Resenha - Oração cartas a Malcolm

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Página | 1 - www.ElielVieira.org - RESENHA: “ORAÇÃO: CARTAS A MALCOLM” – C. S. LEWIS Por Eliel Vieira O lançamento do livro Oração: Cartas a Malcolm, de C. S. Lewis, pela Editora Vida coincidiu exatamente com um período do ano de 2009 que eu estava (na verdade, eu ainda estou) querendo muito ler sobre a oração. Decidi comprar o livro já na sua semana de lançamento e ir lendo-o aos poucos. Terminei a leitura e, aqui, vai minha resenha sobre o livro. “Oração” é algo difícil para se comentar. Há quem diga que oração não se entende, se faz. Tal pensamento simplista, no entanto, não sacia aqueles que possuem questionamentos sobre o ato de conversar com o Criador. Eu mesmo tenho muitas dúvidas referentes à oração, por exemplo: a Bíblia diz que Deus é imutável (isto é, Ele não muda) e que seus planos e propósitos também não mudam. Então, suponhamos que o plano de Deus é que X aconteça com João. Se João orar pedindo por Y, isto não vai acontecer (pois Deus não muda seus planos); e orar por X seria de certa forma inútil, afinal, X aconteceria, pedindo João a Deus ou não. A Bíblia diz também que Deus já sabe o que vamos pedir, antes mesmo que as palavras tomem forma em nossa boca – se é assim, por que orar? Quando um grupo de quatro pessoas se reúne para orar sobre uma questão específica, se uma delas não orar, Deus deixará de responder (por causa desta uma que não orou)? Se for assim, inútil foi a oração das outras três pessoas. Ele vai responder? Se for assim, não era necessário que tivesse ali mais de uma pessoa orando (como se ensina na igreja, que quanto maior for o “clamor” levantando, mais isso “toca no coração de Deus”). Questionamentos como esses não são apenas meus, mas todos têm. Este último (sobre o grupo de pessoas orando) eu lembro que o tive lá pelos meus oito anos de idade. Às vezes parece a nós que estamos falando sozinho – que não há ninguém “do outro lado” que esteja prestando atenção do que dizemos. Escrevendo sobre o luto que sentiu após sua amada morrer, C. S. Lewis escreveu palavras duras e profundas sobre a maneira pela qual Deus supostamente se posiciona ante as nossas orações:

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RESENHA: “ORAÇÃO: CARTAS A

MALCOLM” – C. S. LEWIS

Por Eliel Vieira

O lançamento do livro Oração: Cartas a Malcolm, de C. S. Lewis, pela Editora Vida coincidiu

exatamente com um período do ano de 2009 que eu estava (na verdade, eu ainda estou) querendo

muito ler sobre a oração. Decidi comprar o livro já na sua semana de lançamento e ir lendo-o aos

poucos. Terminei a leitura e, aqui, vai minha resenha sobre o livro.

“Oração” é algo difícil para se comentar. Há quem diga que oração não se entende, se faz. Tal

pensamento simplista, no entanto, não sacia aqueles que possuem questionamentos sobre o ato de

conversar com o Criador. Eu mesmo tenho muitas dúvidas referentes à oração, por exemplo: a Bíblia

diz que Deus é imutável (isto é, Ele não muda) e que seus planos e propósitos também não mudam.

Então, suponhamos que o plano de Deus é que X aconteça com João. Se João orar pedindo por Y, isto

não vai acontecer (pois Deus não muda seus planos); e orar por X seria de certa forma inútil, afinal, X

aconteceria, pedindo João a Deus ou não. A Bíblia diz também que Deus já sabe o que vamos pedir,

antes mesmo que as palavras tomem forma em nossa boca – se é assim, por que orar? Quando um

grupo de quatro pessoas se reúne para orar sobre uma questão específica, se uma delas não orar, Deus

deixará de responder (por causa desta uma que não orou)? Se for assim, inútil foi a oração das outras

três pessoas. Ele vai responder? Se for assim, não era necessário que tivesse ali mais de uma pessoa

orando (como se ensina na igreja, que quanto maior for o “clamor” levantando, mais isso “toca no

coração de Deus”).

Questionamentos como esses não são apenas meus, mas todos têm. Este último (sobre o grupo

de pessoas orando) eu lembro que o tive lá pelos meus oito anos de idade. Às vezes parece a nós que

estamos falando sozinho – que não há ninguém “do outro lado” que esteja prestando atenção do que

dizemos. Escrevendo sobre o luto que sentiu após sua amada morrer, C. S. Lewis escreveu palavras

duras e profundas sobre a maneira pela qual Deus supostamente se posiciona ante as nossas orações:

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“Mas, volte-se para Ele, quando estiver em grande necessidade, quando toda forma de amparo for

inútil, e o que você encontrará? Uma porta fechada na sua cara, ao som do ferrolho sendo passado duas

vezes do lado de dentro”1.

Uma das razões de gostar de C. S. Lewis é esta maneira totalmente sincera de falar sobre coisas

sobre as quais nós provavelmente mediríamos as palavras. Quem nunca teve a mesma impressão que

Lewis de “uma porta na cara” após uma oração? Sendo assim, o que C. S. Lewis teria a nos dizer sobre

a oração?

C. S. Lewis jamais escreveu um livro sobre a oração, porém, trocou cartas com seu amigo

Malcolm tratando sobre o tema. Oração: Cartas a Malcolm é um ajuntamento destas 22 cartas

enviadas por C. S. Lewis ao seu amigo Malcolm onde eles discutem sobre aspectos da oração e da

adoração em geral.

Por alguma razão as cartas de Malcolm a Lewis não foram publicadas (talvez estas cartas

tenham se perdido), o que torna a obra incompleta. Seria muito interessante podermos ler, depois da

carta de um, a resposta do outro. Como não há no livro as cartas de Malcolm, temos que forçar nosso

raciocínio e tentar imaginar qual foi o conteúdo da carta que Malcolm escreveu para Lewis, que gerou

as reações de Lewis na carta seguinte. Tal exercício não é muito difícil uma vez que Lewis sempre

comentava o conteúdo da última cara recebida de Malcolm, quando escrevia as suas.

Sobre o conteúdo das cartas de Lewis, como era de se esperar, é muito rico e válido. Suas

argumentações perspicazes e, como eu disse, Lewis é extremamente sincero em suas palavras. Veja

estas a seguir, da 21ª carta:

Bem, digamos a verdade agora, custe o que custar. A oração é enfadonha. Qualquer desculpa

para preteri-la nunca é mal vinda. Quando acaba, espalha-se uma sensação de alívio e feriado

sobre o restante do dia. Relutamos em começar. Deliciamo-nos em terminar. Enquanto

estamos orando, mas não quando estamos lendo um romance ou resolvendo uma palavra

cruzada, qualquer ninharia é suficiente para nos distrair.2

Que cristão teria coragem de dizer isto dentro de sua igreja sem temer ser chamado de

“desviado” (para dizer pouco)?

1 LEWIS, C. S. A anatomia de uma dor. São Paulo: Editora Vida, 2007.

2 LEWIS, C. S. Oração: cartas a Malcolm. São Paulo: Editora Vida, 2009.

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Enfim, as cartas de Lewis a Malcolm sobre a oração serão de muito valia a você que possui

dúvidas e questionamentos sobre este aspecto da vida cristã. Lewis não maquia suas opiniões sobre o

tema, mas os leva até as últimas conseqüências (o autor, por exemplo, chega a propor que o purgatório

não é uma teoria assim tão sem lógica; que não é pecado fazer pedidos aos mortos; e também que não

é pecado orar por eles).

Se você procura por livros de auto-ajuda que enfeitam o tema (jogando as questões polêmicas

para debaixo do tapete), Oração: Cartas a Malcolm vai te escandalizar. Se você procura ler algo sobre

a oração que aborde sem receios as questões que ninguém tem coragem de abordar, as cartas de Lewis

a Malcolm vão ser úteis a você.

Como não se trata de um livro convencional (começo, meio e fim), Oração: Cartas a Malcolm

não traz uma discussão mais detalhada sobre a oração, tratando de todos os pormenores relacionados

ao tema. Trata-se, como eu já disse, de uma coleção de cartas. Tais cartas podem, no entanto, fomentar

sua curiosidade de pesquisar e refletir sobre o tema.

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