Projeto Diretrizes Hanseniase

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Projeto DiretrizesAssociação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina

O Projeto Diretrizes, iniciativa conjunta da Associação Médica Brasileira e Conselho Federalde Medicina, tem por objetivo conciliar informações da área médica a fim de padronizar

condutas que auxiliem o raciocínio e a tomada de decisão do médico. As informações contidasneste projeto devem ser submetidas à avaliação e à crítica do médico, responsável pela conduta

a ser seguida, frente à realidade e ao estado clínico de cada paciente.

Hanseníase: Episódios Reacionais

Elaboração Final: 4 de julho de 2003

Participantes: Foss NT, Souza CS, Goulart IMB, Gonçalves HS,Virmond M

Autoria: Sociedade Brasileira de Hansenologia eSociedade Brasileira de Dermatologia

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DESCRIÇÃO DO MÉTODO DE COLETA DE EVIDÊNCIAS:Esta publicação buscou incorporar as melhores bases de dados disponíveisà época de sua execução. No entanto, estes dados devem ser interpretadoscuidadosamente, os resultados de estudos futuros podem levar a alteraçõesnas conclusões ou recomendações sugeridas por este documento. Foramutilizadas principalmente as bases de dados MEDLINE (U.S. National Libraryof Medicine) e LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciên-cias da Saúde), manuais e documentos do Ministério da Saúde do Brasil eda Organização Mundial de Saúde, teses e livros de textos relacionados aoassunto.

GRAU DE RECOMENDAÇÃO E FORÇA DE EVIDÊNCIA:A: Estudos experimentais e observacionais de melhor consistência.B: Estudos experimentais e observacionais de menor consistência.C: Relatos de casos (estudos não controlados).D: Opinião desprovida de avaliação crítica, baseada em consensos,

estudos fisiológicos ou modelos animais.

OBJETIVOS:1. Estas diretrizes destinam-se à abordagem prática e atualizada dos

estados reacionais da hanseníase.2. Estabelecer terapêutica adequada ao paciente para minimizar os danos

decorrentes das reações hansênicas e os efeitos colaterais dos fármacosempregados para o controle da reação.

CONFLITO DE INTERESSE:Nenhum conflito de interesse declarado.

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INTRODUÇÃO

Episódios reacionais, descritos como fenômenos agudos so-brepostos à evolução crônica e insidiosa da hanseníase, são poten-cialmente responsáveis por perda funcional de nervos periféricos eagravantes das incapacidades. Decorrem do processo inflamatórioe resposta imunológica, mediada por antígenos do Mycobacteriumleprae, e estabelecem relação com a carga bacilar e a resposta imu-ne do hospedeiro. O diagnóstico precoce, o manejo terapêuticoadequado dos eventos reacionais graves, recorrentes ou crônicossão desafios atuais.

Frente à suspeita de reação hansênica, recomenda-se: 1) Con-firmação do diagnóstico e classificação da forma clínica dahanseníase; 2) Diferenciar o tipo de reação hansênica; 3) Estabe-lecer a extensão do comprometimento de órgãos e sistemas;4) Planejar e instituir, precocemente, terapêutica que impeça ainstalação da incapacidade; 5) Conhecer os efeitos adversos dosmedicamentos empregados no tratamento da hanseníase e em seusestados reacionais; 6) Internação hospitalar e colaboração deoutras especialidades diante de casos graves, particularmente, aque-les com acentuado comprometimento de múltiplos órgãos, ou comdificuldades no diagnóstico e/ou na terapêutica. O cumprimentodestas premissas permitirá o manuseio clínico-terapêutico ade-quado e o sucesso no controle dos episódios reacionais com recu-peração ou o mínimo de danos neurais.

RELAÇÃO ENTRE EPISÓDIOS REACIONAIS EESPECTRO DA DOENÇA

Hanseníase é doença infecciosa crônica causada peloMycobacterium leprae que afeta, preferencialmente, o tegumento eo sistema nervoso periférico, entretanto, tanto a disseminação dobacilo quanto os fenômenos reacionais podem envolver outrosórgãos e sistemas. Distintas características clínicas, bacteriológi-cas, imunológicas e histopatológicas compõem o espectro da doençae expressam a relação da resposta específica do hospedeiro ao bacilo.As classificações mais adotadas, MADRI (1953), baseada no as-pecto morfológico das lesões1(D), e RIDLEY JOPLING (1966),fundamentada no aspecto clínico e histopatológico das lesões2(D),utilizaram-se da abordagem espectral definindo as formas polares

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e interpolares da doença. Essas classificações,embora completas, apresentaram dificuldadespara aplicação em nível operacional, e, para fa-cilitar a divisão dos pacientes, a OrganizaçãoMundial da Saúde – OMS (1988)3(D) propôsa classificação em multibacilares e pauci-bacilares, que adota como critério o resultadoda pesquisa de bacilos nos esfregaços cutâneos.Mais recentemente, com a intenção de opera-cionalizar o diagnóstico e controle da doença,especialmente em áreas endêmicas, tem sidoadotada a classificação segundo o número delesões, sendo considerados paucibacilares ospacientes que apresentarem até cinco lesões emultibacilares, aqueles com mais de cincolesões4(D).

O desenvolvimento da doença pode se ma-nifestar primeiramente como hanseníaseindeterminada (HI), estágio inicial, em geraltransitório, que pode evoluir para cura. Em casode progressão, a resposta imune específica dohospedeiro frente ao bacilo irá definir os padrõesda doença5(D). No pólo de resistência ao bacilo,encontra-se a doença localizada e não conta-giosa, a hanseníase tuberculóide (HT), queexpressa resposta imune competente paramorte bacilar.

No pólo de alta suscetibilidade, associado àdeficiência da imunidade celular, específica aoM. leprae, encontra-se a forma disseminada econtagiosa, a hanseníase virchowiana (HV) quedecorre da incapacidade da resposta imune paraimpedir a multiplicação e eliminação do bacilo.As formas interpolares, dimorfo tuberculóide(HDT), dimorfo-dimorfo (HDD) e dimorfovirchowiano (HDV) refletem graduais variaçõesda resistência ao bacilo que tendem a se aproxi-mar das características de cada uma das formaspolares HT ou HV6(D). A evolução crônica e

insidiosa da doença pode ser sobreposta porfenômenos inflamatórios agudos, as reaçõeshansênicas. Os episódios reacionais podemincidir em qualquer uma das formas clínicas,sendo rara sua detecção na hanseníaseindeterminada.

Os episódios reacionais da hanseníase po-dem ocorrer antes, durante ou após a institui-ção do tratamento específico4,6,7(D)8,9(B). Nãoé infreqüente que os sinais e sintomas que acom-panham as reações motivem a busca de auxíliomédico e, ainda, que o surto reacional estejapresente no momento do diagnóstico dahanseníase7(D)10(B).

Os dois tipos de reações hansênicas: Tipo 1ou reação reversa (RR) e Tipo 2 ou eritemanodoso hansênico (ENH) refletem processoinflamatório imune-mediado, envolvendo dis-tintos mecanismos de hipersensibilidade11,12(D).O entendimento do conceito espectral dahanseníase e dos padrões da resposta imunealiados ao reconhecimento das manifestaçõesclínicas e laboratoriais dos surtos reacionais seráútil para diferenciar as reações tipo RR e ENH,suas características de evolução clínica e conse-qüentemente de propostas terapêuticas.

Há interesse voltado para determinarmarcadores clínicos ou laboratoriais que iden-tifiquem pacientes com aumento do risco parao desenvolvimento das reações. Vários fato-res desencadeantes tais como: estresse, trau-ma físico ou psicológico6(D), contracep-tivos orais e outras drogas6,7(D), infecçõesintercorrentes, particularmente, co-infecçõescomo tuberculose6(D) e HIV7(D) foramcorrelacionados às reações, por meio, em suamaioria, de observações clínicas mais do quepor comprovações de estudos clínicos con-

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trolados. Estudos realizados em áreas em quea hanseníase e a Aids ocorrem simultaneamen-te têm observado uma pequena associaçãoentre infecção HIV1 e hanseníase. Entretan-to, mesmo considerando que tais pesquisas nãoidentificaram associação significante entreHIV1/ Aids e hanseníase, há perspectivas deque estudos futuros possam contribuir cominformações acerca das possíveis modificaçõesdos padrões clínicos de ambas as morbidades,assim como da freqüência dos eventos reacio-nais e das recidivas da hanseníase nestespacientes13(D).

REAÇÃO TIPO 1 OU REAÇÃO

REVERSA (RR):

O episódio da RR envolve principalmentemecanismos da imunidade mediada por célu-las ou de hipersensibilidade tardia (tipo IV deCoombs & Gell)11,12(D). Estas reações ocor-rem com maior freqüência nas formas dimorfas(HD, HDT e HDV)10(B)6,14(D). A incidênciada RR na forma HV é significantemente me-nor do que na forma HDV8(B), e sua ocorrên-cia pode ser observada na forma HT10(B).

O processo inflamatório da RR envolve,principalmente, a pele e nervos invadidos pelobacilo. O comprometimento múltiplo ouisolado de troncos nervosos mantém relaçãocom as formas clínicas, extensão da invasãobacilar e resposta imune. A intensidade daagressão e deterioração neural decorre dainteração entre o bacilo e o hospedeiro, envol-vidos no processo inflamatório imune-media-do em resposta à invasão tecidual. A exube-rância e predomínio da resposta inflamatóriagranulomatosa, ou reação imunológica tipo IV,podem resultar na formação de abscesso neurale úlceras cutâneas6(D).

EPIDEMIOLOGIA

A despeito da importância dos episódiosreacionais na indução de danos neurais, as difi-culdades para obtenção das estimativas daprevalência e da incidência da RR decorrem emparte das diferenças na definição de casos, perio-dicidade, regularidade e qualidade do seguimentodurante e após alta terapêutica, que são, emgeral, mais controladas nos estudos clínicos eepidemiológicos. A ocorrência de RR em qual-quer período mantém relação com a formaclínica da hanseníase. O tipo de tratamentopoderia influir na incidência de surtos reacionaisdurante e após a sua interrupção7(D)15,16(B).

Cerca de 8% a 33% dos indivíduos comhanseníase podem ser acometidos por RR 7(D).No Brasil, dos pacientes multibacilares, segui-dos por seis anos pós-tratamento, 74% apre-sentaram episódios reacionais, sendo 29% deRR, 25% de ENH e 20% de neuriteisolada17(B). Outro estudo controlado e com-parativo de dois esquemas terapêuticos mostrouque 50% dos pacientes tratados com o regimede poliquimioterapia (PQT/OMS) apresenta-ram reações hansênicas, entre estas 17,1% deRR, 30% de ENH e 2,8% de neurite isolada.A ocorrência das manifestações reacionais foisignificantemente menor com regime PQT/OMS comparada àquela observada com regi-me preconizado anteriormente pela DivisãoNacional de Dermatologia Sanitária doMinistério da Saúde (DNDS)16(B).

CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS

Clínicos• Manifestações cutâneas: na reação reversa,

o processo inflamatório atinge a pele e nervosperiféricos. As lesões cutâneas preexistentes

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tornam-se mais eritematosas, intumes-cidas, edematosas e infiltradas. As máculastornam-se placas elevadas e os limites daslesões tornam-se mais evidentes e definidos.Evoluem com descamação e, por vezes, so-brevém a ulceração. Novas lesões asseme-lhando-se às demais surgem em áreas adja-centes. Concomitante a estas alterações,pode ocorrer hiperestesia ou acentuação daparestesia sobre as lesões cutâneas4,6,18(D).

• Neuropatias: o dano neural pode ocorrer aolongo de todo espectro da doença e, sejacomo fenômeno agudo ou crônico, poderesultar em incapacidade e seqüelas irrever-síveis. A perda da função sensitivo-motoradecorrente das neuropatias é uma das maisfreqüentes e graves conseqüências da reaçãoreversa. O espessamento neural acompanha-do de dor, hiperestesia ou acentuação dahipoestesia no território neural acometidopor menos de seis meses de duração caracte-rizam a neurite aguda. Entretanto, a perdada função neural pode instalar-se na ausên-cia dos sintomas de dor e/ou intumescên-cia, definindo-se a neuropatia silenciosa.Neuropatia recorrente é caracterizada porepisódio de acometimento agudo de nervoperiférico no período maior de três mesesapós a interrupção da terapêutica, duranteo qual nenhum sinal ou sintoma de neuritefoi evidente. Na neuropatia crônica, os si-nais e sintomas de inflamação, edema edor, geralmente reaparecem dentro doperíodo de três meses após o término daterapêutica19,20(B).

Com maior freqüência, há o envolvimentodos nervos ulnar e tibial posterior8,19-21(B). Ainstalação súbita da mão em garra, pé caído elagoftalmo deve receber intervenção rápida e

precoce, para evitar que se tornem alteraçõespermanentes. Frente a estes aspectos, asneurites podem ser consideradas emergênciasclínicas, pois a precocidade do seu reconhe-cimento e da intervenção terapêutica podeprevenir o desenvolvimento do dano neural,o estabelecimento de incapacidades e deformi-dades.

Em geral, nos episódios de reação reversanão há comprometimento sistêmico e as ma-nifestações são predominantemente localiza-das. Quadros graves e extensos podem seracompanhados de febre baixa, indisposição eanorexia. O envolvimento cutâneo e neuralvaria entre discreto e grave. Nos quadros maisgraves, há tendência a ulceração das lesõescutâneas, edema acentuado da face, mãos e pés,acometimento de maior número de nervos pe-riféricos concomitante ao comprometimentoda sensibilidade e da força muscular. A pre-sença de placas cutâneas sobre áreas de tronconervoso ou nas regiões perioculares conferemaior gravidade à reação devido ao risco eleva-do de comprometimento neural22(B). Adetecção desses sinais sugere eminência desurto reacional e requer acompanhamentomais rigoroso seguido de tratamento precoce.Testes para avaliação das funções sensitiva emotora são considerados valiosos instrumen-tos de monitoração dos danos neurais associa-dos aos episódios reacionais20,21,23(B). A sus-peita de neurite reacional deve ser feita quan-do da: 1) Perda recente da função neural; 2)Dor ou intumescência de um ou mais nervosperiféricos; 3) Intumescência do nervo semperda da função.

LaboratoriaisEm geral, na RR não são observadas altera-

ções hematológicas e da bioquímica sangüínea.

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A histopatologia de lesões cutâneas exibe edemae expansão do granuloma, aumento marcantedo número de linfócitos, de células epitelióidese de células gigantes, e a redução do número debacilos24,25(D). Podem ser observadas hiperplasiaepitelial e alterações mais graves como necrosesfocais ou confluentes que resultam emulcerações25(D). Em conjunto com os demaismétodos de investigação, as técnicas de imuno-histoquímica e da reação em cadeia dapolimerase (PCR) adicionaram evidênciasindicativas da exacerbação da respostaimunocelular e da redução da carga bacilar naRR12(D)26(C).

Fatores de riscoEpisódios de reação reversa têm sido

associados a fatores de risco como: doença ex-tensa, indicada pelo número de áreas corpóreasenvolvidas9(B), grupo dimorfo9,10(B), lesõesfaciais26(C)27(B), vacinação BCG28,29(C). Aconcomitância de anticorpos glicolipídeofenólico fração-1-anti-PGL-1 e positividadedo teste lepromínico foi sugerida como fatorde risco e marcador da RR30(B). Tem sido ava-liado se as drogas utilizadas para o tratamen-to específico poderiam influenciar no riscopara reação reversa, porém, existem poucosestudos clínicos randomizados com avalia-ções conclusivas17(B)7(D). Logo, essa hipó-tese deve ser considerada com cautela.Outro potencial fator de risco é a gestaçãoque pode cursar, em todas as suas fases,com neurite silenciosa, embora esta predo-mine na lactação31(C). Adicionalmente,existem relatos de que o risco para neuropatiaaumenta de forma significativa em idosos, noscasos de diagnóstico tardio e segundo onúmero de nervos espessados no momentodo diagnóstico ou, ainda, durante a evoluçãoda RR20(B).

A freqüência de reações e/ou perda dafunção neural, necessitando de tratamento,é maior em multibacilares comparada aospaucibacilares21(B). Foi observada correlaçãopositiva entre pacientes multibacilares comíndice baciloscópico (IB) maior ou igual a2,0 no diagnóstico e maior número de epi-sódios reacionais durante o tratamento e apósa alta medicamentosa32(C). O risco de RR émais elevado durante o primeiro ano de tra-tamento com esquema de poliquimioterapia- PQT/OMS nos pacientes multibacilares,tanto para aqueles da forma HDV como paraos da forma HV8,9(B). Nos paucibacilares,além do período de tratamento com esque-ma PQT/OMS, os primeiros seis meses sub-seqüentes ao seu término constituem, ainda,um período de risco para o desenvolvimentode episódios de RR8(B). Nos dimorfos, ouHD, a RR, em geral, ocorre no período depoucas semanas a meses e, nos HDV ocorredentro de 1 a 12 meses após início do es-quema PQT6,33(D). A partir do primeiro ano,há gradual declínio da ocorrência dos episó-dios reacionais nos pacientes paucibacilarese multibacilares8(B). Em cerca de 90% dospacientes que têm reações após a alta, o pri-meiro episódio ocorre no primeiro ano apóso término do tratamento32(C). Com menorfreqüência, os eventos de RR podem serobservados nos paucibacilares até o terceiroe quarto anos após interrupção do esquemaPQT/OMS8(B) e ainda no quinto ano demultibacilares tratados com esquema PQTaté negativação da baciloscopia8(B). Arecorrência tardia de sinais e sintomascutâneos e/ou neurológicos deve ser con-duzida, em geral, em centros de referência,com procedimentos de investigação quediferenciem a reação reversa tardia da reci-diva de hanseníase.

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Distinção entre reação reversa erecidiva

O diagnóstico de recidiva de doentespaucibacilares é um desafio desde que a apa-rência das lesões cutâneas e as alterações histo-lógicas são muitas vezes indistinguíveis dareação reversa tardia34(B). A maioria dos epi-sódios de RR em paucibacilares após a inter-rupção da PQT é observada dentro do períododos primeiros dois anos, porém, estudos comperíodos de maior seguimento demonstrarama ocorrência tardia de episódios tardios deRR8(B). Para diferenciação entre RR e recidi-va, tem sido proposto, operacionalmente, o usode corticoesteróides, pois a RR, geralmente,responde a este tratamento em poucos dias ousemanas4,7(D). Algumas das recomendações

gerais adotadas para nortear a diferenciação en-tre RR e recidiva4,35(D) foram sumariadas noQuadro 1.

TRATAMENTO DA REAÇÃO REVERSA

Os princípios do manejo da RR são:1) manutenção das drogas antimicobacterianas;2) terapêutica antiinflamatória efetiva e prolon-gada e 3) analgesia adequada e suporte físicodurante a fase de neurite aguda. A manutençãoda PQT nos episódios reacionais é imperativa,pois proporciona a redução da carga de bacilosna pele e nervos, removendo o alvo de células Tindutoras da resposta inflamatória e, conseqüen-temente, a tendência à recorrência dos episó-dios de RR14(D).

Quadro 1

Principais aspectos da distinção entre reação reversa e recidiva

Características Reação Reversa RecidivaPeríodo de ocorrência Freqüente durante a PQT e Em geral, período superior a

nos primeiros seis meses. dois anos após términoMenos freqüente no período da PQTde dois a três anos apóstérmino do tratamento.

Surgimento Súbito e inesperado Lento e insidiosoLesões antigas Eritematosas, brilhantes, Algumas podem apresentar

intumescidas e infiltradas bordas eritematosasLesões recentes Em geral, surgimento de Poucas

várias lesõesUlceração Acentuação das alterações Raramente há ulceração

e ulceraçãoRegressão Presença de descamação Ausência de descamaçãoComprometimento neural Maior número de troncos Poucos troncos nervosos,

nervosos envolvidos, perturbações sensitivo-rapidamente sobrevêm a dor motoras ocorrem, em geral,e perturbações mais lentamente.sensitivo-motoras

Resposta a Excelente Não pronunciadacorticoesteróides

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CorticoesteróidesO corticoesteróide é a droga de escolha para

o tratamento da RR, modificando o curso destareação, com redução do edema das lesõescutâneas e intraneural, o que resulta em rápidamelhora4,14,33,36(D). A avaliação e monitoramen-to clínico da bioquímica sangüínea, presença deco-morbidades, riscos e a exclusão de co-infec-ções/infestações, como estrongiloidíase e tuber-culose, são premissas para o emprego seguro e osucesso terapêutico da corticoterapia com omínimo de efeitos colaterais.

O uso precoce de corticoesteróides estárecomendado, frente a evidências de:1) acentuação da inflamação de lesões

preexistentes ou surgimento de novas lesões;2) dor ou intumescimento dos nervos ou perda

da função neural com duração menor de seismeses.

Danos neurais permanentes poderão ser pre-venidos com a terapia efetiva e precoce. Há re-comendações do emprego de corticoesteróidesna dose de 1 a 2 mg/ kg ao dia4(D). Entretanto,há indicações que a dose inicial de 40 mg (0,5 -0,6 mg/ kg) de prednisona ou prednisolona aodia controla a maioria das RR33,36(D), com res-salvas para casos graves que não respondem noperíodo de uma semana, que podem requererdoses mais elevadas 60 mg (ou 1-2mg/kg) aodia de corticoesteróides33,36(D). Diante das evi-dências de melhora ou regressão clínica, a dosede corticoesteróides deve ser reduzida em inter-valos e quantidades fixas, em geral, 5-10mg acada uma a duas semanas. Em circunstânciasideais, a dose, o período de manutenção e a ve-locidade de redução da terapêutica devem seradotados baseando-se em avaliações padroniza-das com testes para função motora e sensitiva.Tratamentos prolongados da RR com

corticoesteróides de 4 a 18 meses demonstra-ram-se superiores aos períodos reduzidos de doismeses37(B). A extensão de 12 para 20 semanasde tratamento com corticoesteróides reduziu arecorrência da RR em pacientes HD/HDV8(B).Como a gravidade e extensão dos quadrosreacionais guardam relação com as formas clí-nicas, há indicações que pacientes HDT reque-rem períodos menores de corticoesteróides, dequatro a nove meses, comparados com HD eHDV, seis a nove meses e 6 a 18 meses, ou até24 meses, respectivamente33(D).

Outras terapias para a reação reversaCiclosporina, dose inicial entre 5 e 10mg/

kg ao dia, é imunossupressor com seletividadepara linfócitos auxiliares CD4+ e, potencialmen-te, útil para o controle da reação reversa. En-tretanto, o custo da droga é maior e não há evi-dências suficientes de que a ciclosporina atuetão rapidamente no edema intraneural como ocorticoesteróide36(D).

Azatioprina, dose de 1mg/kg ao dia, temsido indicada como agente imunossupressor epoupador de corticoesteróides. A associaçãocorticoesteróides e azatioprina resultou em pro-porção discretamente superior de melhora dodistúrbio motor comparada com os resultadosde pacientes tratados com o uso isolado de umadas drogas em pequena série de casos. Como aazatioprina age mais lentamente e não tem efeitono edema intraneural, está indicada apenascomo adjuvante após a introdução do tratamentocom corticoesteróides14(D).

Cirurgia descompressiva deve ser considera-da nos casos de dor neural persistente, manuten-ção ou piora da neuropatia, após a realização dotratamento com corticoesteróide38(B). Em par-ticular, casos de abscessos neurais, associados à

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dor intensa e contínua, podem se beneficiar coma cirurgia descompressiva14,36(D)37(C).

REAÇÃO TIPO 2 OU ERITEMA NODOSO

HANSÊNICO (ENH):

A reação tipo 2 é uma reação inflamatóriaaguda, sistêmica, que envolve a formação deimunocomplexos que circulam pelo sangue pe-riférico (predominantemente a reação tipo IIIde Gel & Coombs), e tem como manifestaçãoclínica mais freqüente o Eritema NodosoHansênico.

Acomete pacientes multibacilares, agravan-do o quadro relacionado à hanseníase, sendoresponsável por morbidade considerável, par-ticularmente, o eritema nodoso recorrente. Apatologia do ENH envolve depósito deimunocomplexos e alteração da respostaimunológica mediada por células. O episódiode ENH é desencadeado pelo depósito de com-plexos imunes nos tecidos39(D), ativação decomplemento, desenvolvimento de inflamaçãolocal, migração de polimorfos nucleares para osítio de resposta inflamatória e liberação localde enzimas responsáveis por lesões teci-duais40(D)41(C). Macrófagos e células T sãoativados12(D) e os níveis de TNFα circulantese elevam durante os episódios de ENH42, 43(D).Concentrações elevadas de anticorpos contrafrações antigênicas do M. leprae, como oanticorpo anti-PGL-1, são observadas nas for-mas com alta carga bacilar11(D)44(C) e partici-pariam da síndrome do imunocomplexocirculante que se instala durante o episódioreacional e cursa com sinais clínicos caracte-rísticos. O depósito do complexo antígeno-anticorpo circulante, ao atingir espaçosteciduais, vasos sangüíneos e linfáticos, desen-cadeiam a resposta inflamatória.

Episódios reacionais de ENH podem envol-ver muitos órgãos e sistemas, dependendo dagravidade e extensão da reação imunológica. Aavaliação clínica e laboratorial do surto reacionaldeve compreender uma investigação voltada paraalterações de pele, nervos, olhos, articulações,rins, testículos, vias áreas superiores, entre ou-tras. A intensidade varia entre casos discretosde ENH com lesões cutâneas pouco dolorosas,sem comprometimento do estado geral, a casosmais graves com formações de lesões vésico-bolhosas e pustulosas, lesões ulceradas enecróticas, concomitante a febre, mal-estar,cefaléia, náu-seas e vômitos.

O manejo do ENH é guiado pela necessi-dade do controle da reação inflamatória aguda,alívio da dor e do desconforto, bloqueio do de-senvolvimento e extensão das alteraçõescutâneas, neurais, oculares e viscerais e a pre-venção de novos episódios.

EPIDEMIOLOGIA

Previamente à introdução da PQT/OMS,cerca de 50% dos pacientes virchowianos (HV)e 25% a 30% dos pacientes HDV eram afeta-dos por este padrão de reação6(D). Há evidênci-as da redução da incidência do ENH com aadoção do esquema PQT/OMS, particular-mente em decorrência da inclusão daclofazimina16(B)45(D), entretanto, há registrosde variabilidade das taxas de incidência, em di-ferentes estudos, sendo descritos cerca de 5%do total de pacientes reacionais na Etiópia8(B)e estimativas de taxas mais elevadas noBrasil e Ásia. Estudos controlados no Brasilmostraram o ENH como tipo freqüente dereação entre os multibacilares com esquemaPQT/OMS, entre 25%17(B) a 30%16(B),atingindo 62,8% dos pacientes com esque-

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ma DNDS16(B). O ENH também foi o tipode reação mais freqüente e recorrente na vigên-cia do tratamento e no seguimento após a alta,tanto do esquema terapêutico PQT/OMS,quanto no esquema DNDS16(B).

Com maior freqüência os episódios deENH incidem no primeiro e segundo ano dePQT8,16(B) e podem persistir por anos17(B), masdeve ser lembrado que a reação ENH pode ocor-rer previamente ao tratamento específico e seruma manifestação presente no momento dodiagnóstico de hanseníase6(D)8(B).

CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS

Clínicos• Manifestações cutâneas

As lesões cutâneas do ENH representamparte das manifestações do comprometimentode múltiplos sistemas, que pode envolver qual-quer órgão ou sistema atingido por antígenosbacilares e/ou imunocomplexos. A alta cargabacilar, presente nas formas HDV e HV,induziria a produção de imunoglobulinas eimunocomplexos, e participaria da disfunçãoenvolvendo mecanismos humorais e celularesdo processo inflamatório agudo, característicodo ENH.

Nesta reação, a pele, aparentemente normal,é acometida pelo aparecimento súbito depápulas, nódulos e placas nodosas. As lesões sãodolorosas e tensas ao toque, de coloração róseaa eritemato-violácea, evoluem com descamaçãocentral e podem se tornar hemorrágicas,vesicobolhosas, pustulares e ulcerativas, carac-terizando o quadro de eritema nodosonecrotizante. Diferente da RR, as lesõespreexistentes permanecem inalteradas. O

surgimento de lesões obedece a uma distribui-ção simétrica, bilateral e difusa que atinge a face,tronco e membros, preferencialmente a super-fície extensora das extremidades. As lesões per-duram por sete a dez dias e, durante os surtos,as lesões antigas coexistem com as mais recen-tes. A eclosão das lesões pode evoluir de modointermitente ou contínuo, caracterizando qua-dros crônicos e recorrentes que persistem pormeses a anos6(D). As principais manifestaçõese distinções clínicas entre RR e ENH foramsumariadas no Quadro 24,6(D).

Os quadros crônicos persistentes devem serdiferenciados da recidiva das formas bacilaresda hanseníase. Em geral, os quadros de recidivaevoluem com o surgimento lento de pápulas enódulos, que não exibem as características in-flamatórias agudas, sendo marcante a presençade bacilos íntegros34(B).

• Outras manifestações

Podem estar presentes manifestaçõesextracutânea e sistêmica, incluindo febre, mal-estar, hiporexia, perda de peso, neuropatia,orquiepididimite, glomerulonefrite (porimunocomplexo), miosite, artralgia, artrite degrandes articulações, sinovite, dactilite, doresósseas, iridociclite e uveíte, comprometimentoda faringe, laringe e traquéia. Alterações clíni-cas como hepatoesplenomegalia, infartamentoganglionar generalizado, edema acrofacial ougeneralizado, rinite, epistaxe, insônia e de-pressão podem ser observadas4,6,18,45(D).

Em casos discretos, as lesões cutâneassão, em geral, em pequeno número, poucosintomáticas e não estão associadas ao com-prometimento sistêmico importante. Noscasos moderados a graves, a extensão das

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manifestações cutâneas e sistêmicas é maisacentuada. A presença de lesões úlcero-necróticas e o comprometimento de olhos,nervos, testículos, rins e fígado são condiçõesagravantes que implicam em monitoramentoe intervenção terapêutica antiinflamatóriaprecoce e efetiva, em geral com cortico-esteróides4,6,18,45(D).

LaboratoriaisEm estreita relação com a gravidade do sur-

to reacional, podem ser observadas alteraçõeshematológicas e da bioquímica sangüínea comleucocitose, neutrofilia e plaquetose46(D)47(B)48(C),aumento das proteínas da reação inflamatóriaaguda, especialmente proteína-C-reativa e

α1-ácido glicoproteína43,46(D), aumento dasimunoglobulinas IgG e IgM11,15,43(D) eproteinúria18,46(D). O histopatológico de lesãocutânea exibe denso infiltrado inflamatórioneutrofílico na derme superficial e/ou profun-da e/ou subcutâneo. Freqüentemente, o inten-so influxo de neutrófilos forma microabscessose a vasculite pode predominar em alguns casos.Há redução local da carga bacilar com avisualização de numerosos bacilos fragmenta-dos e granulosos25(D).

Fatores de riscoPacientes com doença virchowiana, infiltra-

ção cutânea e índice baciloscópico > 4 apre-sentaram risco significantemente aumentado de

Quadro 2

Principais distinções clínicas entre Eritema Nodoso Hansênico e Reação Reversa

Sinais e Sintomas Reação Reversa (Tipo 1) ENH (Tipo 2)

Manifestações cutâneas Associadas às lesões prévias: Distribuição simétricaEritema, edema/intumescimento dissociada de lesões prévias:e infiltração. pápulas, nódulos e placas,Surgimento de lesões satélites dolorosos.em áreas adjacentes. Descamação central.Descamação, às vezes Lesões hemorrágicas,ulceração. vesicobolhosas, pustularesEdema acral e facial. e ulcerativas.

Manifestações neurológicas Espessamento neural;Dor no território de distribuição do nervo;Distúrbios da função neural motora e/ou sensitiva, com ou semsintomas de dor;Redução da força muscular e paralisia progressiva.

Condições gerais do paciente Boa, sem febre Mal estar geral, febre altaFormas clínicas Formas dimorfas: DT, DD, DV Formas multibacilares: DV e VV

Olhos Fraqueza de pálpebras, Irite e iridociclite.dificuldade para fechar.

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desenvolver reação tipo 249(C). A taxa derecorrência do ENH é significantemente ma-ior do que da RR50(B). Gravidez, puberdade,doenças intercorrentes, vacinação e estresseforam implicados com o desenvolvimento deENH6(D).

TRATAMENTO DO ERITEMA NODOSO

HANSÊNICO

Antiinflamatórios não-esteroidais(AINE)

Todos os casos de ENH devem receber re-pouso e terapêutica antiinflamatória. Em casosgraves ou frente a evidências de comprometi-mento ocular, neural, testicular, deve ser inicia-do o tratamento com corticoesteróides4,45(D).Casos discretos de ENH podem ser tratados comantiinflamatórios não-esteroidais (AINE) erepouso36,45(D). Os efeitos da indometacina nocontrole do ENH foram semelhantes aos dacloroquina e superiores aos do ácidoacetilsalicílico51(B). Nos casos moderados deENH, a colchicina foi mais efetiva em induziralívio da dor neural e articular comparada aoácido acetilsalicílico52(B). Estudos posterioresfalharam em demonstrar o sucesso destes resul-tados, implicando na continuidade do uso decorticoesteróides em pacientes com ENH crô-nico e nas limitações impostas pelos efeitoscolaterais da colchicina53(B)54(C). O uso dapentoxifilina, 1200 mg ao dia, dividido em trêsdoses, pode beneficiar os quadros com predo-mínio de vasculite.

CorticoesteróidesPrednisona na dose de 0,5 a 2 mg por kg ao

dia está indicada como antiinflamatório deescolha nos casos moderados a graves. A res-posta é usualmente rápida e a redução gradualpode possibilitar o período de remissão dos

surtos4,36,45(D). Embora o tratamento comcorticoesteróides seja efetivo, pacientes comENH possuem o grande risco de tornarem-sedependentes dessa droga, especialmente aque-les com ENH crônico45(D).

Os corticoesteróides são drogas de escolhano controle dos surtos reacionais de ENH commanifestações sistêmicas moderadas a graves enas condições em que estejam presentes fenô-menos de vasculite, nos quadros de mãos e pésreacionais, envolvimento de nervos, olhos,testículos ou vísceras4,36(D).

TalidomidaTrata-se de consenso que a talidomida é a

droga de primeira escolha no manejo do ENHagudo e recorrente. A melhora clínica emresposta à talidomida é rápida, usualmente en-tre 8 e 72 horas, e em alguns casos cincodias55,56(B)57(C). O uso concomitante datalidomida produziu significante redução da dosee do tempo de necessidade de corticóides57(C).A talidomida foi comprovadamente superior àaspirina na rapidez da resolução da febre e re-gressão das lesões cutâneas56(B). Há tambémsugestões acerca do valor da talidomidana diminuição da freqüência dos episódiosreacionais58(C).

Apesar das evidências clínicas que demons-tram a utilidade da talidomida no manejo doENH, o alto risco de teratogenicidade implicaem controle e limitações do seu emprego4,45(D).A sua prescrição deve ser rigorosamente acom-panhada de métodos contraceptivos, necessá-rios às mulheres em idade fértil, e orientaçõesaos seus usuários sobre os efeitos teratogê-nicos da droga. Destaca-se a necessidade deresponsabilidade pelo uso exclusivo e indivi-dual da medicação, de forma a evitar o uso,

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14 Hanseníase: Episódios Reacionais

acidental ou voluntário, por outrosindivíduos4,45(D).

É controverso o potencial de neuro-toxicidade associada ao uso da medicação nahanseníase45(D)59(C). A neuropatia periférica,decorrente do uso da talidomida em outrasafecções, está bem documentada na litera-tura60(B)61(D). Outros efeitos colaterais, comoconstipação, sonolência e edema de extremida-des podem ser observados61(D).

ClofaziminaFoi sugerido efeito antiinflamatório desta

droga quando do seu uso nos esquemasterapêuticos antibacterianos16,62(B). O trata-mento com clofazimina resultou na reduçãoda necessidade do corticoesteróide nos pacien-tes com ENH grave62,63(C), e de antiinflama-tórios nos pacientes com ENH moderado64(B).Clofazimina é menos efetiva e não atua tãorapidamente quanto os corticoesteróides e atalidomida. Seu principal efeito seria o de

prevenir novos surtos e reduzir a dependênciados corticoesteróides62(C). A despeito dasevidências, não há estudos controlados paraaveriguar os efeitos antiinflamatórios da dro-ga em outras enfermidades e dissociados daação antimicobacteriana na hanseníase.

Os esquemas terapêuticos indicam o uso daclofazimina por três meses, sendo no primeiromês dose de 100 mg três vezes ao dia, reduzin-do-se 100 mg a cada mês4(D). Outro esquemapropõe tratamento prolongado de até 15 meses,sendo a dose inicial de 300 mg ao dia por trêsmeses, e a redução da dose para 200 mg ao dia e,posteriormente, 100 mg ao dia, no intervalo deum a seis meses36(D). Tais esquemas podem serúteis para o ENH crônico ou recorrente, espe-cialmente para pacientes dependentes decorticoesteróides. Os efeitos colaterais se acen-tuam com o emprego de altas doses ou de esque-mas terapêuticos prolongados, em geral, restri-tos a pigmentação cutânea, ictiose, desconfortogastrointestinal, diarréia e dor abdominal36(D).

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15Hanseníase: Episódios Reacionais

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