Revista Doctor Plinio 207_201506

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Publicação Mensal Ano XVIII - Nº 207 Junho de 2015 Conversa no Céu

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Publicaccedilatildeo Mensal Ano XVIII - Nordm 207 Junho de 2015

Conversa no Ceacuteu

N

Fruto da santidade da Igreja

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Satildeo Joatildeo Fisher Igreja de Santa Maria Oxfordshire Inglaterra

a histoacuteria da Inglaterra vemos os grandes processos de atonia de

tibieza de indiferentismo que preparam depois toda a massa catoacutelica para as maiores defecccedilotildees que deram no protestantismo

Mas ao lado disso nos deparamos com uma coisa bonita a permanecircncia da nota da santidade da Igreja Porque apesar de todas essas tristezas eacute na Igreja que se vatildeo encontrar os maacutertires os homens de um caraacuteter admiraacutevel que preferem tudo a ceder diante do adversaacuterio e que expotildeem tudo quanto tecircm e ateacute a proacutepria vida para se manterem fieacuteis agrave verdadeira tradiccedilatildeo e agrave continuidade eclesiaacutestica

Quer dizer mesmo quando a putrefaccedilatildeo invade os meios catoacutelicos a santidade da Igreja produz frutos excepcionais e tatildeo maravilhosos como fora da Igreja natildeo se encontram

Assim ao mesmo tempo em que a Igreja eacute traiacuteda renegada vemo-la deitar uns lampejos memoraacuteveis que provam a divindade dela Nisto estaacute uma espeacutecie de afirmaccedilatildeo contiacutenua da assistecircncia do Divino Espiacuterito Santo na Igreja

Esta me parece ser a reflexatildeo mais oportuna que podemos fazer sobre o martiacuterio de Satildeo Joatildeo Fisher

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2261965)

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As mateacuterias extraiacutedas de exposiccedilotildees verbais de Dr Plinio

mdash designadas por ldquoconferecircnciasrdquo mdash satildeo adaptadas para a linguagem

escrita sem revisatildeo do autor

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XVIII - Nordm 207 Junho de 2015

Conversa no Ceacuteu

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Dr PlinioDr PlinioRevista mensal de cultura catoacutelica de

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Editorial

4 A arte de conversar e o cacircntico dos Bem-aventurados

dona lucilia

6 Dor e seriedade

Sagrado coraccedilatildeo dE JESuS

8 O Divino Interlocutor

a SociEdadE analiSada por dr plinio

16 A organicidade do Brasil

dr plinio comEnta

22 A conversa e a cruz

o pEnSamEnto filoSoacutefico dE dr plinio

26 O tesouro da vida

calEndaacuterio doS SantoS

30 Santos de Junho

luzES da civilizaccedilatildeo criStatilde

32 Roma sparita

Uacuteltima paacutegina

36 Superexcelente misericoacuterdia

Na capa Dr Plinio durante uma conversa em sua residecircncia Foto Arquivo Revista

Editorial

C

A arte de conversar e o cacircntico dos

Bem-aventurados

4

omo seraacute a vida no Ceacuteu Que fazem eternamente os Anjos e os Bem-aventurados Existiraacute entre eles alguma forma de relacionamento ou a visatildeo de Deus os absorve por completo Satildeo essas algumas perguntas que costumam surgir quando se medita sobre as maravilhas do Para-

iacuteso CelesteA este respeito ensina-nos a Doutrina Catoacutelica que cada um dos Santos e dos espiacuteritos angeacutelicos

enquanto vecirc a Deus face a face comunica aos demais aquele aspecto do Altiacutessimo que lhe eacute dado contemplar Esta comunicaccedilatildeo muacutetua constitui um como que cacircntico das excelecircncias divinas um su-blime ato de louvor e adoraccedilatildeo

Para Dr Plinio este cacircntico celestial bem poderia ser comparado nesta Terra agrave boa conversa na qual os homens natildeo soacute se relacionam mas trocam ideias comentaacuterios percepccedilotildees pontos de vista e assim enriquecem o espiacuterito Por isso a conversa tem grande importacircncia para o bem viver

Entretanto cada vez mais nota-se na humanidade a extinccedilatildeo da arte de conversar Hoje ningueacutem se assombra ao encontrar uma famiacutelia cujos membros natildeo convivem entre si Caso se reuacutenam para uma festa de Natal por exemplo natildeo raro eacute que as pessoas prefiram estar agrave frente da televisatildeo ape-nas trocando uma palavra de vez em quando Os mais jovens hipnotizados pelo mundo virtual nem sequer piscam os olhos diante do computador ou dos cada vez mais multifuncionais aparelhos de ce-lular E o patriarca o avocirc que deveria atrair para si a atenccedilatildeo de todos contando interessantes his-toacuterias de seu passado egoisticamente mergulha no jornal pouco se importando com o que se pas-sa ao seu redor Analisando essa situaccedilatildeo tatildeo diferente do ambiente de sua infacircncia comentava cer-ta vez Dr Plinio

ldquoHouve um hiato uma queda um vaacutecuo entre a geraccedilatildeo dos meus avoacutes e a minha Aquela ainda conversava a dos meus pais se achava numa transiccedilatildeo e a dos seus filhos jaacute natildeo sabia fazecirc-lo Com muito pesar eu notava essa decadecircncia pois a conversa estimula a vontade de pensar e comunicar Ela eacute um intercacircmbio mental respirado tonificante e verdadeiramente humano um meio insubstituiacute-vel para viver pensarrdquo1

A conversa ldquonatildeo eacute apenas uma troca de informaccedilotildees nem de impressotildees mas tambeacutem de cogni-ccedilotildees muacutetuas dos interlocutores cujas personalidades se manifestam pelo olhar tom de voz gestos etc [] eacute um intercacircmbio de duas personalidades que falam sobre mateacuteria atraente e que interessa a ambas Seraacute ainda mais autecircntica se o meu interlocutor puser certa nota pessoal em suas palavras fazendo com que eu goste de ouvi-lo Isso eacute um elemento fundamental da conversardquo2 Numa conver-

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Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

sa as mentalidades se visitam e entram em harmoniosa consonacircncia evoluindo pouco a pouco co-mo uma melodia

Daiacute a analogia que pode ter uma conversa nesta Terra com o cacircntico dos Bem-aventurados no Reino dos Ceacuteus

A arte de conversar muito mais do que um ato social ou uma necessidade da natureza humana exige tambeacutem certo discernimento dos espiacuteritos e uma aguda percepccedilatildeo do ambiente e do interlocu-tor a fim de tornar-se agradaacutevel agravequele com quem se fala ldquoNa procura desse objetivo eacute preciso ter em vista que a arte de conversar supotildee uma primeira disposiccedilatildeo de espiacuterito sem a qual ela natildeo exis-te devemos nos interessar pelos outros para saber conversarrdquo3

ldquoObservando essa atitude cumpriremos na conversa a siacutentese de todos os Mandamentos amar a Deus sobre todas as coisas e ao proacuteximo como a si mesmo por amor a Deusrdquo4 deixando o campo meramente terreno e ingressando no celestial Por isso para Dr Plinio a conversa tem seu ponto de convergecircncia no Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e as mais frutuosas conversas satildeo aquelas em que o Divino Interlocutor faz-se presente5 ldquoA boa e verdadeira conversa deve brotar de pensamentos elevados daquilo que se meditou analisou quem natildeo cogita em assuntos elevados eacute incapaz de manter uma conversardquo6

ldquoQuando conversamos animados pelo amor de Deus e do proacuteximo o conviacutevio eacute agradaacutevel Do contraacuterio o trato seraacute detestaacutevel sem afabilidade marcado por um cunho revolucionaacuterio Pois ima-ginemos uma conversa com determinada pessoa em estado habitual de violar ao mesmo tempo to-dos os Mandamentos Ela mata rouba calunia etc O estar com essa pessoa se torna insuportaacutevel um pesadelo Natildeo haacute o que conversar com ela Por outro lado suponhamos um coloacutequio entre du-as pessoas que se esforccedilam por cumprir de modo exiacutemio os dez Mandamentos Eacute um Ceacuteu Sublime exemplo foi o ceacutelebre diaacutelogo de Santo Agostinho com Santa Mocircnica na hospedaria de Oacutestia Em suma a oacutetima conversa eacute aquela iluminada pelo Divino Espiacuterito Santo realizada aos peacutes da Santiacutes-sima Virgem em cujo Coraccedilatildeo vive Nosso Senhor Jesus Cristo O resto no fundo eacute fraude vaida-de e afliccedilatildeo de espiacuteritordquo7

Participando desse estado de espiacuterito as coisas mais comezinhas os fatos mais simples do dia a dia podem se tornar uma prece nos laacutebios daqueles que conversam e que natildeo deixam faltar em sua conversaccedilatildeo o transcendente o maravilhoso e a presenccedila divina Mesmo quando estes elementos estejam presentes de modo impliacutecito mdash e eacute o que se passa na maior parte das vezes mdash a conversa daacute-nos uma paacutelida ideia do cacircntico dos Bem-aventurados no Paraiacuteso

1) Conferecircncia de 5519792) Idem3) Conferecircncia de 14219874) Conferecircncia de 5519795) Ver paacuteginas 13 a 15 neste nuacutemero6) Revista Dr Plinio n 82 p 257) Conferecircncia de 551979

O

Dor e seriedade

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Dona LuciLia

A seriedade causa dor mas o pior sofrimento eacute o produzido pela falta de seriedade a qual faz com que a pessoa se sinta

vazia sem ideias sem ideais sem vontade

sofrimento era algo tatildeo ligado agrave vida de Dona Lucilia e a todo o ser dela que eu em pequeno agraves vezes notava que ela estava sofrendo poreacutem

natildeo sabia por quecirc Ficava olhando para ela e contem-plando o sofrimento mas sem compreender o que a fa-zia sofrer

Pequenos sofrimentos que originavam um sofrimento global

Mais tarde quando me tornei um pouco mais velho fui compreendendo uma ou outra razatildeo de um ou outro sofri-mento Depois compreendi que os sofrimentos dela for-mavam um como que edifiacutecio Era um conjunto de razotildees que a faziam sofrer e que constituiacuteam um grande sofrimen-to global o qual era o sofrimento geral da vida dela En-tatildeo comecei a ter uma ideia global do que era o sofrimento

Quando pequeno eu notava sobretudo que mamatildee tinha restos de enfermidade devido agravequela operaccedilatildeo da vesiacutecula que ela fez na Alemanha em 1912 e percebia que tinha muita dificuldade em caminhar

Eu notava que agraves vezes meu pai voltava cedo do escri-toacuterio passava por casa pegava-a e saiacuteam os dois a fazerem uma volta a peacute Ele tendo terminado seu serviccedilo durante o dia contente com a tarefa com sauacutede e vida um homem muito feliz Ela uma pessoa na qual cada passo era uma dor ao mesmo tempo entendia que natildeo poderia irradiar seu sofrimento sobre o esposo ser uma causa contiacutenua de dores para ele Ela deveria fingir que natildeo estava sofren-do ou contar sorrindo ldquoHoje como estatildeo me doendo os peacutesrdquo e continuar a andar todos os dias a extensatildeo reco-mendada pelos meacutedicos Nunca terminar antes porque lhe estavam doendo muito porque essa extensatildeo era necessaacute-ria para habituar os peacutes ao esforccedilo adequado

O sofrimento produz a seriedade

Entatildeo eu percebia que mamatildee tinha uma compreen-satildeo muito profunda dessa situaccedilatildeo Ela sentia esse sofri-

mento e sentia na alma a dor que tem esta quando o cor-po sofre dor fiacutesica Natildeo eacute uma dor superficial mas uma dor profunda O corpo padece e a alma com isso sofre

Quando voltava para casa ela descansava e nesse mo-mento eu entendia tudo quanto sofrera durante o pas-seio porque sorrindo mamatildee se deitava numa espeacutecie de divatilde e ficava com os peacutes imobilizados ateacute que a dor passasse Ela agraves vezes gemia sorrindo entatildeo se forma-va uma roda de pessoas conversando coisas do dia e por amabilidade perguntavam-lhe

mdash Vocecirc estaacute melhor Luciliamdash Sim sim estou melhorandoEu estava vendo que era todo o dia a mesma coisa

natildeo acabava mais E compreendia bem que aquilo trazia para seu espiacuterito um reflexo que era a seriedade porque o sofrimento produz a seriedade

A pior dor que o homem pode ter natildeo eacute a causada pe-la seriedade eacute a produzida pela falta de seriedade Sen-tir-se natildeo seacuterio vazio sem ideias sem ideais sem querer nada sem dizer algo que valha qualquer coisa isto causa um sofrimento pior do que o pior dos sofrimentos

Um dos melhores dons que Deus pode dar a uma crianccedila eacute o sofrimento Natildeo nos queixemos portanto dos sofrimentos que tenhamos tido Pelo contraacuterio agra-deccedilamos a Nossa Senhora e compreendamos que Ela assim nos destinou para a seriedade

Atitudes das pessoas perante a Primeira Guerra Mundial

Pouco tempo depois desses primeiros fatos da minha infacircncia terem se passado arrebentou a Guerra Mun-dial Entendi mais ou menos o que era essa guerra mas tinha a noccedilatildeo da distacircncia enorme que havia entre o Brasil e a Europa Portanto era impossiacutevel que a guer-ra chegasse ateacute aqui enquanto a Europa passava por to-do aquele sofrimento no Brasil havia a boa vida tranqui-la e folgada o Brasil natildeo entraria em guerra e por isso as pessoas aqui gostavam de celebrar a tranquilidade bra-

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evist

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sileira Natildeo soacute apreciavam isso os brasilei-ros mas os estrangeiros oriundos de pa-iacuteses que estavam na conflagraccedilatildeo mas que tinham vindo para o Brasil antes da guerra Eles tinham pais irmatildeos filhos netos metidos na conflagra-ccedilatildeo Isso lhes interessava mas so-bretudo o que eles possuiacuteam era um bem-estar de pessoalmente natildeo participar da guerra

Quando chegava a tardinha era frequente verem-se nas ruas da Satildeo Paulinho rodas formadas na calccedilada por famiacutelias de imigran-tes As donas de casa faziam pratos do tempo em que viviam em seus pa-iacuteses de origem os homens conversa-vam davam risadas as crianccedilas brinca-vam todos se preparando para comer e depois comendo valorosamente comentando como era bom eles natildeo estarem na guerra

Comecei a observar isso e percebi que havia duas ati-tudes perante a conflagraccedilatildeo uma a daqueles a quem era sobretudo agradaacutevel estar longe dela a outra a dos que admiravam a guerra compreendiam sua beleza Es-tes uacuteltimos natildeo podiam ir agrave guerra porque tinham com-promissos aqui no Brasil para manter a famiacutelia se eles fossem poderiam morrer e a famiacutelia ficava abandonada Mas acompanhavam os jornais com o espiacuterito de lutado-res seu paiacutes avanccedilou ou recuou os aliados deles avanccedila-ram ou recuaram os meios de destruiccedilatildeo se acentuaram Aparece o aeroplano entatildeo o grande perigo satildeo os voos Depois surgem os gases asfixiantes os bombardeios em massa das grandes cidades E no fim coisa talvez pior do que tudo as epidemias que contagiavam agraves vezes um pa-iacutes inteiro e que constituiacuteam uma tristeza uma coisa hor-riacutevel

Atrozes ferimentos causados pela conflagraccedilatildeo

Eu tive uma governanta austriacuteaca que era solteira e ofereceu-se para durante o dia trabalhar num hospital de feridos de guerra

Ela disse que os ferimentos eram atrozes Por exem-plo um jovem que tinha ido para combater e voltou com um ferimento que de si natildeo era mortal mas ele natildeo podia falar porque um projeacutetil lhe arrancara o queixo Quando ele precisava de alguma coisa tocava uma sine-ta e escrevia com letra trecircmula de algueacutem que estaacute gra-vemente doente aquilo de que precisava Agraves vezes natildeo conseguia escrever por inteiro deixava cair sobre a cama

a caneta e o papel e ficava esperando um momento em que um pouquinho mais de

forccedila lhe permitisse fazer o pedidoMinha governanta contava que

pelo regulamento do hospital as enfermeiras tinham horaacuterios de-terminados para descansar por-que se elas ficassem doentes tam-beacutem o hospital tornava-se ino-perante As enfermeiras precisa-vam ter uma defesa contra a epi-demia entatildeo o hospital manda-va-as repousar Mas quando mi-

nha governanta estava descansan-do e se lembrava de que talvez o

homem sem queixo precisasse de al-guma coisa ela se levantava agraves escon-

didas e ia verificar se ele queria algo Quem censuraria uma atitude como essa

Soacute poderia aplaudir Mas que condiccedilotildees de vida que horrores que monstruosidades

Reflexatildeo sobre o magniacutefico tema da dor

Tudo isso representava o sofrimento e eu notava que Dona Lucilia tinha em face desses fatos uma atitude muito mais pensativa e mais seacuteria do que as outras pes-soas Estas comentavam como ela as notiacutecias que os jor-nais publicavam por vezes com sensacionalismo que im-pressionava muito o puacuteblico eacute natural

Por exemplo acabava o almoccedilo de domingo todos se espalhavam pela sala de jantar e comeccedilavam a conversar sobre esses assuntos Lembro-me ateacute hoje de que quan-do um velho reloacutegio de parede com um bonito som marcava duas horas da tarde havia sempre um espiacuterito mais leviano e superficial que dizia com uma voz que do-minava a todos ldquoMeus caros agora chegou a vez de nos divertirmos Vocecirc vai para onde E vocecirc Vamos fazer os nossos programasrdquo Entatildeo uns iam passear nos arredo-res da cidade outros faziam visitas enfim essa vida leve dos domingos

Eu percebia que Dona Lucilia acompanhava mas que o espiacuterito dela ia para a compaixatildeo por aqueles que ti-nham sofrido fazia oraccedilatildeo por eles para Nossa Senhora aliviar ou ateacute para evitar esse sofrimento Mas sobretu-do fazia a reflexatildeo sobre o grande o nobre o magniacutefico tema da dor E dentro deste tema outro ainda mais bo-nito o heroiacutesmo a coragem

Isto ia formando a alma de um menino   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2671995)

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Divino InterlocutorEm sua concepccedilatildeo sacral da existecircncia no processo de seu pensamento e ateacute na elaboraccedilatildeo de uma arte de conversar

Dr Plinio tinha como fonte de inspiraccedilatildeo e ponto de convergecircncia o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

U m tema que daria para um estudo muito in-teressante eacute a exposiccedilatildeo analiacutetica de todos os modos pelos quais as coisas na Criaccedilatildeo cres-

cem Elas tecircm modos diferentes de crescer e de evoluir para chegar ateacute a morte e nesta haacute tambeacutem um proces-so que natildeo eacute sempre anaacutelogo Entatildeo haacute o crescimento depois uma fase de expansatildeo e o deperecimento

Iniacutecio expansatildeo e morte

E isso eacute tatildeo diferente nas vaacuterias espeacutecies de vegetais e em cada planta em particular Eacute diverso nos bichos e nas velocidades materiais E tambeacutem em todo o processo de pensamento e de desenvolvimento do homem

Nesse crescer expandir-se e morrer Deus Nosso Senhor fez um verdadeiro jogo de maravilhas que evidentemente as pessoas que cul-tuam a natureza natildeo se datildeo o tra-balho de apreciar Porque isso su-potildee um miacutenimo de pensamento de contemplaccedilatildeo e de meditaccedilatildeo E es-se tipo de meditaccedilatildeo em geral elas natildeo querem fazer

Tudo isso mdash nas plantas nos ani-mais e nas velocidades materiais mdash eacute simboacutelico de um modo ou de ou-tro do processo do homem eacute sim-boacutelico da vida terrena de Nosso Se-nhor e da trajetoacuteria da Histoacuteria do curso dos acontecimentos

Ateacute mesmo certas coisas que satildeo feitas para matar e natildeo para vi-ver mdash por exemplo uma batalha mdash tecircm seu comeccedilo seu crescimento

depois seu murchamento e caem Um dos aspectos boni-tos desse estudo eacute a questatildeo dos recrudescimentos quais satildeo suas origens que forccedilas tecircm como se faz um recru-descimento Soacute o tema dos recrudescimentos daria pa-ra uma doutrina interessantiacutessima da Contra-Revoluccedilatildeo

Ateacute os fogos de artifiacutecio podem ter uma trajetoacuteria muito bonita nesse sentido

Um universo de belezas

Uma das coisas que eu gosto de apreciar no mar eacute exa-tamente o nascimento da onda depois o sistema de on-das quando elas arrebentam ou expiram na praia

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Tambeacutem a ilusoacuteria perpetuidade da calmariahellip Co-mo dentro da calmaria o primeiro elementozinho indica uma mudanccedila completa das coisas que vatildeo se acumulan-do Eacute um processo muito bonito

Isto tudo eacute uma verdadeira maravilha que depois tem sua transposiccedilatildeo para os processos poliacuteticos para a histoacute-ria das instituiccedilotildees das correntes de espiritualidade etc

Haacute um universo de belezas aiacute que ao homem foi da-do contemplar com olho raacutepido furtivo e atento porque natildeo tem tempo para pensar nisso Mas que eacute uma coisa lindiacutessima

Por exemplo haacute mortes que satildeo como um Amazonas desembocando na eternidade quase que empurra a eter-nidade um pouco para fora Mas existem outras mortes como um riozinho pequenininho humildezinho que vai dar diretamente no mar e se perde envergonhadinho com um sussurro que o mar incorpora a sihellip

Haacute uma porccedilatildeo de coisas bonitas interessantes para ver dentro disso E isso se aplica muito agrave histoacuteria de um homem

Por temperamento sou muito estaacutevel e gosto das coi-sas estaacuteveis que duram na calmaria

Natildeo concebo o Ceacuteu num perpeacutetuo movimento mas com diferentes modos de ser da estabilidade Natildeo eacute a ins-tabilidade eacute a mutaccedilatildeo dentro da estabilidade

Processo de pensamento de Dr Plinio

Todas as doutrinas e temas mdash portanto tambeacutem o conceito de sacralidade mdash tecircm um modo de se desenvol-ver peculiar de cada indiviacuteduo Em mim essa peculiari-dade eacute assim

Primeiro um nascimento cheio de intuiccedilotildees de gra-ccedilas ultra-alcandorado em que entra de um modo espe-cial uma visatildeo confusa do ultramaravilhoso e do ponto terminal bom do ponto supremo do auge e o encanta-mento por esse auge

Depois do auge bem visto e de dar a ele tudo quanto naquele estaacutegio da vida espiritual ele merece que se decirc entatildeo vem um periacuteodo de aparente estabilidade mas de fato eacute um periacuteodo em que se vai ldquocozinhandordquo lentamen-te a explicitaccedilatildeo

Ao mesmo tempo mdash eacute como se daacute concretamente co-migo mdash um periacuteodo de luta em que a explicitaccedilatildeo eacute aju-dada possantemente pela contestaccedilatildeo Porque aquele conhecimento confuso primeiro vem acompanhado de uma impliacutecita rejeiccedilatildeo do que natildeo eacute aquilo E quando al-gueacutem afirma o contraacuterio vem a repulsa

Na repulsa implicitamente fica mais conhecido aquilo que foi negado E ao mesmo tempo em que se prepara a apologeacutetica elabora-se a explicitaccedilatildeo A apologeacutetica e a explicitaccedilatildeo satildeo fenocircmenos reversiacuteveis um no outro De

maneira que eu me torno conhecedor das coisas por dois dados por uma espeacutecie de conaturalidade e por uma es-peacutecie de repulsa daquilo que eacute contraacuterio

Num determinado momento tudo o que se podia co-nhecer a respeito daquilo estaacute conhecido com os proacute-prios recursos e com a observaccedilatildeo concreta da vida Aiacute chega a hora da leitura Natildeo antes

Podem percorrer todos os livros de minha biblioteca e encontraratildeo sinais disso A leitura veio exatamente de-pois para ajudar esse processo dando mais informaccedilotildees fazendo com que a pessoa se situe ante o que diz o es-critor e portanto julgue eacute ldquosimrdquo eacute ldquonatildeordquo eacute ldquotalvezrdquo eacute ldquoconformerdquo etc

Depois de tudo isso feito haacute mais uma vez uma nova aparente estagnaccedilatildeo em que todos esses elementos re-colhidos satildeo objetos de uma nova siacutentese E vem uma vi-satildeo final que depois cresce pouco na aparecircncia mas que de fato tem muita intensidade E prepara o ato de amor terminal

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Eu natildeo sei se isso seraacute assim em outros Desconfio muito que natildeo e que varia muito de acordo com o cami-nho de Deus para cada pessoa

A inocecircncia eacute o princiacutepio da sabedoria

Graccedilas a Nossa Senhora haacute nesse processo muita ino-cecircncia Porque natildeo eacute soacute conhecendo a coisa em si mas eacute conferindo os dados externos com a inocecircncia A inocecircn-cia nesse sentido eacute um comeccedilar de sabedoria Ela cons-titui uma espeacutecie de ortodoxia

O que eu disse agora haacute um ano eu natildeo teria tatildeo cla-ro a ponto de explicitar neste momento estou explicitan-do com facilidade

Na aparecircncia isso em mim se encontrava parado mas de fato estava sendo preparada esta explicita-ccedilatildeo O que indica que havia uma accedilatildeo profunda mdash muito silenciosa tranquila discreta mas natildeo pouco ativa mdash para passar do uacuteltimo estaacutegio de um conhe-cimento confuso para o conhecimento inteiramente definido

Seria um crescimento contiacutenuo sob a forma de esta-bilidade mas na realidade trata-se de uma accedilatildeo em pro-fundidade Mais ou menos como o desenvolvimento da aacutervore jaacute crescida que natildeo cresce mais mas suga da ter-ra coisas que datildeo ao processo vital da aacutervore o meio de ir vivendo Examinando bem a aacutervore pode durante mui-to tempo ainda crescer em forccedila e em volume por esse processo

Entatildeo o conhecimento da transcendecircncia de Deus por exemplo depois de chegar a certo estaacutegio entra nes-sa fase de elaboraccedilatildeo profunda pouco perceptiva que de repente daacute um fruto muito mais sutil e melhor que eacute fazer as correlaccedilotildees entre os conjuntos que se tecircm na mente e daiacute nasce um determinado unum

E esse eacute o piacutencaro do processo intelectual e moral Porque esse piacutencaro jaacute eacute a primeira nota eacute a antiacutefona do cacircntico que noacutes devemos entoar no Ceacuteu

Procura do mundo dos possiacuteveis

Esse eacute o processo de conhecimento das coisas que po-deriam ou deveriam existir algumas das quais existem Por exemplo quando vejo um belo castelo Ele corres-ponde a ideias que todos tivemos na mente sobre um cas-telo inexistente Entatildeo minha primeira reflexatildeo eacute ldquoAqui estaacute o inexistente que eu procuravardquo

Muita coisa que parece estar no mero mundo dos possiacuteveis existe Eacute questatildeo de saber procurar Em uacutelti-ma anaacutelise se fosse bem ordenado o turismo perfeito se-ria uma procura pelo mundo dos possiacuteveis que a pessoa natildeo conheceu

Essa procura eacute um pouco o que vai dando acircnimo e movimentaccedilatildeo agrave vida O contraacuterio eacute o tipo de velho que no domingo agraves trecircs horas da tarde junto com sua espo-sa acabou de almoccedilar ele estaacute bem satisfeito e ela estaacute aliviada porque o marido almoccedilou bem e gostou da re-feiccedilatildeo Ele se senta numa cadeira e fica ruminando com desapontamento porque ele acha que natildeo haacute mais pos-siacuteveis

Propriamente a substacircncia dessa velhice mal concebi-da eacute crer pouco nos meramente possiacuteveis do Ceacuteu e achar que na Terra natildeo adianta conhececirc-los porque jaacute se viu que todas essas coisas fanam Entatildeo o velho fica sentado na cadeira ruminando sua bronquite Essa eacute a substacircncia desse conceito de velhice

Antigamente como a senhora mdash de modo habitual natildeo necessariamente mdash era melhor do que o homem ela ficava pensando um pouquinho no Ceacuteu e nas saudades do tempo que se foi

O homem pouco sujeito a saudades natildeo pensava no Ceacuteu mas de vez em quando o relacircmpago do Inferno lhe aparecia pela mente E isso o levava a fazer a sua Confis-satildeo e Comunhatildeo pascais Assim era a velhice

Havia uma casa mdash creio que natildeo existe mais mdash na es-quina da Rua Imaculada Conceiccedilatildeo com a Rua Martim Francisco1 Eu percebia pela conformaccedilatildeo do preacutedio

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que existiam muitos quartos de dormir vazios donde se deduz terem morado filhos ali que depois tinham se mu-dado e o casal residia sozinho

Eu entatildeo imaginava o velho e a velha possiacutevel no niacute-vel daquela residecircncia que era uma casa mediana Esse velho e essa velha eu os construiacutea de vaacuterios velhos e ve-lhas que tinha conhecido

Como a ideia da Contra-Revoluccedilatildeo foi elaborada no espiacuterito de Dr Plinio

Estou explicitando agora Mas a explicitaccedilatildeo eacute fruto de um trabalho lento que a mim me daacute a impressatildeo de que natildeo estou trabalhando mas simplesmente vivendo Eu diria que parei Mas de repente saio com uma en-xurrada de coisas que assim nunca pensei Eacute o lento tra-balho terminal que deve aprontar na mente

A Contra-Revoluccedilatildeo considerada no seu conjunto teve exatamente esse papel no meu espiacuterito

Primeiro formei impressotildees observei fatos tomei conhecimento pela leitura de alguns tantos aconteci-mentos histoacutericos e tambeacutem conheci muito pelas nar-raccedilotildees mais ou menos agrave Alexandre Dumas que circu-lavam no ambiente familiar a respeito desse ou daque-le caso

Por exemplo Maria Antonieta Na minha geraccedilatildeo o preconceito contra Maria Antonieta era uma coisa atroz ldquoMulher dura maacute traidora favorecia os austriacuteacos De uma beleza esplendorosa mdash era vista assim mdash que fazia com que todas as mulheres feias ficassem complexadas pensando nelardquo

Mas contavam que o povo faminto chegou a Versailles e ela estava tatildeo alheia agraves verdadeiras necessidades do po-vo que disse ldquoEntatildeo se vocecircs natildeo tecircm patildeo comam brio-cherdquo E ela nem sabia bem que brioche era mais caro que o patildeo porque problema de dinheiro natildeo existia para ela Entatildeo deu um conselho que provava mdash assim diziam mdash como ela vivia alheia ao sofrimento do povo

Eu me lembro de ainda pequeno perguntando para Dona Lucilia

mdash Mas mamatildee o que eacute briochemdash Uns bolinhos excelentesNatildeo cheguei a me perguntar por que ela natildeo fazia

brioche para eu comer Ateacute laacute a gula natildeo chegouhellip Mas vejam a provaccedilatildeo para uma crianccedila que ainda natildeo sabe o que eacute brioche

ldquoEntatildeo as pessoas bonitas alinhadas estiladas supe-riores natildeo tecircm coraccedilatildeo porque seguem demais regras e se endurecem com essas regras Por que seguir a regra endurece e cega para a compaixatildeo com os que natildeo con-seguiram seguir a regra Entatildeo seguir as regras eacute maurdquo

Minha resposta interior

ldquoNatildeo pode ser Porque entre bem e bem natildeo pode ha-ver incompatibilidaderdquo

A doutrina natildeo eacute o ponto de partida mas o de chegada

A importacircncia que dou ao raciociacutenio faz com que eu natildeo considere nada por acabado se natildeo foi raciocinado Porque todo esse processo de intuiccedilatildeo tem que chegar a raciociacutenios que provem ou natildeo provem aquilo que foi an-tes intuiacutedo apalpado pressentido

Podem entatildeo imaginar o meu encantamento lendo o ldquoTratado de Direito Naturalrdquo de Taparelli drsquoAzeglio o ldquoTratado de Sociologia Catoacutelicardquo de Albeacuteric Belliot um franciscano enfim uma flotilha de coisas que eu li e me provaram por exemplo a legitimidade do direito de pro-priedade que era uma coisa instintiva mas cuja legitimi-dade eu apanhei aiacute

Quando vi que o direito de propriedade a instituiccedilatildeo da famiacutelia a indissolubilidade do viacutenculo matrimonial a autoridade paterna mdash cuja liceidade era intuiacuteda por mim mdash se baseavam num raciociacutenio claro liacutempido perfeito tive um entusiasmo enorme

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Ostensoacuterio da Igreja de Santa Maria - Cracoacutevia Polocircnia

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Isso deu ao meu pensamento uma estrutura que veio depois de mil apalpaccedilotildees

Essa eacute uma caracteriacutestica do meu espiacuterito natildeo come-ccedilar por ler a doutrina mas por pegar a realidade Depois de ter intuiacutedo na realidade ir ver a doutrina E aiacute ter um contentamento um gaacuteudio enorme

Estou longe de ser daqueles que julgam dever prescin-dir da doutrina mas a questatildeo eacute que para muitos a dou-trina eacute o ponto de partida e na conformaccedilatildeo do meu espiacuterito eacute o ponto de chegada

Todas essas coisas com o tempo acabam for-mando um depoacutesito primeiro de impressotildees maturadas para raciocinar E enquanto jaacute vou raciocinando algumas de minhas im-pressotildees continuo a maturar ou explici-tar outras Entatildeo noacutes poderiacuteamos dizer que esse processo eacute

Primeiro observar captando e classificando subconscientemente

Segundo estabelecendo oposiccedilotildees e come-ccedilando por aiacute a explicitaccedilatildeo

Terceiro fazer os primeiros raciociacutenios que constituem pontas de trilho para que daiacute para diante em contato com qualquer coisa nova o processo in-teiro vai se movendo

Concepccedilatildeo sacral da vida

Isso forma inclusive o pro-gresso na vida espiritual

Por exemplo a noccedilatildeo de sacralidade no comeccedilo eacute muito mais viacutevida em re-laccedilatildeo agrave Igreja Depois me-nos em referecircncia agrave au-toridade paterna dentro da famiacutelia como entida-de toda ela sacral num certo sentido especial da palavra ldquosacralrdquo E tambeacutem em relaccedilatildeo ao mi-to monaacuterquico dentro do Es-tado que pode ser sacral se o indiviacuteduo qui-ser vecirc-lo assim oferececirc-lo agrave Igreja e pedir as becircnccedilatildeos dela a fim de sacralizaacute-lo

Isso acaba dando lugar a uma noccedilatildeo de sacralidade adequada agraves coisas temporais que eacute um desdobramento da noccedilatildeo do sacral mdash proacutepria das coisas estritamente espiritu-ais e sobrenaturais mdash e formando no espiacuterito vaacuterios degraus e modos de ser da sacralidade

cujo auge sempre me pareceu como sendo a Consagraccedilatildeo durante a Missa mais do que a minha Comunhatildeo

Agora uma coisa que eacute pessoal sou mais sensiacutevel agrave sacralidade do ato da Consagraccedilatildeo enquanto conside-rado na Consagraccedilatildeo do vinho e a apresentaccedilatildeo do caacuteli-ce para o povo adorar do que na Consagraccedilatildeo do patildeo e a apresentaccedilatildeo para ser adorado

Eu tinha a impressatildeo mdash que soube depois natildeo cor-responder agrave realidade mdash de que a transubstan-

ciaccedilatildeo se dava no momento da elevaccedilatildeo E daiacute aquele respeito e aquela veneraccedilatildeo

Porque nos fieacuteis haacute um redobrar de res-peito e veneraccedilatildeo quando o Santiacutessi-mo eacute elevado Compreende-se por-que eacute exposto para eles adorarem en-

tatildeo fazerem um ato interior que corres-ponde a essa exposiccedilatildeo Mas eu achava

que era porque a transubstanciaccedilatildeo estava se dando naquele momento

A forma material do caacutelice eacute tatildeo evo-cativa do que eacute o oferecimento da sacra-

lidade Uma alma que se oferece ou oferece alguma coisa de dentro de

si eacute tatildeo bem representada por um caacutelice que se abre e que daacute tudo

o que tem Por outro lado o vi-nho eacute tatildeo mais parecido com

o sangue do que o patildeo o eacute com o corpo que tudo isso me dava mais sen-saccedilatildeo mdash puramente fiacute-sica e analoacutegica mdash de sacralidade

A simples presen-ccedila do Santiacutessimo Sa-cramento exposto me dava uma sensaccedilatildeo de sacralidade colos-sal Muito mais do que o Santiacutessimo guarda-do na capela-mor Po-der chegar perto drsquoEle adoraacute-Lo produz em

mim impressotildees de sa-cralidade que eu acho que

possuem qualquer coisa de miacutestico muito maiores do

que as que se tecircm em contato com a sociedade temporal

Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus - Igreja Imaculada Conceiccedilatildeo Goa Iacutendia

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Mas por esse progresso de alma de que estou falan-do a pessoa vai compreendendo que em formas termos e modos diferentes a sociedade temporal inteira acaba tendo qualquer coisa de sacral E entatildeo uma concep-ccedilatildeo toda ela sacral da vida vai se maturando lentamente ao longo das deacutecadas para depois fazer uma confericcedilatildeo com os autores especializados

Porque a palavra definitiva eacute deles Eles representam a Igreja que eacute infaliacutevel e portanto vamos ouvir o que a Santa Matildee Igreja ensina a esse respeito E ensina na for-ccedila da palavra ldquoensinarrdquo quer dizer ela eacute a Mestra infaliacute-vel eu sou o aluno bobo que posso ter feito um engano e apresento a ela aquilo que pensei

No princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Eacute um processo que em certo momento entra numa apa-rente estagnaccedilatildeo e continua a elaboraccedilatildeo em profundidade De maneira que quem me conhece haacute muito tempo eacute pos-siacutevel que tenha tido ideia de que em algumas coisas eu es-tou me repetindo indefinidamente Mas se forem examinar de perto notaratildeo que tem sempre alguma coisinha nova que corresponde em profundidade a esse processo lento

Mas isso levanta um problema Esse natildeo eacute mdash em suas linhas gerais natildeo nos seus pormenores mdash o proacuteprio meacute-todo de pensar legiacutetimo do espiacuterito humano

Vamos formular a coisa assim O primeiro livro foi escrito por um homem que natildeo teve livros Entatildeo a cultura nasceu de um pensamento anterior ao livro Logo no processo in-telectual no princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Entatildeo eu volto ao ponto de partidaO unum eacute o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus de uma ma-

jestade infinita doccedilura infinita sabedoria infinita de um poder infinito e de uma bondade infinita para dizer soacute alguns atributos Tudo isso eacute uma siacutentese para chegar ateacute Ele compreendecirc-Lo

A teoria geral das vaacuterias formas de crescimento de desen-volvimento que apresentei no comeccedilo da reuniatildeo parece natildeo ter relaccedilatildeo alguma com Ele Mas no fundo eacute a Ele que visa-mos Ele eacute o alfa e o ocircmega o unum eacute Ele Ele eacute o comeccedilo e o fim de tudo E se de algum modo todas essas reflexotildees natildeo vi-sassem o melhor conhecimento drsquoEle natildeo teriam valor

Numa conversa os espiacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical

Em toda essa teoria a conversa tem um papel enor-me porque ela no fundo requer certo discernimento dos espiacuteritos e uma percepccedilatildeo do que conveacutem ou natildeo ser dito Quando natildeo conveacutem deve-se ter o suficiente desa-pego para natildeo tratar

Muita gente conversa sobre aquilo que tem vontade de conversar Isso eacute a morte da conversaccedilatildeo A conver-sa boa nem eacute sobre aquilo que tenho ou meu interlocu-tor tem vontade de conversar mas sim tratar daquilo em que noacutes dois podemos igualmente gostar de conversar O resto eacute a morte da conversaccedilatildeo

Agrave medida que uma conversa estaacute bem travada os es-piacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical E quando se entendem bem vatildeo mudando de tema igual-mente muito mais por apetecircncias do que por nexos loacutegi-cos Entra em algo o nexo loacutegico mas satildeo nexos psicoloacute-gicos mudanccedilas de temas vizinhos que vatildeo fazendo com que as duas pessoas gostem das mesmas coisas Entatildeo a conversa aiacute se torna deliciosa

Eacute mais ou menos como por exemplo duas pessoas que passeiam juntas no centro de Roma a caminho das catacumbas Passam por uma loja qualquer que tem gra-vatas bonitas os dois estatildeo precisando comprar gravatas param olham gostam conversam Depois transitam em frente a uma confeitaria e comem algum doce E assim chegam agrave catacumba

A conversa soacute pega mesmo mdash ao menos eacute a impressatildeo que eu tenho mdash quando na pontinha do que estaacute sendo con-versado haacute qualquer coisa que eacute uma graccedila de Deus sobre alguma coisa de transcendente maravilhoso que por uma pontinha de consolaccedilatildeo sensiacutevel ambos estatildeo sentindo

Pode ser o unum ou natildeo Pode ser uma consolaccedilatildeo que todos tecircm juntos sobre um ponto que Nossa Senho-ra quer glorificar Entatildeo a conversa em geral tem um fundinho comum de supremo E quanto mais esse fundi-nho eacute sentido por todos mais a conversa eacute animada

Donde se tira uma conclusatildeo linda o principal inter-locutor eacute o Interlocutor Divino presente em nossa con-versa falando dentro das nossas almas e elogiando-se a Si proacuteprio por nossos laacutebios

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece

Isso daacute uma elevaccedilatildeo ao conceito de conversa em que Deus estaacute sempre presente natildeo soacute mdash e jaacute eacute muito mdash atra-veacutes da Feacute mas tambeacutem no fundo por alguma coisa comu-nicada diretamente pela graccedila que se torna sensiacutevel e cau-sa alegria Esse eacute o sal da conversa e que a Providecircncia daacute quando quer Eacute certa forma de sensiacutevel Natildeo eacute uma mera troca de ideias teoacuterica mas algo que vai mais alto

Eu volto a dizer pasma mas eacute fato o Divino Interlo-cutor eacute propriamente Aquele que fala Ele fala pela boca de um responde pela boca de outro e Se alegra pelo co-raccedilatildeo de todos Eacute uma coisa muito bonita

Pode-se dar um fato parecido com esse na ordem me-ramente natural O exemplo mais caracteriacutestico disso eacute

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

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ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

29

pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

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duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 2: Revista Doctor Plinio 207_201506

N

Fruto da santidade da Igreja

2

Satildeo Joatildeo Fisher Igreja de Santa Maria Oxfordshire Inglaterra

a histoacuteria da Inglaterra vemos os grandes processos de atonia de

tibieza de indiferentismo que preparam depois toda a massa catoacutelica para as maiores defecccedilotildees que deram no protestantismo

Mas ao lado disso nos deparamos com uma coisa bonita a permanecircncia da nota da santidade da Igreja Porque apesar de todas essas tristezas eacute na Igreja que se vatildeo encontrar os maacutertires os homens de um caraacuteter admiraacutevel que preferem tudo a ceder diante do adversaacuterio e que expotildeem tudo quanto tecircm e ateacute a proacutepria vida para se manterem fieacuteis agrave verdadeira tradiccedilatildeo e agrave continuidade eclesiaacutestica

Quer dizer mesmo quando a putrefaccedilatildeo invade os meios catoacutelicos a santidade da Igreja produz frutos excepcionais e tatildeo maravilhosos como fora da Igreja natildeo se encontram

Assim ao mesmo tempo em que a Igreja eacute traiacuteda renegada vemo-la deitar uns lampejos memoraacuteveis que provam a divindade dela Nisto estaacute uma espeacutecie de afirmaccedilatildeo contiacutenua da assistecircncia do Divino Espiacuterito Santo na Igreja

Esta me parece ser a reflexatildeo mais oportuna que podemos fazer sobre o martiacuterio de Satildeo Joatildeo Fisher

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2261965)

Dar

io Ia

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As mateacuterias extraiacutedas de exposiccedilotildees verbais de Dr Plinio

mdash designadas por ldquoconferecircnciasrdquo mdash satildeo adaptadas para a linguagem

escrita sem revisatildeo do autor

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XVIII - Nordm 207 Junho de 2015

Conversa no Ceacuteu

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Dr PlinioDr PlinioRevista mensal de cultura catoacutelica de

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Editorial

4 A arte de conversar e o cacircntico dos Bem-aventurados

dona lucilia

6 Dor e seriedade

Sagrado coraccedilatildeo dE JESuS

8 O Divino Interlocutor

a SociEdadE analiSada por dr plinio

16 A organicidade do Brasil

dr plinio comEnta

22 A conversa e a cruz

o pEnSamEnto filoSoacutefico dE dr plinio

26 O tesouro da vida

calEndaacuterio doS SantoS

30 Santos de Junho

luzES da civilizaccedilatildeo criStatilde

32 Roma sparita

Uacuteltima paacutegina

36 Superexcelente misericoacuterdia

Na capa Dr Plinio durante uma conversa em sua residecircncia Foto Arquivo Revista

Editorial

C

A arte de conversar e o cacircntico dos

Bem-aventurados

4

omo seraacute a vida no Ceacuteu Que fazem eternamente os Anjos e os Bem-aventurados Existiraacute entre eles alguma forma de relacionamento ou a visatildeo de Deus os absorve por completo Satildeo essas algumas perguntas que costumam surgir quando se medita sobre as maravilhas do Para-

iacuteso CelesteA este respeito ensina-nos a Doutrina Catoacutelica que cada um dos Santos e dos espiacuteritos angeacutelicos

enquanto vecirc a Deus face a face comunica aos demais aquele aspecto do Altiacutessimo que lhe eacute dado contemplar Esta comunicaccedilatildeo muacutetua constitui um como que cacircntico das excelecircncias divinas um su-blime ato de louvor e adoraccedilatildeo

Para Dr Plinio este cacircntico celestial bem poderia ser comparado nesta Terra agrave boa conversa na qual os homens natildeo soacute se relacionam mas trocam ideias comentaacuterios percepccedilotildees pontos de vista e assim enriquecem o espiacuterito Por isso a conversa tem grande importacircncia para o bem viver

Entretanto cada vez mais nota-se na humanidade a extinccedilatildeo da arte de conversar Hoje ningueacutem se assombra ao encontrar uma famiacutelia cujos membros natildeo convivem entre si Caso se reuacutenam para uma festa de Natal por exemplo natildeo raro eacute que as pessoas prefiram estar agrave frente da televisatildeo ape-nas trocando uma palavra de vez em quando Os mais jovens hipnotizados pelo mundo virtual nem sequer piscam os olhos diante do computador ou dos cada vez mais multifuncionais aparelhos de ce-lular E o patriarca o avocirc que deveria atrair para si a atenccedilatildeo de todos contando interessantes his-toacuterias de seu passado egoisticamente mergulha no jornal pouco se importando com o que se pas-sa ao seu redor Analisando essa situaccedilatildeo tatildeo diferente do ambiente de sua infacircncia comentava cer-ta vez Dr Plinio

ldquoHouve um hiato uma queda um vaacutecuo entre a geraccedilatildeo dos meus avoacutes e a minha Aquela ainda conversava a dos meus pais se achava numa transiccedilatildeo e a dos seus filhos jaacute natildeo sabia fazecirc-lo Com muito pesar eu notava essa decadecircncia pois a conversa estimula a vontade de pensar e comunicar Ela eacute um intercacircmbio mental respirado tonificante e verdadeiramente humano um meio insubstituiacute-vel para viver pensarrdquo1

A conversa ldquonatildeo eacute apenas uma troca de informaccedilotildees nem de impressotildees mas tambeacutem de cogni-ccedilotildees muacutetuas dos interlocutores cujas personalidades se manifestam pelo olhar tom de voz gestos etc [] eacute um intercacircmbio de duas personalidades que falam sobre mateacuteria atraente e que interessa a ambas Seraacute ainda mais autecircntica se o meu interlocutor puser certa nota pessoal em suas palavras fazendo com que eu goste de ouvi-lo Isso eacute um elemento fundamental da conversardquo2 Numa conver-

5

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

sa as mentalidades se visitam e entram em harmoniosa consonacircncia evoluindo pouco a pouco co-mo uma melodia

Daiacute a analogia que pode ter uma conversa nesta Terra com o cacircntico dos Bem-aventurados no Reino dos Ceacuteus

A arte de conversar muito mais do que um ato social ou uma necessidade da natureza humana exige tambeacutem certo discernimento dos espiacuteritos e uma aguda percepccedilatildeo do ambiente e do interlocu-tor a fim de tornar-se agradaacutevel agravequele com quem se fala ldquoNa procura desse objetivo eacute preciso ter em vista que a arte de conversar supotildee uma primeira disposiccedilatildeo de espiacuterito sem a qual ela natildeo exis-te devemos nos interessar pelos outros para saber conversarrdquo3

ldquoObservando essa atitude cumpriremos na conversa a siacutentese de todos os Mandamentos amar a Deus sobre todas as coisas e ao proacuteximo como a si mesmo por amor a Deusrdquo4 deixando o campo meramente terreno e ingressando no celestial Por isso para Dr Plinio a conversa tem seu ponto de convergecircncia no Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e as mais frutuosas conversas satildeo aquelas em que o Divino Interlocutor faz-se presente5 ldquoA boa e verdadeira conversa deve brotar de pensamentos elevados daquilo que se meditou analisou quem natildeo cogita em assuntos elevados eacute incapaz de manter uma conversardquo6

ldquoQuando conversamos animados pelo amor de Deus e do proacuteximo o conviacutevio eacute agradaacutevel Do contraacuterio o trato seraacute detestaacutevel sem afabilidade marcado por um cunho revolucionaacuterio Pois ima-ginemos uma conversa com determinada pessoa em estado habitual de violar ao mesmo tempo to-dos os Mandamentos Ela mata rouba calunia etc O estar com essa pessoa se torna insuportaacutevel um pesadelo Natildeo haacute o que conversar com ela Por outro lado suponhamos um coloacutequio entre du-as pessoas que se esforccedilam por cumprir de modo exiacutemio os dez Mandamentos Eacute um Ceacuteu Sublime exemplo foi o ceacutelebre diaacutelogo de Santo Agostinho com Santa Mocircnica na hospedaria de Oacutestia Em suma a oacutetima conversa eacute aquela iluminada pelo Divino Espiacuterito Santo realizada aos peacutes da Santiacutes-sima Virgem em cujo Coraccedilatildeo vive Nosso Senhor Jesus Cristo O resto no fundo eacute fraude vaida-de e afliccedilatildeo de espiacuteritordquo7

Participando desse estado de espiacuterito as coisas mais comezinhas os fatos mais simples do dia a dia podem se tornar uma prece nos laacutebios daqueles que conversam e que natildeo deixam faltar em sua conversaccedilatildeo o transcendente o maravilhoso e a presenccedila divina Mesmo quando estes elementos estejam presentes de modo impliacutecito mdash e eacute o que se passa na maior parte das vezes mdash a conversa daacute-nos uma paacutelida ideia do cacircntico dos Bem-aventurados no Paraiacuteso

1) Conferecircncia de 5519792) Idem3) Conferecircncia de 14219874) Conferecircncia de 5519795) Ver paacuteginas 13 a 15 neste nuacutemero6) Revista Dr Plinio n 82 p 257) Conferecircncia de 551979

O

Dor e seriedade

6

Dona LuciLia

A seriedade causa dor mas o pior sofrimento eacute o produzido pela falta de seriedade a qual faz com que a pessoa se sinta

vazia sem ideias sem ideais sem vontade

sofrimento era algo tatildeo ligado agrave vida de Dona Lucilia e a todo o ser dela que eu em pequeno agraves vezes notava que ela estava sofrendo poreacutem

natildeo sabia por quecirc Ficava olhando para ela e contem-plando o sofrimento mas sem compreender o que a fa-zia sofrer

Pequenos sofrimentos que originavam um sofrimento global

Mais tarde quando me tornei um pouco mais velho fui compreendendo uma ou outra razatildeo de um ou outro sofri-mento Depois compreendi que os sofrimentos dela for-mavam um como que edifiacutecio Era um conjunto de razotildees que a faziam sofrer e que constituiacuteam um grande sofrimen-to global o qual era o sofrimento geral da vida dela En-tatildeo comecei a ter uma ideia global do que era o sofrimento

Quando pequeno eu notava sobretudo que mamatildee tinha restos de enfermidade devido agravequela operaccedilatildeo da vesiacutecula que ela fez na Alemanha em 1912 e percebia que tinha muita dificuldade em caminhar

Eu notava que agraves vezes meu pai voltava cedo do escri-toacuterio passava por casa pegava-a e saiacuteam os dois a fazerem uma volta a peacute Ele tendo terminado seu serviccedilo durante o dia contente com a tarefa com sauacutede e vida um homem muito feliz Ela uma pessoa na qual cada passo era uma dor ao mesmo tempo entendia que natildeo poderia irradiar seu sofrimento sobre o esposo ser uma causa contiacutenua de dores para ele Ela deveria fingir que natildeo estava sofren-do ou contar sorrindo ldquoHoje como estatildeo me doendo os peacutesrdquo e continuar a andar todos os dias a extensatildeo reco-mendada pelos meacutedicos Nunca terminar antes porque lhe estavam doendo muito porque essa extensatildeo era necessaacute-ria para habituar os peacutes ao esforccedilo adequado

O sofrimento produz a seriedade

Entatildeo eu percebia que mamatildee tinha uma compreen-satildeo muito profunda dessa situaccedilatildeo Ela sentia esse sofri-

mento e sentia na alma a dor que tem esta quando o cor-po sofre dor fiacutesica Natildeo eacute uma dor superficial mas uma dor profunda O corpo padece e a alma com isso sofre

Quando voltava para casa ela descansava e nesse mo-mento eu entendia tudo quanto sofrera durante o pas-seio porque sorrindo mamatildee se deitava numa espeacutecie de divatilde e ficava com os peacutes imobilizados ateacute que a dor passasse Ela agraves vezes gemia sorrindo entatildeo se forma-va uma roda de pessoas conversando coisas do dia e por amabilidade perguntavam-lhe

mdash Vocecirc estaacute melhor Luciliamdash Sim sim estou melhorandoEu estava vendo que era todo o dia a mesma coisa

natildeo acabava mais E compreendia bem que aquilo trazia para seu espiacuterito um reflexo que era a seriedade porque o sofrimento produz a seriedade

A pior dor que o homem pode ter natildeo eacute a causada pe-la seriedade eacute a produzida pela falta de seriedade Sen-tir-se natildeo seacuterio vazio sem ideias sem ideais sem querer nada sem dizer algo que valha qualquer coisa isto causa um sofrimento pior do que o pior dos sofrimentos

Um dos melhores dons que Deus pode dar a uma crianccedila eacute o sofrimento Natildeo nos queixemos portanto dos sofrimentos que tenhamos tido Pelo contraacuterio agra-deccedilamos a Nossa Senhora e compreendamos que Ela assim nos destinou para a seriedade

Atitudes das pessoas perante a Primeira Guerra Mundial

Pouco tempo depois desses primeiros fatos da minha infacircncia terem se passado arrebentou a Guerra Mun-dial Entendi mais ou menos o que era essa guerra mas tinha a noccedilatildeo da distacircncia enorme que havia entre o Brasil e a Europa Portanto era impossiacutevel que a guer-ra chegasse ateacute aqui enquanto a Europa passava por to-do aquele sofrimento no Brasil havia a boa vida tranqui-la e folgada o Brasil natildeo entraria em guerra e por isso as pessoas aqui gostavam de celebrar a tranquilidade bra-

7

Arqu

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evist

a

sileira Natildeo soacute apreciavam isso os brasilei-ros mas os estrangeiros oriundos de pa-iacuteses que estavam na conflagraccedilatildeo mas que tinham vindo para o Brasil antes da guerra Eles tinham pais irmatildeos filhos netos metidos na conflagra-ccedilatildeo Isso lhes interessava mas so-bretudo o que eles possuiacuteam era um bem-estar de pessoalmente natildeo participar da guerra

Quando chegava a tardinha era frequente verem-se nas ruas da Satildeo Paulinho rodas formadas na calccedilada por famiacutelias de imigran-tes As donas de casa faziam pratos do tempo em que viviam em seus pa-iacuteses de origem os homens conversa-vam davam risadas as crianccedilas brinca-vam todos se preparando para comer e depois comendo valorosamente comentando como era bom eles natildeo estarem na guerra

Comecei a observar isso e percebi que havia duas ati-tudes perante a conflagraccedilatildeo uma a daqueles a quem era sobretudo agradaacutevel estar longe dela a outra a dos que admiravam a guerra compreendiam sua beleza Es-tes uacuteltimos natildeo podiam ir agrave guerra porque tinham com-promissos aqui no Brasil para manter a famiacutelia se eles fossem poderiam morrer e a famiacutelia ficava abandonada Mas acompanhavam os jornais com o espiacuterito de lutado-res seu paiacutes avanccedilou ou recuou os aliados deles avanccedila-ram ou recuaram os meios de destruiccedilatildeo se acentuaram Aparece o aeroplano entatildeo o grande perigo satildeo os voos Depois surgem os gases asfixiantes os bombardeios em massa das grandes cidades E no fim coisa talvez pior do que tudo as epidemias que contagiavam agraves vezes um pa-iacutes inteiro e que constituiacuteam uma tristeza uma coisa hor-riacutevel

Atrozes ferimentos causados pela conflagraccedilatildeo

Eu tive uma governanta austriacuteaca que era solteira e ofereceu-se para durante o dia trabalhar num hospital de feridos de guerra

Ela disse que os ferimentos eram atrozes Por exem-plo um jovem que tinha ido para combater e voltou com um ferimento que de si natildeo era mortal mas ele natildeo podia falar porque um projeacutetil lhe arrancara o queixo Quando ele precisava de alguma coisa tocava uma sine-ta e escrevia com letra trecircmula de algueacutem que estaacute gra-vemente doente aquilo de que precisava Agraves vezes natildeo conseguia escrever por inteiro deixava cair sobre a cama

a caneta e o papel e ficava esperando um momento em que um pouquinho mais de

forccedila lhe permitisse fazer o pedidoMinha governanta contava que

pelo regulamento do hospital as enfermeiras tinham horaacuterios de-terminados para descansar por-que se elas ficassem doentes tam-beacutem o hospital tornava-se ino-perante As enfermeiras precisa-vam ter uma defesa contra a epi-demia entatildeo o hospital manda-va-as repousar Mas quando mi-

nha governanta estava descansan-do e se lembrava de que talvez o

homem sem queixo precisasse de al-guma coisa ela se levantava agraves escon-

didas e ia verificar se ele queria algo Quem censuraria uma atitude como essa

Soacute poderia aplaudir Mas que condiccedilotildees de vida que horrores que monstruosidades

Reflexatildeo sobre o magniacutefico tema da dor

Tudo isso representava o sofrimento e eu notava que Dona Lucilia tinha em face desses fatos uma atitude muito mais pensativa e mais seacuteria do que as outras pes-soas Estas comentavam como ela as notiacutecias que os jor-nais publicavam por vezes com sensacionalismo que im-pressionava muito o puacuteblico eacute natural

Por exemplo acabava o almoccedilo de domingo todos se espalhavam pela sala de jantar e comeccedilavam a conversar sobre esses assuntos Lembro-me ateacute hoje de que quan-do um velho reloacutegio de parede com um bonito som marcava duas horas da tarde havia sempre um espiacuterito mais leviano e superficial que dizia com uma voz que do-minava a todos ldquoMeus caros agora chegou a vez de nos divertirmos Vocecirc vai para onde E vocecirc Vamos fazer os nossos programasrdquo Entatildeo uns iam passear nos arredo-res da cidade outros faziam visitas enfim essa vida leve dos domingos

Eu percebia que Dona Lucilia acompanhava mas que o espiacuterito dela ia para a compaixatildeo por aqueles que ti-nham sofrido fazia oraccedilatildeo por eles para Nossa Senhora aliviar ou ateacute para evitar esse sofrimento Mas sobretu-do fazia a reflexatildeo sobre o grande o nobre o magniacutefico tema da dor E dentro deste tema outro ainda mais bo-nito o heroiacutesmo a coragem

Isto ia formando a alma de um menino   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2671995)

8

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Divino InterlocutorEm sua concepccedilatildeo sacral da existecircncia no processo de seu pensamento e ateacute na elaboraccedilatildeo de uma arte de conversar

Dr Plinio tinha como fonte de inspiraccedilatildeo e ponto de convergecircncia o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

U m tema que daria para um estudo muito in-teressante eacute a exposiccedilatildeo analiacutetica de todos os modos pelos quais as coisas na Criaccedilatildeo cres-

cem Elas tecircm modos diferentes de crescer e de evoluir para chegar ateacute a morte e nesta haacute tambeacutem um proces-so que natildeo eacute sempre anaacutelogo Entatildeo haacute o crescimento depois uma fase de expansatildeo e o deperecimento

Iniacutecio expansatildeo e morte

E isso eacute tatildeo diferente nas vaacuterias espeacutecies de vegetais e em cada planta em particular Eacute diverso nos bichos e nas velocidades materiais E tambeacutem em todo o processo de pensamento e de desenvolvimento do homem

Nesse crescer expandir-se e morrer Deus Nosso Senhor fez um verdadeiro jogo de maravilhas que evidentemente as pessoas que cul-tuam a natureza natildeo se datildeo o tra-balho de apreciar Porque isso su-potildee um miacutenimo de pensamento de contemplaccedilatildeo e de meditaccedilatildeo E es-se tipo de meditaccedilatildeo em geral elas natildeo querem fazer

Tudo isso mdash nas plantas nos ani-mais e nas velocidades materiais mdash eacute simboacutelico de um modo ou de ou-tro do processo do homem eacute sim-boacutelico da vida terrena de Nosso Se-nhor e da trajetoacuteria da Histoacuteria do curso dos acontecimentos

Ateacute mesmo certas coisas que satildeo feitas para matar e natildeo para vi-ver mdash por exemplo uma batalha mdash tecircm seu comeccedilo seu crescimento

depois seu murchamento e caem Um dos aspectos boni-tos desse estudo eacute a questatildeo dos recrudescimentos quais satildeo suas origens que forccedilas tecircm como se faz um recru-descimento Soacute o tema dos recrudescimentos daria pa-ra uma doutrina interessantiacutessima da Contra-Revoluccedilatildeo

Ateacute os fogos de artifiacutecio podem ter uma trajetoacuteria muito bonita nesse sentido

Um universo de belezas

Uma das coisas que eu gosto de apreciar no mar eacute exa-tamente o nascimento da onda depois o sistema de on-das quando elas arrebentam ou expiram na praia

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Tambeacutem a ilusoacuteria perpetuidade da calmariahellip Co-mo dentro da calmaria o primeiro elementozinho indica uma mudanccedila completa das coisas que vatildeo se acumulan-do Eacute um processo muito bonito

Isto tudo eacute uma verdadeira maravilha que depois tem sua transposiccedilatildeo para os processos poliacuteticos para a histoacute-ria das instituiccedilotildees das correntes de espiritualidade etc

Haacute um universo de belezas aiacute que ao homem foi da-do contemplar com olho raacutepido furtivo e atento porque natildeo tem tempo para pensar nisso Mas que eacute uma coisa lindiacutessima

Por exemplo haacute mortes que satildeo como um Amazonas desembocando na eternidade quase que empurra a eter-nidade um pouco para fora Mas existem outras mortes como um riozinho pequenininho humildezinho que vai dar diretamente no mar e se perde envergonhadinho com um sussurro que o mar incorpora a sihellip

Haacute uma porccedilatildeo de coisas bonitas interessantes para ver dentro disso E isso se aplica muito agrave histoacuteria de um homem

Por temperamento sou muito estaacutevel e gosto das coi-sas estaacuteveis que duram na calmaria

Natildeo concebo o Ceacuteu num perpeacutetuo movimento mas com diferentes modos de ser da estabilidade Natildeo eacute a ins-tabilidade eacute a mutaccedilatildeo dentro da estabilidade

Processo de pensamento de Dr Plinio

Todas as doutrinas e temas mdash portanto tambeacutem o conceito de sacralidade mdash tecircm um modo de se desenvol-ver peculiar de cada indiviacuteduo Em mim essa peculiari-dade eacute assim

Primeiro um nascimento cheio de intuiccedilotildees de gra-ccedilas ultra-alcandorado em que entra de um modo espe-cial uma visatildeo confusa do ultramaravilhoso e do ponto terminal bom do ponto supremo do auge e o encanta-mento por esse auge

Depois do auge bem visto e de dar a ele tudo quanto naquele estaacutegio da vida espiritual ele merece que se decirc entatildeo vem um periacuteodo de aparente estabilidade mas de fato eacute um periacuteodo em que se vai ldquocozinhandordquo lentamen-te a explicitaccedilatildeo

Ao mesmo tempo mdash eacute como se daacute concretamente co-migo mdash um periacuteodo de luta em que a explicitaccedilatildeo eacute aju-dada possantemente pela contestaccedilatildeo Porque aquele conhecimento confuso primeiro vem acompanhado de uma impliacutecita rejeiccedilatildeo do que natildeo eacute aquilo E quando al-gueacutem afirma o contraacuterio vem a repulsa

Na repulsa implicitamente fica mais conhecido aquilo que foi negado E ao mesmo tempo em que se prepara a apologeacutetica elabora-se a explicitaccedilatildeo A apologeacutetica e a explicitaccedilatildeo satildeo fenocircmenos reversiacuteveis um no outro De

maneira que eu me torno conhecedor das coisas por dois dados por uma espeacutecie de conaturalidade e por uma es-peacutecie de repulsa daquilo que eacute contraacuterio

Num determinado momento tudo o que se podia co-nhecer a respeito daquilo estaacute conhecido com os proacute-prios recursos e com a observaccedilatildeo concreta da vida Aiacute chega a hora da leitura Natildeo antes

Podem percorrer todos os livros de minha biblioteca e encontraratildeo sinais disso A leitura veio exatamente de-pois para ajudar esse processo dando mais informaccedilotildees fazendo com que a pessoa se situe ante o que diz o es-critor e portanto julgue eacute ldquosimrdquo eacute ldquonatildeordquo eacute ldquotalvezrdquo eacute ldquoconformerdquo etc

Depois de tudo isso feito haacute mais uma vez uma nova aparente estagnaccedilatildeo em que todos esses elementos re-colhidos satildeo objetos de uma nova siacutentese E vem uma vi-satildeo final que depois cresce pouco na aparecircncia mas que de fato tem muita intensidade E prepara o ato de amor terminal

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Eu natildeo sei se isso seraacute assim em outros Desconfio muito que natildeo e que varia muito de acordo com o cami-nho de Deus para cada pessoa

A inocecircncia eacute o princiacutepio da sabedoria

Graccedilas a Nossa Senhora haacute nesse processo muita ino-cecircncia Porque natildeo eacute soacute conhecendo a coisa em si mas eacute conferindo os dados externos com a inocecircncia A inocecircn-cia nesse sentido eacute um comeccedilar de sabedoria Ela cons-titui uma espeacutecie de ortodoxia

O que eu disse agora haacute um ano eu natildeo teria tatildeo cla-ro a ponto de explicitar neste momento estou explicitan-do com facilidade

Na aparecircncia isso em mim se encontrava parado mas de fato estava sendo preparada esta explicita-ccedilatildeo O que indica que havia uma accedilatildeo profunda mdash muito silenciosa tranquila discreta mas natildeo pouco ativa mdash para passar do uacuteltimo estaacutegio de um conhe-cimento confuso para o conhecimento inteiramente definido

Seria um crescimento contiacutenuo sob a forma de esta-bilidade mas na realidade trata-se de uma accedilatildeo em pro-fundidade Mais ou menos como o desenvolvimento da aacutervore jaacute crescida que natildeo cresce mais mas suga da ter-ra coisas que datildeo ao processo vital da aacutervore o meio de ir vivendo Examinando bem a aacutervore pode durante mui-to tempo ainda crescer em forccedila e em volume por esse processo

Entatildeo o conhecimento da transcendecircncia de Deus por exemplo depois de chegar a certo estaacutegio entra nes-sa fase de elaboraccedilatildeo profunda pouco perceptiva que de repente daacute um fruto muito mais sutil e melhor que eacute fazer as correlaccedilotildees entre os conjuntos que se tecircm na mente e daiacute nasce um determinado unum

E esse eacute o piacutencaro do processo intelectual e moral Porque esse piacutencaro jaacute eacute a primeira nota eacute a antiacutefona do cacircntico que noacutes devemos entoar no Ceacuteu

Procura do mundo dos possiacuteveis

Esse eacute o processo de conhecimento das coisas que po-deriam ou deveriam existir algumas das quais existem Por exemplo quando vejo um belo castelo Ele corres-ponde a ideias que todos tivemos na mente sobre um cas-telo inexistente Entatildeo minha primeira reflexatildeo eacute ldquoAqui estaacute o inexistente que eu procuravardquo

Muita coisa que parece estar no mero mundo dos possiacuteveis existe Eacute questatildeo de saber procurar Em uacutelti-ma anaacutelise se fosse bem ordenado o turismo perfeito se-ria uma procura pelo mundo dos possiacuteveis que a pessoa natildeo conheceu

Essa procura eacute um pouco o que vai dando acircnimo e movimentaccedilatildeo agrave vida O contraacuterio eacute o tipo de velho que no domingo agraves trecircs horas da tarde junto com sua espo-sa acabou de almoccedilar ele estaacute bem satisfeito e ela estaacute aliviada porque o marido almoccedilou bem e gostou da re-feiccedilatildeo Ele se senta numa cadeira e fica ruminando com desapontamento porque ele acha que natildeo haacute mais pos-siacuteveis

Propriamente a substacircncia dessa velhice mal concebi-da eacute crer pouco nos meramente possiacuteveis do Ceacuteu e achar que na Terra natildeo adianta conhececirc-los porque jaacute se viu que todas essas coisas fanam Entatildeo o velho fica sentado na cadeira ruminando sua bronquite Essa eacute a substacircncia desse conceito de velhice

Antigamente como a senhora mdash de modo habitual natildeo necessariamente mdash era melhor do que o homem ela ficava pensando um pouquinho no Ceacuteu e nas saudades do tempo que se foi

O homem pouco sujeito a saudades natildeo pensava no Ceacuteu mas de vez em quando o relacircmpago do Inferno lhe aparecia pela mente E isso o levava a fazer a sua Confis-satildeo e Comunhatildeo pascais Assim era a velhice

Havia uma casa mdash creio que natildeo existe mais mdash na es-quina da Rua Imaculada Conceiccedilatildeo com a Rua Martim Francisco1 Eu percebia pela conformaccedilatildeo do preacutedio

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que existiam muitos quartos de dormir vazios donde se deduz terem morado filhos ali que depois tinham se mu-dado e o casal residia sozinho

Eu entatildeo imaginava o velho e a velha possiacutevel no niacute-vel daquela residecircncia que era uma casa mediana Esse velho e essa velha eu os construiacutea de vaacuterios velhos e ve-lhas que tinha conhecido

Como a ideia da Contra-Revoluccedilatildeo foi elaborada no espiacuterito de Dr Plinio

Estou explicitando agora Mas a explicitaccedilatildeo eacute fruto de um trabalho lento que a mim me daacute a impressatildeo de que natildeo estou trabalhando mas simplesmente vivendo Eu diria que parei Mas de repente saio com uma en-xurrada de coisas que assim nunca pensei Eacute o lento tra-balho terminal que deve aprontar na mente

A Contra-Revoluccedilatildeo considerada no seu conjunto teve exatamente esse papel no meu espiacuterito

Primeiro formei impressotildees observei fatos tomei conhecimento pela leitura de alguns tantos aconteci-mentos histoacutericos e tambeacutem conheci muito pelas nar-raccedilotildees mais ou menos agrave Alexandre Dumas que circu-lavam no ambiente familiar a respeito desse ou daque-le caso

Por exemplo Maria Antonieta Na minha geraccedilatildeo o preconceito contra Maria Antonieta era uma coisa atroz ldquoMulher dura maacute traidora favorecia os austriacuteacos De uma beleza esplendorosa mdash era vista assim mdash que fazia com que todas as mulheres feias ficassem complexadas pensando nelardquo

Mas contavam que o povo faminto chegou a Versailles e ela estava tatildeo alheia agraves verdadeiras necessidades do po-vo que disse ldquoEntatildeo se vocecircs natildeo tecircm patildeo comam brio-cherdquo E ela nem sabia bem que brioche era mais caro que o patildeo porque problema de dinheiro natildeo existia para ela Entatildeo deu um conselho que provava mdash assim diziam mdash como ela vivia alheia ao sofrimento do povo

Eu me lembro de ainda pequeno perguntando para Dona Lucilia

mdash Mas mamatildee o que eacute briochemdash Uns bolinhos excelentesNatildeo cheguei a me perguntar por que ela natildeo fazia

brioche para eu comer Ateacute laacute a gula natildeo chegouhellip Mas vejam a provaccedilatildeo para uma crianccedila que ainda natildeo sabe o que eacute brioche

ldquoEntatildeo as pessoas bonitas alinhadas estiladas supe-riores natildeo tecircm coraccedilatildeo porque seguem demais regras e se endurecem com essas regras Por que seguir a regra endurece e cega para a compaixatildeo com os que natildeo con-seguiram seguir a regra Entatildeo seguir as regras eacute maurdquo

Minha resposta interior

ldquoNatildeo pode ser Porque entre bem e bem natildeo pode ha-ver incompatibilidaderdquo

A doutrina natildeo eacute o ponto de partida mas o de chegada

A importacircncia que dou ao raciociacutenio faz com que eu natildeo considere nada por acabado se natildeo foi raciocinado Porque todo esse processo de intuiccedilatildeo tem que chegar a raciociacutenios que provem ou natildeo provem aquilo que foi an-tes intuiacutedo apalpado pressentido

Podem entatildeo imaginar o meu encantamento lendo o ldquoTratado de Direito Naturalrdquo de Taparelli drsquoAzeglio o ldquoTratado de Sociologia Catoacutelicardquo de Albeacuteric Belliot um franciscano enfim uma flotilha de coisas que eu li e me provaram por exemplo a legitimidade do direito de pro-priedade que era uma coisa instintiva mas cuja legitimi-dade eu apanhei aiacute

Quando vi que o direito de propriedade a instituiccedilatildeo da famiacutelia a indissolubilidade do viacutenculo matrimonial a autoridade paterna mdash cuja liceidade era intuiacuteda por mim mdash se baseavam num raciociacutenio claro liacutempido perfeito tive um entusiasmo enorme

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Ostensoacuterio da Igreja de Santa Maria - Cracoacutevia Polocircnia

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Isso deu ao meu pensamento uma estrutura que veio depois de mil apalpaccedilotildees

Essa eacute uma caracteriacutestica do meu espiacuterito natildeo come-ccedilar por ler a doutrina mas por pegar a realidade Depois de ter intuiacutedo na realidade ir ver a doutrina E aiacute ter um contentamento um gaacuteudio enorme

Estou longe de ser daqueles que julgam dever prescin-dir da doutrina mas a questatildeo eacute que para muitos a dou-trina eacute o ponto de partida e na conformaccedilatildeo do meu espiacuterito eacute o ponto de chegada

Todas essas coisas com o tempo acabam for-mando um depoacutesito primeiro de impressotildees maturadas para raciocinar E enquanto jaacute vou raciocinando algumas de minhas im-pressotildees continuo a maturar ou explici-tar outras Entatildeo noacutes poderiacuteamos dizer que esse processo eacute

Primeiro observar captando e classificando subconscientemente

Segundo estabelecendo oposiccedilotildees e come-ccedilando por aiacute a explicitaccedilatildeo

Terceiro fazer os primeiros raciociacutenios que constituem pontas de trilho para que daiacute para diante em contato com qualquer coisa nova o processo in-teiro vai se movendo

Concepccedilatildeo sacral da vida

Isso forma inclusive o pro-gresso na vida espiritual

Por exemplo a noccedilatildeo de sacralidade no comeccedilo eacute muito mais viacutevida em re-laccedilatildeo agrave Igreja Depois me-nos em referecircncia agrave au-toridade paterna dentro da famiacutelia como entida-de toda ela sacral num certo sentido especial da palavra ldquosacralrdquo E tambeacutem em relaccedilatildeo ao mi-to monaacuterquico dentro do Es-tado que pode ser sacral se o indiviacuteduo qui-ser vecirc-lo assim oferececirc-lo agrave Igreja e pedir as becircnccedilatildeos dela a fim de sacralizaacute-lo

Isso acaba dando lugar a uma noccedilatildeo de sacralidade adequada agraves coisas temporais que eacute um desdobramento da noccedilatildeo do sacral mdash proacutepria das coisas estritamente espiritu-ais e sobrenaturais mdash e formando no espiacuterito vaacuterios degraus e modos de ser da sacralidade

cujo auge sempre me pareceu como sendo a Consagraccedilatildeo durante a Missa mais do que a minha Comunhatildeo

Agora uma coisa que eacute pessoal sou mais sensiacutevel agrave sacralidade do ato da Consagraccedilatildeo enquanto conside-rado na Consagraccedilatildeo do vinho e a apresentaccedilatildeo do caacuteli-ce para o povo adorar do que na Consagraccedilatildeo do patildeo e a apresentaccedilatildeo para ser adorado

Eu tinha a impressatildeo mdash que soube depois natildeo cor-responder agrave realidade mdash de que a transubstan-

ciaccedilatildeo se dava no momento da elevaccedilatildeo E daiacute aquele respeito e aquela veneraccedilatildeo

Porque nos fieacuteis haacute um redobrar de res-peito e veneraccedilatildeo quando o Santiacutessi-mo eacute elevado Compreende-se por-que eacute exposto para eles adorarem en-

tatildeo fazerem um ato interior que corres-ponde a essa exposiccedilatildeo Mas eu achava

que era porque a transubstanciaccedilatildeo estava se dando naquele momento

A forma material do caacutelice eacute tatildeo evo-cativa do que eacute o oferecimento da sacra-

lidade Uma alma que se oferece ou oferece alguma coisa de dentro de

si eacute tatildeo bem representada por um caacutelice que se abre e que daacute tudo

o que tem Por outro lado o vi-nho eacute tatildeo mais parecido com

o sangue do que o patildeo o eacute com o corpo que tudo isso me dava mais sen-saccedilatildeo mdash puramente fiacute-sica e analoacutegica mdash de sacralidade

A simples presen-ccedila do Santiacutessimo Sa-cramento exposto me dava uma sensaccedilatildeo de sacralidade colos-sal Muito mais do que o Santiacutessimo guarda-do na capela-mor Po-der chegar perto drsquoEle adoraacute-Lo produz em

mim impressotildees de sa-cralidade que eu acho que

possuem qualquer coisa de miacutestico muito maiores do

que as que se tecircm em contato com a sociedade temporal

Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus - Igreja Imaculada Conceiccedilatildeo Goa Iacutendia

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Mas por esse progresso de alma de que estou falan-do a pessoa vai compreendendo que em formas termos e modos diferentes a sociedade temporal inteira acaba tendo qualquer coisa de sacral E entatildeo uma concep-ccedilatildeo toda ela sacral da vida vai se maturando lentamente ao longo das deacutecadas para depois fazer uma confericcedilatildeo com os autores especializados

Porque a palavra definitiva eacute deles Eles representam a Igreja que eacute infaliacutevel e portanto vamos ouvir o que a Santa Matildee Igreja ensina a esse respeito E ensina na for-ccedila da palavra ldquoensinarrdquo quer dizer ela eacute a Mestra infaliacute-vel eu sou o aluno bobo que posso ter feito um engano e apresento a ela aquilo que pensei

No princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Eacute um processo que em certo momento entra numa apa-rente estagnaccedilatildeo e continua a elaboraccedilatildeo em profundidade De maneira que quem me conhece haacute muito tempo eacute pos-siacutevel que tenha tido ideia de que em algumas coisas eu es-tou me repetindo indefinidamente Mas se forem examinar de perto notaratildeo que tem sempre alguma coisinha nova que corresponde em profundidade a esse processo lento

Mas isso levanta um problema Esse natildeo eacute mdash em suas linhas gerais natildeo nos seus pormenores mdash o proacuteprio meacute-todo de pensar legiacutetimo do espiacuterito humano

Vamos formular a coisa assim O primeiro livro foi escrito por um homem que natildeo teve livros Entatildeo a cultura nasceu de um pensamento anterior ao livro Logo no processo in-telectual no princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Entatildeo eu volto ao ponto de partidaO unum eacute o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus de uma ma-

jestade infinita doccedilura infinita sabedoria infinita de um poder infinito e de uma bondade infinita para dizer soacute alguns atributos Tudo isso eacute uma siacutentese para chegar ateacute Ele compreendecirc-Lo

A teoria geral das vaacuterias formas de crescimento de desen-volvimento que apresentei no comeccedilo da reuniatildeo parece natildeo ter relaccedilatildeo alguma com Ele Mas no fundo eacute a Ele que visa-mos Ele eacute o alfa e o ocircmega o unum eacute Ele Ele eacute o comeccedilo e o fim de tudo E se de algum modo todas essas reflexotildees natildeo vi-sassem o melhor conhecimento drsquoEle natildeo teriam valor

Numa conversa os espiacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical

Em toda essa teoria a conversa tem um papel enor-me porque ela no fundo requer certo discernimento dos espiacuteritos e uma percepccedilatildeo do que conveacutem ou natildeo ser dito Quando natildeo conveacutem deve-se ter o suficiente desa-pego para natildeo tratar

Muita gente conversa sobre aquilo que tem vontade de conversar Isso eacute a morte da conversaccedilatildeo A conver-sa boa nem eacute sobre aquilo que tenho ou meu interlocu-tor tem vontade de conversar mas sim tratar daquilo em que noacutes dois podemos igualmente gostar de conversar O resto eacute a morte da conversaccedilatildeo

Agrave medida que uma conversa estaacute bem travada os es-piacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical E quando se entendem bem vatildeo mudando de tema igual-mente muito mais por apetecircncias do que por nexos loacutegi-cos Entra em algo o nexo loacutegico mas satildeo nexos psicoloacute-gicos mudanccedilas de temas vizinhos que vatildeo fazendo com que as duas pessoas gostem das mesmas coisas Entatildeo a conversa aiacute se torna deliciosa

Eacute mais ou menos como por exemplo duas pessoas que passeiam juntas no centro de Roma a caminho das catacumbas Passam por uma loja qualquer que tem gra-vatas bonitas os dois estatildeo precisando comprar gravatas param olham gostam conversam Depois transitam em frente a uma confeitaria e comem algum doce E assim chegam agrave catacumba

A conversa soacute pega mesmo mdash ao menos eacute a impressatildeo que eu tenho mdash quando na pontinha do que estaacute sendo con-versado haacute qualquer coisa que eacute uma graccedila de Deus sobre alguma coisa de transcendente maravilhoso que por uma pontinha de consolaccedilatildeo sensiacutevel ambos estatildeo sentindo

Pode ser o unum ou natildeo Pode ser uma consolaccedilatildeo que todos tecircm juntos sobre um ponto que Nossa Senho-ra quer glorificar Entatildeo a conversa em geral tem um fundinho comum de supremo E quanto mais esse fundi-nho eacute sentido por todos mais a conversa eacute animada

Donde se tira uma conclusatildeo linda o principal inter-locutor eacute o Interlocutor Divino presente em nossa con-versa falando dentro das nossas almas e elogiando-se a Si proacuteprio por nossos laacutebios

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece

Isso daacute uma elevaccedilatildeo ao conceito de conversa em que Deus estaacute sempre presente natildeo soacute mdash e jaacute eacute muito mdash atra-veacutes da Feacute mas tambeacutem no fundo por alguma coisa comu-nicada diretamente pela graccedila que se torna sensiacutevel e cau-sa alegria Esse eacute o sal da conversa e que a Providecircncia daacute quando quer Eacute certa forma de sensiacutevel Natildeo eacute uma mera troca de ideias teoacuterica mas algo que vai mais alto

Eu volto a dizer pasma mas eacute fato o Divino Interlo-cutor eacute propriamente Aquele que fala Ele fala pela boca de um responde pela boca de outro e Se alegra pelo co-raccedilatildeo de todos Eacute uma coisa muito bonita

Pode-se dar um fato parecido com esse na ordem me-ramente natural O exemplo mais caracteriacutestico disso eacute

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

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ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

P

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

Ric

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orai

s (C

C 3

0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

s R

epro

duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 3: Revista Doctor Plinio 207_201506

As mateacuterias extraiacutedas de exposiccedilotildees verbais de Dr Plinio

mdash designadas por ldquoconferecircnciasrdquo mdash satildeo adaptadas para a linguagem

escrita sem revisatildeo do autor

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XVIII - Nordm 207 Junho de 2015

Conversa no Ceacuteu

3

Dr PlinioDr PlinioRevista mensal de cultura catoacutelica de

propriedade da Editora Retornarei Ltda CNPJ - 023893790001-07

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SumaacuterioSumaacuterioAno XVIII - Nordm 207 Junho de 2015

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Editorial

4 A arte de conversar e o cacircntico dos Bem-aventurados

dona lucilia

6 Dor e seriedade

Sagrado coraccedilatildeo dE JESuS

8 O Divino Interlocutor

a SociEdadE analiSada por dr plinio

16 A organicidade do Brasil

dr plinio comEnta

22 A conversa e a cruz

o pEnSamEnto filoSoacutefico dE dr plinio

26 O tesouro da vida

calEndaacuterio doS SantoS

30 Santos de Junho

luzES da civilizaccedilatildeo criStatilde

32 Roma sparita

Uacuteltima paacutegina

36 Superexcelente misericoacuterdia

Na capa Dr Plinio durante uma conversa em sua residecircncia Foto Arquivo Revista

Editorial

C

A arte de conversar e o cacircntico dos

Bem-aventurados

4

omo seraacute a vida no Ceacuteu Que fazem eternamente os Anjos e os Bem-aventurados Existiraacute entre eles alguma forma de relacionamento ou a visatildeo de Deus os absorve por completo Satildeo essas algumas perguntas que costumam surgir quando se medita sobre as maravilhas do Para-

iacuteso CelesteA este respeito ensina-nos a Doutrina Catoacutelica que cada um dos Santos e dos espiacuteritos angeacutelicos

enquanto vecirc a Deus face a face comunica aos demais aquele aspecto do Altiacutessimo que lhe eacute dado contemplar Esta comunicaccedilatildeo muacutetua constitui um como que cacircntico das excelecircncias divinas um su-blime ato de louvor e adoraccedilatildeo

Para Dr Plinio este cacircntico celestial bem poderia ser comparado nesta Terra agrave boa conversa na qual os homens natildeo soacute se relacionam mas trocam ideias comentaacuterios percepccedilotildees pontos de vista e assim enriquecem o espiacuterito Por isso a conversa tem grande importacircncia para o bem viver

Entretanto cada vez mais nota-se na humanidade a extinccedilatildeo da arte de conversar Hoje ningueacutem se assombra ao encontrar uma famiacutelia cujos membros natildeo convivem entre si Caso se reuacutenam para uma festa de Natal por exemplo natildeo raro eacute que as pessoas prefiram estar agrave frente da televisatildeo ape-nas trocando uma palavra de vez em quando Os mais jovens hipnotizados pelo mundo virtual nem sequer piscam os olhos diante do computador ou dos cada vez mais multifuncionais aparelhos de ce-lular E o patriarca o avocirc que deveria atrair para si a atenccedilatildeo de todos contando interessantes his-toacuterias de seu passado egoisticamente mergulha no jornal pouco se importando com o que se pas-sa ao seu redor Analisando essa situaccedilatildeo tatildeo diferente do ambiente de sua infacircncia comentava cer-ta vez Dr Plinio

ldquoHouve um hiato uma queda um vaacutecuo entre a geraccedilatildeo dos meus avoacutes e a minha Aquela ainda conversava a dos meus pais se achava numa transiccedilatildeo e a dos seus filhos jaacute natildeo sabia fazecirc-lo Com muito pesar eu notava essa decadecircncia pois a conversa estimula a vontade de pensar e comunicar Ela eacute um intercacircmbio mental respirado tonificante e verdadeiramente humano um meio insubstituiacute-vel para viver pensarrdquo1

A conversa ldquonatildeo eacute apenas uma troca de informaccedilotildees nem de impressotildees mas tambeacutem de cogni-ccedilotildees muacutetuas dos interlocutores cujas personalidades se manifestam pelo olhar tom de voz gestos etc [] eacute um intercacircmbio de duas personalidades que falam sobre mateacuteria atraente e que interessa a ambas Seraacute ainda mais autecircntica se o meu interlocutor puser certa nota pessoal em suas palavras fazendo com que eu goste de ouvi-lo Isso eacute um elemento fundamental da conversardquo2 Numa conver-

5

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

sa as mentalidades se visitam e entram em harmoniosa consonacircncia evoluindo pouco a pouco co-mo uma melodia

Daiacute a analogia que pode ter uma conversa nesta Terra com o cacircntico dos Bem-aventurados no Reino dos Ceacuteus

A arte de conversar muito mais do que um ato social ou uma necessidade da natureza humana exige tambeacutem certo discernimento dos espiacuteritos e uma aguda percepccedilatildeo do ambiente e do interlocu-tor a fim de tornar-se agradaacutevel agravequele com quem se fala ldquoNa procura desse objetivo eacute preciso ter em vista que a arte de conversar supotildee uma primeira disposiccedilatildeo de espiacuterito sem a qual ela natildeo exis-te devemos nos interessar pelos outros para saber conversarrdquo3

ldquoObservando essa atitude cumpriremos na conversa a siacutentese de todos os Mandamentos amar a Deus sobre todas as coisas e ao proacuteximo como a si mesmo por amor a Deusrdquo4 deixando o campo meramente terreno e ingressando no celestial Por isso para Dr Plinio a conversa tem seu ponto de convergecircncia no Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e as mais frutuosas conversas satildeo aquelas em que o Divino Interlocutor faz-se presente5 ldquoA boa e verdadeira conversa deve brotar de pensamentos elevados daquilo que se meditou analisou quem natildeo cogita em assuntos elevados eacute incapaz de manter uma conversardquo6

ldquoQuando conversamos animados pelo amor de Deus e do proacuteximo o conviacutevio eacute agradaacutevel Do contraacuterio o trato seraacute detestaacutevel sem afabilidade marcado por um cunho revolucionaacuterio Pois ima-ginemos uma conversa com determinada pessoa em estado habitual de violar ao mesmo tempo to-dos os Mandamentos Ela mata rouba calunia etc O estar com essa pessoa se torna insuportaacutevel um pesadelo Natildeo haacute o que conversar com ela Por outro lado suponhamos um coloacutequio entre du-as pessoas que se esforccedilam por cumprir de modo exiacutemio os dez Mandamentos Eacute um Ceacuteu Sublime exemplo foi o ceacutelebre diaacutelogo de Santo Agostinho com Santa Mocircnica na hospedaria de Oacutestia Em suma a oacutetima conversa eacute aquela iluminada pelo Divino Espiacuterito Santo realizada aos peacutes da Santiacutes-sima Virgem em cujo Coraccedilatildeo vive Nosso Senhor Jesus Cristo O resto no fundo eacute fraude vaida-de e afliccedilatildeo de espiacuteritordquo7

Participando desse estado de espiacuterito as coisas mais comezinhas os fatos mais simples do dia a dia podem se tornar uma prece nos laacutebios daqueles que conversam e que natildeo deixam faltar em sua conversaccedilatildeo o transcendente o maravilhoso e a presenccedila divina Mesmo quando estes elementos estejam presentes de modo impliacutecito mdash e eacute o que se passa na maior parte das vezes mdash a conversa daacute-nos uma paacutelida ideia do cacircntico dos Bem-aventurados no Paraiacuteso

1) Conferecircncia de 5519792) Idem3) Conferecircncia de 14219874) Conferecircncia de 5519795) Ver paacuteginas 13 a 15 neste nuacutemero6) Revista Dr Plinio n 82 p 257) Conferecircncia de 551979

O

Dor e seriedade

6

Dona LuciLia

A seriedade causa dor mas o pior sofrimento eacute o produzido pela falta de seriedade a qual faz com que a pessoa se sinta

vazia sem ideias sem ideais sem vontade

sofrimento era algo tatildeo ligado agrave vida de Dona Lucilia e a todo o ser dela que eu em pequeno agraves vezes notava que ela estava sofrendo poreacutem

natildeo sabia por quecirc Ficava olhando para ela e contem-plando o sofrimento mas sem compreender o que a fa-zia sofrer

Pequenos sofrimentos que originavam um sofrimento global

Mais tarde quando me tornei um pouco mais velho fui compreendendo uma ou outra razatildeo de um ou outro sofri-mento Depois compreendi que os sofrimentos dela for-mavam um como que edifiacutecio Era um conjunto de razotildees que a faziam sofrer e que constituiacuteam um grande sofrimen-to global o qual era o sofrimento geral da vida dela En-tatildeo comecei a ter uma ideia global do que era o sofrimento

Quando pequeno eu notava sobretudo que mamatildee tinha restos de enfermidade devido agravequela operaccedilatildeo da vesiacutecula que ela fez na Alemanha em 1912 e percebia que tinha muita dificuldade em caminhar

Eu notava que agraves vezes meu pai voltava cedo do escri-toacuterio passava por casa pegava-a e saiacuteam os dois a fazerem uma volta a peacute Ele tendo terminado seu serviccedilo durante o dia contente com a tarefa com sauacutede e vida um homem muito feliz Ela uma pessoa na qual cada passo era uma dor ao mesmo tempo entendia que natildeo poderia irradiar seu sofrimento sobre o esposo ser uma causa contiacutenua de dores para ele Ela deveria fingir que natildeo estava sofren-do ou contar sorrindo ldquoHoje como estatildeo me doendo os peacutesrdquo e continuar a andar todos os dias a extensatildeo reco-mendada pelos meacutedicos Nunca terminar antes porque lhe estavam doendo muito porque essa extensatildeo era necessaacute-ria para habituar os peacutes ao esforccedilo adequado

O sofrimento produz a seriedade

Entatildeo eu percebia que mamatildee tinha uma compreen-satildeo muito profunda dessa situaccedilatildeo Ela sentia esse sofri-

mento e sentia na alma a dor que tem esta quando o cor-po sofre dor fiacutesica Natildeo eacute uma dor superficial mas uma dor profunda O corpo padece e a alma com isso sofre

Quando voltava para casa ela descansava e nesse mo-mento eu entendia tudo quanto sofrera durante o pas-seio porque sorrindo mamatildee se deitava numa espeacutecie de divatilde e ficava com os peacutes imobilizados ateacute que a dor passasse Ela agraves vezes gemia sorrindo entatildeo se forma-va uma roda de pessoas conversando coisas do dia e por amabilidade perguntavam-lhe

mdash Vocecirc estaacute melhor Luciliamdash Sim sim estou melhorandoEu estava vendo que era todo o dia a mesma coisa

natildeo acabava mais E compreendia bem que aquilo trazia para seu espiacuterito um reflexo que era a seriedade porque o sofrimento produz a seriedade

A pior dor que o homem pode ter natildeo eacute a causada pe-la seriedade eacute a produzida pela falta de seriedade Sen-tir-se natildeo seacuterio vazio sem ideias sem ideais sem querer nada sem dizer algo que valha qualquer coisa isto causa um sofrimento pior do que o pior dos sofrimentos

Um dos melhores dons que Deus pode dar a uma crianccedila eacute o sofrimento Natildeo nos queixemos portanto dos sofrimentos que tenhamos tido Pelo contraacuterio agra-deccedilamos a Nossa Senhora e compreendamos que Ela assim nos destinou para a seriedade

Atitudes das pessoas perante a Primeira Guerra Mundial

Pouco tempo depois desses primeiros fatos da minha infacircncia terem se passado arrebentou a Guerra Mun-dial Entendi mais ou menos o que era essa guerra mas tinha a noccedilatildeo da distacircncia enorme que havia entre o Brasil e a Europa Portanto era impossiacutevel que a guer-ra chegasse ateacute aqui enquanto a Europa passava por to-do aquele sofrimento no Brasil havia a boa vida tranqui-la e folgada o Brasil natildeo entraria em guerra e por isso as pessoas aqui gostavam de celebrar a tranquilidade bra-

7

Arqu

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evist

a

sileira Natildeo soacute apreciavam isso os brasilei-ros mas os estrangeiros oriundos de pa-iacuteses que estavam na conflagraccedilatildeo mas que tinham vindo para o Brasil antes da guerra Eles tinham pais irmatildeos filhos netos metidos na conflagra-ccedilatildeo Isso lhes interessava mas so-bretudo o que eles possuiacuteam era um bem-estar de pessoalmente natildeo participar da guerra

Quando chegava a tardinha era frequente verem-se nas ruas da Satildeo Paulinho rodas formadas na calccedilada por famiacutelias de imigran-tes As donas de casa faziam pratos do tempo em que viviam em seus pa-iacuteses de origem os homens conversa-vam davam risadas as crianccedilas brinca-vam todos se preparando para comer e depois comendo valorosamente comentando como era bom eles natildeo estarem na guerra

Comecei a observar isso e percebi que havia duas ati-tudes perante a conflagraccedilatildeo uma a daqueles a quem era sobretudo agradaacutevel estar longe dela a outra a dos que admiravam a guerra compreendiam sua beleza Es-tes uacuteltimos natildeo podiam ir agrave guerra porque tinham com-promissos aqui no Brasil para manter a famiacutelia se eles fossem poderiam morrer e a famiacutelia ficava abandonada Mas acompanhavam os jornais com o espiacuterito de lutado-res seu paiacutes avanccedilou ou recuou os aliados deles avanccedila-ram ou recuaram os meios de destruiccedilatildeo se acentuaram Aparece o aeroplano entatildeo o grande perigo satildeo os voos Depois surgem os gases asfixiantes os bombardeios em massa das grandes cidades E no fim coisa talvez pior do que tudo as epidemias que contagiavam agraves vezes um pa-iacutes inteiro e que constituiacuteam uma tristeza uma coisa hor-riacutevel

Atrozes ferimentos causados pela conflagraccedilatildeo

Eu tive uma governanta austriacuteaca que era solteira e ofereceu-se para durante o dia trabalhar num hospital de feridos de guerra

Ela disse que os ferimentos eram atrozes Por exem-plo um jovem que tinha ido para combater e voltou com um ferimento que de si natildeo era mortal mas ele natildeo podia falar porque um projeacutetil lhe arrancara o queixo Quando ele precisava de alguma coisa tocava uma sine-ta e escrevia com letra trecircmula de algueacutem que estaacute gra-vemente doente aquilo de que precisava Agraves vezes natildeo conseguia escrever por inteiro deixava cair sobre a cama

a caneta e o papel e ficava esperando um momento em que um pouquinho mais de

forccedila lhe permitisse fazer o pedidoMinha governanta contava que

pelo regulamento do hospital as enfermeiras tinham horaacuterios de-terminados para descansar por-que se elas ficassem doentes tam-beacutem o hospital tornava-se ino-perante As enfermeiras precisa-vam ter uma defesa contra a epi-demia entatildeo o hospital manda-va-as repousar Mas quando mi-

nha governanta estava descansan-do e se lembrava de que talvez o

homem sem queixo precisasse de al-guma coisa ela se levantava agraves escon-

didas e ia verificar se ele queria algo Quem censuraria uma atitude como essa

Soacute poderia aplaudir Mas que condiccedilotildees de vida que horrores que monstruosidades

Reflexatildeo sobre o magniacutefico tema da dor

Tudo isso representava o sofrimento e eu notava que Dona Lucilia tinha em face desses fatos uma atitude muito mais pensativa e mais seacuteria do que as outras pes-soas Estas comentavam como ela as notiacutecias que os jor-nais publicavam por vezes com sensacionalismo que im-pressionava muito o puacuteblico eacute natural

Por exemplo acabava o almoccedilo de domingo todos se espalhavam pela sala de jantar e comeccedilavam a conversar sobre esses assuntos Lembro-me ateacute hoje de que quan-do um velho reloacutegio de parede com um bonito som marcava duas horas da tarde havia sempre um espiacuterito mais leviano e superficial que dizia com uma voz que do-minava a todos ldquoMeus caros agora chegou a vez de nos divertirmos Vocecirc vai para onde E vocecirc Vamos fazer os nossos programasrdquo Entatildeo uns iam passear nos arredo-res da cidade outros faziam visitas enfim essa vida leve dos domingos

Eu percebia que Dona Lucilia acompanhava mas que o espiacuterito dela ia para a compaixatildeo por aqueles que ti-nham sofrido fazia oraccedilatildeo por eles para Nossa Senhora aliviar ou ateacute para evitar esse sofrimento Mas sobretu-do fazia a reflexatildeo sobre o grande o nobre o magniacutefico tema da dor E dentro deste tema outro ainda mais bo-nito o heroiacutesmo a coragem

Isto ia formando a alma de um menino   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2671995)

8

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Divino InterlocutorEm sua concepccedilatildeo sacral da existecircncia no processo de seu pensamento e ateacute na elaboraccedilatildeo de uma arte de conversar

Dr Plinio tinha como fonte de inspiraccedilatildeo e ponto de convergecircncia o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

U m tema que daria para um estudo muito in-teressante eacute a exposiccedilatildeo analiacutetica de todos os modos pelos quais as coisas na Criaccedilatildeo cres-

cem Elas tecircm modos diferentes de crescer e de evoluir para chegar ateacute a morte e nesta haacute tambeacutem um proces-so que natildeo eacute sempre anaacutelogo Entatildeo haacute o crescimento depois uma fase de expansatildeo e o deperecimento

Iniacutecio expansatildeo e morte

E isso eacute tatildeo diferente nas vaacuterias espeacutecies de vegetais e em cada planta em particular Eacute diverso nos bichos e nas velocidades materiais E tambeacutem em todo o processo de pensamento e de desenvolvimento do homem

Nesse crescer expandir-se e morrer Deus Nosso Senhor fez um verdadeiro jogo de maravilhas que evidentemente as pessoas que cul-tuam a natureza natildeo se datildeo o tra-balho de apreciar Porque isso su-potildee um miacutenimo de pensamento de contemplaccedilatildeo e de meditaccedilatildeo E es-se tipo de meditaccedilatildeo em geral elas natildeo querem fazer

Tudo isso mdash nas plantas nos ani-mais e nas velocidades materiais mdash eacute simboacutelico de um modo ou de ou-tro do processo do homem eacute sim-boacutelico da vida terrena de Nosso Se-nhor e da trajetoacuteria da Histoacuteria do curso dos acontecimentos

Ateacute mesmo certas coisas que satildeo feitas para matar e natildeo para vi-ver mdash por exemplo uma batalha mdash tecircm seu comeccedilo seu crescimento

depois seu murchamento e caem Um dos aspectos boni-tos desse estudo eacute a questatildeo dos recrudescimentos quais satildeo suas origens que forccedilas tecircm como se faz um recru-descimento Soacute o tema dos recrudescimentos daria pa-ra uma doutrina interessantiacutessima da Contra-Revoluccedilatildeo

Ateacute os fogos de artifiacutecio podem ter uma trajetoacuteria muito bonita nesse sentido

Um universo de belezas

Uma das coisas que eu gosto de apreciar no mar eacute exa-tamente o nascimento da onda depois o sistema de on-das quando elas arrebentam ou expiram na praia

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Tambeacutem a ilusoacuteria perpetuidade da calmariahellip Co-mo dentro da calmaria o primeiro elementozinho indica uma mudanccedila completa das coisas que vatildeo se acumulan-do Eacute um processo muito bonito

Isto tudo eacute uma verdadeira maravilha que depois tem sua transposiccedilatildeo para os processos poliacuteticos para a histoacute-ria das instituiccedilotildees das correntes de espiritualidade etc

Haacute um universo de belezas aiacute que ao homem foi da-do contemplar com olho raacutepido furtivo e atento porque natildeo tem tempo para pensar nisso Mas que eacute uma coisa lindiacutessima

Por exemplo haacute mortes que satildeo como um Amazonas desembocando na eternidade quase que empurra a eter-nidade um pouco para fora Mas existem outras mortes como um riozinho pequenininho humildezinho que vai dar diretamente no mar e se perde envergonhadinho com um sussurro que o mar incorpora a sihellip

Haacute uma porccedilatildeo de coisas bonitas interessantes para ver dentro disso E isso se aplica muito agrave histoacuteria de um homem

Por temperamento sou muito estaacutevel e gosto das coi-sas estaacuteveis que duram na calmaria

Natildeo concebo o Ceacuteu num perpeacutetuo movimento mas com diferentes modos de ser da estabilidade Natildeo eacute a ins-tabilidade eacute a mutaccedilatildeo dentro da estabilidade

Processo de pensamento de Dr Plinio

Todas as doutrinas e temas mdash portanto tambeacutem o conceito de sacralidade mdash tecircm um modo de se desenvol-ver peculiar de cada indiviacuteduo Em mim essa peculiari-dade eacute assim

Primeiro um nascimento cheio de intuiccedilotildees de gra-ccedilas ultra-alcandorado em que entra de um modo espe-cial uma visatildeo confusa do ultramaravilhoso e do ponto terminal bom do ponto supremo do auge e o encanta-mento por esse auge

Depois do auge bem visto e de dar a ele tudo quanto naquele estaacutegio da vida espiritual ele merece que se decirc entatildeo vem um periacuteodo de aparente estabilidade mas de fato eacute um periacuteodo em que se vai ldquocozinhandordquo lentamen-te a explicitaccedilatildeo

Ao mesmo tempo mdash eacute como se daacute concretamente co-migo mdash um periacuteodo de luta em que a explicitaccedilatildeo eacute aju-dada possantemente pela contestaccedilatildeo Porque aquele conhecimento confuso primeiro vem acompanhado de uma impliacutecita rejeiccedilatildeo do que natildeo eacute aquilo E quando al-gueacutem afirma o contraacuterio vem a repulsa

Na repulsa implicitamente fica mais conhecido aquilo que foi negado E ao mesmo tempo em que se prepara a apologeacutetica elabora-se a explicitaccedilatildeo A apologeacutetica e a explicitaccedilatildeo satildeo fenocircmenos reversiacuteveis um no outro De

maneira que eu me torno conhecedor das coisas por dois dados por uma espeacutecie de conaturalidade e por uma es-peacutecie de repulsa daquilo que eacute contraacuterio

Num determinado momento tudo o que se podia co-nhecer a respeito daquilo estaacute conhecido com os proacute-prios recursos e com a observaccedilatildeo concreta da vida Aiacute chega a hora da leitura Natildeo antes

Podem percorrer todos os livros de minha biblioteca e encontraratildeo sinais disso A leitura veio exatamente de-pois para ajudar esse processo dando mais informaccedilotildees fazendo com que a pessoa se situe ante o que diz o es-critor e portanto julgue eacute ldquosimrdquo eacute ldquonatildeordquo eacute ldquotalvezrdquo eacute ldquoconformerdquo etc

Depois de tudo isso feito haacute mais uma vez uma nova aparente estagnaccedilatildeo em que todos esses elementos re-colhidos satildeo objetos de uma nova siacutentese E vem uma vi-satildeo final que depois cresce pouco na aparecircncia mas que de fato tem muita intensidade E prepara o ato de amor terminal

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Eu natildeo sei se isso seraacute assim em outros Desconfio muito que natildeo e que varia muito de acordo com o cami-nho de Deus para cada pessoa

A inocecircncia eacute o princiacutepio da sabedoria

Graccedilas a Nossa Senhora haacute nesse processo muita ino-cecircncia Porque natildeo eacute soacute conhecendo a coisa em si mas eacute conferindo os dados externos com a inocecircncia A inocecircn-cia nesse sentido eacute um comeccedilar de sabedoria Ela cons-titui uma espeacutecie de ortodoxia

O que eu disse agora haacute um ano eu natildeo teria tatildeo cla-ro a ponto de explicitar neste momento estou explicitan-do com facilidade

Na aparecircncia isso em mim se encontrava parado mas de fato estava sendo preparada esta explicita-ccedilatildeo O que indica que havia uma accedilatildeo profunda mdash muito silenciosa tranquila discreta mas natildeo pouco ativa mdash para passar do uacuteltimo estaacutegio de um conhe-cimento confuso para o conhecimento inteiramente definido

Seria um crescimento contiacutenuo sob a forma de esta-bilidade mas na realidade trata-se de uma accedilatildeo em pro-fundidade Mais ou menos como o desenvolvimento da aacutervore jaacute crescida que natildeo cresce mais mas suga da ter-ra coisas que datildeo ao processo vital da aacutervore o meio de ir vivendo Examinando bem a aacutervore pode durante mui-to tempo ainda crescer em forccedila e em volume por esse processo

Entatildeo o conhecimento da transcendecircncia de Deus por exemplo depois de chegar a certo estaacutegio entra nes-sa fase de elaboraccedilatildeo profunda pouco perceptiva que de repente daacute um fruto muito mais sutil e melhor que eacute fazer as correlaccedilotildees entre os conjuntos que se tecircm na mente e daiacute nasce um determinado unum

E esse eacute o piacutencaro do processo intelectual e moral Porque esse piacutencaro jaacute eacute a primeira nota eacute a antiacutefona do cacircntico que noacutes devemos entoar no Ceacuteu

Procura do mundo dos possiacuteveis

Esse eacute o processo de conhecimento das coisas que po-deriam ou deveriam existir algumas das quais existem Por exemplo quando vejo um belo castelo Ele corres-ponde a ideias que todos tivemos na mente sobre um cas-telo inexistente Entatildeo minha primeira reflexatildeo eacute ldquoAqui estaacute o inexistente que eu procuravardquo

Muita coisa que parece estar no mero mundo dos possiacuteveis existe Eacute questatildeo de saber procurar Em uacutelti-ma anaacutelise se fosse bem ordenado o turismo perfeito se-ria uma procura pelo mundo dos possiacuteveis que a pessoa natildeo conheceu

Essa procura eacute um pouco o que vai dando acircnimo e movimentaccedilatildeo agrave vida O contraacuterio eacute o tipo de velho que no domingo agraves trecircs horas da tarde junto com sua espo-sa acabou de almoccedilar ele estaacute bem satisfeito e ela estaacute aliviada porque o marido almoccedilou bem e gostou da re-feiccedilatildeo Ele se senta numa cadeira e fica ruminando com desapontamento porque ele acha que natildeo haacute mais pos-siacuteveis

Propriamente a substacircncia dessa velhice mal concebi-da eacute crer pouco nos meramente possiacuteveis do Ceacuteu e achar que na Terra natildeo adianta conhececirc-los porque jaacute se viu que todas essas coisas fanam Entatildeo o velho fica sentado na cadeira ruminando sua bronquite Essa eacute a substacircncia desse conceito de velhice

Antigamente como a senhora mdash de modo habitual natildeo necessariamente mdash era melhor do que o homem ela ficava pensando um pouquinho no Ceacuteu e nas saudades do tempo que se foi

O homem pouco sujeito a saudades natildeo pensava no Ceacuteu mas de vez em quando o relacircmpago do Inferno lhe aparecia pela mente E isso o levava a fazer a sua Confis-satildeo e Comunhatildeo pascais Assim era a velhice

Havia uma casa mdash creio que natildeo existe mais mdash na es-quina da Rua Imaculada Conceiccedilatildeo com a Rua Martim Francisco1 Eu percebia pela conformaccedilatildeo do preacutedio

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Carcassone Franccedila

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que existiam muitos quartos de dormir vazios donde se deduz terem morado filhos ali que depois tinham se mu-dado e o casal residia sozinho

Eu entatildeo imaginava o velho e a velha possiacutevel no niacute-vel daquela residecircncia que era uma casa mediana Esse velho e essa velha eu os construiacutea de vaacuterios velhos e ve-lhas que tinha conhecido

Como a ideia da Contra-Revoluccedilatildeo foi elaborada no espiacuterito de Dr Plinio

Estou explicitando agora Mas a explicitaccedilatildeo eacute fruto de um trabalho lento que a mim me daacute a impressatildeo de que natildeo estou trabalhando mas simplesmente vivendo Eu diria que parei Mas de repente saio com uma en-xurrada de coisas que assim nunca pensei Eacute o lento tra-balho terminal que deve aprontar na mente

A Contra-Revoluccedilatildeo considerada no seu conjunto teve exatamente esse papel no meu espiacuterito

Primeiro formei impressotildees observei fatos tomei conhecimento pela leitura de alguns tantos aconteci-mentos histoacutericos e tambeacutem conheci muito pelas nar-raccedilotildees mais ou menos agrave Alexandre Dumas que circu-lavam no ambiente familiar a respeito desse ou daque-le caso

Por exemplo Maria Antonieta Na minha geraccedilatildeo o preconceito contra Maria Antonieta era uma coisa atroz ldquoMulher dura maacute traidora favorecia os austriacuteacos De uma beleza esplendorosa mdash era vista assim mdash que fazia com que todas as mulheres feias ficassem complexadas pensando nelardquo

Mas contavam que o povo faminto chegou a Versailles e ela estava tatildeo alheia agraves verdadeiras necessidades do po-vo que disse ldquoEntatildeo se vocecircs natildeo tecircm patildeo comam brio-cherdquo E ela nem sabia bem que brioche era mais caro que o patildeo porque problema de dinheiro natildeo existia para ela Entatildeo deu um conselho que provava mdash assim diziam mdash como ela vivia alheia ao sofrimento do povo

Eu me lembro de ainda pequeno perguntando para Dona Lucilia

mdash Mas mamatildee o que eacute briochemdash Uns bolinhos excelentesNatildeo cheguei a me perguntar por que ela natildeo fazia

brioche para eu comer Ateacute laacute a gula natildeo chegouhellip Mas vejam a provaccedilatildeo para uma crianccedila que ainda natildeo sabe o que eacute brioche

ldquoEntatildeo as pessoas bonitas alinhadas estiladas supe-riores natildeo tecircm coraccedilatildeo porque seguem demais regras e se endurecem com essas regras Por que seguir a regra endurece e cega para a compaixatildeo com os que natildeo con-seguiram seguir a regra Entatildeo seguir as regras eacute maurdquo

Minha resposta interior

ldquoNatildeo pode ser Porque entre bem e bem natildeo pode ha-ver incompatibilidaderdquo

A doutrina natildeo eacute o ponto de partida mas o de chegada

A importacircncia que dou ao raciociacutenio faz com que eu natildeo considere nada por acabado se natildeo foi raciocinado Porque todo esse processo de intuiccedilatildeo tem que chegar a raciociacutenios que provem ou natildeo provem aquilo que foi an-tes intuiacutedo apalpado pressentido

Podem entatildeo imaginar o meu encantamento lendo o ldquoTratado de Direito Naturalrdquo de Taparelli drsquoAzeglio o ldquoTratado de Sociologia Catoacutelicardquo de Albeacuteric Belliot um franciscano enfim uma flotilha de coisas que eu li e me provaram por exemplo a legitimidade do direito de pro-priedade que era uma coisa instintiva mas cuja legitimi-dade eu apanhei aiacute

Quando vi que o direito de propriedade a instituiccedilatildeo da famiacutelia a indissolubilidade do viacutenculo matrimonial a autoridade paterna mdash cuja liceidade era intuiacuteda por mim mdash se baseavam num raciociacutenio claro liacutempido perfeito tive um entusiasmo enorme

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Ostensoacuterio da Igreja de Santa Maria - Cracoacutevia Polocircnia

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Isso deu ao meu pensamento uma estrutura que veio depois de mil apalpaccedilotildees

Essa eacute uma caracteriacutestica do meu espiacuterito natildeo come-ccedilar por ler a doutrina mas por pegar a realidade Depois de ter intuiacutedo na realidade ir ver a doutrina E aiacute ter um contentamento um gaacuteudio enorme

Estou longe de ser daqueles que julgam dever prescin-dir da doutrina mas a questatildeo eacute que para muitos a dou-trina eacute o ponto de partida e na conformaccedilatildeo do meu espiacuterito eacute o ponto de chegada

Todas essas coisas com o tempo acabam for-mando um depoacutesito primeiro de impressotildees maturadas para raciocinar E enquanto jaacute vou raciocinando algumas de minhas im-pressotildees continuo a maturar ou explici-tar outras Entatildeo noacutes poderiacuteamos dizer que esse processo eacute

Primeiro observar captando e classificando subconscientemente

Segundo estabelecendo oposiccedilotildees e come-ccedilando por aiacute a explicitaccedilatildeo

Terceiro fazer os primeiros raciociacutenios que constituem pontas de trilho para que daiacute para diante em contato com qualquer coisa nova o processo in-teiro vai se movendo

Concepccedilatildeo sacral da vida

Isso forma inclusive o pro-gresso na vida espiritual

Por exemplo a noccedilatildeo de sacralidade no comeccedilo eacute muito mais viacutevida em re-laccedilatildeo agrave Igreja Depois me-nos em referecircncia agrave au-toridade paterna dentro da famiacutelia como entida-de toda ela sacral num certo sentido especial da palavra ldquosacralrdquo E tambeacutem em relaccedilatildeo ao mi-to monaacuterquico dentro do Es-tado que pode ser sacral se o indiviacuteduo qui-ser vecirc-lo assim oferececirc-lo agrave Igreja e pedir as becircnccedilatildeos dela a fim de sacralizaacute-lo

Isso acaba dando lugar a uma noccedilatildeo de sacralidade adequada agraves coisas temporais que eacute um desdobramento da noccedilatildeo do sacral mdash proacutepria das coisas estritamente espiritu-ais e sobrenaturais mdash e formando no espiacuterito vaacuterios degraus e modos de ser da sacralidade

cujo auge sempre me pareceu como sendo a Consagraccedilatildeo durante a Missa mais do que a minha Comunhatildeo

Agora uma coisa que eacute pessoal sou mais sensiacutevel agrave sacralidade do ato da Consagraccedilatildeo enquanto conside-rado na Consagraccedilatildeo do vinho e a apresentaccedilatildeo do caacuteli-ce para o povo adorar do que na Consagraccedilatildeo do patildeo e a apresentaccedilatildeo para ser adorado

Eu tinha a impressatildeo mdash que soube depois natildeo cor-responder agrave realidade mdash de que a transubstan-

ciaccedilatildeo se dava no momento da elevaccedilatildeo E daiacute aquele respeito e aquela veneraccedilatildeo

Porque nos fieacuteis haacute um redobrar de res-peito e veneraccedilatildeo quando o Santiacutessi-mo eacute elevado Compreende-se por-que eacute exposto para eles adorarem en-

tatildeo fazerem um ato interior que corres-ponde a essa exposiccedilatildeo Mas eu achava

que era porque a transubstanciaccedilatildeo estava se dando naquele momento

A forma material do caacutelice eacute tatildeo evo-cativa do que eacute o oferecimento da sacra-

lidade Uma alma que se oferece ou oferece alguma coisa de dentro de

si eacute tatildeo bem representada por um caacutelice que se abre e que daacute tudo

o que tem Por outro lado o vi-nho eacute tatildeo mais parecido com

o sangue do que o patildeo o eacute com o corpo que tudo isso me dava mais sen-saccedilatildeo mdash puramente fiacute-sica e analoacutegica mdash de sacralidade

A simples presen-ccedila do Santiacutessimo Sa-cramento exposto me dava uma sensaccedilatildeo de sacralidade colos-sal Muito mais do que o Santiacutessimo guarda-do na capela-mor Po-der chegar perto drsquoEle adoraacute-Lo produz em

mim impressotildees de sa-cralidade que eu acho que

possuem qualquer coisa de miacutestico muito maiores do

que as que se tecircm em contato com a sociedade temporal

Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus - Igreja Imaculada Conceiccedilatildeo Goa Iacutendia

Gus

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Mas por esse progresso de alma de que estou falan-do a pessoa vai compreendendo que em formas termos e modos diferentes a sociedade temporal inteira acaba tendo qualquer coisa de sacral E entatildeo uma concep-ccedilatildeo toda ela sacral da vida vai se maturando lentamente ao longo das deacutecadas para depois fazer uma confericcedilatildeo com os autores especializados

Porque a palavra definitiva eacute deles Eles representam a Igreja que eacute infaliacutevel e portanto vamos ouvir o que a Santa Matildee Igreja ensina a esse respeito E ensina na for-ccedila da palavra ldquoensinarrdquo quer dizer ela eacute a Mestra infaliacute-vel eu sou o aluno bobo que posso ter feito um engano e apresento a ela aquilo que pensei

No princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Eacute um processo que em certo momento entra numa apa-rente estagnaccedilatildeo e continua a elaboraccedilatildeo em profundidade De maneira que quem me conhece haacute muito tempo eacute pos-siacutevel que tenha tido ideia de que em algumas coisas eu es-tou me repetindo indefinidamente Mas se forem examinar de perto notaratildeo que tem sempre alguma coisinha nova que corresponde em profundidade a esse processo lento

Mas isso levanta um problema Esse natildeo eacute mdash em suas linhas gerais natildeo nos seus pormenores mdash o proacuteprio meacute-todo de pensar legiacutetimo do espiacuterito humano

Vamos formular a coisa assim O primeiro livro foi escrito por um homem que natildeo teve livros Entatildeo a cultura nasceu de um pensamento anterior ao livro Logo no processo in-telectual no princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Entatildeo eu volto ao ponto de partidaO unum eacute o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus de uma ma-

jestade infinita doccedilura infinita sabedoria infinita de um poder infinito e de uma bondade infinita para dizer soacute alguns atributos Tudo isso eacute uma siacutentese para chegar ateacute Ele compreendecirc-Lo

A teoria geral das vaacuterias formas de crescimento de desen-volvimento que apresentei no comeccedilo da reuniatildeo parece natildeo ter relaccedilatildeo alguma com Ele Mas no fundo eacute a Ele que visa-mos Ele eacute o alfa e o ocircmega o unum eacute Ele Ele eacute o comeccedilo e o fim de tudo E se de algum modo todas essas reflexotildees natildeo vi-sassem o melhor conhecimento drsquoEle natildeo teriam valor

Numa conversa os espiacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical

Em toda essa teoria a conversa tem um papel enor-me porque ela no fundo requer certo discernimento dos espiacuteritos e uma percepccedilatildeo do que conveacutem ou natildeo ser dito Quando natildeo conveacutem deve-se ter o suficiente desa-pego para natildeo tratar

Muita gente conversa sobre aquilo que tem vontade de conversar Isso eacute a morte da conversaccedilatildeo A conver-sa boa nem eacute sobre aquilo que tenho ou meu interlocu-tor tem vontade de conversar mas sim tratar daquilo em que noacutes dois podemos igualmente gostar de conversar O resto eacute a morte da conversaccedilatildeo

Agrave medida que uma conversa estaacute bem travada os es-piacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical E quando se entendem bem vatildeo mudando de tema igual-mente muito mais por apetecircncias do que por nexos loacutegi-cos Entra em algo o nexo loacutegico mas satildeo nexos psicoloacute-gicos mudanccedilas de temas vizinhos que vatildeo fazendo com que as duas pessoas gostem das mesmas coisas Entatildeo a conversa aiacute se torna deliciosa

Eacute mais ou menos como por exemplo duas pessoas que passeiam juntas no centro de Roma a caminho das catacumbas Passam por uma loja qualquer que tem gra-vatas bonitas os dois estatildeo precisando comprar gravatas param olham gostam conversam Depois transitam em frente a uma confeitaria e comem algum doce E assim chegam agrave catacumba

A conversa soacute pega mesmo mdash ao menos eacute a impressatildeo que eu tenho mdash quando na pontinha do que estaacute sendo con-versado haacute qualquer coisa que eacute uma graccedila de Deus sobre alguma coisa de transcendente maravilhoso que por uma pontinha de consolaccedilatildeo sensiacutevel ambos estatildeo sentindo

Pode ser o unum ou natildeo Pode ser uma consolaccedilatildeo que todos tecircm juntos sobre um ponto que Nossa Senho-ra quer glorificar Entatildeo a conversa em geral tem um fundinho comum de supremo E quanto mais esse fundi-nho eacute sentido por todos mais a conversa eacute animada

Donde se tira uma conclusatildeo linda o principal inter-locutor eacute o Interlocutor Divino presente em nossa con-versa falando dentro das nossas almas e elogiando-se a Si proacuteprio por nossos laacutebios

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece

Isso daacute uma elevaccedilatildeo ao conceito de conversa em que Deus estaacute sempre presente natildeo soacute mdash e jaacute eacute muito mdash atra-veacutes da Feacute mas tambeacutem no fundo por alguma coisa comu-nicada diretamente pela graccedila que se torna sensiacutevel e cau-sa alegria Esse eacute o sal da conversa e que a Providecircncia daacute quando quer Eacute certa forma de sensiacutevel Natildeo eacute uma mera troca de ideias teoacuterica mas algo que vai mais alto

Eu volto a dizer pasma mas eacute fato o Divino Interlo-cutor eacute propriamente Aquele que fala Ele fala pela boca de um responde pela boca de outro e Se alegra pelo co-raccedilatildeo de todos Eacute uma coisa muito bonita

Pode-se dar um fato parecido com esse na ordem me-ramente natural O exemplo mais caracteriacutestico disso eacute

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

Rep

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ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

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duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 4: Revista Doctor Plinio 207_201506

Editorial

C

A arte de conversar e o cacircntico dos

Bem-aventurados

4

omo seraacute a vida no Ceacuteu Que fazem eternamente os Anjos e os Bem-aventurados Existiraacute entre eles alguma forma de relacionamento ou a visatildeo de Deus os absorve por completo Satildeo essas algumas perguntas que costumam surgir quando se medita sobre as maravilhas do Para-

iacuteso CelesteA este respeito ensina-nos a Doutrina Catoacutelica que cada um dos Santos e dos espiacuteritos angeacutelicos

enquanto vecirc a Deus face a face comunica aos demais aquele aspecto do Altiacutessimo que lhe eacute dado contemplar Esta comunicaccedilatildeo muacutetua constitui um como que cacircntico das excelecircncias divinas um su-blime ato de louvor e adoraccedilatildeo

Para Dr Plinio este cacircntico celestial bem poderia ser comparado nesta Terra agrave boa conversa na qual os homens natildeo soacute se relacionam mas trocam ideias comentaacuterios percepccedilotildees pontos de vista e assim enriquecem o espiacuterito Por isso a conversa tem grande importacircncia para o bem viver

Entretanto cada vez mais nota-se na humanidade a extinccedilatildeo da arte de conversar Hoje ningueacutem se assombra ao encontrar uma famiacutelia cujos membros natildeo convivem entre si Caso se reuacutenam para uma festa de Natal por exemplo natildeo raro eacute que as pessoas prefiram estar agrave frente da televisatildeo ape-nas trocando uma palavra de vez em quando Os mais jovens hipnotizados pelo mundo virtual nem sequer piscam os olhos diante do computador ou dos cada vez mais multifuncionais aparelhos de ce-lular E o patriarca o avocirc que deveria atrair para si a atenccedilatildeo de todos contando interessantes his-toacuterias de seu passado egoisticamente mergulha no jornal pouco se importando com o que se pas-sa ao seu redor Analisando essa situaccedilatildeo tatildeo diferente do ambiente de sua infacircncia comentava cer-ta vez Dr Plinio

ldquoHouve um hiato uma queda um vaacutecuo entre a geraccedilatildeo dos meus avoacutes e a minha Aquela ainda conversava a dos meus pais se achava numa transiccedilatildeo e a dos seus filhos jaacute natildeo sabia fazecirc-lo Com muito pesar eu notava essa decadecircncia pois a conversa estimula a vontade de pensar e comunicar Ela eacute um intercacircmbio mental respirado tonificante e verdadeiramente humano um meio insubstituiacute-vel para viver pensarrdquo1

A conversa ldquonatildeo eacute apenas uma troca de informaccedilotildees nem de impressotildees mas tambeacutem de cogni-ccedilotildees muacutetuas dos interlocutores cujas personalidades se manifestam pelo olhar tom de voz gestos etc [] eacute um intercacircmbio de duas personalidades que falam sobre mateacuteria atraente e que interessa a ambas Seraacute ainda mais autecircntica se o meu interlocutor puser certa nota pessoal em suas palavras fazendo com que eu goste de ouvi-lo Isso eacute um elemento fundamental da conversardquo2 Numa conver-

5

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

sa as mentalidades se visitam e entram em harmoniosa consonacircncia evoluindo pouco a pouco co-mo uma melodia

Daiacute a analogia que pode ter uma conversa nesta Terra com o cacircntico dos Bem-aventurados no Reino dos Ceacuteus

A arte de conversar muito mais do que um ato social ou uma necessidade da natureza humana exige tambeacutem certo discernimento dos espiacuteritos e uma aguda percepccedilatildeo do ambiente e do interlocu-tor a fim de tornar-se agradaacutevel agravequele com quem se fala ldquoNa procura desse objetivo eacute preciso ter em vista que a arte de conversar supotildee uma primeira disposiccedilatildeo de espiacuterito sem a qual ela natildeo exis-te devemos nos interessar pelos outros para saber conversarrdquo3

ldquoObservando essa atitude cumpriremos na conversa a siacutentese de todos os Mandamentos amar a Deus sobre todas as coisas e ao proacuteximo como a si mesmo por amor a Deusrdquo4 deixando o campo meramente terreno e ingressando no celestial Por isso para Dr Plinio a conversa tem seu ponto de convergecircncia no Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e as mais frutuosas conversas satildeo aquelas em que o Divino Interlocutor faz-se presente5 ldquoA boa e verdadeira conversa deve brotar de pensamentos elevados daquilo que se meditou analisou quem natildeo cogita em assuntos elevados eacute incapaz de manter uma conversardquo6

ldquoQuando conversamos animados pelo amor de Deus e do proacuteximo o conviacutevio eacute agradaacutevel Do contraacuterio o trato seraacute detestaacutevel sem afabilidade marcado por um cunho revolucionaacuterio Pois ima-ginemos uma conversa com determinada pessoa em estado habitual de violar ao mesmo tempo to-dos os Mandamentos Ela mata rouba calunia etc O estar com essa pessoa se torna insuportaacutevel um pesadelo Natildeo haacute o que conversar com ela Por outro lado suponhamos um coloacutequio entre du-as pessoas que se esforccedilam por cumprir de modo exiacutemio os dez Mandamentos Eacute um Ceacuteu Sublime exemplo foi o ceacutelebre diaacutelogo de Santo Agostinho com Santa Mocircnica na hospedaria de Oacutestia Em suma a oacutetima conversa eacute aquela iluminada pelo Divino Espiacuterito Santo realizada aos peacutes da Santiacutes-sima Virgem em cujo Coraccedilatildeo vive Nosso Senhor Jesus Cristo O resto no fundo eacute fraude vaida-de e afliccedilatildeo de espiacuteritordquo7

Participando desse estado de espiacuterito as coisas mais comezinhas os fatos mais simples do dia a dia podem se tornar uma prece nos laacutebios daqueles que conversam e que natildeo deixam faltar em sua conversaccedilatildeo o transcendente o maravilhoso e a presenccedila divina Mesmo quando estes elementos estejam presentes de modo impliacutecito mdash e eacute o que se passa na maior parte das vezes mdash a conversa daacute-nos uma paacutelida ideia do cacircntico dos Bem-aventurados no Paraiacuteso

1) Conferecircncia de 5519792) Idem3) Conferecircncia de 14219874) Conferecircncia de 5519795) Ver paacuteginas 13 a 15 neste nuacutemero6) Revista Dr Plinio n 82 p 257) Conferecircncia de 551979

O

Dor e seriedade

6

Dona LuciLia

A seriedade causa dor mas o pior sofrimento eacute o produzido pela falta de seriedade a qual faz com que a pessoa se sinta

vazia sem ideias sem ideais sem vontade

sofrimento era algo tatildeo ligado agrave vida de Dona Lucilia e a todo o ser dela que eu em pequeno agraves vezes notava que ela estava sofrendo poreacutem

natildeo sabia por quecirc Ficava olhando para ela e contem-plando o sofrimento mas sem compreender o que a fa-zia sofrer

Pequenos sofrimentos que originavam um sofrimento global

Mais tarde quando me tornei um pouco mais velho fui compreendendo uma ou outra razatildeo de um ou outro sofri-mento Depois compreendi que os sofrimentos dela for-mavam um como que edifiacutecio Era um conjunto de razotildees que a faziam sofrer e que constituiacuteam um grande sofrimen-to global o qual era o sofrimento geral da vida dela En-tatildeo comecei a ter uma ideia global do que era o sofrimento

Quando pequeno eu notava sobretudo que mamatildee tinha restos de enfermidade devido agravequela operaccedilatildeo da vesiacutecula que ela fez na Alemanha em 1912 e percebia que tinha muita dificuldade em caminhar

Eu notava que agraves vezes meu pai voltava cedo do escri-toacuterio passava por casa pegava-a e saiacuteam os dois a fazerem uma volta a peacute Ele tendo terminado seu serviccedilo durante o dia contente com a tarefa com sauacutede e vida um homem muito feliz Ela uma pessoa na qual cada passo era uma dor ao mesmo tempo entendia que natildeo poderia irradiar seu sofrimento sobre o esposo ser uma causa contiacutenua de dores para ele Ela deveria fingir que natildeo estava sofren-do ou contar sorrindo ldquoHoje como estatildeo me doendo os peacutesrdquo e continuar a andar todos os dias a extensatildeo reco-mendada pelos meacutedicos Nunca terminar antes porque lhe estavam doendo muito porque essa extensatildeo era necessaacute-ria para habituar os peacutes ao esforccedilo adequado

O sofrimento produz a seriedade

Entatildeo eu percebia que mamatildee tinha uma compreen-satildeo muito profunda dessa situaccedilatildeo Ela sentia esse sofri-

mento e sentia na alma a dor que tem esta quando o cor-po sofre dor fiacutesica Natildeo eacute uma dor superficial mas uma dor profunda O corpo padece e a alma com isso sofre

Quando voltava para casa ela descansava e nesse mo-mento eu entendia tudo quanto sofrera durante o pas-seio porque sorrindo mamatildee se deitava numa espeacutecie de divatilde e ficava com os peacutes imobilizados ateacute que a dor passasse Ela agraves vezes gemia sorrindo entatildeo se forma-va uma roda de pessoas conversando coisas do dia e por amabilidade perguntavam-lhe

mdash Vocecirc estaacute melhor Luciliamdash Sim sim estou melhorandoEu estava vendo que era todo o dia a mesma coisa

natildeo acabava mais E compreendia bem que aquilo trazia para seu espiacuterito um reflexo que era a seriedade porque o sofrimento produz a seriedade

A pior dor que o homem pode ter natildeo eacute a causada pe-la seriedade eacute a produzida pela falta de seriedade Sen-tir-se natildeo seacuterio vazio sem ideias sem ideais sem querer nada sem dizer algo que valha qualquer coisa isto causa um sofrimento pior do que o pior dos sofrimentos

Um dos melhores dons que Deus pode dar a uma crianccedila eacute o sofrimento Natildeo nos queixemos portanto dos sofrimentos que tenhamos tido Pelo contraacuterio agra-deccedilamos a Nossa Senhora e compreendamos que Ela assim nos destinou para a seriedade

Atitudes das pessoas perante a Primeira Guerra Mundial

Pouco tempo depois desses primeiros fatos da minha infacircncia terem se passado arrebentou a Guerra Mun-dial Entendi mais ou menos o que era essa guerra mas tinha a noccedilatildeo da distacircncia enorme que havia entre o Brasil e a Europa Portanto era impossiacutevel que a guer-ra chegasse ateacute aqui enquanto a Europa passava por to-do aquele sofrimento no Brasil havia a boa vida tranqui-la e folgada o Brasil natildeo entraria em guerra e por isso as pessoas aqui gostavam de celebrar a tranquilidade bra-

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sileira Natildeo soacute apreciavam isso os brasilei-ros mas os estrangeiros oriundos de pa-iacuteses que estavam na conflagraccedilatildeo mas que tinham vindo para o Brasil antes da guerra Eles tinham pais irmatildeos filhos netos metidos na conflagra-ccedilatildeo Isso lhes interessava mas so-bretudo o que eles possuiacuteam era um bem-estar de pessoalmente natildeo participar da guerra

Quando chegava a tardinha era frequente verem-se nas ruas da Satildeo Paulinho rodas formadas na calccedilada por famiacutelias de imigran-tes As donas de casa faziam pratos do tempo em que viviam em seus pa-iacuteses de origem os homens conversa-vam davam risadas as crianccedilas brinca-vam todos se preparando para comer e depois comendo valorosamente comentando como era bom eles natildeo estarem na guerra

Comecei a observar isso e percebi que havia duas ati-tudes perante a conflagraccedilatildeo uma a daqueles a quem era sobretudo agradaacutevel estar longe dela a outra a dos que admiravam a guerra compreendiam sua beleza Es-tes uacuteltimos natildeo podiam ir agrave guerra porque tinham com-promissos aqui no Brasil para manter a famiacutelia se eles fossem poderiam morrer e a famiacutelia ficava abandonada Mas acompanhavam os jornais com o espiacuterito de lutado-res seu paiacutes avanccedilou ou recuou os aliados deles avanccedila-ram ou recuaram os meios de destruiccedilatildeo se acentuaram Aparece o aeroplano entatildeo o grande perigo satildeo os voos Depois surgem os gases asfixiantes os bombardeios em massa das grandes cidades E no fim coisa talvez pior do que tudo as epidemias que contagiavam agraves vezes um pa-iacutes inteiro e que constituiacuteam uma tristeza uma coisa hor-riacutevel

Atrozes ferimentos causados pela conflagraccedilatildeo

Eu tive uma governanta austriacuteaca que era solteira e ofereceu-se para durante o dia trabalhar num hospital de feridos de guerra

Ela disse que os ferimentos eram atrozes Por exem-plo um jovem que tinha ido para combater e voltou com um ferimento que de si natildeo era mortal mas ele natildeo podia falar porque um projeacutetil lhe arrancara o queixo Quando ele precisava de alguma coisa tocava uma sine-ta e escrevia com letra trecircmula de algueacutem que estaacute gra-vemente doente aquilo de que precisava Agraves vezes natildeo conseguia escrever por inteiro deixava cair sobre a cama

a caneta e o papel e ficava esperando um momento em que um pouquinho mais de

forccedila lhe permitisse fazer o pedidoMinha governanta contava que

pelo regulamento do hospital as enfermeiras tinham horaacuterios de-terminados para descansar por-que se elas ficassem doentes tam-beacutem o hospital tornava-se ino-perante As enfermeiras precisa-vam ter uma defesa contra a epi-demia entatildeo o hospital manda-va-as repousar Mas quando mi-

nha governanta estava descansan-do e se lembrava de que talvez o

homem sem queixo precisasse de al-guma coisa ela se levantava agraves escon-

didas e ia verificar se ele queria algo Quem censuraria uma atitude como essa

Soacute poderia aplaudir Mas que condiccedilotildees de vida que horrores que monstruosidades

Reflexatildeo sobre o magniacutefico tema da dor

Tudo isso representava o sofrimento e eu notava que Dona Lucilia tinha em face desses fatos uma atitude muito mais pensativa e mais seacuteria do que as outras pes-soas Estas comentavam como ela as notiacutecias que os jor-nais publicavam por vezes com sensacionalismo que im-pressionava muito o puacuteblico eacute natural

Por exemplo acabava o almoccedilo de domingo todos se espalhavam pela sala de jantar e comeccedilavam a conversar sobre esses assuntos Lembro-me ateacute hoje de que quan-do um velho reloacutegio de parede com um bonito som marcava duas horas da tarde havia sempre um espiacuterito mais leviano e superficial que dizia com uma voz que do-minava a todos ldquoMeus caros agora chegou a vez de nos divertirmos Vocecirc vai para onde E vocecirc Vamos fazer os nossos programasrdquo Entatildeo uns iam passear nos arredo-res da cidade outros faziam visitas enfim essa vida leve dos domingos

Eu percebia que Dona Lucilia acompanhava mas que o espiacuterito dela ia para a compaixatildeo por aqueles que ti-nham sofrido fazia oraccedilatildeo por eles para Nossa Senhora aliviar ou ateacute para evitar esse sofrimento Mas sobretu-do fazia a reflexatildeo sobre o grande o nobre o magniacutefico tema da dor E dentro deste tema outro ainda mais bo-nito o heroiacutesmo a coragem

Isto ia formando a alma de um menino   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2671995)

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Divino InterlocutorEm sua concepccedilatildeo sacral da existecircncia no processo de seu pensamento e ateacute na elaboraccedilatildeo de uma arte de conversar

Dr Plinio tinha como fonte de inspiraccedilatildeo e ponto de convergecircncia o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

U m tema que daria para um estudo muito in-teressante eacute a exposiccedilatildeo analiacutetica de todos os modos pelos quais as coisas na Criaccedilatildeo cres-

cem Elas tecircm modos diferentes de crescer e de evoluir para chegar ateacute a morte e nesta haacute tambeacutem um proces-so que natildeo eacute sempre anaacutelogo Entatildeo haacute o crescimento depois uma fase de expansatildeo e o deperecimento

Iniacutecio expansatildeo e morte

E isso eacute tatildeo diferente nas vaacuterias espeacutecies de vegetais e em cada planta em particular Eacute diverso nos bichos e nas velocidades materiais E tambeacutem em todo o processo de pensamento e de desenvolvimento do homem

Nesse crescer expandir-se e morrer Deus Nosso Senhor fez um verdadeiro jogo de maravilhas que evidentemente as pessoas que cul-tuam a natureza natildeo se datildeo o tra-balho de apreciar Porque isso su-potildee um miacutenimo de pensamento de contemplaccedilatildeo e de meditaccedilatildeo E es-se tipo de meditaccedilatildeo em geral elas natildeo querem fazer

Tudo isso mdash nas plantas nos ani-mais e nas velocidades materiais mdash eacute simboacutelico de um modo ou de ou-tro do processo do homem eacute sim-boacutelico da vida terrena de Nosso Se-nhor e da trajetoacuteria da Histoacuteria do curso dos acontecimentos

Ateacute mesmo certas coisas que satildeo feitas para matar e natildeo para vi-ver mdash por exemplo uma batalha mdash tecircm seu comeccedilo seu crescimento

depois seu murchamento e caem Um dos aspectos boni-tos desse estudo eacute a questatildeo dos recrudescimentos quais satildeo suas origens que forccedilas tecircm como se faz um recru-descimento Soacute o tema dos recrudescimentos daria pa-ra uma doutrina interessantiacutessima da Contra-Revoluccedilatildeo

Ateacute os fogos de artifiacutecio podem ter uma trajetoacuteria muito bonita nesse sentido

Um universo de belezas

Uma das coisas que eu gosto de apreciar no mar eacute exa-tamente o nascimento da onda depois o sistema de on-das quando elas arrebentam ou expiram na praia

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Tambeacutem a ilusoacuteria perpetuidade da calmariahellip Co-mo dentro da calmaria o primeiro elementozinho indica uma mudanccedila completa das coisas que vatildeo se acumulan-do Eacute um processo muito bonito

Isto tudo eacute uma verdadeira maravilha que depois tem sua transposiccedilatildeo para os processos poliacuteticos para a histoacute-ria das instituiccedilotildees das correntes de espiritualidade etc

Haacute um universo de belezas aiacute que ao homem foi da-do contemplar com olho raacutepido furtivo e atento porque natildeo tem tempo para pensar nisso Mas que eacute uma coisa lindiacutessima

Por exemplo haacute mortes que satildeo como um Amazonas desembocando na eternidade quase que empurra a eter-nidade um pouco para fora Mas existem outras mortes como um riozinho pequenininho humildezinho que vai dar diretamente no mar e se perde envergonhadinho com um sussurro que o mar incorpora a sihellip

Haacute uma porccedilatildeo de coisas bonitas interessantes para ver dentro disso E isso se aplica muito agrave histoacuteria de um homem

Por temperamento sou muito estaacutevel e gosto das coi-sas estaacuteveis que duram na calmaria

Natildeo concebo o Ceacuteu num perpeacutetuo movimento mas com diferentes modos de ser da estabilidade Natildeo eacute a ins-tabilidade eacute a mutaccedilatildeo dentro da estabilidade

Processo de pensamento de Dr Plinio

Todas as doutrinas e temas mdash portanto tambeacutem o conceito de sacralidade mdash tecircm um modo de se desenvol-ver peculiar de cada indiviacuteduo Em mim essa peculiari-dade eacute assim

Primeiro um nascimento cheio de intuiccedilotildees de gra-ccedilas ultra-alcandorado em que entra de um modo espe-cial uma visatildeo confusa do ultramaravilhoso e do ponto terminal bom do ponto supremo do auge e o encanta-mento por esse auge

Depois do auge bem visto e de dar a ele tudo quanto naquele estaacutegio da vida espiritual ele merece que se decirc entatildeo vem um periacuteodo de aparente estabilidade mas de fato eacute um periacuteodo em que se vai ldquocozinhandordquo lentamen-te a explicitaccedilatildeo

Ao mesmo tempo mdash eacute como se daacute concretamente co-migo mdash um periacuteodo de luta em que a explicitaccedilatildeo eacute aju-dada possantemente pela contestaccedilatildeo Porque aquele conhecimento confuso primeiro vem acompanhado de uma impliacutecita rejeiccedilatildeo do que natildeo eacute aquilo E quando al-gueacutem afirma o contraacuterio vem a repulsa

Na repulsa implicitamente fica mais conhecido aquilo que foi negado E ao mesmo tempo em que se prepara a apologeacutetica elabora-se a explicitaccedilatildeo A apologeacutetica e a explicitaccedilatildeo satildeo fenocircmenos reversiacuteveis um no outro De

maneira que eu me torno conhecedor das coisas por dois dados por uma espeacutecie de conaturalidade e por uma es-peacutecie de repulsa daquilo que eacute contraacuterio

Num determinado momento tudo o que se podia co-nhecer a respeito daquilo estaacute conhecido com os proacute-prios recursos e com a observaccedilatildeo concreta da vida Aiacute chega a hora da leitura Natildeo antes

Podem percorrer todos os livros de minha biblioteca e encontraratildeo sinais disso A leitura veio exatamente de-pois para ajudar esse processo dando mais informaccedilotildees fazendo com que a pessoa se situe ante o que diz o es-critor e portanto julgue eacute ldquosimrdquo eacute ldquonatildeordquo eacute ldquotalvezrdquo eacute ldquoconformerdquo etc

Depois de tudo isso feito haacute mais uma vez uma nova aparente estagnaccedilatildeo em que todos esses elementos re-colhidos satildeo objetos de uma nova siacutentese E vem uma vi-satildeo final que depois cresce pouco na aparecircncia mas que de fato tem muita intensidade E prepara o ato de amor terminal

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Eu natildeo sei se isso seraacute assim em outros Desconfio muito que natildeo e que varia muito de acordo com o cami-nho de Deus para cada pessoa

A inocecircncia eacute o princiacutepio da sabedoria

Graccedilas a Nossa Senhora haacute nesse processo muita ino-cecircncia Porque natildeo eacute soacute conhecendo a coisa em si mas eacute conferindo os dados externos com a inocecircncia A inocecircn-cia nesse sentido eacute um comeccedilar de sabedoria Ela cons-titui uma espeacutecie de ortodoxia

O que eu disse agora haacute um ano eu natildeo teria tatildeo cla-ro a ponto de explicitar neste momento estou explicitan-do com facilidade

Na aparecircncia isso em mim se encontrava parado mas de fato estava sendo preparada esta explicita-ccedilatildeo O que indica que havia uma accedilatildeo profunda mdash muito silenciosa tranquila discreta mas natildeo pouco ativa mdash para passar do uacuteltimo estaacutegio de um conhe-cimento confuso para o conhecimento inteiramente definido

Seria um crescimento contiacutenuo sob a forma de esta-bilidade mas na realidade trata-se de uma accedilatildeo em pro-fundidade Mais ou menos como o desenvolvimento da aacutervore jaacute crescida que natildeo cresce mais mas suga da ter-ra coisas que datildeo ao processo vital da aacutervore o meio de ir vivendo Examinando bem a aacutervore pode durante mui-to tempo ainda crescer em forccedila e em volume por esse processo

Entatildeo o conhecimento da transcendecircncia de Deus por exemplo depois de chegar a certo estaacutegio entra nes-sa fase de elaboraccedilatildeo profunda pouco perceptiva que de repente daacute um fruto muito mais sutil e melhor que eacute fazer as correlaccedilotildees entre os conjuntos que se tecircm na mente e daiacute nasce um determinado unum

E esse eacute o piacutencaro do processo intelectual e moral Porque esse piacutencaro jaacute eacute a primeira nota eacute a antiacutefona do cacircntico que noacutes devemos entoar no Ceacuteu

Procura do mundo dos possiacuteveis

Esse eacute o processo de conhecimento das coisas que po-deriam ou deveriam existir algumas das quais existem Por exemplo quando vejo um belo castelo Ele corres-ponde a ideias que todos tivemos na mente sobre um cas-telo inexistente Entatildeo minha primeira reflexatildeo eacute ldquoAqui estaacute o inexistente que eu procuravardquo

Muita coisa que parece estar no mero mundo dos possiacuteveis existe Eacute questatildeo de saber procurar Em uacutelti-ma anaacutelise se fosse bem ordenado o turismo perfeito se-ria uma procura pelo mundo dos possiacuteveis que a pessoa natildeo conheceu

Essa procura eacute um pouco o que vai dando acircnimo e movimentaccedilatildeo agrave vida O contraacuterio eacute o tipo de velho que no domingo agraves trecircs horas da tarde junto com sua espo-sa acabou de almoccedilar ele estaacute bem satisfeito e ela estaacute aliviada porque o marido almoccedilou bem e gostou da re-feiccedilatildeo Ele se senta numa cadeira e fica ruminando com desapontamento porque ele acha que natildeo haacute mais pos-siacuteveis

Propriamente a substacircncia dessa velhice mal concebi-da eacute crer pouco nos meramente possiacuteveis do Ceacuteu e achar que na Terra natildeo adianta conhececirc-los porque jaacute se viu que todas essas coisas fanam Entatildeo o velho fica sentado na cadeira ruminando sua bronquite Essa eacute a substacircncia desse conceito de velhice

Antigamente como a senhora mdash de modo habitual natildeo necessariamente mdash era melhor do que o homem ela ficava pensando um pouquinho no Ceacuteu e nas saudades do tempo que se foi

O homem pouco sujeito a saudades natildeo pensava no Ceacuteu mas de vez em quando o relacircmpago do Inferno lhe aparecia pela mente E isso o levava a fazer a sua Confis-satildeo e Comunhatildeo pascais Assim era a velhice

Havia uma casa mdash creio que natildeo existe mais mdash na es-quina da Rua Imaculada Conceiccedilatildeo com a Rua Martim Francisco1 Eu percebia pela conformaccedilatildeo do preacutedio

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Carcassone Franccedila

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que existiam muitos quartos de dormir vazios donde se deduz terem morado filhos ali que depois tinham se mu-dado e o casal residia sozinho

Eu entatildeo imaginava o velho e a velha possiacutevel no niacute-vel daquela residecircncia que era uma casa mediana Esse velho e essa velha eu os construiacutea de vaacuterios velhos e ve-lhas que tinha conhecido

Como a ideia da Contra-Revoluccedilatildeo foi elaborada no espiacuterito de Dr Plinio

Estou explicitando agora Mas a explicitaccedilatildeo eacute fruto de um trabalho lento que a mim me daacute a impressatildeo de que natildeo estou trabalhando mas simplesmente vivendo Eu diria que parei Mas de repente saio com uma en-xurrada de coisas que assim nunca pensei Eacute o lento tra-balho terminal que deve aprontar na mente

A Contra-Revoluccedilatildeo considerada no seu conjunto teve exatamente esse papel no meu espiacuterito

Primeiro formei impressotildees observei fatos tomei conhecimento pela leitura de alguns tantos aconteci-mentos histoacutericos e tambeacutem conheci muito pelas nar-raccedilotildees mais ou menos agrave Alexandre Dumas que circu-lavam no ambiente familiar a respeito desse ou daque-le caso

Por exemplo Maria Antonieta Na minha geraccedilatildeo o preconceito contra Maria Antonieta era uma coisa atroz ldquoMulher dura maacute traidora favorecia os austriacuteacos De uma beleza esplendorosa mdash era vista assim mdash que fazia com que todas as mulheres feias ficassem complexadas pensando nelardquo

Mas contavam que o povo faminto chegou a Versailles e ela estava tatildeo alheia agraves verdadeiras necessidades do po-vo que disse ldquoEntatildeo se vocecircs natildeo tecircm patildeo comam brio-cherdquo E ela nem sabia bem que brioche era mais caro que o patildeo porque problema de dinheiro natildeo existia para ela Entatildeo deu um conselho que provava mdash assim diziam mdash como ela vivia alheia ao sofrimento do povo

Eu me lembro de ainda pequeno perguntando para Dona Lucilia

mdash Mas mamatildee o que eacute briochemdash Uns bolinhos excelentesNatildeo cheguei a me perguntar por que ela natildeo fazia

brioche para eu comer Ateacute laacute a gula natildeo chegouhellip Mas vejam a provaccedilatildeo para uma crianccedila que ainda natildeo sabe o que eacute brioche

ldquoEntatildeo as pessoas bonitas alinhadas estiladas supe-riores natildeo tecircm coraccedilatildeo porque seguem demais regras e se endurecem com essas regras Por que seguir a regra endurece e cega para a compaixatildeo com os que natildeo con-seguiram seguir a regra Entatildeo seguir as regras eacute maurdquo

Minha resposta interior

ldquoNatildeo pode ser Porque entre bem e bem natildeo pode ha-ver incompatibilidaderdquo

A doutrina natildeo eacute o ponto de partida mas o de chegada

A importacircncia que dou ao raciociacutenio faz com que eu natildeo considere nada por acabado se natildeo foi raciocinado Porque todo esse processo de intuiccedilatildeo tem que chegar a raciociacutenios que provem ou natildeo provem aquilo que foi an-tes intuiacutedo apalpado pressentido

Podem entatildeo imaginar o meu encantamento lendo o ldquoTratado de Direito Naturalrdquo de Taparelli drsquoAzeglio o ldquoTratado de Sociologia Catoacutelicardquo de Albeacuteric Belliot um franciscano enfim uma flotilha de coisas que eu li e me provaram por exemplo a legitimidade do direito de pro-priedade que era uma coisa instintiva mas cuja legitimi-dade eu apanhei aiacute

Quando vi que o direito de propriedade a instituiccedilatildeo da famiacutelia a indissolubilidade do viacutenculo matrimonial a autoridade paterna mdash cuja liceidade era intuiacuteda por mim mdash se baseavam num raciociacutenio claro liacutempido perfeito tive um entusiasmo enorme

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Ostensoacuterio da Igreja de Santa Maria - Cracoacutevia Polocircnia

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Isso deu ao meu pensamento uma estrutura que veio depois de mil apalpaccedilotildees

Essa eacute uma caracteriacutestica do meu espiacuterito natildeo come-ccedilar por ler a doutrina mas por pegar a realidade Depois de ter intuiacutedo na realidade ir ver a doutrina E aiacute ter um contentamento um gaacuteudio enorme

Estou longe de ser daqueles que julgam dever prescin-dir da doutrina mas a questatildeo eacute que para muitos a dou-trina eacute o ponto de partida e na conformaccedilatildeo do meu espiacuterito eacute o ponto de chegada

Todas essas coisas com o tempo acabam for-mando um depoacutesito primeiro de impressotildees maturadas para raciocinar E enquanto jaacute vou raciocinando algumas de minhas im-pressotildees continuo a maturar ou explici-tar outras Entatildeo noacutes poderiacuteamos dizer que esse processo eacute

Primeiro observar captando e classificando subconscientemente

Segundo estabelecendo oposiccedilotildees e come-ccedilando por aiacute a explicitaccedilatildeo

Terceiro fazer os primeiros raciociacutenios que constituem pontas de trilho para que daiacute para diante em contato com qualquer coisa nova o processo in-teiro vai se movendo

Concepccedilatildeo sacral da vida

Isso forma inclusive o pro-gresso na vida espiritual

Por exemplo a noccedilatildeo de sacralidade no comeccedilo eacute muito mais viacutevida em re-laccedilatildeo agrave Igreja Depois me-nos em referecircncia agrave au-toridade paterna dentro da famiacutelia como entida-de toda ela sacral num certo sentido especial da palavra ldquosacralrdquo E tambeacutem em relaccedilatildeo ao mi-to monaacuterquico dentro do Es-tado que pode ser sacral se o indiviacuteduo qui-ser vecirc-lo assim oferececirc-lo agrave Igreja e pedir as becircnccedilatildeos dela a fim de sacralizaacute-lo

Isso acaba dando lugar a uma noccedilatildeo de sacralidade adequada agraves coisas temporais que eacute um desdobramento da noccedilatildeo do sacral mdash proacutepria das coisas estritamente espiritu-ais e sobrenaturais mdash e formando no espiacuterito vaacuterios degraus e modos de ser da sacralidade

cujo auge sempre me pareceu como sendo a Consagraccedilatildeo durante a Missa mais do que a minha Comunhatildeo

Agora uma coisa que eacute pessoal sou mais sensiacutevel agrave sacralidade do ato da Consagraccedilatildeo enquanto conside-rado na Consagraccedilatildeo do vinho e a apresentaccedilatildeo do caacuteli-ce para o povo adorar do que na Consagraccedilatildeo do patildeo e a apresentaccedilatildeo para ser adorado

Eu tinha a impressatildeo mdash que soube depois natildeo cor-responder agrave realidade mdash de que a transubstan-

ciaccedilatildeo se dava no momento da elevaccedilatildeo E daiacute aquele respeito e aquela veneraccedilatildeo

Porque nos fieacuteis haacute um redobrar de res-peito e veneraccedilatildeo quando o Santiacutessi-mo eacute elevado Compreende-se por-que eacute exposto para eles adorarem en-

tatildeo fazerem um ato interior que corres-ponde a essa exposiccedilatildeo Mas eu achava

que era porque a transubstanciaccedilatildeo estava se dando naquele momento

A forma material do caacutelice eacute tatildeo evo-cativa do que eacute o oferecimento da sacra-

lidade Uma alma que se oferece ou oferece alguma coisa de dentro de

si eacute tatildeo bem representada por um caacutelice que se abre e que daacute tudo

o que tem Por outro lado o vi-nho eacute tatildeo mais parecido com

o sangue do que o patildeo o eacute com o corpo que tudo isso me dava mais sen-saccedilatildeo mdash puramente fiacute-sica e analoacutegica mdash de sacralidade

A simples presen-ccedila do Santiacutessimo Sa-cramento exposto me dava uma sensaccedilatildeo de sacralidade colos-sal Muito mais do que o Santiacutessimo guarda-do na capela-mor Po-der chegar perto drsquoEle adoraacute-Lo produz em

mim impressotildees de sa-cralidade que eu acho que

possuem qualquer coisa de miacutestico muito maiores do

que as que se tecircm em contato com a sociedade temporal

Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus - Igreja Imaculada Conceiccedilatildeo Goa Iacutendia

Gus

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Mas por esse progresso de alma de que estou falan-do a pessoa vai compreendendo que em formas termos e modos diferentes a sociedade temporal inteira acaba tendo qualquer coisa de sacral E entatildeo uma concep-ccedilatildeo toda ela sacral da vida vai se maturando lentamente ao longo das deacutecadas para depois fazer uma confericcedilatildeo com os autores especializados

Porque a palavra definitiva eacute deles Eles representam a Igreja que eacute infaliacutevel e portanto vamos ouvir o que a Santa Matildee Igreja ensina a esse respeito E ensina na for-ccedila da palavra ldquoensinarrdquo quer dizer ela eacute a Mestra infaliacute-vel eu sou o aluno bobo que posso ter feito um engano e apresento a ela aquilo que pensei

No princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Eacute um processo que em certo momento entra numa apa-rente estagnaccedilatildeo e continua a elaboraccedilatildeo em profundidade De maneira que quem me conhece haacute muito tempo eacute pos-siacutevel que tenha tido ideia de que em algumas coisas eu es-tou me repetindo indefinidamente Mas se forem examinar de perto notaratildeo que tem sempre alguma coisinha nova que corresponde em profundidade a esse processo lento

Mas isso levanta um problema Esse natildeo eacute mdash em suas linhas gerais natildeo nos seus pormenores mdash o proacuteprio meacute-todo de pensar legiacutetimo do espiacuterito humano

Vamos formular a coisa assim O primeiro livro foi escrito por um homem que natildeo teve livros Entatildeo a cultura nasceu de um pensamento anterior ao livro Logo no processo in-telectual no princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Entatildeo eu volto ao ponto de partidaO unum eacute o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus de uma ma-

jestade infinita doccedilura infinita sabedoria infinita de um poder infinito e de uma bondade infinita para dizer soacute alguns atributos Tudo isso eacute uma siacutentese para chegar ateacute Ele compreendecirc-Lo

A teoria geral das vaacuterias formas de crescimento de desen-volvimento que apresentei no comeccedilo da reuniatildeo parece natildeo ter relaccedilatildeo alguma com Ele Mas no fundo eacute a Ele que visa-mos Ele eacute o alfa e o ocircmega o unum eacute Ele Ele eacute o comeccedilo e o fim de tudo E se de algum modo todas essas reflexotildees natildeo vi-sassem o melhor conhecimento drsquoEle natildeo teriam valor

Numa conversa os espiacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical

Em toda essa teoria a conversa tem um papel enor-me porque ela no fundo requer certo discernimento dos espiacuteritos e uma percepccedilatildeo do que conveacutem ou natildeo ser dito Quando natildeo conveacutem deve-se ter o suficiente desa-pego para natildeo tratar

Muita gente conversa sobre aquilo que tem vontade de conversar Isso eacute a morte da conversaccedilatildeo A conver-sa boa nem eacute sobre aquilo que tenho ou meu interlocu-tor tem vontade de conversar mas sim tratar daquilo em que noacutes dois podemos igualmente gostar de conversar O resto eacute a morte da conversaccedilatildeo

Agrave medida que uma conversa estaacute bem travada os es-piacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical E quando se entendem bem vatildeo mudando de tema igual-mente muito mais por apetecircncias do que por nexos loacutegi-cos Entra em algo o nexo loacutegico mas satildeo nexos psicoloacute-gicos mudanccedilas de temas vizinhos que vatildeo fazendo com que as duas pessoas gostem das mesmas coisas Entatildeo a conversa aiacute se torna deliciosa

Eacute mais ou menos como por exemplo duas pessoas que passeiam juntas no centro de Roma a caminho das catacumbas Passam por uma loja qualquer que tem gra-vatas bonitas os dois estatildeo precisando comprar gravatas param olham gostam conversam Depois transitam em frente a uma confeitaria e comem algum doce E assim chegam agrave catacumba

A conversa soacute pega mesmo mdash ao menos eacute a impressatildeo que eu tenho mdash quando na pontinha do que estaacute sendo con-versado haacute qualquer coisa que eacute uma graccedila de Deus sobre alguma coisa de transcendente maravilhoso que por uma pontinha de consolaccedilatildeo sensiacutevel ambos estatildeo sentindo

Pode ser o unum ou natildeo Pode ser uma consolaccedilatildeo que todos tecircm juntos sobre um ponto que Nossa Senho-ra quer glorificar Entatildeo a conversa em geral tem um fundinho comum de supremo E quanto mais esse fundi-nho eacute sentido por todos mais a conversa eacute animada

Donde se tira uma conclusatildeo linda o principal inter-locutor eacute o Interlocutor Divino presente em nossa con-versa falando dentro das nossas almas e elogiando-se a Si proacuteprio por nossos laacutebios

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece

Isso daacute uma elevaccedilatildeo ao conceito de conversa em que Deus estaacute sempre presente natildeo soacute mdash e jaacute eacute muito mdash atra-veacutes da Feacute mas tambeacutem no fundo por alguma coisa comu-nicada diretamente pela graccedila que se torna sensiacutevel e cau-sa alegria Esse eacute o sal da conversa e que a Providecircncia daacute quando quer Eacute certa forma de sensiacutevel Natildeo eacute uma mera troca de ideias teoacuterica mas algo que vai mais alto

Eu volto a dizer pasma mas eacute fato o Divino Interlo-cutor eacute propriamente Aquele que fala Ele fala pela boca de um responde pela boca de outro e Se alegra pelo co-raccedilatildeo de todos Eacute uma coisa muito bonita

Pode-se dar um fato parecido com esse na ordem me-ramente natural O exemplo mais caracteriacutestico disso eacute

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

Rep

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ccedilatildeo

ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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30)

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

Ric

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C 3

0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

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duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 5: Revista Doctor Plinio 207_201506

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Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

sa as mentalidades se visitam e entram em harmoniosa consonacircncia evoluindo pouco a pouco co-mo uma melodia

Daiacute a analogia que pode ter uma conversa nesta Terra com o cacircntico dos Bem-aventurados no Reino dos Ceacuteus

A arte de conversar muito mais do que um ato social ou uma necessidade da natureza humana exige tambeacutem certo discernimento dos espiacuteritos e uma aguda percepccedilatildeo do ambiente e do interlocu-tor a fim de tornar-se agradaacutevel agravequele com quem se fala ldquoNa procura desse objetivo eacute preciso ter em vista que a arte de conversar supotildee uma primeira disposiccedilatildeo de espiacuterito sem a qual ela natildeo exis-te devemos nos interessar pelos outros para saber conversarrdquo3

ldquoObservando essa atitude cumpriremos na conversa a siacutentese de todos os Mandamentos amar a Deus sobre todas as coisas e ao proacuteximo como a si mesmo por amor a Deusrdquo4 deixando o campo meramente terreno e ingressando no celestial Por isso para Dr Plinio a conversa tem seu ponto de convergecircncia no Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e as mais frutuosas conversas satildeo aquelas em que o Divino Interlocutor faz-se presente5 ldquoA boa e verdadeira conversa deve brotar de pensamentos elevados daquilo que se meditou analisou quem natildeo cogita em assuntos elevados eacute incapaz de manter uma conversardquo6

ldquoQuando conversamos animados pelo amor de Deus e do proacuteximo o conviacutevio eacute agradaacutevel Do contraacuterio o trato seraacute detestaacutevel sem afabilidade marcado por um cunho revolucionaacuterio Pois ima-ginemos uma conversa com determinada pessoa em estado habitual de violar ao mesmo tempo to-dos os Mandamentos Ela mata rouba calunia etc O estar com essa pessoa se torna insuportaacutevel um pesadelo Natildeo haacute o que conversar com ela Por outro lado suponhamos um coloacutequio entre du-as pessoas que se esforccedilam por cumprir de modo exiacutemio os dez Mandamentos Eacute um Ceacuteu Sublime exemplo foi o ceacutelebre diaacutelogo de Santo Agostinho com Santa Mocircnica na hospedaria de Oacutestia Em suma a oacutetima conversa eacute aquela iluminada pelo Divino Espiacuterito Santo realizada aos peacutes da Santiacutes-sima Virgem em cujo Coraccedilatildeo vive Nosso Senhor Jesus Cristo O resto no fundo eacute fraude vaida-de e afliccedilatildeo de espiacuteritordquo7

Participando desse estado de espiacuterito as coisas mais comezinhas os fatos mais simples do dia a dia podem se tornar uma prece nos laacutebios daqueles que conversam e que natildeo deixam faltar em sua conversaccedilatildeo o transcendente o maravilhoso e a presenccedila divina Mesmo quando estes elementos estejam presentes de modo impliacutecito mdash e eacute o que se passa na maior parte das vezes mdash a conversa daacute-nos uma paacutelida ideia do cacircntico dos Bem-aventurados no Paraiacuteso

1) Conferecircncia de 5519792) Idem3) Conferecircncia de 14219874) Conferecircncia de 5519795) Ver paacuteginas 13 a 15 neste nuacutemero6) Revista Dr Plinio n 82 p 257) Conferecircncia de 551979

O

Dor e seriedade

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Dona LuciLia

A seriedade causa dor mas o pior sofrimento eacute o produzido pela falta de seriedade a qual faz com que a pessoa se sinta

vazia sem ideias sem ideais sem vontade

sofrimento era algo tatildeo ligado agrave vida de Dona Lucilia e a todo o ser dela que eu em pequeno agraves vezes notava que ela estava sofrendo poreacutem

natildeo sabia por quecirc Ficava olhando para ela e contem-plando o sofrimento mas sem compreender o que a fa-zia sofrer

Pequenos sofrimentos que originavam um sofrimento global

Mais tarde quando me tornei um pouco mais velho fui compreendendo uma ou outra razatildeo de um ou outro sofri-mento Depois compreendi que os sofrimentos dela for-mavam um como que edifiacutecio Era um conjunto de razotildees que a faziam sofrer e que constituiacuteam um grande sofrimen-to global o qual era o sofrimento geral da vida dela En-tatildeo comecei a ter uma ideia global do que era o sofrimento

Quando pequeno eu notava sobretudo que mamatildee tinha restos de enfermidade devido agravequela operaccedilatildeo da vesiacutecula que ela fez na Alemanha em 1912 e percebia que tinha muita dificuldade em caminhar

Eu notava que agraves vezes meu pai voltava cedo do escri-toacuterio passava por casa pegava-a e saiacuteam os dois a fazerem uma volta a peacute Ele tendo terminado seu serviccedilo durante o dia contente com a tarefa com sauacutede e vida um homem muito feliz Ela uma pessoa na qual cada passo era uma dor ao mesmo tempo entendia que natildeo poderia irradiar seu sofrimento sobre o esposo ser uma causa contiacutenua de dores para ele Ela deveria fingir que natildeo estava sofren-do ou contar sorrindo ldquoHoje como estatildeo me doendo os peacutesrdquo e continuar a andar todos os dias a extensatildeo reco-mendada pelos meacutedicos Nunca terminar antes porque lhe estavam doendo muito porque essa extensatildeo era necessaacute-ria para habituar os peacutes ao esforccedilo adequado

O sofrimento produz a seriedade

Entatildeo eu percebia que mamatildee tinha uma compreen-satildeo muito profunda dessa situaccedilatildeo Ela sentia esse sofri-

mento e sentia na alma a dor que tem esta quando o cor-po sofre dor fiacutesica Natildeo eacute uma dor superficial mas uma dor profunda O corpo padece e a alma com isso sofre

Quando voltava para casa ela descansava e nesse mo-mento eu entendia tudo quanto sofrera durante o pas-seio porque sorrindo mamatildee se deitava numa espeacutecie de divatilde e ficava com os peacutes imobilizados ateacute que a dor passasse Ela agraves vezes gemia sorrindo entatildeo se forma-va uma roda de pessoas conversando coisas do dia e por amabilidade perguntavam-lhe

mdash Vocecirc estaacute melhor Luciliamdash Sim sim estou melhorandoEu estava vendo que era todo o dia a mesma coisa

natildeo acabava mais E compreendia bem que aquilo trazia para seu espiacuterito um reflexo que era a seriedade porque o sofrimento produz a seriedade

A pior dor que o homem pode ter natildeo eacute a causada pe-la seriedade eacute a produzida pela falta de seriedade Sen-tir-se natildeo seacuterio vazio sem ideias sem ideais sem querer nada sem dizer algo que valha qualquer coisa isto causa um sofrimento pior do que o pior dos sofrimentos

Um dos melhores dons que Deus pode dar a uma crianccedila eacute o sofrimento Natildeo nos queixemos portanto dos sofrimentos que tenhamos tido Pelo contraacuterio agra-deccedilamos a Nossa Senhora e compreendamos que Ela assim nos destinou para a seriedade

Atitudes das pessoas perante a Primeira Guerra Mundial

Pouco tempo depois desses primeiros fatos da minha infacircncia terem se passado arrebentou a Guerra Mun-dial Entendi mais ou menos o que era essa guerra mas tinha a noccedilatildeo da distacircncia enorme que havia entre o Brasil e a Europa Portanto era impossiacutevel que a guer-ra chegasse ateacute aqui enquanto a Europa passava por to-do aquele sofrimento no Brasil havia a boa vida tranqui-la e folgada o Brasil natildeo entraria em guerra e por isso as pessoas aqui gostavam de celebrar a tranquilidade bra-

7

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evist

a

sileira Natildeo soacute apreciavam isso os brasilei-ros mas os estrangeiros oriundos de pa-iacuteses que estavam na conflagraccedilatildeo mas que tinham vindo para o Brasil antes da guerra Eles tinham pais irmatildeos filhos netos metidos na conflagra-ccedilatildeo Isso lhes interessava mas so-bretudo o que eles possuiacuteam era um bem-estar de pessoalmente natildeo participar da guerra

Quando chegava a tardinha era frequente verem-se nas ruas da Satildeo Paulinho rodas formadas na calccedilada por famiacutelias de imigran-tes As donas de casa faziam pratos do tempo em que viviam em seus pa-iacuteses de origem os homens conversa-vam davam risadas as crianccedilas brinca-vam todos se preparando para comer e depois comendo valorosamente comentando como era bom eles natildeo estarem na guerra

Comecei a observar isso e percebi que havia duas ati-tudes perante a conflagraccedilatildeo uma a daqueles a quem era sobretudo agradaacutevel estar longe dela a outra a dos que admiravam a guerra compreendiam sua beleza Es-tes uacuteltimos natildeo podiam ir agrave guerra porque tinham com-promissos aqui no Brasil para manter a famiacutelia se eles fossem poderiam morrer e a famiacutelia ficava abandonada Mas acompanhavam os jornais com o espiacuterito de lutado-res seu paiacutes avanccedilou ou recuou os aliados deles avanccedila-ram ou recuaram os meios de destruiccedilatildeo se acentuaram Aparece o aeroplano entatildeo o grande perigo satildeo os voos Depois surgem os gases asfixiantes os bombardeios em massa das grandes cidades E no fim coisa talvez pior do que tudo as epidemias que contagiavam agraves vezes um pa-iacutes inteiro e que constituiacuteam uma tristeza uma coisa hor-riacutevel

Atrozes ferimentos causados pela conflagraccedilatildeo

Eu tive uma governanta austriacuteaca que era solteira e ofereceu-se para durante o dia trabalhar num hospital de feridos de guerra

Ela disse que os ferimentos eram atrozes Por exem-plo um jovem que tinha ido para combater e voltou com um ferimento que de si natildeo era mortal mas ele natildeo podia falar porque um projeacutetil lhe arrancara o queixo Quando ele precisava de alguma coisa tocava uma sine-ta e escrevia com letra trecircmula de algueacutem que estaacute gra-vemente doente aquilo de que precisava Agraves vezes natildeo conseguia escrever por inteiro deixava cair sobre a cama

a caneta e o papel e ficava esperando um momento em que um pouquinho mais de

forccedila lhe permitisse fazer o pedidoMinha governanta contava que

pelo regulamento do hospital as enfermeiras tinham horaacuterios de-terminados para descansar por-que se elas ficassem doentes tam-beacutem o hospital tornava-se ino-perante As enfermeiras precisa-vam ter uma defesa contra a epi-demia entatildeo o hospital manda-va-as repousar Mas quando mi-

nha governanta estava descansan-do e se lembrava de que talvez o

homem sem queixo precisasse de al-guma coisa ela se levantava agraves escon-

didas e ia verificar se ele queria algo Quem censuraria uma atitude como essa

Soacute poderia aplaudir Mas que condiccedilotildees de vida que horrores que monstruosidades

Reflexatildeo sobre o magniacutefico tema da dor

Tudo isso representava o sofrimento e eu notava que Dona Lucilia tinha em face desses fatos uma atitude muito mais pensativa e mais seacuteria do que as outras pes-soas Estas comentavam como ela as notiacutecias que os jor-nais publicavam por vezes com sensacionalismo que im-pressionava muito o puacuteblico eacute natural

Por exemplo acabava o almoccedilo de domingo todos se espalhavam pela sala de jantar e comeccedilavam a conversar sobre esses assuntos Lembro-me ateacute hoje de que quan-do um velho reloacutegio de parede com um bonito som marcava duas horas da tarde havia sempre um espiacuterito mais leviano e superficial que dizia com uma voz que do-minava a todos ldquoMeus caros agora chegou a vez de nos divertirmos Vocecirc vai para onde E vocecirc Vamos fazer os nossos programasrdquo Entatildeo uns iam passear nos arredo-res da cidade outros faziam visitas enfim essa vida leve dos domingos

Eu percebia que Dona Lucilia acompanhava mas que o espiacuterito dela ia para a compaixatildeo por aqueles que ti-nham sofrido fazia oraccedilatildeo por eles para Nossa Senhora aliviar ou ateacute para evitar esse sofrimento Mas sobretu-do fazia a reflexatildeo sobre o grande o nobre o magniacutefico tema da dor E dentro deste tema outro ainda mais bo-nito o heroiacutesmo a coragem

Isto ia formando a alma de um menino   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2671995)

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Divino InterlocutorEm sua concepccedilatildeo sacral da existecircncia no processo de seu pensamento e ateacute na elaboraccedilatildeo de uma arte de conversar

Dr Plinio tinha como fonte de inspiraccedilatildeo e ponto de convergecircncia o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

U m tema que daria para um estudo muito in-teressante eacute a exposiccedilatildeo analiacutetica de todos os modos pelos quais as coisas na Criaccedilatildeo cres-

cem Elas tecircm modos diferentes de crescer e de evoluir para chegar ateacute a morte e nesta haacute tambeacutem um proces-so que natildeo eacute sempre anaacutelogo Entatildeo haacute o crescimento depois uma fase de expansatildeo e o deperecimento

Iniacutecio expansatildeo e morte

E isso eacute tatildeo diferente nas vaacuterias espeacutecies de vegetais e em cada planta em particular Eacute diverso nos bichos e nas velocidades materiais E tambeacutem em todo o processo de pensamento e de desenvolvimento do homem

Nesse crescer expandir-se e morrer Deus Nosso Senhor fez um verdadeiro jogo de maravilhas que evidentemente as pessoas que cul-tuam a natureza natildeo se datildeo o tra-balho de apreciar Porque isso su-potildee um miacutenimo de pensamento de contemplaccedilatildeo e de meditaccedilatildeo E es-se tipo de meditaccedilatildeo em geral elas natildeo querem fazer

Tudo isso mdash nas plantas nos ani-mais e nas velocidades materiais mdash eacute simboacutelico de um modo ou de ou-tro do processo do homem eacute sim-boacutelico da vida terrena de Nosso Se-nhor e da trajetoacuteria da Histoacuteria do curso dos acontecimentos

Ateacute mesmo certas coisas que satildeo feitas para matar e natildeo para vi-ver mdash por exemplo uma batalha mdash tecircm seu comeccedilo seu crescimento

depois seu murchamento e caem Um dos aspectos boni-tos desse estudo eacute a questatildeo dos recrudescimentos quais satildeo suas origens que forccedilas tecircm como se faz um recru-descimento Soacute o tema dos recrudescimentos daria pa-ra uma doutrina interessantiacutessima da Contra-Revoluccedilatildeo

Ateacute os fogos de artifiacutecio podem ter uma trajetoacuteria muito bonita nesse sentido

Um universo de belezas

Uma das coisas que eu gosto de apreciar no mar eacute exa-tamente o nascimento da onda depois o sistema de on-das quando elas arrebentam ou expiram na praia

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Tambeacutem a ilusoacuteria perpetuidade da calmariahellip Co-mo dentro da calmaria o primeiro elementozinho indica uma mudanccedila completa das coisas que vatildeo se acumulan-do Eacute um processo muito bonito

Isto tudo eacute uma verdadeira maravilha que depois tem sua transposiccedilatildeo para os processos poliacuteticos para a histoacute-ria das instituiccedilotildees das correntes de espiritualidade etc

Haacute um universo de belezas aiacute que ao homem foi da-do contemplar com olho raacutepido furtivo e atento porque natildeo tem tempo para pensar nisso Mas que eacute uma coisa lindiacutessima

Por exemplo haacute mortes que satildeo como um Amazonas desembocando na eternidade quase que empurra a eter-nidade um pouco para fora Mas existem outras mortes como um riozinho pequenininho humildezinho que vai dar diretamente no mar e se perde envergonhadinho com um sussurro que o mar incorpora a sihellip

Haacute uma porccedilatildeo de coisas bonitas interessantes para ver dentro disso E isso se aplica muito agrave histoacuteria de um homem

Por temperamento sou muito estaacutevel e gosto das coi-sas estaacuteveis que duram na calmaria

Natildeo concebo o Ceacuteu num perpeacutetuo movimento mas com diferentes modos de ser da estabilidade Natildeo eacute a ins-tabilidade eacute a mutaccedilatildeo dentro da estabilidade

Processo de pensamento de Dr Plinio

Todas as doutrinas e temas mdash portanto tambeacutem o conceito de sacralidade mdash tecircm um modo de se desenvol-ver peculiar de cada indiviacuteduo Em mim essa peculiari-dade eacute assim

Primeiro um nascimento cheio de intuiccedilotildees de gra-ccedilas ultra-alcandorado em que entra de um modo espe-cial uma visatildeo confusa do ultramaravilhoso e do ponto terminal bom do ponto supremo do auge e o encanta-mento por esse auge

Depois do auge bem visto e de dar a ele tudo quanto naquele estaacutegio da vida espiritual ele merece que se decirc entatildeo vem um periacuteodo de aparente estabilidade mas de fato eacute um periacuteodo em que se vai ldquocozinhandordquo lentamen-te a explicitaccedilatildeo

Ao mesmo tempo mdash eacute como se daacute concretamente co-migo mdash um periacuteodo de luta em que a explicitaccedilatildeo eacute aju-dada possantemente pela contestaccedilatildeo Porque aquele conhecimento confuso primeiro vem acompanhado de uma impliacutecita rejeiccedilatildeo do que natildeo eacute aquilo E quando al-gueacutem afirma o contraacuterio vem a repulsa

Na repulsa implicitamente fica mais conhecido aquilo que foi negado E ao mesmo tempo em que se prepara a apologeacutetica elabora-se a explicitaccedilatildeo A apologeacutetica e a explicitaccedilatildeo satildeo fenocircmenos reversiacuteveis um no outro De

maneira que eu me torno conhecedor das coisas por dois dados por uma espeacutecie de conaturalidade e por uma es-peacutecie de repulsa daquilo que eacute contraacuterio

Num determinado momento tudo o que se podia co-nhecer a respeito daquilo estaacute conhecido com os proacute-prios recursos e com a observaccedilatildeo concreta da vida Aiacute chega a hora da leitura Natildeo antes

Podem percorrer todos os livros de minha biblioteca e encontraratildeo sinais disso A leitura veio exatamente de-pois para ajudar esse processo dando mais informaccedilotildees fazendo com que a pessoa se situe ante o que diz o es-critor e portanto julgue eacute ldquosimrdquo eacute ldquonatildeordquo eacute ldquotalvezrdquo eacute ldquoconformerdquo etc

Depois de tudo isso feito haacute mais uma vez uma nova aparente estagnaccedilatildeo em que todos esses elementos re-colhidos satildeo objetos de uma nova siacutentese E vem uma vi-satildeo final que depois cresce pouco na aparecircncia mas que de fato tem muita intensidade E prepara o ato de amor terminal

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Eu natildeo sei se isso seraacute assim em outros Desconfio muito que natildeo e que varia muito de acordo com o cami-nho de Deus para cada pessoa

A inocecircncia eacute o princiacutepio da sabedoria

Graccedilas a Nossa Senhora haacute nesse processo muita ino-cecircncia Porque natildeo eacute soacute conhecendo a coisa em si mas eacute conferindo os dados externos com a inocecircncia A inocecircn-cia nesse sentido eacute um comeccedilar de sabedoria Ela cons-titui uma espeacutecie de ortodoxia

O que eu disse agora haacute um ano eu natildeo teria tatildeo cla-ro a ponto de explicitar neste momento estou explicitan-do com facilidade

Na aparecircncia isso em mim se encontrava parado mas de fato estava sendo preparada esta explicita-ccedilatildeo O que indica que havia uma accedilatildeo profunda mdash muito silenciosa tranquila discreta mas natildeo pouco ativa mdash para passar do uacuteltimo estaacutegio de um conhe-cimento confuso para o conhecimento inteiramente definido

Seria um crescimento contiacutenuo sob a forma de esta-bilidade mas na realidade trata-se de uma accedilatildeo em pro-fundidade Mais ou menos como o desenvolvimento da aacutervore jaacute crescida que natildeo cresce mais mas suga da ter-ra coisas que datildeo ao processo vital da aacutervore o meio de ir vivendo Examinando bem a aacutervore pode durante mui-to tempo ainda crescer em forccedila e em volume por esse processo

Entatildeo o conhecimento da transcendecircncia de Deus por exemplo depois de chegar a certo estaacutegio entra nes-sa fase de elaboraccedilatildeo profunda pouco perceptiva que de repente daacute um fruto muito mais sutil e melhor que eacute fazer as correlaccedilotildees entre os conjuntos que se tecircm na mente e daiacute nasce um determinado unum

E esse eacute o piacutencaro do processo intelectual e moral Porque esse piacutencaro jaacute eacute a primeira nota eacute a antiacutefona do cacircntico que noacutes devemos entoar no Ceacuteu

Procura do mundo dos possiacuteveis

Esse eacute o processo de conhecimento das coisas que po-deriam ou deveriam existir algumas das quais existem Por exemplo quando vejo um belo castelo Ele corres-ponde a ideias que todos tivemos na mente sobre um cas-telo inexistente Entatildeo minha primeira reflexatildeo eacute ldquoAqui estaacute o inexistente que eu procuravardquo

Muita coisa que parece estar no mero mundo dos possiacuteveis existe Eacute questatildeo de saber procurar Em uacutelti-ma anaacutelise se fosse bem ordenado o turismo perfeito se-ria uma procura pelo mundo dos possiacuteveis que a pessoa natildeo conheceu

Essa procura eacute um pouco o que vai dando acircnimo e movimentaccedilatildeo agrave vida O contraacuterio eacute o tipo de velho que no domingo agraves trecircs horas da tarde junto com sua espo-sa acabou de almoccedilar ele estaacute bem satisfeito e ela estaacute aliviada porque o marido almoccedilou bem e gostou da re-feiccedilatildeo Ele se senta numa cadeira e fica ruminando com desapontamento porque ele acha que natildeo haacute mais pos-siacuteveis

Propriamente a substacircncia dessa velhice mal concebi-da eacute crer pouco nos meramente possiacuteveis do Ceacuteu e achar que na Terra natildeo adianta conhececirc-los porque jaacute se viu que todas essas coisas fanam Entatildeo o velho fica sentado na cadeira ruminando sua bronquite Essa eacute a substacircncia desse conceito de velhice

Antigamente como a senhora mdash de modo habitual natildeo necessariamente mdash era melhor do que o homem ela ficava pensando um pouquinho no Ceacuteu e nas saudades do tempo que se foi

O homem pouco sujeito a saudades natildeo pensava no Ceacuteu mas de vez em quando o relacircmpago do Inferno lhe aparecia pela mente E isso o levava a fazer a sua Confis-satildeo e Comunhatildeo pascais Assim era a velhice

Havia uma casa mdash creio que natildeo existe mais mdash na es-quina da Rua Imaculada Conceiccedilatildeo com a Rua Martim Francisco1 Eu percebia pela conformaccedilatildeo do preacutedio

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Carcassone Franccedila

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que existiam muitos quartos de dormir vazios donde se deduz terem morado filhos ali que depois tinham se mu-dado e o casal residia sozinho

Eu entatildeo imaginava o velho e a velha possiacutevel no niacute-vel daquela residecircncia que era uma casa mediana Esse velho e essa velha eu os construiacutea de vaacuterios velhos e ve-lhas que tinha conhecido

Como a ideia da Contra-Revoluccedilatildeo foi elaborada no espiacuterito de Dr Plinio

Estou explicitando agora Mas a explicitaccedilatildeo eacute fruto de um trabalho lento que a mim me daacute a impressatildeo de que natildeo estou trabalhando mas simplesmente vivendo Eu diria que parei Mas de repente saio com uma en-xurrada de coisas que assim nunca pensei Eacute o lento tra-balho terminal que deve aprontar na mente

A Contra-Revoluccedilatildeo considerada no seu conjunto teve exatamente esse papel no meu espiacuterito

Primeiro formei impressotildees observei fatos tomei conhecimento pela leitura de alguns tantos aconteci-mentos histoacutericos e tambeacutem conheci muito pelas nar-raccedilotildees mais ou menos agrave Alexandre Dumas que circu-lavam no ambiente familiar a respeito desse ou daque-le caso

Por exemplo Maria Antonieta Na minha geraccedilatildeo o preconceito contra Maria Antonieta era uma coisa atroz ldquoMulher dura maacute traidora favorecia os austriacuteacos De uma beleza esplendorosa mdash era vista assim mdash que fazia com que todas as mulheres feias ficassem complexadas pensando nelardquo

Mas contavam que o povo faminto chegou a Versailles e ela estava tatildeo alheia agraves verdadeiras necessidades do po-vo que disse ldquoEntatildeo se vocecircs natildeo tecircm patildeo comam brio-cherdquo E ela nem sabia bem que brioche era mais caro que o patildeo porque problema de dinheiro natildeo existia para ela Entatildeo deu um conselho que provava mdash assim diziam mdash como ela vivia alheia ao sofrimento do povo

Eu me lembro de ainda pequeno perguntando para Dona Lucilia

mdash Mas mamatildee o que eacute briochemdash Uns bolinhos excelentesNatildeo cheguei a me perguntar por que ela natildeo fazia

brioche para eu comer Ateacute laacute a gula natildeo chegouhellip Mas vejam a provaccedilatildeo para uma crianccedila que ainda natildeo sabe o que eacute brioche

ldquoEntatildeo as pessoas bonitas alinhadas estiladas supe-riores natildeo tecircm coraccedilatildeo porque seguem demais regras e se endurecem com essas regras Por que seguir a regra endurece e cega para a compaixatildeo com os que natildeo con-seguiram seguir a regra Entatildeo seguir as regras eacute maurdquo

Minha resposta interior

ldquoNatildeo pode ser Porque entre bem e bem natildeo pode ha-ver incompatibilidaderdquo

A doutrina natildeo eacute o ponto de partida mas o de chegada

A importacircncia que dou ao raciociacutenio faz com que eu natildeo considere nada por acabado se natildeo foi raciocinado Porque todo esse processo de intuiccedilatildeo tem que chegar a raciociacutenios que provem ou natildeo provem aquilo que foi an-tes intuiacutedo apalpado pressentido

Podem entatildeo imaginar o meu encantamento lendo o ldquoTratado de Direito Naturalrdquo de Taparelli drsquoAzeglio o ldquoTratado de Sociologia Catoacutelicardquo de Albeacuteric Belliot um franciscano enfim uma flotilha de coisas que eu li e me provaram por exemplo a legitimidade do direito de pro-priedade que era uma coisa instintiva mas cuja legitimi-dade eu apanhei aiacute

Quando vi que o direito de propriedade a instituiccedilatildeo da famiacutelia a indissolubilidade do viacutenculo matrimonial a autoridade paterna mdash cuja liceidade era intuiacuteda por mim mdash se baseavam num raciociacutenio claro liacutempido perfeito tive um entusiasmo enorme

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Ostensoacuterio da Igreja de Santa Maria - Cracoacutevia Polocircnia

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Isso deu ao meu pensamento uma estrutura que veio depois de mil apalpaccedilotildees

Essa eacute uma caracteriacutestica do meu espiacuterito natildeo come-ccedilar por ler a doutrina mas por pegar a realidade Depois de ter intuiacutedo na realidade ir ver a doutrina E aiacute ter um contentamento um gaacuteudio enorme

Estou longe de ser daqueles que julgam dever prescin-dir da doutrina mas a questatildeo eacute que para muitos a dou-trina eacute o ponto de partida e na conformaccedilatildeo do meu espiacuterito eacute o ponto de chegada

Todas essas coisas com o tempo acabam for-mando um depoacutesito primeiro de impressotildees maturadas para raciocinar E enquanto jaacute vou raciocinando algumas de minhas im-pressotildees continuo a maturar ou explici-tar outras Entatildeo noacutes poderiacuteamos dizer que esse processo eacute

Primeiro observar captando e classificando subconscientemente

Segundo estabelecendo oposiccedilotildees e come-ccedilando por aiacute a explicitaccedilatildeo

Terceiro fazer os primeiros raciociacutenios que constituem pontas de trilho para que daiacute para diante em contato com qualquer coisa nova o processo in-teiro vai se movendo

Concepccedilatildeo sacral da vida

Isso forma inclusive o pro-gresso na vida espiritual

Por exemplo a noccedilatildeo de sacralidade no comeccedilo eacute muito mais viacutevida em re-laccedilatildeo agrave Igreja Depois me-nos em referecircncia agrave au-toridade paterna dentro da famiacutelia como entida-de toda ela sacral num certo sentido especial da palavra ldquosacralrdquo E tambeacutem em relaccedilatildeo ao mi-to monaacuterquico dentro do Es-tado que pode ser sacral se o indiviacuteduo qui-ser vecirc-lo assim oferececirc-lo agrave Igreja e pedir as becircnccedilatildeos dela a fim de sacralizaacute-lo

Isso acaba dando lugar a uma noccedilatildeo de sacralidade adequada agraves coisas temporais que eacute um desdobramento da noccedilatildeo do sacral mdash proacutepria das coisas estritamente espiritu-ais e sobrenaturais mdash e formando no espiacuterito vaacuterios degraus e modos de ser da sacralidade

cujo auge sempre me pareceu como sendo a Consagraccedilatildeo durante a Missa mais do que a minha Comunhatildeo

Agora uma coisa que eacute pessoal sou mais sensiacutevel agrave sacralidade do ato da Consagraccedilatildeo enquanto conside-rado na Consagraccedilatildeo do vinho e a apresentaccedilatildeo do caacuteli-ce para o povo adorar do que na Consagraccedilatildeo do patildeo e a apresentaccedilatildeo para ser adorado

Eu tinha a impressatildeo mdash que soube depois natildeo cor-responder agrave realidade mdash de que a transubstan-

ciaccedilatildeo se dava no momento da elevaccedilatildeo E daiacute aquele respeito e aquela veneraccedilatildeo

Porque nos fieacuteis haacute um redobrar de res-peito e veneraccedilatildeo quando o Santiacutessi-mo eacute elevado Compreende-se por-que eacute exposto para eles adorarem en-

tatildeo fazerem um ato interior que corres-ponde a essa exposiccedilatildeo Mas eu achava

que era porque a transubstanciaccedilatildeo estava se dando naquele momento

A forma material do caacutelice eacute tatildeo evo-cativa do que eacute o oferecimento da sacra-

lidade Uma alma que se oferece ou oferece alguma coisa de dentro de

si eacute tatildeo bem representada por um caacutelice que se abre e que daacute tudo

o que tem Por outro lado o vi-nho eacute tatildeo mais parecido com

o sangue do que o patildeo o eacute com o corpo que tudo isso me dava mais sen-saccedilatildeo mdash puramente fiacute-sica e analoacutegica mdash de sacralidade

A simples presen-ccedila do Santiacutessimo Sa-cramento exposto me dava uma sensaccedilatildeo de sacralidade colos-sal Muito mais do que o Santiacutessimo guarda-do na capela-mor Po-der chegar perto drsquoEle adoraacute-Lo produz em

mim impressotildees de sa-cralidade que eu acho que

possuem qualquer coisa de miacutestico muito maiores do

que as que se tecircm em contato com a sociedade temporal

Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus - Igreja Imaculada Conceiccedilatildeo Goa Iacutendia

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Mas por esse progresso de alma de que estou falan-do a pessoa vai compreendendo que em formas termos e modos diferentes a sociedade temporal inteira acaba tendo qualquer coisa de sacral E entatildeo uma concep-ccedilatildeo toda ela sacral da vida vai se maturando lentamente ao longo das deacutecadas para depois fazer uma confericcedilatildeo com os autores especializados

Porque a palavra definitiva eacute deles Eles representam a Igreja que eacute infaliacutevel e portanto vamos ouvir o que a Santa Matildee Igreja ensina a esse respeito E ensina na for-ccedila da palavra ldquoensinarrdquo quer dizer ela eacute a Mestra infaliacute-vel eu sou o aluno bobo que posso ter feito um engano e apresento a ela aquilo que pensei

No princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Eacute um processo que em certo momento entra numa apa-rente estagnaccedilatildeo e continua a elaboraccedilatildeo em profundidade De maneira que quem me conhece haacute muito tempo eacute pos-siacutevel que tenha tido ideia de que em algumas coisas eu es-tou me repetindo indefinidamente Mas se forem examinar de perto notaratildeo que tem sempre alguma coisinha nova que corresponde em profundidade a esse processo lento

Mas isso levanta um problema Esse natildeo eacute mdash em suas linhas gerais natildeo nos seus pormenores mdash o proacuteprio meacute-todo de pensar legiacutetimo do espiacuterito humano

Vamos formular a coisa assim O primeiro livro foi escrito por um homem que natildeo teve livros Entatildeo a cultura nasceu de um pensamento anterior ao livro Logo no processo in-telectual no princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Entatildeo eu volto ao ponto de partidaO unum eacute o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus de uma ma-

jestade infinita doccedilura infinita sabedoria infinita de um poder infinito e de uma bondade infinita para dizer soacute alguns atributos Tudo isso eacute uma siacutentese para chegar ateacute Ele compreendecirc-Lo

A teoria geral das vaacuterias formas de crescimento de desen-volvimento que apresentei no comeccedilo da reuniatildeo parece natildeo ter relaccedilatildeo alguma com Ele Mas no fundo eacute a Ele que visa-mos Ele eacute o alfa e o ocircmega o unum eacute Ele Ele eacute o comeccedilo e o fim de tudo E se de algum modo todas essas reflexotildees natildeo vi-sassem o melhor conhecimento drsquoEle natildeo teriam valor

Numa conversa os espiacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical

Em toda essa teoria a conversa tem um papel enor-me porque ela no fundo requer certo discernimento dos espiacuteritos e uma percepccedilatildeo do que conveacutem ou natildeo ser dito Quando natildeo conveacutem deve-se ter o suficiente desa-pego para natildeo tratar

Muita gente conversa sobre aquilo que tem vontade de conversar Isso eacute a morte da conversaccedilatildeo A conver-sa boa nem eacute sobre aquilo que tenho ou meu interlocu-tor tem vontade de conversar mas sim tratar daquilo em que noacutes dois podemos igualmente gostar de conversar O resto eacute a morte da conversaccedilatildeo

Agrave medida que uma conversa estaacute bem travada os es-piacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical E quando se entendem bem vatildeo mudando de tema igual-mente muito mais por apetecircncias do que por nexos loacutegi-cos Entra em algo o nexo loacutegico mas satildeo nexos psicoloacute-gicos mudanccedilas de temas vizinhos que vatildeo fazendo com que as duas pessoas gostem das mesmas coisas Entatildeo a conversa aiacute se torna deliciosa

Eacute mais ou menos como por exemplo duas pessoas que passeiam juntas no centro de Roma a caminho das catacumbas Passam por uma loja qualquer que tem gra-vatas bonitas os dois estatildeo precisando comprar gravatas param olham gostam conversam Depois transitam em frente a uma confeitaria e comem algum doce E assim chegam agrave catacumba

A conversa soacute pega mesmo mdash ao menos eacute a impressatildeo que eu tenho mdash quando na pontinha do que estaacute sendo con-versado haacute qualquer coisa que eacute uma graccedila de Deus sobre alguma coisa de transcendente maravilhoso que por uma pontinha de consolaccedilatildeo sensiacutevel ambos estatildeo sentindo

Pode ser o unum ou natildeo Pode ser uma consolaccedilatildeo que todos tecircm juntos sobre um ponto que Nossa Senho-ra quer glorificar Entatildeo a conversa em geral tem um fundinho comum de supremo E quanto mais esse fundi-nho eacute sentido por todos mais a conversa eacute animada

Donde se tira uma conclusatildeo linda o principal inter-locutor eacute o Interlocutor Divino presente em nossa con-versa falando dentro das nossas almas e elogiando-se a Si proacuteprio por nossos laacutebios

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece

Isso daacute uma elevaccedilatildeo ao conceito de conversa em que Deus estaacute sempre presente natildeo soacute mdash e jaacute eacute muito mdash atra-veacutes da Feacute mas tambeacutem no fundo por alguma coisa comu-nicada diretamente pela graccedila que se torna sensiacutevel e cau-sa alegria Esse eacute o sal da conversa e que a Providecircncia daacute quando quer Eacute certa forma de sensiacutevel Natildeo eacute uma mera troca de ideias teoacuterica mas algo que vai mais alto

Eu volto a dizer pasma mas eacute fato o Divino Interlo-cutor eacute propriamente Aquele que fala Ele fala pela boca de um responde pela boca de outro e Se alegra pelo co-raccedilatildeo de todos Eacute uma coisa muito bonita

Pode-se dar um fato parecido com esse na ordem me-ramente natural O exemplo mais caracteriacutestico disso eacute

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

Rep

rodu

ccedilatildeo

ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

P

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

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Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

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nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

26

o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

27

lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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30)

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

33

Foto

s R

epro

duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 6: Revista Doctor Plinio 207_201506

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Dor e seriedade

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Dona LuciLia

A seriedade causa dor mas o pior sofrimento eacute o produzido pela falta de seriedade a qual faz com que a pessoa se sinta

vazia sem ideias sem ideais sem vontade

sofrimento era algo tatildeo ligado agrave vida de Dona Lucilia e a todo o ser dela que eu em pequeno agraves vezes notava que ela estava sofrendo poreacutem

natildeo sabia por quecirc Ficava olhando para ela e contem-plando o sofrimento mas sem compreender o que a fa-zia sofrer

Pequenos sofrimentos que originavam um sofrimento global

Mais tarde quando me tornei um pouco mais velho fui compreendendo uma ou outra razatildeo de um ou outro sofri-mento Depois compreendi que os sofrimentos dela for-mavam um como que edifiacutecio Era um conjunto de razotildees que a faziam sofrer e que constituiacuteam um grande sofrimen-to global o qual era o sofrimento geral da vida dela En-tatildeo comecei a ter uma ideia global do que era o sofrimento

Quando pequeno eu notava sobretudo que mamatildee tinha restos de enfermidade devido agravequela operaccedilatildeo da vesiacutecula que ela fez na Alemanha em 1912 e percebia que tinha muita dificuldade em caminhar

Eu notava que agraves vezes meu pai voltava cedo do escri-toacuterio passava por casa pegava-a e saiacuteam os dois a fazerem uma volta a peacute Ele tendo terminado seu serviccedilo durante o dia contente com a tarefa com sauacutede e vida um homem muito feliz Ela uma pessoa na qual cada passo era uma dor ao mesmo tempo entendia que natildeo poderia irradiar seu sofrimento sobre o esposo ser uma causa contiacutenua de dores para ele Ela deveria fingir que natildeo estava sofren-do ou contar sorrindo ldquoHoje como estatildeo me doendo os peacutesrdquo e continuar a andar todos os dias a extensatildeo reco-mendada pelos meacutedicos Nunca terminar antes porque lhe estavam doendo muito porque essa extensatildeo era necessaacute-ria para habituar os peacutes ao esforccedilo adequado

O sofrimento produz a seriedade

Entatildeo eu percebia que mamatildee tinha uma compreen-satildeo muito profunda dessa situaccedilatildeo Ela sentia esse sofri-

mento e sentia na alma a dor que tem esta quando o cor-po sofre dor fiacutesica Natildeo eacute uma dor superficial mas uma dor profunda O corpo padece e a alma com isso sofre

Quando voltava para casa ela descansava e nesse mo-mento eu entendia tudo quanto sofrera durante o pas-seio porque sorrindo mamatildee se deitava numa espeacutecie de divatilde e ficava com os peacutes imobilizados ateacute que a dor passasse Ela agraves vezes gemia sorrindo entatildeo se forma-va uma roda de pessoas conversando coisas do dia e por amabilidade perguntavam-lhe

mdash Vocecirc estaacute melhor Luciliamdash Sim sim estou melhorandoEu estava vendo que era todo o dia a mesma coisa

natildeo acabava mais E compreendia bem que aquilo trazia para seu espiacuterito um reflexo que era a seriedade porque o sofrimento produz a seriedade

A pior dor que o homem pode ter natildeo eacute a causada pe-la seriedade eacute a produzida pela falta de seriedade Sen-tir-se natildeo seacuterio vazio sem ideias sem ideais sem querer nada sem dizer algo que valha qualquer coisa isto causa um sofrimento pior do que o pior dos sofrimentos

Um dos melhores dons que Deus pode dar a uma crianccedila eacute o sofrimento Natildeo nos queixemos portanto dos sofrimentos que tenhamos tido Pelo contraacuterio agra-deccedilamos a Nossa Senhora e compreendamos que Ela assim nos destinou para a seriedade

Atitudes das pessoas perante a Primeira Guerra Mundial

Pouco tempo depois desses primeiros fatos da minha infacircncia terem se passado arrebentou a Guerra Mun-dial Entendi mais ou menos o que era essa guerra mas tinha a noccedilatildeo da distacircncia enorme que havia entre o Brasil e a Europa Portanto era impossiacutevel que a guer-ra chegasse ateacute aqui enquanto a Europa passava por to-do aquele sofrimento no Brasil havia a boa vida tranqui-la e folgada o Brasil natildeo entraria em guerra e por isso as pessoas aqui gostavam de celebrar a tranquilidade bra-

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sileira Natildeo soacute apreciavam isso os brasilei-ros mas os estrangeiros oriundos de pa-iacuteses que estavam na conflagraccedilatildeo mas que tinham vindo para o Brasil antes da guerra Eles tinham pais irmatildeos filhos netos metidos na conflagra-ccedilatildeo Isso lhes interessava mas so-bretudo o que eles possuiacuteam era um bem-estar de pessoalmente natildeo participar da guerra

Quando chegava a tardinha era frequente verem-se nas ruas da Satildeo Paulinho rodas formadas na calccedilada por famiacutelias de imigran-tes As donas de casa faziam pratos do tempo em que viviam em seus pa-iacuteses de origem os homens conversa-vam davam risadas as crianccedilas brinca-vam todos se preparando para comer e depois comendo valorosamente comentando como era bom eles natildeo estarem na guerra

Comecei a observar isso e percebi que havia duas ati-tudes perante a conflagraccedilatildeo uma a daqueles a quem era sobretudo agradaacutevel estar longe dela a outra a dos que admiravam a guerra compreendiam sua beleza Es-tes uacuteltimos natildeo podiam ir agrave guerra porque tinham com-promissos aqui no Brasil para manter a famiacutelia se eles fossem poderiam morrer e a famiacutelia ficava abandonada Mas acompanhavam os jornais com o espiacuterito de lutado-res seu paiacutes avanccedilou ou recuou os aliados deles avanccedila-ram ou recuaram os meios de destruiccedilatildeo se acentuaram Aparece o aeroplano entatildeo o grande perigo satildeo os voos Depois surgem os gases asfixiantes os bombardeios em massa das grandes cidades E no fim coisa talvez pior do que tudo as epidemias que contagiavam agraves vezes um pa-iacutes inteiro e que constituiacuteam uma tristeza uma coisa hor-riacutevel

Atrozes ferimentos causados pela conflagraccedilatildeo

Eu tive uma governanta austriacuteaca que era solteira e ofereceu-se para durante o dia trabalhar num hospital de feridos de guerra

Ela disse que os ferimentos eram atrozes Por exem-plo um jovem que tinha ido para combater e voltou com um ferimento que de si natildeo era mortal mas ele natildeo podia falar porque um projeacutetil lhe arrancara o queixo Quando ele precisava de alguma coisa tocava uma sine-ta e escrevia com letra trecircmula de algueacutem que estaacute gra-vemente doente aquilo de que precisava Agraves vezes natildeo conseguia escrever por inteiro deixava cair sobre a cama

a caneta e o papel e ficava esperando um momento em que um pouquinho mais de

forccedila lhe permitisse fazer o pedidoMinha governanta contava que

pelo regulamento do hospital as enfermeiras tinham horaacuterios de-terminados para descansar por-que se elas ficassem doentes tam-beacutem o hospital tornava-se ino-perante As enfermeiras precisa-vam ter uma defesa contra a epi-demia entatildeo o hospital manda-va-as repousar Mas quando mi-

nha governanta estava descansan-do e se lembrava de que talvez o

homem sem queixo precisasse de al-guma coisa ela se levantava agraves escon-

didas e ia verificar se ele queria algo Quem censuraria uma atitude como essa

Soacute poderia aplaudir Mas que condiccedilotildees de vida que horrores que monstruosidades

Reflexatildeo sobre o magniacutefico tema da dor

Tudo isso representava o sofrimento e eu notava que Dona Lucilia tinha em face desses fatos uma atitude muito mais pensativa e mais seacuteria do que as outras pes-soas Estas comentavam como ela as notiacutecias que os jor-nais publicavam por vezes com sensacionalismo que im-pressionava muito o puacuteblico eacute natural

Por exemplo acabava o almoccedilo de domingo todos se espalhavam pela sala de jantar e comeccedilavam a conversar sobre esses assuntos Lembro-me ateacute hoje de que quan-do um velho reloacutegio de parede com um bonito som marcava duas horas da tarde havia sempre um espiacuterito mais leviano e superficial que dizia com uma voz que do-minava a todos ldquoMeus caros agora chegou a vez de nos divertirmos Vocecirc vai para onde E vocecirc Vamos fazer os nossos programasrdquo Entatildeo uns iam passear nos arredo-res da cidade outros faziam visitas enfim essa vida leve dos domingos

Eu percebia que Dona Lucilia acompanhava mas que o espiacuterito dela ia para a compaixatildeo por aqueles que ti-nham sofrido fazia oraccedilatildeo por eles para Nossa Senhora aliviar ou ateacute para evitar esse sofrimento Mas sobretu-do fazia a reflexatildeo sobre o grande o nobre o magniacutefico tema da dor E dentro deste tema outro ainda mais bo-nito o heroiacutesmo a coragem

Isto ia formando a alma de um menino   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2671995)

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Divino InterlocutorEm sua concepccedilatildeo sacral da existecircncia no processo de seu pensamento e ateacute na elaboraccedilatildeo de uma arte de conversar

Dr Plinio tinha como fonte de inspiraccedilatildeo e ponto de convergecircncia o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

U m tema que daria para um estudo muito in-teressante eacute a exposiccedilatildeo analiacutetica de todos os modos pelos quais as coisas na Criaccedilatildeo cres-

cem Elas tecircm modos diferentes de crescer e de evoluir para chegar ateacute a morte e nesta haacute tambeacutem um proces-so que natildeo eacute sempre anaacutelogo Entatildeo haacute o crescimento depois uma fase de expansatildeo e o deperecimento

Iniacutecio expansatildeo e morte

E isso eacute tatildeo diferente nas vaacuterias espeacutecies de vegetais e em cada planta em particular Eacute diverso nos bichos e nas velocidades materiais E tambeacutem em todo o processo de pensamento e de desenvolvimento do homem

Nesse crescer expandir-se e morrer Deus Nosso Senhor fez um verdadeiro jogo de maravilhas que evidentemente as pessoas que cul-tuam a natureza natildeo se datildeo o tra-balho de apreciar Porque isso su-potildee um miacutenimo de pensamento de contemplaccedilatildeo e de meditaccedilatildeo E es-se tipo de meditaccedilatildeo em geral elas natildeo querem fazer

Tudo isso mdash nas plantas nos ani-mais e nas velocidades materiais mdash eacute simboacutelico de um modo ou de ou-tro do processo do homem eacute sim-boacutelico da vida terrena de Nosso Se-nhor e da trajetoacuteria da Histoacuteria do curso dos acontecimentos

Ateacute mesmo certas coisas que satildeo feitas para matar e natildeo para vi-ver mdash por exemplo uma batalha mdash tecircm seu comeccedilo seu crescimento

depois seu murchamento e caem Um dos aspectos boni-tos desse estudo eacute a questatildeo dos recrudescimentos quais satildeo suas origens que forccedilas tecircm como se faz um recru-descimento Soacute o tema dos recrudescimentos daria pa-ra uma doutrina interessantiacutessima da Contra-Revoluccedilatildeo

Ateacute os fogos de artifiacutecio podem ter uma trajetoacuteria muito bonita nesse sentido

Um universo de belezas

Uma das coisas que eu gosto de apreciar no mar eacute exa-tamente o nascimento da onda depois o sistema de on-das quando elas arrebentam ou expiram na praia

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Tambeacutem a ilusoacuteria perpetuidade da calmariahellip Co-mo dentro da calmaria o primeiro elementozinho indica uma mudanccedila completa das coisas que vatildeo se acumulan-do Eacute um processo muito bonito

Isto tudo eacute uma verdadeira maravilha que depois tem sua transposiccedilatildeo para os processos poliacuteticos para a histoacute-ria das instituiccedilotildees das correntes de espiritualidade etc

Haacute um universo de belezas aiacute que ao homem foi da-do contemplar com olho raacutepido furtivo e atento porque natildeo tem tempo para pensar nisso Mas que eacute uma coisa lindiacutessima

Por exemplo haacute mortes que satildeo como um Amazonas desembocando na eternidade quase que empurra a eter-nidade um pouco para fora Mas existem outras mortes como um riozinho pequenininho humildezinho que vai dar diretamente no mar e se perde envergonhadinho com um sussurro que o mar incorpora a sihellip

Haacute uma porccedilatildeo de coisas bonitas interessantes para ver dentro disso E isso se aplica muito agrave histoacuteria de um homem

Por temperamento sou muito estaacutevel e gosto das coi-sas estaacuteveis que duram na calmaria

Natildeo concebo o Ceacuteu num perpeacutetuo movimento mas com diferentes modos de ser da estabilidade Natildeo eacute a ins-tabilidade eacute a mutaccedilatildeo dentro da estabilidade

Processo de pensamento de Dr Plinio

Todas as doutrinas e temas mdash portanto tambeacutem o conceito de sacralidade mdash tecircm um modo de se desenvol-ver peculiar de cada indiviacuteduo Em mim essa peculiari-dade eacute assim

Primeiro um nascimento cheio de intuiccedilotildees de gra-ccedilas ultra-alcandorado em que entra de um modo espe-cial uma visatildeo confusa do ultramaravilhoso e do ponto terminal bom do ponto supremo do auge e o encanta-mento por esse auge

Depois do auge bem visto e de dar a ele tudo quanto naquele estaacutegio da vida espiritual ele merece que se decirc entatildeo vem um periacuteodo de aparente estabilidade mas de fato eacute um periacuteodo em que se vai ldquocozinhandordquo lentamen-te a explicitaccedilatildeo

Ao mesmo tempo mdash eacute como se daacute concretamente co-migo mdash um periacuteodo de luta em que a explicitaccedilatildeo eacute aju-dada possantemente pela contestaccedilatildeo Porque aquele conhecimento confuso primeiro vem acompanhado de uma impliacutecita rejeiccedilatildeo do que natildeo eacute aquilo E quando al-gueacutem afirma o contraacuterio vem a repulsa

Na repulsa implicitamente fica mais conhecido aquilo que foi negado E ao mesmo tempo em que se prepara a apologeacutetica elabora-se a explicitaccedilatildeo A apologeacutetica e a explicitaccedilatildeo satildeo fenocircmenos reversiacuteveis um no outro De

maneira que eu me torno conhecedor das coisas por dois dados por uma espeacutecie de conaturalidade e por uma es-peacutecie de repulsa daquilo que eacute contraacuterio

Num determinado momento tudo o que se podia co-nhecer a respeito daquilo estaacute conhecido com os proacute-prios recursos e com a observaccedilatildeo concreta da vida Aiacute chega a hora da leitura Natildeo antes

Podem percorrer todos os livros de minha biblioteca e encontraratildeo sinais disso A leitura veio exatamente de-pois para ajudar esse processo dando mais informaccedilotildees fazendo com que a pessoa se situe ante o que diz o es-critor e portanto julgue eacute ldquosimrdquo eacute ldquonatildeordquo eacute ldquotalvezrdquo eacute ldquoconformerdquo etc

Depois de tudo isso feito haacute mais uma vez uma nova aparente estagnaccedilatildeo em que todos esses elementos re-colhidos satildeo objetos de uma nova siacutentese E vem uma vi-satildeo final que depois cresce pouco na aparecircncia mas que de fato tem muita intensidade E prepara o ato de amor terminal

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Eu natildeo sei se isso seraacute assim em outros Desconfio muito que natildeo e que varia muito de acordo com o cami-nho de Deus para cada pessoa

A inocecircncia eacute o princiacutepio da sabedoria

Graccedilas a Nossa Senhora haacute nesse processo muita ino-cecircncia Porque natildeo eacute soacute conhecendo a coisa em si mas eacute conferindo os dados externos com a inocecircncia A inocecircn-cia nesse sentido eacute um comeccedilar de sabedoria Ela cons-titui uma espeacutecie de ortodoxia

O que eu disse agora haacute um ano eu natildeo teria tatildeo cla-ro a ponto de explicitar neste momento estou explicitan-do com facilidade

Na aparecircncia isso em mim se encontrava parado mas de fato estava sendo preparada esta explicita-ccedilatildeo O que indica que havia uma accedilatildeo profunda mdash muito silenciosa tranquila discreta mas natildeo pouco ativa mdash para passar do uacuteltimo estaacutegio de um conhe-cimento confuso para o conhecimento inteiramente definido

Seria um crescimento contiacutenuo sob a forma de esta-bilidade mas na realidade trata-se de uma accedilatildeo em pro-fundidade Mais ou menos como o desenvolvimento da aacutervore jaacute crescida que natildeo cresce mais mas suga da ter-ra coisas que datildeo ao processo vital da aacutervore o meio de ir vivendo Examinando bem a aacutervore pode durante mui-to tempo ainda crescer em forccedila e em volume por esse processo

Entatildeo o conhecimento da transcendecircncia de Deus por exemplo depois de chegar a certo estaacutegio entra nes-sa fase de elaboraccedilatildeo profunda pouco perceptiva que de repente daacute um fruto muito mais sutil e melhor que eacute fazer as correlaccedilotildees entre os conjuntos que se tecircm na mente e daiacute nasce um determinado unum

E esse eacute o piacutencaro do processo intelectual e moral Porque esse piacutencaro jaacute eacute a primeira nota eacute a antiacutefona do cacircntico que noacutes devemos entoar no Ceacuteu

Procura do mundo dos possiacuteveis

Esse eacute o processo de conhecimento das coisas que po-deriam ou deveriam existir algumas das quais existem Por exemplo quando vejo um belo castelo Ele corres-ponde a ideias que todos tivemos na mente sobre um cas-telo inexistente Entatildeo minha primeira reflexatildeo eacute ldquoAqui estaacute o inexistente que eu procuravardquo

Muita coisa que parece estar no mero mundo dos possiacuteveis existe Eacute questatildeo de saber procurar Em uacutelti-ma anaacutelise se fosse bem ordenado o turismo perfeito se-ria uma procura pelo mundo dos possiacuteveis que a pessoa natildeo conheceu

Essa procura eacute um pouco o que vai dando acircnimo e movimentaccedilatildeo agrave vida O contraacuterio eacute o tipo de velho que no domingo agraves trecircs horas da tarde junto com sua espo-sa acabou de almoccedilar ele estaacute bem satisfeito e ela estaacute aliviada porque o marido almoccedilou bem e gostou da re-feiccedilatildeo Ele se senta numa cadeira e fica ruminando com desapontamento porque ele acha que natildeo haacute mais pos-siacuteveis

Propriamente a substacircncia dessa velhice mal concebi-da eacute crer pouco nos meramente possiacuteveis do Ceacuteu e achar que na Terra natildeo adianta conhececirc-los porque jaacute se viu que todas essas coisas fanam Entatildeo o velho fica sentado na cadeira ruminando sua bronquite Essa eacute a substacircncia desse conceito de velhice

Antigamente como a senhora mdash de modo habitual natildeo necessariamente mdash era melhor do que o homem ela ficava pensando um pouquinho no Ceacuteu e nas saudades do tempo que se foi

O homem pouco sujeito a saudades natildeo pensava no Ceacuteu mas de vez em quando o relacircmpago do Inferno lhe aparecia pela mente E isso o levava a fazer a sua Confis-satildeo e Comunhatildeo pascais Assim era a velhice

Havia uma casa mdash creio que natildeo existe mais mdash na es-quina da Rua Imaculada Conceiccedilatildeo com a Rua Martim Francisco1 Eu percebia pela conformaccedilatildeo do preacutedio

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que existiam muitos quartos de dormir vazios donde se deduz terem morado filhos ali que depois tinham se mu-dado e o casal residia sozinho

Eu entatildeo imaginava o velho e a velha possiacutevel no niacute-vel daquela residecircncia que era uma casa mediana Esse velho e essa velha eu os construiacutea de vaacuterios velhos e ve-lhas que tinha conhecido

Como a ideia da Contra-Revoluccedilatildeo foi elaborada no espiacuterito de Dr Plinio

Estou explicitando agora Mas a explicitaccedilatildeo eacute fruto de um trabalho lento que a mim me daacute a impressatildeo de que natildeo estou trabalhando mas simplesmente vivendo Eu diria que parei Mas de repente saio com uma en-xurrada de coisas que assim nunca pensei Eacute o lento tra-balho terminal que deve aprontar na mente

A Contra-Revoluccedilatildeo considerada no seu conjunto teve exatamente esse papel no meu espiacuterito

Primeiro formei impressotildees observei fatos tomei conhecimento pela leitura de alguns tantos aconteci-mentos histoacutericos e tambeacutem conheci muito pelas nar-raccedilotildees mais ou menos agrave Alexandre Dumas que circu-lavam no ambiente familiar a respeito desse ou daque-le caso

Por exemplo Maria Antonieta Na minha geraccedilatildeo o preconceito contra Maria Antonieta era uma coisa atroz ldquoMulher dura maacute traidora favorecia os austriacuteacos De uma beleza esplendorosa mdash era vista assim mdash que fazia com que todas as mulheres feias ficassem complexadas pensando nelardquo

Mas contavam que o povo faminto chegou a Versailles e ela estava tatildeo alheia agraves verdadeiras necessidades do po-vo que disse ldquoEntatildeo se vocecircs natildeo tecircm patildeo comam brio-cherdquo E ela nem sabia bem que brioche era mais caro que o patildeo porque problema de dinheiro natildeo existia para ela Entatildeo deu um conselho que provava mdash assim diziam mdash como ela vivia alheia ao sofrimento do povo

Eu me lembro de ainda pequeno perguntando para Dona Lucilia

mdash Mas mamatildee o que eacute briochemdash Uns bolinhos excelentesNatildeo cheguei a me perguntar por que ela natildeo fazia

brioche para eu comer Ateacute laacute a gula natildeo chegouhellip Mas vejam a provaccedilatildeo para uma crianccedila que ainda natildeo sabe o que eacute brioche

ldquoEntatildeo as pessoas bonitas alinhadas estiladas supe-riores natildeo tecircm coraccedilatildeo porque seguem demais regras e se endurecem com essas regras Por que seguir a regra endurece e cega para a compaixatildeo com os que natildeo con-seguiram seguir a regra Entatildeo seguir as regras eacute maurdquo

Minha resposta interior

ldquoNatildeo pode ser Porque entre bem e bem natildeo pode ha-ver incompatibilidaderdquo

A doutrina natildeo eacute o ponto de partida mas o de chegada

A importacircncia que dou ao raciociacutenio faz com que eu natildeo considere nada por acabado se natildeo foi raciocinado Porque todo esse processo de intuiccedilatildeo tem que chegar a raciociacutenios que provem ou natildeo provem aquilo que foi an-tes intuiacutedo apalpado pressentido

Podem entatildeo imaginar o meu encantamento lendo o ldquoTratado de Direito Naturalrdquo de Taparelli drsquoAzeglio o ldquoTratado de Sociologia Catoacutelicardquo de Albeacuteric Belliot um franciscano enfim uma flotilha de coisas que eu li e me provaram por exemplo a legitimidade do direito de pro-priedade que era uma coisa instintiva mas cuja legitimi-dade eu apanhei aiacute

Quando vi que o direito de propriedade a instituiccedilatildeo da famiacutelia a indissolubilidade do viacutenculo matrimonial a autoridade paterna mdash cuja liceidade era intuiacuteda por mim mdash se baseavam num raciociacutenio claro liacutempido perfeito tive um entusiasmo enorme

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Ostensoacuterio da Igreja de Santa Maria - Cracoacutevia Polocircnia

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Isso deu ao meu pensamento uma estrutura que veio depois de mil apalpaccedilotildees

Essa eacute uma caracteriacutestica do meu espiacuterito natildeo come-ccedilar por ler a doutrina mas por pegar a realidade Depois de ter intuiacutedo na realidade ir ver a doutrina E aiacute ter um contentamento um gaacuteudio enorme

Estou longe de ser daqueles que julgam dever prescin-dir da doutrina mas a questatildeo eacute que para muitos a dou-trina eacute o ponto de partida e na conformaccedilatildeo do meu espiacuterito eacute o ponto de chegada

Todas essas coisas com o tempo acabam for-mando um depoacutesito primeiro de impressotildees maturadas para raciocinar E enquanto jaacute vou raciocinando algumas de minhas im-pressotildees continuo a maturar ou explici-tar outras Entatildeo noacutes poderiacuteamos dizer que esse processo eacute

Primeiro observar captando e classificando subconscientemente

Segundo estabelecendo oposiccedilotildees e come-ccedilando por aiacute a explicitaccedilatildeo

Terceiro fazer os primeiros raciociacutenios que constituem pontas de trilho para que daiacute para diante em contato com qualquer coisa nova o processo in-teiro vai se movendo

Concepccedilatildeo sacral da vida

Isso forma inclusive o pro-gresso na vida espiritual

Por exemplo a noccedilatildeo de sacralidade no comeccedilo eacute muito mais viacutevida em re-laccedilatildeo agrave Igreja Depois me-nos em referecircncia agrave au-toridade paterna dentro da famiacutelia como entida-de toda ela sacral num certo sentido especial da palavra ldquosacralrdquo E tambeacutem em relaccedilatildeo ao mi-to monaacuterquico dentro do Es-tado que pode ser sacral se o indiviacuteduo qui-ser vecirc-lo assim oferececirc-lo agrave Igreja e pedir as becircnccedilatildeos dela a fim de sacralizaacute-lo

Isso acaba dando lugar a uma noccedilatildeo de sacralidade adequada agraves coisas temporais que eacute um desdobramento da noccedilatildeo do sacral mdash proacutepria das coisas estritamente espiritu-ais e sobrenaturais mdash e formando no espiacuterito vaacuterios degraus e modos de ser da sacralidade

cujo auge sempre me pareceu como sendo a Consagraccedilatildeo durante a Missa mais do que a minha Comunhatildeo

Agora uma coisa que eacute pessoal sou mais sensiacutevel agrave sacralidade do ato da Consagraccedilatildeo enquanto conside-rado na Consagraccedilatildeo do vinho e a apresentaccedilatildeo do caacuteli-ce para o povo adorar do que na Consagraccedilatildeo do patildeo e a apresentaccedilatildeo para ser adorado

Eu tinha a impressatildeo mdash que soube depois natildeo cor-responder agrave realidade mdash de que a transubstan-

ciaccedilatildeo se dava no momento da elevaccedilatildeo E daiacute aquele respeito e aquela veneraccedilatildeo

Porque nos fieacuteis haacute um redobrar de res-peito e veneraccedilatildeo quando o Santiacutessi-mo eacute elevado Compreende-se por-que eacute exposto para eles adorarem en-

tatildeo fazerem um ato interior que corres-ponde a essa exposiccedilatildeo Mas eu achava

que era porque a transubstanciaccedilatildeo estava se dando naquele momento

A forma material do caacutelice eacute tatildeo evo-cativa do que eacute o oferecimento da sacra-

lidade Uma alma que se oferece ou oferece alguma coisa de dentro de

si eacute tatildeo bem representada por um caacutelice que se abre e que daacute tudo

o que tem Por outro lado o vi-nho eacute tatildeo mais parecido com

o sangue do que o patildeo o eacute com o corpo que tudo isso me dava mais sen-saccedilatildeo mdash puramente fiacute-sica e analoacutegica mdash de sacralidade

A simples presen-ccedila do Santiacutessimo Sa-cramento exposto me dava uma sensaccedilatildeo de sacralidade colos-sal Muito mais do que o Santiacutessimo guarda-do na capela-mor Po-der chegar perto drsquoEle adoraacute-Lo produz em

mim impressotildees de sa-cralidade que eu acho que

possuem qualquer coisa de miacutestico muito maiores do

que as que se tecircm em contato com a sociedade temporal

Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus - Igreja Imaculada Conceiccedilatildeo Goa Iacutendia

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Mas por esse progresso de alma de que estou falan-do a pessoa vai compreendendo que em formas termos e modos diferentes a sociedade temporal inteira acaba tendo qualquer coisa de sacral E entatildeo uma concep-ccedilatildeo toda ela sacral da vida vai se maturando lentamente ao longo das deacutecadas para depois fazer uma confericcedilatildeo com os autores especializados

Porque a palavra definitiva eacute deles Eles representam a Igreja que eacute infaliacutevel e portanto vamos ouvir o que a Santa Matildee Igreja ensina a esse respeito E ensina na for-ccedila da palavra ldquoensinarrdquo quer dizer ela eacute a Mestra infaliacute-vel eu sou o aluno bobo que posso ter feito um engano e apresento a ela aquilo que pensei

No princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Eacute um processo que em certo momento entra numa apa-rente estagnaccedilatildeo e continua a elaboraccedilatildeo em profundidade De maneira que quem me conhece haacute muito tempo eacute pos-siacutevel que tenha tido ideia de que em algumas coisas eu es-tou me repetindo indefinidamente Mas se forem examinar de perto notaratildeo que tem sempre alguma coisinha nova que corresponde em profundidade a esse processo lento

Mas isso levanta um problema Esse natildeo eacute mdash em suas linhas gerais natildeo nos seus pormenores mdash o proacuteprio meacute-todo de pensar legiacutetimo do espiacuterito humano

Vamos formular a coisa assim O primeiro livro foi escrito por um homem que natildeo teve livros Entatildeo a cultura nasceu de um pensamento anterior ao livro Logo no processo in-telectual no princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Entatildeo eu volto ao ponto de partidaO unum eacute o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus de uma ma-

jestade infinita doccedilura infinita sabedoria infinita de um poder infinito e de uma bondade infinita para dizer soacute alguns atributos Tudo isso eacute uma siacutentese para chegar ateacute Ele compreendecirc-Lo

A teoria geral das vaacuterias formas de crescimento de desen-volvimento que apresentei no comeccedilo da reuniatildeo parece natildeo ter relaccedilatildeo alguma com Ele Mas no fundo eacute a Ele que visa-mos Ele eacute o alfa e o ocircmega o unum eacute Ele Ele eacute o comeccedilo e o fim de tudo E se de algum modo todas essas reflexotildees natildeo vi-sassem o melhor conhecimento drsquoEle natildeo teriam valor

Numa conversa os espiacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical

Em toda essa teoria a conversa tem um papel enor-me porque ela no fundo requer certo discernimento dos espiacuteritos e uma percepccedilatildeo do que conveacutem ou natildeo ser dito Quando natildeo conveacutem deve-se ter o suficiente desa-pego para natildeo tratar

Muita gente conversa sobre aquilo que tem vontade de conversar Isso eacute a morte da conversaccedilatildeo A conver-sa boa nem eacute sobre aquilo que tenho ou meu interlocu-tor tem vontade de conversar mas sim tratar daquilo em que noacutes dois podemos igualmente gostar de conversar O resto eacute a morte da conversaccedilatildeo

Agrave medida que uma conversa estaacute bem travada os es-piacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical E quando se entendem bem vatildeo mudando de tema igual-mente muito mais por apetecircncias do que por nexos loacutegi-cos Entra em algo o nexo loacutegico mas satildeo nexos psicoloacute-gicos mudanccedilas de temas vizinhos que vatildeo fazendo com que as duas pessoas gostem das mesmas coisas Entatildeo a conversa aiacute se torna deliciosa

Eacute mais ou menos como por exemplo duas pessoas que passeiam juntas no centro de Roma a caminho das catacumbas Passam por uma loja qualquer que tem gra-vatas bonitas os dois estatildeo precisando comprar gravatas param olham gostam conversam Depois transitam em frente a uma confeitaria e comem algum doce E assim chegam agrave catacumba

A conversa soacute pega mesmo mdash ao menos eacute a impressatildeo que eu tenho mdash quando na pontinha do que estaacute sendo con-versado haacute qualquer coisa que eacute uma graccedila de Deus sobre alguma coisa de transcendente maravilhoso que por uma pontinha de consolaccedilatildeo sensiacutevel ambos estatildeo sentindo

Pode ser o unum ou natildeo Pode ser uma consolaccedilatildeo que todos tecircm juntos sobre um ponto que Nossa Senho-ra quer glorificar Entatildeo a conversa em geral tem um fundinho comum de supremo E quanto mais esse fundi-nho eacute sentido por todos mais a conversa eacute animada

Donde se tira uma conclusatildeo linda o principal inter-locutor eacute o Interlocutor Divino presente em nossa con-versa falando dentro das nossas almas e elogiando-se a Si proacuteprio por nossos laacutebios

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece

Isso daacute uma elevaccedilatildeo ao conceito de conversa em que Deus estaacute sempre presente natildeo soacute mdash e jaacute eacute muito mdash atra-veacutes da Feacute mas tambeacutem no fundo por alguma coisa comu-nicada diretamente pela graccedila que se torna sensiacutevel e cau-sa alegria Esse eacute o sal da conversa e que a Providecircncia daacute quando quer Eacute certa forma de sensiacutevel Natildeo eacute uma mera troca de ideias teoacuterica mas algo que vai mais alto

Eu volto a dizer pasma mas eacute fato o Divino Interlo-cutor eacute propriamente Aquele que fala Ele fala pela boca de um responde pela boca de outro e Se alegra pelo co-raccedilatildeo de todos Eacute uma coisa muito bonita

Pode-se dar um fato parecido com esse na ordem me-ramente natural O exemplo mais caracteriacutestico disso eacute

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

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ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

Ric

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orai

s (C

C 3

0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

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mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 7: Revista Doctor Plinio 207_201506

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sileira Natildeo soacute apreciavam isso os brasilei-ros mas os estrangeiros oriundos de pa-iacuteses que estavam na conflagraccedilatildeo mas que tinham vindo para o Brasil antes da guerra Eles tinham pais irmatildeos filhos netos metidos na conflagra-ccedilatildeo Isso lhes interessava mas so-bretudo o que eles possuiacuteam era um bem-estar de pessoalmente natildeo participar da guerra

Quando chegava a tardinha era frequente verem-se nas ruas da Satildeo Paulinho rodas formadas na calccedilada por famiacutelias de imigran-tes As donas de casa faziam pratos do tempo em que viviam em seus pa-iacuteses de origem os homens conversa-vam davam risadas as crianccedilas brinca-vam todos se preparando para comer e depois comendo valorosamente comentando como era bom eles natildeo estarem na guerra

Comecei a observar isso e percebi que havia duas ati-tudes perante a conflagraccedilatildeo uma a daqueles a quem era sobretudo agradaacutevel estar longe dela a outra a dos que admiravam a guerra compreendiam sua beleza Es-tes uacuteltimos natildeo podiam ir agrave guerra porque tinham com-promissos aqui no Brasil para manter a famiacutelia se eles fossem poderiam morrer e a famiacutelia ficava abandonada Mas acompanhavam os jornais com o espiacuterito de lutado-res seu paiacutes avanccedilou ou recuou os aliados deles avanccedila-ram ou recuaram os meios de destruiccedilatildeo se acentuaram Aparece o aeroplano entatildeo o grande perigo satildeo os voos Depois surgem os gases asfixiantes os bombardeios em massa das grandes cidades E no fim coisa talvez pior do que tudo as epidemias que contagiavam agraves vezes um pa-iacutes inteiro e que constituiacuteam uma tristeza uma coisa hor-riacutevel

Atrozes ferimentos causados pela conflagraccedilatildeo

Eu tive uma governanta austriacuteaca que era solteira e ofereceu-se para durante o dia trabalhar num hospital de feridos de guerra

Ela disse que os ferimentos eram atrozes Por exem-plo um jovem que tinha ido para combater e voltou com um ferimento que de si natildeo era mortal mas ele natildeo podia falar porque um projeacutetil lhe arrancara o queixo Quando ele precisava de alguma coisa tocava uma sine-ta e escrevia com letra trecircmula de algueacutem que estaacute gra-vemente doente aquilo de que precisava Agraves vezes natildeo conseguia escrever por inteiro deixava cair sobre a cama

a caneta e o papel e ficava esperando um momento em que um pouquinho mais de

forccedila lhe permitisse fazer o pedidoMinha governanta contava que

pelo regulamento do hospital as enfermeiras tinham horaacuterios de-terminados para descansar por-que se elas ficassem doentes tam-beacutem o hospital tornava-se ino-perante As enfermeiras precisa-vam ter uma defesa contra a epi-demia entatildeo o hospital manda-va-as repousar Mas quando mi-

nha governanta estava descansan-do e se lembrava de que talvez o

homem sem queixo precisasse de al-guma coisa ela se levantava agraves escon-

didas e ia verificar se ele queria algo Quem censuraria uma atitude como essa

Soacute poderia aplaudir Mas que condiccedilotildees de vida que horrores que monstruosidades

Reflexatildeo sobre o magniacutefico tema da dor

Tudo isso representava o sofrimento e eu notava que Dona Lucilia tinha em face desses fatos uma atitude muito mais pensativa e mais seacuteria do que as outras pes-soas Estas comentavam como ela as notiacutecias que os jor-nais publicavam por vezes com sensacionalismo que im-pressionava muito o puacuteblico eacute natural

Por exemplo acabava o almoccedilo de domingo todos se espalhavam pela sala de jantar e comeccedilavam a conversar sobre esses assuntos Lembro-me ateacute hoje de que quan-do um velho reloacutegio de parede com um bonito som marcava duas horas da tarde havia sempre um espiacuterito mais leviano e superficial que dizia com uma voz que do-minava a todos ldquoMeus caros agora chegou a vez de nos divertirmos Vocecirc vai para onde E vocecirc Vamos fazer os nossos programasrdquo Entatildeo uns iam passear nos arredo-res da cidade outros faziam visitas enfim essa vida leve dos domingos

Eu percebia que Dona Lucilia acompanhava mas que o espiacuterito dela ia para a compaixatildeo por aqueles que ti-nham sofrido fazia oraccedilatildeo por eles para Nossa Senhora aliviar ou ateacute para evitar esse sofrimento Mas sobretu-do fazia a reflexatildeo sobre o grande o nobre o magniacutefico tema da dor E dentro deste tema outro ainda mais bo-nito o heroiacutesmo a coragem

Isto ia formando a alma de um menino   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2671995)

8

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Divino InterlocutorEm sua concepccedilatildeo sacral da existecircncia no processo de seu pensamento e ateacute na elaboraccedilatildeo de uma arte de conversar

Dr Plinio tinha como fonte de inspiraccedilatildeo e ponto de convergecircncia o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

U m tema que daria para um estudo muito in-teressante eacute a exposiccedilatildeo analiacutetica de todos os modos pelos quais as coisas na Criaccedilatildeo cres-

cem Elas tecircm modos diferentes de crescer e de evoluir para chegar ateacute a morte e nesta haacute tambeacutem um proces-so que natildeo eacute sempre anaacutelogo Entatildeo haacute o crescimento depois uma fase de expansatildeo e o deperecimento

Iniacutecio expansatildeo e morte

E isso eacute tatildeo diferente nas vaacuterias espeacutecies de vegetais e em cada planta em particular Eacute diverso nos bichos e nas velocidades materiais E tambeacutem em todo o processo de pensamento e de desenvolvimento do homem

Nesse crescer expandir-se e morrer Deus Nosso Senhor fez um verdadeiro jogo de maravilhas que evidentemente as pessoas que cul-tuam a natureza natildeo se datildeo o tra-balho de apreciar Porque isso su-potildee um miacutenimo de pensamento de contemplaccedilatildeo e de meditaccedilatildeo E es-se tipo de meditaccedilatildeo em geral elas natildeo querem fazer

Tudo isso mdash nas plantas nos ani-mais e nas velocidades materiais mdash eacute simboacutelico de um modo ou de ou-tro do processo do homem eacute sim-boacutelico da vida terrena de Nosso Se-nhor e da trajetoacuteria da Histoacuteria do curso dos acontecimentos

Ateacute mesmo certas coisas que satildeo feitas para matar e natildeo para vi-ver mdash por exemplo uma batalha mdash tecircm seu comeccedilo seu crescimento

depois seu murchamento e caem Um dos aspectos boni-tos desse estudo eacute a questatildeo dos recrudescimentos quais satildeo suas origens que forccedilas tecircm como se faz um recru-descimento Soacute o tema dos recrudescimentos daria pa-ra uma doutrina interessantiacutessima da Contra-Revoluccedilatildeo

Ateacute os fogos de artifiacutecio podem ter uma trajetoacuteria muito bonita nesse sentido

Um universo de belezas

Uma das coisas que eu gosto de apreciar no mar eacute exa-tamente o nascimento da onda depois o sistema de on-das quando elas arrebentam ou expiram na praia

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Tambeacutem a ilusoacuteria perpetuidade da calmariahellip Co-mo dentro da calmaria o primeiro elementozinho indica uma mudanccedila completa das coisas que vatildeo se acumulan-do Eacute um processo muito bonito

Isto tudo eacute uma verdadeira maravilha que depois tem sua transposiccedilatildeo para os processos poliacuteticos para a histoacute-ria das instituiccedilotildees das correntes de espiritualidade etc

Haacute um universo de belezas aiacute que ao homem foi da-do contemplar com olho raacutepido furtivo e atento porque natildeo tem tempo para pensar nisso Mas que eacute uma coisa lindiacutessima

Por exemplo haacute mortes que satildeo como um Amazonas desembocando na eternidade quase que empurra a eter-nidade um pouco para fora Mas existem outras mortes como um riozinho pequenininho humildezinho que vai dar diretamente no mar e se perde envergonhadinho com um sussurro que o mar incorpora a sihellip

Haacute uma porccedilatildeo de coisas bonitas interessantes para ver dentro disso E isso se aplica muito agrave histoacuteria de um homem

Por temperamento sou muito estaacutevel e gosto das coi-sas estaacuteveis que duram na calmaria

Natildeo concebo o Ceacuteu num perpeacutetuo movimento mas com diferentes modos de ser da estabilidade Natildeo eacute a ins-tabilidade eacute a mutaccedilatildeo dentro da estabilidade

Processo de pensamento de Dr Plinio

Todas as doutrinas e temas mdash portanto tambeacutem o conceito de sacralidade mdash tecircm um modo de se desenvol-ver peculiar de cada indiviacuteduo Em mim essa peculiari-dade eacute assim

Primeiro um nascimento cheio de intuiccedilotildees de gra-ccedilas ultra-alcandorado em que entra de um modo espe-cial uma visatildeo confusa do ultramaravilhoso e do ponto terminal bom do ponto supremo do auge e o encanta-mento por esse auge

Depois do auge bem visto e de dar a ele tudo quanto naquele estaacutegio da vida espiritual ele merece que se decirc entatildeo vem um periacuteodo de aparente estabilidade mas de fato eacute um periacuteodo em que se vai ldquocozinhandordquo lentamen-te a explicitaccedilatildeo

Ao mesmo tempo mdash eacute como se daacute concretamente co-migo mdash um periacuteodo de luta em que a explicitaccedilatildeo eacute aju-dada possantemente pela contestaccedilatildeo Porque aquele conhecimento confuso primeiro vem acompanhado de uma impliacutecita rejeiccedilatildeo do que natildeo eacute aquilo E quando al-gueacutem afirma o contraacuterio vem a repulsa

Na repulsa implicitamente fica mais conhecido aquilo que foi negado E ao mesmo tempo em que se prepara a apologeacutetica elabora-se a explicitaccedilatildeo A apologeacutetica e a explicitaccedilatildeo satildeo fenocircmenos reversiacuteveis um no outro De

maneira que eu me torno conhecedor das coisas por dois dados por uma espeacutecie de conaturalidade e por uma es-peacutecie de repulsa daquilo que eacute contraacuterio

Num determinado momento tudo o que se podia co-nhecer a respeito daquilo estaacute conhecido com os proacute-prios recursos e com a observaccedilatildeo concreta da vida Aiacute chega a hora da leitura Natildeo antes

Podem percorrer todos os livros de minha biblioteca e encontraratildeo sinais disso A leitura veio exatamente de-pois para ajudar esse processo dando mais informaccedilotildees fazendo com que a pessoa se situe ante o que diz o es-critor e portanto julgue eacute ldquosimrdquo eacute ldquonatildeordquo eacute ldquotalvezrdquo eacute ldquoconformerdquo etc

Depois de tudo isso feito haacute mais uma vez uma nova aparente estagnaccedilatildeo em que todos esses elementos re-colhidos satildeo objetos de uma nova siacutentese E vem uma vi-satildeo final que depois cresce pouco na aparecircncia mas que de fato tem muita intensidade E prepara o ato de amor terminal

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Eu natildeo sei se isso seraacute assim em outros Desconfio muito que natildeo e que varia muito de acordo com o cami-nho de Deus para cada pessoa

A inocecircncia eacute o princiacutepio da sabedoria

Graccedilas a Nossa Senhora haacute nesse processo muita ino-cecircncia Porque natildeo eacute soacute conhecendo a coisa em si mas eacute conferindo os dados externos com a inocecircncia A inocecircn-cia nesse sentido eacute um comeccedilar de sabedoria Ela cons-titui uma espeacutecie de ortodoxia

O que eu disse agora haacute um ano eu natildeo teria tatildeo cla-ro a ponto de explicitar neste momento estou explicitan-do com facilidade

Na aparecircncia isso em mim se encontrava parado mas de fato estava sendo preparada esta explicita-ccedilatildeo O que indica que havia uma accedilatildeo profunda mdash muito silenciosa tranquila discreta mas natildeo pouco ativa mdash para passar do uacuteltimo estaacutegio de um conhe-cimento confuso para o conhecimento inteiramente definido

Seria um crescimento contiacutenuo sob a forma de esta-bilidade mas na realidade trata-se de uma accedilatildeo em pro-fundidade Mais ou menos como o desenvolvimento da aacutervore jaacute crescida que natildeo cresce mais mas suga da ter-ra coisas que datildeo ao processo vital da aacutervore o meio de ir vivendo Examinando bem a aacutervore pode durante mui-to tempo ainda crescer em forccedila e em volume por esse processo

Entatildeo o conhecimento da transcendecircncia de Deus por exemplo depois de chegar a certo estaacutegio entra nes-sa fase de elaboraccedilatildeo profunda pouco perceptiva que de repente daacute um fruto muito mais sutil e melhor que eacute fazer as correlaccedilotildees entre os conjuntos que se tecircm na mente e daiacute nasce um determinado unum

E esse eacute o piacutencaro do processo intelectual e moral Porque esse piacutencaro jaacute eacute a primeira nota eacute a antiacutefona do cacircntico que noacutes devemos entoar no Ceacuteu

Procura do mundo dos possiacuteveis

Esse eacute o processo de conhecimento das coisas que po-deriam ou deveriam existir algumas das quais existem Por exemplo quando vejo um belo castelo Ele corres-ponde a ideias que todos tivemos na mente sobre um cas-telo inexistente Entatildeo minha primeira reflexatildeo eacute ldquoAqui estaacute o inexistente que eu procuravardquo

Muita coisa que parece estar no mero mundo dos possiacuteveis existe Eacute questatildeo de saber procurar Em uacutelti-ma anaacutelise se fosse bem ordenado o turismo perfeito se-ria uma procura pelo mundo dos possiacuteveis que a pessoa natildeo conheceu

Essa procura eacute um pouco o que vai dando acircnimo e movimentaccedilatildeo agrave vida O contraacuterio eacute o tipo de velho que no domingo agraves trecircs horas da tarde junto com sua espo-sa acabou de almoccedilar ele estaacute bem satisfeito e ela estaacute aliviada porque o marido almoccedilou bem e gostou da re-feiccedilatildeo Ele se senta numa cadeira e fica ruminando com desapontamento porque ele acha que natildeo haacute mais pos-siacuteveis

Propriamente a substacircncia dessa velhice mal concebi-da eacute crer pouco nos meramente possiacuteveis do Ceacuteu e achar que na Terra natildeo adianta conhececirc-los porque jaacute se viu que todas essas coisas fanam Entatildeo o velho fica sentado na cadeira ruminando sua bronquite Essa eacute a substacircncia desse conceito de velhice

Antigamente como a senhora mdash de modo habitual natildeo necessariamente mdash era melhor do que o homem ela ficava pensando um pouquinho no Ceacuteu e nas saudades do tempo que se foi

O homem pouco sujeito a saudades natildeo pensava no Ceacuteu mas de vez em quando o relacircmpago do Inferno lhe aparecia pela mente E isso o levava a fazer a sua Confis-satildeo e Comunhatildeo pascais Assim era a velhice

Havia uma casa mdash creio que natildeo existe mais mdash na es-quina da Rua Imaculada Conceiccedilatildeo com a Rua Martim Francisco1 Eu percebia pela conformaccedilatildeo do preacutedio

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Carcassone Franccedila

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que existiam muitos quartos de dormir vazios donde se deduz terem morado filhos ali que depois tinham se mu-dado e o casal residia sozinho

Eu entatildeo imaginava o velho e a velha possiacutevel no niacute-vel daquela residecircncia que era uma casa mediana Esse velho e essa velha eu os construiacutea de vaacuterios velhos e ve-lhas que tinha conhecido

Como a ideia da Contra-Revoluccedilatildeo foi elaborada no espiacuterito de Dr Plinio

Estou explicitando agora Mas a explicitaccedilatildeo eacute fruto de um trabalho lento que a mim me daacute a impressatildeo de que natildeo estou trabalhando mas simplesmente vivendo Eu diria que parei Mas de repente saio com uma en-xurrada de coisas que assim nunca pensei Eacute o lento tra-balho terminal que deve aprontar na mente

A Contra-Revoluccedilatildeo considerada no seu conjunto teve exatamente esse papel no meu espiacuterito

Primeiro formei impressotildees observei fatos tomei conhecimento pela leitura de alguns tantos aconteci-mentos histoacutericos e tambeacutem conheci muito pelas nar-raccedilotildees mais ou menos agrave Alexandre Dumas que circu-lavam no ambiente familiar a respeito desse ou daque-le caso

Por exemplo Maria Antonieta Na minha geraccedilatildeo o preconceito contra Maria Antonieta era uma coisa atroz ldquoMulher dura maacute traidora favorecia os austriacuteacos De uma beleza esplendorosa mdash era vista assim mdash que fazia com que todas as mulheres feias ficassem complexadas pensando nelardquo

Mas contavam que o povo faminto chegou a Versailles e ela estava tatildeo alheia agraves verdadeiras necessidades do po-vo que disse ldquoEntatildeo se vocecircs natildeo tecircm patildeo comam brio-cherdquo E ela nem sabia bem que brioche era mais caro que o patildeo porque problema de dinheiro natildeo existia para ela Entatildeo deu um conselho que provava mdash assim diziam mdash como ela vivia alheia ao sofrimento do povo

Eu me lembro de ainda pequeno perguntando para Dona Lucilia

mdash Mas mamatildee o que eacute briochemdash Uns bolinhos excelentesNatildeo cheguei a me perguntar por que ela natildeo fazia

brioche para eu comer Ateacute laacute a gula natildeo chegouhellip Mas vejam a provaccedilatildeo para uma crianccedila que ainda natildeo sabe o que eacute brioche

ldquoEntatildeo as pessoas bonitas alinhadas estiladas supe-riores natildeo tecircm coraccedilatildeo porque seguem demais regras e se endurecem com essas regras Por que seguir a regra endurece e cega para a compaixatildeo com os que natildeo con-seguiram seguir a regra Entatildeo seguir as regras eacute maurdquo

Minha resposta interior

ldquoNatildeo pode ser Porque entre bem e bem natildeo pode ha-ver incompatibilidaderdquo

A doutrina natildeo eacute o ponto de partida mas o de chegada

A importacircncia que dou ao raciociacutenio faz com que eu natildeo considere nada por acabado se natildeo foi raciocinado Porque todo esse processo de intuiccedilatildeo tem que chegar a raciociacutenios que provem ou natildeo provem aquilo que foi an-tes intuiacutedo apalpado pressentido

Podem entatildeo imaginar o meu encantamento lendo o ldquoTratado de Direito Naturalrdquo de Taparelli drsquoAzeglio o ldquoTratado de Sociologia Catoacutelicardquo de Albeacuteric Belliot um franciscano enfim uma flotilha de coisas que eu li e me provaram por exemplo a legitimidade do direito de pro-priedade que era uma coisa instintiva mas cuja legitimi-dade eu apanhei aiacute

Quando vi que o direito de propriedade a instituiccedilatildeo da famiacutelia a indissolubilidade do viacutenculo matrimonial a autoridade paterna mdash cuja liceidade era intuiacuteda por mim mdash se baseavam num raciociacutenio claro liacutempido perfeito tive um entusiasmo enorme

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Ostensoacuterio da Igreja de Santa Maria - Cracoacutevia Polocircnia

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Isso deu ao meu pensamento uma estrutura que veio depois de mil apalpaccedilotildees

Essa eacute uma caracteriacutestica do meu espiacuterito natildeo come-ccedilar por ler a doutrina mas por pegar a realidade Depois de ter intuiacutedo na realidade ir ver a doutrina E aiacute ter um contentamento um gaacuteudio enorme

Estou longe de ser daqueles que julgam dever prescin-dir da doutrina mas a questatildeo eacute que para muitos a dou-trina eacute o ponto de partida e na conformaccedilatildeo do meu espiacuterito eacute o ponto de chegada

Todas essas coisas com o tempo acabam for-mando um depoacutesito primeiro de impressotildees maturadas para raciocinar E enquanto jaacute vou raciocinando algumas de minhas im-pressotildees continuo a maturar ou explici-tar outras Entatildeo noacutes poderiacuteamos dizer que esse processo eacute

Primeiro observar captando e classificando subconscientemente

Segundo estabelecendo oposiccedilotildees e come-ccedilando por aiacute a explicitaccedilatildeo

Terceiro fazer os primeiros raciociacutenios que constituem pontas de trilho para que daiacute para diante em contato com qualquer coisa nova o processo in-teiro vai se movendo

Concepccedilatildeo sacral da vida

Isso forma inclusive o pro-gresso na vida espiritual

Por exemplo a noccedilatildeo de sacralidade no comeccedilo eacute muito mais viacutevida em re-laccedilatildeo agrave Igreja Depois me-nos em referecircncia agrave au-toridade paterna dentro da famiacutelia como entida-de toda ela sacral num certo sentido especial da palavra ldquosacralrdquo E tambeacutem em relaccedilatildeo ao mi-to monaacuterquico dentro do Es-tado que pode ser sacral se o indiviacuteduo qui-ser vecirc-lo assim oferececirc-lo agrave Igreja e pedir as becircnccedilatildeos dela a fim de sacralizaacute-lo

Isso acaba dando lugar a uma noccedilatildeo de sacralidade adequada agraves coisas temporais que eacute um desdobramento da noccedilatildeo do sacral mdash proacutepria das coisas estritamente espiritu-ais e sobrenaturais mdash e formando no espiacuterito vaacuterios degraus e modos de ser da sacralidade

cujo auge sempre me pareceu como sendo a Consagraccedilatildeo durante a Missa mais do que a minha Comunhatildeo

Agora uma coisa que eacute pessoal sou mais sensiacutevel agrave sacralidade do ato da Consagraccedilatildeo enquanto conside-rado na Consagraccedilatildeo do vinho e a apresentaccedilatildeo do caacuteli-ce para o povo adorar do que na Consagraccedilatildeo do patildeo e a apresentaccedilatildeo para ser adorado

Eu tinha a impressatildeo mdash que soube depois natildeo cor-responder agrave realidade mdash de que a transubstan-

ciaccedilatildeo se dava no momento da elevaccedilatildeo E daiacute aquele respeito e aquela veneraccedilatildeo

Porque nos fieacuteis haacute um redobrar de res-peito e veneraccedilatildeo quando o Santiacutessi-mo eacute elevado Compreende-se por-que eacute exposto para eles adorarem en-

tatildeo fazerem um ato interior que corres-ponde a essa exposiccedilatildeo Mas eu achava

que era porque a transubstanciaccedilatildeo estava se dando naquele momento

A forma material do caacutelice eacute tatildeo evo-cativa do que eacute o oferecimento da sacra-

lidade Uma alma que se oferece ou oferece alguma coisa de dentro de

si eacute tatildeo bem representada por um caacutelice que se abre e que daacute tudo

o que tem Por outro lado o vi-nho eacute tatildeo mais parecido com

o sangue do que o patildeo o eacute com o corpo que tudo isso me dava mais sen-saccedilatildeo mdash puramente fiacute-sica e analoacutegica mdash de sacralidade

A simples presen-ccedila do Santiacutessimo Sa-cramento exposto me dava uma sensaccedilatildeo de sacralidade colos-sal Muito mais do que o Santiacutessimo guarda-do na capela-mor Po-der chegar perto drsquoEle adoraacute-Lo produz em

mim impressotildees de sa-cralidade que eu acho que

possuem qualquer coisa de miacutestico muito maiores do

que as que se tecircm em contato com a sociedade temporal

Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus - Igreja Imaculada Conceiccedilatildeo Goa Iacutendia

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Mas por esse progresso de alma de que estou falan-do a pessoa vai compreendendo que em formas termos e modos diferentes a sociedade temporal inteira acaba tendo qualquer coisa de sacral E entatildeo uma concep-ccedilatildeo toda ela sacral da vida vai se maturando lentamente ao longo das deacutecadas para depois fazer uma confericcedilatildeo com os autores especializados

Porque a palavra definitiva eacute deles Eles representam a Igreja que eacute infaliacutevel e portanto vamos ouvir o que a Santa Matildee Igreja ensina a esse respeito E ensina na for-ccedila da palavra ldquoensinarrdquo quer dizer ela eacute a Mestra infaliacute-vel eu sou o aluno bobo que posso ter feito um engano e apresento a ela aquilo que pensei

No princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Eacute um processo que em certo momento entra numa apa-rente estagnaccedilatildeo e continua a elaboraccedilatildeo em profundidade De maneira que quem me conhece haacute muito tempo eacute pos-siacutevel que tenha tido ideia de que em algumas coisas eu es-tou me repetindo indefinidamente Mas se forem examinar de perto notaratildeo que tem sempre alguma coisinha nova que corresponde em profundidade a esse processo lento

Mas isso levanta um problema Esse natildeo eacute mdash em suas linhas gerais natildeo nos seus pormenores mdash o proacuteprio meacute-todo de pensar legiacutetimo do espiacuterito humano

Vamos formular a coisa assim O primeiro livro foi escrito por um homem que natildeo teve livros Entatildeo a cultura nasceu de um pensamento anterior ao livro Logo no processo in-telectual no princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Entatildeo eu volto ao ponto de partidaO unum eacute o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus de uma ma-

jestade infinita doccedilura infinita sabedoria infinita de um poder infinito e de uma bondade infinita para dizer soacute alguns atributos Tudo isso eacute uma siacutentese para chegar ateacute Ele compreendecirc-Lo

A teoria geral das vaacuterias formas de crescimento de desen-volvimento que apresentei no comeccedilo da reuniatildeo parece natildeo ter relaccedilatildeo alguma com Ele Mas no fundo eacute a Ele que visa-mos Ele eacute o alfa e o ocircmega o unum eacute Ele Ele eacute o comeccedilo e o fim de tudo E se de algum modo todas essas reflexotildees natildeo vi-sassem o melhor conhecimento drsquoEle natildeo teriam valor

Numa conversa os espiacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical

Em toda essa teoria a conversa tem um papel enor-me porque ela no fundo requer certo discernimento dos espiacuteritos e uma percepccedilatildeo do que conveacutem ou natildeo ser dito Quando natildeo conveacutem deve-se ter o suficiente desa-pego para natildeo tratar

Muita gente conversa sobre aquilo que tem vontade de conversar Isso eacute a morte da conversaccedilatildeo A conver-sa boa nem eacute sobre aquilo que tenho ou meu interlocu-tor tem vontade de conversar mas sim tratar daquilo em que noacutes dois podemos igualmente gostar de conversar O resto eacute a morte da conversaccedilatildeo

Agrave medida que uma conversa estaacute bem travada os es-piacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical E quando se entendem bem vatildeo mudando de tema igual-mente muito mais por apetecircncias do que por nexos loacutegi-cos Entra em algo o nexo loacutegico mas satildeo nexos psicoloacute-gicos mudanccedilas de temas vizinhos que vatildeo fazendo com que as duas pessoas gostem das mesmas coisas Entatildeo a conversa aiacute se torna deliciosa

Eacute mais ou menos como por exemplo duas pessoas que passeiam juntas no centro de Roma a caminho das catacumbas Passam por uma loja qualquer que tem gra-vatas bonitas os dois estatildeo precisando comprar gravatas param olham gostam conversam Depois transitam em frente a uma confeitaria e comem algum doce E assim chegam agrave catacumba

A conversa soacute pega mesmo mdash ao menos eacute a impressatildeo que eu tenho mdash quando na pontinha do que estaacute sendo con-versado haacute qualquer coisa que eacute uma graccedila de Deus sobre alguma coisa de transcendente maravilhoso que por uma pontinha de consolaccedilatildeo sensiacutevel ambos estatildeo sentindo

Pode ser o unum ou natildeo Pode ser uma consolaccedilatildeo que todos tecircm juntos sobre um ponto que Nossa Senho-ra quer glorificar Entatildeo a conversa em geral tem um fundinho comum de supremo E quanto mais esse fundi-nho eacute sentido por todos mais a conversa eacute animada

Donde se tira uma conclusatildeo linda o principal inter-locutor eacute o Interlocutor Divino presente em nossa con-versa falando dentro das nossas almas e elogiando-se a Si proacuteprio por nossos laacutebios

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece

Isso daacute uma elevaccedilatildeo ao conceito de conversa em que Deus estaacute sempre presente natildeo soacute mdash e jaacute eacute muito mdash atra-veacutes da Feacute mas tambeacutem no fundo por alguma coisa comu-nicada diretamente pela graccedila que se torna sensiacutevel e cau-sa alegria Esse eacute o sal da conversa e que a Providecircncia daacute quando quer Eacute certa forma de sensiacutevel Natildeo eacute uma mera troca de ideias teoacuterica mas algo que vai mais alto

Eu volto a dizer pasma mas eacute fato o Divino Interlo-cutor eacute propriamente Aquele que fala Ele fala pela boca de um responde pela boca de outro e Se alegra pelo co-raccedilatildeo de todos Eacute uma coisa muito bonita

Pode-se dar um fato parecido com esse na ordem me-ramente natural O exemplo mais caracteriacutestico disso eacute

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

Rep

rodu

ccedilatildeo

ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

P

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

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nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

26

o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

27

lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

Mic

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30)

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30

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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C 3

0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

33

Foto

s R

epro

duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 8: Revista Doctor Plinio 207_201506

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Divino InterlocutorEm sua concepccedilatildeo sacral da existecircncia no processo de seu pensamento e ateacute na elaboraccedilatildeo de uma arte de conversar

Dr Plinio tinha como fonte de inspiraccedilatildeo e ponto de convergecircncia o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

U m tema que daria para um estudo muito in-teressante eacute a exposiccedilatildeo analiacutetica de todos os modos pelos quais as coisas na Criaccedilatildeo cres-

cem Elas tecircm modos diferentes de crescer e de evoluir para chegar ateacute a morte e nesta haacute tambeacutem um proces-so que natildeo eacute sempre anaacutelogo Entatildeo haacute o crescimento depois uma fase de expansatildeo e o deperecimento

Iniacutecio expansatildeo e morte

E isso eacute tatildeo diferente nas vaacuterias espeacutecies de vegetais e em cada planta em particular Eacute diverso nos bichos e nas velocidades materiais E tambeacutem em todo o processo de pensamento e de desenvolvimento do homem

Nesse crescer expandir-se e morrer Deus Nosso Senhor fez um verdadeiro jogo de maravilhas que evidentemente as pessoas que cul-tuam a natureza natildeo se datildeo o tra-balho de apreciar Porque isso su-potildee um miacutenimo de pensamento de contemplaccedilatildeo e de meditaccedilatildeo E es-se tipo de meditaccedilatildeo em geral elas natildeo querem fazer

Tudo isso mdash nas plantas nos ani-mais e nas velocidades materiais mdash eacute simboacutelico de um modo ou de ou-tro do processo do homem eacute sim-boacutelico da vida terrena de Nosso Se-nhor e da trajetoacuteria da Histoacuteria do curso dos acontecimentos

Ateacute mesmo certas coisas que satildeo feitas para matar e natildeo para vi-ver mdash por exemplo uma batalha mdash tecircm seu comeccedilo seu crescimento

depois seu murchamento e caem Um dos aspectos boni-tos desse estudo eacute a questatildeo dos recrudescimentos quais satildeo suas origens que forccedilas tecircm como se faz um recru-descimento Soacute o tema dos recrudescimentos daria pa-ra uma doutrina interessantiacutessima da Contra-Revoluccedilatildeo

Ateacute os fogos de artifiacutecio podem ter uma trajetoacuteria muito bonita nesse sentido

Um universo de belezas

Uma das coisas que eu gosto de apreciar no mar eacute exa-tamente o nascimento da onda depois o sistema de on-das quando elas arrebentam ou expiram na praia

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Tambeacutem a ilusoacuteria perpetuidade da calmariahellip Co-mo dentro da calmaria o primeiro elementozinho indica uma mudanccedila completa das coisas que vatildeo se acumulan-do Eacute um processo muito bonito

Isto tudo eacute uma verdadeira maravilha que depois tem sua transposiccedilatildeo para os processos poliacuteticos para a histoacute-ria das instituiccedilotildees das correntes de espiritualidade etc

Haacute um universo de belezas aiacute que ao homem foi da-do contemplar com olho raacutepido furtivo e atento porque natildeo tem tempo para pensar nisso Mas que eacute uma coisa lindiacutessima

Por exemplo haacute mortes que satildeo como um Amazonas desembocando na eternidade quase que empurra a eter-nidade um pouco para fora Mas existem outras mortes como um riozinho pequenininho humildezinho que vai dar diretamente no mar e se perde envergonhadinho com um sussurro que o mar incorpora a sihellip

Haacute uma porccedilatildeo de coisas bonitas interessantes para ver dentro disso E isso se aplica muito agrave histoacuteria de um homem

Por temperamento sou muito estaacutevel e gosto das coi-sas estaacuteveis que duram na calmaria

Natildeo concebo o Ceacuteu num perpeacutetuo movimento mas com diferentes modos de ser da estabilidade Natildeo eacute a ins-tabilidade eacute a mutaccedilatildeo dentro da estabilidade

Processo de pensamento de Dr Plinio

Todas as doutrinas e temas mdash portanto tambeacutem o conceito de sacralidade mdash tecircm um modo de se desenvol-ver peculiar de cada indiviacuteduo Em mim essa peculiari-dade eacute assim

Primeiro um nascimento cheio de intuiccedilotildees de gra-ccedilas ultra-alcandorado em que entra de um modo espe-cial uma visatildeo confusa do ultramaravilhoso e do ponto terminal bom do ponto supremo do auge e o encanta-mento por esse auge

Depois do auge bem visto e de dar a ele tudo quanto naquele estaacutegio da vida espiritual ele merece que se decirc entatildeo vem um periacuteodo de aparente estabilidade mas de fato eacute um periacuteodo em que se vai ldquocozinhandordquo lentamen-te a explicitaccedilatildeo

Ao mesmo tempo mdash eacute como se daacute concretamente co-migo mdash um periacuteodo de luta em que a explicitaccedilatildeo eacute aju-dada possantemente pela contestaccedilatildeo Porque aquele conhecimento confuso primeiro vem acompanhado de uma impliacutecita rejeiccedilatildeo do que natildeo eacute aquilo E quando al-gueacutem afirma o contraacuterio vem a repulsa

Na repulsa implicitamente fica mais conhecido aquilo que foi negado E ao mesmo tempo em que se prepara a apologeacutetica elabora-se a explicitaccedilatildeo A apologeacutetica e a explicitaccedilatildeo satildeo fenocircmenos reversiacuteveis um no outro De

maneira que eu me torno conhecedor das coisas por dois dados por uma espeacutecie de conaturalidade e por uma es-peacutecie de repulsa daquilo que eacute contraacuterio

Num determinado momento tudo o que se podia co-nhecer a respeito daquilo estaacute conhecido com os proacute-prios recursos e com a observaccedilatildeo concreta da vida Aiacute chega a hora da leitura Natildeo antes

Podem percorrer todos os livros de minha biblioteca e encontraratildeo sinais disso A leitura veio exatamente de-pois para ajudar esse processo dando mais informaccedilotildees fazendo com que a pessoa se situe ante o que diz o es-critor e portanto julgue eacute ldquosimrdquo eacute ldquonatildeordquo eacute ldquotalvezrdquo eacute ldquoconformerdquo etc

Depois de tudo isso feito haacute mais uma vez uma nova aparente estagnaccedilatildeo em que todos esses elementos re-colhidos satildeo objetos de uma nova siacutentese E vem uma vi-satildeo final que depois cresce pouco na aparecircncia mas que de fato tem muita intensidade E prepara o ato de amor terminal

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Eu natildeo sei se isso seraacute assim em outros Desconfio muito que natildeo e que varia muito de acordo com o cami-nho de Deus para cada pessoa

A inocecircncia eacute o princiacutepio da sabedoria

Graccedilas a Nossa Senhora haacute nesse processo muita ino-cecircncia Porque natildeo eacute soacute conhecendo a coisa em si mas eacute conferindo os dados externos com a inocecircncia A inocecircn-cia nesse sentido eacute um comeccedilar de sabedoria Ela cons-titui uma espeacutecie de ortodoxia

O que eu disse agora haacute um ano eu natildeo teria tatildeo cla-ro a ponto de explicitar neste momento estou explicitan-do com facilidade

Na aparecircncia isso em mim se encontrava parado mas de fato estava sendo preparada esta explicita-ccedilatildeo O que indica que havia uma accedilatildeo profunda mdash muito silenciosa tranquila discreta mas natildeo pouco ativa mdash para passar do uacuteltimo estaacutegio de um conhe-cimento confuso para o conhecimento inteiramente definido

Seria um crescimento contiacutenuo sob a forma de esta-bilidade mas na realidade trata-se de uma accedilatildeo em pro-fundidade Mais ou menos como o desenvolvimento da aacutervore jaacute crescida que natildeo cresce mais mas suga da ter-ra coisas que datildeo ao processo vital da aacutervore o meio de ir vivendo Examinando bem a aacutervore pode durante mui-to tempo ainda crescer em forccedila e em volume por esse processo

Entatildeo o conhecimento da transcendecircncia de Deus por exemplo depois de chegar a certo estaacutegio entra nes-sa fase de elaboraccedilatildeo profunda pouco perceptiva que de repente daacute um fruto muito mais sutil e melhor que eacute fazer as correlaccedilotildees entre os conjuntos que se tecircm na mente e daiacute nasce um determinado unum

E esse eacute o piacutencaro do processo intelectual e moral Porque esse piacutencaro jaacute eacute a primeira nota eacute a antiacutefona do cacircntico que noacutes devemos entoar no Ceacuteu

Procura do mundo dos possiacuteveis

Esse eacute o processo de conhecimento das coisas que po-deriam ou deveriam existir algumas das quais existem Por exemplo quando vejo um belo castelo Ele corres-ponde a ideias que todos tivemos na mente sobre um cas-telo inexistente Entatildeo minha primeira reflexatildeo eacute ldquoAqui estaacute o inexistente que eu procuravardquo

Muita coisa que parece estar no mero mundo dos possiacuteveis existe Eacute questatildeo de saber procurar Em uacutelti-ma anaacutelise se fosse bem ordenado o turismo perfeito se-ria uma procura pelo mundo dos possiacuteveis que a pessoa natildeo conheceu

Essa procura eacute um pouco o que vai dando acircnimo e movimentaccedilatildeo agrave vida O contraacuterio eacute o tipo de velho que no domingo agraves trecircs horas da tarde junto com sua espo-sa acabou de almoccedilar ele estaacute bem satisfeito e ela estaacute aliviada porque o marido almoccedilou bem e gostou da re-feiccedilatildeo Ele se senta numa cadeira e fica ruminando com desapontamento porque ele acha que natildeo haacute mais pos-siacuteveis

Propriamente a substacircncia dessa velhice mal concebi-da eacute crer pouco nos meramente possiacuteveis do Ceacuteu e achar que na Terra natildeo adianta conhececirc-los porque jaacute se viu que todas essas coisas fanam Entatildeo o velho fica sentado na cadeira ruminando sua bronquite Essa eacute a substacircncia desse conceito de velhice

Antigamente como a senhora mdash de modo habitual natildeo necessariamente mdash era melhor do que o homem ela ficava pensando um pouquinho no Ceacuteu e nas saudades do tempo que se foi

O homem pouco sujeito a saudades natildeo pensava no Ceacuteu mas de vez em quando o relacircmpago do Inferno lhe aparecia pela mente E isso o levava a fazer a sua Confis-satildeo e Comunhatildeo pascais Assim era a velhice

Havia uma casa mdash creio que natildeo existe mais mdash na es-quina da Rua Imaculada Conceiccedilatildeo com a Rua Martim Francisco1 Eu percebia pela conformaccedilatildeo do preacutedio

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Carcassone Franccedila

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que existiam muitos quartos de dormir vazios donde se deduz terem morado filhos ali que depois tinham se mu-dado e o casal residia sozinho

Eu entatildeo imaginava o velho e a velha possiacutevel no niacute-vel daquela residecircncia que era uma casa mediana Esse velho e essa velha eu os construiacutea de vaacuterios velhos e ve-lhas que tinha conhecido

Como a ideia da Contra-Revoluccedilatildeo foi elaborada no espiacuterito de Dr Plinio

Estou explicitando agora Mas a explicitaccedilatildeo eacute fruto de um trabalho lento que a mim me daacute a impressatildeo de que natildeo estou trabalhando mas simplesmente vivendo Eu diria que parei Mas de repente saio com uma en-xurrada de coisas que assim nunca pensei Eacute o lento tra-balho terminal que deve aprontar na mente

A Contra-Revoluccedilatildeo considerada no seu conjunto teve exatamente esse papel no meu espiacuterito

Primeiro formei impressotildees observei fatos tomei conhecimento pela leitura de alguns tantos aconteci-mentos histoacutericos e tambeacutem conheci muito pelas nar-raccedilotildees mais ou menos agrave Alexandre Dumas que circu-lavam no ambiente familiar a respeito desse ou daque-le caso

Por exemplo Maria Antonieta Na minha geraccedilatildeo o preconceito contra Maria Antonieta era uma coisa atroz ldquoMulher dura maacute traidora favorecia os austriacuteacos De uma beleza esplendorosa mdash era vista assim mdash que fazia com que todas as mulheres feias ficassem complexadas pensando nelardquo

Mas contavam que o povo faminto chegou a Versailles e ela estava tatildeo alheia agraves verdadeiras necessidades do po-vo que disse ldquoEntatildeo se vocecircs natildeo tecircm patildeo comam brio-cherdquo E ela nem sabia bem que brioche era mais caro que o patildeo porque problema de dinheiro natildeo existia para ela Entatildeo deu um conselho que provava mdash assim diziam mdash como ela vivia alheia ao sofrimento do povo

Eu me lembro de ainda pequeno perguntando para Dona Lucilia

mdash Mas mamatildee o que eacute briochemdash Uns bolinhos excelentesNatildeo cheguei a me perguntar por que ela natildeo fazia

brioche para eu comer Ateacute laacute a gula natildeo chegouhellip Mas vejam a provaccedilatildeo para uma crianccedila que ainda natildeo sabe o que eacute brioche

ldquoEntatildeo as pessoas bonitas alinhadas estiladas supe-riores natildeo tecircm coraccedilatildeo porque seguem demais regras e se endurecem com essas regras Por que seguir a regra endurece e cega para a compaixatildeo com os que natildeo con-seguiram seguir a regra Entatildeo seguir as regras eacute maurdquo

Minha resposta interior

ldquoNatildeo pode ser Porque entre bem e bem natildeo pode ha-ver incompatibilidaderdquo

A doutrina natildeo eacute o ponto de partida mas o de chegada

A importacircncia que dou ao raciociacutenio faz com que eu natildeo considere nada por acabado se natildeo foi raciocinado Porque todo esse processo de intuiccedilatildeo tem que chegar a raciociacutenios que provem ou natildeo provem aquilo que foi an-tes intuiacutedo apalpado pressentido

Podem entatildeo imaginar o meu encantamento lendo o ldquoTratado de Direito Naturalrdquo de Taparelli drsquoAzeglio o ldquoTratado de Sociologia Catoacutelicardquo de Albeacuteric Belliot um franciscano enfim uma flotilha de coisas que eu li e me provaram por exemplo a legitimidade do direito de pro-priedade que era uma coisa instintiva mas cuja legitimi-dade eu apanhei aiacute

Quando vi que o direito de propriedade a instituiccedilatildeo da famiacutelia a indissolubilidade do viacutenculo matrimonial a autoridade paterna mdash cuja liceidade era intuiacuteda por mim mdash se baseavam num raciociacutenio claro liacutempido perfeito tive um entusiasmo enorme

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Ostensoacuterio da Igreja de Santa Maria - Cracoacutevia Polocircnia

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Isso deu ao meu pensamento uma estrutura que veio depois de mil apalpaccedilotildees

Essa eacute uma caracteriacutestica do meu espiacuterito natildeo come-ccedilar por ler a doutrina mas por pegar a realidade Depois de ter intuiacutedo na realidade ir ver a doutrina E aiacute ter um contentamento um gaacuteudio enorme

Estou longe de ser daqueles que julgam dever prescin-dir da doutrina mas a questatildeo eacute que para muitos a dou-trina eacute o ponto de partida e na conformaccedilatildeo do meu espiacuterito eacute o ponto de chegada

Todas essas coisas com o tempo acabam for-mando um depoacutesito primeiro de impressotildees maturadas para raciocinar E enquanto jaacute vou raciocinando algumas de minhas im-pressotildees continuo a maturar ou explici-tar outras Entatildeo noacutes poderiacuteamos dizer que esse processo eacute

Primeiro observar captando e classificando subconscientemente

Segundo estabelecendo oposiccedilotildees e come-ccedilando por aiacute a explicitaccedilatildeo

Terceiro fazer os primeiros raciociacutenios que constituem pontas de trilho para que daiacute para diante em contato com qualquer coisa nova o processo in-teiro vai se movendo

Concepccedilatildeo sacral da vida

Isso forma inclusive o pro-gresso na vida espiritual

Por exemplo a noccedilatildeo de sacralidade no comeccedilo eacute muito mais viacutevida em re-laccedilatildeo agrave Igreja Depois me-nos em referecircncia agrave au-toridade paterna dentro da famiacutelia como entida-de toda ela sacral num certo sentido especial da palavra ldquosacralrdquo E tambeacutem em relaccedilatildeo ao mi-to monaacuterquico dentro do Es-tado que pode ser sacral se o indiviacuteduo qui-ser vecirc-lo assim oferececirc-lo agrave Igreja e pedir as becircnccedilatildeos dela a fim de sacralizaacute-lo

Isso acaba dando lugar a uma noccedilatildeo de sacralidade adequada agraves coisas temporais que eacute um desdobramento da noccedilatildeo do sacral mdash proacutepria das coisas estritamente espiritu-ais e sobrenaturais mdash e formando no espiacuterito vaacuterios degraus e modos de ser da sacralidade

cujo auge sempre me pareceu como sendo a Consagraccedilatildeo durante a Missa mais do que a minha Comunhatildeo

Agora uma coisa que eacute pessoal sou mais sensiacutevel agrave sacralidade do ato da Consagraccedilatildeo enquanto conside-rado na Consagraccedilatildeo do vinho e a apresentaccedilatildeo do caacuteli-ce para o povo adorar do que na Consagraccedilatildeo do patildeo e a apresentaccedilatildeo para ser adorado

Eu tinha a impressatildeo mdash que soube depois natildeo cor-responder agrave realidade mdash de que a transubstan-

ciaccedilatildeo se dava no momento da elevaccedilatildeo E daiacute aquele respeito e aquela veneraccedilatildeo

Porque nos fieacuteis haacute um redobrar de res-peito e veneraccedilatildeo quando o Santiacutessi-mo eacute elevado Compreende-se por-que eacute exposto para eles adorarem en-

tatildeo fazerem um ato interior que corres-ponde a essa exposiccedilatildeo Mas eu achava

que era porque a transubstanciaccedilatildeo estava se dando naquele momento

A forma material do caacutelice eacute tatildeo evo-cativa do que eacute o oferecimento da sacra-

lidade Uma alma que se oferece ou oferece alguma coisa de dentro de

si eacute tatildeo bem representada por um caacutelice que se abre e que daacute tudo

o que tem Por outro lado o vi-nho eacute tatildeo mais parecido com

o sangue do que o patildeo o eacute com o corpo que tudo isso me dava mais sen-saccedilatildeo mdash puramente fiacute-sica e analoacutegica mdash de sacralidade

A simples presen-ccedila do Santiacutessimo Sa-cramento exposto me dava uma sensaccedilatildeo de sacralidade colos-sal Muito mais do que o Santiacutessimo guarda-do na capela-mor Po-der chegar perto drsquoEle adoraacute-Lo produz em

mim impressotildees de sa-cralidade que eu acho que

possuem qualquer coisa de miacutestico muito maiores do

que as que se tecircm em contato com a sociedade temporal

Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus - Igreja Imaculada Conceiccedilatildeo Goa Iacutendia

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Mas por esse progresso de alma de que estou falan-do a pessoa vai compreendendo que em formas termos e modos diferentes a sociedade temporal inteira acaba tendo qualquer coisa de sacral E entatildeo uma concep-ccedilatildeo toda ela sacral da vida vai se maturando lentamente ao longo das deacutecadas para depois fazer uma confericcedilatildeo com os autores especializados

Porque a palavra definitiva eacute deles Eles representam a Igreja que eacute infaliacutevel e portanto vamos ouvir o que a Santa Matildee Igreja ensina a esse respeito E ensina na for-ccedila da palavra ldquoensinarrdquo quer dizer ela eacute a Mestra infaliacute-vel eu sou o aluno bobo que posso ter feito um engano e apresento a ela aquilo que pensei

No princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Eacute um processo que em certo momento entra numa apa-rente estagnaccedilatildeo e continua a elaboraccedilatildeo em profundidade De maneira que quem me conhece haacute muito tempo eacute pos-siacutevel que tenha tido ideia de que em algumas coisas eu es-tou me repetindo indefinidamente Mas se forem examinar de perto notaratildeo que tem sempre alguma coisinha nova que corresponde em profundidade a esse processo lento

Mas isso levanta um problema Esse natildeo eacute mdash em suas linhas gerais natildeo nos seus pormenores mdash o proacuteprio meacute-todo de pensar legiacutetimo do espiacuterito humano

Vamos formular a coisa assim O primeiro livro foi escrito por um homem que natildeo teve livros Entatildeo a cultura nasceu de um pensamento anterior ao livro Logo no processo in-telectual no princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Entatildeo eu volto ao ponto de partidaO unum eacute o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus de uma ma-

jestade infinita doccedilura infinita sabedoria infinita de um poder infinito e de uma bondade infinita para dizer soacute alguns atributos Tudo isso eacute uma siacutentese para chegar ateacute Ele compreendecirc-Lo

A teoria geral das vaacuterias formas de crescimento de desen-volvimento que apresentei no comeccedilo da reuniatildeo parece natildeo ter relaccedilatildeo alguma com Ele Mas no fundo eacute a Ele que visa-mos Ele eacute o alfa e o ocircmega o unum eacute Ele Ele eacute o comeccedilo e o fim de tudo E se de algum modo todas essas reflexotildees natildeo vi-sassem o melhor conhecimento drsquoEle natildeo teriam valor

Numa conversa os espiacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical

Em toda essa teoria a conversa tem um papel enor-me porque ela no fundo requer certo discernimento dos espiacuteritos e uma percepccedilatildeo do que conveacutem ou natildeo ser dito Quando natildeo conveacutem deve-se ter o suficiente desa-pego para natildeo tratar

Muita gente conversa sobre aquilo que tem vontade de conversar Isso eacute a morte da conversaccedilatildeo A conver-sa boa nem eacute sobre aquilo que tenho ou meu interlocu-tor tem vontade de conversar mas sim tratar daquilo em que noacutes dois podemos igualmente gostar de conversar O resto eacute a morte da conversaccedilatildeo

Agrave medida que uma conversa estaacute bem travada os es-piacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical E quando se entendem bem vatildeo mudando de tema igual-mente muito mais por apetecircncias do que por nexos loacutegi-cos Entra em algo o nexo loacutegico mas satildeo nexos psicoloacute-gicos mudanccedilas de temas vizinhos que vatildeo fazendo com que as duas pessoas gostem das mesmas coisas Entatildeo a conversa aiacute se torna deliciosa

Eacute mais ou menos como por exemplo duas pessoas que passeiam juntas no centro de Roma a caminho das catacumbas Passam por uma loja qualquer que tem gra-vatas bonitas os dois estatildeo precisando comprar gravatas param olham gostam conversam Depois transitam em frente a uma confeitaria e comem algum doce E assim chegam agrave catacumba

A conversa soacute pega mesmo mdash ao menos eacute a impressatildeo que eu tenho mdash quando na pontinha do que estaacute sendo con-versado haacute qualquer coisa que eacute uma graccedila de Deus sobre alguma coisa de transcendente maravilhoso que por uma pontinha de consolaccedilatildeo sensiacutevel ambos estatildeo sentindo

Pode ser o unum ou natildeo Pode ser uma consolaccedilatildeo que todos tecircm juntos sobre um ponto que Nossa Senho-ra quer glorificar Entatildeo a conversa em geral tem um fundinho comum de supremo E quanto mais esse fundi-nho eacute sentido por todos mais a conversa eacute animada

Donde se tira uma conclusatildeo linda o principal inter-locutor eacute o Interlocutor Divino presente em nossa con-versa falando dentro das nossas almas e elogiando-se a Si proacuteprio por nossos laacutebios

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece

Isso daacute uma elevaccedilatildeo ao conceito de conversa em que Deus estaacute sempre presente natildeo soacute mdash e jaacute eacute muito mdash atra-veacutes da Feacute mas tambeacutem no fundo por alguma coisa comu-nicada diretamente pela graccedila que se torna sensiacutevel e cau-sa alegria Esse eacute o sal da conversa e que a Providecircncia daacute quando quer Eacute certa forma de sensiacutevel Natildeo eacute uma mera troca de ideias teoacuterica mas algo que vai mais alto

Eu volto a dizer pasma mas eacute fato o Divino Interlo-cutor eacute propriamente Aquele que fala Ele fala pela boca de um responde pela boca de outro e Se alegra pelo co-raccedilatildeo de todos Eacute uma coisa muito bonita

Pode-se dar um fato parecido com esse na ordem me-ramente natural O exemplo mais caracteriacutestico disso eacute

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

Rep

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ccedilatildeo

ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

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nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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30)

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

Ric

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C 3

0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 9: Revista Doctor Plinio 207_201506

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Tambeacutem a ilusoacuteria perpetuidade da calmariahellip Co-mo dentro da calmaria o primeiro elementozinho indica uma mudanccedila completa das coisas que vatildeo se acumulan-do Eacute um processo muito bonito

Isto tudo eacute uma verdadeira maravilha que depois tem sua transposiccedilatildeo para os processos poliacuteticos para a histoacute-ria das instituiccedilotildees das correntes de espiritualidade etc

Haacute um universo de belezas aiacute que ao homem foi da-do contemplar com olho raacutepido furtivo e atento porque natildeo tem tempo para pensar nisso Mas que eacute uma coisa lindiacutessima

Por exemplo haacute mortes que satildeo como um Amazonas desembocando na eternidade quase que empurra a eter-nidade um pouco para fora Mas existem outras mortes como um riozinho pequenininho humildezinho que vai dar diretamente no mar e se perde envergonhadinho com um sussurro que o mar incorpora a sihellip

Haacute uma porccedilatildeo de coisas bonitas interessantes para ver dentro disso E isso se aplica muito agrave histoacuteria de um homem

Por temperamento sou muito estaacutevel e gosto das coi-sas estaacuteveis que duram na calmaria

Natildeo concebo o Ceacuteu num perpeacutetuo movimento mas com diferentes modos de ser da estabilidade Natildeo eacute a ins-tabilidade eacute a mutaccedilatildeo dentro da estabilidade

Processo de pensamento de Dr Plinio

Todas as doutrinas e temas mdash portanto tambeacutem o conceito de sacralidade mdash tecircm um modo de se desenvol-ver peculiar de cada indiviacuteduo Em mim essa peculiari-dade eacute assim

Primeiro um nascimento cheio de intuiccedilotildees de gra-ccedilas ultra-alcandorado em que entra de um modo espe-cial uma visatildeo confusa do ultramaravilhoso e do ponto terminal bom do ponto supremo do auge e o encanta-mento por esse auge

Depois do auge bem visto e de dar a ele tudo quanto naquele estaacutegio da vida espiritual ele merece que se decirc entatildeo vem um periacuteodo de aparente estabilidade mas de fato eacute um periacuteodo em que se vai ldquocozinhandordquo lentamen-te a explicitaccedilatildeo

Ao mesmo tempo mdash eacute como se daacute concretamente co-migo mdash um periacuteodo de luta em que a explicitaccedilatildeo eacute aju-dada possantemente pela contestaccedilatildeo Porque aquele conhecimento confuso primeiro vem acompanhado de uma impliacutecita rejeiccedilatildeo do que natildeo eacute aquilo E quando al-gueacutem afirma o contraacuterio vem a repulsa

Na repulsa implicitamente fica mais conhecido aquilo que foi negado E ao mesmo tempo em que se prepara a apologeacutetica elabora-se a explicitaccedilatildeo A apologeacutetica e a explicitaccedilatildeo satildeo fenocircmenos reversiacuteveis um no outro De

maneira que eu me torno conhecedor das coisas por dois dados por uma espeacutecie de conaturalidade e por uma es-peacutecie de repulsa daquilo que eacute contraacuterio

Num determinado momento tudo o que se podia co-nhecer a respeito daquilo estaacute conhecido com os proacute-prios recursos e com a observaccedilatildeo concreta da vida Aiacute chega a hora da leitura Natildeo antes

Podem percorrer todos os livros de minha biblioteca e encontraratildeo sinais disso A leitura veio exatamente de-pois para ajudar esse processo dando mais informaccedilotildees fazendo com que a pessoa se situe ante o que diz o es-critor e portanto julgue eacute ldquosimrdquo eacute ldquonatildeordquo eacute ldquotalvezrdquo eacute ldquoconformerdquo etc

Depois de tudo isso feito haacute mais uma vez uma nova aparente estagnaccedilatildeo em que todos esses elementos re-colhidos satildeo objetos de uma nova siacutentese E vem uma vi-satildeo final que depois cresce pouco na aparecircncia mas que de fato tem muita intensidade E prepara o ato de amor terminal

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Eu natildeo sei se isso seraacute assim em outros Desconfio muito que natildeo e que varia muito de acordo com o cami-nho de Deus para cada pessoa

A inocecircncia eacute o princiacutepio da sabedoria

Graccedilas a Nossa Senhora haacute nesse processo muita ino-cecircncia Porque natildeo eacute soacute conhecendo a coisa em si mas eacute conferindo os dados externos com a inocecircncia A inocecircn-cia nesse sentido eacute um comeccedilar de sabedoria Ela cons-titui uma espeacutecie de ortodoxia

O que eu disse agora haacute um ano eu natildeo teria tatildeo cla-ro a ponto de explicitar neste momento estou explicitan-do com facilidade

Na aparecircncia isso em mim se encontrava parado mas de fato estava sendo preparada esta explicita-ccedilatildeo O que indica que havia uma accedilatildeo profunda mdash muito silenciosa tranquila discreta mas natildeo pouco ativa mdash para passar do uacuteltimo estaacutegio de um conhe-cimento confuso para o conhecimento inteiramente definido

Seria um crescimento contiacutenuo sob a forma de esta-bilidade mas na realidade trata-se de uma accedilatildeo em pro-fundidade Mais ou menos como o desenvolvimento da aacutervore jaacute crescida que natildeo cresce mais mas suga da ter-ra coisas que datildeo ao processo vital da aacutervore o meio de ir vivendo Examinando bem a aacutervore pode durante mui-to tempo ainda crescer em forccedila e em volume por esse processo

Entatildeo o conhecimento da transcendecircncia de Deus por exemplo depois de chegar a certo estaacutegio entra nes-sa fase de elaboraccedilatildeo profunda pouco perceptiva que de repente daacute um fruto muito mais sutil e melhor que eacute fazer as correlaccedilotildees entre os conjuntos que se tecircm na mente e daiacute nasce um determinado unum

E esse eacute o piacutencaro do processo intelectual e moral Porque esse piacutencaro jaacute eacute a primeira nota eacute a antiacutefona do cacircntico que noacutes devemos entoar no Ceacuteu

Procura do mundo dos possiacuteveis

Esse eacute o processo de conhecimento das coisas que po-deriam ou deveriam existir algumas das quais existem Por exemplo quando vejo um belo castelo Ele corres-ponde a ideias que todos tivemos na mente sobre um cas-telo inexistente Entatildeo minha primeira reflexatildeo eacute ldquoAqui estaacute o inexistente que eu procuravardquo

Muita coisa que parece estar no mero mundo dos possiacuteveis existe Eacute questatildeo de saber procurar Em uacutelti-ma anaacutelise se fosse bem ordenado o turismo perfeito se-ria uma procura pelo mundo dos possiacuteveis que a pessoa natildeo conheceu

Essa procura eacute um pouco o que vai dando acircnimo e movimentaccedilatildeo agrave vida O contraacuterio eacute o tipo de velho que no domingo agraves trecircs horas da tarde junto com sua espo-sa acabou de almoccedilar ele estaacute bem satisfeito e ela estaacute aliviada porque o marido almoccedilou bem e gostou da re-feiccedilatildeo Ele se senta numa cadeira e fica ruminando com desapontamento porque ele acha que natildeo haacute mais pos-siacuteveis

Propriamente a substacircncia dessa velhice mal concebi-da eacute crer pouco nos meramente possiacuteveis do Ceacuteu e achar que na Terra natildeo adianta conhececirc-los porque jaacute se viu que todas essas coisas fanam Entatildeo o velho fica sentado na cadeira ruminando sua bronquite Essa eacute a substacircncia desse conceito de velhice

Antigamente como a senhora mdash de modo habitual natildeo necessariamente mdash era melhor do que o homem ela ficava pensando um pouquinho no Ceacuteu e nas saudades do tempo que se foi

O homem pouco sujeito a saudades natildeo pensava no Ceacuteu mas de vez em quando o relacircmpago do Inferno lhe aparecia pela mente E isso o levava a fazer a sua Confis-satildeo e Comunhatildeo pascais Assim era a velhice

Havia uma casa mdash creio que natildeo existe mais mdash na es-quina da Rua Imaculada Conceiccedilatildeo com a Rua Martim Francisco1 Eu percebia pela conformaccedilatildeo do preacutedio

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que existiam muitos quartos de dormir vazios donde se deduz terem morado filhos ali que depois tinham se mu-dado e o casal residia sozinho

Eu entatildeo imaginava o velho e a velha possiacutevel no niacute-vel daquela residecircncia que era uma casa mediana Esse velho e essa velha eu os construiacutea de vaacuterios velhos e ve-lhas que tinha conhecido

Como a ideia da Contra-Revoluccedilatildeo foi elaborada no espiacuterito de Dr Plinio

Estou explicitando agora Mas a explicitaccedilatildeo eacute fruto de um trabalho lento que a mim me daacute a impressatildeo de que natildeo estou trabalhando mas simplesmente vivendo Eu diria que parei Mas de repente saio com uma en-xurrada de coisas que assim nunca pensei Eacute o lento tra-balho terminal que deve aprontar na mente

A Contra-Revoluccedilatildeo considerada no seu conjunto teve exatamente esse papel no meu espiacuterito

Primeiro formei impressotildees observei fatos tomei conhecimento pela leitura de alguns tantos aconteci-mentos histoacutericos e tambeacutem conheci muito pelas nar-raccedilotildees mais ou menos agrave Alexandre Dumas que circu-lavam no ambiente familiar a respeito desse ou daque-le caso

Por exemplo Maria Antonieta Na minha geraccedilatildeo o preconceito contra Maria Antonieta era uma coisa atroz ldquoMulher dura maacute traidora favorecia os austriacuteacos De uma beleza esplendorosa mdash era vista assim mdash que fazia com que todas as mulheres feias ficassem complexadas pensando nelardquo

Mas contavam que o povo faminto chegou a Versailles e ela estava tatildeo alheia agraves verdadeiras necessidades do po-vo que disse ldquoEntatildeo se vocecircs natildeo tecircm patildeo comam brio-cherdquo E ela nem sabia bem que brioche era mais caro que o patildeo porque problema de dinheiro natildeo existia para ela Entatildeo deu um conselho que provava mdash assim diziam mdash como ela vivia alheia ao sofrimento do povo

Eu me lembro de ainda pequeno perguntando para Dona Lucilia

mdash Mas mamatildee o que eacute briochemdash Uns bolinhos excelentesNatildeo cheguei a me perguntar por que ela natildeo fazia

brioche para eu comer Ateacute laacute a gula natildeo chegouhellip Mas vejam a provaccedilatildeo para uma crianccedila que ainda natildeo sabe o que eacute brioche

ldquoEntatildeo as pessoas bonitas alinhadas estiladas supe-riores natildeo tecircm coraccedilatildeo porque seguem demais regras e se endurecem com essas regras Por que seguir a regra endurece e cega para a compaixatildeo com os que natildeo con-seguiram seguir a regra Entatildeo seguir as regras eacute maurdquo

Minha resposta interior

ldquoNatildeo pode ser Porque entre bem e bem natildeo pode ha-ver incompatibilidaderdquo

A doutrina natildeo eacute o ponto de partida mas o de chegada

A importacircncia que dou ao raciociacutenio faz com que eu natildeo considere nada por acabado se natildeo foi raciocinado Porque todo esse processo de intuiccedilatildeo tem que chegar a raciociacutenios que provem ou natildeo provem aquilo que foi an-tes intuiacutedo apalpado pressentido

Podem entatildeo imaginar o meu encantamento lendo o ldquoTratado de Direito Naturalrdquo de Taparelli drsquoAzeglio o ldquoTratado de Sociologia Catoacutelicardquo de Albeacuteric Belliot um franciscano enfim uma flotilha de coisas que eu li e me provaram por exemplo a legitimidade do direito de pro-priedade que era uma coisa instintiva mas cuja legitimi-dade eu apanhei aiacute

Quando vi que o direito de propriedade a instituiccedilatildeo da famiacutelia a indissolubilidade do viacutenculo matrimonial a autoridade paterna mdash cuja liceidade era intuiacuteda por mim mdash se baseavam num raciociacutenio claro liacutempido perfeito tive um entusiasmo enorme

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Ostensoacuterio da Igreja de Santa Maria - Cracoacutevia Polocircnia

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Isso deu ao meu pensamento uma estrutura que veio depois de mil apalpaccedilotildees

Essa eacute uma caracteriacutestica do meu espiacuterito natildeo come-ccedilar por ler a doutrina mas por pegar a realidade Depois de ter intuiacutedo na realidade ir ver a doutrina E aiacute ter um contentamento um gaacuteudio enorme

Estou longe de ser daqueles que julgam dever prescin-dir da doutrina mas a questatildeo eacute que para muitos a dou-trina eacute o ponto de partida e na conformaccedilatildeo do meu espiacuterito eacute o ponto de chegada

Todas essas coisas com o tempo acabam for-mando um depoacutesito primeiro de impressotildees maturadas para raciocinar E enquanto jaacute vou raciocinando algumas de minhas im-pressotildees continuo a maturar ou explici-tar outras Entatildeo noacutes poderiacuteamos dizer que esse processo eacute

Primeiro observar captando e classificando subconscientemente

Segundo estabelecendo oposiccedilotildees e come-ccedilando por aiacute a explicitaccedilatildeo

Terceiro fazer os primeiros raciociacutenios que constituem pontas de trilho para que daiacute para diante em contato com qualquer coisa nova o processo in-teiro vai se movendo

Concepccedilatildeo sacral da vida

Isso forma inclusive o pro-gresso na vida espiritual

Por exemplo a noccedilatildeo de sacralidade no comeccedilo eacute muito mais viacutevida em re-laccedilatildeo agrave Igreja Depois me-nos em referecircncia agrave au-toridade paterna dentro da famiacutelia como entida-de toda ela sacral num certo sentido especial da palavra ldquosacralrdquo E tambeacutem em relaccedilatildeo ao mi-to monaacuterquico dentro do Es-tado que pode ser sacral se o indiviacuteduo qui-ser vecirc-lo assim oferececirc-lo agrave Igreja e pedir as becircnccedilatildeos dela a fim de sacralizaacute-lo

Isso acaba dando lugar a uma noccedilatildeo de sacralidade adequada agraves coisas temporais que eacute um desdobramento da noccedilatildeo do sacral mdash proacutepria das coisas estritamente espiritu-ais e sobrenaturais mdash e formando no espiacuterito vaacuterios degraus e modos de ser da sacralidade

cujo auge sempre me pareceu como sendo a Consagraccedilatildeo durante a Missa mais do que a minha Comunhatildeo

Agora uma coisa que eacute pessoal sou mais sensiacutevel agrave sacralidade do ato da Consagraccedilatildeo enquanto conside-rado na Consagraccedilatildeo do vinho e a apresentaccedilatildeo do caacuteli-ce para o povo adorar do que na Consagraccedilatildeo do patildeo e a apresentaccedilatildeo para ser adorado

Eu tinha a impressatildeo mdash que soube depois natildeo cor-responder agrave realidade mdash de que a transubstan-

ciaccedilatildeo se dava no momento da elevaccedilatildeo E daiacute aquele respeito e aquela veneraccedilatildeo

Porque nos fieacuteis haacute um redobrar de res-peito e veneraccedilatildeo quando o Santiacutessi-mo eacute elevado Compreende-se por-que eacute exposto para eles adorarem en-

tatildeo fazerem um ato interior que corres-ponde a essa exposiccedilatildeo Mas eu achava

que era porque a transubstanciaccedilatildeo estava se dando naquele momento

A forma material do caacutelice eacute tatildeo evo-cativa do que eacute o oferecimento da sacra-

lidade Uma alma que se oferece ou oferece alguma coisa de dentro de

si eacute tatildeo bem representada por um caacutelice que se abre e que daacute tudo

o que tem Por outro lado o vi-nho eacute tatildeo mais parecido com

o sangue do que o patildeo o eacute com o corpo que tudo isso me dava mais sen-saccedilatildeo mdash puramente fiacute-sica e analoacutegica mdash de sacralidade

A simples presen-ccedila do Santiacutessimo Sa-cramento exposto me dava uma sensaccedilatildeo de sacralidade colos-sal Muito mais do que o Santiacutessimo guarda-do na capela-mor Po-der chegar perto drsquoEle adoraacute-Lo produz em

mim impressotildees de sa-cralidade que eu acho que

possuem qualquer coisa de miacutestico muito maiores do

que as que se tecircm em contato com a sociedade temporal

Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus - Igreja Imaculada Conceiccedilatildeo Goa Iacutendia

Gus

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Mas por esse progresso de alma de que estou falan-do a pessoa vai compreendendo que em formas termos e modos diferentes a sociedade temporal inteira acaba tendo qualquer coisa de sacral E entatildeo uma concep-ccedilatildeo toda ela sacral da vida vai se maturando lentamente ao longo das deacutecadas para depois fazer uma confericcedilatildeo com os autores especializados

Porque a palavra definitiva eacute deles Eles representam a Igreja que eacute infaliacutevel e portanto vamos ouvir o que a Santa Matildee Igreja ensina a esse respeito E ensina na for-ccedila da palavra ldquoensinarrdquo quer dizer ela eacute a Mestra infaliacute-vel eu sou o aluno bobo que posso ter feito um engano e apresento a ela aquilo que pensei

No princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Eacute um processo que em certo momento entra numa apa-rente estagnaccedilatildeo e continua a elaboraccedilatildeo em profundidade De maneira que quem me conhece haacute muito tempo eacute pos-siacutevel que tenha tido ideia de que em algumas coisas eu es-tou me repetindo indefinidamente Mas se forem examinar de perto notaratildeo que tem sempre alguma coisinha nova que corresponde em profundidade a esse processo lento

Mas isso levanta um problema Esse natildeo eacute mdash em suas linhas gerais natildeo nos seus pormenores mdash o proacuteprio meacute-todo de pensar legiacutetimo do espiacuterito humano

Vamos formular a coisa assim O primeiro livro foi escrito por um homem que natildeo teve livros Entatildeo a cultura nasceu de um pensamento anterior ao livro Logo no processo in-telectual no princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Entatildeo eu volto ao ponto de partidaO unum eacute o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus de uma ma-

jestade infinita doccedilura infinita sabedoria infinita de um poder infinito e de uma bondade infinita para dizer soacute alguns atributos Tudo isso eacute uma siacutentese para chegar ateacute Ele compreendecirc-Lo

A teoria geral das vaacuterias formas de crescimento de desen-volvimento que apresentei no comeccedilo da reuniatildeo parece natildeo ter relaccedilatildeo alguma com Ele Mas no fundo eacute a Ele que visa-mos Ele eacute o alfa e o ocircmega o unum eacute Ele Ele eacute o comeccedilo e o fim de tudo E se de algum modo todas essas reflexotildees natildeo vi-sassem o melhor conhecimento drsquoEle natildeo teriam valor

Numa conversa os espiacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical

Em toda essa teoria a conversa tem um papel enor-me porque ela no fundo requer certo discernimento dos espiacuteritos e uma percepccedilatildeo do que conveacutem ou natildeo ser dito Quando natildeo conveacutem deve-se ter o suficiente desa-pego para natildeo tratar

Muita gente conversa sobre aquilo que tem vontade de conversar Isso eacute a morte da conversaccedilatildeo A conver-sa boa nem eacute sobre aquilo que tenho ou meu interlocu-tor tem vontade de conversar mas sim tratar daquilo em que noacutes dois podemos igualmente gostar de conversar O resto eacute a morte da conversaccedilatildeo

Agrave medida que uma conversa estaacute bem travada os es-piacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical E quando se entendem bem vatildeo mudando de tema igual-mente muito mais por apetecircncias do que por nexos loacutegi-cos Entra em algo o nexo loacutegico mas satildeo nexos psicoloacute-gicos mudanccedilas de temas vizinhos que vatildeo fazendo com que as duas pessoas gostem das mesmas coisas Entatildeo a conversa aiacute se torna deliciosa

Eacute mais ou menos como por exemplo duas pessoas que passeiam juntas no centro de Roma a caminho das catacumbas Passam por uma loja qualquer que tem gra-vatas bonitas os dois estatildeo precisando comprar gravatas param olham gostam conversam Depois transitam em frente a uma confeitaria e comem algum doce E assim chegam agrave catacumba

A conversa soacute pega mesmo mdash ao menos eacute a impressatildeo que eu tenho mdash quando na pontinha do que estaacute sendo con-versado haacute qualquer coisa que eacute uma graccedila de Deus sobre alguma coisa de transcendente maravilhoso que por uma pontinha de consolaccedilatildeo sensiacutevel ambos estatildeo sentindo

Pode ser o unum ou natildeo Pode ser uma consolaccedilatildeo que todos tecircm juntos sobre um ponto que Nossa Senho-ra quer glorificar Entatildeo a conversa em geral tem um fundinho comum de supremo E quanto mais esse fundi-nho eacute sentido por todos mais a conversa eacute animada

Donde se tira uma conclusatildeo linda o principal inter-locutor eacute o Interlocutor Divino presente em nossa con-versa falando dentro das nossas almas e elogiando-se a Si proacuteprio por nossos laacutebios

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece

Isso daacute uma elevaccedilatildeo ao conceito de conversa em que Deus estaacute sempre presente natildeo soacute mdash e jaacute eacute muito mdash atra-veacutes da Feacute mas tambeacutem no fundo por alguma coisa comu-nicada diretamente pela graccedila que se torna sensiacutevel e cau-sa alegria Esse eacute o sal da conversa e que a Providecircncia daacute quando quer Eacute certa forma de sensiacutevel Natildeo eacute uma mera troca de ideias teoacuterica mas algo que vai mais alto

Eu volto a dizer pasma mas eacute fato o Divino Interlo-cutor eacute propriamente Aquele que fala Ele fala pela boca de um responde pela boca de outro e Se alegra pelo co-raccedilatildeo de todos Eacute uma coisa muito bonita

Pode-se dar um fato parecido com esse na ordem me-ramente natural O exemplo mais caracteriacutestico disso eacute

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

Rep

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ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

Ric

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

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mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 10: Revista Doctor Plinio 207_201506

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Eu natildeo sei se isso seraacute assim em outros Desconfio muito que natildeo e que varia muito de acordo com o cami-nho de Deus para cada pessoa

A inocecircncia eacute o princiacutepio da sabedoria

Graccedilas a Nossa Senhora haacute nesse processo muita ino-cecircncia Porque natildeo eacute soacute conhecendo a coisa em si mas eacute conferindo os dados externos com a inocecircncia A inocecircn-cia nesse sentido eacute um comeccedilar de sabedoria Ela cons-titui uma espeacutecie de ortodoxia

O que eu disse agora haacute um ano eu natildeo teria tatildeo cla-ro a ponto de explicitar neste momento estou explicitan-do com facilidade

Na aparecircncia isso em mim se encontrava parado mas de fato estava sendo preparada esta explicita-ccedilatildeo O que indica que havia uma accedilatildeo profunda mdash muito silenciosa tranquila discreta mas natildeo pouco ativa mdash para passar do uacuteltimo estaacutegio de um conhe-cimento confuso para o conhecimento inteiramente definido

Seria um crescimento contiacutenuo sob a forma de esta-bilidade mas na realidade trata-se de uma accedilatildeo em pro-fundidade Mais ou menos como o desenvolvimento da aacutervore jaacute crescida que natildeo cresce mais mas suga da ter-ra coisas que datildeo ao processo vital da aacutervore o meio de ir vivendo Examinando bem a aacutervore pode durante mui-to tempo ainda crescer em forccedila e em volume por esse processo

Entatildeo o conhecimento da transcendecircncia de Deus por exemplo depois de chegar a certo estaacutegio entra nes-sa fase de elaboraccedilatildeo profunda pouco perceptiva que de repente daacute um fruto muito mais sutil e melhor que eacute fazer as correlaccedilotildees entre os conjuntos que se tecircm na mente e daiacute nasce um determinado unum

E esse eacute o piacutencaro do processo intelectual e moral Porque esse piacutencaro jaacute eacute a primeira nota eacute a antiacutefona do cacircntico que noacutes devemos entoar no Ceacuteu

Procura do mundo dos possiacuteveis

Esse eacute o processo de conhecimento das coisas que po-deriam ou deveriam existir algumas das quais existem Por exemplo quando vejo um belo castelo Ele corres-ponde a ideias que todos tivemos na mente sobre um cas-telo inexistente Entatildeo minha primeira reflexatildeo eacute ldquoAqui estaacute o inexistente que eu procuravardquo

Muita coisa que parece estar no mero mundo dos possiacuteveis existe Eacute questatildeo de saber procurar Em uacutelti-ma anaacutelise se fosse bem ordenado o turismo perfeito se-ria uma procura pelo mundo dos possiacuteveis que a pessoa natildeo conheceu

Essa procura eacute um pouco o que vai dando acircnimo e movimentaccedilatildeo agrave vida O contraacuterio eacute o tipo de velho que no domingo agraves trecircs horas da tarde junto com sua espo-sa acabou de almoccedilar ele estaacute bem satisfeito e ela estaacute aliviada porque o marido almoccedilou bem e gostou da re-feiccedilatildeo Ele se senta numa cadeira e fica ruminando com desapontamento porque ele acha que natildeo haacute mais pos-siacuteveis

Propriamente a substacircncia dessa velhice mal concebi-da eacute crer pouco nos meramente possiacuteveis do Ceacuteu e achar que na Terra natildeo adianta conhececirc-los porque jaacute se viu que todas essas coisas fanam Entatildeo o velho fica sentado na cadeira ruminando sua bronquite Essa eacute a substacircncia desse conceito de velhice

Antigamente como a senhora mdash de modo habitual natildeo necessariamente mdash era melhor do que o homem ela ficava pensando um pouquinho no Ceacuteu e nas saudades do tempo que se foi

O homem pouco sujeito a saudades natildeo pensava no Ceacuteu mas de vez em quando o relacircmpago do Inferno lhe aparecia pela mente E isso o levava a fazer a sua Confis-satildeo e Comunhatildeo pascais Assim era a velhice

Havia uma casa mdash creio que natildeo existe mais mdash na es-quina da Rua Imaculada Conceiccedilatildeo com a Rua Martim Francisco1 Eu percebia pela conformaccedilatildeo do preacutedio

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que existiam muitos quartos de dormir vazios donde se deduz terem morado filhos ali que depois tinham se mu-dado e o casal residia sozinho

Eu entatildeo imaginava o velho e a velha possiacutevel no niacute-vel daquela residecircncia que era uma casa mediana Esse velho e essa velha eu os construiacutea de vaacuterios velhos e ve-lhas que tinha conhecido

Como a ideia da Contra-Revoluccedilatildeo foi elaborada no espiacuterito de Dr Plinio

Estou explicitando agora Mas a explicitaccedilatildeo eacute fruto de um trabalho lento que a mim me daacute a impressatildeo de que natildeo estou trabalhando mas simplesmente vivendo Eu diria que parei Mas de repente saio com uma en-xurrada de coisas que assim nunca pensei Eacute o lento tra-balho terminal que deve aprontar na mente

A Contra-Revoluccedilatildeo considerada no seu conjunto teve exatamente esse papel no meu espiacuterito

Primeiro formei impressotildees observei fatos tomei conhecimento pela leitura de alguns tantos aconteci-mentos histoacutericos e tambeacutem conheci muito pelas nar-raccedilotildees mais ou menos agrave Alexandre Dumas que circu-lavam no ambiente familiar a respeito desse ou daque-le caso

Por exemplo Maria Antonieta Na minha geraccedilatildeo o preconceito contra Maria Antonieta era uma coisa atroz ldquoMulher dura maacute traidora favorecia os austriacuteacos De uma beleza esplendorosa mdash era vista assim mdash que fazia com que todas as mulheres feias ficassem complexadas pensando nelardquo

Mas contavam que o povo faminto chegou a Versailles e ela estava tatildeo alheia agraves verdadeiras necessidades do po-vo que disse ldquoEntatildeo se vocecircs natildeo tecircm patildeo comam brio-cherdquo E ela nem sabia bem que brioche era mais caro que o patildeo porque problema de dinheiro natildeo existia para ela Entatildeo deu um conselho que provava mdash assim diziam mdash como ela vivia alheia ao sofrimento do povo

Eu me lembro de ainda pequeno perguntando para Dona Lucilia

mdash Mas mamatildee o que eacute briochemdash Uns bolinhos excelentesNatildeo cheguei a me perguntar por que ela natildeo fazia

brioche para eu comer Ateacute laacute a gula natildeo chegouhellip Mas vejam a provaccedilatildeo para uma crianccedila que ainda natildeo sabe o que eacute brioche

ldquoEntatildeo as pessoas bonitas alinhadas estiladas supe-riores natildeo tecircm coraccedilatildeo porque seguem demais regras e se endurecem com essas regras Por que seguir a regra endurece e cega para a compaixatildeo com os que natildeo con-seguiram seguir a regra Entatildeo seguir as regras eacute maurdquo

Minha resposta interior

ldquoNatildeo pode ser Porque entre bem e bem natildeo pode ha-ver incompatibilidaderdquo

A doutrina natildeo eacute o ponto de partida mas o de chegada

A importacircncia que dou ao raciociacutenio faz com que eu natildeo considere nada por acabado se natildeo foi raciocinado Porque todo esse processo de intuiccedilatildeo tem que chegar a raciociacutenios que provem ou natildeo provem aquilo que foi an-tes intuiacutedo apalpado pressentido

Podem entatildeo imaginar o meu encantamento lendo o ldquoTratado de Direito Naturalrdquo de Taparelli drsquoAzeglio o ldquoTratado de Sociologia Catoacutelicardquo de Albeacuteric Belliot um franciscano enfim uma flotilha de coisas que eu li e me provaram por exemplo a legitimidade do direito de pro-priedade que era uma coisa instintiva mas cuja legitimi-dade eu apanhei aiacute

Quando vi que o direito de propriedade a instituiccedilatildeo da famiacutelia a indissolubilidade do viacutenculo matrimonial a autoridade paterna mdash cuja liceidade era intuiacuteda por mim mdash se baseavam num raciociacutenio claro liacutempido perfeito tive um entusiasmo enorme

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Ostensoacuterio da Igreja de Santa Maria - Cracoacutevia Polocircnia

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Isso deu ao meu pensamento uma estrutura que veio depois de mil apalpaccedilotildees

Essa eacute uma caracteriacutestica do meu espiacuterito natildeo come-ccedilar por ler a doutrina mas por pegar a realidade Depois de ter intuiacutedo na realidade ir ver a doutrina E aiacute ter um contentamento um gaacuteudio enorme

Estou longe de ser daqueles que julgam dever prescin-dir da doutrina mas a questatildeo eacute que para muitos a dou-trina eacute o ponto de partida e na conformaccedilatildeo do meu espiacuterito eacute o ponto de chegada

Todas essas coisas com o tempo acabam for-mando um depoacutesito primeiro de impressotildees maturadas para raciocinar E enquanto jaacute vou raciocinando algumas de minhas im-pressotildees continuo a maturar ou explici-tar outras Entatildeo noacutes poderiacuteamos dizer que esse processo eacute

Primeiro observar captando e classificando subconscientemente

Segundo estabelecendo oposiccedilotildees e come-ccedilando por aiacute a explicitaccedilatildeo

Terceiro fazer os primeiros raciociacutenios que constituem pontas de trilho para que daiacute para diante em contato com qualquer coisa nova o processo in-teiro vai se movendo

Concepccedilatildeo sacral da vida

Isso forma inclusive o pro-gresso na vida espiritual

Por exemplo a noccedilatildeo de sacralidade no comeccedilo eacute muito mais viacutevida em re-laccedilatildeo agrave Igreja Depois me-nos em referecircncia agrave au-toridade paterna dentro da famiacutelia como entida-de toda ela sacral num certo sentido especial da palavra ldquosacralrdquo E tambeacutem em relaccedilatildeo ao mi-to monaacuterquico dentro do Es-tado que pode ser sacral se o indiviacuteduo qui-ser vecirc-lo assim oferececirc-lo agrave Igreja e pedir as becircnccedilatildeos dela a fim de sacralizaacute-lo

Isso acaba dando lugar a uma noccedilatildeo de sacralidade adequada agraves coisas temporais que eacute um desdobramento da noccedilatildeo do sacral mdash proacutepria das coisas estritamente espiritu-ais e sobrenaturais mdash e formando no espiacuterito vaacuterios degraus e modos de ser da sacralidade

cujo auge sempre me pareceu como sendo a Consagraccedilatildeo durante a Missa mais do que a minha Comunhatildeo

Agora uma coisa que eacute pessoal sou mais sensiacutevel agrave sacralidade do ato da Consagraccedilatildeo enquanto conside-rado na Consagraccedilatildeo do vinho e a apresentaccedilatildeo do caacuteli-ce para o povo adorar do que na Consagraccedilatildeo do patildeo e a apresentaccedilatildeo para ser adorado

Eu tinha a impressatildeo mdash que soube depois natildeo cor-responder agrave realidade mdash de que a transubstan-

ciaccedilatildeo se dava no momento da elevaccedilatildeo E daiacute aquele respeito e aquela veneraccedilatildeo

Porque nos fieacuteis haacute um redobrar de res-peito e veneraccedilatildeo quando o Santiacutessi-mo eacute elevado Compreende-se por-que eacute exposto para eles adorarem en-

tatildeo fazerem um ato interior que corres-ponde a essa exposiccedilatildeo Mas eu achava

que era porque a transubstanciaccedilatildeo estava se dando naquele momento

A forma material do caacutelice eacute tatildeo evo-cativa do que eacute o oferecimento da sacra-

lidade Uma alma que se oferece ou oferece alguma coisa de dentro de

si eacute tatildeo bem representada por um caacutelice que se abre e que daacute tudo

o que tem Por outro lado o vi-nho eacute tatildeo mais parecido com

o sangue do que o patildeo o eacute com o corpo que tudo isso me dava mais sen-saccedilatildeo mdash puramente fiacute-sica e analoacutegica mdash de sacralidade

A simples presen-ccedila do Santiacutessimo Sa-cramento exposto me dava uma sensaccedilatildeo de sacralidade colos-sal Muito mais do que o Santiacutessimo guarda-do na capela-mor Po-der chegar perto drsquoEle adoraacute-Lo produz em

mim impressotildees de sa-cralidade que eu acho que

possuem qualquer coisa de miacutestico muito maiores do

que as que se tecircm em contato com a sociedade temporal

Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus - Igreja Imaculada Conceiccedilatildeo Goa Iacutendia

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Mas por esse progresso de alma de que estou falan-do a pessoa vai compreendendo que em formas termos e modos diferentes a sociedade temporal inteira acaba tendo qualquer coisa de sacral E entatildeo uma concep-ccedilatildeo toda ela sacral da vida vai se maturando lentamente ao longo das deacutecadas para depois fazer uma confericcedilatildeo com os autores especializados

Porque a palavra definitiva eacute deles Eles representam a Igreja que eacute infaliacutevel e portanto vamos ouvir o que a Santa Matildee Igreja ensina a esse respeito E ensina na for-ccedila da palavra ldquoensinarrdquo quer dizer ela eacute a Mestra infaliacute-vel eu sou o aluno bobo que posso ter feito um engano e apresento a ela aquilo que pensei

No princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Eacute um processo que em certo momento entra numa apa-rente estagnaccedilatildeo e continua a elaboraccedilatildeo em profundidade De maneira que quem me conhece haacute muito tempo eacute pos-siacutevel que tenha tido ideia de que em algumas coisas eu es-tou me repetindo indefinidamente Mas se forem examinar de perto notaratildeo que tem sempre alguma coisinha nova que corresponde em profundidade a esse processo lento

Mas isso levanta um problema Esse natildeo eacute mdash em suas linhas gerais natildeo nos seus pormenores mdash o proacuteprio meacute-todo de pensar legiacutetimo do espiacuterito humano

Vamos formular a coisa assim O primeiro livro foi escrito por um homem que natildeo teve livros Entatildeo a cultura nasceu de um pensamento anterior ao livro Logo no processo in-telectual no princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Entatildeo eu volto ao ponto de partidaO unum eacute o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus de uma ma-

jestade infinita doccedilura infinita sabedoria infinita de um poder infinito e de uma bondade infinita para dizer soacute alguns atributos Tudo isso eacute uma siacutentese para chegar ateacute Ele compreendecirc-Lo

A teoria geral das vaacuterias formas de crescimento de desen-volvimento que apresentei no comeccedilo da reuniatildeo parece natildeo ter relaccedilatildeo alguma com Ele Mas no fundo eacute a Ele que visa-mos Ele eacute o alfa e o ocircmega o unum eacute Ele Ele eacute o comeccedilo e o fim de tudo E se de algum modo todas essas reflexotildees natildeo vi-sassem o melhor conhecimento drsquoEle natildeo teriam valor

Numa conversa os espiacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical

Em toda essa teoria a conversa tem um papel enor-me porque ela no fundo requer certo discernimento dos espiacuteritos e uma percepccedilatildeo do que conveacutem ou natildeo ser dito Quando natildeo conveacutem deve-se ter o suficiente desa-pego para natildeo tratar

Muita gente conversa sobre aquilo que tem vontade de conversar Isso eacute a morte da conversaccedilatildeo A conver-sa boa nem eacute sobre aquilo que tenho ou meu interlocu-tor tem vontade de conversar mas sim tratar daquilo em que noacutes dois podemos igualmente gostar de conversar O resto eacute a morte da conversaccedilatildeo

Agrave medida que uma conversa estaacute bem travada os es-piacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical E quando se entendem bem vatildeo mudando de tema igual-mente muito mais por apetecircncias do que por nexos loacutegi-cos Entra em algo o nexo loacutegico mas satildeo nexos psicoloacute-gicos mudanccedilas de temas vizinhos que vatildeo fazendo com que as duas pessoas gostem das mesmas coisas Entatildeo a conversa aiacute se torna deliciosa

Eacute mais ou menos como por exemplo duas pessoas que passeiam juntas no centro de Roma a caminho das catacumbas Passam por uma loja qualquer que tem gra-vatas bonitas os dois estatildeo precisando comprar gravatas param olham gostam conversam Depois transitam em frente a uma confeitaria e comem algum doce E assim chegam agrave catacumba

A conversa soacute pega mesmo mdash ao menos eacute a impressatildeo que eu tenho mdash quando na pontinha do que estaacute sendo con-versado haacute qualquer coisa que eacute uma graccedila de Deus sobre alguma coisa de transcendente maravilhoso que por uma pontinha de consolaccedilatildeo sensiacutevel ambos estatildeo sentindo

Pode ser o unum ou natildeo Pode ser uma consolaccedilatildeo que todos tecircm juntos sobre um ponto que Nossa Senho-ra quer glorificar Entatildeo a conversa em geral tem um fundinho comum de supremo E quanto mais esse fundi-nho eacute sentido por todos mais a conversa eacute animada

Donde se tira uma conclusatildeo linda o principal inter-locutor eacute o Interlocutor Divino presente em nossa con-versa falando dentro das nossas almas e elogiando-se a Si proacuteprio por nossos laacutebios

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece

Isso daacute uma elevaccedilatildeo ao conceito de conversa em que Deus estaacute sempre presente natildeo soacute mdash e jaacute eacute muito mdash atra-veacutes da Feacute mas tambeacutem no fundo por alguma coisa comu-nicada diretamente pela graccedila que se torna sensiacutevel e cau-sa alegria Esse eacute o sal da conversa e que a Providecircncia daacute quando quer Eacute certa forma de sensiacutevel Natildeo eacute uma mera troca de ideias teoacuterica mas algo que vai mais alto

Eu volto a dizer pasma mas eacute fato o Divino Interlo-cutor eacute propriamente Aquele que fala Ele fala pela boca de um responde pela boca de outro e Se alegra pelo co-raccedilatildeo de todos Eacute uma coisa muito bonita

Pode-se dar um fato parecido com esse na ordem me-ramente natural O exemplo mais caracteriacutestico disso eacute

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

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ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

29

pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

s R

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duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 11: Revista Doctor Plinio 207_201506

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que existiam muitos quartos de dormir vazios donde se deduz terem morado filhos ali que depois tinham se mu-dado e o casal residia sozinho

Eu entatildeo imaginava o velho e a velha possiacutevel no niacute-vel daquela residecircncia que era uma casa mediana Esse velho e essa velha eu os construiacutea de vaacuterios velhos e ve-lhas que tinha conhecido

Como a ideia da Contra-Revoluccedilatildeo foi elaborada no espiacuterito de Dr Plinio

Estou explicitando agora Mas a explicitaccedilatildeo eacute fruto de um trabalho lento que a mim me daacute a impressatildeo de que natildeo estou trabalhando mas simplesmente vivendo Eu diria que parei Mas de repente saio com uma en-xurrada de coisas que assim nunca pensei Eacute o lento tra-balho terminal que deve aprontar na mente

A Contra-Revoluccedilatildeo considerada no seu conjunto teve exatamente esse papel no meu espiacuterito

Primeiro formei impressotildees observei fatos tomei conhecimento pela leitura de alguns tantos aconteci-mentos histoacutericos e tambeacutem conheci muito pelas nar-raccedilotildees mais ou menos agrave Alexandre Dumas que circu-lavam no ambiente familiar a respeito desse ou daque-le caso

Por exemplo Maria Antonieta Na minha geraccedilatildeo o preconceito contra Maria Antonieta era uma coisa atroz ldquoMulher dura maacute traidora favorecia os austriacuteacos De uma beleza esplendorosa mdash era vista assim mdash que fazia com que todas as mulheres feias ficassem complexadas pensando nelardquo

Mas contavam que o povo faminto chegou a Versailles e ela estava tatildeo alheia agraves verdadeiras necessidades do po-vo que disse ldquoEntatildeo se vocecircs natildeo tecircm patildeo comam brio-cherdquo E ela nem sabia bem que brioche era mais caro que o patildeo porque problema de dinheiro natildeo existia para ela Entatildeo deu um conselho que provava mdash assim diziam mdash como ela vivia alheia ao sofrimento do povo

Eu me lembro de ainda pequeno perguntando para Dona Lucilia

mdash Mas mamatildee o que eacute briochemdash Uns bolinhos excelentesNatildeo cheguei a me perguntar por que ela natildeo fazia

brioche para eu comer Ateacute laacute a gula natildeo chegouhellip Mas vejam a provaccedilatildeo para uma crianccedila que ainda natildeo sabe o que eacute brioche

ldquoEntatildeo as pessoas bonitas alinhadas estiladas supe-riores natildeo tecircm coraccedilatildeo porque seguem demais regras e se endurecem com essas regras Por que seguir a regra endurece e cega para a compaixatildeo com os que natildeo con-seguiram seguir a regra Entatildeo seguir as regras eacute maurdquo

Minha resposta interior

ldquoNatildeo pode ser Porque entre bem e bem natildeo pode ha-ver incompatibilidaderdquo

A doutrina natildeo eacute o ponto de partida mas o de chegada

A importacircncia que dou ao raciociacutenio faz com que eu natildeo considere nada por acabado se natildeo foi raciocinado Porque todo esse processo de intuiccedilatildeo tem que chegar a raciociacutenios que provem ou natildeo provem aquilo que foi an-tes intuiacutedo apalpado pressentido

Podem entatildeo imaginar o meu encantamento lendo o ldquoTratado de Direito Naturalrdquo de Taparelli drsquoAzeglio o ldquoTratado de Sociologia Catoacutelicardquo de Albeacuteric Belliot um franciscano enfim uma flotilha de coisas que eu li e me provaram por exemplo a legitimidade do direito de pro-priedade que era uma coisa instintiva mas cuja legitimi-dade eu apanhei aiacute

Quando vi que o direito de propriedade a instituiccedilatildeo da famiacutelia a indissolubilidade do viacutenculo matrimonial a autoridade paterna mdash cuja liceidade era intuiacuteda por mim mdash se baseavam num raciociacutenio claro liacutempido perfeito tive um entusiasmo enorme

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Ostensoacuterio da Igreja de Santa Maria - Cracoacutevia Polocircnia

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Isso deu ao meu pensamento uma estrutura que veio depois de mil apalpaccedilotildees

Essa eacute uma caracteriacutestica do meu espiacuterito natildeo come-ccedilar por ler a doutrina mas por pegar a realidade Depois de ter intuiacutedo na realidade ir ver a doutrina E aiacute ter um contentamento um gaacuteudio enorme

Estou longe de ser daqueles que julgam dever prescin-dir da doutrina mas a questatildeo eacute que para muitos a dou-trina eacute o ponto de partida e na conformaccedilatildeo do meu espiacuterito eacute o ponto de chegada

Todas essas coisas com o tempo acabam for-mando um depoacutesito primeiro de impressotildees maturadas para raciocinar E enquanto jaacute vou raciocinando algumas de minhas im-pressotildees continuo a maturar ou explici-tar outras Entatildeo noacutes poderiacuteamos dizer que esse processo eacute

Primeiro observar captando e classificando subconscientemente

Segundo estabelecendo oposiccedilotildees e come-ccedilando por aiacute a explicitaccedilatildeo

Terceiro fazer os primeiros raciociacutenios que constituem pontas de trilho para que daiacute para diante em contato com qualquer coisa nova o processo in-teiro vai se movendo

Concepccedilatildeo sacral da vida

Isso forma inclusive o pro-gresso na vida espiritual

Por exemplo a noccedilatildeo de sacralidade no comeccedilo eacute muito mais viacutevida em re-laccedilatildeo agrave Igreja Depois me-nos em referecircncia agrave au-toridade paterna dentro da famiacutelia como entida-de toda ela sacral num certo sentido especial da palavra ldquosacralrdquo E tambeacutem em relaccedilatildeo ao mi-to monaacuterquico dentro do Es-tado que pode ser sacral se o indiviacuteduo qui-ser vecirc-lo assim oferececirc-lo agrave Igreja e pedir as becircnccedilatildeos dela a fim de sacralizaacute-lo

Isso acaba dando lugar a uma noccedilatildeo de sacralidade adequada agraves coisas temporais que eacute um desdobramento da noccedilatildeo do sacral mdash proacutepria das coisas estritamente espiritu-ais e sobrenaturais mdash e formando no espiacuterito vaacuterios degraus e modos de ser da sacralidade

cujo auge sempre me pareceu como sendo a Consagraccedilatildeo durante a Missa mais do que a minha Comunhatildeo

Agora uma coisa que eacute pessoal sou mais sensiacutevel agrave sacralidade do ato da Consagraccedilatildeo enquanto conside-rado na Consagraccedilatildeo do vinho e a apresentaccedilatildeo do caacuteli-ce para o povo adorar do que na Consagraccedilatildeo do patildeo e a apresentaccedilatildeo para ser adorado

Eu tinha a impressatildeo mdash que soube depois natildeo cor-responder agrave realidade mdash de que a transubstan-

ciaccedilatildeo se dava no momento da elevaccedilatildeo E daiacute aquele respeito e aquela veneraccedilatildeo

Porque nos fieacuteis haacute um redobrar de res-peito e veneraccedilatildeo quando o Santiacutessi-mo eacute elevado Compreende-se por-que eacute exposto para eles adorarem en-

tatildeo fazerem um ato interior que corres-ponde a essa exposiccedilatildeo Mas eu achava

que era porque a transubstanciaccedilatildeo estava se dando naquele momento

A forma material do caacutelice eacute tatildeo evo-cativa do que eacute o oferecimento da sacra-

lidade Uma alma que se oferece ou oferece alguma coisa de dentro de

si eacute tatildeo bem representada por um caacutelice que se abre e que daacute tudo

o que tem Por outro lado o vi-nho eacute tatildeo mais parecido com

o sangue do que o patildeo o eacute com o corpo que tudo isso me dava mais sen-saccedilatildeo mdash puramente fiacute-sica e analoacutegica mdash de sacralidade

A simples presen-ccedila do Santiacutessimo Sa-cramento exposto me dava uma sensaccedilatildeo de sacralidade colos-sal Muito mais do que o Santiacutessimo guarda-do na capela-mor Po-der chegar perto drsquoEle adoraacute-Lo produz em

mim impressotildees de sa-cralidade que eu acho que

possuem qualquer coisa de miacutestico muito maiores do

que as que se tecircm em contato com a sociedade temporal

Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus - Igreja Imaculada Conceiccedilatildeo Goa Iacutendia

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Mas por esse progresso de alma de que estou falan-do a pessoa vai compreendendo que em formas termos e modos diferentes a sociedade temporal inteira acaba tendo qualquer coisa de sacral E entatildeo uma concep-ccedilatildeo toda ela sacral da vida vai se maturando lentamente ao longo das deacutecadas para depois fazer uma confericcedilatildeo com os autores especializados

Porque a palavra definitiva eacute deles Eles representam a Igreja que eacute infaliacutevel e portanto vamos ouvir o que a Santa Matildee Igreja ensina a esse respeito E ensina na for-ccedila da palavra ldquoensinarrdquo quer dizer ela eacute a Mestra infaliacute-vel eu sou o aluno bobo que posso ter feito um engano e apresento a ela aquilo que pensei

No princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Eacute um processo que em certo momento entra numa apa-rente estagnaccedilatildeo e continua a elaboraccedilatildeo em profundidade De maneira que quem me conhece haacute muito tempo eacute pos-siacutevel que tenha tido ideia de que em algumas coisas eu es-tou me repetindo indefinidamente Mas se forem examinar de perto notaratildeo que tem sempre alguma coisinha nova que corresponde em profundidade a esse processo lento

Mas isso levanta um problema Esse natildeo eacute mdash em suas linhas gerais natildeo nos seus pormenores mdash o proacuteprio meacute-todo de pensar legiacutetimo do espiacuterito humano

Vamos formular a coisa assim O primeiro livro foi escrito por um homem que natildeo teve livros Entatildeo a cultura nasceu de um pensamento anterior ao livro Logo no processo in-telectual no princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Entatildeo eu volto ao ponto de partidaO unum eacute o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus de uma ma-

jestade infinita doccedilura infinita sabedoria infinita de um poder infinito e de uma bondade infinita para dizer soacute alguns atributos Tudo isso eacute uma siacutentese para chegar ateacute Ele compreendecirc-Lo

A teoria geral das vaacuterias formas de crescimento de desen-volvimento que apresentei no comeccedilo da reuniatildeo parece natildeo ter relaccedilatildeo alguma com Ele Mas no fundo eacute a Ele que visa-mos Ele eacute o alfa e o ocircmega o unum eacute Ele Ele eacute o comeccedilo e o fim de tudo E se de algum modo todas essas reflexotildees natildeo vi-sassem o melhor conhecimento drsquoEle natildeo teriam valor

Numa conversa os espiacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical

Em toda essa teoria a conversa tem um papel enor-me porque ela no fundo requer certo discernimento dos espiacuteritos e uma percepccedilatildeo do que conveacutem ou natildeo ser dito Quando natildeo conveacutem deve-se ter o suficiente desa-pego para natildeo tratar

Muita gente conversa sobre aquilo que tem vontade de conversar Isso eacute a morte da conversaccedilatildeo A conver-sa boa nem eacute sobre aquilo que tenho ou meu interlocu-tor tem vontade de conversar mas sim tratar daquilo em que noacutes dois podemos igualmente gostar de conversar O resto eacute a morte da conversaccedilatildeo

Agrave medida que uma conversa estaacute bem travada os es-piacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical E quando se entendem bem vatildeo mudando de tema igual-mente muito mais por apetecircncias do que por nexos loacutegi-cos Entra em algo o nexo loacutegico mas satildeo nexos psicoloacute-gicos mudanccedilas de temas vizinhos que vatildeo fazendo com que as duas pessoas gostem das mesmas coisas Entatildeo a conversa aiacute se torna deliciosa

Eacute mais ou menos como por exemplo duas pessoas que passeiam juntas no centro de Roma a caminho das catacumbas Passam por uma loja qualquer que tem gra-vatas bonitas os dois estatildeo precisando comprar gravatas param olham gostam conversam Depois transitam em frente a uma confeitaria e comem algum doce E assim chegam agrave catacumba

A conversa soacute pega mesmo mdash ao menos eacute a impressatildeo que eu tenho mdash quando na pontinha do que estaacute sendo con-versado haacute qualquer coisa que eacute uma graccedila de Deus sobre alguma coisa de transcendente maravilhoso que por uma pontinha de consolaccedilatildeo sensiacutevel ambos estatildeo sentindo

Pode ser o unum ou natildeo Pode ser uma consolaccedilatildeo que todos tecircm juntos sobre um ponto que Nossa Senho-ra quer glorificar Entatildeo a conversa em geral tem um fundinho comum de supremo E quanto mais esse fundi-nho eacute sentido por todos mais a conversa eacute animada

Donde se tira uma conclusatildeo linda o principal inter-locutor eacute o Interlocutor Divino presente em nossa con-versa falando dentro das nossas almas e elogiando-se a Si proacuteprio por nossos laacutebios

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece

Isso daacute uma elevaccedilatildeo ao conceito de conversa em que Deus estaacute sempre presente natildeo soacute mdash e jaacute eacute muito mdash atra-veacutes da Feacute mas tambeacutem no fundo por alguma coisa comu-nicada diretamente pela graccedila que se torna sensiacutevel e cau-sa alegria Esse eacute o sal da conversa e que a Providecircncia daacute quando quer Eacute certa forma de sensiacutevel Natildeo eacute uma mera troca de ideias teoacuterica mas algo que vai mais alto

Eu volto a dizer pasma mas eacute fato o Divino Interlo-cutor eacute propriamente Aquele que fala Ele fala pela boca de um responde pela boca de outro e Se alegra pelo co-raccedilatildeo de todos Eacute uma coisa muito bonita

Pode-se dar um fato parecido com esse na ordem me-ramente natural O exemplo mais caracteriacutestico disso eacute

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

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ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

s R

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duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 12: Revista Doctor Plinio 207_201506

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SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

Isso deu ao meu pensamento uma estrutura que veio depois de mil apalpaccedilotildees

Essa eacute uma caracteriacutestica do meu espiacuterito natildeo come-ccedilar por ler a doutrina mas por pegar a realidade Depois de ter intuiacutedo na realidade ir ver a doutrina E aiacute ter um contentamento um gaacuteudio enorme

Estou longe de ser daqueles que julgam dever prescin-dir da doutrina mas a questatildeo eacute que para muitos a dou-trina eacute o ponto de partida e na conformaccedilatildeo do meu espiacuterito eacute o ponto de chegada

Todas essas coisas com o tempo acabam for-mando um depoacutesito primeiro de impressotildees maturadas para raciocinar E enquanto jaacute vou raciocinando algumas de minhas im-pressotildees continuo a maturar ou explici-tar outras Entatildeo noacutes poderiacuteamos dizer que esse processo eacute

Primeiro observar captando e classificando subconscientemente

Segundo estabelecendo oposiccedilotildees e come-ccedilando por aiacute a explicitaccedilatildeo

Terceiro fazer os primeiros raciociacutenios que constituem pontas de trilho para que daiacute para diante em contato com qualquer coisa nova o processo in-teiro vai se movendo

Concepccedilatildeo sacral da vida

Isso forma inclusive o pro-gresso na vida espiritual

Por exemplo a noccedilatildeo de sacralidade no comeccedilo eacute muito mais viacutevida em re-laccedilatildeo agrave Igreja Depois me-nos em referecircncia agrave au-toridade paterna dentro da famiacutelia como entida-de toda ela sacral num certo sentido especial da palavra ldquosacralrdquo E tambeacutem em relaccedilatildeo ao mi-to monaacuterquico dentro do Es-tado que pode ser sacral se o indiviacuteduo qui-ser vecirc-lo assim oferececirc-lo agrave Igreja e pedir as becircnccedilatildeos dela a fim de sacralizaacute-lo

Isso acaba dando lugar a uma noccedilatildeo de sacralidade adequada agraves coisas temporais que eacute um desdobramento da noccedilatildeo do sacral mdash proacutepria das coisas estritamente espiritu-ais e sobrenaturais mdash e formando no espiacuterito vaacuterios degraus e modos de ser da sacralidade

cujo auge sempre me pareceu como sendo a Consagraccedilatildeo durante a Missa mais do que a minha Comunhatildeo

Agora uma coisa que eacute pessoal sou mais sensiacutevel agrave sacralidade do ato da Consagraccedilatildeo enquanto conside-rado na Consagraccedilatildeo do vinho e a apresentaccedilatildeo do caacuteli-ce para o povo adorar do que na Consagraccedilatildeo do patildeo e a apresentaccedilatildeo para ser adorado

Eu tinha a impressatildeo mdash que soube depois natildeo cor-responder agrave realidade mdash de que a transubstan-

ciaccedilatildeo se dava no momento da elevaccedilatildeo E daiacute aquele respeito e aquela veneraccedilatildeo

Porque nos fieacuteis haacute um redobrar de res-peito e veneraccedilatildeo quando o Santiacutessi-mo eacute elevado Compreende-se por-que eacute exposto para eles adorarem en-

tatildeo fazerem um ato interior que corres-ponde a essa exposiccedilatildeo Mas eu achava

que era porque a transubstanciaccedilatildeo estava se dando naquele momento

A forma material do caacutelice eacute tatildeo evo-cativa do que eacute o oferecimento da sacra-

lidade Uma alma que se oferece ou oferece alguma coisa de dentro de

si eacute tatildeo bem representada por um caacutelice que se abre e que daacute tudo

o que tem Por outro lado o vi-nho eacute tatildeo mais parecido com

o sangue do que o patildeo o eacute com o corpo que tudo isso me dava mais sen-saccedilatildeo mdash puramente fiacute-sica e analoacutegica mdash de sacralidade

A simples presen-ccedila do Santiacutessimo Sa-cramento exposto me dava uma sensaccedilatildeo de sacralidade colos-sal Muito mais do que o Santiacutessimo guarda-do na capela-mor Po-der chegar perto drsquoEle adoraacute-Lo produz em

mim impressotildees de sa-cralidade que eu acho que

possuem qualquer coisa de miacutestico muito maiores do

que as que se tecircm em contato com a sociedade temporal

Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus - Igreja Imaculada Conceiccedilatildeo Goa Iacutendia

Gus

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Mas por esse progresso de alma de que estou falan-do a pessoa vai compreendendo que em formas termos e modos diferentes a sociedade temporal inteira acaba tendo qualquer coisa de sacral E entatildeo uma concep-ccedilatildeo toda ela sacral da vida vai se maturando lentamente ao longo das deacutecadas para depois fazer uma confericcedilatildeo com os autores especializados

Porque a palavra definitiva eacute deles Eles representam a Igreja que eacute infaliacutevel e portanto vamos ouvir o que a Santa Matildee Igreja ensina a esse respeito E ensina na for-ccedila da palavra ldquoensinarrdquo quer dizer ela eacute a Mestra infaliacute-vel eu sou o aluno bobo que posso ter feito um engano e apresento a ela aquilo que pensei

No princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Eacute um processo que em certo momento entra numa apa-rente estagnaccedilatildeo e continua a elaboraccedilatildeo em profundidade De maneira que quem me conhece haacute muito tempo eacute pos-siacutevel que tenha tido ideia de que em algumas coisas eu es-tou me repetindo indefinidamente Mas se forem examinar de perto notaratildeo que tem sempre alguma coisinha nova que corresponde em profundidade a esse processo lento

Mas isso levanta um problema Esse natildeo eacute mdash em suas linhas gerais natildeo nos seus pormenores mdash o proacuteprio meacute-todo de pensar legiacutetimo do espiacuterito humano

Vamos formular a coisa assim O primeiro livro foi escrito por um homem que natildeo teve livros Entatildeo a cultura nasceu de um pensamento anterior ao livro Logo no processo in-telectual no princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Entatildeo eu volto ao ponto de partidaO unum eacute o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus de uma ma-

jestade infinita doccedilura infinita sabedoria infinita de um poder infinito e de uma bondade infinita para dizer soacute alguns atributos Tudo isso eacute uma siacutentese para chegar ateacute Ele compreendecirc-Lo

A teoria geral das vaacuterias formas de crescimento de desen-volvimento que apresentei no comeccedilo da reuniatildeo parece natildeo ter relaccedilatildeo alguma com Ele Mas no fundo eacute a Ele que visa-mos Ele eacute o alfa e o ocircmega o unum eacute Ele Ele eacute o comeccedilo e o fim de tudo E se de algum modo todas essas reflexotildees natildeo vi-sassem o melhor conhecimento drsquoEle natildeo teriam valor

Numa conversa os espiacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical

Em toda essa teoria a conversa tem um papel enor-me porque ela no fundo requer certo discernimento dos espiacuteritos e uma percepccedilatildeo do que conveacutem ou natildeo ser dito Quando natildeo conveacutem deve-se ter o suficiente desa-pego para natildeo tratar

Muita gente conversa sobre aquilo que tem vontade de conversar Isso eacute a morte da conversaccedilatildeo A conver-sa boa nem eacute sobre aquilo que tenho ou meu interlocu-tor tem vontade de conversar mas sim tratar daquilo em que noacutes dois podemos igualmente gostar de conversar O resto eacute a morte da conversaccedilatildeo

Agrave medida que uma conversa estaacute bem travada os es-piacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical E quando se entendem bem vatildeo mudando de tema igual-mente muito mais por apetecircncias do que por nexos loacutegi-cos Entra em algo o nexo loacutegico mas satildeo nexos psicoloacute-gicos mudanccedilas de temas vizinhos que vatildeo fazendo com que as duas pessoas gostem das mesmas coisas Entatildeo a conversa aiacute se torna deliciosa

Eacute mais ou menos como por exemplo duas pessoas que passeiam juntas no centro de Roma a caminho das catacumbas Passam por uma loja qualquer que tem gra-vatas bonitas os dois estatildeo precisando comprar gravatas param olham gostam conversam Depois transitam em frente a uma confeitaria e comem algum doce E assim chegam agrave catacumba

A conversa soacute pega mesmo mdash ao menos eacute a impressatildeo que eu tenho mdash quando na pontinha do que estaacute sendo con-versado haacute qualquer coisa que eacute uma graccedila de Deus sobre alguma coisa de transcendente maravilhoso que por uma pontinha de consolaccedilatildeo sensiacutevel ambos estatildeo sentindo

Pode ser o unum ou natildeo Pode ser uma consolaccedilatildeo que todos tecircm juntos sobre um ponto que Nossa Senho-ra quer glorificar Entatildeo a conversa em geral tem um fundinho comum de supremo E quanto mais esse fundi-nho eacute sentido por todos mais a conversa eacute animada

Donde se tira uma conclusatildeo linda o principal inter-locutor eacute o Interlocutor Divino presente em nossa con-versa falando dentro das nossas almas e elogiando-se a Si proacuteprio por nossos laacutebios

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece

Isso daacute uma elevaccedilatildeo ao conceito de conversa em que Deus estaacute sempre presente natildeo soacute mdash e jaacute eacute muito mdash atra-veacutes da Feacute mas tambeacutem no fundo por alguma coisa comu-nicada diretamente pela graccedila que se torna sensiacutevel e cau-sa alegria Esse eacute o sal da conversa e que a Providecircncia daacute quando quer Eacute certa forma de sensiacutevel Natildeo eacute uma mera troca de ideias teoacuterica mas algo que vai mais alto

Eu volto a dizer pasma mas eacute fato o Divino Interlo-cutor eacute propriamente Aquele que fala Ele fala pela boca de um responde pela boca de outro e Se alegra pelo co-raccedilatildeo de todos Eacute uma coisa muito bonita

Pode-se dar um fato parecido com esse na ordem me-ramente natural O exemplo mais caracteriacutestico disso eacute

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

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ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

Ric

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

s R

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duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 13: Revista Doctor Plinio 207_201506

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Mas por esse progresso de alma de que estou falan-do a pessoa vai compreendendo que em formas termos e modos diferentes a sociedade temporal inteira acaba tendo qualquer coisa de sacral E entatildeo uma concep-ccedilatildeo toda ela sacral da vida vai se maturando lentamente ao longo das deacutecadas para depois fazer uma confericcedilatildeo com os autores especializados

Porque a palavra definitiva eacute deles Eles representam a Igreja que eacute infaliacutevel e portanto vamos ouvir o que a Santa Matildee Igreja ensina a esse respeito E ensina na for-ccedila da palavra ldquoensinarrdquo quer dizer ela eacute a Mestra infaliacute-vel eu sou o aluno bobo que posso ter feito um engano e apresento a ela aquilo que pensei

No princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Eacute um processo que em certo momento entra numa apa-rente estagnaccedilatildeo e continua a elaboraccedilatildeo em profundidade De maneira que quem me conhece haacute muito tempo eacute pos-siacutevel que tenha tido ideia de que em algumas coisas eu es-tou me repetindo indefinidamente Mas se forem examinar de perto notaratildeo que tem sempre alguma coisinha nova que corresponde em profundidade a esse processo lento

Mas isso levanta um problema Esse natildeo eacute mdash em suas linhas gerais natildeo nos seus pormenores mdash o proacuteprio meacute-todo de pensar legiacutetimo do espiacuterito humano

Vamos formular a coisa assim O primeiro livro foi escrito por um homem que natildeo teve livros Entatildeo a cultura nasceu de um pensamento anterior ao livro Logo no processo in-telectual no princiacutepio natildeo estava o livro mas o pensamento

Entatildeo eu volto ao ponto de partidaO unum eacute o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus de uma ma-

jestade infinita doccedilura infinita sabedoria infinita de um poder infinito e de uma bondade infinita para dizer soacute alguns atributos Tudo isso eacute uma siacutentese para chegar ateacute Ele compreendecirc-Lo

A teoria geral das vaacuterias formas de crescimento de desen-volvimento que apresentei no comeccedilo da reuniatildeo parece natildeo ter relaccedilatildeo alguma com Ele Mas no fundo eacute a Ele que visa-mos Ele eacute o alfa e o ocircmega o unum eacute Ele Ele eacute o comeccedilo e o fim de tudo E se de algum modo todas essas reflexotildees natildeo vi-sassem o melhor conhecimento drsquoEle natildeo teriam valor

Numa conversa os espiacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical

Em toda essa teoria a conversa tem um papel enor-me porque ela no fundo requer certo discernimento dos espiacuteritos e uma percepccedilatildeo do que conveacutem ou natildeo ser dito Quando natildeo conveacutem deve-se ter o suficiente desa-pego para natildeo tratar

Muita gente conversa sobre aquilo que tem vontade de conversar Isso eacute a morte da conversaccedilatildeo A conver-sa boa nem eacute sobre aquilo que tenho ou meu interlocu-tor tem vontade de conversar mas sim tratar daquilo em que noacutes dois podemos igualmente gostar de conversar O resto eacute a morte da conversaccedilatildeo

Agrave medida que uma conversa estaacute bem travada os es-piacuteritos vatildeo evoluindo juntos como num dueto musical E quando se entendem bem vatildeo mudando de tema igual-mente muito mais por apetecircncias do que por nexos loacutegi-cos Entra em algo o nexo loacutegico mas satildeo nexos psicoloacute-gicos mudanccedilas de temas vizinhos que vatildeo fazendo com que as duas pessoas gostem das mesmas coisas Entatildeo a conversa aiacute se torna deliciosa

Eacute mais ou menos como por exemplo duas pessoas que passeiam juntas no centro de Roma a caminho das catacumbas Passam por uma loja qualquer que tem gra-vatas bonitas os dois estatildeo precisando comprar gravatas param olham gostam conversam Depois transitam em frente a uma confeitaria e comem algum doce E assim chegam agrave catacumba

A conversa soacute pega mesmo mdash ao menos eacute a impressatildeo que eu tenho mdash quando na pontinha do que estaacute sendo con-versado haacute qualquer coisa que eacute uma graccedila de Deus sobre alguma coisa de transcendente maravilhoso que por uma pontinha de consolaccedilatildeo sensiacutevel ambos estatildeo sentindo

Pode ser o unum ou natildeo Pode ser uma consolaccedilatildeo que todos tecircm juntos sobre um ponto que Nossa Senho-ra quer glorificar Entatildeo a conversa em geral tem um fundinho comum de supremo E quanto mais esse fundi-nho eacute sentido por todos mais a conversa eacute animada

Donde se tira uma conclusatildeo linda o principal inter-locutor eacute o Interlocutor Divino presente em nossa con-versa falando dentro das nossas almas e elogiando-se a Si proacuteprio por nossos laacutebios

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece

Isso daacute uma elevaccedilatildeo ao conceito de conversa em que Deus estaacute sempre presente natildeo soacute mdash e jaacute eacute muito mdash atra-veacutes da Feacute mas tambeacutem no fundo por alguma coisa comu-nicada diretamente pela graccedila que se torna sensiacutevel e cau-sa alegria Esse eacute o sal da conversa e que a Providecircncia daacute quando quer Eacute certa forma de sensiacutevel Natildeo eacute uma mera troca de ideias teoacuterica mas algo que vai mais alto

Eu volto a dizer pasma mas eacute fato o Divino Interlo-cutor eacute propriamente Aquele que fala Ele fala pela boca de um responde pela boca de outro e Se alegra pelo co-raccedilatildeo de todos Eacute uma coisa muito bonita

Pode-se dar um fato parecido com esse na ordem me-ramente natural O exemplo mais caracteriacutestico disso eacute

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

Rep

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ccedilatildeo

ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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30)

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30

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

Ric

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C 3

0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 14: Revista Doctor Plinio 207_201506

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

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este quando se estaacute muito longe do paiacutes em que se nas-ceu e vaacuterios conacionais se encontram inesperadamente em algum lugar sai uma conversa animada

O que haacute no gaacuteudio de por exemplo vaacuterios brasilei-ros se encontrarem na Tailacircndia inesperadamente for-marem uma conversa animada e serem capazes ateacute de ir almoccedilar juntos

Haacute um fato natural meio parecido com o sobrenatural mdash porque haacute muita analogia entre certos fenocircmenos na-turais e outros sobrenaturais mdash que eacute um ponto comum da alma do brasileiro e do ambiente do Brasil o brasileiro que se sente muito isolado quando estaacute na Tailacircndia sem ter com quem conversar quando encontra outros com o mes-mo ponto comum aquilo aflora com uma veemecircncia extra-ordinaacuteria e faz na conversaccedilatildeo o papel natural semelhante ao que a graccedila opera no tipo de conversa de que falaacutevamos

Outra coisa se daacute quando alguns dos interlocuto-res por serem bons catoacutelicos satildeo objetos de uma graccedila por onde os demais podem ficar deslumbrados Isso po-de ocorrer ateacute no relacionamento entre um jovenzinho e seus colegas

O que se passou nesse caso Eacute algo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora enquanto canal neces-saacuterio do Redentor porque foi dita alguma coisa da Dou-trina Catoacutelica ou qualquer outra mateacuteria por onde eles percebem por um discernimento de espiacuteritos que lhes foi dado no momento alguma coisa de maravilhoso e de celeste

E isso pode determinar dois rumos diferentes a con-versatildeo dos que estatildeo ouvindo ou a perversatildeo de quem es-taacute falando Porque este fica sujeito ao seguinte raciociacute-

nio ldquoAqui me compreendem mais do que nos meios ca-toacutelicos que frequento Portanto vou frequentar mais es-te ambiente porque aqui faccedilo apostoladohelliprdquo Mas de fa-to ele vai se atolando naquele ambiente mundano

A conversa em sua natureza tem algo de uma prece Quando estaacute presente esse lado sobrenatural eacute uma ora-ccedilatildeo uma coletiva elevaccedilatildeo da mente a Deus

Poreacutem naqueles salotildees do periacuteodo do Ancien Reacutegime2 mdash era uma coisa medonha mdash havia uma graccedila propria-mente sobrenatural catoacutelica de caridade fraterna que dava na douceur de vivre3 manifestamente presente laacute misturada com a frivolidade mais escandalosa e com a ir-religiatildeo categoacuterica

Desde que o Divino Interlocutor esteja presente a conversa eacute o verdadeiro prazer da vida

Uma pessoa friacutevola costumava dizer na minha pre-senccedila que o verdadeiro prazer da vida era uma boa con-versa Tambeacutem acho que conversar desde que o Divino Interlocutor esteja presente eacute o gosto da vida E nenhu-ma outra coisa tem o valor da conversa

E daiacute entra outro tema que quase justificaria uma con-versa natildeo eacute compreensiacutevel a felicidade do Ceacuteu se natildeo se admite o que estamos dizendo Aquele colouvor no Ceacuteu eacute uma conversa sumamente bem-aventurada porque o Divino Interlocutor estaacute presente dando uma animaccedilatildeo incomparaacutevel ao que dizem a respeito drsquoEle de si proacute-prios da Histoacuteria e do universo mdash sempre com vistas a Ele mdash todos os que estatildeo ali participando

Mesmo assim eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo que o modo de ser apresentado o Ceacuteu por certas escolas espiri-tuais deturpa-o e torna-o menos apeteciacutevel Tenho a im-pressatildeo mdash que eacute quase uma certeza mas se a Igreja ensi-nar o contraacuterio no mesmo instante mudo de opiniatildeo mdash de que no Paraiacuteso cada bem-aventurado conserva todas as caracteriacutesticas legiacutetimas que teve na Terra

E no Ceacuteu eacute interessante o fato de almas com perso-nalidades tatildeo diferentes estarem todas unidas na conver-sa na interlocuccedilatildeo a mais agradaacutevel a mais amaacutevel a mais nobre a mais gentil a mais elevada a mais distinta a mais recolhida e ao mesmo tempo a mais pseudodissi-pada que se possa imaginar

De maneira que cada um ama muito que o outro se-ja de outro modo e todos sentem as respectivas harmo-nias E a presenccedila de Deus se tornando continuamente sensiacutevel conhecida e apreciaacutevel a todos e sendo Ele no fundo o Divino Interlocutor dentro da alma de todos

haacute um tipo de conversa que eacute do gecircnero das conver-saccedilotildees abenccediloadas aqui na Terra mas com qual-

quer coisa que vai infinitamente aleacutem

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

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ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

28

o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

29

pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

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duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 15: Revista Doctor Plinio 207_201506

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A conversa no Ceacuteu seraacute como uma contiacutenua oraccedilatildeo

E aiacute compreendemos todo o gaacuteudio que o Ceacuteu pode trazer a partir do primado da conversa sobre todos os outros prazeres

Eacute uma coisa que nos eacute dada de vez em quando na Ter-ra um pouquinho e que nos deixa fora de noacutes de con-tentamento E no Ceacuteu nos eacute concedida contiacutenua e plena-mente e com uma intensidade inimaginaacutevel Donde a fe-licidade celeste

Considerem as almas que certos estilos artiacutesticos pin-tam como estando no Ceacuteu todas elas tecircm a mesma per-sonalidade as mesmas caracteriacutesticas e o colouvor per-de o sabor Fica meio inimaginaacutevel um Ceacuteu saboroso

Poreacutem imaginar que no Paraiacuteso se estaacute conversando por exemplo com um grande historiador e vemos Satildeo Tomaacutes de Aquino que estaacute passando e lhe perguntamos

mdash Satildeo Tomaacutes o que dizeis sobre este as-sunto

Ele para extasiado fica contente e res-ponde com aquela simplicidade que lhe eacute caracteriacutestica

mdash Olhe aqui isso eacute assimGrande alegria Ele passa e ainda duran-

te algum ldquotempordquo mdash para usar nossa lingua-gem aqui da Terra mdash aqueles a quem ele en-sinou ficam contentes por causa disso

No ldquofimrdquo do ldquodiardquo vatildeo levar de presen-te para ele uma pedra linda que encontra-ram no Ceacuteu empiacutereo Ele pega-a fica en-cantado e faz uma reflexatildeo ultrassubstan-ciosa sobre aquilohellip

Eacute a vida do Ceacuteu vista com base na con-versa tida como uma oraccedilatildeo

A conversa eacute uma coisa continuamente moacutevel E como as perfeiccedilotildees de Deus satildeo infinitas mdash Deus eacute insondaacutevel mdash Ele eacute pa-ra noacutes no fim de milhotildees de trilhotildees de anos tatildeo novo como no primeiro instante

Aleacutem disso haacute o Ceacuteu empiacutereo onde su-ponho que eacute dado ao homem fazer obras de arte construir organizar arranjar etc e assim ter o gosto de realizar Eu natildeo acre-dito que um contemplativo tenha um ver-dadeiro gosto de contemplaccedilatildeo se natildeo tiver tambeacutem o gosto da contemplaccedilatildeo transfor-mada em obra e deixada para outros

Nesse sentido por exemplo quando li pela primeira vez aquelas palavras de Satildeo Paulo ldquoCombati o bom combate etcrdquo4

que ele pronunciou proacuteximo da hora de morrer aquilo me pareceu a morte por excelecircncia magniacutefica ldquoEu pen-sei eu fiz eu deixeirdquo Quer dizer ldquoAqui estaacuterdquo E o ter fei-to eacute uma grande coisa

Carlos Magno morrendo com a consciecircncia de que ele fez um impeacuterio que coisa magniacutefica

Bem tivemos uma oacutetima conversa Assim foi porque o Interlocutor Divino estava presente   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1941989)

1) Em Satildeo Paulo bairro Santa Ceciacutelia2) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico

aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

3) Do francecircs doccedilura de viver 4) Cf 2Tm 4 7

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ccedilatildeo

ldquoApoteose de Satildeo Tomaacutes de Aquinordquo (por Zurbaraacuten) Museu de Belas Artes de Sevilha Espanha

A organicidade do Brasil

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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30)

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30

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

Ric

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C 3

0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 16: Revista Doctor Plinio 207_201506

A organicidade do Brasil

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ara exemplificar as teorias sobre organicidade que vimos desenvolvendo tomemos o Brasil co-mo ele eacute constituiacutedo hoje em dia

Interpenetraccedilatildeo por osmoseUm bom observador notaraacute haver mais diferenccedilas de

psicologias entre os Estados brasileiros do que parece agrave

As diferenccedilas de psicologias existentes entre as vaacuterias regiotildees do Brasil natildeo causam fricccedilotildees devido ao bom

gecircnio brasileiro A expansatildeo populacional do paiacutes deu-se por um processo natural mas sobretudo providencial

em que Deus foi pondo em ordem todas as coisas

Parque Estadual do Caracol Rio Grande do Sul Brasil

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

Ric

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s (C

C 3

0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 17: Revista Doctor Plinio 207_201506

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primeira vista E que se essas diferenccedilas natildeo se transfor-mam em fricccedilotildees ou quando ocorrem constituem atri-tos miacutenimos eacute por causa do bom gecircnio brasileiro

No que resultam essas diferenccedilas Haacute por exemplo um Rio Grande do Sul que difunde sua proacutepria influecircn-cia sobre os dois outros Estados vizinhos que satildeo em or-dem geograacutefica Santa Catarina e Paranaacute Esses trecircs Es-tados no seu conjunto tecircm uma espeacutecie de mentalidade e modo de ser que vatildeo se tornando menos parecidos com o Rio Grande e mais parecidos com Satildeo Paulo agrave medida que se aproximam deste uacuteltimo Estado Mas ateacute o mo-mento de entrarem 100 ou 150 quilocircmetros em Satildeo Pau-lo ainda se sente certo ldquocheirordquo de Rio Grande do Sul

Depois avanccedila-se em Satildeo Paulo e toca-se nos Esta-dos do Rio de Janeiro Minas Gerais e Mato Grosso No-ta-se que Rio de Janeiro e Minas Gerais tecircm em alguns pontos uma interinfluecircncia muito grande Por exemplo entre o campista e o mineiro existe uma interinfluecircncia enorme que eu poderia mostrar no que consiste mas natildeo o faccedilo por brevidade

Nos limites entre Minas e Espiacuterito Santo notaremos haver sempre um fenocircmeno semelhante ao existente por exemplo nos limites da Alemanha com a Franccedila cida-des da Alemanha que falam francecircs cidades da Franccedila que falam alematildeo nomes franceses na Alemanha no-mes alematildees na Franccedila Eacute uma espeacutecie de interpenetra-ccedilatildeo por osmose ao longo de toda a fronteira mas de-pois em certo momento comeccedila propriamente a Alema-nha e a Franccedila Isso se daacute mais ou menos com todos os Estados brasileiros

Mentalidade una

O que determinou essas circunstacircncias diferencia-doras Poderiacuteamos alinhar mil fatores e quando se ali-nham mil quer dizer que nada eacute decisivo Mas haacute uma resultante daiacute chamada Brasil Esta resultante constitui um unum haacute uma mentalidade una e um todo que se-ria simplificador chamar de siacutentese pela seguinte razatildeo

Vemos se abrirem novos Estados no Brasil laacute na zo-na da Amazocircnia O Acre por exemplo foi antigamen-te um territoacuterio dependente do Governo Federal hoje eacute

Todo o jogo planetaacuterio tem a sua

vida natural mas existem Anjos

que o regem sem que deixe de ser

um fenocircmeno natural poreacutem com

intercorrecircncias e apoios sobrenaturais

que entram para completar isso

Selva amazocircnica Brasil

Pedra Furada Santa Catarina Brasil

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um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

28

o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

29

pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

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duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 18: Revista Doctor Plinio 207_201506

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

um Estado Haacute outras regiotildees assim que ficam pelo Nor-te do paiacutes onde se nota uma coisa curiosa satildeo povoados por adventiacutecios de outros lugares mas que chegam nes-sas regiotildees e formam um conjunto capaz de ldquoesticarrdquo psi-cologicamente o Brasil ateacute laacute e eacute o mesmo Brasil com outra mentalidade eacute um fenocircmeno muito parecido em ponto republicano com o processo de fundaccedilatildeo que se deu em ponto feudal e monaacuterquico com os vaacuterios reinos que constituiacuteram a Espanha Muito mais parecido ainda

com as vaacuterias regiotildees de Portugal cada regiatildeo forma um paisinho e assim se compotildee Portugal

Como cada coisa dessas se constitui e como o todo se forma Creio que eacute um processo natural mas espe-cialmente providencial que a Providecircncia teve em vista quando ordenou as coisas de maneira que as causas se-gundas rolassem nesse sentido e que haacute nisso uma espeacute-cie de superior sabedoria como a que potildee em ordem por exemplo o reino vegetal o reino animal etc uma mani-

festaccedilatildeo do poder de Deus que excede a inte-ligecircncia humana e onde entra um plano mui-to superior

A meu ver quando a unidade das naccedilotildees regionalizadas eacute feita sem apego e nas pro-porccedilotildees devidas eacute tocada por forccedilas e instin-tos naturais dos homens que conveacutem descre-ver e explicar em alguma medida mas natildeo ateacute ao fim porque haacute uma ordem superior dentro disso

O processo natural unido ao sobrenatural

Haacute nos vegetais uma forccedila pela qual a planta puxa os nutrientes da terra que che-gam por diversas transformaccedilotildees ateacute as ca-pilaridades do vegetal

Assim tambeacutem na formaccedilatildeo das elites haacute uma pressatildeo para cima que faz com que o no-bre vaacute aparecendo e depois do conviacutevio dos nobres vai surgindo no mais alto grau o rei Para usar outra metaacutefora as naccedilotildees produ-zem seu rei como as abelhas o mel

Contudo como na sociedade orgacircnica os fenocircmenos se passam com homens e natildeo com bichos nem com plantas entra tambeacutem na ponta do processo natural mdash natildeo eacute sem-

Olinda - Pernambuco Brasil

Coroaccedilatildeo de Luiacutes VIII e Branca de Castela Biblioteca Nacional Franccedila Paris

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pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

26

o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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30)

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

33

Foto

s R

epro

duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 19: Revista Doctor Plinio 207_201506

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

pre mas com alguma frequecircncia mdash algo que eacute uma in-terferecircncia de Deus com uma gota de sobrenatural em que haacute uma instauraccedilatildeo de Deus Daiacute a necessidade da intervenccedilatildeo da Igreja

Porque para agir conforme a natureza portanto de acordo com a vontade de Deus o homem concebido no pecado original tem cem tendecircncias contra e se a graccedila natildeo estaacute continuamente amparando-o bem sabemos que besteiras ele faz

Entatildeo para esse proacuteprio processo natural correr se-gundo a natureza o Anjo da Guarda o sobrenatural a graccedila estatildeo juntos mais ou menos como haacute Anjos regen-do cada corpo celeste Todo o jogo planetaacuterio tem a sua vida natural mas existem Anjos que o regem sem que deixe de ser um fenocircmeno natural poreacutem com intercor-recircncias e apoios sobrenaturais que entram para comple-tar isso

Assim quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia por exemplo a tendecircncia geral de todos para o bem pro-duz um movimento subconsciente que destila uma famiacute-lia que a ordem natural indicou Mas por detraacutes da or-dem natural estaacute a Providecircncia

Humildade e flexibilidade

A dinastia eacute no alto de um paiacutes mais ou menos co-mo as duas torres de Notre-Dame tendo ao fundo aque-la espeacutecie de flecha Elas ordenam e explicam a catedral e a levam agrave sua mais alta expressatildeo mas natildeo satildeo propria-mente o edifiacutecio Tambeacutem natildeo satildeo estranhas a ele elas satildeo uma magniacutefica protuberacircncia do edifiacutecio

Assim tambeacutem o rei eacute uma magniacutefica protuberacircncia da naccedilatildeo

Vou dizer uma coisa um tanto ousada mas que parece deduzir-se do ateacute aqui exposto A situaccedilatildeo do rei eacute de-

Quando desce uma becircnccedilatildeo sobre uma dinastia a

tendecircncia geral de todos para o bem produz um movimento subconsciente

que destila uma famiacutelia que a ordem natural indicou

Mas por detraacutes da ordem natural estaacute

a Providecircncia

Aspectos da Catedral Notre-Dame - Paris Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

26

o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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30)

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

33

Foto

s R

epro

duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

baixo de vaacuterios pontos de vis-ta parecida com a do religio-so ou ele tende continuamente para a perfeiccedilatildeo ou eacute um de-molidor da ordem da qual ele eacute ao mesmo tempo o princiacutepio ordenador e explicador perfei-to e o siacutembolo maacuteximo De on-de entatildeo a necessidade de ha-ver muitos reis santos para que todo esse preacutedio natildeo caia no chatildeo

Dou um exemplo que po-de ajudar-nos a compreender a humildade e a flexibilidade exi-gidas de um monarca

Um professor pode ser tatildeo plenamente um mestre que ele estimule todas as energias in-telectuais dos disciacutepulos a produzirem tudo quanto po-diam e ateacute mais O problema seria encontrar um profes-sor que tivesse este talento mas seria tambeacutem de conse-guir que o professor natildeo incentivasse no aluno uma am-biccedilatildeo maior do que a capacidade dele De maneira que em nenhum momento da formaccedilatildeo quisesse que o me-nino fosse um mocinho que o moccedilo fosse um homem maduro etc mas respeitasse os limites naturais de cada etapa Do contraacuterio esgotaria o sujeito e o transformaria em fogo de artifiacutecio gasto natildeo valendo mais nada

Quando um homem que lidera uma naccedilatildeo consegue levaacute-la a dar tudo mas natildeo procura fazecirc-la dar demais deixa ldquogasolinardquo para os seacuteculos futuros Mas quando o liacuteder a faz andar demais ela decai durante o governo dos sucessores dele

A meu ver um dos grandes erros de Luiacutes XIV foi que ele quis fazer a Franccedila progredir demasiadamente raacutepi-do Versailles deveria ter sido construiacutedo cem ou duzen-tos anos mais tarde Ele procurou esticar a Franccedila e co-mo resultado veio o cansaccedilo Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fe-

Luiacutes XV Luiacutes XVI satildeo fenocircmenos

de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

Acima Marcha do Rei com seus guardas

Biblioteca Nacional Haia Holanda

Ao lado estaacutetua equestre de Luiacutes XIV - Palaacutecio de

Versailles Franccedila

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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30)

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30

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 21: Revista Doctor Plinio 207_201506

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a SocieDaDe anaLiSaDa por Dr pLinio

nocircmenos de cansaccedilo desse arquiprofessor que foi Luiacutes XIV

O ldquovovosatildeordquo Dom Pedro II

No Brasil deu-se um fenocircmeno diverso A fa-miacutelia imperial brasileira estava colocada numa posiccedilatildeo muito singular porque tomava um pa-iacutes muito atrasado que se encontrava sob a di-reccedilatildeo de uma naccedilatildeo decadente e com a influ-ecircncia da luta contra uma selva habitada por iacuten-dios e dotada de uma natureza tatildeo pujante que o homem em certos momentos fica semides-norteado sentindo-se meio pequenino Tanto mais que se a pujanccedila fosse sempre a do belo seria uma coisa mas muitas vezes eacute a pujanccedila do grotesco

Entatildeo parece-me que sob esse ponto de vis-ta D Pedro II e Dona Teresa Cristina foram de um ajuste muito profundo e acertado natildeo intencional porque o intencional nunca acer-ta tanto Creio que D Pedro II conseguiu ser o que o Brasil queria o ldquovovosatildeordquo do paiacutes e Do-na Teresa Cristina a avoacute bem-amada do Brasil querida e respeitada por todos Havia uma es-peacutecie de ligaccedilatildeo que numa monarquia euro-peia pessoas da mesma dinastia natildeo teriam

Por exemplo a cena que Dona Lucilia conta-va D Pedro II visitando o interior parou em Pirassununga desceu do trem e foi para a ca-sa de meu avocirc onde estava preparada a recep-ccedilatildeo municipal O Imperador sentou-se no sofaacute e minha matildee muito menina ainda foi-lhe apre-sentada por meu avocirc como sua filha mais velha D Pedro II olhou-a e disse-lhe ldquoVem caacuterdquo

Ela foi e ele colocou-a junto de si Ela ficou mui-to agradada por estar sendo assim tratada pelo Impe-rador

Mas a matildee dela tinha-lhe feito um penteado ultracui-dadoso daqueles que segundo o estilo do seacuteculo XIX se faziam para meninas com cachos fita e toda espeacutecie de coisas E enquanto conversava com senhores que es-tavam ali todos de peacute o Imperador distraidamente co-meccedilou a passar a matildeo nos cabelos da pequena Lucilia

Meu avocirc percebeu imediatamente qual seria a rea-ccedilatildeo de menina ldquoEstatildeo estragando meu penteadordquo Ela olhou para ele como pedindo socorro E ele fitou-a co-mo quem diz ldquoNatildeo se movardquo Vaacuterias vezes saiu esse SOS de parte a parte

No fim quando o Imperador terminou a visita o pen-teado estava uma ruiacutena Mas ela nunca mais se esqueceu desse episoacutedio que ela gostava de contar

Notem a familiaridade do Imperador alisando assim a cabeccedila de uma menina Isso natildeo aconteceria em outros paiacuteses Mas ele sentia que ali era preciso e deve ter feito isso em vaacuterios outros lugares Eacute o Brasil

Vamos dizer que tivesse entrado ali Luiacutes XIV sublime e irrepreensiacutevel ldquoMonsieurs et Dames le roi va srsquoasseoirrdquo1 O rei se sentahellip Poderia ocasionar uma frieza geral eacute outra questatildeo Todos sabem quanto admiro a etiqueta francesa a um grau paroxiacutestico Pois bem mas tem o seu lugar natildeo eacute para caacute Por quecirc Porque precisaria levar muito tempo ateacute ela ser possiacutevel aqui e teria de ser agrave ma-neira do Brasil   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 12111991)

1) Do francecircs Senhores e Senhoras o rei vai se sentar

D Pedro II na abertura da Assembleia Geral Museu Imperial Petroacutepolis Brasil

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A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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30)

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30

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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duccedilatilde

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mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 22: Revista Doctor Plinio 207_201506

A conversa e a cruz

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Dr pLinio comenta

Mestre na arte da conversa Dr Plinio explica como ela pode nascer do sofrimento

personalidade naquilo Nasce entatildeo uma conversa sucu-lenta pois cada um ajuda o outro a ver melhor as coisas

A conversa e a espuma da champagne

Ficaria uma coisa artificial se todos se sentassem jun-tos e decidissem ldquoVamos conversar a respeito do traje-tordquo O agradaacutevel estaacute em natildeo ser uma combinaccedilatildeo sur-gir no improviso e de repente a conversa comeccedilar a fer-ver porque todos sentem que cada um estaacute pondo o seu contributo

A melhor comparaccedilatildeo eacute com a efervescecircncia da espu-ma da champagne

Ao dar este exemplo algo do que estou expondo se passou Todos noacutes vimos a espuma da champagne e par-ticipamos de conversas Certamente alguns dos presen-tes natildeo se teratildeo lembrado de comparar uma com outra Entretanto depois que um fez essa analogia tirada de uma observaccedilatildeo pessoal e corriqueira da vida contem-poracircnea eacute possiacutevel que a primeira vez em que tomem champagne se lembrem de uma conversa ou a primeira vez em que saia uma boa conversa se lembrem da espu-ma da champagne

Quer dizer o contributo de um ajudou vaacuterios a nota-rem na conversa e na espuma de champagne uma relaccedilatildeo que todos tinham visto mas natildeo tinham explicitado A conversa foi boa porque trouxe uma explicitaccedilatildeo

A torcida impede a boa conversa

Imaginem pelo contraacuterio que vatildeo conversando duran-te o percurso Comeccedila a conversa durante a qual a pes-soa precisa ter uma virtude mdash que raramente algueacutem aos vinte e poucos anos tem mdash bastante grande para natildeo ser imediatamente tomado por uma espeacutecie de ldquobolsa de va-loresrdquo do amor-proacuteprio quem disse a coisa mais engraccedila-da a mais interessante se prestaram ou natildeo atenccedilatildeohellip

Depois fica uma feira de torcida algueacutem diz algo pa-ra provocar excitaccedilatildeo e os demais torcem para degustar

ediram-me para falar a respeito da relaccedilatildeo exis-tente entre a conversa e a cruz Vamos entatildeo conversar um pouquinho sobre isso

Antes de conversar falar consigo mesmo

A pessoa recolhida fala consigo mesma e soacute entatildeo co-meccedila a conversar Porque soacute tem uma boa prosa quem antes falou consigo mesmo Natildeo eacute o doido que fala sozi-nho evidentemente mas eacute aquele que pensa e nas rea-ccedilotildees de sua proacutepria alma encontra o preacircmbulo neces-saacuterio para conversar Quem natildeo eacute assim eacute uma caixa de repeticcedilatildeo das sensaccedilotildees das impressotildees dos outros um papagaio que recompotildee colchas de retalhos daquilo que ouviu Natildeo eacute um homem capaz de pensar e portanto de conversar

Dou um exemplo concreto Imaginem que alguns dos senhores vatildeo por exemplo deste auditoacuterio agraves sedes onde residem guardando o silecircncio dentro dos respectivos ve-iacuteculos Natildeo havendo conversa prestam atenccedilatildeo nas coi-sas mais diacutespares pelas quais vatildeo passando pelo caminho e que vatildeo assim sendo captadas pelo intelecto

Chegando agrave sede passam pela capela e vatildeo quietos para os quartos de dormir Ao se recostarem aquilo que viram vem agrave memoacuteria Natildeo como se fosse uma fita de ci-nema mas sem os senhores perceberem voltam agrave cabe-ccedila mdash um pouco mais acentuadas trabalhadas e analisa-das mdash aquelas coisas que lhes chamaram mais a atenccedilatildeo

Se os senhores percorrerem aquele trajeto em silecircn-cio vaacuterias vezes numa semana teratildeo feito de cada via-gem sem se darem conta um livro cujas paacuteginas estatildeo cheias de vida e realidade natildeo de tipografia

Em determinado momento algueacutem comenta ldquoViram em tal casa tal coisa assimrdquo Vaacuterios intervecircm ldquoNatildeo natildeo eacute isso eacute de outro modo etcrdquo Sem perceber formaram uma ideia inteiramente pessoal sobre a qual ningueacutem conver-sou Assim quando forem trocar aquelas impressotildees per-mutam algo que vale a pena tratar porque cada um daacute agravequela imagem uma caracteriacutestica que eacute a projeccedilatildeo de sua

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

26

o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

27

lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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30)

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

33

Foto

s R

epro

duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

Foto

s R

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duccedilatilde

o

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 23: Revista Doctor Plinio 207_201506

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algum tempo comeccedila a ficar profundo Porque do fun-do dele nascem os problemas as questotildees o interesse as indagaccedilotildees as leiturashellip O que ele tem de melhor vai se definindo e adquirindo vida e curiosidade

Mas tambeacutem o que ele tem de mais seacuterio leva-o a dis-criminar classificar julgar e ele vai tomando uma rela-ccedilatildeo pessoal com aquilo que leu Ao cabo de algum tem-po estaacute em condiccedilotildees de florescer num comentaacuterio Mas este vem dessa espeacutecie de profundidade que a solidatildeo daacute

O pensamento nasce da dor como o som de um instrumento

Algueacutem poderia objetar ldquoDr Plinio o senhor estaacute desviando o tema da exposiccedilatildeo Noacutes pedimos para o se-nhor falar sobre a conversa e a cruz e o senhor estaacute tra-tando da conversa e da seriedaderdquo

Eacute que haacute uma identidade profunda entre o amor agrave se-riedade e o amor agrave cruz e eu natildeo fiz senatildeo preparar o terreno para falar do amor agrave cruz e da conversa nasci-da da cruz

Assim como num instrumento de cordas o som nas-ce porque se passa o arco pelas cordas ferem-se as cor-das para que elas cantem assim como um instrumento de percussatildeo ressoa porque se bate naquela membrana tambeacutem eacute pela pressatildeo que o homem reage Quando al-go o faz sofrer ele pensa como nunca O homem que so-fre este sim pensa verdadeiramente e elabora um pen-samento particularmente excelente

As dores do corpo

Haacute situaccedilotildees tremendas de sofrimento como as am-putaccedilotildees que se faziam antigamente quando natildeo havia anesteacutesicos Por exemplo na Idade Meacutedia em que para serrar uma perna amarrava-se o paciente de cabeccedila para baixo para diminuir a hemorragia e passava-se o serrote na perna dele Havia casos de guerreiros que tinham suas duas pernas amputadas

Agraves pessoas de nosso seacuteculo eacute difiacutecil imaginar como al-gueacutem suportava uma dor como essa Natildeo estou muito longe de achar que um homem contemporacircneo a quem se tivesse que amputar uma perna assim em cru depois natildeo ficasse meio louco o resto da vida

Depois cauterizavam a ferida encostando brasas sobre a carne cortada para queimando e secando evitar a infec-ccedilatildeo Quer dizer depois de tudo cortado ainda vinha isto

Podemos imaginar a dor do poacutes-operatoacuterio em um ho-mem nessas condiccedilotildees Durante quantos dias aquilo do-eria No ciclo normal da dor primeiro doacutei muito depois melhora um pouco e doacutei somente quando se movimenta passa-se o tempo e melhora um pouquinho mais doendo

aquela sensaccedilatildeo Poreacutem a torcida eacute uma coisa inteira-mente diferente da impressatildeo Ela eacute uma espeacutecie de tor-ccedilatildeo que provocamos em noacutes para tomar um determinado gosto do que foi observado mas natildeo eacute o sabor normal da impressatildeo que aquilo causaria

Lembro-me de que havia quando eu era menino crian-ccedilas que faziam brincadeira com os proacuteprios olhos aper-tando ligeiramente o globo ocular para verem mais fundo menos fundo etc Eu nunca quis saber dessa brincadeira comigo mas admito que pudesse ser engraccedilada Entretan-to eacute uma coisa muito singular porque natildeo daacute a visatildeo da realidade que daacute o globo ocular na sua posiccedilatildeo normal

A torcida eacute uma pressatildeo que fazemos em noacutes para ti-rar uma emoccedilatildeo que a coisa de si natildeo daria vendo-a meio disformemente para gozaacute-la Natildeo eacute a visatildeo seacuteria que daacute a verdade mas eacute uma visatildeo mentirosa

Essa torcida eacute um modo de esporear os proacuteprios ner-vos com uma vontade de querer algo nervosamente pe-la ideia de que calmamente natildeo se tira o sabor daquilo

Algueacutem talvez jaacute tenha passado por isso durante os cinco ou dez primeiros minutos de uma reuniatildeo natildeo conseguir prestar atenccedilatildeo no assunto tratado porque es-tava torcendo por exemplo para conseguir um bom lu-gar Depois quando vai tentar pegar o tema a reuniatildeo jaacute embalou e natildeo se acompanha bem o curso

Resultado a observaccedilatildeo da realidade foi-se embora A pessoa para viver aquilo torceu deformou seus nervos e natildeo tomou o sabor exato das coisas Fez como aquele que brinca com os olhos

Na hora de conversar sobre aquilo como a pessoa sente que tem um comentaacuterio vazio a fazer fala de modo excitado para ver se chama a atenccedilatildeo Sai daiacute uma con-versa excitada rasa onde haacute risco de se dizer bobagens

Os benefiacutecios da solidatildeo

Agora prestem atenccedilatildeo na fisionomia de algueacutem quando estaacute sozinho O isolamento potildee o indiviacuteduo nos eixos Ele natildeo tem para quem fazer graccedila com quem se excitar Ele cai nos seus proacuteprios gonzos e comeccedila a ver as coisas na normalidade de seu ser

Como me alegra notar naqueles que vivem um tanto isolados olhares que refletem a pessoa na sua autenticida-de Quando se estaacute sozinho fica-se seacuterio e vivendo numa tranquilidade seacuteria o indiviacuteduo vai se formando abrindo os olhos para as verdades Eacute aliaacutes uma das razotildees pelas quais se tem tanto medo de ficar sozinho eacute porque se tor-na seacuterio e as pessoas tecircm pavor da seriedade pois ela diz coisas que nossa frivolidade natildeo quer ouvir

Ficando seacuterio o homem comeccedila a ouvir a voz das pro-fundidades de sua alma que ele percebe corresponder agraves altitudes da ordem do ser O espiacuterito solitaacuterio ao cabo de

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

s R

epro

duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

Foto

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 24: Revista Doctor Plinio 207_201506

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Dr pLinio comenta

apenas quando se fazem alguns movimentos desajeita-dos afinal em certo momento cicatriza e natildeo doacutei mais

Aparecem entatildeo outros problemas Como se deslo-car Como entrar em contato com os outros Quem vai procurar um indiviacuteduo nessas condiccedilotildees Quem quere-raacute conversar com ele Comeccedila a solidatildeo o abandono Os cumprimentos amaacuteveis mas de longe e acabou

O coitado serve-se de pequenas habilidades para atrair a si este ou aquele para ter uma pequena conver-sa mas natildeo consegue Entatildeo arranja um livro para ler e o livro distrai pouco porque ele eacute muito extrovertido e soacute se alegra conversando E laacute vai toda aquela seacuterie de problemas

Eacute ou natildeo eacute verdade que nessas horas o indiviacuteduo co-meccedila a pensar ldquoComo estaacute tremendo este sofrimento E agora como seraacute minha vida Ainda sou moccedilo tenho muito tempo pela frente como vai ser ateacute o fim Para o que eu nasci Como se explica que eu esteja sofrendo is-to Ai meu Deusrdquo

e as dores da alma

Serrar as pernas eacute uma coisa baacuterbara mas a alma so-fre mais do que o corpo Quantas coisas acontecem na alma e fazem sofrer mais do que uma amputaccedilatildeo A vi-da traz situaccedilotildees tremendas a pessoa caluniada que natildeo encontra um meio de se reabilitar por exemplo E daiacute para fora quantas situaccedilotildees a vida apresenta

Lembro-me de que um padre jesuiacuteta com quem tive muito contato contava uma coisa tremenda que se deu em Berlim

Uma senhora de pequena burguesia morava num preacute-dio de apartamentos e houve um incecircndio Ela saiu dei-xando em casa sua filhinha e quando voltou encontrou tudo em chamas O uacutenico jeito de salvar a crianccedila era en-frentar as labaredas mas com o risco de morrer queimada ou ficar completamente desfigurada Essa senhora enfren-tou tudo por amor agrave filhinha e levou-a para fora

Poreacutem ficou a vida inteira com o rosto tatildeo horrendo que ela natildeo o mostrava para ningueacutem Usava ateacute dentro de casa um chapeacuteu do qual pendia um veacuteu leve que lhe cobria a face cuja pele ficara medonha

Essa menina ficou mocinha e comeccedilou a frequentar maus lugares A matildee muito religiosa se afligia natural-mente com isso E quando ela sabia que a filha estava em algum lugar ruim ia ateacute laacute e mandava chamaacute-la

Certa noite ela soube que a mocinha estava num mau ambiente e mandou-a chamar mas a filha natildeo foi A matildee ficou muito aflita com medo de um desastre moral com a menina e entrou para pegaacute-la

Ao falar com sua filha que estava acompanhada esta deu uma risada e disse

mdash Quem eacute vocecirc Natildeo a conheccedilo A matildee respondeu levantando o veacuteu que cobria seu

rostomdash Natildeo me conhece Minha filha olhe quem eu souA filha deu uma gargalhada e dissemdash Monstro natildeo te conheccedilo A pobre senhora voltou sozinha para casa Natildeo era melhor ter levado um tiro Natildeo tem palavras

Pensar na maldade da filha que vendo a matildee se afastar sozinha e triste continuou no rega-bofe e na perdiccedilatildeo

Qual foi a dor dessa matildee que com certeza a noite in-teira natildeo dormiu Teraacute dormido nas noites seguintes Pode haver ingratidatildeo pior do que esta

Do sofrimento brota a reflexatildeo

Satildeo as dores da alma Mas como elas fazem pensar refletir

Talvez essa senhora tenha pensado ldquoEssa menina an-dou malhellip que ingratidatildeo Eu me imolei por ela e ela ca-ccediloa da hediondez que tomei por amor a ela Minha filha esbofeteia a bem dizer o meu coraccedilatildeo que lhe estendi e pisa sobre o meu afeto do modo mais ignoacutebilhellip Lembro--me dela quando era boazinha quando me queria bem quando me abraccedilou e me beijouhellip E quando eu con-tei para ela o que aconteceu como ela ficou agradada e agradecida Foi ao jardim colheu uma flor pocircs num va-so e eu pensei lsquoEstou pagarsquo Agora vejo o pagamentohellip Do que me adiantou ter feito isso Mas sei que fiz bem Entretanto como se explica que eu tenha feito bem se era para receber este pagamentordquo

E do fundo da alma vem a respostaldquoEacute porque tu serviste a DeusrdquoUma coisa eacute ter chegado a esta conclusatildeo na dor ou-

tra coisa eacute ler num tratado a teoria o homem nasceu pa-ra amar servir e dar gloacuteria a Deus etc Isto na teoria es-taacute muito bom e eacute magniacutefico Mas quem passou pela coi-sa tomou o sabor amargo e o sabor deleitaacutevel do princiacute-pio diraacute

ldquoNunca mais um sofrimento vai me abater Eu jaacute vivi a minha vida estaacute para traacuteshellip mdash uma senhora assim eacute uma morta-viva mdash a minha vida estaacute para traacutes Seja qual for o sofrimento que eu receba tudo isto acabou para mim Eu agora vivo para Deus Porque se eu vier a ter outra fi-lha olharei para essa crianccedila no berccedilo e me perguntarei ela natildeo repetiraacute o que fez a irmatilde O que vale o afeto hu-mano O afeto de uma filha agrave sua matildee coisa tatildeo apreciaacute-vel do que vale quando o homem eacute capaz de ingratidotildees como esta Soacute um vale porque Ele eacute eterno perfeito e me ama infinitamente porque o Filho drsquoEle Se encarnou e morreu na Cruz por amor a mim Estaacute tocando o sino da igreja eacute hora da Via Sacrahellip Vou fazer minha Via Sa-

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

Arquiv

o Rev

ista

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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30)

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30

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

Ric

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C 3

0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

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mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 25: Revista Doctor Plinio 207_201506

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cra e contemplar a Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo e aprender assim a carregar o peso da vidardquo

A dor catoacutelica perfuma a conversa como o incenso

Considerem almas que tenham passado por situaccedilotildees dessas e que conversam entre si Soacute isso natildeo bastaria pa-ra perfumar um conviacutevio durante uma tarde inteira

Quando se teve uma vida muito cheia de dores so-fridas com paz e resignaccedilatildeo eacute agradaacutevel to-mar as feridas cicatrizadas as amputaccedilotildees espirituais pelas quais se passou mdash o que queria e natildeo teve ou desejava e perdeu ou conquistou a duras pe-nas e despencou sobre si mdash e pen-sar pensarhellip Fica aquela doccedilura daquela paciecircncia da entrega a Deus e a Nossa Senhora ldquoEles quiseram Eles permitiram se-jam Eles benditos Fizeram co-migo o que se faz com o incen-so rasga-se a aacutervore e a resina sai para o fabrico do incenso Assim tambeacutem o dedo dos fa-tos me rasgou e de mim brotou a resina do bom sofrimento Agora eu me lembro disso e sobre isso eu filosofo e conversordquo

Ningueacutem pergunta a um gozador da vida qual foi o passado dele Para quecirc Natildeo interessa Quem abordaria um homem na saiacuteda de um clube para lhe dizer ldquoConte-me quais foram as piadas que vocecirc ouviu e as distraccedilotildees que vocecirc teve Vocecirc ganhou no jogordquo

Onde vamos procurar o perfume do passado Onde esteve a dor catoacutelica Natildeo eacute uma dor qualquer porque haacute dores das quais tam-beacutem natildeo se tem vontade de ouvir contar ldquoEu amanhe-ci com uma dor aqui no joelho mas depois me deu uma tossezinhahelliprdquo Por que natildeo se tem vontade de ouvir con-tar isso Porque natildeo estava ali a dor das dores a dor de Nosso Senhor Jesus Cristo

Havia um tipo de reloacutegio que conheci em menino com um mostrador onde vinha indicado o que aconte-ceu a cada hora da Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo

Imaginemos um doente que tendo diante de si esse reloacutegio e sofrendo uma dor de cabeccedila muito forte exa-tamente na hora em que Jesus foi apresentado ao povo por Pilatos se lembrasse da divina fronte coroada de es-pinhos e pensasse ldquoQuanto a fronte drsquoEle sofreu mais

do que a minha Ele sofreu isso por mim e eu natildeo ofere-cerei por Elerdquo

A esse doente sim teriacuteamos interesse de ouvir contar seus padecimentos pois entra a resignaccedilatildeo a aceitaccedilatildeo e com elas uma qualidade na alma que eacute uma participa-ccedilatildeo do sofrimento do Redentor Isso faz com que na ho-ra de falar a pessoa diga palavras cheias de neacutectar

Eacute uma vantagem sabermos tirar proveito do bom con-viacutevio e da boa conversa dos que sofrem em uniatildeo com

Jesus Cristo na Cruz porque a alma batida pelo so-frimento eacute como a aacutervore que comeccedila a dar a

resina ideal a qual pode ser transformada em incenso

Dor da qual floresce uma alegria prateada

Esse eacute o padecimento que ele-va a alma Natildeo eacute como o bicho por cima do qual passou um au-tomoacutevel e que fica ganindo na rua ateacute expirar mas eacute a dor do catoacutelico que se une agrave dor de Nosso Senhor Jesus Cristo agraves laacute-grimas de Nossa Senhora e acei-ta ldquoEu vos ofereccedilo isso Adora-

mus te Christe et benedicimus tibi quia per sanctam Crucem tuam redi-

misti mundum mdash Noacutes vos adoramos oacute Cristo e vos bendizemos porque pe-

la vossa santa Cruz redimistes o mundo Mater dolorosa ora pro nobis1rdquo

Essas almas assim porque satildeo re-signadas tecircm ateacute momentos em que a alegria floresce nelas Mas natildeo eacute a ale-gria do gozador da vida eacute a alegria pu-ra feita de prata do inocente Alegria casta do homem desprendido e que sa-

be conversar por amor desinteressado aos outros con-tando-lhes coisas falando para fazer-lhes bem e com o desejo de ser bom para eles E sentindo gaacuteudio em ver que eles ficam alegres A conversa chega ao seu apogeu

Com isso fica explicado como as alegrias as curiosi-dades as bondades as gentilezas da alma que aprendeu a sofrer tornam atraente o conviacutevio e consequentemen-te encantadora a conversa   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 27101984)

1) Do latim Matildee dolorosa rogai por noacutes

Jesus coroado de espinhos Paroacutequia Nossa Senhora da

Ajuda Ilha Bela Brasil

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O tesouro da vida

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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0)

Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

29

pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

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duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 26: Revista Doctor Plinio 207_201506

O tesouro da vida

A

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

A Revoluccedilatildeo instigando a desordem nas almas procurou destruir o verdadeiro viacutenculo entre os homens A virtude da temperanccedila cria o clima em que esse viacutenculo se afirma onde haacute apegos surgem as

fricccedilotildees e inimizades

propoacutesito da doutrina sobre a sustentaccedilatildeo dos seres1 pediram-me que estabelecesse uma dis-tinccedilatildeo entre os conceitos de causa participaccedilatildeo

sustentaccedilatildeo e semelhanccedila

Seres materiais e seres espirituais

Tomando em seu sentido corrente mdash e natildeo na acepccedilatildeo dos quatro tipos de causas classificados por Aristoacuteteles mdash a causa eacute aquilo em virtude de cuja accedilatildeo algo existe

Poder-se-ia perguntar se a accedilatildeo causadora natildeo supotildee certa sustentaccedilatildeo ou seja se tal accedilatildeo ao produzir algo natildeo o faz de tal maneira que continua a sustentaacute-lo ne-cessariamente

Em relaccedilatildeo a Deus e os seres por Ele criados isso se pode dizer Sendo perfeitiacutessimo em princiacutepio ao criar os seres mais elevados Ele os causa para sempre Evi-dentemente haacute muitas criaturas que Deus causa e pos-teriormente faz cessar ou deixa de sustentar Na ordem da mateacuteria haacute incontaacuteveis exemplos Toda mateacuteria viva estaacute nessa linha Portanto essa sustentaccedilatildeo natildeo se apli-ca necessariamente para todas as criaturas mas estaacute na ordem dos seres espirituais Estes sim uma vez que Ele os criou natildeo poderia deixar de causar Esta accedilatildeo de cau-sar reiteradamente se chama sustentaccedilatildeo Vista por es-te lado a sustentaccedilatildeo seria uma causaccedilatildeo ininterrupta e eterna

A sustentaccedilatildeo entretanto natildeo eacute soacute um efeito da cau-sa Tomemos como exemplo uma cabra A causa imedia-ta dela foi o casal caprino que a gerou Mas este mor-reu desapareceu Contudo essa causaccedilatildeo continua a seu modo por meio de uma sustentaccedilatildeo da parte das ou-tras cabras

Aqui jaacute natildeo se pode dizer que eacute a causa senatildeo num sentido mais remoto pelo qual aquilo que chamariacuteamos

de ldquocapricidaderdquo mdash ou seja um atributo exclusivo des-ta espeacutecie mdash corresponde a um modelo ideal em Deus criado para refleti-Lo e que Ele quer que se mantenha por uma espeacutecie de accedilatildeo a qual enquanto produzida re-ciprocamente pelos vaacuterios seres natildeo eacute causada por Deus mas que Ele deseja que os seres exerccedilam uns sobre os outros

Causa e sustentaccedilatildeo colateral semelhanccedila e participaccedilatildeo

Nessa accedilatildeo se daacute o que noacutes poderiacuteamos chamar de sustentaccedilatildeo num sentido mais familiar que eacute o por onde seres que natildeo satildeo causas uns dos outros entretanto pe-la participaccedilatildeo numa mesma natureza sustentam-se mu-tuamente

Naturalmente haacute uma analogia entre causa e susten-taccedilatildeo colateral uma vez que a vida cessaria se tal sus-tentaccedilatildeo desaparecesse Contudo enquanto a causa pro-priamente dita eacute preacutevia ao ser a sustentaccedilatildeo colateral eacute concomitante com ele e nisto se distingue da causa

Aqui se vecirc bem um conceito acessiacutevel de participaccedilatildeo pois dessa ldquocapricidaderdquo todos participam O que quer dizer aiacute participar Evidentemente eacute ter parte Mas o que isso significa neste exemplo concreto

A ldquocapricidaderdquo pode ser concebida de modo abstra-to distintamente de todos os seres como um possiacutevel em Deus Mas ela criada vive e se realiza nas cabras e nun-ca fora das cabras em qualquer outro ser O fato de o ser de todas elas ter em comum um mesmo princiacutepio se cha-ma ldquoparticipaccedilatildeordquo

Essa participaccedilatildeo torna os seres anaacutelogos e ao mesmo tempo a analogia ajuda a participaccedilatildeo

Portanto analogia natildeo se confunde com participa-ccedilatildeo satildeo conceitos distintos A analogia ou seja a seme-

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

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duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 27: Revista Doctor Plinio 207_201506

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lhanccedila eacute meio causa e meio efeito da participa-ccedilatildeo Como as cabras tecircm a mesma ldquocapricidaderdquo tornam-se anaacutelogas En-tatildeo a analogia aparece co-mo fruto da ldquocapricidaderdquo participada Mas enquan-to auxiliar da participaccedilatildeo eacute meio causa desta

Entrelaccedilamento de almas

Para aplicar esta doutrina ao acircmbito humano consi-deremos a instituiccedilatildeo do Sacro Impeacuterio Houve vaacuterias eacutepocas em que ele esteve reduzido a um siacutembolo porque tal era o tumulto entre aquelas naccedilotildees que o constituiacute-am e dentro dessas naccedilotildees entre os feudos e seus res-pectivos senhores feudais que a autoridade imperial fi-cou um mero siacutembolo

Mas assim que as circunstacircncias o propiciavam a au-toridade imperial tomava novamente sua densidade pa-ra tender a ser aquilo que naturalmente todos sabiam em tese que ela deveria ser e que nunca se tentou abolir Quem extinguiu o Sacro Impeacuterio foi Napoleatildeo mas an-tes disso jamais se procurou aboli-lo embora muitas ve-

zes se tenha atentado con-cretamente contra a auto-ridade dos imperadores

Como se explica que esse siacutembolo tenha sobrenada-do quase sem razotildees expli-caacuteveis de sobrevivecircncia se-natildeo por esse entrelaccedilamen-to de almas que fazia com que todos compreendes-sem que esse siacutembolo re-presentava uma uniatildeo de fundo mais ou menos ine-faacutevel e que era necessaacute-rio haver pairando no ar uma representaccedilatildeo sim-boacutelica como uma espe-ranccedila de dias melhores

Entretanto isso soacute eacute possiacutevel por meio de viacutenculo de homem a homem que a Revoluccedilatildeo com suas desor-dens procurou destruir pois esse viacutenculo soacute existe on-de haacute certa dose de temperanccedila Ele natildeo eacute mero fruto da temperanccedila mas este eacute o clima no qual ele se afirma Porque desde que comecem os apegos surgem as fric-ccedilotildees e inimizades

Na elaboraccedilatildeo de um ideal de impeacuterio cristatildeo deu-se uma coisa muito curiosa desde o tempo das catacumbas os catoacutelicos comeccedilaram a ver o Impeacuterio Romano mdash que tinha apenas uns traccedilos de semelhanccedila com essa repre-sentaccedilatildeo simboacutelica mdash com o olhar imbuiacutedo de espiacuterito catoacutelico E a lembranccedila desse impeacuterio foi sendo enrique-cida pelos catoacutelicos com dados que ele natildeo tinha

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Ao lado coroaccedilatildeo de Carlos Magno Museus Vaticanos

Abaixo siacutembolo do Sacro Impeacuterio Romano-Alematildeo com seus principados

Carlos Magno de fato no mais fundo de sua alma queria o que desabrochou No consciente ele queria o romano no subconsciente

ele tendia germinativamente para o feudal e nisso

ele foi original

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

34

LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 28: Revista Doctor Plinio 207_201506

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o penSamento fiLoSoacutefico De Dr pLinio

Foi sendo composta dessa forma uma suprema or-dem em que a graccedila o sangue catoacutelico por assim di-zer foram tecendo essa relaccedilatildeo humana de maneira que quando o Impeacuterio do Ocidente caiu o melhor dele esta-va de peacute que era o ideal de uma ordem perfeita de rela-cionamento entre os homens E isto foi o que alimentou a esperanccedila dos catoacutelicos e a sofreguidatildeo com que o Pa-pa Satildeo Leatildeo III coroou Carlos Magno

Carlos Magno quis fazer o Impeacuterio Romano e saiu o feudal porque natildeo distinguia bem uma coisa da outra Ele de fato no mais fundo de sua alma queria o que de-sabrochou No consciente ele queria o romano no sub-consciente ele tendia germinativamente para o feudal e nisso ele foi original

O pariato

Encontram-se na Idade Meacutedia umas manifestaccedilotildees dessa vinculaccedilatildeo de alma particularmente nobres den-sas como por exemplo a ideia do pariato A noccedilatildeo de par tem alguma coisa disso Eacute uma determinada vinculaccedilatildeo um determinado comeacutercio de almas que faz com que o par sendo semelhante a outro se deleita nessa semelhan-ccedila sem ter vontade de aproveitar-se do outro para subir porque ele se deleita nessa semelhanccedila e nessa paridade e dela se nutre mais do que se ele fosse superior

Um poliacutetico tipo Ceacutesar Borgia do seacuteculo XVI jaacute eacute um que quer subir que natildeo compreende o pariato a natildeo ser como os cavalos numa corrida que estatildeo todos juntos

abre aquela cancela e saem para a corrida Tais poliacuteticos entendem o pariato como uma coisa destrutiva de si proacute-pria E o pariato natildeo eacute isto Eacute o deleite de ter comeacutercio com seu igual de sustentaacute-lo e sustentar-se na reciacuteproca contemplaccedilatildeo sem ambiccedilatildeo de destruiccedilatildeo E na subordi-naccedilatildeo a um superior que era o suserano que preenchia o vaacutecuo e tornava a ambiccedilatildeo da emulaccedilatildeo impossiacutevel

Havia tal noccedilatildeo da forccedila desse pariato que quando um dos pares fazia algo que superava os outros todos se sentiam honrados e eram levados a empurrar para a frente a honra coletiva dando outra contribuiccedilatildeo e man-tendo essa semelhanccedila nutritiva

Isso foi destruiacutedo pela Revoluccedilatildeo e hoje natildeo se com-preende mais

Essa relaccedilatildeo de pariato mdash estaacutevel digna uma flor do conviacutevio humano mdash eacute o muacutetuo respeito entre iguais Eacute uma coisa que me deleita ver iguais que se encontram e fazem reverecircncia um para o outro Em certo sentido a mera reverecircncia do inferior ao superior natildeo tem a beleza da reverecircncia entre iguais

Eu ainda peguei algo disso nas maneiras antigas no trato entre amigos de uma geraccedilatildeo que ficava entre a de meus pais e de meus avoacutes Encontravam-se na rua por exemplo cumprimentavam-se com certa solenidade Exatamente tinha algo daquele muacutetuo apreccedilo carrega-do de respeito em que entrava uma das coisas mais no-bres da alma do homem que eacute o respeito por si mesmo e que natildeo eacute a visatildeo vaidosa natildeo tem nada de comum com a vangloacuteria Eacute o respeito de si por ser quem eacute Dois iguais

se encontram se deleitam se res-peitam eacute o festim da sustentaccedilatildeo muacutetua

A compagnonnage

Como eu dizia haacute pouco natildeo de-sejando romper isso para ser mais do que o outro mdash o que eacute fruto da Revoluccedilatildeo mdash mas querendo man-ter-se iguais e um elevando-se procurar elevar o outro consigo

Quando algueacutem da categoria se sobressaiacutea todos se sentiam convi-dados a se elevar tambeacutem Assim se passava na classe nobre do pa-riato mas que tinha na classe ple-beia uma expressatildeo muito bonita que era a compagnonnage que se traduz hoje inadequadamente por companheirismo camaradagem

O termo em portuguecircs se de-teriorou ao maacuteximo mas a com-

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Henrique de Borgonha recebe a investidura do Condado Portucalense em 1096 das matildeos de Afonso VI de Leatildeo e Castela - Palaacutecio de Versailles Franccedila

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

Foto

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duccedilatilde

o

N

Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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uivo

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Page 29: Revista Doctor Plinio 207_201506

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pagnonnage se verificava entre dois cujo gaacuteudio muacutetuo era o de serem companheiros iguais e de se considera-rem embora sem tanta nobreza com muita autenticida-de com muita amizade com verdadeira fraternidade e se apoiarem

Eis a grande virtude catoacutelica que se exprime no gaacuteudio do pariato no encontro cheio de respeito de dois que satildeo iguais na noccedilatildeo de que quando numa classe de iguais algueacutem sobe tende a levar consigo toda a classe natildeo a usurpar a chefia dentro da classe porque subiu e que se exprimia na nobreza pela lealdade feudal

Antecacircmera do Ceacuteu

Neste aspecto da vida da Igreja ou da Civilizaccedilatildeo Cris-tatilde vecirc-se uma fulguraccedilatildeo a santidade a bondade a verda-de a ordenaccedilatildeo daquilo refulge com uma beleza extra-ordinaacuteria

Por exemplo as Cruzadas de um modo geral sobretu-do no que elas tecircm mais de miacutetico do que de real de his-toacuterico quer dizer como os cruzados imaginaram a Cru-zada como o medieval imaginou o cavaleiro satildeo ideais que tecircm um relampaguear proacuteprio uma beleza peculiar e fulgurante e que faz a pessoa ver com muita clareza em primeiro lugar ateacute que ponto a natureza humana se realiza inteiramente ali e eacute elevada acima de si mesma Eacute qualquer coisa que supera o homem

Isto produz um respeito uma emoccedilatildeo e uma vontade de se colocar dentro daquele fluxo daquele nexo ser da-

quilo que a pessoa tem certa noccedilatildeo sobretudo se algueacutem toma iniciativa de dizer de fazer ver que resulta da Feacute catoacutelica do fato de ser catoacutelico e que eacute um influxo do es-piacuterito da Igreja ou seja do Espiacuterito Santo naquela insti-tuiccedilatildeo

E a pessoa vendo aquela instituiccedilatildeo compreende que eacute por uma carecircncia explicaacutevel dela que ela natildeo vecirc a Igre-ja inteira assim mas que se ela se aplicar perceberaacute lam-pejos destes em tudo quanto eacute verdadeiramente da Igre-ja e da Civilizaccedilatildeo Cristatilde

Mas tambeacutem fica habilitada a ver isso nas almas com que convive E de repente vecirc numa alma ou noutra cer-to lampejo que produz um fenocircmeno de vinculaccedilatildeo e que agraves vezes ateacute pode dar-se em relaccedilatildeo a uma coisa natildeo catoacutelica mas que eacute da natureza que ruma aponta para a Religiatildeo catoacutelica

Esta forma de uniatildeo que teriacuteamos com um cruzado ideal que conhececircssemos esse afeto cheio de veneraccedilatildeo que te-mos por Godofredo de Bouillon por Santa Joana drsquoArc satildeo aperccedilus2 desta vinculaccedilatildeo de almas mdash entatildeo no terreno experimental psicoloacutegico mdash que se entendecircssemos bem va-lidamente o que isso representa compreenderiacuteamos que eacute uma antecacircmara do Ceacuteu e o tesouro da vida   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1871984)

1) Ver Revista Dr Plinio n 206 p 22-252) Do francecircs visotildees de conjunto

Rep

rodu

ccedilatildeo

Tomada de Beirute pelos Cruzados em 1197 - Palaacutecio de Versailles Franccedila

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

s R

epro

duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

Foto

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epro

duccedilatilde

o

N

Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 30: Revista Doctor Plinio 207_201506

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Beata Ana Maria Taigi

1 Satildeo Justino maacutertir (daggerc 165)Satildeo Simeatildeo de Siracusa eremita (dagger1035) Nasceu em

Siracusa Itaacutelia de pai grego Depois de levar vida eremiacuteti-ca em Beleacutem e no Monte Sinai terminou seus dias recluso na torre da Porta Negra de Treacuteveris Alemanha

2 Santos Marcelino e Pedro maacutertires (dagger304)Beato Sadoc presbiacutetero e companheiros maacutertires

(dagger1250) Religioso dominicano de Sandomierz Polocircnia foi viacutetima dos taacutertaros junto com mais 48 religiosos enquanto cantavam a Salve Rainha

3 Satildeo Carlos Lwanga e companheiros maacutertires (dagger1886)Satildeo Cono monge (daggerseacutec XIII) Monge do Convento de

Santa Maria de Cadossa na Lucacircnia Itaacutelia morto muito jovem

4 Solenidade do Santiacutessimo Corpo e Sangue de CristoSatildeo Francisco Caracciolo presbiacutetero (dagger1608) Funda-

dor da Ordem de Cleacuterigos Regulares Menores morreu aos 44 anos em Agnone Itaacutelia

5 Satildeo Bonifaacutecio bispo e maacutertir (dagger754)Satildeo Doroteu de Tiro bispo e maacutertir (daggerseacutec IV) Ain-

da presbiacutetero sofreu muitas perseguiccedilotildees no tempo de Diocleciano mas conseguiu sobreviver ateacute os 107 anos quando foi martirizado em Tiro Liacutebano no tempo de Juliano

6 Satildeo Norberto bispo (dagger1134)Beato Inocecircncio Guz presbiacutetero e maacutertir (dagger1940) Sa-

cerdote franciscano polonecircs martirizado no campo de concentraccedilatildeo de Sachsenhausen Alemanha

7 X Domingo do Tempo ComumBeata Maria Teresa de Soubiran La Louviegravere virgem

(dagger1889) Fundadora das Irmatildes de Maria Auxiliadora em Toulouse Franccedila Foi injustamente expulsa de sua obra e passou o resto de sua vida em profunda humildade

8 Santo Efreacutem diaacutecono e Doutor da Igreja (dagger373)Beato Nicolau de Gestuacuteri religioso (dagger1958) Sacerdo-

te capuchinho do convento de Cagliari Itaacutelia Com muita humildade dedicou-se aos enfermos e feridos durante a II Guerra Mundial

9 Satildeo Joseacute de Anchieta presbiacutetero (dagger1597)Beata Ana Maria Taigi matildee de famiacutelia (dagger1837) Supor-

tou com paciecircncia o caraacuteter violento de seu marido e de-dicou-se agrave educaccedilatildeo de seus sete filhos Favorecida pelo dom da profecia tornou-se conselheira de Santos e ilus-tres eclesiaacutesticos em Roma

10 Beato Henrique de Bolzano leigo (dagger1315) Carpin-teiro dava tudo aos pobres reduzido agrave mendicacircncia no fi-nal da vida partilhava com outros mendigos a esmola que conseguia em Treviso Itaacutelia

11 Satildeo Barnabeacute ApoacutestoloSanta Rosa Francisca Maria das Dores virgem

(dagger1876) Transformou uma associaccedilatildeo de mulheres piedo-sas na Congregaccedilatildeo das Irmatildes de Nossa Senhora da Con-solaccedilatildeo em Tortosa Espanha

12 Solenidade do Sagrado Coraccedilatildeo de JesusSatildeo Gaspar Bertoni presbiacutetero (dagger1843) Fundador da

Congregaccedilatildeo das Santas Chagas de Cristo em Verona Itaacutelia

13 Imaculado Coraccedilatildeo de MariaSanto Antocircnio de Paacutedua presbiacutetero e

Doutor da Igreja (dagger1231)Satildeo Facircndila presbiacutetero e monge (dagger853)

No tempo do rei Mohamed I foi decapita-do em Coacuterdova Espanha por defender a Feacute Catoacutelica

14 XI Domingo do Tempo ComumSatildeo Metoacutedio bispo (dagger847) Antes de ser

eleito Patriarca de Constantinopla foi mon-ge na ilha de Quios Greacutecia e recorreu a Roma para defender o culto das sagradas imagens

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Junho ndashndashndashndash

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

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duccedilatilde

o

mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Satildeo Norberto

15 Beata Albertina Berkenbrock virgem e maacutertir (dagger1931) Assassinada aos 12 anos em Satildeo Luiacutes Santa Ca-tarina Brasil por defender heroica-mente a sua castidade

16 Santo Aureliano bispo (dagger551) Bispo de Arles e Vigaacuterio do Papa Virgiacutelio para a Gaacutelia fundou um mosteiro masculino e outro femini-no na sua diocese dando-lhes uma regra por ele redigida

17 Satildeo Pedro Da maacutertir (dagger1862) Carpinteiro e sacristatildeo morto na fo-gueira em Qua-Linh Vietnatilde no tempo do imperador Tu Duc

18 Santa Isabel virgem (dagger1164) Abadessa do mosteiro beneditino de Schoumlnau Alemanha Foi modelo de observacircncia da regra de seu con-vento

19 Satildeo Romualdo abade (dagger1027)Santa Juliana Falconieri virgem

(daggerc 1341) Fundou em Florenccedila Itaacute-lia o instituto das Irmatildes da Ordem dos Servos de Maria denominadas ldquoMantelatasrdquo por causa de seu haacutebito religioso

20 Beata Margarida Ebner virgem (dagger1351) Religio-sa dominicana que sofrendo muitas enfermidades des-tacou-se na praacutetica de mortificaccedilotildees em Moumldingen Ale-manha

21 XII Domingo do Tempo ComumSatildeo Luiacutes Gonzaga religioso (dagger1591)Satildeo Joseacute Isabel Flores presbiacutetero e maacutertir (dagger1927) Ca-

pelatildeo de Matalaacuten Meacutexico degolado durante as pregaccedilotildees religiosas em Zapotlanejo

22 Satildeo Paulino de Nola bispo (dagger431)Satildeo Joatildeo Fisher bispo e Satildeo Tomaacutes Moro maacutertires

(dagger1535) Ver paacutegina 2

23 Satildeo Joseacute Cafasso presbiacutetero (dagger1860) Dedicou-se agrave formaccedilatildeo espiritual e cultural dos futuros cleacuterigos e a

reconciliar com Deus os condena-dos agrave morte em Turim Itaacutelia

24 Natividade de Satildeo Joatildeo Ba-tista

Satildeo Teodgaro presbiacutetero (daggerc 1065) Missionaacuterio que evangelizou e cons-truiu em Vestervig Dinamarca a primeira igreja de madeira

25 Satildeo Guilherme de Vercelli abade (dagger1142)

26 Satildeo Josemariacutea Escrivaacute de Ba-laguer presbiacutetero (dagger1975)

Beato Tiago Ghazir Haddad pres-biacutetero (dagger1954) Sacerdote capuchi-nho fundador da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Franciscanas da Cruz em Beirute Liacutebano

27 Satildeo Cirilo de Alexandria bis-po e Doutor da Igreja (dagger444)

Satildeo Sansatildeo presbiacutetero (dagger560) De origem romana viveu desde jo-vem em Constantinopla onde foi or-denado e fundou um hospital Usava os seus conhecimentos meacutedicos em benefiacutecio dos pobres

28 Solenidade de Satildeo Pedro e Satildeo Paulo ApoacutestolosSanto Irineu bispo e maacutertir (daggerc 202)Santa Vicecircncia Gerosa virgem (dagger1847) Juntamente com

Santa Bartolomea Capitanio fundou o Instituto das Irmatildes da Caridade (ou das Irmatildes de Maria Menina) em Lovera Itaacutelia

29 Beato Raimundo Luacutelio religioso e maacutertir (dagger1316) Terciaacuterio franciscano Homem de grande cul-tura e eminente doutrina empenhou-se no diaacutelogo com os sarracenos e viajou ao norte da Aacutefrica com essa fi-nalidade Foi morto quando retornava para Maiorca Espanha

30 Santos Protomaacutertires da Igreja de Roma (dagger64)Beato Zenatildeo Kovalyk presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacer-

dote redentorista que durante um regime hostil a Deus foi martirizado em Lviv Ucracircnia

Roma sparita

V

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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Foto

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mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

35

Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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Page 32: Revista Doctor Plinio 207_201506

Roma sparita

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

A Roma dos Papas natildeo tinha a monotonia das grandes cidades modernas mas possuiacutea muita fisionomia porque as pessoas ao fazerem suas residecircncias comunicavam-lhes seu caraacuteter seu modo de ser com o pitoresco que causa o sorriso

ou expor o que era a Roma papal para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tra-tava e depois iremos considerar algumas foto-

grafias selecionadas de um aacutelbum chamado ldquoRoma spari-tardquo ou seja ldquoRoma desaparecidardquo Quer dizer a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Saboacuteia a qual unificou a Peniacutensula Italiana e se tornou a uacutenica dominadora da Cidade de Roma on-de estabeleceu a sua capital transformando-a de cida-de antiga que era numa grande cidade do tipo moderno

Cidade natildeo planejada com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas Eacute ao mesmo tempo uma Roma medieval com todas as carac-teriacutesticas da vida medieval um tanto reformada no tem-po do periacuteodo do Ancien Reacutegime1 e uma cidade eminen-temente eclesiaacutestica

Quando falo de uma cidade medieval o que eu que-ro indicar Era uma cidade raras vezes planejada de an-tematildeo Por exemplo se tomarmos em Satildeo Paulo o bair-ro Higienoacutepolis perceberemos que o traccedilado das ruas natildeo foi espontacircneo as casas natildeo foram se acrescentando umas agraves outras normalmente mas houve uma empresa que pla-nejou e fez o loteamento do bairro devido ao qual todas as ruas satildeo em linha reta e se cortam em acircngulo reto fa-zendo do bairro uma espeacutecie de tabuleiro de xadrez O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana

Na eacutepoca em que o Pacaembu foi urbanizado o urba-nismo tipo Higienoacutepolis estava fora de moda Tinha-se considerado que as avenidas retiliacuteneas cortando-se em acircngulo reto e formando quarteirotildees quadrados eram mo-noacutetonas Entatildeo fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaem-bu que existem tambeacutem em outros bairros de Satildeo Paulo Pinheiros Jardim Ameacuterica Jardim Europa em que natildeo se usa mais a linha reta mas as grandes curvas macias

Poreacutem o que nos interessa no momento eacute o fato de que as ruas natildeo foram feitas por cada morador que co-locou sua casa onde queria portanto um pouco mais re-cuada da rua ou um pouco mais para a frente e dando agrave via puacuteblica um graacutefico todo casual fortuito aquilo foi planejado de antematildeo

Tambeacutem as construccedilotildees eram menos planejadas do que se tornaram depois Uma famiacutelia construiacutea uma ca-sa nascia um filho mandava construir um quarto no te-to da residecircncia nascia outro filho colocava dois quartos De repente um velho que morava num quar-to da casa comeccedilava a ter reumatismo abria--se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o anciatildeo se aquecer Natildeo se incomoda-vam em saber se a casa ficava simeacutetrica ou as-simeacutetrica bonita ou feia Era uma necessida-de do velho para natildeo ficar reumaacutetico O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir Ele queria o sol sobre a perna ou o bra-ccedilo doente Quer dizer circunstacircncias impre-vistas foram formando essas cidades

Por causa disso elas natildeo tiveram a mono-tonia das grandes cidades modernas e possu-iacuteam muita fisionomia por-que as pessoas que iam fa-zendo essas construccedilotildees im-previstas comunicavam seu caraacuteter seu modo de ser sua fisionomia agraves casas que estavam sendo construiacutedas

De onde Roma como to-das as cidades desse tipo era uma cidade com fisiono-mia A esse dote de ter fisio-nomia noacutes poderiacuteamos cha-

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mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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mar em certo sentido de pitoresco O pitoresco eacute a fisio-nomia quando pelo imprevisto ela faz sorrir um pouco

O Panteon e o tuacutemulo de Adriano

Haacute outra coisa que se acrescentava agrave Roma ela era uma cidade velhiacutessima nascida mitologicamente de Rocirc-mulo e Remo Portanto uns sete oito seacuteculos antes de Je-sus Cristo E com aquele senso de conservaccedilatildeo existente na Europa do qual noacutes brasileiros natildeo temos uma ideia Ateacute hoje certos preacutedios do tempo dos remotos romanos satildeo utilizados para uso comum O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentiacutelicos antigos E para a Roma de antigamente era uma igreja bem gran-de O Panteon esteve franqueado ao culto pagatildeo ateacute o mo-mento em que Constantino mandou fechaacute-lo Quando o Imperador deu a ordem de fechar natildeo pensem que agrave mo-derna derrubaram o Panteon ele mandou instalar uma igreja catoacutelica ali E o Panteon eacute hoje uma paroacutequia As pessoas se casam satildeo batizadas confessam-se laacute e a igreja funciona como qualquer outra Ali haacute seacuteculos Juacutepiter era adorado e agora eacute adorado Nosso Senhor Jesus Cristo E o preacutedio ainda se conserva

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada eacute uma torre ciliacutendrica de pouca altura e imenso diacircmetro

Foi utilizada durante a Idade Meacutedia para fortaleza De-pois uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para pa-laacutecio O tuacutemulo de Adriano natildeo existe mais Mas podem--se visitar as muralhas da fortaleza e o palaacutecio que ago-ra eacute museu De maneira que houve a seguinte mutaccedilatildeo de sepultura de Adriano para fortaleza de fortaleza para palaacutecio de palaacutecio a museu

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos agora as fotografiasEis um poacutertico um arco numa rua no gueto de Roma

A rua existe para uma casa que estaacute em cima Ali uma rua popular com a roupa lavada estendi-

da e gotejando em cima de quem passa duas velhas co-mentam qualquer coisa Eacute a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora Reconheccedilamos que eacute bem diferente da Avenida Paulista2

Observem um recanto da velha Roma Uma casa o alinhamento caprichoso da rua uma bonita torre no meio de casarotildees velhos que eu quase chamaria lepro-sos Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus Nichos com imagens de Santos as-sim eram frequentes na Roma daquele tempo

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual jaacute foi construiacuteda assim A rua eacute uma escadaria que passa no meio da velha casa sem eira nem beira tem um bo-nito balcatildeo de alguma famiacutelia nobre ou rica que mora aqui E isso eacute uma coisa muito comum ateacute hoje na Itaacute-lia Metade da casa eacute corticcedilo a outra metade eacute um pa-laacutecio de nobres

Duas irmatildes da Caridade de Satildeo Vicente de Paulo com seus lindos chapeacuteus bretotildees andando numa espeacutecie de praccedila de terra sem calccedilamento da velha Roma com uma magniacutefica palmeira se espraiando suavemente no clima romano Uma nobre torre antiga e mais adiante outra tor-re Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construccedilatildeo das ca-sas Mas aqui por qualquer razatildeo o dono natildeo quis que rebaixasse e ficou alto E permaneceu a aacutervore que se eleva de modo pitoresco aqui Um muro uma aacutegua para-da e uma bela igreja ao fundo

Pormenor da vida do tempo um cachorro que procu-ra comida pela rua Eacute um catildeo sem dono na infeliz situa-ccedilatildeo dos cachorros sem dono

Uma senhora conduzindo o filho para passear A crianccedila estaacute vendo o cachorro mas ela estaacute tocando uma espeacutecie de corneta para ver o que o catildeo faz Manifesta-ccedilatildeo musical do gecircnero italiano O cachorro eacute utilitaacuterio e

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

Foto

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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LuzeS Da civiLizaccedilatildeo criStatilde

estaacute se preocupando exclusivamente com a comida Natildeo liga para nada

Aqui o reboco da casa caiu mas ela pode durar mais mil anos Natildeo pensem que a escada eacute para escorar a ca-sa estaacute encostada do lado de fora para qualquer coisa Um cavalo bem lustroso e bonito uma porta com um no-bre arco um paacutetio cimentado de pedras mas sem qual-quer regularidade

Outra viela romana Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das mura-lhas A iluminaccedilatildeo puacuteblica jaacute havia comeccedilado Aqui haacute um poste com iluminaccedilatildeo a gaacutes que era o grande pro-gresso do momento Tambeacutem significava progresso a pla-ca com o nome da rua

Estaacute chovendo duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente e aqui haacute uma comerciante oferecendo algum produto Notem a desigualdade do solo como eacute tudo feito mais ou menos ao acaso

Isso natildeo se vecirc de jeito nenhum em rua moderna um arco comunicando uma casa com a outra Eu natildeo sei por que se condena isso que eacute uma coisa que po-de prestar muito serviccedilo

Uma bela torre Estaacute mal cuidada e velha mas eacute nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza apesar de todas as devastaccedilotildees do tempo e do dinheiro

Numa praccedila puacuteblica um homem danccedila e outro natildeo presta atenccedilatildeo na danccedila Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordatildeo e vai andando com uma sacola e uma caixa de muacutesica Essas cidades eram todas muito musicais Cantava-se tocava-se violino danccedilava-se mais ou menos em todos os luga-res e ouvia-se muacutesica sair de todas as janelas com a voz bonita e o senso meloacutedico tatildeo frequente na Itaacute-lia

Cena pitoresca mais uma vez O burrico puxado pelo homem carregado que vai devagarzinho pela cida-de Provavelmente um vendedor ambulante

Aqui uma como que pequena coluna e dali brota aacutegua Roma eacute a cidade das fontes em geral com aacutegua muito liacutempida muito boa

Significado da palavra rdquopitorescordquo

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Meacutedia Tudo caiu mas ao lado foi construiacutedo um pitoresco jar-dim suspenso Um dos pitorescos em Roma satildeo os ter-raccedilos como esse onde se colocam guarda-soacuteis grandes e haacute restaurantes no local Um homem toca violino para os que comem e bebem e ficam olhando o movimento da rua onde se vecirc um monge dominicano atravessando-a A cidade dos Papas era a cidade dos frades

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

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Esse menino tem um lado pitoresco Eacute um menino de rua que natildeo teve nenhuma educaccedilatildeo e portanto es-taacute deitado na carroccedila como estaria em sua casa Se ele estivesse de bruccedilos na cama tentando pegar um rato no quarto dele sua atitude natildeo seria diferente Apesar dis-so o gesto todo dele natildeo deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade Natildeo eacute um gesto feio Tem certa har-monia de posiccedilatildeo e de atitude e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente agrave vontade na cidade Eacute a cidade dele feita para ele na qual ele estaacute em casa como em sua residecircncia particular

Esse inteiro laissez faire3 faz parte do pitoresco da ati-tude do menino Algueacutem diria que isso natildeo deveria ser assim e que ele natildeo eacute um menino educado Natildeo eacute ver-dade A educaccedilatildeo tem vaacuterios graus Ele possui essa for-ma principal e miacutenima de educaccedilatildeo que eacute a virtude Ele estaacute composto direito porque eacute um menino que teve uma educaccedilatildeo pura A pureza eacute o principal da educaccedilatildeo e natildeo as maneiras Maneiras ele natildeo tem mas possui a compostura do menino direito Eacute o essencial

A ideia que eu tenho de pitoresco eacute imaginar moran-do ali gente que satildeo os pais e tios desse menino e des-se outro que estaacute atraacutes Talvez esse casal e esses dois ho-mens sejam moradores aqui E gente do povinho inteli-gente como eacute habitualmente o italiano gente que mora nos casebres mas que se pocircs numa situaccedilatildeo muito pito-resca tendo sempre diante dos olhos esse templo a torre e o Tibre milenaacuterios e que presencia tudo isso como de um terraccedilo O cenaacuterio eacute magniacutefico encostado num tem-plo pagatildeo uma torre do fim da Idade Meacutedia olhando o rio romano passar como quem vecirc a vida fluir com toda a navegaccedilatildeo do Tibre

Isso eacute pitoresco porque forma quadros A palavra ldquopito-rescordquo vem de pintura pictus pintado O pitoresco estaacute no homem do povinho com sua inteligecircncia sua vivacidade inalando tudo isso sem saber bem o que eacute e vivendo aqui agrave romana Quer dizer agrave noite fazendo um jantar entre o pa-rapeito e a casa comendo uma polenta bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez te-nha uma corda ou duas a menos e cantando a plena voz nu-ma noite enluarada de Roma Isso eacute pitoresco   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2911977)

1) Do francecircs Antigo Regime Sistema social e poliacutetico aristo-craacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Extensa via puacuteblica localizada entre as zonas centro-sul central e oeste da cidade de Satildeo Paulo

3) Do francecircs deixai fazer Aqui tem o sentido de distender-se

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

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Superexcelente misericoacuterdia

Sagrados Coraccedilotildees de Jesus e Maria Catedral de Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora sendo Matildee seu Coraccedilatildeo Imaculado natildeo eacute mais misericordioso do que

o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus mdash seria um absurdo imaginar isso mdash poreacutem seu Imaculado Coraccedilatildeo faz ver mais a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus do que Ele proacuteprio

Seria mais ou menos como quando os raios do Sol se concentram atraveacutes de uma lente e potildeem fogo numa folha seca A lente eacute tatildeo pouco em comparaccedilatildeo com o Sol mas sem ela esse fogo natildeo pegaria

Portanto o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria seria por assim dizer uma lente do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus uma como que concentraccedilatildeo da misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus Entatildeo Ela debaixo desse aspecto tem uma superexcelente misericoacuterdia

Ademais Maria Santiacutessima eacute especialmente nossa advogada pois sendo mera criatura eacute mais plenamente conatural conosco do que o seu Divino Filho que enquanto Homem-Deus eacute juiz

Por essas razotildees dir-se-ia que o Imaculado Coraccedilatildeo de Maria representa num largo e glorioso sentido muito especialmente a bondade e a misericoacuterdia do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101980)

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