Revista do Sismuc 26 anos

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Revista do Sismuc 26 anos História, conquistas e lutas Opinião, formação, informação

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EXPEDIENTESindicato dos Servidores Municipais de Curitiba

A Revista do Sismuc é um informativo do Sindicato dos Servidores Municipais de Curitiba (Sismuc). Localização: Rua Monsenhor Celso, 225, 9º andar. CEP 80010-150 / Fone/Fax: (41) 3322-2475. E-mail: [email protected]. Página: www.sismuc.org.br.

Tiragem: 15.000 exemplares Jornalista Responsável: Manoel Ramires (DRT 4673) - Jornalistas: Pedro Carrano (Mtb 4492) e Phil Batiuk Trindade. Revisão: Irene Rodrigues e Cathia Almeida - Secretária de Imprensa e Comunicação: Adriana Claudia Kalckmann.

Funcionários do sindicato: Letissa Cristina Faville, Andrea Landarim, Ana Flávia de Oliveira Sant’ana, Soeli Schenoveber dos Santos, Tadeu Félix, Everson Cunha, Fernando Henrique Biagio. Assessoria Jurídica: Ludimar Rafanhim, Maíra Tramontim, Andressa Rosa

Bampi, Claudia Scheidweiler, Raquel de Souza Magrin. Diagramação: Jennifer Giacomet Inda. Produção: Argo Propaganda.Os artigos, entrevistas e opiniões não representam a posição do sindicato e são de responsabilidade de seus autores.

Diretoria da Gestão “Reconstruir pela base”Coordenação Geral - Ana Paula Cozzolino

Coordenação de Administração - Everson Roberto SchiesselCoordenação de Finanças - Sônia Nazareth Duarte CruzCoordenação de Estrutura - Irene Rodrigues dos Santos

Coordenação de Comunicação e Informática - Adriana Claudia KalckmannCoordenação de Assuntos Jurídicos - Rita Choinski Kloster

Coordenação de Formação e Estudo Socioeconômicos - Eduardo Recker NetoCoordenação de Políticas Sindicais - Patrícia de Souza Lima

Coordenação de Políticas Sociais - Alzira Isabel SteckelCoordenação de Organização por Local de Trabalho - Cathia Regina Pinto de Almeida

Coordenação de Saúde do Trabalhador e Meio Ambiente - Vera Lucia ArmstrongCoordenação de Aposentados - Salvelina Borges e Natel Cardoso dos Santos

Coordenação de Gênero - Maria Aparecida Martins SantosCoordenação Juventude João Guilherme BernardesCoordenação de Etnia - Dermeval Ferreira da SilvaCoordenação de LGBT - Patrícia Cristina Gonçalves

Conselho FiscalAugusto Luis da Silva

Icléa Aparecida Alves MateusPaulo Gomes

Suplência do Conselho Fiscal Arno Emilio Gerstenberger Junior

Odilon Adriano de OliveiraOsni Narestki

Renato Alves Ferreira

Suplência da DiraçãoAlice da Silva

Daniel Augusto SimõesGiuliano Marcelo Gomes

Guilherme Felippe do PradoIlma Alves Bomfim

João Medeiros PereiraLeandro Francel Alves Servilha

Marlene Aparecida Santos CazuraMario Barbosa

Mauro ScarmocinPaula Regina Jardim Campos

Paulo Canova Filho RitaSebastião Rodrigues Alves

Suely Terezinha de Souza Araújo

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editorial

05 Uma revista sem dono e com muitos colaboradores

artiGoS

08 Sismuc e a trajetória das negociações coletivas Economia Sindical 23 A judicialização da política, dos movimentos sociais e grevistas Judicialização Política40 Em busca de legitimidade: duas frentes de ação sindical Política e Ação Sindical

eNtreViSta

06 SISMUC, nascido para lutar O começo da História 13 SISMUC entrevista Marilena Silva O sindicato é um equipamento de reação da classe trabalhadora38 SISMUC entrevista Ana Paula Cozzolino Um período de lutas e avanços

trabalho em debate 10 Direito à organização Direito à convenção coletiva do serviço público precisa de regulamentação 19 Jornada de Trabalho A realidade é que trabalhamos demais44 Perda de Direitos A terceirização continua ameaçando os trabalhadores

sumário

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4 • Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br •

orGaNização em debate

11 Hierarquia Transversal Estrutura do Sismuc vai da base à coordenação21 Tripé contra-hegemônico A Organização por Local de Trabalho (OLT) na luta de classes 47 Luta de Classes O tripé contra-hegemônico do Sismuc48 Formação é pauta geral e específica Atuação sindical e disputa de poder só constroem novo mundo possível, sem reproduzir hegemonia, quando existe consciência.51 Charge Servelino e a Comunicação52 Comunicação, uma tarefa urgente para os sindicatos

rePortaGem eSPeCial

26 Um Sindicato, todas as lutas Histórico e conquistas do Sismuc

SiSmUC debate

16 Sismuc e a trajetória das negociações coletivas A quem interessa a divisão dos sindicatos por categoria

liVroS

55 Obras para lutar melhor 56 Crônicas e Romances

filmeS

57 Cardápio variado

CrôNiCaS

59 Diante de Si

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Certa vez, um escritor, perguntado sobre quanto tempo

havia demorado a escrever seu romance, sorriu e respondeu:

– A vida toda.

Evidente que ele não tinha levado toda a existência

apenas para escrever uma obra. Muito embora alguns escritores

gastem toda uma vida para concluir seu Best Seller e outros

não levem mais do que um mês. Isso porque, como assinala José

Saramago, “no fundo, todos temos necessidade de dizer quem

somos e o que é que estamos a fazer e a necessidade de deixar

algo feito, porque esta vida não é eterna e deixar coisas feitas

pode ser uma forma de eternidade”.

“A vida toda”, segundo aquele escritor, significa que para

escrever um conto, um ensaio, um poema, um haicai, ninguém

parte do zero, do nada, de uma sorte de

inspiração. Pelo contrário, a criatividade se

alimenta da transpiração, a cereja, do bolo,

o gol, do passe. O livro, portanto, era resul-

tado de experiências que ele havia absor-

vido de outros livros, de bula de remédio,

de recadinho em papel de pão, do contato

com as pessoas que estimava e do afasta-

mento das que repulsava, das ideias alhe-

ias acertadas e dos seus próprios erros.

Tanto que sua dedicatória era direcionada

“aos caboclos e suas ideias que desen-

terrei para escrever essa obra”, compar-

tilhava, dialogando com Dom Casmurro,

que cravou: “Ao verme que primeiro roeu

as frias carnes do meu corpo dedico com

saudosa lembrança estas memórias póstumas”.

A posse desse pensamento fazia com que ele,

na entrevista, dispensasse elogios ou recursos financeiros em

relação aos seus manuscritos. Para o escritor, fechando essa

introdução, a ideia não é propriedade de ninguém, assim como a

luta não tem direito autoral.

E é de olho nesta postura que nasce a Revista do

Sismuc – 26 anos. Uma revista que foi concebida há pouco mais

de cinco meses quando, em discussão com diretores, se percebeu

que parte das conquistas dos trabalhadores se perdia justamente

pela falta de registro posterior. É o caso das férias de meio de

ano para os educadores, que são gozadas sem que se exalte a

luta que a tornou possível, ou o 13º em plano nacional, a licença

prêmio, a aposentadoria especial, a incorporação da gratificação,

a redução de jornada, o difícil provimento, a primeira greve,

entre muitos outros pontos. Nada disso veio de graça. Na vida,

não existe janta gratuita. Tudo resulta da fome por direitos, da

mobilização de trabalhadores em algum instante ou em diversos

momentos, pois a vitória pode vir numa primeira greve ou ao

longo de diversas paralisações.

Portanto, essa revista, cronologicamente, está direcio-

nada para os 26 anos de fundação do Sindicato dos Servidores

Municipais de Curitiba, mas a história que ela conta, as ideias,

as estratégias podem ter a idade de nossos pais, avós, tataravós.

O magazine pode passar de 200 anos quando se debate a luta

de classes, a exploração do trabalho, entre outros, e também

pode ser fresquinha quando se utiliza de ferramentas modernas

de comunicação, quando busca conquistar pautas que calejam

nossas mentes como a convenção 151 da Organização Mundial

do Trabalho, quando debate a necessidade de

disputar a hegemonia através da formação, da

comunicação e da organização por local de

trabalho.

Esta revista, que agora você lê a

introdução, nas próximas páginas e até seu

ponto final, debaterá a importância do sindi-

calismo no cotidiano das pessoas. Ela não tem

dono e sim muitos colaboradores. São jornalis-

tas, funcionários do sindicato, diretores

sindicais, servidores da base, assessores,

companheiros que se dedicaram para produzir

um produto que valorize o serviço municipal.

Gente que resgata o histórico das negociações

salariais dos servidores municipais e muitas

outras profissões, que discorre sobre a judi-

cialização da política, que afirma (ou não) o papel dos sindica-

tos na melhoria de vida do povo. Turma que aborda a importância

de se ter um sindicato único que faça todas as lutas, que

coloque holofote sobre grandes e pequenos temas de interesse

dos trabalhadores, que dê sua opinião, seja na fundação, no meio

da história do Sismuc ou no atual momento. A revista ainda

se propõe a curtir e compartilhar parceiros sindicais e dos

movimentos sociais preocupados em reduzir as desigualdades e

as injustiças de nosso país. E porque nem todo conteúdo informa

sem a forma e o formato também é conteúdo, traz também gra-

vada em suas folhas ilustrações, charges, curiosidades, dicas de

filme e livros para que a última página virada seja apenas o start

de novas inspirações e de fôlego renovado.

Aproveite a sua Revista do Sismuc - 26 anos.

Manoel Ramires Editor de Comunicação do SISMUC

editorial Uma reViSta Sem doNo e Com mUitoS ColaboradoreS

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o que conta Maria Madalena, primeira presidente em 1988:

- Eu participei da assembleia que ia fundar o Sismuc. Como eu trabalhava

no prédio central, eu fui indicada. Primeiro, não como presidente, mas como

secretária de finanças junto com o grupo que foi indicado. Na assembleia,

se não me falha a memória, tinha umas duas mil pessoas. Ela ocorreu no

auditório atrás da Câmara Municipal. Foi neste momento em que construímos o

sindicato independente da Associação de Servidores Municipais (Assmuc).

A fundação do sindicato ocorreu sem estrutura física ou materiais para

mobilizar a base. No conceito da solidariedade, os diretores eleitos foram trazendo

objetos de suas casas. Mais do que isso. O Sismuc nasceu com a convicção de que era

importante fazer a luta

- Eu aproveitei as minhas férias para participar da fundação do sindicato –

recorda Madalena. Naquela época o Ludimar Rafanhim (segundo presidente) comprou

uma Kombi para percorrer os locais de trabalho. Nós visitamos todos os lugares para

colocar nosso posicionamento da luta sindical. Aquela época foi logo após a Ditadura

Militar, por isso havia um clima favorável à participação. O Sismuc foi um dos primeiros

sindicatos do Brasil de municipais e virou referência no Brasil. No começo, a gente se

dedicou àquele sindicato e com muito apoio e participação da categoria. Já na primeira

greve tivemos participando de muitos servidores, inclusive do prédio central.

Momento político. . . . O primeiro grande evento político ocorreu no governo de Roberto Requião.

Segundo Maria Madalena, era o fim de sua gestão.

”Ele tinha postura truculenta, sem diálogo. Mesmo assim, com as lutas anteriores,

conseguimos uma negociação no fim de mandato”.

A primeira pauta. . . A primeira ação do Sismuc foi encaminhar a pauta de reivindicações ao

prefeito. Desse processo se conquistou o acordo para que houvesse o desconto das

mensalidades, assinatura de carta de intenções com os servidores municipais e

a mensagem de 83,35% de reposição salarial que Roberto Requião deixou para ser

votada na Câmara Municipal. Nesta época, em menos de cinco meses, o Sismuc já

possuía 1200 sindicalizados.

SiSmUC, NAsCiDo PArA LuTAr

O Sismuc tem em seu DNA a

luta sindical e a defesa dos

servidores municipais e

movimentos sociais.

Ao longo de sua história*, o

processo democrático e de

diálogo com a base sempre foi

referencial.

É

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Primeira precarização. . . Contudo, Jaime Lerner, ao assumir em 1989, não cum-

priu a carta de intenções, dividindo em duas vezes a reposição

salarial. Além disso, Lerner ainda anunciou a demissão de cinco

mil servidores sem estabilidade. Nesta ocasião, Lerner prometeu

a liberação de cinco dirigentes sindicais, mas não cumpriu.

O início das demissões atingiu 822 servidores. Desses, 150

foram readmitidos após 15 dias de pressão do Sismuc sobre a

Prefeitura. A postura ainda impediu a demissão total de cinco

mil trabalhadores, como havia sido anunciado.

Primeiras manifestações. . . Elas ocorreram em maio de 1989. Já em outubro

ocorreu a primeira greve vitoriosa do sindicato. A mobilização

conseguiu zerar as perdas salariais. Já em março de 1990, devido

à recusa de o prefeito Jaime Lerner em negociar, mais de três

mil servidores aprovaram greve a partir do dia 7, como conta

o deputado federal e fundador do Sismuc, Doutor Rosinha:

“Jaime Lerner tratava o servidor como objeto: péssimo salário

e condições de trabalho, além de perseguir aquele que luta por

seus direitos. Tratava a cidade como dono dela. Ele desperdiçou

dinheiro embelezando a cidade em detrimento de recursos para

saúde, educação e saneamento. Também sempre favoreceu o

setor empresarial que financiava sua campanha”.

A greve não teve avanços, mas consolidou o Sismuc

como sindicato de luta para os próximos anos, como declarou

Ludimar Rafanhim, na década de 1990.

- Uma das preocupações do sindicato desde sua

fundação foi à democracia interna. Por isso sempre fizemos

uma direção colegiada. Isso significa compartilhar as respon-

sabilidades entre todos os dirigentes. Isso ocorreu na gestão da

Marilena, na minha gestão e o ponto máximo foi atingido quan-

do eu e outros companheiros abrimos mão de nossos cargos em

favor do revezamento para que outros companheiros pudessem

ampliar essa democracia.

Mostrando-se sempre combatido, o Sismuc entrou

em greve em setembro de 1992. Foram seis dias durante a

campanha para prefeito em que Rafael Greca, apoiado por

Lerner, tornou-se prefeito. A outra greve ocorreu em 22 de

março de 1993 com forte repressão do aparato policial e

justiça declarando a mobilização ilegal. “Tanto antigamente,

como agora, a justiça agiu muitas vezes em favor do patrão.

Mesmo assim, nos mobilizamos independente da legalidade,

seja enquanto sindicato ou como associação, Nos organizamos

durante a ditadura, durante a democracia e vamos seguir sempre

assim”, conclui Irene Rodrigues, presidente em exercício.

MULTIMÍDIA * Reportagem baseada nos documentários “25 anos de luta”, de 2014, e “Sismuc, cinco anos de luta”, em 1993. Acesse o Canal do Youtube Sismuc 88 e veja os documentários.

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negociação coletiva no setor público é diferen-

ciada em relação ao setor privado, com algu-

mas características importantes: ao contrário da

empresa privada, o objetivo do Estado não é o

lucro, mas o bem estar coletivo, a partir, sobretudo,

da legislação voltada para o maior controle das contas públicas;

as empresas privadas

podem agir livremente

segundo suas metas e

objetivos, desde que

estes não sejam proi-

bidos em lei, o admi-

nistrador público só

pode agir nos limites

e contornos autoriza-

dos pela legislação; e

outra característica da

negociação no setor

público é que o poder

normativo da Justiça

do Trabalho não tem

tanta influência, como

ocorre no setor privado, em que atua, principalmente como “ter-

ceiro ator” do processo de negociação, com a função de dirimir

os conflitos entre as partes.

Por estas várias características citadas acima, a nego-

ciação no setor público é mais complexa do que aquela obser-

vada no setor privado, além de ter muitos atores envolvidos

no processo, não se limitar apenas a data-base, tendo vários

assuntos na pauta, reajuste salarial, plano de cargos, carreiras e

vencimentos, concursos públicos, saúde e segurança do trabal-

hador, entre outros.

Ao longo dos anos observamos que os resultados das

negociações coletivas no Brasil, tanto no setor público como

privado, são influenciados pelo nível de organização sindical,

mas também pela conjuntura econômica, principalmente o cres-

cimento da economia, a inflação e as condições no mercado de

trabalho, além das finanças públicas que afetam diretamente

as negociações no setor púbico, variáveis que apresentaram

mudanças significavas no Brasil nas últimas três décadas.

Mas antes de entrarmos no período após a criação do

Sismuc, que ocorreu no dia 22 de outubro de 1988, apenas 22

dias após a promulgação da Constituição Federal de 1988, é

importante voltar um pouco no tempo, e verificarmos a conjun-

tura econômica no período anterior à criação do sindicato, na

qual observamos um avanço dos movimentos sociais e sindicais,

consequência da busca da redemocratização do país, após 30

anos de ditadura. Em termos econômicos a conjuntura não era

muito favorável, com baixo crescimento econômico, na econo-

mia a década de 80

no Brasil é conhecida

como a década per-

dida, além disso, no

final dos anos 80 até

o Plano Real, vivemos

um período de

hiperinflação, a infla-

ção mensal chegou a

quase 80% em alguns

momentos, e o avanço

no mundo da ideolo-

gia neoliberal, que é

a doutrina econômica

que defende a absolu-

ta liberdade de mer-

cado e a não intervenção estatal sobre a economia, que começou

a influenciar as políticas adotadas pelo governo brasileiro no

início dos anos 90.

Nas negociações coletivas durante o período de 1965

a 1994, existiu no Brasil uma política salarial nacional por

parte do Governo Federal, que determinava os reajustes sala-

riais automáticos, que acabavam sendo o patamar mínimo de

correção dos salários, que foi extinta após quase 30 anos. Mas

esta politica não garantia a reposição automática da inflação,

principalmente no período de 1986 a 1994, que vivemos em

uma conjuntura de hiperinflação, com vários planos econômicos

(Planos Cruzado I e II, Plano Bresser, Plano Verão e Planos Collor

I e II) e baixo crescimento da economia.

Após várias tentativas de conter a hiperinflação, no

segundo semestre de 1993 o Plano Real começou a ser implan-

tado, ele se dividiu em três fases, a primeira delas foi o ajuste

das contas públicas, através de um corte no Orçamento, a

segunda foi à implantação da Unidade Real de Valor (URV), uni-

dade monetária para desindexar a economia; e por fim, a URV

seria transformada em real, a nova moeda brasileira a partir de

julho de 1994.

AsANDro siLVA

SiSmUC e A TrAjeTóriA DAs NegoCiAções CoLeTiVAs

economista e supervisor técnico do DIEESE-PR.

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sANDro siLVA

Apesar do Plano Real ter alcançado seu principal obje-

tivo, que era conter a inflação, a economia brasileira continuou

patinando, consequência das medidas adotadas terem sido man-

tidas por muitos anos, como as altas taxas de juros, manutenção

do câmbio artificialmente valorizado e abertura comercial,

além da reforma administrativa do Estado, as privatizações, a

restruturação produtiva, a flexibilização dos direitos trabalhistas,

entre outras, tendo como consequência o baixo crescimento da

economia, em patamar próximo ao verificado na década de 80,

e o maior problema da economia passou a ser o baixo cresci-

mento econômico e a precarização do mercado de trabalho. No

inicio de 1999, após a reeleição de Fernando Henrique Cardoso,

o Brasil enfrentou uma grave crise, que acabou acarretando

mudanças na politica econômica, que passou a ser pautado

pelo tripé macroeconômico, que consiste no regime de metas

de inflação, de metas de superávit primário e câmbio flutuante,

observando no primeiro momento uma desvalorização do real.

A década de 90 foi um período em que o movimento

sindical brasileiro enfrentou grandes dificuldades no campo

econômico e politico, com reflexos inevitáveis sobre os pro-

cessos de negociação coletiva. As altas taxas de desemprego,

ocasionadas pela estagnação da atividade econômica e a

adoção de politicas que visavam à flexibilização da legisla-

ção trabalhista ensejaram um cenário bastante adverso para

a ação sindical. Além disso, teve a aprovação em 2000 da Lei

de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101), que

estabelece limites do gasto com pessoal em relação a receita

corrente liquida, por esfera de governo (Federal, Estadual e

Municipal) e de poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário).

Para os servidores públicos municipais de Curitiba esta

conjuntura do final dos anos 80 e da década de 90 teve impacto

nas negociações coletivas, gerando perdas para os servidores.

No período até o Plano Real, apesar da existência de uma políti-

ca salarial nacional, que garantia um reajuste salarial mínimo,

não foi suficiente para repor nem a inflação do período, mesmo

após o Plano Real, quando passou a vigorar a livre negociação,

também acabou gerando um aumento das perdas para os ser-

vidores, inclusive em alguns anos ficaram sem reajustes (1998

e 1999), consequência da conjuntura econômica já destacada

anteriormente.

A conjuntura econômica, e consequentemente das

negociações coletivas, mudaram apenas a partir de 2004, apesar

da manutenção por parte do governo federal do tripé macro-

econômico. No meu ponto de vista isto ocorreu principalmente

pelo abandono do paradigma neoliberal, principalmente a

mudança do papel do Estado na economia, através da valoriza-

ção do mercado interno, valorização do salário mínimo, amplia-

ção das políticas sociais, valorização do serviço público, redução

dos juros, ampliação do crédito, entre outras. Tendo como con-

sequência a retomada na geração de empregos formais, redução

das taxas de desemprego, recuperação da renda, redução da

informalidade, aumento no consumo das famílias, retomada do

crescimento da economia e o aumento real passou a ser uma

realidade na maioria das negociações salariais.

Em função deste novo cenário, bem como a maior

mobilização dos servidores e do sindicato, as negociações cole-

tivas dos Servidores de Curitiba avançaram neste período, prin-

cipalmente a partir de 2005, sendo que nos últimos 10 anos de

negociação, em 8 anos a categoria conquistou aumento real, mas

que ainda não foi suficiente para compensar a perda acumulada

no período de mar/1999 a fev/2014 (9,24%), que atualmente é

utilizado como referência para o cálculo de perda salarial da

categoria, no entanto, a perda acumulada já chegou a ser de

quase 20,00%, e vem se reduzindo nos últimos anos.

Apesar dos avanços conquistados nos últimos anos, há

necessidade de continuar avançando, principalmente para recu-

perar as perdas salariais acumuladas ao longo dos anos, além de

avançar em outros temas importantes para os servidores, como

plano de cargos, carreiras e vencimentos, condições de tra-

balho, saúde e segurança, entre outras. Outro desafio que julgo

muito importante para todos os servidores públicos, é a luta

pela regulamentação da Convenção 151 da OIT (Organização

Internacional do Trabalho), que foi ratificada em 2010, e trata da

organização sindical e do processo de negociação dos trabalha-

dores do serviço público.

Mas o cenário econômico mudou desde a crise finan-

ceira de 2008, verificamos nos últimos anos uma forte

desaceleração do crescimento da economia, principalmente a

partir de 2011, que acaba afetando o setor público, mas que

ainda não afetou o mercado de trabalho e as negociações

coletivas, mas se não ocorrer uma reversão nos próximos anos,

à situação pode ser alterada, criando um desafio a mais para o

movimento sindical brasileiro, colocando em risco os sucessivos

ganhos reais observados na maioria das negociações coletivas.

drops sindicalismo

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Constituição Federal expressa, no artigo 37, o direito à negociação no

serviço público, mas não falou expressamente da negociação coletiva. No

ano de 2013, a presidenta Dilma fez um decreto, ainda não regulamentado.

“Precisaria desse passo, que romperia com algumas amarras nessa relação

com os servidores junto ao poder público”, descreve Ludimar Rafaghin (na

foto à direita), assessor jurídico e militante histórico do Sismuc.

Este item é importante devido ao direito à negociação coletiva no serviço

público, vinculando ambas as partes, empregador e empregado.

A data-base é consequência desse vínculo entre as partes. Pois toda a relação

sindical com a administração pública é regulada, com liberdade e autonomia sindical.

“Tem tudo a ver a relação entre a Convenção 151 e o direito à greve. Se não tem regu-

lamentada a negociação, como se pode dizer que os caminhos esgotaram?”, questiona

Ludimar.

De concreto, o direito à negociação coletiva poderia coibir práticas anti-sindicais e avançar na construção da Organização

por Local de Trabalho (OLT). Todas essas coisas são necessárias à boa negociação coletiva. “Nada disso ocorrerá se não for garantida

de fato a organização sindical”, afirma o advogado.

A

DireiTo À orgANiZAçÃoDireito à convenção coletiva do serviço público precisa de regulamentação

Ratificação da Convenção 151 da OIT, que trata da negociação coletiva no serviço público, foi aprovada, mas ainda não regulamentada no país.

Pedro Carrano

- Garantir regras e procedimentos mínimos que assegurem a negociação necessária;

- Que o negociado vincule as partes;

- Que se reconheça que o servidor possa fazer a greve de fato e não sejam fixados

judicialmente percentuais elevadíssimos de manutenção de servidores;

- Regulamentar o direito de greve .

drops sindicalismo

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Sindicato dos Servidores Públicos Municipais

(Sismuc) representa trinta mil servidores munici-

pais, lotados em mais de 130 cargos diferentes.

Por conta dessa complexidade, é organizado por

um conjunto de centenas de pessoas desde a base

até a coordenação liberada para atuar integralmente em nome

da entidade.

A instân-

cia máxima do Sismuc

é o Congresso dos

Trabalhadores, que acon-

tece uma vez a cada três

anos, sempre no ano

seguinte à eleição da

chapa que será gestão por

três anos. O Congresso tem

por finalidade analisar as

condições de conjuntura

política e econômica dos

trabalhadores no contexto

do município, estado, país

e internacional. Uma vez

feita essa análise, os servi-

dores definem o programa

de trabalho que o sin-

dicato deverá seguir até

a realização do próximo

Congresso.

A Assembleia

Geral é convocada uma

vez por ano para debater a

data-base, pautas geral e

específicas. Também pode

ser realizada extraor-

dinariamente, tanto

Assembleia Geral quanto

específicas. A cada três anos, é na Assembleia que ocorre o pro-

cesso eleitoral da Diretoria Executiva Colegiada e do Conselho

Fiscal.

Cabe à Diretoria Executiva colocar em prática as ações

definidas em Congresso, Assembleia e outros espaços de decisão.

Também é responsável por manter toda a estrutura do sindicato

e tomar decisões executivas, que eventualmente podem ser

homologadas por outra instância. A Diretoria Executiva é coor-

denada por pastas, sendo elas: coordenação geral; de adminis

tração; de finanças; de estrutura; de comunicação e informática;

de assuntos jurídicos; de formação e estudos sócio-econômicos;

de políticas sociais; de organização por local de trabalho; de

políticas sindicais e relações de trabalho; de saúde do trabalha-

dor e meio ambiente; e de aposentados.

Já o Conselho Fiscal deve

acompanhar esse trabalho e

problematizar quaisquer irregulari-

dades. Também é responsável por

aprovar ou não o plano orçamen-

tário e outras despesas do sindica-

to, além de fiscalizar o patrimônio

da entidade.

O Conselho de Delegados

Sindicais, por sua vez, é um organis-

mo complexo, que tem seus repre-

sentantes eleitos em cada local de

trabalho e deve realizar justamente

isso, a organização por local de tra-

balho (OLT). As decisões tomadas

por este conselho superam aquelas

tomadas pela Diretoria Executiva,

que tem o papel de executar o

que foi decidido. A cada delegado

sindical cabe manter-se atualiza-

do sobre a atuação do sindicato,

debater e organizar o local de tra-

balho, levar à atenção do Sismuc

reivindicações e denúncias da base.

É a representação sindical nas pon-

tas, em cada unidade da Prefeitura.

Por fim, é nos Coletivos

que as pautas são organizadas

de acordo com a secretaria, cargo

ou parte específica da categoria.

Concentram e aprofundam discussões levantadas nos locais de

trabalho ou que afetam diretamente o grupo de trabalhadores

representado por aquele coletivo. Servem como espaços de

debate, formação, mas também de ação, articulando negociações

e organizando mobilizações, movimentos e assembleias especí-

ficas. Qualquer servidor pode participar dos coletivos.

DireiTo À orgANiZAçÃo hierArQuiA TrANsVersALPhil Batiuk

Estrutura do Sismuc vai da base à coordenaçãoOrganização busca envolver trabalhador no local de trabalho e por pauta, além de conselhos e coordenação para decidir e executar.

o

O Estatuto do Sismuc está disponível em: www.sismuc.org.br/docs/estatuto_sismuc.pdf

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Revista do Sismuc entrevistou a assistente social e ex-presidente do

Sismuc, Marilena Silva (2003 a 2006). Nesta conversa ela reviveu momen-

tos importantes das lutas dos trabalhadores, abordando a organização sin-

dical, o ICS e IPMC, a importância de um sindicato único, o arrocho salarial

e muitos outros pontos. Para Marilena, que foi entrevistada na subsede do

Sismuc, na Rua José Loureiro, é papel do sindicato ampliar a “participação da categoria

com qualidade, devolvendo o que ela investe quando paga sua contribuição”.

O sindicato é um

equipamento de reação da

classe trabalhadora

A

SiSmUC eNTreVisTA mAriLeNA siLVA

Revista do Sismuc: Você considera que a sua eleição rompeu com a gestão anterior? Por que houve a mudança? O processo foi conturbado...Marilena Silva: Um dos pontos mais instigantes para nós trata-

va sobre a democracia interna, da organização e da participação

da base nos rumos da luta sindical.

“Nós discordávamos da ausência de fóruns de debate no sindicato.”

A ausência dos dirigentes sindicais nos locais de trab-

alho, a desorganização com relação ao congresso da categoria,

que foi interrompido e era um espaço de discussão interno e

também sobre a conjuntura social e política. Nossa chapa se

constituiu por entender que aquela direção estava há muito

tempo no poder e vinha de um desgaste, sem debate com a cat-

egoria. Também divergíamos da forma como esse instrumento

da luta (o sindicato) pautava questões pertinentes à categoria.

Lembro que nós vínhamos de um processo muito doloroso com

a Prefeitura de Curitiba em que nossos direitos estavam amea-

çados como na aposentadoria, assistência à saúde com o ICS

e principalmente com relação às perdas salariais. Na gestão

Cássio Taniguichi persistiu o modelo de fazer a reposição em

duas etapas. A gente já tinha o salário corrompido com a infla-

ção alta e ao invés de respeitar a data base, a Prefeitura dividia.

Nós passamos por isso em 2003. Não conseguimos reverter isso

em 2004 e só no ano seguinte que a gente conseguiu recuperar

pelo menos parte daquilo que a inflação já tinha levado dos

nossos salários.

Revista do Sismuc: Em 2003, por exemplo, o reajuste foi 6% e em duas partes enquanto que a inflação no mesmo ano chegou a 9,30%. Como era trabalhar isso?Marilena Silva: Vivemos um período em que a organização

econômica privilegiava grandes grupos, o que resultava em

inflação e juros altos, a perda do poder de compra. São coisas

que a gente ainda vive, mas a partir do momento em que se

elege representantes do campo popular para o legislativo se

consegue recuperar o poder de compra dos trabalhadores, o

salário mínimo etc. Naquela época, nossa campanha na CUT era

ter salário mínimo de 100 dólares. Nós superamos isso ao longo

dessa trajetória. Não que tenhamos conquistado salário decente,

aquele que o Dieese recomenda (Em agosto de 2014, o salário

mínimo estava em R$ 724 enquanto que o recomendado pelo

Revista do Sismuc: Como você entrou para a luta sindical? Marilena Silva: A minha eleição sindical foi na época em que eu trabalhava nos tele-

fônicos do Paraná. Eu fui membro da direção do Sintel-PR em 1986. Naquela época já

era uma chapa filiada a CUT. Por outro lado, a minha trajetória na luta sindical acontecia

antes de eu ser dirigente. Eu era base de um sindicato com grande discussão política

estadual. Fiquei nesta categoria até 1992. Depois migrei para a assistência social do

Paraná pelo Sindasp. Naquele momento, na CUT, nós fazíamos o debate do sindicato

por ramo de atividade e sindicato por categoria. Nós, junto com a Associação Nacional

dos Assistentes Sociais, tínhamos a diretriz que a gente devia fortalecer a luta

dos trabalhadores. Portanto, cada assistente social deveria estar junto com a classe

trabalhadora vinculada ao sindicato do ramo e fazendo a luta. Foi na nossa gestão que

extinguimos o sindicato e no Paraná e fomos nos filiar ao sindicato do ramo, no meu

caso, o Sismuc em 1992. Permaneci como base até 2003 quando nos reunimos em um

grupo e demos início à discussão de mudar os rumos do sindicato.

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Dieese é R$ 2861). Para os servidores, conseguimos avançar

nos planos de carreira, no piso salarial regional. Essa era uma

bandeira da CUT que gerou benefícios principalmente para os

aposentados.

Revista do Sismuc: O período anterior à sua gestão se carac-terizou por um forte neoliberalismo com a precarização de ser-viços públicos e privatizações. O sindicalismo estava na ofensiva por mais direitos ou na defensiva para não perdê-los?Marilena Silva: Nós lutamos muito tempo para não perder

direitos. O sindicato é um equipamento de reação da classe

trabalhadora. Eu desconheço um período onde a gente conse-

guiu simplesmente avançar. Você está o tempo todo discutindo

as condições e os processos de trabalho. Não é só o número, o

salário em si. O servidor público tem característica diferente com

a fábrica, com a indústria. Você não lida com a lucratividade. O

teu lucro é atender bem a população, é estabelecer políticas

publicas que deem conta das necessidades do povo onde você

atua. A gente sofre as consequências do capitalismo, vive em

uma sociedade competitiva, mas participa de um processo de

como se organiza a sociedade, seja ele privatizante ou não.

Vejam, a partir da Lei de Responsabilidade Fiscal, os servidores

passam a atuar na defensiva sempre porque tem essa “faca no

pescoço” dizendo que o orçamento da cidade não pode ser com-

prometido pelo salário. Por outro lado, os servidores não têm

competitividade do salário se comparado à iniciativa privada.

Nós, na segunda gestão, fizemos o Manual de Direitos

do Servidor (2005). Eu considero um instrumento muito impor-

tante. As pessoas lá na ponta desconhecem seus direitos.

A legislação que regula o serviço público, o decreto que diz

respeito à gratificação, avaliação, estágio probatório. Essas fer-

ramentas e esse debate que é realizado nos coletivos e nas

mesas de negociação qualificam o trabalhador para que ele

possa exigir o seu direito e, no final das contas, para ter serviço

público de qualidade para a população. O difícil é que se faça

o diálogo ampliado para que o usuário entenda que o servidor

é um trabalhador, que ele não está ali para fazer favor para a

gestão eleita, mas prestando serviço.

”Por isso, quando a gente aborda a democra-cia interna do sindicato, possibilitamos maior

inserção na sociedade. O Sismuc se abriu para debater outras políticas públicas, se abre para participar de conferências, dos congressos da CUT, das Conferências das Cidades, fazendo

intercâmbio com outras entidades, colaborando com outras lutas como movimento por moradia,

transporte público de qualidade.”

Então, nós vivemos este processo de abrir as portas do

sindicato para outras lutas que tem semelhança com o nosso

cotidiano.

Revista do Sismuc: Isso significa expandir os horizontes, não olhar apenas para o próprio umbigo. Marilena Silva: Eu acredito nisso. Que quando o sindicato faz

o debate, seja nos coletivos ou em seminários, de reportagens,

ele dialoga com os servidores em outra perspectiva. Isso não

tinha. Pelo menos, a gente sentia falta desse espaço e a gestão

passou a fazer.

“O sindicato não é um elemento isolado. No meio sindical, existe o jargão “Sindicato de resul-

tado”. Isso é uma falácia. Não existe resultado positivo se tudo em volta estiver quebrando, se a indústria estiver falindo, a economia não esteja progredindo. Logo, mostrar que não somos um

agente isolado, que pertencemos à classe tra-balhadora, ter posicionamento classista, isso traz um diferencial. A gente nunca vai deixar de fazer as lutas específicas da categoria, lutar pelo servi-

dor.”

Talvez quem trabalhe dentro de uma fábrica tenha

questões mais pontuais. Agora, quando se está dentro de uma

escola, o campo se amplia. Não há como se trabalhar o indivíduo

isoladamente. Pra mim, portanto, o sindicato deve servir como

instrumento de luta da classe trabalhadora.

Revista do Sismuc: Ainda em 2003 houve discussão sobre alte-rações no ICS. Que mudanças eram essas? Como o sindicato se mobilizou?Marilena Silva: A grande discussão gira em torno da alíquota,

o modelo de contribuição, qual é a abrangência do Instituto.

Algumas mudanças ocorrem por força no Código Civil. Os

servidores se ressentem até hoje com a redução da idade dos

beneficiários dependentes para os 18 anos, trazendo prejuízos.

Destaca-se também o valor pago individualmente, que gera

disputa ferrenha em relação ao mercado de saúde estabelecido

no país na medida em que o SUS, enquanto projeto não atinge

a todas as pessoas no tempo devido. Isso promove a ingerência

de outros organismos no ICS na medida em que o comparam

com um plano de saúde, trazendo para nós a questão de que

estaríamos utilizando um recurso universal (SUS) para atender

uma única fatia da população que são os servidores munici-

pais e seus dependentes. Essa briga é longa, mas, por força

da questão legal, nós temos prejuízo concreto na medida em

que o ICS passa a ser encarado como plano de saúde, exigindo

mudança nos serviços prestados, no estatuto e na lei que regu-

lamenta. Nós, inclusive, corremos o risco de perder tudo. Acho

que a luta feita pelo sindicato, desde 1999, quando foi aprovada

a assistência da previdência (IPMC), é manter o ICS com quali-

dade. Atualmente não temos essa característica principalmente

porque foi quebrado o princípio da solidariedade em que todos

colaboravam. Na medida em que eu posso competir, eu quebrei o

princípio, pois as pessoas vão escolher o mercado e sua proposta

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e não o debate coletivo de uma assistência maior para um grupo

de pessoas.

A gente sempre discutiu que fosse transformado em

autarquia municipal e não uma Organização Social para que

houvesse controle. A realidade atual é que o servidor é atendido

por um médico em um dia e pode ser atendido por outro depois

porque venceu um contrato de prestação de serviços. Perde-se a

afinidade.

Revista do Sismuc: Na sua época o Sismuc e o Sismmac faziam campanhas conjuntas salariais entre outras ações. Qual era a importância dessa parceria?Marilena Silva: Fundamental para a luta de trabalhadores se

enxergavam enquanto classe. O Sismmac foi muito importante

no período de nosso mandato porque podiam compartilhar infor-

mações e debate com a Prefeitura. A gente trocava experiências

nas pautas, formação sindical conjunta, discutíamos em semi-

nários e com os pais etc. O Sismmac é um sindicato coirmão.

E a pauta semelhante como previdência e assistência e tantas

outras que dizem respeito às condições de trabalho avançavam

na mesma direção. Até no momento de entregar a pauta os

dois sindicatos se uniam e a pressão era maior. Não tinha como

diferenciar. Ao longo do tempo, por questões de ordem política

sindical, houve o distanciamento e cada categoria entrega sua

pauta isoladamente. Isso nos enfraquece, assim como perdemos

força quando algumas categorias saem do Sismuc.

“Eu entendo que o surgimento de sindicato de guarda, fiscal, de procurador e assim por diante

enfraquece a luta.”

Retomo que o debate feito na CUT anteriormente de

unificar os ramos é importantíssimo. Às vezes, porque uma cat-

egoria conquistou alguma coisa e outra não, se busca criar outro

sindicato para se ter status de presidente e puxar brasa para

nossa sardinha.

“Eu sempre me pergunto: quem é que vai ficar com as categorias menores? Parece que se

busca a separação nas categorias maiores e com melhores salários, mas acabam abandonando os menores. Por isso defendo o sindicato acolhendo

todo mundo.

Revista do Sismuc: No ano da maioridade do Sismuc (18 anos) foram inauguradas a nova sede e o novo site. Conte-nos como foi isso e a importância para a luta dos servidores municipais.Marilena Silva: O Sismuc já tinha sede própria. O que fizemos

foi a mudança de endereço. Onde estávamos não tínhamos

condições de receber as pessoas na quantidade que pensamos.

Portanto, comprar uma sede no centro de Curitiba foi importante

para ampliar a participação da categoria com qualidade, devol-

vendo o que ela investe quando paga sua contribuição. Ter as

mídias como jornal e site é partilhar da direção do sindicato com

sua categoria. Logo, usar o orçamento para equipar a entidade,

organizar a base, os coletivos, é fazer com que o sindicato seja

dos trabalhadores. Eu lembro que em 2003 a gente mandava

fax para os locais de trabalho, pois não dava tempo de percorrer

mais de 1500 locais de trabalho. Já o site liberdade para que o

servidor acesse as informações, mesmo que de sua casa, afinal,

ainda há chefias que restringem o acesso, e saiba do cotidiano

do sindicato, além de interagir.

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fragmentação dos sindicatos é um fenômeno que

tem ganhado força devido a equívocos de concep-

ção. Nem todo dirigente tem as mesmas idéias e

conceitos que os demais sobre o que é e como

deve ser o movimento sindical. Aquela que defendemos aqui

tem a ver com a unificação da classe trabalhadora, pois repre-

senta o fortalecimento

do poder popular con-

tra os interesses de

gestores e patrões, os

quais já concentram

muitos processos de

decisão na sociedade.

Mas existem

outras linhas de

se trabalhar o sindi-

calismo. Alguns dire-

tores trazem consigo

uma visão indi-

vidualista, mas ainda

assim voltada à

categoria, mesmo que

só à sua própria. Outros, certas vezes, são pessoas que sequer

estão preocupadas com os anseios dos trabalhadores e almejam

apenas exercer um cargo sindical para se projetar na política.

Cabe aqui apontar que a participação na disputa de

poder é legítima e essencial para que os interesses dos tra-

balhadores sejam representados na política. O problema é

quando se perde o foco da luta de classes para promover um

projeto pessoal. Se a própria origem do movimento sindical é

agregar trabalhadores de diversas categorias, é preciso de fato

representá-los.

“Os sindicatos representaram, nos primeiros tempos do

desenvolvimento do capitalismo, um progresso gigantesco da

classe operária, pois propiciaram a passagem da dispersão e da

impotência dos operários aos rudimentos da união de classe”, já

dizia Vladimir Lênin, liderança na revolução socialista de 1917.

No Brasil, o movimento sindical teve sua origem no século 19 e

nasceu com a concepção de se organizar através dos ramos de

atividade. As Uniões Operárias, que foram as primeiras formas de

organização dos trabalhadores por aqui, tinham um caráter mais

assistencialista. Até hoje, existem entidades que atuam nesse

modelo, mas, devido à diferença na correlação de forças entre

patrões e empregados, entidades modernas escolheram for-

talecer ramos de um mesmo setor produtivo como, por exemplo,

o serviço público municipal.

Com o fim da ditadura militar e o recente período

democrático, ficou muito mais fácil atuar no movimento sindical

brasileiro, haja vista a

diminuição significa-

tiva da repressão, per-

seguição e assassina-

tos de dirigentes sin-

dicais. Infelizmente,

essa nova conjuntura

facilitou a vida de

oportunistas que pro-

curam o movimento

sindical para ter

proveito e projeção

pessoal.

Uma das for-

mas de alcançar este

objetivo individual é

a disseminação da idéia de que sindicato próprio, específico de

uma categoria, é o melhor caminho para os trabalhadores con-

seguirem seus objetivos. Será? A quem interessa a fragmentação

da classe trabalhadora?

Quando essa divisão acontece, a luta do coletivo é

enfraquecida em nome de uma só categoria. Esta atitude torna

mais fácil a postura de não negociação do gestor ou patrão, que

pode com mais facilidade isolar e controlar a categoria. É um

desserviço para avançar nas demandas de toda a classe tra-

balhadora, como é a redução da jornada de trabalho, o fim das

terceirizações, auxílio-refeição e assim por diante.

O impacto de uma greve geral é inegavelmente maior

do que o de categorias isoladas. É claro que existem pautas

específicas, como a jornada de 30 horas na Saúde, o pagamento

do piso nacional a professoras e professores, justo remaneja-

mento na Ação Social, entre tantas outras, lutas que devem ser

travadas pelos sindicatos. Não é o simples fato de congregar

várias categorias de trabalhadores que causa prejuízo às ban-

deiras específicas.

Num caso extremo, em que não haja diálogo com o

ACiBeLe CAmPos

SiSmUC DeBATeA Quem iNTeressA A DiVisÃo Dos siNDiCATos Por

CATegoriA?

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patrão e os trabalhadores entrem em greve, categorias dife-

rentes amparam umas às outras, mesmo porque muitas vezes a

interrupção de determinados serviços demora em surtir efeito

na sociedade em um movimento grevista. O exemplo é espe-

cífico, mas demonstra como a solidariedade e o apoio entre a

classe trabalhadora fortalece lutas que favorecem a todos.

Será mesmo que um sindicato próprio seria mais

“competente”, mais combativo e atuante? Estas características

dependem muito mais dos dirigentes sindicais que lá estão do

que da exclusividade na representação. Prova de que o caminho

não é a fragmentação ocorre no maior sindicato de servidores

públicos municipais do Paraná, o Sismuc. Ao todo são trinta mil

servidores municipais na base atuando em mais de 132 cargos

diferentes.

Essa situação nunca impediu que tivessem conquis-

tas específicas para categorias do serviço público municipal.

Podemos citar como exemplo a mudança de auxiliar de enfer-

magem para técnico e a mudança do nível de Auxiliares de

Saúde Bucal (ASBs) para ensino médio. Na educação, a conquista

de aposentadoria especial, férias coletivas, recesso e isonomia

no calendário escolar com o magistério.

Já conquistas do Sismuc como a redução da jornada de

trabalho na Saúde, auxílio transporte, data-base, licença mater-

nidade de seis meses e licença prêmio só foram possíveis pela

unificação da pauta e também do movimento sindical.

O Sindicato dos Servidores de Maringá (Sismmar) é

outro sindicato que também pode ser citado. Em 2013, organi-

zou os mais de nove mil servidores do município para a revisão

do Plano de Carreira, que conquistou avanços individualizados

para várias categorias, tais como fiscais, engenheiros, guarda

municipal. Mas, em razão da unificação, levou aditivo no salário

por titulação e realização de cursos de aperfeiçoamento a todas

e todos servidores que representa.

CiBeLe CAmPos

“Acreditamos que o caminho a ser trilhado pelos trabalhadores para mudar a con-figuração da sociedade é o da união com autonomia, solidariedade e fortalecimento das entidades. Só assim poderão se libertar cada vez mais, passo a passo, das cor-

rentes que mantêm a maioria do povo sob a direção dos patrões. Como já diziam os economistas Karl Marx e Friedrich Engels: “Trabalhadores de todo o mundo, uni-vos,

vós não tendes nada a perder a não ser vossos grilhões.”

drops sindicalismo

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luta pela jornada de trabalho de 40 horas sema-

nais é a mais importante luta do movimento sin-

dical no Brasil, elencada pelas diferentes centrais

sindicais. A jornada brasileira ainda apresenta

níveis altos comparados com outros países, ainda mais se pen-

sarmos os mecanismos de exploração do trabalho, como é o

caso de horas-extras, banco de horas e maior velocidade no

ritmo de produção.

Tramita na Câmara dos Deputados, desde 1995, a

Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 231 que reduz a carga

horária máxima semanal de 44 para 40 horas e aumenta o valor

da hora extra de 50% para 75%. Esse projeto é rejeitado pelos

empresários. Ainda assim, a projeção com a redução de jornada

seria de criação de dois milhões de postos de trabalho. 

A presidente Dilma Roussef deu sinais a cerca de 80

executivos de varejo, em 2014, que não apoia a redução da jor-

nada semanal de 44 horas para 40 horas. Justificou sua posição

devido ao momentâneo pleno emprego, o que, em tese, não

exigiria a redução de jornada.

Já as empresas são contrárias às 40 horas e amea-

çam com a intensificação do ritmo da jornada de trabalho. Os

empresários orientam a livre negociação entre as partes em

torno da jornada e argumentam que a jornada de trabalho em

países como a Alemanha teria, em tese, retrocedido de 35 horas

para 40 horas.

Em resposta, as centrais sindicais atribuem os números

de acidentes de trabalho, as doenças e lesões osteomusculares

à extensa jornada de trabalho no Brasil. Dirigente do Sindicato

dos Bancários de Curitiba e Região, Pablo Díaz analisa o

problema sob o viés do impacto na saúde física do trabalhador.

“Quando se vai ao esgotamento, fisiologicamente se produz

mais ácido, que é a saúde da pessoa e a saúde mental”, diz. Esse

impacto à saúde se deve ao aumento de metas e lucros, amplia-

ção da terceirização, ao lado da incorporação de tecnologias, que

fazem com que o trabalhador leve trabalho para casa.

“Na prática você pode trabalhar seis horas por dia, mas

via email e celular fica conectado com a empresa. Conseguimos

que os bancos proibissem, que fosse vedado qualquer tipo de

conexão a email e celular. Mas estamos diante de uma geração

que, com raras exceções, cresceu sob o mando do Capital e não

tem o discernimento do que é imoral e ilegal”, afirma Diaz.

O dirigente sindical cita dois exemplos de categorias

bastante marcadas por uma jornada de trabalho elevada. São

eles, os vendedores de comércio e de redes de supermercado.

“Nesse mundo da produção da riqueza imaterial, a intensidade

aumenta de maneira brutal”, complementa Diaz.

A

jorNADA De TrABALhoA reALiDADe É Que TrABALhAmos DemAis

Mesmo alcançando uma jornada de trabalho regulamentada, nem sempre os trabalhadores con-

seguem cumprir a jornada de trabalho determinada em lei.

“Na medida, portanto, em que o trabalho dá menos satisfação e se torna mais repugnante, nessa

mesma medida aumenta a concorrência e diminui o salário. O operário procura manter a massa

do seu salário trabalhando mais, seja trabalhando mais horas, seja produzindo mais no mesmo

tempo. Pressionado pelas privações, aumenta ainda mais os efeitos funestos da divisão do trab-

alho. O resultado é: quanto mais trabalha menos salário recebe”, Karl Marx.

Pedro Carrano

Intensificação da produção A redução da jornada de trabalho conquistada em 1988, do patamar de 44 horas para 40 horas. Porém, aconteceu no contexto da década de 1990, de intensificação do trabalho, das metas e da produtividade nas empresas. O pensamento do economista alemão Karl Marx já apon-tava esse fato, no livro O capital, (cit., p.748): “(...) Quanto maior a produtividade do trabalho, tanto maior a pressão dos trabalhadores sobre os meios de emprego, tanto mais precária, portanto, sua condição de existência, a saber, a venda da própria força de trabalho para aumentar a riqueza alheia ou a expansão do capital”. O Dieese (2009) aponta que, no Brasil, a redução da jor-nada em 9% é compatível com o aumento de produtivi-dade geral da indústria, que cresceu 23,18% entre 2004 e 2013. Entretanto, os ganhos de produtividade, resul-tado dos avanços da tecnologia, acabam sendo apropria-dos apenas pelos patrões. O trabalhador, que sofre com o ritmo de trabalho mais forte, não tem qualquer retorno financeiro. “Neste momento de produtividade e intensi-ficação da jornada, é necessário rediscutir o formato da jornada. Pois o empresário está se apropriando deste excedente”, analisa Fabiano Camargo, técnico do Dieese-PR, em entrevista à imprensa do Sismuc.

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Serviço Público A jornada de trabalho no serviço público de maneira

geral é de 40 horas semanais. Porém, segmentos de trabalha-

dores da Saúde e educadores lutam para aprovar e regulamentar

a aplicação da jornada de 30 horas semanais. As 30 horas foram

conquistadas pelos servidores municipais de Curitiba. Essa

luta é feita também em todo o país. A mobilização em ramos

como o da enfermagem é pelo cumprimento da Lei 2295/2000,

que regulamenta às 30 horas, mas esbarra na negativa dos

empresários.

Tabela Veja abaixo tabela comparativa entre diferentes locais

de trabalho, em Curitiba e Região Metropolitana.

Ambev (Alimentício) 40 horas semanais

Volvo (veículos pesados) 40 horas

PepsiCo Brasil 44 horas

Enfermeiros 30 horas

Educadores 40 horas

Jornalistas 25 horas

Bancos 36 horas

Metas e lucros Mesmo alcançando uma jornada de trabalho regu-

lamentada, nem sempre os trabalhadores conseguem cumprir

a jornada de trabalho determinada em lei. Isso porque os

trabalhadores também realizam horas-extras e banco de horas.

No caso dos terceirizados, as metas e lucros acrescen-

tam 40% a mais na jornada de trabalho para os trabalhadores

terceirizados, de acordo com Diaz.

Somada à jornada de trabalho, é possível contabilizar

o tempo que o trabalhador gasta no trajeto de casa até o tra-

balho, sendo que o sistema de transporte público muitas vezes

é precário. “Se o cara trabalha seis horas, trabalhando e se loco-

movendo, em São Paulo, a jornada acaba sendo de doze horas

entre sair e voltar para casa”, afirma Diaz.

É preciso que a luta pela jornada de trabalho seja

divulgada de forma atrativa para os trabalhadores compreen-

derem essa bandeira. “O sindicalismo, nesses últimos doze anos,

distanciou-se da sociedade, burocratizou, lançou campanha, quer

ser entendido, mas não se fez entender o ano inteiro”, critica

Pablo Diaz.

Um exemplo está nos operários da Volvo, que con-

quistaram a redução da jornada de trabalho. Com isso, os diri-

gentes sindicais avaliam que é possível a contratação de mais

trabalhadores e gerando postos de emprego. “A resistência dos

empresários é por que eles terão que contratar mais pessoas.

Eles vão ter que cumprir a jornada, e nós estamos combatendo

as horas extras. Dentro do limite (duas horas diárias), tudo bem,

mas quando acumula, o pessoal faz hora extra até no domingo.

Então, essa dificuldade, diminuindo o horário, vai ter que

contratar mais pessoas”, afirma Wilson Kaminski, da direção do

Sindicato dos Metalúrgicos de Ponta Grossa.

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TriPÉ CoNTrA-hegemôNiCoPhil Batiuk

A oLT NA LuTA De CLAsses

Organização por local de trabalho unifica pensamento crítico, reivindicações do servidor e atuação sindical.

auxiliar de serviços escolares João Guilherme

Bernardes, 26 anos, entrou na Prefeitura de

Curitiba em fevereiro de 2010. Ele conta que,

apesar da personalidade mais crítica do que pas-

siva, ele não tinha formação política. Mas, ainda no início de

sua carreira, sentia-se angustiado porque não via as questões

específicas de sua categoria na pauta do sindicato. Ele queria

continuar estudando, por exemplo, mas poder contar com o

apoio do serviço público municipal para isso. Para tanto, ele

sabia que o Governo Federal tem o programa Profuncionário,

que realiza cursos de formação para funcionários de escola,

compatíveis com a atividade que o trabalhador exerce na uni-

dade. Mas Curitiba não tinha o convênio necessário com a União

e, portanto, não contava com o programa.  “Então eu participei

do primeiro coletivo dos trabalhadores de escola no Sismuc,

ainda em 2010, e já tiramos uma comissão para negociar com a

Prefeitura”, conta João.

Em julho daquele ano ele se sindicalizou para que

pudesse participar de debates e negociações. “No início de

2011, participei da data-base e outras mesas de negociação em

nome da categoria e me preparei para isso através de espaços

de formação do Sismuc, tanto de conhecimentos gerais quanto

o treinamento para mesa de negociação”, conta ele. O município,

em parceria com o Instituto Federal do Paraná (IFPR) e o

Governo Federal, oferece o Profuncionário a uma média de 600

trabalhadores de escola por turma, segundo a gestão municipal.

Mas, para que João tivesse o direito de se organizar para lutar e

conquistar para si e para os seus, muita coisa precisou acontecer

antes.

A Constituição Federal de 1988, conhecida como

Constituição Cidadã, veio na sequência de um sombrio e obscuro

regime ditatorial civil-militar, que durou mais de vinte anos

no Brasil. Até hoje, vigora uma lei de anistia geral e irrestrita,

um tipo de perdão dado tanto a agentes da ditadura quanto

aos militantes pró-democracia. Sequer temos, enquanto povo

brasileiro, acesso a dados e informações sobre o que aconte-

ceu naquele período. Já em países que passaram por situações

semelhantes, como Argentina, Chile e Uruguai, foram punidas

violações de direitos humanos e crimes contra a humanidade

cometidos pelos tiranos.

Nesse sentido, o Governo Federal criou, em 2011, a

Comissão da Verdade, justamente para “examinar e esclarecer

as graves violações de direitos humanos” que aconteceram

naquele período, “a fim de efetivar o direito à memória e à ver-

dade histórica e promover a reconciliação nacional”, de acordo

com seu Regimento Interno. Se a Constituição de 88 veio para

contrastar com a ditadura, então isso fica claro no Art. 11, que

assegura a eleição de um representante por local de trabalho

em empresas com mais de 200 trabalhadores. Isso garante a

possibilidade da organização por local de trabalho (OLT).

A Central Única dos Trabalhadores (CUT), por exemplo,

surgiu defendendo a OLT como ação estratégica para a luta de

classes. Afinal, é no local de trabalho que se inicia a organização

de cada trabalhador, em geral no enfrentamento aos patrões,

seja contra assédio moral, favoritismos ou por valorização e

melhores condições. A estratégia da OLT é, no fim das contas, o

embrião de um sindicato e, para sempre, seu cordão umbilical

com a base. Sem isso, trabalhadores ficariam “órfãos” de

representação, bem como o sindicato deixaria de representar

sua própria base ao se desconectar dela.

Sindicatos buscam manter contato com a base que

representam por meio de visitas constantes aos locais

de trabalho e distribuição de materiais, por exemplo. Outro

mecanismo de organização local bastante utilizado por diversas

categorias são as comissões, organizadas para tratar de temas

específicos, seja de uma categoria só, ou que atinja a todos os

sindicalizados. As comissões só se apresentam como ameaça à

organização sindical quando constituídas de forma paralela, sem

ligação ao sindicato.

Já na Itália, na Espanha e na França, comissões de

empresa são vinculadas aos sindicatos ou às centrais sindicais.

Nesses países, os representantes sindicais têm um tempo livre

em sua jornada para percorrer a empresa conversando com os

trabalhadores, que são liberados integralmente para participar

de assembléias. Essas comissões negociam com os patrões

questões específicas das empresas, mas aquelas que dizem res-

peito ao conjunto da categoria são negociadas pelos próprios

o

Page 22: Revista do Sismuc 26 anos

22 • Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br •

sindicatos. 

“A OLT é uma estratégia que abre a visão do tra-

balhador para o todo, desde o sindicato até a sociedade, mesmo

internacional”, define Cathia Almeida, coordenadora do Sismuc

responsável pela pasta. Ela explica que é papel do delegado

sindical orientar e mobilizar cada local de trabalho para dar

unidade às lutas. “Entrei em 2010 para a OLT ainda sem entender

muito. Para mim era só organizar as saídas dos liberados para a

base”, conta Cathia. “Aí então eu entendi que, além de entregar

o Jornal do Sismuc, é da função ser um braço do sindicato, uma

parte integral dele, no local de trabalho”, revela.

A partir de um planejamento que estabelece um cro-

nograma de visitas à base e reuniões periódicas no sindicato, a

OLT é organizada e também organiza o Sismuc, em um movi-

mento que se complementa mutuamente. “Eu mesma já atuava

como delegada sindical sem saber, já organizava lutas entre os

colegas, antes mesmo de entrar para o sindicato e só fui com-

preender isso depois”, aponta. Muitas vezes a base de repre-

sentação de um sindicato critica com razão quando a atuação

da entidade deixa a desejar. No entanto, isso pode acontecer

justamente porque representantes da base não estão levando

à atenção dos liberados problemas que ocorrem por lá. Como a

luta é da classe trabalhadora, pode ocorrer de faltar a presença

do sindicato na base e também de faltar a presença da base no

sindicato.

O que vai unir ponta e centro da atuação sindical

é a OLT. Só que a organização por local de trabalho também

depende de outros fatores para ser eficaz. Por isso é importante

a participação de trabalhadores, delegados sindicais e mesmo

diretores em espaços de formação, por exemplo. “Precisamos

buscar ter a compreensão de temas para além do próprio cargo

ou categoria, para podermos levar isso à base e também trazer

dela questões específicas para o sindicato tocar”, explica Cathia.

A formação cumpre função essencial, já que fica difícil contrapor

os patrões quando não se tem o conhecimento sobre os temas

em debate, sejam eles específicos ou gerais.

Já para dar conta de temas complexos, que não são

compreendidos em uma só reunião e também para manter

todos atualizados a respeito do que se passa no sindicato e na

sociedade que integramos, o movimento sindical conta com a

Comunicação. O Sismuc faz isso de todas as maneiras possíveis,

por meio do jornal mensal e das publicações específicas, como

o Mobilização e o Curitiba de Verdade. Mas também comunica

por panfletos e cartas, cartilhas e também livros, tal como as

Crônicas dos Excluídos e Vozes da Consciência.

Depois de conquistar avanços para sua categoria e par-

ticipar de espaços de formação, João Guilherme se inscreveu na

chapa que venceu as últimas eleições do sindicato e hoje coor-

dena a pasta de juventude. Ele ampliou sua atuação para que

pudesse fazer parte de um movimento maior e mais complexo.

É por isso que a OLT faz parte do tripé contra-hegemônico do

Sismuc. Representa o papel da ação do trabalhador organizado

(práxis), que é orientada pela Formação e expressada pela

Comunicação.

lATuff: DoNos Do PoDer

Page 23: Revista do Sismuc 26 anos

• Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br • 23

República Federativa do Brasil se sustenta em

pilares constitucionais que se encontram em toda

a constituição, mas especialmente nos artigos 1,

2 e 3.

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela

união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal,

constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como funda-

mentos - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa

humana; IV - os valores

sociais do trabalho e da

livre iniciativa; V - o plu-

ralismo político.

Parágrafo único.

Todo o poder emana do

povo, que o exerce por meio

de representantes eleitos

ou diretamente, nos termos

desta Constituição.

Art. 2º São

Poderes da União, indepen-

dentes e harmônicos entre

si, o Legislativo, o Executivo

e o Judiciário.

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil:I - construir uma sociedade livre, justa e

solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional;  III - erradicar

a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais

e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de

origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discrimi-

nação.

É para preservar esses e outros direitos que a socie-

dade se organiza em associações, partidos políticos, sindicatos

e outras entidades ou movimentos. Esses fazem o papel de

catalisar e dirigir as movimentações sociais pelas mudanças

necessárias nos governos, nos parlamentos, nas ruas e no ambi-

ente de trabalho.

É com esse intuito que são realizadas eleições, greves,

protestos e diversas formas de manifestação popular com o

intuito de pressionar patrões e governos para que ocorram as

mudanças necessárias.

Ocorre que todas essas movimentações sociais que

deveriam ficar restritas ao espaço da política, passaram a ser

judicializadas, ora para impedir a realização dos movimentos,

ora para criminalizá-los e ora para discutir o mérito dos plei-

tos pois acreditam que os mesmos serão negados pelo Poder

Judiciário.

Quando o Poder Judiciário é provocado por patrões,

administradores públicos, proprietários de terras e outros seg-

mentos da sociedade, as mais diversas decisões têm sido profe-

ridas pelos órgãos judicantes levando para outro patamar aquilo

que deveria ser objeto de diálogo e mediação com aquelas que

reivindicam seus direitos.

Essa postura

autoritária e contrária aos

basilares pressupostos

da democracia resultam

de resquícios da ditadura

instalada em 31 de março

de 1964 e que até hoje

permanecem influenci-

ando muitas decisões que

pode até contrariar a lógi-

ca do estado democrático

e de direito. Isso ocorre

em relação as greves,

passeatas, ocupações de

terras e outros imóveis,

decisões do próprio parlamento.

Sob o argumento de que devem ser preservados os

direitos dos usuários do serviço público, nos últimos anos, ocor-

reu um intenso processo de judicialização das greves desses

trabalhadores, de forma que o direito constitucional de greve

chega a ser violado com o teor das decisões.

Exemplos de decisões que afetaram diretamente o

direito de greve do serviço público são declarações de ilegali-

dade de greves por meio de liminares, determinação do imediato

retorno ao trabalho de todos os servidores, impedindo que ser-

vidores da saúde e educação possam fazer, equiparando guarda

municipal a militares para impedir a realização de greves pelos

mesmos.

Em todos os casos tem sido regra fixar pesadíssimas

multas sobre os sindicatos caso não cumpram as liminares defe-

ridas pelo Poder Judiciário, e em algumas situações são impostas

multas aos servidores em greve ou à diretoria do sindicato. Há

casos em que foi determinada a prisão de dirigente sindical por

suposto descumprimento de ordem judicial, tendo que participar

das assembleias com Habeas Corpus.

O SISMUC, ao longo de seus 26 anos, foi alvo de

ALuDimAr rAfANhim

A juDiCiALiZAçÃo DA PoLÍTiCA, Dos moVimeNTos soCiAis e greVisTAs

Page 24: Revista do Sismuc 26 anos

24 • Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br •

várias decisões nesse sentido, com multas de R$ 10.000,00, R$

20.000,00, R$ 50.000,00 e outros valores, bem como reintegra-

ções de posse, entre outras decisões desfavoráveis e que dificul-

tavam a continuidade dos movimentos.

No período imediatamente anterior à Copa da FIFA de

2014 no Brasil, muitas foram as decisões impondo multas aos

sindicatos que planejavam a realização de greves. Ao sindicato

da Polícia Federal, por exemplo, foi fixada uma multa de R$

200.000,00 caso fizessem greve, mesmo que na forma de opera-

ção padrão.

As decisões sobre greves ainda impõem descontos

dos dias parados, sem possibilidade de reposição, o que cria

restrições aos crescimentos nas carreiras e a perda de outros

direitos como é o caso da Licença Prêmio nos locais onde ainda

existe o direito.

Nas greves do setor privado, o principal instrumento

judicial de restrição ao direito de greve é o interdito proibitório,

instituto do Direito Civil aplicado ao Direito do Trabalho. São

proibições de paralisar determinados serviços, permanecer con-

centrados na entrada das empresas, usar determinados espaços

públicos ou privados. Em todas essas hipóteses também são

impostas multas altíssimas pelo descumprimento das decisões,

com o intuito de tentar inviabilizar os sindicatos. Não pode

ser esquecida greve dos petroleiros de maio de 1995 onde foi

declarada a abusividade da mesma e imposta multa diária de R$

100.000,00, tendo alguns sindicatos suas sedes bloqueadas para

a garantia do pagamento.

Situações similares a dos petroleiros ocorreram com

trabalhadores dos correios, com os trabalhadores bancários,

entre outros.

Se no movimento sindical, nos últimos anos e décadas,

houve intenso processo de judicialização dos movimentos, o

mesmo ocorreu com os demais movimentos sociais, tais como

luta pela terra e políticas públicas.

Movimentos que reivindicam terras para produzir

alimentos tiveram judicializados seus pleitos para reintegrar

proprietários na posse das terras, e dirigentes dos movimentos

foram criminalizados e presos, quando não mortos.

Os movimentos populares por moradia, saúde, educa-

ção, ruas e políticas públicas também foram alvos do processo

de judicialização com proibição de realizar protestos, limitar

trânsito em ruas, fazer passeatas em determinadas ruas ou fre-

quentar eventos para ali protestar.

Há também a judicialização de direitos conquistados

por leis aprovadas nos parlamentos quando se busca no Poder

Judiciário a declaração de inconstitucionalidade das normas,

como ocorreu em relação ao feriado da Consciência Negra em

Curitiba, Lei do Piso Nacional do Magistério, Lei Federal que

garantiu a aposentadoria especial aos diretores e pedagogos,

questionando a Lei da Ficha Limpa, decretos demarcatórios de

terras indígenas, atos interna corpores do Poder Legislativo nas

diferentes esferas.

Nessas e outras situações, o Poder Judiciário fez às

vezes dos demais poderes para impedir o exercício da liberdade

de organização manifestação, bem como a autonomia do Poder

Legislativo.

O processo de judicialização dos movimentos sociais

e da política como um todo não interessa aos trabalhadores

pois, em regra, as decisões são desfavoráveis aos mesmos, e é

ilusório pensar que o Poder Judiciário é a tábua da salvação dos

trabalhadores.

Não se deve alimentar a ilusão, pois a composição dos

tribunais reflete a desigualdade da sociedade pois dificilmente

um operário será magistrado, e os magistrados são humanos,

portanto, também têm compreensão ideológica da sociedade e

estão sujeitos às influências do modelo de sociedade vigente.

A Corte Maior do Brasil, qual seja, o Supremo Tribunal

Federal, tem todos os seus ministros indicados pela Presidência

da República, portanto, carregado de influência política, e nova-

mente, operários e integrantes dos movimentos sociais não são

indicados como ministro.

O espaço para solução dos conflitos sociais próprios

do movimento popular, movimento sindical e política como um

todo, não é no Poder Judiciário.

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• Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br • 25

drops sindicalismo

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No começo, o sindicato tinha o formato de Associação dos Servidores Municipais de Curitiba, a Asmuc.

Na vida dos servidores municipais, até mesmo o direito a um período fixo de negociação para a data-base é uma conquista

da luta. Esse direito foi conquistado apenas no ano de 1988, com a fundação do Sismuc. O sindicato, na década de 1980, estava na

luta pelo direito à organização sindical, que foi conquistado apenas com a Constituição de 1988.

Ainda na década de 1980, o prefeito Maurício Fruet

já sofrera a pressão da categoria, antes mesmo de existir

o sindicato. A luta dos servidores na realidade já existia,

entre 1983 e 1987. Na época, o sindicato tinha o formato de

Associação dos Servidores Municipais de Curitiba, a Asmuc,

um espaço de organização. “Um verdadeiro guarda-chuva da

defesa dos trabalhadores”, como narra uma servidora.

Em 1989, muitos servidores são transformados de cele-

tistas em estatutários, conquistando o regime jurídico único.

O então famoso prefeito Jaime Lerner (1989-1991), foi duro

contra o servidor, embora o período fosse de abertura políti-

ca, de maneira que ele se viu obrigado a negociar.

Os servidores de Curitiba sempre combateram a gestão

privatista do grupo político que ficou no poder por mais de

30 anos em Curitiba. “Escândalos e corrupção marcam o fim da gestão Lerner”, é a manchete principal do jornal do Sismuc de dezem-

bro de 1992, com denúncias envolvendo a urbanização de Curitiba.

ToDAs As LuTAs

Uma caminhada que inicia no direito à organização nos anos 1980, prossegue nos anos 1990 e 2000 contra o grupo político que permaneceu três décadas no poder, e não acaba. Ao contrário,

fortalece cada vez mais. Na valorização e busca de identidade de cada seg-

mento de trabalhadores que formam o Sismuc, o sindicato como um todo cresce cada vez mais. As conquistas

não são restritas a pequenos grupos: a trajetória beneficiou toda a população trabalhadora de Curitiba. Em poucas siglas: Sismuc, um sindicato, todas as

lutas. Muitas memórias.

um siNDiCATo Pedro Carrano

REPORTAGEM ESPECIAL

Memorial de ganhos e lágrimas dos servidores de Curitiba

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Duas grevesAntes, não havia referência de data-base.

Duas greves gerais dos servidores do município muda-

ram a vida do sindicato e alteraram o modo de lidar com a

Prefeitura, obrigada a negociar com o sindicato. A greve de 1989

teve conquistas salariais e explodiu contra a corrosão do salário,

resultado da inflação da década de 1980. Nesse período de

transição de celetistas em estatutários, o prefeito Jaime Lerner

demitiu 822 operários em janeiro. Desse total, cerca de 100

foram readmitidos graças à luta do Sismuc. 

Essa primeira greve dirigida pelo Sismuc tem a partici-

pação de cerca de 2,5 mil servidores, atingindo 80% dos serviços.

Lerner cede e o reajuste salarial chega então a 55%. 

“No governo Lerner, a Prefeitura recebia o sindicato e

não se resolvia nada. As reuniões eram apelidadas de ‘café com

bolacha’. Não se encaminhava nada. Duas grandes greves, de

1989 e 1990, foram um momento de explosão quando o servi-

dor não tinha nada de concreto para sua vida”, afirma Ludimar

Rafanhim, presidente do Sismuc à época e atual assessor jurídico

do sindicato.

Na época, os servidores haviam arrancado de Lerner o

direito de a data-base no mínimo repor a inflação. Esse direito

foi derrubado anos mais tarde, na revisão da Lei Orgânica

municipal, feita pelo prefeito Luciano Ducci, em 2010.

Antes, por não ter referencial de data-base, a qual-

quer momento se negociava, explica Ludimar. Agora existe um

momento de negociação, elaboração de calendário, prazos para

realizar e encerrar a negociação, um direito que não existe em

uma série de outras cidades. “Tanto que considero a principal

greve do Sismuc a de 1989, uma greve geral da prefeitura,

quando os professores também se somaram”, relembra Ludimar.

Desde então, muitas conquistas melhoraram a qualidade de vida

do trabalho e permitiram o seu acesso a direitos básicos. Por

exemplo, a garantia do auxílio-transporte. “A garantia do auxílio-

transporte em pecúnia para todos os servidores.” Independente

do seu salário, todo o servidor tem direito ao auxílio-transporte.

Depositado em pecúnia, o servidor pode definir a melhor

forma para se deslocar ao local de trabalho”, explica Ana Paula

Cozollino, coordenadora-geral do Sismuc.

Enfrentamento contra o poder municpal

Os servidores de Curitiba sempre combateram a gestão

privatista do grupo político que ficou no poder por mais de 30

anos em Curitiba.

Com um discurso mais simpático, nem por isso a

prefeitura de Rafael Greca (1993-1997) foi mais democrática.

Pelo contrário, aos servidores coube uma luta tenaz contra a

repressão. Duas greves foram organizadas em 1993. A primeira

delas contra 300% de perdas, quando os servidores conheceram

então a perseguição.

O primeiro ano de governo de Greca foi marcado tam-

bém pela primeira greve da Saúde em busca das 30 horas. Os

guardas municipais também fizeram uma greve de 16 dias, em

1994, que conquistou 15% de reajuste e gratificação de risco de

vida de 30%, uma conquista importante.

Quando lança um olhar para trás, Irene Rodrigues,

coordenadora do Sismuc, lembra que houve vitórias, mas tam-

bém perdas. “O momento mais marcante na minha vida foi

quando fizemos uma greve, em 1992, e ocupamos o Centro de

Processamento de Dados da Prefeitura. Um momento tenso,

com um arrocho salarial imenso. Como resultado, a Secretaria

de Saúde comprometeu-se com o ticket-refeição por um certo

tempo. Perdemos os tickets, que não foi incorporado ao salário”,

lamenta Irene.

“Seja na Asmuc ou no Sismuc, enfrentamos o mesmo

grupo. Nós temos gestões na cidade de Curitiba que passam

de pais para filhos, com influência direta na gestão. Além

disso, sempre enfrentamos o Legislativo também com quatro

vereadores de oposição no máximo. Como pensar então em

independência, em papel fiscalizador do Legislativo, atrelado ao

Executivo. Qual é a independência daquela casa?”, reflete Irene.

Contra a privatização da Educação Infantil

REPORTAGEM ESPECIAL

Prefeitura de Cássio Taniguchi tentou privatizar os cmeis.

População e sindicato não permitiram. Na foto, Cathia Almeida.

Irene Rodrigues

Coordenadora do Sismuc.

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Greca já havia lançado o programa “Poupatudo”, quan-

do esbanja recursos com propagandas. O gasto público em

publicidade torna-se mais uma característica do grupo no poder

da cidade há décadas.

Foi pior que isso. Greca inicia também a terceirização

de serviços de limpeza das escolas.

A proposta da Prefeitura de privatização da educação

infantil começou a ser desenhada em 2001, pelo então prefeito

recém-empossado Cássio Taniguchi. A ideia era ceder os cmeis

para que instituições de ensino privado administrassem a rede

de educação infantil em Curitiba. Entre elas, constava a rede de

sistemas de ensino apostilado Positivo e Dom Bosco. Além disso,

Bagozzi e Santa Maria.

Cerca de 30 cmeis corriam risco de passar às mãos

da rede privada. Foi uma das primeiras conquistas dos

trabalhadores junto com o envolvimento da população na luta.

“Foi uma participação conjunta do sindicato e da comunidade.

O que fizemos para barrar a terceirização foi histórico”, reflete

Irene Rodrigues, coordenadora do Sismuc.

“Queriam terceirizar tudo. E nós levamos os pais para

a frente da Prefeitura, o que aconteceu durante quase uma

semana. Reuniões eram feitas em diferentes locais. Na verdade,

os pais tinham medo de que o trabalho com as crianças não

seria mais o mesmo e não confiavam em deixar as crianças com

empresas. Houve até mesmo acampamento em frente ao cmei.

Terceirização: marca deixada na educação infantil

Hoje, há setores terceirizados no inte-rior dos cmeis. A limpeza, a cozinha e a

manutenção, antes feita pela Secretaria de Obras. Tudo era feito pela Prefeitura. “Mas os cmeis eles não conseguiram privatizar.

Na verdade, foi a população que não permi-tiu”, defende Cathia.

A avaliação do sindicato e dos pais é de que a perda da terceirização não é apenas fun-cional, mas também pedagógica, pois havia

relação dos alunos com todo o ambiente de produção de alimento e preparação de comida. Antes da privatização da merenda, os alunos participavam inclusive da elabo-

ração da refeição. Com a privatização, o alimento vem pronto.

Os pais ajudavam nas reuniões”. Este é o relato de Cathia Almeida, coordenadora do Sismuc, quem se aproximou do sindicato

justamente naquela luta.

Reuniões eram feitas em garagens de casas, em igrejas, na comunidade. Ocorreram fortes protestos, com fogo ateado em

pneus. Cathia trabalhava no Cmei Jardim Paranaense, no bairro Boqueirão. “Ali nós tínhamos uns quinze pais que iam comigo em

outras reuniões. Daí, eu conversava com os pais, pegávamos um ônibus e íamos para frente da Prefeitura”, recorda.

Mais conquistas de um sindicato

1998. Garante-se o direito das filhas dependentes realizarem parto custea-

do pelo Instituto Curitiba de Saúde (ICS).

2001 a 2003. Servidores cobram do prefeito Cássio Taniguchi os

10% de reajuste que prometeu. A pressão se daria ao longo de toda a gestão. Servidores levam um bolo de

aniversário das promessas do prefeito, em frente à Prefeitura.

13 de maio de 2005: libertar da escravidão

O slogan dessa luta foi a necessidade de libertação da

escravidão e das falsas promessas da Prefeitura.

Passado um período de apatia, servidores voltam às

ruas no maior movimento de servidores da década. A crítica era

contra a política remuneratória da gestão de Beto Richa (2004-

2008), dividida em duas parcelas anuais, após a data-base, em

abril. “Com essa mobilização, garantimos a reposição salarial

em única parcela, já naquele ano, e também a partir do ano

seguinte, no mês da data-base, o que ocorre até hoje”, afirma

Irene Rodrigues.

Educador com E maiúsculo

Dessa história de avanços e recuos dos servidores e

dos educadores, um momento marcante foi a greve de 2007, que

também envolveu os trabalhadores da educação, Fundação de

REPORTAGEM ESPECIAL

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Ação Social (FAS) e Faróis do Saber.

“Essa greve é o retrato perfeito de que o segmento

organizado não se beneficia apenas a si próprio, mas a conquista

respinga em outros profissionais. Conquistamos a isonomia no

plano de carreira, o aumento de 8,63% para 15% no crescimento

vertical para todos os servidores da Prefeitura, daí foi um passo

importante no debate sobre a isonomia, os direitos iguais”,

define Irene Rodrigues.

As conquistas dessa greve apontam para o aumento

salarial de 34%, hora-atividade de 20%, inclusão no calendário

escolar, inclusão de pedagogos e agentes administrativos nos

cmeis, condições de trabalho. Foram muitas as conquistas.

Na realidade, o movimento surge no final de 2006, com

a aprovação do plano de carreira dos educadores infantil. Depois

de um ano e meio de estudos com uma comissão, a prefeitura

encaminha o projeto unilateralmente, sem acordo. No final do

ano, houve um dia de paralisação na semana que antecedeu o

Natal, quando foi mandado um recado para a Prefeitura. Porém, a

gestão quis pagar o preço. E a categoria mostrou que tinha bala

na agulha para enfrentar essa decisão.

Nada vem de graça, nem o pão e nem a cachaça, diz

o ditado popular. Por isso, foi preciso uma paralisação de três

dias. Quando o prefeito Beto Richa estava dentro da Câmara dos

Vereadores, foi feita uma corrente. Uma comissão o encurralou

e subiu para a negociação. A porta para mais conquistas estava

aberta.

Identidade do educador

A paralisação envolveu cerca de seis mil pessoas e

consolidou a identidade de educador, rompendo o preconceito

de títulos como os nomes de ‘babá’, ´crecheiro’, ‘tia’, passando

então a ser “educadores com letra maiúscula”, como explica a

educadora Alessandra de Oliveira, no documentário “Educadores

e suas lutas”, com direção de Guilherme de Carvalho.

Até então era apenas uma hora de permanência. Essas

greves da educação foram grandes avanços, como demonstra

o documentário. “Naquela época não tínhamos nem a hora-

permanência garantida, porque não era lei. Às vezes acontecia

a cada dois meses”, reflete Ana Paula Cozzolino, coordenadora-

geral do Sismuc.

Funcionários de escola: acabar com a exploração

As férias coletivas para todos os profissionais da

educação. Essa pode ser listada entre as principais vitórias dos

funcionários de escola, grupo formado por agentes administra-

tivos e auxiliares de serviços escolares. O recesso de julho e a

isonomia no calendário escolar entre professores, educadores e

funcionários de escola trata-se de uma das principais conquistas

do segmento. “São resultado das lutas individuais e coletivas da

categoria”, avalia de João Guilherme Bernardes, coordenador do

Sismuc e funcionário de escola.

Os trabalhadores também conquistaram o piso mínimo

para esses trabalhadores, em luta conjunta entre magistério e

profissionais. João Guilherme reflete que a elevação do piso do

trabalhador foi significativa. “Foi a conquista mais relevante. Dá

para fazer um comparativo entre o salário do trabalhador de

escola, o menor piso da Prefeitura, antes do PPQ, e o crescimento

significativo que tivemos”, complementa.

Já a greve de 2012 dos trabalhadores de escola, por

mais que tenha sido curta, alcançou um número elevado de

trabalhadores de escola no segundo dia, o que mostrou a força

do segmento. A greve demonstrou grande repercussão quando o

servidor deixa o local de trabalho e se mobiliza. “Nesse momen-

to, começam a contatar os núcleos e a escola tem que se ajustar

à falta desse trabalhador. Percebemos a falta que eles fazem

dentro da escola”, conta.

Com isso, o trabalhador de escola se reafirmou como

um sujeito fundamental para uma nova educação, sem a

marca do passado colonial. “A importância da mobilização do

funcionário da escola é por toda a herança que temos, desde

os tempos dos jesuítas, os escravos faziam esse trabalho.

Questionamos a posição a qual esses trabalhadores eram sub-

metidos, o que resulta ainda hoje em desvalorização do ser

humano e do trabalhador”, afirma João Guilherme Bernardes.

Greve de 2007 consolida identidade e conquistas profundas

da carreira de professor de educação infantil.

REPORTAGEM ESPECIAL

Com participação em greves recentes, funcionários de escola

mostram a sua importância. Na foto, João Guilherme Bernardes.

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30 • Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br •

Fiscais: dias de boicote.

Um segmento de Prefeitura que desempenhava atri-

buição de polícia, sem reconhecimento, e precisava lutar pelos

seus direitos, são os trabalhadores fiscais. Na luta pelo reconhe-

cimento da atividade e por valorização, os fiscais se lançaram à

luta, por meio de um boicote aos plantões. Eles deram visibili-

dade ao papel social da fiscalização, algo que não existia até o

momento.

Graças ao boicote aos plantões, quando passaram

30 dias sem fazer plantão, em 2011, os fiscais conquistaram o

aumento progressivo salarial, quando coletivamente se negaram

a cumprir as horas-extras no final de semana. Embora a tentativa

da Prefeitura tenha sido pela retaliação, mesmo assim os fiscais

se mantiveram na luta.

A unificação do segmento se deu por meio de mani-

festações criativas, construções de bonecos gigantes, caminhada

e distribuição de panfletos, para demonstrar a importância dos

fiscais para a cidade. “Houve união para conquistar as pautas,

porque não tinha união anterior. A categoria vinha num descrédi-

to”, afirma Eduardo Recker Neto, coordenador do Sismuc.

Agora, os fiscais exigem gratificação de risco para os

demais equipamentos onde não existe, nas secretarias de meio-

ambiente e abastecimento. “É importante lembrar que, no final

de 2010, havia expectativas de melhorias dos fiscais. Porém,

em janeiro de 2011 tivemos cortes de horas extras e DSR. Daí

a expectativa ficou por conta do dissídio quando foram anun-

ciados os míseros 6,5% em março de 2011. Tudo isso, junto com

a defasagem salarial, culminou no boicote aos plantões”, conta

Giuliano Gomes, coordenador do sindicato.Houve até mesmo

acampamento em frente ao cmei.

Fundação de Ação Social (FAS) e a luta de todos

O cenário hoje em dia é de crítica às condições de trabalho do educador social. “Faço o que gosto e trabalho por isso, mas

faltam condições”, lamentam.

Assim mesmo, Elaine Murmel, educadora social há 18 anos, e Tito Souza, trabalhador há 21 anos, eles relatam que a grati-

No Sismuc, a luta dos servidores já conquistou:

- Manutenção do Instituto Curitiba de Saúde (ICS) como um espaço de saúde pública e atendimento médico ao servidor; - Aumento progressivo do piso salarial dos servidores;- Manutenção da licença-prêmio dos servidores; - Licença-maternidade de seis meses, uma das primeiras capitais a obter essa concessão dessa Lei Federal;

Fiscais lutaram pelo reconhecimento da atividade e do papel

social da fiscalização.

REPORTAGEM ESPECIAL

Os trabalhadores desejavam manter o benefício por risco social e, junto com isso, receber o aumento salarial.

Page 31: Revista do Sismuc 26 anos

• Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br • 31

ficação de 30% por risco social para todos os profissionais da

Fundação de Ação Social (FAS) é uma das principais conquistas

do segmento.

Em 2006, o educador social e o educador faziam o

mesmo concurso para ingressar na Prefeitura. Mas o educador

social recebia uma gratificação de risco social. Com o novo

plano de carreira para o segmento, houve uma equiparação no

nível salarial entre os dois segmentos. Para tanto, o educador de

cmeis teve aumento salarial de fato. Ao passo que, no caso do

trabalhador da FAS, o que houve foi apenas a incorporação do

risco social no salário.

A luta iniciada então em 2007 foi feita contra a medida

da Prefeitura de Beto Richa (PSDB). “Pegaram a gratificação e

jogaram um salário base. Os educadores na verdade tiveram um

crescimento no salário equivalente a 30%, um grande aumento”,

explica Tito. E completa: “Mas nós (da FAS) tínhamos defasagem

de salário”. Os trabalhadores desejavam manter o benefício por

risco social e, junto com isso, receber o aumento salarial, ao invés

de perder as duas coisas.

Na gestão Ducci (2010-2012), o movimento dos educa-

dores sociais então lotou o pátio em frente à Fundação de Ação

Social com cerca de 200 pessoas, realizando apitaços. Foi uma

luta pelo reconhecimento da especificidade da profissão, logo

no início do mandato de Ducci. Hoje, os trabalhadores voltaram

a receber a primeira parcela da gratificação. Em janeiro de 2017

recebem o pagamento final. Os trabalhadores do Conselho

Tutelar e Regional ainda não estão incluídos.

Saúde: Muito já foi percorrido, muito ainda pela frente

Basta, agora temos que lutar!

Foi assim que pensou Lucimara Fediuk, técnica em

saneamento. Ela decidiu-se e participou daquela que seria a

greve mais longa da história da Prefeitura Municipal de Curitiba:

a Greve dos Excluídos, em dezembro de 2011, com duração de

74 dias.

E não foi qualquer greve. De fora do projeto que imple-

mentou as 30 horas e incluía apenas algumas carreiras da saúde,

mais de mil servidores se mobilizaram e aderiram à paralisação.

A Prefeitura, com medo de uma greve geral na Saúde,

atendeu a pauta histórica das 30 horas de cinco categorias,

porém deixou de fora os demais servidores da Saúde.

Lucimara já estava na Prefeitura há 22 anos. Trabalha

na vigilância sanitária no distrito matriz central. Mas, como

conta, sempre houve muito receito e temor das possíveis con-

sequências. Punição, assédio moral, tantas pressões sobre o

servidor.

“Disse para o meu marido: agora eu vou pra luta. A

primeira que realmente abracei (...) Ou vou lutar agora ou con-

tinuar dessa forma. Tivemos salário descontado, mas tivemos

salário retroativo. Como diz a nossa camiseta: quem luta vence”.

Lucimara foi uma das que passaram até 60 horas sem

banho, acampadas na frente da Prefeitura. Dormia ao relento.

Para ela, o movimento foi intenso. “Ressalto a garra, a luta e

a união de todos. Enquanto servidores e sindicato, foi muito

importante, hora de garra e vontade de conquistar”, afirma.

A intransigência do prefeito Luciano Ducci não permi-

tiu negociações e o movimento só veria sua demanda atendida

em 2014, após negociações realizadas em 2013 com a nova

gestão.

A vitória veio, aprovada na Câmara de Vereadores

de Curitiba, no ano de 2014. A redução de jornada alcançou

psicólogos, nutricionistas, biólogos, assistentes sociais e demais

segmentos que reduzem a jornada em consonância com lei

nacional. “A redução da jornada alcançou diversos segmentos.

Veio em duas etapas com muita luta”, reflete Irene Rodrigues,

coordenadora do Sismuc.

Irene complementa: “Infelizmente, por mais que a

conquista seja uma das mais significativas do setor, a luta ainda

não acabou. Mesmo tendo sido aprovada uma emenda na lei

que incluiu um artigo dizendo que, para os profissionais não

contemplados na lei, poderia ser feito por decreto o benefício,

possibilitando assim isonomia entre todos os servidores da

saúde. Um exemplo claro desta situação de desigualdade é a do

CAPS Centro Vida, onde todos atendem a população em igual-

dade, mas nem todos tem o mesmo tratamento no que se refere

à jornada de trabalho”, diz.

Greve dos dentistas: goleada de conquistas

Em 2011, depois de várias negociações frustradas, os dentistas entraram em greve no dia 22 de setem-bro. Mais de 70% dos 600 profissionais se mobili-zaram e lutaram pela conquista. Após seis dias de paralisação, os servidores conquistaram mais de

100% de aumento real salarial.

REPORTAGEM ESPECIAL

Servidores da Saúde apresentam conquistas em diferentes espe-

cialidades. Mas ainda há muitas lutas pela frente.

Page 32: Revista do Sismuc 26 anos

32 • Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br •

Agentes administrativos

Essa categoria existe em todos os locais da Prefeitura,

desde o prédio central, passando pelos cmeis, no interior das

USs, nos Cras, Crees, até mesmo nos Faróis do Saber. É o pro-

fissional que está presente em todos os locais de trabalho da

Prefeitura. “É, infelizmente, um dos profissionais menos valori-

zados e reconhecidos no interior da Prefeitura”, reconhece Ana

Paula Cozzolino, coordenadora-geral do Sismuc.

Entre as dificuldades enfrentadas na caminhada desse

segmento, figura a desculpa da gestão para não avançar nas

questões do segmento por não ser específico. Um exemplo:

“A conquista das 30 horas, nossa pauta enquanto sindicato, é

que todos os servidores que atuam em Unidade de Saúde têm

direito. O argumento da gestão, por outro lado, é que não são

exclusivos ou específicos da Secretaria de Saúde. Por isso, não

se consegue avançar, porque a Prefeitura vem sempre com a

mesma desculpa”, critica Ana Paula.

O fundamental é perceber o potencial dos trabalha-

dores desse segmento. “É a categoria que se resolver cruzar

os braços, se resolver parar amanhã, pára a cidade de Curitiba.

Porque a grande maioria dos locais de trabalho não vão

trabalhar sem esse profissional dentro. Devemos avançar no

debate da valorização desse profissional”, afirma Ana Paula

Cozzolino.

Aposentados

Os servidores aposentados com licença-prêmio acu-

mulada e não realizada têm direito à indenização financeira. A

garantia está expressa na lei 13.948/12 e o pagamento só é feito

após a aposentadoria nos casos de servidores que acumularam

a licença-prêmio.

Aqueles que estão nestas condições e se aposentaram

nos últimos cinco anos, também podem receber a indenização

de forma retroativa. Este é um direito conquistado pelos servi-

dores públicos municipais depois de a Prefeitura perder várias

ações judiciais para o sindicato.

Assim mesmo, é fundamental que o servidor prepare

o terreno para a sua aposentadoria, como ressalta Salvelina

REPORTAGEM ESPECIAL

Medidas conquistadas na Saúde

A análise das conquistas dos servidores da Saúde passa por verificar que os servidores de várias outras capitais não alcançaram as mesmas conquistas. O comparativo com as maiores capitais

brasileiras mostra que o Sismuc foi pioneiro na licença maternidade de seis meses. “Somos uma das primeiras capitais a conquistar 30 horas para todos, médicos e dentistas equiparados em seus salários,

equiparação no Plano de Carreira e valorização de todos os profissionais”, descreve Irene.

Outras conquistas:

- Passagem de auxiliar de enfermagem para técnico;

- Passagem dos ASBs para nível médio;

- 2005. Transição dos Centro Municipal de Assistência Especializada (Cmaes) e Ambulatórios da Secretaria de Educação para a

Secretaria de Saúde;

Valorizar o funcionário que está em todos os espaços.

Na foto, Ana Paula Cozzolino

É fundamental que o servidor prepare o terreno para a sua

aposentadoria. Na foto, Salvelina Borges.

É fundamental que o servidor prepare o terreno para a sua

aposentadoria. Na foto, Salvelina Borges.

Page 33: Revista do Sismuc 26 anos

• Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br • 33

Borges, do coletivo dos aposentados do Sismuc. Ao mesmo

tempo, é importante que entenda a conquista da licença-prêmio

como um direito do servidor público, uma vez que ele não acessa

o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), que é um

benefício reservado ao trabalhador da iniciativa privada.

Hoje, os servidores aposentados estão em pé de luta,

de acordo com Salvelina, por acesso e condições de atendimento

no Instituto Curitiba de Saúde (ICS). “Não temos médicos no ICS,

estamos tendo que buscar o atendimento privado. Ou muitas

vezes os próprios exames são oferecidos apenas em um labo-

ratório particular, no qual o número de trabalhadores é pequeno”,

convoca Salvelina.

Outra conquista significativa para os aposentados foi

a devolução de valores cobrados indevidamente pelo IPMC. O

Sismuc tentou o diálogo, mas a PMC se negou a negociação e,

por força de decisões judiciais, pediu o acordo e os aposentados

sindicalizados receberam os valores retroativos ao início dos

descontos. Todos receberam os últimos cinco anos.

Instituto de Previdência Municipal de Curitiba (IPMC) e Instituto

Curitiba de Saúde (ICS)

Servidor de Curitiba pede revisão e maior inserção em

ambos espaços.

Em edição do jornal do Sismuc de outubro de 1999 os

servidores municipais, ao lado do magistério, reivindicam par-

ticipação nos conselhos municipais que se referem à Previdência

(IPMC) e na Saúde (Instituto Curitiba de Saúde). Para isso,

organizaram um plebiscito com a categoria, já apostando em

mecanismos de participação direta do servidor.

“O IPMC cuida da Saúde e da Previdência, era um órgão

único e o plebiscito foi no sentido de que iria se dividir em duas

instituições distintas e foi uma forma de ouvir a opinião dos

servidores. Foi a manutenção de uma conquista”, avalia Irene

Rodrigues, coordenadora do Sismuc.

Desde aquele momento, a luta segue sendo por mais

espaço, poder de decisão do servidor e pelo caráter público de

ambos os espaços. No caso do IPMC, por exemplo, a briga do

Sismuc é por um conselho paritário, entre servidores e gestão,

assim como pela transparência dos recursos.

O mau uso dos recursos do instituto gerou até mesmo

ação judicial, isso porque foram investidos recursos do IPMC na

Bolsa de Valores de Nova Iorque em 2009, quando o Instituto

aplicou R$ 21,5 milhões em um fundo gerenciado pela empresa

na bolsa de valores da Nova York. Há uma ação judicial do insti-

tuto contra a Bolsa. Cotas do fundo já tiveram perdas de cerca

de R$ 2,5 milhões e o prejuízo pode chegar a R$ 4 milhões. O

caso tramita no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e aguarda

sentença. O IPMC também requer o pagamento dos prejuízos. 

ICS: revisão necessária Hoje, o ICS tem aproximadamente 77 mil pessoas

inscritas. Está em pauta a revisão da Lei do ICS. A Agência

Nacional de Saúde determinou, em 2010, que o ICS não faz parte

do SUS. Com isso, é considerado um Plano de Saúde Privado. A

demanda dos servidores é pela revisão da lei municipal 9626/99,

que trata do plano de saúde dos servidores. 

Com isso, a luta é sempre por um ICS com gestão

democrática, municipal, “no qual não haja nenhum prejuízo

econômico e financeiro na questão do financiamento”, afirma

Irene Rodrigues.

Isso porque, em 2010, o ICS deixa de ser considerado

uma instituição pública e torna-se um serviço privado, passando

a ser considerado plano privado pela ANS. (Veja matéria com

Marilena Silva, sobre a necessidade de o Instituto ser uma autar-

quia).

Fim do PPQ

O Programa de Produtividade e Qualidade (PPQ) foi

criado no ano 2000. Ele é inspirado na iniciativa privada, sob

o argumento de melhorar a eficiência do serviço público. Sua

remuneração era apenas individual e depois da avaliação de

chefia, o que agrava um clima de falsa competição entre os

trabalhadores.

Com o ato de março de 2012, os servidores conquista-

ram 10% de reajuste e a primeira incorporação do PPQ no valor

de R$ 100. O fim do PPQ é uma grande conquista do Sismuc. A

incorporação dessa remuneração sempre foi uma das principais

bandeiras sindicais.

Ao invés de promover a qualidade do trabalho, PPQ,

IDQ e outras remunerações variáveis eram e ainda são usadas

como instrumento de pressão contra os trabalhadores e sinôni-

mo de assédio moral. Com a incorporação, nenhum servidor

recebe menos do que R$ 1,1 mil na Prefeitura.

Uma conquista significativa se deu no setor de

Finanças, quando os servidores tiveram a aprovação de projeto

votado em primeiro turno na Câmara Municipal. Com ele, são

REPORTAGEM ESPECIAL

Sindicato encampa lutas contra as remunerações variáveis, por

incorporação no salário-base.

Page 34: Revista do Sismuc 26 anos

34 • Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br •

transformadas em salário todas as remunerações variáveis da

Prefeitura, o que prova que a luta pelas incorporações salariais

são justas e possíveis quando os servidores se organizam.

Risco de vida e saúde em 30% sobre o vencimento dos servidores

Acidentes são comuns no dia a dia do trabalhador do

serviço público. Nael Cardoso, já precisou fazer cirurgia após

uma queda que resultou em problemas na coluna. “Em 2008 caí

e danificou minha coluna. O acidente de trabalho é comum no

serviço público”, lamenta Nael, que é coordenador do Sismuc.

Casos como o dele apontam a importância da con-

quista do risco de vida e saúde em 30% sobre o vencimento dos

servidores. Foi a custa de greves e lutas. “A prefeitura não queria

abrir o debate. Houve greve à época. E até hoje é uma das mel-

hores remunerações do país. É justo porque certas atividades,

por mais que se façam todos os procedimentos possíveis para

eliminação do risco, é inerente à profissão e ao cargo”, diz Ana

Paula Cozzolino, coordenadora-geral do Sismuc.

Hoje o risco de vida abrange os trabalhadores da

Saúde, Obras Públicas e Meio-ambiente. Em alguns casos, o

direito se deve à atividades que causam o desgaste da saúde

do trabalhador, como é o caso, por exemplo, da exposição ao

chumbo por parte dos trabalhadores das obras públicas, o que

pode gerar câncer. Em 1994, a luta foi reafirmada e garantida.

“Lutamos para que se mantenha como risco de vida. Pois se for

gratificação, a hora que quiserem podem acabar”, defende Nael.

Guarda municipal: aumento de 30% para 50% na gratificação.

O guarda municipal, um trabalhador obrigado a cum-

prir mais de 150 horas extras, onze horas todo dia. Assim mesmo,

recebia um salário muito baixo, cerca de R$ 700. A mobiliza-

ção era por um piso de R$ 1300 para a guarda. Mobilizados

e politizados, os guardas conquistaram aumento real de 50%,

chegando a R$ 1450, o que significava praticamente o dobro do

salário.

E fazíamos muita hora-extra. Por isso, o bolo ficava

grande. Cheguei a fazer 150 horas. Como o salário era pouco,

com as lutas veio a possibilidade deste aumento real”, relata o

guarda municipal Edilson Aurelio Melo.

Entretanto, todos os segmentos dos servidores munici-

pais tinham acesso ao PPQ, menos os guardas. Foi feita a mobi-

lização. A gestão, por sua vez, queria tirar 50% da gratificação

e jogar apenas 30% para o salário”, descreve Melo. Para ele, a

medida não seria benéfica, uma vez que a gratificação é incor-

porada à aposentadoria. Nesse sentido, a proposta da gestão

municipal significava uma redução nos ganhos da guarda. Os

guardas recusaram e seguiram se mobilizando.

Ainda existem muitos acidentes e doenças do trabalho no dia a

dia do servidor. Na foto, Nael Cardoso.

Excesso de jornada leva segmento dos guardas municipais para a

luta e enfrentamento. Na foto, Edilson Aurelio Melo.

Outras importantes conquistas do servidores municipais

- Direito à licença para tratamento de saúde de pessoas da família, em isonomia

com o magistério; - Gratificação dos fiscais do urbanismo;

- Isonomia no crescimento vertical de 15% (antes 8,68%) para todos os servidores; - Lei da Reabilitação e Readaptação. Se

estiver impossibilitada por alguma fatali-dade, a pessoa segue tendo direito a trab-alhar. Esse direito vale para todos os ser-vidores, inclusive em estágio probatório.à

Prefeitura.

REPORTAGEM ESPECIAL

Page 35: Revista do Sismuc 26 anos

• Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br • 35

Abastecimento e Armazéns da Família

Nos Armazéns da Família, um dos locais de trabalho

mais importantes da Secretaria de Abastecimento, devido ao

contato diário com a população, o servidor Artur Neto recorda

a luta constante pelo reconhecimento da Prefeitura da falta de

qualidade de vida presente na vida do servidor.

“No momento quando sentamos na mesa de negocia-

ção e mostramos os problemas e as demandas, nós consegui-

mos algumas conquistas que foram essenciais para o servidor”,

descreve. A alteração da escala de trabalho no interior dos

armazéns foi uma medida concreta conquistada. “Mostramos que

o período da tarde não era viável e conquistamos isso”, recorda.

A alteração da escala de trabalho no interior dos

armazéns foi uma medida concreta conquistada. “Mostramos que

o período da tarde não era viável e conquistamos isso”, recorda.

Oriundo da Secretaria de Esporte e Lazer, Artur insiste que o

trabalhador da Smab precisa conquistar respeito e valorização.

“Insisti muito nisso porque antes de entrar nos Armazéns conhe-

ci a Prefeitura e como os servidores são tratados. Nos Armazéns

da Família isso foi mudando aos poucos. Em um ano tivemos

grandes mudanças”, afirma.

O Sismuc hoje

O Sismuc organiza-se em coletivos que debatem as

necessidades de cada segmento dos servidores, entre os quais

Abastecimento, Saúde, Educação Infantil, Administração, Defesa

Social, Meio-Ambiente, Fiscais, Fundações, entre outros. Os

coletivos reúnem-se no mínimo uma vez por mês. As reuniões

geralmente são feitas na sede do sindicato. Os coletivos abor-

dam problemas do dia a dia do servidor, tal como assédio moral,

jornada de trabalho, Plano de Carreira.

A alteração da escala de trabalho no interior dos armazéns foi

uma medida concreta conquistada. Na foto, Artur Neto.

Para o Sismuc, a solidariedade entre a classe trabalhadora é um valor fundamental.

REPORTAGEM ESPECIAL

Page 36: Revista do Sismuc 26 anos

36 • Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br •

Outro momento importante é a Campanha Salarial,

que inicia-se já no segundo semestre de cada ano, quando são

convocadas assembleias para discutir a pauta geral. Os coletivos,

por sua vez, discutem a pauta específica de cada segmento de

servidores. No início do ano, a pauta geral e a pauta específica

são entregues ao prefeito de Curitiba.

O Sismuc também participa de espaços da sociedade

civil relacionados às áreas que representa. A postura do sindi-

cato é de, ao lado da sociedade, exercer o Controle Social sobre

os órgãos do Poder Público. Com esse princípio, o Sismuc está

na Mesa Municipal de Negociação do Sistema Único de Saúde

(SUS); e integra os conselhos municipais: de Saúde; da Pessoa

Idosa; de Assistência Social; Educação; do Fundo da Educação

Básica (Fundeb); além dos Conselhos de Administração e Fiscal

do Instituto de Previdência Municipal de Curitiba (IPMC); e o

Conselho de Administração e Fiscal do Instituto Curitiba de

Saúde (ICS).

A Confederação dos Trabalhadores do Serviço Público

Municipal (Confetam) agrupa as federações estaduais. No

Paraná, o Sismuc é integrante da Federação dos Sindicatos dos

Servidores Públicos Municipais Cutistas do Paraná (Fessmuc)

desde 2002. Nesse espaço de articulação dos sindicatos de

servidores dos municípios do Paraná, a Fessmuc participa da

Mesa Estadual de negociação do SUS e do Conselho Estadual de

Saúde (CES).

O sindicato também integra a A Central Única dos

Trabalhadores (CUT) é a maior central sindical brasileira, que

representa hoje 7.847.077 trabalhadores associados

A solidariedade entre a classe trabalhadora é um

valor fundamental. Sozinho, um sindicato não alcança grandes

conquistas que melhorem a vida dos trabalhadores. Para trans-

formar o Brasil em um país justo, os movimentos sociais são

fundamentais, com suas lutas pela Reforma Agrária, da Reforma

Urbana, Trabalho Decente, Redução da Jornada de Trabalho,

Constituinte do Sistema Político.

REPORTAGEM ESPECIAL

Page 37: Revista do Sismuc 26 anos

• Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br • 37

drops sindicalismo

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38 • Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br •

s últimos anos do Sismuc estão marcados por intensas lutas e conquistas.

Foram realizadas greves em diversas categorias e gerais, além de paral-

isações e atos. Mobilizações que sempre buscaram aumentar direitos e

reduzir desigualdades na Prefeitura de Curitiba. Os frutos colhidos foram

redução de jornada, incorporação de gratificações, ganhos reais e, princi-

palmente, o aumento da identificação do servidor e da população com o Sismuc. Nesta

entrevista com Ana Paula Cozzolino, coordenadora geral do Sismuc, um pouco desta

história recente é registrada.

Um período de lutas e avanços o

SiSmUC eNTreVisTA ANA PAuLA CoZZoLiNo

Revista do Sismuc: Sua gestão inaugura a figura do coordenador geral. Na última era presidencialismo e você era secretária geral. Qual é a diferença?Ana Paula: Na prática, dentro do cotidiano do sindicato não

ocorreram grandes mudanças. Mesmo na gestão anterior nós já

trabalhávamos mais coletivamente. Já era uma linha não tão

presidencialista. As decisões eram tomadas por todos em que

tanto os diretores liberados quanto os não liberados tinham o

mesmo poder de decisão.

Revista do Sismuc: Um sindicato reúne diversas categorias e forças políticas. Como é possível conciliar interesses diferentes em um objetivo comum?Ana Paula: Há momentos que não são fáceis conciliar essas

diferenças.

”Mas é muito importante respeitar essas diferenças dentro de um sindicato único.

Fortalecer as lutas no dia a dia.”

O gestor, o cofre, as dificuldades são as mesmas. Logo,

uma categoria pequena como os da Câmara Antiqua, se estives-

sem sozinhos, não conseguiam conquistas. Nós, recentemente,

acabamos com o PPQ (Programa de Produtividade e Qualidade,

encerrado em 2013). A conquista atingiu diversas categorias. Se

estivéssemos divididos, somente os mais organizados conquis-

tariam. Por isso é fortalecer todos juntos.

Revista do Sismuc. O último congresso do Sismuc aprovou a luta por um sindicato único. No entanto, no meio do caminho, foi fun-dado um sindicato de guardas municipais. Como você vê essa situa-ção? O que pode ser feito pela unificação?Ana Paula: Eu quero dar um exemplo claro: o ICS. Ele é pat-

rimônio de todos os servidores, independente da carreira ou do

salário. A partir do momento em que a gente tem uma divisão

na luta pelo ICS, o que a gestão vai conseguir é sucatear e fechar

nosso Instituto.

”Mas se todos estiverem juntos, nós vamos avançar. As nossas dificuldades são as mesmas,

independe o local de trabalho. Há as especificidades de cada carreira, mas a

luta maior deve ser feita conjunta. O guarda municipal vai dar força para o

enfermeiro que está em greve. Este vai dar força para o polivalente que está em

seu campo de trabalho. Então é unir um ao outro.”

Revista do Sismuc: Como você entrou para a luta sindical?Ana Paula: Em 4 de outubro eu completo 12 anos na Prefeitura de Curitiba. Desde o

primeiro momento eu participei de movimento grevista em 13 de maio com um dia

de paralisação. Ainda na gestão de Cássio Taniguchi e eu em estágio probatório. Neste

dia eu me sindicalizei no pátio da Prefeitura de Curitiba. Logo após essa greve, decidi

me envolver diretamente na luta dos servidores. Após esse momento participei de outras ações como a greve histórica de 2007 dos

educadores. Naquela ocasião 90% dos trabalhadores do Cmei Butiatuvinha aderiram. Já em 2009, na greve geral, eu me aproximei um

pouco mais da entidade, pois era representante por local de trabalho. Naquele ano entrei para a chapa do sindicato. No primeiro ano

da gestão eu ainda permaneci na base como coordenadora de OLT. Fui liberada na semana do nosso 9º Congresso (2010) e desde

25 de agosto até hoje atuo no Sismuc.

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Revista do Sismuc: O Sismuc é filiado à CUT, a Confetam e a Fesmmuc. Inclusive tem representantes nestas entidades. Por que é importante ocupar esses espaços? Eles contribuem na organização do Sismuc?Ana Paula: A mesma dificuldade que os servidores municipais

tem em Curitiba é vivida pelos trabalhadores de Barra do Garça

(MT). A intenção de participar dessas entidades é unir os

trabalhadores de todo o país, independente se estamos no sul,

no norte, enfim, a luta conjunta dá força para todos. Nós con-

quistamos as 30 horas na saúde e podemos levar, através da

Fesmmuc, da Confetam, essa experiência para outras cidades.

E também trazer conquistas de outros municípios para a nossa

cidade.

”É o caso de termos negociado todas as greves. É uma conquista histórica que tem servido de

exemplo para todo o Brasil.”

Já para conquistar a aposentadoria especial para

os educadores, fomos nos espelhar em Belo Horizonte e

Florianópolis que já obtiveram essa pauta. Nós trouxemos esses

exemplos para debater com a Prefeitura de Curitiba. Por isso

conseguimos a conquista recentemente em Curitiba.

Revista do Sismuc: Na sua gestão foi conquistada a conciliação de greves e paralisações. Qual é a importância disso? O Sismuc teve que dar alguma contrapartida?Ana Paula: Atualmente, alguns políticos e no meio jurídico

querem acabar com o direito de greve. A partir do momento

que a gente traz essa discussão para o meio político e avança

na negociação de movimentos de 2007 a 2012, com greves

específicas e gerais, a gente coloca o direito do trabalhador em

primeiro plano. Avançando nessas discussões, também se avança

no atendimento da população.

Revista do Sismuc: Recentemente ocorreu a redução de jornada para os excluídos da saúde. Durante a greve que durou 74 dias ocorreram diversas ações. Uma delas foi acampamento em frente à Prefeitura. Conte essa experiência.Ana Paula: Quando avançamos lá atrás na redução das 30 horas,

a Prefeitura de Curitiba não concedeu a todos servidores da

saúde, mas apenas a uma parte, dividindo a categoria. Com isso,

os excluídos da lei fizeram a maior greve da história da cidade.

Ela se iniciou em dezembro e se encerrou depois do carnaval.

Nós ficamos três noites acampadas no relento, sem banheiro,

sem acesso até a própria família. Não foram momentos fáceis.

Saímos dali na véspera de natal. Mas valeu a pena. Foi histórico

pela mobilização e pela conquista em 2014. Alguns servidores

da secretaria de saúde ficaram de fora, mas seguimos lutando

por eles também. É importante ressaltar que as conquistas nem

sempre são imediatas. Essa levou três anos para ser atingida.

Todo mundo quer o retorno imediato, mas, muitas vezes, é a

certeza da pauta e o sonho devem ser maiores. Portanto, foi uma

vitória nossa e de toda a população.

Revista do Sismuc: Em 2013 e 2014 ocorreram duas greves na educação. Com elas avançou-se na eleição de direção e na hora atividade. Mas os trabalhadores foram punidos. Como isso pode ser revertido?Ana Paula: Essas pautas são sonhadas por esses profissionais

muito antes de eu entrar na Prefeitura. Ela vem sendo trabalha-

da há muito tempo. Demos um passo gigantesco com essas duas

greves. Foram dois dias em novembro de 2013 e quatro dias em

2014. Conseguimos negociar a primeira greve. Mas neste ano a

Prefeitura mudou a postura. Ao invés de dialogar, preferiu procu-

rar a justiça. Nós não decidimos. Trabalhamos nas vias políticas

e judiciais contra essa punição severa.

Revista do Sismuc: A incorporação do PPQ foi outro avanço signifi-cativo. Por que e como ele reflete em outras categorias?Ana Paula: O Programa de Produtividade e Qualidade não foi

criado para valorizar o servidor municipal. Ele era utilizado para

manter o trabalhador nas rédeas curtas. A partir do momento

que o servidor questionasse algo ou fizesse paralisação, ele

perdia essa remuneração. Atrelado a isso a baixa remuneração

base do servidor. Logo, o PPQ fazia parte dos vencimentos dos

trabalhadores. Além disso, o recebimento dependia da avaliação

da chefia, o que aumentava a ferramenta de pressão.

Revista do Sismuc: Se você pudesse estabelecer três prioridades de sua gestão, quais seriam e como atingi-las? Ana Paula: Nós incorporamos o PPQ, mas esse é uma das grati-

ficações da Prefeitura. Nós ainda temos que superar outras

amarras nas gratificações. Precisamos avançar nas remune-

rações dos servidores por nível. Tem muitas categorias com

salários abaixo da região metropolitana. Precisamos avançar

no fim do assédio moral, nas condições de trabalho, concurso

público, entre outros.

“Também precisamos aumentar nosso combate às terceirizações.

Esse é o grande câncer do serviço público. A partir do momento que se terceiriza,

se precariza, principalmente para os terceirizados, que não tem estabilidade

ou organização sindical. ”

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40 • Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br •

m dos conceitos fundamentais para compreender

a atividade sindical diz respeito ao sentido de

democracia. Este conceito precisa ser pensado

em duas perspectivas diferentes, quando se parte

do ponto de vista da ação do sindicalismo, que revelam a

ambivalência da representação do sindicalismo. Dizemos que

a relação entre a organização sindical e os trabalhadores está

estabelecida sob um conceito de democracia interna, enquanto

que a relação entre a organização sindical e a sociedade, se dá

sob as bases do conceito de democracia externa.

Na primeira, o que se

observa é a adoção de cer-

tas práticas que visam garantir

o mandato representativo, ou

seja, a possibilidade do sindi-

cato falar e agir em nome de

trabalhadores. O fator determi-

nante nesta perspectiva é que

a relação se dá de uma forma

direta, sem intermediações, uma

vez que, em condições ideais, a

ação sindical é dependente da

concessão do mandato. Neste

sentido, internamente, o sindicalismo aplica certos métodos

que visam a legitimação das diretorias sindicais, tais como as

eleições sindicais, as assembleias, os debates, a livre opção para

sindicalização, o direito de oposição, entre outros métodos que

pressupõem o princípio de igualdade entre representantes e

representados em que a decisão da maioria deve prevalecer.

Internamente, portanto, o sindicalismo aproxima-se do modelo

direto de democracia, em que as decisões são definidas pelos

membros associados e não por instituições intermediárias.

Um sentido aproximado para o que estamos expli-

cando é o que descreve Gramsci (1976) a respeito da

“democracia operária”. Ou seja, uma ação voluntária por parte

dos trabalhadores, auto-organizada, e conscientemente eman-

cipada, de modo que as decisões e os métodos de organização

estejam baseados em um modelo autônomo de estatuto, o qual

é estabelecido em consenso entre os seus associados.

Uma das condições básicas para a consolidação de

um sindicalismo representativo, segundo Silva (1984), é a pos-

sibilidade de participação das várias tendências internas nas

decisões relativas à condução das entidades e, desta forma, o

respeito às opiniões divergentes. É o que pode assegurar uni-

dade ao conjunto dos trabalhadores e fazer com que se sintam

de fato representados. Em seu estudo, realizado quando do

surgimento da CUT, portanto, um momento de ebulição do sin-

dicalismo brasileiro, ele identifica um alto grau de democracia

interna decorrente de uma nova política sindical, que assume

caráter massivo a partir do momento que permite a participação

dos trabalhadores nas decisões e na organização do movimento.

“A democratização da relação entre as lideranças e as bases

sindicais é uma medida fundamental para levar à superação do

atrelamento dos sindicatos ao Estado, na medida em que pos-

sibilita a manifestação das enti-

dades, conferindo-lhes a legitimi-

dade dos trabalhadores” (SILVA,

1984, p. 22).

Na segunda perspectiva

da ação sindical, a relacionada

com os meios externos, isto é,

com a sociedade, o Estado, a

mídia, a empresa, enfim, o sentido

de democracia precisa ser perce-

bido sob outro ângulo. A base da

ação sindical, que permite que as

organizações se apresentem em

nome de um grupo de trabalhadores, pressupõe a inserção em

meios institucionais. Ou seja, em certo grau, o sindicalismo se

apresenta como representante de um grupo, baseado em valores

sociais modernos que conferem determinado status a uma orga-

nização. Nesse sentido, dizemos que as organizações sindicais,

como organizações modernas, se adaptam e reproduzem boa

parte destes valores reunidos no princípio de democracia, não

como regime de governo, descrito pelos gregos antigos ou con-

forme debatido pela Ciência Política, mas o sentido ideológico

que reúne um conjunto de práticas que supõe a igualdade e

justiça social e que foram reunidas como virtudes do Estado

moderno.

Trata-se de uma coletividade ilusória apresentada pela

classe dominante como a matriz de direitos iguais para todos a

determinar a forma de querer e agir das pessoas. É o que Marx

define como a atividade da classe dominante em fazer parecer

que o interesse particular coincide com o interesse geral. Assim,

“segue-se que todas as instituições comuns são mediadas pelo

Estado e adquirem através dele uma forma política” (MARX;

ENGELS, 1999, p.98). A forma política predominante que obser-

vamos como um princípio de igualdade universal no capitalismo,

uguiLherme CArVALho

em BusCA De LegiTimiDADe: DuAs freNTes De AçÃo siNDiCAL

Jornalista sindical, doutor em Sociologia pela Unesp. Atualmente é professor de jornalismo da Uninter e da UFPR.

Page 41: Revista do Sismuc 26 anos

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na qual todos os cidadãos são aparentemente iguais perante

a lei, popularizou-se como o sentido de democracia. Para uma

compreensão marxista, portanto, é preciso considerar uma

democracia em sentido ideológico, em contraposição à verda-

deira democracia em que o distanciamento entre o poder e a

sociedade, demarcado pela existência do Estado, seria superado.

O que só poderia ser concebido com o fim de toda forma de

mediação política, ou seja, com a extinção do próprio Estado,

onde estão concentrados os poderes instituintes. Uma democra-

cia real pressupõe, então, o fim das formas de representação e a

possibilidade dos indivíduos falarem e agirem por si próprios.

Com isso, dizemos que o sindicalismo desenvolveu sua

própria forma de legitimação. As relações de representação no

sindicalismo devem ser percebidas em dois meios; um interno

e outro externo. Dizemos, portanto, que o sindicalismo é uma

organização que esenvolve atividades de caráter duplo;

representa trabalhadores, meio no qual desenvolve sua ativi-

dade elementar, e direciona-se também para a sociedade como

um todo, como forma de dar sustentação a sua atividade-fim.

Diferenciação entre meio interno e externo nas relações de representação da organização sindical

ELEMENTOS Meio interno Meio externo

Legitimação Meio primário Meio secundário

Relações Com representados Com sociedade/instituições

Democracia Direta Indireta

Atividades comuns Eleição sindical, assembleias, congressos,

jornal sindical, etc.

Negociação coletiva, participação em fóruns

do governo, negociação de leis, declarações

na mídia, etc.

Quanto ao mandato representativo Concede Atribui valor

Quanto à legitimação Concede Atribui valor

Ação Fonte de mobilização Espaço de intervenção

Representação Direta Indireta

Compreender esta distinção entre meios internos e

externos contribui para definir o quão representativa é uma

organização sindical. Não é possível determinar que uma

organização seja representativa se considerarmos apenas as

atividades desenvolvidas no meio interno, assim como não é

possível fazer o mesmo observando apenas o meio externo. Por

este motivo, o estudo da representação no sindicalismo exige

um olhar para o todo, compreendendo os meios onde a atividade

se desenvolve como complementares e inter-relacionados.

O desenvolvimento da ação em dois meios distintos

é fundamental para a sobrevivência dos sindicatos, apesar de

todos os desafios impostos a estas organizações ao longo da

história em função do seu caráter opositor aos interesses capi-

talistas. A primeira forma (interna) garante ao sindicalismo uma

vantagem em relação aos sistemas de governo convencionais

porque consegue construir um vínculo maior entre represent-

antes e representados em função da proximidade de interesses

que os trabalhadores têm em relação ao sindicato. A segunda

forma (externa) permite que os trabalhadores possam fortalecer

suas ações em favor de seus interesses em outras esferas de

maneira a sentirem-se participantes dos processos decisórios

de governos. Estar sindicalizado, portanto, compreende o “fazer

parte” de uma organização que intervém socialmente, debatendo

políticas de governo. Esta ação pode favorecer a capacidade de

intervenção social do sindicalismo. É o que assegura certa con-

fiança dos trabalhadores nos sindicatos, garantindo o mandato

representativo. Em outros termos, dizemos que o sindicalismo é

uma organização cuja forma mescla modelos diretos e indiretos

de representação.

Se analisarmos os aspectos da ação sindical que

também conferem legitimidade às organizações sindicais, per-

ceberemos que boa parte da atividade sindical preza de forma

incondicional a democracia. Em nosso entendimento, não se

trata apenas de uma percepção reificada da realidade que

elege a democracia liberal como um princípio de igualdade e

justiça social, ainda que estas sejam palavras proferidas quase

que cotidianamente por dirigentes destas organizações. Mas

se trata, também, de recorrer a uma estratégia de legitimação.

Estamos nos referindo, mais especificamente, ao relacionamento

que as organizações têm com a mídia, as negociações com os

empresários, a participação em fóruns do governo, entre outras

atividades resguardadas aos sindicatos como representantes

dos trabalhadores.

Uma negociação com uma instituição pública que

surta resultados positivos para os trabalhadores, por exemplo, é

uma atividade externa que pode reforçar a concessão do man-

dato representativo, já que os representados ficarão satisfeitos

com a atividade e nutrirão o sentimento de confiança na direção

sindical. Uma declaração à imprensa feita por um dirigente sin-

dical ressalta a representatividade da organização, quando este

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42 • Revista do SISMUC - Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba • www.sismuc.org.br •

assume em seu discurso o pronome “nós”, a fim de defender os

interesses coletivos. Portanto, esta ação no meio externo deve

ser percebida sempre como uma atividade complementar à

lógica sindical; ou seja, como meio secundário de legitimação

do mandato representativo atribuído pelos representados.

Ao fortalecer a sua legitimidade, equilibrando suas ações em

meios internos e externos, o sindicato ganha maior relevância

para os trabalhadores e fortalece sua representatividade social.

Nesse sentido, representatividade não pode ser vista apenas

como uma questão numérica, mas relaciona-se diretamente

com a capacidade do sindicato de intervir socialmente, isto é

de transformar a realidade impondo a ela os interesses dos

trabalhadores.

Referência Bibliográfica:GRAMSCI, A. Democracia operária. In: _______. Escrito políticos. Lisboa: Seara Nova, 1976. pp 337-341

SILVA, R. Representatividade, democracia e unidade no sindicalismo brasileiro. In: Cedec. Sindicatos em uma época de crise. Petrópolis:

Vozes, 1984.

MARX, K; ENGELS, F. A ideologia alemã (Feuerbach). 11. ed. São Paulo: Hucitec, 1999.

drops sindicalismo

drops sindicalismo

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drops sindicalismo

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ituações como a contratação de trabalhadores por

meio de diferentes formas de contrato, as chama-

das terceirizações, geram contratos de trabalho

como a chamada pessoa jurídica, a transferência

do chão da fábrica para o espaço doméstico, a

fragmentação de vínculos trabalhistas em um mesmo local de

trabalho, tudo isso a organização sindical dos trabalhadores.

A partir da década de 1990, os patrões encontraram

um terreno aberto para implantar medidas como a retirada dos

direitos trabalhistas e a mudança no processo de produção. Isso

aconteceu a partir de derrotas da classe trabalhadora no plano

mundial nos anos 1970 e 80.

Podemos entender a terceirização em dois eixos prin-

cipais, de acordo com Nota Técnica do Dieese (número 112). O

primeiro é quando se desmonta um ramo produtivo, descolado

da estrutura da empresa, quando os capitalistas buscam locais

com mão de obra mais barata.

Outra forma bastante comum refere-se à terceirização

de atividades-meio, tais como limpeza, segurança patrimonial,

manutenção, buscando diminuir os encargos trabalhistas da

empresa. Mesmo neste caso, as terceirizações de atividades-

meio podem até alcançar as chamadas atividades-fim, o que

ainda é proibido pela legislação atual, ponto de defesa do

sindicalismo. Embora essa classificação seja aplicada ao ramo

produtivo da economia, é fato que a terceirização vem ganhando

raízes no serviço público.

Essa situação gera um exército de trabalhadores sem

direitos, sem eira nem beira, que também podem ser chamados

de precários. Na avaliação de Ruy Braga, sociólogo da USP, autor

de “A política do precariado”, em entrevista ao jornal Brasil de

Fato (1 a 7 de maio) “Na década de 1990, uma parte importante

do precariado foi constituída a partir da reorganização produtiva

das empresas, que foi, também, um período de reajuste da eco-

nomia nacional à globalização capitalista.

s

PerDA De DireiTosA terceirização continua ameaçando os trabalhadores

Apesar de o Projeto de Lei 4330, que implementa a terceirização, ter sido derrotado com a pressão dos

trabalhadores, agora é o Poder Judiciário quem busca expandir a exploração sobre os trabalhadores.

Pedro Carrano

Exército de precarizados

O pesquisador Ruy Braga complementa: “Isso ocorre em um período de terceirização da força de trabalho muito intenso, asso-ciado às tecnologias de informação, à precarização das condições de contrato - o que acabou -, em um contexto de privatização das multinacionais, refluxo dos direitos sociais, aumento do desemprego e da informalização, criando uma massa trabalhadores precarizados”, descreve. Trata-se de uma marca do mercado de trabalho brasileiro da década de 1990. Essa massa, criada pela contratualização, pelo aumento do desemprego e pela desestruturação do mercado de tra-balho, foi, de alguma maneira, reabsorvida pelo mercado formal de trabalho nos anos 2000, só que em condições muito degradadas de consumo da força de trabalho, defende o autor. O sindicalismo se prepara para colocar este tema na Agenda da XVIII Reunião Regional Americana da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em Lima, em outubro 2014, para pressionar por um posicionamento firme da parte da OIT e dos governos, a fim de fortalecer o debate para definir uma norma sobre a precarização e abordar o trabalho precário na América Latina e no Caribe.

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PerDA De DireiTos Revista do Sismuc entrevista: Paula Cozero

Depois do engavetamento momentâneo do Projeto de

Lei 4330 (PL 4330), que regulamenta as terceirizações a partir

da vontade empresarial, os sindicatos não podem descansar,

afastando novas ameaças. Isso porque a matéria agora tramita

no Supremo Tribunal Federal. Para explicar melhor essa questão,

a Revista do Sismuc entrevistou a advogada trabalhista Paula

Cozero, que vem estudando o tema.

Revista do Sismuc: O Projeto de Lei 4330 foi alvo de enfrenta-mento do movimento sindical em 2013. Ainda assim, existe o risco de a terceirização ser viabilizada na prática?Paula Cozero: Ainda existe o risco. O PL 4330, que pretende

tornar lícita a terceirização em todos os âmbitos, ainda não foi

votado no Congresso e, além disso, o tema está sendo debatido

no Supremo Tribunal Federal (STF), que, ao ser questionado

sobre a legalidade da Súmula 331 do Tribunal Superior do

Trabalho, reconheceu a repercussão geral do tema. Desta forma,

o empresariado está pressionando não só o Poder Legislativo,

mas também o Poder Judiciário a fim de ampliar as hipóteses

legais de terceirização. Hoje, o entendimento do Judiciário

Trabalhista, firmado na Súmula 331, é o de que a terceirização só

é lícita se acontecer em atividades-meio da empresa. A decisão

do STF tem o poder, inclusive, de modificar este entendimento

que proíbe a terceirização em atividades-fim.

Este posicionamento do STF terá consequências sérias para toda a

sociedade brasileira na medida em que pode generalizar, tornando regra,

o estado de precarização a que estão submetidos os trabalhadores terceirizados.

Como sabemos, ampliar a terceirização é ampliar a

precarização nas condições de trabalho e de vida dos trabalha-

dores. A terceirização diminui a responsabilidade do emprega-

dor, mitiga direitos consolidados, pulveriza os empregados em

inúmeras empresas prestadoras de serviços, o que compromete

a identidade das categorias e enfraquece o movimento sindical.

Representa, enfim, um grande retrocesso social. Por isso, a luta

contra a terceirização deve estar na ordem do dia.

Revista do Sismuc: A súmula 331 do TST, de 1993, que admite a terceirização naquilo que é atividade meio e proíbe a atividade fim, deve seguir guiando as decisões judiciais? Ou essa relação entre atividade meio e fim deve deixar de limitar o processo de terceiriza-ções e a tendência é o seu crescimento?

Paula Cozero: Os parâmetros da Súmula 331 do TST não são os

mais adequados para os trabalhadores. O fato de a terceirização

representar, em si mesma, precarização do trabalho já faz com

que ela seja uma técnica de gestão empresarial que deve ser

combatida de forma ampla, tanto nas atividades-meio, quanto

nas atividades-fim. Até mesmo porque a diferenciação entre

atividade-meio e atividade-fim não é, muitas vezes, demon-

strável. Além disso, segundo a Súmula 331, no caso de a empresa

terceirizada não pagar os créditos trabalhistas dos empregados,

a empresa tomadora de serviços não é responsável direta pelo

pagamento das verbas – sua responsabilidade é subsidiária, não

solidária. O mais adequado seria, evidentemente, o fim da tercei-

rização em todos os âmbitos. Porém, a conjuntura tem mostrado

que o modelo jurídico da terceirização pode passar para um

quadro ainda pior, ou seja, a legalidade de terceirização em

todas as atividades. Tudo depende, como sempre, da correlação

de forças entre as classes sociais. Se não houver mobilização

da classe trabalhadora, a tendência é a de que a terceirização

se expanda, uma verdadeira catástrofe para os trabalhadores

brasileiros.

Revista do Sismuc: O atual processo de tentativa de regulamen-tar as terceirizações passa pelo serviço público?Paula Cozero: O processo de terceirização afeta diretamente o

serviço público. O PL 4330 apresenta claramente essa ameaça.

E a decisão do STF sobre a Súmula 331 também tem o poder

de mudar a forma como a terceirização do serviço público está

hoje regulamentada, tanto possibilitando terceirizar o trabalho

nas atividades-fim, quanto diminuindo a responsabilidade pelas

verbas trabalhistas do poder público que usa a terceirização,

para citar exemplos dramáticos.

Dessa forma, é preciso encarar o cenário com a devida seriedade:

ou existe mobilização popular contra a terceirização, ou ela

pode generalizar-se drasticamente – tanto no serviço público,

quanto no setor privado.

A terceirização no serviço público

No serviço público, é sensível o avanço de formas de

terceirização, ainda que os dados não estejam devidamente

registrados. Durante a greve dos servidores em 2012, a decisão

do governo Dilma de editar o Decreto 7.777/12, que permite

contratação de servidores estaduais, municipais ou de empre-

sas de terceirização para substituir os grevistas foi motivo de

críticas do movimento sindical. Trata-se na realidade de um

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limitador de greve e sua efetividade.

No plano nacional, o quadro é preocupante. A Empresa

Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) é uma empresa

pública de direito privado. Foi proposta para responder à

determinação do Tribunal de Contas da União que denunciou

a situação de 26 mil funcionários públicos terceirizados dentro

dos Hospitais Universitários.

Algumas decisões recentes servem de precedente

contra a privatização em andamento na saúde, mas são ações

ainda insuficientes. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal

havia apontado que “os cargos inerentes aos serviços de saúde,

prestados dentro de órgãos públicos, por ter a característica de

permanência e de caráter previsível, devem ser atribuídos a ser-

vidores admitidos por concurso público”.

drops sindicalismo

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egemonia é quando um povo, ou nação, convence

os demais a aceitarem que sejam dirigidos por

uma elite. Nas democracias, dirigentes também

hegemonizam outras forças políticas e econômi-

cas para obter “governabilidade”. Já para a trabalhadora e o

trabalhador, a hegemonia pode parecer algo de outro mundo e

passar despercebida, mas não por acaso. Afinal, ser hegemônico

também é convencer a maioria do povo de que não há jogo de

poder, muito menos

alguém interferindo

nas regras.

Neste jogo,

somos organiza-

dos, antes mesmo

de nascermos, em

classes, populações,

segmentos, catego-

rias, cargos, produtos,

é o “pacto social”. E

essa organização toda

serve para que o trab-

alho de uns dê lucro,

vantagem, para outros

- os tais hegemônicos.

Então, hegemonia não é a exploração propriamente

dita, mas pior: é o conjunto de condições que convencem,

autorizam e replicam o Estado como ele é, o status quo. Como

diria o filósofo italiano Antonio Gramsci, “uma classe dominante,

para ser também dirigente, deve articular em torno de si um

bloco de alianças e obter pelo menos o consenso passivo das

classes e camadas dirigidas”. Hegemonia, então, é onde estamos.

Consumimos preferencialmente produtos indus-

trializados, marcas que exploram trabalho escravo em outros

países, cinema em que os heróis pertencem às Forças Armadas

Norte-Americanas, jornalismo que defende a liberdade de ape-

nas a imprensa se expressar, consumimos. Gramsci foi preso pelo

governo fascista italiano em 8 de novembro de 1926 e passou

mais de vinte anos na cadeia por ser comunista. Nesse tempo,

ele buscou entender o porquê do Estado ter poder suficiente,

mais do que o dos exércitos, a ponto de manter a ordem vigente

sem que a sociedade se revolte. Ele, que era tão inimigo de

Mussolini quanto de Stálin, enxergou na hegemonia a disputa

pela Ideologia.

A Ideologia aqui não é aquela do senso comum, em que

cada um teria a sua, como uma opinião. A Ideologia para Gramsci

é como para o economista alemão Karl Marx: aquela que é

hegemonizada por uma classe dominante e passa a ser seguida

e reproduzida pela maioria. Para estes intelectuais, a sociedade

é como é não só porque burgueses concentram renda, têm a

propriedade de indústrias, empresas e outros meios de produção

como jornais e revistas. Mas também porque têm a “propriedade”

da Ideologia, da “ver-

dade”.

Por serem os

donos da mídia,

fabricam notícias usa-

das para convencer os

povos, Brasil e mundo

afora, o tempo todo de

que é bom que as cois-

as sejam como são. Ou

que seria melhor que

o Estado tivesse mais

controle ainda. Então,

por serem donos de

colégios particulares

e gestores públicos,

definem o que é lembrado ou apagado da História nas escolas.

E, é claro, por serem patrões ou, mais uma vez, gestores públicos,

interferem no grau de organização do trabalhador para reivindi-

car seus direitos.

Quanto maior a participação do sindicalizado na orga-

nização das lutas em cada local de trabalho, maior a consciência

daquele servidor e de seus colegas, maior também o alcance

das informações que não vemos na mídia comercial. Da mesma

maneira, quanto mais profunda a formação, mais fortes são

as ações individuais e coletivas. E essa luta acontece no tripé

contra-hegemônico do Sismuc: organização por local de trab-

alho, a formação e a comunicação sindicais. Essas três áreas são

a ponte entre atuação do sindicato na política e a realidade de

cada servidor no seu local de trabalho, na sua base de atuação.

Para que um sindicato possa encampar todas as lutas dos ser-

vidores públicos municipais, é preciso fortalecer a formação e

organização das pontas, além de unificar discurso e ação desde

os locais de trabalho até a direção tomada pela entidade.

h

LuTA De CLAssesPor Phil Batiuk O tripé contra-hegemônico do SismucSindicato foca na visão de mundo do servidor para construir novo mundo possível.

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ão se pilota um helicóptero sem treinamento. Não

se escreve um texto sem conhecer a linguagem.

Não se usa uma enxada sem se machucar sem ter

prática. Não se cozinha uma só refeição sem ter

alguma experiência. Experiência aqui é a chave. Por um lado,

ela vem com a prática. Mas também por observação e estudo.

Experiência é vivência, é viver. Paulo Freire passou fome na infân-

cia durante a depressão de 1929 e entendeu que ninguém deve-

ria sofrer isso. Entrou

para a Universidade

de Recife em 1943

para estudar Direito,

mas também se dedi-

cou à Filosofia da

Linguagem. Em 1963,

ensinou 300 adultos

a ler e escrever em

apenas 45 dias no Rio

Grande do Norte.

Foi assim

que Freire começou

a colocar em prática

o método que viria a

ser conhecido como a

Pedagogia da Libertação. A base desse pensamento crítico diz o

seguinte: “não existe educação neutra. Todo ato de educação é

um ato político”. Ou, nas palavras de Eduardo Recker, que coorde-

na a formação no Sismuc: “Entendemos que tudo é política, não

só a disputa partidária e eleitoral. Político é todo ato humano,

porque parte de uma escolha. E não existe prática revolucionária

sem teoria revolucionária”. Segundo ele, os cursos de formação

do sindicato têm lado, o lado do trabalhador, pois o ser humano

não é neutro. Isso porque quem educa escolhe o que vai ensinar

e o que não vai, além de como ensinar.

Donos de empresas de educação e gestores públicos

do setor escolhem conscientemente o que entra e o que não

entra na formação de todo o povo brasileiro por meio das

escolas. É por isso que Paulo Freire defendeu que a educação

não acontece somente nos espaços formais. Ela também ocorre

neles, mas não está presa à sala de aula. Se educar é um ato

político e, se quem age para manter a sociedade dividida já

decide como será a educação formal, cabe então às entidades

e movimentos que pautam a mudança promover espaços não

formais de educação – e também espaços formais alternativos –

dentro dos conceitos da Pedagogia da Libertação.

Libertação é das estruturas e mecanismos sociais

autoritários, que oprimem, reprimem e colocam na linha, como,

muitas vezes, a própria escola, a mídia, a igreja, a família etc. A

proposta não é “ser contra” essas instituições, mas apresentar

contrapontos, outras visões de mundo, tão legítimas e parciais

quanto aquelas que impõem essas autoridades. Isso tudo para

que informações e

c o n h e c i m e n t o s

próprios de tra-

balhadores da cidade

e do campo, e de

povos tradicionais

como o de negros e

indígenas, não sejam

esquecidos e enterra-

dos com o tempo.

“As pessoas não

vêm aqui para apre-

nder ou receber con-

hecimento e sim para

construir junto, colo-

car o seu e misturar

com o dos outros, com o nosso e também com o de autores

que usamos por base”, explica Eduardo. A proposta da educação

não formal rejeita a idéia de que uns têm conhecimento, outros

não e que cabe aos primeiros ensinar. Pelo contrário, diz que o

conhecimento é da vida, que ele muda com o tempo, com o con-

texto e que é de cada um e de todos criar compreensões comuns

sobre o mundo. Isso é conhecido como formação emancipatória.

Parte dessa formação é conhecer outras experiências

de vida, como a Escola Latino-Americana de Agroecologia (Elaa),

que fica no município da Lapa, no Paraná, a 80 Km de Curitiba. A

formação sindical realizada no Sismuc promove visitas à escola,

onde há uma poderosa troca de conhecimento. A agroecologia é

uma maneira de produzir alimentos que está integrada ao ecos-

sistema de cada região.

Quando o agronegócio pratica a monocultura, por

exemplo, e planta sempre as mesmas variedades de alimento

em um mesmo espaço de terra, isso acaba com o solo, com a

água em baixo do solo e causa efeitos que não podem ser medi-

dos diretamente, pois cada um por sua vez causa tantos outros

N

formAçÃo É PAuTA gerAL e esPeCÍfiCAPhil Batiuk

Atuação sindical e disputa de poder só constroem novo mundo possível, sem reproduzir hegemonia, quando existe consciência.

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que só podemos dizer que é um desastre ecológico. O mesmo

vale para o uso de agrotóxicos, o uso de sementes genetica-

mente modificadas, o desperdício de água na irrigação – cerca

de 70% de toda a água disponível no mundo é utilizada para

irrigação, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU).

A agroecologia, por outro lado, busca integrar o cultivo

ao meio ambiente e também ao ser humano. Isso significa rela-

ções de trabalho diferentes, em que o agricultor tem autonomia

e atua em coletivo com outros agricultores, muitas vezes recor-

rendo ao mutirão como forma principal de trabalho. Já para o

agronegócio, existem somente patrões e trabalhadores contrata-

dos para operar máquinas e executar serviços. A agroecologia,

portanto, é também uma forma de luta da classe trabalhadora,

em especial no campo. E é por isso que o conhecimento obtido

com a vivência em um espaço de formação como a Elaa dá

recursos para o trabalhador do serviço público municipal com-

preender seu próprio papel na luta de classes.

“O que mais me motiva a atuar no sindicato é ver a

mudança na compreensão de mundo dos participantes. Por

exemplo, quando o cara deixa de achar que pobre é tudo

vagabundo e que o rico é que trabalha. A questão central na for-

mação é justamente orientar as pessoas a serem questionado-

ras”, revela Eduardo. Essa visão é validada pelo relato de outro

coordenador do Sismuc, o auxiliar de serviços escolares João

Guilherme Bernardes. Ele conta que hoje participa do sindicato

porque partiu de seu interesse pessoal e viu que, para ter avan-

ços e mudar injustiças, era preciso que a luta não fosse só dele,

mas sim coletiva, no caso dele por meio do movimento sindical.

“Logo que me sindicalizei, não fazia questão de ter a

leitura de como funciona a sociedade. Quando visitei o assenta-

mento do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), na

Lapa, perto da Elaa, tive medo e preconceito. Achei que seria uma

zona de guerra, com foices e enxadas”, revela João, que coordena

a pasta de juventude. “Minha visão era um mito, uma história

contada pela mídia, que, até eu conhecer outras experiências,

não tinha como não acreditar”, explica. A visita era parte do

módulo de economia política da formação e abriu os olhos de

João para a existência de uma divisão na sociedade.

Em 2011, a gestão atual do sindicato estava se for-

mando e ele, que hoje tem 26 anos, não imaginava se envolver,

pois achava que era muito imaturo. Mas ele conta que, dentro

das formações, compreendeu como funciona um sindicato, as

centrais sindicais, os movimentos popular e social. “Peguei gosto

pela luta, pois participava da OLT e já tinha estado em mesa

de negociação da minha categoria, os trabalhadores de escola.

Então coloquei meu nome à disposição da chapa, defendi a can-

didatura e fui aceito”, conta ele.

O coordenador Eduardo acredita que é preciso

“desnaturalizar” o que hoje nos parece natural, como assédio

moral, perseguição política, produtivismo desenfreado e outras

opressões. Isso porque o que estaria por trás disso, a dominação,

é algo velado, escondido, negado. “As coisas não foram sempre

assim e mudar só depende de nós”, conclui. Para isso, a forma-

ção do Simuc promove aulas, vivências, oficinas, debates, cine-

debates, grupos de estudos e parcerias com outras entidades.

“Depois de participar das formações, senti vergonha

de até então ter só lutado pelo que é meu. Mas, nesse processo,

desconstruí quem eu era – e eu era machista, racista, homofóbico

e alienado com relação à luta de classes. No lugar, construí

uma nova pessoa, mais coerente, apaixonada pelo trabalho e o

movimento. Assim, sou mais feliz, pois vejo lutas que ajudei a

construir se concretizarem e mudarem a vida das pessoas, inclu-

sive a minha”, depõe João. Ele finaliza: “Sinto que sou útil e que

pertenço a este lugar. Enquanto a luta precisar, estou aí”!

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ComuNiCAçÃo, umA TArefA urgeNTe PArA os siNDiCATos

ma questão séria: a mídia empresarial há alguns

anos aprofunda uma redução massiva de postos

de trabalho, demissões e enxugamento nos prin-

cipais jornais brasileiros.

Houve grande quantidade de demissões nas redações

do Valor Econômico, O Estado de São Paulo e Folha de São

Paulo. Na região Sul, tivemos, em 2014, mais de 130 demitidos

pelo grupo RBS, do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Em

agosto, mais de 23 profissionais foram demitidos pelo jornal

Gazeta do Povo, no Paraná. Seja no formato das demissões mas-

sivas ou mesmo a conta-gotas, o saldo final é uma dispensa e

redução drástica de profissionais.

No Paraná, entre 2011 e 2013, o chamado

“Demissômetro”, criado pelo Sindicato dos Jornalistas

Profissionais do Paraná (Sindijor-PR), mostrou que dez empresas

deste ranking demitiram 156 profissionais em dois anos. Ao

todo, foram 287 demissões no período em todas as empresas no

estado do Paraná, em rádio, TV e jornal.

Sabemos a consequência disso para os profissionais de

jornalismo que permanecem nas redações, como sobrecarga e

assédio. Assim como também há impactos na qualidade do que

é produzido. Fato é que a mídia empresarial está enxugando. E,

no sentido contrário, a comunicação dos trabalhadores deveria

ser priorizada e valorizada.

O objetivo deste artigo é analisar que esse cenário

reforça a necessidade de a mídia sindical se construir como

um espaço de garantia de condições de trabalho  para os jor-

nalistas.  Mais que isso: os sindicatos têm a tarefa de ampliar

suas redações, capazes de fazer um jornalismo que, a partir

do contato com os trabalhadores e com a população pobre no

geral, incluindo os trabalhadores terceirizados, falasse para além

do público segmentado do sindicato, sendo referência para um

público amplo de trabalhadores.

Essa comunicação deve ser feita com qualificação,

tornando-se referencial de produção de notícias e também de

produção editorial. Afinal, qual sindicato hoje publica livros?

Qual sindicato fala hoje da situação do bairro onde a unidade

de trabalho está localizada? 

Há anos esse debate é provocado pelo Núcleo

Piratininga de Comunicação e pelas contribuições de Vito

Gianotti. Na prática, cada sindicato deveria formar redações com

pelo menos uma equipe de cinco jornalistas contratados, para

fazer reportagens, ir a campo, desvendar a realidade, ser fonte de

informações e fazer comunicação por local de trabalho. Afinal,

sabemos que os trabalhadores devem pautar a sociedade com

seus valores e com sua ideologia.

É necessário que os trabalhadores tenham de fato uma

plataforma de comunicação. Seria uma forma de contraponto à

prisão do imaginário a que as pessoas se submetem no dia a dia.

Mesmo que a juventude e os trabalhadores tenham vivido, nos

últimos dez anos, melhorias econômicas e passaram a fazer mais

greves, a realidade é que a influência, a visão de mundo e o que

passa em nossas cabeças e corações é ditado pelo monopólio de

poucas empresas de comunicação.

O Sismuc e alguns outros sindicatos têm sido

referência nessa prática, mas precisamos analisar o movimento

dos trabalhadores como um todo, que ainda está distante de

uma maior preocupação com a comunicação. O conteúdo deste

artigo pode ser uma utopia ou apenas a necessidade de provo-

cação, uma vez que esta realidade está distante da atual prática

dos sindicatos. No entanto, é uma sugestão concreta e pos-

sível sobre o papel que os sindicatos deveriam cumprir no atual

momento histórico. Como disse Riobaldo, personagem do livro

Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa: “Agora é agora”.

uPor Pedro Carrano

Diretor do Sindijor-PR e militante da Coordenação do Movimentos Sociais (CMS-PR)

Jornalistas do Paraná protestam por negociação salarial.

Fotografia: Joka Madruga.

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PARCEIROS SISMUCAgência Pública de Jornalismo Investigativo - Apublica: www.apublica.org

Barão de Itararé: www.baraodeitarare.org.brCampanha de Valorização do Servidor: www.observatoriosocial.org.br

Convergência Digital: convergenciadigital.uol.com.brCorreio da Cidadania: www.correiocidadania.com.br

Dieese: www.dieese.org.brDireito a Comunicação: www.direitoacomunicacao.org.br

Direto da Redação: www.diretodaredacao.comFundação Perseu Abramo: novo.fpabramo.org.br

Instituto Observatório Social: www.observatoriosocial.org.br/portalIntervozes: intervozes.org.br

Os Melhores Links da Mídia Alternativa: http://osmelhoreslinksdamidiaalternativa.blogspot.com.br/Portal Vermelho: www.vermelho.org.br

Revista Bula: www.revistabula.comRevista Piauí: revistapiaui.estadao.com.br

Sismmac: www.sismmac.org.brSite Adital: www.site.adital.com.br

Brasil 247: www.brasil247.comBrasil de Fato: www.brasildefato.com.br

Centro de Mídia Independente: www.midiaindependente.orgComunique-se: portal.comunique-se.com.br/

Confetam: www.confetam.com.brCUT: www.cut.org.br

CUT Paraná: www.cutpr.org.brFazendo Media: http://fazendomedia.com/

Midia Independente: www.midiaindependente.orgOIT Brasil: www.oitbrasil.org.br

Portal Imprensa: portalimprensa.uol.com.brRevista Forum: www.revistaforum.com.br

Sindijor Paraná: sindijorpr.org.br/ APP-Sindicato: www.appsindicato.org.br

Bancários de Curitiba: www.bancariosdecuritiba.org.brSenge: www.senge-pr.org.br

Confetam: www.confetam.com.brFessmuc: fessmucpr.blogspot.com.br

Terra de Direitos: terradedireitos.org.brDefensoria Pública Paraná: www.defensoriapublica.pr.gov.br

Ministério Público do Trabalho: www.prt9.mpt.gov.brSertoledo: www.sertoledo.org.br

Sinsep: www.sinsep.org.brSindipetro: www.sindipetroprsc.org.br/site

Mídia Ninja: ninja.oximity.comRede Brasil Atual: www.redebrasilatual.com.br

Ponte Jornalismo: www.ponte.orgCarta Capital: www.cartacapital.com.br

Carta Maior: www.cartamaior.com.brAgência Brasil: agenciabrasil.ebc.com.br

Vanguarda Política: www.vanguardapolitica.com.btAgência NP: www.radioagencianp.com.br

Rede TVT: www.tvt.org.br

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Manifesto do Partido Comunista, de Karl Marx e Frederic Engels, de 1848.“Indicamos esse livro em nosso primeiro módulo do curso de formação, para romper a ideia de que as coisas são naturais e sempre foram assim. Quando na verdade, elas são construídas socialmente”, descreve.

Aparelhos Ideológicos de Estado, de Louis Althusser, de 1998 (sétima edição). “Essa obra mostra como o campo das ideias conservador-as é fundamental para manter uma estrutura de exclusão. O autor aqui fala do papel da mídia, do Estado, o papel de atores que, na verdade, não imaginamos que influencia na manutenção da ordem social. E como isso ajuda a for-mar nossa visão de mundo? Nesse sentido, é importante também um livro acessível: ‘Ensaios sobre Consciência e Emancipação’, de Mauro Iasi (Editora Expressão Popular, 2011, segunda edição) são construídas socialmente”,

descreve.

A situação da classe operária na Inglaterra, de Frederic Engels, de 1845. “Essa obra é importante para mostrar o início do capitalismo e do trabalho assalariado. Mostrar que a pobreza não é muito diferente de hoje. E o livro mostra também como esses trabalhadores se organizam”.

1984, romance de George Orwell, escrito em 1949 “Esse romance dá uma ideia de que o Estado é totalitário e repressor. Alertamos que esse estado totalitário não é apenas presente no momento mais duro da URSS, mas hoje o capitalismo é autoritário. Estamos tão vigiados quanto o personagem Wiston. Indico também o romance ‘Admirável Mundo Novo’, de Adous Huxley.

liVroS oBrAs PArA LuTAr meLhor

O coordenador de formação do Sismuc, Eduardo

Recker Neto (abaixo, em foto de Pedro Carrano), elenca

para o servidor algumas obras e trechos de obras que têm

servido de base para os cursos de formação do Sismuc.

A maioria das obras pode ser encontrada no site

http://www.marxists.org/ ou na biblioteca localizada na

sede do sindicato.

A Ideologia Alemã, de Karl Marx e Frederic Engels, de 1932.

“Fazemos a ponte entre a leitura do ‘Manifesto do Partido Comunista’ e a leitura da obra ‘A Ideologia

Alemã’. Analisamos que o modo de produção capitalista é um modo de produção muito recente, para

romper com a ideia de que as coisas são assim e sempre serão”.

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Grito dos Excluídos, de Manoel Ramires É algo raro uma greve se transformar em livro. Ainda mais com grandes histórias e um ótimo texto. Mas o jornalista Manoel Ramires, da imprensa do Sismuc, soube transfor-mar em crônicas os 74 dias da greve dos excluídos. Bem-humoradas, por vezes doídas, a narrativa dessas lutas dis-secam o que acontece por dentro de uma greve: os desen-contros, as madrugadas acampadas em frente à Prefeitura, em busca de um direito.(Fotografia de Joka Madruga)Também da Editora Sismuc tem o livro “Vozes da Consciência”, organizado por Guilherme Carvalho e Manoel Ramires, tra-zendo entrevistas publicadas no Jornal do Sismuc.

Meu Pai, de Paulo Venturelli Contista, autor de literatura infantil consagrado e roman-cista, nascido em Brusque (SC), mas residente em Curitiba desde os anos 1980, o escritor Paulo Venturelli traça uma história com a narrativa de um personagem que recorda o pai, um operário e sindicalista ativo na região industrial de Santa Catarina, no Vale Verde do Itajaí. O autor aborda tanto a marca que o pai lhe deixa como o próprio ambiente da época.(Fotografia de Pedro Carrano)

O Filho Eterno, de Cristovão Tezza O romancista problematiza o momento de sua vida em que, perto dos 30 anos, com uma vida de aventuras, projetos e viagens, surge o seu primeiro filho, portador de síndrome de down. A partir de então, a narrativa desenha as modifica-ções, os conflitos e adaptações que o narrador passa a viver.(Fotografia de Pedro Carrano)

liVroS CrôNiCAs e romANCes

Os livros elencados abaixo poderiam ser outros. Muitos outros. Essa lista é curta, apenas para provocar o leitor com alguns textos

produzidos na capital paranaense, mas que estão com as janelas abertas para outros trabalhos e obras. Afinal, a literatura é isso.

Não há livro bom ou ruim, mas há uma constante ponte entre um autor e outro, entre um livro e outro.

Pedro Carrano

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Entre os filmes do acervo exibidos em 2014, destacam-se  O Morro dos Ventos Uivantes (do diretor Wyler, 1939) e  O Segredo da Porta Fechada (Fritz Lang, 1948). Ambos integraram a programação do Cineclube da Cinemateca, que acontece aos sábados às 15h. Do acervo da Cinemateca, difundindo a memória do cinema paranaense, foi exibido o filme Xetás na Serra dos Dourados, de Wladmir Kozak,  durante a “I Mostra Audiovisual – Olhares Indígenas” em abril de 2014. Mas, como a história cinematográfica está sempre em construção e não nos leva apenas a um passado longínquo, filmes mais recentes do nosso acervo também são divulgados. Por isso, a animação de Paulo Munhoz, Em Busca da Identidade Perdida (2006), e  o curta-metragem Balada da Cruz Machado (Terence Keller, 2009), por exemplo, foram exibidos durante a programação especial do aniversário da cidade.Em parceria com a Cinemateca da Embaixada da França, foi recentemente organizada a Mostra de Cinema Haitiano com filmes de Raoul Peck. Foi uma programação inédita que contou com a presença do Professor Clovis Gruner da UFPR para a palestra “Cinema e história em Raoul Peck: aspectos do Haiti contemporâneo”, após a exibição do filme O Homem das Docas (Raoul Peck, 1992). Desta parceria, foram exibidos películas francesas como 7 Anos, de Jean-Pascal Hattu.A Cinemateca também tem o objetivo de dar espaço a novos cineastas e à produção local, por isso há pouco espaço na agenda para sessões de filmes vindos de distribuidoras. Semanalmente são promovidos lançamentos de filmes locais, tais como Um Olhar do Passeio Público, de Gabriel Eloi que, devido à grande repercussão, teve outras exibições realizadas para atender solicitações do público.No entanto, Hoje eu quero voltar sozinho, escolhido para representar o Brasil no Oscar 2015, foi um dos filmes exi-bidos na Sala Groff, que veio por intermédio da Distribuidora Vitrine. Festejado em Berlim, primeiro longa de Daniel Ribeiro tentará prêmio inédito para o país e esteve em cartaz na Cinemateca e no Cine Guarani, outra sala de cinema da Fundação Cultural, em junho.A animação O Apóstolo que faz parte da Mostra de Cinema Atual Espanhol (parceria com Instituto Cervantes) é uma animação de 2012. Ela esteve na Mostra de Animação Contemporânea, de outubro de 2014. O Apóstolo (2012) é um filme galego de animação que teve muito reconhecimento por parte do público, da crítica especializada e dos principais festivais de cinema internacionais. 

filmeS CArDáPio VAriADo

Para além do que vemos nos grandes cinemas, há coisas

muito interessantes no cinema nacional e internacional.

Na seleção de filmes da servidora Claudia Arioli, que

organiza a exibição de filmes da Cinemateca de Curitiba,

é possível ter contato com um acervo que envolve

produções locais, filmes nacionais e também a produção

de países, para muito além da produção de Holywood.

Muitos filmes citados na lista abaixo fazem parte do

acervo da Cinemateca.

Outros estiveram em cartaz ao longo desse ano e podem

voltar a ser exibidos.

Há ainda os filmes que a Cinemateca e o Cine Guarani

exibem gratuitamente a partir das distribuidoras de

filmes.

 O Homem das Docas (Raoul Peck, 1992)

Claudia Aridi

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café estava quente. Um pequeno gole servira para

queimar a ponta da língua e identificar a baixa

qualidade da torra. É um hábito brasileiro imposto

pelos cafeicultores. Bebe-se café muito forte com

a ideia de que ele é melhor. Contudo, esse aroma ríspido e ácido

mascara grãos de baixa qualidade misturados com folhas e

pedaços de galhos. Tudo queimado. Melhor, com torrefação entre

treze e dezenove minutos. Paladar e coloridos diferentes do café

colombiano que se

acostumara a beber,

que são torreados em

dez minutos, trazendo

gosto urbano e encor-

pado.

Suas papilas

gustativas nem sem-

pre foram tão apura-

das. Reflexo de anos

tomando cafezinhos

improvisados em gar-

rafas térmicas duran-

te o período em que

era dirigente sindical.

Há 20 anos, ou mais,

as mobilizações par-

tiam prioritariamente

da boa vontade dos

trabalhadores. Se de

um lado, a democracia ainda era muito frágil, precisando ser

embalada sob a ameaça de que algum político autoritário de

plantão a abortasse, de outro, a convicção da necessidade de

lutar crescia pujante em suas mentes. Afinal, se um regime dita-

torial foi derrubado com a ajuda deles, porque uma conquista

salarial não seria conquistada?

Esse era um conceito de heroísmo coletivo da época

em que muitas de nossas ações seriam evitadas se pudéssemos

refletir antes de cometê-las. O juízo não tem em seu DNA a

audácia e a irresponsabilidade como traços marcantes. Quem,

não tomado pelo impulso, se colocaria a frente de um carro para

evitar o atropelamento de um animal ou criança? Quem, sem

estabilidade no emprego em um período de recessão e inflação

de 100% ao ano colocaria em risco a segurança financeira de

sua família? Aquele grupo colocava. Por isso, o café ruim pre-

parado em casa, a água armazenada em galões reutilizáveis, a

marmita, a bolacha de água salgada e demais alimentos de fácil

manuseio eram pequenos detalhes de sobrevivência.

Algo diferente do que acontece atualmente. Agora, em

uma mobilização, o sindicato, estruturado, fornece lanches, água,

protetor solar, capa de chuva, almoço e outros kits para atrair os

grevistas e mantê-los no movimento. Algumas entidades mais

abastadas já adotaram a figura do piquete profissional. A catego-

ria vota a greve à noite

e retorna para casa

para fazer as malas e

viajar por uma sema-

na enquanto que na

manhã seguinte (ou

dentro do prazo legal)

os piqueteros fecham

agências bancárias,

impedem a entrada

de funcionários nas

fábricas, vestem as

cores da luta. “Nada

contra”, cogita. “Talvez

um pouco”, conclui.

Não significa ser

nostálgico com rela-

ção aos seus grandes

momentos em cima

do caminhão, discur-

sando arduamente contra os patrões ou quando empunhava o

megafone quase sem voz e continha desavenças em rodinhas.

Sempre teve a convicção de que um país é miserável se não tem

heróis. Contudo, é ainda mais miserável a nação que precisa de

heróis para se afirmar. Por isso, nunca viu suas ações como líder

das paralisações como atos heroicos, mesmo realizando-os com

grande afinco. Nunca se deu ao direito de se vangloriar por ter

evitado uma cacetada da guarda em uma mulher, por exemplo.

Mesmo que alguém que tivesse visto a cena tenha e espalhado:

“Que bela atitude. Nosso dirigente correu risco em favor de

beltrano. Eu, em seu lugar, não teria coragem semelhante”. Nada

disso. Não se empluma de elogios. Para ele, o que importa é o

caráter pedagógico de toda greve. É durante ela que se ensina e

vivencia a luta de classes, é o momento em que os trabalhadores

se unem por um ideal, que a lógica “manda quem pode, obedece

o“Os meus heróis na vida real são os que desafiam a lei em nome de um ideal.” Correia, Natália.

CrôNiCa DiANTe De si

Manoel Ramires

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quem tem juízo” é subvertida.

II

Dá outro gole no café. Está mais morno, só que igual-

mente ruim. O misto quente prensado chega. Ele é o único

cliente na banquinha. Na Boca Maldita, importante calçadão de

agitação política em Curitiba, o domingo frio parece ter segu-

rado as pessoas na cama. Vai ser fácil deslocar-se até o compro-

misso sem ter que desviar de artistas de rua, entregadores de

panfletos, gente de camiseta azul ou vermelha oferecendo chip

de telefone celular ou cartão de crédito sem adesão.

Tendo tempo de sobra, decide folhear o jornal do dia.

Procura, mas não encontra a notícia imprensa do motivo que o

fez levantar mais cedo. A informação só saiu na página online do

veículo. Nisto os personagens não tinham previsto. Sonhavam

com a capa do periódico, uma grande foto com seus rostos e

manchete denunciativa. Não sabem que a edição dominical é

fechada na sexta-feira à tarde e que a tática, embora audaciosa,

repercutiria apenas no mundo virtual até a próxima vitória ou

derrota dos times de futebol locais.

Ele havia alertado, não como assessor de imprensa,

mas como assessor político, que a luta não precisa de sensacio-

nalismo para consagrar-se. Havia outras possibilidades de abrir

a mesa de negociação. O telefone e os contatos dos dois lados

era a principal delas. Na hora que a corda estica, como se diz no

jargão, interlocutores dos dois lados podem ser acionados. Um

cede no discurso, outro na postura, um aceita negociar parte da

pauta, outro também, ambos retiram a faca do pescoço alheio.

Era uma alternativa salutar para os novos tempos. Bem dife-

rente do período em que a negativa prevalecia, em que a greve

era combatida com cassetete, cortes de salários e demissões.

Atualmente, existe o talvez, “as forças policiais acompanham a

distância e os cortes de gratificações já tinham sido abonadas

na paralisação anterior”, ponderava.

Sua opinião foi descartada. O objetivo inconsciente

não era mostrar que a pauta era legítima. Assim como um

herói criado pela propaganda, sejam esses das histórias em

quadrinhos, esses anônimos pleiteavam sua estrelinha, sua capa

de revista, sua menção honrosa que o crivo da história se encar-

regaria de registrar. Por isso, orquestraram algemar-se a uma

árvore e manterem-se presos até que fossem recebidos. A ideia

surgira dois dias antes e baseada em outra paralisação onde o

gramado do governo foi ocupado. As cordas foram compradas,

cadeados também. Depois discutiram quem ficaria preso e quem

ficaria no suporte. Como havia mais mártires do que nós,

realizaram uma votação e cinco foram eleitos. O próximo passo

foi apostar no interesse da imprensa. No fim da tarde, anun-

ciaram à mídia que se algemariam e fariam greve de fome até

serem atendidos. A tática deu certo. Sem pauta forte no plantão,

duas emissoras de TV e dois fotógrafos apareceram para regis-

trar o evento. Sonoras foram gravadas, fotos foram compartilha-

das e a imagem de carrasco foi jogada pro outro lado da mesa

que se negava a negociar.

Todavia, o que não apareceu na reportagem da manhã

seguinte, tampouco na nota do site é que por volta das duas

horas da manhã as cordas foram afrouxadas e um bravo guer-

reiro desertou ao perceber que os flashes tinham acabado.

III

Enquanto caminhava na direção da reunião convocada

por causa do acorrentamento, refletia sobre a importância de

ter mudado seus hábitos. Há pouco mais de um ano adotara a

rotina de substituir o carro e a moto pela caminhada. Não se

preocupava com a saúde corporal. O foco era a higiene mental.

No carro ou na moto, a atenção sempre ficava presa ao trânsito,

ao motorista que podia dar uma fechada, às trocas de sinais, a

passar a marcha e todas outras ações motoras aos quais somos

condicionados. Na caminhada, por outro lado, a atenção sempre

estava livre para pensar em um embargo, um habeas corpus,

uma medida cautelar ou simplesmente olhar a paisagem.

Subitamente, viu um carro avançar sobre o pedestre. O sinaleiro

estava aberto para o veículo que não titubeou em arrancar. O

caminhante, surpreendido pela pressa, trocou o passo pela cor-

ridinha, chegando ao meio fio e entregando um palavrão em

resposta à buzinada. O que aconteceria se ao invés de correr, o

pedestre parasse? O motorista realmente teria acelerado? Teria

atropelado? Ou isso seria mais um desses perversos contratos

sociais contemporâneos em que a nossa atitude depende da

fragilidade do outro? E o pedestre, teria respondido com um

palavrão se percebesse que o carro podia estacionar? Ocorreria

tanta valentia se ambos não estivessem distantes?

Falando em coragem, de repente, veio-lhe à mente a

imagem do jovem chinês que parou uma fileira de tanques em

1989, na Praça da Paz Celestial, em Pequim. Armado com duas

sacolas e uma dose de heroísmo, ele encarou aqueles que no

dia anterior haviam esmagados carros e matado rebeldes contra

o governo comunista. A cena, registrada em fotos e filmagens,

percorreu o mundo e foi capa dos principais jornais e revistas

do mundo. A revista Time, inclusive, considerou a atitude de um

desconhecido como uma das 100 pessoas mais importantes do

século XX. Contudo, o que queria e o que pensava o jovem herói

jamais se soube, uma vez que ele foi detido e desapareceu.

Destino diferente Phan Thi Kim Phuc, que se tornou

famosa ao ser fotografada nua de corpo e alma aos nove anos

enquanto fugia das bombas napalm lançadas pelos sul vietna-

mita apoiado pelo imperialismo norte americano na Guerra do

Vietnã, em 1962. “A Guerra do Vietnã terminou graças a essa

fotografia”, alegou o fotógrafo da agência EFE que fez o clique. Já

a menina, que mais tarde virou embaixadora da Boa Vontade da

ONU no Canadá, armazenou em sua memória tanto o terror das

bombas quanto a insistência da foto de correr em sua direção.

Ela disse: “Eu realmente queria escapar daquela pequena meni-

na. Mas parece que aquela imagem não me deixava ir”.

Do capitalismo ao comunismo, do carro que acelera

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ao pedestre que se apressa, o herói e o covarde podem ser dis-

tinguidos pelo próximo passo dado ou evitado. Era sua primeira

conclusão ao comparar os dois momentos. Afinal, a inspiração

heroica também é relativa. Em uma sociedade belicista, o herói

será o indivíduo que pratica proezas em nome do conflito. Já

em uma cultura pacifista, essa mesma personagem poderá ser

repudiada como herói. Logo, não sabia se aquela reunião a que

se direcionava era resultado de um ato heroico ou estupido.

Percepção bem diferente de uma paralisação que

vivenciou na década de 1990. Naquela ocasião o impasse tam-

bém estava dado. O prefeito não queria conceder o reajuste

firmado no ano anterior. Também se recusava a receber os

trabalhadores, tampouco a rever as 800 demissões que promo-

vera ou ceder na intenção de demitir outros 4,2 mil servidores

para enxugar a máquina. A saída tinha sido a greve. O contra-

ataque, ameaças das chefias. O movimento parecia enfraquecer.

A direção do sindicato precisava mostrar firmeza. O caminhão

de som era ocupado pelos dirigentes. Os discursos pregavam

união e resistência. Mas as mentes se confrontavam com o

medo. O piquete estava formado. A corda esticara. Se naquele

local de trabalho os funcionários saíssem com os caminhões

da Prefeitura, um importante segmento seria desmobilizado. O

microfone ganhou mais entonação. Logo abafado pelo barulho

do motor. Já era possível imaginar o sorriso gordo do prefeito no

Centro Cívico quando fosse informada que aquela barreira tinha

sido desfeita. As cabeças principiavam em ficar cabisbaixas e

os punhos perdiam a tensão. O caminhão avançou. Mas parou.

Conteve-se. Foi contido pela moça grávida que se deitou na

frente do veículo. Elza era seu nome, educadora sua profissão,

heroína sua atitude. O motorista congelou-se. Viu seu filho ali.

O motor acalmou-se, o escapamento maneirou. Aquele sorriso

distante mochou. Os corações pulsaram. Naquele instante, a

greve ganhava sustentabilidade. O trabalhador enxergou o tra-

balhador, a luta encontro seus lutadores, os sonhos voltaram a

se concretizar. As únicas coisas perdidas foram as lágrimas que

rolaram e o registro fotográfico que não foi feito.

Arrepiou-se. Era fato que não havia foto, mas também

era verdade que, no seu íntimo, aquele corpo estirado que car-

regava uma vida dentro de si tinha parido nele sua única e

verdadeira heroína. Depois disso despiu-se para sempre de hon-

rarias, afinal, o verdadeiro herói é aquele que tem mais coragem

contra si mesmo, quando se dispõe a por risco seus conceitos

egocentrismo em favor da luta sindical.

Feita essa reflexão, atravessou a rua em frente à

Prefeitura torcendo para que a reunião fosse curta e o café em

casa estivesse passado.

Page 62: Revista do Sismuc 26 anos