RECURSO ESPECIAL Nº 1.094.769 - SP 2008-0223841-8

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Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL 1.094.769 - SP (2008/0223841-8) RELATOR : MINISTRO MARCO BUZZI RECORRENTE : ACADEMIA PAULISTA ANCHIETA S/C LTDA ADVOGADO : ADRIANA INÁCIA VIEIRA E OUTRO(S) RECORRIDO : RENATA GUIRRO ADVOGADO : CÉLIO CAUS JÚNIOR E OUTRO(S) EMENTA RECURSO ESPECIAL - AÇÃO ANULATÓRIA DE CLÁUSULA CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - NÃO FORMAÇÃO DE NOVAS TURMAS DE CURSO SUPERIOR (EXTINÇÃO DE CURSO UNIVERSITÁRIO) - TRANSFERÊNCIA DE ALUNA PARA OUTRA INSTITUIÇÃO DE ENSINO - RESPONSABILIDADE CIVIL DA UNIVERSIDADE RECONHECIDA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS, AO ENTENDEREM CONFIGURADOS E COMPROVADOS OS DANOS ALEGADOS, NÃO OBSTANTE O AFASTAMENTO DA ARGUIDA ABUSIVIDADE DA CLÁUSULA CONTRATUAL QUE FACULTA À UNIVERSIDADE A EXTINÇÃO DO CURSO POR AUSÊNCIA DE VIABILIDADE ECONÔMICO-FINANCEIRA - AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA (ART. 207 DA CF/88) - POSSIBILIDADE DE EXTINÇÃO DE CURSO SUPERIOR, NOS TERMOS DO ARTIGO 53, INCISO I, DA LEI N. 9.394/96 - RECURSO ESPECIAL PROVIDO, A FIM DE JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO CONDENATÓRIO. INSURGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO EDUCACIONAL. 1. Violação ao art. 535 do CPC não configurada. Acórdão local que enfrentou de modo fundamentado todos os aspectos fundamentais ao julgamento da demanda. 2. Nos termos do Código de Defesa do Consumidor, o contrato de prestação de serviços educacionais traduz relação de consumo. 3. A instituição educacional privada de ensino superior goza de autonomia universitária, nos termos do art. 207 da Constituição Federal, motivo pelo qual possível, ante a inviabilidade de determinado curso, proceder à sua extinção, conforme preceito constante do art. 53, I, da Lei 9.394/1996 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. 4. O art. 6º, III, do CDC que institui o dever de informação e consagra o princípio da transparência, alcançou o negócio jurídico entabulado entre as partes, porquanto a aluna/consumidora foi adequadamente informada acerca da possibilidade de extinção do curso em razão de ausência de quorum mínimo, tanto em razão de cláusula contratual existente no pacto, quanto no manual do discente. 5. No caso, não se verifica o alegado defeito na prestação de serviços, haja vista que a extinção de cursos é procedimento Documento: 1300131 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 15/08/2014 Página 1 de 36

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RECURSO ESPECIAL - AÇÃO ANULATÓRIA DE CLÁUSULACONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS EMATERIAIS - NÃO FORMAÇÃO DE NOVAS TURMAS DECURSO SUPERIOR (EXTINÇÃO DE CURSO UNIVERSITÁRIO) -TRANSFERÊNCIA DE ALUNA PARA OUTRA INSTITUIÇÃO DEENSINO - RESPONSABILIDADE CIVIL DA UNIVERSIDADERECONHECIDA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS, AOENTENDEREM CONFIGURADOS E COMPROVADOS OSDANOS ALEGADOS, NÃO OBSTANTE O AFASTAMENTO DAARGUIDA ABUSIVIDADE DA CLÁUSULA CONTRATUAL QUEFACULTA À UNIVERSIDADE A EXTINÇÃO DO CURSO PORAUSÊNCIA DE VIABILIDADE ECONÔMICO-FINANCEIRA -AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA (ART. 207 DA CF/88) -POSSIBILIDADE DE EXTINÇÃO DE CURSO SUPERIOR, NOSTERMOS DO ARTIGO 53, INCISO I, DA LEI N. 9.394/96 -RECURSO ESPECIAL PROVIDO, A FIM DE JULGARIMPROCEDENTE O PEDIDO CONDENATÓRIO.

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    RECURSO ESPECIAL N 1.094.769 - SP (2008/0223841-8) RELATOR : MINISTRO MARCO BUZZIRECORRENTE : ACADEMIA PAULISTA ANCHIETA S/C LTDA ADVOGADO : ADRIANA INCIA VIEIRA E OUTRO(S)RECORRIDO : RENATA GUIRRO ADVOGADO : CLIO CAUS JNIOR E OUTRO(S)

    EMENTA

    RECURSO ESPECIAL - AO ANULATRIA DE CLUSULA CONTRATUAL C/C INDENIZAO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - NO FORMAO DE NOVAS TURMAS DE CURSO SUPERIOR (EXTINO DE CURSO UNIVERSITRIO) - TRANSFERNCIA DE ALUNA PARA OUTRA INSTITUIO DE ENSINO - RESPONSABILIDADE CIVIL DA UNIVERSIDADE RECONHECIDA PELAS INSTNCIAS ORDINRIAS, AO ENTENDEREM CONFIGURADOS E COMPROVADOS OS DANOS ALEGADOS, NO OBSTANTE O AFASTAMENTO DA ARGUIDA ABUSIVIDADE DA CLUSULA CONTRATUAL QUE FACULTA UNIVERSIDADE A EXTINO DO CURSO POR AUSNCIA DE VIABILIDADE ECONMICO-FINANCEIRA - AUTONOMIA UNIVERSITRIA (ART. 207 DA CF/88) - POSSIBILIDADE DE EXTINO DE CURSO SUPERIOR, NOS TERMOS DO ARTIGO 53, INCISO I, DA LEI N. 9.394/96 - RECURSO ESPECIAL PROVIDO, A FIM DE JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO CONDENATRIO.

    INSURGNCIA DA INSTITUIO EDUCACIONAL.1. Violao ao art. 535 do CPC no configurada. Acrdo local

    que enfrentou de modo fundamentado todos os aspectos fundamentais ao julgamento da demanda.

    2. Nos termos do Cdigo de Defesa do Consumidor, o contrato de prestao de servios educacionais traduz relao de consumo.

    3. A instituio educacional privada de ensino superior goza de autonomia universitria, nos termos do art. 207 da Constituio Federal, motivo pelo qual possvel, ante a inviabilidade de determinado curso, proceder sua extino, conforme preceito constante do art. 53, I, da Lei n 9.394/1996 - Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional.

    4. O art. 6, III, do CDC que institui o dever de informao e consagra o princpio da transparncia, alcanou o negcio jurdico entabulado entre as partes, porquanto a aluna/consumidora foi adequadamente informada acerca da possibilidade de extino do curso em razo de ausncia de quorum mnimo, tanto em razo de clusula contratual existente no pacto, quanto no manual do discente.

    5. No caso, no se verifica o alegado defeito na prestao de servios, haja vista que a extino de cursos procedimento

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    legalmente previsto e admitido, no sendo dado atribuir-se a responsabilizao universidade por evento sobre o qual no h qualquer participao ou influncia da desta (ausncia de alunos e no obteno, pela aluna, de aprovao), mormente quando cumpre todos os deveres nsitos boa-f objetiva.

    Na relao jurdica estabelecida com seu corpo discente, consoante atestado pelas instncias ordinrias, a instituio de ensino forneceu adequada informao e, no momento em que verificada a impossibilidade de manuteno do curso superior, ofereceu alternativas aluna, providenciando e viabilizando, conforme solicitado por esta, a transferncia para outra faculdade.

    6. Recurso especial provido para julgar improcedente os pedidos da inicial.

    ACRDO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que so partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de Justia, prosseguindo no julgamento, aps o voto-vista do Ministro Luis Felipe Salomo, negando provimento ao recurso especial, divergindo do Relator, e os votos dos Ministros Raul Arajo e Maria Isabel Gallotti, acompanhando o Relator, e o voto do Ministro Antonio Carlos Ferreira, no sentido da divergncia, por maioria, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Relator.

    Vencidos os Ministros Luis Felipe Salomo e e Antonio Carlos Ferreira .Votaram vencidos os Srs. Ministros Luis Felipe Salomo (voto-vista) e Antonio Carlos Ferreira.

    Os Srs. Ministros Raul Arajo (Presidente) e Maria Isabel Gallotti votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Braslia (DF), 18 de maro de 2014 (Data do Julgamento)

    MINISTRO RAUL ARAJO Presidente

    MINISTRO MARCO BUZZI Relator

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    RECURSO ESPECIAL N 1.094.769 - SP (2008/0223841-8) RECORRENTE : ACADEMIA PAULISTA ANCHIETA S/C LTDA ADVOGADO : ADRIANA INCIA VIEIRA E OUTRO(S)RECORRIDO : RENATA GUIRRO ADVOGADO : CLIO CAUS JNIOR E OUTRO(S)

    RELATRIO

    O SR. MINISTRO MARCO BUZZI (Relator):

    Cuida-se de recurso especial interposto por ACADEMIA PAULISTA ANCHIETA SOCIEDADE CIVIL LTDA, com fulcro no artigo 105, inciso III, alneas "a" e "c", da Constituio Federal, contra acrdo proferido pelo Tribunal de Justia do Estado de So Paulo.

    Na origem, RENATA GUIRRO ajuizou ao anulatria de clusula contratual, cumulada com perdas e danos e lucros cessantes em face da ACADEMIA PAULISTA ANCHIETA SOCIEDADE CIVIL LTDA., visando obteno de ressarcimento pelos danos materiais e morais sofridos em razo da extino/fechamento do curso de graduao em engenharia qumica, com base na clusula 4, 1 do contrato educacional formulado entre as partes.

    Segundo a exordial, no ano de 1997 a autora prestou exame vestibular, tendo ingressado no curso de engenharia de alimentos da Universidade Bandeirante de So Paulo - UNIBAN, que tem como mantenedora a Academia Paulista Anchieta.

    Aps dois anos de estudos, o curso foi fechado pela instituio educacional, tendo a estudante optado por transferir-se para o curso de engenharia qumica, que continuaria a ser oferecido pela r.

    Com a concluso do terceiro e quarto ano de estudos em engenharia qumica, a autora, em razo de no ter alcanado notas suficientes em cinco matrias, necessitou proceder repetio do quarto ano. Ao tentar efetuar a matrcula, tomou cincia da cessao do oferecimento do curso de engenharia qumica.

    Depreende-se, ainda, que a universidade, como forma de superar o problema, ofereceu a opo de transferncia com aproveitamento de matrias para a Faculdade Oswaldo Cruz ou Universidade Santa Ceclia, ambas situadas em localidades distantes do domiclio da acadmica.

    Pleiteou a autora, alm da declarao da nulidade da clusula contratual, a condenao da instituio educacional ao pagamento de: (i) indenizao por danos

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    morais, a ser apurado em liquidao de sentena; e (ii) indenizao pelos danos patrimoniais decorrentes da mudana da instituio de ensino superior (diferena de custo de transporte, diferena do valor de mensalidades, o acrscimo de um ano ao curso e demais despesas a serem apuradas em liquidao).

    Sentenciado o feito, o magistrado singular julgou parcialmente procedentes

    os pedidos veiculados na inicial para o fim de condenar a r a pagar autora:

    a) R$ 12.000,00 (doze mil reais) a ttulo de reparao pelos danos morais

    sofridos;

    b) R$ 158,00 (cento e cinquenta e oito reais) por ms relativos diferena de

    despesas de transporte;

    c) R$ 120,00 (cento e vinte reais) por ms ttulo de reparao de despesas

    com alimentao durante os meses em que lhe foram ministradas aulas, adotando

    como termo a quo a data a partir da qual passou a autora a frequentar o curso na

    Faculdade Osvaldo Cruz;

    d) as mensalidades correspondentes ao ltimo ano do curso de engenharia

    qumica frequentado na Faculdade Oswaldo Cruz, segundo os valores ento vigentes;

    e) a diferena de valores das mensalidades que eram pagas r pela autora

    e as que por esta foram pagas Faculdade Oswaldo Cruz (montante de R$ 151,40 no

    ms de janeiro de 2004, que deve ser apurado ms a ms desde a matrcula da autora

    na Faculdade Osvaldo Cruz);

    Ainda, deferiu a antecipao dos efeitos da tutela, determinando que "a

    r passe a pagar, todo dia 10 de cada ms e sob pena de multa diria de R$ 500,00

    (quinhentos reais), os valores mensais atinentes diferena de despesas de conduo

    e a ttulo de reparao das despesas com alimentao durante a frequncia da autora

    no curso superior, bem como os relativos s diferenas de valores das mensalidades

    que eram pagas r ela autora e as que por esta so pagas Faculdade Osvaldo

    Cruz." (fl. 173, e-STJ)

    Inconformada, a r interps recurso de apelao, recebido apenas no efeito devolutivo, ao qual o Tribunal de origem negou provimento, nos termos da seguinte ementa:

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    PRESTAO DE SERVIOS EDUCACIONAIS - EXTINO DO CURSO UNIVERSITRIO - TRANSFERNCIA DE ALUNA PARA OUTRA UNIVERSIDADE DISTANTE DE SUA RESIDNCIA - DANOS MORAIS E MATERIAIS - CONFIGURAO - REPARAO DEVIDA.Apesar de constar no contrato de prestao de servios educacionais a necessidade de quorum para a formao de turmas, a aluna no pode ser prejudicada pela ausncia de viabilidade econmico-financeira para a instituio de ensino continuar a oferecer um curso acadmico, mesmo porque o contrato de prestao de servios educacionais tipicamente de adeso, protegido pelo Cdigo de Defesa do Consumidor, da resultando que as clusulas que restringem direitos devem ser interpretadas estritamente e, em caso de dvida, no interesse do contratante.RECURSO IMPROVIDO. (fl. 235, e-STJ)

    Requereu a autora a extrao de carta de sentena para proceder execuo provisria do julgado. (fls. 222)

    Opostos embargos de declarao pela associao educadora, estes foram rejeitados pelo acrdo de fls. 249-252.

    Irresignada, a r interpe recurso especial (fls. 260-278, e-STJ), com fundamento no artigo 105, inciso III, alneas "a" e "c", da Constituio Federal, sustentando, alm de dissdio jurisprudencial, a existncia de:

    a) violao ao artigo 535, inciso II, do Cdigo de Processo Civil, pois o Tribunal local teria se omitido na anlise do ponto fundamental de sua defesa, consistente na informao precisa e oportuna quanto necessidade de um nmero mnimo de alunos para a formao de uma turma, bem como acerca de clusula resolutria alternativa existente no contrato de prestao de servios, que deixa escolha do contratante a opo pela resciso do contrato ou transferncia para curso diverso da mesma instituio ou de outra;

    b) ofensa aos artigos 188, inciso I, e 393 do Cdigo Civil e 54, 2, do Cdigo de Defesa do Consumidor, porquanto: i) inexistente o dever de indenizar, haja vista que a aluna foi previamente informada (manual do vestibular) sobre a necessidade de quorum mnimo para formao de turmas; ii) no ocorreu a extino da turma da autora, pois a sua reprovao no quarto ano que impossibilitou que conclusse o curso com os demais alunos; iii) a universidade possui autonomia e o fechamento do curso decorre de exerccio regular de direito; iv) a no concluso do curso pela autora decorreu de caso fortuito sobre o qual a instituio no se responsabilizou; v) a existncia de clusula resolutria em contratos de adeso permitida, desde que as

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    clusulas que restrinjam direitos sejam interpretadas restritivamente.Contrarrazes s fls. 308-318, e-STJ.Inadmitido na origem, o apelo extremo ascendeu a esta Corte por fora da

    deciso exarada pelo Min. Joo Otvio de Noronha, no Agravo de Instrumento n. 1.023.908/SP.

    o relatrio.

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    RECURSO ESPECIAL N 1.094.769 - SP (2008/0223841-8)

    EMENTA

    RECURSO ESPECIAL - AO ANULATRIA DE CLUSULA CONTRATUAL C/C INDENIZAO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - NO FORMAO DE NOVAS TURMAS DE CURSO SUPERIOR (EXTINO DE CURSO UNIVERSITRIO) - TRANSFERNCIA DE ALUNA PARA OUTRA INSTITUIO DE ENSINO - RESPONSABILIDADE CIVIL DA UNIVERSIDADE RECONHECIDA PELAS INSTNCIAS ORDINRIAS, AO ENTENDEREM CONFIGURADOS E COMPROVADOS OS DANOS ALEGADOS, NO OBSTANTE O AFASTAMENTO DA ARGUIDA ABUSIVIDADE DA CLUSULA CONTRATUAL QUE FACULTA UNIVERSIDADE A EXTINO DO CURSO POR AUSNCIA DE VIABILIDADE ECONMICO-FINANCEIRA - AUTONOMIA UNIVERSITRIA (ART. 207 DA CF/88) - POSSIBILIDADE DE EXTINO DE CURSO SUPERIOR, NOS TERMOS DO ARTIGO 53, INCISO I, DA LEI N. 9.394/96 - RECURSO ESPECIAL PROVIDO, A FIM DE JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO CONDENATRIO.

    INSURGNCIA DA INSTITUIO EDUCACIONAL.1. Violao ao art. 535 do CPC no configurada. Acrdo local

    que enfrentou de modo fundamentado todos os aspectos fundamentais ao julgamento da demanda.

    2. Nos termos do Cdigo de Defesa do Consumidor, o contrato de prestao de servios educacionais traduz relao de consumo.

    3. A instituio educacional privada de ensino superior goza de autonomia universitria, nos termos do art. 207 da Constituio Federal, motivo pelo qual possvel, ante a inviabilidade de determinado curso, proceder sua extino, conforme preceito constante do art. 53, I, da Lei n 9.394/1996 - Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional.

    4. O art. 6, III, do CDC que institui o dever de informao e consagra o princpio da transparncia, alcanou o negcio jurdico entabulado entre as partes, porquanto a aluna/consumidora foi adequadamente informada acerca da possibilidade de extino do curso em razo de ausncia de quorum mnimo, tanto em razo de clusula contratual existente no pacto, quanto no manual do discente.

    5. No caso, no se verifica o alegado defeito na prestao de servios, haja vista que a extino de cursos procedimento legalmente previsto e admitido, no sendo dado atribuir-se a responsabilizao universidade por evento sobre o qual no h qualquer participao ou influncia da desta (ausncia de alunos e no obteno, pela aluna, de aprovao), mormente quando

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    cumpre todos os deveres nsitos boa-f objetiva. Na relao jurdica estabelecida com seu corpo discente,

    consoante atestado pelas instncias ordinrias, a instituio de ensino forneceu adequada informao e, no momento em que verificada a impossibilidade de manuteno do curso superior, ofereceu alternativas aluna, providenciando e viabilizando, conforme solicitado por esta, a transferncia para outra faculdade.

    6. Recurso especial provido para julgar improcedente os pedidos da inicial.

    VOTO

    O SR. MINISTRO MARCO BUZZI (Relator):

    No mrito,o presente recurso especial merece acolhida.1. Preliminarmente, no que concerne apontada omisso do Tribunal de

    origem, verifica-se dos autos que o acrdo recorrido no padece do vcio apontado, pois ostenta fundamentao robusta, explicitando as premissas fticas adotadas pelos julgadores e as consequncias jurdicas dali extradas. O seu teor resulta de exerccio lgico, restando mantida a pertinncia entre os fundamentos e a concluso, no havendo falar, portanto, em ausncia de fundamentao, tampouco em omisso.

    Depreende-se que, no tocante necessidade de quorum mnimo para a formao de turmas e acerca de clusula resolutria alternativa existente no contrato de prestao de servios, que deixa escolha do contratante a opo pela resciso do contrato ou transferncia para curso diverso da mesma instituio ou de outra, assim se manifestou a Corte local:

    Apesar de constar no contrato de prestao de servios educacionais a necessidade de quorum para a formao de turmas, a aluna no pode ser prejudicada pela ausncia de viabilidade econmico-financeira para a instituio de ensino continuar a oferecer um curso acadmico, mesmo porque o contrato de prestao de servios educacionais tipicamente de adeso, protegido pelo Cdigo de Defesa do Consumidor, da resultando que as clusulas que restringem direitos devem ser interpretadas estritamente e, em caso de dvida, no interesse do contratante.Ademais, o principal objetivo de um aluno quando ingressa em uma universidade o de terminar o curso para o qual foi matriculado para posteriormente exercer a profisso, sendo que as clusulas que se revelam por demais restritivas dos direitos do aluno devem ser interpretadas segundo a funo social do contrato, levando em considerao a natureza e o contedo da contratao, bem como o interesse das partes.

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    Com efeito, o Tribunal a quo se manifestou acerca de todas as questes relevantes para a soluo da controvrsia, tal como lhe fora posta e submetida, afigurando-se dispensvel, ademais, o exame pontual de cada uma das alegaes e fundamentos expendidos pelas partes.

    Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes: AgRg no Ag 1.402.701/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomo, Quarta Turma, julgado em 01.09.2011, DJe 06.09.2011; REsp 1.264.044/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 01.09.2011, DJe 08.09.2011; AgRg nos EDcl no Ag 1.304.733/RS, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 23.08.2011, DJe 31.08.2011; AgRg no REsp 1.245.079/MG, Rel. Ministro Benedito Gonalves, Primeira Turma, julgado em 16.08.2011, DJe 19.08.2011; e AgRg no Ag 1.407.760/RJ, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 09.08.2011, DJe 22.08.2011; REsp 264.101/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMO, QUARTA TURMA, julgado em 10/03/2009, DJe 06/04/2009.

    2. No mrito, cinge-se a controvrsia configurao da responsabilidade civil da Associao Paulista Anchieta, mantenedora da Universidade Bandeirante, pelos alegados prejuzos experimentados face a extino do curso de graduao (engenharia qumica) cursado pela autora, em razo da ausncia de nmero mnimo de alunos para a formao de turma e a sua transferncia para outra instituio de ensino superior.

    Inicialmente, indispensvel ressalvar que no est em discusso qualquer responsabilidade da universidade pelo no fornecimento do curso de engenharia de alimentos, curso para o qual alega a aluna ter prestado o concurso vestibular, porquanto as matrias ministradas nos dois primeiros anos no estavam direcionadas a qualquer ramo da Engenharia em especfico, mas a um ciclo bsico comum, e sequer constituem objeto de irresignao da parte autora, pois esta optou por transferir-se para o curso de engenharia qumica.

    Logo, a controvrsia fica limitada apenas aos alegados prejuzos oriundos da extino da turma do quarto ano do curso de engenharia qumica.

    Estabelecida essa premissa, relevante mencionar ser entendimento pacfico no mbito do Superior Tribunal de Justia que a prestao de servios educacionais caracteriza-se como relao de consumo, motivo pelo qual incidem, na espcie, as regras protetivas ao consumidor.

    Nesse sentido:

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    RECURSO ESPECIAL. SERVIOS EDUCACIONAIS. RELAO DE CONSUMO. APLICAO DO CDC. FATO DO SERVIO. PRESCRIO QUINQUENAL.1. Nos termos do Cdigo de Defesa do Consumidor, o contrato de prestao de servios educacionais constitui relao de consumo.2. Nos casos de responsabilidade pelo fato do produto e do servio, aplica-se o prazo prescricional de 5 anos (artigo 27 do CDC).3. O termo inicial da prescrio comea a fluir a partir do momento em que o direito violado, o qual coincide com o momento de nascimento da pretenso.4. Recurso especial no provido.(REsp 647.743/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/12/2012, DJe 11/12/2012)

    Reconhecida a natureza da relao jurdica, imprescindvel verificar o eventual defeito que possa ter contaminado o servio discutido, visto que no se mostra razovel agasalhar sob o rtulo da autonomia universitria toda e qualquer prtica que afete a relao contratual entre o aluno e a entidade privada que fornece os servios educacionais. (REsp 1306179/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2012, DJe 09/05/2013.)

    Na hiptese ora em foco, indubitvel gozar a instituio educacional privada de ensino superior de autonomia, nos termos do que preleciona o art. 207 da Constituio Federal: "as universidades gozam de autonomia didtico-cientfica, administrativa e de gesto financeira e patrimonial, e obedecero ao princpio de

    indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extenso ".A autonomia universitria constitui princpio constitucional genrico que

    abarca tanto universidades pblicas quanto privadas, no sendo dado ao intrprete da norma fazer distino onde a lei assim no o faz, haja vista que a insero de tal preceito na obra do constituinte originrio traz como consequncia a sua intangibilidade.

    Desta forma, traduzindo-se a autonomia na capacidade de autodeterminao e de autorregulamentao dentro dos limites fixados pelo poder que a institui, indiscutvel a possibilidade de a instituio proceder extino de determinado curso, porquanto tal faculdade consta expressamente do artigo 53, inciso I, da Lei n 9.394/1996 - Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional , ao assim dispor:

    Art. 53. No exerccio de sua autonomia, so asseguradas s universidades, sem prejuzo de outras, as seguintes atribuies: I - criar, organizar e extinguir, em sua sede, cursos e programas de educao superior previstos nesta Lei, obedecendo s normas gerais da Unio e, quando for o caso, do respectivo sistema de ensino; II - fixar os currculos dos seus cursos e programas, observadas as

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    diretrizes gerais pertinentes; III - estabelecer planos, programas e projetos de pesquisa cientfica, produo artstica e atividades de extenso; IV - fixar o nmero de vagas de acordo com a capacidade institucional e as exigncias do seu meio; V - elaborar e reformar os seus estatutos e regimentos em consonncia com as normas gerais atinentes; VI - conferir graus, diplomas e outros ttulos; VII - firmar contratos, acordos e convnios; VIII - aprovar e executar planos, programas e projetos de investimentos referentes a obras, servios e aquisies em geral, bem como administrar rendimentos conforme dispositivos institucionais; IX - administrar os rendimentos e deles dispor na forma prevista no ato de constituio, nas leis e nos respectivos estatutos; X - receber subvenes, doaes, heranas, legados e cooperao financeira resultante de convnios com entidades pblicas e privadas.Pargrafo nico. Para garantir a autonomia didtico-cientfica das universidades, caber aos seus colegiados de ensino e pesquisa decidir, dentro dos recursos oramentrios disponveis, sobre: I - criao, expanso, modificao e extino de cursos; II - ampliao e diminuio de vagas; III - elaborao da programao dos cursos; IV - programao das pesquisas e das atividades de extenso; V - contratao e dispensa de professores; VI - planos de carreira docente. (grifos nossos)

    Corroborando a legalidade do procedimento adotado, constitui fato incontroverso dos autos que a transferncia da autora para outra instituio ocorreu em razo de a universidade, ao amparo da inviabilidade econmico-financeira, no ter logrado formar nova turma do quarto ano do curso de engenharia qumica, ante a ausncia de nmero mnimo de alunos, com base no Regimento Geral da Universidade Bandeirante de So Paulo e no pargrafo 1 da clusula 4 do contrato de prestao de servios educacionais.

    Elucidativo o trecho extrado das razes de apelao:Infelizmente, o curso de Engenharia Qumica, no alcanou o nmero mnimo de alunos necessrios para o seu aproveitamento e desenvolvimento mediante formao de novas turmas, no restando outra alternativa apelante seno cumprir com o seu objetivo social, formando, ao final do presente ano letivo, a ltima turma, at ento, do curso de Engenharia Qumica. (...)Tambm no procede a informao lanada pela apelada, ao justificar sua transferncia baseando-se na extino do curso; conforme listagem que acostada (sic) contestao, no ano de 2003, diversos alunos estaro concluindo o curso de Engenharia Qumica o que vale dizer que o curso no foi extinto, mas to somente, at o momento, no houver (sic) formao de uma nova turma diante da ausncia de "quorum".Obviamente, se a apelada tivesse obtido aprovao no 4 ano,

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    estaria, ao final de 2003 se formando com os demais colegas, sem qualquer dificuldade. (...)Vale ressaltar que a turma da autora foi a ltima de engenharia qumica oferecida pela apelada, sendo de conhecimento de todos os alunos que o seu curso no era mais oferecido, no sendo nenhuma novidade para a apelada o fato de no poder cursar novamente na Instituio apelante o quarto ano (face a sua reprovao), pois sabia que no existiam mais turmas nas sries anteriores. (fls. 187-191, e-STJ - grifos no original)

    Assim, no ano de 2002, quando a autora no obteve a sua aprovao no quarto ano - diga-se, frequentado por esta juntamente com os colegas que formavam nmero de alunos suficientes para viabilizar economicamente a referida turma -, no ocorreu a extino abrupta do curso de engenharia qumica conforme faz transparecer os dizeres da petio inicial e o entendimento externado pelo magistrado singular (fls. 162, e-STJ), mas apenas a no formao de novo grupo estudantil para o referido curso e srie (quarto ano) em virtude da ausncia de quorum razovel.

    Frente ao quadro ora em exame, a universidade, comprovadamente, afastou o alegado defeito na prestao de servios educacionais, pois no ano seguinte (2003) logrou formar a primeira e nica turma de engenharia qumica (fls. 110, e-STJ), que no contou com a participao da autora em razo de sua reprovao no quarto ano, para o qual no havia a possibilidade de cursar, em regime de dependncia, as matrias nas quais no obteve notas satisfatrias.

    Nesse ponto, necessrio informar que, ante a eventual no formao de turma em razo de no se completar nmero mnimo de matrculas em determinado curso, ao discente cabia, alternativamente, rescindir o contrato com o devido ressarcimento, ingressar em curso de graduao diverso na mesma instituio educacional ou transferir-se para outro estabelecimento de ensino - opo adotada pela aluna, ora recorrida -, o que afasta a sua tese de que a universidade teria fechado o curso sem qualquer planejamento e preocupao com o destino dos alunos (fls. 14, e-STJ).

    Reitere-se, a argumentao contida na petio inicial, na qual a aluna afirma ter optado pela transferncia para curso de engenharia qumica ministrado em outra faculdade:

    (...) a R forneceu a opo de transferncia com aproveitamento de currculos para as Faculdades Osvaldo (sic) Cruz, ou Universidade Santa Ceclia. A primeira est localizada na Barra Funda, j a segunda, em Santos, sendo ambas "fora de mo" se comparadas UNIBAN para a Autora,

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    tendo em vista a distncia de sua residncia (...) A Autora se viu obrigada a escolher a Faculdade Osvaldo (sic) Cruz para concluir seus estudos, tendo, de dispender R$ 200,00 (duzentos reais) mensais com transporte, alm da importncia de R$ 112,00 (cento e doze reais) mensais referentes diferena entre os valores das mensalidades das duas instituies.(fls. 7-8, e-STJ - grifos nossos)

    Desta forma, ante o implemento de clusula resolutria do contrato, nos termos do artigo 54, 2 do CDC, a aluna contou com a viabilizao de alternativas, tendo escolhido por transferir-se para outra faculdade com o aproveitamento das disciplinas j cursadas, ao invs de mudar de curso no mbito da mesma instituio ou de obter a devoluo dos valores desembolsados.

    Denota-se, da petio inicial, que a autora, ao optar pela transferncia para a Faculdade Oswaldo Cruz, estava ciente quanto ao aproveitamento das matrias e enquadramento acadmico de acordo com a grade curricular da referida instituio educacional (fls. 153-154, e-STJ), bem como quanto aos gastos que iria suportar.

    Com efeito, invivel cogitar em defeito na prestao dos servios educativos prestados, tampouco em omisso da universidade, haja vista que, alm de ter fornecido alternativas autora, providenciou e viabilizou, conforme solicitado pela aluna, a sua transferncia para outra instituio de ensino.

    Verificou-se, tambm, que diante da no obteno de notas mnimas em cinco matrias do referido quarto ano, necessitaria a autora repetir/estudar novamente a srie, diga-se, j cursada e finalizada sem aproveitamento perante a r.

    Confira-se, no ponto, o seguinte trecho da exordial:Ao concluir os estudos do quarto ano de Engenharia Qumica, a Autora teve notas insuficientes em cinco matrias, sendo obrigada a estudar novamente o quarto ano.Ao tentar efetivar a matrcula para o quarto ano, foi surpreendida com a notcia de que a instituio no estava mais ministrando o curso de Engenharia Qumica para os alunos do quarto ano. (fl. 7)

    Ressalte-se, ainda, no ter a Corte local considerado abusiva a clusula 4, 1, contida no contrato de prestao de servios educacionais, que d poderes instituio de ensino para cancelar, de forma unilateral, curso de graduao por ela administrado, tendo to somente declarado que a interpretao clusula deveria ser realizada de forma limitada, sempre no interesse da aluna/contratante, por tratar-se de contrato de adeso.

    A ttulo elucidativo, segue excerto do acrdo recorrido:Documento: 1300131 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 15/08/2014 Pgina 13 de 36

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    Apesar de constar no contrato de prestao de servios educacionais a necessidade de quorum para a formao de turmas, a aluna no pode ser prejudicada pela ausncia de viabilidade econmico-financeira para a instituio de ensino continuar a oferecer um curso acadmico, mesmo porque o contrato de prestao de servios educacionais tipicamente de adeso, protegido pelo Cdigo de Defesa do Consumidor, da resultando que as clusulas que restringem direitos devem ser interpretadas estritamente e, em caso de dvida, no interesse do contratante. (fls. 237-238)

    Na oportunidade, a fim de corroborar a tese segundo a qual no houve declarao de abusividade da mencionada clusula contratual, tampouco de que no teria havido falta/falha de informao consumidora, necessrio acentuar ter o magistrado a quo afirmado existir informao adequada no manual do discente acerca da necessidade de nmero mnimo de estudantes para a formao de turmas, bem como de que no se poderia falar em caso fortuito, haja vista que tanto o manual como o contrato de prestao de servios previam o encerramento do curso por insuficincia de alunos.

    Confira-se, por oportuno, trecho da sentena:"(...) 4. Ora, indubitvel gozar a r de autonomia nos termos do art. 207 da Magna Carta ("as universidades gozam de autonomia didtico-cientfica, administrativa e de gesto financeira e patrimonial, e obedecero ao princpio de indissociabilidade, entre ensino, pesquisa e extenso") . (...)8. Em suma, a r, com sua conduta, violou direitos da autora assegurados pela Lei Federal n. 8.078/90 e, ainda que no se vislumbre na clusula 4a, 1, do contrato de prestao de servios (fls. 17 anverso), nulidade absoluta - da porque o pedido respectivo improcedente - seus efeitos, conforme nica interpretao cabvel a ela na forma suso explanada, so mais limitados - pena de, ento, incorrer em nulidade absoluta - do que aquela pretende. (...)10. Ademais, descabido falar-se em caso fortuito, porquanto o prprio manual e o contrato prevem o encerramento do curso por insuficincia de alunos do que resulta ser impossvel falar-se em imprevisibilidade do evento e quanto menos ante a obrigao de planejar a r eficiente e adequadamente a instituio e manuteno dos cursos oferecidos ao pblico consumidor.11. Enfim, conclui-se que a r incorreu em condutas violadoras de direitos subjetivos da r independentemente da previso contratual de encerramento de cursos, causando-lhe danos que deve reparar. " (fls. 161-166, e-STJ - grifos nossos)

    Assim, pela simples leitura dos excertos acima colacionados, verifica-se ter a autora sido adequadamente informada acerca da possibilidade de extino do curso em razo de ausncia de quorum mnimo e, ainda, que a clusula contratual Documento: 1300131 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 15/08/2014 Pgina 14 de 36

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    advertindo a possibilidade de extino do curso no fora considerada abusiva.Desta forma, o art. 6, inc. III, do CDC, o qual institui o dever de informao

    e consagra o princpio da transparncia, alcanou o negcio em sua essncia, porquanto a informao repassada ao consumidor integrou o prprio contedo do contrato.

    Ora, trata-se de dever intrnseco ao negcio, presente no apenas na formao do contrato, mas tambm, durante toda a sua execuo. O direito informao visa a assegurar ao consumidor uma escolha consciente, permitindo que suas expectativas em relao ao produto ou servio sejam de fato atingidas (consentimento informado/vontade qualificada).

    No caso, ainda que evidenciado o aborrecimento sofrido pela autora, em razo de no ter logrado xito em cinco matrias do quarto ano, no vivel cogitar a existncia de defeito na prestao de servios educacionais, pois (i) o quarto ano de engenharia qumica foi prestado adequadamente pela instituio educacional, sem, no entanto, consagrar a aluna a sua aprovao; e (ii) a extino de cursos constitui procedimento legalmente previsto e admitido, motivo pelo qual no dado atribuir universidade a responsabilizao por eventos sobre os quais no h qualquer participao ou influncia desta - ausncia de alunos e reprovao da aluna.

    A hipossuficincia do consumidor, na hiptese dos autos, no tem o condo de legitimar prejuzo ao fornecedor (onerosidade excessiva da r), mormente quando no verificado o defeito na prestao do servio pelo qual se obrigou, porquanto certo, enquanto presente a viabilidade econmico-pedaggica da manuteno do curso de graduao (lucro e alunos em quorum mnimo), foi ele preservado, o que corroborado, inclusive, por ter a autora cursado o quarto ano de engenharia qumica, ressalte-se, sem aprovao, e ainda, de ter a universidade mantido o curso de engenharia qumica at a formatura da primeira turma.

    Ademais, ao contrrio do que afirmam as instncias ordinrias, a aluna no foi obrigada a optar pela transferncia para a Faculdade Oswaldo Cruz, tanto em razo da ausncia de correlao lgico-gramatical entre as duas proposies, quanto pelo fato de que a escolha/opo foi realizada de forma livre e consciente, mediante pedido/solicitao da prpria discente, aps analisar as alternativas adequadamente prestadas pela universidade como forma de superar a crise relacional existente entre as partes.

    Assim, como corolrio do princpio da eticidade e da boa-f objetiva, o

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    fornecedor pautou-se como podia e devia ante o dever intrnseco de colaborao e cooperao. A universidade atendeu plenamente regra de exceo estatuda para os casos de inexecuo contratual involuntria e autorizada por lei (extino de curso), fornecendo informao adequada e caminhos alternativos para a autora, nos exatos termos preceituados pelo artigo 54, 2, do CDC.

    No se olvida que o principal objetivo de um aluno ao ingressar em uma universidade o de finalizar o curso para o qual se matriculou e, posteriormente, ingressar no mercado de trabalho e l aplicar os conhecimentos adquiridos. Entretanto, na hiptese ora em foco, no se verifica a quebra do dever de lealdade, transparncia, informao, boa-f, tampouco desrespeito e descaso para com a aluna.

    Deste modo, invivel, nesta hiptese, imputar instituio educacional a responsabilidade por todas e quaisquer prticas que afetem a relao contratual estabelecida entre as partes, mormente quando viabilizado pelo fornecedor alternativas para soluo do problema, ante a clusula resolutria do contrato, diga-se, decorrente de inexecuo no voluntria.

    3. Do exposto, no mrito, DOU PROVIMENTO ao recurso especial para julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial.

    Custas e honorrios pela autora, estes ltimos arbitrados em R$ 1.000,00 (um mil reais) nos termos do artigo 20, 4, do CPC, ressalvado o disposto no art. 12 da Lei n 1.060/50.

    como voto.

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    CERTIDO DE JULGAMENTOQUARTA TURMA

    Nmero Registro: 2008/0223841-8 PROCESSO ELETRNICO REsp 1.094.769 / SP

    Nmeros Origem: 200800497553 3386303 950007018 95000720

    PAUTA: 20/02/2014 JULGADO: 20/02/2014

    RelatorExmo. Sr. Ministro MARCO BUZZI

    Presidente da SessoExmo. Sr. Ministro RAUL ARAJO

    Subprocurador-Geral da RepblicaExmo. Sr. Dr. ANTNIO CARLOS PESSOA LINS

    SecretriaBela. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI

    AUTUAO

    RECORRENTE : ACADEMIA PAULISTA ANCHIETA S/C LTDAADVOGADO : ADRIANA INCIA VIEIRA E OUTRO(S)RECORRIDO : RENATA GUIRROADVOGADO : CLIO CAUS JNIOR E OUTRO(S)

    ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Responsabilidade Civil

    CERTIDO

    Certifico que a egrgia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epgrafe na sesso realizada nesta data, proferiu a seguinte deciso:

    Aps o voto do Sr. Ministro Relator que dava provimento ao recurso especial, PEDIU VISTA dos autos o Sr. Ministro Luis Felipe Salomo.

    Aguardam os Srs. Ministros Raul Arajo (Presidente), Maria Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira.

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    RECURSO ESPECIAL N 1.094.769 - SP (2008/0223841-8)RELATOR : MINISTRO MARCO BUZZIRECORRENTE : ACADEMIA PAULISTA ANCHIETA S/C LTDA ADVOGADO : ADRIANA INCIA VIEIRA E OUTRO(S)RECORRIDO : RENATA GUIRRO ADVOGADO : CLIO CAUS JNIOR E OUTRO(S)

    VOTO-VISTA

    O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMO:

    1. Renata Guirro ajuizou demanda contra Academia Paulista Anchieta, objetivando anulao de clusula contratual abusiva e percepo de indenizao por danos materiais e morais, diante de alegada m prestao de servios.

    Sustenta a autora que, no final de 1997, prestou vestibular na instituio r para o curso de engenharia de alimentos, frequentou por dois anos o ciclo bsico inerente a todos os cursos de engenharia, logrando aprovao, e, quando iniciaria o curso especfico de engenharia de alimentos, "... a r decidiu, por motivos de ordem econmica, no mais oferecer o curso de engenharia de alimentos, suscitando a proposio normativa inserida no 21, clusula quarta, do contrato de adeso" ; no lhe restando alternativa, matriculou-se no curso de engenharia qumica oferecido pela r.

    Aduz que concluiu o terceiro e o quarto anos do curso de engenharia qumica, porm, quanto ao ltimo, " ... teve notas insuficientes em cinco matrias, sendo obrigada a estudar o quarto ano" , mas, "ao tentar efetivar a matrcula para o quarto ano, foi surpreendida com a notcia de que a instituio no estava mais ministrando o curso de engenharia qumica

    para os alunos do quarto ano" (fls. 5-17).

    Sobreveio sentena de parcial procedncia do pedido para condenar a r ao pagamento de: (i) R$ 12.000,00 a ttulo de reparao pelo dano moral; (ii) R$ 158,00 por ms relativos diferena de despesas de conduo e R$ 120,00 mensais a ttulo de reparao de despesas com alimentao durante os meses em que foram ministradas aulas, adotado como termo a quo a data a partir da qual passou a autora a frequentar aulas nas Faculdades Osvaldo Cruz; (iii) mensalidades correspondentes ao ltimo ano do curso de engenharia qumica frequentado nas Faculdades Osvaldo Cruz, segundo os valores ento vigentes; e (iv) diferenas de valores entre as mensalidades que eram pagas r e as das Faculdades Osvaldo Cruz (fls. 158-173).

    O Tribunal estadual negou provimento apelao da entidade educacional,

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    consoante acrdo assim ementado (fls. 230-240):

    PRESTAO DE SERVIOS EDUCACIONAIS - TRANSFERNCIA DE ALUNA PARA OUTRA UNIVERSIDADE DISTANTE DE SUA RESIDNCIA - DANOS MORAIS E MATERIAIS - CONFIGURAO - REPARAO DEVIDA.Apesar de constar no contrato de prestao de servios educacionais a necessidade de quorum para a formao de turmas, a aluna no pode ser prejudicada pela ausncia de viabilidade econmico-financeira para a instituio de ensino continuar a oferecer um curso acadmico, mesmo porque o contrato de prestao de servios educacionais tipicamente de adeso, protegido pelo Cdigo de Defesa do Consumidor, da resultando que as clusulas que restringem direitos devem ser interpretadas estritamente e, em caso de dvida, no interesse do contratante.RECURSO IMPROVIDO.

    Nas razes do recurso especial, interposto com base nas alneas "a" e "c" do permissivo constitucional, alegou-se dissdio jurisprudencial e violao dos arts. 535 do CPC; 188, I e 393 do CC; e 54, 2, do CDC.

    O Ministro relator deu provimento ao recurso especial para julgar improcedentes os pedidos da inicial, com base nos seguintes fundamentos: (i) a autonomia universitria de que goza a instituio de ensino superior confere-lhe o direito de proceder extino de curso para o qual no haja viabilidade econmica; (ii) o dever de informao previsto no art. 6, III, do CDC foi cumprido, haja vista constar do contrato de prestao de servios educacionais e do manual do discente clusula com tal informativo; (iii) no ocorrncia de defeito na prestao de servio, quer pelo fato de estar fazendo uso de uma faculdade legal quer por no ser responsvel pela aluna no ter conseguido concluir o curso com os demais colegas de turma; (iv) implemento de clusula resolutria do contrato, nos termos do art. 54, 2, do CDC, haja vista que a prpria aluna optou por transferir-se para outra instituio de ensino; (v) a clusula que previa a possibilidade de encerramento de curso superior no foi considerada abusiva pela instncia a quo.

    Pedi vista dos autos para melhor anlise.

    o relatrio.

    2. Quanto alegada violao ao art. 535 do CPC, no merece prosperar o recurso, no que acompanho o nobre relator, uma vez que o Tribunal de origem se manifestou suficientemente sobre o tema, tendo apresentado fundamentadamente as razes de sua convico em relao necessidade de existncia de quorum mnimo para a formao de turma (fls. 237-238):

    Apesar de constar no contrato de prestao de servios educacionais a necessidade de quorum para a formao de turmas, a aluna no pode ser prejudicada pela ausncia de viabilidade econmico-financeira para a instituio de ensino continuar a oferecer um curso acadmico, mesmo

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    porque o contrato de prestao de servios educacionais tipicamente de adeso, protegido pelo Cdigo de Defesa do Consumidor, da resultando que as clusulas que restringem direitos devem ser interpretadas estritamente e, em caso de dvida, no interesse do contratante.Ademais, o principal objetivo de um aluno quando ingressa em uma universidade o de terminar o curso para o qual foi matriculado para posteriormente exercer a profisso, sendo que as clusulas que se revelam por demais restritiva dos direitos do aluno devem ser interpretadas segundo a funo social do contrato, levando em considerao a natureza e o contedo da contratao, bem como o interesse das partes.

    Ademais, no se exige do magistrado que se reporte de modo especfico a determinados preceitos legais, que no compem a base jurdica adotada para sua deciso nem que se detenha a analisar pontualmente todas as alegaes expendidas pela parte.

    3. No mrito, especificamente quanto possibilidade de extino de curso superior por instituio de ensino - de maneira abrupta, sem ressarcimento aos alunos -, parece mister alguma reflexo, haja vista a dinmica surpreendente que a realidade das relaes sociais ostenta, fazendo exsurgir, a cada dia, situaes fticas peculiares.

    O Tribunal de origem, confirmando integralmente a sentena, assim se manifestou quanto ao tema (fls. 236-240):

    2. Cuidam os autos de ao anulatria de clusula contratual cumulada com indenizao por danos morais e materiais, ajuizada pela aluna em face da instituio de ensino, fundamentando para tanto que no final do ano de 1.997 prestou vestibular para o curso de engenharia de alimentos, passando a freqentar, nos dois primeiros anos, no campus de So Bernardo do Campo, o ciclo bsico para todos os cursos de engenharia. No terceiro ano, a universidade no ofereceu o curso de engenharia de alimentos, motivo pelo qual matriculou-se em engenharia qumica. Entretanto, ao tentar fazer matrcula para o ltimo ano, que teve que repetir por insuficincia de notas, foi surpreendida com a notcia de que a instituio no estava mais oferecendo o curso de engenharia qumica, razo pela qual teve que se transferir para a Faculdade Osvaldo Cruz, localizada no bairro de Santa Cecilia, no Municpio de So Paulo, o que lhe acarretou danos morais, alm de maior gastos com conduo, alimentao e mensalidade, j que morava na cidade de Mau e tinha que se locomover at a capital.Restou incontroverso nos autos que a transferncia da autora para outra universidade se deu pela extino do curso de engenharia qumica em razo da ausncia de nmero mnimo de alunos para formao da turma.No se desconhece que as Universidades gozam de "autonomia didtico-cientfica, administrativa e de gesto financeira e patrimonial", nos termos do artigo 207 da Constituio Federal, cabendo a elas, no exerccio de sua autonomia, conferir graus, diplomas e outros ttulos, conforme determina o artigo 53, VI, da Lei n 9.394/96.Entretanto, incontestvel que a requerida ocasionou sofrimento aluna, ao encerrar, confessadamente, o curso de engenharia qumica, depois de ter ministrado aulas por quatro anos, sendo previsvel o fato de que

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    eventualmente algum aluno poder precisar refazer algum perodo por insuficincia de notas.Apesar de constar no contrato de prestao de servios educacionais a necessidade de quorum para a formao de turmas, a aluna no pode ser prejudicada pela ausncia de viabilidade econmico-financeira para a instituio de ensino continuar a oferecer um curso acadmico, mesmo porque o contrato de prestao de servios educacionais tipicamente de adeso, protegido pelo Cdigo de Defesa do Consumidor, da resultando que as clusulas que restringem direitos devem ser interpretadas estritamente e, em caso de dvida, no interesse do contratante.Ademais, o principal objetivo de um aluno quando ingressa em uma universidade o de terminar o curso para o qual foi matriculado para posteriormente exercer a profisso, sendo que as clusulas que se revelam por demais restritiva dos direitos do aluno devem ser interpretadas segundo a funo social do contrato, levando em considerao a natureza e o contedo da contratao, bem como o interesse das partes.[...]No mais, esse quadro deixa evidenciado o constrangimento e o aborrecimento sofrido pela autora que teve que se transferir para outra universidade no ltimo ano do curso, em virtude do ocorrido, configurando ineludivelmente o dano moral, assim conceituado por WILSON MELLO DA SILVA:"Leses sofridas pelo sujeito fsico ou pessoa natural de direito em seu patrimnio ideal, entendendo-se por patrimnio ideal, em contraposio ao patrimnio material, o conjunto de tudo aquilo que no seja suscetvel de valor econmico". (O Dano Moral e Sua Reparao, 195, n. 5,1.) Amparado na lio dos Irmos MAZEAUD, escreve MARTINHO GARCEZ:"O que a cincia jurdica tem estabelecido, em definitivo, no campo da responsabilidade civil resultante do ato ilcito o seguinte: quando uma imprudncia ou negligncia provada contra o agente, no h necessidade de investigar alm disto; desde que, afastada essa culpa, o dano no se teria verificado, no h necessidade de mais nada para impor a condenao". ("Prtica de Responsabilidade Civil", 2a ed., Editora Jurdica e Universitria Ltda., p. 45).Configurada na hiptese em estudo, a existncia do dano moral no mago da autora, como bem retratou o pavilho probatrio, resta a analise do valor do ressarcimento aplicado na r. deciso.Sobre o tema, CARLOS ROBERTO GONALVES d a seguinte lio: "em geral, mede-se a indenizao pela extenso do dano e no pelo grau da culpa. No caso do dano moral, entretanto, o grau da culpa tambm levado em considerao, juntamente com a gravidade, extenso e repercusso da ofensa, bem como a intensidade do sofrimento acarretado vtima." (cf. Responsabilidade Civil, 6 ed., So Paulo, Saraiva, 1.995, n 94.5, pg. 414).Assim, levando em considerao a gravidade e extenso do dano, bem como a culpa da requerida, mostra-se adequada a fixao dos danos morais no valor de R$ 12.000,00 (doze mil reais), pois o valor arbitrado deve ser o suficiente para inibir a apelante da prtica dessa natureza, capaz de macular a honra e o sentimento alheio e, de outro lado, no importar enriquecimento sem causa da ofendida.Por fim, os danos materiais tambm restaram comprovados, na medida em que a aluna passou a freqentar aulas em outra universidade, distante de

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    sua residncia, aumentando o valor de suas despesas com transporte, alimentao, alm do valor da mensalidade que passou a ser mais elevado.

    3.1. No ponto, bem verdade que a Lei n. 9.394/1996 prev a possibilidade de as universidades, no exerccio da sua autonomia, extinguirem curso superior:

    Art. 53. No exerccio de sua autonomia, so asseguradas s universidades, sem prejuzo de outras, as seguintes atribuies:I - criar, organizar e extinguir, em sua sede, cursos e programas de educao superior previstos nesta Lei, obedecendo s normas gerais da Unio e, quando for o caso, do respectivo sistema de ensino; [...]Pargrafo nico. Para garantir a autonomia didtico-cientfica das universidades, caber aos seus colegiados de ensino e pesquisa decidir, dentro dos recursos oramentrios disponveis, sobre:I - criao, expanso, modificao e extino de cursos;

    De fato, em linha de princpio, no h como compelir a unidade de ensino superior a manter o funcionamento de curso em circunstncias fticas desfavorveis, por se tratar de faculdade didtico-pedaggica regulada pelas diretrizes de ensino e pesquisa, alm de atividade econmica orientada pelas regras de mercado.

    No obstante, como todo texto legal, o ora em anlise necessita de interpretao consentnea com a realidade, no sentido de que tal prerrogativa no pode ocorrer de forma abrupta - sempre em prejuzo do corpo discente -, sob pena de configurar abuso do direito, passvel da devida responsabilizao civil pelos danos ocasionados queles que confiaram na sua sequncia e encerramento regular.

    Isso porque a prestao de servios educacionais, mormente no mbito de curso superior, tem como fator nsito a legtima expectativa do aluno de concluso do seu curso, haja vista que - ainda que eventualmente renovado o contrato a cada ano ou semestre -, a contratao se d pelo prazo integral necessrio correspondente graduao.

    Rui Stocco, citando o esclio de Irineu Strenger, conceitua:

    Abuso do direito o ato realizado com apoio em preceito legal, que causa dano a interesse no especificamente protegido pelo ordenamento positivo, manifestado pela leso a princpios ticos e sociais, objetiva ou subjetivamente, mediante adequao entre o intencional e o sentido da lei. (Tratado de responsabilidade civil. So Paulo: Ed. revista dos Tribunais, 2013, p. 1.827)

    3.2. Nesse passo, utilizando o dilogo entre o Cdigo do Consumidor e o Cdigo Civil, traz-se a lume o mandamento insculpido no art. 187 do CC:

    Art. 187. Tambm comete ato ilcito o titular de um direito que, ao exerc-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econmico ou social, pela boa-f ou pelos bons costumes.

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    Nessa ordem de ideias, penso que o encerramento repentino das atividades de ensino durante o curso de graduao - por ausncia de nmero suficiente de alunos - caracteriza violao das expectativas geradas pelo prprio fornecedor, afrontando sobremaneira a esfera moral do consumidor, porquanto faz exsurgir um sentimento de impotncia diante da atitude imprevista e arbitrria causadora de intenso transtorno na vida do estudante.

    No ponto, traslada-se elucidativo excerto da sentena (fls. 162-165):

    Ora, indubitvel gozar a r de autonomia nos termos do art. 207 da Magna Carta ("as universidades gozam de autonomia didtico-cientfica, administrativa e de gesto financeira e patrimonial, e obedecero ao princpio de indissociabilidade, entre ensino, pesquisa e extenso") . Da porque, inclusive, no se discute a possibilidade de, ante a inviabilidade (pedaggica ou econmica) de determinado curso que esteja a ministrar, encerr-lo. Contudo, esta faculdade de encerrar cursos no pode ir ao ponto de eximir-se a universidade das conseqncias que dela possam advir aos seus alunos regularmente matriculados no curso abruptamente encerrado, porquanto h de ser exercida sem abusividade e, independentemente desta, com absoluta assuno da obrigao de reparar os danos aos alunos em funo dela.5. De fato, se de um lado, goza a r de autonomia na forma do aludido dispositivo constitucional, prescreve a mesma Constituio Federal, em seu art. 170, V, ser a ordem econmica, fundada, dentre outros, no princpio da defesa do consumidor. Alm disso, constitui objetivo bsico da poltica nacional de relaes de consumo (conforme dispe a Lei Federal n. 8.078/90) "o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito sua dignidade, sade e segurana, a proteo de seus interesses econmicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparncia e harmonia das relaes de consumo" (art. 4, caput ), observado o princpio de que devem ser harmonizados "... os interesses dos participantes das relaes de consumo e compatibilizao da proteo do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econmico e tecnolgico, de modo a viabilizar os princpios nos quais se funda a ordem econmica (art. 170, da Constituio Federal), sempre com base na boa-f e no equlibrio nas relaes entre consumidores e fornecedores" (art. 40, III).6. Como, contudo, falar-se em atendimento das necessidades dos consumidores, respeito sua dignidade, proteo de seus interesses econmicos e em transparncia e harmonia das relaes de consumo, alm de boa-f e equilbrio nas relaes entre consumidores e fornecedores quanto a uma universidade que no est capacitada a ministrar no apenas um, mas dois cursos que se viu obrigada a encerrar por insuficincia de alunos, deixando estes mngua? Ser o aluno mero joguete sujeito ao exerccio das faculdades inerentes chamada autonomia universitria?

    4. Com efeito, o contrato de prestao de servios educacionais encarta relao jurdica de cunho notadamente consumerista, de modo que as suas clusulas devem ser interpretadas da maneira mais favorvel ao consumidor (art. 47 do CDC), sendo certo

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    que, mesmo que o pacto contenha, teoricamente, clusulas claras, ele ainda deve ser interpretado de acordo com a sua funo econmica, ou seja, "conforme as expectativas que aquele tipo contratual e aquele tipo de clusula desperta nos consumidores, conforme as novas imposies da boa-f" (MARQUES, Claudia Lima. Comentrios ao cdigo de defesa do consumidor. So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 880).

    Isso porque o Cdigo de Defesa do Consumidor reconheceu a vulnerabilidade do consumidor e a necessidade de o Estado atuar no mercado para minimizar essa hipossuficincia, garantindo quele os direitos bsicos apontados no art. 6, mormente no que se refere ao caso presente, os incisos II e III.

    Preconiza o segundo inciso do art. 6 a igualdade material entre as partes, que perpassa necessariamente pela valorizao do sinalagma como elemento estrutural do contrato, de modo que o equilbrio contratual aferido no apenas sob o prisma econmico, mas global, uma vez que:

    Concentrar-se no desequilbrio apenas econmico do contrato de consumo seria uma viso limitada da noo de equidade contratual (Vertragsgerechtigkeit ) imposta pelo CDC e pelo princpio da boa-f objetiva. A noo h de ser mais ampla, pois o que se quer o reequilbrio total da relao, inclusive de seu nvel de tratamento leal e digno, nica forma de manter e proteger as expectativas legtimas das partes, que so a base funcional que origina a troca econmica. (MARQUES, Claudia Lima. Op. Cit., p. 247)

    Em adio, o art. 6, III enfatiza o direito informao como assegurador da igualdade material e formal do consumidor com o fornecedor:

    [...] pois o que caracteriza o consumidor justamente seu dficit informacional quanto ao produto e servio, suas caractersticas, componentes e riscos e quanto ao prprio contrato, no tempo e contedo. Neste sentido, ensina o STJ que todos os consumidores tm direito informao e que o homo medius pode ser um parmetro, mas no o nico, pois muitas vezes o consumidor do prprio produto (ex: medicamentos, alimentos) ou servio (ex: mdico, educacional, recreacional infantil, geritrico) um consumidor hipervulnervel. A informao deve ser clara e adequada para todos, inclusive para estes vulnerveis [...]. (MARQUES, Claudia Lima. Op. Cit., p. 248).

    Sob esse prisma, a informao educacional superior deve ser realizada de forma a especificar pormenorizadamente a durao do curso; sua carga horria; a distribuio em mdulos; os indicadores de qualidade (v.g. corpo docente, material a ser utilizado); preos e ndices de reajuste e, primordialmente, as clusulas restritivas de direitos do consumidor, tal como a que faculta instituio de ensino o encerramento do curso por falta de quorum.

    Tal espcie de informao deve ser apresentada no apenas no momento da Documento: 1300131 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 15/08/2014 Pgina 24 de 36

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    contratao, como tambm deve ser reiterada anual ou semestralmente, uma vez que o direito informao perdura durante toda a relao de consumo.

    Isso porque se deve garantir ao aluno a apreenso do real significado da publicidade veiculada nos panfletos e flderes, bem como da linguagem utilizada no contrato, nem sempre clara o suficiente para ser entendida por um leigo.

    Claudia Lima Marques elucida com toda a propriedade que:

    Este dever de prestar informao no se restringe fase pr-contratual da publicidade, das prticas comerciais ou da oferta (arts. 30, 31, 34, 35, 40 e 52), mas inclui o dever de informar atravs do contrato (arts. 46, 48, 52 e 54) e de informar durante o transcorrer da relao (a contrario, art. 51, I, IV, XIII, c/c art. 6, III) [...]. dever do fornecedor nos contratos relacionais de consumo manter o consumidor adequada e permanentemente informado sobre todos os aspectos da relao contratual, especialmente aqueles relacionados ao risco, qualidade do produto ou servio ou qualquer outra circunstncia relevante para a sua deciso de consumo, durante todo o perodo em que perdurar a relao contratual. (Op. Cit., p. 251)

    Foroso concluir que, sendo a informao um direito bsico do consumidor, com sua matriz no princpio da boa-f objetiva, deve ser prestada de forma inequvoca, ostensiva e de fcil compreenso, porquanto:

    O consumidor bem informado um ser apto a ocupar seu espao na sociedade de consumo. S que essas informaes muitas vezes no esto sua disposio. Por outro lado, por melhor que seja a sua escolaridade, no tem ele condies, por si mesmo, de apreender toda a complexidade do mercado. (BENJAMIN, Antnio Herman de Vasconcellos. Cdigo brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto /Ada Pellegrini Grinover (et al.). Rio de Janeiro: Forense, 2011, Vol. 1, p. 289-293).

    Assim, a conduta da instituio educacional de encerrar determinado curso durante a vigncia do contrato de prestao de servios de ensino, apesar de prevista em tese, e de maneira genrica na lei referida e no contrato, contrria aos princpios sociais e ticos e boa-f, e sobremaneira legislao consumerista, atingindo fortemente os interesses e anseios do estudante que depositou seus sonhos futuros e sua confiana naquela entidade.

    Nesse sentido, embora no ocorra, no caso, a nulidade preconizada pelo art. 51, I , do CDC - haja vista o art. 53 da Lei n. 9.394/1996 -, no se pode elidir a responsabilidade do fornecedor pelos danos causados aos consumidores em virtude da m prestao dos servios, caracterizada, no caso, pela interrupo do curso de forma repentina, sem respeito aos direitos e s expectativas dos alunos, mormente o essencial dever de informao, que, se observado, possibilitaria queles o tempo e as condies Documento: 1300131 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 15/08/2014 Pgina 25 de 36

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    necessrias realizao de uma transferncia tranquila para outra universidade ou a adoo de alguma outra alternativa.

    O art. 14 do CDC prev a responsabilizao do fornecedor por defeito de informao:

    Art. 14. O fornecedor de servios responde, independentemente da existncia de culpa, pela reparao dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos prestao dos servios, bem como por informaes insuficientes ou inadequadas sobre sua fruio e riscos.

    Como bem destaca Bruno Miragem:

    [...] o atendimento ao dever de informar no regime do CDC traduz-se sempre pela prestao de uma informao eficiente . Isto implica dizer que no basta para desonerar-se de responsabilidade o fornecedor, formalmente, informar o consumidor, se o modo como tal informao se estabelece no razoavelmente perceptvel ou reconhecvel por este. (Curso de direito do consumidor . So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 517)

    5. Nesse particular, relevante registrar que o Decreto n. 3.860/2001, regulamentando o art. 53, I, da Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional, trouxe, como contraponto ao direito de criao e extino de cursos pelas universidades, o dever de resguardar os direitos dos alunos:

    Art. 37. No caso de desativao de cursos superiores e de descredenciamento de instituies, caber entidade mantenedora resguardar os direitos dos alunos, dos docentes e do pessoal tcnico administrativo.

    Sob esse enfoque, a mera existncia de clusula contratual ou de disposio em manual do estudante que contenha meno possibilidade de extino de curso em virtude da no formao de turma, por certo, segundo penso, no produz a certeza de sua cincia pelo aluno, nem mesmo no momento em que ele tem contato com tal informao abstrata e genrica.

    Por isso que, cogitando a instituio de fazer uso de sua prerrogativa legal, de modo a tornar aquela longnqua possibilidade um fato concreto e iminente, no pode crer que o aluno se lembrar daquele pequeno pargrafo que previa a faculdade de encerramento do curso por ausncia de quorum mnimo.

    Dessarte, compatibilizando-se a norma contida no art. 53, I, da Lei n. 9.394/1996 com a legislao protetiva do consumidor, tem-se que a instituio de ensino deve necessariamente proceder ao cumprimento do dever de informao, alertando os alunos com antecedncia suficiente - e de forma reiterada - acerca da iminncia desse grave evento, alm de lhes prestar o auxlio necessrio transio para outro curso ou Documento: 1300131 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 15/08/2014 Pgina 26 de 36

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    estabelecimento de ensino.

    6. No caso, cinge-se a controvrsia definio acerca da responsabilizao civil da Academia Paulista Anchieta, mantenedora da Universidade Bandeirante de So Paulo - Uniban, pela no manuteno do quarto ano do curso de engenharia qumica por razes econmicas, sendo que a recorrida precisaria refaz-lo em virtude da sua reprovao, por no ter logrado se graduar com a nica turma formada por essa universidade.

    O Tribunal entendeu pelo dever de a recorrente indenizar a aluna por danos materiais e morais, porquanto (fl. 236-238):

    [...] ao tentar fazer matrcula para o ltimo ano, que teve que repetir por insuficincia de notas, foi surpreendida com a notcia de que a instituio no estava mais oferecendo o curso de engenharia qumica, razo pela qual teve que se transferir para a Faculdade Osvaldo Cruz, localizada no bairro de Santa Cecilia, no Municpio de So Paulo, o que lhe acarretou danos morais, alm de maior gastos com conduo, alimentao e mensalidade, j que morava na cidade de Mau e tinha que se locomover at a capital.Restou incontroverso nos autos que a transferncia da autora para outra universidade se deu pela extino do curso de engenharia qumica em razo da ausncia de nmero mnimo de alunos para formao da turma.[...]Entretanto, incontestvel que a requerida ocasionou sofrimento aluna, ao encerrar, confessadamente, o curso de engenharia qumica, depois de ter ministrado aulas por quatro anos, sendo previsvel o fato de que eventualmente algum aluno poder precisar refazer algum perodo por insuficincia de notas.Apesar de constar no contrato de prestao de servios educacionais a necessidade de quorum para a formao de turmas, a aluna no pode ser prejudicada pela ausncia de viabilidade econmico-financeira para a instituio de ensino continuar a oferecer um curso acadmico [...]

    No obstante a fundamentao expendida no voto condutor no tenha como ponto forte o dever de informao atribudo ao fornecedor, pode-se dele dessumir que a notcia acerca do critrio do quorum mnimo foi prestada no contrato de prestao de servios de forma sobremodo ineficiente, tanto que consignou que a aluna foi surpreendida pela notcia do encerramento por ocasio da tentativa de realizao da matrcula.

    O mesmo se infere dos seguintes excertos da sentena, que aludiu tambm ao manual do aluno como fonte insuficiente e imperfeita da referida notificao (fls. 164 e 166):

    [...] inadmissvel dar clusula 4, 1, do contrato de prestao de servios (fls. 17 anverso), interpretao pela qual se veja, pura e singelamente, isenta a r de qualquer responsabilidade pelos danos causados autora em funo do encerramento abrupto dos cursos que, por contrato, se obrigou a ministrar-lhe.[...]

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    E no se diga que informava o manual de aluno a necessidade de ter-se um nmero mnimo de alunos para a formao de turmas sob pena de no ser iniciado o curso, porquanto tanto o de engenharia de alimentos como o de engenharia qumica foram iniciados e, portanto, aquela restrio inicial foi superada e o manual no informava a possibilidade de renovar-se a exigncia ano a ano, indicando qual seria o risco a que estaria efetivamente sujeito o aluno no tocante possibilidade de no conclu-los. Pertinentes e relevantes a este respeito, inclusive, so as observaes feitas pela autora a fls. 106, penltimo e ltimo pargrafos.

    Dessarte, verifica-se que a recorrente no se desincumbiu devidamente do dever de informao, nos moldes em que imposto pelo art. 6, III, do CDC, e que foi brilhantemente pormenorizado pelo culto Ministro Herman Benjamin, por ocasio do julgamento do REsp 586.316/MG:

    DIREITO DO CONSUMIDOR. ADMINISTRATIVO. NORMAS DE PROTEO E DEFESA DO CONSUMIDOR. ORDEM PBLICA E INTERESSE SOCIAL. PRINCPIO DA VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR. PRINCPIO DA TRANSPARNCIA. PRINCPIO DA BOA-F OBJETIVA. PRINCPIO DA CONFIANA. OBRIGAO DE SEGURANA. DIREITO INFORMAO. DEVER POSITIVO DO FORNECEDOR DE INFORMAR, ADEQUADA E CLARAMENTE, SOBRE RISCOS DE PRODUTOS E SERVIOS. DISTINO ENTRE INFORMAO-CONTEDO E INFORMAO-ADVERTNCIA. ROTULAGEM. PROTEO DE CONSUMIDORES HIPERVULNERVEIS. CAMPO DE APLICAO DA LEI DO GLTEN (LEI 8.543/92 AB-ROGADA PELA LEI 10.674/2003) E EVENTUAL ANTINOMIA COM O ART. 31 DO CDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. MANDADO DE SEGURANA PREVENTIVO. JUSTO RECEIO DA IMPETRANTE DE OFENSA SUA LIVRE INICIATIVA E COMERCIALIZAO DE SEUS PRODUTOS. SANES ADMINISTRATIVAS POR DEIXAR DE ADVERTIR SOBRE OS RISCOS DO GLTEN AOS DOENTES CELACOS. INEXISTNCIA DE DIREITO LQUIDO E CERTO. DENEGAO DA SEGURANA.[...]3. As normas de proteo e defesa do consumidor tm ndole de ordem pblica e interesse social. So, portanto, indisponveis e inafastveis, pois resguardam valores bsicos e fundamentais da ordem jurdica do Estado Social, da a impossibilidade de o consumidor delas abrir mo ex ante e no atacado.4. O ponto de partida do CDC a afirmao do Princpio da Vulnerabilidade do Consumidor, mecanismo que visa a garantir igualdade formal-material aos sujeitos da relao jurdica de consumo, o que no quer dizer compactuar com exageros que, sem utilidade real, obstem o progresso tecnolgico, a circulao dos bens de consumo e a prpria lucratividade dos negcios.5. O direito informao, abrigado expressamente pelo art. 5, XIV, da Constituio Federal, uma das formas de expresso concreta do Princpio da Transparncia, sendo tambm corolrio do Princpio da Boa-f Objetiva e do Princpio da Confiana, todos abraados pelo CDC.6. No mbito da proteo vida e sade do consumidor, o direito informao manifestao autnoma da obrigao de segurana.

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    7. Entre os direitos bsicos do consumidor, previstos no CDC, inclui-se exatamente a informao adequada e clara sobre os diferentes produtos e servios, com especificao correta de quantidade, caractersticas, composio, qualidade e preo, bem como sobre os riscos que apresentem (art. 6, III).8. Informao adequada, nos termos do art. 6, III, do CDC, aquela que se apresenta simultaneamente completa, gratuita e til, vedada, neste ltimo caso, a diluio da comunicao efetivamente relevante pelo uso de informaes soltas, redundantes ou destitudas de qualquer serventia para o consumidor.9. Nas prticas comerciais, instrumento que por excelncia viabiliza a circulao de bens de consumo, a oferta e apresentao de produtos ou servios devem assegurar informaes corretas, claras, precisas, ostensivas e em lngua portuguesa sobre suas caractersticas, qualidades, quantidade, composio, preo, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam sade e segurana dos consumidores (art. 31 do CDC).10. A informao deve ser correta (= verdadeira), clara (= de fcil entendimento), precisa (= no prolixa ou escassa), ostensiva (= de fcil constatao ou percepo) e, por bvio, em lngua portuguesa.11. A obrigao de informao desdobrada pelo art. 31 do CDC, em quatro categorias principais, imbricadas entre si: a) informao-contedo (= caractersticas intrnsecas do produto e servio), b) informao-utilizao (= como se usa o produto ou servio), c) informao-preo (= custo, formas e condies de pagamento), e d) informao-advertncia (= riscos do produto ou servio).12. A obrigao de informao exige comportamento positivo, pois o CDC rejeita tanto a regra do caveat emptor como a subinformao, o que transmuda o silncio total ou parcial do fornecedor em patologia repreensvel, relevante apenas em desfavor do profissional, inclusive como oferta e publicidade enganosa por omisso.[...]22. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.(REsp 586316/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/04/2007, DJe 19/03/2009)

    A questo da reprovao da aluna, na minha tica, em nada altera a responsabilidade da r.

    No caso vertente, a existncia de apenas uma turma de engenharia qumica e, por conseguinte, a inviabilidade de manuteno do curso nessas circunstncias, evidncia suficiente a demandar da universidade a orientao reiterada e ostensiva aos alunos no sentido de evitarem a reprovao, porquanto, consoante assinalado no voto condutor do acrdo recorrido, "previsvel o fato de que eventualmente algum aluno poder precisar refazer algum perodo por insuficincia de notas", o que - destaca-se - no constitui ato ilcito, mas sim uma eventualidade nsita atividade estudantil.

    Impende salientar que as instncias ordinrias no consideraram abusiva a

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    clusula quarta, 1, do contrato de prestao de servios, em virtude de o referido art. 53, I, da Lei de Diretrizes e Bases prever a possibilidade de encerramento de curso superior.

    Notadamente, o intento do legislador ordinrio foi o de prestigiar o exerccio da autonomia universitria, em conformidade com o art. 207 da Carta da Repblica: "As universidades gozam de autonomia didtico-cientfica, administrativa e de gesto financeira e patrimonial [...]".

    No entanto, a meu juzo, tal autonomia no significa, por bvio, independncia absoluta em relao aos demais princpios constitucionais e s normas do ordenamento jurdico, cabendo, na hiptese de aparente conflito, proceder-se ponderao de princpios constitucionais ou compatibilizao de normas infraconstitucionais, tal qual aqui se props.

    Corroborando essa tese, o Ministro Antnio de Pdua Ribeiro registrou que "a autonomia universitria, prevista no art. 207 da Constituio Federal, no pode ser interpretada como independncia e, muito menos, como soberania. A sua constitucionalizao no teve o condo de alterar o seu conceito ou ampliar o seu alcance [...]" (MS 3.318/DF).

    Desse modo, ainda que a extino de curso universitrio seja medida ao alcance da entidade privada de ensino, certo que essa faculdade no pode ocorrer em prejuzo dos alunos, de forma aodada e em desrespeito lei.

    No ponto, trasladamos excerto do voto condutor (fl. 162):

    Ora, indubitvel gozar a r de autonomia nos termos do art. 207 da Magna Carta ("as universidades gozam de autonomia didtico-cientfica, administrativa e de gesto financeira e patrimonial, e obedecero ao princpio de indissociabilidade, entre ensino, pesquisa e extenso") . Da porque, inclusive, no se discute a possibilidade de, ante a inviabilidade (pedaggica ou econmica) de determinado curso que esteja a ministrar, encerr-lo. Contudo, esta faculdade de encerrar cursos no pode ir ao ponto de eximir-se a universidade das conseqncias que dela possam advir aos seus alunos regularmente matriculados no curso abruptamente encerrado, porquanto h de ser exercida sem abusividade e, independentemente desta, com absoluta assuno da obrigao de reparar os danos causados aos alunos em funo dela.

    O contraponto desse direito legal das universidades privadas - o que a compatibiliza com as normas de proteo ao consumidor - o cumprimento cumulativo dos deveres de informao adequada e suficiente ao corpo discente, alm de auxlio em eventual transferncia para outro estabelecimento, o que no ocorreu no caso.

    7. O art. 54, 2, do CDC dispe:

    2 Nos contratos de adeso admite-se clusula resolutria, desde que a

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    alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto no 2 do artigo anterior.

    De fato, a insero de clusula resolutria nos contratos de adeso admitida. Porm, a escolha quanto resoluo do contrato ou a sua manuteno deve caber ao consumidor e somente a ele, sob pena de ser considerada abusiva.

    O contrato de prestao de servios de ensino consubstancia um contrato cativo de longa durao, no qual o consumidor se encontra em uma posio de acentuada dependncia em relao ao fornecedor, de tal forma que o seu poder de escolha praticamente se desvanece, ressaltando ainda mais o desequilbrio contratual entre as partes.

    Que opo tem a recorrida com o fechamento do curso?

    A resciso do contrato consiste na mera formalizao da deciso da instituio de ensino de extinguir o curso, no cabendo aluna nem mesmo ressarcimento com essa postura, haja vista que os pagamentos efetuados tiveram como contraprestao as aulas ministradas ao longo de 4 anos.

    A transferncia para outro estabelecimento educacional - que pressupe a resoluo contratual - a nica via que se lhe abre, haja vista que, estando no penltimo ano do curso de engenharia qumica, a escolha de manter o contrato e comear um outro curso de graduao na mesma universidade somente lhe traria mais transtornos e despesas, postergando o seu ingresso no mercado de trabalho.

    Assim, com a mxima vnia, o desfazimento do contrato no se mostra como uma opo consumidora, mas como verdadeira imposio.

    Registre-se, por oportuno, a reincidncia dessa situao na vida estudantil da recorrida, uma vez que a Uniban tambm encerrou o curso de engenharia de alimentos quando a aluna se encontrava no segundo ano letivo, tendo ela optado, naquela ocasio, pela transferncia para engenharia qumica, mormente pelo fato de ser o primeiro binio composto pelas matrias bsicas, pertencentes a todos os cursos de engenharia (art. 1 da Resoluo n. 48/1976 do Conselho Federal de Educao). Foi essa a opo que menos prejuzos lhe trouxe poca, no sendo, entretanto, uma possibilidade plausvel para o momento atual.

    Assim, ressoa inequvoca a inexistncia de alternativas viveis aluna, implicando o afastamento da norma prevista no art. 54, 2, do CDC.

    Ademais, o descumprimento do dever de informao razo bastante para a responsabilizao da universidade pelos danos morais e materiais ocasionados consumidora, nos moldes em que fixado nas instncias ordinrias: (i) R$ 12.000,00 a ttulo de reparao pelo dano moral; (ii) R$ 158,00 por ms relativos diferena de despesas de

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    conduo e R$ 120,00 mensais a ttulo de reparao de despesas com alimentao durante os meses em que foram ministradas aulas, adotado como termo a quo a data a partir da qual passou a autora a frequentar aulas nas Faculdades Osvaldo Cruz; (iii) mensalidades correspondentes ao ltimo ano do curso de engenharia qumica frequentado nas Faculdades Osvaldo Cruz, segundo os valores ento vigentes; e (iv) diferenas de valores entre as mensalidades que eram pagas r e as das Faculdades Osvaldo Cruz.

    8. Ante o exposto, pedindo vnia ao eminente e nobre relator, nego provimento ao recurso especial.

    o voto.

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    RECURSO ESPECIAL N 1.094.769 - SP (2008/0223841-8)RELATOR : MINISTRO MARCO BUZZIRECORRENTE : ACADEMIA PAULISTA ANCHIETA S/C LTDA ADVOGADO : ADRIANA INCIA VIEIRA E OUTRO(S)RECORRIDO : RENATA GUIRRO ADVOGADO : CLIO CAUS JNIOR E OUTRO(S)

    VOTO-VENCIDO

    O EXMO. SR. MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA: Sr. Presidente, entendo que as diligncias adotadas pelo fornecedor, destacadas pelo eminente Ministro MARCO BUZZI em seu voto, foram hbeis apenas para minimizar os danos ocasionados ao consumidor. Apenas para isso: mitigar os danos. Creio que tal circunstncia foi considerada pelas instncias ordinrias ao arbitrar valores reduzidos a ttulo de danos moral e material.

    Em tais condies, pedindo vnia ao Relator, acompanho a divergncia, nos termos do voto do Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMO.

    NEGO PROVIMENTO ao recurso especial.

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    RECURSO ESPECIAL N 1.094.769 - SP (2008/0223841-8)

    VOTO

    MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI: Sr. Presidente, peo vnia ao eminente Ministro Luis Felipe Salomo para acompanhar o voto do Relator.

    No entendo que tenha sido abrupto ou repentino o encerramento do curso, uma vez que a universidade cumpriu o seu papel de formar aqueles que cursaram regularmente as matrias. No poderia a universidade ser obrigada a manter uma turma de quarto ano apenas para eventual aluno que fosse reprovado. O equilbrio econmico-financeiro dos cursos requisito para a adequada prestao do ensino, no s para os alunos desse determinado curso, mas para a generalidade dos cursos da instituio de ensino privada. Estava previsto e fora suficientemente informado a ela no contrato de ensino e tambm no manual do estudante que no haveria formao de turma sem o nmero mnimo de alunos l previsto.

    Portanto, com a devida vnia, acompanho o voto do Ministro Relator no sentido de dar provimento ao recurso especial.

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  • Superior Tribunal de Justia

    CERTIDO DE JULGAMENTOQUARTA TURMA

    Nmero Registro: 2008/0223841-8 PROCESSO ELETRNICO REsp 1.094.769 / SP

    Nmeros Origem: 200800497553 3386303 950007018 95000720

    PAUTA: 18/03/2014 JULGADO: 18/03/2014

    RelatorExmo. Sr. Ministro MARCO BUZZI

    Presidente da SessoExmo. Sr. Ministro RAUL ARAJO

    Subprocurador-Geral da RepblicaExmo. Sr. Dr. DURVAL TADEU GUIMARES

    SecretriaBela. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI

    AUTUAO

    RECORRENTE : ACADEMIA PAULISTA ANCHIETA S/C LTDAADVOGADO : ADRIANA INCIA VIEIRA E OUTRO(S)RECORRIDO : RENATA GUIRROADVOGADO : CLIO CAUS JNIOR E OUTRO(S)

    ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Responsabilidade Civil

    CERTIDO

    Certifico que a egrgia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epgrafe na sesso realizada nesta data, proferiu a seguinte deciso:

    Prosseguindo no julgamento, aps o voto-vista do Ministro Luis Felipe Salomo, negando provimento ao recurso especial, divergindo do Relator, e os votos dos Ministros Raul Arajo e Maria Isabel Gallotti, acompanhando o Relator, e o voto do Ministro Antonio Carlos Ferreira, no sentido da divergncia, a Quarta Turma, por maioria, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Relator. Vencidos os Ministros Luis Felipe Salomo e e Antonio Carlos Ferreira .

    Votaram vencidos os Srs. Ministros Luis Felipe Salomo (voto-vista) e Antonio Carlos Ferreira.

    Os Srs. Ministros Raul Arajo (Presidente) e Maria Isabel Gallotti votaram com o Sr. Ministro Relator.

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  • Superior Tribunal de Justia

    RECURSO ESPECIAL N 1.094.769 - SP (2008/0223841-8)

    VOTO-VOGAL

    O SR. MINISTRO RAUL ARAJO (PRESIDENTE): Srs. Ministros, o

    eminente Ministro Relator mantm seu voto e entendo que, de fato, houve disponibilizao de opes

    para a recorrida, para que pudesse continuar o seu curso em outras instituies de ensino superior.

    Ela estava, parece-me, suficientemente advertida, segundo o voto do eminente Relator, pois j havia

    sido transferida de curso anteriormente. Alm disso, o fato de ficar reprovada em diversas matrias

    do ltimo ano do curso inviabilizou que ela pudesse frequentar determinada disciplina em que

    reprovada, pois eram muitas as matrias a serem repetidas.

    Ento, peo vnia ao Ministro Luis Felipe Salomo para acompanhar o voto do

    Ministro Relator no sentido de dar provimento ao recurso especial.

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