Psicologia e Educação

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Universidade do Sul de Santa Catarina Palhoça UnisulVirtual 2007 Psicologia e Educação Disciplina na modalidade a distância psicologia_e_educacao.indb 1 psicologia_e_educacao.indb 1 19/7/2007 15:21:46 19/7/2007 15:21:46

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Palhoça

UnisulVirtual

2007

Psicologia e EducaçãoDisciplina na modalidade a distância

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CréditosUnisul - Universidade do Sul de Santa CatarinaUnisulVirtual - Educação Superior a Distância

Campus UnisulVirtualAvenida dos Lagos, 41 Cidade Universitária Pedra BrancaPalhoça – SC - 88137-100Fone/fax: (48) 3279-1242 e3279-1271E-mail: [email protected]: www.virtual.unisul.br

Reitor UnisulGerson Luiz Joner da Silveira

Vice-Reitor e Pró-Reitor AcadêmicoSebastião Salésio Heerdt

Chefe de Gabinete da ReitoriaFabian Martins de Castro

Pró-Reitor AdministrativoMarcus Vinícius Anátoles da Silva Ferreira

Campus SulDiretor: Valter Alves Schmitz NetoDiretora adjunta: Alexandra Orsoni

Campus NorteDiretor: Ailton Nazareno SoaresDiretora adjunta: Cibele Schuelter

Campus UnisulVirtualDiretor: João VianneyDiretora adjunta: Jucimara Roesler

Equipe UnisulVirtual

AdministraçãoRenato André LuzValmir Venício Inácio

Avaliação InstitucionalDênia Falcão de Bittencourt

BibliotecaSoraya Arruda Waltrick

Capacitação e Apoio Pedagógico à TutoriaAngelita Marçal Flores (Coordenadora)Caroline BatistaEnzo de Oliveira MoreiraPatrícia MeneghelVanessa Francine Corrêa

Coordenação dos CursosAdriano Sérgio da CunhaAloísio José RodriguesAna Luisa MülbertAna Paula Reusing PachecoCharles CesconettoDiva Marília FlemmingFabiano CerettaItamar Pedro BevilaquaJanete Elza FelisbinoJucimara RoeslerLauro José BallockLívia da Cruz (Auxiliar)Luiz Guilherme Buchmann FigueiredoLuiz Otávio Botelho LentoMarcelo CavalcantiMaria da Graça PoyerMaria de Fátima Martins (Auxiliar)Mauro Faccioni FilhoMichelle D. Durieux Lopes DestriMoacir FogaçaMoacir HeerdtNélio HerzmannOnei Tadeu DutraPatrícia AlbertonRaulino Jacó BrüningRodrigo Nunes LunardelliSimone Andréa de Castilho (Auxiliar)

Criação e Reconhecimento de CursosDiane Dal MagoVanderlei Brasil

Desenho EducacionalDesign InstrucionalDaniela Erani Monteiro Will (Coordenadora)Carmen Maria Cipriani PandiniCarolina Hoeller da Silva BoeingFlávia Lumi MatuzawaKarla Leonora Dahse NunesLeandro Kingeski PachecoLigia Maria Soufen TumoloMárcia LochViviane BastosViviani Poyer

AcessibilidadeVanessa de Andrade Manoel

Avaliação da AprendizagemMárcia Loch (Coordenadora)Cristina Klipp de OliveiraSilvana Denise Guimarães

Design Gráfi coCristiano Neri Gonçalves Ribeiro (Coordenador) Adriana Ferreira dos SantosAlex Sandro XavierEvandro Guedes MachadoFernando Roberto Dias ZimmermannHigor Ghisi LucianoPedro Paulo Alves TeixeiraRafael PessiVilson Martins Filho

Disciplinas a DistânciaTade-Ane de AmorimCátia Melissa Rodrigues

Gerência AcadêmicaPatrícia Alberton

Gerência de EnsinoAna Paula Reusing Pacheco

Logística de Encontros PresenciaisMárcia Luz de Oliveira (Coordenadora) Aracelli AraldiGraciele Marinês LindenmayrLetícia Cristina BarbosaKênia Alexandra Costa HermannPriscila Santos Alves

Formatura e EventosJackson Schuelter Wiggers

Logística de MateriaisJeferson Cassiano Almeida da Costa (Coordenador)José Carlos TeixeiraEduardo Kraus

Monitoria e SuporteRafael da Cunha Lara (Coordenador)Adriana SilveiraAndréia DrewesCaroline MendonçaCristiano DalazenDyego RachadelEdison Rodrigo ValimFrancielle ArrudaGabriela Malinverni BarbieriJonatas Collaço de SouzaJosiane Conceição LealMaria Eugênia Ferreira CeleghinRachel Lopes C. PintoVinícius Maykot Serafi m

Produção Industrial e SuporteArthur Emmanuel F. Silveira (Coordenador)Francisco Asp

Relacionamento com o MercadoWalter Félix Cardoso Júnior

Secretaria de Ensino a DistânciaKarine Augusta Zanoni Albuquerque(Secretária de ensino)Ana Paula Pereira Andréa Luci MandiraCarla Cristina SbardellaDeise Marcelo AntunesDjeime Sammer Bortolotti Franciele da Silva BruchadoGrasiela MartinsJames Marcel Silva RibeiroJenniff er CamargoLamuniê SouzaLauana de Lima BezerraLiana Pamplona Marcelo José SoaresMarcos Alcides Medeiros JuniorMaria Isabel AragonOlavo LajúsPriscilla Geovana PaganiRosângela Mara SiegelSilvana Henrique SilvaVanilda Liordina HeerdtVilmar Isaurino Vidal

Secretária ExecutivaViviane Schalata Martins

TecnologiaOsmar de Oliveira Braz Júnior(Coordenador)Jeff erson Amorin OliveiraRicardo Alexandre Bianchini

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Apresentação

Este livro didático corresponde à disciplina Psicologia e

Educação.

O material foi elaborado visando a uma aprendizagem autônoma,

abordando conteúdos especialmente selecionados e adotando uma

linguagem que facilite seu estudo a distância.

Por falar em distância, isto não signifi ca que você estará sozinho.

Não esqueça que sua caminhada nesta disciplina também

será acompanhada constantemente pelo Sistema Tutorial da

UnisulVirtual. Entre em contato sempre que sentir necessidade.

Nossa equipe terá o maior prazer em atendê-lo, pois sua

aprendizagem é o nosso principal objetivo.

Bom estudo e sucesso!

Equipe UnisulVirtual.

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Maria da Glória Silva e Silva

Palhoça

UnisulVirtual

2007

Design instrucional

Carolina Hoeller da Silva Boeing

Karla Leonora Dahse Nunes

Psicologia e EducaçãoLivro didático

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370.15S58 Silva, Maria da Glória Silva e

Psicologia e educação : livro didático / Maria da Glória Silva e Silva ; design instrucional Carolina Hoeller da Silva Boeing, Karla Leonora Dahse Nunes. – Palhoça : UnisulVirtual, 2007.

166 p. : il. ; 28 cm.

Inclui bibliografi a. 1. Psicologia educacional. 2. Educação. 3. Psicologia. I. Boeing, Carolina Hoeller

da Silva. II. Nunes, Karla Leonora Dahse. III. Título.

Edição – Livro Didático

Professor ConteudistaMaria da Glória Silva e Silva

Design InstrucionalCarolina Hoeller da Silva Boeing

Karla Leonora Dahse Nunes

Projeto Gráfi co e CapaEquipe UnisulVirtual

DiagramaçãoRafael PessiAlex Xavier

Vilson Martins

Revisão Ortográfi caB2B

Ficha catalográfi ca elaborada pela Biblioteca Universitária da Unisul

Copyright © UnisulVirtual 2007

Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição.

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Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .3Palavras da professora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .9Plano de estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

Unidade 1 – A Psicologia em suas relações com a Educação . . . . . . . . . . . . 15Unidade 2 – A Psicologia e as tendências pedagógicas liberais . . . . . . . . . 53Unidade 3 – O construtivismo no Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75Unidade 4 – A Psicologia sócio-histórica e a educação . . . . . . . . . . . . . . . . 103Unidade 5 – Os mitos sobre o fracasso escolar e as

difi culdades de aprendizagem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135

Para concluir o estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157Referências bibliográfi cas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 159Sobre a professora conteudista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 161Comentários e respostas das atividades de auto-avaliação . . . . . . . . . . . . 163

Sumário

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Palavras da professora

Caro aluno,

Seja bem-vindo à disciplina de Psicologia e Educação!

Cada teoria psicológica eleita como referência traz em seu bojo

uma série de implicações para o entendimento das relações

estabelecidas entre o professor e os alunos e dos alunos entre si

na realidade escolar.

Para compreender melhor tudo isto é necessário conhecer

como as teorias da Psicologia vêm abordando esse assunto

ao longo da história desta ciência. Os conteúdos estudados

na disciplina Psicologia e Educação são fundamentais

para compreender o papel da educação na promoção do

desenvolvimento humano e da aprendizagem, dentro e fora da

escola, e para entender o modo como a Psicologia se relaciona

com as tendências e as propostas pedagógicas que norteiam as

ações dos profi ssionais de educação no Brasil.

Ingresse no conteúdo da Psicologia e Educação e bons estudos!

Profa. Maria da Glória Silva e Silva

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Plano de estudo

O plano de estudos visa a orientá-lo no desenvolvimento da

disciplina. Ele possui elementos que o ajudarão a conhecer o

contexto da disciplina e a organizar o seu tempo de estudos.

O processo de ensino e aprendizagem na UnisulVirtual leva

em conta instrumentos que se articulam e se complementam.

Portanto, a construção de competências se dá com a

articulação de metodologias e por meio das diversas formas de

ação/mediação.

São elementos desse processo:

o livro didático;

o Espaço UnisulVirtual de Aprendizagem (EVA);

as atividades de avaliação (a distância, presenciais e de auto-avaliação);

o Sistema Tutorial.

Ementa

Aspectos históricos e conceituais da interface Psicologia e

Educação. Fenômenos educacionais contemporâneos. Políticas

públicas e Educação. Intervenções socioeducacionais e

Psicologia. O processo ensino-aprendizagem no universo das

escolas.

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Objetivos:

Identifi car as relações historicamente estabelecidas entre a Psicologia e a Educação, bem como suas implicações para a compreensão do processo de ensino e aprendizagem na realidade escolar brasileira.

Descrever as características das concepções de desenvolvimento e aprendizagem inatista, comportamentalista e interacionista, relacionando-as com diferentes práticas pedagógicas.

Desenvolver projetos de prática na realidade escolar com fundamentos teóricos e metodológicos da Psicologia.

Carga horária

A carga horária total da disciplina é 60 horas-aula.

Conteúdo programático/objetivos

Veja, a seguir, as unidades que compõem o livro didático desta

disciplina.

Unidades de estudo: 5

Unidade 1 – A Psicologia em suas relações com a Educação

Nesta unidade, você estudará como a escola tornou-se uma

escola de massas e como a Psicologia participou desse processo.

Você conhecerá as idéias psicológicas que fundamentaram o

movimento escolanovista, que muito infl uenciou o pensamento

educacional brasileiro. Estudará também os conceitos

fundamentais do behaviorismo e da psicologia da Gestalt.

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Nome da disciplina

Unidade 2 - A Psicologia e as tendências pedagógicas liberais

Nesta unidade, você estudará os principais conceitos da

psicanálise, do humanismo e do cognitivismo, importantes linhas

da Psicologia. Você também conhecerá as tendências pedagógicas

liberais tradicional, renovada e tecnicista, relacionando as teorias

estudadas até então com essas tendências pedagógicas.

Unidade 3 - O construtivismo no Brasil

A unidade 3 trata dos principais conceitos da Epistemologia

Genética de Jean Piaget e das características dos estágios de

desenvolvimento propostos por este pesquisador. Permite saber

como o construtivismo esteve presente na educação no Brasil, as

implicações pedagógicas e as críticas sofridas por esta concepção

de aprendizagem e desenvolvimento.

Unidade 4 - A Psicologia sócio-histórica e a educação

Nesta unidade, você estudará as idéias de dois famosos autores

da Psicologia, L. S. Vygotsky e H. Wallon, que têm em comum

a utilização do materialismo histórico e dialético de Karl Marx

como fundamento medodológico para compreensão do papel da

educação no desenvolvimento humano.

Unidade 5 – Os mitos sobre o fracasso escolar e as difi culdades de aprendizagem

Nesta unidade, serão abordadas as teorias da carência e da

diferença cultural como explicações para o fracasso escolar das

classes populares. Você estudará também o conceito de distúrbio

de aprendizagem e a abordagem psicopedagógica das difi culdades

de aprendizagem. Por fi m, serão discutidas as noções de erro

construtivo e de zona de desenvolvimento proximal na avaliação

da aprendizagem escolar.

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Agenda de atividades/ Cronograma

Verifi que com atenção o EVA, organize-se para acessar periodicamente a sala da disciplina. O sucesso nos seus estudos depende da priorização do tempo para a leitura, da realização de análises e sínteses do conteúdo e da interação com os seus colegas e tutor.

Não perca os prazos das atividades. Registre no espaço a seguir as datas com base no cronograma da disciplina disponibilizado no EVA.

Use o quadro para agendar e programar as atividades relativas ao desenvolvimento da disciplina.

Atividades de Avaliação

Demais atividades (registro pessoal)

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1UNIDADE 1

A Psicologia em suas relações com a Educação

Objetivos de aprendizagem

Identifi car marcos importantes da história da Psicologia e da Educação no Brasil.

Defi nir os principais conceitos elaborados por algumas escolas psicológicas que fundaram a Psicologia como ciência.

Identifi car implicações dos conceitos psicológicos estudados para o pensamento educacional.

Seções de estudo

Seção 1 Como a escola se tornou o que é hoje?

Seção 2 A concepção de desenvolvimento inatista

Seção 3 A psicologia da Gestalt

Seção 4 O pensamento escolanovista

Seção 5 O behaviorismo na educação

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Para início de estudo

Para que você dê início ao seu percurso nesta disciplina, é

importante conhecer ou recordar as características dos estudos da

Psicologia relacionados à Educação. Estudar a história de uma

disciplina é importante, porque os conceitos que a constituem não

nascem “do nada”.

Toda idéia tem relação com idéias que a antecederam. O

conhecimento dessa origem pode ser um importante subsídio

para a compreensão dos caminhos pelos quais seguiram as

pesquisas e as intervenções sobre o processo de desenvolvimento e

de aprendizagem de crianças, adolescentes e adultos na escola.

Nesta unidade, você estudará como a Psicologia tem se

relacionado com a Educação na realidade brasileira. No Brasil,

esta relação estreitou-se nas primeiras décadas do século XX,

mais precisamente nas décadas de 1920 e 1930, momento em

que a sociedade brasileira via-se às voltas com as exigências

da modernidade capitalista. À Psicologia, com suas técnicas

inovadoras, era atribuído o papel de ciência e disciplina

coadjuvante na construção de um novo homem, especialmente

por sua contribuição aos aspectos metodológicos do ensino, ou

seja, o como ensinar.

Como o principal aqui é compreender de que maneira o

conhecimento e a prática da Psicologia gerou implicações para o

que acontece em espaços de educação, não serão abordadas todas

as teorias e práticas existentes, mas apenas as que apresentam

infl uências relevantes para o pensamento e no cotidiano

pedagógico.

Você terá contato com muitos nomes, fatos e conceitos que,

possivelmente, lhes serão novos.

E então, você se sente preparado para esta jornada? Respire fundo, concentre-se e dê o próximo passo para este novo desafi o!

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Unidade 1

SEÇÃO 1 – Como a escola se tornou o que é hoje?

As escolas antecederam o capitalismo e continuaram a se desenvolver

por muito tempo sob os auspícios da igreja antes que as necessidades

provocadas pelo processo de industrialização, em termos de mão-de-

obra, gerassem transformações no sistema escolar.

Enguita (1989), contando a história da escola de massas, mostra

que foi o desenvolvimento da manufatura que impulsionou a

escolarização de crianças órfãs em casas de trabalho e outros

estabelecimentos similares, nos quais serviam de mão-de-obra

barata. O século XVIII foi aquele em que mais se incentivou

o internamento e disciplinamento das crianças órfãs. Muitos

autores expressaram seu desejo de ver universalmente internadas

as crianças pobres, e “escolarizadas”, o que fundamentalmente

signifi cava muitas horas de trabalho e alguma instrução.

Na Europa, os projetos de lei que pretendiam assegurar um

mínimo de instrução literária às crianças foram sistematicamente

rejeitados durante grande parte do século XIX. Nessa época,

temia-se as conseqüências de letrar demasiadamente aqueles que,

no fi nal, deveriam continuar ocupando os níveis mais baixos

da sociedade. A educação poderia alimentar neles ambições

indesejáveis e os conhecimentos do povo não deviam se estender

além de suas ocupações.

Por outro lado, o monopólio da educação pela igreja difi cultava a modelagem da infância às necessidades da nova ordem capitalista e industrial, na qual já não bastava que o sujeito se desenvolvesse resignado e piedoso. Sob pressão da burguesia em ascensão, a escola foi se transformando de espaço da educação religiosa e doutrinamento ideológico para o local da disciplina.

A experiência escolar passou a ser organizada de modo a gerar

nos jovens novos hábitos, mais adequados para a indústria. A

questão não era, de modo algum, ensinar um certo montante

de conhecimentos no menor tempo possível, mas ter os alunos

entre as paredes da sala de aula submetidos ao olhar vigilante

do professor o tempo sufi ciente para dar a forma adequada

ao seu comportamento. Logo se percebeu que os empregados

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escolarizados mostravam-se mais pontuais, precisos, obedientes,

respeitosos, ordenados, dóceis, entre outras qualidades para a

produção. Essa ênfase na disciplina converteu as escolas em algo

parecido com quartéis ou conventos. Na Europa e nos Estados

Unidos, o ensino ou a instrução fi cava em segundo plano, atrás

da obsessão pela ordem e compostura.

No processo de industrialização dos Estados Unidos, a escola foi

o agente de “americanização” dos imigrantes e de assimilação

da população às novas relações produtivas. Buscando erradicar

os hábitos irregulares de trabalho das populações imigrantes e

substituí-los por formas de comportamento e traços de caráter

requeridos pela indústria em crescimento, fundou-se uma rede

de escolas tão rudimentares quanto os processos produtivos do

século XIX.

Nessa época, a produção fabril foi submetida a uma revisão

baseada, principalmente, nas idéias de gestão científi ca do

trabalho de F. W. Taylor. Ele propôs para a indústria um sistema

de organização baseado no controle absoluto dos produtos e

processos pelo empresário ou seus representantes que se traduzia

na padronização e rotinização máxima de suas tarefas. Além

disso, no taylorismo havia uma preocupação em contabilizar

cada dólar gasto ou ganho e aquilatar com exatidão os custos de

produção. Essa organização foi se estendendo às escolas e, com

isso, desenvolveu-se a pedagogia científi ca.

Nas escolas, era progressivamente inserida a fi gura do especialista em educação, que deveria estudar todas as fases do processo educacional, as necessidades da sociedade e da indústria, o estado do aluno nas distintas fases, a efi cácia dos distintos métodos, a relação entre custos e efi ciência etc., e fornecer, com base nisso, os dados e as conclusões pertinentes às instituições escolares e ao público.

Procurou-se, assim, desenvolver propostas metodológicas para

conhecer a estrutura e o funcionamento dos processos mentais e

o comportamento dos seres humanos. Além disso, o estudo da

Psicologia infantil e da Psicologia em sua relação com a educação

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Psicologia e Educação

Unidade 1

desenvolveu-se signifi cativamente. Os laboratórios de Psicologia

instalados nas universidades passaram a não ser os únicos espaços

em que os estudos dessa ciência se realizavam, criando-se cada

vez mais laboratórios anexos às escolas, bem como institutos

cujos objetivos centravam-se no estudo do desenvolvimento das

diferenças individuais entre as crianças.

O especialista auxiliaria a organização escolar a:

1) fi xar as especifi cações e os padrões do produto fi nal

desejado (aluno egresso);

2) fi xar as especifi cações e os padrões para cada fase de

elaboração do produto (matérias, anos acadêmicos,

trimestres, dias ou unidades letivas);

3) encontrar os métodos mais efi cazes a respeito e

assegurar que fossem seguidos pelos professores;

4) determinar, em função disso, as qualifi cações

padronizadas exigidas dos professores;

5) capacitá-los, em consonância com isso, ou colocar

requisitos de acesso tais que forçassem as instituições

encarregadas disso a fazê-lo;

6) exigir uma formação permanente que mantivesse

o professor à altura de suas tarefas durante sua

permanência no trabalho;

7) dar-lhe instruções detalhadas sobre como realizar seu

trabalho;

8) selecionar os meios materiais mais adequados;

9) traduzir todas as tarefas e realizar em

responsabilidades individuais e exigíveis;

10)estimular sua produtividade mediante um sistema de

incentivos;

11)controlar permanentemente o aluno.

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Para cumprir todas estas tarefas, faziam-se necessários também

conhecimentos psicológicos que permitissem ao especialista em

educação controlar o processo educativo de modo a gastar apenas

o tanto necessário para promover o desenvolvimento satisfatório

do maior número de ingressantes no sistema de ensino.

Destaca-se, entre os conhecimentos e práticas da Psicologia

requeridos pela educação, aqueles que envolviam testes de

inteligência. Alfred Binet (1857-1911), juntamente com seu

colega Th éodore Simon, foi responsável pelo desenvolvimento

dos primeiros testes de inteligência na Europa. Foram esses

pesquisadores que criaram a primeira escala métrica de

inteligência, que permite medir o Quociente de Inteligência (Q.I.).

Certamente você já ouviu falar do Q.I.. Este índice, utilizado para medida da inteligência, foi desenvolvido a partir da submissão a testes compostos por questões de raciocínio lógico. Aplicando esses testes a um grande número de pessoas, verifi cou-se que, para cada idade, há uma quantidade de acertos médios. Desta forma, podia se determinar o que foi chamado de idade mental. A idade mental era transposta para uma escala para estabelecimento do quociente de inteligência. Assim, se o sujeito acerta um número de questões correspondente à média para a sua idade, o índice de Q.I. obtido denota uma inteligência mediana. Se o indivíduo acerta menos questões do que a média para a sua idade, considera-se que seu Q.I. é mais baixo do que o dos demais, e assim por diante.

O quadro a seguir pode ilustrar a distribuição das faixas de Q.I.

em relação à classifi cação da inteligência.

Classifi cação geral dos níveis de QI

Faixa de QI Classifi cação

< 74 Infradotado

75-89 Abaixo da média

90-110 Mediano

111-125 Acima da média

> 126 Superdotado

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Unidade 1

Com a ampla divulgação dos trabalhos de Binet e Simon, e

a necessidade de se desenvolverem métodos efi cientes para a

escolarização, a psicometria, utilização de testes psicológicos para

mensurar as capacidades humanas e, em especial, a inteligência,

desenvolveu-se fortemente.

A perspectiva de medir a inteligência instituiu a prática de submeter a diagnósticos médicos e psicológicos as crianças, especialmente aquelas que não respondiam ao esperado pela escola. Criou-se, com isto, uma verdadeira fábrica de rótulos, reproduzidos no interior das escolas. As classes passaram a ser divididas conforme o desempenho dos alunos nas avaliações psicológicas. Desde essa época, as difi culdades de aprendizagem escolar passaram a ser associadas ao défi cit intelectual e à baixa inteligência, ou ao baixo Q.I.

Enquanto isso, você sabe o que acontecia no Brasil?

Nesse período, o Brasil começava a industrializar-se e urbanizar-

se. A partir da Proclamação da República, pretendeu-se a

transformação do cenário nacional e a construção da “nova

nação”. O ideário de modernização do país dominava os meios

intelectuais e apontava para a urgência de transformações tanto

econômicas quanto na mentalidade da sociedade (CUNHA,

2001), e este processo deveria passar pela educação.

A educação passava a ser vista como grande promotora das mudanças necessárias para a manutenção do capitalismo no mundo e, no Brasil, era considerada uma via importante para a modernização do país.

Com base no ideário funcionalista, as reformas educacionais do

período do governo de Getúlio Vargas trouxeram a introdução

progressiva da Sociologia e da Psicologia nos programas de

ensino voltados à formação docente. A introdução de conteúdos

da Psicologia deveu-se à necessidade sentida naquele momento

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Universidade do Sul de Santa Catarina

histórico de se repensar a formação docente em bases científi cas.

No momento em que o acesso à escola se ampliava, estudar a

inteligência, a aprendizagem e as diferenças individuais assumiu

grande importância.

A Psicologia se apresentava como disciplina fundamental para o entendimento da criança que chegava à escola e para o dimensionamento do cidadão que se pretendia que ela se tornasse. As informações obtidas nesses estudos formariam os futuros professores.

A pedagogia seria desenvolvida com base na ciência, tornando-

se experimental, mediante avaliações precisas baseadas

em critérios científi cos e impessoais. Pretendia-se que o

conhecimento e as técnicas científi cas trouxessem para o campo

educacional a compreensão das mentes infantis e avaliações

mais precisas do trabalho dos professores. Pesquisas sobre

inteligência, personalidade e capacidade começaram a ser feitas

para classifi car as crianças.

Compreender o processo de aprendizagem da criança como algo

delimitado por seu quociente de inteligência é manter uma visão

inatista do processo de desenvolvimento. Nesta perspectiva, a

capacidade cognitiva, a capacidade de conhecer o mundo estaria

determinada desde o nascimento. A educação, esta sim, é que

deveria se organizar para receber os alunos com diferentes

capacidades, que não mudariam com a educação.

Na próxima seção, você irá conhecer mais sobre a concepção

inatista do desenvolvimento e da aprendizagem.

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SEÇÃO 2 – A concepção de desenvolvimento inatista

A concepção inatista relaciona-se à crença em que as características de cada indivíduo, sua personalidade, suas aptidões, o desenvolvimento dos seus valores, seus modos de compreender a realidade, entre outros aspectos, já se apresentam praticamente prontos desde o nascimento. O que não está pronto desenvolve-se com o tempo, amadurecendo ou desabrochando, como ocorre com os vegetais, em cuja semente está a previsão de todas as características a serem desenvolvidas no futuro.

Comentários como “ele é uma criança de boa índole”, “eu sei que

está tudo na cabecinha dele, e a qualquer hora ele vai mostrar

o que sabe”, “quem é bom já nasce feito” e “pau que nasce torto

morre torto” ilustram essa concepção de sujeito que “nasce

pronto” e pode ser somente aprimorado pela qualidade das

experiências externas, mas nunca modifi cado.

Segundo essa concepção, a aprendizagem decorre da maturação e do desenvolvimento das capacidades que estavam potencialmente dadas ao indivíduo, e não da intervenção do professor no processo de ensino. Segundo o inatismo, a difi culdade para aprender é relacionada à imaturidade ou à falta de “prontidão” para a aprendizagem.

Os testes de inteligência, as idéias funcionalistas

provenientes da Europa e dos Estados Unidos com

os intelectuais da Escola Nova e o apriorismo da

Psicologia da Gestalt formam um arcabouço de

conhecimentos científi cos que tiveram infl uência

sobre a realidade escolar em situações práticas

como, por exemplo, a busca de enquadramento das

crianças em classes distintas em função de suas

características individuais, tidas como inatas.

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A função do professor, conforme o inatismo, centra-se em

respeitar os dons, interesses ou as capacidades individuais

exibidos pelas crianças espontaneamente. O professor perde seu

papel social de formador, já que a situação escolar não alteraria ou

ampliaria as determinações psicológicas inatas.

Partindo dessa concepção, o sistema escolar não se responsabiliza

pelo desempenho das crianças na escola, pois serão bem-

sucedidas as crianças que, dotadas naturalmente de potencial

para aprender, aproveitarem as oportunidades educativas. Assim,

a responsabilidade pelo aprendizado é quase exclusivamente

do aluno, e o papel das interações sociais no desenvolvimento

humano, fora e dentro da dinâmica escolar, é desconsiderado.

Os pressupostos que fundamentam essa concepção se revelam

nas práticas pedagógicas de infl uência escolanovista que se

multiplicaram no Brasil a partir dos anos 1930. Elas tendem a

subordinar a aprendizagem ao ritmo individual e à “maturação”

da criança. Você poderá perceber este ponto de vista revisando as

idéias de Edouard Claparède, que serão estudadas na seção 4.

A Psicologia da Gestalt é outra linha de estudo que faz parte da

história da Psicologia que realizou pesquisas que fundamentariam

uma visão inatista, ou apriorista, do mundo psicológico. Autores

posteriores que não concordavam com o ponto de vista inatista

do desenvolvimento e da aprendizagem citaram as idéias da

Psicologia da Gestalt a fi m de criticá-las, situando seu próprio

ponto de vista.

Mas você sabe o que discute a Psicologia da Gestalt? Para que você se oriente nesta discussão, que tal retomar algumas idéias?

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SEÇÃO 3 – A Psicologia da Gestalt

A escola gestaltista da Psicologia deu grande relevo ao estudo

sistemático da percepção. Contribuiu para aprofundar o conhecimento

sobre o papel da percepção na organização da aprendizagem. Foi uma

reação à visão associacionista, presente no estruturalismo e, de outro

modo, no funcionalismo e no behaviorismo.

As teorias associacionistas vêem os fenômenos psicológicos como resultantes da soma de pequenas sensações, reações, percepções, enfi m, de um somatório de partes que se combinam de maneira mecânica.

Para os psicólogos da Gestalt, não se pode analisar os fenômenos

mentais e comportamentais em elementos pré-determinados

arbitrariamente, pois o todo psicológico é mais do que a soma

de suas partes. Assim, os fenômenos psicológicos merecem ser

compreendidos em sua totalidade.

O conceito de Gestalt, forma ou estrutura foi expresso

como um conjunto de coisas que se prendem, se apóiam

e se determinam reciprocamente.(...) Gestalt signifi ca um

padrão ou todo organizado, ao invés de uma soma de partes.

A maneira de ser de cada parte depende da estrutura do

conjunto e das leis que o regem (CAMPOS, 1997, p. 32).

A Psicologia da Gestalt é representada historicamente pelos

pesquisadores Wertheimer, Kohler e Koff ka. Wertheimer pesquisou

os processos de percepção visual. Ele demonstrou a idéia de que o

todo é mais do que a soma das partes nos fenômenos psicológicos por

meio de experimentos como o que segue.

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1. Observe a fi gura.

Figura 1.1 – Experimento 1

Fonte: http://www.ufrgs.br/faced/slomp/

Você pode interpretá-la como um triângulo. No entanto, não há

nada em cada um dos pontos que remeta a tal fi gura geométrica.

É a relação entre os pontos, estabelecida pelo observador, que

leva a essa percepção total.

Wolfgang Kohler (1887-1967) concentrou-se no estudo do

desenvolvimento da inteligência e da aprendizagem. Estudou

chimpanzés em situações de resolução de problemas práticos e

dos resultados obtidos com esses animais derivou idéias sobre a

aprendizagem humana.

Em um de seus experimentos, Kohler colocava do lado de fora

da gaiola de um macaco um pedaço de uma vara que podia

ser encaixado a outro pedaço, colocado dentro da jaula. Era

colocado ainda um cacho de bananas a uma altura inacessível

para o macaco, além de um caixote. A tarefa do macaco era

pegar o cacho de bananas e, para isso, ele precisaria estabelecer

as relações certas entre os objetos disponíveis, dando-se conta da

solução a partir destas conexões.

Kohler percebeu que todos os elementos envolvidos na solução

do problema necessitavam estar dentro do campo de visão do

macaco para que ele percebesse as relações possíveis, reunindo os

objetos do modo adequado para alcançar suas bananas.

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Figura 1.2 - Foto de experimento de Kohler com macacos

Fonte: http://www.ufrgs.br/faced/slomp/edu01135/chimpanze3.jpg

Deriva-se deste experimento que a aprendizagem se expressa

no estabelecimento de relações entre os elementos envolvidos

em uma situação problema, formando uma percepção que

aproxima o sujeito da solução. Observa-se também que a forma

de apresentação desses elementos em um campo pode favorecer a

organização cognitiva.

Para Kohler, não é o treino ou o hábito, como proposto pelo

funcionalismo de William James, nem o condicionamento, como

proposto pelo behaviorismo, que explica a aprendizagem, mas

sim o fenômeno do insight.

O insight é o momento em que o campo perceptivo se reorganiza frente a um conhecimento novo. Nesse fenômeno, o animal compreende as relações entre as partes da situação-problema que lhe é apresentada, ao dar-se conta do todo, e age em conformidade com as relações percebidas. Nos seres humanos, o insight provoca a sensação agradável da descoberta repentina da solução de um problema: Eureka! Agora eu entendi!

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Mas será que essa idéia se relaciona com a forma de apresentação dos

materiais didáticos ao aluno?

Veja as fi guras a seguir. Cada uma pode ser percebida de mais de um

modo. Mais do que os traços das próprias fi guras, o que determina a

interpretação que será dada a elas é o olhar do observador.

Figura 1.3 – Jovem e Idosa

Fonte: http://www.ufrgs.br/faced/slomp/edu01135/idosa-jovem2.gif

Figura 1.4 - Cálice e perfi l

Fonte: http://www.ufrgs.br/faced/slomp/edu01135/perfi s-taca1.gif

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Figura 1.5 – Pato e coelho

Fonte: http://www.ufrgs.br/faced/slomp/edu01135/patocoelho1.gif

Você conseguiu ver mais de uma possibilidade de interpretação para cada uma das fi guras apresentadas? Como você se sentiu ao descobrir a segunda possibilidade, que você não viu logo no primeiro olhar? Esta é a sensação do insight.

A Psicologia da Gestalt defende que o funcionamento psicológico

apresenta propriedades semelhantes às do funcionamento cerebral.

Qualquer estado de consciência tem propriedades

estruturais semelhantes no córtex. Se vemos um

quadrado, haveria uma parte topologicamente

igual formada de quatro lados no córtex visual.

(ENGELMANN, 1978, p. 17).

Para os gestaltistas, os estímulos não atingem o córtex cerebral

de modo isolado. Pelo contrário, o cérebro é que os organiza em

formas que os inter-relacionam, sendo que a forma a ser percebida

depende das características do cérebro em questão e não dos

estímulos recebidos.

O olhar do observador, neste

caso, é mais importante do que as

características do estímulo. Assim,

quando falamos em percepção ou

compreensão de uma situação-

problema, haveria uma propensão do

sujeito para perceber as fi guras ou

situações desta ou daquela forma.

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É por isso que a Psicologia da Gestalt é apontada como apriorista, ou inatista, na medida em que características inatas do cérebro determinariam as diferenças individuais de percepção, de aprendizagem e de resolução de problemas.

Os autores da Psicologia que pesquisam as teorias da

aprendizagem na atualidade citam as idéias da Psicologia da

Gestalt para situar seu próprio ponto de vista. Ela é apresentada

como apriorista, pois, para esta linha de pesquisa, os aspectos

mais importantes para que ocorra a aprendizagem pré-existem no

sujeito e se manifestarão quando acontecer o insight.

SEÇÃO 4 – O pensamento escolanovista

O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova foi um marco

histórico da busca por transformações educacionais. Publicado

em 1932, trazia idéias de intelectuais brasileiros inspiradas no

pensamento de escolanovistas como John Dewey, dos Estados

Unidos, e Edouard Claparède, da Europa.

O movimento de implementação da Escola Nova durou de 1925

até a década de 1950. O escolanovismo não se propôs a refl etir

sobre a aprendizagem no contexto das relações em que ela se

realiza, naturalizando o ser humano e dando ênfase às diferenças

individuais.

Os testes foram amplamente usados nas décadas de 1930 e 1940.

Aplicados na escola, eles se prestaram à divisão entre o normal

e o anormal, divisão das turmas e aos prognósticos sobre o

sucesso escolar. Os testes eram utilizados para o diagnóstico da

inteligência, para a sondagem de aptidões e para a avaliação de

interesses. De posse dos resultados dos testes, o ensino poderia

ser moldado às idades e fases do aprendizado.

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Destaca-se, nesse contexto, a contribuição de Lourenço Filho.

Este foi um importante intelectual da educação brasileira,

estudioso da Psicologia que trabalhou pela fundamentação

científi ca da intervenção didático-pedagógica. Lourenço Filho

assumiu cargos estaduais e na administração pública federal,

tendo sido diretor geral do Departamento Nacional de Educação

(nomeado por Gustavo Capanema, em 1937) e diretor do

Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos – INEP, de 1938 a

1946. Por infl uência de Lourenço Filho, a estrutura inicial do

INEP incluiu uma Divisão de Psicologia Aplicada.

O Teste ABC, criado por Lourenço Filho a partir de pesquisas realizadas na escola-modelo anexa à Escola Normal de Piracicaba em 1925, foi o principal instrumento usado para selecionar alunos aptos a freqüentar a escola, tendo sido amplamente aplicado em escolas do Rio de Janeiro e São Paulo a partir de 1928 e por décadas a seguir (DÁVILA, 2003, p. 141-142).

O teste tinha por objetivo medir a maturidade para a aprendizagem da leitura e escrita. Os alunos que se mostrassem capazes de identifi car e escrever palavras contidas em um determinado grupo de objetos e tivessem habilidade motora para realizar desenhos geométricos eram classifi cados como maduros.

As primeiras relações mais signifi cativas estabelecidas entre

a Psicologia e a Educação no ensino escolar ocorreram com o

movimento da Escola Nova. Lourenço Filho e outros intelectuais

da educação brasileira foram entusiastas desse movimento, o que

foi fundamental para a constituição da Psicologia da Educação

como campo de estudo em nosso país.

O movimento da Escola Nova buscou renovar a educação

em um tempo em que a aprendizagem escolar era vista como

a capacidade de repetir e memorizar conteúdos acadêmicos

geralmente distantes da experiência de vida das crianças. O bom

professor era aquele que dominava os conteúdos, e o bom aluno

era aquele que os decorava. Defendeu que o ensino deveria tomar

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como ponto de partida a ação do aluno. A educação deveria

oportunizar às crianças condições de experimentar, produzir,

fazer, manipular e refl etir sobre os resultados obtidos.

John Dewey e Edouard Claparède foram importantes expoentes

do pensamento escolanovista na Psicologia da Educação. Você

pode perceber que, apesar de ambos teóricos serem identifi cados

com o movimento da Escola Nova, existem algumas diferenças

em seus modos de compreender o desenvolvimento humano e

o papel da educação. Enquanto John Dewey enfatiza o papel

da educação para o desenvolvimento do sujeito, dando ao

professor um lugar de destaque como organizador das fontes e

metodologias de pesquisa a serem utilizadas pelos aprendizes,

Edouard Claparéde, por sua vez, dá muito mais ênfase às

aptidões tidas como naturais das crianças. Para ele, é a educação

que deve se adaptar às características naturais apresentadas por

cada aluno.

Que tal conhecer um pouco mais sobre as idéias desses pesquisadores?

A escola democrática de John Dewey

John Dewey (1859-1952), fi lósofo, educador e participante da

vertente funcionalista da Psicologia, cunhou uma proposta

de como deveria funcionar uma escola que rompesse com os

métodos de ensino tradicionais e educasse para a democracia. Seu

trabalho nos Estados Unidos repercutiu no mundo todo e tem,

até hoje, implicações para o pensamento pedagógico.

A noção de movimento é central no pensamento de Dewey. Para

ele, a sociedade está em constante transformação.

Para Dewey, a Filosofi a não deve pretender se colocar como

o “farol da sabedoria”, impondo dogmas imutáveis e verdades

absolutas que conduzam a humanidade. Pelo contrário,

É interessante perceber que a difusão do tema transformação constante da realidade, que assumiu posição de centralidade no discurso pedagógico nessa primeira metade do século XX, estava relacionada à necessidade de aceitação das mudanças tecnológicas e das mudanças sociais atreladas ao processo de modernização e industrialização. Era necessário que as pessoas estivessem dispostas a viver com otimismo essas mudanças.

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a Filosofi a deve se colocar sempre na

transitoriedade em que se encontra a realidade,

norteando a busca dos homens para soluções

dos problemas vividos em sua experiência

cotidiana. O ponto de vista de Dewey confere

um caráter essencialmente pragmático e

instrumental à Filosofi a.

Para os seguidores de Dewey, aceitar a mudança, a transitoriedade, a alteração das coisas signifi cava colocar a produção de conhecimento à disposição do bem-estar coletivo. A busca do modo de vida cooperativo em benefício de todos era o que daria signifi cado à democracia.

A educação proposta por Dewey tinha como princípios a iniciativa,

a originalidade e a cooperação. Deveria liberar as potencialidades

dos indivíduos rumo a uma ordem social que, por sua vez,

deveria ser progressivamente aperfeiçoada (mas não totalmente

transformada). Seria um processo de reconstrução da experiência

da realidade, para torná-la melhor, e um processo de melhoria

permanente da efi ciência individual segundo os próprios interesses.

Além disso, a proposta de John Dewey pode se caracterizar,

ainda, pelas seguintes oposições:

À imposição de cima para baixo opõe-se a expressão e

cultivo da individualidade;

à disciplina externa opõe-se a atividade livre;

a aprender por livros e professores, aprender por experiência;

à aquisição por exercício e treino de habilidades técnicas

isoladas, a sua aquisição como meios de atingir fi ns que

respondam a apelos diretos e vitais do aluno;

à preparação para um futuro mais ou menos remoto opõe-

se aproveitar ao máximo as oportunidades do presente;

a fi ns e conhecimentos estáticos opõe-se a tomada de

contato com o mundo em mudança. (DEWEY apud

GADOTTI, 1999, p.150.)

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Para Dewey (apud GADOTTI, 1999), o ato de pensar ocorre

sempre que estamos diante de um problema. Nesta situação, o

pensamento passa por cinco estágios:

1) uma necessidade sentida que coloque o sujeito em uma

situação de experiência real e atividade contínua que o

interesse por si mesmo;

2) a análise da difi culdade do problema por meio do

pensamento;

3) as alternativas de solução do problema – nesse momento

é necessário buscar informações para agir na situação,

fazendo as observações necessárias para este fi m;

4)a experimentação de várias soluções, desenvolvendo-as

de modo bem ordenado até que o teste mental aprove

uma delas;

5) a ação como prova fi nal para a solução proposta, que

deve ser verifi cada de maneira científi ca. Pondo à

prova as próprias idéias, aplicando-as e tornando clara

sua signifi cação, o sujeito descobre por si mesmo o

valor das soluções desenvolvidas.

A vida real e as experiências que nela vivemos estão repletas

de problemas a serem resolvidos. A educação proposta por

Dewey deveria se aproximar da realidade e defrontar-se com os

problemas que os homens nela encontram, desencadeando o ato

de pensar na busca de soluções.

No funcionalismo de John Dewey, “o ensino não é uma tarefa

do acaso ou da rotina, e deve-se considerá-lo uma atividade

consciente, intencional, com método e processo defi nidos”

(CARVALHO, 2002, p. 53). O professor e o conteúdo, nessa

perspectiva, assumem grande importância para a formação

mental e moral da criança, pois o pensamento depende de fontes

informativas e de alguém que as organize adequadamente, sem

oferecer soluções prontas para os problemas, pois o aspecto ativo

de aprendizagem não pode ser esquecido.

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Carvalho (2002, p. 53) mostra que a escola de John Dewey teria

três funções:

a) proporcionar um ambiente simplifi cado, selecionando

experiências úteis e estabelecendo uma progressão, com

o objetivo de conduzir os alunos à compreensão real das

coisas mais complexas;

b) eliminar os aspectos desvantajosos do meio ambiente que

exercem infl uência sobre os hábitos mentais;

c) coordenar, na vida mental de cada indivíduo, as diversas

infl uências dos vários meios sociais em que vive.

Ao partir da idéia de que o conhecimento verdadeiro a ser

aprendido é o que funciona como solução na vida prática,

Dewey traz uma concepção utilitária da educação. “À escola é

atribuído um papel fundamental de selecionar as experiências

úteis realizadas pela humanidade para construir os conteúdos

cognitivos necessários a uma sociedade futura mais perfeita, uma

sociedade democrática” (CARVALHO, 2002, p. 53).

A cooperação na resolução de problemas práticos no contexto escolar ensinaria sobre a convivência democrática, sem questionar as desigualdades sociais, naturalizando-as. A busca de soluções contribuiria tanto para a formação dos alunos quanto para o desenvolvimento da sociedade. Assim, Dewey traduzia para o campo da educação a ideologia liberal dos Estados Unidos.

William Kilpatrick (1871-1965) foi um dos principais discípulos

de John Dewey. Ele desenvolveu o “método dos projetos”, que era

centrado na atividade prática dos alunos, de preferência, manual.

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Os projetos poderiam ser: manuais, como a produção de uma maquete; de descoberta, como a realização de um passeio; de competição, como um jogo; de comunicação, como contar uma história; entre outros.

As etapas de execução do projeto envolveriam a determinação

do objetivo, a preparação do projeto, a execução e a apreciação

do resultado. Os projetos poderiam envolver a produção de algo,

a aprendizagem sobre como utilizar algo que já foi produzido, a

resolução de algum problema ou o aperfeiçoamento de alguma

técnica.

De preferência, o projeto deveria ser realizado em um ambiente

natural, próximo da situação real em que a prática em questão

ocorre na sociedade.

A educação funcional de Edouard Claparède

O médico Edouard Claparède (1873-1940) nasceu em Genebra,

na Suíça. Em 1912, fundou o Instituto Jean-Jacques Rousseau

naquela cidade. A instituição voltava-se para o desenvolvimento

de estudos na área da Psicologia Infantil e suas aplicações na

educação. Da mesma forma que John Dewey fez nos Estados

Unidos, Edouard Claparède procurou defender uma nova escola,

diferente da tradicional, no contexto europeu.

Enquanto Dewey ingressou nas questões educacionais por meio

da Filosofi a, Claparède o fez por meio de estudos em Biologia, o

que faz diferença na constituição de seus pontos de vista.

As idéias de Edouard Claparede são consideradas inatistas, ou organicistas, pois priorizam a maturação biológica na análise do desenvolvimento do sujeito, a qual é determinada pelo pertencimento à espécie humana. As características humanas teriam, assim, determinações inatas, e não históricas e sociais.

Jean Piaget veio a ser chefe de trabalhos deste instituto a convite de Edouard Claparède e lá realizou a maior parte de suas pesquisas.

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Assim como outros contemporâneos, Claparède via a Psicologia

como a única ciência que poderia de fato trazer informações

úteis para o direcionamento da educação. Esta deveria adaptar-

se às aptidões naturais do aluno e estimular seus interesses para

a busca de resolução de problemas da vida prática nos conteúdos

escolares. Nessa perspectiva, o interesse do sujeito tem muito

mais peso do que os conteúdos escolares em si, ainda que estes

sejam organizados a partir dos problemas que a vida coloca.

Claparède defendia que se conhecessem as características

“naturais” da criança, por meio da pesquisa experimental

psicológica, em uma visão claramente organicista.

Para Claparède, assim como para os demais representantes do movimento da Escola Nova infl uenciados pelo funcionalismo, o desenvolvimento de cada ser humano e de toda a espécie signifi ca uma luta ou uma procura pela conservação da vida, o que ocorre pela interação com o ambiente.

A vida corresponde a um processo de adaptação

contínuo, guiado pela lógica da utilidade e da efi ciência.

O pensamento seria uma atividade biológica a serviço

do organismo humano, que ocorre para confrontar

situações com as quais não se pode lidar por meio de

comportamento aprendido, automático ou simples

refl exo característico dos animais. Quando a pessoa se

defronta com uma situação nova, a tensão resultante a

leva a proceder por tentativa e erro, refi nando a experimentação

da situação. Este processo seria o pensamento.

Se a infância tem uma signifi cação biológica, é necessário estudar

as manifestações naturais das crianças e ajustar a ação educativa

a elas. Os métodos e programas devem girar em torno das

crianças, e não as crianças girar em torno de um programa.

De acordo com Claparède, a atividade educacional deveria

ser individualizada, correspondendo sempre à função vital do

homem, à expressão natural de sua atividade e desenvolvimento.

São chamadas organicistas as teorias que, ainda que não considerem a maturação biológica como sendo o único fator responsável pelas mudanças que ocorrem no ciclo vital, valorizam mais o desenvolvimento orgânico do que outros fatores como explicação para o desenvolvimento em geral.

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A escola deve estimular a independência intelectual da criança, fazendo-a atuar sobre o que aprende, diferentemente da postura passiva exigida do aluno na educação tradicional.

Claparède acusou a escola de não saber tirar o máximo rendimento

das inteligências, desperdiçando o capital intelectual das nações,

em um contexto no qual o investimento em educação vinha sendo

alto na Europa. Valorizava os testes de inteligência e o diagnóstico

psicológico como meios para conhecer as aptidões naturais dos

sujeitos e direcioná-los para uma educação mais adequada.

Para ele, as melhores inteligências seriam pouco desenvolvidas na

escola por se verem obrigadas a adaptarem-se ao ritmo do grande

número de alunos medianos. Recomendava a criação de classes

diferentes para os estudantes mais inteligentes e para aqueles

com maior difi culdade de aprendizado. Assim, os estudantes que

se revelassem mais aptos poderiam ser submetidos a exigências

maiores em classes constituídas apenas de bons alunos.

Ao defender uma escola sob medida, Claparède dizia que na

impossibilidade de haver uma escola para cada criança ou para

cada tipo de inteligência o sistema mais próximo disto seria o

que permitisse a cada aluno reagrupar o mais livremente possível

os elementos favoráveis ao desenvolvimento de suas condutas

pessoais. Para isso, pregava a redução do currículo obrigatório a

conteúdos sufi cientes para a transmissão de um conhecimento

que constituísse uma espécie de legado espiritual de uma mesma

geração, deixando a maior parte do período letivo para atividades

escolhidas pelo próprio aluno.

Claparède propôs ainda que um mesmo aluno pudesse acompanhar diferentes disciplinas em ritmos diferentes, mais acelerados ou mais lentos, de acordo com suas aptidões.

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Outra contribuição importante de Claparède é a defesa que fez

da atividade pedagógica como atividade lúdica. O jogo é uma

das principais necessidades da criança. Por isso, serviria como um

meio para despertar o seu interesse pelo conhecimento escolar.

Assim, seja qual for a atividade que se queira realizar na sala

de aula, deve-se encontrar um meio de apresentá-la como um

jogo, partindo da necessidade da criança de brincar. Conforme

a criança cresce, a idéia de jogo vai sendo substituída pela de

trabalho, seu complemento natural.

De acordo com Claparède, são as necessidades que movimentam

os indivíduos. Toda atividade desenvolvida pela criança é sempre

suscitada por uma necessidade a ser satisfeita e pela qual ela

está disposta a mobilizar energias. É isso que se pode notar em

todo lugar e sempre, exceto, é verdade, nas escolas, porque estas

estão fora da vida, dizia Claparède. Para fazer um indivíduo agir

devemos colocá-lo nas condições próprias ao aparecimento da

necessidade, em que a ação que se deseja despertar tem a função

de satisfazer. Cabe então ao professor colocar o aluno na situação

adequada para que seu interesse seja despertado e permitir que

ele adquira o conhecimento que vá ao encontro do que procura.

Desta forma, está se aproximando à escola da vida.

O educador, segundo Claparède (apud CARVALHO, 2002, p. 55):

Em vez de tornar-se um plasmador de espíritos, tornar-

se-á um estimulador de interesses; em vez de fi car

no meio do palco (onde muitas vezes pontifi ca, sem

outros resultados tangíveis, a não ser a satisfação de

suas tendências autoritárias), deverá, daí em diante,

permanecer nos bastidores, de onde disporá e organizará

o meio da maneira mais favorável ao despertar das

necessidades intelectuais e sociais da criança.

A escola, assim, deve promover a atividade como um laboratório,

e não a passividade, como um auditório. E, se o interesse é o

motor da educação, não são necessários castigos ou recompensas,

bastando a adequação entre o que se há de fazer e o sujeito que

fará. Nesta perspectiva, a disciplina vem de dentro do sujeito e

não de fora dele.

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Universidade do Sul de Santa Catarina

A criação de faculdades de Filosofi a e de cursos de Pedagogia

no Brasil nas décadas de 1940 e 1950 dava novo impulso à

Psicologia. Ocorreu aumento na importação de livros e o envio de

professores aos Estados Unidos para aperfeiçoamento, conforme

acordos estabelecidos entre os dois governos. Em seu retorno, os

estudantes traziam conhecimentos sobre a Psicologia experimental

do behaviorista J. B. Watson. Ela passou a ser estudada e

ensinada em disciplinas universitárias, preparando terreno para a

tecnologia educacional que foi amplamente aceita nos anos 1960,

fundamentada principalmente nos trabalhos de B. F. Skinner.

SEÇÃO 5 – O behaviorismo na educação

Nos anos 1960 e 1970, os interesses econômicos do Brasil

voltavam-se para a exportação de produtos industrializados. A

educação seria um fator de incremento da produtividade, pois a

mão-de-obra escolarizada se tornaria mais qualifi cada.

Na intenção de qualifi car a mão-de-obra especializada que

trabalharia nas indústrias e de garantir a rapidez e a efi ciência da

escolarização, o tecnicismo passou a dominar o campo educacional.

As técnicas educacionais valorizadas neste período basearam-se

no comportamentalismo e nas estratégias de ensino propostas

por Skinner. As máquinas de ensinar e a instrução programada

conquistaram prestígio. O condicionamento operante na escola

foi largamente utilizado e o planejamento do ensino levava em

consideração os estímulos a serem aplicados no alunado para

atingir objetivos determinados Nesta seção, você vai conhecer mais

sobre as idéias da Psicologia que fundamentaram essas práticas.

Os behavioristas procuram estudar os aspectos objetivos, observáveis e mensuráveis da atividade psicológica, deixando de lado aspectos subjetivos, considerados não mensuráveis. Por isso, seus partidários deixaram de lado o estudo da mente e voltaram-se para o estudo do comportamento.

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Unidade 1

O estudo do comportamento animal é parte

importante do behaviorismo. O comportamento

dos animais não pode ser pesquisado por

introspecção, já que os animais, naturalmente,

não podem narrar o que estão sentindo se

questionados sobre isso. Para conhecer a

psicologia animal, o método da observação,

defendido pelos behavioristas, acabou sendo o

caminho possível. Tal método foi também usado

pelos pesquisadores para o estudo dos seres humanos.

Para conhecer esta escola da Psicologia, é interessante

evidenciar que, desde 1860, pesquisadores russos chamados de

refl exologistas, como I. M. Sechenov (1829-1905), Ivan P. Pavlov

(1849-1936) e Vladimir Bechterev (1857-1927), já sustentavam

que o caminho adequado para estudar a aprendizagem era a

investigação fi siológica dos refl exos. Desses pesquisadores, o que

fi cou mais conhecido foi Ivan Pavlov.

Você já ouviu falar de Pavlov?

Estudando secreções digestivas em seu laboratório, Pavlov

observou eventos interessantes que ocorriam com a salivação dos

cães utilizados em seus experimentos e, a partir disso, passou a

pesquisar o que chamou de refl exos condicionados.

Em seu experimento mais famoso, demonstrou que um estímulo

inicialmente neutro, como o som de uma campainha, que não

está associado à salivação dos cães, poderia passar a produzir

esta resposta se a campainha fosse tocada juntamente com a

apresentação do alimento por repetidas vezes.

O processo de associação da campainha (estímulo - S) à salivação (resposta - R) foi denominado condicionamento.

Refl exo é o nome dado a comportamentos que disparam quando o indivíduo se encontra em determinadas situações. No bebê, por exemplo, o desconforto dispara o choro. Nos animais em geral, a presença do alimento dispara a salivação.

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John B. Watson (1878-1958) foi o principal divulgador do

behaviorismo. Ele entendia que se a observação objetiva era um

método adequado para conhecer o comportamento animal, por

que não utilizá-la com seres humanos?

Para Watson, o processo de condicionamento, isto é, a associação

de um estímulo inicialmente neutro a uma resposta, por meio

do treinamento ou repetição, era a chave para a compreensão do

comportamento. A afi rmação a seguir é famosa, e foi feita por

este pesquisador em um de seus livros – O behaviorismo (1925):

Dêem-me uma dúzia de crianças sadias e bem formadas

e o mundo por mim especifi cado dentro do qual criá-las,

e garanto que tomarei uma delas ao acaso e treiná-la-ei

para que se torne um especialista em qualquer tipo que

eu escolha – médico, advogado, dentista, comerciante,

bem como mendigo ou ladrão, - quaisquer que sejam

seus talentos, tendências, capacidade ou vocação. (apud

WERTHEIMER, 1989, p. 154).

Burrhus Frederic Skinner (1904-1990) foi o pesquisador

behaviorista mais conhecido. Suas idéias, originadas no

Behaviorismo clássico de Watson e nas pesquisas sobre

condicionamento de Pavlov, aprimoraram o estudo do

comportamento b, e estão vivas até hoje.

Figura 1.6 - Burrhus Frederic Skinner

Fonte: www.psychology.uiowa.edu

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Unidade 1

Skinner ultrapassou o condicionamento clássico, desenvolvendo o

que chamou de condicionamento operante.

O condicionamento clássico, como você pôde verifi car estudando

as idéias de Pavlov e de Watson, diz respeito à reprodução

de respostas naturais, como salivação ou medo, em situações

que antes não produziam estas reações. A associação é feita

diretamente entre estímulos e respostas, e nenhuma outra

variável é incluída.

No condicionamento operante, o comportamento do sujeito é modelado por suas conseqüências, que se constituem numa terceira variável, além do estímulo e da resposta.

Você compreenderá melhor isso se entender o conceito de reforço.

Reforço é tudo aquilo que aumenta a probabilidade de uma resposta associada anteriormente a um estímulo acontecer novamente. É a conseqüência dos comportamentos, como as recompensas, por exemplo, que costuma fazer com que eles se repitam.

Quando desejamos que um organismo tenha um

comportamento que não lhe é peculiar, começamos por

reforçar o desempenho que se aproxime do esperado,

premiando-o. Posteriormente, premiam-se somente

respostas mais específi cas e relacionadas ao objetivo,

deixando de lado as respostas próximas, porém não exatas.

A premiação tende a funcionar muito bem. Prêmios são

denominados, na teoria, de reforços positivos.

Comportamentos indesejáveis tendem a extinguir-se quando não

são premiados ou quando a conseqüência deles se apresenta como

um estímulo aversivo, isto é, um castigo ou punição.

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No condicionamento operante de Skinner, é possível também

reforçar um comportamento pela retirada de um estímulo aversivo

da situação em questão. A retirada de estímulos aversivos é

chamada de reforço negativo. Esta retirada também aumenta a

probabilidade de a resposta desejada ocorrer.

Para chegar a estes conceitos, Skinner utilizou-se de experimentos

que fi caram famosos, realizados com ratos de laboratório em um

equipamento que ganhou o nome de Caixa de Skinner. Cada rato

era colocado sozinho no interior da caixa, a qual era equipada com

um bebedouro acionável pelo experimentador ou pelo próprio rato,

na medida em que pressionasse numa pequena barra existente no

interior do equipamento.

Figura 1.7 – Caixa de Skinner

Fonte: http://www.str.com.br

Mas como ensinar o rato a pressionar a barra?

A estratégia era deixá-lo privado de água, isto é, com sede, antes

da realização do experimento. Em seguida, buscava-se treinar

o rato para pressionar a barra. A água lhe era oferecida cada

vez que este realizava comportamentos que se aproximavam

da pressão à barra. Mais adiante, a água era oferecida ao rato

somente se ele pressionasse a barra de fato. Observando as

conseqüências de seus comportamentos anteriores, o rato passava

a pressionar a barra com mais freqüência do que antes.

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Unidade 1

Este tipo de método, chamado de reforçamento, é muito usado

com os alunos na educação.

Aliás, dentre os behavioristas, o trabalho de Skinner é o que tem mais implicações educacionais.

Bazzo e Carvalho Neto (2003, p. 7) escrevem que, para Skinner:

as raízes dos problemas humanos mais relevantes e

desafi adores estariam na forma equivocada, inefi ciente e

amadora com que o comportamento humano é tratado

por aqueles que teriam a função de compreender e regular

as relações humanas. Desse modo, ter à disposição uma

tecnologia biológica efi caz de controle da natalidade

(uma pílula anticoncepcional, por exemplo), permitindo

potencialmente um planejamento familiar racional, seria

inútil se não houvesse uma tecnologia comportamental

equivalente para tornar mais provável que as pessoas

adotassem tais controles e passassem efetivamente a se

planejar para ter fi lhos. Para criar um espaço de refl exão

dessa natureza (pensando as possibilidades, a natureza

e as conseqüências de uma ciência do comportamento),

Skinner criou uma fi losofi a de uma ciência do

comportamento, conhecida como Behaviorismo.

A abordagem de Skinner teve profundo impacto nas tecnologias

de ensino, especialmente no que se refere à instrução

programada. O sujeito que se submete a este tipo de instrução

vai passando por etapas curtas de exposição a conteúdos com grau

de difi culdade crescente. Recebe o conteúdo, responde exercícios

e verifi ca os resultados obtidos com suas respostas para, só então,

passar à etapa seguinte. O resultado das respostas, positivo ou

negativo, funciona como incentivo para continuar o estudo, isto

é, um reforço positivo. O objetivo é levar o aluno a acumular o

maior número possível de respostas corretas em seu “repertório”.

É o material instrucional que orienta todo o processo de

aprendizagem, e não o interesse ou a atividade do aluno, ou as

características do conteúdo, entre tantas outras possibilidades.

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Os professores costumam, tradicionalmente, utilizar punições para modelar o comportamento dos sujeitos. Com a instrução programada, vai se tornando desnecessário utilizar estímulos aversivos ou punições para levar o aluno a desenvolver o comportamento desejado, pois ele mesmo vai modelando suas respostas de acordo com o que é solicitado pelo material instrucional. O planejamento do professor torna-se fundamental para o sucesso do processo de ensino e aprendizagem.

A instrução programada pode ser realizada por meio das

chamadas máquinas de ensinar. Nelas, são apresentadas fi chas

com sentenças que contêm lacunas a serem preenchidas com a

resposta correta. O conteúdo das fi chas pode ser apresentado

também em programas de computador.

Acesse o site http://www.ufrgs.br/faced/slomp/maquina %2Dde%2Densinar/ e observe um exemplo dessa tecnologia.

Em entrevista dada a uma revista brasileira, em 1974, Skinner

defi niu sua máquina de ensinar da seguinte maneira:

Minha “máquina de ensinar” consiste, muito

simplesmente, em programar o material didático de

maneira que o estudante seja recompensado pelos seus

esforços não no fi m do curso ou de seus estudos – o que

é causa de baixa produtividade –, mas em cada uma das

etapas de sua aprendizagem. Isto é, ao aprender uma

lição, o aluno não é recompensado pelos seus esforços um

mês depois, quando recebe a nota X, mas enquanto está

trabalhando na lição. Se um aluno pode ver a resposta

de um problema matemático apenas quando terminou

de resolvê-lo, ele é estimulado por vários fatores: o

triunfo de ter resolvido o problema corretamente ou o

descobrimento da resposta correta. Se ele fi ca esperando

a nota do professor, que deve ter um valor punitivo, ele

não tem verdadeiras razões positivas para se interessas por

problemas matemáticos. É fundamental entender que o

organismo humano, em relação com o seu comportamento,

é reforçado pela sua capacidade de efetividade.

(SKINNER, 1974)

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Psicologia e Educação

Unidade 1

Estudando o conteúdo desta seção, você pôde concluir que, para

o behaviorismo, a aprendizagem se refere a mudanças observáveis

no comportamento das pessoas, causadas unilateralmente pela

ação sobre elas do ambiente material e social. São as mudanças

de comportamento, ou aprendizagens acumuladas, que

correspondem ao desenvolvimento do sujeito. Assim, nesta teoria,

aprendizagem e desenvolvimento são termos sinônimos, pois se

referem ao mesmo processo coordenado por agentes externos ao

sujeito, estudante ou aprendiz.

Skinner é criticado até hoje por sua visão ambientalista da aprendizagem. As críticas tomam a proposta de Skinner de modelagem do comportamento como algo autoritário, que desconsidera o que se passa na mente do aprendiz, impondo a ele o desenvolvimento dos comportamentos socialmente valorizados. Isto retiraria do sujeito a sua liberdade de escolha.

Aos críticos, em um texto muito importante publicado em

1971, Skinner responde que a liberdade é um mito, e que cabe

à sociedade planejar, controlar e conduzir o comportamento,

como alternativa para manutenção da qualidade de vida. Por

causa destas idéias e da contribuição que elas deram para o ensino

tecnicista no Brasil, Skinner fi cou associado ao posicionamento

político de direita.

A concepção comportamentalista do desenvolvimento e da

aprendizagem está muito ligada à teoria behaviorista, pois

compreende a aprendizagem como um processo pelo qual o

comportamento dos indivíduos é modifi cado pelos estímulos

recebidos do meio em que está inserido. Este passa a produzir

respostas, isto é, a se comportar, de acordo com os incentivos

que recebe, os quais podem ser planejados a fi m de reforçar o

comportamento considerado adequado para cada situação.

Para o behaviorismo, é a organização das condições externas que determina o comportamento dos sujeitos.

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Entre as tantas frases ouvidas no cotidiano que podem ilustrar

esse pensamento, podemos pinçar as seguintes: “é de pequenino

que se torce o pepino”, “o conteúdo entrou (ou não entrou) na

cabecinha dele”, “você vai escrever esta palavra repetidas vezes

até aprender”, entre outras. Lendo estas frases, você percebe

que nelas é dada uma grande importância ao ambiente

externo, e nenhuma importância à atividade do sujeito, para a

modifi cação do seu comportamento.

Nas práticas pedagógicas comportamentalistas, a ênfase é dada

ao planejamento e à organização das condições em que se dará

a aprendizagem, sendo estes os aspectos centrais do processo.

O papel do professor é organizar a seqüência do ensino,

programando-o de modo a atender aos objetivos que almeja

alcançar em termos de respostas dos alunos. O objetivo das

situações de aprendizagem, nesta concepção, é fazer com que

os alunos reproduzam respostas consideradas corretas para as

questões apresentadas pelos professores. O professor deve escolher

os reforçadores positivos e negativos que serão utilizados com o

objetivo de estimular os alunos a produzirem respostas adequadas.

E hoje, será que a Psicologia continua se relacionando com a Educação? Entre no portal da Secretaria da Educação do seu município ou estado e verifi que se este disponibiliza o documento que traz a proposta curricular norteadora das ações educativas em sua região. Nesta proposta, verifi que se são citados conceitos de teorias psicológicas que você já estudou ou sabe que irá estudar. Você poderá observar como o conhecimento psicológico vem sendo usado atualmente (ou não) nas políticas educacionais existentes em nosso país.

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Unidade 1

Atividades de auto-avaliação

Efetue as atividades de auto-avaliação e, a seguir, acompanhe as respostas e comentários. Para melhor aproveitamento do seu estudo, confi ra suas respostas somente depois de fazer as atividades propostas.

1 – Na seção 1, abordamos a transformação da escola numa instituição de massas. Você observou que os especialistas em educação foram tornando sua atuação cada vez mais minuciosa, e utilizaram, neste processo, conhecimentos da psicologia. Segundo o que foi trabalhado na seção 1, quais eram os objetivos destes especialistas?

2 - Para Claparède, os conceitos de necessidade e de interesse aparecem relacionados no contexto da prática pedagógica. Defi na e estabeleça relações entre estes conceitos, procurando ser fi el ao pensamento do pesquisador.

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3 – Você estudou o funcionalismo na seção 1. Explique por que Edouard Claparède e John Dewey são tidos como funcionalistas.

4 – Existem diferenças sutis entre o ponto de vista de John Dewey e o de Edouard Claparède sobre o papel da educação e do trabalho docente para o desenvolvimento humano. Você identifi cou essas diferenças? Procure caracterizá-las, indo além do exposto na síntese da unidade.

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Unidade 1

5 - Verifi que se você captou os conceitos apresentados na descrição da Psicologia da Gestalt e do Behaviorismo! Que tal sistematizar o seu conhecimento com a ajuda do quadro a seguir?

ESCOLA OU TEORIA PALAVRAS-CHAVE

PSICOLOGIA DA FORMA/GESTALT

BEHAVIORISMO

Síntese

Nesta unidade, você estudou como a escola se desenvolveu e se tornou

uma “escola de massas”. Você conheceu também o Funcionalismo de

John Dewey e de Edouard Claparède, representantes do movimento

escolanovista, que muito infl uenciou o pensamento educacional

brasileiro. Estudou também as características gerais, os conceitos

fundamentais e as implicações para o estudo do desenvolvimento e

da aprendizagem de certas teorias psicológicas. Entre elas, estão o

Behaviorismo e a Psicologia da Gestalt. Desta forma, você percorreu a

primeira parte da historia das relações entre a psicologia e a educação na

realidade brasileira, correspondente ao período de 1920 aos anos 1970.

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2UNIDADE 2

A Psicologia e as tendências pedagógicas liberais

Objetivos de aprendizagem

Conhecer os principais conceitos da psicanálise, do humanismo e do cognitivismo.

Relacionar conteúdos estudados na unidades 1 com as tendências pedagógicas liberais que infl uenciaram a educação brasileira.

Seções de estudo

Seção 1 A psicanálise

Seção 2 O humanismo e a tendência pedagógica não-diretiva

Seção 3 O cognitivismo

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Para início de estudo

Percorrendo a história das relações entre Psicologia e Educação,

você conheceu um conjunto de teorias a partir das quais a

compreensão sobre o processo de ensino e de aprendizagem nas

escolas foi sendo construída.

Há outras teorias que fazem parte da história da Psicologia

como ciência que trazem implicações tanto para as tendências

pedagógicas quanto para a compreensão do relacionamento

professor-aluno e das difi culdades de aprendizagem. Essas teorias

são a psicanálise, o humanismo e o cognitivismo.

Nesta unidade, você conhecerá os conceitos básicos destas três

teorias e estabelecerá relações entre os conteúdos estudados

nas seções seguintes e na unidade anterior com as tendências

pedagógicas liberais que infl uenciaram a educação brasileira.

Você verá que diferente da psicanálise, que é utilizada na

educação mais para a compreensão do relacionamento entre o

professor, o aluno e o conhecimento, principalmente no que

diz respeito às difi culdades de aprendizagem, o humanismo e

o cognitivismo, por sua vez, relacionam-se com as tendências

pedagógicas de uma forma mais próxima.

SEÇÃO 1 – A psicanálise

A psicanálise desenvolveu-se a partir do trabalho de Sigmund

Freud (1856-1939). Este médico propôs a psicanálise, com suas

técnicas de hipnose, expressão e associação livre de idéias pelos

pacientes, como uma proposta terapêutica para os distúrbios

emocionais e também como uma via de investigação dos

processos mentais.

Sigmund Freud distinguiu três zonas do funcionamento mental:

o consciente, o subconsciente e o inconsciente.

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Unidade 2

No inconsciente, situam-se as representações inacessíveis

voluntariamente. Os seus conteúdos aparecem disfarçados nos

sonhos, nos atos falhos, nos sintomas, mas nunca aparecem em

forma pura. Os conteúdos do inconsciente estão relacionados ao

que foi denominado por Freud de Id.

O consciente e o subconsciente estão reunidos em uma região psíquica denominada Ego.

O ego administra a relação do indivíduo com o meio,

coordenando os seus processos mentais e dando-lhe a unidade de

uma identidade. Os conteúdos conscientes e subconscientes são

acessíveis voluntariamente pelo sujeito. É possível para o sujeito

saber razoavelmente o que está pensando ou sentindo a respeito

dos conteúdos que estão em sua consciência.

A instância psíquica responsável pela censura gratuita aos

conteúdos do id é o Superego. Esta instância é constituída a

partir do moralismo e das repressões da sociedade.

A psicanálise preocupa-se com o funcionamento do inconsciente, diferentemente de outras linhas psicológicas que se debruçam sobre o funcionamento da mente tomando-a exclusivamente como consciência.

Freud apontou a existência de instintos inatos no

ser humano quando do seu nascimento, que o

estimulam internamente a buscar a satisfação de

necessidades como fome, sede e liberação de energia

sexual. Os instintos são os propulsores da dinâmica

de desenvolvimento da personalidade. Como Freud

identifi ca o termo instinto com as características

animais, prefere usar os termos impulso ou pulsão

para tratar desses estímulos internos quando se refere

aos seres humanos.

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Devido ao funcionamento do id, os seres humanos estariam

sempre em busca de satisfação para seus impulsos, pois o id

ignora juízos de valor, a moral, o bem e o mal, sendo regido pelo

princípio do prazer.

O ego desempenha o papel de mediador entre o id e o mundo

exterior, sendo regido pelo princípio da realidade. Toda vez que

o ego se sente ameaçado pelas exigências de satisfação imediata

do id, este produz a sensação de angústia. Tanto o id quanto o ego

confl itam com o superego, a instância moralista que já foi citada.

Para não sucumbir à sensação de angústia provocada pela pressão

das pulsões, o ego utiliza certos mecanismos de defesa que

acabam por constituir em grande parte a personalidade.

São exemplos desses mecanismos: a negação, a fantasia, a

projeção, a racionalização, a regressão, entre outros.

Procure saber mais sobre os mecanismos de defesa. Pesquise na internet o signifi cado de cada um desses termos e procure criar exemplos que os ilustrem, discutindo os exemplos com seus colegas no EVA.

Estágios do desenvolvimento psicossexual

De acordo com a teoria psicanalítica, o desenvolvimento da

personalidade passa pelos seguintes estágios psicossexuais:

estágio oral – estende-se do nascimento até o segundo ano de vida. Neste estágio, a estimulação da boca é a fonte primária de satisfação erótica.

estágio anal – coincide com o período de treinamento para aprender a ir ao banheiro autonomamente e de desenvolvimento de competências para a higiene pessoal.

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Unidade 2

estágio fálico – acontece por volta do quarto ano de idade. A satisfação erótica está relacionada à região genital e surge muita curiosidade em torno das diferenças entre os sexos e sobre, por exemplo, a origem dos bebês. É quando costuma ocorrer o chamado Complexo de Édipo, que consiste na identifi cação com o genitor do sexo oposto. É também o estágio em que se desenvolve o superego, que infl ige à criança vergonha e culpa.

período de latência – dos 5 aos 10 anos, aproximadamente. Caracteriza-se por maior interesse em questões intelectuais e pela sublimação do interesse por questões sexuais que caracterizava o estágio anterior. A sublimação também é um mecanismo de defesa.

estágio genital – preparação para a formação de família, início dos relacionamentos amorosos e da heterossexualidade.

A partir desta estrutura teórica proposta por Freud, muitos

trabalhos vêm se desenvolvendo até hoje no sentido da

compreensão do ser humano. No campo da educação, os

conceitos propostos por Freud são largamente utilizados para a

compreensão e intervenção sobre as difi culdades de aprendizagem

pela psicopedagogia clínica.

A psicopedagogia clínica, ao inspirar-se na psicanálise, entende as difi culdades de aprendizagem como sintomas. Como vimos, os sintomas são uma das formas de expressão dos conteúdos do Id, conteúdos estes que não são conscientes e, portanto, não podem ser controlados pelo sujeito.

A psicanálise também é acionada para a compreensão

das questões subjetivas que envolvem o relacionamento

professor-aluno. O conceito de transferência, tomado da

psicoterapia psicanalítica, costuma ser utilizado para tratar

dessa relação. A transferência é entendida como uma

repetição pelo sujeito, em suas relações atuais, de modalidades de

relacionamento vividas por ele com outras fi guras signifi cativas e

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outros espaços. Pelo processo de transferência, relações infantis

carregadas de afetividade podem ser revividas no relacionamento

com outras pessoas, mesmo muito tempo depois ou em um

contexto completamente diferente.

Assim, um professor pode ser um suporte dos

investimentos de seu aluno, porque é objeto de uma

transferência. Então, mais além da fi gura pessoal do

professor, o educador vai representar, para o aluno, uma

função, substituindo, nesse momento, as fi guras parentais

e/ou pessoas que lhe foram importantes, representando

então esse lugar de ‘saber’, de idealização, de poder

(NUNES, 2004).

O professor que conhece o conceito de transferência pode

compreender atitudes agressivas ou despropositadamente

amorosas que partam de um aluno para com ele. Nem sempre

essas atitudes são realmente pessoais para com o professor, mas

sim correspondentes a um estilo de relacionamento que o aluno

está repetindo, resgatado de relações passadas, vividas em outros

espaços ou, ainda, que o aluno gostaria de viver e não consegue

na relação com outras pessoas. Desta forma, seus desejos

inconscientes projetam-se na fi gura do professor. É interessante

lembrar que tal processo também pode se dar da parte do

professor em relação ao aluno.

A psicanálise é uma abordagem muito interessante da subjetividade, com diversas implicações ainda não exploradas. Desde a década de 1950, no entanto, ela enfrenta a oposição do humanismo.

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Unidade 2

SEÇÃO 2 – O humanismo e a tendência pedagógica não-diretiva

O humanismo surgiu na década

de 50 como uma reação tanto ao

behaviorismo quanto à psicanálise.

A psicologia humanista concentra-

se no conceito de pessoa e não

no de comportamento, como o

behaviorismo, e enfatiza a liberdade

em oposição ao controle.

O humanismo rejeita a psicanálise pela ênfase excessiva que dá ao

inconsciente. Acredita que as pessoas são seres conscientes, capazes

de dirigir a própria vida. Enfatiza a espontaneidade e o poder criador

do ser humano.

O mais famoso representante desse movimento é Carl Rogers. Para

ele, o principal fator promotor do desenvolvimento da personalidade

é uma tendência inata dos seres humanos para a auto-realização.

As pessoas que vivem todo o seu potencial são aquelas que vivem

plenamente cada momento, deixando-se guiar por seus próprios

instintos, em lugar de levar em consideração opiniões alheias. São

pessoas de pensamento livre e alta criatividade. O pensamento

de Carl Rogers infl uenciou a educação centrada no aluno e

espontaneísta, sendo mais uma contribuição da psicologia à busca por

uma escola renovada.

Libâneo (1989), ao analisar as tendências pedagógicas que tiveram

aplicações no contexto brasileiro, situa o humanismo, na educação,

como relacionado a uma das tendências pedagógicas liberais.

Entender por que o Humanismo se relaciona à tendência liberal

auxilia a compreender como ele, apesar de ser interessante pelo valor

que dá ao aspecto de desenvolvimento humano presente na educação

e às questões atitudinais e de postura do sujeito frente à vida, tem um

aspecto bastante individualista e desconectado da crítica às relações

sociais que caracterizam o capitalismo.

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A pedagogia liberal, conforme Libâneo (1989), sustenta a idéia

de que a escola tem por função preparar os indivíduos para o

desempenho de papéis sociais, de acordo com as aptidões individuais.

Esta visão pressupõe o desenvolvimento da cultura individual

para que o sujeito possa adaptar-se aos valores e normas vigentes

na sociedade capitalista. As diferenças entre as classes sociais não

são discutidas, pois embora a pedagogia liberal difunda a idéia de

igualdade de oportunidades, não leva em conta a desigualdade de

condições existente no capitalismo.

O humanismo está relacionado a um tipo específi co de tendência

pedagógica liberal, denominado por Libâneo de ‘Tendência

Liberal Renovada Não-diretiva’. Acompanhe a seguir a descrição

das características desta tendência.

Tendência Liberal Renovada Não-diretiva

Na tendência liberal renovada näo-diretiva ganha evidência o

papel da escola na formação de atitudes. Todo o esforço da escola

deve visar a uma mudança dentro do indivíduo, ou seja, a uma

adequação pessoal às solicitações do ambiente.

Aprender é modifi car suas próprias percepções. Apenas se

aprende o que estiver signifi cativamente relacionado com essas

percepções. A retenção se dá pela relevância do aprendido em

relação ao “eu”, o que torna a avaliação escolar sem sentido,

privilegiando-se a auto-avaliação. Trata-se de um ensino centrado

no aluno, sendo o professor apenas um facilitador.

Conforme Libâneo, entre as tendências liberais que infl uenciaram

a educação brasileira, além da tendência liberal “renovada

não-diretiva”, podemos identifi car a tendência “tradicional”, a

tendência “renovada progressivista” e a tendência “tecnicista”.

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Unidade 2

Tendência Liberal Tradicional

A tendência liberal tradicional se caracteriza por acentuar o ensino

humanístico, de cultura geral. Na escola tradicional, o aluno é

educado para atingir sua plena realização por meio de seu próprio

esforço. Sendo assim, como caracteriza a pedagogia liberal, as

diferenças de classe social não são consideradas na avaliação do

processo de ensino-aprendizagem. Além disso, não há preocupação

em relacionar a prática escolar com o cotidiano do aluno.

Quanto aos pressupostos de aprendizagem, há a idéia de que o

ensino consiste em repassar os conhecimentos para o espírito da

criança e de que a capacidade de assimilação da criança é idêntica

à do adulto, sem levar em conta as características próprias de

cada idade. A criança é vista, desta forma, como um adulto em

miniatura, porém, menos desenvolvida.

Na tendência tradicional, a atividade pedagógica está centrada no

professor, diferentemente do que propõe o humanismo.

Tendência Liberal Tecnicista

A escola liberal tecnicista, segundo Libâneo (1989), atua no

aperfeiçoamento da ordem social vigente e do sistema capitalista,

articulando-se diretamente com o sistema produtivo. Para isto,

emprega o behaviorismo, que você estudou na unidade 1. Como

visto, o behaviorismo se considera uma ciência de mudança do

comportamento por meio de tecnologias de ensino.

No tecnicismo, o principal interesse é produzir indivíduos

capacitados para o mercado de trabalho. Não há preocupação em

promover mudanças sociais que tornem o trabalho mais adequado

às necessidades dos grupos sociais.

A reforma do ensino que ocorreu no Brasil com a LDB de

1971 implantou a escola tecnicista no Brasil. Ao basear-se no

behaviorismo, a escola tecnicista vê o aluno como depositário

passivo dos conhecimentos, que devem ser acumulados na mente

por meio de associações. Como você já sabe, Skinner foi o expoente

principal dessa corrente psicológica em que se preconizou uma

educação programada.

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Tendência Liberal Renovada Progressivista

A tendência liberal renovada progressivista, também chamada

de pragmatista, conforme Libâneo, acentua o sentido da cultura

como desenvolvimento das aptidões individuais.

A escola continua, dessa forma, a preparar o aluno para assumir

seu papel na sociedade, adaptando as necessidades do educando

ao meio social. Deve reproduzir características da realidade

social, para que o sujeito vivencie as situações que o prepararão

para o papel que assumirá na sociedade do futuro. Por isso, nesta

tendência, a escola deve imitar a vida.

Na escola renovada progressivista, defende-se a idéia de aprender

fazendo. A atividade pedagógica está centrada no aluno,

valorizando as tentativas experimentais, a pesquisa, a descoberta

e o estudo do meio natural e social. Os interesses do aluno são

colocados em evidencia e devem ser o ponto de partida do ensino.

Na unidade 1, você estudou as idéias dos funcionalistas da

Escola Nova. As idéias de John Dewey compõem a tendência

liberal renovada progressivista. Se você voltar a esse conteúdo

na unidade 1, perceberá como os valores democráticos presentes

nas idéias desse pensador valorizam por demais os interesses

individuais (o que as situa como liberal), propõem uma escola

nova em relação à escola tradicional (o que a situa como

renovada) e compactuam com a visão de progresso difundida

pelos defensores das relações de trabalho capitalistas.

As relações de trabalho capitalistas, como defendeu Karl

Marx, podem ser consideradas relações de assalariamento e de

exploração da força de trabalho dos trabalhadores pelos donos

dos meios de produção. O “progresso”, nas relações capitalistas,

segundo Marx, benefi cia somente os capitalistas, e não os

trabalhadores.

A tendência liberal renovada progressivista foi reforçada, ao longo

do século XX, pelas idéias cognitivistas sobre a aprendizagem.

Ainda de acordo com essa tendência pedagógica, identifi camos

como pressupostos de aprendizagem os seguintes aspectos:

aprender se torna uma atividade de descoberta;

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a aprendizagem é mais uma auto-aprendizagem do que algo que dependa do ensino e das relações com sujeitos mediadores, como o professor;

o ambiente é apenas um meio estimulador.

Para a tendência renovada progressista, só é retido aquilo que se

incorpora à atividade do aluno por meio da descoberta pessoal.

O que é incorporado passa a compor a estrutura cognitiva

para ser empregado em novas situações. Estudar mais sobre o

cognitivismo, linha de estudos da psicologia que reforça essas

idéias, pode ajudar você a compreender melhor o que estamos

referenciando.

SEÇÃO 3 – O cognitivismo

A psicologia cognitivista é um dos mais recentes ramos

da investigação da mente e do comportamento humano.

Desenvolveu-se como uma área separada desde os fi ns dos anos

1950 e princípios dos anos 1960. O pesquisador americano

Ulrich Neisser, nascido em 1928, foi um importante expoente

desta linha da psicologia.

O cognitivismo estuda os artifícios de processamento da

informação e de organização do conhecimento pelo ser

humano. Busca compreender os diferentes estilos de pensamento

e estilos de aprendizagem.

As investigações dos cognitivistas se baseiam na análise do

funcionamento dos processos psicológicos cognitivos. Nesta seção,

vamos conhecer um pouco mais sobre cada um desses processos

psicológicos, que também são chamados de processos mentais.

Você sabe o que são processos mentais?

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De certa forma, mesmo que nunca tenha ouvido falar deste termo,

você sabe o que são processos mentais. Sabe por que você os vive e,

muitas vezes, refl ete sobre o seu funcionamento em seu cotidiano.

Quando dizemos para nós mesmos: “Hum, minha memória não

anda boa! Esqueci de buscar meu fi lho na escola!” ou “Puxa,

não posso me distrair, este assunto é importante! Vou concentrar

minha atenção na leitura desta seção deste livro!”, estamos

falando de nossos próprios processos mentais.

No cognitivismo, os processos mentais são comparáveis aos

softwares executados em um computador que, neste caso, seria

o cérebro. Os processos mentais são responsáveis pelo conjunto

de competências cognitivas que diferenciam o ser humano dos

outros animais. As capacidades cognitivas permitem que os

humanos acessem e conheçam as características da realidade que

os cerca, obtendo, armazenando e utilizando, de modo mais ou

menos inteligente, a informação sobre essa realidade.

Os processos mentais, combinados e desenvolvidos de modo

singular em cada ser humano, nos tornam capazes de resolver

problemas de lógica, de lembrar de nossos entes queridos e de

nossa história pregressa, de perceber diferenças sutis entre dois

aromas ou dois padrões de cores. Entre esses processos estão a

atenção, a percepção, a memória, o pensamento, a linguagem e a

imaginação.

O controle consciente do funcionamento de nossos próprios processos mentais e a refl exão sobre eles é chamada de metacognição. A capacidade de metacognição é fundamental para que o sujeito seja capaz de resolver os problemas que se apresentam a ele na realidade e para realizar muitas das tarefas que se impõem no cotidiano.

A atenção é um processo mental de grande importância para a

aquisição de conhecimento. É este processo que confere ao sujeito

a capacidade de concentrar o esforço mental em um estímulo

específi co, deixando de lado outros estímulos que não merecem

ser considerados para a realização da tarefa em questão. Esses

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Unidade 2

estímulos desconsiderados costumam permanecer como um “pano

de fundo”. Os psicólogos da Gestalt, que você estudou na unidade 1,

foram precursores do cognitivismo e estudaram a fundo os processos

mentais de atenção e de percepção.

Os pesquisadores cognitivistas buscam compreender que fatores

infl uenciam na concentração dos sujeitos. O tempo de concentração

possível em cada fase da vida e em diferentes situações é um dos

fatores pesquisados. As crianças da educação infantil, por exemplo,

podem concentrar a atenção em um determinado estímulo por menos

tempo do que as crianças que já freqüentam o último ano das séries

iniciais. A motivação para aprender sobre aquele estímulo, no entanto,

faz diferença para a defi nição do tempo de concentração.

A memória é outro processo mental, responsável por armazenar e

recuperar no momento certo as nossas representações das experiências

vividas ou transmitidas por outras pessoas. Isto pode acontecer de

diferentes maneiras, por muito ou pouco tempo, o que depende da

relevância da informação, do contexto em que foi aprendida, do

signifi cado atribuído à informação, entre outros fatores.

Os estudos dos cognitivistas sobre o processo mental da memória chegaram à formulação de diferentes conceitos: memória de curto e de longo prazo, memória episódica, memória semântica, memória autobiográfi ca, entre outros.

O processo mental de memória já foi muito mais valorizado pela

educação. “Decorar” um conteúdo já foi mais importante do que

o é hoje. Atualmente, processos como pensamento, linguagem e

imaginação têm assumido maior relevância nos estudos realizados

pelas teorias psicológicas que fundamentam práticas pedagógicas.

De qualquer modo, sem a memória não saberíamos nem mesmo quem

somos, como se evidencia nas situações de sujeitos que sofrem lesões

e tornam-se vítimas de amnésia. Assim, atenção e memória nunca

perderão sua relevância para que ocorra a aprendizagem.

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O pensamento é o processo mental compreendido pelo

cognitivismo como responsável pela capacidade de comparar

objetos e conceitos, generalizar o que vale em uma situação para

outras situações semelhantes, abstrair elementos em comum de

diferentes experiências, relacionar diferentes situações, analisar

um determinado contexto, entre outras operações. É um processo

mental bastante complexo, que depende dos demais e se desenvolve

mais tarde do que a atenção voluntária e a memória na criança.

Aprender a pensar e resolver problemas, e não somente a dar as respostas consideradas corretas, constituiu-se como um dos grandes objetivos da educação por infl uência do cognitivismo.

Os processos mentais cujas características foram esboçadas aqui

de modo introdutório são estudados pelas teorias psicológicas

em geral. O cognitivismo, no entanto, é uma linha da Psicologia

que se caracteriza por destacar esses processos e estudá-los,

isoladamente e em sua inter-relação.

Jerome Bruner e Jean Piaget são citados como cognitivistas, mas

muitos estudiosos entendem que a concepção de aprendizagem

nutrida por eles transcende o mero cognitivismo, por valorizar

aspectos que vão além do funcionamento dos processos mentais

para que o conhecimento seja construído, em especial, as

interações sociocognitivas.

Nas próximas páginas, você conhecerá mais sobre as idéias de

Jerome Bruner.

Jerome Bruner é conhecido por ter desafi ado o behaviorismo e

sustentado a proposta cognitivista, tornando-a conhecida como

forma de compreender o processo de aprendizagem.

Aprendizagem e compreensão são sinônimos na teoria de

Bruner, e a compreensão é um processo interno ao sujeito, que

depende de seus processos cognitivos e de sua ação sobre o

objeto de conhecimento. Deste modo, Bruner diverge da posição

behaviorista, segundo a qual a aprendizagem é a aquisição de

respostas a partir da ação do meio externo sobre o sujeito.

Jerome Bruner é um autor cognitivista cujas idéias acerca da aprendizagem foram infl uenciadas pela psicologia da Gestalt e divulgadas em duas obras de garnde impacto no mundo da educação: The process of education (1962) e Toward a theory of instruction (1966).

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Unidade 2

Para Bruner, a proposta behaviorista de uma instrução

programada, envolvendo o controle por meio de recompensas, não

é capaz de provocar uma verdadeira motivação para o trabalho,

como defendia Skinner. Os conteúdos aprendidos por descoberta,

estes sim, teriam o potencial de serem generalizados para as mais

variadas situações, favorecendo a recuperação de informações pela

memória, já que tais informações passaram a compor a estrutura

cognitiva por uma construção do próprio aprendiz.

Os conceitos básicos utilizados por Bruner para explicar como

ocorre o processo de aprendizagem são: motivação, estrutura,

seqüência e reforço.

A motivação é a vontade de aprender que aparece na criança

na forma de curiosidade, competência e reciprocidade. A

curiosidade é um impulso vital que deve ser orientado pelo

professor. A competência é inata e responsável por nosso interesse

em atividades nas quais nos saímos bem. A reciprocidade é a

necessidade de trabalhar em grupo.

O conceito de estrutura corresponde à organização do

conteúdo a ser ensinado. É a atividade do professor organizar

o assunto a ser tratado com atenção ao modo de apresentação,

à economia de apresentação e ao poder de apresentação. O

modo de apresentação deve ajustar-se à experiência da criança

e ao tipo de assunto. A informação a ser fornecida ao aluno

deve ser econômica, quantifi cada de acordo com a necessidade

para avançar à próxima etapa da aprendizagem. O poder

da apresentação está em levar o aluno a estabelecer novas

relações entre os conteúdos estudados e destes com os outros

conhecimentos que já possui.

A seqüência diz respeito à idéia de Bruner de que, embora não

exista um ordenamento único no qual o conhecimento deve ser

apresentado ao aprendiz, sendo a melhor seqüência variável de

acordo com quem aprende, ainda assim, o grau de complexidade

da compreensão poderia ser indicado para a formulação da

seqüência de conteúdos a ensinar. Para Bruner, a compreensão

inicia com a representação motora do objeto de conhecimento,

passando pela representação icônica ou imagética e chegando

à representação simbólica, seqüência que o currículo de ensino

também poderia seguir.

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O conceito de reforço é apresentado por Bruner de modo diferente

de como o behaviorismo o apresenta. O reforço é o conhecimento

sobre os próprios resultados. É a informação que o sujeito recebe

sobre seus resultados no processo de aprendizagem e sobre o valor

de tê-los atingido para o avanço aos próximos objetivos.

Bruner compartilha com outros pesquisadores cognitivistas

a idéia de que o sujeito que aprende é ativo e, a partir de seus

conhecimentos prévios, pode construir, por meio de sua própria

ação, novos conceitos. Para ele, o aprendiz seleciona e transforma

a informação, compondo a sua estrutura cognitiva.

Desta forma, para Bruner, a aprendizagem implica a realização

de um conjunto de ações cognitivas que põem em movimento

todos os processos mentais para compreender a realidade.

O autor valoriza duas idéias: a de aprendizagem por descoberta, da qual já tratamos na seção anterior, e a de currículo em espiral.

Falar em currículo em espiral signifi ca dizer que o currículo

deve organizar-se de modo que o aluno possa ter acesso e

trabalhar de forma periódica os mesmos conteúdos, sendo que,

a cada nova oportunidade, eles são trabalhados com maior

profundidade. Desta forma, o aluno pode qualifi car cada vez

mais as categorias que vem construindo. Isto mostra que Bruner

não valoriza apenas a descoberta de conceitos novos, mas também

o aprofundamento dos conceitos já aprendidos.

Quanto à aprendizagem por descoberta, o autor a defende porque

acredita que esta pode liberar o estudante de expectativas quanto

à existência de uma única resposta correta, havendo sempre uma

nova abordagem para o conhecimento e a possibilidade de que

o aluno coloque em ação toda a sua capacidade cognitiva para

buscar conhecer. A aprendizagem por descoberta, de acordo

com Bruner, é sempre mais duradoura do que outras formas de

aprendizagem.

A estrutura cognitiva corresponde aos esquemas ou modelos mentais constituídos pela inter-relação dos conceitos aprendidos, que se organizam na forma de uma rede.

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Unidade 2

Para a aprendizagem signifi cativa, o autor recomendou que

o professor utilizasse perguntas como método educativo. As

questões deveriam ser colocadas de modo a levar o aluno a

descobrir por ele mesmo as soluções para os problemas.

Quanto ao aprendiz, se o processo de ensino está ocorrendo

adequadamente, aquele deverá:

ter clareza sobre o objetivo da aprendizagem;

vivenciar o processo em um clima de constante desafi o, sem sentir nem demasiada difi culdade nem demasiada facilidade;

sentir-se capaz de realizar a tarefa;

contar com a ajuda dos colegas;

explorar ativamente alternativas para a solução do problema; e

contar com a orientação do professor, que coloca questões que possam levar à descoberta de soluções.

As idéias do cognitivista Jerome Bruner, assim como

as idéias do escolanovista John Dewey, estudadas na

unidade 1, infl uenciaram a pedagogia de projetos, muito

utilizada nos dias de hoje na educação em todos os níveis,

e principalmente na educação infantil, para ampliar as

possibilidades de aprendizagem.

Estudando as idéias de Jerome Bruner é possível perceber

que, para os cognitivistas, o papel do ensino é aumentar o

número de conhecimentos dos alunos. A aprendizagem é vista

como um processo ativo do aprendiz. Este é visto como um

sujeito que recolhe, seleciona, processa e armazena a informação

por meio de seus próprios processos mentais. O modelo de

processamento de informação, ao comparar o cérebro a um

sistema computacional, coloca o indivíduo e seus processos

mentais como centrais para que a aprendizagem ocorra.

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Para o cognitivismo, é condição básica para que ocorra a

aprendizagem a intenção do sujeito, mesmo que involuntária,

de tornar coerente aquilo que lhe surge como incoerente. É esta

aparente incoerência que o levará a ter o insight que transforma

em um todo coerente o que antes era ilógico. No processo de

aprendizagem, assim, há uma reestruturação do sistema cognitivo

do sujeito para atender à nova percepção da realidade.

Aprender é compreender e resulta da capacidade humana de

adquirir, transformar e avaliar informações que obtemos da nossa

experiência com o mundo. Para os cognitivistas, os estímulos

não infl uenciam mecanicamente o indivíduo e sua aprendizagem.

Esta acontece pela ação do sujeito, e não pela infl uência do meio.

O importante não é levar o aluno a executar uma seqüência de

comportamentos adequados, como propunha o behaviorismo,

mas sim promover a sua compreensão da estrutura da matéria em

questão. A estrutura da matéria é a inter-relação dos signifi cados

que a compõem.

A aprendizagem, para os cognitivistas, é algo que o aluno faz que aconteça ao manejar a informação recebida de modo organizado para que o conhecimento seja mais duradouro e resistente ao esquecimento. O principal objetivo da escola, nesta perspectiva, é o desenvolvimento intelectual do aluno, proporcionando-lhe conhecimentos signifi cativos e relevantes.

Os trabalhos dos cognitivistas permitiram à Psicologia da

Educação desenvolver métodos pedagógicos para ensinar a

pensar, para desenvolver estratégias de resolução de problemas e

ajudar o aluno a aprender a aprender. No entanto, os cognitivistas

deixaram de lado as implicações do ambiente sociocultural e das

interações sociais sobre o processo de aprendizagem.

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Unidade 2

Atividades de auto-avaliação

1 – Ao estudar a psicanálise, você observou que o ego se utiliza de mecanismos de defesa para fazer frente a impulsos inconscientes. Retome os conceitos de ego, de inconsciente e de mecanismos de defesa estudados na seção 1. Busque na internet ou em livros de Psicologia uma relação de mecanismos de defesa identifi cados por Sigmund Freud. Procure criar um exemplo de um dos mecanismos de defesa identifi cados.

Exemplo:

2 – Para avaliar se você realmente compreendeu as características das tendências pedagógicas liberais, relacione cada tendência com a teoria psicológica correspondente, numerando:

(1) Tendência pedagógica liberal renovada progressivista

(2) Tendência pedagógica liberal renovada não-diretiva

(3) Tendência pedagógica liberal tecnicista

( ) Humanismo de Carl Rogers

( ) Funcionalismo de John Dewey e de Edouard Claparede

( ) Behaviorismo

( ) Cognitivismo

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3 – Para Bruner, o currículo ideal seria organizado em espiral, em uma seqüência que fosse capaz de levar o aluno à compreensão dos conteúdos. A partir desta idéia, relacione o conceito de SEQÜÊNCIA com o conceito de CURRÍCULO ESPIRAL.

Síntese

Nesta unidade, você estudou os principais conceitos da

psicanálise, do humanismo e do cognitivismo, importantes

linhas da Psicologia. A partir das idéias de Libâneo sobre as

tendências pedagógicas que tiveram infl uência na educação

brasileira, você situou o humanismo e aspectos do cognitivismo

na tendência pedagógica liberal renovada, da qual fazem parte

também os conhecimentos produzidos pelos escolanovistas

John Dewey e Edouard Claparède, estudados na unidade 1. De

acordo com o quadro teórico de Libâneo, você observou que as

tendências pedagógicas liberais, ou seja, a tradicional, a renovada

e a tecnicista, por se declararem neutras, nunca assumiram

compromisso com as transformações da sociedade, embora, na

prática, procurassem legitimar a ordem econômica e social do

sistema capitalista.

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Unidade 2

Saiba mais

Para aprofundar possíveis relações entre a psicanálise e a

educação, uma referência interessante é o livro intitulado Freud e

a educação.

Para saber mais sobre os processos psicológicos e sobre o

cognitivismo, você poderá consultar o manual intitulado

Psicologia Cognitiva, desenvolvido pelos americanos Eysenck e

Keane, ou o livro Introdução à Psicologia, de Rita Davidoff .

Você encontra a referência completa ao fi nal do livro didático.

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UNIDADE 3

O construtivismo no Brasil

Objetivos de aprendizagem

Descrever os principais conceitos da Epistemologia Genética de Jean Piaget e o desenvolvimento do construtivismo no Brasil.

Avaliar criticamente as implicações pedagógicas do construtivismo.

Seções de estudo

Seção 1 A Epistemologia Genética de Jean Piaget

Seção 2 Os estágios de desenvolvimento da inteligência

Seção 3 As idéias construtivistas no Brasil

Seção 4 As implicações pedagógicas do construtivismo

3

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Para início de conversa

Estudando as tendências pedagógicas liberais, na unidade 2,

você percebeu que a psicologia progrediu no Brasil porque

desenvolveu um discurso que contribuía para justifi car e preservar

as desigualdades sociais.

Em função da história das relações estabelecidas entre Psicologia

e educação no Brasil, a apropriação dessa ciência para a refl exão

sobre o processo educativo foi alvo de críticas que partiram de

outras ciências da educação.

Novas tendências pedagógicas, caracterizadas por Libâneo (1989)

como progressistas, entre as quais se destacam a pedagogia

libertadora de Paulo Freire e a pedagogia crítico-social dos

conteúdos, ganharam força. A principal característica das

tendências pedagógicas progressistas, que não estão ligadas à

Psicologia, foi a critica ao sistema capitalista. A idéia de que as

teorias da Psicologia trazem todos os subsídios para a teoria e a

prática educativa passou a ser mal vista pelos educadores críticos.

Ainda assim, nos anos 1980, após a ditadura militar, em um

período de abertura política no Brasil, outra teoria da psicologia

começou a ser identifi cada nas propostas educacionais: a

Psicologia Genética de Jean Piaget.

Nesta unidade, você estudará as idéias de Jean Piaget e alguns

aspectos do construtivismo no Brasil.

SEÇÃO 1 – A Epistemologia Genética de Jean Piaget

Algumas teorias sobre o desenvolvimento e a aprendizagem

produzidas no último século, mesmo contando já com mais de

oitenta anos, ainda geram tantas questões para a pesquisa que

podem ser consideradas atuais.

Muitas dessas teorias utilizam a abordagem genética. Isto quer

dizer que procuram compreender os processos cognitivos, afetivos

e de relacionamento social que se desenvolvem nos seres humanos

a partir da identifi cação, descrição e explicação de sua gênese, de

seu início, de sua origem.

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Unidade 3

A Epistemologia Genética de Jean Piaget é considerada uma

teoria genética porque o objetivo do autor é compreender como

inicia e se desenvolve a capacidade de conhecer a realidade na

criança.

Certamente você já ouviu falar de Jean Piaget associado à

Psicologia infantil ou à educação. Jean Piaget nasceu em

Neuchâtel, na Suíça, no ano de 1896. Após a conclusão de seu

doutorado em Biologia, ele passou a dedicar-se à Psicologia.

Que tal retomar esta história, para que você possa compreender as implicações de buscar aplicar essa teoria na educação?

Para saber mais sobre Psicologia, Piaget buscou associar-se a

pesquisadores dessa área em atividade na Europa. Acompanhou,

inicialmente, os atendimentos realizados em clínicas psicológicas

em Zurique. Das entrevistas psiquiátricas que observou, tomou

algumas características para o desenvolvimento de seu método

de investigação do raciocínio da criança, que chamou de método

clínico.

O método clínico é um método inspirado naquele praticado

pelos psiquiatras como meio de diagnóstico e de investigação.

É um método de conversação livre com a criança sobre um

tema dirigido pelo interrogador, que acompanha as suas

respostas, pede-lhe que justifi que o que diz, que explique,

que diga o porquê, que lhe faz contra-sugestões, etc.

Inicialmente, Piaget utilizou-se da observação pura.

Posteriormente, passou a utilizar-se de conversas com

crianças, até, fi nalmente, passar a utilizar as conhecidas

provas piagetianas, nas quais se realizam diante da criança

algumas pequenas experiências, perguntando o porquê de cada

evento. Por meio deste método, Piaget entendeu ser possível

conhecer o nível de inteligência da criança.

Saiba mais

Para saber mais sobre o método clínico, consulte: <http://educadi.psico.ufrgs.br/cursos/ppg/textos/txisolda1.htm>.

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Depois desse breve período de incursão pela psicologia clínica,

Piaget foi para Paris e passou a trabalhar com crianças em um

laboratório de Psicologia. Nesse laboratório, era realizada a

validação de testes de inteligência. Validar um teste é repeti-lo

tantas vezes quantas forem necessárias, com um grande número

de sujeitos, até poder estabelecer o tipo de resposta esperada do

sujeito em cada faixa etária ou nível de desenvolvimento.

Você lembra do teste de Q.I., desenvolvido por Binet e Simon?

No laboratório de Psicologia destes pesquisadores, em Paris,

Piaget trabalhava sob a supervisão do próprio Dr. Simon.

Realizando seu trabalho, interessou-se por investigar os motivos

pelos quais as crianças davam respostas erradas a certas questões

que compunham os testes. Preocupou-se, assim, com o estudo

qualitativo das repostas, em lugar de tomar em consideração

somente a quantidade de respostas certas ou erradas, como

faziam os outros pesquisadores.

Reunindo resultados de suas primeiras investigações, Piaget

os enviou a Edouard Claparède, escolanovista e estudioso do

desenvolvimento infantil que você conheceu por meio da leitura

da unidade 1. Como você estudou, Claparède havia fundado o

Instituto Jean-Jacques Rousseau, em Genebra, na Suíça.

A partir de 1921, trabalhando no Instituto Jean-Jacques

Rousseau, Piaget tinha uma estrutura acadêmica à sua disposição

que lhe permitiu investigar intensamente o desenvolvimento

do raciocínio da criança, publicando numerosos livros e

constituindo um produtivo programa de pesquisas nas décadas

que sucederam.

Jean Piaget casou com uma companheira de pesquisa e teve

três fi lhos: Jacqueline, Lucienne e Laurent, nascidos entre

1925 e 1931. A observação do processo de desenvolvimento de

seus fi lhos desde o nascimento rendeu a produção da obra O

nascimento da inteligência na criança (1936), que trata do período

sensório-motor do desenvolvimento da inteligência (zero a dois

anos). Algumas das obras de Jean Piaget foram escritas em

colaboração com colegas como Ana Szeminska e Barbel Inhelder.

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Unidade 3

De 1952 a 1963, Piaget lecionou Psicologia Genética na

Sorbonne. Como você já leu quando iniciava o estudo desta

unidade, a Psicologia Genética estuda o desenvolvimento

humano desde a sua origem, buscando as manifestações mais

simples de comportamentos que se tornam complexos nas fases

ulteriores que culminam na idade adulta. Esta foi justamente a

abordagem escolhida por ele para compreender o conhecimento,

de modo que a teoria sobre o conhecimento que desenvolveu

recebeu o nome de Epistemologia Genética.

Em 1955, Jean Piaget criou o Centro Internacional de Estudos

em Epistemologia Genética, na Faculdade de Ciências de

Genebra, com o objetivo de possibilitar a realização de pesquisas

interdisciplinares. Para isto, contou com a colaboração de

especialistas de várias áreas interessados em questões relacionadas

ao desenvolvimento do conhecimento pelo homem. Piaget

lecionou até 1973, quando passou a dedicar-se exclusivamente à

pesquisa, à escrita e à participação em eventos científi cos até sua

morte, em 1980, com 84 anos.

O biólogo suíço Jean Piaget e os colaboradores que a ele se

uniram no desenvolvimento de pesquisas sobre o processo de

desenvolvimento do conhecimento forneceram base para uma

abordagem bastante inovadora da aprendizagem.

De acordo com a Epistemologia Genética, a aprendizagem é a construção de novos conhecimentos a partir da ação do sujeito sobre a realidade.

Afastando-se do inatismo e do empirismo, Jean Piaget

desenvolveu uma visão interacionista do desenvolvimento, na qual

o sujeito é protagonista, agindo sobre seu meio para construir

conhecimento.

Veja que estamos falando de construção, pois o conhecimento,

para Jean Piaget, nunca é uma cópia da realidade produzida

pela exposição aos estímulos do ambiente, como propõem os

empiristas, entre os quais estão os behavioristas, nem preexiste no

sujeito desde o seu nascimento, como defenderam os inatistas, ou

aprioristas, entre os quais estão os psicólogos da Gestalt.

A Epistemologia é uma área da Filosofi a que estuda o desenvolvimento do conhecimento científi co.

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Os novos conhecimentos são construídos pelos sujeitos para que

a sua relação com a realidade permaneça equilibrada. Construir

conhecimento, nesta perspectiva é a forma que os seres humanos

têm de adaptarem-se biologicamente às mudanças percebidas no

meio para a manutenção do equilíbrio.

A origem desta idéia está nas pesquisas realizadas por Piaget com

moluscos desde a infância. A concha dos moluscos se modifi ca

ao longo das gerações quando estes, por exemplo, são removidos

de águas calmas para águas agitadas. Conchas alongadas podem

tornar-se arredondadas a partir de mudanças no ambiente. Isto

permite ao molusco que enfrenta a mudança aderir melhor às

rochas e não se deixar levar pela correnteza. Se os organismos

vivos não fossem capazes de modifi car sua estrutura para manter

o equilíbrio em sua relação com o meio, pereceriam.

A estrutura que mais se modifi ca no ser humano para que

este possa manter a sua relação com o meio equilibrada é

a estrutura cognitiva. Ela é feita de todo o conhecimento

produzido pelo sujeito. Esses conhecimentos se organizam

na forma de esquemas. A estrutura cognitiva não pode

ser vista, pois não é material, mas simbólica. Ela está em

constante reorganização para dar conta das demandas do

ambiente. Os esquemas que compõem a estrutura cognitiva

podem ser esquemas de ação ou esquemas conceituais.

Os esquemas de ação são predominantes nos primeiros anos de

vida e correspondem à combinação das ações sobre o mundo

que a criança aprendeu a realizar até então. Essa combinação

de ações é colocada em prática automaticamente sempre que há

oportunidade, sem que haja necessidade de a criança refl etir a

respeito do que está fazendo ou planejar.

Para sacudir o chocalho, a criança combina as ações mais simples de olhar, pegar, balançar e escutar, desenvolvidas anteriormente, em uma ação mais complexa que pode ser estendida a outros objetos e se constitui em um esquema de ação.

Os esquemas conceituais são aqueles que combinam

representações mentais. Estas são imagens da realidade

construídas internamente pelos sujeitos a partir de sua ação sobre

o mundo. As representações mentais começam a se desenvolver

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a partir do segundo ano de vida, de modo que os esquemas

conceituais, que as combinam, não podem se desenvolver antes

disso.

Os esquemas conceituais são utilizados para operar

mentalmente sobre a realidade, em lugar de agir diretamente

sobre ela. Começam a aparecer em suas formas rudimentares

no terceiro ano de vida, mas atingem a sua “maturidade”

somente ao fi nal da adolescência, quando tornam-se

mais complexos e precisos, e permitem a operação sobre

realidades virtuais ou hipotéticas.

Para responder a uma simples pergunta como “Você quer uma fruta?”, a criança precisa lançar mão do esquema conceitual que defi ne o que é fruta. Tal esquema foi construído a partir de suas experiências anteriores com maçãs, laranjas, bananas e outras frutas, cujas imagens a criança construiu e armazenou.

O desenvolvimento cognitivo é o que possibilita a passagem da

simples ação sobre os objetos da realidade para a operação com

conceitos mais complexos. Para que esse desenvolvimento ocorra

normalmente, quatro fatores são considerados importantes:

1. a maturação do sistema nervoso,

2. a experimentação ativa da realidade,

3. as transmissões sociais,

4. o processo de equilibração.

Este último fator é o de maior relevância, segundo a perspectiva

piagetiana.

A equilibração é a passagem do desequilíbrio para o equilíbrio. Quando entramos em contato com uma situação nova, que não conhecemos, fi camos em desvantagem, em desequilíbrio com a realidade. Para que possamos recuperar o equilíbrio nessa relação, necessitamos apreender as características da situação nova e nos adaptarmos a ela e é a este processo que o conceito de equilibração se refere. Quando esse processo é concluído, nossa estrutura cognitiva está mais desenvolvida, pois incluiu novos conhecimentos e modifi cou-se qualitativamente, permitindo-nos lidar com situações mais complexas.

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Enquanto outras teorias acreditam que nenhum conhecimento

pode ser construído sem a ajuda de outras pessoas, direta ou

indireta, formal ou informal, para Jean Piaget o conhecimento

socialmente transmitido é importante somente para a

construção de um certo tipo de conhecimento, o conhecimento

social. Os demais poderiam ser descobertos pelo sujeito a partir

de sua própria ação sobre o mundo e pela construção de suas

próprias hipóteses.

Você sabe o que é conhecimento social para Piaget?

O conhecimento social é aquele relacionado aos costumes, às regras de convivência, às leis e à língua de cada povo. Dentre os tipos de conhecimentos, conhecimento físico, conhecimento lógico-matemático e conhecimento social, este último é o único que, para ser desenvolvido, precisa ser ensinado por outras pessoas na visão piagetiana.

Piaget e seus colaboradores criaram certas provas para avaliar

os níveis infantis de desenvolvimento cognitivo. A partir

dessas provas, procuraram mostrar como a passagem da não-

conservação para a conservação de quantidades é um processo

gradual que caracteriza a passagem do estágio pré-operatório

para o operatório-concreto, em torno dos seis ou sete anos de

idade.

Conservação refere-se ao conceito de que a quantidade de

uma matéria permanece a mesma independentemente de

quaisquer mudanças em uma dimensão irrelevante. Por

exemplo, se temos uma fi leira de 8 moedas e se mudamos

as moedas abrindo espaço maior entre elas, nós ainda

temos 8 moedas. Isto é, o número de moedas não muda

quando se introduz uma mudança em outra dimensão

irrelevante (neste caso, o comprimento da fi leira)

(WADSWORTH, 1996, p. 66).

De acordo com Piaget, as estruturas de conservação não podem

ser ensinadas. Seu desenvolvimento depende da experimentação

ativa. Segundo ele, na maioria das culturas, as crianças tendem

a atingir a capacidade de resolver os problemas de conservação

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ao fi nal do estágio pré-operatório, com ou sem educação escolar,

sendo que a conservação de volume costuma ser a última a ser

desenvolvida.

Estágio pré-operatório? Estágio operatório-concreto? Que tal você conhecer mais sobre os estágios de desenvolvimento propostos por Jean Piaget, para que possa compreender o que estamos falando?

SECAO 2 – Os estágios de desenvolvimento da inteligência

Os estágios de desenvolvimento da inteligência propostos por

Jean Piaget são: sensório-motor (zero a dois anos), pré-operatório

(dois a sete anos), operatório-concreto (sete a doze anos) e

operatório-formal (doze a dezesseis anos).

Estágio sensório-motor (zero a dois anos)Este estágio se caracteriza pela ausência da capacidade de

representar mentalmente os objetos da realidade. A criança

aprende por meio de suas sensações e dos atos motores, que

permitem a interação com a realidade. Ela explora os objetos

e pode chegar a resolver problemas utilizando-se de meios

práticos baseados em esquemas de ação, mas ainda não “pensa”

conceitualmente.

O bebê desenvolve conhecimento físico,

descobrindo as propriedades físicas dos objetos

de seu entorno por meio da manipulação e do

conhecimento lógico-matemático, expresso

nas noções de objeto e de causalidade que se

constituem com base no estabelecimento de

relações espaciais e temporais. Para Piaget,

o bebê não é um ser social, pois não realiza

trocas signifi cativas com as outras pessoas ao nascer, sendo que ao

completar dois anos e desenvolver a função simbólica, encontra-se

mais preparado para tais interações.

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Veja agora como as mudanças dos dois primeiros anos de vida

acontecem. O período sensório motor é sub-dividido em seis

etapas:

Etapa 1 - zero a um mês – Refl exo

Nesta fase, o bebê se relaciona com o mundo principalmente por

meio de refl exos como o choro, a preensão palmar (fechar a mão

em torno do que lhe toca a palma da mão) e o sugar (o seio, as

mãos ou a própria boca). Desde os primeiros dias de vida, inicia-

se a transformação desses refl exos em outras formas de ação sobre

o mundo. Ainda não se construiu noção alguma de espaço. O

bebê não se diferencia do mundo e das outras pessoas.

Etapa 2 - um a quatro meses – Reações circulares primárias

Os refl exos vão se modifi cando e diferenciando na relação

com o meio e novos comportamentos surgem. Esta é a fase

da construção dos primeiros hábitos. As reações circulares

primárias são ações que se repetem envolvendo o bebê e seu

corpo, como chupar o dedo, tocar ou mover o rosto e pegar o

pé. O movimento dos objetos passa a ser acompanhado com os

olhos e a criança vira a cabeça em direção aos sons que escuta,

demonstrando coordenação entre visão e audição.

Assim, o bebê pode associar a face do adulto aos sons que emite

ao aproximar-se dele. Os objetos parecem já ser percebidos

como externos ao bebê, mas ele ainda não tem noção de que este

permanece o mesmo quando o vê por um ângulo diferente e não

parece sentir sua falta quando ele sai de seu campo de visão.

Etapa 3 - quatro a oito meses – Reações circulares secundárias

O bebê passa a orientar-se cada vez mais para objetos externos

ao seu corpo, pegando e manipulando o que pode alcançar,

demonstrando coordenação entre visão e tato e entre visão e

preensão (pegar).

As reações circulares secundárias são justamente a ocorrência de

comportamentos que se repetem, mas que não mais envolvem

somente o corpo do bebê, como as reações primárias, mas

também objetos.

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A intencionalidade começa a aparecer em comportamentos, como

a tentativa de repetição de eventos interessantes que acontecem,

pela primeira vez, acidentalmente, como, por exemplo, tocar no

móbile sobre o berço e este balançar. A noção de permanência do

objeto desenvolve-se, de modo que a criança consegue perceber

que o objeto é o mesmo ainda que mude de posição e pode, até

mesmo, antecipar as posições pelas quais o objeto poderá passar

quando movimentado. Assim pode, por exemplo, procurar no

chão algo que viu cair.

Etapa 4 - oito a doze meses – Coordenação de esquemas de ação

Surge a utilização de meios para alcançar fi ns, isto é, de combinar

comportamentos já construídos anteriormente como forma de

atingir objetivos. “As crianças podem ser vistas afastando um

objeto (meio) para alcançar um outro objeto (fi m)”. Isto demonstra

um rudimento de planejamento da ação e uma separação entre

meios e fi ns. “Há uma seleção intencional dos meios antes de

iniciar o comportamento”, sendo que o fi m já está estabelecido

desde o início da ação (WADSWORTH, 1996, p. 37).

Neste período igualmente é construída a noção de que os objetos

mantêm sua forma e tamanho, independentemente de estarem

perto ou longe, ou de estarem sendo vistos pela frente ou por trás.

A criança também começa a procurar objetos que desaparecem

de seu campo de visão, diferentemente do que ocorria aos quatro

meses, quando parecia que entendia que não existiam mais após o

seu desaparecimento.

A noção de causalidade aparece nesta fase, pois a criança

demonstra perceber que os objetos ou as outras pessoas também

podem ser causadores de atividades e não somente ela mesma em

sua ação sobre o mundo.

Etapa 5 - doze a dezoito meses – Invenção de novos meios para atingir fi ns

A criança passa a utilizar mais a experimentação de meios

para atingir fi ns do que a repetição de comportamentos que já

construiu anteriormente, demonstrando a capacidade de criar

novos meios, acomodando-se às situações novas, demonstrando,

fi nalmente, comportamentos genuinamente inteligentes.

Lembre-se de que a acomodação é a modifi cação dos esquemas existentes para a adaptação a uma situação nova.

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A criança ainda não demonstra capacidade de

resolver problemas que envolvem deslocamentos

invisíveis dos objetos, como procurar no

lugar certo uma bola que rolou por baixo da

cama e foi parar do outro lado do ambiente.

A criança procura onde viu o objeto entrar,

mas não imagina onde ele foi parar após seu

deslocamento por não poder mais ser visto.

Esta capacidade se desenvolverá somente com o

advento da capacidade de representação mental, que caracteriza a

última etapa do período sensório-motor.

Etapa 6 - dezoitoa 24 meses – Representação

Nesta etapa, a criança também inventa novos meios para atingir

determinados fi ns, mas não apenas por meio da experimentação,

contando também com a representação mental. Isto signifi ca

que se torna capaz de parar por um instante o que está fazendo

e imaginar uma possível solução, por meio de representações

mentais, colocada em prática a seguir. O pensamento, assim, vai

se “descolando” da ação e tornando-se independente.

Período pré-operatório (dois a sete anos)O período pré-operatório é caracterizado pelo desenvolvimento

da capacidade simbólica, que se expressa na fala e em outras

formas de representação, como o desenho e a brincadeira. Pela

ordem como aparecem no processo de desenvolvimento da

criança, geralmente a partir dos dois anos de idade, as formas

de representação características deste estágio são: a imitação

diferida, o jogo simbólico, o desenho, a imagem mental e a

linguagem falada.

A imitação diferida é uma imitação que acontece na ausência do

modelo.

Uma garotinha de 16 meses, que vê um companheiro zangar-se, chorar e bater os pés (espetáculos novos para ela), mas somente uma ou duas horas após a sua partida, imita a cena a rir (PIAGET e INHELDER,1998, p. 49).

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O jogo simbólico também pode ser chamado de jogo de fi cção

ou de faz-de-conta. Envolve imitação e se faz acompanhar de

objetos que entram em cena representando outros objetos.

A mesma garotinha inventou o primeiro jogo simbólico ao fi ngir dormir, sentada e sorrindo largamente, mas de olhos fechados, cabeça inclinada, polegar na boca e segurando um canto de pano, que simula o canto do travesseiro, consoante o ritual costumeiro que observa ao adormecer; pouco depois, faz dormir o seu urso de pelúcia, enfi a uma conchinha numa caixa dizendo ‘miau’ (acaba de ver um gato num muro), etc. (PIAGET e INHELDER, 1998, p. 49).

O desenho ou imagem gráfi ca, nos seus primórdios, é

intermediário entre o jogo simbólico e a imagem mental e,

segundo Piaget, quase não aparece entre os dois anos e dois anos

e meio. A imagem mental é a imitação interiorizada.

A linguagem falada permite a evocação verbal de acontecimentos

não atuais, que já aparece mesmo que o uso adequado do idioma

ainda não se faça presente, em função de estar em processo de

aprendizagem.

Quando a garotinha há pouco citada diz ‘miau’, já sem ver o gato, há representação verbal além de imitação. Quando, algum tempo depois, diz ‘panéné pati’ (=grand papa parti = vovô foi embora) mostrando o caminho em declive que ele seguiu ao deixá-la, a representação apóia-se exclusivamente (ou fazendo-se acompanhar de uma imagem mental) no

signifi cante diferençado constituído pelos sinais da língua em vias de aprendizagem (PIAGET e INHELDER, 1998, p. 49).

Além de caracterizar-se pelo desenvolvimento da função

simbólica, o estágio pré- operatório caracteriza-se ainda por uma

forma de pensamento denominada egocêntrica.

Signifi cante = coisa usada para representar objetos e eventos (signifi cado).

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Pensamento egocêntrico O pensamento egocêntrico é uma forma de pensamento centrada

em um só aspecto das situações observadas, que corresponde ao

ponto de vista do próprio sujeito. Esta forma de pensamento faz

com que a criança:

desconsidere o ponto de vista de outros, pois não o

percebe como diferente do seu próprio;

centre-se em características aparentes das situações

observadas ao analisá-las;

tome partes das situações, as partes imediatamente

percebidas, como representantes do todo;

não acompanhe movimentos quadro a quadro, todo o

processo de uma transformação, registrando apenas,

geralmente, o quadro inicial e o quadro fi nal;

não seja plenamente capaz de inverter mentalmente ou

compensar mentalmente transformações observadas nas

características dos objetos, capacidade esta denominada

de reversibilidade;

demonstre difi culdade ou incapacidade de conservar

quantidades.

Conservação de quantidadesOs problemas de conservação foram criados por Piaget e os seus

colaboradores para avaliar os níveis infantis de desenvolvimento

cognitivo. A passagem da não-conservação para a conservação é

um processo gradual que caracteriza a passagem do estágio pré-

operatório para o operatório-concreto, em torno dos seis ou sete

anos de idade.

Conservação refere-se ao conceito de que a quantidade de

uma matéria permanece a mesma independentemente de

quaisquer mudanças em uma dimensão irrelevante. Por

exemplo, se temos uma fi leira de 8 moedas e se mudamos

as moedas abrindo espaço maior entre elas, nós ainda

temos 8 moedas. Isto é, o número de moedas não muda

quando se introduz uma mudança em outra dimensão

irrelevante (neste caso, o comprimento da fi leira)

(WADSWORTH, 1996, p. 66).

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De acordo com Piaget, as estruturas de conservação não podem

ser ensinadas. Seu desenvolvimento depende da experimentação

ativa. Segundo ele, na maioria das culturas, as crianças tendem

a atingir a capacidade de resolver os problemas de conservação

ao fi nal do estágio pré-operatório, com ou sem educação escolar,

sendo que a conservação de volume costuma ser a última a ser

desenvolvida.

A noção de númeroA construção da noção de número toma por base os

mecanismos sensório-motores, pois o contato com

quantidades acontece na experiência da criança desde

os seus primeiros meses de vida. No período pré-

operatório, estão em elaboração duas relações básicas

para o desenvolvimento do conceito de número: a

seriação e a inclusão de classes, relações estas que são

completamente elaboradas somente no próximo período,

no qual o conceito de número propriamente dito é conquistado,

juntamente com a capacidade de operar.

Veja no que consistem as duas relações citadas.

A seriação consiste em ordenar objetos tomando de acordo

com um determinado critério (tamanho, por exemplo).

A inclusão hierárquica de classes consiste na formação de

grupos de objetos utilizando como critério uma característica

dos mesmos e a eleição de outra característica para a formação

de agrupamentos internos a este grupo. Exemplo: no grupo

das fl ores, as rosas formam um sub-grupo e as rosas vermelhas

formam outro sub-grupo dentro do sub-grupo das rosas.

O número reúne em um só todo a classifi cação e a seriação,

porque os termos enumerados são, ao mesmo tempo, equivalentes

entre si e diferentes uns dos outros por ordem de enumeração.

Cinco balas são todas balas, mas uma pode ser considerada a

número um, outra a número dois, outra a número três e assim por

diante. Para a criança do período pré-operatório, estas relações

não são simples de compreender: “Professor, como um só número

cinco pode ser cinco balas?”.

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Ao fi nal da seção, você conhecerá um pouco mais sobre o estágio

pré-operatório quando estiver estudando o desenvolvimento do

julgamento moral na criança segundo Jean Piaget.

Período operatório-concreto (sete a doze anos)É a superação do egocentrismo do pensamento infantil e a

construção da noção de reversibilidade que dá a característica de

operatória à estrutura cognitiva e indica a entrada neste período

do desenvolvimento. O pensamento ganha mais mobilidade do

que no estágio anterior, quando estava submetido às percepções

imediatas da criança.

Operar signifi ca estabelecer relações, comparar, agrupar, entre

outras ações mentais.

Operação é tudo aquilo que transforma um estado

A em um estado B, deixando pelo menos uma

propriedade invariante no decurso da transformação

e com retorno possível, a partir dessa invariante,

de B para A, anulando a transformação. Ocorre

operação quando a ação do sujeito ou a transformação

observada no objeto pode ser anulada em pensamento

(reversibilidade) por uma ação orientada em sentido

inverso (inversão) ou compensada por uma ação recíproca

(compensação).

A reversibilidade é a característica das operações que permite

que as ações mentais sejam realizadas em dois sentidos

sem alterar suas propriedades. Com isto, é possível somar

mentalmente objetos e também inverter a soma, subtraindo.

No período operatório-concreto, torna-se possível conservar

as propriedades de um objeto mesmo que este passe por

transformações em sua aparência (conservação). Piaget buscou

conhecer a conservação de número, área e volume.

No quadro a seguir, veja os tipos de conservação e as idades

aproximadas em que se desenvolvem, de acordo com os estudos

de Piaget.

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Psicologia e Educação

Unidade 3

CONSERVAÇÃO IDADE

Número

Substância (massa)

Área

Volume líquido

Peso

Volume sólido

5-6

7-8

7-8

7-8

9-10

11-12

Fonte: WADSWORTH, B. J. Inteligência e afetividade da criança na teoria de Piaget, 2001, p.71.

No estágio operatório-concreto, a criança torna-se capaz, ainda, de:

representar grafi camente um dado concreto por meio de

símbolos e signos;

realizar a seriação ou ordenação de objetos a partir de

uma propriedade (tamanho, por exemplo);

proceder à inclusão de classes;

realizar agrupamentos multiplicativos, progredindo desde

a correspondência termo a termo até as classifi cações

multiplicativas.

As operações mentais, nesse período, necessitam apoiar-se em

situações concretas, não estando completamente livres.

Período operatório-formal (doze a dezesseis anos)As operações formais são aquelas que libertam o

sujeito das limitações ao raciocínio impostas pela

realidade concreta. As crianças que se encontram

no estágio operatório-concreto raciocinam somente

sobre problemas isolados, não estabelecendo

relações entre eles, e fi cam muito presas ao

conteúdo real, não sendo capazes de raciocinar

sobre premissas falsas.

O adolescente do estágio operatório-formal, por sua vez,

raciocina sobre proposições, sobre hipóteses e mesmo sobre o

futuro de uma situação imaginada. Isto permite a realização de

relações entre proposições que formam as teorias e a dedução de

implicações práticas ou aplicações delas.

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Universidade do Sul de Santa Catarina

No estágio das operações formais, desenvolvem-se as noções

de probabilidade, de proporção e de chance. O conceito de

‘probabilidade’ abrange os conceitos de proporção e de chance.

‘Proporção’ implica saber que as probabilidades 3/9 e 2/6 são

equivalentes. ‘Chance’ diz respeito a levar em consideração todas

as combinações possíveis entre os objetos dados por meio de uma

combinatória.

O problema do líquido químico incolor – Cinco frascos contêm diferentes líquidos incolores que parecem exatamente iguais. O frasco 5 contém iodeto de potássio e está equipado com um conta-gotas. Quando este é acrescentado à água oxigenada (frasco 3), esta o oxida, produzindo uma cor amarela. São apresentados à criança dois frascos, um com água e outro com uma mistura de ácido sulfúrico (frasco 1) com água oxigenada (frasco 3). O frasco 2 contém água, que é neutra, e o frasco 4 contém um descolorante. O experimentador coloca algumas gotas do frasco 5 em cada um dos dois recipientes, cujo líquido fi ca amarelo. Pede à criança que procure reproduzir o amarelo utilizando livremente os líquidos contidos nos cinco frascos. Vinte e cinco combinações de dois ou mais líquidos são possíveis, mas apenas duas podem produzir a cor amarela. Que combinações são essas? Procure resolver este problema e veja a solução ao fi nal do livro didático.

Os adolescentes e adultos são os únicos capazes de chegar

às combinações possíveis entre os líquidos dos frascos, pois

aplicam métodos sistemáticos para chegar ao resultado, como

experimentar as combinações e anotar o que já foi feito,

procurando tirar conclusões sobre o conteúdo dos frascos a partir

da análise das combinações.

SEÇÃO 3 – As idéias construtivistas no Brasil

A Epistemologia Genética de Jean Piaget não era propriamente

uma novidade para os brasileiros quando começou a aparecer com

mais força nas propostas educacionais ao fi nal dos anos 1980. Os

brasileiros já a relacionavam com a pedagogia da Escola Nova.

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Unidade 3

As idéias de Jean Piaget foram introduzidas no Brasil a partir da

década de 1920, na mesma época em que era difundido o ideário

da Escola Nova. Considerando que a primeira obra na área da

Psicologia publicada por Jean Piaget data de 1923, podemos dizer

que a chegada de suas idéias ao Brasil foi bastante rápida para a

época.

Nesse período, as idéias de Edouard Claparède, como você

estudou nesta disciplina, estavam sendo muito requisitadas para

aplicação pedagógica. Jean Piaget era seu assistente no Instituto

Jean-Jacques Rosseau. Helena Antipoff era colega de trabalho de

Jean Piaget naquele Instituto. Esta pesquisadora foi convidada a

participar do projeto de reforma educacional em Minas Gerais,

em 1927, quando passou a divulgar no país as idéias piagetianas

em nosso país.

Lauro de Oliveira Lima foi outro intelectual que se destacou por

sua importância para a difusão das idéias de Jean Piaget em nosso

país, trabalhando na proposta pedagógica do Ceará e divulgando

o seu trabalho em outros estados brasileiros.

O próprio Piaget esteve no Brasil em 1949, representando a

UNESCO, organismo internacional no qual foi assessor para

a área educacional. Nessa ocasião, recebeu o titulo de Professor

Honoris Causa da Universidade do Brasil.

A partir da década de 1950, as obras de Piaget começaram a ser

publicadas em português, o que contribuiu para a difusão de suas

idéias em nosso meio. Nos anos 1960, com a criação de cursos de

graduação em Psicologia nas universidades brasileiras, pesquisas

utilizando a Epistemologia Genética como referencial teórico

começaram a se proliferar, constituindo-se alguns núcleos de

pesquisa nessa linha no país.

A partir dos anos 1980, as idéias desenvolvidas por Emília

Ferreiro, que estudou com Jean Piaget no Centro de Estudos de

Epistemologia Genética, em Genebra, foram muito utilizadas

para procurar determinar o que as crianças já sabem sobre a

leitura e a escrita, a fi m de planejar o processo de alfabetização.

Segundo Ferreiro & Teberosky (1999), a criança desenvolve

algumas hipóteses sobre como se lê e sobre como se escreve

antes mesmo de aprender a ler e escrever. Nas culturas letradas,

As hipóteses sobre como se lê e escreve nestas duas fases são consideradas pré-silábicas, pois a criança ainda não estabelece relação entre as partes das palavras e os sons correspondentes.

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Universidade do Sul de Santa Catarina

estas hipóteses costumam evoluir em uma seqüência semelhante,

descrita pelas pesquisadoras da seguinte maneira.

1. Escrita indiferenciada: o desenho é diferenciado da

escrita, mas ainda há confusão entre um e outro. São

usados grafi smos mais longos ou mais curtos para

representar objetos grandes ou pequenos. A criança não

demonstra intenção de analisar os grafi smos em suas

partes, associando-os ao que se pretendia escrever. A

associação e feita em relação ao todo.

2. Diferenciação da escrita: nesta fase, a criança passa

a apresentar grafi smos diferentes para representar

signifi cados diferentes. Para escrever e para ler, segundo

as crianças desta fase, é necessário que o grafi smo

apresente duas características: variedade e quantidade

mínima de caracteres (geralmente três). Nesta fase, a

criança começa a se apropriar do modo de escrita de

seu nome e de palavras vistas diariamente, como as que

aparecem em rótulos.

3. Hipótese silábica – nesta fase, as crianças procuram

estabelecer relações entre os sons e as partes das palavras.

Na escrita, a criança começa a utilizar uma letra para

cada sílaba. Na leitura surgem confl itos cognitivos,

pois as palavras têm mais letras do que as contempladas

ao realizar as associações. Ao ler seu nome e procurar

utilizar a hipótese silábica, a criança percebe que sobram

letras e demonstra certa confusão. Além disso, a leitura

de certas palavras pelos adultos não fecha com suas

hipóteses sobre o que pode ser lido.

4. Hipótese silábico-alfabética – a partir desta

compreensão, a criança começa a tentar reproduzir cada

sílaba com mais de uma letra, e tem sucesso em algumas

situações, misturando a escrita silábica com a alfabética,

na qual letras e sons estabelecem total correspondência.

5. Hipótese alfabética – com o estabelecimento desta

hipótese, letras e sons passam a demonstrar total

correspondência. Alcançar a hipótese alfabética não é

tudo para que se domine a escrita em sua forma culta.

Difi culdades ortográfi cas dependem do ensino para

Lembre-se de que, para Piaget, o confl ito cognitivo é o que motiva a construção de conhecimento.

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Psicologia e Educação

Unidade 3

serem resolvidas e podem perdurar mesmo após todo o

processo de alfabetização.

A difusão das idéias de Jean Piaget e os trabalhos de Emília

Ferreiro permitiram que se desenvolvesse a concepção de erro

construtivo, uma visão mais positiva do erro, que passa a ser

considerado um caminho para o acerto e um indicativo sobre o

estágio de desenvolvimento em que a criança se encontra.

As idéias desenvolvidas por Emília Ferreiro e Ana Teberosky

foram muito utilizadas para procurar determinar o que as

crianças já sabem sobre a leitura e a escrita, a fi m de planejar o

processo de alfabetização. Os estágios de desenvolvimento das

hipóteses infantis sobre a leitura e a escrita, considerados pelos

piagetianos como universais nas culturas letradas, acabaram

por ser utilizados para dividir as crianças em grupos, em uma

apropriação tradicional de um conhecimento inovador.

A crítica à aplicação das idéias de Emília Ferreiro e Ana

Teberosky ao processo de alfabetização centram-se na

não-concordância com a perspectiva de que as etapas de

desenvolvimento da leitura e da escrita sejam semelhantes para

todos. Para os críticos, tais capacidades são singulares, vinculadas

às mediações encontradas pelo sujeito em seu meio social, e suas

etapas não podem ser universalizadas.

SEÇÃO 4 – As implicações pedagógicas do construtivismo

Para compreender as implicações pedagógicas do pensamento

construtivista piagetiano, é importante retomar as diferenças

entre a abordagem de Jean Piaget para a aprendizagem, a

abordagem inatista e a abordagem empirista ou ambientalista.

Você estudou na unidade 1 que a corrente empirista ou

ambientalista, representada na Psicologia pelo behaviorismo,

compreende o processo ensino-aprendizagem como sendo

centrado no professor, que organiza as informações do meio

externo que deverão ser recebidas pelos alunos. A aprendizagem

é compreendida como mudança de comportamento resultante

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do treino ou da experiência. Há uma preocupação excessiva

em organizar o ensino, baseando-se na idéia de que “ensinando

bem” o aluno aprende. Todo o conhecimento está fora do sujeito,

no professor e nos livros, e o aluno é visto como um recipiente

vazio em que é necessário “despejar” o conhecimento

(DARSIE, 1999).

Becker (1993) aponta que, na aula fundada nessa

concepção epistemológica, o professor fala e o aluno

escuta; o professor dita e o aluno copia; o professor

decide o que fazer e o aluno executa; o professor ensina

e o aluno aprende. Mas por que o professor age assim?

Porque ele acredita que o conhecimento pode ser

transmitido para o aluno. A capacidade de conhecer a

realidade viria de fora para dentro, de modo que o sujeito é

totalmente determinado pelos objetos que incidem sobre ele no

meio físico e social.

Na concepção inatista, por sua vez, o professor interfere o

mínimo possível, pois acredita que o aluno aprende por si

mesmo e o máximo que ele pode fazer é auxiliar a aprendizagem

do aluno, despertando o conhecimento que nele já existe. A

epistemologia que sustenta este modelo pedagógico é também

denominada apriorista, palavra derivada da expressão a priori,

que signifi ca “aquilo que é posto antes”, neste caso, a bagagem

genética/hereditária. Esta concepção, portanto, acredita que o

ser humano nasce com o conhecimento já programado na sua

herança genética. Para essa corrente, as interações socioculturais

são excluídas na formação das estruturas comportamentais

e cognitivas da pessoa. Assim, o entendimento é o de que a

educação pouco ou quase nada altera as determinações inatas.

Em geral, as idéias sobre como o sujeito aprende e o pensamento

pedagógico do professor tendem a se debater entre estas duas

concepções de aprendizagem: inatismo e ambientalismo. Por

vezes, é difícil identifi car se o ensino está fundado numa teoria

ou noutra. Isto ocorre porque o tratamento dado à aprendizagem

pelas duas correntes em foco é, antes de tudo, reducionista: o

ambientalismo reduz o sujeito ao objeto, enquanto o inatismo

sugere que a realidade se resume ao ponto de vista do sujeito.

Essas duas concepções, com bases epistemológicas tão diferentes,

podem levar a práticas e efeitos semelhantes do ponto de vista

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Psicologia e Educação

Unidade 3

pedagógico. No inatismo, não há nada que a atividade do sujeito

ou o processo educativo possam fazer para modifi car o que já

está dado desde o nascimento. No ambientalismo, por sua vez,

não é a atividade do sujeito que lhe permitirá aprender. Ambas

as perspectivas vêem o sujeito como um ser passivo frente ao

conhecimento. De acordo com Giusta (1985) a separação entre

subjetividade e objetividade apresentada nessas duas

concepções é um refl exo da divisão social do trabalho

no capitalismo: da separação entre o fazer e o pensar, da

prática e da teoria.

O interacionismo, como proposto por Jean Piaget, é uma

síntese do inatismo e do ambientalismo. O autor não

concorda que o conhecimento nasça com o indivíduo,

nem acredita que este seja dado pelo meio social. Afi rma

que o sujeito constrói o conhecimento na interação com o

meio físico e social, e essa construção vai depender tanto das

condições do indivíduo como das condições apresentadas pelo

meio em que está inserido.

Segundo Becker (1993), na pedagogia derivada da concepção

interacionista, o professor acredita que o aluno só aprenderá,

isto é, só construirá algum conhecimento novo se agir sobre a

realidade material e social e problematizar a sua ação por meio

da refl exão. Aprendizagem, nessa perspectiva, é ação e tomada

de consciência da relação entre as ações. Assim, não se pode

exagerar na importância dada à bagagem hereditária, nem na

importância do meio social.

Quando buscamos as implicações pedagógicas da teoria de

Jean Piaget, primeiramente, é interessante apontar que, para

esta teoria, a aprendizagem ou construção de conhecimento

ocorre somente se o conhecimento que o indivíduo já possui

em sua estrutura cognitiva lhe dá condições para assimilar as

características essenciais do conhecimento novo.

De acordo com o proposto por Piaget, certas categorias, como

as noções de objeto, espaço, tempo e causalidade, por exemplo,

necessitam ser construídas nos primeiros anos de vida para

que o sujeito possa compreender grande parte das relações que

observa no meio em que vive sem fi car perdido. Assim, é preciso

que alguns ciclos de desenvolvimento já tenham sido completados

para que se possa aprender os conteúdos novos.

Kant também preconizava que certas categorias devem estar dadas a priori no sujeito para que este possa conhecer o mundo. A diferença entre Kant e Piaget neste aspecto é que Kant acreditava que já nascemos com essas categorias prontas, enquanto que Piaget descreve o processo de construção dessas categorias a partir do nascimento, como podemos ver no livro “A construção do real na criança”.

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Há, ainda, outras implicações a destacar. Entre elas, a idéia de que:

O conhecimento exato não pode ser derivado diretamente

da leitura ou de ouvir dizer (por exemplo, os professores).

Antes do desenvolvimento das operações formais, o

conhecimento exato só pode ser construído a partir da

experiência de objetos signifi cativos; ele não pode ser

adquirido de representações (por exemplo, palavras faladas

e escritas) de objetos e eventos (WADSWORTH, 1996, p.

15).

Além disso, é possível destacar os seguintes aspectos da teoria

piagetiana que trazem implicações para a educação.

A aprendizagem envolve sempre construção e

compreensão, de modo que a aprendizagem mecânica

(aquela que se baseia na decoração das defi nições dos

conceitos) não poderia ser considerada uma aprendizagem.

O professor deve encorajar o desequilíbrio cognitivo, pois

é este que produz motivação para a resolução de problemas

e construção de conhecimento na escola.

O professor deve também promover o confl ito cognitivo,

fazendo com que o aluno coloque suas próprias idéias em

confronto e tenha dúvidas, questionando o seu próprio

posicionamento e pesquisando.

As interações sociais na escola são importantes para que

as crianças possam, tendo superado o egocentrismo do

pensamento, dialogar em busca da assimilação do ponto de

vista do outro e construir o conhecimento social.

Interpretações equivocadas da teoria de Jean Piaget levaram

professores a aplicar provas piagetianas aos alunos no contexto

escolar, procurando, com isto, levá-los a perceber relações que não

haviam percebido espontaneamente, como forma de acelerar o

seu desenvolvimento cognitivo. Tal abordagem é equivocada, na

medida em que as provas piagetianas foram criadas para fi ns de

pesquisa e não de ensino.

Outro equívoco foi o de interpretar a teoria piagetiana como uma

teoria espontaneísta, o que traria como implicação pedagógica

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Psicologia e Educação

Unidade 3

que o aluno fosse deixado por sua própria conta nas atividades

escolares e o professor não teria intervenção alguma em sua

aprendizagem e desenvolvimento.

O fato é que na teoria de Jean Piaget é papel do

professor observar o processo de desenvolvimento do

aluno e planejar atividades que tragam os desafi os

apropriados para provocar os confl itos cognitivos

necessários ao avanço do conhecimento. É a busca

por adaptação à adversidade, como estar frente a

uma situação nova e não saber exatamente como

resolvê-la, precisando criar estratégias, o que levará

o aluno ao desenvolvimento cognitivo. O professor

deverá planejar, então, tais situações novas, como forma de levar

o aluno a aprender os conhecimentos próprios para o seu estágio

de desenvolvimento.

As idéias liberais da Escola Nova, já identifi cadas na teoria

piagetiana, em um contexto brasileiro de política econômica

neoliberal, precisariam de uma nova roupagem. A aproximação

da Epistemologia Genética com as idéias cognitivistas que

você conheceu na unidade 2 conferiu a esta teoria um viés mais

moderno e o pensamento de Jean Piaget serviu como uma

luva para que a escola pudesse preparar o trabalhador para as

exigências de um novo contexto produtivo. Neste novo contexto,

a capacidade de construir novos conhecimentos permanentemente

é condição necessária para a adaptação às mudanças no mercado

de trabalho.

O construtivismo é relacionado ao discurso neoliberal quando

fundamenta a preparação do aluno para um mercado de trabalho

que exige cada fez mais “fl exibilidade” do trabalhador no

exercício de várias funções e para lidar com situações inesperadas,

buscando soluções imediatas para situações enfrentadas no

atual sistema produtivo. Daí a importância do aprendiz não só

aprender mais, mas, sobretudo, aprender a aprender.

A revalorização das idéias de interacionistas como Jean Piaget e

a aplicação dessa teoria à educação brasileira está relacionada às

novas características exigidas do trabalhador com a globalização,

as novas tecnologias e as novas exigências dos sistemas

produtivos.

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O construtivismo é criticado por valorizar mais o que o sujeito

aprende sozinho do que as aprendizagens originadas por

transmissões sociais. É criticado também por valorizar mais

a capacidade criativa do sujeito para desenvolver métodos de

resolução de problemas do que o conhecimento que já está

pronto e foi produzido por outras pessoas que nos antecederam

no processo histórico. Outra crítica é a que mostra o lugar

assumido pelas relações sociais na teoria piagetiana: estas

oferecem a mesma qualidade de desafi o à inteligência que a

oferecida pelo ambiente físico, levando o sujeito ao desequilíbrio

e à reequilibração em seu processo individual de construção de

conhecimento. O conhecimento, assim, é sempre visto como

individual e desconectado das relações intersubjetivas.

Duarte (2001), autor que tem se dedicado à análise do lema

pedagógico de “aprender a aprender”, presente hoje nos relatórios

que fundamentam as políticas internacionais na área da educação,

as quais infl uenciam diretamente as políticas educacionais

brasileiras, aponta que desconsidera especifi cidades do psiquismo

como um fenômeno histórico-social, abordando o psiquismo

humano de forma biológica.

Quando o critério é a historicização ou não do psiquismo, Piaget,

Skinner e Freud, autores estudados nesta disciplina, segundo

Duarte, estariam muito mais próximos um do outro do que da

Psicologia sócio-histórica de Vygotsky, também presente na

Psicologia de Wallon.

Estes estudiosos procuraram trabalhar tomando o materialismo

histórico e dialético de Karl Marx como fundamento e método.

Você compreenderá o que isto signifi ca e identifi cará as

implicações dessas teorias para a educação na próxima unidade.

SínteseNesta unidade, você conheceu os principais conceitos da

Epistemologia Genética de Jean Piaget e as características dos

estágios de desenvolvimento propostos por este pesquisador. Você

identifi cou como o construtivismo esteve presente na educação no

Brasil, as implicações pedagógicas e as críticas sofridas por esta

concepção de aprendizagem e desenvolvimento.

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Unidade 3

Atividades de auto-avaliação

1 - Os conceitos de egocentrismo e de reversibilidade do pensamento permitem, dentro da teoria piagetiana, estabelecer uma linha divisória entre as capacidades características do estágio pré-operatório e aquelas que já se identifi cam no estágio operatório-concreto. Identifi que esses conceitos e estabeleça relação entre eles.

2 - Assinale a alternativa correta. Quanto ao construtivismo, é possível afi rmar que:

(a) coloca o professor no centro do processo pedagógico.

(b) enfatiza questões históricas e políticas na compreensão do desenvolvimento humano e do processo de ensino-aprendizagem.valoriza mais a descoberta do que a recepção de conhecimentos.

(c) defende a origem social das funções psicológicas.

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3 - A visão construtivista do erro é diferente da visão da pedagogia tradicional. Como o erro é concebido de acordo com o construtivismo?

Saiba mais

Para saber mais sobre a teoria piagetiana, sua descrição dos

estágios de desenvolvimento e as implicações educacionais do

construtivismo, busque o livro de Barry J. Wadswoth cujo título

é Inteligência e afetividade na teoria de Jean Piaget. Esses

temas são tratados, nesta obra em uma linguagem bastante

acessível.

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UNIDADE 4

A Psicologia sócio-histórica e a educação

Objetivos de aprendizagem

Descrever o signifi cado dos principais conceitos da teoria histórico-cultural de L. S. Vygotsky, identifi cando também as infl uências desta fundamentação teórica no trabalho do professor na educação básica.

Compreender os princípios que regem o desenvolvimento de crianças e adolescentes na escola segundo a perspectiva desenvolvida por Henri Wallon.

Seções de estudo

Seção 1 A teoria histórico-cultural de L. S. Vygotsky

Seção 2 A teoria da emoção Henri Wallon

4

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Para início de conversa

Nesta unidade, você conhecerá outras duas teorias consideradas

genéticas: a histórico-cultural, de Lev Semenovitch Vigotski, e a

da emoção, de Henri Wallon.

Estas teorias são genéticas porque se preocupam com o modo

como o ser humano se diferencia dos outros animais pelo

desenvolvimento de capacidades que se originam nas relações

sociais. O arcabouço teórico produzido por Vygotsky e

Wallon nos permite compreender a emoção, o movimento e as

mediações sociais como dimensões humanas que se contrapõem

e, ao mesmo tempo, trabalham em conjunto para originar a

personalidade e desenvolver a pessoa em todos os sentidos.

Ao valorizar a contradição como “motor” das transformações

que acontecem com os humanos desde o seu nascimento, as duas

teorias aqui abordadas se fundamentam nas idéias de Karl Marx,

cujo ponto de vista de Marx, seguido por Vygotsky e Wallon, é

chamado de materialismo histórico e dialético.

Você saberá mais sobre tão complexo tema estudando esta

unidade.

SEÇÃO 1 – A teoria histórico-cultural de L. S. Vygotsky

Antes de conhecer os principais conceitos da teoria histórico-

cultural, iniciaremos esta etapa do nosso percurso pela biografi a

de L. S. Vygotsky, o responsável pela sistematização de conceitos

que têm tantas implicações para a educação.

Lev Semionovitch Vygotsky nasceu em 1896, no mesmo ano

de nascimento de Jean Piaget, porém, em um contexto social e

geográfi co completamente diferente. Sua cidade de nascimento

foi Orsha, mas cresceu em Gomel, ambas as cidades localizadas

na Bielo-Rússia, país que se tornou uma das Repúblicas

Socialistas Soviéticas após a Revolução Russa, ocorrida em 1917.

Vygotsky estudou Medicina e Direito na Universidade de

Moscou, formando-se em Direito em 1917. Estudou também

Filosofi a e Literatura na Universidade Popular Shayavsky,

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Psicologia e Educação

Unidade 4

aprofundando-se no pensamento de Karl Marx e de fi lósofos

como Spinoza. Nos seus primeiros anos de estudo, dedicou-se ao

estudo da criação artística.

De 1917 até 1924, Vygotsky deixou Moscou e permaneceu em

Gomel, onde se casou com Roza Smekhova e teve duas fi lhas.

Trabalhou como professor de Literatura e Psicologia.

Como se sabe, a revolução russa mudou o regime político da

Rússia para o comunismo, sob o comando de Lênin, sucedido,

posteriormente, por Stalin.

Até 1936, viveu-se um período de relativa liberdade acadêmica na

antiga União Soviética.

Nessa época, “a psicologia de cunho mecanicista tinha

um espaço muito grande no cenário científi co soviético

devido aos avanços da fi siologia que, já no século XIX,

pesquisava a base material da atividade nervosa superior”

(ZANELLA, 2001, p. 64).

Na unidade 1, ao estudar o behaviorismo, você tomou

conhecimento do trabalho de Ivan Pavlov com cães, que deu

início ao estudo do refl exo condicionado, mecanismo pelo qual

comportamentos podem ser desencadeados no sujeito por meio

da associação a determinados estímulos. A valorização deste

trabalho para a compreensão do funcionamento psicológico

é um exemplo da compreensão mecanicista assumida pela

Psicologia da então U.R.S.S..

Em 1924, após apresentar um aclamado artigo no II Congresso

Pan-Russo de Psiconeurologia, Vigostski foi convidado e

passou a trabalhar no Instituto de Psicologia da Universidade

de Moscou. Juntamente com Aleksandr Luria (1902-1977) e

Aleksei Leontiev (1904 - 1979), incumbiu-se de construir uma

nova Psicologia fundamentada nos princípios do materialismo

histórico e dialético desenvolvidos por Karl Marx.

A nova Psicologia deveria investigar “como as características

singulares humanas, os processos psicológicos, são produzidos

a partir das relações sociais, isto é, do convívio com outros

indivíduos da espécie humana, capazes de elaborar cultura e fazer

história” (ZANELLA, 2001, p. 74). Este tornou-se o projeto de

vida daqueles jovens pesquisadores.

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Vygotsky teve dez anos de trabalho muito intenso em Moscou até

sua morte por tuberculose em 1934, aos 37 anos.

Após sua morte, já no ano de 1936, a publicação de seus livros foi

proibida na U.R.S.S. pelo governo de Stalin, que os acusava de

‘idealistas’. Suas obras foram publicadas no Ocidente somente na

década de 1960.

Para conhecer a teoria histórico-cultural, você percorrerá um

caminho composto de alguns conceitos básicos que estão inter-

relacionados. Os conceitos são:

1. atividade humana;

2. mediação (mediação instrumental, mediação social,

mediação pedagógica)

3. internalização;

4. funções psicológicas superiores; e

5. zona de desenvolvimento proximal.

1. Atividade humanaDe acordo com a perspectiva desenvolvida por Karl Marx,

o trabalho propriamente dito é uma atividade tipicamente

humana. Os outros animais que realizam ações produtivas

semelhantes ao trabalho humano o fazem apenas por

instinto. O ser humano idealiza o objeto que pretende

produzir muito antes de tê-lo concretamente, por meio da

representação mental, planejando o que será executado para

alcançar o objetivo a que se propôs.

Ao vislumbrar o resultado de sua atividade, identifi ca-se

como alguém de valor, reconhecendo algo de si mesmo no

que foi produzido.

Do conceito de trabalho de Marx e de suas implicações para o

desenvolvimento da espécie humana em geral e de cada sujeito

em particular, Vygotsky tomou as características que defi niriam a

atividade humana.

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São características da atividade humana:

estar conscientemente direcionada para uma fi nalidade.

Quem trabalha ou entra em atividade produz em si uma

imagem mental do que pretende realizar ou produzir.

utilizar instrumentos mediadores para realizar a

atividade (no próximo item abordaremos o conceito de

instrumentos mediadores).

produzir algo. O produto do trabalho sempre é um

bem material ou simbólico componente da cultura.

Esse produto objetiva o imaginado pelo sujeito. No

processo de produção de bens materiais ou simbólicos

componentes da cultura, o ser humano também produz a

sua própria subjetividade, isto é, o seu jeito de ser.

Além do trabalho, outras atividades podem ser incluídas

nesse conceito: a atividade escolar é uma delas, muito

importante na teoria histórico-cultural, pois Vygotsky e seus

colaboradores responsabilizam o processo de escolarização pelo

desenvolvimento de funções psicológicas superiores avançadas.

A atividade mental do sujeito, a sua consciência, é um refl exo

modifi cado de sua atividade objetiva no mundo. A boa qualidade

das atividades realizadas pelo sujeito é muito importante para que

o funcionamento psicológico nelas desencadeado contribua para

o desenvolvimento global do sujeito. Daí a importância de que

os professores sejam capazes de inserir seus alunos em atividades

bem planejadas no contexto escolar, já que do seu envolvimento

nas atividades coletivas resultará o modo de funcionamento de

seus processos psicológicos.

O que confere qualidade a uma atividade?

As mediações nela utilizadas são um item fundamental. Veja

agora o que se denomina mediação.

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2. Mediação Podemos dizer que toda mediação é um meio para realizar

uma atividade. É algo que ajuda a ter mais efi cácia e rapidez no

processo que culmina com a produção de algo que se idealizou

no princípio da atividade. Existem diferentes tipos de mediação.

Neste item, você conhecerá a mediação instrumental, a social e a

pedagógica, ação para a qual você está se preparando neste curso.

A mediação instrumental é a utilização de instrumentos

mediadores materiais ou simbólicos na atividade humana.

Toda atividade humana acontece com a ajuda de

instrumentos mediadores. Estes auxiliam o sujeito que

realiza a atividade a alcançar o seu objetivo.

Os instrumentos mediadores materiais são aqueles

artefatos que foram produzidos na atividade humana

ao longo da história e que auxiliam os seres humanos em

outras de suas atividades cotidianas.

São exemplos de instrumentos mediadores materiais objetos

como as ferramentas de trabalho, existindo uma para cada

função.

Os assentos, que nos auxiliam em atividades como a de

nos acomodar para ler, assistir às aulas, descansar.

Os óculos, que nos auxiliam a enxergar; entre outros

objetos.

Um lenhador que corta uma árvore precisa de um

machado, de um serrote ou de uma serra elétrica para

chegar ao fi nal da atividade.

Todos esses artefatos são instrumentos mediadores materiais.

Cada artefato que nos auxilia em nossa atividade tem a sua

própria história. Foi produto da atividade de alguém e carrega

um pouco da subjetividade de quem o produziu.

Os instrumentos mediadores simbólicos que auxiliam os seres

humanos em suas atividades são os signos. Eles compõem a

linguagem. As palavras são instrumentos mediadores simbólicos

porque auxiliam no processo de comunicação, facilitando

a interação social. Cada palavra nos remete a um conceito,

científi co ou não, o qual auxilia os sujeitos na atividade de

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interpretação do mundo e de organização dos próprios processos

psicológicos (pensamento, memória, imaginação, entre outros).

É interessante perceber que todo instrumento mediador

material também carrega uma dimensão simbólica, pois tem um

nome e um signifi cado que acabamos por conhecer ao aprender

a utilizá-lo.

Os instrumentos mediadores simbólicos podem ser bastante

simples, como um ícone na porta do banheiro, que

indica se ele é masculino ou feminino, facilitando a sua

utilização de acordo com as normas da cultura.

Os instrumentos mediadores simbólicos também podem

ser bastante complexos, como uma teoria que nos

auxilia a compreender melhor uma situação observada

na realidade escolar. As teorias são mediações simbólicas

para a compreensão da realidade e, por sua vez, são

produtos da atividade de outras pessoas que, muitas vezes,

nem existem mais.

As mediações simbólicas vão sendo apropriadas pelos sujeitos

na medida em que vivenciam atividades coletivas de interação

social, passando do nível interpsicológico ou interpessoal para o

nível intrapsicológico ou intrapessoal. Com isto, vão se tornando

parte do nosso funcionamento mental. Ao estudar o conceito de

internalização, você compreenderá melhor como esse processo

acontece.

A mediação social é a ação na qual um sujeito auxilia outros

sujeitos a se apropriarem dos instrumentos materiais e simbólicos

necessários para alcançar a fi nalidade das atividades que

realizam. Quando acompanhamos e auxiliamos um bebê que

está aprendendo a usar a colher para se alimentar ou uma criança

que está aprendendo a andar de bicicleta, estamos realizando

mediação social.

A mediação pedagógica é um tipo especial de mediação social

sistematizada e intencional que tem por fi nalidade levar o

aprendiz à apropriação dos instrumentos mediadores necessários

para realizar atividades acadêmicas e cotidianas, o que pode

contribuir diretamente para a qualidade de sua formação

humana, profi ssional e intelectual.

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O auxílio que o professor oferece ao aluno para que este se

aproprie dos instrumentos materiais e simbólicos existentes em

sua cultura para a realização das atividades próprias da vida

em sociedade é a mediação pedagógica. Este tipo de mediação

acontece quando o professor ou um colega mais experiente

contribui para que o aluno vá além do que ele já sabe na

realização de uma determinada atividade.

A intervenção do professor no processo de aprendizagem

do aluno deve ocorrer em uma zona de capacidades que

está em desenvolvimento no aluno, denominada zona de

desenvolvimento proximal. Você identifi cará e se apropriará

deste conceito nas próximas páginas. Fique atento!

3. Internalização A internalização é a reconstrução interna de uma operação

realizada externamente na atividade do sujeito. É por meio desse

processo que os sujeitos desenvolvem as funções psicológicas

superiores. Estas possibilitam o estabelecimento de relações

entre objetos e eventos e a formação de conceitos, bem como o

desenvolvimento de modos planejados de conduta.

Em sua obra A formação social da mente, Vygotsky utiliza-se de

um exemplo para explicar o que signifi ca a internalização. Esse

exemplo tornou-se muito famoso. Refere-se ao desenvolvimento

da atividade de apontar o dedo. Um bebê tenta pegar um

determinado objeto, realizando uma atividade externa na qual

ele e o objeto interagem. Um adulto vê que o bebê está tentando

alcançar o objeto e o entrega a ele. Fica estabelecida uma relação

entre a mão estendida do bebê e a ação de pedir ao adulto que

alcance o objeto.

Esta relação se estabeleceu porque o adulto compreendeu o que

o bebê queria, atribuindo um signifi cado para a sua ação de

estender a mão. Quando os outros compreendem a tentativa de

pegar o objeto como um ato de apontar para ele e o alcançam

para o bebê estão atribuindo signifi cado à ação do bebê.

Compreendendo o signifi cado atribuído para a sua ação, o ato

que, anteriormente, era uma tentativa de pegar, torna-se um gesto

de apontar dotado de signifi cado compreensível por outrem.

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Durante as atividades posteriores da criança e entre ela e

o adulto, o ato de apontar irá se tornando cada vez mais

preciso e freqüente. Com isso, o processo interpessoal de

atribuição de signifi cado para a ação do bebê torna-se um

processo interno do bebê, um processo intrapessoal.

A internalização é a transformação de um processo

interpessoal em um processo intrapessoal. Isto não é

imediato, mas é conseqüência de uma série de eventos

ocorridos ao longo do desenvolvimento.

A ação, existindo e sendo transformada, continua em

processo de transformação até a sua completa internalização.

Assim, a internalização das atividades socialmente realizadas

e historicamente desenvolvidas constitui a consciência e é

característica da psicologia humana.

Para a Psicologia histórico-cultural, a aprendizagem ocorre nas atividades desenvolvidas coletivamente e dá-se necessariamente por meio de outras pessoas. Quando a criança imita a forma pela qual o adulto utiliza instrumentos e manipula objetos, ela está dominando o verdadeiro princípio envolvido em uma atividade particular. Compreender uma realidade signifi ca apropriar-se dos signifi cados atribuídos a essa realidade por outras pessoas, confrontando com as próprias interpretações que, por sua vez, são fruto de apropriações anteriores de signifi cados culturalmente produzidos.

4. Funções psicológicas superioresExiste uma vertente de funções psicológicas que aparece

naturalmente no ser humano com o amadurecimento do sistema

nervoso central em condições ambientais favoráveis.

Essas funções costumam estar presentes também em outros

animais e são chamadas de funções psicológicas elementares.

São exemplos delas a atenção involuntária e a inteligência prática.

Com o desenvolvimento do ser humano nas interações sociais,

uma nova vertente de funções se desenvolve. As funções

psicológicas superiores (FPS) são aquelas funções psicológicas

tipicamente humanas, mediadas pela linguagem internalizada

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nas relações interpessoais. São exemplos de FPS a memória e a

atenção voluntárias e a imaginação.

O desenvolvimento das funções psicológicas superiores relaciona-

se ao processo de internalização das mediações características da

cultura. Você viu que esse processo de internalização acontece

nas relações interpsicológicas que acontecem entre as pessoas. Na

medida em que a criança internaliza os signifi cados atribuídos

à realidade pelos outros membros de sua cultura - que servem

como mediação para a sua compreensão do mundo -, amplia a

sua consciência de si e da realidade em que está inserida.

O desenvolvimento das funções psicológicas superiores é

determinado, assim, pelas relações que vão se estabelecendo entre

o pensamento e a linguagem.

A fala como mediação do pensamento e o desenvolvimento das funções psicológicas superiores

A partir de seus estudos, Vygotsky defendeu a idéia de que o

sistema de atividade da criança é determinado, em cada estágio

específi co, tanto por seu grau de desenvolvimento orgânico

quanto por seu grau de domínio no uso de instrumentos materiais

e simbólicos.

Vygotsky lembra os experimentos que Kohler, o psicólogo da

Gestalt, realizou com antropóides para mostrar que o início

da inteligência prática da criança, o “raciocínio técnico”, é

independente da fala, como ocorre com os macacos, que utilizam

instrumentos para resolver tarefas simples, independentemente da

atividade simbólica, bastando que os identifi quem e relacionem

em seu campo de visão.

Ao longo do desenvolvimento da criança, no entanto,

progressivamente, fala e raciocínio prático vão se integrando um

ao outro. As operações de uma criança que sabe falar são menos

impulsivas e espontâneas do que as dos macacos ao resolver

um problema prático. Por meio da fala, a criança planeja como

resolver o problema e só então entra em ação.

Vygotsky atribui à atividade simbólica uma função organizadora

específi ca que invade o processo de uso de instrumentos e produz

formas fundamentalmente novas de comportamento.

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Antes de controlar o próprio comportamento, a criança começa

a controlar o ambiente com a ajuda da fala. Falando, a criança

vai além do que está contido no seu campo visual, desenvolvendo

planos de ação. Assim, a fala torna-se tão importante quanto o

cérebro e as mãos para a resolução de um problema prático. Além

de facilitar a manipulação de objetos, a fala ajuda a controlar o

próprio comportamento da criança, que adquire a possibilidade

de ser tanto sujeito como objeto de sua própria ação.

Você já observou crianças em situação de fala egocêntrica?

A fala egocêntrica aparece quando as crianças do terceiro

ano de vida em diante falam em voz alta, mas não se

encontram conversando com ninguém, exceto consigo mesmas.

Acompanham a atividade de desenhar por falas do tipo: “Estou

desenhando o sol. Essas são as nuvens. Agora vou fazer uma

casa...”

A fala se desloca associada à ação da criança: no início, ocorre

durante a execução da tarefa, de forma dispersa e caótica,

passando, pouco a pouco, a preceder a ação. Assim, as palavras

podem moldar uma atividade e mesmo modifi car a estrutura

desta atividade quando as crianças adquirem o domínio da

linguagem e de sua função planejadora.

A fala egocêntrica deve ser vista como forma de transição entre a

fala exterior, que aparece nas relações das crianças com as outras

pessoas, e a fala interior, mediadora dos processos psicológicos

– aquela fala que organiza nossos pensamentos e que só nós

mesmos podemos “escutar”.

Na medida em que a fala utilizada nas relações com as outras

pessoas vai se tornando uma fala que permite à criança

relacionar-se consigo mesma, vão se desenvolvendo os processos

metacognitivos.

A metacognição é a capacidade de regular o próprio funcionamento psicológico e a própria atividade por meio da fala interior. Esta capacidade é fundamental para a resolução de problemas complexos.

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A qualidade do desenvolvimento da metacognição depende

da qualidade das relações estabelecidas entre as crianças e os

demais sujeitos que as cercam. Os processos metacognitivos

permitem que você perceba o quanto está aprendendo, perceba

se compreendeu ou não o conteúdo de uma frase lida no texto,

auxiliando você a retornar aos pontos que não fi caram claros na

leitura.

A metacognição permite que você redirecione a sua atividade

quando percebe que os resultados que está obtendo estão aquém

do planejado, criando novos meios para alcançar os fi ns a que se

propõe.

5. A zona de desenvolvimento proximal

Para conhecer o processo de desenvolvimento humano, o que é mais importante?

É saber o que já está desenvolvido no sujeito, podendo ser prontamente observado em suas ações? Ou é saber o que ainda está em desenvolvimento e poderá ser consolidado se houver mediação social?

Uma das contribuições mais signifi cativas de Vygotsky para

a educação está relacionada a essas questões e diz respeito ao

conceito de zona de desenvolvimento proximal.

Para compreender o signifi cado deste conceito, é importante

conhecer outros dois : o de nível de desenvolvimento real e o de

nível de desenvolvimento potencial.

O nível de desenvolvimento real corresponde à medida

proposta por Vygotsky para verifi car as capacidades que já estão

plenamente desenvolvidas na pessoa. Nesse nível estão todos

aqueles conhecimentos, capacidades e habilidades que o sujeito já

desenvolveu e é capaz de realizar sozinho, sem ajuda.

O nível de desenvolvimento potencial é a medida

correspondente ao máximo que a pessoa está conseguindo

realizar em um determinado campo de atividade contando com

a ajuda de outras pessoas. Você pode fi car surpreso ao observar

o quanto um sujeito pode ir além do que realiza sozinho quando

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encontra cooperação. Não é à toa que existem certos ditos

populares como “A união faz a força” ou “Duas cabeças pensam

melhor do que uma”.

A zona de desenvolvimento proximal corresponde a todas aquelas capacidades que ainda estão em desenvolvimento no sujeito e aparecem na sua atividade somente quando o sujeito conta com a ajuda de alguém.

Quando o sujeito está sozinho e não conta com nenhum tipo

de auxílio, ainda encontra difi culdade em demonstrar esse

aprendizado, que não está completamente consolidado. Assim,

a zona de desenvolvimento proximal contém as capacidades que

vão além do nível de desenvolvimento real, sendo que o seu limite

é demarcado pelo nível de desenvolvimento potencial.

A zona de desenvolvimento proximal é dinâmica, está sempre em movimento. O que é potencial hoje pode tornar-se real amanhã. Tudo depende da qualidade das mediações encontradas pelo sujeito na realização da atividade.

A mediação pedagógica acontece nas capacidades que se

encontram na zona de desenvolvimento proximal. São essas as

capacidades ainda em desenvolvimento que o professor deve

auxiliar o aluno a consolidar.

Para isso, vale ensinar fórmulas e conceitos com os quais o

aluno poderá contar para realizar atividades cujo sentido tem

claro. Vale também chamar a atenção do aluno para os aspectos

signifi cativos do problema em questão a serem levados em

consideração no processo de resolução, aspectos importantes que,

sozinho, o sujeito ainda não consegue perceber. A internalização

dos signifi cados atribuídos pelo professor aos aspectos envolvidos

na atividade é que levará ao desenvolvimento do aluno.

O jogo no processo de desenvolvimento

Em suas pesquisas, Vygotsky observou

a importância das atividades lúdicas

para o desenvolvimento. O pesquisador

percebeu que essas atividades, além de

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dar prazer, cumprem uma função signifi cativa no processo

de desenvolvimento, pois costumam ampliar a zona de

desenvolvimento proximal de quem as realiza. Na atividade

lúdica, os sujeitos envolvidos vivenciam as interações sociais

de uma forma diferente do modo como podem vivenciá-las na

realidade.

A brincadeira de “faz-de-conta” na qual se envolvem as crianças

é um exemplo disso. Ao desempenhar papéis sociais diferentes

dos que desempenham na vida real, as crianças vão tomando

consciência de aspectos da realidade social que, de outra forma,

lhes passariam despercebidos.

É o caso de duas crianças que brincam de boneca, o “papai” e a

“mamãe”, e se vêem premidos a debater questões complexas como

o modo para conciliar o trabalho com a criação dos fi lhos ao

precisarem decidir, na brincadeira, quem sairá para trabalhar e

quem cuidará da boneca, que representa um bebê. Observe que,

nesta brincadeira, entra em questão até mesmo a divisão sexual

do trabalho!

Fig. 4.1 – O desenvolvimento do pensamento matemáticoFonte: Extraída do site: <http://ouri.ccems.pt/jogo/ouri.htm>

Adolescentes, jovens e adultos também se envolvem em atividades

lúdicas. Os esportes e a arte são exemplos dessas atividades

nas quais é possível viver interações que não são diretamente

identifi cadas, mas existem na realidade.

Participando de atividades como jogos de equipe ou grupos

musicais, participando do processo de produção de obras de arte

ou discutindo com os colegas as suas diferentes interpretações, os

sujeitos podem viver situações de interação interpessoal aliadas ao

conhecimento enriquecedor do processo de desenvolvimento.

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É interessante perceber, no entanto, que as atividades

profi ssionais e as discussões políticas e ideológicas são outras

atividades que absorvem adultos tanto quanto a brincadeira pode

absorver uma criança. Trazer tais atividades para o contexto

escolar é promover o desenvolvimento humano.

O processo de formação de conceitos e a escolarizaçãoConceito é o nome dado à generalização que é feita por meio

da palavra. A palavra cadeira, por exemplo, não alude apenas a

uma cadeira específi ca, mas diz respeito às cadeiras em geral, que

existem, existiram e existirão na realidade ou na imaginação. O

conceito corresponde à reunião das características relevantes e

defi nidoras de objetos ou situações.

Estas características foram selecionadas pelos grupos culturais

no processo histórico para a separação das coisas em categorias

e para a defi nição das relações existentes entre elas. Uma das

tarefas da criança consiste em apropriar-se desses conceitos.

Para isto, precisa desenvolver ações intelectuais adequadas a essa

tarefa.

O processo de formação de conceitos envolve uma intensa

atividade mental, integrando processos psicológicos superiores

como a atenção, a memória e o pensamento, exigindo a realização

de operações como a comparação e a diferenciação, a abstração e

a generalização e a análise e a síntese.

Os conceitos espontâneos ou não-científi cos são aqueles que

se desenvolvem nas interações sociais não-sistematizadas que

ocorrem no cotidiano da criança. O desenvolvimento dos

conceitos científi cos, por sua vez, depende de processos de

transmissão organizada do conhecimento que, geralmente,

ocorrem na escola.

No processo de aquisição de conceitos científi cos, a criança

vai desenvolvendo a capacidade de pensar sobre o modo de

funcionamento de seus próprios processos psicológicos e ações

intelectuais. A capacidade de pensar sobre os próprios processos

cognitivos, como você já viu anteriormente, é chamada de

metacognição. O fato de tomarmos consciência das operações

intelectuais que realizamos nos torna capazes de controlá-las

deliberadamente.

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É interessante que você perceba que a aprendizagem de

conceitos científi cos contribui para a reorganização dos conceitos

espontâneos desenvolvidos pelo sujeito nas interações sociais

para lidar com a realidade. Enquanto os conceitos espontâneos

tornam-se mais complexos e organizados, os científi cos, por sua

vez, na medida em que vão sendo internalizados pelo sujeito

e relacionados com os conhecimentos que este já possui e

com suas realidades de aplicação, vão se tornando mais e mais

“espontâneos” e automáticos.

Ao estudar o papel da escolarização no desenvolvimento

psicológico, Vygotsky (2000) mostra que a atenção da criança,

que antes da escolarização costumava ser predominantemente

involuntária, vai sendo complementada pela atenção

voluntária e dependendo cada vez mais do pensamento. A

memória mecânica, associada ao ato de decorar, vai sendo

complementada pela memória lógica, orientada pelo

signifi cado do que é memorizado. Você pode perceber,

assim, que a criança passa por importantes mudanças em seus

processos psicológicos superiores na escola.

De acordo com Vygotsky, passar pelo sistema escolar faz

com que o indivíduo classifi que, conceitue e compreenda

o mundo de modo diferente, porque aprende a lidar com

conceitos teóricos, que permitem formas de generalização

mais complexas e independentes da experiência prática

e direta da realidade. Tal afi rmação está pautada por sua

compreensão do papel da cultura no desenvolvimento do

psiquismo: a cultura origina formas especiais de conduta,

modifi ca a atividade das funções psíquicas, edifi ca

novos níveis no sistema do comportamento humano em

desenvolvimento. (CARVALHO, 2002)

Com base nisto, é possível dividir os processos psicológicos

superiores em rudimentares e avançados. Os processos

psicológicos superiores rudimentares são aqueles desenvolvidos

durante a formação de conceitos espontâneos na atividade

cotidiana. Os processos psicológicos superiores avançados, no

entanto, costumam desenvolver-se somente com a passagem do

sujeito por processos de ensino-aprendizagem sistematizados.

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A contribuição de Vygotsky para a compreensão da educação de sujeitos portadores de defi ciênciaVygotsky distingue dois tipos de defi ciência: primária e

secundária.

A defi ciência primária é aquela de ordem biológica. Diz respeito

às lesões propriamente ditas sobre as quais se constrói a relação

com o portador de defi ciência, isto é, as suas características

físicas.

A defi ciência secundária está localizada nas interações sociais

que o sujeito portador de defi ciência tem a oportunidade de

estabelecer com os outros sujeitos. Garcia (1999, p. 43), estudiosa

desta questão em Vygotsky, aponta que, para o autor:

a forma como o sujeito que apresenta uma lesão

orgânica ou uma alteração cromossômica desenvolve-

se está intimamente relacionada ao modo como vive,

às interações sociais com as quais está envolvido (...). A

defi ciência primária converte-se em secundária em certas

condições sociais.

Que condições sociais seriam essas? Segundo Vygotsky, a

criança que tem o seu desenvolvimento complicado por uma

lesão física não se desenvolve menos ou mais do que uma criança

que não a tem, mas sim desenvolve-se de um modo diferente.

Seu desenvolvimento estará comprometido tão somente se as

interações sociais que com ela são estabelecidas levarem a esta

situação.

Assim como o corpo compensa suas próprias lesões

desenvolvendo outras características que, em outras

condições, não se desenvolveriam e dão mobilidade ao

portador de defi ciência, a sociedade também deve criar

meios de compensação social. Compensação social,

neste sentido, consiste em “criar condições e estabelecer

interações que possibilitem aos sujeitos considerados

portadores de defi ciência apropriarem-se da cultura” (GARCIA,

p. 45).

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Embora os diversos tipos de defi ciências sejam também

circunstâncias biológicas, a educação deve estar voltada para

as suas conseqüências sociais. Se acreditarmos que os sujeitos

portadores de defi ciência devem acessar um ensino por demais

simplifi cado e carente de abstrações, diferente do oferecido

aos sujeitos ditos normais, estaremos contribuindo para o

desenvolvimento da chamada defi ciência secundária. Ainda

que o ensino necessite de algumas adaptações de acordo com

o tipo de defi ciência primária apresentada pelos sujeitos, como

o oferecimento de material didático ampliado para alunos

com baixa visão, por exemplo, tais sujeitos podem e devem ter

acesso à mesma qualidade nas interações promotoras de seu

desenvolvimento.

Implicações educacionaisVygotsky morreu jovem e seus escritos não deixaram muitas

informações sobre o modo como realizou suas pesquisas. Como

você leu em sua biografi a, o Ocidente conheceu a obra de

Vygotsky somente a partir dos anos 1960. Sendo assim, a teoria

histórico-cultural apresenta potencial para fundamentar uma

ampla gama de investigações de uma diversidade de situações

ainda inexploradas. Como esta teoria concebe a educação como

parte integrante do processo de desenvolvimento humano,

o contexto educacional é privilegiado pelas pesquisas nela

fundamentadas.

Relacionar a investigação científi ca diretamente com o contexto

escolar é uma prática carregada de difi culdades e contradições.

Ainda assim, nesta seção, procuramos a todo momento destacar

os aspectos conceituais de signifi cado pedagógico presentes na

teoria histórico-cultural.

Neste fi nal de seção, que tal retomarmos algumas destas contribuições, apenas para sistematizá-las?

Vamos destacar, então, três contribuições fundamentais da teoria

histórico-cultural para a educação, que estão inter-relacionadas.

A importância da mediação social e da mediação pedagógica

para que ocorra o processo de internalização das mediações

culturais, o que signifi ca que o sujeito não constrói nenhum tipo

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de conhecimento sozinho, mas sempre necessita se apropriar dos

signifi cados atribuídos aos objetos de conhecimento pelo seu

grupo cultural para se desenvolver.

A precedência da aprendizagem em relação ao

desenvolvimento das funções psicológicas superiores,

o que signifi ca que o processo de ensino não necessita

aguardar a conclusão de etapas de desenvolvimento

para ocorrer, pois não é posterior a este, mas sim seu

promotor.

A relevância da intervenção do professor mediador na

zona de desenvolvimento proximal do aluno, o que

signifi ca que retomar ou treinar operações já conhecidas

não amplia as perspectivas de desenvolvimento tanto

quanto levar o aluno a trabalhar com conceitos que ainda

não domina completamente.

Se as idéias de Vygotsky fi zeram sentido para você, estudar a

próxima seção ampliará o seu entendimento do signifi cado da

visão contextualista-interacionista do desenvolvimento, pois

nela trataremos de outra teoria que toma por base o pensamento

de Karl Marx: a teoria do desenvolvimento criada pelo médico

francês Henri Wallon.

SEÇÃO 2 – A teoria da emoção de Henri Wallon

Henri Wallon se diferenciou dos pesquisadores de seu tempo

pela atenção explícita que deu à emoção e ao movimento corporal

ao elaborar sua concepção de desenvolvimento psicológico. Sua

teoria, voltada para a compreensão da pessoa completa, parte de

princípios do materialismo histórico dialético para afi rmar que

a contradição leva à transformação.

A contradição explica as mudanças que ocorrem nos seres

humanos em seu processo de desenvolvimento: entre afetividade e

racionalidade, entre orgânico e social, entre o eu e os outros. Em

sua teoria, Wallon mostra como, em um processo descontínuo

marcado por crises, a pessoa vai se construindo na relação com

os outros e consigo mesma. Para iniciar o estudo das idéias de

Para conhecer um pouco mais sobre o materialismo histórico Dialético você poderá ler, entre tantos textos disponíveis na internet, o de autoria de Marília Freitas de Campos Pires, intitulado O materialismo histórico e dialético e a educação, disponível no site: <www.interface.org.br/revista1/ensaio5.pdf>

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Wallon, vamos conhecer alguns princípios que regem a sua

concepção de desenvolvimento humano: os princípios funcionais.

Henri Wallon nasceu em 1879 em Paris, França. De 1899 a 1902, freqüentou a Escola Normal

Superior, em sua cidade de nascimento, onde formou-se em Filosofi a. Desde essa época já se interessava por questões psicológicas. Realizou estudos em medicina e trabalhou em hospitais de 1908 a 1931, parando somente durante a

Primeira Guerra, quando foi mobilizado como médico do exército francês. A partir

de 1920, concomitantemente ao seu trabalho como médico, já ministrava conferências sobre

Psicologia da Criança na Sorbonne, importante universidade francesa. Em 1925, defendeu sua tese de doutorado e criou o Laboratório de Psicobiologia da Criança, em atividade até os dias atuais. Foi presidente das Sociedades Francesas de Psicologia e de Pedagogia, sendo simpatizante do movimento escolanovista. De 1937 a 1949, foi professor de Psicologia e Educação da Criança no College de France, instituição de estudos avançados. Participou ativamente do movimento de resistência francês à ocupação alemã na Segunda Guerra Mundial. Ao fi nal desta, passou a ocupar cargos políticos na França, tendo apresentado à Assembléia Nacional daquele país um projeto inovador de reforma do ensino baseado em seus estudos. Morreu em 1962.

Os princípios funcionaisWallon desenvolveu alguns princípios dos quais parte para

explicar a evolução psicológica da criança. Esses princípios são: a

predominância, a alternância e a integração funcional.

O princípio da predominância funcional indica que certos

estágios do desenvolvimento são predominantemente afetivos e

subjetivos. São estágios de acúmulo de energia e de preparação

interna para o estágio subseqüente. Outros estágios são

predominantemente de busca de conhecimento sobre o mundo,

são cognitivos. Logo, são mais objetivos e estão ligados ao

dispêndio da energia interior acumulada no estágio precedente.

Assim, a cada estágio, há a predominância de um campo

funcional, que se evidencia mais do que os outros: o campo da

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emoção, o campo da cognição, o campo do corpo ou o campo da

pessoa.

O princípio da alternância funcional pressupõe que a cada novo

estágio vivido pela criança modifi ca-se o seu foco de interesse,

retomando-se o foco que havia sido deixado de lado no estágio

anterior. As atividades preponderantes em cada fase se

orientam ou para o eu; ou para o mundo; ou para as

pessoas; ou para os objetos, alternando-se de estágio para

estágio do desenvolvimento.

Ao longo do seu desenvolvimento, a pessoa pode

estar mais voltada para o seu mundo interno e para

crises a este relacionadas, como é o caso do estágio

da adolescência, por exemplo, ou, por outro lado, pode

voltar-se mais para o seu mundo externo e para as contradições

nele presentes, como ocorre nos estágios em que predomina o

desenvolvimento cognitivo, como o estágio sensório-motor e

projetivo, correspondente ao segundo ano de vida, e o estágio

categorial, que corresponde ao período vivido nos anos escolares

das séries iniciais do ensino fundamental.

O princípio da integração funcional signifi ca que cada

nova atividade desenvolvida em um novo estágio incorpora a

atividade desenvolvida no estágio anterior, em um processo

de integração e de diferenciação semelhante ao que ocorre no

amadurecimento do sistema nervoso, quando cada função nova

não elimina a função desenvolvida anteriormente, mas a submete

ao seu funcionamento, integrando-a e tornando-a parte de um

funcionamento mais complexo.

A integração funcional não é imediata e nem defi nitiva. Uma

função nova pode ser exercida de modo desintegrado por algum

tempo, repetindo-se sem um sentido claro na atividade do sujeito.

Como exemplo, podemos citar o bebê que aprende a fi car em pé.

Ele pode segurar-se na parede para se levantar apenas para, no

momento seguinte, cair sentado novamente. Faz isto repetidas

vezes e a atividade, nesse momento do desenvolvimento, tem um

fi m em si mesma, estando desintegrada do funcionamento global

da criança e desorientada em relação a qualquer objetivo evidente.

Em um estágio posterior, a atividade de se levantar e fi car em pé

fará parte de comportamentos mais complexos e orientados para

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objetivos mais defi nidos, como caminhar até outro ambiente ao

encontro de um adulto, por exemplo.

Por outro lado, depois de ocorrida a integração funcional, podem

ocorrer desintegrações provisórias. Isto explica os freqüentes

retrocessos que marcam o desenvolvimento na perspectiva

dialética defendida por Wallon. Ainda que já tenhamos

desenvolvido modos de agir mais complexos, pode ocorrer de

nos apresentarmos com ações próprias de momentos anteriores

de nosso processo evolutivo, principalmente quando enfrentamos

situações de estresse.

Os campos funcionaisEm busca da psicogênese da pessoa completa, Henri Wallon

estuda o ser humano em, pelo menos, quatro campos funcionais

que se misturam e participam da produção uns dos outros.

1) O campo funcional da emoção

Longe de signifi car somente perturbação, as emoções

são reações organizadas comandadas pelo sistema

nervoso e com utilidade específi ca. Para Wallon, a

emoção é uma possibilidade natural desenvolvida pela

espécie humana para auxiliar na sobrevivência desde

o nascimento. Os bebês necessitam da assistência dos

adultos para atender às suas necessidades e prover a sua

existência. A expressão da emoção no corpo é defi nida

por Wallon como uma pré-linguagem que possibilita a

comunicação entre o bebê e os seus ‘cuidadores’ desde

o nascimento. A expressão da emoção, principalmente

por meio do choro, mobiliza os adultos para o cuidado e

a proximidade com o bebê.

A emoção se expressa no tônus muscular e nos movimentos do

nosso corpo. As sensações corporais, por sua vez, podem acalmar

ou infl amar as emoções. Isto signifi ca que emoção e movimento

estão intimamente relacionados. A mediação dos outros também

é fundamental para as transformações que ocorrem no modo

como as pessoas expressam suas emoções. Podemos dizer que

as reações das pessoas à expressão da emoção lhe dá forma,

equalizando-a.

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Você sabia que emoções e sentimentos não são a mesma coisa?

A emoção tende a se expressar mais diretamente no corpo

(suar frio, sentir o coração bater mais forte, fi car com a boca

seca, encolher os ombros) e de modo mais impulsivo do que os

sentimentos. Estes são mais duradouros. Expressam-se de modo

mais controlado e tranqüilo e estão ligados às aprendizagens que

ocorrem desde o nascimento nas relações sociais.

2) O campo funcional do corpo

Você já compreendeu que a motricidade está ligada à

expressão de emoções. É importante saber ainda que o

movimento dá origem também à capacidade de conhecer o

mundo: a cognição. Inicialmente, conhecemos os objetos que

nos cercam apalpando-os, levando-os à boca, deslocando-

nos em torno deles. Posteriormente, passamos a buscar

representar as situações que vivemos e os objetos que nos

cercam, assim como seus atributos, com a ajuda do corpo,

por meio dos gestos e da imitação.

Observe como as crianças, por volta do segundo e

do terceiro ano de vida, fazem suas narrativas ou canções

serem acompanhadas por gestos amplos que as ajudam a

expressar as características dos objetos citados substituindo,

geralmente, palavras por movimentos: o elefante caminha

assim... e é grande assim, ó! A expressão das idéias com o corpo

é denominada projeção, a qual torna possível a internalização

das representações, contribuindo, assim, para a organização do

pensamento.

O pensamento nos permite estudar os passos que daremos

para realizar uma tarefa. Sua origem está nos movimentos que

realmente foram dados nos estágios iniciais do desenvolvimento

para alcançar certos objetivos. Estes movimentos foram

internalizados e tornaram-se representações, permitindo a

previsão das etapas do movimento sem que seja necessária a sua

execução.

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Assim, a criança torna-se capaz, por exemplo, de imaginar o

conteúdo de um desenho antes de iniciá-lo, fazendo com que a

cognição comande os seus movimentos para alcançar o resultado

esperado, quando antes movimentava intensamente os lápis no

papel e só depois atribuía um signifi cado ao produzido.

Os músculos do corpo apresentam uma função cinética e

uma função tônica. A cinética diz respeito ao movimento,

ao deslocamento do corpo no espaço. A tônica relaciona-se à

postura, à tensão e ao relaxamento dos músculos. Da mesma

forma que a expressão da emoção se transforma de acordo

com o signifi cado a ela atribuído pelos outros, o modo como

nos movimentamos tem relação com as nossas interações com

as outras pessoas. Os movimentos do corpo se tornam mais

retraídos ou mais expansivos, por exemplo, de acordo com o

modo como as pessoas os interpretam, controlam, incitam,

valorizam, desaprovam, entre outras reações.

3) O campo funcional da cognição

Você já sabe que o pensamento tem sua origem nos movimentos

do corpo. A internalização das ações sobre os objetos permite

o desenvolvimento das representações mentais, as quais. são

imagens internas que desenvolvemos para as coisas do mundo a

partir da interação com elas. Na medida em que internalizamos

as características dos objetos, vamos aprendendo a dividi-los em

categorias.

Organizar o mundo que nos cerca em categorias ou conceitos

é o grande desafi o enfrentado pela capacidade de conhecer.

Categorias são grupos nos quais podemos incluir as coisas

do mundo ou as idéias existentes sobre essas coisas. Cada

grupo de coisas tem um nome específi co que se expressa em

uma palavra. Quanto melhor utilizamos as palavras, melhor

damos conta de separar adequadamente as coisas do mundo

nos grupos a que pertencem, o que torna mais fácil operar

sobre elas com o pensamento, defi nindo-as e explicando-as.

Wallon observou em suas pesquisas que as crianças entre três

e sete anos apresentam modos particulares de lidar com as

categorias que, aos olhos de um adulto, podem parecer bastante

confusas. O pensamento da criança nessa fase foi denominado

por Wallon de sincrético. A palavra sincretismo se relaciona à

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mistura de dois elementos diferentes em um só, formando um

amalgamado indissociável. O pensamento da criança, na fase do

sincretismo, costuma formar pseudo-categorias.

Exemplo: A origem do pensamento na criança

4) O campo funcional da pessoa e os grupos

Para Wallon, a pessoa completa integra os três campos funcionais

citados até aqui, sendo, ela própria, um campo funcional pleno

de contradições. Os grupos também podem ser entendidos como

campos funcionais. Assim, quando duas pessoas interagem,

diversos campos funcionais estão em jogo.

Os estágios do desenvolvimento segundo Henri WallonO desenvolvimento é entendido por Wallon como processo de

mudanças resultantes de confl itos: confl ito entre o corpo e a

sociedade, entre a emoção e a razão, entre a emoção e o corpo,

entre a razão e a sociedade. Os confl itos pelos quais passamos

para nos tornarmos quem somos se expressam mais visivelmente

em momentos críticos do desenvolvimento, descritos por Wallon

em estágios. São eles:

I. estágio impulsivo-emocional.

II. estágio sensório-motor e projetivo.

III. estágio do personalismo.

IV. estágio categorial.

V. estágio da adolescência.

I. Estágio impulsivo-emocional - primeiro ano de vida

Este primeiro estágio é entendido como predominantemente

afetivo. O bebê está mais orientado para relacionar-se com as

pessoas do que para interagir com o mundo físico. A tarefa

evolutiva do bebê nesta fase é conhecer os limites do seu próprio

corpo, diferenciando-o do corpo das outras pessoas.

O bebê se comunica afetivamente com os adultos por meio

do choro, do balbuciar, do movimento e da rigidez ou

relaxamento do tônus muscular. Os movimentos das pernas e

dos braços principiam sem objetivos defi nidos, desorientados

e descoordenados, expressando impulsivamente e sem controle

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as sensações e a emoção do bebê. A reação dos adultos a essas

expressões se tornará parte do modo particular como cada bebê

expressa as diversas sensações que experimenta em seus primeiros

meses de vida: dor, saciedade, sono, desconforto, bem-estar, entre

outras.

II. Estágio sensório-motor e projetivo – segundo e terceiro anos de vida

Enquanto que para Piaget o período sensório-motor corresponde

aos dois primeiros anos de vida, para Wallon, este se inicia

somente ao fi nal do primeiro ano, com os primeiros passos do

bebê.

Durante o estágio anterior, ocorreram importantes

conquistas no estabelecimento de vínculos entre o bebê

e seus cuidadores. Neste estágio, o foco está no campo

funcional cognitivo. Ao fi nal do primeiro ano, com a

aquisição da preensão e da marcha, a criança encontra-se

capacitada para a exploração direta da realidade material.

Para isto, experimenta os objetos de seu entorno,

empurrando-os, jogando-os, puxando-os, arrastando-os

e observando os resultados de suas experiências. A estes

movimentos, Wallon deu o nome de praxias. Futuramente, cada

um desses movimentos virá a compor comportamentos mais

complexos e dotados de intencionalidade, mas, por ora, é a sua

repetição que caracteriza a atividade do bebê.

Ao fi nal do segundo ano de vida, o bebê demonstra estar

desenvolvendo a capacidade de representação mental, mas ainda

utiliza muito o seu próprio corpo como apoio para expressar-se

e para atribuir signifi cado aos objetos e situações com os quais

toma contato. Aparecem, então, os gestos e a imitação como

recurso representacional.

O ato mental passa a projetar-se nos atos motores, como forma

de auxiliar a exteriorização do pensamento e a internalização da

linguagem.

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Unidade 4

III. Estágio do personalismo – dos três aos seis anos de idade

Tendo sido o estágio anterior predominantemente cognitivo,

seguindo o princípio da alternância funcional, neste estágio, a

criança volta-se novamente para si mesma e para as suas relações

afetivas com as outras pessoas.

Você leu que no estágio impulsivo-emocional uma das tarefas de

desenvolvimento estava na construção da noção de independência

do próprio corpo em relação aos outros corpos.

Esta noção permitiu à criança experimentar

movimentos que a levaram a explorar o mundo

circundante no estágio sensório-motor e projetivo.

No estágio do personalismo, o desafi o da criança

não é mais apenas o de identifi car-se como corpo

separado dos outros corpos, cujos movimentos

podem ser controlados. A tarefa evolutiva do

estágio do personalismo é a de identifi car-se como

pessoa, como eu psicológico independente. Para

isto, a criança passa a experimentar seus próprios limites nas

relações com os demais.

Inicialmente, são percebidas mudanças de comportamento como

a utilização freqüente dos pronomes “eu” e “meu”. Pouco antes,

ao referir-se a si mesma, a criança ainda utilizava somente o seu

próprio nome, o que dava impressão de estar se referindo a uma

terceira pessoa: “Marina quer bolo”. Aparecem também atitudes

de “teimosia” e de negação: “Não quero!”. Estes comportamentos

demonstram a busca por auto-afi rmação.

Nos anos seguintes, vão aparecendo ainda os comportamentos de

imitação e de sedução. A criança procura incessantemente imitar

as pessoas que admira, como se pudesse tomar um pouco delas

para si. Busca, ainda, atrair a admiração das pessoas que a cercam

apresentando o que aprende a fazer. Desta forma, por meio do

confl ito com os demais e da incorporação das características

admiradas, a criança vai se construindo como indivíduo

independente, em um movimento dialético.

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IV. Estágio categorial – dos sete aos onze anos de idade, aproximadamente

Novamente, neste estágio, o foco de interesse da criança se

volta para o conhecimento do mundo. Anteriormente, esse

conhecimento foi prático, na exploração direta do ambiente e, em

seguida, simbólico, com a utilização dos gestos e a imitação das

características de situações e de objetos.

Neste estágio, a tarefa da criança é tornar-se capaz de

defi nir e de explicar as coisas do mundo, categorizando-as

e estabelecendo relações entre elas. Antes de desenvolver o

pensamento categorial propriamente dito, você aprendeu que

podemos identifi car na criança o pensamento sincrético.

Você estudou as características do pensamento sincrético

nas páginas anteriores, quando leu sobre o campo funcional

da cognição. O desenvolvimento do pensamento categorial

promoverá um salto qualitativo na relação da criança com

o conhecimento e permitirá que esta esteja preparada para

enfrentar os desafi os próprios da adolescência.

V. Estágio da adolescência

Neste estágio, a emoção fi ca “à fl or da pele” e os movimentos do

corpo tendem a ser excessivamente expansivos ou retraídos. As

crises típicas do estágio do personalismo são retomadas, mas as

conquistas obtidas ao longo do estágio categorial fazem com que

o adolescente possa ir muito mais longe na atividade de se auto-

afi rmar em relação aos outros.

Agora, o adolescente é capaz de se afi liar a certos grupos

ideológicos, a partidos políticos, a movimentos sociais ou

culturais, pois pode compreender e admirar, por vezes

ardorosamente, o que é defendido por tais grupos. É

capaz também de se manifestar contra as idéias de outros

grupos e tende a fazê-lo com radicalismo. Você pode

perceber, ainda, que o adolescente procura assemelhar-se

aos membros dos novos grupos a que se afi lia, à turma de amigos

e, geralmente, entra em confl ito de idéias com os pais. Tudo isto

mostra que o indivíduo está buscando posicionar-se em relação à

sociedade e encontrar nela um lugar para si.

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Unidade 4

Relações entre a Psicologia de Henri Wallon e a educação

Para Wallon, o papel do professor não se restringe a acompanhar

as etapas de desenvolvimento do raciocínio da criança, como

sugere a teoria piagetiana. Ao contrário, o professor interfere em

todos os aspectos do processo de desenvolvimento por meio da

aprendizagem proporcionada à criança nas relações que estabelece

com ela.

Na realização de seu trabalho, de acordo com Wallon, o professor deve estar atento a dois aspectos:

1. as disposições da criança, dependentes da idade e do seu temperamento individual, e

2. as aptidões exigidas e exercidas pelos conteúdos de cada disciplina, pois é a partir das características desses conteúdos que o professor poderá investigar e defi nir os melhores meios para torná-los assimiláveis pelas crianças.

Wallon deu especial atenção à formação docente. Para ele, a

formação de professores deve estar relacionada às experiências

vividas por eles em seu contexto de atuação e “o ponto de partida

da investigação psicológica deve ser a ação dos professores, suas

facilidades, difi culdades e necessidades no processo de ensinar”.

Nesta perspectiva teórica, a ênfase da investigação

sobre a criança é colocada no exame da realidade e

não em princípios teóricos abstratos que a expliquem

desvinculada do seu meio ou que tratem dos conteúdos

específi cos de cada disciplina como capazes de, pela

sua própria natureza, desenvolver habilidades mentais.

(GALVÃO, 2001)

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SínteseNesta unidade, você conheceu três importantes teorias

psicogenéticas do desenvolvimento humano e suas implicações

para a compreensão da aprendizagem na realidade escolar.

Você viu que a teoria de Jean Piaget considera o processo de

equilibração, que ocorre em função da tendência inata do ser

humano para a busca de adaptação ao meio, o principal fator

responsável pelo desenvolvimento humano.

Ao buscar equilíbrio em sua relação com o meio, o sujeito

constrói esquemas que ampliam e reorganizam a sua estrutura

cognitiva, tornando a sua ação no mundo mais qualifi cada e

complexa.

Nesta perspectiva, certos esquemas conceituais necessitam

ter sido desenvolvidos previamente para que o sujeito possa

assimilar grande parte dos conteúdos escolares. Além disso, o

desenvolvimento cognitivo é entendido como condição para que

ocorra a socialização.

Você estudou também a teoria histórico-cultural de

Vygotsky, na qual toda forma de conhecimento só pode ser

construída contando com a mediação social, e os conceitos são

compreendidos como mediações simbólicas para a interpretação e

intervenção sobre a realidade na atividade humana.

Neste estudo, você viu que a mediação do professor, dos colegas

e de outros sujeitos na zona de desenvolvimento proximal do

aluno é responsável pelas transformações que ocorrem em seu

funcionamento mental nos anos de escolarização.

Por fi m, ao conhecer a teoria de Henri Wallon, você se apropriou

de uma outra abordagem para os estágios de desenvolvimento

humano diferente da proposta por Jean Piaget e que enfatiza

as contradições e as relações entre o corpo e a mente, entre a

emoção, o movimento e a cognição, nas relações sociais nas quais

se constitui a pessoa completa.

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Psicologia e Educação

Unidade 4

Atividades de auto-avaliação

1 - Identifi que a alternativa que apresenta os estágios do desenvolvimento nos quais o campo funcional da cognição predomina em relação aos demais campos funcionais.

(a) Estágio impulsivo-emocional e estágio do personalismo

(b) Estágio sensório-motor e projetivo e estágio categorial

(c) Estágio do personalismo e estágio da adolescência

(d) Estágio categorial e estágio da adolescência

(e) Estágio sensório-motor e projetivo e estágio do personalismo

2 - Sistematize os princípios básicos e as principais implicações pedagógicas das teorias estudadas na unidade e preencha o quadro a seguir.

TEORIAS PRINCÍPIOS BÁSICOS IMPLICAÇÕES PEDAGÓGICAS

A teoria histórico-cultural de L. S. Vygotsky

A teoria da emoção de Henri Wallon

Saiba mais

Para saber mais sobre as teorias estudadas nesta unidade, é

interessante que você leia os livros que indicamos a seguir. A

relação das obras é longa, mas os textos de cada uma delas são

compactos e de fácil leitura, escritos especialmente para leitores

iniciantes. Você os encontrará na biblioteca da Universidade, mas

também poderá comprá-los por valores bastante acessíveis nas

livrarias de sua cidade ou mesmo pela internet.

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Universidade do Sul de Santa Catarina

O livro de Marta Kohl de Oliveira intitulado Piaget,

Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em

discussão, tornou-se um clássico para quem está dando

os seus primeiros passos na teoria histórico-cultural.

Para saber mais sobre o contexto histórico em que

Vygotsky desenvolveu a sua teoria e sobre o conceito

de zona de desenvolvimento proximal, é fundamental

a leitura do livro de Andrea Vieira Zanella intitulado

Vygotsky: contexto, contribuições à psicologia e o

conceito de zona de desenvolvimento proximal.

O livro Henri Wallon: uma concepção dialética do

desenvolvimento infantil, de Izabel Galvão, aborda

resumidamente os aspectos mais relevantes da teoria

walloniana.

Piaget, Vygotsky e Wallon: teorias psicogenéticas em

discussão é um livro que traz textos de Yves La Taille,

pesquisador da teoria piagetiana, de Marta Kohl de

Oliveira, pesquisadora da teoria histórico-cultural, e

de Heloisa Dantas, pesquisadora da teoria de Henri

Wallon.

Para comparar a concepção de desenvolvimento da

inteligência de Jean Piaget com o modo como Henri

Wallon trata dessa mesma questão, nada melhor do que

a leitura do livro de Heloisa Dantas cujo título é A

infância da razão.

As referências completas dos livros aqui sugeridos

encontram-se no fi nal do livro didático.

Vale a pena também verifi car os textos disponibilizados

no Espaço UnisulVirtual de Aprendizagem sobre os

teóricos estudados nesta unidade.v

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UNIDADE 5

Os mitos sobre o fracasso escolar e as difi culdades de aprendizagem

Objetivos de aprendizagem

Descrever os pressupostos de teorias sobre o fracasso escolar das classes populares.

Defi nir difi culdade e distúrbio de aprendizagem.

Compreender a abordagem da psicopedagogia clínica para as difi culdades de aprendizagem.

Relacionar os conceitos de erro construtivo e de zona de desenvolvimento proximal com o processo de planejamento e de avaliação do desempenho escolar.

Seções de estudo

Seção 1 As teorias sobre o fracasso escolar das classes populares

Seção 2 As difi culdades de aprendizagem

Seção 3 A psicopedagogia

Seção 4 O erro construtivo e a zona de desenvolvimento proximal

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Para início de estudo

Durante o estudo desta disciplina, você conheceu diferentes

teorias e observou como elas se sucederam e tiveram maior ou

menor importância para a compreensão das relações de ensino e

de aprendizagem, estudando as suas implicações educacionais.

Nesta unidade, abordaremos questões às quais a Psicologia

sempre esteve associada e foi solicitada a dar respostas em sua

relação com a educação: o fracasso escolar, as difi culdades de

aprendizagem e a avaliação do desempenho do aluno.

Serão discutidos os conceitos de carência e diferença cultural,

bem como os conceitos de erro construtivo e de zona de

desenvolvimento proximal.

Os conhecimentos que você reuniu até aqui serão muito

importantes para compreender o que vem por aí!

Seção 1 – As teorias sobre o fracasso escolar das classes populares

O fracasso escolar não existiu sempre, posto que o acesso à escola

é recente para grande parte da população. Nos anos 1960 e 1970,

no auge da disseminação do modelo de escola de massas da

sociedade industrial, com o controle do desempenho escolar por

especialistas, o desempenho dos alunos das classes populares em

relação ao desempenho geral dos alunos da classe média e alta

tornou-se objeto de análise.

As teorias sobre o fracasso escolar sustentadas em pressupostos

inatistas subestimaram a capacidade intelectual do indivíduo,

na medida em que defendem que o sucesso ou fracasso

dependem quase exclusivamente de talento, aptidão, dom ou

maturidade do aluno.Como o fracasso é mais comum entre

as camadas sociais mais desfavorecidas: os mal-nutridos, os

pobres, os marginalizados, as teorias inatistas sugerem que

lhes falta bagagem genética adequada à aprendizagem dos

conteúdos escolares. No nascimento, já estaria ‘determinado’

quem seria ou não inteligente.

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Unidade 5

Por outro lado, vimos nesta disciplina que na abordagem

ambientalista da aprendizagem o papel do ensino é

supervalorizado, já que o aluno é considerado um receptáculo

vazio. O compromisso da escola é com a transmissão da cultura,

a modelagem do comportamento dos alunos e a transmissão

de um grande número de conteúdos. As teorias ambientalistas

propõem que o ambiente de origem do aluno é que traz os

requisitos indispensáveis ao processo de aprendizagem. Essas

teorias valorizam o ambiente como principal responsável pelo seu

sucesso ou fracasso na escola.

Entre as teorias ambientalistas sobre o fracasso escolar, encontramos aquelas que propõem que o ambiente de origem do aluno varia de acordo com a sua classe social. São a Teoria da Carência Cultural e a Teoria da Diferença Cultural.

A teoria da carência cultural diz respeito ao discurso da

psicologia educacional norte-americana que surgiu nos anos

sessenta e setenta para explicar o problema das desigualdades

sociais da educação. Nesta teoria, “a infl uência dos fatores

extra-escolares no rendimento escolar ocupava o primeiro

plano. Características dos alunos e de seu ambiente familiar

eram relacionadas com o desempenho na escola, em busca dos

determinantes do baixo rendimento” (PATTO, 1993, p. 111).

Segundo a análise de Patto (1993), no momento em que minorias

raciais reivindicavam igualdade de oportunidades, a ciência foi

acionada pela classe dominante para buscar respostas para a

questão: por que os negros não conseguem ser bem-sucedidos

socialmente? Argumentava-se, então, pela teoria da carência

cultural, que os negros viviam em contextos menos estimulantes,

pois o ambiente de pobreza desenvolve menos as capacidades

cognitivas. Afi rmava-se que as pessoas pobres são pouco

estimuladas e, conseqüentemente, menos inteligentes, e

sustentava-se que a linguagem que desenvolve a inteligência

é a culta e esta é característica da classe alta.

A literatura também atribuía as virtudes às classes altas e os

defeitos e problemas às classes baixas. Segundo este discurso,

valores, crenças, normas, hábitos e habilidades tidos como

típicos da classe dominante são os mais adequados para a

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promoção de um desenvolvimento psicológico sadio. Os adultos

das classes subalternas são referidos como ‘agressivos’, ‘relapsos’

e ‘desinteressados’ pelos fi lhos. Em seu ambiente, as crianças

pobres teriam contato somente com um código lingüístico

restrito, caracterizado por frases curtas e erradas.

Além disso, os objetos com os quais interagiriam, por sua

pobreza, não possibilitariam realizar o treinamento visual e

auditivo necessário para conquistar a prontidão para aprender.

Assim, o ambiente do qual as crianças da classe dominante são

oriundas seria, naturalmente, mais adequado para oferecer as

condições necessárias para a aprendizagem.

Para fazer frente a isso, segundo esta linha de raciocínio, seria

interessante oferecer programas de compensação cultural às

crianças pobres, que lhes fornecessem a base para atingir o

desempenho escolar esperado. O impacto dessa abordagem

ambientalista na educação, assim, pode ser verifi cado nos

programas educacionais elaborados com o objetivo de estimular

e intervir no desenvolvimento das crianças provenientes das

camadas populares ou compensar, de forma assistencialista, as

carências sociais dos indivíduos.

A teoria da diferença cultural, por sua vez, não concorda com

a proposição de existência de uma cultura padrão, à qual estão

submetidas outras culturas inferiores. O problema do fracasso

escolar das crianças pobres não estaria na falta de pré-requisitos

para aprendizado, mas sim em terem uma base cultural diferente

daquela das crianças da classe dominante.

A escola não estaria preparada para receber essa população

de bagagem cultural diferente, surgindo, assim, difi culdade

de comunicação entre professores e alunos pobres, o que

difi cultaria o processo de ensino-aprendizagem a ponto de

produzir fracasso escolar.

A proposta para intervir sobre a situação seria a de preparar os

professores para partir do que os alunos sabem e, aos poucos,

“aculturá-los”, com vistas a propiciar-lhes condições de ascensão

social. A crítica de Patto (1993) a esta visão é a de que o objetivo

dos defensores da teoria da diferença cultural não seria garantir

às classes subalternas a apropriação do saber escolar como forma

de propiciar a transformação social, mas somente possibilitar uma

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improvável melhoria no nível social e econômico dos indivíduos,

por meio da transmissão de conhecimentos que resultasse na

elevação do seu grau de instrução.

A conclusão do estudo de Patto (1996) em A produção do fracasso escolar foi de que o professor, enquanto portador da cultura da “classe média”, foi preparado pedagogicamente para receber o aluno ideal, isto é, o aluno limpo, inteligente, sadio e disciplinado e, principalmente, que já vinha para a escola preparado para assimilar uma grande quantidade de informações sistematizadas no contexto escolar.

Observa-se assim que em um primeiro momento, desenvolveu-

se uma teoria denominada a teoria da carência ou defi ciência

cultural. Esta foi amplamente divulgada e aceita, e atribuía as

causas do fracasso escolar ao indivíduo, veiculando uma imagem

negativa da criança pobre. Em um segundo momento, propôs-

se que a criança pobre não é defi ciente, mas apenas diferente da

criança de classe média ou alta, em uma teoria denominada teoria

da diferença cultural. Esta não questionava as desigualdades

sociais, mas apenas constatava que as crianças pobres precisariam

de outro tipo de atendimento pela escola, por apresentarem

características culturais diferentes das crianças de classe alta.

Apenas em um terceiro momento o foco não estará mais no

ambiente de origem da criança, mas nas práticas escolares, que

passam a ser investigadas em busca da origem, ou das formas

de produção, do fracasso escolar. Discutiremos esse enfoque na

última seção desta unidade. Antes disso, nas próximas seções,

você conhecerá a abordagem das difi culdades de aprendizagem

como distúrbios e o ponto de vista da psicopedagogia clínica.

Seção 2 - As difi culdades de aprendizagem

As difi culdades de aprendizagem dizem respeito a um

conjunto de manifestações muito amplo e passível de diferentes

interpretações. Uma dessas interpretações associa toda a

difi culdade de aprendizagem a um distúrbio de origem orgânica

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que se relaciona unicamente ao aluno, a uma doença da qual este

seria portador, que mereceria tratamento médico individual. Essa

perspectiva responsabiliza exclusivamente o aluno por seu sucesso

ou fracasso na aprendizagem e vê a difi culdade de aprendizagem

como sinônimo de distúrbio.

Segundo o conceito de distúrbio de aprendizagem mais

divulgado e aceito atualmente, o do Interagency Comitee of

Learning Disabilities (ICLD) dos Estados Unidos, cunhado em

1987,

Distúrbios de Aprendizagem é um termo genérico que se

refere a um grupo heterogêneo de alterações manifestas

por difi culdades signifi cativas na aquisição e uso da

audição, fala, leitura, escrita, raciocínio ou habilidades

matemáticas. Estas alterações são intrínsecas ao indivíduo

e presumivelmente devidas a disfunções no sistema

nervoso central. Apesar de o distúrbio de aprendizagem

poder ocorrer concomitantemente com outras condições

desfavoráveis (por exemplo, alteração sensorial, retardo

mental, distúrbio social ou emocional) ou infl uências

ambientais (por exemplo, diferenças culturais, instrução

insufi ciente/inadequada, fatores psicogênicos), não é o

resultado direto destas condições ou infl uências.

Veja que, de acordo com este conceito, apenas podem ser

excluídas do termo distúrbios as difi culdades para acompanhar

o programa escolar que não possam ser devidas a disfunções

no sistema nervoso central. Ainda que o termo tenha sua

abrangência bastante restrita nesse conceito, excluindo infl uências

ambientais, distúrbios emocionais e problemas de instrução

inadequada, por exemplo, é comum que toda a difi culdade de

aprendizagem seja compreendida como distúrbio, ignorando-se

as tantas outras possibilidades.

Um dos distúrbios de aprendizagem diagnosticado a partir

dessa abordagem é a discalculia. A primeira vez que se utilizou

este termo foi em 1920, por Henschen. A discalculia seria

um transtorno estrutural de desenvolvimento das habilidades

matemáticas que se manifestaria em erros na compreensão dos

números, habilidade de contagem, habilidades computacionais e

solução de problemas. Identifi cada principalmente em crianças,

poderia ser diagnosticada em adultos, desde que não estivesse

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relacionada a lesões cerebrais comprovadas, mas sim a disfunções

presumidas no sistema nervoso central.

Os pesquisadores que criticam essa abordagem biológica

entendem que a “biologização” das difi culdades de aprendizagem

serve para escamotear os determinantes do fracasso escolar,

que seriam sociais, políticos e pedagógicos. O objetivo da

interpretação biológica seria tão somente o de isentar o

sistema social vigente e a instituição escolar neste inserida de

responsabilidades sobre o desempenho dos alunos.

Propondo-se a contar a “história não contada” dos distúrbios

de aprendizagem, recuperando a história real, as pesquisadoras

Maria Aparecida Moyses e Cecília Collares (1992) defendem

que os distúrbios de aprendizagem são apenas uma construção

do pensamento médico. Para sustentar este argumento, retomam

a história das pesquisas em torno da dislexia, difi culdade

signifi cativa na aquisição da leitura, mostrando que o conceito

foi contestado por outros pesquisadores desde o início, e que

não há provas científi cas sufi cientes para atribuir as difi culdades

de leitura e outras difi culdades consideradas distúrbios a uma

origem orgânica e genética.

Seção 3 – A psicopedagogia

A psicopedagogia é uma área de conhecimento que nasce da

união entre a Psicologia e a Pedagogia e estuda o processo de

ensino e aprendizagem na busca de soluções para a questão dos

problemas de aprendizagem. Quando falamos em problemas

de aprendizagem não estamos falando, necessariamente, de

difi culdades de aprendizagem.

As difi culdades de aprendizagem são a expressão, no aluno, de

relações de ensino e aprendizagem que se dão dentro e fora da

escola. Estas relações, quando trazem complicações, podem

resultar ou não em difi culdades de aprendizagem. O conceito de

problemas de aprendizagem, assim, amplia o foco de análise, que

deixa de estar no indivíduo e se situa nas relações estabelecidas

no processo de ensino e de aprendizagem.

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A psicopedagogia clínica é representada pela psicopedagoga

Alicia Fernandez. Esta pesquisadora divulgou a abordagem

multidisciplinar e a entrevista familiar como forma de

compreender e intervir sobre as difi culdades de aprendizagem.

O modo como o sujeito lida com o conhecimento é analisado

pela autora a partir dos conhecimentos da psicanálise e da

Epistemologia Genética.

Para Alicia Fernandez, as questões emocionais trabalhadas

no inconsciente e as questões cognitivas estão profundamente

relacionadas na produção de difi culdades de aprendizagem.

As teorias que estudam o desenvolvimento humano

do ponto de vista cognitivo, como a teoria piagetiana,

que você estudou na unidade 3, não costumam fazer

referência às associações simbólicas que se produzem

no inconsciente dos indivíduos e à sua relação com a

aprendizagem. A psicanálise, por sua vez, na qual foram

cunhados os conceitos de inconsciente e de sintoma de

origem psicológica, raramente faz referência aos aspectos

do desenvolvimento da personalidade que dizem

respeito à construção de conhecimento. Desta forma,

as relações entre inconsciente e construção (ou não) de

conhecimento fi cam perdidas.

Alicia Fernandez escreveu um livro que já se tornou um

clássico dos estudos em psicopedagogia intitulado A inteligência

aprisionada. Nele, a autora mostra como a história singular de

cada sujeito, em sua família e na escola, pode explicar sua forma

de relação com o conhecimento.

Para uma melhor compreensão do que foi dito, acompanhe o

seguinte exemplo retirado de um caso clínico.

Você estudou na unidade 2 a psicanálise, que traz o conceito de inconsciente, de autoria de Sigmund Freud. Viu que o inconsciente diz respeito aos conteúdos da mente dos quais não temos consciência. Estes conteúdos são simbólicos, associam-se uns aos outros de modos particulares para cada sujeito e se expressam disfarçados nos sonhos, nos sintomas e nos enganos que cometemos no cotidiano, como trocar o nome de alguém ou esquecer de algo, por exemplo.

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A criança, ao nascer, instala-se em uma constelação de signifi cações. Vem preencher muitos desejos, carências, objetos dos pais. É-lhe designado um nome, e a criança, sem que tenha consciência disso, terá que se inserir no lugar que o nome signifi que.

A Paulo Alfredo chamam Alfredo. Perguntamos por que o chamaram de Paulo: “Por que assim se chama o pai” e, em outro momento da entrevista familiar, perguntamos por que não o chamam de Paulo, e responde a mãe: “Porque assim se chama o pai”. Pelo mesmo motivo que lhe é dado o nome, lhe é também retirado. “Aprende – diz a mãe -, mas no dia seguinte esqueceu-se de tudo (FERNANDEZ, 1990, p. 41).

Você pode observar, assim, que, de acordo com o signifi cado

inconsciente assumido pelo conhecimento, originado nas relações

familiares, pode produzir-se o sintoma da não-aprendizagem.

Quando os produtos do inconsciente transformam-se em

sintomas, podem aprisionar a capacidade de aprender e de

ensinar de crianças e adultos, de alunos e de professores. A

intervenção clínica de uma equipe multidisciplinar, que escute a

criança e sua família, pode ser uma alternativa para lidar com a

difi culdade de aprendizagem assim produzida.

A difi culdade para aprender pode ocorrer como um sintoma

relacionado a desejos inconscientes de ser amado pelas pessoas

próximas, por exemplo, que leva a reproduzir comportamentos

que são nocivos ao sujeito, mas lhe parecem contribuir para ser

mais aceito, o que lhe dá um conforto a curto prazo.

Seção 4 – O erro construtivo e a zona de desenvolvimento proximal

Na educação, o erro costuma ser severamente combatido e é

entendido como algo que atrapalha a aprendizagem. Teme-se

o risco de que a resposta errada possa se fi xar na mente e no

Sintomas são formas geralmente dolorosas e incapacitantes de expressão dos conteúdos inconscientes dos sujeitos.

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comportamento do aluno. Respostas erradas até hoje são riscadas

com caneta vermelha, procurando-se provocar a sua eliminação.

A perspectiva de mudança na maneira de encarar o erro do aluno

nas tarefas escolares está entre as implicações educacionais de

maior destaque da Psicologia Genética de Jean Piaget. Para os

construtivistas, como você estudou na unidade 3, o erro é positivo

e seu papel precisa ser estudado, pois ele indica o progresso

conceitual que está sendo realizado pelo aluno. Conhecendo a

lógica do erro do aluno, o professor pode avaliar as estratégias a

serem utilizadas para o seu desenvolvimento e para a superação

de assimilações incompletas ou incorretas no processo de

construção do conhecimento.

Embora a compreensão do erro como construtivo seja um avanço

na compreensão das relações de ensino e de aprendizagem, esta

abordagem sofre algumas críticas dos partidários da perspectiva

histórico-cultural de Vygotsky. Eles consideram que a idéia

de erro construtivo mantém a visão de separação entre erro e

acerto e de valorização de um padrão universal que situa o que

é “certo”. Esses pesquisadores preferem, assim, lidar com o

desenvolvimento do aluno nas relações estabelecidas no contexto

escolar tomando como fundamento o conceito de zona de

desenvolvimento proximal.

Sustentam que, mais importante do que buscar problemas

individuais que possam acarretar desempenho ruim na

escola, para compreender os problemas de aprendizagem, é

necessário analisar a relação professor-aluno-conhecimento

e a intersubjetividade na sala de aula. Para esses autores, o

aparato biológico do aluno nunca poderia ser tomado como

único fator, nem mesmo como um fator importante para o

desempenho escolar.

Como você estudou na unidade 4, a Psicologia sócio-histórica

reúne os pesquisadores que concordam com os pressupostos do

materialismo histórico e dialético e que fundamentam suas idéias

sobre a pesquisa e a intervenção da Psicologia nas instituições na

Psicologia histórico-cultural.

Um dos pressupostos do materialismo histórico e dialético é o de

que é a contradição que provoca as transformações que ocorrem

nos sujeitos e na realidade. No texto Repensando o fracasso escolar,

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Maria Teresa Esteban parte dessa perspectiva quando afi rma que

as contradições entre o saber e o não saber nas relações de ensino

e de aprendizagem na sala de aula devem ser tomadas como foco

de análise para que se avalie o desempenho escolar.

Observando a relação pedagógica que se dá na sala de

aula, é possível conhecer melhor as interações criança/

conhecimento, professor/aluno e professor/aluno/

conhecimento na construção do sucesso/fracasso escolar

(ESTEBAN, 1992, p. 75).

Esta pesquisadora conta que, no campo de pesquisa, encontrou

uma criança na sala de aula que chamou sua atenção: Vilmar.

Vejamos o caso de Vilmar a seguir.

Vilmar contava muitas histórias, ricas em detalhes e apoiadas por desenhos. Era considerado pela sua professora como alguém que atrapalhava as aulas, pois “falava demais”. De vez em quando, Vilmar procurava a pesquisadora para mostrar seus desenhos e contar suas historias. Ela dizia: “Vilmar, escreva a historia de seus desenhos”, e Vilmar, que vinha evoluindo em seus conhecimentos sobre a escrita, criando seus próprios símbolos, respondia: “Ah, isso tudo eu ainda não sei...”. Tendo estado afastada por um tempo da classe que observava, a pesquisadora surpreendeu-se, ao retornar com a afi rmação da nova professora de que Vilmar teria difi culdade de aprendizagem. A nova professora trabalhava com ditados, com separação de sílabas e com utilização de letras na formação de palavras “novas”. Vilmar não parecia interessado. Aproximou-se da pesquisadora e lhe propôs fazer um desenho. Como já fi zera por diversas vezes, a pesquisadora pediu a ele: “Vamos Vilmar, escreva a história do seu desenho. E Vilmar respondeu, cabisbaixo: “Eu não sei escrever”.

O que ocorreu com Vilmar? Será que Vilmar tem difi culdade

de aprendizagem? Como você, a escola e a professora poderiam

abordar o caso de Vilmar?

A partir do caso de Vilmar, Esteban busca apoio na

concepção de zona de desenvolvimento proximal para mostrar

como, entre o saber e o não saber, encontra-se o espaço do

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processo de produção do conhecimento. É nesse espaço que

a intersubjetividade, o diálogo e a atividade coletiva, com

professor(a) e colegas, acontece e intervém na qualidade do

conhecimento produzido. Desconsiderar a existência desta

zona, na qual o processo de produção do conhecimento se dá,

é avaliar o conhecimento como algo que se tem ou não tem,

difi cultando a possibilidade de sua produção.

Para compreender tal afi rmação, é importante revisitar o

conceito de zona de desenvolvimento proximal proposto por

Vygotsky. Este conceito carrega implicações pedagógicas no

planejamento e na avaliação da aprendizagem escolar que

merecem ser consideradas.

Para Vygotsky, a aprendizagem é condição necessária para que

o desenvolvimento ocorra, pois ser humano é apropriar-se das

características culturais da sociedade em que está inserido, as

quais são produtos de um processo histórico. O desenvolvimento

do sujeito é produto da internalizacão dessas características

histórico-culturais. O processo de internalização se dá em uma

zona de interação que foi chamada por Vygotsky de zona de

desenvolvimento proximal.

Hazin e Meira mostram que o conceito de ZDP passou por

mudanças durante o seu processo de elaboração que o deram

maior consistência e correspondência com os demais conceitos

que compõem a teoria de Vygotsky.

Ao longo de aproximadamente quinze meses, os últimos

da vida de Vygotsky, o conceito evoluiu do status de

oposição a noção de QI, para enfatizar relações entre

o ensino formal e o desenvolvimento de conceitos

científi cos, sendo, posteriormente, ampliado para o

domínio da interação social, imitação e mediação

semiótica em atividades tais como a brincadeira (HAZIN

e MEIRA).

Desta forma, é possível identifi car três momentos na evolução do

conceito de ZDP, que marcam diferentes ênfases de análise.

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Ênfase no desempenhoEsta fase foi marcada pela crítica de Vygostky aos testes de QI.

Nela, era realizada a comparação do desempenho do sujeito

em atividade individual com o desempenho do indivíduo em

atividade colaborativa.

A idéia importante que está subjacente a esta visão do conceito

é a de que o que hoje é realizado com o auxílio de uma pessoa

mais competente, no futuro poderá ser realizado de forma

autônoma pelo sujeito. Como implicação educacional disto temos

a importância de o professor ajudar o aluno, e colocar os alunos

em situação de ajuda mútua, oferecendo pistas sobre como atingir

os objetivos a que se propuseram na atividade que realizam.

Devido à ênfase dada ao desenvolvimento da performance

individual nesta fase, a zona de desenvolvimento proximal

poderia parecer ser uma propriedade do sujeito. Ela seria mais ou

menos ampla conforme a riqueza das competências individuais e

o desenvolvimento no sujeito.

Branco = o que o sujeito já é capaz de realizar sozinho. Aquilo

que ele “já sabe”.

Cinza = o que o indivíduo é capaz de realizar com ajuda de outra

pessoa, mas ainda não é capaz de realizar sozinho. Aquilo que ele

“ainda não sabe”.

Fora desta zona, temos o que ainda não é possível realizar nem

com a ajuda de outros ou aquilo que o indivíduo “não sabe”.

Esta análise enfatiza o que ocorre com o indivíduo no processo

de desenvolvimento. As limitações teóricas e educacionais

desta visão de ZDP são parcialmente resolvidas na segunda

formulação do conceito, com ênfase na interação, que você

conhecerá a seguir.

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Ênfase na interação e na mediação socialEm um momento posterior, o conceito de ZDP passou a ser

analisado a partir de seus aspectos sociointeracionais, enfocando

o processo de colaboração em si e não tanto o desempenho

individual nele produzido.

A ZDP passa a ser compreendida como um espaço

compartilhado, constituído por indivíduos em interação.

Os resultados obtidos na atividade compartilhada vão além

do que poderia ser atingido por qualquer um dos sujeitos

envolvidos que realizasse a atividade individualmente. A zona

representada em vermelho na ilustração, que corresponde ao

que o indivíduo “ainda não sabe” na abordagem descrita acima,

é aquela na qual devem se dar as interações promotoras do

desenvolvimento, isto é, a mediação social.

Como implicação educacional, esta abordagem enfatiza a

produção compartilhada na sala de aula, com o emprego de

práticas didáticas que favoreçam a comunicação entre os alunos,

sem tanta ênfase na análise do conteúdo semiótico trocado nessas

interações.

Ênfase na mediação simbólicaNesta última fase de desenvolvimento do conceito de ZDP,

a ênfase recai sobre os aspectos simbólicos e discursivos que

perpassam as atividades dos indivíduos, ainda considerando a

sua dimensão interacional, mas evoluindo para uma concepção

dialógica do desenvolvimento que se afasta defi nitivamente

da avaliação de desempenho característica da primeira fase.

Não se trata mais de atingir resultados mais efi cazes, mas de

produzir e comunicar novos signifi cados e novos sentidos para o

conhecimento. A ênfase está, portanto, na linguagem.

A linguagem oferece ao sujeito que a vai dominando a

possibilidade de controlar e mediar seu próprio processo

de aprendizagem e resolução de problemas, como mostra o

desenvolvimento da fala na atividade da criança, estudado

na unidade 4.

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Como implicação educacional, enfatiza-se o emprego de práticas

didáticas que proporcionem uma estrutura comunicativa,

favorecendo o discurso argumentativo e a produção

compartilhada de cultura na sala de aula.

Desta forma, voltando ao caso de Vilmar, é importante perceber

como a abordagem tradicional do ensino não dá espaço para

que a mediação social e simbólica ocorram, espaço este que

poderíamos denominar, informalmente, como o espaço que

Vilmar defi ne quando afi rma: “ainda não sei”. Esta afi rmação

mostra como o conhecimento está em processos de produção

e poderá ser produzido na medida em que se der a interação

e a troca simbólica, valorizando-se o que Vilmar não sabe e

acreditando em suas possibilidades de saber.

Esta seria uma alternativa ao modelo tradicional, que enfatiza

o “erro” como algo negativo e não vê nada entre o saber e o não

saber, em cuja relação contraditória produz-se o conhecimento.

Seção 5 - A Psicologia na escola e nos novos espaços socioeducativos

Como você pôde perceber durante o estudo da disciplina, os

psicólogos têm sentido necessidade de redimensionar o seu papel

na escola, visando menos os indivíduos isoladamente e mais os

fenômenos que se dão nas relações de ensino e aprendizagem.

Há muito tempo, o psicólogo educacional freqüentemente

tem atuado como um psicólogo clínico dentro da escola. A

ele caberia ocupar-se dos fenômenos individuais e afetivos dos

alunos, encaminhando-os para atendimento especializado

sempre que necessário. Comumente, a Psicologia na escola

vinha se restringindo aos serviços de orientação educacional

individualizada e orientação profi ssional em uma perspectiva de

encaminhamento ao mercado de trabalho de acordo com aptidões

tidas como naturais dos sujeitos.

Atualmente, a necessidade de uma visão mais contextualizada

dos indivíduos na realidade escolar e social faz-se necessária.

Para além da psicologia escolar tradicionalmente praticada, a

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Universidade do Sul de Santa Catarina

psicologia da educação tem estudado os processos de mudança

nos sujeitos conseqüentes de sua participação em situações e

atividades educativas de diferentes naturezas.

Esse estudo vem assumindo como fi nalidades:

contribuir teoricamente para a melhor compreensão e

explicitação desses processos;

auxiliar na construção de procedimentos e estratégias

para planejar e intervir nesses processos a fi m de dar-lhes

uma determinada direção;

auxiliar no estabelecimento de práticas educativas mais

efi cazes, satisfatórias e enriquecedoras para os sujeitos

envolvidos.

Você já sabe, no entanto, que o conhecimento não é algo

neutro, e pode ser ideológico, na medida em que pode ser

tomado como verdade de acordo com os interesses dos grupos

que o defendem, como mostra a história das relações entre a

Psicologia e a educação.

Autores como Bock (2003), em uma perspectiva sócio-histórica

de atuação em Psicologia, vêm propondo que a instituição

escolar deve ser analisada em sua complexidade e historicidade,

começando por um recorte e partindo deste para compreender a

totalidade concreta dessa realidade. A observação empírica e o

pensamento teórico devem ser nossos instrumentos na busca das

contradições e determinações do espaço de relações sociais que

estamos analisando.

A escola como instituição fundamental do capitalismo tem como

função difundir normas, valores e conhecimentos que justifi quem

as relações sociais estabelecidas nesse sistema. Ela consegue tal

intento não só por meio dos conteúdos transmitidos, mas também

por meio de sua organização e pelas práticas cotidianas que a

constituem, encarnando as contradições sociais.

O professor, o pedagogo, o psicólogo educacional e todos aqueles que se interessam pelo que acontece dentro da sala de aula devem refl etir sobre como se constituem as relações didáticas e sociais, sob um ponto de vista mais abrangente, estabelecidas entre o professor e o grupo de alunos.

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Unidade 5

Para compreender melhor estas relações, cabe destacar os

conceitos de situação didática, a transposição didática e o

contrato didático, este último em especial, discutidos a partir das

idéias de Menezes e Araújo (2004).

Situação didática - é organizada com a fi nalidade de que um

saber constituído ou em vias de constituição seja negociado

no contexto de sala de aula e apropriado pelos alunos, sob a

coordenação/organização do professor.

Transposição didática - transformação que o saber

cientifi co sofre desde a comunidade científi ca até a sala de

aula. Nessa transformação, o saber científi co se transforma

em saber a ser ensinado.

Contrato didático - é considerado o fenômeno central que

aborda a relação professor-aluno-saber na construção do

conhecimento. Corresponde às expectativas e às regras que

balizam a relação didática entre professor e aluno. Estas são

explicitadas, em pequena parte, mas, em sua maior parte,

permanecem implícitas. Estabelecem-se entre o professor e o

aluno ou um grupo de alunos e o saber, defi nindo o papel de

cada um dos participantes da relação didática, bem como as

expectativas que cada um tem em relação ao outro.

Na dimensão implícita do contrato didático, a subjetividade do

professor e do aluno entram em jogo, trazendo as marcas de

outras relações e contratos didáticos vivenciados anteriormente.

O professor, com base em vivências anteriores, pode eleger alunos

que terão sucesso ou fracasso na escola, e essas escolhas tornam-

se determinantes para o seu real desempenho.

O aluno, também com base em suas próprias vivências, pode

estabelecer uma relação de transferência com o professor

que, por sua vez, também pode apresentar características

próprias, aparecendo como companheirismo, distanciamento,

desconforto, segurança, entre tantos outros sentimentos que

certamente são condicionantes do processo de ensino e de

aprendizagem.

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A relação do professor com o conhecimento a ser ensinado no contrato didático também merece consideração. Tanto o professor quanto o aluno tem sua própria relação com o conhecimento, mas aquele entra nessa relação em uma posição privilegiada, pois é ele quem conhece o que será ensinado e organizará as situações didáticas. Isto confere ao professor certo poder de mostrar, esconder ou promover a construção individual ou coletiva do conhecimento.

Enfrentamos o desafi o de conviver em novos espaços e tempos

educativos. Os meios para a difusão de conhecimento que vão

surgindo com a constante inovação tecnológica e a crise pela qual

passam instituições tradicionais apontam para a necessidade de

fortalecer a convivência e a interação humana.

Os novos espaços socioeducativos relacionam-se às novas

formas de organização familiar, às comunidades virtuais, aos

espaços comunitários de interação (junto aos serviços públicos

ou associações de bairro, por exemplo), aos movimentos

sociais e outros contextos em que a Psicologia e a educação se

fazem necessárias.

Porém, será que a constituição desses novos espaços e tempos educativos poderá viabilizar:

a auto-realização? o respeito às diferenças individuais? a conquista da autonomia na base da interdependência e não no individualismo? a ampliação dos vínculos sociais?a redistribuição do poder?

A constituição saudável da subjetividade, o jeito de ser

próprio de cada um nas relações com os outros depende

de cada um desses aspectos. Neste sentido, deixamos estas

questões para refl exão, pois apenas nossa atividade, na

constituição desses novos espaços e tempos, poderá trazer as

devidas respostas.

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Unidade 5

Atividades de auto-avaliação

1) Caracterize três visões diferentes sobre como se produz o fracasso escolar das crianças pobres.

2) Na seção 2, você estudou a visão das difi culdades de aprendizagem que as toma como distúrbios neurológicos. Pense e responda: por que esta visão é criticada por muitos pesquisadores da área da Psicologia da Educação?

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3) A psicopedagogia clínica, por infl uência da psicanálise, entende as difi culdades de aprendizagem como sintomas. Explique o que signifi ca compreender a difi culdade de aprendizagem como um sintoma. Para isto, você deverá explicar o que é um sintoma, de acordo com a psicanálise.

4) O conceito de zona de desenvolvimento proximal desenvolveu-se e foi se tornando mais coerente com a obra de Vygotsky como um todo durante seu processo de elaboração. Identifi que os momentos pelos quais passou a elaboração deste conceito e as implicações educacionais derivadas de cada um desses momentos.

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Unidade 5

Síntese

Nesta unidade, você conheceu diferentes pontos de vista

sobre o fracasso escolar das crianças pobres, e aprendeu mais

sobre o modo como as difi culdades de aprendizagem podem

ser analisadas de acordo com as pesquisas em Psicologia.

Você estudou o conceito de erro construtivo e o de zona de

desenvolvimento proximal, buscando as implicações destes para a

análise do ensino e da aprendizagem na escola.

Saiba mais

Para saber mais sobre os temas estudados nesta unidade, leia o

livro A produção do fracasso escolar, de Maria Helena Souza

Patto. Outra sugestão é a obra A inteligência aprisionada,

da psicopedagoga clínica Alicia Fernandez. Você encontra as

referências completas ao fi nal do livro didático.

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Para concluir o estudo

Chegamos ao fi nal de uma longa caminhada na

disciplina Psicologia e Educação. Pensando no seu

futuro como profi ssional da educação, acredito que

muitos dos conteúdos estudados já têm seu sentido

bem evidente para você hoje. Imagino também que

outros conteúdos poderão fi car mais claros somente na

medida em que você for identifi cando relações entre

esses conceitos e os novos conhecimentos a serem

construídos nas próximas disciplinas. Esta é a dinâmica

do desenvolvimento do conhecimento: organizado em

rede, este se amplia e se modifi ca, se automatiza e se

torna mais complexo, conforme agimos sobre ele com o

auxílio dos colegas, tutores e professores.

Como autora, estive ao mesmo tempo perto e longe de

você nesse período de estudo, pois procurei dialogar

com a sua imagem em minha mente ao escrever,

e você, ao ler, provavelmente fez o mesmo. Desta

forma, foi um prazer estar ao seu lado e acompanhar à

distância o seu progresso.

Resta então a despedida e a expectativa de que os

fundamentos psicológicos da educação sejam agora

menos misteriosos para você do que pode ter sido

antes da passagem por esta experiência de ensino-

aprendizagem.

Um grande abraço!

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Sobre a professora conteudista

Maria da Glória Silva e Silva é licenciada e mestre

em Psicologia pela Universidade Federal do Rio

Grande do Sul (UFRGS). Ministra disciplinas de

Psicologia da Educação, da Aprendizagem e do

Desenvolvimento e de Prática de Ensino em cursos

de formação de educadores em nível de graduação

e de pós-graduação, nas modalidades presencial e

a distância em diferentes universidades, entre as

quais estão a Universidade Estadual do Rio Grande

do Sul (UERGS), a Universidade Federal de Santa

Catarina (UFSC) e a Universidade do Estado de

Santa Catarina (UDESC), além da Universidade do

Sul de Santa Catarina (UNISUL). Atua também

como professora tutora e é autora de diversos livros

didáticos para educação a distância.

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Referências

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ENGELMANN, Arno (org.). Wolfgang Köhler: psicologia. São Paulo: Ática, 1978.

ESTEBAN, Maria Tereza. Repensando o fracasso escolar. Cadernos CEDES, São Paulo, n. 28, p. , 1992.

EYSENCK, M. W.; KEANE, M. Psicologia cognitiva. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.

FERNANDEZ, Alícia. A inteligência aprisionada: abordagem psicopedagógica clínica da criança e sua família. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991.

GADOTTI, Moacir. História das idéias pedagógicas. São Paulo: Ática, 1999.

GARCÍA, Jesus Nicasio. Manual de difi culdades de aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 1998.

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Respostas e comentários das atividades de auto-avaliação

Unidade 1

1) É importante mostrar como os especialistas em educação buscaram mecanismos de controle do processo educativo a fi m de garantir que seria gasto apenas o necessário para produzir indivíduos adequados às necessidades do mercado de trabalho da época, caracterizado pela produção fabril nos moldes tayloristas.

2) Para desenvolver sua resposta lembre-se que, para Claparede, a necessidade é anterior ao interesse.

3) Estes pesquisadores são tidos como funcionalistas porque acreditam que o desenvolvimento humano relaciona-se à interação com o meio e à adaptação ao mesmo. O conhecimento que vale é o que funciona na prática para a adaptação e a resolução de problemas.

4) J. Dewey valoriza mais o conteúdo ensinado do que Claparede. Este último enfatiza mais o interesse e as aptidões do aluno para que a aprendizagem aconteça.

5)

ESCOLA OU TEORIA PALAVRAS-CHAVE

PSICOLOGIA DA FORMA/GESTALT

TodoInsigthPercepçãoAtenção

BEHAVIORISMOEstímuloRespostaReforço

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Unidade 2

1) Para desenvolver sua resposta, lembre-se que, para Claparède, a necessidade é anterior ao interesse.

2) Estes pesquisadores são tidos como funcionalistas porque acreditam que o desenvolvimento humano relaciona-se à interação com o meio e à adaptação ao mesmo. O conhecimento que vale é o que funciona na prática para a adaptação e a resolução de problemas.

3) J. Dewey valoriza mais o conteúdo ensinado do que Claparède. Este último enfatiza mais o interesse e as aptidões do aluno para que a aprendizagem aconteça.

Unidade 3

1) Os processos mentais são descritos na seção 1 da unidade 3. É possível pesquisar mais sobre eles em manuais de psicologia ou em sites da internet. O exemplo apresentado é pessoal do aluno e pode ser avaliado e comentado pelo professor tutor.

2) Os conceitos de aprendizagem por descoberta, aprendizagem por recepção, aprendizagem mecânica e aprendizagem signifi cativa constam na seção 2 da unidade 3. A partir das características desses conceitos, você deverá dar uma resposta pessoal, relacionada com sua própria experiência, que ilustre o que foi aprendido. Você deve mostrar como tanto a aprendizagem por descoberta quanto a aprendizagem por transmissão podem ser mecânicas ou signifi cativas, dependendo de como ocorre o processo de ensino e de aprendizagem.

3) Para Bruner, não existe um ordenamento único a ser empregado no ensino dos conteúdos. A ordenação deve considerar a experiência anterior do aluno. Ainda assim, apresentar o conteúdo proposto ao aluno - inicialmente, ações motoras sobre ele, em seguida, representações como imagens ou ícones e, fi nalmente, como representações simbólicas da ordem da linguagem -, seria um ordenamento interessante, por respeitar o processo de compreensão característico dos aprendizes. O currículo espiral, que retoma conteúdos já ensinados de tempos em tempos, tornando-os mais complexos conforme o desenvolvimento do aluno, pode ser organizado também seguindo essas etapas de compreensão.

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Unidade 4 1) (b)

2) Você pode citar oposições como organicismo X mecanicismo, atividade X passividade do sujeito, aspectos contextuais X características inatas. Após caracterizá-la, de acordo com o conteúdo do livro didático, os exemplos e comentários são pessoais e poderão ser avaliados pelo tutor.

Unidade 5

1) Os rótulos relacionam-se à utilização de um resultado isolado em um teste, avaliação ou tarefa para tirar uma conclusão sobre todas as perspectivas de desenvolvimento de um aluno. A partir de informações como essa, ou de informações como idade, tamanho, anos de repetência ou prontidão para aprender, por muito tempo as classes de alunos foram divididas, em busca de homogeneização. Você tem experiências que ilustram esta situação? Resposta pessoal.

2) Conforme o conteúdo estudado, a teoria da carência ou defi ciência cultural foi a primeira amplamente divulgada e aceita. Ela atribuía as causas do fracasso escolar ao indivíduo e veiculava uma imagem negativa da criança pobre, dizendo que esta teria menos condições para aprender do que as crianças ricas pela falta de estímulos em seu ambiente. Em um segundo momento, propõe-se que a criança pobre não é defi ciente, mas apenas diferente da de classe média ou alta, e a escola não estaria preparada para receber crianças de cultura diferente. Já em um terceiro momento, o foco não está mais no ambiente cultural de origem da criança, mas nas práticas escolares, que passam a ser investigadas em busca das formas de produção do fracasso escolar.

3) Esta visão é criticada porque responsabiliza unicamente características inatas do aluno por seu desempenho escolar, desconsiderando as relações em que este está inserido e o espaço pedagógico.

4) Sintomas são uma das formas que os conteúdos inconscientes têm para vir à tona, para se expressar. Geralmente, são dolorosos e incapacitantes, do ponto de vista emocional. A difi culdade para aprender pode ocorrer como um sintoma relacionado a desejos inconscientes de ser amado pelas pessoas próximas, por exemplo, que leva a reproduzir comportamentos que são nocivos ao sujeito, mas lhe parecem contribuir para ser mais aceito, o que lhe dá um conforto a curto prazo.

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