“REBENTAÇÃO” DE IMAGENS: TENSÃO ENTRE CORPO & ESPAÇO NA POÉTICA DE LUÍS MIGUEL NAVA
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“REBENTAÇÃO” DE IMAGENS: TENSÃO ENTRE CORPO & ESPAÇO
NA POÉTICA DE LUÍS MIGUEL NAVA
Leonardo David de Morais1
“[...] o mar há de revolver-se, debater-se, rebentar, há-de trazer à superfície a força das entranhas e atrair o céu [...]”
Luis Miguel Nava
RESUMO: O presente artigo objetiva propor, a partir dos poemas que compõem o livro Rebentação de Luís Miguel Nava, uma análise da construção da imagem poética. A imagem poética, no sentido cunhado por Octavio Paz, é toda forma verbal, frase ou conjunto de frases que o poeta diz e que articuladas formam um poema. Para o surrealista Pierre Reverdy, a imagem poética não nasce a partir de uma comparação, mas da aproximação de duas realidades distantes. Em ambas as definições entrevê-se, além de uma associação entre conceitos distintos de linguagem, palavra e imagem, uma tensão decorrente da natureza, por vezes antitética, inerentes a esses elementos quando utilizados em conjunto. Nesse sentido, pretende-se investigar a construção das imagens poéticas em Rebentação analisando como se relacionam, nas linhas e versos de Nava, dois elementos que se apresentam fulcrais na poética do autor: o corpo e o espaço. Ao longo dos poemas em verso e prosa de Rebentação afigura-se uma espécie de embate entre o corpo/eu-lírico de Nava e o espaço, representado pela natureza, que por vezes acolhe o eu-lírico, noutras, repele, “rebenta” seu corpo, gerando assim um movimento de tensão que pode ser associado à construção da imagem poética.
PALAVRAS-CHAVE: Corpo; Espaço; Imagem poética; Luís Miguel Nava.
Na obra de Luís Miguel Nava, morto precoce e tragicamente em 1995, o ensaio,
a tradução e principalmente a poesia parecem evidenciar para o leitor mais atento a
sensibilidade e o rigor empreendido pelo autor na construção de um corpus literário sui
generis. Na poética de Nava, plasmada por meio de poemas em verso livre ou em textos
que se aproximam do formato e da dicção da prosa poética, uma série delimitada de
temas e elementos apresentam-se recorrentes, sugerindo mais uma vez que a
sensibilidade e o rigor caracterizam o processo de criação literária naviano.
1 Contato: [email protected]
2
No livro Rebentação (1984), a imagem poética afigura-se como um dos recursos
fulcrais à tessitura do texto de Luís Miguel Nava. Nessa recolha de poemas, na
perspectiva que adotamos, subsiste uma tensão entre certas linhas de força que ajuda a
constituir de maneira particular as frases e versos do poeta. Tensão essa advinda da
relação, arquitetada engenhosamente pelo autor, entre dois elementos, entre duas
instâncias, entre duas realidades que se apresentam e se articulam a temas recorrentes
não apenas em Rebentação, mas ao longo da travessia textual de Nava.
No prefácio de Poesia Completa (2002), Fernando Pinto de Amaral aponta, nos
textos de Nava, tal relação que seria baseada na oposição entre certos elementos e
criadora dessa tensão sugerida. Segundo Amaral, na poética de Nava há uma relação
que “[...] por vezes se estabelece entre áreas semânticas aparentemente afastadas,
originando efeitos insólitos, por exemplo, ao associar o concreto e o abstrato [...]”
(AMARAL apud NAVA, 2002). Em ensaio sobre o “espaço do corpo” no livro O céu
sob as entranhas (1989), Moisés David Ferreira fundamenta-se na tese de Amaral para
delimitar, sob essa perspectiva, algo da poética naviana:
Este processo caracteriza-se pelo estabelecimento de uma relação de proximidade entre universos semânticos aparentemente afastados, originando efeitos por vezes desconcertantes. É sobretudo nisto que assenta o pendor alucinatório desta poesia, multiplicando-se as passagens em que se firma uma união entre objectos ou processos referentes a uma esfera material ou corpórea e outros do domínio do imaterial ou incorpóreo [...] (FERREIRA, 2009, p. 3).
É a partir de uma intencionalidade radical que pressupõe um uso
particularíssimo da linguagem como geradora de tensionamento entre realidades
díspares na trama do texto que, desconfiamos, aflora a imagem poética no trabalho de
Luís Miguel Nava. Imagem poética que, segundo entrevemos, pode ser tomada como
elemento chave na construção de algum dos poemas que habitam as páginas de
Rebentação. Antes de verificarmos nossa hipótese partindo da análise de alguns dos
poemas do livro, convém definirmos melhor o conceito de imagem. O objetivo é o de
embasar mais solidamente este nosso breve estudo da poética naviana.
Massaud Moisés, em seu Dicionário de Termos Literários (2005), entre várias
definições, apresenta o seguinte conceito de imagem, muito próximo ou mesmo análogo
ao de imagem poética: “Da perspectiva literária, a imagem relaciona-se ou confunde-se
com o símbolo, a metáfora, as figuras de pensamento, tropos, etc., [...]” (MOISÉS,
3
2005, p. 241). Nesse sentido, a poesia de Nava em Rebentação, a despeito de apresentar
um caráter de inventividade sobre o qual dissertaremos logo adiante, configura-se, da
perspectiva formal, como texto literário construído levando em conta parâmetros já
consagrados uma vez que a própria constituição desse texto se arvora na operação
metafórica, esta última, um dos atributos comumente associados à linguagem literária.
Octavio Paz, poeta e ensaísta mexicano, por sua vez, teceu considerações
pertinentes sobre a imagem poética. Considerações que pensamos também se relacionar
à forma atribuída ao texto de Nava, plasmado tanto em verso quanto em prosa. Segundo
Paz “designamos com a palavra imagem toda forma verbal, frase ou conjunto de frases,
que o poeta diz e que unidas compõem um poema” (PAZ, 1990, p. 37). Nesse sentido,
esse conceito de imagem pode ser associado tanto aos poemas em verso quanto aos
textos em prosa poética na obra de Nava uma vez que, segundo Paz, a imagem pode
existir tanto no âmbito do verso quanto no domínio da prosa.
Antes de chegarmos à análise propriamente dita, vale salientar que o uso ou a
presença da imagem poética não é exatamente uma novidade na literatura moderna
produzida em língua portuguesa. O ensaísta Claudio Willer, a propósito da influência
das vanguardas do século XX e da imagem poética na obra do poeta brasileiro Roberto
Piva, escreveu:
Seu modo dominante é a imagem poética, tal como definida por Pierre Reverdy e adotada pelo surrealismo: “A imagem é uma criação pura do espírito. Ela não pode nascer de uma comparação, mas da aproximação de duas realidades mais ou menos afastadas. Quanto mais as relações das duas realidades aproximadas forem distantes e justas, tanto mais a imagem será forte, mais força emotiva e realidade poética ela terá” (WILLER apud PIVA, 2005, p. 150).
Em poemas como os recolhidos no livro Ciclones, de 1997, a imagem poética,
construída pelo poeta Piva, surge a partir desse movimento de “aproximação” entre
“realidades mais ou menos afastadas”: “cem planetas? cem pupilas? / simpatia das
coisas distantes / o nada árido das areias” (PIVA, 1997, p. 41). Nesse poema, o eu lírico
piviano revela sua “simpatia” pelas “coisas distantes”, sugerindo a aproximação entre
dois elementos distintos, homem e natureza, eu lírico e espaço literário, e que pode ser
lida como representação da relação que advém da referida aproximação de “realidades”
a princípio “afastadas”, propagada em certa medida na literatura moderna.
4
Ora, nossa hipótese de que a imagem poética2 em Rebentação é formada a partir
da mencionada aproximação entre “realidades afastadas” parece confluir na direção
proposta pelos movimentos de vanguarda e, nesse sentido, tangencia de alguma forma a
poética de Piva3. Entretanto, a possível relação entre poéticas tão imagéticas, a poética
de Roberto Piva e a de Luís Miguel Nava, não será tratada neste momento, podendo ser
tema de um futuro estudo.
Chegamos agora ao ponto em que devemos começar a investigar com mais
apuro na poesia de Rebentação pistas que possam jogar luz sobre essa relação entre
“realidades afastadas” e seus elementos constituintes. Para isso, tomemos como nosso
primeiro objeto de análise o poema “Cisão”. O objetivo é o de tentarmos perceber com
mais nitidez esse recorte de imagem poética que por ora associamos a este trabalho de
Luís Miguel Nava:
CISÃO
Gostava de saber até que ponto a ideia de céu e a de unidade andam ligadas. Só assim poderia avaliar que peso tem o facto de eu sentir que o céu se encontra dividido e uma das partes se alojou transversalmente no meu corpo. Tal é às vezes o seu peso que me vejo constrangido a andar dobrado. (NAVA, 2005, p. 109)
O poema acima foi intitulado com o vocábulo “cisão”, que entre outras
definições, remete-se ao ato de “cindir”, isto é, “cortar”, “dividir algo em duas ou mais
partes” (HOUAISS, 2001). Ora, e de que forma a ideia de imagem poética como
fenômeno que se dá a partir da “aproximação de duas realidades mais ou menos
afastadas” se coaduna ao tema proposto pelo título do texto em análise?
Sugerimos que esse movimento de “cisão”, embora a princípio possa ser
considerado paradoxal por conta do sentido contrário denotado pela ação de
“aproximação de realidades”, ainda assim advém de um movimento de tensão aplicado
a elementos ou situações que, por conta de tal força, acabam cindidos, divididos. Tensão
2 Octavio Paz, no mesmo texto, desenvolve ideia que também julgamos apropriada a nossa proposta de análise: “Cada imagem – ou cada poema composto de imagens – contém muitos significados contrários ou díspares, aos quais abarca ou reconcilia sem suprimi-los.” (PAZ, 1990, p. 38). Nesse sentido, podemos pensar que subsiste a presença de uma tensão, advinda da natureza distinta dos elementos aproximados pelo poeta no corpo do texto.3 Sobre a relação entre o sujeito lírico e o espaço poético no livro Ciclones, pode ser interessante consultar o seguinte artigo: O poeta, o xamã e o discípulo: representações do sujeito lírico em Ciclones de Roberto Piva (2010).
5
essa que, conforme estamos propondo, parece gerar a fagulha que incendeia linhas e
versos que se iluminam em imagens poéticas. Vejamos de que forma a “cisão”
anunciada no título pode ser lida no poema.
No texto em questão, construído sob a forma de prosa poética, o eu lírico
apresenta-se inicialmente em uma situação de reflexão4 com tons metafísicos. Há uma
busca por uma apreensão da relação advinda entre dois elementos: “céu5” e “unidade”.
Essa busca aparenta ter um objetivo, segundo a perspectiva do eu lírico naviano. Ela é
empreendida para que esse mesmo sujeito lírico possa compreender o “peso” de um
“céu que se encontra dividido” e “uma das partes” está alojada “transversalmente” no
seu “corpo”.
Ainda sobre a linha/ verso acima desmembrado, cabe assinalar que essa busca
sugerida aparentemente não se apresenta de forma pacífica, mas sim, a partir de um
tensionamento entre elementos de natureza distinta. Senão, vejamos. Para além do
embate inicial entre as ideias de “céu” e “unidade”, a tensão engendrada pelo poeta
atinge seu paroxismo na relação entre o “céu” e o “corpo” ainda nesse mesmo poema,
proporcionando, segundo nosso entendimento, a materialização da imagem poética.
Na última frase/verso do poema “Cisão” percebe-se essa tensão extrema entre
“corpo” e “espaço” que alimenta não apenas este, mas outros poemas de Rebentação:
“Tal é às vezes o seu peso que me vejo constrangido a andar dobrado” (NAVA, 2002, p.
109). Neste caso, a tensão apresenta-se plasmada não apenas a partir da “cisão” inicial
entre “céu” e “unidade”, representada nas primeiras linhas do poema. Este segundo
momento de tensão, surgido a partir do embate entre duas instâncias, “corpo” e
“espaço”, toma vulto nas linhas do texto por conta do “peso” de uma parte do “céu”
alojada “transversalmente” no “corpo cindido” do eu lírico, que acaba por fazê-lo
“andar dobrado”, logo, tensionado, contraído, em desconforto. Vale lembrar que André
Breton, no Manifesto do Surrealismo (1924) apresentou percepção de uma figuração
semelhante, na qual o sonho a respeito de um “homem cortado em dois pela janela”
gerou subsídios para a delimitação de algo da estética surrealista. (BRETON, 1985, p.
53)
4 Vale lembrar nesse sentido o caráter reflexivo de um nome central da poesia moderna portuguesa: o “guardador de livros” Bernardo Soares no Livro do desassossego (PESSOA, 2006).5 Importante salientar que, a propósito do vocábulo “céu”, o livro que Nava escreveu na sequência do livro Rebentação (1984) foi intitulado O céu sob as entranhas, de 1989, que dinamiza e desconstrói o aspecto metafísico às vezes presente em seu percurso textual.
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Conforme assinalado, a relação entre elementos muitas vezes pertencentes a
“áreas semânticas aparentemente afastadas” (AMARAL apud NAVA, 2002) salta aos
olhos em vários momentos na poesia de Nava e, segundo nosso entendimento, é uma
das forças pulsando no imaginário naviano. Um desses elementos é o “corpo”
metonimicamente desmembrado. O outro, o “espaço”, frequentemente representado
pelos topônimos ou termos correlatos como “céu”, “mar”, “ondas”, “sol” e outros. Cabe
ressaltar que esse “corpo” não se apresenta exatamente em harmonia com o “espaço”, à
maneira bucólica do arcadismo ou idealizante do romantismo literário.
O “corpo”, neste poema de Luís Miguel Nava, parece ter sofrido as
consequências do tensionamento, não apenas cindido em sua concretude por outro
elemento de “área semântica” distinta, mas fraturado por uma “realidade afastada”;
fendido por outra materialidade, por outro “espaço” paradoxalmente abstrato: o “céu”.
Impossível não lembrarmos um dos momentos supracitados da análise de Fernando
Amaral Pinto (AMARAL apud NAVA, 2002) na qual se delimitou justamente tal
associação entre “termos concretos e abstratos” como um fazer poético recorrente no
texto de Nava.
“Corpo” e “céu”, elementos oferecidos ao leitor em concretudes e abstrações
cujo estranhamento o incita a uma espécie de perdição em seu afã de organizar as
imagens. Duas instâncias cujos respectivos atributos, conforme sugerido, podem ser
considerados importantíssimos para a construção dessa aproximação entre “realidades
afastadas” na poética naviana. É a partir do tensionamento advindo do movimento de
fricção entre “corpo” e “espaço” é que vemos irromper, como as ondas em movimento
de uma “rebentação” contra os rochedos à beira-mar, a imagem poética na trama textual
de Luís Miguel Nava.
A propósito do vocábulo mencionado e que intitula esse livro de Nava lançado
no ano de 1984, o substantivo feminino “rebentação” (HOUAISS, 2001) pode ser
apreendido, entre algumas definições, como o “ato de rebentar”; ou ainda, “o quebrar
das ondas de encontro aos rochedos ou ao casco dos navios”. O verbo “rebentar” (idem,
ibidem), intransitivo, por sua vez descreve ações como “estourar”, “irromper”,
“arrebentar”, “quebrar com violência”, “fazer estalar”, “romper”. Todas essas ações
aparecem representadas não apenas no poema “Cisão”, mas também em outros poemas
do livro Rebentação.
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Nas últimas linhas do poema intitulado “Decalcomania”, algo como uma
“rebentação” de imagens, advinda do embate entre “corpo” e “espaço”, acaba por gerar
mais uma instigante imagem poética: “O mar, bata ele onde bater, é uma decalcomania
que não podemos arrancar sem que atrás fique o nosso próprio corpo em carne viva”
(NAVA, 2002, p. 105). O “mar”, uma “decalcomania”, isto é, um “processo que permite
transmitir imagens para outra superfície” (HOUAISS, 2001), apresenta-se no poema
como um “espaço” que, quando apartado do “corpo” atribuído ao eu lírico naviano,
acaba por deixá-lo em “carne viva”. Desse atrito, dessa tensão, dessa “rebentação” entre
elementos distintos, “corpo” e “espaço”, mais uma vez, surge, também “em carne viva”,
a imagem poética.
Essa “rebentação” de imagens, conforme até o momento sugerido, afigura-se
como uma linha de força que, na poética de Luís Miguel Nava, surge dessa tensão
advinda do atrito, do embate entre duas instâncias: a primeira delas, representada por
um “espaço” em algumas oportunidades caracterizado por um lócus de matriz litorânea;
a segunda, o “corpo”, inúmeras vezes apresentado a partir de seus órgãos, em
fragmentos, desvelando a presença de uma operação metonímica de temática corporal
na construção da imagem poética. De acordo com estudo de Danilo Bueno sobre o
“corpo-escrito” na poesia de Nava
[...] é possível depreender a noção de corpo dilacerado, corpo visceral, corpo úmido corpo sem vida, entre outras extensões de sentido. É com esses elementos que se dá o entrelaçamento das questões corporais com o nível simbólico: alma, céu, mar, memória, lembrança, destino entre outras. (BUENO, 2011, p. 4)
Em Rebentação, esse “entrelaçamento das questões corporais” com o “nível
simbólico” conflui, de acordo com o proposto até este momento, para a instauração da
imagem poética nas linhas e versos de Luís Miguel Nava. No último poema desta nossa
análise, “O céu agrada-me pensar”, por exemplo, entrevê-se mais uma vez tal relação.
Tomemos um de seus trechos: “[...] Não sei quando o mar lhes vier ao espírito o
ouviremos rebentar, o certo é que por ele às vezes sobem as marés. Há ondas que se vê
terem por ele passado antes de contra os nossos corpos deflagrarem” (NAVA, 2002, p.
110).
É possível vislumbrar nas linhas supracitadas esse movimento de “rebentação”
do “mar”, deflagrado por meio do “espírito”, contra os “corpos”. Nessa perspectiva,
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também se entrevê o tensionamento, via linguagem poética, entre “realidades
afastadas”, entre “concreto” e “abstrato”, entre o “real” e o “simbólico”, entre o “corpo”
e o “espaço”. Tudo isso, segundo entendemos, com vistas à construção da imagem
poética nos poemas de Rebentação.
Tentamos com este trabalho propor um olhar sobre a poesia de Luís Miguel
Nava. A imagem poética, de acordo com o analisado, afigura-se como elemento chave à
construção das linhas e versos no livro Rebentação. A partir da tensão advinda do
embate entre “corpo” e “espaço”, entre “concreto” e “abstrato”, entre “real” e
“simbólico”, Nava, de maneira particularíssima, ainda que supostamente bebendo em
fontes como as vanguardas europeias do início do século XX, oferece-nos não apenas
uma perspectiva de leitura em que instâncias de naturezas distintas se “rebentam”
formando a imagem poética. Na trama textual de Nava, sobrevém uma possibilidade de
leitura para além da literária, permitindo uma reflexão sobre a própria condição humana
e sua respectiva relação com o “espaço” no qual é interpretada.
Nesse sentido e encerrando este breve estudo, cabe evocarmos mais uma das
observações de Fernando Pinto de Amaral, observação essa que, segundo entendemos,
sintetiza apropriadamente o espanto provocado pela intensa “rebentação” de imagens
poéticas incrustadas ao longo das linhas e versos deste e de outros trabalhos do poeta
português: “Nava surpreende-nos pela sua arte de saber articular os universos só
aparentemente separados da vida e dos livros.” (AMARAL, 2006, p. 21)
REFERÊNCIAS
BRETON, André. Manifestos do surrealismo. São Paulo: Brasiliense, 1985.
BUENO, Danilo. O corpo-escrito de Luís Miguel Nava. Revista Vivência. N.º 36, p. 33-40, 2011. Disponível: < http://www.cchla.ufrn.br/Vivencia/sumarios/36/PDF%20para%20INTERNET_36/03_Danilo%20Bueno.pdf>. Acesso em 22 nov. de 2014.
FERREIRA, Moisés David Sousa Gomes. Luís Miguel Nava e o espaço do corpo em O Céu Sob as Entranhas. Revista eletrônica de crítica e teoria de literaturas. Artigos da seção livre PPG-LET-UFRGS – Porto Alegre – Vol. 05 N. 01 – jan/jun 2009. Acesso em 22 nov. de 2014.
HOUAISS, Antonio. Dicionário eletrônico da língua portuguesa 1.0. São Paulo: Editora Objetiva, 2001.
MOISÉS, Massaud. Dicionário de termos literários. 12ª ed. São Paulo: Cultrix, 2013.
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MORAIS, Leonardo David de. SANTOS, Mislaine Almeida. O poeta, o xamã e o discípulo: representações do sujeito lírico em Ciclones, de Roberto Piva. Revista e-hum. Belo Horizonte, vol.3, nº.2, 2010. Acesso em 23 nov. de 2014.
NAVA, Luís Miguel. Poesia completa: 1979-1994. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 2002.
PAZ, Octavio. Signos em rotação. São Paulo: Perspectiva, 1990.
PESSOA, Fernando. Livro do desassossego: composto por Bernardo Soares, ajudante de guarda-livros na cidade de Lisboa. São Paulo: Companhia de bolso, 2006.
PINTO, Fernando Amaral. As cicatrizes da lava. In: NAVA, Luís Miguel. Poesia completa: 1979-1994. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 2002.
PIVA, Roberto. Ciclones. São Paulo: Nankin Editorial, 1997.
WILLER, Claudio. Uma introdução à leitura de Roberto Piva. In: PIVA, Roberto. Um estrangeiro na legião. Obras reunidas. V. I. Rio de Janeiro: Globo, 2005.