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REVISTA DE JURISPRUDÊNCIA JUSTIÇA FEDERAL SEÇÃO JUDICIÁRIA – PB VOLUME I Administração FORUM JUIZ FEDERAL RIDALVO COSTA Rua João Teixeira de Carvalho, nº 480 CEP 58031-220 - João Pessoa - PB

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REVISTA DE JURISPRUDÊNCIAJUSTIÇA FEDERAL

SEÇÃO JUDICIÁRIA – PB

VOLUME I

AdministraçãoFORUM JUIZ FEDERAL RIDALVO COSTA

Rua João Teixeira de Carvalho, nº 480CEP 58031-220 - João Pessoa - PB

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JUSTIÇA FEDERAL

SEÇÃO JUDICIÁRIA DA PARAÍBA

“PARAHYBA JUDICIÁRIA”

Diretor da RevistaJUIZ JOÃO BOSCO MEDEIROS DE SOUSA

CENTRO DE ESTUDOS JURÍDICOS MINISTRO TORREÃO BRAZ

Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, a.1 n.1 338p. 1998

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COORDENAÇÃO:Gabinete da RevistaSeção de Editoração Eletrônica do Tribunal Regional Federal da 5ª Região

REVISTA PARAYBA JUDICIÁRIA. João Pessoa: Centrode Estudos Jurídicos Ministro TorreãoBraz. a. 1, n. 1, 1998. 338p.

1. PODER JUDICIÁRIO - PARAÍBA - HISTÓRIA. 2.PODER JUDICIÁRIO - BRASIL. 3. DIREITO PROCESSUAL -PARAÍBA

CDU 342.56

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COMPOSIÇÃO DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DA PARAÍBA

Juiz Federal Diretor do ForoDr. JOSÉ FERNANDES DE ANDRADE

Diretor da Secretaria AdministrativaBel. Otto Marcelo Navarro Cruz

Juiz Federal da 1ª VaraDr. JOÃO BOSCO MEDEIROS DE SOUSA

Juiz Federal SubstitutoDr. Janilson Bezerra de Siqueira

Diretor da SecretariaBel. Genival Veloso de F. Filho

Juiz Federal da 2ª VaraDr. ALEXANDRE COSTA LUNA FREIRE

Diretor da SecretariaBel. Ricardo Correia de Miranda Henriques

Juiz Federal da 3ª VaraDr. JOSÉ FERNANDES DE ANDRADE

Juíza Federal SubstitutaDrª. Cristina Maria Costa Garcez

Diretora da SecretariaBelª Maria da Conceição Carvalho

Juiz Federal da 4ª VaraDr. ROGÉRIO DE MENESES F. MOREIRA

Diretor da SecretariaBel. José Alves de Lima Filho

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APRESENTAÇÃO

O surgimento desta Revista é fruto do somatório de esforços dos magistrados que compõema Justiça Federal de Primeiro Grau desta Seção Judiciária da Paraíba, ao ensejo dascomemorações do Trigésimo Aniversário do restabelecimento da Justiça Federal e doCentésimo Sexto do Decreto nº 848, de 11 de outubro de 1890, que organizou a JustiçaFederal.

O seu nome de batismo “Parahyba Judiciária”, dentre outros lembrados, foi escolhido porvotação de todos os Juízes.

Por primeiro, cumpre assinalar que os julgados dos antigos Juízes Seccionais, da PrimeiraFase da Justiça Federal, entre 1890 e 1937, eram publicados na Revista do Foro, editadapelo eg. Tribunal de Justiça da Paraíba, diga-se de passagem, um dos periódicos maisantigos da literatura jurídica nacional e já prestes a completar o seu centenário.

Com a reorganização da Justiça Federal pela Lei nº 5.010, de 30 de maio de 1966, ainstalação da Seção Judiciária da Paraíba, em 20 de março de 1968 e até os dias de hoje,todos os julgados dos juízes federais foram, só e tão-somente, encadernados e que passavama constituir “Livro de Registro de Sentença”, servindo para estatística e mais para pesquisainterna, contudo, sem maiores conhecimentos dos operadores do Direito.

Dito periódico que ora se oferece ao público especializado vem enriquecer enormemente aliteratura jurídica paraibana. A idéia de publicar a Revista da Seção Judiciária da Paraíbaadveio da convergência de um sem número de fatos expressivos, dos quais dois devem serressaltados: as circunstâncias de os juízes federais não disporem, até os dias correntes, deum órgão que divulgue os seus julgados, teses, opiniões e artigos relacionados com omundo jurídico; e a calmaria porque ora atravessa em muitos meios a vida jurídica paraibana.

Eis a razão desta Revista.

Ela objetiva congregar os anseios dos magistrados federais, bem como os mestres daciência jurídica dispersos e que quiserem colaborar no empreendimento de cultura ehumanismo de outros ramos do saber que interessem a ordem jurídica.

A missão informativa que a Revista Parahyba Judiciária se propõe, apresenta ainda outrosaspectos que se mostrem importantes para brindar o leitor com boa formação e informaçãodo profissional do Direito.

Há razões para regozijo. A Revista já se apresenta, neste primeiro número, com umarelevante contribuição para o esclarecimento de temas importantes do seu múltiplo objetoque lhe diz respeito. Assim, o leitor vai encontrar nela além de conferências de Ministro doSuperior Tribunal de Justiça e de Juízes da 5ª Regional, aqui realizadas sobre vários temas,artigos sobre questões doutrinárias e julgados dos juízes federais.

Encerra a parte doutrinária deste primeiro volume o trabalho técnico-jurídico “Critério científicopara distinguir a prescrição da decadência e para identificar as ações imprescritíveis”,festejado por grandes civilistas brasileiros, de autoria do eminente professor de Direito Civilda UFPB e primeiro Juiz Federal desta segunda fase da Seção Judiciária da Paraíba e queveio a falecer no exercício do cargo.

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Não pode, todavia, passar sem registro especial o apoio decisivo do Exmº. Sr. Presidentedo eg. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, Juiz Nereu Santos, do Vice-Presidente JuizFrancisco Falcão, bem como do não menos renomado Juiz da citada Regional, Dr. JoséMaria Lucena, Diretor da Revista do TRF da 5ª Região, que contribuíram de maneira efetivana publicação deste Primeiro Volume.

O desejo maior é o de que a Revista Parahyba Judiciária contribua de forma expressivapara o aperfeiçoamento do instrumental jurídico posto à disposição dos operários do Direito.

Concluindo, a Revista dispõe-se a assumir um lugar para não dizer uma lacuna na culturajurídica paraibana.

João Pessoa, 19 de dezembro de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADE Juiz Federal e Diretor do Foro

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SUMÁRIO

DOUTRINA (Seção I)

A JUSTIÇA FEDERAL NO BRASIL:Evolução Histórica, Crises e Soluções para o Futuro........................................... 15Globalização e Direito .......................................................................................... 25O novo Sistema de Recursos no Código de Processo Civil ................................. 33Desapropriação - Perfil Atual ................................................................................ 54Direito de Petição e Direitos Humanos ................................................................. 67O Judiciary Act of 1789 e as origens da Justiça Federal ...................................... 70Aplicação analógica da Lei nº 9.249/95 aos crimes contra a Previdência ............ 72Dos efeitos da divisibilidade ou indivisibilidadeda Obrigação na Ação Monitória .......................................................................... 74Critério científico para distinguir a prescrição da decadênciae para identificar as ações imprescritíveis ............................................................ 77

JURISPRUDÊNCIA (Seção II)

Julgados da Seção Judiciária ............................................................................. 105Julgados do Eleitoral .......................................................................................... 307

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Seção I

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DOUTRINA

1 “A JUSTIÇA FEDERAL NO BRASIL: Evolução Histórica, Crises e Soluções para oFuturo.”Dr. José Augusto Delgado (Ministro do STJ)

2 “Globalização e Direito”.Dr. José de Castro Meira (Juiz do TRF - 5ª Região)

3 “O novo Sistema de Recursos no Código de Processo Civil”.Dr. José Lázaro Alfredo Guimarães (Juiz do TRF - 5ª Região)

4 “Desapropriação - Perfil Atual”.Dr. Francisco Geraldo Apoliano Dias (Juiz do TRF - 5ª Região)

5 “Direito de Petição e Direitos Humanos”.Dr. João Bosco Medeiros de Sousa (Juiz Federal da 1ª Vara - PB)

6 “O Judiciary Act of 1789 e as origens da Justiça Federal”.Dr. Alexandre Costa de Luna Freire (Juiz Federal da 2ª Vara - PB)

7 “Aplicação analógica da Lei nº 9.249/95 aos crimes contra a Previdência.”Dr. Rogério de Meneses Fialho Moreira (Juiz Federal da 4ª Vara - PB)

8 “Dos efeitos da divisibilidade ou indivisibilidade da Obrigação na Ação Monitória.”Márcio Accioly de Andrade (Acadêmico de Direito da UNIPE - Universidade de JoãoPessoa).

9 “Critério científico para distinguir a prescrição da decadência e para identificar asações imprescritíveis”Agnelo Amorim Filho (Professor da UFPB e Juiz Federal da SJPB)

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A JUSTIÇA FEDERAL NO BRASILEVOLUÇÃO HISTÓRICA, CRISES E SOLUÇÕES PARA O FUTURO1

JOSÉ AUGUSTO DELGADOMinistro do Superior Tribunal deJustiça.Professor de Direito Público da UFRN(aposentado) e ex-Professor daUniversidade Católica de Pernambuco.Sócio Honorário da AcademiaBrasileira de Direito Tributário.

1. Introdução2

O tema a ser desenvolvido “Justiça Federal: Sua Evolução, Crises e Soluções para oFuturo” envolve uma referência ao passado, uma análise do presente e a apresentação desoluções para o futuro que se avizinha, futuro que está sendo esperado com ascomplexidades vivenciadas pela humanidade neste final de Século e com as indagaçõesfeitas para o início do Século XXI.Em primeiro plano, será dado tratamento à evolução histórica da Justiça Federal. Paratanto, necessário se faz que os nossos pensamentos se voltem para um passado situado

1 Palestra proferida no dia 30 de maio de 1996, na sede do Fórum da Seção Judiciária da Justiça Federal no Estado da Paraíba,encerrando as solenidade presididas pelo Dr. José Fernandes de Andrade, Juiz Diretor do Foro da referida Seção, em comemoraçãoao aniversário dos 30 anos de revitalização da Justiça Federal no Brasil.

2 Antes de penetrar no tema da palestra, apresentei a seguinte saudação aos presentes: “Eminente Presidente e amigo, nãosomente meu, mas, amigo maior ainda da Paraíba, Exmo. Dr. Nereu Santos, Vice-Presidente do Tribunal Regional Federal da 5a.Região, representando neste ato o eminente Presidente; Exmo. Dr. José Fernandes de Andrade, Diretor do Foro, inteligênciainquieta, que faz com que as coisas boas aconteçam nos dias próprios e momentos adequados; Exmo. Dr. Alexandre Costa LunaFreire, a quem, com a permissão das autoridades aqui presentes e dos amigos que também aqui se encontram, peço permissãopara lançar sobre sua pessoa sentença de suspeição, decisão essa que prolato com cunho ditatorial, por não permitir qualquerrecurso, em razões dos elogios que fez a minha pessoa, tudo em decorrência da amizade que nos une e que tem origem no seucoração grandioso, representativo daquilo que cada paraibano tem dentro de si; a você, Alexandre, agradeço as palavras ditas emsua saudação, agradecimento que faço por Maria José, minha Zezé, por Magnus e pelos demais familiares; fique certo que, sevocê se diz honrado com a nossa amizade, eu e meus familiares, todos nós juntos nos sentimos muito mais honrados em Deushaver permitido a concessão de tê-lo como amigo; Exmo. Sr. representante do Governador do Estado e Procurador do EstadoDesembargador Geraldo Ferreira Leite, cidadão sempre voltado para as lides da vida jurídica e que me faz lembrar, neste instante,o momento em que nasceu nossa amizade, em Curso de Especialização que participamos no Estado do Rio de Janeiro, naUniversidade Estadual, nos anos de 1978; Exmo. Desembargador Júlio Aurélio, representante do Egrégio Tribunal de Justiça doEstado, a quem peço que transmita ao Exmo. Sr. Desembargador Queiroga, eminente Presidente da Corte, a minha admiraçãopelo processo de transformação que imprimiu no Poder Judiciário do Estado da Paraíba, graças aos esforços dos ilustres membrosda Corte Estadual, apoiando os comandos administrativos da Presidência, fato que tive conhecimento quando aqui compareci, emdias passados, para proferir palestra em simpósio destinado à formação de novos Juízes aprovados recentemente em concurso;Exmo. Sr. General Mário Ivan, presença que simboliza a força da instituição militar no Estado da Paraíba, dando exemplo depatriotismo por intermédio das funções exercidas; Ilmo. Sr. Tenente Abrão José Silva, autoridade militar que muito me honra coma sua presença; Exmo. Dr. Joacil de Brito, advogado, e Exmo. Dr. Eitel, Subprocurador -Geral da República, pai e filho, amigospresentes e que os saúdo conjuntamente pela alegria do reencontro, com quem, também, compartilho a alegria da promoção deEitel para o cargo já referido, fruto da sua integridade e inteligência; Exmo. Dr. José Maria Lucena, Juiz do Tribunal RegionalFederal da 5a. Região e cidadão de Limoeiro, Ceará, amigo de todos nós e que me dá muita alegria em revê-lo, por ser influenciadopela sua bondade e disponibilidade de servir; eminentes Juízes do Trabalho, Juízes Federais ja nominados pela recepção; Ilmo. Sr.José Carlos Arvoredo Nóbrega, representante da família do primeiro Juiz Federal da Paraíba e que dentro em breve terá o seuretrato posto na Galeria de Honra desta Casa; Meus Senhores e Minhas Senhoras: Queria eu descumprir o compromisso assumidocom o Dr. José Fernandes de Andrade, Diretor da Seção Judiciária da Paraíba, e deixar de lado o tema que me foi solicitado a falar,para que a minha imaginação saísse correndo solta pelas emoções, a fim de me ser possível responder as palavras tão bondosasemitidas pelo Exmo. Dr. Alexandre Costa de Luna Freire, ao me saudar. Mas, como homem disciplilnado que sou e, especialmente,por exercer há trinta e um anos a magistratura em todas as escalas, tenho que cumprir as determinações do simpósio: devo, assim,ser obediente ao programa. Não vou, assim, ter a satisfação de me envolver com as emoções do momento pela saudação que mefoi prestada e pelo carinho com que sou recebido neste ambiente. Fiquem, porém, certos os presentes, todos meus amigos, que ooutro lado do meu coração - dizem que, em regra, o coração do homem é dividido em três partes: uma para os pais, a mulheramada, filhos, netos e bisnetos; outra parte para guardar fidelidade aos amigos pelas amizades construídas; a terceira para fugirdas emoções e cumprir as obrigações assumidas. Deixarei essas duas partes de lado e apenas farei trabalhar a terceira, emhomenagem ao esforço do comandante-chefe desta solenidade, o Dr. José Fernandes, pelo que tentarei traçar alguns rumos sobreo tema que me foi apresentado: Justiça Federal: Sua Evolução, Crises e Soluções para o Futuro.

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no dia 11 de outubro de 1890, portanto, há mais de um século, quando, rompendo-se comtoda uma tradição de costumes políticos implantados no Brasil pela Monarquia, iniciava-se o Período Republicano. Este, conforme revela a história, surgiu das idéias de liberdadecultivadas, na época, pelos franceses, idéias que estavam sendo aplicadas e que refletiramem uma nova concepção de Estado, impulsionando-o para que se voltasse para seaproximar do cidadão, o que, aliás, ainda hoje se persegue, haja vista a lentidão como talfenômeno tem acontecido.Marco de relevo para a Justiça Federal é a data de 14 de outubro de 1890, quando, logoapós a Proclamação da República, foi editado o Decreto-Lei n. 848, que, em suas linhasmestras, criou a chamada Justiça Federal. Esta denominou os seus magistrados de “JuízesSeccionais” (art. 15 do referido decreto), dando-lhe uma competência dividida em doiscampos: a) processamento e julgamento das causas que tivessem como origem atosadministrativos do Governo Federal: b) processamento e julgamento das ações queinteressassem ao fisco nacional.Convém se fazer a observação de que, em tal período, a Justiça Federal, na sua origem,recebeu competência limitada tão somente aos dois tipos de relações jurídicas jámencionados. Por tal razão, doutrinadores de então chegaram a afirmar que tais JuízesFederais faziam o querer do Estado : eram juízes seccionais para realizarem a vontadeestatal e não o direito do cidadão. O desenvolver, porém, da atuação dos magistradosfederais seccionais demonstrou que a crítica foi apressada, com raras exceções, conformepode se constatar com a realização de pesquisa mais aprofundada sobre as decisõesjudiciais emitidas em tal período.A instalação da Justiça Federal no Brasil começou com muitas dificuldades, entre elas aacima apontada: a dos dirigentes da Nação pretenderem que ela fosse uma instituiçãovoltada para atender a um determinado seguimento da organização política: o Estado.Esse vício de constituição da Justiça Federal foi, de imediato, identificado. Em conseqüência,para corrigi-lo, surgiram, quatro anos após a data de sua origem, a Lei n. 221, de 20 denovembro de 1894, e o Decreto n. 3.084, de 05 de novembro de 1898, dispositivos legaisque completaram a sua organização e contribuíram para a consolidação da Justiça Federalno início do Século XX. Tais regramentos jurídicos aumentaram a competência da JustiçaFederal, permitindo que os Juízes Seccionais processassem e julgassem causas criminais.Em tal oportunidade, foi determinado o duplo sistema de soberania3 da Justiça. Haviaclara divisão entre a Justiça Federal e a aplicada pelos Estados Federados.Com essa configuração, a Justiça Federal vigorou até a Carta de 1937. Em tal período,isto é, entre 1890 e 1937, ela foi aplaudida por uns e criticada por outros. Em determinadosmomentos o seu funcionamento foi prejudicado por movimentos encetados por vários setoresque se sentiam atingidos por suas decisões e, por tal razão, pregavam a sua extinção.A força dessa movimentação contrária à manutenção da Justiça Federal exigiu esforçodesmedido dos seus defensores e luta política intensa para mantê-la na Carta de 1934. Aforma de sua composição continuou a mesma: os Juízes eram indicados pelo SupremoTribunal Federal e nomeados pelo Presidente da República.A posição de alguns setores contra a extinção da Justiça Federal em 1934, até certoponto, contribuiu para o aperfeiçoamento da instituição. Ela passou por sérias modificações,com a correção dos vícios de origem que a contaminavam e que provocaram a oposição jáanunciada.

3 Registro que, ao aplicar, na expressão em causa, o termo soberania, não posso deixar de fazê-lo com ressalvas, porque a JustiçaFederal, como já disse, desde a sua origem até o momento comentado, não tinha, por inteiro, soberania, esta vista em seu conceitoverdadeiro, isto é, de funções estatais exercidas com independência e harmonia. A Justiça Federal da época estava, ainda, muitovinculada à vontade estatal, não obstante o esforço de muito dos seus Juízes para que tal não acontecesse.

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A indicação dos Juízes federais, feita pelo Supremo Tribunal Federal, passou a ser revestidade maiores cuidados: só podia ser juiz federal o Bacharel em Direito com mais de 35 anose menos de 60 anos de idade, salvo se já tivesse sido magistrado. Dois requisitos eramexigidos: o da experiência jurídica e o da idade. A exceção existia, apenas, para quem jáera magistrado, por haver a presunção de ser o indicado, possuidor de tal título, capacitadomoral e intelectualmente para o exercício das funções do cargo.A Carta de 1937 extinguiu a Justiça Federal. O mesmo fez com a Justiça Eleitoral. Estefoi um momento negro de nossa história, em que o respeito aos direitos do cidadão nãoforam considerados.O Decreto-lei n. 06, de 16 de novembro de 1937 foi quem cumpriu com essa missão.Extinta a Justiça Federal, os seus Juízes foram colocados em disponibilidade.Nessa época ocorreu um fenômeno de muito interesse para aqueles que estudam a históriado Direito: houve a abolição da chamada “pluralidade processual”. Cada Estado, até então,tinha o seu Código de Processo. A partir de tal data é que começou a unificação do DireitoProcessual, resultando na edição do Código de Processo Civil de 1939.Com a redemocratização do País, em 1946, a Justiça Federal foi reestruturada, de modoparcial, com a criação do Tribunal Federal de Recursos. Não foram recriados os JuizadosFederais de primeiro grau. A competência para decidir os litígios do interesse da UniãoFederal passou a ser de Juízes Estaduais designados, especialmente, pela Lei deOrganização Judiciária de cada Estado.O Tribunal Federal de Recursos passou a atuar como corte de apelação, recebendo osrecursos apresentados nos feitos de interesse da União Federal e de duas autarquias,todos julgados por magistrados estaduais que eram conhecidos como os Juízes dasVaras da Fazenda Pública.É de se deixar assentado que os Juízes Estaduais, no exercício da competência daJustiça Federal de Primeiro Grau, prestaram valiosos serviços à Nação. Eles deram todaa sua inteligência, saúde, lazer, sacrifício de suas famílias, para o cumprimento do dever,haja vista ter sido de grande intensidade o serviço e inúmeros os problemas que foramsolucionados.O Estado, pela sua força, queria que essa situação de desconforto na entrega da prestaçãojurisdicional, quando ele fosse parte, acontecesse. Havia para o Estado benefício com ademora na solução dos conflitos dos jurisdicionados quando com ele litigava. Interessava-lhe, assim, a manutenção desse caos, pois, implicava em demora na liquidação dasindenizações devidas e no cumprimento dos precatórios expedidos.Tudo era fruto de uma mentalidade estatal concebida na época, com reflexos até nacomposição do Tribunal Federal de Recursos. Este funcionou, durante muito anos, comnúmero reduzido de Ministros e com um volume de serviço assustador.A revitalização da Justiça Federal de Primeiro Grau surgiu no ano de 1965. Aliás, é de seter em consideração que tal década é marcada pelo surgimento de alguns diplomas legaisque honram o nosso ordenamento jurídico, a exemplificar, a Lei que combate o Abuso deAutoridade.A Justiça Federal foi recriada em atendimento aos sentimentos da Nação, sempre presentesnas reivindicações feitas em tal sentido por Hely Lopes Meirelles, Francisco Cavalcanti,Oscar Saraiva e outros nomes que construíram o Direito neste País. Eles reivindicaram,utilizando o prestígios de seus escritos e palavras, a reorganização da Justiça Federal.O Ato Institucional n. 02, de 27 de outubro de 1965, revitalizou a Justiça Federal dePrimeiro Grau. Esse diploma legal originário de um Comando Revolucionário, foi recebidocom reservas pela sociedade jurídica da época. Imaginou-se que a Justiça Federal dePrimeiro Grau iria ser uma Justiça do Rei, especialmente, porque os seus primeiros Juízes

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foram escolhidos por indicação de segmentos políticos, sem concurso, mediante, apenas,aprovação do Senado Federal e nomeação do Presidente da República.O contrário, porém, ocorreu. Reorganizada a Justiça Federal, os seus primeiros Juízes,mesmo sem condições materiais de trabalho, desvincularam-se, imediatamente doscompromissos políticos decorrentes das indicações, e começaram a construir uma Justiçavoltada, de modo inteiro, para o cidadão, pelo que, dentro de pouco tempo, ela ganhou aconfiança da sociedade.Os senhores advogados que acompanharam essa nova fase da Justiça Federal e aos queenfrentaram as dificuldades apresentadas, bem sabem o que de positivo foi construídopelos primeiros Juízes Federais nomeados em 1966, responsáveis, de modo integral, pelofortalecimento que, hoje, tem a referida instituição.Nenhuma homenagem foi prestada ao “rei” que efetuou as nomeações. A Justiça Federalpassou a homenagear o cidadão e a marcar o novo ciclo com a confiança dos jurisdicionadosem suas atividades.Com a Emenda Constitucional de 26 de novembro de 1965, a Justiça Federal deixou deser regulada por ato institucional e passou a ter vida própria no corpo da nossa CartaMagna. Com suporte nos dispositivos constitucionais que a regulavam, surgiu a Lei n.5.010, de 30 de maio de 1966, portanto, há exatamente 30 anos, organizando, de mododefinitivo, a Justiça Federal no Brasil. A mencionada lei é conhecida como sendo o Códigode Organização Judiciária da Justiça Federal. Ela recebeu, para sua elaboração, valiosacontribuição de Hely Lopes Meirelles, Oscar Saraiva, Theotônio Negrão e outros.A lei mencionada criou os juízes federais e os juízes federais substitutos, com competênciajá definida em texto constitucional.A Constituição Federal de 1967 tentou ampliar a Justiça Federal, especialmente, com acriação de mais dois Tribunais Federais de Recursos. Mantinha-se o sediado no DistritoFederal, em Brasília, e instalava-se um em Recife e outro em São Paulo. Infelizmente, porquestões de ordem política e por forte pressão exercida por setores produtivos e nãoprodutivos que se sentiam incomodados com a atuação da Justiça Federal, face as decisõestomadas pelos Juízes Federais e pelo Tribunal Federal de Recursos, especialmente, notocante aos demandos praticados pelos agentes público federais, os referidos tribunaisnão foram instalados.A Emenda Constitucional de 1967 transformou os juízes federais substitutos em juízesfederais, desdobrando, também, as varas até então existentes, o que proporcionou umcampo maior para as atividades judicantes.No ano de 1969, a competência da Justiça Federal foi ampliada. Enquanto a suacompetência era tão somente limitada à causas de interesse da União, das suas autarquiase empresas públicas e as demais de natureza especial fixadas na Carta Magna, elapassou, também, a ter competência para processar e julgar as reclamações trabalhistasque envolviam interesses das pessoas jurídicas acima mencionadas.4

O prestígio da Justiça Federal entre os operadores do direito e no meio dos cidadãosávidos pela entrega da prestação jurisdicional, bem como, a disciplinação da suacompetência no corpo da Carta Magna, geraram algumas conseqüências. A Justiça Federal,por ter se firmado no panorama jurídico brasileiro, em todos os seus graus, tanto o Governocomo outras entidades jurídicas começaram a desenvolver idéias para atrair a competência

4 É de se registrar que a Justiça Federal, desde a sua reorganização, sempre teve a sua competência pressente no corpo da CartaMagna. É muito importante essa observação, pois, tal definição em sede constitucional exige que não se amplia o campo competencialda Justiça Federal. Esse fato não representa uma competencia elitista para a Justiça Federal. Tanto não o é que ela está nivelada,de modo igual, aos juizes estaduais que exercem funções delegadas competenciais da Justiça Federal, em sede de Comarca ondenão exista Vara da Justiça Federal.

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da Justiça Federal para solucionar conflitos em que estivessem envolvidos.Um exemplo a destacar é o que ocorreu com o Decreto-lei n. 685, de 17 de agosto de1969, que, em seu art. 2º, firmou a competência da Justiça Federal para processar e julgaros feitos em que as sociedades financeiras fossem parte, quer como autoras, quer comodemandadas. Submetido, porém, o referido Decreto-lei ao exame do Colendo SupremoTribunal Federal, entendeu esta Corte da impossibilidade de ser firmada tal competência,haja vista ser impossível se ampliar o texto constitucional via legislação ordinária.O Colendo Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucional o mencionado Decreto-lei. A decisão produziu, em minha visão, uma contribuição para valorizar a competênciada Justiça Federal, face ter ficado delimitado que a competência da Justiça Federal nãopodia ser ampliada por lei, o que resultou, também, o entendimento de que, também, porlei, ela não podia sofrer restrição.O mesmo fenômeno ocorreu em 1967, com a Lei n. 5.316, quando se tentou fixar acompetência da Justiça Federal para processar e julgar acidente de trabalho. Novamente,o Colendo Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 16 damencionada lei, pelos fundamentos já expostos.Esse rápido histórico é para demonstrar a evolução da Justiça Federal desde a data desua criação e o atual momento vivenciado, quando se testemunha a sua pujança com osTribunais Regionais Federais, em número de cinco, e a instalação de Varas em váriosMunicípios dos Estados brasileiros.

2. As Tentativas de Esvaziamento da Justiça FederalOs primeiro e segundo graus da Justiça Federal passaram, como instituição, a se imporno ambiente jurídico, proferindo decisões de profundas repercussões para a entrega dosdireitos subjetivos dos cidadãos.O homem do povo, muito embora descrente da atuação do Poder Judiciário, percentualque se eleva na atualidade a 23% (vinte e três por cento), começou a depositar confiançana Justiça Federal e nela foi buscar os seus direitos, a exemplificar os relativos aoscruzados bloqueados, aos empréstimos compulsórios cobrados indevidamente, àsexigências de pagamento de valores a título de tributos quando a lei que os instituiuapresentava-se como sendo inconstitucional, os da sua liberdade de ir e vir, etc.Por ter a Justiça Federal firmado a sua independência e confiança dos jurisdicionados,incontrolável, portanto, por grupos políticos e por setores atingidos pela sua atuação,instalou-se um movimento pela sua extinção ou pelo menos, para o seu esvaziamento.Fenômeno dessa natureza sempre aconteceu com as instituições. A história registra quea Igreja Católica, ao atingir o seu apogeu com as pregações de sua religião, passou a sercombatida com outras seitas criadas para esvaziá-la. A Escola quando está exercendo asua plena função de educar, contribuindo para modificações de mentalidade e de valorizaçãodo ser humano, passa a ter contra si obstáculos de toda ordem que impedem a suapermanência em grau respeitável de atuação. As instituições militares quando realizamas missões constitucionais que lhe são exigidas e estão, portanto, cumprindo com osseus deveres, recebem toda sorte de investidas para desestabilizá-las. A instituição familiarpassa pelo mesmo processo. Quando ela se mostra fortalecida no ambiente social, osque se sentem prejudicados com essa força, tentam esvaziá-la com métodos de váriasmodalidades.É a realidade presente em todas as instituições: quando elas alcançam o seu patamarmais alto de credibilidade, só lhe resta suportar as investidas para diminuição dos efeitosproduzidos pelas suas ações. A tentativa de esvaziamento da Justiça Federal foi umaconseqüência do seu crescimento. Começou com a Constituição de 1967, Emenda

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Constitucional n. 01 de 1969, quando foram criados, porém, não instalados os “contenciososadministrativos”. Os vários setores do Estado, aqueles não adeptos da aplicação do princípioda legalidade, começaram a verificar que a Justiça Federal estava impondo o cumprimentoda lei pelos agentes públicos. Verificaram, então, que, por ela não se encontrar servindoaos seus interesses, necessário se fazia criar o “contencioso administrativo”, de origemfrancesa, que nada mais seria do que um tribunal administrativo composto por servidorespúblicos, sem as garantias dos membros do Poder Judiciário, para julgar os litígios dosservidores e dos contribuintes com o Estado. Era o próprio Poder Executivo julgando ascausas do seu próprio interesse.Embora tais contenciosos administrativos tenham sido previstos no Texto Constitucional,eles não foram instalados, em razão da reação contrária dos operadores do direito.Uma outra tentativa se fez presente para ser diminuída a atuação da Justiça Federal. Foia de se exigir do servidor público ou do contribuinte, primeiramente, que exaurisse a viaadministrativa para só depois ingressar com o seu pleito perante o Poder Judiciário.Em síntese, o contribuinte, por exemplo, só podia defender o seu direito de pagar menosimposto, quando a exigência fosse ilegal, depois de percorrer toda a via administrativa.Essa condição foi disposta em lei, mas o Poder Judiciário reagiu e considerou que aConstituição devia prevalecer com a força dos princípios nela inseridos.Tais leis, posteriormente, foram retiradas do mundo jurídico.É de ser lembrado que, na fase analisada, tentou-se reabilitar alguns conceitos sobre aJustiça Federal que fizeram coro nos idos de 1930 e 1934. Determinado seguimentocomparou a Justiça Federal de 1969 com a de 1934, isto é, os Juízes Federais começarama ser chamados de “os nobres de pijama”, por se acusar da mesma ser cara, elitista e sóatender aos ricos. O mesmo seguimento tentou, também, criar conflitos entre a JustiçaFederal e a Justiça Estadual, pregando que a primeira tudo fazia para desprestigiar asegunda.Há de se reconhecer que foi um momento difícil vivido pela Justiça Federal. Na verdade,alguns juízes federais, em número muito pequeno, contribuíram para essa situação, coma prática de determinados abusos de autoridade e desvio de suas funções e doscompromissos assumidos para o exercício do cargo. Contudo, mais de noventa e oito porcento dos Juízes Federais dobraram os seus esforços e revitalizaram, mais uma vez, aJustiça Federal, fazendo calar os movimentos que investiam contra a sua integridade.Graças a Juízes Federais como Ridalvo Costa, sempre atuando neste Estado da Paraíbae hoje integrando o Tribunal Regional Federal da 5a. Região, exemplo de integridade absolutae de cidadão, jurista voltado para os problemas da sociedade, missionário do fazer justiça;Araken Mariz de Faria, Juiz Federal na Bahia e no Rio Grande do Norte, hoje, no TribunalRegional Federal da 5a. Região, exemplo de bondade, de honradez e de prestador deculto ao bom direito; José Cândido, Juiz Federal na Bahia, Ministro no Tribunal Federal deRecursos e no Superior Tribunal de Justiça, reconhecido como exemplo de dignidade e demagistrado cumpridor dos seus deveres para com a Nação; Pedro da Rocha Acioli, JuizFederal na Alagoas, Ministro do Tribunal Federal de Recursos e do Superior Tribunal deJustiça, homem integrado à causa da Justiça e valorizador da fidelidade aos princípios daaxiologia em todos os seus graus, e outros mais, especiamente os magistradoscomponentes do então e egrégio Tribunal Federal de Recursos, a quem os homenageio napessoa do decano Exmo. Sr. Ministro José Dantas, exemplo de juiz e de cidadão paratodas as gerações, pela impossibilidade, por serem muitos, de citar os seus nomes, éque a Justiça Federal soergueu-se e, no lugar de ser esvaziada ou extinta, foi valorizadana Carta Magna de 1988, com apoio, inclusive, da Ordem dos Advogados do Brasil.Não se pode deixar de ser lembrada a missão desempenhada pelo Ministro Lauro Leitão,quando no exercício da Presidência do Tribunal Federal de Recursos, combateu tais

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movimentos com altivez e espírito voltado para a valorização da instituição, pelo queconquistou apoio de todos os seguimentos políticos, o que fez interiorizar a Justiça Federal,ampliar as varas existentes e construir prédios novos para melhorar as suas instalações.Hoje a Justiça Federal está amplamente interiorizada nos Estados de São Paulo, RioGrande do Sul, Minas Gerais, etc.. Na 5a Região tem-se Varas na cidade de CampinaGrande e de Petrolina, sem se deixar de falar da necessidade de serem criadas outras emMunicípios que as reivindicam.

3. A Justiça Federal na Visão da ImprensaÉ campo para se enfocar, agora, um outro lado da Justiça Federal: o que se refere a suaimagem na Imprensa. Sabe-se que a imprensa transmite para a sociedade aquilo que estásendo pensado, em média, pelo cidadão. Ela é o espelho do sentimento do povo. Não sepode, assim, desconsiderar o que a imprensa transmite a respeito da Justiça Federal.Há, na abordagem de tal tema, de não se ficar vinculado aos excessos, às notícias dirigidaspara atender a determinados interesses. Tem-se que se acreditar na imprensa como umainstituição voltada para a informação, isto é, a boa imprensa.A imprensa só bem recentemente está se aproximando do Poder Judiciário. A culpa doafastamento está debitada ao modo fechado desse Poder lidar com a informação. A ausênciade uma cultura para tal fim motivou esse distanciamento.Sabe-se que na época atual todas as instituições (Igreja, Escola, Estado, Universidade,etc) se aproximam da imprensa. Há uma consciência de que ela, quando atua dentro dosprincípios para os quais foi criada, contribui para o aperfeiçoamento da entidade institucional,por torná-la conhecida pelo cidadão e, conseqüentemente, se exercita de modo confiávela sua missão passa a ser aceita pela sociedade.Foi feito recente estudo pelo Centro de Estudos da Justiça Federal sobre o que a imprensapensa a respeito da Justiça Federal. Esse estudo tomou por base pesquisa feita entre1992 e 1993, pelo IBOPE. Nessa época, chegou-se à conclusão de que 87% da populaçãofez queixumes contra a lentidão da Justiça Federal. O índice é, realmente, alarmante.Esse percentual de cidadãos afirmou que o problema existente, hoje, da demora na entregada prestação jurisdicional não está nas leis. Encontra-se na lentidão da Justiça. Outros86% por cento de pessoas pesquisadas opinaram que, no Brasil, certas pessoas, porocuparem posição destacada na escala social, mesmo que cometam ilícitos civis oucriminais, nunca serão punidas pela Justiça. É, também, um índice muito alto e preocupante.É verdade que dados estatísticos não devem ser analisados de modo isolado. Eles devemser vistos de modo conjuntural e vinculados com as influências emocionais do ambientepesquisado.Em uma outra pesquisa feita entre outubro e novembro de 1995, onde duas mil pessoasforam consultadas, ficou apurado que 56% delas entenderam que a principal causa dacorrupção no país é a ineficiência com que a justiça atua.Esses dados atingem diretamente o Poder Judiciário. Contudo, ele, isoladamente, não éculpado por esse quadro de não confiabilidade. Há desse Poder formar corrente dereivindicação junto ao Legislativo e ao Executivo para que as mudanças aconteçam.Mudanças na legislação, mudanças nas condições de trabalho, aumento do número deJuízes, e em fatores outros que contribuem para o quadro desfavorável demonstrado.Por outra visão pesquisada ficou apurado, contudo, que 53% dos cidadãos confiam noPoder Judiciário Federal. Esse percentual leva também preocupação. Tem-se, ainda, 47%de brasileiros que não acreditam ou crêem pouco na Justiça Federal.Sobre a Justiça Federal em especial há uma pesquisa ofertando o seguinte quadro:

a) 27% das pessoas concordam que o Poder Judiciário Federal tem um conceito

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entre bom e ótimo;b) 37% o conceituam como regular;c) 28% lhe emprestam um conceito ruim e péssimo.

Por último, a última pesquisa que tenho em mãos, realizada há uns dois meses passados,revela, numa escala de 1 a 10, que o Poder Judiciário recebeu nota 5. Isso representa quenada mudou: somente a metade da população brasileira crer na atuação da Justiça.Um outro levantamento demonstra que a Justiça Federal tem sido preocupação dos jornaisnum percentual de 1%. Tais dados demonstram que os 99% dos espaços dos jornais sãodedicados ao futebol, crimes, política, notícias da sociedade, horóscopo, culinária, etc.Esse dado não é tranqüilizador. Demonstra o quanto a Justiça Federal é desconhecida docidadão.A imprensa pouco destaca os 80 mil processos que estão em curso nesta Seção Judiciáriada Paraíba. Não informa que os magistrados federais dedicam-se ao estudo dos casosdurante os dias feriados, finais de semana, nas horas de lazer, em suas residências, etc.Não interessa à imprensa as angústias sofridas pelos magistrados em face do volume deserviço que lhes é entregue; idem os problemas gerados à sua saúde pela intensidade dotrabalho e as tensões provocadas pelas decisões e pelos reclamos da família e dasociedade.Ao lado de tais informações, colha-se o retrato, contudo, de que há uma credibilidadecrescente do cidadão no Poder Judiciário Federal. Em nenhum momento dos 496 anos dedescoberta do Brasil, filas e mais filas de cidadãos se formaram na porta dos Fóruns paraentregar suas petições reivindicando entrega de direitos subjetivos. Há alguns anos atrás,a Nação testemunhou tal episódio. A televisão nos mostrou, em São Paulo, integrantesde vários estamentos sociais batendo na porta da Justiça Federal para conseguirem aliberação dos cruzados bloqueados. As filas cresciam, as esperanças aumentavam e,conseqüentemente, a credibilidade na Justiça Federal era uma realidade.A imprensa noticiou amplamente tal fato por ser inusitado. Apresentou, porém, desinteressepelos resultados, com exceção quando saíram as primeiras decisões sobre desbloqueiodos cruzados e foi determinado, também, a devolução dos empréstimos compulsóriosdos combustíveis e das passagens para o exterior. Deu-se também publicidade para asliberações do FGTS e para declarações de inconstitucionalidade de leis que exigiam tributosfora dos parâmetros fixados pela Constituição Federal.A Justiça Federal tem sido a responsável pelas decisões de maior repercussão no País.Tem sempre se posicionado ao lado da Constituição e contrariado a vontade do Estado.Responderam e respondem os Juízes Federais de todos os graus com esforço e dedicaçãoàs críticas que lhe foram e que lhes são feitas.

4. Visão Interna da Justiça FederalOs magistrados integrantes da Justiça Federal não pensam, unicamente, em processar ejulgar os feitos que lhe são distribuídos.O Conselho da Justiça Federal, os Tribunais Regionais Federais e os Juízes Federaisestão profundamente preocupados com o melhoramento da Justiça Federal e com oaperfeiçoamento das suas instalações.Há uma visão interna dos problemas que afetam esse ramo do Poder Judiciário e umabusca de soluções.Há pleno reconhecimento da morosidade com que as ações são concluídas. Há demorana entrega da prestação jurisdicional, o que se transforma em tormentosa preocupaçãopara os responsáveis pelo funcionamento das Varas e Tribunais, especialmente, dos seus

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dirigentes.O volume de serviço tem aumento geométrico. As dificuldades para fazê-lo diminuir são devárias espécies, especialmente, no âmbito do Poder Legislativo e do Poder Executivo,onde a contribuição é limitada.A insuficiência de recursos para o reaparelhamento da Justiça Federal causa desestímuloe dificulta o cumprimento da missão do magistrado: a entrega célere da prestaçãojurisdicional.Buscam-se e propõem-se soluções. Não há, contudo, concretizações das propostas.Há no Brasil, em todos os níveis do Poder Judiciário, apenas 8 mil juízes para solução dasdemandas. No âmbito da Justiça Federal, há Varas com mais de 20.000 processos emandamento, sem se falar na sediada na cidade de Campina Grande que chegou a atingir40.000 processos.O aumento do número de juízes e de servidores, portanto, é uma necessidade.A informatização de todos os procedimentos judiciais na Justiça Federal contribuirá paradiminuir a crise. Esse é um programa que tem merecido a melhor das atenções dosdirigentes dos Tribunais e dos Juízes Federais que exercem as Direções do Foro.Encontra-se adiantada a informatização dos atos judiciais expedidos pela Justiça Federal.Há, contudo, muito a ser feito, o que exige liberação de dotação orçamentária suficientepara tal.Outra solução que muito ajudaria a melhorar a entrega da prestação jurisdicional, não sóno referente à demora, como também, no tocante à sua qualidade, é a simplificação dasnormas processuais.O nosso direito formal é rigorosamente burocrático. A complexidade acompanha aelaboração de todos os seus atos.A ciência processual tem avançado por demais em seus conceitos. Não tem, porém,conseguido fazer com que o processo se aproxime do cidadão, simplificando os seusatos.Há, hoje, grandes movimentos mundiais pela desburocratização do processo. Na Itália,Mauro Cappelletti comanda corrente em tal sentido. Defende-se o acesso à justiça domodo mais fácil e barato.Na Tailândia há uma experiência de ritos processuais com, apenas, quatro ou cinco folhasde papel. No Brasil, três ou quatro folhas de papel são as capas que se sobrepõem em umprocesso, quando ele sobe aos graus superiores.O Poder Judiciário e a Ordem dos Advogados do Brasil devem iniciar movimentos para queleis modernas sejam elaboradas, facilitando o curso do processo.A responsabilidade por tais movimentos deve ser dividida. O sistema de co-gestão necessitaser adotado. Todos os seguimentos sociais devem colaborar.As classes sociais devem exercer coerção para que haja uma entrega melhor da prestaçãojurisdicional. Advogados, estudantes de Direito, sindicatos, associações de classe devemse unir na busca da adoção de meios legais e administrativos para que o cidadão recebaa solução do seu litígio com maior rapidez e melhor qualidade.A criação dos Juízados Especiais não é o suficiente. Representa apenas um início de umciclo histórico que tem muito a percorrer para a sua consumação.

5. Uma Proposta para o Século XXI?Não é fácil fazer uma proposta de modificação da Justiça Federal para o Século XXI.

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O Século XXI será por nós enfrentado com perplexidade crescente. O futuro que nosespera se apresenta com forte dose de desconhecimento, face aos inúmeros problemasque estão nos envolvendo no presente.Temos a certeza, apenas, de que a era contemporânea é angustiante. Em 1990, porexemplo, o primeiro grau da Justiça Federal julgou 172 mil processos. No ano de 1994, onúmero de processos julgados passou para 410 mil. É um crescimento vertiginoso e semaumento de condições de trabalho para atendimento da demanda.No ano de 1990, os Tribunais Regionais Federais julgaram 89 mil feitos. No ano de 1994,tal número alcançou 184 mil.O crescente aumento de ações perante o Poder Judiciário Federal revela que o Estadoestá, a cada dia mais, a violar o direito subjetivo do cidadão. O que fazer? Modificar oEstado? Diminuir o seu tamanho? Impor-lhe regras coercitivas para que não tenha talcomportamento? As respostas são variadas e algumas impossíveis de serem cumpridas.O primeiro grau da Justiça Federal tem, na data de hoje, 358 Varas Federais em todo oPaís. Algumas faltam a ser instaladas. De 1989 a 1994, recebeu 2.843.007 processos.Julgou 1.735.431; no ano de 1995 tinha 1.115.000 processos sem julgamento. Issorepresenta 1.115.000 conflitos sem solução.O segundo grau, os Tribunais Regionais Federais receberam, em seus quase seis anosde funcionamento, de 1988 a 1994, 1.050.000 processos. Julgaram 673.000. Há, assim,400.000 processos que passaram para o ano de 1995. Não sei precisar os números dehoje. Não possuo elementos para identificá-los.Não sei o que nos espera no próximo Século XXI. Temo que, se nenhuma solução forencontrada neste final de Século, há de muitas tensões serem vivenciadas no futuro quese aproxima.O que tenho a defender é a certeza de que o Juiz Federal não tem medo de enfrentar ofuturo e está preparado para tal. Saberá, em qualquer circunstância, cumprir com o seudever e honrar o compromisso assumido com a Nação. Em várias oportunidades, tanto osque foram responsáveis pelo início da Justiça Federal, os valorosos Juízes nomeados em1966, como os atuais, eles têm dado prova do que agora aqui está afirmado.A Justiça Federal do final deste século tem que cada vez mais se preocupar com a suaaproximação com o cidadão. Ele é a razão principal da sua existência, por caber zelarpelo seu direito subjetivo.A toga do juiz da atualidade e do futuro deve ter a cor e o corte da sociedade onde ele atua.Não o corte e a cor que o Estado quer que ela tenha. O modelo a ser seguido é o queridopelo cidadão. Nunca o das forças econômicas e das ideologias pessoais do magistrado.Os juízes são mensageiros estatais da paz. Devem, portanto, entregá-la do modo melhorpossível.

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GLOBALIZAÇÃO E DIREITO

José de Castro MeiraJuiz do Tribunal Regional Federal - 5ª Região.

1. Introdução. 2. O Fenômeno da Globalização. Visão Genérica. 3.A Integração Regional. 4. Os Passos Necessários para a IntegraçãoRegional. 5. O Exemplo da União Européia. 6. O ExtraordinárioCrescimento do Setor Privado. 7. Repercussões das Mudanças.Cautela na Análise do Fenômeno. 8. O Brasil no ComércioInternacional. Alguns Entraves. 9. Algumas Repercussões daGlobalização no Direito. 10. Conclusão.

1. IntroduçãoO estudo da ocorrência da globalização e suas implicações no fenômeno jurídico assumegrande complexidade. Na presente exposição, abordarei apenas alguns aspectos que meparecem mais importantes, a fim de que possa suscitar interesse para que outros tambémreflitam sobre os questionamentos que são aqui trazidos. Abordarei inicialmente o fenômenoda globalização e, eventualmente, suas repercussões na economia e sociedade brasileiras.Na segunda parte, procurarei analisar alguns temas jurídicos que parecem particularmenteatingidos pelas recentes mudanças econômicas.

2. O Fenômeno da Globalização. Visão GenéricaUm breve exame da História revela-nos uma tendência crescente na aproximação dospovos, facilitada pelos novos meios de transporte e comunicação, a ponto de, em dadomomento, falar-se em uma “aldeia global”. O maior incremento em tal aproximação nosúltimos anos assumiu características especiais, não apenas pela intensificação maior dointercâmbio entre os povos, mas por outras características especiais como a mudança naestrutura das organizações econômicas e do processo produtivo.Na busca de maior racionalização no emprego dos fatores de produção, as empresasmultinacionais ou transnacionais não hesitam em buscar mão-de-obra ou matéria-primaem qualquer lugar onde possa obter maior vantagem. Desse modo, uma grande empresanorte-americana ali não tem mais do que um centro de pesquisa de modelos, preferindolocalizar a fábrica em outros países, como Porto Rico, em que o custo da mão-de-obra éexpressivamente menor do que no país de origem. Outras vezes, o produto final é o resultadoda reunião de peças fabricadas em diversos países pela mesma empresa ou por empresasdiferentes que se especializam na fabricação de determinados componentes, não sepodendo definir com precisão o país de origem da fabricação daquele bem.

3. A Integração RegionalAo mesmo tempo, o multilateralismo que era apregoado pelo GATT viu-se completamentemodificado com a formação dos blocos regionais, dos quais os mais importantes são ogrupo constituído pelos países do NAFTA, liderado pelos Estados Unidos; a União Européia,liderado pela França e Alemanha, e o bloco asiático, liderado pelo Japão.Entre nós, o Tratado de Assunção instituiu o MERCOSUL, tendo como fundadores Brasil,Argentina, Paraguai e Uruguai, com a adesão já anunciada do Chile, Colômbia e Venezuela.Cabe assinalar, porém, que esses blocos não se limitam a caminhar de forma compactae isolada. Ao contrário, entre os seus países isoladamente ou entre os própriosagrupamentos celebram-se inúmeros acordos, ajustes ou tratados, a exemplo do que

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está sendo celebrado entre o MERCOSUL e a União Européia.O fenômeno da globalização mediada pelos blocos econômicos foi assinalado peloeconomista americano, professor MIT, LESTER THUROW, na sua obra O Futuro doCapitalismo, ao escrever: “Países se estilhaçam, blocos regionais de comércio crescem,a economia global torna-se cada vez mais inter-conectada”.A expressão “inter-conectada” é bem reveladora. No mundo contemporâneo, grandesoperações são realizadas em poucos segundos, através dos computadores.No campo financeiro, tais mudanças se fazem notar de modo eloqüente. Primeiro, pelovolume gigantesco dos empréstimos internacionais. Em 1971, o volume dos empréstimosinternacionais de médio e longo prazo feitos pelo capital privado foi de 10 bilhões dedólares. Em 1995, 1,3 trilhão, ou seja, 130 vezes mais no período de 24 anos. O segundoaspecto diz respeito ao chamado capital volátil, ou “smart money”, à busca de melhorremuneração, que chega e sai dos países tomadores dos empréstimos com a mesmavelocidade.

4. Os Passos Necessários para a Integração RegionalO objetivo da integração não é alcançado senão depois de longo processo de maturação,passando por diversas fases.O primeiro estágio é o da Zona de Livre Comércio, em que os países concordam emeliminar ou reduzir as barreiras alfandegárias exclusivamente para as importações demercadorias produzidas dentro dessa área. É o caso da ALADI.O segundo é o da União Aduaneira, em que são eliminadas as barreiras alfandegáriaspara a importação de mercadorias produzidas dentro da área, com o estabelecimento deuma Tarifa Externa Comum. O MERCOSUL está nessa etapa.Assim sendo, verifica-se que a importação dos bens de terceiros países submetem-se àsmesmas tarifas em qualquer dos seus integrantes. Houve algumas postulações no âmbitoda 5ª Região em que se argumentou que a TEC se destinava exclusivamente aos signatáriosdo Tratado de Assunção, quando na verdade os destinatários são os demais países.O terceiro estágio é o Mercado Comum, em que além das características da fase anterior,são eliminadas as restrições aos fatores de produção, capital e trabalho. Um empresárioargentino poderia estabelecer-se no Brasil, sob as mesmas regras a que estão submetidosseus colegas nacionais, ou um médico brasileiro poderia prestar serviços profissionais emBuenos Aires.O quarto estágio ocorre quando os países procuram adaptar suas legislações paraharmonizá-las com os objetivos comunitários. É a União Econômica. Aqui são criadasinstituições comunitárias, como na União Européia, porém, todo o seu território passa aser considerado como uma unidade. Os direitos de importação, conhecidos na Espanhacomo “aranceles”, destinam-se à União Européia, ficando os países com as receitas doIVA (Imposto sobre o Valor Agregado) e outros tributos.O quinto e último estágio é o da União de Integração Total, quando os países decidemadotar uma política monetária comum, que é o próximo objetivo dos países da UniãoEuropéia.

5. O Exemplo da União EuropéiaÉ preciso compreender, também, que o processo de integração não se faz de modoinstantâneo, mas é o resultado de uma experiência demorada. Além disso, não traz apenasbenefícios, como também problemas que precisam ser superados ao longo do tempo.Tomemos o exemplo da União Européia. A idéia de unificação é antiga. Em 1929, a

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França formulou a proposta, não concretizada pela crise econômica da época e pelosurgimento dos movimentos nacionalistas de índole fascista, mas ficou a idéia. Em 1950,foi firmado o tratado sobre carvão e aço, dando origem à Comunidade Européia do Carvãoe do Aço, com os princípios fundamentais da futura CEE, criando instituições comuns,com expressa renúncia à soberania nacional de cada país signatário. Em 1957, é assinadoo Tratado de Roma, que entrou em vigor no ano seguinte, firmado pela França, Alemanha,Itália, Bélgica, Holanda e Luxemburgo. Os demais países que hoje integram a atual UniãoEuropéia foram aderindo paulatinamente: em 1973, Irlanda, Dinamarca e Reino Unido. AGrécia formulou seu pedido nesse mesmo ano, só aceito em 1981. Portugal e Espanhasão admitidos em 1986, passando por uma fase transitória que só se completa em 1992.Os principais objetivos do Tratado de Roma podem ser assim resumidos: fim das barreirasalfandegárias entre os Estados-membros; estabelecimento de uma Tarifa Externa Comumem relação a terceiros países; supressão entre os signatários dos entraves à livre circulaçãode pessoas, serviços e capitais; política comum agrícola e de transportes; adaptação daslegislações nacionais à comunitária; surgimento de um Banco Europeu de Investimentos.Criaram-se ainda o Parlamento (interesses políticos), o Conselho (interesses dos governos),a Comissão (interesses comunitários) e o Tribunal de Justiça (aplicação do direitocomunitário).Tais objetivos vêm sendo alcançados ao longo de todos esses anos. No momento, discute-se a introdução da moeda única, medida de extrema complexidade, tendo em vista osdiferentes níveis dos países quanto ao equilíbrio orçamentário, gerando conflitos com osinteresses nacionais. A política econômica formulada por tecnocratas, sem maiorcompromisso com os objetivos sociais, pode gerar problemas da maior relevância, comoo visto há pouco na França, quanto à sua política previdenciária.

6. O Extraordinário Crescimento do Setor PrivadoOutro aspecto da ocorrência da globalização é o extraordinário crescimento do setor privado,em que as dez maiores empresas do mundo têm um faturamento equivalente à soma doPIB do Brasil, México, Argentina, Chile, Colômbia, Uruguai e Venezuela. Aqui se vê umfenômeno inverso ao que acontecia antes: os governos correm atrás das empresas, daí achamada “guerra fiscal”, em que diversos governos porfiam em proporcionar mais incentivosà instalação de grandes empresas.Pelo lado do consumidor, já não sabe mais quando está a adquirir um produto estrangeiroou nacional, porque os produtos são o resultado de participação de diversos países.

7. Repercussões das Mudanças. Cautela na Análise do FenômenoEssa intensificação nas mudanças denota uma profunda alteração nas relaçõeseconômicas, políticas e jurídicas que precisam ser refletidas pelos profissionais do Direito,com vistas à preservação dos direitos humanos e dos valores jurídicos fundamentais.É preciso cuidado com análises apressadas quanto a alguns fenômenos de nossa época.Um exemplo são os países asiáticos, especialmente os chamados “tigres”- Hong Kong,Taiwan (Formosa) Coréia do Sul e Cingapura. Apontados como modelos a serem imitados,começam a revelar deficiências, levando os grandes investidores a perderem o entusiasmoinicial. O economista PAUL KRUGMAN, do MIT, já denunciara o “mito do milagre asiático”.A legislação da maioria desses países não assegura o respeito pelos direitos trabalhistas.KRUGMAN cita o caso da Cingapura que cresceu mobilizando recursos de uma formaque “deixaria Stalin orgulhoso”.Nada obstante, começam a enfrentar dificuldades. O colunista GILSON SHCWARTZ (Folha,18.08.96) anota que “a economia coreana está engasgada”, com a bolsa deprimida emaus resultados das empresas neste primeiro semestre. Por outro lado, o Presidente de

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Taiwan, LEE TENG-HUI, faz advertência sobre os riscos de investimento na China. Convémlembrar também que apenas recentemente foram realizadas as primeiras eleições emFormosa, que não pode ser apontada como exemplo para os países que optaram pelomodelo democrático.Tais observações parecem oportunas para o momento que atravessamos. Alguns políticose empresários vêm defendendo uma abertura a qualquer preço, sem nenhuma ressalvapara os interesses nacionais. Cria-se verdadeira histeria quando alguns países fazemconsultas à OMC a propósito de determinadas medidas de política econômica.Ressalte-se que as discussões sobre temas dessa natureza são relativamente comuns, ea lição dos países que promoveram um processo de maior inserção no comércio internacionalé no sentido de lutar pela preservação dos seus interesses.Em artigo publicado na edição da Folha de São Paulo do dia 17 deste mês (sábadopassado), GIORGIO ROMANO SCHUTTE, que é mestre em Relações Internacionais pelaUniversidade de Amsterdã, chama a atenção para a necessidade de desmitificar a opiniãosegundo a qual a atenção sobre o tema da globalização seria fruto do “eterno provincianismo”brasileiro. Lembra o autor recente conferência ocorrida na Holanda. O evento foi transmitidoao vivo pela televisão, sem que o público conseguisse entender o significado da palavra.Concluíram os participantes que a Holanda deveria rapidamente fazer reformas naPrevidência Social, flexibilizar, desregulamentar e, dessa forma, diminuir o “custo Holanda”para se tornar competitiva no mercado internacional e enfrentar a realidade da economiaglobalizada.Depois de outras considerações sobre o tema, o economista oferece-nos importante lição:“Subestimar a nova fase de internacionalização da economia é tão errado quanto considerá-la uma fase natural, à qual temos de nos adequar como um navegante ao sabor dacorrenteza”.

8. O Brasil no Comércio Internacional. Alguns EntravesCertamente o Brasil precisa abrir sua economia ao exterior. Nossa participação no comérciomundial ainda é muito modesta. As exportações que, em 1984, eram 1,4% das vendasmundiais, caíram em 1995 para 0,9%. Por outro lado, as importações respondem aindapor apenas 8% a 9% do consumo interno, índice inferior ao da Índia, que é de 11%.São inegáveis as vantagens da maior participação do País no comércio internacional e éevidente a necessidade da maior abertura. Entretanto, há algumas pedras a entravar essacaminhada. As enormes distâncias em nosso país são vencidas por transporte rodoviário,de custos muito mais altos do que o efetuado em ferrovias, agravado pelo mau estado denossas rodovias. Há ainda a obsoleta estrutura portuária, com serviços caros e empregandoequipamentos superados. O Deputado JÚLIO REDECKER, Presidente da SubcomissãoPermanente de Comércio Exterior, observa que os custos máximos por contêiner no Portode Santos estão além dos US$ 800,00, enquanto no porto chileno de Valparaíso estãopouco acima de US$ 250,00. Lembra ainda o parlamentar outras dificuldades, como acarga tributária incidente sobre os produtos destinados à exportação e a sobrevalorizaçãoda moeda brasileira como outras dificuldades às exportações nacionais (Gazeta Mercantil,1º.08.96).Recentemente, em palestra pronunciada no encerramento do curso de pós-graduação emcomércio exterior realizado pela FCAP/FESP, em convênio com a Universidade deBarcelona, o industrial PAULO GUSTAVO CUNHA começou lembrando a frase do lídercomunista DENG XIAO PING, em 1982: “Nenhum país do mundo, seja qual for o seusistema político, chegou a modernizar-se com uma política de portas fechadas”.O Brasil adotou como modelo de industrialização, como sabemos, a substituição deimportações, criando barreiras alfandegárias para a implantação do seu parque industrial.Tal protecionismo levou as empresas nacionais a certa acomodação. Já que tinham à sua

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mercê um enorme mercado cativo, não havia maior preocupação com o binômio preço-qualidade do produto. Além disso, acostumaram-se a benfazeja ação estatal que as protegiacom taxas de câmbio especiais para a importação, linhas de financiamentos tentadoras eoutros favores oficiais. Por isso, poucas empresas se aventuravam à dura competiçãointernacional.Daí as enormes dificuldades que os grupos nacionais estão tendo para enfrentarem acompetição internacional, com o fechamento de empresas tradicionais. Todos estamoslembrados da reserva para a informática. Dizia-se que seria o custo que a sociedadepagaria para a criação de uma tecnologia nacional. Acabada a reserva, onde algunsganharam e a maioria pagou a alta conta, é de perguntar-se: Onde andam os gruposnacionais?Impende que se desenvolvam esforços no sentido de adaptar nossa economia para que oPaís não seja ultrapassado pelos fatos. Todavia, é preciso que se busque o ritmo adequado,evitando-se os avanços e retrocessos dos últimos tempos, hesitações que causaminsegurança e terminam por desestimular os investidores com prejuízos incalculáveis.No mês de maio deste ano, o economista ÁLVARO ANTÔNIO ZINI JR., Professor titular deMacroeconomia Aberta da Faculdade de Economia e Administração da USP, promoveuuma conferência sobre a globalização. Resumiu o ilustre professor a conclusão do trabalhoque apresentou juntamente com a Profª FERNANDA ARANTES, da mesma faculdade,nos seguintes termos, que resumem muito bem o fenômeno ora discutido:

“Pode-se tirar a conclusão de que globalização significa mudança;deixando para trás o passado (sem o esquecer) e indo em direçãoa uma nova época histórica.”

A globalização não é uma mudança para o caos, mas para uma configuração que sedissemina pelos quatro continentes, menos a África.Este conjunto de países escolheu o capitalismo como regra do jogo e sabe que o juiz quevai apitar a partida fala inglês, usa uniforme azul da Marinha americana e tem em instituiçõescomo OMC, FMI e BIRD órgãos de defesa de seus interesses.Em um sentido histórico, a globalização é a ‘Pax Americana’.Isto pode trazer benefícios e custos para cada país, mas, seguramente, temos no Brasilmuitas das qualidades que irão marcar o novo período: flexibilidade, capacidade de darrespostas rápidas a situações novas e espírito criativo. Mas, do lado oposto, não temossuficiente educação escolar, dado o descaso com que esta área é tratada pelo governo.Mais saúde e educação, governo! (Folha de São Paulo, ed. de 26.05.96).Realmente, nesses dois aspectos situam-se as grandes dificuldades brasileiras. Em recenterelatório da ONU, considerando apenas os indicadores de saúde e educação, no períodode 1960 a 1992, o Brasil teve um desempenho inferior à média mundial, embora tenha sidoum dos dois que mais cresceram no período (o outro foi a ilha de Barbados), entre ospaíses latino-americanos e do Caribe. Nesse relatório, a ONU constata que “nenhum paísconsegue uma transformação estrutural da economia sem elevar os níveis de educaçãobásica”, citando diversos países em que o crescimento do PIB esteve diretamenterelacionado com o nível de escolaridade.A educação do povo tem sido a grande alavanca do desenvolvimento. A pesquisa científicae o desenvolvimento tecnológico a cada dia assumem importância decisiva para os paísesque pretendam ter um papel relevante na economia globalizada. Aqui lembro uma reflexãodo diplomata RUBENS RICUPERO, atual Secretário Geral da UNCTAD, a propósito dadramatização radiofônica de ORSON WELLES sobre uma fictícia invasão de marcianos,que levou algumas pessoas amedrontadas a se matarem: “O episódio lança luz sobreuma verdade pouco percebida: a de que vivemos muito mais de futuro que de presente.

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Arranque-se de alguém o seu futuro e tê-lo-emos conquistado para a morte” (Visões doBrasil, Record, 1995, pág. 28).

9. Algumas Repercussões da Globalização no DireitoFeitas essas breves considerações sobre o fenômeno da globalização, cumpre analisarsuas conseqüências para o Direito.

9.1 A Sobrevivência da Soberania EstatalA primeira conseqüência, a meu ver, diz respeito à sobrevivência da organização estatal,sobretudo depois da queda do comunismo.Escrevendo sobre o tema, o diplomata ALFREDO TORO HARDY, Embaixador da Venezuelano Brasil, observa:

“A nova linguagem do direito internacional se assenta em conceitostais como ‘soberanias limitadas’, ‘tutelas internacionais’, ‘direitosde ingerência’ e ‘administrações supra nacionais’, que têm comodenominador comum o desconhecimento do Estado como atoressencial da vida internacional”. (O Estado pode ter deixado deter sentido, Gazeta Mercantil, 12.08.96.)

Entre nós parecem-me preocupantes as ingerências internacionais na Amazônia, a propósitode defesa dos povos indígenas ou de alguns bens de indiscutível interesse para todos,como a ecologia, o meio ambiente e os recursos naturais.Na importante questão que envolve a definição do papel do Estado na sociedadecontemporânea, parece fundamental admitir que a redução do tamanho do Estado nãopode torná-lo incapaz de mediar os conflitos, sob pena de deixar a grande maioria dapopulação sem qualquer defesa, completamente dominada pelos grandes gruposeconômicos e financeiros, que têm no lucro o único objetivo de suas ações.Na verdade, a crise do conceito de soberania não é preocupação muito recente. NICOLAMATEUCCI refletiu sobre o tema, mostrando que nos achamos diante do ocaso dasoberania, ressaltando a importância do conceito político-jurídico de soberania, ao visar auma síntese entre o poder e o direito, entre ser e dever ser, buscando a racionalização dopoder através do direito. E conclui: “Estando este supremo poder de direito em via deextinção, faz-se necessário agora, mediante uma leitura atenta dos fenômenos políticosque estão ocorrendo, proceder a uma nova síntese político-jurídica capaz de racionalizar edisciplinar juridicamente as novas formas de poder, as novas autoridades que estão surgindo”(Dicionário de Política, de Norberto Bobbio, Nicola Mateucci e Gianfranco Pasquino, 2ªed., Ed. Univ. de Brasília, págs. 1.187/1.188).Nesta fase da História, torna-se fundamental que o tema seja amplamente discutido, a fimde que os valores já conquistados pela civilização não comecem a ser relegados.

9.2 O Direito ComunitárioSeguindo a lógica da evolução da Comunidade Européia, a criação de novas instituiçõesimplicará o desenvolvimento de estudos do direito comunitário, com análise da legislaçãoemanada do Parlatino e a jurisprudência de um Tribunal de Justiça do MERCOSUL, àsemelhança do que ocorre com o Tribunal de Justiça da União Européia. Tudo indica,porém, que a instituição de uma Corte de Justiça não está posta entre os objetivosimediatos.Escrevendo sobre o tema, o Embaixador JOSÉ BOTAFOGO GONÇALVES assinala que osistema atual deve ser mantido. E explica: “Trata-se de mecanismo ágil, em muito similara outros tantos previstos em acordos de comércio firmados no âmbito da ALADI, e contemplatrês etapas distintas: as negociações diretas, a intervenção do órgão executivo do Mercosul

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e a fase arbitral. A garantia de segurança jurídica do Mercosul está assente no acessofacilitado ao referido mecanismo e no caráter obrigatório e inapelável dos laudos arbitraisemitidos pelos diversos Tribunais Ad Hoc do Protocolo de Brasília, tantos quantos foremnecessários para a solução, caso a caso, das controvérsias surgidas no Mercosul” (Ostribunais do Mercosul, Gazeta Mercantil, 15.08.96).A experiência européia pode ser-nos útil. A instituição do Tribunal de Justiça europeuverificou-se quando as condições sócio-econômicas revelaram a sua necessidade. Dessemodo, o Tribunal de Justiça do MERCOSUL não deveria ser uma preocupação imediata.Entretanto, deve ser um projeto a merecer a reflexão de todos, especialmente dosdiplomatas, dos juristas e dos que militam no comércio intra-regional.

9.3 Concessão e Permissão de Obras e Serviços PúblicosOutro instituto que tende a ganhar prestígio diz respeito à concessão e permissão. Sentindoa insuficiência de recursos financeiros para a execução de serviços e obras públicas, oGoverno aprovou as Leis 8.987, de 13.02.95, e 9.074, de 07.07.95, que disciplinam osinstitutos da concessão e permissão de obras e serviços públicos.Ainda são poucos os estudos jurídicos desenvolvidos sobre a matéria, mas tudo indicaque se tornarão temas da maior importância, na medida em que o setor público fizer maioruso de tal legislação.Como bem assinala o tributarista IVES GANDRA DA SILVA MARTINS:

“Na realidade, a privatização se destina a resolver o problemapresente das sociedades de economia mista e das empresaspúblicas, muitas das quais estão à beira da insolvência.

Já a concessão permite a construção do futuro, substituindo aadministração pelo segmento privado, não só na manutenção dosserviços públicos, mas também (e este é, no momento, o seuaspecto principal) no tocante à realização de obras públicas” (“ALei de Concessões e o direito de parceria”, Folha de São Paulo,07.04.96).

9.4 Direito SocietárioCresce, também, a demanda pelos estudos de direito societário, em decorrência dasprivatizações de empresas estatais ou do incentivo a incorporações, fusões e “jointventures” de empresas.Entre nós, vem-se destacando o advogado que atua junto a empresas familiares. É o casodo advogado gaúcho RENATO OCHMAN, que assim sintetizou o papel do profissional queatua nessa área: “Ser um pouco psicólogo e economista, profundo conhecedor de direitode família e, sobretudo, ter boa forma física e paciência de Jó” (Gazeta Mercantil, 29.07.96).De fato, a atuação do profissional pode envolver situações muito delicadas. É o caso doadvogado que se vê em dificuldades para colher elementos necessários à defesa porqueos diretores, embora parentes, simplesmente não se falam, devido às questiúnculas que,entretanto, se tornam obstáculo à comunicação na empresa.Em casos dessa ordem, é preciso valer-se de argúcia para superar o impasse. Um juristade expressão nacional narrou-me uma experiência singular : Dois irmãos queriam dividiros bens comuns em razão de desavenças familiares. Todavia, nenhum deles concordavacom a parte que lhe era atribuída. Valeu-se o jurista de inspiração salomônica, propondo:um deles ficaria encarregado da divisão do patrimônio em duas partes iguais, todavia aooutro ficaria atribuída a faculdade de escolher a que melhor lhe aprouvesse. A proposta foiaceita. E, assim, foi resolvido o problema que se achava pendente havia muito tempo.

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9.5 ConsultoriaNos maiores centros, é a vez da consultoria, a cargo de grandes escritórios de advocacia,que começam a adaptar-se às novas tendências da globalização. Além disso, parececrescer o interesse na questão para temas como os relativos às patentes e aos aspectosde direito autoral, sem falar nos problemas jurídicos que estão por surgir pelo uso massivoda informática e da INTERNET.Tudo indica que partiremos para o maior prestígio da advocacia preventiva, como acontecenoutros países, a exemplo dos Estados Unidos, em que não se constitui uma empresanem se celebra um contrato sem a participação do advogado especializado.

10.ConclusãoCertamente, muitos outros aspectos novos mereceriam destaque. Lembrei apenas algunsque me pareceram mais importantes. É um novo amanhã que surge. Cabe a todos nós,profissionais do direito, empenhar nossos esforços para que predominem os valores cristãose democráticos nesse novo tempo, certos de que, nessa sociedade em mutação, nossopaís tem um importante papel a desempenhar. É a nossa grande missão.

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NOVO SISTEMA DE RECURSOS NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

José Lázaro GuimarãesJuiz do Tribunal Regional Federal da 5ª Região

Módulo nº 1

Sumário da primeira aula

I– Introdução. II- Normas e princípios gerais. 1- Pressupostosrecursais. 1.1– Recorribilidade; 1.2– Adequação; 1.3– Preparo; 1.4–Tempestividade. 2-Pressupostos negativos. 2.1- Fatos extintivos;2.2- Fatos modificativos; 2.3- Fatos impeditivos. 3- Competênciado órgão revisor. 4- Condições de admissibilidade; 4.1-Legitimidaderecursal; 4.2- Interesse recursal; 4.3- Petição recursal apta.

I. IntroduçãoEste curso oferecido pela “Teia Jurídica” busca estudar a nova sistemática recursal noCódigo de Processo Civil, após a reforma introduzida pelas Leis 8.950/94 e 9.139/95, coma finalidade de apontar novos conceitos e discutir as questões levantadas pela doutrina epela jurisprudência.Os destinatários destes estudos são usuários da revista eletrônica lançada há exatas 15semanas, estudantes e profissionais do Direito que navegam pelas ondas cibernéticas àprocura de conhecimento e informação, sem as limitações de espaço (os participantes sedistribuem por todo o País, com os vínculos comuns à página na WEB e ao correioeletrônico) e com maiores facilidades de tempo.O curso será dividido em seis módulos, a saber-. 1 - Normas e princípios gerais; 2 -Apelação; 3 Agravo; 4 - Embargos infringentes; 5 - Embargos de declaração e Agravoregimental; e 6 - Recurso ordinário, Recurso especial, Recurso extraordinário e embargosde divergência.Para cada módulo, haverá um texto básico. Os participantes receberão o material pelocorreio eletrônico, em attachment de arquivo Word 7.0. Aqueles que não dispõem desseprograma poderão solicitar a conversão para o seu editor de texto e, se possível, receberãoarquivo convertido. As provas serão prestadas opcionalmente. Cinco dias depois de recebero texto da aula de cada módulo, o candidato terá as questões formuladas com o objetivode avaliar o aprendizado.A qualquer momento, os participantes poderão formular perguntas, críticas, sugestões ecomentários, encaminhando-as pelo correio eletrônico. O endereç[email protected] estará sempre disponível.

II. Normas e princípios geraisRecurso é o meio de que dispõem as partes, o Ministério Público e o terceiro prejudicadopara provocar a reapreciação de atos decisórios, no curso do processo. A sua naturezacoincide com a da ação, de que é ato inaugural de uma nova fase procedimental destinadaà revisão do ato impugnado.Ação, na definição de Chiovenda, é o poder de provocar a atividade jurisdicional, de modoautoritativo, substitutivo e subsidiário. Dirige-se, portanto, a um órgão do Poder Judiciário,para que este, com a autoridade outorgada pela Constituição Federal, emita o ato de

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vontade destinado a suprir a não realização voluntária do direito, acertando o conflito deinteresses qualificado pela pretensão resistida (lide, conforme Carnellutti), ou constituindoato somente realizável na via judicial, por imposição legal1 .O recurso impugna sempre um ato decisório, encaixando-se no curso do processo, noqual se integra, e fazendo abrir uma nova fase, um procedimento subseqüente. Se aimpugnação faz instaurar um outro processo não será recurso, mas ação autônoma.Assim, diante da sentença, dentro de 15 dias, cabe recurso de apelação. Mas, casoultrapassado esse prazo, efetivando-se a coisa julgada, aquele mesmo ato, desde quepresente um dos requisitos do art. 485 do CPC, dará lugar a ataque por meio da açãorescisória, até dois anos após o trânsito em julgado. A diferença, como se vê, é que orecurso ataca a decisão no mesmo processo em que ela foi proferida, enquanto a açãoautônoma, como a rescisória, ou o mandado de segurança contra ato judicial, faz instauraroutro processo.Da mesma forma que a ação, o recurso, para ensejar a formação e desenvolvimento deuma nova fase procedimental e para ser apreciado pelo órgão competente, sujeita-se apressupostos (antecedentes necessários para que possa ser recebido e apreciado o seuobjeto) e condições (requisitos intrínsecos ao recurso, indispensáveis ao conhecimentodo pedido de reforma ou de anulação da decisão).As Leis 8.950/94 e 9.139/95 introduziram uma nova sistemática recursal, no processo civilbrasileiro, procurando torná-lo mais simples e ágil. Dentre as inovações, destacam-se oônus do preparo como pressuposto para desenvolvimento válido do recurso, a uniformizaçãodos embargos de declaração, a interposição do agravo de instrumento diretamente aotribunal e o aprofundamento do efeito devolutivo, permitindo ao colegiado conhecer dequestões não apreciadas na sentença.Neste primeiro módulo do nosso curso, serão apreciadas as normas e princípios geraisdos recursos, na nova sistemática introduzida pela reforma do processo civil.

1. Pressupostos recursaisÉ preciso saber, em primeiro lugar, para determinar se cabível o recurso, da ocorrência decertos antecedentes que a lei impõe para que se o receba. Tais pressupostos são arecorribilidade, a adequação, o preparo, a tempestividade e a inexistência de fato extintivoou impeditivo do poder de recorrer.

1.1 RecorribilidadeA decisão impugnada deve estar sujeita a recurso, ou, em outras palavras, é preciso estardiante de um dos atos judiciais recorríveis - as decisões interlocutórias, as sentenças, osacórdãos e as decisões monocráticas dos membros do tribunal. Os despachos de meroexpediente são irrecorríveis (art. 504). A regra mais simples para indicar se determinadoato processual é, ou não, recorrível é examinar se tem conteúdo decisório, se resolvealguma questão no processo, seja, por exemplo, referente à postulação, ao contraditório,à prova, à comunicação, à intervenção de terceiros, à competência, à conexão, à continênciaou ao objeto da ação. Se o ato não tem carga decisória, mas apenas dá impulso ao feito,dele não há recurso.

1.2 AdequaçãoPara cada tipo de ato processual, há um recurso adequado à sua impugnação. Sabe-seda adequação confrontando o caso com o permissivo recursal específico. Em princípio, há

1 São diferentes as hipóteses de acertamento de uma lide e de constituição de um ato por imposição legal. Na primeira, que pormuito tempo a doutrina entendeu ser o campo exclusivo da atividade jurisdicional, o juiz substitui a vontade das partes em conflito.Na segunda, ainda que não exista conflito (ex. - a anulação do casamento), a lei exige o ajuizamento da ação constitutiva.

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a seguinte correspondência entre os tipos de atos e o recurso apropriado:1. da decisão interlocutória (§ 2º do art. 162) - cabe agravo retido (art. 523) ou agravo de

instrumento (art. 524);2. da sentença (§ 1º do art. 162, seja terminativa - art. 267 - ou de mérito - art. 269) cabe

apelação (art. 513);3. do acórdão não unânime, proferido em apelação e em ação rescisória - cabem embargos

infringentes (art. 530);4. da sentença ou acórdão, quando apontada obscuridade, contradição ou omissão -

cabem embargos de declaração (art. 535);5. do acórdão dos tribunais superiores, em mandado de segurança, habeas data ou

mandado de injunção, quando denegada a ordem, cabe recurso ordinário para o SupremoTribunal Federal (art. 539, I) e do acórdão dos tribunais ordinários (TJ ou TRF) emmandado de segurança, quando denegada a ordem, cabe recurso ordinário para oSuperior Tribunal de Justiça (art. 539, II);

6. do acórdão proferido em única ou última instância pelo tribunal ordinário (TJ ou TRF),quando apontada infringência de lei federal ou divergência com acórdão de outro tribunal,cabe recurso especial, para o STJ (art. 105, III,CF, e art. 541, CPC);

7. do acórdão proferido pelo tribunal ordinário ou pelo Superior Tribunal de Justiça, quandoapontada violação da Constituição Federal, caberá recurso extraordinário, para o STF(art. 102, III, CF, e art. 541, CPC);

8. do acórdão de Turma do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal,quando apontado dissídio com acórdão de outra turma ou do plenário, cabem embargosde divergência (art. 546);

9. da decisão do presidente do tribunal que nega seguimento a recurso extraordinário ourecurso especial cabe agravo de instrumento para o Supremo Tribunal Federal ou parao Superior Tribunal de Justiça, respectivamente (art. 544);

10. da decisão do relator, no recurso especial ou no recurso extraordinário, que negarseguimento ou que negar provimento ao agravo de instrumento, cabe agravo para oórgão julgador (art. 545);

11. da decisão do relator, nos tribunais ordinários, cabe agravo regimental;12. da sentença, na execução fiscal de valor inferior a 50 BTN, cabem embargos infringentes

do julgado, para o juiz da causa (Lei 6.830/80, art. 34);Como se vê, há, sempre, um tipo específico de recurso previsto para impugnação de cadaato judicial.É preciso, pois, diante do ato decisório, verificar qual a sua natureza, para saber qual orecurso adequado. Somente este será cabível. Há, no entanto, situações especiais, emque o prejudicado deverá interpor mais de um recurso, para evitar a preclusão (perda daoportunidade de agir no processo para obter certa vantagem). Isso acontecerá diante doacórdão não unânime em relação a um ou mais pontos, e unânime em relação a outro ououtros pontos. Nesse caso, a parte interporá embargos infringentes para atacar a parteem que a turma ou câmara decidiu por maioria, e recurso especial ou extraordinário, paraimpugnar a parte unânime.Há ainda a hipótese de o acórdão comportar recurso especial (violação de lei federal oudissídio jurisprudencial) e recurso extraordinário (violação de norma constitucional). Nessecaso, serão interpostos os dois recursos, que o presidente do tribunal examinará,separadamente, e, admitindo ambos, encaminhará os autos ao Superior Tribunal de Justiça(art. 543), que julgará o recurso especial, e remeterá, após, os autos ao STF, salvo se orelator considerar o recurso extraordinário prejudicial, fazendo encaminhar o feito ao STF(§ 2º do art. 543).Excepcionalmente, quando não se trate de erro grosseiro e a petição recursal contiver osrequisitos necessários, além de preenchidos os demais pressupostos, admite-se afungibilidade do recurso, ou seja, interposto, por equívoco justificável, um recurso, poderáser recebido como se tratasse do tipo adequado.

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1.3 PreparoO preparo configura requisito para o desenvolvimento válido do processo, na fase recursal.No sistema anterior, o recorrente era intimado da conta de custas e se abria, então, prazode dez dias para preparar o recurso. Atualmente, o art. 511 exige a comprovação dopreparo já no ato do recurso. A petição recursal deverá reportar-se a guia anexa, devidamenteautenticada, para provar que efetuou o pagamento das custas, quando a lei exigir o preparo.Os Tribunais Regionais Federais da 3ª. e da 5ª. Regiões entendem que somente leiespecífica poderá criar tributo estabelecendo o pagamento de taxa judiciária parainterposição do recurso de agravo, dada a garantia da legalidade.Os tribunais têm baixado provimentos determinando que do ato de intimação da decisão,sentença ou acórdão conste o valor das despesas, inclusive a estimativa do porte deretorno, a fim de propiciar o preparo.Se a parte deixar de comprovar o recolhimento de tal valor o recurso será consideradodeserto.O Ministério Público, a União, os Estados e Municípios e respectivas autarquias estãodispensados de preparo (§ único do art. 511), mas não as empresas públicas, as fundaçõesde natureza privada e as sociedades de economia mista.

1.4 TempestividadeO recurso deve ser interposto no lapso temporal fixado pela lei, sob pena de preclusão(perda da faculdade de agir).Diz o CPC, art. 242, que o prazo para interposição do recursoconta-se da dita em que os advogados são intimados da decisão, sentença ou acórdão,esclarecendo adiante, parágrafo único, que a intimação se dá em audiência quando aíocorre a publicação do ato judicial, o que se verifica mediante lavratura de termo, comoprevisto no art. 457 (resumo do ocorrido na audiência, bem como, por extenso, os despachose a sentença, se esta for proferida no ato, ditado pelo juiz e lançado pelo escrivão).Se o ato é emitido fora de audiência (no procedimento ordinário, por exemplo, o juiz tem aopção - art.456 - de proferir sentença até dez dias após encerrado o debate oral ou aentrega dos memoriais), os advogados serão intimados pela publicação do ato no DiárioOficial, quando o juízo ou tribunal estiver sediado na capital (Distrito Federal ou capital doEstado), ou, mesmo no interior, se houver órgão oficial a esse fim destinado - art. 236. Far-se-á pessoalmente, quando residirem na sede do juízo, ou pelo correio, por carta registrada,quando residente o procurador fora do local onde sediada a Vara interiorana (art. 237).Quanto às decisões dos tribunais, o prazo conta-se da data da publicação da súmula doacórdão no órgão oficial. Vale ressaltar que há geralmente dois anúncios dos julgamentos:o do resultado, ou a ata da sessão, desse não começando a fluir prazo, e a publicaçãopara intimação do acórdão que, conforme nova redação do art. 563, deve sempre conterementa. Os tribunais federais sempre publicam a ementa do acórdão, o que facilita acompreensão do conteúdo, mas alguns tribunais estaduais não o fazem, dificultando atarefa dos procuradores. De todo modo, repita-se, somente flui prazo para recurso daintimação do acórdão, e não da simples notícia do resultado do julgamento.Na contagem do prazo, exclui-se o dia do começo e inclui-se o do vencimento (art. 184).Prorroga-se o termo inicial se recair em feriado ou se não houver expediente forense e, domesmo modo, o dia do vencimento (§ 1º e 2º do art. 184).Na apelação, nos embargos infringentes, no recurso ordinário, no recurso especial. Norecurso extraordinário e nos embargos de divergência, o prazo para interpor e para responderé de quinze dias, nos termos do art. 508. No agravo, o prazo agora é de dez dias (art. 522),mas o advogado poderá preferir a interposição oral, hipótese em que formulará, em audiência,o agravo retido, como uma faculdade (§ 3º do art. 523, que se refere à admissão dessaforma, e não à sua obrigatoriedade). Nos embargos de declaração, a prazo é de cinco dias

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(art. 536), no agravo para o colegiado, da decisão do relator em recurso especial ouextraordinário, de cinco dias (art. 545). Os embargos infringentes do julgado, previstos naLei 6.830/80, art. 34, devem ser interpostos em dez dias.Em todos esses casos, cada parte interpõe o recurso no prazo que lhe couber, mas,quando houver litisconsórcio, o recurso interposto por um aproveita os demais, no limiteda unitariedade, ou seja, no que for comum o objeto da causa em relação aos litisconsortes(art. 509 e seu parágrafo único).Há ainda a considerar a hipótese do recurso adesivo (art. 500), em que a parte parcialmentevencida pode aguardar a iniciativa da outra e deixar para recorrer somente no caso deinconformidade do adversário. O prazo para interposição é de 15 dias, coincidindo com oestabelecido no art. 508 para resposta na apelação, nos embargos infringentes e no recursoextraordinário (art. 501, I).

2. Pressupostos negativosSão antecedentes negativos necessários à admissibilidade dos recursos a constataçãoda inexistência de preclusão lógica ou de preclusão consumativa, ou, em outras palavras,a aferição da inocorrência de fatos extintivos ou impeditivos do poder de recorrer.Fatos extintivos excluem o direito ao recurso. Assim, se desaparecer o objeto do litígio,ou se houver renúncia ao direito material ou ao direito de recorrer, ou, ainda, a desistênciada ação ou desistência do recurso, não se poderá abrir a via recursal, ou, se já instaurada,será encerrada sem o julgamento de mérito. Os fatos impeditivos - aqueles que obstam oexercício do recurso - também podem determinar a inadmissibilidade. Constituem,geralmente, a prática de atos incompatíveis com o direito de recorrer, fazendo operar apreclusão lógica. Já os fatos modificativos podem alterar o objeto do recurso, mas não oextinguem.Há formas mais sutis de preclusão lógica (perda do direito em razão da prática de atoincompatível com o poder de atuá-lo). Verifica-se, por exemplo, quando o recorrente requerextrajudicialmente a preparação de instrumento para satisfação da obrigação que é objetoda ação. Se o recurso versa sobre a ilegalidade da cobrança do débito e,administrativamente, o recorrente pede a expedição de guia para pagamento ocorre apreclusão impeditiva do direito de recorrer, tendo-se o recurso por prejudicado.O CPC, arts. 501 a 503, arrola algumas hipóteses exemplificativas de fatos extintivos eimpeditivos - a desistência, a renúncia e a aceitação tática.Diferentemente da desistência da ação, que requer a anuência da parte contrária quandoformulada após o prazo para resposta do réu, ou depois de apresentada a constestação (§4º do art. 267), a desistência do recurso independe do consentimento da parte contráriaou dos litisconsortes (art. 501). O juiz ou o relator apenas homologará a desistência eordenará a baixa dos autos ao juízo de origem, salvo se houver outros recursos a apreciar,caso em que prosseguirá somente quanto a estes.A desistência da ação, contudo, somente é fato impeditivo da apreciação do recursoquando houver a aceitação da parte contrária. O autor não pode, v.g., mesmo tendo vencidoa ação em primeiro grau, fazer terminar o processo pela desistência se o réu ofereceurecurso e não concorda com a extinção do feito.A renúncia ao direito de recorrer diz respeito ao próprio poder de interpor o recurso,configurando fato extintivo do poder de instaurar a fase recursal. Também independe daaceitação da outra parte (art. 502).A aceitação tácita da decisão, da sentença ou do acórdão configura-se pela prática dequalquer ato incompatível com o exercício do direito de recorrer. Assim, se o réu efetua opagamento do débito reconhecido na sentença, não poderá apelar da condenação que lhefora imposta.

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3. Competência do órgão revisorDentre os pressupostos recursais, há que examinar, ainda, a competência do órgão a quese destina o recurso. Em primeiro lugar, deve-se examinar a competência constitucional.A jurisdição é repartida a partir da Constituição Federal. Assim, nas ações da competênciaoriginária dos tribunais superiores, não se irá cogitar do cabimento de recursos típicos dainstância ordinária, como a apelação. Somente serão adequados os tipos recursais quese dirijam àquelas cortes.Na competência originária dos tribunais ordinários, ou de segundo grau somente serãocabíveis os recursos que se dirijam à revisão de atos dos tribunais. Exemplo: não seadmitirá apelação, na ação rescisória.Ainda no âmbito da competência constitucional, é preciso examinar o poder de revisão doórgão a que se dirige o recurso. Cada juízo de primeiro grau está vinculado a um órgãorevisor e, nos tribunais há previsão da competência para apreciação dos recursos cabíveisante os atos dos relatores, das turmas e seções. O profissional encarregado de elaborara petição recursal terá que consultar o regimento interno do tribunal para definir o órgãocom atribuição para recebê-la e o órgão que irá julgar o recurso.Há situações complexas que exigem o cuidado do advogado, como a que envolve a decisãoou sentença do juiz de direito com função federal delegada, nos casos de açõesprevidenciárias. O recurso se dirigirá ao Tribunal Regional Federal, e não ao Tribunal deJustiça.

4. Condições de admissibilidadeComo o recurso é o poder de provocar a revisão do ato judicial, no curso do processo,coincidem as condições para que seja admitido com as condições da ação: legitimidade,interesse e possibilidade jurídica. São requisitos ligados ao ato recursal que devem estarpresentes para que lhe seja apreciado o mérito.Antes de examiná-los, tracemos desde logo a divisória entre admissibilidade e mérito dorecurso, advertindo para que tais elementos são considerados em relação ao recurso, enão à ação. Uma coisa é a legitimidade para agir, outra é a legitimidade recursal, uma ointeresse de agir, outra o interesse recursal. O mérito da ação é uma coisa, o mérito dorecurso, outra. A ação tem um objeto, que é o objeto do processo e ao qual está vinculadoo âmbito do recurso, mas este tem, nesse limite, o seu objeto, que é a matéria impugnada.Analisaremos esse aspecto quando estudarmos cada recurso.Legitimidade recursal.Têm legitimidade para provocar a revisão do ato judicial, no curso do processo, as partes,o Ministério Público e o terceiro prejudicado. Partes são autor, réu, intervenientes eassistentes. Qualquer deles, desde que seja atingido pelo ato judicial, tem o poder deprovocar a abertura da fase revisional. Tem-no, igualmente, o Ministério Público, seja quandoatue como parte, seja quando intervenha como fiscal da Lei, do mesmo modo, o terceiroprejudicado, ou seja, aquele que não figura como parte no processo, mas que é reflexamenteatingido pela eficácia da decisão. O terceiro terá que demonstrar o interesse jurídico queautoriza a sua intervenção no feito, o que o § 1º do art. 499 estabelece como “o nexo deinterdependência entre o seu interesse de intervir e a relação jurídica submetida à apreciaçãojudicial”.Interesse recursal.Mas não basta estar legitimado a recorrer. É necessário, também, ter interesse, ou, emoutras palavras, o recorrente deve almejar uma utilidade prática com a revisão do atoimpugnado, a obtenção de uma situação, no deslinde da causa, que lhe seja mais favorável.A simples discordância da fundamentação não autoriza o conhecimento do recurso.

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Petição recursal apta.A possibilidade jurídica do pedido de reforma da decisão depende da sua formulaçãonuma petição que preencha os requisitos formais estabelecidos na lei e que geralmentesão a indicação do órgão a quem se dirige o recurso e que o examinará, a identificação doprocesso, os fundamentos do recurso e o pedido de prolação de um novo ato, que substituao impugnado. Cada recurso tem os seus requisitos formais que serão examinados nomomento oportuno.

Bibliografia recomendada

• José Carlos Barbosa Moreira - Comentários ao Código de Processo Civil, vol. V - 6a. ed.Forense, 1994;

• Cândido Rangel Dinamarco - A reforma do Código de Processo Civil - Malheiros, 1995;• J. E. Carreira Alvim - Ação Monitória e Temas Polêmicos da Reforma Processual - Del

Rey, 1995;• Nelson Nery Júnior - Princípios Fundamentais - Teoria Geral dos Recursos, RPC (v. a

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MÓDULO 2 - APELAÇÃO

1. ConceitoApelação é o recurso que impugna a sentença, tanto aquela meramente terminativa, numdos casos previstos no art. 267, CPC, quanto à definitiva, ou de mérito, nas hipóteses doart. 269. Assim, será cabível para atacar o ato do juiz de primeiro grau com eficáciaextintiva do processo, ou em outras palavras, que encerra a relação jurídica processualcaso não seja provocada a abertura da fase recursal.Essa definição se ajusta ao modelo adotado pelo nosso legislador (art. 513), que, nareforma de 1973, procurou simplificar o sistema de recursos, abolindo o antigo agravo depetição, e, agora, na atualização progressiva que se empreende desde 1993, o enxugoumais ainda.Sempre que o profissional estiver diante de um ato proferido por juiz de primeira instância(federal ou estadual) que tenha a potencialidade de extinguir o feito, seja uma sentençaque conclua pela inadmissibilidade da ação, ante a falta de certo pressuposto processual,ou de uma das condições da ação, ou que indefira a inicial, ou determine o arquivamentodo feito ante a inércia do autor, seja uma sentença de mérito, desde aquela que pronunciaa decadência ou a prescrição, ou a que extinga o processo ante o reconhecimento dopedido pelo réu, até aquela em que o juiz acolhe ou nega o pedido após analisar osfundamentos da ação, em todas essas hipóteses caberá apelação.A referência ao juiz de primeiro grau vale como advertência, porque se o ato é proferidopelo tribunal em ação de competência originária (exemplos: a ação rescisória, o mandadode segurança) não caberá, obviamente, apelação, e, sim, nos cargos previstos naConstituição Federal, o recurso ordinário, o recurso especial ou o recurso extraordinário.

1.1 Regras excepcionadorasMesmo com a simplicidade adotada, restam algumas situações que excepcionam a regrageral de cabimento da apelação. São elas:1.1.1 O recurso ordinário ante sentença proferida pelo juiz federal nas causas emque forem partes Estado estrangeiro ou organismo internacional, de um lado, e, do outro,Município ou pessoa residente ou domiciliada no País. O recurso será julgado não pelotribunal ordinário, a que está submetido o juiz, mas pelo Superior Tribunal de Justiça (art.105, II, c, da Constituição Federal e art. 539, II, b, CPC).1.1.2 As execuções fiscais e respectivos embargos de valor inferior a 50 OTN, emrazão do disposto no art. 34 da Lei 6.830/80, que estabelece como recurso adequado paraa hipótese os embargos infringentes do julgado (não confundir com os embargos infringentesdo art. 530, CPC). Esse recurso de alçada é julgado pelo próprio juiz da causa. Como nãohá mais OTN, nem BTN, entende-se que a alçada corresponde a 283,43 UFIR no momentoda distribuição da petição inicial.

2. Pressupostos e requisitos de admissibilidadeEm todo recurso devem estar presentes certos antecedentes (fatos que lhe são exteriorese precedentes) que a lei exige para a formação da nova fase procedimental e certosrequisitos (condições inerentes às partes ou ao objeto) impostos para que seja conhecidoo pedido de reforma do ato impugnado. Já vimos tais pressupostos e requisitos de modogeral, no primeiro módulo. Aqui, vamos examiná-los no âmbito da admissibilidade daapelação.O tribunal não conhecerá do recurso se qualquer um desses pressupostos ou requisitosnão estiver presente.

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2.1 AdequaçãoNão se cogitará do primeiro pressuposto recursal que é a recorribilidade, porque todasentença é recorrível. Bastará cuidar do pressuposto da adequação. Esse é o primeiroantecedente necessário para a admissibilidade da apelação: é preciso que seja impugnadauma sentença, terminativa (art. 267) ou definitiva (art. 269).Sob o aspecto formal, a petição, que será sempre escrita, dirigir-se-á ao juiz da causa,que irá praticar os atos de impulso inicial do recurso, e deverá conter:I - os nomes e a qualificação das partes, bastando, para tanto, identificar o feito, pela suaclasse e numeração, indicando-se os nomes do autor e do réu, porque a qualificação jáconsta da inicial;II - os fundamentos de fato e de direito, quais sejam, os motivos da impugnação, com osquais se delimitará o objeto do recurso, ou a matéria impugnada (voltaremos a tratar doassunto adiante);III - o pedido de nova decisão, ou a formalização da pretensão de revisão da sentença pelotribunal, com o provimento do recurso;Tem-se como apta a petição recursal que contenha tais requisitos. O modelo comporta I.a abertura, na qual o apelante se apresenta, pelo seu representante judicial, nos autos dedeterminado processo, nomina a parte contrária e manifesta a sua inconformidade com odecisório, II. a fundamentação, em que são expostos os motivos de fato e de direito daimpugnação, e III. o pedido de reforma da sentença.A motivação comporta a justificação do preenchimento dos pressupostos e requisitos dorecurso - uma breve exposição das disposições da sentença, a data da intimação, ainexistência de fatos impeditivos ou extintivos do direito ao recurso, as questões referentesao processo e aos fatos e fundamentos da causa. Por isso se diz que cumpre ao apelantedelimitar o objeto da apelação, que coincidirá com a matéria impugnada. Vamos precisaresse conceito.Ao decidir a causa, o juiz e as partes se conduzem de acordo com modelos traçados nalei processual - os modos de postular (p. ex, a inicial, a contestação, a intervenção deterceiros), de realizar a instrução (o depoimento pessoal, a inquirição de testemunhas, aprova pericial) e de decidir (o despacho, a decisão interlocutória, a sentença). Se o juiz oua parte contrária praticam ato em desconformidade com tais figurinos, haverá irregularidadeou nulidade. Está-se aí no âmbito dos erros de procedimento - errores in procedendo.Toda alegação que versar sobre tais defeitos - digam eles respeito ao cabimento do recursoou aos pressupostos e condições da ação - consistirá numa argüição preliminar, ousimplesmente, numa preliminar, que deve ser formulada e decidida destacadamente.Só após arrolar as preliminares é que a apelação abordará os fatos e fundamentos dacausa pelos quais procura demonstrar o error in judicando, que justifique a reforma dasentença.As preliminares apontam erros de procedimento ou a inexistência destes. Depois de formulá-las é que serão abordadas as questões de mérito. Às vezes, porém, o recurso se limita aoataque de questões processuais, como a legitimação da parte, o interesse de agir, adeficiência da representação, dentre tantas outras possíveis. Por isso é importante distinguiro mérito do recurso do mérito da causa.Mérito do recurso é toda razão de pedir a reforma do ato judicial, quer se trate de questãoatinente à regularidade do processo, quer se cuide dos motivos fáticos e jurídicos em quese sustenta a ação, nestes últimos se identificando o mérito da ação.Assim, se o juiz extinguiu o processo sem julgamento de mérito, digamos, por considerarilegitimada a parte para a causa, a questão preliminar concernente à legitimidade constituirá

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o mérito do recurso.É relevante, portanto, compreender que na apelação há preliminares de diversos tipos, asaber:1- preliminares recursais: aquelas que dizem respeito ao cabimento ou não do recurso, aoconhecimento ou não da apelação pelo tribunal;2- preliminares da ação: aquelas que têm a ver com a regularidade da relação jurídicaprocessual, tais como a discussão dos pressupostos processuais e das condições daação; e,3- preliminares de mérito: aquelas que integram o mérito da ação, mas são prejudiciais àanálise dos fundamentos de fato e jurídicos do pedido, tais como a prescrição, a decadênciae o reconhecimento do pedido.

2.2 PreparoAntes de entregar a petição recursal em cartório ou secretaria, o advogado deveráprovidenciar o recolhimento das custas processuais, para tanto observando as normaslegais aplicáveis. Na Justiça Federal, as custas são reguladas pela Lei 9249, de 4 de julhode l996, publicada no Diário Oficial do dia 5 passado, e que revogou a Lei 6.032/74. Seucálculo obedece à tabela anexa àquele diploma. Na Justiça dos Estados, são previstasem leis estaduais e calculadas conforme determinado pelos Tribunais de Justiça. Asecretaria do juízo (cartório) deverá fornecer guia e indicar os valores devidos, para que seviabilize o pagamento. Se houver algum empecilho, a parte deverá, de imediato, comunicar,mediante requerimento, ao juiz, a fim de se prevenir da deserção.Efetivado o preparo, cuidará o advogado de anexar o comprovante (a guia, devidamenteautenticada), para atender à exigência do art. 511. Sempre que se inviabilizar o recolhimentodas custas, a parte deverá justificar o fato e requerer seja relevada a deserção, devolvendo-se o prazo para preparo, como previsto no art. 519.É importante que os tribunais simplifiquem esse ato, baixando provimentos que obriguemos funcionários das secretarias ou cartórios a indicar com precisão o valor do preparo, aofornecer a guia de recolhimento. Melhor ainda se já da intimação da sentença, como ofazem alguns juízos, constasse a indicação do valor do preparo.A União, os Estados, Distrito Federal, Municípios e suas respectivas autarquias e fundaçõesestão dispensados de custas (art. 511, CPC e art. 4º da Lei 9.249.96), não se lhes exigindopreparo. Os conselhos de fiscalização do exercício profissional, mesmo sendo definidoscomo autarquias, não mais estão isentos do pagamento de custas (Lei 9.249, parágrafoúnico do art. 4º).

2.3 TempestividadeO prazo para apelação é de 15 dias (art.508), contando-se da data da publicação dasentença em audiência, quando nela for proferida, ou da intimação das partes, sempreexcluído o dia do começo e incluído o dia do vencimento, e contando-se em dobro o prazopara a Fazenda Pública e o Ministério Público, bem como para os litisconsortes quetenham procuradores diferentes (art. 191).Quando a sentença é atacada por meio de embargos de declaração, dá-se a interrupçãodo prazo para interposição da apelação por ambas as partes (art. 538), e não mais asuspensão. Essa alteração implica i. em reabrir-se por inteiro o prazo para apelar, a partirda data da intimação da decisão dos embargos declaratórios, i.i em não se desconsiderara interrupção se os embargos não forem conhecidos.Explico. No sistema anterior, a jurisprudência adotara o entendimento de que não se temcomo suspenso o prazo para apelar se os embargos de declaração foram interpostos adestempo. Ocorre que a suspensão produzia efeitos para a parte que interpusera os

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embargos, salvo se a retirada dos autos do cartório prejudicara a produção do recurso pelaoutra parte. Agora, não se dá a interrupção - elimina-se o prazo para ambas as partes,desde que qualquer delas ou o Ministério Público interponha os embargos de declaração.Não se poderia imaginar que uma parte pudesse valer-se do expediente de interpor embargosintempestivos para reduzir, ou até eliminar, o prazo para recurso da parte contrária.

2.4 Legitimação e interesseO apelante será a parte vencida, o Ministério Público ou o terceiro prejudicado (art. 499).Partes são autor, réu e os intervenientes - o assistente, simples ou litisconsorcial (arts. 50e 54), o oponente (art. 56), o nomeado à autoria (art. 62), o denunciado da lide (art. 70) eo chamado ao processo (art. 77). O Ministério Público é parte ou interveniente especial(art. 82), em qualquer caso tendo amplos poderes recursais (§ 2º do art. 499). O terceiroprejudicado tem situação jurídica afetada reflexamente pela sentença, competindo-lhejustificar esse fundamento jurídico, ou seja, não será o mero interesse de fato que autorizaráo recurso do terceiro, mas o interesse jurídico.

3. Limites da apelação: matéria impugnadaO apelante tem o ônus de precisar a sua inconformidade com a sentença. Nessaespecificação consistirá a matéria impugnada, que limitará o objeto do recurso (art. 515).Não estão compreendidos nestes limites os pontos que independem de provocação daparte, ou seja, aqueles que o juiz pode conhecer de ofício, tais quais os pressupostos econdições da ação, e a decadência.A apelação poderá versar sobre questão não apreciada na sentença, mas discutida noprocesso, e sobre ela o tribunal se pronunciará, não mais se limitando a anular o atojudicial, dada a regra do parágrafo 1º do art. 515, com nova redação, que veio tirar asdúvidas quanto à observância do princípio do duplo grau de jurisdição. Há fatos e fundamentosque o juiz de primeiro grau não precisa apreciar, porque decidiu a causa por um outrofundamento. Nesse caso, o tribunal, afastando o motivo pelo qual o juiz decidiu, passaráa examinar os demais, em função da amplitude da devolução. É possível, também, que ojuiz sentenciante tenha se omitido de apreciar alguma questão. O tribunal não mais anularáa sentença, mas passará ao exame da matéria, inclusive aquelas questões anteriores àsentença que nela não foram analisadas (art. 516).

4. Efeitos da apelaçãoTodo recurso tem efeito devolutivo, que implica em substituição do poder de decidir acausa pelo órgão revisor. Até mesmo as questões de fato, não propostas no juízo inferior,poderão ser suscitadas na apelação, mas somente quando a parte provar que não podeprovocá-las antes por motivo de força maior (art. 517). Note-se, porém, que se trata aí dadiscussão de questões que se insiram no pedido e da causa de pedir, porque estes sãoimodificáveis, após a citação, sem consentimento da parte contrária, ou, de qualquermodo, após o saneamento do feito (arts. 264 e 294).O efeito suspensivo faz com que seja obstada a execução da sentença em função dainterposição do recurso. Tem-no normalmente a apelação, salvo nas hipóteses do art.520.

5. Procedimento recursalInterposto o apelo, o juiz o receberá, indicando os efeitos (especificamente, se recebe orecurso em ambos os efeitos ou somente no devolutivo) e ordenando a abertura de vista aoapelado para responder.O juiz de primeiro grau poderá indeferir a petição recurso, fundamentando a inadmissibilidadedo recurso, por falta de algum pressuposto ou requisito, tanto quanto da sua interposição,

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como, agora, quando da apresentação da resposta do apelado (nas contra-razões, orecorrido poderá demonstrar o incabimento do apelo), conforme explicitado no parágrafoúnico do art. 518.Uma outra inovação interessante da lei nova foi a abertura da possibilidade de retrataçãona sentença que indefere a inicial (art. 296). Antes, a causa tinha que ser levada, emapelação, ao tribunal, para anulação do ato decisório.

6. Julgamento da apelaçãoNo julgamento da apelação, o tribunal cuidará de observar a precedência do agravo deinstrumento, caso ainda pendente. Quanto ao agravo retido, será apreciado como preliminar,desde que tal postulação conste das razões do apelante ou do apelado.O relator poderá negar seguimento à apelação manifestamente inadmissível, improcedenteou prejudicada, ou que contrarie a súmula do seu tribunal ou de tribunal superior. Dessadecisão cabe agravo em cinco dias para o respectivo colegiado (art. 557). Essa norma dámaior celeridade à tramitação dos recursos, permitindo uma filtragem daqueles cujodescabimento ou improcedência é evidente.Dando seguimento ao recurso, o relator irá preparar o seu pronunciamento e encaminharáos autos ao revisor, salvo nos casos de procedimento sumário, de despejo e deindeferimento liminar da inicial. Os tribunais incluem ainda em seus regimentos a dispensade revisão na hipótese de o recurso versar sobre matéria predominantemente de direito.Só há necessidade de revisor quando o mérito do recurso versar sobre questão de fatodependente do exame minucioso da prova. Com isso, reduz-se o fluxo de processos notribunal.O relator, quando dispensar revisão, ou o revisor, recebendo os autos, lançará visto e asecretaria providenciará a inclusão do feito em pauta de julgamentos que será publicadacom o mínimo de 48 horas de antecedência (parágrafo 1º do art. 552).Do julgamento participarão três juízes - o relator, o revisor (ou segundo vogal, conforme ocaso) e o terceiro vogal. O resultado será tomado pela maioria dos votos sobre as diversasquestões (preliminares e de mérito) e inserido na ata de sessão, que será publicada masnão constituirá ainda marco para interposição do recurso. O acórdão será lavrado pelorelator, se vencedor, ou pelo juiz para tanto designado, quando o relator restar vencido.Uma vez proferido será encaminhada a publicação do seu dispositivo, com a ementa, naqual é lançado o sumário da decisão e dos pontos principais da fundamentação.O julgamento compreende as preliminares, entre as quais pode constar apreciação doagravo retido, ou seja um outro recurso, e o mérito, quando for conhecida a apelação. Seambas as partes recorrem isoladamente, as apelações serão julgadas conjuntamente. Domesmo modo, se houver apelação adesiva, recurso que a parte vencida parcialmente podeinterpor no prazo de resposta, em petição separada das contra-razões, e cujo conhecimentofica dependente do conhecimento do recurso da parte contrária (art. 500).

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MÓDULO 3 - AGRAVO

1. IntroduçãoO recurso que na era dos descobrimentos revolucionou o Direito português, pondo fim àchicana que consistia em levar-se o processo até sentença definitiva, para anulá-la emfunção da invalidade de decisão anterior, renova-se, no Processo Civil brasileiro, adquirindouma nova funcionalidade e eficácia que já está contribuindo para a desobstrução de umaparte do acúmulo de feitos na primeira instância e para o fim da utilização do mandado desegurança como meio de revisão de atos judiciais recorríveis.O agravo nasceu como instrumento de agilização e moralização do processo português.Antes, a parte deveria impugnar na sentença as questões sobre o ordenamento, instruçãoe todas as demais surgidas no curso do feito. Assim, após o árduo trabalho de instruçãoe julgamento, o juiz quase sempre tinha que fazer tudo de novo, ante a decisão anulatóriado tribunal.Com a impugnação das decisões interlocutórias, não só se permitia ao juiz retratar-separa corrigir de imediato o erro de procedimento, evitando-se o desenvolvimento do processonulo, como se viabilizava a revisão, de pronto, pelo tribunal, além de aplicar-se o princípioda preclusão em relação aos atos não impugnados. Um dos expedientes de chicana maisconhecidos era o que implicava em o advogado silenciar sobre o vício de uma decisãointerlocutória, até sobrevir sentença.Mas o agravo, tanto o retido quanto o de instrumento, perdeu boa parte da sua utilidadesocial em função da demora no procedimento em primeiro grau, o que implicava em serapreciado na segunda instância quando já não serviria para evitar o gasto de tempo comatividade inválida. Na prática, interpunha-se o agravo e o tribunal o conheceria pelo menosseis meses a um ano, às vezes mais, depois do ato impugnado. Se acolhido, seriamrepetidos todos os atos. Pior ainda: a parte teria que utilizar do mandado de segurançapara corrigir os efeitos da decisão atacada, porque o recurso não tem efeito suspensivo.No agravo de instrumento, havia a petição recursal que, uma vez recebida, implicava naabertura da fase de formação do instrumento pelo cartório, ante indicação de peças poruma parte, depois pela outra. Vinha a fase de resposta, seguida do preparo, depois, ojuízo de retratação e, se negativo, a subida do instrumento ao tribunal.Agora, o agravante dirige-se diretamente ao tribunal, já com a comprovação do preparo eas cópias de todas as peças necessárias, e pode obter do relator a imediata suspensãoda eficácia do ato impugnado. Ganha-se tempo e devolve-se ao recurso a sua proeminênciacomo fator de moralização e agilização do processo.Em José Carlos Barbosa Moreira, Comentários, Forense, e em Alfredo Buzaid, Do Agravode petição, há excelentes dados sobre a história do agravo e sua evolução, desde asquérimas ou querimônias dirigidas ao Rei protestando contra o agravo sofrido.

2. Pressupostos, requisitos e modalidades de agravo

2.1 Pressuposto específico: a impugnação de decisão interlocutóriaO agravo, nas duas modalidades em que se apresenta - retido ou de instrumento - é orecurso adequado para impugnar a decisão interlocutória proferida pelo juiz de primeirograu. Esse é o primeiro antecedente necessário para que o tribunal dele conheça. Orecorrente terá que indicar um determinado ato judicial com carga decisória, ou seja, como efeito de constituir ou desconstituir uma situação, dentro da relação jurídica processual.Não terá essa conotação o despacho de mero expediente, que tem como resultado tãosomente o impulso processual, nada criando, modificando ou extinguindo no processo.Assim, em princípio, se o juiz ordena a juntada de documentos ou a abertura de vista à

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parte ou ao Ministério Público, não haverá nesse despacho qualquer elemento constitutivo.No sistema atual, inclusive, esses atos devem ser praticados diretamente pela secretariaou cartório judicial (§ 2º do art. 162). Mas nada, no Direito, como na vida, é absoluto, porisso que é possível que um ato com essa aparência contenha, ou mascare, uma decisãointerlocutória.Tome-se o exemplo de o juiz, num processo em que não há qualquer razão de intervençãodo Ministério Público (art. 82), ordenar que se abra vista dos autos ao representante doParquet. A parte ficaria prejudicada com a movimentação indevida do feito, implicando emretardamento. O gravame manifesto ensejaria a interposição do agravo, para correção doerro procedimental.Nessa mesma linha, observe-se que a prática tem revelado que o juiz sem maior atençãoaos deveres do cargo é capaz de determinar a abertura de vista às partes com o únicoobjetivo de evitar um pronunciamento que deveria de logo fazer. Digamos que a parteproduziu um documento. A parte contrária deve ser intimada para manifestação, e o faz.Cabe ao juiz, então, impulsionar o feito, seja decidindo eventual questão incidente, sejaproferindo saneador, ou efetuando julgamento antecipado. Mas, ao invés, lança o chamado“despacho pingue-pongue”, ordenando nova abertura de vista à parte contrária. Cuida-sede omissão que faz integrar ao despacho uma carga decisória capaz de abrir a via doagravo.Há, suplementarmente, o agravo regimental, como conseqüência da atribuição que se dáao relator de indeferir de plano o processamento do recurso (art. 557).

2.1.2 O agravo retidoO objetivo do agravo retido é o de evitar a preclusão (perda da oportunidade de agir paraalcançar certa situação favorável no processo). O ato impugnado resolve certo incidenteem prejuízo da parte, que não tem, entretanto, necessidade do pronto desfazimento,preferindo a solução da questão quando do julgamento de eventual apelação. Emprega,então, esse instrumento, que abre ainda a possibilidade de retratação. O juiz pode seconvencer do erro de procedimento e corrigi-lo. Se não o fizer, a decisão será reexaminadapelo tribunal como preliminar, na apelação e desde que o apelante ou o apelado tenhaformulado tal pedido em seu arrazoado.Dois são os subtipos do agravo retido: escrito e oral.

2.1.3 O agravo retido comumA modalidade comum e tradicional requer petição dirigida ao juiz da causa, identificandoas partes e o processo, descrevendo o fato (o ato impugnado e as circunstâncias que oenvolvem) e os fundamentos da impugnação e pedindo a reforma da decisão. Não haverápreparo (parágrafo único do art. 522) e a entrega da peça recursal dar-se-á diretamente nasecretaria ou cartório.Ao receber o recurso, o juiz abrirá vista por cinco dias à parte contrária (§ 2º do art. 523),o que decorre da imperiosidade do contraditório (Constituição Federal, art. 5º, LV). Mesmoconvencido do erro, o magistrado deverá ouvir a outra parte, porque esta poderá apontarrazões novas que demonstrem a necessidade de manutenção do ato. Sob o ponto de vistaprático, é também melhor que se observe a oportunidade de contradição, porque estaensejará maior reflexão antes da deliberação a respeito do ato atacado.Para reformar a decisão o juiz precisa apresentar os fundamentos da retratação, mas,para confirmá-la, basta reportar-se às razões expostas no ato impugnado. É importantenão se exagerar na aplicação do princípio da obrigatoriedade da fundamentação, paraerigir tão relevante garantia constitucional em aparato formalista de sobrecarga do serviçojudicial. O óbvio não precisa ser dito. A postura acaciana não condiz com a exigência deum Poder Judiciário ágil e adequado ao atendimento das suas funções.

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Quando o juiz reformar a decisão, o agravado poderá, por sua vez, interpor agravo, querretido, quer de instrumento.É importante que o advogado ou o membro do Ministério Público que interpôs o agravoretido anote, na agenda, e cuide de ler com atenção os autos ao preparar a apelação,porque tem o ônus de, nesta, requerer, em preliminar, a apreciação do agravo pelo tribunal(§ 1º do art. 523).

2.1.4. O agravo oralOutro subtipo de agravo retido é o oral, interposto no curso da audiência (§ 3º do art. 523).O juiz decide sobre produção de prova, formulação de perguntas à testemunha, à partecontrária, esclarecimentos do perito, contradita e tantos outros incidentes, em plenoandamento da audiência. Tratando-se de pronunciamento do qual resulte gravame, a parteatingida tem a faculdade de interpor agravo oral.Entende o eminente juiz e professor Carreira Alvim, integrante da comissão que elaborouos anteprojetos da reforma do CPC e comentarista das inovações em livros de grandeaceitação, que se sobrevier sentença em audiência e a parte não houver interposto agravooral da decisão anterior, ter-se-ia operado preclusão. Examinemos mais detidamente oproblema.A superveniência de sentença implica em oportunidade diferente de manejo do recurso.Caberá apelação do ato que extinguir o processo (art. 513) e ali o apelante poderá impugnaras questões anteriores à sentença, quer as decididas, quer as não decididas, conformeexpressa referência dos §§ 1º e 2º do art. 515. E preclusão não poderia ter ocorrido, nahipótese, porque se cuida de decisão recorrível. Não havendo mais lugar para ataquemediante agravo de instrumento, porque já se está diante de sentença, ter-se-á que usara apelação, colocando-se as razões da inconformidade, no particular, como uma daspreliminares.Impedir-se o conhecimento da matéria a pretexto de preclusão significaria violação flagrantedo princípio da ampla defesa (art. 5º, LV, da Constituição Federal). Sim, porque a parteatingida pela decisão e que normalmente poderia aguardar dez dias após a audiência parainterpor agravo retido na forma escrita ou o agravo de instrumento, seria obstada de provocara atividade jurisdicional tendente à correção de eventual erro de procedimento.Interposto oralmente o agravo retido, a pane, que abdicou do prazo de dez dias parafundamentar a sua impugnação, terá que apresentar de imediato as suas razões, queserão reduzidas a termo, ditando-as ao secretário da audiência ou, se esta for gravada,simplesmente pronunciando a sua sustentação. Já a parte contrária, apesar de a lei não odizer expressamente, poderá se reservar o direito de resposta no prazo legal, que é decinco dias (§ 2º do art. 523), hipótese em que a audiência será suspensa, marcando-sedata oportuna para sua continuação.Caberá, também aí, a retratação, após ouvida do agravado, oralmente ou por petição, noqüinqüídio.

2.2 O agravo de instrumento

2.2.1. PressupostosO modelo do novo agravo de instrumento é, sem dúvida, o procedimento do mandado desegurança contra ato judicial, quebrando a tradição de que o recurso é interposto peranteo juízo recorrido, mas proporcionando, com sua apresentação diretamente ao tribunal,celeridade e funcionalidade.A parte que sofreu gravame com decisão interlocutória pode impugná-la diretamente aotribunal, ao invés de, pretendendo a sua reapreciação imediata, para corrigir o erroprocedimental e evitar os danos dele advindos, ter que interpor o recurso e, ao mesmo

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tempo, impetrar mandado de segurança, com pedido de liminar para atribuição de efeitosuspensivo ao agravo.Aí está a utilidade da inovação: acabar com a repetição de atos e abrir uma via única parao ataque ao ato judicial que resolve questão incidente.Nesse ponto, vale uma observação. A antiga redação do art. 522 reportava-se genericamentea decisões proferidas no processo, ressalvando as hipóteses do despacho de meroexpediente (art. 504), do qual não cabe recurso, e da sentença, impugnável medianteapelação.Nem bem a Lei 9.139/95 fora editada já discutiam os doutos acerca dos efeitos da inclusãono texto do dispositivo da qualificativa “interlocutória”, como se uma palavra ou um artigode lei isolado pudessem modificar toda uma sistemática traçada no código. Sérgio Rizzi,em conferência pronunciada no Congresso Brasileiro de Direito Processual, de 24 a 26 demarço de 1996, em Recife, publicada na coletânea “Estudo do Direito Processual Trabalhista,Civil e Penal” (Recife, 1996), apresenta as correntes que se formaram e conclui pelapersistência do regime de ampla recorribilidade, com as mesmas ressalvas anteriores.Claro que essa é a orientação certa. Não fosse assim, como conciliar com a regra do art.504 a interpretação do descabimento de recurso da decisão que embora cause prejuízo àparte, não resolva questão incidente? Evidente que não se trata de despacho de meroexpediente, este sim, insuscetível de impugnação recursal. Haveria um buraco negro, quea Física admite, mas não o Direito.Pressuposto específico do agravo de instrumento é, portanto, a decisão de primeiro grauque cause prejuízo (situação desvantajosa) à parte, ao Ministério Público, fiscal da lei, oua terceiro, e desde que não implique na extinção do processo (sentença), por, então, orecurso adequado seria o de apelação.Mas há ainda os pressupostos negativos, aqueles antecedentes que obstam a interposiçãodo agravo de instrumento. São eles: a) as decisões posteriores à sentença somente serãoatacadas em preliminares da apelação, salvo a que indeferir esse recurso (§ 4º do art. 523)- lembre-se que tal disposição diz respeito a certo processo, considerado isoladamente,ou, em outras palavras, não alcança outro processo, ainda que se instaure nos mesmosautos, como a execução de sentença, b) não será cabível também, no procedimentosumário, quanto às interlocutórias proferidas durante a audiência ou relativas a provas (art.280, III), c) nem da decisão do juiz que admite a sua suspeição ou impedimento e ordenaa remessa dos autos ao substituto legal (art. 313, primeira parte), porque, ainda que nãose trate de causa legalmente prevista, o magistrado poderia declarar suspeição por motivode foro íntimo, inviabilizando qualquer possibilidade de revisão do ato. Cuida-se, portanto,de preclusão lógica pro-judicato.Sempre será o agravo de instrumento o único recurso adequado nos casos da decisão daexceção de incompetência2, na impugnação ao valor da causa e no processo de execução,no qual inexiste sentença, salvo a que extingue o processo pela satisfação do débito, pelatransação ou quando se dá, por outro meio, a remissão total da dívida, e pela renúncia aocrédito (art. 794). Assim, somente haverá interesse recursal na interposição desse tipo deagravo, porque o retido não comportaria reapreciação pelo tribunal. Sérgio Bermudesrecomenda o agravo de instrumento como o meio hábil para atacar o indeferimento ou odeferimento de tutela antecipada, também pela aplicação do raciocínio de que em seaguardando a sentença estaria prejudicado o objeto do recurso.

2 Sérgio Rizzi (ob. cit.) refere-se apenas à exceção oposta pelo terceiro prejudicado, mas, nos demais casos, também haveránecessidade de imediata apreciação pelo tribunal, para evitar que o processo se desenvolva ante juiz incompetente, com a nulidadede todos os atos decisórios.

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2.2.2. RequisitosSão requisitos da petição recursal aqueles elencados no art. 524 e outros contidos noCPC. Vamos enunciá-los:a) petição escrita dirigida ao tribunal e entregue no protocolo deste, postada no correio ouencaminhada por outra forma prevista em lei local (lei de organização judiciária estadual,ou lei estadual de procedimento, de que trata o art. 24,)ü, da Constituição Federal, aindanão descoberto pelos Parlamentos estaduais)3 , na qual deverá estar perfeitamenteidentificado o processo em que proferida a decisão;b) exposição do fato e do direito - é indispensável que o agravante indique claramente osfatos que devem ser apreciados pelo tribunal, especialmente o ato impugnado (a decisãodo juiz de primeiro grau) e as suas conseqüências jurídicas;c) as razões do pedido de reforma da decisão, ou seja, os fundamentos pelos quaisentende o agravante deva o tribunal rever o ato, anulando-o, simplesmente, ou substituindo-o por outro que deva ser adotado para o bom andamento do feito;d) o nome e o endereço completo dos advogados, constantes do processo (tanto o advogadodo agravante, quanto o do agravo, principalmente este último, que terá que ser intimadopara resposta) - providência que não tem merecido maior atenção dos advogados, implicandoem atraso no processamento do agravo, pois o relator normalmente tem ordenado aintimação do agravante para suprir a omissão, aplicando analogicamente a disposição doart. 284;e) a remissão às peças que devem instruir obrigatoriamente o agravo em que são ascópias da decisão agravada, da certidão da respectiva intimação e das procuraçõesoutorgadas aos advogados do agravante e do agravado (art. 525, I) e das peças cujajuntada é facultativa;f) a remissão ao comprovante do pagamento das respectivas custas e do porte de retomo,quando devidos, conforme tabela que será publicada pelos tribunais.Complementarmente, o agravante tem o ônus de se dirigir ao juiz da causa, no primeirograu, requerendo juntada da cópia da petição do agravo e dos documentos que a instruem(art. 526). Com isso, permitirá ao juiz o exercício da retratação e a prestação de informaçõesao tribunal, independentemente da remessa de cópias das peças do recurso (o que, deresto, se revela plenamente dispensável, face à providência de natureza econômica contidanesse dispositivo).Apesar das posições minoritárias da Carreira Alvim e Cleto Forniciari Júnior, no sentido deque a falta da juntada de tais peças aos autos principais acarretaria o não conhecimentodo recurso, esse não é o entendimento da maioria dos doutrinadores, nem das decisõesdos tribunais. O código não sanciona a omissão, nem há razão lógica para tanto, porqueo julgamento do agravo, com a resposta do réu, ou simplesmente com a intimação deste,far-se-á com a plena observância do contraditório.

2.2.3 PrazoAgora é de dez dias o prazo para impugnação das decisões do juiz de primeira instância.Ganha-se mais tempo para fundamentação, o que de modo algum acarreta retardamento,em relação ao procedimento anterior, que estabelecia cinco dias para a interposição doagravo, mas previa tempo infinitamente mais longo para preparo, formação de instrumento,resposta, juízo de retratação, até a subida do recurso.

3 O recurso postado no correio cria o grave inconveniente da possibilidade de recebimento por setor não especializado do tribunal.A correspondência da qual não conste na capa do envelope a natureza de recurso poderá ser confundida e juntada ao expedienteadministrativo geral, demorando de ser aberta e encaminhada ao protocolo. É importante, por isso, que o advogado fique atento aorecebimento e encaminhamento da petição ao setor de distribuição.

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O controle do pressuposto da tempestividade fica, de imediato, com o relator (no sistemaanterior, o juiz de primeiro grau, a quem se dirigia o recurso, não poderia indeferi-lo porextemporaneidade).Proferida a decisão em audiência, conta-se daí o prazo recursal, excluindo-se, como emqualquer outra situação, o dia do começo e incluindo-se o do fim (art. 184). Quanto aosatos decisórios lançados nos autos, conta-se o lapso desde o primeiro dia após a intimaçãopelo órgão oficial nos Juízos sediados nas capitais (art. 236) e nas demais comarcas ondehouver jornal especialmente destinado à publicação dos atos judiciais (art. 237). Nascomarcas onde a intimação se fizer pelo correio ou por oficial de justiça, o termo inicial éa data da juntada aos autos do aviso de recebimento ou da certidão de intimação (art. 241,I e II). Note-se que, havendo mais de um réu, o prazo só começa a correr quando o últimofor intimado (art. 241, III). O mesmo ocorrerá, mutatis mutandi, se forem vários os autores,com diferentes advogados, quando sejam estes os destinatários da intimação.

2.2.4 Atos do relatorO agravo de instrumento deve ser distribuído de imediato. O art. 527 usa a expressãoincontinente, para que a petição recursal tenha preferência que só pode ser disputadacom o habeas corpus e o mandado de segurança, no setor de distribuição do tribunal.Essa previsão se destina à rápida correção de possível erro de procedimento que estejaprejudicando a parte. Nada mais injusto e danoso à sociedade que o dano causado pelaatividade jurisdicional, seja por ação, seja por omissão, porque na Justiça é que o cidadãoespera e deve encontrar a última e maior proteção ao direito que entende lhe caber.O mesmo artigo faz remissão a uma outra disposição de grande relevo introduzida pelareforma processual civil. Trata-se do poder conferido pelo art. 557 ao juiz relator de negarseguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou contrárioà súmula do respectivo tribunal ou tribunal superior.Se o recurso for evidentemente inadmissível (faltam-lhe os pressupostos ou os requisitostraçados pela lei), ou, e assim nas outras hipóteses, manifestamente improcedente, setiver perdido objeto ou se for contrário à súmula do próprio tribunal ou de tribunal superior,será trancado na origem.Primeiro é preciso ressaltar que defeitos existem no recurso que podem ser sanados, daí,como dito acima, a aplicação analógica do disposto no art. 284, que manda o juiz abrirprazo para correção ou emenda da inicial. Se uma peça estiver ilegível, por exemplo, serádada ao agravante oportunidade para substituí-la. Se vier com a indicação incompleta donome ou do endereço dos advogados, também poderá a falta ser suprida. Mas não poderáo relator utilizar essa oportunidade para permitir a juntada de peça obrigatória, que deveriaacompanhar a petição recursal, pois assim estará desequilibrando as partes, combenevolência para quem descumpriu o claro comando legal.Vejamos, agora, o que vem a significar a manifesta inadmissibilidade, manifestaimprocedência, a perda de objeto e a contrariedade à sumula.O recurso é inadmissível quando carece de um dos pressupostos processuais -recorribilidade, adequação, tempestividade, preparo, de uma condição - legitimidade parainterpor e interesse recursal ou de outro requisito (v. item 2.2.2). Se transparece umadessas causas obstativas do conhecimento, não há sentido para que se dê continuidadeao processamento.É manifesta a improcedência quando os fatos narrados não levam à conseqüência jurídicapretendida. Se o agravante pretende a reforma de uma decisão e apresenta motivação quenão conduz logicamente à revisão do ato, impõe-se o trancamento do recurso.Prejudicado está o conhecimento do agravo quando se dá a perda do seu objeto. O pedidode reforma se esvaziara seja por já ter sido atendido, com o juízo de retratação (art. 529),

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seja porque sobreveio sentença que superou a questão levantada, seja porque se tornoumaterialmente impossível o alcance da situação de vantagem postulada.A contrariedade à súmula do tribunal (não de outro do mesmo nível) ou de tribunal superiortambém enseja a negativa de seguimento ao recurso, mas deve ser claro o conflito entreas razões do agravo e o verbete sumulado.Criação da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LC 35, art. 28), inspirada no antigoRegimento Interno do Supremo Tribunal Federal, o poder de o relator, no antigo TribunalFederal de Recursos negar seguimento a recurso que contrarie súmula destinava-se aaliviar a sobrecarga de trabalho dos tribunais, evitando levar-se à discussão em turma ouem plenário questão já pacificada. A disposição passou a ser aplicada nos TribunaisRegionais Federais e foi ampliada na Lei 8.038/90, que regulou os poderes do relator noSupremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, e tem o mesmo conteúdo doart. 557, CPC, agora estendido a todos os tribunais.Cuida-se de providência, como acentuamos no módulo sobre Apelação, da maior importânciapara desobstrução das pautas dos tribunais e para viabilizar o processamento mais rápidodo recurso.Da decisão do relator caberá agravo, de que trataremos no item próprio.

2.2.5 Efeito suspensivo ao agravoO efeito normal da interposição do agravo é exclusivamente devolutivo. A suspensão doato atacado pode ser obtida, mas tem que ser sempre fundamentada.Inovação de grande alcance introduzida pela Lei 9139 é a que amplia, em relação aosistema anterior, e facilita a possibilidade de o relator atribuir efeito suspensivo ao recurso.Daí é que se irradiam os efeitos mais intensos de economia processual do novo agravo ea conseqüência do esvaziamento da utilização do mandado de segurança contra ato judicial.Sempre que verificar, “nos casos de prisão civil, adjudicação, remissão de bens,levantamento de dinheiro sem caução idônea e em outros casos dos quais possa resultarlesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação”, o relator, a requerimentodo agravante, poderá “suspender o cumprimento da decisão até o pronunciamento definitivoda turma ou câmara”.As hipóteses de prisão civil, adjudicação, remissão de bens e levantamento de dinheirosem caução idônea são exemplificativas. Em qualquer caso, desde que evidenciada arelevância dos fundamentos do agravo (aparência do bom direito, ou plausibilidade dodireito invocado) e a possibilidade de lesão grave e de difícil reparação (perigo de demora),o relator atribuirá efeito suspensivo ao recurso, comunicando de pronto ao juízo recorrido.Mais ainda - e essa é a tendência dominante no Tribunal Regional Federal da 5ª. Região -se o ato impugnado é omissivo (ou seja, se o juiz, por exemplo, negou liminar que deveriaconceder) o uso do termo suspender no dispositivo mencionado tem o mesmo alcanceque a expressão “que suspenda o ato impugnado”, constante do art. 7º, II da Lei 1.533/51,que, de resto, é a fonte inspiradora da Lei 9.139. Essa é a interpretação teleológica dodispositivo, aquela que melhor atende à finalidade de pronta sustação dos efeitos do atojudicial com indícios suficientes de erronia.

2.2.6 Os demais atos procedimentaisSe a petição recursal estiver em ordem, o relator poderá requisitar informações ao juiz dacausa, o que só não se fará necessário em casos excepcionais e até poderá permitir umamelhor reflexão do magistrado de primeiro grau, no juízo de retratação, e ordenará anotificação do agravado, pelo seu advogado, por ofício, pelo correio, com aviso derecebimento e abrindo este prazo de dez dias para resposta e para juntada dos documentosque achar convenientes ao exame do recurso.

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Na resposta, o agravado examinará os fatos e o direito e, obviamente, sustentará osfundamentos da decisão recorrida. As contra-razões poderão ser apresentadas no protocoloou enviadas pelo correio, da mesma forma que a petição do agravo.O julgamento na Turma deverá realizar-se até 30 dias após a intimação do agravado pararesposta (são dez dias de prazo, mais dois para juntada e conclusão, e, pelo menos, seisdias para publicação da pauta no Diário da Justiça, com o que restam cerca de 12 diaspara exame do feito e anotações pelo relator).A distribuição do agravo previne o relator para julgar a apelação, o que permite ocumprimento do disposto no art. 559, que impede o julgamento da apelação antes doagravo.

3. O agravo regimentalDisposições legais diversas foram surgindo para regular o recurso antes extranumerário,denominado agravo regimental por constar de previsão exclusiva nos regimentos dostribunais, servindo para atacar as decisões monocráticas de seus juízes. Começou peloagravo da decisão do presidente que suspendia a execução da sentença no mandado desegurança (Lei 1.533/51, art. 13), depois o agravo da decisão do presidente que suspendeliminar ou sentença, também no mandado de segurança (Lei 4.348/64, art. 4º), mais tardeo agravo (para a turma julgadora competente para apreciar o recurso) da decisão dopresidente que concede ou denega a suspensão da liminar na ação civil pública (Lei7.347/85, § 1º do art. 12) e o agravo (para o plenário) da decisão do presidente que concedeou denega a suspensão “da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seusagentes” (Lei 8.437/92, art. 4º).A Lei 8.038/90, como visto, ao alargar os poderes do relator, no Supremo Tribunal Federale no antigo Tribunal Federal de Recursos, estabeleceu, em contrapartida, a recorribilidadedos atos monocráticos dos ministros, mediante agravo para o órgão competente para ojulgamento do recurso ou da petição.Agora, o Código de Processo Civil contém diversas previsões de agravo que correspondemao agravo regimental, termo que pode ser mantido, para permitir o diferenciamento doagravo que ataca decisão de primeiro grau, até porque a natureza daquele é distinta.Basta atentar para o fato de que a decisão do relator pode implicar na extinção do processo,enquanto a decisão interlocutória do juiz do primeiro grau tem como característica o nãoencerramento do feito, no que se distingue da sentença.Abstraindo o agravo de instrumento especialíssimo, ante decisão que nega seguimento arecurso extraordinário ou a recurso especial, são as seguintes as hipóteses de agravoregimental previstas no CPC: a) art. 532, ante decisão do relator que indefere oprocessamento de embargos infringentes; b) art. 544, ante decisão do relator, no STF ouno Superior Tribunal de Justiça, que inadmite agravo de instrumento em recursoextraordinário ou em recurso especial, e, c) parágrafo único do art. 557, ante decisão quenega seguimento a recurso. Além dessas hipóteses, subsistem todas as outras reguladasnos regimentos internos dos tribunais.A petição recursal apontará as razões de pedir a reforma da decisão e o relator apresentaráo agravo, em mesa, independentemente de pauta, ante a turma, a câmara ou o plenário,conforme a competência para julgar o recurso.

Bibliografia recomendada

• José Carlos Barbosa Moreira, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. V, 1993.• Cândido Rangel Dinamarco, A Reforma do Processo Civil, São Paulo, 1995.• Sálvio de Figueiredo Teixeira, A Efetividade do Processo e a Reforma Processual, 1995

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• Sérgio Rizzi, O Novo Recurso de Agravo de Instrumento à Luz da Lei 9.139/95, in Estudodo Direito Processual Trabalhista, Civil e Penal, Recife, 1996.

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DESAPROPRIAÇÃO - PERFIL ATUAL

Francisco Geraldo Apoliano DiasJuiz do Tribunal Regional Federal da 5ª Região

Sumário: I - Considerações prévias. II - Conceito. III - Fundamentos.IV - Princípios básicos da atividade expropriatória. V - Requisitosconstitucionais. VI - A desapropriação por interesse social. VII -Competência. VIII - O Decreto declaratório. IX - A declaração deinteresse social. X - A vistoria administrativa. XI - O levantamentoda oferta. XII - A prova pericial. XIII - A fixação da indenização. XIV- O artigo 14 da Lei Complementar 76/93 e o Supremo TribunalFederal. XV - O Ministério da Reforma Agrária. XVI - Bibliografia.

I- Considerações préviasPontal do Paranapanema… Eldorado… Movimento dos “Sem Terra”… Violência no Campo…E a Reforma Agrária? Por que não se realiza? Por que não se desapropriam terrasimprodutivas e não se assentam trabalhadores rurais para que produzam, sustentem comdignidade as respectivas famílias, assegurando-se-lhes, a partir daí, condições para oexercício pleno da cidadania?São apenas algumas das indagações que inquietam a todos, e para as quais ainda não seencontrou resposta satisfatória, muito embora se costumem apontar múltiplas soluçõespara todos esses questionamentos.Em atenção ao momento histórico hoje vivenciado por toda a sociedade, é que me animoa empreender um esforço no sentido de fazer traçar, em rápidas considerações, um perfildo instituto da desapropriação, tal como se apresenta hoje, no direito positivo brasileiro.Quem sabe ao cabo das considerações que aqui serão alinhavadas, não consigamosvislumbrar, todos nós, leigos e estudiosos do fenômeno jurídico, algumas das soluçõespossíveis para o equacionamento das questões afloradas no início deste trabalho.

II- ConceitoA desapropriação, quiçá a “… mais drástica das formas de manifestação do poder deimpério, ou seja, da Soberania interna do Estado no exercício de seu domínio eminentesobre todos os bens existentes no território nacional” - Hely Lopes Meirelles, in, “DireitoAdministrativo Brasileiro”, 19ª. ed. p. 508, “Malheiros”, São Paulo, 1994 -, é procedimentoadministrativo por excelência, que se exercita nos exatos limites insculpidos no inciso“XXIV” do artigo 5º da vigente Carta Política, e nos casos previstos em lei, com a observânciaindispensável do devido processo legal.Para maior comodidade no acompanhamento do raciocínio que se está a desenvolver,transcrevo o dispositivo constitucional adrede referido:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paísa inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, àsegurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(…)

XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação pornecessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante

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justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casosprevistos nesta Constituição” (sublinhei).

As ressalvas referidas no dispositivo constitucional acima reproduzido, aludem àpossibilidade de que a desapropriação ocorra sem que a prévia indenização seja efetuadaem moeda corrente, ou que nem mesmo exista.Acham-se elas consignadas nos artigos 182, inciso “III”, 184, e 243, nos quais se fezestatuir, pela ordem:(a) a desapropriação, pelo Poder Público municipal, nos termos da lei, de área incluída noplano diretor da comuna, quando o proprietário do solo urbano não edificado, subutilizadoou não utilizado, não promover o seu adequado aproveitamento, mediante a paga “… emtítulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, comprazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, asseguradoso valor real da indenização e os juros legais”;(b) a desapropriação, pela União, para fins de reforma agrária, do imóvel rural que nãoesteja a cumprir a sua função social, mediante prévia e justa indenização “… em títulos dadívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de vinteanos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei”;(c) a imediata expropriação de glebas de qualquer região do País onde forem localizadasculturas ilegais de plantas psicotrópicas, terras que serão prontamente destinadas aoassentamentos de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos,“… sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstasem lei”.Penso já ser possível, a partir das disposições constitucionais a que se fez menção, ecom amparo na Doutrina mais escorreita, esboçar um conceito de desapropriação.Pode-se dizer que ela é “o procedimento administrativo através do qual o Poder Público,tendo em vista a necessidade ou a utilidade pública, ou o interesse social, subtrai dealguém, compulsoriamente, um dado bem ou direito, adquirindo-o de forma originária,mediante prévia e justa indenização, ressalvada a hipótese em que seja utilizado comoforma de aplicação de penalidade, por decorrência de ilícito criminal, caso em que aindenização não será, de regra, devida”.

III- FundamentosÉ pertinente cogitar-se, em tema de desapropriação, da existência de um fundamento:(a) político, que se traduz na prevalência do interesse coletivo sobre o individual, quandopostos em conflito;(b) de um, jurídico-teórico, correspondente à exteriorização, dentro do ordenamentojurídico, dos princípios políticos por ele albergados;(c) de um, normativo constitucional, tal como desponta dos cânones da Carta Políticaem vigor, aqui já reproduzidos ou anunciados; e, por fim,(d) de um fundamento normativo infraconstitucional, que se desvenda na legislaçãoespecífica, merecendo destaque o Decreto-Lei nº 3.365, de 1941, e alterações anteriores(Lei nº 4.686, de 1965, Lei nº 6.602, de 1978)que dispõe sobre a desapropriação porutilidade pública, a Lei nº 4.132, de 1962, que define os casos de desapropriação porinteresse social e dispõe sobre sua aplicação, o Decreto-Lei nº 1.075, de 1970, que regulaa imissão de posse “initio litis” em imóveis residenciais urbanos, a Lei Complementar nº76, de 1993, que dispõe sobre o procedimento contraditório especial, de rito sumário, parao processo de desapropriação de imóvel rural, para fins de reforma agrária, a Lei nº 8.257,de 1991, que dispõe sobre a expropriação de glebas nas quais se localizem culturas

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ilegais de plantas psicotrópicas e dá outras providências, e a Lei nº 8.629, de 1993, quedispõe sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos à reforma agrária.

IV- Princípios básicos reguladores da atividade expropriatóriaComo atividade típica da Administração Pública, submete-se a desapropriação aos princípiosbásicos da:- legalidade - a chamada desapropriação indireta “… não passa de esbulho da propriedadeparticular e como tal não encontra apoio em lei. É situação de fato que se vai generalizandoem nossos dias, mas que a ela pode opor-se o proprietário até mesmo com os interditospossessórios. Consumado o apossamento dos bens e integrados no domínio público,tornam-se, daí por diante, insuscetíveis de reintegração ou reivindicação, restando aoparticular espoliado haver a indenização correspondente, da maneira mais completapossível, inclusive correção monetária, juros moratórios, compensatórios a contar doesbulho, e honorários advocatícios, por se tratar de ato caracteristicamente ilícito daAdministração.” (cf. MEIRELLES, Hely Lopes, Ob. Cit. p. 509 e ss.)- moralidade - é inconcebível que a desapropriação ocorra fundada em arritmia com osprincípios éticos, notadamente os da lealdade e os da boa fé, eis que à Administração édefeso qualquer “… comportamento astucioso, eivado de malícia, produzido de maneira aconfundir, dificultar ou minimizar o exercício de direitos por parte dos cidadãos” - cf. C. A.Bandeira de Mello - Curso de Direito Administrativo, 5ª ed. p. 59 e ss., “Malheiros”, SãoPaulo, 1994;- impessoalidade - tampouco é aceitável que do ato expropriatório dimanem situaçõesque se venham de caracterizar como discriminações, simpatias ou animosidades de qualquermatiz, eis que a Administração deve a todos, tratamento isônomo, aí considerados os“status” jurídicos próprios de cada administrado;- finalidade - ao administrador impõe-se que só pratique o ato para o seu fim legal,subentendido que, o fim legal “… é unicamente aquele que a norma de Direito indicaexpressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal” (MEIRELLES, HelyLopes - Ob. Cit. p. 85 e,- publicidade - sem o qual, não se realiza a isonomia, nem é possível o exercício dasforma de controle constitucionalmente admitidos, nem haverá a sempre tão desejada“transparência” dos negócios e atos públicos, nem mesmo o devido processo legal seráobservado(veja-se a propósito - FIGUEIREDO, Lúcia Valle - Ob. Cit. p. 48 e ss.-, vetoresbásicos que, juntamente com outros subprincípios, que deles defluem, informam toda equalquer atividade administrativa.

V- Requisitos ConstitucionaisSobressai, ainda, dos dispositivos constitucionais trazidos à colação, que o atoadministrativo de desapropriação se exercita sob influxo de certos requisitos, quais sejam:- a necessidade pública - que se caracteriza quando a Administração enfrenta situaçõesde emergência, cuja solução satisfatória, exija a urgente transferência de bens de terceiros,particulares ou não, para o seu domínio e utilização imediata;- a utilidade pública -,que avulta quando se revela conveniente (embora não imprescindível)ao público interesse, a transferência de bens de terceiros para a Administração;- o interesse social -, isto é, quando as circunstâncias impõem “… a distribuição ou ocondicionamento da propriedade para seu melhor aproveitamento, utilização ou produtividadeem benefício da coletividade ou de categorias sociais merecedoras de amparo específicodo Poder Público” (MEIRELLES, Hely Lopes - Ob. Cit. p. 516);- a necessidade de imposição de pena -, “… pelo descumprimento da função social da

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propriedade” - cf. Lúcia Valle Figueiredo, in “Curso de Direito Administrativo”, p. 203,Malheiros, São Paulo, 1994 -, tal como expressamente estatuído na própria Constituiçãoem vigor e,- a justa e prévia indenização -, devida em quase todos os casos, em dinheiro, ou emtítulos da dívida pública ou da dívida agrária, tal como já restou destacado em outrospontos desta exposição.

VI- A desapropriação por interesse socialA desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, à conta de toda aconjuntura que se desenha no noticiário do dia a dia, é a que reclama, ao meu sentir, umamaior atenção.Em função disso, e atento às limitações próprias de uma incursão dessa natureza, é queme deterei mais nessa espécie de desapropriação, na tentativa de tracejar-lhe um perfilespecífico que, afastadas as peculiaridades que lhe sejam próprias, servirá ao feitio demolde ou padrão, para as demais espécies expropriatórias.Destaquei que a desapropriação é procedimento administrativo por excelência; destaco,agora, que o procedimento expropriatório pode se realizar, tão somente, na via administrativa(fase declaratória e executória processada no âmbito da própria Administração) mas podereclamar, também, a atuação judicial (fase declaratória em sede administrativa e faseexecutória em Juízo).No caso específico das desapropriações por interesse social para fins de reforma agrária,a utilização da via judicial é imprescindível.Há um procedimento especial, de rito sumário, tal como referido na Constituição de 1988(§ 3º do artigo 184), para as desapropriações para fins de reforma agrária; refiro-me ao queé disciplinado na Lei Complementar nº 76, de 1993.Sem o exame desse ato normativo (ao menos de alguns dos seus tópicos) não serápossível a apreensão das diversas nuanças, assim do procedimento administrativo dedesapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, como do processo ou dafase judicial que àquele se subsegue.

VII- CompetênciaÉ privativa da União (LC nº 76/93 - artigo 2º, 1ª parte) o que torna competente para apreciare decidir a lide, o Juiz Federal da Vara privativa das desapropriações para fins de reformaagrária.Em função da interiorização da Justiça Federal, em boa hora concebida e implantada, apartir de 1986, pelo eminente Ministro Lauro Leitão, à época, presidente do extinto esempre egrégio Tribunal Federal de Recursos (TFR), talvez se pudesse cogitar no sentidode que essa competência, privativa, em princípio, dos Juízes Federais das “Varas Agrárias”,fosse atribuída, também, aos ocupantes das Varas interioranas.Se por um lado, tal poderia contribuir para a agilização procedimental (imóvel situado nasede do Juízo, com maiores facilidades para o deslocamento do Perito, por exemplo) poroutro poderia, também, acarretar morosidade para a tramitação processual.É que as intimações do “INCRA” -Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária”-órgão federal, cujos prepostos, ingressarão na propriedade particular, “… para levantamentode dados e informações, com prévia notificação …” (Lei nº 8.629, de 1993 - § 2º do artigo2º) e a quem incumbirá, também, aforar “opportuno tempore”, a ação expropriatória, porexemplo, teriam de ser feitas na forma estabelecida na segunda parte do artigo 237 dovigente Código de Processo Civil (vale dizer, por carta registrada) eis que, em boa partedas comarcas, não existe órgão de publicação dos atos oficiais.

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Anote-se, por outro lado que, a teor do que se contém no § 1º do artigo 18 da L.C. 76, de1993, “qualquer ação que tenha por objeto o bem expropriando será distribuída, pordependência, à Vara Federal onde tiver curso a ação de desapropriação, determinando-sea pronta intervenção da União”.Isso inviabilizaria, na prática, a tramitação célere do processo judicial, de vez que osadvogados da União, hão de ser intimados, sempre, pessoalmente (Lei Complementar nº73, de 1993 - artigo 38)!Bem se vê que, a alternativa de outorgar competência aos Juízes Federais das Varassituadas fora das Capitais dos Estados, não seria, na maioria dos casos, fórmula quepudesse contribuir para a pronta solução da lide…

VIII-O Decreto declaratórioRetomo os comentários em derredor do artigo 2º, da Lei Complementar nº 76, de 1993; ena segunda parte do dispositivo se estabelece que a desapropriação será procedida dedecreto declarando o imóvel de interesse social, para fins de reforma agrária.Decretos “em sentido próprio e restrito, são atos administrativos da competência exclusivados Chefes do Executivo, destinados a prover situações gerais ou individuais, abstratamenteprevistas de modo expresso, explícito ou implícito, pela legislação” (MEIRELLES, HelyLopes - Ob. Cit. p. 162).Pode-se sustentar que o nosso ordenamento jurídico admite duas modalidades de decretogeral (normativo): o independente ou autônomo e o regulamentar ou de execução.O decreto que declara o imóvel de interesse social, para fins de reforma agrária, porqueregula, sem invadir as reservas de lei, matéria possível de ser disciplinada mediante oemprego dessa espécie normativa, pode ser doutrinariamente classificado como decretoindependente ou autônomo.Tal ato, até bem pouco tempo, era editado somente após a realização de levantamentoaerofotogramétrico da área a ser expropriada.E porque tomava por base os resultados decorrentes do levantamento já mencionado, emque pese a possibilidade de, nesse tipo de iniciativa, consubstanciarem-se acentuadasdistorções, notadamente no que diz respeito à área efetiva do imóvel objeto dedesapropriação, os decretos traziam em seu bojo, as coordenadas (pontos de latitude ede longitude) de toda a área a ser expropriada.Hoje, já não é assim; o decreto que declara o imóvel de interesse social para fins dereforma agrária, contenta-se em identificar o imóvel (menciona o nome da propriedade, omunicípio e a Unidade da Federação onde se situa, os nomes dos proprietários e a áreaprovável), sem que haja mais qualquer menção às coordenadas da área.Disso decorrem conseqüências relevantes; menciono algumas: como já não se especificamas coordenadas do imóvel, o levantamento topográfico, sem prejuízo da realização daprova pericial onde se irá aferir a justa indenização devida torna-se, mais do que nunca, derealização imprescindível.Só a partir do levantamento topográfico, saber-se-á, com segurança, qual a áreaefetivamente expropriada (esse tipo de prova permite a aferição milesimal da área dospolígonos irregulares - e na maioria das vezes, as áreas a serem expropriadas seapresentam com essa conformação) o que se projeta, notadamente, na própria indenizaçãodevida.Ademais, só a perícia identificará, com exatidão, se existem benfeitorias pertencentes aposseiros e qual o justo valor a eles devido - nem sempre a vistoria administrativa apuracircunstâncias dessa natureza.

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IX- A declaração de interesse socialConsoante o disposto na Lei nº 4.132, de 1962, a desapropriação por interesse social “…será decretada para promover a justa distribuição da propriedade ou condicionar o seu usoao bem-estar social, na forma do art. 147 da Constituição Federal” (artigo 1º - a menção aoartigo 147, remete à Carta de 1946, vigente ao tempo da edição do ato normativo oraexaminado).E diz-se mais (inciso I, do artigo 2º): “Considera-se de interesse social, o aproveitamentode todo bem improdutivo ou explorado sem correspondência com as necessidades dehabitação, trabalho e consumo dos centros de população a que deve ou possa suprir porseu destino econômico”.Logo a seguir se esclarece que, “… o disposto no item I deste artigo só se aplicará noscasos de bens retirados de produção ou tratando-se de imóveis rurais cuja produção, porinsuficientemente explorados, seja inferior a média da região, atendidas as condiçõesnaturais do seu solo e sua situação em relação aos mercados” (§ 1º do mesmo artigo).Pois bem: só a propriedade improdutiva, pode ser expropriada; mas não é difícil que se“simule”, na vistoria administrativa da qual falarei a seguir, uma situação de conflito na área(basta que “os sem terra” a invadam) e já se tornará conveniente que a Administraçãodeclare o imóvel de interesse social para fins de reforma agrária.O Supremo Tribunal Federal, em pronunciamento recente (o acórdão ainda pende depublicação) tendo em vista a prova produzida, reconheceu que a situação efetiva de umdado imóvel havia sido “maquilada” e, à conta dessa irregularidade, proclamou nulos osefeitos do ato de desapropriação.É que a Fazenda Timboré, localizada entre os municípios de Andradina e Castilho (SP.)“… anteriormente à invasão dos sem-terra, era considerada produtiva. Com a invasão, apropriedade foi fragmentada e deixou de ser produtiva, deixou de cumprir suas funções.Com isso, o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) atestou que apropriedade não era mais produtiva e o presidente assinou o decreto de desapropriação”,tal como se fez noticiar na edição de 26 de março de 1996, da “Gazeta Mercantil”.Ainda segundo o noticioso, o eminente ministro relator, Celso de Mello, entendeu que o“… governo federal não pode invocar contra o proprietário uma falta de produtividadedecorrente de uma invasão”.E em outro trecho fez-se sublinhar: “Esse é um caso emblemático e preocupante docrescente desprezo do governo federal pelas normas da Constituição Federal que asseguramo direito à propriedade. Elas estão descritas nos artigos 184, 185 e 186 da ConstituiçãoFederal, diz o ministro, ressaltando que a decisão do STF não é contra a reforma agrária,e sim contra essa prática ilícita, particularmente”.O raciocínio consagrado na decisão acima noticiada, há de prevalecer nos casos em quea declaração de interesse social tenha por esteio, verbi gratia, situações de conflito geradaspropositadamente.Menciono, a guisa de exemplo, grupo de pessoas que, agindo em nome dos “sem-terra”,ameace invadir uma propriedade, cujos donos, resolvam exercitar, nos limites legalmenteadmitidos, a defesa da posse …Ou, quem sabe, rebanhos (bovinos, ovinos ou caprinos) de terceiros que, de súbito e pormera “coincidência”, resolvam pastar em uma propriedade que se pretenda expropriar …Situações como essas, encerram em si mesmas potencialidade para deflagrar instantesde tensão, o que é facilmente captado na vistoria administrativamente empreendida noimóvel (na prática, não é difícil que ocorram situações assemelhadas às do exemplo oraconsignado).

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A posição sufragada no colendo Supremo Tribunal Federal é, assim o reputo, da maiorrelevância, e se sintoniza, ao meu sentir, com o princípio da universalidade dajurisdição; afinal, ainda quando seja defeso ao expropriado discutir”… quanto ao interessesocial declarado … “(artigo 9º, da L.C. 76, de 1993), se a ilegalidade residir justamente aí,não se poderá subtrair tal lesão, ou mesmo a simples e só ameaça de lesão a direito, aocontrole jurisdicional da constitucionalidade e/ou da legalidade, confiado ao Poder Judiciário.

X- A vistoria administrativaExtrai-se do § 2º, do artigo 2º, da Lei Complementar sob exame, a legitimidade doexpropriante para empreender a vistoria e a avaliação do imóvel, inclusive com o auxílio deforça policial, mediante prévia autorização do Juízo competente, responsabilizando-se osprepostos que se desincumbirem de tal mister, por eventuais prejuízos que venham decausar, sem que afaste a incidência das sanções penais compatíveis.A experiência há demonstrado que a avaliação administrativamente empreendida, quiçápor se cogitar de ato realizado de forma unilateral, e que não se beneficia, portanto, dosinfluxos salutares do contraditório, quase nunca aponta o justo preço, quer da terra nua,quer das benfeitorias existentes na área a ser expropriada.Ou a avaliação desses itens é risível, o que elimina a possibilidade de qualquer acordoentre as partes interessadas ou, por vezes (embora não seja freqüente), é superfectada.A propósito da ocorrência dessa última hipótese, atente-se para a publicação estampadano noticioso “Estado de São Paulo”, edição de 8-4-1996, dando conta de que em Goiás,”…o INCRA desapropriou uma área de 322,5 alqueires para fins de reforma agrária e propôso pagamento de R$ 8.159 por alqueire”.E, segue a nota, “… segundo o juiz federal Carlos Humberto de Souza, o preço oferecidopelo mercado para a mesma região, em média, varia de R$ 2 mil a R$ 3 mil por alqueire…”.Em sã consciência, alguém duvida de que essas ou outras hipóteses, sejam possíveis deacontecer?!

XI- O levantamento da ofertaCaso não exista dúvida acerca do domínio, “… poderá o expropriando requerer olevantamento de oitenta por cento da indenização depositada, quitado(s) os tributos epublicados os editais, para conhecimento de terceiros, a expensas do expropriante, duasvezes na imprensa local e uma na oficial, decorrido o prazo de trinta dias” - § 2º, do artigo6º da LC sob exame.O dispositivo legal não encerra, no concernente às exigências a serem cumpridas paraque o levantamento de parte da oferta possa ocorrer validamente.Questão de ordem prática, todavia, tem surgido por conta da publicação dos editais naimprensa local.A publicação (que é custeada pelo INCRA) reclama a realização de concorrência pública.Mas é comum que as empresas que se dediquem às atividades próprias da imprensa,tenham dívidas para com a Previdência Social e, portanto, estejam impedidas de licitarenquanto não pagarem as dívidas de suas responsabilidades.Caso já se registrou em que, todas as empresas de um dado Estado-membro, deviam àPrevidência; e por causa disso, nenhuma delas pode ser admitida a participação do torneiolicitatório.Qual a solução possível? Privar o expropriado de efetuar o levantamento dos valoresjudicialmente custodiados? Paralisar a marcha processual? Ou incumbir os prepostos do

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“INCRA” de desenvolverem gestões junto ao Expropriado, ao objetivo de que ele próprioarcasse com os ônus (que costumam ser expressivos) das publicações para futuroressarcimento?!Por que não excluir a publicação dos editais da imprensa local, isto é, confiá-la, apenas,ao órgão incumbido de efetuar a publicidade dos atos oficiais, sem prejuízo da afixação decópia do edital no átrio do Foro da Comarca de situação do imóvel a ser expropriado, e noátrio do próprio Foro Federal perante o qual tramitasse a expropriatória?Será que com isso não se evitaria a possibilidade da ocorrência de uma das causascapazes de acarretar infindáveis procrastinações na marcha processual? Fica a sugestão.

XII -A prova pericialAjuizada a ação de desapropriação, e porque a vistoria feita pelo INCRA quase nuncaaponta para a justa indenização devida, surge a necessidade de se fazer realizar a provapericial.E agora, em função do próprio conteúdo dos decretos declaratórios a que anteriormentefiz referência, essa prova pericial haverá de ter por objetivo, assim a apuração da áreaefetiva do imóvel a ser expropriado como a justa indenização devida (terra nua e benfeitorias,produtivas e improdutivas).Nos quadros funcionais da Justiça Federal, não figuram profissionais que detenham saberespecializado das diferentes áreas do conhecimento científico, e que estejam regularmenteinvestidos em cargos de Perito Judicial.Porque a realização da prova pericial é indispensável (salvo nos casos em que tenhahavido acordo), o juiz singular se vê obrigado a garimpar, junto aos Conselhos deFiscalização, profissionais que, mediante compromisso1 , possam fazer carrear para osautos, a apreciação técnica sobre fatos que reclamem esclarecimentos científicos, desorte a que o juiz possa ter sobre aqueles, cognição, tanto quanto possível, a mais plenae perfeita.Caso se resolva prestigiar a tabela de honorários periciais, anexa ao Regimento de Custasda Justiça Federal (Lei nº 6.032, de 1974), aprovada pelo Conselho da Justiça Federal e,atualizada de tempos em tempos, a marcha processual ficará paralisada.É que, a remuneração prevista na tabela, é simbólica (nem mesmo um técnico em iníciode carreira a ela se submeteria).Os profissionais liberais de comprovada experiência, costumam cobrar pela realização daperícia, segundo os padrões remuneratórios fixados nas tabelas editadas pelos Conselhosde Fiscalização, nos quais estejam inscritos.Essa remuneração, com certeza, quase nunca será módica, eis que é definida em funçãode uma série de critérios: tempo a ser dispendido na perícia, complexidade dos fatos aserem periciados, necessidade ou não de deslocamentos do perito para localidades forada sede do Juízo, tempo para a leitura dos autos e para a elaboração do laudo, dentreoutros.A prova pericial é determinada pelo juiz e, segundo a regra em vigor (ver artigo 19 e ss., do

1 No inciso “III”, do artigo 9º,da Lei Complementar nº 76, de 1993, reintroduziu-se a exigência do “compromisso”, para peritos eassistentes técnicos. O “compromisso”, data vênia dos que se posicionem em sentido divergente, é ato processual de nenhumaserventia. Afinal, se o Código de Processo Civil- “CPC” cuidou de elencar os deveres do Vistor e, por igual, quais as conseqüênciasque poderão advir para esse auxiliar do Juízo, nos casos em que desatenda ele a preceituações legais pertinentes (ver “CPC”,artigos, 145 “usque” 148 e 420 e ss.) não será a mera aposição de uma assinatura em um formulário forense, que irá compelir oExperto a bem cumprir o múnus que lhe houver sido confiado. Quanto aos Louvados, na condição de pessoas da estreita confiançadas partes, não estão obrigados a guardar eqüidistância dos interesses em confronto e, por isso mesmo, não se lhes pode argüir oimpedimento ou a suspeição (ver “CPC”, artigo 422). Por isso que sustento: o compromisso é ato estéril e, data vênia, perfeitamenteprescindível.

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“CPC”) tocará ao “INCRA” antecipar as despesas dela decorrentes.Mas as unidades do “INCRA” nos Estados, não dispõem de qualquer autonomia financeira;e porque qualquer valor tem de ser solicitado a outras unidades da Administração (a“conta”, hoje, é única, convém recordar), é corriqueiro que um simples despacho quedetermine a antecipação das despesas para a realização da perícia demore, muita vez, 60(sessenta) ou mais dias para ser cumprido.Essas considerações não eliminam, data vênia, a possibilidade dos prepostos do “INCRA”terem de procurar o expropriado para que, ele próprio, antecipe o depósito da cifra que irácustear as despesas com a realização da prova pericial, para ressarcimento futuro…Solução que se me afigura plausível, residiria na criação de um quadro de peritos judiciais;as despesas com vencimentos seriam, estou certo, bem menores do que as que sãofeitas hoje, com a utilização de profissionais liberais sem vínculo com o Poder Judiciário.

XIII-A fixação da indenizaçãoRealizada a perícia, em não sendo necessários esclarecimentos do Experto ou a produçãode prova oral, encerra-se a instrução e profere-se a sentença.Vencida a fase recursal, urge liquidar a sentença segundo a regra insculpida no artigo 604do “CPC”, isto é, o Expropriado instruirá o pedido de execução com a memória discriminadae atualizada do cálculo.Doutrinadores existem, é certo, a sustentar que não existe um procedimento de execuçãonas desapropriações, vale dizer, procedimento que seja, em tudo por tudo, assemelhadoao que decorra da execução de um título judicial surgido a partir do encerramento de umaação de cognição de conteúdo condenatório.É fato que o domínio da área expropriada se transfere para o INCRA, a partir da simplesexpedição de mandado ao Oficial do Registro Imobiliário (L.C. nº 76/93 - artigo 17).Mas há a necessidade de liquidação do julgado; sem isso não se apura o valor, em moedacorrente, da justa indenização fixada por sentença.Que não se cogite de que essa liquidação dependerá, apenas, de “cálculo aritmético”, talcomo se menciona na vigente redação do artigo 604 do Código de Processo Civil- “CPC”.Deveras, os cálculos são por demais complexos e o expropriado, a mais das vezes,elabora-los-á de forma incorreta.Não é sem razão que, informalmente, se noticia a ocorrência de equívocos (aplicações deíndices indevidos de atualização monetária, por exemplo) que findam por se traduzir emindenizações sobremodo vultosas, em tudo relembrando o que ocorreu, não faz muito, emrelação à Previdência, em importante Estado da Federação.Contra a Fazenda Pública, consigno vênia aos que entendam em sentido oposto, não sefaz viável a execução na forma estabelecida no artigo 604 do Código de Processo Civil-“CPC”.Em se cuidando de desapropriações, confiar a liquidação da sentença, quer ao expropriado,quer ao Poder Público, não parece ser a alternativa mais apropriada.A liquidação por arbitramento (o Contador do Foro, auxiliar do Juízo, poderia oficiar comoárbitro) - se não se preferir reintroduzir disposição já revogada do “CPC”-, seria a soluçãomais confiável para todos (partes e juiz, este último, o responsável pela liberação, em favordo expropriado, das cifras devidas a título de justa indenização).Nesse modo de liquidação ora sugerido, observar-se-ia, inclusive, o disposto no manualde normas padronizadas de cálculo elaborado sob os auspícios do Conselho da JustiçaFederal.

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Com isso, as perspectivas do surgimento de situações que justificassem a interposiçãode embargos seria, com certeza, bem mais reduzida.Ainda no concernente à liquidação da sentença, questão que começa a ser suscitada,relaciona-se à fixação do “dies a quo” para a contagem dos juros de mora.A teor da Súmula 70 do extinto e sempre egrégio Tribunal Federal de Recursos, fluiriameles “… a partir do trânsito em julgado da sentença que fixa a indenização”.Na jurisprudência sumulada do colendo Superior Tribunal de Justiça, extrai-se do verbetenº 70, praticamente a mesma orientação pretoriana: “os juros moratórios, na desapropriaçãodireta ou indireta, contam-se desde o trânsito em julgado da sentença”.A desapropriação indireta, já se disse no início dessas considerações, deriva de esbulho(ato ilícito da Administração Pública).A Doutrina2 se vem insurgindo contra o critério de fixação do “dies a quo” para a contagemdos juros, na desapropriação derivada da prática de ato ilícito pelo Poder Público.Pugna-se, sob amparo do que figura no artigo 962, do Código Civil (a jurisprudência já sevem demonstrando inclinada a referendar essa nova postura)Deveras, se em sede desapropriação o princípio informativo básico é o da “justaindenização”3 , não é justo nem razoável que a contagem dos juros não se faça da data doesbulho (e não do ajuizamento da ação de desapropriação indireta, que reclama a iniciativado próprio esbulhado, sem prejuízo da observância do lapso prescricional, tal como já temdecidido o egrégio Superior Tribunal de Justiça4 nem, muito menos, da data do trânsito emjulgado da decisão fixadora da justa indenização devida.Mas em se cuidando de desapropriação direta, haveria respaldo para que o termo inicialda contagem dos juros fosse fixado a contar da propositura da ação ou, pelo menos, daimissão do expropriante na posse do imóvel?O ideal é que na avaliação empreendida administrativamente pelo “INCRA”, já se sugerissemesmo, o valor da justa indenização, devida por conta do ato de desapropriação.Se isso ocorresse, as partes transigiriam e, ao juiz, tocaria, tão somente, homologar oacordo, pondo termo ao processo.Isso, a mais das vezes, não acontece; os valores da oblação inicial são, quase sempre,irreais.A indenização há de ser prévia5 e justa; quer dizer: ajuizada a ação, a oferta há de sercustodiada à ordem do Juízo e, desde que isto ocorra, “… o autor será imitido na posse doimóvel expropriando …” (§ 1º, do artigo 6º, da LC 765, de 1993).Na prática, com a perda da posse, o expropriado priva-se do uso, gozo e disposição dobem; muito embora o domínio somente se transfira segundo os critérios estabelecidos noartigo 17, da Lei Complementar, é dizer, efetuado o levantamento, ainda que parcial, daindenização ou do depósito judicial, instante em que, será ratificada imissão de posse eexpedido o mandado translativo do domínio, para o necessário registro no Cartório deRegistro de Imóveis a tanto competente.Com a perda da posse, já se desfalca o patrimônio do expropriado. Ora, se tudo se orienta

2 Menciono, por exemplo, “Juros de Mora na Desapropriação Indireta”, da lavra do eminente ministro Cesar Asfor Rocha, do colendoSuperior Tribunal de Justiça, disponível para consulta na “home page” Teia Jurídica no seguinte endereço eletrônico: HTTP://WWW.ELOGICA.COM.BR/USERS/LAGUIMAR.3 No artigo 12 da Lei Complementar nº 76/93, se diz ser “justa”, a indenização que permita ao desapropriado a reposição, em seupatrimônio, do valor do bem perdeu por interesse social.4 Cf. REs nº 785 e 4.058-SP, rel. o em. Min. AMÉRICO LUZ, apud “Juros de Mora na Desapropriação”, Min. Cesar Asfor Rocha,loc. Cit.

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pelo “princípio da justa indenização”, o “dies a quo “do juros moratórios deveria ser, se nãoa data da propositura da ação6 , pelo menos, a data da imissão na posse (a contar dessemomento a propriedade passa, de fato, a integrar o patrimônio do expropriante e, dela, sepassa a fazer o compatível uso).

XIV- O artigo 14 da Lei Complementar 76/93 e o Supremo Tribunal FederalFixado o “quantum” indenizatório, o valor da indenização, estabelecido por sentença, “…deverá ser depositado pelo expropriante à ordem do juízo, em dinheiro, para as benfeitoriasúteis e necessárias, inclusive culturas e pastagens artificiais e, em Títulos da Dívida Agrária,para a terra nua”, consoante se expressa no artigo 14 da Lei Complementar sob enfoque.Mas nas execuções contra a Fazenda Pública, há de seguir-se o critério consagrado doartigo 730 do Código de Processo Civil- “CPC”, vale dizer, “… o juiz requisitará o pagamentopor intermédio do presidente do tribunal competente”.Na Ação Declaratória de Inconstitucionalidade nº 1.187-1, em sede liminar, suspendeu-se“… até decisão final da ação a eficácia da expressão” em dinheiro, para as benfeitoriasúteis e necessárias, inclusive culturas e pastagens artificiais (in DJU. 15-2-95, p. 2.523,apud Theotônio Negrão - Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, 27ªed. p. 809, Saraiva, São Paulo, 1996).Não é difícil de se intuir qual o raciocínio que embasou a R. decisão da Alta Corte deJustiça: se a execução contra a Fazenda Pública se há de fazer “via de precatório”, aindaquando o crédito do particular derive da prática de um ato ilícito do Poder Público (acobrança de um empréstimo compulsório cuja inconstitucionalidade tenha sido proclamadapelo Supremo Tribunal Federal, por exemplo), a fortiori assim haverá de ser, também,quando o uso inadequado da propriedade rural autorizar a que esse mesmo Poder Público,declare o imóvel de interesse social para fins de reforma agrária e, posteriormente, façaajuizar a ação de desapropriação.Essa conclusão, todavia, parece não ter prevalecido; notícias que recolhi em contato comeminente membros do Senado da República, dão conta de que, em decisão final, a colendaCorte de Justiça houve por bem proclamar a constitucionalidade do artigo 14, da LeiComplementar nº 76, de 1993, revogando, de conseqüência, os efeitos da medida liminaraté então em vigor.Desconheço as razões invocadas para supedanear essa orientação pretoriana (o V. Acórdãonão foi, ainda, publicado); creio, todavia, que o espectro do princípio constitucional daindenização justa e prévia, que informa quase todas as desapropriações, tenha sidodevidamente retraçado pela Corte Suprema.

XV- O Ministério da Reforma AgráriaA imprensa tem dado destaque à criação do Ministério Extraordinário da Reforma Agrária.É possível que a criação de mais um órgão possa contribuir de forma positiva para arealização da reforma agrária por todos ambicionada.Interpreto a criação do Ministério, como o reconhecimento expresso do esvaziamento do

5 José Carlos de Moraes Sales sustenta que não se pode considerar como prévia a indenização paga em Títulos da Dívida Agrária- cf. Desapropriação à Luz da Doutrina e da Jurisprudência, 3ª ed. p. 782 e ss., “RT”, São Paulo, 1995; essa posição doutrinária,todavia, não é pacífica.6 Em uma das últimas decisões que proferi como magistrado monocrático, julgando uma das ações de desapropriação por interessesocial para fins de reforma agrária, que mais alcançou repercussão no Estado do Ceará, condenei o expropriante a pagar jurosmoratórios de 6% (seis por cento) ao ano, contados da imissão na posse; ao ensejo explicitei: “… despreza-se o critério fixado naSúmula 70 do colendo Superior Tribunal de Justiça, em homenagem ao preceito constitucional que estabelece o pagamento prévioe justo da indenização”; resta ver qual será a orientação jurisprudencial que a V. Instância Revisora irá imprimir em relação àmatéria.

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“INCRA” que, justiça seja feita, muito embora a braços com limitações de toda ordem,possibilitou, mesmo assim, a concretização de tudo o que se fez até hoje, em matéria dereforma agrária no País.Oxalá o novo ente estatal se demonstre infenso ao males que sempre costumam afetar asestruturas estatais - a tendência ao agigantamento da burocracia, com a inevitável perdada tão desejada eficiência no trato da coisa pública.Que as dotações orçamentárias sejam compatíveis com as metas de assentamentos quese venham de estabelecer, e que se desejem, de fato, cumprir.Que o Poder Legislativo, sempre sensível às grandes questões nacionais, faça introduzir,via de Lei Complementar, as modificações indispensáveis a que o procedimento especialdas desapropriações por interesse social, para fins de reforma agrária, observe um ritoverdadeiramente sumário - por incrível que possa parecer, a tramitação das desapropriaçõesjudiciais, quando regidas pelo Decreto-Lei nº 554, de 1969, era bem mais célere…7

O que fiz abordar aqui, contribui, estou certo, para que se possa vislumbrar o perfil atual,da atividade administrativa de desapropriação.Que as medidas governamentais ora deflagradas possam proporcionar, é com certeza odesejo de todos, de forma a mais positiva, o retracejamento de um novo perfil para essaatividade administrativa de tão magna importância: a desapropriação por interesse social,para fins de reforma agrária.

Bibliografia

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• FIGUEIREDO, Lúcia Valle - Curso de Direito Administrativo, “Malheiros”, São Paulo,1994.

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• SALLES, José Carlos de Moraes - A Desapropriação à Luz da Doutrina e da Jurisprudência,3ª ed. “RT”, São Paulo, 1995.

7 Só o Estado Democrático de Direito, é minha a convicção, é capaz de ensejar o atingimento do “bem comum”, tal como concebidopor Tomás de Aquino; esse desiderato, que há de se constituir sempre na meta derradeira do Estado - personificação própria doeticismo, relembrando a sempre atual posição de Hegel - não será alcançado enquanto não se equacionarem problemas estruturaisbásicos (desemprego, fome, miséria, doença, má distribuição da riqueza, e incontáveis outras mazelas, que nem vale a penaserem referidas) e não se banir da legislação (e agora falo da reforma agrária) impropriedades como as que fiz destacar, e outrastantas, das quais só resultam os mais sérios entraves para a entrega célere da prestação jurisdicional. Que não se interprete pois,a advertência, como apologia às leis de exceção, ou saudosismo de épocas onde a intolerância conduziu aos resultados de todosconhecidos.

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DIREITO DE PETIÇÃO E DIREITOS HUMANOS

João Bosco Medeiros de SousaJuiz Federal 1ª Vara - PB

Diz-se direito de petição à faculdade constitucionalmente assegurada a qualquer pessoa,física (brasileiro ou estrangeiro residente no Brasil) ou jurídica, de pleitear interesse individualou coletivo, inclusive contra ilegalidade e abuso de poder, ou simplesmente de requerercertidões perante os poderes públicos.2. Isso significa que, ao peticionar (representar), o interessado estará buscando direitoindividual ou não; esta última hipótese caracterizará o chamado interesse geral (coletivo),equivalendo dizer que o seu exercício não depende, necessariamente, de violação a direitoindividual (interesse próprio).3. O direito de petição, portanto, é a um só tempo meio assecuratório de direitos einstrumento de defesa da ordem constitucional, da legalidade e do interesse geral.4. O assunto está incluído na Constituição Federal vigente, no Título II (Dos direitos egarantias fundamentais), no seu Capítulo I (Dos direitos e deveres individuais ecoletivos) e veio em resposta aos anseios do indivíduo, por vezes desprotegido ante opoder infinitamente maior do organismo estatal; assim, o art. 5º, inc. XXXIV, da CF,estabelece o seguinte, textualmente: “XXXIV - São a todos assegurados,independentemente do pagamento de taxas: a) o direito de petição aos PoderesPúblicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder; b) aobtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos eesclarecimento de situações de interesse pessoal”.5. Pode ser dirigido a autoridades de quaisquer dos Poderes Públicos, isto é, Executivo,Legislativo ou Judiciário, sob dúplice enfoque:”pode ser uma queixa, uma reclamação,e então aparece como um recurso não contencioso (...); por outro lado, pode sera manifestação da liberdade de opinião e revestir-se do caráter de uma informaçãoou de uma aspiração dirigida a certas autoridades”. (Curso de direito constitucionalpositivo / José Afonso da Silva — São Paulo : Malheiros, 1995, p. 421).6. Mas, o direito de petição, no sentido aqui abordado (acessibilidade ao Poder Judiciário)não é um instituto de direito processual, civil ou penal, propriamente dito; ou seja, não é odireito de peticionar em juízo, de estar em juízo, de exigir a prestação jurisdicional, previstoaliás no inciso XXXV, do mesmo art. 5º, da CF, nos seguintes termos : “XXXV - a lei nãoexcluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. De qualquersorte, sendo este também um direito individual (fundamental), é preciso não perder devista que o direito de petição situa-se dentre os “meios de defesa não jurisdicionais”(Direito constitucional / J. J. Gomes Canotilho - Coimbra : Almedina, 1991, p. 677).7. A origem do direito de petição remonta à Idade Média, nos primórdios doconstitucionalismo inglês, por isso mesmo perfeitamente adequado ao espírito da CommonLaw, ou seja, despido de maiores formalismos; o pedir ao Rei esteve na raiz dessedireito desde a própria Magna Carta, de 1215; o direito de petição então conferido aoConselho do Reino e ao Parlamento, especialmente para propor a sanção de leis, somentemuito tempo depois alcançou o cidadão comum, de ordinário distanciado de Sua Majestade(o centro das decisões do Reino), o que segundo alguns registros teria acontecido atravésdo Petition of Rights, decorrência da Revolução inglesa de 1628.8. Também o Bill of Rights inglês, de 1689, a Constituição Francesa de 1791, assimcomo a First Amendment à Constituição Norte Americana, emenda datada de 1790 eratificada em 1791, o consagraram, embora curiosamente não tenha sido contemplado

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pela Declaração de 1789, da Revolução Francesa.9. No Brasil, direito de petição chegou a ser confundido, em termos conceituais, comdireito de representação, certamente por força da natureza política (direito político) que lheé própria; em verdade, é correto entender que a representação dirigida a órgãos e/ouautoridades públicas é assegurada pelo direito de petição, a quem quer que esteja legitimadopelo caput do art. 5º, da vigente C F, donde a conclusão de que a petição (direito de) é omeio hábil para representar. Em síntese: o direito de representação é exercível via petição,daí porque o direito brasileiro consagrou a terminologia direito de petição.10. Interessa recordar ser este um instituto jurídico sempre presente nas diversasConstituições brasileiras: Constituição do Império/1824, no art. 179, nº 30; CF/1891, art.72, § 9º; CF/1934, art. 113, nº 10 e 35; CF/1937, art. 122, nº 7; CF/1946, art. 141, §§ 36 e37; CF/1967, art. 150, §§ 30 e 34; e Emenda Constitucional/1969, art. 153, §§ 30 e 35; dacomparação entre as referidas normas constitucionais, é bom lembrar que o art. 179, nº30 da outorgada Constituição Política do Império do Brasil, de 1824, limitava o exercíciodo direito de petição apenas aos cidadãos, o que de resto era compatível com a sociedadebrasileira de então, dividida entre livres e escravos; mas já a partir da Constituição seguinte,a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 1891, o exercício foi alargado,no “art. 72,§ 9º. É permitido a quem quer que seja o direito de representar, mediantepetição, aos poderes públicos, denunciar as irregularidades, e promover aresponsabilidade dos culpados”.11. Entretanto, se a CF atual não distingue petição de representação, a CF/1967, art.150, §§ 30 e 34, o fizera e com isso proporcionou várias interpretações, naturalmentedestituídas de importância prática, em favor de uma possível distinção teleológica entre osdireitos de petição e de representação; na realidade, tanto o direito de petição, preordenado“à defesa dos direitos particulares ou públicos”, quanto o direito de representação,“mais apto à denúncia de abusos de autoridade” (Comentários à Constituição doBrasil / Celso Ribeiro Bastos, Ives Gandra Martins. — São Paulo : Saraiva, 1988 - 1989,p. 167) têm a mesma fonte constitucional e sobretudo a mesma razão lógica, de forma anão recomendar a sua distinção, pena de enfraquecimento do próprio instituto.12. Em termos de legislação ordinária, merece especial atenção a Lei nº 4.898, de 09/dezembro/1965, que “Regula o Direito de Representação e o Processo deResponsabilidade Administrativa Civil e Penal, nos casos de abuso de autoridade”,surgida já sob a influência dos tempos que trariam a CF/1967, que (cf. item 5, retro)distinguiu os direitos de petição e representação; de qualquer sorte, essa lei ainda vigentetem o mérito de viabilizar, em termos processuais, a previsão constitucional contra abusode autoridade.13. Em seqüência, vale esclarecer que a Lei 5.249, de 09/fevereiro/1967, que “Dispõesobre a representação do ofendido nos crimes de abuso de autoridade”, estabeleceuo seguinte, taxativamente: “Art. 1º. A falta de representação do ofendido, nos casosde abusos previstos na Lei nº 4.898, de 9 de dezembro de 1965, não obsta a iniciativaou o curso de ação pública”.14. Por outro lado, a obtenção pelo particular de certidões em repartições públicas nemsempre constitui empresa fácil, o que é comprovado pelo número de procedimentos judiciais(especialmente, mandados de segurança) objetivando viabilizar esse direito fundamental,nos termos do já referido art. 5º, XXXIV, b, que veio a ser regulamentado pela Lei 9.051, de18/maio/1995, o que em sede administrativa deveria decorrer do direito de petição.15. O direito de petição é, pois, importante instrumento de combate aos abusos contraos direitos fundamentais (individuais, coletivos, sociais e políticos, segundo a terminologiada CF em vigor) e, por extensão, contra os direitos humanos, por constituir canal deligação entre o cidadão comum e os Poderes Públicos; falando de direitos humanos, que

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é conceito absoluto e não admite exceções, é sempre importante lembrar HANNAHARENDT, autora de um trabalho clássico, The Origins of Totalitarism, para quem oprimeiro direito humano é “o direito a ter direitos” (apud A reconstrução dos direitoshumanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt / Celso Lafer. — SãoPaulo : Companhia das Letras, 1991, p. 154).Por fim, diante do conteúdo programático das regras constitucionais consagradoras dodireito de petição e da constatação de que as violações aos direitos humanos, no Brasil,na maior parte das vezes são decorrência de abuso de autoridade por agentes dos PoderesPúblicos (Estado x cidadão), o jurista pode concluir que o direito de petição, se manejadocom a devida habilidade, poderá constituir eficaz instrumento inibidor do aumento doscasos de violação aos direitos humanos e, o que também é importante, oferecer condiçõespara a identificação e a punição dos culpados.

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O JUDICIARY ACT OF 1789 E AS ORIGENS DA JUSTIÇA FEDERAL

Alexandre Costa de Luna FreireJuiz Federal da 2ª Vara - PB

A existência da Justiça Federal envolve temas que se desenvolvem ao longo de váriosramos do Direito nos países que a adotaram e cujas origens e fontes permitem análiseshistóricas, políticas e jurídicas incessantes. Desde o seu modelo inspirador que guardamaior liame com o adotado pelo Brasil, o Judiciário Federal Americano tem origem noJudiciary Act of 1789.A criação do sistema judiciário federal é considerada uma experiência relevante paracaracterização da democracia americana. Aspectos como o papel da interpretaçãoconstitucional, seus imperativos em face das considerações políticas, as ambigüidades econflitos na divisão jurisdicional com as Cortes Estaduais, aplicações do common law noâmbito federal e a postura de independência dos juízes.Merece considerar também o enfoque interdisciplinar dos mais importantes dispositivos,com reflexos na atuação de juristas, historiadores do Direito, juízes, professores, advogadose vários outros profissionais que exercitam atividades no âmbito jurídico.A atualidade das idéias que nortearam a elaboração de importante documento que repercutiuna organização do sistema judiciário americano e em sua democracia gravou a importânciadas discussões e estudos, de notar a realização da Bicentennial Conference on theJudiciary Act of 1789, pela Georgetown University, e objeto de preciso e peculiar debate,de cujos anais veio a lume o livro “Origins of the Federal Judiciary - Essays on theJudiciary Act of l789”, editado por MAEVA MARCUS, pela Oxford University Press.Ao longo da publicação, textos selecionados como “The Judiciary Act of 1789: PoliticalCompromise or Constitutional Interpretation?”, pelo autor citado; “Jurisdiction Strippingand the Judiciary Act of 1789”, por AKHIL REE AMAR; “Recovering CoterminousPower Theory: The Lost Dimension of Marshall Court Sovereignty Cases” por G.EDWARD WHITE; “United States v. Joseph Ravara: Presumptuous Evidence”, “TooMany Lawyers” e “A Federal Common Law Crime”, por JOHN D. GORDAN III; “UnitedSates v. Callender: Judge and Jury in a Republican Society”, por KATHRYN PREYER;“Dual Office Holding and the Constitution: A view From Hayburn’s Case”, por MARKTUSHNET; “Murdoch v. Memphis: Section 25 of the 1789 Judiciary Act and JudicialFederalism”, por WILLIAM M. WIECEK; “Temples of Justice: The Iconography ofJudgement and American Culture”, por MICHAEL KAMMEN; e “The Judiciary Act of1789 and Judicial Independence”, por GERHARD CASPER.No primeiro ensaio o questionamento reside em considerações sobre a natureza doJudiciary Act desde os debates que o criaram, tão pouco conhecidos 200 anos maistarde, com diferentes pontos-de-vista, ao longo de artigos sucessivos. Rememorando osestatutos em cotejo com o Direito Inglês, Colonial e State Law. Considerações proeminentessobre o papel da interpretação constitucional sobressaíram dos argumentos.Na análise titulada “Jurisdiction Stripping and The Judiciary Act of 1789” é mostrada umateoria inspirada em pensamento do Justice JOSEPH STORY em que marca diferentesramos de categorias jurisdicionais.No enfoque sobre a Corte, de MARSHALL, sobrelevam análises em casos tipicamentecaracterizados como “nacionalismo, direitos estaduais”, a partir de ambigüidades esobressaindo que o poder judicial de um governo efetivo pode ser coextensivo com o poderlegislativo e o poder legislativo pode ser coextensivo com o poder judicial.A abordagem seguinte, envolvendo o julgamento de JOSEPH RAVARA, ocorrido em abril

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de l794, cuidou de examinar, embora com poucos dados documentais sobre o processo,antiga interpretação da doutrina do federal common law e o impacto emergente, cujoprocesso tem sido objeto de intensivo interesse acadêmico.Na temática do Judge and Jury, em vista do julgamento pelo Sedition Act of l798, sãomostradas características heterogêneas da Nação e a sociedade republicana, comespecíficos tratamentos sobre o Juízo e o Júri no âmbito federal e estadual. A heteronímiajurídica advém das diferentes teorias sobre a União.Duplo ofício ou dualidade jurisdicional examinada por MARK TUSHNET mostra prevalênciado Judiciary Act quando outros aspectos legais compreendem incumbências adicionaispor juízes federais e, ainda, diante de novo statute, cuja constitucionalidade for examinada,concluindo por não ser imprópria à época, a dualidade de atribuições.O exame do Case Murdock cuida da aplicação do capítulo do Judiciary Act que assegurouà Suprema Corte o poder de revisão de certas decisões de Cortes Estaduais. Atitudesconflitantes sobre o lugar das Cortes Federais em suas relações com as Nações e Estados.Advieram as correntes constitucionais: nacionalismo de ALEXANDRE HAMILTON, JOHNMARSHALL e JOSEPH STORY; e “o particularismo dos direitos estaduais” de THOMASJEFFERSON, JAMES MADISON, SPENCER TOANE e JOHN C. CALHOUN, em meio avozes e triunfos em algumas controvérsias que antecederam à Guerra da Secessão,prevalecendo a vitória dos nacionalistas.Significativo ensaio, com ineditismo em nosso Direito e em nossa história judiciária,apresenta-se a abordagem sobre os Templos da Justiça, como aguda descrição de suaimagem física, revelando a cultura de uma Nação cuja história é também a de suasinstituições. As transformações de sua arquitetura e a evolução cultural a par do progressoeconômico é retratada para análise e reflexão pela imagem, como revela o ensaio ilustrado,com o titulo: “The Temples of Justice: The Iconography of Judgment and American Culture”,por MICHAEL KAMMEN.Finalizando a edição comemorativa, o ensaio de GERHARD CASPER sobre a independênciajudicial em face do Judiciary Act of 1789, após breve remissão aos longínquos Bill ofRigths em l791 e a Constituição de 1789, sinalizando em uma das precisas passagens aopção peculiar a inclinação pela revisão judicial como ferramenta necessária para assegurara supremacia do poder antes dos poderes: o poder constituinte do povo.As notas acima, antes de qualquer pretensão resumem-se em seu intento a uma breveresenha, como se fora uma mera ficha catalográfica, para possível releitura, homenageandoa 50a edição da Revista da AJUFE, desde seus primeiros idealizadores e realizadores.∗

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APLICAÇÃO ANALÓGICA DA LEI Nº 9.249/95AOS CRIMES CONTRA A PREVIDÊNCIA

Rogério de Meneses Fialho MoreiraJuiz Federal da 4ª Vara - PBProfessor da Faculdade de Direito da UFPB.

As publicações especializadas e a imprensa em geral têm divulgado amplamente a ediçãoda Lei nº 9.249, de 26.12.95, que voltou a incluir o PAGAMENTO DO TRIBUTO, antes dorecebimento da denúncia, como causa de extinção da punibilidade, em relação aoschamados “crimes fiscais”, o que não mais se verificava desde a vigência da Lei nº 8.383/91.Não há qualquer dúvida a respeito da aplicação da lei nova aos fatos ocorridos anteriormenteà sua vigência, já que, em se tratando de lei penal mais benéfica ao réu, deve ser aplicadacom efeitos retro-operantes, em face do disposto no art. 2º, e seu parágrafo único doCódigo Penal.O problema, que não tem sido enfocado em recentes artigos sobre o tema, é que a Lei nº9.249/95, determinou apenas, verbis: “Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimesdefinidos na Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e na Lei nº 4.729, de 14 dejulho de 1965, quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuiçãosocial, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia”.Como visto, a lei nova, possivelmente por um dos chamados “cochilos do legislador”,referiu-se somente à Lei nº 4.729/65 (Sonegação Fiscal) e à Lei nº 8.137/90 (Crimescontra a Ordem Tributária, econômica e contra as relações de consumo), quando outrosdiplomas legais também tratam de delitos fiscais, a exemplo da Lei nº 8.212/91 (Plano deCusteio da Previdência Social).Quanto a esta última, nos últimos tempos tem sido grande a incidência de processos naJustiça Federal, notadamente quanto ao crime tipificado no seu art. 95, alínea “d”, consistenteem “deixar de recolher, na época própria, contribuição ou outra importância devida àSeguridade Social e arrecadada dos segurados ou do público”. A hipótese, quecostumeiramente tem ocorrido, consiste na apropriação indevida, pela empresa, dos valoresdescontados do salário dos seus empregados, deixando-se de repassá-los aos cofrespúblicos.Nesse caso, e nas demais hipóteses previstas nas diversas alíneas do art. 95 da Lei8.212/91, estaria ou não extinta a punibilidade se o agente efetuasse o recolhimentointegral da contribuição previdenciária, e encargos antes do recebimento da denúncia?A primeira idéia seria a de que, se o legislador referiu-se expressamente aos tipos previstosna Lei de Sonegação e na Lei dos Crimes contra a ordem tributária, estariam excluídos dasua abrangência outros diplomas legais que também definissem crimes fiscais, já quenão contemplados pelo art. 34 da Lei 9.249/95. Em face da peculiaridade, por exemplo,das contribuições previdenciárias, que servem para o custeio de prestações devidas aparcela definida de contribuintes, em geral mais carentes, seria perfeitamente razoávelque o legislador, por medida de política criminal e fiscal, as tivesse excluído do favor legal.Todavia, tal interpretação não tem como prevalecer. O art. 34 da Lei nº 9.249/95 mencionaexpressamente as “contribuições sociais”. Ora, no atual sistema constitucional aquelascontribuições servem exatamente para o financiamento da seguridade social. Logo, nãopode ter sido intenção do legislador excluir os delitos capitulados na Lei nº 8.212/91, para“proteger” a massa de segurados, pois, do contrário, não teria incluído em seu texto ascontribuições sociais.A melhor solução pode ser encontrada na analogia, que serve para o suprimento das∗ E-mail: [email protected]

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lacunas legais “involuntárias”, como parece ser o caso de que cuidamos. Por essa formade integração do sistema normativo, aplicável ao Direito Penal, por imperativo de eqüidade,desde que em favor do réu, “aplica-se ao fato não regulado expressamente pela normajurídica um dispositivo que disciplina hipótese semelhante”, na precisa definição deMIRABETE1 .Tomemos o mesmo exemplo já citado: o do delito previsto no art. 95, “d”, do Plano deCusteio da Previdência. Antes da edição daquela norma específica, o mesmo fato nelaprevisto já era incriminado na Lei 8.137/90, que em seu art. 2º, II, descreve de formagenérica: “deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social,descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolheraos cofres públicos”.Apenas em face do PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE, técnica empregada para a resoluçãode “conflito aparente de normas”, é que, em se tratando de apropriação de contribuiçãoprevidenciária, o agente é incriminado pela Lei nº 8.212/91, e não pela norma geral da Leinº 8.137/90.Mas a situação fática é absolutamente semelhante, o que autoriza a aplicação da analogiain bonam partem.Não teria sentido, por exemplo, extinguir-se a punibilidade do empresário que se aproprioudo imposto de renda retido na fonte do seu empregado, e prosseguir-se o processo, emrelação à apropriação da contribuição previdenciária, descontada do mesmo empregado enão recolhida, quando, em ambos os casos, houve o pagamento, antes do recebimentoda denúncia. As situações são análogas, e, se não fosse a norma específica da Lei 8.212/91, estaria o agente, de qualquer maneira, enquadrado na Lei nº 8.137/90, cujos tipos sãoabrangidos pelo art. 34 da Lei nº 9.249/95.Resumindo, entendo que a disposição contida no art. 34 daquele diploma, deve ser, nãosó aplicada retroativamente, por se tratar de novatio legis in mellius mas ainda porANALOGIA, também aos ilícitos capitulados no art. 95 da Lei nº 8.212/91.Em relação ao momento processual para encerramento das ações penais, iniciadas antesdo advento da Lei nº 9.249/95, tenho entendido que deve o Juiz decretar a extinção dapunibilidade, antes mesmo da conclusão da instrução criminal, desde que o acusadocomprove os requisitos previstos no art. 34 da lei nova: 1º) o pagamento integral, inclusivedos acessórios; e 2º) que o recolhimento tenha ocorrido antes do despacho de recebimentoda denúncia.É que, estando extinta a punibilidade, tem o acusado direito público subjetivo ao imediatosentenciamento, independentemente do término da instrução processual, pois, do contrário,estaria sofrendo coação ilegal, amparável por habeas corpus, de acordo com disposiçãoexpressa do art. 648, VII, do Código de Processo Penal.Ocorrendo qualquer das causas enumeradas no art. 107 do CP, ou outra hipótese previstaem lei extravagante, deve o juiz, imediatamente, até mesmo de ofício, proferir sentença,numa espécie de JULGAMENTO ANTECIPADO, declarando extinta a punibilidade, sobpena de causar constrangimento ilegal ao denunciado.Saliente-se, por fim, que embora a lei se refira ao “pagamento do tributo ou contribuiçãosocial”, o col. Superior Tribunal de Justiça, interpretando o art. 14 da Lei nº 8.137/90, játeve a oportunidade de decidir que a concessão de parcelamento administrativo, para finspenais, tem o mesmo efeito do pagamento, inexistindo justa causa para a ação penal.2

DOS EFEITOS DA DIVISIBILIDADE OU INDIVISIBILIDADEDA OBRIGAÇÃO NA AÇÃO MONITÓRIA∗

Márcio Accioly de Andrade

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Acadêmico de Direito da UNIPE - Universidadede João Pessoa - PB

Com o objetivo de tornar mais célere, prática e eficaz a prestação jurisdicional, veio à bailaa Lei. nº 9.079 de 14 de julho de 1995, dispondo sobre a Ação Monitória, quecomentaremos brevemente, a título de intróito.É sabido que, preenchidos os requisitos do art.1.102a do CPC, com redação da referidalei, bem como os dos arts. 282 a 284 do CPC, o juiz determina de plano a expedição domandado de pagamento, aqui denominado de monitório, para que o réu cumpra com suadevida obrigação, quer seja o pagamento da soma em dinheiro, quer a entrega da coisafungível ou de determinado bem móvel no prazo de 15 dias. Se o réu cumprir sua obrigação,extingue-se o processo, com baixa na distribuição. Caso não venha a adimplir com aobrigação, poderá no mesmo prazo retro mencionado, opôr embargos, obedecendo aosrequisitos da execução para entrega de coisa e execução por quantia certa contra devedorsolvente (Livro II, Título II, Capítulo II e IV do CPC).O embargante pode como matéria de defesa, alegar além das hipóteses elencadas noart.741 do CPC, qualquer outra matéria que seria lícito argüir no processo de conhecimento,devendo-se notar que não é imprescindível a garantia do juízo.A partir deste momento, ou seja, da oposição dos embargos, o processo deixa o ritosumário e passa ao rito ordinário, devendo o juiz fazer o possível para recebê-los, a fim deque não haja cerceamento de defesa, por ser também considerado os embargos, umapeça contestatória, a não ser, por exemplo, que tenham sido interpostos intempestivamente,ou que lhes falte alguma das condições da ação e pressupostos processuais, caso emque, deverão ser rejeitados liminarmente.Recebidos os embargos, haverá a suspensão dos efeitos do mandado monitório até o seujulgamento, onde, caso o juiz no mérito os acolha, extinguirá o processo condenando oautor nas custas e honorários advocatícios. Por outro lado, se os embargos forem rejeitados,o juiz condenará o réu ao cumprimento da obrigação, intimando o autor para, querendo,prosseguir com o processo de execução, por ter se convertido de pleno direito o mandadoinicial em mandado executivo, passando a ter aquela prova escrita inicial, força executiva.Concluída essa introdução, indagamos a respeito do EFEITO DA DIVISIBILIDADE OUINDIVISIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO na referida ação, o qual definirá sobre o procedimentoa ser realizado pelo juiz com relação à extensão da defesa(embargos), porventuraapresentada por um dos devedores da obrigação em relação aos demais.Mister se faz, em síntese, comentarmos sobre essa obrigação complexa, quanto ao seuobjeto, se ou não divisível.Divisível é a obrigação cujo objeto é suscetível de ser dividido em quantas forem aspartes. Logo, numa relação obrigacional onde o objeto é divisível a prestação poderá serfracionada, isto é, cada devedor deve cumprir com a sua parte devida.Deve-se ter cautela ao apontar se o objeto é passível ou não de divisão, pois poderáocorrer que o objeto em sendo divisível, com o seu fracionamento, venha a sofrer perda deseu valor ou de sua substância, o que in casu, se tornará em objeto indivisível. Assim,cumpre lembrar os ensinamentos do eminente professor SILVIO RODRIGUES, em suaobra: Direito Civil, Parte Geral Das Obrigações, pág.58 Vol.2, ed.Saraiva, in verbis:

“Casos há, entretanto, em que a coisa é, por sua natureza, divisível,mas a divisão implica considerável perda de valor...

1 MIRABETE, Júlio Fabrini. Manual de Direito Penal, Parte Geral, vol. 1, pág. 48. São Paulo, Atlas, 8ª edição.

2 STJ, 5ª Turma, HC nº 2.538-5-RS, rel. Min JESUS COSTA LIMA, in DJU, Seção I, 9-5-94, pág. 10.883).

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... e as obrigações que tenham por objeto prestações dessa naturezadevem, ao meu ver, ser consideradas indivisíveis.”

Na obrigação indivisível ou solidária, havendo conseqüentemente a pluralidade dedevedores, o credor poderá cobrar de qualquer deles, o pagamento, no entanto, terá de serefetuado integralmente, ou seja, por inteiro, por ser a natureza de seu objeto insuscetívelde divisão.Se, porventura não for cumprida a obrigação, exsurge ao credor o direito a perdas e danos,onde a partir desse momento, haverá uma conversão, deixando essa obrigação de serindivisível, tornando-se divisível, onde cada devedor será responsável apenas pela suaparte na dívida.Encontramos lições de alguns mestres, aqui transcritas:

“As obrigações indivisíveis deixam de o ser quando se resolvemem perdas e danos. Havendo culpa de todos os devedores,responderão em partes iguais, mas, se, de um só, a culpa, osoutros ficam exonerados, concentrando-se nêle aresponsabilidade.(ORLANDO GOMES - Obrigações, pág.92, ed.Forense, 1972).”

“Se a prestação indivisível for descumprida e os devedores foremcondenados a perdas e danos, ela perde o caráter de indivisível ecada um daqueles só pode ser cobrado de sua parte viril, pois aresponsabilidade de cada qual pelo todo, que advinha da naturezado objeto devido, desapareceu com o perecimento do referido objeto.De maneira que a obrigação, tornando-se divisível, segmenta-seentre as partes, voltando a incidir a regra concurso partes fiunt.(SILVIO RODRIGUES - Parte Geral das Obrigações, pág.69, ed.Saraiva. Vol.2).”

“Não cumprida a obrigação, surge a responsabilidade que revestea forma de cada indenização em dinheiro, um dos devedores sendoapenas responsável pela sua quota. Sendo a culpa de um só, esteresponderá pelas perdas e danos.(ARNOLDO WALD - Obrigaçõese Contratos, pág.26, 8ª edição revista, ampliada e atualizada, ed.Revista dos Tribunais).”

Com relação à defesa apresentada por um dos réus, em sendo a obrigação divisível e seapenas um deles embarga, deverá o juiz suspender em relação a este, os efeitos daeficácia do mandado monitório e intimar o autor para que prossiga, querendo, com aexecução da ação com relação aos outros devedores que porventura não embargaram,em razão da possibilidade da obrigação ser prestada em quotas referente a cada um dosco-obrigados.Na hipótese do objeto da obrigação ser indivisível, os efeitos do mandado monitório sereportará a todos na qualidade de devedor comum logo, os embargos porventuraapresentados por qualquer um deles, aproveitará aos demais que não opuseram tal medida;da mesma forma no cumprimento da obrigação, que satisfeita inteiramente por um dosdevedores, ficará extinta a obrigação não só em relação ao que pagou, como também aosdemais co-obrigados, que, todavia, terá o adimplente, o seu direito assegurado contraseus co-devedores.Como o objetivo dos embargos visa tornar ineficaz um título de crédito sem força executiva,

∗ Trabalho apresentado e aprovado no IV Congresso Nacional de Direito Processual Civil, Trabalhista, Penal e Administrativo, de02 a 04 de maio de 1996 em Recife - PE

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(em sendo esta uma obrigação indivisível, eis que todos os co-devedores estão obrigadospela totalidade do quantum ou da coisa), não teria sentido por meio desse embargo,desconstituir apenas uma parte do título que, por disposição legal, é indivisível. Ademais,desconstituído o título em relação a um dos co-devedores, a todos aproveita, em face daprópria natureza indivisível da coisa, razão pela qual não há em se iniciar uma execuçãopor não haver mais título a ser executado.Torna-se imperioso dizer que, a situação dos co-devedores, não deixa de ser, de certaforma, litisconsorcial, por haverem, em ambas as situações(ação monitória e litisconsorte),duas ou mais pessoas numa mesma relação jurídica processual, interessadas no mesmopropósito, unidas pelo mesmo vínculo de indivisibilidade, quer por força de lei, quer porimpossibilidade física da divisão da coisa. O insigne mestre CÂNDIDO RANGELDINAMARCO, em sua obra Litisconsórcio, 3ª ed., Revista Atualizada e Ampliada,págs.39 e 157, editora Malheiros, leciona:

“No contexto da categoria mais ampla, representada pela pluralidadede partes, fácil é caracterizada pela coexistência de duas ou maispessoas do lado ativo ou do lado passivo da relação processual,ou em ambas as posições (independentemente de estarem unidasno mesmo pólo ou serem distintas as situações: v. n. ant.).”

Com relação ao efeito recursal gerado nessa relação litisconsorcial, continua CÂNDIDORANGEL DINAMARCO a dispôr:

“O litisconsorte vencido que não recorreu participará do processorecursal, arrazoando-o como tivesse recorrido, sustentandooralmente o recurso no tribunal, requerendo a instauração deincidente de uniformização etc. Tudo isso porque, como é sabido,ao princípio do contraditório repugna que fique a parte impedida departicipar de atos ou procedimentos capazes de influir na esfera deseus direitos e interesses (v.supra, n.2, texto e esp. Nota 6).Estender os efeitos do recurso a todos os litisconsortes e privar departicipação o que não recorreu equivaleria a cumprir só parcialmenteo intuito unificador revelado no art. 509 do Código de ProcessoCivil.”

Mutatis Mutandis, pode-se estabelecer para o caso de objeto indivisível na ação monitória,a regra do litisconsórcio passivo necessário, onde o efeito dos embargos apresentadospor um dos devedores favorecerá a todos os ocupantes do pólo passivo indistintamente,ou seja, haverá a suspensão dos efeitos daquele mandado monitório tanto para o queembargou, como também para os demais que não se manifestaram, devendo o juizprosseguir com o julgamento normal dos embargos.

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CRITÉRIO CIENTÍFICO PARA DISTINGUIR A PRESCRIÇÃO DA DECADÊNCIAE PARA IDENTIFICAR AS AÇÕES IMPRESCRITÍVEIS*

Agnelo Amorim FilhoProfessor da Faculdade de Direito daUniversidade da Paraíba

SUMÁRIO: I - O problema em face da doutrina e da lei. II - Critériosque têm sido apresentados para distinguir a prescrição dadecadência. III - A moderna classificação dos direitos e os direitospotestativos. IV - Críticas feitas à existência dos direitospotestativos. V - Formas de exercício dos direitos potestativos. VI- Moderna classificação das ações. VlI - Ações constitutivas. VIII -Fundamentos e efeitos da prescrição. IX - Fundamentos e efeitosda decadência. X - Casos especiais de ações construtivasencontradas no art. 178 do Código Civil. XI - Ações declaratórias.XII - Ações aparentemente declaratórias. XIII - O problema daimprescritibilidade das ações. XIV - Alcance dos arts. 177 e 179 doCódigo Civil. XV - Conclusões.

I - O Problema em Face da Doutrina e da Lei.A questão referente à distinção entre prescrição e decadência tão velha quanto os doisvelhos institutos de profundas raízes romanas - continua a desafiar a argúcia dos juristas.As dúvidas são tantas, e vêm se acumulando de tal forma através dos séculos, que, aolado de autores que acentuam a complexidade da matéria, outros, mais pessimistas,chegam até a negar - é certo que com indiscutível exagero - a existência de qualquerdiferença entre as duas principais espécies de prazos extintivos. E’ o que informa DeRuggiero (<<Instituições de Direito Civil>>, vol. 1º, pág. 335, da trad. port.). Já Baudry-Lacantinerie e Albert Tissier declaram que são falíveis, ou imprestáveis, os vários critériospropostos para distinguir os dois Institutos. Acentuam, ainda, que não se pode, “a priori”estabelecer diferença entre prescrição e decadência, e sim examinar caso por caso, paradizer, “a posteriori”, se o mesmo é de prescrição ou de decadência. Clóvis Bevilaqua, porsua vez, afirma que “a doutrina ainda não é firme e clara neste domínio” (“Teoria Geral”,pág. 367 da 2ª ed.). Para Amílcar de Castro, é “uma das mais difíceis e obscuras questõesde Direito essa de distinguir a prescrição da decadência” (“Rev. dos Tribs.” vol. 156/323).Giorgi diz que a ciência ainda não encontrou um critério seguro para distinguir a prescriçãodas caducidades (“Teoria de Ias obligaciones”, vol. 9º, pág. 217). E Câmara Leal,inegavelmente o autor brasileiro que mais se dedicou ao estudo do assunto, chegandomesmo a elaborar um método prático para se fazer a distinção entre os dois Institutos, dizque este é “um dos problemas mais árduos da teoria geral do Direito Civil” (“Da prescriçãoe da decadência”, pág. 133, 1ª ed.).

É incontestável, porém, que as investigações doutrinárias, confirmadas pela grandemaioria da jurisprudência, já conseguiram, pelo menos, chegar a uma conclusão: a de queos dois institutos se distinguem. Deste modo, falta apenas encontrar uma regra, um critérioseguro, com base científica, para se fundamentar tal distinção, de modo a se tornar possívelidentificar, “a priori”, os prazos prescricionais e os decadenciais, o que, sem dúvida, nãoconstitui empreendimento fácil.No Direito brasileiro a questão ainda se torna mais complexa e eriçada de obstáculos,pois o nosso Código Civil engloba indiscriminadamente, sob uma mesma denominação e

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subordinados a um mesmo capítulo, os prazos de prescrição e os prazos de decadência.dando-lhes, conseqüentemente, tratamento igual. Por vezes, ainda, o mesmo Código fazuso de terminologia absolutamente inadequada em face dos pronunciamentos dajurisprudência e da doutrina: é aliando se refere à “prescrição do direito”, (arts. 166, 167 e174. n. I) embora prevaleça o ponto de vista segundo o qual é a ação, e não o direito, queprescreve. Este último está sujeito é a decadência, cujos efeitos atingem a ação apenaspor via reflexa. A explicação para aquele injustificável erro do nosso Código é a seguinte,segundo observação de Costa Manso: no projeto primitivo organizado por Clóvis Bevilaqua,os prazos de decadência se achavam dispersos pelo Código, nos lugares apropriados eassim foram mantidos pela comissão revisora extra-parlamentar, pela “Comissão dos XXI”da Câmara dos Deputados, e pela própria Câmara, nas três discussões regimentais. Naredação final, entretanto, a respectiva comissão, supondo melhorar o projeto, modernizando-o, transferiu para a Parte Geral todos os prazos de decadência, colocando-os ao lado dosprazos prescricionais propriamente ditos. E isso passou despercebido, não foi objeto dedebate, resultando, daí, ao invés do planejado melhoramento, um erro manifesto declassificação (“Rev. dos Tribs.”, vol. 85/257).Aquela indiscriminação, que resultou de uma lamentável inadvertência, força os aplicativosdo Código a decidirem contra seu texto expresso, distinguindo onde ele não distingue,infringindo-se, assim, multissecular regra de hermenêutica. É certo porém que, ou seadota essa atitude de franca rebeldia contra o texto legal, ou ter-se-á que chegar a conclusãoainda mais absurda, isto é, admitir que certos prazos classificados pelo Código comosendo de prescrição (mas que são, indiscutivelmente, de decadência), podem ser objetode suspensão, de interrupção e de renúncia. Como exemplo entre muitos, citemos oprazo que tem o marido para anular o casamento contraído com mulher já deflorada (art.178, § 1º). Ninguém admite, doutrinariamente, a possibilidade de ser tal prazo objeto deinterrupção, suspensão, ou renúncia, mas, por outro lado, ninguém pode negar que, emface do texto do Código Civil, o mesmo prazo é suscetível de renúncia, interrupção, oususpensão. Como situar-se o intérprete diante dessa alternativa tão paradoxal? Atentarcontra a letra da lei, ou atentar contra o bom senso jurídico? A única solução é seguiraquele conselho de Carpenter: em artigos de lei, o erro, quando é demasiado grande, nãoprejudica, pois pode ser ladeado (“Da prescrição”, pag. 357, 1ª ed.). Deste modo, apesardo texto expresso do Código, doutrina e jurisprudência, embora divergindo as opiniõescom referência a alguns casos, classificam como sendo de decadência os prazos previstosno art. 178, §§ 1º, 2º, 3º e 4º, ns. I e II; § 5º, ns. I, II, III e IV; § 6º, ns. I, III, IV, V, XI, XII e XIII;§ 7º ns. I, VI e VII; § 8º; § 9º, ns. I, “a” e “b” II, III, IV, V e VI; e § 10, n. VIII.Há também um outro problema de capital importância, intimamente relacionado com aqueleda distinção entre prescrição e decadência, e ao qual não se tem dispensado a necessáriaatenção. E’ o que diz respeito às denominadas ações imprescritíveis. Como identificartais ações? Ou - reunindo os dois problemas - como saber se determinada ação estásubordinada a um prazo de prescrição, a um prazo de decadência (por via indireta), ou seela é imprescritível?

II - Critérios que têm sido apresentados para distinguir a Prescrição da DecadênciaO critério mais divulgado para se fazer a distinção entre os dois institutos é aquele segundoo qual a prescrição extingue a ação, e a decadência extingue o direito. Entretanto, talcritério, além de carecer de base científica, é absolutamente falho e inadequado, poispretende fazer a distinção pelos efeitos ou conseqüências, se bem que aqueles sejam,

* Tema debatido no Seminário de Direito Privado organizado pela Faculdade de Direito a Universidade da Paraíba, peloDiretório Acadêmico “Epitácio Pessoa” e pela Seção da Ordem dos Advogados da Paraíba.

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realmente, os principais efeitos dos dois institutos. O critério apontado apresenta-se,assim, com uma manifesta petição de princípio, pois o que se deseja saber, precisamente,é quando o prazo extintivo atinge a ação ou o direito. O que se procura é a causa e não oefeito.Processo distintivo indiscutivelmente mais vantajoso do que aquele é o sugerido por CâmaraLeal, assim resumido pelo seu autor:“É de decadência o prazo estabelecido pela lei, ou pela vontade unilateral ou bilateral,quando prefixado ao exercício do direito pelo seu titular. E é de prescrição, quando fixado,não para o exercício do direito, mas para o exercício da ação que o protege. Quando,porém, o direito deve ser exercido por meio da ação, originando-se ambos do mesmo fato,de modo que o exercício da ação representa o próprio exercício do direito, o prazoestabelecido para a ação deve ser tido como prefixado ao exercício do direito, sendo,portanto, de decadência, embora aparentemente se afigure de prescrição” (Câmara Leal,“Da prescrição e da decadência”, 1ª ed.. págs. 133 e 134).Todavia, o critério proposto por Câmara Leal, embora muito útil na prática, se ressente dedupla falha: em primeiro lugar, é um critério empírico, carecedor de base científica, e istoé reconhecido pelo próprio Câmara Leal, pois ele fala em “discriminação prática dos prazosde decadência das ações” (obra citada, pág. 434). Com efeito, adotando-se o referidocritério, é fácil verificar, praticamente, na maioria dos casos, se determinado prazo extintivoé prescricional ou decadencial, mas o autor não fixou, em bases científicas, uma normapara identificar aquelas situações em que o direito nasce, ou não, concomitantementecom a ação, pois é este o seu ponto de partida para a distinção entre os dois institutos.Em segundo lugar, o critério em exame não fornece elementos para se identificar, diretaou mesmo indiretamente (isto é, por exclusão), as denominadas ações imprescritíveis.Faz-se necessário, assim, intensificar a procura de um outro critério, e temos a impressãoque, tomando-se como ponto de partida a moderna classificação dos direitos desenvolvidapor Chiovenda e, particularmente, a categoria dos direitos potestativos, chegar-se-áindubitavelmente, àquele critério ideal, isto é, a um critério dotado de bases científicas eque permite, simultânea e seguramente, distinguir, “a priori”, a prescrição da decadência,e identificar as denominadas ações imprescritíveis. E’ o que nos propomos demonstrarcom o presente trabalho.

III - A Moderna Classificação dos Direitos e os Direitos PotestativosSegundo Chiovenda (“Instituições”), 1/35 e segs.), os direitos subjetivos se dividem emduas grandes categorias: a primeira compreende aqueles direitos que têm por finalidadeum bem da vida a conseguir-se mediante uma prestação, positiva ou negativa, de outrem,isto é, do sujeito passivo. Recebem eles, de Chiovenda, a denominação de “direitos auma prestação”, e como exemplos poderíamos citar todos aqueles que compõem asduas numerosas classes dos direitos reais e pessoais. Nessas duas classes há sempreum sujeito passivo obrigado a uma prestação, seja positiva (dar ou fazer), como nosdireitos de crédito, seja negativa (abster-se), como nos direitos de Propriedade. A segundagrande categoria é a dos denominados “direitos potestativos”, e compreende aquelespoderes que a lei confere a determinadas pessoas de influírem, com uma declaração devontade, sobre situações jurídicas de outras, sem o concurso da vontade destas.Desenvolvendo a conceituação dos direitos potestativos, diz Chiovenda:“Esses poderes (que não se devem confundir com as simples manifestações de capacidadejurídica, como a faculdade de testar, de contratar e semelhantes, a que não correspondenenhuma sujeição alheia), se exercitam e atuam mediante simples declaração de vontade,mas, em alguns casos, com a necessária intervenção do juiz. Têm todas de comum

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tender à produção de um efeito jurídico a favor de um sujeito e a cargo de outro, o qualnada deve fazer, mas nem por isso pode esquivar-se àquele efeito, permanecendo sujeitoà sua produção. A sujeição é um estado jurídico que dispensa o concurso da vontade dosujeito, ou qualquer atitude dele. São poderes puramente ideais, criados e concebidospela lei... ; e, pois, que se apresentam como um bem, não há excluí-los de entre osdireitos, como realmente não os exclui o senso comum e o uso jurídico. E’ mera petiçãode princípio afirmar que não se pode imaginar um direito a que não corresponda umaobrigação” (“Instituições”, trad. port., 1/41-42).Von Tuhr, por sua vez, conceitua os direitos potestativos nos seguintes termos:“Em princípio, quando se trata de modificar os limites entre duas esferas jurídicas, énecessário o acordo dos sujeitos interessados. A possibilidade que têm A e B de modificarsuas relações jurídicas recíprocas, não pode, evidentemente, conceber-se como um direito,pois não pressupõe mais que a capacidade geral de produzir efeitos jurídicos. Sem embargo,distinta é a situação quando A ou B têm a faculdade de realizar a modificação em virtudede sua só vontade. Tais faculdades são inumeráveis e ilimitadamente diversas, porémsempre se fundamentam em certos pressupostos exatamente determinados. Neste casocabe falar de direitos; são os potestativos”, (“Derecho Civil”, vol. 1º,, tomo lº, pág. 203 datradução castelhana).Como exemplos de direitos potestativos podem ser citados os seguintes: o poder que têmo mandante e o doador de revogarem o mandato e a doação; o poder que tem o cônjuge depromover o desquite; o poder que tem o condômino de desfazer a comunhão; o poder quetem o herdeiro de aceitar ou renunciar a herança; o poder que têm os interessados depromover a invalidação dos atos jurídicos nulos ou anuláveis (contratos, testamentos,casamentos etc.); o poder que tem o sócio de promover a dissolução da sociedade civil; opoder que tem o contratante de promover a rescisão do contrato por inadimplemento (art.1.092 do Código Civil), ou por vícios redibitórios (art. 1.101); o poder de escolha nasobrigações alternativas (art. 884); o poder de interpelar, notificar, ou protestar, para constituirem mora; o poder de alegar compensação; o poder de resgate do imóvel vendido comcláusula de retrovenda; o poder de adquirir meação de parede, muro etc. (art. 643); o poderde dar vida a um contrato mediante aceitação da oferta; o poder de requerer a interdição dedeterminadas pessoas; o poder de promover a rescisão das sentenças; o poder que temo pai de contestar a legitimidade do filho de sua mulher (art. 344); o poder assegurado aofilho de desobrigar os imóveis de sua propriedade alienados ou gravados pelo pai fora doscasos permitidos em lei; o poder que têm os herdeiros do filho de pleitearem a prova dalegitimidade da filiação; o poder que tem o adotado de se desligar da adoção realizadaquando ele era menor ou se achava interdito; o poder assegurado ao cônjuge ou seusherdeiros necessários para anular a doação feita pelo cônjuge adúltero ao seu cúmplice.Muitos outros exemplos ainda poderiam ser citados.Da exposição feita acima se verifica facilmente que uma das principais características dosdireitos potestativos é o estado de sujeição que o seu exercício cria para outra ou outraspessoas, independentemente da vontade destas últimas, ou mesmo contra sua vontade.Assim, por exemplo, o mandatário, o donatário e os outros condôminos sofrem os efeitosda extinção do mandato, da doação, e da comunhão, sem que possam se opor à realizaçãodo ato que produziu aqueles efeitos. No máximo a pessoa que sofre a sujeição pode, emalgumas hipóteses, se opor a que o ato seja realizado de determinada forma, mas nessecaso o titular do direito pode exercê-lo por outra forma. Ex.: divisão judicial, quando osdemais condôminos não concordam com a divisão amigável.Outras características dos direitos potestativos: são insuscetíveis de violação e a eles nãocorresponde uma prestação.A categoria dos direitos potestativos é conceituada por vários outros autores em termosmais ou menos equivalentes aos de Chiovenda e Von Tuhr: Ennecerus-Kipp e Wolf, “Tratado

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de derecho civil”, vol. 1º, tomo 1º, trad. cast., pág. 294; Lehmann, “Tratado de derechocivil”, vol. 1º, págs. 128 e 129; Guilherme Estelita, “Direito de ação - direito de demandar”,págs. 88 e 89; Pontes de Miranda, “Tratado de direito privado”, vol. 5º, pág. 242; J. FredericoMarques, “Ensaio sobre a jurisdição voluntária”, pág. 241; Orlando Gomes, “Introdução aodireito civil”, pág. 119; e Luis Loreto, “Rev. Forense”, vol. 98/9.

IV - Críticas feitas à Existência dos Direitos PotestativosA categoria dos direitos potestativos embora admitida por vários autores, principalmentena Alemanha e na Itália, também tem sido muito combatida. Entretanto, Chiovenda, aoredigir as suas “Instituições de direito processual civil”, afirmou que “... as vivas controvérsiasdos últimos anos em torno aos direitos potestativos agora se aplacaram e a categoriapode considerar-se em definitivo, também na Itália, reconhecida pela doutrina e pela própriajurisprudência, que lhe consagrou a utilidade prática em importantes aplicações” (vol. 1º,pág. 43 da tradução portuguesa).As principais objeções feitas à existência dos direitos potestativos são as seguintes:alega-se que eles nada mais são do que faculdades jurídicas, ou, então, manifestaçõesda capacidade jurídica, e que não se pode admitir a existência de um direito ao qual nãocorresponda um dever. Todavia, na exposição que faz da sua doutrina, Chiovenda dá respostacabal e antecipada a todas aquelas objeções. Assim, cumpre acentuar, em primeiro lugar,que o exercício de um direito potestativo cria um estado de sujeição para outras pessoas,coisa que não ocorre com o exercício das meras faculdades. Por sujeição, como já vimos,deve-se entender a situação daquele que, independentemente da sua vontade, ou mesmocontra sua vontade, sofre uma alteração na sua situação jurídica, por força do exercício deum daqueles poderes atribuídos a outra pessoa o que receberam a denominação de direitospotestativos. Com efeito, ao fazer referência às declarações de vontade por meio dasquais se exercitam os direitos potestativos, Chiovenda diz:“Têm todas de comum tender à produção de um efeito jurídico a favor de um sujeito e acargo de outro, o qual nada deve fazer, mas nem por isso pode esquivar-se àquele efeito,permanecendo sujeito à sua produção. A sujeição é um estado jurídico que dispensa oconcurso da vontade do sujeito, ou qualquer atitude dele” (“Instituições”, 1/41).É Precisamente o que ocorre com o poder, assegurado aos contratantes, de promoverema decretação de invalidade dos contratos nulos, exemplo típico de direito potestativo. Seum dos contratantes pretende exercitar aquele direito, pode fazê-lo sem o concurso davontade do outro, e este, embora não possa se opor, fica sujeito aos efeitos do ato: suaesfera jurídica é afetada por uma manifestação da vontade alheia, independentemente daprópria vontade.Já o mesmo não ocorre com o exercício das denominadas faculdades jurídicas: tal exercíciosó afeta a esfera jurídica de terceiro com aquiescência deste. Ex.: O proprietário tem opoder de vender a coisa, mas só a compra quem quer - ninguém é obrigado a fazê-lo. Oexercício desse poder não cria um estado de sujeição para terceiros sem a vontade destes.Tal poder é, por conseguinte, uma mera faculdade, e não um direito potestativo.Por aí se verifica que não assiste qualquer parcela de razão a Cunha Gonçalves quandoidentifica os direitos potestativos com as faculdades jurídicas e cita, como exemplos, osatos de andar, comer, beber, dormir, dançar, ler e escrever (“Princípios de Direito Civil LusoBrasileiro”, vol. 1º, pág. 62, e “Tratado de Direito Civil”, vol. 1º, tomo 1º, da 1ª ediçãobrasileira). Tais atos, entretanto, são faculdades que nem sequer podem ser classificadasde jurídicas, e muito menos podem ser classificadas de direitos potestativos, pois nãocriam estados de sujeição para terceiros.Com referência às outras objeções feitas à existência dos direitos potestativos convém

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atentar para as considerações que Chiovenda faz a respeito do conteúdo jurídico daexpressão “bem”, a qual abrange, entre outras coisas, “... a modificação do estado jurídicoexistente, quando se tenha interesse de interromper uma relação jurídica ou de constituiruma nova”. E arremata: “... pois que (tais poderes) se apresentam como um bem, não háexcluí-los de entre os direitos, como realmente não os exclui o senso comum e o usojurídico” (“Instituições”, vol. 1º, pág. 42). Como reforço de argumentação poder-se-ia invocar,ainda, a opinião de Pontes de Miranda:“Toda permissão de entrar na esfera jurídica de outrem é direito;..............................................................................................................A todo direito corresponde sujeito passivo, ou total, nos direitos absolutos, ou determinadonos direitos relativos. Os direitos formativos, quer geradores, quer modificativos, querextintivos, não são sem sujeitos passivos: há sempre esfera jurídica alheia em que seopera a eficácia do exercício de tais direitos” (“Tratado de Direito Privado”, vol. V, pág.245).E’ certo que, em virtude da grande semelhança entre os dois institutos, torna-se muitosutil, em alguns casos, a distinção entre o direitos potestativos e as meras faculdades,mas a questão fica grandemente facilitada se se levar em conta, como fator distintivo, asujeição, pois esta só existe nos direitos potestativos.Deste modo, aqueles que não querem, de forma alguma, ver nos direitos potestativos umacategoria autônoma de direitos subjetivos, têm que admitir, necessariamente, que elesconstituem, pelo menos, uma classe especial de faculdades - isto é, aquelas faculdadescujo exercício cria um estado de sujeição para terceiros. O problema se reduzirá, então, auma simples questão de natureza terminológica. De qualquer forma, não serão afetadasas conclusões que temos em vista no presente estudo.

V - Formas de Exercício dos Direitos PotestativosOs direitos potestativos se exercitam e atuam, em princípio, mediante simples declaraçãode vontade do seu titular, independentemente de apelo às vias judiciais, e, em qualquerhipótese, sem o concurso da vontade daquele que sofre a sujeição. Exemplos: os direitosde revogação do mandato, de aceitação da herança, de dar vida a um contrato medianteaceitação da oferta, de escolha nas obrigações alternativas, de retrovenda, de dissoluçãodas sociedades por tempo indeterminado (art. 1.404).Em outros casos, que compõem uma segunda categoria, os direitos potestativos tambémpodem ser exercitados mediante simples declaração da vontade do seu titular, sem apeloà via judicial, mas somente se aquele que sofre a sujeição concordar com tal forma deexercício. Se não houver concordância, o titular do direito potestativo pode recorrer à viajudicial para exercitá-lo. Tal via funciona, aí, apenas subsidiariamente. Exemplos: o direitoque tem o condômino de dividir a coisa comum; o direito que tem o sócio de promover adissolução da sociedade por tempo indeterminado, antes de expirado o respectivo prazo(art. 1.408 do Código Civil); o direito que tem o doador de revogar a doação; o direito quetem o filho de desobrigar os imóveis de sua propriedade alienados ou gravados pelo paifora dos casos expressos em lei; o direito que tem o cônjuge, ou seus herdeirosnecessários, para anular a doação feita pelo cônjuge adúltero ao seu cúmplice; o direitoque tem o vendedor para resgatar o imóvel vendido com cláusula de retrovenda.Finalmente, há uma terceira categoria de direitos potestativos que só podem ser exercidospor meio de ação. A ação, aqui, já não tem caráter simplesmente subsidiário ou facultativo,mas obrigatório, como forma de exercício do direito. Conseqüentemente, nessa terceiracategoria não se dispensa a propositura da ação nem mesmo quando todos osinteressados, inclusive aqueles que sofrem a sujeição, estão de acordo em que o direito

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seja exercitado por outra forma. É por esse motivo que Calamandrei dá, a tais procedimentosjudiciais, a denominação de ações necessárias, e a elas faz referência em várias passagensdos seus “Estudios sobre el proceso civil” (págs. 37, 152, 233, 238, 239 e 240 da traduçãocastelhana).O que tem em vista a lei, ao eleger a via judicial como forma especial e exclusiva deexercício dos direitos potestativos dessa terceira categoria, é conceder maior segurançapara determinadas situações jurídicas, cuja alteração tem reflexos acentuados na ordempública. Nessa categoria Eduardo Conture inclui, de modo geral, aqueles direitos potestativosque dizem respeito ao estado civil das pessoas (“Fundamentos del derecho procesal civil”,pág. 221). Exemplos - o direito que tem o marido de promover a anulação do casamentocontraído com mulher já deflorada, e todos aqueles direitos de invalidar os casamentosnulos ou anuláveis; o direito que tem o pai de contestar a legitimidade do filho de suamulher; o direito que tem o filho ilegítimo de pleitear o reconhecimento de sua paternidade,quando o pai não o reconheceu voluntariamente; o direito que têm determinadas pessoasde requererem a interdição de outras etc. etc.Corolário da natureza especial destas ações constitutivas necessárias é a impossibilidadede ser aplicado a elas o princípio da confissão ficta, consubstanciado no art. 209 doCódigo de Processo Civil.Ao propor uma daquelas ações por meio das quais são exercidos os direitos potestativosda segunda e da terceira categorias, o respectivo autor não pleiteia do réu qualquerprestação, seja prestação de dar, de fazer, de não-fazer, de abster-se, ou de outra espécie.O a que ele visa com a propositura da ação é, apenas, criar, extinguir, ou modificardeterminada situação jurídica, e isso é feito independentemente da vontade, ou mesmocontra a vontade da pessoa ou pessoas que ficam sujeitas aos efeitos do ato. Assim, oréu da ação, embora não fique obrigado a uma prestação, sofre uma sujeição. E’ o queocorre, por exemplo, com a ação proposta pelo cônjuge coacto para anular o casamento.Julgada procedente a ação, o efeito da sentença não é a condenação do outro cônjuge auma prestação, e sim a anulação do casamento. A tal efeito o outro cônjuge fica sujeito,mesmo contra sua vontade.Como se verifica fácil e prontamente, há uma nítida diferença de conteúdo entre tais açõese aquelas outras que caracterizam a atividade jurisdicional e que são propostas exatamentecom o objetivo de compelir o réu a uma prestação.

VI - Moderna Classificação das AçõesA concepção dos direitos potestativos induziu a substituição da tradicional classificaçãodas ações, oriunda do Direito Romano, e que levava em conta a natureza do direito cujadefesa se pretendia com o exercício da ação (ações reais, pessoais, mistas e prejudiciais),por uma outra classificação que tivesse em vista a natureza do pronunciamento judicialpleiteado. “Classificação segundo a carga de eficácia”, conforme a conceituou Pontes deMiranda (“Tratado de Direito Privado”. 5/483).De acordo com essa orientação, Chiovenda classificou as ações em três grupos principais:condenatórias, constitutivas e declaratórias (“Instituições”, 1/67).Lança-se mão da ação condenatória quando se pretende obter do réu uma determinadaprestação (positiva ou negativa), pois, “correlativo ao conceito de condenação é o conceitode prestação”. Deste modo, um dos pressupostos da ação de condenação é a existênciade uma vontade de lei que garanta um bem a alguém, impondo ao réu a obrigação de umaprestação. Por conseqüência, não podem jamais dar lugar a sentença de condenação osdireitos potestativos” (Chiovenda, ob. cit., 1/267).Já a ação constitutiva (positiva ou negativa) cabe quando se procura obter, não uma

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prestação do réu, mas a criação de um estado jurídico, ou a modificação, ou a extinção deum estado jurídico anterior.Por aí se verifica, de pronto, que as duas mencionadas espécies de ação correspondemexatamente, com rigorosa precisão, aqueles dois grandes grupos nos quais Chiovendadivide os direitos: as ações condenatórias são meio de proteção daqueles direitossuscetíveis de violação (“direitos a uma prestação”); e as ações constitutivas são o meiode exercício daqueles direitos insuscetíveis de violação (direitos potestativos).Quanto às ações declaratórias, têm elas por objetivo conseguir uma “certeza jurídica”. Ou,segundo a conceituação de Chiovenda:“... verificar qual seja a vontade concreta da lei, quer dizer, certificar a existência do direito(já direito a uma prestação, já direito potestativo), sem o fim de preparar a consecução dequalquer bem, a não ser a certeza jurídica...............................................................................................................O autor que requer uma sentença declaratória não pretende conseguir atualmente umbem da vida que lhe seja garantido por vontade da lei, seja que o bem consista numaprestação do obrigado, seja que consista na modificação do estado jurídico atual; quer,tão-somente, saber que seu direito existe ou quer excluir que exista o direito do adversário;pleiteia, no processo, a certeza jurídica e nada mais” (“Instituições”, 1º vol., págs. 265 e303).Por enquanto, deve ficar bem fixada esta noção, que tem importância capital nodesenvolvimento de alguns aspectos do presente estudo: o objetivo da ação declaratória éa obtenção de uma “certeza jurídica”, e nada mais. Nas declaratórias, conseqüentemente,o autor “não colima a realização do direito” (Chiovenda, obra citada, 1/302).Convém acentuar, porém, que as sentenças condenatórias e as constitutivas também têmcerto conteúdo declaratório, ao lado do conteúdo condenatório ou constitutivo, pois todasentença deve conter, necessariamente, a declaração da existência da relação jurídicasobre a qual versa. O que as distingue das declaratórias propriamente ditas é que, nestas,tal conteúdo é total, ao passo que nas outras duas espécies é parcial. Em outras palavras:as sentenças declaratórias são puramente declaratórias, ao passo que as condenatóriassão, simultaneamente, declaratórias e condenatórias. O mesmo se pode dizer comreferência às constitutivas: são, simultaneamente, declaratórias e constitutivas (Calamandrei,“Estudios sobre el proceso civil”, pág. 282; Luiz Machado Guimarães, “in” “Rev. Forense”,vol. 101/8; Lopes da Costa, “Direito Processual Civil Brasileiro”, 1/84, 1ª ed.; Alfredo Buzaid,“Ação declaratória”, pág. 95; e Torquato Castro, “Ação declaratória”, pág. 19).Ainda a respeito da classificação das ações faz-se necessário registrar que alguns autoresadmitem outras categorias além daquelas três já referidas, como, por exemplo, as açõesexecutórias, as ações determinativas, as ações mandamentais etc. Todavia, EduardoCouture acentua, com muita propriedade, que a classificação tricotômica abarca todasessas ações, as quais, de resto, nem sequer chegam a formar categorias particulares(citação feita por Nelson Carneiro na “Rev. Forense”, vol. 136/51).

VII - Ações ConstitutivasA natureza do presente estudo exige que, a esta altura, nos detenhamos um pouco naanálise das ações constitutivas. Têm elas por objetivo o exercício de duas categorias dedireitos potestativos: a) aqueles que, por medida de segurança dos negócios jurídicos, alei não permite sejam exercidos mediante simples declaração de vontade, nem mesmoquando estão de acordo todos os interessados, inclusive aquele que sofre a “sujeição”(ações constitutivas necessárias, segundo a terminologia adotada por Calamandrei). Ex.:

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as ações anulatórias de casamento; e b) aqueles direitos potestativos que são exercidospor meio de ação apenas subsidiariamente, isto é, quando os outros interessados nãoconcordam em que eles sejam exercidos mediante simples declaração de vontade. Ex.: aação de divisão.Pelo que foi dito acima já se pode concluir que as ações constitutivas têm as seguintescaracterísticas: a) não pressupõem a existência de lesão a um direito, como ocorre nasações condenatórias; b) por meio delas não se exige uma prestação do réu, mas apenasse pleiteia a formação, modificação, ou extinção de um estado jurídico; c) não são meiopara se restaurar um direito lesado, mas meio pelo qual se exercitam duas classes dedireitos potestativos; d) não têm por objetivo a satisfação de uma pretensão, se se entendercomo tal “o poder de exigir de outrem uma prestação”, pois os direitos potestativos são,por definição, “direitos sem pretensão” (quando muito há, nas ações constitutivas, umapretensão de natureza especial, isto é, uma pretensão dirigida contra o Estado, ou umapretensão à tutela jurídica, ou “pretensão à prestação jurisdicional”, como quer Pontes deMiranda, mas ele mesmo acentua que não se deve confundir “pretensão de direito material”,com “pretensão à tutela jurídica” - “Comentários ao Código de Processo Civil”, 1ª ed., 1ºvol., pág. 19); finalmente: e) as sentenças proferidas nas ações constitutivas (positivas ounegativas) não são suscetíveis, e nem carecem de execução, pois o conteúdo de taisações se esgota com o provimento judicial que determina a criação, modificação, ouextinção do estado jurídico. (Somente quando a ação constitutiva se encontra cumuladacom uma ação condenatória é que se pode cogitar de execução, mas aí a execução dizrespeito a essa última. Ex.: a ação para rescindir o contrato de compra e venda de coisarecebida com vicio redibitório, e reaver o preço pago, mais perdas e danos - art. 178, § 29,e § 59, n. IV).Convém acentuar, finalmente, que embora as sentenças proferidas nas ações constitutivasproduzam, normalmente, efeitos “ex nunc”, não é contrária à sua natureza, e é até mesmofreqüente, a produção de efeitos “ex tunc”, conforme ensinam Chiovenda (“Instituições”, 1/286), Pontes de Miranda (“Comentários ao Código de Processo Civil”, vol. 2º, pág. 468, da1ª ed.), Goldschmidt (“Derecho procesal”, pág. 112), e Prieto Castro (“Derecho ProcesalCivil”, tomo I, pág. 65).

VIII - Fundamentos e Efeitos da PrescriçãoAcentua Savigny que, durante muito tempo, a prescrição foi um instituto completamenteestranho ao Direito Romano, mas, ao surgir o Direito Pretoriano, passou a constituir umaexceção à antiga regra da duração perpétua das ações. Por último, a exceção se converteuem regra geral (“Sistema del derecho romano”, tomo IV, págs. 181 e 185 da trad. cast.).Tendo ainda em vista o Direito Romano, diz o mesmo autor que o principal fundamento daprescrição é a necessidade de serem fixadas as relações jurídicas incertas, suscetíveisde dúvidas e controvérsias, encerrando-se dita incerteza em um lapso determinado detempo (ob. e vol. cite., pág. 178).Por sua vez, ensina Pontes de Miranda que o instituto da prescrição “serve à segurança eà paz públicas”, e é este, precisamente, o ponto de vista que, de modo geral, prevalece, arespeito do assunto, na doutrina e na jurisprudência, embora ainda haja quem procureapresentar, como fundamento do mesmo instituto, o castigo à negligência, a aplicação doprincípio “dormientibus non sucurrit ius”.Mas há um ponto que deve ficar bem ressaltado, porque interessa fundamentalmente àsconclusões do presente estudo: os vários autores que se dedicaram à análise do termoinicial da prescrição fixam esse termo, sem discrepância, no nascimento da ação (“actionata”), determinado, tal nascimento, pela violação de um direito. Savigny, por exemplo, nocapítulo da sua monumental obra dedicado ao estudo das condições da prescrição, inclui,

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em primeiro lugar, a “actio nata”, e acentua que esta se caracteriza por dois elementos: a)existência de um direito atual, suscetível de ser reclamado em Juízo; e b) violação dessedireito (obra citada, tomo IV, pág. 186). Também Câmara Leal afirma, peremptoriamente:“Sem exigibilidade do direito, quando ameaçado ou violado, ou não satisfeita sua obrigaçãocorrelata, não há ação a ser exercitada; e, sem o nascimento desta, pela necessidade degarantia e proteção ao direito, não pode haver prescrição, porque esta tem por condiçãoprimária a existência da ação...............................................................................................................Duas condições exige a ação, para se considerar nascida (“nata”), segundo a expressãoromana: a) um direito atual atribuído ao seu titular; b) uma violação desse direito, à qualtem ela por fim remover...............................................................................................................O momento de início do curso da prescrição, ou seja, o momento inicial do prazo, édeterminado pelo nascimento da ação - “actioni nondum natae non praescribitur”.Desde que o direito está normalmente exercido, ou não sofre qualquer obstáculo, porparte de outrem, não há ação exercitável.Mas, se o direito é desrespeitado, violado, ou ameaçado, ao titular incumbe protegê-lo e,para isso, dispõe da ação...” (Câmara Leal, “Da prescrição e da decadência”, págs. 19, 32e 256).Opinando no mesmo sentido, poderão ser citados vários outros autores, todos mencionandoaquelas duas circunstâncias que devem ficar bem acentuadas (o nascimento da açãocomo termo inicial da prescrição, e a lesão ou violação de um direito como fato gerador daação): De Ruggiero, “Instituições de Direito Civil”, vol. 1º,. págs. 324 e 325; Carpenter, “Daprescrição”, pág. 269 da 1ª ed.; Von Tuhr, “Derecho Civil”, vol. 3º, tomo 2º, pág. 202, datrad. cast.; Ennecerus-Kipp e Wolf, “Tratado de Derecho Civil”, tomo 1º, vol. 2º, pág. 510da trad. cast.; Ebert Chamoun, “Instituições de Direito Romano”, pág. 68; Pontes de Miranda,“Tratado de Direito Privado”, vol. VI, pág. 114; Lehmann, “Tratado de Derecho Civil”, vol. 1º,pág. 510, da trad. castelhana.Sancionando aquele entendimento, que remonta ao Direito Romano, o Código Civil alemão,depois de definir a pretensão, no seu § 194, como “o direito de exigir de outrem uma açãoou uma omissão (prestação)”, acrescenta (§ 198) que “a prescrição começa com onascimento da pretensão”. Deste modo, também no Direito positivo alemão não são todasas ações que dão origem à prescrição, mas apenas aquelas ações nascidas da lesão deum direito.Compreende-se facilmente o motivo da escolha da lesão do direito como termo inicial doprazo de prescrição: é que a lesão dá origem a uma ação, e a possibilidade de proposituradesta, com o fim de reclamar uma prestação destinada a restaurar o direito, é que concorrepara criar aquele estado de intranqüilidade social que o instituto da prescrição procuraevitar. Assim, com a prescrição, limita-se o prazo para exercício da ação. Esgotado oprazo, extingue-se a ação, mas somente a ação, pois o direito correspondente continua asubsistir, se bem que em estado latente, podendo até, em alguns casos, voltar a atuar. Asobrevivência do direito violado (em estado latente) por si só não causa intranqüilidadesocial. O que causa tal intranqüilidade é a ação, isto é, a possibilidade de ser ela propostaa qualquer momento. Deste modo, não se faz necessário extinguir o direito para fazercessar a intranqüilidade basta extinguir a ação. E’ por isso que se diz comumente, e comprocedência, que a prescrição extingue a ação e não o direito. Exemplos: o créditocorrespondente a uma ação executiva cambiária prescrita pode ser cobrado por meio deação ordinária; o proprietário que deixou prescrever a ação reivindicatória que tinha contradeterminada pessoa, ainda pode exercer sua pretensão reivindicatória contra outra pessoa,

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se a coisa passou, depois, para a posse desta última e ela não pode invocar, em seu favora prescrição consumada. Nos exemplos citados houve extinção da ação, mas não dodireito.Deste modo, fixada a noção de que a violação do direito e o início do prazo prescricionalsão fatos correlatos, que se correspondem como causa e efeito, e articulando-se tal noçãocom aquela classificação dos direitos formulada por Chiovenda, concluir-se-á, fácil eirretorquivelmente, que só os direitos da primeira categoria (isto é, os “direitos a umaprestação”), conduzem à prescrição, pois somente eles são suscetíveis de lesão ou deviolação, conforme ficou amplamente demonstrado. Por outro lado, os da segunda categoria,isto é, os direitos potestativos (que são, por definição, “direitos sem pretensão”, ou “direitossem prestação”, e que se caracterizam, exatamente, pelo fato de serem insuscetíveis delesão ou violação), não podem jamais, por isso mesmo, dar origem a um prazo prescricional.Por via de conseqüência chegar-se-á, então, a uma segunda conclusão importante: só asações condenatórias podem prescrever, pois são elas as únicas ações por meio das quaisse protegem os direitos suscetíveis de lesão, isto é, os da primeira categoria da classificaçãode Chiovenda.Se, a título de verificação do acerto daquelas conclusões, as aplicarmos aos vários prazospara propositura de ações enumerados no art. 178 do Código Civil, verificaremos o seguinte:1º) todos os prazos do mencionado dispositivo que são classificados, pela doutrina e pelajurisprudência, como prazos de prescrição “stricto sensu”, se referem a açõescondenatórias; 2º) os demais prazos do mesmo art. 178 (que são classificados pela doutrinae pela jurisprudência como prazos de decadência) não se referem a ações condenatórias.Aliás, se analisarmos o Código Civil alemão, e atentarmos para a circunstância de que ele(ao contrário do Código Civil brasileiro) não trata indistintamente os prazos de prescriçãoe de decadência, faremos algumas observações interessantes, que vêm confirmar,plenamente, aquelas conclusões a que chegamos com referência ao art. 178 do CódigoCivil brasileiro: o dispositivo do Código alemão (§ 196) que fixa os prazos especiais deprescrição enumera exclusivamente direitos pertencentes à primeira categoria daclassificação de Chiovenda, isto é, <<direitos a uma prestação>>, que são os únicossuscetíveis de violação, e que são protegidos por meio de ações condenatórias.Por outro lado, convém levar em conta dois outros fatos importantes: 1º) o dispositivo doCódigo Civil brasileiro que fixa os prazos gerais de prescrição se refere apenas às açõesreais e às ações pessoais (art. 177); 2º) as ações condenatórias (ou “ações de prestação”)são as únicas que comportam subdivisão em ações reais e ações pessoais. Porconseguinte, o mencionado art. 177 se aplica, única e exclusivamente, às açõescondenatórias.As considerações feitas acima conduzem, pois, inevitavelmente, à fixação desta primeiraregra, indispensável à distinção entre prescrição e decadência: Todas as açõescondenatórias (e somente elas) estão sujeitas à prescrição.Passemos, agora, ao instituto da decadência.

IX - Fundamentos e Efeitos da Decadência.Por que razão há prazos de prescrição e prazos de decadência? Por que há ações queconduzem à prescrição e ações que conduzem à decadência, quando seria muito maissimples unificar os conceitos e dar uma só denominação aos principais efeitos da incidênciado tempo sobre as relações jurídicas? E’ exatamente porque os dois institutos, emboratendo fundamentos comuns, divergem quanto ao objeto e quanto aos efeitos.Realmente, ao conceituarem decadência, doutrina e jurisprudência, na sua grande maioria,embora não forneçam critério seguro para distingui-la da prescrição, acentuam um fato de

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importância capital: o efeito imediato da decadência é a extinção do direito, ao passo queo da prescrição é a extinção da ação. Isto, porém, não basta para distinguir os doisinstitutos, e o problema permanece de pé. Examinemos a questão sob outro aspecto.Quando enumera os princípios concernentes ao exercício dos direitos, o Prof. OrlandoGomes inclui dois que interessam de perto à matéria em discussão: o da disponibilidade,segundo o qual o exercício dos direitos é facultativo (ninguém é obrigado a exercê-los); eo da inesgotabilidade, de acordo com o qual os direitos não se esgotam pelo não-uso(“Introdução ao Direito Civil”, pág. 122). Pode-se dizer, assim, que a exemplo do queocorria com as ações no Direito Romano antes de nascer o instituto da prescrição, tambémos direitos, em princípio, têm duração perpétua.Todavia, conforme já vimos anteriormente, há certos direitos cujo exercício afeta, em maiorou menor grau, a esfera jurídica de terceiros, criando para esses um estado de sujeição,sem qualquer contribuição da sua vontade, ou mesmo contra sua vontade. São os direitospotestativos. E’ natural, pois, que a possibilidade de exercício desses direitos origine,para os terceiros que vão sofrer a sujeição, uma situação de intranqüilidade, cuja intensidadevaria de caso para caso. Muitas vezes aqueles reflexos se projetam muito além da esferajurídica dos terceiros que sofrem a sujeição e chegam a atingir interesses da coletividade,ou de parte dela, criando uma situação de intranqüilidade de âmbito mais geral. Assim, aexemplo do que ocorreu com referência ao exercício das ações condenatórias, surgiu anecessidade de se estabelecer também um prazo para o exercício de alguns (apenasalguns) dos mencionados direitos potestativos, isto é, aqueles direitos potestativos cujafalta de exercício concorre de forma mais acentuada para perturbar a paz social. Daí fixara lei (além de outros), prazos para o exercício dos seguintes direitos potestativos: direitode preempção ou preferência; direito de propor ação rescisória; direito que têm os cônjugesde promover a anulação do casamento; direito que tem o marido de contestar a legitimidadedo filho de sua mulher; direito que têm os contratantes de rescindir ou anular os contratosetc. etc. Convém acentuar, a esta altura, que nem todos aqueles prazos estão ligados àpropositura de uma ação, pois, como já vimos, há direitos potestativos que se exercempor outro meio que não o do procedimento judicial, mas, mesmo assim, podem estarsubordinados a um prazo. Por exemplo: o exercício do direito de preempção ou preferêncianão se faz por meio de ação, porém está subordinado a um prazo (art. 1.153 do CódigoCivil). Assim, pode-se dizer, com relação aos direitos potestativos subordinados a prazo,que o prazo não é fixado, propriamente, para a propositura da ação, mas para o exercíciodo direito. E se quase sempre não se atenta para esta circunstância é porque, na maioriados casos, tais direitos, quando subordinados a prazo, se exercitam por meio de ação.Também se verifica a situação inversa: há direitos potestativos que se exercitam (facultativaou mesmo obrigatoriamente) por meio de ação, mas, apesar disso, não estão subordinadosa prazo.Exs.: os direitos potestativos exercitados por meio das ações de divisão e investigatóriade paternidade. Esta observação deve ficar bem acentuada, porque é o ponto de partidapara a construção da teoria da imprescritibilidade, que pretendemos expor mais adiante.Com referência, àqueles direitos potestativos para cujo exercício a lei não achou necessáriofixar um prazo especial, fica prevalecendo, então, o princípio geral da inesgotabilidade ouda perpetuidade (“os direitos não se extinguem pelo não-uso”), pois não há dispositivoestabelecendo um prazo geral para que os direitos potestativos sejam exercitados sobpena de extinção. Relativamente a tais direitos só há prazos especiais. Já o mesmo nãoacontece com os direitos da outra categoria (os “direitos a uma prestação”, da classificaçãode Chiovenda): as ações por meio das quais estes direitos são protegidos, ou estãosubordinadas a prazos especiais no art. 178 do Código, ou estão subordinadas aos prazosgerais do art. 177, pois este último artigo só se aplica às ações condenatórias, conformejá acentuamos.

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As considerações feitas acima levam, inevitavelmente, à conclusão de que, quando a lei,visando à paz social, entende de fixar prazos para o exercício de alguns direitos potestativos(seja exercício por meio de simples declaração de vontade, como o direito de preempçãoou preferência; seja exercício por meio de ação, como o direito de promover a anulação docasamento), o decurso do prazo sem o exercício do direito implica na extinção deste,pois, a não ser assim, não haveria razão para a fixação do prazo. Tal conseqüência (aextinção do direito) tem uma explicação perfeitamente lógica: é que (ao contrário do queocorre com os direitos suscetíveis de lesão) nos direitos potestativos subordinados aprazo o que causa intranqüilidade social não é, propriamente, a existência da ação, masa existência do direito, tanto que há direitos desta classe ligados a prazo, embora nãosejam exercitáveis por meio de ação. O que intranqüiliza não é a possibilidade de serproposta a ação, mas a possibilidade de ser exercido o direito. Assim, extinguir a ação, edeixar o direito sobreviver (como ocorre na prescrição), de nada adiantaria, pois a situaçãode intranqüilidade continuaria de pé. Infere-se, daí, que quando a lei fixa prazo para oexercício de um direito potestativo, o que ela tem em vista, em primeiro lugar, é a extinçãodesse direito, e não a extinção da ação. Esta também se extingue, mas por via indireta,como conseqüência da extinção do direito.O mesmo fato não é observado com referência à outra categoria de direitos (os “direitos auma prestação”): a lei não fixa - e nem tem motivos para fixar - prazo para o exercício denenhum deles. Com relação a estes direitos, os prazos que existem, fixados em lei, sãotão-somente para a propositura das ações por meio das quais eles são protegidos. Assim,o decurso do prazo sem propositura da ação, implica na extinção desta, e não na extinçãodo direito que ela protege, pois - repita-se - em face dos denominados “direitos a umaprestação”, a ação funciona como meio de proteção e não como meio de exercício.Por conseguinte, também se impõe, necessariamente, a conclusão de que só na classedos potestativos é possível cogitar-se da extinção de um direito em virtude do seu não-exercício. Daí se infere que os potestativos são os únicos direitos que podem estarsubordinados a prazos de decadência, uma vez que o objetivo e efeito desta é, precisamente,a extinção dos direitos não exercitados dentro dos prazos fixados. A conclusão imediataé, igualmente, inevitável: as únicas ações cuja não propositura implica na decadência dodireito que lhes corresponde são as ações constitutivas, que têm prazo especial de exercíciofixado em lei, e apenas essas, pois - insista-se - a lei não fixa prazos gerais para oexercício de tais ações, a exemplo do que ocorre com as condenatórias (art. 177).Finalmente, se, para testar o acerto daquelas conclusões, analisarmos os vários prazosespeciais enumerados no art. 178 do Código Civil, verificaremos que todos aquelesclassificados pela doutrina e pela jurisprudência como sendo prazos de decadência,correspondem, exatamente, a direitos potestativos e a ações constitutivas.Deste modo chegamos, por dedução, a esta segunda regra: os únicos direitos para osquais podem ser fixados prazos de decadência são os direitos potestativos, e, assim, asúnicas ações ligadas ao instituto da decadência são as ações constitutivas, que têmprazo especial de exercício fixado em lei.Com a aplicação das duas regras deduzidas acima, torna-se extremamente fácil distinguira prescrição da decadência e classificar os vários prazos enumerados no art. 178 doCódigo Civil: se se trata de ação condenatória, o prazo é de prescrição da ação; e se setrata de ação constitutiva, o prazo é de decadência do direito exercitado por meio dela.A seguir trataremos de alguns casos especiais que podem suscitar dúvidas.

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X - Casos Especiais de Acões Constitutivas Encontrados no Art. 178 do Código CivilO primeiro caso que pode oferecer alguma dificuldade na aplicação das duas regras fixadasacima é aquele a que se referem o § 2º e o § 5º, n. IV, do art. 178; prazo para o compradorpropor ação destinada a haver abatimento da preço de coisa (móvel ou imóvel) recebidacom vício redibitório, ou rescindir o contrato e reaver o preço pago, mais perdas e danos.Como se verifica dos textos indicados, o comprador tem, à sua disposição, ações denatureza diversa (condenatórias e constitutivas), das quais pode fazer uso alternativamente:a) pode ele propor uma ação para haver abatimento do preço (ação condenatória), ou, b)pode propor uma ação para rescindir o contrato (ação constitutiva), cumulada com umaação para reaver o preço pago, mais perdas e danos (ação condenatória). Como aplicar,na hipótese, o critério distintivo proposto acima, desde que estão presentes os dois tiposde ações que servem de base à distinção? O prazo é de prescrição ou de decadência?Só há uma maneira de solucionar o impasse, desde que não é possível admitir que oprazo seja, simultaneamente, de prescrição e de decadência: é verificar qual dos doisinteresses deve prevalecer - o protegido pela prescrição, ou o protegido pela decadência.Ora, basta atentar para as circunstâncias de que os prazos de decadência são insuscetíveisde renúncia, de interrupção, e de suspensão, e que o seu esgotamento deve ser reconhecidode ofício pelo juiz, para se concluir que tais prazos têm um conteúdo de interesse públicomuito mais relevante que os prazos prescricionais. Deste modo, os prazos estabelecidosno art. 178, § 2º, e § 5º, n. IV, são prazos de decadência, e é esta, realmente, a classificaçãodada a tais prazos por Pontes de Miranda (“Tratado de Direito Privado”, vol. 6º, págs. 140,340 e 341); Câmara Leal (“Da prescrição e da decadência”, págs. 145 e 146; OrlandoGomes (“Introdução ao Direito Civil”, pág. 393) e Carlos Maximiliano (“Hermenêutica eAplicação do Direito”, pág. 352).Outro prazo que merece referência especial é o do art. 178. § 6º, n. XI, do Código Civil: aação do proprietário do prédio desfalcado contra o do prédio aumentado pela avulsão, éação condenatória ou constitutiva? O prazo é de prescrição da ação, ou de decadência dodireito a que ela corresponde?À primeira vista parece tratar-se de ação condenatória, pois afigura-se que, ao propor aação, o autor pretende do réu uma prestação, isto é, a entrega da parte acrescida ao seuimóvel pela avulsão. Ocorre, porém, que a avulsão não resulta de ato do proprietário doimóvel beneficiado, contrário ao direito do outro proprietário, e sim de fato da natureza quetem como efeito jurídico a constituição de um direito de propriedade em favor do proprietáriodo imóvel beneficiado (art. 536), se não houver reclamação do outro proprietário dentro doprazo de um ano (arts. 541 e 542). Deste modo, a ação em análise não tem efeitocondenatório, e sim efeito constitutivo negativo: visa a evitar que se crie um novo direito depropriedade sobre a porção de terra objeto da avulsão, ou que se crie esse novo direitoindependentemente de indenização (arts. 541 e 542). Trata-se, pois, de ação constitutiva,e conseqüentemente o prazo é de decadência. Este entendimento coincide com o dePontes de Miranda (“Tratado de Direito Privado”, vol. VI, págs. 358 e 359); Carlos Maximiliano(“Hermenêutica e Aplicação do Direito”, pág. 351 da 5ª ed.); e Câmara Leal (“Da Prescriçãoe da Decadência”, pág. 146 da 1ª ed.).

XI - Ações Declaratórias.Quando expusemos a classificação das ações adotada por Chiovenda, verificamos que,ao lado das ações condenatórias (ligadas ao instituto da prescrição), e das açõesconstitutivas (ligadas, indiretamente, ao instituto da decadência), existe uma terceiracategoria, a das ações declaratórias. Qual a posição destas últimas em face dos institutos?Estão ligadas a eles, ou a algum deles?

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Conceituando as ações declaratórias e, simultaneamente, distinguindo-as dascondenatórias e das construtivas, diz Chiovenda:“O autor que requer uma sentença declaratória não pretende conseguir atualmente umbem da vida que lhe seja garantido por vontade da lei, seja que o bem consista numaprestação do obrigado, seja que consista na modificação do estado jurídico atual; quer,tão-somente, saber que seu direito existe ou quer excluir que exista o direito do adversário;pleiteia no processo a certeza jurídica e nada mais” (“Instituições”, 1/302 e 303).A obtenção dessa “certeza jurídica” é, no dizer do mesmo autor, a mais autônoma e amais elevada função do processo (ob. e pág. cits.).A “certeza jurídica” surge, assim, como efeito, não apenas imediato, mas também único,daí ações e sentenças declaratórias, e é precisamente o que acentua Chiovenda quandoafirma que a sentença declaratória “... não ensarta outro efeito que não o de fazer cessara incerteza do direito...”, (obra citada, 1º vol., pág. 286). Realmente, a noção de obtençãoda “certeza jurídica” está sempre ligada ao conceito de ação declaratória: Chiovenda(“Instituições”, 1º vol., págs. 286, 321, e 324; “Ensayos de derecho procesal civil”, 1º vol.,pág. 32 da trad. cast.); e Torquato Castro (“Ação declaratória”, págs. 27 e 88).Por conseguinte, pode-se dizer que as sentenças declaratórias não dão, não tiram, nãoproíbem, não permitem, não extinguem e nem modificam nada. Em resumo: não impõemprestações, nem sujeições, nem alteram, por qualquer forma, o mundo jurídico. Por forçade uma sentença declaratória, no mundo jurídico nada entra, nada se altera, e dele nadasai. As sentenças desta natureza, pura e simplesmente, proclamam a “certeza” a respeitodo que já existe, ou não existe, no mundo jurídico. E’ exatamente o princípio consagradono nosso Código de Processo Civil quando trata de tais ações: “O interesse do autorpoderá limitar-se à declaração da existência, ou inexistência de relação jurídica ou àdeclaração da autenticidade ou falsidade de documento” (art. 2º, parágrafo único).Fixado o conceito, pergunta-se: as ações declaratórias estão ligadas à prescrição ou àdecadência? Parece-nos que nem a uma coisa nem a outra, conforme se passa ademonstrar.Já vimos, anteriormente, que todo prazo prescricional está ligado, necessária eindissoluvelmente, à lesão de um direito, de modo que, se não há lesão do direito, não hácomo cogitar de prescrição da ação. Já vimos, igualmente, que fato semelhante ocorrecom o instituto da decadência: todo prazo decadencial está ligado, também necessária eindissoluvelmente, ao exercício de um direito, de modo que só sofrem os efeitos (indiretos)da decadência aquelas ações que são meio de exercício de alguns direitos pertencentesa uma categoria especial.Ora, as ações declaratórias nem são meio de proteção ou restauração de direitos lesados,nem são, tampouco, meio de exercício de quaisquer direitos (criação, modificação ouextinção de um estado jurídico). Quando se propõe uma ação declaratória, o que se temem vista, exclusivamente, é a obtenção da “certeza jurídica”, isto é, a proclamação judicialda existência ou inexistência de determinada relação jurídica, ou da falsidade ouautenticidade de um documento. Daí é fácil concluir que o conceito de ação declaratória évisceralmente inconciliável com os institutos da prescrição e da decadência: as açõesdesta espécie não estão, e nem podem estar, ligadas a prazos prescricionais oudecadenciais. Realmente, como já vimos, o objetivo da prescrição é liberar o sujeito passivode uma prestação, e o da decadência, o de liberá-lo da possibilidade de sofrer uma sujeição.Ora, se as ações declaratórias não têm o efeito de realizar uma prestação, nem tampoucoo de criar um estado de sujeição, como ligar essas ações a qualquer dos dois institutosem análise? Se o único efeito de tais ações é a declaração da existência ou inexistênciade uma relação jurídica, ou da autenticidade ou falsidade de um documento, qual a finalidadeda fixação de um prazo para o seu exercício? E quais seriam as conseqüências do decurso

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do prazo sem propositura da ação? A relação inexistente passaria a existir? E a existentedeixaria de existir? O documento falso passaria a autêntico? E o autêntico passaria afalso? Mesmo admitindo-se, para argumentar, a possibilidade de conseqüências tãoabsurdas, a ação não seria, nestes casos, declaratória, e sim constitutiva.Para ficar ainda mais acentuada a incompatibilidade entre as ações declaratórias e osinstitutos da prescrição e da decadência, basta atentar para o seguinte: diz Chiovendaque as sentenças declaratórias podem ter por objeto qualquer direito, inclusive de naturezapotestativa (“Instituições”, 1/331, e “Ensayos de derecho procesal civil”, pág. 127). Daípode-se concluir que os direitos objeto das ações declaratórias são, também, objeto deuma das outras duas categorias de ações (condenatórias ou constitutivas), e tal conclusãodá origem a mais um argumento favorável ao ponto de vista que sustentamos. Realmente,desde que as situações jurídicas que se colocam no campo de atuação das açõesdeclaratórias já são tuteladas por um dos outros dois tipos de ações cuja finalidade precípuaé a realização do direito (condenatórias ou constitutivas) e se estas, por sua vez, já seencontram ligadas a um prazo extintivo (prescricional ou decadencial), seria absurdo admitiroutro prazo de igual natureza para a ação declaratória que tivesse por objetivo a mesmasituação jurídica. Se se entender de outra forma, qual dos dois prazos deve prevalecer? Oda ação declaratória ou o outro? Levando em consideração o ponto assinalado, acentuamChiovenda (“Ensayos de derecho procesal civil”, 1/129 da trad. cast.) e Ferrara (“A simulaçãodos negócios jurídicos”, pág. 458 da trad. port.), que quando a ação condenatória estáprescrita, não é razão para se considerar também prescrita a correspondente açãodeclaratória, e sim para se considerar que falta o interesse de ação para a declaração dacerteza.E se se levar em conta que a prescrição e a decadência têm uma finalidade comum, queé a paz social, ainda ficará mais evidenciada a desnecessidade de se fixar prazo extintivopara as ações declaratórias, pois, não produzindo elas (e as respectivas sentenças),como de fato não produzem, qualquer modificação no mundo jurídico (mas apenas aproclamação da certeza jurídica), o seu exercício, ou falta de exercício, não afetam, diretaou indiretamente, a paz social. E tanto é exata a conclusão que, entre os vários prazosextintivos encontrados no art. 178 do Código Civil, não há um só que se refira a açõesdeclaratórias propriamente ditas.Além do mais, se se quisesse fixar um prazo extintivo para as ações declaratórias, de quenatureza seria este prazo? Prescricional ou decadencial? O legislador que pretendessefazer uma escolha se depararia com um obstáculo intransponível: como as açõesdeclaratórias não têm por finalidade a restauração, nem tampouco o exercício de direitos,elas não podem ser atreladas nem ao instituto da prescrição nem ao da decadência.Diante de tudo isso, a conclusão que se impõe é a seguinte: as ações declaratóriasdevem ser classificadas como ações imprescritíveis. E é esta, realmente, a classificaçãodada pela maioria dos doutrinadores. Entre muitos outros: Chiovenda (“Instituições”, 1/62;“Ensayos”, 1/32); Pontes de Miranda (“Tratado de Direito Privado”, vol. 6º, págs. 129, 130e 285) e Ferrara (”Da simulação dos negócios jurídicos”, pág. 458).

XII - Ações Aparentemente Declaratórias.Problema intimamente ligado ao das ações declaratórias, e que merece exame maisdetido, é o daquelas ações que poderiam receber a denominação de “aparentementedeclaratórias”, em virtude de serem geralmente classificadas como declaratórias, emborasejam, na realidade, constitutivas.Em primeiro lugar examinaremos as denominadas “ações de nulidade”, isto é, aquelasações que têm por objetivo a invalidação dos atos nulos. São tradicionalmente classificadas

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como declaratórias, enquanto que aquelas outras que têm por finalidade a invalidação dosatos anuláveis são classificadas como constitutivas.Todavia, Pontes de Miranda, usando argumentos que nos parecem irretorquíveis, demonstraque as ações de nulidade (do mesmo modo que as de anulação), são constitutivas negativas.Começa ele acentuando que, classificar as ações de nulidade como declaratórias equivalea equiparar os atos nulos aos atos inexistentes, o que representa “romanismo escusado”ou “resíduo romanístico” não tolerado pelo Direito moderno. Realmente, no Direito Romano,os conceitos de ato nulo e ato juridicamente inexistente se equivaliam, e por isso a sentençaque proclamava uma nulidade era de natureza puramente declaratória: limitava-se a registrarum fato (a inexistência jurídica do ato), sem produzir qualquer modificação de naturezajurídica, pois o ato nulo, que já se encontrava fora do mundo jurídico antes da sentença, láse conservava, de vez que não era considerado ato jurídico. Hoje, porém, a conceituaçãoé diferente, conforme acentua o mesmo autor: “ato nulo” difere de “ato juridicamenteinexistente”. O ato nulo é um ato que, embora defeituosamente, penetra no mundo jurídico,tanto que recebe a denominação de “ato jurídico” (Código Civil, art. 145). “Nulo” é negaçãode validade no mundo jurídico, e não negação de existência no mesmo mundo. Destemodo a decisão que pronuncia uma nulidade não tem efeito apenas declaratório, e sim,também, efeito constitutivo, pois desloca o ato do mundo jurídico para o mundo fático. Oato que teve sua nulidade pronunciada por sentença, sai do mundo jurídico, por forçadesta sentença, e passa a ser apenas ato do mundo fático, isto é, ato juridicamenteinexistente. O efeito da sentença é, pois, o de ocasionar uma modificação: transforma umato jurídico nulo em ato juridicamente inexistente. Não ocorreu aí, apenas, a proclamaçãode uma “certeza jurídica”, e por isso a ação é constitutiva e não simplesmente declaratória.Por conseguinte, a nulidade é “decretável” e não “declarável”, (Pontes de Miranda, “Tratadode Direito Privado”, vol. 4º, págs. 7, 9, 11 a 14, 17, 19, 20, 28, 29, 33, 75, 77, 79, 80 e 209;,”Tratado de Direito de Família”, 1º vol., pág. 304 da 3ª ed.; “Comentários ao Código deProcesso Civil”, vol. 2º, págs. 464 e 467 da 1ª ed.).Aliás, a distinção entre atos nulos e atos juridicamente inexistentes, estranha ao DireitoRomano (v. Savigny, “sistema”, tomo 3º, pág. 351, da trad. cast.), surgiu por ocasião daelaboração do Código Civil francês (Josserand. “Derecho Civil”, tomo 1º, vol. 1º, pág. 137).Para reforçar aquelas conclusões de Pontes de Miranda, convém atentar para umacircunstância que não se concilia, de modo algum, com a pretendida equiparação dosatos nulos aos atos juridicamente inexistentes, nem com a natureza simplesmentedeclaratória que se quer atribuir às ações de nulidade: é que há atos nulos que produzemefeitos permanentes, e alguns chegam mesmo a convalidar por completo. Exemplos: ocasamento putativo (art. 221); o casamento contraído perante autoridade incompetente,depois de decorrido o prazo de dois anos dentro do qual a nulidade deve ser alegada (art.208); a partilha nula, depois de decorrido o prazo de decadência fixado no art. 178, § 6º, n.V, do Código Civil; o parentesco por afinidade em linha reta sobrevive a casamento nulo(art. 335). Entendemos, assim, que as ações de nulidade devem ser classificadas comoconstitutivas negativas.Outras ações aparentemente declaratórias são as denominadas ações de estado, tambémgeralmente classificadas como declaratórias, mas na realidade são constitutivas, emboracom uma grande carga de declaratividade. Pelo menos elas não podem ser consideradasdeclaratórias dentro da concepção moderna desse tipo de ações, isto é, aquelas açõespor meio das quais se procura, exclusivamente, obter uma certeza jurídica. E’ o queprocuraremos demonstrar.Da conceituação da ação declaratória se infere, naturalmente, que uma das suas principaiscaracterísticas é a facultatividade ou voluntariedade: ela é utilizada quando alguém quer,apenas, estabelecer a certeza jurídica a respeito da existência ou inexistência dedeterminada relação jurídica, mas ninguém é obrigado a propô-la para que desta relação

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decorram efeitos jurídicos. A relação jurídica existe (ou inexiste), e seus efeitos se produzem(ou não se produzem), independentemente de sua declaração judicial. Em resumo: pode-se dizer que não há ações declaratórias “obrigatórias”, ou “necessárias”, como as há naclasse das constitutivas. Assim, por exemplo, se não há dúvidas a respeito da existênciade determinada relação jurídica, isto é, se coincidem as vontades de todos os possíveisinteressados, no sentido de reconhecerem a existência da relação; ou, em outras palavras,se não há incerteza a respeito da existência da mesma relação, a ação declaratória setorna desnecessária. E mesmo havendo incerteza, ou incoincidência das vontades dosinteressados, não é indispensável a propositura da declaratória para que a relação jurídicaexista e produza seus efeitos, pois, como já vimos, a finalidade única das ações declaratóriasé a obtenção da “certeza jurídica”, e não a produção de quaisquer outros efeitos. Ointeressado na declaração pode até achar preferível aguardar-se para tutelar seu direitopor um meio mais enérgico, que não seja apenas o declaratório. O que é certo, porém, edeve ficar bem ressaltado, é que, com ou sem ação declaratória, os efeitos jurídicos darelação se produzem da mesma forma.Tais inferências encontram pleno apoio nestes ensinamentos de Goldschmidt a respeitodo “interesse declaratório” e da “incerteza jurídica”, ligados às ações declaratórias:“Desaparece o interesse na declaração se o demandado declara não pretender discutir nofuturo o direito do autor, ou renunciar ao direito de que se jactou.”..............................................................................................................“Falta esta insegurança quando a demanda deva procurar, não o esclarecimento de relaçõesjurídicas controvertidas concretas e determinadas, e sim a declaração de relações aindaincontrovertidas” (“Derecho Procesal Civil”, pág. 107 da trad. cast.).Ora, nada do que foi assinalado acima (e que é característico das ações declaratórias),ocorre com as denominadas “ações de estado”. Assim, se se pretende obter oreconhecimento de determinado estado pessoal e a produção dos efeitos deles decorrentes,é necessário e indispensável a propositura da competente ação de estado, mesmo havendoabsoluta e inabalável certeza a respeito da existência desse estado, e mesmo havendocoincidência das vontades e acordo expresso de todos os interessados possíveis eimagináveis, próximos ou remotos. Por conseguinte, única e exclusivamente por meio deação é possível: a) o marido contestar a legitimidade do filho de sua mulher (art. 344); b) ofilho, ou seus herdeiros, provarem a legitimidade da filiação na hipótese do art. 350 doCódigo Civil; c) o adotado se desligar da adoção realizada quando ele era menor ou seachava interdito (art. 373); d) o filho natural impugnar o reconhecimento (art. 362); e) o filhonatural demandar o reconhecimento da filiação, quando os pais não o tenham feitovoluntariamente (art. 363 e 355); f) o cônjuge promover a decretação da invalidade docasamento nulo ou anulável.Há, ainda, algumas outras circunstâncias observadas nas ações de estado, em geral, eque as incompatibilizam, inteiramente, com o caráter declaratório que se lhes pretendeatribuir. Assim, em primeiro lugar: somente determinadas pessoas (e não todos osinteressados) podem propor a ação de estado. Ora, é noção elementar, e fundamental,que as sentenças declaratórias não produzem qualquer alteração no mundo jurídico, poiselas não têm como efeito a aquisição, modificação ou extinção de direitos, e sim aproclamação da certeza jurídica. Deste modo, se as ações de estado fossem açõesdeclaratórias, não havia razão para se permitir sua utilização apenas a determinadaspessoas, e não a todos os interessados. Se sua utilização é limitada, é porque as açõesde estado têm outros efeitos que não a simples proclamação da certeza jurídica.Em segundo lugar: o Código Civil estabelece prazos extintivos para o exercício de váriasações de estado (art. 178. §§ 3º, 4º, 6º, nº XII, 9º, nº VI, e art. 208). Qual a conseqüênciada extinção do prazo para exercício de uma ação de estado? A impossibilidade de ser

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proclamada, daí por diante, a certeza jurídica? Isto não teria sentido, nem finalidade. Olegislador não iria estabelecer, como conseqüência da extinção daquele prazo, apenas aimpossibilidade de se proclamar a certeza jurídica, deixando subsistirem os efeitos inerentesao estado objeto da ação, efeitos esses que independem da proclamação daquela certeza:a declaração da “certeza jurídica”, ou a permanência da situação de “incerteza”, não atingem,e nem podem atingir, os efeitos das relações jurídicas. Estas existem, e produzem efeitos,independentemente da proclamação da certeza jurídica, como já vimos. Em conclusão:se há prazo para o exercício de algumas ações de estado, é porque a lei tem em vistaalcançar, com a extinção do prazo, não a impossibilidade de se proclamar a certezajurídica, mas a impossibilidade de serem obtidos os efeitos decorrentes do estado objetoda ação. Conseqüentemente, a finalidade das ações de estado não é a proclamação dacerteza jurídica, mas a obtenção daqueles efeitos, e assim elas devem ser classificadascomo constitutivas (positivas ou negativas), e não como declaratórias.A brevidade do presente estudo não permite uma análise detalhada de todas as ações deestado, mas não resistimos à tentação de assinalar algumas particularidades observadascom relação a um dos tipos mais característicos da classe - a ação investigatória defiliação. Tais particularidades também acentuam a incompatibilidade que existe entre asações de estado e as ações declaratórias. Assim (e devendo-se levar em conta que asentença proferida na ação investigatória tem os mesmos efeitos do reconhecimentovoluntário - art. 366): a) o filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento(art. 362); b) mesmo que exista escrito daquele a quem se atribui a paternidade,reconhecendo-a expressamente (art. 363, n. III), e mesmo que todos os interessados(inclusive os herdeiros do suposto pai), estejam de acordo com o conteúdo de tal escrito(o que, obviamente, dispensa a ação declaratória para se obter a “certeza jurídica”), aindaassim não se dispensa a propositura da ação investigatória; c) o Código Civil enumera,taxativamente, os únicos casos em que se pode demandar o reconhecimento da filiação(art. 363 e incisos); d) os filhos adulterinos e os incestuosos não podem ser reconhecidos,nem demandar o reconhecimento, a não ser, quanto aos primeiros, após a dissolução dasociedade conjugal (art. 258. e lei n. 883, de 21 de outubro de 1949); e) algumas legislaçõesestrangeiras fixam prazo (de decadência) para ser proposta a investigatória de paternidade(Planiol, “Tratado Practico de Derecho Civil”, vol. 2º, pág. 729 da trad. cast.) e De Ruggiero(“Instituições”, vol. 1º, pág. 335), o que equivale a dizer que, decorrido o prazo, já não émais possível obter o reconhecimento judicial do estado, nem os efeitos dele decorrentes;f) há legislações que, embora reconhecendo efeitos jurídicos ao estado de filho natural, epermitindo o reconhecimento voluntário, não admitem a ação investigatória. Era o caso daFrança, antes da lei de 1912, (Colin et Capitant, “Curso elemental de derecho civil”, tomo1º, págs. 620 e segs.).Parece-nos, face ao exposto, que se impõe a conclusão de que as ações de estado nãosão declaratórias, e sim constitutivas (positivas ou negativas), e realmente elas seapresentam com as duas principais características das ações constitutivas: a) são meiode exercício de direitos potestativos (o direito à aquisição, modificação ou extinção doestado, e aos efeitos daí decorrentes), e b) as sentenças nelas proferidas sempre criamum estado de “sujeição” para terceiros, independentemente do concurso da vontade destes,ou mesmo contra sua vontade. Aliás, as ações de estado não são apenas constitutivas -elas são constitutivas “obrigatórias” ou “necessárias”. E as ações de nulidade de casamentoainda se apresentam com uma feição particular: são constitutivas por dois motivos - porquesão “ações de estado” e porque são “ações de nulidade”.O ponto de vista que sustentamos, isto é, a constitutividade das ações de estado, seajusta perfeitamente a estas duas observações alusivas aos efeitos do reconhecimentovoluntário da filiação ilegítima (e que equivalem aos da ação investigatória): “antes doreconhecimento não há, juridicamente, filiação ...” (Pontes de Miranda, “Tratado de DireitoPrivado”, vol. 9º, pág. 181); para Cicu, é o reconhecimento que estabelece o estado de

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filiação natural (“apud” Orlando Gomes e Nelson Carneiro, “Do reconhecimento dos filhosadulterinos”, pág. 226).E’ certo que, concluindo pela constitutividade das ações de estado, nos colocamos emposição diametralmente oposta à da maioria esmagadora da doutrina e da jurisprudência,mas não nos encontramos sós. Eduardo Couture, por exemplo, situa as ações de estadoentre as constitutivas necessárias (“Fundamentos del derecho procesal civil”, pág. 221 da2ª ed.); Ricardo Reimundin (“Derecho procesal civil”, pág. 112) considera as ações deestado como “tipicamente constitutivas”, e Vicente Rão admite que há algumas ações deestado que são declarativas e outras, construtivas (“O Direito e a vida dos direitos”, vol. 2º,tomo 3º, pág. 194). No mesmo sentido: Planiol, “Tratado practico”, 1/17. Alguns outrosautores limitaram seu pronunciamento às ações investigatórias de paternidade, ou aoreconhecimento voluntário, classificando-os como atos construtivos: Cunha Gonçalves(“Tratado de Direito Civil”, vol. 1º, tomo 1º, pág. 267, da edição brasileira); Sergio Sotgia(“apud” Serpa Lopes, “Tratado dos registros públicos”, vol. 1º, pág. 310 da 3ª ed.).Concluindo as considerações a respeito das ações às quais demos a denominação de“aparentemente declaratórias” (isto é, as ações de nulidade e as ações de estado), podemosdizer que elas, como constitutivas que são, seguem a sorte destas últimas com referênciaaos dois institutos objeto do presente estudo: estão ligadas à decadência.Finalmente, deve ficar acentuado que o fato de produzirem, quase sempre, efeitos “extunc”, não impede que as ações de nulidade, e as de estado, e respectivas sentenças,sejam classificadas como constitutivas, pois, de acordo com os ensinamentos de Chiovenda,Goldschmidt, Pontes de Miranda e Prieto Castro, tais efeitos não são privativos das açõese sentenças declaratórias. Eles são até muito freqüentes nas ações e sentençasconstitutivas.

XIII - O Problema da Imprescritibilidade das AçõesSão constantes, na jurisprudência e na doutrina, referências a ações imprescritíveis, eentre elas, embora variando as opiniões, são colocadas as seguintes: as açõesdeclaratórias, algumas ações de estado (inclusive a de desquite e a investigatória depaternidade), a ação de divisão e a de demarcação, e as ações de nulidade.Entretanto, observa-se, com relação à imprescritibilidade, a mesma situação já registradaao tratarmos da distinção entre os institutos da decadência e da prescrição: é a inexistênciade um critério seguro, com base científica, que permita identificar, “a priori”, as açõesimprescritíveis. A respeito do assunto Câmara Leal acentua:“Todo o estudo relativo à imprescritibilidade se ressente de um certo empirismo. Não seencontra nos autores a fixação de uma doutrina, com princípios juridicamente estabelecidos.Tudo se reduz à casuística” (“Da prescrição e da decadência”, pág. 51 da 1ª ed.).Aliás, faz-se necessário acentuar, antes de mais nada, que a admissão da existência deações imprescritíveis no Direito brasileiro aparentemente se choca com o disposto nosarts. 177 e 179, do Código Civil. Com efeito, dizendo o referido art. 179, como diz, que oscasos de prescrição não previstos no Código serão regulados, quanto ao prazo, pelo art.177, a conclusão que se impõe, à primeira vista, é a da inexistência de ações imprescritíveisem face do nosso Direito, pois qualquer ação, necessariamente, ou estará enquadradaem um dos casos especiais do art. 178, ou a ela se aplica um dos prazos geraisestabelecidos no art. 177. Com base nesse raciocínio, cuja falsidade pretendemosdemonstrar no presente estudo, há mesmo quem sustente que, na sistemática do nossoCódigo Civil, não existem ações imprescritíveis (“Rev. Forense”, vol. 152/480, e BrennoFisher, “A prescrição nos tribunais”, vol. III, págs. 396 e 397).Entretanto, para demonstrar de início, e independentemente de qualquer outra consideração,

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que existem ações imprescritíveis no Direito brasileiro, basta atentar para as conclusõesabsurdas e que conduziria a adoção de ponto de vista diferente. Assim, por exemplo, umcontrato firmado por um menor de oito anos, ou por um louco judicialmente declaradocomo tal, ou a compra e venda de um imóvel de alto valor feita por instrumento particular,apesar de serem atos nulos (art.145), passariam a produzir todos os seus efeitos, comose válidos fossem, e não poderiam mais ter sua nulidade decretada, após o decurso doprazo geral de prescrição, e depois de atravessados, com referência aos incapazes, osobstáculos legais que se opõem à fluência dos prazos prescricionais (art. 169, nº I). Outroexemplo: o casamento que um pai contraísse com sua própria filha, apesar de ser ato nulo(art. 207), passaria a produzir efeitos, como se válido fosse, e também não poderia maister sua nulidade decretada, depois que se consumasse o prazo prescricional geral. Ora,ninguém pode admitir conclusões tão estapafúrdias, nem mesmo invocando o texto legal.Assim, apesar do que dispõem de medo expresso os arts. 177 e 179 do Código, forçosoé concluir, desde já, no sentido da existência de, pelo menos, algumas açõesimprescritíveis: aquelas ações de nulidade mencionadas nos exemplos citados. E se seadmite que há algumas ações imprescritíveis, já fica aberta uma brecha no sistema que,aparentemente, resulta da letra dos mencionados dispositivos. Por aí, então, poderão seradmitidas outras ações igualmente imprescritíveis, pois outras existem. E quais são elas?Como identificá-las “a priori”? Qual o critério a adotar? São as perguntas que nos propomosresponder a seguir.Antes, porém, torna-se mister examinar um assunto de natureza terminológica, que deveser analisado antes de qualquer outro, para que o problema que temos em vista fique bemequacionado. E’ o que diz respeito à manifesta impropriedade da expressão “açõesimprescritíveis”, pois tal expressão não corresponde, com exatidão, ao sentido em que elaé utilizada comumente. Costuma-se usar tal expressão com o objetivo de designar aquelasações que não estão sujeitas, direta ou indiretamente, a qualquer prazo extintivo(prescricional ou decadencial). Este objetivo não corresponde, todavia, à compreensãológica e gramatical da expressão. “Imprescritível” significa “que não prescreve” ou “nãosujeito à prescrição”. Deste modo, lógica e gramaticalmente, a expressão abrange, nãosó: a) as ações não sujeitas nem a prescrição nem a decadência, como também b) asações sujeitas à decadência “indiretamente, por força da extinção do direito a elascorrespondente), pois estas últimas também são “ações que não prescrevem”. A expressãoem foco tem, por conseguinte, uma compreensão mais ampla do que o sentido em que éutilizada, pois abrange uma categoria de ações (aquelas sujeitas à decadência) que nãose tem em mente abranger quando se faz uso dela. Talvez a anomalia decorra da confusãoque muitos fazem entre os institutos da prescrição e da decadência, ou da dificuldade quehá em distingui-los. Mas, como a precisão dos conceitos é fundamental nos domínios doDireito, há necessidade de ser substituída a expressão “ações imprescritíveis” por umaoutra que corresponda com exatidão à idéia que se pretende exprimir, e concilie a realidadecom a lógica. Para esse fim não vemos outra melhor do que a expressão “ações perpétuas”que submetemos, neste momento, à apreciação dos doutos. Aliás, no Direito Romano,essa expressão designava, inicialmente, aquelas ações que não estejam sujeitas a qualquerprazo extintivo, e depois, quando todas as ações ficaram subordinadas a prazos, passoua designar aquelas ações sujeitas ao prazo mais longo (Savigny, “Sistema” tomo IV, pág.185).O problema da identificação das denominadas “ ações imprescritíveis” tem sua soluçãograndemente facilitada com fixação daquelas duas regras, já deduzidas acima, destinadasa identificar as ações sujeitas a prescrição ou a decadência. Sendo a imprescritibilidadeum conceito negativo, pode ser definido por exclusão, estabelecendo-se como regra que:são perpétuas (imprescritíveis) todas aquelas ações que não estão sujeitas nem a prescriçãonem, indiretamente, a decadência. Por aí se verifica facilmente que são perpétuas(imprescritíveis): a) todas as ações meramente declaratórias; b) algumas ações constitutivasdaquelas que não têm prazo especial de exercício fixado em lei. Quanto às ações

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condenatórias, não há, entre elas, ações perpétuas (imprescritíveis); pois todas sãoatingidas, ou por um dos prazos especiais do art. 178, ou por um dos prazos gerais do art.177.Com efeito, já vimos anteriormente que não há qualquer razão para o legislador subordinaras ações declaratórias a prazos extintivos, pois o seu uso, ou não-uso, não afeta, diretaou indiretamente, a paz social, uma vez que elas nada criam e nada modificam - apenasdeclaram a “certeza jurídica”. Já vimos, também, que há até mesmo uma impossibilidadelógica em filiar as ações declaratórias aos institutos da prescrição ou da decadência, umavez que elas não são meio de restauração de direitos lesados, nem meio de exercício dedireitos potestativos. Um fato confirma plenamente as duas observações feitas acima:entre os vários prazos estabelecidos no art. 178 do Código Civil, não há um só que serefira à ação declaratória.Quanto às ações constitutivas, a lei só fixou prazo para a propositura de algumas delas:são aquelas que se encontram enumeradas no art. 178, ao lado de várias açõescondenatórias. As demais ações constitutivas, não estando, como não estão, sujeitas aqualquer prazo extintivo, devem ser classificadas como imprescritíveis, (ou perpétuas,segundo a denominação que propusemos). Com relação aos direitos exercidos por meiodestas ações constitutivas não incluídas no art. 178, fica prevalecendo o princípio geral daperpetuidade dos direitos.Convém acentuar que não existe, com referência às ações declaratórias e às constitutivas,qualquer dispositivo fixando prazo geral de extinção para aquelas não atingidas por prazosespeciais, de vez que os arts. 177 e 179, conforme já acentuamos e será demonstradomais desenvolvidamente, só se aplicam às ações condenatórias.Já temos, assim, elementos para fixar a terceira e última regra: são perpétuas (ouimprescritíveis) todas as ações declaratórias, e também aquelas ações construtivas paraas quais a lei não fixa prazo especial de exercício.Os resultados da aplicação da regra deduzida acima coincidem com a opinião generalizadaa respeito da imprescritibilidade das ações declaratórias, da ação de divisão, de váriasações de estado, inclusive a investigatória de paternidade; da ação de demarcação, e dequase todas as ações de nulidade. Com a mesma regra ficam, pois, eliminadas aquelasdiscussões irredutíveis a respeito da prescritibilidade da ação investigatória de paternidade:ela é imprescritível porque é constitutiva e não tem prazo especial fixado em lei para o seuexercício.

XIV - Alcance dos Arts. 177 e 179 do Código CivilDepois da confusão que o Código Civil fez no art. 178, dos prazos de prescrição com os dedecadência, talvez a inexplicável existência do art. 179 seja o fator que mais haja concorridopara dificultar, entre nós, a distinção entre os dois institutos e a identificação das açõesperpétuas (imprescritíveis).Diz o mencionado art. 179 que: “Os casos de prescrição não previstos neste Código serãoregulados, quanto ao prazo, pelo art. 177.” Por sua vez, o art. 177 dispõe que: “As açõespessoais prescrevem ordinariamente em vinte anos, as reais em dez, entre presentes e,entre ausentes, em quinze, contados da data em que poderiam ter sido propostas.”Nestas condições, faz-se necessário, em primeiro lugar, fixar os limites do campo deincidência do art. 177, e não há dúvida que ele só pode se aplicar às ações condenatórias(ou “ações de prestação” ou “ações de pretensão”), pois somente elas comportam asubdivisão em ações reais e ações pessoais. Não se pode cogitar de ações reais e açõespessoais nas classes das constitutivas e das declaratórias, de vez que estas são, pordefinição, “ações sem pretensão de Direito material”. Não há ações constitutivas reais ou

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pessoais, do mesmo modo que não há declaratórias nas mesmas condições. Não épossível pleitear, por meio de ação constitutiva ou declaratória, qualquer prestação, pessoalou real. Aliás, Pontes de Miranda acentua esse aspecto do problema em uma síntesefeliz:“As categorias “ações reais, ações pessoais” pertencem ao Direito material. Compreende-se perfeitamente o que o Código Civil, no art. 177, quis exprimir quando disse que asações pessoais prescrevem ordinariamente em trinta anos, as reais em dez entre presentese, entre ausentes, em vinte, contados da data em que poderiam ter sido propostas. Osconceitos e as qualificações, aí contidos, pertencem ao Direito material. “Ação” está, emtal texto, em lugar de “pretensão” (“Comentários ao Código de Processo Civil”, 1/94, 1ªed.).Ferrara, por sua vez, depois de concluir que as ações declaratórias são imprescritíveis,observa, a respeito da incidência do dispositivo do antigo Código Civil italiano, equivalenteao art. 177 do nosso Código:“Nem pode constituir obstáculo para esta dedução lógica o art. 2.135, segundo o qualtodas as ações, quer reais, quer pessoais, prescrevem em trinta anos, pois é certo que sefaz aqui alusão às ações de prestação ...” (“A simulação dos negócios jurídicos”, págs.458 e 459 da trad. port.).Diante das considerações feitas acima, cabe a pergunta: e qual o alcance, ou campo deincidência, do art. 179 do Código?À primeira vista, parece que o art. 179 manda aplicar o art. 177 a todas as ações nãoabrangidas pelo mesmo art. 177. Assim, afigura-se, também à primeira vista, que, porforça do art. 179, o art. 177 do Código Civil seria aplicável às ações constitutivas e àsdeclaratórias. Todavia, tal conclusão, por vários motivos, não pode ser admitida.Note-se, em primeiro lugar, que o mencionado art. 179 fala em “casos de prescrição”, oque induz, desde logo, a conclusão de que somente os casos que podem ser submetidosà prescrição é que são atingidos pelo dispositivo. Ora, as ações constitutivas, exatamenteporque não são “ações de prestação”, e nem estão ligadas a um direito suscetível delesão, não podem ficar subordinadas a um prazo prescricional, pois, conforme já ficouacentuado, prescrição e lesão do direito são conceitos correlatos e inseparáveis, que secorrespondem como causa e efeito. Quando o legislador quer subordinar uma açãoconstitutiva a prazo extintivo, tal prazo só pode ser de decadência, isto é, decadência dodireito potestativo exercido por meio da ação: extinto o direito, extingue-se também, porvia de conseqüência, a ação construtiva correspondente. Quanto às ações declaratóriaselas não podem ser subordinadas nem a prazo prescricional nem a prazo decadencial,pois não são meio de restauração de direitos lesados (“direitos a uma prestação”), nem,tampouco, são meio de exercício de determinados direitos que podem ser exercitados porvia de ação (direitos potestativos). O legislador nem sequer pode cogitar de submeter asações declaratórias a prazos extintivos, pois não há como filiá-las, lógica e juridicamente,nem ao instituto da prescrição, nem ao da decadência.Por conseguinte, as ações constitutivas e as declaratórias não estão - e nem podem serincluídas pelo legislador - entre aqueles “casos de prescrição” a que alude o art. 179.Mas, se, contrariando o bom senso e a lógica jurídica, se pretendesse aplicar o art. 179 àsações constitutivas e às declaratórias, ter-se-ia também que admitir, necessariamente,uma outra conclusão que já foi repelida por absurda: a inexistência de açõesperpétuas(imprescritíveis), no Direito brasileiro, pois o art. 177, 178 e 179 passariam aabarcar todas as classes de ações (condenatórias, constitutivas e declaratórias). Ter-se-iam, então, que admitir igualmente, aquelas conseqüências extravagantes da adoção detal ponte de vista, já assinaladas antes: as ações de nulidade estariam sujeitas a prazo

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extintivos e, por conseguinte, os contratos firmados por menores de qualquer idade, oupor loucos, e os casamentos celebrados entre pais e filhas passariam a ter validade apóso decurso do prazo extintivo. Por mais este motivo, isto é, por conduzir a resultadosabsurdos, deve ser repelida a interpretação em foco.E se examinarmos o problema sob outro ângulo, verificaremos que não só jurídica, comotambém logicamente, é impossível fazer o art. 177 incidir, por força do art. 179, sobreoutras ações que não as condenatórias. Com efeito, o mencionado art. 177 estabeleceduas espécies diferentes de prazo, um para as ações pessoais, e outro para as açõesreais, variável, este último, conforme os interessados estejam presentes ou ausentes. Sese pretender aplicar o mesmo dispositivo às ações constitutivas e declaratórias, e levando-se em conta que tais ações não comportam a subdivisão em ações reais e ações pessoais,qual daqueles prazos deve ser observado? Os das ações reais ou os das ações pessoais?O código não fornece elementos para se fixar um critério de escolha, e nem seria possívelfazer-se, no caso, uma escolha arbitrária.As três situações localizadas acima conduzem, inevitavelmente, a esta conclusão: osarts. 177 e 179 não se aplicam às ações constitutivas nem às declaratórias. Segue-se daíque o art. 179 é um dispositivo completamente inerte e ineficaz - sua presença não altera,do mesmo modo que sua ausência não alteraria, o campo de incidência do Código Civil.E´ precisamente a conclusão a que chega Pontes de Miranda: o art. 179 nada mais é doque uma explicitação do art. 177, perfeitamente riscável da letra do Código Civil, porqueestá contido na generalidade conceitual do mesmo art. 177 “(Tratado de Direito Privado”,6/285).E’ certo que há um princípio de hermenêutica, segundo o qual as leis não contêm palavrasou dispositivos inúteis, mas é igualmente certo que existe um outro princípio, muito maisimportante, segundo o qual a interpretação dos textos legais não deve conduzir aconseqüências absurdas. Se há conflito, é óbvio que deve prevalecer o princípio maisimportante.

XV - ConclusõesReunindo-se as três regras deduzidas acima, tem-se um critério dotado de bases científicas,extremamente simples e de fácil aplicação, que permite, com absoluta segurança,identificar, “a priori”, as ações sujeitas a prescrição ou a decadência, e as ações perpétuas(imprescritíveis). Assim:1ª - Estão sujeitas à prescrição: todas as ações condenatórias, e somente elas (arts. 177e 178 do Código Civil);2ª - Estão sujeitas à decadência (indiretamente, isto é, em virtude da decadência dodireito a que correspondem): as ações constitutivas que têm prazo especial de exercíciofixado em lei;3ª - São perpétuas (imprescritíveis): a) as ações constitutivas que não têm prazo especialde exercício fixado em lei; e b) todas as ações declaratórias.Várias inferências imediatas podem ser extraídas daquelas três proposições. Assim: a)não há ações condenatórias perpétuas (imprescritíveis), nem sujeitas a decadência; b)não há ações constitutivas sujeitas à prescrição; e c) não há ações declaratórias sujeitasà prescrição ou à decadência.Aplicando-se aquele critério, conclui-se que são de decadência os seguintes prazosespeciais fixados no art. 178 do Código Civil: § 1º, § 2º, § 3º § 4º, nºs. I e II, § 5º, nºs. I aIV, § 6º, n°s. I, III, IV, V, XI, XII e XIII, § 7º nºs. I, VI e VII, § 8º, § 9º, nºs. I, “a” e “b”, II. “a” e“b”, III, IV, V e VI, e § 10, nº VIII. Tais prazos correspondem exatamente àqueles queCâmara Leal - utilizando-se de um critério prático, mais complexo, e de mais difícil aplicação

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- também classificou como prazo de decadência.Uma grande vantagem do critério aqui sugerido é que, tendo como um dos pontos departida, para sua dedução, a categoria dos direitos potestativos, pode, contudo, ser acolhidoe utilizado até mesmo por aqueles que não reconhecem essa categoria, desde que admitiama existência de ações constitutivas, pois as duas situações são perfeitamente conciliáveis,conforme acentua Carnelutti (“Sistema de derecho procesal civil”, 1/172).Aí fica, pois, exposto o critério que, como contribuição das mais modestas para a soluçãodo tormentoso problema, apresentamos ao exame e à crítica dos doutos.

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JULGADOS DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DA PARAÍBA

1 - Servidor Público - Reajuste (Processo nº 95.03743-2) ................................... 109Dr. José Fernandes de Andrade

2 - INSS - Revisão de Benefício I (Processo nº 95.05971-1) ............................... 114Dr. José Fernandes de Andrade

3 - SFH - Cessão de Direitos - Mutuário (Processo nº 95.12199-9) .................... 120Dr. José Fernandes de Andrade

4 - INSS - Dependência Econômica - Menor Púbere (Processo nº 95.06246-1) .. 124Dr. José Fernandes de Andrade

5 - Concessão de Serviços (Processo nº 95.03647-0) ........................................ 126Dr. José Fernandes de Andrade

6 - Desapropriação - Interesse Social (Processo nº 93.12093-0) ........................ 130Dr. José Fernandes de Andrade

7 - INSS - Revisão de Benefício II (Processo nº 96.02811-7) ............................... 137Dr. José Fernandes de Andrade

8 - Contrato - Correção Monetária (Processo nº 00.04315-0) .............................. 140Dr. João Bosco Medeiros de Sousa

9 - INSS - Revisão de Benefícios III (Processo nº 000037039) ............................ 147Dr. Rogério de Menezes Fialho Moreira

10 - Pensão - Direito da Companheira (Processo nº 96.03798-1) ......................... 156Drª. Cristina Maria C. Garcez

11 - INSS - Reajuste de Benefício (Processo nº 96.00990-2) ................................ 161Drª. Cristina Maria Costa Garcez

12 - Importação Exportação (DRAWBACK) (Processo nº 96.00273-8) ................. 165Dr. José Fernandes de Andrade

13 - Importação - Carros Usados (Processo nº 93.01963-5) ................................. 169Dr. José Fernandes de Andrade

14 - Ensino Superior - Convênio - Violação (Processo nº 96.04174-1) .................. 174Dr. José Fernandes de Andrade

15 - Segurança do Trabalho (Processo nº 96.08246-2) ......................................... 177Dr. José Fernandes de Andrade

16 - Meio Ambiente - Obra Pública (Processo nº 96.03625-0) .............................. 180Dr. José Fernandes de Andrade

17 - INSS - Proventos - Irredutibilidade (Processo nº 96.02794-3) ......................... 185Dr. José Fernandes de Andrade

Seção II

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18 - Majoração de Alíquota - Medida Provisória (Processo nº 96.06833-0) ............ 189Dr. José Fernandes de Andrade

19 - PSS - Contribuição Social - Inativos (Processo nº 96.06191-2) ..................... 195Dr. José Fernandes de Andrade

20 - Aposentadoria - Tempo de Serviço (Processo nº 94.08819-1) ........................ 202Dr. Janilson Bezerra de Siqueira

21 - Tempo de Serviço - Reconhecimento (Processo nº 96.03857-0) .................... 207Dr. João Bosco Medeiros de Sousa

22 - Concurso Público - Deficiente Físico (Processo nº 000006412) ..................... 210Drª. Cristina Maria Costa Garcez

23 - Medicamentos - Importações - Registro (Processo nº 95.11476-3) ................ 213Drª. Cristina Maria Costa Garcez

24 - Professor Universitário - Remoção (Processo nº 96.06406-7) ........................ 216Drª. Cristina Maria Costa Garcez

25 - Indisponibilidade de Bens (Processo nº 95.08498-8) ..................................... 219Dr. José Fernandes de Andrade

26 - Embargos à Execução - Alegação de Nulidade de Título(Processo nº 95.10597-7) .............................................................................. 221Drª. Cristina Maria Costa Garcez

27 - Reparação de Danos (Processo nº 96.04529-1) ............................................ 223Dr. João Bosco Medeiros de Sousa

28 - Construção de Barracas - Área Litorânea (Processo nº 00.01805-8) ............. 230Dr. João Bosco Medeiros de Sousa

29 - Preservação Ambiental – Gabiões - Erosão Marinha(Processo nº 96.04138-) ................................................................................ 237Dr. José Fernandes de Andrade

30 - Reserva Ecológica - Furto Madeira (Processo nº 00.00035-3) ....................... 245Dr. José Fernandes de Andrade

31 - Importação de Mercadoria Estrangeira - Ausência Documentação Fiscal(Processo nº 94.05619-2) .............................................................................. 251Dr. José Fernandes de Andrade

32 - Circulação Moeda Falsa (Processo nº 96.03177-0) ....................................... 253Dr. José Fernandes de Andrade

33 - Difamação - Lei Imprensa (Processo nº 96.06292-7) ..................................... 260Dr. José Fernandes de Andrade

34 - Estelionato (Processo nº 91.02176-8) ........................................................... 262Dr. João Bosco Medeiros de Sousa

35 - Concurso Material de Crimes (Processo nº 0000215) .................................... 274Dr. Janilson Bezerra de Siqueira

36 - Calúnia - Lei de Imprensa (Processo nº 000098) ........................................... 287Drª. Cristina Maria Costa Garcez

37 - Furto - Concurso de Agentes (Processo nº 000096) ...................................... 290Drª. Cristina Maria Costa Garcez

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106 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

38 - Falso Testemunho (Processo nº 93.12016-6) ................................................ 295Drª. Cristina Maria Costa Garcez

39 - Falsificação de Documentos (Processo nº 93.04768-0) ................................. 299Drª. Cristina Maria Costa Garcez

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SERVIDOR PÚBLICO - REAJUSTE

Processo nº 95.03743-2 / AÇÃO ORDINÁRIARequerente: JOSÉ LEITÃO SOBRINHO e OUTRORequerido : UNIÃO

SENTENÇA

EMENTA: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL.REAJUSTE SALARIAL. PLANOS ECONÔMICOS. VERBAS ADVINDASDE CONTRATO LABORAL. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA RATIONEMATERIAE. ANUÊNIOS. PRELIMINARES DESACOLHIDAS.PROCEDÊNCIA PARCIAL DOS PEDIDOS.

I - Incompetência ratione materiae - sendo algumas das verbas pleiteadasadvindas de contrato laboral, quanto a estas, este Juízo é absolutamenteincompetente para apreciá-las, enviando a sua análise ao Juízocompetente.

II - A Lei nº 8.627/93 ao estabelecer reajuste médio de 28,86% nosvencimentos dos militares, não afrontou o art. 37, X, da ConstituiçãoFederal, posto que cuida apenas de corrigir defasagem nos soldos dosmilitares, parte básica de sua remuneração, não versando “revisão geralde remuneração dos servidores públicos”.

III - Não há como conceder o anuênio a servidores federais regidos pelovínculo estatutário e negar o mesmo direito aos servidores anteriormenteregidos sob o regime celetista.

IV - PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO

Vistos etc.

JOSÉ LEITÃO SOBRINHO e GEOVANI NOGUEIRA DE SOUZA,qualificados nos autos, propuseram a presente ação ordinária contra a UNIÃO objetivandoreceberem os seguintes percentuais: a) 16,19%, relativo a URP dos meses de abril e maio de1988, devendo a diferença apurada ser paga ao promovente com juros e correção monetária;b) 26,05% relativa ao mês de fevereiro de 1989 e incorporação a partir de fevereiro de 1989; c)28,86% (Lei 8.622 de janeiro de 1993), d) Anuênios, a partir de sua admissão no serviçopúblico federal, com efeito financeiro a partir de janeiro de 1991, acrescidos de juros e correçãomonetária, e suas diferenças e seus reflexos nos salários vencidos e vincendos.

Citada, a UNIÃO alegou preliminarmente a Prescrição do art. 7º, XXIX,“a”, CF/88, com relação ao índice de 26,05%. No mérito aduz que não houve a ocorrência dosfatos idôneos à configuração do direito adquirido aos reajustes salariais, e conseqüentemente,insubsistindo amparo legal, não há como a Administração conceder os reajustes pleiteadoscom base apenas em índices que foram extintos antes mesmo de suas vigências e eficácia,

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pois o que havia era apenas mera expectativa de direito.

Concedida oportunidade para impugnação, propugnaram os autores àsfls. 32/33, nos termos da exordial.

O instituto do julgamento antecipado da lide é cabível, uma vez que nãohá necessidade de produzir outras provas além das já constantes dos autos.

É o relatório. Decido.

PRELIMINAR

Prescrição

A promovida suscitou ainda a prescrição qüinqüenal do art. 7, XXIX, “a” daConstituição Federal, com relação ao índice de 26,05% (URP do mês de fevereiro de 1989);pois, entende que são decorridos mais de cinco anos entre a data do diploma legal que oinstituiu e a data da propositura da ação.

Realmente, são passados mais de cinco anos considerando-se o fatoacima mencionado. No entanto, convém observar que os reajustes pleiteados têm naturezaalimentar, portanto de caráter sucessivo. Daí porque o que se encontra prescrito são asprestações anteriores ao qüinqüênio legal e não o fundo do direito pleiteado.

Só por ocasião da prolação da presente sentença, foi constatado que asverbas pleiteadas pelos autores, referentes ao pagamento no percentual de 16,19% inerenteàs URP’s de abril e maio de 1988, e ao pagamento no percentual de 26,05% inerente à URPde fevereiro de 1989, remontam à época em que mantinham com a promovida vínculo celetistas,constituindo, desta forma, verbas advindas de contrato laboral, sendo este Juízo absolutamenteincompetente para apreciá-las.

Tal entendimento encontra-se consagrado na jurisprudência pátria. A títulode exemplo, transcrevo decisão do Superior Tribunal de Justiça.

EMENTA: CC - CONSTITUCIONAL - REGIME ÚNICO - LEI Nº 8.112/90 -CAUSA DE PEDIR.

A Lei nº 8.112/90 modificou o vínculo do trabalho para relação estatutária.A determinação da competência resulta da causa de pedir, ainda que aação seja proposta após a vigência desse diploma legal. Assim, se opedido encerra direito decorrente do contrato laboral, a competência seráda Justiça do Trabalho. Da Justiça Federal, porém, se a demanda envolverfato acontecido a partir do status de funcionário público. (Conflito deCompetência nº 5.022-7 / Relator: Min. VICENTE CERNICCHIARO -publicado no DJ nº 231, de 06.12.93, pág. 26.634).

Trago à colação, ainda, sobre a matéria, o verbete nº 97 da Súmula doSuperior Tribunal de Justiça, in verbis:

“Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar reclamação de servidorpúblico relativamente a vantagens trabalhistas anteriores à instituição doRegime Jurídico Único.”

Conseqüentemente, sendo a pretensão deduzida em Juízo de relação

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110 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

trabalhista, impõem-se sejam processadas e julgadas pela Justiça Especializada.

Estando, também, embutido no pedido exordial parcelas salariais referentesàs vantagens posteriores ao advento da implantação do Regime Jurídico Único - Reajuste de28,86% e Anuênios - passo então a decidir sobre seu mérito.

REAJUSTE DE 28,86%

A tabela de soldos dos militares, constante do Anexo V, da Lei 8.627/1993, não caracterizou reajuste diferenciado na ordem de 28,86% para estes, considerandoque referido percentual não foi concedido em igualdade para todos os militares. Alguns tiveramseus soldos aumentados em índice superior e outros, em índice inferior. O que ocorreu foiuma reestruturação remuneratória sobre seus soldos, autorizada pelo art. 39, da CF, diantedo que, não se pode falar em ofensa ao princípio da isonomia insculpido na ConstituiçãoFederal. O inciso X, do art. 37 da CF, não proíbe revisão parcial destinada a reestruturardeterminada espécie de servidores.

Sobre a matéria versada nos autos, decidiu o T.R.F da 5ª Região:

“ADMINISTRATIVO. SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS. REAJUSTE DE28,86%. LEI Nº 8.627/93. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

1. A Lei nº 8.627/93, aprovada em conseqüência do determinado no art.4º, da Lei nº 8.622/93, especificou os critérios para reposicionamento deservidores PÚBLICOS federais civis e militares, não indo de encontro aoestatuído no art. 37, X, da Constituição Federal.

2. A análise da mencionada Lei revela que tanto os servidores civis foramreposicionados em suas vantagens financeiras, recebendo aumentosalarial quanto o foram os servidores militares.

3. A extensão dos percentuais financeiros decorrentes doreposicionamento que beneficiaram os servidores do Poder Executivo eos militares, dos servidores do Poder Judiciário, do Legislativo e doMinistério Público Federal ocorreu porque a Lei nº 8.627/93 não oscontemplou com tais vantagens.

4. Não têm, assim, os servidores do Poder Executivo direito ao acréscimoaos seus vencimentos do percentual de 28,86%, média dos aumentos deseus vencimentos que já receberam por causa do reposicionamento daLei 8.627/93.

5. A concessão de tal percentual seria duplicar, sem qualquer autorizaçãolegal, a vantagem financeira nascida com o reposicionamento das classese dos padrões dos servidores civis e da adequação dos postos, graduaçõese soldos dos servidores militares.

6. Precedente do STJ: MS n 3.074-4 (DJU de 21.02.94, pág. 2090).

7. Apelação improvida”.

A disciplina jurídica da remuneração devida aos agentes públicos emgeral está sujeita ao princípio da reserva legal absoluta, razão pela qual impede o Judiciáriode ampliar-lhe o conteúdo normativo e a estender sua eficácia jurídica a situações subjetivasnão previstas em lei ainda que a pretexto de tornar efetiva a cláusula isonômica descrita naConstituição.

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ANUÊNIOS

Com relação à concessão do adicional por tempo de serviço observa-se oregulado pelo art. 67 da Lei nº 8.112/90, que discorre:

“art. 67 - O adicional por tempo de serviço é devido à razão de 1% (um porcento) por ano de serviço público efetivo, incidente sobre o vencimento deque trata o art. 40.

Parágrafo único - O servidor fará jus ao adicional a partir do mês em quecompletar o anuênio”.

Pela exegese do artigo acima referenciado, não há qualquer óbice aocômputo do tempo de serviço público federal prestado sob o vínculo celetista para fins deanuênio.

O direito de igualdade é princípio insculpido na Carta Magna, inclusive noque tange ao princípio da isonomia. Não há como conceder o anuênio a servidores federaisestatutários e negar o mesmo direito aos servidores anteriormente regido pelo regime celetista.

Como apoio dinâmico, vale citar acórdão do Tribunal Regional Federal da5ª Região, da lavra do ilustríssimo Juiz JOSÉ DELGADO, que dispõe:

“EMENTA: ADMINISTRATIVO. REGIME JURÍDICO ÚNICO. ANUÊNIOS.TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO PELOS CELETISTAS.

1. Afronta ao princípio insculpido na carta Magna de exigir a implantaçãodo Regime Jurídico ÚNICO pela Administração Pública, no seurelacionamento com os servidores públicos, o estabelecimento de regrasjurídicas restritivas de direito para aqueles oriundos de vínculos celetistas,diferenciando-os dos que vieram do sistema estatutário.

2. A contagem de tempo de serviço público federal, independentementede ter sido prestado por celetistas ou estatutários, deve ser contado parafins de anuênio.

3. Não é concebível, sob pena de ferimento ao direito de igualdade, seconceder anuênio com base em tempo de serviço federal prestado sobregime federal estatutário e se negar esse mesmo direito a quem prestouserviço público federal subordinado aos ditames da CLT.

4. Apelação improvida”.

(AC - 525.338-5/93 - RN / TRF DA 5ª REGIÃO - Rel. Juiz JOSÉ DELGADO- decisão unânime - DJ. 27/09/93)

Com supedâneo nas lições fáticas, legais e jurisprudenciais acimaexpendidas, entendo que têm direito os requerentes a contagem do tempo de serviço prestadosob o vínculo celetista.

Diante do Exposto, com referência ao pedido de ANUÊNIOS, julgo-oprocedente, para condenar à UNIÃO a contar para fins de anuênio o tempo de serviço públicofederal prestado pelos requerentes sob o vínculo celetista e ao pagamento das prestaçõesvencidas, a partir de 01/01/91, e vincendas relativas a essa vantagem, a contar da data devigência dos efeitos financeiros da Lei nº 8.112/90, até 30 de junho de 1994, aplicando-se daípor diante a atualização monetária pela variação da UFIR, conforme as disposições legais.

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112 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

Com relação ao pedido referente ao pagamento no percentual de 28,86%das Leis nºs. 8.622/93 e 8.627/93, requerendo a isonomia salarial aos militares, julgo-oimprocedente, face à vedação da disposição legal e da jurisprudência aludida.

No que tange aos pedidos dos autores relativos ao percentual de 16,19%inerentes as URP’s de abril e maio de 1988 e ao percentual de 26,05% inerentes a URP defevereiro de 1989, com fulcro no art. 113 do CPC, declaro, de ofício, a incompetência absolutadeste Juízo, por serem as verbas por estes pleiteadas decorrentes de contrato laboral, sendocompetente a JUSTIÇA DO TRABALHO.

Finalmente, condeno as partes ao pagamento pro rata de custas ehonorários advocatícios, estes no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor dacondenação, a ser apurado na liquidação.

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição.

Extraiam-se cópias de todo este processo, às custas dos autores cujopedido não foi apreciado por este Juízo, remetendo-as ao Juízo competente da JustiçaEspecializada do Trabalho.

P.R.I

João Pessoa, 19 de junho de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADE

Juiz Federal da 3ª Vara

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INSS - REVISÃO DE BENEFÍCIO I

Processo nº 95.05971-1 / AÇÃO ORDINÁRIAAutora: MARIA JOSÉ DE BARROS RIBEIRORéu: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

SENTENÇA

EMENTA: CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. RENDA MENSALINICIAL. REAJUSTE. REVISÃO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

A renda mensal inicial da aposentadoria da autora foi calculada de acordocom as disposições contidas na Lei nº 8.213/91.

A Súmula 260, do extinto TRF, e o art. 58 do ADCT, não são aplicáveisaos benefícios concedidos em 1993.

IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

Vistos etc...

Cuida-se de ação de rito ordinário ajuizada por MARIA JOSÉ DE BARROSRIBEIRO, qualificada às fls. 02, contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -INSS, objetivando a revisão dos cálculos iniciais de seu benefício, bem assim, dos reajustessubseqüentes, a fim de que sejam aplicadas as disposições da Súmula 260, do ex-TFR.

Aduz a autora, em síntese, que é detentora de uma aposentadoria poridade desde 12.07.93, tendo o réu calculado a renda mensal inicial (RMI) do referido benefícioobservando o disposto no Decreto 89.312/84 e não, no art. 202, da CF, e na Lei 8.213/91, queasseguram a atualização monetária de todas as trinta e seis contribuições.

Prosseguindo, afirma que o promovido aplicou o critério daproporcionalidade no primeiro reajustamento do benefício da promovente, ocorrido em setembro/93, procedimento esse adotado também nos reajustes subseqüentes, o que provocoudefasagem naqueles proventos, em relação à paridade inicial.

Requer, a final, que seja decretada a revisão do cálculo da concessãoinicial do benefício, a fim de que os salários-de-contribuição sejam atualizados monetariamente,mês a mês, levando em conta o INPC apurado pelo IBGE; que seja decretada a revisão doprimeiro reajuste do benefício, determinando a aplicação do índice integral da política salarial,de acordo com a Súmula 260, do ex-TFR, a fim de manter a paridade inicial da data daconcessão do benefício, e que seja o INSS condenado a pagar as parcelas vencidas evincendas, acrescidas de juros de mora, a partir da lesão do direito, e correção monetária,mês a mês, de acordo com a Lei 6.899/81, com inclusão dos expurgos inflacionários.

Juntou procuração e documentos às fls. 12/29.

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114 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

Citado, o INSS apresentou contestação pugnando pela improcedência dopedido, haja vista o benefício da promovente ter sido concedido e reajustado de acordo comas disposições da Lei 8.213/91 e legislação posterior.

Em impugnação, a autora reiterou o pedido inicial, afirmando que o INSSnão aplicou, na atualização dos salários-de-contribuição da promovente, a correção plena(expurgos) do INPC.

Intimadas as partes para especificarem as provas que pretendiam produzir,apenas a suplicante se manifestou, solicitando que fosse requerido ao INSS, cópia doprocedimento concessório da aposentadoria em questão, o que foi atendido, estando a referidadocumentação encartada às fls. 57/77.

Dada vista à autora dos mencionados documentos, essa mais uma vezrequereu a procedência do pedido.

Assim relatados, decido.

Revisão da renda mensal inicial

Almeja a autora a revisão da renda mensal inicial (RMI) de suaaposentadoria, visto que o Instituto promovido não teria atualizado monetariamente todos ossalários-de-contribuição da suplicante, conforme determina a Constituição Federal, em seusart. 201, §§ 3º e 4º, e 202, in verbis:

“Art. 201................................................................ § 3º. Todos ossalários-de-contribuição considerados no cálculo de benefício serãocorrigidos monetariamente.

§ 4º. Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serãoincorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária econseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei.

...............................................................................

Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-seo benefício sobre a média dos trinta e seis últimos salários de contribuição,corrigidos monetariamente mês a mês, e comprovada a regularidade dosreajustes dos salários de contribuição de modo a preservar seus valoresreais e obedecidas às seguintes condições:

..............................................................................”

A fim de disciplinar a aplicação dos dispositivos acima reproduzidos, aLei nº 8.213/91, que instituiu o novo Plano de Benefícios da Previdência Social estabeleceuque:

“Art. 31. Todos os salários-de-contribuição computados no cálculo dovalor do benefício serão ajustados, mês a mês, de acordo com a variaçãointegral do Índice Nacional de Preços ao Consumidor - INPC, calculadopela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE,referente ao período decorrido a partir da data de competência do salário-de-contribuição até a do início do benefício, de modo a preservar os seusvalores reais”.

Analisando o demonstrativo de cálculo da RMI da aposentadoria da autora(fls. 76), pode-se constatar que todos os salários-de-contribuição utilizados naquele cálculo

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foram corrigidos monetariamente, de acordo com a variação acumulada do INPC/IRSM, comomandam a Carta Política e o Plano de Benefícios da Previdência Social instituído pela Lei8.213/91.

Ressalte-se que a própria promovente, na inicial, apresenta uma planilhaem que informa qual deveria ser a RMI de seus proventos, caso o INSS tivesse calculadocorretamente aquela aposentadoria (fls. 20). De acordo com a referida planilha, a RMI dobenefício da promovente deveria ser CR$ 20.676.167,57 (Vinte milhões, seiscentos e setentae seis mil, cento e sessenta e sete cruzeiros reais e cinquenta e sete centavos).

Ocorre que os cálculos elaborados pelo INSS resultaram em valor superiorao pretendido pela autora, pois como se vê da carta de concessão de fls. 15, a RMI obtidapelo órgão previdenciário foi CR$ 20.844.557,80 (Vinte milhões, oitocentos e quarenta e quatromil, quinhentos e cinquenta e sete cruzeiros reais e oitenta centavos), razão pela qual, inexistequalquer revisão a ser feita nos proventos iniciais da autora.

Quanto à aplicação dos índices expurgados na correção dos salários-de-contribuição, o índice eleito pelo legislador para ser utilizado na referida atualização foi oINPC, posteriormente substituído pelo IRSM, não havendo como determinar a aplicação decritério diverso do estabelecido na legislação de regência, sob pena de comprometer o equilíbrofinanceiro da Previdência Social. Esse entendimento guarda harmonia com a decisão proferidapelo TRF da 4ª Região, abaixo reproduzida:

“EMENTA: PREVIDÊNCIA SOCIAL. HOMOLOGAÇÃO DE CÁLCULO DELIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. CORREÇÃO MONETÁRIA. ÍNDICESEXPURGADOS.

Não é exigível a atualização de débito judicial com índices expurgadosnão aplicados às contribuições previdenciárias.

A Previdência Social no país está estruturada sob o regime de caixa. Ainclusão dos percentuais expurgados se ressenteria da prévia arrecadação.

Criar benefícios em favor dos segurados sem a correspondente fonte decusteio total seria inviabilizar a Previdência.

Apelação parcialmente provida”.

(AC 93.04.13872-8/RS. Rel: Juíza Sílvia Goraieb. Julgado em 15.08.95,por maioria. Publicado no DJU nº 22, de 31.01.96, S. 2, pág. 3931).

Revisão dos reajustes

Pretende também a autora que seja determinada a revisão do primeiroreajuste de seu benefício, o qual foi concedido em 12.07.93, a fim de que seja aplicado oíndice integral da política salarial do governo, de acordo com a Súmula 260 do ex-TFR, paraque seja mantida a paridade inicial da data da concessão daquele benefício.

A Súmula 260 do extinto TFR, serviu de oriente às decisões acerca doreajuste dos benefícios previdenciários ocorridos até março/89, cristalizando em seu enunciadoa rejeição à aplicação na primeira majoração, de índice proporcional ao tempo que mediavaentre a data de início do benefício e a de concessão do reajuste, determinando que fossemaplicados os índices integrais da política salarial, o que não significava índices de aumento dosalário mínimo. O reajuste dos benefícios previdenciários pelo mesmo índice de aumento dosalário mínimo, de forma a manter a equivalência inicial, constitui direito assegurado somenteno período compreendido entre abril/89 e a implantação dos novos Planos de Benefícios da

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Previdência Social, conforme determinação contida no art. 58 do ADCT.

Esse entendimento encontra-se em harmonia com o verbete 21 da Súmulado TRF da 1ª Região, in verbis:

“O critério de revisão previsto na Súmula 260 do Tribunal Federal deRecursos, diverso do estabelecido no art. 58 do Ato das DisposiçõesConstitucionais Transitórias, da Constituição Federal de 1988, e aplicávelsomente aos benefícios previdenciários concedidos até 04.10.88, perdeueficácia em 05.04.89”.

A aplicação de índice proporcional ao tempo de inatividade por ocasiãodo primeiro reajuste, isso com relação aos benefícios concedidos na vigência da Lei n. 8.213/91, não ocasiona perda do poder aquisitivo dos proventos, visto que esses são corrigidos poríndice que reflete integralmente a variação dos preços, apurada a contar da data da concessãode cada benefício, de modo a assegurar o seu valor real.

Quanto aos índices de preços anteriores à concessão do benefício, serãoutilizados na atualização dos salários-de-contribuição do segurado, que como já fizemosmenção anteriormente, serão corrigidos até a data de início do benefício.

Sobre o tema, julgo oportuno transcrever a decisão proferida pelo TRF da4ª Região na Apelação Cível 94.04.5434-8/RS, cujo acórdão encontra-se assim ementado:

“EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. CRITÉRIOS.

1. O Artigo 41, II, da Lei n. 8.213, de 1991, prevê reajustamento dosbenefícios ‘de acordo com suas respectivas datas de início’, com base navariação integral do INPC e, após a Lei n. 8.542, de 1992, pela variaçãoacumulada do IRSM (art. 9º).

Não há, no critério, ofensa ao princípio da isonomia em relação aosbenefícios concedidos em data anterior, cujo primeiro reajuste é porpercentual mais elevado. É que o artigo 31 da Lei n. 8.213, de 1991, prevêa atualização dos salários-de-contribuição pelo mesmo critério (INPC/IRSM) ‘...até a data de início do benefício’. Assim, se é certo que o primeiroreajuste de determinado benefício é por percentual inferior ao de outrosconcedidos em mês anterior, não é menos certo que seu valor inicial éproporcionalmente mais elevado que o daqueles, porque calculadomediante correção, por percentual maior, dos salários-de-contribuição.

2. Apelo provido”.

(Rel: Juiz Teori Albino Zavascki. Julgado em 25.10.94, à unanimidade.Publicado no D.J.U. nº 08, de 11.01.95, p. 422).

A constitucionalidade da aplicação de índice proporcional à data deinativação, no primeiro reajustamento de benefício concedido após a implantação dos novosPlanos de Custeio e de Benefícios da Previdência Social, foi reconhecida também pelo SuperiorTribunal de Justiça em sede de Recurso Especial, relatado pelo eminente Ministro JoséDantas, nos seguintes termos:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO. REAJUSTE.

Proporcionalidade. Sua aplicação no primeiro reajuste, como decorrênciado § 1º do art. 9º da Lei 8.542/92.

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(Resp 85.015/RS. Julgado em 10.06.96, à unanimidade. Publicado noDJU 125, de 01.07.96, S. 1, pág. 24066).

Julgo oportuno ressaltar que a preservação do valor real dos benefícios,determinada pelo art. 201, § 2º, da CF, não implica na manutenção permanente da equivalênciainicial, critério de reajustamento a ser observado apenas no período compreendido entre abril/89 e dezembro/91, constituindo apenas uma garantia de que as prestações previdenciáriasnão serão corroídas pela inflação, assegurando-se aos beneficiários da Previdência Social orepasse da variação de preços para seus rendimentos, segundo os índices definidos pelolegislador ordinário.

Sabe-se que a economia brasileira apresenta uma infinidade de índicesque refletem a variação de preços. Tendo em vista que cada um dos institutos encarregadosde levantar essa variação utiliza metodologia diferente dos demais, há sempre divergênciaentre os percentuais encontrados, haja vista o número e a diversidade dos produtos pesquisados.Tanto é assim que até índices apurados pela mesma instituição, como por exemplo, o INPCe o IPC, divulgados pela Fundação IBGE, sempre apresentaram valores divergentes em relaçãoao mesmo período. A título de ilustração, cite-se o ocorrido no mês de janeiro/89, em que oINPC foi 35,48%, e o IPC, 70,28%.

Ante a diversidade de indexadores disponíveis, e à luz do art. 201, § 2º,da CF, escolheu o legislador ordinário, como fator de reajustamento dos benefícios, a partir dejaneiro/92, o INPC (art. 41, II, da Lei 8.213/91), substituindo-o posteriormente pelo IRSM deque trata a Lei 8.542/92, alterado pela Lei nº 8.880/94 e Medidas Provisórias nºs. 1.415/96,1.463/96 e 1.463-2/96, índices esses que, tendo em vista os critérios empregados na suaapuração, podem não variar na mesma proporção do aumento do salário mínimo, mas quenão devem por isso ser desprezados, sob o argumento de que não recompõem o valor realdos benefícios, expresso na quantidade de salários mínimos que representava a renda mensalna data da concessão.

Saliente-se, por oportuno, que por força do art. 7º, IV, da ConstituiçãoFederal, é vedada a vinculação do salário mínimo para qualquer fim, aí incluída, evidentemente,a sua utilização como parâmetro para o reajustamento dos benefícios previdenciários, que éo que realmente almeja a promovente. Sobre a matéria, destaco o entendimento dos TRFs da4ª Região e 5ª Regiões, cujos acórdãos encontram-se assim ementados:

“EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIOS. CRITÉRIOS.

l. O reajuste dos valores dos benefícios previdenciários obedecem àvariação integral do INPC (Lei nº 8.213, de 1991, art. 41, II), índice eleitopelo legislador com base no art. 201, § 2º, da CF, que veda a utilização dosalário mínimo como indexador (art. 7º, IV).

2. Apelo provido.”

(AC nº 93.04.44689-9/RS - TRF 4ª Região. Julgado em 27.09.94, àunanimidade. Publicado no D.J.U. nº 08, de ll.0l.95, pág. 36l).

“EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO.EQUIPARAÇÃO AO NÚMERO DE SALÁRIOS MÍNIMOS À ÉPOCA DACONCESSÃO.

1. A equivalência entre os reajustes do salário mínimo e dos benefíciosprevidenciários vigorou de abril de 1989 até a efetiva implantação da Lei nº8.213/91, em janeiro de 1992, nos termos do art. 58 do ADCT.

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2. Após janeiro de 1992 ficou vedada a equiparação com o salário mínimo,inexistindo direito adquirido ou redução salarial.

3. Atualização pela variação do INPC (art. 41, II, da Lei nº 8.213/91), comsubstituição posterior pela variação do IRSM, a partir de janeiro de 1993(Lei nº 8.542/92). Reajuste anual em maio de cada ano, a contar de 1995,aplicando-se o IPCr acumulado nos doze meses imediatamente anteriores(Lei nº 8.880/94).

4. Apelação improvida. Vencido o MM. Juiz Relator.”

(AC nº 85.437-CE - TRF 5ª Região. Rel: Juiz Ubaldo Ataíde Cavalcante(convocado). Julgado em 13.03.96, por maioria. Publicado no DJU nº 100,de 24.05.96, S. 2, pág. 34.426).

Por todo o exposto, julgo improcedentes os pedidos, condenando a autoraao pagamento de honorários advocatícios, que arbitro em 05% (cinco por cento) do valoratribuído à causa.

Custas na forma do art. 14, da Lei 9.289/96.

P. R. I.

João Pessoa, 19 de setembro de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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SFH - CESSÃO DE DIREITOS - MUTUÁRIO

Processo nº 95.12199-9 / AÇÃO COMINATÓRIAAutora: MARINEIDE SOLANGE FERREIRA RODRIGUESRéu: VALMIR JÚNIOR SILVA E CEF

SENTENÇA

E M E N T A: SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. CESSÃO DEDIREITOS PELO MUTUÁRIO. IMPOSSIBILIDADE.

A cessão de mútuo hipotecário só é possível mediante consentimentoprévio e expresso do mutuante, por disposição de cláusula contratual queinclusive deve ser demonstrado através de documentos.

IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

Vistos etc.

MARINEIDE SOLANGE FERREIRA RODRIGUES, qualificada nos autos,propôs a presente ação cominatória contra VALMIR JÚNIOR SILVA e a CAIXA ECONÔMICAFEDERAL - FILIAL NO ESTADO DA PARAÍBA, expondo em síntese que em 29 de maio de1991, realizou um contrato de compra e venda, mútuo com obrigações e quitação parcial coma Caixa Econômica Federal, agência deste Estado, adquirindo o imóvel residencial nº 182,localizado na rua Projetada VL 07.

Em 19 de maio de 1992, transferiu o imóvel financiado a Maria da ConceiçãoMartins, que por sua vez tornou a passá-lo a Silvano Francisco da Silva, que culminourepassando-o para Valmir Júnior Silva, ora detentor do imóvel acima mencionado.

Alega que pretende adquirir outro imóvel financiado, no entanto encontraóbice no fato de que o seu nome consta como mutuária perante a CEF, e nenhum dosrepasses efetivados com terceiros foram efetuados perante aquela Instituição.

Requer, finalmente, que os promovidos sejam instados a transferirem oimóvel para o seu nome junto à Caixa Econômica Federal, sob pena de não o fazendo pagarmulta diária de um salário mínimo, até o cumprimento da obrigação.

Juntou aos autos procuração e cópias de documentos (fls. 05/17).

Citada, a CEF apresentou sua contestação argüindo preliminarmente acarência de ação por falta de impossibilidade jurídica uma vez que o réu não integrou ocontrato de mútuo habitacional firmado pela Autora com a promovida, aduzindo ainda que ocontrato faz lei entre as partes e a CF no seu art. 5º assegura a todos indistintamente que“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei”razões pelas quais requer o julgamento sem exame do mérito, nos termos do inciso VI do

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artigo 267, do CPC.

No mérito, argumenta que não existe amparo legal a pretensão da Autorae o pedido deve ser julgado improcedente.

Valmir Júnior Silva foi citado e contestou a lide, afirmando que adquiriu oimóvel, conforme deduziu a Autora na inicial, mas que não fez a transferência perante a CEF,uma vez que o seu salário e o da sua esposa, não corresponde a renda mínima exigida pelapromovida.

Juntou aos autos procuração e documentos (fls. 35/44).

Trata-se de matéria unicamente de direito, cabível o julgamento antecipadoda lide (art. 330 - I do CPC).

É o relatório. Decido.

PRELIMINAR

A promovida - CEF, requereu que a Autora fosse julgada carecedora aodireito de ação pela impossibilidade jurídica do pedido, sob o argumento de que Valmir JúniorSilva não haver integrado o contrato de mútuo firmado entre a promovida e a Autora, bemassim por expressa vedação legal quanto a realização de transferência de imóvel sem aanuência da CEF.

A preliminar levantada pela CEF, confunde-se com o próprio mérito, peloque deixo para apreciá-la com o seu julgamento.

MÉRITO

Pretende a Autora que seja efetivada pela CEF a transferência do contratode compra e venda, mútuo com obrigações e quitação parcial, do imóvel residencial, paraValmir Júnior Silva, terceiro adquirente da chave do imóvel acima mencionado.

Sobre a transferência de contratos no âmbito do Sistema Financeiro daHabitação, dispõe os artigos 1º, 2º e 3º da Lei 8.004, de 14.03.1990, que trata da matériarelacionada ao Sistema Financeiro de Habitação:

“Art. 1º - O mutuário do Sistema Financeiro de Habitação - SFH podetransferir a terceiros os direitos e obrigações decorrentes do respectivocontrato, observado o disposto nesta Lei.

Parágrafo único - A formulação de venda, promessa de venda, cessão oupromessa de cessão relativa a imóvel gravado em favor de instituiçõesfinanciadoras do SFH dar-se-á em ato concomitante à transferência dofinanciamento respectivo, com a interveniência obrigatória da instituiçãofinanciadora, mediante a assunção, pelo novo mutuário, do saldo devedorcontábil de operação, observados os requisitos legais e regulamentadorespara o financiamento da casa própria, vigentes no momento datransferência, ressalvadas as situações especiais previstas nos artigos2º e 3º desta Lei.

Art. 2º - A transferência dar-se-á mediante simples substituição do devedor,mantidas para o novo mutuário das mesmas condições e encargos do

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contrato original, desde que se trate de financiamento destinado à casaprópria, cujo valor original não ultrapasse os seguintes limites:

Art. 3º - Nos financiamentos contratados até 28 de fevereiro de 1986, nãoenquadrados nas condições fixadas no artigo anterior, a transferênciaserá efetivada mediante a assunção, pelo novo muturário, da metade dosaldo devedor contábil da operação, atualização ‘pro rata die’ da data doúltimo reajuste até a da data da transferência.

§ 1º - A transferência, nos casos deste artigo, se efetivará mediante acontratação de nova operação, que deverá observar as normas em vigorrelativas aos financiamentos do SFH”.

Conforme se depreende do texto acima transcrito verifica-se que atransferência de contrato pode ser realizada entre o mutuário e terceiro interessado, desdeque com a anuência da CEF.

Tal não ocorreu no caso sub judice. A Autora repassou a chave do imóvel,para Maria da Conceição Martins, que por sua vez transferiu-a para Silvano Francisco daSilva, que concluiu passando-o para o réu Valmir Júnior Silva. Todos os atos negociais forampraticados sem a intervenção da Institutição Financiadora.

A Autora realizou transação contra legem, agindo temerariamente, poisnem ao menos procurou acautelar-se das medidas necessárias para desvincular-se da obrigaçãoassumida perante a CEF.

A cessão de direitos pelo mutuário, com transferência de imóvel, só temeficácia com a anuência do credor hipotecário, especialmente em virtude das característicasque norteiam o Sistema Financeiro de Habitação, que procura resguardar-se o desvirtuamentoda aquisição, para fins especulativos, de várias unidades habitacionais por uma única pessoa,em contraposição ao seu caráter eminentemente social.

O entendimento, acima esposado, guarda harmonia com a decisãoproferida em sede de Recurso Especial nº 34.495-9-RS, em que foi Relator o Exmo. Sr.Ministro Humberto Gomes de Barros, cuja ementa encontra-se assentada nos seguintestermos:

“EMENTA: SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - TRANSFERÊNCIADE FINANCIAMENTO - INTERVENÇÃO DO AGENTE FINANCEIRO -OBRIGATORIEDADE.

- A intervenção do agente financeiro é obrigatória, na transferência definanciamentos, celebrados pelo Sistema Financeiro de Habitação.

- O cessionário de financiamento regido pelo SFH carece de legitimidadepara propor ação de consignação contra o agente financiador, se estenão interveio na transferência (Lei 8.004/90, Art. 1º).”

De outro lado, não há como o Poder Judiciário determinar que os promovidosalterem o contrato originário de compra e venda, firmado pela Autora com a CEF.

Um dos princípios que norteiam o contrato é o da autonomia da vontade,por isso não se admite a coação para que se realize avença entre terceiros. Destarte, quandojá existe um contrato em vigor, que deve ser respeitado pelas partes que o avençaram, não sepermitindo, pois, o inadimplemento de suas cláusulas, salvo se em determinadas situações

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restar comprovado que o acordo tornou-se oneroso para uma das partes, considerando-se emtela o princípio do não enriquecimento sem causa.

A Autora cabe-lhe procurar resolver o impasse que contribuiu para o iníciodo litígio com o promovido Valmir Júnior Silva, manejando a a via de ação própria, a fim derequerer o que lhe for de direito.

Ante o exposto JULGO IMPROCEDENTE o pedido, nos termos do incisoI, do artigo 269 do CPC e condeno a Autora ao pagamento de honorários advocatícios queatribuo em 5% (cinco por cento) a ser calculado sobre o valor dado à causa.

Custas, ex lege.

P.R.I.

João Pessoa, 16 de agosto de 1996

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal Titular da 3ª Vara

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 123

INSS - DEPENDÊNCIA ECONÔMICA - MENOR PÚBERE

Processo nº 95.06246-1 / AÇÃO DECLARATÓRIARequerente: MARIA DORACY LOPES DA SILVA, assistida por sua genitora

MARIA DA GLÓRIA LOPES DA SILVARequerido : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

SENTENÇA

EMENTA: AÇÃO DECLARATÓRIA DESTINADA A COMPROVAR ADEPENDÊNCIA ECONÔMICA DA AUTORA, MENOR PÚBERE, EMRELAÇÃO À SUA AVÓ, PARA FINS DE PERCEPÇÃO DE BENEFÍCIOPREVIDENCIÁRIO. MATÉRIA DE FATO QUE DEMANDA PRODUÇÃODE PROVA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. IMPOSSIBILIDADE DEADAPTAÇÃO AO TIPO ADEQUADO. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃOINICIAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM EXAME DO MÉRITO.

1. A ação meramente declaratória busca por termo a incerteza jurídicarelativa a uma relação jurídica, não se prestando para acertamento desituação de fato, como requer a autora da presente demanda.

2. Verificada a impossibilidade de adaptação ao tipo adequado, toma-seforçoso o indeferimento da petição inicial.

Cuida a hipótese vertente nos presentes autos de ação declaratóriapromovida por MARIA DORACY LOPES DA SILVA, menor púbere, representada por suagenitora, MARIA DA GLÓRIA LOPES DA SILVA, devidamente qualificada na petição inicial,tendo no pólo passivo da demanda o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL.

Pretende a autora que seja declarada a sua condição de dependente dasua avó, ADALGISA LOPES DA SILVA, falecida em 25 de janeiro de 1994.

Para a comprovação da situação fática, cuja declaração judicial objetiva,requereu o “depoimento pessoal da ré, sob pena de confesso, inquirição de testemunhas,perícias e todas as demais provas necessárias...” (fls.O3).

O feito seguiu o regular processamento, com a citação do requerido (fls.39) (após três emendas à exordial), a contestação (fls. 40/45), impugnação aos termos dacontestação e documentos a esta acostados (fls. 47/48).

Conclusos os autos, passo a DECIDIR.

A ação meramente declaratória, direito potestativo previsto no art. 4º daLei, Adjetiva Civil, busca a declaração quanto à existência ou inexistência de uma relaçãojurídica ou a autenticidade ou falsidade de um documento. Em outras palavras, visa tomarcerto o que é incerto no que tange a uma relação jurídica.

No caso ventilado nos presentes autos a autora busca o reconhecimento

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de sua condição de dependente de sua falecida avó, para fins de percepção de benefícioprevidenciário, matéria que, apesar de juridicamente relevante é refratária de apreciação pormeio de ação declaratória por constituir-se em questão de mero fato que poderá, por suarelevância, ser apreciada por meio dos procedimentos adequados à espécie.

O nó górdio da questão posta a deslinde é o fato de ter a autora vivido soba guarda e dependência de ADALGISA LOPES DA SILVA, sua avó, situação fática que nãose compadece com o feito declaratório que somente deve ser usado quando por outro meioprocessual não houver a possibilidade de resolver o problema, o que não se constitui, emabsoluto, a hipótese dos autos.

Acerca dos limites e da pertinência da ação declaratória, assim semanifestou a vetusta jurisprudência dos tribunais, em acórdãos que soam:

“A ação declaratória não se presta à elucidação de fatos controvertidosou passíveis de alguma dúvida sobre a real existência dos mesmos, salvono que se refere à falsidade ou autenticidade de documento. (RT. 645178)”

“Os fatos não são suscetíveis de acertamento por meio de declaratória.”(RJTJERGS 133/251)

Mutatis mutandis, as lições pretorianas acima delineadas caibam àfiveleta no presente feito, onde a autora pretende, por meio de prova testemunhal e pericial,comprovar a sua relação de dependência da sua falecida avó, para fins de percepção debenefício previdenciário.

É sabido e consabido que processo é direito público e que a forma doprocedimento não é posta no interesse das partes, mas sim, da justiça. Daí porque é dever dojuiz corrigir a impropriedade de procedimento adequado, sendo irrelevante o nomem iurisatribuído ao feito, eis que o autor deve narrar os fatos e o juiz deduzir a norma jurídica quedestes se irradia. Entrementes, existem determinadas situações onde é impossível aomagistrado adaptar o feito ao tipo adequado, o que ocorre no presente caso, apesar da boavontade deste juízo e da relevância da matéria, inclusive, robustecida pelo início de provalevantado.

Feitas essas considerações com supedâneo no art. 295, V indefiro apetição inicial e julgo extinto o feito sem exame do mérito, conforme dispõe o art. 267, I, paraque produza seus jurídicos e legais efeitos, facultado à autora os meios e procedimentosinerentes à satisfação de sua pretensão e, ainda, o traslado de peças do presente feitomediante a substituição por fotocópia autenticada.

Condeno à autora ao pagamento da verba honorária que fixo, de logo, em5% (cinco) por cento sobre o valor atribuído à causa e ao pagamento das custas processuais.

P.R.I.

João Pessoa, 20 de agosto de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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CONCESSÃO DE SERVIÇOS

Processo nº 95.03647-0 / AÇÃO ORDINÁRIARequerente: TUT - TRANSPORTES LTDARequerido: UNIÃO

SENTENÇA

EMENTA: AÇÃO ORDINÁRIA: TRANSPORTE INTERESTADUAL DEPASSAGEIROS. PEDIDO DE CONCESSÃO DE LINHA.IMPOSSIBILIDADE DE O JUDICIÁRIO PRATICAR UM ATODISCRICIONÁRIO POR NATUREZA.

1. o serviço de transporte interestadual de passageiros é da competênciada UNIÃO, cuja exploração pode ser transferida a particulares medianteconcessão ou permissão, através de procedimento licitatório. (art. 21,XII, “e” da CF/88, c/c o art. 175 do mesmo Diploma Legal)

2.concessão de linha de transporte interestadual é um ato administrativodiscricionário por excelência, onde somente o agente público administrativoé quem pode aferir os critérios de conveniência e oportunidade para iniciarou não o processo licitatório pertinente, razão pela qual não pode é oJudiciário se sub-rogar em autoridade administrativa e, numa atitudeabusiva, invadir a seara de outro Poder constituído, substituindo-o naobservância dos critérios de conveniência e oportunidade.

3. Improcedência do pedido.

Cuida-se de ação ordinária intentada pela TUT - TRANSPORTES LTDA,qualificada na exordial, tendo por requerida a UNIÃO - Departamento de Transportes Terrestres,sob os fatos e fundamentos a seguir desnovelados:

Aduz a autora, empresa estabelecida no ramo de transporte coletivo depassageiros, com sede em CUIABÁ/(MT), que exerce sua atividade operando há mais detreze anos, sendo titular de várias linhas interligando o Estado do Mato Grosso a diversasUnidades de Federação.

Como parte de sua atividade empresarial, vem explorando, há mais de10(dez) anos, a linha interestadual CUIABÁ(MT)/JOÃO PESSOA (PB). Por essa razão,requereu, em 20 de agosto de 1991, com base no Decreto 92.353/86, a regularização damencionada linha, haja vista a exploração ser feita de maneira tácita, com a devida permissãodo DNER e, posteriormente, de seu sucessor, o DTT.

Argüi que seu pedido, no entanto, não foi apreciado, denotando a inérciae omissão desses órgãos no sentido da regularização da linha.

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Protesta, ainda, pelo fato de haver sofrido constantes ações por parte dafiscalização, consubstanciadas na apreensão de seus veículos e lançamentos de autos deinfração e multas.

Enfileira, em prol da sua tese, argumentos doutrinários e jurisprudenciais.

Ao final, requer a procedência do pedido, determinando a regularizaçãodos serviços rodoviários interestaduais, mediante a outorga à autora da permissão para aexploração da linha CUIABÁ (MT) /JOÃO PESSOA (PB), o itinerário descrito no petitório,condenado-se à ré a arcar com o ônus da sucumbência.

Acostou aos autos a procuração e documentos.

A liminar foi indeferida.

Citada, a UNIÃO contestou a lide, alegando que a concessão de serviçosde transporte interestadual deve ser feita mediante LICITAÇÃO sendo, destarte, defeso aoPoder Judiciário imiscuir-se nas atribuições constitucionalmentes atribuídas ao Executivo.

Ao final, requer a improcedência do pedido, condenando-se à requerentea arcar com o ônus da sucumbência.

Conclusos. D E C I D O.

Ao cuidar da competência para a autorização, concessão e permissãode transporte interestadual, a Constituição Federal, em seu art. 21, XII “e”, dispõe que:

“Art. 21. Compete à União:

XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão oupermissão.

e) os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional depassageiros;”

Mais adiante, ao se referir aos regimes da concessão e da permissão, oPacto Político de 1988, preceitua que:

“Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da Lei, diretamente ou sobregime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, aprestação de serviços públicos”.

Da exegese do contido nos artigos suso transcritos, conclui-se, semmuito esforço, que o serviço de transporte interestadual de passageiros é da competência daUNIÃO, cuja exploração pode ser transferida a particulares mediante concessão ou permissão,através de procedimento LICITATÓRIO.

O Decreto 952, por sua vez, buscando regulamentar o texto Constitucional,no que tange à concessão de serviços de transporte interestadual, dispõe que:

“Art. 2º. A organização, a coordenação, o controle, a outorga e afiscalização dos serviços de que trata este Decreto caberá ao Departamentode Transportes Rodoviários do Ministério dos Transportes.”

Das regras insertas nos textos normativos trazidos à colação, observa-se

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a falta de plausibilidade da pretensão explicitada pelo requerente na presente medida cautelarinominada.

Somente o Departamento de Transportes Rodoviários, órgão atrelado aoPoder Executivo, é quem pode, em observância aos princípios da conveniência e daoportunidade, decidir sobre a necessidade ou de concessão de uma linha de transporteinterestadual e, em caso positivo, levar a efeito o competente procedimento licitatório parahabilitar a empresa que preencha as condições estabelecidas.

O que não pode é o Judiciário se sub-rogar em autoridade administrativae, numa atitude abusiva, invadir a seara de outro Poder constituído, substituindo-o naobservância dos critérios de conveniência e oportunidade.

Consoante já ventilado no despacho denegatório da cautela liminar,entendo que a concessão de linha de transporte interestadual é um ato administrativodiscricionário por excelência, onde somente o agente público administrativo é quem podeaferir os critérios de conveniência e oportunidade para iniciar ou não o processo licitatóriopertinente.

Atender aos reclamos do requerente seria errar duas vezes: primeiro porinvadir a competência de outro Poder e praticar um ato administrativo, ao invés de jurisdicional.Segundo, prescindir do procedimento licitatório para um ato que a Carta Magna expressamenteo recomenda.

Como dinâmico apoio, valho-me de decisões Pretorianas da 1ª Região,apontando no sentido da tese esposada por este Juízo:

“CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. LIMINAREM AÇÃO CAUTELAR CONCEDENDO PERMISSÃO PARAEXPLORAÇÃO DE SERVIÇO DE TRANSPORTE RODOVIÁRIOINTERESTADUAL. ILEGALIDADE. SEGURANÇA CONCEDIDA PARAATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO A AGRAVO AVIADO CONTRALIMINAR ILEGAL.

A autorização, concessão ou permissão de serviço de transporte rodoviárioé ato exclusivamente administrativo, não cabendo, jamais, ao Juizsubstituir a autoridade administrativa em providência dessa natureza.Ilegalidade flagrante da liminar que, em ação cautelar concede, inauditaaltera parte, permissão para exploração de linha de transporte rodoviáriointerestadual.

Segurança concedida para atribuição de efeito suspensivo ao agravo aviadocontra liminar ilegal”.

(DJ de 01.06.92, Rel. Juiz Hércules Quasimodo).

“ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL.MANDADO DE SEGURANÇA. ATO JUDICIAL. LIMINAR AUTORIZANDOEXPLORAÇÃO DE LINHA DE TRANSPORTE RODOVIÁRIOINTERESTADUAL. ILEGALIDADE FLAGRANTE.

A 1ª Seção do TRF da 1ª Região firmou entendimento pela ilegitimidadede liminar que, em ação cautelar, concede permissão para exploração delinha de transporte rodoviário interestadual de passageiros, porquanto aautorização, concessão ou permissão de serviço de transporte rodoviárioé ato exclusivamente administrativo, dependente de prévia licitação,

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consoante o art. 175 da Constituição Federal, sendo defeso ao Judiciáriosubstituir-se à autoridade administrativa, em providência de tal natureza”.

(DJ de 13.10.94, Rel. Juíza Assusete Magalhães).

Isto posto, verificando a impossibilidade de o Judiciário praticar um atoadministrativo por natureza, torna-se imperiosa a exegese apontando no sentido da falta deplausibilidade das alegações da autora, razão pela qual julgo improcedente o pedido.

Condeno a autora ao pagamento da verba honorária que arbitro em 10%(dez por cento) sobre o valor atribuído à causa e ao pagamento das custas processuais.

P.R.I.

João Pessoa, 20 de agosto de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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DESAPROPRIAÇÃO - INTERESSE SOCIAL

Processo nº 93.0012093-0 / AÇÃO DESAPROPRIAÇÃOExpropriante: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA

AGRÁRIA - INCRAExpropriado: FELIPE JOÃO LUNDGREN e LUIZ HERCÍLIO LUNDGREN

SENTENÇA

EMENTA: ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL.DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL. REFORMA AGRÁRIA.REJEIÇÃO DAS PRELIMINARES ARGÜIDAS PELO EXPROPRIADO.PRINCÍPIO DA JUSTA INDENIZAÇÃO. PERÍCIA AVALIATÓRIA.

1. No Juízo da desapropriação não são discutidas questões outras quenão as referentes ao quantum e a nulidade de natureza formal. Não cabeao Judiciário interferir quanto à “causa determinante” quando enquadradaem uma das espécies legais.

2. INDENIZAÇÃO. Norteia a sistemática da desapropriação o princípioda indenização justa, segundo mandamento constitucional (art. 184).

3. TÍTULOS DA DÍVIDA AGRÁRIA. A indenização da terra nua e coberturavegetal não economicamente explorada dever ser efetuada por meio deTDA, a prazo, sem qualquer deságio, como manda o CF/88.

4. BENFEITORIAS ÚTEIS E NECESSÁRIAS. A indenização dasbenfeitorias úteis e necessárias devem ser indenizadas diferentementeda terra nua e cobertura vegetal não economicamente explorada, ou seja,em dinheiro, nos moldes do parágrafo primeiro do art. 5º, da Lei nº 8.029,de 25 de fevereiro de 1993, c/c o parágrafo primeiro do art. 184 da CF/88.

5. JUROS COMPENSATÓRIOS. A 12% a.a., incidentes desde a imissãona posse, calculados, até a data do laudo, sobre o valor simples daavaliação e, desde então, sobre o referido valor corrigido monetariamente(Súmulas 74 e 110 /TRF e 164/STF), destinados a ressarcir os prejuízosque os expropriados tiveram com o não uso dos bens.

6. JUROS MORATÓRIOS. Á taxa de 6% a.a., incidindo de formacumulativa com os compensatórios, a partir do trânsito em julgado dasentença (Súmula 70 do TFR), com o objetivo de cobrir o prejuízo sofridopelos expropriados com a demora do pagamento da indenização.

7. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Arbitrados em 10% sobre a diferençaentre o valor da indenização e do depósito, devidamente atualizados(Súmula 141/TFR).

8. CORREÇÃO MONETÁRIA. Incidente a partir do laudo, de acordo com

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os índices oficiais que medem a inflação, até a data do efetivo pagamentoda indenização (Súmula 75/TFR).

9. Ação procedente sujeita ao duplo grau de jurisdição.

Vistos etc.

Cuida-se de Ação de Desapropriação proposta pelo INSTITUTONACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA, contra FELIPE JOÃOLUNDGREN e LUIZ HERCÍLIO LUNDGREN, tendo por objeto o imóvel rural denominado“CORVOADA OU FAZENDA CORVOADA”, descrito às fls. 04 dos autos e localizado nomunicípio de Pitimbu, no estado da Paraíba, expondo as razões fáticas e jurídicas de suapretensão, conforme delineado abaixo:

Alega o promovente que o imóvel, objeto da ação, tem área registrada de342.8915 ha. (trezentos e quarenta e dois hectares, oitenta e nove ares e quinze cintiares),todavia, a área planimetrada é de 337.0000 ha. (trezentos e trinta e sete hectares), ficando aretificação do registro imobiliário para ser procedida após a realização da perícia. Ainda, queeste terreno foi declarado de interesse social para fins de reforma agrária através do DecretoFederal de 08.07.93, publicado no D.O.U., de 09.07.93.

Informa que incide sobre o referido imóvel uma inscrição hipotecária feitacom o Banco do Brasil S/A, débito para com o Imposto Territorial Rural - ITR, dos exercíciosde 1987, 1988, 1989, 1991 e 1992, e ainda, uma penhora resultante da Reclamação Trabalhistanº 627/90, tramitando na 3ª JCJ de João Pessoa/PB.

Aduz que a avaliação procedida resulta na oferta de Cr$ 22.466.736,88(vinte e dois milhões, quatrocentos e sessenta e seis mil, setecentos e trinta e seis cruzeirosreais e oitenta e oito centavos), correspondendo ao valor de 7.112 (sete mil e cento e doze)TDA’s (Títulos da Dívida Agrária), para indenização da terra nua e da cobertura natural e, deCr$ 6.127.262,10 (seis milhões, cento e vinte e sete mil, duzentos e sessenta e dois cruzeirosreais e dez centavos), equivalente às benfeitorias e cobertura natural.

Por fim, requer seja expedido o mandado de imissão na posse, garantindoao Expropriante a posse do imóvel em questão, evitando que o mesmo venha a ser novamenteinvadido por terceiros.

Acostou aos autos a documentação de fls. 11 usque 39.

Despachando nos autos, o MM. Juiz Federal da 3ª Vara, às fls. 41/43,determinou, a citação dos expropriados, que fosse oficiado o douto Juiz da Comarca deAlhandra e nomeado perito o Dr. Gilberto Souto Muniz de Albuquerque, e ainda, que deixariapara determinar a imissão na posse do imóvel, somente quando levada a efeito a avaliaçãoprovisória pelo perito.

O INCRA, na petição de fls. 48/50, reiterou a indicação dos seusassistentes técnicos, mencionados na exordial, e, apresentou seu quesitos.

O INCRA juntou aos autos (fls. 52) comprovante de depósito no valor deCr$ 6.127.262,10 (seis milhões, cento e vinte e sete mil, duzentos sessenta e dois cruzeirosreais, e dez centavos), referente ao valor da oferta pelas benfeitorias e culturas existentes noimóvel.

O MM. Juiz ARAKEN MARIZ, do TRF da 5ª Região, ao apreciar mandado

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de segurança impetrado pelo INCRA contra ato deste juízo da 3ª Vara (PB), decidiu no sentidode conceder a liminar requerida na inicial, a fim de que o impetrante seja imitido na posse doimóvel expropriado, (decisão via fax fls. 57/58).

As informações, como de estilo, foram prestadas (fls. 59/60).

No despacho de fls. 62, foi determinada a expedição de averbação, bemcomo edital de citação de terceiros interessados e que fosse oficiado o douto Juízo da Comarcade Alhandra e ao Cartório da referida Comarca.

Auto e Imissão na Posse (fls. 67). Mandado de Averbação (fls. 68).

Na contestação de fls. 136, os expropriados, alegaram preliminarmente ainsuficiência do depósito, eis que os trabalhos de vistoria foram concluídos no dia 30 de julhode 1993 e o depósito efetivado em 21.11.1993, o que resultou em um prejuízo de 2.322 TDA’s,sendo o mesmo comportamento adotado com relação à indenização da benfeitorias.Contestam ainda outros itens do laudo de avaliação. No mérito, diz que a desapropriação porinteresse social, para fins de reforma agrária, é uma previsão constitucional, que asseguraque o pagamento oferecido deve ser prévio e justo.

Nomeados aos assistentes técnicos do Expropriante e do Expropriado.

O expropriado requereu, por intermédio da petição de fls. 238, olevantamento de 80% (oitenta por cento) do valor da indenização levantada, conforme autorizaa Lei Complementar 76/83, sendo deferido às fls. 241.

O INCRA apresentou seus quesitos às fls. 239/24 e requereu a substituiçãodo assistente técnico.

O Sr. Carlos Alves do Nascimento Lundgren vem às fls. 247, denominando-se inventariante dos bens deixados pela morte de seu pai, Hercílio Alves Ferreira Lundgren,requerer que não se admita o levantamento dos valores depositados, “Eis que encontra-se emvias de promover ação de rompimento de doação inoficiosa”.

Na petição de fls. 276/278, o Sr. Carlos A. N. Lundgren vem, novamente,alegar a conexão da presente desapropriação com a ação similar tramitando na 1ª Vara destaJustiça Federal, requerendo que este Juízo decline de sua competência, encaminhando osautos à 1ª Vara.

Acerca dos pedidos manifestaram-se os expropriados às fls. 280/282 e289/297.

No despacho de fls. 307/309, foi mantida a decisão que concedia olevantamento de parte da importância depositada e rejeitada a alegação de conexão, facetratar-se de ações distintas, onde as partes e a causa de pedir eram diversas, e finalizadeterminando a continuidade do feito.

Na petição de fls. 312, os expropriados juntaram aos autos os comprovantesde quitação do Imposto Sobre Propriedade Territorial Rural - ITR, exercícios de 92 e 93, bemcomo da Certidão Negativa de ônus sobre a Fazenda Corvoada.

Os expropriados às fls. 318 requereram o apensamento da Medida Cautelarde Produção Antecipada de Provas, processo nº 93.0010644-9, em tramitação nessa mesmaVara da ação de desapropriação, visto que desta Medida constam os recentes laudos de

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vistoria e avaliação do imóvel objeto da presente desapropriação.

Na certidão de fls. 319, houve a informação do decurso de prazo sem quetivesse qualquer interposição de recurso, e ainda, de que a ação cautelar, mencionada napetição de fls. 318, já havia sido proferida sentença.

No despacho de fls. 319, foi indeferido o pedido de apensação dos autos.

O engenheiro Agrônomo, Dr. Roberto Djalma Guedes Pereira, foi indicadocomo novo perito, face o Oficial de Justiça não conseguir localizar o perito indicadoanteriormente.

Os expropriados apresentaram seus quesitos às fls. 344/345.

No despacho de fls. 414, entendo-se indispensável a realização de provapericial, foi determinado ao INCRA que complementasse o depósito dos honorários do peritoe fixado o prazo de 30 (trinta) dias para entrega do laudo.

O Perito oficial apresentou o Laudo Técnico (fls. 421/435), respondendoas respostas formuladas pelas partes.

Os expropriados se pronunciaram (fls. 430/435), em discordância com osdados periciais contidos no Laudo Técnico.

O expropriante - INCRA - se pronunciou (fls. 437/439), também,discordando em parte do Laudo Técnico.

É o relatório. DECIDO.

Todos sabem que declarar a perda da propriedade é um problema políticoe jurídico dos mais sérios e contravertidos na ordem social e histórica. O instituto dadesapropriação longevo como é, ainda não se pacificou no espírito do homem que é marcadopor reações que nem o dinheiro paga ou convence o expropriado.

O certo é que o instituto da desapropriação tem como idéia fundamentala prevalência do público sobre o privado. O interesse social, no caso dos autos, é o motivonuclear da desapropriação do imóvel denominado “CORVOADA OU FAZENDA CORVOADA”.

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 184, procura entender apropriedade condicionada ao bem-estar social, recepcionando o princípio que se pode definircomo de justiça distributiva.

In casu, enxergo presentes os pressupostos basilares que norteiam oprocedimento expropriatório, ou seja:

a) Relação processual saneada;

b) Objetos da demanda perfeitamente identificados;

c) Laudo Pericial oficial indicando os elementos necessários à fixaçãoda justa indenização.

É regra basilar do procedimento expropriatório o instituto da justaindenização, insculpido no art. 5º, XXIV, da CF/88. Corresponde, no dizer do mestre CELSO

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ANTÔNIO BANDEIRA DE MELO, in verbis:“àquela que corresponde real e efetivamente ao valor do bem expropriado,ou seja, aquela cuja importância deixe o expropriado absolutamenteindene, sem prejuízo algum em seu patrimônio. Indenização justa é a quese consubstancia em importância que habilita o proprietário a adquiriroutro bem perfeitamente equivalente e o exima de qualquer detrimento.”(In Curso de Direito Administrativo, 4ª edição, Malheiros Editores, p. 382/383)

É sabido e consabido que, em sede de ação expropriatória, há de sediscutir apenas o quantum da indenização desde que, o que se constitui o caso dos autos,estejam presentes os pressupostos autorizativos do processo de desapropriação.

Com respeito ao pagamento da indenização aos expropriados, registro oentendimento que se norteia na sistemática da desapropriação, o princípio da indenizaçãojusta, cujo valor real deve ser preservado, segundo mandamento Constitucional (art. 184), quenão pode sofrer desrespeito por norma de escalão inferior. Assim, determino que a indenizaçãoobedeça aos seguintes critérios:

I - A extensão de terra desapropriada para efeito de indenização deveobedecer à área descrita na planta de fls. 17 dos autos, em consonância com o pronunciamentodo louvado oficial de fls. 424, pelo que tenho como desapropriada a área de 337 ha.

II - Quanto ao Valor da terra nua para efeito de indenização com Títulos daDívida Agrária (TDA), acosto-me ao laudo do perito oficial que, levando em conta fatores dadinâmica econômica, chegou ao quantum de 1.100,00 (hum mil e cem reais) por hectare, afim de garantir uma justa indenização aos expropriados e preservar o Poder Público de umpreço abusivo e, para tanto, levo em conta não só o valor da terra nua, como também arealidade da economia brasileira e a situação sócio-geográfica do objeto da desapropriação.A fixação desse valor, atualizado e em moeda corrente, expressando o preço de mercado daterra expropriada, somados aos critérios de juros e correção monetária adotados no presentedecisum, que põem fim à controvérsia quanto à insuficiência do depósito e à mudança dopadrão monetário, bem como o transcurso do lapso temporal entre a primeira avaliação e odepósito das TDA’s.

III - Quanto à indenização das benfeitorias, adoto os seguintes critérios,levando em conta que, entre o primitivo estado dos bens por ocasião do início do processoexpropriatório e o atual, ocorreram fatores sociais que levaram à depredação de parte dasbenfeitorias, conforme se depreende do cotejo dos laudos acostados e das deduções dosExpropriados:

a - Edificações:

Adoto a avaliação constante no item 7.11 do laudo oficial (fls. 425), novalor de R$ 81.365,40.

b - Equipamentos e Instalações:

1. Transformador - Valor descrito no item 7.2.1 do laudo oficial - fls. 426.

2. Rede elétrica - Valor descrito no item 7.2.2 do laudo oficial - fls. 426.

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3. Rede de drenagem na várzea - levando em consideração que o grau dedepreciação (0,90) não se deu por conta dos expropriados, mas dos fatores sociais ocorridosna propriedade após a expropriação, arbitro, tomando por base os dados colhidos na MedidaCautelar de Produção Antecipada de Prova nº 93.10644-9, em R$ 500,00 (quinhentos reais) ototal de depreciação da rede de drenagem na várzea.

4. Rede viária interna - Valor apurado no laudo oficial, até porque nãohouve grande depreciação dessas benfeitorias. Item 7.2.4 - fls. 426.

IV - Culturas Indenizáveis -

1. Cana-de-açúcar - Tenho por correta a avaliação do perito oficial, inclusiveao tomar por conta a 6ª folha, o que compensaria o critério da indenização pela raiz e oslucros cessantes reclamados pelos Expropriados. Item 8.1 - fls. 427.

2. Coqueiros - Adoto o valor encontrado pelo perito oficial e a quantidadede coqueiros adultos. Quanto aos coqueiros novos, fico com os valores encontrados na MedidaCautelar de Produção Antecipada de Prova, ou seja, 851 coqueiros novos e o valor constantedo laudo oficial (item 8.2 fls. 428 - 2º vol.).

3. Fruteiras diversas - Tomo por base as quantidades e valores encontradospelo perito oficial. Item 8.3 - fls. 428.

V. Os juros compensatórios de 12% (doze por cento) ao ano devem incidirdesde a imissão na posse, calculados, até a data do laudo, sobre o valor simples da avaliaçãoe, desde então, sobre o referido valor corrigido monetariamente (Súmulas 74 e 110 do TFR e164 do STF), destinados a ressarcir os prejuízos que os expropriados tiveram com o não usodos bens depois da colheita da última safra.

VI. Os juros moratórios, à taxa de 6% (seis por cento) ao ano, devemincidir de forma cumulativa com os compensatórios, a partir do trânsito em julgado da sentença(Súmula 70/TFR), com o objetivo de cobrir o prejuízo sofrido pelos expropriados com a demorado pagamento da indenização. Essa incidência dos juros sobre juros não constitui, no caso,anatocismo, não se subsumindo a hipótese dos autos à prevista na Súmula 121 do STF,segundo precedentes dessa Colenda Suprema Corte.

VII. Arbitro a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre a diferença dovalor entre o preço oferecido e depositado e a indenização, ambas as parcelas devidamentecorrigidas, computando-se as relativas aos juros moratórios e compensatórios (Súmula 141/TFR). Quanto aos honorários do assistente técnico dos expropriados, fixo-os em 1% (humpor cento) dos devidos ao advogado dos expropriados, apurados em liquidação de sentença.

VIII. A correção monetária fixada, a partir do laudo de avaliação (Súmula75/TFR), de acordo com os índices oficiais que medem a inflação, até a data do efetivopagamento da indenização.

Rejeito, por descabida, a indenização dos demais itens pleiteados. Tenhoque nos incisos acima a reparação integral não considera apenas o valor da coisa desapropriada,senão aquele valor somado ao dano conseqüente, direto e imediato da expropriação, comoos supra elencados, que os expropriados ficaram privados. Os danos que devem serindenizados no processo expropriatório são os efetivos e não os prováveis, problemáticos ouapenas possíveis. Para o julgador da desapropriação o que importa é encontrar o justo preço,não havendo, para isso, regras absolutas ou rígidas, estando embutido, no caso em julgamento,

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 135

os lucros cessantes. Não encontrei, quer nos presentes autos, quer na Medida Antecipadade Prova outros bens a serem indenizados.

O STJ interpreta a jurisprudência das leis federais nos tribunais brasileiros,desde o advento da CF de 88 e segundo os Ministros AMÉRICO LUZ, PÁDUA RIBEIRO,JOSÉ DE JESUS e HÉLIO MOSIMANN, em julgados incertos na Revista do STJ, não sepode mais fixar para baixo o valor da desapropriação, situação que chegou a representar umtormento as milhares de pessoas que se consideram “vítimas” de desapropriação em todo oPaís. Assim, a indenização deve corresponder ao verdadeiro valor real do bem expropriadosob pena de haver enriquecimento de uma parte em detrimento da outra, a mais fraca. Emjulgado recente, disse o Min. PEÇANHA MARTINS que: “Não cabe na cabeça de ninguémpossa o expropriado adquirir bem semelhante ao de que foi desapossado, por metade dopreço legítimo e honradamente arbitrado”. E disse mais: “Não é justo que perca mais, compelidoa viver na rua da amargura, para que com sua ruína, se concretize o interesse coletivo.

Não é outro o teor do art. 12, da Lei nº 8.629/93 que, ao conceituar a justaindenização, diz:

“Art. 12. Considera-se justa a indenização que permite ao desapropriadoa reposição em seu patrimônio do bem que perdeu por interesse social”.

Observe-se que a inscrição hipotecária feita com o Banco do Brasil,noticiada às fls. 06 dos autos não mais existe, conforme a Certidão de fls. 316.

Por fim, condeno a expropriante ao pagamento das custas do processocomo única solução justa para preservar os expropriados de despesas que acarretariam umadiminuição na indenização, bem como à luz do Art. 19 da Lei Complementar nº 76/93.

Sentença sujeita ao reexame necessário.

P.R.I.

João Pessoa, 31 de agosto de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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136 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

INSS - REVISÃO DE BENEFÍCIO II

Processo nº 96.02811-7 / AÇÃO ORDINÁRIAAutor: ALÍPIO BEZERRA DE MELORéu: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

SENTENÇA

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO.EQUIVALÊNCIA DOS PROVENTOS COM O SALÁRIO-DE-CONTRIBUIÇÃO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

Não existe norma legal fixando o valor do benefício em igual número desalários mínimos a que correspondia o salário-de-contribuição do segurado.

IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

Vistos etc...

Cifra-se a controvérsia Ação Ordinária proposta por ALÍPIO BEZERRADE MELO contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, visando obter arevisão de seu benefício.

O autor, que percebe proventos do Instituto promovido desde junho de1984, alega que durante quarenta anos, contribuiu para a Previdência Social sobre vinte saláriosmínimos, e que ao ser aposentado, passou a receber proventos equivalentes a 8,78 saláriosmínimos.

Requer, a final, a intimação do Ministério Público, e que seja o INSScondenado a rever os proventos do suplicante, a partir da concessão, e a pagar as diferençasvencidas e vincendas.

O réu apresentou contestação às fls. 15/21, suscitando a preliminar deinépcia da inicial, sustentando, também, a prescrição do direito de ação, pugnando pelaimprocedência do pedido, caso ultrapassada a prejudicial de mérito.

Instado a se manifestar sobre a defesa do réu, o promovente não semanifestou.

Observo que há pedido do autor para que seja intimado o Ministério Público.Embora não apreciado oportunamente, prejuízo não houve, ante a impossibilidade de seatender a tal pleito, seja em face da vedação contida no art. 129, IX, da Constituição Federal,seja porque a matéria travejada nos autos não envolve interesse público relevante, a justificara intervenção do parquet na lide.

Tratando-se de matéria controvertida unicamente quanto ao direitoaplicável, é possível o julgamento antecipado da lide.

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Conclusos é o relatório, decido.

Preliminar: Inépcia da inicial

Argüiu o réu a preliminar de inépcia da inicial, por não ser possível de sualeitura chegar a qualquer conclusão lógica.

É certo que a petição inicial sofre de um certo grau de incoesão, mas épossível concluir que o que o autor pretende é receber proventos equivalentes aos seus salários-de-contribuição, ou seja, 20 (vinte) salários mínimos, pelo que, REJEITO a preliminar suscitadapelo INSS.

De meritis

Sustentou o INSS a prescrição do direito de ação, uma vez quetranscorridos mais de doze anos entre a data de concessão do benefício e o ajuizamento daação.

A jurisprudência dos Tribunais já se consolidou no sentido de que, em setratando de benefício previdenciário, o direito de pleitear a revisão do benefício não prescreve,mas tão-somente, o direito às parcelas anteriores ao ajuizamento da ação.

Trata-se de aposentadoria por tempo de serviço concedida antes do adventoda nova Constituição Federal, regendo-se, portanto, pelas regras do Decreto nº 83.080/79,que instituiu o Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, que dispunha:

“Artigo 41. O valor da renda mensal do benefício de prestação continuada,ou da sua parcela básica, mencionada na letra a do item II do artigo 40, écalculado mediante a aplicação dos coeficientes seguintes:

......................................

IV- aposentadoria por tempo de serviço:

a) 80% (oitenta por cento) ou 95% (noventa e cinco por cento) do salário-de-benefício, conforme, respectivamente, o sexo masculino ou femininodo segurado que comprova 30 (trinta) anos de serviço;

b) para o segurado do sexo masculino que continua em atividade após30(trinta) anos de serviço, 80% (oitenta por cento) do salário-de-benefício,mais 3% (três por cento) para cada novo ano completo de atividadeabrangida pela previdência social urbana, até o máximo de 95% (noventae cinco por cento), aos 35 (trinta e cinco) anos de serviço”;

O salário-de-benefício, por sua vez, correspondia à média dos trinta eseis últimos salários-de-contribuição do segurado, sendo que destes, apenas os vinte e quatroprimeiros sofriam atualização monetária (art. 37, § 1º, do Decreto suso referido).

Inexiste, portanto, qualquer norma legal amparando a pretensão do autorde ter seus proventos fixados no mesmo valor de seu salário-de-contribuição. Nesse sentido,destaco a decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região no julgamento daApelação Cível 94.04.20108-1/RS, assim ementada:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. CRITÉRIOS.

1. Inexistência de direito à identidade de valor entre o salário-de-contribuiçãoe a renda mensal inicial do benefício.

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2. Apelo improvido.

(Rel: Juiz Teori Albino Zavascki. Julgado em 25.10.94, à unanimidade.Publicado no D.J.U. nº 08, de 11.01.95, Seção II).

Isto posto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, nos termos do art. 269, Ido CPC, condenando o autor ao pagamento de honorários advocatícios, que arbitro em 05%(cinco por cento) do valor da condenação.

Custas na forma estatuída no art. 14, da Lei 9.289/96.

P.R.I.

João Pessoa, 12 de setembro de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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CONTRATO - CORREÇÃO MONETÁRIA

Processo nº 00.04315-0 - AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇAAutora: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEFRé: L.M.N

SENTENÇA

Vistos etc.

A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF, por advogado legalmenteconstituído(s) (fls. 06), propôs ação ordinária de cobrança contra LUIZ MOTTA NETO,também qualificado nos autos, objetivando a cobrança de Cz$ 8.407.254,25 (oito milhões,quatrocentos e sete mil, duzentos e cinqüenta e quatro cruzados e vinte e cinco centavos),valor histórico apurado em 17/julho/1987, com juros, correção monetária e cominações legais.

2. Fundamentou o seu pedido no CPC, artigos 274 c/c o artigo 282 eseguintes.

3. Na petição inicial (fls. 02/05), que trouxe aos autos documentaçãopertinente (fls. 06/81) à pretensão deduzida, alegou textualmente que:

“Através de contrato, a SUPLICANTE abriu na sua agência Cidade Antiga,em 10.02.87, em nome do SUPLICADO, a c/c 001.1063-7 e em 13.04.87na mesma conta foi efetivado um CONTRATO DE ABERTURA DECRÉDITO ROTATIVO EM CONTA CORRENTE, com limite de cz$10.000,00 (dez mil cruzados). (Doc. 01 a 03)

O SUPLICADO extrapolando os limites de seu crédito e desrespeitandoas cláusulas contratuais e disposições legais, efetuou até 29.05.87, nac/c 001.1063-7 saques na ordem de cz$ 5.775.804,18 (cinco milhões,setecentos e setenta e cinco mil, oitocentos e quatro cruzados e dezoitocentavos) valor este que acrescido de juros e encargos financeiros,contratualmente estabelecidos, perfazem, conforme apuração em 17.07.87no Proc. Administrativo 13.13.0110/87, a quantia de cz$ 8.407.254,25(oito milhões, quatrocentos e sete mil, duzentos e cinqüenta e quatrocruzados e vinte e cinco centavos), assim discriminada:

saldo apurado em 29.05.87 cz$ 5.775.804,18; juros: 2.600.951,60; IOF:30.498,47; Dívida em 17.07.87: 8.407.254,25.

O SUPLICADO para efetuar tal vultosa movimentação, agiu de formaindevida, ou melhor dizendo, ilícita. A partir de abril/87, começou a fazerdepósitos de valores significativos mediante cheques de outras praças -Belém/PA e Santa Inês/MA - emitidos por Moacir Ribeiro Júnior, LaércioRonaldo Batista e Venildo Pereira dos Santos Júnior, sendo aquelescheques sistematicamente devolvidos por falta de fundos. (Doc. 04 a 54)

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Como para a prática desses atos, o SUPLICADO contou necessariamentecom a participação de empregado da SUPLICANTE, esta instaurouprocesso administrativo nº 13.13.0110/87, a fim de apurar asresponsabilidades pertinentes a qualquer empregado seu, nessesepisódios.”

4. Pagas (fls. 71) as custas iniciais (Lei nº 6.032/74, RCJF, artigo 13,tab. I, nº II), foi determinada citação da R. (fls. 86), que ofereceu contestação (fls. 89/102),argüindo o seguinte:

4.1 - preliminarmente, a inépcia da inicial, por conter valores arbitrariamenteatribuídos pela A., que não refletem os extratos de conta que instruem apostulação;

4.2 - ainda preliminarmente, impõe-se o chamamento para integrar a lidecomo litisconsortes passivos necessários dos emitentes de chequesmencionados na inicial, Moacir Ribeiro Júnior, Laércio Ronaldo Batista,Venildo Pereira dos Santos Júnior, Darlene do Socorro dos Anjos Azulaye a sociedade comercial INORFIL - Indústria e Comércio RepresentaçõesSanta Inez LTDA;

4.3 - no mérito, a improcedência da ação, tendo em vista cobrança devalores indevidos.

5. Sobre a contestação, manifestou-se a A. (fls. 114/120), afirmandoem essência que restaram incontestados os argumentos da inicial, vez que o R. limitou-se aquestionar o valor cobrado.

6. Juntou à impugnação o original do contrato de abertura de créditorotativo em conta corrente (fls. 121).

7. Facultada às partes a apresentação de provas, requereu o R. (fls.123), a realização de perícia contábil; a A., por sua vez, pediu o depoimento pessoal do R.,como também a juntada de cópia do Relatório Pericial efetuado nos autos da Ação Penal nº672, em tramitação na 3ª Vara, desta Seccional.

8. Despacho posterior (fls. 126) deferiu o pedido da A. e intimou o R. adizer se persistia o interesse na realização da perícia contábil.

9. Novo despacho (fls. 127) determinou à A. a apresentação do laudopericial, do qual requereu juntada; o que foi atendido (fls. 128/158).

10. O R. insistiu (fls. 160) na realização da perícia contábil, a qual foideferida (fls. 161), sendo determinada a indicação de perito e a intimação das partes aapresentarem assistentes técnicos.

11. O R. (fls. 165/169) e a A. (fls. 171/172), apresentaram assistentestécnicos e formularam quesitos para efetivação da perícia.

12. Nomeados (fls. 173) perito e assistentes técnicos e depósitada averba honorária respectiva (fls. 186), foram os experts intimados a apresentarem parecerestécnicos, o que foi cumprido apenas pelo primeiro (fls. 191/194) e pela assistente técnica daA. (fls. 197/210).

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13. Intimadas as partes sobre os laudos apresentados, a A. (fls. 212)manifestou concordância, enquanto que o R. (fls. 214) entendeu contraditórios alguns pontosdos ditos laudos, protestando por esclarecimentos em audiência (artigo 435, do CPC); o R.protestou ainda por depoimento pessoal de representante da A. (fls. 219), indicando oeconomiário RÔMULO A. GOMES DE LIMA, que, na ocasião dos fatos, ocupava a gerênciada agência bancária.

14. Em seguida, manifestou-se o R. (fls. 227/228), sobre o documento(fls. 121) acostado aos autos pela A., reconhecendo ser o mesmo o Contrato de Abertura decrédito rotativo em conta corrente, porém, apontou diversas irregularidades, tais como a faltade registro em Títulos e Documento e finalizou desconsiderando tal documento comonecessário para o deslinde da questão.

15. Após intimações (fls. 237 e 238), veio a audiência de instrução ejulgamento (fls. 240/241), com o depoimento do representante legal da CEF, Rômulo AntônioGomes de Lima, testemunha arrolada pelo R., que declarou, em síntese, que houve participaçãode empregado da CEF na conversão dos depósitos efetuados em cheque para dinheiro,permitindo o saque em prazo inferior ao determinado pelo Banco Central do Brasil e que oreferido funcionário era o substituto legal do Gerente da Agência, no caso o depoente; disseainda que o R. reconheceu a dívida, compareceu a Agência e se propôs a pagá-la, porém,oferecendo uma quantia inferior ao valor levantado pela CEF.

16. Em cumprimento a anterior despacho (fls. 242), certificou a secretaria(fls. 244) sobre o andamento da Medida Cautelar de Exibição de Documento (nº 00.4274-9),promovida pelo R. LUIZ MOTTA NETO contra a CEF, e da ação penal nº 00.0876-1, movidacontra o mesmo LUIZ MOTTA NETO, sendo que a primeira encontra-se extinta e a segundafoi julgada procedente.

17. Sem mais incidentes, vieram-me os autos conclusos para decisão.

Relatados. DECIDO.

18. De início, afasto as preliminares levantadas pelo R., diante das razõesseguintes, todas de especial relevância em termos processuais:

18.1 - a inicial atendeu a todos os pré-requisitos de admissibilidade, ex vido CPC, artigo 282, e além disso o R.não se insurgiu propriamente contraa dívida cobrada (=principal), mas sim contra o “demonstrativo de cálculoda dívida e dos encargos de conta” (sic), vale dizer, contra o acessório,não contra o principal;

18.2 - conseqüentemente, os pressupostos de constituição edesenvolvimento válido e regular do processo informam a presente açãoordinária;

18.3 - não há carência da ação por parte da A., que demonstrou legítimointeresse na demanda;

18.4 - o litisconsórcio necessário preconizado pelo R. não procede porque,segundo alegou, os pretensos litisconsortes passivos são meros emitentesde cheques depositados pelo R. em conta corrente de que era (ele mesmo)o titular.

19. No mérito, a vexata quaestio implica saber se o R. efetuou saquesna c/c nº 001.1063-7, aberta em agência bancária da A., a descoberto, ou seja,

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independentemente de provisão de fundos, já que o quantum antes referido - devidamentecorrigido e atualizado - representa o valor pecuniário da demanda.

20. Na hipótese, irreleva perquirir quanto à alegada participação deempregado da A. nas operações bancárias efetuadas, já que esse aspecto refoge dosparâmetros desta ação de cobrança e, por outro lado, as jurisdições civil e criminal sãoindependentes, donde descaber indagar quanto ao processo criminal em que o R. foidenunciado (fls. 98/127).

21. Mas, o que importa verificar é se houve os alegados saques adescoberto, o seu valor e a autoria desses mesmos saques; as afirmativas respostas a taisquestionamentos constam principalmente:

21.1 - da prova documental (fls. 06/81).

21.2 - da prova pericial (fls. 91/194 e 197/210), destes autos.

22. Sim, essa prova pericial, cujo laudo do expert oficial (fls. 191/194) épor demais conclusivo, militando desfavoravelmente ao R., já que aponta os seguintes aspectosprincipais:

22.1 - o saldo devedor do extrato computadorizado corresponde ao saldodevedor com os depósitos em cheques não compensados;

22.2 - o saldo devedor corresponde ao disponível após a desconsideraçãodos depósitos em cheques não compensados;

22.3 - o R. utilizou crédito superior ao contratado com a A. e os cálculosefetuados por esta obedeceram aos termos do contrato firmado entre oslitigantes;

22.4 - o R. efetivamente promoveu depósitos, em sua conta corrente, decheques de terceiros, sem provisão de fundos;

22.5 - a A. não montou extrato paralelo da conta corrente 00.3180-4, aocontrário do pretendido pelo R;

22.6 - “a conta 003180-4 apresentava um saldo credor de cz$ 268,20 e apartir daquela data não houve mais movimentação. Exclareço que o saldocredor existente em 29.05.87 tinha como origem os depósitos em chequesde outras praças, que posteriomente foram devolvidos por insuficiênciade fundos. Na devolução dos referidos cheques, os mesmos foramdebitados na conta 1063-7 de Luiz Motta Neto, já que o saldo da conta003180-4 era insuficiente para cobrir tais débitos. Este procedimento daCEF em debitar um cheque devolvido, na conta 1063-7, quando os mesmosforam depositados na conta 003180-4 é um tanto irregular, mas que emnada altera o resultado devedor nas duas contas, visto ser da mesmapessoa reponsável e demais circunstâncias inerentes ao processo.” (fls.194, in verbis)

23. O laudo do assistente técnico da A. (fls. 197/210) não difere emessência do laudo do perito oficial, merecendo todavia expressa transcrição três quesitosformulados pelo R. e as respectivas respostas:

“3º Quesito - À vista dos extratos de conta emitidos pelo Serviço deProcessamento de Dados da CEF, lançamentos e registros contábeis, aCEF lançou na referida conta 1744-2, um cheque nominal a LUIZ MOTTA

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NETO, de nº 636668, no valor de Cz$ 12.000.000,00 emitido por LaercioRonaldo Batista, datado de 26.05.1987, contra o Banco do Estado deGoiás S/A, agênica Belém(PA)? Qual a natureza dessa conta?

Resposta - Essa conta, conforme se constata pela denominação escritano verso do cheque 636668, é puramente contábil, o que pode ser facilmenteconstatado se observarmos o Plano de Contas Contábil da CEF ondeencontramos a referida Conta no Ativo Circulante, grupo RelaçõesInterdepartamentais, no subgrupo Agências - Conta Movimento, cujafinalidade é registrar em caráter transitório o movimento das Fichas deCompensação em Trânsito entre a Unidade Centralizadora deCompensação e a Unidade da CEF, destinatária das referidas fichas,bem como registrar os cheques acatados no SIDEC (Sistema deprocessamento dos documentos de depósitos da CEF) na rotina deCompensação Antecipada e os cheques recebidos pelas UnidadesIntegradas de Compensação na troca local, com a finalidade de permitir asumultaneidade de lançamentos na subconta ‘COMPENSAÇÃO’. Ocheque nº 636668 no valor de Cz$ 12.000.000,00 foi contabilizado nessaConta, tendo em vista a devolução por insuficiência de fundos de umasérie de cheques de numeração seqüencial idêntica a este, possivelmentede um mesmo talonário, os quais tinham sido anteriormente depositadosnas contas correntes do cliente LUIZ MOTTA NETO e de sua firma DONLUIGI COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES MOTTA NETO LTDA. Diantedo ocorrido, a Unidade Financeira da CEF deduziu que possivelmenteaquele cheque (636668) também poderia ser devolvido e assim, visandoresquardar o patrimônio da CEF de conseqüências que certamente lhetrariam prejuízos, orientou a Agência para registro contábil do mesmo narubrica 1744-2 COMPENSAÇÃO A CREDITAR - TRÂNSITO até quehouvesse a compensação do referido documento, finda a qual o valorestaria disponível na conta corrente do cliente. Ressalta-se no entantoque o cheque nº 636668 foi devolvido pela compensação por Insuficiênciade Fundos, confirmando assim a previsão feita pela Unidade Financeirada CEF e justificando as medidas tomadas no registro contábil do mesmo.

6º Quesito - Em 18.05.1987, a conta nº 1063-7, de LUIZ MOTTA NETO,apresentava saldo credor, de acordo com os elementos do Serviço deProcessamento de Dados da CEF? Se positivo a resposta, qual o saldonaquela data?

Resposta - De acordo com os extratos emitidos pelo Serviço deProcessamento de Dados da CEF, em 18.05.1987 a conta nº 1063-7 deLUIZ MOTTA NETO apresentava um saldo credor no valor de Cz$19.392.291,87 (dezenove milhões, trezentos e noventa e dois mil, duzentose noventa e hum cruzados e oitenta e sete centavos), embora que aquase totalidade desse valor se referisse a depósitos em cheques osquais estavam pendentes de confirmação por parte do Serviço deCompensação de Cheques.

8º Quesitos - Na movimentação da conta nº 1063-7, LUIZ MOTTA NETOfez todos os saques sobre os saldos efetivamente disponíveis?

Resposta - Não. Durante o período de movimentação da conta nº 1063-7,LUIZ MOTTA NETO fez saques sobre Depósitos Bloqueados, cujoscheques depositados estavam pendentes de confirmação pelo Serviço deconpensação, podendo ser citados como exemplo os saques efetuados

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nos dias 04,05 e 06.05.1987 através dos cheques nºs 981537 no valor deCz$ 8.559.000,00 sacado sobre depósito bloqueado no valor de Cz$9.205.000,00; 981540, no valor de Cz$ 9.305.000,00 sacado sobre odepósito bloqueado no valor de 8.609.000,00 e o cheque nº 981583 novalor de Cz$ 8.610.000,00 sacado sobre depósito bloqueado no valor deCz$ 8.000.000,00. Houve ainda alguns casos de Saque a Descobertoefetuados através de cheques compensados, como pode ser facilmenteobservado pelo Saldo Devedor apresentado na referida Conta nos dias 06,08 e 09.04.1987 conforme extrato emitido pelo Serviço de Processamentode Dados da CEF.”

24. Desse mesmo laudo, merece transcrição, por oportuno, as respostasaos seguintes quesitos formulados pela própria A.:

“1º Quesito - O saldo devedor constante do extrato computadorizado,coresponde ao saldo devedor com os depósitos em cheque nãocompensados?

Resposta - Sim. No extrato emitido pelo Serviço de Processamento deDados da CEF estão contidos todos os depósitos efetuados na conta nº1063-7 titulada por LUIZ MOTTA NETO, portanto, no SALDO DEVEDORconstante do referido extrato estão incluídos os depósitos efetuados comcheques compensados e não compensados, bem como toda amovimentação da citada conta. Quando da montagem do extrato paraleloé que foram desconsiderados os depósitos cujos cheques não foramcompensados, para efeito de apuração do Saldo Devedor real do cliente.

2º Quesito - O saldo devedor encontrado pela CEF corresponde ao saldodisponível após a desconsideração dos depósitos em cheques nãocompensados?

Resposta - O SALDO DEVEDOR encontrado pela CEF, corresponde aosaldo contábil da conta, incluindo valores disponíveis e bloqueados, apósserem desconsiderados os depósitos cujos cheques não foramcompensados, isto é, que foram devolvidos, uma vez os mesmos tinhamcaráter meramente numérico, sem nenhuma expressão financeira, nãorepresentando recursos para a conta em questão, sendo apenas um jogode cheques, tendo sido considerados apenas os depósitos em chequesefetivamente confirmados pelo Serviço de compensação.

8º Quesito - Os cálculos levados a efeito pela CEF obedeceram às normasinternas da mesma e aos termos do contrato vigente entre a CEF e ocliente LUIZ MOTTA NETO?

Resposta - Todos os cálculos foram efetuados de acordo com as normasinternas estabelecidas pela CEF para as operações de Adiantamentos aDepositantes e Crédito Rotativo. Quanto aos cálculos relativos à operaçãoCrédito rotativo, embora no contrato firmado entre a CEF e o cliente LUIZMOTTA NETO estivesse estabelecido que a cobrança dos encargos seriaefetuada de acordo com a variação da ORTN’s acrescida dos juroscontratuais e do IOF, para efeito de cálculo desses encargos levamos emconsideração as taxas de juros estabelecidas semanalmente para aoperação, sendo aplicada a taxa de juros vigente na data da implantaçãoda conta na sistemática de Crédito rotativo através do Serviço deProcessamento de Dados. Vale ressaltar que a variação mensal da ORTN/OTN na época, estava em torno de aproximadamente 20% e que este

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parâmetro foi desconsiderado no cálculo dos encargos.”

25. Interessa aduzir que o assistente técnico do R. não apresentou oseu laudo técnico, conforme certificado nos autos (fls. 211).

26. O mesmo R., intimado (fls. 211) a falar sobre os laudos apresentados,apontou “desencontros nos mencionados laudos” (fls. 214), pediu esclarecimentos, mas nãocompareceu à audiência para tal fim designada (fls. 240/241).

27. Sem qualquer dúvida, o R. não desconstituiu a matéria de provaproduzida pela A., demonstrada via documentos e perícia.

28. Isto Posto, fundamentado no artigo 201, do CPC, julgo procedentea ação para condenar o R. LUIZ MOTTA NETO pague à A. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL -CEF, a importância de Cz$ 8.407.254,25 (oito milhões, quatrocentos e sete mil, duzentos ecinqüenta e quatro cruzados e vinte e cinco centavos), dos quais Cz$ 2.600.951,60 (doismilhões, seiscentos mil, novecentos e cinqüenta e um cruzados e sessenta centavos)correspondem a juros e Cz$ 30.498,47 (trinta mil, quatrocentos e noventa e oito cruzados equarenta e sete centavos) correspondem a IOF, valores esses apurados até 17/julho/1987,devendo ser o total, a partir de então, acrescido de juros legais e correção monetária.

29. Condeno, ainda, o R. ao pagamento de honorários advocatícios de10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (CPC, artigo 20).

30. Custas, ex lege.

31. P. R. I.

João Pessoa, 21 janeiro 1997.

JOÃO BOSCO MEDEIROS DE SOUSAJuiz Federal da 1ª Vara

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INSS - REVISÃO DE BENEFÍCIO III

Processo nº 37039 / AÇÃO ORDINÁRIAAutor: ANTÔNIO AUGUSTO SILVARéu: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL-INSS

SENTENÇA

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO.

Renda mensal inicial. Cálculo pela média dos últimos 36 salários decontribuição, corrigidos, mês a mês. CF/88, art. 202, caput e Lei nº 8.213/91, art. 41.

Benefício concedido após a vigência do Novo Plano de benefícios daPrevidência Social, com aplicação do critério de atualização monetáriadas contribuições.

Teto-limite do salário-de-contribuição. Legalidade na fixação do limitemáximo do salário-de-contribuição pelo INSS. Lei nº 8.213/91, arts. 29, §2º, 33, caput, 53 e 135 e Lei 8.212/91 art. 28, § 5º. Inexistência de afrontaao art. 202, da Constituição de Federal de 1988.

Paridade com o número de salários mínimos da época da concessão.Preservação do valor real do Benefício. Os arts. 194, IV e 201, parágrafosegundo da Constituição não asseguram a equivalência do benefício aosalário mínimo. Os critérios de preservação, em caráter permanente, dovalor real, são os estabelecidos em lei ordinária.

Primeiro reajuste. Índice proporcional. Súmula 260 do TFR e Portarias doINSS.

O enunciado sumulado somente se aplica aos benefícios concedidosantes de outubro de 1988. Revogação da legislação que a suportava.

Portarias editadas pela Previdência, após a vigência da Lei nº 8.212/91,determinando a aplicação de índices proporcionais aos meses em que osegurado estivesse em inatividade. Legalidade, em face da anteriorcorreção dos salários-de-contribuição, com base na nova legislação eart. 201, parágrafo terceiro da CF/88. Proporcionalidade previstaexpressamente no art. 41, II da Lei 8.212/91. A aplicação do índice integralrepresentaria dupla correção.

Improcedência do pedido.

Vistos etc.

ANTÔNIO AUGUSTO SILVA, devidamente qualificado(a) nos autos, titular

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de benefício com data de início (DIB) após agosto de 1993, propõe contra o INSTITUTONACIONAL DO SEGURO SOCIAL-INSS a presente ação ordinária objetivando a revisão dobenefício percebido, com pedido de pagamento de diferenças atrasadas, acrescido dosencargos legais. Alega a petição inicial, em resumo, que:

a) o autor contribuiu para a previdência social no limite de 18(dezoito)salários-mínimos, sem qualquer impugnação do INSS. Todavia, quando do cálculo para aconcessão de seu benefício foi verificado o estabelecimento, ilegal e abusivo, pelo Instituto-promovido de limites no salário-de-contribuição que refletiram, conseqüentemente, na definiçãodo salário-de-benefício. Aduz, portanto, serem inconstitucionais os arts. 29, parágrafo 2º, 33,caput, 53 e 135 da Lei 8.213/91 e art. 28, § 5º da Lei 8.212/91, já que limitaram o salário-de-contribuição e o salário-de-benefício, limitações estas não previstas na Carta Magna.

b) quando da feitura dos cálculos da concessão inicial do benefício, estesnão foram realizados de acordo com o que dispõe o art. 202, caput, da CF/88 c/c o art. 41, Ie II da Lei 8.213/91, já que o INSS não corrigiu todos os 36 últimos salários de contribuiçãopelo INPC, calculado pelo IBGE;

c) no primeiro reajuste do benefício, o Instituto-promovido aplicou índiceproporcional, com base em portarias administrativas, em desrespeito aos ditames da Súmula260, do extinto TFR;

d) não vem sendo mantida a paridade inicial com o número de saláriosmínimos da época da concessão do benefício, em afronta ao princípio da preservaçãopermanente do valor real, prevista no art. 201, parágrafo 2º da Constituição Federal.

Requer a revisão do benefício e, ainda, que seja aplicada “por analogia aSúmula 71, do ex-TFR, correção monetária também de acordo com a Súmula 71, até oajuizamento da ação, e desta data em diante pela Lei 6.899/81, incluindo-se, ainda, os índicesinflacionários EXPURGADOS pelo Governo, de 84,32% em março/90, 44,50% em abril/90,7,87% em maio/90 e 21,50% em fevereiro/91, medidos pela Fundação IBGE”.

Citado, o INSS apresentou contestação, sustentando que o benefício do(a)promovente foi concedido já na vigência da Lei nº 8.213/91 e que a renda mensal inicial foicorretamente calculada, com atualização monetária dos 36 últimos salários de contribuição.Alega, ainda, que no caso sub examine, é inaplicável o contido na Súmula 260, do extintoTFR, conseqüentemente ficando sem amparo o pedido de paridade inicial da concessão dobenefício.

Não havendo o que revisar, pede a improcedência do pedido.

O(A) autor(a) apresentou réplica à contestação.

Determinada a especificação de provas, nada foi requerido, vindo-me osautos conclusos para julgamento.

É o relatório.

Passo a fundamentar e ao final DECIDO.

1 - DO TETO DO SALÁRIO-DE-CONTRIBUIÇÃO:

Afirma a petição inicial ser ilegal qualquer limitação, a título de teto, para

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o salário-de-benefício.

Ao proferir julgamento na ação ordinária nº 93.0004916-0, ajuizada porCLÓVIS EUGÊNIO OLIVEIRA MELO, este magistrado, em entendimento do qual atualmentese penitencia, decidiu pelo acolhimento de tese idêntica à ora debatida, em sentença assimementada:

“EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. TETO MÁXIMOAPLICÁVEL À APOSENTADORIA. LEI Nº 8.213/91, ARTIGOS 29, § 2º E33.

Renda mensal inicial. Cálculo pela média dos últimos 36 salários decontribuição, corrigidos, mês a mês. CF/88, art. 202, caput. Auto-aplicabilidade. Súmula 09, do TRF 5ª Região. Precedentes do Col.STF.

Dispositivo constitucional que prevê todos os critérios para a fixação dovalor inicial da aposentadoria. Inexistência de qualquer limitação.

Inconstitucionalidade dos dispositivos de lei ordinária que fixam teto aovalor do salário-de-benefício”.

Contudo, melhor estudando a matéria, cheguei a conclusão diversa. Naverdade, o legislador ordinário poderia perfeitamente estabelecer contingenciamento,notadamente quando resguardada a razoabilidade, como feito no parágrafo 2º do art. 29 daLei 8.213/91, que, de modo perfeitamente lógico, estabeleceu a paridade com o próprio salário-de-contribuição, verbis:

“Art. 29 (...)

§ 2º. O valor do salário-de-benefício não será inferior ao de um saláriomínimo, nem superior ao do limite máximo do salário-de-contribuição nadata de início do benefício”.

Assim como para o salário-de-benefício, a Lei nº 8.213 tambémestabeleceu o mesmo teto para a renda mensal inicial, em dispositivo que mantém a harmoniado sistema de equivalência entre o financiamento da seguridade e a contraprestação securitária:

“Art. 33. A renda mensal do benefício de prestação continuada quesubstituir o salário-de-contribuição ou o rendimento do trabalho dosegurado não terá valor inferior ao do salário mínimo, nem superior ao dolimite máximo do salário-de-contribuição, ressalvado o disposto no art.45 desta Lei”.

Nenhuma inconstitucionalidade reside naqueles dispositivos. Em alentadasentença sobre o tema, o eminente Juiz Federal Substituto, Dr. JOSÉ MANUEL ZEFERINOGALVÃO DE MELO, assim se pronunciou sobre o tema, inclusive acrescentando a inexistênciade contradição com o disposto no art. 136 da Lei 8.213/91:

“Na sua dicção, o art. 136 afastou a incidência de limites para cálculo dosalário-de-benefício, sendo o valor deste, porém, ou seja, o valor final (queé coisa diversa), limitado ao do maior salário-de-contribuição (art. 29, §2º).”

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Não há, já daí se observa, incompatibilidade entre os arts. 29, § 2º, e 136da Lei 8.213, quando o primeiro reafirmou o limite máximo ao salário-de-benefício e esteúltimo aboliu a sistemática de limites dentro do próprio cálculo daquela base, tal como ocorria- e o exemplo deixa bem evidente a procedência do argumento - à luz dos arts. 23, inciso II,e 29, par.único, da CLPS (expedida com o Dec. 89.312/84).

Em todo caso, considere-se ainda o disposto no art. 33 da mesma Lei8.213, pelo qual a renda mensal inicial do benefício do Autor, de qualquer modo, nãoultrapassaria o limite máximo do salário-de-contribuição.

Nenhum processo hermenêutico, acrescente-se, autoriza dizer-se que oparágrafo 5º do art. 201 da Carta Federal, ao vedar valor de benefício inferior ao salário mínimo,tenha obstado, por isto, a fixação de limite máximo por norma infraconstitucional: desideratodaquele dispositivo foi, tão-somente, garantir aos beneficiários aquele mínimo condigno a suasubsistência.

Correto, destarte, o procedimento da Autarquia Ré ao fixar o valor darenda mensal inicial, precisamente, em correspondência ao “teto” tantas vezes referido.

Trata-se de controle atuarial que, de resto, dentro do sistema de custeio,implica em justiça distributiva, na medida em que garante a higidez do sistema como umtodo, se bem que não atenda ao ideal dos segurados, como no caso em exame.

WLADIMIR NOVAES MARTINEZ, que comenta lucidamente o Plano deBenefícios, anota muito bem esses dois pontos da questão, dizendo :

“A partir da vigência da Lei nº 8.213/91, os coeficientes do segurado sãoaplicados diretamente ao valor do salário de benefício, não mais subsistindoos limites fixados no art. 23, II, b, da CLPS, nem o estabelecido no seuart. 25. O menor valor-teto desapareceu para todos os fins, mas o maiorvalor-teto, sob o título de limite do salário de benefício continua existindo,definido no art. 29, § 2º, do PBPS.

Na verdade, sabendo o legislador dessa idealização (para contribuir quemadota uma certa base de cálculo espera receber um benefício aferido emfunção dessa mesma base de cálculo), em vez de antipaticamente reduzira renda mensal inicial deveria aumentar a alíquota e preservar acorrelatividade entre o salário de contribuição (base da contribuição) e odo salário de benefício (base do benefício). (autor citado, Comentários àLei Básica da Previdência Social, LTR, 2ª edição, pg. 397/398).”

De outra parte, em janeiro de 1992 já incidia a regra, específica aosbenefícios, do art. 41 da Lei 8213, por cujo inciso II as rendas mensais seriam reajustadaspela variação do INPC e não do salário mínimo, donde a impertinente invocação, para ahipótese, do art. 20 da Lei 8212: o art. 58, in fine do ADCT, aliás, foi expresso em que aparidade do valor dos benefícios com o número de salários-mínimos vigeria até a implantaçãodo Plano de Benefícios, o que ocorreu, em definitivo, com o Decreto 357, de 07.12.91.

Finalmente, observa-se do demonstrativo de fls. 10 que foi obedecido, narevisão procedida, o § 3º ao art. 201 da Carta Federal, posto que todos os salários-de-contribuição foram considerados e devidamente corrigidos.

(Sentença proferida em 17.5.95, nos autos da ação ordinária 94.0004482-8- 6ª Vara-PE).

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É, portanto, perfeitamente válido o limite máximo previsto em lei.

2. DA CONCESSÃO INICIAL DO BENEFÍCIO:

O(A) autor(a) pretende, ainda, que, ao cálculo da renda mensal inicial dobenefício de que é titular, seja aplicada a correção monetária dos 36 últimos salários decontribuição, pelos índices do INPC.

Entretanto, restou demonstrado, por documento elaborado pela DATAPREVque, ao benefício em análise, concedido após agosto de 1993, a Previdência aplicou a correçãomonetária das 36 últimas contribuições, em obediência ao disposto na Constituição Federalde 1988, artigo 202, e na Lei nº 8.212/91.

Ressalte-se que não se discute, no caso, sobre a auto-aplicabilidade ounão da regra constitucional, por se tratar de benefício posterior à regulamentação do art. 202,caput, da Constituição.

Não há o que revisar. Não restou demonstrado que o benefício não tenhasido corretamente calculado, ressalvando-se a possibilidade de existência de algum erromaterial que poderá, a qualquer tempo, ser retificado.

3. DA SÚMULA 260:

Requer o(a) autor(a) a aplicação da Súmula 260 do Tribunal Federal deRecursos, que determinava:

“Súmula 260. No primeiro reajuste do benefício previdenciário, deve-seaplicar o índice integral do aumento verificado, independentemente domês da concessão, considerado, nos reajustes subseqüentes, o saláriomínimo então atualizado”.

Aquela construção jurisprudencial surgiu em interpretação da legislaçãoque, à época, disciplinava os reajustes dos benefícios previdenciários. O Decreto-Lei nº 2.171,de 13 de novembro de 1984, então vigente, alterou a sistemática prevista no art. 25 da CLPS(Dec. 89.312/84). O critério passou a ser o da “política salarial”.

Determinava o D.L. 2.171/84:

“Art. 1º. O reajuste dos benefícios de média ou longa duração a cargo daPrevidência Social far-se-á sempre que for alterado o salário mínimo, sendodevido a contar da data em que este entrar em vigor.

Art. 2º. Os índices de reajustamento serão os mesmos da política salarial,considerando-se como mês básico o do início da vigência do novo saláriomínimo.

§ 1º Para fins de enquadramento do valor do benefício nas faixas adotadaspela política salarial será considerado, a partir da vigência do presenteDecreto-Lei, o novo salário mínimo”.

O critério previsto no referido Decreto-Lei foi estendido aos benefíciosrelativos ao período de novembro de 1979 a maio de 1984, em razão da Lei nº 7.604, de 28 demaio de 1987.

Todavia, aquela legislação, que suportava a interpretação dada pela Súmula

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260, no que tange à forma de reajuste dos benefícios, foi derrogada pela Constituição Federalde 1988.

Com efeito, determina o art. 58 do Ato das Disposições ConstitucionaisTransitórias:

“Art. 58. Os benefícios de prestação continuada, mantidos pela previdênciasocial na data da promulgação da Constituição, terão seus valores revistos,a fim de que seja restabelecido o poder aquisitivo, expresso em númerode salários mínimos, que tinham na data de sua concessão, obedecendo-se a esse critério de atualização até a implantação do plano de custeio ebenefícios referidos no artigo seguinte”.

Desse modo, somente então, instaurou-se a equivalência entre os reajustesdo salário mínimo e dos benefícios previdenciários, a partir de abril de 1989, até a efetivaimplantação da Lei nº 8.213/91, em janeiro de 1992, nos termos do art. 58 do ADCT. Ressalte-se que anteriormente, mesmo na vigência da Súmula 260, o critério de reajuste era a “políticasalarial”, o que não implicava em equiparação ao salário mínimo.

Se não bastasse a derrogação dos antigos critérios de reajustamentopela CF/88, toda a legislação que suportava o enunciado da Súmula 260 do TFR (art 89 doDecreto nº 89.312/84; Lei 3.807/60; Decreto 83.080/79 e Decreto 2.171/84; art. 153 do RBPS),encontra-se inteiramente revogada pelas Leis 8.212/91 e 8.213/91.

No caso em julgamento, o benefício do(a) autor(a) foi concedido, inclusive,após outubro de 1988, não se podendo sequer falar em eventuais diferenças, anteriores aonovo texto constitucional.

Improcede, portanto, o pedido de reajuste, na forma da Súmula 260, emface daquele enunciado não mais vigorar, desde o advento da Constituição Federal de 1988.

4. DAS PORTARIAS QUE INSTITUÍRAM CRITÉRIOS PROPORCIONAIS:

Sustenta a petição inicial que, quando do primeiro reajuste, deveria tersido aplicado o “índice integral”, da variação do INPC. Seriam ilegais as Portarias que instituíramcritérios proporcionais, ou fatores de redução para o indexador.

Ocorre que é o próprio art. 41, II, da Lei nº 8.213/91, que introduz umcritério, que não constitui um “fator de redução”, mas um mecanismo para que se evite maisde uma atualização, verbis:

“Art. 41. O reajustamento dos valores de benefícios obedecerá às seguintesnormas:(...)

II- os valores dos benefícios em manutenção serão reajustados, de acordocom suas respectivas datas de início, com base na variação integral doINPC, calculado pelo IBGE, nas mesmas épocas em que o salário mínimofor alterado, pelo índice da cesta básica ou substituto eventual”.

Logo, não se estabeleceu qualquer REDUÇÃO do valor real do benefício,em função da data da sua concessão. Pelo contrário, a aplicação proporcional do INPC émesmo necessária, de modo a que, no cálculo do benefício, não incida dupla correção.

Isto porque, o período anterior à data da concessão já fora corrigido, quandoda fixação da renda mensal inicial, em atendimento ao disposto no art. 201, parágrafo 3º da

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Constituição Federal,que determina a correção de todos os salários de contribuiçãocomputados no cálculo do benefício.

Logo, ao se computar novamente o INPC do período anterior (já levadoem consideração no cálculo do benefício), ocorreria dupla correção, em intolerável bis inidem.

Nesse sentido, registro precedente da eg. 3ª Turma do eg. TRF - 5ª Região,em Acórdão da lavra do eminente Juiz Ridalvo Costa:

“EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. REAJUSTE DE BENEFÍCIO. LEI 8.213/91, ART. 41, II. PROPORCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA.

- O critério de reajuste previsto na Lei 8.213/91, art. 41, não implicou emproporcionalidade, uma vez que o período anterior já foi devidamentecorrigido em função do art. 201, parágrafo 3º da CF/88.

- Apelação improvida”.

(Dec. unân. 3ª Turma, TRF-5ª Região. Juiz Rel. Ridalvo Costa, na AC nº77922-PE, julgamento em 18.05.95).

Desse modo, as Portarias da Previdência foram editadas com base nalegislação previdenciária, que não padece de qualquer inconstitucionalidade.

A situação é distinta da que ocorria quando da vigência da Súmula 260,quando os critérios de PROPORCIONALIDADE eram MERAMENTE ADMINISTRATIVOS,sem base em qualquer lei.

5. DA PARIDADE COM O SALÁRIO MÍNIMO / DO SISTEMA ATUAL DEREAJUSTE:

Pretende a inicial que, mesmo após a vigência do Novo Plano de benefíciosda Previdência Social, mantenha-se a paridade do benefício com o número de salários mínimosda época da concessão.

Não existe, porém, óbice constitucional em que a legislação ordináriafixe indexador para os benefícios previdenciários, distinto da variação do salário mínimo, jáque o critério previsto no art. 58 do ADCT foi provisório.

A Constituição Federal não vincula os benefícios mantidos pela PrevidênciaSocial aos percentuais ou às datas de reajuste do salário mínimo.

A majoração do salário mínimo somente é relevante em relação aosbenefícios de prestação mínima, em face da regra de que “Nenhum benefício que substitua osalário de contribuição ou o rendimento do trabalho terá valor mensal inferior ao salário mínimo”(CF, art. 201, § 5º).

Quanto aos demais, é a lei ordinária que fixa as épocas e índices para arecomposição, desde que mantido o “VALOR REAL” do benefício (CF, art. 201, § 2º). Não háque se falar em direito adquirido, já que o art. 58 do ADCT contém disposição expressaquanto à sua provisoriedade.

Os critérios adotados pelo legislador ordinário, até o momento, sãobaseados em indexadores da economia, não havendo, portanto, violação à regra da preservaçãopermanente do poder de compra:

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1º) A Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, em obediência aos dispositivosconstitucionais já mencionados, definiu como critério de reajuste a variaçãodo INPC, calculado pelo IBGE (art. 41,II).

Correspondendo à inflação do período, mantém, sem dúvida, o “valor realdo benefício”, estando o art. 41 do Plano de Benefícios em perfeitaharmonia com a exigência contida no art. 201, § 2º, da CF/88.

2º) A partir de janeiro de 1993, o reajuste passou a seguir a variação doIRSM, nos termos da Lei nº 8.542/92, conforme autorização contida noart. 41, § 1º, da Lei 8.213/91.

3º) Com a instituição da Unidade Real de Valor-URV, os benefíciospassaram a ser revistos de acordo com os critérios da Lei nº 8.880, de 27de maio de 1994, em que se converteu a Medida Provisória nº 434, de 27de fevereiro de 1994.

Determina o art. 29 daquele diploma legal, verbis:

“Art. 29. O salário mínimo, os benefícios mantidos pela Previdência Sociale os valores expressos em cruzeiros nas Leis nº 8.212 e nº 8.213, ambasde 1991, serão reajustados, a partir de 1996, inclusive, pela variaçãoacumulada do IPC-r nos doze meses imediatamente anteriores, nos mesesde maio de cada ano.

§ 1º Para os benefícios com data de início posterior a 31 de maio de1995, o primeiro reajuste, nos termos deste artigo, será calculado combase na variação acumulada do IPC-r entre o mês de início, inclusive, e omês imediatamente anterior ao reajuste.

§ 3º O salário mínimo, os benefícios mantidos pela Previdência Social eos valores expressos em cruzeiros nas Leis nº 8.212 e nº 8.213, ambasde 1991, serão reajustados, obrigatoriamente no mês de maio de 1995,em percentual correspondente à variação acumulada do IPC-r entre omês da primeira emissão do Real, inclusive, e o mês de abril de 1995,ressalvado o disposto no § 6º.

§ 4º Para os benefícios com data de início posterior à primeira emissãodo Real, o reajuste de que trata o parágrafo anterior será calculado combase na variação acumulada do IPC-r entre o mês de início, inclusive, e omês de abril de 1995”.

Assim sendo, o critério legal passou a ser o de reajuste, em maio decada ano, a partir de maio de 1995, pela variação acumulada do IPC-r,nos doze meses anteriores, ou entre a data da concessão e a data-base,se recente o benefício.

4º) Com o advento do atual padrão monetário, através da MedidaProvisória nº 542, de 30.6.94 (sucessivamente reeditada), foiobservada a PARIDADE prevista no art.1º, § 3º daquele diploma,sendo a APOSENTADORIA mantida “congelada”, até maio de 1995,quando houve o primeiro reajuste dos benefícios previdenciários,pela variação acumulada do IPC-r.

Em resumo, a Súmula 260, cuja aplicação é pleiteada na inicial, nãomais prevalece desde a efetiva implantação do art. 58 do ADCT. A revisão, procedida peloINSS, com base naquele dispositivo transitório, foi realizada administrativamente. Não se

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pode falar sequer em eventual diferença, com base na Súmula 260, já que o benefício do autorfoi concedido após a vigência do art. 58 do ADCT. Atualmente, o salário mínimo não mais éutilizado como referência para os reajustamentos dos benefícios previdenciários. A preservação,em caráter permanente, do valor real do benefício, não significa paridade com o número desalários mínimos da época da concessão. As Portarias editadas pelo INSS encontramfundamento no art. 41, II da Lei nº 8.213/91 e não constituem expurgo de índices de correção,mas apenas uma forma de evitar a dupla correção, tendo em vista que os salários-de-contribuiçãojá são atualizados, com base na nova legislação previdenciária e art. 201, parágrafo 3º da CF/88.

Não foi indicada qualquer defasagem a reparar. Não se demonstrou que aautarquia venha mantendo a prestação do benefício, em desacordo com a legislação vigente.

Por fim, no que tange ao requerimento de aplicação, quando da atualizaçãomonetária dos atrasados, do critério contido na Súmula 71, do ex-TFR, bem como a inclusãodos índices inflacionários expurgados pelo Governo, de 84,32%, 44,50%, 7,87% e 21,50%,fica prejudicado em face da improcedência total do pedido.

ISTO POSTO, julgo improcedente o pedido, condenando o(a) autor(a)nas custas processuais e nos honorários advocatícios, que arbitro em 10% (dez por cento)sobre o valor atribuído à causa, devidamente corrigido.

PUBLIQUE-SE. REGISTRE-SE. INTIMEM-SE.

Campina Grande, 02 de outubro de 1996.

ROGÉRIO DE MENESES FIALHO MOREIRAJuiz Federal da 4ª Vara/PB

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PENSÃO - DIREITO DA COMPANHEIRA

Processo Nº 96.03798-1 / AÇÃO ORDINÁRIAAutora: MARLI DAS NEVES BANDEIRARéu: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL

SENTENÇA

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ÓBITOANTERIOR À LEI 5.890/73. DIREITO DA COMPANHEIRA.PROCEDÊNCIA DO PEDIDO DE CONDENAÇÃO DA AUTARQUIA RÉNA IMPLANTAÇÃO DA PENSÃO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO DEINDENIZAÇÃO, COM ARRIMO NO ART. 159 DO CÓDIGO CIVIL, POSTOQUE O NÃO DEFERIMENTO DA PENSÃO POR MORTE, NA VIAADMINISTRATIVA, POR SI SÓ, NÃO GERA DIREITO À INDENIZAÇÃO,PRIMEIRO PORQUE CONTROVERTIDA A MATÉRIA, SEGUNDOPORQUE NÃO APONTADA QUALQUER ILICITUDE NO AGIR DAADMINISTRAÇÃO. Juros de mora, à base de 1% ao mês, desde a datado débito. Precedentes do Eg. Tribunal Regional Federal da 5ª Região.Juros compensatórios indevidos por falta de amparo legal e não seenquadrar a hipótese sub judice na construção jurisprudencial(desapropriação direta e indireta). Correção monetária, a partir dorequerimento administrativo, com base na Lei 8.213/91, com a redaçãodada pela legislação superveniente.

MARLI DAS NEVES BANDEIRA, qualificada na inicial, ajuizou ação derito ordinário, cumulada com pedido de tutela antecipatória, contra o INSTITUTO NACIONALDO SEGURO SOCIAL-INSS, objetivando a condenação da autarquia ré na implantação dapensão por morte de seu ex-companheiro e segurado obrigatório da Previdência Social,ALFREDO MARQUES DA SILVA, acrescida a condenação do pagamento de todos os valoresque deixaram de ser pagos, desde o requerimento administrativo, mais juros moratórios ecompensatórios, à base de 1% ao mês, desde a lesão do direito e correção monetária. Pediu,ainda, indenização correspondente a um salário mínimo pelo período que deixou de auferir aprestação, a teor do art. 159 do Código Civil, custas, verba honorária e, por fim, a gratuidadejudiciária.

Sustenta, que na qualidade de ex-companheira do falecido servidor daPrefeitura Municipal de João Pessoa, ALFREDO MARQUES DA SILVA, requereu,administrativamente, pensão por morte do ex-companheiro, restando o pedido sem apreciaçãopela Administração até a data do ajuizamento desta ação.

Aduz, ainda, que intentou Justificação Administrativa, com o fim de provara união estável com o de cujus e sua dependência econômica, também sem solução, daíhaver ingressado com pedido de Justificação Judicial, distribuída a esta 3ª Vara, onde ouvidas

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as testemunhas do fato.

Por fim, aduz que além da prova testemunhal, há prova material da uniãoestável, como se vê da certidão de nascimento da filha que teve com o ex-segurado, ANALÚCIA MARQUES DA SILVA.

Instruiu a petição inicial com procuração, autos da Justificação Judicial,certidão de nascimento, petição inicial da Justificação Administrativa de fls. 08 a 31.

Em juízo de admissibilidade da ação, determinei a emenda à inicial, paraque a autora trouxesse aos autos prova de que requisera o benefício junto ao INSS.

Cumprida a determinação, conclusos os autos, em decisão fundamentadaàs fls. 42/45, deferi a tutela antecipatória, em parte, no sentido de determinar ao INSS aimplantação da pensão por morte à autora.

Regularmente citado, o Instituto Nacional do Seguro Social não contestouo feito.

Expediente de fls. 51/53, da Procuradoria Autárquica, noticia o cumprimentoda decisão.

Às fls. 54/63 apresentou a autarquia ré cópia da petição de agravo deinstrumento interposto contra a decisão concessiva da tutela.

Comunicação do Eg. Tribunal Regional Federal da Quinta Região, às fls.67/72, acerca do recebimento do recurso, sem pedido de liminar, solicitando informações.

Informações prestadas (fls. 73/77), e tratando-se de matériapredominantemente de direito, passo ao julgamento antecipado da lide. DECIDO.

Observo que a autora requereu os benefícios da justiça gratuita, nãoenfrentado quando do despacho inicial, pelo que o examino neste ato, deferindo-o, à luz daLei 1.060/50.

No mérito, trata-se de pedido de pensão por morte requerida por ex-companheira de segurado da Previdência Social, morto em 1959, não solucionado na viaadministrativa.

O feito não foi contestado. Porém, segundo se depreende da cópia dapetição de agravo de instrumento junta aos autos às fls. 60/63, o obstáculo ao reconhecimentodo pedido, deve-se ao fato de que, à época do óbito do segurado instituidor da pensão, alegislação básica da Previdência não contemplava a companheira como beneficiária de pensão.

Este o único óbice levantado em desfavor do pedido, restandoincontroversos a convivência entre a autora e ex-segurado, em estado more uxorio, durantelongos anos e sua dependência econômica, fatos, ademais, sobejamente demonstrados emprova documental e testemunhal produzida na Justificação Judicial que instrui os pedidos.

Examinemos, pois, a lei de regência vigente no tempo do óbito, o Decretonº 32.667, de 01.05.53, art. 136, verbis:

“Art. 136 - Para os efeitos deste Regulamento, consideram-se dependentesdo segurado, na seguinte ordem de preferência:

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a) a esposa, o marido inválido, os filhos de qualquer condição, quandoinválidos ou menores de 18 (dezoito) anos e as filhas solteiras de qualquercondição, quando inválidas ou menores de 21 (vinte e um) anos;

b) a mãe e o pai inválido, os quais poderia, mediante declaração expressado segurado, concorrer com a esposa ou esposo inválido;

c) os irmãos inválidos ou menores de 18 (dezoito) anos e as irmãs solteiras,quando inválidas ou menores de 21 (vinte e um) anos;

§ 1º - A dependência econômica das pessoas indicadas e das demaisenumeradas deve ser comprovada.

§ 2º - Em falta de dependentes enumerados na alínea “a” deste artigopoderá o segurado inscrever, para fins de percepção de benefício, pessoaque vive sob sua dependência econômica e que, por sua idade, condiçãode saúde ou encargos domésticos, não possa angariar meios para seusustento.

§ 3º - Não existindo a declaração que alude o parágrafo anterior, servirápara comprovar a condição de dependente a designação constante dacarteira profissional.

§ 4º - A existência de dependente de uma das classes exclui do benefícioos das classes subseqüentes, ressalvada a hipótese da alínea “b” desteartigo.”

Como se vê dos dispositivos acima transcritos, a lei vigente à data doóbito do instituidor da pensão, não contemplava, expressamente, a companheira, no rol dedependentes do segurado, ignorando-a enquanto realidade de fato.

A norma, é cediço, não disciplina com instantaneidade as relações sociaisem constante mutação.

Mas não se pode, entretanto, negar à companheira seu direito ao benefício,à luz da norma acima referida, posto que esta mesma norma contempla a pessoa que vivesob a dependência econômica do segurado. Em outras palavras, a companheira, a sociedadede fato que a realidade social brasileira de há muito conhece, mas que à época, o ordenamentojurídico preferiu ignorar até o advento da Lei 5.890, de 08.06.73, que veio garantir o direito àpercepção de pensão por morte à companheira.

Com o advento da Constituição Cidadã de 1988, restou superada toda equalquer possibilidade de interpretação restritiva da norma, garantida a proteção do Estado àunião estável entre o homem e a mulher como entidade familiar.

Daí a Lei nº 8.213/91, em sintonia com a nova ordem constitucional,também assegurar, em seu art. 16, o direito da companheira, como beneficiária do RegimeGeral da Previdência Social, na condição de dependente do segurado. Dependência essa,ressalte-se, presumida, por força de lei.

Por último, ressalto que o conflito sub judice não é estranho ao Judiciário,que, em inúmeros julgados, interpretando teleologicamente a norma, tem prestigiado a uniãoestável do homem e da mulher, concluindo pelo direito próprio da companheira aos benefíciosprevidenciários, a despeito de não encontrar amparo expresso na legislação de regência àépoca do óbito do instituidor do benefício.

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Destaco, entre inúmeros, o acórdão adiante ementado, da lavra doeminente JUIZ CASTRO MEIRA:

“PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO. COMPANHEIRA. ÓBITO ANTERIOR ÀLEI 5.890/73.

- A ocorrência de óbito anterior à vigência da Lei 5.890/73 não é óbice àconcessão de pensão à viúva que conviveu mais de dez anos com osegurado sob sua dependência.

- Todavia, havendo sido deferido o benefício em favor de seus filhos menores,determina-se que o pagamento se dê proporcionalmente, a medida quecada um atinja a maioridade, ressalvadas as parcelas já atingidas pelaprescrição.

- Apelação parcialmente provida”.

(Apelação Cível nº 0508237-CE, 1ª Turma, TRF 5ª Região, Coleção JURIS-CD, 1ª EDIÇÃO).

Aliado ao fato de restarem incontroversas a convivência em estado moreuxorio e a dependência econômica, há prova nos autos de que a autora era companheira doex-segurado, ALFRÊDO MARQUES DA SILVA, com quem teve uma filha, hoje maior, denome Ana Lúcia Marques da Silva, como se vê da certidão de nascimento de fls. 21, tendosido declarante o próprio genitor.

Prova material que por si só, já dá um grau de probabilidade máxima darelação marital entre a autora e o segurado, reforçada, inclusive, pela prova testemunhalproduzida na Justificação Judicial que instrui a peça vestibular (fls. 15 a 31), harmônica e ricade detalhes quanto à existência da relação marital por muitos anos e a dependência daautora ao então segurado da Previdência.

Isto posto, JULGO PROCEDENTE o pedido de condenação do INSS naimplantação da pensão por morte, requerida por MARLI DAS NEVES BANDEIRA.

Condeno, ainda, a autarquia ré no pagamento das parcelas vencidas, apartir do requerimento administrativo, em 23.05.95, protocolado sob o nº 35172.002225/95-01(fls. 36), até a data da efetiva implantação da pensão, acrescidas de juros de mora, à base de1% ao mês, a partir do requerimento administrativo (AC 19973-PE, Rel. JUIZ MANOELERHARDT, unânime, AC 32812-PE, Rel. JUIZ JOSÉ DELGADO, unânime).

Incabíveis os juros compensatórios, por falta de amparo legal e por nãose enquadrar a hipótese sub judice nos casos abrangidos pela construção jurisprudencial(desapropriação direta e indireta).

A correção monetária deve ser calculada, a partir do requerimentoadministrativo, pelos índices definidos na Lei 8.213/91, com a redação dada pela legislaçãosuperveniente.

Quanto ao pedido de indenização, julgo-o improcedente, posto que o nãodeferimento da pensão por morte, na via administrativa, por si só, não gera direito à indenização,primeiro porque controvertida a matéria, segundo porque não apontada qualquer ilicitude noagir da Administração, que, vinculada ao princípio da legalidade, interpretou a norma como selhe apresentou como dever.

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Dado que o pedido da autora não foi inteiramente acolhido, mas levandoem consideração o trabalho do seu patrono, que incluiu seu acompanhamento na viaadministrativa, ajuizamento de justificação judicial, resposta ao recurso de agravo deinstrumento, e porque aplicável à hipótese o § 4º do art. 20 do CPC (STJ, 1ª, RESp 12.077-RJ,DJU 21.10.91, pág.14.732), fixo a verba honorária em 12% sobre o valor da condenação,assim distribuída: 10% a ser suportada pela autarquia ré e 2% pela autora.

Sem custas adiantadas a ressarcir.

P. R. I.

João Pessoa, 16 de setembro de 1996.

CRISTINA MARIA COSTA GARCEZJuíza Federal Substituta da 3ª Vara

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INSS - REAJUSTE DE BENEFÍCIO

Processo Nº 96.00990-2 / AÇÃO ORDINÁRIAAutor: EDNALDO CARDOSO DA SILVARéu: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL

SENTENÇA

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. Reajuste debenefício previdenciário para manutenção da equivalência entre o númerode salários mínimos a que correspondia a RMI na data da concessão.Prescrição qüinqüenal. Obediência ao princípio constitucional dapreservação do valor real. Interpretação dos arts. 194, IV, 201, § 2º e 202,todos da Constituição Federal. Resíduo da correção monetária dos147,06%. Juros de mora, a base de 1% ao mês, a partir do vencimentoda dívida, dada sua natureza alimentar. Correção monetária. Aplicaçãoda Lei 6.899/81, quanto aos índices, com marco inicial a partir dovencimento da dívida. Procedência dos pedidos.

EDNALDO CARDOSO DA SILVA, qualificado na petição inicial edocumentos que a instruem, ajuizou ação de rito ordinário contra o INSTITUTO NACIONALDO SEGURO SOCIAL-INSS, objetivando sua condenação na revisão de seu benefício parapreservar, em caráter permanente, o valor real que tinha na data da concessão, a partir deabril de 1989, com o pagamento das parcelas vencidas e vincendas atualizadas monetariamente,com base na Lei nº 6.899/81, a partir do pagamento frustado e juros moratórios, à base de 1%ao mês, a partir da lesão do direito. Pediu, ainda, a condenação da autarquia ré no pagamentodo resíduo da correção monetária sobre as parcelas atrasadas dos 147,06%, verba honoráriae ressarcimento de custas.

Sustenta, em resumo, na bem elaborada petição inicial, o decesso emseus proventos, desde a revisão procedida com o advento da Lei 8.213/91, em afronta flagranteaos princípios constitucionais da irredutibilidade de proventos e seu reajuste para manutenção,em caráter permanente, do valor real, com apoio nos arts. 194, inc. IV, §§ 2º e 3º do art. 201,202, todos da Constituição Federal, além de precedentes jurisprudenciais do Cl. SuperiorTribunal de Justiça e Tribunais Regionais Federais.

Instruiu a inicial com procuração e documentos de fls. 18 a 22.

Regularmente citado, o Instituto Nacional do Seguro Social contestou ofeito, argüindo, preliminarmente, carência de ação, em face da impossibilidade jurídica dopedido e, no mérito, a prescrição qüinqüenal e improcedência do pedido, por não restar violadoo princípio da manutenção do valor real do benefício ou reajuste proporcional, uma vez queobedecidos aos comandos da Lei 8.213/91 e alterações.

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Sem impugnação à contestação e tratando-se de matéria eminentementede direito, DECIDO.

Sustenta a autarquia ré, em preliminar, que o autor é carecedor do direitode ação, face a impossibilidade jurídica do pedido.

Não tem razão. O direito à revisão dos benefícios previdenciários, paramanutenção, em caráter permanente, do seu valor real, está previsto, expressamente, no art.201, § 2º, da Constituição Federal, daí resultar que o pedido é juridicamente possível, porfundado, em tese, no ordenamento jurídico vigente. Rejeito, portanto, a preliminar levantada.

Os benefícios previdenciários, em face de sua natureza alimentar, sãoimprescritíveis, daí só se haver falar em prescrição das parcelas anteriores ao qüinqüídio doajuizamento da ação.

No mérito, pede o autor o reajuste de sua aposentadoria para preservaçãodo valor real, com arrimo nos arts. 194, inc. IV e 201, § 2º, da Constituição Federal.

Segundo análise dos documentos que instruem a inicial, está a situaçãodo autor em confronto com o direito adquirido na data da concessão de seu benefício, tomando-se por critério o preconizado no art. 58, do ADCT:

NOME EDNALDO CARDOSO DA SILVAVALOR DO BENEFÍCIO NA DATA DACONCESSÃO, EM NÚMERODE SALÁRIOS MÍNIMOS .................................................................................... 4,88

VALOR DO BENEFÍCIOEM SETEMBRO/95 ............................................................................................ 4,06

Em casos semelhantes a este, vinha julgando improcedente o pedido,por entender que o reajuste dos benefícios previdenciários pelo mesmo índice de aumento dosalário mínimo, de forma a manter a equivalência inicial, constituiria direito assegurado somenteno período compreendido entre abril/89 e a implantação dos novos Planos de benefícios daPrevidência Social, conforme determinação contida no art. 58, do ADCT.

Pautava-me no entendimento de que a própria Constituição havia remetidoao legislador ordinário a fixação dos critérios para preservação do valor real, daí não tervislumbrado pela aplicação dos sucessivos índices (INPC, IRSM, IPCr, IGP-DI), a alegadaofensa aos arts. 194, IV e 201, § 2º, da Constituição Federal.

Tal entendimento, hoje, não se me afigura o mais correto, diante da tristerealidade que aflige todos os “beneficiários” da Previdência Social - a perda do poder aquisitivodos proventos, em face da aplicação de índices de inflação, que apenas lhe recompõem,parcialmente, o valor, como bem demonstra o quadro acima.

Tantos índices e tantos os critérios diferenciados para sua aferição, nãoconseguiram registrar a perda real da expressão monetária frente à inflação, é um fato. Deconseqüência, o repasse da variação de preços para os benefícios, não lhes protegeu dacorrosão provocada pelo processo inflacionário. A título de ilustração, cite-se o ocorrido nomês de janeiro/89, em que o INPC foi 35,48%, e o IPC, 70,28%.

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A preservação do valor real dos benefícios está constitucionalmentegarantida aos segurados da Previdência Social, não podendo tal garantia ser violada ou reduzida,de forma direta ou indireta, pela legislação infraconstitucional, como bem decidiu a MM.JUÍZA LUÍSA DIAS CASSALES, em acórdão, assim ementado:

“PREVIDENCIÁRIO. REAJUSTE DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.PROPORCIONALIDADE. SUM-260 / TFR.

1. O REAJUSTE DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DEVE MANTER OVALOR REAL DA ÉPOCA DA APURAÇÃO DA RMI.

O PRINCÍPIO DO REAJUSTAMENTO PROPORCIONAL CAUSADEFASAGEM NO VALOR REAL DO BENEFÍCIO, MOTIVO PELO QUALDEVE ELE SER FEITO NA FORMA ESTABELECIDA PELA SUM-260 /TFR.”

(AC NUM:0452311 ANO:94 UF:RS TURMA:05 REGIÃO:04, DECISÃO:09-03-1995, In Coleção JURIS-CD, 9ª EDIÇÃO)

Creio, portanto, que a melhor exegese é aquela que aponta para apreservação do número de salários mínimos que tinha o benefício na data da sua concessão,por ser este PISO o tradutor do mínimo do VALOR REAL prescrito no art. 201, § 2º, daConstituição Federal; o critério que, até alteração da legislação infraconstitucional reguladorados reajustes, melhor atende aos princípios constitucionais da irredutibilidade do valor dosbenefícios (art. 194, IV) e o seu reajuste para preservação, em caráter permanente, do valorreal.

Nesse sentido, colho trecho do voto do Eminente JUIZ PETRUCIOFERREIRA, nestes termos:

“Não se discute que o art. 58 do ADCT determinou a atualização dosbenefícios por equivalência ao número de salários mínimos até aimplantação do Plano de Custeio e Benefícios e, também, que o saláriomínimo não possa ser utilizado como índice para qualquer efeito, ante avedação do art. 7º, IV do Texto Constitucional, entretanto, não podemosfechar os olhos diante do princípio da preservação do valor real do benefício,prevista, também, no referido texto, diante da solicitação em juízo deaposentados que perderam o poder aquisitivo dos seus proventos, apesarda aplicação do INPC, posto que houve redução do número de saláriosmínimos que percebiam na data de sua concessão. Se todos concordamque o salário mínimo é um valor insuficiente para a subsistência humanadiante da realidade econômica brasileira, como poderemos concordar queuma parcial atualização diminua, ainda, mais o seu poder real, respeitando-se apenas o limite de tal defasagem o fato de não ser inferior a um saláriomínimo. Importa posicionar-se no sentido de que ocorrendo um novo índiceespecífico que, em sua aplicação, não preserve o valor real do benefício,há de proceder-se à devida atualização, observando-se o limite mínimoque seria a equivalência em salários mínimos. Tal preocupação com aconservação do valor real do benefício está prevista no § 2º do art. 41 dalei nº 8.213/91, quando determina que ‘na hipótese de se constatar perdado poder aquisitivo com a aplicação do disposto neste artigo, o ConselhoNacional de Seguridade Social-CNSS poderá propor reajuste extraordináriopara recompor esse valor, sendo feita igual recomposição das faixas elimites fixados para os salários - de - contribuição’. Assim, se por umlado, não se pode vincular a atualização dos benefícios determinando

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como índice o salário mínimo, que em futuros momentos poderia ser atéprejudicial ao aposentado, por outro lado não se pode aplicar um índicede atualização que defase o valor real, impondo-se como solução afreqüente atualização pela equivalência do número de salários da data daconcessão quando o índice não atinja o objetivo de preservação do poderaquisitivo”. (grifo nosso) (AC 90546/95-PB, 95.05.32710-2, julgada em19.12.1995)

Quanto ao pedido da condenação do INSS no pagamento do resíduo dacorreção monetária dos 147,06% sobre as parcelas pagas com atraso de dois meses;reconhecida a dívida, com o pagamento administrativo parcelado, é de se aplicar o enunciadoda SÚMULA 05 do Eg. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, verbis:

“Súmula 05 - As prestações atrasadas reconhecidas como devidas pelaAdministração Pública devem ser pagas com correção monetária”.

Isto posto, JULGO PROCEDENTE a demanda para condenar o INSS areajustar o benefício do autor, a partir de abril de 1989, preservando-lhe, em caráter permanente,o valor real, quando da aplicação dos índices previstos na Lei 8.213/91 e alterações, observandocomo parâmetro mínimo o número de salários mínimos da data da concessão. Condeno,ainda, a autarquia ré no pagamento das diferenças das prestações vencidas e vincendas,deduzindo-se os índices aplicados pelo INSS, nos meses correspondentes, afastadas asparcelas atingidas pela prescrição qüinqüenal, com correção monetária, pelos índices fixadospela Lei nº 6.899/81 e alterações, a partir do vencimento de cada parcela, em face do caráteralimentar do débito, além de juros de mora, à base de 12% ao ano, desde a data do débito,conforme orientação firmada pelo Eg. TRF da 5ª Região (AC 19973-PE, Rel. JUIZ MANOELERHARDT, AC 32.812, Rel. JUIZ JOSÉ DELGADO), e resíduo de correção monetária sobre opagamento parcelado dos 147,06%, a ser apurado na fase de liquidação, além de suportar oreembolso das custas antecipadas e verba honorária, que fixo em 10% sobre o valor dacondenação, atendendo ao disposto no § 4º do art. 20, do CPC.

P. R. I.

João Pessoa, 18 de setembro de 1996.

CRISTINA MARIA COSTA GARCEZJuíza Federal Substituta da 3ª Vara

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IMPORTAÇÃO EXPORTAÇÃO (DRAWBACK)

Processo nº 96.00273-8 / MANDADO DE SEGURANÇAImpetrante: USINA MARAVILHAS S/AImpetrado: INSPETOR DO PORTO DE CABEDELO/PB

SENTENÇA

EMENTA: TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE EXPORTAÇÃO. REGIME DEDRAWBACK. ÁLCOOL ETÍLICO IMPORTADO E QUE TEVE SEU TEORALCÓOLICO MODIFICADO. PRODUTO NACIONALIZADO.OCORRÊNCIA DE HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DEEXPORTAÇÃO. DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA.

1. Para que uma mercadoria entre no campo de incidência do imposto deexportação é necessário que esta seja nacional ou nacionalizada (art.221, caput, do Decreto 91.030/85).

2. O álcool importado pelo impetrante sob o regime especial do drawback,lógico, não é nacional. Porém, foi nacionalizado, eis que passou por umprocesso de modificação do seu teor alcóolico, que se consubstanciaem industrialização por beneficiamento, consoante o disposto no art. 3º,do Decreto nº 87.981/82.

3. Destarte, por ser o álcool em tela produto nacionalizado, entra no campode abrangência do imposto de exportação.

2. Segurança que se denega.

Cuida-se de Mandado de Segurança cumulado com pedido liminar,impetrado por USINA MARAVILHAS S/A, devidamente qualificada, contra suposto ato ilegaldo INSPETOR DO PORTO DE CABEDELO-PB, consubstanciado na exigência de pagamentodo imposto de exportação de mercadoria remetida pela impetrante ao exterior, à alíquota de40% (quarenta por cento).

Alega a empresa impetrante, no desenvolvimento de suas atividadesindustriais e mercantis, ingressou junto à Receita Federal com pedido de constituição deregime de drawback para internação e posterior exportação, após reprocessamento de12.760,31m3 de álcool etílico, o que lhe foi concedido.

Aduz que, à medida que o álcool era reprocessado, efetuou a devoluçãono prazo assinado nos atos concessórios de 10.038,310m3, restando-lhe devolver o total de2.211,597 m3 do produto.

Diz que a autoridade impetrada ameaça proceder à cobrança do impostode exportação sobre as remessas já efetuadas na alíquota de 40% (quarenta por cento), na

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forma instituída pela RESOLUÇÃO DO BACEN nº 2.136/94.

Na tentativa de sustar tal ato, por acreditar que sua mercadoria não foraimportada com ânimo definitivo, requer a impetrante, a concessão de liminar e por fim, sejaconcedida a segurança para assegurar o seu pretenso direito líquido e certo de não recolhersobre o álcool enviado ao exterior o imposto de exportação.

Acostou aos autos a procuração e os documentos de fls. 13/70.

A liminar foi concedida às fls. 74/75.

Notificado para prestar informações, o impetrado afirma que o álcoolimportado pela impetrante sob o regime de drawback fora submetido a um processo debeneficiamento que alterou seu teor alcoólico para volume igual ou superior a 80 GL VOL.Destarte, tal beneficiamento é nada mais é do que industrialização, conforme informa oRegulamento do Imposto sobre produtos industrializados, aprovado pelo Decreto 87.981, de23.12.82, no seu art. 3º, o que torna o produto nacionalizado e, desta forma, passível deincidência do imposto de exportação.

Alega, ainda, que o referido álcool a ser exportado é mercadoria diversadaquela anteriormente importada, com o que cai por terra a tese do impetrante de que aimportação não seria à título definitivo.

O parecer da Douta Procuradoria da República, na palavra do ilustreProcurador LUCIANO MARIZ MAIA é no oriente da denegação da segurança face aobeneficiamento a que foi submetida a mercadoria, que, desde então, passou a ser um produtoindustrializado e nacionalizado, sujeito ao imposto sobre exportações.

É o relatório. Decido.

O drawback, palavra derivada da língua inglesa (to draw - tirar e back -outra vez) é um benefício fiscal que consiste na suspensão, isenção e restituição do impostode importação de mercadorias importadas para posterior reexportação tem por escopo oincentivo às exportações e abrange só e tão somente o imposto de importação e obrigaçõesfiscais decorrentes dessa operação, não ocorrendo, em detrimento desse regime especial,qualquer isenção ou redução no imposto de exportação.

O imposto de exportação, por sua vez, nos termos do art. 221 doRegulamento Aduaneiro, tem seu campo de incidência assim definido:

“Título IV

DO IMPOSTO DE EXPORTAÇÃO

Capítulo I

Incidência

Art. 221. O imposto incide sobre mercadoria nacional ou nacionalizadadestinada ao exterior (Decreto-Lei nº 1.578, art. 1º)”.

No particular caso dos autos, o impetrante procedeu à importação, com obenefício do drawback de 12.760,320 m3 de álcool etílico desnaturado com um teor alcoólicoem volume igual ou superior a 80 GL (Gay-Lussac) VOL e, para adequá-la ao consumo,

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modificou o seu teor alcoólico mínimo para 95 G.L., efetuando a devolução de 10.038,310 m3para o país de origem.

Em consonância com o preclaro Representante do MPF, entendo que aalteração no teor alcóolico do bem importado sob o regime de drawback, para adequar oálcool importado à fins medicinais e/ou carburantes, o tornou um produto nacional, fato que ocolocou no campo de incidência do imposto de exportação, consoante o disposto no art. 211do Regulamento Aduaneiro, supra transcrito.

O álcool importado sob o regime de drawback, foi beneficiado, para quese adequasse a fins medicinais e/ou carburantes, o que é, nada mais, nada menos do queum processo de industrialização, previsto no Regulamento do Imposto Sobre ProdutosIndustrializados, aprovado pelo Decreto nº 87.981/82 que, em seu art. 3º, preceitua e ensina:

“art. 3º. Caracteriza industrialização qualquer operação que modifique anatureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidadedo produto, ou o aperfeiçoe para o consumo, tal como:

II - a que importe em modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alteraro funcionamento ou a aparência do produto. (beneficiamento)”.

Destarte, não é preciso muito esforço lógico nem mental para se concluirque a alteração do teor alcóolico do álcool importado -imprestável para o consumo medicinale/ou carburante - de modo a torná-lo útil para essas finalidades, constitui um beneficiamento,fato que torna o produto nacionalizado e, desta feita, sujeito à incidência do imposto deexportação.

Ao contrário do que ventila o impetrante na sua petição inicial, quando dizque importou o álcool para “internação e posterior reexportação”, a hipótese retratada nosautos não é de admissão temporária que se destina a bens que precisam ingressar no territórionacional, permanecer durante certo tempo e retornarem ao exterior da mesma forma comoentraram, ou seja sem que tenha havido beneficiamento ou industrialização. O álcool importadopelo impetrante, conforme ele próprio afirma “inservível para usos medicinais ou carburantes”(fls. 03) foi beneficiado e exportado para esses fins e, portanto, teve sua essência alterada,transformando-se em mercadoria nacionalizada, sobre a qual incide o imposto de exportação.

Destarte, pode se construir no caso dos autos o seguinte silogismo:

Premissa maior: Para que uma mercadoria entre no campo de incidência(esteja ao alcance ou chegada efetiva) do imposto de exportação é necessário que esta sejanacional ou nacionalizada.

Premissa menor: o álcool importado sob o regime especial do drawback,lógico, não é nacional. Porém, foi submetido processo de industrialização através da modificaçãono seu teor alcóolico de modo a adequá-lo a fins medicinais e/ou carburantes, o que o tornounacionalizado e, portanto, dentro do campo de incidência do imposto de exportação.

Isto posto, por ser o álcool em questão (mercadoria importada sob oregime de drawback para posterior reexportação), produto nacionalizado, torna-se imperiosaa conclusão de que sobre ele incide o imposto de exportação, razão pela qual, em harmoniacom o parecer ministerial, cassada a liminar concedida, denego a segurança requerida.

Isento de honorários (Súmula 512, STF).

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Custas, ex lege.

João Pessoa, 25 de março de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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IMPORTAÇÃO - CARROS USADOS

Processo nº 93.019.63-5 / MANDADO DE SEGURANÇAImpetrante: ORNILDO JOAQUIM PESSOAImpetrado: GERENTE DA CARTEIRA DE COMÉRCIO EXTERIOR DO

BANCO DO BRASIL S/A - CACEX

SENTENÇA

EMENTA: ADMINISTRATIVO - TRIBUTÁRIO. IMPORTAÇÃO DECARROS USADOS. PORTARIA DO DECEX 06/90. PRELIMINAR DEILEGITIMIDADE REJEITADA. DENEGAÇÃO DO WRIT.

1- O gerente da CACEX é parte legítima para figurar no pólo passivo darelação processual do presente mandamus. Preliminar rejeitada.

2-Não viola o princípio constitucional da Isonomia, a legislação específicaque proíbe a importação de veículos usados.

3- A proibição de importação de bens usados visa proteger a economianacional, tem amparo constitucional e faz parte do Poder Discricionárioda Administração Pública.

4- Denegação do mandamus.

Vistos etc.

Cuida-se de mandado de segurança cumulado com medida liminar,impetrado por ORNILDO JOAQUIM PESSOA, devidamente qualificado na inaugural, contraato do GERENTE DA CARTEIRA DE COMÉRCIO EXTERIOR DO BANCO DO BRASIL S/A -CACEX, consubstanciado na negativa de aceitação de guia de importação referente a automóvelde propriedade do impetrante.

Aduz o impetrante que foi estudante nos Estados Unidos por mais de 02(dois) anos, tendo seus bens sido desembaraçados normalmente, exceto veículo de suapropriedade.

Sustenta que com a edição da Portaria nº 06, da CACEX, permissiva deentrada de veículos automotores, resolveu reinvindicar à autoridade federal a liberação doveículo de sua propriedade, que se encontra nos Estados Unidos. Porém apesar de váriastentativas nesse sentido não logrou êxito, sendo iterativametne negada, pela autoridadeimpetrada, a aceitação da guia de importação, devido ao fato da aludida Portaria privilegiarapenas os importadores de veículos novos, tendo esses a obrigação de pagar o Imposto deImportação e o ICMS, respectivamente.

Esclarece que já existem, atualmente, liminares concedendo a liberaçãode carros usados.

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Por fim, entendendo presente os requisitos do fumus boni juris e dopericulum in mora, requer a concessão de medida liminar inaudita altera pars no sentidode determinar à autoridade impetrada aceitar a guia de importação e, cumprindo o tramitarregular do feito, a concessão da segurança definitiva, confirmando a liminar, bem comoisentando o impetrante do recolhimento do IPI e ICMS referentes à operação.

Colacionou aos autos a procuração de fls. 05 e os doc. de fls.06/07.

Verificando o caráter supina e escancaradamente satisfativo doprocedimento acautelatório requerido, foi indeferida a liminar pleiteada, determinada anotificação da autoridade impetrada e, em seguida, vista ao douto órgão do parquet federal(fls. 09).

Regularmente notificada, a autoridade apontada como coatora prestou asinformações de fls.12/14 onde, em síntese, alega que a Portaria nº 06/90, da SecretariaNacional de Economia, contra a qual se insurge o impetrante, “só permite a importação decarros novos, fabricados pelo país de procedência, por Pessoas Jurídicas, devidamenteregistradas junto ao Departamento de Comércio Exterior, e desde que os automóveis sejamexportados diretamente pelos fabricantes ou pelas empresas por eles credenciadas”.

Pugna também pela sua ilegitimidade ad causam, eis que entende praticarmeramente atos executórios, eis que é um mero executor da determinação contida na normade importação, bem como a determinação da citação da União para compor a lide, na qualidadede litisconsorte passivo necessário.

Por fim, requer a denegação do mandamus face a inexistência de direitolíquido e certo a amparar a impetração.

O parecer da douta Procuradoria da República, da lavra do Dr. FRANCISCOCHAVES DOS ANJOS NETO é no oriente de, preliminarmente, a extinção do processo semjulgamento do mérito ante a ausência de prova pré-constituída de direito líquido e certo aembasar a pretensão do impetrante que não trouxe aos autos a prova de propriedade doveículo. De meritis, opina pela concessão da segurança, face ao Princípio da Isonomia e aosditames da Portaria nº 56/90, do Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento.

Às fls. 19, foi determinada a baixa dos autos em diligência para juntadade petição, em seguida foi dada nova vista ao MPF que mutatis mutandis, reiterou o parecerinserto no ventre dos autos.

Em seguida, os autos foram novamente baixados em diligência, às fls.32, para proceder à notificação da União Federal para compor a lide na qualidade de litisconsortenecessário.

Notificada a Procuradoria da Fazenda Nacional, esta esclareceu que aliminar requerida era realmente impossível, registrando o acerto por parte deste juízo.

Alega também, a Fazenda Nacional, que o impetrante não preenchenenhuma das condições necessárias à importâção de bens objeto de liberação por parte daPortaria nº 06/90, do DECEX.

CONCLUSOS. É o relatório. Decido.

Por primeiro, cumpre apreciar a preliminar suscitada pela autoridade

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impetrada.

A tese de ilegitimidade ad causam verberada pelo GERENTE DACARTEIRA DE COMÉRCIO EXTERIOR DO BANCO DO BRASIL não tem como prosperar,eis que este possui poder de decisão dentro da esfera de competência que lhe é atribuída, ouseja, tem competência para autorizar ou não a importação do automóvel do impetrante, coma conseqüente aceitação da guia de importação. A autoridade coatora, conforme entendimentopacífico e remansado na jurisprudência dos tribunais, não é o superior que recomenda oubaixa normas de execução, mas o que ordena ou omite a prática do ato, pelo que rejeito apreliminar suscitada pela autoridade impetrada.

De meritis.

As alegações feitas pelo impetrante, a respeito do descumprimento doPrincípio da Isonomia, não comove este juízo, visto que a aplicação deste princípio requer aobservação de alguns parâmetros que possam representar o seu real sentido, pois para seaplicar o Princípio da Isonomia, deve-se tratar igualmente os que estão na mesma situaçãode igualdade e desigualmente os desiguais, sempre na proporção de suas desigualdades, eno entendimento deste juízo, isto foi observado pelo Gerente da CACEX, visto que o impetrantenão pode ser igualado a pessoas que se revestem de todas as qualificações impostas pelalegislação.

Insurge-se a impetrante contra as vedações impostas pela Portaria DECEX08/91, que proíbe a importação de pneumáticos usados, por considerá-la ilegal, pelo fato deinexistir dispositivo de lei que dê suporte à sua aplicabilidade.

A Portaria nº 06/90, da Secretaria Nacional de Economia, em seu artigo1º, incisos I e II, trata das possibilidades de importação de veículos, in verbis:

Art. 1º.......(omissis)

I- Somente serão admitidas importações de veículos novos, procedentesdos países de origem (fabricação) e exportados diretamente pelos fabricantes ou por empresaspor ele credenciadas;

II - Somente serão admitidas como importadores pessoas jurídicasregistradas junto ao Departamento do Comércio Exterior, na forma da regulamentação emvigor;

III -.........(omissis)

IV -......... (omissis)

Ora, os interesses pessoais do impetrante passam completamente aolargo das definições legais de possibilidade de importação, visto que as vedações impostaspela legislação se referem a parâmetros que devem ser observados não só com relação àspessoas que importam, mas também no que se refere aos bens que são importados, portantoé impossível enquadrar o impetrante nas previsões do artigo transcrito acima, pois o mesmonão é pessoa jurídica registrada no DECEX, o bem a importar não é novo e nem procede dopaís de fabricação.

A jurisprudência encontra-se dividida ao meio, entretanto este juízo ousadissentir do entendimento do eg. TRF da 5ª Região e opta por abraçar os julgados do eg. TRFda 4ª Região, por entender que estes julgados mais se coadunam com o interesse nacional.

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Trago a colação jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região,como forma de embasar e fortificar o entendimento deste juízo, que ensina o seguinte:

EMENTA. ADMINISTRATIVO. IMPORTAÇÃO DE VEÍCULOS USADOS.CONTROLE. RESTRIÇÃO. LEGALIDADE.

Não há afronta ao princípio da isonomia e nem ao princípio da legalidadeno ato administrativo que proíbe a importação de veículos de passeiousados, sendo decorrência lógica o indeferimento da expedição da guiade importação. Precedentes. Remessa oficial provida. Segurançacassada.

(AC; 3ª Turma do TRF da 4ª Região; Apelação em Mandado de Segurançanº 93.04.02530-3-PR; J. 08/02/94).

EMENTA. ADMINISTRATIVO. IMPORTAÇÃO DE VEÍCULOESTRANGEIRO USADO. PORTARIA DECEX Nº 08/91.

1- O gerente do Setor de Crédito Exterior do Banco do Brasil S/A estálegitimado passivamente para responder pela impetração.

2- É legítima a Portaria nº 08, de 13 de maio de 1991, que, por entenderprejudicial “à defesa dos interesses fazendários nacionais”, proibiu aimportação de veículos estrangeiros usados.

(AC; 3ª Turma do TRF da 4ª Região; Apelação em Mandado de Segurançanº 93.04.28187-3/PR; J. 09/11/93).

Sabe-se que a finalidade precípua do tributo é arrecadatória, pois forneceao Estado receitas financeiras para o seu custeio.

No entanto, existem tributos que embora mantenham fidelidade absolutaà definição do art.3º do CTN, por serem compulsórios, em moeda, cobrados mediante atividadeadministrativa plenamente vinculada, não têm, strictu sensu, função arrecadatória, pois seprestam mais a utilização como instrumentos de política econômica, possibilitando ao Estadoo protecionismo da economia nacional, evitando que esta fique exposta a uma concorrênciadesleal, quer seja com a utilização de alíquotas diferenciadas, ou até mesmo com a própriaproibição de importação de certos bens, como é o caso de veículos usados.

A utilização de uma política ditada pelo liberalismo econômico vem sendogerida pelo governo brasileiro, fazendo com que haja uma certa diminuição no nível de controleprotecionista do Estado, fato este que em certos casos não deixa a Nação a mercê domercado internacional, gerando uma concorrência desleal, muito pelo contrário, pois impulsionao desenvolvimento interno da economia, visando não só a diminuição dos preços, como também,o aumento da qualidade dos produtos.

Um exemplo bastante explícito da face positiva deste liberalismo é ocaso da liberação para importação de carros novos, pois, incontestavelmente, induziu oincremento da indústria nacional que desencadeou numa concorrência de incomensurávelimportância para o país, pois os nossos carros melhoraram acentuadamente devido àcompetitividade do produto estrangeiro.

Por outro lado, certas limitações a esse liberalismo econômico são deverasessenciais para o equilíbrio econômico da Nação, pois impedem determinadas importaçõesque viriam a desestruturar a economia interna, por vezes gerando um quadro caótico.

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Em economias de primeiro mundo, onde as remunerações da força detrabalho são de grande vulto, ocorre uma grande desvalorização dos bens de consumo duráveisapós serem utilizados, fato este que pode ser observado em países como o Japão, onde osurgimento diário de novas tecnologias aliado ao alto poder aquisitivo do povo gera a inutilizaçãoquase que instantânea dos bens, mesmo antes de serem depreciados pelo uso ou pelotempo.

Nos Estados Unidos, por exemplo, carros com pouco tempo de uso sofremdecréscimos de valor surpreendentes quando comparados com a realidade de nosso país,onde os carros usados têm valores relativamente mais altos.

O baixo valor dos carros usados nos Estados Unidos pode ser comprovadopela própria guia de importação do bem do impetrante (fls. 06).

Diante destes fatos, este juízo tem a plena convicção de que a liberaçãoda importação de carros usados seria catastrófica para a economia do país, pois muitos iriampreferir, em igualdade de condições, adquirir um carro importado usado, a adquirir um carropopular nacional novo, gerando assim, um desvio exorbitante do fluxo de consumo dos produtosinternos, o que certamente iria causar uma considerável diminuição do Produto NacionalBruto, devido ao escoamento das divisas do país para o resto do mundo.

Em virtude das razões acima expendidas, fica demonstrado cabal eirrefutavelmente que a adoção deste protecionismo pela legislação aduaneira é legítimo, poisvisa a proteção da economia do país como princípio indispensável à defesa dos interessesnacionais pela administração pública.

Ante o exposto, denego a segurança, condenando o impetrante nascustas processuais.

Sem honorários, à luz do disposto na Súmula 512 do STF.

João Pessoa, 02 de agosto de 1994.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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ENSINO SUPERIOR - CONVÊNIO - VIOLAÇÃO

Processo nº 96.0004174-1 / AÇÃO MANDAMENTALImpetrante: HUBERT MARCOS TORRICO VALÊNCIAImpetrado: PRO-REITOR DE GRADUAÇÃO UFPB - COORDENADOR DO

PROGRAMA DE ESTUDANTE CONVÊNIO

SENTENÇA

EMENTA: ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. ENSINO SUPERIOR.ALEGAÇÃO DE DECADÊNCIA. INEXISTÊNCIA. ESTUDANTECONVÊNIO. AQUISIÇÃO DO VISTO PERMANENTE. VIOLAÇÃO AOSTERMOS DO CONVÊNIO. LEGALIDADE DO DESLIGAMENTO DOIMPETRANTE. DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA.

1. Ao ingressar no PROGRAMA ESTUDANTE CONVÊNIO, o impetrantetomou ciência das normas regimentais do IES, às quais ficou subordinado,dependendo a manutenção de sua condição de aluno conveniado daobservância das regras que regem o instituto.

2. O impetrante, por sua vez, contraiu núpcias com uma brasileira (fls.14) e adquiriu o visto permanente, em clara violação ao item 2.4, “c” doPrograma Estudante-Convênio, o que justifica o seu desligamento doCurso de Medicina da UFPB.

3. Denegação da segurança.

Vistos etc.

Cuida a hipótese dos autos ação mandamental impetrada por HUBERTMARCOS TORRICO VALÊNCIA, qualificado, contra suposto ato ilegal e abusivo imputado aoPRO-REITOR DE GRADUAÇÃO UFPB - COORDENADOR DO PROGRAMA DE ESTUDANTECONVÊNIO, consubstanciado no indeferimento do pedido formulado pelo impetrante dematrícula no Curso de Medicina da UFPB, na qualidade de ESTUDANTE CONVÊNIO (PEC/GRADUAÇÃO).

Alega o impetrante que ingressou na UFPB no ano de 1982, através doprograma de Estudantes-Convênio - PEC, matriculando-se no Curso de Medicina, pelo quepassou a freqüentar o curso dentro das regras estabelecidas no convênio.

Aduz que, no final de 1994, teve sua matrícula para o semestresubseqüente impedida por despacho do impetrado, sob a alegação de que o impetrante haviaadquirido o visto de permanência e não mais poderia continuar no curso.

Sustenta que, continuando a assistir às aulas, recorreu ao CONSEPE

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que, em 14.02.96, manteve o cancelamento da matrícula do impetrante.

Entende que tal ato fere direito líquido e certo seu, pelo que requer aconcessão de medida liminar inaudita altera parte, para que se suspenda o ato impugnadoe, ao final, a concessão da segurança, confirmando a liminar.

Acostou aos autos procuração e documentos.

A liminar foi indeferida - fls. 51/52.

As informações foram prestadas no prazo legal - fls. 55/58.

O MPF, em parecer da lavra do Dr. LUCIANO MARIZ MAIA,aconselha a denegação da segurança e ventila a decadência do direito de ajuizamento domandamus.

Assim relatados, decido.

Por primeiro, entendo que não houve decadência, por parte do impetrante,do direito de ajuizar o mandamus.

O dies a quo para o ajuizamento da ação mandamental inicia-se a partirdo momento em que o ato se torna operante e exeqüível, ou seja, que produz seus efeitospráticos.

No caso dos autos, o indeferimento da matrícula do impetrante só produziuefeitos práticos a partir de 14.02.96, haja vista este ter continuado a assistir às aulas docurso, até a decisão final do CONSEPE.

Portanto, a impetração foi ajuizada no prazo legal.

No mérito, melhor sorte não assiste ao impetrante.

Ao ingressar no PROGRAMA ESTUDANTE CONVÊNIO, o impetrantetomou ciência das normas regimentais do IES, às quais ficou subordinado, dependendo amanutenção de sua condição de aluno conveniado da observância das regras que regem oinstituto. É o que se depreende do item 2.1.2 do Manual do Programa Estudante-Convênio.

Pois bem, dentre essas regras, destaca-se a obrigação de:

“Não pode ser estudante-convênio o estrangeiro portador de visto de turista,diplomático ou permanente, nem o brasileiro dependente de pais que, porqualquer motivo, estejam prestando serviço no exterior”.

O visto do estudante-convênio é o temporário, que deve ser renovadosempre que for preciso, e dentro dos prazo legais.

Tal condição deriva da própria finalidade do convênio que é capacitarestudantes para exercerem a profissão no seu País de origem, não concorrendo, destarte,com os estudantes graduados no nosso País. Por essa razão, o Diploma dos estudantes-convênio não é válido no Brasil (item 2.1.4 “a” do Manual do Programa Estudante-Convênio).

O impetrante, por sua vez, contraiu núpcias com uma brasileira (fls. 14) eadquiriu o visto permanente, em clara violação ao item 2.4, “c” do Programa Estudante-Convênio

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 175

que dispõe, in verbis:

“O estudante-Convênio permanecerá na IES, para realizar o curso comoparticipante do PEC-G, desde que:

a)...................................................................

b)...................................................................

c) mantenha o visto temporário, renovando-o, sempre que for preciso edentro dos prazos, pois se este for transformado em permanente, poruma das situações previstas, perderá a vaga no PEC-G e será desligadoda IES”.

Demais disso, como bem afirma e comprova o impetrado em suasinformações, o impetrante violou diversas regras do convênio, tais como reprovação em maisde uma disciplina no mesmo período letivo e extrapolação do prazo de conclusão do curso,fatos que per se, já renderiam ensejo ao desligamento. Portanto, o impetrado nada mais fezsenão cumprir o que foi avençado.

A partir daí, por maior que seja a boa vontade deste juízo e, mesmolevando em conta a situação subjetiva do impetrante, não há como conceder uma segurançacontra flagrante disposição normativa positiva, pelo que, ao fim e ao cabo, denego a segurançarequerida.

Isento de honorários, à luz da Súmula 512 do STF.

Custas, ex lege.

P.R.I.

João Pessoa, 20 de agosto de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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SEGURANÇA DO TRABALHO

Processo nº 96.08246-2 / MANDADO DE SEGURANÇAImpetrante: MANTÉM ENGENHARIA E INSTALAÇÕES LTDAImpetrado: CHEFE DA SEÇÃO DE SEGURANÇA E SAÚDE NO

TRABALHO DA DELEGACIA REGIONAL DO TRABALHO

SENTENÇA

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO.SEGURANÇA DO TRABALHO. NOTIFICAÇÃO DO IMPETRANTE PELANÃO INSTALAÇÃO DE ELEVADOR DE SEGURANÇA.OBRIGATORIEDADE A PARTIR DO 12º PAVIMENTO OU ALTURAEQUIVALENTE. CONCESSÃO DA SEGURANÇA.

1. A norma jurídica não prevê e abarca todas as situações que merecema sua tutela, a sua proteção. Por isso, para que se determine o sentido ea extensão da lei, descobrindo os elementos significativos que entram nasua compreensão e reconhecendo os casos em que se estende a suaaplicação, entra em cena o juiz-exegeta, procurando reconstituir a menslegis, entendendo corretamente o sentido da lei e suprindo-lhes as lacunasporventura existentes.

2. No particular casos dos autos, a legislação que rege a espécie determinaa instalação de elevador de segurança para edifícios a partir do 12ºpavimento ou altura equivalente. Destarte, não é preciso muito esforçomental para se concluir que, até o 12º pavimento ou altura a estecorrespondente, é despiciendo o elevador de segurança.

3. Concessão da segurança.

MANTÉM ENGENHARIA E INSTALAÇÕES LTDA, pessoa jurídica dedireito privado, qualificada na inicial, impetrou Mandado de Segurança contra ato supostamenteilegal e abusivo, atribuído ao CHEFE DA SEÇÃO DE SEGURANÇA E SAÚDE DO TRABALHODA DELEGACIA REGIONAL DO TRABALHO, consubstanciado na exigência de instalaçãode um elevador para pessoas no condomínio residencial que está sendo construído pelaimpetrante, denominado TOULOUSE.

Aduz a empresa impetrante que está edificando condomínio residencialde 14 pavimentos, denominado TOULOUSE, atualmente no 6º pavimento, ocasião em quesofreu fiscalização do MINISTÉRIO DO TRABALHO, que passou a exigir a instalação de umelevador para pessoas.

Sustenta que a legislação que rege a matéria prevê a construção deelevador de segurança (destinado ao transporte de cargas e pessoas) nos edifício com maisde 12 pavimentos, o que não é o caso do condomínio ora em construção, que se encontra no

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 177

7º pavimento.

Discorre longamente sobre o ato administrativo, os requisitos da concessãode medida liminar e tutela antecipatória e, ao final, requer a concessão de medida liminar paraa suspensão dos efeitos do ato administrativo atacado, que requer seja cassado na sentençade mérito.

Juntou procuração e documentos.

A liminar foi deferida pelo Dr. JANILSON BEZERRA DE SIQUEIRA, JuizFederal Substituto em exercício na 2ª Vara.

Notificado, o impetrado prestou as informações de fls. 54/57, onde alegaque há uma enorme distinção entre elevador de segurança (transporte de pessoas) e elevadorde materiais, razão pela qual foi a empresa impetrante notificada a providenciar a instalaçãodo primeiro, “a fim de resguardar a condição primeira que é, a segurança e a saúde dotrabalhador”.

O MPF, em parecer da lavra do Dr. LUCIANO MAIA, aconselha aconcessão da segurança, por entender que a exigência de elevador de segurança somentese impõe quando o construtor for erigir o 12º pavimento, ou a edificação alcançar alturaequivalente a isto.

O feito foi processado perante a 2ª Vara Federal da Seção Judiciária daParaíba e, por suspeição do MM. Juiz Titular, redistribuído a esta 3ª Vara.

Assim relatados, decido.

A questão posta a deslinde pode ser assim disposta:

O impetrado notificou a empresa impetrante por esta não haver instaladono condomínio residencial que vem construindo um elevador de segurança, destinado aotransporte de cargas e pessoas.

Emerge dos autos que a impetrante dispõe de um elevador de materiais,cujo transporte de pessoas é proibido pelo subitem 18.11.18 da NR-18.

Pois bem, é certo que, nos edifícios com mais de 12 pavimentos, oualtura equivalente, está o construtor obrigado a instalar um elevador de segurança, destinadoao transporte de cargas e pessoas. É esse o comando expresso na NR 18, subitem 18.11.27.

Entretanto, a norma jurídica, em face da prodigiosa diversidade dos fatos,não prevê e abarca todas as situações que merecem a sua tutela, a sua proteção. Por isso,para que se determine o sentido e a extensão da lei, descobrindo os elementos significativosque entram na sua compreensão e reconhecendo os casos em que se estende a sua aplicação,entra em cena o juiz-exegeta, procurando reconstituir a mens legis, ou seja, a vontade dolegislador, entendendo corretamente o sentido da lei e suprindo-lhes as lacunas porventuraexistentes. Segundo SAVIGNY, interpretar é a reconstrução do pensamento contido na lei.

No particular casos dos autos, a legislação que rege a espécie determinaa instalação de elevador de segurança para edifícios a partir do 12º pavimento ou alturaequivalente. Destarte, não é preciso muito esforço mental para se concluir que, até o 12ºpavimento ou altura a este correspondente é despiciendo o elevador de segurança porque, atéeste patamar os operários e demais pessoas que necessitem se locomover no prédio podem,

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perfeitamente, subir sem maiores problemas.

Seria até ilógico que, mesmo que um prédio tivesse 30 (trinta) andares,fosse obrigatória a construção do elevador a partir da construção do primeiro pavimento.

Faço minhas as lúcidas considerações do representante do MPF que, deforma lapidar, aduz que:

“Previu esta norma a proibição de elevadores de carga serem usadoscomo transporte de pessoas (subitem 18.11.18), mas só exigiu elevadoresde segurança, para transporte de cargas e pessoas, quando os edifícios,em construção, tivessem mais de 12 (doze) pavimentos, ou alturaequivalente. Isso de modo claro e objetivo quer dizer que enquanto aconstrução não alcançar o 12º pavimento ou altura equivalente, não incidea norma do subitem 18.11.27. A contrário senso, quando tiver início aconstrução do 12º pavimento, ou quando tiver início a construção depavimento de altura equivalente, será obrigatória a instalação do referidoelevador de segurança”. (fls. 66).

Isto posto, concedo a segurança requerida para tornar sem efeito ànotificação imposta a impetrada ante a não instalação do elevador de segurança no edifícioTOULOUSE.

Sem honorários (SÚMULA 512 STF).

Custas, ex lege.

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição.

P. R. I.

João Pessoa, 20 de agosto de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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MEIO AMBIENTE - OBRA PÚBLICA

Processo nº 96.3625-0 / MANDADO DE SEGURANÇAImpetrante: MUNICÍPIO DE CABEDELOImpetrado: SUPERINTENDENTE DO IBAMA

SENTENÇA

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. MEIO AMBIENTE. OBRAPÚBLICA. CONSTRUÇÃO DE GABIÕES PARA A CONTENÇÃO DAEROSÃO MARINHA.OBRA DE RELEVÂNCIA E URGÊNCIA, SEM AQUAL A ORLA CABEDELENSE SERIA DESTRUÍDA. ESTUDOTÉCNICO APRESENTADO PELO IMPETRANTE QUE SE LEVA EMCONSIDERAÇÃO. CONCESSÃO DA SEGURANÇA.

1. Não há outra tecnologia em todo o mundo para deter a avalanche dooceano, a não ser os espigões de praia adentro. Os ora construídos emCabedelo vão ficar como dedos de concreto dentro d’agua apontandopara os de Angola, lá na mãe África, como a dizer: Vamos deter a fúriado Atlântico. O resto é questiúncula, própria de campanário ou paroquialcomo queiram.

2. A ausência do estudo prévio de impacto ambiental foi suprimida peloestado caótico da orla cabedelense que entra pelos olhos adentro. Entrea cidade e sua orla serem engolidas pelo oceano e o desejo insopitávelda juventude bronzeada passear pela orla e dos bugres roncarem naareia, este juízo fica com a primeira hipótese.

3. Segurança que se concede.

Cuida-se de ação mandamental impetrada pelo MUNICÍPIO DECABEDELO, representado legalmente por seu prefeito constitucional, visando obter prestaçãojudicial reparadora a pretenso direito líquido e certo, supostamente violado por ato tido comoilegal, atribuído ao SUPERINTENDENTE DO IBAMA NA PARAÍBA, consubstanciado noembargo da obra de construção de gabiões nas praias de Cabedelo, sob alegação deinexistência de prévio estudo de impacto ambiental.

Aduz a requerente que o processo de erosão marítima tem progredidorapidamente, destruindo os bens materiais dos habitantes do litoral cabedelense e tambémdevastando os coqueirais e demais componentes do ecossistema daquela área. Por essarazão, foi decretada situação de emergência na orla marítima cabedelense, por meio dosDecretos municipais nºs 46/95 e 64/95, ocasião em que passou o Município a envidar esforçosjunto aos Governos Federal e Estadual em busca de saídas para o problema.

Sustenta que daí, resultou a assinatura de dois convênios para a

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construção de gabiões nas praias cabedelenses (entre o Município e o Estado da Paraíba eentre este e o Governo Federal), nos quais os convenentes liberariam recursos a seremdestinados à construção dos referidos gabiões, e, ao serem iniciadas as obras em epígrafe,alguns moradores ocasionais de Cabedelo provocaram a ação da SUDEMA e do IBAMA, nosentido de sua paralisação, o que resultou o embargo da obra pelo IBAMA, sob a alegação deque não havia sido realizado um prévio estudo de impacto ambiental.

Alegando estarem presentes os requisitos legais, requereu a concessãode medida liminar com o fim de suspender o embargo, bem como a concessão do mandamuse a continuidade da execução da obra.

Juntou procuração e documentos.

A liminar foi deferida.

Irresignada, a autoridade impetrada requereu junto ao Eg. TRF. da 5ª Regiãoa suspensão da segurança, o que foi deferido, por ato do Excelentíssimo Senhor Presidenteda Corte.

Provocado pelo impetrante, o Pleno do referido Tribunal, em sede de agravoregimental decidiu pelo restabelecimento da liminar.

As informações foram prestadas (fls. 118/128).

O parecer do MPF, da lavra do Dr. LUCIANO MAIA, aconselha a denegaçãoda segurança, ante a ausência de prévio estudo de impacto ambiental para a construção dosgabiões.

Conclusos, Decido.

IBAMA e o MPF se entrincheiram no argumento repetido de falta de prévioestudo de impacto ambiental. É este só e tão-somente o argumento contra os trabalhoslevados a efeito pela impetrante. Impacto ambiental maior não pode haver do que os olhosdesarmados do homem do povo pode enxergar. Basta um passeio a pé pela orla marítimadesde o enrocamento do Porto de Cabedelo, do lado contrário ao ancoradouro, até o final dapraia de Ponta de Campina, para bem se enxergar o estrago que o mar fez a parte norte etambém a leste de Cabedelo, aliás, as partes mais antigas e habitadas por pessoas menospotentadas.

Será que era preciso esperar que a força bravia do oceano avançasse detal forma que as águas acabassem com a parte velha da cidade?

Há outra tecnologia mais avançada para que se detenha o furor das ondasque não os gabiões?

Será que somente se teria estudos de impacto ambiental se antes oIBAMA e o MPF fossem ouvidos ou se a preservação da cidade, cuja devastação pelo mar éfato público e notório, também não representa um modo de se concluir como uma salvaguardaexpressa e clara de impacto ambiental?

Qual foi o estudo apresentado pelo impetrante? Foi de há sete anospassados. Se o estudo fosse dos dias atuais, mais forte razão teria a Prefeitura de efetuar ostrabalhos, pois desde àquele tempo para cá, o oceano fez mais estragos na cidade.

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Este magistrado recebeu informalmente uma jovem estudante de direitoaflita, residente numa das praias chics de Cabedelo que vinha fazer uma peroração para queos trabalhos fossem suspensos, sob o fundamento de que após a implantação dos gabiões,o mar havia expelido uma camada de sargaço de mais de 15 centímetro nas praias deCamboinha e adjacências e que não se podia mais andar a beira mar, argumentos tolos esem consistência. Outro pior, e de um jovem, foi o de que a juventude bronzeada não podiamais percorrer a orla com seus bugres, como se o bugre e beira-mar fossem coisas que secompletassem.

Quando autorizei liminarmente o prosseguimento da obra, estive no local,anonimamente, ouvindo pessoas do povo e, da leitura que fiz dos documentos acostadospela impetrante não tive a menor dúvida de que a liminar tinha de ser concedida e assim o fiz.

Agora, após a decisão do TRF da 5ª Região, no julgamento do agravoregimental dando conta do acerto da liminar aqui concedida, bem se compreende que estejulgador andou pela trilha segura do convencimento acertado.

Ademais, se esse estudo de impacto ambiental prévio, que não foirealizado, tivesse de ser feito, qual o órgão mais capaz de fazê-lo? Creio que o Instituto dePesquisas Hidroviárias. Em que estudo se baseou a impetrante? Em estudo realizado poresse instituto.

Acaso a devastação que o mar vinha fazendo em Cabedelo antes dainstalação dos gabiões, fosse nas praias nobres de Camboinha, Poço e Intermares, certamenteque o Estado e a União teriam sido acicatados pela nobreza dessas praias no sentido deadotar providências para conter o avanço do mar. Como a destruição foi na parte antiga dacidade, onde os moradores são de pequenas posses, quer-se, serra acima, obstaculizar umaobra que serve à parte já afetada como àquela de possível destruição.

Argumentam, também, IBAMA e MPF da desnecessidade de ser a obraexecutada no seu todo, mas só e tão-somente na parte já atingida. A alegação não tem comoser aceita. Os estudos levados a efeito dão conta da necessidade da realização de todoespaço litorâneo neles contidos.

Atribuir-se o fato de que a obra poderá vir afetar a ponta do Cabo Branco,ou seja, passando a erosão a atingir o ponto mais oriental das Américas é apena alegação deleigos representantes do IBAMA e MPF, pois, não demonstraram através de estudo procedidopor especialistas, tal fundamento. Ao contrário, a impetrante trouxe para os autos elementosde prova importantes, chumbados na experiência de órgão encarregado de defesa da costa,bem assim a execução da obra por empresa de grande know how (experiência) em obrasdesse porte internacionalmente.

Vale lembrar também de que em Angola, como mostram as fotografiasacostadas aos autos, a resposta contra a violência do Atlântico foi a construção de gabiões.

É certo que há uma perda inicialmente por parte dos veranistas deCamboinha, Poço e Intermares, mas no futuro próximo esses gabiões serão aterrados pelasareias e, então, a obra vai ser ovacionada.

Conversei com velhos moradores de Tambaú e que me disseram queantes mesmo de o então governador Pedro Gondim haver levantado gabiões na praia deManaíra, já o então governador José Américo, na década de 50 havia erigido uns gabiões demadeira, em Manaíra, que o povo denominava de quebra-mar. Não há outra tecnologia em

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todo o mundo para deter a avalanche do oceano, a não ser os espigões de praia adentro. Osora construídos em Cabedelo vão ficar como dedos de concreto dentro d’agua apontando paraos de Angola, lá na mãe África, como a dizer: Vamos deter a fúria do Atlântico. O resto équestiúncula, própria de campanário ou paroquial como queiram.

Como foi lembrado na liminar e agora como mandamento definitivo destasentença, cabe a impetrante concluir a obra até onde os órgãos técnicos entenderemnecessário, bem assim promover a Prefeitura a urbanização da área recuperada com aconstrução de calçadão onde se fizer possível, bem assim com ajuda da comunidade aplantação de coqueiros, os quais foram engolidos ao longo do tempo pela ação do mar e domaior devastador do meio ambiente - o homem.

Uma obra pode ser edificada sem o prévio estudo de impacto ambiental eser nociva ao meio ambiente; outra não, pode ser construída com base em estudo prévio eatender as regras ambientais, como é o caso versado na questão deduzida nos autos ondehouve um estudo de um Instituto especializado.

Já é tempo de se acabar com esse frisson ou calafrios de que estãopossuídos o IBAMA e o MPF com a construção dos gabiões. Acabou a farra que impuseramà mídia. É preciso deixar de barulho pela Imprensa. Parece a este julgador que o princípio dalógica não foi incluído nos argumentos expendidos pelo Impetrado e MPF. Apenas sustentamteses amparadas no possível e no pode acontecer, enquanto as da impetrante estão alicerçadasem dados provados e já ocorridos, ou seja, a devastação da praia e a continuação da erosãomarinha, além dos estragos já realizado nas vias urbanas de Cabedelo. Em demandas desseporte o MPF faria maior e melhor proveito de estivesse acolitado no pólo ativo da demanda doque estar a esgrimir o fato de que não foi elaborado o exame prévio. Ora, a ausência doestudo prévio de impacto ambiental foi suprimida pelo estado caótico da orla cabedelenseque entra pelos olhos adentro. Entre a cidade e sua orla serem engolidas pelo oceano e odesejo insopitável da juventude bronzeada passear pela orla e dos bugres roncarem na areia,este juízo fica com a primeira hipótese.

Não resta a menor sombra de dúvida que nisso tudo há um perde e ganha.O público ganha na preservação da cidade e suas praias, o particular perde nos passeios dosbanhistas e bugreiros pelas areias. Entre os dois não há como este julgador ficar ao lado dointeresse particular em detrimento do bem público. O resto é chorumela que o tempo e asondas com as areias hão de apagar cobrindo as costeletas dos gabiões, hoje expostas.

A importância do meio ambiente cresceu muito depois da Constituiçãode 88 do ECO RIO 92. Há necessidade de criação de conselhos e comissões dedesenvolvimento sustentável, juntando sociedade civil e governo. Há notícias de que nospaíses mais avançados do hemisfério norte de que todos as prefeituras estão em vias deconclusão de suas agendas para um desenvolvimento sustentável.

Nossas cidades parece que crescem mas incham. Aqui temos endemiasepidérmicas, enchentes, secas, favelização, soterramento de população por desmoronamentode barreiras e em poucas cidades há uma sociedade civil organizada para minorar asconseqüências desastrosas ao meio ambiente.

Toda cidade pode ter uma comissão sem fim lucrativo formada pelo padre,promotor, pelo delegado de polícia, pelos presidentes das sociedades civis com o fito deestudar as melhorias da coletividade sem qualquer vínculo com o poder público, mas para aeste ajudar. Cabedelo pode ter a sua Comissão. A impetrante através de seu prefeito podemuito bem organizar uma comissão de cidadãos notáveis para ajudar o poder público na

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defesa do meio ambiente. Só basta vontade política na mais alta expressão do termo.

Isto posto, confirmando a liminar, concedo a segurança requerida paragarantir a continuidade da obra, desconstituindo a multa imposta à edilidade.

Sem honorários (Súmula 512 STF).

Sentença sujeita ao reexame necessário.

Custas, ex lege.

João Pessoa, 20 de agosto de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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INSS - PROVENTOS - IRREDUTIBILIDADE

Processo nº 96.02794-3/ MANDADO DE SEGURANÇAImpetrante: VALDEMAR JOSÉ DA SILVAImpetrado: SUPERINTENDENTE REGIONAL DO INSS NA PARAÍBA

SENTENÇA

EMENTA: CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO - MANDADO DESEGURANÇA - IRREDUTIBILIDADE DE PROVENTOS - AUSÊNCIA DODEVIDO PROCESSO LEGAL - DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA.

A garantia insculpida no art. 194, IV, da CF, aplica-se aos benefíciosregularmente concedidos, e não àqueles calculados em desacordo coma legislação de regência.

Facultada ao impetrante oportunidade para, em processo judicial,comprovar a regularidade das contribuições vertidas por ele à PrevidênciaSocial, permanecendo esse segurado inerte, não há que se falar emausência de devido processo legal.

DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA.

Vistos etc...

Cuida-se de mandado de segurança, cumulado com pedido de liminar,impetrado por VALDEMAR JOSÉ DA SILVA, qualificado às fls. 02, contra oSUPERINTENDENTE REGIONAL DO INSS NA PARAÍBA, objetivando que seja restabelecidoo pagamento integral dos seus proventos, até o trânsito em julgado da sentença proferida naAção Ordinária nº 94.0011305-6, que se encontra na fase recursal.

Expõe, em síntese, que ajuizou a referida ação ordinária de revisão deconcessão inicial dos benefícios auxílio-doença e aposentadoria por invalidez cumulada commedidas de correção dos reajustes dos cálculos, com base na Súmula 260 do ex-TFR, porentender que seus proventos devem corresponder a 7,83 salários mínimos, e não, 7,40 saláriosmínimos, como lhe foi concedido.

Afirma que mesmo estando a matéria sub judice, a autoridade coatora,sem conceder ao impetrante o direito de defesa, reduziu abruptamente seus proventos, sob aalegação de que ele, impetrante, recolheu as contribuições previdenciárias sem observânciada escala de salário-base de que trata a Lei 5.890/73.

Prosseguindo, sustenta que requereu junto ao INSS, com fundamento naLei 6.332/76, seu reposicionamento para a classe 10, da referida escala, tendo, inclusive,firmado compromisso por escrito nesse sentido perante o órgão previdenciário, o que tambémfoi feito pelo segurado JOSÉ CLEMENTINO ALVES FILHO.

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Sustentando que a CF assegura a irredutibilidade do valor dos benefícios,requer a concessão de liminar inaudita altera pars e da segurança, no sentido de que sejadecretada a nulidade do ato administrativo que reduziu em parte os proventos do impetrante,ante o princípio insculpido no art. 194, IV, da CF/88, e que seja restabelecido o valor dosproventos que vinha percebendo o impetrante, até o trânsito em julgado da sentença proferidana ação ordinária acima referenciada.

Juntou aos autos a procuração e os documentos de fls. 10/30.

Distribuídos os autos para a 2ª Vara, desta Seção Judiciária, ordenou oMM. Juiz Titular a redistribuição do feito para esta Vara, tendo em vista a correlação entre oobjeto do presente mandamus com o da referida ação ordinária.

Em face do contido na certidão de fls. 35, determinei à Secretaria quetrasladasse para os autos a petição inicial e a sentença exarada naquela ação ordinária, oque foi providenciado às fls. 36/55.

A liminar foi indeferida (fls. 57/58).

Notificada, a autoridade apontada como coatora apresentou informaçõesacompanhada de documentos (fls. 62/84), suscitando, preliminarmente, a decadência dodireito à impetração, pugnando pela rejeição do writ.

O Ministério Público, equivocadamente, ofertou parecer atinente àsuspensão de aposentadoria por invalidez (fls. 88/91).

É o relatório. Decido.

Suscitou o impetrado a preliminar de decadência do direito à impetração,posto que transcorridos mais de cento e vinte dias entre a data da realização do ato derevisão do cálculo de concessão do benefício do impetrante (JULHO/95) e o ajuizamento daação.

Razão não assiste à autoridade coatora: o pedido do impetrante envolveprestações de trato sucessivo, hipótese em que o prazo decadencial renova-se a cada mês,em face da redução procedida nos proventos daquele segurado. A respeito do tema, observe-se jurisprudência nesse sentido:

“Art. 18: 13. O prazo decadencial para impetração do mandado desegurança renova-se a cada ato lesivo que envolva prestações de tratosucessivo”. (RTFR 121/370). Nesse sentido: TFR - 5ª turma, AMS 107.461-RJ, rel: Min. sebastião Reis, j. 18.09.85, deram provimento, v.u., DJU10.10.85, p. 17779, 1ª Col., em. (Código de Processo Civil e LegislaçãoProcessual em vigor, Theotônio Negrão, Editora Saraiva, 16ª Edição, 1995,pág. 1143).

Em sendo assim, REJEITO a preliminar suscitada pelo impetrado.

Requer o impetrante, fundamentado no art. 194, IV, da Carta Política queeste Magistrado declare a nulidade do ato do impetrado que reduziu o valor da aposentadoriado primeiro, assegurando a este o direito de receber seus proventos como vinham sendopagos antes da revisão efetuada pelo INSS, até o trânsito em julgado da sentença proferidana ação ordinária acima referenciada.

O impetrante, em 16.12.94, ajuizou a mencionada ação ordinária contra o

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INSS, visando ao recálculo das rendas mensais iniciais (RMI) do auxílio-doença e daaposentadoria por invalidez na qual aquele foi transformado, bem assim, à revisão dos reajustesconcedidos a ambos os benefícios.

Sustentou o impetrante, naqueles autos, ter ocorrido erro material nocálculo da renda mensal inicial do auxílio-doença, que deveria ter sido fixada em Cr$ 34.837,94,correspondentes à época a 7,83 salários mínimos, e não, em Cr$ 32.958,00 (7,4 saláriosmínimos), como apurou o réu.

Asseverou, ainda, o promovente, que o equívoco no cálculo do primeirobenefício refletiu sobre o valor inicial da aposentadoria por invalidez, requerendo, por fim, queeste Magistrado determinasse a revisão dos cálculos dos dois benefícios, a fim de que ambostivessem suas rendas mensais iniciais fixadas em 7,83 salários mínimos, haja vista ambospossuírem idêntica fórmula de cálculo.

Em sua resposta, o INSS informou que procedeu à revisão das RMI’s dosbenefícios do suplicante, constatando, todavia, que aquelas haviam sido calculadasincorretamente, apresentando valor superior ao realmente devido àquele segurado, posto quenão foi levado em conta que o autor, contribuinte autônomo, não havia obedecido aos interstíciosprevistos na escala de salário-base, colacionando aos autos documentos relativos à inscriçãoe às contribuições daquele segurado perante a Previdência Social.

Intimado, o autor não rechaçou a afirmação do réu, no tocante à nãoobservância dos referidos interstícios, limitando-se a informar que havia ingressado naPrevidência Social como empregador, passando o INSS a exigir dele, impetrante, contribuiçõesem razão do pro labore retirado da empresa, “nunca chegando a 15 (quinze) salários mínimos,isto é, no período de Dezembro de 1979 a Novembro de 1980”.

Ora, o impetrante na mencionada ação ordinária requereu que a rendamensal inicial do auxílio-doença e da aposentadoria por invalidez na qual aquele foi transformadofosse fixada em 7,83 salários mínimos, mantendo-se a referida equivalência nas majoraçõessubseqüentes dos proventos. Não tendo aquele segurado comprovado a regularidade dascontribuições recolhidas ao INSS, este Magistrado REJEITOU o pedido inicial, uma vez queacolher tal pretensão implicaria em computar no cálculo do benefício, contribuições recolhidasem desacordo com a escala de salário-base de que trata o Decreto 83.081/79.

Ressalte-se que naquela ação ordinária em nenhuma oportunidade osuplicante alegou que tinha firmado compromisso por escrito com o INSS, visando seuposicionamento na classe 10, da escala de salário-base, conforme facultado no art. 11, da Lei6.332/76, estando aventando tal matéria somente agora, na exordial destes autos.

Obviamente tivesse o autor ventilado naquela ação ordinária que os valoresrecolhidos por ele ao INSS encontravam amparo na Lei 6.332/76, este Juízo teria levado emconta tal informação, oferecendo ao autor oportunidade para comprovar esse fato, pelo que,não sensibiliza este Magistrado a tese do impetrante de que a redução dos seus proventosafronta a garantia insculpida no art. 194, IV, da Constituição Federal, que a meu ver, se dirigeaos benefícios regularmente concedidos.

Como o impetrante não colacionou aos autos da ação ordinária nem dopresente writ qualquer prova de que tenha manifestado a opção prevista na Lei 6.332/76,sendo sabido e consabido que a via estreita do mandado de segurança não admite dilaçãoprobatória, entendo ser inaplicável ao caso vertente a garantia do pré-falado inciso IV, do art.194, da Carta Política, porquanto não comprovada a regularidade da concessão dos cálculosiniciais de sua aposentadoria.

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Pelas mesmas razões acima elencadas, também não julgo pertinente aponderação do impetrante no sentido de que seus proventos foram reduzidos abruptamente,sem oportunidade de defesa, pois teve ele, impetrante, oportunidade de impugnar namencionada ação ordinária os fatos trazidos à colação pelo INSS, mas não o fez, pelo quenão antevejo o direito líquido e certo do impetrante, a justificar o restabelecimento do pagamentointegral de sua aposentadoria, até o trânsito em julgado da Ação Ordinária suso referida.

Não é despiciendo lembrar que a revisão praticada pelo INSS, que resultouna redução dos proventos do impetrante, encontra respaldo no verbete 473 da súmula doSupremo Tribunal Federal, in verbis:

“A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de víciosque os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos, ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitosadquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”.

Como o impetrante não demonstrou neste Juízo que contribuiu para aPrevidência Social nos termos fixados na legislação de regência, inexiste direito adquiridodele continuar percebendo sua aposentadoria com base em cálculo efetuado pelo INSS emdesacordo com a referida legislação, já que os atos ilegais não geram direitos, como jádecidiu o Excelso Pretório.

Finalmente, quero salientar que a decisão proferida na Ação Ordinária nº94.11305-6 não obsta que o impetrante venha a buscar nas vias próprias o reconhecimento daregularidade das contribuições recolhidas por ele à Previdência Social, uma vez que esteMagistrado apenas valeu-se das informações trazidas pelo INSS, as quais, repito, não foramimpugnadas pelo autor, para verificar se as rendas mensais iniciais do auxílio-doença e daaposentadoria por invalidez havia apresentado valor inferior ao devido àquele segurado,concluindo, a vista das referidas informações, não ser possível atender o pedido do promovente,que pretendia receber proventos equivalentes a 7,83 salários mínimos, e não, 7,4 saláriosmínimos, como originalmente foi concedido pelo órgão previdenciário.

Ajunte-se a isso que este Magistrado, após entender naquela açãoordinária que a aposentadoria do impetrante foi concedida em desacordo com os ditameslegais, não pode ir de encontro à sua própria decisão, proferida nos referidos autos, e determinarque esse segurado continue recebendo proventos equivalentes a 7,4 salários mínimos até otrânsito em julgado daquela sentença, restando ao impetrante aguardar o julgamento daapelação por ele interposta perante o Tribunal Regional Federal da 5ª Região.

Por todo o exposto, DENEGO A SEGURANÇA, sem embargo de oimpetrante pleitear nas vias ordinárias o reconhecimento da regularidade das contribuiçõesvertidas por esse segurado à Previdência Social.

Isento de honorários - Súmula 512 do STF.

Custas na forma estatuída na Lei 9.289/96.

P. R. I.

João Pessoa, 30 de agosto de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA - MEDIDA PROVISÓRIA

Processo nº 96.06833-0 / MANDADO DE SEGURANÇAImpetrante: VÂNIA MARIA CARTAXO GUIMARÃESImpetrado: GERENTE DO ESCRITÓRIO REGIONAL DO MINISTÉRIO DA

SAÚDE NA PARAÍBA e OUTRO

SENTENÇA

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. PSS.MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA POR FORÇA DE MEDIDA PROVISÓRIAE SUAS POSTERIORES REEDIÇÕES. INCONSTITUCIONALIDADERENOVAÇÃO DE MATÉRIA JULGADA INCONSTITUCIONAL PELOSUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ATRAVÉS DA ADIN 790-4-DF.DESRESPEITO AO PRAZO NONAGESIMAL. DECLARAÇÃOINCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE DA MP 560/94 E SUASREEDIÇÕES. CONCESSÃO DA SEGURANÇA.

1. A medida provisória 560/94 e todas as suas reedições, nada mais sãoque a reprodução da norma suspensa pela Suprema Corte, demonstrando,à evidência, a renitência do Executivo em impor ao servidor o custeio dacontribuição, na forma em que declarada, pela Cúpula do Judiciário,inconstitucional.

2. Como se não bastasse a inconstitucionalidade material, há ainda adestacar a infringência ao prazo nonagesimal, que resulta da exigênciada contribuição, através da edição da MP 560, em 26 de julho de 1994,sem observância da vacatio legis de noventa dias e o que é pior, comefeitos retro-operantes.

3. Concessão da segurança.

Vistos etc.

VÂNIA MARIA CARTAXO GUIMARÃES, qualificada na exordial, impetrouMandado de Segurança contra ato supostamente ilegal e abusivo, atribuído ao GERENTE DOESCRITÓRIO REGIONAL DO MINISTÉRIO DA SAÚDE NA PARAÍBA, tendo por litisconsortepassivo necessário a UNIÃO, consubstanciado no desconto incidente sobre seus vencimentos,a título de contribuição para o PSS (Plano de Seguridade Social do Servidor Público Civil dosPoderes da União, das Autarquias e das Fundações), à alíquota majorada, com base naMedida Provisória 560, de 26.07.94 e reedições.

Alegando contra a ilegalidade e abusividade do ato, sustenta, em resumo,que:

a) a exigência da aludida contribuição, através de Medida Provisóriasistematicamente reeditada, nada mais é que a reprodução da normacontida no parágrafo 1º do art. 231 da Lei 8.112/90, com a redação dada

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pelo art. 9º da Lei 8.162/91, suspensa pelo Cl. Supremo Tribunal Federal,na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 790-4, publicada no DJU de27.10.92;

b) a Medida provisória 560/94 entrou em vigor com efeitos retro-operantes,não cumpriu o prazo nonagesimal para exigibilidade, além de inadequadapara alterar ou instituir contribuição nova.

Instruiu a petição inicial com procuração e documentos de fls. 07/10,pugnando pela segurança, para que a autoridade apontada como coatora se abstivesse dosdescontos da contribuição em causa, na forma prevista na MP 560/94 e suas reedições,procedendo à dedução nos moldes da legislação pretérita, tal como disposto no art. 249 dalei 8.112/90.

No despacho de fls. 12, foi determinado que a impetrante requeresse acitação da União como litisconsorte passivo necessário.

Na petição de fls. 13, a impetrante requereu a citação da União comolitisconsorte passivo necessário.

A liminar foi INDEFERIDA (fls. 23), sendo também, determinada a citaçãoda União.

Notificada, a autoridade impetrada não se pronunciou.

Citada, a União ofereceu contestação, argüindo, preliminarmente, ailegitimidade passiva ad causam e a carência de ação, por entender que a impetração sebate contra lei em tese e por se achar ilegítima para figurar no pólo passivo da impetração, porse tratar de matéria de natureza fiscal. No mérito, sustenta a inexigibilidade de lei complementar,porque a contribuição em tela tem por fundamento o art. 149, combinado com o parágrafo 6ºdo art. 40, ambos da Constituição Federal. No mais, sustenta a legalidade do ato impugnado.

O Ministério Público Federal, em Parecer da lavra do culto Procurador daRepública, Dr. ANTÔNIO CARLOS PESSOA LINS, opinou pela concessão da segurança.

Relatados, DECIDO.

Por primeiro, cumpre deslindar as prejudiciais de mérito suscitadas.

LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO DA UNIÃO

A União é parte legítima, na qualidade de litisconsorte passiva necessária,eis que divide com o servidor público o custeio da seguridade social, (art. 40, parágrafo 6º daConstituição Federal, com a redação dada pela Emenda 3/93), daí seu interesse, já quesofrerá a repercussão dos efeitos patrimoniais da sentença, se concessiva. Aliás, citada, aUnião atendeu à convocação, defendendo a manutenção do ato impugnado. Mantenho-a,pois, na relação jurídica processual, inclusive, prevenindo nulidade e, destarte, entendodespicienda a convocação à lide da PROCURADORIA DA FAZENDA NACIONAL.

Ademais, não existe a pessoa jurídica FAZENDA NACIONAL, razão pelaqual não poderia ser chamado a integrar a lide um ente despersonalizado. Caso haja na leique criou a Advocacia Geral da União procuradores específicos para determinada matériasque seja o feito a eles remetido por ato interna corporis da repartição.

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MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA LEI EM TESE

A impetração não se volta contra lei em tese, posto que os impetrantesatacam ato concreto, que, executando a previsão legal (Medida Provisória 560/94 e reedições),determina o desconto em seus vencimentos, à alíquota majorada, da contribuição para oPSS, configurando, a toda vista, violação de direito individual, que viabiliza a propositura doMandado de Segurança. Rejeito, por essas razões, a preliminar invocada pela União.

MÉRITO

No mérito, razão assiste à impetrante.

Por primeiro, cumpre tecer as seguintes considerações:

1°) A interpretação sistemática da C.F. informa que as contribuições sociaisnão estão sujeitas à lei complementar;

2º) Com respeito à irredutibilidade de vencimentos também não se temcomo cogitar de transgressão do art. 37, XV da C.F. no que majoradas asalíquotas da contribuição social. A jurisprudência sedimentada no STF éno sentido da plena harmonia dos descontos assistenciais com o princípioda irredutibilidade de vencimentos;

No mais, razão assiste à impetrante.

O Plano da Seguridade dos Servidores Públicos instituído pela Lei 8.112/90 (art. 231, parágrafo único) tem sobrevivido de forma tortuosa, desde a sua regulamentaçãopela Lei 8.162/91, que introduziu alíquotas variáveis, de 9 a 12%, sobre a remuneração mensaldo servidor, antes fixada em 6%.

Nota-se que até a vigência da Lei 8.162/91, os servidores públicoscontribuíam, por força da Lei nº 6.439/77, regulamentada pelo decreto 83.081/79, alteradopelo decreto-lei nº 1.910/81, com a alíquota de 6%, correndo à custa do Tesouro Nacional oônus decorrente das aposentadorias.

O projeto que resultou na Lei nº 8.112/90, reafirmou o princípio de que aresponsabilidade pelo custeio integral da aposentadoria integral dos servidores públicos federaiscabe ao Tesouro Nacional, § 2º do art. 231. Esse dispositivo foi vetado, pois se entendia quea matéria estaria disciplinada nos arts. 183 e 231 caput.

Em 08 de janeiro de 1991, foi editada a Lei 8.162 estabelecendo alíquotasvariáveis, a expressar a contribuição mensal dos servidores, de 9% a 12%, art. 9º. Ocorre quea seguir o Congresso Nacional, em abril de 1991, derrubou, dentre outros vetos, o relativo ao§ 2º do art. 231, prevalecendo, portanto, o quadro pretérito atinente a contribuições e benefíciosprevidenciários, ou seja, o custeio da aposentadoria como de responsabilidade integral doTesouro Nacional, devendo, destarte a alíquota a cargo do servidor voltar a ser na ordem de6%.

Nesse diapasão, se pronunciou o STF, ao declarar inconstitucional, nojulgamento da ADIn 790-4-DF, a majoração da alíquota, ante a inexistência de causa suficienteà elevação da contribuição do servidor para o PSS, entendimento esse cristalizado na seguinteementa:

“CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. MAJORAÇÃO PERCEN-TUAL. CAUSA

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 191

SUFICIENTE. DESAPARECIMENTO. CONSEQÜÊNCIA. SERVIDORESPÚBLICOS FEDERAIS.

O disposto no art. 195, parágrafo 5º, da Constituição Federal, segundo oqual “nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado,majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio”,homenageia o equilíbrio atuarial, revelando princípio indicador da correlaçãoentre, de um lado, contribuições e, de outro, benefícios e serviços. Odesaparecimento da causa da majoração do percentual implica o conflitoda lei que a impôs com o texto constitucional. Isto ocorre em relação aosservidores públicos federais, considerado o quadro revelador de que oveto do Presidente da República relativo ao preceito da Lei 8.112/90,prevendo o custeio integral da aposentadoria pelo Tesouro Nacional, foiderrubado pelo Congresso, ocorrendo, no interregno, a edição da lei - ade nº 8.162/91- impondo percentuais majorados”.(RTJ 147, p. 921).

Daí a convicção de que os acréscimos combatidos passaram a ser umatributação adicional sobre a remuneração dos servidores, após a derrubada do veto do § 2º doart. 23, persistindo o móvel da majoração das contribuições previstas no art. 9º da Lei 8.162/91, contrariando a regra implícita correspondente ao § 9º do art. 195 da Carta Magna.

Entretanto, tal vício foi ressuscitado pelo Poder Executivo, pelo que se vêdo texto da Medida Provisória 560/94 e todas as suas reedições (já passam das dezoito), quenada mais são que a reprodução da norma suspensa pela Suprema Corte, demonstrando, àevidência, a renitência do Executivo em impor ao servidor o custeio da contribuição, na formaem que declarada, pela Cúpula do Judiciário, inconstitucional.

Dita inconstitucionalidade, declarada em alto e bom som pela CorteSuprema deveu-se à falta de motivação para o aumento das contribuições previdenciárias dosservidores públicos, eis que, derrubado o veto do Presidente da República ao § 2º do art. 231,da Lei 8.112/90, o Tesouro voltou a custear as aposentadorias, desaparecendo a causadeterminante do aumento das alíquotas - cobrir a parcela do Tesouro nas aposentadorias.

A premissa de toda contribuição social é a necessidade de custeio daseguridade. A seguridade social é financiada por toda a sociedade de forma direta e indireta,nos termos da lei. À regra segundo a qual nenhum benefício poderá ser criado majorado ouestendido sem a correspondente fonte de custeio total, corresponde a relativa à exigibilidadede causa suficiente para a majoração sob pena desta última discrepar do móvel que lhe épróprio, ligado ao equilíbrio atuarial entre contribuições e benefícios, implicando nesse aspecto,um adicional sobre a renda do trabalhador.

Da mesma forma que não pode ser criado um benefício sem a suarespectiva fonte de custeio, não se justifica um aumento na alíquota de contribuição dosservidores públicos civis se inexiste despesa a ser coberta.

Ainda como fundamento, faço minhas as oportunas e percucientesconsiderações do Parecer Ministerial da lavra do douto Procurador Regional da República,EITEL SANTIAGO DE BRITO PEREIRA, exarado em feito análogo ao presente, acerca doequilíbrio autarial entre custeio de despesa, que transcrevo e adoto, também, como razão dedecidir:

“O equilíbrio entre as fontes de custeio e os valores dos benefícios pagospela seguridade social reputa-se, atualmente, em mais uma limitação aoarbítrio do legislador, impedindo que novas obrigações sejam criadas sem

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a respectiva majoração nos benefícios. Criou-se, portanto, uma verdadeirarelação custo-benefício, a ser respeitada, de modo incondicional.

Historicamente, o percentual de 6% sobre o salário-base do funcionalismopúblico sempre foi tido como suficiente ao regular funcionamento dosistema securitário a que este faz jus. Se com o veto presidencial ao § 2ºdo art. 231, da Lei nº 8.112/90, era imprescindível a criação de uma novafonte de custeio, com a sua derrubada pelo Congresso Nacional foi mantidaa responsabilidade integral do tesouro nacional pelo custeio daaposentadoria, não havendo mais porque majorar as alíquotas do descontona remuneração do funcionário público civil. Se fosse mantido o aumento,estaria sendo instituído um adicional sobre a renda, em flagrante afrontaaos artigos 149 e 153, da CF. Assim sendo, o equilíbrio autarial, invocadopara o aumento das alíquotas, não tem, portanto, razão de ser, já que nãohouve modificação substancial no volume de benefício pago pelaseguridade social”.

Como se não bastasse a inconstitucionalidade material, há ainda adestacar a infringência ao prazo nonagesimal, que resulta da exigência da contribuição, atravésda edição da MP 560, em 26 de julho de 1994, sem observância da vacatio legis de noventadias.

É que, com a suspensão do art. 9º da Lei 8.162/91, a matéria passou aser regulada, desta feita pela Lei 8.688/93 que, apesar de respeitar a vacatio legis de noventadias para exigibilidade, teve sua existência limitada até o dia 30 de junho de 1994 (art. 2º,parágrafo 1º, da Lei 8.688/93). Ora, esgotado o prazo de vigência da referida lei, exsurge ainconstitucionalidade da manutenção da contribuição às alíquotas majoradas pela lei morta,através de medida provisória publicada quase um mês depois, 27.07.94, que, atribuindo-seefeitos retro-operantes, antecipou sua vigência para 1º de julho de 1994, em flagrantedescumprimento à vacatio legis de 90 dias.

Não há como uma medida provisória, ato normativo precário e transitório,que perde sua eficácia se não for transformado em lei no prazo de 30 (trinta) dias, a partir desua publicação (art. 62, § 2º da CF/88), respeitar o prazo nonagesimal para a vigência dacontribuição previdenciária, prazo este que é o triplo da existência efêmera da medida provisórianão convertida em lei. Quando do escoamento do prazo nonagesimal já teriam de ter sidoeditadas 03(três) medidas provisórias sobre a matéria, que igualmente teriam de respeitar oprazo nonagesimal.

Parafraseando THOMAS MALTHUS, enquanto a vigência da medidaprovisória dá-se em progressão aritmética, o prazo nonagesimal se multiplica em progressãogeométrica.

Isto posto, CONCEDO A SEGURANÇA, declarando, incidentalmente, ainconstitucionalidade do art. 1º da Medida Provisória 560/94 e determinando à Autoridadeimpetrada se abstenha de deduzir dos vencimentos da impetrante as contribuições para aseguridade social, na forma prevista na MP 560/94 e suas reedições, procedendo à deduçãonos moldes da legislação anterior, ou seja, à alíquota de 6%.

Sem honorários (SÚMULA 512 STF).

Custas, ex lege.

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 193

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição.

Correções cartorárias.

P. R. I.

João Pessoa, 20 de novembro de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3a. Vara

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PSS - CONTRIBUIÇÃO SOCIAL - INATIVOS

Processo nº 96.06191-2 / MANDADO DE SEGURANÇAImpetrante: SINDICATO DOS TRABALHADORES EM SERVIÇO PÚBLICO

FEDERAL NO ESTADO DA PARAÍBAImpetrado: CHEFE DO DEPARTAMENTO NACIONAL DE OBRAS

CONTRA AS SECAS - DNOCS (2º DISTRITO DEENGENHARIA RURAL) e OUTRO.

SENTENÇA

EMENTA. MANDADO DE SEGURANÇA - PREVIDENCIÁRIO - PLANODE SEGURIDADE SOCIAL - INATIVOS - INCLUSÃO REGULAMENTADAPOR MEDIDA PROVISÓRIA E SUAS POSTERIORES REEDIÇÕES -INCONSTITUCIONALIDADE - CONCESSÃO DA SEGURANÇA.

1. Extensão aos proventos dos servidores públicos inativos, da incidênciada contribuição para o custeio da Previdência Social. Incabimento.

2. A aposentadoria deve ser custeada pela contribuição da União e dosservidores ativos. (Inteligência do art. 40, § 6º da Constituição Federal).

3. A Lei nº 8.112/90, em seu art. 2º, define servidor como sendo a pessoalegalmente investida em cargo público.

4. Uma vez concedida a aposentadoria deverá esta conservar o poderaquisitivo inicial, produto de ato jurídico perfeito consumado.

5. As Medidas Provisórias perderão eficácia, desde a edição, se nãoforem convertidas em lei no prazo de trinta dias, a partir de sua publicação(art. 62, § 2º da CF).

6. Concessão da segurança.

Vistos etc.

SINDICATO DOS TRABALHADORES EM SERVIÇO PÚBLICO FEDERALNO ESTADO DA PARAÍBA - SINTSERF/PB, qualificado na inicial, na qualidade de substitutoprocessual de seus associados, impetra o presente mandado de segurança coletivo contrasuposto ato ilegal e abusivo, atribuído ao CHEFE DO DEPARTAMENTO NACIONAL DE OBRASCONTRA AS SECAS - DNOCS - 2º DISTRITO DE ENGENHARIA RURAL, tendo porlitisconsorte passivo necessário a UNIÃO, a fim de que seja declarada a inconstitucionalidadedo art. 7º da Medida Provisória nº 1.415/96 e do art. 7º da Medida Provisória 1.463-2/96 parasustar sua eficácia e determinar à autoridade coatora a abstenção de quaisquer descontosrelativos à contribuição social sobre os proventos dos servidores aposentados.

Alegando contra a ilegalidade e abusividade do ato, sustentam, em resumo,

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 195

que:

a) a exigência da aludida contribuição, através de Medida Provisóriasistematicamente reeditada, pretende obter resultado idêntico ao doProjeto de Lei enviado ao Congresso Nacional pelo Poder Executivo em30 de agosto de 1995, recebido sob o nº 914, de 1995, e rejeitado peloPlenário da Câmara dos Deputados;

b) que tal medida deu nova redação ao art. 231 da Lei nº 8.112/90 visandoincluir os inativos dentre os responsáveis pelo custeio do Plano, passandoa exigir dos aposentados a contribuição exigidas aos servidores públicoscivis regidos pela Lei nº 8.112/90, ocupantes de cargos efetivos.

c) o referido dispositivo infringe o direito adquirido, constitucionalmenteassegurado, dos inativos ao não custeio do Plano de Seguridade Social,(arts. 195 e 40 da Constituição Federal).

Instruiu a petição inicial com procurações e documentos de fls. 13/48,pugnando pela segurança, para que seja declarada incidentalmente a inconstitucionalidadedas Medidas Provisórias 1.415/96 e 1.463-2/96 e, que a autoridade apontada como coatorase abstivesse dos descontos da contribuição em causa, na forma prevista nos art. 7º dasreferidas Medidas.

A liminar foi indeferida fls. 51/53.

Citada, a União ofereceu contestação, argüindo, preliminarmente ailegitimidade passiva ad causam, por se tratar de matéria de natureza fiscal e a carência deação, por entender que a impetração se bate contra lei em tese. No mérito, sustenta ainexigibilidade de lei complementar, porque a contribuição em tela tem por fundamento o art.149, combinado com o parágrafo 6º do art. 40, ambos da Constituição Federal. No mais,sustenta a legalidade do ato impugnado.

Notificada, a Autoridade impetrada prestou informações de estilo, onde,preliminarmente, argüi a sua ilegitimidade passiva ad causam por não ter poder decisório emrelação a alíquota do PSS dos servidores do órgão. No mérito, alega a legitimidade do atouma vez que a Medida Provisória tem força de lei enquanto não for rejeitada pelo Congresso.

O Ministério Público Federal, em brilhante parecer da lavra do cultoProcurador da República, Dr. ANTÔNIO CARLOS PESSOA LINS, opinou pela concessão dasegurança.

Relatados, DECIDO.

PRELIMINARES

LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO DA UNIÃO e ILEGITIMIDADEPASSIVA AD CAUSAM

A União é parte legítima, na qualidade de litisconsorte passiva necessária,eis que divide com o servidor público o custeio da seguridade social, (art. 40, parágrafo 6º daConstituição Federal, com a redação dada pela Emenda 3/93), daí seu interesse, vista quesofrerá a repercussão dos efeitos patrimoniais da sentença, se concessiva. Aliás, citada, aUnião atendeu à convocação, defendendo a manutenção do ato impugnado. Mantenho-a,pois, na relação jurídica processual, inclusive, prevenindo nulidade e, destarte, entendo

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despicienda a convocação à lide da PROCURADORIA DA FAZENDA NACIONAL.

MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA LEI EM TESE

A impetração não se volta contra lei em tese, posto que os impetrantesatacam ato concreto, que, executando a previsão legal (Medidas Provisórias 1.415/96, 1.463/96 e reedições), determina o desconto em seus proventos, da contribuição para o PSS,configurando, a toda vista, violação de direito individual, que viabiliza a propositura do Mandadode Segurança. Rejeito, por essas razões, a preliminar invocada pela União.

ILEGITIMIDADE DO IMPETRADO

Não prospera. Autoridade coatora, segundo esmerada doutrina ejurisprudência, é aquela que, dentro de sua esfera de competência, possui poder decisório epode corrigir o ato inquinado com a pecha de ilegal e abusivo. No caso presente, o impetrado,na qualidade de ordenador de despesa do órgão a que pertencem os substituídos pode sustara cobrança do PSS e, destarte, figurar no pólo passivo da demanda, razão pela qual rejeito apreliminar ventilada.

MÉRITO

A pretensão do impetrante insurge-se contra os termos das MedidasProvisórias nºs 1.415/96 e 1.463/96 e suas reedições que entre outras disposições, em seuart. 7º, alterou a redação do art. 231 da Lei nº 8.112/90, que instituiu a cobrança da contribuiçãosocial para os servidores inativos da União.

As Medidas Provisórias nºs 1.415/96 e 1.463/96 e suas reedições, dispõemsobre o reajuste do salário mínimo e dos benefícios da Previdência Social, alteram alíquotasde contribuição para a Seguridade Social e institui contribuição para o servidores inativos daUnião, sendo este último o cerne da questão no presente mandumus. Pois, o art. 7º dasreferidas medidas, traz:

“Art. 7º - O artigo 231 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, passaa vigorar com a seguinte redação:

Art. 231. O Plano de Seguridade Social do servidor será custeado com oproduto da arrecadação de contribuições sociais obrigatórias dosservidores ativos e inativos dos três Poderes da União, das autarquias edas fundações públicas.

...........................................

§ 3º A contribuição mensal incidente sobre os proventos será apuradaconsiderando-se as mesmas alíquotas e faixas de remuneraçãoestabelecidas para os servidores em atividade.”

A inovação trazida pela medida provisória em relação ao texto anteriorsão as expressões ativos e inativos, pois, a redação alterada apenas continha a expressãoservidores de forma isolada. Para melhor se entender tais aditivos, necessário se tornacompreender o significado de servidor.

A própria Lei nº 8.112/90, em seu artigo 2º, assim define:

“Para efeitos desta lei, servidor é a pessoa legalmente investida em cargopúblico.”

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 197

Para Celso Antônio Bandeira de Mello, servidor tem a presente definição:

“A designação servidores públicos abarca todos aqueles que entretêmcom o Estado e entidades de sua administração indireta ou fundacionalrelação de trabalho de natureza profissional e caráter não eventual sobvínculo de dependência.(Curso de Direito Administrativo, MalheirosEditores, 4ª ed., pág.124)”

E, para o mestre Hely Lopes Meirelles servidores públicos representam:

“... os servidores públicos constituem em subespécies dos agentespúblicos administrativos, categoria que abrange a grande massa deprestadores de serviços à Administração e a ela vinculados por relaçõesprofissionais, em razão de investidura em cargos e funções, a título deemprego e com retribuição pecuniária. (Direito Administrativo Brasileiro,Malheiros Editores, 18ª ed., pág. 358)”

Depreende-se desses conceitos que servidor público é aquele investidoem cargo público que, face a prestação de serviço, mantém uma relação de trabalho.

Quanto ao cargo público a legislação é expressa (art. 3º da Lei nº 8.112/90):

“Cargo público é o conjunto de atribuições e responsabilidades previstasna estrutura organizacional que devem ser cometidas a um servidor”.

No presente feito, os impetrantes são todos aposentados e, não ocupammais cargo público e nem prestam mais seus serviços a administração. Entendo comodescabido, face os conceitos acima, considerar os aposentados como servidores, uma vezque já não prestam mais os seus serviços à administração pública - direta ou indireta -, comobem leciona o mestre Hely Lopes Meirelles, na obra já citada, a aposentadoria para o servidorpúblico “é a garantia de inatividade remunerada reconhecida aos servidores que já prestaramlongos anos de serviço, ou se tornaram incapacitados para suas funções.” Logo, o servidorinativo não é mais um agente público, haja visto que não exerce qualquer função, ou seja, nãoestá sujeito a qualquer atribuição ou responsabilidade, não participa da estrutura organizacionale nem está investido em cargo público.

O atual regime jurídico único distingue, com nitidez, entre a condição deservidor, de ativo (arts. 5º e 182); e a de beneficiário da seguridade social, de aposentado(arts. 186 a 195), a que chama de inativo (art. 189, parágrafo único). No art. 197, refere-se aoservidor inativo, para abranger o disponível. No art. 226, alude a servidor aposentado, ou seja,ao ex-servidor, que não mais presta serviços (cf. art. 4º).

E, sobre a aposentadoria a Constituição em seu art. 40, § 6º, diz que osproventos dos aposentados serão custeados por recursos provenientes da União e dascontribuições dos servidores, senão vejamos:

“Art. 40. O servidor será aposentado:

...........................................

§ 6º. As aposentadorias e pensões dos servidores públicos federais serãocusteadas com recursos provenientes da União e das contribuições dosservidores na forma da lei”.

O presente texto constitucional é claro ao afirmar que as aposentadorias

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198 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

são custeadas pela União e pelos servidores em atividade (que permanece no exercício deserviço público), não incluídos os aposentados como pretende o Poder Executivo ao editar aMedida Provisória nº 1.415/96 e suas reedições.

Nesse sentido trago como ilustração ensinamentos do professor CelsoRibeiro Bastos, onde diz que para o servidor público, a aposentadoria tem caráter previdenciárioe pode constituir-se em direito decorrente do exercício da função pública, financiado inteiramentepelo Estado, ou seja:

“... A aposentadoria é uma contraprestação do Estado por serviçosprestados, nas condições especificadas em lei, ainda que não hajacontemporaneidade entre a prestação do serviço e os proventos; daí falaremos doutrinadores que os proventos da aposentadoria correspondem avencimentos diferidos, ou seja, uma parcela dos vencimentos não pagana atividade para ser paga quando da aposentadoria (pf. J. E. Abreu deOliveira - Direito Administrativo, cit. P. 323-4) (Comentários à Constituiçãodo Brasil, Editora Saraíva, art. 40 págs. 205/206)”.

Nessa obra ainda, o constitucionalista Celso Bastos cita (pág. 206) oconceito de aposentadoria segundo o mestre Themístocles Cavalcanti, que defende esteinstituto como uma garantia geral para os servidores, in verbis:

“O instituto da aposentadoria é, antes de tudo, uma conquista social,fundada em um princípio de justiça que não permite ao abandono namiséria, depois da velhice ou da invalidez, daquele que prestou o seuserviço ao Estado”.

Dessa forma, o Executivo ao editar a Medida Provisória, ora em questão,foi um tanto quanto incongruente, equiparando o aposentado com o servidor ativo e, ainda,estipulando o recolhimento de uma contribuição social que a própria Constituição define quedeve ser custeada pela União e pelos servidores em exercício. Ora, o inativo já não é servidorporque deixou o serviço público com a aposentadoria.

Com relação a contribuição social, há de se analisar, ainda, o textoconstitucional que diz:

“Art. 195 - A seguridade social será financiada por toda a sociedade, deforma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientesdos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dosMunicípios, e das seguintes contribuições sociais:

I - dos empregadores, incidente sobre a folha de salários, o faturamento eo lucro;

II - dos trabalhadores;

III - sobre as receitas de concursos de prognósticos;”

Portanto, mais uma vez, o próprio texto constitucional é claro ao afirmarque a seguridade social será financiada pelos trabalhadores e, não pelos aposentados comobem quer o Executivo.

Em consonância com os argumentos até aqui defendido, há de observar,também, a questão da irredutibilidade do valor dos proventos, que conforme J. Cretella Jr. (inComentários à Constituição de 1988, vol. VIII, pág. 4.302, 2ª ed., Forense Universitária),devem ser mantido o poder aquisitivo inicial, in verbis:

“A irredutibilidade do valor dos benefícios é outro dos pilares orientadores

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do Poder Público, na organização da seguridade social. Assim, uma vezconcedido, deverá o benefício manter-se inalterado, ou seja, conservandoo poder aquisitivo inicial.”

Por conseguinte, o aposentado se encontra em situação subjetiva, geradorade direitos adquiridos, produto de ato jurídico perfeito, consumado, aperfeiçoado no passado.Estando o núcleo dos direitos do aposentado radicalizado na percepção dos proventos, comoretribuição dos serviços pro labore facto, já prestados pelo ex-servidor, ora inativo, e, portantoestipêndio de que não pode ser privado seu titular, eis que objeto de direito adquirido.

Acrescento que outro ponto a ser verificado é o fato da incompatibilidadedas reedições das Medidas Provisórias com a regra de eficácia ab initio da medida nãoconvertida em lei (art. 62, parágrafo único da Constituição Federal). Sobre essa matéria,acompanho o entendimento do tributarista Hugo de Brito Machado, que assim leciona:

“Parece-nos que a reedição de medida provisória não apreciada não podedisciplinar as relações jurídicas decorrentes da medida anterior, porqueisto viola, flagrantemente aliás, a regra da Constituição, segundo o qualcompete ao Congresso Nacional regular as relações jurídicas decorrentesda medida provisória não convertida em lei. Por outro lado, a reedição,com tal convalidação de efeitos da medida anterior, implicaria clara einduvidosa prorrogação do prazo de trinta dias, constitucionalmente fixado,e, portanto, em modificação, pelo Presidente da República, de uma normaexpressa da Constituição, o que, no plano estritamente jurídico, não érazoável admitir-se.(Os Princípios Jurídicos da Tributação na Constituiçãode 1988, Editor Revista dos Tribunais, 2ª edição, pág. 33)”.

Não é demais adicionar o entendimento, do Eminente Ministro JOSÉCELSO DE MELLO FILHO, do Supremo Tribunal Federal sobre as edições das MedidasProvisórias, publicado no jornal a “Folha de São Paulo” do dia 18 de novembro de 1996,quando expressa:

“... a cada momento uma conduta de desprezo à Constituição. As medidasprovisórias são emblemáticas da posição típica de um presidencialismoimperial. Não é correto tornar a medida provisória um expediente ordináriode atividade legislativa. Sob esse aspecto, a medida provisória tem uminquestionável componente autoritário. Nada mais é do que a manifestaçãoformal da vontade unilateral do príncipe, vale dizer, do governante. É elequem, por uma manifestação unilateral de vontade, impõe determinadasprescrições à observância de toda a coletividade. E isso não é aceitávelno contexto de uma formação social democrática, especialmente quandoo chefe do Executivo é um homem que tem uma formação democrática.Isso me surpreende e me preocupa porque é prática que se tornou crônicana esfera da Presidência da República”.

Dessa forma, reconheço que o aposentado não é destinatário depagamento de contribuição previdenciária como previsto nas Medidas Provisórias nºs. 1.415/96 e 1.463/96 e suas reedições, por sua escancarada ilegitimidade passiva.

Ainda, o aposentado está claramente amparado pelo princípio dasegurança ou certeza jurídica, bem assim como dos princípios da legalidade, moralidade elegitimidade para que seja reconhecida a preservação de sua situação jurídica consolidada notempo, sem imposição da contribuição previdenciária.

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200 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

Suficiente relevância, pois, da questão travejada nestes autos, ou seja,no Juízo definitivo, para o fim de se concluir pela concessão do mandumus.

Isto posto, CONCEDO A SEGURANÇA, declarando, incidentalmente, ainconstitucionalidade do art. 7º das Medidas Provisórias nºs. 1.415/96 e 1.463/96 e de suasreedições, determinando à autoridade impetrada que se abstenha de deduzir dos proventosdos impetrantes-substituídos, nominados na relação constante dos autos, as contribuiçõespara a seguridade social.

Sem honorários (SÚMULA 512 STF).

Custas, ex lege.

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição.

P. R. I.

João Pessoa, 27 de novembro de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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APOSENTADORIA - TEMPO DE SERVIÇO

Processo Nº 94.08819-1 – MANDADO DE SEGURANÇAImpetrante: GUILHERMO CAMPOS PEREZImpetrado: REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA – UFPB

SENTENÇA

I – RELATÓRIO (CPC, art. 458, I)

Vistos etc...

GUILHERMO CAMPOS PEREZ, qualificado na exordial, impetra atravésde advogado legalmente habilitado mandado de segurança contra ato reputado abusivo eilegal imputado ao Sr. REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA, visando obterproteção judicial reparadora contra o indeferimento de pedido de aposentadoria a que alegater direito, por cumprimento do tempo de serviço exigido por lei.

2. Aduz que, na qualidade de brasileiro naturalizado, exerce as funçõesde professor adjunto da UFPB há mais de 15 (quinze) anos e conta mais 20 (vinte) anos, 9(nove) meses e 16 (dezesseis) dias de serviço prestado em seu País de origem, o Chile,conforme faz certo a documentação trazida em anexo e o tratado internacional sobre a matériaassinado entre os dois Estados.

3. Segundo, entende o Acordo de Previdência Social concluído entre oGoverno da República Federativa do Brasil e o Governo da República do Chile, assinado nacapital Santiago aos 10 de outubro de 1980, teve aprovação pelo Decreto Legislativo nº 27, de1982, autorizando a contagem do tempo de serviço pretendida, nos termos da Constituição.

4. Argüi que o seu pleito foi indeferido com base em dois pareceres dasassessorias jurídicas da UFPB e do Ministério da Educação e Desportos, no sentido de queo tratado sob comento não teria a abrangência que lhe pretende emprestar o impetrante eque, para a contagem do tempo de serviço prestado na República do Chile, exigível se tornao pagamento da contribuição respectiva junto ao INSS.

5. Processado sem liminar, à inicial foram juntados os documentosnecessários ao conhecimento e julgamento do pedido, com guia de recolhimento de custas eregular instrumento de procuração.

6. Notificada, prestou a autoridade impetrada as informações de estilo(fls. 38/40), sustentando a regularidade e legalidade do seu procedimento e a inexistência dequalquer direito a proteger em favor do impetrante, especialmente:

a) que o impetrante não contribuiu para a Previdência Social pelo tempode serviço prestado em lei para a aposentadoria de docente (trinta anos);

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202 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

b) que o Tratado sob o qual se funda o pedido condiciona textualmente acontagem à observância da “legislação do País onde tenham sidoprestados os serviços respectivos”, autorizando cada parte celebrante aaplicar suas respectivas leis.

7. O ilustrado Procurador da República que atua no feito advoga arejeição do writ, aduzindo que o Acordo tem aplicação restrita aos trabalhadores regidos pelaCLT, não se assemelhando o serviço prestado no estrangeiro a tempo trabalhado no âmbitofederal, estadual ou municipal, dependendo a eficácia do tratado de “ajustes administrativos”,que o complementariam.

A seguir, vieram–me conclusos os autos para sentença, que, relatados,DECIDO.

II - FUNDAMENTOS (CPC, art. 458, II)

9. Trata–se, como se vê, de examinar–se sobre a possibilidade ou nãode contagem de período de trabalho prestado ao governo do Chile por cidadão de origemchilena, naturalizado brasileiro, para fins de concessão de aposentadoria por tempo de serviço,presentes as normas internacionais emanadas do Acordo de Previdência Social oficializadoentre a República Federativa do Brasil e o Governo da República Andina, em confronto com alegislação previdenciária nacional.

10. Diga–se, de início, que nenhum dos documentos juntados peloimpetrante foi impugnado, seja pela autoridade reputada coatora, seja pelo ilustrado órgãoministerial, estando a demonstrar efetivamente o tempo de serviço prestado ao governo doChile, regularmente trazidos, autenticados e devidamente traduzidos e aquele prestado noBrasil.

11. Para ser correto e por rigor ao sistema e à técnica da Constituição,tem-se como nacional a legislação fundada em tratados e acordos bilaterais de que participeo Brasil, respeitado o devido processo legislativo estabelecido pela Carta.

12. A legislação brasileira, assim, não resta dúvida, assegura ao professorempregado na iniciativa privada ou integrante do serviço público aposentadoria por tempo deserviço com rendimento mensal correspondente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefícioou proventos integrais, respectivamente, contados 30 (trinta) anos de efetivo serviço ou emcaso de enfermidade, conforme definido em lei. Nesse sentido, o texto da Carta de 1988,arts. 40, inciso III, alínea “b” e 202, inciso III; o Regulamento de Benefícios da PrevidênciaSocial (Lei nº 8.213, de 24.7.1991), art. 56; e o Regime Jurídico dos Servidores PúblicosCivis da União (Lei nº 8.112, de 11.12.1990), art. 186, inciso III, alínea “b”.

13. No caso dos autos, o tempo de serviço do impetrante encontra–sedevidamente demonstrado pela documentação colacionada e, afora o texto do Acordo citado,tem-se como inexistente qualquer previsão categórica da legislação que especifique o direitoà contagem do tempo de serviço externo para os efeitos requeridos, no Brasil.

14. Ainda assim, tenho que a aposentadoria do servidor encontra-seamparada pela legislação constitucional e infraconstitucional brasileira, senão vejamos.

15. A Constituição de 1988, como as anteriores recentes, dentre osdireitos sociais dos trabalhadores públicos e privados (CF, arts. 7º, inciso XXIV e 40, inciso III,alínea “b”), assegurou ao brasileiro nato, como ao naturalizado, o direito à aposentadoria,regulada nos termos dos Diplomas legais antes citados.

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16. Para a contagem de tempo de serviço prestado no estrangeiro, tantoa Constituição quanto a legislação infraconstitucional brasileiras foram omissas, dando ensejoa iniciativa das relações exteriores de ambos os países no sentido de suprirem essa lacuna,mediante assinatura e inclusão no sistema positivo de cada Estado de legislação pertinente,consubstanciada in casu no Acordo Internacional de Previdência Social antes mencionado.

17. A disciplina do tratado internacional no sistema constitucionalbrasileiro, como as normas definidoras dos direitos e garantias individuais, tem aplicaçãoimediata no Brasil tão logo aprovados pelo Congresso mediante Decreto Legislativo (quandose trate de atos que acarretem encargos ou compromissos gravosos), ou em data nestefixada, mantidos os seus efeitos mesmo quando não previstos ou não decorrentes do regimee dos princípios adotados pela Constituição (CF, art. 5º, §§ 1º e 2º).

18. O texto aprovado pelo Congresso estabelece “normas que regulamas relações entre os dois países, em matéria de Previdência Social” (Preâmbulo) e fala em“trabalhadores chilenos no Brasil e... brasileiro no Chile”. Por isso, o d. Procurador entendeuexcluídos os “trabalhadores” sujeitos ao regime estatutário, por não utilizada especificamentea palavra “servidor” no diploma inter-Estados.

19. Em que pese a inteligência desse entendimento, tenho para mim,com respaldo em REZEK (Direito Internacional Público – Curso Elementar, Saraiva, 3ªedição, 1993, pág. 9), que a exegese mais correta dos tratados e acordos internacionais develevar em conta especialmente os costumes e os princípios gerais de direito, utilizadas ajurisprudência e a doutrina apenas como meios auxiliares, não descartada, ainda, a eqüidade.

20. Ora, a orientação que vislumbra interpretação restritiva para aexpressão “trabalhador” como o indivíduo unicamente vinculado a um regime jurídico de trabalhoé própria do sistema jurídico brasileiro, que distingue entre “trabalhadores” celetistas e servidoresestatutários, que não pode prevalecer nas relações internacionais. Aqui, a particularidade dosistema e a realidade específica decerto que são diversas daquela reinante no Chile e, comcerteza, em outros países.

21. Aliás, o próprio Acordo se encarrega de elencar as exceções à suavigência, não incluindo nestas nenhuma nota específica quantos aos regimes jurídicos dequalquer dos dois países.

22. Certo, pois, com a devida venia, que tal não significa apenas matériapertinente a trabalhadores regidos pelas normas de direito privado, havendo um conteúdo deabrangência mais geral para os dois Estados, segundo o qual as disposições envolvem todosos sistemas previdenciários relativos aos regimes adotados no Chile e no Brasil, sendo nesteo celetista e o estatutário.

23. Quanto ao tratamento a ser dado ao tempo de serviço, firmou-se:

“ARTIGO VII –“

“1. Os períodos de serviço cumpridos em ambos os Estados Contratantespoderão, desde que não sejam simultâneos, ser totalizados para aconcessão das prestações que estabeleça o Ajuste Administrativo.”

“2. O cômputo desses períodos se regerá pela legislação do país ondetenham sido prestados os serviços respectivos.”

24. E no artigo VIII:

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“1. Cada Entidade Gestora determinará, de acordo com a sua próprialegislação e com base no total dos períodos cumpridos em ambos osEstados Contratantes, se o interessado reúne as condições necessáriaspara a concessão de prestação.”

“2. Em caso afirmativo, determinará o valor da prestação como se todosos períodos tivessem sido cumpridos sob a sua própria legislação ecalculará a parcela a seu cargo, na proporção dos períodos cumpridosexclusivamente sob essa legislação”.

25. A pretensa lacuna existente no “direito interno” deixou então de existir,uma vez editado o Decreto Legislativo referenciado, que tornou obrigatória no Brasil aobservância do texto do Acordo firmado entre os seus signatários, autorizando-se a contagemdo tempo de serviço relativamente à “concessão das prestações que estabeleça o AjusteAdministrativo”.

26. Vê-se, daí, que apenas a concessão das prestações é que deveráser estabelecida no Ajuste, e não a contagem do tempo trabalhado. Este é direito assegurado,independentemente de qualquer outra formalidade pelas leis brasileiras, em consonânciacom o item 2 do ARTIGO VII suso transcrito.

27. Visto isso, à legislação brasileira é que caberá estabelecer comoserá concedida a aposentadoria. Para os trabalhadores sujeitos ao regime privado, exige-seum período de carência, variável de acordo com o benefício pleiteado. Para os servidorespúblicos, tem-se apenas a exigência do tempo de serviço, ou, em caso específicos, como aaposentadoria compulsória, a conseqüência da proporcionalidade. No caso do impetrante, acarência exigida no âmbito da Previdência Social aplicável aos trabalhadores sob o regimeprivado – 180 (cento e oitenta) prestações, de acordo com o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91 – foi integralmente cumprida, resultado do período de 15 anos trabalhado para a UFPB.

28. Não teria sentido interpretar-se de maneira diversa o texto do Acordoem causa, que perderia eficácia justamente para o fim maior que visou proteger, ou seja, otratamento isonômico previdenciário dos nacionais de ambos os países, significando oentendimento em contrário, especialmente para trabalhadores com idade mais avançada comoo impetrante, verdadeira impossibilidade de aposentar-se, a não ser pela compulsória, aindaassim com proventos proporcionais ao tempo de serviço “prestado no Brasil”.

29. Sem contar o humanitarismo que encerra a matéria versada, entendoque, em termos de interesses multinacionais, a execução do Acordo desperta maior apelo daparte do Estado brasileiro do que do Chile, na medida em que as colônias de nacionaisdesses países provavelmente penderá mais para o Brasil do que para este último, consideradasas medidas geográficas e populacionais, conquanto não se encontre em julgamento esteaspecto, próprio que é das autoridades do Executivo.

Não há, pois, como negar–se bom direito à impetração.

III - DISPOSITIVO (CPC, art. 458, III)

31. ISSO POSTO, desarmônico com o douto parecer ministerial, acolhoo pedido deduzido na peça vestibular e concedo integralmente a segurança, para reconhecero direito à contagem do tempo de serviço prestado ao governo chileno pelo impetrante, paraefeito de aposentadoria, determinando o processamento do pedido administrativo, cujo examedos demais requisitos ficará a cargo da instituição autárquica de ensino superior paraibana, a

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UFPB.

32. Sentença sujeita a reexame necessário.

33. Sem honorários (STF e STJ, Súmulas nº 512 e 105, respectivamente).

34. Custas ressarcíveis pela UFPB, de quem é agente a autoridadecoatora.

P.R. I.

João Pessoa, 19 de dezembro de 1994.

JANÍLSON BEZERRA DE SIQUEIRAJuiz Federal Substituto da 1ª Vara

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TEMPO DE SERVIÇO - RECONHECIMENTO

Processo nº 96.03857-0 / MANDADO DE SEGURANÇAImpetrante: AVANI DANIEL DE ASSISImpetrado: DIRETOR DA DIVISÃO DE SEGURO SOCIAL DO INSS

SENTENÇA

Vistos etc.

AVANI DANIEL DE ASSIS, qualificado nos autos, por advogado legalmenteconstituído (fls. 12), impetrou mandado de segurança com pedido de liminar contra ato doDIRETOR DA DIVISÃO DE SEGURO SOCIAL DO INSS, também qualificado, objetivandocadastrar-se como segurado-facultativo-estudante, perante a Previdência Social,retroativamente, pelo período correspondente a maio/1963 a abril/1973.

2. Fundamentou o pedido na CF, artigo 5º, LXIX, na Lei nº 1.533/51 eem legislação de natureza previdenciária.

3. Na petição inicial (fls. 02/10), que trouxe aos autos documentação(fls. 12/16) pertinente à pretensão deduzida, alegou textualmente que:

“No dia 26 de março de 1996, a Impetrante protocolizou junto àSuperintendência Estadual do INSS na Paraíba, (...) endereçado à Diretorada Divisão de Seguro Social do INSS, pleiteando autorização para efetuaro recolhimento como segurado facultativo-estudante, nos termos dosDecretos nºs 83.081/79 e 90.817/85, combinados com os decretos-leinºs. 611/92 e 612/92, correspondente ao período de maio de 1963 a abril1973, conforme documento nº 02 que segue em apenso.

No dia 06 de maio de 1996, foi notificada através de um pedaço de papelque o seu pleito não encontrava amparo legal face ao disposto no memo‘circular nº 13.700.0/02/96’, tendo juntado ao comunicado um parecerapócrifo, documento 03 e 04 que vão em anexo (...).”

4. Pagas as custas iniciais (Lei nº 6.032/74, RCJF, artigo 13, tab. I, nºII), foi indeferida (fls. 19) a liminar e determinada a notificação do impetrado para prestarinformações (Lei nº 1.533/51, artigo 7º, inciso I).

5. O impetrado, em tempestivas informações, argüiu (fls. 22/25)essencialmente que:

“(...) ao Segurado-Facultativo-Estudante, não estendeu a permissividadede reconhecimento e conseqüente recolhimento de contribuições, deperíodos anteriores à Lei nº 8.213/91.

Constata-se, de modo irrefutável, que o reconhecimento do período

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questionado na qualidade de Segurado-Facultativo-Estudante, comodeseja a Impetrante, é data-venia juridicamente impossível, por falta deprevisão legal, haja vista que, somente após o advento da Lei nº 8.213/91,tal categoria foi inserida nas demais abrangidas pela Previdência Social(art. 8º, “c”). Não obstante, quando do requerimento do reconhecimentode tempo de serviço, além do recolhimento das contribuiçõescorrespondentes, faz-se necessário que a atividade exercida já estejaabrangida pelo Regime de Previdência Social Urbano.

Portanto, o início da contagem de tempo de serviço dessa categoria dar-se-á, a partir da edição da mencionada Lei, com a primeira contribuiçãorelativa à inscrição (...).”

6. O d. MPF, como parte pública autônoma, pronunciou-se (fls. 31/33)pela denegação da segurança, em parecer que recebeu a seguinte ementa:

“EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA DAS SITUAÇÕES E FATOS QUE EMBASAM O DIREITOINVOCADO PELA PARTE-IMPETRANTE.

CONSEQÜÊNCIA. SEU DESCABIMENTO”.

7. Sem incidentes, os autos vieram-me conclusos (fls. 34 verso) parasentença.

Relatados, DECIDO.

8. A discussão, portanto, está resumida em saber-se da existência dedireito líquido e certo, “apto a ser exercido no momento da impetração” (Mandado deSegurança e Ação Cautelar./Hely Lopes Meirelles, 7ª ed. ampl., São Paulo, Ed. RT, 1980, p.10/11), resultante de ato coator certo, capaz de ser comprovado, de plano, por documentoinequívoco, o que restou indemonstrado nos autos.

9. No caso, desenganadamente, inexiste qualquer comprovação quede estar o impetrante amparado por disposição legal ou por direito adquirido; entretanto, àvista do documento expedido pelo INSS (fls. 16), que teoricamente pode ser elevado à categoriade ato coator, deixo de rejeitar preliminarmente o mandamus.

10. No mérito, a pretensão do impetrante está compreendida em duasvertentes principais, a saber:

10.1 - cadastrar-se como Segurado-Facultativo-Estudante, indenizada aPrevidência Social, referentemente ao período maio/1963 a abril/1973; e,

10.2 - ver contado esse tempo de serviço, para os fins previstos em lei.

11. Em verdade, o reconhecimento da condição de segurado, para finsde filiação de estudante, apesar das disposições legais referidas - Dec. Nº 611/92, art. 8º, §único, alínea “c”, art. 15, VI, art. 58, VI, art. 188, art. 189, § único, art. 190, art. 191 e art. 198;Dec. Nº 612/92, arts. 10 e 13, § único, alínea “c” - e da predisposição do impetrante emindenizar a Previdência Social, esbarram na lacuna atualmente existente no direito positivo arespeito da matéria, já a Lei nº 7.004/82, instituidora do Programa da Previdência Social aosEstudantes restou derrogada, no particular, pela Lei nº 8.213/91, por sua vez regulamentadapelo Dec. Nº 611/91, o chamado Regulamento Geral da Previdência Social; vale ressaltar queo art. 137, da referida Lei 8.213/91, foi taxativo quanto à revogação do Programa da

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Previdência Social aos Estudantes.

12. Por oportuno, interessa frisar que o caso dos autos não éenquadrável nas hipóteses seguintes, as quais, em tese, infirmariam o raciocínio antesexpendido:

12.1 - de aluno-aprendiz de Escola Técnica Federal, com percepção deretribuição pecuniária; nem tampouco,

12.2 - de estudante-universitário que haja contribuído, nessa finalidade,para o referido Programa de Previdência, ao tempo da sua vigência.

13. Portanto, não há o pretendido direito líquido e certo do impetrante, jáque apenas através da Lei nº 7.004/82, mais especificamente no seu art. 1º, e segs., acategoria estudantes foi abrangida pela Previdência Social.

14. Isto Posto, fundamentado na Constituição Federal, artigo 5º, LXIX,no CPC, art. 269, I, na Lei nº 1.533/51 e demais legislações referidas, denego a segurançaimpetrada por AVANI DANIEL DE ASSIS contra ato do DIRETOR DA DIVISÃO DE SEGUROSOCIAL DO INSS, diante da inexistência de direito líquido e certo.

15. Sem honorários advocatícios por incabíveis na espécie (Súmula 512- STF).

16. Custas, ex lege.

17. P.R.I.

João Pessoa, 20 de agosto de 1996.

JOÃO BOSCO MEDEIROS DE SOUSAJuiz Federal Titular da 1ª Vara

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CONCURSO PÚBLICO - DEFICIENTE FÍSICO

Processo Nº 6412 / MANDADO DE SEGURANÇAImpetrante: SEVERINO DANTAS FERNANDESImpetrado: DIRETOR DA ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE

SOUSA-PB

SENTENÇA

Ementa: Constitucional e Administrativo. Mandado de Segurança.Concurso Público. Portador de deficiência física. Art. 37, VIII, CF e art.5º, parágrafo 2º da Lei 8.112/90.

O parágrafo 2º do art. 5º da Lei 8.112/90 não regulamentou por completoo dispositivo constitucional, pois apenas fixou o percentual de reserva devagas, sem contudo, definir os critérios de admissão no serviço e deaferição da compatibilidade dos cargos com as deficiências de que sãoportadores os candidatos. Inexistência de ilegalidade ou abuso no atoimpetrado. Segurança denegada.

SEVERINO DANTAS FERNANDES, qualificado, impetrou Mandado deSegurança contra ato do SR. DIRETOR DA ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE SOUSA,que, após todas as etapas do Concurso Público para Assistente Administrativo da EAF-Sousa-PB, classificou o impetrante, deficiente físico, em 17º (décimo sétimo) lugar e nãoassegurou sua vaga na reserva legal de que trata o Edital do referido certame.

Alega que se inscreveu no Concurso Público para Técnico Administrativo,na categoria de assistente administrativo da Escola Agrotécnica Federal de Sousa-PB, e porser portador de DISTROFIA MUSCULAR, inscreveu-se na qualidade de deficiente físico, parao preenchimento das vagas reservadas para tal situação.

Acontece que no dia 17 de dezembro de 1994, foi divulgada a lista doscandidatos aprovados e classificados, constando o nome do impetrante somente entre oscandidatos habilitados, não constando qualquer referência aos candidatos aprovados nasvagas destinadas aos portadores de deficiência física.

Sustenta, ainda, o impetrante que sua irresignação decorreu do fato deser o único candidato aprovado nas vagas de deficiente físico, o que lhe faria manter a colocaçãode primeiro lugar dentre essas vagas, para que, quando fosse feita a classificação geral,constando os candidatos aprovados sem deficiência e os aprovados ditos deficientes, seunome apareceria logo na totalidade de uma provável lista geral de aprovação final, o que nãoaconteceu, pelo que requer a concessão de liminar inaudita altera parte, no sentido desuspender temporariamente as nomeações já realizadas e que seja concedida em definitivo asegurança para que se determine à autoridade coatora a sua nomeação para ocupar o cargode técnico administrativo na vaga do sexto nomeado.

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210 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

Liminar indeferida, fls. 32.

Ao prestar informações, aduz a autoridade impetrada que o Edital doConcurso observou a reserva legal de 20% das vagas destinadas aos portadores de deficiênciafísica como manda o disposto no parágrafo 2º, art. 5º, da Lei 8.112, representando ocumprimento à ordem constitucional posta no art. 37, VIII, da Carta Magna.

Além do mais, o impetrante, em 16 de janeiro de 1995, ingressou comProcesso Administrativo, que lhe assegurou a vaga, sendo, então, condicionado o seu direitoà realização de perícia médica por junta oficial, que decidirá normativamente sobre a qualificaçãodo candidato deficiente, para o fim de detectar o grau de deficiência capacitante para o exercíciodo cargo para o qual fez jus.

Parecer da douta procuradoria Regional da República, da lavra do ilustreprocurador EITEL SANTIAGO DE BRITO PEREIRA, é no oriente da denegação da Segurança,face a ausência de direito líquido e certo do impetrante a amparar o presente WRIT, ante ainexistência de prova pré-constituída.

É o relatório. DECIDO.

Por primeiro, cumpre assinalar que o não cumprimento do mandamentolegal, quando da publicação de lista geral de aprovados, sem destaque à reserva legal destinadaaos portadores de deficiência física, restou sanado no orbe administrativo (cf. fls. 33 a 54),com a reserva da vaga destinada a portador de deficiência física em favor do Impetrante.

Esclarecido este ponto, cumpre examinar o cerne da impetração quereside em aferir se a aprovação de portador de deficiência física em vaga decorrente da reservalegal do parágrafo 2º do art. 5º, da Lei 8.112/90, implica em imediata nomeação.

Transcrevo o dispositivo que trata do tema:

“Às pessoas portadoras de dificência é assegurado o direito de se inscreverem concurso público para o provimento de cargos cujas atribições sejamcompatíveis com a deficiência de que são portadores; para tais pessoasserão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas noconcurso.” (art. 5º, parágrafo 2º, da Lei 8.112/90)

Ainda que de defeituosa redação, como bem enfatiza o mestre IVANBARBOSA RIGOLIN, em “Comentários ao Regime Único dos ServidoresPúblicos Civis, Saraiva Editora, pág. 28”, ao assinalar que:

“Trata-se de um artigo sem a mínima condição de auto-executoriedade,de eficácia absolutamente contida pela falta de regulamentação, à qual oartigo, com sua técnica fraquíssima, nem sequer se refere. Parece tersido o parágrafo redigido às pressas, apenas para dar cumprimento amandamento constitucional, já que assunto tão importante jamais poderiater sido tratado com semelhante rapidez e frivolidade pela lei. Esta comtodo efeito, precisaria ter disposto sobre maior número de institutos, edisposições capitais acerca do serviço de deficientes na administraçãofederal”.

De sua leitura, não se pode abonar a tese defendida pelo impetrante. Éque, mesmo informado pelo princípio constitucional anti-discriminatório de acesso a cargospúblicos por trabalhadores portadores de deficiência, o dispositivo legal, sujeita à investidura

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 211

o implemento de uma condição, qual seja, a compatibilidade entre a deficiência que apresentao candidato aprovado e as atribuições do cargo a prover. Este o critério que deverá nortear suaadmissão.

Está, portanto, a nomeação do candidato portador de deficiência físicacondicionada à aferição da deficiência e da compatibilidade desta com o exercício normal docargo. Caso contrário, ver-se-ia a Administração na absurda situação de nomear o servidorpara, após, ter que dispensá-lo por não atender à aptidão mínima necessária à consecuçãodo trabalho.

Mostra-se, assim, perfeitamente sintonizado com a lei, o edital doconcurso, ao dispor em seu item 13.6.1, que:

“Os candidatos deverão declarar, quando da inscrição, serem portadoresde deficiência, especificando-a, e submetendo-se, quando convocados, àperícia médica por junta oficial, que terá decisão terminativa sobre aqualificação do candidato com deficiência ou não, e sobre o grau dedeficiência capacitante para o exercício de cargo.” (art. 5º, parágrafo 2ºdo REJUR)

Assim fundamentado, e não apresentando o impetrante, nestes autos,prova da deficiência de que é portador e sua compatibilidade com o Cargo de Assistente deAdministração, não há como se acolher a segurança pleiteada, por inexistente ilegalidade ouabuso de poder no ato impugnado.

Isto posto, com base no art. 269, I, do CPC, denego a Segurança,ressalvando ao impetrante o uso dos meios idôneos para alcançar sua pretensão.

Sem honorários, a teor do enunciado nº 105 da Súmula do cl. SuperiorTribunal de Justiça.

Custas pelo impetrante.

P.R. I.

João Pessoa, 29 de abril de 1996.

CRISTINA MARIA COSTA GARCEZJuíza Federal Substituta da 3a Vara, em auxílio à 4ª Vara

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MEDICAMENTOS - IMPORTAÇÃO - REGISTRO

Processo Nº 95.11476-3 / MANDADO DE SEGURANÇAImpetrante: EVEC-COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES, IMPORTAÇÕES

E EXPORTAÇÕES LTDAImpetrada: COORDENADORA DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA DO

MINISTÉRIO DA SAÚDE, NA PARAÍBA

SENTENÇA

EVEC- COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES, IMPORTAÇÕES EEXPORTAÇÕES LTDA, qualificada na inicial, impetrou Mandado de Segurança contra ato daSra. COORDENADORA DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, NAPARAÍBA, consistente na apreensão definitiva e proibição de comercializar o produto importado- MELOTONIN - (Melatonina), com fundamento no comando do art. 12 da Lei 6.360/76, queexige para a comercialização de produtos importados o prévio registro no Ministério da Saúde.

Sustenta a impetrante, em resumo, a inaplicabilidade do art. 12 da Lei6.360/76 ao caso sub judice, eis que a MELATONIN é suplemento alimentar, não seenquadrando no rol dos produtos regulamentados naquele diploma legal. Alega ainda que,mesmo desnecessário o pedido de registro, foi este efetivado em 20.12.94, restando de hámuito superado o prazo de 90 (noventa) dias, estabelecido no parágrafo 1º do art. 12 da Lei6.360/76, sem qualquer pronunciamento do Ministério da Saúde.

Instruiu a inicial com os atos constitutivos da empresa e alterações,instrumento de procuração e documentos diversos (fls. 07 a 38).

Liminar indeferida, às fls. 42/43.

Notificada, a autoridade impetrada deixou transcorrer em branco o decêndiolegal para informações.

O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do douto ProcuradorRegional da República, LUCIANO MARIZ, opinou pela concessão do Writ, aduzindo, emresumo, que:

“Ementa: Administrativo. Medicamentos. Importação. Registro.

A importação de medicamentos e conseqüente comercialização requeremregistro do produto perante o Ministério da Saúde (Lei 6.360/76, arts. 10e 12).

Uma vez requerido, a concessão do registro é obrigatória, e deve serrealizada dentro de 90 dias da entrega da documentação pertinente (Lei6.360/76, art. 12, parág. 3º). A denegação do registro é ato vinculado, e,para ser válida, há de ser manifestada dentro daquele prazo, e

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 213

fundamentadamente, por inobservância da lei ou dos regulamentos (Art.12, parág. 3º, parte final).

Comerciante local, que expõe à venda medicamento importado, comcomercialização autorizada por força de medida liminar de Juiz Federalda sede da empresa importadora, não pode sofrer apreensão de ditosmedicamentos, sob pena de haver constrangimento ilegal, passível decorreção pela via do Mandado de Segurança.

Parecer pela concessão da Segurança”.

Relatados, DECIDO.

Por primeiro, cumpre analisar o argumento de que a Metalonina temimportação exclusiva pela empresa Pantheon Comercial Ltda, autorizada a comercializar oproduto em todo o território nacional, por força de liminar concedida pela 15ª Vara Federal deSão Paulo, daí a aquisição e venda pelo comerciante local, no caso, a impetrante, encontrar-se sob o manto do pronunciamento monocrático.

Em que pese o lúcido argumento, não há como se o acolher, à míngua deelementos probatórios que o sustentem, atenta ao fato de que o mandado de segurança nãocomporta dilação probatória, nem se presta para dirimir situações de fato controvertidas,senão vejamos:

No expediente de fls.36, dirigido à Secretaria de Saúde Pública da Paraíba,sustenta a impetrante que o pedido de registro da Metalonina foi efetivado, em 20.12.1994,pela empresa Pantheon Comercial Ltda, distribuidora exclusiva da SOURCE NATURALS,fabricante nos Estados Unidos da Metalonina. Nenhum documento há nestes autos quecomprove essa assertiva. Ademais, é a própria impetrante que, no mesmo expediente, afirmater importado a Metalonina, o que a afasta do alcance da liminar obtida pela empresa paulista.Verifico, ainda, que as metaloninas apreendidas (termo de apreensão à fls. 35) não provêem,exclusivamente, da Source Naturals, mas também de outros fabricantes, como o ProgressiveLaboratories e Nutrition-Therapy.

Afastado esse óbice, razão também não assiste à impetrante, ao sustentara inexigibilidade do registro previsto no art. 12 da Lei 6.360/76, no tocante à melatoninaimportada, posto que se trata de suplemento alimentar.

Como já fundamentado na decisão que rejeitou o pedido de liminar, aprópria prova pré-constituída produzida com a inicial, descreve o produto que se quer verliberado e comercializado (jornais e revistas nacionais: Jornal Correio/PB, Revista Isto é,Revista Vip/Exame; ensaio de autoria do Dr. Arnoldo Velloso da Costa publicado na Revistade Oxiologia, Set/Out 1995, págs. 10 a 16), não como um suplemento alimentar, mas comoum medicamento descrito como uma versão sintética do hormônio natural melatonina,secretado pela glândula pineal, localizada na parte posterior do cérebro, contra-indicado paramulheres grávidas ou que estejam amamentando. Assim, sem adentrar no mérito da droga,que se quer capaz de diminuir a insônia, combater o câncer e retardar o envelhecimento, nãovejo como enquadrá-la no conceito de suplemento alimentar, apenas pelo fato de constar,também, como componente de sua fórmula, a vitamina B6 Coenzimato (f. 30).

Medicamento que é, o registro da metalonina é obrigatório, a teor dosarts. 10 e 12 da Lei 6.360/76.

Desta forma, não se há falar em ilegalidade no ato de apreensão e proibição

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de comercialização do produto importado, inclusive, porque inerente ao poder de polícia, nadefesa e proteção da saúde individual e coletiva.

Não impressiona também a alegação de que superado o prazo paraapreciação do pedido de registro, este é tido como realizado, porque o silêncio da autoridadecompetente, ainda que condenável, não induz à aprovação tácita do produto alienígena quese pretende comercializar.

Tal modalidade de aprovação, nos termos da lei, só ocorre na hipótese derevalidação do registro, a teor do parágrafo 6º da Lei 6.360/76, verbis:

“Art. 12. Nenhum dos produtos de que trata esta lei, inclusive osimportados, poderá ser industrializado, exposto à venda ou entregue aoconsumo antes de registrado no Ministério da Saúde.

............................................................................................

Parágrafo 6º. A revalidação do registro deverá ser requerida no primeirosemestre do último ano do qüinqüênio de validade, considerando-seautomaticamente revalidada, independentemente de decisão, se nãohouver sido esta proferida até a data do término daquela.”

Isto posto, com base no art. 269, I, do CPC, denego a Segurança.

Custas, pela impetrante.

Sem honorários, a teor do enunciado 105 da Súmula do Superior Tribunalde Justiça.

P. R. I.

João Pessoa, 15 de março de 1996.

CRISTINA MARIA COSTA GARCEZJuíza Federal Substituta da 3ª Vara

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PROFESSOR UNIVERSITÁRIO - REMOÇÃO

Processo nº 96.06406-7 / MANDADO DE SEGURANÇAImpetrante.: DIRCEU MARQUES GALVÃO FILHOImpetrado.: REITOR DA UFPB

SENTENÇA

EMENTA: Mandado de Segurança. Administrativo. Professor universitário.Remoção. Acompanhamento de cônjuge. Indeferimento. Ilegalidade.Concessão da ordem.

O servidor público tem o direito à remoção, a pedido, para outra localidade,a fim de acompanhar o cônjuge (art. 36, da Lei 8.112/90).

O interesse da Administração não pode se sobrepor à preservação daunidade familiar, daí por que fere direito líquido e certo o ato que indefereo pedido de remoção de professor, dentro da mesma instituição de ensino,com prejuízo à convivência marital.

- Ordem concedida.

Vistos etc.

DIRCEU MARQUES GALVÃO FILHO, já qualificado nos autos, por seusprocuradores e advogados, impetrou o presente MANDADO DE SEGURANÇA contra atoconsiderado ilegal do MAGNÍFICO REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA,nesta Capital, pelos seguintes motivos:

O impetrante é professor universitário, lotado no Centro de CiênciasJurídicas e Sociais, Campus VI, da cidade de Sousa - PB, tendo sido afastado das atividadesdocentes desde julho de 1993 até o mês de julho deste ano, a fim de participar de curso demestrado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Em razão da sua transferênciapara a cidade de São Paulo, sua esposa, funcionária pública federal, acompanhou-o, passandoambos a residir naquela Capital durante todo o curso.

Ao término do mestrado, momento em que o impetrante deveria retornaràs suas atividades docentes na cidade de Sousa, viu-se surpreendido com a transferência desua esposa para esta Capital, por não existir vaga na cidade de Cajazeiras - PB, na repartiçãoonde estava lotada anteriormente.

Administrativamente, requereu a sua remoção do Campus VI, Sousa -PB, para o Campus I, em João Pessoa - PB, com fundamento no art. 36, caput, e parágrafoúnico da Lei 8.112/90. Porém foi-lhe negado o pedido. Posteriormente, o impetrante requereujunto à Procuradoria da UFPB, parecer sobre a sua situação, tendo obtido daquele órgãoopinião favorável a sua situação. Contudo, o Reitor da Universidade, ora impetrado, indeferiu aremoção pleiteada, ferindo, segundo o impetrante, com ato ilegal, direito líquido e certo, razãopela qual impetrou o presente writ of mandamus.

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216 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

Requereu medida liminar para que fosse determinada a sua remoção doCampus VI para o Campus I, e no mérito, declarada a invalidade do ato que indeferiu a suaremoção.

Após as informações, foi deferida a medida liminar, garantindo a remoçãodo impetrante para o Campus I (fls. 52/53).

Às fls. 48/50, o impetrado informou que a Universidade Federal vinhaenfrentando sérias dificuldades quanto à permanência de professores nos diversos campi dointerior, tendo em vista as várias licenças e aposentadorias e que a grande maioria preferia serremovida para a Capital, onde há “melhores opções de conforto, lazer, etc., etc.” (sic). Alegouque a esposa do impetrante é que deveria acompanhá-lo, quando este retornasse do curso demestrado para o Campus VI, em Sousa, já que ambos residiam anteriormente na cidade deCajazeiras - PB. Argumenta, também, que o Departamento de origem não concordou com aremoção, por não ter substituto para o professor impetrante. Portanto, não tendo preenchidoos requisitos da lei, não estava a Universidade Federal obrigada a aceitar a remoção pleiteada,razão pela qual esperava a denegação da segurança.

Com vista dos autos, o ilustre representante do Ministério Público Federalopinou pela concessão do mandamus (fls. 59/62).

É o relatório, em síntese.

Decido.Conforme consta dos autos, o impetrante Dirceu Marques Galvão Filho e

sua esposa Márcia Virgínia Nasiasene Lins Marques são servidores públicos federais. Ele,professor universitário; ela, vinculada ao INSS. Verifica-se, também, que ambos estavamresidindo em São Paulo - SP; o impetrante, realizando curso de mestrado, e a sua esposa,trabalhando em repartição do INSS. Ocorreu que o cônjuge do autor, na época em que deveriamretornar a este Estado, foi transferida de São Paulo para esta Capital, em razão de não existirvaga na cidade de Cajazeiras - PB, onde estava lotada anteriormente. O impetrante, por suavez, diante dessa situação, requereu sua remoção do Campus VI para o Campus I, a fim deacompanhar sua esposa para a nova localidade. O pedido foi negado.

A situação fática que se apresenta é típica da hipótese legal, ou seja, odeslocamento de um servidor, no âmbito do mesmo quadro, para outra localidade, paraacompanhar cônjuge (art. 36, da Lei 8.112/90). A esposa do impetrante já se encontraefetivamente residindo nesta Capital. Obstacular o convívio familiar, pela forçada separaçãogeográfica, é o cúmulo da insensatez, é negar a proteção constitucional à família. É certo quea Administração deve se ater ao princípio da legalidade de seus atos, mas também não podese esquecer de que não deve incursionar por devaneios subjetivistas, a ponto de adentrar aintimidade do servidor, vendo em sua atitude uma maneira de se furtar à vida precária dointerior, bem como a invadir a órbita administrativa de outra repartição para criticar seus atos.Observe-se que no lúcido parecer da Procuradoria Jurídica da Universidade Federal, foi analisadaa questão, concluindo-se pela remoção do servidor, no caso o impetrante, pois, entendimentodiferente “significaria deixar de atender à finalidade social dos dispositivos legais referidos ecausar injustificável prejuízo ao casal” (fls. 35).

Com efeito, na aplicação da lei, deve-se levar em conta os fins sociais aque ela se dirige e as exigências do bem comum (art. 5º, LICC). Parodiando o apóstolo Paulo,diria eu que a letra mata, mas o direito é vivo, independente das interpretações pessoais quese possa dar à lei. Não pode o impetrado retrotrair para apurar circunstâncias passadas. Ofato que se apresenta na atualidade, e que gera o direito para o impetrante, é que a suaesposa foi transferida para esta Capital — por sinal bastante distante da cidade onde oimpetrado pretende manter o impetrante —, devendo o autor acompanhá-la na condição de

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cônjuge que é. Entre o interesse da Administração e a preservação da célula mater dasociedade, fico com a segunda opção.

Diz o art. 36, da Lei 8.112/90, in verbis:“Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, noâmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.

Parágrafo único. Dar-se-á remoção, a pedido, para outra localidade,independente de vaga, para acompanhar cônjuge ou companheiro, ou pormotivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou companheira oudependente, condicionada à comprovação por junta médica.”

Como se vê, a uma simples leitura desse artigo constata-se a aplicaçãoda primeira parte do parágrafo ao caso sob exame. Arrematando, a Corte Suprema já decidiu:

“Constitucional. Administrativo. Mandado de segurança. Remoção.Acompanhamento de cônjuge ou companheiro. Ausência de vagas.Indeferimento de pedido administrativo. Ilegalidade. Ordem concedida.

Diante da impossibilidade de serem conciliados, como se tem na espécie,os interesses da Administração Pública, quanto à observância da lotaçãoatribuída em lei para seus órgãos, com os da manutenção da unidade dafamília, é possível, com base no art. 36 da Lei 8.112/90, a remoção doservidor-impetrante para o órgão sediado na localidade onde já se encontralotada a sua companheira, independentemente da existência de vagas.

Mandado de Segurança deferido”.

(STF, MS n. 21893, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 02.12.94,p. 33198).

Dessa forma, caracterizado e demonstrado o direito líquido e certo doimpetrante, patente o ato ilegal da autoridade coatora, não resta outra alternativa, senão aconcessão da segurança.

Isto posto, concedo a segurança, ratificando a liminar, e, emconseqüência, declaro inválido o ato que indeferiu a remoção do impetrante do Campus VIpara o Campus I da Universidade Federal da Paraíba. Determino à autoridade impetrada queproceda à remoção do impetrante para o Campus I da UFPB — Centro de Ciências Jurídicase Sociais — em João Pessoa.

Isento de honorários (Súmula 512, do STF).

Custas na forma do art. 14, da Lei 9.289/96.

Sentença sujeita ao reexame necessário.

P. R. I.

João Pessoa, 27 de novembro de 1996.

Cristina Maria Costa GarcezJuíza Federal Substituta da 3ª Vara

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218 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

INDISPONIBILIDADE DE BENS

Processo nº 95.8498-8 /AÇÃO CAUTELAR FISCALRequerente: FAZENDA NACIONAL.Requerido: RODRIGUES E CORDEIRO LTDA.

SENTENÇA

EMENTA: CAUTELAR FISCAL. INDISPONIBILIDADE DE BENS.PRESENÇA DOS REQUISITOS ESSENCIAIS AUTORIZATIVOS.INTELIGÊNCIA DA LEI 8.397/92.

À presença dos pressupostos da Lei 8.397/92, impõe-se a confirmaçãode liminar requerida de indisponibilidade do bem com propriedadedemonstrada nos autos.

CAUTELA CONCEDIDA.

Cuida-se de ação cautelar fiscal promovida PELA FAZENDA NACIONALcontra RODRIGUES E CORDEIRO LTDA, com fulcro na Lei nº 8.397/92, incidental à ExecuçãoFiscal nº 93.7344-3, objetivando, liminarmente, seja oficiado o Departamento Estadual deTrânsito – DETRAN-PB, no sentido de realizar a constrição judicial no bem pertencente aoexecutado e abster-se de realizar qualquer transferência, a qualquer título.

Aduz que promoveu a execução fiscal supracitada contra a requeridafundamentada na Certidão de Dívida Ativa da União nº 42593000047-23, relativa à multa porinfração ao art. 42 da CLT.

Alega que, apesar das diligências realizadas através de Oficial de Justiça,a requerida não foi localizada, tendo, inclusive, sido citada através de Edital, publicado em18.12.93, expedido às fls. 12 dos autos da execução supracitada.

Informa, ainda, que obteve informações de que a promovida é proprietáriade um veículo VW/KOMBI - Tipo Caminhonete, ano/modelo 89 - Cor Branca - Chassi9BWZZZ23ZKPO11135 - Renavan 181713802 - Placa XI 077O - PB, conforme documentoexpedido pelo Departamento Estadual de Trânsito DETRAN-PB, acostado às fls. 11.

Ao final, pugna pela concessão da cautela, decretando-se indisponíveisos bens da requerida até o limite da satisfação da obrigação, conforme art. 4º e seguintes, daLei nº 8.397/92.

Juntou aos autos os documentos de fls. 05/30.

Medida liminar concedida às fls.31, decretando a indisponibilidade dosbens da empresa-requerida até o limite do crédito cobrado na execução fiscal acima

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mencionada.

Devidamente oficiado o DETRAN-PB da decisão de fls. 31, conformeconsta das fls. 34.

Ofício do Departamento Estadual de Trânsíto (fls.35), com informaçõesacerca do devido cumprimento da medida liminar supracitada.

Citação feita através do Edital publicado no DJE de 17.02.96, com decursodo prazo legal sem apresentação de defesa pela promovida, conforme certidão lavrada às fls.39.

É o relatório. Decido.

A demanda versa sobre pedido cautelar fiscal incidental, ancorado na Leinº 8.397/92, no sentido de, através de constrição judicial, tornarem-se indisponíveis os bensda requerida a fim de garantir o crédito tributário objeto do executivo fiscal promovido pelaFazenda Nacional contra a promovida, suso mencionada.

Como já ventilado no despacho concessivo da cautela liminar, a hipótesedos autos está acudida pelos pressupostos autorizativos da medida cautelar, estatuídos nosarts. 798 e ss. do CPC, a saber:

O fumus boni juris, representado pela certeza, liquidez e exigibilidadeconferida ao título executado, somado à autorização legal expressa à medida cautelar fiscal,representada pela Lei nº 8.397/92 e pelo enquadramento do caso dos autos na hipóteseabstratamente prevista no art. 2º da referida Lei, materializado na citação editalícia daexecutada/requerida que, além de não ter sido localizada, não foram encontrados bens paragarantir o processo executivo.

O periculum in mora, consubstanciado na possibilidade de lesãoirreparável, ou pelo menos de difícil reparação ao exeqüente, eis que o lapso temporaldemandado no processamento da ação executiva favorece àqueles que se escondem e, omais grave, apaga os vestígios que possibilitem encontrar bens necessários a satisfação docrédito.

À presença dos pressupostos da Lei nº 8.397/92, impõe-se a confirmaçãoda liminar requerida de indisponibilidade do bem com propriedade demonstrada nos autos.

Isto posto, a fim de garantir o débito executado, confirmando a liminar,concedo a cautela requerida de indisponibilidade do bem, qual seja, o veículo descrito nodocumento de fls. 36 do presente feito.

Deixo de condenar a requerida no pagamento dos honorários advocatícios,em face da inexistência do contraditório.

Oficie-se ao DETRAN-PB.

Traslade-se cópia para os autos principais.

P. R. I.

João Pessoa, 15 de agosto de 1996.

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220 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 221

EMBARGOS À EXECUÇÃOALEGAÇÃO DE NULIDADE DE TÍTULO

Processo nº 95.10597-7 / EMBARGOS À EXECUÇÃOEmbargante: JOSÉ HÉLIO DE LUCENAEmbargado: CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMÓVEIS-

CRECI

SENTENÇA

EMENTA: EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. Alegaçãode nulidade do título executivo por falta de notificação. Inocorrência. Onão pagamento da contribuição devida ao CRECI constitui infração à Lei6.530/78. Rejeição dos Embargos.

JOSÉ HÉLIO DE LUCENA, qualificado nos autos, ajuizou Embargos àexecução que lhe move o CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMÓVEIS-CRECI,objetivando desconstituir a certidão de dívida ativa que instrui a petição da execução fiscal,sustentando, preliminarmente, nulidade do título, porque não precedido do devido processolegal. No mérito, argüi que apesar de inscrito no Órgão de fiscalização nos termos da Lei4.116/72, nunca exerceu a profissão de corretor de imóveis, daí não caber a exigência dopagamento da anuidade. Ademais, já havia requerido baixa da inscrição, sem que tal providênciafosse efetivada.

Instruiu a inicial com procuração e cópias das peças do processo principal.

Impugnando os embargos, aduz o Conselho Embargado que o Embargantefoi notificado do débito, sendo-lhe, na oportunidade concedido o prazo de 30 (trinta) dias paradefesa, sem que tenha exercido tal direito.

No mérito, sustenta que, uma vez deferida a inscrição, o seu cancelamentofica condicionado ao cumprimento das obrigações sociais do corretor perante aquele Órgão.

No mais, sustenta que as anuidades em atraso, conforme disciplina doart. 6º da Resolução do COFECI 12/78, sujeitam-se à inscrição na Dívida Ativa, sob pena deresponsabilidade.

Em especificação de provas, nada foi requerido.

Tratando-se de matéria predominantemente de direito, e havendo nos autosprova documental suficiente ao conhecimento da demanda, decido.

Não procede a alegação do Embargante de que lhe foi supressa a garantiaconstitucional ao devido processo legal.

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222 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

O Embargante foi notificado do débito, oportunidade em que lhe foi deferidoo prazo de 30 (trinta) dias até sua inscrição na dívida ativa, sem que houvesse satisfeito aobrigação ou discutido sua validade (docs. de fls. 18 a 21), daí não resultar o vício apontadona inscrição da dívida.

No mérito, melhor sorte não lhe assiste.

Restou incontroverso que o Embargante estava regularmente inscrito noConselho Embargado, sujeitando-se, pois, às normas que regulam o exercício da profissãode corretor de imóveis, inclusive no que dispõem sobre o pagamento da contribuição devida(Lei 6.530/78), sob pena de inscrição na dívida ativa.

Não afasta a obrigação quanto ao pagamento da anuidade vencida e nãopaga de 1993 a alegação do Embargante de que nunca exercera a profissão, uma vez que opressuposto de direito restou preenchido - a inscrição nos quadros do Conselho Regional,como Corretor de Imóveis. Regularmente inscrito, teve à sua disposição o exercício dosdireitos que o status de Corretor de Imóveis lhe conferia, ficando a seu talante exercitá-los ounão. Ressalte-se, inclusive, que o pedido de revalidação de sua inscrição, em 1987, comoaduz o próprio suplicante, não corrobora a sua alegação, inclusive pelo pagamento dasanuidades nos anos anteriores.

Finalmente, quanto à alegação de que requisera baixa da inscrição, semcontudo obtê-la, não se mostra apta a desconstituir a dívida exeqüenda, que goza de presunçãode liquidez e certeza. É que a defesa se fez de forma genérica, sem se situar no tempo, semqualquer relação de causa e efeito com a dívida exeqüenda, além de destituída de qualquerdocumento hábil a elidir a legalidade da cobrança.

Com efeito, não ficou caracterizado que a contribuição cobrada naexecução tenha seu fato gerador ocorrido após o alegado pedido de cancelamento do registro,o que, por certo, violaria direito fundamental do Embargante, na medida em que ninguém podeser compelido a associar-se ou a permanecer associado (art. 5º, XX, da Constituição Federal).

Acresça-se que, conferida oportunidade para indicação das provas comque pretendia comprovar os fatos constitutivos de seu direito, o Embargante permaneceuinerte.

Isto posto, rejeito os Embargos, determinando o prosseguimento daexecução.

O Embargante suportará as custas finais e verba honorária que fixo em10% sobre o valor da execução atualizado.

P. R. I.

João Pessoa, 17 de setembro de 1996.

CRISTINA MARIA COSTA GARCEZJuíza Federal Substituta da 3ª Vara

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REPARAÇÃO DE DANOS

Processo nº 96.4529-1 / AÇÃO SUMARÍSSIMAAutora: G.M.S.S.Ré: EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS -

ECT

SENTENÇA

Vistos etc.

G.M.S.S., qualificada nos autos, por advogados legalmente constituídos(fls. 19), propôs ação de indenização por dano material, lucro cessante e dano moral,com pedido de tutela antecipada (procedimento sumário) contra a EMPRESABRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT, também qualificada, objetivandoressarcimento nos valores de R$ 33.609,58 (trinta e três mil, seiscentos e nove reais e cinqüentae oito centavos), a título de despesas realizadas e a realizar, R$ 96.056,28 (noventa e seismil, cinqüenta e seis reais e vinte e oito centavos), por lucros cessantes, e indenização de10.000 (dez mil) salários mínimos, ou uma pensão vitalícia de 20 (vinte) salários mínimosmensais, por danos morais, mais custas, despesas processuais e honorários advocatícios.

2. Fundamentou as suas pretensões, principalmente, no Código CivilBrasileiro, arts. nºs 159, 1.059 e 1.060 e no CPC, art. 275, II, letra “d”.

3. Na petição inicial (fls. 02/18), que veio acompanhada dedocumentação pertinente (fls. 19/58), alegou o seguinte, textualmente:

“(...) é funcionária do Hotel Litoral (nome de fantasia) de propriedade daempresa privada Litoral Hotéis Turismo Ltda, com sede na Avenida CaboBranco, nº 2.172, Praia do Cabo Branco, nesta Capital, desde 1º de marçode 1995, consoante se observa na sua Carteira Profissional (Documento1),onde exerce o cargo de encarregada do Escritório.

Ocorre que, no dia 10 de novembro de 1995, às 9 (nove) horas da manhã,trafegava pela Avenida Marechal Esperidião Rosas em direção à AvenidaEpitácio Pessoa, no veículo, tipo caminhonete Saveiro, de placa NS-2940/PB (adquirida através de “leasing” da empresa B. B. LeasingArrendamentos Mercantil), a serviço da empresa, conduzido pelo seucolega de trabalho, o motorista Ricardo Luiz de Oliveira Santos, quando acitada camionete foi violentamente abalroada pelo veículo, tipo Kombi, deplaca MH-7951/PB, de propriedade da Empresa Brasileira de Correios eTelégrafos-ECT, que trafegava pela Avenida Júlia Freire, dirigido na ocasiãopelo motorista W.A.G., a serviço da mesma.

(.........................................................)

Examinando-se o Boletim da CPTRAN, verifica-se que houve imprudência,

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negligência e excesso de velocidade por parte do condutor do veículo depropriedade dos Correios e Telégrafos - ECT. No item referente à ação docondutor 01 (Motorista da ECT), o citado Boletim é taxativo ao dizer:houve desrespeito ao sinal PARE ou dê a preferência. E, mais adiante,arremata o citado documento que houve flagrante desrespeito ao art. 175,inciso I do Decreto nº 62.127, de 16.01.1986 - Regulamento do CódigoNacional de Trânsito - RCNT (...)”

4. Dentre os documentos (fls. 19/58) acompanhantes da petição inicialdestacam-se, pela importância para o deslinde da questão, os seguintes:

4.1 - cópia de contrato de controle em CTPS da A. (fls. 20);

4.2 - boletim de acidente de trânsito (fls. 21);

4.3 - relatório de inquérito policial (fls. 25/27);

4.4 - exame de corpo de delito (fls. 30);

4.5 - laudos médicos (fls. 31/34);

4.6 - recibos de despesas (fls. 34/43);

4.7 - orçamentos diversos (fls. 44/46);

4.8 - concessão de auxílio-doença por acidente de trabalho (fls. 48) e

4.9 - fotografias do local do acidente (fls. 55/58);

5. Posterior despacho (fls. 61/62), aliás irrecorrido, devidamentefundamentado, indeferiu a pretendida tutela antecipada.

6. A seguir, foi designada (fls. 62) audiência de instrução, conciliação ejulgamento, na forma do CPC, art. 277, determinada a citação da R. e a intimação da A. e deseu advogado.

7. Na audiência (fls. 71/73), não houve a conciliação do art. 277, § 1º,do CPC, e a R. contestou (fls. 74/91) através de memorial, acompanhado de documentação(fls. 92/98); da referida contestação, que trouxe preliminar de denunciação da lide, constatextualmente o seguinte, quanto ao mérito:

“Pretende a Autora uma indenização por danos no valor de R$ 96.056,28a título de lucros cessantes. Quantia essa relativa a uma suposta diferençaentre o suposto salário de R$ 480,00 que ganhava antes do acidente e oque efetivamente pagaria o INSS em termos de aposentadoria R$ 183,53.

Ora Exa. Tal indenização é totalmente desprovida de fundamento, pelasrazões de fato e de direito a seguir delineadas.

(.......................................................................................)

A princípio seria devida uma indenização de 8% (oito por cento)correspondente a diferença existente entre o salário-de-contribuição nodia do acidente e o auxílio doença concedido pelo INSS.

Como a indenização tem por fim repor a vítima na sua situação econômicaanterior, ou naquela a que poderia aspirar se não fora o acidente, econsiderando que se constitui no justo ressarcimento daquilo que perdeu,mas sem vantagem alguma a mais, porque reparação não implica lucro,conclui-se que a autora não faz jus nem a diferença dos 8% (oito por

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cento) retro citado, uma vez que o auxílio-doença concedido pelo INSSno valor de R$ 186,56 é superior ao salário que a autora percebia no diado acidente, conforme ofício INSS-84/96 (doc. fls. 01/02).

Não resta dúvidas de que o acidente provocou lesões corporais na senhoraG.M.S.S.

Nestas circunstâncias, a indenização é calculada, em conformidade como disposto no Art. 1538 do Código Civil (...)

(.......................................................................................)

Observa-se que com o afã exacerbado de se obter lucros em cima de uminfortúnio, não se avaliou sequer as conseqüências dos atos praticados,visto que a declaração do L. Hotel (doc. fls. 47 dos autos) é uma confissãoem juízo de crime de sonegação fiscal (não recolhimento das contribuiçõesprevidenciárias devidas pelo empregador).

Se a autora percebia uma remuneração de R$ 480,00, obviamente o seuauxílio-doença, em razão do acidente de trabalho sofrido, seria de R$441,60. Neste caso, seria devido pela Ré uma complementação mensalno valor de R$ 38,40 enquanto perdurasse a concessão do auxílio-doença.

(.......................................................................................)

Ora, a vítima já retornou ao trabalho, em 07.05.96, conforme ofício INSS-84/96 (doc. fls.01). Como pleitear então uma indenização mensal, porlucro cessante, até a autora completar 65 anos de idade, se esta vinhapercebendo auxílio-doença em um montante superior ao que percebiacomo se em atividade estivesse, conforme já demonstrado.

(...................................................................................)

Da mesma sorte que a outra indenização anteriormente analisada verifica-se que a quantia pleiteada no valor de 10.000 (dez mil) salários mínimosou renda mensal vitalícia de 20 salários mínimos é por demais exorbitante(...)”

8. Nessa mesma audiência aconteceram ainda os seguintes atosprocessuais:

8.1 - impugnação (fls. 71/72) à contestação e documentos acostados;

8.2 - indeferimento (fls. 72) da preliminar de denunciação à lide;

8.3 - interposição, pela R. (fls. 72), de agravo retido;

8.4 - manutenção da decisão agravada;

8.5 - juntada aos autos de cinco documentos (fls. 99/102 e 106/107), pelaA., sem oposição da parte adversa;

8.6 - renovação, pela A. (fls. 72), do pedido de tutela antecipada;

8.7 - renovação do indeferimento da tutela antecipada;

8.8 - concessão de prazo (fls. 73) de cinco dias para regularização darepresentação processual da R.

9. Os litigantes não requereram novas provas em audiência.

10. A seguir, sem incidentes, os autos vieram-me conclusos para decisão

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(fls. 114).

Relatados, DECIDO.

11. Tratam os autos, pois, de litígio envolvendo o tema responsabilidadecivil da Administração Pública (a R. é uma empresa pública, cujo capital pertence exclusiva eintegralmente à União Federal), à vista de pretensos danos materiais e morais causados aparticular, no caso à A., em razão de conduta comissiva de preposto da R.

12. De logo, ressalto que a preliminar de denunciação da lide (fls. 75) jáfoi decidida em audiência (cf. item 8.2, retro), de forma a possibilitar o exame direto do mérito,nesta oportunidade.

13. Da instrução do feito (fls. 21/33) restou desenganadamentecomprovada a ocorrência de acidente automobilístico (fls. 22/27) vitimando a A. (fls. 30), quesuportou, conseqüentemente, danos de variada ordem, inclusive prejuízos materiais (fls. 31 esegs.); nesse sentido, à unanimidade das provas documental (fls. 21, 25/27, 28, 29, 31/58),pericial (fls. 30) e testemunhal (fls. 23/24).

14. A contestação (fls. 74/91) não negou o acidente e parte dos danosdele decorrentes, embora haja procurado discutir, em preliminar, a responsabilidade - inclusivepenal - do condutor (= preposto) do veículo, de tal forma que, no mérito, é possível entenderdita contestação como parcial.

15. Os autos demonstraram os três requisitos básicos e indispensáveisà pretendida indenização, ao menos parcialmente:

15.1 - o ato ilícito (abalroamento no veículo transportador da A., por veículoda R.);

15.2 - o dano (prejuízos) daí decorrente; e

15.3 - o nexo de causalidade entre o ato ilícito e o dano.

16. A A., contudo, comprovou dados, isto é, despesas materiais:

16.1 - transporte próprio (fls. 34/35) - ambulância e táxi: R$ 1.015,00 (mile quinze reais);

16.2 - frete de uma cama (fls. 36): R$ 40,00 (quarenta reais);

16.3 - exames laboratoriais (fls. 37/38), referente a exame médico e àstomografias: R$ 605,67 (seiscentos e cinco reais e sessenta e setecentavos);

16.4 - medicamentos (fls. 39): R$ 30,47 (trinta reais e quarenta e setecentavos);

16.5 - consulta e honorários médicos (fls. 40/41): R$ 3.550,00 (três mil,quinhentos e cinqüenta reais);

16.6 - aluguel de cama com colchão (fls. 42): R$ 160,00 (cento e sessentareais);

16.6 - internação hospitalar - materiais e serviços - (fls. 43): R$ 3.500,00(três mil e quinhentos reais);

16.7 - TOTAL: R$ 8.901,14 (oito mil, novecentos e um reais e quatorze

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centavos).

17. À vista dos autos, as demais verbas pretendidas não podem serreconhecidas, pois:

17.1 - despesas a realizar: por inexistirem demonstrações de suaocorrência e necessidade, tecnicamente falando;

17.2 - lucros cessantes: por não demonstrados; demais a mais, a A.beneficiou-se de auxílio-doença (fls. 48/49) em valores superiores ao doseu próprio salário (fls. 92), e retornou ao trabalho (fls. 92);

17.3 - renda mensal ou pensão vitalícia: tanto pelo retorno da A. ao trabalho(cf. sub-item anterior), como porque não ficaram esclarecidos ospretendidos danos morais, que não são sucedâneos ou corolários dosdanos materiais.

18. Neste passo, importante ressaltar não ser possível conferir aosofrimento induvidosamente suportado pela A. — de resto, imensurável em termos financeiros—, durante seu tratamento, a indenização tal qual pretendida, porque desamparada legalmente;noutras palavras, é-lhe devida indenização quanto a despesas efetivamente feitas (cf.sub-itens 16, retro).

19. O direito da A., tem sede em norma constitucional, art. 37, § 6º,consagrador da responsabilidade civil objetiva sob a modalidade do risco administrativo,que diz textualmente:

Constituição Federal:

“Art. 37. (...........................................................................)

§ 6.º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privadoprestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seusagentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito deregresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

20. A melhor doutrina reconhece a responsabilidade civil do Estado (latosensu), em caso como o dos autos:

“Só louvores merece a nova diretriz constitucional, mantida na vigenteConstituição (art. 37, § 6º), que harmoniza os postulados daresponsabilidade civil da administração com as exigências sociaiscontemporâneas, em face do complexo mecanismo do Poder Público,que cria riscos para o administrado e o amesquinha nas demandas contraa Fazenda, pela hipertrofia dos privilégios estatais (...) Desde que aAdministração defere ou possibilita ao seu servidor a realização de certaatividade administrativa, a guarda de um bem ou a condução de umaviatura, assume o risco de sua execução e responde civilmente pelosdanos que esse agente venha a causar injustamente a terceiros.” (DireitoAdministrativo Brasileiro/Hely Lopes Meirelles. - 14ª ed., atual. pelaConstituição de 1988. São Paulo : Ed. Revista dos Tribunais, 1989, pp.553/554).

21. A matéria ressarcimento de danos independentemente de culpa(stricto sensu), por ato ilícito, aparece disciplinado pelo mesmo Código Civil nos arts. 160,1.520, 1.540, além dos arts. 560, 564 e 568, estes três últimos referentes a situações impostas

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pelo direito de vizinhança; a respeito, estabelecem também os arts. 159 e 1.538, do CódigoCivil Brasileiro, textualmente:

Código Civil:

“ART.159 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ouimprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado areparar o dano.

A verificação da culpa e a avaliação da responsabilidade regulam-se pelodisposto neste Código, artigos 1.518 a 1.532 e 1.537 a 1.553.”

“Art. 1.538. No caso de ferimento ou outra ofensa à saúde, o ofensorindenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantesaté o fim da convalescença, além de lhe pagar a importância da multa nograu médio da pena criminal correspondente.

§ 1º Esta soma será duplicada, se do ferimento resultar aleijão oudeformidade.

§ 2º Se o ofendido, aleijado ou deformado, for mulher solteira ou viúva,ainda capaz de casar, a indenização consistirá em dotá-la, segundo asposses do ofensor, as circunstâncias do ofendido e a gravidade do defeito.”

22. Outro não é o entendimento jurisprudencial, conforme o seguintejulgado, mutatis mutandis aplicável ao caso dos autos:

“EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DEDANOS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA ADMINISTRAÇÃOPÚBLICA. INOCORRÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA.

I - A responsabilidade civil da administração pública é objetiva, seus agentescausarem aos particulares.

II - Comprovado que o veículo abalroado por funcionário da ECT, funcionavacomo táxi e encontrava-se em serviço, é de serem deferidos os lucroscessantes, que foram estipulados razoavelmente, além da indenizaçãopelos danos causados.

III - Não há cerceamento de defesa se o indeferimento da perícia sefundamenta na suficiência de outros meios de prova bastantes a formaçãodo convencimento judicial, e na desnecessidade de sua realização quenada de novo traria aos outros.

IV - Voto vencido que dava pelo indeferimento do pedido de lucros cessantesque entendia haverem sido estipulados por presunção.

V - Apelação improvida.”

(AC nº 0504884-90/CE, TRF-5ª Região, 2ª Turma, DJ em 08-02-91, p.01675)

23. Isto Posto, com fundamento na Constituição Federal, artigo 37, § 6º,e demais legislações referidas, julgo parcialmente procedente a ação para condenar a R.EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT a ressarcir à A. G.M.S.S.o prejuízo decorrente de acidente causado por veículo de propriedade daquela, no valor origináriode R$ 8.901,14 (oito mil, novecentos e um reais e quatorze centavos) — cf. sub-itens 15,retro —, a ser devidamente corrigido na forma da lei.

24. Sobre a condenação incidirão juros moratórios a partir da data do

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acidente, ex vi do art. 962, do Código Civil Brasileiro.

25. Condeno, ainda, a R. ao pagamento de honorários advocatícios,conforme o CPC, artigo 20, parágrafo 3º, à base de 10% (dez por cento) sobre o valor total dacondenação (STF - 1ª Turma, RE 80.350-GB - DJU 26/setembro/75, p. 6897).

26. Custas, ex lege.

27. P.R.I.

João Pessoa, 21 de janeiro 1997.

JOÃO BOSCO MEDEIROS DE SOUSAJuiz Federal Titular da 1ª Vara

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CONSTRUÇÃO DE BARRACAS - ÁREA LITORÂNEA

Processo nº 00.1805-8 - MEDIDA CAUTELARRequerente: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL/PBRequerido: MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA, UNIÃO FEDERAL e OUTROS

SENTENÇA

Vistos etc.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, através de digno Procurador daRepública, promoveu medida cautelar contra o MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA, a UNIÃOFEDERAL, o MUNICÍPIO DE CABEDELO/PB, o CLUBE DE ENGENHARIA e maisFRANCISCO TARGINO DA SILVA, LINDEMBERG BORGES GUEDES, SÉRGIO DEALBUQUERQUE SMITH, MARIA DO SOCORRO COSTA, CLOVIS JOÃO DA SILVA, JOSÉALVENILDO DA SILVA, ALÍRIO CARDOSO DE LUCENA, JOSÉ XAVIER DA SILVA, MANOELBEZERRA DA SILVA, EDUARDO CARVALHO DE MELO, MARIA DA GLÓRIA MACEDO DEAZEVEDO, PETRÔNIO CABRAL GONDIM, JOSÉ ROBERTO GOMIDES, CAUBY HONÓRIOJÚNIOR, JOSÉ ANTÔNIO MENEZES CRISPIM, FRANCISCO SOLANIEL TRIGUEIRO,ANTÔNIO BARBOSA DOS SANTOS, SEBASTIÃO CÂNDIDO DA SILVA, ROBERTO FREITASJARDIM, VALDETE RITA FERNANDES, ANTÔNIO SANTOS SILVA, MARIA DE FÁTIMAALVES DA SILVA, MARIA JOSÉ FARIAS, WALLACE DE SOUSA NASCIMENTO, ADAUTOTAVARES DE MELO, MARIZA PEREIRA DUARTE, HAROLDO PINHO DE ALENCAR, LUISDE GONZAGA GOMES, ANTÔNIA DE LIMA SILVA, JOSÉ FERREIRA DOS SANTOS, MARIADO CARMO FILHO, JOSENALDO FELISBELO DE SOUZA, RAIMUNDA NUNES RIBEIRO,MARIA DE FÁTIMA SANTIAGO, ALBENOR LIMA, CLEONCIO LUCENA, JOÃO ALVESTENÓRIO, ANTÔNIO DE PÁDUA DE ANDRADE PEIXOTO, ANTÔNIO INALDO BARBOSA,SÉRGIO CARDOSO DE LIMA, ROBERTO LAURENTINO PINTO, HUMBERTO MADRUGADO NASCIMENTO, EDMUNDO GOMES DE MEDEIROS, SÉRGIO MURILO BARBOSA, LUISMONTEIRO, LINDUÁRIO JOSÉ COSTA DE SANTANA, GERALDO FLOR DE OLIVEIRA,BENEDITO GOMES DA SILVA, BENEDITO BATISTA DOS SANTOS, JOSÉ ALVES DESOUSA, MARIA JOSÉ DA SILVA LIMA, GISÉLIA RODRIGUES DOS SANTOS, SEVERINAFIDELIS RODRIGUES, SEBASTIÃO VITAL DOS SANTOS, PAULO PONTES DA COSTA,JOÃO JUSTINO DA SILVA, PAULO HÉLIO FERREIRA DE CASTRO, LAÉRCIO TEODORORODRIGUES, OTÁVIO XAVIER LEITE, MARICELIA SAMUEL HAARDMAN, MAGNO LUNADE OLIVEIRA, RAIMUNDO PEDRO DA SILVA, GUTEMBERG JUSTINO DE MELO, PEDROROSENDO GOMES, GONÇALO VIEIRA THEODÓSIO, ALTO PEREIRA LIMA, MARCOSANTÔNIO LOPES DE AGUIAR, IVAN FILHO DE FRANÇA, MANOEL MIGUEL DOS ANJOS,JÚLIO MARTINS DO CARMO, ZEZITA AGRIPINA DA SILVA, JOSÉ RICARDO DA SILVA,FRANCISCO LUIZ BARBOSA, LUCIANO BEZERRA DE LIMA, IVANILDO ANTÔNIO SALES,CARLOS FERREIRA DA SILVA, IVALDO BEZERRA DIAS FILHO, SEVERINO JOSÉ DONASCIMENTO, GENIVAL TRAJANO DA SILVA, JOSÉ GOMES DA SILVA, MARCELOAMORIM BARBOSA DE SOUZA, JOSÉ ADAUTO DA SILVA, ANTÔNIO JUSTINO DA SILVA,ANTÔNIO DOMINGOS DA SILVA, GILVAN GOMES DA SILVA, MARIA DA GLÓRIA PEREIRADA SILVA, ANTÔNIO GALDINO DOS SANTOS, MARLI ALICE DA CONCEIÇÃO CABRAL,

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ELIZA MARTINS GOMES, MARIA DA PENHA FERNANDES DE SOUZA, JOÃO SEBASTIÃODA SILVA, ANTÔNIO FIRMINO DA CRUZ, MAURÍCIO RAMOS NEVES, DEUZENIR WAN-DERLEY, MARCO ANTÔNIO MENDES, ONILDO GUILHERME DA SILVA, FRANCISCO DEASSIS ANDRADE, JÚLIO URBANO MAIA, JOÃO BATISTA OLIVEIRA DE MELO, MANUELALÍPIO MONTEIRO, CARLOS ALBERTO OLIVEIRA DE MELO, LUIZ FERNANDES DA MOTA,HOSANA BARBOSA DA SILVA, EDUARDO FREIRE DOS SANTOS, JOÃO ANTÔNIO RI-BEIRO, MARIA DA PENHA CAVALCANTE DE OLIVEIRA, DIJALMA PAES DE SOUSA,MARIA ROSINEIDE COSTA DA SILVA, MARIA JOSÉ COSTA DE BRITO, GENOVEVA DOSSANTOS SILVA, ANTÔNIO RIBEIRO, MÁRIO RODRIGUES DUARTE, PAULO CAÇULA DASILVA, JOÃO BATISTA RAMOS DOS SANTOS, ROZILDA MARIA DA CONCEIÇÃO,HERONILDES PEREIRA DA SILVA, JOSÉ MANOEL DO NASCIMENTO, MARIA DAS NEVESMATIAS, MARIA DO CARMO FÉLIX, CARLOS LAURINDO DO NASCIMENTO, PAULOGOMES DA COSTA, EDMILSON LUSTOSA DE FRANÇA, FRANCISCO SALVADOR DASILVA, ODALÍCIO FARIAS, JOÃO ALVES DA SILVA, JOÃO MOISES DOS SANTOS, ANTÔNIOMANOEL FERREIRA, JOAQUIM PEREIRA DA SILVA, MAURÍCIO GONÇALVES, AMÉLIAALVES, IZETE SILVA DE FARIAS e MARIA JOSÉ DA SILVA NASCIMENTO, tambémqualificados (fls. 163/295), objetivando interdição ou embargo preventivo da construçãode barracas e outros prédios de alvenaria, nas praias de Tambaú e do Cabo Branco, nestaCapital, assim como em praias do Município de Cabedelo.

2. Fundamentou o pedido no CPC, artigo 796 e seguintes, e na Lei nº7.347/85, artigos 4º e 19.

3. Na petição inicial (fls. 02/17), que trouxe aos autos documentação(fls. 18/119) pertinente à pretensão deduzida, alegou basicamente e em síntese que:

3.1 - a Associação Paraibana dos Amigos da Natureza, pessoa jurídicade direito privado, integrante do Sistema Municipal de Defesa do MeioAmbiente, pediu providência da Procuradoria da República para evitar aconstrução de barracas de alvenaria, na praia de Tambaú, porque taisedificações ferem o direito dos cidadãos de usufruírem de um bem esté-tico, turístico e paisagístico;

3.2 - no sentido de verificar os fundamentos necessários para propositurade ação civil pública, requisitou informações de diversos órgãos federais,estaduais e municipais;

3.3 - constatou, então, que há algum tempo, estão sendo erigidos baresem terreno de marinha, em praias de João Pessoa e de Cabedelo, naverdade palhoças e barracas, em que são comercializadas bebidasalcoólicas, refrigerantes e frutos do mar, entre outros;

3.4 - a disseminação dos mencionados botequins facilita o surgimento deefeitos adversos sobre os valores das terras das praias e das águas dooceano; as descargas livres, a céu aberto, de resíduos sólidos,apresentam, por seu intenso volume, perigos e acarretam poluição daságuas subterrâneas e, por conseguinte, do mar; estimulam a proliferaçãoinsetos, roedores e de fungos, gerando odores nauseabundos defermentação, prejudicando, assim, a beleza da paisagem natural das praiase interferindo no desenvolvimento do potencial turístico do litoral; além domais, afetam a tranqüilidade dos moradores daqueles bairros e das famí-lias que eventualmente buscam as praias, pois são comuns as cenas deviolência nas freqüentes brigas entre os ébrios que para lá se deslocam;

3.5 - as praias são bens públicos de uso comum do povo (CC, artigo 66,

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inciso I), não podendo ser privatizadas através de construções limitadorasde sua utilização pela comunidade, mormente quando se sabe que taisedificações ocasionam danos à paisagem natural e ao desenvolvimentodo turismo, à higiene e ao meio ambiente, numa cidade que, sem possuirusinas de detritos e sem ter um serviço de coleta apropriado, tem no lixoum dos seus principais problemas;

3.6 - não se deve permitir que o R. MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA, semlicenças dos órgãos federais competentes, utilize o dinheiro arrecadadodos contribuintes para construir, em plena beira-mar, prédios queocasionem danos ao meio ambiente, mormente quando se sabe que poderáser condenada a reconstituir, demolindo as construções, os bens lesadose, para tanto, usará mais uma vez o dinheiro do povo;

3.7 - liminarmente, pediu a interdição ou embargo preventivo para suspendera construção das barracas e outros prédios de alvenaria, nos locaisindicados, bem como, a citação do MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA e daUNIÃO FEDERAL, como litisconsortes ativos, a produção de prova pericial,testemunhal, além da juntada dos documentos (fls. 118/119) e, no mérito,a procedência da ação, condenando o promovido no ônus da sucumbência.

4. Em decisão fundamentada (fls. 120), o MM. Juiz Federal que entãopresidia o feito deferiu a liminar e as citações requeridas, assim como a expedição de ofíciocomunicando a concessão da liminar.

5. O R. MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA, agravou de instrumento (fls.145) da decisão referida, mas o recurso foi julgado prejudicado, posteriormente, conforme nosautos (fls. 340).

6. Regularmente citado, o MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA contestoua ação (fls. 124/132), argüindo:

6.1 - preliminar de ilegitimidade ativa ad causam, porque se a contestanteinvadiu terreno de marinha ao construir bares, lanchonetes, semautorização da Delegacia do Serviço do Patrimônio da União, somente àUNIÃO FEDERAL assiste o direito de postular em Juízo o restabelecimentodo status quo ante, repelindo o esbulho possessório, e não ao MinistérioPúblico Federal, com fundamento na Lei 7.347/85;

6.2 - preliminar de indeferimento da citação da UNIÃO FEDERAL, vezque essa citação não é condição para eficácia da sentença; se, de acordocom o artigo 5º, da Lei nº 7.347/85, a UNIÃO FEDERAL tem legitimidadepara propor o mesmo tipo de ação, poderá integrar a lide como litisconsortevoluntário, não como litisconsorte necessário, como quer o A;6.3 - no mérito, não necessita de licença ou de autorização de órgãofederal ou estadual, no que concerne à organização dos serviços públicoslocais; ademais, no conjunto, predomina a solução de arquitetura tropical,cujo valor primitivo avulta como o de melhor conhecimento da tecnologiamoderna, em plena harmonia com a construção civil; assim, o invento secristaliza no espaço criado artificialmente, em perfeita adequação com osítio ao qual se insere e ao estender o espaço público do passeio jáexistente (calçada), nessa pequena extensão de piso, com a mesmapadronagem da preexistente, erguem-se as pequenas barracas, que aoinvés de provocarem qualquer dano, proporcionam um novo e natural pontode apoio ao cidadão pessoense e aos turistas que procuram a orla

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marítima;

6.4 - a solução de esgotamento sanitário, ao contrário do que noticia ainicial, foi encontrada através da interligação dos dutos subterrâneos daobra (barracas), ao sistema geral de esgoto já implantados pela CAGEPAno sub-solo do leito da Av. Tamandaré, tratando-se, portanto, de maisuma economia, sem a menor possibilidade de provocar saturação dosistema citado (coletor público) ou poluir as águas mediterrâneas; como,então, falar na geração de odores nauseabundos ou remessa de objetospara o oceano? qual a melhor opção: as novas barracas higiênicas eacomodadas à beleza ambiental ou a manutenção de botecos infectos etrailers ocupando a via pública?

6.5 - implanta, no interesse da comunidade, obra criteriosamente estudada,no sentido da solução alternativa à tipologia predominante na construçãocivil que se realiza na Capital; não se trata, absolutamente, de construçãoem alvenaria, na acepção integral do termo, pois alia no espaço físico, ovalor cultural e o conhecimento tecnológico disponível, materializando noespaço - sem qualquer dano ao meio ambiente, ao estético e ao paisagís-tico - um abrigo de rara beleza e enaltecer os valores locais na forma e noemprego de materiais nativos; e,

6.6 - finalmente, requereu o deferimento das preliminares, e em casocontrário à improcedência da ação com a condenação do A. no ônus dasucumbência, protestando pela produção de prova testemunhal, pericial,inspeção judicial, além da juntada de documentos.

7. O A, intimado (fls. 146) para falar sobre a contestação supra e osdocumentos que a acompanham, apresentou a réplica (fls. 147/152), pedindo a condenaçãodo R. nos termos dos artigos 16, 17 e 18, do CPC, a juntada de documentos e a apensaçãoda presente cautelar aos autos da ação principal, ratificados os termo da inicial.

8. Em cumprimento a r. despacho (fls. 157v/158), o A. requereu (fls.159) a citação do CLUBE DE ENGENHARIA, do MUNICÍPIO DE CABEDELO e dos proprietáriosde estabelecimentos localizados na beira-mar, qualificados no relatório de missão constantedos autos da ação principal, e reiterou o pedido de apensação formulado.

9. O MM. Juiz Federal indeferiu o pedido de apensamento e ordenou acitação dos litisconsortes (fls. 296/297).

10. Seguiu-se comunicado (fls. 307) da suspensão da liminar pelo entãoPresidente do e. Tribunal Federal de Recursos.

11. Intimado (fls. 349) para falar sobre a certidão (fls. 325/328) do Sr.Oficial de Justiça, o A. requereu a citação editalícia dos RR. não encontrados, o apensamentodestes autos aos do processo principal, a realização de audiência e de perícia, bem como asolicitação, ao e. TFR, de informações sobre o julgamento do agravo, da decisão que suspendeua liminar concedida.

12. Foi deferida (fls. 359) a citação editalícia e a solicitação de informaçõesrequeridas e indeferida, mais uma vez, a apensação.

13. Conforme comunicação (fls. 367), foi negado provimento ao agravoregimental interposto pelo MPF.

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14. Posteriormente, foi exarado despacho declarando suspeição do MM.Juiz Federal que até então presidia o feito (fls. 399v).

15. Citados os litisconsortes passivos, apenas ROBERTO FREIREJARDIM (fls. 300/302), JOÃO MOISÉS DOS SANTOS (314/315), ODALÍCIO FARIAS (fls.329) e LINDEMBERG BORGES GUEDES (fls. 345/346) contestaram a ação, através deadvogado constituídos; FRANCISCO TARGINO DA SILVA e outros, revéis, citados por edital,contestaram (fls. 397/398) por curadora nomeada, tendo, todos, argüido as preliminares deilegitimidade e inépcia da inicial, pedindo, por fim, a extinção da ação, na forma do artigo 267,incisos IV e VI, do CPC e a condenação do autor no ônus da sucumbência.

16. Manifestando-se sobre a contestação (397/398), o A. requereu arejeição das preliminares e o apensamento destes autos aos da ação principal.

17. O MM. Juiz Federal reservou-se (fls. 406) para apreciar as preliminares,quando de julgamento final e indeferiu, novamente, o pedido de apensamento, facultando àspartes à especificação de provas.

18. A R. UNIÃO FEDERAL não contestou a ação, conforme certidão(fls. 418vº), assim como o MUNICÍPIO DE CABEDELO e o CLUBE DE ENGENHARIA,conquanto devidamente citados (fls. 328).

19. Após o trânsito em julgado da decisão retro, sem manifestação daspartes, vieram-me os autos conclusos para decisão.

Relatados, DECIDO.20. Tratam os autos, pois, de hipótese em que é possível o julgamentoantecipado da lide, ex vi do artigo 330, do CPC, que é a terceira hipótese de “julgamentoconforme o estado do processo” (CPC, capítulo V, seção I), em especial porque os litigantesnão têm provas a produzir em audiência.

21. De início, afasto integralmente as preliminares argüidas pelosdiversos RR., pelas razões seguintes:

21.1 - R. MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA (fls. 124/131):

21.1.1 - ilegitimidade ativa ad causam, porque é evidente que alegitimidade e o interesse (CPC, artigo 3º) do A. é conseqüência dointeresse público, que “é perceptível (...) haja vista que o fenômeno em sitranscende, extrapola os estreitos limites do indivíduo, e alcança a esferado social”. (A intervenção do ministério público no processo civilbrasileiro/Antônio Cláudio da Costa Machado. - São Paulo: Saraiva, 1989,p. 277);

21.1.2 - indeferimento da citação da UNIÃO FEDERAL, por se tratarde edificações erigidas em terrenos de marinha, vale dizer, do patrimôniopúblico nacional, daí porque foi facultada a sua integração à relaçãoprocessual;

21.2 - RR. FRANCISCO TARGINO DA SILVA e OUTROS (fls. 397/398).

21.2.1 - ilegitimidade ativa ad causam, pelos mesmos motivos referidosno sub-item 21.1.1, retro;

21.2.2 - ilegitimidade passiva ad causam, por serem os RR. ocupantes

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 235

irregulares de terrenos de marinha;

21.2.3 - inépcia da inicial, porque estão presentes todos os requisitosdo CPC, artigos 282, incisos I a VII, e 283, caput).

21.3 - R. ODALÍCIO FARIAS (fls. 329):

21.3.1 - ilegitimidade passiva ad causam, porque, malgrado a suaalegada condição de comerciante ambulante, e um ocupante da área demarinha, logo é interessado no deslinde da causa;

21.3.2 - inépcia da inicial, porque estão presentes todos os requisitosdo CPC, artigos 282, incisos I a VII, e 283, caput.21.4 - ROBERTO FREITAS JARDIM:

21.4.1 - ilegitimidade passiva ad causam, pelos mesmos motivosapreciados no sub-item 21.3.1;

21.4.2 - inépcia da inicial, pelas exatas razões expostas no sub-item21.3.2, retro.

22. Por via de conseqüência, persiste à decisão apenas a essência daprópria medida cautelar.

23. No mérito, observo que o A. pretende fundamentalmente evitar aconstrução de bares, geralmente sob a forma de palhoças e barracas em áreas de praia,alegando que a disseminação de tais edificações “facilita o surgimento de efeitos adversossobre os valores das terras das praias e das águas do oceano” e, para tanto, pediu interdiçãoou embargo preventivo sobre mencionadas construções.

24. Em verdade, os terrenos sobre os quais estão erigidas as construçõesde que fala a petição inicial são bens nacionais (públicos) de uso comum, logo insuscetíveisde direito de propriedade (res extra commercium), “podendo ser utilizados por quisque depopulo, desde que o uso de cada um não impeça o de outrem. (...) Enfim, o princípio geralque rege a utilização dos bens de uso comum é o de que o uso de um seja transitório eprecário, não impedindo o uso dos demais, reservando-se a Administração, em casos especiais,o direito de utilização privilegiada quando se trata de interesse público” (Bens públicos/J.Cretella Jr. - São Paulo: EUD, 1975, p. 258 e 179); portanto, afigura-se incabível que a PrefeituraMunicipal de João Pessoa (rectius, o R. MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA) indevidamenteprivilegie terceiros com autorização para o comércio em tais áreas, pois na verdade falece-lhecompetência para tanto, conforme o Código Civil, artigo 678, e o Decreto-Lei nº 9.760/46,artigo 64; daí, então vale colacionar a seguinte doutrina: “A Administração Pública temobrigações especialíssimas no capítulo das terras de marinha, uma vez que a ela competefiscalizar, prover e zelar, não só as marinhas aforadas, como aquelas que ainda não foramobjeto de contratos de aforamento ou de regularização de ocupação. O domínio da União, istoé, seu direito sobre tais terras, não decorre das leis orçamentárias, que a partir do ano de1831, passaram a destacar na receita a renda delas proveniente. Esse direito vem de princípiosimemoriais que nortearam o comportamento administrativo, princípios de Direito Histórico,que, bem sabemos, só poderiam ser revogados por cláusula expressa da lei constitucional.”(Terras de Marinha / Rosita de Sousa Santos. - Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1985, 1ªedição, pág. 77).

25. Daí vem a constatação de que a pretensão do A. não tem carátersatisfativo, - porquanto a sua eventual concessão, não será antecipadora de decisão em açãoprincipal - e não esvaziará, de conseqüência essa prestação jurisdicional futura; é mais doque certo que o poder de cautela do Juiz, no particular, é limitado pela necessidade, que écorolário do bom-senso, e sempre adstrito aos pressupostos do fumus boni juris e do

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periculum in mora, concomitantes, contemporâneos e presentes no caso dos autos.

26. Portanto, sendo a cautelar mero processo preparatório de uma açãoprincipal - vem daí a sua denominação -, a pretensão se enquadra à tese de que a suafinalidade é obter segurança que torne possível a prestação jurisdicional de conhecimento ede execução; nesse sentido, iterativa jurisprudência, mutatis mutandis aplicável à espécie,da qual é destacável o seguinte julgado:

“EMENTA: - PROCESSUAL CIVIL. PODER DE CAUTELA DE JUIZ.

- A finalidade da medida cautelar é garantir a utilidade e eficácia da futuraprestação jurisdicional. No particular, o juiz deve atuar com parcela dediscricionariedade, cujo limite é o requisito da necessidade.

- Se está em curso ação ordinária com pretensão de rescindir contrato decompra e venda e mútuo, não há lugar para que se dê curso a execuçãoforçada desse mesmo pacto.” (AI nº 59.748-REG. Nº 8800737145-1E.,Rel. Min. José Delgado, 5ª T. TFR., DJU de 26.689, pág. 11158)

27. De todo modo, a presente cautelar haverá de impedir a proliferaçãode tais construções, mantido o status quo, até decisão de mérito na ação principal.

28. Excluo da relação processual o CLUBE DE ENGENHARIA DAPARAÍBA, por não vislumbrar a sua legitimidade passiva ad causam; excluo também a UNIÃOFEDERAL, apesar de não haver contestado (conforme o item 7, retro) e tratar-se de direitoindisponível, por não entendê-la com legitimidade ativa para postular, neste caso, já que asautorizações para as construções de que falam os autos foram autorizadas pelos MunicípiosRR.

29. Isto Posto, fundamentado no artigos 269, I, e 804, do CPC, julgoparcialmente procedente a medida cautelar preparatória proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICOFEDERAL contra o MUNICÍPIO DE J0ÃO PESSOA e OUTROS e, nesse sentido, determinoa suspensão de obras de construção de barracas e prédios de alvenaria, em terrenos demarinha situados nas praias de Tambaú e de Cabo Branco, em João Pessoa, e em praias deCabedelo desde que não autorizadas na forma da legislação federal vigente; determino ainda,aos RR. MUNICÍPIOS DE JOÃO PESSOA e de CABEDELO não mais concedam licenças e/ou alvarás de construção para a instalação de bares nas referidas áreas e, finalmente, aosdemais RR. ocupantes de tais estabelecimentos determino se abstenham de ampliar oumodificar os já existentes, até o deslinde da ação principal.

30. De conseqüência, condeno os RR. em honorários advocatícios de10% (dez por cento) do valor da causa, ex vi do artigo 20, do CPC e dos artigos 3º e 11,parágrafo 2º, a Lei nº 1.060/50 (JTA 88/183).

31. Custas, ex lege (Lei nº 1.060/50).

32. P.R.I.

João Pessoa, 31 de março de 1993.

JOÃO BOSCO MEDEIROS DE SOUSAJuiz Federal da 1ª Vara

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PRESERVAÇÃO AMBIENTAL

Processo nº 96.4138 - AÇÃO CIVIL PÚBLICAPromovente: IBAMAPromovida: PREFEITURA MUNICIPAL DE CABEDELO – PB e

CONTRUTORA GAMA LTDA

SENTENÇA

EMENTA: Ação Civil Pública. Gabiões. Risco ao meio ambiente nãocaracterizado. Inexistência do Estudo de Impacto Ambiental e Relatóriode Impacto Ambiental. Existência de pesquisa feita por institutoespecializado. Matéria reproduzida em ação anteriormente julgada.Litispendência.

Visando os pedidos o mesmo efeito jurídico, ou seja, considerar ou não aimprescindibilidade do Estudo de Impacto Ambiental e do Relatório deImpacto Ambiental para a continuidade da construção de gabiões, eestando presentes as mesmas quaestiones facti e quaestiones iuris,caracterizada está a litispendência.

— Extinção do processo, sem o julgamento do mérito.

Vistos etc.

INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOSNATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA -, autarquia federal, devidamente representada, propôs apresente AÇÃO CIVIL PÚBLICA contra A PREFEITURA MUNICIPAL DE CABEDELO - PB ea CONSTRUTORA GAMA LTDA., aduzindo o seguinte:

1. O IBAMA autuou a Prefeitura Municipal de Cabedelo - PB, em 01/04/1996, porque esta construíra inicialmente, sem a previsão de um estudo de impacto ambientale sem o devido licenciamento, 26 (vinte e seis) gabiões nas praias de Santa Catarina, Pontado Mato e Formosa, esta compreendendo as praias do Osso e Areia Dourada, todas no litoraldo município de Cabedelo. Após o embargo da obra, desrespeitosamente a promovida construiumais 20 (vinte) gabiões, cuja obra está sob a responsabilidade da Construtora Gama Ltda.

2. A construção desses gabiões foi justificada pela Prefeitura, peranteo IBAMA, sob a alegação de que a orla marítima de Cabedelo está seriamente ameaçada porum processo acelerado de erosão marinha, baseando-se num anteprojeto denominadoProteção Contra a Erosão do Litoral da Cidade de Cabedelo - PB, realizado pelo Institutode Pesquisas Hidroviárias - INPH, integrante da extinta Empresa de Portos do Brasil S/A,recomendado à Prefeitura de Cabedelo, em outubro de 1989. Com apoio nesse anteprojeto, aPrefeitura de Cabedelo construiu em 1995 04 (quatro) gabiões nas praias de Ponta do Mato eFormosa, onde apresenta visível processo erosivo.

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3. Amparada nesse anteprojeto, a promovida declarou situação deemergência naquele município, a fim de obter apoio do Poder Público, com a destinação deverbas para a construção dos gabiões. Nesse sentido, vários convênios foram firmados entreo município de Cabedelo e o Estado da Paraíba e entre o Governo Federal e o Estado.

4. Prossegue o promovente, em seu arrazoamento, alegando que oproblema vem de longa data, havendo tempo suficiente para um estudo científico na área,para localização da origem do processo erosivo, que está ocorrendo em quase todo o litoraldo Estado, daí a necessidade do estudo, tendo em vista que os gabiões não são a únicaalternativa para o problema.

5. Segundo o IBAMA, a obra em questão não contemplou parâmetrosambientais exigidos por lei, podendo causar sérios danos ambientais a outras regiões dolitoral do Estado, atingindo a população e o bem público e, além do mais, os gabiões estãosendo construídos aleatoriamente. Argüi, baseada em relatório seu, que foram executados42 (quarenta e dois) gabiões, quando estavam previstos inicialmente no anteprojeto 4 na praiade Santa Catarina, 5 na praia de Ponta do Mato e 4 na praia de Formosa, com a previsão deconstrução de gabiões intermediários a medida em que os espaços entre os primeiros fossemdevidamente associados.

6. Critica, na inicial, o anteprojeto realizado pelo INPH, por não fornecerdados conclusivos, deixando transparecer dúvidas quanto à eficiência da obra.

7. Para o IBAMA, ora promovente, é inexplicável a construção dosgabiões pela promovida, uma vez que “não foi detectado nenhum processo erosivo além dapraia Formosa, sentido Cabedelo - João Pessoa, capaz de justificar o empreendimento até oMar dos Macacos, por ser evidente a proteção natural na forma de arrecifes de corais edepósitos de areia”. Portanto, inexiste qualquer tipo de erosão.

8. Às fls. 7/9, faz uma breve explanação sobre o “Estudo Prévio deImpacto Ambiental- EIA”, destacando sua conditio sine qua non para a concessão de qualquerlicenciamento de obra ou empreendimento de impacto ambiental, citando vários autores.Afirma que sem o “Relatório de Impacto Ambiental - RIMA”, que é a conclusão do EIA, aconstrução dos festejados gabiões não poderá ser licenciada, invocando a Resolução n. 01/86-CONAMA. Ressaltou, ainda, o promovente, o licenciamento ambiental, por ser um dosprocedimentos da Política Nacional do Meio Ambiente, pressuposto indispensável para oexercício da atividade licenciadora com o objetivo da proteção do meio ambiente.

9. Conceitua, o promovente, às fls. 12, o que seja “Zona Costeira”, econclui que, pela presença dos gabiões, as praias estão sendo danificadas, agredindovisualmente a paisagem e privando o direito do cidadão ir e vir em um dos bens da União, deuso comum de todos.

10. Em defesa do Direito, o promovente invocou o art. 225, daConstituição Federal, a Lei n. 6.938/81, regulamentada pelo Decreto n. 99.274/90, e aResolução 001/86 do CONAMA - CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE.

11. Justificou o embargo inicial à obra em questão, e as penalidadessubseqüentes, em vista da infração ambiental cometida pela promovida, nos termos das Leis6.938/81 e 7.661/88 e § 3º, do art. 225, da CF, em razão da falta de licenciamentoambiental, precedido da falta do Estudo de Impacto Ambiental e do Relatório deImpacto Ambiental, devidamente aprovados, “posto que, a construção dos gabiõescertamente trará impactos negativos a outras áreas, conforme laudos técnicos, docs. 08 e

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09”.

12. Alegou, também, a responsabilidade civil, prevista no art. 7º, caput,da Lei 7.661/88 c/c art. 14 da Lei 6.938/81, em face da degradação dos ecossistemas, dopatrimônio e dos recursos naturais da zona costeira.

13. Considerando o fumus boni juris e o pericullum in mora, requereumedida liminar inaudita altera pars, para sustar as atividades de construção dos gabiões,em razão de esta representar um risco ao meio ambiente, consubstanciando-se em danoirreparável ao patrimônio ambiental, bem como por inexistirem as licenças exigíveis aoempreendimento que ora está realizando a Prefeitura Municipal de Cabedelo.

14. Finalmente, requereu a citação da Prefeitura Municipal de Cabedelo- PB, da Construtora Gama Ltda. e da União, para responder aos termos da ação, e a intervençãodo Ministério Público Federal, julgando-se procedente a demanda e condenando-se ospromovidos:

a) na obrigação de cessar com a obra, enquanto não apresentar o Estudode Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental aprovados, sobpena de execução específica;

b) na obrigação de fazer, com a retirada imediata dos gabiões, a partir dapraia de Formosa, sentido Cabedelo - João Pessoa, remanescendoprovisoriamente 13 (treze) gabiões, até a aprovação do EIA/RIMA, notrecho da praia de Santa Catarina até o início da praia Formosa;

c) a recuperação, eventualmente indicada no EIA/RIMA, em prazo nãosuperior a 12 (doze) meses, independentemente de acordo administrativo,sob pena de pagamento de multa diária a ser aplicada pela empresa;

d) no pagamento das custas processuais, honorários periciais e demaiscominações de estilo.

15. Requereu, também, a produção de provas, tais como perícia, oitivade testemunhas e juntada de documentos.

16. Com a inicial, juntou os documentos relacionados às fls. 27, dosautos.

17. Distribuída, inicialmente, para a 2ª Vara Federal desta SeçãoJudiciária, em 23/05/1996, o Exmo. Sr. Dr. Alexandre Costa de Luna Freire, MM. Juiz Federaldaquela Vara, em face do conhecimento de que nesta 3ª Vara tramitava um mandado desegurança sob n. 96.3625-0, impetrado pela Prefeitura Municipal de Cabedelo, ora promovida,contra ato do Superintendente do IBAMA, entendeu ocorrer a hipótese de conexão dasações e prevenção deste juízo, razão pela qual determinou a redistribuição destes autos aesta Vara, em despacho datado de 01/08/1996 (fls. 151/152).

18. Feita a redistribuição, em data de 29/10/1996, os autos foramconclusos à MM. Juíza Federal Substituta desta 3ª Vara, a qual, em despacho bem fundamento,observou que este juiz julgara o aludido mandado de segurança, razão pela qual estava preventopara conhecer e julgar esta ação. Porém, ressalvou o seu entendimento de que se esgotaraa necessidade de reunião dos processos (a ação civil pública e o mandado de segurança),tendo em vista que o mandamus já havia sido julgado em 20/8/1996 (fls. 158/159).

19. Remetidos os autos à Secretaria, esta informou que o mandado de

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segurança, cuja cópia da petição inicial se encontra às fls. 138/147, encontrava-se comrecurso interposto pelo IBAMA, aguardando publicação do despacho que admitiu o recurso eabriu vista à impetrante para oferecimento de resposta.

20. Vieram-me os autos conclusos.

É o relatório.

Decido.

21. A promovida impetrou o mandado de segurança n. 96.3625-0 contraato do Superintendente do IBAMA, que embargou a construção dos gabiões, objeto da presenteação civil pública. Naquela ação mandamental, o IBAMA, alegando falta de aprovação doanteprojeto de Proteção contra a Erosão do Litoral da Cidade Cabedelo - PB, realizado peloInstituto de Pesquisas Hidroviária -INPH, bem como a inexistência de estudo prévio de impactoambiental, mencionando a mesma legislação que fundamenta a presente ação, requereu aimprocedência do mandamus.

22. Acolhi o pedido liminar no writ, no sentido de ser dada continuidadeà edificação dos gabiões, tendo em vista o estudo técnico realizado pelo INPH e o cronogramada obra que deveria ser cumprido, sob pena de desfazer-se o acerto administrativo, comirreparáveis prejuízos à Prefeitura e à população Cabedelense. Porém, o impetrado, orapromovente, requereu junto ao TRF 5ª R., a suspensão da medida, o que foi alcançado.Posteriormente, em face do Agravo Regimental interposto pela Prefeitura Municipal de Cabedelo,o mesmo Egrégio Tribunal, em plenário, por maioria, confirmou a liminar.

23. Julguei o mérito do mandamus, dando procedência ao pedido,garantindo a continuidade da obra e desconstituindo a multa imposta à Edilidade, levando emconsideração o estudo prévio realizado por Instituto especializado, no caso, o INPH, e asituação emergencial em que se encontra as praias daquele município.

24. Agora, na presente ação, vem o IBAMA subindo a ladeira, de marcha-a-ré, na contramão da história, com o reverso da moeda. Trazendo à tona os mesmo fatos efundamentos, já apreciados e decididos no mandado de segurança, requer a reapreciação damatéria, desta feita para suspender a construção dos gabiões e desfazê-los.

25. Observe-se a repetição dos argumentos utilizados pelo IBAMA, emambas ações:

No mandado de segurança: “Por tratar-se de Ante-projeto, processoem plena gestação embrionária, mercê das discussões em seu regularprocedimento, não configurando, ainda, em essência, uma decisão comeficácia, porque sequer nascera, é que não vislumbramos a rigor a adoçãode qualquer medida decisória plausível,...” “Por outro lado, se o problemaem questão está se arrastando há várias décadas,..., foi tempo suficientepara dar andamento ao procedimento inicialmente proposto...,” “... aexecução dos gabiões foi realizada sem o atendimento ao funesto ante-projeto, fato constatado através de vários laudos técnicos.” “Ainda aoreportar-se ao ante-projeto aludido, é fácil constatar que nem mesmoeste fornece dados conclusivos e deixa transparecer claramente dúvidasquanto à eficiência da pretensão...” Na ação civil pública: “Trata-se deAnte-projeto, processo em plena fase embrionária, mercê das discussõesem seu regular procedimento, não configurando ainda, em essência, uma

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decisão com eficácia.” “Por outro lado, o problema em questão estáocorrendo há várias décadas, tempo suficiente para ter originado um estudocientífico para localização da origem do processo erosivo...” “...os gabiõesestão sendo construídos aleatoriamente, sem sequer atender asrecomendações do prefalado ante-projeto, fato constatado através de laudotécnico...” “Sobre o ante-projeto aludido, é fácil constatar que este nemmesmo fornece dados conclusivos e deixa transparecer claramente dúvidasquanto à eficiência da pretensão...”

26. Insiste repetidamente o autor sobre a realização do Estudo Préviode Impacto Ambiental e do Relatório de Impacto Ambiental. Essa matéria também foiexaustivamente apreciada na sentença mandamental, como se vê adiante:

“IBAMA e o MPF se entricheiram no argumento repetido de falta de prévioestudo de impacto ambiental. É este só e tão-somente o argumento contraos trabalhos levados a efeito pela impetrante. Impacto ambiental maiornão pode haver do que os olhos desarmados do homem do povo podeenxergar. Basta um passeio a pé pela orla marítima desde o enrocamentodo Porto de Cabedelo, do lado contrário do ancoradouro, até o final dapraia de Ponta de Campina, para bem se enxergar o estrago que o marfez a parte norte e também a leste de Cabedelo, aliás, as partes maisatingidas e habitadas por pessoas menos potentadas.

Será que era preciso esperar que a força bravia do oceano avançasse detal forma que as águas acabassem com a parte velha da cidade?

Há outra tecnologia mais avançada para que se detenha o furor das ondasque não os gabiões?

Será que somente se teria estudos de impacto ambiental se antes oIBAMA e o MPF fossem ouvidos ou se a preservação da cidade, cujadevastação pelo mar é fato público e notório, também não representa ummodo de se concluir como uma salvaguarda expressa e clara de impactoambiental?

Qual foi o estudo apresentado pelo impetrante? Foi de há sete anospassados. Se o estudo fosse dos dias atuais, mais forte razão teria aPrefeitura de efetuar os trabalhos, pois desde àquele tempo para cá, ooceano fez mais estragos na cidade.

......................................................................................

Ademais, se esse estudo de impacto ambiental prévio, que não foirealizado, tivesse de ser feito, qual o órgão mais capaz de fazê-lo? Creioque o Instituto de Pesquisas Hidroviárias. Em que estudo se baseou aimpetrante. Em estudo realizado por esse instituto.

......................................................................................

Argumentam, também, IBAMA e MPF da desnecessidade de ser a obraexecutada no seu todo, mas só e tão-somente na parte já atingida. Aalegação não tem como ser aceita. Os estudos levados a efeito dão contada necessidade da realização de todo espaço litorâneo neles contidos.

Atribuir-se o fato de que a obra poderá vir a afetar a ponta do Cabo Branco,ou seja, passando a erosão atingir o ponto mais oriental das Américas éapenas alegação de leigos representantes do IBAMA e MPF, pois, nãodemonstraram através de estudo procedido por especialistas, tal

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fundamento. Ao contrário, a impetrante trouxe para os autos elementosde prova importantes, chumbados na experiência de órgão encarregadode defesa da costa, bem assim a execução da obra por empresa degrande Know how (experiência) em obras desse porte internacionalmente.

......................................................................................

Não há outra tecnologia em todo o mundo para deter a avalanche dooceano, a não ser os espigões de praia a dentro. Os ora construídos emCabedelo vão ficar como dedos de concreto dentro d’água apontandopara os de Angola, lá na mãe África, como a dizer: Vamos deter a fúria doAtlântico. O resto é questiúncula, própria de campanário ou paroquialcomo queiram.

......................................................................................

Uma obra pode ser edificada sem o prévio estudo de impacto ambiental eser nociva ao meio ambiente; outra não, pode ser construída com baseem estudo prévio e atender as regras ambientais, como é o caso versadona questão deduzida nos autos onde houve um estudo de um Institutoespecializado.

......................................................................................

Isto posto, confirmando a liminar, concedo a segurança requerida paragarantir a continuidade da obra, desconstituindo a multa aplicada àedilidade.”

27. Quando do deferimento da medida liminar, na outra ação, tambémlevei em consideração a relevância do estudo realizado pelo Instituto de Pesquisas Hidroviárias- INPH, para a implantação dos gabiões no litoral de Cabedelo, expondo o meu convencimentodesta maneira:

“Os críticos apenas argumentam que não se procedeu a estudo prévio doimpacto ambiental que a construção dos gabiões poderia acarretar. Porém,releva observar que já foi realizado estudo técnico sobre o assunto,materializado no “ANTEPROJETO DE PROTEÇÃO CONTRA A EROSÃODO LITORAL DA CIDADE DE CABEDELO/PB”, levado a cabo peloINSTITUTO DE PESQUISAS HIDROVIÁRIAS - INPH - da extintaPORTOBRÁS que recomenda, como hábil a contenção dos avanços domar, a construção de espigões, que poderão ser construídos de Bolsacreto/bolsaroca, Entroncamento, Madeira ou Gabiões. O referido estudo, afigura-se-me bastante completo, chegando até a dispor sobre a massa dosgabiões, volume e a sua disposição por ordem de construção.” (fls. 101,do mandado de segurança).

28. Quanto à alegação de que os gabiões estão sendo construídosaleatoriamente (fls. 06), isso não procede, posto que vêm sendo implantados segundo aprópria orientação do Instituto de Pesquisas Hidroviárias - INPH -, o único no Brasil competentepara o assunto. Tanto é assim que, afora o IBAMA, nenhum cidadão daqueles que estejamconvivendo com a presença dos ditos gabiões, tem vindo reclamar de impedimento no direitode ir e vir nas praias beneficiadas pelos espigões.

29. Ora, a desnecessidade do Estudo de Impacto Ambiental e doRelatório de Impacto Ambiental, para a construção dos gabiões pela Prefeitura Municipal deCabedelo - PB, no caso específico destes autos, já é matéria totalmente discutida e decidida,

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 243

já se tornou “prego batido e ponta virada”. É completamente descabida, agora, a pretensão doIBAMA, utilizar-se da ação civil pública para conseguir o que não pode no mandado desegurança, ou seja, a paralisação da obra. Em sede de Agravo Regimental, perante o TRF-5ª R., a Prefeitura de Cabedelo obteve a confirmação da liminar no sentido de prosseguir coma construção dos gabiões, cuja Ementa é do teor seguinte:

“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE SEGURANÇA.EMBARGO DE OBRA PELO IBAMA. AUSÊNCIA DE ESTUDO PRÉVIODE IMPACTO AMBIENTAL. GRAVE LESÃO À ORDEM PÚBLICA NÃOCARACTERIZADA.

Decisão agravada que deferiu pedido de suspensão de liminar concedidaem mandado de segurança impetrado, perante a 3ª Vara Federal - PB,que havia determinado o desembargo da obra realizada pelo Município deCabedelo e referente à construção de gabiões para conter o avanço domar.

Obra precedida de estudo do Instituto de Pesquisas Hidrográficas - INPH,que, por sua vez, propiciou a liberação de recursos ajustados em convênio.

Não comprovação, pelo IBAMA, da inadequação dos estudos realizadosou da impropriedade das construções embargadas.

Grave lesão à ordem ou à economia pública não caracterizada.

Agravo provido.”

(Ag, Reg. N. 2378-PB, Rel. Juiz Ridalvo Costa, publicado no DJ em28.06.1996) Lê-se no corpo do Acórdão: “A preocupação do IBAMA seriaplenamente válida se manifestada no início da obra e não agora. Acontinuação dos trabalhos, que não impedirá a elaboração dos estudosnecessários à aferição do impacto ambiental dessas medidas, a meu ver,não é passível de lesionar a ordem pública. Ao contrário, preserva aeconomia da municipalidade a as praias de seu litoral”.

30. Será que o IBAMA não enxerga a realidade por que passa a orlamarítima daquele município, ou só vê até a distância das escrivaninhas e o que se passa naparafernália de leis que impedem atitudes salutares como a da Prefeitura de Cabedelo? Cabívelaqui admoestar o IBAMA, até através da poesia:

“De tanto olhar para longe,

não vejo o que passa perto.

Subo monte, desço monte,

meu peito é puro deserto.”

(Meireles, Cecília. Obra Poética (trecho). Rio de Janeiro, José Aguilar,1958, p. 229-30).

31. Finalmente, entendo que as quaestiones facti e as quaestionesiuris abordadas nas duas ações são idênticas, ocorrendo, assim, uma litispendência, comrisco de haver sentenças conflitantes. Como preconiza Pontes de Miranda, “para que se dê ainfração da litispendência é preciso que haja identidade entre as pretensões dos dois processos,de modo que possa ocorrer contradição entre duas sentenças que houverem de proferir”. Nocaso dos autos, bem se afigura essa identidade, embora em faces opostas, ou seja, nomandado de segurança pretende-se a continuidade da obra, nesta ação a sua paralisação,porém, tudo sob a mesma argumentação, isto é, a alegação de que a construção dos gabiões

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encontra-se desaparelhada, embora com o devido estudo técnico, feito por Instituto competentecontestado pelo IBAMA, por faltar-lhe o festejado Estudo Prévio de Impacto Ambiental. Seriao mesmo mandado de segurança anteriormente impetrado ao revés. Na presente ação oIBAMA nada traz de novo que não tenha sido objeto de apreciação no mandado de segurança.Se o Estudo Prévio de Impacto Ambiental, neste caso, é tão imprescindível, por que não orealiza de uma vez o IBAMA, apontando onde realmente ocorrerá o dano ao meio ambiente?Há tempo que vem rolando essa pendenga e até agora não foi isolado o ambiente exato ondeestaria ocorrendo o alegado desequilíbrio ecológico.

32. Já preconizava o Egrégio Tribunal Federal de Recursos:

“Tendo fundamento semelhante ao da coisa julgada, e a finalidade deevitar duas decisões contraditórias, pode a litispendência ser decretadade ofício.” (1ª Turma, Agravo de Petição n. 33.862, DJ de 25/5/73, p.8.199).

33. Isto posto, com apoio no art. 267, V, do Código de Processo Civil,declaro extinto o processo, sem o julgamento do mérito.

P. R. I.

João Pessoa, 11 de novembro de 1996.

José Fernandes de AndradeJuiz Federal da 3ª Vara

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 245

RESERVA ECOLÓGICA

Proc. nº. 00.0035-3 / AÇÃO PENALAutor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALRéus: ANTÔNIO MANOEL DE MIRANDA E OUTROS.

SENTENÇA

EMENTA: Penal - Processual penal. Reserva Ecológica - Concurso deagentes e de crimes - Prescrição que não atinge o crime de furtoqualificado.

1 - Materialidade plenamente demonstrada através de laudo.

2 - O alegado desconhecimento de que a área é de preservação ambientalrestou desacreditado pela fragilidade da versão dada em juízo e pelaconfissão extrajudicial.

3 - Pena exacerbada contra o acusado mentor das infrações penais.

4 - Extinção da punibilidade - Verificado o lapso prescricional da pretensãopunitiva de crimes em concurso calculado pela pena em abstrato, nostermos do art. 109, inc. IV do CP, decreta-se a sua ocorrência dos crimespor ela alcançado.

5 - Resta incólume o crime de furto qualificado, praticado em concursoformal.

6 - Erro de proibição - Somente é concebível o reconhecimento de tal erroquando o agente se equivoca sobre a injuridicidade de sua conduta -Inocorrência.

— Procedência, em parte, da denúncia.

Vistos etc.

JOSÉ DO CARMO DA SILVA, MANOEL ANTÔNIO DA SILVA, SEVERINOBERNARDO PEREIRA, OTÁVIO PEREIRA DA SILVA, EDMILSON PINTO DA SILVA,ANTÔNIO MANOEL DE MIRANDA, JOÃO GOMES DA SILVA, MANOEL ALVES DA SILVA,JOÃO GERMANO DA SILVA, LUIZ FRANCISCO DO CARMO E FRANCISCO PEQUENODANTAS, todos já devidamente qualificados nos autos, foram denunciados pelo representantedo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL na Paraíba, como incursos nas penas dos arts. 288,166, 163, parágrafo único, III, 155, § 4º, IV, 161, § 1º, II, c/c art. 29, 62, I e II, e art. 69, todosdo Código Penal Brasileiro.

Conforme consta da denúncia, em dias de julho de 1986, os denunciadosacima mencionados invadiram a Estação Ecológica de Mamanguape/PB, pertencente à União(Lei n. 7.169, de 14.12.93), sem autorização dos órgãos federais competentes. Ali, iniciaramum desordenado desmatamento da floresta, furtando a madeira cortada e destruindo partedaquele santuário ecológico, que abriga a fauna e a flora remanescente da Mata Atlântica.

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A Polícia Federal, em diligências, apreendeu 323 (trezentos e vinte etrês) toros de madeira de espécies diversas, sendo essa madeira destinada à venda, além deinstrumentos utilizados na derrubada das árvores e de um revólver pertencente a AntônioManoel de Miranda, um dos denunciados.

Diz, ainda, a denúncia, que os denunciados João Germano da Silva eManoel Alves da Silva incitavam a invasão e o furto, e que os demais denunciados, aderiramàs condutas criminosas dos aludidos acusados, associando-se e formando um bando, queinvadia a área, furtava madeira e destruía parcialmente a reserva ecológica.

Da peça acusatória consta, também, pedido de prisão preventiva contra oacusado João Germano da Silva, fundamentada em folha de maus antecedentes criminais, eno fato de ser este apontado como o principal responsável pelos danos causados à MataAtlântica, observando que João Germano da Silva era funcionário da Secretaria Especial doMeio Ambiente (SEMA), tendo sido demitido por estímulo à invasão da reserva e participaçãoem furto de madeira. Quanto a esse pedido, o então Eminente Juiz Federal Dr. FranciscoBarros Dias, respondendo na ocasião por esta 3ª Vara, em decisão fundamentada indeferiu opleito, recebendo a denúncia em 17/03/1987 (fls. 235/236 - 2º volume).

Os denunciados citados por precatória, à exceção de Manoel Alves daSilva e Luiz Francisco do Carmo, citados por edital (fls. 307 - 2º volume), foram devidamenteinterrogados às fls. 255 usque 264/264v - 2º volume). Afirmaram em seus depoimentos perantea autoridade judiciária que desconheciam a prática de ilícito penal e que se utilizavam dasterras da Reserva Ecológica para cultivo e plantio, objetivando o sustento de suas famílias.

Nos autos as defesas prévias dos acusados, às fls. 277 usque 282, 294,315 usque 319, 2º volume.

A denúncia arrolou oito (8) testemunhas, das quais três (3) foram ouvidasneste Juízo, a saber: Helder José Mesquita Menezes, Givaldo Maia de Moura e José BonifácioVital (fls. 348 usque 356, 2º vol.); e na Comarca de Bayeux, por precatória, Vicente SalustianoGomes (fls. 442, 3º vol.). Em audiência, o ilustre representante do Ministério Público Federalrequereu a desistência das testemunhas José Adamau de Sá e José Clóvis Gonçalves Paiva,além de cópia do inventário florestal, realizado na área da Estação Ecológica, junto a umaação civil pública, em tramitação da 2ª Vara Federal desta Seção Judiciária, alegando verificaçãodo tamanho dos danos e da alteração causados no local especialmente protegido, o que foideferido pelo Juiz (fls. 258 - 2º vol.); e insistiu na oitiva das testemunhas Manoel Claudino daSilva e Evilásio Alcari, tendo sido expedidas cartas precatórias às comarca de Mamanguapee Bayeux, respectivamente, para esse fim (fls. 333 e 334, 2º vol.).

As testemunhas arroladas pela acusação, em seus depoimentos nesteJuízo, afirmaram que tinham conhecimento de que eram muitas as pessoas que invadiam areserva ecológica com o intuito de cortar madeira para revenda, ou de se apossar das terras,com o propósito de promover a sua ocupação e, posteriormente, regularizar a situação juntoaos órgãos competentes. Declararam, ainda, que não se lembravam mais dos semblantesdos denunciados presentes à audiência, mas que tinham informações de que existiam pessoasque incentivavam a invasão das terras, organizando-se em bandos para derrubada das árvores,sabendo ser área proibida, tanto é verdade que faziam o carregamento da madeira no horárionoturno.

Às fls. 459, do 3º volume, o Ministério Público requereu a desistência daoitiva das testemunhas Manoel Claudino da Silva e Evilásio Alcari, por não terem sidoencontrados; requereu, também, a extinção da punibilidade em relação ao acusado AntônioManoel de Miranda, em vista do seu falecimento, o que foi deferido pelo MM. Juiz Federal emexercício na 3ª Vara, o Dr. Antônio Bruno de Azevedo Moreira (fls. 460). Ainda no mesmo

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despacho, foi declarada a revelia dos acusados Luiz Francisco do Carmo, Manoel Alves daSilva, José do Carmo da Silva, Severino Bernardo Pereira e Otávio Pereira da Silva. Também,em despacho anteriormente proferido (fls. 309, 2º vol.), decretou a revelia dos acusados LuísFrancisco do Carmo e Manoel Alves da Silva.

Foram expedidas cartas precatórias às Comarcas de Pilar-PB, Rio Tinto-PB, Mamanguape-PB e Nova Cruz-RN (fls. 461 usque 466), para inquirição das testemunhasarroladas pelos denunciados, de nomes: Everaldo Belarmino da Silva, José Soares dos Santose José Antônio Claudino (pelo acusado João Gomes da Silva), inquiridas às fls. 511/513; JoséOliveira da Silva, Josival Barbosa da Silva e José Romão da Silva (pelo acusado FranciscoPequeno Dantas), ouvidas às fls. 484/485, sendo que a última testemunha não foi encontrada;Elias Gomes da Silva e Benedito Augusto Aragão (pelo acusado Otávio Pereira da Silva),inquiridas às fls. 496/497; José Costa da Silva e Antônio Anselmo da Silva (pelo acusadoManoel Antônio da Silva), ouvidas às fls. 480/480v; Pedro Patrício Marcos e Valdir Pereira deLima (pelo acusado Severino Bernardo Pereira), inquiridas às fls. 582v e 583.

Os acusados Luís Francisco do Carmo, Manoel Alves da Silva, EdmilsonPinto da Silva e José do Carmo Silva não apresentaram rol de testemunhas na instrução,conforme consta das peças de defesa prévia (fls. 311, 318 e 319 - 2º vol.). As testemunhasarroladas pela defesa do acusado João Germano da Silva, de nomes José Alves Filho, JoãoDias de Almeida, Severino Manoel Ananias, Santino José Barbosa, Arlindo Soares dos Santose Antônio Sebastião, foram ouvidas neste Juízo às fls. 534, 544 usque 547 e 558, e a últimatestemunha não compareceu à audiência.

Na fase do art. 499, as partes nada requereram, conforme certidão de fls.621.

Em termos de alegações finais, o ilustre representante do Parquetpropugnou a procedência da ação penal, diante das provas colhidas e pelo fato de que,inobstante afirmarem que desconheciam a ilicitude de seus atos, os acusados, em seusdepoimentos, confirmaram que sabiam ser a área invadida parcela remanescente da MataAtlântica, pertencente à União e que na região existem placas afixadas pelo IBAMA, informandoda condição de floresta de preservação. No final, pede a aplicação das sanções penais aosacusados, imputados na formação de quadrilha e cometimento, em co-autoria, em concursomaterial do crime de furto qualificado, bem como a extinção da punibilidade aos denunciadosem delitos cujas penas não excedam a um (1) ano, consoante os arts. 161, II, 163, parágrafoúnico, III, 166 e 288, do Código Penal, porque, lamentavelmente, prescreveram (fls. 622/623 -3º vol.).

As defesas apresentaram suas alegações finais às fls. 628/629, 641/645,649/650, 654/655, 656/657, 660, 661/662 e 668/669 - 3º vol.).

Foram acostados aos autos os antecedentes criminais dos acusadosatestando suas primariedades (fls. 573, 574, 576, 578, 596, 598, 599, 607, 669v e 670), comexceção do acusado Manoel Alves da Silva que, conforme certidões de fls. 598 e 599, contraele já houvera condenações anteriores, por ter infringido o art. 2º da Lei n. 1521/51, e art. 171,§ 2º, VI, c/c o art. 51, do CP, embora esta última tenha sido alcançada pela prescrição.

É o relatório.

Assim relatados, decido.

Consta dos autos que os réus, associados num concursus delinquentiun,praticaram um concursus delictorum, conforme denunciados na peça exordial da acusação.

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O caso tratado nos autos cuida de concurso material heterogênio. Em face da teoria unitáriaou monística abraçada pelo Código Penal, todos os denunciados, de um modo ou de outro,concorreram para os fatos delituosos apontados na denúncia, consoante a regra do art. 13,caput, do CP, ou seja, a parcela de infração de cada denunciado, ainda que fragmentada,relacionada ao evento criminoso, tal como ocorreu, foi toda ela igualmente necessária para oresultado, mesmo que qualquer uma, sem o auxílio das outras, não tivesse sido suficiente, oque se denomina condição sine qua non ao resultado.

Na realidade, como foi postulado nas alegações finais do Ministério PúblicoFederal, os crimes de esbulho possessório, dano qualificado, alteração de local especialmenteprotegido, de incitação ao crime e de quadrilha ou bando, atribuídos aos acusados, estãoirremediavelmente prescritos, posto que entre o recebimento da denúncia ocorrido em 17 demarço de 1987 (fls. 235/236 - 2º vol.), até a presente data, já decorreram mais de nove (9)anos, e para o delito mais grave dos acima mencionados, ou seja, o do art. 288 do CP, cujapena é de 1 a 3 anos de reclusão, o prazo de prescrição está enquadrado na regra do art. 109,IV, do Código Penal, isto é, em oito (8) anos.

Nessa ordem de consideração, decreto a prescrição dos crimes acimaelencados e imputados aos acusados.

Resta, ainda, incólume e em concurso formal, o delito do art. 155, § 4º,inciso IV, do Código Penal (furto qualificado), em que os denunciados, em concurso, subtraírammadeira da Estação Ecológica de Mamanguape, pertencente à União, criada pela Lei n.7.169, de 14 de dezembro de 1983. A autoria e a materialidade do furto é indisputável.

Os elementos de prova que emergem, tanto do inquérito policial quantoda instrução processual, induz este julgador à convicção de que os acusados se enredaraminexoravelmente na senda do crime de furto qualificado. A prova testemunhal arrolada por elesé frágil e inconcludente. Não tem mesmo o condão de afastar o juízo de desvalor que recaisobre a conduta típica, antijurídica e a culpabilidade como elemento de ligação entre o crimee a pena.

Por primeiro, essa cantilena de que não sabiam os réus que a MataAtlântica, onde está implantada a Estação Ecológica, é área de preservação ambiental, nãoencontra eco nos ouvidos e entendimento deste julgador.

A duas, igualmente não convence a este magistrado a alegação de queos acusados são pessoas de poucas letras ou analfabetos. Contra eles milita o fato de seremresidentes nos municípios de Rio Tinto e Mamanguape, onde está encravada a EstaçãoEcológica e urbi et orbi, isto é, por toda parte, é do conhecimento que dita área é depreservação ambiental.

A três, não há, pois, como este julgador enquadrar os acusados na regrado art. 21, do CP, que trata do erro sobre a ilicitude do fato, mais conhecido como erro deproibição. Somente é concebível o reconhecimento de tal erro, quando o agente se equivocasobre a injuridicidade de sua conduta, não podendo, portanto, socorrer-se de erro de proibiçãoquem tem pleno conhecimento de que atua ilicitamente, como é o caso narrado na denúncia,em que os acusados subtraíram a madeira da área de preservação ambiental, cônscios dasua ilicitude.

A quatro, o acusado João Germano da Silva, fundador da Associação deProteção em Amparo ao Trabalhador Rural de Mamanguape (APRATA), foi o mentor intelectuale também executor dos ilícitos penais. Além do mais, é funcionário público estadual do

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Colégio Senador Ruy Carneiro e, também, conhecido como vigia responsável pela matapertencente ao SENA, razão pela qual teria sobejos motivos para não violar a lei penal, mas,ao contrário, incitou os demais co-autores à prática dos ilícitos penais, culminando com asubtração de madeira de diversas espécies da área de preservação ambiental; os demaisacusados, todos imbuídos do mesmo propósito, promoveram o furto da madeira da reservaecológica, como dá conta o termo de apreensão de fls.

A cinco, o denunciado José do Carmo da Silva, depois da derrubada dasárvores, contratou um caminhoneiro para transportar a madeira para ser vendida em CampinaGrande. Residente em Rio Tinto, comercializa madeira. Não há como aceitar-se as alegaçõesde que não sabia de que a madeira que subtraíra, juntamente com os demais acusados, erade propriedade da União.

O acusado Manoel Antônio da Silva, conhecido por Manoel Santana,proprietário do caminhão placa AL 4730/PB, foi flagrado quando o seu veículo ia ser carregadocom madeira furtada, para ser vendida.

Os demais acusados, de uma forma ou de outra, contribuíram para oevento criminoso ainda não prescrito, ou seja, o crime de furto qualificado.

O concurso formal de agentes na consumação do crime de furto qualificadoestá amplamente comprovado, ante a participação criminosa com a presença in loco dosconcorrentes, ou seja, ante a cooperação deles na fase executiva do crime e, também, aconsciente combinação de vontades na ação conjunta.

CONCLUSÃO

Do concurso material de crimes, inicialmente perpetrados pelos acusados,restou incólume, apenas, em concurso formal, ante a ocorrência de prescrição dos crimesretro mencionados, o delito do art. 155, § 4º, inciso IV, do Código Penal (furto qualificado),razão pela qual hei por bem de condenar, como condenado tenho, os acusados nas seguintespenas:

Ao denunciado JOÃO GERMANO DA SILVA, já qualificados nos autos,aplico-lhe a pena de dois (2) anos de reclusão. Atendendo aos fatores indicados pela regra doart. 59, do CP, os episódios da vida pregressa do réu, os motivos e metas do réu, incitandopublicamente a invasão da área preservada e invadindo-a com a posterior subtração de madeirada Estação Ecológica, sendo ele acusado funcionário público, demonstram o seu grau decontrariedade ao dever de atuar conforme o Direito, carece de exacerbação da pena, razãopela qual, sopesando os elementos fornecidos pelos autos e dando prevalência àsconseqüências graves de sua conduta, majoro a pena-base de dois (2) anos em mais 1/3 (umterço), ou seja, mais quatro (4) meses, perfazendo o total de dois (2) anos e quatro (4) mesesde reclusão.

Com referência aos acusados JOSÉ DO CARMO DA SILVA, MANOELANTÔNIO DA SILVA, SEVERINO BERNARDO PEREIRA, OTÁVIO PEREIRA DA SILVA,EDMILSON PINTO DA SILVA, JOÃO GOMES DA SILVA, MANOEL ALVES DA SILVA, LUIZFRANCISCO DO CARMO E FRANCISCO PEQUENO DANTAS, condeno-os como incursosnas penas do art. 155, § 4º, inciso IV, (furto qualificado) do Código Penal, pelo que lhes aplicoa pena mínima cominada prevista nesse artigo, isto é, dois (2) anos de reclusão, a qual torno-a definitiva, à míngua de circunstâncias agravantes ou causas especiais de aumento oudiminuição, na consideração de que todos os condenados reúnem os elementos mencionadosno elenco do art. 59 do Código Penal.

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Condeno todos, ainda, à pena pecuniária, sendo que o réu JOÃOGERMANO DA SILVA, em quinze (15) dias-multa; e os demais réus em dez (10) dias-multa,à razão de 1/30 (um trigésimo) o dia-multa, do salário mínimo vigente à época do fato criminoso.

O regime inicial do cumprimento da pena ora imposta é o aberto e serácumprida na PENITENCIÁRIA MÉDIA DE MANGABEIRA, nesta Capital.

Com exceção do acusado JOÃO GERMANO DA SILVA, concedo a todosos demais condenados a suspensão condicional da pena pelo prazo de dois (2) anos,posto que presentes as condições do art. 77 do CP, desde que para tanto aceitem as seguintescondições:

a) não se ausentarem os réus do seu domicílio por mais de trinta (30)dias, salvo autorização judicial;

b) não freqüentarem ambientes propícios à prática de novas infrações;

c) tomarem ocupação digna, em prazo razoável;

d) apresentarem-se mensalmente e obrigatoriamente ao juízo dasExecuções Criminais, para informar ou justificar suas atividades.

Ao trânsito em julgado desta sentença, lancem-se os nomes doscondenados no livro Rol dos Culpados, podendo, entretanto, os sentenciados recorrerem emliberdade (art. 594 do CPP).

À presente condenação junte-se, ainda, a concernente à obrigação depagar as custas do processo.

P. R. I.

João Pessoa, 31 de agosto de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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IMPORTAÇÃO DE MERCADORIA ESTRANGEIRAAUSÊNCIA DOCUMENTAÇÃO FISCAL

Processo nº 94.5619-2 / AÇÃO PENALAutor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALRé: MARINETE MORAES COELHO

DECISÃO

EMENTA:SUSPENSÃO DO PROCESSO INICIADO ANTES DAVIGENCIA DA LEI 9.099/95 - ATUAÇÃO DO JUIZ NA APLICAÇÃO DALEI - PRINCÍPIO DA NOVATIO LEGIS IN MELLIUS.

Vistos etc...

MARINETE MORAES COELHO, já qualificada nos autos, foi denunciadapelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL como incursa no art. 334, § 1º, alínea “d”, do CódigoPenal, por importar mercadoria estrangeira, proveniente do Paraguai, sem a devidadocumentação fiscal.

Recebida a denúncia em 13.05.94, a ré foi citada e interrogada às fls. 35,apresentando a defesa prévia no tríduo legal, por advogado legalmente constituído.

Foram ouvidas as testemunhas de acusação - fls. 79 e 80, bem como asde defesa - fls. 85 e 86.

Nas alegações finais - fls. 89/90 - o ilustre representante do parquetrequereu a condenação da acusada; enquanto esta, por seu advogado, a improcedência dadenúncia, tendo em vista que a ré praticou o delito movida pelo estado de necessidade, bemcomo afirmou não estar reincidindo na prática do descaminho - fls. 93/94.

Foram acostados aos autos os antecedentes criminais da acusada,atestando sua primariedade - fls. 99, 100 e 102.

Vieram-me os autos conclusos para sentença.

Com efeito, a ré foi incursa no art. 334, § 1º, “d”, do Código Penal, cujapena varia de um a quatro anos de reclusão. Verifica-se, assim, que, com o advento da Lei9.099/95, a ré poderá ser beneficiada com o sursis processual, na forma prevista no art. 89,tendo como parâmetro o mínimo da pena cominada ao crime, isto é, um ano de reclusão,bem como por não estar respondendo a outro processo.

É corrente entre os doutrinadores pátrios, que o art. 89, da Lei 9.099/95,tem aplicação imediata, mesmo aos processos cuja instrução já tenha sido iniciada, contrariandoo disposto no art. 90 da mesma Lei.

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252 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

Assim é o entendimento de Damásio de Jesus, entre outros, o qual, emseus brilhantes comentários à Lei 9.099/95, considera o art. 90 inconstitucional, invocando oprincípio da retroatividade incondicional da lei nova (CF, art. 5º, XL, CP, art. 2º, parágrafoúnico) - na obra Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada, Saraiva, 3ª ed. Ver. E amp.,1996, p. 126).

E, arrematando, o Juiz Eustáquio Nunes Silveira, do TRF da 1ª Região eprofessor de Direito Processual da AEUDF, também segue esse raciocínio, limitando, apenas,a aplicação do art. 89 ao trânsito em julgado da sentença, isto é, mesmo que o processo seencontre com sentença, porém sem trânsito em julgado, “deve-se abrir ao acusado aoportunidade de se manifestar sobre a proposta de suspensão condicional, já que esta poderáresultar na extinção da punibilidade” - na Cartilha Jurídica n. 37, Aplicação da Lei 9.099/95 naJustiça Federal.

Por outro lado, a Comissão Nacional de Interpretação da Lei 9.099/95,composta pelo Min. Sávio de Figueiredo Teixeira - Presidente - e outros, chegou à conclusãode que “Se o Ministério Público não oferecer proposta de transação penal ou de suspensãocondicional do processo nos termos dos arts. 79 e 89, poderá o Juiz fazê-lo.” (Conclusão 13ª,apud Doorgal Gustavo B. de Andrada, na obra A suspensão Condicional do Processo Penalnos Tribunais, Juizados Especiais Criminais e nas Justiças Comuns e Especializadas, DelRey, 1996, Belo Horizonte, p. 148).

Pois bem, esse é o entendimento que acompanho. Não se pode deixarde aplicar o princípio da isonomia, da presunção da inocência e da retroatividade dalei mais benéfica, consagrados na Carta Magna (art. 5º, caput, e incisos XL e LVII), fazendodistinção entre réus que respondam ou não a processos em andamento. Portanto, estando aré Marinete Moraes Coelho a preencher as condições exigidas na Lei, converto o julgamentoem diligência, para aplicar a suspensão do processo, na forma do art. 89, da Lei 9.099/95,pelo prazo de dois (2) anos, sob as seguintes condições:

a) proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização dojuiz;

b) comparecer mensalmente em juízo, para informar e justificar suasatividades.

Designe a Secretaria dia e hora para a audiência, onde a acusada,acompanhada de seu defensor, terá oportunidade de dizer se aceita ou não a proposta desuspensão do processo, mediante as imposições legais.

Intimações necessárias.

João Pessoa, 25 de setembro de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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CIRCULAÇÃO MOEDA FALSA

Processo Nº 96.03177-0 / AÇÃO PENALAutor: O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALRéu: YANIV BRONSHTEIN

SENTENÇA

EMENTA: Ação Penal. Circulação de moeda falsa. Dolo. Autoria ematerialidade comprovadas. Procedência.

Estando o agente ciente de que a moeda que está em seu poder é falsae, nessa condição, adquiri-a, importa-a, guarda-a ou a introduz nacirculação, incorre nas sanções do art. 289, § 1º, do Código Penal.

Praticando quaisquer das ações previstas no § 1º, do art. 289, do CP, oagente consuma o crime de circulação de moeda falsa.

— Procedência da denúncia.

Vistos etc.

YANIV BRONSHTEIN, já qualificado nos autos, foi denunciado pelorepresentante do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL como incurso nas penas do art. 289, §1º, do Código Penal, pelos seguintes fatos delituosos:

Consta da peça acusatória que o acusado foi preso em flagrante delito,pela Polícia Federal, no dia 20/3/1996, nesta Capital, tentando trocar US$ 2.000,00 (dois mildólares) por seu equivalente da moeda nacional (Real) na agência 1817 do Banco do Brasil S/A.

Após a sua prisão, o acusado revelou a existência de mais US$ 97.000,00(noventa e sete mil dólares) em moeda falsa. Sendo que US$ 60.000,00 foram encontradosno fundo falso de uma mala de viagem pertencente ao réu, e US$ 37.000,00 numa churrasqueiraexistente no quintal da residência de seu amigo Daniele Bacolla, em Natal - RN.

Pelas provas constantes dos autos do inquérito policial, o Ministério Públicoconcluiu que o réu ingressara no País, com US$ 100.000,00 (cem mil dólares) falsos, osquais foram adquiridos em Israel pela importância de US$ 35.000,00 (trinta e cinco mil dólares),com a finalidade de introduzi-los no ambiente de circulação nacional, tendo, inclusive, jáefetuado a troca de US$ 1.000,00 (mil dólares) em Natal - RN: US$ 500,00 numa agência doBanco do Brasil S/A e US$ 500,00 num Shopping Center, ambos naquela Capital.

Entendendo caber a hipótese do art. 312, do CPP, em vista da garantia daordem pública (a possível circulação de novas moedas falsas), por conveniência da instruçãocriminal (assegurar a integridade de testemunha) e para assegurar a aplicação da lei (por se

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254 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

tratar o réu de pessoa estrangeira, sem profissão nem residência definida em nosso País), oParquet requereu a prisão preventiva do denunciado.

Concomitantemente ao oferecimento da denúncia, em 10/04/1996, emautos apartados, apensos, o acusado, por seu advogado, requereu o relaxamento da prisãoem flagrante, sob a alegação de constrangimento ilegal, em razão do lapso de tempo entre asua prisão e o oferecimento da denúncia. Analisando as alegações do réu, este juiz concluiupela sua improcedência, posto que os prazos legais foram rigorosamente cumpridos.

Recebida a denúncia (fls. 79), de imediato foi deferido o pedido do órgãoMinisterial, no sentido de ser decretada a prisão preventiva do acusado, com a recomendaçãode que fosse mantido na Penitenciária Modelo do Róger, nesta Capital, onde já se encontrava,por conta da prisão em flagrante.

Citado, o réu foi interrogado às fls. 90 usque 94, nas presenças de seuDefensor Dr. Roberto Costa de Luna Freire e do intérprete que o assistiu no interrogatóriopolicial, o Sr. Fernando Pereira da Silva. Em seu depoimento, confessou a posse dos dólares,porém alegou desconhecer a sua falsidade.

No tríduo legal, seu defensor constituído apresentou a defesa prévia (fls.96/101), alegando nulidades processuais, requerendo a improcedência da denúnica e arrolandotestemunhas residentes em Israel. Verificada a inexistência das nulidades argüidas, foidesignada audiência para oitiva das testemunhas arroladas pelo Ministério Público Federal,inclusive determinada a expedição de precatória para ouvir a testemunha Daniele Bacolla, emNatal - RN (fls. 103/105).

Depoimento das 4 (quatro) testemunhas da acusação, às fls. 113/119 e171/172.

No termo de audiência de fls. 120, foi deferida a colheita da provatestemunhal requerida pelo réu, através de carta rogatória, facultando às partes formularemquesitos, a serem traduzidos para as línguas inglesa e hebraica.

Petição de renúncia ao cargo de tradutor de hebraico, formulado pelointérprete Fernando Pereira da Silva, às fls. 145. Por esse motivo, foi determinada a traduçãodos quesitos apenas na língua inglesa. No mesmo despacho (fls. 182), também foi determinadaa intimação do advogado do réu, para depositar em juízo os honorários do tradutor juramentado,fixados em R$ 350,00, no prazo de 48 horas.

A pedido do réu (fls. 175), sob os argumentos de que estaria na iminênciade sofrer violência física na Penitenciária do Róger, deferi o requerimento de transferênciapara o cárcere da Polícia Federal. Porém, o Superintendente Regional da Polícia Federal, emexercício, comunicou a este juízo sobre a impossibilidade de manter o réu sob sua custódia,por falta de dotação orçamentária para sua manutenção. Com vista dos autos (fls. 185), orepresentante do Ministério Público formulou quesitos para serem respondidos pelo Diretordo Presídio do Róger, nesta Capital, sobre as condições carcerárias, reservando-se a umpronunciamento sobre a transferência do réu, após a manifestação do seu patrono. Este, porsua vez, nesse sentido, nada requereu. O réu permaneceu naquela Penitenciária.

Decorrido o prazo assinado ao réu, para depositar os honorários do tradutor,sem que o fizesse nem justificasse a sua impossibilidade, em despacho fundamentado (fls.193/194), indeferi a produção da prova testemunhal requerida pelo acusado, em face do seudesinteresse em colaborar com a Justiça, quanto ao envio da carta rogatória, até por que as

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 255

perguntas formuladas pelo acusado às testemunhas que seriam ouvidas em Israel, nadatraria de substancial ao desenlace da questão.

Às fls. 196/197, em data de 11/09/1996, habilita-se novo causídico emdefesa do réu, o bel. Amaury Guimarães Monteiro. Ato contínuo (fls. 198), peticiona paraconcordar com o despacho que indeferiu a oitiva de suas testemunhas e para informar queestava à espera das Razões Finais.

Paralelamente, o bel. Roberto Costa de Luna Freire ingressa perante oEgrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, com pedido de habeas corpus, em favor doacusado Yaniv Bronshtein, argüindo irregularidades processuais e irresignação peloindeferimento da oitiva das testemunhas de defesa (cópia às fls. 203/212). O Egrégio TRF,porém, denegou a ordem, à unanimidade (fls. 233).

Nada foi requerido no prazo do art. 499 do CPP.

Consta dos autos, fls. 220/225, informações sobre o relatório da sindicânciapara apurar a fuga frustrada do acusado, do Presídio do Róger. Em face de seu comportamento,Yaniv Bronshtein foi transferido para a Penitenciária de Segurança Máxima de Mangabeira,nesta Capital.

Foi acostada aos autos (fls. 235) uma carta dirigida a este juiz, dandoconta de possíveis maus tratos infligidos ao réu Yaniv, na Penitenciária de Mangabeira. Comvista dos autos, o representante do órgão Ministerial requereu fosse o réu submetido a examede corpo de delito e, ao mesmo tempo, fosse transferido para a Superintendência de PolíciaFederal. Simultaneamente, seu defensor, o bel. Amaury Guimarães Monteiro, requereu nomesmo sentido (fls. 240/241).

Determinada a apresentação do réu em Juízo, este prestou depoimentoàs fls. 246/248, afirmando ter sofrido diversos tipos de violência. Em seguida, foi determinadoo exame de corpo de delito e exame médico, para detectar o seu estado de saúde e possívelinternamento hospitalar, bem como oficiado ao Juiz das Execuções Criminais da Capital,comunicando a transferência de Yaniv para Presídio do Róger, onde inicialmente estavarecolhido.

Finalmente, no prazo para as razões finais, o Ministério Público Federal(fls. 256/260), requereu a procedência da denúncia. Para reforçar a pretensão, salientou ocomportamento típico do crime de moeda falsa atribuído ao réu, quando este adquiriu, importou,introduziu em circulação e trocou os dólares falsos, fatos estes corroborados pelos depoimentostestemunhais. Em tese, admitiu a tentativa do crime (art. 14, II, c/c o seu parágrafo único),mas, em face das diversas condutas criminosas consumadas imputadas ao acusado, entendeunão ser cabível na hipótese dos autos.

Por sua vez, a defesa em suas razões finais (fls. 262/269), amparou-sena tese da boa fé, alegando que o réu desconhecia a falsidade da moeda que estava em seupoder, daí por que requerida a sua absolvição. No caso do não acolhimento dessa pretensão,fosse-lhe reduzida a pena, nos termos do art. 14, II, do CPP, em seu grau máximo.

Antecedentes criminais acostados às fls. 157/158, dando notícia de queo réu está sendo procurado em Israel por receptação de objetos roubados, arrombamento deveículo, posse e uso de drogas, posse de utensílio para preparar drogas, usar veículo sempermissão, dirigir sem habilitação, roubo de veículo, e com antecedentes de roubo de cartãode crédito, agressão, lesões corporais, estelionato, entre outros crimes.

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É o relatório, no essencial.

Decido.

Trata-se o presente caso de crime contra a fé pública, tipificado no §1º,do art. 289 do Código Penal. O objeto material é a moeda metálica ou papel-moeda decurso legal neste ou noutro país, fabricada ou alterada para que pareça verdadeira.

O tipo subjetivo consiste “na vontade livre e consciente de praticar asações alternativamente previstas” (Celso Delmanto), bastando o “conhecimento por parte dointrodutor ou passador de que a moeda é falsa”, ou seja, pune-se quem importa a moedafalsa, ou obtém-na para si, ou vende, ou troca, ou cede, ou empresta, ou guarda, ou a introduzna circulação. Consumando-se o delito, com a prática de qualquer dessas ações.

Pois bem. Conforme tudo melhor consta dos autos, o acusado YanivBronshtein, ingressou em nosso país, oriundo de Tel-Aviv, Israel, conduzindo US$ 100.000,00(cem mil dólares) falsos, com a intenção de pô-los em circulação no comércio nacional.Embora tenha negado o conhecimento de que os dólares eram falso, a sua atitude comrelação à guarda do dinheiro e os depoimentos testemunhais, desmentem suas afirmações.

Observa-se que o acusado, quando intentou visitar o Brasil, portando osUS$ 100.000,00, procurou a via mais obscura para resguardar o seu patrimônio. Para isso,confeccionou um fundo falso na sua mala de viagem, onde ninguém poderia imaginar estivesseo dinheiro, ficando a salvo, não dos assaltantes, como quer justificar o réu, mas da fiscalizaçãopolicial. Qualquer cidadão que pretendesse proteger vultosa quantia, certamente agiria deforma mais civilizada, ou seja, procuraria os meios legais de transferência de dinheiro, tãoacessíveis hoje em dia.

A conduta do réu não se coaduna com a de alguém que pretende seconduzir licitamente. Tanto é assim que logo ao chegar na cidade de Natal - RN, na residênciade seu amigo Daniele Bacolla, escondeu US$ 37.000,00 no quintal da casa. Mais umaevidência de sua conduta reprovável.

Em seu depoimento, Yaniv afirma que, no momento em que adquirira osdólares, procedera ao exame através de caneta e máquina especializada (fls. 93), constatandoa sua autenticidade. Entretanto, entre aquele momento e a sua prisão em flagrante, pareceque ocorreu uma mágica, onde todos os dólares que estava em seu poder se transformaramem dinheiro falso, conforme ficou atestado (laudo de fls. 54/57). Contudo, como o réu não émágico, e as mágicas são ilusões, a realidade é que os dólares introduzidos no país peloacusado sempre foram falsos, e este conhecia perfeitamente as conseqüências da sua condutailícita. Desde o momento em que adquiriu os dólares, observa-se a conduta temerosa doacusado. Refoge ao mais elementar raciocínio seja normal a forma de aquisição dos dólaresescolhida pelo réu; levanta suspeita alguém que por US$ 35.000,00 obtém outros US$100.000,00. Ainda mais se o faz no “meio-da-rua”, tendo como vendedora uma pessoacompletamente desconhecida do acusado — e este não é pessoa ingênua, propensa a cairno “conto dos dólares”. Isso é o que constata o seu depoimento (fls. 93):

“que os dólares apreendidos pela polícia foram comprados em Tel-Aviv, narua Alembi; que essa rua é onde se trocam os dólares; que adquiriu osdólares por trezentos mil ‘chekeles’, moeda corrente em Israel; que nadata da aquisição dos dólares por ele trazido, cada dólar valia três‘chekeles’; que ele interrogado ao adquirir os dólares, examinou atravésde caneta e máquina especializada a autenticidade dos dólares, econstatou serem verdadeiros; que em Israel, o Banco só vende três mildólares, não sabendo a razão desse limite; que conhece apenas de vista

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 257

a pessoa de quem adquiriu os cem mil dólares;” (sic)

A alegação do réu de que agira de boa-fé, não pode ser acolhida. O quese depreende dos autos é a sua confiança na qualidade da falsificação, crente de que chegariaa enganar até as instituições oficiais. O laudo realizado pelo Instituto de Criminalista (fls. 54/57), conclui que “esse tipo de contrafação pode ser considerado de boa qualidade,capaz de iludir um cidadão comum do povo...” “a sua aceitação como legítima,..., vaidepender dele estar afeito ao manuseio de papel-moeda desse valor”.

A testemunha Edite Mororó França, bancária, que atendeu o acusadoquando este tentava trocar o dinheiro falso numa agência do Banco do Brasil S/A, nestaCapital, às fls. 115, corrobora a qualidade da falsificação atestada pelos peritos:

“que as notas que lhe foram apresentadas eram capazes de iludir umhomem comum do povo, e numa escala de perfeição de um a dez, elaocuparia o sétimo lugar, isto é, na ordem crescente de perfeição; que asnotas que lhe foram apresentadas eram de falsificação boa;”

O que se destaca do universo dos autos, na verdade, é o dolo do acusado.Ele próprio confessou ter fabricado o fundo falso da mala, com a intenção de ocultar osdólares falsos. E não se limitou a isso. Para que não fosse descoberto o seu crime, envolveutodas as cédulas em papel-carbono, a fim de que o material escondido não fosse detectadopelo Raio X, burlando desse modo a fiscalização dos aeroportos. Pelo menos isso é o queestá dito por ele mesmo e pelas testemunhas arroladas pela acusação.

Afirmações do acusado, fls. 93:

“que foi ele interrogado quem confeccionou o próprio fundo falsoda mala, onde se encontravam os dólares apreendidos pela políciafederal; que fez o fundo falso na mala para trazer seus dólares emsegurança;”Depoimento da testemunha Luiz Carlos Pereira Gomes, agente dapolícia federal, fls. 117:

“que apalpando a mala, notou muito escondido um volume erasgando o material do fundo da mala, lá foram encontradossessenta mil dólares em cédulas de cem dólares; que ele depoenteindagou do acusado se aquelas notas eram falsas e se o acusadotinha conhecimento dessa falsidade, tendo o acusado respondidoafirmativamente, mas que os escondera para evitar umafiscalização ou ser roubado;”Depoimento da testemunha Ricardo de Sousa Lima, agente de políciafederal, fls. 119:

“que se lembra que os dois mil dólares que lhe foram entreguespelo gerente do Banco do Brasil nesta, apresentavam-seamassados, como já manuseados pelo acusado, enquanto ossessenta mil dólares encontrados no fundo da mala estavamenvoltos em papel-carbono, em pacotes de dez mil dólares,apresentando-se como notas novas, não manuseadas;” e às fls. 119:“que, segundo o próprio acusado, as notas apreendidas em Natal,e envoltas em papel-carbono, serviria para evitar a detectação doRaio “X” nos aeroportos;”

Yaniv não se contentou apenas em ocultar os dólares na mala. Abusando

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de sua amizade com o italiano Daniele Baccola, não soube dignificar a hospitalidade que lhefoi oferecida. Pelo contrário, sem a autorização do amigo, escondeu US$ 37.000,00 falsosnuma churrasqueira localizada no quintal da casa onde estava hospedado. Chegou a mentirpara o amigo sobre a verdadeira quantia que estava em seu poder (depoimento de fls. 36).Pergunta-se: se Yaniv Bronshtein acreditava na autenticidade dos dólares, por que nãoconsultou a seu amigo Daniele Baccola sobre o procedimento correto para trocá-los pelanossa moeda nacional? Ou, pelo menos, indagar ao amigo sobre a maneira mais segura deguardá-los? Se assim, ou de outra forma mais coerente, não agiu, certamente estava a esconderum crime.

Como se não bastasse tudo isso, o réu consumou o seu intento,introduzindo dólares falsos em circulação. Consta dos autos que Yaniv trocou US$ 500,00falsos numa agência do Banco do Brasil S/A, na cidade de Natal - RN (fls. 127/128), confessadopor ele mesmo (fls. 93), in verbis:

“que somente trocou dólares no Banco do Brasil, em Natal - RN, no valorde quinhentos mil dólares, e também mais quinhentos mil dólares numacasa de Câmbio do Shopping Center em Natal, e que tentou trocar maisdois mil dólares no Banco do Brasil, nesta Capital;”

(sic. Onde se lê “quinhentos mil dólares”, leia-se quinhentos dólares).

Destarte, provada a autoria e materialidade, verifica-se que Yaniv Bronshteinincidiu em todos os tipos subjetivos previstos no § 1º, do art. 289, do Código Penal. Comobem salientou o ilustre representante do Parquet:

“Do relato da peça acusatória, o que se dessume é que o Acusado estariaimbuído de promover um verdadeiro derrame de dinheiro falsificado emnosso País, a começar quando fez a importação, à sorrelfa, passandodespercebido pelas barreiras alfandegárias e monetárias, de falsos US$100.000,00 (cem mil dólares americanos) que teria adquirido em sua terranatal - Israel -, tendo, logo após a sua chegada, já na cidade que escolherapara sua estada - Natal/RN -, acentuado o seu périplo delituoso, a julgarde sua firme disposição de introduzir moeda ilusória em circulaçãonacional, primeiro, quando passara US$ 500,00 (quinhentos dólares) emum Shopping Center, ali estabelecido, e, segundo, quando trocara maisUS$ 500,00 (quinhentos dólares) em uma agência do Banco do Brasil,naquela mesma cidade potiguar.” Fls. 256. Tudo constatado nos autos.

Por outro lado, não pode prosperar, in casu, a tese ventilada pelo acusado,em suas razões finais. A tentativa, embora admitida em crimes dessa espécie, foi afastada,à vista das provas trazidas aos autos. À efetiva prática de quaisquer das ações previstas no §1º, do art. 289, do Código Penal, consuma-se o crime de circulação de moeda falsa. E comoficou demonstrado e provado, o réu incidiu em quase todas elas.

Finalmente, some-se, ainda, a tudo isso, o caráter tendencioso ao crime,atribuído ao réu, que se depreende das informações constantes do processo. Às fls. 157,consta uma informação da INTERPOL/ISRAEL, dando notícia de que Yaniv Bronhstein éprocurado naquele País por receptação de objetos roubados, arrombamento de veículos,posse e uso de drogas, posse de utensílio para preparo de drogas, entre outros crimes, eainda tem como antecedentes os crimes de roubo de cartão de crédito, agressão, lesõescorporais, posse de drogas para distribuição, estelionato, falsificação de placas de automóvel,entre outros. E aumentado o seu curriculum, além desta ação penal, o réu já tentou evadir-se duas vezes dos presídios onde está recolhido, à espera do julgamento, sendo o seu

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comportamento considerado agressivo pelas autoridades responsáveis por sua custódia (videfls. 221/222 e 224/225).

Isto posto, atendendo ao mais que dos autos consta, julgo procedente adenúncia e, conseqüentemente, em face da culpabilidade do agente, revelada pelapremeditação da ação criminosa; da sua primariedade, embora de caráter habituado ao crime;dos motivos reprováveis de sua conduta, que repercutiria na orbe financeira, caso levasse àcabo a totalidade de seu intento, ou seja, introduzir os US$ 100.000,00 (cem mil dólares) emcirculação; do pouco dano efetivamente causado à coletividade, fixo a pena - base em 4(quatro anos) de reclusão, e 30 (trinta) dias - multa, à razão de um trigésimo do saláriomínimo vigente à época do fato, que, à falta de circunstâncias atenuantes e agravantes, e decausas de aumento ou de diminuição da pena, torno-a definitiva. Condeno, ainda, o réu, nopagamento das custas processuais.

Tendo em vista que o réu não tem residência fixa neste País e a sua pré- disposição para escapar do cumprimento da pena, estabeleço o regime fechado, para oinício da execução penal, que será cumprida no Presídio Regional do Róger, nesta Capital.

Oficie-se ao Diretor daquela Penitenciária, dos termos desta sentença,recomendando-se o réu no lugar em que se encontra.

Após o trânsito em julgado, lance-se o nome do réu no Rol dos Culpados.

P.R.I.

João Pessoa, 13 de dezembro de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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DIFAMAÇÃO - LEI IMPRENSA

Processo nº 96.06292-7 - REPRESENTAÇÃOAutor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALRéu: MARCOS DOS ANJOS PIRES BEZERRA

SENTENÇA

Vistos etc...

Cuida-se de representação ofertada pelo Procurador Geral da Câmarados Deputados, o Deputado BONIFÁCIO DE ANDRADA, alegando em síntese que:

O jornalista MARCOS PIRES ofendeu a reputação da Câmara dosDeputados, em matéria publicada pelo jornal “0 NORTE”, nesta capital, estando portantoincurso no art. 21 da Lei de Imprensa, trazendo na íntegra o texto mencionado.

O representante do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, o eminente Dr.LUCIANO MARIZ MAIA, requereu o arquivamento da referida representação, por não secaracterizar crime contra a honra, em respeito à liberdade de expressão, críticas irrogadasem situação de defesa de interesses sociais, pois a liberdade de expressão do advogado nãodeve ser garantida tão somente quando passar informações ou idéias que sejam favoráveis ourecebidas como inofensivas, como também as que ofenderem, provocarem o Estado ouqualquer setor da população.

Sustenta ainda o representante do parquet que os limites das críticassão aceitáveis, quando concernentes a homens públicos.

É o relatório. Decido.

É sabido que, para se caracterizar a difamação, mister se faz que o atoatente meramente à reputação, contudo, in casu, deve-se notar a natureza, o cunho de talafirmação.

Percebe-se de forma clara e cristalina, o direito à liberdade de expressão,tida como garantia constitucional, art. 5º, IV da CF inerente a todos os cidadãos e principalmenteao advogado, que por sua vez atua com a retórica, escrita ou falada, utilizando o dom daoratória.

Não há como esse magistrado se furtar à promoção do Ministério PúblicoFederal, haja vista que, o texto em discussão, deixa transparecer sem sombra de dúvida,apenas uma análise, uma crônica a situação política brasileira, característica do Estadodemocrático de direito, e não um crime contra a honra. Devemos, pois, como cidadãos eprincipalmente como eleitores outorgantes de mandato eletivo, fiscalizar de forma democrática

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e legal a atuação dos nossos representantes.

Isto posto, fundamentado no art. 28, primeira parte, acolho a promoçãoMinisterial, para deteminar o seu arquivamento.

Dê-se baixa na distribuição e arquivem-se os autos.

P. R. I.

João Pessoa, 30 de agosto de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz Federal da 3ª Vara

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262 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

ESTELIONATO

Processo Nº. 91.02176-8 / AÇÃO CRIMINALAutor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALRéu: J.C.C. e OUTROS

SENTENÇA

Vistos etc.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por seu representante legal, ofereceuDENÚNCIA (fls. 03/11), recebida em 18/maio/1991, baseada em IPL (fls. 14/166) iniciado porPortaria (fls. 14), contra J.C.C., T.G.A., P.F.C., F.A.C., E.B.F., A.M.L., M.S.L., V.F.B. e G.M.P.,todos devidamente qualificados, por alegada prática de estelionato qualificado, de formacontinuada e em co-autoria.

2. Fundamentou o pedido nos arts. 29, 71 e 171, § 3º, todos do CódigoPenal Brasileiro.

3. Da denúncia referida, consta textualmente o seguinte:

“(...) 1) Apurou-se, nos inquéritos administrativo e policial, que os acusadosJ.C.C., T.G.A., P.F.C. e F.A.C. eram servidores do extinto INPS, hojeInstituto Nacional de Seguros Sociais (INSS). Trabalhavam como médicos,no Grupamento Médico-Pericial de Patos/PB.

2) Já os denunciados A.M.L., M.S.L., G.M.P., V.F.B. e EBF. trabalhavam,também, para o mencionado órgão previdenciário, como médicos peritoscredenciados.

3) Os réus procediam aos exames de saúde, nos segurados da previdênciasocial da região, para fins de concessão de benefícios, quandoconstatadas suas incapacidades laboriosas.

4) Surgiram denúncias sobre fraudes nas concessões das aposentadoriaspor invalidez dos trabalhadores rurais, residentes nos Municípios de Jurú,Catingueira, Condado, Tavares, Desterro de Malta, Várzea, Água Branca,Imaculada, São José do Sabugi, Teixeira, Passagem, São José do Bonfim,São José de Espinharas, Cacimba de Areia, Salgadinho, Desterro, OlhoD’água, São Mamede, Santa Terezinha, Quixaba, Patos e Mãe D’água.

5) J.C.C. era o Coordenador do Grupamento Médico-Pericial doINSS e, nessa condição, homologava os laudos dos outros acusados,atestando a incapacidade dos segurados. Além disso, tambémexaminava os trabalhadores e, nestes casos, homologava seuspróprios laudos.6) Com base em laudos médicos falsos, fornecidos pelos acusados, oórgão previdenciário concedeu, indevidamente, na região, cerca de

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novecentas (900) aposentadorias por invalidez. Os beneficiários, descobriua Coordenadoria Regional de Perícias Médicas do INSS em revisãoanalítica que realizou, não eram portadores das moléstias indicadas nosexames ou estavam acometidos de doenças que não os incapacitavapara o trabalho. Por isso mesmo, não poderiam os réus, como fizeram,considerá-los inválidos para o exercício de quaisquer atividades laboriosas.

7) Esses fatos ocorreram, de forma continuada, entre os anos de 1982 a1988, sendo certo que causaram à Autarquia da União um prejuízo deCr$ 26.003.494,54 (vinte e seis milhões e três mil e quatrocentos e noventae quatro cruzeiros e cinquenta e quatro centavos), em valores estimadosno mês de agosto de 1990.8) T.G.A. emitiu os laudos médicos periciais, atestando a incapacidadedos trabalhadores rurais João Antônio da Silva, Napoleão Leandro Araújoe Antônio Félix de Medeiros. Estes chegaram a receber, por longo tempo,benefícios por incapacidade. Posteriormente, o órgão previdenciáriocancelou suas aposentadorias, quando constatou, através de exames erevisões feitos por sua Coordenadoria Regional de Perícias Médicas, queeles não eram portadores de patologias que incapacitam para o trabalho.Tudo está provado nos documentos acostados ao processos administrativoe apontados às fls. 2.879/2.880, do Volume 07.

9) P.F.C. fez exames e homologou laudos emitidos por seus colegascredenciados, atestando a invalidez dos trabalhadores rurais, cujos nomessão indicados às fls. 2.880/2.881, do Volume 07, do procedimentoadministrativo. Todos aqueles rurícolas receberam, por vários meses,rendas mensais de aposentadorias, que somente foram canceladasdepois, quando se verificou que não eram inválidos. Entre os beneficiáriosapontados, o Parquet cita os nomes de Ageu Targino da Cruz, AméliaPereira, Antonio Maria dos Santos, Matilde L. Bezerra, etc... (fls. 2.880/2.881, do volume 07). As fraudes perpetradas pelo réu restaramcomprovadas na documentação, junta ao processo administrativo, indicadaàs fls. 2.880 a 2.882, do Volume 07.

10) J.C.C. foi quem mais cometeu fraudes. Emitia e homologava laudosmédicos dando conta de invalidez e muitos trabalhadores rurais. ComoCoordenador do Grupamento Médico-Pericial de Patos, homologava osfalsos exames realizados por seus colegas, inclusive os credenciados.Concorreu, assim, de forma decisiva, para que grande quantidade derurícolas obtivessem, mediante tais fraudes, vantagens ilícitas. Vê-se queexistem parentes seus entre os que foram contemplados com asaposentadorias (Nilton Candeia de Souto, Diarnaud L. Candeia, José G.Candeia, Maria Figueiredo Candeia, Maria Luzia Candeia (fls. 2.883/2.888).Muitas outras pessoas também foram diretamente beneficiadas peloacusado J.C.C., como, por exemplo, Doracy Gomes Pereira, JosefaSeverina de Oliveira, Zélia Cristina C. Moraes, Terezinha Gomes Lacerda,Abdal José de Lucena, Antonio Enéas de Medeiros, etc... (fls. 2.883/2.888). Todos perceberam, continuadamente, benefícios por incapacidade,que o órgão previdenciário cancelou ao apurar que não estavam acometidosde moléstias que os inabilitassem ao trabalho. As provas documentaissão inconcussas, repousam nos autos do inquérito administrativo, àspáginas indicadas nas fls. 2.882 a 2.894, do Volume 07.

11) F.A.C. emitiu laudos e, também, homologou exames realizados por

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outros médicos, atestando a invalidez de inúmeros rurícolas, entre osquais Genésio Caetano Costa, Raimunda Galdino da Silva, Cícero Ferreirada Silva, etc... (ver relação às fls. 2.895/2.896, do Volume 07 do inquéritoadministrativo). Os trabalhadores não estavam incapacitados para oexercício de suas atividades laboriosas, consoante apurou a perícia doórgão previdenciário. Mas conseguiram auferir, por longo tempo, as rendasmensais das aposentadorias que lhes foram concedidas com base nosfalsos pareceres do acusado. Os benefícios já estão cancelados. E asprovas documentais do seu comportamento delituoso se acham insertasno processos administrativo, nas páginas citadas às fls. 2.895/2.898, doVolume 07.

12) Os acusados A.M.L., M.S.L., G.M.P., V.F.B. e E.B.F. examinaramos trabalhadores rurais, cujos nomes aparecem referidos às fls. 2.899,2.902, 2.904 e 2.905/2.907, respectivamente. Atestaram a incapacidadelaboriosa de todos aqueles rurícolas, concorrendo para a concessãofraudulenta dos benefícios, que receberam por algum tempo e foramcancelados quando o órgão previdenciário descobriu que eles não eraminválidos. Esses fatos restaram confirmados nas provas documentais,que estão dentro do processo administrativo, nas páginas mencionadasàs fls. 2.899/2.909 do Volume 07.

(..........................................................)

14) É indiscutível que os réus, atestando falsamente a invalidez detrabalhadores rurais aptos aos exercícios de suas atividades laboriosas,concorreram para que eles obtivessem, mediante fraude, as vantagensilícitas decorrentes dos pagamentos das rendas mensais dos benefícios,por quanto não se pode acreditar que agiram por altruísmo. Cometeram,portanto, estelionato, de forma continuada, estando incursos nos arts.29, 71 e 171, § 3º, do Código Penal”.

4. Posteriormente, foram citados T.G.A., A.M.L., P.F.C., F.A.C., G.M.P.(fls. 186, verso), V.F.B. (fls. 189, verso), M.S.L. (fls. 193, verso), J.C.C. (fls. 195, verso), E.B.F.(fls. 249, verso); nos respectivos interrogatórios (fls. 210/211, 212/213, 214, 240, frente everso, 251/252, 253/254, 337, 338 e 339), todos negaram as acusações que lhes foramimputadas.

5. Nos autos, as defesas prévias de todos os RR., a saber, A.M.L.(fls.219/222), arrolando 03 (três) testemunhas; P.F.C. (fls. 225/229); arrolando 03 (três)testemunhas; T.G.A. (fls. 231/232), arrolando 03 (três) testemunhas; M.S.L. (fls. 244/245),arrolando 02 (duas) testemunhas; J.C.C. (fls. 255/258), arrolando 03 (três) testemunhas; F.A.C.(fls. 309/313), arrolando 03 (três) testemunhas; V.F.B. (fls. 341/344), arrolando 04 (quatro)testemunhas; G.M.P. (fls. 345/348), arrolando 03 (três) testemunhas; E.B.F. (fls. 350/352),),arrolando 02 (duas) testemunhas.

6. Em audiências, foram inquiridas as testemunhas de acusação Mariado Socorro Brasileiro Lima Montenegro (fls. 384/386), Reginaldo Tavares de Albuquerque (fls.387/388), Francisco de Assis Vieira (fls. 390/392), Wille Guedes Magalhães (fls. 393/394),Antônio Viana de Souza Lima (fls. 395/397), Gustavo Navarro de Oliveira (fls. 404/405), EdriseVinagre Villar (fls. 406/407), Clizeuda Torres Timóteo Figueiredo (fls. 408/409), que ratificaramos termos da denúncia (fls. 03/11).

7. Posteriormente, foram também inquiridas todas as

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testemunhas arroladas pelas diversas defesas, ou seja:

7.1 - Inalda Cruz de Oliveira (fls. 441/443), arrolada pelos RR. F.A.C. eG.M.P.;

7.2 - Djalma Pires dos Santos (fls. 444), arrolado pela R. T.G.A.;

7.3 - Terezinha Silva (fls. 445/446), arrolada pelos RR. A.M.L., T.G.A. eG.M.P.;

7.4 - Liesse Silva (fls. 447), arrolada pelos RR. A.M.L., T.G.A. e G.M.P.;

7.5 - Demetrius Marcial Marques Dantas (fls. 448), arrolado pelo R. F.A.C.;

7.6 - Amauri Sátiro Fernandes (fls. 449/450), arrolado pelos RR. P.F.C. eA.M.L.;

7.7 - Solon Cordeiro e Silva (fls. 453/455), arrolado pelos RR. J.C.C. eE.B.F.;

7.8 - Liberalino Ferreira de Lucena (fls. 456), arrolado pelo R. J.C.C.;

7.9 - Maristela Gomes de Medeiros (fls. 538, frente e verso/539/539, frentee verso), arrolada pela R. M.S.L.;

7.10 - Francisco Pedro de Medeiros (fls. 539, frente e verso), arroladopelo R. M.S.L.;

8. Despacho subseqüente (fls. 542) abriu às partes o prazo do art. 499do CPP, em função do que pronunciaram-se as defesas dos RR. M.S.L. (fls. 565), G.M.P. (fls.566), A.M.L. (fls. 567), P.F.C. (fls. 568), F.A.C. (fls. 569) e J.C.C. (fls. 570/571), tendo sidodeferidos (fls. 578/589 e 598/599) todos os requerimentos apresentados.

9. Em alegações finais (fls. 600), o MPF. pediu (fls. 602/604) acondenação dos RR., enquanto que a defesa dos RR. pediu (fls. 613/624, 631/639, 649/657e 658/669) suas absolvições.

10. Em defesa das respectivas teses, as partes argumentaram nos seguintes termos(excertos):

10.1 - o MPF (fls. 602/604): “(...) Os elementos indiciários, colhidos nafase inquisitorial, foram confirmados na Justiça. Realmente, os réustrabalhavam no Grupamento Pericial de Patos-PB e procederam a examesde saúde nos segurados da região, emitindo laudos médicos falsos,concorrendo, assim, para as concessões indevidas de muitos benefíciospor incapacidade;

O órgão previdenciário, com base nesses laudos médicos falsos fornecidospelos réus, deferiu cerca de novecentas (900) aposentadorias irregulares.Só constatou a fraude quando sua Coordenadoria Regional de PeríciasMédicas realizou uma revisão analítica, submetendo os beneficiários anovos exames e verificando que eles não eram portadores das moléstiasincapacitantes indicadas nos laudos emitidos pelos acusados.

(............................................................)

Na verdade, ficou demonstrado que os réus tentaram, com desculpasevasivas, ilidir a acusação. Mas, tanto os médicos do INSS quanto oscredenciados são responsáveis pelas fraudes, porque emitiram laudosque não condiziam com a realidade física dos beneficiários.

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(...........................................................)

Assim, causaram prejuízos ao patrimônio público. Inúmeros rurícolasconseguiram auferir as rendas ilícitas, de forma continuada e por muitotempo. Os réus são responsáveis pelas fraudes. Todos almejavam aobtenção de vantagens econômicas, não se podendo crer que agiram,conforme afirmado na denúncia, por motivos altruísticos (...).”;

10.2 - os RR. J.C.C., P.F.C., F.A.C., A.M.L., M.S.L. e G.M.P. (fls. 613/624): “(...) Com efeito, as acusações formuladas na denúncia nãoprocedem e nenhuma delas resultou provada no sumário de culpa, umavez que nenhuma testemunha afirmou que as aposentadorias eramfraudulentas e que os acusados participavam das rendas mensais dosbenefícios.

Ao contrário, todas afirmaram que os Médicos Peritos nos seus LaudosPericiais apresentam diagnóstico provável da doença incapacitante, e nãodefinitivo, uma vez que toda aposentadoria por invalidez está sujeita àrevisão médica, periodicamente.

E justamente isto disseram os acusados em seus interrogatórios.

(............................................................)

Outra testemunha arrolada na denúncia, Médico GUSTAVO NAVARRODE OLIVEIRA, no seu depoimento de fls. 404/405, não fez nenhumareferência a aposentadorias fraudulentas, esclarecendo se tratar dedivergências ou irregularidades técnicas nas aposentadorias examinadas,informando que, à época, que o ruralista não tinha direito a auxílio dedoença, na hipótese de incapacidade laborativa temporária, o que significaque o trabalhador rural doente não podia gozar de qualquer benefício.

(...........................................................)

Por outro lado, a testemunha EDRISE VINAGRE VILLAR, que à épocados fatos era Chefe de Equipe da Perícia Médica do INPS, e que controlavatoda produtividade de Perícia Médica, no seu depoimento de fls. 406/407,após algumas considerações sobre as suas atividades, diz o que chamoua sua atenção foi o fato de haver na área rural muita aposentadoria por“ósteo artrite”, que na época não era doença invalidante podendo ocasionaruma incapacidade temporária, esclarecendo, no entanto, que de acordocom a atividade laborativa do paciente a “ósteo artrite” pode ser doençaincapacitante, e que na Cidade de Patos foram encontrados casos desegurados aposentados, por ósteo artrite, quando ainda não estavam emfase de agutinação.

(...........................................................)

A testemunha CLIZEUDA TORRES TIMOTHEO FIGUEIREDO, tambémarrolada na denúncia, no depoimento prestado às fls. 408/409, diz quetrabalhava na Coordenação de Perícias Médicas do INPS, hoje INSS, eque convocou alguns segurados para examiná-los, ficando constatadoque, em alguns casos, o segurado no momento em que estava sendoreexaminado não era portador de doença, sugerida para a suaaposentadoria, adiantando que a ósteo artrose não é doença invalidante,inicialmente mas quando se encontra em estágio mais avançado, estágiodenegenerativo.

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(...........................................................)

Com efeito, as concessões de aposentadorias e benefícios outros, pelaperícia médica rural, estão sujeitos às revisões médicas analíticasperiódicas, quando são, então, verificadas a evolução da doença, ou se amesma regrediu.

(...........................................................)

De modo que é de todo improcedente a denúncia fruto do ranço políticodos adversários dos acusados J.C.C. e F.A.C., adversários políticos einimigos pessoais, como se vê às fls. 03/04, 08/15, 27/33, 76/78 e 79, doI Volume do Processo Administrativo, acostada aos autos.

Esclarece o acusado J.C.C., que se afastou de suas atividadesprofissionais em fevereiro de 1986, para se candidatar a Deputado Estadual,sendo eleito e tomado posse na Assembléia Legislativa no ano de 1987,conforme se verifica às fls. 260/267 se encontram Declarações desegurados informando coação de políticos locais para incriminarem omesmo acusado CANDEIA e o acusado F.A.C. (...).”;

10.3 - o RR. V.F.B. (fls. 631/639): “(...) Com efeito, as acusações contidasna denúncia são todas improcedentes, pois todas as testemunhas ouvidasem Juízo não confirmaram os fatos narrados na denúncia, portanto, nãorestou provado que o acusado concedia aposentadorias fraudulentas, bemcomo, não participava das rendas mensais dos benefícios.

(...........................................................)

Convém ressaltar que os poucos exames periciais sugerindoaposentadorias pelo denunciado, como afirmou a testemunha AntônioViana de Souza Lima, poderão ser alguns dos exames realizados peloacusado, que depois de entregue ao Grupamento Médico Pericial dePatos-PB, sofreram adulterações e até rasuras.

Indicaram ainda, que o acusado, como médico credenciado, emitia umdiagnóstico provável, subjetivo, pessoal e a olho nu, fazendo suasobservações clínicas de forma limitada, incapaz de dar um diagnósticopreciso em algumas patologias, porque lhe faltava meios técnicos parauma análise detalhada do paciente no momento do exame.

Indicam, também, que o trabalhador rural, ao apresentar-se para fazerexame médico pericial, às vezes estava sem condições laborativas, e omédico credenciado informava ao médico local do Grupamento MédicoPerito Coordenador esta incapacidade temporária, uma vez que existeuma hierarquia, e seus superiores tinham e têm poderes para requisitar ocomparecimento do segurado, através de R.C.S. (REQUISIÇÃO DOCOMPARECIMENTO DO SEGURADO), oportunidade em que o seguradodeverá ser melhor examinado e de até realizar exames complementares,porque só o Grupamento Médico-Pericial tem poderes para solicitar osreferidos exames.

(..........................................................)

Douto Juiz, a diligência solicitada nos termos do artigo 156 da Lei AdjetivaPenal, data venia, se faz necessário que este Juízo requisite ao INSS osoriginais dos laudos médicos periciais do inquérito administrativo,especialmente a folha nº 1.751, uma vez que as cópias xerografadas

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dificultam a distinção da cor das tintas usadas nos laudos os quais estãoassinados por mais de médico, certamente com lápis diferente, enquantoque fotocópias do I.A., anexas aos autos, revelam uma única cor (...).”;

10.4 - o R. E.B.F. (fls. 649/657): “(...) Nunca é demais, lembrar que oacusado, como MÉDICO, foi credenciado pelo atual INSS, para examinarsegurados da Zona rural, em Patos, no seu consultório. Como MÉDICOCREDENCIADO, somente tinha o dever de proceder ao exame superficialdo doente/segurado, bem como sugerir alguma coisa para a PERÍCIAMÉDICA, sequer um exame clínico poderia requisitar. O poder de aposentarou não, não cabia ao MÉDICO PERITO CREDENCIADO, pois, isto erafaculdade exclusiva do CHEFE DA PERÍCIA MÉDICA.

Por outro lado, o MÉDICO CREDENCIADO, além de não poder solicitarexames laboratoriais, endoscópicos, radiográficos ou outros equivalentes,somente poderia sugerir um quadro médico, e, mesmo assim, estasugestão não era definitiva, porque todo segurado teria que passarobrigatoriamente pelo chefe de grupo de perícia local, pessoa que teria acondição de requisitar exames e proceder ou não, no final, à aposentadoria.O fato é tanto que o LAUDO MÉDICO, emitido pelo MÉDICOCREDENCIADO, era tão somente de um diagnóstico provável, comoprovam as testemunhas ouvidas neste PROCESSO. Assim, era o MÉDICOCREDENCIADO, para a PREVIDÊNCIA, equivalente aquele MÉDICO que,nos grandes HOSPITAIS, serve de triagem, para depois encaminhar opaciente para quem de DIREITO. Somente com o laudo provável, fornecidopelo MÉDICO CREDENCIADO, NÃO havia como ocorrer aposentadoria,assim dizem as testemunhas do PROCESSO, inclusive pessoas quetrabalham no INSS, com conhecimento de causa deste assunto, comoveremos detalhadamente, mais adiante.

Também, poderia ocorrer que o quadro clínico, em determinada ocasião,indicasse a sugestão de uma aposentadoria, pelo menos temporária,porque na época não havia a condição de licença médica para zonaRURAL, (na prática o que se diz quando fulano encontra-se encostado)e depois poderia ocorrer o restabelecimento deste doente e conseqüentedesligamento da aposentadoria. As testemunhas, inclusive arroladas naDENÚNCIA, quanto as arroladas pelos ACUSADOS.

(...........................................................)

Assim, não há prova de dolo, por parte do acusado E.B.F., nestePROCESSO, e, sem este requisito, não tem como ter ocorrido o crimetipificado na DENÚNCIA.

Destarte, não há prova que autorize decreto condenatório nestePROCESSO. Para autorização de DECRETO CONDENATÓRIO, serianecessário prova concreta, robusta e insuspeitável, meio não existentenesta LIDE (...).”

10.5 - a R. T.G.A. (fls. 658/669): “(...) Nunca é demais, lembrar que, aacusada, como MÉDICA, foi dos quadros do atual INSS, fazendo partedo GRUPAMENTO PERITO DE PATOS, sendo conhecida como PERITAcompetente, cumpridora de suas obrigações, zelosa, sem nenhumaobservação em sua ficha funcional e tida, no meio dos SEGURADOS,como carrasca, porque somente deferia uma aposentadoria, quando havia,seguramente, um embasamento para a concessão. O envolvimento da

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Drª Terezinha, como é mais conhecida em Patos, em PROCESSO, foisurpresa.

Os depoimentos de todas as testemunhas, seja as arroladas peloMINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, ou mesmo das indicadas pelosacusados, informam bem sobre o comportamento e responsabilidadefuncional da MÉDICA T.G.A..

Ocorre que o quadro clínico de um segurado, em determinada ocasião,poderia indicar uma aposentadoria, pelo menos temporária, porque naépoca não havia a condição de auxílio doença para o ruralista, e depoispoderia ocorrer o restabelecimento deste doente e conseqüentedesligamento da aposentadoria, no decorrer de uma revisão analítica. Astestemunhas, inclusive arroladas na DENÚNCIA, a exemplo de DrªSocorro, confirmam que poderia acontecer recuperação do doente queestava aposentado, e sempre ocorria em torno de dez por cento, tanto naParaíba, quanto nos outros ESTADOS do resto do BRASIL. Também, aprova maior que o INSS sabia da recuperação de alguns aposentados éque sempre fazia revisão analítica, exatamente para descobrir os quetinham se recuperado. Isto implicava dizer que a aposentadoria porinvalidez, também, não era definitiva, pois poderia ser perdida em revisãoanalítica posterior e isto sempre ocorria em torno de dez por cento dossegurados. Estes dados são retirados dos depoimentos das testemunhas,tanto da DENÚNCIA quanto as arroladas pelos ACUSADOS.

Outro aspecto é que nenhuma testemunha prova ter a Drª T.G.A. recebidoqualquer importância, seja de segurado, seja a maior do INSS pelo númerode pessoas examinadas, seja como benefício político, até porque, nuncafoi candidata a nenhum cargo, não tem parente político, jamais foi caboeleitoral para político, para cometer o crime de que é acusada. Não háprova de dolo da MÉDICA PERITA, Drª T.G.A., neste PROCESSO.

Não como reconhecimento de prática de crime, mas por amor ao debate,se por acaso a acusada tivesse deferido alguma aposentadoria irregular,não teria tirado vantagem nenhuma em seu proveito, como não estava aserviço de nenhum POLÍTICO, logo, não estaria provado o seu dolo, e,mediante modalidade culposa, não existe o crime constante naDENÚNCIA. Pelo menos, falta a prova de dolo, contra esta acusada,neste PROCESSO (...).”

11. Antecedentes criminais de todos os RR. estão nos autos (fls. 607),sem anotações anteriores.

Relatados, DECIDO.

12. No mérito, a acusação pretendeu (fls. 03/11) ver a conduta dos RR.enquadrada no tipo penal do art. 171, § 3º, do CP, com as características dos arts. 29 e 71 domesmo CP, cujas redações textuais são as seguintes, respectivamente:

“Art. 171. Obter para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízoalheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil,ou qualquer outro meio fraudulento:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.

(...........................................................)

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§ 3º. A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimentode entidade de direito público ou de instituto de economia popular,assistência social ou beneficência.”

“Art. 29. Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide naspenas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.

§ 1º. Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuídade um sexto a um terço.

§ 2º. Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave,ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade,na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave.”

“Art. 71. Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão,pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições detempo, lugar, maneira de execução e outras semelhanças, devem ossubseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se a penade um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas,aumentadas, em qualquer caso de um sexto a dois terços (...).”

13. No caso, os RR. - à vista das correspondentes condutas - podemser divididos em dois grupos distintos, a saber:

13.1 - na qualidade de médicos-peritos, isto é, servidores da PrevidênciaSocial: os RR. J.C.C., T.G.A., P.F.C., F.A.C.; e

13.2 - na qualidade simplesmente de médicos-credenciados pelaPrevidência Social, os demais RR.: E.B.F., A.M.L., M.S.L., V.F.B. eG.M.P..

14. O estelionato materializou-se no momento em que, utilizando-se dacondição de médicos peritos, os quatro primeiros RR., isto é, J.C.C., T.G.A., P.F.C. e F.A.C.indevidamente aposentaram, por doença, segurados da Previdência Social, causando dessaforma prejuízo à entidade de direito público, circunstância de aumento de pena em 1/3 (humterço), conforme o já transcrito art. 171, § 3º, do CP.

15. Nesse sentido, as provas colhidas contra os RR. são de absolutaclareza e coerência, de tal forma que IPL e o processo criminal estão harmônicos entre si, emsua maior parte, em desfavor dos RR. antes referidos; contra esses mesmos RR. foramproduzidas as seguintes provas, principalmente:

15.1 - o laudo pericial (fls. 153/155) elaborado em sede de IPL:

15.2 - os depoimentos testemunhais (fls. 384/386, 387/388, 390/392, 393/394, 395/397, 404/405, 406/407, 408/409).

16. Mais especificamente, é possível observar as seguintes provas emdesfavor dos RR. referidos, individualmente considerados:

16.1 - R. J.C.C.: confissão em IPL (fls. 135, frente e verso/136), poroportunidade do seu interrogatório, de que são suas as assinaturas,constantes dos laudos médicos apostados às fls. 108v, 109v, 110v, 116,117, 118, 119, 120, 121, 122, 123, destes autos; depoimento da testemunhaMaria do Socorro Brasileiro Lima Montenegro (fls. 384/386); depoimentoda testemunha Reginaldo Tavares de Albuquerque (fls. 387/388);depoimento da testemunha Francisco de Assis Vieira (fls. 390/392);depoimento da testemunha Wille Guedes Magalhães (fls. 393/394);

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depoimento da testemunha Antônio Viana de Souza Lima (fls. 395/397);

16.2 - R. T.G.A.: laudo de exame documentoscópico (fls. 153/155);depoimento da testemunha Maria do Socorro Brasileiro Lima Montenegro(fls. 384/386); depoimento da testemunha Reginaldo Tavares deAlbuquerque (fls. 387/388); depoimento da testemunha Antônio Viana deSouza Lima (fls. 395/397);

16.3 - R. P.F.C.: laudo de exame documentoscópico (fls. 153/155);depoimento da testemunha Maria do Socorro Brasileiro Lima Montenegro(fls. 384/386); depoimento da testemunha Antônio Viana de Souza Lima(fls. 395/397);

16.4 - R. F.A.C.: laudo de exame documentoscópico (fls. 153/155);depoimento da testemunha Maria do Socorro Brasileiro Lima Montenegro(fls. 384/386); depoimento da testemunha Antônio Viana de Souza Lima(fls. 395/397);

17. Entretanto, contra os demais cinco RR., a seguir nomeados queeram apenas médicos credenciados, não funcionários peritos da Previdência Social - militaramos seguintes indícios apenas:

17.1 - R. E.B.F.: depoimento da testemunha Antônio Viana de SouzaLima (fls. 395/397);

17.2 - R. A.M.L.: depoimento da testemunha Antônio Viana de SouzaLima (fls. 395/397);

17.3 - R. M.S.L.: depoimento da testemunha Antônio Viana de SouzaLima (fls. 395/397);

17.4 - R. V.F.B.: depoimento da testemunha Antônio Viana de SouzaLima (fls. 395/397);

17.5 - R. G.M.P.: depoimento da testemunha Antônio Viana de SouzaLima (fls. 395/397);

18. Aprofundando a análise dos depoimentos referidos no item anterior,resultou o seguinte, especificamente:

18.1 - R. E.B.F.: a testemunha (fls. 395) disse “que ouviu comentáriosque o Dr. E.B.F. atendia a pedido político, razão porque concedia asaposentadorias irregulares”;

18.2 - RR. A.M.L. e G.M.P.: a mesma testemunha (fls. 395) disse “quetomou conhecimento de que a Dr.ª A.M.L., bem como o Dr. G.M.P. recebiapedidos de políticos para facilitar as aposentadorias”;

18.3 - R. M.S.L.: a mesma testemunha (fls. 395) disse “que quanto àMaria Salete seus laudos continham também a afirmação de quedeterminada pessoa não possuía condição para trabalhar”;

18.4 - R. V.F.B.: a mesma testemunha (fls. 395) disse “que quantoao Dr. V.F.B. a testemunha afirma que constatou em seus laudosque apenas sugeria aposentadoria e em outros, afirmoucategoricamente outro não tinha condição laborativa”.

19. Quer dizer, os indícios veementes contra esses cinco RR. nãopuderam ser elevados à categoria de prova, dada a sua evidente fragilidade e inconsistência,

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272 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

exatamente contrário do acontecido referentemente co-RR. J.C.C., T.G.A., P.F.C. e F.A.C.,contra os quais a prova é forte e robusta (cnf. Itens 16.1, 16.2, 16.3, 16.4, retro), sendopossível acrescentar que estes co-RR. efetivamente se houveram em co-autoria, já que osautos demonstraram os seus ânimos de aposentarem indevidamente grande número desegurados, como de fato o fizeram.

20. Passo a referir-me, pois, aos quatro RR. nominalmente referidos noitem anteriormente, no sentido conceitual do concurso de agentes, a doutrina tem formulaçãoadequada à hipótese dos autos:

“É possível que um sujeito empregue fraude contra a vítima, enquantooutro obtém a indevida vantagem patrimonial. Neste caso, ambos sãosujeitos ativos de delito” (Código Penal anotado, Damásio E. de Jesus.- São Paulo: Saraiva, 1989, p. 486).

21. Considerando valorativamente equivalentes as condutas desses co-RR., para efeito da fixação das penas, à vista dos arts. 59, 61, I, 62, 63, 65, III, d, 67, e 68, §3º, todos do CP, tenho como:

21.1 - circunstâncias agravantes (arts. 61, I, 62 e 63): o concurso depessoas (fls. 03/11);

21.2 - causas de aumento (art. 171, § 3º) ou de diminuição: presente tãosomente a primeira, porque cometido o delito em desfavor de entidade dedireito público (=INSS).

22. Tenho, portanto, que a conduta dos RR. J.C.C., T.G.A., P.F.C. eF.A.C. foi típica, injurídica e culpável, perfeitamente enquadrada no art. 171, do CP, com oagravante do seu parágrafo 3º, constitutiva de crime material de dano, consumado com asimples obtenção vantagem ilícita em prejuízo alheio, ex vi do art. 14, I, do mesmo sentido dopretendido pela denúncia, a hipótese dos autos configurou estelionato qualificado, porquecometido contra autarquia federal e, por extensão, contra a própria União Federal; a consumaçãodo estelionato deu-se no momento em que os RR. obtiveram a vantagem ilícita, causandodano patrimonial (conf. Item 14, retro); o concurso de agentes, de igual maneira, restoudevidamente comprovado.

23. Assim, sobre a pena-base de 01 (hum) ano de reclusão, fixada emrazão do valor não muito significativo do dano patrimonial, devem acrescer o concurso deagentes (=agravante) e a qualificadora (=causa de aumento), conforme anteriormentedemonstrado (item 21, supra), tudo na conformidade do art. 68, ainda do mesmo CP; noparticular, interessa esclarecer que as agravantes não constituíram elementos ou qualificadoresdos crimes, daí porque a agravação se tornou possível.

24. Isto posto, fundamentado no art. 171, § 3º, do CP, e demaisdispositivos referidos, julgo parcialmente procedente a denúncia para condenar os RR. J.C.C.,T.G.A., P.F.C. e F.A.C., individualmente, à pena de 01 (hum) ano de reclusão, com o aumentode 1/3 (hum terço), perfazendo o total de 01 (hum) ano e 04 (quatro) meses de reclusão, quetransformo em definitiva, acrescida de 10 (dez) dias-multa, cujo valor unitário corresponderá a1/30 (hum trigésimo) do maior salário-mínimo vigente à época do delito, na conformidade doart. 49, §§ 1º e 2º, do mesmo CP; em sentido contrário, absolvo os RR. E.B.F., M.S.L.,V.F.B., A.M.L.e G.M.P., por insuficiência de provas, na conformidade do disposto pelo CPP,art. 386, IV.

25. Transitada em julgado, inscrevam-se os nomes dos RR. no rol dos

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culpados.

26. Custas, ex lege.

27. P.R.I.

João Pessoa, 07de agosto de 1996.

JOÃO BOSCO MEDEIROS DE SOUSAJuiz Federal Titular da 1ª Vara

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CONCURSO MATERIAL DE CRIMES

Processo nº 215 - AÇÃO PENALAutor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALRéus: CARLOS CÉZAR RESENDE FREITAS, JOSÉ KLÉBER DE

SOUZA SILVA, CARLOS ANTONIO DA SILVA, JOSÉ GALVÃOFILHO e SEBASTIÃO PEREIRA DA SILVA

SENTENÇA

I - RELATÓRIO (CPP, art. 381, II)

Vistos etc...

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ingressou com Ação Penal contraCARLOS CÉZAR RESENDE FREITAS, JOSÉ KLÉBER DE SOUZA SILVA, CARLOSANTONIO DA SILVA, JOSÉ GALVÃO FILHO e SEBASTIÃO PEREIRA DA SILVA, qualificadosnos autos, dando-os como incursos nas sanções do art. 157, § 2º, incisos I, II e III, c/c art. 29do Código Penal, bem assim no art. 1º da Lei nº 2.252, de 1.7.1954 e art. 40, § 1º, da Lei nº6.538, de 22.6.1978, porque teriam os quatro primeiros acusados praticado o crime de roubo,corrupção de menores e sonegação ou destruição de correspondência, e o último o delito dereceptação, pedindo no final a citação de todos para verem-se processar, a inquirição detestemunhas e a procedência do pedido, a ser ratificado nas alegações finais, conforme oseguinte relato:

“1.No dia três de agosto do ano corrente de 1995, por volta das oito horas,Carlos Cézar Resende Freitas transportou, em um Corcel II, cor vinho, depropriedade do seu pai, o menor Júnior Sebastião da Silva juntamentecom os acusados José Kléber de Sousa Silva, Carlos Antônio da Silva eJosé Galvão Filho (‘Grilo’), desde a Praça José Sérgio Maia, na cidade deCatolé do Rocha, até um local, chamado ‘Placa’, no início da estrada deacesso à cidade de Riacho dos Cavalos. Deixando-os lá, diz Carlos Cézar,logo em seguida, regressou à sua residência (fls. 20).”

“2.O menor Júnior e os denunciados José Kléber, Carlos Antônio(‘Carlinhos’) e José Galvão (‘Grilo’), aguardara, então, no local escolhido,a passagem esperada de uma camioneta, que estava prestes a partir daAgência dos Correios e Telégrafos de Catolé do Rocha, transportandodinheiro para o pagamento dos segurados do INSS, em Riacho dos Cavalos,bem como correspondência postal.”

“Com efeito, por volta das nove horas e meia do mesmo dia, a camionetatipo C-10, cor azul, de carroceria de madeira, bem conhecida dos réus,aproximou-se da tocaia, já na estrada de barro que leva a Riacho dosCavalos. O menor Júnior, vestido com farda de policial, arranjada pelosmilitares acusados, dá ao veículo sinal para parar, enquanto seuscomparsas se ocultam no mato adjacente e põem seus capuzes.”

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“3.Logo que o veículo estacionou, foi cercado pelos acusados queempunhavam revólveres e espingardas de calibre 12, apontando-os contraos passageiros, o motorista e dois policiais que viajavam na carroceria.Os acusados tomaram as armas dos dois policiais, incumbidos dasegurança do transporte.”

“...”

“Todos, com exceção de José de Andrade Carneiro, Chefe da Agênciados Correios de Riacho dos Cavalos, foram obrigados a se afastarem doveículo e correrem para o matagal, ao lado da estrada. José de Andradefoi obrigado a entregar-lhes os malotes que continham o dinheiro e acorrespondência postal. Em seguida, como os outros, foi forçado a corrersem olhar para trás.”

“4.O menor Júnior e os denunciados José Kléber, Carlos Antônio(‘Carlinhos’) e José Galvão (‘Grilo’) apoderaram-se da camioneta,conduzindo-a até cerca de três quilômetros do local, onde foi deixada aolado da estrada. Entraram no matagal e dividiram o dinheiro, além dasarmas tomadas da escolta do veículo interceptado. Após violarem o maloteque continha a correspondência, abandonaram-no, perto de um açudenas vizinhanças, no Sítio Timbaúba, de propriedade de Manoel Pedro (fls.22).”

“Fardas e capuzes foram largados no mato.”

“5.Na residência de José Galvão, ‘Grilo’, foram encontrados R$ 1.200,00,em 12.08.95 e apreendidos (fls. 24) e o menor Júnior (fls. 10 e 11)descrevem o delito com detalhes exuberantes. Eles definem a participaçãodolosa de ‘Cabo’, a quem os réus militares tratavam por senhor, quemmandou a todos que entrassem no carro.”

“Estranha contradição surge entre o depoimento de José de AndradeCarneiro (‘Binoco’), o Chefe da Agência dos Correios em Riacho dosCavalos, e as demais vítimas ameaçadas pelos autores do roubo. Afirmaele (fls. 14) não ter dúvida de que eram seis os assaltantes, enquanto osdemais referem-se a apenas quatro (fls. 11, 17, 25, 30, 34 e 36). A instruçãopoderá esclarecer sobre tal divergência.”

“6.Sebastião Pereira da Silva recebeu das mãos de Júnior, seu filho menor,parte do dinheiro subtraído pelos acusados, consciente de sua procedênciacriminosa, e adquiriu, com ele, diversas mercadorias, pagando, ainda, aseus credores (fls. 23).”

2. Instruindo a denúncia vieram os autos do Inquérito Policial nº 04/95 -SSP - PB, instaurado mediante Portaria do Sr. Superintendente Regional de Polícia Civil deCatolé do Rocha (documentos de fls. 8 e ss.), contando, inclusive, com prisão preventivadecretada de alguns dos agentes do alegado delito.

3. Prisão preventiva dos réus decretada pelo MM. Juízo de Direito daComarca de Catolé do Rocha, neste Estado, presentes os pressupostos legais para esse fim(fls. 51/56), sendo o menor JÚNIOR SEBASTIÃO DA SILVA, também envolvido na açãodelituosa, internado por 45 (quarenta e cinco) dias na repartição policial local, isolado dosadultos. Na página seguinte (fls. 57), declina o douto magistrado estadual de sua competênciapara esta 4ª Vara Federal em virtude da vinculação do patrimônio de pessoas referidas no art.109, inciso VI, da Constituição (Empresa de Correios e Telégrafos – ECT).

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4. Recebida a denúncia, foi ratificado em parte o decreto de prisãopreventiva, determinando o eminente Juiz Federal ANTONIO CARLOS DE MARTINS MELLO,então titular desta 4ª Vara, a soltura do réu SEBASTIÃO PEREIRA DA SILVA nos termos dadecisão de fls. 73, bem assim a recomendação ao Juízo da Criança e do Adolescente deCatolé do Rocha e à Polícia Federal para que se assegurasse a integridade física e psíquicado menor encontrado em irregular estado.

5. Apreendidos os bens conforme documentos de fls. 26/28, 80/81, 90/95, 97/102 e 180/184, sendo alguns devidamente entregues aos seus proprietários (R$ 1.200,00em poder de “Grilo” ou JOSÉ GALVÃO FILHO; R$ 1.995,00 em poder de JOSÉ KLÉBER DESOUSA SILVA; R$ 1.060,00 em poder de CARLOS ANTONIO DA SILVA; um revólver Taurus,nº 4655, calibre 38, de seis tiros, cano longo, oxidado; um revólver Taurus, nº 00444-1 A/1446770, cano longo reforçado, da PM/PB; uma bicicleta Monark barra circular 1995, nº LG582.403, de cor azul; uma bicicleta Unitrak 18 marchas 1995, nº LX 1700, de cor vinho; umabicicleta Caloi Moutain Bike, 1994, nº 1.022, de cor preta, em poder do menor JÚNIORSEBASTIÃO DA SILVA; um malote da ECT com um selo de boca nº 44037640, localizado noSítio Timbaúba, de propriedade do Sr. Manoel Pedro; um óculos escuro Lótus; um relógiomarca Yankee Street; uma espingarda calibre 12, CBC, nº 1038831, mod. 151, cano únicoserrado; um TV a cores Philco Hitachi, 14 e uma espingarda calibre 24, CBC, cano únicocerrado, em poder de CARLOS CÉZAR RESENDE FREITAS; documentos e fotografiasenumeradas.

6. Interrogatórios às fls. 107/114, seguido de alegações preliminares,rol de testemunhas e documentos (fls. 115/136).

7. Inquiridas as testemunhas FRANCISCO DAS CHAGAS NUNES DACOSTA (fls. 197/197vº), FRANCINEUDO OLIVEIRA CAVALCANTE DE ARAÚJO (fls. 198/198vº), JOÃO MELCHÍADES DE OLIVEIRA SOBRINHO (fls. 193/194), JOSÉ DE ANDRADECARNEIRO (fls. 195/195vº), ROGÉRIO ARAÚJO DE OLIVEIRA (fls. 196/196vº) e MARIALÚCIA DE ALMEIDA como declarante (fls. 199), arroladas pela acusação (fls. 6), através decarta deprecada ao MM. Juízo de Direito da Comarca de Catolé do Rocha. Ouvido emdeclarações o menor JÚNIOR SEBASTIÃO DA SILVA, conforme termo de fls. 169/170vº,determinando-se a comunicação ao Juízo dos fatos sobre a inexistência de interesse oucompetência quanto à situação do menor, rechaçando-se na audiência o pedido de relaxamentoformulado por JOSÉ KLÉBER DE SOUZA SILVA.

8. Ouvidas também mediante precatória ao Juízo de Catolé do Rochaas testemunhas JOSÉ RAIMUNDO DE ALMEIDA (fls. 232/232vº), JOSÉ ZEZONE MAIA (fls.233/233vº), VICENTE ROCHA SOBRINHO (fls. 234/234vº), LEÔNIDAS VIEIRA DE FARIAS(fls. 235), FRANCISCO BARBOSA DA SILVA (fls. 236/236vº), FRANCISO DE ASSIS AZEVEDO(fls. 237/237vº), IREMAR ALVES DE FREITAS (fls. 241), ELMIÇO BEIJAMIM DINIZ (fls. 242),TEREZA MARIA MAIA (fls. 243), GERÔNCIO ALVES DE SOUSA (fls. 244), SEVERINOFRANCISO DA SILVA (fls. 245), FRANCISCO SOARES DA SILVA (fls. 246) e ALCIDES DASILVA VIEIRA (fls. 247), indicadas pelas defesas. Dispensada a inquirição das testemunhasJOSÉ SILVESTRE DA SILVA SOBRINHO e MARIA DAS NEVES GOMES, conformerequerimentos dos réus arrolantes, respectivamente JOSÉ KLEBER DE SOUSA FILHO (fls.238) e JOSÉ GALVÃO FILHO (fls. 248).

9. Indeferido novo pedido de relaxamento de prisão formulado pelo réuJOSÉ KLÉBER DE SOUSA FILHO às fls. 209/211, depois de pronunciamento ministerial emcontrário e diante da inexistência de qualquer modificação fática (conf. despacho de fls. 252).

10. Em diligências, manifestou-se apenas o patrono do acusado CARLOSANTONIO DA SILVA para indicar o novo endereço onde daquela data em diante poderia ser

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intimado (fls. 257).

11. Nas alegações finais, pediu o MPF a procedência da denúncia quantoaos réus CARLOS CÉZAR RESENDE FREITAS, JOSÉ KLEBER DE SOUZA SILVA, CARLOSANTONIO DA SILVA e JOSÉ GALVÃO FILHO (fls. 259/261), registrando sobre a natureza efixação da pena úteis considerações de ordem jurídica e filosófica e reconsiderando oenquadramento da conduta dos réus no tipo penal de “sonegação ou destruição decorrespondência” (Lei nº 6.538/78, art. 40, § 1º), pela ocorrência do fato na progressão dodelito contra o patrimônio. Pediu, outrossim, a aplicabilidade em relação ao réu SEBASTIÃOPEREIRA DA SILVA do disposto no art.; 180, § 3º, do Código Penal, bem assim, quanto atodos, do disposto no art. 121 do CPP (perda em favor do Tesouro Nacional do produto dosbens adquiridos com os proventos da infração).

12. Os réus, por sua vez, propugnaram pela “nomeação de um corpoclínico” para avaliar as condições do paciente, absolvição sumária com reconhecimento deviolenta emoção e transferência do réu preso para o Batalhão de Polícia Militar de Patos(CARLOS CÉZAR REZENDE FREITAS); absolvição ou pena mínima (CARLOS ANTONIO DASILVA); absolvição (JOSÉ GALVÃO FILHO e SEBASTIÃO PEREIRA DA SILVA); e clemênciacom cumprimento da pena em liberdade, junto aos seus familiares (JOSÉ KLÉBER DE SOUSASILVA).

13. A seguir, vieram-me conclusos os autos para sentença, que, relatados,decido.

II - FUNDAMENTOS (CPP, art. 381, III e IV)

14. Antes do exame das questões pertinentes ao feito, cabe a este Juízodeterminar a imediata disponibilização do menor JÚNIOR SEBASTIÃO DA SILVA ao MM.Juízo de Direito da Comarca de Catolé do Rocha, a quem se atribui as funções de juízo dainfância e da juventude, para os fins solicitados pelo ofício de fls. 178, ainda não apreciado edecidido. Com efeito, tratando-se de alegada participação em fato delituoso atribuída a menorde dezoito anos, o procedimento apuratório especial compete ao juízo da infância e dajuventude, não havendo como manter-se indefinidamente o investigado sob a custódia daJustiça Federal, que não tem qualquer ingerência no processo respectivo.

15. Tornando ao processo, devo assinalar a inexistência de quaisqueralegações de nulidade ou prejuízos fundamentados pelos acusados. A petição de fls. 257 queinforma o novo endereço do seu subscritor para futuras intimações e menciona não ter oadvogado recebido até aquela data nenhuma notificação para atos do processo nãoconsubstancia irregularidade. É que a defesa de CARLOS ANTONIO DA SILVA, patrocinadaconjuntamente pelos advogados GILBERTO CHAVES e/ou EZENILDO ALVES DA SILVA, foidevidamente notificada de todos os atos do processo, conforme se pode verificar às fls. 112,130/131, 138, 169, 172, 175, 191, 200, 222/222vº, 238, 248 e 254.

16. Por outro lado, o pedido preambular constante das razões finais doréu CARLOS CÉZAR RESENDE FREITAS no sentido de avaliar-se as condições do “paciente”e de reconhecimento de violenta emoção não tem pertinência, por inexistirem dúvidas sobrea sua integridade mental. Ademais, na fase própria, como dito, não houve alegação oujustificativa sobre nenhum prejuízo sofrido, por isso não apreciada pelo douto magistrado queconduzia o processo, inexistindo nulidades a declarar.

17. Acrescento que, tratando-se de ações delitivas prejudiciais aopatrimônio de empresa pública federal, a competência para o feito é atribuída à Justiça Federal,

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nos precisos termos do art. 109, inciso IV, da Constituição, segundo o qual cabe aos juízesfederais o processo e julgamento dos “crimes políticos e as infrações penais praticadas emdetrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ouempresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militare da Justiça Eleitoral”.

18. As descrições das condutas configuram, em tese, crimes contra opatrimônio de empresa pública federal – Empresa de Correios e Telégrafos - ECT –, tipificadosno art. 157, § 2º, incisos I, II e III, c/c art. 29 do Código Penal, bem assim no art. 1º da Lei nº2.252, de 1.7.1954. O d. MPF pretendeu inicialmente também enquadrar as condutas no art.40, § 1º, da Lei nº 6.538, de 22.6.1978, propugnando, a final, pela absorção do último delitopelos crimes contra o patrimônio conforme razões finais, que considero jurídicas pelo seupróprio conteúdo, excluindo esse tipo da imputação penal. Os fatos descritos referem-se aoseguinte:

CÓDIGO PENAL

“Art.29. Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penasa este cominadas, na medida de sua culpabilidade.

§ 1º. Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuídade um sexto a um terço.

§ 2º Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave,ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade,na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave.”

“Art. 157. Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediantegrave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquermeio, reduzido à impossibilidade de resistência:

Pena – reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

§ 1º. Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa,emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar aimpunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro.

§ 2º. A pena aumenta-se de um terço até metade:

I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;

II - se há concurso de duas ou mais pessoas;

III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhecetal circunstância.”

LEI Nº 2.252, de 1.7.1954

“Art. 40.Constitui crime, punido com a pena de reclusão de um a quatroanos e multa de Cr$ 1 (um cruzeiro) a Cr$ 0,01 (um centavo), corromperou facilitar a corrupção de pessoa menor de 18 (dezoito) anos, com elapraticando infração penal ou induzindo-a a praticá-la.”

19. Os fatos relatados pela denúncia foram suficientemente demonstradosperante esta Justiça Federal, com a confirmação das confissões feitas pelos réus nosrespectivos interrogatórios nas fases policial e judicial, exceto quanto ao réu SEBASTIÃOPEREIRA DA SILVA, cuja imputação, ao que parece, fundara-se em dúbias afirmações deque teria adquirido três bicicletas e um fogão a gás com o suposto produto do crime, nocomércio local. Na verdade, as declarações de fls. 19/19vº e o interrogatório de fls. 29/29vº,ambos na fase policial, bem assim os depoimentos de fls.198/198vº, 234/234vº, 237/237vº,243, 244, 245 e 246 (testemunhas FRANCINEUDO OLIVEIRA CAVALCANTE DE ARAÚJO,

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VICENTE ROCHA SOBRINHO, FRANCISCO DE ASSIS AZEVEDO, TEREZA MARIA MAIA,GERÔNCIO ALVES DE SOUSA, SEVERINO FRANCISO DA SILVA e FRANCISCO SOARESDA SILVA, respectivamente) deixam claro que a compra das bicicletas e do fogão foraefetivamente feita por JÚNIOR e não por seu pai SEBASTIÃO, também réu no processo. Oconjunto probatório atesta, pois, a materialidade e aponta no sentido da identificação daautoria, com as observações aqui feitas, deixando claras as circunstâncias em que os fatosaconteceram, presentes todos os demais requisitos necessários à prolatação da sentençade mérito.

20. Não resta dúvida, assim, sobre a efetiva ocorrência do assalto nadata mencionada – 3 de agosto de 1995, por volta das nove horas e trinta minutos da manhã.Conforme se observa dos autos, houve naquele dia a abordagem, pelos réus, da camionetaque transportava o dinheiro do pagamento dos segurados da Previdência Social de Riachodos Cavalos e correspondências postais diversas, veículo que era utilizado a serviço da Agênciados Correios e Telégrafos de Catolé do Rocha, e onde viajavam o chefe dos serviços locais daECT, JOSÉ DE ANDRADE CARNEIRO, o motorista JOÃO MELCHÍADES DE OLVIEIRASOBRINHO, ROGÉRIO DE ARAÚJO DE OLIVEIRA e os policiais militares FRANCISCODAS CHAGAS NUNES e FRANCINEUDO OLIVEIRA CAVALCANTE, responsáveis pelasegurança.

21. Na data e hora fatídicas, o menor JÚNIOR SEBASTIÃO DA SILVA,vestido de farda característica da Polícia Militar paraibana fez deter o veículo transportador.Logo após, seguido de três homens encapuzados e armados de revólveres e espingardacalibre 12 (doze), todos passaram a ameaçar os passageiros e seguranças, concluindo porsubtraírem os malotes contendo a importância de R$ 11.250,00 (Onze mil e duzentos ecinqüenta reais) e correspondências postais diversas, que ali se encontravam.

22. A autoria, igualmente, ficou sobejamente caracterizada pela provacolacionada aos autos, a partir das declarações prestadas perante a autoridade policial – eratificadas em Juízo às fls. 170/170vº, pelo menor JÚNIOR SEBASTIÃO DA SILVA. Segundoos elementos coligidos, teria JÚNIOR praticado o assalto em companhia das pessoas de“Grilo, Carlinhos e Cléber”, os dois últimos integrantes da corporação militar do Estado daParaíba. Segundo essas declarações, Grilo, ou JOSÉ GALVÃO FILHO, fora o mentor e arquitetodo crime, juntamente com os outros policiais militares envolvidos, incluindo o cidadão conhecidocomo “Cabo”, militar reformado da PM por ter uma mão decepada, vindo este a ser o réuCARLOS CÉZAR RESENDE FREITAS, ou “Cabo Freitas”.

23. Confirmando as conclusões nesse sentido, os interrogatórios dosquatro réus – exceção feita a SEBASTIÃO PEREIRA DA SILVA – no seguinte sentido:

I) CARLOS CÉZAR RESENDE FREITAS: “que no dia 03 de agosto de1995, o depoente encontrava-se em Catolé do Rocha, junto com os demaisacusados; que, daquele local em um corcel II de cor vinho, propriedadedo pai do depoente, conduziu o grupo qualificado na denúncia, com exceçãode Sebastião Pereira da Silva, em cujo lugar viajou o filho desse, de nomeJúnior até o local chamado Placas na entrada para Riacho dos Cavalos;(...); que o depoente já sabia do que o grupo se encarregaria, sendo queo papel dele, depoente, era só a referida condução até o local planejado;que o grupo, na pessoa de José Kléber e Carlos Antônio, fez entrega aodepoente da quantia de R$ 400,00 de que se apossou o depoente; quedeseja esclarecer que, embora graduado da PM, não foi o autor da idéianem da coordenação do delito, tanto que não arranjou fardas nem armasnem capuz, tendo os verdadeiros líderes do grupo, liderança que o depoente

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atribui a José Kléber e Carlos Antônio, feito o rateio do roubo na ausênciado depoente; que o depoente nasceu e se criou na região, principalmenteem Catolé do Rocha, nunca se tendo envolvido com prisões ou processo,tendo caído nessa tentação;”

II) JOSÉ KLÉBER DE SOUSA SILVA: “(...); que a tarefa do depoente erasomente dirigir o carro, mas acabou tendo a participação em todos osatos; que pela manhã naquele 03 de agosto, encontrando-se o depoentecom Carlos Antônio da Silva, o Cabo Carlos Cézar abordou os dois, dizendoque não eram homens porque vacilavam em participar da trama; quefinalmente o Cabo Carlos Cézar dirigindo o corcel de seu pai, levou ogrupo até o local Placas, na entrada para Riacho dos Cavalos e voltoupara uma mercearia de onde se ver todo o movimento do Quartel, que ficade fronte; que ali ficaria o Cabo Cézar, para vigiar se a coisa tinha ‘sujado’,caso em que daria um jeito para avisar o grupo para fugir; que a participaçãodo Cabo Cézar, segundo o próprio e o grupo não seria aconselhável, porquea sua decepada poderia chamar a atenção e denunciar o esquema dosenvolvidos; que, todos sabem, aquela caminhoneta C10 é que conduz osvalores do Correio, nem se fazendo segredo disso; que, como planejadopouco depois de o grupo ser deixado nas Placas, efetivamente lá veio acaminhoneta do Correio; que o menor Júnior tinha sido indicado parafazer parar a viatura com o dinheiro por José Galvão Filho, vulgo Grilo,pois seria um ‘carniceiro’; que o coturno e a Gandola que vestiriam evestiram o menor eram do Cabo Carlos Cézar, ao passo que a calça erade Carlos Antônio da Silva; que o menor pôs-se a frente da caminhonetae fê-la parar, ao que acorreu todo grupo para o assalto; (...); que ao fim deuns 2 km mais ou menos, abandonaram o veículo e entraram no mato,onde fizeram a partilha, cabendo ao depoente R$ 2.200,00; que o depoentelavara para a ação uma velha espingarda 12 de propriedade, que na oraestava na posse de Grilo, ou seja José Galvão Filho; que dita espingarda12 foi jogada num açude próximo ao Quartel, mas já não foi encontradaquando o depoente levou ao local o Tenente da guarnição; que foi dada aoCabo Carlos Cézar a importância de R$ 400,00 com a promessa de maisum presente de um revólver; que o Cabo Cézar havia ficado no barzinhodefronte ao Quartel para avisar eventualmente que o grupo devia voltar,caso houvesse algum problema; que a trama teria sido descoberta porcausa de um telefonema anônimo, tendo finalmente o depoente, depoisde negar, confessado tudo ao Capitão do Quartel, que o Capitão na mesmahora mandou chamar o delegado que tomou o depoimento do depoente,de quem recebeu também a importância de R$ 1.795,00, isto é, os dois eduzentos da partilha do roubo, menos duzentos que o depoente tinhadado, de sua parte ao Cabo Carlos Cézar, menos cinco nem se lembra odepoente por que motivo, talvez na contagem; (...);”

III) CARLOS ANTÔNIO DA SILVA: “(...); que a idéia foi do Cabo CarlosCézar, superior do depoente; que no dia da ação pela manhã, cedo, odepoente encontrava-se na Junta Trabalhista de Catolé do Rocha, quandofoi abordado pelo soldado José Kléber que, em roupas civis e de bicicletaconvidado o depoente para irem beber na casa dele José Kléber, poisambos já tinham desistido da ação criminosa convocada pelo Cabo CarlosCézar; que, quando chegaram à pracinha, lá estava o Cabo com oautomóvel de seu pai de lado e conversando com Grilo e José GalvãoFilho e o menor Júnior; que o Cabo provocou o depoente e Kléber para aprática criminosa, dizendo que ficaria vigiando de fronte ao Quartel; que

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Kléber foi para casa na bicicleta, ficando o depoente na maternidade aolado, onde acabou sendo convencido, numa hora de fraqueza pelo CaboCarlos Cézar, partindo o grupo para apanhar em casa o soldado Kléber;que o Cabo Carlos Cézar deixou o grupo no local chamado Placa, naentrada para Riacho dos Cavalos e foi direto para um barzinho de fronte àCompanhia da PM de onde observaria o movimento para eventualmenteavisar o grupo sobre quaisquer irregularidades; que o menor tinha toda aaparência de maioridade, inclusive bigode, mas a roupa do depoente nãoserviria para ele, bem mais esguio; que, de qualquer maneira havia nabolsa portada pelo grupo um calça de farda do depoente, assim como umcoturno e uma gandola pertencentes ao Cabo Carlos Cézar; que o menorJúnior com a gandola e as divisas do Cabo fez parar a viatura de dinheiroda ECT, tendo o grupo atacado com máscaras; que o depoente demoroua sair pois condicionara a ação à não prática de qualquer violência; (...);que coube ao depoente na partilha reais 2.200,00; que Kléber entregouna hora em que se encontrou com o Cabo R$ 400,00, com a promessa delhe dar depois o revólver; (...);”

IV) JOSÉ GALVÃO FILHO: “(...); que a idéia de toda a trama foi do CaboCarlos Cézar; que o Cabo e o soldado Carlos da Silva pediram ao depoenteque arranjassem um civil para figurar na hora da ação; que o depoente,não tendo a quem indicar, foi visto um dia pelo Cabo e da Silva emcompanhia do menor, com quem jogava umas peladas perto de casatendo os dois manifestado interesse em convidar aquele elemento, queimediatamente aceitou; que o depoente não sabe se o menor é mauelemento e nunca disse isso; que o Cabo apareceu na praça já com ogrupo embarcado no auto de seu pai levando todos até o local denominadoPlacas, na entrada da estrada para Riacho dos Cavalos; que, depois dedeixar o grupo no local, o Cabo foi para um bar de fronte ao Quartel ondeficaria vigiando algum movimento para poder avisar o grupo para a fugaeventual; que pouco depois de chegarem ao local determinado, apareceua viatura com os valores da ECT, tendo o menor Júnior mandado parar,vestido que estava com a calça de da Silva, coturno e gandola do CaboCarlos Cézar; que Kléber portava uma espingarda, o grupo tomou as armasdos dois policiais que vinham guarnecendo os valores, tendo Kléberassumido o volante da caminhonete; (...); que o policial Kléber fez umcroqui para o deslocamento do grupo pela mata até a cidade; que notrajeto fizeram a partilha do roubo cabendo ao depoente R$ 2.200,00;(...);”

24. Vê-se dos textos dos interrogatórios parcialmente transcritos, que aquestão da coordenação, liderança ou chefia da ação – importante para efeito de fixaçãoeventual da intensidade da culpa e fixação eventual da pena – não está bem delineada,embora as informações apontem no sentido do planejamento comum da ação por parte deGrilo e dos policiais, disso não resultando maiores problemas. Com efeito, enquanto JÚNIORaponta como arquitetos do plano todos os partícipes maiores de idade, CARLOS CÉZARRESENDE FREITAS, embora mais graduado da PM, indica como chefes os acusados JOSÉKLÉBER DE SOUSA SILVA e CARLOS ANTÔNIO DA SILVA, alegando que sua função erasimplesmente transportar o grupo até o local do crime, tanto assim que o rateio do dinheirofora feito pelos referidos réus na sua ausência, e a quem coube apenas R$ 400,00 (quatrocentosreais) de um total de um total superior a R$ 11.000,00 (onze mil reais).

25. Já os dois integrantes do grupo acusados por CARLOS CÉZAR

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RESENDE DE FREITAS, ou “Cabo” Freitas, de liderarem a ação, bem assim o réu JOSÉGALVÃO GRILO, foram harmônicos em afirmar que o papel principal na articulação do crimefora desempenhado não por eles, mas pelo próprio CARLOS CÉZAR, a quem atribuem osprimeiros (JOSÉ KLÉBER e CARLOS ANTÔNIO) uma atitude indutora de admoestação feitadiante do “vacilo” de ambos em participarem da ação, ao afirmar que os mesmos não seriamhomens suficientes para a empreitada, no dizer de JOSÉ KLÉBER ou a provocar o brio deambos, no dizer de CARLOS ANTÔNIO. O fato é que tanto CARLOS CÉZAR, ou “Cabo”Freitas, quanto JOSÉ KLÉBER e CARLOS ANTÔNIO tiveram as funções divididas noplanejamento e coordenação do roubo.

26. Os depoimentos das testemunhas arroladas pela denúncia ratificamcom elevado grau de verossimilhança os fatos relatados pelos interrogados, pelo menor JÚNIORSEBASTIÃO DA SILVA e pela mãe deste, MARIA LÚCIA DE ALMEIDA. Todos os depoimentosmencionam, com pequenas variações, as suas presenças no local e horário do crime, afinalidade da viagem no transporte de numerário, a parada na estrada no local conhecidocomo “Placas” a pedido de um suposto policial, a ocorrência do assalto por bandidos armadose mascarados (exceção de JÚNIOR), o disparo de tiros após a ação, a localização posteriordo automóvel dos Correios, a presença de dois policiais servindo como seguranças, dentreoutras informações comuns, apontando para a consistência das confissões feitas pelos réus.O reconhecimento do menor JÚNIOR, por outro lado, foi feito pelas testemunhas JOÃOMELCHÍADES DE OLIVEIRA SOBRINHO, FRANCISCO DAS CHAGAS NUNES DA COSTAe FRANCINEUDO OLIVEIRA CAVALCANTE DE ARAÚJO (que afirmou ter reconhecido tambémos outros assaltantes, às fls. 198/198vº).

27. Diversamente, os depoimentos das testemunhas arroladas pelasdefesas foram pouco esclarecedores, jamais chegando, porém, a negarem a ocorrência dosfatos como narrados na denúncia. Trouxeram informações dispersas, o mais das vezes porouvir dizer na comunidade, especialmente com referências sobre a primariedade e idoneidadedos acusados, suas vidas profissionais, a perda de membro por CARLOS CÉZAR, suacapacidade de dirigir e seu desgosto pela deficiência, etc.

28. Como se vê, os elementos do tipo penal previsto no art. 157 e § 2º doCódigo Penal, estão integralmente presentes, inclusive a intenção dolosa, que, no entendimentoda doutrina finalista, se localiza na própria descrição do tipo, como elemento subjetivo deste,e não na culpabilidade como exposto pelos partidários da teoria causalista. Com efeito, cristalinoe impassível de contestação apresenta-se a intenção e a consciência de delinqüir, de subtraira coisa alheia que sabiam os réus pertencerem à ECT, arquitetando com suficiente antecedênciauma sofisticada trama onde se propuseram a descobrir a data e trajeto do transporte denumerário nas viagem da ECT (possivelmente valendo-se da condições de policiais ou ex-policiais), estudar horários de passagem do veículo e a capacitação dos seguranças (“recrutasda PM, soldados inexperientes”, fls. 17), atrair um civil e ainda por cima menor para a ação (jáque um policial de verdade poderia dar ares de veracidade ao disfarce), forjar disfarces, utilizar-se de veículo para o transporte do banco, planejar croqui de retorno dos agentes à cidadeapós o delito, vigiar a Polícia, etc., restando também configurado o total desprezo pelasregras éticas, profissionais e de convício social, pela completa inversão dos valores inerentesaos agentes da segurança pública envolvidos na prática de crimes.

29. Há notícia, nesse sentido, fornecida pelo próprio réu JOSÉ KLÉBERDE SOUSA SILVA em seu interrogatório, confirmada depois por informação de JÚNIOR, deque referido policial integrou a equipe responsável pela “prisão do menor Júnior, mesmo sabendoque isso poderia revelar toda a trama em que se via envolvido” (fls. 109/110). Apesar de nãoconfirmada em declarações prestadas a este Juízo pelo menor, versão dada pela mãe deJÚNIOR dá conta de que nesse dia o acusado JOSÉ KLÉBER teria sugerido a sua fuga, da

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janela da casa onde a prisão foi efetuada, somente não ocorrida em face do medo doadolescente de ser alvejado pelas costas (conforme declarações de fls. 19). Aliás, o medo deJÚNIOR também pode ter sido o responsável pela omissão constante do primeiro interrogatóriopolicial quanto à participação de CARLOS CÉZAR na realização do assalto.

30. Utilizaram-se, pois, os réus, para o fim almejado, de todos os meiosprevistos nos diversos incisos do § 2º do art. 157 do Código (“violência ou ameaça exercidacom emprego de arma, concurso de duas ou mais pessoas e vítima em serviço de transportede valores e o agente conhece tal circunstância”), necessários para configurar a qualificaçãoda conduta, ou seja, de agravar a pena conforme descrição específica. A violência, de fato, foiexercida com emprego de arma de fogo, com o concurso de quatro pessoas, encontrando-seas vítimas em serviço de transporte de valores, com o conhecimento dessa circunstânciapelo criminosos. Com isso, a pena eventualmente aplicada a final deverá sofrer o acréscimode um terço até metade, nos termos do dispositivo em referência.

31. A responsabilidade dos agentes, assim, já demonstrada em relaçãoaos quatro réus indicados quanto ao crime de roubo qualificado, e examinada na seqüênciaquanto ao delito de corrupção de menores em relação a JOSÉ GALVÃO FILHO, na dicção doart. 29 do CPB estabelece a incursão do agente na pena “na medida de sua culpabilidade”.

32. Essa culpabilidade, no lúcido pensar de JÚLIO FABRINI MIRABETE(“Manual de Direito Penal”, Parte Geral, 7ª ed., Atlas, p. 188), define-se como sendo “aresponsabilidade da conduta típica e antijurídica”, cabendo observar, segundo o mesmo autor,que o dolo e a culpa “não podem ser elementos da culpabilidade: colocando-os como fazendoparte desta, está-se fracionada a estrutura natural da ação”. Do mesmo modo, “do princípioda culpabilidade se depreende que, em primeiro lugar, toda pena supõe culpabilidade, demodo que não pode ser castigado aquele que atua sem culpabilidade (exclusão daresponsabilidade pelo resultado), e, em segundo lugar, que a pena não pode superar a medidada culpabilidade (dosagem da pena no limite de culpabilidade)” (id. p. 188).

33. Tenho para mim que a culpabilidade referida pela Lei e pelo respeitadoautor diz respeito ao grau de participação do agente na conduta criminosa, já que o doloidentificado nas figura delitivas sob exame é o específico, ou elemento subjetivo do tipo, nodizer dos finalistas. Se não fosse assim, realmente, o conteúdo ficaria totalmente esvaziado.A responsabilidade, então, decorre de se proceder de acordo com a lei, como seria peculiara agentes da segurança pública.

34. A figura típica, pois, considerada objetivamente, existe. De certaforma, a própria defesa a admite ao tentar justificar a ocorrência com argumentação sobre apretendida conduta anterior irreprovável dos acusados, sua primariedade e bons antecedentes,chegando-se, inclusive, ao pedido de clemência. Inexistem, por outro lado, alegações isentivasda antijuridicidade ou da culpabilidade. Existem, portanto, condições de condenabilidade.

35. Perpetraram, assim, os acusados CARLOS CÉZAR RESENDEFREITAS, JOSÉ KLÉBER DE SOUZA SILVA, CARLOS ANTÔNIO DA SILVA e JOSÉ GALVÃOFILHO, o delito de roubo qualificado (CP, art. 157 e § 2º, incisos I, II e III), porque subtraíramem proveito próprio a importância de R$ 11.250,00 (onze mil duzentos e cinqüenta reais) daECT, destinada ao pagamento de segurados da Previdência Social, mais outros pertences daempresa, mediante grave ameaça as pessoas dos transportadores e depois de havê-las reduzidoà impossibilidade de resistência, restando indagar-se sobre a participação dos denunciadosno crime de corrupção de menores (Lei nº 2.252, de 1.7.1954, art. 1º), por envolverem nodelito o menor JÚNIOR SEBASTIÃO DA SILVA, cooptado para a empreitada criminosa.

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36. Relativamente ao delito de corrupção de menores, devo registrar, porimportante, que não existem indicações objetivas expressas de que tivessem todos os réusconhecimento sobre a menoridade de JÚNIOR SEBASTIÃO DA SILVA, com exceção deJOSÉ GALVÃO FILHO, que era seu amigo e costumava jogar bola com o menor. Na realidade,nada apontava no sentido de que o referido partícipe dos fatos contasse menos de 18 (dezoito)anos de idade, tanto assim que foi o mesmo utilizado sem qualquer restrição pelos “maiores”para fazer-se passar por policial, com absoluto sucesso. A imputação desse crime, pois, emque pese fundar-se no elemento idade, dado objetivo do tipo penal, exige o conhecimentosobre essa circunstância, não devidamente provada quanto aos réus a ponto de autorizar acondenação, exceto com relação ao acusado JOSÉ GALVÃO FILHO. Nesse sentido, asafirmações sobre a existência de bigode e sobre o porte físico de adulto, capaz de utilizar-sede roupas de policiais militares, sem qualquer necessidade de ajustes.

37. Por tais razões, considero que CARLOS CÉZAR RESENDE DEFREITAS, JOSÉ KLÉBER DE SOUZA SILVA, CARLOS ANTONIO DA SILVA e JOSÉ GALVÃOFILHO praticaram o crime de roubo qualificado, subtraindo da Empresa de Correios e Telégrafos- ECT a importância de R$ 11.520,00 (onze mil e quinhentos e vinte reais), incorrendo nocrime previsto no art. 157 e § 2º, inciso I, II e III, do Código Penal. O último réu, JOSÉGALVÃO FILHO, deve ainda ser responsabilizado pelo delito de corrupção de menores, porter envolvido o adolescente JÚNIOR SEBASTIÃO DA SILVA na ação criminosa, de acordocom o art. 1º da Lei nº 2.252, de 1.7.1954. Já SEBASTIÃO PEREIRA DA SILVA não participoude nenhum dos crimes, não sendo responsável pela receptação imputada na denúncia, umavez que a aquisição dos bens encontrados na sua residência fora feita pelo filho JÚNIOR.Procede, pois, apenas em parte, a denúncia.

38. É certo, entretanto, que os acusados são primários e apresentambons antecedentes, não tendo embaraçado a instrução criminal (até porque permanecerampresos preventivamente). Quando encontrados em delito, devolveram parte dos valoressubtraídos e colaboraram com o esclarecimento do crime, confessando a sua autoria, sem aqual haveria dificuldades para a persecução penal, embora não antes das investigaçõesapontarem para a iminente solução do mistério. Por outro lado, a sofisticação da trama e aexecução dos atos que culminaram no ilícito, bem assim o desprezo demonstrado pela açãodessas pessoas, responsáveis justamente pela segurança da comunidade em que viviam,indicam um grau de periculosidade além dos padrões reais colhidos na sociedade em quevivem os réus, motivo pelo qual permanecem até hoje detidos preventivamente.

39. E não incidem as agravantes previstas no Código Penal, art. 61,inciso II, alínea “c” (“ter o agente cometido o crime... à traição, emboscada, ou mediantedissimulação, ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido”), emvirtude de constar essa elementar do tipo descrito no próprio art. 157 do CPB; ou alínea “f” domesmo dispositivo e Diploma (“com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo,ofício, ministério ou profissão”), em face de não se apresentarem os agentes militares da PMno exercício da função policial. Mas incorreram os réus nas agravantes do art. 62 do CPB,uma vez que cada um teve enquadramento específico nos diversos incisos do artigo citado:CARLOS CÉZAR, quando menos, porque na qualidade de superior dos policiais militaresenvolvidos, incitou-os à ação, sendo ainda um dos responsáveis pela organização e direçãodesta; JOSÉ KLÉBER, pelo fato de haver coordenado a execução, a partilha do dinheiro e oretorno dos agentes à cidade depois do crime; todos, pelo fato de sua participação medianteexpectativa de recompensa em dinheiro.

40. A atenuante do art. 65, inciso I, do CPB, concedida pela Lei aosréus menores de vinte e um anos, por sua vez, não aproveita aos acusados, como parecesugerir o d. representante ministerial em suas alegações finais de fls. 259/261. Na verdade,

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embora relativamente jovens os agentes, com idade variando de vinte a quatro a trinta e umanos, não contempla o dispositivo esse benefício além da idade de vinte e um anos. A referênciatambém feita pelo d. MPF ao art. 16, do CPP, para justificar os benefícios do art. 65, inciso III,alíneas “b” e “d” (“ter o agente... procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logoapós o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparadoo dano;... confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;”) não justificaigualmente a redução de um a dois terços prevista naquele dispositivo (art. 16), emboraautorize as atenuações pretendidas. Isso porque tal artigo apenas aproveita àqueles crimespraticados “sem violência ou grave ameaça à pessoa”. De qualquer sorte, a atenuação tãosomente abrange o crime de roubo, já que dificilmente se poderá reconhecê-la nos casos decorrupção de menores, que constitui a outra hipótese dos autos.

41. Por fim, cabe consignar, em ratificação ao já suficientemente exposto,o completo e total desprezo moral e profissional manifestado pela ação dos réus integrantesda Polícia Militar do Estado da Paraíba, cujo dever de manutenção da ordem e da segurançapública foi ultrajado de maneira grave, constituindo-se causa de suas exclusões da Corporaçãoem referência. Com efeito, a pena fixada em concreto em relação aos acusados na situaçãoindicada soma em relação a cada um o mínimo de 5 (cinco) anos, justificando inteiramente aperda ora decretada, nos termos do art. 92, inciso I, da Lei Substantiva Penal.

42. Realmente, não se pode admitir que indivíduos treinados pelo Estadopara o exercício de múnus relevantíssimo, consubstanciado na prestação do serviço desegurança pública, venham a utilizar-se desses estratégicos conhecimentos para a práticade crimes gravíssimos e ainda possam permanecer incorporados à instituição policial. Atémesmo para expurgar da briosa PM os maus elementos que a denigrem e, por conseqüência,atingem com a sua ação negativa a própria sociedade.

III - DISPOSITIVO (CPP, art. 381, V)

43. ISSO POSTO, com base nos arts. 59 e 60, do CPB, e 387, do CPP,bem assim levando em conta a culpabilidade, a primariedade, os bons antecedentes, a condutasocial e a personalidade dos agentes, conforme exposto na fundamentação, hei por bemcondenar os réus CARLOS CÉZAR RESENDE DE FREITAS, JOSÉ KLÉBER DE SOUZASILVA, CARLOS ANTÔNIO DA SILVA e JOSÉ GALVÃO FILHO à pena de reclusão e multapelo crime de roubo qualificado previsto no art. 157, § 2º, do CPB, fixando-lhes a pena-baseem 5 (cinco) anos e a multa individual em R$ 166,66 (cento e sessenta e seis reais e sessentae seis centavos), correspondente a 50 (cinqüenta) dias multa de valor igual, cada dia, a 1/30(um trinta avos) do salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato (agosto de 1995), quedeverá ser devidamente atualizado pelos índices oficiais de correção monetária, quando daexecução (CP, art. 49, § 2º). Condeno ainda o réu JOSÉ GALVÃO FILHO à pena de reclusãopela prática de corrupção de menores disposta no art. 1º da Lei nº 2.252/54, fixando-lhe apena-base de 1 (um) ano, mais multa de R$ 33,33 (trinta e três reais e trinta e três centavos),correspondente a 10 (dez) dias multa de valor também igual, cada dia, a 1/30 (um trinta avos)do salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato (agosto de 1995), que deverá ser atualizadona forma já mencionada anteriormente. Condeno-os, ainda, nas custas processuais.

44. Absolvo SEBASTIÃO PEREIRA DA SILVA, por inexistir prova de teresse réu concorrido para a infração penal, nos termos do art. 386, inciso IV, do CPP.

45. Reconhecendo quanto aos réus do crime de roubo a existência dasagravantes de que trata o art. 62, incisos I, II, III e IV, do Código Penal e das atenuantes do art.65, inciso III, letras “b” e “d”, do mesmo Diploma, e não vislumbrando preponderância entreumas e outras, mantenho inalterada a pena nesta segunda fase e passo à dosimetria da pena

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nos termos do art. 68 do mesmo Diploma legal, para acrescer a pena em 1/3 (um terço) pelacausa especial de aumento do § 2º do art. 157, uma vez enquadrados os agentes em todosos incisos desse dispositivo e torno a mesma definitiva em 6 (seis) anos e 8 (oito) meses. Emrelação ao crime de corrupção de menores praticado por JOSÉ GALVÃO FILHO, por nãovislumbrar a existência de agravantes ou atenuantes a considerar, nem de causas de aumentoou diminuição geral ou especial de pena, torno-a definitiva em 1 (um) ano. Tais penas são asque julgo suficientes para reprimir e prevenir as condutas delituosas e terão regime inicial decumprimento semi-aberto, relativamente às penas privativas de liberdade.

46. Deixo de substituir a pena privativa de liberdade ou de manifestar-mesobre a suspensão condicional da pena (sursis), nos termos do art. 43, inciso I, 44 e 46 e 77do Código Penal, em face de não se apresentarem passíveis de concessão no processo taisbenefícios, em face do total da pena imposta.

47. Inaplicável o disposto no art. 594 do Código Penal em razão da prisãoprovisória decretada, devendo os réus condenados permanecerem enclausurados, de acordocom precedentes do C. STF (RHC nº 54.430, DJU 26.11.1976, pág. 10103, cit. DAMÁSIO,Código de Processo Penal Anotado, Saraiva, 12ª edição, 1995, pág. 416).

48. Recomendem-se os réus na prisão onde se encontram e, trânsitaem julgado esta sentença, convertam-se ao patrimônio da União os bens apreendidos e nãoreclamados, ressalvado o direito de terceiros, comunique-se ao Estado da Paraíba para finsde perda dos cargos em relação aos réus policiais militares e lancem-se seus nomes no roldos culpados.

49. Oficie-se ao MM. Juízo de Direito da Comarca de Catolé do Rocha,para os fins determinados no item 14 desta sentença, remetendo-lhe cópia desta.

P. R. I.

João Pessoa, 8 de agosto de 1996.

JANÍLSON BEZERRA DE SIQUEIRAJuiz Federal da 1ª Vara, em exercício

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 287

CALÚNIA - LEI DE IMPRENSA

Processo nº 098 / AÇÃO PENALAutor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL.Réu: CARLOS DAVID DE CARVALHO LOBÃO

SENTENÇA

EMENTA: PENAL. DENÚNCIA POR DELITO DE CALÚNIA, NOSTERMOS DO ART.138, DO CP. EMENDATIO LIBELLI.ENQUADRAMENTO DA CONDUTA DELITIVA DO ACUSADO NO ART.20,DA LEI Nº 5.250/67, LEI DE IMPRENSA.

1.Crime contra a honra, calúnia, cometido através de programa de rádio,que se traduz num veículo de comunicação, enquadrando-se a condutadelitiva do acusado, em delito previsto na Lei de Imprensa.

2.Operou-se a prescrição do delito de imprensa, pois já transcorridosmais de 2 (dois) anos entre a data do recebimento da denúncia, que sedeu em 23/11/93, (fls. 95), e a presente data, (26/04/96), impondo-se adeclaração de extinção da punibilidade, pelo reconhecimento daprescrição, nos termos do art. 107, IV, do CP.

DECLARAÇÃO DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.

O ilustre representante do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofereceudenúncia contra CARLOS DAVID DE CARVALHO LOBÃO dando-o como incurso nos arts.138e 141,II, ambos do Código Penal.

Recebida a denúncia, o acusado foi citado e interrogado na forma da lei,fls.106, 106 verso.

A defesa, em alegações prévias de fls. 99/100, sustentou que não sãoverdadeiros os fatos descritos na denúncia.

Depoimento de testemunhas de acusação, às 108,109.

Inquirição de testemunhas de defesa, às fls. 117 a119.

Quanto à fase do art. 499 do CPP, inexistiu requerimento de diligênciaspelas partes.

O parquet, em alegações finais, às fls.121 e 122, requereu aimprocedência da ação para absolver o acusado, sustentando a atipicidade dos fatos descritosna denúncia.

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288 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

A defesa, por seu turno, sustentou a tese de ausência de dolo específico.

Os antecedentes do denunciado, às fls. 127, atestam a situação deprimariedade.

Assim relatados, decido.

O acusado foi incurso nas penas dos arts.138 e 141,II, ambos do CódigoPenal, por ter imputado falsamente fato definido como crime, atingindo a honra objetiva defuncionário público em lato sensu (Juiz Eleitoral), em razões de suas funções.

A conduta delitiva do acusado deu-se por volta das 12:10 horas, em 06/10/92, quando,no Programa “A Hora do povo na TV”, fez referências à atuação do MM. Juiz deDireito, investido da função eleitoral, imputando-lhe o delito de prevaricação, nos termos doart. 319, do CP.

A Legislação Penal prevê, em seu art. 138, o crime de calúnia, comosendo a imputação falsa de fato definido como crime. O texto da Lei nº 5.250/67, em seuart.20, também prevê o mesmo tipo legal, aplicando-se, porém, quando cometido através deveículo de comunicação.

Ora, as afirmações, que atribuíram ao Magistrado a prática de delito,foram veiculadas através de Programa de Rádio, “A Hora do Povo na TV”, promovido pela TVBorborema em Campina Grande, Paraíba. Caracterizando-se, pois, delito de imprensa, definidoem Lei Extravagante, e não crime previsto no Código Penal, art.138, como entendeu o parquet.

A Lei de Imprensa, (Lei nº 5.250/67), prevê delitos contra a honra (calúnia,difamação e injúria), praticados por veículos de comunicação, que pode ser o jornal, periódicos,revistas, rádio, cinema e televisão, pois, segundo a Eminente Jurista DARCY ARRUDAMIRANDA, os delitos previstos na Lei de Imprensa, não se restringem àqueles praticadosapenas por jornais, revistas e periódicos, senão vejamos, in verbis:

“E assim, já agora, não se pode separar o jornal escrito do falado pelorádio, do jornal falado e ilustrado pelo cinema e pela televisão. A diferençaestá apenas na forma material, no produtor e no veículo que para o jornalé a máquina impressora e são as folhas esparsas, e para o rádio, cinemae a televisão são os microfones e a tela.”(In Comentários à Lei de Imprensa,Editora Revista dos Tribunais,3ª Edição, pág.54).

Por estas considerações, entendo que a conduta delitiva do acusadoenquadra-se na hipótese prevista no art.20, da Lei de Impresa, pois os delitos insertos nestaLei podem ser praticados por vários meios de comunicação, inclusive através de Programasde Rádio, como se verificou no caso vertente.

Estamos, pois, diante da emendatio libelli, prevista no art.383, do CPP,que faculta ao magistrado dar definição jurídica diversa daquela contida na denúncia, noscasos em que, na peça acusatória, o parquet descreve perfeitamente o fato concreto dedeterminado crime, e dá-lhe qualificação diversa, pois como já se sabe o acusado defende-sedos fatos contidos na denúncia e não da capitulação dada pelo órgão ministerial.

Convém ressaltar que nenhum prejuízo sofreu a defesa, peloestabelecimento do rito comum e não especial, pelo contrário, pois aquele importa em prazosmais abrangentes do que o previsto na Lei Extravagante.

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 289

Verifica-se que, in casu, em sendo crime de imprensa, a prescrição dapretensão punitiva é sempre de 2 (dois) anos, conforme se vê da leitura do art. 41, da Lei deImprensa, não importando a pena máxima cominada ao crime, a exemplo do delito previstono art. 14, desta Lei,que fixa o limite máximo da pena em 04 (quatro) anos.

No tocante ao delito de calúnia, previsto na Lei de Imprensa, operou-se aprescrição da pretensão punitiva, nos termos dos arts. 109 e 117, ambos do CP, pois játranscorridos mais de 2 (dois) anos entre a data do recebimento da denúncia, que se deu em23/11/93,(fls. 95), e a presente data, (26/04/96).

E considerando que a prescrição é matéria de ordem pública, podendoser declarada de ofício, e em qualquer grau de jurisdição, (art. 61, do CPP), declaro extinta apunibilidade do crime de calúnia, previsto no art.20, da Lei nº 5.250/67, imputado ao acusadona denúncia.

Diante do exposto, DECLARO EXTINTA A PUNIBILIDADE do delito decalúnia, previsto na Lei nº 5.250/67, em seu art.20, imputado ao denunciado na peça inaugural,face ao reconhecimento da prescrição, em conformidade com o art.107, inciso IV, do CP.

Transcorrido o prazo recursal, dê-se baixa na distribuição, comunicando-se ao D.P.F.

P.R.I.

João Pessoa, 26 de abril de 1996.

CRISTINA MARIA COSTA GARCEZJuíza Federal Substituta da 3ª Vara

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FURTO - CONCURSO DE AGENTES

Processo nº 96 / AÇÃO PENALAutor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL.Réu: SEVERINO FERNANDES DA SILVA E OUTROS.

SENTENÇA

EMENTA: PENAL. FURTO QUALIFICADO PELO CONCURSO DEAGENTES. EXISTÊNCIA DE CONTINUIDADE DELITIVA. INFRAÇÃOQUE RESTOU SATISFATORIAMENTE COMPROVADA NESTESAUTOS. CRIME DE RECEPTAÇÃO CULPOSA. CONFIGURAÇÃO NAFORMA TENTADA, O QUE É INADMISSÍVEL EM DELITOS CULPOSOS.ABSOLVIÇÃO.

1. Restou provado o furto qualificado, pelo concurso de agentes, praticadopelos denunciados SEVERINO FERNANDES DA SILVA e DJACI ALVESDA SILVA, e caracterizada a continuidade delitiva, nos termos do art.71,da Lei Substantiva Penal.

2. O delito de receptação dolosa imputado ao acusado SEVERINOPEREIRA DA SILVA não restou provado nestes autos, uma vez que nãocomprovada a existência do dolo direto, ou seja, que o agente sabia aprocedência criminosa da mercadoria que iria receber como pagamentopelo transporte das mercadorias subtraídas.

3. Não se configurando a receptação em sua modalidade dolosa,desclassifica-se o delito para a forma culposa, se o agente não tomou oscuidados necessários para averiguação da procedência da mercadoriaque iria receber.

4. Como o delito de receptação culposa não se consumou, enquadrando-se na forma tentada do delito, o que é inadmissível em delitos culposos,impõe-se a absolvição, nos termos do art. 386, inciso III, do Código Penal.

PROCEDÊNCIA DA AÇÃO EM PARTE.

Cuida-se de ação penal, movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALcontra SEVERINO FERNANDES DA SILVA, DJACI ALVES DA SILVA, SEVERINO PEREIRADA SILVA, estando os dois primeiros denunciados incursos nas sanções do art.155, parágrafo4º, inciso IV, c/c o art.71, ambos do Código Penal e o último incurso nas penas do art. 180,da Lei Substantiva Penal.

Recebida a denúncia, os acusados SEVERINO FERNANDES DA SILVAe DJACI ALVES DA SILVA foram citados por edital, fls.76 verso, sendo decretada a reveliadeles às fls.79. O acusado SEVERINO PEREIRA DA SILVA, foi citado e interrogado na formada lei.

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 291

A defesa, em alegações prévias, reservou-se a apresentar o rol detestemunhas.

Depoimento de testemunha da acusação, às fls. 96 a 98.

Ouvidas as testemunhas arroladas pela defesa, às fls.105 e 106.

O parquet, em alegações finais, às fls.109, requereu a procedência dadenúncia para condenar os acusados, sustentado que a materialidade e autoria do delitoestão sobejamente comprovadas nestes autos.

A defesa, por seu turno, requereu a improcedência da denúncia.

Os antecedentes dos denunciados, às fls. 120, atestam situação deprimariedade.

Assim relatados, decido.

Os acusados SEVERINO FERNANDES DA SILVA e DJACI ALVES DASILVA foram incursos nas penas do art.155, parágrafo 4º, inciso IV, c/c o art.71, ambos doCódigo Penal e SEVERINO PEREIRA DA SILVA enquadrado nas sanções do art.180, da LeiSubstantiva Penal, por terem, os dois primeiros acusados, em três oportunidades, adentradono interior dos armazéns da CONAB- Companhia Nacional de Abastecimento, e subtraídomercadorias de natureza alimentícia, agindo,sempre, em conluio. Quanto a Severino Pereirada Silva foi denunciado por ter tentado receber, em proveito próprio, coisa que sabia serproduto de crime.

A materialidade do delito de furto qualificado encontra-se sobejamentecomprovada às fls. 08, através de relatório da CONAB, que discrimina as mercadorias subtraídas,assim como mediante confissão dos acusados, na fase policial, enumerando as mercadorias,produtos do crime, fls.37 verso e 42.

No tocante à autoria do delito de furto qualificado, é evidente a imputaçãodo fato delituoso aos denunciados SEVERINO FERNANDES DA SILVA e DJACI ALVES DASILVA, uma vez que, na fase policial, confessaram o delito, fls. 37 e 42, senão vejamos osdepoimentos, in verbis;

(DEPOIMENTO DE SEVERINO FERNANDES DA SILVA)

“...que a última vez que estiveram no armazém da CONAB retiraram 06(seis) sacos de feijão e 03 (três) caixas de peixe enlatado...”

(DEPOIMENTO DE DJACI ALVES DA SILVA)

“... que realmente participou do furto de mercadorias da antiga CIBRAZEM,hoje CONAB, ocorrido a partir do carnaval deste ano...”

Quanto à continuidade delitiva, também restou provada, pois, conformedepoimento de fls.43, em três oportunidades os acusados, SEVERINO FERNANDES DASILVA e DJACI ALVES DA SILVA, adentraram nas dependências da CONAB e subtraíram asmercadorias descritas às fls.08, que pelas condições de tempo, lugar, maneira de execuçãoe outras semelhantes, devem os subseqüentes havidos como continuação do primeiro,aplicando-se o art. 71, do CP.

No tocante à caracterização da co-autoria, restou induvidosa, pois Severino

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Fernandes da Silva e Djaci Alves da Silva conforme se infere do depoimento de fls.43, agiramem conluio, a qualificar o delito de furto, enquadrando-o no art. 155, parágrafo 4º, inciso IV, doCódigo Penal, senão vejamos, in verbis:

(DEPOIMENTO DE DJACI ALVES DA SILVA)

“...que entrou no armazém da CONAB em três ocasiões e em todas elasestava acompanhado do seu amigo SEVERINO FERNANDES DA SILVA...”

Convém ressaltar que o delito verificou-se na calada da noite, entretantonão se aplica a qualificadora de repouso noturno, uma vez que esta qualificadora apenas temincidência quanto à figura do furto simples, capitulado no art.155, caput e não quanto ao furtoqualificado, nos termos do art.155, parágrafo 4º, inciso IV, do Código Penal, que é a hipótesedos autos.

Quanto ao reconhecimento da qualificadora inserta no art.155, inciso III,do CP, chave falsa, conforme se infere do depoimento de fls.36 abaixo transcrito, tecereicomentários a respeito, senão vejamos, in verbis:

(DEPOIMENTO DO AGENTE DA POLÍCIA FEDERAL- ANTÔNIOEPAMINONDAS DE BARROS FRANÇA)

“... que, durante o trajeto de viagem de Carrapateira do Piancó a CampinaGrande/PB, o elemento “Didi Loneiro”, (DJACI ALVES DA SILVA)confessou ao depoente e aos demais colegas de trabalho, em detalhes,como tinha penetrado com chaves falsas, Michas, no interior da CONAB,por três vezes, sempre na companhia do “BIU” (SEVERINO FERNANDESDA SILVA)...”

Entretanto, apesar da utilização da Micha para a abertura das portas dosarmazéns da CONAB, entendo não se tratar de chave falsa, pois chave falsa é aquela que nãoé verdadeira e que tem aparência de chave, logo a micha não pode ser enquadrada nestahipótese, uma vez que não possui nenhuma similitude com a chave.

“Não qualifica o emprego de micha para acionar moto.”(TACrSP, Julgados96/177).

“Chave falsa, como é referida no n.III, do parágrafo 4º, do art.155, no CP,é chave mesmo, não se equiparando o objeto cujo labor do agente conduziuao contorno da chave. Mas a micha sequer se assemelha à chave.”(TACRIM-SP-AC-Rel. Camargo Sampaio - JUTACRIM 73/396).

Igualmente, não se considera a qualificadora de destruição ou rompimentode obstáculo à subtração da coisa, nos termos do art. 155, parágrafo 4º, do Código Penal,declarado às fls.97, pela testemunha ZACARIAS HENRIQUE CAVALCANTE, que alegou que:“as ocorrências não foram praticadas com arrombamentos e destruição exceto uma delasque teve serrado um dispositivo de segurança colocado para impedir o crime”, pois nestecaso é imprescindível a feitura do laudo pericial, uma vez que se trata de delito que deixavestígios, aplicando-se o art.158, do CPP. Acosto Jurisprudência dominante para respaldar atese defendida, in verbis:

“Laudo pericial é indispensável para o reconhecimento da qualificativa dedestruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa. (TAMG -Ac- Rel. Elisson Guimarães- RJTAMG 21/3363).”

“Sem regular exame pericial, impossível se torna o reconhecimentoda qualificadora do rompimento de obstáculo à subtração da coisa,

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 293

sendo aliás, pacífica a jurisprudência nesse sentido. (TACRIM-SP-AC-Rel. Lustosa Goulart - JUTACRIM 9944/236).”

No tocante ao delito previsto no art. 180, do CP, de receptação dolosa,imputado ao denunciado SEVERINO PEREIRA DA SILVA, entendo que o delito não restouprovado em sua modalidade dolosa, pois para a configuração do delito de receptação, nestamodalidade, é imprescindível a existência do dolo direto, ou seja, que o agente sabia daprocedência criminosa da mercadoria adquirida ou recebida, o que não restou provado nospresentes autos, pois da instrução criminal colhe-se que pairou dúvidas a respeito doconhecimento, pelo agente, da origem delitiva da mercadoria que iria receber pelo pagamentodo transporte das mercadorias subtraídas (um saco de feijão, fls. 48), senão vejamos, inverbis:

(DEPOIMENTO DE SEVERINO PEREIRA DA SILVA - FASEPROCESSUAL, fls. 88/89)

“... que a mercadoria a ser transportada seria segundo o Sr. Didi um feijãoque teria adquirido numa transação...”

“... que somente por ocasião de sua prisão é que veio saber que amercadoria era produto de crime...”

(DEPOIMENTO DE SEVERINO PEREIRA DA SILVA - FASE POLICIAL,fls. 48)

“... que nesse exato momento o interrogado desconfiou que poderia tratar-se de algo irregular...”

Sabe-se que o fato delituoso deve está satisfatoriamente comprovadonos autos, existindo dúvidas a respeito da autoria e materialidade delitiva, deve-se ser aplicadoo princípio do in dubio pro réu, afastando-se, desse modo, o delito de receptação dolosaimputado ao denunciado SEVERINO PEREIRA DA SILVA.

Ocorre que nesses casos, em não havendo elementos para a condenaçãoem receptação dolosa, desclassifica-se para a receptação culposa, se o agente não tomouos cuidados necessários para a averiguação da origem da coisa recebida ou adquirida, umavez que, pelas condições do lugar onde seria realizada a operação, (“no meio do mato”) ahora, (à noite) deveria ter previsto que se tratava de mercadorias, produtos de crimes, senãovejamos, entendimento jurisprudencial, in verbis:

“Não provada a dolosidade na aquisição do objeto furtado, mas sendomanifesta a inadvertência do adquirente, desclassifica-se sua ação parao tipo delituoso do parágrafo primeiro do art.180 do CP.” (TJMT-AC - Rel.Erasmo do Couto- RT 502/348).

Não obstante a caracterização do delito de receptação culposa imputadoao acusado SEVERINO PEREIRA DA SILVA, tal delito não se consumou, configurando-se,desse modo, a figura da tentativa, prevista no art.14, inciso II, do CP. Ora é inadmissíveltentativa em delitos culposos, restando a conduta do agente atípica, impondo-se a suaabsolvição, nos termos do art.386, inciso III, do CPP.

Diante do disposto, julgo procedente, em parte, a denúncia para absolvero acusado SEVERINO PEREIRA DA SILVA da imputação que lhe é feita na denúncia, e paracondenar os acusados SEVERINO FERNANDES DA SILVA e DJACI ALVES DA SILVA, nostermos do art. 155, parágrafo 4º, inciso IV, c/c o art. 71, ambos do Código Penal, e, atendendoà regra do art.59 do Código Penal, fixo a pena base em 02 (dois) anos de reclusão.

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Considerando que os condenados são primários e de bons antecedentes,assim como, a moderação do dolo, e tendo em vista que inexistem circunstâncias agravantese presente circunstância atenuante, nos termos do art. 65,inciso III, alínea d, do CódigoPenal, da confissões dos acusados, verificadas às fls.37/38 e 47/48 que deixo de aplicá-la,uma vez que a pena-base foi fixada no mínimo legal, hipótese em que não incidemcircunstâncias legais (atenuantes ou agravantes), pois as penas não podem ser aplicadasfora dos limites previstos pela lei penal, em razão de circunstâncias legais, mas sim, emrazão das causas especiais de aumento e diminuição da pena. Respaldo este entendimentoem Jurisprudência dominante, in verbis:

“As penas não podem ser aplicadas fora dos limites previstos pela leipenal, em razão de circunstâncias atenuantes ou agravantes. Tão só porforça de causas de aumento ou diminuição, esses limites podem serultrapassados, porque, em casos que tais, ocorre o surgimento de umasubespécie delituosa, com um novo mínimo e novo máximo”. (TACRIM-SP- AC- Rel. Reynaldo Ayrosa - BMJ 26/20).

Ausente causa de diminuição de pena, mas presente causa de aumentode pena, prevista na parte geral do CP, em seu art. 71, razão pela qual aumento a pena-base,inicialmente fixada em 02 (dois) anos de reclusão, em 1/6 (um sexto), tornando-a definitivaem 2 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão.

Condeno, ainda, os acusados, SEVERINO FERNANDES DA SILVA eDJACI ALVES DA SILVA, à pena pecuniária de 10 (dez) dias multa à razão de 1/30 (um, trintaavos), o dia multa, referente ao salário mínimo vigente à época do fato criminoso descrito nadenúncia.

O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade impostaaos condenados é o aberto, sendo executada a pena em dependência adequada daPenitenciária Média de Mangabeira desta capital.

Passada em julgado a presente condenação, lance-se o nome doscondenados no livro “Rol dos Culpados”, podendo, entretanto, recorrerem em liberdade (art.594, do CPC).

Ajunte-se à presente condenação a concernente ao pagamento das custasdo processo.

Comunicações necessárias.

P.R.I.

João Pessoa, 16 de maio de 1996.

CRISTINA MARIA COSTA GARCEZJuíza Federal Substituta da 3ª Vara

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FALSO TESTEMUNHO

Processo nº 93.12016-6 / AÇÃO PENALAutor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALRéu: SEVERINO BARBOSA DA SILVA

SENTENÇA

EMENTA: PENAL. CRIME DE FALSO TESTEMUNHO. Não comete ocrime de falso testemunho a testemunha que, por falsa percepção darealidade, faz afirmação que não lhe corresponde. Ademais, no casoconcreto, não vislumbrado o dolo específico consistente no propósitodeliberado de falsear a verdade, nem o potencial lesivo, por incidir aafirmação em fato não juridicamente relevante. Rejeição da denúncia.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofereceu denúncia contra SEVERINOBARBOSA DA SILVA, qualificado nos autos, tendo-o como incurso nas penas do art. 342,caput, do Código Penal.

Segundo a denúncia:

“1. No dia 06 de maio do corrente ano (1993), o denunciado prestoudepoimento durante audiência trabalhista que se desenrolava na Junta deConciliação e Julgamento, no município de Mamanguape-PB, na condiçãode testemunha do reclamado, ocasião em que falseou a verdade, para,em tese, favorecer a parte que o tinha arrolado como testemunha dedefesa.

2. O falso testemunho restou perceptível a partir do momento em que odenunciado, mesmo com oportunidade de se retratar, voltou a insistir quea parte reclamante teria trabalhado na Fazenda Sapucaí, no município deRio Tinto-PB, no plantio de cana de açúcar, quando, pelas demaistestemunhas, ficou provado que o autor da demanda prestara seu laborna Fazenda Miranda, em Mamanguape-PB;

3. O denunciado só veio a reconhecer o seu erro, já no IPL, e ainda assimo atribuindo ao fato do reclamante, de nome Reginaldo Simão da Silva,muito embora tenha trabalhado na Fazenda Miranda, em sua carteira detrabalho consta o seu registro como empregado da Fazenda Sapucaí,ambas pertencentes a um mesmo proprietário, o que será devidamenteesclarecido no decorrer da instrução criminal.”

Recebida a denúncia, em 11.11.93 (fls. 33), foi expedida Precatória citatória,às fls.36.

Interrogado (fls. 37 e verso), sustentou o denunciado não ter agido com

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296 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

dolo, pois ao afirmar que o reclamante trabalhava na Fazenda Sapucaí, quando na realidadetrabalhava na Fazenda Miranda, levou em consideração as anotações constantes da suaCTPS.

Defesa prévia (fls. 40), pugna pela extinção da punibilidade, em razão daretratação levada a cabo antes da prolação da sentença.

Expedida Carta Precatória para oitiva das testemunhas arroladas pelaacusação, foi tomado o depoimento de ODAIR ALVES DA SILVA (fls. 61), que alegoudesconhecer o reclamante. Quanto às demais testemunhas, SEVERINO FRANCISCO DELIMA e CARLOS ANTONIO DA SILVA, não localizadas (cf. certidão de fls. 60 verso), foramdispensadas pelo Órgão Ministerial (fls. 63 verso).

Deprecada a inquirição das testemunhas da defesa, foi colhido odepoimento de JOSÉ MATIAS DE LIMA, nos seguintes termos:

“Que o Sr. Reginaldo Simão da Silva, reclamante, no processo trabalhista,trabalhava junto à Faz. Miranda, e não na Faz. Sapucaí; que acha ter sidoum engano do acusado, ao afirmar que o reclamante supra citadotrabalhava na Faz.Sapucaí, pois é comum mesmo trabalhando na Faz.Miranda, os funcionários desta prestar serviços de emergências na Faz.Sapucaí, assim e neste ponto, conclui-se pelo motivo do engano, ademaisambas as Fazendas são do mesmo proprietário; que assim que tomouconhecimento, o acusado, da realidade de seu engano, procurou a Justiçaa fim de se retratar, e esclarecer a verdade dos fatos;... que existemcasos em que o empregado é registrado nos termos da lei trabalhistacomo vinculado a uma fazenda, entretanto trabalha em outra, como ocaso do Sr. Reginaldo, que era registrado na Faz. Sapucaí, e trabalhavana Faz. Miranda; da mesma forma o depoente tem sua carteira registradacomo prestando serviços a Faz. Nossa Senhora de Lourdes, quando narealidade desempenha suas atividades na Fazenda Miranda”.

Face o não comparecimento das testemunhas restantes, foi deferida adispensa de seu depoimento.

Na fase no art. 499, do CPP, nada foi requerido.

Em alegações finais, o Ministério Público Federal requereu a absolviçãodo acusado, nos termos do art. 386, III, do CPP, aduzindo, em resumo, que a contradição nodepoimento do acusado não resultou de má fé, além de haver recaído sobre fato juridicamenteirrelevante, sem potencial lesivo.

Não apresentadas alegações finais, pela defesa, no prazo legal, foideterminada a intimação do denunciado para constituir novo defensor, sobrevindo as alegaçõesde fls. 89/90, sustentando a primariedade do acusado e inexistência de prova do cometimentodo crime descrito na denúncia.

Os antecedentes criminais do acusado atestam sua condição deprimariedade.

Relatados, DECIDO.

O acusado foi arrolado como testemunha nos autos da Reclamação

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Trabalhista movida por REGINALDO SIMÃO DA SILVA contra PAULO FERNANDO C. MORAIS,onde objetivado o recebimento do salário mínimo integral, férias, 13º salário, além das parcelasrescisórias não adimplidas, em razão da relação de emprego mantida no período de 01.03.92a 25.01.93, conforme detalhado na Ata de Instrução e Julgamento de Reclamação nº 031/93,às fls. 15. Vê-se ainda daquele documento que o reclamado confirmou o vínculo empregatício,desconhecendo, entretanto, o período laboral declinado na exordial, este, portanto, o únicoponto controverso, relevante para o deslinde da demanda.

O tipo descrito no art. 342, do CP estatui que consiste falso testemunhoou falsa perícia fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade, como testemunha, perito,tradutor ou intérprete em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral.

Comentando o dispositivo aludido, ALBERTO SILVA FRANCO, JOSÉSILVA JÚNIOR, LUIS CARLOS BETANHO, RUI STOCO, SEBASTIÃO CARLOS FELTRIN,VICENTE CELSO DA ROCHA GUASTINI e WILSON NINNO, em Código Penal e suaInterpretação Jurisprudencial, 4ª ed., Editora Revista dos Tribunais, pág. 1772, assim seposicionam:

“Sobre o que se deva entender aqui por falsidade, há duas teorias: aobjetiva e a subjetiva. Segundo a primeira, falso é o testemunho quando oque foi dito não corresponde ao efetivamente sucedido. Pela segunda, éfalso o que não está em correspondência com o que a testemunhapercebeu. Num caso, faz-se referência ao que aconteceu: no outro, aoque a testemunha viu. Este último é o critério dominante, que remonta àlição de Carrara.

.....................................................................................

Falso é o depoimento que não está em correspondência qualitativa ouquantitativa com o que a testemunha viu, percebeu ou ouviu. Conformeadvertia Carrara, o critério de falsidade do testemunho não depende darelação entre o dito e a realidade, mas de relação entre o dito e o estadode consciência da testemunha.”

Ora, o conjunto probatório é uníssono quanto ao fato de que o reclamanteera empregado da Fazenda Sapucaí, apesar de trabalhar na Fazenda Miranda, daí perfeitamentecrível que o acusado, testemunhando sobre o fato, ao afirmar que o reclamante trabalhava naFaz. Sapucaí, agiu movido pela percepção que tinha da realidade, posto que do seuconhecimento que constava da carteira profissional do reclamante a Fazenda Sapucaí.

Mostram ainda os elementos de prova que ambas as fazendas - Sapucaíe Miranda - são propriedade do reclamado, Paulo Fernando C. Morais, sendo comum ostrabalhadores de uma fazenda, prestarem serviços na outra, daí possível a qualquer um incorrerem equívoco quanto à real situação trabalhista do reclamante.

Bastante elucidativo o depoimento da testemunha arrolada na defesa,quando afirma que:

“...é comum mesmo trabalhando na Faz. Miranda, os funcionários destaprestam serviços de emergências na Faz. Sapucaí, assim e neste ponto,conclui-se pelo motivo do engano, ademais ambas as Fazendas são domesmo proprietário; que assim que tomou conhecimento, o acusado, darealidade de seu engano, procurou a Justiça a fim de se retratar, eesclarecer a verdade dos fatos;... que existem casos em que o empregadoé registrado nos termos da lei trabalhista como vinculado a uma fazenda,

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entretanto trabalha em outra, como o caso do Sr. Reginaldo, que eraregistrado na Faz. Sapucaí, e trabalhava na Faz. Miranda; da mesmaforma o depoente tem sua carteira registrada como prestando serviços àFaz. Nossa Senhora de Lourdes, quando na realidade desempenha suasatividades na Fazenda Miranda”.

Ressalte-se que ainda que tivesse incorrido o acusado em mentira, estanão teria relevância jurídica, mas apenas censura moral, haja vista que sem nenhumapotencialidade lesiva à administração da Justiça.

Com efeito, o ponto controverso que remanescia para deslinde, consistiaem perquirir acerca do período efetivamente trabalhado pelo reclamante. Assim sendo, apergunta formulada na instrução, que culminou na resposta do denunciado, não tem interessedireto ou indireto para o desfecho do processo, daí impossível o dano a ser causado pelasimples troca do local de trabalho, levando-se, inclusive, em consideração, que ambas asfazendas pertenciam ao reclamado, Paulo Fernando C. Morais.

Essa, também, a conclusão do eminente Procurador Regional daRepública, Dr. Eitel Santiago de Brito Pereira, verbis:

“Destarte, se o depoimento falso do denunciado em nada influiu noresultado do litígio, não provocando nenhuma espécie de prejuízo, apesarda inexatidão, descaracterizado está o crime de falso testemunho, pois,é imprescindível para a tipificação do crime previsto no art. 342 do CP quea falsidade do testemunho diga respeito a fato juridicamente relevante epertinente ao objeto do processo.

A mais renomada jurisprudência comunga do nosso entendimento, senãovejamos:

Se o depoimento acoimado de falso nenhuma influência teve no deslindeda causa, não há que falar, sequer em tese, no delito do art. 342 do CP,por não conter aquele qualquer potencialidade lesiva” (TJSP - RHC - Rel.Des. Xavier Homrich - RT 511/356)

“Falsidade de testemunho, para que se considere criminosa, deve incidirsobre fato juridicamente relevante e pertinente ao objeto do processo deque se trate. Desaparece a ratio da incriminação se a falsidade versasuper accidentalibus ou fatos estranhos ao thema probandum. Sempotencialidade lesiva, o falso testemunho será um ato imoral, mas nãoantijurídico” (TJSP - RHC - Rel. Des. Acácio Rebouças - RT 448/293).

O dolo fica ainda excluído pelo comparecimento espontâneo do denunciadoperante o MM. Juiz Trabalhista para desfazer o equívoco, quando dele tomou ciência, não secogitando, entretanto, como bem realçou o Ministério Público, em se falar em extinção depunibilidade, porque sua retratação se deu após o julgamento da reclamatória.

Isto posto, rejeito a denúncia e absolvo SEVERINO BARBOSA DA SILVA,com apoio no art. 386, III, do Código de Processo Penal, da imputação que lhe foi feita.

P. R. Intimem-se.

João Pessoa, 31 de maio de 1996.

CRISTINA MARIA COSTA GARCEZJuíza Federal Substituta da 3ª Vara

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FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTOS

Processo nº 93.04768-0 / AÇÃO PENALAutor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALRéus: WALGHTON FERREIRA DE LIMA e WILSON ALVES SOUZA

SENTENÇA

EMENTA: PENAL. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO E ESTELIONATO.CONCURSO MATERIAL E DE AGENTES. INOCORRÊNCIA.CONCURSO FORMAL. APLICAÇÃO DA PENA. INTELIGÊNCIA DO ART.70, DO CÓDIGO PENAL. PROCEDÊNCIA PARCIAL DA DENÚNCIA.

1- Concurso de agentes. Não demonstrado o liame psicológico, a adesãoconsciente e voluntária de estar contribuindo para o ato delituoso, não sehá falar em co-autoria ou participação.

2- Falsidade ideológica e estelionato. O Cl. Supremo Tribunal Federaltem acenado com o entendimento de que há concurso formal quando afalsidade é meio para a prática de outro crime como o estelionato.Precedentes - STF - RE - Rel. Min. CARLOS MADEIRA - RT 636/445.

O digno representante do Ministério Público Federal denunciouWALGHTON FERREIRA DE LIMA e WILSON ALVES SOUZA, qualificados nos autos, comoincursos nas sanções dos arts. 29, 171, § 3º e 299, todos do Código Penal, por contribuíremativamente para a falsificação de documentos em nome de Josilene Pereira Lima, BeneditaLima da Silva e Adeilza Maria de Souza, pessoas essas fictícias, com o intuito de fraudar oINSS, através de benefícios irregulares concedidos em homenagem aos documentos edeclarações eivados de vícios.

Recebida a denúncia, em 26.07.93, foram os acusados interrogados àsfls. 154/155 e apresentadas suas defesas prévias às fls. 156/157, por advogado constituídona pessoa do Bel. Ananias Pordeus Gadêlha, nelas constando rol de testemunhas.

A exordial arrolou uma única testemunha, de nome AGNALDO DEALMEIDA BRAGA, ouvida através de precatória, na Comarca de Alexandria/RN, em cujodepoimento disse desconhecer a autoria dos fatos delituosos narrados na denúncia, nadapodendo informar, nem por ouvir dizer.

Das seis testemunhas arroladas pelas defesas dos acusados,apenas quatro foram ouvidas, de nomes: MANOEL FELIPE DAS NEVES, SEVERINORAIMUNDO DA SILVA, PEDRO ALVES SARMENTO e JOVENTINO JOAQUIM DE ALENCAR,também por precatória inquisitória ao MM. Juízo da Comarca de Souza/PB, que declararamnada saber que desabonasse as condutas dos acusados, tidos como pessoas de bem etrabalhadoras. Dispensados os depoimentos de CLIDENOR JOSÉ DAS NEVES e FRANCISCO

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ALVES DE SOUZA.

Em diligências, as partes nada requiseram.

Na fase do art. 500 do CPP, o Ministério Público pediu a condenaçãodos acusados, como incursos nos arts. 29, c.c. o art. 299, ambos do Código Penal, porrestarem comprovadas a autoria e materialidade dos delitos, não havendo nenhuma excludenteda criminalidade, deixando de pugnar pela condenação com relação ao crime de estelionato,por insuficiência probatória (fls. 198/199).

A defesa dos acusados, por seu turno, pugnou pela absolvição,sustentando, em resumo, que não praticaram os atos que compõem a elementar dos tiposem que enquadrados (fls. 202/203).

Requisitados os antecedentes criminais dos acusados, sobrevieramas certidões de fls. 207, 210 a 212, atestando sua situação de primariedade.

Relatados, no essencial, DECIDO.

WALGHTON FERREIRA DE LIMA e WILSON ALVES SOUZAforam acusados de terem praticado, em concurso material e de pessoas, os crimes deestelionato qualificado (art. 171, § 3º, CP) e falsidade ideológica (art. 299, CP).

Segundo o art. 171, § 3º, do Código Penal, o crime de estelionatoqualificado se configura quando alguém obtém para si ou para outrem vantagem ilícita, emprejuízo de entidade de direito público ou equiparada, induzindo ou mantendo alguém emerro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.

A segunda figura delituosa, prevista no art. 299, também do CódigoPenal, é descrita como sendo o fato de alguém omitir, em documento público ou particular,declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversada que deveria ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdadesobre fato juridicamente relevante.

Segundo a denúncia, o acusado WALGHTON FERREIRA DE LIMAinseriu, em uma Folha de Informação Rural, declaração falsa, afirmando que Josilene PereiraDiniz era dependente de Francisco Dantas Diniz, seu empregado rural, tendo tal documentosido utilizado para a concessão de pensão previdenciária, em detrimento dos cofres daPrevidência Social.

WILSON ALVES DE SOUZA, por seu turno, segundo a acusação,na qualidade de representante do FUNRURAL, foi responsável pela concessão dos benefíciosde Josilene Pereira Diniz, Benedita Lima da Silva e Adeilza Maria de Souza, com base emdocumentos ideologicamente falsos.

Cumpre, pois, analisar, recorrendo aos elementos probatóriostrazidos aos autos, se os denunciados cometeram, na realidade fática, as figuras típicas quelhes foram imputadas pelo Ministério Público Federal.

Com relação ao denunciado WALGHTON FERREIRA DE LIMA, écerto que exsurge induvidosa a materialidade dos fatos descritos na denúncia - declaraçãoideologicamente falsa de fls. 43, criando obrigação para o ex-FUNRURAL e a obtenção debenefício fraudulento por terceiro, em prejuízo da autarquia. Quanto à autoria, resta comprovada

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pelo laudo pericial de exame grafotécnico, apontando como do punho do acusado a assinaturano documento aludido, corroborada pela confissão na fase inquisitorial. Sem relevo, portanto,a tentativa de retratação quando do interrogatório judicial.

Entendo, entretanto, que, apesar de delineados os aspectosextrínsecos dos delitos, não restou demonstrado o elemento subjetivo dos tipos penais descritosno estelionato qualificado e falsidade ideológica, isto é, a vontade livre e consciente deprejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante (falsidadeideológica), com o fim de obter vantagem ilícita (estelionato).

Transcrevo, para ilustrar, o interrogatório do denunciado, na faseextrajudicial (fls. 74 e verso):

“... que nasceu neste Sítio, e nunca foi morar em outro local, visto termontado aqui toda a sua família, mesmo porque vive da agricultura,juntamente com os integrantes de sua família: que mostrado nestemomento a Folha de Informação Rural, onde consta uma fotografia deuma mulher de nome JOSILENE PEREIRA DINIZ, a qual teria sido suaempregada no período compreendido entre 1962 a 1985, no Sítio Vassoura,no Povoado de Casinha do Homem, não reconhece a mesma; quemostrado mais de uma vez como também para toda a sua família aquipresente, ninguém a reconheceu como sua moradora, todavia confere onúmero do seu CPF, o qual teria dado em data que não se recorda a umtal de “Zé Boió”, atualmente vereador na cidade de Santa Cruz; quereconhece a sua assinatura aposta na Folha de Informação Rural - fls. 43,todavia não sabe e nem se lembra aonde foi o local que assinou, muitomenos quem lhe pediu para fazer tal coisa; que o único documento quelembra-se ter assinado foi para problemas com a escritura de sua casa,isto no Cartório do Tabelião Público FRANCISCO SOBREIRA DEOLIVEIRA E EM NENHUM OUTRO LOCAL MAIS...”

No interrogatório judicial, o denunciado ratificou a declaração de que nãoconhecia a beneficiária da fraude, negando, inicialmente, a autoria da assinatura na Folha deInformação Rural de fls. 43, ressalvando, a final, a possibilidade de ter assinado tal documentoa mando de alguém, que não se lembra.

A única testemunha arrolada pela acusação, nada esclareceu sobre osfatos em apuração, restando contra o acusado, apenas, o fato de sua assinatura, em formuláriopadronizado da Previdência, no campo destinado ao empregador/declarante de FranciscoDantas Diniz (pág. 43 dos autos). Nada mais há nos autos que autorize o convencimento deque o denunciado tenha assinado tal documento com a vontade livre e consciente de induzirem erro os funcionários da autarquia previdenciária, com o fim de obter para Josilene PereiraDiniz, pessoa que lhe é estranha, benefício previdenciário indevido. Nenhum liame entre aconduta isolada do denunciado, apondo sua “assinatura”, na folha xerocopiada que lhe foiexibida, foi estabelecido com os momentos dos crimes consumados. Analfabeto e isoladocom sua prole, no seu pedaço de chão, teria ele obtido êxito, nos cuidados normais que seexige ao homem comum, em aferir, através de terceiro, o real conteúdo do documento queestaria assinando? Ou foi mais uma vítima, em sua boa fé, uma “massa de manobra” de genteinescrupulosa? Teria ele realmente tomado conhecimento do vício que inquinava o documentoe aderido à consumação do ilícito em conluio com o co-acusado? Com que objetivo? Sãoindagações para as quais não encontro respostas na prova produzida.

É cediço que inexistente o dolo específico de violar o conteúdo de valor

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da norma, não se realiza o tipo penal, uma vez que, modernamente, não se pode recusar oconceito integrado de crime, a existência do elemento subjetivo do injusto, daí resultando,com relação às figuras descritas na denúncia, como a quaisquer outras, que não há margempara a responsabilidade objetiva. Não tenho, pois, como considerar como prova conclusivacontra o acusado, sua mera assinatura no documento referido.

Por outro lado, não vejo como prevalecer a nova posição sustentada pelaProcuradoria Regional da República de que subsiste o delito de falsidade ideológica,considerando que, igualmente, não restou esclarecido qual o elemento subjetivo que presidiua conduta do réu.

Observe-se que o perfil do denunciado WALGHTON FERREIRA DE LIMA,homem humilde do sertão, que nunca saiu dos limites de sua pequena propriedade, de ondetira seu sustento e de sua família, analfabeto, sabendo, apenas, desenhar, de forma nãointeligível, seu nome, convence da verossimilhança da afirmação de que assinara o documentoem questão, a pedido de alguém. Não há qualquer evidência de que soubesse do vício queestava a macular seu conteúdo e/ou da finalidade a que se destinava. O acusado poderia atéter conhecimento do conteúdo viciado da declaração. Contudo, a meu ver, esta intençãodolosa não restou comprovada. Tenho, portanto, que o denunciado não pode ser identificadocomo autor das figuras típicas descritas na denúncia, inclusive porque inexistentes em suaforma culposa.

Quanto ao alegado concurso de pessoas, rejeito-o, uma vez queindispensável à sua configuração o liame subjetivo ou psicológico, isto é, o acordo de vontades,a adesão, a consciência do agente co-autor ou partícipe de estar contribuindo para o atodelituoso.

Ora, não restou provado de que o denunciado conhecesse a beneficiáriada pensão, o representante do FUNRURAL co-acusado, e houvesse aderido à consecução eaos objetivos dos fatos típicos e anti-jurídicos perpetrados, não bastando, pois, apenas onexo causal consistente na aposição da “assinatura”, pelo denunciado WALGHTON FERREIRADE LIMA, em declaração de informação rural ideologicamente falsa e a concessão do benefíciofraudulento, embasada naquele documento, pelo co-denunciado WILSON ALVES SOUZA.

Com relação ao acusado WILSON ALVES SOUZA, entendo que restoudemonstrado que o mesmo sabia, antes de autorizar a concessão dos benefícios previdenciáriosem favor de Josilene Pereira Lima, Benedita Lima da Silva e Adeilza Maria de Souza, que osdocumentos que embasaram os pedidos de pensão previdenciária eram ideologicamentefalsos, tendo, inclusive, participado da manobra que culminou com a inserção da declaraçãode informação rural ideologicamente falsa pelo octagenário Augusto Viana de Sousa, emfavor de BENEDITA LIMA DA SILVA.

Como bem destacou o Parquet Federal em suas alegações finais:

“Wilson Alves Souza reconheceu que assinou todos aqueles documentos,mas declarou que confiava que fossem verídicos os dados delesconstantes, não tendo, pois, o objetivo de fraudar o INSS. Ocorre que oSr. Augusto Viana de Sousa, que assinou a Folha de Informação Rural deBenedita Lima Silva, declarou que não a conhecia e que foi Wilson AlvesSouza que lhe pedira tal comportamento. Disse ele, em seu depoimentode fls. 80:

‘...Que reconhece a sua assinatura aposta na folha de informação rural,lembrando que fora o chefe do FUNRURAL de Santa Cruz, WILSON ALVES

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SOUZA que lhe pedira, no próprio órgão, inclusive pedira muita calmapara assiná-la; Que devido a idade avançada e por ser analfabeto, assinacom muita dificuldade, além do mais tem a mão trêmula...’ “

Tenho, portanto, como comprovada a atuação criminosa do denunciadoWILSON ALVES SOUZA, fazendo inserir, dolosamente, o falsum nos documentos, visando aobtenção de vantagem patrimonial indevida junto à Previdência Social, como de fato houve,como comprova o levantamento feito pela Auditoria interna do INSS, onde apurado que ADEILZAMARIA DE SOUSA recebeu, indevidamente, Cr$ 45.771,10, BENEDITA LIMA DA SILVA, Cr$45.771,10 e JOSILENE PEREIRA DINIZ, Cr$ 45.769,84 (Valores históricos), ficando, portanto,desmoralizada a versão apresentada pela sua defesa.

A denúncia pugnou pela condenação nas penas dos delitos de estelionatoe falsidade ideológica, em concurso material. Adoto, no entanto, o oriente gizado pelo Cl.Supremo Tribunal Federal, em casos como o ventilado nestes autos, no sentido de que háconcurso formal quando a falsidade é meio para a prática de outro crime, como o estelionato(STF - RE - Rel. MINISTRO OSCAR CORREIA - RT 606/445), impondo-se, de conseqüência,a aplicação da regra do art. 70 do Código Penal.

Nessa linha de entendimento, transcrevo Acórdão do Eg. TRIBUNALREGIONAL FEDERAL DA TERCEIRA REGIÃO:

Ementa:

I - CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO QUE NÃOPODE SER TIDO COMO CRIME-MEIO PARA A PRÁTICA DO CRIME-FIM, O ESTELIONATO.

II - NÃO SE PODE APLICAR AQUI O PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO,NÃO SÓ EM VIRTUDE DAS HETEROGÊNEAS OBJETIVIDADESJURÍDICAS, COMO TAMBÉM, EM VIRTUDE DE O CRIME-MEIO SERMAIS GRAVEMENTE APENADO QUE O CRIME-FIM.

III - ADMITIR-SE A ABSORÇÃO DO FALSO PELO ESTELIONATO ECOLOCAR O PROBLEMA NO ÂMBITO DO CONFLITO APARENTE DENORMAS EM FLAGRANTE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOSDOUTRINÁRIOS QUE O REGEM, PORQUANTO NELE SE EXIGE DOISPRESSUPOSTOS FUNDAMENTAIS: UNIDADE DE FATO EPLURALIDADE DE NORMAS IDENTIFICANDO O MESMO FATO COMOCRIMINOSO. IN CASU DOIS SÃO OS FATOS: A FALSIFICAÇÃO DEDOCUMENTO PÚBLICO E O ESTELIONATO.

IV - A ABSORÇÃO DO FALSO PELO ESTELIONATO SERIACONSIDERÁ-LO UM ANTEFACTUM IMPUNÍVEL O QUE NÃO ÉPOSSÍVEL, PORQUANTO PARA A SUA ACEITAÇÃO MISTER SERIAQUE O FATO ANTECEDENTE IMPUNÍVEL REPRESENTASSEAGRESSÃO AO MESMO BEM JURÍDICO E DO MESMO SUJEITO. NAFALSIFICAÇÃO, O BEM JURÍDICO TUTELADO É A FÉ PÚBLICA. NOESTELIONATO, O PATRIMÔNIO.

V - CONCURSO FORMAL E NÃO MATERIAL DE CRIMES, NA ESTEIRADO POSICIONAMENTO ADOTADO PELO EXCELSO PRETÓRIO.APLICAÇÃO DO ARTIGO 70 DO CÓDIGO PENAL.

VI - APELAÇÃO DO RÉU IMPROVIDA. PROVIMENTO DO RECURSODA JUSTIÇA PUBLICA. (TRIBUNAL:TRF3ªR, ACORDÃO RIP:00000000

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DECISÃO:08-09-1992, PROC:ACR NUM:00308963 ANO:91 UF:SPTURMA:01 REGIÃO:03, Relator: JUIZ:319 - JUIZ SINVAL ANTUNES-COLEÇÃO JURIS-CD, 9ª EDIÇÃO)

Isto posto, considerando que restaram evidenciadas a materialidade e aautoria, patentes à tipicidade, à antijuridicidade e à culpabilidade componentes da estruturados crimes de estelionato qualificado contra a Previdência e falsidade ideológica, JULGOPROCEDENTE, EM PARTE, a denúncia, para condenar WILSON ALVES SOUZA nas penasdos arts. 171, § 3º e 299, caput, combinado com o art. 70, todos do Código Penal.

Para efeito de aplicação da pena, nos termos do art. 70, CP, tomo emconsideração a sanção decorrente da infração do art. 171, § 3º, do Código Penal.

Analisando as circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do CódigoPenal, vejo que o réu é primário, com família constituída e integrado na sociedade.Considerando, por outro lado, a circunstância de o acusado estar, à época do fato, à frente darepresentação da autarquia prejudicada, fixo-lhe a pena-base em 01 (um) ano e 04 (quatro)meses de reclusão.

Não identifico, na espécie, a presença de outras circunstâncias agravantesou atenuantes, nem de causas de diminuição da pena. Presente a causa especial de aumentode pena, prevista no § 3º do art. 171 do Código Penal, em face do estelionato ter sido praticadoem detrimento de autarquia federal (RE 115.182, Rel. MINISTRO CARLOS MADEIRA, DJUde 17.06.88). Assim sendo, aumento a pena-base fixada em 01 (um) ano e 04 (quatro) mesesde reclusão, em 1/3 (um terço), tornando-a definitiva em 01 (um) ano e 09 (nove) meses dereclusão.

Condeno-o, ainda, à pena de multa, que fixo em 20 (vinte) dias-multa, quedeverá ser adimplida dentro de 10 (dez) dias, após o trânsito em julgado desta sentença.Arbitro o dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do maior salário mínimo mensal vigente ao tempodo fato delituoso, devidamente atualizada, com arrimo nos arts. 49, 50 e 60 do Código Penal.

Presentes os requisitos do art. 77, do Código Penal, concedo-lhe o sursis,pelo prazo de 02 (dois) anos, desde que aceite as seguintes condições:

a) comparecer trimestralmente, à presença do Juiz da Vara de ExecuçõesCriminais, informando o domicílio e suas atividades, durante todo o períodode prova;

b) prestar serviços, no primeiro ano de suspensão da pena, à comunidade,através de entidade assistencial ou programa credenciado (art. 46, doCódigo Penal).

À presente condenação, ajunte-se, ainda, a concernente à obrigação docondenado pagar as custas do processo.

Quanto ao acusado WALGHTON FERREIRA DE LIMA, JULGOIMPROCEDENTE a denúncia, para absolvê-lo das penas dos arts. 171, § 3º, e 299, c.c. osarts. 29 e 69, todos do Código Penal, com apoio no que dispõe o art. 386, IV, do CódigoPenal.

Trânsita em julgado esta sentença, dê-se baixa na distribuição, com relaçãoao denunciado WALGHTON FERREIRA DE LIMA, lançando-se o nome do condenado WILSONALVES SOUZA, no livro “ROL DOS CULPADOS”, garantido o direito do condenado de apelar

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em liberdade (art. 549, do Código de Processo Penal).

Publique-se a presente sentença, em resumo, no Diário Oficial do Estado.Registre-se.

Intimem-se, por precatória dirigida ao MM. Juízo de Direito da Comarcade Sousa-PB, os acusados e seu defensor, Dr. Gutemberg Sarmento da Silveira; e, pormandado, o defensor, Dr. Ananias Pordeus Gadelha e o representante do Ministério PúblicoFederal.

Comunique-se.

João Pessoa, 21 de outubro de 1996.

CRISTINA MARIA COSTA GARCEZJuíza Federal Substituta da 3ª Vara

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JULGADOS DO ELEITORAL

1 - Partidos Políticos - Dissolução de Diretório Municipal (Processo nº 618/96) 309Dr. José Fernandes de Andrade

2 - Propositura da Ação Principal - Decurso do Prazo - Extinção(Processo nº 607/96) .................................................................................... 312Dr. José Fernandes de Andrade

3 - Retirada de Expressão do Contexto - Nova Redação (Processo nº 183/96) ... 315Dr. José Fernandes de Andrade

4 - Suspensão dos Direitos Políticos Independentementede Regulamentação Infra-Constitucional (Processo nº 158/96) ...................... 317Dr. José Fernandes de Andrade

5 - Crime Eleitoral - Corrupção Ativa (Processo nº 469/95) ................................. 321Dr. José Fernandes de Andrade

6 - Revisão Eleitoral - Prova de Residência (Processo nº 56/96) ......................... 326Dr. José Fernandes de Andrade

7 - Registro de Candidatura (Processo nº 738/96) .............................................. 329Dr. José Fernandes de Andrade

8 - Dupla Filiação Partidária (Processo nº 359/96) .............................................. 332Dr. José Fernandes de Andrade

9 - Recontagem de Votos (Processo nº 1017/96) ............................................... 335Dr. José Fernandes de Andrade

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PARTIDOS POLÍTICOSDISSOLUÇÃO DE DIRETÓRIO MUNICIPAL

Processo nº 618/96 - AÇÃO CAUTELARRelator: O SR. JUIZ JOSÉ FERNANDES DE ANDRADERequerente: OSWALDO TRIGUEIRO DO VALERequerido: COMISSÃO PROVISÓRIA DO PPB

DECISÃO

EMENTA: MEDIDA CAUTELAR. PARTIDOS POLÍTICOS. DISSOLUÇÃODE DIRETÓRIO MUNICIPAL PELA COMISSÃO PROVISÓRIAESTADUAL. MATÉRIA INTERNA CORPORIS. INDEFERIMENTOLIMINAR DA MEDIDA CAUTELAR.

1. Os partidos políticos são formas de organizações sociais que sepropõem a organizar, coordenar e implementar a vontade popular, visandoassumir o poder e realizar programa de governo, com personalidade jurídicade direito privado.

2. Em questão de economia interna de partido político, não cabe ao PoderJudiciário nela se imiscuir, sob pena de ingerência em matéria internacorporis.

3. Os recursos são os previstos no Estatuto do partido para os órgãossuperiores e não medidas judiciais para apreciar legalidade ou não dedissolução de órgão partidário a nível municipal e/ou estadual.

4. INDEFERIMENTO LIMINAR DA MEDIDA CAUTELAR.

Cuida-se de ação cautelar inominada cumulada com pedido liminar ajuizadapor OSWALDO TRIGUEIRO DO VALE, qualificado, contra a COMISSÃO PROVISÓRIA DOPPB, sob os fatos e fundamentos a seguir narrados:

Inicialmente, faz o requerente uma digressão acerca da competência daJustiça Eleitoral para o controle dos atos internos e externos dos partidos políticos, elencandoentendimentos doutrinários e jurisprudenciais favoráveis à sua tese.

A seguir defende o cabimento de ação cautelar em matéria eleitoral.

Passando para o campo dos fatos, aduz que, na qualidade de Presidenteda Comissão Executiva do Diretório Municipal do PPB - Partido Progressista Brasileiro deJoão Pessoa, convocou convenção municipal para escolha dos candidatos e realização decoligações nas eleições de 03 de outubro vindouro, ocasião em que ficou decidido pelarealização de coligação na eleição majoritária e lançamento de chapa própria.

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Sustenta que, em pleno processo de convenção, a Comissão ProvisóriaEstadual, por meio de Resolução, dissolveu liminarmente o Diretório Municipal.

Entende que tal fato é ilegal, ante a ausência de motivação da dissolução;incompetência da Comissão Provisória para dissolver Diretório regularmente constituído, epela ausência de qualquer violação aos Estatutos do partido praticada pelo Diretório Municipaldissolvido.

Ao final, enxergando os pressupostos legais, requer a concessão de medidaliminar inaudita altera parte para suspender os efeitos da dissolução do Diretório e nomeaçãoda Comissão Provisória, objeto das Resoluções 01 e 02/96.

Acostou procuração e documentos.

Conclusos, DECIDO.

A questão ventilada nos autos não há como ter curso no âmbito do PoderJudiciário.

A uma, os partidos políticos são forma de organização de um grupo socialcom proposta de organizar, coordenar e instrumentar a vontade popular, visando assumir opoder e realizar o seu programa de governo, no dizer dos mestres constitucionais.

Em face do direito constitucional brasileiro, impõe-se que se lhe dêpersonalidade jurídica, mediante o registro dos Estatutos. A Carta anterior não previa a naturezadessa personalidade jurídica, se de direito público ou privado. A lei anterior que regia ospartidos políticos reconheceu-lhes a natureza de pessoa jurídica de direito público interno (Leinº 5.682/71, art. 2º), o que não era perfeitamente aceita pela maioria dos doutrinadores.

Agora, a atual Constituição os definiu como pessoa jurídica de direitoprivado, consoante o disposto no art. 17, § 2º. Ora, se adquirem personalidade na forma daLei Civil é porque são pessoas de direito privado, devendo registrarem-se no Cartório deRegistro de Títulos e Documentos e, após, os Estatutos são levados a Registro no TribunalSuperior Eleitoral, apenas comunicando à Justiça Eleitoral a constituição de seus órgãos dedecisão, bem como alteração (art. 10, parágrafo único, da Lei 9.259/96).

A duas, a disciplina e fidelidade partidária, passam a ser com a atualConstituição e a nova lei partidária (Lei 9.096/95) não mais uma determinante da lei, mas umaimposição estatutária (arts. 17, § 1º da CF e 3º da Lei 9.096/95), ou seja, o respeito eacatamento ao programa e objetivos partidários, compreendendo também a aceitação dasdecisões discutidas e tomadas pelos órgãos de duração partidária.

A três, a disputa ventilada nos autos é de ocorrência interna do partido enão cabe ao Poder Judiciário nela se imiscuir, sob pena de ingerência em questão internacorporis, imune de apreciação judicial.

A quatro, não seria cabível sequer impetração de mandado de segurançapara deslinde da disputa intestina de que nos falam os autos. Pois bem, o § 1º, do art. 1º, daLei nº 1.533/51 que dizia, in verbis:

Foi alterada pela Lei nº 9.259/96, de 09 de janeiro de l996, que acrescentouo parágrafo único do art. 10 e dispõe sobre a aplicação dos arts. 49, 56,incisos II. e IV e 57, inciso III da Lei Orgânica dos Partidos Políticos, com

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a seguinte redação, in verbis:

“Consideram-se autoridades, para os efeitos desta lei, os representantesou administradores das entidades autárquicas e das pessoas naturais oujurídicas com funções delegadas do Poder Público, somente no queentender com essas funções.”

Como bem se enxerga, o legislador retirou do texto a expressão:

“...os representantes ou órgãos dos partidos políticos e...”

Com dito expurgo, querem os legisladores, políticos por excelência, queas disputas partidárias sejam resolvidas mesmo no seio da organização partidária e não noâmbito do Judiciário.

Pela norma expressa, sequer é possível conceber que o ato praticadopela Comissão Provisória Estadual do PPB é decorrente de delegação do Poder Público.

Com efeito, se há ilegalidade no mérito do ato inquinado de ilegal nãocabe mandado de segurança. A via eleita não é cabível nem o remédio heróico constitucionaldo mandamus para atender a postulação; outra é a via, ou seja, recurso interno para aDireção Nacional do Partido para reparo de que de pode valer quem se considerar prejudicadocom a intervenção na decisão partidária deste município.

Finalmente, a corroborar a tese ora delineada, bem se enxerga pelosestatutos acostados pelo requerente que o caminho por este escolhido não pode chegar a umporto seguro. Para tanto, basta que se leia o que dispõe o Título XVII - Da Disciplina e daFidelidade Partidária - do Estatuto do PPB, especialmente o art. 68 e seu § 1º, que cuidam dadissolução do órgão partidário. É indubitável que é incomportável a via eleita para desfazer oato atacado, mesmo tendo ele sido injusto ou contra as regras do Estatuto. Cabe sim, aoórgão partidário superior dirimir a controvérsia, e não ao Poder Judiciário, sob pena de ingerênciadescabida no âmbito do Partido Político.

Com estas considerações, hei por bem de indeferir, liminarmente, comoindeferida tenho a presente medida cautelar.

P.R.I.

João Pessoa, 04 de julho de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJuiz - Eleitoral

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PROPOSITURA DA AÇÃO PRINCIPALDECURSO DO PRAZO - EXTINÇÃO

Processo: nº 607/96 - MEDIDA CAUTELARRelator designado: O SR. JUIZ JOSÉ FERNANDES DE ANDRADERequerente: MARIA DO LIVRAMENTO ALVES RAMALHO e OUTRORequerido: O SR. PRESIDENTE DA COMISSÃO REGIONAL PROVISÓRIA

DO PSLAdvogado: DRS. DELOSMAR DOMINGOS DE MENDONÇA JÚNIOR

(RECTE.) E JOSÉ RICARDO PORTO (RECDO.)

ACÓRDÃO

EMENTA: MEDIDA CAUTELAR. DECURSO DO PRAZO DE TRINTADIAS, SEM PROPOSITURA DA AÇÃO PRINCIPAL. EXTINÇÃO.

- O art. 806, do CPC, dispõe que cabe à parte propor a ação no prazo detrinta (30) dias, contados da data da efetivação da medida cautelar, quandoesta for concedida em procedimento preparatório; e o art. 808, I, do mesmocódigo, determina que cessa a eficácia da medida cautelar se a partenão intentar a ação no prazo estabelecido no art. 806.

- Extinção da medida.

Vistos, relatados e discutidos estes autos acima identificados.

A C O R D A o Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba em proferira seguinte decisão: Por maioria, contra o voto do Relator, acolheu-se a preliminar de extinçãoda Medida Cautelar. Lavrará o acórdão o Dr. José Fernandes de Andrade. Usaram da Tribuna,pelos requerentes e requerido, respectivamente, os Bels. Delosmar Domingos de MendonçaJúnior e José Ricardo Porto.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, emJoão Pessoa, 01 de agosto de 1996.

Presidente

Relator

PRE

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 313

RELATÓRIO

MARIA DO LIVRAMENTO ALVES RAMALHO E ARMANDO BEZERRACAVALCANTE ajuizaram medida cautelar com pedido de liminar contra o Presidente do DiretórioRegional do PSL, Sr. RONALDO NÓBREGA MEDEIROS. Os autores são, respectivamente,Presidente e Vice-Presidente do Diretório Municipal daquela agremiação partidária em JoãoPessoa.

Os promoventes articularam, inicialmente, argumentos acerca dacompetência da Justiça Eleitoral e do cabimento da ação, em contraposição aos que dizemescapar atos como o atacado nesta ação do controle judicial, por serem interna corporis,asseverando competir ao judiciário exercer o controle da legalidade interna (Estatuto eResoluções) e constitucional de que nenhuma lesão ou ameaça ao direito escapa da apreciaçãodo judiciário (CF, art. 5º, XXXV) (fls.03). Em Abono de sua tese invocam ensinamentos dosMinistros Torquato Jardim, José Cândido e Carlos Veloso.

Os fatos narrados na petição inicial são: 1) ato de intervenção do Presidentedo Diretório Regional do PSL, aqui promovido, no Diretório Municipal de João Pessoa, afastandoos autores desta demanda; 2) estão os Diretórios Regional e Municipal ainda em fase deregistro perante esta Corte; 3) a Comissão Executiva Municipal convocou Convenção para odia 29/06/96 e o interventor para o dia seguinte (30/06/96), para deliberar sobre as candidaturasàs próximas eleições Municipais; 4) e o ato de intervenção, continuam os autores, violou osarts. 83, 86 e 89, do Estatuto Partidário, bem como a Lei 9.096/95, art. 15, inciso V. Osrequerentes formularam pedido de liminar, para suspensão dos efeitos do ato de intervenção,assegurando a realização da Convenção convocada por eles, autores, e, finalmente, aprocedência da ação, com a nulidade do ato de intervenção.

Dos documentos acostados à inicial destacam-se os seguintes: os defls. 16 e 17, que registram os atos de intervenção ora atacados; os de fls. 36 e 37, que são oseditais de convocação das Convenções Partidárias convocadas, sendo o primeiro assinadopela autora desta cautelar, Maria do Livramento Alves Ramalho, e o segundo pelo interventor;e o de fls. 40/52, que é o Estatuto do PSL.

Foi proferido despacho às fls. 55 e 56, datado de 28/06/96, onde seentenderam relevantes os fundamentos do pedido, concedendo-se a medida liminar nos termosformulados pelos autores.

Foi também determinada a citação do promovido para oferecercontestação. Citado em 01/07/96, o demandado apresentou contestação em 05/07/96 (fls.61/66). Em sua defesa alinha dois argumentos principais: perda do objeto, vez que a partir de26/06/96 já existia uma nova Comissão Municipal Provisória ; e que as agremiações partidáriastêm plena autonomia para resolverem os seus problemas internos (fls. 64).

À defesa foram juntados os documentos de fls. 67/114. Às fls. 116 e 117consta o pedido dos autores no sentido de que a liminar fosse ao Juiz responsável peloregistro de candidaturas nesta capital, além de informar que o interventor realizou Convençãovetada na liminar proferida.

Despacho às fls. 25, deferindo o pedido de fls. 116 e 117, no sentido deque fizesse a comunicação ali requerida, o que foi cumprido pela Secretaria desta Corte.Registro também que o promovido interpôs agravo regimental da decisão liminar aqui proferida.Julgado em 11/07/96, o recurso foi improvido, com a manutenção da liminar.

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Às fls. 124/127, vem o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, dalavra do Dr. Francisco Chaves dos Anjos Neto. Após incisiva análise da matéria, opina pelaprocedência da ação cautelar, com o conseqüente retorno dos requerentes às funçõespartidárias.

Às fls. 129 e 130, habilitou-se novo patrono do promovido, Dr. José RicardoPorto. Também foram acostados aos autos os documentos de fls. 132 /136, que dão conta daintervenção levada a efeito por Órgão Nacional do PSL, inclusive nomeando interventor,reconduzindo aos seus postos os autores desta cautelar e ratificando os seus atos.

Conclusos, o Relator originário pediu data para julgamento.

É o relatório.

V O T O (Vencedor)

Sr. Presidente, Egrégio Tribunal, ouso discordar do voto do eminente relator,por entender que a lei aponta o único caminho possível de trilhar, neste momento, diante doque consta dos autos e do que foi trazida pelo nobre advogado do requerido.

Com efeito, o meu voto é no sentido de acatar a preliminar suscitada deextinção do processo, em face de decurso de tempo, sem que tenha sido promovida a açãoprincipal competente.

Dispõe o art. 806, do CPC:

“Art. 806. Cabe à parte propor a ação no prazo de trinta (30) dias,contados da data da efetivação da medida cautelar, quando estafor concedida em procedimento preparatório.”

Já o art. 808, I, do mesmo código, determina que:

“Art. 808. Cessa a eficácia da medida cautelar:

I - se a parte não intentar a ação no prazo estabelecido no art. 806.”

No caso vertente nos autos, a medida cautelar em tela é tipicamentepreparatória, e o prazo de trinta dias, que é peremptório, segundo pacífica jurisprudência, foiextrapolado sem que a parte propusesse a ação de conhecimento cabível.

Isso posto, acolho a preliminar de extinção da medida cautelar.

Presidiu o julgamento o Exmo. Des. Evandro de Souza Neves, e deleparticiparam, além do Relator, o Exmo. Des. Joaquim Sérgio Madruga e os Juízes Dr. LeôncioTeixeira Câmara, Dr. Marcello Figueiredo Filho, Dr. Hitler de Siqueira Campos Cantalice e oDr. José Edísio Simões Souto. Presente o Dr. Antonio Carlos Pessoa Lins, ilustre representantedo Ministério Público Eleitoral.

Sala das Sessões do EgrégioTribunal Regional Eleitoral da Paraíba, JoãoPessoa, 01 de agosto de 1996.

Juiz JOSÉ FERNANDES DE ANDRADERELATOR

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RETIRADA DE EXPRESSÃO DO CONTEXTO - NOVA REDAÇÃO

Processo nº 183/96 - AÇÃO MANDADO DE SEGURANÇARelator: O SR. JUIZ JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEImpetrante: MARIA DO LIVRAMENTO ALVES RAMALHO ROSASImpetrado: O SR. PRESIDENTE DA COMISSÃO REGIONAL PROVISÓRIA

DO PSL

SENTENÇA

EMENTA: ELEITORAL E CONSTITUCIONAL. MANDADO DESEGURANÇA CONTRA ATO DE PRESIDENTE DE COMISSÃOPROVISÓRIA DE PARTIDO POLÍTICO. IMPOSSIBILIDADE ANTE ANOVA REDAÇÃO DO ART. 1º, § 1°, DA LEI Nº 1.533/51, QUE RETIROU,PARA FINS DE ABRANGÊNCIA DA AÇÃO MANDAMENTAL, O STATUSDE AUTORIDADE DOS “REPRESENTANTES OU ÓRGÃOS DEPARTIDO POLÍTICOS” COMO AUTORIDADE PÚBLICA.DESCABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA. INDEFERIMENTODA PETIÇÃO INICIAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 8º DA LEI Nº 1.533/51.

1. O legislador retirou expressamente do contexto do art. 1º, § 1º, da Leinº 1.533/51 a expressão “órgãos dos partidos políticos e os...” Logo, ainterpretação a que se chega sem maiores delongas é que o legisladorfederal não mais considera para efeitos da lei do mandado de segurançaos dirigentes dos órgãos partidários como autoridade com capacidadepara figurar no pólo passivo do mandado de segurança.

2. Não sendo o impetrado considerado, para fins de mandado desegurança, como autoridade e, em pressupondo o mandado de segurançaATO DE AUTORIDADE, impõe-se o indeferimento da peça exordial,consoante dispõe o art. 8° da Lei nº 1.533/51.

Vistos etc...

Cuida-se de mandado de segurança impetrado por MARIA DOLIVRAMENTO ALVES RAMALHO ROSAS, devidamente qualificada às fls. dos autos,objetivando impugnar ato do Presidente da Comissão Regional Provisória do Partido SocialLiberal (PSL), Sr. RONALDO NÓBREGA MEDEIROS, consubstanciado na decisão daautoridade apontada como coatora que destituiu a impetrante e toda Comissão diretoriana doPSL do município de João Pessoa, que foram regularmente eleitas em convenção partidáriarealizada no último dia 26 de março p. passado.

Por fim, requer a concessão inaudita altera parte da medida liminar atéo julgamento do mérito no sentido de que permaneça a impetrante na Presidência do diretóriomunicipal do PSL.

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O presente mandamus não tem mais cabimento.

É fora de qualquer dúvida que o indeferimento liminar do presente writ seapresenta de modo escancarado.

É que o § 1º do art. 1º da Lei de Mandado de Segurança (Lei nº 1.533/51)foi alterado pela Lei nº 9.259 de 09.01.96.

A redação anterior prescrevia:

“Consideram-se autoridades, para efeitos desta lei, os representantes ouórgãos dos partidos políticos e os representantes ou administradores dasentidades autárquicas e das pessoas naturais ou jurídicas com funçõesdelegadas do poder público, somente no que entender com essas funções.”

Pois bem, veio à lume a lei nova n° 9.259/96 e deu ao § 1º do art. 1º da Leinº 1.533/51 a seguinte redação, a saber:

“Consideram-se autoridades, para efeitos desta lei, os representantes ouadministradores das entidades autárquicas e das pessoas naturais oujurídicas com funções delegadas do Poder Público, somente no queentender com essas funções.”

Como bem se enxerga o legislador retirou expressamente do contexto dodispositivo acima a expressão “órgãos dos partidos políticos e os...”. Logo, a interpretaçãoa que se chega sem maiores delongas é que o legislador federal não mais considera paraefeitos da lei do mandado de segurança os dirigentes dos órgãos partidários como autoridadecom capacidade para figurar no pólo passivo do mandado de segurança.

Perlenga da do porte da delineada da inicial da presente impetraçãosomente pode ser objeto de disputa na via ordinária e no Juízo competente.

É bom que se frise que a controvérsia deduzida nos autos não diz respeitoà matéria eleitoral, ou seja, a justiça especializada eleitoral que tem por objetivo o processoeleitoral e não questão interna corporis das agremiações partidárias, como é a hipóteseventilada nos presentes autos.

Por todas estas considerações acima enunciadas, hei por bem de chamarà colação a regra insculpida no art. 8° da Lei nº 1.533/51 e indeferir como indeferida tenho ainicial do presente mandado de segurança.

Intime-se.

João Pessoa, 18 de abril de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJUIZ - RELATOR

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SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS INDEPENDENTEMENTE DEREGULAMENTAÇÃO

INFRA-CONSTITUCIONAL

Processo nº 158/96 - AÇÃO MANDADO DE SEGURANÇARelator: O SR. JUIZ JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEImpetrante: GERÔNCIO GOMES DA SILVAImpetrado: JUSTIÇA PÚBLICA ELEITORALAdvogado: DR. LUISMAR DÁLIA (IMPTE.)

ACÓRDÃO

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. CONDENAÇÃO CRIMINALTRANSITADA EM JULGADO. SURSIS CONCEDIDO. SUSPENSÃO DOSDIREITOS POLÍTICOS INDEPENDENTEMENTE DEREGULAMENTAÇÃO INFRA-CONSTITUCIONAL..

- A suspensão dos direitos políticos se dá ainda quando, com referênciaao condenado por sentença criminal transitada em julgado, esteja emcurso o período da suspensão condicional da pena.

- Segurança denegada.

Vistos, relatados e discutidos estes autos acima identificados.

A C O R D A o Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba em proferira seguinte decisão: “Denegou-se a segurança, cassando-se a liminar concedida, abstendo-se de votar o MM. Juiz Leôncio Câmara”.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, emJoão Pessoa, 05 de junho de 1996.

Presidente

Relator

PRE

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RELATÓRIO

Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado porGERÔNCIO GOMES DA SILVA, brasileiro, solteiro, agropecuarista, vereador no Município deTacima, residente e domiciliado no Distrito de Cachoeirinha, do referido município, contra atoreputado ilegal e arbitrário do EXMO. SR. JUIZ ELEITORAL DA 20ª ZONA ELEITORAL -ARARUNA.

Em sua inicial, o impetrante alega, em síntese, que: a) foi condenado, naComarca de Nova Cruz/RN, à pena de um (01) ano de detenção, incurso no art. 121, § 3º,Código Penal brasileiro; b) recebeu sursis pelo prazo de dois (02) anos, a ser cumprido naComarca de Araruna; c) O Juiz desta Comarca (Araruna) oficiou, em 22/03/96, ao Presidenteda Câmara de Vereadores do Município de Tacima, comunicando a suspensão do direitospolíticos, mas tal ato foi ilegal e arbitrário, uma vez que, deixando de informar a respeito dobenefício da suspensão da pena, o mandato do impetrante foi cassado; d) apesar de transitadaem julgado, a sentença teve seus efeitos suspensos pela concessão do sursis, situaçãoessa que impede a prática de qualquer ato que viesse atingir o seu direito, visto que os efeitosda condenação criminal estão suspensos; e) o disposto no art. 15, III, da CF, não é auto-aplicável, conforme decisão do TSE; e f) além disso, para que a cassação ocorresse,necessário se faria um processo específico, não seria a vontade unilateral do impetrado válidapara tolher o direito do impetrante;

Requereu: a) a concessão de medida liminar; b) a notificação da autoridadeimpetrada para prestar as informações; e c) a audiência do MPE.

Juntou procuração e quatro documentos.

Concedida a liminar (fls. 11), procedeu-se à notificação da autoridadeapontada como coatora, que prestou as seguintes informações (fls. 14):

“(...) não somos a autoridade coatora e sim o Dr. Juiz João Jorge deMedeiros Tejo, atualmente titular da comarca e Zona Eleitoral de AlagoaGrande.

Entretanto, salientamos que o ato do já referido Juiz encontra-se delineadonos documentos que instruem o Mandamus”.

Às fls. 17, o Dr. Antônio Carlos Pessoa Lins, digno representante doMinistério Público Eleitoral, concluiu, em seu parecer, pela denegação da segurança postulada.

Conclusos, pedi dia para julgamento.

É o relatório. A seguir, o voto.

VOTOSr. Presidente, Egrégia Corte, vem à discussão neste Tribunal, mais uma

vez, a questão da suspensão dos direitos políticos no caso de condenação criminal em quese concedeu o sursis.

A matéria já provocou grande acirramento na Corte Suprema Eleitoral,que também já foi provocada a respeito da suspensão imediata dos direitos políticos quandoa sentença condenatória concede o sursis.

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A decisão nº 28.695, proferida por este Tribunal, no processo nº 469/95,do qual fui relator, consagrou tese contrária àquela sustentada pelo impetrante do writ.

Com efeito, restou consignada no item 3 da ementa da supramencionadadecisão:

“3. A suspensão dos direitos políticos se dá ainda quando, com referênciaao condenado por sentença criminal transitada em julgado, esteja emcurso o período da suspensão condicional da pena”.

E, no corpo do acórdão, registrou-se:

“Sem razão o apelante quando peleja no sentido de que o benefício dasuspensão condicional da pena que lhe foi concedido afasta eventualinelegibilidade ou mesmo suspensão dos seus direitos políticos. É bemverdade que em quatro ou cinco decisões, girando a hipótese ventiladaneste autos, o eg. Tribunal Superior Eleitoral decidiu que a regra do Art.15, III, da CF, não é auto-aplicável, dependendo de lei específica a indicaras hipóteses em que ocorre a suspensão dos direitos políticos, em razãoda condenação criminal transitada em julgado, cujo debate maior ocorreuentre os votos dos Ministros Marco Aurélio e Carlos Velloso, aquelesufragando a tese vencedora no TSE, enquanto este a que veio a servitoriosa no STF.

A controvérsia foi deslindada pelo Col. Supremo Tribunal Federal no R.E.Nº 179502-SP, Relator o Eminente Ministro Moreira Alves, julgado em 31de maio de 1995, in DJ 08.09.95 quando ficou sinetado que a suspensãodos direitos políticos, com referência ao condenado por sentença criminaltransitada em julgado, ocorre, ainda quando esteja em curso o período dasuspensão condicional da pena, cujo aresto está assim ementado:

‘Ementa: Condição de elegibilidade. Cassação de diploma decandidato eleito vereador, porque fora ele condenado, com trânsitoem julgado, por crime eleitoral contra a honra, estando em cursoa suspensão condicional da pena. Interpretação do art. 15, III, daConstituição Federal.- Em face do disposto no art. 15, III, da CF, a suspensão dos direitospolíticos se dá ainda quando, com referência ao condenado, porsentença criminal transitada em julgado, esteja em curso o períododa suspensão condicional da pena.- Recurso conhecido e provido’.Como bem se entende, a regra do Art. 15, III, da CF de 1988, nainterpretação do Egrégio Supremo Tribunal Federal, deve reputar-se deaplicação imediata, independente de norma infra-constitucional deregulamentação, o que vale dizer, a inelegibilidade do ora recorrente decorredo próprio texto constitucional.

Na orientação do STF, a condenação criminal, transitada em julgado, deque cogita o Art. 15, III, da CF, não é só aquela que inviabilize pelorecolhimento do condenado, o exercício dos direitos políticos, mas tambémestando o condenado em gozo do sursis.

Por todo o exposto, voto pelo não provimento da apelação, mantida emtodos os termos a sentença recorrida”

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Por estas razões, em consonância com o entendimento do Parqueteleitoral, hei por bem de denegar o mandamus e cassar a liminar concedida initio litis.

É como voto.

Presidiu o julgamento o Exmo. Des. Evandro de Souza Neves, e deleparticiparam, além do Relator, os Exmos. Juízes Dr. Leôncio Teixeira Câmara, Dr. MarcelloFigueiredo Filho, Dr. Hitler de Siqueira Campos Cantalice, o Des. Josias Pereira do Nascimentoe o Dr. José Edísio Simões Souto. Presente o Dr. Antônio Carlos Pessoa Lins, ilustrerepresentante do Ministério Público Eleitoral.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, JoãoPessoa, 05 de junho de 1996.

Juiz José Fernandes de AndradeRELATOR

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CRIME ELEITORAL - CORRUPÇÃO ATIVA

Processo nº 469/95 - RECURSORelator: O SR. JUIZ JOSÉ FERNANDES DE ANDRADERecorrente: SEVERINO PEREIRA GOMESRecorrida: JUSTIÇA PÚBLICA ELEITORAL

ACÓRDÃO

EMENTA: CRIME ELEITORAL. CORRUPÇÃO ATIVA. CRIME DE MERACONDUTA. PROVA DO DELITO. RECURSO. CONDIÇÃO DEELEGIBILIDADE. IMPROVIMENTO DO APELO.

1. Consuma-se o crime com o ato de oferecer ou prometer vantagemindevida. À lei eleitoral não interessa que a lesão ou ofensa ao bemjurídico tutelado - o interesse da lisura da eleição - se dê efetivamente,isto é, se concretize, basta-lhe a possibilidade de dano real.

2. A prova testemunhal é uniforme no sentido de que o apelante resvaloupara a senda do crime de corrupção ativa.

3. A suspensão dos direitos políticos se dá ainda quando, com referênciaao condenado por sentença criminal transitada em julgado, esteja emcurso o período da suspensão condicional da pena.

4. Recurso improvido.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos acima identificados.

R E S O L V E o Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba negarprovimento ao recurso, votando com restrição o Dr. EDÍSIO SOUTO. Decisão unânime.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, aos06 de fevereiro de 1996.

Presidente

Relator

PRE

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322 Revista de Jurisprudência da Seção Judiciária da Paraíba

RELATÓRIO

Na 25ª Zona Eleitoral de Picuí, a Justiça Pública Eleitoral denunciou deSEVERINO PEREIRA GOMES e de EMÍLSON FERREIRA DA SILVA, como incursos naspenas do art. 299, do Código Eleitoral.

Configurada a autoria e materialidade do delito de corrupção ativa só etão-somente com relação ao primeiro denunciado SEVERINO PEREIRA GOMES, pugnou apromotoria eleitoral pela condenação dele e pela absolvição do segundo denunciado EMÍLSONFERREIRA DA SILVA.

A sentença recorrida condenou o apelante SEVERINO PEREIRA GOMESà pena privativa de liberdade em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão, bem assim napena pecuniária de 10 (dez) dias multa.

Pelo mesmo julgado foi concedida a suspensão condicional da pena peloprazo de 02(dois) anos.

Em tempo hábil, o recorrente embargou de declaração sustentando que asentença não esclareceu se o condenado, beneficiário que foi pelo sursis, tinha o condão de“afastar eventual inelegibilidade ou mesmo suspensão dos direitos políticos,” indicando nesseoriente decisões do TSE (fls. 109).

Os embargos foram rejeitados com suporte no art. 275, § 4º, do CódigoEleitoral, sob o fundamento de que a sentença embargada não padecia dos defeitos de omissão,obscuridade, dúvida ou contradição (fls. 112/113).

Dessa decisão as partes foram intimadas em 17 e 28 de agosto desteano (fls. 114v e 1l9v) e o mandado junto aos autos em 28/08/95 e, em 21/08/95 (fls. 115) ocondenado apelou da sentença condenatória, sustentando, em síntese, que ele apelante nãopraticou a infração penal eleitoral pela qual foi denunciado, inexistindo prova cabal nos autospara a condenação, razão pela qual requereu a reforma da sentença apelada.

VOTO

A sem razão do recorrente está clara e evidente. A prova carreada paraos autos é robusta e não havia como o apelante obter uma absolvição no Juízo a quo.

Emerge dos autos que o recorrente foi preso em flagrante delito quandose encontrava relacionando nomes de eleitores, ou seja, colhendo o número dos títuloseleitorais, no próprio Comitê Eleitoral, sob a promessa de R$ 5,00 (cinco reais) em troca dovoto eleitoral.

Consta dos autos, às fls. 13, escritos extraídos de cadernos de anotaçõespessoais, nomes de eleitores, números de títulos e Seção eleitoral na qual o eleitor relacionadovota.

Há nos autos prova de saque de cheque pelo recorrente de sua conta dealto valor, no dia do fato narrado na denúncia.

Às fls. 49 dos autos percebe-se muito bem que a fila que se formoudiante do comitê eleitoral do recorrente no dia do fato criminoso de “aproximadamente quarenta

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 323

pessoas portando um pedaço de papel onde constava o nome do eleitor, número do título e oendereço” e as pessoas da fila diziam que estavam ali para receber do apelante a importânciade R$ 5,00 que estava sendo distribuída a cada eleitor pelo recorrente, mais uma prova daocorrência do delito.

A prova testemunhal é uniforme no sentido de que o apelante resvaloupara a senda do crime. Pois bem, a testemunha Iracema Souto de Lima (fls. 51) afirma queviu uma fila de muitas pessoas em frente ao Comitê do apelante e foi informada de que aspessoas que estavam ali esperavam a distribuição de dinheiro, onde existia uma moçarecolhendo os títulos das pessoas e fazendo anotações, “em um pedaço de papel e queposteriormente devolvia o título e pedaço de papel... com este bilhete foi para a fila, com oobjetivo de receber a importância de R$ 5,00...”

A testemunha TEREZA DANTAS diz que “chegou a Picuí por volta demeio dia e logo tomou conhecimento de que no Comitê do Sr. Severino Gomes estavamdistribuindo dinheiro; que chegou ao Comitê constatou muita gente na fila; que estava semtítulo e diziam na fila que tinha que tê-lo, mas mesmo assim foi aconselhada a permanecer nafila...” (fls. 52).

Por seu turno, a testemunha ANTONIA SOARES DA SILVA (fls. 53)sustenta que ouviu dizer que o 1º acusado estava em seu comitê distribuindo dinheiro. Alegamais a depoente que resolveu ir até lá e lá chegando presenciou várias pessoas e ela com otítulo à mão se dirigiu a uma sala onde falou com uma moça a qual não conhecia que indagoua pretensão dela depoente pedindo, também o título de eleitora da depoente, anotando algunsdados e no momento em que a moça devolvia o título de eleitor chegaram os oficiais dejustiça interditando o comitê.

O declarante JOSENILDO MEDEIROS DE OLIVEIRA constatou que esteveno Comitê e verificou que havia muita gente na fila e que as pessoas estavam lá com o fito dereceber R$ 5,00 mas não chegou a ver quem estava escrevendo os bilhetes que continham onome, o número do título de eleitor e o endereço das pessoas, mas havia no local moças comcartazes e vestida com camisetas dos candidatos (fls. 56 e 56v).

O depoimento da testemunha MARGARIDA ROCHA SILVA (fls. 59)esclarece que passando pelo Comitê do apelante constatou muita gente na fila e que todosque ali estavam portavam um bilhete à mão onde continha o nome, endereço, o número daseção eleitoral e o número do título eleitoral “e todo mundo dizia que ia receber do 1º acusadodinheiro, precisamente a importância de R$ 5,00.”

Os demais testemunhos são todos no sentido de que o apelanteencontrava-se, no dia do fato delituoso, no seu comitê, distribuindo dinheiro em troca devotos.

Está evidenciado nos autos que nenhum eleitor foi flagrado recebendo aimportância prometida das mãos do apelante o que não afasta a consumação do delito.

Na defesa da moralidade do pleito eleitoral, o legislador inseriu o crime decorrupção ativa, ou seja, oferecer, prometer e dar qualquer vantagem, com o fito de recebervoto para si ou para outrem, ainda que a oferta não seja aceita. Na verdade, a lei eleitoral haviade ocupar-se com a pessoa daquele que é autor da improbidade e venalidade da eleição, oque evidentemente não condiz com os fins desta, ou seja, a lisura da eleição, orientada nosentido da boa representação do povo nas Câmaras, Assembléias e Congresso Nacional.

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Pela só leitura dos termos do dispositivo incriminador entende-se muitobem que se trata, no caso, de um delito de simples atividade, ou de mera conduta, tambémdito formal. Consuma-se com o ato de oferecer ou prometer a vantagem indevida. À lei eleitoralnão interessa que a lesão ou ofensa ao bem jurídico tutelado - o interesse da lisura daeleição - se dê efetivamente, isto é, se concretize, basta-lhe a possibilidade de dano real. Éa corrupção ativa um desses crimes, em que, como ensina o mestre BINDING “a impaciênciados legislados o antecipa”, colocando a consumação na fase da tentativa. Crime formaatinge o momento consumativo no instante em que o eleitor toma conhecimento da oferta oupromessa da vantagem pelo candidato. No caso vertente a oferta foi às escâncaras. No meioda rua, por assim dizer, visto que se formou uma fila defronte ao comitê eleitoral do acusado,onde se dizia a una vox que os eleitores ali se encontravam para receber dinheiro oferecidopelo acusado. Tanto é corrupto quem dá o dinheiro ao eleitor, como quem oferece, faz uma filadefronte ao comitê arrecadando títulos eleitorais para anotar o nome do eleitor, o número dotítulo e a seção onde vota o eleitor em troca de dinheiro prometido. Como bem se enxerga odispositivo do art. 299, do CE, incrimina a ação externa que promove o candidato a postoeletivo.

Não resta a menor dúvida de que a corrupção ativa se consuma com asimples oferta ou promessa de vantagem indevida por parte do candidato, ora recorrente,pouco importando que o eleitor tenha recebido ou não a oferta. Assim, atos que, segundo aregra geral, não passariam de tentativa, já se constituem, na espécie ventilada nos autos, aconsumação do delito.

É indiferente que a oferta ou promessa seja feita ao eleitor pelo corruptodiretamente ou por interposta pessoa, no caso as moças se encontravam vestindo farda dopartido do recorrente, posto que em nome dele as moças recolhiam os títulos para os fins detomar nota dos respectivos números, nomes e seções de votação.

Não é possível dizer-se com mais clareza que o crime de corrupção ativase constitui de oferecimento ou promessa de proveito ilegítimo, sendo a aceitação e a execuçãodo ato avençado “condições de punibilidade mais grave para o corruptor.”

No caso, o elemento subjetivo, o dolo específico, ou seja, a vontadelivremente dirigida à oferta ou promessa de vantagem, que o recorrente sabe indevida, com ofim de determinar o aliciamento do voto mediante paga, é indisputável.

Sem razão o apelante quando peleja no sentido de que o benefício dasuspensão condicional da pena que lhe foi concedido afasta eventual inelegibilidade ou mesmosuspensão dos seus direitos políticos. É bem verdade que em quatro ou cinco decisões,girando a hipótese ventilada nestas autos, o eg. Tribunal Superior Eleitoral decidiu que a regrado Art. 15, II., da CF, não é auto-aplicável, dependendo de lei específica a indicar as hipótesesem que ocorre a suspensão dos direitos políticos, em razão da condenação criminal transitadaem julgado, cujo debate maior ocorreu entre os votos dos Ministros Marco Aurélio e CarlosVelloso, aquele sufragando a tese vencedora no TSE, enquanto este a que veio a ser vitoriosano STF.

A controvérsia foi deslindada pelo Col. Supremo Tribunal Federal no R. E.n° 179502-SP, Relator o Eminente Ministro Moreira Alves, julgado em 31 de maio de 1995, inDJ 08.09.95 quando ficou sinetado que a suspensão dos direitos políticos, com referência aocondenado por sentença criminal transitada em julgado, ocorre, ainda que esteja em curso operíodo da suspensão condicional da pena, cujo aresto está assim ementado:

“EMENTA: Condição de elegibilidade. Cassação de diploma de candidato

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eleito vereador, porque fora ele condenado, com trânsito em julgado, porcrime eleitoral contra a honra, estando em curso a suspensão condicionalda pena. Interpretação do Art. 15, III, da Constituição Federal. Em face dodisposto no Art. 15, II., da CF, a suspensão dos direitos políticos se dáainda quando, com referência ao condenado, por sentença criminaltransitada em julgado, esteja em curso o período da suspensão condicionalda pena. Recurso extraordinário conhecido e provido.”

Como bem se entende, a regra do art. 15, III, da CF de 1988, nainterpretação do Egrégio Supremo Tribunal Federal, deve reputar-se de aplicação imediata,independentemente de norma infra-constitucional de regulamentação, o que vale dizer, ainelegibilidade do ora recorrente decorre do próprio texto constitucional.

Na orientação do STF, a condenação criminal, transitada em julgado, deque cogita o Art. 15, III, da CF, não é só aquela que inviabilize pelo recolhimento do condenado,o exercício dos direitos políticos, mas também estando o condenando em gozo do sursis.

Por todo o exposto, voto pelo não provimento da apelação, mantida emtodos os termos a sentença recorrida.

Participaram do julgamento que foi presidido pelo Exmo. Des. EVANDRODE SOUZA NEVES, além do Relator, os Exmos. Juízes: Dr. LEÔNCIO TEIXEIRA CÂMARA,Dr. MARCELLO FIGUEIREDO FILHO, Dr. HITLER DE SIQUEIRA CAMPOS CANTALICE,Des. JOSIAS PEREIRA DO NASCIMENTO e o Dr. JOSÉ EDÍSIO SIMÕES SOUTO.

Presente o Exmo. Dr. FRANCISCO CHAVES DOS ANJOS NETO,Procurador Regional Eleitoral.

João Pessoa, aos 06 de fevereiro de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJUIZ - RELATOR

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REVISÃO ELEITORAL - PROVA DE RESIDÊNCIA

Processo nº 56/96 - RECURSORelator: O SR. JUIZ JOSÉ FERNANDES DE ANDRADERecorrente: DIMAS EMÍDIO DOS SANTOSRecorrido: JUSTIÇA PÚBLICA ELEITORALAdvogado: DR. ANTÔNIO BERNARDO NUNES FILHO (RECTE.)

ACÓRDÃO

EMENTA: REVISÃO ELEITORAL. PROVA DA RESIDÊNCIA.CONTRATO DE ARRENDAMENTO. SUSPEIÇÃO. CANCELAMENTO DAINSCRIÇÃO. RECURSO. PROVIMENTO.

- A mera suspeição do Juiz quanto à veracidade da documentaçãoapresentada para fazer prova da residência não justifica o cancelamentode inscrição eleitoral, ainda mais quando a dúvida decorre apenas doserôdio reconhecimento de firmas em contratro de arrendamento.

- Recurso a que se dá provimento.

Vistos, relatados e discutidos estes autos acima identificados.

A C O R D A o Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba em proferira seguinte decisão: Deu-se provimento ao recurso, à unanimidade, em desarmonia com oparecer do MPE.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, emJoão Pessoa, 02 de abril de l996.

Presidente

Relator

PRE

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 327

RELATÓRIO

Dimas Emídio dos Santos, qualificado, recorreu a este E. TRE, em 12/01/96, em virtude de decisão judicial que cancelou sua inscrição na revisão eleitoral realizadaem São José do Bonfim (65ª Zona - Patos), alegando, em síntese, que: a) o Juiz vislumbroususpeição nos documentos do recorrente, mas o mesmo merece reforma, já que a inscrição- que é a inicial - data de 1980; e b) A Resolução 19.219, de 21.03.95, do C. TSE, exigiurevisão de inscrição ou transferência ocorrida entre 01.01.86 e 31.12.94, o que não ocorrecom o recorrente.

Aduziu, mais, que (fls. 03):

“Com relação à conservação de qualquer documento, se esclareça aprincípio, que isso pode ocorrer segundo a maneira como o mesmo foiguardada, desde a sua lavratura e, a respeito ao reconhecimento dasfirmas dos signatários dos documentos, isto também é uma opção daspartes, que, muitas vezes, só reconhecem as referidas firmas, senecessitarem de utilizar o documento no âmbito da Justiça, sendo,portanto, uma faculdade das partes o reconhecimento ou não. Se otabelionato ao reconhecer as firmas, o fez, com a data anterior, entende orecorrente, que esse reconhecimento não vei alterar o documento, vezque as assinaturas são autênticas e o reconhecimento das firmas veioapenas confirmar a autenticidade das mesmas.”

Por fim, pediu o provimento do recurso.

Juntos: três certidões (fls. 06/08); cópia do título (fls. 09); documentos defls. 10/12; ficha de interrogatório individual. (fls. 14); documentos de fls. 15/19.

O Juiz cancelou a inscrição (fls. 24), por desconfiar da veracidade doscontratos de arrendamento que fundamentaram o pedido de recadastramento, já que osinstrumentos, apesar de datados de já algum tempo, estavam muito conservados.

A Promotoria Eleitoral opinou pelo improvimento do recurso.

Subiram os autos e a PRE manifestou-se pelo desprovimento, posto que“muito embora, a ter do parágrafo único do art. 42 do Código Eleitoral, exista uma faculdadede escolher como domicílio eleitoral quaisquer dos lugares onde mantinha moradia, cujaescolha, a cargo do alistando, somente pode ser feito quando de sua inscrição, e não quandopromova sua transferência em caso de mudança de domicílio, mesmo na hipótese dos autosé de se ressaltar que este dispositivo não socorre o recorrente, pois, contemporaneamente àdata da inscrição originária, não existia nenhum dado que o levasse a ser considerado moradornaquela cidade de São José do Bonfim/PB, o que leva à convicão que agiu bem o il. Juiz aquo ao proceder o cancelamento de seu título eleitoral naquela cidade.”

Conclusos, pedi dia para julgamento.

É o relatório. A seguir o voto.

VOTO

Dessume-se da leitura atenta dos autos que o MM. Juiz Eleitoral, cumprindoa programação para revisão do eleitorado, forte nas suspeitas que levantou acerca da veracidade

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do instrumento do contrato de arrendamento rural apresentado para fazer prova da residência,determinou o cancelamento da inscrição do recorrente Dimas Emídio dos Santos.

Data venia, entendo equivocada a decisão. É que uma simples suspeiçãopessoal do Juiz não é suficiente para torná-la devidamente fundamentada, seja em virtude deimprovável estado de conservação dos documentos, seja por conta de serôdio reconhecimentocartorário das firmas.

Vislumbrando-se qualquer sinal de fraude ou simulação, com suposiçãode documentos forjados, a atitude correta seria proceder-se a um exame mais acurado daquiloque se pretende provar, lançando mãos das diligências cabíveis. Se não agiu dessa maneira,incorreta foi a exclusão.

Por essas razões, dou provimento ao recurso.

É como voto.

Presidiu o julgamento o Exmo. Des. Evandro de Souza Neves, e deleparticiparam, além do Relator, os Exmos. Juízes Dr. Leôncio Teixeira Câmara, Dr. José EdísioSimões Souto, Dr. Marcello Figueiredo Filho, Dr. Hitler de Siqueira Campos Cantalice e Dr.Josias Pereira do Nascimento. Presente o Dr. Antônio Carlos Pessoa Lins, ilustre representantedo Ministério Público Eleitoral.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, JoãoPessoa, 02 de abril de 1996.

JOSÉ FERNANDES DE ANDRADEJUIZ - RELATOR

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 329

REGISTRO DE CANDIDATURA

Processo nº 738/96 - RECURSORelator: O SR. JUIZ JOSÉ FERNANDES DE ANDRADERecorrente: COLIGAÇÃO FRENTE POPULAR E DEMOCRÁTICA

TEIXEIRENSE (PSD - PMDB - PT)Recorrido: JUSTIÇA PÚBLICA ELEITORALAdvogado: DR. EDMUNDO DE MELLO XAVIER (RECTE.)

ACÓRDÃO

EMENTA: REGISTRO DE CANDIDATURA. IMPUGNAÇÃO. TRÍPLICEFUNDAMENTAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. RECURSO. PRELIMINARES.DESCABIMENTO. MÉRITO. MATÉRIAS JÁ APRECIADAS EM OUTROSPROCESSOS, COM RELAÇÃO AO MESMO CANDIDATO, E SOB ASMESMAS ALEGAÇÕES. IMPROVIMENTO.

- O processo de impugnação é regido pela resolução 19.509/96, comvista às partes em cartório, com prazo comum; não se exige, para maiorceleridade, notificação para tanto.

- Não há interesse jurídico no desentranhamento de alegaçõesapresentadas em substituição a outras apócrifas, se não há prejuízo,nem intempestividade, mormente quando só ratificam os termos dacontestação.

- Resta prejudicado o recurso contra decisão que julgou improcedenteimpugnação de registro de determinado candidato, se o mesmo foi deferido,sob os mesmos fundamentos, em outros processos.

Vistos, relatados e discutidos estes autos acima identificados.

A C O R D A o Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba em proferira seguinte decisão: “rejeitadas as preliminares suscitadas, à unanimidade. Por igual votação,negou-se provimento ao recurso, quanto ao mérito”.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, emJoão Pessoa, 26 de agosto de 1996.

Presidente

Relator

PRE

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RELATÓRIO

Cuida-se de recurso da decisão que julgou improcedente impugnação aoregistro do candidato Inácio de Oliveira Amorim, ao cargo de Prefeito do Município de Teixeira.

A argüição de inelegibilidade vem lastreada em três fundamentos: rejeiçãode contas, duplicidade de filiações e emissão de cheque sem fundos.

A sentença guerreada restou assim ementada (fls. 107):

“IMPUGNAÇÃO - REGISTRO DE CANDIDATURA - PRELIMINARSUSCITADA - REJEITADA - INELEGIBILIDADE - REJEIÇÃO DE CONTAS- TCU - ÓRGÃO CONSULTIVO - INOCORRÊNCIA - DUPLA FILIAÇÃO -NÃO CARACTERIZAÇÃO - CONFLITO DE LEIS NO TEMPO - ÚLTIMOVÍNCULO PARTIDÁRIO MANTIDO - IMPROCEDÊNCIA - INTELIGÊNCIADAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS DA LEI 9.096/95.

- É de se rejeitar as preliminares suscitadas, à míngua de amparo legal.

- A impugnação formalizada sob o ângulo da rejeição de contas pressupõeo crivo do órgão competente - do Poder Legislativo - e a cláusula referenteà existência de irregularidade insanável. Simples parecer do Tribunal deContas não respalda o indeferimento do registro. (AC-TSE nº 11.972,Ministro Marco Aurélio)

- Nos casos em que uma das filiações antecede à nova regulamentação,considerar-se-á válida a última realizada.”

O prazo para contra-razões transcorreu in albis (fls. 117), sendo asmesmas anexadas às fls. 125 e ss., em face do atestado médico de fls.123.

A douta PRE opinou às fls. 138/140, pelo improvimento.

Conclusos, coloquei em mesa para julgamento.

É o relatório. A seguir, o voto.

VOTO

PRELIMINARES

1º - Ausência de vista dos documentos acostados à inicial.

Sem razão o recorrente, que busca a decretação de nulidade, uma vezque, além de inexistir prejuízo, decidiu corretamente o Juiz Eleitoral, no sentido de que não é“de se considerar nulo o processo, ante a falta de vista à impugnante, após a contestação ejuntada de documentos, nos termos do art. 398, do CPC, considerando o processo deimpugnação ser regido pela resolução 19.509/96, a qual prevê vista às partes em cartório,com prazo comum, não exigindo, para maior celeridade do processo eleitoral, notificaçãopara tanto. Não se aplica no caso in specie as regras do CPC, motivo pelo qual é de serejeitar a preliminar suscitada”.

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2º - Desentranhamento das alegações finais apócrifas

Às fls. 92/93, repousam as alegações finais pelo recorrido, devidamenteassinadas, o que vem suprir a falta de assinatura na peça de fls. 90/91. Assim, como bemassinalou o Juiz monocrático, “não obstante o lapso do patrono do impugnado, não ocasionouprejuízos às partes, tendo esse deixado de assinar (...) as alegações, e, inclusive, tendoapresentado outra ainda em tempo hábil, sem maiores influências, considerando ter, emambas, pura e tão-somente, ratificado os termos da contestação.”

Ou seja, não há interesse jurídico suficiente para autorizar odesentranhamento pleiteado.

MÉRITO

Em seu recurso, o recorrente não chega a insurgir-se com fundamento naalegada emissão de cheque sem fundos. Ressalta apenas não ter alardeado que a LC 64/90punisse com inelegibilidade os “passadores de cheque sem fundo”, mas que apenas tencionaraalertar as pessoas sobre a conduta do candidato. Assim, não tendo pedido a reforma dasentença em virtude dessa alegação - não existindo nos autos, ademais, qualquer prova daexistência de ação criminal contra o impugnado - não há, juridicamente, recurso quanto aesse aspecto.

Por outro lado, no que toca às alegações de rejeição de contas e deduplicidade de filiações, o recurso há de ser julgado prejudicado, pois essas matérias, comrelação ao impugnado, já foram discutidas nos processos 750/96 e 749/96, respectivamente.

Isso posto, ante o descabimento das preliminares, nego provimento aorecurso.

É como voto.

Presidiu o julgamento o Exmº Des. Evandro de Souza Neves, e deleparticiparam, além do Relator, o Exmº Des. Joaquim Sérgio Madruga e os Juízes Dr. RuyFormiga Barros, Dr. Marcello Figueiredo Filho, Dr. Manoel Paulino da Luz e o Dr. José EdísioSimões Souto. Presente o Dr. Antonio Carlos Pessoa Lins, ilustre representante do MinistérioPúblico Eleitoral.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, JoãoPessoa, 26 de agosto de 1996.

JUIZ JOSÉ FERNANDES DE ANDRADERELATOR

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DUPLA FILIAÇÃO PARTIDÁRIA

PROCESSO Nº 359/96 - RECURSORelator: O SR. JUIZ JOSÉ FERNANDES DE ANDRADERecorrente: FRANCISCO DE ASSIS LEÔNCIO DE BRITORecorrido: JUSTIÇA PÚBLICA ELEITORALAdvogados: DRS. MARCOS PIRES E FRANCISCO DE ASSIS LEÔNCIO DE

BRITO (RECTE.)

ACÓRDÃOEMENTA: DUPLA FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. FILIAÇÃO PRIMITIVAOCORRIDA NA VIGÊNCIA DA EX-LOPP. NÃO INCIDÊNCIA DO ART.22, PARÁGRAFO ÚNICO, DA ATUAL LEI. 9.096//95.

- Se a filiação mais antiga remonta à época de vigência da revogada L.5.682/71 (ex-LOPP), não é de se fazer incidir o comando do art. 22,parágrafo único, da L. 9.096/95, que impõe a nulidade de ambas asfiliações, no caso de inobservância de suas prescrições.

Vistos, relatados e discutidos estes autos acima identificados.

A C O R D A o Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba em proferira seguinte decisão: Por maioria de votos, deu-se provimento em harmonia com o parecer.Esteve na Tribuna, em sustentação, o Bel. Marcos Pires.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, emJoão Pessoa, 16 de agosto de 1996.

Presidente

Relator

PRE

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RELATÓRIO

Cuida-se de recurso da decisão do juiz eleitoral da 58ª Zona Eleitoral,que, aplicando o que dispõe o art. 22, parágrafo único, da L. 9.096/95, determinou ocancelamento das filiações partidárias de Francisco de Assis Leôncio de Brito.

Consta dos autos, que a primeira filiação (PFL) se deu na vigência da L.5.682/71, e, a segunda (PMDB), na vigência da nova L. 9.096/95, ambas agremiações noMunicípio de São José dos Cordeiros (58ª Zona - Serra Branca), sem que se tenha procedidoàs comunicações atualmente exigidas.

A douta PRE opinou pelo provimento (fls. 20), por não se considerar afiliação havida anteriormente à vigência da lei nova.

Conclusos, pedi dia para julgamento.

É o relatório. A seguir, o voto.

VOTO

Sr. Presidente, Egrégio Tribunal, o recurso merece provimento.

Com efeito, como já tive oportunidade de votar, aqui, em casosassemelhados, se a filiação mais antiga remonta à época de vigência da revogada L. 5.682/71(ex-LOPP), entendo que não incide o comando do art. 22, parágrafo único, da L. 9.096/95,que prescreve:

“Parágrafo único. Quem se filia a outro partido deve fazer comunicação aopartido e ao juiz de sua respectiva Zona Eleitoral, para cancelar sua filiação;se não o fizer no dia imediato ao da nova filiação, fica configurada duplafiliação, sendo ambas consideradas nulas para todos os efeitos”.

Essa regra é válida, a partir de sua vigência, apenas para aquelas filiaçõesnovas, quando ambas se realizarem sob o seu manto. Outra interpretação feriria o dispostono art. 5º, inciso XXXVI, da Lei Maior:

“A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisajulgada”.

E a própria Lei. 9.096/95, em seu art. 58, faz a ressalva em torno daprimeira relação de filiados:

“Art. 58. A requerimento de Partido, o Juiz Eleitoral devolverá as fichas defiliação partidária existentes no cartório da respectiva Zona, devendo serorganizada a primeira relação de filiados, nos termos do art. 19, obedecidasàs normas estatutárias”.

Isto posto, dou provimento ao recurso.

É como voto.

Presidiu o julgamento o Exmº Des. Evandro de Souza Neves, e deleparticiparam, além do Relator, o Exmº Des. Joaquim Sérgio Madruga e os Juízes Dr. Ruy

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Formiga Barros, Dr. Marcello Figueiredo Filho, Dr. Hitler de Siqueira Campos Cantalice e o Dr.José Edísio Simões Souto. Presente o Dr. Antonio Carlos Pessoa Lins, ilustre representantedo Ministério Público Eleitoral.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, JoãoPessoa, 16 de agosto de 1996.

JUIZ JOSÉ FERNANDES DE ANDRADERELATOR

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 335

RECONTAGEM DE VOTO

Processo nº 1017/96 - RECURSORelator: O SR. JUIZ JOSÉ FERNANDES DE ANDRADERecorrentes: COLIGAÇÃO UNIÃO DEMOCRÁTICA PROGRESSISTARecorrido: JUNTA ELEITORALAdvogados: DRS. JOSÉ LUCIANO GADELHA, JOÃO DE ASSIS BENTO

(RECTE.)

ACÓRDÃO

EMENTA: PEDIDO DE RECONTAGEM. ART. 28, III, DA L. 9.100.INDEFERIMENTO. RECURSO. REQUISITOS ATENDIDOS.PROVIMENTO.

- O pedido de recontagem com base no art. 28, III, da L. 9.100, queindepende de prévia impugnação ou recurso, deve ser deferido, tanto queatendidos os requisitos a ele atinentes.

- Recurso provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos acima identificados.

A C O R D A o Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba em proferira seguinte decisão: Deu-se provimento ao recurso, por votação unânime. Usaram da tribunaos advogados Luciano Gadelha e Walter Agra Júnior.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, emJoão Pessoa, 12 de novembro de 1996.

Presidente

Relator

PRE

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RELATÓRIO

Cuida-se de recursos da decisão da Junta Eleitoral que indeferiu pedidode recontagem de votos do pleito majoritário do Município de Aguiar, e em que são recorrentesa Coligação “UNIÃO DEMOCRÁTICA PROGRESSISTA” de Aguiar, por seu candidato a Vice-Prefeito, José Horácio Ramalho Leite e o DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PMDB de Aguiar, porseu Presidente.

As razões recursais repousam às fls. 05 e ss., bem assim às fls. 103/104, e se fulcram basicamente em que a diferença de dois (02) votos, margem com que foieleito o candidato Darcy Alves de Lacerda, num universo de 3.827 votos apurados, entreválidos, brancos e nulos, não expressa cristalinamente a vontade do eleitorado, a se considerara possibilidade de ter ocorrido erro na apuração.

Alega-se, outrossim, destonância do total de votos válidos de determinadaurna em comparação com a média das demais apuradas.

Com vista dos autos, opinou a douta PRE pelo provimento do recurso (fls.132/133).

Conclusos, pedi dia para julgamento.

É o relatório. A seguir, o voto.

VOTO

Sr. Presidente, egrégia Corte, os recursos vêm lastreados no comandodo art. 28, III, da L. 9.100/95, in verbis:

III - será, também, assegurada a recontagem dos votos, na forma doinciso anterior, quando, na fundamentação do recurso, ficar evidenciada aatribuição de votos a candidatos inexistentes, o não fechamento dacontabilidade da urna, bem como a apresentação de totais de votos nulos,brancos ou válidos destoantes da média geral verificada nas demais Seçõesdo mesmo município ou Zona Eleitoral;

Analisando o dispositivo, em seus Comentários à Lei nº 9.100/95, FiuzaEditores, prelecionam Alberto Rollo e Enir Braga, acerca dessa distorção na média:

“Outro motivo abrigado pelo art. 28, inc. III, da L. 9100, para a recontagem,é a demonstração, pela média, da existência de distorções relativamenteaos votos nulos, brancos e válidos, de uma urna, comparativamente comoutras de secções do mesmo município.

Tal hipótese de recontagem motivada já estava prevista no art. 25, § 2º,da L. 8.214/92, e no art. 87 da L. 8.713/93.”

A meu sentir, egrégia Corte, o caso em apreço subsume-se ao incisoepigrafado.

Primeiramente, porque, desconsiderando a urna da seção de nº 17, emque o candidato Darcy Alves obteve maioria de 25 votos - urna essa que mais causou estranhezaaos recorrentes -, temos que em todas as outras a diferença a seu favor nunca foi superior a

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Rev. Parahyba Judiciária. João Pessoa, 1(1): 338, 1998 337

10 votos, salvo na seção 003, em que obteve 18 votos a mais que o candidato FranciscoMendes, que, por seu turno, chegou a obter, na seção de nº 006, 28 votos a mais que o seuconcorrente. Sem dúvida, não só na seção de nº 17, como também na de nº 003, a apresentaçãode votos válidos em favor de Darcy Alves encontra-se destoante da média geral verificada nasdemais seções do município.

Por outro lado, o resultado final da apuração revelou uma diferença singular:apenas dois (02) votos de vantagem para o candidato Darcy Alves. E sendo essa margemmuito pequena para - como já se disse - um universo de 3.827 votos contabilizados, entendode bom alvitre o atendimento do pedido, para que não reste duvidosa a manifestação dasoberania popular exercida no último pleito eleitoral.

No caso, entendo dispensável a prévia impugnação ou recurso, por ocasiãoda apuração, como condição para o posterior pedido de recontagem. Há de se buscar a menslegis, a partir da leitura do texto frio da lei. Com efeito, o inciso III, do art. 28, já referido, fazmenção ao inciso II, ao dizer que será também assegurada a recontagem de votos, na formado inciso anterior (...)... Ora, o inciso II, que foi vetado, dizia:

“Art. 28..........................................................................

II - sendo o pedido formulado conjuntamente pela maioria dospartidos participantes do pleito e com representação na Câmarados Deputados, considerados individualmente, quer sejamcoligados ou não, o deferimento será automático e a recontagempela Junta Apuradora efetivar-se-á no prazo máximo de 48 horas;”......................................................................................

E as razões do veto foram as seguintes:

“A regra insculpida na Lei nº 8.214, de 24 de julho de 1991, teve comofundamento a previsão de escrutínio na própria mesa receptora, onde,pela sua natureza, seria impossível, o controle jurisdicional do processode apuração. Nessa hipótese, seria, em tese, admissível a recontagemautomática, a fim de que a matéria fosse devolvida à Justiça Eleitoral,como primeira instância jurisdicional.

Não é o caso do projeto de lei em tela, dado que este, no art. 28, II, aoprever a apuração tradicional, pela Junta, leva à atuação do Poder Judiciáriodesde a gênese do processo de escrutínio, cuja ata final tem a eficáciade ato jurisdicional.

Diga-se que o legislador, na espécie, se limitou a transcrever a norma dacitada Lei nº 8.214, a qual já fora suprimida pela Lei nº 8.713, de 30 desetembro de 1993, que regulamentou as eleições de 1994, por absolutaincompatibilidade com o sistema de apuração alvitrado.

Destarte, pleito de recontagem que implique deferimento automático, combase apenas no número de partidos requerentes, sem que estes justifiquemsuficientemente o pedido, constitui-se em flagrante inconstitucionalidade,violando a autonomia do ato jurisdicional e conduzindo a uma ruptura dosistema processual em vigor, o qual exige a fundamentação em qualquerdecisão, como pressuposto de sua executoriedade (art. 93, IX, CF), oque conduz ao veto do art. 28, II, da propositura.”

Creio que a intenção do legislador, no que se refere ao inciso III,permaneceu inalterada, e deve ser visualizada da maneira que o seria se o inciso II não

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houvesse sido vetado, o que implica a possibilidade de pedido de recontagem, fulcrado emdestonância da média, independente de prévia impugnação ou recurso.

Nesse ponto, faço minhas as palavras do Dr. Antonio Carlos Pessoas,eminente Procurador Regional Eleitoral:

“Cumpre observar que assiste razão aos recorrentes ao afirmarem que “ainexpressiva maioria de 02 (dois) votos se mantida sem uma recontagem,deixará sérias dúvidas sobre a garantia constitucional da vontade doseleitores. Diante da probabilidade de erros causados pelo cansaço eparcialidade dos escrutinadores, é que se recorre de plano, à Justiçapara ver respeitado no sistema democrático o sagrado direito da vontadepopular”.

Com relação à apuração da Seção 17 (dezessete), também, mereceacolhida o argumento dos recorrentes, visto que a diferença de 25 (vinte ecinco) votos em favor do candidato Francisco Mendes Pedrosa foi eliminadacom os votos existentes apenas na referida seção, o que causou umacerta surpresa, não estando a apuração daquela urna de acordo com amédia das demais”.

Isso posto, dou provimento ao recurso, para determinar a recontagemtotal dos votos da eleição majoritária de 03/10/96, no município de Aguiar (66ª Zona Eleitoral- Piancó).

É como voto.

Presidiu o julgamento o Exmº Des. Evandro de Souza Neves, e deleparticiparam, além do Relator, o Exmo. Des. Joaquim Sérgio Madruga e os Juízes Dr. RuyFormiga Barros, Dr. Marcello Figueiredo Filho, Dr. Hitler de Siqueira Campos Cantalice e o Dr.José Edísio Simões Souto. Presente o Dr. Antonio Carlos Pessoa Lins, ilustre representantedo Ministério Público Eleitoral.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, JoãoPessoa, 12 de novembro de 1996.

JUIZ JOSÉ FERNANDES DE ANDRADERELATOR

Desconsiderando a urna de nº de 17, em que o candidato Darcy obtevemaioria de 25 votos, em todas as outras a diferença a seu favor nunca foi superior a 10 votos,salvo na seção 003, em que obteve 18 votos a mais que o candidato Chico, que, por seuturno, chegou a obter, na seção de nº 006, 28 votos a mais que o seu concorrente. Semdúvida, não só na seção de nº 17, como também na de nº 003, a apresentação de votosválidos em favor de Darcy encontra-se destoante da média geral verificada nas demais seçõesdo município.