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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO RENATO DE LIMA DANTAS CALDAS A (IM)POSSIBILIDADE DO RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA NATAL 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

RENATO DE LIMA DANTAS CALDAS

A (IM)POSSIBILIDADE DO RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA

NATAL

2021

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RENATO DE LIMA DANTAS CALDAS

A (IM)POSSIBILIDADE DO RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA

Monografia apresentada ao curso de

graduação em Direito, da Universidade

Federal do Rio Grande do Norte, como

requisito parcial para a obtenção do título de

Bacharel em Direito.

Orientadora: Profª. Drª. Érica Verícia Canuto

de Oliveira Veras.

NATAL

2021

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RENATO DE LIMA DANTAS CALDAS

A (IM)POSSIBILIDADE DO RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA

Monografia apresentada ao curso de graduação em Direito, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Aprovada em: 13 / 09 / 2021

BANCA EXAMINADORA

______________________________________

Profa. Drª. Érica Verícia Canuto de Oliveira Veras.

Orientadora

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

______________________________________

Profª. Me(a). Anna Emanuella Nelson dos Santos Cavalcanti da Rocha

Membro interno

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

______________________________________

Profª. Drª. Amanda Oliveira da Câmara Moreira

Membro externo

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ÁRIDO

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Dedico este trabalho à memória do meu avô João, que, como um verdadeiro pai, sempre cuidou de mim com carinho e amor, do seu jeito. Ao senhor, vovô.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, em primeiro lugar, à minha família, base de tudo, em especial minha

mãe Cileide e vovó Nazinha. Sem vocês, nada disso teria sido possível.

À minha noiva, D’ângella Katyuscia, por estar sempre ao meu lado, me dando

conselhos, força e apoiando em todos os momentos. Te amo!

Aos colegas e amigos que fiz durante o curso, principalmente aos integrantes dos

grupos Alcateia Jurídica e Mecanismo por sempre contribuírem em conjunto, do início ao

fim do curso, a construção dessa longa caminhada.

Por fim, à professora Érica Canuto, minha orientadora, por ter me tornando um

grande entusiasta do Direito de Família e suas implicações sociais.

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“Família não é uma coisa importante. É tudo”.

Michael J. Fox

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo esclarecer sobre a possibilidade, ou não, do reconhecimento das uniões estáveis putativas à luz dos entendimentos dos órgãos judiciais, uma vez que a lei não regulamenta a união estável putativa. A pesquisa sobre o tema proposto justifica-se pela realidade vivenciada por muitos casais que hoje encontram-se na situação ora estudada e, assim, prejudicando os direitos daqueles que estão de boa-fé na relação, tal qual o casamento putativo, este, sim, já devidamente regulado pelo art. 1.561, do Código Civil de 2002. A família, como diz a Constituição Federal de 1988, é a base da sociedade. É por meio dela, geralmente, que as relações sociais são introduzidas. Sua formação inicial tradicional acontece pelo casamento, mas diversos outros modelos de construção familiar têm sido adotados, tais como a união estável ou, até mesmo com as famílias monoparentais. Na construção dessas relações há a participação de princípios elementares, como a boa-fé objetiva, que busca proteger, essencialmente, o sentimento de confiança nessas relações. É com base nesse princípio, além da analogia que se deve fazer com o casamento putativo, que se busca perceber a possibilidade do reconhecimento da união estável putativa como mais uma espécie de entidade familiar, apta a proporcionar todos os efeitos legais (pessoais e patrimoniais) àqueles que estejam de boa-fé. Para tanto, foi desenvolvido um estudo bibliográfico acerca do estudo da família e seus principais modelos formadores, o casamento e a união estável. Além disso, foi feita uma pesquisa de decisões judiciais, de vários tribunais do país, inclusive do STF e do STJ, que alicerçaram ainda mais o entendimento pela possibilidade – senão o dever – do reconhecimento da união estável putativa. Portanto, é preciso que os legisladores supram essa lacuna legal, para que seja extinta essa discriminação, ao menos legalmente, em relação às uniões estáveis putativas, bem como, os órgãos do Poder Judiciário tomem, cada vez mais, decisões favoráveis a elas quando estiver presente o elemento da boa-fé.

Palavras-chave: Família. Casamento. União estável. Boa-fé objetiva. Putatividade.

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ABSTRACT

This paper aims to clarify the possibility, or not, of recognizing putative stable unions in light of the understandings of judicial bodies, since the law does not regulate putative stable unions. The research on the proposed theme is justified by the reality experienced by many couples who are currently in the situation studied here and, thus, harming the rights of those who are in good faith in the relationship, such as putative marriage, this one, yes, already duly regulated by art. 1561, of the Civil Code of 2002. The family, as the Federal Constitution of 1988 says, is the basis of society. It is generally through it that social relations are introduced. Its traditional initial formation takes place through marriage, but several other models of family construction have been adopted, such as a stable union or even with single-parent families. In the construction of these relationships, there is the participation of elementary principles, such as objective good faith, which essentially seeks to protect the feeling of trust in these relationships. It is based on this principle, in addition to the analogy that should be made with putative marriage, that we seek to realize the possibility of recognizing the putative stable union as another kind of family entity, able to provide all legal effects (personal and patrimonial) to those who are in good faith. Therefore, a bibliographical study was developed about the study of the family and its main formative models, marriage and stable union. In addition, a survey was made of court decisions from various courts in the country, including the STF and the STJ, which further supported the understanding of the possibility – if not the duty – of recognizing the putative stable union. Therefore, it is necessary that legislators fill this legal gap, so that this discrimination is extinguished, at least legally, in relation to putative stable unions, as well as, the bodies of the Judiciary Branch increasingly take decisions favorable to them when they are present the element of good faith. Keywords: Family. Wedding. Stable union. Objective good faith. Putativity.

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LISTA DE SIGLAS

ADIN Ação Direta de Inconstitucionalidade

ADPF Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental

BGB Bürgerliches Gesetzbuch (Código Civil alemão)

CC Código Civil de 2002

CF Constituição Federal de 1988

EC Emenda Constitucional

LINDB Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro

RE Recurso Extraordinário

REsp Recurso Especial

STF Supremo Tribunal Federal

STJ Superior Tribunal de Justiça

TJMA Tribunal de Justiça do Maranhão

TJRS Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

TJSC Tribunal de Justiça de Santa Catarina

TJSE Tribunal de Justiça de Sergipe

TJSP Tribunal de Justiça de São Paulo

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 12

2 A FAMÍLIA ................................................................................................................................ 14

3 O CASAMENTO ...................................................................................................................... 17

3.1 DISPOSIÇÕES GERAIS ..................................................................................................... 17

3.2 ESPÉCIES ............................................................................................................................ 20

3.2.1 Casamento putativo ....................................................................................................... 22

4 A UNIÃO ESTÁVEL ............................................................................................................... 22

4.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA ................................................................................................... 22

4.2 ELEMENTOS ........................................................................................................................ 24

4.2.1 Características ................................................................................................................ 24

4.2.2 Efeitos, direitos e deveres ............................................................................................ 25

5 O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ .................................................................................................... 27

5.1 O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ NAS RELAÇÕES FAMILIARES ........................................ 30

6 O INSTITUTO DA PUTATIVIDADE ..................................................................................... 31

7 A (IM)POSSIBILIDADE DO RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA ....................................................................................................................................................... 33

7.1 INTERPRETAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 1.561, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 .... 35

7.2 AVANÇOS NAS DECISÕES JUDICIAIS ......................................................................... 37

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................. 42

REFERÊNCIAS .......................................................................................................................... 44

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1 INTRODUÇÃO

O ser humano, desde seu surgimento no planeta Terra, vive em grupos sociais e,

com sua reprodução, espalhou-se por todos os lugares, dos mais frios aos mais quentes.

A vida em grupos facilitou a dominação do planeta pelo ser humano, uma vez que

ele não precisava se arriscar a caçar, plantar, cuidar da prole sozinho.

Além de viver em bandos maiores, o ser humano sempre teve um grupo nuclear,

a sua família, que, inicialmente, era composta pelo genitor, pela genitora e pelos seus

descendentes.

Com o passar dos tempos, a figura masculina acabou por dominar as relações

familiares, dando origem às famílias patriarcais, onde a figura do pai era absoluta nesse

núcleo familiar.

A consolidação das relações passou ser demonstrada socialmente por meio da

celebração do casamento, por meio do qual o casal afirmava, ao menos nas sociedades

ocidentais, que estavam ligados um ao outro, sem a possibilidade de relações

extraconjugais, principalmente com a adoção dos ritos seguidos pelo Cristianismo, que

sempre pregou a monogamia.

Entretanto, o próprio conceito de família tem sido alvo de modificações, a depender

do momento em que é observado, partindo da chamada família “tradicional”, patriarcal,

já comentada, e indo até as novas possibilidades de composição das famílias, que podem

ser as mais variadas possíveis, bastando apenas a sua ligação pelo afeto.

As sociedades, como um todo, e as pessoas, individualmente, estão em

constantes transformações, aí incluídas as relações familiares.

A legislação, muitas vezes, não consegue acompanhar essas transformações no

mesmo ritmo em que estas acontecem. Por isso, questões tidas como polêmicas, como

é o caso das uniões extramatrimoniais, demoram a ter as suas devidas regulamentações

legais efetivadas, o que acaba por contribuir com a não solução eficaz das demandas

sociais.

No brasil, esses novos modelos de família foram introduzidos, principalmente, pela

Constituição Federal de 1988, que trouxe em seu bojo princípios fundamentais à

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organização das relações familiares, tais como: da dignidade da pessoa humana, da

afetividade, do pluralismo das entidades familiares e da monogamia.

O casamento continua sendo um importante instituto e é, também, uma das formas

de constituição de entidade familiar, porém não é a única. A união estável, contudo,

também merece a devida proteção do Estado, como reza o art. 226, §3º, da Carta Maior

de 1988, in litteris:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

A união estável, como se verá mais adiante, passou por um processo de

modificação muito forte para chegar ao seu atual estágio de garantidor de direitos

fundamentais nas relações familiares. Sua história é recheada de temas controversos e

que, ainda hoje, levantam discussões sociais, acadêmicas, doutrinárias e

jurisprudenciais.

Dessa forma, o presente trabalho, quem tem como tema a união estável putativa,

tem também como objetivo principal o de esclarecer sobre a viabilidade (ou não) de sua

aplicação no direito brasileiro, tendo em vista os inúmeros casos de uniões extraconjugais

no Brasil, nas quais pelo menos uma das partes está de boa-fé, desconhecendo a

situação conjugal da outra, e deve ter seus direitos observados e garantidos, à luz dos

entendimentos dos órgão judiciais, tendo em vista que a lei não a regulamenta.

Quanto aos objetivos específicos do trabalho, eles podem ser relacionados aos

próprios capítulos deste. O primeiro é o que envolve os capítulos dois, três e quatro, que

fazem um apanhado dos conceitos e trajetória histórica de família, casamento e união

estável até os dias de hoje, principalmente após a promulgação da Carta Magna de 1988,

fazendo uma relação entre eles. O segundo envolve perceber o princípio da boa-fé e o

instituto da putatividade como elementos essenciais à compreensão da união estável

putativa. Já o terceiro objetivo específico irá demonstrar como é abordado o assunto na

legislação e nas decisões judiciais mais atuais, comprovando a relevância do tema.

Para alcançar os objetivos, a pesquisa foi elaborada tendo como referências

grandes nomes de importância nacional para o estudo bibliográfico, além de um

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apanhado de decisões judiciais de tribunais de vários estados do país, bem como do

Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Foi realizada, também, uma

pesquisa às legislações correlatas ao tema, principalmente a Constituição Federal e o

Código Civil de 2002.

A presente pesquisa justifica-se, portanto, pela realidade vivenciada por muitos

casais que hoje encontram-se na situação abordada pelo tema proposto e, assim, podem

vir a ter direitos prejudicados, uma vez estando de boa-fé na relação, diferentemente do

que ocorre nas relações de casamento putativo.

Assim, o presente trabalho busca, a partir do que se entende hoje como família,

bem como pelo comparativo entre os institutos do casamento e da união estável, fazer

um alerta sobre uma situação real vivida por muitas famílias, mas que ainda esbarra em

uma série de discriminações, seja de cunho moral seja de cunho legal.

2 A FAMÍLIA

Conceituar “família”, hoje, é uma tarefa das mais árduas, pois tem sido alvo de

severas modificações ao longo dos anos, mais ainda nas últimas décadas.

O certo é que a família é a base de toda e qualquer sociedade em qualquer época

da humanidade, na qual todas as pessoas têm a sua origem.

Para o entendimento de família deve-se ter em mente seu caráter natural, bem

como o sociocultural, conforme leciona Rodrigo da Cunha Pereira (2021, p. 47), citando

Jacques Lacan: “a família não é um grupo natural, mas cultural. Ela não se constitui

apenas por homem, mulher e filhos. Ela é, antes, uma estruturação psíquica, onde cada

um de seus membros ocupa um lugar, uma função”.

Porém, por muito tempo, a família era compreendida como sendo, de forma

genérica, “o grupo plural de pessoas que, pela natureza ou pelo direito, vive sob o poder

de outra”, como dito por Sílvio de Salvo Venosa (2017, p. 18), citando o jurista romano

Ulpiano.

A família tinha um perfil hierarquizado e patriarcal, agregando todos os parentes

com o objetivo de procriação para o desenvolvimento econômico da família através do

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aumento da produção, ou seja, uma família maior traria mais benefícios aos seus

integrantes, sendo, portanto, uma entidade patrimonializada (DIAS, 2021, p. 43).

Essa estrutura, após a ascensão do Cristianismo, tinha como seu fundamento

principal o casamento, e esse modelo perdurou, de forma hegemônica na sociedade

ocidental, da Antiguidade – fim do Império Romano, passando por toda a Idade Média,

até a Idade Moderna, quando, por volta do final do século XVIII, após a Revolução

Industrial, começou a haver mudanças em sua formação (GAGLIANO E PAMPLONA

FILHO, 2019, p. 68).

Venosa (2017, p. 21) ilustra muito bem essa transformação no seguinte trecho:

A passagem da economia agrária à economia industrial atingiu irremediavelmente a família. A industrialização transforma drasticamente a composição da família, restringindo o número de nascimentos nos países mais desenvolvidos. A família deixa de ser uma unidade de produção na qual todos trabalhavam sob a autoridade de um chefe.

A partir de então, a estrutura familiar passou a ficar restrita ao casal e aos filhos,

fazendo-os aproximarem-se e, criando, assim, um vínculo afetivo entre seus integrantes,

dando origem à “concepção da família formada por laços afetivos de carinho, de amor”

(DIAS, 2021, p. 43).

As grandes transformações sociais, econômicas, culturais e tecnológicas durante

o século XX, fizeram com que fosse repensado o conceito contemporâneo de família.

São diversos os arranjos familiares nesse período de “pós-modernidade”, que estão

abarcados pela tutela jurídica constitucional (GAGLIANO E PAMPLONA FILHO, 2019, p.

70).

No Brasil, o Código Civil de 1916 trazia uma visão tradicional de família, com teor

discriminatório entre seus membros e que fazia do casamento uma instituição

indissolúvel. Nas palavras de Sílvio de Salvo Venosa, “era um Código tecnicamente muito

bem feito, mas que nascera socialmente defasado, preocupado apenas com o

individualismo e o patrimônio” (2017, p. 22).

Somente com a Constituição Federal de 1988 foi que a família, em todas as suas

formas, teve sua devida proteção jurídica, principalmente com o enunciado do art. 226 e

seus parágrafos. Várias foram as modificações trazidas em um único dispositivo, tais

como: igualdade entre homem e mulher; alargou o conceito de família; estendeu a

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proteção à família constituída pelo casamento, bem como à união estável; trouxe o

conceito de família monoparental; consagrou a igualdade entre os filhos. Além disso, a

Emenda Constitucional (EC) 66, trouxe o divórcio como a única forma de pôr fim ao

casamento (DIAS, 2021, p. 47).

O Código Civil de 2002, por sua vez, já nasceu defasado, trazendo apenas

algumas atualizações de termos inadequados e revogando dispositivos, além de trazer a

possibilidade de dissolução do casamento extrajudicialmente (DIAS, 2021. p. 47).

A título de exemplo, Rolf Madaleno (2020, p. 56-86) cita algumas das atuais

concepções de família: família matrimonial, família informal, família monoparental, família

anaparental, família reconstituída, família paralela, união poliafetiva, família natural,

família extensa ou ampliada, família substituta, família eudemonista, família homoafetiva.

Farias e Rosenvald (2016, p. 39-40) mostram como deve ser compreendida a

família nesse novo formato:

A família do novo milênio, ancorada na segurança constitucional, é igualitária, democrática e plural (não mais necessariamente casamentária), protegido todo e qualquer modelo de vivência afetiva e compreendida como estrutura socioafetiva, forjada em laços de solidariedade.

Giselda Hironaka (2013, p. 199) demonstra o mesmo entendimento quando afirma:

“família é arranjo que se dá espontaneamente no seio da sociedade, tendo por base e

fundamento o afeto cultivado entre seus membros”.

Portanto, o conceito de família deve ser compreendido em cada época na qual é

estudado.

Hoje, no Brasil, é preciso que se tenha em conta para uma compreensão de

família, principalmente, os ditames da Carta Cidadã, em especial o seu art. 226 e,

tomando por base alguns de seus princípios, conforme lição de Flávio Tartuce (2020, p.

1.750-1.768), como a dignidade da pessoa humana, a solidariedade, igualdade entre

filhos, igualdade entre cônjuges e companheiros, da não intervenção ou da liberdade, do

maior interesse da criança e do adolescente, da afetividade, da função social da família

e da boa-fé objetiva, entre outros.

Conforme dito por Anderson Schreiber (2020, p. 1.197), o constituinte de 1988, ao

longo de todo capítulo sobre família, teve a devida preocupação de destacar a dignidade

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da pessoa humana nas relações familiares. Com isso, várias foram as consequências

que daí vieram: (a) o reconhecimento da pluralidade de formas de convivência familiar;

(b) o reconhecimento da inexistência de hierarquia entre as diversas formas de família; e

(c) a democratização das relações familiares, com ênfase na igualdade de papéis e no

diálogo entre cônjuges e companheiros, bem como na participação dos filhos no seu

processo educacional.

3 O CASAMENTO

3.1 DISPOSIÇÕES GERAIS

Assim como o entendimento sobre família, “o casamento, como todas as

instituições sociais, varia com o tempo e os povos” (GONÇALVES, 2020, p. 44).

Não se questiona a importância que tiveram as estruturas familiares da

Antiguidade, como dos assírios, dos hebreus e dos egípcios. Todavia, para o Direito de

Família brasileiro, é preciso que seu estudo se dê com maior relevância a partir do Direito

Romano, uma vez que dele tem origem o Direito Civil brasileiro como um todo, bem como

do Direito Canônico, já que o Cristianismo é a base religiosa da sociedade ocidental.

Para o Direito Romano, o casamento era mais uma “relação jurídica do que uma

celebração, mais a situação fática da convivência, animada sempre da affectio maritalis”

(PEREIRA, 2018, p. 83). Para o Direito Canônico, o casamento era entendido como

“fundamento da sociedade” (GAGLIANO E PAMPLONA FILHO, 2019, p. 134). O

Cristianismo, portanto, elevou o casamento ao status de sacramento:

O advento do Cristianismo, portanto, sacralizando o casamento, alterou a própria concepção de família, que deixava de ser, na forma do Direito Romano, simplesmente o núcleo de pessoas submetido à autoridade de um mesmo pater familias, para identificar aqueles que estavam unidos pelo sagrado matrimônio religioso (GAGLIANO E PAMPLONA FILHO, 2019, p. 134).

Essa relação entre Estado e Igreja perdurou por séculos, até que com o

rompimento da Reforma Protestante, no século XVI, e de Revoluções sociais, como a

francesa, no século XVIII, houve grandes transformações na concepção do casamento.

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Um exemplo de transformação foi a de que o casamento estritamente religioso

deixou de ser a única espécie de casamento. Surgiu, então, a possibilidade de um

casamento civil, sem interferência da Igreja (GAGLIANO E PAMPLONA FILHO, 2019, p.

135).

No Brasil, inclusive, o casamento civil só foi possível a partir da Proclamação da

República, em 1890, com o Decreto nº 18, de 24 de janeiro de 1890, “Ainda assim seu

caráter sagrado foi absorvido pelo direito, tanto que o conceito de família, identificado

com o casamento indissolúvel, constava em todas as Constituições do Brasil” (DIAS,

2021, p. 464).

No Direito brasileiro atual, não há um conceito bem definido do que seja o

casamento, ficando essa tarefa à doutrina.

Várias são as tentativas de conceituar o casamento, e cada uma com as suas

interpretações.

Há aqueles mais tradicionalistas, apegados ainda a ideia de patriarcalismo e

indissolubilidade do vínculo conjugal, tais como - Caio Mário da Silva Pereira (2018, p.

85): “união de duas pessoas de sexo diferente, realizando uma integração fisiopsíquica

permanente”; Washington de Barros Monteiro (1996, apud VENOSA, 2017, p. 40): “a

união permanente entre o homem e a mulher, de acordo com a lei, a fim de se

reproduzirem, de se ajudarem mutuamente e de criarem os seus filhos”; Clovis

Bevilácqua (1976, apud PEREIRA, 2021, p. 209): “Casamento é o contrato bilateral e

solene, pelo qual um homem e uma mulher se unem indissoluvelmente, legitimando por

ele suas relações sexuais, estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e de

interesses, e comprometendo-se a criar e educar a prole que de ambos nascer”.

Contudo, é inegável que esses conceitos precisaram sofrer alterações,

principalmente após a promulgação da Carta Cidadã de 1988, que passou a reconhecer

a proteção do Estado à entidade familiar constituída por qualquer dos pais e seus

descendentes ou à união estável entre um homem e uma mulher (art. 226, §§ 3º e 4º, da

CF/88), além da aprovação do casamento entre pessoas homoafetivas por meio de

decisão do STF na ADI 4.277/DF e ADPF 132, Rel. Min. Ayres Britto, publicada em 04 e

05.05.2011 (PEREIRA, 2018, p. 85).

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Abordando uma linha mais contemporânea estão Cristiano Chaves de Farias e

Nelson Rosenvald (2017, p. 176):

o casamento é uma entidade familiar estabelecida entre pessoas humanas, merecedora de especial proteção estatal, constituída, formal e solenemente, formando uma comunhão de afetos (comunhão de vida) e produzindo diferentes efeitos no âmbito pessoal, social e patrimonial.

No mesmo diapasão, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2019, p.

139):

podemos então, com maior segurança, definir o casamento como um contrato especial de Direito de Família, por meio do qual os cônjuges formam uma comunidade de afeto e existência, mediante a instituição de direitos e deveres, recíprocos e em face dos filhos, permitindo, assim, a realização dos seus projetos de vida.

Quanto à natureza jurídica do casamento, ainda hoje há grandes divergências

doutrinárias, porém, três são as teorias mais aceitas, são elas: a) Teoria institucionalista:

o casamento é uma instituição; b) Teoria contratualista: o casamento é um contrato de

natureza especial, e com regras próprias de formação; e, c) Teoria eclética ou mista: o

casamento é uma instituição quanto ao conteúdo e um contrato especial quanto à

formação (TARTUCE, 2020, p. 1.780).

Cada uma dessas teorias tem fortes defensores, entretanto, nas palavras de

Anderson Schreiber (2020, p. 1.271-1.272):

‘a discussão, ainda que tradicional, se revela estéril e inútil’. O conteúdo existencial do casamento depõe contra as tentativas de qualificá-lo à luz dos institutos tradicionais do direito civil, cujo foco na patrimonialidade e no aspecto volitivo falham em traduzir os traços essenciais do matrimônio e, por conseguinte, em oferecer ao intérprete elementos para a determinação do regime jurídico aplicável.

O Casamento possui características que independem do posicionamento adotado

em relação à sua natureza jurídica. Essas características são frutos normativos da

Constituição Federal, do Código Civil e dos tribunais superiores (STF e STJ) (FARIAS E

ROSENVALD, 2016, p. 181). São elas: a) caráter personalíssimo e livre da escolha dos

nubentes; b) solenidade da celebração; c) inexigência de diversidade de sexos

(possibilidade do casamento homoafetivo), embora haja divergências doutrinárias, como

a posição de Carlos Roberto Gonçalves (2020, p. 54); d) inadmissibilidade de submissão

a termo ou condição; e) estabelecimento de uma comunhão de vida; f) natureza cogente

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das normas que o regulamentam; g) estrutura monogâmica; h) dissolubilidade, de acordo

com a vontade das partes.

3.2 ESPÉCIES

Duas são as formas de celebração de casamento (espécies), conforme art. 226,

§§ 1º e 2º, da CF/88: civil (art. 1.512, do CC) e religioso com efeitos civis (art. 1.515 e

1.516, do CC).

O casamento civil no Brasil somente começou a ser celebrado após 1890, pois

quem detinha a exclusividade para a celebração do casamento era a Igreja Católica, de

acordo com os ritos do Direito Canônico. Essa ruptura, entre Estado e Igreja,

proporcionou a “secularização do matrimônio” (FARIAS E ROSENVALDO, 2016, p. 191).

Ele é um ato formal, solene e gratuito, que deve ser realizado perante o oficial do Cartório

do Registro Civil, “levado a efeito por um celebrante e na presença de testemunhas”

(DIAS, 2021, p. 473).

Já o casamento religioso com efeitos civis, é o realizado em cerimônia religiosa,

mas que, para ter validade como o casamento civil, deve ser

promovido o seu registro dentro de até noventa dias de sua realização, com a comunicação do celebrante ao ofício competente, ou por iniciativa de qualquer interessado, desde que haja sido homologada previamente a habilitação regulada neste Código. Se este prazo for descumprido, o registro dependerá de nova habilitação (art. 1.516, caput e § 1º, CCB) (PEREIRA, 2021, p. 217).

Caso não seja realizado o devido registro, o casamento unicamente religioso não

terá qualquer efeito civil, pois, conforme lição dos eminentes professores Cristiano

Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2017, p. 191), “o nosso ordenamento não confere

validade e eficácia jurídica ao chamado casamento eclesiástico. Por conta disso, as

pessoas casadas meramente no religioso não são casadas, podendo, se for o caso, estar

em união estável”.

Há outras formas de celebração do casamento que, embora não sejam novas

espécies, merecem ser comentadas.

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21

A primeira delas é o chamado casamento por procuração (art. 1.542, CC), por meio

da qual, outorgada por instrumento público e com validade de 90 (noventa) dias, um

nubente, ou ambos, escolhe um terceiro, com poderes especiais, como procurador para

representá-lo(s) (PEREIRA, 2021, p. 217).

Outra forma de casamento é o chamado nuncupativo, art. 1.540 a 1.542, do CC/02,

(ou in extremis ou in articulo mortis). Ele somente pode ser realizado em circunstâncias

excepcionais, quando um dos noivos estiver em iminente risco de morte. Nessa situação

não é necessário que se atenda a nenhum dos requisitos legais, salvo a presença de seis

testemunhas que não tenham parentesco com os nubentes (em linha reta, ou colateral

até o segundo grau). Continuando, Maria Berenice Dias (2021, p. 476) afirma:

No prazo de 10 dias, as testemunhas devem confirmar o casamento perante a autoridade judicial que, antes de mandar registrar o casamento, deve proceder a uma verdadeira investigação. Estranhamente, não é prevista a ouvida do cônjuge sobrevivente. Todo esse procedimento é dispensável se o enfermo convalescer e ratificar o casamento na presença da autoridade competente e do oficial do registro. Ainda que não explicite a lei, devem ambos os cônjuges, e não só o enfermo, ratificar o casamento. Em qualquer das duas hipóteses — quer o noivo sobreviva ou não —, os efeitos do casamento retroagem a data de sua celebração (grifos no original).

Um terceiro modo de casamento é o casamento consular, quando um brasileiro

está em outro país e quer se casar, seja mediante as leis brasileiras, em repartição

consular brasileira, seja mediante uma autoridade estrangeira. Para que tenha validade

no Brasil, é preciso que seja realizado seu registro em até 180 (cento e oitenta) dias a

contar da volta de um ou de ambos os cônjuges ao Brasil. Ele deve ser “feito no cartório

do domicílio dos nubentes ou, se não tiverem domicílio certo, no 1.° Oficio da Capital do

Estado em que passarem a residir (CC 1.544)” (DIAS, 2021, p. 478).

Há, ainda, o casamento de estrangeiros no Brasil, que é regido pelo art. 7º, da Lei

de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB). Esse artigo determina, de acordo

com Rodrigo da Cunha Pereira (2021, p. 223), “se os estrangeiros fixarem residência no

Brasil, deverão registrar seu casamento no cartório de registro civil da cidade onde estão

domiciliados, com a devida tradução juramentada”.

Por fim, existe, também, o casamento putativo, que será visto no próximo tópico,

em separado.

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3.2.1 Casamento putativo

O casamento putativo, previsto no art. 1.561, do CC/02, ocorre quando um dos

cônjuges, ou ambos, de boa-fé, contraíram vínculo matrimonial desconhecendo por

completo que seu casamento está eivado de algum tipo de vício causador de nulidade

ou anulabilidade (GAGLIANO E PAMPLONA FILHO, 2019, p. 296).

Logo, o casamento putativo se baseia em uma “imaginação”, um erro (de fato ou

de direito) e, por isso mesmo, deve produzir efeitos àquele que está de boa-fé na relação.

Para Farias e Rosenvald (2016, p. 248), quatro são os requisitos para que seja

reconhecida a putatividade: i) invalidade do casamento; ii) boa-fé dos nubentes, ou de

apenas um deles; iii) erro desculpável; iv) declaração judicial.

Em relação à declaração judicial, diz Maria Berenice Dias (2021, p. 529):

Reconhecendo o juiz a boa-fé dos cônjuges ou de um deles, declara, com relação a um ou a ambos, que o casamento é putativo. Essa declaração é necessária, pois altera o marco temporal dos efeitos da anulação. Anulado o casamento quanto ao que estava de má-fé, os efeitos retroagem a data da celebração — efeito ex tunc (CC 1.563). No entanto, reconhecida a boa-fé, os efeitos da desconstituição do casamento só vigoram a partir da sentença — efeito ex nunc.

O instituto da putatividade no casamento busca proteger não só os cônjuges e os

filhos, “mas também a terceiros que podem valer-se do caráter putativo do casamento,

para exercer direitos que adquiriram na suposição de um casamento válido. Neste caso,

aplica-se na verdade, a teoria da aparência” (PEREIRA, 2021, p. 219).

Quanto aos filhos, Caio Mário (2018, p. 158) afirma que o parágrafo único, do art.

14, da Lei n. 6.515/77, passou a deixar estabelecido que estando ambos os cônjuges de

boa-fé ou de má-fé ao contrair o casamento, os efeitos deste seriam aproveitados aos

filhos comuns, independentemente da origem do nascimento.

4 A UNIÃO ESTÁVEL

4.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

A união prolongada no tempo entre duas pessoas, sem casamento, notadamente

entre o homem e a mulher foi conhecida no Brasil, durante muito tempo, como

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concubinato. Ao longo da história, o concubinato pode ser percebido e continuará o

sendo, “apesar da rejeição social e do repúdio do legislador” (DIAS, 2016, p. 407).

A união estável, ou concubinato, só passa a deixar de ser tolerado, de fato, a partir

do meio do século XVI, quando, após o Concílio de Trento, ocorrido entre 1545 e 1563,

a Igreja Católica tenta ampliar seu poder e eleva o casamento à única forma de se

estabelecer uma relação familiar, proibindo o casamento presumido (MADALENO, 2018,

p. 1.425).

No Brasil, o Código Filipino já seguia essas características às uniões não

matrimonializadas, como afirma Caio Mário da Silva Pereira, quando diz que “vamos

encontrar no Código Filipino disposições que se lhe referiam, para condená-lo, impondo

severas punições às ‘barreganices’ de nobres e peões” (2018, p. 549).

Mais à frente, e até recentemente, vigeu o Código Civil de 1916, que somente

admitia o casamento como entidade familiar, rechaçando qualquer tipo de união

extramatrimonial. Portanto, no seu contexto, “família tradicional”, legítima, era aquela que

foi composta pelo casamento, já as demais uniões seriam consideradas ilegítimas, ainda

que marcadas pelo afeto (FARIAS; ROSENVALD; BRAGA NETTO, 2017, p. 1.764). Às

uniões estáveis restava serem consideradas “sociedades de fato” e, portanto, regidas

pelo Direito Obrigacional, e não pelo Direito das Famílias, como o casamento.

Logo vê-se que havia um enorme preconceito com as uniões não

matrimonializadas, seja pela sociedade, seja pela Igreja, seja pelas próprias legislações.

Até que, em 1964, o Supremo Tribunal Federal (STF) editou a Súmula n. 380,

dispondo: “Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível

a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”.

Esse foi o primeiro passo para o reconhecimento das uniões não constituídas pelo

casamento. Logo em seguida, o STF editou a Súmula n. 382, dizendo: “A vida em comum

sob o mesmo teto, more uxorio, não é indispensável à caracterização do concubinato”.

Com esses dois enunciados abriu-se um caminho para a efetivação do reconhecimento

da união estável como entidade familiar.

Os legisladores acabaram sendo pressionados a partir das decisões dos tribunais

e criaram normas sobre o tema, como o art. 57, §§2º a 6º, da Lei n. 6.015/73 (Lei de

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Registros Públicos), reconhecendo ao uso do sobrenome pela concubina; a Lei n.

6.367/75 e o Decreto-lei n. 7.036/44, que reconheciam ao concubino o direito ao

recebimento de indenização por acidente de trabalho com seu convivente (FARIAS;

ROSENVALD; BRAGA NETTO, 2017, p. 1.765).

A doutrina também passou a analisar o assunto, dividindo o concubinato em duas

espécies: a) o concubinato puro – composto por pessoas que poderiam se casar, mas

não queriam; e, b) o concubinato impuro – formado por pessoas impedidas de casar

(também chamado de adulterino ou incestuoso).

Até que com a promulgação da Carta Cidadã de 1988, em seu art. 226, §3º, a

união estável, que substituiu o concubinato, entre homem e mulher, alcançou o status de

entidade familiar. Em seguida, outras normas, como a Lei n. 8.971/94 e a Lei n. 9.278/96,

buscaram regularizar outros direitos aos companheiros, como os alimentos e a sucessão,

além de “considerar a união estável como a entidade familiar de convivência duradoura,

pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de

constituição de família, afastando, de uma vez por todas, a exigência temporal” (FARIAS;

ROSENVALD; BRAGA NETTO, 2017, p. 1.765).

Dessa forma, buscou-se dar início ao fim do preconceito estigmatizador, adquirido

por séculos, ao qual as uniões extramatrimoniais eram (e ainda são, algumas vezes)

confrontadas, bem como proteger as pessoas e suas relações nesse tipo de constituição

familiar.

4.2 ELEMENTOS

4.2.1 Características

A união estável é regida, na sua essência, pela informalidade, ou seja, não segue

os rigores formais do casamento, não necessitando, portanto, de fases às quais este está

submetido, para que tenha efeito, tais como habilitação, publicação do edital de

proclamas, celebração etc., conforme os ditames do art. 1.511 e seguintes, do Código

Civil.

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Porém, essa entidade familiar possui algumas características que dão suporte à

sua existência. Essas características são trazidas pelo art. 226, §3º, da CF/88, e pelo art.

1.723, do Código Civil, que diz:

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. § 1 o A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente. § 2 o As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união estável.

A partir da leitura desses dispositivos é possível extrair as características que

fundamentam a união estável, que são: (i) diversidade de sexos, (ii) estabilidade; (iii)

publicidade; (iv) continuidade; (v) ausência de impedimentos matrimoniais. Vale ressaltar

que todas essas características devem estar interligadas a um elemento principal, que é

o ânimo de constituir família (FARIAS; ROSENVALD; BRAGA NETTO, 2017, p. 1.769).

É possível perceber também que alguns elementos não são essenciais para a

formação da união estável, como a comprovação de um lapso temporal mínimo de

relacionamento, bem como a convivência sob o mesmo teto, que inclusive está

regulamentada pela Súmula 382, do STF.

Um ponto interessante a ser observado é que a diversidade de sexos já foi

completamente afastada pela Suprema Corte brasileira, no julgamento da ADIN

4.277/DF, em controle de constitucionalidade concentrado, na qual o entendimento da

Corte, por unanimidade do Tribunal Pleno, é de que se promova uma interpretação

conforme a Constituição do caput do art. 1.723, do CC, para se admitir a caracterização

de uma união estável hétero ou homoafetiva, reconhecendo-lhes todos os efeitos

decorrentes de uma entidade familiar (FARIAS; ROSENVALD; BRAGA NETTO, 2017, p.

1.771).

4.2.2 Efeitos, direitos e deveres

Assim como o casamento, a união estável propaga efeitos na vida dos

companheiros, podendo ser na esfera pessoal, patrimonial ou econômica.

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Maria Berenice Dias (2016, p. 422) faz um paralelo entre os deveres presentes na

união estável e no casamento. Na união estável há os deveres de lealdade, respeito e

assistência (art. 1.724, CC); já no casamento os deveres são de fidelidade recíproca, vida

no domicílio conjugal e mútua assistência (art. 1.566, CC). E como deveres em comum

tem-se a obrigação de guarda, sustento e educação dos filhos.

Entre os direitos podem ser destacados: o direito ao uso do sobrenome do

companheiro, conforme art. 57, §§ 2º e 3º, da Lei de Registros Públicos (Lei n. 6.015/73);

a possibilidade de adoção pelos companheiros, de acordo com o art. 42, § 2º, da Lei n.

12.010/09 (Lei de Adoção), além dos arts. 1.618, parágrafo único, e 1.622, ambos do

Código Civil de 2002; a sub-rogação na locação de imóvel, de acordo com o art. 11, da

Lei de Locação de Imóveis Urbanos (Lei n. 8.245/91); quando da dissolução da união

estável entre vivos, decorrem o direito à meação (a depender do regime de bens, que em

regra é o de comunhão parcial) e aos alimentos; já na dissolução por motivo da morte de

um dos conviventes, aquele que permanecer poderá reclamar o direito à meação, à

herança, à habitação e aos eventuais benefícios previdenciários (FARIAS; ROSENVALD;

BRAGA NETTO, 2017, p. 1.781).

Já há decisões que conferem direitos às “concubinas” em termos sucessórios e

previdenciários.

Uma delas reconhece os direitos sucessórios a uma das companheiras, que não

sabia da duplicidade de relações de seu parceiro, fato este que não poderia servir como

um verdadeiro escudo ao companheiro de má-fé, que construiu junto com ela um

patrimônio ao longo da relação1.

1 UNIÃO ESTÁVEL. RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO. O FATO DE MANTER DUPLA UNIÃO NÃO

SE CONSTITUI NUM BILL DE INDENTIDADE ÀQUELE QUE AGE DE FORMA A MANTER UM DOS COMPANHEIROS NA IGNORÂNCIA DE SUA ATITUDE. PARTILHA DOS BENS ADQUIRIDOS NA CONSTÂNCIA DA RELAÇÃO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO (TJSP, Apelação Cível n. 646037.4/4-00, Rel. Des. Caetano Lagrasta, j. 16.12.2009.

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Outra decisão diz respeito aos direitos previdenciários, que partilhou a pensão

deixada pelo de cujus tanto a sua esposa, mesmo eles estando separados de fato, quanto

a sua companheira (“concubina”), por estarem em uma relação paralela2.

Logo, apesar das diferenças entre o casamento e a união estável, é perceptível

que esta também possui um apanhando de direitos às pessoas que dela fazem parte,

bem como às uniões estáveis ditas paralelas, que, cada vez mais, têm seu

reconhecimento obtido tanto pela doutrina quanto pelos órgãos do Judiciário.

5 O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ

Conforme Cleyson de Moraes Mello (2017, p. 77), a origem do princípio da boa-fé

tem sua origem ainda na Antiguidade, no período da Grécia Antiga, mais precisamente

no estoicismo de Atenas, por volta do século III a.C. Ele e outros autores, como Paulo

Lôbo (2011, p. 73) e Cristiano Chaves de Farias, Felipe Braga Netto e Nelson Rosenvald

(2017, p. 894) afirmam que esse princípio também se funda no direito romano com a

noção de bona fides, que teria o significado de ser fiel à palavra dada e o dever de cumprir

a promessa feita anteriormente.

Dando um salto no tempo, Cristiano Chaves, Braga Netto e Rosenvald (2017, p.

894) ponderam que a boa-fé somente vai reaparecer no Código Napoleônico de 1804,

porém, restando absorvido pela autonomia da vontade.

Estes autores dizem ainda que é na Alemanha da Idade Média que o conceito

moderno de boa-fé se estabeleceu e que perdurara até sua codificação no Código Civil

alemão (Bürgerliches Gesetzbuch - BGB) de 1900, e sendo posteriormente adotado pelas

outras codificações romanísticas (FARIAS; BRAGA NETTO; ROSENVALD, 2017, p.

894).

2 RECURSO ESPECIAL. PENSÃO PREVIDENCIÁRIA. PARTILHA DA PENSÃO ENTRE A VIÚVA E A CONCUBINA. COEXISTÊNCIA DE VÍNCULO CONJUGAL E A NÃO SEPARAÇÃO DE FATO DA ESPOSA. CONCUBINATO IMPURO DE LONGA DURAÇÃO. “Circunstâncias especiais reconhecidas em juízo”. Possibilidade de geração de direitos e obrigações, máxime, no plano da assistência social. Acórdão recorrido não deliberou à luz dos preceitos legais invocados. Recurso especial não conhecido (STJ, RESP Nº 742.685 – RJ, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, j. 05.09.2005).

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A boa-fé como atualmente é conhecida no Brasil, divide-se em dois tipos: a

subjetiva e a objetiva.

Para Penteado (2007, p. 45-46), a boa-fé subjetiva é um estado de ignorância,

semelhante ao erro negocial, diante do qual se encontra aquele que não sabe que está

em uma situação irregular e atua como se fosse o titular do direito, ainda que sem a

efetiva titularidade e sem a consequente legitimação para o pleno exercício dele.

Nessa mesma linha Gonçalves (2012, p. 54) diz que a boa-fé subjetiva diz respeito

ao conhecimento ou à ignorância da pessoa relativamente a certos fatos, sendo levada

em consideração pelo direito, para os fins específicos da situação regulada. Serve à

proteção daquele que tem a consciência de estar agindo conforme o direito, apesar de

ser outra a realidade.

Farias, Braga Netto e Rosenvald (2017, p. 894) conceituam boa-fé subjetiva como

sendo “um estado psicológico em que a pessoa possui a crença de ser titular de um

direito que em verdade só existe na aparência. O indivíduo se encontra em escusável

situação de ignorância sobre a realidade dos fatos e da lesão a direito alheio”.

Ratificando os entendimentos anteriores, Fábio Ulhoa Coelho (2012, p. 83) expõe

que a boa-fé subjetiva “corresponde à virtude de dizer o que acredita e acreditar no que

diz. Tem relevância para o direito das coisas, na qualificação da posse, mas não é

operacionalizável no direito dos contratos”.

Judith Martins-Costa (2015, p. 40) afirma que a boa-fé subjetiva “indica um estado

de confiança objetivado ou objetivável, segundo critérios externos ao sujeito”.

Portanto, a boa-fé subjetiva, não é um princípio, mas sim um estado psicológico

internalizado pelo indivíduo que acredita, ou tem ignorância, possuir um direito que, na

verdade, pertence a outro (MORAES E ALMEIDA JÚNIOR, 2016, p. 2).

Ela está internalizada no direito brasileiro, principalmente nos arts. 1.201, 1.214,

1.219 e 1.561, todos do Código Civil de 2002. Este último, inclusive, diz respeito ao

chamado “casamento putativo”, ao qual a união estável putativa se equivale.

Já a boa-fé objetiva é conceituada por Mello (2017, p. 76-77) como sendo uma

conduta já esperada entre parceiros contratuais, ou seja, um dever jurídico imposto às

partes contratantes. É esperado das partes “uma conduta recíproca, um respeito mútuo,

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um agir leal e honesto que dignifique o exercício da sua capacidade civil com vistas à

construção de uma sociedade justa, fraterna e solidária”.

Para Gonçalves (2012, p. 55), a boa-fé objetiva é uma “norma jurídica fundada em

um princípio geral do direito, segundo o qual todos devem comportar-se de boa-fé nas

suas relações recíprocas. Classifica-se, assim, como regra de conduta”.

Em relação à boa-fé objetiva diz Paulo Lôbo (2011, p. 72-73)

A boa-fé objetiva é regra de conduta dos indivíduos nas relações jurídicas contratuais. Interessam as repercussões de certos comportamentos na confiança que as pessoas normalmente neles depositam. Confia-se no significado comum, usual, objetivo da conduta ou comportamento reconhecível no mundo social. A boa-fé objetiva importa conduta honesta, leal, correta. É a boa-fé de comportamento.

Farias, Braga Netto e Rosenvald (2017, p. 895) possuem entendimento próximo

aos anteriores, acrescentando que a boa-fé objetiva é uma “confiança adjetivada”, uma

crença efetiva no comportamento do outro.

Judith Martins-Costa (2015, p. 42-43) afirma ser tecnicamente impossível

conceituar a boa-fé objetiva, porém pode se descrever as condutas que lhe são

conformes (comportamentos exigíveis), além de suas atuações funcionais como pauta

de interpretação, fonte de integração e critério para a correção de condutas contratuais.

A cláusula geral da boa-fé objetiva é tratada no Código Civil em três dispositivos,

sendo de maior repercussão o art. 422, que diz: “Art. 422. Os contratantes são obrigados

a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de

probidade e boa-fé.”

Os demais são: o art. 113, que diz: “Art. 113. Os negócios devem ser interpretados

conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração” e o art. 187, “Art. 187. Também

comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os

limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.

O art. 422 do Código Civil é uma norma legal aberta. Com base no princípio ético

que ela acolhe, fundado na lealdade, confiança e probidade, cabe ao juiz estabelecer a

conduta que deveria ter sido adotada pelo contratante, naquelas circunstâncias, levando

em conta ainda os usos e costumes. Estabelecido esse modelo criado pelo juiz para a

situação, cabe confrontá-lo com o comportamento efetivamente realizado. Se houver

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contrariedade, a conduta é ilícita porque violou a cláusula da boa-fé, assim como veio a

ser integrada pela atividade judicial naquela hipótese. Somente depois dessa

determinação, com o preenchimento do vazio normativo, será possível precisar o

conteúdo e o limite dos direitos e deveres das partes.

5.1 O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ NAS RELAÇÕES FAMILIARES

Deve existir nas relações familiares, e em qualquer outra relação social, um

elemento que dá suporte à credibilidade nessas relações, que é a confiança. Esse

elemento é envolvido pela tutela jurídica na medida em que são protegidas “as

expectativas justas e legítimas recíprocas entre as pessoas” (FARIAS E ROSENVALD,

2016, 120).

Sobre a boa-fé objetiva e confiança nessas relações, Maria Berenice Dias afirma

o seguinte:

A boa-fé objetiva é definida como cláusula geral que impõe deveres de lealdade e respeito à confiança recíproca entre as partes de uma relação jurídica. O exercício do direito irregular consubstancia quebra da confiança e frustração de legítimas expectativas. A constatação do abuso passa, obrigatoriamente, pelo reconhecimento do uso antifuncional do direito aferido objetivamente, com base no conflito entre a sua finalidade própria e a atuação concreta da parte (2016, p. 100).

Isso pode ser explicado por um termo trazido por Cristiano Chaves e Nelson

Rosenvald, que é a “solidariedade social”, materializada através da efetivação da tutela

jurídica da confiança “impondo um dever jurídico de não serem adotados

comportamentos contrários aos interesses e expectativas despertadas em outrem”

(FARIAS E ROSENVALD, 2016, p. 120).

Especificamente no Direito de Famílias, a confiança pode se apresentar sob duas

vertentes: nas relações pessoais (como na união estável putativa, por exemplo) ou nas

relações patrimoniais (como, e. g., na compreensão dos bens a se comunicar de acordo

com os regimes de bens).

Nas relações pessoais, a confiança se materializa sob a forma do afeto, enquanto

nas relações patrimoniais ela pode se dar de variadas formas, podendo exercer o papel

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de paradigma interpretativo, atribuição integrativa ou função limitadora (FARIAS E

ROSENVALD, 2016, p. 121).

Logo, é perceptível que as relações pessoais e patrimoniais devem interagir

diretamente com a boa-fé objetiva, como muito bem dizem Farias e Rosenvald (2016, p.

122):

Pois bem, o amplo espectro de compreensão da boa-fé objetiva como mola propulsora das relações privadas impõe, assim, a sua incidência também nas relações de Direito das Famílias, sejam de índole patrimonial (como, e. g., na compreensão dos bens a se comunicar de acordo com os regimes de bens), sejam de caráter pessoal (valendo o exemplo da união estável putativa).

Portanto, o princípio da boa-fé, caracterizado como expressão similar à confiança

nas relações familiares, pode, e deve, ser aplicado a essas relações, tendo como objetivo

maior dar segurança, seja quanto ao afeto seja quanto ao patrimônio, aos seus

integrantes.

6 O INSTITUTO DA PUTATIVIDADE

A putatividade vem da palavra em latim putare, que significa crer, pensar, imaginar.

Esse termo está inicialmente vinculado à hipótese do casamento putativo. Este, por sua

vez, pode ser conceituado como aquele que “mesmo nulo ou anulável, ainda assim a lei

lhe reconhece os efeitos jurídicos àquele que o contraiu de boa-fé, podendo incidir sobre

um ou sobre ambos os cônjuges” (MADALENO, 2018, p. 216). Isso é o que pode ser

depreendido a partir da leitura do art. 1.561, do Código Civil de 2002.

Conforme Maria Berenice (2016, p. 332), “prestigia o legislador a boa-fé dos noivos

e preserva os efeitos do matrimônio”.

Ainda segundo Rolf Madaleno,

O enlace conjugal putativo surge como uma forma de amenizar as danosas consequências da retroatividade do reconhecimento judicial da nulidade ou de anulação do casamento, no tocante aos interesses dos cônjuges e dos filhos, passando o instituto a reconhecer efeitos retroativos à sentença aos que haviam casado com inequívoca boa-fé, desconhecendo ao tempo da celebração das núpcias os impedimentos geradores da invalidade do matrimônio (2018, p. 216).

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Ou seja, a putatividade não almeja convalidar ou prorrogar a validade de um

casamento inválido, mas sim dar eficácia a situações pontuais envolvendo somente

aquele(s) cônjuge(s) que esteja(m) agindo de boa-fé.

Para que seja reconhecida a putatividade são exigidos os seguintes requisitos: a)

invalidade do casamento; b) boa-fé dos cônjuges, ou de apenas um deles; c) erro

desculpável; d) declaração judicial (FARIAS E ROSENVALD, 2016, p. 248).

Podem ser citados como putativo o casamento do homem que casa com sua irmã,

sem saberem que são colaterais, e que apenas tempos depois descobriram a situação

(ambos estão de boa-fé, nesse caso), ou o casamento de mulher como homem já casado,

o qual omitiu esta situação à sua segunda cônjuge (assim, somente ela está de boa-fé,

podendo ter o direito de reconhecimento da putatividade do casamento) (FARIAS E

ROSENVALD, 2016, p. 247).

Sobre o casamento putativo e seus possíveis efeitos, dizem Suelem Alves de

Moraes e Jesualdo Eduardo de Almeida Júnior (2016) o seguinte:

A putatividade do casamento está intimamente costurada à boa fé e decorre da ignorância do indivíduo na celebração do casamento, quando contrai o matrimônio com uma falsa apreciação da realidade. Considerada a nulidade do matrimonio, o vínculo é tratado como se jamais houvesse existido. Os efeitos em relação a terceiros, filhos e o próprio patrimônio advindo dessa união se mantêm válidos por conta dessa boa-fé de um ou ambos os cônjuges, mas se provada a má-fé de um dos cônjuges, esse não desfruta dos efeitos matrimoniais. A nulidade do casamento por putatividade cessa os efeitos pessoais como responsabilidade de fidelidade, no entanto, se confirmada a boa-fé da mulher, ela poder continuar a usufruir do sobrenome do esposo. Ainda, se um dos cônjuges for emancipado pelo casamento, tal ação se manterá.

Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2016, p. 250), acreditam,

inclusive, que a tese da putatividade aplicada ao casamento putativo deve ser aceita

também para as uniões estáveis putativas:

A tese da putatividade, inclusive, parece, aos nossos olhos, também incidir nas uniões estáveis. Em sendo assim, a pessoa que estabelece uma convivência afetiva com uma outra, como se casados fossem (convivência more uxório), reputando e confiando que se trata de uma família convivencial, merece proteção. Com isso, se a pessoa enganada vem a descobrir, posteriormente, a existência de um impedimento matrimonial a obstar a caracterização da união estável (como, e. g., o fato do suposto companheiro já ser casado), terá o direito de ver reconhecida a sua boa-fé e projetados os efeitos jurídicos da sua união estável (putatividade). Nesse caso, merecerá proteção especial, por simples analogia do aludido art. 1.561 do Código de 2002 – que autoriza o reconhecimento do casamento putativo. Pensar diferente seria criar uma desastrosa situação, através da qual uma pessoa casar pela segunda vez seria mais confortável para

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o cônjuge enganado do que se fosse estabelecida uma união estável por uma pessoa que já é casada.

Logo, a putatividade busca proteger aquele que está agindo de boa-fé em uma

relação que, a princípio, nem deveria existir por ser aparentemente ilegal.

7 A (IM)POSSIBILIDADE DO RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA

É sabido que, desde tempos remotos, a posição amplamente majoritária, seja pela

doutrina, seja pela jurisprudência, é a de negação de todo e qualquer efeito às uniões

afetivas paralelas às ditas “oficiais”, com respaldo de se estar protegendo o princípio da

monogamia, como afirma Carlos Roberto Gonçalves (2017, p. 709): “O vínculo entre os

companheiros, assim, tem de ser único, em vista do caráter monogâmico da relação”.

Todavia, é preciso perceber que apesar da monogamia ser um princípio

organizador das relações afetivas, como dito por Rodrigo da Cunha Pereira (p. 172,

2021), deve-se atentar para outros princípios tão primordiais quanto ele, como são a

dignidade da pessoa humana e a boa-fé.

Esse mesmo autor, no entanto, pondera afirmando que esse princípio da

monogamia tem sido flexibilizado ao serem levados em consideração outros princípios

norteadores do Direito de Família.

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 226, não trouxe um rol taxativo, “[...]

o que representa uma possibilidade para o reconhecimento dos mais diversos tipos de

arranjos familiares que se encontram à margem do Direito de Família” (GOECKS E

OLTRAMARI, 2009).

Não poderia, portanto, o legislador infraconstitucional criar qualquer tipo de

embaraço aos companheiros, não importando se um deles mantém concomitantemente

outra relação a dois, o jocosamente chamado “concubinato”, conforme dito pelo art.

1.727, do Código Civil de 2002: “Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e

a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato”.

Como muito bem trazido por Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho

(2019, p. 471-472), hoje não se pode mais admitir que o concubinato seja sinônimo de

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união estável, já que são situações diferentes, estando a união estável muito mais

próxima do conceito de casamento:

Hoje em dia, o concubinato (relação entre amantes), sob o prisma eminentemente técnico, não pode ser confundido com a união estável, uma vez que, a teor do art. 1.727 do Código Civil — posto que possa gerar determinados efeitos jurídicos, como veremos em capítulo próprio — não consubstancia, em geral, um paradigma ou standard familiar, traduzindo, simplesmente, uma relação não eventual entre o homem e a mulher, impedidos de casar. A união estável, por seu turno, não se coaduna com a mera eventualidade na relação e, por conta disso, ombreia-se ao casamento em termos de reconhecimento jurídico, firmando-se como forma de família, inclusive com expressa menção constitucional (CF, § 3.º do art. 226).

A justiça brasileira tem flexibilizado o princípio da monogamia ao ponderá-lo com

outros princípios norteadores do Direito de Família, como o da dignidade e

responsabilidade, para atribuir direitos às famílias que se constituem paralelamente a um

casamento ou a uma união estável.

Em um Estado que se proclama democrático e orientado pelo princípio pluralista

inclusivo, não há lugar para o regramento unívoco da conjugalidade. Estabelecer um

padrão para todas as relações conjugais, com as facilidades e praticidades inerentes a

determinado modelo único, talvez seja o caminho mais fácil e mais apto a proporcionar a

chamada segurança jurídica, porém a vida e os relacionamentos são dinâmicos, criativos,

voláteis e mutantes.

Rodrigo da Cunha Pereira (2021, p. 362) afirma que a monogamia não se resume

simplesmente a uma norma moral ou moralizante, ela é também um princípio que faz

parte da organização jurídica da família no mundo ocidental. E que, por isso, não permite

a ocorrência simultânea de duas uniões estáveis ou de dois casamentos. Mas que isso

não deve impedir que sejam tratadas a situações em que isso aconteça, pois devem ser

também levados em consideração os princípios da dignidade da pessoa humana, da

solidariedade e da responsabilidade, para que não haja a perpetuação das injustiças

históricas às pessoas em situação de constituição de famílias paralelas ou simultâneas.

Maria Berenice Dias, em sua obra Manual de Direito das Famílias (2021, p. 60), é

ainda mais enfática ao afirmar que a monogamia não é nem princípio, mas sim uma regra:

Uma ressalva merece ser feita: a monogamia não é um princípio do direito estatal de família, é regra restrita a proibição de múltiplas relações matrimonializadas, constituídas sob a chancela do Estado. Monogamia é um imperativo da cultura. Um modo de organização da família conjugal. O seu negativo, ou o seu avesso,

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não significa necessariamente o horror de toda organização social, ou seja, a promiscuidade. Traição e infidelidade não ensejam a quebra do sistema

monogâmico.

Nas palavras da professora Érica Canuto (2013, p. 94), os preceitos monogâmicos

não podem servir como um álibi para afastar direitos de famílias formadas a partir de

uniões simultâneas, uma vez que a própria Constituição protege qualquer forma de

modelo familiar.

Portanto, não se pode aceitar que sob o véu da monogamia se cubram os direitos,

legítimos, daqueles que estão em situação de união estável putativa, mormente aquele

que está de boa-fé, tal qual a previsão legal para o casamento putativo do art. 1.561, do

Código Civil Brasileiro de 2002.

7.1 INTERPRETAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 1.561, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002

O art. 1.561, do Código Civil, trata do casamento putativo, dizendo: “Art. 1.561.

Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o

casamento, em relação a estes como aos filhos, produz todos os efeitos até o dia da

sentença anulatória”.

Logo se vê que a putatividade no casamento em muito se assemelha a das uniões

paralelas. Para estas, inclusive, há correntes doutrinárias que fazem sua análise.

De acordo com Caio Mário Pereira, há três teorias doutrinárias a respeito das

uniões paralelas:

A primeira, capitaneada por Maria Helena Diniz, nega o reconhecimento de uniões estáveis paralelas, com base no dever de fidelidade ou de lealdade e no princípio da monogamia. A segunda, majoritária, considera a boa-fé e aplica analogicamente a lógica do casamento putativo caso o terceiro esteja certo de que integra uma entidade familiar nos termos legais, sem o conhecimento de que o outro é casado ou mantém união diversa. Nesses casos, o companheiro de boa-fé possuirá os direitos assegurados à união estável, sem prejuízo dos danos morais cabíveis. A terceira, defendida por Maria Berenice Dias, admite uniões estáveis concomitantes, independentemente de boa-fé, considerando que o dever de fidelidade não é requisito essencial à caracterização da união estável (2018, p. 571).

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A segunda teoria é exatamente a conceituação de união estável putativa, que se

aplica analogicamente ao casamento putativo, previsto no art. 1.561, do Código Civil,

conforme o entendimento de Flávio Tartuce (2020, p. 1.966).

Anderson Schreiber, na sua obra Manual de Direito Civil (p. 1.110-1.111), traz uma

passagem bastante rica e elucidativa sobre essa questão do art. 1.561, do Código Civil

de 2002:

Para além dessa inicial incongruência, veja-se uma mais marcante. O art.1.561 do Código Civil dispõe que ‘embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o casamento, em relação a estes como aos filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória. § 1º Se um dos cônjuges estava de boa-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só a ele e aos filhos aproveitarão’. Nos exatos termos do dispositivo, o casamento nulo – que, como ato nulo, não produziria, segundo a civilística tradicional, nenhum efeito – mantém-se plenamente eficaz em relação ao cônjuge ‘de boa-fé’. Ou seja, quem se casa, sem saber do prévio vínculo matrimonial do seu cônjuge, violando a regra da exclusividade do casamento e o imperativo monogâmico, não perde, se estiver de boa-fé, a proteção jurídica de ordem familiar. O casamento produz, em relação ao cônjuge de boa-fé, todos os seus efeitos. Ora, se a violação à regra imperativa de exclusividade do casamento não implica perda de proteção jurídica ao cônjuge de boa-fé, a constituição de união estável – que deriva de circunstância fática e não exige, como visto, exclusividade – não poderia resultar na perda de proteção ao convivente de boa-fé. Trata-se de uma questão de isonomia (quem casa com pessoa casada não pode ter tratamento mais benéfico que quem passa a conviver com ela, faticamente), além de consequência lógica e necessária de um sistema jurídico que se queira, minimamente, coerente.

A esse respeito, e em concordância com o eminente autor, também fala Rodrigo

da Cunha Pereira (2021, p. 362):

Considerando que o casamento e os seus ingredientes são um forte paradigma de constituição de família, neste caso deve-se também ser invocado para ser aplicada analogicamente a putatividade. Em outras palavras, se no casamento putativo são concedidos os efeitos para o contraente de boa-fé, aqui também pode ser invocado este princípio, ou seja, a(o) companheira(o), sendo pessoa de boa-fé na relação conjugal, e, pelo menos por parte dela(e), sendo uma relação monogâmica, não há razões para negar a concessão de todos os efeitos da união estável.

Assim sendo, é preciso que as decisões tomadas pelos órgãos do judiciário, em

todas as suas instâncias, tomem por analogia a utilização do art. 1.561, do CC/2002, às

situações de uniões estáveis putativas, pois, caso contrário, serão decisões incoerentes,

não isonômicas, injustas e, além disso, discriminatórias, uma vez que as situações

previstas pelo art. 1.561 e seus parágrafos são absolutamente semelhantes às das

uniões estáveis putativas.

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7.2 AVANÇOS NAS DECISÕES JUDICIAIS

As relações paralelas, de forma geral, por si sós já são alvos de grandes

controvérsias. Com a união estável putativa, portanto, ocorre a mesma situação. Porém,

apesar de ser um assunto polêmico, assim como o casamento putativo, o fato de parcela

da sociedade repudiar sua existência não a faz desmerecer a sua devida proteção,

devidamente estampada em sede Constitucional. É por meio desse caminho que é

trilhado o entendimento de Maria Berenice Dias (2016, p. 421-422):

[...] afirmar a inexistência da entidade familiar é, muitas vezes, castigar quem nem sabia da reprovabilidade de tal agir, ou até submeteu-se a uma situação que lhe foi imposta. A postura omissiva, a negativa de extrair efeitos jurídicos de situação existente não é a solução mais adequada para atender aos mais elementares princípios da justiça e da ética. O casamento, embora nulo, mas realizado de boa-fé, produz todos os efeitos jurídicos até que seja desconstituído (CC 1.561). No mínimo, em se tratando de união estável que afronta aos impedimentos legais, há que se invocar o mesmo princípio e reconhecer a existência de uma união estável putativa. Estando um ou ambos os conviventes de boa-fé, indispensável atribuir efeitos à união, tal como ocorre no casamento putativo.

Para que tal situação de união estável putativa seja reconhecida, no entanto, é

preciso que os requisitos atinentes às uniões estáveis comuns estejam presentes,

principalmente o afeto, caracterizando-a como uma convivência marital à luz de quem a

veja (FARIAS E ROSENVALD, 2016, p. 485).

Dando apoio às evoluções e realidades fáticas da sociedade, os tribunais

começam a dar um novo entendimento às uniões paralelas.

Vários dos julgados nesse sentido são do Tribunal de Justiça do Rio Grande do

Sul, reconhecido por ser um tribunal de vanguarda em muitas decisões paradigma.

A primeira decisão do egrégio Tribunal gaúcho aborda especificamente a questão

da união estável putativa, uma vez que as provas colacionadas aos autos demonstraram

não só o vínculo afetivo, público e notório, mas também, e, principalmente, a boa-fé da

companheira3.

3 UNIÃO ESTÁVEL. SITUAÇÃO PUTATIVA. AFFECTIO MARITALIS. NOTORIEDADE E PUBLICIDADE

DO RELACIONAMENTO. BOA-FÉ DA COMPANHEIRA. PROVA DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL. JUNTADA DE DOCUMENTOS COM A APELAÇÃO. DESCABIMENTO. 1. Descabe juntar com a apelação

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Outras decisões desse Tribunal reconhecem a união estável paralela, bem como

direito de meação, e até “triação”, quanto à partilha dos bens adquiridos na constância

da união4 5 6.

Na mesma esteira do TJRS, outros tribunais pelo país também já se debruçaram

sobre o tema, como o Tribunal de Justiça do Maranhão e o Tribunal de Justiça de Santa

documentos que não sejam novos ou relativos a fatos novos supervenientes. Inteligência do art. 397 do CPC. 2. Tendo o relacionamento perdurado até o falecimento do varão e se assemelhado a um casamento de fato, com coabitação, clara comunhão de vida e de interesses, resta induvidosa a affectio maritalis. 3. Comprovada a notoriedade e a publicidade do relacionamento amoroso havido entre a autora e o de cujus, é cabível o reconhecimento de união estável putativa, quando fica demonstrado que a autora não sabia do relacionamento paralelo do varão com a mãe da ré. Recurso provido (TJRS. AC 70025094707. 7ª Câm. Cív – Comarca de Gravataí. Rel. Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves. j. 22.10.2008. DJERS 30.10.2008) (grifo do autor). 4 APELAÇÃO. UNIÃO ESTÁVEL CONCOMITANTE AO CASAMENTO. POSSIBILIDADE. DIVISÃO DE BEM. “TRIAÇÃO”. VIÁVEL O RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL PARALELA AO CASAMENTO. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. CASO EM QUE A PROVA DOS AUTOS É ROBUSTA EM DEMONSTRAR QUE A APELANTE MANTEVE UNIÃO ESTÁVEL COM O FALECIDO, MESMO ANTES DELE SE SEPARAR DE FATO DA ESPOSA. NECESSIDADE DE DIVIDIR O ÚNICO BEM ADQUIRIDO NO PERÍODO EM QUE O CASAMENTO FOI CONCOMITANTE À UNIÃO ESTÁVEL EM TRÊS PARTES. “TRIAÇÃO”. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. DERAM PROVIMENTO, POR MAIORIA (TJRS, Acórdão 70024804015, Guaíba, 8.ª Câmara Cível, Rel. Des. Rui Portanova, j. 13.08.2009, DJERS 04.09.2009, p. 49) (grifo do autor). 5 APELAÇÃO CÍVEL. UNIÃO ESTÁVEL. RELACIONAMENTO PARALELO AO CASAMENTO. SE MESMO

NÃO ESTANDO SEPARADO DE FATO DA ESPOSA, VIVIA O FALECIDO EM UNIÃO ESTÁVEL COM A AUTORA/COMPANHEIRA, ENTIDADE FAMILIAR PERFEITAMENTE CARACTERIZADA NOS AUTOS, DEVE SER RECONHECIDA A SUA EXISTÊNCIA, PARALELA AO CASAMENTO, COM A CONSEQUENTE PARTILHA DE BENS. PRECEDENTES. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA, POR MAIORIA (TJRS, Acórdão 70021968433, Canoas, 8.ª Câmara Cível, Rel. Des. José Ataídes Siqueira Trindade, j. 06.12.2007, DOERS 07.01.2008, p. 35) (grifo do autor). 6 APELAÇÃO. UNIÃO DÚPLICE. UNIÃO ESTÁVEL. POSSIBILIDADE. A PROVA DOS AUTOS É ROBUSTA E FIRME A DEMONSTRAR A EXISTÊNCIA DE UNIÃO ENTRE A AUTORA E O DE CUJUS EM PERÍODO CONCOMITANTE AO CASAMENTO DE “PAPEL”. RECONHECIMENTO DE UNIÃO DÚPLICE. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. OS BENS ADQUIRIDOS NA CONSTÂNCIA DA UNIÃO DÚPLICE SÃO PARTILHADOS ENTRE A ESPOSA, A COMPANHEIRA E O DE CUJUS. MEAÇÃO QUE SE TRANSMUDA EM ‘TRIAÇÃO’, PELA DUPLICIDADE DE UNIÕES. DERAM PROVIMENTO, POR MAIORIA, VENCIDO O DES. RELATOR (TJRS, Apelação Cível 70019387455, 8.ª Câmara Cível, Rel. Rui Portanova, j. 24.05.2007) (grifo do autor).

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Catarina, reconhecendo a possibilidade de uniões dúplices, devendo existir, contudo, a

boa-fé de pelo menos uma das partes7 8.

Há, ainda, outros dois julgados, ambos do STF, que, apesar da maioria dos

Ministros terem ido no sentido de não reconhecimento de direitos ao concubino, tiveram

votos divergentes que merecem ser destacados.

O primeiro deles é o caso citado por Flávio Tartuce (2020, p. 1.963), no qual um

homem manteve, por 37 anos, duas relações paralelas – uma com sua esposa e a outra

7 DIREITO DE FAMÍLIA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE UNIÃO ESTÁVEL POST

MORTEM. CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL SIMULTÂNEOS. RECONHECIMENTO. POSSIBILIDADE. PROVIMENTO. 1. Ainda que de forma incipiente, doutrina e jurisprudência vêm reconhecendo a juridicidade das chamadas famílias paralelas, como aquelas que se formam concomitantemente ao casamento ou à união estável. 2. A força dos fatos surge como situações novas que reclamam acolhida jurídica para não ficarem no limbo da exclusão. Entre esses casos, estão exatamente as famílias paralelas, que vicejam ao lado das famílias matrimonializadas. 3. Para a familiarista Giselda Hironaka, a família paralela não é uma família inventada, nem é família imoral, amoral ou aética, nem ilícita. E continua, com esta lição: ‘Na verdade, são famílias estigmatizadas, socialmente falando. O segundo núcleo ainda hoje é concebido como estritamente adulterino, e, por isso, de certa forma perigoso, moralmente reprovável e até maligno. A concepção é generalizada e cada caso não é considerado por si só, com suas peculiaridades próprias. É como se todas as situações de simultaneidade fossem iguais, malignas e inseridas num único e exclusivo contexto. O triângulo amoroso sub-reptício, demolidor do relacionamento número um, sólido e perfeito, é o quadro que sempre está à frente do pensamento geral, quando se refere a famílias paralelas. O preconceito, ainda que amenizado nos dias atuais, sem dúvida, ainda existe na roda social, o que também dificulta o seu reconhecimento na roda judicial’. 4. Havendo nos autos elementos suficientes ao reconhecimento da existência de união estável entre a apelante e o de cujus, o caso é de procedência do pedido formulado em ação declaratória. 5. Apelação cível provida (TJMA, Recurso 19.048/2013, Acórdão 149.918/2014, 3.ª Câmara Cível, Rel. Des. Jamil de Miranda Gedeon Neto, j. 10.07.2014, DJEMA 17.07.2014). (grifo do autor). 8 DIREITO DE FAMÍLIA. RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE DUPLA UNIÃO ESTÁVEL. MORTE

DO COMPANHEIRO. PRETENSÃO SECUNDÁRIA DE RECEBIMENTO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS JUNTO AO INSS. UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA. PROVA ORAL E DOCUMENTAL QUE EVIDENCIA A EXISTÊNCIA DE DUPLICIDADE DE UNIÕES. COMPANHEIRAS QUE, MUTUAMENTE, DESCONHECEM ESSA REALIDADE. BOA-FÉ CONFIGURADA. PUTATIVIDADE QUE IMPLICA A PROTEÇÃO JURÍDICA DE AMBOS OS RELACIONAMENTOS. DIVISÃO IGUALITÁRIA DA PENSÃO DEIXADA PELO VARÃO (ART. 226 PAR. 3° DA CF E ARTS. 1.723 E 1.561 DO CC). RECURSOS IMPROVIDOS. 1. A união estável é reconhecida como entidade familiar consubstanciada na convivência pública, contínua e duradoura com o fito de constituição de família, competindo à parte interessada demonstrá-la adequada e concretamente, seja por elementos de prova oral ou documental. 2. Embora seja predominante, no âmbito do direito de família, o entendimento da inadmissibilidade de se reconhecer a dualidade de uniões estáveis concomitantes, é de se dar proteção jurídica a ambas as companheiras em comprovado o estado de recíproca putatividade quanto ao duplo convívio com o mesmo varão, mostrando-se justa a solução que alvitra a divisão da pensão derivada do falecimento dele e da terceira mulher com quem fora casado (TJSC. AC 2009.041434-7. 4ª Câm. Cív. – Comarca de Lages. Rel. Des. Eládio Torret Rocha. j. 10.11.2011). (grifo do autor).

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com sua concubina, que pleiteavam, concomitantemente os direitos previdenciários após

o seu falecimento.

A maioria dos Ministros votou pela não existência de união estável, mas sim de

concubinato entre o de cujus e a sua concubina. Porém, divergindo de seus pares, o

Ministro Carlos Ayres de Britto, chegou à conclusão de que a concubina deveria ser

tratada como companheira, conforme trecho de seu voto a seguir:

Com efeito, à luz do Direito Constitucional brasileiro o que importa é a formação em si de um novo e duradouro núcleo doméstico. A concreta disposição do casal para construir um lar com um subjetivo ânimo de permanência que o tempo objetivamente confirma. Isto é família, pouco importando se um dos parceiros mantém uma concomitante relação sentimental a dois. No que andou bem a nossa Lei Maior, ajuízo, pois ao Direito não é dado sentir ciúmes pela parte supostamente traída, sabido que esse órgão chamado coração ‘é terra que ninguém nunca pisou’. Ele, coração humano, a se integrar num contexto empírico da mais entranhada privacidade, perante a qual o Ordenamento Jurídico somente pode atuar como instância protetiva. Não censora ou por qualquer modo embaraçante (...) 17. No caso dos presentes autos, o acórdão de que se recorre tem lastro factual comprobatório da estabilidade da relação de companheirismo que mantinha a parte recorrida com o de cujus, então segurado da previdência social. Relação amorosa de que resultou filiação e que fez da companheira uma dependente econômica do seu então parceiro, de modo a atrair para a resolução deste litígio o § 3.º do art. 226 da Constituição Federal. Pelo que, também desconsiderando a relação de casamento civil que o então segurado mantinha com outra mulher, perfilho o entendimento da Corte Estadual para desprover, como efetivamente desprovejo, o excepcional apelo. O que faço com as vênias de estilo ao relator do feito, ministro Marco Aurélio9.

O outro caso, esse sendo o Tema de Repercussão Geral n. 529, julgamento do

RE 1.045.273/SE, no STF, também citado por Tartuce (2020, p. 1.969), diz respeito a um

homem que manteve duas uniões estáveis concomitantes, sendo uma com sua

companheira e a outra com um companheiro. No caso concreto, a pensão por morte foi

deferida à companheira e à filha do segurado instituidor falecido. Em seguida, o

companheiro recorreu para ter reconhecida sua união estável com o de cujus e, por

conseguinte, seus efeitos previdenciários.

Em seu voto, o ilustre Ministro Luiz Edson Fachin afirmou que houve o

reconhecimento, pelo Tribunal de Justiça de Sergipe – TJSE, da união estável

homoafetiva, conforme julgamento da Ação de Descumprimento de Preceito

Fundamental – ADPF 132, restando a análise da concomitância entre uniões estáveis.

9 STF, RE 397.762-8/BA, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 03.06.2008.

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Assim, em trecho de clareza ímpar de seu voto, tem-se:

O fio condutor para o desate do tema, limitado ao campo previdenciário, jaz na boa-fé. A questão central, pois, reside na boa-fé. Aliás, esta é a condição até mesmo para os efeitos do casamento nulo ou anulável, nos termos do Código Civil: “Art. 1.561. Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o casamento, em relação a estes como aos filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória”. Como se vê, o casamento anulável ou mesmo nulo produz todos os efeitos até o dia da sentença que o invalida. Na situação dos autos, por causa da morte, cessaram as relações jurídicas, mas os efeitos, de boa-fé, devem ser preservados. Ademais, a boa-fé se presume, inexistente demonstração em sentido contrário, prevalece a presunção, especialmente porque não se cogita de boa-fé subjetiva e sim de boa-fé objetiva. Desse modo, uma vez não comprovado que ambos os companheiros concomitantes do segurado instituidor, na hipótese dos autos, estavam de má-fé, ou seja, ignoravam a concomitância das relações de união estável por ele travadas, deve ser reconhecida a proteção jurídica para os efeitos previdenciários decorrentes. Assim, o caso é de provimento do recurso extraordinário, possibilitando o rateio da pensão por morte entre os conviventes10.

Foram também vencidos os Ministros Luis Roberto Barroso, Rosa Weber, Cármen

Lúcia e Marco Aurélio. Ou seja, foi uma derrota por número mínimo.

Ao final, o STF elaborou a seguinte tese, proposta pelo Relator, o Ministro

Alexandre de Moraes, contra a possibilidade do reconhecimento de duas uniões

concomitantes: “A preexistência de casamento ou de união estável de um dos

conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1.723, § 1º, do Código Civil, impede o

reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins

previdenciários, em virtude da consagração do dever de fidelidade e da monogamia pelo

ordenamento jurídico-constitucional brasileiro.”

Muito embora esses entendimentos citados estejam inovando no direito brasileiro,

ainda há muito o que percorrer, pois as Cortes Superiores, STF e STJ, como visto acima,

ainda possuem posicionamentos, majoritários, firmados à não aceitação do

reconhecimento das uniões paralelas.

Contudo, como pode ser demonstrado, por meio de doutrina e de decisões

judiciais favoráveis, além de votos individuais de Ministros dos tribunais superiores, não

só é possível, mas também se faz necessário que a união estável putativa seja

devidamente reconhecida, tanto judicial quanto legalmente, para que os direitos das

10 STF, RE 1.045.273/SE, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 09.04.2021.

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pessoas envolvidas nesse tipo de relação sejam protegidos, fazendo-as efetivar seus

direitos, dentre eles a sua dignidade humana.

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A sociedade está em constante transformação, e o Direito busca acompanhar

essas mudanças, porém, muitas vezes, não consegue ter a mesma velocidade e a

agilidade necessária a suprir as novas demandas por ele recebido.

Um exemplo é a nova concepção de família, trazida pela Constituição Federal de

1988, em seu art. 226. É uma concepção inovadora justamente por não colocar limites

ao conceito de família, ao contrário de sua predecessora, a Constituição Federal de 1967,

que afirmava, expressamente, no art. 167, que “a família é constituída pelo casamento

[...]”.

A partir, então, dessa amplitude de entendimento do que seja “família”, foi possível

que se estendesse a proteção a todo e qualquer tipo de formação de entidade familiar,

desde que cumpridos determinados requisitos. Isso também levou a um respeito à

dignidade das pessoas, uma vez que elas poderiam escolher a melhor formação de sua

própria família.

Como visto durante a pesquisa, ainda há setores da sociedade que desaprovam

certas arranjos de entidades familiares, por motivos morais, religiosos ou por qualquer

outro motivo, que não estritamente jurídicos. O certo é que a Lei Maior é absolutamente

cristalina e a evolução social, nesse caso, é irreversível. Não podem, portanto, a lei ou o

Judiciário interferirem dizendo qual seria o modelo familiar mais ou menos adequado às

pessoas.

É sabido, porém, que o casamento foi, durante muito tempo, admitido como a única

forma aceita de entidade familiar, relegando as demais formações familiares a uma certa

clandestinidade, pois, ainda assim, existiam de fato. Com o passar do tempo, outras

situações de modelos familiares foram sendo toleradas e aceitas, como o casamento

putativo, que no Brasil é previsto no art. 1.561, do atual Código Civil.

O que tornou o casamento putativo protegido pelo Estado foi a presença da boa-

fé objetiva dos cônjuges, ou de pelo menos um deles (neste caso, somente o cônjuge de

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boa-fé está protegido). A boa-fé objetiva, portanto, passou a ser um elemento

fundamental para determinar as situações que se encaixariam no conceito de casamento

putativo.

Entende-se, deste modo, não fazer sentido que a união estável putativa não possa

ser reconhecida, jurídica, legal e socialmente, uma vez que ela é a analogia fidedigna ao

casamento putativo, e este estar abraçado pelas regras do Direito, enquanto aquela, não.

A pessoa de boa-fé numa relação de união estável putativa, não deve ser tratada

meramente como concubina, mas, sim, como verdadeira companheira para todos os

efeitos.

Aline Bueno (2011) sintetiza muito bem todos esses pensamentos com o

seguinte adágio: “Negar a alguém que nunca pensou viver em uma união paralela o

reconhecimento de uma união estável fere não só sua honra, como também sua

dignidade, princípio este basilar no Direito pátrio”.

É preciso que sejam feitos futuros estudos para um aprofundamento sobre as

causas de rejeição ao reconhecimento da união estável putativa, seja legal seja

moralmente, bem como uma pesquisa mais abrangente sobre as decisões mais

recentes que tratam desse tema.

Aos legisladores fica registrado o apelo para que se inclua a previsão da união

estável putativa no Código Civil, tal qual o casamento civil putativo, em seu art. 1.561.

Conclui-se, por fim, que o trabalho apresentado trouxe uma percepção para um

problema vivido no seio de muitas famílias Brasil afora, mas que está, ainda, dando os

primeiros passos em busca de reconhecimento juntamente com outros tantos, como as

uniões homoafetivas (reconhecidas apenas judicialmente), as famílias poliafetivas,

monoparentais, pluriparentais, entre outras.

Nos dizeres de Maria Berenice Dias (2021, p. 71), não se pode negar a tutela

jurídica aos arranjos familiares formados a partir do sentimento de afeto e que ocasiona

uma ligação pessoal e patrimonial, caso contrário se estaria promovendo o

enriquecimento ilícito, além de ser frontalmente contra a ética e conivente com a

injustiça.

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