Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

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RENATA LOURENÇO DOS SANTOS Radiojornalismo nas ocupações sociais Implantação de programas de rádio em assentamentos de movimentos sociais de luta pela terra. VITÓRIA DA CONQUISTA 2004

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monografia sobre omeio de comunicação radio como fortalecedor de movimentos socias populares de luta pela terra, escrito em 2003.

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RENATA LOURENÇO DOS SANTOS

Radiojornalismo nas ocupações sociais

Implantação de programas de rádio em assentamentos

de movimentos sociais de luta pela terra.

VITÓRIA DA CONQUISTA

2004

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RENATA LOURENÇO DOS SANTOS

Radiojornalismo nas ocupações sociais

Implantação de programas de rádio em assentamentos

de movimentos sociais de luta pela terra.

Trabalho apresentado ao Colegiado do Curso de

Comunicação Social da universidade Estadual do Sudoeste da

Bahia, UESB, para obtenção do título de Bacharel em

Comunicação Social, habilitação Jornalismo, sob a orientação do

Professor Dirceu Goés

VITÓRIA DA CONQUISTA

2004

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RENATA LOURENÇO DOS SANTOS

Radiojornalismo nas ocupações sociais

Implantação de programas de rádio em assentamentos

de movimentos sociais de luta pela terra.

Essa monografia foi julgada e aprovada para a

conclusão do curso de Comunicação Social/Jornalismo da

Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.

Vitória da Conquista, 13 de dezembro de 2004.

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dirceu Góes

..........................................................................

Prof.ª Ana Claudia Pacheco

..........................................................................

Prof. José Carlos Simplício

..........................................................................

Page 4: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus pais, que tornaram

minha vida real.

Aos amigos, que me deram muita força e incentivo.

À Sérgio , que teve muita paciência e companheirismo.

E ao Dono de tudo isso, DEUS!

Page 5: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

AGRADECIMENTOS

Para conclusão desse trabalho agradeço ao Professor

Dirceu Góes pela orientação e pelos ensinamentos passados.

A professora Ana Claudia que também orientou o

trabalho e, principalmente, se tornou uma verdadeira amiga.

Ao colegiado de comunicação , nas pessoas de Kalila

Gil e Hélia, pelos vários incentivos apoio dados.

E, especialmente, aos assentados e coordenadores dos

movimentos sociais entrevistados, pelas horas de conversa e total

dedicação para o enriquecimento do texto.

Sem todos acima citados não seria possível o término

do trabalho.

Page 6: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

"A utilização dos meios de comunicação e da própria

comunicação como intercâmbio para a prática libertadora deve

realizar-se politicamente e assumir um compromisso com a

história que presentemente se desenrola. Ou os meios de

comunicação servem à opressão ou auxiliam a libertação."

Bordenave

Page 7: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

RESUMO

Este trabalho monográfico pretendeu criar um espaço de referência em

comunicação popular, fazendo valer o direito de todo ser humano, o de se comunicar.

Com o título, Radiojornalismo nas ocupações sociais, o trabalho prevê, a

implantação de programas de rádio nos assentamentos dos movimentos sociais de luta

pela terra. Seu contexto aborda a implantação do rádio no Brasil e toda sua trajetória,

envolvendo evoluções tecnológicas, investimentos financeiros, atrelamento político e

condição atual do meio radiofônico, apontando, inclusive caminhos alternativos

seguidos pelo rádio, na tentativa de se tornar um meio mais democrático.

Como a proposta está diretamente ligada aos movimentos sociais de luta pela

terra, o trabalho fala da situação agrária brasileira e conseqüente formação dos

referidos movimentos.

Por último, o trabalho trata da prática adquirida em visitas aos acampamentos

e, com essa prática, estrutura do programa. É quando aparece a proposta consolidada

do programa, com os seus horários, definições de pautas, quadros, função social, e

tudo que tenha relação direta com o programa, com o que vai ao ar. Tudo isso como

resultado da pesquisa de campo.

Palavras-chave: radiojornalismo; comunicação popular; movimentos

sociais; democratização dos meios de comunicação.

Page 8: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

ABSTRACT

This monographic work intended to create a space of reference in popular

communication, making to be valid the right of all human being, to communicate.

With the title, radiojornalismo in the social occupations, the work foresees, the

implantation of programs of radio in the nestings of the social movements of fight for the

land. Its context approaches the implantation of the radio in Brazil and all its trajectory,

involving technological evolutions, financial investments, join politician and current

condition of the brazilian radio radiophone, pointing, also alternative ways followed by

the radio, in the attempt of becoming it self way the most democratic one.

As the this proposal is directly linked on the social movements of fight for the

land, the work says of the Brazilian agrarian situation and consequent formation of the

related movements.

At last, the work deals with practises acquired in visits to the encampments

and, with this practises, structure of the program. It is when it appears the proposal

consolidated of the program, with its schedules, definitions of guidelines, parts, social

function, and everything that has direct relation with the program, with what it goes to air.

Everything this as resulted of the field research.

Key-words: radiojornalism; popular communication; social moviments;

democratization of the comunicative ways.

Page 9: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

SUMÁRIO

Introdução...................................................................................................................10

Capítulo1. Rádio no Brasil................................................ ..........................................13

1.1 Fase de

implantação ..............................................................................13

1.2 Ajuda da

tecnologia ...............................................................................18

1.3 Radiojornalismo .................................................................................

....19

1.4 Rádio e o poder

político ........................................................................ 21

1.5 Festival de

concessões..........................................................................23

1.6 Tendências

atuais..................................................................................25

1.7 Conseqüências da

atualidade ...............................................................28

1.8 Novos

caminhos ....................................................................................30

1.9 Rádios Livres

Comunitárias ...................................................................31

Capítulo 2. Movimentos sociais, Mídia e Comunicação Popular ................................37

2.1 Movimento social ...................................................................................37

2.2 A luta pela terra e a formação dos movimentos sociais no campo .......40

2.3 Movimentos sociais X Grande mídia .....................................................45

2.4 A comunicação comunitária ...................................................................48

Capítulo 3. O programa de Rádio ....................................................... .......................51

3.1 Porque um programa de rádio? .............................................................51

3.2 Linha editorial ........................................................................................53

Page 10: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

3.3 Público alvo ...........................................................................................54

3.4 Mediação do público .............................................................................55

3.5 Conteúdo dos programas .....................................................................56

3.6 Estrutura do programa ..........................................................................58

3.7 Modelo de programa .............................................................................55

Considerações Finais ...............................................................................................68

Referências Bibliográficas .......................................................................................70

Bibliografia consultada ............................................................................................72

Anexos .......................................................................................................................73

INTRODUÇÃO

Este trabalho surge como meio de trazer, mais uma vez, a discussão dos

movimentos sociais e sua conflituosa relação com os meios de comunicação no Brasil.

É um meio que pretende mostrar o esforço e dedicação dos movimentos sociais na

busca pelos seus direitos e, principalmente, pela sua liberdade de expressão. No

presente trabalho essa liberdade começa a ser alcançada atravez do rádio, que

entendemos ser um grande meio de comunicação popular, de longo alcance e baixo

custo.

Na era da globalização, as tecnologias da mídia passaram por um processo

acelerado e constante de modificações que acabaram por alterar o próprio processo da

comunicação, principalmente a comunicação de massa. Dessa forma a comunicação,

que num processo histórico e político já se encontra sob poder e acesso de poucos,

reduz ainda mais o seu alcance, e o privilégio de atuar em seu cenário continua com os

mesmos donos de rádio, tv e jornal.

Parceira à presença dominante de grupos familiares e da vinculação com as

elites políticas locais e regionais, está a concentração da propriedade. São oligopólios

Page 11: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

ou monopólios que ora comandam uma mesma área midiática, ora participam na

integração de etapas da cadeia de produção ou distribuição da comunicação, ou ainda

dominando várias tecnologias, reafirmando o controle da maioria do setor midiático por

poucos.

Além dessas questões de controle da mídia, existe o problema da exclusão

social. Aqui vamos tratar da exclusão dos movimentos sociais de luta pela terra. A

necessidade de uma reforma agrária é cada vez mais notável, em defesa das milhares

de famílias desfavorecidas com a exclusão no campo e na cidade. Tal exclusão provoca

o aparecimento de experiências conjuntas, que vão lutar pela terra, moradia e trabalho.

Grupos como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, o MST, são exemplos

de organizações sociais que lutam pela reforma agrária no Brasil.

Mas estes movimentos não são reconhecidos dignamente pela mídia, e se

sentem ofendidos quando citados nos noticiários que, quase sempre, os representam

enquanto bagunceiros, radicais ou invasores.

É nesse ponto que o trabalho pretende se desenvolver. Criar espaços

democráticos de comunicação, que sejam geridos, formulados e comandados pelos

movimentos sociais. O trabalho deve ser uma alternativa viável de comunicação

popular/comunitária, que contemple uma grande maioria de cidadãos excluídos da zona

urbana e dos grandes pólos midiáticos.

Para isso o rádio foi escolhido como peça principal do projeto. Será através

de programas irradiados por rádios comunitárias locais, que a população rural dos

movimentos sociais de luta pela terra poderão ter acesso a informações sobre

agricultura, higiene, educação, segurança e também ao lazer.

Estando divido em três capítulos, no primeiro o trabalho fala exclusivamente

sobre o rádio no Brasil e sua evolução ate os nossos dias, fazendo uma análise da sua

forte relação com a tecnologia, a política e, conseqüentemente, com o poder. Chegando

aos efeitos dessas ligações para seu desenvolvimento atual. Neste momento

apontamos caminhos para o rádio, a fim de ser sempre mais democrático.

No segundo capítulo falaremos dos movimentos sociais, culminando nos

movimentos de luta pela terra. Será tratado suas origens, características e sua relação

com a grande mídia. Como a imprensa vê e mostra esses movimentos para seu

Page 12: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

público, e como os movimentos se vêem nessa imprensa. Contrapondo a grande mídia

falamos sobre um viés da comunicação alternativa, a comunitária e suas formas de

atuação.

O terceiro capítulo é a junção do rádio com os movimentos sociais. É a

estruturação do programa de rádio. Nessa fase foi realizada uma pesquisa de campo

em assentamentos de movimentos sociais, para sabermos exatamente o que esse

público espera de um programa de rádio. Assuntos a serem tratados, estilos de música

ou a hora de transmissão foram questões importantes para a finalização do projeto, que

conta também com sugestões de quadros.

Além da pesquisa de campo utilizamos o conceito teórico de “rádio

informativo” defendido por Eduardo Meditisch, que afirma que tal conceito se refere a

“um jornalismo novo, qualitativamente diferente”.

Tal trabalho nos leva a crer que qualidade, democracia e jornalismo devem

andar juntos e devem ser para todos. Portanto queremos incluir os movimentos sociais

nos processo de comunicação, tornando cada cidadão dos assentamentos capazes de

produzir sua própria comunicação e ter seu direito de livre expressão garantido.

Page 13: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

CAPÍTULO I

O RÁDIO NO BRASIL

1.1 Fase de implantação

Oficialmente o rádio no Brasil foi inaugurado em 7 de setembro de 1922,

como parte das comemorações do Centenário da Independência, quando, através de

80 receptores, a alta sociedade carioca pode ouvir em casa o discurso do Presidente

Epitácio Pessoa. Apesar de causar muito impacto, as transmissões radiofônicas logo

foram encerradas por falta de um projeto que lhes dessem continuidade.

Podemos considerar que a radiodifusão foi definitivamente instalada no Brasil

no dia 20 de abril de 1923, quando começou a funcionar a Rádio Sociedade do Rio de

Janeiro, fundada por Roquete Pinto e Henrique Morize, uma emissora que tinha o

cunho prioritariamente educativo. A partir daí o rádio se desenvolve em diversas regiões

do país, tendo destaque no cenário radiofônico nacional as emissoras cariocas e

paulistas.

Em seu livro, A Informação no Rádio, Gisela Ortriwano afirma que em sua

fase de implantação as rádios nasceram nos ambientes de clubes ou associações

formados pelos idealistas que acreditavam na potencialidade do novo meio, daí, hoje

termos muitas estações denominadas “clubes” ou “sociedade” (ORTRIWANO, 1985:

14).

Page 14: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

Este veículo não atingiu de imediato as massas. Devido ao alto custo do

aparelho, só uma restrita parte da sociedade poderia adquiri-lo. Além disso, suas

programações contavam sempre com assuntos seletos como recitais de poesia, óperas,

palestras culturais, assuntos interessantes para os próprios financiadores do rádio, e se

distanciavam da cultura popular, inerente à grande maioria da população.

Este fato impediu que o rádio se estabilizasse, visto que não havia tantos

ricos engajados em patrocinar e sustentar o meio, que se mantinha com as

mensalidades pagas pelos proprietários de receptores, com eventuais doações de

entidades privadas ou públicas e, muito raramente, com inserção de anúncios pagos,

que eram em sua maioria proibidos pela legislação da época. Assim o rádio lutava com

dificuldades, sem estrutura econômico-financeira que pudesse favorecer o seu

desenvolvimento. A década de 20, para as emissoras, foi um período de lentidão não

apenas por estas razões de ordens técnicas, mas também pela turbulenta conjuntura

política. Foi um tempo de instabilidade, com revoltas tenentistas e as constantes

declarações de Estado de Sítio; nesse contexto, o rádio poderia tornar-se um perigoso

meio de comunicação, de divulgação dos acontecimentos e de propaganda contra o

poder estabelecido.

O governo então limitou a programação, que deveria ter somente assuntos

com fins educativos, científicos e artísticos, para o beneficio do público, ficando

expressamente proibida a propagação de notícias internas de caráter político sem a

prévia permissão do governo.

As transformações surgidas no país a partir da Revolução de 1930, com o

despontar de novas forças como a indústria e o comércio, que precisavam colocar seus

produtos no mercado interno, aliadas as mudanças na própria estrutura administrativa

federal, com a forte centralização do poder Executivo engendrada por Getúlio Vargas,

são o contexto que favorecem a expansão da radiodifusão nos anos 30: o rádio mostra-

se um meio extremamente eficaz para incentivar a introdução de estímulos ao

consumo. As mensagens radiofônicas, então, vão se transformando e se adaptando a

essa nova função comercial. O que era erudito passa a ser popular, numa programação

voltada para o lazer e a diversão. A preocupação educativa foi sendo deixada de lado,

dando lugar aos interesses mercantis.

Page 15: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

Rapidamente os empresários e comerciantes percebem no rádio um meio

divulgador de seus produtos, muito mais eficiente que os jornais impressos, devido,

principalmente, ao grande número de analfabetos existentes no Brasil1.

Assim o rádio passa por um processo de reformulação estrutural, ampliando

seus recursos, na tentativa de suprir as novas atribuições dos processos de

industrialização, urbanização, e avanços tecnológicos, exigindo cada vez mais

profissionalismo e caráter empreendedor daqueles que trabalhavam no meio.

O rádio atingiu outros níveis da realidade brasileira e passou a responder às

necessidades coletivas, como meio recreativo, informativo, ou formador de opinião.

Além da diversão como forma de atrair o público ouvinte, aumentar a

audiência e vender mais produtos, o rádio passou a servir como palanque das

tendências e forças políticas que despontavam na época. Diante da sua potencialidade

em difundir ideais, o Governo resolve usá-lo como aliado, tornando-se instrumento no

fortalecimento das correntes políticas atuantes.

Na Revolução Constitucionalista de 1932, em São Paulo, a Rádio Record

conclamou o povo a favor da causa política, com César Ladeira, que ganhou fama

nacional como o locutor oficial da Revolução. Segundo Antonio Pedro Tota, o que

ocorreu em 1932 foi uma verdadeira guerra no ar entre as emissoras paulistas e

cariocas. As rádios Philips, do Rio de Janeiro, e Record, de São Paulo, que até as

vésperas da Revolução realizavam transmissões conjuntas, tornaram-se inimigas.

Após o início do movimento paulista as rádios passaram a servir como armas

na luta, ocupando campos opostos na batalha. O rádio mostrava-se um excelente meio

de propagação ideológica, um veículo revolucionário, com seu largo alcance e rapidez

na divulgação dos fatos. Ele vai definindo sua linha de atuação e assumindo um papel

cada vez mais importante na vida política e econômica do país.

Getúlio Vargas foi o primeiro a ver no rádio uma grande importância política.

Ele aumentou o número de emissoras confiante na organização da propaganda

governamental junto à população. Era o primeiro governante brasileiro a utilizar o rádio

dentro de um modelo autoritário, Vargas entendia que:

1 Em 1927 22,1% dos brancos, 52,2% dos negros e 37,1% dos mulatos são analfabetos no Brasil, segundo estatísticas do dr. Lobo da Silva. SITE www.unicamp.br

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“O Governo da União procurará entender-se a propósito, com os

estados e municípios, de modo que, mesmo nas pequenas aglomerações, sejam

instalados rádios receptores, providos de alto-falantes, em condição de facilitar a

todos os brasileiros, sem distinção de sexo nem de idade, momentos de

educação política e social, informes úteis aos seus negócios e toda sorte de

notícias tendentes a entrelaçar os interesses diversos da nação... à radiotelefonia

está interessado o papel de interessar todos por tudo quanto se passa no Brasil”

Getúlio Vargas (ORTRIWANO, 1986)

Logo após a Revolução de 30 havia sido criado o Departamento Oficial de

Propaganda, DOP, encarregado de uma seção de rádio que antecedeu a “Hora do

Brasil”. Em 1934, o DOP foi transformado em Departamento de Propaganda e Difusão

Cultural, surgindo então a Voz do Brasil.

Posteriormente, o decreto nº 1.915, de 27 de dezembro de 1939, criava o

Departamento de Imprensa e Propaganda, o DIP, diretamente ligado à Presidência da

República “tendo a seu encargo a fiscalização e censura não só do conteúdo das

programações radiofônicas, como as do cinema, teatro e jornais” (ORTRIWANO, 1985:

19)

Nesse ambiente surge uma referência muito importante para história do rádio

no Brasil. Em setembro de 1936 foi inaugurada a Rádio Nacional do Rio de Janeiro, tida

como a maior lenda entre as emissoras do país. O início de suas atividades foi o fato

que marcou o período das mais sérias transformações ocorridas na rádio difusão

brasileira, até o advento da televisão.

A Rádio Nacional surgiu em um cenário propício ao crescimento das

emissoras populares. A legislação fornecia uma maior estabilidade ao setor; no campo

profissional começa a surgir um grupo de artistas formado pelo rádio, que iniciaram

suas carreiras diretamente nesse veículo.

Na parte técnica os aperfeiçoamentos eram constantes. A Rádio Nacional

operava com dois transmissores para ondas médias (25 e 50 kw), e dois para ondas

curtas (cada um com 50 kw), conseguindo cobrir todo o território brasileiro. Ela

Page 17: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

permaneceu, reconhecidamente, como a emissora de maior alcance no Brasil, daquela

época, chegando, sozinha, a atingir 40 por cento de audiência.

A década de 30 foi importante para que o rádio se definisse em seus

caminhos e encontrasse seu rumo na fase seguinte, acompanhado e auxiliando o

desenvolvimento nacional como um todo.

O rádio comercial e a popularização do veículo implicaram a criação de um

elo entre o indivíduo e a coletividade, mostrando-se capaz não apenas de vender

produtos e ditar modas, como também de mobilizar massas, levando-as a uma

participação ativa na vida nacional. Os progressos da industrialização ampliavam o

mercado consumidor, criando as condições para a padronização de gostos, crenças e

valores.

Estando então mais bem preparado e estruturado, o rádio entra na década de

40, na chamada “época de ouro do rádio brasileiro”. Período em que prossegue a

implantação de novas emissoras em todo país. Em 1940 havia 76; 117, em 1945; em

1950 eram 243 emissoras, que ao contrário dos jornais impressos, não se

concentravam apenas nas grandes cidades. Junto com este aumento, cresceu também

o número de aparelhos receptores entre a população, em 1948 já existiam no país mais

de 3 milhões deles. Segundo Ortriwano esse fato possibilita o aumento da concorrência

entre as emissoras, pela audiência dos ouvintes, é então que:

“ inicia-se uma guerra pela conquista de público sempre maiores.

Na ânsia de angariar ouvintes, inclusive os muitos analfabetos, a programação

de certas emissoras vai se popularizando.” (1985: 19)

Pela primeira vez se descobria nos meios de comunicação uma indústria de

consciência. Os governos apoderavam - se com maior freqüência do meio a fim de

manipular a opinião pública. Sendo a Rádio Nacional a melhor, mais bem equipada, e

mais ouvida, emissora do país, em 1940, o Governo decidiu que ela seria o instrumento

de afirmação do regime, e Getúlio Vargas decretou a encampação da rádio.

Miriam Goldfeder, procurando identificar o significado político-ideológico mais

amplo da Rádio Nacional, a partir da função ocupada por ela no conjunto das práticas

sociais do período, conclui que as razões maiores de sua eficácia poderiam ser

Page 18: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

localizadas no conjunto das relações sociais, econômicas e políticas que teriam

permitido a ampla penetração de seu projeto.

“Cumpre-nos, portanto, compreender a Rádio Nacional no conjunto

dos mecanismos de legitimação ideológica acionados direta ou indiretamente

pelo sistema de dominação política, vale dizer, como prática cultural, com

autonomia e atuação específicas, destinada, no entanto, em última instância, a

reiterar o quadro geral dos valores dominantes no período. Esta emissora

deveria atuar como um mecanismo de controle social, destinado a manter as

expectativas sociais dentro dos limites compatíveis com o sistema como um

todo”.(GOLDFEDER apud ORTRIWANO, 1985: )

Tal estudo de Mirian Goldfeder vem reforçar a tendência do rádio na

divulgação de propaganda política governamental e, principalmente a sua tendência

em, estando sob mando do Governo, controlar a sociedade para que nada ficasse ‘fora’

da ordem.

A “época de ouro” do rádio termina, coincidentemente, com o surgimento no

Brasil de um novo meio, a televisão (1950). Profissionais, programas e fontes de

financiamento foram transferidos em massa para o novo veículo, a tal ponto que o rádio

parecia ter chegado ao fim. Esse fato conseguiu alterar muito o formato e a dinâmica no

meio radiofônico. Primeiro pela sua reestruturação no quadro de programas, já sem os

grandes artistas, e depois pela sua persistência em conquistar a audiência do público.

1.2 Ajuda da tecnologia

Após o fim da época de ouro, as novas tecnologias vieram ajudar o progresso

do rádio. A primeira delas foi a possibilidade de veicular música gravada, através do

acesso a um acervo inesgotável produzido pela indústria fonográfica (MEDITSCH,

2001: 36). A música, que até então representava o espaço mais caro da programação,

pela necessidade de manter, com remuneração, elencos de artistas para execuções ao

vivo, transformou-se no mais simples e barato.

Page 19: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

Também contribui para o sucesso do rádio o desenvolvimento de novas

formas de conservação, manipulação e reprodução de som, e o surgimento da

Freqüência Modulada (FM), para sua emissão, que melhoraram a qualidade de

programação musical, diminuindo seus custos.

A substituição das válvulas nos aparelhos receptores pelos transistores,

tornando o rádio portátil, o aumento do número de emissoras, com nova faixa de

freqüências, e a multiplicação dos receptores, cada vez mais simples e baratos, abriram

caminho para a segmentação da audiência, dando origem a novos modelos de

programação radiofônica, cada vez mais distantes daquele que prevaleceu no início do

rádio brasileiro.

1.3 Radiojornalismo

Foi a partir dessa época, 1940, que o radiojornalismo ganhou grande impulso.

Dois programas noticiosos travaram valorosa disputa pela audiência no rádio brasileiro

a partir dos anos quarenta: o Repórter Esso e O Grande Jornal Falado Tupi. O primeiro

estreou em 1941, na Rádio Nacional, permanecendo no ar durante 27 anos e

consagrando a voz de Heron Domingues. Com suas edições extraordinárias,

anunciadas ao som de clarins inquietantes, ditava um novo formato de se fazer notícias

em rádio. O Grande Jornal era comandado por Corifeu de Azevedo Marques e Armando

Bertoni na Rádio Tupi de São Paulo, que fazia parte do império de comunicações

montado por Assis Chateaubriand.

Foi um período fértil de construção de uma linguagem própria do instrumento

para a transmissão de notícias. Nos anos 50 a inovação ficou com a Rádio

Bandeirantes de São Paulo, que gerou uma programação diferenciada com noticiário

intensivo a cada 15 minutos e nas horas cheias. A idéia foi desenvolvida por Carlos

Pedregal, o “Professor Baskaram”, um argentino visionário que levou a Bandeirantes à

liderança de audiência em 1955. Era um esboço do formato seguido nos anos 90 pelas

principais emissoras do país: notícias 24 horas por dia.

Page 20: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

A grande revolução no radiojornalismo no Brasil foi detonada com a chegada

do transistor, que começou a entrar no país de forma ilegal. O jornalista Silveira

Sampaio se referia àqueles aparelhos de recepção radiofônica como “o tijolo do

trabalhador”, e complementava: “o tijolo do trabalhador, que é o radinho de pilha, entrou

pelo contrabando. É a corrupção construtiva” 2.

Através do rádio, o cidadão começou a descobrir os seus direitos, desde o

valor do salário mínimo até a mais básica instrução de como escovar os dentes. Com a

nova tecnologia que apareceu no país no final dos anos 50, o rádio iniciou a sua

popularização que coincidiu com o processo de urbanização das grandes capitais do

Brasil. O rádio foi para as ruas, para a mão do trabalhador que carregava o seu radinho

de pilha, para o interior dos automóveis, numa nova dinâmica da difusão das

informações, com um maior número de fontes.

Já no final do decênio, em 1959, o rádio brasileiro estava em condições de

acelerar sua corrida para um radiojornalismo mais atuante, ao vivo, permitindo que

reportagens fossem transmitidas diretamente da rua e entrevistas realizadas fora dos

estúdios. Segundo Ortriwano “com os aperfeiçoamentos verificados na parte eletrônica

das estações móveis – carros com transmissores volantes – em muito se reduziu o

volume e o peso dos equipamentos técnicos, com sensível melhora, também, na

qualidade da transmissão” (1985: 22). As emissoras de maior porte passam a utilizar

cada vez mais acentuadamente as unidades móveis, agilizando a transmissão da

informação.

Também em 1959, a Rádio Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro, lançou um tipo

de programa que depois seria adotado por todas emissoras do país: o serviço de

utilidade pública. Estes programas divulgavam notas de achados e perdidos,

meteorologia, condições das estradas, ofertas de emprego, entre outros. Essa inovação

deu mais dinâmica ao rádio, restabelecendo o diálogo dele com seus ouvintes.

Surgem então programas de troca de informações, como o “Show da Manhã”,

na Rádio Panamericana, de São Paulo, onde foi montada uma rede de dados, que iam

desde receitas culinárias a fontes de pesquisa para trabalhos escolares (ORTRIWANO,

1985). A mesma Panamericana criou, em 1967, uma equipe de jornalismo bem

2 SITE www.mre.gov.br

Page 21: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

estruturada, que faz com que a imagem da própria emissora mude, de esportiva, para

jornalística e de prestação de serviços. A reportagem de rua é intensificada, e a

informação passa a estar presente no momento em que o fato acontece, a qualquer

hora do dia ou da noite.

Na década de 70 a tendência à especialização mostrou-se cada vez maior. As

emissoras passaram a identificar-se com determinadas faixas sócio-econômico-

culturais, procurando dirigir-se a elas e buscando sua linguagem nos próprios padrões

das classes que desejavam atingir. A potência das pequenas emissoras aumenta, bem

como a criação de novas rádios. O governo também mostra sua preocupação em

relação à expansão e ao conteúdo da radiodifusão sonora, criando, em 1976, a

Radiobrás – Empresa Brasileira de Radiodifusão.

O desenvolvimento do rádio brasileiro acompanha o processo de

desenvolvimento do próprio país. De maneira geral, há uma forte dependência aos

centros de desenvolvimento do sistema econômico vigente no país, uma vez que o

rádio – falando somente das emissoras comerciais – vive exclusivamente do

faturamento originado pela publicidade.

1.4 Rádio e o poder político

“Instrumento político que tanto pode servir à mudança como à

manutenção de um Estado, das relações sociais, da própria liberdade

individual e/ou coletiva. O mais eficaz veículo de informação torna-se um

instrumento ideológico na medida em que seu controle e propriedade o

transformam em arma. Arma que mobiliza, induz, liberta ou escraviza” (VIEIRA

apud ORTRIWANO, 1985)

Até 1988, o presidente da República tinha exclusividade na decisão das

concessões de serviços de radiodifusão e, na tradição brasileira, esse privilégio legal foi

sempre usado como “moeda política” em troca de apoio para o grupo que,

temporariamente, está no poder. É com a evolução dessa prática que surgiram

expressões como “coronelismo eletrônico” ou “cartórios eletrônicos”, ou seja, políticos

que tentam exercer, por meio da mídia que possuem, o controle de parte de seu

Page 22: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

eleitorado. Para Venício de Lima (2001), o resultado dessa situação é o atrelamento

entre as comunicações e as elites políticas, sobretudo regionais e locais, que deixa

raízes profundas no país e, ainda segundo Lima, “esta é uma característica que

certamente vai existir ainda por muitos anos”.

O poder sempre procurou andar de mãos dadas com o rádio. O presidente

Getúlio Vargas deu o tom em 1939, quando iniciou a produção do programa A Hora do

Brasil, hoje A Voz do Brasil, cuja retransmissão ainda é obrigatória para todas as

estações de rádio do país.

A rede nacional não aquietou o presidente, que foi buscar numa emissora

privada a base de popularidade que tentava conquistar incessantemente. Em 1940, a

Rádio Nacional foi incorporada ao patrimônio da união em novo ato da ditadura do

Estado Novo de Vargas.

Dados estatísticos, divulgados em 1995 indicava que 31,12 % das emissoras

de rádio e televisão do Brasil eram controlados por políticos e, em alguns estados,

metade ou quase metade das emissoras de rádio estavam sob controle de políticos,

como podemos ver nos quadros abaixo:

Emissoras de rádio e tv controladas por políticos

T

OTAL

Políticos e

Ex-politicos

%TV 302 94 31,12RADIO 2098 1169 40,19

Fonte: Góis, 1/11/1995

Emissoras de rádio controladas por políticos

ESTADO QUANTIDADE (aproximada em %)Bahia 50Pernambuco 44Minas Gerais 33São Paulo 20

Fonte: Veja, 25/7/1990

Page 23: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

De acordo com Lima (2001:108), diversas fontes ( Jornal do Brasil, 8/5/1994,

Fernandes, 1998, Lobato, 1995, e Mottes, 1994), pesquisaram e afirmam a notória

presença de políticos no controle das comunicações estaduais. Os mais mencionados

são: no Norte e Nordeste, os estados da Bahia (grupo de Antonio Carlos Magalhães);

Maranhão (grupo de Jose Sarney); Rio Grande do Norte (grupo de Aluízio Alves);

Sergipe (grupos de Albano Franco e de João Alves); Pará (grupo de Jader Barbalho);

Roraima (grupo de Rômulo Villar Furtado); Alagoas (grupo Collor de Melo); Pernambuco

(grupo de Inocêncio de Oliveira); e no Sul, os estados de São Paulo (grupo Orestes

Quércia) e Paraná (grupo de Paulo Pimentel e Jose Carlos Martinez).

O número relativo de parlamentares vinculados à mídia que se elegem para o

Congresso Nacional desde a Constituinte de 1988 tem ficado me torno de 23%. No

Congresso Constituinte 26,1% eram concessionários de emissoras de rádio e/ou

televisão; na Legislatura de 1991/94, 21,47% dos deputados federais; e na Legislatura

de 1995/98, 21,8% dos deputados e senadores tinham uma concessão de rádio ou de

tv ou uma combinação das duas (LIMA, 2001: 109). Ao verificarmos a distribuição

desses parlamentares por estados, constatamos que o Rio Grande do Norte com 15

veículos (8 rádios, 5 jornais e 2 emissoras de tv), a Bahia com 14 (9 rádios, 2 jornais e

emissoras de tv) e São Paulo com 10( 6 de rádio, 1 jornal e 3 tvs) eram os estados

onde havia o maior número de veículos de mídia controlados por parlamentares (LIMA).

A relação da mídia com os poderes políticos esta longe de se esgotar. O

poder percebeu como sua força se potencializa ao se aliar com os meios de

comunicação de massa. Percebeu a força da mídia para propagar suas mensagens e

com isso, aumentar o seu número de eleitores, estreitando ainda mais sua relação com

o poder.

1.5 Festival de concessões

No Brasil, o processo de licitação de emissoras de rádio e tv, é fraudado

porque a escolha final não se baseia em critérios exigidos pela lei que regula a

radiodifusão, sendo sempre uma escolha político-partidária. Como costuma dizer o ex-

Page 24: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

ministro das Comunicações, Antonio Carlos Magalhães, o ACM: "Preferimos dar as TVs

e rádios aos amigos” (MELIANI, 1995: 30).

O direito de participar das concorrências, que deveria ser de todos os

brasileiros, é na realidade uma moeda de troca de interesses entre o Executivo e o

Legislativo. Os sindicatos e partidos políticos não são autorizados a explorar os meios

eletrônicos de comunicação, tampouco entidades da sociedade civil. Em contrapartida,

políticos como ACM, da Bahia, José Sarney, do Maranhão, ou Fernando Collor de

Mello, de Alagoas, são detentores de redes de radiodifusão, utilizadas para a sua

própria reprodução política e a de seus grupos.

Até 1990, quando as concorrências foram interrompidas por Fernando Collor,

os parlamentares eram agraciados com canais de rádio e TV, como aconteceu, em

1988, no festival de concessões promovido pelo governo de José Sarney em troca da

votação dos cinco anos de mandato para a presidência da República, durante a

Constituinte. Um mês antes da votação, o presidente distribuiu 339 canais de rádio e 29

de tevê, que se somam a mais 527 outorgas realizadas em seu governo. Antes disso,

em 1985, somente o presidente João Figueiredo fez 634 concessões de rádio e TV,

sendo 295 rádios AM, 299 FM e 40 emissoras de televisão.

Outro grande escândalo foi protagonizado novamente, em 1987, por ACM,

então ministro das comunicações, que concedeu 80 canais de retransmissão para a TV

Bahia (integrante da Rede Globo), de propriedade de seus filhos e parentes.

Segundo Gisela Ortriwano, do total de emissoras de rádio outorgadas até

1987, cerca de 60% estão nas mãos de políticos ou ex-políticos, em grande parte

"caciques" ou "coronéis" de currais eleitorais (1995: 31).

Dez por cento das emissoras foram entregues as entidades religiosas,

enquanto que cerca de seis por cento foram destinadas a organismos estatais. Pouco

mais de 20% restantes foram confiadas aos chamados empresários da informação e da

comunicação, para exploração propriamente dita.

Ao criticar a proposta de leilão, sugerida pelo governo de Fernando Henrique

Cardoso para a distribuição de canais de rádio e TV, ACM mais uma vez não se

intimidou em assumir publicamente o critério político para distribuição de canais. "Se o

governo fizer leilão, vai permitir que só o poder econômico detenha a comunicação no

Page 25: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

País. Só os ricos e poderosos, eles mesmos ou através de testas de ferro, conseguirão.

Se for por licitação, ele (o presidente) e seu ministro vão decidir politicamente. Fora daí

é hipocrisia" (MELIANI, 1995: 31).

1.6 Tendências atuais

Observando as transformações econômicas e geopolíticas que ocorreram no

mundo durante a virada do século XX para XXI, percebemos um fenômeno social que

se destaca e que ganhou notoriedade em todo mundo: a globalização. São

transformações que atravessam nações e continentes reestruturando a geopolítica

global.

Nesse contexto econômico aparecem as multinacionais, mega empresas, que

rapidamente estão dominando o setor financeiro, enfraquecendo as pequenas

corporações que ainda não se associaram nacional ou internacionalmente.

Os avanços tecnológicos, cada vez mais rápidos, da comunicação, permitem

uma intensa circulação de informações que orientam as especulações no mercado;

todos sabem quando um grande acordo foi feito, quando uma empresa pediu

concordata, ou entrou em falência. A resposta a essas informações está na

estruturação ou inquietação da organização social global, que através das mega

empresas, geram uma rápida circulação de capitais no mundo.

Essas multinacionais e os organismos mundiais econômicos e políticos

constituem as novas estruturas de poder. Desse conjunto fazem parte as empresas de

comunicação, que hoje se constituem em gigantes, controlando a veiculação de

notícias e a distribuição do entretenimento.

As empresas de comunicação vêm afirmar uma das faces da realidade

política global, que é a formação e atuação das corporações mundiais de mídia. Elas

não só agilizam a difusão de notícias no mundo, como elegem os temas e assuntos,

editam o material jornalístico que vai para o ar. A edição jornalística globalizada pauta

Page 26: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

os assuntos que o mundo e o país vão saber e discutir, influenciando decisivamente na

formação de uma opinião pública nacional e mundial.

A mídia consegue selecionar, dentro dos fatos gerados pela sociedade, os

assuntos que serão tratados e discutidos nos seus veículos, formando a consciência de

uma grande maioria dos receptores, e influenciando a direção do consumo, do

divertimento, da política e da religião. E segundo Barbeiro a mídia é sempre ajudada

pela tecnologia que se dispõe, cada vez mais, a atingir seus objetivos mercantis:

“Há inúmeros exemplos, nacionais e internacionais que mostram

que a mídia se transformou no intelecto orgânico de classes, grupos ou blocos

de poder dominantes no mundo. Essa atuação se manifesta através de grupos

que dominam todas as formas de mídias disponíveis, do jornal ao outdoor, da

televisão ao rádio, do Pager à internet, e atuam decisivamente nos diversos

segmentos sociais, sejam eles religiosos, sindicais ou políticos” (BARBEIRO,

prefácio MEDITSCH, 2001: 17 ).

O perigo maior desse controle global de informações é a manipulação da

opinião pública, com a satanização de determinadas lideranças e endeusamento de

outras. Não diferente de qualquer outro momento histórico da humanidade, a

comunicação é um elemento básico de qualquer sociedade, influindo em seus aspectos

culturais, políticos e econômicos.

A atual condição mundial que conta com internacionalização do controle da

comunicação, e com a tecnologia capaz de vencer cada vez mais barreiras, concede

aos meios de informação uma condição de estrutura de poder como nunca antes foi

constatado.

As grandes corporações de comunicação são as que mais colaboram na

estruturação dos Estados Nacionais, fortalecendo ou enfraquecendo-os. São elas que

influenciam a opinião pública, pois o seu negócio é a difusão de idéias, notícias e

entretenimento. Elas vivem da rentabilidade desse tipo de mercado e da continuação da

ideologia que são portadoras, reproduzindo os objetivos e as práticas das nações

globais ou centrais consolidando seus conceitos.

No caso brasileiro, as rádios também estão se fortalecendo enquanto

empresa, criando redes nacionais, com dezenas (ou até centenas) de emissoras

Page 27: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

regionais transmitindo uma programação unificada para os mais diversos pontos do

país. Assim como para as multinacionais o objetivo principal se pauta no fator

financeiro, as redes radiofônicas se justificam somente em fatores econômicos.

Para a empresa comercial de radiodifusão, o interesse básico e o mercantil,

pois é do faturamento gerado pela venda do espaço publicitário que vão surgir recursos

para a manutenção tecnológica e a formação da estrutura dos programas. É a interação

entre a publicidade e a programação que determina os padrões dominantes no

conteúdo das mensagens: “é preciso ter maior audiência para lograr maior faturamento,

poder produzir novos programas e manter maior audiência, o que gera um processo em

cadeia” (ORTRIWANO, 1985: 54).

Segundo Abraham Moles, existem quatro doutrinas que são essenciais para

definir o papel social da radiodifusão: doutrina demagógica dos publicitários; eclética

ou culturalista; dogmática; e a doutrina sociodinâmica. As rádios do tipo comercial

estão predominantemente voltadas para o que ele denomina a “doutrina demagógica

dos publicitários”: dar a maior satisfação ao maior público possível sem, a rigor, haver

uma preocupação quanto ao conteúdo que está sendo transmitido pelos programas.

“Isso pode ser resumido na célebre ‘ dar ao público o que o público quer’, uma das

frases mais repetidas pelos responsáveis pela programação das emissoras

comerciais,..., mesmo que, na grande maioria das vezes, ninguém tenha parâmetros

reais que permitam saber ‘o que o público quer’” (MOLES apud ORTRIWANO, 1985:

56).

Salomão Amorin acredita que “é falso que o rádio oferece o que o público

quer, já que o público não dispõe de elementos necessários para tal escolha. No fundo

o que o rádio acaba vendendo é o anúncio e não o programa” (AMORIN apud

ORTRIWANO, 1985).

Esta prática comercial das empresas de rádio acaba por fortalecer o meio

enquanto alternativa publicitária, procurando obter maior lucratividade com menor

investimento, uma vez que as emissoras que fazem parte de uma rede, recebem ao

mesmo tempo, programação e patrocinador.

As agências e os anunciantes podem saber com antecedência a

programação em que seus anúncios serão inseridos, definindo o tipo de público que

Page 28: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

pretendem atingir, com maior segurança quanto à veiculação dos comerciais, uma vez

que são gravados junto com programação unificada.

“Há mais de 30 anos, a Rede CBS de Rádio e Televisão tem um

compromisso de qualidade com o mercado. Através de suas diversas

emissoras, perfeitamente segmentadas para atender às diferentes

necessidades dos anunciantes, a Rede CBS consegue oferecer produtos cada

vez mais adequados ao público-alvo de seus anunciantes, garantindo

eficiência na comunicação” 4

Neste caso a Rede CBS se porta como as grandes redes de comunicação, e

se preocupa em agradar o mercado, com uma programação mista capaz de atrair todo

tipo de ouvinte, ou seja, todo público em potencial, e assim “atender as diferentes

necessidades dos anunciantes”.

As maiores redes brasileiras de rádio são aquelas pertencentes a grupos

concessionários definidos. Vários são os exemplos: A Rede Bandeirantes de Rádio,

formada por 4 emissoras AM e 1 FM (a Band FM, com 43 afiliadas); a Divisão Rádio da

RBS, que tem 24 emissoras; a Rede CBS de Radio, operando com 5 emissoras AM e 6

FM. A primeira rede brasileira de FM foi a Transamérica, que hoje conta com 46

emissoras, com um sistema de multigeração digital via satélite, dividida em sub-redes: a

rede POP, com 6 emissoras próprias e 11 afiliadas; a rede HITS, com 2 próprias e 25

afiliadas; e a rede LIGHT, com 1 emissora própria e 1 afiliada.

A Rede Transamérica ainda conta com outros veículos como o site na

internet, www.transanet.com.br, a Revista Transamérica,e o Directmídia, uma mídia

direta desenvolvida para estabelecimentos culturais, contando com programação

musical e intervalos comerciais. Reforçando que o único interesse dessas redes é o

lucro: “traz retorno garantido aos anunciantes por um custo imbatível” 5

1.7 Conseqüências da atualidade

4 SITE www.redecbs.cidadeinternet.com.br5 SITE www.transanet.com.br

Page 29: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

Todo esse investimento na estruturação das rádios, visando a maior

exploração das potencialidades comerciais do meio, tratando a informação e produção

cultural como mera mercadoria, a dinâmica de concentração empresarial, a formação

de megacorporações comunicacionais, reforçando as radiofônicas, ou seu atrelamento

com o poder, servindo como moeda de barganha política, abre espaço para uma

reflexão crítica.

A tendência de formação de redes, divulgando os mesmos programas em

diversas regiões do país, põe em xeque a preservação das características culturais de

cada localidade receptora. As redes radiofônicas correm o risco de apresentar

programas, inclusive os jornalísticos, desvinculados da realidade local, perdendo com

isso a força da proximidade, da programação feita com base em hábitos e costumes

específicos, como o linguajar da própria região.

Em 2001 ocorreu uma mudança no artigo 222 da Constituição Federal,

permitindo a participação de capital estrangeiro e pessoas jurídicas com direito a voto,

em jornais, revistas e emissoras de rádio e televisão. Dependendo ainda de uma lei

específica para definir esse ingresso de 30% de capital estrangeiro nas empresas

brasileiras, essa decisão já interfere na questão da nacionalidade dos futuros

programas exibidos nos meios que receberam tais investimentos.

Existe o medo de que aumente o número dos produtos “enlatados”, aqueles

produzidos no exterior, que normalmente mostram uma cultura, hábitos, tendências,

ideologias, muito diferenciadas das que os consumidores brasileiros estão

acostumados a ver e a conviver. É tanto que o artigo 221 da Constituição exige que a

produção e a programação dos meios de comunicação atendam, entre outros, o

principio de regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme

percentuais estabelecidos em lei. A atual proposta de regionalização prevê que todas as

emissoras, tanto de tv quanto de rádio, produzam 30% de material, o que representa

aproximadamente sete horas por dia de programação local.

A lei ajuda a preservar as características inerentes a cada cidade ou

comunidade que tenha sua emissora de rádio, sem submeter-se a escutar diariamente

programas onde só são entrevistados pessoas de São Paulo, onde sorteios de brindes

só são validos para os mesmos paulistas, ou onde os artistas presentes ao vivo nos

Page 30: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

programas estão sempre distantes da comunidade ouvinte, como acontece em Vitória

da Conquista, no programa “A hora do Ronco” da rádio Transamérica, que é

retransmitido todo dia, às 6:00 da manhã. Esse programa é feito em São Paulo e entra

em cadeia para várias afiliadas da Rede Transamérica de Rádio distribuídas por todo

país.“A programação homogeneizada passa a ganhar espaço, a criatividade local não

tem como se manifestar e o mercado de trabalho fica cada vez mais restrito”

(ORTRIWANO, 1985: 34).

A regionalização cada vez maior do rádio, em termos de conteúdo, seria uma

das formas de impedir a destruição dos valores interioranos e rurais e sua

descaracterização cultural, priorizando sempre a programação local.

1.8 Novos caminhos

Os caminhos do rádio atual é a concentração cada vez maior em sistemas de

exploração comercial, buscando formas mais eficientes de comercialização para a

obtenção do lucro e permitindo, ao mesmo tempo, que o monopólio de controle do

Estado seja eficaz. No extremo oposto vamos encontrar as rádios livres, rádios

comunitárias ou rádios alternativas, que tentam quebrar esse monopólio político e

econômico, “procurando abrir possibilidades para uma apropriação coletiva dos meios,

apresentam uma mensagem alternativa cujo objetivo é atingir, não mais as grandes

massas, mas as minorias e os grupos socialmente marginalizados” (ORTRIWANO,

1985: 34).

Rádios alternativas porque o próprio conceito sugere referência ao contexto

político de seu aparecimento. Alternativa indica uma relação com outro, uma alteração

que chama a si os que se desviam de um caminho inicial, neste caso, a indústria de

comunicação tradicional. Pode-se haver solução para os que fazem a comunicação,

que não estando contente com a forma vigente se propõe a elaborar um novo projeto

para tal, assim como para os que consomem a informação, que vão procurar outras

opiniões além daquelas impostas pelo monopólio dos grupos. A atual situação provoca

o aparecimento de novos caminhos, pois o conteúdo das redes radiofônicas está

Page 31: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

subserviente a um poder autoritário que não age no sentido de mudanças na estrutura

da sociedade brasileira.

Para compensar essa situação, as rádios alternativas surgiram como opção

de um espaço de referência para as pessoas excluídas da grande indústria da

comunicação, um veículo aberto aos acontecimentos de uma forma mais democrática e

verdadeira, e não sob a ideologia dominante. Assim a alternativa é a criação de rádios

próprias para estes excluídos, onde as pessoas ali engajadas em trabalhar não tenham

que se subordinar às regras ou políticas editorias não condizentes com os seus

pensamentos e os da comunidade que representará.

Essas rádios se impõem a partir de ideologias opostas à corrente principal e

ao domínio atual do sistema educacional, social e governamental. Serve de ligação

entre pessoas que adotam pontos de vista semelhantes, como, universitários, excluídos

sociais, integrantes de movimentos sexuais, ecológicos ou raciais, comunidades dos

bairros, principalmente aqueles que não se vêm representados nos meios de

comunicação de massa.

1.9 Rádios Livres Comunitárias

Tendo aparecido no Brasil em 1970, inicialmente como uma forma de externar

o ‘prazer pelo domínio da técnica’, a rádio livre desenvolveu-se, ao longo dos anos

oitenta, como expressão de grupos descontentes com o sistema de comunicação social

e sua concentrada distribuição de canais e, no início dos anos noventa, “caiu no gosto

popular e passou a fazer parte de projetos tão variados quanto os desejos da

população” (PERUZZO, 1998: 252). Hoje ela se apresenta sob várias formas, das

comunitárias às independentes – dentre as quais as de cunho político ou comercial.

Foi em novembro de 1995 (PERUZZO, 1998: 252) que se institucionalizou o

termo ‘rádio comunitária’, no I Encontro Nacional de Rádios Livres Comunitárias,

definidas como aquelas que têm gestão pública, operam sem fins lucrativos e tem

programação plural. Elas encaixam-se no perfil das chamadas rádios de baixa potência.

O Brasil chegou a ser o único país da América do Sul sem legislação para

essas rádios de baixa potência. Situação que se modificou em dezembro de 1996,

Page 32: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

através do Projeto de lei 1.521, que deu origem a Lei 9.612, de 19 de fevereiro de 1998,

e em julho do mesmo ano, com o Decreto 2.615, que também ajudou a compor a

legislação das rádios comunitárias.

Contudo a legislação vigente não contempla a necessidade das entidades

que lutam pela legalização das rádios comunitárias. Ela restringe as áreas de atuação

das rádios, estabelecendo, por exemplo, o alcance de 1 km a partir da antena; que elas

funcionarão em um só canal em todo país; que não poderão entrar em rede; terão

potência máxima de 25 watts; que cada cidade brasileira só terá uma concessão de

rádio comunitária;...

Toda essa legislação poda a livre expressão daqueles que trabalham nas

rádios, e geralmente são imposições feitas sob os olhares dos grandes donos e

empresários das megacorporações de comunicação. Os mesmos donos que, sendo

opositores das rádios comunitárias, nomearam-nas de piratas, ou clandestinas, com a

intenção de marginalizá-las diante do público ouvinte, ao serem taxadas de piratas elas

são tidas como ilegais.

As vozes mais ferrenhas, contrárias às emissoras de baixa potência, provem

de órgãos do Governo e daqueles donos das emissoras convencionais, de forma

isolada ou através de suas associações, entre elas a ABERT – Associação Brasileira

das Empresas de Rádio e Televisão, que logo na página inicial do seu site apresenta

uma carta de “alerta” a população, dizendo que:

“Muitas emissoras de rádio que se dizem ‘comunitárias’ ou ‘livres’

são na verdade ilegais. Ilegais, porque ocupam as ondas do rádio sem

autorização do poder concedente – o Governo Federal - , sem pagar impostos

e sem condições técnicas adequadas (...) Denuncie toda e qualquer

interferência causada por emissoras irregulares. Não permita que rádios ilegais

impeçam você de ouvir sua rádio favorita!...”7

Existe ainda um outro elemento que reforça a não aceitação das rádios

comunitárias. As rádios convencionais têm receio da pulverização da audiência e a

conseqüente perda de anunciantes para seus programas.

7 SITE www.abert.org.br

Page 33: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

Segundo o radialista Onildo Barbosa “aqui em Vitória da Conquista existem

mais de vinte rádios que se dizem comunitárias e na verdade são comerciais,

atrapalhando o comércio do rádio profissional (...) eles vendem comercial por até R$ 50,

quando são R$ 600” 8.

A prática tem mostrado que pequenas emissoras comunitárias tem

conseguido índices altos de audiência e de aceitação pelas comunidades locais.

Primeiro, porque desenvolvem uma programação sintonizada com os interesses,

culturas e problemáticas locais. Segundo, porque tem revelado grande capacidade de

inovar programas e linguagem, o que as diferenciam das FMs tradicionais. Terceiro,

porque acabam revelando um grande potencial de atrair os anunciantes locais, tanto

pelos preços mais baixos, quanto pela possibilidade de alta segmentação de mercado,

ou seja, atinge diretamente o público-alvo do anunciante local.

Contudo na nossa realidade existem emissoras de baixa potência de

diferentes tipos e com interesses divergentes, mas todas se intitulam comunitárias.

Essas rádios podem ser agrupadas de acordo com seus objetivos principais em:

1) Emissoras que se caracterizam como eminentemente comunitárias, uma

vez que as organizações comunitárias são responsáveis por todo processo

comunicativo, desde a programação até a gestão do veículo. Não tem fins lucrativos.

Vivem de apoio cultural, contribuição de sócios, doações e recursos arrecadados

mediante realização de festas etc, às vezes também veiculam anúncios comerciais e

prestam serviços de áudio a terceiros.

2) Aquelas que prestam algum serviço comunitário, mas estão sob o controle

de poucas pessoas, e em última instância servem como meio de vida para seus

idealizadores, os quais em geral também são seus donos. Ou seja, são de propriedade

privada de alguém, e sua finalidade maior é a venda de espaço publicitário.

3) Há também aquelas mais estritamente comerciais, com programação

similar a das emissoras convencionais, sem vínculos diretos com a comunidade local.

4) As emissoras de cunho político-eleitoral, ligadas a candidatos, a cargos

eletivos e seus respectivos partidos políticos. Essas se proliferam mais rapidamente em

8 Entrevista concedida no ano de 2003, na produção do documentário “Piratas do Ar”.

Page 34: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

períodos pré-eleitorais, estando mais preocupadas em fazer “campanhas” políticas de

candidatos.

5) Além daquelas emissoras religiosas, vinculadas a setores das igrejas

Católicas e Evangélicas. São sustentadas por suas mantenedoras e/ou pela venda de

espaço publicitário. Entre elas algumas fazem programação estritamente religiosa e

outras incluem programas de caráter educativo, informativo e cultural, o que as

aproxima da comunitária.

Este projeto pretende fazer uma demonstração de programa radiojornalistico,

para rádio comunitária, trabalhando mais fortemente em seu conceito primordial, junto

de seus objetivos e intenções. É no primeiro grupo listado acima que se enquadra o tipo

de rádio defendido e idealizado aqui. Uma rádio que não pretende competir com as

emissoras convencionais, que quer oferecer às comunidades informações de cunho

cultural e educativo, trazendo aspectos inovadores quanto ao conteúdo de sua

programação e processo de gestão. Que tenham caráter público e como tal, contribuem

para democratização da comunicação e para ampliação da cidadania.

Mas segundo Peruzzo, trabalhar rádio comunitária não nos restringe ao fato

dela estar circunscrita a uma localidade e falar coisas desta. É necessário elencar

outras características para determinar esse tipo de emissora. (PERUZZO, 1998: 257)

a) Sem fins lucrativos: a rádio comunitária pode vender espaços para

anúncios e busca de patrocínios culturais, mas deve canalizar os recursos arrecadados

para custeio, manutenção ou reinvestimento, e não para o lucro particular.

b) Programação comunitária: ela desenvolve uma programação que tende a

ter um vínculo orgânico com a realidade local, tratando de seus problemas, suas

comemorações, suas necessidades, seus interesses e sua cultura.

c) Gestão Coletiva: ela possui um sistema de gestão que envolve a

participação direta da comunidade, por meio de órgãos deliberativos como conselhos e

a assembléia.

d) Interatividade: ela favorece a participação do público no microfone e até na

transmissão de programas próprios, por meio de suas entidades representativas. É

assim que se concretizam as mais completas formas de interatividade nos meios de

comunicação popular.

Page 35: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

e) Valorização da cultura local: ela incentiva a produção e transmissão de

programas que valorizem as manifestações da cultura local.

f) Compromisso com a cidadania: ela se compromete com a educação para a

cidadania no conjunto da programação e não apenas em algumas atividades isoladas.

g) Democratização da comunicação: ela democratiza o poder de comunicar,

proporcionando treinamento a pessoas próprias da comunidade, a fim de que adquiram

os necessários conhecimentos para produzir programas e falas ao microfone, por

exemplo.

As rádios comunitárias caracterizam-se por estarem organizadas a partir da

prática da comunicação comunitária popular alternativa, que Peruzzo define como

sendo aquela que abrange o universo dos movimentos sociais assim como o cotidiano

das pessoas da comunidade que estão inseridas. Acredita-se, portanto, que essa

comunicação contribui para uma mudança efetiva na comunicação oficial e dominante

e, com efeito, no conjunto da sociedade. É feito por pessoas que têm parte ou não nos

movimentos sociais organizados, com um projeto pedagógico libertador, partindo do

cotidiano das pessoas, contribuindo dessa forma para que elas reflitam sobre a sua

realidade através da comunicação feita por e com elas mesmas.

Ainda sobre as características de uma rádio comunitária e a importância

dessas características para o desenvolvimento cultural, participação e organização de

uma comunidade recorre-se a Associação Mundial das Rádios Comunitárias – AMARC

– que afirma:

Quando uma rádio promove a participação dos cidadãos e defende

seus interesses; quando responde ao gosto da maioria e faz do bom humor e da

esperança sua primeira proposta: quando informa verazmente; quando ajuda a

resolver os mil e um problemas da vida cotidiana: quando em seus programas se

debatem todas as idéias e respeitam todas as opiniões: quando se estimula a

diversidade cultural e não a homogeneização mercantil: quando a mulher

protagoniza a comunicação e não é uma simples voz decorativa ou um reclame

publicitário: quando não se tolera nenhuma ditadura, nem sequer a musical

imposta pelas gravadoras: quando a palavra de todos voa sem discriminação,

sem censuras, essa é uma rádio comunitária9.

9 SITE www.amarc.com

Page 36: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

O trabalho que aqui apresentamos, vai estruturar o projeto de um programa

de rádio, com as características das rádios livres comunitárias, dentro dos

acampamentos de movimentos sociais.

Assim como a grande maioria da população brasileira, os movimentos sociais

não se vêm representados nos meios de comunicação de massa, não podendo

expressar suas opiniões, pensamentos e até se defender dos constantes ataques feitos

pela grande mídia. A idéia é de que se produza e transmita programas de rádio com

notícias da comunidade, de outros movimentos afins, informações de cunho educativo,

tentando resguardar o direito a informação e de liberdade de expressão que todo e

qualquer cidadão brasileiro tem.

Page 37: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

CAPÍTULO II

Movimentos Sociais, Mídia e Comunicação Popular

2.1 Movimento Social

A modernidade privilegiou teórica e praticamente, o mercado e o Estado, ou

seja, as dimensões econômicas e políticas. Mas essa modernidade entra em

decadência. A crise dos modelos e dos programas políticos questiona a importância dos

partidos e levanta outras possibilidades de demandas e de propostas socais. Não por

acaso que surgem, e que tem recebido atenção especial, os movimentos sociais. “Eles

são laboratórios de criatividade, nos quais se testam novas alternativas societárias”

(SCHERER, 1993). São experiências localizadas e concretas, com potencial efeito

multiplicador.

Os movimentos sociais passam a ser objeto de estudo das Ciências Sociais a

partir dos anos 70, caracterizados como “novos” e situados privilegiadamente na

problemática urbana. Uma definição, que pode ser considerada consensual, descreve

os movimentos sociais como formas de organização e mobilização, inscritos como elos

ativos entre os processos de reprodução social e a esfera política. Desta maneira, os

movimentos sociais articulam-se tanto aos processos de construção da sociabilidade

quanto ao campo político em seus conflitos (BERGER,cap.3 pg. 4).

Na primeira metade dos anos 80, o movimento social, serviu de referência

central a um grande número de reflexões teóricas e de pesquisas e de estudos de

casos feitos em toda América Latina. Estes recursos buscaram os elementos

inovadores nestas formas de organização e o seu modo de fazer política, sugerindo-se

Page 38: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

que “uma nova cultura política popular e de base estaria sendo gerada” (SCHERER,

1993).

Entretanto, não há um acordo sobre o conceito de movimento social. Para

alguns toda ação coletiva com caráter reivindicativo ou de protesto é movimento social.

Já Cifuentes (CIFUENTES apud SCHERER, 1993), não acredita que se possa chamar

de movimento social qualquer conduta coletiva, sem levar em consideração a

centralidade do ator, o alcance de suas lutas, os condicionamentos de sua ação, a

consciência, a ideologia, o projeto social e político que envolve sua ação.

E num outro extremo, Touraine (TOURAINE apud SCHERER, 1993) afirma

que movimentos sociais seriam aqueles que atuam no interior de um tipo de sociedade,

lutando pela direção de seu modelo de investimento de conhecimento ou cultural.

Porém, mesmo diante de tantas definições, Scherer faz uma releitura dos

movimentos sociais analisando seu passado, projetando novas perspectivas futuras.

Nesse sentido existe um encaminhamento em separar esses movimentos em velhos e

novos. Entretanto o importante nesse projeto é pensarmos os elementos culturais que

emergem desses movimentos sociais, tanto nos tradicionais, como nos surgidos

recentemente. Entre estes elementos têm sido destacados os étnicos e de cultura

política, os quais compõem intrinsecamente a ideologia dos movimentos: a sua

natureza cívica e pacífica, o comprometimento com a descentralização e autonomia, a

tolerância pluralística fundada na diversidade cultural e humana, paz com justiça social

e respeito à natureza, democracia mais participativa e direta (SCHERER, 1993).

O projeto de democratização da sociedade brasileira tem alcançado

envergadura nacional e para alguns grupos sociais a corrosão do autoritarismo,

presente nos mais diversos aspectos da vida social, torna-se a utopia necessária. Os

movimentos sociais almejam atuar no sentido de estabelecer um novo equilíbrio de

forças entre Estado e sociedade civil, bem como no interior da sociedade civil nas

relações de força entre dominantes e dominados, entre subordinantes e subordinados.

Com essa característica forte e com a partilha da ideologia do

antiautoritarismo e descentralização do poder, os movimentos sociais da atualidade

demarcam espaço na sociedade. Rezende (REZENDE apud SCHERER, 1993), assim

se refere a esta forma de organização:

Page 39: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

“Os movimentos sociais não podem ser pensados, apenas como

meros resultados da luta por melhores condições de vida, produzidos pela

necessidade de aumentar o consumo coletivo de bens e serviços.

Os movimentos sociais devem ser vistos também(e neles, é claro, os

seus agentes), como produtores da História, como forças instituintes que, além

de questionar o Estado autoritário e capitalista, questionam com sua prática, a

própria centralização, burocratização, tão presentes nos partidos políticos”

Os movimentos sociais apontam para um projeto alternativo em construção

resultante da ruptura que esses grupos tentam estabelecer diante de várias crises da

sociedade contemporânea, no que diz respeito aos seus modelos, econômico, estatal e

cultural. Atuando mais diretamente no seio da sociedade civil, eles representam a

possibilidade de fortalecimento desta em relação ao aparelho do Estado e perante a

forma tradicional do agir político por meio dos partidos.

As ações desses movimentos sugerem a criação de um novo sujeito social

(SCHERER, 1993) o qual redefine o espaço da cidadania. O sentimento de uma tripla

exclusão relativa – econômica política e cultural/ideológica esta impresso nos

movimentos organizados.

Assim, defende-se o direito de participar do consumo de bens e

equipamentos coletivos, através dos Movimentos Sociais Urbanos; o direito a

permanecer na moradia e na terra ocupada, pelo Movimento dos Favelados; direito a

terra pelo trabalho, pelo Movimento dos Sem Terra ou de preservar as terras produtivas,

pelo Movimento das Barragens; o direito a uma vida mais sadia, pelo Movimento

Ecológico; o direito a não serem discriminados culturalmente, pelos Movimentos Étnicos

e assim por diante.

O relevante é que esses movimentos defendem-se também o direito de

participar de decisões que afetam o destino de seus membros e o respeito por suas

formas culturais.

Portanto, o sentimento da exclusão relativa, ou a consciência da carência

relativa, conduz às reivindicações, as quais são assumidas como direito, conforme

aponta Schere (1993).

Page 40: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

“A transformação de necessidades e carências em direitos, que se

opera dentro dos movimentos sociais, pode ser vista como um amplo processo

de revisão e definição do espaço da cidadania (...)”. Parece que estamos

vivendo um processo de construção coletiva de uma nova cidadania, definida

por um conjunto de direitos, tomados como auto evidentes, que é pressuposto

da atuação política e fundamento de avaliação da legitimidade do poder”.

A afirmação de novas relações societárias dá-se através da re-apropriação

política no sentido das relações comunitárias. Estes movimentos crêem no poder da

força comunitária para a constituição histórica do grupo.

É nesse sentido que o Movimento dos Sem Terra criou uma nova forma de

fazer política e de vida societária: os acampamentos coletivos. Enfatiza-se, neste caso,

a importância das relações comunitárias como forma de luta e como modo de vida.

Alguns grupos de Sem Terra tem defendido o coletivismo enquanto forma de

organização social, reivindicando a posse coletiva da terra através da Reforma Agrária.

A busca de uma sociedade construída sob nova base evidencia-se também

pelo tipo de ação encaminhada por esses movimentos: a resistência ativa não violenta.

Os acampamentos de luta pela terra têm sido os exemplos mais significativos desta

forma de agir político: resistência prolongada com cunho pacífico, “o acampamento é

uma forma ativa de espera, que dá existência política concreta ao desejo dos

trabalhadores sem terra” (SCHERER, 1993).

2.2 A luta pela terra e a formação dos movimentos sociais no campo

A prática dos movimentos sociais no campo e a luta pela terra pode ser

historicamente explicada a partir da chegada dos colonizadores portugueses. Naquela

época (séculos XVI e XVII) os povos indígenas de norte a sul – Poriraguares, Tamoios e

Guaranis – lutaram contra a invasão de seus territórios e contra a escravidão.

Outros fatores também marcaram essas lutas como a luta dos Quilombos, no

final do século XVI, sendo o Quilombo do Palmares a maior representatividade do

movimento. As lutas Messiânicas, que eram lutas de lideranças religiosas entre elas

Page 41: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

estão Canudos na Bahia (1870-1897), liderada por Antonio Conselheiro; Contestado em

Santa Catarina (1912-1916), liderada pelo Monge Jose Maria; bem como o movimento

de Padre Cícero, no Ceara (1930-1934). As revoltas populares na década de 40e 50

com a luta de posseiros de Teófilo Otoni, Minas Gerais (1945-1948). A realização da I

Conferência Nacional dos Trabalhadores Agrícolas (1953), com a luta de posseiros de

Paracatu (Paraná). Surgimento da União dos Lavradores e Trabalhadores agrícolas do

Brasil, ULTAB, com mais de 300 representantes em São Paulo e outros no Paraná e no

Rio de Janeiro. A formação da Ligas Camponesas (1954), nascidas das lutas de

engenho em Pernambuco. O surgimento do MASTER, Movimento dos Agricultores Sem

Terra, em 1961, formado por assalariados, pequenos proprietários e seus filhos, que

vinham somar as Ligas Camponesas e a ULTAB. Com a ULTAB e Máster a luta pela

terra ganhou o apoio dos sindicatos urbanos, assumindo uma nova dimensão política e

exercendo pressão sobre o governo de João Goulart que reconheceu em 1962 a

organização dos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais.

As manifestações foram acontecendo gradualmente e sempre com maior

apoio popular e de entidades, mas no período do Regime Militar as reivindicações

encontraram algumas dificuldades. Durante o regime quaisquer manifestações em favor

da Reforma Agrária ou tentativas de organização dos trabalhadores rurais eram, de

imediato, identificadas com a subversão. Assim grandes empresas madeireiras,

pecuaristas e grandes projetos agro florestais puderam livremente se apoderar de terras

e explorar o trabalho agrícola sem temer punições.

Ao contrário do ocorrido no período nacional-desenvolvimentista, durante os

governos de Juscelino Kubitschek e João Goulart, quando a questão agrária era

prioridade econômica e social do governo, a agricultura foi agora, relegada a segundo

plano e o interesse do governo volta-se, em relação ao campo, quase que

exclusivamente para a chamada segurança nacional.

Seguindo a orientação dos estudos realizados na Escola Superior de Guerra,

a ESG, no Rio de Janeiro, propunha-se a consideração da paz social como premissa do

desenvolvimento. Queria-se diminuir as desigualdades regionais e, em cada região,

estreitar as profundas diferenças sociais.

Page 42: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

Assim, a preocupação maior do novo regime não era nem econômica, nem

social. Do ponto de vista econômico considerava-se a entrada de capitais estrangeiros

e a modernização forçada do campo, como resposta adequada às questões referentes

ao estrangulamento do processo de desenvolvimento. Do ponto de vista social

articulava-se poderosa repressão às representações populares com uma conspiração

internacional do comunismo. Dessa forma a preocupação central do regime militar com

o campo originava-se na busca da segurança e consolidação do novo modelo

econômico.

Para Delfim Neto (NETO apud LINHARES, 1999:184), por exemplo, a chave

do processo de desenvolvimento residiria numa melhoria técnica da produtividade do

setor agrícola, o que, a um só tempo, liberaria mão-de-obra e elevaria os rendimentos

dos que ficassem no campo, aumentando o volume da produção inclusive para as

cidades. Propunha-se assim, uma abordagem técnica da questão agrária e sua

despolitização, claramente explicíta na teoria do bolo (LINHARES, 1999:184), ou seja,

primeiro era necessário fazer o bolo (a riqueza nacional) crescer, para então dividí-lo.

Logo em 1964, o primeiro general-presidente, Humberto Castelo Branco

procurou atender às pressões que advinham do campo (principalmente para evitar os

conflitos agrários) e superar o estrangulamento do crescimento industrial provocado

pelas crises de abastecimento (o que era também importante para sua política de

contenção e salários, chamada, então, de arrocho salarial).

As principais ações dos Governos Militares visavam colocar à disposição dos

grandes produtores rurais dinheiro fácil e barato, através de mecanismos bancários e

financeiros voltados para a agricultura. Iria atender, dessa forma, à demanda por uma

por uma agricultura mais eficiente. Era a resposta técnica à questão agrária, como a

visão conservadora pretendia.

Tratava-se de passar de um padrão agrário, montado sobre a exploração do

trabalhador e o sufocamento do minifúndio pelo latifúndio, para um padrão baseado no

acesso a financiamentos e insumos, o que certamente beneficiava a conjugação dos

interesses financeiros do grande capital multinacional (química, para adubos e

corretores de solo; máquinas e equipamentos, para instrumentos e implementos

agrícolas).

Page 43: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

Em 30 de novembro de 1964, surgia o Estatuto da Terra, criado pelo Decreto

4.504, que foi o reconhecimento pela ditadura da questão agrária no país, o

reconhecimento de um longo processo de lutas sociais e políticas. Entretanto, a

interpretação e prática do Estatuto da Terra possibilitou que o processo de resolução da

questão agrária, tal qual se imaginava naquele momento, fosse montado sobre a idéia

chave de modernização do latifúndio. Tal associação entre propriedade da terra, bancos

e grande capital abria caminho para a industrialização do campo e a indiferenciação

campo/cidade.

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, INCRA, começou no

ano de 1970, desenvolvendo planos e políticas específicas para o setor. Dentre suas

ações devemos destacar o primeiro cadastro de imóveis rurais, base para uma análise

mais profunda da questão agrária no país. Tal ausência do registro mostrava a força

dos senhores de terra que, temerosos na possibilidade de controle ou de distribuição de

seus bens, inviabilizavam qualquer trabalho nesse sentido.

O governo Sarney, logo em sua primeira fase, estabeleceu o Plano Nacional

de Reforma Agrária, PNRA. Foi criado o Ministério da Reforma e Desenvolvimento

Agrário, com especialistas e políticos voltados para a questão. Previa-se que pelo

menos 1 milhão e 500 mil famílias (de um total de 4 milhões e 500 mil sem-terra, num

conjunto de doze milhões de trabalhadores rurais expropriados) deveriam ser

assentados, dispondo-se de uma área de 130 milhões de hectares. Mas essas

medidas não se efetivaram como planejadas, e segundo Linhares, “após inúmeras

desapropriações inúteis e avaliações erradas o plano estancou. Menos de setenta mil

famílias chegaram a ser assentadas” (1999:196).

A paralisia do processo gerou, por sua vez, a explosão da violência. A melhor

organização dos trabalhadores rurais, agora assessorados por advogados, permitiu que

se exigisse de pecuaristas e madeireiras, na Justiça, a apresentação dos títulos que

dariam direito à expropriação dos posseiros.

Agora o que iria manter a legitimidade não era mais a força e sim a

legalidade. A resposta veio rápida: por todo país, no Maranhão, Rondônia, Acre, Rio de

Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul, jagunços assassinavam lideres sindicais

advogados e padres envolvidos na defesa dos sem-terra.

Page 44: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

A explosão de violência no campo, ao lado da paralisia do governo federal

(tanto em promover a reforma agrária quanto em punir os crimes de fazendeiros e

jagunços), levou os sem-terra a se organizar. Reunidos no MST – Movimento dos

Trabalhadores Rurais Sem Terra, e com o apoio de sindicatos e da Igreja Católica,

iniciaram um amplo movimento de invasões de terras improdutivas, quer do Estado,

quer de particulares.

A partir da década de 80 podemos observar a concentração dos movimentos

populares de luta pela terra acelerando os processos de discussões agrárias no país.

Processos estes, estagnados desde o Golpe Militar de 64. Trata-se de práticas coletivas

desenvolvidas por classes de grupos que experimentavam a discriminação social e

sofriam com conseqüências de medidas governamentais que desfavoreciam os

trabalhadores rurais. Esses grupos, buscando alternativas de sobrevivência no campo

passaram a defender e buscar transformações sócio políticas passando pela estrutura

agrária. Dessa forma e com esses ideais, se organizaram, contando sempre com apoio

e ajuda de partidos de esquerda (PT, PCdoB, PCB) e Igreja Católica (representadas

pelas Comunidades de Base). Ao buscar essas transformações os movimentos

sofreram resistência por parte das estruturas políticas mantenedoras do Estado,

reconhecidas pelas classes dominantes (representadas quase sempre por partidos de

direita, latifundiários, empresários e industriários etc.). O MST, por exemplo, passou a

defender uma linha de pensamento de vida em comunidade de forma coletiva, sem

designações de propriedades e isto entrou em choque com as classes dominantes do

modelo capitalista, que estimula a competição entre os cidadãos e a propriedade

privada.

As lutas sociais no campo, apresentam como causa imediata à situação de

empobrecimento dos trabalhadores. A organização dos agricultores se deu em torno de

quatro tipos de lutas, agrupadas por Berger assim (1996)

1 Lutas contra a expropriação: movimentos dos camponeses pela terra

a)Movimentos dos Posseiros

b)Movimentos dos Sem-Terra

Page 45: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

c) Movimentos das Barragens

d) Lutas Indígenas

2 Lutas contra as formas de exploração e assalariamento: movimentos dos

operários do campo

3 Lutas contra a subordinação do trabalho ao capital: movimentos dos

camponeses integrados

4 Alternativas de produção, mulheres, previdência social: novas frentes de

luta no campo.

2.3 Movimentos Sociais × Grande Mídia

A imprensa é um dos principais agentes modeladores de conhecimento, que

através da criação de estereótipos distorce o entendimento da realidade. Isso se

concluiu no estudo de Walter Lipmam, em 1922, no seu livro Public Opinion, que mostra

como as notícias são construídas e a conseqüente reação dos meios de comunicação.

Foi quando a imprensa apareceu como mediadora da realidade, sem reproduzi-la, mas

representando tal realidade de forma estereotipada.

Já no início dos anos 70, estudos como os da Sociologia Interpretativa viam

os meios de comunicação como um dos principais atores que viriam a modelar e

transformas diretamente o conhecimento social. Neste caso a mídia deixa de ser

espelho da realidade, para ser participante ativa dessa mesma realidade. O jornalismo

aparece como reconstrutor social da realidade.

No Brasil, os meios de comunicação se transformaram em área de

acumulação de capital, desenvolvendo-se juntamente com o processo de expansão do

capitalismo monopolista. Na realidade a impressa não cobre os acontecimentos de uma

maneira objetiva e imparcial, mas acaba exercendo um caráter opinativo e partidário,

não no sentido de defender este ou aquele partido, mas no de ter um programa a

defender, que acaba por se identificar com as propostas das elites ou classes

dominantes. Além do exercício do jornalismo construindo notícias, os meios de

comunicação têm interesses próprios enquanto empresa, desenvolvendo suas

Page 46: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

atividades em torno do interesse econômico, revelando que uma boa matéria, mesmo

praticando a atividade jornalística de informar não deve contrariar os interesses

empresarias do veículo comunicacional, aliado a quem lhe interessa economicamente

na luta pela hegemonia na sociedade.

A grande imprensa comercial, principalmente os jornais revistas e emissoras

de rádio e televisão, insistem em dizer que sua política editorial é sempre imparcial,

independente e democrática. Mas o que se vê diariamente nesses canais de

comunicação é uma continuação e reafirmação da ideologia dominante.

A mídia expressa sempre o mesmo pensamento dos setores e classes que

controlam a economia, a propriedade privada e a riqueza, usando as mesmas pautas,

fontes e enfoques. A mídia contemporânea influencia mentes, uniformiza pensamentos

e condiciona comportamentos. Isto é feito de forma sutil, requintada – através de meias

verdades, notícias fora do contexto, fatos sem vínculo com o passado, flashes

instantâneos, aparência encobrindo a essência. Além disso, diferente do passado, a

mídia está incorporada ao mundo do capital.

“As corporações da mídia projetam-se, a um só tempo, como agentes

discursivos, com uma proposta de coesão ideológica em torno da ordem global, e como

agentes econômicos presentes nos hemisférios”, argumenta Dênis de Moraes10

Esta rede de comunicação brasileira está sob posse de algumas poucas

famílias que impõe sua ideologia de poder. Ou seja, uma coação política, social e

cultural é feita aos 178 milhões de brasileiros que consomem essa comunicação.

Nestes meios os movimentos sociais não se sentem representados.

A imprensa comercial, defensora politicamente das propostas liberais, sempre

teve intolerância com as manifestações e as lutas populares, e particularmente com os

movimentos sociais organizados. Durante muito tempo tratou os movimentos do povo

com preconceito, como algo inferior, ou com rótulos pejorativos, geralmente com a

alegação de que eram insuflados por anarquistas e por comunistas.

É certo que os movimentos sociais sempre representaram ameaça concreta

aos privilégios das elites brasileiras, ao seu modo de vida (exploração do trabalho,

acumulação da riqueza e idolatria aos países centrais) e, principalmente, ao seu

10 site do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, www.mst.org.br

Page 47: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

controle do poder político, concentrado, baseado nos esquemas oligárquicos locais e

regionais.

A grande imprensa raramente tratou com isenção e com respeito

democrático os movimentos surgidos no meio do povo, no seio das classes

trabalhadoras, subalternas e “perigosas”.

Raramente a mídia registra a contribuição dos movimentos de luta pela terra,

para organizar uma população desamparada e sem perspectivas; raramente credita a

eles o mérito de acelerar o processo de reforma agrária e tentar consolidar no campo

um caminho de ocupação produtiva, de produção de alimentos, distribuição da renda e

de melhoria da qualidade de vida; raramente verifica as obras concretas nos

assentamentos, as escolas e as cooperativas em funcionamento, e, o mais importante,

raramente mostra as pessoas vivendo com auto-estima e com dignidade.

Por isso, uma das lutas dos movimentos sociais é pela democratização dos

meios de comunicação de massas, em especial as emissoras de rádio e TV, que

funcionam como concessão pública. Reorganizando o sistema de comunicação, de

forma a garantir o acesso a todos os setores da sociedade, sem discriminação e sem

exclusão. Construir e consolidar veículos de comunicação que expressem as propostas

políticas e culturais dos movimentos sociais. Democratização que vai possibilitar a

abertura de espaços onde a troca de informações e notícias seja livre, sem restrições

ou exclusões.

Eles lutam por um sistema que contemple, na comunicação de massa, a

participação e a opinião dos setores mais discriminados social e economicamente. Em

parcerias com instituições que também defendem a democratização da comunicação,

os movimentos tentam chamar atenção da sociedade para a forma preconceituosa e

distorcida com que os principais veículos comerciais os tratam.

À medida que em os movimentos sociais se articulam junto aos meios de

comunicação municipais comunitários, criam redes de formação de cidadãos que vão

ser muito eficazes, para fazer com que essas vozes dispersas comecem a tomar corpo

no espaço regional e, até mesmo, no espaço nacional.

Page 48: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

2.4 A comunicação comunitária

Dentro de todo esse processo de monopolização da mídia, emergem

manifestações de comunicação denominadas, inicialmente, de populares (ou seja,

ligadas ao povo ou que vêm do povo), alternativas ou comunitárias, no sentido de

serem uma opção em relação à grande mídia, no tocante ao conteúdo e aos canais

utilizados, tais como boletins, panfletos, alto-falantes etc.

Os grandes meios de comunicação de massa estão submetidos a

mecanismos rígidos de censura e auto-censura, além de seus vínculos políticos e

econômicos com os setores das classes dominantes e com o governo, não refletindo

tudo o que esta acontecendo na sociedade, principalmente nos movimentos sociais

(PERUZZO, 1998).

Nesse tipo de comunicação se faz possível que os receptores das mensagens

dos meios mediáticas se tornem também produtores das mesmas, se tornem emissores

do processo de comunicação. A participação na comunicação é um mecanismo

facilitador da ampliação da cidadania, uma vez que possibilita a pessoa tornar-se

sujeito de atividades de ação comunitária e dos meios de comunicação ali forjados, o

que resulta num processo educativo, sem se estar nos bancos escolares.

A pessoa inserida nesse processo tende a mudar o seu modo de ver o mundo

e de relacionar-se com ele. Tende a agregar novos elementos à sua cultura. Os meios

de comunicação comunitários/populares – nem todos obviamente – têm assim o potencial

de ser, ao mesmo tempo, parte de um processo de organização popular e canais

carregados de conteúdos informacionais e culturais, além de possibilitarem a prática da

participação direta nos mecanismos de planejamento, produção e gestão. Contribuem,

portanto, duplamente para a construção da cidadania. Oferecem um potencial educativo

enquanto processo e também pelo conteúdo das mensagens que transmitem.

Seus conteúdos podem dar vazão à socialização do legado histórico do

conhecimento, facilitar a compreensão das relações sociais, dos mecanismos da estrutura

Page 49: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

do poder (compreender melhor as coisas da política), dos assuntos públicos do país,

esclarecer sobre os direitos da pessoa humana e discutir os problemas locais.

Entre essas alternativas estão as emissoras de rádios comunitárias,

pensadas a partir das bases da sociedade. Elas apareceram como forma de dizer um

basta à concentração absoluta dos veículos de comunicação de massa nas mãos dos

grandes grupos controladores do poder econômico e político, ao mesmo tempo em que

assumiram a responsabilidade de fazerem programas “voltados para o desenvolvimento

de suas comunidades” (PERUZZO, 1998). Associações, grupos comunitários e outras

entidades coletivas sem fins lucrativos começaram a colocar emissoras no ar – as então

denominadas rádios livres comunitárias.

Os programas de rádio montados por moradores de favelas ou comunidades, já

são reconhecidos pelo trabalho educativo que fazem junto a crianças e jovens quanto aos

perigos do consumo e do tráfico de drogas. Podem facilitar a valorização das identidades

e raízes culturais, abrindo espaço para manifestações dos saberes e da cultura da

população: da história dos antepassados às lendas e aos remédios naturais que curam

doenças. Ou servir de canal de expressão aos artistas do lugar, que dificilmente

conseguem penetrar na grande mídia regional e nacional. Ou, ainda, informar sobre como

prevenir doenças, sobre os direitos do consumidor, o acesso a serviços públicos gratuitos

(como registro de nascimento) e tantos outros assuntos de interesse social.

A participação das pessoas na produção e transmissão das mensagens, nos

mecanismos de planejamento e na gestão do veículo de comunicação comunitária

contribui para que elas se tornem sujeitos, se sintam capazes de fazer aquilo que estão

acostumadas a receber pronto, se tornam protagonistas da comunicação e não

somente receptores.

Segundo Peruzzo (1998) os veículos de comunicação produzidos por setores

organizados das classes subalternas, ou a elas organicamente ligados, acabam por criar um

campo propício para o desenvolvimento da educação para a cidadania.

As relações entre educação e comunicação se explicitam, pois as pessoas

envolvidas em tais processos desenvolvem o seu conhecimento e mudam o seu modo de

ver e relacionar-se com a sociedade e com o próprio sistema dos meios de comunicação de

massa. Apropriam-se das técnicas e de instrumentos tecnológicos de comunicação,

Page 50: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

adquirem uma visão mais crítica, tanto pelas informações que recebem quanto pelo que

aprendem através da vivência, da própria prática.

Por exemplo, a seleção de notícias que a pessoa se vê obrigada a fazer na hora

de montar o noticiário na rádio comunitária, bem como os demais mecanismos que

condicionam o processo de produzir e transmitir mensagens com os quais se depara

cotidianamente, lhe tira a ingenuidade sobre as estratégias e as possibilidades de

manipulação de mensagens pelos grandes meios de comunicação de massa. Ela passa a

conhecer as possibilidades de seleção das mensagens, os conflitos de interesses que

condicionam a informação ou a programação, a dinâmica do mercado publicitário, além da

força que tem um veículo de comunicação, tal como o rádio, o jornal, a televisão etc.

O potencial educativo implícito nos veículos de comunicação, sejam eles de

pequeno ou grande alcance, é muito significativo. Por isso mesmo, são bens públicos e

não privados e representam uma conquista da humanidade enquanto instrumentos

capazes de democratizar, de forma ágil, interessante e com fidedignidade, a informação, a

cultura e o conhecimento, do senso comum ao científico.

É essa vontade de querer um meio de comunicação mais livre e democrático

que justifica o projeto de implantação de programas de rádio em acampamentos de

movimentos sociais. Segundo Heródoto Barbeiro, nessa nova conformação global

imperada pelas multi-empresas de comunicação, a sobrevivência da liberdade de

expressão e a garantia de que setores minoritários vão ter acesso à mídia, vão ser

dadas pela internet e pelo rádio.

Veículos que abrem a possibilidade de explorar as contradições internas do

sistema global através das brechas que possui, através da capilaridade e da facilidade

técnica, possibilitando seu acesso a esses grupos.

As rádios comunitárias, livres ou alternativas são exemplo de preservação da

democracia, do contraditório, da resistência ao globalizado e da difusão de idéias não

oficiais.

Page 51: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

CAPÍTULO III

O programa de rádio

3.1 Por que um programa de rádio?

A escolha do meio foi muito importante porque, segundo Bordenave (1985,

p.73), o rádio é o melhor meio de comunicação para atingir o público rural. "Por utilizar

códigos auditivos que não exigem a habilidade da leitura para decodificar suas

mensagens, por seu baixo custo, tecnologia de complexidade relativamente manejável

por leigos, e pela intimidade de sua recepção, o rádio é o meio universalmente utilizado

nas áreas rurais”, as funções da comunicação rural devem ser entendidas como

facilitadoras no diagnóstico da realidade e na apresentação de seus resultados. A

participação da comunidade na reflexão e na ação sobre seus problemas visa facilitar o

diálogo, que mantém a população das cidades interessada e informada sobre o setor

rural.

Essa capacitação do setor rural no uso dos meios de comunicação modernos

fortalece sua capacidade de exercer pressão reivindicatória e contribui para a educação

de crianças e adultos nas próprias condições e locais em que vivem. Ou seja, a

comunicação rural deve conscientizar a população para que haja uma participação ativa

nos processos de mudança social e de construção de uma sociedade mais democrática

e participativa.

A rádio popular, voltada para públicos com baixo nível econômico-

educacional, quer colocar o ouvinte cada vez mais em contato com sua realidade, de

forma a compreendê-la e transformá-la. A rádio comercial não tem como fazer isso, pois

seu objetivo principal, enquanto empresa capitalista é o lucro. Ela, portanto, "nunca fala

da realidade do povo, mas de outras coisas, de outras realidades, justamente para

atrapalhar a luta popular pela transformação da sociedade em que vivemos." (No Ar...,

1984, p.04)

Page 52: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

Na comunicação popular é muito mais importante aquilo que o receptor

acredita, pense, sinta. O rádio voltado para este público deve ser democrático também

na maneira de se expressar. Não deve haver uma imposição dos pontos de vista aos

ouvintes. O importante é que ele possa tirar suas próprias conclusões de todas as

informações que recebe.

Com um programa de rádio dentro dos assentamentos dos movimentos

sociais de luta pela terra, levando informações sobre o andamento do movimento e de

outros correlacionados, é possível estimular a comunicação interpessoal dos

assentados, fortalecendo a própria comunicação interna do movimento e,

conseqüentemente, fortalecendo as bases do grupo.

Sendo coeso e bem informado o assentamento reflete na sociedade a

imagem de uma instituição organizada; divulgando suas ações e, principalmente,

mostrando o resultado de sua luta conquistam o respeito e credibilidade do público

externo.

O programa deve representar aquele espaço onde todos terão voz, sem se

limitarem a políticas editoriais imperativas, onde todos podem questionar os

mecanismos políticos que os cercam. Que será concretizado dentro de um estúdio de

rádio que produza programas democráticos, livres, com a intenção de enriquecer todos

os ouvintes com informação de qualidade, sem interferência política e, principalmente,

com liberdade de expressão.

O programa servirá, ainda, de ponte entre a coordenação do movimento e os

assentados, entre os próprios assentados, entre a comunidade e os assentados e entre

os assentamentos e a realidade de outros movimentos de luta pela terra.

Outro fator positivo nessa comunicação é o contato entre os assentados de

dois ou mais movimentos, que nem sempre podem manter contato direto. Daí,

coordenador da regional sudoeste do MST, cuja sede é em Vitória da Conquista, diz

haver várias pessoas da mesma família em assentamentos diferentes, e que eles quase

nunca sabem notícias de seus familiares, então o programa seria a ponte mais

acessível para eles se comunicarem.

Page 53: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

As coordenações do MST e MTD, de Vitória da Conquista sentem algumas

dificuldades com relação, por exemplo, às reuniões e assembléias, que nem sempre é

possível avisar a todos os a assentados. Com um sistema de comunicação interno e

periódico esse repasse de informações da coordenação para a base facilitaria.

3.2 Linha editorial

A informação radiofônica cresce em importância nos anos 90, o rádio viu no

jornalismo uma forma de atrair novamente seus ouvintes que se encantaram pela tv.

Porém esse começo de atividade jornalística no rádio foi influenciado pela forma de

jornalismo mais atuante, o impresso.

Apesar de agora as atividades estarem sendo realizadas em meios

eletrônicos, não houve uma mudança de linguagem, o rádio adquiriu uma série de

tradições, normas, hábitos e técnicas daquele outro tipo de meio (MEDITSCH, 2001:

30).

A necessidade de qualidade e capacidade de competir definitivamente como

meio de comunicação o fez dinâmico, ágil, adequando suas peculiaridades à

programação, nascendo daí uma multiplicidade de utilizações para o meio, expressa

em diferentes formatos de programação dirigidos a públicos diversos.

Esse projeto vai trabalhar o conceito de “rádio informativo” de acordo com o

estudo de Meditsch. Segundo ele “o rádio informativo não é apenas um novo canal para

a mesma mensagem do jornalismo, é também um jornalismo novo, qualitativamente

diferente” (MEDITSCH, 2001: 30).

“Na verdade esse termo, rádio informativo, vem do alargamento do

conceito de radiojornalismo, e das transformações ocorridas no campo do

próprio jornalismo. Faus Belau diz o rádio informativo se diferenciaria por uma

maior profundidade em relação à programação tradicional de notícias, e estaria

ainda numa fase de evolução e posterior definição, podendo representar o

ponto culminante de um segundo ciclo na história do rádio” (MEDITSCH, 2001:

30).

A transposição das notícias do meio impresso para o rádio, causou

modificações qualitativas com a sua adequação ao novo meio, num processo que vem

Page 54: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

se dando ao longo da história e que hoje começa a se definir como o rádio informativo.

Ele fala de coisas que anteriormente não eram notícia (a hora certa, por exemplo) e

revoluciona a idéia da reportagem com as transmissões ao vivo, aprofunda e contrapõe

idéias com facilidade, consegue colocar em contato pontos distantes reduzindo as

distâncias, permite que o receptor se manifeste, além de ser, na sua maioria, um

serviço gratuito.

È dentro destas definições de rádio informativo que o programa para

assentamentos de movimentos sociais deve estar norteado. Serão programas que

devem pensar e entender a notícia como bem público e que devem tratá-la com

profundidade e investigação, dentro das possibilidades das equipes de produção.

Priorizando sempre o espaço livre e democrático para a apresentação dos movimentos

sociais, fato inexistente nos grandes canais da mídia e o que mais incomoda e

enfraquece o movimento segundo declarações dos coordenadores do MST e MTD,

presentes em Vitória da Conquista.

3.3 Público alvo

Concentrando-nos nesse projeto de programa de rádio podemos definir o

público alvo como a população rural que vive em assentamentos de movimento sociais

que lutam pela terra. Grande parte dessa população continua analfabeta, pobre e

exclusa socialmente, portanto com imensas dificuldades de acessar e receber

informações básicas. Em Vitória da Conquista, a coordenação do MTD faz uma

previsão de que 70% dos assentados são analfabetos.

Dada a cultura oral que permeia a realidade dos homens e mulheres rurais, o

rádio tem se mostrado um veículo eficiente para essa população, inclusive como

instrumento de educação à distância (GOMES, 2003:19), ainda segundo Gomes o rádio

tem grande popularidade nas populações e áreas mais pobres do país, e que “dados

apontam, por exemplo, que mais de 90% dos nordestinos sintonizam alguma emissora

de rádio” (2003:20).

A grande popularidade do veículo é atribuída ao caráter universal de sua

linguagem – essencialmente coloquial, simples e direta – além da empatia que procura

Page 55: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

estabelecer com o ouvinte, ao atender suas demandas por lazer, música,

entretenimento, informação e companhia. Segundo Daí, do MST, o maior número de

ouvintes nos assentamentos é de pessoas mais velhas, ele acredita que seja pela

convivência quase que integral com o meio. O rádio sai de casa com essas pessoas e

vai até o campo, na lavoura e na colheita.

Uma outra característica do público ouvinte é a condição de produtor, na

maioria deles. Como os assentamentos são guiados pela luta por terra, toda terra

conquistada é cultivada, portanto 95% dos assentados são pequenos produtores. Estes

5% restantes trabalham fora dos assentamentos e acabam passando pouco tempo

nesse ambiente, e essa é uma realidade presente tanto nos assentamentos do MST e

do MTD, portanto essa pequena parcela da população não se identifica como público

alvo do programa.

O rádio deve ser parte fundamental de qualquer projeto de divulgação que

objetive atingir a população de baixa renda, carente de informação e que necessite ser

mobilizada para participar dos processos de desenvolvimento local sustentável.

3.4 Mediação do público

O discurso no rádio informativo é específico por sua forma de objetivação, no

que se refere ao modo como o discurso participa da interação social. Esta participação

envolve dois aspectos: primeiro todo discurso dirigi-se a um determinado auditório;

segundo, este auditório tem participação ativa na atribuição de seu sentido.

Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é

determinada tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que

se dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do

locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao

outro. A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros. Se ela

se apóia sobre mim numa extremidade, na outra apóia-se sobre o meu

interlocutor (BAKHTIN apud MEDITSCH, 2001:54)

Page 56: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

Para Bakhtin, o discurso em geral deve estar norteado tanto pelo emissor

quanto pelo receptor da mensagem, uma posição unilateral não se enquadra na

comunicação. A segmentação do público de rádio conduz a uma nova maneira de ver a

mediação deste no meio radiofônico. Mediação que se torna determinante na produção

da mensagem tanto quanto a subjetividade do jornalista, de seu profissionalismo e de

sua organização.

A segmentação de audiência retira do profissional a intenção de agradar um

público universal, exigindo dele um conhecimento maior sobre seus ouvintes. A

mediação do público está presente não apenas na etapa posterior à emissão, mas

também numa etapa anterior, como a intencionalidade que a orienta. A definição de um

público alvo dirige a produção da mensagem tanto em relação a forma quanto ao seu

conteúdo. Essa segmentação facilita também a criação de mecanismos de feedback

efetivo e a monitoração de seu funcionamento, oferecendo uma maior possibilidade de

intervenção ao seu público.

A mediação do público vem referendar também os conceitos trabalhados em

rádio comunitária. Peruzzo defende que tais rádios se caracterizam, entre outras, pela

interatividade, favorecendo a participação do público no microfone, não apenas como

meros ouvintes. Esse contato direto permite ainda o treinamento de pessoas do próprio

assentamento, afim de que se tornem capazes de produzir integralmente os programas

de rádio.

3.5 Conteúdo dos programas

A programação deve ter um vínculo organizado e baseado na realidade da

localidade para onde está sendo produzido o programa, tratando de seus problemas,

suas conquistas, suas necessidades, interesses e cultura. Abrangendo o cotidiano das

pessoas que formam tal comunidade.

De acordo com os depoimentos dos coordenadores dos movimentos e

também de entrevistas com assentados, alem dos estudos teóricos, constatou-se a

necessidade do programa seguir a linha informativa e musical. Informativa pois é o meio

mais fácil dos assentados terem acesso às notícias e acontecimentos regionais,

Page 57: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

estaduais, nacionais e internacionais; e musical pelo caráter inerente ao rádio de

entreter e divertir o ouvinte.

Nas entrevistas realizadas em duas áreas de ocupações sociais, aqui em

Vitória da Conquista, uma sob a instrução do MST, a Vila da Santa Marta, e outra, que

ainda é um acampamento, na saída da cidade dirigido pelo MTD, comprova o que os

dois coordenadores já haviam declarado, que um grande número de assentados vêm

no rádio o único meio de se informar a respeito do que acontece a sua volta, na cidade

e no mundo. Segundo analise dos questionários aplicados nos assentamentos dos

movimentos sociais, os entrevistados passam quase todo o dia com o rádio ligado, e

nas raras vezes que isso não acontece, é quando eles ligam uma bateria de carro para

funcionar a tv, afinal os dois assentamentos e estão em localidades sem energia

elétrica.

O mais importante nessas entrevistas foi saber que os assentados acham de

grande importância o movimento ter um programa de rádio próprio, essa pergunta foi

unanimidade entre os entrevistados, que vislumbravam na possibilidade em ter um

programa dirigido especialmente para eles. Importância que aumenta quando se mostra

a futura chance dos programas de rádio serem produzidos por eles.

Na parte teórica Ortriwano nos mostra a existência de cinco níveis de

informação, níveis que não supõe especialização, mas que tem seu fundamento na

eficácia da mensagem de acordo com o interesse próprio de cada conteúdo (1985: 94).

Neste programa para assentamentos indicamos como mais úteis os níveis

dois: determinado pela aparição ocasional de grandes notícias, promotoras de espaços

informativos especiais, cuja finalidade é tratar o fato de modo mais completo possível; e

o quatro, que pressupõe um tratamento mais profundo da informação, uma seleção

valorativas de notícias por períodos mais longos de tempo; serão os mais usados não

excluindo a possibilidade real de utilização dos demais níveis de informação. O nível

dois será usado ao tratarmos das notícias atuais que, quase sempre, os grandes

veículos tratam de forma parcial ou tendenciosa, portanto a necessidade de tratar o

assunto de forma completa, transparente. Já o nível quatro será mais usado em

questões genéricas, frias, mas não menos importantes, que podem contar com mais

Page 58: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

investigação e estudo da produção. Por exemplo a ALCA e seus efeitos para o Brasil,

um tema muito falado que pode se alongar, com entrevistas, pesquisas e até debates.

Dentro da definição do nosso público alvo estão aqueles que passam o dia no

campo e são produtores de terra, para esses os conteúdos serão: informações sobre

plantio, condições da terra, fatores climáticos favoráveis para certas culturas agrícolas,

financiamentos para pequenos produtores ou para as cooperativas, cuidados com os

agrotóxicos, contribuição sindical, realização de cursos pelo movimento ou outras

entidades.

Já para as pessoas que ficam mais nas casas, como exemplos as donas de

casa, ou filhas, os conteúdos mudam um pouco de teor: temas sociais como

campanhas de amamentação, prevenção à AIDS, saúde da família, higiene pessoal,

segurança, saneamento básico e preservação ambiental.

Os consultórios médicos, jurídicos, psicológicos, os espaços para compra e

vender de segunda mão, os “classificados” pelo rádio, os preços do mercado e as

normas da estrada, a informação sexual, as farmácias de plantão, as receitas de

cozinha, as bolsas de trabalho, os conselhos de beleza, a orientação vocacional, a

defesa do consumidor, as instruções em caso de desastre, esses e outros serviços bem

concretos ”podem brindar uma rádio popular – sem falar do tão auxiliar quadro de

avisos – e aparecem sempre como os mais apreciados pelo publico em todas as

pesquisas de audiência” (GOMES, 2003:48).

Apesar dos conteúdos estarem sendo dirigidos para um tipo de público, o

programa será um só com todos, ou alguns, daqueles temas referidos, contando

também com informações recentes sobre as lutas dos trabalhadores rurais por todo

estado e país.

3.6 Estrutura do programa

O programa será semanal indo ao ar toda quinta-feira, por ser um dia no meio

da semana, podendo informar o que aconteceu nos dias anteriores e adiantar os

eventos que ocorrerão no final dela. O tempo de duração é de 60 minutos, tempo que

foi contemplado pelos dois movimentos entrevistados. O horário que ele vai ao ar é das

Page 59: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

5:30 às 6:3 0 da manhã, “...exatamente quando os trabalhadores estão se arrumando,

preparando a farofa, para ir pro campo” afirmou Daí, MST.

Para a locução não fica determinado se será feita por uma voz feminina ou

masculina, essa definição se fará de acordo com as possibilidades e disponibilidade de

locutores.

Esta proposta de programa de rádio será concretizada atravez de parceria

com as rádios comunitárias locais e Universidades que possuam estúdio de rádio, como

é o caso da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, UESB, campus de Vitória da

Conquista. Os estúdios serão utilizados para edição de matérias e edição de

entrevistas. Como o programa é semanal e dura 60 minutos o trabalho de edição não é

demorado o que torna viável o uso dos estúdios de rádio das Universidades, lembrando

que tais Instituições já tem feito experiências dessa natureza em outros Estados e tem

dado certo. O próprio MST, por exemplo, faz parceria com a Universidade Católica de

Santos (Unisantos), em São Paulo e com o Departamento de Jornalismo da Faculdade

da Comunicação e Filosofia da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), buscamos

sempre o envolvimento de estudantes universitários e recém-formados na produção e

distribuição de programas de rádio, Vozes da Terra, para alguns assentamentos. Ou

ainda a RALACOCO, que é Rádio Laboratório de Comunicação Comunitária na UNB,

Universidade de Brasília, faz parte das atividades laboratoriais do curso de jornalismo e

começou com uma rádio comunitária.

Já as rádios comunitárias se tornam parceiras enquanto transmissoras dos

programas. Considerando os assentamentos locais onde a terra já é posse das famílias

e, logo começam a produzir, o comércio passa a ser presente nas localidades.

Geralmente com pequena estrutura, mas com o básico para atender a comunidade e

ajudar na arrecadação de fundos para o apoio cultural das rádios comunitárias. Com

esse apoio será possível a reserva de um espaço na grade de programação da rádio.

Outra forma de patrocinar o programa é a verba dos próprios movimentos para

execução de projetos que venham a melhorar o convívio da comunidade.

Dos 60 minutos de programa, 15 serão para músicas, os assentados

entrevistados dizem gostar muito dessa parte musical nos programas. Os outros 45

minutos estarão divididos em 3 blocos. Neles entrarão os quadros abaixo:

Page 60: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

Um dedo de prosa: quadro de entrevista com pessoas da coordenação de

movimentos, sindicatos, representantes do governo, nomes de representação para o

trabalhador rural. Essas entrevistas devem durar em torno de 10 minutos, tempo

suficiente para esclarecer duvidas dos assentados. Como o programa prevê a

participação ativa dos mesmos, os nomes dos entrevistados podem partir de indicações

internas dos assentados, de acordo com sua necessidade atual. As entrevistas poderão

ser ao vivo ou gravadas previamente.

Dicas do campo: nesse quadro engenheiros agrônomos ou técnicos rurais

falam como melhor utilizar o solo e os recursos naturais, afim de que o produtor tenha

mais rendimento. Dicas como uso da água, melhor tipo de cultura para aquele solo,

formas de aumentar o numero da produção e, conseqüente, renda financeira, serão

constantemente tratados nesse quadro. Ele terá aproximadamente 8 minutos de

duração.

Remédio caseiro: espaço onde as informações sobre higiene pessoal,

cuidado com saneamento, saúde família, conservação de alimentos, serão tratados.

Como o próprio nome diz, será uma serie de informações fáceis de serem realizadas e

de resultados garantidos, bem como os remédios caseiros, tão conhecidos das

populações rurais. Mas é claro que o quadro não será leviano a ponto de indicar

resoluções para problemas graves, onde só um especialista poderá resolver. Fazendo,

inclusive, parte do programa o conselho de procurar sempre orientações médicas.

Recados: esta é a hora que os assentados podem mandar notícias,

saudações e até músicas, é o momento da comunicação inter pessoal. Segundo os

coordenadores dos movimentos entrevistados, essa é uma das horas que mais agrada

os moradores dos assentamentos. Se sentir realmente representado no meio de

comunicação e ter a possibilidade de construí-lo, é muito importante e satisfatório para

a população. Este quadro virá no final de cada bloco após o quadro de destaque e

antes das musicas.

Chora viola: é o quadro musical, com seleções feitas pelos próprios

assentados que já mostraram interesse pela música sertaneja e pela música que fale

do campo, segundo eles, às poucas vezes que escutam músicas de rádios comerciais é

Page 61: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

por falta de opção. Será também um espaço onde os artistas da comunidade poderão

divulgar seus trabalhos.

3.7 Modelo de programa

Após serem definidos todos os quadros e suas finalidades, mais o tempo de

duração de cada um deles, nos resta preparar um modelo de programa, pronto para ir

ao ar. Lembrando que o modelo serve de exemplo e provavelmente não poderá ser

usado com as mesmas informações contidas, já que algumas notícias são factuais e

logo perderão o sentido. Os nomes são fictícios.

Page 62: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

VINHETA ABERTURA

BG FUNDO

LOCUTOR(A)

VINHETA

“DICAS DO CAMPO”

BF FUNDO

LOCUTOR(A)

BOM DIA AMIGOS DO CAMPO//

EXATAMENTE AS 5 E MEIA DA MANHÃ

COMEÇA O SEU ...............................//

O SEU ESPAÇO PARA FALAR, ESCUTAR

E PARTICIPAR//

NO PROGRAMA DE HOJA VAMOS

FALAR DE FORMAS DE PLANTIO//

VAMOS TER UM DEDO DE PROSA

COM O DIRETOR DO SINDICATO

DOS TRABALHADORES RURAIS//

VAMOS APRENDER O LUGAR CERTO

DAS FOSSAS//

E FALAR COM NOSSOS AMIGOS

DISTANTES//

EM CONQUISTA SÃO ...............HORAS

E O DIA SERÁ DE SOL.

HOJE VOCES VAO APRENDER //

COMO CULTIVAR MELHOR SUA ROÇA E

AUMENTAR A PRODUÇAO DE

MANDIOCA.

Page 63: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

LOCUTOR(A)

BG FUNDO

BOM AMIGOS DO CAMPO, HOJE NOSSA

PLANTAÇAO É UMA RAIZES MUITO

FORTE E QUE PODE GERAR MUITA

RENDA PARA NÓS APRODUTORES, É A

MANDIOCA, AIPIM E ATE MACAXEIRA.

EM GERAL, QUALQUER TIPO DE SOLO

BOM, PODE PLANTAR MANDIOCA QUE

DA UMA BOA COLHEITA.

MAS TEMOS QUE TER CUIDADO COM A

EPOCA, PORQUE A MANDIOCA NÃO

GOSTA DE FRIO E PODE ACABAR

PERDENDO A PLANTAÇAO...(SEGUE O

TEXTO COM MAIS INFORMAÇOES)

Page 64: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

VINHETA “RECADOS”

LOCUTOR(A)

BG FUNDO

BG FUNDO

VINHETA “RECADOS”

LOCUTOR(A)

ENTRA MUSICA

AGORA SÃO............HORAS

E TA NA HORA DOS RECADOS//

O PRIMEIRO É DE MARCOS DA ..............

PARA SEU IRMAO PAULO DE ...............

OLHA PAULO, MARCOS AVISA QUE

SUA FILHA JÁ NASCEU E SE CHAMA

MARIA//

E QUE OS OUTROS MENINOS ESTAO

BEM//

Á NAZARE LIGOU DE SÃO PAULO E

AVISOU QUE FEZ BOA VIAGEM, QUE

SEUS PAIS, JOSE E RITA

NÃO PRECISAM SE PREOCUPAR//

ELA VAI LIGAR NO PROXIMO SABADO//

4 HORAS DA TARDE//

NA VENDA DE SEU ZE//

SE VOCE QUER MANDAR NOTICIAS

PARA ALGUEM É SO FALAR COM O

REPRESENTANTE DO PROGRAMA EM

SEU ASSENTAMENTO

DEPOIS TEM MAIS RECADOS

VAMOS AGORA ESCUTAR UMA

MUSICA//

QUE FOI UM PEDIDO DE JOANA

DO..........//

BOM DIA PRA VOCE JOANA EFIQUE

COM A MUSICA//

AGORA SÃO..........HORAS//

Page 65: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

VINHETA PROGRAMA

LOCUTOR(A)

VINHETA “UM DEDO DE PROSA”

VINHETA “UM DEDO DE PROSA”

LOCUTOR(A)

ENTRA MUSICA

LOCUTOR(A)

VINHETA “RECADOS”

LOCUTOR(A)

BOM PESSOAL DEPOIS DESSA MUSICA

BONITA VAMOS PROSEAR UM POUCO

COM O DIRETOR DO SINDICATO DOS

TRABALHADORES RURAIS, JOA SILVA.

O DIA TA CLAREANDO E SÃO....HORAS.

CORRE ENTREVISTA OU FITA GRAVADA

DEPOIS DESSE PAPO COM JOAO É

HORA DA VIOLA CHORAR SOLTA A

MUSICA.

GENTE AGORA SÃO....HORAS E TEMOS

AQUI OUTROS RECADOS

DESSA VEZ E A COORDENAÇAO DO

MOVIMENTO QUE AVISA AOS CHEFES

DE SETORES QUE DOMINGO AS 10

HORAS DA MANHA VAI TER UMA

REUNIAO NA SEDE, ATENÇAO É

DOMINGO AS 10 DA MANHA E TODOS

DEVEM PARTICIPAR.

PRESTEM ATENÇAO QUE É HORA DE

FALAR DA SUA SAUDE ELA É MUIRTO

IMPORTANTE E VOCE DEVE TER MUITO

CUIDADO PARA QUE A AGUA QUE

VAMOS BEBER E OS ALIMENTOS QUE

VAMOS COMES NÃO ESTEJAM SUJOS//

Page 66: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

VINHETA ”REMEDIO CASEIRO”

LOCUTOR(A)

VINHETA

LOCUTOR(A)

ENTRA MUSICA

LOCUTOR(A)

BG FUNDO

VOCE DEVE FAZER SUA FOSSA A PELO

MENOS 10 METROS AFASTADO DO

POÇO ARTESIANO//

SE AINDA NÃO CONSTRUI A FOSSA

QUANDO TIVER AQUELA DOR DE

BARRIGA OU FOR TIRAR AGUA DO

JOELHO VAI BEM LONGE DO POÇO//

PARA QUE A SUJEIRA NÃO CHEGUE

ATE A AGUA OU NA PLANTAÇAO//

E TAMBEM NÃO PODE ESQUECER DE

LAVAR AS MAOS. CUIDANDO DA SUA

SAUDE VOCE CUIDA DA SUA VIDA E

AUDA A MELHORAR O LUGAR ONDE

VOCE MORA!

EM CONQUISTA SÃO.....HORAS E TA

QUASE NA HORA DE IR PARA O

CAMPO//

ANTES VAMOS ESCUTAR MAIS UM

POUCO DE MUSICA

DESTA VEZ VAMOS OFERECER PARA A

SANTA MARTA/

BEM AMIGOS JÁ SÃO.....HORAS E

NOSSO PROGRAMA ACAOU.TA NA

HORA DE IR PRO CAMPO// QUE TODOS

TENHAM UM BOM DIA DE TRABALHO//

Page 67: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

LOCUTOR(A)

BG FUNDO

E QUE AMANHA TODOS TENHAM

FORÇA PRA CONTINUAR NA LIDA//

AGENTE ESPERA O RECADO DE

VOCES//

LEMBRANDO QUE TODOS PODEM

FALAR O QUE QUIZEREM

É SO APARECER POR AQUI.

NA PROXIMA QUINTA TEM MAIS

PROGRAMA E ESTAMOS TE

ESPERANDO

BOM DIA

(NESTE MOMENTO ENTRA A FICHA

TECNICA DO PROGRAMA)

Page 68: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

Considerações Finais

O rádio serve para milhares de objetivos. Desde o seu surgimento, como

lugar clássico, até hoje, com programas voltados para a informação e entretenimento,

as ondas sonoras se encarregaram de apresentar um vasto campo de atuação. Antes

de mais nada, os objetivos deste trabalho foram os de contribuir, de alguma forma, para

a discussão e proposta da criação de programas voltados para um público específico,

com objetivos bem definidos, que são os moradores de assentamentos de movimentos

de luta pela terra.

Com o trabalho pudemos perceber a necessidade desses movimentos sociais

em terem seus veículos de comunicação, e atravez deles mostrar para a cidade onde

moram que o movimento vive ali e portanto faz parte daquela realidade. A intenção é

que este trabalho estimule não só a formação de programas de rádio pelos movimentos

sociais como também qualquer forma de comunicação livre e democrática, onde não

existam somente receptores de mensagens, mas também receptores emissores ativos,

onde todos possam falar e ser escutados.

Tal necessidade de veículos de comunicação para os movimentos vem

primeiro de uma questão básica de todo ser humano a de se comunicar, e depois, pelo

enorme embate e preconceito das grandes empresas midiáticas, que atuam como

reprodutores ideológicos dos interesses das classes dominantes, para com esses

movimentos, que reclamam, principalmente, um espaço para relatar suas conquistas,

sua produção, seus avanços frente às suas reivindicações (embora tais reivindicações

sejam consistentes e validas, e o sentido de sua luta decorra do fato de exporem sua

comum situação de excluídos). Reclamam dos enfoques dados nas matérias referentes

aos movimentos, tratados sempre como radicais, invasores e desordeiros.

Page 69: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

Além do preconceito, existe a barreira do poder de poucos em controlar

muitos veículos, ou seja, as mesmas pessoas comandam o mundo midiático e nunca

permitem a participação ativa dos movimentos, que acabam por ter um número

reduzido de mídia a seu favor, ou pelo menos, que os trate com imparcialidade.

Surge então um caminho alternativo para começar a resolver esse problema

de falta de espaço para os excluídos, o da comunicação popular. Inúmeros exemplos

podem ser citados como experiências de sucesso na comunicação feita pelo povo de

forma comunitária. São rádios comunitárias que se espalham pelas ondas eletro

magnéticas em todo mundo, imprensa de oposição, que conquistam cada vez mais

espaço no mercado, são documentários sobre crenças, etnias, guetos que quase nunca

se vê num programa de tv , enfim muitas possibilidades de mudar o cenário das

comunicações no Brasil, e quem sabe torna-lo o mais justo possível.

Pretendemos instigar cada vez mais pessoas a perceber a necessidade da

sociedade se unir e lutar pela democratização dos meios de comunicação, afinal

enquanto os empresários e os políticos detiverem a hegemonia dos meios, os

interesses que serão defendidos estarão muito longe de ser os das classes sociais

menos favorecidas. Estimular o debate em torno da comunicação, e como ela perpassa

qualquer relação social, deve ser bem resolvida.

Portanto, não é o homem, o cidadão, o ouvinte que deve adaptar-se à

realidade, mas, é a realidade que deverá ser adequada e ajustada, pelos homens, para

responder aos interesses, anseios e aspirações de todos, para que todos possam ter

um desenvolvimento igualitário, um crescimento único. Na comunicação voltada para o

público de movimentos sociais rurais, devemos ressaltar a importância do radio e sua

facilidade de comunicação nesses ambientes, alem da importância de que todos devem

ter espaço para aprender a comunicação entre si e com as instituições do Estado. O

verdadeiro desenvolvimento rural e urbano só ocorrerá quando houver premissas de

novos processos de educação e comunicação permanente, capazes de promover tais

anseios.

Page 70: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

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Sites:

www.anatel.gov.br (Agencia Nacional de Telecomunicações)

www.intervozes.org.br (Coletivo Brasil de Comunicação)

www.obore.org.br (Projetos especiais Obore)

www.radiomuda.hpg.ig.com.br

www.mc.gov.br (Ministério das Comunicações)

www.rbc.org.br (Rede Brasil de Comunicação Cidadã)

Page 73: Radiojornalismo Movimentos Luta Pela Terra

ANEXO

Questionário aplicado nos assentamentos:

1.Durante quanto tempo por dia você escuta rádio? Qual o horário mais escutado?

2.Quais os tipos de programa de sua preferência?

3.Que assunto gostaria de ouvir no rádio?

4.Gosta de programas musicais? Que tipo de música?

5.Acha o rádio importante?por que?

6.Acha importante o assentamento ter um programa de rádio?

7.O que esse programa poderia ter?