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PROJETO PENSANDO O DIREITO ÁREA TEMÁTICA: AGÊNCIAS REGULADORAS E A TUTELA DO CONSUMIDOR Convocação nº. 001/2009 Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça -- Produto III -- Março de 2010 1

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PROJETO PENSANDO O DIREITO

ÁREA TEMÁTICA: AGÊNCIAS REGULADORAS E A TUTELA DO CONSUMIDOR

Convocação nº. 001/2009

Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça

-- Produto III --

Março de 2010

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...................................................................................................................................4

1 PROPOSTAS DE INSTRUMENTOS PARA EFETIVAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO SOCIAL NO

PROCESSO DECISÓRIO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS......................................................6

1.1 Propostas Gerais........................................................................................................................7Objetivo 1 - Esclarecimento do papel da regulação...................................................................9Objetivo 2 - Transparência nos processos decisórios e qualificação da participação...............13Objetivo 3 - Integração entre agências e Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC)..................................................................................................................................................16Objetivo 4 - Estabelecimento de Agenda Regulatória..............................................................20Objetivo 5 - Adequado atendimento ao consumidor individual...............................................23Objetivo 6 - Fomento às organizações de defesa do consumidor.............................................26Objetivo 7 - Ampliação dos espaços participativos e aprimoramento dos canais existentes. . .30

2 INCORPORAÇÃO DE TEMAS REFERENTES À PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR NA

AGENDA REGULATÓRIA E ARTICULAÇÃO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS COM O

SISTEMA NACIONAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR............................................................36

2.1 Entrevistas com especialistas em regulação, com representantes de agências reguladoras erepresentantes do SNDC................................................................................................................36

2.1.1 Entrevista com Calixto Salomão Filho............................................................................382.1.2 Entrevista com Ronaldo Porto Macedo Junior................................................................392.1.3 Entrevista com Ana Luiza Valadares...............................................................................412.1.4 Entrevista com Carlos Ari Sunfeld..................................................................................422.1.5 Entrevista com Roberto Pfeiffer......................................................................................432.1.6 Considerações Idec..........................................................................................................44

2.2 Experiências de articulação entre agências reguladoras e órgãos de defesa do consumidor. .472.2.1 Cenário Geral: interação SNDC e agências reguladoras.................................................472.2.2 Acordos de cooperação entre ANS e Procons..................................................................51

3 PROPOSTA DE ANTEPROJETO DE LEI....................................................................................57

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4. DIRETRIZES PARA O ESTABELECIMENTO DE INSTRUMENTOS DE COMUNICAÇÃO E

EDUCAÇÃO PARA O CONSUMO QUE CONTEMPLEM TEMAS RELATIVOS AO PAPEL

DAS AGÊNCIAS, DOS ÓRGÃOS DO SNDC E DIREITOS DO CONSUMIDOR NOS SETORES

REGULADOS ...................................................................................................................................72

5. CONCLUSÃO FINAL...................................................................................................................79

REFERÊNCIAS.................................................................................................................................83

ANEXO 1 - Íntegra entrevista Calixto Salomão Filho......................................................................85

ANEXO 2 - Íntegra entrevista Ronaldo Porto Macedo Júnior.........................................................88

ANEXO 3 – Íntegra entrevista Ana Luiza Valadares Ribeiro............................................................97

ANEXO 4 – Íntegra entrevista Carlos Ari Vieira Sundfeld.............................................................105

ANEXO 5 – Íntegra entrevista Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer............................................110

ANEXO 6 - Legislação Argentina e Peru: financiamento à participação social..............................113

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INTRODUÇÃO

O presente relatório é o terceiro e último apresentado em sede do Projeto Pensando o Direito. Serão

apresentadas as conclusões do trabalho desenvolvido pelo Idec acerca das “Agências Reguladoras e

a tutela do consumidor” e propostas de aperfeiçoamento da atividade regulatória, que podem ser

divididas em quatro grandes grupos:

1) Propostas de instrumentos para efetivação da participação social no processo decisório das

agências reguladoras;

2) Propostas de mecanismos que visem à incorporação de temas referentes à proteção do

consumidor na Agenda Regulatória, inclusive através da articulação das agências reguladoras com

o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC);

3) Proposta de Anteprojeto de Lei;

4) Diretrizes para o estabelecimento de instrumentos de comunicação e educação para o consumo

que contemplem temas relativos ao papel das agências, dos órgãos do SNDC e direitos do

consumidor nos setores regulados.

Inicialmente serão apresentadas propostas gerais de instrumentos para efetivação da participação

social no processo decisório das agências reguladoras, divididas em sete objetivos que se

intercomunicam. As idéias apresentadas podem servir de subsídio tanto para iniciativas legislativas

como para ações a serem tomadas pelas agências reguladoras. Destacamos que as propostas

tiveram como fonte o resultado do Workshop – Regulação e participação social: experiências,

desafios e propostas, realizado em novembro de 2008, promovido pelo Idec no Projeto

desenvolvido com apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID): Programa de

Fortalecimento da Capacidade Técnica da Participação Social nos Processos de Regulação.

Convênio ATN/ME-10541-BR (BR-M1035).

No que diz respeito aos mecanismos que visam incorporar temas referentes à proteção do

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consumidor na Agenda Regulatória, inclusive através da articulação das agências reguladoras com o

Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), as propostas apresentadas também tiveram o

subsídio de entrevistas com especialistas em regulação, representantes de agências reguladoras e do

Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, além do conhecimento adquirido pelos pesquisadores

do Idec sobre regulação. Evidenciou-se, assim, os diversos entendimentos sobre a relação entre

direitos do consumidor e regulação. De igual maneira, questionou-se aos entrevistados sobre

eventuais propostas para inclusão das discussões de consumo na Agenda Regulatória, assim como

opiniões sobre as propostas em debate atualmente.

A articulação das agências reguladoras com o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor também

foi alvo de estudo como um meio de incorporação dos temas afetos à proteção e defesa do

consumidor na atividade regulatória. Para isso, foram identificadas experiências pontuais de

articulação entre agências reguladoras com órgãos de defesa do consumidor. Ao evidenciar essas

experiências, pretende-se conhecer mais em detalhes os aspectos dessas articulações e seus efeitos.

Consideradas as propostas apresentadas, optou-se por desenvolver um anteprojeto de lei (APL) que

as contemplassem. O APL apresentado dispõe sobre os procedimentos para elaboração da Agenda

Regulatória, a realização de consultas e audiências públicas a serem adotados pelos Órgãos ou

Entidades Reguladoras, e sobre o estímulo à participação de entidades de defesa do consumidor no

processo regulatório.

Por fim, o quarto e último ponto trata de instrumentos de comunicação e educação para o consumo

em temas relativo ao papel das agências, dos órgãos do SNDC e dos direitos do consumidor nos

setores regulados. Serão apresentadas idéias práticas para implementação desses instrumentos, a

fim de que se aprimore e se amplie a comunicação dos agentes reguladores com a sociedade.

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1 PROPOSTAS DE INSTRUMENTOS PARA EFETIVAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO SOCIAL

NO PROCESSO DECISÓRIO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS

O acúmulo de experiências vivenciadas pelo Idec na representação do consumidor em instâncias de

participação social, assim como sua larga experiência no debate de temas relacionados a regulação,

permitem afirmar a existência de problemas que comprometem o exercício do controle social e a

transparência nos processos decisórios das agências reguladoras. Ao longo desse projeto,

evidenciou-se a existência de obstáculos à efetivação da participação social no processo decisório

das agências reguladoras, como por exemplo:

− Falta de transparência nos processos decisórios;

− Procedimentos inadequados para consultas e audiências públicas - divulgação deficiente, prazos

extremamente curtos para apresentação de contribuições sobre temas de alto grau de complexidade

técnica, linguagem extremamente técnica, que dificulta a compreensão por parte das organizações

de consumidores;

− Ausência de recursos técnicos e financeiros que viabilizem a participação efetiva das

organizações de consumidores nas instâncias de controle social, entre outros.

Tendo em vista os desafios percebidos ao longo desse projeto, apresentaremos a seguir: (1.1)

propostas gerais para a consolidação de uma efetiva participação social no processo regulatório

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1.1 Propostas Gerais

Inicialmente, serão apresentadas propostas gerais, divididas em sete objetivos que se

intercomunicam. Tais propostas podem servir de subsídio tanto para iniciativas legislativas como

para ações a serem tomadas pelas agências reguladoras.

Destacamos que as propostas aqui apresentadas tiveram como fonte o resultado do Workshop –

Regulação e participação social: experiências, desafios e propostas, realizado pelo Idec em

novembro de 2008, no âmbito do projeto Programa de Fortalecimento da Capacidade Técnica da

Participação Social nos Processos de Regulação. Convênio ATN/ME-10541-BR (BR-M1035).

Participaram do workshop sete agências reguladoras e diversas organizações do SNDC (entidades

civis, Procons, ministérios público, DPDC)1. O Workshop possuía dois objetivos específicos

relacionados à elaboração de propostas de aperfeiçoamento da participação dos consumidores nos

processos regulatórios, quais sejam:

• Elaborar propostas de fortalecimento da atuação das entidades civis e públicas de defesa do

consumidor nos processos regulatórios;

• Elaborar propostas de criação e/ou aperfeiçoamento dos canais de participação das entidades de

1 Participaram do workshop o Idec, Associação Brasileira de Agências Reguladoras – ABAR, ABCCON, AssociaçãoBrasileira de Economistas Domésticos – ABED, Associação Cidade Verde – ACV, ADOC, ADOCON/TU, AgênciaNacional de Aviação Civil – ANAC, Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL, Agência Nacional de EnergiaElétrica – ANEEL, Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP, Agência Nacional de SáudeSuplementar – ANS, Agência Nacional de Transporte Terrestre – ANTT, Agência Nacional de Vigilância Sanitária –ANVISA, Associação Brasileira de Direito de Informática e Telecomunicações, Associação Brasileira Interdisciplinarde AIDS, Associação do Ministério Público do Consumidor – MPCON, Banco Interamericano de Desenvolvimento –BID, Câmara dos Deputados – Comissão de Defesa Consumidor, Casa Civil da Presidência da República, CentroBrasileiro de Estudos da Saúde, Centro de Apoio Operacional de Defesa do Consumidor e Tutelas Coletivas – RS,CEPEDISA, Comissão de Defesa do Consumidor – OAB/SP, Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor eFiscalização e Controle – CMA – Senado Federal, Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE,Departamento de Proteção e Defesa Econômica/SDE/MJ, Forum Nacional de Procon's Estadual e Municipais deCapitais, Fundação Ford, Fundação Procon/SP, Grupo de Trabalho de Propriedade Intelectual da Rebrip, InstitutoBrasileiro de Política e Defesa do Consumidor – Brasilcon, MDC/MG, Ministério da Saúde, Ministério Público doEstado de São Paulo, NUDECON – Núcleo de Defesa do Consumidor – RJ, Procon Municipal de São José dosCampos, Procuradoria da República no Estado de São Paulo, SEGES.

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defesa do consumidor nos processos regulatórios, a partir de “boas práticas” identificadas, que

possam ser disseminadas para outras agências.

As presentes proposições distribuídas nos objetivos que seguem abaixo foram inspiradas no

resultado do citado workshop e nos primeiros relatórios do Projeto Pensando o Direito “Agências

Regulatórias e a Tutela do Consumidor”.

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Objetivo 1 - Esclarecimento do papel da regulação

A proteção do interesse do consumidor, garantindo-se o fornecimento adequado de serviços

públicos, foi um dos principais argumentos legitimadores do processo de desestatização e

constituição do modelo regulatório dos serviços públicos.

A Constituição Federal, por sua vez, determina que cabe ao Estado, na forma da lei, promover a

defesa do consumidor (art. 5º, XXXII). Na execução de sua atividade regulatória, as agências

devem ainda garantir a observância pelos regulados do princípio da defesa do consumidor (art. 170,

V, CF).

Mais do que uma determinação constitucional ou legal, a necessidade de proteção do consumidor –

ainda mais em setores socialmente sensíveis da sociedade, que o Estado escolheu regular – é a

garantia de cumprimento adequado pelo regulador de sua função, garantindo-se o equilíbrio entre

os fornecedores de serviços públicos ou de interesse público e o consumidor, parte vulnerável na

relação.

Apesar das evidências normativas e sociais da necessidade das agências reguladoras pautarem suas

atividades pela promoção da proteção do consumidor, ainda se encontra resistências. Assim sendo,

e para que se dirimam quaisquer dúvidas sobre a necessidade de que as agências reguladoras

apliquem aos setores regulados o Código de Defesa do Consumidor, o Idec sugere a edição de lei

em que conste menção expressa nesse sentido2.

O debate ainda é importante para combater uma questão que se tornou lugar comum, o mito da

2 Em resposta a sugestão de redação apresentada pelo Idec ao relator, o Projeto de Lei 2.057/2003, que dispõe sobre agestão, a organização e o controle social das agências reguladoras, incorporou dispositivo nesse sentido na versão quetramita atualmente. O PL não foi aprovado na Câmara dos Deputados e ainda passará no Senado, podendo sermodificado.

“Art. 31. No exercício de suas atribuições, e em articulação com o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor– SNDC e com o órgão de defesa do consumidor do Ministério da Justiça, incumbe às Agências Reguladoras zelar pelocumprimento da legislação de defesa do consumidor, monitorando e acompanhando as práticas de mercado dos agentesdo setor regulado.

§ 1º As Agências Reguladoras deverão se articular com os órgãos e entidades integrantes do SNDC, visando àeficácia da proteção e defesa do consumidor e do usuário de serviço público no âmbito de sua esfera de atuação”.

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equidistância. Ele consiste em acreditar que as agências devem sempre se manter equidistantes dos

interesses do governo, das empresas e dos consumidores, o que evitaria que elas viessem a

favorecer algum desses lados.

O fato é que a regulação e as agências existem com o objetivo primordial de fazer o mercado

funcionar de forma eficiente e justa, corrigindo externalidades e minimizando falhas. Portanto, ela

deve atuar onde tais problemas estiverem ocorrendo, mesmo que isso signifique se colocar ao lado

de algum dos prejudicados. As agências devem ser imparciais a despeito das pressões dos diversos

atores, mas não equidistantes. Vejam, por exemplo, como as agências reguladoras inglesas e

peruana, definem suas atribuições:

• OFCOM – Office of Communications (regulador inglês equivalente à nossa Anatel):

“Ofcom operates under the Communications Act 2003. This detailed Act of Parliamentspells out exactly what Ofcom should do.The Act says that Ofcom’s general duties should be to further the interests of citizens andof consumers. Meeting these two duties is at the heart of everything we do.”3

• OFGEM – Office of the Gas and Electricity Markets (regulador inglês equivalente à Aneel e

à ANP juntas)

“Ofgem is the Office of the Gas and Electricity Markets. Protecting consumers is our firstpriority. We do this by promoting competition, wherever appropriate, and regulating themonopoly companies which run the gas and electricity networks.”4

• FSA – Food Standards Agency (regulador inglês equivalente à Anvisa)

“The Food Standards Agency is an independent Government department set up by an Actof Parliament in 2000 to protect the public's health and consumer interests in relation tofood.”5

• OSIPTEL - Organismo Supervisor do Investimento Privado em Telecomunicações

3 “Ofcom opera sob o Communications Act de 2003. Este ato detalhado do Parlamento diz exatamente o que o Ofcomdeve fazer. O Ato diz que as obrigações gerais do Ofcom devem ser avançar os interesses dos cidadãos e dosconsumidores. Atender a essas duas obrigações está no coração de tudo o que fazemos” http://www.ofcom.org.uk/what-is-ofcom/, acesso em 21/09/2009.4 “Ogem é o Escritório dos Mercados de Gás e Eletricidade. Proteger os consumidores é nossa primeira prioridade.Nós fazemos isso promovendo a concorrência sempre que apropriado e regulando as empresas monopolistas quepossuem as redes de gás e eletricidade” http://www.ofgem.gov.uk/About%20us/Pages/AboutUsPage.aspx, acesso em21/09/20095 “A Agência de Normas em Alimentos é um departamento governamental independente estabelecido por um ato doParlamento de 2000 para proteger a saúde pública e os interesses do consumidor em relação aos alimentos.”http://www.food.gov.uk/aboutus/, acesso em 21/09/2009.

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(regulador peruano de telecomunicações). No Plano Estratégico da Agência (OSIPTEL,

Dezembro, 2007) constam as seguintes afirmativas:

“Misión de OSIPTEL: Somos el ente regulador y supervisor que promueve el desarrollo delas telecomunicaciones, integrando al país en un marco de competencia e inclusión yprotegiendo los derechos de los usuarios.Visión de OSIPTEL: Ser el referente mundial de excelencia en el desarrollo de lastelecomunicaciones en beneficio de la población.6”

No Brasil, verifica-se a necessidade de um esclarecimento legal sobre o papel da regulação no que

concerne à tutela dos direitos do consumidor e os mecanismos de participação da sociedade civil

nos processos decisórios. Nesse sentido, listamos as seguintes propostas que visam o alcance do

objetivo de “Esclarecimento do papel da Regulação”:

Objetivo 1 – Esclarecimento do Papel da Regulação

Desafios das agências Propostas de Superação

A Difundir a cultura da regulação para asociedade e para as próprias agências,inclusive, identificando quem são osreguladores em cada setor, a finalidade daregulação, princípios, diretrizes etc. (ex.: Pro-Reg7)

1.1 Desenvolver estratégias de educação ecomunicação para os consumidores em geral

1.2 Utilizar espaços de utilidade pública paradebate e divulgação do papel das agênciasreguladoras.

B Estabelecer procedimentos gerais comuns emtodas as agências para os mecanismos departicipação

1.3 Promover iniciativas legislativas quehomogenizem os procedimentos departicipação no sistema regulatório

CRever o desenho institucional das agências,tendo em vista a participação/representaçãoda sociedade

1.4 Elaboração de previsão legal expressasobre o papel das agências reguladoras emrelação ao respeito aos direitos doconsumidor.

1.5 Elaborar estudo para revisão do desenhoinstitucional das agências, de forma a seprever a participação e representação dasociedade (ex.: Pro-Reg)

D Compreender o direito do consumidor (asimplicações da regulação e seu reflexo nas

1.6 Capacitar os reguladores em temas doCDC (Código de Defesa do Consumidor) e do

6 “Missão da OSIPTEL: Somos o ente regulador e supervisor que promove o desenvolvimento das telecomunicações,integrando o país em um marco de competência e inclusão e protegendo os direitos dos usuários. Visão da OSIPTELSer referência mundial de excelência no desenvolvimento das telecomunicações em benefício da população.” (traduçãonossa)34

7 Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para gestão em Regulação (http://www.regulacao.gov.br/).Acesso em 25.02.2010

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relações de consumo), sem contrariar o CDC SNDC (Sistema Nacional de Defesa doConsumidor)

1.7 Incluir o tema direito do consumidor noplanejamento estratégico das agências

1.8 Criar e implementar política deatendimento ao consumidor

1.9 Materializar as normas que preveem oatendimento ao consumidor pelas agências

Justificativa resumida: Necessidade de relacionar a defesa do consumidor dentre as prioridades das

agências reguladoras, assim como sanar dúvidas quanto à competência das agências em estabelecer

mecanismos de articulação com as instituições de defesa do consumidor. Nesse sentido, o direito do

consumidor deve ser considerado na elaboração de todos os atos das agências e deve integrar o

planejamento estratégico das mesmas.

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Objetivo 2 - Transparência nos processos decisórios e qualificação da participação

Existe um enorme desequilíbrio entre os entes regulados e o consumidor nos espaços de

interlocução com as agências reguladoras. A especificidade e a complexidade dos temas em pauta

na atividade regulatória contribuem para o estabelecimento desse desequilíbrio. O que percebemos

é um alto grau de assimetria entre os atores interessados no processo regulatório, como por

exemplo:

• Assimetria de Informação - as empresas e concessionárias que atuam nos setores regulados detêm

todo o conhecimento relativo ao seu negócio – informações técnicas, econômicas, concorrência,

tendências mundiais, novas tecnologias – e esse fato é inerente à atividade econômica. Além disso,

há dificuldade de manter os interlocutores do público em geral em condições de exercer um papel

realmente crítico na avaliação das informações divulgadas pelos prestadores de serviço.

• Assimetria de linguagem - a tecnicidade dos termos adotados no ambiente das agências

Reguladoras torna difícil a compreensão por parte do consumidor, que desconhece até mesmo os

seus direitos relativos aos serviços regulados. A complexidade está presente na linguagem das

normas administrativas, na divulgação de minutas de novos regulamentos, nas informações

disponíveis sobre o setor regulado e até mesmo na comunicação sobre os mecanismos de

participação disponíveis.

Temos, portanto, que a redução dessas assimetrias somente pode ser alcançada através da adoção de

mecanismos que garantam a transparência do processo decisório. Não apenas a garantia da

transparência se faz necessária, mas também a devida qualificação dos consumidores e de seus

representantes é imprescindível para que o setor regulado seja propriamente fiscalizado.

Em suma, para a efetividade da participação no processo regulatório, necessário que seja possível o

acompanhamento dos impactos e resultados que a atuação dos órgãos causa nas empresas e nos

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consumidores. É fundamental que a comunicação entre as agências e consumidores seja feita em

linguagem acessível, reduzindo, ao máximo, o tecnicismo dos termos, e que se aperfeiçoem os

mecanismos de representação, qualificando o processo participativo de forma a diminuir as

barreiras que dificultam ou impedem a efetiva participação dos segmentos mais vulneráveis e

institucionalmente frágeis. Isso é determinante para o alcance de uma maior legitimidade do

processo regulatório e credibilidade no trabalho das agências por parte dos consumidores.

A seguir encontram-se enumeradas algumas propostas que visam atender o objetivo de

transparência e qualificação do processo participativo.

Objetivo 2 – Transparência nos processos decisórios e qualificação da participação

Desafios das agências Propostas de Superação

E Estabelecimento deprocessos maistransparentes

2.1 Que a Agenda Regulatória seja definida em um processoparticipativo e que, após definida, seja amplamente divulgada,viabilizando a participação da sociedade civil

2.2 Criar grupos de discussão para elaboração de melhorespráticas no relacionamento entre agências e organizações dedefesa do consumidor

2.3 Criar ou aperfeiçoar uma área ligada à diretoria, voltada aoconsumidor, com interface com o SNDC

2.4 Elaborar e divulgar relatórios sistemáticos de avaliação dosetor

2.5 Fazer as exposições de motivos dos atos administrativosnormativos

2.6 Objetivar critérios para a definição de temas para asaudiências e consultas públicas

F Redução da assimetria dosconsumidores e seusrepresentantes em relaçãoaos entes regulados

2.7 Apoiar a participação das entidades de defesa doconsumidor no processo regulatório

2.8 Mitigar tecnicismos dos conteúdos abordados. Convertertemas áridos em informação compreensível ao cidadão.Designar setor responsável pela “tradução” de documentostécnicos

2.9 Realizar acordos e parcerias com o SNDC via EscolaNacional de Defesa do Consumidor (ENDC) com o intuito decapacitar as agências para o tema defesa do consumidor

2.10 Avaliar e aprimorar, por meio de consultas às entidades, oscanais de comunicação

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2.11 Criar fóruns e espaços descentralizados de discussão paraorientar ações de fiscalização e aperfeiçoamento da regulação

G Qualificar a participaçãonos canais de debates

2.12 Realizar eventos prévios (preparatórios) às consultas eaudiências públicas

2.13 Regionalizar, descentralizar e setorizar o debatepreparatório das audiências e consultas públicas

2.14 Capacitar as entidades da sociedade civil para o processode regulação através da disponibilização de apoio técnico àsorganizações de consumidores

2.15 Financiar estudos e atividades de mobilização de entidadesrepresentativas dos consumidores em temas específicos

H Divulgação dasinformações quanto aoprocesso decisório

2.16 Divulgar as propostas apresentadas nas consultas públicas,identificando os proponentes

2.17 Acusar recebimento da proposta ao proponente e respondersobre o acatamento ou não das propostas realizadas nasconsultas públicas

2.18 Disponibilizar notas técnicas e outros documentos sobre osmotivos determinantes que fundamentam as decisões

2.19 Realizar seminários sobre os temas motivos de tomada dedecisões

2.20 Reorientar as áreas de assessoria de imprensa para facilitara divulgação das informações à imprensa

2.21 Atualizar periodicamente as páginas das agências nainternet

I Explicitar osinteresses/interessados nosprocessos de regulação

2.22 Definir critérios democráticos para escolha e composiçãodos representantes nos fóruns de debates

2.23 Identificar o(s) responsável(eis) pela tomada de cadadecisão

2.24 Identificar os atores envolvidos e os interesses por elesdefendidos

2.25 Estabelecer formas simples e objetivas de apontar asconsequências decorrentes de cada proposta apresentada pelosatores

Justificativa resumida: O alcance de uma efetiva participação pública no processo decisório passa

pela necessidade de obediência aos critérios que conferem transparência sobre os atos regulatórios.

Nesse sentido, cumpre-se elaborar medidas que garantam a ampla divulgação de informações

relativas ao processo decisório e que essas informações sejam compartilhadas em grau de igualdade

entre os interessados, a fim de consolidar a redução de assimetrias entre as partes.

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Objetivo 3 - Integração entre agências e Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC)

Tendo como objetivo a realização da Política de Consumo, o Código de Defesa do Consumidor

prevê a participação no Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC) de diversos órgãos

públicos e entidades privadas. Nesse sentido, a concepção do Sistema pode ser atribuída à união

dos esforços do Estado e da sociedade civil para a viabilização dos direitos do consumidor:

Código de Defesa do ConsumidorArt. 105. Integram o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), os órgãosfederais, estaduais, do Distrito Federal e municipais e as entidades privadas de defesa doconsumidor.Art. 106. O Departamento Nacional de Defesa do Consumidor, da Secretaria Nacional deDireito Econômico (MJ), ou órgão federal que venha substituí-lo, é organismo decoordenação da política do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, cabendo-lhe:I - planejar, elaborar, propor, coordenar e executar a política nacional de proteção aoconsumidor; II - receber, analisar, avaliar e encaminhar consultas, denúncias ou sugestões apresentadaspor entidades representativas ou pessoas jurídicas de direito público ou privado;III - prestar aos consumidores orientação permanente sobre seus direitos e garantias;IV - informar, conscientizar e motivar o consumidor através dos diferentes meios decomunicação;V - solicitar à polícia judiciária a instauração de inquérito policial para a apreciação dedelito contra os consumidores, nos termos da legislação vigente;VI - representar ao Ministério Público competente para fins de adoção de medidasprocessuais no âmbito de suas atribuições;VII - levar ao conhecimento dos órgãos competentes as infrações de ordem administrativaque violarem os interesses difusos, coletivos, ou individuais dos consumidores;VIII - solicitar o concurso de órgãos e entidades da União, Estados, do Distrito Federal eMunicípios, bem como auxiliar a fiscalização de preços, abastecimento, quantidade esegurança de bens e serviços;IX - incentivar, inclusive com recursos financeiros e outros programas especiais, aformação de entidades de defesa do consumidor pela população e pelos órgãos públicosestaduais e municipais;X - (Vetado).XI - (Vetado).XII - (Vetado)XIII - desenvolver outras atividades compatíveis com suas finalidades.Parágrafo único. Para a consecução de seus objetivos, o Departamento Nacional de Defesado Consumidor poderá solicitar o concurso de órgãos e entidades de notória especializaçãotécnico-científica.

O Decreto nº 2.181, de 20 de março de 1997, também dispõe sobre a organização do Sistema

Nacional de Defesa do Consumidor – SNDC. Vejamos o seu artigo 2º:

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Art. 2º Integram o SNDC a Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça -SDE, por meio do seu Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor - DPDC, e osdemais órgãos federais, estaduais, do Distrito Federal, municipais e as entidades civis dedefesa do consumidor.

A atuação do SNDC tem como objetivo restabelecer o equilíbrio nas relações de consumo –

considerada a vulnerabilidade intrínseca do consumidor – por meio da coordenação das entidades

(públicas e privadas). (SODRÉ, 2009, p. 39). Dentre outras atividades, o SNDC apresenta um

programa que integra em rede as ações e informações da Defesa do Consumidor, o Sistema

Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (SINDEC).

“O SINDEC institui uma base de dados nacional e estadual que disponibiliza informações egráficos em tempo real, cria novos mecanismos para inclusão dos órgãos municipais eainda estabelece a base tecnológica necessária para a elaboração de Cadastros Estaduais eNacional de Reclamações Fundamentadas, previstos no Código de Defesa do Consumidor.(…) O acesso aos dados, informações e gráficos SINDEC cumpre o princípioconstitucional da publicidade na Administração Pública, reforça a cultura da prevenção epermite a promoção de políticas públicas nacionalmente integradas para a Defesa doConsumidor.”8.

Mesmo estando prevista a existência do SNDC no CDC e no decreto nº 2.181, não há clarificação

de forma explícita sobre a posição institucional das agências reguladoras em relação ao Sistema

Nacional de Defesa do Consumidor. Diante dessa lacuna, houve mal-sucedidas tentativas de

suprimento da mesma. Um exemplo encontra-se na legislação da Agência Nacional de

Telecomunicações (Anatel). Essa agência foi criada pela Lei Federal 9.472/97, que traz alguns

dispositivos a respeito do tema da defesa do consumidor. Sobre o tema de aplicação das sanções

administrativas, essa lei foi regulamentada pelo Decreto Federal 2.338/1997, e dispõe sobre a

articulação com o SNDC em seu artigo 19:

Art. 19. A Agência articulará sua atuação com a do Sistema Nacional de Defesa doConsumidor, organizado pelo Decreto nº. 2.181, de 20 de março de 1997, visando àeficácia da proteção e defesa do consumidor dos serviços de telecomunicações, observadoo disposto nas Leis nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990, e nº. 9.472, de 1997.Parágrafo único. A competência da Agência prevalecerá sobre a de outras entidades ouórgãos destinados à defesa dos interesses e direitos do consumidor, que atuarão de modosupletivo, cabendo-lhe com exclusividade a aplicação das sanções do art. 56, incisos VI,VII, IX, X e XI da Lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990.

8 http://www.mj.gov.br/data/Pages/MJ80F6148EITEMID2FF65845E36D43C290E3D7EB346A20D2PTBRIE.htm -Acesso em 25.02.2010

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A partir do momento em que o artigo 19 do citado decreto informa que a Anatel deve se articular

com o SNDC, fica aparentemente fixado o pressuposto de que a Anatel não faz parte do próprio

Sistema. Além disso, o parágrafo único afasta a atuação do DPDC e dos Procons quanto à aplicação

das sanções administrativas (SODRÉ, 2007, p. 227). Há que se questionar até mesmo a legalidade

de tal decreto, posto que tenta minorar a aplicabilidade de dispositivos da Lei Consumerista.

Não existe um comando constitucional específico determinando a necessidade de um Sistema

Nacional de Defesa do Consumidor, sendo esse um fator que contribui para a fragilidade da

legislação infraconstitucional de defesa do consumidor. Urge que sejam esclarecidos legalmente os

aspectos dessa articulação entre sistema e agências reguladoras, uniformizando esse relacionamento

de forma a atingir todas as agências de uma mesma maneira. Nesse sentido, deve-se regulamentar

propostas da seguinte ordem:

Objetivo 3 – Integração agências e SNDC

Desafios das agências Propostas de Superação

J Promover a integraçãoentre as agências e o SNDC

3.1 Buscar aproximação/parcerias com o SNDC (ex: requisiçãode pareceres do SNDC sobre as decisões regulatórias; parceriasem projetos etc.)

3.2 Buscar e reconhecer a informação disponível no SINDECcomo um instrumental para as decisões das agências

3.3 Elaborar uma agenda comum entre o SNDC e as agências,possibilitando a institucionalização de um “check-list” dosconflitos de interesses. Essa agenda, elaborada em conjuntopelo SNDC e agências, deve viabilizar a troca de informaçõessobre os conflitos de interesses de forma ágil e qualificada

3.4 Estabelecer Agenda Regulatória de curto, médio e longoprazos em conjunto com as entidades civis e governamentais

3.5 Sistematizar e organizar as contribuições da sociedade nasconsultas e audiências públicas

Justificativa resumida: Não há na legislação clarificação de forma explícita sobre a posição das

agências reguladoras em relação ao Sistema Nacional de Defesa do Consumidor. Nesse sentido,

necessário o estabelecimento de diretrizes que comandem a articulação das agências e do SNDC,

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devendo as mesmas serem institucionalizadas e obrigatórias quando o assunto regulado afetar os

interesses do consumidor.

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Objetivo 4 - Estabelecimento de Agenda Regulatória

Para a redução do problema de assimetria de informações, já comentado no objetivo de

consolidação da transparência, o estabelecimento de Agendas Regulatórias torna-se imprescindível.

A Agenda Regulatória é um documento público que indica os temas a serem regulados em

determinado período, com o fim de promover a previsibilidade e a transparência da atuação

regulatória e possibilitar a participação da sociedade civil na definição das prioridades

institucionais.

Com a Agenda Regulatória, permite-se que os interessados nos assuntos regulados tomem

previamente conhecimento do plano de trabalho da agência. A função da Agenda Regulatória, no

entanto, só é alcançada se a mesma for divulgada em prazo hábil para que os interessados se

preparem para intervir nos assuntos a serem trabalhados. Em outras palavras, as condicionantes

para o alcance da função da Agenda Regulatória seriam as seguintes:

• discussão prévia e institucionalizada com os interessados sobre os temas a serem colocados

na Agenda Regulatória;

• divulgação da Agenda Regulatória em amplo prazo antes que suas disposições sejam

colocadas em prática;

• abertura de espaços de participação nas discussões dos temas definidos pela agenda;

• capacitação quanto aos temas a serem debatidos; e

• monitoramento da execução da Agenda Regulatória.

Em 2009, a Anvisa foi a primeira agência reguladora a implementar a Agenda Regulatória no

Brasil. Conforme informa a agência em seu site9, “A Agenda Regulatória é composta por um

9 Disponível em:http://portal.anvisa.gov.br/wps/portal/anvisa/agencia/ut/p/c4/04_SB8K8xLLM9MSSzPy8xBz9CP0os3hnd0cPE3MfAwMDMydnA093Uz8z00B_A3cPQ_2CbEdFALjii4!/tax=Agencia&cat=Agenda+Regulatoria&siteArea=Agencia&pagedesign=Agencia_N2&WCM_GLOBAL_CONTXT=/wps/wcm/connect/Anvisa/Anvisa/Agencia . Acesso em:2/3/2010.

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conjunto de temas estratégicos e prioritários que serão objeto da atuação regulatória pela Anvisa

num determinado período, incluindo tanto a previsão dos novos regulamentos quanto aqueles que

demandam revisão. Seu objetivo é promover a previsibilidade e a transparência da atuação

regulatória, por meio da antecipação dos temas a serem regulamentados, além de possibilitar a

participação da sociedade na definição das prioridades institucionais.”

No caso da Anvisa, previu-se a existência de um monitoramento da execução da Agenda

Regulatória através de um corpo diretivo da Agência e de um comitê composto de especialistas da

carreira de regulação, além do acompanhamento da sociedade por meio dos canais de participação

existentes na Agência. A Anvisa cita como canais de participação expressivos o Conselho

Consultivo e as Câmaras Setoriais, cujos assentos são ocupados por entidades de representação

nacional, incluindo representantes do governo, do setor empresarial, dos consumidores e da

comunidade científica. Segundo informa o site da Agência, “o monitoramento é realizado

trimestralmente e leva em consideração, dentre outros fatores, o percentual de execução do tema

com relação às etapas do processo de regulamentação; a perspectiva de cumprimento da Agenda e

os principais avanços e dificuldades apontados pelos dirigentes das áreas responsáveis com relação

ao processo de regulamentação no período avaliado.”

A Agenda Regulatória implementada pela Anvisa é uma experiência pioneira e pode ser

considerada um avanço. Todavia, precisa ser aprimorada quanto às condicionantes citadas acima.

Observamos a necessidade de que a mesma seja elaborada em caráter participativo e não apenas

informada aos interessados; necessário que a divulgação da mesma se dê em um amplo prazo

prévio ao início de sua colocação em prática para que os interessados possam preparar-se para

participar dos debates10.

Diante da importância desse instrumento para viabilização da transparência nos processos

decisórios da regulação, as propostas do Idec são as seguintes:

10 A Agenda Regulatória da Anvisa referente ao ano de 2009 foi divulgada apenas em abril de 2009.

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Objetivo 4 – Estabelecer Agenda Aegulatória

Desafios das Agências Propostas de Superação

K Contemplar os interesses enecessidades dosconsumidores nasprioridades da atividaderegulatória

4.1 Estabelecer Agenda Regulatória de curto, médio e longoprazos em conjunto com as entidades civis e governamentais

4.2 Contemplar na Agenda Regulatória as principais demandasdos usuários recebidas por meio de canais como Ouvidorias ecentrais de atendimento e dados do SINDEC

4.3 Tornar a informação disponível nos órgãos do SNDC eoutros sistemas de informação um instrumental para asagências

4.4 Estabelecer comissões para a fiscalização do cumprimentoda Agenda Regulatória

L Inserção das organizaçõesde defesa do consumidor noprocesso de construção daAgenda Regulatória

4.5 Organizar fóruns de discussão institucionalizados com aparticipação dos órgãos do SNDC para a definição da AgendaRegulatória.

Justificativa resumida: A Agenda Regulatória é um importante instrumento para alcançar-se o

objetivo da transparência nos processos regulatórios. Necessário que a implementação desse

instrumento se estenda a todas as agências reguladoras e que os aspectos que o constituem sejam

uniformes. A agenda deve necessariamente ser elaborada em um processo participativo, divulgada

previamente e com um prazo hábil para que os interessados possam se preparar para atuarem nos

temas definidos. O monitoramento da execução da Agenda Regulatória é também uma condição

para sua efetividade.

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Objetivo 5 - Adequado atendimento ao consumidor individual

A importância de atendimento ao consumidor individual extrapola a função de resolução pontual

dos problemas reclamados. Promover o adequado atendimento ao consumidor individual é um

objetivo para o alcance de uma regulação que atenda aos interesses dos consumidores, pois permite

que haja uma identificação das principais demandas do setor.

Nesse sentido, a demanda registrada pelas unidades responsáveis pelo atendimento aos

consumidores dos serviços regulados deve ser utilizada internamente pelas agências para o

aperfeiçoamento de suas atividades e como subsídio às operações de fiscalização. Essas

informações, no entanto, somente serão idôneas se os canais de acesso à agência forem

adequadamente disponibilizados. As providências diante de uma reclamação devem, pois, ir além

da resolução do conflito entre consumidor e empresa regulada. Essas providências devem ser

elaboradas para que também promovam soluções em larga escala, de forma a atingir a coletividade.

O atendimento ao consumidor individual deve funcionar como um mecanismo de identificação dos

sintomas dos problemas do setor. Esses sintomas funcionariam como indicativo de enfermidades

que estão acometendo a área regulada, não bastando tratá-los sem considerar as suas causas.

Necessário, portanto, que os dados extraídos do atendimento individual embasem as políticas

públicas e a regulação, como um todo, desenvolvidas pela agência reguladora.

Outro aspecto relativo ao atendimento ao consumidor enquanto indivíduo diz respeito à importância

da ampliação da participação das pessoas físicas nos processos consultivos para a elaboração de

atos regulatórios. Essa participação garante a legitimidade do processo participativo, no qual os

interesses dos consumidores são defendidos não só pelas entidades representativas, mas também

pelos próprios consumidores. Tendo isso em vista, necessário haver a ampla divulgação dos canais

de participação, seja por meio da mídia, ou otimizando os canais de comunicação já existentes entre

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as empresas reguladas e consumidor. Dessa forma, por exemplo, poder-se-ia utilizar como meio de

comunicação acerca da realização de consultas e audiências públicas, ou mesmo de educação para o

consumo, as faturas enviadas aos consumidores.

As condicionantes para que o atendimento ao consumidor torne-se adequado para os fins acima

explicitados são:

• disponibilização dos canais de atendimento ao consumidor;

• retorno às reclamações apresentadas;

• ampla divulgação dos canais de atendimento e dos canais de participação; e

• utilização das informações obtidas nos canais de atendimento ao consumidor individual para

elaboração de macro-soluções através de atos regulatórios.

Nesse sentido, apresentamos as seguintes propostas guias para o alcance desse objetivo geral:

Objetivo 5 – Adequado atendimento ao consumidor individual

Desafios das agências Propostas de Superação

M Respostas quanto ao prazoe solução de andamentodas demandas.Justificativas quanto àdemora na solução dasreclamações

5.1 Criar e implementar política de atendimento ao consumidor

5.2 Sistematizar os mecanismos de resposta às reclamações dosconsumidores

N Materialização das normasque preveem o atendimentoao consumidor pelasagências

5.3 Divulgar as normas que ainda não foram implementadas, asjustificativas para o atraso e os prazos para implementação

O Aprimoramento dasouvidorias comoinstrumentos de controlesocial sobre as agências

5.4 Avaliar os relatórios produzidos pela ouvidoria, comdefinição de mecanismos e prazos para superação dosproblemas identificados

P Revisão dos procedimentosde atendimento aoconsumidor pelas agências

5.5 Avaliação dos principais problemas identificados pelaouvidoria, relatórios externos (TCU, academia e outros) eorganizações de defesa dos consumidores. Elaboração depropostas de revisão e prazos para implementação

Q Ampliação da participaçãodo consumidor/cidadão

5.6 Estabelecer formas de comunicação mais abrangentes eacessíveis (rádio, TV, internet, jornais de grande circulação)

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individual 5.7 Divulgar os canais existentes

5.8 Otimizar os meios que já são dirigidos aos consumidores(contas, faturas etc.)

R Utilização das informaçõese dos dados doatendimento individual aoconsumidor comoinstrumento de gestãoaperfeiçoado, dandopublicidade a estes dados

2.26 Tornar as informações e os dados do atendimentoindividual ao consumidor instrumentos de embasamento dosatos de regulação

2.27 Contemplar as principais demandas dos usuários recebidaspor meio de canais como ouvidorias e centrais de atendimento

2.28 A agência deve manifestar-se periodicamente sobre asinformações e os dados de atendimento individual aoconsumidor, com definição de mecanismos e prazos parasuperação dos problemas identificados

Justificativa resumida: O atendimento individual das demandas setoriais dos consumidores permite

a identificação de problemas sistêmicos e pode funcionar como importante fonte para elaboração de

atos regulatórios. A importância dos canais de atendimento individual é dada não só pela

possibilidade de solução individual dos problemas apresentados, mas por permitir verificar as

lacunas do sistema, motivando uma maior fiscalização do setor.

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Objetivo 6 - Fomento às organizações de defesa do consumidor

Conforme abordado no primeiro relatório do Projeto Pensando o Direito “Agências Reguladoras e a

Tutela do Consumidor”, as organizações de consumidores, tanto privadas como governamentais,

têm importante papel no acompanhamento de agências reguladoras, monitorando a qualidade de

produtos e serviços, educando para o consumo consciente e representando os interesses dos

consumidores. São importantes instrumentos de efetivação da democracia participativa no Brasil,

nos termos do art. 1º, parágrafo único, da Constituição Federal.

Por esse motivo, deve haver a preocupação governamental com políticas que incentivem a criação e

a consolidação de organizações de consumidores, para equilibrar a balança da representatividade de

interesses a serem mediados pela regulação. Retomamos aqui os apontados problemas institucionais

para que os incentivos previstos nas normas legais sejam aplicados11:

(1). falta de recursos para ampliação da representação de consumidores;

(2). falta de recursos para a realização de campanhas de esclarecimento da população;

(3). pouca qualificação técnica dos representantes de consumidores; e

(4). cultura institucional que faz com que as agências atribuam-se uma postura de árbitro em

relação aos interesses dos consumidores.

Seguramente, uma importante barreira para a participação dos consumidores é o financiamento da

participação social. Enfatizamos, portanto, a assimetria de recursos técnicos e financeiros – os

quadros especializados, além do recursos dos quais as prestadoras podem lançar mão (consultores,

escritórios de advocacia, além da mobilização do seu próprio quadro técnico), em uma situação de

consulta pública, por exemplo, são infinitos perto daqueles disponíveis nas organizações de

consumidores, sejam elas públicas ou da sociedade civil organizada.

São raríssimos os casos de organizações de consumidores que monitoram um determinado setor

11 Primeiro Relatório Pensando o Direito “Agências Reguladoras e a Tutela do Consumidor”, p. 80.

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regulado, com o acompanhamento permanente das tendências, normas e regulamentos, e que

realizam estudos para diagnosticar e equacionar problemas enfrentados pelo consumidor para que,

de posse de todos esses dados sistematizados, possam contrapor-se aos pleitos do setor regulado

junto à agência reguladora.

Nesse sentido, registramos também o problema da assimetria de oportunidades – o acesso à agência

é muito mais facilitado para o setor regulado, já que seus executivos e técnicos podem, a todo

momento, levar demandas e apresentar seus pleitos ao regulador, seja no próprio ambiente da

agência, em reuniões acordadas; em fóruns técnicos, onde há clara interlocução entre reguladores e

regulados, como simpósios, congressos etc.; ou até mesmo no ambiente da empresa, quando

técnicos das agências demandam informações, dados, estudos e esclarecimentos para subsidiar

processos de fiscalização e acompanhamento do setor.

Com o objetivo de sanar tais assimetrias, há países que preveem em sua legislação mecanismos de

incentivo à atuação das entidades civis de defesa do consumidor. Exemplo desse tipo de legislação

é a lei 24.240/9312, da Argentina. A lei prevê, em seu artigo 62, que o Governo poderá dispor do

orçamento nacional para contribuir com associações que tenham como finalidade a defesa, a

informação e a educação do consumidor, legalmente reconhecidas e que cumpram com as alguns

resquisitos. As entidades são selecionadas de acordo com critérios de representatividade,

autofinanciamento, atividade e planos de ação a serem cumpridos pelas mesmas.

Ainda na Argentina, a Resolução 38/0613 traça os critérios exigidos para que ocorra a distribuição

da verba destinada a financiar o trabalho de entidades civis de defesa do consumidor. De acordo

com essa resolução, são consideradas beneficiárias das contribuições financeiras as associações de

consumidores com no mínimo 1 ano de inscrição no Registro Nacional de Associações de

Consumidores (RNAC). Essas contribuições financeiras são repassadas de acordo com os seguintes

12 Disponível em: http://infoleg.mecon.gov.ar/infolegInternet/anexos/0-4999/638/texact.htm. Acesso em 2 de março de2010.

13 Disponível em:http://www.enre.gov.ar/web/bibliotd.NSF/04256380006cf0060425636f00508108/fa5dad2f468873290325721a004561bc?OpenDocument . Acesso em 2 de março de 2010.

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critérios: 30% para apoio institucional e 70% para contribuir com projetos específicos, de acordo

com as diretrizes citadas na resolução. A distribuição do orçamento destinado a projetos é realizada

mediante o financiamento de 80% do custo de projetos específicos propostos pelas associações de

consumidores à Direção Nacional de Comércio Interno.

Cada associação pode apresentar até cinco projetos com base em temas como educação formal,

capacitação ou educação não formal destinada a grupos específicos, e difusão dos aspectos mais

significantes da proteção do consumidor. Os projetos são escolhidos pelo Comitê de Seleção e, em

todos os casos, são priorizados aqueles cujo impacto previsto alcance o maior número de

consumidores. No caso da falta inicial de projetos selecionados e/ou aprovados, ou por qualquer

outra razão, todos os fundos restantes disponíveis são dirigidos para financiar outros projetos, com

novas chamadas ou outras medidas adequadas. As associações que descumprem as obrigações

assumidas para o financiamento de projetos não recebem a respectiva verba. Em casos de repasse

indevido, o mesmo deve ser reembolsado e/ou compensado.

O Peru também apresenta outro modelo de legislação bastante significativo no que se refere a

financiamento de projetos de entidades de defesa do consumidor. O Decreto Legislativo 716/0014,

em seu artigo 45, autoriza o repasse de uma porcentagem do valor das multas aplicadas para

entidades, com a finalidade de financiar atividades das organizações de consumidores. A Lei

27.846/0215 também prevê o repasse de até 50% do valor das multas para entidades mediante

celebração de convênio de cooperação interinstitucional com a finalidade de financiar atividades

das organizações de consumidores inscritas no registro do INDECOPI (órgão governamental de

defesa do consumidor, da concorrência e da propriedade intelectual).

As legislações da Argentina e do Peru, assim como de outros países referentes ao financiamento à

participação das entidades de defesa do consumidor encontram-se sistematizadas no anexo 6 do

presente relatório.

14 Disponível em: http://www.indecopi.gob.pe/repositorioaps/0/8/par/tuo716/tuo716.pdf . Acesso em 02 de março de2010.

15 Disponível em: http://www.bvindecopi.gob.pe/legis/l27846.pdf . Acesso em 02 de março de 2010.

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Tendo isso em vista, apresentamos a seguir as propostas gerais para concretizar o fomento às

organizações de defesa do consumidor no Brasil:

Objetivo 6 – Fomento às organizações de defesa do consumidor

Desafios das agências Propostas de Superação

S Fomento aodesenvolvimento equalificação de associaçõesrepresentativas dosconsumidores paraparticipar nos processos deregulação

6.1 Definir e apoiar linhas de projetos decapacitação/qualificação dos representantes dos consumidores,inserindo as atividades no planejamento orçamentário

6.2 Viabilizar novos mecanismos para garantir a participaçãodos consumidores

6.3 Financiar estudos e atividades de mobilização promovidospor entidades representativas dos consumidores em temasespecíficos

6.4 Celebrar acordos de cooperação com órgãos do SNDC

6.5 Viabilizar condições técnicas para que entidadesrepresentantes dos consumidores compareçam às audiênciaspúblicas, reuniões de comitês e outras instâncias de participação(custeando passagens, estadia, alimentação etc.) segundocritérios de eleição

T Viabilização de recursosfinanceiros paraparticipação dosrepresentantes dosconsumidores nosprocessos de regulação

6.6 Encomendar e fazer estudos e proposições para promovermudanças jurídico-legais que possibilitem dotação orçamentáriae repasses de recursos financeiros para apoiar entidades derepresentação dos consumidores (ex: repasse de fundos demultas)

U Ampliação e promoção daparticipação qualificada

6.7 Estabelecer critérios para a definição da entidade apoiada,considerando a diversidade de organizações e dos váriospúblicos envolvidos (critérios de representatividade,autofinanciamento, atividade e planos de ação a seremcumpridos, participação no SNDC)

6.8 Capacitar as entidades da sociedade civil para o processo deregulação por meio dos próprios técnicos das agências (fórunstécnicos, simpósios, congressos etc.)

Justificativa resumida: A assimetria de recursos técnicos e financeiros das entidades de defesa do

consumidor é um fator impeditivo da participação das mesmas nos processos regulatórios.

Necessário, portanto, o incentivo à participação social, seja através da promoção de capacitações,

seja pelo financiamento de projetos na área regulatória desenvolvidos pelas entidades de defesa do

consumidor.

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Objetivo 7 - Ampliação dos espaços participativos e aprimoramento dos canais existentes

De modo geral, percebe-se que os entes regulados – empresas e concessionárias – têm uma posição

privilegiada no relacionamento com os reguladores. No entanto, os esforços por parte de

reguladores para minimizar esse desequilíbrio ainda são insuficientes.

Existem diversos canais e instâncias, formais e informais, de relacionamento das agências com os

consumidores interessados, tais como audiências e consultas públicas, ouvidorias, conselhos

consultivos, câmaras setoriais, grupos de trabalho, comitês de defesa dos usuários etc. No entanto, o

predomínio de questões técnicas – em prejuízo da abordagem de questões que afetam os interesses

do consumidor – revela que o modelo regulatório ainda se encontra distanciado do ideal de espaço

de discussão. Como conseqüência, o poder de decisão do consumidor torna-se mínimo, se

comparado ao das empresas reguladas ou concessionárias de serviços públicos.

Os mecanismos por meio dos quais os consumidores podem participar institucionalmente do

processo regulatório devem ser pautados na transparência e na criação de condições que possam

ampliar a participação objetiva do povo na condução da função administrativa do Estado. O

aprimoramento dos canais existentes depende necessariamente da efetivação dos objetivos aqui

apresentados, quais sejam: o esclarecimento do papel da regulação; a qualificação e transparência

do processo decisório; a integração entre agências e Sistema Nacional de Defesa do Consumidor

(SNDC); o estabelecimento de Agenda Regulatória; o adequado atendimento ao consumidor

individual; o fomento às organizações de defesa do consumidor, dentre outros.

Sendo assim, ainda que se observe a presença de alguns mecanismos que possibilitam a intervenção

do consumidor no processo decisório de um órgão regulador, torna-se evidente a necessidade de

melhorias e avanços nesses quesitos, seja através da criação de novos canais participativos a partir

da análise daqueles adotados por outros países, seja a partir do aprimoramento dos canais já

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implantados nos entes reguladores brasileiros.

O segundo relatório do projeto Pensando o Direito apresentou iniciativas de participação e

informação destinadas ao consumidor. Nesse sentido, retomamos algumas das iniciativas

verificadas para apresentá-las como ideias a serem implementadas nas agências reguladoras

brasileiras. O Idec apresenta, através de observações, as condições e complementações que

considera necessárias para que os mecanismos participativos possam ser aplicados com sua máxima

efetividade no Brasil. Vejamos:

ARGENTINA - Ente Nacional Regulador de la Eletricidad – Enre (http://www.enre.gov.ar/)Forma departicipação

Descrição Observação Idec

Elaboraçãoparticipativade normas(internet)

O website do Enre disponibiliza um espaço deelaboração participativa de normas, através do qualo público pode preencher um formulárioapresentando opiniões e propostas no processo deelaboração participativa de normas.

Necessidade de que essaforma de participação sejaacompanhada de um feedbackpor parte da agência, comprazos de contribuição eresposta pré-estabelecidos.

Sistema dequeixas(internet)

Espaço que possibilita ao consumidor, de formaindividual, deixar reclamações e sugestões noLivro de Queixas do órgão regulador.

Necessidade de feedback porparte da agência.

Representaçãodeconsumidoresem Diretórios

A Lei 210 da Argentina prevê a possibilidade de asassociações de consumidores apresentarem umcandidato para se tornar membro do Diretório,representando os consumidores. O candidato devecumprir os requisitos da Lei 210, além decomprovar que é membro da associação há pelomenos um ano da candidatura. Esse representantedos consumidores pode levar os problemasenfrentados pelos consumidores ao Diretório eapresentar propostas de solução.

Necessidade deestabelecimento de agendaanual para realização dasreuniões.

Atención ausuários:- Problemasfrecuentes- Reclamo pordaños(internet)

A primeira é destinada a esclarecer as perguntasmais frequentes feitas por consumidores. Asegunda destina-se a orientar o consumidor aproceder com uma reclamação por danos sofridos.

CANADÁ – Ontario Energy Board - OEB (http://www.oeb.gov.on.ca/OEB/Consumers)Forma departicipação

Descrição Observação Idec

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AudiênciasPúblicas –Intervenor ouObserver(correspondência)

Na OEB há a figura dos intervenors, que seria umindivíduo ou um grupo interessado que pode serafetado pelas eventuais decisões que surgirem noprocesso regulatório. Esses interessados no processoregulatório devem apresentar uma Carta deIntervenção junto à Câmara, na qual demonstramseu interesse e legitimam sua intervenção; dadospessoais e endereço para a entrega de documentosreferentes ao processo; a natureza e a forma departicipação etc. A Câmara realiza uma análise einforma o intervenor sobre o aceite ou a recusa daproposta enviada. Também há a figura do observer,que trata de grupos ou indivíduos interessados quenão querem participar ativamente do processo masdesejam acompanhar seu andamento, podendoapresentar um pedido à Secretaria do Conselho paraque receba os documentos.

Necessária a padronizaçãodas audiências públicas nasagências regulatórias, comprazos pré-definidos para quehaja tempo hábil depreparação dos interessados.Necessário que osparticipantes sejamcomunicados quanto àavaliação de suas propostas.

Preparo dosparticipantesparaaudiênciaspúblicas(internet oucorrespondência)

Preparo dos participantes: os intervenors sãopreparados para as audiências e podem receber osdocumentos fornecidos previamente pelas partes.Eles ainda têm acesso à Agenda Regulatória oucalendário de atividades do órgão regulador paraque possam se preparar para as audiências.

Acompanhamento dasaudiências -Listen to aLive Hearing(internet)

Possibilita que o consumidor ouça as audiênciaspúblicas da OEB no momento em que elas estãoocorrendo, por meio do próprio site.

Peru – Regulador de las Telecomunicaciones – OSIPTEL(http://www.osiptel.gob.pe/WebSiteAjax/ )Forma departicipação

Descrição Observação Idec

Conselho deUsuários –OSIPTEL(presencial)

Trata-se de um conselho formado por sete membros,que são eleitos pra mandatos de dois anos. Essesmembros são escolhidos dentre os candidatos dasassociações de consumidores e Usuários, bem comocandidatos de universidades públicas e privadas, eoutras organizações sem fins lucrativos. A funçãodesse conselho é a de garantir uma efetivaparticipação das associações de consumidores eusuários.

Necessidade deestabelecimento de agendaanual para realização dasreuniões.

Campanhas deComunicação

A OSIPTEL executa campanhas de comunicaçãodirigidas aos consumidores dos serviços detelecomunicações, objetivando fomentar a geraçãode uma cultura de direitos e deveres de um usuário

Necessidade de utilização demídia de amplo alcance eotimização dos canais jáexistentes de comunicação

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responsável, e colocando à disposição informaçõesrelevantes, transmitidas de forma clara e oportuna.

entre regulados econsumidores (ex.: faturas).

TRASU –TribunalAdministrativo de SoluçãodeReclamaçõesde Usuários(presencial)

Compete a este Tribunal, em última instância, asolução de reclamações de usuários, analisandoqueixas e apelações apresentadas pelosconsumidores perante as empresas, impondo asrespectivas sanções.

Guia doUsuário(internet)

Um guia que traz informações relevantes para ousuário e lista seus direitos.

Necessária ampla divulgação

Agenda deatividades(internet)

A agência disponibiliza em seu site um calendáriocom todas as atividades a serem realizadas.

Reino Unido – Office of the Gas and Electricity Markets - Ofgem(http://www.ofgem.gov.uk/Pages/OfgemHome.aspx)Forma departicipação

Descrição Observação Idec

Tratamentodas demandasindividuais

Na Ofgem, consumidores domésticos e pequenasempresas podem procurar ajuda adicional naresolução de seus problemas com a empresa. Ochamado The Energy Ombudsman é um órgão quepode exigir da empresa que se retrate com oconsumidor, bem como pode tomar medidasconcretas para resolver um litígio e, em algunscasos, impor sanção financeira.

As informações quanto àsdemandas individuais devemser encaminhadas aos setoresapropriados, para que tambémprovidenciem soluções emlarga escala.

Ofgem’ssimplificationplan(internet)

A agência divulga uma definição prévia da AgendaRegulatória para o ano subsequente.

ESTADOS UNIDOS – Federal Energy Regulatory Commision - FERC (http://www.ferc.gov/)Forma departicipação

Descrição Observação Idec

Participaçãodireta doconsumidorpor meio doenvio decomentários(internet)

O usuário pode se cadastrar através do e-Subscription para receber informações,correspondências e novidades sobre determinadoassunto. Através do e-Filing é possível o envio decomentários e de documentos à Comissão.

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Sistema deQueixas eOpiniões dosConsumidores(internet)

Os consumidores podem registrar queixas oucríticas relativas a propostas apresentadas ou ainfra-estruturas já existentes, bem como apresentaropiniões (de maneira anônima) em relação aoconteúdo e a disposição de informações no site.

Calendário deEventos(internet)

Trata-se de calendário dos eventos de participaçãosocial. São fornecidas informações sobre a data e otipo de evento, e um resumo sobre o assunto.

Importância da informaçãoprévia para o planejamentodos participantes.

Planoestratégico(internet)

Neste plano enunciam-se as ações que estão sendotomadas para melhorar os serviços da Comissãopara o público. O documento apresenta as principaismetas e respectivas estratégias para alcançá-las.

Esse tipo de instrumento,quando divulgadoamplamente e disponibilizadoem linguagem acessível,contribui para o alcance datransparência no processodecisório das agênciasreguladoras.

Colômbia - Comisión de Regulación de Comunicaciones – CRC (http://www.crcom.gov.co/)Forma departicipação

Descrição Observação Idec

Capacitaçãoparaparticipação

Consumidores recebem formação adequada paraque possam participar do processo regulatório demaneira expressiva. Os principais instrumentosutilizados para a capacitação são panfletos, vídeosinstitucionais, manuais e guias, e informaçõesdisponíveis no website.

Importância da ampladivulgação.

AgendaRegulatória(internet)

A agência disponibiliza agenda informando asprincipais atividades a serem realizadas.

Serviço dechat(internet)

A CRT coloca à disposição do setor e dos cidadãosem geral um serviço de chat, por meio do qualatendentes se correspondem em tempo real parasolucionar problemas dos usuários.

Em síntese, para o objetivo 7 (Ampliação e aprimoramento dos canais de participação) temos

duas propostas que concluem o item de propostas gerais:

7.1 Criar câmaras setoriais, conselho consultivo, fóruns de discussão, e importar para o

Brasil iniciativas bem sucedidas no exterior.

7.2 Aprimorar os meios de participação e os mecanismos de informação, cumprindo com os

objetivos apresentados nesse trabalho.

Justificativa resumida: As agências reguladoras devem aperfeiçoar os canais de participação social

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já existentes e criar novos canais participativos, pois atualmente se verifica que são tímidos e por

vezes inócuos instrumentos de controle social, deixando a desejar em termos de institucionalização

da participação da sociedade e ampliação da democracia participativa.

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2 INCORPORAÇÃO DE TEMAS REFERENTES À PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR NA

AGENDA REGULATÓRIA E ARTICULAÇÃO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS COM O

SISTEMA NACIONAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Neste capítulo serão enfatizados alguns mecanismos para a incorporação dos temas consumeristas

no universo regulatório. Nesse sentido, realizou-se entrevistas com especialistas em regulação, com

o fim de evidenciar os diversos entendimentos sobre a relação entre direitos do consumidor e

regulação. Também foram coletadas, durante as entrevistas, eventuais propostas para inclusão do

tema na Agenda Regulatória, assim como opiniões sobre as propostas em debate atualmente.

A articulação das agências reguladoras com o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor também

foi alvo de estudo como um meio de incorporação dos temas afetos à proteção e defesa do

consumidor na atividade regulatória. Para isso, foram identificadas experiências pontuais de

articulação entre agências reguladoras com órgãos de defesa do consumidor. Ao evidenciar essas

experiências pretende-se conhecer em detalhes os aspectos dessas articulações, inclusive os efeitos

positivos e negativos decorrentes.

2.1 Entrevistas com especialistas em regulação, com representantes de agências reguladoras e

representantes do SNDC

No período de 8 a 12 de fevereiro de 2010, o Idec realizou entrevistas com especialistas em

regulação, representantes das agências reguladoras e representantes do SNDC. A realização dessas

entrevistas teve como intuito evidenciar as diversas óticas sobre o papel das agências reguladoras

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na temática do consumidor. Fez-se questão de entrevistar pessoas com diferentes óticas acerca de

regulação e do papel das agências na defesa do consumidor. Assim, os entrevistados traçaram seus

diagnósticos sobre a questão e teceram suas avaliações sobre as propostas de inclusão do tema nas

atividades das agências.

A entrevista procurou seguir o seguinte roteiro de questionamentos:

1. Qual o papel que o senhor/a senhora acredita ocuparem os consumidores na missão e nas

atividades das agências reguladoras?

2. O senhor/a senhora considera que as decisões regulatórias levam em consideração os interesses

dos consumidores? Por exemplo, o Código de Defesa do Consumidor. Ele é uma lei que deve,

sempre, ser incorporada em todos os atos das agências reguladoras?

3. O senhor/a senhora considera que existe participação efetiva dos consumidores e de seus

representantes no processo regulatório (definição dos temas a serem regulamentados pela agência,

efetiva regulamentação do setor regulado etc.)?

4. Como o senhor/a acredita que a participação do consumidor e de seus representantes no processo

regulatório pode ser intensificada? Considera o financiamento público para capacitar as entidades

de defesa do consumidor para atuarem com competência no próprio tema das agências uma

alternativa (por exemplo, apoio institucional, contribuição com projetos específicos, capacitação de

pessoas, financiamento de passagens, financiamento para contratação de consultorias

especializadas)?

5. O senhor/a senhora possui algum entendimento, ou até mesmo alguma sugestão, sobre como os

temas referentes à proteção do consumidor podem fazer parte da Agenda Regulatória?

A seguir, apresenta-se um resumo descritivo das entrevistas realizadas. A sua íntegra encontra-se

nos anexos desse relatório.

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2.1.1 Entrevista com Calixto Salomão Filho

A íntegra dessa entrevista encontra-se no Anexo 1.

Resumo da entrevista:

Calixto Salomão, advogado e professor de Direito Concorrencial da Faculdade de Direito da

Universidade de São Paulo, explica que as agências possuem uma missão constitucional e legal de

proteção do consumidor, até mesmo porque ele é o destinatário final do serviço regulado. O

professor faz questão de ressaltar que aquele que não é consumidor em um sentido estrito também

precisa ser protegido. Ou seja, aquele que é excluído das relações de consumo precisa ser incluído,

precisa ser destinatário dos serviços, para que a proteção seja mais ampla.

Para que isso ocorra, deve haver instrumentos mais amplos de proteção que não se restringem ao

Código de Defesa do Consumidor, para que a influência se dê sobre a estrutura de funcionamento

do sistema. O Código, esclarece, restringe-se à compensação de grupos hipossuficientes. Na

regulação, no entanto, deve-se ir além para o sistema funcionar bem. Um exemplo do que deve ser

feito além do que está previsto no Código é a concorrência como uma limitação do poder

econômico, que favorece preços menores e consequentemente a inserção dos excluídos no mercado.

Outro exemplo são os programas de universalização e outros programas distributivos.

Como a regulação tem que ser dinâmica, a lei prevê os princípios, que precisam ser implementados

pela regulação para fazer algum sentido. Se os regulamentos não são feitos, é importante que a

sociedade cobre e, se preciso, recorra ao Judiciário.

As agências reguladoras têm que passar por mudanças para que sejam mais inclusivas. Essas

mudanças devem se dar no âmbito das consultas públicas (mais tempo para contribuições, por

exemplo), mas também no âmbito da representação interna dos consumidores. Com relação a isso,

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Calixto salienta que no conselho diretor deveria haver uma representatividade mais ampla, e que os

consumidores deveriam poder indicar um dos conselheiros para o conselho diretor. Essa presença,

ainda que minoritária, seria suficiente para que houvesse mais visibilidade e transparência no

processo de deliberação e de decisões do Conselho.

O professor também sinaliza que a mudança deve ocorrer não só no interior das agências, como

também na própria sociedade civil organizada. As organizações não governamentais precisam criar

conhecimento, se capacitar fora das agências, até para manter sua independência. O financiamento

público das entidades é uma alternativa, desde que haja regras claras e que essa não seja uma fonte

exclusiva.

Por fim, Salomão pondera que a solução para tudo não é lei, mas um impulso legislativo seria

importante, lembrando que diferentes agências podem ter diferentes necessidades, e conclui que

as mudanças têm mais chances de acontecer quanto maior for a atuação dos consumidores.

2.1.2 Entrevista com Ronaldo Porto Macedo Junior

A íntegra dessa entrevista encontra-se no anexo 2.

Resumo da entrevista:

Ronaldo Porto Macedo Junior, promotor de justiça e professor da Faculdade de Direito da

Universidade de São Paulo e da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), explica

que, de uma maneira geral, as leis que se aplicam aos setores regulados não tiveram nenhuma ou

quase nenhuma preocupação com a questão da participação do consumidor. As agências, ao seu ver,

não são órgãos orientados exclusivamente e sequer, muitas vezes, primordialmente para a defesa do

consumidor, pois elas devem cumprir várias outras funções, como organizar o mercado, regular a

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locação de recursos, promover o desenvolvimento econômico etc. Essa variedade de funções

ofuscaram completamente outra função que as agências deveriam ter, que é a defesa dos interesses

do consumidor.

Para garantir a proteção do consumidor, o professor defende que em alguns casos pode ser mais

eficaz a criação de uma agência geral que controle ou monitore a atuação das agências

especializadas. Em outros casos, por outro lado, pode ser mais factível internalizar a preocupação

com a defesa do consumidor na agência. Em geral, porém, algum tipo de internalização será sempre

desejável.

Ronaldo acredita que se na época da privatização e da criação das agências tivesse havido uma

aproximação entre os especialistas das diferentes áreas – como, por exemplo, o Direito do

Consumidor, o Direito da Concorrência ou o Direito Regulatório – hoje, eventualmente, uma

agência reguladora poderia ter uma cultura consumerista já mais internalizada.

O professor credita ao Código de Defesa do Consumidor a novidade de convocar o intérprete a

olhar a dinâmica do fato, mas, em um mercado efervescente, em setores regulados, o Código é

insuficiente.

Destaca a assimetria de informações e também chama a atenção para a necessidade de haver uma

participação qualificada e técnica. Concorda que um fundo criado a partir de multas poderia ser

usado para financiar a qualificação das entidades, mas ressalta, no entanto, que a sua gestão pode

ser complicada. A participação qualificada é importante, pois ela tem que acontecer nos mesmos

termos da participação das empresas para ser eficaz.

Porto Macedo salienta a importância de aprender com experiências que deram certo, com a

casuística. Por fim, aponta que é necessário um olhar mais multidisciplinar, uma aproximação dos

consumeristas com a linguagem técnica e o conhecimento específico de outras áreas, como

concorrência e economia, e o favorecimento do fim da assimetria de informação.

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2.1.3 Entrevista com Ana Luiza Valadares

A íntegra dessa entrevista encontra-se no anexo 3.

Resumo da entrevista:

Ana Luiza Valadares, ex-Procuradora Geral da Anatel, inicia sua entrevista avaliando que, no

âmbito das agências, não houve uma política pública ou uma definição clara de diretriz geral, o que

fez com que cada agência funcionasse de um jeito diferente. Tampouco houve uma diretriz que

estabelecesse que a atividade dessas agências deveria ser norteada, por exemplo, por uma política

de relações de consumo. No lado dos direitos regulatórios, a diretriz inicial foi privatizar para poder

garantir o acesso, um atendimento de uma demanda reprimida de diversos setores, e para garantir

que houvesse retorno dos investimentos feitos.

Ana Luiza pondera que as agências não são órgãos vocacionados pra reflexões consumeristas e

sequer é possível criticar isso na sua essência, pois elas foram criadas para ser assim. Para mudar,

seria preciso aculturar todo um sistema para que fosse diferente, além de haver uma presença mais

forte do Poder Executivo central, com políticas públicas e diretrizes, e do Poder Legislativo.

A ex-Procuradora entende que o custo de transação de um sistema regulado é muito alto para todos

os envolvidos, tanto para a empresa, quanto para o consumidor.

Em relação à participação dos consumidores no processo regulatório, Valadares avalia que os

espaços já existem e que a representação dos consumidores está melhorando. Do ponto de vista

prático, defende que haja uma mobilização dos representantes já colocados nas agências da

categoria consumidor, e que assuntos de impacto direto no consumidor poderiam ter que

necessariamente ser submetidos aos comitês de usuários antes da decisão do conselho diretor.

Para fomentar a participação qualificada, Ana Luiza propõe a realização de workshops obrigatórios

e itinerantes. Ao seu ver, é mais fácil e mais barato alguns funcionários da agência reguladora

viajarem pelo país do que entidades se deslocarem para Brasília.

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Por fim, Valadares conclui que o consumidor tem dificuldades de se organizar, e que é preciso fazer

uma agenda do setor consumerista, que integre todos os pontos das agendas das agências.

2.1.4 Entrevista com Carlos Ari Sunfeld

A íntegra dessa entrevista encontra-se no anexo 4.

Resumo da entrevista:

O advogado e professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) e da Escola de Direito da

Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), Carlos Ari Sunfeld, inicia sua fala esclarecendo que a

regulação econômica tem como objetivos definir obrigações dos prestadores de serviço em relação

ao consumidor atual e potencial, ampliar a cobertura dos serviços e universalizá-los. Explica, no

entanto, que é uma abstração difícil de trazer para a concreção, pois existe uma margem de

deliberação e tensões. O professor pondera que a agência frequentemente decide de maneira que

desagrada a defesa dos consumidores, mas que considera que há um equilíbrio no processo

regulatório e que não há captura das agências.

O professor explica que regulação é construção, é composição, é processo de deliberação. O

consumidor, de um lado, tem baixa participação na construção da regulação, e, de outro, há dentro

das agências uma exposição aos interesses das empresas, o que não significa, no entanto, que as

agências sejam capturadas.

Sundfeld critica o projeto de lei n. 3337/2004 (projeto de lei que visa estabelecer normas para as

agências), no que tange à contratação de consultoria específica para atuar junto às organizações de

consumidores. Em sua ótica, isso não funcionaria, pois os agentes públicos têm receio de autorizar

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recursos por ficarem expostos, além de o processo licitatório ser complicado. Outro obstáculo

reside no fato de o regulador muito dificilmente querer contribuir para quem potencialmente irá

criticá-lo.

Carlos Ari Sunfeld é contrário à criação de um fundo para financiamento público de entidades que

dependa de um percentual de multas, porque há muita flutuação no valor arrecadado, não havendo

como definir a porcentagem ideal sobre um valor imprevisível. Aponta, no entanto, que seria uma

possibilidade de fonte de financiamento a porcentagem das taxas de fiscalização das agências que,

diferentemente das multas, são previsíveis. No entanto, considera que qualquer iniciativa nessa

direção tende a ser infrutífera, pois existe um tradicional contingenciamento do governo, além da

provável resistência das agências a essa proposta.

Como alternativa, o professor propõe a criação de um programa do Ministério da Justiça por

exemplo (por ser independente e desvinculado dos órgãos regulatórios) que tenha como objetivo o

fomento e o financiamento de entidades a longo prazo. Ressalta que um programa assim deve ser

permanente e criado por lei.

Resume, por fim, que o grande desafio é ter atores fortes e estáveis para discutir a regulação.

2.1.5 Entrevista com Roberto Pfeiffer

A íntegra dessa entrevista encontra-se no anexo 5.

Resumo da entrevista:

Roberto Pfeiffer, professor da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP) e da

Pontifícia Universidade Católica (PUC/SP), e diretor da Fundação Procon-SP, entende que a missão

básica das agências é harmonizar interesses, como viabilizar políticas, manter o equilíbrio

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econômico-financeiro e cuidar dos direitos dos consumidores. Em tese, os interesses dos

consumidores devem ser respeitados e tutelados pelas agências, porém, na prática, não ocorre essa

harmonia.

O professor entende que o Código de Defesa do Consumidor deve necessariamente ser levado em

consideração na elaboração normativa da agência, e que ainda há inadequação da regulação em face

dos direitos dos consumidores.

No que diz respeito à participação, Pfeiffer avalia que somente nos temas que não envolvem

aspectos técnicos os consumidores conseguem participar em maior quantidade e de modo mais

qualificado. Naqueles assuntos mais técnicos, a participação é muito pequena e pouco qualificada.

É fundamental, segundo o diretor do Procon, que haja uma capacitação técnica das entidades e uma

divulgação interna que ressalte a importância da participação dos consumidores, para que a questão

regulatória ocupe um lugar de destaque. O financiamento público é uma alternativa, no seu

entendimento, porém deve haver uma reflexão sobre qual é a melhor forma de fazer o uso dos

recursos públicos.

Por fim, Pfeiffer conclui que o mais importante é o olhar do aspecto técnico sob a perspectiva do

consumidor, e a capacitação deve ocorrer tanto para os consumidores quanto para os próprios

agentes reguladores.

2.1.6 Considerações Idec

Os entrevistados apresentaram diversos pontos de vista acerca da tutela dos direitos do consumidor

e participação social no ambiente regulatório. Destacamos aqui alguns pontos que coincidem com o

posicionamento do Idec, pontos esses trabalhados ao longo dessa pesquisa.

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Conforme abordado por Calixto Salomão, as agências reguladoras tem que passar por mudanças

para que sejam mais inclusivas. Ronaldo Porto também salientou que a ausência de uma cultura

consumerista na regulação deu-se devido ao modelo adotado na época das privatizações e da

criação das agências. Hoje percebemos, através das demandas sociais, que urge uma atuação nos

setores regulados em consonância com os já positivados diretos do consumidor. Deve haver,

portanto, um movimento de conscientização da cultura consumerista dentro dos órgãos e entidades

reguladoras, e para isso as determinações legais podem contribuir. No entanto, a aproximação entre

reguladores e agentes que atuam na defesa do consumidor é fundamental. Conforme Ronaldo Porto

Macedo bem colocou, uma aproximação entre os especialistas das diferentes áreas poderia

contribuir para a internalização de uma cultura consumerista nas agências. Também merece

destaque a sugestão apontada por Calixto Salomão, de que um assento no Conselho Diretor das

Agências seja ocupado por órgãos de defesa do consumidor.

Roberto Pfeiffer, por sua vez, salienta que o Código de Defesa do Consumidor deve

necessariamente ser levado em consideração na elaboração normativa da agência, e que ainda há

inadequação da regulação em face aos direitos dos consumidores. Nesse sentido, concluímos pela

necessidade dos órgãos e entidades reguladores afirmarem dentre suas competências a subsunção à

ordem normativa e, por consequência, a obrigatoriedade de consonância de seus atos regulatórios

aos direitos dos consumidores. Ainda, segundo Pfeiffer, é fundamental que haja uma capacitação

técnica das entidades representativas do consumidor e uma divulgação interna que ressalte a

importância da participação desse ator no processo regulatório. Quanto à viabilização da inserção

dos temas afetos aos consumidores na regulação, o financiamento público é uma alternativa, no seu

entendimento, porém deve haver uma reflexão sobre qual é a melhor forma de fazer o uso dos

recursos públicos.

Nesse sentido, o Idec apresentou no presente trabalho uma proposta de anteprojeto de lei em que

fica criado o Fundo de Fomento à Participação das Entidades Civis de Defesa do Consumidor no

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Processo Regulatório. Esse fundo seria constituído por uma percentagem do valor arrecadado com

as multas aplicadas pelos Órgãos e Entidades Reguladoras; por recursos oriundos da receita

orçamentária dos Órgãos e Entidades Reguladoras; e por doações. Tal fundo seria destinado a

subsidiar a capacitação técnica das entidades, conforme descrito na proposta de projeto de lei. A

consequência lógica desse incentivo é a efetiva incorporação da proteção do consumidor na Agenda

Regulatória e a diminuição das assimetrias já apontadas. Temos, portanto, que uma série de ações

devem ser tomadas para que a cultura consumerista tome forma dentro dos órgãos e entidades que

regulam setores de grande impacto no cotidiano da população.

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2.2 Experiências de articulação entre agências reguladoras e órgãos de defesa do consumidor

No presente ponto são apresentados dados que delineiam o panorama geral da interação entre

agências reguladoras e Sistema Nacional de Defesa do Consumidor. Em seguida,

exemplificativamente, relata-se as impressões dos órgãos de defesa do consumidor (Procons

estaduais do Mato Grosso e de São Paulo) acerca de acordos de cooperação firmado com a ANS.

2.2.1 Cenário Geral: interação SNDC e agências reguladoras

O projeto Fortalecimento da Capacidade Técnica da Participação Social nos Processos de

Regulação, desenvolvido pelo Idec com o apoio do BID – Banco Interamericano de

Desenvolvimento, realizou uma pesquisa junto às entidades civis filiadas ao FNECDC – Fórum

Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor e organizações públicas de defesa do

consumidor participantes do SNDC – Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, visando fazer

um levantamento da capacidade instalada para a participação na regulação. Essa pesquisa resultou

na produção do texto “Regulação e participação social: experiências, desafios e propostas”, que

contém uma síntese dos mapeamentos e pesquisas das entidades de consumidores. Nesse

documento apresentou-se um relatório das articulações e parcerias entre entidades e agências

reguladoras em prol da ampliação da participação social nos processos regulatórios. Em específico,

realizou-se pesquisa junto aos Procons visando evidenciar um panorama ilustrativo da atuação dos

órgãos públicos de proteção ao consumidor nos processos regulatórios. A pesquisa foi conduzida

através da requisição de preenchimento de questionários entre 8 de setembro e 15 de outubro de

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2008. O questionário foi enviado para os 26 Procons Estaduais, dos quais 11 responderam.

Tal relatório ainda não foi publicado. Todavia, pela sua pertinência , destacamos alguns pontos do

mesmo no presente trabalho, no intuito de compreendermos o cenário de articulações:

Articulação e parcerias:

Regra geral, os órgãos indicaram intervenção articulada com outros atores e realização de parcerias,

embora, na maioria dos casos, as parcerias sejam eventuais e informais.

Dentre os Conselhos, redes e Fóruns dos quais os Procons participam, destacam-se os Conselhos de

Consumidores /Usuários ligados às concessionárias e os conselhos consultivos e câmaras técnicas

de agências reguladoras.

Os órgãos federais com os quais os Procons articulam-se com mais frequência são o Departamento

de Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça, o Ministério Público Federal e

outros Ministérios de Estado.

Com relação às parcerias com a sociedade civil, a organização mais citada pelos Procons é a Ordem

dos Advogados do Brasil, mas também se destacam as parcerias com entidades civis de defesa do

consumidor e associação de bairros ou comunitárias. Os objetivos das parcerias com organizações

da sociedade civil consistem na implementação conjunta de ações de proteção aos direitos do

consumidor, por meio de reuniões, seminários, produção de material de divulgação de direitos e a

busca do fortalecimento do sistema de defesa e aperfeiçoamento de mecanismos de participação

dos consumidores. Apenas um Procon indicou não se articular com a sociedade civil.

Oito órgãos também indicam manter parcerias com agências reguladoras, em especial para

desenvolvimento de cooperação técnica, ações de fiscalização e perícias (notadamente com

agências delegadas localizadas nos Estados), realização de análises e estudo, troca de informações e

capacitação de corpo técnico. As agências citadas de forma recorrente como parceiras são a

ANVISA e a ANS.

Embora somente quatro órgãos tenham informado manter parcerias com empresas autorizadas,

concessionárias ou permissionárias de serviços, várias indicaram a existência de um canal de acesso

direto com empresas concessionárias de energia elétrica e telefonia. Nas que indicaram a parceria,

esta se materializa, em muitos dos casos, na participação do órgão em Conselhos de Consumidores/

Usuários das empresas.

Mais da metade dos Procons indicou manter parceria com universidade ou instituição de ensino ou

pesquisa. Além da cooperação para realização de estágios, as parcerias indicadas têm muitas vezes

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por finalidade a realização de testes e pesquisas e utilização de laboratório.Fonte: “Regulação e participação social: experiências, desafios e propostas”- Subsídio para os participantes dosworkshops do projeto Fortalecimento da Capacidade Técnica da Participação Social nos Processos de Regulação,coordenado pelo Idec, novembro de 2008, p. 33.Sobre o apoio à participação do consumidor no processo regulatório, o mesmo relatório aponta a

articulação entre entidades de defesa do consumidor e agências reguladoras como soluções às

debilidades da capacitação dos consumidores:

Apoio para a participação do consumidor no processo regulatório:

(…) No que se refere à debilidade da capacitação dos consumidores ou de seus representantes, vale

ressaltar que a mesma pode ser solucionada com iniciativa das próprias agências, com a realização

de capacitação ou o apoio técnico às organizações quando da realização de consultas públicas ou

discussões relevantes, dentro de regras a serem definidas.

Nesse sentido, verificamos que a Aneel realiza frequentemente treinamentos específicos para

integrantes dos Conselhos de Consumidores quando da revisão tarifária, além do apoio

institucional, participando frequentemente de palestras, cursos e eventos patrocinados pelos

conselhos ou outras entidades como o Fórum Nacional de Conselhos de Consumidores.

Para a ANVISA, o apoio à participação vem ocorrendo de forma descontinuada através de projetos

específicos, como o Projeto Visa Mobiliza. O projetou desenvolveu atividades importantes como o

Seminário “Comunicação, Educação e Mobilização em Vigilância Sanitária” e a “I Feira VISA

Mobiliza”, criando uma rede de atores, governamentais e da sociedade civil, para atuar de forma

articulada em relação às questões de vigilância sanitária. No entanto, ao que tudo indica o projeto

foi descontinuado.

Outra iniciativa da ouvidoria da Anvisa de incentivo à participação foi a recente realização da

Oficina de “Reforço à Participação Social na Anvisa”, em conjunto com o Programa de Direito

Sanitário da Fiocruz, com o objetivo de estudar estratégias que possam levar ao fortalecimento e

incentivo da participação da sociedade no âmbito daquela agência. O evento contou com a

participação de representantes de instituições de ensino e pesquisa em saúde pública, representantes

da Anvisa, representantes da sociedade civil organizada e representantes do Conselho Nacional de

Saúde, totalizando 25 pessoas.

A ANS destacou suas ações nos últimos anos de redução da assimetria de informações no

desenvolvimento do Programa “Parceiros da Cidadania”, com a capacitação de Procons em vários

Estados.Fonte: “Regulação e participação social: experiências, desafios e propostas”- Subsídio para os participantes dos

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workshops do projeto Fortalecimento da Capacidade Técnica da Participação Social nos Processos de Regulação,coordenado pelo Idec, novembro de 2008, p. 24.

No Workshop “Governança das agências reguladoras de infraestrutura” – realizado pelo Programa

de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação – Pro-Reg - em agosto de

2009 –, Marilena Lazzarini discorreu sobre o tema da governança regulatória e defesa do

consumidor, destacando alguns pontos da pesquisa do projeto Fortalecimento da Capacidade

Técnica da Participação Social nos Processos de Regulação, como o ponto sobre relacionamento

entre agências e SNDC:

Relacionamento entre agências e o SNDC

Anac

Incluiu em seu projeto de aperfeiçoamento dos mecanismos de atendimento, a celebração de

acordos e parcerias institucionais com órgãos de proteção do consumidor.

ANS

Tem acordos de cooperação técnica firmados com o SNDC para atividades como “mesas técnicas”,

reuniões e seminários, elaboração de cadernos de orientação e boletins eletrônicos.

Aneel

A agência tem se empenhado em aumentar a interação com os Procons, com o DPDC e outras

associações.

Anatel

Não foram encontradas referências sobre interação com os órgãos de defesa do consumidor na Lei

9.472/97, no Regulamento da Anatel ou em seu Regimento Interno.

Verificou-se interação entre a Ouvidoria da Anatel e as entidades de defesa do consumidor.

Anvisa

Verificou-se um processo em construção, reforçado por vários atores ligados à agência e à defesa do

consumidor.

Exemplos: trabalho integrado para ampliar a divulgação das medidas sanitárias de grande interesse

público, a ser desenvolvido pela Anvisa e pelo Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor.

Atualmente, para monitorar os preços e a disponibilidade de genéricos no mercado, a Agência conta

com os Procons estaduais e municipais.

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Fonte: http://www.regulacao.gov.br/outros-eventos/workshop-201cgovernanca-das-agencias-reguladoras-de-infraestrutura201d-1/governanca-regulatoria-e-defesa-do-consumidor/view , slide 48.

Temos, portanto, com as informações acima, um cenário geral das articulações entre SNDC e

agências reguladoras. Verifica-se que o relacionamento entre agências reguladoras e entidades do

SNDC é traduzido em iniciativas ainda muito pontuais e restritas principalmente aos órgãos

governamentais de defesa do consumidor. Rara é a interação entre as agências e as demais

entidades civis de defesa do consumidor. Outro ponto a ser notado é a falta de uniformidade entre

as agências na adoção de mecanismos interativos com as entidades de defesa do consumidor. A

adoção desses mecanismos é aparentemente mera discricionariedade das agências; enquanto umas

encontram-se mais avançadas nesse processo, outras nem sequer tem conhecimento de seu dever

em estabelecer tais interações. Nesse sentido, apontamos a necessidade de legislação que clarifique

esse dever para todas as agências reguladoras, de forma uniforme.

Diante do relato do cenário geral partimos para casos específicos no ponto que segue.

2.2.2 Acordos de cooperação entre ANS e Procons

Em 5 de maio de 2008 divulgou-se no website da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) a

celebração de parcerias, termos de cooperação, participações em eventos e ações educativas entre

Procons Estaduais e ANS. Conforme se noticiou, o objetivo dessa estratégia seria a máxima difusão

de informação sobre planos de saúde, o aprimoramento dos mecanismos de fiscalização e a

manutenção de uma relação plenamente colaborativa entre a Agência Reguladora e demais

entidades de defesa do consumidor.

Nesse sentido, em 25 de novembro de 2008, a ANS assinou o Acordo de Cooperação Técnica com

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o Procon Mato Grosso. Segundo divulgado em nota na internet, esse acordo tinha o intuito de

estabelecer um canal direto da agência junto ao Procon e, com isso, aperfeiçoar a regulação do setor

e a qualidade do atendimento aos beneficiários. A proposta era de a ANS oferecer informação,

capacitação técnica e mecanismos de consulta para os integrantes do Sistema Nacional de Defesa

do Consumidor (SNDC)16.

Para analisarmos mais a fundo essas experiências de articulação, realizamos entrevistas com os

Procons do Mato Grosso e São Paulo.

Questionamos aos entrevistados sobre o teor desses acordos de cooperação e eventuais

considerações sobre a efetividade dessas iniciativas. Obtivemos as seguintes informações:

Procon/MT – Superintendência de Defesa do Consumidor do Estado do Mato Grosso:

O Procon/MT informou17 que o termo de cooperação técnica com a ANS foi firmado em 25 de

novembro de 2008, sendo estabelecido como objetivos comuns:

I – agilizar e melhorar o acesso à informação entre os partícipes, com a finalidade de identificação

de problemas do mercado de saúde suplementar no âmbito local, facilitando a sua resolução;

O Procon/MT informou que na prática, semestralmente é fornecido cópia de todos os espelhos de

atendimentos realizados pelo Procon que envolvem plano de saúde para a ANS, a fim de que

identifiquem eventual infração a norma de regulação. Da mesma forma, a ANS encaminha os

registros da agência do NURAF- núcleo de fiscalização da ANS – situado em Cuiabá-MT, para que

o Procon possa analisar eventual direito do consumidor violado no caso concreto.

Informou-se que referida troca já gerou atendimentos individuais e coletivos no Procon/ MT, além

16 http://www.ans.gov.br/portalv4/site/noticias/noticia_25641.asp?secao=Home - Acesso em

25.02.2010

17 Informações concedidas por Gisela Simona Viana de Souza, Superintendente de Defesa do Consumidor , SETECS/Procon/MT, em 8 de fevereiro de 2010.

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de ser um meio de aprendizado sobre as normas expedidas pela ANS. Quando o Procon/MT

identifica problemas graves, tal como negativa de cobertura de forma ilegal, aciona-se

imediatamente a ANS para que o consumidor obtenha o atendimento necessário.

II – promover a divulgação junto ao beneficiário/consumidor dos seus direitos e deveres, bem

como o papel de cada instituição partícipe;

O Procon/MT informou que diante de todas as resoluções sobre plano de saúde ou legislação são

produzidos realeses para a sociedade em geral, divulgando endereços e telefones do Procon e do

posto da ANS em Mato Grosso. O Procon acrescenta que estão montando uma pesquisa para que os

consumidores que comparecerem ao Procon respondam se conhecem seu plano de saúde e sabem o

que é a ANS.

III – contribuir para o aperfeiçoamento dos instrumentos de monitoramento e regulação do

mercado de saúde suplementar, a partir do compartilhamento de dados de identificação do perfil de

consumo e das demandas registradas nas instituições partícipes, vedado o repasse de informações

abrigadas por sigilo médico ou pela garantia da privacidade dos agentes regulados, que possam

comprometer o direito à imagem do beneficiário/consumidor ou prejudicar os negócios privados,

salvo expressa autorização;

Além da troca de demandas, o Procon/MT envia relatório dos problemas que aparentam ser

coletivos.

IV – qualificar e municiar o órgão de defesa do consumidor de informações técnicas sobre a saúde

suplementar;

V – otimizar os técnicos e recursos materiais da ANS e da Superintendência de Defesa do

Consumidor- Procon/MT.

Semestralmente é feito curso de atualização com todos os servidores que atendem ao público sobre

as normas expedidas pela ANS, sendo comentados o posicionamento da ANS e do Procon, visto

que às vezes são posições divergentes.

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VI – Planejar elaboração de materiais informativos e didáticos sobre temas

relacionados à saúde suplementar para difusão e distribuição ao consumidor;

VII – Manual de orientação elaborado pela ANS sobre a Saúde Suplementar que é

utilizado na rotina de trabalho dos técnicos da Superintendência de Defesa do

Consumidor-Procon/MT, como fonte de consulta e disseminação dos conhecimentos;

VIII – Encontro nacional promovido pela ANS;

O Procon/MT informou que participou desse encontro nacional, mas que não percebeu

no comportamento da diretoria uma imparcialidade quanto ao tratamento dos agentes

envolvidos na relação jurídica do plano de saúde.

Quanto às demais agências, o Procon/MT informou que o melhor relacionamento até a presente

data foi com a ANVISA, e os piores são com a ANATEL e ANEEL, nas quais não logrou-se

nenhum acesso.

Procon/SP – Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor

Conforme informado pelo Procon/SP18, a política Estadual de Defesa do consumidor se consolida

com a celebração de parcerias com outros órgãos Governamentais para a atuação conjunta na

educação, proteção e defesa do consumidor, oferecendo condições para que possam exercer a

cidadania frente às relações de consumo.

Para a consecução deste trabalho, o Procon/SP firmou convênio com a Agência Nacional de Saúde

Suplementar - ANS, em 06/03/2009, com término em 28/02/2010, com os seguintes objetivos:

I – desenvolvimento de ações, no sentido de promover uma atuação integrada, com vistas a garantir

a proteção e defesa dos direitos do beneficiário/consumidor de planos privados de assistência à

saúde, bem como garantir o intercâmbio de informações que sirvam para melhorar o desempenho

18 Informações concedidas por Regina Accorsi Lunardelli, Diretoria de Relações Institucionais da FundaçãoProcon/SP, em 22 de fevereiro de 2010 (OF/FP/DRI/523/010).

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da atividade regulatória;

II –agilizar e melhorar o acesso à informação entre os partícipes, com a finalidade de identificação

de problemas de consumo no âmbito de saúde suplementar, facilitando sua resolução;

III – promover a orientação junto ao beneficiário/consumidor dos seus direitos e deveres, bem

como o papel de cada instituição;

IV – contribuir para o aperfeiçoamento dos instrumentos de monitoramento e regulação do mercado

de saúde suplementar, a partir do compartilhamento de dados de identificação do perfil de consumo

e das demandas registradas nas instituições partícipes, vedado o repasse de informações abrigadas

nas instituições por sigilo médico ou pela garantia de privacidade dos agentes regulados que

possam comprometer o direito à imagem do consumidor/beneficiário ou prejudicar os negócios

privados salvo expressa autorização; e

V – qualificar, capacitar e municiar os técnicos das instituições de informações técnicas sobre saúde

suplementar e defesa do consumidor.

Para tanto, informou-se que foi realizada a capacitação técnica pelo Procon/SP para os técnicos da

ANS, abordando os conceitos do CDC e sua aplicabilidade no âmbito da saúde suplementar.

Por outro lado, houve também capacitação dada pela ANS para os técnicos do Procon/SP, visando o

ensinamento da legislação e normas editadas pela Agência Reguladora.

Neste trabalho também se realizou mesas técnicas para a discussão dos problemas enfrentados pelos

consumidores e a criação de canais de atendimentos junto a ANS para o atendimento do Procon/SP.

Sobre a efetividade desse convênio, o Procon/SP informou que os objetivos previstos no referido

convênio foram atingidos a contento e em prol da defesa e proteção do consumidor.

Considerações do Idec

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A aproximação entre agências reguladoras e órgãos de defesa do consumidor através de convênios e

parcerias deve ser uma prática estimulada. No entanto, necessário ter-se em vista alguns aspectos

para que esses instrumentos atinjam seus objetivos com efetividade. Dentre os casos estudados

chamamos atenção para a importância de que essas experiências sejam de trocas efetivas, isto é, a

capacitação de ambas as instituições deve ocorrer em uma via de mão dupla. O mesmo deve ocorrer

quanto à às informações detidas pelas partes envolvidas, sendo necessária uma intercomunicação

das mesmas. Para que essas experiências tornem-se de fato um canal de encontro, é necessário

viabilizar o diálogo, ou seja, todas as partes devem ter agentes e receptores concomitantemente das

atividades a serem realizadas.

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3 PROPOSTA DE ANTEPROJETO DE LEI

A proposta de anteprojeto de lei que segue é a materialização das propostas de aperfeiçoamento da

participação social no processo regulatório anteriormente apresentadas. As entrevistas realizadas e o

diagnóstico acerca da articulação existente entre agências reguladoras e órgãos do SNDC

contribuíram para a sua construção.

A proposta dispõe sobre os procedimentos para elaboração da Agenda Regulatória e a realização de

consultas e audiências públicas a serem adotados pelos Órgãos ou Entidades Reguladoras, e sobre o

estímulo à participação de entidades de defesa do consumidor no processo regulatório.

Seus fundamentos encontram-se detalhados nos três relatórios apresentados em sede da pesquisa

sobre “Agências Reguladoras e a Tutela do Consumidor” do projeto Pensando o Direito.

JUSTIFICATIVA

Quando foi pensado o modelo regulatório brasileiro, não se dedicou especial atenção à forma como

a regulação relacionar-se-ia com a tutela dos direitos do consumidor. Os aspectos econômicos da

regulação ficaram em primeiro plano, e hoje sentimos o impacto dessa deficiência.

Existe um enorme desequilíbrio entre o setor regulado e o consumidor em todos os espaços

institucionalizados ou não institucionalizados de interlocução com Agências Reguladoras. Esse

desequilíbrio é sempre atribuído à especificidade e à complexidade dos temas em pauta na atividade

regulatória. Percebe-se, todavia, a existência de um alto grau de assimetria entre esses atores, em

diversos aspectos:

• Assimetria de Informação – as empresas e concessionárias que atuam nos setores regulados detêm

todo o conhecimento relativo ao seu negócio (informações técnicas, econômicas, concorrência,

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tendências mundiais, novas tecnologias) e esse fato é inerente à atividade econômica. Além disso,

há dificuldade de manter os interlocutores do público em geral em condições de exercer um papel

realmente crítico na avaliação das informações divulgadas pelos prestadores de serviço.

• Assimetria de recursos técnicos e financeiros – os recursos dos quais as prestadoras podem lançar

mão (consultores, escritórios de advocacia, além da mobilização do seu próprio quadro técnico) em

uma situação de consulta pública, por exemplo, são infinitos perto daqueles disponíveis nas

organizações de consumidores, sejam elas públicas ou da sociedade civil organizada. São raríssimos

os casos de organizações de consumidores que monitoram um determinado setor regulado, com o

acompanhamento permanente das tendências, normas e regulamentos e que realizam estudos para

diagnosticar e equacionar problemas enfrentados pelo consumidor para que, de posse de todos esses

dados sistematizados, possam se contrapor aos pleitos do setor regulado junto à Agência

Reguladora.

• Assimetria de oportunidades – O acesso à Agência é muito mais facilitado para o setor regulado,

já que seus executivos e técnicos podem, a todo momento, levar demandas e apresentar seus pleitos

ao regulador, seja no próprio ambiente da Agência, em reuniões acordadas; em fóruns técnicos,

onde há clara interlocução entre reguladores e regulados, como simpósios, congressos etc.; ou até

mesmo no ambiente da empresa, quando técnicos das Agências demandam informações, dados,

estudos e esclarecimentos para subsidiar processos de fiscalização e acompanhamento do setor.

• Assimetria de linguagem – a tecnicidade dos termos adotados no ambiente das Agências

Reguladoras torna difícil a compreensão por parte do consumidor, que desconhece até mesmo os

seus direitos relativos aos serviços regulados. A complexidade está presente na linguagem das

normas administrativas, na divulgação de minutas de novos regulamentos, nas informações

disponíveis sobre o setor regulado e até mesmo na comunicação sobre os mecanismos de

participação disponíveis.

De modo geral, há um amplo consenso de que os entes regulados – empresas e concessionárias –

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têm uma posição privilegiada no relacionamento com os reguladores, devido aos fatores

anteriormente expostos. É preciso aperfeiçoar os mecanismos de representação, de forma a diminuir

as barreiras que dificultam ou impedem a efetiva participação dos segmentos mais vulneráveis e

institucionalmente frágeis e, de fato, alcançar uma situação que contribua para maior legitimidade

do processo e credibilidade no trabalho das Agências por parte dos consumidores.

Entre os instrumentos regulatórios existentes, optou-se por tratar nesta proposta de anteprojeto

daqueles que se referem ao processo de elaboração e modificação de instrumentos normativos,

assim como daqueles que tem o condão de publicizar as prioridades regulatórias dos órgãos ou

entidades reguladores.

Verificados os processos de elaboração ou revisão normativa adotados pelos diversos órgãos ou

entidades reguladores brasileiros, nota-se uma falta de uniformidade nos procedimentos adotados,

como prazos para contribuição e temas submetidos a consulta e audiência pública. Além disso, são

visíveis as assimetrias anteriormente apontadas, estando o consumidor e seus representantes em

desvantagem de representatividade e incidência, se considerada a permeabilidade dos outros grupos

de interesses.

Os instrumentos propostos no anteprojeto de lei ora apresentado objetivam garantir a participação

dos consumidores e seus representantes no processo regulatório, diminuindo as assimetrias. Entre

as medidas propostas encontram-se padronizações de procedimentos de consulta e audiência

pública, estabelecimento de prazos mínimos necessários para garantia de participação qualificada

dos consumidores e seus representantes, e instrumento que asseguram a divulgação, com a devida

antecedência e justificadamente, dos temas a serem regulados (Agenda Regulatória).

São elementos constantes da proposta de anteprojeto de lei:

(I) Previsão da elaboração pelos órgãos e entidades reguladores de Agenda Regulatória,

documento público que indica os temas a serem regulados em determinado período, com o fim de

promover a previsibilidade e a transparência da atuação regulatória e possibilitar a participação da

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sociedade civil na definição das prioridades institucionais.

A Agenda Regulatória para os temas consumeristas é um importante instrumento para se alcançar o

objetivo da transparência nos processos regulatórios. É necessário que a implementação desse

instrumento se estenda a todas as agências reguladoras e que os aspectos que o constituem sejam

uniformes. A agenda deve necessariamente ser elaborada em um processo participativo, divulgada

previamente e com um prazo hábil para que os interessados possam se preparar para atuarem nos

temas definidos. O monitoramento da execução da Agenda Regulatória é também uma condição

para sua efetividade.

(II) Procedimentos claros para participação social na elaboração e revisão de atos normativos.

No que tange à elaboração de revisão de atos normativos, foram delineadas as situações que tornam

necessária ou recomendável a realização de consultas e audiências públicas, assim como os

procedimentos a serem adotados. Além disso, previu-se a obrigatoriedade de divulgação de

documentos que “traduzam” para a população questões técnicas e o instrumento da consulta prévia

– procedimento de coleta de subsídios para elaboração da minuta de regulamento ou decisão

regulatória a ser colocada em consulta pública, assim como para esclarecimentos aos consumidores

e entidades de defesa do consumidor acerca do tema.

A consulta prévia garante a ampliação da democracia participativa na elaboração e na revisão de

atos normativos. Nas consultas e audiências públicas submete-se aos consumidores proposta

anteriormente preparada e discutida pelos órgãos e entidades reguladores. A consulta prévia é um

instrumento que vai além, pois através dela se coleta da sociedade subsídios para a construção da

proposta.

(III) Estabelecimento de diretrizes que comandem a articulação entre agências e órgãos

reguladores e o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC)

Interligado ao tema das consultas e audiências públicas, a participação social no processo

regulatório carece de incentivos e clarificação legal. Nesse sentido, necessário o estabelecimento de

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diretrizes que comandem a articulação entre agências e órgãos reguladores e o SNDC, devendo as

mesmas serem institucionalizadas e obrigatórias quando o assunto regulado afetar os interesses do

consumidor.

(IV) Criação do Fundo Federal de Fomento à Participação das Entidades Civis de Defesa do

Consumidor no Processo Regulatório

A assimetria de recursos técnicos e financeiros das entidades de defesa do consumidor é um fator

impeditivo à participação das mesmas nos processos regulatórios. Necessário, portanto, o incentivo

à participação social. Como uma forma de viabilização do fomento à participação social, propõe-se

a criação do Fundo Federal de Fomento à Participação das Entidades Civis de Defesa do

Consumidor no Processo Regulatório.

Os recursos do Fundo devem ser utilizados para garantir a intervenção qualificada das entidades de

consumidores no processo regulatório e atividades de divulgação à população de informações sobre

os assuntos regulados. A existência de tal fundo está fortemente ligada à previsibilidade dos temas a

serem regulados, através da elaboração democrática e ampla divulgação da Agenda Regulatória dos

órgãos e entidades reguladores. Sabendo quais os temas que serão objeto de regulamentação, as

organizações de consumidores podem se capacitar para incidir efetivamente na discussão –

pleiteando, se necessário, recursos ao Fundo Federal de Fomento à Participação das Entidades

Civis de Defesa do Consumidor no Processo Regulatório – e desenvolver atividades informativas

aos consumidores acerca dos temas a serem regulados.

Especificamente com relação ao Fundo, sua criação é prevista em termos genéricos no anteprojeto

em questão. São estabelecidas apenas as principais linhas que o delineiam, como administração,

hipóteses de utilização de seus recursos e requisitos para acessá-lo. Faz-se necessária, portanto,

regulamentação específica posterior.

No que diz respeito às fontes de recursos do referido fundo, propõe-se a reserva de determinado

porcentual dos recursos arrecadados com a aplicação de multas pelos órgãos e entidades

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reguladores e outros recursos. A fixação desse percentual depende da realização de estudos de

caráter econômico-financeiro, motivo pelo qual se optou por não determiná-lo explicitamente19.

Essas são, em síntese, as razões que justificam a incorporação da proposta normativa que segue à

legislação brasileira, na forma de lei ordinária.

19 O Idec tem interesse em colaborar com as discussões acerca da regulamentação Fundo Federal de Fomento àParticipação das Entidades Civis de Defesa do Consumidor no Processo Regulatório e, naquilo que puder, com oestudo econômico-financeiro acerca do financiamento do Fundo.

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LEI Nº …, DE …

Dispõe sobre os procedimentos para elaboração da Agenda

Regulatória e a realização de consultas e audiências públicas a

serem adotados pelos Órgãos ou Entidades Reguladoras e o

estímulo à participação de entidades de defesa do consumidor

no processo regulatório.

Art. 1º Esta lei dispõe sobre os procedimentos para a elaboração da Agenda

Regulatória e a realização de consultas e audiências públicas nos temas de interesse do consumidor,

a serem adotados pelos Órgãos ou Entidades Reguladoras, assim como e o estímulo à participação

de entidades de defesa do consumidor no processo regulatório.

Art. 2º Considera-se, para fins desta lei, as seguintes definições:

I – Agenda Regulatória: documento público que indica os temas a serem

regulados em determinado período, com o fim de promover a previsibilidade e a transparência da

atuação regulatória e possibilitar a participação da sociedade civil na definição das prioridades

institucionais.

II – consulta pública: procedimento por meio do qual o a Órgão ou Entidade

Reguladora divulga regulamento ou decisão regulatória que pretende adotar, com o fim de receber

contribuições ou dúvidas dos interessados, por escrito.

III – audiência pública: evento presencial de interlocução dos representantes

do Órgão ou Entidade Reguladora com interessados nos temas constantes da Agenda Regulatória,

para dirimir dúvidas e recolher críticas e sugestões.

IV – consulta preparatória: procedimento para coleta de subsídios para

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elaboração da minuta de regulamento ou decisão regulatória a ser colocada em consulta pública,

assim como para esclarecimentos aos consumidores e entidades de defesa do consumidor acerca do

tema.

V - entidades de defesa do consumidor: associações representativas dos

consumidores, constituídas nos termos da lei civil, que incluam entre suas finalidades institucionais

a proteção ao consumidor e integrem o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, nos termos do

art. 105 da Lei 8.078/90.

CAPÍTULO I

DA AGENDA REGULATÓRIA

Art. 3º Os Órgãos ou Entidades Reguladoras elaborarão Agenda

Regulatória, a ser revista no período máximo de um ano, na qual serão previstos os temas e

respectivo cronograma de atividades de curto, médio e longo prazo, na forma de regulamento.

§ 1º A elaboração e a revisão da Agenda Regulatória serão objeto de

consultas preparatórias e consultas públicas.

§ 2º As Agências ou Órgãos reguladores realizarão, ao menos

semestralmente, balanço de implantação das atividades previstas na Agenda Regulatória.

§ 3º A Agenda Regulatória e os balanços de implantação das atividades

previstas serão divulgados na sede e no respectivo sítio na rede mundial de computadores dos

Órgãos ou Entidades Reguladoras.

CAPÍTULO II

DAS CONSULTAS PÚBLICAS

Art. 4º As propostas de regulamento ou decisão regulatória de interesse do

consumidor, assim como suas revisões, serão submetidas a consulta preparatória e consulta pública

previamente à tomada de decisão.

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Art. 5º Os Órgãos ou Entidades Reguladoras deverão, com antecedência

mínima de trinta dias úteis do início da consulta pública:

I - comunicar formalmente os respectivos dados da consulta pública

ao coordenador do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, para

fins de ampla divulgação aos integrantes do Sistema;

II - solicitar parecer sobre as propostas ao coordenador do Sistema

Nacional de Defesa do Consumidor, visando adequar a matéria aos

ditames da legislação consumerista;

III - apresentar previamente aos órgãos do Sistema Nacional de

Defesa do Consumidor as considerações pertinentes sobre o tema a

ser regulado, inclusive análise do impacto da medida aos

consumidores.

Artigo 6º Os Órgãos ou Entidades Reguladoras deverão, com antecedência

mínima de sete dias úteis do início da consulta pública:

I - publicar despacho motivado, no Diário Oficial da União, fixando o

termo inicial da respectiva consulta pública;

II - disponibilizar, na sua sede e no respectivo sítio na rede mundial de

computadores os estudos, os dados e o material técnico utilizado

como fundamento para as propostas colocadas em consulta pública,

devendo tais informações permanecer disponíveis na Internet pelo

prazo mínimo de um ano.

III - disponibilizar explicações, em linguagem leiga, de temas técnicos

abordados nas propostas colocadas em consulta pública.

Parágrafo único - Os Órgãos ou Entidades Reguladoras poderão realizar

eventos antes e durante a consulta pública, a fim de subsidiar a participação dos consumidores e de

entidades de defesa do consumidor.

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Art. 7º O período de consulta pública não poderá ser inferior a sessenta dias.

§1º - A pedido dos integrantes do Sistema Nacional de Defesa do

Consumidor, poderá ser prorrogado o prazo de consulta pública, considerada a complexidade do

tema e a garantia da efetiva participação da sociedade civil.

§ 2º - O não atendimento do pedido a que se refere o parágrafo anterior

deverá ser fundamentado.

Art. 8º As críticas e sugestões recebidas deverão ser disponibilizadas na sede

e no sítio do Órgão ou Entidade Reguladora na rede mundial de computadores, devidamente

identificadas, até dez dias úteis após o seu recebimento, devendo permanecer disponíveis na

Internet pelo prazo mínimo de um ano após a publicação da decisão regulatória sobre a qual versou

a consulta pública.

Art. 9º O posicionamento do Órgão ou Entidade Reguladora sobre as

críticas ou contribuições apresentadas em consulta pública deverá ser disponibilizado na sede e no

sítio do Órgão ou Entidade Reguladora na rede mundial de computadores, até trinta dias úteis após

a reunião para deliberação sobre a matéria, devendo permanecer disponível na Internet pelo prazo

mínimo de um ano após a publicação da decisão regulatória sobre a qual versou a consulta pública.

Art. 10. Os Órgãos ou Entidades Reguladoras deverão se manifestar acerca

das matérias submetidas à sua apreciação no prazo de sessenta dias contados do encerramento do

processo de consulta pública, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada.

CAPÍTULO III

DAS AUDIÊNCIAS PÚBLICAS

Art. 11. Os temas constantes da Agenda Regulatória, de significativa

repercussão para os consumidores, serão submetidas a audiências públicas previamente à tomada de

decisão.

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Parágrafo único. As audiências públicas ocorrerão, preferencialmente, em

pelo menos uma capital de cada região do País.

Art. 12. Os Órgãos e Entidades Reguladoras deverão, em até trinta dias

antes da realização da audiência pública:

I - comunicar formalmente o coordenador do Sistema Nacional de

Defesa do Consumidor acerca da realização da consulta pública, para

fins de ampla divulgação aos integrantes do Sistema;

II - solicitar parecer sobre suas propostas ao coordenador do Sistema

Nacional de Defesa do Consumidor, visando adequar sua a matéria

aos ditames da legislação consumerista

III - publicar despacho motivado, no Diário Oficial da União, fixando

a data da audiência pública;

IV - disponibilizar, na sede e no respectivo sítio na rede mundial de

computadores, os estudos, os dados e o material técnico utilizado

como fundamento para as propostas colocadas em audiência pública;

V- disponibilizar explicações, em linguagem leiga, de temas técnicos

abordados na respectiva audiência pública;

Art. 13. Os Órgãos ou Entidades Reguladoras poderão realizar eventos

prévios à audiência pública, a fim de subsidiar a participação dos consumidores e de entidades de

defesa do consumidor.

Art. 14. As atas das audiências públicas, nas quais constarão as críticas e

sugestões apresentadas pelos participantes, deverão ser disponibilizadas na sede e no sítio do Órgão

ou Entidade Reguladora na rede mundial de computadores, devidamente identificadas, até trinta

dias úteis após a sua realização, devendo permanecer disponíveis na Internet pelo prazo mínimo de

um ano após a publicação da decisão regulatória sobre a qual a audiência versou.

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Art. 15. O posicionamento do Órgão ou Entidade Reguladora sobre as

críticas ou contribuições apresentadas no processo de audiência pública deverá ser disponibilizado

na sede e no sítio do Órgão ou Entidade Reguladora na rede mundial de computadores, até sessenta

dias após a sua realização, com a indicação do procedimento adotado, devendo permanecer

disponíveis na Internet pelo prazo mínimo de um ano após a publicação da decisão regulatória

sobre a qual versou audiência.

CAPÍTULO IV

DO FUNDO FEDERAL DE FOMENTO À PARTICIPAÇÃO DAS ENTIDADES CIVIS DE

DEFESA DO CONSUMIDOR NO PROCESSO REGULATÓRIO

Art. 16. Fica criado o Fundo Federal de Fomento à Participação Social no

Processo Regulatório - FFPR, com o objetivo de proporcionar recursos e meios para financiar a

participação social no processo regulatório e apoiar programas de desenvolvimento de entidades

civis de defesa do consumidor.

Artigo 17. O Fundo Federal de Fomento à Participação Social no Processo

Regulatório será gerido por Conselho Federal, criado no âmbito da estrutura organizacional do

Ministério da Justiça

Art. 18. O Conselho Gestor do FFPR, órgão colegiado com paridade

quantitativa entre representantes do Poder Executivo e de entidades civis, com sede em Brasília,

será integrado pelos seguintes membros:

I – um representante da Casa Civil da Presidência da República,

II - um representante do órgão federal de defesa do consumidor,

III – um representante do Ministério da Fazenda;

IV – três representantes de órgãos ou entidades reguladoras;

V – um representante do Ministério Público Federal;

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VI – cinco representantes de entidades civis de defesa do consumidor, de

acordo com o disposto no art. 2º desta lei.

Art. 19. A escolha dos representantes das entidades civis de defesa do

consumidor e dos órgãos e entidades reguladoras será disciplinada pelo Regimento Interno do

Conselho.

§ 1º No ato de nomeação dos representantes do Poder Executivo, o

Presidente da República determinará a expedição de edital convocando os integrantes das entidades

civis de defesa do consumidor para a assembleia a se realizar até trinta dias após sua publicação,

visando à escolha do processo da primeira eleição dos membros daquelas entidades que comporão o

Conselho.

§ 2º O Ministério Público Federal fiscalizará todo o processo de escolha dos

representantes das entidades civis de defesa do consumidor e dos órgãos e entidades reguladoras.

Art. 20. A Presidência e a Vice-presidência do Conselho serão ocupadas

alternativamente por representantes do Poder Executivo e das entidades civis , eleitos pleos

membros do Conselho para mandato de dois anos.

Art. 21. A participação no Conselho Federal gestor do FFPR é considerada

serviço público relevante e não remunerado.

Art. 22. As reuniões do Conselho serão públicas, com pautas pré-

estabelecidas no ato da convocação.

Art. 23. Caberá ao Conselho Federal gestor do FFPR formular as políticas,

diretrizes gerais e prioridades que orientarão as aplicações do Fundo, bem como definir os

programas, projetos e atividades financiadas com recursos do Fundo, nos termos do art. 24 desta

Lei.

Art. 24. Os recursos do Fundo serão aplicados em programas, projetos e

atividades de fomento à participação social no processo regulatório que contemplarão, entre outros,

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os seguintes objetivos:

I - contratação de apoio técnico sobre matérias reguladas para e

assessoramento qualificado à organização de consumidores e seus associados;

II – apoio institucional para capacitação e atuação nos temas que compõem

a Agenda Regulatória;

III – desenvolvimento de atividades de educação nos temas que compõem a

Agenda Regulatória;

IV - incentivo ao desenvolvimento das entidades civis representativas dos

consumidores, atendendo aos princípios da Política Nacional das Relações de Consumo.

Art. 25. Poderá pleitear recursos do Fundo Federal de Fomento à

Participação Social no Processo Regulatório - FFPR para financiamento das ações previstas no

artigo anterior, a entidade civil de defesa do consumidor em efetivo funcionamento e que atenda,

cumulativamente, aos seguintes requisitos :

I - seja independente de empresas, governos e partidos políticos.

II - não receba apoio, doações e subvenções de empresas comerciais,

industriais ou prestadoras de serviços, privadas ou estatais, nacionais ou estrangeiras;

III - não veicule, em suas publicações e meios de comunicação, avisos de

natureza publicitária de empresas comerciais, industriais ou prestadoras de serviços;

IV - preveja, em seus atos constitutivos, mecanismos que assegurem a

democracia e a transparência nas diferentes instâncias da entidade;

V - aplique suas rendas, seus recursos e eventual superávit integralmente na

manutenção e desenvolvimento de seus objetivos institucionais.

Art. 26. Constituem recursos do FFPR o produto da arrecadação :

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I - de % das multas resultantes de processo administrativo sancionatório dos

Órgãos e Entidades Reguladoras;

II - de recursos oriundos da receita orçamentária dos Órgãos e Entidades

Reguladoras;

III - dos rendimentos auferidos com a aplicação dos recursos do Fundo;

IV - de doações de pessoas físicas ou jurídicas;

V - de convênios e acordos e celebrados com entidades, organismos e

empresas, públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras;

VI - de outras receitas que vierem a ser destinadas ao Fundo.

§ 1º Enquanto o fundo não for regulamentado, os recursos ficarão

depositados em estabelecimento oficial de crédito, em conta com correção monetária.

§ 2º O saldo positivo do Fundo, apurado no balanço anual, será transferido

como crédito do mesmo fundo para o exercício seguinte.

Art. 27. As contribuições ao Fundo serão devidas 30 dias após

regulamentação desta Lei.

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4. DIRETRIZES PARA O ESTABELECIMENTO DE INSTRUMENTOS DE

COMUNICAÇÃO E EDUCAÇÃO PARA O CONSUMO QUE CONTEMPLEM TEMAS

RELATIVOS AO PAPEL DAS AGÊNCIAS, DOS ÓRGÃOS DO SNDC E DIREITOS DO

CONSUMIDOR NOS SETORES REGULADOS

O processo de construção da cidadania no Brasil enfrenta muitos desafios e, em especial, a

superação de uma cultura política calcada na tutela. A construção de uma cidadania ativa configura-

se como elemento determinante para constituição e fortalecimento de sujeitos que, portadores de

direitos e deveres, assumam a importância da abertura de novos espaços de participação.

A educação para a cidadania representa a possibilidade de motivar e sensibilizar as pessoas para

transformar as diversas formas de participação em potenciais fatores de dinamização da sociedade e

de ampliação do controle social da coisa pública, inclusive pelos setores menos mobilizados. Trata-

se de criar as condições para a ruptura com a cultura política dominante e para uma nova proposta

de sociabilidade baseada na educação para a participação. Esta se concretizará, principalmente, pela

presença crescente de uma pluralidade de atores que, pela ativação do seu potencial de participação,

terão cada vez mais condições de intervir consistentemente e sem tutela nos processos decisórios de

interesse público, legitimando e consolidando propostas de gestão baseadas na garantia do acesso à

informação e na consolidação de canais abertos para a participação, que, por sua vez, são requisitos

básicos para a institucionalização do controle social.

Ainda que este processo necessite algum tempo para maturação e consolidação de uma nova

realidade, deve-se considerar que há uma demanda crescente para que a sociedade esteja mais

motivada e mobilizada para assumir um papel propositivo e seja capaz de questionar, de forma

concreta, a falta de iniciativa do governo na implementação de políticas públicas ou a ausência

delas. Nessa direção, os inúmeros problemas enfrentados pelos consumidores, em especial nos

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setores regulados, constituem um tema muito propício para o aprofundamento, a reflexão e a prática

em torno do controle social, e representa a possibilidade de abertura de estimulantes espaços para

implementar alternativas diversificadas de democracia participativa, notadamente a garantia do

acesso à informação e a consolidação de canais abertos para uma participação plural.

O exercício do controle social na Administração Pública passa, obrigatoriamente, por uma

transformação cultural da sociedade, objetivando a conscientização e o preparo da população para o

exercício de uma cidadania ativa. O controle social só será efetivo quando o conjunto da sociedade

exercer esse controle. Para uma transformação cultural é imprescindível a utilização da educação,

entendida de forma abrangente, como sendo o processo de desenvolvimento harmonioso das

faculdades humanas.

A educação informal, aquela que é realizada fora da escola e que possui um público-alvo bem

heterogêneo, é um outro desafio que deve ser enfrentado pelo poder público em suas diferentes

instâncias. A atuação e o papel das agências reguladoras não se restringem à promoção do

desenvolvimento e ao fomento ao crescimento econômico. O ciclo se completa com a correção das

falhas de mercado garantindo segurança e bem-estar à população. Essas falhas comprendem

questões de natureza e complexidades distintas e incluem desde a assimetria de informação até

externalidades negativas que atingem os consumidores a cada dia. A combinação dessas atribuições

é que propicia um ambiente regulatório estável, capaz de impulsionar os investimentos no país.

Para que haja um fluxo perfeito de informação e trocas entre o ente regulador e o cidadão, é preciso

que se estabeleçam vínculos de confiança e um dos requisitos básicos é a comunicação. O diálogo

com os cidadãos e com a mídia reforça acima de tudo, a legitimidade da agência e clarifica a sua

importância no cenário nacional, além de propiciar o controle social efetivo. Após uma década de

existência, as agências ainda não são reconhecidas pelo cidadão, que desconhece o papel e as

formas de atuação desses entes e os espaços institucionalizados de participação. O cidadão também

desconhece seus direitos com relação aos serviços regulados e a forma de exercê-los. Políticas de

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comunicação que considerem canais capazes de alcançar toda a população, disponibilizando

informação clara, com linguagem acessível e útil ao consumidor, são fator determinante para a

construção desses vínculos e para a promoção da participação da sociedade na atividade regulatória.

Todas as agências reguladoras possuem sites na Internet, com muitas informações institucionais e

dados sobre os setores regulados, porém a linguagem adotada é absolutamente inacessível ao

cidadão leigo e, além disso, a maioria da população não tem acesso à rede mundial de

computadores e nem identifica-se com os temas tratados nesses espaços. Por essas e outras razões, a

internet deve ser entendida como um instrumento importante na política de comunicação das

agências, mas deve haver a combinação de vários canais de comunicação e educação com

estratégias distintas, a fim de se alcançar os diversos públicos.

São poucas as iniciativas no sentido de gerar material com informação sobre o setor regulado e a

atividade regulatória de forma mais simples, capaz de atingir qualquer cidadão, individualmente, ou

grupos específicos de consumidores. As iniciativas mais comuns são algumas cartilhas,

disponibilizadas nos sites das agências. Entretanto, não há informações sobre a forma de

disseminação desses materiais, nem evidências de que o público-alvo tenha sido atingido. Também

merece destaque a falta de estratégias voltadas à educação formal em todas as agências reguladoras.

Pesquisa realizada pelo Idec no segundo semestre de 2008 identificou uma campanha publicitária

da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, divulgada em emissoras de rádio com o

objetivo de aumentar o conhecimento sobre a agência, sua função regulatória e as principais

características dos planos de saúde. Em 2007 o material foi divulgado em 6 rádios FM e em 2008

foram envolvidas duas emissoras AM e duas FM, com cobertura nacional. Trata-se de uma boa

prática, uma vez que a rádio é um canal que alcança a grande maioria da população e que se presta

muito bem à divulgação de informação sobre direitos e sobre as formas de reparação dos danos

sofridos pelos consumidores.

A utilização das contas como canal de comunicação com os consumidores, é uma prática que deve

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ser incentivada pelas agências reguladoras. O decreto nº 5.440 de 4 de maio de 2005, que versa

sobre instrumentos para divulgação de informação ao consumidor sobre a qualidade de água para o

consumo humano, é um exemplo dessa recomendação. Além das informações previstas na conta de

água, o decreto prevê a obrigação de envio de relatório anual contendo informações como

transcrição de direitos do consumidor; indicação do setor de atendimento ao consumidor;

responsável legal pela empresa ou entidade, etc.

É preciso considerar, acima de tudo, que a informação, assim como a educação para consumo,

constituem elementos vitais para o processo democrático. O acesso à informação é um direito

básico do consumidor, reconhecido pela ONU e assegurado pelo Código de Defesa do Consumidor.

A Lei de Concessões também registrou a importância desse direito quando determinou, em seu art.

70, Inciso II, que “sem prejuízo do disposto na Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, são direitos

e obrigações dos usuários: II - receber do poder concedente e da concessionária informações para a

defesa de interesses individuais ou coletivos”. O compromisso das agências com a comunicação

deve, portanto, integrar metas e contratos de gestão, permitindo uma rápida mudança na situação

atual.

O estabelecimento de diretrizes para a comunicação e educação para o consumo deve considerar

duas dimensões principais:

a) o papel indutivo do poder público nos conteúdos educacionais como caminho possível para

promover a transformação cultural da sociedade, objetivando a conscientização e o preparo do

indivíduo para o exercício de uma cidadania ativa;

b) o dever das agências reguladoras em relação à transparência e à disponibilização de informação e

de orientações úteis para a defesa individual e coletiva, e para a promoção dos direitos do

consumidor.

Com relação à primeira dimensão, há que se considerar que os parâmetros curriculares do

Ministério da Educação (MEC) indicam a inserção da educação para o consumo como um tema

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transversal, onde os direitos são apresentados a partir de situações concretas presentes no cotidiano

da criança, do adolescente e da família e combinados com conceitos de matemática, língua

portuguesa, ciências, geografia etc.. As diretrizes do Ministério da Educação levam em conta que a

formação de um consumidor consciente, que entenda a cidadania como algo mais além do voto, e

que tenha a clara percepção do seu papel na definição de políticas públicas e no mercado de

consumo, passa necessariamente pela escola. E esse é um campo vastíssimo para a apresentação

sistematizada de aspectos relacionados aos serviços regulados, reguladores, deveres e direitos. Já

existem experiências no Brasil que podem e devem ser copiadas. A educação ambiental, que

também é um tema transversal apresentado por meio das diversas disciplinas do currículo escolar,

já é uma realidade em muitas escolas. Os resultados já começam a ser percebidos e têm origem na

adoção de políticas públicas gestadas no Ministério do Meio Ambiente em parceria com o

Ministério da Educação.

A publicação "Consumo Sustentável: Manual de Educação", fruto de

parceria do Idec e do Ministério do Meio Ambiente (MMA) é uma das

ferramentas para auxiliar professores do ensino fundamental a estimular

formas responsáveis de consumo em crianças e adolescentes. A

publicação analisa os problemas socioambientais associados aos atuais

padrões de produção e consumo, apresentando alternativas para a

mudança de hábitos de consumo.

Lançada a primeira edição em 2002, 32 mil exemplares foram distribuídos para professores de

redes públicas de ensino, para educadores ambientais, organizações ambientalistas, diversas ONGs

e movimentos sociais. Em 2003, o Idec e o MMA fizeram seu primeiro projeto piloto de formação

de professores em consumo sustentável, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação de

São José dos Campos (SP). A publicação "Consumo Sustentável: Manual de Educação" passou

a ser utilizada, em 2004, no Programa “Vamos Cuidar do Brasil com as Escolas”, desenvolvido pelo

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MEC, que atingiu cerca de 30 mil professores em 4.400 Municípios brasileiros. Para essa ação

elaborou-se uma segunda edição do manual, que inclui mais um capítulo sobre consumo, a

sustentabilidade socioambiental e cidadania. Também em 2004, o conteúdo da publicação foi

utilizado em uma inciativa do Canal Futura em cinco programas sobre consumo sustentável (água,

energia, alimentos, biodiversidade e lixo) da série “Nota 10”, voltada para professores.

Outra experiência de âmbito nacional da qual o Idec fez parte e que merece ser destacada é a

produção da coleção "Educação para o consumo responsável", publicada pelo Instituto Nacional de

Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro) e utilizada para a capacitação de

professores. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) também produziu, no âmbito dos

projetos “Educanvisa” e “Contributo”, um material para a capacitação de professores.

Apresentamos no quadro abaixo, de forma bastante simplificada, algumas diretrizes para o

estabelecimento de instrumentos de comunicação e educação para o consumo nos temas relativos

aos setores regulados:

Diretrizes para o estabelecimento de instrumentos de comunicação e educação para o

consumo nos temas relativos aos setores regulados

Comunicação direta entre agências

reguladoras e consumidores

Estabelecimento de formas de comunicação mais abrangentes e

acessíveis: rádio, TV, internet e jornais de grande circulação

Divulgação permanente dos canais existentes para

comunicação do cidadão com a Agência em spots de rádios

Mitigação do tecnicismo do conteúdo abordado nos canais de

comunicação

Utilização das faturas mensais dos serviços para divulgação de

direitos, do papel da agência e dos canais de informação com

mensagens elaboradas pelas agências

Utilização dos espaços de utilidade pública para

disseminação dos direitos e dos caminhos para a reparação

Elaboração de cartilhas abordando direitos em linguagem

simples e disseminação em postos de atendimento dos órgãos

de defesa do consumidor e das próprias agências

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Criação de espaços para a discussão de temas específicos com

a sociedade – fóruns descentralizados com técnicos das

agências e com o público local

Educação para o consumo nas

escolas

Criação, no âmbito do MEC, de um comitê formado por

agências reguladoras, DPDC/MJ e MEC para discussão de

política pública que objetive disseminar a cultura da regulação

no país:

Definição das linhas de ação

Formação de professores

Elaboração de material didático

Adoção de técnicas modernas de ensino

A necessidade de se aprimorar e ampliar a comunicação dos agentes reguladores com a sociedade é

urgente, sob pena de se comprometer ainda mais o equilíbrio no ambiente regulatório, no qual o

grau de assimetria de informação já é muito alto, e o nível de participação do consumidor nos

canais institucionalizados é baixíssimo.

É premente a dinamização da comunicação, adotando-se estratégias diferenciadas, capazes de

atingir todas as camadas da população. Tal atividade é tão importante quanto o papel indutivo do

poder público nos conteúdos educacionais. São caminhos possíveis para alterar o quadro atual, em

que os problemas na relação de consumo nos serviços regulados são a maioria das reclamações em

órgãos de defesa do consumidor de todo o país.

Esses esforços devem objetivar a promoção do crescimento da cultura da regulação, expandindo a

possibilidade de a população participar em um nível mais complexo e incidente no processo

decisório, como uma forma de fortalecer sua co-responsabilidade na fiscalização e no controle dos

agentes do mercado.

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5. CONCLUSÃO FINAL

A viabilização da participação social no processo decisório das agências reguladoras e a

consequente incorporação de temas referentes à proteção do consumidor na Agenda Regulatória

estão condicionadas à mudança de paradigmas regulatórias e à sua imediata implantação.

Alguns dos condicionantes para a implantação de mudanças no modelo regulatório, a fim de

garantir maior participação do consumidor e seus representantes no processo decisório, foram

sistematizadas nesse relatório em sete objetivos transformados em propostas a serem postas em

prática.

Primeiramente, há que se esclarecer o papel da regulação, passando a relacionar a defesa do

consumidor dentre as prioridades das agências reguladoras, assim como sanar dúvidas quanto à

competência das agências em estabelecer mecanismos de articulação com as instituições de defesa

do consumidor. Nesse sentido, o direito do consumidor deve ser considerado na elaboração de todos

os atos das agências e deve integrar o planejamento estratégico das mesmas.

Além disso, é necessário melhorar os instrumentos de t ransparência nos processos decisórios e

qualificação da participação. O alcance de uma efetiva participação pública no processo decisório

passa pela necessidade de obediência aos critérios que conferem transparência sobre os atos

regulatórios. Cumpre-se, com isso, elaborar medidas que garantam a ampla divulgação de

informações relativas ao processo decisório e que essas informações sejam compartilhadas em grau

de igualdade entre os interessados, a fim de consolidar a redução de assimetrias entre as partes.

A integração entre agências e Sistema Nacional de Defesa do Consumidor é outro importante

objetivo a pautar ações para a consolidação de modelo regulatório que contemple a tutela do

consumidor. Ainda não se diagnostica, de forma clara, o papel adotado pelas agências reguladoras

em relação ao Sistema Nacional de Defesa do Consumidor. Nesse sentido, necessário o

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estabelecimento de diretrizes que comandem a articulação das agências e do SNDC, devendo as

mesmas ser institucionalizadas e obrigatórias quando o assunto regulado afetar os interesses do

consumidor.

Nesse ponto relativo à transparência, destaque para a construção e divulgação ampla de Agenda

Regulatória. Necessário que a implementação desse instrumento estenda-se a todas as agências

reguladoras e que os aspectos que o constituem sejam uniformes. A agenda deve necessariamente

ser elaborada em um processo participativo, divulgada previamente e com um prazo hábil para que

os interessados possam se preparar para atuarem nos temas definidos, juntamente com

monitoramento de sua execução.

A inserção da discussão sobre os direitos do consumidor na atividade regulatória depende da

aproximação das agências das demandas e problemas enfrentados pelos consumidores no dia-a-dia

– adequado atendimento ao consumidor individual. Nesse sentido, o atendimento individual das

demandas setoriais dos consumidores permite a identificação de problemas sistêmicos e pode

funcionar como importante fonte para elaboração de atos regulatórios. A importância dos canais de

atendimento individual é dada não só pela possibilidade de solução individual dos problemas

apresentados, mas por permitir verificar as lacunas do sistema e, consequentemente, melhor focar

as atividades fiscalizatórias.

Diante da constatação da assimetria de recursos técnicos e financeiros das entidades de defesa do

consumidor, chamamos atenção para a necessidade de fomento às organizações de defesa do

consumidor. Essas assimetrias são um fator impeditivo à participação dos consumidores nos

processos regulatórios, e por conseguinte acabam sendo uma barreira à penetração das questões

consumeristas na atividade regulatória. Necessário, portanto, o incentivo à participação social, seja

através da promoção de capacitações, ou pelo financiamento de projetos na área regulatória

desenvolvidos pelas entidades de defesa do consumidor.

Concomitantemente às ações citadas nesse documento, deve se dar atenção ao aprimoramento dos

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canais de participação existentes e com a ampliação desses canais. As agências reguladoras devem

aperfeiçoar os canais de participação social já existentes e criar novos canais participativos, pois

atualmente o que se verifica são tímidos e por vezes inócuos instrumentos de controle social,

deixando a desejar em termos de institucionalização da participação da sociedade e ampliação da

democracia participativa. Nesse ponto, também merece destaque a necessidade de que os

consumidores possam indicar um dos conselheiros para o conselho diretor, conforme proposta

defendida pelo professor Calixto Salomão.

A proposta de anteprojeto de lei que acompanha este último relatório tem o condão de apresentar

saídas legais – quando cabíveis – para os problemas que dificultam a tutela do consumidor pelas

agências reguladoras, diagnosticados no decorrer da pesquisa. Contribuíram para a construção da

proposta as entrevistas realizadas com especialistas em regulação e o diagnóstico acerca da

interação entre agências reguladoras e SNDC.

O cerne da proposição legal apresentada é a ampliação da participação dos consumidores e seus

representantes nos processos regulatórios. Assim, propõem-se mecanismos de uniformização de

consultas e audiências públicas, a obrigatoriedade de construção e divulgação de Agenda

Regulatória, e a criação de fundo federal que ajude na qualificação para o debate das organizações

de consumidores.

Por fim, há que se considerar que a solução de muitas das assimetrias relatadas durante a pesquisa

não passam somente – ou necessariamente – apenas por mudanças no arcabouço legal regulatório.

É necessária uma mudança cultural dentro das próprias agências, incorporando-se a defesa do

consumidor como tarefa hodiernamente reconhecida como sua pelos reguladores.

Além disso, como forma de consolidação da democracia, participação e de afirmação da cidadania,

urgente que o consumidor individualmente considerado tenha mais acesso a informações sobre seus

direitos relativos a serviços regulados, e como exercê-los.

Dinamizar a comunicação com estratégias diferenciadas capazes de atingir todas as camadas da

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população é tão importante quanto o papel indutivo do poder público nos conteúdos educacionais,

por ser um caminho possível para alterar o quadro atual, onde os problemas na relação de consumo

nos serviços regulados possui grande peso nos registros de órgãos de defesa do consumidor de todo

o país. Medidas em sede da educação formal também são possíveis e necessárias. É urgente que

órgãos reguladores, integrantes do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor e Ministério da

Educação unam forças e repensem a educação para o consumo em escolas.

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REFERÊNCIAS

ANS – NOTÍCIAS. Disponível em:

http://www.ans.gov.br/portalv4/site/noticias/noticia_25641.asp?secao=Home. Acesso em

25.02.2010.

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Consumidor – Produto I. Convocação nº. 001/2009. Secretaria de Assuntos Legislativos do

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ANEXO 1 - Íntegra entrevista Calixto Salomão Filho

Pensando Direito - Idec

Entrevista realizada em 12.02.2010

Entrevistado:

Calixto Salomão Filho

Possui graduação em Direito pela Universidade deSão Paulo (1988) e doutorado em Direito pelaUniversità degli Studi La Sapienza (1992).Atualmente é professor titular da Universidade deSão Paulo. Tem experiência na área de Direito,atuando principalmente nos seguintes temas:direito concorrencial, direito societário, mercosul,sociedade anônima e mercado de capitais.

Como o senhor vê os consumidores na missãoe na atividade das agências reguladoras, tantonuma esfera legal (em termos de previsãolegal, se existe essa previsão, de que aproteção do consumidor tem que fazer parteda missão da agência, e como isso se dá naprática, realmente, assumindo a premissa deque deve haver alguma proteção?

São duas coisas aí. Em primeiro lugar, não temdúvida que há uma missão constitucional, legalpara o consumidor (até porque ele é o destinatáriofinal do serviço). Mas aqui tem uma primeiraressalva. A gente não pode, em matéria de setorregular, falar só em consumidor. É consumidor enão-consumidor. Porque aquele excluído doserviço também é um destinatário importante.Então isso já é uma primeira amostra de que oraciocínio exclusivo de direito ao consumidor nãobasta. Quer dizer, nós temos um grande grupo,com aqueles que têm como consumir - consomemos serviços e tem que ser protegidos em funçãoda situação de poder que existe, daessencialidade do serviço. Mas tem um grandegrupo de pessoas que não conseguem ter acessoao serviço, mas que possuem seus interessestutelares. Então é uma proteção mais ampla.

Isso faz com que a gente tenha que terinstrumentos mais amplos de proteção que não serestrinjam ao Código de Proteção ao Consumidor.Até com uma diferença de fundo que é a seguinte:para que esses instrumentos funcionem, eles têmque ter instrumentos que influenciem a estruturade funcionamento do sistema. Não uminstrumento que seja uma mera conversação. OCódigo do Consumidor é uma importantíssimafonte de compensações. Então ele identifica umgrupo de hipossuficientes e nota-se que se há

prejuízos na relação desse grupo dehipossuficientes com o regulado (com asempresas), eu tenho que compensar esse grupo.Com a proteção mais ampla, os consumidores eos não consumidores, precisam além dascompensações, de outro tipo de proteção, que éuma proteção estrutural. Ou seja, garantir queestruturalmente o sistema funcione e funcionebem para todos.

Como é que se faz isso? Bom, são tantosinstrumentos que protegem o consumidor eprotegem outros. Precisa ser bem entendido issoporque, às vezes, concorrência se confunde comlivre mercado, mas é o oposto. Se eu limito opoder econômico, eu estou tornando aquelarelação mais equilibrada para o consumidor. Eutorno aquele não usuário (exatamente porque arelação é mais equilibrada, o preço é menor) maiscapaz de entrar naquele mercado. Então alimitação do poder econômico, concorrência,entendida no sentido de limites estruturais aopoder econômico, é um elemento. Existem outroselementos. Outros elementos estruturais que sãoredistributivos diretos. Por exemplo, programas deuniversalização. Então todos esses elementosinfluenciam no funcionamento do setor. Então nãoé uma mera compensação. Compensações sãonecessárias. É o que o Código do Consumidor faz,mas em matéria de setores que envolvem tantosinteresses, precisa de mais e esses elementosestruturais de redistribuição, de limitação de podereconômico são essenciais.

E o senhor acha que isso está presente naregulação de fato?

O problema aí é o “de fato”. Quer dizer, na lei nóstemos todos esses princípios, princípios lindos,redistributivos, concorrência, limitação. Emalgumas leis, por exemplo, a Lei deTelecomunicações.

A Lei Geral de Telecomunicações, porexemplo, prevê a desagregação de rede dasconcessionárias e isso nunca foi feito.

Exatamente por serem setores regulados, elespartem do pressuposto que tem que haver umaregulação constante e dinâmica, porque mudamuito a tecnologia e tal, então tudo não pode ficarna lei. A consequência disso é que a lei traz sóprincípios que, se não forem incrementados pelaregulação, não são nada. Então, aí sim, entra aparticipação dos órgãos e da sociedade civil e dasONGs. Porque elas têm que participar na

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elaboração desses regulamentos que são o centrodo funcionamento e elas tem que cobrar,eventualmente, até no judiciário (se esseregulamentos não forem feitos, ou forem feitoscontra esses vários interesses). Porque na prática,a resposta é que, de fato, a regulação leva muitopouco em consideração esses princípios.

Na época da criação das agênciasreguladoras, o foco concentrava-se naregulação econômica devido às privatizações,não se olhou para as questões consumeristas,e isso reflete nos dias de hoje, porque é umaquestão cultural. Não seria uma questãointencional de captura. Até que ponto isso temque mudar? E como isso ocorreria? Com aparticipação mais efetiva da sociedade e seusdiversos representantes?

É o que eu estava te dizendo. Essas mudançasestruturais são as mais difíceis. Não é só umamudança das agências, é uma mudança tambémdas ONGs, das associações. As agências têm quemudar sim os processos de consulta pública, temque ser mais inclusivas, chamar à participação(exemplo: reuniões, promovidas pela Anatel comos grupos específicos, ONGs), explicar aquilo.Mas não é só isso, também as ONGs, essasassociações, elas têm que procurar se capacitar.E aí é uma questão de também se entender ointeresse público até promovido pela atuação dela.Necessário, portanto, mudanças dos dois lados: aagência tem que mudar e as ONGs têm quemudar para buscar a própria capacitação. E porque eu falo dessa capacitação própria? Porquepara que as ONGs e as associações sejamindependentes, toda a vez que a capacitação delafor dirigida por uma agência governamental,aquela ideia da sociedade civil independentediminui um pouco, então ela tem que buscar alémdaquilo que as agências proporcionarem, umacapacitação própria (até para desenvolver aindependência dela). A gente vê que as ONGsmais independentes, hoje, vamos pensar emmatéria de meio ambiente, elas criamconhecimento. O Greenpeace por exemplo. Cria-se conhecimento sobre o meio ambiente dentro doGreenpeace. Uma ONG de consumidor, elaprópria tem que criar conhecimento. Então sãoduas coisas muito importantes: a agência se abrirmais, a agência promover debates e discussõesespecíficas com os vários interesses e nãosimplesmente soltar uma consulta pública e dizer“quem vier, veio”. Tem a questão da agência daprópria composição interna de órgãos. E tem aONG independente e procurando também meiosindependentes de se capacitar.

O senhor vê o financiamento público comouma alternativa? Porque é uma realidade queas ONGs no Brasil têm poucos recursos,algumas conseguem se destacar mais. Mas emregra é bastante difícil o dia-a-dia para essasONGs. O senhor vê o financiamento públicocomo uma possibilidade, uma alternativa?

Eu acho que não pode ser exclusivo, mas é umaalternativa, desde que bem regrada e garantida aindependência. As universidades públicas têmuma boa experiência nisso de garantir suaindependência com relação a financiamentos. Háfinanciamentos públicos, inclusive, emuniversidades públicas. Isso se dá pela absolutaautonomia de definição de projetos. O que nãosignifica não apresentar relatório do que foi feito,mas uma absoluta autonomia em relação a comoesses recursos serão utilizados. Mas eu acho quepode sim. Acho que o financiamento público,desde que bem regrado, ele pode ser uminstrumento útil.

Sobre o funcionamento interno das agências,como isso se comunica com a participaçãopública?

Então, é que isso varia tanto de agência paraagência. A representação do consumidor tem essepropósito nos conselhos. E não é só com oconsumidor, eu acho que tem tantas agências comuma representação de não usuários, umarepresentação de associações do meio ambienteetc. Imagine um setor como o de energia elétrica,o quanto não afeta o meio ambiente. No dia-a-diada agência, no próprio conselho diretor, eu achoque deveria haver obrigatoriedade que houvesserepresentação mais ampla, não uma escolha, masque houvesse, por exemplo, indicações, como hános tribunais. Então a OAB apresenta uma lista.Eu acho que, por exemplo, órgãos do consumidordeveriam poder indicar alguns conselheiros. Dealguma forma congregando. Enfim, isso teria queser bem pensado também. Aqueles alijados doprocesso de consumo, deveriam tambémparticipar da escolha do representante doconsumidor, quer dizer, consumidores e nãoconsumidores. Eu acho isso fundamental. Nemprecisa ser a maioria (porque um grande problemadas agências é a visibilidade e transparência),basta estarem lá para que certas coisas tenhamvisibilidade. E certas coisas, às vezes, se façamcom mais transparência. O direito societário temboa experiência nesse ramo, porque, no momentoem que acionistas minoritários conseguem se unirpara indicar um conselheiro de administração, elenão vai decidir, mas vai trazer a luz a certosproblemas. Ninguém vai poder falar de certascoisas, fazer certas coisas, porque vai saber que

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aquilo vai prejudicar. Isso é essencial numaagência.

Ainda que se vote, num determinado sentido,mas que, pelo menos, aquela votação sejatransparente. Todos vão ficar sabendo.

Vão ficar sabendo, emitir opinião. Na ata da coisa,a controvérsia vai constar. “Mas escuta, isso aquivai fazer mal ao meio ambiente. Isso aqui vai fazermal para os consumidores. Os não usuários nãoestarão alijados”. Quer dizer, isso já é um passogrande. Quem dera, no futuro, a gente tenha umaparidade. De novo, no direito societário, porexemplo, países que conseguiam paridades departicipação dos trabalhadores, isso foi naAlemanha, foi um processo. Começaramminoritários e depois cresceu. Oxalá que um diahaja paridade, mas até lá, uma representação jáseria muito bom.

O que se fala muito é que se precisa deespecialistas e técnicos nas agências e aindanão se vêem um representante de consumidorcomo alguém bom o suficiente, no sentido deespecialista, para fazer parte. E aí talvez sejaum outro problema, porque, se é que não tem,deveria ter, então, talvez um investimento paracriar essas pessoas, para capacitar essaspessoas.

É, mas aí, apesar de eu estar de acordo, naprimeira pergunta, eu falei que essas ONGsdeveriam se capacitar independentemente. Apesardisso, eu acho que uma coisa não pode ficaresperando a outra. Quando se criou a lei departicipação dos operários na Alemanha, elesfizeram a mesma coisa. “Nossa, mas essestrabalhadores vão entrar aqui no conselho deadministração de empresa e não vão entendernada, não vão falar nada.” E não é verdade, elesforam escolhendo os melhores. Lá a participaçãoé paritária, e muitas vezes não se chegava aoconsenso e o que se teve que fazer foi aumentar onível de profissionalismo dos administradores,exatamente porque a briga nos conselhos eramuito grande. A mesma coisa pode acontecer naagência. Na medida em que aumento essaparticipação, número um: as ONGs vão ter que sevirar para encontrar alguém que consiga ir lá eentender as coisas, porque sabem que se for láalguém que não consegue entender, sequer vaiconseguir dialogar com eles e, portanto, vai seruma sub-participação. As ONGs vão ter que correratrás, ou encontrar alguém que represente seusinteresses e entenda do setor, — isso é possível—, ou então é formar alguém. Então esse já é umimpulso sobre a capacitação. E, segundo, porque

um certo impasse interno nesse colegiado é bom.Um impasse interno gera mudanças, gera atébusca por profissionais. Toda vez que se criaimpasse, há a busca por um tecnicismo maior enão uma proteção de interesses específicos.Então pode ser que isso aconteça também. Euacho que uma coisa não deveria esperar a outranão. Os dois poderiam acontecerconcomitantemente.

Isso é algo que depende só das agências ouprecisaria de um envolvimento de todo opoder, o Executivo, eventualmente oCongresso?

O Congresso seria muito importante. O Executivose possível. Mas eu acho que a participação doCongresso é importante. A solução para tudo nãoé lei, mas um impulso exaustivo aí seriainteressante.

É claro que se viesse do Executivo e issocomeçasse em diferentes agências... Porquediferentes agências podem ter diferentesnecessidades. Um representante do meioambiente pode ser mais necessário no setorelétrico do que em outros, por exemplo. Entãonem sei se essa formatação deveria ser feita poruma lei. Talvez a lei pudesse dar as diretrizes paracada agência, e ela se adaptasse. Portanto tem aíespaço para a participação legislativa e tambémnecessidades de conscientização do Executivodas próprias agências.

O senhor teria alguma sugestão para melhorartudo isso?

É formação independente, induzida, ambasajudadas pelas agências (mas preservando-se aindependência). Mudanças no funcionamento dasagências, mais participações, não só em consulta,mas nos próprios conselhos diretores.

Essas alterações mais estruturais que osenhor disse com relação à concorrência.

Eu não sei se sozinhas as agências conseguemisso. Acho que, na medida em que houver maisparticipação em conselho diretor, maisparticipação em consulta pública de órgãos quetêm esse foco, maior será a possibilidade. Etambém na medida em que houver maiscontestação (judicial, inclusive, para que nãodescumpra os princípios tais e tais). Mudar aforma de aplicação do direito material, às vezes,exige muitas mudanças procedimentais no

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funcionamento da agência, na forma com que aONG atua. Com mais dinamismo na contestação.Não tem só uma mágica a não ser atuaçãojurídica. Atuação jurídica tem várias esferas,

tomadas de decisões das agências, contestaçãojudicial, participação em consultas públicas,atividade acadêmica de convencimento. É umprocesso longo.◘

ANEXO 2 - Íntegra entrevista Ronaldo Porto Macedo Júnior

Pensando Direito – Idec

Entrevista realizada em 08.02.2010

Entrevistado:

Ronaldo Porto Macedo Junior

Possui graduação em Ciências Sociais pelaUniversidade de São Paulo (1987), graduação emDireito pela Universidade de São Paulo (1985),mestrado em Filosofia pela Universidade de SãoPaulo (1993) e doutorado em Direito pelaUniversidade de São Paulo (1997). Fez pós-doutorado na Yale Law School (2002) e King´sCollege of London (2008-2009). Foi professorvisitante do Center for Transnational Studies-London (2008). Atualmente é promotor de justiçado Governo do Estado de São Paulo, professordoutor da Faculdade de Direito da Universidadede São Paulo e professor da Escola de Direito deSão Paulo Fundação Getúlio Vargas (Direito GV),possui vínculo com o Centro Brasileiro de Análisee Planejamento, é consultor ad hoc da Fundaçãode Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo epossui vínculo com a Sociedade Brasileira deDireito Público. Tem experiência na área deDireito, com ênfase em Teoria do Direito, Filosofiado Direito, Filosofia Política, Direito Contratual eDireito Ambiental, atuando principalmente nosseguintes temas: Filosofia da Linguagem, Teoriada Interpretação, Direitos Difusos, MinistérioPúblico e Contratos Relacionais. É coordenadorda Coleção Teoria e Filosofia do Direito, da EditoraElsevier.

Qual papel o senhor acredita que ocupam osconsumidores na missão e nas atividades dasagências reguladoras em termos legais, deprevisão legal, e na prática?

De maneira geral, as leis que regulam os setoresregulados não tiveram nenhuma ou quasenenhuma preocupação com essa questão da

participação do consumidor. Isso se dá poralgumas razões, algumas delas que não são bemacolhidas ou não aceitas pelos consumeristas,dentre as quais eu destacaria uma delas (que nãoé uma boa razão, mas é uma razão real), trata-sedo fato de que as agências reguladoras não sãoórgãos orientados exclusivamente e sequer,muitas vezes, primordialmente para a defesa doconsumidor. Sei que muitos consumeristas odeiamque se diga isso, discordam disso, mas acho que,de fato, as agências reguladoras cumprem váriasfunções, basicamente de organizar o mercado,regular a locação de recursos, desenvolvimentoeconômico, que são outros interesses que nãotem a ver com a tutela específica do consumidor.E certamente isso pôs esses outros interesses,talvez até preponderantes, ofuscandocompletamente uma outra função que as agênciasdevem ter, que era a defesa dos interesses doconsumidor. Em outras palavras, a agência não éexclusivamente para isso, mas ela pode e devetambém incorporar questões do consumidor.Agora, isso traz alguns problemas. Quais sãoeles? Em primeiro lugar, muitos desses interesses,quando você fala, como eu estou aqui propondo,que uma agência tem mais de uma função, issogera problemas de articulação interna. Como éque você faz com que dois interesses, queeventualmente estarão em conflito, por exemplo,de modernização, locação de investimento,aumento de eficiência, segurança do sistema einteresse do consumidor? Às vezes pode entrarem conflito. Vou até dar um exemplo maiscorriqueiro do que a questão do consumidor, que éa questão com a qual trabalhei bastante:regulação e concorrência. De maneira geral, asagências têm também que ter uma preocupaçãocom a defesa da concorrência. No caso deTelecom (acho que é onde temos a lei regulatóriamais elaborada, mais moderna), há a previsão daprópria instrução dos atos de concentração e dascondutas anticoncorrenciais competentes à Anatel.No entanto, é difícil realmente do ponto de vista dalógica interna, um órgão se encarregar da

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concorrência quando o foco fundamental dele é aregulação.

A mesma coisa digo do Banco Central e questõesdo CADE. Essa questão se colocava em váriasconversas que tivemos com o Armínio Fraga.“Olha, não é bom a defesa da concorrência ficarno Banco Central e, por uma razão simples, aquininguém nunca vai dar muita bola para isso, nossoproblema é matar um leão por dia na questão docontrole de segurança financeira, calcular moeda,esse é nosso ponto”. Trazer para dentro de umaagência, que não tem esse nome mas o BancoCentral é uma agência, preocupaçõesconcorrenciais é muito difícil, isso sempre vai sersubalterno. Eu me lembro na época da Anatel,tivemos o mesmo tipo de conversa com o [LuizGuilherme] Shimura, ex presidente da Anatel.“Todo o nosso esforço é na construção do modelo,é na regulação, é difícil colocar a questãoconcorrencial”. E, olha, concorrência e regulaçãoainda tem uma convergência, uma proximidadepor termos da linguagem, da análise econômica,muito maior. Então, de alguma forma, aincorporação não retórica, não baseada no “parainglês ver” (como eu acho que algumas vezes, aprópria ouvidoria da Anatel não tinha muitaeficácia para valer), é difícil. É uma questão real, éimportante você avaliar qual é o melhor modelo,se é bom isso estar dentro da agência ou não, seuma agência nunca vai conseguir tratar isso com adevida atenção.

Um trabalho interessante do Gesner [José deOliveira Filho] que publicou sobre esses desenhos,sobre modelos de agência, se é interessante teralguma agência reguladora “geralzona”, regulaçãoe concorrência, consumidor ou não, etc. Essa éuma questão super interessante no ponto de vistainstitucional. Porque estou dizendo tudo isso? Emfunção da sua pergunta, “qual o papel dosconsumidores na agência?”. Eu acho que esseassunto, em primeiro lugar, é uma questão que eudiria, institucional. A própria teoria da regulação eos próprios desenhos de agências reguladorastêm várias alternativas possíveis. Não existe ummodelo único de como você defende os interessesdo consumidor em setores regulados e nemsequer se a melhor maneira de fazê-lo élembrando a agência que ela também deve zelarpelo consumidor, e muito menos, na minha visão,dizer que isso é o mais importante. É um pouco demiopia profissional de quem está vendo o mundo apartir do seu ponto de vista. Não é isso!

O fato também é que a nossa legislação, emmaneira geral, é ausente nesse capítulo, excetopela Anatel. Mas mesmo a Anatel que não éausente, nunca implementou isso, nunca tevegrande repercussão. A própria casuísticarelativamente pobre (tem aquela tese do PauloMatos sobre isso). Enfim, é muita teoria parapouca experiência de participação.

Existem várias questões interessantes a seremfeitas ao regulador, a primeira delas: Por que nãoa questão do consumidor? Acho que uma parte daresposta que ele dá é a própria estrutura daburocracia, das preocupações, do foco do BancoCentral, da Anatel, da Aneel, que não é orientadapara isso (a própria formação, o corpo técnico,geralmente engenheiros). E como é que issopoderia ser feito?

Eu acho que um outro grande aspecto,extremamente importante, é o fato de que semuma qualificação técnica, essa participaçãosempre vai ser ritual ou inútil. Não adianta dizer“ah, tem que ter audiência pública”, mas você vai auma audiência pública sem a menor condição dedialogar sobre aquilo. Até porque, convenhamos,podemos até lembrar um pouco o movimentoestudantil, isso não dá para decidir emassembléia. Às vezes, a audiência pública tem oseu papel simbólico, importante, mas não é assimque você efetivamente define ou participa. Éimpossível! Então, se você apostar tudo nisso, eusei que muita gente discorda, mas acho que éuma aposta completamente equivocada, ingênua.Não vai dar em nada mesmo! Qual é a melhormaneira então? Uma das coisas que havia deinteressante no projeto da Lei Geral das Agênciasdo Governo Federal (que no geral, eu achavamuito ruim, um projeto desastroso, concentrador,antidemocrático, corporativo), era a previsão deque a agência custearia alguns laudos técnicos efranquearia as informações essenciais para quehouvesse uma participação organizada.

Como o senhor vê essa possibilidade de algumtipo de financiamento público específico vindoda agência ou não, para custear eventualmentealguma consultoria, uma ida à Brasília paraparticipar de alguma coisa, ou um apoioinstitucional para organizações...

Acho que tem que ser por aí. Isso nem sempre éfácil gerir. Sempre que você está falando em

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dinheiro público gasto por órgão privado, você temmil questões complicadas da gestão dessedinheiro, mas tem que ser por aí.

Vamos pensar como é que isso poderia ser feito.Acho que em primeiro lugar, você tem algunsórgãos da própria burocracia do Estado latosensu, o Ministério Público é uma delas, tempoderes de requisição. Acho que é um mecanismointeressante porque você está imaginando que éum órgão que já tem algum tipo de legitimidadepara a tutela desse tipo de interesse, mas nuncavai entrar para valer nessas áreas se não tiver umtipo de assessoria técnica muito mais sofisticadado que tem hoje. Pedir perícia do Procon, até oIdec... é o “roto pedindo ajuda para o esfarrapado”.

Você poderia, de alguma forma, imaginar umfundo, ou parte de um fundo, dedicado a isso. Oude multas etc. Acho que tem um papel para asONGs também. E que poderia funcionar damesma forma, através de um mecanismosemelhante ao fundo de reparação de interessesdifusos. Mas tem mil problemas. O fundo tambémtem que ser reformado. Eu fui membro do fundo.

A gestão ou a concepção? A concepção épositiva, mas a gestão...

A gestão é difícil. Sabe qual é um dos problemaslá do fundo? Aliás, o mérito do Paulo de TarsoRibeiro de fazer o fundo federal começar afuncionar, regulamentado. O que acabouacontecendo depois de um tempo? Não se sabiadireito que tipo de casos. Como é que você vaiusar aquele dinheiro? Para um programa deeducação ambiental ou para fazer a perícia de umcaso de improbidade? Como é que você aloca?Você pega gente de diversos ministérios que estãolá trabalhando gratuitamente e tem que decidir oque vão fazer com o dinheiro público. Como é quefuncionava isso? Num momento as pessoascomeçaram a ter medo: “vamos fixar em 250 milreais e assim mesmo em duas etapas...”. Ótimo!Ótimo no sentido de por a coisa em movimento ealgum dinheiro vem sendo gasto em programasinteressantes, eu mesmo participei de vários.Agora, convenhamos, uma perícia para valer, deanálise de uma questão regulatória importante vaicustar muito mais do que isso, e o sistema queexiste é muito pouco amigável à liberação demuito dinheiro. Por quê? Porque existe umaquestão do risco da responsabilização por

improbidade. Eu acho que existe aí uma questãode como imaginar um fundo que possa ser maisoperacional e possa atender essa demanda. E euinsisto: essa demanda de perícias em casosrealmente importantes não é nada simples, écomplexa.

Vamos pegar um caso, como agora essa questãodo recálculo das tarifas de energia elétrica. Parafazer isso para valer, e fiscalizar paralelamente oquê a Aneel faz, não vai sair barato. Não é comduzentos e cinquenta mil reais que você faz isso.É uma coisa bem mais complexa, exige auditoriaetc. Um ponto importante é esse. Acho que oprojeto de lei das agências, que eu acho ruim,trouxe essa possibilidade. Esse é um caminho.

Acho que as ONGs e órgãos também, comoMinistério Público e o Procon, têm que se equipar,têm que, na verdade, começar a ter uma rubricaorçamentária para se preparar para isso, seja paraos próprios técnicos, seja com verba paraterceirizar e solicitar perícias quando isso fornecessário. Não tem como dispensar isso!

Acho que no CADE, especialmente no novoCADE, a partir de 1994, houve uma mudançacompleta em termos da linguagem e da análise dequestões concorrenciais. Por quê? Porque sehouver uma fusão no setor de Telecomunicações,ou no setor de Mineração, haverão mil dadostécnicos, laudos, avaliações, balanços, parecereseconômicos. Não tem como fazer isso seriamente,se não dispuser disso tudo. E as empresasgastam certo dinheiro com isso aí, não é pouconão. Para a defesa do consumidor, então, vocêtem que gastar o mesmo dinheiro, para fazer omesmo, digo, essa é a exigência. Se for para fazeruma defesa nos mesmos termos, não tem como.Por que não existe participação dos consumidoresno CADE? Por que o Idec não solicita virar amicusnuma fusão da Nestlé-Garoto? Porque para entrarnesse debate vai ter que fazer tanto quanto osconcorrentes.

Acho que é necessária a criação de mecanismosde financiamento público e um mecanismo deformação de alguns fundos, uma arrecadação. Porque não o Idec começar a arrecadar para isso? Epossivelmente, é um pouco uma tendência quevejo em vários países, você começa a ter o “Idecda Telecom”. Essa ideia da “ONG Guarda-Chuva”,é difícil cada vez mais por conta disso. Teve seumomento heróico e acho que algumas entidadesvão funcionar como guarda-chuva, mas é evidente

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que há uma demanda de especialização e derecursos mais concentrados. Acho que aparticipação do consumidor nas agências, demaneira geral, não está prevista e, mesmo queestivesse, não ia mudar grande coisa.

O foco sempre ia ser outro...

Aquele tipo de participação (veja, não quero dizerque quem está se ocupando disso, está gastandocompletamente seu tempo) precisa mudar odesenho substancialmente. Esse era um capítulofundamental que tinha que ser discutido nessa LeiGeral de Agências.

Mas mudar o desenho no sentido de sóincorporar em termos legais, nãonecessariamente vai gerar resultado positivonessa proteção do consumidor. O problema é aprática, a cultura por trás disso?

Você poderia me perguntar: “Isso significa entãoque deveríamos preparar agências para que elastenham dentro dela um departamento, umapreocupação com o consumidor?”. Eu diria: Emalguns casos, sim. Em alguns casos, esse não é omelhor desenho. É difícil, à priori, imaginar queexista uma solução ideal para todas elas. Emalguns casos, criar-se-á algo fora da agência,controlando a agência, ou monitorando e comcondições para fazer isso. Em outros casos, talvezseja mais factível você realmente internalizar apreocupação com a defesa do consumidor naagência. Algum tipo de internalização é sempredesejável. A questão é saber se sempre essa deveser a bandeira de luta. Tenho cá minhas dúvidas!Ou então criar uma agência de defesa doconsumidor poderosa que monitora outrasagências.

Mas teria que ter poder normativo,fiscalizatório, sobre as outras agências...

E recursos. Essa era uma questão que surgiu nogoverno Fernando Henrique, houve algumasoscilações, no governo Lula ficou mais parado.Salve engano, se discutiu mais isso no governoFernando Henrique. De se criar uma agência dedefesa do consumidor e concorrência, e sedeveria ser uma agência única. Curiosamente,quais eram os argumentos pró e contra? De um

lado, uma agência única tem, é claro, ganho deescala e de poder, e de quadros, isso no ponto devista de uma bandeira de fortalecimento de umademocracia encarregada e capacitada. Isso ésuper importante! Não tem porque ter o órgão, euma secretária e um economista aposentado. Éuma exigência ter uma agência toda equipada.Curiosamente naquela época, ninguém queria quea agência fosse única. Por que razão? Osconsumeristas teriam algumas razões maisrazoáveis, outras não, até mais fantasiadas. Masalguns teriam a linguagem econômica. O law andeconomics, em sua versão mais conservadora.Isso é ignorância, é uma questão cultural.

Mas havia também a questão sobre quem iria daro tom, o risco de captura etc. Por outro lado, (e euvia muito isso no lado da concorrência, porque euestava lá) havia o receio dos consumeristas serempopulistas, e mais, politicamente muito maisrelevante do que a concorrência, porque defesa doconsumidor elege políticos, e concorrência nãoacompanha. Por outro lado, tem a quantidade dedemagogos na área do consumidor. Era o riscotambém de você ter uma agência controladapoliticamente por conta da força política que elapoderia ter. Era então um misto de dúvidas sobrea racionalidade, o corpo técnico, qual linguagemtécnica. Já havia uma desconfiança da próprialinguagem técnica dos economistas. Então não, osconsumeristas se colocavam em posição dedefesa contra eles. Esse era o mecanismo. Atéonde eu sei na Austrália funciona assim também.

Uma agência de consumidor?

E que monitora as outras.

Monitorar como? Na prática?

Pedindo informação e acompanhando.

Vou usar a Anatel como exemplo. A Anatelpublica um regulamento sobre algum serviço eali existem diversas disposições que vão deencontro, por exemplo, ao CDC. Essa agênciade consumidor teria alguma força?

Acho que o ponto mais importante é o poder paraobter informação e prestação de conta. “Por quevocês fizeram assim? Quais são os dados? Qual o

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embasamento? Vocês autorizaram o aumento detarifa de 90% no setor? Por quê? Quais foram osestudos? Quais eram as alternativas?” Um poucocomo Tribunal de Contas faz. “Teve uma licitação?Quais eram as razões técnicas que havia paraaquele preço, para aquele aditivo?”

Para que haja uma fundamentação pública?

E mais, para que você possa imaginar poderes. Aextensão desses poderes é uma outra questãocomplexa. Não sei se o modelo da super-agênciaé bom. Daí é algo que envolve questões de umaanálise institucional bem mais complexa.Depende. Às vezes você tem uma super agênciaaltamente suscetível a ser capturada e isso é umapéssima ideia. Isso é difícil definir à priori, mas emtese é imaginar um desenho no qual você possater uma outra agência com uma autonomia relativaem relação às outras e que possa solicitar essesdados, com poderes de avaliação. O MinistérioPúblico, em pequena escala, faz isso um pouco. OTribunal de Contas tem um corpo técnico, porexemplo, para avaliar as contas demunicipalidade. Está fazendo um papelimportante. Eu acho que uma agência dessaespécie (na Inglaterra também funciona assim)tem um tipo de centralização e esse poder paraexigir a prestação de contas não é nada pequeno.Por que não é apenas exigir e o outro dar ainformação como quiser, não!

Pensemos na relação do CADE com a Anatel,ainda que nem sempre satisfatória. Mas o órgãopede: “Qual a base regulatória para tomar umadecisão que pode ter efeitos anti-concorrenciais?”.

Bem, cria-se um órgão, sai do Ministério e daí? Oórgão ficará mais forte politicamente? Sim ou não?Era mais forte quando você tinha um ministro portrás? Acho que é uma questão extremamenteinteressante, mas é difícil imaginar uma respostaúnica. Estamos falando de desenhosinstitucionais. Necessário verificar a casuística (vercomo o México resolveu) e imaginar qual é amontagem mais adequada.

Então, voltando a sua pergunta., em alguns casos,internalizado a defesa do consumidor até onde dá,ótimo! Mas em outros casos é saber que nãoadianta.

O Banco Central, por exemplo, nunca vai ter comofoco primordial a defesa dos consumidores no

setor financeiro. É outro órgão que deveráacompanhar mais de perto a defesa dosconsumidores no setor financeiro. Não que nãotenha papel para o Banco Central. Teve até aquelalei do acesso bancário. É a sabedoria de quematua nessa área de saber...

...de reconhecer isso e passar para umaestratégia viável?

Volto a dizer, eu não acredito na ideia de modeloúnico ou a super-agência do consumidor. Não énem factível, politicamente, e eu tenho sériasdúvidas de que, se factível fosse, geraria osmelhores resultados. Essa é uma discussão superinteressante, de ciência política, direito, eeconomia, análise institucional. Acho que aagenda deveria ser essa.

A agenda consumerista deveria ser multi-disciplinar, acho que é o que falta.

Essa ideia de desenhar as instituições é um papelfundamental. Que tipo de desenho institucionalpermite que você tenha uma voz efetiva para oconsumidor. Estava conversando com o Carlos AriSundfeld que foi o colaborador da Lei Geral deTelecomunicações, acredito que o capítulo dedefesa do consumidor foi colocado lá com amelhor das boas intenções, tenho certeza disso,no meio de outras preocupações mais marcantesno momento em que a lei foi feita, mas está lá.Houve um certo experimentalismo e os resultados,eu acho que são mais ou menos tímidos. Então,eu acho que é um pouco isso, você observar asexperiências, ter um certo espaço para essaexperimentação institucional. E é questão de terdinheiro público para financiar, tem queexperimentar. O fundo foi uma experiência.Enquanto estive nele, eu posso dizer. Mas tinhaum problema. Seria muito difícil tirar muito dinheirode lá.

Por esse medo das pessoas.

Medo. Como é que você controla isso? Ah, entãovamos mandar o funcionário “x” para ir para aAlemanha. É bacana em tese, mas quem vai? Temmil opções. Sempre que você trabalha comdinheiro público, você tem uma série deconstrangimentos. Como é que isso vai funcionardepois?

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A questão geral é se as decisões regulatóriaslevam em consideração os interesses doconsumidor. Não só se é papel das agênciasnum plano teórico essa proteção dosconsumidores, mas na prática, se essasdecisões levam realmente os interesses dosconsumidores em consideração? A outraquestão é se existe participação efetiva dosconsumidores nas decisões do processoregulatório? E a última abordagem seriameventuais sugestões. O senhor vislumbraalguma possibilidade de que a defesa doconsumidor seja incorporada como função daagência? Ou como o senhor disse,incorporado internamente na agência de modoque essa visão também seja refletida naprodução normativa da agência? O senhorvislumbra outras soluções em que haja umoutro órgão, uma outra agência?

Deixa eu começar pelo segundo ponto e depoisvoltar para essa questão mais geral. Qual é odesenho? Me permita usar esse exemplo daconcorrência. O único setor regulado onde ainstrução dos casos especialmente nocivos daconcorrência é feita pela agência reguladora éTelecom, onde a lei claramente tem essa função.Qual a avaliação que se faz? Tem aí umaexperiência para ser examinada e para,justamente, imaginar quando e se a internalizaçãoé desejável ou não. Ganhou-se ou perdeu-se comisso?

Quando eu estava no CADE, teve um caso que eudei um voto, onde defenderam uma tese que haviauma legitimidade concorrente entre Anatel e SDE.Ou seja, se o CADE tinha poder de requisição,podia requisitar a Anatel, mas se ele quisesserequisitava de qualquer órgão. Por que não daSDE? O que era um negócio que na época geroumuita dúvida, se a gente vai invadir atribuições,competências do outro órgão e tudo mais. Isso porum lado. E de outro lado, um outro argumento eraser irracional ter dois órgãos fazendo a mesmacoisa. A teoria diz que dois órgãos fazendo amesma coisa geralmente é irracional. Em outroscontextos, não. Ou seja, em outros contextos,quando um não funciona e há como recorrer aooutro, pode ser extremamente salutar. Jáargumentei várias vezes esse ponto inclusive naquestão da relação do Ministério Público Federal eEstadual. Por exemplo, aumento na ação civil

pública com legitimação, eu acho excelente,porque pode ocorrer de um estar fazendo bem eoutro se dedicar a outra área. E isso significa que,em tese, há algum tipo de justaposição. Então euacho que, de alguma forma, tem-se que olhar maispara as experiências e ver o que estáfuncionando. Sendo bem pragmático no meuargumento: ver o que está funcionando. Bom, eunão estou dando uma resposta. Estou dizendo queesse é um assunto que, curiosamente, não seestudou.

A questão do setor financeiro do Banco Central, amesma coisa: tem uma expertise própria o setorfinanceiro? com certeza! Mas, esse era argumentodo Armínio e do Meirelles: “A gente nunca vaicuidar de defesa da concorrência, o Banco Centralnão consegue. Não dá, a nossa vocação é outra”.O Armínio dizia: “Precisa tirar tudo que não é doBanco Central”. Então esse é um ponto.

Eu sou favorável a um certo experimentalismo,porque olhar experiência que dá certo é olhar umpouco os condicionantes institucionais, políticasque estavam presentes e que poderiam serexploradas. Então é super multifatorial, não é sójurídico, nem só econômico, é institucional. E deoutro lado, quando você levantou a outra questão.Bom, de que maneiras os interesses doconsumidor são incorporados, levados emconsideração. É mais geral ainda sua pergunta.

Em certo sentido, são. Vai negar que a ANS levaisso em consideração? Leva. A Anatel, em certosentido, sim. Mas, agora, uma questão diferente éver se leva adequadamente. Qual é o parâmetroque se tem para avaliar como foi levada emconsideração. Qual é o standard? Qual é amedida? E se a consideração deveria ter sidooutra? Eu acho que, de novo, em alguns casos, euvolto a dizer que é necessário você criar um tipode controle fora. Mas esse tipo de controle foranão pode ser dos dos bacharéis e dos agrônomosapenas. Precisa de especialistas na questãoregulatória também. E, quando eu digoespecialistas, não é uma questão de profissionalsó, mas pessoas que realmente se debruçamsobre aquele assunto para ter uma conversa.Porque se não, é uma dissintonia tão grande quenão adianta nada.

É um argumento que quando se discutia agênciaúnica, ou agência consumidor-concorrência, um

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dos argumentos pró agência única era quejustamente a única forma de se ter umacontaminação produtiva de enfoques, abordagens,etc, é reunindo essas pessoas. Quando as partestem medo da contaminação, acaba por ter doisdiscursos: “vamos discutir, vamos levar para ojudiciário?”. Enquanto o judiciário ainda tem essaretórica mais formalista da lei.

O senhor acha que se tivesse havido essaaproximação entre esses diferentesespecialistas, hoje uma agência reguladorapoderia ter uma outra cultura já maisinternalizada? A linguagem já seria maiscomum a todas essas áreas de forma natural,inconsciente, não é?!

Eu acho. Às vezes eu tenho a impressão que emBrasília, o Ministério da Justiça, o DPDE e oDPDC, não tem servido como essa experiência.Agora, a experiência do CADE é muito bemsucedida com o conselho com economistas,advogados. Isso tem criado uma expertise, umimpacto na academia.

Falo do DPDC, DPDE, porque são os dois únicosórgãos ligados diretamente a uma mesmaburocracia, que poderiam estar conversando maise até onde eu sei, cada um faz o seu. E ospróprios secretários de direito econômico, cadaum com uma vocação mais pra lá ou pra cá, masessa integração de equipes, acho que nunca foifeita. E o DPDC continua funcionando um poucocom o discurso mais jurídico, e o DPDE, maiseconômico. Eu acho que é importante criar essesnichos institucionais onde esse aprendizado possaocorrer. Por que eu digo isso? Mesmo algumasresoluções, algumas portarias do DPDE e doDPDC, não tem em sua linguagem essapercepção da dinâmica econômica. Não estouaqui fazendo apologia de que a economia é quedeve nos colonizar, muito pelo contrário, soubastante crítico.

Acho que uma das novidades que o Código deDefesa do Consumidor traz do ponto de vistametodológico é que, de maneira muito maisostensiva do que os antigos diplomas de direitoprivado, convoca o intérprete a olhar a dinâmicado fato. Como é que você sabe se umadeterminada prática de mercado é abusiva ounão? Veja se é um jogo em que o consumidor jogae sempre perde. Se isso acontecer no mundo real,

é porque esse jogo é abusivo. Você nem precisaolhar muito bem as regras do jogo. Porque asregras deverão ser justas se elas forem capazesde garantir um determinado resultado. Issosignifica olhar o fato, ou seja, você extrai, dealguma forma uma normatividade, e extrai quaisdeveriam ser as regras olhando para o fato. Nãoque não possa existir risco, pelo contrário. Porexemplo, quando você sabe se um jogo de xadrezentre um adulto e uma criança é equilibrado? Nãoé olhando as regras. Deixe-o jogar cem vezes. Oadulto ganhou 98, então percebe-se: Esse jogoestá desequilibrado! Ou seja, é olhando o fato, oresultado.

E esse consumidor, ao meu ver, faz essa mesmaconvocação para olhar o fato. E eu acho que ofato é, em igual medida, um fato econômico. Não éexclusivamente, pois existem questões valorativasde outra ordem. Então se você olhar asresoluções, você vai ver que poucas delas sãofeitas com uma argumentação desse tipo. Issodemonstra que não se chegou ainda nessadiscussão sobre desenho regulatório. E mais,acho que isso traz uma outra consequência muitoimportante. De maneira geral, a defesa doconsumidor ainda teve muito privilegiadamenteenfocada na tutela judicial dos interesses doconsumidor. Mas nunca a regulatória. Muitopouco. O judiciário não é uma boa arena paratutelar direitos preventivamente.

A própria formação dos juízes também nãopassou por aí.

Por “n” razões o judiciário, mesmo com o juiz bemtreinado, não é o foro adequado para decidir asquestões regulatórias. Exceto questões do deverlegal que são mais informais, as questõessubstantivas, regulatórias, não é o foro adequado.O judiciário não está equipado para isso. Eu achoque isso é um equívoco. Ainda que eu possaimaginar que é justificável e saudável em algunsaspectos, ter-se uma certa competênciaconcorrente. Quanto mais regulatórias asquestões se tornam, menos adequado o judiciárioé como mecanismo para tutelar esse tipo deinteresse. E, se o Ministério Público (se pensarcom uma ferramenta para levar a questão aojudiciário), também não, acho que o MinistérioPúblico também deve pensar em outros papéis:sobre essa participação mais qualitativa, de usaros poderes de requisição de uma maneira muito

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mais inteligente do que faz. Mas isso passa poruma nova estrutura de obtenção e deprocessamento dessas informações. Não dá paraficar olhando o código, princípios e princípios,essa farra principiológica. Acho que é umequívoco. O futuro não está aí. Se for esse ofuturo, não promete muita coisa para oconsumidor.

Acho que a participação deve se dar por umaatuação em políticas públicas, defendendo umadeterminada política pública, um determinadomodelo de desenho regulatório.

Eu lembro uma vez, uma reunião antiga doBrasilcon, que antes da nova lei de planos desaúde, queriam uma moção contra a lei. Atéquando dá para a o Brasilcon ficar limitado a sercontra a lei. Alguma lei virá, e veio.

Mas existia uma proposta do Brasilcon?

Não teve a menor capacidade de dizer: Olha, a leique queremos é essa! E o argumento era deixar àcargo do Código e dizer que isso seria umretrocesso em relação ao código. Não dá! Masacho que as ONGs, os órgãos, têm que sepreparar para isso. A regulação traz um processodinâmico de interação e regulamentação. Ou seja,você regula, vê como funciona e refaz a suaregulação conforme a experiência. Isso é danatureza da regulação. É um mercadoefervescente. Não precisa ter um conjunto deregras a priori. O Código é ótimo, mas o Códigofaz isso, regras mais ou menos a priori, algunsbalizamentos. Fantástico! Já soltaram muitosrojões e vamos soltar muitos outros por causa docódigo. Mas, em setores regulados, ele éinsuficiente. E é interessante que vai para umaparalisia total, vai ver nos anais, quais foram osprojetos consumeristas? É uma estratégia debloqueio: “essa não!”.

O modelo de regulação “consumer friendly” nosetor de telecom. É um belíssimo tema. Existemtrabalhos sobre regulação em telecom, mas sobreessa pergunta “Qual é o melhor modelo regulatóriode telecomunicações no ponto de vista da tutelados interesses do consumidor?”, eu não conheçotrabalhos. Acho que essa agenda não chegoudireito ainda, está chegando. Acho que dependeno fundo de você re-equipar a burocracia quecuida disso, no caso, as agências (sou contra

tentar internalizar o máximo possível esse tipo depreocupação. Há que equipar os órgãos estatais -muitas informações, é muito difícil que sejamobtidas na base de ONGs. Importante que aspróprias ONGs também se preparem. Na áreaambiental, algumas ONGs fizeram isso. OGreenpeace se associou a laboratóriosextremamente sofisticados para fazer.

Usar mais essas parcerias.

Como discutir na Biotecnologia, o efeito dostransgênicos? Você vai dizer “eu acho que fazmal”. Não é assim! Na CTNBIO acontece issoainda, você tem diálogo de surdos na CTNBIO.Têm os consumeristas, os técnicos, osreguladores. É uma questão complicadíssima noponto de vista ético, econômico, científico. É cadavez mais interdisciplinar? É. Fica evidente aondeessa interdisciplinaridade é vital. Você querdefender o consumidor na área de telecom, vocêtem que entender a área inteira de telecom.

Tem o desenho, tem essa casuística, tem essaquestão política. Qual o órgão que tem mais riscode ser capturado? Acho que essa é uma agendadifícil, isso vai mudar quando tiver um grupo ouinstituições capacitadas para fazer isso, dentro oufora do Estado ou num estado mais independentedele. Como, por exemplo, o tribunal de contas.

Mas de alguma forma tem que fazer parte,ainda que na prática, para alguma agência ouo Banco Central por exemplo, nunca vai ser ofoco, mas que de alguma forma tem que sepensar em algum modelo...

Especialmente, eu chamaria particular atençãopara o tema da assimetria de informações. Aagência tem que fornecer relatórios.

E alguém tem que poder requisitar isso.

Exato! E depois dizer: Não era assim que euqueria!

E se eu disser: Não, não é assim! Qual o fimdisso?

Você não tem um desenho completo e acabado.Você tem poderes para requisitar. Como o

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Ministério Público faz? Requisita e se é negado háum crime, desobediência. No limite, é isso.Também tem opinião pública, audiência pública,não tem uma ferramenta única. Mas o judiciário éuma delas. Sem dúvida, não dá para abrir mão.Em alguns casos funciona bem.

Em casos mais pontuais, né?

Para contratos escritos com letra minúscula,funciona aquela beleza. Para produto que não temrótulo, vem aquela liminar festiva que resolve oproblema. Agora, quando você está falando emmodelos, acho que não dá. O judiciário não é oforo direto. Acho que essa questão da informaçãoé central. O consumidor não terá uma vozqualificada enquanto ele não tiver acesso àsinformações. E é claro, também, não se pode seringênuo e dizer “Precisa ter transparência”.Convenhamos, você quando tem uma contapoupança num banco “x”, no manual doconsumidor diz que ele deve ser informado sobreos riscos. Razoável supor, tanto que seu interessedireto como consumidora, que a saúde financeirado banco é uma informação importante para você,não?! Claro que é! Se o banco quebrar, oconsumidor sofrerá as consequencias...

Mas ele nunca vai fazer isso porque ele colocaem risco a própria atividade dele e você tira odinheiro do banco.

Essa é uma típica situação em que não se pode

pensar nesses direitos de transparência. Entãocomo é que você internaliza a tutela desseinteresse do consumidor? No caso de fundos deprevidência, foi surgindo na legislaçãoespecialmente norte-americana, canadense, algomuito interessante, que é um parâmetro doadministrador prudente. Tem um fundo de pensão,qual é o seu interesse como participante dessefundo de pensão? É que quando precisar dodinheiro, ele esteja lá. É o básico que você quer. Éa garantia. Investimento de menor rentabilidade,mas de maior segurança. Você pode ter desde umsistema de ratting de notas - uma maneira deconciliar mercado e notas. Se o meu está malranqueado, eu vou procurar outro que está melhor.E o outro quer melhorar seu raitting, que faça pormerecer. Então é uma maneira interessante nomercado. Você tem outras maneiras como ocritério do administrador prudente. Você pode estarnum fundo onde o gestor é brilhante, fazaplicações brilhantes, mas de alto risco e com altarentabilidade. Isso é bom ou mau para você?Acrescendo o bolo, em certo sentido, você vaiganhar mais, mas você pode imaginarperfeitamente que o risco que você está correndonão é adequado, então você cria certosbalizamentos. Da mesma forma como serviçosfinanceiros são avaliados assim. Se você quertrazer esse tipo de preocupação para oconsumidor, você também tem que equipá-lo comos mesmos mecanismos de avaliação de risco. Eleprecisa entender e depois precisa saber que aagência tem o papel de transformar aquilo numdado simples.◘

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ANEXO 3 – Íntegra entrevista Ana Luiza Valadares RibeiroPensando o Direito - Idec

Entrevista realizada em 11.02.2010

Entrevistada:

Ana Luiza Vieira Valadares Ribeiro

Ex Procurador-Geral da Procuradoria FederalEspecializada junto à Agência Nacional deTelecomunicações - ANATEL

Como a senhora vê o papel dos consumidoresna missão e nas atividades das agênciasreguladoras?

Esse tema é um dos temas mais atuais hoje: acomunicação entre a regulação e o direito doconsumidor. Com o descompasso dasprivatizações e com o código recémimplementado, não ficou muito colocado nasdiretrizes da privatização que esse era umalinhamento necessário. O que eu acho muitonatural, porque enfim, eram dois processos queestavam começando. O Brasil já aprendeu muitonas duas áreas e na verdade o direito doconsumidor evoluiu mais do que a regulação,enfim, o direito regulatório ou setoriais. E eu achoque foi principalmente por uma questão política,porque se o direito do consumidor nesses últimosanos não enfrentou nenhuma resistência do poderexecutivo central, o direito regulatório sim. Temosum presidente que entrou nos últimos oito anos ea despeito de declarar publicamente que gostariade rever o modelo de agência, fez uma propostaque na verdade parou no Congresso Nacional enão tomou mais providências, deixou na inércia.

Você se refere ao PL das Agências?Isso, exatamente. Particularmente eu tenho umacrítica sobre a inércia. Acho que não existe vácuo,o espaço é ocupado por alguém. A comunidadeconsumerista veio trabalhando durante os 20 anosde código ativamente para a melhoria e paras asdiscussões e eventualmente até alterações nadinâmica consumerista e no marco normativoconsumerista, nas grandes celeumas, como foi ocaso do direito bancário. Passaram anos, mas,enfim, a discussão foi no final das contas profícua

porque a relação melhorou com eles. No âmbitodas agências a falta de política pública e dedefinição de uma diretriz objetiva para que essadiscussão acontecesse, como aconteceu nocampo consumerista, foi muito ruim nessesúltimos oito anos. Cada agência funcionou do jeitoque quis, praticamente, e não houve um projetosistematizado de que as indicações para osConselheiros seriam feitas observandodeterminado critério, e que a atividade dessasagências deveria ser norteada, por exemplo, poruma política nacional de relações de consumo.Isso poderia ter acontecido. Em muitos casos sãosetores que regulam relações individuais deconsumo no caso da Anatel, no caso da ANS, nocaso da Aneel. Há outros setores que regulam“stakeholders” e tem tipos diferentes de ato deconsumo, mas na maioria delas, na minhaavaliação, acho que poderia ter havido umadiretriz central, mas não houve. Por outro lado,também nesse setor, especificamente no setor detelecomunicações, não houve uma diretriz depolíticas públicas detalhada. O último marco dediretriz de política pública no setor da educação éaquele decreto da época do Miro Teixeira. Odecreto 733, sobre políticas públicas que dá váriasdiretrizes. Então se pararmos para ver é umagrande carta de princípios. Princípios que repeteminclusive o que está na LGT há anos. Porexemplo, na questão da PNBL, eu soudesfavorável a ficar repetindo em decreto o que alei já disse, se não for, efetivamente, regulamentaro que a lei já disse. Não há razão para isso. Sópara dizer o que não foi feito? Significa o quê?Unbundling, competição, tem que tercompartilhamento de rede. Não há novidades.

Isso já está na LGT...

Onde, quem vai fazer, o que vai acontecer se nãofizer, qual a meta, qual é o prazo, de que formaisso deve ser feito? Nesse aspecto, portanto, euacho que há o descompasso com bastante ênfasepor causa disso. Enquanto o direito doconsumidor, nos últimos 20 anos, quando osistema já estava colocado, as pessoas já tinhamentendido como é que funcionaria isso e houveuma acomodação que permitiu que os diversosinteresses começassem a trabalhar pelos seusinteresses, o que é legitimo, num estadodemocrático de direito. No lado dos direitos

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regulatórios isso não aconteceu, por que a diretrizinicial foi: privatizar para poder garantir o acesso,um atendimento de uma demanda reprimida dediversos setores e para garantir que houvesseretorno desses investimentos. Isso é uma diretrizque foi feita para os primeiros cinco anos e aprova disso é o PASTE das telecomunicações. Sevocê for ver o PASTE, as previsões ali sãosuperadas rapidamente nos primeiros cinco anos,e não houve uma revisão do PASTE. Então ogoverno do PSDB, nesse aspecto, deixou para ogoverno de Luiz Inácio Lula da Silva uma coisaque se pode, objetivamente, dizer num primeiromomento que foi alcançada: a universalização devoz e fixo e garantir retorno do investimento quefoi feito nisso. A partir do momento da efetivaverificação da universalização e de repensar, apartir daí, o que efetivamente precisaria passar aser foco de demanda governamental e de políticapara poder orientar inclusive a partir dessemomento a coisa que sempre coloco na mesapara a gente discutir: banda larga precisa virarserviço público antes do celular? Quando asexpectativas do PASTE em relação à telefoniamóvel ficaram totalmente desatualizadas, talvez aprimeira providência que deveria ter sido tomadaseria verificar o seguinte: o serviço de telefoniacelular é o único serviço, praticamente, em quecada assinatura é uma relação de consumoindividual. O STFC, você pode presumir, atendeum lar, uma família, a banda larga também. Ocelular não. Então a pergunta que fica a partir domomento que se verifica esse exponencialcrescimento e até atípico pra um país de rendamédia (a gente tendo o PIB per capita que a gentetem), não era momento de ter parado para pensarcomo é que isso ia implodir em cima do modelo derelação de consumo, envolvido ali? Não houveessa reflexão. Houve uma euforia por parte doregulador com relação ao crescimento da planta,houve uma euforia econômica de que o Brasilestava atingindo índices de primeiro mundo deacesso a telefonia, mas não houve umaponderação sobre as consequências disso, noplano consumerista, muito menos um alinhamentode políticas nesse sentido. Eu acho que o próximocenário de cinco anos não é nem um poucomelhor em relação a isso, porque agora estamosfalando de relações de multi-serviços: você vaireceber uma conta e nessa conta tem quantasrelações de consumo? Você não pode dizer,apesar das empresas venderem do ponto de vistacomercial, que você está comprando um bundle,

ou seja, um pacote, que aquilo ali é uma coisa só.Não é, porque a regulamentação não é igual.Cada um daqueles serviços tem regulamentodiferente, são, portanto relações de consumodiferentes. Só estão sendo agregadas na mesmaconta e o direito à informação está cada dia maiscomplicado de ser atendido. O consumidor recebeuma conta e não consegue entender.

A senhora acha que essa ausência de reflexãose reflete, portanto, nas regulamentações, porexemplo, da Anatel no caso detelecomunicações?

A falta de reflexão nacional, incluindo aí oCongresso Nacional e o poder executivo central,sobre a necessidade de alinhamento de políticas eorientações consumeristas para relações deconsumo em setores regulados deixa as agênciasa seu “bel prazer”. As agências não são órgãosvocacionados pra reflexões consumeristas esequer é possível criticar isso na essência, poiselas foram criadas para ser assim. Era precisoaculturar todo um sistema para que fossediferente. Eu gosto sempre de lembrar que aAnatel não deixa de ser um monte de funcionáriosda Telebrás no mesmo prédio. Eu sou uma daspoucas que eles chamam de geração Anatel, eusaí da UNB, me formei no final de 1998 e assimque me formei meu primeiro emprego foi naAnatel. Mas isso é uma geração raríssima. Naépoca que eu entrei na Anatel os meus amigosachavam que eu trabalhava na Embratel. Aspessoas não sabiam o que era Anatel.

Isso foi em 99? Bom, fazia um ano epouquinho que a Anatel havia sido criada...

Eu estava ali, comecei na regulamentação doserviço de comunicação de massa, e o primeirotrabalho que eu tive na Anatel foi um regulamentopara juntar no mesmo regulamento a TV a cabo, oMMDS e o DTH. Até hoje ele não foi publicado. AAnatel contratou uma consultoria, pagou umafortuna para essa consultoria ajudar a fazer essenegócio e até hoje não conseguiu resolver oproblema da disfunção regulatória do que existede TV por assinatura no Brasil. Isso não é umproblema da Anatel, porque ela tentou. A gentefez várias reuniões desse regulamento, quandochegou na decisão final o setor se juntou e falou

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que entraria com um mandado de segurança.Agora a Agência, por exemplo, conseguiu fazercom que os operadores de telefonia celularabrissem mão de suas concessões e migrassempara um regime de autorização, que modernizoubastante o serviço de celular no Brasil. Tambémfez isso, fazendo trade off.

Quer dizer que trade offs vão sempre fazerparte do jogo, algum tipo de equilíbrio ecompensação...

O modelo de administração consensual que vocêpode verificar que a doutrina, tanto o Aragão,quanto o Floriano, o Carlos Ari falam, é um modeloque traz um principio bastante sensível porque oprincipio da captura anda colado com ele. Ou seja,você fazer uma administração consensual nãosignifica que você só trabalha para o regulado.Agora o problema que eu estou levantando é quetalvez a questão da ausência de diálogo entre odireito do consumidor e o direito regulatório nãoresida única e exclusivamente naresponsabilidade da agência. Faltou políticapública e faltou política legislativa, afinal de contaso Congresso Nacional delegou para as agênciascoisas, que segundo constam, eles nãoconseguem fazer tão rápido quanto era necessárioporque o processo de legislação é muito longo.Então eu destaco: estamos esperando o processodo PL 29 até hoje!

Tudo aqui é espera do PL 29, e se tudo é PL 29não precisa de Anatel. Agora, do ponto de vista defazer uma reflexão efetiva entre o diálogo entredireito do consumidor e o direito regulatório, oCongresso Nacional já podia ter feito essareflexão há 10 anos. O que a gente vê sãoprojetos de lei esparsos para resolver questõespontuais, normalmente populistas. Por exemplo,eu já estive representando a associação de celularnuma audiência publica cujo objetivo era fazer umPL para dizer que não poderia cortar a conta decelular do inadimplente. A primeira pergunta queeu fiz aos deputados foi: A quem estamos nosreferindo, senhores deputados? Ao pós pago, né?

Sendo que pós-pago não corresponde nem a20% dentro dos assinantes...

Primeiro porque é um projeto voltado para a

classe A e B, porque a classe C, D e E, não temconta, portanto não é inadimplente. Entãorealmente para as empresas de celular essaaudiência não faz o menor sentido, a não ser queo objetivo seja efetivamente esse. O fato é, asmedidas são normalmente legislativas nessa áreaconsumerista, são movimento de reação a partirde questões pontuais que sequer são bemrefletidas no final das contas, e também não vemuma política. Muito se diz que a LGT estádesatualizada. Mais do que a atualização da LGT,está faltando o que os Estados Unidos já têm, queé uma lei do consumidor na área digital, e isso osEstados Unidos já fizeram há algum tempo. Quaissão os direitos do consumidor na área digital? OBarack Obama determinou que um grupo detrabalho se reunisse, que fizesse milhares deesforços para refletir sobre uma proposição de umplano nacional de banda larga para os EstadosUnidos. O deadline dele era agora em fevereiropara entregar esse programa que passarammeses trabalhando. Na página do FCC tem o blogda banda larga, é uma página especial só paraisso. Foi difícil definir o que é banca larga, elesestão há meses exatamente tentando chegarnuma definição do que é banda larga, se é umserviço, uma rede etc. Antes de definir tudo isso apremissa da FCC foi definir quais são as diretrizesde atendimento da população. Então o que jáexistia desde o ano passado como base para queeles pudessem chegar ao guideline para um planonacional de banda larga que vai ser divulgado pelogoverno americano nesse semestre, como umdocumento oficial, foi definir o direito dosconsumidores na banda larga. Aqui, na verdade, agente sempre começa a discussão de trás parafrente, então pra mim essa é a principalponderação em relação a esse descompasso. Daparte da Anatel, como eu trabalhei lá muito tempo,eu digo que não há disposição para lidar com odireito do consumidor. Eu acho que realmente éfalta de cultura, no primeiro momento. Mas oprimeiro grande movimento que foi fazeratualização regulamentária do STFC aosprincípios do CDC, isso foi feito, e depois do SMPtambém foi feito, depois na TV por assinaturatambém foi feito. A gente vai dizer que osregulamentos da Anatel são muito ruins e ninguémentende. Eu concordo, mas isso vale para oconsumidor e vale para as empresas. É que navida real o consumidor não acompanha a batalhadentro da agência no dia a dia da agência. Quemvive lá dentro são as empresas, todo mundo sabe

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disso. E por que elas passam o dia inteiro ládentro? Porque 90% das coisas que a Anatelmanda elas fazerem - o que elas não queremfazer e não é por causa de consumidor -, a Anatelmanda por oficio, manda por despacho, fora dassuas competências (é gerente interpretando a Lei,coisa que é de competência exclusiva do conselhodiretor...). O sistema por si só é um sistema muitocomplexo. Esse modelo é um modelo no mundointeiro e o custo de transação de um sistemaregulado é muito alto para todos os envolvidos,tanto para a empresa, quanto para o consumidor.Ele é feito dessa forma para que o menor númeropossível de pessoas possam entender o queacontece ali, porque assim os privilegiados queentendem são os que conseguem navegar por alie com isso auferem, lícita ou ilicitamente, não vouentrar nesse mérito, alguma vantagem, porqueafinal de contas o direito ao lucro estáconstitucionalmente garantido. Então eu acho quea principal colocação seria a necessidade dealinhamento político, uma diretriz forte central dolegislativo ou executivo em relação a esse tema. Opresidente Lula quer dar banda larga para omoleque da periferia de Porto Alegre, mas faltaele dizer que para atender o moleque da periferiade Porto Alegre, o serviço tem que estar comqualidade. Em relação ao PNBL, eu digo que háum plano que vai chegar e vai dizer como a gentevai fazer internet banda larga no futuro. Mas euquestiono sobre a qualidade existente na nossarealidade, sobre a banda larga que possuímosatualmente. E eu que estou aqui com 10 megasda GVT?

E que não funciona, ou que te entrega 10% davelocidade?

Exatamente, eles elaboram um plano que não temnada para mim hoje, eu quero hoje, agora, o quevai acontecer.

Não basta levar infraestrutura se o serviço nãotem uma qualidade mínima, se existe umproblema de informação ainda...

Dizer que banda larga é mais do que X megas eujá sei, porque não precisa ter muita experiência,não é uma questão de alfabetização ou de classe.Qualquer um que entra na internet começa aachar aquele negócio legal e depois quer que

essa coisa vá mais rápido. A população brasileiraé a que troca de celular mais rápido no mundo, oque é um dado impressionante, porque umeuropeu compra um aparelho celular e fica emmédia 2, 3 anos com esse aparelho. O brasileiro édiferente. Se surgiu uma novidade ele queradquiri-la, isso inclui as classes C, D e E. Épreciso melhorar a forma de os consumidoresparticiparem das agências reguladoras.

Eu citei o modelo americano mas o modeloeuropeu vai na mesma linha de ter um consumeract na era digital, para o consumidor saber o quedeve ou não esperar, porque a regulamentaçãotem que ter um papel secundário, e ela só nãoteve nesses últimos oito, dez anos porquedeixaram as agências no vácuo e, eu repito, nãoexiste vácuo.

A regulamentação tem que ter um papelsecundário ao quê?

O principio da legalidade diz que ninguém podeser obrigado ou desobrigado a fazer alguma coisase não em virtude de lei. A Anatel não deveria ficarinventando muita moda, ela devia receber umaorientação central e implementar isso garantindoque efetivamente aquilo que não foi garantido pordecreto ou por lei na prática se realize através dodetalhamento operacional. Por exemplo, se a Leidiz que a Anatel tem que dar a portabilidade, aAnatel tem que dizer como é que funciona,quantos dias leva etc. Bem como precisa tambémreceber orientações, se o foco for qualidadeesclarecer isso de fato porque se não gastaremoshoras discutindo se isso é a qualidade percebidapelo usuário ou a qualidade medida na redeefetivamente. Na verdade falta uma diretriz centralpara que as agências tenham menos margem dediscricionariedade, porque a discricionariedadefunciona muito como elemento de conservação daimplementação das coisas. Então, em relação àgarantia dos espaços, eu acho que eles já existeme que a representação dos consumidores dosespaços existentes está melhorando.

E nesse sentido, como é que você avalia essaparticipação do consumidor? O fato dela serpequena já é até um consenso, mas a questãoé por que ela é pequena, o que precisaria e atépergunto como é que a agência pode tomar

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essas decisões dentro do conceito de umacomposição, compensação, quando aparticipação de empresas e de consumidoresnão se dá de uma forma igual?

A discussão da transferência do ônus daparticipação do consumidor para o poder públiconão uma é questão que acho que possa sercolocada para dentro da agência, porque aagência sofre um contingenciamento orçamentárioque ela não gostaria de sofrer. A Anatel arrecada oFistel, que é taxa vinculada, que poderia servirpara financiar a Anatel. Se a Anatel recebesseaquela verba ela poderia se auto-financiar e maismilhares de pessoas. Então do ponto de vista prático, pra agência, oque eu acho que é viável é uma mobilização dosrepresentantes já colocados nas agências dacategoria do consumidor para que haja, porexemplo, um regramento especifico com relação apassagens e diárias e para que assuntos deimpacto direto no consumidor tenham quenecessariamente ser submetidos ao comitê deusuários antes da decisão do conselho diretor.

Apesar de serem entidades que representamos interesses do consumidor de uma formageral, isso ainda é um pouco restrito. Paraoutras entidades que queiram participar deuma audiência pública, contribuir para umaconsulta pública que eventualmente tenha umtema complexo, como é que isso alcançariaquem não está no comitê ou no conselhoconsultivo?

Eu acho, por exemplo, que as agências poderiam,na verdade, deveriam, antes de publicar umaConsulta Pública em formato final sobre umassunto pulso-minuto, oferecer workshopsobrigatórios, rodar um workshop pelo país...

Para um público aberto...

Para um público aberto. A pessoa se inscreve, aagência anuncia. A Anvisa, nos dois últimos anos,resolveu rever seus procedimento derelacionamento com a sociedade. A Anvisa é umcaso que adotou determinados procedimentos:divulgação da Agenda Regulatória do ano,elaboração e realização das câmaras temáticas edas câmaras técnicas, que são na verdadeespaços públicos, no sentido teórico da palavra

mesmo, em que na câmara técnica, o assunto émais técnico, e na Câmara temática,periodicamente realizada, com a menor burocraciapossível, é aberto uma discussão num auditórioonde há um diálogo entre aquelas pessoas queestão ali no auditório e as pessoas da agênciasobre determinado tema. Esse modelo é ummodelo recomendável, mas ele pode seraperfeiçoado, ele poderia inclusive ser maisdidático. Divulga-se uma Agenda Regulatória enão estou falando de uma Agenda Regulatóriagrandiosa. Basta dizer o que você vai fazer nospróximos três meses, qual é o seu planejamentoestratégico.

Até para que as pessoas possam se preparar,porque a gente sabe que as próprias consultaspúblicas têm um tempo muito pequeno paraque as pessoas possam se preparar econtribuir.

Por exemplo a minha grande divergência com oSardenberg é que ele queria fazer uma consultapública de quinze dias para o PGO, e meu parecersugeria 60 no mínimo, e ele pediu para mudar oparecer. Nós estamos falando de melhoria dosprocedimentos de forma geral. De forma geral, euacho que a Anatel comete um erro muito crasso, eque ela já sabe que é um erro há muito tempo.Porque a Anatel é a senhora das experiênciasinternacionais. Ela tem dinheiro e viaja para osfóruns, ela sabe quais são as best practices. Oparecer da procuradoria que eu mais dei nessesúltimos anos foi sobre accountability. Inclusive asminhas últimas diretrizes de consulta são asseguintes: se não estiver nos autos o documentoassinado pelo Presidente, a ata da reunião, todasas contribuições respondidas, tudo isso nabiblioteca, não pode nem estar na imprensa oficial.Nem a minuta da consulta pública, nem oregulamento final. E eles não cumprem isso. Masisso é uma questão política, não é isso que nósestamos discutindo aqui. A agência precisacomeçar procedimentos de regulamentação comoessa que estão fazendo com o caso da bandalarga. Antes de sair com regulamento de bandalarga, ela está há 6 meses discutindo a bandalarga, com o país. E isso é feito através de umblog, em que se pode postar tudo o que estáfazendo, todo dia, e a sociedade participa ecomenta. A FCC está no facebook, por exemplo.

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É mesmo?

É, eu do facebook vejo o streaming de vídeo aovivo da reunião do FCC.

Olha só, é a transparência concretizada.

O projeto da banda larga tem todo um modelo deformatação do assunto pra que ele seja acessívelpra quem não entende daquele assunto.

Que é um outro problema, não é?

Eu até falei para a Anatel fazer um blog da BandaLarga. Tem que ser coisa que chame atenção. Aspessoas não estão muito interessadas,infelizmente. Mas a minha visão é usar essesmeios de comunicação que as pessoas gostam. Épara que as empresas e a sociedade tenham aoportunidade de fazer uma reflexão antes que aagência ou quem de direito apresente um textonormativo. E durante esses procedimentos, fazerworkshops, e num país de dimensões continentaiscomo o nosso, fazer com que o workshop sejaitinerante, permitir que as pessoas se inscrevam,fazer uma divulgação efetiva da realização dessascoisas, criar canais de comunicação com asociedade, que na verdade são canais quedezenas de outros órgãos públicos já utilizam. Efazer um blog não é nenhum pouco difícil,qualquer um faz, é uma simples questão deausência de vontade política. A agência não deveter vontade política, mas o que está faltando é avontade política mesmo, e não é só da agência.

Que viria do poder central, quer dizer comouma diretriz pra agência?

Se vem uma diretriz de cima e a agência nãocumpre, pode haver uma ação civil pública. Vemuma outra coisa também, que é uma critica minhaa nós todos os brasileiros: falta de mobilizaçãosocial. Os órgãos que já estão instituídos precisammelhorar a sua atuação nos próprios comitês,porque se o comitê vai esperar a Anatel convocaruma reunião, vocês podem esperar sentados.

É muito difícil uma entidade ir para Brasília...

A gente tem que ser realista, porque aquela

proposta de PL das agências de financiamento foimuito mal recebida, e ela, inclusive muitas vezes,por mais necessária que seja, descredenciaporque pensam que só se quer viajar. Tem algunsorganismos, tem algumas associações queconseguem efetivamente ter uma representaçãopositiva. É preciso que o consumidor se mobilizepara entrar no espaço de representatividade. Daminha visão do movimento representativo, que vaidepois ter direito a subsídio pra atuação, é quenão dá para subsidiar todo mundo, é impossívelcriar uma regra geral de subsídio. Na minhaopinião é possível criar obrigações de qualificaçãogerais, relacionadas a temas de interesse geral.As agências devem ser obrigadas a realizarworkshops pelo Brasil e viabilizar a participaçãodas pessoas, de qualquer um do povo, noworkshop. Isso custa, óbvio, mas em vez decolocar 50 consumidores em um avião e levarpara Brasília, leva-se 5 ou 6 servidores da agênciapara Manaus. É uma forma de subsídio. Eu achoisso mais efetivo para o consumidordesorganizado. Para o consumidor organizado euacho que além de conseguir entrar no espaço deorganização, depois ele tem que continuar semobilizando. Se não tem incômodo, não vaiacontecer, porque isso é natural do processo noEstado Democrático do Direito, o CongressoNacional funciona assim, tudo quanto é lugarfunciona assim.

As empresas incomodam bastante e acho queo consumidor não incomoda o suficiente...

As empresas não são tão boas como vocêspensam, tem grupos que são separados para ficarem Brasília. O burocrata ganha mal, então eleacha que não precisa se apurrinhar e vai receberquem ele quiser ou alguém que realmente estejademandando. Ou realmente são pessoas queapesar de burocratas já entraram num modelo decompromisso com o público, mais moderno. O fatoé, seja consumidor, seja empresa, ser recebido naAnatel não é coisa simples. É que as empresas,obviamente, têm mais disposição, porque elas têmum objetivo claro que é o lucro e além de tudo têmmais verbas para isso.

E são organizadas...

Exatamente. Eu me considero representante do

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movimento consumerista, e entrei para osegmento dizendo que não dá para matar ofornecedor, tem que ter relação de consumo.

O fato é que a Anatel tem o comitê deinfraestrutura nacional de formação, o comitê daordem econômica e o comitê do Espectro - todosfechados! Por que só que só o Comitê do usuárioestá funcionando? Porque a mobilização dousuário melhorou nos 6 últimos anos. Asempresas não deixam barato quando aparecealguma proposta que elas não querem.

Na verdade, objetivamente falando, acho que emum nível de organização do consumidor é precisoter determinados focos. Quem sabe não está nahora das organizações que têm a representaçãoorganizada fazerem um campo dedicado a isso,por exemplo, uma pessoa pelo menos que possasó ficar fazendo isso?

Essa questão do financiamento eu vejo de duasformas: eu acho que é possível estabelecer simvínculos, mas de forma mais abrangente para opúblico do consumidor organizado, e que épreciso estabelecer, criar e reforçar os espaços derepresentação institucional e nesses espaços derepresentação institucional garantir o subsídio.Existem duas formas de garantir esses subsídios.Se há uma política pública nacional deaparelhamento da relação de consumo com aregulação setorial, que essa própria diretriz venhacom a política de financiamento usando o Fistel,que é pra isso que ele existe.

No caso da Anatel, mas acredito que existealguma coisa parecida paras as outrasagencias.

Eu sei que o foco aqui é outro, a gente estáfalando de agências de reguladoras geral.

Geral, mas é natural tomarmos como exemploa Anatel.

Também tem fundo de direito difuso e é pra issoque ele serve. Muito órgão regulador arrecadapara ele. Eu não sei se a Aneel arrecada pra ele,mas é muito dinheiro que tem ali. Basta vontadepolítica. Se é para deixar a cargo do próprio órgãoque sejam as despesas operacionais dos órgãosde representação que foram instituídos dentro

dela, o que é viável desde que objetivamente amobilização e organização sejam efetivas. Se eucrio um comitê e ele se dá por satisfeito por terseu nome no DO e por fazer duas reuniões porano, assim vai ser. Seria a mesma coisa para aAbrafix, a Telebrasil, qualquer um. O que asagências gostam mesmo é de ter aquela relaçãotete-a-tete. São relações individuais comempresas e empresas defendem seus interessesindividuais. Pode esquecer que a Oi fala aqui naAnatel a mesma coisa que a Telefônica fala. Que aVivo defende o mesmo ponto da vista da TIM.Não, elas se gastam o dia inteiro. Então éimpossível dizer que vai ter o mecanismo definanciamento individualizado. Tem que sercolocado nos espaços de representação, e oconsumidor que não se interessar em se mobilizarpara participar dessas pautas, que participedesses outros espaços que são espaços dequalificação necessária. E que haja uma diretrizcentral para que haja um mecanismo de trabalhoregulatório efetivo e que o financiamento venhaatravés da efetiva disponibilização dessasquestões. Por exemplo, o Ministério da Educação,agora, lançou um edital, que foi suspenso peloTCU ontem ou anteontem, para fazer cursos adistância. Dez milhões de reais. O edital não estáincluído na visão de participação do consumidor.Eu acho que tem que estar.

Caminhando aqui pro final, a última pergunta éum pouco isso: se você tem sugestões decomo os temas referentes ao consumidorpodem fazer parte da Agenda Regulatória.

Eu acho que o Presidente Lula está no momentoonde ele está valorizando muito o diálogo com oconsumidor. Essa reunião que ele fez com oterceiro setor, com as entidades relacionadas aoPNBL, foi uma grande demonstração de que elenão recebeu empresas.

Ele recebeu depois.

Mas quem recebeu depois não foi ele, foi aErenice. O Lula é o Lula e a Erenice é a Erenice.Cezar Alvarez é Cezar Alvarez. O Lula sentou namesa durante duas horas com os representantesrelacionados a esse assunto, e eu lhe pergunto oque foi dito a ele? A oportunidade de falar foi dada.Foi dito a ele o que nós falamos, ou ficaram lá

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discutindo se querem 250k ou 3 megas?

É, pelo que eu sei nesse caso específico,levaram a questão da banda larga comoserviço essencial...

É o que eu estou dizendo. O consumidor temdificuldades de se organizar. Se tem aoportunidade de estar com o Presidente daRepública para discutir um assunto desse, aagenda tem que estar regimentada. Eu tenhonotícias dessa reunião que isso sequer entrou napauta. Eu estou dizendo que não é só o governoque está desorganizado em matéria dealinhamento de diretriz política consumerista detelecomunicações. As organizações dosconsumeristas também são. Virou uma coisaemocional que é ruim para todos os lados. Euacho que é preciso chegar e fazer uma agenda dosetor consumerista do Sistema Nacional deDefesa do Consumidor, que integre todos ospontos das agendas de telecomunicações ou dasde energia elétrica ou de outra agência. Tem queser levada de forma organizada para o chefe dopoder executivo, porque na minha opinião bastaum decreto. Não precisa de lei.

Independente de alguém reclamar, a própriaAnatel, ou uma agência reguladora, não teriaque olhar para os problemas? À luz dessaproteção do direito do consumidor?

Teria. Mas aí eu volto para a cultura do órgão. Acultura da Anatel não é pensar grande, nem daAneel e nem da ANTT. Pensar grande é pensarpoliticamente e política não se faz em agência.Política se faz no local público, no quadrado legal

responsável por isso.

É a procuradoria que chega para Anatel e fala queno regulamento tem coisa que é incompatível como código de defesa do consumidor.

Como a Anatel recebe esses pareceres?

Dizem que vai para uma consulta pública e vãoesperar o que os consumidores vão falar. E naconsulta pública, será que alguém viu?

Quer dizer, e ai se isso não aparecer numaconsulta pública, a agência deixa como está edeixa passar?

Pode ser que sim, pode ser que não, vai dependerdo jogo de forças dentro da agência. Falta nesseaspecto, portanto, na minha opinião, aorganização interna das entidades que já têmrepresentação nos comitês, que sabem requereruma audiência com o conselho diretor, com opresidente, pra determinar os procedimentos, pelomenos, de notificação para o comitê.

É um processo bastante complexo. Qualquer setorregulado é assim, se aplica inclusive dentro daprópria agência. Então eu acho que a as medidasefetivas são duas: uma é a discussão e aelaboração de uma pauta geral, consumerista,relacionada aos setores regulados, em um nívelde políticas públicas, para que houvesse umencaminhamento direto com o Presidente daRepública A outra é fazer uma pauta e trazer estademanda para o órgão propriamente dito. E aí,obviamente, não é só ir lá e entregar a cartinha, éir lá, e continuar indo lá, reclamar até acontecer,como todo mundo faz dentro de estabelecimentode qualquer regra.◘

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ANEXO 4 – Íntegra entrevista Carlos Ari Vieira Sundfeld

Pensando Direito – Idec

Entrevista realizada em 9.02.2010

Entrevistado:

Carlos Ari Vieira Sundfeld

Possui graduação (1982), mestrado (1987) edoutorado (1991) pela Pontifícia UniversidadeCatólica de São Paulo, sendo estes dois últimostítulos na área de Direito Administrativo.Participou da criação da Escola de Direito de SãoPaulo da Fundação Getúlio Vargas, onde éprofessor de direito administrativo na Graduação,professor no programa de Mestrado ecoordenador do Curso de Especialização emDireito Administrativo. É também professor doMestrado em Direito da Pontifícia UniversidadeCatólica de São Paulo. Foi professor convidadoda Faculté de Droit, d Économie et de Gestion del Université de Pau et des Pays de L Adour(1994/5). Fundou e preside a Sociedade Brasileirade Direito Público (www.sbdp.org.br), que mantémuma escola de iniciação científica (a Escola deFormação) e programas de aperfeiçoamento,pesquisa e publicações, como as editadas pelaeditora Malheiros (os livros Direito AdministrativoEconômico, Parcerias Público-Privadas, Leis deProcesso Administrativo, por ele coordenados, eoutros). Concebeu diversas inovaçõeslegislativas, como a licitação por pregão, a LeiGeral de Telecomunicações, o modelo brasileirode agência reguladora independente (ANATEL),as Leis Federal e Mineira de Parcerias Público-Privadas, a Lei Paulista de ProcessoAdministrativo, e outras. Advogado especializadoem consultoria jurídica em direito público eregulação - Sundfeld Advogados.

Como é que o senhor vê o papel dosconsumidores na missão e nas atividades daagência, tanto em termos legais, do que estáprevisto, quanto na prática mesmo? Como éque se dá na prática essa atuação dasagências, se a agência deve levar emconsideração sempre os interesses dosconsumidores ou depende do caso? Como éque os atos das agências tem que serelacionar com o Código de Defesa doConsumidor, ou com outra eventual Lei queproteja os interesses dos direitos dosconsumidores?

Eu não tenho a menor dúvida que a atividade deregular serviços públicos e atividades

econômicas, quer dizer, de fazer regulaçãoeconômica, tem como uma das suas questõescentrais a de conseguir definir adequadamente asobrigações do prestador de serviço em relação aoconsumidor e portanto definir de maneira concretaquais são os direitos do consumidor. Não só doconsumidor atual, mas o consumidor empotencial. Então, essas são as duas questõeschaves em relação ao consumidor: a de garantirdireitos àqueles que já tem a relação estabelecida(que já tem acesso aos serviços), e tentar ampliara cobertura de serviços para atingir pessoas, quepor várias razões, não tem acesso mas quedeveriam ou poderiam ter. É a questão dauniversalização dos serviços.Essa questão é uma tarefa da regulação, quer elaseja feita por agências ou não seja feita poragências. E as Leis que disciplinam a atuaçãodas agências, Leis que frequentemente tem umesboço da regulação setorial, costumam dizerisso que eu acabo de falar: que os interesses dosconsumidores tem que ser defendidos,respeitados, observados, e até, eventualmente,que a legislação de Defesa do Consumidor sejaatendida. A legislação de telecomunicações fala isso, falado respeito ao próprio Código, da legislação dosconsumidores, bom, mas isso é uma abstraçãoque é fácil de dizer, mas que é difícil de trazerpara a concreção. Por quê? Porque no trabalhode definir quais são os direitos assegurados equais são, portanto as obrigações dosprestadores, existe uma margem de deliberaçãoextremamente complexa e que cabe à regulaçãofazer.Nesse sentido ocorrem tensões e essas tensõestem que ser resolvidas por alguém. Exemplo detensão que possivelmente é uma das questõeschaves da regulação em saúde, em energiaelétrica: o efeito da inadimplência do consumidorno tocante à prestação de serviços (acontinuidade na prestação de serviços). Como éque a inadimplência do consumidor deve refletirno cumprimento das obrigações do prestador?Não existe uma resposta simples para essaquestão, então é o que tem acontecido é umdebate no interior das agências reguladoras queleva a construção de normas regulamentares,cuja validade, se discute. E aí alguns dizem,“bem, essa norma viola o código de defesa doconsumidor”, ou dizem “essa norma viola aprópria legislação setorial, a Lei”, outros dirão,“essa norma está de acordo com a legislaçãosetorial”, ou dirão “embora a legislação setorialnão diga nada especificadamente sobre isso, deupoder para a agência para ela fazer a definição ea definição da agência é uma definição razoável e

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adequada e não viola o código de Defesa doConsumidor”. Bom, então, nesses exemplos, euacho que estão claras as tensões: “Como seinterpreta o Código de Defesa do Consumidor? Oque se entende que o Código de Defesa doConsumidor já gerou de direitos para oconsumidor que deveria ser observado para aagência?”. Tudo isso é matéria polêmica. Então, alguns que interpretam a legislação de ummodo dirão que as agências não realizam osinteresses do consumidor, cuidam só dosinteresses da empresa e essa acusação foi muitofeita, mesmo para Aneel, para Anatel em relaçãoaos temas de telefonia celular e telefonia fixa, etc.Diz-se que eles não observam os direitos doconsumidor, enquanto a agência se defendedizendo que considera sim, só que não significagarantir o direito de um consumidor continuarrecebendo os serviços sem pagar.Enfim, é uma tensão, e a agência reguladorafrequentemente resolve essa tensão de umamaneira que desagrada a quem carrega abandeira da defesa do consumidor – o próprioIdec é um exemplo.Isso evidentemente leva a uma avaliação dessesatores de defesa dos consumidores negativa emrelação à agência com a qual, muitas vezes eunão concordo. Quer dizer, em uma avaliação apartir da minha perspectiva de observador, paradizer se estou de acordo com todas as tesesjurídicas e mesmo as críticas sobre o conteúdo daregulação para além do direito que são as feitaspor entidades de defesa do consumidor privadasou até pelo Procon, eu diria, não concordo comvárias delas, eu diria ao meu ver, contra a opiniãodesses atores, que a agência realizou umequilíbrio adequado entre os interesses doconsumidor presente, do consumidor futuro, doinadimplente, do adimplente, do investidor dessacoisa toda. Então em resumo, essa resposta épara dizer que eu não concordo com uma visãomuito crítica que existe em relação às agências,no sentido de que elas são capturadas pelosprestadores e que ignoram os direitos e osinteresses do consumidor.Eu acho que essa crítica é compreensível numcontexto de luta, luta por um certo ponto de vista,mas que ela não é correta. Agora, isso dito, eudiria que os consumidores tem suficiente espaçono debate sobre regulação? Eu diria que não.

Entendendo que o consumidor não participade uma forma adequada ou suficiente, poderiaa proposta de financiamento público àparticipação social no processo regulatórioser, entre outras possíveis, uma solução parachegar a um cenário mais ideal?Certo, então, eu acho que não estou mecontradizendo. Eu acho que os consumidores,seja como movimento privado (como o Idec, de

entidades privadas não estatais) , seja como oSistema Brasileiro de Defesa do Consumidor, tembaixa participação nas discussões de mudançasregulatórias (na construção das normas deregulação). Há uma insuficiência. Do ponto devista individual a participação é muito mais difícil,e os que participam são usuários grandes e nãoconsumidores autorizados. Há uma baixa participação, um problema sério.Então, se nós formos pegar exemplos de conflitosque se judicializaram depois, esse que eumencionei da inadimplência, ou a discussão sobrese a assinatura da telefonia fixa é legitima doponto de vista legal e se é adequada ouinadequada do ponto de vista econômicoregulatório, são dois exemplos em que acreditoque a solução da regulação não é errada, não éilegal e nem é inadequada do ponto de vista dointeresse do consumidor! No entanto, conhecendoo modo como essas normas foram feitas, paramim parece claro que elas foram elaboradas semabsolutamente nenhuma participação doconsumidor, nenhum movimento do consumidor,nenhum que jamais discutiu ou pode discutiradequadamente como é que deveria ser osistema antes do estabelecimento das regras. O sistema de tarifação da telefonia fixa foiconstruído (e eu participei dessa discussão)levando em consideração as práticas do setor,que são praticas já estabelecidas e que vem de30, 40 anos, com algumas modificações queforam consideradas convenientes pelasautoridades governamentais à época, mas nãohouve qualquer tipo de debate e negociação daqual poderia eventualmente resultar em algumtipo de diferença.Eu estou vendo isso muito tranquilamente, achoo sistema de assinatura bastante razoável, e nãoconcordo com a crítica mais fundamental, maisampla que é feita em relação a isso. É um temabastante amplo, agora o que acontece que se háuma participação dos movimentos, a soluçãoregulatória pode ser diferente e eventualmenteaté pior. Cada um verá a solução de acordo comsua visão, bom, enfim, as pessoas divergirão issoé totalmente natural. É inegável que apesar dosesforços que já existem até hoje (e o Ideccertamente é uma entidade que tem participadoem algumas discussões, participandorelevantemente, mas isso é muito pontual) existeum déficit. No entanto, não acho que oconsumidor esteja sendo absolutamenteprejudicado, porque as agências seriamincapazes de olhar pelos interesses dele, eu nãoconcordo com esse diagnóstico. O que aconteceé que a regulação é um processo de discussão ede composição muito frequentemente, não é umamera questão de encontrar a melhor soluçãotécnica. É levantar opções, ver as vantagens edesvantagens e negociar entre grupos qual

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solução é a melhor e aí realmente a participaçãodos consumidores tem sido muito pequena.

A participação dos consumidores éfundamental para que haja esse equilíbrio,essa discussão, essa composição, que osenhor mencionou dentro das agências noprocesso de regulação? Eu não tenho a menor dúvida de que faria muitadiferença e seria diferença positiva, ao menospara que os movimentos tivessem desde o início,cientes da complexidade toda que a discussãoenvolve e pudessem eventualmente tomarposições em relação à regulação, diferentesdaquelas que eventualmente tomam (críticas porfalta de informação). Mas acho que é muito maisque isso, não é só envolver os órgãos de defesado consumidor para mostrar que as agências sãoboazinhas, não é isso. É para fazer processos dedeliberação mesmo. Há dentro das agênciasmuita exposição aos interesses das empresas, oque não significa que sejam capturadas por isso. O que significa isso na prática? Significa quediante do surgimento de novos interesses, asempresas produzem propostas e começam acircular na agência com documentos, com idéias,sempre de acordo com aquilo que elesconsideram a melhor solução para eles. Os reguladores ouvem isso o tempo todo e elestem que fazer o filtro. Para isso, é precisoinformação, é preciso inclusive um certocontencioso. É preciso que cada agente briguepor seu interesse. E isso falta para o regulador.Às vezes, por falta desse ator combatendo, porfalta até de informação, não são produzidassoluções que poderiam ser mais vantajosas parao consumidor. Eu não tenho a menor dúvida que isso é umacoisa importante e que precisa existir, que aregulação melhoraria, embora eu não possa dizerque a regulação está um desastre do ponto devista do consumidor. No entanto, a regulaçãopoderia melhorar se levar cada vez mais emconsideração os interesses, as dificuldades, osproblemas do consumidor.

Nesse sentido o senhor tem alguma proposta,alguma sugestão, algum pensamento sobrecomo essa participação poderia ser maisintensa?Olha, tem uma coisa que eu acho que não vaifuncionar em hipótese nenhuma (nem conheço aposição do Idec em relação a isso, ou não melembro). Trata-se da proposta que está no projetode Lei das Agências Reguladoras, incorporadopelo relator, de que a agência, mediante umregulamento, vai contratar por indicação dasorganizações de defesa do consumidor o suportetécnico de que elas precisarem. É totalmente impossível que funcione, para

resumir, por duas razões:(I) o Poder Público não consegue contratarconsultoria que ele escolheu sem licitação. Acontratação com licitação encontra muitasdificuldades e os agentes públicos que celebramesses contratos ou abrem essas licitações estãoexpostos hoje a condenações severíssimas doTribunal de Contas, Ações Judiciais etc. Quando apressão do Governo para fazer isso é grande,eles já se recusam porque o risco é enorme. Seeles tiverem que correr esse risco em nome dointeresse de uma organização de defesa doconsumidor, eles não o farão nunca. Isso que euestou falando é uma coisa muito séria, dadificuldade da implementação prática disso. Orisco hoje de um administrador público celebrarum contrato é muito grande e ele não vai correresse risco em favor de uma entidade de defesado consumidor, é impossível isso funcionar;(II) a segunda razão é porque não é de imaginarque o regulador tenha muita simpatia em dararmas para quem eventualmente vai criticá-lo.Não fosse a primeira dificuldade (eu estouimaginando um País que não haja esse medo dosadministradores públicos de celebraremcontratos), a segunda dificuldade faz com queesta solução que está no Projeto de Lei se torneinadequada. A solução apresentada pelo PL dasagências é contratar pontualmente, caso a caso,uma acessória técnica indicadas pelas entidadesde defesa do consumidor para assessoramento.Isso ao meu ver, não tem a menor chance defuncionar. Um mecanismo para capacitar(capacitar no sentido de capacidade material)essas entidades, não pode ser ligada aoregulador setorial. Ao meu ver, tem que existir umprograma unificado, que esteja num Ministério(para falar de um exemplo Federal) desvinculadoda regulação (o Ministério da Justiça, porexemplo, parece que é adequado, até porque láestá o tema da defesa do consumidor) e esseprograma tem que ser um programa definanciamento de entidades para a atuação delongo prazo, e não ligada a uma ou outra consultapública especifica, por exemplo. Seria um programa de financiamento deatividades das entidades e não de intervençõespontuais. Quer dizer, há um projeto de ação queevidentemente envolve custos com consultoriatécnica para participar das consultas públicas queexistirem e isso tem que de alguma maneira setentar orçar num prazo relativamente longo,porque você não sabe a cada ano quantasconsultas podem aparecer, de modo a permitirque se faça um valor de patrocínio que o poderpúblico dê a essas entidades, para que essasentidades possam desenvolver a sua açãopermanentemente. Um pouco parecido com osfinanciamentos que se conseguem das agênciasinternacionais para manutenção de programas de

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regulação, o próprio Idec já teve ou tem.

O BID, por exemplo. Hoje o Idec tem projetoem convênio com o BID. Projeto longo de 4anos.É isso ai, é isso ao meu ver, que tem que serbuscado. Um Programa de fomento estatalpermanente, de longo prazo de entidades dosetor privado independentes que possam elas demaneira organizada, fazer essa participação noprocesso deliberativo, discussão e deliberativoquando for o caso. Para isso é preciso criar esseprograma (e eu acho que esse projeto de lei deagências reguladoras para mim é um nati morto,não vai vingar) mas acho que valeria umamudança legislativa, uma norma legislativa queautorizasse esse tipo de programa que hoje é umpouco difícil pela legislação atual. Por quê?Porque se o Ministério da Justiça arrumasseverba para isso, ele teria dificuldade de manterconvênios de longo prazo com objetos com essascaracterísticas, porque a legislação (a Lei deContratações Públicas de licitação) exige quehaja um programa de trabalho que vai definir ovalor e que provavelmente geraria algumadificuldade nos órgãos de controle do Ministérioda Justiça. Bom, então eu acho que sem uma previsão legalnão é viável fazer este programa (que seria umprograma de apoio à melhoria da regulação pormeio de participação de entidades privadas,entidades do setor privado de apoio aoconsumidor). Eu acho que esse, ao meu ver, é umprograma que pode fazer a real diferença.

O que o senhor acha, por exemplo, de umaidéia de criação de um fundo, como similar aoFundo dos Direitos Difusos, que destinasseuma percentagem das multas que sãoaplicadas pelas agências para o fomento dasatividades das entidades? Essa idéia já édiscutida, mas ainda não existe um conceito.Gostaria de saber o que o senhor acha dessaidéia? Olha eu acho complicado esse negócio de fundode multas, sabe, porque teria que fazer um fundogeral, que pagasse percentuais de multas devárias agências, seria esse o esquema que emtermos abstratos funcionaria, então a lei definiriao percentual de multa de cada agência para supririsso daí. É um pouco difícil de viabilizar politicamenteporque as agências, digamos, tem muito “ciúme”desse dinheiro que é amplamente reivindicado.Segundo, eu acho que tem o problema que é apossível flutuação exagerada desse valor quetorna muito difícil fazer uma programação. Querdizer, não existe um fluxo constante de multa,considerando um conjunto de agências que mepermitisse dizer, eu vejo assim, num período de

10 anos.......quantas multas vão ser aplicadas por ano,quer dizer, e a partir daí ter sempre umamesma base...Isso, e aí eu pego uma média,e digo “10% vaipara esse fundo, para esse fim” é muito difícil,pelo menos, pela minha experiência (nunca fizesse cálculo, não tenho dados), mas olhandopara situação concreta acho muito difícil que seconsiga ter uma regularidade. É muito difícil parauma Lei falar qual o percentual de arrecadaçãocom multas que deveria irrigar esse fundo dedefesa do consumidor. Então, eu acho muito complicado ir por aí, euacho que uma outra solução possível, (mas aípoliticamente, cada um puxará seus punhais) étirar um percentual daquilo que é o recursodestinado hoje às agências que vem das taxas defiscalização. O porquê da legitimidade disso? Porque quandose cria uma taxa de fiscalização, é para pagar oquê? As atividades que o Estado tem para regulare o que é essa atividade? Não é só uma atividadeda agência reguladora, são outras atividadestambém que o Estado tem que manter para que aregulação funcione, tudo isso é custo “lato senso”da regulação. No meu ver é totalmente legítimo, éinquestionável que seria correto que o Estado emvez de pegar um percentual e dar exclusivamentepara os órgãos estatais de defesa do consumidor,para eles irem lá discutir a regulação (coisa quetambém pode ser feita), que eles façam também ofomento das entidades não estatais, porque isso éum elemento importante para dar equilíbrio aosistema. Então eu não teria a menor dúvida queseria constitucional o modelo.

Uma porcentagem dessas taxas seria maisfácil porque já existiria uma previsibilidade domontante.Exatamente, a diferença é essa.Então se você olha num período de longo prazo,você tem como ver qual a flutuação da taxa defiscalização de cada setor, e aí você podecalcular qual o percentual correto, se tem umaprevisão de aumento, um percentual correto.Agora existe uma dificuldade que é a dificuldadepolítica de conseguir isso. É que tem que avançarsobre receita que hoje em dia é da agência, e aías agências, claro, vão lutar contra. Mas essa dificuldade política é para criar osistema, e há dificuldade política para administraro sistema, qual é? As agências hoje tem fundosque são irrigados supostamente por essas taxasde fiscalização. Só que o Poder Executivocontingencia essa verba (ainda que prevista emorçamento), e libera no final das contas opercentual que ele quer, o restante fica para fazersuperávit primário. A história desses mais de 10anos tem demonstrado que o fato de existir

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recursos vinculados, essas taxas, não garantiu àsagências um fluxo regular de recursos. É verdade que esses anos todos, desde aimplantação das agências, nós vivemos muito operíodo de luta contra o déficit público, e queentão era natural que o poder executivo usassedesse dinheiro para obter o superávit. Mas euacho um pouco de excesso de otimismo imaginarque a diminuição da pressão para fazer superávitvai mudar significativamente esse cenário. Para resumir tudo que eu disse, eu não perderiameu tempo fazendo uma luta para criar um fundoque tem que brigar com todas as agências, sejapara pegar multa, que eu acho pior, seja parapegar percentual da taxa. Além disso, tem quelutar com o Executivo, para depois ver toda aexpectativa ser frustrada com ocontingenciamento de despesas. Sinceramente, acho que não vale o esforço hoje.Eu acho que hoje se precisa criar o programa porLei para que não haja dúvidas de que o poderpúblico (Ministério da Justiça) pode contratar. Queeu acho que é o maior problema prático paracomeçar um programa assim de longo prazo. E aluta por recursos virá na sequencia e continuarátodo ano. Já que é para gastar energia, deixapara gastar energia todo ano pela inclusão deverba no orçamento e não energia para aprovarno Congresso Nacional uma mudança genérica.Eu acho que não vale a pena.O que eu estou dizendo é assim, deixar de criarpor Lei um Programa desse, só porque ainda nãose conseguiu na Lei uma fonte estável derecursos é bobagem. Porque eu achorazoavelmente fácil aprovar uma Lei que cria oPrograma, dificilmente vai ter uma oposição, masacho dificílimo aprovar uma Lei que tenha essaprevisão de recursos fixos. Então isso é enterrar aaprovação da Lei.E aprovada a Lei, tendo esses recursos fixos nãoadianta, hoje, absolutamente, nada na prática, ouadianta muito pouco na prática, então eu nãoamarraria uma coisa à outra.Isso passa a ser uma briga que o próprioMinistério que centraliza, que eu acho que tenhaque ser o Ministério da Justiça, vai fazer. Por issoé que acho que o Programa é completamenteinviável se ele estiver descentralizado, se forsetorial. Como é uma briga complexa, ela tem queser centralizada em um Ministério que não seja odiretamente interessado na regulação, mas um

Ministério que se fortalece politicamente por teresse programa, e que não se enfraquece pelofato desse programa ser para “amolar” osreguladores. Porque ele sempre dirá, “não é paraeu - Ministério da Justiça - amolar os reguladoresou setor tal”, “esse dinheiro é para manter umprograma que é do Governo”. Então, se contariacom os Ministério da Justiça para lutar pelasverbas, como eles lutam por outras verbas deles,com as dificuldades que existem, que sãoenormes. Acho que é um tema simpático no Congressopara lutar por ele, para inclusão de novas verbase coisa e tal. Não é fácil, não é nada fácil essabriga orçamentária, é uma briga terrível.

Recursos escassos, outros interesses...Há setores mais organizados que outros, mas eusinceramente não vejo em termos de estratégia,não acho que se teriam dificuldades imensas parase ter recursos para começar o programa edepois é um contínuo. Desde que sejacentralizado, aí tudo bem, para acabar com umprograma como um todo é um custo político alto,agora para descontinuar um programa, num setorde saúde suplementar ou setor de Telecom émuito fácil. Por isso a centralização parecefundamental.

Para finalizar, o senhor deseja acrescentarmais alguma coisa ou até eventualmente,contribuir com alguma outra ideia específica?O grande desafio é ter atores fortes, estáveis, quesejam capazes de discutir a regulação comseriedade, com competência técnica e comisenção. E esses atores não podem fazer parte doEstado, agora evidentemente o financiamento temque vir do Estado, tem que ser um financiamentopermanente, estável, que se mantenha no cursodo tempo, que não fique flutuando a cada dia, acada projeto, senão, não vai sair nunca. Então, euacho que conseguindo fazer isso, o mais vemcomo consequência. Daí há muitas maneiras,muitas estratégias que as entidades, aí entãofortalecidas para atuar, poderão adotar para poderfazer propostas efetivas de modificação daregulação. Eu acho que tudo passa por essaquestão central, hoje nós não temos atores forteso suficientes, eles são pequenos, eles são aindadependentes muitos de financiamentos que sãoinfláveis. Por aí, não vamos andar.◘

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ANEXO 5 – Íntegra entrevista Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer

Pensando o Direito - Idec

Entrevista realizada em 10.02.2010

Entrevistado:

Roberto Pfeiffer

Professor e Coordenador de disciplina do curso deespecialização da Escola de Direito da FundaçãoGetúlio Vargas (GVLAW). Possui graduação(1991) e mestrado (1998) pela Faculdade deDireito da Universidade de São Paulo, tendoingressado no curso de doutorado da instituiçãoem 2007. Diretor Executivo da Fundação Procondo Estado de São Paulo. Leciona também emcursos de especialização do Cogeae da PontifíciaUniversidade Católica de São Paulo. Foi professordo curso de especialização do Centro Universitáriode Brasília e professor adjunto do Instituto deEducação Superior de Brasília. É Diretor daRevista de Direito do Consumidor e Procurador doEstado de SP nível V. Foi assessor de Ministro doSTF, Consultor Jurídico do Ministério da Justiça eConselheiro do CADE. Tem experiência na áreade Direito, com ênfase em direito econômico,direito da concorrência, direito do consumidor edireito e desenvolvimento.

Qual o papel que você considera que ocupamos consumidores na missão e nas atividadesdas agências reguladoras?

Na verdade, o que eu vejo na missão básica dasagências é tentar harmonizar alguns interesses.Então tem a questão de viabilização de algumaspolíticas, às vezes, de universalização, porexemplo. Tem uma relevância do equilíbrioeconômico financeiro do negócio. E o interessedos consumidores. Ou seja, o interesse dosconsumidores é um fator relevante e que, nalegislação, na maior parte dos serviços reguladospor agência, é algo que deve ser respeitado e,consequentemente, elas também devem estartutelando.

Isso seria em tese. E na prática? As decisõesregulatórias levam em consideração os

interesses dos consumidores e que, comoexemplo, o CDC, é uma lei que deve sempreser incorporada em todos os atos dasagências reguladoras?

Então, vamos lá. Eu entendo que ainda há muitainadequação. Então, respondendo objetivamenteaté a última parte. Eu entendo que sim, que oCDC deve ser necessariamente levado emconsideração. Então, na regulação, ele deve levarem conta o CDC e, consequentemente, umanorma de regulação não pode contrariar algo queo CDC estipula e entendo que ainda é muitoinadequada, na maior parte, a regulação feitapelas agências. É bem verdade que já foi pior, euacho. Principalmente no começo, havia umacompleta ignorância no sentido de que não eralevado em consideração de maneira alguma oCódigo de Defesa do Consumidor. E aí sãoinúmeros exemplos de normas regulatórias,normas de regulação que contrariamexpressamente o CDC. Hoje parece haver umcuidado maior, mas ainda não é tão adequado.Mas sem dúvida nenhuma, na regulação, deve serobedecido o CDC. Eu tenho as minhas dúvidas sea agência reguladora pode aplicar multas combase no CDC, mas é coisa completamentediferente que na regulação deve levar o CDC semdúvida nenhuma, e ainda não é adequadamentelevado em consideração

A outra questão diz respeito à participaçãoefetiva dos consumidores e de seusrepresentantes no processo regulatório. Entãoo senhor considera que existe participaçãoefetiva?

A participação ainda é muito inadequada, eu acho.Existem alguns termos onde há participaçãomaior, então, normalmente, quais são essestermos? Algum termo de maior mobilização eprincipalmente quando envolve aspectos não tãotécnicos daquele setor, não tão específicos. Então,por exemplo, quando se faz uma regulação sobredireitos gerais dos consumidores de telefonia, deenergia elétrica, enfim. Nesses casos, como seenvolve, principalmente, o conhecimento denormas, coisas que são mais gerais. Aí há uma

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participação, uma mobilização maior. No entanto,tudo aquilo que é muito técnico do setor - inclusivee infelizmente, algo que é essencial,importantíssimo, que é o próprio preço, a tarifa - aparticipação, às vezes, não ocorre pelacircunstância do aspecto técnico. Então meparece que para esses assuntos que envolvamespecificidades do setor, falta conhecimentosuficiente para os consumidores participarem.Mesmo o conhecimento mais básico daquelascaracterísticas. Isso acaba gerando muitasdificuldades, inclusive nisso que é superimportante, que é a questão de revisões tarifáriasetc. Para isso há pouco conhecimento e aparticipação acaba sendo muito pequena emesmo essa participação pequena, não muitoqualificada. Então acaba você não conseguindoelevar argumentos ou participar adequadamentedo processo.

Como você acredita que a participação doconsumidor e de seus representantes noprocesso regulatório pode ser intensificada?Considera o financiamento público paracapacitar as entidades de defesa doconsumidor para atuarem com competênciano próprio tema das agências uma alternativa?E tem exemplos: apoio constitucional,contribuição com projeto específico,capacitação de pessoas, financiamento depassagens, financiamento para contratação deconsultorias especializadas.

A primeira é através de uma capacitação técnica.Então, teria que ter algum tipo de capacitaçãotécnica que poderia ser dado por cursos decapacitação. Poderia ser dado, em alguns casos,com financiamento de alguém expert no assunto.Então esse é um primeiro aspecto. A ausência decapacidade técnica. E também divulgar-se umpouco mais internamente, entre os consumidores,entre as associações e os órgãos, da importânciadessa participação.

Se por um lado falta capacitação técnica, por outrotambém, me parece, que ainda há por parte dasentidades, das associações (A maior parte,fazendo ressalvas, é lógico, ao Idec, ao próprioProcon de São Paulo ou outras instituições) aindanão há, não sei se é talvez uma descrença oumesmo não se tem muito a noção da importânciaou pelo menos... Lógico, pode até ser que estejam

certos, que sejam um pouco descrentes doprocesso, mas não sei se é só descrença ou se édesconhecimento. Mas não está na agenda dosórgãos, das associações, não está. Essa questãoregulatória ainda não ocupa lugar de destaque.

Então, uma consciência de que é importanteparticipar, de que pode haver uma influência, umamobilização etc. Então isso não está. Então achoque faltaram essas duas coisas: capacitação einclusão na agenda como algo prioritário a serexecutado. E como isso pode ser superado?

Isso eu concordo com o financiamento público.Acho que é, superado um pouco através... Achoque aí não envolve propriamente recurso público,mas talvez alguma coisa que as própriasassociações e mesmo o consumidor pessoa físicanão é muito mobilizado para isso, acaba nãotendo muita consciência de como essas normassão adotadas etc. Mas enfim, acho que parte umpouco por parte das próprias associações eentidades públicas estarem reconhecendo aimportância de participar desse processo. Talvezseja uma coisa interna que devemos fazer. E poroutro lado a capacitação. Aí eu acho importantesim. Eu não vejo com maus olhos a questão douso do recurso público. Só acho que ele deve sermuito refletido. Qual que é a melhor forma? Assimacho que investimento e capacitação seria amelhor forma delas, vamos dizer, poderemcaminhar com suas próprias pernas. Então teremuma capacitação e aí poderem, a partir de umdeterminado momento, conseguir produzir.

As consultorias podem ser importantes paraassuntos muito específicos, mas tem seus limitestambém. A todo o momento ser utilizado, acho queelas podem ser utilizadas para coisas muitoespecíficas, mas não ser rotineiro. Caso contráriovocê acaba não entronizando mesmo essacapacitação. Acho que é assim, um financiamento,às vezes, pode ter dificuldade de participação,ausência de viagem. Mas aí acho também quedeve ser muito bem pensado, porque não é sóviabilizar presença física, ou a presença ali. Maisimportante do que isso é ter a contribuição comqualidade. Ou seja, olhar aquele aspecto técnicocom olhar do consumidor. Mas você precisadominar aquele aspecto técnico, então, às vezes,nem tantas viagens são tão importantes. Maspode ter uma linha de financiamento, que envolve,principalmente, a questão de uma capacitaçãomais permanente. Acho que cursos de

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capacitação. Às vezes, consultoria assim paraassuntos muito técnicos, você não vai ter tambémcomo incorporar a pessoa no dia-a-dia. Não sei setodo mundo vai ter condição ou nem sei setambém é o caso de ter dinheiro dentro. Mas àsvezes você vai precisar de alguma consultoria.Acho que o principal seria uma capacitaçãoatravés de cursos de capacitação mesmo do setor.

Você possui algum entendimento ou atémesmo alguma sugestão sobre como ostemas referentes à proteção do consumidorpodem fazer parte da Agenda Regulatória?Acho que já foi falado um pouco.

Acho que tem, em primeiro lugar, obviamente,através de uma participação mais efetiva, onde seleve o olhar do consumidor e o conhecimentosobre as normas. Então você vê aquela regulaçãoque defenda, a regulação prevaleça. Por outrolado, isso eu acho uma coisa importante que oIdec vem fazendo com algumas agências que épassar para as agências cursos de capacitaçãoem Direito do Consumidor (conhecimento dasnormas de defesa do consumidor). No início [adefesa do consumidor] não estava na órbita dapreocupação devido a “n” motivos, como pelo fatode as agências terem sido formadas porservidores do próprio órgão regulado, do próprioente regulado. Começa com algumaspreocupações fortes de universalização. Então

não havia qualquer preocupação com as normasdo Direito do Consumidor, o interesse doconsumidor. Mas posteriormente, às vezes, há atéum desconhecimento. Acho que a partir domomento que se conhece os própriosfuncionários, agora que elas tendem a seorganizar em carreira, isso acaba auxiliandobastante no fato deles terem o conhecimento.Então acho que levar também ao conhecimentodelas uma capacitação em normas de proteção aoconsumidor, também seja um caminho.

Então vejo esses dois caminhos: um através daparticipação dos órgãos, entidades de defesa doconsumidor, que vão levar as normas; e o outro éa partir da capacitação dos próprios funcionáriosdas agências. Talvez a terceira questão sejamobilização posterior. Também é importanteidentificar quando saem normas ruins. Identificar,fazer campanhas de esclarecimento. E nessascampanhas de esclarecimento e nessasidentificações, salientar como o processo ocorrerá,ou porque há pequena participação e dizer “olha,como é importante participar porque sai umproduto tão ruim quanto esse”. Ou então falar“olha, apesar de termos feito, contribuições dadasnão foram levadas em consideração”. Ou seja,posteriormente estar chamando atenção paranormas inadequadas ao consumidor, me parecetambém um terceiro elemento importante, porqueisso acaba fazendo com que a repercussãoeventualmente negativa, faça a agência repensarna sua atuação.◘

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ANEXO 6 - Legislação Argentina e Peru: financiamento à participação social

ARGENTINA

Lei 24240/1993 http://infoleg.mecon.gov.ar/infolegInternet/anexos/0-4999/638/texact.htm

Artigo Resumo em português

Artículo 62.- Contribuciones estatales. El Estado nacional podrádisponer el otorgamiento de contribuciones financieras con cargoal presupuesto nacional, a las asociaciones de consumidores paracumplimentar con los objetivos mencionados en los artículosanteriores.En todos los casos estas asociaciones deberán acreditar elreconocimiento conforme a los arts. 56 y 57 de la presente ley.La autoridad de aplicación seleccionará a las asociaciones enfunción de criterios de representatividad, autofinanciamiento,actividad y planes futuros de acción a cumplimentar por éstas.

Dispõe sobre o orçamentonacional disponibilizado aassociações de consumidores.Estas Associações devem serlegalmente reconhecidas e asmesmas serão escolhidasmediante critérios derepresentatividade,autofinanciamento, atividade eplanos de ação a seremcumpridos . Não especifica aorigem da contribuição.

Resolução 31/2006 http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet/anexos/110000-114999/114555/norma.htm

Artículo 1º - A los efectos de la asignación de las contribucionesfinancieras, con cargo al Presupuesto Nacional, previstas en elArtículo 62 de la Ley Nº 24.240, se consideran beneficiarias lasasociaciones de Consumidores inscriptas con al menos UN (1)año de antigüedad en el Registro Nacional de Asociaciones deConsumidores (RNAC) al inicio del ejercicio financiero cuyaspartidas se asignen, y que cumplan en tiempo y forma con losrequerimientos establecidos en la presente resolución y losdemás requisitos establecidos por la normativa vigente.

São consideradas beneficiáriasdas contribuições financeiras, asassociações de consumidorescom no mínimo 1 ano deinscrição no Registro Nacionalde Associações deConsumidores (RNAC).

Art. 2º - Las contribuciones financieras referidas anteriormentese otorgarán con base en los siguientes criterios:El treinta por ciento (30%) de las partidas presupuestadas, enconcepto de apoyo institucional.El setenta por ciento (70%) restante de las partidaspresupuestadas, para contribuir a solventar proyectos específicosconforme las pautas establecidas en la presente resolución.

As contribuições financeirasserão repassadas de acordo comos seguintes critérios: 30% paraapoio institucional e 70% paracontribuir com projetosespecíficos.

Art. 4º - La asignación de las contribuciones financierascorrespondientes a lo establecido en el Artículo 2º, inciso b) de lapresente resolución, se realizará mediante el financiamiento del

A distribuição do orçamentoconsiste em financiamento de80% do custo de projetos

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ochenta por ciento (80%) del costo de los proyectos específicospropuestos por las Asociaciones de Consumidores a la DirecciónNacional de Comercio Interior, dependiente de la Subsecretaríade Defensa del Consumidor de la Secretaría de CoordinaciónTécnica del Ministerio de Economía y Producción, y aprobadosconforme lo establecido en el Artículo 5º de la presente medida.Cada asociación podrá proponer para su financiamiento hastacinco (5) proyectos, con base en los temas indicados en elArtículo 10 de la presente resolución.En caso de que por una inicial falta de proyectos seleccionadosy/o aprobados, o por cualquier otro motivo, quedaren fondosdisponibles para asignar en función de lo establecido en elArtículo 2º, inciso b) de la presente resolución, la DirecciónNacional de Comercio Interior de la Subsecretaría de Defensadel Consumidor, dispondrá lo necesario para destinar dichosfondos al financiamiento de proyectos, mediante nuevasconvocatorias u otras medidas convenientes a ese objeto.

específicos propostos pelasAssociações de Consumidores àDireção Nacional de ComércioInterno.No caso da falta inicial deprojetos selecionados e / ouaprovados, ou por qualqueroutra razão, todos os fundosrestantes disponíveis serãodirigidos para financiar projetos,com novas chamadas ou outrasmedidas adequadas.

Art. 5º - A los efectos de seleccionar los proyectos que sepresenten por las Asociaciones de Consumidores, deconformidad con el artículo anterior de la presente medida, sedesigna un Comité de Selección integrado por la DirectoraNacional de Comercio Interior de la Subsecretaría de Defensadel Consumidor de la Secretaría de Coordinación Técnica; elDirector de Defensa del Consumidor de la Dirección Nacional deComercio Interior, el funcionario a cargo de la coordinaciónjurídica de la Dirección de Defensa del Consumidor y otros dos(2) funcionarios designados por el titular de la Secretaría deCoordinación Técnica.Dicho Comité elevará a la Secretaría de Coordinación Técnica lapropuesta de asignación de las contribuciones financieras paracoadyuvar a solventar los proyectos seleccionados. Dichapropuesta será aprobada, de así considerarlo, por la resoluciónrespectiva.

Será formado um Comitê deSeleção para selecionar osprojetos apresentados pelasAssociações de Consumidoresque serão destinatários dofinanciamento.

Art. 7º - El financiamiento de los proyectos seleccionados quedasujeto al monto real de las cuotas que asigne la Secretaría deHacienda del Ministerio de Economía y Producción para ejecutarla partida presupuestaria correspondiente y a los plazos en querealice las asignaciones.

O financiamento dos projetosselecionados está sujeito a cotasdesignadas pela Secretaria daFazenda do Ministério deEconomia e Produção.

Art. 8º - Las conclusiones, resultados o toda otra informaciónque se derive de los proyectos financiados bajo el régimen de lapresente resolución, podrán ser difundidos con carácter general,con el correspondiente reconocimiento de los autores, pero sinque ello les otorgue derecho a reclamo pecuniario alguno.

As informações provenientesdos projetos financiadospoderão ser difundidaslivremente, com o respectivoreconhecimento dos autores.

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Art. 9º - Además de otras sanciones que por tales hechospudieren corresponderles, las Asociaciones de Consumidores queincumplan las obligaciones asumidas para el financiamiento deproyectos, como así también las que hubieren proporcionado conel mismo objeto información no veraz, no recibiránfinanciamiento alguno en el ejercicio en el que la falta se hayacometido. De haber percibido financiamiento que resulteindebido, conforme los parámetros establecidosprecedentemente, el mismo deberá ser reembolsado y/ocompensado con el financiamiento que eventualmente lecorrespondiere a la entidad de que se trate, otorgado por laAutoridad Nacional de Aplicación de la Ley Nº 24.240 enejercicios futuros.

Prevê que as Associações quedescumpram as obrigaçõesassumidas para o financiamentode projetos não receberão arespectiva verba. Se houverrepasse indevido, o mesmodeverá ser reembolsado e/oucompensado.

Art. 10. - A los efectos de asignar las contribuciones financierascon cargo al Presupuesto Nacional, correspondientes al Ejercicio2006, se establecen los siguientes temas sobre los cuales versaránlos proyectos:- Educación formal en todos los niveles de la enseñanzaobligatoria, preferentemente aquellos que se realicen fuera delámbito de la Ciudad Autónoma de Buenos Aires. Se priorizaránlas actividades dirigidas a la formación docente, articulándolascon las autoridades locales de aplicación de la Ley Nº 24.240, emel marco de eventuales convenios con las autoridades educativas.- Capacitación o educación no formal destinada a gruposespecíficos (jóvenes, tercera edad, discapacitados, gruposvulnerables).- Difusión de los aspectos más significativos de la protección alconsumidor, bajo la modalidad de charlas, conferencias,elaboración de material gráfico (folletos, cartillas, manuales,guías) y audiovisual.Eventualmente, podrían ser tomados en consideración otrostemas que por su importancia, pertinencia y originalidad, sean deinterés para la Secretaría de Coordinación Técnica. En ese caso,las asociaciones deberían presentar a consideración de laDirección Nacional de Comercio Interior, una breve síntesistemática de los lineamientos del proyecto. En todos los casos, sedará prioridad a aquellos proyectos cuyo impacto previstoalcance el mayor número de consumidores.

Os projetos deverão versarsobre os seguintes temas:Educação formal, Capacitaçãoou educação não formaldestinada a grupos específicos,difusão dos aspectos maissignificantes da proteção doconsumidor.Em todos os casos, serãopriorizados aqueles projetoscujo impacto previsto alcance omaior número de consumidores.

Resolução 38/2006 http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet/anexos/120000-124999/121612/norma.htm

Art. 1º - A los efectos de la asignación de las contribucionesfinancieras, con cargo al Presupuesto Nacional, previstas en elArtículo 62 de la Ley Nº 24.240, se consideran beneficiarias las

São consideradas beneficiáriasdas contribuições financeiras, asassociações de consumidorescom no mínimo 1 ano de

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Asociaciones de Consumidores inscriptas con al menos UN (1)año de antigüedad en el Registro Nacional de Asociaciones deConsumidores (RNAC) y que cumplan en tiempo y forma conlos requerimientos establecidos en la presente resolución.Asimismo, para la asignación de contribuciones financierascorrespondientes al Ejercicio 2006, se considerarán beneficiariastodas aquellas Asociaciones de Consumidores inscriptas en elRegistro Nacional de Asociaciones de Consumidores (RNAC) ycon actividad efectiva al 31 de diciembre de 2005.

inscrição no Registro Nacionalde Associações deConsumidores (RNAC).

Resolução 21/2000 http://www.etoss.org.ar/desarrollo/sitioetoss05/index.htm

Art. 1°.- Otórgase un subsidio destinado a fomentar el mejorfuncionamiento de las Asociaciones que integran la Comisión deUsuarios del ETOSS de DOCE MIL PESOS ($ 12.000.)mensuales que serán distribuidos en partes iguales entre lasmismas.

O subsídio destinado a financiaro melhor funcionamento dasAssociações que integram aComissão de Usuários doETOSS (ENTE TRIPARTITEDE OBRAS E SERVIÇOSSANITÁRIOS) será de doze milpesos mensais, distribuídos empartes iguais entre as mesmas.

Peru

Decreto Legislativo 716/2000 http://www.aspec.org.pe/documentos/legal/tuo716.pdf

Artigo Resumo em português

Artículo 45º. - El Directorio del INDECOPI podrá celebrar conveniosde cooperación interinstitucional con Asociaciones de Consumidoresde reconocida trayectoria. Igualmente, podrá disponer que unporcentaje de las multas administrativas impuestas en los procesospromovidos por estas Asociaciones de Consumidores sea destinado afinanciar publicaciones, labores de investigación o programas dedifusión a cargo de las mismas.Mediante Resolución del Directorio del INDECOPI se estableceránlos alcances y mecanismos para llevar a cabo el adecuado uso de losrecursos mencionados en el párrafo anterior.

Autoriza a celebração deconvênios de cooperaçãoinstitucional comAssociações deConsumidores legalmentereconhecidas, bem comoprevê o repasse de umaporcentagem do valor dasmultas para entidades, com afinalidade de financiaratividades das organizaçõesde consumidores.

Lei 27846/2002 http://www.teleley.com/normas/octubre02/231300.pdf

Artículo 3°.- Convenios y destino de las multas administrativas: Los Consejos Directivos del INDECOPI, OSINERG, SUNASS,

Prevê o repasse de até 50%do valor das multas para

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OSIPTEL y OSITRAN, podrán celebrar Convenios de Cooperaciónlnterinstitucional con Asociaciones de Consumidores legalmentereconocidas. Igualmente, podrán disponer que hasta un 50%(cincuenta por ciento) de las multas administrativas impuestas en losprocesos promovidos por estas Asociaciones de Consumidores, seadestinado a financiar publicaciones, labores de investigación,información, educación en defensa de los consumidores a cargo de lasmismas. El correcto uso de estos recursos será fiscalizado por laContraloría General de la República.

entidades mediantecelebração de convênio decooperação interinstitucionalcom a finalidade de financiaratividades das organizaçõesde consumidores. Aorganização deve estarinscrita no registro doINDECOPI (órgãogovernamental de defesa doconsumidor, da concorrênciae da propriedade intelectual).

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