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20 Revista Formação@Docente Belo Horizonte vol. 6, n o 1, jan/jun 2014. A relação entre o repertório e a tessitura vocal de idosas integrantes de um coral de Belo Horizonte: um estudo de caso Débora Andrade 1 Nardelly de Fátima Rodrigues 2 Resumo No presente artigo pretende-se analisar a equivalência entre a extensão melódica do repertório aplicado em um coral de terceira idade e a tessitura vocal das integrantes do mesmo. Por não haver materiais que discorrem a respeito deste assunto, os profissionais da área ficam dependentes da experiência empírica e sujeitos a cometerem equívocos. No coral pesquisado verificou-se que há uma compatibilidade entre a extensão melódica do repertório e a tessitura vocal das integrantes do coro. Portanto, a música é executada de forma prazerosa, exigindo pouco esforço vocal das coristas idosas. Metodologicamente, trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa, na qual, foi realizado um estudo de caso fundamentado pela revisão bibliográfica. É importante que o regente conheça a tessitura vocal de seu grupo, principalmente se tratando de idosos, a fim de adequar a música à região vocal confortável para o canto. Palavras-chave: Canto Coral. Idoso. Educação Musical. Tessitura vocal. Presbifonia. The relationship between the vocal range and repertoire of elderly members of a choir of Belo Horizonte: a case study Abstract In the present article aims to analyze the equivalence between the melodic range applied to the repertoire of choral and vocal range senior members of the choir. Since there are no materials that talk about it, the professionals are at the mercy of empirical experience and subject to making mistakes. In the coral research found that there is a compatibility between the melodic range of repertoire and vocal range of the choir members, so the music is performed in a pleasant way, requiring little effort from vocal choir. Methodologically, this is a qualitative research. In which, there will be a case study substantiated by literature review. It is important that the conductor knows the vocal range of his group, especially when dealing with elderly in order to tailor the music to the region for the comfortable vocal singing. Keywords: Choral Singing. Elderly. Music Education. Vocal range. Presbyphonia. Introdução A população com idade acima de sessenta anos tem aumentado consideravelmente nos últimos anos. Este fato decorre dos inúmeros avanços na medicina, nos programas de controle 1 Mestra em Música, Especialista em Educação Musical e Bacharel em Regência, pela UFMG. Professora do Curso de Licenciatura em Música da UFSJ. E-mail: [email protected]. 2 Licenciada em Música pelo Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix. E-mail: [email protected].

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ResumoNo presente artigo pretende-se analisar a equivalência entre a extensão melódica do repertório aplicado em um coral de terceira idade e a tessitura vocal das integrantes do mesmo. Por não haver materiais que discorrem a respeito deste assunto, os profissionais da área ficam dependentes da experiência empírica e sujeitos a cometerem equívocos. No coral pesquisado verificou-se que há uma compatibilidade entre a extensão melódica do repertório e a tessitura vocal das integrantes do coro. Portanto, a música é executada de forma prazerosa, exigindo pouco esforço vocal das coristas idosas. Metodologicamente, trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa, na qual, foi realizado um estudo de caso fundamentado pela revisão bibliográfica. É importante que o regente conheça a tessitura vocal de seu grupo, principalmente se tratando de idosos, a fim de adequar a música à região vocal confortável para o canto.

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    Revista Formao@Docente Belo Horizonte vol. 6, no 1, jan/jun 2014.

    A relao entre o repertrio e a tessitura vocal de idosas

    integrantes de um coral de Belo Horizonte: um estudo de caso

    Dbora Andrade

    1

    Nardelly de Ftima Rodrigues2

    Resumo

    No presente artigo pretende-se analisar a equivalncia entre a extenso meldica do repertrio

    aplicado em um coral de terceira idade e a tessitura vocal das integrantes do mesmo. Por no

    haver materiais que discorrem a respeito deste assunto, os profissionais da rea ficam

    dependentes da experincia emprica e sujeitos a cometerem equvocos. No coral pesquisado

    verificou-se que h uma compatibilidade entre a extenso meldica do repertrio e a tessitura

    vocal das integrantes do coro. Portanto, a msica executada de forma prazerosa, exigindo

    pouco esforo vocal das coristas idosas. Metodologicamente, trata-se de uma pesquisa de

    natureza qualitativa, na qual, foi realizado um estudo de caso fundamentado pela reviso

    bibliogrfica. importante que o regente conhea a tessitura vocal de seu grupo,

    principalmente se tratando de idosos, a fim de adequar a msica regio vocal confortvel

    para o canto.

    Palavras-chave: Canto Coral. Idoso. Educao Musical. Tessitura vocal. Presbifonia.

    The relationship between the vocal range and repertoire of elderly members of a choir

    of Belo Horizonte: a case study

    Abstract

    In the present article aims to analyze the equivalence between the melodic range applied to

    the repertoire of choral and vocal range senior members of the choir. Since there are no

    materials that talk about it, the professionals are at the mercy of empirical experience and

    subject to making mistakes. In the coral research found that there is a compatibility between

    the melodic range of repertoire and vocal range of the choir members, so the music is

    performed in a pleasant way, requiring little effort from vocal choir. Methodologically, this is

    a qualitative research. In which, there will be a case study substantiated by literature review. It

    is important that the conductor knows the vocal range of his group, especially when dealing

    with elderly in order to tailor the music to the region for the comfortable vocal singing.

    Keywords: Choral Singing. Elderly. Music Education. Vocal range. Presbyphonia.

    Introduo

    A populao com idade acima de sessenta anos tem aumentado consideravelmente nos

    ltimos anos. Este fato decorre dos inmeros avanos na medicina, nos programas de controle

    1 Mestra em Msica, Especialista em Educao Musical e Bacharel em Regncia, pela UFMG. Professora do

    Curso de Licenciatura em Msica da UFSJ. E-mail: [email protected]. 2 Licenciada em Msica pelo Centro Universitrio Metodista Izabela Hendrix. E-mail: [email protected].

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    de mortalidade e da tomada de conscincia sobre a importncia de uma alimentao saudvel

    - fatores que contribuem para a conservao da vida humana. Por tal motivo, crescente a

    preocupao em torno da realizao de programas que promovam a integrao social da

    populao idosa, visando melhorar a qualidade de vida, diminuir a excluso e, principalmente,

    considerar sua participao no desenvolvimento social e econmico do pas (LUZ;

    SILVEIRA, 2006).

    Os idosos tm direito educao, a aprender e a compartilhar seus conhecimentos,

    pois, apesar de a velhice ser a ltima etapa do ciclo da vida humana, cheia de peculiaridades

    e de fortes impactos fisiolgicos, muito ainda pode ser aprendido e produzido nela

    (FIGUERDO, 2009, p.18).

    De acordo com Garcia (2007), as pessoas acima de sessenta anos tm procurado mais

    as atividades de ensino e aprendizagem que possibilitam a aquisio e troca de saberes, do

    que s atividades de lazer, objetivando adquirir novos conhecimentos, compartilhar

    experincias, realizar sonhos pessoais, estimular seus potenciais criativos e expressivos e

    atualizar-se diante das mudanas do mundo, reafirmando que um ser ativo na sociedade.

    O ensino musical apresenta recursos para atingir esses objetivos, uma vez que uma

    possibilidade de educao e participao do idoso no meio social (RODRIGUES;

    CARVALHO, 2008). Souza e Leo (2006, p. 57) afirmam que, O ensino musical para a

    terceira idade pode trazer benefcios no s na melhoria da qualidade de vida do grupo, como

    tambm pode promover aspectos de desenvolvimento criativo e expressivo do ser. Dentre as

    atividades musicais aplicadas aos idosos, o canto coral figura-se como uma das mais

    praticadas, aparecendo como um recurso importante para a musicalizao da terceira idade

    (FIGUERDO, 2009), pois, abrange um fazer musical em conjunto, influenciando

    diretamente na ressocializao e autoestima. Alm disso, ajuda no desenvolvimento da

    memria e proporciona o ensino e aprendizagem por meio da educao musical (JNIOR,

    2008).

    O canto coral se constitui em uma relevante manifestao educacional musical e em

    uma significativa ferramenta de integrao social. [...] Alm disso, os

    conhecimentos adquiridos pelos participantes do coral influenciam na apreciao

    artstica e na motivao pessoal de cada um, independentemente de sua faixa etria

    ou de seu capital cultural, escolar ou social (AMATO, 2007, p. 77).

    No entanto, a prtica de Canto Coral voltada para a terceira idade apresenta

    particularidades e requer alguns cuidados, pois, o envelhecimento traz limitaes tanto

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    fisiolgicas quanto psicolgicas e sociais (FIGUERDO, 2009). Embora seja o

    envelhecimento um processo natural que ocasiona modificaes em todo o organismo,

    procura-se evidenciar, nesta pesquisa, informaes especficas sobre as alteraes vocais, que

    sero relevantes para o desenvolvimento da mesma. importante, ento, que o

    educador/regente se atente para essas alteraes e trabalhe consciente das necessidades de um

    grupo limitado fisiologicamente, psicologicamente e socialmente, que por sua vez, tem

    capacidade de aprender e ensinar (SOUZA; LEO, 2006).

    Atravs das pesquisas bibliogrficas realizadas, percebe-se que muito se discute sobre

    os benefcios do canto coral e em paralelo as transformaes vocais inerentes idade

    (AMATO, 2007; PAES, 2008; FIGUERDO, 2009). No entanto, existem poucos materiais

    que discorrem a respeito da equivalncia entre as extenses meldicas utilizadas em

    repertrio de corais de terceira idade e a tessitura vocal dos integrantes. Dessa forma, os

    profissionais da rea ficam dependentes da experincia emprica e sujeitos a cometerem

    equvocos.

    Apesar de a maioria dos corais de terceira idade possibilitar a presena de idosos tanto

    do sexo feminino quanto masculino, so poucos os que contam com a participao do pblico

    masculino (FIGUERDO, 2009). Isso pode ser decorrente do aumento do nmero de

    mulheres na populao idosa em relao aos homens, denominado feminizao da velhice

    (PAES, 2008).

    Por isso e, tambm, por haver procurado em diversos corais a constatao da premissa

    de que o pblico idoso feminino mais incidente em coral, o trabalho foi realizado com

    mulheres, tornando a pesquisa interessante, pois, algumas alteraes vocais inerentes do

    envelhecimento so mais marcantes nas mulheres.

    A inspirao para o desenvolvimento desse estudo surgiu a partir da experincia de

    uma das autoras, que no primeiro semestre de 2010 participou como bolsista em um projeto

    de extenso universitria, atuando como tecladista, em um coral de terceira idade. Percebeu-

    se, neste contexto, que as idosas integrantes do coro, apresentavam dificuldades em cantar

    algumas msicas no registro agudo.

    Realizou-se, ento, um estudo de caso que analisou a equivalncia entre a extenso

    meldica do repertrio aplicado em um coral de terceira idade, situado em Belo Horizonte, e a

    tessitura vocal das integrantes dos mesmos, tendo como principal objetivo alertar regentes

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    para a possibilidade de no acelerarem as mudanas decorrentes do processo natural de

    envelhecimento vocal de suas coristas.

    Envelhecimento vocal: presbifonia

    A voz sofre alteraes desde o nascimento, passando pelos demais ciclos de vida at

    chegar velhice. Considera-se que o perodo que corresponde entre os 25 aos 40 anos de

    idade o pice da eficincia vocal. No perodo que se segue, ocorrem vrias alteraes

    estruturais, implicando na diminuio da funcionalidade dos rgos utilizados na produo da

    voz (BEHLAU,1999; BILTON, 2002).

    A comunicao por meio da fala depende da produo de um som larngeo

    (ANDREWS, 2009). Esse som gerado atravs da passagem de ar pela laringe, fazendo com

    que as pregas vocais vibrem. Este ar, provindo dos pulmes, liberado de forma audvel,

    ressoando e sendo modificado pelas cavidades situadas abaixo e acima das pregas vocais as

    cavidades de ressonncia. A laringe produz a fonao, enquanto o trato produz a voz. Voz

    fonao acrescida de ressonncia (BEHLAU, 2001. p. 26).

    O envelhecimento vocal denominado de presbifonia, assinalado pela calcificao e

    ossificao gradual das cartilagens larngeas que, como consequncia, ao redor dos 65 anos,

    apresentam-se quase sem nenhuma mobilidade (ZEMLIM, 1968 apud BEHLAU, 2001, p.

    63) e pelo definhamento dos msculos larngeos intrnsecos (BEHLAU, 2001), que tm

    origem e insero na prpria laringe atuando diretamente na fonao.

    Durante a presbifonia, a musculatura larngea perde parte de sua mobilidade e

    flexibilidade, gerando uma voz fraca, trmula e com falhas. Observa-se que a voz cantada se

    deteriora precedentemente a voz falada. Uma voz treinada, cercada de hbitos saudveis, no

    se deteriora para fala, mas suas possibilidades para o canto se tornam bem limitadas com o

    avanar da idade (GREENE, 1989).

    De maneira peculiar, nas mulheres, ocorre menopausa, um perodo marcado por

    alteraes hormonais, podendo originar uma modificao vocal discreta ou acentuada. Por

    isso, a senilidade vocal mais precoce nelas, podendo gerar maior agravamento na voz

    cantada. Assim, a frequncia feminina torna-se mais grave, enquanto a masculina torna-se

    mais aguda (BEHLAU, 2001).

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    As caractersticas vocais encontradas em indivduos idosos so caracterizadas como

    aspereza, rouquido, tremor, reduo dos tempos mximos de fonao, o que

    provoca frases curtas e a necessidade de reabastecimento de ar, reduo na

    intensidade, tessitura vocal diminuda, reduo na velocidade da fala, impreciso

    articulatria e alterao da ressonncia (LIMA, 2008. p.74.).

    importante salientar que, a idade de incio das alteraes e o grau de danificao

    vocal variam de pessoa para pessoa, podendo ser resultado de cuidados e hbitos vocais

    realizados durante o suceder da vida, como tambm, de fatores hereditrios, raciais e sociais

    (GREENE, 1989; BEHLAU, 2001). Sendo assim, os problemas vocais apresentados pelas

    pessoas idosas no so resultantes somente da velhice, podendo haver disfonias3 anteriores

    que se acentuam nela (FIGUERDO, 2009)

    Apesar das debilidades vocais causadas pela presbifonia, esta no deve ser considerada

    como uma desordem vocal, apesar de ser difcil estabelecer distino entre ambas. O

    envelhecimento vocal um processo natural do desenvolvimento humano, no sendo

    considerado uma doena (BEHLAU, 2001).

    Como explicitado anteriormente, indivduos idosos de uma forma ou de outra,

    apresentam algum tipo de alterao vocal. No que se refere formao de coral com esse

    pblico, o regente deve se atentar para essas modificaes vocais, pois, os efeitos da

    presbifonia incidem diretamente na qualidade do canto (FIGUERDO, 2009).

    Contudo, pesquisas revelam que, um acompanhamento fonoaudiolgico associado a

    uma prtica de canto coral saudvel, pode minimizar os efeitos da presbifonia (CASSOL;

    BS, 2006). Por tal motivo, alm de realizar treinamentos vocais adequados antes do canto, o

    regente deve verificar se a extenso do repertrio proposto est de acordo com a tessitura

    vocal dos integrantes, que na terceira idade, j se encontra diminuda. A fim de proporcionar

    um canto com o menor nvel de esforo vocal possvel e com maior qualidade. Em carter de

    ilustrao, se a voz das mulheres idosas fica mais grave, sugere, que o repertorio aplicado a

    elas seja nessa regio, pois, mais confortvel.

    Implicaes do envelhecimento no canto coral

    O canto coral uma atividade artstica que pode ser considerada benfica e adequada

    para o pblico idoso, pois se constitui uma ferramenta eficaz no processo de ensino e

    3 Considera-se como disfonia qualquer dificuldade de emisso natural da voz, resultante de fatores orgnicos,

    funcionais ou emocionais. (BEHLAU, 1997, p. 39)

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    aprendizagem, fato que est diretamente ligado ao aumento da autoestima. Proporciona um

    ambiente favorvel criao de novos projetos e relaes interpessoais, alm de envolver

    atividade corporal e vivncia musical, promovendo uma profunda percepo do corpo e

    emoes de um indivduo. (SACKS, 2007 apud DEGANI; MERCADANTE, 2010).

    Corroborando com este ponto de vista, o desenvolvimento da voz cantada, associado a

    exerccios de tcnica vocal, podem retardar os efeitos da presbifonia, visto que,

    responsvel por manter a flexibilidade, regularidade e simetria dos movimentos das pregas

    vocais, contribuindo para uma longevidade nas vozes cantadas, treinadas, e melhor eficincia

    respiratria (LIMA, 2008. p.74).

    Todavia, no se pode negar que o trabalho de canto coral direcionado a pessoas idosas,

    de uma forma ou de outra, sofre influncias do envelhecimento. Portanto, o profissional da

    rea deve se atentar para as objees apresentadas no decorrer do processo de

    ensino/aprendizagem e execuo das atividades. Dessa forma, por meio de observao,

    conhecimento dos sujeitos envolvidos e interaes com seus alunos, o regente pode inferir

    estratgias para amenizar essas dificuldades, podendo assim, explorar em grande escala as

    qualidades e possibilidades do ensino voltado para essa camada da populao (FIGUERDO,

    2009).

    Em relao ao repertrio, Figuerdo (2009) afirma que, a aplicao de msicas

    conhecidas e vividas pelos coristas idosos na infncia e juventude, favorece uma melhor

    execuo do canto, estimulando a memria, auxiliando aqueles que no tm leitura fluente, e

    muitas vezes, no tem boa viso. O mesmo no ocorre com o emprego de um repertrio no

    familiar experincia musical deles. Outro aspecto relevante que, como dito anteriormente,

    na presbifonia, a extenso vocal e consequentemente a tessitura da voz cantada encontra-se

    diminuda durante essa fase da vida (BEHLAU, 2001; GREENE, 1989).

    De maneira peculiar, nas mulheres a voz se torna mais grave, apontando para o fato de

    que, to importante quanto realizao de exerccios vocais, a extenso meldica do

    repertrio aplicado ao coro deve se equiparar com a tessitura vocal das cantoras. Desse modo,

    o som ser emitido com menor nvel de esforo o que acarretar em uma melhor qualidade do

    canto evitando a aquisio de patologias decorrentes do mau uso da voz cantada.

    Cabe ressaltar, aqui, a diferena entre extenso vocal (extenso fonatria mxima) e

    tessitura. A primeira, diz respeito quantidade mxima de notas que uma pessoa consegue

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    emitir, do registro mais grave ao mais agudo, no considerando a qualidade do som gerado e o

    esforo vocal necessrio para alcan-la. Verifica-se somente a capacidade de produo

    sonora do indivduo, estando diretamente associada sade das pregas vocais. Por sua vez,

    tessitura so todos os sons emitidos sem esforo vocal, ou seja, da nota mais grave mais

    aguda gerada naturalmente, com qualidade, dando origem a uma sonoridade agradvel

    (MARSOLA; BA, 2000; BEHLAU, 2001).

    Objeto da pesquisa e mtodo

    A presente pesquisa possui caractersticas de abordagens qualitativas, configurando-se

    em um estudo de caso fundamentado em uma reviso bibliogrfica. O objetivo principal foi o

    conhecimento e a explanao dos assuntos envolvidos neste caso e as possveis solues das

    questes encontradas.

    Participaram dessa pesquisa 21 pessoas do sexo feminino integrantes de um coral de

    terceira idade, situado na cidade de Belo Horizonte. Os critrios para participao foram: ter

    idade igual ou acima de sessenta anos e participar do coral h mais de um ano.

    O coral investigado, composto por 35 integrantes do sexo feminino, se enquadrava

    nesses critrios sendo que a maioria das integrantes possua entre cinco a vinte anos de

    participao. Contudo, por questes de regularidade na frequncia dos ensaios, participaram

    do estudo apenas 21 coristas.

    O grupo se encontra semanalmente, em um antigo posto de sade, situado na regio

    leste, da cidade de Belo Horizonte e possui ensaios de, aproximadamente, trs horas de

    durao. Seu repertrio, em geral, formado por canes populares antigas, escolhidas pelas

    prprias coristas, havendo poucas intervenes da regente.

    Os dados foram coletados no local onde ocorrem os ensaios do grupo, pela ocasio de

    duas visitas aos ensaios, em datas previamente combinadas com a regente. As informaes

    adquiridas foram registradas em um formulrio redigido para esta pesquisa, contendo nome,

    idade, tempo de coral, registro mais grave e registro mais agudo, emitidos sem esforo vocal.

    Antes da mensurao da tessitura das idosas, foi realizado um aquecimento vocal, por

    meio de exerccios de tcnica dos sons vibrantes e, depois, tcnica dos sons nasais. Num

    terceiro momento, pediu-se que elas emitissem a vogal //, por ser uma vogal confortvel de

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    ser sustentada (BEHLAU, 2001), na mesma altura executada no teclado, partindo-se do D3 e

    seguindo, primeiro, cromaticamente em direo s frequncias mais graves e, depois, em

    direo s mais agudas. No momento, foi lhes dada a orientao de que emitissem cada nota

    sem esforar a voz e que interrompessem o exerccio ao sentir algum desconforto. Foram

    consideradas todas as notas alcanadas com qualidade e sem esforo vocal.

    Com o intuito de aferir a extenso meldica do repertrio, pediu-se para que as idosas

    cantassem a capella duas msicas que fazem parte do mesmo, aps realizarem um

    aquecimento vocal adequado ao canto, efetuado pela regente do coro. As canes foram

    gravadas e, posteriormente, transcritas para a partitura.

    Por questes ticas, a identidade das participantes coristas foi preservada atravs da

    substituio dos nomes prprios por nomes de flor, mantendo as idades reais.

    Anlise dos dados e discusso

    Aps a coleta das informaes desejadas, fez-se a comparao entre a tessitura vocal

    das integrantes do coral e a extenso das msicas que fazem parte do repertrio, verificando a

    equivalncia entre ambas.

    No QUADRO 1 so apresentadas as idades das coristas, o tempo de participao no

    coro e o resultado da tessitura vocal, compreendendo da frequncia mais grave mais aguda.

    Nas FIGURAS 1 e 2 so apresentadas as msicas utilizadas como referncia para a anlise.

    Em relao tessitura vocal das coristas, observou-se que o registro mais grave

    alcanado por elas a nota Si1 e o mais agudo a nota Si3, sendo esta a tessitura mxima

    alcanada pelo grupo. No entanto, a regio mdia, confortvel a todas, compreende da nota

    Sol2 ao Mi3.

    Durante a coleta destes dados, observou-se que todas as idosas apresentavam alguma

    alterao na voz, ainda que discreta em algumas e mais acentuada em outras, tais como,

    rouquido, voz soprosa, fraca, trmula, provavelmente decorrente da idade, como observado

    na bibliografia pesquisada.

    Quanto s canes, verifica-se que, na primeira (FIGURA 1), a voz escrita na regio

    mais aguda entoa desde R3 ao Si3 e a voz escrita na regio mais grave entoa desde o Si2 at

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    o Sol3. A segunda cano (FIGURA 2), cantada em apenas uma voz, percorre entre o Sol#2,

    nota mais grave e o L3, nota mais aguda. Porm, a melodia o alcana poucas vezes,

    concentrando-se mais at o Mi3.

    Verifica-se, ento, que h uma compatibilidade entre a extenso meldica do

    repertrio analisado e a tessitura vocal das integrantes deste coro, talvez pelo fato de serem as

    prprias cantoras quem define o repertrio e o tom no qual as msicas sero cantadas.

    QUADRO 1 Idade, tempo de participao no coro e tessitura vocal.

    Corista Nome Idade Tempo de coral (anos) Nota grave Nota aguda

    01 Margarida 71 12 D 2 L 3

    02 Perptua 60 06 F 2 Sol 3

    03 Gloriosa 72 12 D 2 Sol3

    04 Anglica 72 12 R 2 L3

    05 Gardenia 60 15 Si 1 Sol 3

    06 Yasmin 73 18 R 2 Sol 3

    07 Aucena 92 10 Mi 2 F 3

    08 Rosa 58 12 Mi 2 L 3

    09 Violeta 70 06 R 2 Si 3

    10 Tulipa 68 10 D 2 F 3

    11 Hortnsia 66 8 Sol 2 Si 3

    12 Jasmin 60 13 D 2 Sol 3

    13 Magnlia 64 10 D 2 F 3

    14 Vitria Rgia 75 12 Sol 2 F 3

    15 Begnia 71 12 Mi 2 F 3

    16 Dlia 64 10 R 2 Si 3

    17 Azalia 72 10 Mi 2 L 3

    18 Camlia 64 09 D 2 L 3

    19 Jade 72 10 D 2 Mi 3

    20 Iris 71 09 Mi 2 F 3

    21 Peonia 81 20 Si 1 L 3

    Fonte: dados da pesquisa

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    FIGURA 01 - Msica Peneirei Fub

    Fonte: transcrio das autoras

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    FIGURA 02 - Msica Marej

    Fonte: transcrio das autoras

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    Consideraes finais

    No coral investigado, a extenso meldica do repertrio se adqua tessitura vocal das

    integrantes. Dessa maneira, a msica executada de forma prazerosa, exigindo pouco esforo

    vocal das coristas e contribuindo para uma melhor qualidade do canto. Vale ressaltar que,

    apesar de todas coristas apresentarem algum tipo de alterao vocal, o canto se faz possvel

    porque, alm das msicas estarem em uma regio confortvel para praticamente todas

    cantarem, as dificuldades no so iguais em todas, havendo um equilbrio.

    Concordando com a bibliografia pesquisada, a formao de coral com pessoas idosas

    se defronta com dificuldades inerentes ao envelhecimento. Assim, conhecer os aspectos que

    interferem na realizao dessa atividade fundamental para a busca de recursos que tornem

    essa educao musical possvel. Neste sentido, os benefcios do canto coral para os idosos

    anteriormente citados s se concretizaro, se levar em considerao o preparo e a formao do

    profissional envolvido. importante que o regente conhea a tessitura vocal de seu grupo,

    principalmente se tratando de idosos, a fim de adequar a msica regio vocal confortvel

    para o canto. Este cuidado tomado pelo regente pode impedir que o grupo se disperse e

    abandone a atividade.

    Existe um campo aberto a ser explorado por regentes que pretendem atuar nessa rea,

    e assim, conhecer melhor sobre a atividade de canto coral voltada a pessoas da terceira idade.

    Aprender msica em grupo pode contribuir para a melhoria da qualidade de vida da pessoa

    idosa, alm de, influenciar positivamente na socializao e proporcionar conhecimento, tendo

    em vista que, envelhecimento no significa o fim da capacidade criativa e nem o anseio por

    novas conquistas.

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