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Rede São Paulo de Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da SEESP Ensino Fundamental II e Ensino Médio São Paulo 2011

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Rede So Paulo de

Cursos de Especializao para o quadro do Magistrio da SEESP

Ensino Fundamental II e Ensino Mdio

So Paulo

2011

UNESP Universidade Estadual PaulistaPr-Reitoria de Ps-GraduaoRua Quirino de Andrade, 215CEP 01049-010 So Paulo SPTel.: (11) 5627-0561www.unesp.br

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Metforas, mtodos e metodologias, metforas

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Ficha da Disciplina:Metodologias para ensino

e aprendizagem de arte

Rita Luciana Berti Bredariolli

Bacharel e Licenciada em Educao Artstica pela Universidade de Campinas, UNI-CAMP (1993). Possui mestrado em Artes pela Escola de Comunicaes e Arte da Universi-dade de So Paulo, ECA-USP (2004) e doutorado em Artes pela mesma instituio (2009). Atuou como professora de Arte de Ensino Fundamental II por 12 anos. Em 2005 ingressou na Universidade Federal do Esprito Santo, UFES, voltando a So Paulo em 2010 para assu-mir o cargo de professora assistente doutora do Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho, IA-UNESP. Leciona as disciplinas de Fundamentos do Ensino da Arte e Didtica para os cursos de Bacharelado e Licenciatura em Artes Visuais, Licenciatura em Artes Cnicas e Licenciatura em Msica. autora do livro Das lembranas de Suzana Rodrigues: tpicos Modernos de Arte e Educao e desenvolve pesquisas sobre teoria da imagem, histria e memria do ensino da arte e ensino da arte como mediao cultural.

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Ementa: Conceitos de mtodo e metodologia. A relao entre epistemologia e metodologia do ensino

da arte em suas variaes ao longo do tempo. Mtodos e Metodologias artstico-educacionais contemporneos. O professor-pesquisador. O artista/pesquisador/ professor. As relaes entre teoria (theorie), prtica (prxis) e criao (poisis). Metodologias para o artista/pesquisador/ professor.

Estrutura da DisciplinaTema 1: Metforas, mtodos e metodologias, metforas

1.1. Metforas 1.2. Mtodos e Metodologias 1.3. Metforas

Tema 2. Metodologias para ensino e aprendizagem de arte 2.1. Metodologias modernas: academicismos 2.2. Metodologias modernas: modernismos 2.3. Metodologias ps-modernas: arte como expresso e cultura

Tema 3: Isto tambm uma metodologia: duas verses contemporneas de mtodos, metodologias, educao e arte.

3.1. O professor ironista 3.2. Outras metforas: rvores, rizomas, mapas, a partilha do sensvel

Tema 4: professor-pesquisador: os outros, os mesmos mapas 4.1. Teoria como A/R/TOGRAFIA: artista/pesquisador/professor

Tema 5 : Metodologias para a prtica de uma pesquisa ativa 5.1. Etnografia 5.2. Um tipo de pesquisa ativa: a Pesquisa -Ao 5.3. Histria de Vida 5.4. Estudo de Caso

Rita Luciana Berti Bredariolli

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Vdeo da Disciplina

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SumrioEmenta: ................................................................................... 3

Metodologias para ensino e aprendizagem de arte ........................6

Metforas, mtodos e metodologias, metforas ............................8

1.1. Metforas ............................................................................................8

1.2. Mtodos e Metodologias ..................................................................10

1.2.1. As vrias acepes de mtodo ........................................................10

1.2.2. A acepo moderna de mtodo ......................................................12

1.2.3. Experimento, logo existo ................................................................13

1.3. Metforas ..........................................................................................20

Para saber mais: ..................................................................... 22

Referncias Bibliogrficas para esse Tema: .............................. 23

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Metodologias para ensino e aprendizagem de arte

1. Para apalpar as intimidades do mundo preciso saber:

a) Que o esplendor da manh no se abre com faca

b) O modo como as violetas preparam o dia para morrer

c) Por que que as borboletas de tarjas vermelhas tm devoo

por tmulos

d) Se o homem que toca de tarde sua existncia num fagote, tem

salvao

e) Que um rio que flui entre 2 jacintos carrega mais ternura

que um rio que flui entre 2 lagartos

f ) Como pegar na voz de um peixe

g) Qual o lado da noite que umedece primeiro.

etc.

etc.

etc.

Desaprender 8 horas por dia ensina os princpios.

(BARROS, 2000).

Locuo: Rita Luciana Berti Bredariolli

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J se sabe: para uma linha razovel ou uma correta

informao, h lguas de insensatas cacofonias, de confuses

verbais e de incoerncias. (Sei de uma regio montanhosa

cujos bibliotecrios repudiam o supersticioso e vo costume de

procurar sentido nos livros e o equiparam ao de procur-los nos

sonhos ou nas linhas caticas das mos...os livros em si nada

significam. Esse ditame, j veremos, no completamente

falaz.)

(BORGES, 1999, v. 1)

Locuo: Rita Luciana Berti Bredariolli

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Metforas, mtodos e metodologias, metforas 1.1. Metforas

Comecemos nossa insero pelas Metodologias para ensino e aprendizagem da arte recorrendo a uma metfora muito comum, ouvida quando, por vezes, exauridos por um cotidiano adverso a todos os nossos ideais educacionais, atropelado pelo tempo escasso, pela falta de apoio insti-tucional, pelos baixos salrios, pela quantidade de turmas e alunos por turmas, clamamos por uma conduo, por um caminho que nos leve a uma soluo imediata para problemas espe-cficos a um contexto e a uma relao particular: a nossa, com nossos alunos, com e em nossa escola.

Pela nsia de resolver todo o tipo de adversidade, clamamos por um como: como fao para en-sinar arte para tantos alunos, com um tanto de tempo e outro tanto de condies de trabalho? A resposta ouvida, talvez frustrante, vem em forma de uma metfora: no h receita.

O uso da receita como imagem para ilustrar o inapropriado a um processo educacional, em nosso caso especificamente, voltado ao ensino e aprendizagem da arte, tornou-se com o tempo, um jargo, um clich, por vezes pejorativo, repetido exaustivas vezes, ao mesmo tempo, como forma de apaziguar angstias e ansiedades pela resoluo imediata de problemas especficos, e de induo compreenso contempornea do processo educativo como algo especfico a um contexto, interagente e varivel, avesso a um estereotipado carter prescritivo de uma receita.

Agora, paremos um pouco e pensemos sobre uma receita, de bolo, no caso. Muitos de ns j seguimos uma receita. Fizemos bolos. Por vezes, usamos a mesma receita diversas vezes, ou a mesma receita usada por algum de nossa famlia ou de algum amigo, mas nem sempre um bolo, da mesma receita, igual ao outro. Seja pela qualidade dos ingredientes, temperatura do forno, pelo clima, pela velocidade da batedeira que se desajustou, enfim, percebemos que as contingncias de uma situao incluindo, e principalmente, quem faz o bolo - interferem no sabor, textura, cor, consistncia desses bolos, cuja origem a mesma receita: esse bolo nunca sai como o da minha av!

Os anos de experincia, junto ao arranjo dos ingredientes e ambiente, provocam os resultados e suas diferenas, ou semelhanas. A receita, por ela mesma, no garantia da qualidade de um

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bolo. Os resultados, nesse caso, dependero da experincia e envolvimento desse algum que, hbil e sabiamente, perceber as suas circunstncias e as articular com os procedimentos esco-lhidos, a receita, arranjando-os, em alteraes se necessrias, para o seu fim: um delicioso bolo.

Ao longo da histria do ensino da arte muitas receitas foram elaboradas, usadas, reinventa-das; por vezes - por vrios motivos, dentre os quais, os citados no incio desse texto reprodu-zidas, indiferentes aos seus contextos.

Todas essas receitas de como ensinar arte continuam a circular, impressas em livros didticos e paradidticos, presentes e resistentes em nossas prticas, contendo seus ingredientes, sua ordem, seu modo de fazer. Mas, sozinhas no resolveram, resolvem ou resolvero nenhum problema edu-cacional. Sozinhas, pairam inertes e alheias, repousando sobre pginas. No realizam nada, sem serem escolhidas por algum e atualizadas, no sentido mesmo de coloc-las em ato, torn-las potencialidades. A partir da acontecem, tornam-se eventos integrantes da realizao de um pro-cesso educativo. Acontecem sob nossa conduo, suscetveis aos outros acontecimentos inerentes a esse mesmo processo. Acontecimentos esses, gerados e alterados pela reao de nossos alunos e constituio de nosso ambiente escolar. Acontecimentos que configuram nosso cotidiano; e dele, de sua observao, compreenso, reviso, enfim de seu conhecimento e reconhecimento, que encontramos os muitos e diferentes como fazer, as receitas.

As receitas, os mtodos, as metodologias, so importantes como formas abstratas de organi-zao, de sistematizao, uma constituio de sentido que aplaca nossa sensao de inseguran-a diante da condio movedia daquilo que chamamos realidade. No entanto, efetivamente, em nossa relao com cada uma dessas nossas realidades - aliando aquilo que sabemos s situaes concretas que vivemos, em meio ao erro, a instabilidade, a confuso, ao inespera-do - que podemos encontrar os modos de agir, os como fazer, os caminhos possveis para o enfrentamento do difcil, mas da mesma forma valoroso, trabalho educativo. , pois, desse enfrentamento, incmodo por vezes, com as nossas reais condies de trabalho que so criados e recriados os caminhos, as receitas, os mtodos e as metodologias para realizar o mais prximo possvel daquilo que compreendemos ensinar arte.

Trataremos nesse texto sobre essas receitas, mtodos e metodologias. Apresentaremos suas variaes conceituais ao longo do tempo, tomando-os no sentido mais aproximado a sua eti-mologia, entendendo-os, portanto, como caminho e investigao, procurando revolver uma

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rotinizada - pois tornada usual (CNDIDO, 2000, p. 182) - derivao de um de seus sig-nificados modernos, qual nos acostumamos: a de mtodo como preceito abstrato, univer-sal, imperativo, restritivo e impeditivo, alheio realidade, prtica; buscando dessa forma, devolver-lhe sua condio de parte estruturante de um conjunto formado, em nosso caso, por ns professores, nossos alunos, nossas condies de trabalho e nossas concepes e, portanto, nossos objetivos, justificativas, contedos - sobre o ensino, a aprendizagem, a arte e suas rela-es, restituindo aos mtodos, metodologia, sua indissociabilidade da epistemologia da arte.

O como ensinar e aprender arte, o como desenvolver o conhecimento artstico indissocivel da nossa concepo sobre o que ensinar e aprender arte, o que o conhecimento artstico.

1.2. Mtodos e Metodologias

1.2.1. As vrias acepes de mtodo

Em Vocabulrio Tcnico e Crtico da Filosofia(LALANDE,1999,p.678-679)encontramostrs definies de mtodo. A primeira refere-se ao seu sentido etimolgico de demanda, assu-mindo como conseqncia o significado de esforo para atingir um fim. Seguindo essa ideia, agregam-se a essa noo de mtodo, a de investigao - essa, segundo Lalande, uma acepo antiga usada especialmente por Aristteles - e estudo. Portanto, originalmente, a palavra m-todo estaria associada s ideias de demanda, empenho por um objetivo, investigao e estudo.

Dessa noo embrionria de mtodo, duas acepes modernas diferentes, embora muito prximas seriam derivadas: a de caminho e a de prescrio. A ideia de mtodo como caminho no supe uma fixidez determinada por uma premeditao. Antes, est associada a uma orde-nao da variedade de idias, juzos e raciocnios sobre um determinado tema, propiciando o meio mais ajustado para o seu conhecimento. Todo esse processo de organizao seria realiza-do de forma natural e por vezes mais acertadamente, por quem no tivesse qualquer domnio de regras lgicas. Nesse sentido, mtodo refere-se a procedimentos habituais de observao e compreenso, constantemente averiguados, simultaneamente sua realizao, para atestar sua eficincia, adequao e prtica segura, ou constatar sua nulidade.

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A outra acepo moderna de mtodo - a mais comum entre ns -, a de prescrio, o determina como um planejamento responsvel por regular previamente uma seqncia de procedimentos de forma a precaver erros que possam obstar o alcance de um fim determinado. Desse sentido, derivam ainda as noes de mtodo como processo tcnico de clculo ou experimentao e sistema de classificao, atribudo especialmente s cincias biolgicas. As palavras mtodo e metodicamente, de acordo com Lalande, chegaram at ns e so mais comumente usadas no sentidodeumapreconcepodeumplanoaseguir(LALANDE,1999,p.678-679).

Em nota, Lalande justifica a proximidade entre a concepo de mtodo como caminho, como investigao e elaborao crtico-reflexiva sobre a prtica, sem premeditao e a de m-todo como um programa regulamentar, por sua caracterstica comum de enfrentamento com umasituaoprviaeconcreta(LALANDE,1999,p.679).

A parte de toda essa complexidade semntica, necessria para entendermos que mtodo nem sempre significou ou significa o que costumeiramente entendemos sobre ele, h algo inerente a esse conceito e comum a qualquer uma de suas variaes: a ideia de mtodo sempre se remeter a direes definidas e regularizadas pelo confronto com uma situao concreta, experimental e experimentvel.

Pode se apresentar como regulao prvia e alheia s interferncias das circunstncias, ou em relao a um contexto. Ambas as noes so consideradas precisas. Porm, a primeira, subsiste no mundo das ideias, comportando-se como regulao e auto-regulao, indiferente ao objeto, sujeitos ou situao; a segunda, a relao e a variao de acordo com as reaes dos integrantes da situao de aplicabilidade. Ambas precisas, nenhuma desvalida.

Em Dicionrio de Filosofia de Nicola Abbagnano, encontramos dois significados funda-mentais de mtodo, um como qualquer pesquisa ou orientao de pesquisa, sem qualquer distino entre investigao e doutrina; e como uma tcnica particular de pesquisa, um pro-cedimento de investigao organizado, repetvel e autocorrigvel, que garanta a obteno de resultados vlidos (ABBAGNANO, 2003, p. 668).

Abbagnano afirma que na antiguidade clssica, o termo mtodo era empregado em seus dois sentidos, como investigao e doutrina. Ambos encontrados em textos como Sophista e Phaedo de Plato, e em Poltica e Ethica nicomachea de Aristteles. Nota, porm, que em seu uso

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moderno e contemporneo, mantm-se a prevalncia de seu significado como tcnica parti-cular de pesquisa. Apesar dessa ressalva, Abbagnano nos faz atentar para a ordenao de pro-cedimentos como inerncia a toda e qualquer teoria ou doutrina, portanto a todo e qualquer conhecimento sistematizado, seja ele cientfico, filosfico ou e tambm, diramos, artstico.

1.2.2. A acepo moderna de mtodo

A acepo moderna de mtodo, prevalecente em nossos dias, embora modificada por seu uso ao longo do tempo, tem como marco filosfico o pensamento de Ren Descartes e, por-tanto, como marco temporal de sua conformao o sculo XVII. Perodo conhecido como o do Grande Racionalismo. Segundo Marilena Chau, esse foi o momento de inaugurao da razo ocidental moderna, como o conhecimento que se realiza no interior da experincia para colocar-se fora e acima dela, propondo-se a domin-la. O sculo XVII designado como a poca da definio de dicotomias que ainda estruturam nosso pensamento e modelo educa-cional: as dicotomias entre sujeito-objeto, conscinciacoisa, ideia-fato, verdade-aparncia, essncia-existncia, natureza-homem, vontade-intelecto, causalidade-finalidade, razo-expe-rincia, necessidade-liberdade (CHAU, 1999, p. 25).

Com o passar do tempo Ren Descartes tornou-se adjetivo, por vezes pejorativo, usado em senso comum para qualificar algo como estritamente racional, imparcial a qualquer afeto, de uma retido coercitiva e tola. Do pensador cartesiano, diz Olgria Matos, guardamos algo daquele que procede por ordem em suas reflexes (MATOS, 1999, p. 195). De suas elabora-es metodolgicas nos chegou uma noo comum de mtodo como algo abstrato, apriors-tico, alheio a uma relao concreta com as coisas do mundo sensvel (cf. M2_D4: Esttica), alheio da realidade.

De fato, a inteno de ordenar o mundo guiou o pensamento de Descartes. Esse filsofo buscou a exatido, a estabilidade, a permanncia em contrapartida inconstncia dos sentidos, a mudana caracterstica das contingncias, os erros e as iluses do mbito da imaginao. Descartes no confiava nos sentidos. Assumia, pela prpria experincia, que tudo o que havia recebido, como o mais verdadeiro e seguro, tinha sido apreendido dos sentidos ou pelos sentidos, no entanto, concluiu tambm que algumas vezes esses sentidos eram enganosos, e, portanto, seria muito prudente nunca se fiar inteiramente em quem j nos enganou uma vez (DESCARTES, 2010, p. 136).

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Mas, a prudente busca pela regulao dos sentidos, pela ordenao da experincia, tem como ponto de partida o prprio interior da experincia. A conscincia cartesiana desper-ta para o mundo na experincia da dvida, isto em meio ao labirinto. A experincia foi, portanto, seu ponto de partida, mesmo que para colocar-se fora e acima dela, propondo-se a domin-la(MATOS,1999,p.37).

Ao invs de certezas, o que moveu Descartes em sua elaborao metodolgica foi o emba-raado entre [...] dvidas e erros. Michel Foucault (1999), em seu livro As Palavras e as Coisas, afirma que Descartes, ao assumir como ponto de partida da elaborao de seu mtodo para bem conduzir a razo, o erro ou a iluso, acabou por revelar a impossibilidade desses no serem tambm pensamentos. O pensamento do mal-pensado, do no-verdadeiro, do quim-rico, do puramente imaginrio, seriam os lugares da primeira evidncia de caminhos para o conhecimento, a verdade para Descartes. Pelas palavras de Foucault, Descartes empenhava-se em trazer luz o pensamento como forma mais geral de todos esses pensamentos que so o erro ou a iluso, mesmo sob o risco de reencontr-los no final de sua tentativa, voltando explic-losedeproporentoomtodoparaevit-los(FOUCAULT,2000,p.446-447).

O mtodo para Descartes significava um caminho seguro para conduzir o sujeito outra noo recm-criada nesse mesmo sculo XVII a estabelecer a distino entre um raciocnio verdadeiro de um falso, e assim alcanar a verdade. Em seu Discurso do Mtodo, publicado em 1637,Descartesdefineoprimeiroprincpiodesuafilosofia,poreleconsideradoumaverdadeinabalvel: penso, logo existo. A assuno dessa verdade to firme e to segura, o levou a considerar que teria encontrado aquilo que era necessrio a uma proposio para ser verdadei-ra e certa. Para pensar, preciso ser, da a regra geral de que tudo aquilo que concebemos de maneira clara e distinta verdadeiro. Como resolver a dificuldade de observar bem o que concebemos distintamente? Como assegurar que aquilo que dito verdadeiro? Somente pelo uso de um caminho preciso e objetivo, pelo uso de um mtodo seguro, poderamos discer-nir o falso do verdadeiro, poderamos ordenar a desordem do mundo sensvel (DESCARTES, 2004,p.70-71).

1.2.3. Experimento, logo existoAo longo de anos de uso, a ideia de mtodo concebida por Descartes no sculo XVII, se

perdeu de sua instncia de formao a experincia, a relao com o mundo sensvel, com a prtica - adquirindo um carter abstrato relegado ao campo estritamente terico.

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Hoje muitas vezes, ao pensarmos em mtodos ou metodologias, os relacionamos com algo do campo das ideias, cuja concepo depende apenas de uma elaborao terica. Ao longo do tempo, afastamos o mtodo, assim como a metodologia e as receitas, de sua derivao da re-lao entre o pensamento e o mundo. O pensamento sobre o mundo. Aprendemos a entender os mbitos da teoria e da prtica como separados e assim a noo de mtodo como sentido, direo, caminho para o conhecimento, sendo, ao mesmo tempo, instrumento de sua prpria investigao, tem para ns pouca identificao.

Com o passar do tempo o processo de conhecimento foi se tornando cada vez mais abstra-to, cada vez mais desvinculado da experincia do mundo sensvel. O Grande Racionalismo do sculo XVII, poca das elaboraes de Descartes, foi se transformando em mmese da linha de produo industrial. A escola pblica e seu sistema nascem dessa transformao. Nascem no como instncias de produo do conhecimento, a fim de alcanar a verdade pela ordenao do mundo, mas como reprodutores de conhecimento em escala industrial, considerando a coletividade como massa1.

Essa nossa herana. Para entend-la, entender-mos como fomos tornados suas partes e resultados, e principalmente para conseguir agir sobre essa he-rana, vale sondar os princpios de nosso ofcio e de sua matria essencial: o conhecimento. Por isso falamos aqui de um filsofo que com suas ideias ali-mentou o pensamento ocidental moderno, a ponto de ser considerado o pai da filosofia ocidental. E porque falarmos em filosofia em um curso de espe-cializao em artes? A resposta pode ser encontra-da ao nos perguntarmos de onde vm nossas con-cepes de arte, educao e sobre ensino da arte? De onde vem nossa forma de se relacionar com o mundo? De onde vem nossa forma de compreender esse mundo? Absorvemos e elaboramos ideias sem atentar para o fato de que elas existiam antes mesmo de assumi-las como nossas.

1. A escola, tal como a conhecemos em seus traos gerais, surgiu no contexto da Revoluo

Industrial, iniciado o sculo XVIII, na Inglaterra.

Seu programa: produzir a criana para um mundo

repetitivo, no mais regulado pelo relgio do sol

[...] Mundo de portas fechadas, fbricas de disci-

plina coletiva, de rituais de seriao, de homoge-

neizao de comportamentos e gestos, posturas

corporais e mentais. Todos deviam aprender as

mesmas coisas, na mesma velocidade [...] toda

a hierarquia administrativa da escola seguiu o

modelo da burocracia industrial. Hoje, segue o

modelo empresarial (BENEDETTI, 2007, p.

108-112). Para Robert Kurz (2004) o sistema de educao Ocidental, usado como meio para exe-

cuo do grande projeto moderno civilizatrio,

no se configurou como presente civilizador

generoso, mas parte de um processo designado

como colonizao interna. Disciplina e ades-

tramento em funo do ajuste da vida ao tra-

balho abstrato[...] e concorrncia universal,

faziam parte deste sistema educacional escolar

dirigido pelo objetivo da interiorizao de um

perfil capitalista de requisitos.

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H uma msica muito singela sobre isso. Ela se chama Transpirao, interpretada por Ney Matogrosso e Pedro Luiz e a Parede. Ao invs de ideias, eles perguntam sobre a inspirao. De onde vem nossa inspirao? No de algo alheio s nossas experincias cotidianas. Isso bonito: atentarmos para o fato de que nossa inspirao - nossas ideias - est pelo mundo, nas coisas que por vezes no valorizamos, tambm naquelas muito sutis, naquelas quase ou impercept-veis, nas entrelinhas de um livro ou em um trabalho rduo....

A inspirao vem de onde Pergunta pra mim algum Respondo talvez de longe De avio, barco ou bonde Vem com meu bem de Belm Vem com voc nesse trem Nas entrelinhas de um livro Da morte de um ser vivo Das veias de um corao Vem de um gesto preciso Vem de um amor, vem do riso Vem por alguma razo Vem pelo sim, pelo no Vem pelo mar gaivota Vem pelos bichos da mata Vem l do cu, vem do cho Vem da medida exata Vem dentro da tua carta Vem do Azerbaijo Vem pela transpirao A inspirao vem de onde, de onde A inspirao vem de onde, de onde Vem da tristeza, alegria Do canto da cotovia Vem do luar do serto Vem de uma noite fria Vem olha s quem diria

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Vem pelo raio e trovo No beijo dessa paixo A inspirao vem de onde, de onde

De onde A inspirao vem de onde, de onde

(ESPNDOLA; ASSUMPO, 2004).

Vem tambm de um livro nunca lido, de ideias perdidas ao tempo transformadas em prtica e lugares comuns. Por isso trouxemos o texto de Descartes a essa disciplina, justificado por sua participao fundamental na constituio do pensamento moderno ocidental, ao firmar a importncia da razo pela definio de um ser que porque pensa: Penso, logo existo. Tal noo estabelecer a supremacia da razo em um processo de conhecimento, entendido como discernimento da verdade e cuja determinao caberia apenas ao sujeito. Para essa determina-o h que se ter um caminho preciso, mas no necessariamente novo, como aqueles grandes caminhos que do voltas entre montanhas e vo aos poucos se tornando planos e cmodos de tanto serem freqentados, muito melhor segui-los do que empreender um rumo mais direto, escalando rochedos e descendo at o fundo dos precipcios (DESCARTES, 2004, p. 50).

Os velhos e conhecidos caminhos, aqueles j experimentados, j revistos e reelaborados, mas no necessariamente criados por outrem. Descartes deixou claro em seu Discurso do Mtodo de 1637,queseupropsitonoeraensinaromtodoquecadaumdeveseguirparabemconduzirsua razo, mas compartilhar a maneira como conduziu a sua. Descartes no tenta persuadir o leitor, alertando-o que seu Discurso pode ser lido como uma histria, ou se quiserem, como uma fbula [...] na qual, entre alguns exemplos possveis de imitar, talvez se encontraro vrios outros que se ter razo de no seguir (DESCARTES, 2004, p. 39).

Como j dissemos, o mtodo para Descartes significava o caminho mais seguro para garan-tir a distino da verdade, por isso o elaborou como um conjunto sinttico de apenas 4 regras. Optou por esse formato para evitar escusas aos vcios, fornecidas pela multido de leis. O efeito desses preceitos seria deflagrado pela firme e constante resoluo de no deixar uma nica vez de observ-los:

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O primeiro era no aceitar jamais alguma coisa como verdadeira que eu no conhecesse evidentemente como tal: isto evitar cuidadosamente a precipitao e a preveno, e nada incluir em meus julgamentos seno o que se apresentasse de maneira to clara e distinta a meu esprito que eu no tivesse nenhuma ocasio de coloc-lo e dvida.

O segundo, dividir cada uma das dificuldades que eu examinasse em tantas parcelas possveis e que fossem necessrias para melhor resolv-las.

O terceiro, conduzir por ordem meus pensamentos, comeando pelos objetos mais simples e mais fceis de conhecer, para subir ao poucos, como por degraus, at o conhecimento dos mais compostos, e supondo mesmo uma ordem entre os que no se precedem naturalmente uns aos outros

E o ltimo, fazer em toda parte enumeraes to completas, e revises to gerais, que eu tivesse a certeza de nada omitir

(DESCARTES, 2004, p. 54-55).

Olgria Matos associou o mtodo de Descartes ao fio usado por Teseu para gui-lo pelo interior do labirinto. O labirinto, representao do acaso, da experincia, do mundo sensvel e seus movimentos imprevisveis; do lugar que aprisiona na falsa liberdade. Teseu, usando o fio dado por Ariadne, venceu a intrincada e ilusria organizao labirntica. Ao desenrolar o fio e enrol-lo em sentido inverso, esse heri da mitologia grega reencontrou seu rumo. Essa ao realizada em vai e vem constituiu o smbolo do movimento metdico. Esse ir e vir no mesmo caminho o movimento metdico - relaciona-se com a noo de ordem como cadeia, cuja existncia depende do entrelaamento dos elos que a compem. Se um deles se rompe, todo o conjunto desfeito. Assim tambm se constituiria o fio-mtodo, a menor distrao sobre a relao entre as partes que o compe, poderia, poderia provocar sua ruptura e o sujeito orientado por ele seria arrastado para a definitiva errncia (MATOS, 1999, p. 39).

Descartes constituiu-se como referncia para o pensamento ocidental, articulado e rearticu-lado pelo desdobramento de suas ideias, seja por sua afirmao ou contraposio. A elaborao de seu fio-mtodo, como forma de dominar o labirinto, gerou tambm sua contrapartida como a ideia de mtodo de Walter Benjamin (BENJAMIN, 2004) no incio do sculo XX.

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Ao contrrio de Descartes, Benjamin propunha como mtodo a prpria experincia la-birntica. Abandonar o fio de Ariadne e se deixar levar pelo acaso, pelas contingncias, pelas surpresas. O mtodo era tambm para Benjamin um caminho, mas um caminho indireto, di-gressivo. Diferente de Descartes que buscava um caminho para ordenar o mundo, Benjamin se preocupava em assumir a desordem e sua ao sobre o sujeito em relao ao mundo. Benjamin, diferente de Descartes para quem o conhecimento se centrava apenas e to somente no sujeito, compreende seu mtodo sobre a relao entre o sujeito e o mundo sensvel, o sujeito e o objeto.

Essa reunio entre sujeito e seu mundo tambm foi considerada por Paulo Freire, ao valori-zar a rigorosidade metdica e um pensamento considerado certo. Para Freire, pensar certo no significava excluir ou superar dvidas e erros, mas mant-los, a fim de preservar a infini-tude de um processo de conhecimento. O professor que pensa certo, segundo concepo de Freire, deixaria

transparecer aos educandos que uma das bonitezas de nossa maneira de estar no mundo e com o mundo, como seres histricos, a capacidade de, intervindo no mundo, conhecer o mundo. Mas, histrico como ns, o nosso conhecimento do mundo tem historicidade. Ao ser produzido, o conhecimento novo supera o outro que antes foi novo e se fez velho e se dispe a ser ultrapassado por outro amanh. Da que seja to fundamental conhecer o conhecimento existente quanto saber que estamos abertos e aptos produo do conhecimento ainda no existente. Ensinar e aprender e pesquisar lidam com esses dois momentos do ciclo gnosiolgico: o em que se ensina e se aprende o conhecimento j existente e o em que se trabalha a produo do conhecimento ainda no existente. A dodiscencia-docncia-discencia e a pesquisa, indicotomizveis, so assim prticas requeridas por estes momentos do ciclo gnosiolgico (FREIRE, 2010, p. 28).

Para conquistarmos esse modo de pensar certo, necessrio que haja rigorosidade met-dica, condio basilar para o ofcio pedaggico: Ensinar exige rigorosidade metdica. Assim d incio ao seu Pedagogia da Autonomia (FREIRE, 2010).

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Compreendemos um pouco melhor o significado dessa afirmao ao encontrarmos, em sequncia ao seu texto, a diferenciao entre a curiosidade ingnua e a curiosidade epistemo-lgica. A curiosidade ingnua reverte-se indiscutivelmente em um certo saber, mesmo sem ser submetida a um rigor metodolgico. Acontece da pura experincia (no devemos confundir essa experincia citada por Freire com o conceito de experincia exposto por Dewey. cf. M1_D1: Repertrio dos professores em formao) e caracterizada pelo senso comum, o qual deve ser respeitado no processo de sua necessria superao.

A curiosidade epistemolgica, por sua vez caracterizada pela rigorosidade metdica, diferenciando-se de um saber ingnuo, resultante de uma prtica espontnea ou quase es-pontnea, desarmada (FREIRE, 2010, p. 38). Para Freire, o movimento dinmico, dialtico, entre o fazer e o pensar sobre o fazer, em outras palavras, a reflexo crtica sobre a prtica, tanto sobre a prtica atual quanto a de outros tempos, o que torna possvel a transio da curiosidade ingnua curiosidade epistemolgica:

pensando criticamente a prtica de hoje ou de ontem que se pode melhorar a prxima prtica. O prprio discurso terico, necessrio a reflexo crtica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda com a prtica. O seu distanciamento epistemolgico da prtica enquanto objeto de sua anlise, deve dela aproxim-lo ao mximo. Quanto melhor faa esta operao, tanto mais inteligncia ganha da prtica em anlise e maior comunicabilidade exerce em torno da superao da ingenuidade pela rigorosidade. Por outro lado, quanto mais me assumo como estou sendo e percebo a ou as razes de ser de porque estou sendo assim, mais me torno capaz de mudar, de promover-me, no caso, do estado de curiosidade ingnua para o de curiosidade epistemolgica (FREIRE, 2010, p. 39).

Paulo Freire no desconsidera o saber que acumulamos, podemos dizer, informalmente, ao contrrio. Porm para aqueles que assumiram o conhecimento como ofcio, ns professo-res, torna-se necessria a superao desse saber informal. preciso trans-form-lo, por um processo submetido a uma rigorosa e constante ateno daquele que o responsvel pelo seu desenvolvimento. Voltando s acepes de mtodos, podemos identificar nessas afirmaes de Freire uma compreenso de mtodo como algo inerente a prtica. Mtodo para Freire estava prximo de seu significado mais antigo - assim como estava tambm para Descartes e Benja-

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min - entendido como investigao sobre aes e relaes implicadas na prtica, incluindo a do professor com seu ofcio, o conhecimento, - quanto mais me assumo como estou sendo e percebo a ou as razes de ser de porque estou sendo assim, mais me torno capaz de mudar, de promover-me, no caso, do estado de curiosidade ingnua para o de curiosidade epistemolgi-ca - resultando, pois, de uma operao afetiva (FREIRE, 2010).

1.3. Metforas

Abrimos esses nossos caminhos sobre as Metodologias para ensino e aprendizagem da arte, percorrendo vrias noes de mtodo, abordando um pensador, Ren Descartes, crucial para a formao de um pensamento ocidental moderno, ainda presente, apresentando um outro, Walter Benjamin, que traou uma noo de mtodo em contraposio preciso almejada pelo primeiro. Um buscava impor ordem ao mundo, por meio de um caminho preciso, consi-derando as incertezas, os erros, a instabilidade para super-las; o outro assumia a impreciso do caminho, traando o mtodo segundo os enfrentamentos entre o sujeito e as coisas do mundo, sem respeitar uma direo planejada. O plano se cria no ato da ao, est sujeito e complementado pelos desvios. Por ltimo apresentamos as ideias de Paulo Freire, o qual sem negar essa tradio da busca pelo conhecimento, criada por ditos, contraditos, rotinizaes de conceitos pelo uso em nosso discurso e prtica, definiu e props como atributos de um profes-sor a rigorosidade metdica e o pensar certo.

Todos esses trs pensadores, mesmo com suas divergncias e convergncias de ideias, bus-caram formas de promover o conhecimento das coisas do mundo. Nenhum deles excluiu de suas buscas a certeza de que o conhecimento se faz pela interao entre a teoria e a prtica, ou em outras palavras, a interao entre o mundo abstrato das ideias e o mundo concreto, incerto, impreciso, conturbado, desordenado da ao. Todos esses trs pensadores sabiam e nos ensi-naram que qualquer tipo de conhecimento se faz na relao complementar e dialtica entre teoria e prtica.

Todo esse percurso inicial, assim como toda essa disciplina, teve como epgrafes dois ex-certos. O primeiro do poeta Manoel de Barros; o segundo de um conto de Jorge Luis Borges. Ambos tratam de um ponto fundamental para pensarmos Metodologias para ensino e aprendi-zagem da arte, e que j comeamos a abordar: esse impasse entre a teoria e a prtica, o mundo ordenado da abstrao e o mundo catico da ao.

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Manoel de Barros nos diz que para apalpar as intimidades do mundo, para conhecer, portanto, intimamente esse mundo, devemos seguir alguns itens muito bem estruturados em a); b); c); d); e); f ); g) etc.etc.etc.; devemos pois, seguir uma ordem de procedimentos rigoro-samente estabelecida. No entanto, ao seguir tal receita, to precisamente traada, nos depara-mos com preceitos pouco convencionais, poderamos dizer at absurdos, nada afeitos ao que comumente esperaramos de uma prescrio. Para apalpar as intimidades do mundo para Manoel de Barros preciso saber, em seqncia alfabtica estrita que o esplendor da manh no se abre com faca; o modo como as violetas preparam o dia para morrer; o porqu que as borboletas de tarjas vermelhas tm devoo por tmulos; tambm precisamos saber se o homem que toca de tarde sua existncia num fagote, tem salvao; que um rio que flui entre 2 jacintos carrega mais ternura que um rio que flui entre 2 lagartos; como pegar na voz de um peixe; qual o lado da noite que umedece primeiro; e por fim, pela seqncia ordenadamente estabelecida precisamos ainda saber etc.etc.etc..

A tenso entre a ordenao da estrutura dessa receita, nossa expectativa e seus dizeres nos demove daquilo que j sabemos a respeito de um mtodo, de uma metodologia para chegar ao conhecimento do mundo. Por isso somos obrigados a desaprender. Desaprender metodica-mente durante 8 horas por dia. Nessa desaprendizagem, do j sabido, do conhecido, podemos, segundo o poeta, aprender os princpios, desse conhecimento ntimo com e sobre as coisas do mundo.

Manoel de Barros apreende o caos do mundo em uma ordem que se mantm na iminncia da ecloso, pois o desenho catico de suas palavras fora o rompimento dessa mesma ordem que o retm. Manoel de Barros frustra nossa expectativa sobre a ordenao das coisas do mun-do, ao preservar a sua (des)ordem. preciso rearranjar o pensamento para compreender essa nova ordem criada por Manoel de Barros. Assim como na escola, cujas aulas ainda se mantm presas em grades de horrios que no as suportam mais. Vivemos um cotidiano tensionado entre dois mundos, o abstrato da tradicional conformao escolar e o nosso e de nossos alunos, cheio de desvios, completamente avesso a uma ordem ideal. A escola, com sua forma tradi-cional de organizao no mais suporta a estrutura catica e mutante de nosso mundo. Como agir, portanto, nessa zona de tenso e conflito? Enquanto insistirmos na adequao, na ordena-o ideal, ou em esperar solues externas e alheias ao nosso cotidiano, continuaremos, talvez, a sofrer as presses de uma realidade que no mais se (en)forma nos moldes tradicionais e por isso rompe, dilacera nossos planos, projetos, nossos apriores.

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Para conseguirmos uma linha razovel ou uma correta informao, h que se percorrer lguas e lguas de insensatas cacofonias, de confuses verbais e incoerncias, disse um dia Jorge Luiz Borges. O sentido das coisas no estaria nas linhas de um texto, nem nos planeja-mentos, nem na ordenao ou nas linhas caticas das mos. Os livros, assim como as recei-tas, mtodos e metodologias, em si nada significariam. S comeariam a ganhar significado, a concretizar sentidos, quando sonhados, lidos, atualizados postos em ao - por algum. O conhecimento somente acontece em sua concretude, ou seja, ao ser disposto e apreendido em relao ao mundo e aos seres que o habitam. As respostas so abstraes geradas pelos proble-mas reais que enfrentamos. Para elabor-las recorremos ao nosso repertrio de ideias, armaze-nado pelas nossas experincias, acontecimentos feitos de teoria e prtica (agora sim recorrendo a ideia de experincia de John Dewey , cf. M1_D1: Repertrio dos professores em formao).

Buscar respostas fora do enfrentamento com nossos problemas ou sem o auxlio de outros que pensaram sobre problemas semelhantes, sem o auxlio, portanto, das ideias de outros co-legas, das ideias expostas em textos de outros autores, um caminho difcil, cansativo, talvez, infecundo, inspito, improfcuo. Nem somente o mundo das ideias, sem somente a concretude da prtica, mas o dilogo entre nossos pensamentos, alimentados pelos pensamentos de outros, e a nossa prtica, as nossas aes. Somente por esse caminho feito de ideias e ao, teoria e prtica, conseguiremos elaborar e praticar boas receitas.

Para saber mais: O PONTO de mutao = Mindwalk. Direo: Bernt Capra. Produo: Klaus Lints-

chinger e Adrianna Cohen. Intrpretes: Liv Ullman, Sam Waterston, John Heard. Ro-teiro: Bernt Capra. So Paulo: Versatil, 1990. 1 DVD (110 min), son., color.

O Ponto de Mutao uma adaptao cinematogrfica do livro de Fritjof Capra e leva para o cinema as diferentes formas de pensar de uma cientista, um poltico e um poeta. Vale as-sistir para observar os diferentes pontos de vistas sobre assuntos vrios pertinentes ao nosso tempo, em uma conversa cujo desfecho dado pela poesia.

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ARHEIM, R. Intuio e intelecto na arte. So Paulo: Martins Fontes, 2004.

Vale, especialmente a leitura do captulo A Duplicidade da Mente: a intuio e o intelecto no qual Arheim mostra a atuao da intuio e intelecto como complementares e simultneas, rompendo com a ideia comum de que so duas instncias separadas.

EFLAND, A. Imaginao na cognio: propsito da arte. In: BARBOSA, A. M. (Org.). Arte/educao contempornea: consonncias internacionais. So Paulo: Cortez, 2005.

Esse texto de Arthur Efland nos apresenta como foi criada historicamente a ciso entre imaginao e cognio, buscando mostrar como essa separao culturalmente estabeleci-da, e, portanto, pertinente a tempos e espaos especficos.

Referncias Bibliogrficas para esse Tema: ABBAGNANO, N. Dicionrio de filosofia. Traduo Ivone Castilho Benedeti. So Pau-lo: Martins Fontes, 2003.

BARROS, M. Poesia completa. So Paulo: Leya, 2010.

_____. Uma didtica da inveno. In: _____. O livro das ignoras. Rio de Janeiro: Re-cord, 2000.

BENJAMIM, W. Obras escolhidas: magia e tcnica, arte e poltica. Traduo Srgio Pau-lo Rouanet. So Paulo: Brasiliense, 1996.

___. Origem do Drama Trgico Alemo. Trad. Joo Barrento. Lisboa: Assrio & Alvim, 2004.

BENEDETTI, S. C. G. Entre a educao e o plano de pensamento de Deleuze & Guattari: uma vida... 2007. 185f. Tese (Doutorado)-Faculdade de Educao, Universidade de So Paulo, So Paulo, 2007. Disponvel em: . Acesso em: 25 abr. 2011.

_____. Origem do drama trgico alemo. Traduo Joo Barrento. Lisboa: Assrio & Al-vim, 2004.

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BORGES, J. L. Obras completas de Jorge Luis Borges. So Paulo: Globo, 1999. 4 v.

CNDIDO, A. A educao pela noite e outros ensaios. 3. ed. So Paulo: tica, 2000.

DESCARTES, R. O discurso do mtodo. Traduo Paulo Neves. Porto Alegre: L&PM, 2005.

ESPNDOLA, A.; ASSUMPO, I. Transpirao. Intrpretes: Ney Matogrosso; Pedro Lus e a Parede. In: Ney Matogrosso; Pedro Lus e a Parede. Vagabundo: ao vivo. So Paulo: Universal Music, 2004. 1 CD.

FERRAZ, M. H. C.; FUSARI, M. F. R. Metodologia do ensino da arte. 2. ed. So Pau-lo: Cortez, 2001.

FOUCAULT, M. A Arqueologia do saber. Traduo Luiz Felipe Baeta Neves. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 2000.

_____. As palavras e as coisas. Traduo Salma Tannus Muchail. 8. ed. So Paulo: Mar-tins Fontes, 1999.

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia. 41. ed. So Paulo: Paz e Terra, 2010.

KURZ, R. O efeito colateral da educao fantasma. Folha de So Paulo, So Paulo, 11 abr. 2004. Caderno Mais, p. 18.

LALANDE, A. Vocabulrio tcnico e crtico da filosofia. Traduo Ftima S Correia; Maria E. V. Aguiar; Jos Eduardo Torres; Maria Gorete de Souza. So Paulo: Martins Fon-tes, 1999.

MATOS, O. C. F. O iluminismo visionrio: Benjamin, leitor de Descartes e Kant. So Paulo: Brasiliense, 1999.

NOVAES, A. (Org.) A crise da razo. So Paulo: Companhia das Letras, 1999.

Pr-Reitora de Ps-graduaoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraAna Maria Martins da Costa Santos

Coordenadora Pedaggica

Cludio Jos de Frana e SilvaRogrio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte: Rejane Galvo Coutinho (IA/Unesp)

Filosofia: Lcio Loureno Prado (FFC/Marlia)Geografia: Raul Borges Guimares (FCT/Presidente Prudente)

Antnio Cezar Leal (FCT/Presidente Prudente) - sub-coordenador Ingls: Mariangela Braga Norte (FFC/Marlia)

Qumica: Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Tcnica - Sistema de Controle AcadmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

Secretaria/AdministraoMrcio Antnio Teixeira de Carvalho

NEaD Ncleo de Educao a Distncia(equipe Redefor)

Klaus Schlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andr Lus Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Cssio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produo, veiculao e Gesto de materialElisandra Andr Maranhe

Joo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

Marcador 1Ementa: Metodologias para ensino e aprendizagem de arteMetforas, mtodos e metodologias, metforas 1.1. Metforas 1.2. Mtodos e Metodologias1.2.1. As vrias acepes de mtodo1.2.2. A acepo moderna de mtodo1.2.3. Experimento, logo existo1.3. Metforas

Para saber mais: Referncias Bibliogrficas para esse Tema:

Boto 2: Boto 3: Boto 6: Boto 7: Boto 50: Boto 51: Boto 36: Pgina 4: OffPgina 5:

Boto 37: Pgina 4: OffPgina 5:

Boto 38: Pgina 6: OffPgina 7:

Boto 39: Pgina 6: OffPgina 7:

Boto 44: Pgina 8: OffPgina 9: Pgina 10: Pgina 11: Pgina 12: Pgina 13: Pgina 14: Pgina 15: Pgina 16: Pgina 17: Pgina 18: Pgina 19: Pgina 20: Pgina 21: Pgina 22: Pgina 23: Pgina 24: Pgina 25: Pgina 26:

Boto 45: Pgina 8: OffPgina 9: Pgina 10: Pgina 11: Pgina 12: Pgina 13: Pgina 14: Pgina 15: Pgina 16: Pgina 17: Pgina 18: Pgina 19: Pgina 20: Pgina 21: Pgina 22: Pgina 23: Pgina 24: Pgina 25: Pgina 26:

Boto 4: