REFORMAS INTERNACIONAIS DA EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO … · tribuído para uma nova fase da...

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89 Cadernos de Pesquisa, n. 118, p. 89-117, março/ 2003 REFORMAS INTERNACIONAIS DA EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO DE PROFESSORES OLGAÍSES CABRAL MA OLGAÍSES CABRAL MA OLGAÍSES CABRAL MA OLGAÍSES CABRAL MA OLGAÍSES CABRAL MAUÉS UÉS UÉS UÉS UÉS Departamento de Fundamentos da Educação da Universidade Federal do Pará [email protected] RESUMO A formação de professores está hoje no centro dos acontecimentos do mundo da educação, sus- citando aprovações e divergências e apontando para a necessidade de se fazerem reformas na área. Os motivos dessas reformas estão ligados, para alguns, aos resultados negativos do desempe- nho escolar, que não têm atendido às exigências do mundo do trabalho. Este texto analisa a reforma na formação de professores como uma tendência internacional, ligada às exigências dos organismos multilaterais, que visam atender ao processo de globalização/mundialização. A partir dessa lógica procuram-se identificar os postulados de base da reforma, o quadro conceitual, os aportes metodológicos que vêm dando suporte ao processo. O texto apresenta alguns eixos que sustentam as reformas na formação de professores, tais como: a “universitarização” profissio- nalização, a ênfase na formação prática/certificação de experiências, a formação contínua e a pedagogia das competências, analisando a importância de cada um no contexto internacional. FORMAÇÃO DE PROFESSORES – COMPETÊNCIAS – GLOBALIZAÇÃO – ORGANISMO IN- TERNACIONAL ABSTRACT INTERNATIONAL REFORMS IN EDUCATION AND TEACHER TRAINING. Teacher training is currently the center of events in the world of education, yielding approval and controversy, and pointing out the need for reforms in the area. Reasons for these reforms, for some, are linked to the negative results in student performance, which have not met the labor market’s demands. This text analyzes teacher training reform as an international trend, linked to multilateral agencies’ requirements, whose purpose is to serve the process of globalization. Based on this logic, the aim is to identify the premises of such reform, the conceptual framework and the methodological contributions which have supported the process. The text presents some axes which have sustained teacher training reforms, such as: “universitarization”/professionalization, emphasis on practical training/certification of experience, continuous training and competence-based pedagogy, analyzing the importance of each in the international context. TEACHER EDUCATION – SKILLS – GLOBALIZATION – INTERNATIONAL AGENCY Este texto foi produzido no contexto de estágio pós-doutoral, realizado na Université Laval, Quebec, e recebeu incentivo do CNPq.

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REFORMAS INTERNACIONAIS DAEDUCAO E FORMAO DE PROFESSORES

OLGASES CABRAL MAOLGASES CABRAL MAOLGASES CABRAL MAOLGASES CABRAL MAOLGASES CABRAL MAUSUSUSUSUSDepartamento de Fundamentos da Educao da Universidade Federal do Par

[email protected]

RESUMO

A formao de professores est hoje no centro dos acontecimentos do mundo da educao, sus-citando aprovaes e divergncias e apontando para a necessidade de se fazerem reformas narea. Os motivos dessas reformas esto ligados, para alguns, aos resultados negativos do desempe-nho escolar, que no tm atendido s exigncias do mundo do trabalho. Este texto analisa areforma na formao de professores como uma tendncia internacional, ligada s exigncias dosorganismos multilaterais, que visam atender ao processo de globalizao/mundializao. A partirdessa lgica procuram-se identificar os postulados de base da reforma, o quadro conceitual, osaportes metodolgicos que vm dando suporte ao processo. O texto apresenta alguns eixos quesustentam as reformas na formao de professores, tais como: a universitarizao profissio-nalizao, a nfase na formao prtica/certificao de experincias, a formao contnua e apedagogia das competncias, analisando a importncia de cada um no contexto internacional.FORMAO DE PROFESSORES COMPETNCIAS GLOBALIZAO ORGANISMO IN-TERNACIONAL

ABSTRACT

INTERNATIONAL REFORMS IN EDUCATION AND TEACHER TRAINING. Teacher training iscurrently the center of events in the world of education, yielding approval and controversy, andpointing out the need for reforms in the area. Reasons for these reforms, for some, are linked to thenegative results in student performance, which have not met the labor markets demands. Thistext analyzes teacher training reform as an international trend, linked to multilateral agenciesrequirements, whose purpose is to serve the process of globalization. Based on this logic, the aim isto identify the premises of such reform, the conceptual framework and the methodologicalcontributions which have supported the process. The text presents some axes which have sustainedteacher training reforms, such as: universitarization/professionalization, emphasis on practicaltraining/certification of experience, continuous training and competence-based pedagogy, analyzingthe importance of each in the international context.TEACHER EDUCATION SKILLS GLOBALIZATION INTERNATIONAL AGENCY

Este texto foi produzido no contexto de estgio ps-doutoral, realizado na Universit Laval,Quebec, e recebeu incentivo do CNPq.

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O mundo tem sofrido profundas mudanas em todas as esferas, sobretudo apartir dos anos 1970 do sculo XX. Essas transformaes ocorrem em diferentessetores da vida, quer seja o poltico, o econmico ou o social. Pode-se dizer, semque isso seja uma figura de retrica, que a face do mundo outra; existe hoje umacartografia diferente, uma geopoltica determinada por fatores como a globalizaoe a reestruturao do Estado. A crise do capitalismo internacional representada pelacrise do petrleo, pela alta inflacionria, pelo esgotamento do modelo fordista soalgumas das causas que fizeram entrar na cena poltica outros fatores que tm con-tribudo para uma nova fase da acumulao. A educao, como um fenmenosocial, no ficou isenta dessa revoluo na paisagem social e econmica do planetaterra. Ao contrrio, seu papel e suas funes passaram a ser questionados e a edu-cao passou a ser apontada como um dos elementos fortes dessa etapa de mu-danas.

O objetivo deste texto o de apresentar alguns resultados parciais de umapesquisa denominada As mutaes no mundo do trabalho e as polticas de forma-o do profissional da educao, financiada pelo Conselho Nacional de Desenvol-vimento Cientfico e Tecnolgico CNPq , analisando alguns aspectos dessasmudanas e respectivas influncias sobre a educao, sobretudo as que ocorremem relao s polticas de formao de professores, e buscando identificar suascausas e conseqncias. Para tanto, em primeiro lugar discutiremos a interfernciada globalizao no neoliberalismo e dos organismos internacionais na definio daspolticas educacionias no mundo, de modo a implantar o pensamento nico quevisa a uma homogeinizao capaz de permitir a formao de um trabalhador quepossa atender s exigncias do mercado. Em segundo lugar procuraremos analisara conotao que tem sido dada s reformas como instrumento de regulao socialque busca o equilbrio e a homeostasia social, servindo como conformao de umaideologia que v na competitividade e no lucro as nicas razes de existncia. Emterceiro lugar, examinaremos as principais caractersticas das reformas na formaode professores, identificando os eixos sobre os quais elas esto assentadas e o queisso pode representar na formao de cidados e cidads. Finalmente, analisaremosalgumas alternativas apresentadas como sadas para esse momento em que a edu-cao assumida como mercadoria, o papel que movimentos sociais, sindicatos,organizaes no governamentais tm desempenhado mediante a realizao deconferncias, seminrios, debates, publicaes que apontam sadas viveis para essemundo mercantilizado.

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O CENRIO DAS REFORMAS

As mudanas que ocorreram na estrutura da sociedade, principalmente noprocesso de trabalho, com a introduo de novas tecnologias e com o esgotamen-to do fordismo, que dominou o mundo por um sculo, passaram a exigir a forma-o de um outro trabalhador, mais flexvel, eficiente e polivalente. A escola quepreparou o trabalhador para um processo de trabalho assentado no paradigmaindustrial o fordismo , com a rgida separao entre a concepo do trabalho e aexecuo padronizada das tarefas, deixou de atender s demandas de uma novaetapa do capital. Essa escola passou a ser criticada e responsabilizada pelo insucessoescolar, pelo despreparo dos alunos ao trmino dos estudos, pela desvinculaodos contedos ensinados em relao s novas demandas oriundas do mundo dotrabalho assentado no paradigma informacional. Da mesma forma, os professorespassaram a sofrer profundas crticas, e a ser, de certo modo, responsabilizados poresse fracasso escolar. A formao desses profissionais passou a ser vista comomuito terica, desvinculada de uma prtica efetiva e afastada das demandas dasescolas e da sociedade. Essas anlises realizadas por alguns organismos internacio-nais, como o Banco Mundial, a Unesco, a Organizao de Cooperao e Desen-volvimento Econmico, parecem apontar para um s caminho: o sistema educacionalprecisa passar por uma reforma visando qualificar melhor as pessoas para enfren-trarem um mundo mais competitivo, mais afinado com o mercado.

O fenmeno da globalizao/mundializao significa uma nova fase dainternacionalizao do capital, representando um processo econmico que preten-de aplicar os princpios da economia liberal, isto , de mercado, ao conjunto doplaneta. Alguns autores fazem a diferena entre os dois termos, globalizao emundializao. Chesnais (1997) diz que a globalizao tem o carter de um proces-so puramente econmico, enquanto a mundializao se refere a fenmenos da so-ciedade, indo alm das motivaes econmicas. Glinas (2000) tambm faz diferen-a entre os termos, atribuindo globalizao a concentrao e o controle da infor-mao nas mos das empresas transnacionais, o que significa um totalitarismo e umaconcentrao de poder, enquanto que a mundializao seria a socializao de recur-sos para toda a humanidade. Outros autores (Comeliau,1997), Harnecker (2001)tratam os dois termos de forma idntica, isto , significando a mesma coisa, ou seja,a expanso dos mercados financeiros e o crescimento das transaes financeiras decarter especulativo, que possibilitam a centralizao e a concentrao do capital.

Neste texto utilizaremos os termos indistintamente por compreendermosque ambos representam uma intensificao de trocas de mercadorias e servios,

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dos fluxos de capitais, a desregulamentao da economia e sobretudo o aumentodo poder dos pases ricos sobre os demais, impondo suas regras e exigncias. Narealidade a globalizao, juntamente com o neoliberalismo, seu constructo ideol-gico, constitui uma forma hegemnica para a sada da crise do capitalismo, umareao terica e poltica contra o Estado intervencionista e de bem-estar (Anderson,1995), consiste em maneiras de reagir perda gradativa do regime de acumulao.Teixeira (1998) analisa o neoliberalismo como uma doutrina que, para viabilizar-se,apresenta programas de poltica econmica. Harnecker (2001) apresenta-o comoum conjunto de medidas econmicas e programas polticos. Romo (2000) afirmaque h uma teoria neoliberal exprimindo uma viso de mundo que abrange asquestes ontolgicas, epistemolgicas e ticas, e ressalta, contudo, que essa teoria alienada e alienante. Bianchetti (1996) afirma tratar-se de um modelo, isto , umaelaborao terica, um conjunto de princpios que geram um novo tipo de indiv-duo, de instituies sociais, de Estado, de mercado e de polticas oficiais. Machado(2000) afirma categoricamente que o neoliberalismo pode ser identificado comoum sistema de idias, que reinventa o liberalismo clssico, introduzindo formula-es e propostas caracterizadas pelo conservadorismo poltico.

H tambm a idia de que o neoliberalismo uma estratgia de organizaoda produo e da vida social, na medida em que o keynesianismo deixou de serinteressante para os donos do capital e que era preciso, para sair da crise, que oEstado deixasse de intervir diretamente na economia, subordinando assim todas asrelaes sociais lgica do mercado.

H uma convergncia entre os diferentes autores citados: trata-se de umaproposta hegemnica para a sada da crise do capitalismo, em razo do esgotamen-to do modelo fordista/keynesiano (Harvey, 1989), que comea a indicar que opapel do Estado Benfeitor, principalmente as funes distributivas que tinha, esta-vam em conflito com os objetivos do capitalismo, isto , com a acumulao. inerente natureza do capitalismo o fato de ele gerar suas prprias crises. Ele esta-ria marcado pelo carter cclico do processo de desenvolvimento, alternando fasesde prosperidade com outras de depresso, representadas por ciclos parciais ougerais, em que se apresentariam as crises, significando estas um colapso de repro-duo do sistema. De um lado, h o interesse de abrir mais mercados (globalizao),sendo necessrio para tanto que haja uma desregulamentao do Estado, o fim dasbarreiras administrativas ou polticas (neoliberalismo), de modo a facilitar a entradade capitais internacionais, com vistas eficcia econmica. Nessa lgica, a educaopassa a ser um poderoso instrumento para atingir esse fim.

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esse o contexto que propicia uma interveno mais direta dos organismosinternacionais nos Estados-Nao, entre outras formas, mediante a educao, como objetivo de alinh-los nova ordem econmica, poltica e social. Carnoy (1999)indica a existncia de uma relao direta entre a mundializao e as reformas naeducao e a especifica da seguinte forma: 1. o impacto sobre a organizao dotrabalho passa a exigir maior qualificao do trabalhador; 2. os governos aumentamas despesas com a educao, a fim de ter um sistema educacional bem estruturado;3. a comparao entre os diferentes pases sobre a qualidade dos sistemas educacio-nais fora os sistemas a buscarem os mesmos padres; 4. a utilizao da informtica,da educao a distncia, como forma de baratear os custos e atingir maior nmerode pessoas; 5. a internet como forma de globalizar as informaes e a educao.Toda essa relao tem como finalidade contribuir para a construo da sociedadedo saber, que baseada na informao, em recursos imateriais como os sabe-res, a informao, a comunicao e a lgica. Petrella (1999) diz que essa novasociedade indispensvel para a fase da economia que tem a informao como seuprincipal recurso. Essa sociedade, que substituiria a sociedade industrial, visa ren-tabilidade, ao lucro, competitividade, atendendo assim aos anseios da globalizao.

Os organismos internacionais, a partir dessa realidade, passaram a determi-nar as metas que os pases devem atingir, tambm em matria de educao. Assim que alguns organismos assumiram de forma velada o papel dos ministrios deeducao, sobretudo no caso dos pases em desenvolvimento. Podem-se citar al-gumas das instituies que tm estado frente das definies das polticas educacio-nais no mundo: Organizao dos Estados Americanos OEA , Banco In-teramericano de Desenvolvimento BID , Banco Mundial BM , ComunidadeEuropia CE , Organizao de Cooperao e Desenvolvimento Econmico OCDE , Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento PNUD , Pro-grama de Reformas Educacionais da Amrica Latina e Caribe Preal. Pela realizaode fruns, como o de Jomtien, em 1990, ou o de Dakar, em 2000, ou de confern-cias internacionais, como a realizada em Lisboa, em 2000, esses organismos tmfixado as metas que os pases devem alcanar. A CE, por exemplo, estabeleceu 16indicadores de qualidade a serem atingidos pelos pases pertencentes Comunida-de Europia, relativos, dentre eles, leitura, matemtica, lngua estrangeira, forma-o de professores. Esses indicadores objetivam homogeneizar o nvel de educa-o nos pases pertencentes Comunidade, tornando-os mais competitivos e ca-pazes de participarem diretamente do processo de globalizao. Da mesma formao Banco Mundial tem elaborado diferentes documentos, entre os quais destacam-

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se prioridades e estratgias para a educao (Banque Mondiale, 1995, World Bank,2002). No primeiro desses documentos o BM prope as reformas que devem serfeitas pelos pases em desenvolvimento, a fim de que a educao possa contribuirpara o crescimento econmico e a diminuio da pobreza; para tanto as polticaseducacionias devem estar assentadas no trip eqidade, qualidade e reduo dadistncia entre reforma educativa e reformas das estruturas econmicas. A OCDEpromoveu, em 2002, um frum que teve como tema Os grandes desafios: a segu-rana, a eqidade, a educao e o crescimento, em que se salientou o fato de quea educao pode contribuir para a edificao de sociedades tolerantes, democrti-cas e prsperas.

A partir desse cenrio que as polticas educacionais so desenhadas, asreformas passam a ser internacionais, tendo em vista que seus objetivos so deter-minados pelos organismos multilaterais cujos fins esto voltados para o crescimentoeconmico, e, para tanto, procuram alinhar a escola empresa, e os contedosensinados s exigncias do mercado.

AS REFORMAS EDUCACIONAIS

As reformas educacionais, a partir do final da dcada de 1980, partiram dosmesmos princpios: as mudanas econmicas impostas pela globalizao, exigindomaior eficincia e produtividade dos trabalhadores, a fim de que eles se adaptemmais facilmente s exigncias do mercado. Essas reformas apresentam um objetivopoltico bem definido, que envolve a estrutura administrativa e pedaggica da esco-la, a formao de professores, os contedos a serem ensinados, os aportes tericosa serem adotados, enfim tudo o que possa estar relacionado com o processo deensino-aprendizagem.

O sentido de reforma traz, no senso comum, a idia de progresso, de mu-dana, de avano. Para Popkewitz (1997) a reforma mais bem entendida comoparte do processo de regulao social, como elemento ativo de poder presente nascapacidades individuais. Canguilhem (apud Jeammeaud, 1993) apresenta outra com-preenso: a da regulao como ajustamento, de acordo com algumas regras ounormas e com uma pluralidade de movimentos ou atos e seus efeitos ou produ-es, cuja diversidade torna estranhos uns aos outros. Claude Bernard tenta clarifi-car um pouco essa noo dizendo ser a regulao a capacidade que tem o organis-mo de controlar e manter, dentro de certos limites, suas prprias reaes protegi-das das perturbaes exgenas. A regulao para esse autor seria o ajustamento deelementos estranhos entre si, mas que devem adaptar-se para fins especficos, o

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que permite a manuteno do equilbrio do todo, quando as partes esto em con-flito. Para tanto, exigida a existncia de normas e de uma instncia que faa comque elas sejam cumpridas, visando atingir determinados objetivos. A concepo deregulao como controle no um consenso. O prprio Popkewtiz afirma preferiro uso do conceito de regulao social em vez do conceito de controle social. Damesma forma Jean-Marie Fecteau (2002) diz que a regulao no um modo decontrole, mas um conjunto de tendncias que orienta o pensamento e a ao emligao com a opinio da mdia das pessoas.

As reformas educacionais, como uma forma de regulao social, podero tero papel de realizar no-somente um ajustamento no sistema social, de manter oequilbrio, como podem servir de controle, medida que venham de baixo paracima, como o caso em alguns pases. Isto , so os organismos governamentaisque decidem a direo que devem tomar as reformas, a partir das relaes que seestabelecem no contexto mundial, quer seja no aspecto poltico, econmico ousocial.

Carnoy (1999) diz que as mudanas econmicas mundiais esto exigindo trstipos de reformas na educao, as quais ele chama de reformas com base nacompetitividade, nas exigncias financeiras, na eqidade. Os argumentos apresenta-dos por esse autor so que a produtividade econmica depende de mo-de-obraformada para atender s exigncias mundiais; que a privatizao pode ser uma sadapara atingir tais objetivos e que o problema da educao est mais vinculado gestoracional dos recursos do que quantidade de recursos destinada ao setor pelosgovernos. Para que a educao seja competitiva, continua o autor, preciso investirpesadamente na educao bsica e na formao de professores. O Banco Mundialaponta na mesma direo, afirmando que a educao tem de ser produtiva e que preciso gerenciar melhor a escola, os contedos e a formao de professores, suge-rindo em relao ao ltimo item uma formao mais curta e fora das universidades.

As reformas educacionais, como uma poltica pblica, passam a ser compre-endidas como instrumento usado pelo Estado para manter as bases de funciona-mento do sistema de acumulao, o que refora a tese de regulao social comocontrole, mas tambm aponta na direo de ajuste estrutural exigido pelos organis-mos multilaterais aos pases com dvidas externas, como forma de garantir o paga-mento delas. Para o Banco Mundial o ajustamento estrutural um processo din-mico que redistribui os recursos na economia de modo a favorercer o seu cresci-mento. Chossudovsky (1989) explica o programa de ajustamento estrutural a partirdo que ele chama Plano Marshal para os pases ricos, exemplificando com essaexpresso que a dvida contrada pelos pases em desenvolvimento tem feito a ri-

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queza dos pases desenvolvidos. Isso porque ela, apesar de estar sendo paga, semultiplica cada vez mais, em um crculo vicioso, que obriga, para o pagamento, quenovas dvidas sejam contradas, colocando os pases numa dependncia total emrelao aos credores, que passam a exigir medidas draconianas para a obtenodos recursos exigidos.

Em 1989, os organismos financeiros internacionais organizaram uma reu-nio para discutir a dvida externa dos pases em desenvolvimento, buscando for-mas que garantissem o seu pagamento. Nessa reunio, foram elaboradas algumasmedidas que passaram a orientar as polticas econmicas dos pases endividados,um verdadeiro dcalogo que ficou conhecido como o Consenso de Washington1.O ajuste estrutural, na prtica, representa os cortes de salrios dos funcionriospblicos, demisses, flexibilizao do mercado, corte nas contribuies sociais, re-forma do Estado, incluindo a a reforma na educao. Chossudovsky (1989) divideo ajustamento estrutural em duas fases, a primeira chamada estabilizao econmi-ca a curto prazo, que implica a desvalorizao da moeda do pas, a dolarizao dospreos, o controle do efetivo monetrio e a desindexao dos salrios. A segundaetapa ele chama de reformas estruturais, que vo desde a liberalizao do comr-cio, passando pela privatizao das empresas do Estado, a reforma fiscal, a privatizaodas terras, entre outras medidas. Alguns dos resultados desse ajuste estrutural apre-sentam-se no setor social, principalmente na sade e na educao, tendo em vistaa diminuio de recursos para as reas. Eric Toussaint (2002) diz que o ajuste estru-tural um pouco como apertar a cintura colocando o cinto dois ou trs pontos amenos. Nos pases do Grupo dos 7 G7 o mesmo discurso aparece: precisoequilibrar as finanas, depurar os gastos, cortar as gorduras, fazer uma espcie deterapia econmica, o que implica adoo das medidas citadas, cujos resultados socompresso social, diminuio de recursos para as reas sociais, sendo as maisatingidas a educao e a sade. As reformas educacionais sero feitas dentro desseenfoque de regulao social e ajuste estrutural, tendo em vista que a educaocomo poltica pblica estaria, segundo a concepo neoliberal, desviando recur-sos, desequilibrando o oramento, provocando dficits pblicos, que geram infla-o e desemprego, criando a crise. Assim, a partir desse raciocnio o Estado no

1 Os dez pontos so: 1. a estabilizao oramentria; 2. o enxugamento das despesas pblicas;3. a reforma fiscal; 4. a liberalizao financeira; 5. a adoo de uma taxa de juros nica ecompetitiva; 6. a liberalizao do mercado; 7. a eliminao das barreiras fiscais; 8. a privatizaodas empresas pblicas; 9. a desregulamentao do mercado; 10. a garantia dos direitos depropriedade.

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deve desviar seus recursos para as polticas sociais, tendo em vista o desequilbrioque isso gera. Logo, como uma sociedade no pode se desenvolver sem cincia etecnologia, sem educao, cabe iniciativa privada fornecer tais servios.

Nico Hirtt (1999) chama a ateno, numa conferncia realizada na Bolsa deTrabalho em Paris, para as semelhanas entre as reformas educacionais que se efe-tuam na Europa e bem enftico quando afirma: Essa poltica educacional comum,que no diz seu nome, pode se resumir em alguns pontos, e enumera seis: adesregulamentao das estruturas de ensino, o aligeiramento dos programas deensino, a relao muito estreita entre o mundo empresarial e o mundo educacio-nal, a introduo em massa das novas tecnologias de informao, a diminuio dasdespesas com a educao e a justificativa de que todas essas medidas seriam paralutar contra o fracasso escolar e pelo aumento do emprego.

Reforando a tese de Carnoy (1999) de que as reformas tm o carter deestimular a competitividade, de colocar os aspectos financeiros como determinantesdas escolhas de concepes de conhecimento, diversos autores (Petrella, 1999;Weissheimer, 2002; Hirtt, 2001a) chamam a ateno para o processo demercantilizao da educao, destacando que o mercado que determina o que aeducao deve fazer, desde os aspectos conceituais at as concepes metodolgicase pedaggicas, incluindo a formao de professores. Para esses e outros autores aeducao estaria contaminada pelos discursos da eficcia, do lucro e dacompetitividade. Esses aspectos da educao como mercadoria so reforados nosdiscursos oficiais com os argumentos da necessidade de adaptar a educao smudanas que a sociedade do conhecimento exige por parte da escola. A TableRonde des Industriels Europens [Mesa-Redonda dos Industriais Europeus], em2000, manifesta sua insatisfao em relao educao, pois segundo esse organis-mo a educao no tem atendido s demandas da economia e, por isso, precisoaproximar a escola da empresa. Para tanto o patronato deve definir os contedos aserem ensinados e tambm as estruturas de ensino, aumentando a autonomia dasescolas, o que contribui para a maior concorrncia entre elas.

A Comisso Europia, no mesmo esprito de mercantilizao da educao,chega a propor o fim da escola; por meio de um grupo de reflexo, constitudo parapensar o futuro da educao, apresenta, dentre outras recomendaes:

...numerosos so aqueles, hoje, que pensam que o tempo da educao fora daescola chegou e que a liberao do processo educativo possibilitar um contrle porparte daqueles que possam oferecer a educao de maneira mais inovadora do quea estrutura tradicional existente. (Hirtt, 2000, p.62)

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Ser a educao ofertada pela internet e por outros meios informatizados,abrindo assim esse colossal mercado iniciavita privada. Existe hoje no mundocerca de um bilho de pessoas envolvidas em algum processo de aprendizagem, 50milhes de professores, centenas de milhares de estabelecimentos escolares. Asdespesas com a educao representam mais de um bilho de dlares2. Realmente,trata-se de um imenso mercado a ser conquistado e alvo de interesse da iniciativaprivada, em razo da possibilidade dos lucros que possa trazer.

OS EIXOS DAS REFORMAS

As diferentes conferncias mundiais de educao realizadas, como as deJomtien (1990) e de Dacar (2000), alm dos documentos expedidos pelos organis-mos internacionais como o Banco Mundial, a Unesco e a OCDE, apontam paraque a prioridade da educao seja a educao bsica3, compreendida como o ensi-no primrio e o secundrio, o que representa, no mnimo, oito anos de escolarizao.A educao de base definida no documento Estratgias do setor educacional, 1999,como sendo as habilidades, as competncias de base, para que os clientes ter-mo adotado pelo documento adquiram as competncias gerais relativas lingua-gem, cincias, matemtica, comunicao, assim como apresentem a performanceexigida pelo mercado mundial. A partir da a concentrao de esforos de diferentesgovernos ocorreu nessa direo. Os programas, os currculos foram reestruturados,sistemas de avaliao foram criados com base nos indicadores de qualidade estabe-lecidos pelos organismos internacionais, a fim de garantir e assegurar o alcance dosobjetivos desse nvel de ensino. A OCDE concebeu e colocou em ao um progra-ma para acompanhamento dos alunos, denominado Programme International pourle Suivi des Acquis des lves Pisa [Programa Internacional de Acompanhamentodas Aquisies dos Alunos], cujo objetivo avaliar em que medida os jovens de 15anos, que esto chegando ao fim da escolaridade obrigatria, esto preparados paraenfrentar os desafios da sociedade do conhecimento, bem como verificar o nveldas competncias que foram adquiridas. Esse mais um dos mecanismos de con-trole visando disseminao do pensamento nico, cujo objetivo sempre omercado globalizado.

2 Fonte http://www.svmep.ch/enjeux1.html, acessado em: 27.6.2002.

3 No Brasil, com a Lei n. 9.394/96, a educao bsica inclui a educao infantil, o ensino funda-mental e o mdio.

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A reforma na formao de professores veio na seqncia da prioridade deuniversalizao do ensino fundamental; afinal para fazer face a esse contingente dealunos preciso que se forme o pessoal necessrio e adequado a tal empreitada.Alguns ministrios de educao consideram a formao dos professores a segundaetapa das reformas educacionais. As reformas na formao de professores tmbuscado traduzir uma preocupao bsica a respeito do papel que esse profissionaldeve desempenhar no mundo de hoje. Considerando-se os aspectos j abordadosao longo do texto as reformas na educao como meio ou forma de regulaosocial e de ajuste estrutural, o poder dos organismo multilaterais junto aos governosna determinao das polticas, a atuao do mercado como definidor das necessi-dades e dos conhecimentos a serem adquiridos, o papel da educao como motordo crescimento econmico , pode-se observar que o movimento internacionaltem indicado atualmente alguns elementos bsicos que devem compor a arquitetu-ra da formao de professores. Os elementos constitutivos desse novo receiturioda formao so a universitarizao/profissionalizao, a nfase na formao pr-tica/validao das experincias, a formao continuada, a educao a distncia e apedagogia das competncias. As reformas em curso tm, de modo geral, contem-plado tais aspectos. Destaque-se, porm, que existe uma relao entre as escolhastericas de abordagem dessas categorias e o grau de autonomia que assume oEstado-Nao que vai realizar a reforma, ou seja, no so deixados de lado osaspectos polticos e econmicos que influenciam diretamente as escolhas e deci-ses no mundo da educao.

A universitarizao/a profissionalizao

As reformas educacionais, cada vez mais, ganham um carter internacional eisso pode ser bem compreendido quando as entendemos como uma forma deglobalizar tambm esse setor. Desse modo a formao de professores tem sidouma tnica em todos os pases, como uma maneira de evidenciar a importncia dodesempenho educacional para o crescimento econmico, o que em tese dependeda atuao dos profissionais da educao. A universitarizao seria uma forma dequalificar melhor essa formao e encaminh-la para a profissionalizao; represen-taria um aprofundamento dos conhecimentos e um maior domnio no exerccio dafuno. A universitarizao representa um movimento de absoro das institui-es de formao de professores pelas estruturas habituais das universidades, de-partamentos, faculdades ou outros (Bourdoncle,1994). Contudo, nem sempre aformao que se d no terceiro grau tem contribudo para esses objetivos. Os

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interesses de cada pas, mesmo sua situao de dependncia econmica, tm porvezes feito esse processo de elevao do nvel de escolaridade ocorrer de maneiramuito duvidosa. Alguns pases, ao tentarem seguir as orientaes dos organismosinternacionais, passando a formao para o nvel superior, fizeram-no de formaaligeirada. A universitarizao ocorre fora da universidade, o que, primeira vista,parece um contra-senso. Isso quer dizer que a formao oferecida em nvel ps-secundrio, ou seja, superior, mas sem obedecer necessariamente aos princpiosbsicos que caracterizam a instituio universitria desde o seu surgimento, pelomenos como universidade moderna, no incio do sculo XIX, ou seja, o ensinoligado pesquisa, autonomia em relao a ensino e pesquisa e socializao dosconhecimentos. A pesquisa estaria pois, implicitamente, vinculada formao deprofessores na universidade. Alis, para Bourdoncle, a universitarizao da forma-o implica que os saberes ensinados esto estreitamente ligados pesquisa, e oautor enfatiza que no se trata simplesmente de transmitir um saber, mas de cri-lo.Uma outra caracterstica dessa universitarizao aligeirada a tentativa de fazeruma espcie de tbula rasa do passado, ignorando as experincias bem-sucedidasocorridas e querendo partir do zero, como se nada existisse como formao emnvel superior nas universidades.

A universitarizao parece vir tambm na direo de uma profissio-nalizao do mtier de professor. A abordagem funcionalista da profisso afirmaque as profisses formam comunidades unidas em torno dos mesmos valores e damesma tica de servio, alm de terem um status profissional baseado em umsaber cientfico e no somente prtico (Dubar, 1996). Esse saber, que se podedizer especializado, caracteriza os conhecimentos necessrios para o exerccio deuma profisso, deve em geral ser transmitido pelas universidades e resultar em umdiploma. Para Carbonneau (1993), uma das caractersticas da profissionalizao exatamente o fato de que o futuro profissional recebe uma longa formao univer-sitria, de natureza cientfica. Assim, podem-se identificar pelo menos duas carac-tersticas da profissionalizao: o fato de haver um saber cientfico e o fato de essesaber ser desenvolvido pela universidade como instituio de ensino e pesquisa, oque cria uma forte ligao entre profisso e universidade, tendo em vista que asuniversidades so as principais intituties de produo do saber (Bourdoncle,1993). Lang (1996) enfatiza que a profissionalizao no campo da formao deprofessores ambgua e justifica essa ambigidade afirmando que o termo indicaora uma modalidade de formao particular, como formar o mais prximo poss-vel da realidade prtica, du terrain, ora um modelo de profissionalidade especfica,mais tcnica.

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Formao prtica /validao das experincias

A nfase na formao prtica outro componente da reforma internacionalda formao do magistrio. A justificativa apresentada para tanto que, semelhan-a de outras profisses, o futuro professor precisa entrar em contato real com omeio em que dever atuar, devendo desde o incio da formao assumir tarefasespecficas e ter um acompanhamento direto para a realizao delas. Outro argu-mento utilizado que os cursos de formao tm sido muito tericos, desvinculadosdo meio escolar e, para confirmar esse raciocnio, so apresentados alguns exem-plos provenientes dos resultados das avaliaes realizadas com os alunos, como ocaso do Pisa. Essas avaliaes ocorrem no final do curso, o que significa que somen-te o produto avaliado e no o processo. Com base nessas crticas, o tipo de saberque passa a ser valorizado o saber prtico, o saber que pode resolver os proble-mas do cotidiano. Donald Schn (1993) tem sido um dos grandes inspiradoresdesse modelo de formao com nfase na prtica, com sua teoria do praticienrflxif, segundo a qual a reflexo no curso da ao e sobre a ao o ponto departida para uma formao com qualidade. Ives Couturier (2002), analisando anoo de reflexividade, afirma que, para o senso comum, esta concebida comorelao consigo mesma, fundada sobre a introspeco, e a explicitao existencialdo implcito na ao do agente. Para esse autor a forma considerada como aexperincia, a expresso do saber tcito. Eraly, apud Couturier, apresenta uma clas-sificao em relao ao humana, indicando que esta se realiza em trs planos: oplano irrefletido, que o autor considera como tcito, seria a relao prtica com omundo; o plano refletido, que ele diz ser o discursivo, o que mobiliza o pensamen-to sobre um objeto; e o plano reflexivo, no qual o objeto da reflexo a experin-cia de si prprio. A partir dessa classificao Couturier diz que a centralizao doagir somente sobre o plano reflexivo constitui uma reduo da ao dimensosubjetiva, experiencial apenas, o que significa que as outras dimenses so reduzi-das ou, mesmo, desaparecem.

Essa questo da prtica como reflexividade remete a um outro aspecto ex-tremamente vinculado, que trata dos saberes tericos e saberes prticos ou saberesde ao, que tm sido alvo de discusses nesses tempos de reforma internacional.Para Galatanu (1996), os saberes de ao constituem os saberes profissionais, mo-bilizados nas atividades de explicao, reformulao e redefinio dos saberes ensi-nados. Barbier (1996) completa a argumentao, afirmando serem esses saberestradicionalmente assimilados s competncias prticas, aos saberes ocultos, de ex-perincia, informais, s habilidadades adquiridas na ao, para a ao. Este autor

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constata que existem pelo menos quatro posies em relao aos saberes tericose aos saberes de ao: a primeira delas consiste na repetio da bipolarizao exis-tente entre teoria e prtica, com um peso maior para a teoria entendida comopertencente ordem universal, abstrata, dedutiva, enquanto a prtica seria o quepertence ao efmero, passageiro, local, incerto, estando o saber de ao prximo aesta ltima. A segunda posio representada pelas tentativas de diminuir o peso eo valor da representao acerca dos saberes tericos, sem, contudo, igualar-se terceira posio. Esta inverte o argumento da primeira, defendendo a produo dosaber a partir da prtica e pela prtica, o que representa uma espcie de estabeleci-mento de uma relao de causa e efeito entre a ao e a produo de saberes. Aquarta posio, apresentada por Barbier, a existncia de vrias tcnicas, que pro-curam fazer a transposio, a mobilizao entre ao e saber, que esto hoje emvoga, como a transposio didtica e as competncias entendidas como mobilizaode recursos, para citar apenas duas. A formao do praticien rflxif estaria maisdiretamente vinculada aos saberes de ao como uma abordagem mais prtica des-se processo, sendo operacionalizada pelo ensino em alternncia, por exemplo.

A questo que se coloca relativa importncia e ao papel dos saberestericos na formao. At que ponto os currculos dos cursos estaro dando im-portncia formao de um profissional crtico, analtico, capaz de compreender osprocessos sociais e fazer as relaes necessrias entre estes e a sala de aula, aprofisso, os contedos ensinados? Enfim, que importncia atribuem apreensoda totalidade, no sentido da dialtica, que permitir a formao de sujeitos capazesde construir, como diz Gramsci (1983), sua concepo de mundo e no apenasaceitar uma concepo imposta? O simples aumento da carga horria para a cha-mada parte prtica no garantia de melhor qualidade na formao, nem de queesta esteja mais prxima das necessidades das escolas. preciso considerar os as-pectos em que essa prtica se d, como os saberes tericos e de ao so conside-rados no currculo, no apenas em relao a uma carga horria destinada, sobretu-do em relao s funes que eles devem desempenhar para a formao do futuroprofessor.

O aproveitamento de experincias com a validao correspondente consti-tui-se em outro elemento das reformas na formao de professores, estando inti-mamente ligado aos demais. A importncia de considerar as experincias existentes relevante, isso no se questiona no processo de aprendizagem. O que precisoanalisar como esse outro paradigma das reformas est sendo includo no proces-so. Em alguns casos, esse aproveitamento tem servido para enriquecer a formaoe valorizar as experincias existentes, mas, em outros, tem contribudo para dimi-

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nuir a durao dos cursos e aligeirar a formao, aumentando assim o nmero dediplomados, num jogo de estatstica que serve para impressionar os organismosfinanciadores, mas que no representa melhoria na qualidade da formao e conse-qentemente do processo de aprendizagem. A Frana oferece um exemplo con-creto, chamado validao das aquisies profissionais VAP , que possui normasgerais determinadas por legislao4 de 1992, a qual exige uma apresentao pes-soal, a comprovao da trajetria da formao inicial e da formao contnua, exem-plos de realizaes pessoais, livros, artigos, uma descrio das funes exercidas, asatividades extra-profissionais, lazer, esporte, famlia, sendo tudo isso submetido aum jri, a um grupo de profissionais da rea que dever analisar o dossi e decidirpela validao ou no das aquisies feitas. Esclarea-se que, nesse pas, tal valida-o realizada no segundo ano do curso que o candidato est fazendo no InstitutoUniversitrio de Formao de Professores IUFM , no qual esto inscritos osprofessores estagirios das escolas de ensino fundamental e mdio e os conselhei-ros de educao, lembrando que eles j cursaram obrigatoriamente trs anos nauniversidade e um ano no IUFM. Esse destaque dado pelo fato de que em algunspases o carter de aproveitamento da experincia, que vlido e importante, tem-se prestado a um aligeiramento na formao, aumentando assim o nmero deprofessores com o diploma de nvel superior, diminuindo o custo da formao ealterando as estatsticas, exibidas como se o pas tivesse priorizado a educao e aformao de professores.

A formao contnua

De maneira geral a formao contnua constitui parte integrante de todas asreformas que se esto processando, tendo sempre como objetivo maior a buscade um alinhamento dos professores que j esto em exerccio com as ltimas deci-ses em matria de poltica educacional. O fato em si, sem uma anlise maisaprofundada, no parece trazer nenhum problema no tocante aos fins da educa-o. Contudo, quando ele examinado de forma poltica e contextualizada, pode-se observar que, como os demais elementos que compem o kit refoma, este tem,sociologicamente falando, o carter de acomodao e assimilao dos professoresa uma sociedade que est cada vez mais voltada para as exigncias do mercado eem que a educao est sendo questionada por se parecer a uma mercadoria,

4 Lei de julho de 1992; Decreto 93-489, de 26/3/1993; Resoluo de 19/5/1995.

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enquanto a escola se identifica com uma empresa. Em uma obra de 1998, denomi-nada Lcole la page: formation continue et perfectionnement professionnel desenseignants [A escola atualizada: formao contnua e aperfeioamento profissionaldos docentes], desenvolvida pelo Centre pour la Recherche et lInnovation danslEnseignement Ceri , pertencente OCDE, a questo est posta como umaexigncia de modernizao dos sistemas de ensino. O trabalho diferencia duas ex-presses que so freqentemente utilizadas em todas as publicaes sobre o as-sunto, quais sejam, o aperfeioamento profissional e a formao contnua. Quanto primeira, a definio apresentada refere-se a todas as atividades que permitem odesenvolvimento das competncias, os conhecimentos, a expertise e outras carac-tersticas necessrias para o processo de ensino. Esses aspectos envolvem a refle-xo, o trabalho pessoal e os cursos formais. J a propsito do segundo termo,formao contnua, o trabalho refere-se mais particularmente s aes de forma-o das quais participam os professores que esto em exerccio. A partir dessacompreenso, a OCDE identifica pelo menos seis objetivos que esse tipo de for-mao pode ter, como a atualizao dos conhecimentos aps a formao inicial, aadaptao das competncias ao novo contexto, a possibilidade de aplicao dasmudanas determinadas pela administrao central, a possibilidade de aplicar asnovas estratgias concernentes prtica de ensino, a troca de informaes e decompetncias entre os professores, a ajuda aos professores mais fracos a fim deque melhorem sua eficincia. Mais uma vez a questo da aceitao tcita das polti-cas governamentais evidenciada, isto , o objetivo maior da formao contnua a adaptao s exigncias postas pelos governos, que apresentam a necessidade deuma atualizao a esse novo mundo globalizado.

Existe uma corrente de gestores da educao que pensa a formao cont-nua tambm como uma forma de reparar as lacunas e as deficincias da formaoinicial, colocando em xeque o valor desta e as instituies que as ministram. Dessamaneira a formao contnua viria contribuir, em certa medida, para o aligeiramentoda formao inicial, tendo em vista que ela no atenderia s demandas sociais. Almdisso, como as transformaes em todos os domnios do conhecimento tm-sedado de forma acelerada, caberia formao inicial apenas dar noes mais gerais,deixando todo o resto a cargo da formao contnua. Esse parece ser um aspectoque tem sido de fato colocado em destaque pelas polticas dos pases em desenvol-vimento, abrindo um enorme mercado de formao, o que enseja tanto nas uni-versidades pblicas quanto nas demais instituies de ensino, e mesmo nas empre-sas, a possibilidade de aumentar a receita contbil.

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As competncias como eixo nuclearizador

Apesar das diferenas entre as reformas na formao de professores, existeuma certa unanimidade em relao ao aporte pedaggico que lhe deve servir deparadigma. Trata-se do aporte por competncias, tambm chamado modelo decompetncias ou pedagogia das competncias. Apesar de no ser uma abordagemnova, tendo em vista que na dcada de 1970 j era utilizado nos Estados Unidos,esse aporte tem-se revestido de certa modernidade, e classifica como ultrapassa-do tudo o que no cabe nesse entendimento acerca da formao. O modelo decompetncias na formao do professor parecer vir na esteira da utilizao feitadessa mesma noo no mundo da indstria e das empresas.

O ano de 1989 pode servir de referncia para o impulso do que alguns tmdenominado a obsesso das competncias5 nas polticas educacionais. Naqueleano a Mesa-Redonda dos Industriais Europeus, organizao fundada em 1983 eformada por cerca de 47 indstrias europias importantes6, apresenta um relatriodenominado ERT, Education et comptence en Europe, tude de la Table RondeEuropene, sur lducation et la formation en Europe [Educao e competncia naEuropa, estudo da Mesa-Redonda Europia sobre a educao e a formao naEuropa]. Esse estudo, analisado por Nico Hirtt (2000), apresenta a inquietao dosindustriais com o que eles consideram um afastamento entre a formao e as ne-cessidades das indstrias. Eles acrescentam que as indstrias tm apenas uma dbilinfluncia sobre os programas adotados nas escolas e que preciso empreenderuma poltica que associe as indstrias s discusses concernentes educao. Asreivindicaes e recomendaes no param por a. A indicao de que a escoladeve ser flexvel est presente, assim como a recomendao de que a formaodeve ser polivalente e a escola deve ser desregulamentada. Isso tudo porque, se-gundo esses industriais, os sistemas de ensino e os programas precisam de umarenovao acelerada. Alguns anos depois, em 1995, a ERT continua o seu trabalhode assumir a responsabilidade pela educao, dizendo que a responsabilidade daformao deve ser definitivamente assumida pela indstria, tendo em vista que omundo da educao parece no perceber bem o perfil dos colaboradores necess-rios indstria. Mas a ousadia dos industriais vai mais longe, quando estes afirmamque a educao deve ser considerada como um servio prestado ao mundo eco-

5 Nome do livro de Grald Boutin e Loise Julien (2000).

6 Entre essas indstrias destacam-se Renault, Fiat, Shell, Siemens, Pirelli, Philips, Nokia, Nestl,Lufthansa, Ericsson, Danone, Bayer.

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nmico (Slys, Hirtt, 1998). Com isso, de uma forma concreta, declara-se avinculao estreita entre a educao e o mercado, transformando assim a educaoem mercadoria. Essa mercantilizao, no dizer de Garcia (2002), implica uma adequa-o do ensino compreendido como contedos, estruturas e formas s exign-cia do mercado.

Essa exigncia do mundo das indstrias ir modificar a educao profissional,assim como a educao primria, a secundria e a formao de professores. Todosesses nveis e modalidades de ensino vo trabalhar a partir da pedagogia das com-petncias. Neste artigo o objetivo o de analisar o sentido desse aporte pedaggi-co como um dos elementos constitutivos da reforma internacional na formao dosprofessores, juntamente com os demais elementos indicados anteriormente.

A utilizao da pedagogia das competncias na formao de professores estligada s exigncias das indstrias e dos organismos multilaterias. Por exemplo, aOCDE, em 2001, durante uma reunio do comit de educao, enfatizou a neces-sidade de novas competncias para a inovao e para o crescimento. A mesmaorganizao, em 2002, no Simpsio internacional sobre a definio e seleo decompetncias-chave, ocorrido em Genebra, instituiu um programa internacionalde pesquisa denominado Definio e seleo de competncias Deseco , cujafinalidade a definio das competncias bsicas que devero servir como indica-dores para todas as pessoas. Para tanto o programa dever desenvolver uma estru-tura terica que permita a identificao das competncias apropriadas para fazerface s mudanas, incluindo a as novas tecnologias. Outro objetivo do programa o estabelecimento de indicadores internacionalmente comparveis, que possamvalidar o alcance das competncias-chave estabelecidas.

A definio de competncia tem trazido, para alguns autores (Lasnier, 2000,Paquay et al., 2001, Perrenoud, 2002, Le Boterf, 2000 dentre outros), elementosde convergncia, tais como: ocorre em uma situao real, intencional, manifesta-se de forma eficaz , um projeto, tem uma finalidade. A partir desses elementosbsicos pode-se concluir que a formao de professores, seguindo esse aportepedaggico, dever se processar a partir dessas caractersticas, o que implica quedeve estar voltada para a predominncia do saber fazer. Nada contra, desde queesse saber fazer no represente uma diminuio dos conhecimentos (Perrenoud,2002), ou uma nfase no saber fazer procedimental (Le Boterf, 2000) e que noseja apenas uma formao utilitarista (Ramos, 2001).

Mas o que existe de incorreto em querer que a formao de professorestenha como eixo nucleador a pedagogia das competncias? Quais os argumentosque se pode sustentar para se contrapor a essa obsesso das competncias?

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Em um artigo da revista Lcole Democratique (Hirtt, 2001a), a questo construda de forma muito interessante: Temos necessidade de trabalhadores com-petentes ou de cidados crticos? E essa questo vem no sentido de que uma dasrazes para a adoo desse aporte que a escola se preocupa excessivamentecom os conhecimentos, portanto, a introduo da noo de competncia constituiuma mudana no sentido ideolgico, ou seja, no de diminuir os conhecimentosque hoje so apresentados pela escola, tendo em vista que estes no so teis paraa insero no mercado de trabalho. Ento, preciso que a escola prepare de outraforma os futuros trabalhadores para a sociedade dita do saber. E essa forma exa-tamente a da pedagogia das competncias, considerando que esta permite umaformao flexvel, polivalente, que atende s exigncias imediatas, ou seja, a escolase ocupar de ensinar aquilo que ter utilidade garantida. E a est a grande mudan-a, isto , os conhecimentos deixam de ser importantes para se dar maior destaqueao savoir-xecuter [saber executar], tendo em vista a compreenso de que as com-petncias so sempre consideradas em situao, em ao.

A formao do professor a partir do modelo de competncias pode contri-buir para a subordinao da educao ao racionalismo utilitarista do mercado e, nodizer de Ramos (2001), [...] a pedagogia das competncias [...] assume e se limitaao senso comum como lgica orientadora das aes humanas, [...] reduz todosentido do conhecimento ao pragmatismo. Da mesma forma Nico Hirtt chama aateno para as recomendaes feitas pelo Conselho Europeu em 1997, quaissejam, de que a escola deve dar prioridade ao desenvolvimento das competnciasprofissionais e sociais para uma melhor adaptao dos trabalhadores s evoluesdo mercado de trabalho, sobre o que o autor ressalta:

Em um quadro de rpida mudana do ambiente tecnolgico e industrial o papeltradicional do ensino a transmisso de conhecimentos vista como obsoleta. Oque conta doravante dotar o futuro trabalhador do savoir-faire e do savoir-tre quefavoream a flexibilidade social e a adaptabilidade profissional. Adeus Balzac ou ateoria do campo eltrico, o que conta poder ler o manual de utilizao de umaparelho e poder utiliz-lo. (2000, p.2)

Nessa perspectiva a pedagogia das competncias serve para alinhar a escolaao mercado de uma forma direta.

CONSIDERAES FINAIS, OU A POSSIBILIDADE DE MUDANA

As reformas internacionais da atualidade tm a mesma configurao, umavez que esto baseadas nos mesmos princpios: os de tornar a educao um dos

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motores do crescimento econmico, precisando aproxim-la do modelo empre-sarial, a fim de que ela corresponda lgica do mercado. Os indicadores dessasreformas, universitarizao/profissionalizao, nfase na formao prtica, apro-veitamento das experincias, formao contnua e a pedagogia das competnciasapontam para uma formao vinculada lgica de mercado, voltada para uma so-ciedade globalizada, na qual o capital, o dinheiro, mais importante do que o ho-mem como sujeito e ser crtico, produtor de conhecimento e construtor de suahistria. As reformas trazem hoje essa marca, que precisa ser considerada quandoda definio da concepo de formao de professor que se vai adotar.

O papel do professor fundamental e a sua formao assume uma funocentral nas polticas educacionais. Esse profissional precisa ser preparado para con-tribuir com o ajuste da educao s exigncias do capital, devendo para tanto serformado de acordo com o pensamento nico desse receiturio ideolgico. Destaforma, o mundo econmico que vai determinar os contedos de ensino e atri-buir sentido prtico aos saberes escolares (Ramos, 2001). As reformas internacionais,dentro dessa lgica, podem servir para, na realidade, submeter a formao racio-nalidade que facilita uma dominao, com a quebra de toda a resistncia, por meioda formao de indivduos que respondam como autmatos s exigncias do mer-cado, mas que no tenham desenvolvido as capacidades crticas que contribuampara buscar a utilizao dos conhecimentos como uma forma de emancipao.

Contra essa situao alguns movimentos sociais, sindicatos, a sociedade civil,como lugar das lutas sociais e das resistncias, tm-se organizado, buscando sadase alternativas ao modelo neoliberal. H um sentimento crescente de que se precisade outra mundializao, de uma globalizao diferente daquela que aumentou amisria, a excluso, o desemprego, a dvida dos pases em desenvolvimento, onmero de analfabetos. Cresce o movimento para a criao de uma globalizaodas lutas sociais, de uma mundializao das resistncias, movimentos esses organi-zados nas diferentes reas da sociedade, das quais a educao uma delas. Assim que fruns, seminrios, redes, associaes organizaes no governamen-tais tm sido criados, com vistas a fazer face s polticas educacionais determinadaspelos organismos multilaterais, que tm gerado as reformas internacionais realiza-das pelos governos de diferentes pases e continentes. Essas iniciativas utilizam paratanto diferentes estratgias, como publicaes, reunies mundiais, continentais,regionais e locais. A tnica de todos esses movimentos salvar a educao damundializao neoliberal (Charlot, 2002).

Para Houtart e Polet (1999), a busca de alternativas para essa mundializaocontempornea da economia capitalista conduz a pelo menos duas sadas: a pri-

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meira seria o neokeynesianismo e a segunda, o ps-capitalismo. A primeira verten-te tem algumas variantes, que vo desde a tentativa de salvar o capitalismo at apreocupao com os direitos elementares dos trabalhadores, sem contudo colocarem xeque a lgica do capitalismo, mas simplesmente diminuir e controlar os seusexcessos, tentando humaniz-los. A segunda sada, o ps-capitalismo, vai mais lon-ge opondo-se claramente ao capitalismo; em busca de ultrapassar esse modelo, vo papel da economia como uma atividade que assegura as bases materiais do bem-estar fsico e cultural do conjunto de seres humanos. Dierckxsens (2001) propecomo uma alternativa para essa segunda sada uma nova regulao econmica, queparta da cidadania e do direito vida, isto , que esteja acima das puras relaeseconmicas. Houtart indica alternativas em trs nveis, a saber: o nvel das utopias,o nvel a mdio prazo e o nvel a curto prazo, esclarecendo, em relao ao primeironvel, que no se trata de uma iluso, mas de um projeto mobilizador que busquesubstituir a noo de lucro pela de necessidade, que socialize os meios de produ-o, sem estatiz-los, que faa o controle democrtico no campo poltico e econ-mico, que busque a construo de um Estado que no seja opressor. A noo deutopia ganhou, atravs dos tempos, o sentido de algo irrealizvel, impossvel, ima-ginrio, apesar de ter surgido como um ideal que pode ser explorado. Para evitaresse sentido de sonho, de busca do inatingvel, Wallesrstein (2000) inventou a pala-vra utopistique, que significa a avaliao ponderada das alternativas histricas, peloexerccio de nosso julgamento sobre a racionalidade material de diferentes sistemashistricos alternativos possveis. O sentido de utopia dado por Houtart pareceestar mais prximo do significado de utopstico, como possibilidade, viabilidade, apartir de condies objetivas que possam ajudar a operar essa mudana. As alterna-tivas, a mdio prazo, so vistas pelo autor como de ordem econmica com dimen-ses sociais e de ordem poltica. No primeiro caso, o autor arrola algumas alterna-tivas, como a reduo do comrcio de armas, a reorganizao do processo deproduo e distribuio, a redefinio do trabalho baseada em outros parmetros,dentre outras. As alternativas polticas enfatizam a reestruturao para a democrati-zao dos organismos internacionais e a recuperao do papel do Estado comoresponsvel pelos objetivos sociais. Finalmente, a curto prazo, o autor aponta comoalternativas alguns pontos que j so bandeiras de luta de muitos dos movimentossociais e sindicatos, entre os quais destacam-se: as regulaes econmicas, comoas taxaes sobre as operaes financeiras internacionais, a anulao da dvida dospases pobres, a proteo dos recursos no renovveis, a proteo das riquezasbiolgicas, a legislao internacional sobre o trabalho, a proteo das produesculturais locais e nacionais.

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Outras opes tm sido indicadas, como a proposta por Hinkelammert(1994), que v na resistncia globalizao a condio da racionalidade, pois essaseria a forma de recusar a entrada de uma sociedade no jogo que apresenta aloucura como nica racionalidade. Petrella (1999) indica algumas reas a seremtrabalhadas, especificando que a curto prazo se dever prosseguir a mobilizaoem torno de projetos como a taxao dos investimentos, a anulao da dvida dospases pobres, contra o trabalho escravo de mulheres e crianas, a privatizao dotransporte pblico, das companhias de eletricidade, de gs e de gua, da educao,dos sistemas de seguridade social, da sade. A mdio e a longo prazo Petrella apon-ta para as questes da regulao poltica mundial, ou da mundializao da poltica,do Estado, da mesma forma que chama a ateno para a questo da seguridadesocial coletiva mundial, do salrio mnimo comunitrio, da allocation universal.

Nesse contexto de resistncia e proposies, a educao, que foi fortementeatingida pelo projeto conservador neoliberal, tambm tem demonstrado a sua capa-cidade de organizao, buscando caminhos para impedir uma completa mercan-tilizao. Da mesma forma que, para a sociedade em geral, os movimentos sociais,sindicatos e organizaes no governamentais articulam-se para desenvolver aesque possam barrar esse avano desmesurado da privatizao do ensino, alm debuscarem uma educao com qualidade socialmente referenciada, isto , que noesteja voltada apenas para uma preparao imediata para o mercado de trabalho.

As principais crticas, em diferentes partes do mundo, relativas educao,esto ligadas mercantilizao a que ela tem sido submetida, incluindo a a desregula-mentao e a autonomia, o que significa o abandono da responsabilidade por partedo Estado, em relao a esse servio. O fato de a educao apresentar grandesnmeros7, o que significa gastos elevados, tem atrado fortemente o interesse dainiciativa privada em vista do montante de recursos que isso representa.

Esse fato no passa despercebido pelos organismos internacionais, como ocaso da Organizao Mundial do Comrcio OMC , entidade que congrega 144pases membros, mais de 30 pases observadores e 6 organizaes com o estatutode observadores no Conselho Geral da entidade, e representa cerca de 97% docomrcio mundial. Essa organizao, com sede em Genebra, na Sua, tem comofinalidade elaborar as regras que regem o comrcio entre os pases, visando melho-

7 Hirtt (2002) aponta que apenas uma indstria de material escolar nos Estados Unidos, no anode 1998, tinha um mercado de 82 bilhes de dlares, dos quais 24 bilhes provenientes deprodutos, 39 bilhes de servios e 28 bilhes de mensalidades escolares de escolas de vriosnveis.

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rar o bem-estar das populaes dos pases membros. A OMC constituiu, em 1998,um grupo de trabalho incumbido de estudar as perspectivas de liberalizao daeducao que termina por ressaltar o papel crucial da educao na estimulao docrescimento econmico. A partir da, o grupo apresenta trs recomendaes: aprimeira refere-se livre circulao da informao eletrnica e dos meios de comu-nicao, o que significa o estmulo utilizao, na educao, do correio eletrnico eda internet; a segunda implica a quebra das restries que possam limitar ou impe-dir o fornecimento de servios educacionais e a formao em outros pases; e aterceira refere-se tambm quebra de barreiras e restries que possam impedir acertificao das competncias (Hirtt 2002). Com isso a educao passa, aos olhosda OMC, a representar verdadeiramente uma mercadoria, que como tal deve epode ser negociada, procurando-se sempre obter lucros. Essa lgica tem orientadoas aes dos organismos internacionais, que hoje fazem as polticas educacionais nomundo. As reformas em curso privilegiam a descentralizao e a autonomia, queso formas de permitir que a escola possa, sem restries, atender s exigncias domercado.

contra essa desregulamentao da educao que diferentes movimentosse organizam e se levantam. Em 2001 ocorreu o Frum Mundial de Educao FME , que se colocou contra o neoliberalimo, em favor de uma escola pblica egratuita, alis, a declarao elaborada e aprovada pelos 15 mil educadores presen-tes ao evento foi taxativa em apregoar uma Educao Pblica para Todos, umaeducao como direito social inalienvel, financiada pelo Estado, e jamais reduzida condio de mercadoria e de servio, na perspectiva de uma sociedade solidria,democrtica, igualitria e justa. Com propsitos parecidos em 2002, no interior doFrum Social Mundial, ocorreu o Seminrio Mundial de Educao, tendo comotema Uma outra educao possivel e necessria. A declarao oriunda desseencontro, contendo 19 pontos, enfatizou a necessidade de ampliar o acesso edu-cao, de terminar com as desigualdades sociais, de reafirmar o fato de que a edu-cao um direito social universal fundamental da pessoa e dos povos, devendoser assegurada pelos servios pblicos sob a responsabilidade do Estado e por estefinanciado. Alm desses aspectos a declarao deu destaque a uma educao pbli-ca, gratuita e com qualidade para todos, devendo para isso o governo destinar nomnimo 8% do produto interno bruto para essa ao.

Outros encontros ocorreram, como o Frum Continenal da Educao, quese passou paralelamente Cpula das Amricas, em Quebec, 2001. A declaraodesse evento foi muito enftica em relao mercantilizao da educao, afirman-do que

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A educao no uma mercadoria que deva servir para enriquecer as empresas, osalunos no so produtos, os pais de alunos, os estudantes no so consumidores deeducao e os profissionais da educao no so simples dispensadores de servio.

Assim como o FME, esse outro frum posicionou-se contrariamente inclu-so da educao em acordos como o da OMC e o Acordo de Livre Comrcio dasAmricas Alca , bem como utilizao da educao virtual e a distncia comosubstituta de uma educao presencial e com qualidade. Ao mesmo tempo o frumpropugnou por uma educao que formasse pessoas livres e crticas, cidados ecidads ativos e engajados, abertos ao mundo e preocupados com o futuro do pla-neta, o que inclui as questes de segurana alimentar, agricultura, desenvolvimentoenergtico, proteo ao meio ambiente, aos direitos humanos e justia social.

A Rede Social da Educao Pblica das Amricas Red Sepa , integrada pororganizaes sindicais e populares da Argentina, do Equador, da Amrica Central,do Mxico, do Canad, de Quebec e das Carabas, que tem como uma de suasmisses opor-se comercializao da educao, manifestou-se no contexto daCpula das Amricas, solicitando a excluso da educao de qualquer acordo deliberalizao das trocas (OMC e Alca). Da mesma forma a questo da dvida exter-na foi considerada, tendo em vista que seu pagamento impede que os governospossam destinar maior quantia de dinheiro educao e a outros aspectos sociaisimportantes para a qualidade de vida dos povos. As proposies apresentadas pe-los diferentes organismos contra a atual globalizao econmica tm decorrnciaspolticas, como a definio de finalidades e objetivos que considerem a educaocomo um direito fundamental e induzam os Estados a terem como obrigao oatendimento s demandas de todos os nveis, inclusive do nvel superior, devendopara tanto haver maior destinao de recursos ao setor. Wallerstein (2002), escreven-do sobre o fenmeno da mundializao, diz que o planeta encontra-se em perodode transio, entre essa fase avanada do capitalismo, a globalizao e um outrosistema de mundo. Ressalta que se assiste desintegrao de um sistema histricoque no pode mais continuar existindo. Para o autor o novo sistema de mundo,que vai surgir aps o esgotamento desse modelo do capitalismo, pode ser melhorou ainda pior, mas o que ele destaca que se pode lutar para que seja um mundomais democrtico e mais igualitrio que o atual.

A certeza de que um outro mundo possvel que tem congregado aspessoas nas associaes, movimentos, sindicatos, organizaes no governamen-tais, buscando conjuntamente a construo dessa nova realidade. Para essa novaconfigurao societal, a educao dever ter um papel preponderante, como um

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poderoso instrumento de libertao dos homens e mulheres e como meio dedesenvolver a cidadania e permitir o acesso aos bens socialmente produzidos pelahumanidade. Para tanto a educao libertadora no pode ser considerada umamercadoria, na qual os estudantes que fazem seus cursos no exterior so colocadossob a rubrica de consumo no exterior, o ensino a distncia catalogado comooferta alm da fronteira de um servio, as estadas cientficas, de curta durao, deprofessores e pesquisadores em laboratrios estrangeiros so chamadas presenade pessoas fsicas, e a implantao de universidades privadas em outros pases considerada presena comercial. Da mesma forma essa educao no pode sercomercializada, no pode servir como moeda de troca includa em acordos quevisam ao lucro e acumulao, como o caso do Acordo Geral do Comrcio edos Servios AGCS8 , que prev, por parte de seus membros, um comprome-timento no sentido de uma abertura concorrncia internacional dos mercadosnacionais dos servios. O objetivo da educao democrtica s poder ser atingidose seu financiamento for feito pelo setor pblico e regulamentado pelo Estado. Elaprecisa ser considerada um direito fundamental, acessvel a todas as pessoas, de-vendo ser pblica e gratuita, com qualidade socialmente referenciada.

Os profissionais da educao que devero atuar nesse novo mundo solidrioe justo precisaro ser preparados sob outras bases, nas quais sua dignidade comopessoa e como profissional seja respeitada, traduzida em salrios dignos que voalm dos discursos e recomendaes em um plano de carreira, em condies detrabalho que incluem bibliotecas, computadores, acesso a redes de pesquisa. Almdesses aspectos o perfil dos cursos deve preocupar-se com uma formao para acidadania que inclua a capacidade de fazer anlises crticas da realidade, contribuin-do para o bem-estar social.

Essa outra sociedade, diferente da neoliberal, est sendo construda pelosmovimentos sociais, mediante a resistncia, as lutas, a apresentao de alternativascontra a globalizao das desigualdades, a favor da escola pblica, contra amercantilizao do ensino e pela construo de inditos vivies9, como sonhavaPaulo Freire. Essa luta significa a mundializao da resistncia, pelo direito vida etem congregado, cada vez mais, um nmero maior de pessoas, porque este mode-

8 Trata-se de um acordo multilateral, criado em 1995 no quadro da Organizao Mundial doComrcio.

9 Categoria freiriana que significa sonhos coletivos, democrticos, a utopia alcanada, dese-jos, vontades e possibilidades, anncios, sonhos possveis (Freire, 2000).

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lo que a est aumenta o nmero de excludos, de despossudos. A crena de queum outro mundo possvel est posta e, hoje, com alguns governos populares nomundo, comea a tornar-se realidade.

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Recebido em: novembro 2002Aprovado para publicao em: novembro 2002