€¦ · Resumo Sejam Dum anel com divis˜ao, Kum subanel com divisao de De Xum conjunto. O D-anel...

93
Corpos livres em an´ eis com divis˜ ao ´ Erica Zancanella Tese apresentada ao Instituto de Matem ´ atica e Estat ´ ıstica da Universidade de S ˜ ao Paulo para obtenc ¸ ˜ ao do t ´ ıtulo de Doutor em Ci ˆ encias ´ Area de Concentra¸ ao: Matem´ atica Orientador: Prof. Dr. Vitor de Oliveira Ferreira Durante o desenvolvimento deste trabalho a autora recebeu aux´ ılio financeiro da CAPES e do CNPq ao Paulo, setembro de 2007

Transcript of €¦ · Resumo Sejam Dum anel com divis˜ao, Kum subanel com divisao de De Xum conjunto. O D-anel...

Corpos livres em aneis com divisao

Erica Zancanella

Tese apresentadaao

Instituto de Matematica e Estatısticada

Universidade de Sao Paulopara

obtencao do tıtulode

Doutor em Ciencias

Area de Concentracao: Matematica

Orientador: Prof. Dr. Vitor de Oliveira Ferreira

Durante o desenvolvimento deste trabalho a autora recebeu auxılio financeiro da CAPES e do CNPq

Sao Paulo, setembro de 2007

ii

Resumo

Sejam D um anel com divisao, K um subanel com divisao de D e X um conjunto. O D-anellivre sobre K em X, DK〈X〉 = D ∗

KK〈X〉, possui um corpo universal de fracoes denominado corpo

livre e denotado por DK<(X)>. Neste trabalho fazemos uma investigacao acerca de condicoes que,quando satisfeitas por um anel com divisao, sejam suficientes para garantir a existencia de um subanelisomorfo a algum corpo livre nao-comutativo, e tambem descrevemos famılias de aneis com divisaoque satisfazem as condicoes encontradas. Os aneis com divisao que provamos conter um corpo livresao, em sua maioria, completamentos de corpos de fracoes de domınios noetherianos com topologiadefinida por uma valorizacao.

Palavras-chave: anel, anel com divisao, corpo livre, valorizacao.

iii

iv

Abstract

Let D be a division ring, K a subfield of D and X a set. The D-free ring over K on X,DK〈X〉 = D ∗

KK〈X〉, has an universal field of fractions called a free field and denoted by DK<(X)>.

In this work we look into conditions which, when satisfied by a division ring, are sufficient to guaranteethe existence of a subring isomorphic to some non-commutative free field, and we also describe familiesof division rings which satisfy the conditions that were found. The majority of the division rings thatwe proved to contain a free field are completions of fields of fractions of Noetherian domains withtopology defined by a valuation.

Keywords: ring, division ring, free field, valuation.

v

vi

Sumario

Lista de Sımbolos ix

Introducao 1

1 Nocoes Preliminares 5

1.1 Corpos livres . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

1.2 Aneis de quocientes e domınios de Ore . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

1.3 Valorizacoes e completamentos de aneis com divisao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

1.4 Grupos nilpotentes, finitamente gerados, livres de torcao . . . . . . . . . . . . . . . . . 18

1.5 Aneis de grupo e series de Malcev-Neumann . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

1.6 Extensoes de Ore e series de Laurent skew . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24

1.7 Algebras de Lie e envolventes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

2 Corpos livres em aneis com divisao valorizados 33

2.1 O Teorema de Chiba . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

2.2 Aneis com divisao arbitrarios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34

2.3 Corpos livres e especializacoes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

3 Series de Malcev-Neumann 39

3.1 Uma valorizacao de K((G)) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39

vii

viii SUMARIO

3.2 Corpos livres em K((G)) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45

3.3 Corpos livres em K((G, σ)) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47

4 Series de Laurent 49

4.1 Series de Laurent skew . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49

4.2 O completamento do corpo de Weyl . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54

4.3 O completamento do corpo das matrizes quanticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55

5 Uma classe de aneis com valorizacao t-adica 59

5.1 O completamento de um anel com divisao gerado por um anel com valorizacao t-adica 59

5.2 O completamento do corpo de Lie . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60

6 Alguns aneis com divisao que nao contem corpos livres 65

6.1 Um resultado geral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65

6.2 O corpo de Weyl . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72

6.3 O corpo de fracoes de KG . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74

7 Consideracoes Finais 77

Referencias Bibliograficas 79

Indice Remissivo 82

Lista de Sımbolos

Vamos fixar algumas notacoes que serao bastante utilizadas no decorrer da tese. Sejam R umanel, S ⊂ R um subconjunto, M um R-modulo, K ⊂ D aneis com divisao, X um conjunto e m, ninteiros positivos.

N O conjunto dos numeros naturais (incluindo o 0).Z O anel dos numeros inteiros.Q O corpo dos numeros racionais.R O corpo dos numeros reais.⊂ Usado para inclusao. Usado para inclusao estrita.R∗ O conjunto dos elementos nao-nulos do anel R.Z(R) O centro do anel R.CenR(S) O centralizador de S em R.〈S〉 O ideal de R gerado por S.J(R) O radical de Jacobson de R.Aut(R) O grupo dos automorfismos do anel R.IdM , 1M O homomorfismo identidade do R-modulo M .Mm×n(R), mRn O anel das matrizes m× n sobre R.In A matriz identidade de tamanho n× n.M(R) O anel de matrizes sobre R de tamanho adequado ao contexto.I, 1 A matriz identidade de tamanho adequando ao contexto.DK〈X〉 O D-anel livre sobre X, centralizando K.DK<(X)> O corpo livre.car(D) A caracterıstica do anel com divisao D.

ix

x LISTA DE SIMBOLOS

Introducao

O interesse na compreensao da estrutura de aneis com divisao tem ja uma razoavelmente longahistoria, mas apenas recentemente resultados mais profundos tem surgido na literatura. Uma dasprincipais conjecturas na area data do final dos anos 70 e foi proposta por Lichtman em [21]: “SejaD um anel com divisao nao-comutativo. Entao o grupo multiplicativo de D contem um grupo livrenao-cıclico”. Essa conjectura foi verificada em algumas classes de aneis com divisao; em especial,Goncalves [11, 12] mostrou ser a conjectura verdadeira para aneis com divisao de dimensao finitasobre seus centros. Mais recentemente, Chiba [2] demonstrou que a conjectura e valida para aneiscom divisao de centro nao-enumeravel. Outros trabalhos diretamente relacionados com esse problemasao [10,13,22–24,32,39].

Um problema analogo foi proposto por Makar-Limanov em [31]: “Seja D um anel com divisaode dimensao infinita e finitamente gerado sobre seu centro k. Entao D contem uma subalgebra livrede posto 2 sobre k”. Algebras livres foram construıdas em alguns aneis com divisao conhecidos([26,29,30,33]), mas nenhum metodo geral foi ainda encontrado.

Nos anos 90, inspirado por trabalhos de Goncalves e Shirvani [42, 43], Makar-Limanov proposuma conjectura que engloba as duas acima: “Seja D um anel com divisao de dimensao infinita efinitamente gerado sobre seu centro k. Entao D contem, como subalgebra, a algebra de grupo dogrupo livre de posto 2 sobre k”.

Sejam D um anel com divisao, K um subanel com divisao de D e X um conjunto. O D-anel livresobre K em X, DK〈X〉, possui um corpo universal de fracoes denominado corpo livre e denotadopor DK<(X)>. Recentemente, Chiba [3] foi capaz de exibir aneis com divisao contendo corpos livres.Se um anel com divisao contem um corpo livre entao ele contem a algebra de grupo de um grupolivre ([20]) e, portanto, contem uma algebra livre e um grupo livre. O trabalho de Chiba [3] pode serconsiderado, assim, como uma contribuicao no sentido de iluminar a investigacao acerca da existencia

1

2 INTRODUCAO

de objetos livres em aneis com divisao. Por outro lado, Lichtman mostrou que o corpo universal defracoes da primeira algebra de Weyl, apesar de conter uma subalgebra livre, nao contem um corpolivre.

Neste trabalho, procuramos encontrar condicoes suficientes para garantir a existencia de umsubanel isomorfo a um corpo livre em um anel com divisao nao-comutativo de dimensao infinita etambem descrever famılias de aneis com divisao que satisfacam tais condicoes, preferencialmente,buscando incluir os exemplos ja encontrados por Chiba. Os aneis com divisao que provamos conterum corpo livre sao, em sua maioria, completamentos de corpos de fracoes de domınios noetherianoscom topologia definida por uma valorizacao.

No Capıtulo 1 introduziremos detalhadamente as definicoes de corpo livre e corpo universal defracoes, e apresentaremos varias propriedades relacionadas a esses conceitos. Tambem nesse capıtuloserao apresentados varios outros conceitos e resultados que serao bastante utilizados no decorrerda tese. Embora alguns desses resultados possam ser bastante conhecidos pelo leitor, eles seraointroduzidos com o intuito de tornar o trabalho o mais completo possıvel.

No Capıtulo 2 provaremos o Teorema 2.2.4, o qual e uma especie de generalizacao do Corolario 1de [3] para corpos arbitrarios, uma vez que tal resultado foi provado em [3] para corpos enumeraveis.Tambem neste capıtulo provaremos um teorema que permite “puxar” corpos livres por meio de umaespecializacao cujo contradomınio contenha um corpo livre.

No Capıtulo 3 aplicaremos o Teorema 2.2.4 para provar a existencia de corpos livres em umanel com divisao de series de Malcev-Neumann de um grupo nilpotente, finitamente gerado, livre detorcao, nao-abeliano.

No Capıtulo 4 aplicaremos o Teorema 2.2.4 para encontrar condicoes suficientes para garantira existencia de corpos livres em famılias de corpos de series de Laurent skew. Dentre esses corposde series de Laurent estao o completamento do corpo de fracoes da primeira algebra de Weyl emcaracterıstica zero e o completamento do corpo das matrizes quanticas 2× 2 (com topologia definidapor uma valorizacao).

No Capıtulo 5 provaremos uma condicao suficiente para garantir a existencia de um corpo livreem um anel com divisao construıdo por Lichtman em [25]. Tambem nesse capıtulo provaremos aexistencia de um corpo livre no completamento de um corpo de fracoes da envolvente universal deuma algebra de Lie em caracterıstica zero.

INTRODUCAO 3

Finalmente, no Capıtulo 6, apresentaremos dois exemplos de aneis com divisao que nao contemcorpos livres sobre um determinado corpo, embora contenham uma algebra livre sobre esse mesmocorpo. Tais exemplos nos foram apresentados por Lichtman e aqui serao detalhados.

No decorrer da tese todos os aneis serao associativos, nao necessariamente comutativos (salvomencao contraria) e com unidade preservada por homomorfismos, herdada por subaneis e que agecomo a identidade nos modulos. Um elemento a de um anel R sera chamado divisor do zero aesquerda se existir b 6= 0 em R tal que ab = 0. Divizores do zero a direita sao definidos de maneirasimetrica. Um elemento que nao for um divisor do zero (nem a esquerda nem a direita) sera chamadoregular. Um anel tal que todos os seus elementos nao-nulos forem regulares sera chamado domınio.Um anel cujos elementos nao-nulos forem todos inversıveis sera chamado corpo ou anel com divisao.Para um corpo qualquer D, o subcorpo de D gerado por 1 sera chamado corpo primo. Por fim, umconjunto X sera dito enumeravel se existir uma correspondencia bijetora entre X e Z+, onde Z+ eo conjunto dos numeros inteiros positivos.

4 INTRODUCAO

Capıtulo 1

Nocoes Preliminares

Iniciaremos nossos estudos introduzindo alguns conceitos que serao uteis nos capıtulos que se-guem. Dentre esses conceitos destacamos a definicao de “corpo livre”, que sera apresentada ja naSecao 1.1. Nossos resultados provarao a existencia de corpos livres em determinados aneis com divisaoque, em sua maioria, serao obtidos como completamento de corpos de fracoes de domınios de Ore.Tal completamento esta relacionado com a topologia definida por uma metrica induzida por umavalorizacao. Para isso apresentaremos nas Secoes 1.2 e 1.3 as definicoes de domınios de Ore e valo-rizacoes e algumas de suas propriedades. Destre essas propriedades destacamos que toda valorizacaodefinida num domınio de Ore pode ser estendida de maneira unica a seu corpo de fracoes. Algunsdomınios de Ore que serao considerados sao aneis de grupo de um grupo nilpotente, finitamentegerado, livre de torcao. Tal grupo e ordenado e por isso o corpo de fracoes de seu anel de grupo podeser imerso num corpo de series de Malcev-Neumann. Tais definicoes e resultados serao apresentadosnas Secoes 1.4 e 1.5. Outros domınios de Ore que tambem serao considerados sao algumas extensoesde Ore ou aneis de polinomios skew que, em certos casos, podem ser imersos num corpo de seriesde Laurent, como veremos na Secao 1.6. Embora nao seja necessariamente um domınio de Ore, aenvolvente universal associativa de uma algebra de Lie tambem possui um corpo de fracoes, cujocompletamento contem corpo livre, como sera mostrado. As definicoes de algebra de Lie e envolventeuniversal serao apresentadas na Secao 1.7. Nem todos os resultados enunciados neste capıtulo seraocitados no decorrer do texto. Sua inclusao tem o objetivo de minimizar a consulta a outros trabalhos.

1.1 Corpos livres

Nesta secao apresentaremos dentre outras coisas a definicao de corpo livre, conceito fundamental

5

6 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

neste trabalho. Todos os conceitos e resultados citados nesta secao podem ser encontrados em [5], [6]e [8].

Seja R um anel. Por um R-anel entendemos um anel L com um homomorfismo R −→ L. Para Rfixado, os R-aneis formam uma categoria onde os morfismos sao os homomorfismos de aneis L −→ L′

tais que o diagrama

R

������

���

@@@

@@@@

L // L′

seja comutativo. Um R-anel que e um corpo e chamado R-corpo. Um R-corpo e chamado epico seele for gerado como corpo pela imagem de R. Um R-corpo epico K tal que o homomorfismo R −→ K

e injetor, e dito um corpo de fracoes de R.

O unico homomorfismo de R-aneis possıvel entre dois R-corpos epicos e um isomorfismo. Poisqualquer homomorfismo entre dois corpos deve ser injetor e, neste caso, a imagem sera um corpocontendo a imagem de R, portanto temos uma sobrejecao. Por esse motivo, e necessario consideraraplicacoes mais gerais. Define-se um homomorfismo local entre R-corpos K, L como um homomor-fismo de R-aneis f : K0 −→ L de um R-subanel K0 de K em L tal que todo elemento de K0 que naopertence a Ker(f) tem inverso em K0. Segue da definicao que K0 e um anel local com ideal maximalKer(f) e, portanto, K0/Ker(f) e um corpo isomorfo a Im(f) ⊂ L. Como Im(f) e um subcorpo deL contendo a imagem de R em L, entao se L for um R-corpo epico, Im(f) = L. Portanto, todohomomorfismo local em um R-corpo epico e sobrejetor. Dois homomorfismos locais de um R-corpoK em um R-corpo L sao considerados equivalentes se eles coincidem sobre um R-subanel K0 de Ke a restricao comum a K0 e tambem um homomorfismo local. Esta relacao e de fato uma relacao deequivalencia. Agora, uma especializacao entre dois R-corpos K e L e definida como uma classe deequivalencia de homomorfismos locais de K em L. Frequentemente escreveremos f : K −→ L paradenotar uma especializacao de K em L, ficando subentendido que existe um R-subanel K0 de K eum homomorfismo local f : K0 −→ L. Diremos nesse caso que f : K −→ L e uma especializacaocom domınio K0.

Os R-corpos e especializacoes formam uma categoria denotada por FR. Vejamos como composicaode duas especializacoes e definida. Dadas duas especializacoes f : K −→ L, g : L −→ M , sejamK0, L0 os domınios de f e g, respectivamente, e considere K1 = {x ∈ K0 : f(x) ∈ L0}, f1 = f |K1 .Entao K1 e um R-subanel de K, gf1 : K1 −→ M e um homomorfismo local e portanto define uma

1.1. CORPOS LIVRES 7

especializacao de K em M .

Seja ER a subcategoria plena de FR cujos objetos sao os R-corpos epicos. Um objeto inicial emER e chamado um R-corpo universal . Explicitamente, um R-corpo universal e um R-corpo epicoU tal que para todo R-corpo epico K existe uma unica especializacao U −→ K. Claramente umR-corpo universal, se existe, e unico a menos de isomorfismo. Suponha que R tenha um R-corpouniversal U . Entao R tem um corpo de fracoes se e somente se U e seu corpo de fracoes; de fato, seU e corpo de fracoes de R entao R tem um corpo de fracoes. Por outro lado, se R tem um corpode fracoes K entao existe uma unica especializacao f : U −→ K. Seja U0 o domınio de f e sejamλU : R −→ U e λK : R −→ K os homomorfismos canonicos. Entao o triangulo

RλU

~~}}}}

}}}

λK

��@@@

@@@@

@

U0 f// K

e comutativo. Como λK e injetor, λU e injetor. Assim U e um corpo de fracoes de R. Neste caso, Ue dito o corpo universal de fracoes de R.

A existencia de R-corpos epicos esta intrinsicamente relacionada com determinados conjuntos dematrizes sobre R, como veremos a seguir.

Definicao 1.1.1. Sejam R e S aneis e seja Σ um conjunto de matrizes sobre R (de tamanhosarbitrarios). Um homomorfismo f : R −→ S e dito Σ-inversor se para toda matriz A em Σ, f(A)for uma matriz inversıvel sobre S, onde f(A) denota a matriz sobre S obtida de A por aplicacao def a cada uma de suas entradas.

E fundamental observar que para todo conjunto Σ de matrizes sempre existe um homomorfismoΣ-inversor universal : por este termo entendemos um homomorfismo λ : R −→ RΣ que e Σ-inversore tal que todo homomorfismo Σ-inversor f pode ser fatorado de maneira unica por λ, ou seja, dadof : R −→ S tal que f(Σ) consiste de matrizes inversıveis, existe um unico homomorfismo f : RΣ −→ S

tal que o diagrama

Rf //

�

S

f

>>}}}}}}}}

8 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

comute. O anel RΣ e determinado a menos de isormorfismo por essas condicoes e e dito o anel Σ-inversor universal ou tambem uma localizacao universal de R. Tal anel sempre existe (para quaisquerescolhas de R e Σ) e duas construcoes distintas podem ser encontradas em [6, pg. 390] e [8, pg. 162].Temos entao o seguinte resultado:

Teorema 1.1.2. Seja R um anel arbitrario e Σ um conjunto qualquer de matrizes sobre R. Entaoexiste uma localizacao universal RΣ, unica a menos de isomorfismo, com um homomorfismo Σ-inversor universal

λ : R −→ RΣ.

Alem disso, λ e injetora se e somente se R pode ser imerso num anel sobre o qual todas as matrizesde Σ sao inversıveis.

Demonstracao: Ver Teorema 7.2.1 de [6].

Definicao 1.1.3. Seja R um anel. Um conjunto Σ de matrizes sobre R e dito multiplicativo superior

se 1 ∈ Σ e sempre que A, B ∈ Σ, entao

(A C

0 B

)∈ Σ para toda matriz C de tamanho apropri-

ado. Conjuntos multiplicativos inferiores sao definidos analogamente (com C no canto inferior).Se Σ e multiplicativo inferior e toda matriz de Σ ainda pertence a Σ apos qualquer permutacao delinhas e colunas, entao Σ e dito multiplicativo. (Claramente um conjunto multiplicativo e tambemmultiplicativo inferior.)

O proximo teorema mostra como qualquer R-corpo epico K pode ser descrito em termos doconjunto das matrizes sobre R que sao inversıveis sobre K.

Teorema 1.1.4. Seja R um anel. Entao

(i) se Σ e um conjunto de matrizes tal que a localizacao universal RΣ e um anel local, entao o corpode resıduos de RΣ e um R-corpo epico e

(ii) se K e um R-corpo epico e Σ e o conjunto de todas as matrizes sobre R cujas imagens saoinversıveis sobre K, entao Σ e multiplicativo e RΣ e um anel local com corpo de resıduosisomorfo a K.

Demonstracao: Ver Teorema 7.2.2 de [6].

1.1. CORPOS LIVRES 9

Vejamos agora como toda especializacao tambem pode ser descrita em termos de matrizes sobreR.

Teorema 1.1.5. Sejam R um anel qualquer, K1, K2 R-corpos epicos quaisquer, Σi o conjunto detodas as matrizes sobre R que sao inversıveis sobre Ki e Ri a localizacao universal RΣi, i = 1, 2.Entao sao equivalentes:

(a) existe uma especializacao K1 −→ K2,

(b) Σ1 ⊃ Σ2,

(c) existe um homomorfismo de R aneis R2 −→ R1.

Se existe uma especializacao de K1 em K2 e uma de K2 em K1, entao K1∼= K2.

Demonstracao: Ver Teorema 7.2.4 de [6].

Uma especializacao de R-corpos e dita propria se ela nao for um isomorfismo. Segue do teoremaanterior que

Corolario 1.1.6. Se um R-corpo epico K for uma localizacao universal, entao K nao pode ser obtidopor uma especializacao propria de qualquer outro R-corpo.

Em particular, se R tem um R-corpo universal U , entao U e o unico R-corpo epico que pode seruma localizacao universal.

Dentre todas as matrizes sobre um anel R as mais importantes neste trabalho sao as matrizesplenas:

Definicao 1.1.7. Sejam R um anel e A ∈ mRn, onde mRn denota o conjunto das matrizes m × n

sobre R. A matriz A e dita plena a esquerda se para quaisquer P ∈ mRr, Q ∈ rRn, A = PQ implicarr ≥ m. Matrizes plenas a direita sao definidas de modo similar e uma matriz plena a esquerda e adireita e chamada de matriz plena.

Segue da definicao acima que uma matriz e plena se e somente se ela for quadrada, digamos n×n,e nao puder ser escrita como produto de uma matriz n× r por uma matriz r × n, com r < n.

10 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

Definicao 1.1.8. Seja R um anel e A ∈ mRn. O posto interno de A, denotado por ρ(A), e o menorinteiro r tal que A = BC, com B ∈ mRr, C ∈ rRn.

Observe que se A ∈ mRn entao A e plena a esquerda se e somente se ρ(A) = m; A e plena adireita se e somente se ρ(A) = n. Segue que as matrizes plenas sobre R sao exatamente as matrizesn× n (n ≥ 1) de posto interno n. Quando R e um anel com divisao entao as matrizes plenas sobreR constituem exatamente o conjunto das matrizes inversıveis. (Ver [6, pg. 160].)

Definicao 1.1.9. Um domınio de Sylvester e um anel nao-nulo R tal que para todo n,

PQ = 0, com P ∈ rRn, Q ∈ nRs, implicar ρ(P ) + ρ(Q) ≤ n.

Nosso interesse agora e apresentar a classe dos aneis que tem um corpo universal de fracoes sobreo qual toda matriz plena pode ser invertida.

Um homomorfismo de aneis e chamado de honesto se ele leva matrizes plenas em matrizes plenas.Em particular, um homomorfismo em um corpo K e honesto se ele inverte todas as matrizes plenas.O conjunto de todas as matrizes plenas sobre um anel R sera denotado por Φ = Φ(R), e um homo-morfismo de aneis e dito plenamente inversor se ele for Φ-inversor. Observe que todo homomorfismoplenamente inversor f : R −→ S em um anel nao-nulo S deve ser injetivo, uma vez que todo elementonao-nulo de R e pleno, como uma matriz 1× 1, e entao sua imagem por f e um elemento inversıvelde S.

Teorema 1.1.10. Para todo anel R as seguintes condicoes sao equivalentes:

(a) RΦ e um corpo;

(b) R tem um homomorfismo que preserva posto interno em um corpo;

(c) R e um domınio de Sylvester.

Alem disso, RΦ e o corpo universal de fracoes de R.

Demonstracao: Ver Teorema 7.5.10 de [6] e Teorema 4.5.8 de [8].

1.1. CORPOS LIVRES 11

Este resultado nos mostra que os domınios de Sylvester formam precisamente a classe de todosos aneis que tem corpo universal de fracoes sobre o qual toda matriz plena pode ser invertida. (Ver[6, pg. 417].)

Seja k um corpo comutativo. Uma k-algebra livre e descrita facilmente por sua propriedadeuniversal: dado um conjunto X existe uma k-algebra A = k〈X〉 e uma funcao i : X −→ A tal quetoda funcao θ : X −→ B em uma k-algebra B pode ser fatorada unicamente por i, ou seja, existeum unico homomorfismo de k-algebras θ′ : A −→ B tal que o diagrama

X

�

i // A

θ′~~~~~~

~~~

B

comuta. Esta algebra e unica a menos de isomorfismo e seus elementos podem ser escritos de maneiraunica como combinacoes lineares sobre k de produtos da forma x1x2 · · ·xn com xi ∈ X, n ≥ 0,incluindo o produto vazio que e o elemento unidade de A. (Ver [6, pg. 59].)

Seja K um corpo nao-necessariamente comutativo. Podemos definir o K-anel livre K〈X〉 sobreum conjunto X pela seguinte propriedade universal: K〈X〉 e gerado por X como um K-anel e todafuncao f : X −→ R em um K-anel R tal que f(x)a = af(x), para todo a ∈ K e todo x ∈ X, podeser estendida a um unico homomorfismo de K-aneis f ′ : K〈X〉 −→ R. Este K-anel e unico a menosde isomorfismo e seus elementos podem ser escritos de maneira unica na forma

a0 +∑

ai1···inxi1xi2 · · ·xin ,

com a0, ai1···in ∈ K, xij ∈ X,n ≥ 1. (Ver [5, pg. 111].) Se K for comutativo K〈X〉 nada mais e quea K-algebra livre em X.

Seja D um corpo com subcorpo K e considere o co-produto D ∗KK〈X〉. (Para qualquer anel

R o co-produto de uma famılia de R-aneis (Rλ) sempre existe, e denotado por ∗RRλ e e chamado

co-produto sobre R. Ver [5, pg. 94] e [8, pg. 205].) Esse co-produto nada mais e que o D-anel geradopor X com relacoes ax = xa, para x ∈ X e a ∈ K. (Ver [6, pg. 61].) Ele e denotado por DK〈X〉 e echamado D-anel livre sobre K em X. Segue da definicao de co-produto que DK〈X〉 tem a seguintepropriedade universal:

Proposicao 1.1.11. Seja R um D-anel com homomorfismo canonico µ : D −→ R. Se f : X −→ R

12 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

e uma funcao tal que f(x)µ(a) = µ(a)f(x), para todo a ∈ K e todo x ∈ X, entao existe um unicohomomorfismo de D-aneis f : DK〈X〉 −→ R tal que f(x) = f(x), para todo x ∈ X.

Observe que quando D = K temos DK〈X〉 = K ∗KK〈X〉 = K〈X〉, o K-anel livre em X.

Teorema 1.1.12. Seja D um anel com divisao com subcorpo K, e seja X um conjunto. Entaoo D-anel livre DK〈X〉 e um domınio de Sylvester. (Mais precisamente, DK〈X〉 e um fir. Ver[6, pg. 114].)

Segue dos dois ultimos teoremas que DK〈X〉 tem um corpo universal de fracoes sobre o qual todamatriz plena e inversıvel. Esse corpo universal de fracoes e chamado corpo livre e e denotado porDK<(X)>. Quando D = K ele e denotado por K<(X)>.

Vejamos alguns resultados importantes sobre os corpos livres.

Proposicao 1.1.13. Sejam K ⊂ D ⊂ E corpos arbitrarios e seja X um conjunto. Entao existe umainclusao natural

DK<(X)>−→ EK<(X)> .

Demonstracao: Ver o Corolario da pg. 114 de [5].

Proposicao 1.1.14. Seja D um corpo com um subcorpo K e seja D(t) o corpo das funcoes racionaissobre uma indeterminada central t. Entao existe uma inclusao natural

DK<(X)>−→ D(t)K(t)<(X)> .

Demonstracao: A demonstracao e analoga a da Proposicao 5.4.4 de [8].

Teorema 1.1.15. Sejam E ⊂ D aneis com divisao e seja X um conjunto. Entao o subcorpo deD<(X)> gerado por X sobre E e naturalmente isomorfo a E<(X)>.

Demonstracao: Ver Teorema 5.8.12 de [8].

Teorema 1.1.16. Seja E um corpo com um subcorpo central C, seja D um subcorpo de E e sejak = D ∩ C. Entao para qualquer conjunto X existe uma inclusao natural

Dk<(X)>−→ EC<(X)>,

1.2. ANEIS DE QUOCIENTES E DOMINIOS DE ORE 13

se e somente se D e C forem linearmente disjuntos em E sobre k (ou seja, se e somente se ohomomorfismo natural D ⊗k C −→ E for injetor).

Demonstracao: Ver Teorema 6.4.6 de [8].

Observacao 1.1.17. Sejam R e S domınios de Sylvester e denotemos por U(R), U(S) seus corposuniversais de fracoes. E importante observar que R ⊂ S nao implica U(R) ⊂ U(S). Na verdade issoacontece se e somente se a inclusao R −→ S for honesta. (Ver Teorema 1.1.10.)

1.2 Aneis de quocientes e domınios de Ore

Na secao anterior introduzimos o conceito de corpo de fracoes de um anel R. Sabemos que tododomınio comutativo possui um corpo de fracoes, que e unico a menos de isomorfismo. No entanto,quando a hipotese de comutatividade nao e exigida, este resultado esta longe de ser verdadeiro.Existem domınios que nao podem ser imersos em nenhum anel com divisao (como por exemplo,a construcao de Malcev, que pode ser vista em [19, pg. 290–292]) e portanto nao possuem corposde fracoes. Por outro lado existem domınios que possuem dois corpos de fracoes nao-isomorfos,como veremos no Capıtulo 6, e portanto possuem “mais de um” corpo de fracoes. No entanto, comalgumas hipoteses adicionais, e possıvel encontrar uma classe de domınios que possuem corpos defracoes, unicos a menos de isomorfismo e cujos elementos possuem uma forma normal.

Definicao 1.2.1. Um subconjunto S de um anel R e dito ser multiplicativo se 1 ∈ S, 0 6∈ S eab ∈ S, para quaisquer a, b ∈ S.

Definicao 1.2.2. Seja R um anel e seja S ⊂ R um conjunto mulplicativo. Um anel R′ e dito seruma localizacao a direita de R em S ou um anel de quocientes a direita de R com respeito a S seexistir um homomorfismo de aneis ϕ : R −→ R′ tal que:

(a) ϕ e S-inversor, ou seja, ϕ(s) e inversıvel, para todo s ∈ S;

(b) todo elemento de R′ tem a forma ϕ(a)ϕ(s)−1, para algum a ∈ R e algum s ∈ S;

(c) Ker(ϕ) = {r ∈ R : rs = 0 para algum s ∈ S}.

Teorema 1.2.3. Seja R um anel e seja S um subconjunto de R. Entao R possui um anel dequociente a direita com respeito a S, denotado por RS−1, se e somente se as seguintes condicoesforem satisfeitas:

14 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

(1) S e multiplicativo.

(2) Para quaisquer a ∈ R, s ∈ S, aS ∩ sR 6= ∅.

(3) Para quaisquer a ∈ R, s ∈ S, sa = 0 implicar at = 0 para algum t ∈ S.

Neste caso, ϕ : R −→ RS−1 e dado por ϕ(a) = a · 1−1 e todo elemento de RS−1 pode ser escrito naforma ϕ(a)ϕ(s)−1 = as−1, para algum a ∈ R e algum s ∈ S.

Demonstracao: Ver Teorema 4.10.6 de [19].

Um subconjunto S de um anel R que satisfaz a condicao (2) do teorema acima e dito um conjuntode Ore a direita. Se S satisfaz a condicao (3) ele e dito reversıvel a direita e se ele satisfaz as trescondicoes do teorema ele e dito um conjunto denominador a direita.

Corolario 1.2.4. Sejam a1s−11 , a2s

−12 , . . . , ans

−1n ∈ RS−1 elementos arbitrarios. Entao existem

b1, b2, . . . , bn ∈ R e s ∈ S tais que ais−1i = bis

−1, para todo i = 1, . . . , n. (Expressamos este resultadodizendo que qualquer conjunto finito de elementos de RS−1 pode ser colocado num denominadorcomum.)

Demonstracao: Ver [19], pg. 301.

Corolario 1.2.5. Seja S um conjunto denominador a direita em R. Entao ϕ : R −→ RS−1 e umhomomorfismo S-inversor universal, ou seja, para todo homomorfismo de aneis ψ : R −→ R′ que eS-inversor existe um unico homomorfismo de aneis f : RS−1 −→ R′ tal que ψ = fϕ.

Demonstracao: Ver Corolario 4.10.11 de [19].

De forma analoga tambem temos as nocoes de conjunto de Ore a esquerda, conjunto reversıvel aesquerda e de conjunto denominador a esquerda. Alem disso o Teorema 1.2.3 e o Corolario 1.2.5 temsuas respectivas versoes a esquerda. Segue do Corolario 1.2.5 e da sua versao a esquerda o seguinteresultado:

Corolario 1.2.6. Se ambos RS−1 e S−1R existem entao RS−1 ∼= S−1R.

Demonstracao: Ver Teorema 4.10.14 de [19].

1.2. ANEIS DE QUOCIENTES E DOMINIOS DE ORE 15

Seja S ⊂ R um conjunto multiplicativo. Se S for central em R entao, claramente, S e um conjuntodenominador a direita e a esquerda. Se S for um conjunto de elementos regulares de R entao S ereversıvel a direita e a esquerda e, neste caso, ϕ : R −→ RS−1 e injetora. Se S consistir de todos oselementos regulares de R, dizemos R e um anel de Ore a direita se e somente se S for um conjuntode Ore a direita, se e somente se RS−1 existe, pelo Teorema 1.2.3. Neste caso dizemos que RS−1

e o anel de quocientes classico a direita de R. Os analogos a esquerda dessas nocoes sao definidossimilarmente. Se R for um anel de Ore a direita e a esquerda dizemos que R e um anel de Ore. Porexemplo, todo anel comutativo e um anel de Ore, pelas consideracoes acima.

Seja R um anel e seja S = R∗, o conjunto dos elementos nao-nulos de R. Neste caso a condicao(2) do Teorema 1.2.3 pode ser escrita da seguinte forma equivalente:

aR ∩ bR 6= 0, para quaisquer a, b ∈ R∗.

Esta condicao e chamada de condicao de Ore a direita sobre R. Portanto temos

Corolario 1.2.7. Seja R um domınio. Entao R e um anel de Ore a direita (resp. esquerda) se esomente se R satisfaz a condicao de Ore a direita (resp. esquerda). Neste caso, R e dito um domıniode Ore a direita (resp. esquerda), e o anel de quocientes classico RR∗−1 (resp. R∗−1R) e um corpo,chamado corpo de quocientes classico a direita (resp. esquerda) de R e e, obviamente, um corpo defracoes de R.

Demonstracao: Ver Corolario 1.3.3 de [8].

Proposicao 1.2.8. O corpo de fracoes de um domınio de Ore a direita e unico a menos de isomor-fismo.

Demonstracao: Ver Proposicao 1.3.4 de [8].

Proposicao 1.2.9. Todo domınio noetheriano a direita e um domınio de Ore a direita.

Demonstracao: Ver Proposicao 1.3.6 de [8].

Definicao 1.2.10. Seja R um domınio. Um ideal a direita (resp. esquerda) I de R e dito principalse ele for gerado por um unico elemento, ou seja, se I = aR (resp. Ra), para algum a ∈ R. Se todos

16 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

os ideais a direita (resp. esquerda) de R forem principais R e dito um domınio de ideais principaisa direita (resp. esquerda).

Uma vez que todo domınio de ideais principais a direita e um domınio noetheriano a direita([18, (1.18) pg. 20]) temos

Corolario 1.2.11. Todo domınio de ideais principais a direita e um domınio de Ore a direita e,portanto, tem um (unico) corpo de fracoes.

Demonstracao: Ver Corolario 1.3.7 de [8].

Por exemplo, se D e um anel com divisao e z e uma indeterminada central entao o anel depolinomios D[z] e um domınio de ideais principais a direita e a esquerda e, portanto, e um domıniode Ore com corpo de quocientes classico denotado por D(z) e chamado corpo das funcoes racionaissobre D.

1.3 Valorizacoes e completamentos de aneis com divisao

Nesta secao, apresentaremos a definicao de valorizacao e algumas de suas propriedades. Mostrare-mos tambem de que forma determinadas valorizacoes podem induzir metricas em aneis com divisao,tornando-os assim, aneis topologicos.

Definicao 1.3.1. Seja (G,+) um grupo, nao necessariamente abeliano. Dizemos que G e ordenadose G possuir uma relacao de ordem total ≥ tal que

x ≥ y, x′ ≥ y′ ⇒ x+ x′ ≥ y + y′, para quaisquer x, x′, y, y′ ∈ G.

Seja (G,+) um grupo ordenado. Denotemos por 0 o elemento neutro de G. Aumentemos G porum sımbolo ∞ , sujeito as regras:

∞+ a = a+∞ = ∞+∞ = ∞, a <∞, para todo a ∈ G.

Entao (G ∪ {∞},+) e um monoide.

Definicao 1.3.2. Uma valorizacao sobre um anel R com valores em um grupo ordenado G e qualqueraplicacao ν : R −→ G ∪ {∞} satisfazendo as seguintes condicoes:

1.3. VALORIZACOES E COMPLETAMENTOS DE ANEIS COM DIVISAO 17

(V.1) ν(xy) = ν(x) + ν(y), para todos x, y ∈ R;

(V.2) ν(x+ y) ≥ min{ν(x), ν(y)}, para todos x, y ∈ R;

(V.3) ν(1) = 0 e ν(0) = ∞.

Aplicando a definicao obtemos que ν(−1) = 0 e portanto ν(−x) = ν(x), para todo x ∈ R. Seguefacilmente por inducao que ν

(∑ni=1 xi

)≥ min{ν(xi) : 1 ≤ i ≤ n}. Alem disso, se somente um

ındice k e tal que ν(xk) = min{ν(xi) : 1 ≤ i ≤ n} entao vale a igualdade acima. O conjuntoN = {x ∈ R : ν(x) = ∞} e um ideal proprio de R, por (V.3). Se N = 0, ν e dita propria; porexemplo, sobre um corpo toda valorizacao e propria, uma vez que 0 e o unico ideal proprio. Em geral,R/N e um domınio, por (V.1). Daqui em diante, todas as valorizacoes consideradas serao proprias,salvo mencao contraria.

Exemplo 1.3.3. (1) Seja R um anel com um elemento central e regular t tal que⋂tnR = 0 e R/tR

e um domınio. Se definimosνt(x) = sup{n : x ∈ tnR}

entao νt e uma valorizacao de R, chamada valorizacao t-adica. Por exemplo, se R e umdomınio e se R[z] e o anel de polinomios na indeterminada central z sobre R, entao podemosconsiderar em R[z] a valorizacao z-adica.

(2) Seja R um anel com uma valorizacao ν e considere o anel de polinomios R[z]. Se definimos

ν(∑

aiti)

= min{ν(ai) + i},

entao ν e uma valorizacao de R[z] que estende ν.

Proposicao 1.3.4. Seja R um domınio de Ore a direita com corpo de fracoes K. Entao todavalorizacao propria ν de R tem uma unica extensao a uma valorizacao ω de K, a saber,

ω(ab−1) = ν(a)− ν(b), para todos a, b ∈ R, b 6= 0.

Demonstracao: Ver Proposicao 9.1.1 de [8].

18 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

Vamos agora considerar uma valorizacao ν sobre um corpo D. Seja D∗ = D − {0} o grupomultiplicativo de D. Segue de (V.1) que ν|D∗ e um homomorfismo de grupos. Seja V = {x ∈ D :ν(x) ≥ 0}. Entao V e um subanel de D chamado anel de valorizacao de ν. Se x ∈ V , x 6= 0, entao0 = ν(1) = ν(xx−1) = ν(x) + ν(x−1) ≥ ν(x−1) e portanto ν(x−1) ≤ 0. E, como ν : D∗ −→ G e umhomomorfismo de grupos, ν(x−1) = −ν(x). Entao x−1 ∈ V se e so se ν(x) = 0. Logo o ideal de Vdefinido por M = {x ∈ D : ν(x) > 0} e o conjunto dos elementos nao inversıveis de V e portanto Ve um anel local. O anel V/M e um anel com divisao chamado corpo de resıduos de ν. A imagemν(D∗) sob ν do grupo multiplicativo D∗ e um subgrupo de G chamado grupo de valores de ν. Umavalorizacao ν sobre D e chamada abeliana se o grupo de valores ν(D∗) for abeliano e e chamadadiscreta se o grupo ordenado ν(D∗) for isomorfo ao grupo aditivo dos inteiros.

Suponhamos que G seja um subgrupo ordenado do grupo aditivo dos numeros reais. Entaopodemos definir uma metrica sobre D escolhendo uma constante real c ∈ (0, 1) e definindo

d(x, y) = cν(x−y).

Isso torna D um anel com divisao topologico e, como todo espaco metrico, podemos construir ocompletamento D de D com relacao a topologia definida pela metrica acima. E bem conhecido queD e um anel com divisao com uma valorizacao ν (onde ν(D∗) ⊂ R) tal que D e ν sao extensoes de De ν, respectivamente. (Ver [14], Cap. V, Secao 4 ou [41], Cap. 2.) Chamamos D de completamentode D com relacao a topologia definida por ν.

Exemplo 1.3.5. Seja D um anel com divisao e considere o corpo das funcoes racionais D(z) naindeterminada central z. D(z) nada mais e que o corpo de fracoes do domınio de Ore D[z]. Se ω ea valorizacao de D(z) que estende a valorizacao z-adica de D[z], entao ω e uma valorizacao discretae o completamento de D(z) com relacao a topologia definida por ω e o corpo das series de LaurentD((z)). A metrica em D((z)) e a dada pela valorizacao

ω(f) = sup{n : f ∈ znD[[z]]}, para todo f ∈ D((z)),

que e uma extensao de ω, onde D[[z]] e o anel das series de potencia em z.

1.4 Grupos nilpotentes, finitamente gerados, livres de torcao

Dentre os grupos nilpotentes, uma classe se destaca pela existencia de uma forma normal para os

1.4. GRUPOS NILPOTENTES, FINITAMENTE GERADOS, LIVRES DE TORCAO 19

elementos. Esta classe e a constituıda pelos grupos nilpotentes, finitamente gerados, livres de torcao.A forma normal dos elementos de um grupo G deste tipo servira para definirmos uma valorizacaoem aneis de grupo gerados por G, como veremos num capıtulo posterior. Recordemos primeiramentea definicao de grupos nilpotentes.

Definicao 1.4.1. Um grupo G e chamado nilpotente se ele contem uma serie de subgrupos

{1} = G0 ⊂ G1 ⊂ · · · ⊂ Gn = G

tal que cada subgrupo Gi−1 e normal em G e cada grupo quociente Gi/Gi−1 esta contido no centrode G/Gi−1, 1 ≤ i ≤ n.

Uma serie de subgrupos de G com essa propriedade e dita uma serie central de G.

Lema 1.4.2. Subgrupos e grupos quocientes de grupos nilpotentes sao nilpotentes.

Demonstracao: Ver Lema 1.5.12 de [37].

Dados dois elementos a, b de um grupo G, o comutador de a e b e o elemento (a, b) := a−1b−1ab.O subgrupo derivado G′ = (G,G) de G e o subgrupo gerado por todos os comutadores (x, y), x, y ∈G. Obviamente G e abeliano se e somente se G′ = {1}. Denotaremos o centro de G por Z(G).Vejamos as relacoes entre nilpotencia e comutadores. Primeiro, defina duas series de subgrupos,indutivamente. Por um lado, sejam γ1(G) = G, γ2(G) = G′ e γi(G) = (γi−1(G), G), para todo i ≥ 2.Por outro lado, sejam Z0(G) = {1}, Z1(G) = Z(G) e Zi(G) como o unico subgrupo de G tal queZi(G)/Zi−1(G) = Z(G/Zi−1(G)), para todo i ≥ 1. O grupo Zi(G) e chamado o i-esimo centro deG.

Definicao 1.4.3. As sequencias de subgrupos

{1} = Z0(G) ⊂ Z1(G) ⊂ · · · ⊂ Zn(G) ⊂ · · ·

G = γ1(G) ⊃ γ2(G) ⊃ · · · ⊃ γn(G) ⊃ · · ·

sao chamadas serie central superior e serie central inferior de G, respectivamente.

Claramente, essas series sao series centrais. Elas sao chamadas “superior” e “inferior” pelasseguintes razoes:

20 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

Lema 1.4.4. Seja{1} = A0 ⊂ A1 ⊂ · · · ⊂ An ⊂ · · ·

uma serie central ascendente arbitraria. Entao An ⊂ Zn(G), para todo n.

Demonstracao: Ver Lema 1.5.14 de [37].

Lema 1.4.5. SejaG = A0 ⊃ A1 ⊃ · · · ⊃ An ⊃ · · ·

uma serie central descendente arbitraria. Entao γn(G) ⊂ An−1, para todo n.

Demonstracao: Ver Lema 1.5.15 de [37].

Segue dos lemas acima que um grupo G e nilpotente se e somente existir c ≥ 0 tal que γc+1(G) ={1} (se e somente se Zc(G) = G). O menor inteiro c tal que γc+1(G) = {1} e chamado classe denilpotencia de G (e e tambem o menor inteiro c tal que Zc(G) = G).

Proposicao 1.4.6. Todo subgrupo de um grupo nilpotente finitamente gerado e finitamente gerado.

Demonstracao: Ver Corolario 1.5.24 de [37].

Proposicao 1.4.7. Seja G um grupo nilpotente livre de torcao com serie central superior

{1} = Z0(G) ⊂ Z1(G) ⊂ · · · ⊂ Zn(G) = G.

Entao cada quociente Zi+1(G)/Zi(G) e livre de torcao. Se, alem disso, G e finitamente gerado entaoG possui pelo menos uma serie central

G = G1 ⊃ G2 ⊃ · · · ⊃ Gr+1 = {1}

tal que todos os quocientes Gj/Gj+1 sao grupos cıclicos infinitos. Uma serie central desse tipo serachamada F-serie.

Demonstracao: Para a demonstracao da primeira parte veja o Lema 1.5.26 de [37]. Para a segundaparte, uma vez que G e finitamente gerado, segue que Zi+1(G)/Zi(G) e finitamente gerado e livre de

1.4. GRUPOS NILPOTENTES, FINITAMENTE GERADOS, LIVRES DE TORCAO 21

torcao. Logo Zi+1(G)/Zi(G) pode ser escrito como um produto direto de grupos cıclicos infinitos.Segue daı que a serie central superior pode ser refinada a uma serie central com quocientes cıclicosinfinitos (ver Corolario 1.5.27 de [37]) .

Seja G um grupo nilpotente, finitamente gerado e livre de torcao, e seja

G = F1 ⊃ F2 ⊃ F3 ⊃ · · · ⊃ Fr ⊃ Fr+1 = {1} (1.1)

uma F-serie do grupo G, ou seja, (1.1) e uma serie central de G tal que Fi/Fi+1, (i = 1, . . . , r)e um grupo cıclico infinito. Seja fi um representante em G de um gerador de Fi/Fi+1, ou seja,Fi/Fi+1 = 〈fiFi+1〉, o grupo gerado por fiFi+1. Entao todo elemento de G e escrito de maneira unicana forma

g = fα11 fα2

2 · · · fαrr , (1.2)

com α1, α2, . . . , αr ∈ Z, chamada forma normal de g. De fato, seja g ∈ G. Se g ∈ Fr+1 entao g = 1.Se g ∈ Fr \ Fr+1 entao g 6= 1. Logo existe um unico α ∈ Z, α 6= 0, tal que g = fαr . Se g ∈ Fr−1 \ Frentao gFr 6= 1 · Fr ∈ 〈fr−1Fr〉. Logo existe um unico β ∈ Z, β 6= 0, tal que gFr = fβr−1Fr o queimplica f−βr−1g ∈ Fr. Entao existe gr ∈ Fr tal que f−βr−1g = gr e assim g = fβr−1gr. Mas, como gr ∈ Fr,existe um unico αr ∈ Z tal que gr = fαr

r . Segue que g = fβr−1fαrr . Prosseguindo deste modo obtemos

que todo elemento g ∈ G e escrito na forma (1.2). Suponhamos que g = fβ11 fβ2

2 · · · fβrr , com βi ∈ Z.

Entao fα1−β11 fα2

2 · · · fαrr = fβ2

2 · · · fβrr e portanto fα1−β1

1 = (fβ22 · · · fβr

r )(fα22 · · · fαr

r )−1 ∈ F2. Logofα1−β11 F2 = 1 · F2 o que implica α1 − β1 = 0, uma vez que F1/F2 e livre de torcao. Logo α1 = β1

e assim fα22 · · · fαr

r = fβ22 · · · fβr

r . Temos entao fα2−β22 fα3

3 · · · fαrr = fβ3

3 · · · fβrr e portanto fα2−β2

2 =(fβ3

3 · · · fβrr )(fα3

3 · · · fαrr )−1 ∈ F3. Assim, fα2−β2

2 F3 = 1 · F3 e, portanto, α2 = β2. Prosseguindo demaneira analoga obtemos que αi = βi, para todo i = 1, . . . , r. Portanto todo elemento g ∈ G e escritode maneira unica na forma (1.2).

Como (1.1) e uma serie central entao (Fi, G) ⊂ Fi+1, i = 1, . . . , r, onde (Fi, G) e o subgrupo geradopor todos os comutadores da forma (f, g) com f ∈ Fi e g ∈ G. Assim, (Fi, Fj) ⊂ Fi+1, (Fi, Fj) =(Fj , Fi) ⊂ Fj+1 e portanto (Fi, Fj) ⊂ Fk, onde k > max{i, j}. Logo

fαii f

αj

j = fαj

j fαii fγk

k fγk+1

k+1 · · · fγrr , (1.3)

para algum k > max{i, j}, i, j = 1, . . . , r, uma vez que (fαii , f

αj

j ) ∈ (Fi, Fj) ⊂ Fk, k > max{i, j}e todo elemento de Fk e escrito de maneira unica na forma fγk

k fγk+1

k+1 · · · fγrr (pois Fk e nilpotente,

22 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

finitamente gerado, livre de torcao e Fk ⊃ Fk+1 ⊃ · · · ⊃ Fr ⊃ Fr+1 = {1} e uma F-serie do grupoFk). Em particular, fαi

i fαrr = fαr

r fαii para todo i e, portanto, Fr = 〈fr〉 ⊂ Z(G), o centro de G.

Observe que G pode ser ordenado da seguinte maneira: se g = fα11 fα2

2 · · · fαrr , h = fβ1

1 fβ22 · · · fβr

r

entao g < h se existir s, 1 ≤ s ≤ r, tal que α1 = β1, . . . , αs−1 = βs−1 e αs < βs. Esta e a ordemlexicografica, que e uma relacao de ordem total. Segue de (1.3) que se g < h entao gk < hk, kg < kh

para todo k ∈ G, o que implica que se g1 < h1 e g2 < h2 entao g1h1 < g2h2. Logo a relacao ≤ ecompatıvel com a multiplicacao de G e portanto (G,≤) e um grupo ordenado.

As definicoes e os resultados que foram apresentados nesta secao podem ser encontrados em [16]e [37].

1.5 Aneis de grupo e series de Malcev-Neumann

Seja G um grupo e considere o anel de grupo KG sobre um corpo K nao necessariamente comu-tativo. Este e um espaco vetorial sobre K com base G e multiplicacao induzida pela multiplicacaode G. Em certos casos, esse anel pode ser imerso em um anel com divisao. Um desses casos e quandoG e um grupo ordenado, por exemplo, quando G e nilpotente, finitamente gerado, livre de torcao.Isso seguira dos resultados mais gerais apresentados a seguir e que podem ser encontrados em [18].

Recordemos que um subconjunto S de um conjunto totalmente ordenado T e dito bem-ordenadose todo subconjunto nao-vazio de T possuir um elemento mınimo.

Lema 1.5.1. Sejam S, T subconjuntos bem-ordenados de um conjunto totalmente ordenado (G,<).Entao S ∪ T e bem-ordenado. Se (G,<) e um grupo ordenado, entao

U := S · T = {st : s ∈ S, t ∈ T}

e tambem bem-ordenado. Alem disso, para cada u ∈ U existe somente um numero finito de paresordenados (s, t) (s ∈ S, t ∈ T ) tal que u = st.

Demonstracao: Ver Lema 14.17 de [18].

Seja G um grupo ordenado, com uma ordem ≤, seja R um anel e seja Aut(R) o grupo dosautomorfismos de R. Fixe um homomorfismo de grupos σ : G −→ Aut(R) e denote por σg a imagemde g ∈ G por σ. Define-se R((G, σ)) como sendo o conjunto de todas as series formais (mas nao

1.5. ANEIS DE GRUPO E SERIES DE MALCEV-NEUMANN 23

necessariamente finitas)a =

∑g∈G

agg, ag ∈ R,

com supp(a) := {g ∈ G : ag 6= 0} bem-ordenado. O conjunto supp(a) e chamado suporte de a. EmR((G, σ)) nos somamos e multiplicamos os elementos de acordo com as regras:∑

g∈Gagg +

∑g∈G

bgg =∑g∈G

(ag + bg)g,

∑g∈G

agg

(∑h∈G

bhh

)=∑l∈G

(∑agσg(bh)

)l,

onde a ultima soma e tomada sobre todos os pares (g, h) tal que gh = l. Uma vez que podemosrestringir g e h respectivamente a supp(a), supp(b), e esses suportes sao subconjuntos bem-ordenadosde G, a ultima soma acima e finita pelo Lema 1.5.1. Alem disso, uma vez que

supp(a+ b) ⊂ supp(a) ∪ supp(b),

supp(ab) ⊂ supp(a) · supp(b),

entao supp(a + b) e supp(ab) sao ambos bem-ordenados, pelo Lema 1.5.1. Portanto a adicao ea multiplicacao estao bem-definidas em R((G, σ)). E possıvel checar que, com essas operacoes,R((G, σ)) e um anel. O subanel de R((G, σ)) consistindo de todas as somas finitas

∑agg (ou seja,

somas de suporte finito), e chamado anel de grupo skew e e denotado por R(G, σ). Se σ for ohomomorfismo identidade usaremos as notacoes: R((G, IdR)) = R((G)) e R(G, IdR) = RG. Nestecaso, o subanel RG consistindo das somas finitas nada mais e que o anel de grupo usual.

Teorema 1.5.2. Assuma que R e um anel com divisao e sejam G e σ como acima. Entao R((G, σ))e tambem um anel com divisao, chamado corpo das series de Malcev-Neumann skew, se σ 6= IdR ecorpo das series de Malcev-Neumann, se σ = IdR.

Demonstracao: Ver Teorema 14.21 de [18].

O anelR((G, σ)) depende, claramente, da relacao de ordem considerada emG. Mais precisamente,para cada relacao de ordem definida em G existe um anel R((G, σ)).

24 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

1.6 Extensoes de Ore e series de Laurent skew

Nesta secao, apresentaremos a definicao de extensao de Ore e algumas propriedades deste anel.Em particular, mostraremos que, em certos casos, esse aneis sao domınios de Ore e que seu corpo defracoes pode ser imerso num corpo maior, cujos elementos sao series de Laurent. Todos os resultadosapresentados nesta secao podem ser encontrados em [8] e [9].

Seja A um anel e α um endomorfismo de A. Uma funcao δ : A −→ A e chamada α-derivacao deA se

δ(a+ b) = δ(a) + δ(b), δ(ab) = δ(a)α(b) + aδ(b), para todos a, b ∈ A.

Proposicao 1.6.1. Sejam A um anel, α um endomorfismo e δ uma α-derivacao de A e seja x

uma indeterminada. Seja R o anel gerado por x e A, contendo A como subanel e com relacoesax = xα(a) + δ(a), para todo a ∈ A, ou seja, R ∼= A[x]/〈ax− xα(a)− δ(a)〉. Entao

(i) cada elemento nao-nulo f ∈ R pode ser escrito unicamente como f =∑n

i=0 xiai, para algum

inteiro nao-negativo n e elementos ai ∈ A, com an 6= 0,

(ii) R e um domınio se A for um domınio e α for injetor,

(iii) se A for um corpo entao R e um domınio de ideais principais a direita. Alem disso, se α forum automorfismo, R e tambem um domınio de ideais principais a esquerda.

Demonstracao: Ver Proposicao 2.1.1 de [8].

O anel R da proposicao anterior e chamado extensao de Ore ou anel de polinomios skew em x

sobre A associado com α, δ, e e denotado por A[x;α, δ]. O inteiro n do item (i) acima e chamadoo grau de f , abreviado deg(f), e o elemento an e chamado coeficiente dominante de f . Se f temcoeficiente dominante igual a 1, f e chamado monico. O elemento zero de R e definido para ter grau−∞ e coeficiente dominante 0. Quando δ = 0 escrevemos A[x;α] no lugar de A[x;α, 0]. Se alem dissoα = 1, obtemos o anel de polinomios na indeterminada central x sobre A, denotado por A[x]. O anelA[x; 1, δ] e tambem chamado anel de polinomios diferenciaveis ou anel de operadores diferenciais ee denotado por A[x; δ].

O anel A[x;α, δ] satisfaz a seguinte propriedade universal:

1.6. EXTENSOES DE ORE E SERIES DE LAURENT SKEW 25

Proposicao 1.6.2. Sejam A e S aneis, α : A −→ A um endomorfismo e δ : A −→ A uma α-derivacao. Se ψ : A −→ S e um homomorfismo de aneis e u ∈ S tem a propriedade que

ψ(a)u = uψ(α(a)) + ψ(δ(a)),

para todo a ∈ A, entao existe um unico homomorfismo de aneis χ : A[x;α, δ] −→ S tal que χ(x) = u

e que faz o diagrama

Ai //

ψ

��

A[x;α, δ]

χzzvvv

vvvvvv

v

S

comutar, onde i : A −→ A[x;α, δ] e a inclusao.

Demonstracao: Basta definir χ : A[x;α, δ] −→ S por χ(∑xiai) =

∑uiψ(ai).

E facil ver que se A for um domınio com um endomorfismo injetor α e uma α-derivacao δ entaoa funcao deg em A[x;α, δ] satisfaz

(i) deg(f − g) ≤ max{deg(f), deg(g)},

(ii) deg(fg) = deg(f) + deg(g).

Como todo domınio de ideais principais a direita e um domınio de Ore a direita (pelo Corolario1.2.11) entao, para um corpo K, K[x;α, δ] tem um corpo classico de fracoes que sera denotado porK(x;α, δ) e chamado corpo das funcoes racionais skew. A proposicao a seguir mostra exatamentesob quais condicoes o anel de polinomios skew sobre um corpo e um domınio de ideais principais aesquerda.

Proposicao 1.6.3. Seja K um corpo com um endomorfismo α e uma α-derivacao δ, e seja R =K[x;α, δ]. Entao as seguintes condicoes sao equivalentes:

(a) α e um automorfismo,

(b) R e principal a esquerda,

(c) R e Ore a esquerda.

26 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

Demonstracao: Ver Proposicao 2.1.6 de [8].

Sejam K um corpo, α um automorfismo de K e δ uma α-derivacao de K. Entao as seguintespropriedades sao satisfeitas pelo anel de polinomios skew K[x;α, δ].

Proposicao 1.6.4 (Regra de Leibniz). Para todo inteiro n ≥ 0 e para quaisquer elementos a, b, c ∈K temos:

(i) δn(ab) =∑n

i=0 δi(a)g(i, n− i)(b)

(ii) cxn =∑n

i=0 xig(i, n− i)(c),

onde g(i, j) : K −→ K e a soma de todas as palavras distintas formadas com i letras α e j letras δ.

Demonstracao: Ver [9, pg. 246].

Corolario 1.6.5. Se αδ = δα e 0 ≤ i ≤ n,

(i) g(i, n− i) =(ni

)αiδn−i

(ii) δn(ab) =∑n

i=0

(ni

)δi(a)αiδn−i(b)

(iii) cxn =∑n

i=0

(ni

)xiαiδn−i(c).

Demonstracao: Ver [9, pg. 248].

Como α e um automorfismo e possıvel escrever os elementos de K[x;α, δ] como polinomios emx com coeficientes a esquerda. Mais precisamente, e possıvel mostrar por inducao que, para todoa ∈ K e todo inteiro n ≥ 0,

xna =n∑i=0

(−1)n−ig′(i, n− i)(a)xi, (1.4)

onde g′(i, j) : K −→ K e a soma de todas as palavras distintas formadas com i letras α−1 e j letrasδα−1.

Vamos considerar agora δ = 0. Neste caso podemos definir o anel formado pelas series depotencias

∑∞i=0 x

iai com multiplicacao induzida por ax = xα(a). Como α e um automorfismo,

1.6. EXTENSOES DE ORE E SERIES DE LAURENT SKEW 27

potencias negativas de α estao definidas. Podemos entao considerar o anel K((x;α)) das series deLaurent skew; elas sao series da forma

∑∞−r x

iai, onde r e um inteiro nao-negativo, com multiplicacaodada pela regra:

axn = xnαn(a), n ∈ Z.

Observe que toda serie nao-nula pode ser escrita na forma x−rc(1 −∑∞

i=1 xiai) e esta tem inverso

[∑∞

n=0(∑∞

i=1 xiai)n]c−1xr. A soma

∑∞n=0(

∑∞i=1 x

iai)n esta bem definida, ou seja, e um elemento deK((x;α)), uma vez que as potencias de x que aparecem em (

∑∞i=1 x

iai)n sao maiores ou iguais an. Logo [

∑∞n=0(

∑∞i=1 x

iai)n]c−1xr e um elemento de K((x;α)) e, portanto, K((x;α)) e um corpo.Como K((x;α)) ⊃ K[x;α] entao K((x;α)) ⊃ K(x;α).

Quando δ 6= 0 nao e possıvel definir um anel formado pelas series de potencias∑∞

i=0 xiai com

multiplicacao induzida por ax = xα(a)+δ(a), uma vez que na multiplicacao b∑∞

i=0 xiai =

∑∞i=0 bx

iai,b ∈ K, aparecem infinitos termos independentes, por exemplo. Para superar este problema e usualintroduzir uma outra variavel, y = x−1. Segue de ax = xα(a) + δ(a) que

ya = α(a)y + yδ(a)y.

Aplicando repetidamente esta formula obtemos

ya = α(a)y + αδ(a)y2 + yδ2(a)y2

... (1.5)

= α(a)y + αδ(a)y2 + αδ2(a)y3 + · · ·+ αδn−1(a)yn + yδn(a)yn.

Se δ e localmente nilpotente, ou seja, cada elemento de K e anulado por alguma potencia de δ, entaosegue de (1.5) que ya pode ser escrito como um polinomio em y com coeficientes a esquerda. Mas,para qualquer δ, podemos tomar o limite quando n→∞ em (1.5) e obter

ya = α(a)y + αδ(a)y2 + αδ2(a)y3 + αδ3(a)y4 + · · · =∞∑i=0

αδi(a)yi+1. (1.6)

Denotemos por K[[y;α, δ]] o conjunto de todas as series de potencia da forma∑∞

i=0 aiyi e defina em

K[[y;α, δ]] uma multiplicacao induzida por (1.6). Observe que desta vez a multiplicacao esta bemdefinida uma vez que na expansao de yna em potencias de y com coeficientes a esquerda, a menor

28 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

potencia de y que aparece e yn. Logo K[[y;α, δ]] e um anel. Temos entao o seguinte teorema:

Teorema 1.6.6. Seja K um anel com divisao com automorfismo α e α-derivacao δ, e considere oanel

R = K〈y : ya = α(a)y + yδ(a)y, para todo a ∈ K〉.

Entao R ⊂ K[[y;α, δ]], que e um domınio. Alem disso, o conjunto {1, y, y2, . . .} e um conjunto deOre a esquerda em K[[y;α, δ]] cuja localizacao nos da um corpo K((y;α, δ)) consistindo de todas asseries de Laurent skew

∑∞i=r aiy

i, r ∈ Z.

Demonstracao: Ver Teorema 2.3.1 de [8].

Observacao 1.6.7. Como α e um automorfismo, os elementos de K((y;α, δ)) tambem podem serescritos na forma

∑yiai, pois

ay = (α(α−1(a))y = yα−1(a)− yδα−1(a)y = yα−1(a)− yα(α−1δα−1(a))y

= yα−1(a)− y(yα−1δα−1(a)− yδα−1δα−1(a)y)

= yα−1(a)− y2α−1δα−1(a) + yδα−1δα−1(a)y

= yα−1(a)− y2α−1δα−1(a) + y3α−1δα−1δα−1(a)− y4α−1δα−1δα−1δα−1(a) + · · · .

Considere o anel de polinomios skew K[z;α, δ] na indeterminada z. Como ay−1 = ax = xα(a) +δ(a), para todo a ∈ K, entao, pela Proposicao 1.6.2, existe unico homomorfismo de aneis ψ :K[z;α, δ] −→ K((y;α, δ)) tal que ψ(z) = y−1 = x e ψ(a) = a, para todo a ∈ K. Se ψ

(∑ziai

)= 0

entao∑xiai = 0 e, portanto, ai = 0, para todo i. Logo

∑ziai = 0 e portanto ψ e injetora. Logo

K[z;α, δ] ∼= Im(ψ), que e o subanel formado pelos polinomios∑n

i=0 xiai. Como ψ(z) = x vamos

identificar z com x e assim temos a inclusao

K[x;α, δ] ⊂ K((y;α, δ))

de onde segue queK(x;α, δ) ⊂ K((y;α, δ)).

1.6. EXTENSOES DE ORE E SERIES DE LAURENT SKEW 29

Mais ainda, se f =∑∞

i=−r aiyi ∈ K((y;α, δ)), r ≥ 0, entao

f =−1∑i=−r

aiyi +

∞∑i=0

aiyi =

−1∑i=−r

aix−i +

∞∑i=0

aiyi =

r∑j=1

a−jxj +

∞∑i=0

aiyi ∈ K[x;α, δ] +K[[y;α, δ]]

e portantoK((y;α, δ)) = K[[y;α, δ]] +K[x;α, δ].

Vejamos como escrever os elementos de K(x;α, δ) como series de Laurent de K((y;α, δ)). Sejamf =

∑mi=0 x

iai, g =∑n

i=0 xibi ∈ K[x;α, δ], am, bn 6= 0, n ≥ 1. Temos

ymf = x−mf =m∑i=0

x−m+iai =m∑i=0

x−(m−i)ai =m∑i=0

ym−iai =m∑j=0

yjam−j ,

yng = x−ng =n∑i=0

x−n+ibi =n∑i=0

x−(n−i)bi =n∑i=0

yn−ibi =n∑j=0

yjbn−j

= bn + ybn−1 + · · ·+ yn−1b1 + ynb0 = (1 + ybn−1b−1n + · · ·+ yn−1b1b

−1n + ynb0b

−1n )bn

= [1 + y(bn−1b−1n + · · ·+ yn−2b1b

−1n + yn−1b0b

−1n )]bn = (1 + yh)bn,

h = bn−1b−1n +· · ·+yn−2b1b

−1n +yn−1b0b

−1n ∈ R. Seja l = b−1

n (1−yh+(yh)2−(yh)3+· · · ) ∈ K[[y;α, δ]],que e um elemento com termo independende nao-nulo. Entao

yngl = (1 + yh)bnb−1n (1− yh+ (yh)2 − (yh)3 + · · · )

= (1− yh+ (yh)2 − (yh)3 + · · · ) + (yh− (yh)2 + (yh)3 − · · · ) = 1,

lyng = b−1n (1− yh+ (yh)2 − (yh)3 + · · · )(1 + yh)bn

= b−1n (1 + yh− yh− (yh)2 + (yh)2 + (yh)3 − (yh)3 + · · · )bn = b−1

n · 1 · bn = 1

30 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

e portanto (yng)−1 = l ∈ K[[y;α, δ]]. Logo

fg−1 = (y−mym)fg−1(y−nyn) = y−m(ymf)(yng)−1yn

= y−m

m∑j=0

yjam−j

lyn ∈ K((y;α, δ)), (1.7)

onde(∑m

j=0 yjam−j

)l ∈ K[[x;α, δ]] e tem termo independente nao-nulo.

Um exemplo classico de anel de polinomios skew e a (primeira) algebra de Weyl A1(K), sobreum anel com divisao K,

A1(K) = K〈x, y : xy − yx = 1〉.

A1(K) pode ser definida como o anel de polinomios skew K[x][y; 1, ddx ] = K[x][y; ddx ], onde d

dx e aderivada formal com relacao a x. Uma vez que K[x] e um domınio de Ore a direita entao A1(K) =K[x][y; d

dx ] e um domınio de Ore a direita com corpo de quocientes classico Q(A1(K)) = K(x)(y; ddx),

chamado corpo de Weyl . De fato, isto segue do seguinte resultado mais geral.

Observacao 1.6.8. Seja R um domınio de Ore a direita com corpo de quocientes classico Q(R).Seja α um endomorfismo injetor de R e seja δ e uma α-derivacao. Entao α se estende a um unicoendomorfismo de Q(R) e δ se estende a uma unica α-derivacao de Q(R) (pelo Teorema 0.8.11 de [6]ou pela Proposicao 2.1.2 de [8]) e temos as inclusoes

R[z;α, δ] ⊂ Q(R)[z;α, δ] ⊂ Q(R)(z;α, δ)

(ver [6, pg. 54]). Com abuso de notacao usamos os mesmos sımbolos α e δ para denotar taisextensoes. Se u = fg−1 ∈ Q(R)(z;α, δ), f, g ∈ Q(R)[z;α, δ], podemos escrever os coeficientes de f eg num denominador comum c ∈ R∗ e portanto f = f1c

−1, g = g1c−1, para alguns f1, g1 ∈ R[z;α, δ].

Assim, u = fg−1 = (f1c−1)(g1c−1)−1 = f1g

−11 e portanto Q(R)(z;α, δ) e um corpo de quocientes

classico de R[z;α, δ]. Segue que R[z;α, δ] e um domınio de Ore a direita.

Vimos que se R for um domınio de Ore a direita e α for um endomorfismo injetor de R entaoR[z;α, δ] e tambem um domınio de Ore a direita (para qualquer α-derivacao δ). Um resultadosemelhante vale no caso em que R e um anel noetheriano a direita.

Proposicao 1.6.9. Seja R um domınio noetheriano a direita (resp. esquerda), α um automorfismo

1.7. ALGEBRAS DE LIE E ENVOLVENTES 31

de R e δ uma α-derivacao de R. Entao o anel de polinomios skew R[z;α, δ] e um domınio noetherianoa direita (resp. esquerda).

Demonstracao: Ver Proposicao 0.10.3 de [6].

Segue dessa proposicao que A1(K) e um domınio noetheriano a direita e a esquerda.

1.7 Algebras de Lie e envolventes

Uma algebra de Lie L sobre um corpo comutativo k e um k-espaco vetorial com uma aplicacaobilinear L × L −→ L, comumente chamada multiplicacao de Lie ou simplesmente “multiplicacao”,denotada por [x, y] e satisfazendo as seguintes identidades:

[x, x] = 0, (1.8)

[[x, y], z] + [[y, z], x] + [[z, x], y] = 0 (identidade de Jacobi). (1.9)

Segue de (1.8) que [x, y] = −[y, x], ou seja, a multiplicacao de Lie e anticomutativa, mas em geral enao-associativa.

Um exemplo importante de uma algebra de Lie e a derivada de uma algebra associativa. Seja Aum anel que tambem e uma k-algebra e sobre A defina uma multiplicacao pela regra

[x, y] = xy − yx. (1.10)

O k-espaco A com a multiplicacao (1.10) e uma algebra de Lie, denotada por A− e chamada algebrade Lie derivada de A.

Se L e uma algebra de Lie e A e uma algebra associativa entao uma representacao de L em A e umhomomorfismo de L em A−. Um resultado basico e que toda algebra de Lie tem uma representacaofiel (injetora) em uma algebra associativa adequada:

Teorema 1.7.1 (Poincare-Birkhoff-Witt). Para toda algebra de Lie L sobre um corpo k existe umaalgebra associativa U(L) com uma representacao i : L −→ U(L)− que e universal para representacoesde L em algebras associativas. Esta representacao e fiel; mais precisamente, se (uλ) e uma base

32 CAPITULO 1. NOCOES PRELIMINARES

totalmente ordenada de L entao U(L) tem uma base constituıda pelos monomios da forma

uλ1uλ2 · · ·uλr , λ1 ≤ λ2 ≤ · · · ≤ λr, r = 0, 1, . . . .

Demonstracao: Ver Teorema 2.A pg. 89 de [8] ou Teorema 3 pg. 159 de [15].

A algebra U(L) e chamada envolvente universal associativa de L e a representacao i : L −→U(L)− e universal no seguinte sentido: se A e qualquer k-algebra e θ : L −→ A− e um homomorfismoentao existe um unico homomorfismo θ′ : U(L) −→ A tal que θ = iθ′.

Um teorema bastante importante provado por Cohn ( [8, Teorema 2.6.6]) e que a envolventeuniversal associativa de qualquer algebra de Lie L pode ser imersa num anel com divisao D(L), oqual chamaremos de corpo de Lie. Veremos num capıtulo posterior que D(L) esta contido num corpomaior e que tal corpo contem um corpo livre.

Capıtulo 2

Corpos livres em aneis com divisao valorizados

Neste capıtulo provaremos dois resultados que nos fornecem condicoes suficientes para garantir aexistencia de um subanel isomorfo a um corpo livre em um anel com divisao. O primeiro deles e umaespecie de generalizacao do Corolario 1 de [3] (Corolario 2.1.2 abaixo) para corpos arbitrarios, umavez que tal resultado foi provado em [3] para corpos enumeraveis. O segundo nos permite “puxar”corpos livres por meio de uma especializacao cujo contradomınio contenha um corpo livre.

2.1 O Teorema de Chiba

Como citamos na Introducao, um resultado importante sobre a inclusao de corpos livres em aneiscom divisao foi provado por Chiba. O Teorema 1 de [3], enunciado abaixo, garante a existencia decorpos livres em alguns aneis com divisao completos:

Teorema 2.1.1 ([3], Teorema 1). Seja D um anel com divisao enumeravel com centro enumeravelC, e seja K um subcorpo de D o qual e seu proprio bicentralizador e cujo centralizador K ′ e talque o K-espaco a esquerda KcK ′ e de dimensao infinita sobre K, para todo c ∈ D∗ = D − {0}. Seexiste uma valorizacao discreta ν em D e um elemento nao-nulo t de K ′ tal que ν(t) > 0, entao ocompletamento D de D com relacao a topologia definida por ν contem um corpo livre DK<(X)> sobreum conjunto enumeravel X.

Um caso interessante ocorre quando K e o centro de D.

Corolario 2.1.2 ([3], Corolario 1). Seja D um anel com divisao enumeravel com centro enumeravelC tal que a dimensao de D sobre C seja infinita. Se existe uma valorizacao discreta ν em D entao

33

34 CAPITULO 2. CORPOS LIVRES EM ANEIS COM DIVISAO VALORIZADOS

o completamento D de D com relacao a topologia definida por ν contem o corpo livre DC<(X)> sobreum conjunto enumeravel X.

2.2 Aneis com divisao arbitrarios

Da demonstracao do Teorema 1 do artigo [3], Teorema 2.1.1 acima, e possıvel extrair um resultadoum pouco mais geral, no qual nao se exige que o anel com divisao D seja enumeravel:

Teorema 2.2.1. Seja D um anel com divisao com centro infinito e seja K um subcorpo de D oqual e seu proprio bicentralizador e cujo centralizador K ′ e tal que o K-espaco a esquerda KcK ′

e de dimensao infinita sobre K, para todo c ∈ D∗. Seja X um conjunto enumeravel e seja Σ umconjunto enumeravel de matrizes plenas sobre DK〈X〉. Se existe uma valorizacao discreta ν emD e um elemento nao-nulo t de K ′ tal que ν(t) > 0, entao existe um homomorfismo Σ-inversorDK〈X〉 −→ D.

Em particular, se D for enumeravel e Σ = Φ, o conjunto de todas as matrizes plenas sobreDK〈X〉, segue que D contem o corpo livre DK<(X)>, e este e exatamente o Teorema 2.1.1.

O Teorema 2.1.1 tem um corolario importante:

Corolario 2.2.2. Seja D um anel com divisao enumeravel com centro enumeravel C, e seja K umsubcorpo de D o qual e seu proprio bicentralizador e cujo centralizador K ′ e tal que o K- espacoa esquerda KcK ′ e de dimensao infinita sobre K, para todo c ∈ D∗. Entao o corpo das series deLaurent D((z)) contem um corpo livre DK<(X)>, sobre um conjunto enumeravel X.

Este corolario e provado diretamente em [3], sem fazer uso do Teorema 2.1.1. No entanto, epossıvel obte-lo como uma consequencia do Teorema 2.1.1 da seguinte maneira: primeiramente,mostramos que K(z) e igual ao seu bicentralizador e que o K(z)-espaco a esquerda K(z)fK(z)′ e dedimensao infinita sobre K(z) para todo f ∈ D(z)∗, onde K(z)′ = CD(z)(K(z)) = CD(K)(z) = K ′(z).Seja ω a valorizacao de D(z) que estende a valorizacao z-adica de D[z]. Entao ω e uma valorizacaodiscreta, com ω(z) = 1 > 0 e, como dissemos no Exemplo 1.3.5, o completamento de D(z) comrelacao a topologia definida por ω e o corpo das series de Laurent D((z)). Como D e enumeravelentao D(z) e enumeravel. O centro de D(z) e dado pela seguinte

Proposicao 2.2.3 ([8], Proposicao 2.1.5). Seja K um anel com divisao com centro C. Entao o corpodas funcoes racionais K(t) tem centro C(t).

2.2. ANEIS COM DIVISAO ARBITRARIOS 35

Pela proposicao acima, o centro de D(z) e C(z), que tambem e enumeravel. Logo, pelo Teorema2.1.1, segue que D((z)) contem um corpo livre D(z)K(z)<(X)>, sobre um conjunto enumeravel X.Pela Proposicao 1.1.14, D((z)) ⊃ DK<(X)>.

O Teorema 2.2.1 tem como consequencia o Corolario 2.1.2 que pode ser generalizado para corposarbitrarios no seguinte sentido:

Teorema 2.2.4. Seja D um anel com divisao com centro infinito C e tal que a dimensao de D sobreC seja infinita. Se existe uma valorizacao discreta ν em D entao o completamento D de D comrelacao a topologia definida por ν contem um corpo livre C<(X)>, sobre um conjunto enumeravel X.

Para provar o teorema acima precisamos do seguinte lema:

Lema 2.2.5. Todo corpo comutativo infinito contem um subcorpo enumeravel.

Demonstracao: Seja C um corpo comutativo infinito. Se car(C) = 0 entao C ⊃ Q, o corpo dosnumeros racionais. Suponha que car(C) = p > 0. Neste caso, o corpo primo de C e Fp, o corpofinito com p elementos. Se C for uma extensao algebrica de Fp, como C e infinito, C e enumeravel.Se existir x ∈ C transcendente sobre Fp entao o corpo das funcoes racionais Fp(x) e um subcorpoenumeravel de C.

Precisamos tambem do seguinte resultado.

Lema 2.2.6 ([3], Lema 9). Seja D um anel com divisao com subcorpo primo Π. Seja k um subcorpocentral qualquer de D e seja X um subconjunto de D. Entao X gera livremente um subcorpo livreΠ<(X)> de D sobre Π se e somente se ele gera um subcorpo livre k<(X)> de D sobre k.

Demonstracao do Teorema 2.2.4: Seja F ⊂ C um subcorpo enumeravel, que existe pelo Lema 2.2.5,e seja F 〈X〉 −→ DC〈X〉 a inclusao natural. Essa inclusao e honesta, pelo Teorema 1.1.16, uma vezque F e C sao obviamente linearmente disjuntos em D sobre F . Seja Σ o conjunto de todas asmatrizes plenas sobre F 〈X〉. Pelo que acabamos de mostrar, Σ esta contido em Φ, o conjunto detodas as matrizes plenas sobre DC〈X〉. Como F e X sao enumeraveis entao Σ e enumeravel. PeloTeorema 2.2.1, existe um homomorfismo Σ-inversor DC〈X〉 −→ D e, portanto, a composta

F 〈X〉 −→ DC〈X〉 −→ D

36 CAPITULO 2. CORPOS LIVRES EM ANEIS COM DIVISAO VALORIZADOS

e um homomorfismo Σ-inversor de F -aneis. Como Σ e o conjunto de todas as matrizes plenas sobreF 〈X〉 entao esse homomorfismo se estende a um homomorfismo de F -aneis F<(X)>−→ D. Logo Xgera livremente um subcorpo livre F<(X)> de D sobre F . Como F ⊂ C = Z(D) ⊂ Z(D), segue peloLema 2.2.6 que X gera livremente um subcorpo livre Π<(X)> de D sobre Π, o subcorpo primo de D.Logo X gera livremente um subcorpo livre C<(X)> de D sobre C, novamente pelo Lema 2.2.6.

Corolario 2.2.7. Seja D um anel com divisao com centro C e tal que a dimensao de D sobre Cseja infinita. Entao o corpo das series de Laurent D((z)) contem um corpo livre C<(X)> sobre umconjunto enumeravel X.

Demonstracao: Ja sabemos que o corpo das funcoes racionaisD(z) tem uma valorizacao discreta e queseu completamento com relacao a topologia definida por essa valorizacao e D((z)). Alem disso, pelaProposicao 2.2.3, o centro deD(z) e C(z), que e um corpo infinito. Mostremos queD(z) tem dimensaofinita sobre C(z). Suponhamos que [D(z) : C(z)] = n <∞ e sejam d1, . . . , dn+1 ∈ D ⊂ D(z). Entaoexistem f1g

−11 , . . . , fn+1g

−1n+1 ∈ C(z) nao todos nulos tais que f1g

−11 d1 + · · · + fn+1g

−1n+1dn+1 = 0,

onde fi, gi ∈ C[z], gi 6= 0, i = 1, . . . , n + 1. Sejam f ′i , g ∈ C[z], g 6= 0, tais que fig−1i = f ′ig

−1,i = 1, . . . , n + 1. Como os fig−1

i nao sao todos nulos entao os f ′i nao sao todos nulos. Como g ecentral em D(z) segue que

0 = f ′1g−1d1 + · · ·+ f ′n+1g

−1dn+1 = (f ′1d1 + · · ·+ f ′n+1dn+1)g−1 = 0

e portanto f ′1d1 + · · ·+ f ′n+1dn+1 = 0. Escreva f ′i =∑

j aijzj , aij ∈ C. Entao

0 =

∑j

a1jzj

d1 + · · ·+

∑j

an+1,jzj

dn+1 =∑j

(n+1∑i=1

aijdi

)zj .

Logo∑n+1

i=1 aijdi = 0, para todo j. Seja l ∈ {1, . . . , n + 1} tal que f ′l =∑

j aljzj 6= 0. Entao existe

j0 ≥ 0 tal que alj0 6= 0. Portanto temos∑n+1

i=1 aij0di = 0 com alj0 6= 0, onde aij0 ∈ C e di ∈ D,i = 1, . . . , n+ 1. Logo qualquer conjunto com n+ 1 elementos de D e linearmente dependente sobreC, contradizendo a hipotese que D tem dimensao infinita sobre C. Portanto [D(z) : C(z)] = ∞. PeloTeorema 2.2.4, D((z)) contem um corpo livre C(z)<(X)>, sobre um conjunto enumeravel X. PelaProposicao 1.1.14, D((z)) ⊃ C<(X)>.

2.3. CORPOS LIVRES E ESPECIALIZACOES 37

2.3 Corpos livres e especializacoes

O teorema que provaremos a seguir e uma especie de mecanismo que nos permite “puxar” corposlivres por meio de uma especializacao cujo contradomınio contenha um corpo livre.

Teorema 2.3.1. Seja D um anel com divisao com um subcorpo K e seja E um D-anel com divisaotal que E contem um corpo livre DK<(X)>. Suponha que exista uma especializacao α : F −→ E, ondeF e um D-anel com divisao, tal que

(i) X ⊂ Im(α);

(ii) para cada x ∈ X existe yx ∈ α−1(x) tal que yxa = ayx, para todo a ∈ K.

Entao F contem um corpo livre DK<(Y )>, com |Y | = |X|.

Demonstracao: Seja F0 o domınio de α. Para cada x ∈ X fixe yx ∈ α−1(x) satisfazendo yxa = ayx,para todo a ∈ K, e defina o homomorfismo de D-aneis ϕ : DK〈X〉 −→ F0 tal que ϕ(x) = yx.Esquematizando, temos o seguinte diagrama:

D� � //

� _

��

DK〈X〉� _

��

ϕ

yyrrrrrrrrrrr

F0 α//

� _

��

E ⊃ DK<(X)>

F

Entao αϕ(x) = α(yx) = x, para todo x ∈ X, e portanto αϕ(f) = f , para todo f ∈ DK〈X〉. Emparticular, se f ∈ Ker(ϕ) temos 0 = αϕ(f) = f , donde segue que ϕ e injetora. Logo DK〈X〉 ∼=Im(ϕ) ⊂ F0. Escrevendo Y = {yx : x ∈ X} obtemos que DK〈X〉 ∼= DK〈Y 〉 = Im(ϕ) ⊂ F0.Seja A(yx) uma matriz plena sobre DK〈Y 〉. Entao A(x) = ϕ−1(A(yx)) e plena sobre DK〈X〉 eportanto e inversıvel sobre DK<(X)>⊂ E. Agora, observe que DK<(X)>⊂ Im(α); de fato, comoD, X ⊂ Im(α) entao DK〈X〉 ⊂ Im(α). Alem disso, toda matriz plena sobre DK〈X〉 e inversıvelsobre E (equivalentemente, plena sobre E) e portanto e plena sobre Im(α) ⊂ E. Como Im(α) eum corpo, Im(α) ∼= F0/Ker(α), segue que toda matriz plena sobre DK〈X〉 e inversıvel sobre Im(α)e, portanto, DK<(X)>⊂ Im(α). Logo a inversa de A(x) e a imagem de uma matriz B sobre F0:

38 CAPITULO 2. CORPOS LIVRES EM ANEIS COM DIVISAO VALORIZADOS

A(x)α(B) = I. Como A(x) = αϕ(A(x)) = α(A(yx)) entao I = α(A(yx))α(B) = α(A(yx)B). Logoα(A(yx)B− I) = 0 e portanto A(yx)B− I = C ∈M(Ker(α)) = M(J(F0)) = J(M(F0)), onde M(R)e o anel de matrizes de tamanho apropriado sobre um anel R e J(R) e o radical de Jacobson deR. Logo A(yx)B = I + C e inversıvel sobre F0 e assim A(yx)B(I + C)−1 = I ⇒ A(yx) e inversıvela direita sobre F0 ⇒ A(yx) e inversıvel a direita sobre F . Como F e um corpo segue que A(yx) einversıvel sobre F . Portanto F contem corpo livre DK<(Y )>.

Capıtulo 3

Series de Malcev-Neumann

Seja KG a algebra de grupo sobre um corpo comutativo K de um grupo nilpotente, finitamentegerado, livre de torcao, nao-abeliano G. Como vimos na Secao 1.4, G e ordenavel e portanto podemosconsiderar o corpo das series de Malcev-Neumann K((G)) relativo a uma ordem fixada de G. Umavez que KG ⊂ K((G)) entao KG e um domınio. Alem disso, segue do Corolario 10.2.8 de [34] queKG e um anel noetheriano. Em particular, KG e um domınio de Ore e seu corpo de quocientesclassico sera denotado por Q(KG). Temos entao as inclusoes KG ⊂ Q(KG) ⊂ K((G)). De agoraem diante, ate o final deste trabalho, G sera considerado com a relacao de ordem definida na Secao1.4. Provaremos neste capıtulo que o corpo das series de Malcev-Neumann K((G)) contem um corpolivre sobre o centro de Q(KG). Isso e uma aplicacao do Teorema 2.2.4.

3.1 Uma valorizacao de K((G))

Como todo elemento de G e escrito de maneira unica na forma (1.2), temos

KG =

{∑I

aIfα11 fα2

2 · · · fαrr : I = (α1, α2, . . . , αr) ∈ Zr, aI ∈ K, (aI) quase-nula

}.

Definamos sobre KG a funcao of1 : KG −→ Z ∪ {∞} dada por: se f e um elemento nao-nulo deKG, f =

∑I aIf

α11 fα2

2 · · · fαrr , entao

of1(f) = min{α1 : fα11 fα2

2 · · · fαrr ∈ supp(f) para alguns α2, . . . , αr ∈ Z}

= min{α1 : a(α1,α2,...,αr) 6= 0 para alguns α2, . . . , αr ∈ Z}

39

40 CAPITULO 3. SERIES DE MALCEV-NEUMANN

e of1(0) = ∞. Vamos chamar of1 de funcao ordem com relacao a f1. Mostremos que of1 e umavalorizacao de KG. Temos of1(1) = of1(1f

01 · · · f0

r ) = 0. Sejam f =∑

I aIfα11 fα2

2 · · · fαrr , g =∑

I bIfα11 fα2

2 · · · fαrr ∈ KG com of1(f) = s ∈ Z e of1(g) = t ∈ Z. Temos

f + g =∑

(aI + bI)fα11 fα2

2 · · · fαrr .

Se f + g = 0 entao of1(f + g) = ∞ > min{of1(f), of1(g)}. Suponhamos entao que f + g 6= 0 esuponhamos sem perda de generalidade que s ≤ t. Seja I = {I = (α1, α2, . . . , αr) ∈ Zr : α1 = s}.Se aI + bI = 0 para todo I ∈ I entao of1(f + g) > s = min{s, t}. Se aI + bI 6= 0 para algum I ∈ Ientao of1(f + g) = s = min{s, t}. Logo, of1(f + g) ≥ min{of1(f), of1(g)}. Se f = 0 ou g = 0 entaoof1(f + g) = min{of1(f), of1(g)}.

Agora, segue de (1.3) que

fg =∑I,J

aIbJfα11 fα2

2 · · · fαr−1

r−1 fβ11 fβ2

2 · · · fβr−1

r−1 fαr+βrr

=∑I,J

aIbJfα11 fα2

2 fβ11 fβ2

2 fα3+β33 fγ44 · · · fγr

r

=∑I,J

aIbJfα1+β11 fα2

2 f ε33 · · · f εrr fβ22 fα3+β3

3 fγ44 · · · fγrr

=∑I,J

aIbJfα1+β11 fα2+β2

2 fα3+β3+ε33 fφ4

4 · · · fφrr .

Como of1(f) = s e of1(g) = t existem I0 = (s, s2, . . . , sr), J0 = (t, t2, . . . , tr) tais que aI0 6= 0e bJ0 6= 0 e portanto aI0bJ0 6= 0. Tomemos I0 e J0 de forma que fs1f

s22 · · · fsr

r = min supp(f) ef t1f

t22 · · · f trr = min supp(g). Suponhamos que

fα11 fα2

2 · · · fαrr fβ1

1 fβ22 · · · fβr

r = fs1fs22 · · · fsr

r ft1f

t22 · · · f trr ,

ou seja,fα1+β11 fα2+β2

2 fα3+β3+ε33 fφ4

4 · · · fφrr = fs+t1 fs2+t2

2 fs3+t3+ε′33 f

φ′44 · · · fφ′rr ,

para algum I = (α1, α2, . . . , αr) e algum J = (β1, β2, . . . , βr), tais que aI , bJ 6= 0. Entao α1 + β1 =s+t, α2+β2 = s2+t2, α3+β3+ε3 = s3+t3+ε′3, φ4 = φ′4, . . . , φr = φ′r. Suponhamos por absurdo queα1, β1 sao tais que α1 6= s, β1 6= t. Entao α1 < s ou β1 < t. Se α1 < s entao aI = 0. Se β1 < t entaobI = 0. Portanto devemos ter α1 = s e β1 = t. Se α2 6= s2 (⇒ β2 6= t2) entao α2 < s2 ou β2 < t2. Se

3.1. UMA VALORIZACAO DE K((G)) 41

α2 < s2 entao aI = 0. Se β2 < t2 entao bI = 0. Portanto devemos ter α2 = s2 e β2 = t2. Segue queε3 = ε′3 e assim α3 +β3 = s3 + t3. De modo analogo segue que α3 = s3 e β3 = t3. Prosseguindo dessaforma obtemos que o elemento fs1f

s22 · · · fsr

r ft1f

t22 · · · f trr = fs+t1 fs2+t2

2 fs3+t3+ε′33 f

φ′44 · · · fφ

′r

r aparece umaunica vez no suporte de fg. Logo

fg = aI0bJ0fs+t1 fs2+t2

2 fφ3′

3 · · · fφr′

r +∑I 6=I0

J

aIbJfα1+β11 fα2+β2

2 fφ33 fφ4

4 · · · fφrr

+∑

IJ 6=J0

aIbJfα1+β11 fα2+β2

2 fφ33 fφ4

4 · · · fφrr

com α1 ≥ s, β1 ≥ t e portanto of1(fg) = s+ t = of1(f) + of1(g). Portanto of1 e uma valorizacao deKG.

Seja ν : Q(KG) −→ Z ∪ {∞} a unica valorizacao de Q(KG) tal que ν|KG = of1 ; mais preci-samente, se fg−1 ∈ Q(KG), f, g ∈ KG, entao ν(fg−1) = of1(f) − of1(g), pela Proposicao 1.3.4.Fixemos uma constante real c ∈ (0, 1) e definamos sobre Q(KG) a seguinte metrica:

d(u, v) = cν(u−v), u, v ∈ Q(KG).

Vamos estudar o completamento de Q(KG) com relacao a topologia dada por essa metrica.

Considere o corpo das series de Malcev-Neuman K((G)). Observe que se f ∈ K((G)) e umelemento nao-nulo, entao aI = a(α1,...,αr) 6= 0 somente para um numero finito de valores negativos deα1 pois, caso contrario, supp(f) nao teria um elemento mınimo. Podemos entao escrever

f =∑

I=(α1,...,αr)α1≥α0

aIfα11 · · · fαr

r ,

para algum α0 ∈ Z.

Definamos sobre K((G)) a funcao ν : K((G)) −→ Z∪{∞} dada por: se f =∑aIf

α11 fα2

2 · · · fαrr ∈

K((G)) e um elemento nao-nulo entao

ν(f) = min{α1 : fα11 · · · fαr

r ∈ supp(f) para alguns α2, . . . , αr ∈ Z}

= min{α1 : a(α1,...,αr) 6= 0 para alguns α2, . . . , αr ∈ Z}

42 CAPITULO 3. SERIES DE MALCEV-NEUMANN

e ν(0) = ∞.

Lema 3.1.1. ν : K((G)) −→ Z ∪ {∞} e uma valorizacao de K((G)) que estende ν : Q(KG) −→Z ∪ {∞}.

Demonstracao: Para mostrar que ν e uma valorizacao basta proceder de maneira analoga ao que foifeito para of1 . Como µ := ν|Q(KG) e uma valorizacao de Q(KG) e µ|KG = of1 , entao µ = ν, ou seja,ν|Q(KG) = ν, pela Proposicao 1.3.4.

Seja d a metrica sobre K((G)) definida por:

d(f, g) = cν(f−g), f, g ∈ K((G)).

Lema 3.1.2.(K((G)), d

)e um espaco metrico completo.

Demonstracao: Seja (un) uma sequencia de Cauchy em K((G)),

un =∑

I=(α1,...,αr)

a(n)I fα1

1 fα22 · · · fαr

r , a(n)I ∈ K.

Para todo k ∈ Z existe nk ∈ N tal que d(up, uq) < ck, se p, q ≥ nk. Se η ∈ N e tal que η >

max{n0, n1} entao d(up, uq) < c1 = c, para todo p, q ≥ η. Logo η e um numero natural tal quen0 < η e d(up, uq) < c1, para todo p, q ≥ η. Podemos entao supor que n0 < n1. E possıvel entaotomar

n0 < n1 < n2 < · · · < nk < · · · (k > 0).

Observe que, para todo k ∈ Z,

d(up, uq) < ck ⇔ a(p)I = a

(q)I , ∀ I = (α1, . . . , αr) com α1 ≤ k. (3.1)

De fato,

ck > d(up, uq) = cν(up−uq) ⇔ k < ν(up − uq) = ν(∑

(a(p)I − a

(q)I )fα1

1 fα22 · · · fαr

r

)⇔ a

(p)I − a

(q)I = 0, ∀ I = (α1, . . . , αr) com α1 ≤ k.

3.1. UMA VALORIZACAO DE K((G)) 43

Considere a subsequencia (unk)k≥0 de (un). Entao unk

=∑

I a(nk)I fα1

1 fα22 · · · fαr

r , k ≥ 0. Se l ≥ k ≥ 0entao nl ≥ nk ≥ n0. Segue de (3.1) que,

a(nk)I = a

(n0)I , ∀ I = (α1, . . . , αr) com α1 ≤ 0, (3.2)

a(nl)I = a

(nk)I , ∀ I = (α1, . . . , αr) com α1 ≤ k, (3.3)

para todo l ≥ k ≥ 0. Defina

u =∑

I=(α1,...,αr)α1<0

a(n0)I fα1

1 fα22 · · · fαr

r +∑

I=(α1,...,αr)α1≥0

a(nα1 )

I fα11 fα2

2 · · · fαrr .

Mostremos que u ∈ K((G)), ou seja, que supp(u) e bem-ordenado. Vamos denotar por v a primeiraparcela da soma em u e por w a segunda parcela. Como supp(v) ⊂ supp(un0) entao supp(v) e bem-ordenado. Fixe α1 ≥ 0 tal que fα1

1 fα22 · · · fαr

r ∈ supp(w) para alguns α2, . . . , αr ∈ Z, e considere oconjunto

Nα1 = {α2 ∈ Z : fα11 fα2

2 · · · fαrr ∈ supp(w) para alguns α3, . . . , αr}.

Suponha que Nα1 nao tenha elemento mınimo. Entao existe uma sequencia decrescente de inteiros

α21 > α22 > α23 > · · · > α2l > · · ·

tal que fα11 fα2l

2 fα3l3 · · · fαrl

r ∈ supp(w) para alguns α3l, . . . , αrl ∈ Z, para todo l ≥ 1, ou seja,a

(nα1 )

(α1,α2l,α3l,...,αrl)6= 0, para todo l ≥ 1. Assim, fα1

1 fα2l2 fα3l

3 · · · fαrlr ∈ supp(unα1

), para todo l ≥ 1, eportanto {fα1

1 fα2l2 · · · fαrl

r : l ≥ 1} ⊂ supp(unα1) e um subconjunto que nao possui elemento mınimo

uma vez que fα11 fα21

2 · · · fαr1r > fα1

1 fα222 · · · fαr2

r > · · · > fα11 fα2l

2 · · · fαrlr > · · · . Isso e um absurdo

pois unα1∈ K((G)) e portanto seu suporte e bem-ordenado. Logo Nα1 possui elemento mınimo.

Agora fixe α1 ≥ 0 e α2, . . . , αn ∈ Z, 2 ≤ n < r, tais que fα11 fα2

2 fαnn f

αn+1

n+1 · · · fαrr ∈ supp(w) para

alguns αn+1, . . . , αr ∈ Z, e considere o conjunto

N(α1,...,αn) = {αn+1 ∈ Z : fα11 fα2

2 · · · fαrr ∈ supp(w) para alguns αn+2, . . . , αr ∈ Z}.

(Se n = r − 1, N(α1,...,αr−1) = {αr ∈ Z : fα11 fα2

2 · · · fαrr ∈ supp(w)}). Suponha que N(α1,...,αn) nao

44 CAPITULO 3. SERIES DE MALCEV-NEUMANN

tenha elemento mınimo e seja

αn+1,1 > αn+1,2 > αn+1,3 > · · · > αn+1,l > · · ·

uma sequencia decrescente em N(α1,...,αn). Entao, para todo l ≥ 1, existem αn+2,l, . . . , αrl ∈ Z tais

que fα11 · · · fαn

n fαn+1,l

n+1 fαn+2,l

n+2 · · · fαrlr ∈ supp(w), para todo l ≥ 1, ou seja, a(nα1 )

(α1,...,αn,αn+1,l,...,αrl)6= 0,

para todo l ≥ 1. Logo {fα11 · · · fαn

n fαn+1,l

n+1 · · · fαrlr : l ≥ 1} ⊂ supp(unα1

) e um subconjunto que naopossui elemento mınimo pois fα1

1 · · · fαnn f

αn+1,1

n+1 · · · fαr1r > fα1

1 · · · fαnn f

αn+1,2

n+1 · · · fαr2r > · · · . Isso e um

absurdo pois unα1tem suporte bem-ordenado. Logo N(α1,...,αn) possui elemento mınimo, para todo

1 ≤ n < r.

Seja S ⊂ supp(w) um subconjunto nao-vazio e defina os seguintes inteiros:

α1S = min{α1 ≥ 0 : fα11 fα2

2 · · · fαrr ∈ S para alguns α2, . . . , αr ∈ Z},

αnS = min{αn ∈ Z : fα1S1 · · · fαn−1,S

n−1 fαnn · · · fαr

r ∈ S para alguns αn+1, . . . , αr ∈ Z}

⊂ N(α1S ,...,αn−1,S), 1 < n < r,

αrS = min{αr ∈ Z : fα1S1 · · · fαr−1,S

r−1 fαrr ∈ S} ⊂ N(α1S ,...,αr−1,S),

que existem pelo Princıpio da Boa Ordem. Entao g = fα1S1 fα2S

2 · · · fαrSr e o elemento mınimo de S.

De fato, seja h = fβ11 fβ2

2 · · · fβrr ∈ S. Entao β1 ≥ α1S . Se β1 > α1S entao h > g. Suponha que

β1 = α1S e seja m = max{i ≥ 1 : β1 = α1S , . . . , βi = αis}. Se m = r entao h = g. Se m < r entaoh = fα1S

1 · · · fαmSm f

βm+1

m+1 · · · fβrr com βm+1 6= αm+1,S . Como h ∈ S entao

βm+1 ≥ min{αm+1 ∈ Z : fα1S1 · · · fαmS

m fαm+1

m+1 · · · fαrr ∈ S para alguns αm+2, . . . , αr ∈ Z}

= αm+1,S

e assim h ≥ g, para todo h ∈ S. Logo g = minS e portanto supp(w) e bem-ordenado. Segue queu = v + w ∈ K((G)).

Mostremos agora que un → u. Dado ε > 0 seja t um inteiro positivo tal que ct < ε. Se k ≥ t

3.2. CORPOS LIVRES EM K((G)) 45

entao ck ≤ ct < ε. Temos

unk− u =

∑I=(α1,...,αr)

α1<0

(a(nk)I − a

(n0)I )fα1

1 fα22 · · · fαr

r +∑

I=(α1,...,αr)0≤α1≤k

(a(nk)I − a

(nα1 )

I )fα11 fα2

2 · · · fαrr

+∑

I=(α1,...,αr)α1≥k+1

(a(nk)I − a

(nα1 )

I )fα11 fα2

2 · · · fαrr

=∑

I=(α1,...,αr)α1≥k+1

(a(nk)I − a

(nα1 )

I )fα11 fα2

2 · · · fαrr ,

por (3.2) e (3.3). Entao ν(unk− u) ≥ k + 1 > k e portanto d(unk

, u) = cν(unk−u) < ck < ε. Portanto

a subsequencia (unk) de (un) converge para u. Como (un) e de Cauchy entao un → u e portanto

K((G)) e completo.

3.2 Corpos livres em K((G))

Nesta secao usaremos o Teorema 2.2.4 para mostrar que o corpo das series de Malcev-NeumannK((G)) contem um corpo livre sobre o centro de Q(KG). Primeiramente, vamos encontrar o centrode Q(KG). Para isso, vamos utilizar o seguinte resultado:

Teorema 3.2.1 ([44], pg. 332). Se G e nilpotente, finitamente gerado, livre de torcao e K e umcorpo comutativo entao

Z(Q(KG)) = Q(KZ(G)).

Vamos considerar uma F-serie de G

G = F1 ⊃ F2 ⊃ · · · ⊃ Fr ⊃ Fr+1 = {1}

que seja um refinamento da serie central superior de G, como na demonstracao da Proposicao 1.4.7.

Lema 3.2.2. Z(Q(KG)) = K(fj , . . . , fr), onde Fj = Z(G).

Demonstracao: Como G e nao-abeliano entao f1 6∈ Z(G) pois, caso contrario, f1 ∈ Z(G) ⊂ F2 ⇒F1/F2 = 〈f1F2〉 = {1}, o que e uma contradicao ja que F1/F2 e um grupo cıclico infinito. Seja j > 1

46 CAPITULO 3. SERIES DE MALCEV-NEUMANN

tal que Fj = Z(G). Entao

Z(G) = Fj ⊃ Fj+1 ⊃ · · · ⊃ Fr ⊃ Fr+1 = {1}

e uma F-serie para Z(G). Logo todo elemento de Z(G) e escrito de maneira unica na forma g =fαj

j · · · fαrr e portanto

KZ(G) =

{∑I

αIfαj

j · · · fαrr : I = (αj , . . . , αr) ∈ Zr−j+1

}.

Como {fαj

j · · · fαrr : αi ∈ Z} e linearmente independente sobre K entao

KZ(G) = K[fj , f−1j , . . . , fr, f

−1r ],

o anel dos polinomios de Laurent nas indeterminadas centrais fj , . . . , fr sobre K. Como

K[fj , . . . , fr] ⊂ K[fj , f−1j , . . . , fr, f

−1r ] ⊂ K(fj , . . . , fr),

onde K(fj , . . . , fr) e o corpo das funcoes racionais em fj , . . . , fr sobre K, segue que Q(KZ(G)) =Q(K[fj , f−1

j , . . . , fr, f−1r ]) = K(fj , . . . , fr). Logo, pelo teorema acima, Z(Q(KG)) = K(fj , . . . , fr).

Teorema 3.2.3. Seja K um corpo comutativo e seja G um grupo nilpotente, finitamente gerado,livre de torcao, nao-abeliano. Entao K((G)) contem um corpo livre Z<(X)>, onde Z e o centro deQ(KG) e X e um conjunto enumeravel.

Demonstracao: Ja sabemos que Z(Q(KG)) = K(fj , . . . , fr), que e um corpo infinito. Mostremosque Q(KG) tem dimensao infinita sobre K(fj , . . . , fr).1 Para isso, considere o conjunto {f i1 : i ≥1} ⊂ KG e sejam g1h

−11 , g2h

−12 , . . . , gnh

−1n ∈ K(fj , . . . , fr), gi, hi ∈ K[fj , . . . , fr], hi 6= 0, tais que

(g1h−11 )f1 + (g2h−1

2 )f21 + · · · + (gnh−1

n )fn1 = 0. Seja h ∈ K[fj , . . . , fr] tal que gih−1i = kih

−1, paraalgum ki ∈ K[fj , . . . , fr], para todo i = 1, . . . , n. Entao (k1h

−1)f1 +(k2h−1)f2

1 + · · ·+(knh−1)fn1 = 0

1Vale dizer que ja sabemos de [30] que Q(KG) tem dimensao infinita sobre seu centro, uma vez que Q(KG) contemuma algebra livre. Mas, uma vez que o calculo da dimensao e simples, faremos uma demonstracao direta.

3.3. CORPOS LIVRES EM K((G, σ)) 47

e portanto k1f1 + k2f21 + · · ·+ knf

n1 = 0. Escrevamos ki =

∑I a

(i)I f

αj

j · · · fαrr ∈ K[fj , . . . , fr]. Entao

0 =∑I

a(1)I f

αj

j · · · fαrr f1 + · · ·+

∑I

a(n)I f

αj

j · · · fαrr fn1

=∑I

a(1)I f1f

αj

j · · · fαrr + · · ·+

∑I

a(n)I fn1 f

αj

j · · · fαrr

⇒ a(i)I = 0, ∀ I = (αj , . . . , αr), ∀ i⇒ ki = 0, ∀ i⇒ gih

−1i = 0, ∀ i.

Logo {f i1 : i ≥ 1} ⊂ KG e linearmente independente sobre K(fj , . . . , fr) e, portanto, Q(KG) temdimensao infinita sobre K(fj , . . . , fr). Se ν e a unica valorizacao de Q(KG) tal que ν|KG = of1 , afuncao ordem com relacao a f1, entao ν e uma valorizacao discreta e portanto o completamento deQ(KG) com relacao a topologia definida por ν contem um corpo livre Z<(X)>, sobre um conjuntoenumeravel X.

A inclusao f : Q(KG) −→ K((G)) e um mergulho isometrico, ou seja,

d(f(x), f(y)) = cν(f(x)−f(y)) = cν(x−y) = cν(x−y) = d(x, y),

para todos x, y ∈ Q(KG), pelo Lema 3.1.1. Como K((G)) e completo entao o fecho f(Q(KG)) do su-bespaco f(Q(KG)) do espaco metrico K((G)) e completo e, portanto, f(Q(KG)) e o completamentode Q(KG). Portanto K((G)) contem Z<(X)>.

Se H for um grupo residualmente-{nilpotente, livre de torcao}, finitamente gerado, entao H eum grupo ordenavel, pelo Lema 13.2.2 de [34]. As investigacoes feitas ate o momento nos levam aacreditar que existe uma especializacao, nas hipoteses do Teorema 2.3.1, de um corpo de series deMalcev-Neumann K((H)) em K((G)), onde G e um grupo nilpotente, finitamente gerado, livre detorcao e K e um corpo comutativo. Se essa suspeita for confirmada teremos entao um corpo livreem K((H)), pelo Teorema 2.3.1.

3.3 Corpos livres em K((G, σ))

Consideremos agora o corpo das series de Malcev-Neumann skew K((G, σ)), onde σ : G −→Aut(K) e um homomorfismo. Uma vez que K(G, σ) ⊂ K((G, σ)) entao K(G, σ) e um domınio.Alem disso, segue da Proposicao 1.6 de [35, pg. 7] que K(G, σ) e um anel noetheriano a direita. Emparticular, K(G, σ) e um domınio de Ore a direita e seu corpo de quocientes classico sera denotado

48 CAPITULO 3. SERIES DE MALCEV-NEUMANN

por Q(K(G, σ)). Temos entao as inclusoes K(G, σ) ⊂ Q(K(G, σ)) ⊂ K((G, σ)).

Assim como no caso das series de Malcev-Neumann K((G)), tambem conseguimos encontrar casosem que K((G, σ)) contem um corpo livre. Considere a funcao of1 : K(G, σ) −→ Z ∪ {∞} definidade forma analoga ao caso σ = 1. Do mesmo modo, mostra-se que of1 e uma valorizacao de K(G, σ).Seja ν : Q(K(G, σ)) −→ Z ∪ {∞} a unica valorizacao de Q(KG) tal que ν|K(G,σ) = of1 . Tambemdefinida de forma analoga ao caso σ = 1, considere a funcao ν : K((G, σ)) −→ Z ∪ {∞}, que e umavalorizacao de K((G, σ)). Como µ := ν|Q(K(G,σ)) e uma valorizacao de Q(K(G, σ)) e µ|K(G,σ) = of1 ,

entao ν|Q(K(G,σ)) = ν, pela Proposicao 1.3.4. Sejam d e d as metricas definidas sobre Q(K(G, σ)) eK((G, σ)), respectivamente, como no caso σ = 1. Prosseguindo de maneira analoga ao que fizemosna Secao 3.1 e possıvel mostrar que (K((G, σ)), d) e um espaco metrico completo.

No caso em que σ 6= 1 nao temos um resultado que nos ajude a calcular o centro de Q(K(G, σ)),como tınhamos o Teorema 3.2.1 no caso σ = 1 e, portanto, nao e possıvel afirmar se Q(K(G, σ)) temdimensao infinita sobre seu centro e se seu centro e infinito. No entanto, com algumas hipoteses sobreσ ainda e possıvel garantir que K((G, σ)) contenha um corpo livre. Por exemplo, temos o seguinte

Teorema 3.3.1. Seja K um corpo comutativo e seja G um grupo nilpotente, finitamente gerado,livre de torcao, nao-abeliano. Se σ : G −→ Aut(K) for um homomorfismo injetor tal que o corpoKG = {a ∈ K : σg(a) = a, ∀ g ∈ G} seja infinito entao K((G, σ)) contem um corpo livre KG<(X)>sobre um conjunto enumeravel X.

A demonstracao deste teorema segue o roteiro descrito acima e faz uso da seguinte caracterizacaodo centro de K((G, σ)):

Teorema 3.3.2 ([18], Corolario 14.26). Se R e um corpo comutativo, G e um grupo ordenado eω : G −→ Aut(R) e um homomorfismo injetor, entao

Z(R((G,ω))) = RG := {r ∈ R : ωg(r) = r, ∀ g ∈ G},

e R((G,ω)) tem dimensao infinita sobre RG.

Capıtulo 4

Series de Laurent

Neste capıtulo usaremos o Teorema 2.2.4 para provar a existencia de corpos livres em algunscorpos de series de Laurent skew, como, por exemplo, o completamento do corpo de Weyl e do corpodas matrizes quanticas 2× 2.

4.1 Series de Laurent skew

Sejam K um corpo, α um automorfismo de K e δ uma α-derivacao nao-nula de K. Considereo corpo K((y;α, δ)), onde ya = α(a)y + yδ(a)y, a ∈ K, como no Teorema 1.6.6. Defina sobreK((y;α, δ)) uma funcao ω : K((y;α, δ)) −→ Z ∪ {∞} da seguinte forma: se f ∈ K((y;α, δ)),

ω(f) = sup{n : f ∈ K[[y;α, δ]]yn = ynK[[y;α, δ]]}. (4.1)

Entao ω e uma valorizacao de K((y;α, δ)). De fato, e obvio que ω(1) = 0 e ω(0) = ∞. Sejamf =

∑∞i=k aiy

i, g =∑∞

i=l biyi com ak, bl 6= 0. Suponha sem perda de generalidade que k ≤ l.

Entao f + g =∑∞

i=k(ai + bi)yi, onde bi = 0 se i < l. Se ak + bk 6= 0 entao ω(f + g) = k =min{k, l} = min{ω(f), ω(g)}. Se ak + bk = 0 entao ω(f + g) > k = min{ω(f), ω(g)}. Portantoω(f + g) ≥ min{ω(f), ω(g)}. Se f = 0 ou g = 0 entao ω(f + g) = min{ω(f), ω(g)}. Agora, sejam

49

50 CAPITULO 4. SERIES DE LAURENT

f =∑∞

i=−k aiyi, g =

∑∞j=−l bjy

j , k, l ≥ 0. Entao

fg =∞∑

i=−k

∞∑j=−l

aiyibjy

j =∑i≤0

∞∑j=−l

aiyibjy

j +∑i>0

∞∑j=−l

aiyibjy

j

=∑i≤0

∞∑j=−l

aix−ibjy

j +∑i>0

∞∑j=−l

ai

∑n1,...,ni≥0

αδn1 · · ·αδni(bj)yn1+···+ni+i

yj , por (1.6)

=k∑i=0

∞∑j=−l

a−ixibjy

j +∞∑i=1

∞∑j=−l

∑n1,...,ni≥0

aiαδn1 · · ·αδni(bj)yn1+···+ni+i+j .

Agora,

k∑i=0

∞∑j=−l

a−ixibjy

j =k∑i=0

∞∑j=−l

a−i

(i∑

m=0

(−1)i−mg′(m, i−m)(bj)xm)yj , por (1.4)

=k∑i=0

∞∑j=−l

(i∑

m=0

(−1)i−ma−ig′(m, i−m)(bj)yj−m)

e, portanto,

fg =k∑i=0

∞∑j=−l

(i∑

m=0

(−1)i−ma−ig′(m, i−m)(bj)yj−m)

+∞∑i=1

∞∑j=−l

∑n1,...,ni≥0

aiαδn1 · · ·αδni(bj)yn1+···+ni+i+j .

Denotemos por A a primeira parcela da soma acima e por B a segunda parcela. Sejam p e q osmenores ındices tais que ap 6= 0 e bq 6= 0. Entao ω(f) = p e ω(g) = q. Vamos considerar dois casos:

10 caso: p ≤ 0.Neste caso, A =

∑−pi=0

∑∞j=q

(∑im=0(−1)i−ma−ig′(m, i−m)(bj)yj−m

)e portanto a menor

potencia possıvel de y em A e p + q, que ocorre quando i = m = −p e j = q. Tomandoesses valores para i, j e m temos a−ig′(m, i − m)(bj) = apg

′(−p, 0)(bq) = ap(α−1)−p(bq) =apα

p(bq) 6= 0. Alem disso, B =∑∞

i=1

∑∞j=q

∑n1,...,ni≥0 aiαδ

n1 · · ·αδni(bj)yn1+···+ni+i+j e por-tanto as potencias de y que aparecem em B sao maiores ou iguais a q + 1. Como p ≤ 0 entaop+ q < q + 1 e, portanto, ω(fg) = p+ q.

4.1. SERIES DE LAURENT SKEW 51

20 caso: p > 0.Neste caso, A = 0 e B =

∑∞i=p

∑∞j=q

∑n1,...,ni≥0 aiαδ

n1 · · ·αδni(bj)yn1+···+ni+i+j . Entao amenor potencia possıvel de y em B e p+ q, que ocorre quando i = p, n1 = · · · = ni = 0 e j = q.Para esses valores temos aiαδn1 · · ·αδni(bj) = apα

p(bq) 6= 0 e, portanto, ω(fg) = p+ q.

Se f = 0 ou g = 0 e obvio que ω(fg) = p+ q. Portanto ω e uma valorizacao sobre K((y;α, δ)).

A funcao −deg : K[x;α, δ] −→ Z∪ {∞} (onde y = x−1) e uma valorizacao e se estende de modounico a uma valorizacao ν sobre K(x;α, δ). Mais precisamente, se f, g ∈ K[x;α, δ], g 6= 0, entao

ν(fg−1) = −deg(f)− (−deg(g)) = deg(g)− deg(f).

E facil ver que ω|K(x;α,δ) = ν, por (1.7). Considere a metrica d(u, v) = cω(u−v) sobre K((y;α, δ)),onde c ∈ (0, 1) e um numero real fixo. Mostremos que, com a topologia dada por essa metrica,K((y;α, δ)) e o completamento de K(x;α, δ). Seja u =

∑∞i=n aiy

i ∈ K((y;α, δ)), an 6= 0. Entaou =

(∑∞i=n aiy

i−n) yn =(∑∞

j=0 an+jyj)yn. Considere a sequencia em K(x;α, δ) dada por bm =(∑m

j=0 an+jx−j)x−n. Dado ε > 0 seja N um inteiro positivo tal que cN+n+1 < ε. Entao, se m ≥ N ,

d(bm, u) = cω(bm−u) = cω((P∞

j=m+1 an+jyj)yn) = cω((

P∞j=m+1 an+jy

j−m−1)yn+m+1) ≤ cn+m+1 < cn+N+1 < ε

e portanto bm → u. Logo u ∈ K(x;α, δ) e portanto K(x;α, δ) = K((y;α, δ)). Resta mostrar queK((y;α, δ)) e completo. Seja (un) uma sequencia de Cauchy em K((y;α, δ)),

un =∑i≥mn

a(n)i yi, a

(n)i ∈ K, mn ∈ Z.

Para cada k ∈ Z seja nk ∈ N tal que d(up, uq) < ck, se p, q ≥ nk. Se η ∈ N e tal que η > max{n0, n1}entao, d(up, uq) < c1 = c, para todo p, q ≥ η. Logo η e um numero natural tal que n0 < η ed(up, uq) < c1, para todo p, q ≥ η. Podemos entao supor que, n0 < n1. E possıvel entao tomar

n0 < n1 < n2 < · · · < nk < · · · (k > 0).

Observe que, para todo k ∈ Z,

d(up, uq) < ck ⇔ a(p)i = a

(q)i , ∀ i ≤ k. (4.2)

52 CAPITULO 4. SERIES DE LAURENT

De fato,

ck > d(up, uq) = cω(up−uq) ⇔ k < ω(up − uq) = ω(∑

(a(p)i − a

(q)i )yi

)⇔ a

(p)i − a

(q)i = 0, ∀ i ≤ k.

Considere a subsequencia (unk)k≥0 de (un). Entao unk

=∑

i≥mnka

(nk)i yi, k ≥ 0. Se l ≥ k ≥ 0 entao

nl ≥ nk ≥ n0. Segue de (4.2) que,

a(nk)i = a

(n0)i , ∀ i ≤ 0, (4.3)

a(nl)i = a

(nk)i , ∀ i ≤ k, (4.4)

para todo l ≥ k ≥ 0. Definau =

∑i<0

a(n0)i yi +

∑i≥0

a(ni)i yi.

Como a(n0)i = 0 para todo i < mn0 , entao a primeira parcela da soma em u e finita (podendo, claro,

ser nula) e, portanto, u ∈ K((y;α, δ)). Mostremos que un → u. Dado ε > 0 seja t um inteiro positivotal que ct < ε. Se k ≥ t entao ck ≤ ct < ε. Temos

unk− u =

∑i<0

(a(nk)i − a

(n0)i )yi +

∑0≤i≤k

(a(nk)i − a

(ni)i )yi +

∑i≥k+1

(a(nk)i − a

(ni)i )yi

=∑i≥k+1

(a(nk)i − a

(ni)i )yi,

por (4.3) e (4.4). Entao ω(unk−u) ≥ k+1 > k e portanto d(unk

, u) = cω(unk−u) < ck < ε. Portanto a

subsequencia (unk) de (un) converge para u. Como (un) e de Cauchy entao un → u. Logo K((y;α, δ))

e completo e, portanto, K((y;α, δ)) e o completamento de K(x;α, δ). Para simplificar usaremos anotacao

K((y;α, δ)) = K(x;α, δ).

Recordemos que o automorfismo α e dito ter ordem interna r se αr e a menor potencia positivade α a qual e um automorfismo interno. Se αr nao e interno para todo r > 0, α e dito ter ordeminterna infinita. O seguinte teorema sera muito util.

Teorema 4.1.1 ([8], Teorema 2.2.10). Sejam D um anel com divisao com centro C, α um auto-

4.1. SERIES DE LAURENT SKEW 53

morfismo de D e δ uma α-derivacao. Considere o subcorpo C0 = {c ∈ C : α(c) = c e δ(c) = 0},chamado o (α, δ)-centro reduzido de D. Se D[x;α, δ] for simples ou α tiver ordem interna infinitaentao Z(D(x;α, δ)) = C0.

Temos entao o seguinte resultado:

Teorema 4.1.2. Sejam K um anel com divisao com centro C, α um automorfismo de K e δ umaα-derivacao tal que o corpo C0 = {c ∈ C : α(c) = c e δ(c) = 0} seja infinito. Se K[x;α, δ] for simplesou α tiver ordem interna infinita entao o corpo das series de Laurent K((y;α, δ)), y = x−1, contemum corpo livre C0<(X)>, onde X e um conjunto enumeravel.

Demonstracao: Sabemos que Z(K(x;α, δ)) = C0, pelo Teorema 4.1.1. Como o conjunto {xi : i ∈Z} ⊂ K(x;α, δ) e lineramente independente sobre C0 (pois o e sobre K) entao [K(x;α, δ) : C0] =∞. Seja ω a valorizacao de K((y;α, δ)) definida em (4.1) e ν a valorizacao de K(x;α, δ) definidaanteriormente. Entao ω|K(x;α,δ) = ν e uma valorizacao discreta de K(x;α, δ). Resumindo, temos:K(x;α, δ), um corpo com centro infinito C0, [K(x;α, δ) : C0] = ∞ e ν uma valorizacao discreta deK(x;α, δ). Alem disso, K((y;α, δ)) e o completamento de K(x;α, δ) com a topologia dada por essavalorizacao. Logo, pelo Teorema 2.2.4, K((y;α, δ)) contem um corpo livre C0<(X)>, onde X e umconjunto enumeravel.

No caso em que δ = 0, defina sobre K(x;α) a seguinte funcao: η(fg−1) = o(f) − o(g), ondeo(∑xiai) = min{i : ai 6= 0} e a ordem de f, que e uma valorizacao de K[x;α]. Seja ainda ηx a

valorizacao de K((x;α)) definida do seguinte modo: se h =∑xiai ∈ K((x;α)), ai ∈ K, entao

ηx(h) = sup{n : h ∈ xnK[[x;α]]

}. E facil ver que ηx|K(x;α) = η. Temos η(x) = o(x) = 1 e e facil

mostrar que K((x;α)) e o completamento de K(x;α) com relacao a topologia definida por η. (Aprova e semelhante ao caso δ 6= 0.) Temos entao o seguinte

Teorema 4.1.3. Seja K um anel com divisao com centro C e seja α um automorfismo de K talque o corpo C0 = {c ∈ C : α(c) = c} seja infinito. Se K[x;α] for simples ou α tiver ordem internainfinita entao o corpo das series de Laurent K((x;α)) contem um corpo livre C0<(X)>, onde X e umconjunto enumeravel.

Demonstracao: Sabemos que Z(D(x;α)) = C0, que e infinito, por hipotese. Como o conjunto {xi :i ∈ Z} ⊂ K(x;α) e lineramente independente sobre C0 (pois o e sobre K) entao [K(x;α) : C0] = ∞.

54 CAPITULO 4. SERIES DE LAURENT

Como η e uma valorizacao discreta de K(x;α) e K((x;α)) e o completamento de K(x;α) com atopologia dada por essa valorizacao, segue pelo Teorema 2.2.4 que K((x;α)) contem um corpo livreC0<(X)>, onde X e um conjunto enumeravel.

Observamos que o teorema acima e uma generalizacao do Teorema 4 de [3] no qual o corpo Kconsiderado e comutativo.

Vejamos uma aplicacao deste ultimo teorema. Seja k um corpo comutativo e seja λ ∈ K∗. SejaBλ a k-algebra gerada por quatro indeterminadas x, x−1, y, y−1, sujeita a relacao xy = λyx, ou maisprecisamente, Bλ = k〈x, u, y, v〉/I onde I e o ideal gerado por {xu−1, ux−1, yv−1, vy−1, xy−λyx}.Esta algebra foi definida por Jategaonkar e tratada por Lorenz em [27]. Ela pode ser vista como umquociente Bλ = kG/〈(a, b)− λ〉 da algebra de grupo kG, onde G = 〈a, b : (a, (a, b)) = (b, (a, b)) = 1〉e o grupo nilpotente livre de ındice 2, ou tambem como uma extensao de Ore Bλ = k[x, x−1][y, y−1;α],onde α e o k-automorfismo de k[x] definido por α(x) = λx. Segue desta ultima caracterizacao quek[x][y;α] ⊂ Bλ ⊂ k(x)(y;α) e, portanto, Bλ e um domınio de Ore com corpo de fracoes Qλ =k(x)(y;α). Se λ nao for uma raiz da unidade entao α tem ordem infinita e, portanto, pelo Teorema4.1.1, Z(Qλ) = {r ∈ k(x) : α(r) = r} = k, que e um corpo infinito. A funcao ordem o : k[x][y;α] −→N, o(y) = 1, e uma valorizacao e se estende a uma valorizacao em Bλ e, consequentemente, em Qλ.Assim, com respeito a essa valorizacao, pelo Teorema 4.1.3, o completamento Qλ = k(x)((y;α))contem um corpo livre k<(X)>, onde X e um conjunto enumeravel. Este exemplo deve ser comparadocom o caso considerado no Capıtulo 3, de cujos resultados segue que o corpo de fracoes classico dekG, para esse mesmo grupo G, tem uma valorizacao que define um completamento contendo umcorpo livre.

4.2 O completamento do corpo de Weyl

Consideremos agora o corpo de Weyl K(x)(y; ddx). Nesta secao aplicaremos o Teorema 4.1.2

para mostrar que, em caracterıstica zero, o completamento do corpo de Weyl, ou seja, o corpoK(x)((z; d

dx)), z = y−1, contem um corpo livre.

Suponhamos que K tenha caracterıstica zero e seja R = K(x)[y; ddx ]. Entao A1(K) ⊂ R ⊂

K(x)(y; ddx) e Q(R) = K(x)(y; d

dx).

Lema 4.2.1 ([18], Corolario 3.16). Seja A um anel simples de caracterıstica zero. Entao para todaderivacao nao-interna δ de A, A[x; δ] e um anel simples nao-artiniano.

4.3. O COMPLETAMENTO DO CORPO DAS MATRIZES QUANTICAS 55

Segue deste ultimo lema que R e um anel simples. Para isso, basta observar que ddx nao e interna.

De fato, se existisse u ∈ K(x) tal que ddx(v) = uv − vu, para todo v ∈ K(x) entao, em particular,

terıamos 1 = ddx(x) = ux− xu = ux− ux = 0. Temos entao o seguinte

Teorema 4.2.2. Seja K um anel com divisao com centro C. Se car(K) = 0 entao o completamentodo corpo de Weyl, isto e, o corpo das series de Laurent skew K(x)((z; d

dx)), contem um corpo livreC<(X)>, onde X e um conjunto enumeravel.

Demonstracao: Ja sabemos queR e simples, pelo lema anterior. Alem disso, o corpo Z := Z(K(x))0 ={v ∈ Z(K(x)) : d

dx(v) = 0} e infinito pois C ⊂ Z(K(x))0 e car(C) = 0. Pelo Teorema 4.1.2,K(x)((z; d

dx)), contem um corpo livre Z<(X)>, onde X e um conjunto enumeravel. Como C ⊂ Z

entao, pelo Teorema 1.1.15, K(x)((z; ddx)) contem o corpo livre C<(X)>.

Vale observar que C e de fato o centro de Q(R). Como R e simples entao Z = Z(Q(R)) =Z(K(x))0, pelo Teorema 4.1.1. Agora, pela Proposicao 2.2.3, Z(K(x)) = C(x) onde C e o centro deK. Logo Z = C(x)0 = {v ∈ C(x) : d

dx(v) = 0}. Seja fg−1 ∈ C(x) um elemento nao-nulo, f, g ∈ C[x],tal que d

dx(fg−1) = 0. Mostremos que fg−1 ∈ C. Como 0 = ddx(1) = d

dx(gg−1) = ddx(g)g−1+g d

dx(g−1)entao g d

dx(g−1) = − ddx(g)g−1 e assim d

dx(g−1) = −g−1 ddx(g)g−1. Logo 0 = d

dx(fg−1) = ddx(f)g−1 −

fg−1 ddx(g)g−1 e, portanto, d

dx(f) = fg−1 ddx(g). Se d

dx(g) = 0 entao ddx(f) = 0. Como car(C) = 0

entao f, g ∈ C e, portanto, fg−1 ∈ C. Suponhamos entao que ddx(g) 6= 0. Nesse caso,

d

dx(f)(d

dx(g))−1

= fg−1. (4.5)

Mostremos por inducao sobre o grau de f que fg−1 ∈ C. Se deg(f) = 0 entao f ∈ C e ddx(f) = 0.

Por (4.5) segue que fg−1 = 0 ∈ C. Suponhamos que o resultado seja verdadeiro para todo elementouv−1 ∈ C(x) com deg(u) = n, para algum n ≥ 0, ou seja, se d

dx(uv−1) = 0 entao uv−1 ∈ C.Se deg(f) = n + 1 entao, como car(C) = 0, deg( d

dx)(f) = n. Alem disso, ddx

(ddx(f)

(ddx(g)

)−1)

=ddx(fg−1) = 0, por (4.5). Pela hipotese de inducao segue que d

dx(f) ddx(g)−1 ∈ C e, portanto, fg−1 ∈ C,por (4.5). Logo Z = C(x)0 = C.

4.3 O completamento do corpo das matrizes quanticas

Seja k um corpo comutativo e seja q ∈ k um elemento nao-nulo. A algebra de matrizes quanticas

56 CAPITULO 4. SERIES DE LAURENT

2× 2 sobre k e a k-algebra Mq(2) dada por geradores a, b, c, d e relacoes

ab = qba ac = qca bc = cb

bd = qdb cd = qdc ad− da = (q − q−1)cb

A algebra Mq(2) pode tambem ser definida como uma extensao de Ore k[a][b;σb][c;σc][d;σd, δd],onde σb : k[a] −→ k[a], σc : k[a][b;σb] −→ k[a][b;σb], σd : k[a][b;σb][c;σc] −→ k[a][b;σb][c;σc] saok-automorfismos definidos por

σb(a) = qa,

σc(b) = b, σc(a) = qa,

σd(c) = qc, σd(b) = qb, σd(a) = a,

e δd : k[a][b;σb][c;σc] −→ k[a][b;σb][c;σc] e a σd-derivacao definida da seguinte maneira: se f =∑i,j,k≥0 c

ibjakαijk ∈ k[a][b;σb][c;σc], entao

δd(f) =∑i,j≥0k>0

ci+1bj+1ak−1(q2k−1 − q−1)αijk.

Esses e outros detalhes sobre matrizes quanticas podem ser encontrados em [17].

Para simplificar as notacoes vamos escrever Ra = k[a], Rb = Ra[b;σb], Rc = Rb[c;σc] e Rd =Rc[d;σd, δd] = Mq(2). Como k e um corpo entao, em particular, k e um domınio noetheriano (adireita e a esquerda). Pela Proposicao 1.6.9, Ra = k[a] e um domınio noetheriano. Como σb e σcsao automorfismos de Ra e Rb, respectivamente, segue pela Proposicao 1.6.9 que Rb = Ra[b;σb] eum domınio noetheriano e, portanto, Rc = Rb[c;σc] tambem e. Pelo mesmo argumento, Rd e umdomınio noetheriano. Segue pela Observacao 1.6.8 que

Q(Rd) = Q(Rc)(d;σd, δd) = Q(Rb)(c;σc)(d;σd, δd) = Q(Ra)(b;σb)(c;σc)(d;σd, δd).

Seja R = Q(Rc)[d;σd, δd]. Entao Rd = Rc[d;σd, δd] ⊂ R ⊂ Q(Rd) e Q(R) = Q(Rd). Parapodermos aplicar o Teorema 4.1.2 e assim concluirmos que o completamento Q(Rd) = Q(R) =Q(Rc)((e;σd, δd)), e = d−1, contem um corpo livre, temos que provar que R e simples ou que σd temordem interna infinita. No entanto, observe que σd e um automorfismo interno de Q(Rc). De fato,

4.3. O COMPLETAMENTO DO CORPO DAS MATRIZES QUANTICAS 57

se fg−1 ∈ Q(Rc), f =∑cibjakαijk, g =

∑cibjakβijk ∈ Rc, g 6= 0, entao

σd(fg−1) = σd

(∑cibjakαijk

)σd

(∑cibjakβijk

)−1

=(∑

cibjakqi+jαijk

)(∑cibjakqi+jβijk

)−1

=(∑

cibjakqi+jαijk

)aa−1

(∑cibjakqi+jβijk

)−1

=((∑

cibjakqi+jαijk

)a)((∑

cibjakqi+jβijk

)a)−1

=(∑

cibjak+1qi+jαijk

)(∑cibjak+1qi+jβijk

)−1

=(∑

acibjakαijk

)(∑acibjakβijk

)−1

= a(∑

cibjakqi+jαijk

)(∑cibjakβijk

)−1a−1

= a(fg−1)a−1.

Tambem nao conseguimos provar que R e simples e portanto nao podemos aplicar o Teorema 4.1.2.Mesmo assim, mostraremos que Q(Rd) contem um corpo livre se q nao for uma raiz da unidade.Para isso, precisamos do seguinte resultado:

Lema 4.3.1 ([28], Teorema pg. 401). Seja K = k(t) o corpo das funcoes racionais sobre um corpocomutativo k e seja α um k-automorfismo de K de ordem infinita. Entao K(x;α) contem umak-subalgebra livre nao-comutativa.

De agora em diante vamos supor que q nao seja uma raiz da unidade. Mostremos que σb e umautomorfismo de k(a) de ordem infinita. Suponhamos que σb tenha ordem n para algum n ≥ 1. Entaoσnb = Idk(a). Em particular, a = σnb (a) = qna e, portanto, (qn−1)a = 0 o que implica qn = 1. Mas issoe uma contradicao uma vez que estamos supondo que q nao e uma raiz da unidade. Pelo Lema 4.3.1,Q(Rb) = k(a)(b;σb) contem uma k-subalgebra livre nao-comutativa. Como Q(Rb) ⊂ Q(Rc) ⊂ Q(R)segue que Q(R) contem uma k-subalgebra livre nao-comutativa. Logo Q(R) tem dimensao infinitasobre Z = Z(Q(R)) (uma vez que qualquer algebra de dimensao finita n satisfaz o polinomio standardSn+1 e, portanto, nao pode conter uma algebra livre). Alem disso, como q nao e raiz da unidade, Ze infinito. Segue diretamente do Teorema 2.2.4 o seguinte:

Teorema 4.3.2. Nas notacoes acima, Q(Rd) = Q(Rc)((e;σd, δd)) contem um corpo livre Z<(X)>,sobre um conjunto enumeravel X. Em particular, Q(Rd) contem k<(X)>, pelo Teorema 1.1.15.

58 CAPITULO 4. SERIES DE LAURENT

Capıtulo 5

Uma classe de aneis com valorizacao t-adica

Seja R um anel com um elemento central e regular t tal que⋂tnR = 0 e R/tR e um domınio

de Ore a direita. Em [25], Lichtman provou que R pode ser imerso num anel anel com divisao D.Mostraremos neste capıtulo que, em alguns casos, tal anel com divisao D contem um corpo livre.Tambem neste capıtulo provaremos a existencia de um corpo livre no completamento de um corpode fracoes da envolvente universal de uma algebra de Lie em caracterıstica zero.

5.1 O completamento de um anel com divisao gerado por um anel com valoriza-

cao t-adica

Seja R um anel e seja t um elemento central e regular de R tal que⋂tnR = 0 e R/tR e um domınio.

Como vimos no Exemplo 1.3.3(1), R tem uma valorizacao νt definida por νt(x) = sup{n : x ∈ tnR},chamada valorizacao t-adica . Com algumas hipoteses adicionais e possıvel mostrar que R pode serimerso num anel com divisao. Mais precisamente Lichtman provou o seguinte

Teorema 5.1.1 ([25], Teorema 1). Seja R um anel e t um elemento central e regular de R. Assumaque

⋂tnR = 0 e que R/tR e um domınio de Ore a direita. Entao R pode ser imerso em um anel com

divisao D, a valorizacao t-adica νt se estende a uma valorizacao ν de D e o subconjunto R(R∗)−1 edenso em D. Alem disso, se S e o anel de valorizacao de D entao S/tS e isomorfo a ∆, o corpo defracoes de R/tR.

Este teorema tambem pode ser visto em [8], Teorema 2.6.2. Tambem segue da demonstracaodesse teorema que t e um elemento central de D, S e um anel local com ideal maximal tS e, alemdisso, tS define uma valorizacao t-adica em S, que estende νt e que e igual a ν|S .

59

60 CAPITULO 5. UMA CLASSE DE ANEIS COM VALORIZACAO T -ADICA

Fixemos uma constante real c ∈ (0, 1) e considere a metrica definida sobre D por d(x, y) = cν(x−y).Nao e difıcil provar que D e completo com a topologia definida por essa metrica. Provemos agorao seguinte teorema, o qual fornece uma condicao suficiente para garantir a existencia de um corpolivre no anel com divisao D. Este e mais uma aplicacao do Teorema 2.2.4.

Teorema 5.1.2. Nas condicoes do teorema acima, se ∆ tem dimensao infinita sobre Z(∆), entaoD contem um corpo livre Z(D)<(X)>, onde X e um conjunto enumeravel.

Demonstracao: E claro que ν e uma valorizacao discreta de D, pois ν(R∗) = νt(R∗) = N. Como aspotencias de t sao todas distintas (pois, caso contrario t seria inversıvel em R) entao Z(D) e infinito.Mostremos agora que D tem dimensao infinita sobre Z(D). Suponhamos que [D : Z(D)] = n < ∞.Sejam s1 + tS, s2 + tS, . . . , sn+1 + tS, n + 1 elementos distintos de S/tS. Entao s1, s2, . . . , sn+1,sao n + 1 elementos distintos de D. Existem z1, z2, . . . , zn+1 ∈ Z(D), nao todos nulos, tais que∑n+1

i=1 zisi = 0. Podemos entao escrever

∑mj=1 zijsij = 0, onde ij ∈ {1, . . . , n + 1}, j = 1, . . . ,m,

sao tais que zij 6= 0. Se ν(zij ) = lj entao ν(zij t−lj ) = ν(zij ) − ljν(t) = ν(zij ) − lj = 0. Logo

uj := zij t−lj ∈ S\tS. Assim, zij = ujt

lj , com uj ∈ S\tS. Como zij ∈ Z(D) entao, para todo d ∈ D,ujt

ljd = dujtlj e, portanto, ujd = duj . Logo uj ∈ Z(D) ∩ S ⊂ Z(S), para todo j = 1, . . . ,m. Temos

0 =∑m

j=1 ujtljsij =

∑mj=1 ujsij t

lj . Seja r = min{lj : j = 1, . . . ,m}. Sem perda de generalidadepodemos supor que r = l1. Entao lj − r ≥ 0, e portanto tlj−r ∈ R ⊂ S, para todo 1 ≤ j ≤ m. Assim(∑m

j=1 ujsij tlj−r

)tr = 0 o que implica 0 =

∑mj=1 ujsij t

lj−r = u1si1 +∑m

j=2 ujsij tlj−r. Em S/tS

temos 0 = (u1 + tS)(si1 + tS) +∑m

j=2(ujtlj−r + tS)(sij + tS), onde u1 + tS, ujt

lj−r + tS ∈ Z(S/tS),para todo j = 1, . . . ,m, com u1 + tS 6= 0. Logo {sij + tS : j = 1, . . . ,m} ⊂ S/tS e linearmentedependente sobre Z(S/tS) e, portanto, [∆ : Z(∆)] = [S/tS : Z(S/tS)] < m ≤ n + 1, o que e umacontradicao. Portanto D tem dimensao infinita sobre Z(D). Como D e completo segue pelo Teorema2.2.4 que D contem um corpo livre Z(D)<(X)>, onde X e um conjunto enumeravel.

5.2 O completamento do corpo de Lie

Seja L uma algebra de Lie sobre um corpo comutativo k. Como dissemos na Secao 1.7, Cohnprovou que a envolvente universal U(L) pode ser imersa num corpo D(L), chamado corpo de Lie;mais ainda, D(L) esta contido num corpo maior que sera denotado por D(L). Nosso objetivo nestasecao sera provar que, em caracterıstica zero, D(L) contem um corpo livre. Para isso precisamos dealgumas definicoes e resultados.

5.2. O COMPLETAMENTO DO CORPO DE LIE 61

Um anel filtrado R e um anel com uma serie de Z-submodulos indexados por Z,

· · · ⊃ R−1 ⊃ R0 ⊃ R1 ⊃ · · · , (5.1)

tais que

(1) RiRj ⊂ Ri+j ,

(2)⋂Rn = 0,

(3)⋃Rn = R.

Se em (5.1) R0 = R e R−1, R−2, . . . estao ausentes dizemos que a filtracao e positiva. Analogamente,quando R1 = R2 = · · · = 0, temos uma filtracao negativa (neste caso, e conveniente trocar o sinaldos ındices).

Sobre um anel filtrado podemos definir uma funcao com valores em Z colocando

ν(x) = sup{n : x ∈ Rn}. (5.2)

E facil verificar que ν satisfaz

(1) ν(x) ∈ Z se x 6= 0, ν(0) = ∞,

(2) ν(x+ y) ≥ min{ν(x), ν(y)},

(3) ν(xy) ≥ ν(x) + ν(y).

Tal funcao e chamada subvalorizacao, pseudovalorizacao ou tambem filtracao de R. Obviamente, sevale a igualdade em (3), ν e uma valorizacao.

Quando a filtracao e negativa e mudamos o sinal dos ındices em (5.1), e facil ver que ν passa aser dada por

ν(x) = − inf{n : x ∈ Rn}.

Um anel R e dito ser graduado se ele e uma soma direta de Z-submodulos indexados por Z:R =

⊕An tais que AiAj = Ai+j . Um elemento de Ai e dito ser homogeneo de grau i. Todo anel

graduado pode ser filtrado definindo Rn =∑∞

i=nAi. A todo anel filtrado podemos associar um anel

62 CAPITULO 5. UMA CLASSE DE ANEIS COM VALORIZACAO T -ADICA

graduado G(R), cujo grupo aditivo e a soma direta⊕

(Rn/Rn+1), com multiplicacao definida comosegue: dados α ∈ Ri/Ri+1, β ∈ Rj/Rj+1, tomamos representantes a ∈ Ri para α e b ∈ Rj para β ecolocamos

αβ = (a+Ri+1)(b+Rj+1) = ab+Ri+j+1.

Proposicao 5.2.1 ([8], Proposicao 2.6.1). Seja R um anel filtrado com filtracao associada ν e anelgraduado G(R). Entao G(R) e um domınio se e somente se ν for uma valorizacao. Neste caso, oproprio anel R e um domınio.

O teorema seguinte foi provado por Cohn em [4] e posteriormente foi redemonstrado por Lichtmanusando o Teorema 5.1.1.

Teorema 5.2.2 ([8], Teorema 2.6.5). Seja R um anel filtrado cujo anel graduado associado e umdomınio de Ore a direita. Entao R pode ser imerso em um corpo D, a valorizacao induzida dafiltracao de R se estende a D e D e completo na topologia definida por essa valorizacao.

Se L e uma algebra de Lie sobre um corpo comutativo k, L gera U(L) como algebra. Logo U(L)tem uma filtracao canonica dada pelos subespacos

U−1 = 0, U i = k + L+ L2 + · · ·+ Li, i ≥ 0,

onde Li e o subespaco gerado por todos os produtos de i elementos de L. Segue do Teorema dePoincare-Birkhoff-Witt que o anel graduado associado a essa filtracao e um domınio comutativo (ver[8, pg. 89]) e portanto a filtracao associada ν : U(L) −→ Z∪{∞} dada por ν(x) = − inf{n : x ∈ Un}e uma valorizacao. Em particular, U(L) e um domınio. Vamos chamar ν de valorizacao canonica deU(L). Uma consequencia particularmente interessante do Teorema 5.2.2 e o seguinte

Teorema 5.2.3 ([8], Teorema 2.6.6). A envolvente universal associativa de qualquer algebra de Liesobre um corpo comutativo pode ser imersa em um anel com divisao D(L), o qual e completo natopologia definida pela valorizacao canonica de U(L).

O anel com divisao D(L) citado acima e o subcorpo de D(L) gerado por U(L). Como D(L) ecompleto entao o fecho D(L) do subespaco D(L) do espaco metrico D(L) e completo e, portanto,D(L) e o completamento de D(L).

5.2. O COMPLETAMENTO DO CORPO DE LIE 63

Lichtman provou em [26] que, se car(k) = 0, entao qualquer anel com divisao que contenha U(L),contem uma k-algebra livre de posto 2 e, portanto, tem dimensao infinita sobre seu centro, que einfinito, pois car(k) = 0. Segue imediatamente do Teorema 2.2.4 e do Teorema 5.2.3 o seguinte

Teorema 5.2.4. Seja L uma algebra de Lie nao-comutativa sobre um corpo comutativo de carac-terıstica zero e seja U(L) sua envolvente universal associativa. Seja D(L) o corpo obtido no Teorema5.2.3 e D(L) o subcorpo de D(L) gerado por U(L). Entao D(L) contem um corpo livre Z(D(L))<(X)>,sobre um conjunto enumeravel X e, portanto, D(L) contem Z(D(L))<(X)>.

64 CAPITULO 5. UMA CLASSE DE ANEIS COM VALORIZACAO T -ADICA

Capıtulo 6

Alguns aneis com divisao que nao contem corpos livres

Seja K um corpo comutativo e seja G um grupo nilpotente, finitamente gerado, livre de torcao,nao-abeliano. Vimos na Secao 3.2 que o completamento do corpo de quocientes classico Q(KG), queesta contido em K((G)), contem um corpo livre Z<(X)>, sobre um conjunto enumeravel X, onde Ze o centro de Q(KG). Como K ⊂ Z segue pelo Teorema 1.1.15 que K((G)) contem o corpo livreK<(X)>. Ja na Secao 4.2 mostramos que o completamento do corpo de Weyl K(x)(y; 1, d/dx) sobreum corpo K nao-necessariamente comutativo e de caracterıstica zero, contem um corpo um corpolivre sobre Z(K). Neste momento, e natural surgirem as seguintes perguntas (principalmente se oleitor conhece os artigos [29] e [30] das referencias): O corpo de Weyl contem um corpo livre sobreZ(K)? E quanto ao corpo de fracoes da algebra de grupo acima? A resposta para essas perguntas e“nao”, como veremos neste capıtulo.

6.1 Um resultado geral

Recordemos o seguinte conceito envolvendo produtos tensoriais de modulos:

Definicao 6.1.1. Seja R um anel e seja M um R-modulo a direita. Dizemos que M e fielmenteplano se dada uma sequencia de R-modulos a esquerda

N ′ f−→ Ng−→ N ′′ (6.1)

a sequenciaM ⊗R N ′ 1M⊗f−−−−→M ⊗R N

1M⊗g−−−−→M ⊗R N ′′

65

66 CAPITULO 6. ALGUNS ANEIS COM DIVISAO QUE NAO CONTEM CORPOS LIVRES

e exata se e somente se a sequencia (6.1) for exata.

Modulos a esquerda fielmente planos sao definidos de maneira analoga.

Proposicao 6.1.2. Todo modulo livre e fielmente plano.

Demonstracao: Ver Exemplo 2 pg. 29 de [1].

Proposicao 6.1.3 ([1], Proposicao 2 pg. 29). Seja M um R-modulo a direita fielmente plano e sejaf : N ′ −→ N um homomorfismo de R-modulos a esquerda. Entao f e injetor (respectivamentesobrejetor, bijetor) se e somente se 1M ⊗ f : M ⊗R N ′ −→M ⊗R N for.

Seja R uma k-algebra, k um corpo comutativo. Seja Rop o anel oposto a R, ou seja, Rop = {rop :r ∈ R}, com adicao e multiplicacao definidas por

aop + bop = (a+ b)op e aopbop = (ba)op.

Como k e central em R entao Rop tambem e uma k-algebra. Considere o produto tensorial R⊗kRop,que e uma k-algebra, onde a multiplicacao e dada por

(a1 ⊗ bop1 )(a2 ⊗ bop2 ) = a1a2 ⊗ bop1 bop2 = a1a2 ⊗ (b2b1)op.

O anel R pode ser visto como um R⊗k Rop-modulo a esquerda se definimos(∑ai ⊗ bopi

)r =

∑airbi, ai, bi, r ∈ R.

Sejaµ : R⊗k Rop −→ R

a⊗ bop 7−→ ab.

Entao µ e um homomorfismo sobrejetor de R⊗k Rop-modulos a esquerda. O conjunto {∑ai ⊗ bopi :∑

aibi = 0} e o nucleo desse homomorfismo e e portanto um ideal a esquerda de R⊗k Rop.

Lema 6.1.4. Nas notacoes acima, Ker(µ) e gerado como R-modulo a esquerda pelos elementosx⊗ 1op − 1⊗ xop, x ∈ R.

Demonstracao: Ver Proposicao 2.2.5 de [7].

6.1. UM RESULTADO GERAL 67

O lema abaixo nos foi apresentado por Lichtman.

Lema 6.1.5. Seja D um anel com divisao o qual e uma k-algebra sobre um corpo comutativo k.Suponha que D contenha uma cadeia infinita de k-subalgebras com divisao

D1 $ D2 $ D3 $ · · · .

Denotemos por Rn := Dn ⊗k Dopn , µn : Rn −→ Dn, µn(a ⊗ bop) = ab, e In := Ker(µn). Entao a

algebra R := D ⊗k Dop contem uma cadeia infinita de ideais a esquerda

RI1 $ RI2 $ RI3 $ · · · .

Demonstracao: Como Dn $ Dn+1 entao Rn $ Rn+1. Se∑ai ⊗ bopi ∈ In entao

∑ai ⊗ bopi ∈ Rn+1 e∑

aibi = 0. Logo∑ai ⊗ bopi ∈ In+1 e, portanto, In ⊂ In+1 o que implica RIn ⊂ RIn+1, para todo

n ≥ 1. Queremos mostrar agora que essa inclusao e estrita. Por analogia e suficiente mostrar queRI1 $ RI2.

Como I1 ⊂ I2 e I2 e um ideal a esquerda de R2 entao R2I1 ⊂ I2. Suponhamos que R2I1 = I2.Como µ2 e um homomorfismo sobrejetor de R2-modulos a esquerda entao D2

∼= R2/I2 = R2/R2I1.Como D1 ⊂ D2 entao Dop

1 ⊂ Dop2 . Logo Dop

2 e um Dop1 -modulo a direita com multiplicacao por

escalar dada pela multiplicacao de Dop2 ; portanto, Dop

2 e um (Dop1 )op = D1-modulo a esquerda com

multiplicacao por escalar dada por d1dop2 = (dop1 )opdop2 = dop2 d

op1 = (d1d2)op. Consideremos entao

S = D2 ⊗D1 Dop2 . Seja x ∈ D2\D1. Entao {1op, xop} ⊂ Dop

2 e linearmente independente sobre D1

a esquerda. Completemos {1op, xop} a uma base de Dop2 sobre D1: {1op, xop, xopj : j ∈ J}. Segue

pelo Corolario 1.7.16 de [40] que S e um D2-modulo livre a esquerda com base {1 ⊗D1 1op, 1 ⊗D1

xop, 1⊗D1 xopj : j ∈ J}. Em particular, {1⊗D1 1op, 1⊗D1 x

op} e linearmente independente sobre D2

a esquerda.

E facil ver que existe um unico homomorfismo de grupos aditivos ϕ : R2 −→ S tal que ϕ(x ⊗kyop) = x⊗D1y

op. Observe agora que S e um R2-modulo a esquerda se definimos (a⊗kbop)(x⊗D1yop) =

ax⊗D1 bopyop = ax⊗D1 (yb)op, para todos a, b, x, y ∈ D2. Como

ϕ((a⊗k bop)(x⊗k yop)) = ϕ(ax⊗k (yb)op) = ax⊗D1 (yb)op

= (a⊗k bop)(x⊗D1 yop) = (a⊗k b)ϕ(x⊗k yop)

entao ϕ e um homomorfismo de R2-modulos a esquerda. Claramente, ϕ e sobrejetor. Alem disso, se

68 CAPITULO 6. ALGUNS ANEIS COM DIVISAO QUE NAO CONTEM CORPOS LIVRES

a, b ∈ D1 e x, y ∈ D2, entao

ϕ((x⊗k yop)b(a⊗k 1op − 1⊗k aop)) = ϕ((x⊗k yop)(ba⊗k 1op − b⊗k aop)

= ϕ(xba⊗k yop − xb⊗k (ay)op)

= xba⊗D1 yop − xb⊗D1 (ay)op

= xb⊗D1 ayop − xb⊗D1 (ay)op

= xb⊗D1 (ay)op − xb⊗D1 (ay)op = 0.

Segue pelo Lema 6.1.4 que R2I1 ⊂ Ker(ϕ). Pelo Teorema do isomorfismo existe um unico homo-morfismo (sobrejetor) de R2-modulos a esquerda ϕ : R2/R2I1 −→ S tal que o diagrama abaixocomuta.

R2ϕ //

��

S

R2/R2I1

ϕ

;;wwwwwwwwww

Como µ2 : R2 −→ D2 e um homomorfismo sobrejetor de R2-modulos a esquerda e R2I1 = I2 =Ker(µ2) entao existe um unico isomorfismo µ2 : R2/R2I1 −→ D2 tal que o diagrama abaixo comuta.

R2µ2 //

��

D2

R2/R2I1

µ2

::uuuuuuuuu

Seja ψ a seguinte composta

D2µ2−1

−−−→ R2/R2I1ϕ−→ S.

Tome um elemento x ∈ D2\D1. Temos

ψ(x) = ϕ µ2−1

(x) = ϕ(x⊗k 1op +R2I1) = ϕ(x⊗k 1op) = x⊗D1 1op

e tambem

ψ(x) = ϕ µ2−1

(x) = ϕ(1⊗k xop +R2I1) = ϕ(1⊗k xop) = 1⊗D1 xop

6.1. UM RESULTADO GERAL 69

e, portanto, x⊗D1 1op = 1⊗D1 xop de onde segue que x(1⊗D1 1op)− 1(1⊗D1 x

op) = 0. Mas isso e umabsurdo pois sabemos que {1⊗D1 1op, 1⊗D1 x

op} e linearmente independente sobre D2 a esquerda.Portanto, R2I1 $ I2.

Suponhamos que RI1 = RI2. Seja f : R2 ⊗R1 I1 −→ R2I1 o unico homomorfismo de gruposaditivos tal que f(x⊗R1 a) = xa. Como

f(y(x⊗R1 a)) = f(yx⊗R1 a) = (yx)a = y(xa) = yf(x⊗R1 a),

para quaisquer x, y ∈ R2 e a ∈ I1, entao f e um homomorfismo de R2-modulos a esquerda. Alemdisso, se xa ∈ R2I1, entao xa = f(x ⊗R1 a) e portanto f e sobrejetor. Seja

∑i xi ⊗R1 ai ∈ Ker(f).

Como D2 e um D1-modulo a direita livre e Dop2 e um Dop

1 -modulo a direita livre entao R2 = D2⊗kDop2

e um R1 = D1 ⊗k Dop1 -modulo a direita livre, pelo Lema pg. 166 e pelo Exercıcio 2 pg. 168 de [36].

Seja {vl : l ∈ L} uma base de R2 sobre R1 a direita. Entao xi =∑

l vlαil, para alguns αil ∈ R1.Assim,

∑i

xi ⊗R1 ai =∑i

(∑l

vlαil

)⊗R1 ai =

∑i,l

vlαil ⊗R1 ai =∑i,l

vl ⊗R1 (αilai)

=∑l

vl ⊗R1

(∑i

αilai

)

e, portanto,

0 = f

(∑i

xi ⊗R1 ai

)= f

(∑l

vl ⊗R1

(∑i

αilai)

))=∑l

vl

(∑i

αilai

).

Como∑

i αilai ∈ I1 ⊂ R1 devemos ter∑

i αilai = 0, para todo l, de onde segue que∑

i xi ⊗R1 ai =∑l vl⊗R1 (

∑i αilai) = 0. Portanto f e injetor. Logo R2⊗R1 I1

∼= R2I1, como R2-modulos a esquerda.

De modo analogo ao que foi feito acima, tambem podemos mostrar que existe um isomorfismode R-modulos a esquerda

gn : R⊗Rn In −→ RIn

x⊗Rn a 7−→ xa,

70 CAPITULO 6. ALGUNS ANEIS COM DIVISAO QUE NAO CONTEM CORPOS LIVRES

para todo n ≥ 1. Alem disso, e facil mostrar que existe um isomorfismo de (R,Rn)-bimodulos

hn : R⊗Rn Rn −→ R

r ⊗Rn x 7−→ rx,

para todo n ≥ 1. Seja θ a seguinte composta

R⊗R2 R2I11R⊗f−1

//

θ

))SSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSR⊗R2 (R2 ⊗R1 I1)

t−1// (R⊗R2 R2)⊗R1 I1

h2⊗1I1// R⊗R1 I1

g1

��RI1

RI2

g−12��

R⊗R2 I2

,

onde t : (R ⊗R2 R2) ⊗R1 I1 −→ R ⊗R2 (R2 ⊗R1 I1) e o isomorfismo de R-modulos a esquerda dadopor (x1 ⊗ x2) ⊗ x3 7→ x1 ⊗ (x2 ⊗ x3). Logo θ e um isomorfismo de R-modulos a esquerda. Ser ⊗R2 r2a ∈ R⊗R2 R2I1, entao

θ(r ⊗R2 r2a) = g−12 g1(h2 ⊗ 1I1)t

−1(1R ⊗ f−1)(r ⊗R2 r2a)

= g−12 g1(h2 ⊗ 1I1)t

−1(r ⊗R2 f−1(r2a))

= g−12 g1(h2 ⊗ 1I1)t

−1(r ⊗R2 (r2 ⊗R1 a))

= g−12 g1(h2 ⊗ 1I1)((r ⊗R2 r2)⊗R1 a)

= g−12 g1(h2(r ⊗R2 r2)⊗R1 a)

= g−12 g1((rr2 ⊗R1 a)

= g−12 ((rr2)a) = g−1

2 (r(r2a))

= r ⊗R2 r2a.

Logo θ = 1R ⊗ ι, onde ι : R2I1 −→ I2 e a inclusao natural que, obviamente, e um homomorfismode R2-modulos a esquerda. Pelo Lema pg. 166 e pelo Exercıcio 2 pg. 168 de [36], R e um R2-moduloa direita livre. Logo, pela Proposicao 6.1.2, R e um R2-modulo a direita fielmente plano. Como

6.1. UM RESULTADO GERAL 71

θ = 1R ⊗ ι e um isomorfismo segue pela Proposicao 6.1.3 que ι e um isomorfismo. Mas isso eum absurdo uma vez que nos mostramos que R2I1 $ I2. Portanto, RI1 $ RI2, como querıamosdemonstrar.

Lema 6.1.6 ([8], Corolario 5.5.9). Seja D um anel com divisao e seja K um subcorpo de D. Entaotodo corpo livre da forma DK<( x1, x2, . . . )> pode ser imerso em DK<( x, y )>, mapeando xr 7→ y−rxyr,r = 1, 2, . . ..

Corolario 6.1.7. Todo corpo livre nao-comutativo contem um corpo livre com um sistema infinitode geradores.

Demonstracao: Seja D um corpo com subcorpo K e seja X um conjunto nao-vazio. Seja Y umsubconjunto nao-vazio de X tal que Y $ X. Escreva Z := X\Y . Pelo Lema 5.4.2 de [8], ohomomorfismo natural de D-aneis f : DK〈Y 〉 −→ DK〈X〉 = DK〈Y 〉 ∗K K〈Z〉 e honesto. Logo f seestende a um monomorfismo DK<(Y )>−→ DK<(X)>, pela Observacao 1.1.17.

Seja DK<( x1, x2, . . . , xn)> um corpo livre com n ≥ 2. Pelo que acabamos de mostrar, temos ainclusao DK<( x1, x2 )>⊂ DK<( x1, x2, . . . , xn )>. Pelo corolario anterior, DK<( x1, x2)> contem umcorpo livre com um sistema enumeravel de geradores e, portanto, DK<( x1, x2, . . . , xn )> tambemcontem.

O seguinte lema tambem nos foi apresentado por Lichtman e fornece uma condicao suficientepara que um anel com divisao nao contenha um corpo livre.

Lema 6.1.8. Seja D uma k-algebra com divisao sobre um corpo comutativo k. Se D contem umcorpo livre sobre k entao D ⊗k Dop nao pode ser um anel noetheriano a esquerda.

Demonstracao: Se D contem um corpo livre sobre k entao D contem um corpo livre com um numeroinfinito enumeravel de geradores, digamos, kC<( x1, x2, . . .)>, onde C e um subcorpo de k. ComokC<( x1, x2, . . . , xn )>⊂ kC<( x1, x2, . . . , xn+1 )>, pela demonstracao do corolario anterior, entao,tomando Dn = kC<( x1, x2, . . . , xn )>, n ≥ 1, obtemos uma cadeia infinita de k-subalgebras comdivisao de D,

D1 $ D2 $ · · · $ D2 $ · · · .

Se R = D ⊗k Dop entao, pelo Lema 6.1.5, R contem uma cadeia infinita de ideais a esquerda e,portanto, R nao e noetheriano a esquerda.

72 CAPITULO 6. ALGUNS ANEIS COM DIVISAO QUE NAO CONTEM CORPOS LIVRES

6.2 O corpo de Weyl

Seja k um corpo comutativo de caracterıstica zero. Makar-Limanov provou em [29] que o corpo deWeyl k(x)(y; 1, ddx) contem uma algebra livre nao-comutativa sobre k e, consequentemente, contemum corpo de fracoes dessa algebra livre. No entanto, usando o Lema 6.1.8, Lichtman observou queesse corpo de fracoes nao e um corpo livre, como veremos a seguir.

Seja A1(k) a primeira algebra de Weyl sobre k e seja W1 seu corpo de quocientes classico aesquerda. Considere W1 ⊗k W op

1 . Podemos construir esta ultima algebra em dois passos: primeiro,tome S := A1(k)⊗k W op

1 . Mostremos que S e uma algebra de Weyl sobre o corpo W op1 , isto e, que

S ∼= A1(Wop1 ) = W op

1 〈z, t : zt− tz = 1〉 ∼= W op1 [z][t; 1,

d

dz].

Seja f : k〈x, y〉 −→ A1(Wop1 ) o unico homomorfismo de k-algebras tal que f(x) = z e f(y) = t.

Entao f(xy − yx− 1) = zt− tz − 1 = 0, o que implica que 〈xy − yx− 1〉 ⊂ Ker(f). Logo existe umunico homomorfismo de k-algebras f : A1(k) −→ A1(W

op1 ) tal que f(x) = z e f(y) = t, onde, com

abuso de notacao, escrevemos x e y tambem para suas imagens em A1(k). Seja g : W op1 −→ A1(W

op1 )

a inclusao canonica, que e um homomorfismo de k-algebras. Se α ∈W op1 e β ∈ k ⊂ Z(W op

1 ) entao

f(x)g(α) = zα = αz = g(α)f(x);

f(y)g(α) = tα = αt = g(α)f(y);

f(β)g(α) = βα = αβ = g(α)f(β).

Logo, f(a)g(b) = g(b)f(a), para todo a ∈ A1(k), para todo b ∈ W op1 . Portanto existe um unico

homomorfismo de k-algebras ϕ : A1(k) ⊗k W op1 −→ A1(W

op1 ) tal que ϕ(a ⊗ b) = f(a)g(b). Como

ϕ(1⊗α) = f(1)g(α) = g(α), para todo α ∈W op1 , entao ϕ e um homomorfismo de W op

1 -aneis. Agora,como (x ⊗ 1)(1 ⊗ α) = (x ⊗ α) = (1 ⊗ α)(x ⊗ 1) e (y ⊗ 1)(1 ⊗ α) = (y ⊗ α) = (1 ⊗ α)(y ⊗ 1), paratodo α ∈ W op

1 , entao existe um unico homomorfismo de W op1 -aneis ψ : W op

1 〈z, t〉 −→ A1(k)⊗k W op1

tal que ψ(z) = x ⊗ 1 e ψ(t) = y ⊗ 1. (Em particular, ψ e um homomorfismo de k-algebras.) Comoψ(zt−tz−1) = (x⊗1)(y⊗1)−(y⊗1)(x⊗1)−1⊗1 = xy⊗1−yx⊗1−1⊗1 = (xy−yx−1)⊗1 = 0⊗1 = 0entao 〈zt − tz − 1〉 ⊂ Ker(ψ). Logo existe um unico homomorfismo de W op

1 -aneis ψ : A1(Wop1 ) −→

6.2. O CORPO DE WEYL 73

A1(k)⊗k W op1 tal que ψ(z) = x⊗ 1 e ψ(t) = y ⊗ 1. Seja α ∈W op

1 . Temos:

ϕψ(z) = ϕ(x⊗ 1) = f(x)g(1) = z · 1 = z,

ϕψ(t) = ϕ(y ⊗ 1) = f(y)g(1) = t · 1 = t,

ϕψ(α) = ϕ(1⊗ α) = f(1)g(α) = α,

o que implica que ϕψ = 1A1(W op1 ). E, tambem,

ψϕ(x⊗ α) = ψ(f(x)g(α)) = ψ(zα) = (x⊗ 1)(1⊗ α) = x⊗ α,

ψϕ(y ⊗ α) = ψ(f(y)g(α)) = ψ(tα) = (y ⊗ 1)(1⊗ α) = y ⊗ α,

de onde segue que ψϕ = 1S . Portanto ϕ e um isomorfismo de W op1 -aneis com inversa ψ. Logo

S ∼= A1(Wop1 ) como W op

1 -aneis, em particular, como k-algebras.

Ja sabemos que A1(Wop1 ) e um domınio noetheriano a direita e a esquerda (pela Proposicao

1.6.9). Logo S tambem e. Considere o conjunto T := A1(k)∗ ⊗k 1 ⊂ S. Obviamente, T e umconjunto multiplicativo, isto e, 1 ∈ T , 0 6∈ T e, se a, b ∈ T , entao ab ∈ T . Mostremos que Te um conjunto de Ore a esquerda em S, ou seja, que T (

∑ai ⊗ αi) ∩ S(a ⊗ 1) 6= ∅, para todo∑

ai ⊗ αi ∈ S, para todo a ∈ A1(k)∗. Se∑ai ⊗ αi = 0 entao 0 ∈ T · 0 ∩ S(a ⊗ 1). Suponhamos

entao que∑ai ⊗ αi 6= 0. Sem perda de generalidade podemos supor que ai 6= 0 e αi 6= 0 para todo

i. Como A1(k) e um domınio de Ore a esquerda entao A1(k)ai ∩ A1(k)a 6= 0, para todo i. Logoexistem ci, bi ∈ A1(k)∗ tais que ciai = bia. Em W1 temos ai = c−1

i (bia) = (c−1i bi)a o que implica

aia−1 = c−1

i bi. Novamente, como A1(k) e Ore a esquerda, podemos colocar os elementos c−1i bi num

denominador comum, ou seja, existem b′i, c ∈ A1(k)∗ tais que c−1i bi = c−1b′i, para todo i. Assim,

aia−1 = c−1b′i o que implica que cai = b′ia, para todo i. Logo

0 =∑i

(cai − b′ia)⊗ αi =∑i

cai ⊗ αi −∑i

b′ia⊗ αi =∑i

(c⊗ 1)(ai ⊗ αi)−∑i

(b′i ⊗ αi)(a⊗ 1).

Logo, r := (c ⊗ 1)∑

i(ai ⊗ αi) = (∑

i b′i ⊗ αi) (a ⊗ 1), com c ⊗ 1 ∈ T e

∑i b′i ⊗ αi ∈ S. Portanto

r ∈ T (∑ai ⊗ αi) ∩ S(a⊗ 1). Consideremos a localizacao de S em T ,

T−1S = (A1(k)∗ ⊗k 1)−1(A1(k)⊗k W op1 ) = (A1(k)∗

−1 ⊗k 1)(A1(k)⊗k W op1 ) ⊂W1 ⊗k W op

1 .

Se α, β ∈W1, α = b−1a, entao α⊗β = b−1a⊗β = (b−1⊗1)(a⊗β) ∈ T−1S. Logo, T−1S = W1⊗kW op1 .

74 CAPITULO 6. ALGUNS ANEIS COM DIVISAO QUE NAO CONTEM CORPOS LIVRES

Como S e noetheriano a direita e a esquerda entao T−1S tambem e, pela Proposicao 4.10.32 de [19].Provamos entao que W1⊗kW op

1 e um anel noetheriano a esquerda (e a direita). Pelo Lema 6.1.8, W1

nao contem um corpo livre (nao-comutativo) sobre k, ou seja, nao contem um corpo livre da formakC<(X)>, |X| ≥ 2, para todo subcorpo C de k. Em particular, W1 nao contem o corpo livre k<(X)>,|X| ≥ 2 e, portanto, nao contem nenhum corpo livre sobre qualquer subcorpo central, pelo Lema2.2.6.

6.3 O corpo de fracoes de KG

Seja G um grupo nilpotente, finitamente gerado, livre de torcao, nao-abeliano, e seja k um corpocomutativo. O mesmo metodo da secao anterior pode ser usado para mostrar que o corpo de fracoesda algebra de grupo kG nao contem um corpo livre sobre k. Denotemos por F o corpo de quocientesclassico a esquerda de kG. O anel de grupo FG e tambem uma k-algebra e portanto podemosconsiderar a k-algebra R = kG ⊗k F op. Mostremos que R ∼= F opG. Sejam φ : kG −→ F opG eψ : F op −→ F opG as inclusoes naturais que, obviamente, sao homomorfismos de k-algebras. Maisainda, ψ e um homomorfismo de F op-aneis. Se f =

∑g∈G αgg ∈ kG e β ∈ F op entao

φ(f)ψ(β) = fβ =(∑

αgg)β =

(∑gαg

)β =

∑g(αgβ) =

∑g(βαg) =

∑(gβ)αg

=∑

(βg)αg = β∑

gαg = β∑

αgg = ψ(β)φ(f).

Logo existe um unico homomorfismo de k-algebras θ : kG ⊗k F op −→ F opG tal que θ(f ⊗ β) =φ(f)ψ(β) = fβ = βf , para todo f ∈ kG, para todo β ∈ F op. Como θ(1 ⊗ β) = β = ψ(β) entao θ eum homomorfismo de F op-aneis. Seja ξ : F opG −→ kG⊗kF op o unico homomorfismo de F op-espacosa direita tal que ξ(g) = g ⊗ 1, para todo g ∈ G. Se f =

∑g∈G αgg ∈ kG, h =

∑g∈G βgg ∈ F opG e

β ∈ F op entao

ξθ(f ⊗ β) = ξ(fβ) = ξ(∑

g(αgβ)) =∑

(g ⊗ 1)αgβ =∑

(g ⊗ αgβ)

=∑

(gαg ⊗ β) = (∑

gαg)⊗ β = f ⊗ β,

θξ(h) = θξ(∑

gβg) = θ(∑

(g ⊗ 1)βg) = θ(∑

g ⊗ βg) =∑

gβg = h,

e, portanto θ e um isomorfismo com inversa ξ. Logo F opG ∼= R como F op-aneis, em particular, comok-algebras. Como F op e um domınio noetheriano a direita e a esquerda, entao R tambem e.

6.3. O CORPO DE FRACOES DE KG 75

Procedendo de maneira analoga ao que foi feito na secao anterior, e possıvel mostrar que F⊗kF op

e um anel noetheriano a esquerda (e a direita). Pelo Lema 6.1.8, F nao contem um corpo livre (nao-comutativo) sobre k.

Makar-Limanov provou em [30] que o corpo F contem uma algebra livre nao-comutativa sobrek e, consequentemente, contem um corpo de fracoes dessa algebra livre. No entanto, esse corpo defracoes nao e o corpo livre, pelo que acabamos de mostrar.

76 CAPITULO 6. ALGUNS ANEIS COM DIVISAO QUE NAO CONTEM CORPOS LIVRES

Capıtulo 7

Consideracoes Finais

Tratamos neste trabalho da existencia de imersoes de corpos livres em completamentos, comrespeito a uma metrica induzida por uma valorizacao, de aneis com divisao de dimensao infinitasobre seus centros. Grande parte dos aneis considerados aqui sao corpos de fracoes de domıniosnoetherianos com uma filtracao natural.

O principal resultado provado garante a existencia de corpos livres em completamentos de aneiscom divisao com uma valorizacao discreta, cujo centro e infinito e a dimensao sobre o centro e infinita(Teorema 2.2.4). Dentre esses completamentos estao, por exemplo:

• corpos de series de Laurent sobre um anel com divisao (Secao 2.2);

• corpos de series de Malcev-Neumann de grupos nilpotentes, finitamente gerados, livres de torcao(Capıtulo 3);

• alguns corpos de series de Laurent skew como, por exemplo, um completamento do corpo deWeyl em caracterıstica zero (Capıtulo 4);

• o completamento de um corpo de fracoes da envolvente universal de uma algebra de Lie emcaracterıstica zero com relacao a valorizacao canonica (Capıtulo 5).

Como e sabido, a existencia de uma algebra livre em um anel com divisao D nao garante aexistencia de um corpo livre em D, mesmo se D tiver um completamento D que contenha um corpolivre. Os corpos de fracoes da primeira algebra de Weyl em caracterıstica zero e da algebra de grupode um grupo nilpotente, finitamente gerado, livre de torcao, nao-abeliano sobre um corpo comutativo

77

78 CAPITULO 7. CONSIDERACOES FINAIS

sao exemplos deste fato, como foi visto no Capıtulo 6. Cabe aqui nos questionar se esse e um fatogeral, ou seja, sera que todo anel com divisao que contem um algebra livre tem uma valorizacao cujocompletamento associado contem um corpo livre?

Nossos resultados garantem a existencia de um corpo livre em determinados aneis com divisao,porem nao fornecem uma construcao explıcita dos geradores desse corpo livre. A procura por re-sultados que nos fornecam tais geradores, principalmente em aneis com divisao que ja sabemos quecontem um corpo livre, e algo de nosso interesse.

Outras questoes que tambem surgiram no decorrer do trabalho e que nos indicam algumas direcoesde pesquisa futura sao:

• Sera que o Teorema 3.2.3 vale para grupos poli-Z quaisquer ou, mais geralmente, para grupospolicıclicos? E para grupos residualmente-{nilpotente, livre de torcao}?

• Como indicado na Secao 3.2, uma resposta a segunda questao acima pode eventualmente serobtida como consequencia do Teorema 2.3.1. Quais seriam outras possıveis aplicacoes desseteorema?

• Neste trabalho fizemos uso de valorizacoes discretas em aneis com divisao para construcao deaneis com divisao que contem corpos livres. No caso de valorizacoes em aneis com divisao quenao sao necessariamente discretas ou mesmo abelianas, algo semelhante poderia ser feito?

• SejamK ⊂ D1 ⊂ D2 ondeD1 eD2 sao aneis com divisao tais que dimD2D1<∞ ou dimD1D2 <

∞ e K e um subcorpo central de D2. Se D2 contem um corpo livre K<(X)> entao D1 tambemcontem? Esta pergunta nos foi feita por Makar-Limanov e a resposta tambem nao e conhecidase trocamos K<(X)> por K〈X〉. Um problema relacionado a este foi considerado por Reichsteinem [38].

Referencias Bibliograficas

[1] Bourbaki, N., Commutative Algebra, Chapters I–VII, Addison-Wesley, Reading, Mass., 1972.

[2] Chiba, K., Free subgroups and free subsemigroups of division rings, J. Algebra 184 (1996),570–574.

[3] Chiba, K., Free fields in complete skew fields and their valuations, J. Algebra 263 (2003), 75–87.

[4] Cohn, P. M., On the embedding of rings in skew fields, Proc. London. Math. Soc. 11 (1961),511–530.

[5] Cohn, P. M., Skew Field Constructions, Cambridge University Press, Cambridge, 1977.

[6] Cohn, P. M., Free Rings and Their Relations, 2nd. Ed., Academic Press, London, 1985.

[7] Cohn, P. M., Algebra, 2nd. Ed., Vol. III, John Wiley and Sons, Chichester, 1991.

[8] Cohn, P. M., Skew Fields. Theory of General Division Rings, Cambridge University Press,Cambridge, 1995.

[9] Dauns, J., A Concrete Approach to Division Rings, Heldermann Verlag, Berlin, 1982.

[10] Ferreira, V. O., Goncalves, J. Z. and Mandel, A., Free symmetric and unitary pairs in divisionrings with involution, Internat. J. Algebra Comput. 15 (2005), 15–36.

[11] Goncalves, J. Z., Free subgroups of units in group rings, Canad. Math. Bull. 27 (1984), 309–312.

[12] Goncalves, J. Z., Free groups in subnormal subgroups and the residual nilpotence of the groupof units of group rings, Canad. Math. Bull. 27 (1984), 365–370.

[13] Goncalves, J. Z. and Mandel, A., Are there free groups in division rings?, Israel J. Math. 53(1986), 69–80.

[14] Jacobson, N., Lectures in Abstract Algebra III. Theory of Fields and Galois Theory, Springer-Verlag, New York, 1975.

79

80 REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

[15] Jacobson, N., Lie Algebras, Dover Publications, Inc., New York, 1979.

[16] Jennings, S. A., The group ring of a class of infinite nilpotent groups, Can. J. Math. 7 (1955),169–187.

[17] Kassel, C., Quantum Groups, Springer-Verlag, New York, 1995.

[18] Lam, T. Y., A First Course in Noncommutative Rings, Springer-Verlag, New York, 1991.

[19] Lam, T. Y., Lectures on Modules and Rings, Springer-Verlag, New York, 1999.

[20] Lewin, J., Fields of fractions for group algebras of free groups, Trans. Amer. Math. Soc. 192(1974), 339–346.

[21] Lichtman, A. I., On subgroups of the multiplicative group of skew fields, Proc. Amer. Math.Soc 63 (1977), 15–16.

[22] Lichtman, A. I., Free subgroups of normal subgroups of the multiplicative group of skew fields,Proc. Amer. Math. Soc. 71 (1978), 174–178.

[23] Lichtman, A. I., On normal subgroups of the multiplicative group of skew fields generated by apolycyclic-by-finite group, J. Algebra 78 (1982), 548–577.

[24] Lichtman, A. I., Free subgroups in linear groups over some skew fields, J. Algebra 105 (1987),1–28.

[25] Lichtman, A. I., Valuation methods in division rings, J. Algebra 177 (1995), 870–898.

[26] Lichtman, A. I., Free subalgebras in division rings generated by universal enveloping algebras,Algebra Colloq. 6 (1999), 145–153.

[27] Lorenz, M., Group rings and division rings, Methods in Ring Theory (Antwerp, 1983), 265–280,NATO Adv. Sci. Inst. Ser. C Math. Phys. Sci., 129, Reidel, Dordrecht, 1984.

[28] Lorenz, M., On free subalgebras of certain division algebras, Proc. Amer. Math. Soc. 98 (1986),401–405.

[29] Makar-Limanov, L., The skew field of fractions of the Weyl algebra contains a free noncommu-tative subalgebra, Comm. Alg. 11 (1983), 2003–2006.

[30] Makar-Limanov, L., On group rings of nilpotent groups, Israel J. Math. 48 (1984), 244-248.

[31] Makar-Limanov, L., On free subobjects of skew fields, Methods in Ring Theory (Antwerp, 1983),281–285, NATO Adv. Sci. Inst. Ser. C Math. Phys. Sci., 129, Reidel, Dordrecht, 1984.

[32] Makar-Limanov, L., On subnormal subgroups of skew fields, J. Algebra 114 (1988), 261–267.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 81

[33] Makar-Limanov, L. and Malcolmson, P., Free subalgebras of enveloping fields, Proc. Amer.Math. Soc. 111 (1991), 315–322.

[34] Passmann, D. S., The Algebraic Structure of Group Rings, Wiley-Interscience, New York, 1977.

[35] Passmann, D. S., Infinite Crossed Products, Academic Press, Boston, Mass., 1989.

[36] Pierce, R. S., Associative Algebras, Springer-Verlag, New York, 1982.

[37] Polcino Milies, C. and Sehgal, S. K., An Introduction to Group Rings, Kluwer, Dordrecht, 2002.

[38] Reichstein Z., On a question of Makar-Limanov, Proc. Amer. Math. Soc. 124 (1996), 17–19.

[39] Reichstein, Z. and Vonessen, N., Free subgroups of division algebras, Comm. Algebra 23 (1995),2181–2185.

[40] Rowen, L. H., Ring Theory, Vol. I, Academic Press, Boston, Mass., 1988.

[41] Schilling, O. F. G., The Theory of Valuations, American Mathematical Society, New York, 1950.

[42] Shirvani, M. and Goncalves, J. Z., Free group algebras in the field of fractions of differentialpolynomial rings and enveloping algebras, J. Algebra 204 (1998), 372–385.

[43] Shirvani, M. and Goncalves, J. Z., Large free algebras in the ring of fractions of skew polynomialrings, J. London Math. Soc. (2) 60 (1999), 481–489.

[44] Snider, R. L., The division ring of fractions of a group ring, Paul Dubreil and Marie-PauleMalliarin Algebra Seminar, 35th year (Paris, 1982), 325–339, Lectures Notes in Math. 1029,Springer, Berlin, 1983.

Indice Remissivo

D-anel livre sobre K em X, 11R-anel, 6R-corpo, 6

epico, 6universal, 7

F-serie, 20, 45algebra

de Lie, 31de matrizes quanticas, 56de Weyl, 30, 72livre, 11, 57

anelΣ-inversor universal, 8com divisao, 3de grupo, 23

skew, 23de operadores diferenciais, 24de Ore, 15de Ore a direita, 15de polinomios, 16, 17, 24

skew, 24diferenciaveis, 24

de quocientes a direita, 13de quocientes classico a direita, 15de valorizacao, 18filtrado, 61graduado, 61

completamento, 18conjunto

bem ordenado, 22de Ore a direita, 14denominador a direita, 14enumeravel, 3multiplicativo, 13reversıvel a direita, 14

corpo, 3das funcoes racionais, 16

skew, 25das matrizes quanticas, 49das series de Laurent, 18, 34, 36

skew, 27, 28, 49das series de Malcev-Neumann, 23, 39

skew, 23, 47de fracoes, 6, 13de Lie, 32, 60de resıduos, 18de Weyl, 30, 54, 65, 72livre, 12primo, 3universal, 7

derivacao, 24domınio, 3

de ideais principais a direita, 16, 24de ideais principais a esquerda, 16, 24de Ore a direita, 15, 30de Sylvester, 10, 12, 13

envolvente universal, 32, 60especializacao, 6, 37

82

INDICE REMISSIVO 83

extensao de Ore, 24

filtracao, 61negativa, 61positiva, 61

forma normal, 21

gruponilpotente, 19, 39, 65, 74ordenado, 16

homomorfismoΣ-inversor, 7

universal, 7honesto, 10local, 6plenamente inversor, 10

localizacao a direita, 13localizacao universal, 8

modulo fielmente plano, 65matriz plena, 9

a direita, 9a esquerda, 9

ordem interna (de um automorfismo), 52

Poincare-Birkhoff-Witt, 31, 62posto interno, 10propriedade universal

de algebras livres, 11de aneis livres, 11de aneis de polinomios skew, 24

regra de Leibniz, 26

serie central, 19inferior, 19superior, 19

suporte, 23

valorizacao, 16

t-adica, 17, 59abeliana, 18discreta, 18propria, 17