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Revista de Circulação Men-

sal.

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site: VIRTUALCULT.COM.BR.

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A rev is ta V i r tua lcu l t não se

responsab i l i za por conce i tos

emi t idos em ar t igos assina-

dos, bem como qua lquer

op in ião mani festa nos ar t i -

gos pub l i cados, sendo neste

caso de in te i ra responsab i l i -

dade dos seus autores.

A cendem-se os pica-

piscas. Luzes coloridas

abrilhantam as noites

de dezembro nas cida-

des. Fim de ano é época de fazermos

balanço e elaborarmos planos e me-

tas, para mais uma etapa a ser trilha-

da no calendário da vida. O desejo é

o de que, a cada página arrancada da

folhinha, possamos sentir a vitoriosa

sensação de dever cumprido, sem

grandes perdas.

O ano de 2013 marca a reali-

zação de um sonho para um grupo

de inquietos amantes da leitura. Ho-

je, já em sua edição de número 03, a

revista eletrônica Kukukaya mantém

-se focada em seu propósito de difu-

sora cultural, abrindo suas laudas

para a economia, para a política e

para as artes, em suas mais variadas

vertentes. Se, por um lado, preocupa

-se com o fomento da cultura, abre

espaço também para a abordagem de

temáticas do cotidiano, trazendo à

tona sempre os aspectos sociais e

legais que as circundam, temáticas

estas, que tocam as linhas de interes-

se da sociedade, de forma abrangen-

te.

O ano de 2014 nos chegará

com um grande desafio: angariar,

cada vez mais, vozes que engrossem

o coro dos defensores da nossa cul-

tura, chamando a atenção, tanto para

a preservação das nossas tradições,

como para o incentivo a toda e qual-

quer manifestação emergente no ce-

nário artístico-cultural, antenados às

novas tendências da criatividade,

pelos quatro cantos do planeta . Isto,

em um ano em que todos os holofo-

tes se direcionam para a copa do

mundo. Tarefa difícil, quando o Bra-

sil arrasta consigo o título de “país

do futebol”, aplicando recursos mili-

onários na promoção de um evento

esportivo de proporções mundiais,

enquanto setores responsáveis pelo

atendimento às necessidades bási-

cas de seu povo agonizam, por falta

de um olhar mais cuidadoso, vindo

de quem atua nas esferas de decisão

política. Encontra-se negligenciada,

a cultura, em nosso país.

Estaremos ainda mais atentos

e imbuídos do objetivo de defender

e promover o conhecimento, certos

da importância de iniciativas, sim-

ples que sejam, que democratizem o

pensamento crítico, que ampliem o

acesso às artes e disponibilizem in-

formações, de forma fácil. Coloca-

mo-nos neste time. No time dos ati-

vistas culturais, dos questionadores

de um sistema que inverte priorida-

des, que joga educação e cultura

para escanteio, menosprezando a

inteligência e as reais necessidades

de seu povo.

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Manoel Onofre Jr. natural de Santana do Matos,

onde nasceu em 1943. Atualmente reside em Natal, ca-

pital do estado do RN. Manoel Onofre Jr. É membro

da Academia-norte-rio-grandense de Letras e do Insti-

tuto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.

Atuou na área jurídica durante muitos anos e hoje é

aposentado como desembargador. Num clima de des-

contração e recheado de inspiração cultural que entre-

vistamos esse ficcionista, cronista, biógrafo e poeta.

– Como se deu o início da rela-

ção entre Manoel Onofre Jr. e a literatura?

- Creio que o amor às letras me

veio no sangue, herdado geneticamente...

Alguns dos meus antepassados eram ho-

mens de letras. Esta, a explicação que te-

nho para o fato de que, ainda menino de

calças curtas, vivendo em Martins, peque-

na cidade do interior, onde não havia bibli-

oteca nem livraria, eu gostava muito de ler,

e já rabiscava algumas coisas, sempre me

saia bem nas provas de redação do Grupo

Escolar “Almino Afonso”. Depois, continu-

ando os estudos no Colégio Diocesano

Santa Luzia, de Mossoró, fundei um jornal-

zinho estudantil, e passei a frequentar a

Biblioteca Municipal, leitor voraz. Em 1964,

já cursando Direito, em Natal, publiquei

meu primeiro livrinho, “Serra Nova”, tornei-

me repórter e colunista de jornais natalen-

ses, deixei-me inocular pelo vírus da litera-

tura.

– Você poderia destacar alguns

trabalhos feitos por você em prol da litera-

tura potiguar?

- Voltando-me para o estudo da

nossa literatura, escrevi “Estudos Norte-rio-

grandenses”, uma espécie de bibliografia

comentada, com a qual ganhei o Prêmio

“Câmara Cascudo” (1975). Prosseguindo

na mesma trilha, publiquei

“Salvados” (1982), reeditado com o subtítu-

lo “Livros e Autores Norte-rio-

grandenses” (2002); “Os Potiguares-

Contistas” (1987), 2ª. edição revista e am-

pliada sob o título “Contistas Potigua-

res” (2003); “Ficcionistas do Rio Grande do

Norte” (1995), 2a. edição revista e amplia-

da sob o título “Ficcionistas Potigua-

res” (2010) e “Alguma Prata da Ca-

sa” (2012).

Creio ter dado alguma contribuição às

nossas letras, também, como articulista,

palestrante e autor de 43 prefácios e ore-

lhas de livros. Gostaria de ter escrito a His-

tória da Literatura no Rio Grande do Norte,

mas, para tanto, faltou-me fôlego.

– O que uma obra literária pre-

cisa ter para ser de qualidade?

- Talento na forma, principal-

mente. O conteúdo é importante, mas não

tanto quanto a forma.

Fo

to: A

lex

Fe

rna

nd

es

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– Fala-se muito do crescimento

do mercado editorial potiguar nos últimos

anos. Esse aumento quantitativo veio

acompanhado da melhoria na qualidade

da escrita?

- Sim, notadamente na área

da ficção. Até meados do século passado,

os bons ficcionistas do Estado contavam-

se nos dedos de uma mão. Ultimamente,

têm surgido, em número cada vez maior,

contistas e romancistas de valor.

– Quem seriam os grande es-

critores potiguares da atualidade?

- Temos escritores que nada

ficam a dever às estrelas do eixo Rio/São

Paulo. Citá-los de memória seria temerá-

rio.

– Quais autores você elegeria

como cânone da literatura potiguar?

- Na poesia: Auta de Souza,

Ferreira Itajubá, Henrique Castriciano, Jor-

ge Fernandes, Otoniel Menezes, Zila Ma-

mede, Homero Homem, Myriam Coeli, Lu-

ís Carlos Guimarães e Deífilo Gurgel; na

ficção: Polycarpo Feitosa, Afonso Bezerra,

José Bezerra Gomes, Newton Navarro,

Eulício Farias de Lacerda e Bartolomeu

Correia de Melo; na crônica: Berilo Wan-

derley, Augusto Severo Neto, Dorian Jor-

ge Freire e Pedro Simões, no ensaio: Câ-

mara Cascudo, Tavares de Lyra, Nilo Pe-

reira, Edgar Barbosa, Hélio Galvão, Verís-

simo de Melo, Américo de Oliveira Costa,

Oswaldo Lamartine e Olavo de Medeiros

Filho.

O cânone exclui os vivos, é claro.

– Quais os projetos no prelo e

os planos para o futuro?

- No prelo, a terceira edição revista e au-

mentada de “Salvados”. Quanto aos pla-

nos para o futuro, nada definido.

– Manoel Onofre Jr. prefere ser

escritor ou crítico de literatura?

- Não me considero um crítico

literário. No Rio Grande do Norte há pou-

quíssimos críticos: Nelson Patriota, Anchi-

eta Fernandes... Quem mais?

– Quais os planos literários pa-

ra 2014?

- “Chão dos Simples”, meu li-

vro de contos, em terceira edição acresci-

da de duas novas histórias. Também, “A

Palavra e o Tempo”, diário íntimo –

1988/1991, juntamente com o diário que

estou escrevendo, iniciado em outubro de

2013.

– Manoel Onofre Jr. por ele

mesmo.

- Citando Drummond, eu diria:

“Tenho apenas duas mãos

e o sentimento do mundo”

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A inda conservo, cari-

nhosamente, uma

edição antiga de

poemas de Manuel Bandeira, reunidos em an-

tologia (a sétima que fez) e que adquiri em 30

de setembro de 1961 (a data, escrevi-a na pri-

meira página do livro), aos 16 anos de idade.

Foi um “alumbramento” estético, o que ainda

sinto, hoje, quando o releio. Dos brasileiros, é

seguramente um de meus poetas preferidos.

Naquele ano de 1961, lembro bem, morava

com minha tia Lulu (Luísa Paiva de Melo), ir-

mã de minha mãe, no Alecrim, em Natal, e lia

muito Manuel Bandeira e Garcia Lorca. (O

meu primeiro poema publicado - no jornal “O

Nacionalista”, de Macau -, intitulado “Tempo”,

também data daquele ano). Mas o conhecia

de bem antes. O meu contato inicial com Ban-

deira deu-se provavelmente em 1957, ao ler

alguns de seus poemas num caderno de no-

tas de meu irmão Graziani.

Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Fi-

lho (este o seu nome completo) nasceu no dia

19 de abril de 1886, no Recife, e faleceu, aos

82 anos, no Rio de Janeiro, em 13 de outubro

de 1968.

O poeta e tradutor José Paulo Paes, ho-

menageando-o, escreveu o seguinte poema

curto:

“13 de outubro, morte de Manuel Bandei-

ra

Epitáfio

Poeta menormenormenormenormenor

menormenormenormenormenorenorme”

Manuel Bandeira, poeta de grande liris-

mo e ternura, dissera em um de seus poemas

(“Testamento”): “Criou-me, desde eu menino,/

Para arquiteto meu pai./ Foi-se-me um dia a

saúde.../ Fiz-me arquiteto? Não pude!/ Sou

poeta menor, perdoai!” Naturalmente, empre-

gara a expressão “poeta menor” não apenas

por modéstia, mas por ser um poeta essenci-

almente lírico, não afeito, literariamente, ao

mundo político, à poesia trágica, engajada ou

social (usava, nesse sentido, uma distinção,

por gênero, estabelecida pelos antigos). Com

efeito, diz em seu “Itinerário de Pasárgada”:

“Tomei consciência de que era poeta menor;

que me estaria para sempre fechado o mundo

das grandes abstrações generosas; que não

havia em mim aquela espécie de cadinho on-

de, pelo calor do sentimento, as emoções

maiores se transmudam em emoções estéti-

cas: o metal precioso ou teria que sacá-lo a

duras penas, ou melhor, a duras esperas, do

pobre minério das minhas pequenas dores e

ainda menores alegrias.”

Escolhi o poema “Profundamente” (de

seu quarto livro, “Libertinagem”, publicado em

1930) para representá-lo, pelo menos neste

momento, dentre tantas outras expressivas

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obras de sua autoria. O conteúdo existencial,

nostálgico, evocativo, presente nesse poema,

caracteriza o conjunto de sua obra, que se re-

veste, afinal, de tênue melancolia, reflexo pro-

vável de seu constante diálogo com a morte.

Com ela flertara muito cedo, jovem, em função

de sua frágil saúde (a tuberculose o perse-

guia). Uma curiosidade: quase à mesma época

em que o li, tive também acesso a outro gran-

de poeta - o americano Edgar Lee Masters -

através de seu igualmente belo poema “A Coli-

na” (“The Hill”), de abordagem lírica semelhan-

te à de Bandeira, embora publicado quinze

anos antes, em 1915 (v. “notas”, in fine).

MANUEL BANDEIRA (n. 19/04/1886, Recife;

m. 13/10/1968, Rio de Janeiro):

PROFUNDAMENTE

Quando ontem adormeci

Na noite de São João

Havia alegria e rumor

Estrondos de bombas luzes de Bengala

Vozes cantigas e risos

Ao pé das fogueiras acesas.

No meio da noite despertei

Não ouvi mais vozes nem risos

Apenas balões

Passavam errantes

Silenciosamente

Apenas de vez em

quando

O ruído de um bonde

Cortava o silêncio

Como um túnel.

Onde estavam os que há pouco

Dançavam

Cantavam

E riam

Ao pé das fogueiras acesas?

- Estavam todos dormindo

Estavam todos deitados

Dormindo

Profundamente.

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Quando eu tinha seis anos

Não pude ver o fim da festa

de São João

Porque adormeci

Hoje não ouço mais as vozes daquele tem-

po

Minha avó

Meu avô

Totônio Rodrigues

Tomásia

Rosa

Onde estão todos eles?

Estão todos dormindo

Estão todos deitados

Dormindo

Profundamente.

NOTAS:

(1) Transcrevo o poema de Edgar Lee

Masters (23/08/1868-05/03/1950), “A Coli-

na” - primeiro poema de seu livro “A Anto-

logia de Spoon River”, publicado em 1915 -

na íntegra, na bela tradução de outro gran-

de poeta, o nosso alagoano Jorge de Lima:

A COLINA

Onde estão Elmer, Herman, Bert, Tom e

Charley,

O irresoluto, o de braço forte, o palhaço, o

ébrio, o guerreiro?

Todos, todos, estão dormindo na colina.

Um morreu de febre,

Um lá se foi queimado numa mina,

O outro assassinaram-no num motim,

O quarto se extinguiu na prisão,

E o derradeiro caiu de uma ponte quando

trabalhava para

[a esposa e os filhos.

Todos, todos, estão dormindo, dormindo,

dormindo na colina.

Onde estão Ella, Kate, Mag, Lizzie e Edith,

A de bom coração, a de alma simples, a

alegre, a orgulhosa,

[a feliz?

Todas, todas, estão dormindo na colina.

Ella morreu de parto vergonhoso,

Kate de amor contrariado,

Mag nas mãos de um bruto num bordel,

Lizzie ferida em seu orgulho, à procura do

que quis seu

[coração,

E Edith, depois de ter vivido nas distantes

Londres e Paris,

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Foi conduzida a seu pequeno domínio por

Ella e Kate e Mag.

Todas, todas estão dormindo, dormindo,

dormindo na colina.

Onde estão tio Isaac, e tia Emily,

E o velho Towny Kincaid e Sevigne

Houghton,

E o Major Walker que conversava

Com os veneráveis homens da revolução?

Todos, todos estão dormindo na colina.

Trouxeram-lhes filhos mortos na guerra,

E filhas cuja vida tendo sido desfeita,

Os filhos sem pai choravam

Todos, todos, estão dormindo, dormindo,

dormindo na colina.

Onde está o velho violinista Jones

Que brincou com a vida durante noventa

anos,

Desafiando as geadas a peito descoberto,

Bebendo, fazendo arruaças, sem pensar na

esposa, nem na

[família,

Nem em dinheiro, nem em amor, nem no

céu?

Vede! Fala sobre os cardumes de peixes de

antigamente,

Sobre as corridas de cavalo,

outrora, em Clary’s Grove,

Sobre o que Abe Lincoln disse

Uma vez em Springfield.

(2) Um verbete de Manuel Bandeira, in-

serto em seu livro “Noções de História da

Literaturas”, diz: “EDGAR LEE MASTERS

(1869-1950) tornou-se famoso com a sua

Spoon River Anthology, livro considerado

um marco na poesia norte-americana; são

para mais de cem epitáfios em que os mor-

tos de uma cidadezinha do Oeste dizem a

verdade sobre as suas vidas; e através dos

supostos depoimentos o lugarejo revive

com todas as suas grandezas e misérias.”

Horácio de Paiva Oliveira - é

natural de Macau-RN . Advoga-

do, poeta, escritor e Presiden-

te da Comissão Municipal da

Memória, Justiça e Verdade

de Natal.

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E stava eu deitado, tentando relaxar

na rede armada pela última vez

na varanda do “Observatório do

Filósofo”, esperando o caminhão

para fazer a minha mudança, pois tudo já

estava desmontado: estantes, guarda rou-

pas, camas, armários, roupas e livros encai-

xotados, foi quando ouvi se aproximar aque-

le terrível carrinho sonoro, poluindo mais

uma vez o ambiente com os seus decibéis

desmedidos.

Ainda bem que tocava desta feita, a música:

Então É Natal, na voz de Simone, cuja letra

faço questão de consignar:

“Então é Natal, e o que você fez?

O ano termina, e nasce outra vez

Então é Natal, a festa Cristã

Do velho e do novo, do amor como um todo

Então bom Natal, e um ano novo também

Que seja feliz quem souber o que é o bem”.

E seguindo assim, mal acabava a mú-

sica, dava-se uma nova sequência, fazendo

lembrar aos desavisados que já é Natal.

Após uns quarenta a cinquenta minutos, o

carrinho já tinha tomado o seu rumo, a sua-

ve melodia não saia dos meus ouvidos:

“Então é Natal, pro enfermo e pro são

Pro rico e pro pobre, num só coração

Então bom Natal, pro branco e pro negro

Amarelo e vermelho, pra paz afinal

Então bom Natal, e um ano novo também

Que seja feliz quem, souber o que é o bem”.

Tentei por diversas vezes, despistar o

meu pensamento e procurei telefonar para o

motorista do caminhão, perguntei ao mesmo

se ainda iria demorar e por quanto tempo.

Foi quando o mesmo me respondeu que

ainda iria demorar em torno de duas a três

horas e ao baixar o telefone no descanso,

veio-me logo a mente a terceira estrofe da

música:

“Então é Natal, o que a gente fez?

O ano termina, e começa outra vez

Então é Natal, a festa Cristã

Do velho e do novo, o amor como um todo

Então bom Natal, e um ano novo também

Que seja feliz quem, souber o que é o bem”.

Tirei de dentro de uma das caixas, O

Livro das Velhas Figuras, de Luis da Câma-

ra Cascudo e abri logo na página 58, cujo

tópico: ÁRVORE DE NATAL retratava a pri-

meira árvore do Natal, exibida nesta cidade

e que foi no salão do Natal clube, na noite

de 24 de dezembro de 1909.

Diz ainda o ilustre historiador:

“Não tendo a mais longínqua relação com o

Cristianismo, constitui um elemento orna-

mental para as ruas, praças e salas domés-

ticas, coberta de lâmpadas, festões, presen-

tes e globos de vidro, resplandecente de

luzes suaves. Nada sugere no ponto de vis-

ta de Fé. Não irradia malefícios. Não ensina

coisa alguma. É bonita”.

O natal é uma data em que comemo-

ramos o nascimento de Jesus Cristo. Na

antiguidade, o natal era comemorado em

várias datas diferentes, pois não se sabia

com exatidão a data do nascimento de Je-

sus. Foi somente no século IV, que o 25 de

dezembro foi estabelecido como data oficial

de comemoração.

Na Roma Antiga, o dia 25 de dezem-

bro era a data em que os romanos comemo-

ravam o início do inverno. Portanto, acredita

-se que haja uma relação deste fato com a

oficialização da comemoração do natal. As

antigas comemorações de natal costuma-

vam durar até 12 dias, pois este foi o tempo

que levou para os três reis Magos chegarem

até a cidade de Nazaré e entregarem os

presentes ao menino Jesus. Atualmente, as

pessoas costumam desmontar as árvores e

outras decorações natalinas em até 12 dias

após o natal.

Do ponto de vista cronológico, o natal é uma

data de grande importância para o Ocidente,

pois marca o ano um da nossa História.

* Washington

Ferreira Fontes é

Escritor, Filósofo e

Poeta.

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Em quase todos os países do mundo, as pessoas

montam árvores de natal para decorar casas e outros

ambientes. Em conjunto com as decorações natalinas,

as árvores proporcionam um clima especial neste perío-

do.

Acredita-se que esta tradição começou em 1530,

na Alemanha, com Martinho Lutero. Certa noite, enquan-

to caminhava pela floresta, Lutero ficou impressionado

com a beleza dos pinheiros cobertos de neve. As estre-

las do céu ajudaram a compor a imagem que Lutero re-

produziu com galhos de árvore em sua casa. Além das

estrelas, algodão e outros enfeites, ele utilizou velas ace-

sas para mostrar aos seus familiares a bela cena que

havia presenciado na floresta.

Esta tradição foi trazida para o continente americano por

alguns alemães, que vieram moram na América durante

o período colonial. No Brasil, país de maioria cristã, as

árvores de natal estão presentes em diversos lugares,

pois além de decorar, representam um símbolo de ale-

gria, paz e esperança.

O presépio também representa uma importante decora-

ção natalina. Ele mostra o cenário do nascimento de Je-

sus, ou seja, uma manjedoura, os animais, os reis Magos

e os pais do menino. Esta tradição de montar presépios

teve início com São Francisco de Assis, no século XIII.

Pois bem, não satisfeito, comecei a navegar pela internet

e me deparei com a seguinte manchete: Árvore de Miras-

sol receberá iluminação especial, rolei rapidamente a

barra e leio na íntegra:

“A tradicional árvore de Mirassol, localizada na

entrada da cidade, será entregue à população na próxi-

ma quarta-feira (4), às 19h, pelo Prefeito Carlos Eduardo.

A estrutura possui 126 metros e conta com 8.000 mil

conjuntos de lâmpadas de LED, com 100 micros lâmpa-

das em cada. Ao todo serão 800.000 mil lâmpadas nas

cores verde, amarela, branco, azul e âmbar.

Este ano a árvore terá animação com sequências de co-

res, espiral e giratório, alternados pelo movimento de

pisca-pisca. Entre as novidades, está a instalação de um

telão todo em LED na lateral da nova estrutura, que se-

quenciará as cores e movimentos da árvore com as ban-

deiras dos países que participarão da Copa do Mundo de

2014.

Com o uso da iluminação em LED, a árvore natalina, terá

16 vezes mais economia no consumo de energia em

comparação a árvore antiga, que usava lâmpadas incan-

descentes e chegou a um consumo de 480.000 Watts, a

nova atingirá apenas 30.000 Watts.

Ainda em Mirassol, a Fundação Cultural Capitania das

Artes (Funcarte), também organizou uma programação

especial, dentro do "Natal em Natal". A área receberá o

Natal em Cena, com a apresenta-

ção do Auto de Natal e os shows

de Roberta Sá (13) e Zeca Baleiro

(20). No dia 10 será a vez de acen-

der a árvore da Zona Norte, que será

instalada ao lado do Ginásio Nélio

Dias, local também receberá as atra-

ções musicais de Elba Ramalho (14) e

Fagner (21)”.

Ao terminar de ler o anúncio atual, canto mental-

mente o restante da música:

Puxa! Quase ia me esquecendo, independendo da

mudança, tenho que ir agora mesmo até a casa dos

meus pais, pois todos os anos, sou eu que subo o muro

da casa dos mesmos e coloco três filetes de cordões,

com lâmpadas coloridas, comprados no camelódromo do

alecrim e os coloco no pé de pinheiro, que meu pai sem-

pre teve o cuidado de mantê-lo cortado.

De acordo com a tradição católica, a árvore de Natal de-

ve ser montada a partir do dia 30 de novembro, que é o

começo do período do advento. Sua montagem deve ser

aos poucos, intensificando-se a partir de 17 de dezembro

(momento em que a Bíblia começa a falar do nascimento

de Jesus). Em seis de janeiro (Dia de Reis), de acordo

com esta tradição, é o dia de desmontar a árvore de Na-

tal.

Após efetuar o serviço de decorador de pinheiro,

minha mãe se apressa e acopla a extensão do fio na to-

mada e corre para apreciar como se fosse uma criança e

logo após, alguns momentos de perplexidades, solta a

repetitiva frase dita anualmente: A árvore do Natal mais

bonita e marcante das nossas vidas.

Resta-me, simplesmente, proferir: “Sim! É Natal, é Natal,

é Natal”. Feliz Natal a todos os meus amigos, a todos

aqueles que acreditam no trabalho, no amor, no renascer

da vida e em Deus.

PS: Segundo os mais antigos, o cume da árvore do tipo pinheiro, nunca deve crescer ao

ponto de passar da cumeeira da casa, senão o proprietário morre de maneira prematura.

REFERÊNCIA

CASCUDO, Luís da Câmara, O Livro das Velhas Figuras, volume X, (pesquisa e lembran-

ças na História do Rio grande do Norte). Sebo Vermelho, Natal/RN, 2008.

http://nominuto.com/noticias/cidades/arvore-de-mirassol-recebera-iluminacao-

especial/104611/

Harehama, há quem ama

Harehama, ha

Então é Natal, e o que você fez?

O ano termina, e nasce outra vez

Hiroshima, Nagasaki, Mururoa, ha...

É Natal, é Natal, é Natal”.

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G rupos formais e informais de fotografias es-tão espalha-

dos por todo canto. Uma das principais atividades é a saída fotográfica, ou, expedição fotográfica, como costumam cha-mar. Saída ou expedi-ção, o objetivo é único: fotografar muito. Nor-malmente, as expedi-ções fotográficas da Aphoto reúnem cerca de 50 pessoas, que viajam confortavelmente e na segurança de ônibus novos.

Com a garantia de sol e céu limpo o ano inteiro, o Nordeste se transforma em cenários per-feitos para vá-rias expedi-ções fotográfi-cas que ocorrem ao lon-go do ano, mesmo em períodos chuvosos ou tempos de seca. Praia e sertão são os destinos mais óbvios para se fo-tografar, mas a diversi-dade cultural e as bele-zas naturais explodem a cada passeio realizado pela Associação Poti-guar de Fotografia. As expedições fo-tográficas acontecem, em média, de dois em dois meses, e reúne fo-tógrafos profissionais e

amadores, que fotogra-fam por hobby. Para não ficar muito tempo dentro de ônibus e na estrada, a organização das expe-dições decidiu não viajar para um destino com mais de 250 km de dis-tância. A expedições são no estilo bate-e-volta, saindo às seis da manhã do Centro Histó-rico de Natal e retorndo após fotografar o pôr do sol em algum lugar. Olinda, Recife, Pe-dra do Ingá, João Pes-

soa, Pedra da Boca, Barra do Cunhaú, Brejo Paraibano, Canguareta-ma, Praia da Pipa, São Miguel do Gostoso, en-tre outros destinos, já foram explorados pelos aventureiros aphotistas durante as expedições fotográficas. “Passamos um dia inteiro fotogra-fando as paisagens e conhecendo novos luga-res. Não há nada melhor pra quem é apaixonado por fotografia”, disse Jailson Fernandes, dire-tor financeiro da Aphoto.

Logo depois das expedições, a Aphoto reúne os participantes, amigos e familiares para o “Sarau Fotográfico” onde são projetadas as imagens captadas du-rante a última expedi-ção. As reuniões acon-tecem em restaurantes ou bares de Natal e cos-tumam reunir cerca de 150 pessoas em cada sarau. Segundo Jailson, em todos os passeios da Aphoto, os sócios tem um preço diferenci-ado em relação às tari-fas cobradas aos não sócios. Aventuras Fotográfi-cas As capitais nordes-tinas são banhadas por praias. É natural que o tema marinho seja pre-ferido por vários fotógra-fos, nos mais diversos assuntos como dunas, restingas, falésias, man-gues, lagoas, praias de-sertas e lugares paradi-síacos espalhados pela beira do mar. O sertão também é alvo de algu-mas expedições. A ri-queza da cultura nor-destina está marcada no cotidiano do vaqueiro ou na fé, na devoção dos santos, na dança do for-ró, na bodega velha, na caatinga seca, na cape-la enfeitada e no pôr do sol por trás da serra.

“Um dos hobbies preferidos pelos loucos por foto-

grafia é sair por aí clicando”

* Alex Gurgel -

Jornalista, pro-

fessor,

fotógrafo e

presidente da

Aphoto

(Associação

Potiguar de Fo-

tografia). -

Créditos da fo-

to: Laine Paiva,

Macau-RN.

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Um grupo de fotógrafos escalaram um dos pontos mais alto do Rio Grande do Norte, no “1º Off-road Foto-gráfico”, organizado pelo fotó-grafo Canin-dé Soares que reuniu uma galera de fotógrafos potiguares e se aventu-ram numa escalada ao Pico do Ca-bugi, forma-ção geológi-ca de aspec-to vulcânica com mais de 600 metros de altura aci-ma do nível da planície central do interior do Rio Grande do Norte, no municí-pio de Lajes, distante 170 km de Natal. Os fotógrafos leva-ram barracas, comidas e pro-teção para suportar o frio e esperar a melhor luz no alto do Pico do Cabugi. Sob o sabor dos ventos agresteiros, a nave carregada

de fotógrafos rasgou a BR 406 nesse domingo ensolara-do em meados de maio, nu-ma Expedição Fotográfica em busca das Dunas do Rosado,

polo turístico do Litoral da Costa Branca potiguar, onde montanhas de areias doura-das encantam os olhos privi-legiados dos turistas afoitos. Cada fotógrafo foi procurar sua vereda nas dunas em busca do melhor ângulo. To-dos se espalharam pelas areias até o sol se deitar e o dia findar.

Como

Natal é uma

cidade que

celebra o “Natal

em Natal”

e a época

natalina a cidade se

veste de cores e luzes

nas ruas e nas facha-

das, a Aphoto reúne

sócios e a comunidade

fotográfica natalense

para uma Expedição

Fotográfica Noturna,

todos os anos. Apesar

de as fotos circularem

nas redes sociais mos-

trando Natal como cida-

de luz, a própria Prefei-

tura de Natal criou um prêmio

em dinheiro para as fachadas

mis iluminadas de lojas, mas

não criou nenhum apoio para

mostrar as imagens. Depois

que passa o período de festa,

somente as fotos podem con-

tar a história do natal que

passou.

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É o Brasil um país onde se fala uma única lín-

gua? É a língua falada uma manifestação verbal

de unidade nacional? A língua é uma ferramen-

ta incomparável de comunicação. É um ele-

mento social, cultural, político, erudito e popular. Toma

conta de todos, dos pensamentos, dos desejos e das

ações. Falar é viver. É, ao mesmo tempo, social e indivi-

dual. Ela nos torna distintos dos demais animais. Somos

racionais pelo pensamento inteligente que nos rege. Ex-

pressamo-nos a partir de uma massa fonética que profe-

rimos pelo aparelho fonador e pela racional organização

de idéias que emerge em ca-

da fala que verbalizamos.

Cremos que no Brasil não

falamos a nossa língua da

mesma forma.

Diante de tantas varia-

ções linguísticas faladas nes-

se território continental, mui-

tos eruditos, tidos como nor-

mativos e pretensiosos deten-

tores de uma verdade grama-

tical absoluta, levantam-se e

estabelecem regras que são verdadeiros tratados pre-

conceituosos e excludentes, referindo-se ao modo de

falar do povo brasileiro. Criou-se um modelo padrão que

discrimina as variações. Puro preconceito. Notamos que

nenhuma língua é falada do mesmo jeito em todos os

lugares, assim como nem todas as pessoas falam a pró-

pria língua de modo idêntico o tempo todo (Bagno,

2007).

Se o certo é falar do mesmo modo que se escre-

ve, assevera Marcos Bagno (2007), então as variações

das comunidades linguísticas são pertinentes. Para ele

Diante de uma placa escrita TEATRO

é provável que um pernambucano,

lendo em voz alta, diga TÉ-ATRU,

que um carioca diga TCHI-ATRU e

que um paulistano diga TÊ-ATRU. E

agora? Quem está certo? Ora, todos

estão igualmente certos. O que acon-

tece é que em toda comunidade lin-

guística existem as variações.

São as variações que determinam as diversas

maneiras de falar do nosso povo em suas regiões espe-

cíficas. E isso causa uma esquizofrenia gramatical. É a

forma diferente de falar a mesma língua. Entretanto, a

escrita dessa língua deve, com isso concordo com Bag-

no, obedecer a uma ortografia oficial, porém só para as

escrituras, para a língua falada devem continuar seguin-

do os resultados da sua história cultural

praticada nos diversos rincões desse

imenso país. Seria mais justo dizer ao

aluno que se pode falar “bolacha” ou

“bulacha”, mas que só pode escrever

BOLACHA, porque é necessária uma

ortografia única para toda a língua, para

que todos possam ler e compreender o

que está escrito (Bagno, 2007).

Muitos atestam que o português

é uma língua muito difícil. Discordo.

É uma afirmação preconceituosa. O

mito de que o “português é muito difícil” tem a sua ori-

gem também na confusão, gerada no ambiente escolar,

entre a língua propriamente dita e a codificação tradicio-

nal da língua, isto é, a gramática normativa (Bagno,

2007). Observamos que muitos autores se apresentam

como pessoas letradas e inteligentes, portanto domina-

dores da norma culta da nossa língua e se acham ilumi-

nados por causa disso. Com essa atitude preconceitu-

osa, revelam-se totalmente desvinculados dos contextos

sociais mais populares. Depreciam e humilham as varia-

das formas de falar dos grupos menos esclarecidos e

opotunizados da esfera social, que são as comunidades

periféricas, rurais e os grupos urbanos.

Não podemos observar uma unidade linguística

nacional sem deixar de combater a discriminação e a

exclusão social. Existe uma diversidade linguística cultu-

ral brasileira que precisa ser levada em consideração

diante das regionalidades da língua.

(Continua na pag. 14 e 15)

“O combate ao preconceito linguístico.

Numa sociedade historicamente

pouco democrática como a

brasileira, essa tarefa exige,

muitas vezes, um tom veemente.”

Marcos Bagno

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Esses paradigmas pré-conceituais e sociais ten-

dem a ser encarados como uma prática dentro das

ações da normatividade. Não havendo, então, espaço

para o combate aos preconceitos linguísticos e nem as

descobertas dos erros milenares dos gramáticos tradici-

onais, façamos então o duelo de forma incisiva e aberta.

A língua é um elemento vivo, para isso precisamos prati-

cá-la, defende-la e reorganizá-la em todas as suas esfe-

ras e características.

Para Professor Marcos Bagno (2007), há uma

grande desordem no surgimento do dito preconceito lin-

güístico brasileiro, já que

O preconceito linguístico está ligado,

em boa medida, à confusão que foi

criada, no curso de história, entre

línguas e gramática normativa. Nossa

tarefa mais urgente é desfazer essa

confusão. Uma receita de bolo não é

um bolo. Um molde de um vestido

não é um vestido. Um mapa-mundi

não é o mundo... Também a gramáti-

ca não é a língua.

A língua é muito mais do que uma simples organi-

zação de regras e conceitos. A elite culta se pauta por

uma fala gramaticalmente normativa e toma para si a

deliberação de definir ou reformar as regras. Entratanto,

do ponto de vista prático, a língua não é a gramática, é

uma unidade de comunicação nacional, portanto, ineren-

te as suas variações regionais e sociais. Se isso não

ocorrer está decretado o preconceito linguístico.

Por ser um fenômeno social, a língua é, também,

um instrumento de dominação. O aparelho escolar, mes-

mo preterido, é promulgado pelo estado dominador que

se utiliza, dentre outros eixos e espaços, da linguagem

como fator de dominação social. O português é a língua

ensinada na escola que se torna o modelo geral que

deve ser seguido e respeitado por todos, e é na escola,

onde se localiza as identificações das deficiências de

dominação da estrutura gramatical normativa que ocorre

sem refutação, e com isso, no lugar de conduzir o dis-

cente para o entendimento da correção e da normativi-

dade e das posturas sociais que a língua lhe impõe, ra-

dicaliza e encaminha apenas para a identificação de

“erros” e formas padronizadas da fala.

Tomando essa atitude, a escola se torna espaço

de preconceito linguístico formal. Defendemos que todos

os espaços educacionais devam desprezar a fantasia da

coesão linguística e apoiar a existência da profunda di-

versificação existente em nosso país, procurando assim,

estabelecer uma relação mais próxima das realidades

sociais do que das unidades curriculares, onde o que

não está dentro das normas não está certo. Acreditamos

que precisamos tomar coragem para realizar uma mu-

dança de atitude radical em relação a nossa cultura lin-

guística.

Marcos Bagno (2007), tratando do tema, notifica que

E a primeira campanha a ser feita,

por todos na sociedade, é a favor da

mudança de atitude. Cada um de

nós, professor ou não, precisa elevar

o grau da sua própria auto-estima

linguística: recusar com veemência

os velhos argumentos que visem me-

nosprezar o saber linguístico individu-

al de cada um de nós. Temos de nos

impor como falantes competentes de

nossa língua materna. Parar de acre-

ditar que brasileiro não sabe portu-

guês, que português é muito difícil,

que os habita. Acionar o nosso senso

crítico toda vez que nos deparamos

com um comando paragramatical e

saber filtrar as informações deixando

de lado (e denunciando, de preferên-

cia) as afirmações preconceituosas,

autoritárias e intolerantes.

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Para que possamos criticar

com veemência essas ações e não

reconhecer tal atitude como heran-

ça cultural, precisamos combater

esse preconceito que difama a

nossa diversidade cultural. Isso se

tornará realidade quando todos os

setores da sociedade aceitaram

essas diferenças culturais e reco-

nhecerem as nossas riquezas lin-

guísticas como patrimônio imaterial

do nosso povo. Não podemos reconhecer apenas a

língua padrão e culta imposta pela classe culturalmente

dominante, precisamos respeitar, observar e estudar as

variantes regionais linguísticas

e, com isso, elevá-las ao pata-

mar de padronização, também,

oficial, livrando-as dos precon-

ceitos. Reconhecendo em todas

as suas dimensões a riqueza

que realmente existe nessa

nossa língua brasileira, estare-

mos, assim, nos impondo.

* Graduado em Letras – UFRN

Graduado em Educação Artística/Artes Cênicas – UFRN

Especialista em Didática do Ensino – UNP

Mestre em Educação – PPGeD/CCSA/UFRN

Aluno especial de doutorado em Educação/UFRN

Professor/Supervisor pedagógico da rede estadual

e municipal - Ensino Fundamental e Médio.

Professor do ensino superior e pós-graduação da UVA

Universidade do Vale do Acaraú - CE.

Escritor, compositor, poeta, cordelista e ativista cultural.

REFERENCIAL

BAGNO, Marcos. Precon-ceito Linguístico: o que é, como se faz. São Paulo: Loyola,2007.

------------------. Gramática Pedagógica do Português Brasileiro. São Paulo: Pa-rábola, 2012.

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O anúncio

da morte

do gran-

de líder

Nelson Mandela cau-

sou uma comoção

universal, como não

deveria deixar de

ser. Fazendo a res-

salva de que muitos

dos que agora o lou-

vam, também louva-

ram sua condenação

a 27 anos na prisão.

De qualquer manei-

ra, a vida e as lições

de coragem e deter-

minação que trans-

formaram a vida da

África do Sul estão

chegando ao nosso

conhecimento, e isso

é muito bom.

Homens como

Mandela e Gandhi tive-

ram uma vida extrema-

mente árdua e prova-

ram que para conse-

guirmos um objetivo

temos que ter firmeza

e determinação. Mos-

traram que as coisas

não são conseguidas

num piscar de olhos,

como querem nos fa-

zer crer. Atualmente,

tudo que demora mais

de dois minutos, é lon-

go demais. Os textos,

os vídeos, as aulas, as

palestras... Queremos

tudo para ontem, mes-

mo que ainda não es-

tejamos preparados e

nos falte a experiência.

As pessoas querem,

no primeiro ano de um

emprego, ser remune-

radas como quem está

há trinta anos no traba-

lho. Se isso não acon-

tece, elas ficam depri-

midas e sem motiva-

ção. Por isso, correm

cada vez mais, leem

cada vez menos, e

acham que isso é sufi-

ciente. Caso olhassem

para Mandela, veriam

que 27 anos ele pas-

sou na prisão, pagan-

do por uma condena-

ção injusta. Que mes-

mo assim ele não tirou

o sorriso do rosto, que,

com certeza, não se

considerou infeliz, nem

muito menos ficou frus-

trado, achando que

sua luta tinha sido em

vão. Veriam que nunca

permitiu que a tristeza

e o desânimo o aba-

tessem. De onde esse

homem tirou essa for-

taleza toda? Da certe-

za de que a causa pela

qual lutava era justa e

que era preciso tempo

para maturar no Povo

o sentimento da mu-

dança e a fé de que a

vitória era possível.

Acima de tudo, a con-

vicção que a raiva o

ódio não resolvem na-

da, e sim o otimismo e

a alegria. Evidente-

mente, tendo como pi-

lar de sustentação a

organização e a disci-

plina, que são funda-

mentais para quem

quer perseverar em

busca de algo.

"Nos outros países africanos, vi brancos e negros se mistu-

rando de forma pacífica e alegre em hotéis e cinemas,

usando o mesmo transporte público e morando nos mes-

mos bairros. Voltei para casa para relatar essas experiên-

cias aos meus colegas. Cumpri meu dever com o povo e

com a África do Sul. Tenho certeza que o futuro mostrará

que sou inocente e que os criminosos que deveriam estar

neste tribunal são os homens do governo."

Mandela (1962)

* Luiz Carlos

Petroleiro,

Tem 49 anos, é

empregado da

Petrobras’há 29

anos. É Econo-

mista e filiado

ao PT.

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Issue

Seguindo o mesmo dia-

pasão de tantas outras histó-

rias, a chamada grande im-

prensa mostra apenas o lado

bom, o lado glamoroso. Não

mostram que eles nasceram

e viveram como qualquer um

de nós, em famílias simples.

No caso de Mandela, em uma

tribo, tendo até o nome muda-

do, na escola, para ser aceito,

que vivenciaram todo tipo de

sofrimento. Fundamental-

mente, não mostram que to-

dos podem contribuir na

construção de um mundo me-

lhor. A causa não precisa ser

de tão alto quilate, mas pode

ser dedicando algumas horas

de nosso tempo para uma

ação social que, por menor

que seja, é de profunda im-

portância para quem é benefi-

ciário e para a sociedade em

seu conjunto. Mandela lutou

para unificar uma nação divi-

dida pelo preconceito racial e

todas as sua nuances. Nós

podemos, por exemplo, lutar

contra o preconceito social

que faz com que milhões de

brasileiros e brasileiras vivam

numa espécie de escravidão

moderna, em que todos

acham que são livres. Na ver-

dade, não percebem que,

sem independência econômi-

ca, não é possível termos in-

dependência politica e, sem

essa, não é possível mudar-

mos, na forma e no ritmo ne-

cessário, a brutal correlação

de forças que nos mantém,

apesar dos avanços, ainda

numa situação de grandes

desigualdades.

Por que causa tanta cu-

riosidade a vida de um ho-

mem como Mandela?

Não seria porque nós no

fundo gostaríamos de seguir

o seu exemplo e não o faze-

mos em razão do nosso ego-

ísmo? Por que nos prende-

mos em nossa vidinha peque-

no-burguesa se achando o

centro do universo, e que já

fazemos demais quando, por

ocasião do natal, compramos

duas ou três cestas básicas e

doamos a alguma família ca-

rente, para depois irmos a um

restaurante e numa única

oportunidade gastamos cinco

ou seis vezes o valor das ces-

tas?

Não seria porque nunca

temos tempo de intervir na

vida da nossa comunidade,

participando dos conselhos

gestores, a saber: de saúde,

de educação, de agricultura,

de direitos das crianças e dos

adolescentes, de bairro etc.

Sempre nos esquivando de

contribuir com as associa-

ções, sindicatos e partidos,

ficando na cômoda situação

de eternos críticos, colocan-

do-nos como implacáveis juí-

zes emitindo juízo de valor

contra tudo e contra todos?

O que nos impede de

realizarmos ações dignas de

serem “mandelianas”? A ne-

cessidade está aí mais evi-

dente do que nunca. Basta

olharmos ao nosso redor, a

necessidade está presente

em todos os lados, em todas

as esferas. As tarefas vão

desde contribuirmos para mu-

dar os nossos governantes

até o síndico do nosso prédio.

São ações, digamos, no ata-

cado. Porém, existem tam-

bém no varejo. Que tal facili-

tar a vida de uma pessoa que

você conhece para conseguir

um trabalho melhor dando

aulas que possam capacitá-

la?

Você também pode con-

tinuar fazendo cara de paisa-

gem , cara de “não é comigo”,

e eu vou dizer:

Então é Nelson Mande-

la! E o que você fez ou está

fazendo?

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A Consolida-

ção das Leis

do Trabalho,

a CLT, de

maio de 1943, foi recepcionada

pela Constituição Federal de

1988, que garantiu liberdade e

autonomia ao trabalho para en-

frentar os ataques e se defender

frente aos interesses do capital.

Qual a importância desses fatos

para a classe que vive do traba-

lho2 e quais as reflexões mais ne-

cessárias para o mundo do tra-

balho na atualidade?

A primeira reflexão a ser

feita é sobre a própria configura-

ção da sociedade, ou seja, como

esta se organiza para produzir os

bens de que necessita. A socieda-

de da atualidade, na qual preva-

lece o sistema capitalista, organi-

za a produção econômica com

base na exploração do trabalho.

Nesse modelo, os interesses do

capital e do trabalho são antagô-

nicos, pois o lucro do capital na-

da mais é do que o trabalho soci-

al humano apropriado de forma

privada3.

Da justa compreensão da

existência de interesses contrá-

rios entre capital e trabalho nas-

ceu o Direito do Trabalho, de na-

tureza protetiva, reconhecendo a

hipossuficiência do trabalho di-

ante da força do capital e sua ne-

cessidade de proteção4, da qual

deve se obrigar o Estado.

O desenvolvimento do ca-

pitalismo não alterou a natureza

da relação entre o capital e o tra-

balho, pelo contrário, aprofun-

dou os antagonismos. As crises

econômicas próprias desse siste-

ma econômico e as alterações

delas decorrentes, principalmen-

te na organização do sistema de

produção, trouxeram maior vul-

nerabilidade ao trabalho, com a

expansão e o aperfeiçoamento da

exploração.

O movimento de expan-

são da exploração do trabalho

ultrapassou as fronteiras da or-

ganização fabril e da nacionali-

dade, pois prevalece na econo-

mia mundial o crescimento do

domínio do capital,

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concentrado em aproximadamente

500 corporações, responsáveis por 47% da

produção global e pelo governo da maioria

dos países, segundo dados do professor e

economista Márcio Pochmann.

As alterações no tempo e no local do

trabalho5 permitiram produzir em escala e

cadeia globais, onde cada país participa de

uma etapa dessa cadeia de produção. A re-

percussão e o impacto dessas mudanças na

relação do homem com o processo de pro-

dução do seu trabalho têm efeito devasta-

dor.

A produção centralizada em cadeia

global permitiu a fragmentação do traba-

lho6, com a geração de uma nova conforma-

ção do mundo produtivo, agora integrado

por diversas esferas de trabalho, num mes-

mo processo. Cada esfera de trabalho de

um só processo de produção está ligada por

relações distintas, nas quais prevalece a

precarização das relações e condições de

trabalho.

A terceirização surge como a luva

perfeita para abrigar os interesses do capi-

tal: todos estão integrados no processo de

produção, embora desconheçam o próprio

processo; e todos, com exceção do capital,

não participam do produto do trabalho.

A relação de trabalho fragmentada é

o berço do trabalho precarizado, na qual o

trabalhador não tem segurança, pois se vin-

cula ao processo por uma relação temporá-

ria – o tempo de duração do contrato. Tam-

bém, o trabalho terceirizado não consegue

se organizar com vista a se defender, pois é

rotativo e não se vincula a uma categoria

específica, senão a de prestador de serviço.

O novo mundo do trabalho não foi

acompanhado por uma evolução do Direito

Trabalhista no sentido de garantir e efetivar

sua natureza protetiva. As tentativas de al-

teração normativas são sempre orquestra-

das e protagonizadas pelo capital, respon-

sável pela eleição de 67% dos parlamenta-

res que integram o poder legislativo federal.

A organização sindical tem grande

dificuldade de enfrentar os novos desafios

da representação e da organização de todas

as esferas do trabalho. Por um lado, esbarra

na insuficiência política de um período des-

favorável à luta dos trabalhadores, hegemo-

nizado pelas teses neoliberais. De outro,

esbarra no formalismo e na natureza de

classe do poder judiciário, que diante das

novas demandas opta por uma aplicação

minimizada das garantias e liberdades sin-

dicais existentes no ordenamento jurídico

pátrio.

Fato representativo desse “agir” da

Justiça do Trabalho tem sido a forma como

esta tem respondido aos pedidos de judicia-

lização dos conflitos do trabalho por parte

do capital e dos governantes:

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1 - A maioria das sentenças que

apreciam pedido de julgamen-

to de ilegalidade das greves de-

termina o retorno ao trabalho

de metade dos grevistas. Mais

recentemente, em nome da

proteção do direito de proprie-

dade do capital, o instituto do

interdito proibitório se tornou

“meio próprio” pelo qual a jus-

tiça impede a realização das

greves e a presença do sindica-

to nos locais de trabalho;

2 – Na esfera da administração

pública é comum sentenças de-

terminando o fim da paraliza-

ção dos servidores em nome do

“princípio constitucional da

continuidade dos serviços”7. O

curioso é que esse princípio

não é invocado para obrigar o

gestor a prestar o serviço;

3 – Não bastasse, o TST tem

reiterado sua interpretação

restritiva do art. 522 da CLT,

limitando o reconhecimento da

estabilidade aos integrantes da

diretoria executiva dos sindica-

tos, limitada ao número de sete

integrantes e três representan-

tes do conselho fiscal, indepen-

dentemente do tamanho da ca-

tegoria representada e de sua

distribuição no espaço territo-

rial da representação.

Essas são atitudes disso-

nantes com o princípio prote-

tor que preside o Direito do

Trabalho, além de negar e im-

pedir, claramente, a efetivação

das liberdades e das garantias

outorgadas ao trabalho pelo

poder constituinte originário8,

ao redigir a Constituição Fede-

ral de 1988, a constituição ci-

dadã.

A edição da CLT - reuni-

ão de todas as normas regedo-

ras da relação de emprego inci-

almente, e posteriormente das

relações de trabalho, num úni-

co instrumento normativo -

representou um marco na His-

tória da classe mais numerosa

da sociedade. Principalmente

porque a maioria das normas

da CLT tem caráter protetivo,

embora limitado diante da for-

ça do capital.

“O desenvolvimento

do capitalismo não

alterou a natureza da

relação entre o capi-

tal e o trabalho, pelo

contrário, aprofun-

dou os antagonis-

mos.”.

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A CLT permanece como instrumento

normativo válido, recepcionada que foi pela

Carta de 1988. Mas, para responder às novas

demandas do trabalho - sob a perspectiva pro-

tetiva -, precisa ser interpretada conforme os

postulados da Carta Magna, única forma de

efetivar a garantia de plena liberdade de orga-

nização e autonomia aos trabalhadores, frente

aos ataques e interesses do capital.

REFERÊNCIAS

POCHMANN, M. (Org.) ; GUERRA, Alexandre

(Org.) ; AMORIM, Ricardo (Org.) ; SILVA, Ronnie

(Org.) . Atlas da Nova Estratificação Social no Brasil:

Classe Média, Desenvolvimento e Crise. São Paulo:

Cortez Editora, 2006.

POCHMANN, M. . Relações de Trabalho e Padrões

de Organização Sindical no Brasil. São Paulo. LTR,

2003.

POCHMANN, M. ; BORGES, A. . Era FHC - A Re-

gressão do Trabalho. São Paulo: CES, 2002.

MARX, Karl. Obras Escolhidas. Editora Avante.

Tradução da publicação em alemão: José Barata

Moura. Março de 2007.

ENGELS, Friedrich e Marx, Karl. Manifesto do Parti-

do Comunista. Rio de Janeiro/RJ. Editora Vozes

Ltda. 2011.

FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito

Administrativo. 22ª ed. Rio de Janeiro/RJ. Editora

Lumen Juris Ltda.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do

Trabalho. 6ª ed. São Paulo/SP. LTR. 2007.

MORAIS, Alexandre. Direito Constitucional. 13ª ed.

São Paulo/SP. Editora Atlas S. A. 2003.

ANTUNES. Ricardo. Adeus ao trabalh? Ensaio sobre

a metamorfose e a centralidade do mundo do traba-

lho. 3ª ed. São Paulo/SP. Editora Cortez. 1995.

2 O termo “classe-que-vive-do-trabalho” foi formulado pelo sociólogo brasileiro Ricardo Antunes no livro “Adeus ao trabalho?”, e se con-trapõe diretamente ao termo, cunhado pelo filósofo austro-francês André Gorz, da “não-classe do não-trabalho” em seu famoso livro “Adeus ao proletariado”. Esta obra, publicada em 1980. 3 Na obra “ o Manifesto Comunista”, Karl Marx explica a relação an-tagônica entre as classes sociais: “Ora, a propriedade privada de ho-je, a propriedade burguesa, é a última e a mais acabada expressão do modo de produção e de apropriação baseado nos antagonismos de classes, na exploração de uns pelos outros”. 4 O reconhecimento da hipossuficiência do trabalho frente ao capital está expresso no princípio da proteção, que integra os princípios especiais do Direito do Trabalho, na obra “Curso de Direito do Traba-lho” de Maurício Godinho Delgado. 5 Márcio Pochman explica na obra “A regressão do trabalho”, de 2002, que a restruturação produtiva mudou os tempos e local do trabalho. 6 Termo utilizado por David Harvey, na obra “ A condição pós-moderna”, de 1989, para explicar as alterações promovidas pela re-estruturação do trabalho. 7 Princípio informativo do Direito Administrativo na obra “Manual de Direito Administrativo” de José dos Santos Carvalho Filho. 8 Terminologia utilizada por Alexandre de Morais para denominar e classificar o poder que cria, constitui juridicamente um novo Estado, na obra “Direito Constitucional”.

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Em julho de 2013, o go-verno, como “resposta” às manifestações de junho encaminhou à Câ-mara dos Deputados um documento sugerin-do a convocação de um plebiscito para que a população fosse consul-tada sobre cinco pontos

de uma possível re-forma política: Siste-ma eleitoral (distrital; distrital-misto e pro-porcional), financia-mento de campa-nhas (público, priva-do ou misto), fim da suplência de sena-dor, coligações par-tidárias (fim das coli-gações em eleições proporcionais) e fim do voto secreto no

parlamento.

Desde o início estava claro para os que têm acompanhado o trâmite da reforma po-lítica no Congresso Na-cional, que não haveria plebiscito nenhum, pelo menos se dependesse dele e que valesse para as eleições de 2014. Nem mesmo os partidos da chamada “base alia-da” aprovaram. Apenas o PT, PDT e PC do B apostaram (e perderam) na realização do plebis-cito.

Pouco depois da apresentação da pro-posta do governo, foi formado um Grupo de

Trabalho na Câmara dos Deputados, com 14 integrantes, coordenado pelo deputado Cândido Vacarezza, (PT/SP) e com prazo de 90 dias para apresentar uma proposta de reforma po-lítica. Na primeira reuni-ão do grupo, o coorde-nador foi claro: as mu-danças não valeriam para as eleições de 2014. A própria forma-ção de um grupo já mostrava que não havia intenção de fazer refor-ma política: propostas já existem e há muito tem-po no Congresso Nacio-nal, tanto do Senado, como da Câmara dos Deputados com suas Comissões Especiais de Reforma Politicas e os respectivos relatórios finais.

No dia 16 de ou-tubro de 2013, o plená-rio da Câmara dos De-putados aprovou, por 222 votos contra 161 e uma abstenção, um pro-jeto chamado apropria-damente de “minirreforma eleito-ral” (PL 6397/13). O Projeto teve origem no Senado e foi encami-nhado à Câmara dos Deputados. Substancial-mente, como veremos, não altera em nada o sistema político brasilei-ro e traz apenas mudan-ças superficiais e “cosméticas” como, en-

tre outros exemplos, a proibição de pintura de muros particulares pelos candidatos. O PL man-tém o financiamento pri-vado das campanhas, altera as normas para propaganda eleitoral na TV e na internet (permite a pré-campanha na internet e nos demais meios de comunicação, podendo os filiados a partidos po-líticos ou de pré-candidatos participar de entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, com exposi-ção de plataformas e projetos políticos) e en-tre as mais polêmicas, por suas óbvias conse-quências, limita o poder de auditoria da Justiça Eleitoral sobre a conta-bilidade, a prestação de contas e as despesas dos partidos. Com a jus-tificativa de que isso simplifica a prestação de contas dos partidos, a justiça deverá fazer apenas o exame formal dos documentos contá-beis e fiscais que forem apresentados pelos par-tidos políticos. Fica cla-ro, portanto a intenção de limitar o poder de au-ditoria da Justiça Eleito-ral sobre a contabilida-de, a prestação de con-tas e as despesas de campanha eleitoral dos partidos.

* Homero de

Oliveira Costa

Prof. do Departa-

mento de Ciências

Sociais da UFRN.

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Pouco depois, mais precisamente no dia 22 de ou-tubro a Câmara conclui o PL a ser encaminhado de volta ao Senado. O PL ainda foi “flexibilizado” e inclui a rejeição da proposta do Senado de li-beração de doações de con-cessionários de serviços públi-cos caso eles não sejam "os responsáveis diretos pela doa-ção". Também foi aprovada a ampliação dos recursos do fundo partidário para campa-nha e a permissão para que, no semestre das eleições, pos-sam ser feitas transferências do fundo partidário aos partidos que tive-ram suas contas de-saprovadas pela Justi-ça Eleitoral. Entre as medidas “cosméticas” fica proibido o uso de bonecos nas campa-nhas e ainda placas, faixas, outdoors, car-tazes, bandeiras e pinturas em muro de bens particulares (com multas previstas de R$ 5.000,00 e R$ 15.000,00). Ficou mantida também a proposta do PL do Senado de proibir propagandas que ridicu-larizem candidato, partido ou coligação.

Outra alteração in-cluída na proposta da Câmara foi a que permite que o político que receba punição da Justiça Eleitoral possa pagar a multa em até 60 vezes “desde que cada parcela não ultrapasse o limite de 10% de seus rendi-mentos”. Também fica autori-zado que os comícios das campanhas podem ser realiza-dos até às 2h (hoje eles têm que ser encerrados às 24h).

Jânio de Freitas em artigo muito anterior a essas propostas, mas já prevendo o que ocorreria no Congresso, afirmou que “o essencial está fora”. E, de fato, observada às propostas apresentadas pela Câmara ao PL do Senado, questões essenciais ficaram de fora, inclusive várias pro-postas da Comissão Especial de Reforma Política do próprio Senado, assim como da Câ-mara dos Deputados (a mais recente teve como relator o deputado Henrique Fontana (PT/RS).

Entre questões importan-tes que Jânio de Freitas chamou à atenção, estão a que ele chamou de “arrastão” e a outra relativa

às doações empresariais. Am-bas, fora da minirreforma elei-toral. Em relação ao “arrastão” a referência são as muitas dis-torções do sistema eleitoral, entre outras, a que permite que uma alta quantidade de votos de um candidato com-pleta a votação insuficiente de outros (houve casos de depu-tados eleitos com apenas 200 votos, beneficiado por uma co-ligação que teve à frente um "puxador de votos") distorções, claro, que também ocorrem nas Câmaras Municipais, ou seja, em função da coligações, pode-se eleger candidatos (inclusive de partidos que o

eleitor não vota) com menos votos do que outros que não foram eleitos, tornando assim ilegítima a representação par-lamentar. No caso da Câmara dos deputados, para exemplifi-car, apenas 36 deputados fo-ram eleitos em 2010 com vota-ção própria. Os demais se be-neficiaram das "sobras" de vo-tos nos respectivos partidos ou de coligações com outros parti-dos. Portanto, sem haver proi-bição das coligações, as dis-torções continuarão. Para ele: “As coligações para absorção de um tempinho a mais na pro-paganda eleitoral dita gratuita, em TV e rádio, resultam em corrupção maior a cada elei-ção. Tornaram-se comuns as coligações para que dirigentes de partidos pequenos vendam o tempo de propaganda que caberia à sua sigla”.

Quanto às doações empresariais - grande fonte de corrupção - são usadas “para encobrir identidades e com is-so, dificultar possíveis compro-metimentos e responsabiliza-ções legais de doadores-compradores. O financiamento das campanhas (...) precisa ser claro e objeto de fiscaliza-ção rigorosa em mão dupla: da Justiça Eleitoral, na contabili-dade do candidato ou partido, e da Receita Federal na parte doadora. Toda obscuridade eleitoral deslegitima o proces-so democrático e amplia a cor-rupção” -.

Há muitas outras pro-postas relevantes que ficaram de fora. Como disse Jânio de Freitas: “Reforma política que não contribui para a moraliza-ção e a representação legítima não é reforma. Com sorte, não é apenas embuste”. É o que temos.

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P or meio

de pes-

quisas

acadêmi-

cas, tenho persegui-

do a ideia de que as

transformações ur-

banas

da capi-

tal do

Estado

do Rio

Grande

do Nor-

te sem-

pre se

deram

em ra-

zão do

interes-

se de

suas

elites e

em de-

trimento da real ne-

cessidade da cidade.

Muitas vezes, seus

discursos são con-

trários às soluções

racionais e à cons-

trução de um futuro

condizente com a

qualidade do espaço

urbano.

A última pes-

quisa que desenvol-

vi foi realizada no

período da Segunda

Guerra Mundial.

Nesse, as transfor-

mações do espaço

de Natal estiveram

contidas nos discur-

sos das suas elites. E

sua confirmação po-

de ser constatada

nos escritos do Jor-

nal A República, on-

de pude compreen-

der as revelações de

experiências que

continham significa-

dos ou compreen-

sões de um seleto

grupo de pessoas

que se encontrava

no centro do poder

do Estado do Rio

Grande do Norte.

Era, portanto, uma

visão de mundo das

elites que privilegia-

va a modernidade e

mostrava os desejos

de mudanças, para

as quais fizeram

concessões e adap-

taram as circunstân-

cias de forma que

pudessem atender

sempre a seus pró-

prios interesses.

Foi a partir

dessa leitura históri-

ca que se tornou

possível verificar

que a configuração

urbana atual de Na-

tal, assim como

apreender os ele-

mentos que estão

incutidos nos dis-

cursos dos que li-

dam com o turismo

contemporâneo.

Durante a Se-

gunda Guerra Mun-

dial, período em que

serviu de base mili-

tar para as forças

armadas brasileiras

e norte-americanas,

a cidade do Natal

teve seu eixo de

crescimento muda-

do, deslocando-se

para o sul, na dire-

ção do município de

Parnamirim, onde

estavam situadas as

Bases Aéreasi. Teve

ainda consolidada

sua divisão sócio-

espacialii, intensifi-

cado seu processo

de produção e ocu-

pação do espaço por

meio do capital co-

mercial e imobiliá-

rioiii, assim como,

posteriormente,

preservada grandes

áreas militares no

seu espaço intraur-

bano – Quartéis,

Base Naval e vilas

militares.

A HISTÓRIA E AS TRANSFORMAÇÕES URBANAS

NO CONTEXTO DA MODERNIDADE DE NATAL,

CAPITAL DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE .

* Giovana Paiva de Oliveira, arquiteta e urbanis-

ta, professora do Departamento l de Arquitetura e

Coordenadora do Curso de Arquitetura e Urbanismo

da UFRN. Pesquisadora na área de História da Cida-

de e do Urbanismo, autora do livro De cidade à Ci-

dade e Natal em Guerra (no prelo), ambos tratam

sobre o ideal de modernidade e progresso que pro-

movem transformações no espaço urbano.

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A população local viveu a

Segunda Guerra Mundial, co-

mo expectadora e participan-

te, guardou as suas marcas até

os dias atuais e manteve suas

marcas nas palavras que fa-

lam até hoje que, embora te-

nham perdido seus significa-

dos originais, continuam no-

meando lugares – “Rampa”,

“Black-Out” e “Trampolim” –

e revelando-se nos elementos

da paisagem que permanece-

ram – muros que delimitam

áreas militares, ônibus inter-

municipais denominados

“Parnamirim Field” e

“Trampolim da Vitó-

ria” (SILVA, 1998)iv. Apesar

de tudo, persiste o desconhe-

cimento a respeito da dimen-

são e do significado do mo-

mento histórico mundial no

tracejar das linhas que deline-

aram o presente desta cidade

e de sua população.

É fato que as pesquisas

mostram que desde meados

do século XIX, a relação das

elites com as mudanças pro-

movidas no espaço estiveram

justificados pela adoção do

“novo” e da novidade que,

muitas vezes, negou e destruiu

o passado. Esse desenraiza-

mento do passado, que tam-

bém é percebido em outras

cidades e sociedades capitalis-

tas, em Natal pode ser obser-

vado como uma das conse-

quências de ações que tem a

pretensão de antecipar sua

modernização e acelerar sua

transformação, independente

da realidade local, o que fragi-

lizou a identidade local.

No final do século XIX e

início do século XX, observá-

vamos que os grupos que geri-

ram a capital do Rio Grande

do Norte estiveram atentos ao

que acontecia nas principais

cidades europeias, particular-

mente acompanhando a evo-

lução dos modelos urbanísti-

cos e as inovações tecnológi-

cas. E essa sintonia pode ser

identificada em vários mo-

mentos: em 1901 na proposi-

ção do Bairro da Cidade Nova

(atuais Petrópolis e Tirol); na

incorporação das propostas

do zoning no Plano de Siste-

matização da década de 20; e

na consolidação do sanitaris-

mo promovido pelo Plano Ge-

ral de Obras em 1935. Foram

ações que embora possuam

porte relevante, não estimula-

ram o crescimento da cidade e

não interferiram no fato de

que em 1939, quando a Guer-

ra se inicia, Natal ainda pos-

suísse apenas duas áreas den-

samente ocupadas, embora

tivesse seis bairros oficial-

mente reconhecidos e peque-

nas aglomerações periféricas.

Até a chegada dos milita-

res, a cidade possuía uma di-

nâmica urbana lenta e previsí-

vel, uma economia sustentada

principalmente por salários de

funcionários públicos e pelo

pequeno comércio varejista,

pequena indústria pulveriza-

da, assim como as atividades

voltadas para os serviços ur-

banos e era o centro político-

administrativo do Estado do

Rio Grande do Norte.

A conjuntura da Segun-

da Guerra Mundial, enfim,

determinou uma ruptura no

seu processo histórico de es-

truturação urbana e no plano

institucional e político provo-

cou a necessidade de um rear-

ranjo na organização social,

política e econômica estadual.

Segundo estimativa de Câma-

ra Cascudov (1999, p.401)vi,

“entre 1942 e 1944, a popula-

ção de Natal conviveu com

cerca de 10 a 15 mil militares

dos Estados Unidos (sem con-

tar os soldados brasileiros),

quando seu crescimento ante-

rior só lhe permitiu ter cerca

de 50 mil habitantes”. Ou se-

ja, em torno de 20% da popu-

lação residente na cidade, nes-

se período, era formada por

estrangeiros, o que tornou es-

sa experiência muito específi-

ca se comparada com as de-

mais cidades brasileiras que

abrigaram bases e outras ati-

vidades militares na Segunda

Guerra Mundial. Repentina-

mente, teve potencializadas as

características de centro mili-

tar e estratégico e a perspecti-

va comercial e de entreteni-

mentos, o que, ao contrário

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de momentos anteri-

ores, não depende-

ram da iniciativa das

elites locais.

Nesse contexto

de revelações, acre-

ditamos ser necessá-

rio aprimorar o co-

nhecimento e alicer-

çar práticas sobre o

estudo do espaço ur-

bano, assim como

orientar ações que

possam interferir na

construção de mais

histórias de cidades.

De qualquer forma,

sabemos que é preci-

so que se faça mais

pesquisas, pois os

aspectos que cons-

troem a cultura de

um povo, embora

não estejam eviden-

tes, estão materiali-

zadas no espaço co-

mo rastros das trans-

formações e adequa-

ções, motivações e

interesses que esti-

veram intricados em

cada período. E que

venham outras pes-

quisas e revelações,

pois a história se faz

e refaz a cada mo-

mento e a cada nova

descoberta.

I Anteriormente o eixo de crescimento da Cidade do Natal tinha a direção leste, no

sentido do bairro do Alecrim e no sentido da antiga Estrada de Macaíba.

ii Até os dias atuais, as elites dirigentes privilegiam a ocupação das regiões leste e sul

da cidade, que compreende os bairros de Petrópolis, Tirol e os demais que espacial-mente compõem a Zona Leste e Sul de Natal.

iii Este tema foi tratado detidamente por FERREIRA, Angela L. De la producción del

espacio urbano a la creación de territorios en la ciudad: un estudio sobre la consti-tución de lo urbano en Natal, Brasil. 1996. Tese (Doutorado em Geografia Humana) – Universidad de Barcelona, Barcelona, Espanha, 1996.

iv

SILVA, Josimey Costa da. A palavra sobreposta: imagens contemporâneas da Se-gunda Guerra Mundial. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 1998.

v Câmara Cascudo nasceu em Natal em 30/12/1898. Foi professor, jornalista, consul-

tor jurídico do Estado, escritor, historiador, folclorista, etnógrafo, memorialista e orador de recursos inesgotáveis. Exerceu a profissão de jornalismo principalmente na impren-sa local. Sua bibliografia contabiliza mais de uma centena de obras distribuídas em diversos campos do conhecimento, principalmente do folclore. Morreu em Natal, em julho de 1986, porém continua influenciando a produção literária do país, assim como a construção de documentos governamentais e acadêmicos sobre Natal e sobre o Rio Grande do Norte. In: CARDOSO, Rejane (Coord.). Op. Cit.

vii

CASCUDO, Luís da C. História da Cidade do Natal: Prefeitura do Município de Natal, 1947. 3. ed. Natal: RN Econômico, 1999.

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A deputada federal Fátima Bezerra (PT) fez pronunciamento na tribuna da Câmara dos Deputados sobre o pedido de afasta-mento da governadora do RN, Rosalba Ciarlini (DEM). No

discurso, Fátima Bezerra considerou que a decisão do TRE-RN foi correta diante das graves acusações de uso da máquina pública as-sociado ao abuso do poder econômico por parte da governadora do DEM na campanha eleitoral de Mossoró, em 2012.

Discurso na íntegra

Vivemos no Rio Grande do Norte um momento de extrema gra-vidade. Podemos caracterizá-lo como uma situação de crise de go-verno. A primeira evidência é a absoluta falência dos serviços públi-cos, notadamente na saúde e segurança, como resultado do desastre na gestão política do governo do DEM que levou a insolvência das finanças públicas.

Outra face dessa crise é o descumprimento de legislações rela-tivas a planos de cargos, carreiras e salários de várias categorias de servidores públicos, o que tem provocado embates permanentes en-tre os trabalhadores e o governo Rosalba, precarizando ainda a oferta de serviços públicos à população, principalmente os que mais preci-sam da ação do Estado. Essa afronta à lei chegou a tal nível que re-sultaram em representação junto a Assembleia Legislativa do RN de pedido de cassação da governadora Rosalba, do DEM.

Para tornar o quadro ainda mais grave há uma crise institucional que vem se arrastando com embates do Poder Executivo com a Assembleia Legislativa e o poder Judiciário, ocasionando um ambiente que compromete a necessária harmonia entre os poderes e profunda a perda de condições para governabilidade, que já são terríveis em decorrência de in-competência administrativa e política com a qual somos obrigados a conviver desde o início de 2011, quando o RN teve a infelicidade de passar a ser governado pelo DEM. Alias, o jeito DEM de governar que já produziu escândalos como o do governador Arruda, do Distrito Federal, e o afasta-mento da prefeita de Mossoró, pela 11ª vez, é o maior desastre da história política do nosso esta-do.

Como se não bastassem esses fatos de enormes dimensões e implicações, a decisão do Tribunal Regional Eleitoral TRE-RN desse último dia 10/12 declarando inelegível a governadora Rosalba e determinando seu afastamento do cargo, torna ainda mais dramático o que já estava crítico.

As acusações são graves e a decisão por 5X1 parecem dar uma clara indicação da consci-ência do que consta nos autos. Na verdade, a ostensividade da presença da governadora Rosalba na campanha eleitoral de Mossoró, em 2012, com o uso da máquina pública associado ao abuso do poder econômico levou o TRE-RN, corretamente, a tomar essa posição.

Deputada fede-ral Fátima Be-zerra.

É pedagoga e deputada Fede-ral pelo PT do RN. Está em seu 3o Manda-to.

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Omar Souki afirma que com as chaves da iniciativa você abre as portas da

proatividade e da perspectiva, mergulhando de cabeça no mundo da ação

maciça, contínua e congruente.

Chave 1 – Eu faço acontecer – Você já percebeu o quanto gostamos de pes-

soas vencedoras? Vejam o que podemos aprender com o Jesse Owens, cor-

redor norte-americano e ganhador de 04 medalhas de ouro nas Olimpíadas

de Berlim em 1936. Deixou seu nome registrado para sempre como símbolo

de resistência contra ideias contrárias.

Chave 2 – Eu assumo responsabilidade – Não satisfeito com a sua ótima per-

formance em impedir o time de tomar gols, Rogério Ceni, goleiro do São Pau-

lo Futebol Clube, assumiu a responsabilidade por seus atos e tornou-se um

artilheiro. Além disso, é hoje o maior goleiro artilheiro do mundo.

Chave 3 – Eu vejo as coisas sob várias perspectivas – Um dia chegaram para

Thomas Edison, o grande inventor e lhe disseram que uma de suas fábricas

tinha acabado de pegar fogo. E ele falou que o acidente representava uma

oportunidade para construir uma outra fábrica ainda melhor.

Chave 4 – Tudo que me acontece me beneficia – Imagine o que é ficar preso,

isolado em uma cela. Nelson Mandela saiu de uma prisão, onde esteve por

quase 28 anos e foi direto para a presidência da África do Sul.

Chave 5 – Para mim não existe fracasso, apenas resultado – Um acidente

para muitos poderia ser o fim de uma vida e carreira, mas não para Lars Gra-

el. Esse esportista mostrou toda a sua força de superação e não enxergou

nisso um fracasso, mas sim um recomeço.

Agora pare e reflita, pois é hora de cultivar a ousadia e preparar-se para as

mudanças com a autoestima elevada. Acredite no seu potencial e transforme

as adversidades em oportunidades de negócios. Tome a iniciativa, abuse da

criatividade e da força interior e aja, agora mesmo com a utilização das 5 cha-

ves da iniciativa.

*Edivan Silva é pales-

trante e consultor. Autor

dos livros “O PODER DA INI-

CIATIVA”; “MOTIVACAO – A

mais forte aliada para en-

frentar desafios” e “O PO-

DER DO MARKETING DE

ATITUDE”. e-mail: conta-

[email protected]

www.edivansilva.com.br

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No dia 13 de dezembro, uma data

para entrar para a história, instalou-se a

Comissão Municipal da Memória, Verdade

e Justiça. A comissão será presidida por

Horácio de Paiva Oliveira. Horácio tem

em seu currículo uma história de lutas, de

dedicação às causas sindicais, políticas e

foi outrora presidente da Comissão Justi-

ça e Paz.

A Comissão tem ainda nomes de

inserção e participação em diversos seto-

res da nossa sociedade, tais como Geor-

ge Câmara, Maria Rizolete Fernandes,

Afonso Laurentino Ramos, Roberto Bran-

dão Furtado, Jeane Fialho Canuto e Fábio

Dantas Capistrano.

Com mandato de um ano a Comis-

são estará investigando arbítrios cometi-

dos desde as décadas de 40 até os anos

de 1988, período este que vai desde o Es-

tado Novo até o Golpe Militar de 1964.

Horácio diz ainda que a Comissão

terá como base as orientações do Comis-

são Nacional da Verdade, que foi criada

pela Lei 12.528/2011.

Fica assim então formada a Comis-

são:

COMISSÃO MUNICIPAL DA MEMÓ-

RIA, VERDADE E JUSTIÇA - NA-

TAL/RN

Criação (art. 1°, caput):

Lei n° 6393, de 5 de julho de 2013

(publicada no Diário Oficial do Município,

edição de 06/07/2013).

Finalidade (art. 1º, caput):

Examinar e esclarecer as graves violações

de direitos humanos praticadas no período

fixado no art. 8° do Ato das Disposições

Constitucionais Transitórias da Constitui-

ção Federal (18/09/1946 - 05/10/1988), a

fim de efetivar o direito à memória, à ver-

dade, à justiça e a reconstituição histórica

que envolveu cidadãos natalenses

INTEGRANTES da Comissão Muni-

cipal da Memória, Verdade e Justiça

Nomes designados (Portaria n°

079/2013-GP, de 30/09/2013, publicada

em 02/10/2013):

HORÁCIO DE PAIVA OLIVEIRA

MARIA RIZOLETE FERNANDES

JEANE FIALHO CANUTO

LUCIANO FÁBIO DANTAS CAPIS-

TRANO

ROBERTO BRANDÃO FURTADO

AFONSO LAURENTINO RAMOS

GEORGE CÂMARA

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N os últi-

mos tem-

pos tenho

me preo-

cupado com questões

morais, o que tem dei-

xado alguns amigos

mais chegados um tan-

to desconfiados. Diz-

se que uma pessoa de

espírito libertário na

juventude acaba, com

o passar dos anos, des-

cambando para algu-

ma forma de moralis-

mo. Obviamente quem

diz isso vê nesse mo-

vimento uma caminha-

da em direção a certa

decadência. Nesse ca-

so, o incipiente mora-

lista é alguém que,

cansando-se da luta,

acabou por juntar-se

ao inimigo contra o

qual não teve forças

para combater. Assim,

passa a integrar o sis-

tema, a ser mais uma

peça a dar vida à en-

grenagem social. Mui-

tas das vezes converte-

se em um reacionário,

conservador, funda-

mentalista, elitista,

radical de direita, por-

co capitalista, filhote

da ditadura, fascista e

muitos outros adjeti-

vos simpáticos por

meio dos quais a es-

querda se refere aos

seus adversários. Em

uma época na qual a

liberdade irrestrita é o

bem supremo, na qual

os ideais mais desejá-

veis podem ser tradu-

zidos por meio do slo-

gan de maio de 1968,

“é proibido proibir”,

quem reza por outra

cartilha só pode ser

alguém com o sádico

desejo de restringir a

liberdade humana. Is-

so fica muito mais evi-

denciado hoje devido

ao predomínio das

concepções da Escola

de Frankfurt, que, des-

construindo os para-

digmas da tradição do

racionalismo moderno,

interditou qualquer

pretensão a uma ver-

dade objetiva, o que

resultou, no campo da

moralidade, no subje-

tivismo ético. Eviden-

temente, tal perspecti-

va implica ampla li-

berdade moral, uma

vez que nega a exis-

tência de valores mo-

rais válidos para todos

os homens, indepen-

dentemente das con-

tingências temporais e

espaciais. Não obstan-

te isso, acostumei-me

a ouvir (e, no passado,

a fazer) críticas à su-

posta motivação moral

do religioso. Seja ori-

ginária de um materia-

lista de viés iluminista

(aquele que acredita

na verdade científica),

seja de um adepto de

uma cosmovisão pós-

moderna (aquele que

acredita em verdades

construídas), a crítica

que se faz é que o reli-

gioso age moralmente

por medo de ir para o

inferno, ou, na melhor

das hipóteses, alme-

jando a recompensa

celestial. O ateu ou o

agnóstico, ao contrá-

rio, preferem fazer o

certo porque é o certo

e nisso reside toda sua

superioridade em rela-

ção aos que procuram

barganhar com Deus.

O caro leitor percebeu

a contradição?

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Ora, é impossível ser

bom sem Deus. E se a bonda-

de existe, ela se constitui uma

evidência da existência de

Deus. Para entender isso, su-

ponhamos que seja verdade

que valores morais objetivos

inexistam, sendo toda a mora-

lidade um construto sócio-

histórico de uma determinada

comunidade humana. Se as-

sim fosse, como seria possível

“fazer o certo porque é cer-

to”? O problema aqui seria

explicar o significado da pala-

vra certo. Seria certo, por

exemplo, submeter animais a

testes de laboratório? Alguns

diriam: “sim, trata-se de um

mal necessário para o avanço

da ciência farmacêutica”; por

outro lado, outros diriam:

“não temos direito de dispor

assim da vida dos animais”.

Qual é o certo a fazer nesse

caso? Outro exemplo: seria

certo que a mulher tivesse di-

reito de escolha em relação ao

aborto? As opiniões também

se dividem nesse caso: há os

defensores da autonomia da

mulher sobre seu corpo e os

que defendem o direito da vi-

da intra-uterina. Quem está

certo? Mais um: é certo matar

em nome de uma causa no-

bre? Há quem defenda isso,

apesar de a maioria parecer

não concordar com tal ideia.

Figuras históricas como Ro-

bespierre, Stálin e Hitler pen-

saram assim. Estariam eles

errados? Mas como é possível

saber isso? Ou seja, se a mo-

ralidade não tem qualquer va-

lor objetivo, não há bases so-

bre as quais se possa saber o

que, afinal, corresponde ao

certo. É impossível fazer o

certo sem Deus.

Alguns ateus não com-

preendem bem o que eu afir-

mo aqui. Quando digo que é

impossível fazer o certo sem

Deus, não estou dizendo que é

impossível fazer o certo se

você não acredita em Deus.

Portanto, um ateu pode ser

uma pessoa moralmente cor-

reta, desde que esteja equivo-

cado quanto ao seu ateísmo.

Mas, se for mesmo o caso de

Deus não existir, então ele não

poderá fazer o certo, haja vista

não existir nada a que se possa

chamar de “certo”. Qualquer

escolha moral que faça será

apenas uma escolha entre tan-

tas possíveis, sem nenhuma

significação especial. Na ver-

dade, nem se trata de escolha

moral, já que a palavra moral

nada representa nesse contex-

to. Se, por outro lado, Deus

existir, tanto o crente quanto o

ateu poderão escolher “fazer o

certo porque é certo”.

Compreender isso foi o

bastante para me reaproximar

de uma concepção teísta. Isso

porque nunca deixei de acre-

ditar no certo e a desejá-lo,

justamente por saber-me erra-

do. A ideia de certo e errado é

tão intuitiva que me parece

impossível negar seu caráter

de verdade. Não entendo, por

exemplo, como torturar crian-

ças pelo simples prazer de tor-

turá-las poderia ser moral-

mente indiferente. Ou como

dar abrigo e alimento a um

necessitado poderia não ser

algo objetivamente bom. Mas

o que não entendo seria verda-

de se o ateu tivesse razão.

Com tais considera-

ções, começo a explicar ao

leitor porque voltei a acreditar

em Deus. Digo começo a ex-

plicar porque essa conversa

deve ser longa e não tenho

pretensão de que você que me

lê agora compreenda a dimen-

são do que estou dizendo em

tão pouco tempo. É preciso

aqui muita reflexão. É preciso

mergulhar no problema. No

entanto, tenho uma pretensão

mais modesta: espero que o

distinto leitor, neste final de

ano, quando o clima de frater-

nidade paira no ar, deseje fa-

zer o que é certo, e chegue a

fazê-lo, sabendo que é certo.

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S e alguém pedisse pra você

desenhar separadamente

um homem e uma mulher,

como seria seu desenho?

Eu presumo que provavelmente muitos re-

presentariam o homem e a mulher com a

imagem de um ser humano com cabeça,

tronco e membros como qualquer outro ser

humano. Mas o que marcaria a diferença

entre eles?

Na minha infância, lembro-me que na

escola eu sempre fazia desenhos de homens

e mulheres. O que mais eu usava para apon-

tar a diferença de gênero entre as imagens

era desenhar formas masculinas ou femini-

nas. Os homens genericamente sempre ti-

nham os ombros largos e eram mais muscu-

losos. Entretanto, as mulheres tinham for-

mas mais arredondadas e seios bem maiores.

Em último caso, para dar sentido e não res-

tar dúvidas sobre quem é quem, eu atribuía

aos desenhos órgãos sexuais masculinos ou

femininos. Os homens sempre tinham pênis

e as mulheres sempre possuíam alguma coi-

sa que lembrasse a vagina. Só me dei conta

muitos anos depois que desde pequenos,

nós, seres humanos, somos disciplinados a

conceber a imagem de um homem ou mu-

lher a partir de um conceito biológico/

genético. Também só percebi muito tempo

depois da minha infância, os problemas de

tentar dar inteligibilidade a minha própria

vida e a vida dos outros ao meu redor a par-

tir de um conceito biológico/genético. Se-

gundo esse conceito, os seres humanos já

nascem determinados como homens ou mu-

lheres porque nasceram respectivamente

com pênis ou vagina.

Mas será que só pode ser homem

quem tem um pênis? E só pode ser mulher

quem possui uma vagina no corpo? Será que

o pênis ou a vagina atribui mesmo algum

sentido determinante ao modo como o ser

humano vai se comportar em sociedade?

Para responder tais perguntas, vamos

pensar na imagem de um bebê recém-

nascido, ou seja, um ser humano com cabe-

ça, tronco, membros e uma genitália. O que

um bebê sabe dele mesmo? Quase nada. Um

bebê sabe apenas respirar, mamar, chorar e

mexer-se involuntariamente. Um bebê re-

cém-nascido não sabe se é homem ou mu-

lher. Quem vai dizer o que ele é e educa-lo

como tal são os pais, a escola, a mídia e a

sociedade. Lembrando as palavras de Simo-

ne de Beauvoir, “ninguém nasce mulher,

torna-se mulher”. Seguindo a mesma lógica,

também poderíamos dizer que ninguém nas-

ce homem, torna-se homem ou até mesmo:

ninguém nasce nada, torna-se alguma coisa.

Não é a genitália que permite ao bebê ser

reconhecido como homem ou mulher, mas

são os significados que essa genitália

oferece que permite ao mundo (familiares,

instituições e a sociedade) criar expectativas

e impor investimentos sobre a construção do

gênero de uma criança. A construção de um

gênero de uma criança começa antes mes-

mo do seu nascimento. Segundo a

socióloga Berenice Bento, os investimen-

tos da família sobre a construção do gê-

nero dos/as filhos/as começam

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quando o médico anuncia: “é um menino!”

ou “é uma menina!”, a partir daí se inicia uma sé-

rie de expectativas, suposições e aquisições mate-

riais e simbólicas, como por exemplo, a escolha

das roupas do bebê, dos brinquedos e a escolha do

nome da criança. Esse conjunto de práticas faz

com que todos os códigos que marcam a constru-

ção do gênero num corpo recém-nascido sejam

vistos e socialmente repetidos como naturais.

Esse determinismo biológico encontra refle-

xos na moral e acaba resultando numa série de

preceitos e mecanismos de controle que limita a

liberdade humana. Na coluna vertebral da nossa

sociedade se encontra um sistema moral que dita a

linearidade das condutas humanas vinculando di-

retamente comportamento social e auto-identidade

com a genitália do indivíduo. Michael Warner no-

meou esse sistema como “heteronormatividade”.

A filósofa americana Judith Buler foi uma das que

condenou a heteronormatividade, ou seja, essa

linearidade baseada na heterossexualidade que

determina que se alguém nasce com um pênis, de-

ve ser reconhecido como um homem e sentir atra-

ção pelo sexo oposto ou se nascer com uma vagi-

na, deve ser reconhecida como uma mulher e se

relacionar sexualmente somente com homens. Es-

sa lei da coerência heterossexual resiste nos espa-

ços de socialização e de controle e marca uma or-

dem social vigente que ao mesmo tempo em que

diferencia o hetero/homo, naturaliza a heterosse-

xualidade e torna-a compulsória, dando com isso,

ininteligibilidade e caráter de anormalidade a ex-

periência gay, lésbica, travesti e transexual.

A heteronormatividade também confirma o

gênero como uma categoria performática porque

se tudo fosse determinado pela natureza, então pra

quê seria necessário tantos investimentos culturais

na construção dos gêneros dos seres humanos. Por

fim, talvez devêssemos pensar um pouco mais no

trecho da música de Caetano Veloso: “de perto

ninguém é normal”. Talvez devêssemos refletir

um pouco mais até tentarmos chegar à conclusão

que não é um órgão genital que pode determinar a

nossa vida e que existem várias maneiras de ser

homem e de ser mulher e que todas essas maneiras

são igualmente legítimas porque ser homem ou

mulher é uma questão de performance.

Esse determinismo biológico encon-

tra reflexos na moral e acaba resul-

tando numa série de preceitos e me-

canismos de controle que limita a

liberdade humana. Na coluna verte-

bral da nossa sociedade se encon-

tra um sistema moral que dita a li-

nearidade das condutas humanas

vinculando diretamente comporta-

mento social e auto-identidade com

a genitália do indivíduo. Michael

Warner nomeou esse sistema como

“heteronormatividade”.

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I. Introdução

A qui investiga-

mos o conceito

de imagem co-

mo elemento singular que

em sua coletividade sim-

boliza os aspectos consti-

tutivos do imaginário em

suas diversas manifesta-

ções: social, política, pic-

tórica, poética e corporal.

Nossa abordagem enfati-

zará a problemática filosó-

fica da imagem e sua rela-

ção com o corpo físico e a

consciência a partir do

pensamento de Jean-Paul

Sartre.

Para fundamentar-

mos uma concepção acer-

ca do que seja o imaginá-

rio a investigação sobre a

imagem e a consciência

imaginante se faz necessá-

ria. Na experiência dese-

jante da consciência a ima-

gem se forma em sua rela-

ção com o objeto transcen-

dente. O imaginário forma

-se como universo da irre-

alidade de desejos, símbo-

los, rituais míticos, sonhos

e ficções e é movido pela

liberdade de uma consci-

ência imaginante para sua

possível efetivação na rea-

lidade.

II. Imagem e Imaginário

O conceito etimoló-

gico de imagem vem do

latim imago e designa re-

presentação visual de um

objeto. Em seus diversos

usos o conceito de imagem

tanto caracteriza reflexo

de algo em nossa mente,

representação simbólica

ou metafórica de um obje-

to, imagem artística ex-

pressa em pintura ou dese-

nho, ou ideia que nossa

consciência faz de algo

distante. Até mesmo pode-

mos falar em imagens tele-

visivas e cinematográficas

ou imagem fotográfica.

Interessa-nos aqui é

o conceito fenomenológi-

co de imagem como apare-

ce na ontologia sartreana.

A finalidade de Sartre, ao

longo de suas investiga-

ções sobre a imagem nas

grandes correntes da filo-

sofia e também da psicolo-

gia, é a trilhar um percurso

filosófico para demonstrar

uma nova teoria da ima-

gem. Em Sartre, por forte

influência do pensamento

fenomenológico de Hus-

serl, a imagem adquire um

estatuto fundado em uma

psicologia fenomenológi-

ca.

Nesta concepção de

uma ontologia fundamen-

tal da imagem o método

utilizado para atingir a

compreensão da imagem é

o da epokhé (),

redução eidética1, que é o

processo de suspender,

colocar entre parênteses, a

atitude natural, em busca

do sentido fenomenológi-

co da verdade sobre a ima-

gem como aparece

(fenômeno) à luz da cons-

ciência. Segundo Sartre,

para uma diferente investi-

gação sobre a imagem, na

contraposição às grandes

correntes da metafísica

tradicional, “deve-se pro-

curar constituir uma eidé-

tica da imagem, isto é, fi-

xar e descrever a essência

dessa estrutura psicológica

tal qual aparece à intuição

reflexiva.” 2

* Francisco Ra-

mos Neves -

Doutorando em

filosofia (UFRN-

UFPE-UFPB) -

Mestre em Filoso-

fia (UFPB), gradu-

ado em Filosofia

(UFRN), Profes-

sor Assistente II –

UERN.

professor.ramos@

hotmail.com -

Curriculum

Lattes: http://

lattes.cnpq.br/24

46309590738693

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Sartre no diálogo com a tra-

dição das grandes correntes meta-

físicas realiza uma investigação

crítica e contesta as teses da ima-

gem enquanto coisa-em-si e en-

quanto objeto inerte no interior da

consciência desvinculado do mun-

do (psicologismo). A definição do

conceito de imagem em sua obra

sobre a “imaginação”, Sartre parte

da seguinte reflexão abaixo.

Olho esta folha branca posta sobre minha mesa; percebo sua forma, sua cor, sua posição. Essas diferentes qualidades têm características comuns: em primeiro lugar, elas se dão a meu olhar como existências, que apenas posso constatar e cujo ser não depende de forma alguma do meu capricho.3

Para definição do conceito

de imagem como objeto da cons-

ciência em uma inter-relação, Sar-

tre recorre a esta metáfora visual

acima que caracteriza a existência

física em presença e sua supressão

nadificadora como advento da

imagem. Esta imagem não é um

conteúdo inerte no interior da

consciência nem uma realidade

imaterial dissociada da mesma. A

realidade visual da coisa percebi-

da é uma exterioridade que não

depende da consciência, designa

uma presença física, que ao ser

eliminado enquanto corpo físico

atual revive em imagem, como

ausência existencial na consciên-

cia imaginante. “A imagem deixa

de ser um conteúdo psíquico; ela

não se acha na consciência a título

de elemento constituinte; mas, na

consciência de uma coisa em ima-

gem.” 4

A folha descrita acima e demais

objetos da realidade sensível “são

para mim, não são eu”, não são

manifestações dependentes de mi-

nha consciência que se presentifi-

cam no mundo; são presenças

inertes que são captadas por mi-

nha consciência. Estas existências

estão no mundo livres da determi-

nação da espontaneidade de qual-

quer consciência. Este objeto pre-

sente com a inércia de seu conteú-

do sensível tem uma existência em

si, e esta condição salvaguarda sua

autonomia e o faz independente de

minha consciência. O que difere

de minha consciência, que em sua

pura espontaneidade jamais pode-

rá ser uma coisa inerte no seu em

si, pois ela tem seu modo de ser é

um ser para si. “Existir, para ela, é

ter consciência de sua existên-

cia.”5

Porém, como surge a

imagem para a consciência? Para

Sartre a imagem surge pela inten-

ção da consciência imaginante

logo após a ausência do objeto

observado, que aparece como o

não-ser da presença. Para este en-

tendimento, Sartre enfatiza o se-

guinte aspecto: “Mas eis que, ago-

ra, desvio a cabeça. Não vejo mais

a folha de papel. Agora vejo o pa-

pel cinzento na parede. A folha

não está mais presente, não está

mais aí.”6 Ela não se aniquilou

dado a sua inércia, mas deixou de

ser em presença para mim. A sua

ausência enquanto corpo físico

não a elimina de minha consciên-

cia, ela se revela a mim enquanto

imagem. Na imagem que formo

em minha consciência tem a mes-

ma identidade de essência com a

folha de papel que minha consci-

ência captava como presença físi-

ca existente. “A folha, em minha

consciência, fora do mundo sensí-

vel, 'não existe de fato, existe em

imagem. '“ 7

Para Sartre podemos estabe-

lecera distinção entre existência

como coisa e existência como

imagem. É preciso educação da

consciência para a difícil tarefa de

apreensão da existência em ima-

gem sem confundi-la com os di-

versos modos de existência física.

“A folha em imagem e a folha em

realidade são uma única e mesma

folha em dois planos diferentes de

existência.”8 Confundir a imagem

de um objeto com outro objeto

coisificado é recair em uma meta-

física ingênua da imagem. “Essa

metafísica consiste em fazer da

imagem uma cópia da coisa, exis-

tindo ela mesma como uma coi-

sa.” 9

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A imagem enquanto coisa

permaneceria inerte para e em

minha consciência e teria uma

existência em si, aparecendo e

desaparecendo a seu próprio cri-

tério sem o crivo do para si de

minha consciência. Esta metafísi-

ca ingênua da imagem, segundo

Sartre, é construída costumeira-

mente onde se atribui à imagem

autonomia e um poder demiúrgi-

co sobre minha própria consciên-

cia. Ingenuamente nesta coisifi-

cação da imagem se compreende

em vez de uma só folha de papel

em dois planos diferentes de

existência, duas folhas, rigorosa-

mente semelhantes existindo no

mesmo plano.

Recorremos ao pensamento

de Jean-Paul Sartre pela proposta

da ontologia fenomenológica

abordar com seriedade e respeito

a importância do corpo na com-

preensão da imagem. Nesta onto-

logia o corpo presentifica o não-

ser da imagem tornando-a possí-

vel como realidade outra. “Trata-

se do deslocamento do para-si

(consciência) em direção ao em-

si (o outro). Esse deslocamento

se verifica sobretudo em função

do desejo do para-si (porque é

nada), de se tornar pleno do em-

si.” 10

Nesta ontologia fenomeno-

lógica a consciência livre situa a

imagem como seu objeto exterior

em uma situação de transcenden-

te como não-ser, o nada. A ima-

gem enquanto objeto da consci-

ência é movida por um desejo de

realidade que desencadeia sua

ação de realização do nada em

algo existente. “A imaginação,

portanto, é liberdade, o homem é

livre porque imagina. A consci-

ência imaginante é ato livre, cria-

dor e não está ligada à vontade

porque está vinculada ao dese-

jo.”11

A vinculação da consciên-

cia imaginante à possibilidade de

realização do imaginário caracte-

riza a imagem como momento de

um ato mágico. A vida imaginá-

ria da consciência, na ontologia

fenomenológica sartreana, do seu

universo irreal pode, pelo desejo,

transformar-se em ação presenti-

ficadora do objeto desejado.

“Todo ato mágico é um ato desti-

nado a de uma certa maneira pro-

duzir um encantamento; ele é co-

mo que um encanto destinado a

fazer aparecer um objeto do dese-

jo.”12 Podemos estabelecer pro-

jetos existenciais futuros a partir

desta compreensão e estes proje-

tos só são possíveis se a imagem

deste ainda-não-ser em minha

consciência existir. Ou seja, “essa

relação dinâmica que o imaginá-

rio exerce, de maneira mágica,”

13 é o móbil que desencadeia no

corpo a ação rumo ao vir-a-ser

outro.

III. A educação física do corpo

e sua relação com o imaginário.

A imagem do corpo que-

brando limites é um outro corpo

em uma outra realidade que se

torna possível pela consciência

imaginante. O desejo movimenta

as ações do corpo para atingir

suas metas e até mesmo superá-

las, fazendo da imagem como

não-ser a um ser outro para si. A

educação física do corpo aprimo-

rada pela consciência de um cor-

po outro é capaz de superar limi-

tes. O corpo natural completa-se

com as imagens que a consciên-

cia tem de si e outro corpo toma

seu lugar como imaginado. A

imaginação da meta desejada mo-

vimenta o corpo para atingí-la e

tornar-se outro corpo como ima-

ginado. A imagem-meta é objeto

da consciência desejante e situa-

se como exterioridade que se di-

rige a esta pela intencionalidade.

A educação corporal pelos exer-

cícios expõe fenomenologica-

mente a intenção da consciência

na manifestação do seu desejo de

ser outro. Desta forma, a consci-

ência imaginante movimenta-se

intencionalmente em direção a

outro corpo físico, com outro es-

paço e tempo, tornando possível

a realização do não-ser da ima-

gem meta em ação.

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O corpo imaginado e os

desafios imaginados no esporte

não são realidades perceptíveis

materialmente, fazem parte do

nada, pois, constituem o objeto-

imaginado possível para a cons-

ciência imaginante, que movida

pelo desejo de realizá-los supera

limites e quebra fronteiras, transi-

tando do não-ser ao ser da reali-

dade.

Os recordes são quebrados

constantemente e questiona-se

qual será o limite fronteiriço en-

tre o a realidade do máximo pos-

sível e o imaginado além disto.

As novas técnicas, exercícios fí-

sicos e os recursos à biotecnolo-

gia, sem levar em conta os artifí-

cios ilícitos, para o imaginário do

esporte ético, como o doping e

estimulação físico-química do

corpo não bastam para a imagem-

meta ser atingida. A consciência

intencionalmente se dirige ao

corpo físico formando a imagem

para si dos desafios que testam

seus limites. A motivação de po-

der realizar as metas que esbelece

para o corpo no esporte e nos de-

safios a serem quebrados consti-

tui o móbil da consciência que a

direciona para a realização do seu

desejo imaginado, retirando-lhe

da condição do nada, o ainda não

existente, para o ser existente.

Não há ato sem motivo (móbil),

nem fenômeno sem causa que o

produza. O móbil da consciência

imaginante nega a impossibilida-

de inerte do ainda-não-ser. “O

móbil só pode ser compreendido

pelo fim, ou seja, pelo não-

existente; portanto, o móbil é, em

si mesmo, uma negatividade.” 15

A impossível e inatingível

radicalidade da aventura para o

corpo, na imaginação não existe.

A ilimitada e irreal aventura para

a consciência, no imaginário per-

ceptivo do corpo não existe. A

consciência da aventura dos es-

portes não existe isolada da maté-

ria corporal do esporte. A inten-

ção da imagem em síntese com a

intenção da percepção fundamen-

ta os limites e fronteiras que se

quebram nesta interação: imagem

-meta e meta imaginada.

A consciência imaginante é

livre do próprio objeto para signi-

ficá-lo imageticamente. Há uma

intenção mental que caracteriza a

imagem enquanto realidade pre-

sentificada do ausente. Neste ato

noético,16 podemos distinguir

duas consciências imaginantes,

duas “Erlebnisse intencionais”,

percepção e imagem, que se dife-

rem por suas intenções. Segundo

Sartre, a distinção entre a inten-

ção da percepção e a intenção da

imagem reside na essência de sua

estrutura formativa. A intenção

da imagem dirige-se aos objetos

da consciência como imagem

mental. E a intenção da percep-

ção se dirige aos objetos da reali-

dade percebida. A intenção da

percepção nutre e preenche o va-

zio da imagem intencional, mes-

mo que esta possa existir sem

referência a um objeto real e sen-

sível.

O ato noético que marca a

superação de limites e a conquis-

ta de vitórias que só existiam em

imagem, como um nada para a

realidade presente, é produto da

consciência intencionalmente

desejante. O ato noético só existe

preconizado pela consciência in-

tencional. Sartre explica isto ci-

tando a concepção de um algo

novo , como a cidade de Cons-

tantinopla, cidade cristã em con-

Agir é modificar a figura do mun-

do, é dispor meios com vistas a

um fim, é produzir um complexo

instrumental e organizado de tal

ordem que, por uma série de en-

cadeamentos e conexões, a modi-

ficação efetuada em um dos elos

acarrete modificações em toda

série e, para finalizar, produza um

resultado previsto (...) convém

observar, antes de tudo, que uma

ação é por princípio intencional.

(...) A adequação do resultado à

intenção é aqui suficiente para

que possamos falar de ação. 14

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traposição à cidade pagã de Ro-

ma.17 Este algo novo é um possí-

vel desejado e não realizado. Um

puro estado de coisas ideal como

puro nada presente, ruptura com

um presente que não me motiva

por si mesmo para conceber um

ser outro como puro possível,

presentificado como certo nada,

que ao nadificá-lo faz presente o

ausente imaginado.

Em referência a Husserl, Sartre

faz uma distinção entre intenção

imaginante da consciência e uma

hylê (corporeidade física) que a

intenção tem como finalidade

animar, atribuir significação ima-

gética. A hylê, mesmo continuan-

do sendo subjetiva, é, ao mesmo

tempo, “objeto da imagem, desta-

cado do puro 'conteúdo', situa-se

fora da consciência como alguma

coisa radicalmente diferente.” 18

Podemos falar mesmo em

uma consciência noética que ani-

ma o corpo conduzindo-o aos

seus desafios e livremente a 'bel-

prazer' animar a hylê, a matéria

impressional, como percepção ou

imagem qualquer. O 'Centauro

imaginado', é também o noema

de uma consciência noética ple-

na, realizável visto que a imagem

é consciência de algo. Desta for-

ma o corpo imaginado é consci-

ência corporal e intencionalidade

que o move nas conquistas e su-

perações desejadas.

É evidente que a consciência

só pode existir seu corpo co-

mo consciência. Assim, por-

tanto, meu corpo é uma estru-

tura consciente de minha

consciência (...) não há, no

plano da consciência irrefleti-

da, consciência do corpo (...) a

consciência nada mais é do

que corpo; o resto é nada e

silêncio. 19

Na quebra de limites, recor-

des, invencibilidades o corpo

quebra o silêncio da passividade

e se integra com a imagem, ven-

cendo os desafios que na realida-

de transpareciam inquebrantá-

veis. A liberdade como possibili-

dade do vir-a-ser outro diferente

representa a condição da factici-

dade do ser do homem. Nesta

liberdade todo imaginário se for-

ma e a consciência imaginante

move o corpo com suas possibili-

dades para a realização da ima-

gem-meta objeto de sua intencio-

nalidade.

Logo, aquilo que chamamos liberdade não pode se diferen-ciar do ser da 'realidade hu-mana'. O homem não é pri-meiro para ser livre depois: não há diferença entre o ser do homem e seu 'ser - li-vre'(...) precisamos enfocar a liberdade em conexão com o problema do nada e na medi-da estrita que condiciona sua aparição. 20

IV. Conclusão

Na concepção da imagem

em Sartre a noção de intenciona-

lidade é fundamental para sua

compreensão. De acordo com a

ontologia fenomenológica sartre-

ana da imagem, toda consciência

é consciência de alguma coisa;

não há consciência isolada do

mundo, ela tende ao mundo. O

objeto da consciência é transcen-

dente, está fundamentalmente

fora da consciência, mas interage

com ela no momento da percep-

ção. Na experiência da consciên-

cia com o mundo há uma inten-

ção, como as “Erlebnisse intenci-

onais”. Nesta experiência-vivida

intencional, a consciência de al-

guma coisa determina sua relação

intencional a essa mesma coisa.

A intencionalidade é a estrutura

essencial de toda consciência. A

consciência é consciência daquilo

de que se tem consciência.

Em relação à imagem, nes-

ta ontologia fenomenológica, po-

demos entendê-la também como

intencional, toda imagem é ima-

gem de alguma coisa. Na forma-

ção do imaginário há uma inten-

ção imaginante, onde a imagem

não se reduz a um objeto ou ima-

gem-coisa, muito menos a um

mero conteúdo interno (psíquico)

da consciência. A imagem se

constitui enquanto ato espontâ-

neo da consciência na sua relação

com o objeto imaginado.

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A consciência imagi-

nante em sua intencionalida-

de com relação ao objeto da

realidade produz a imagem

mágica ou fictícia que é re-

presentada espontaneamen-

te. A criatividade e a imagi-

nação animam representati-

vamente o objeto da realida-

de material. A imagem torna-

se estrutura intencional des-

pojada da condição de mero

conteúdo inerte da consciên-

cia para se efetivar em uma

relação de síntese como um

objeto transcendente.

Nesta concepção o cor-

po é a consciência de si movi-

do pela imagem intencional

para si. O corpo físico na sua

educação estética e formativa

move-se rumo às possibilida-

des diversas realizando os

desejos e superando limites.

A imagem do corpo físico

quebrando limites e enfren-

tando os esportes mais radi-

cais é a consciência imagética

transformada em ato. Em

uma prova ontológica na fe-

nomenologia sartreana da

imagem a meta desejada e

ausente presentifica-se inten-

cionalmente pela consciência

desta meta.

Toda consciência é consciên-

cia de alguma coisa (...) ser

consciência de alguma coisa é

estar diante de uma presença

concreta e plena que não é a

consciência. Sem dúvida, po-

de-se ter consciência de uma

ausência. Mas esta ausência

aparece necessariamente so-

bre um fundo de presença.21

1 SARTRE, Jean-Paul. A imaginação. 4.ed. São Paulo: Difusão

Européia do Livro, 1973. A respeito ver. p. 105

2 Idem. p. 107 3 SARTRE, Jean-Paul. A imaginação. 4.ed. São Paulo: Difusão

Européia do Livro, 1973. p. 5

4 Idem. p. 109 5 Idem. p. 05 6 Id Ibidem p. 05 7 Idem p. 06 8 Idem. p. 07 9 Idem. p. 07 10 ARRUDA, Francimar Duarte. A Questão do Imaginário: a con-tribuição de Sartre. Em Aberto, Brasília, ano 14, n.61, pp. 79-85, jan./mar. 1994. p.81 11 Idem. p.81 12 Id. Ibdem. p. 81 13 Idem, p. 84. 14 SARTRE, Jean-Paul. O Ser e o Nada: ensaio de Ontologia Fenomenológica. Petrópolis: Vozes, 1997. p.536 15 Idem. p. 540 16 Com a perda de sentido da distinção consciência-mundo, a

partir de Husserl, Sartre afirma que noésis é a realidade psíquica

concreta intencional, e o sentido que vem habitar a noésis repre-

senta o noema. “Por exemplo, 'árvore-em-flor-percebida' é o

noema da percepção que tenho neste momento.” (114). A árvore

real pode deixar de existir, mas o sentido (noema) desta árvore

em minha consciência não deixa de ser o que é. O noema tem

uma existência ideal.

17 Idem. p. 537 18 SARTRE, Jean-Paul. A imaginação. 4.ed. São Paulo: Difusão

Européia do Livro, 1973. p. 109

19 SARTRE, Jean-Paul. O Ser e o Nada: ensaio de Ontologia

Fenomenológica. Petrópolis: Vozes, 1997. p.416

20 Idem. p.68 21 Idem. p. 33

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARRUDA, Francimar Duarte. A Questão do Imaginário: a contribuição de Sartre. Em Aberto, Brasília, ano 14, n.61, pp. 79-85, jan./mar. 1994. SARTRE, Jean-Paul. A imaginação.

4.ed. São Paulo: Difusão Européia do Li-

vro, 1973.

_____. O Ser e o Nada: Ensaio de On-

tologia Fenomenológica. Petrópolis: Vo-

zes, 1997

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Nada para mim é mais insano que meu versejar insosso, meu poetar sem dono, meu viver mambembe, meu morrer cigano.

Nada para mim é mais humano que caminhar sem rimas, seguir sem planos, desprezar a certeza, abraçar o engano.

Nada para mim me traz mais paz que a incerteza, o prelúdio do inexato, a artimanha do ato para de fato ser e não ser.

Nada para mim me parece mais sensato que o delírio do sentido lato, latir e não morder.

João Andrade

O BOÊMIO

O mundo inteiro acorda

e o boêmio vai dormir

encantado por musas diversas

escuta o galo cantar para o sol

os cães ladrarem pela rua

a criança chorar

tanta vida!

Vida que não pertence a seu mundo

pois o mundo inteiro acorda

e o boêmio vai dormir

Daniel Násser

A FLAUTA VÉRTEBRA

Vladimir Maiakovski

A todos vocês, que eu amei e que eu amo, ícones guardados num coração-caverna, como quem num banquete ergue a taça e celebra, repleto de versos levanto meu crânio.

Penso, mais de uma vez: seria melhor talvez pôr-me o ponto final de um balaço. Em todo caso eu hoje vou dar meu concerto de adeus.

Memória! Convoca aos salões do cérebro um renque inumerável de amadas. Verte o riso de pupila em pupila, veste a noite de núpcias passadas. De corpo a corpo verta a alegria. esta noite ficará na História. Hoje executarei meus versos na flauta de minhas próprias vértebras.

Sob o azul do céu

em nordeste brando, vens,

e assemelhas-te, em leve

sonoridade do passo, à nobreza

e à fina elegância de garça,

mirando-se no espelho das águas.

Gilberto Avelino (In os tercetos e um canto às vozes do mar.

A palavra é como uma lata, quanto mais você bate mais ela fala. Marcos Fonseca

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O NATAL DE SÃO FRANCISCO

São Francisco refletia sobre as chagas de Jesus e a esperar se quedava transido de frio e jejum. Que procurais São Francisco nesta noite de Natal? A quem chamais, pobrezinho na noite fria de Assis? Já não tendes o presépio e vossa fé bem plantada? Vosso bordão, vosso hábito e as vossas orações? As cinco chagas chamais de Nosso Senhor Jesus Cristo profundo e simples quereis compartir a sua sorte. Há uma estrela a guiar o caminho até as chagas. Há o sangue derramado sobre a neve sossegada.

Horácio Paiva

Pétalas de flor, amor

Me encanto em cada canto

Bailando no palco dos sonhos

Minha vida é um conto!

Tahisi Rodrigues

JULGA-ME A GENTE TODA POR PERÍODO Julga-me a gente toda por perdido, Vendo-me tão entregue a meu cuidado, Andar sempre dos homens apartado E dos tratos humanos esquecido. Mas eu, que tenho o mundo conhecido, E quase que sobre ele ando dobrado, Tenho por baixo, rústico, enganado Quem não é com meu mal engrandecido. Vá revolvendo a terra, o mar e o vento, Busque riquezas, honras a outra gente, Vencendo ferro, fogo, frio e calma; Que eu só em humilde estado me contento De trazer esculpido eternamente Vosso fermoso gesto dentro na alma.

Luís de Camões

BUSCA

Busco um sorriso, busco o encanto, conto de fadas. Busco ruídos de uma meninice, não ouço nada. O florescer da primavera talvez não haja. Busco a criança em alguns olhares, só vejo a tarja

Leocy Saraiva

O TRÁGICO DILEMA

Quando alguém pergunta a um autor o

que este quis dizer, é porque um dos dois é

burro.

Mário Quintana

Eu vou mal e irei pior ain-

da mas aprendo pouco a

pouco a ser só, e isso já é

alguma coisa, uma vanta-

gem, um pequeno triunfo.

Frida Kahlo

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