SABERES E AUTONOMIA: A EFETIVAÇÃO DE DIREITOS · Jaci Fátima de Souza Candiotto2 RESUMO: ......

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SABERES E AUTONOMIA: A EFETIVAÇÃO DE DIREITOS Maria Rosa da Silva Miranda 1 Jaci Fátima de Souza Candiotto 2 RESUMO: O objetivo desse estudo é identificar nas práticas de Educação Popular, desenvolvidas pelo Centro de Formação Urbano e Rural Irmã Araújo (CEFURIA), na região de Curitiba, Paraná, as formas de Educação em Direitos Humanos e inclusão social. Utiliza-se a metodologia da pesquisa bibliográfica e empírica, com centralidade no educador Paulo Freire, sobretudo nas obras "Pedagogia do Oprimido" (1987) e "Pedagogia da Autonomia" (1997) e nos dados da observação participativa, uma vez que o CEFURIA conta com um grupo de Educadores Populares. Entende-se que a formação das pessoas envolvidas neste Centro quer traduzir-se em um empenhado esforço de transformação da realidade pela conscientização e afirmação dos Direitos Humanos. A formação em Direitos Humanos mediante a pedagogia popular tem sido satisfatória visto que ela tem uma dimensão política que se orienta, sobretudo, por princípios tais como os da autonomia e da emancipação. No entanto, a realização dessa educação passa pelo exercício da crítica e pelo discernimento diante dos aspectos positivos e negativos vivenciados e ou observados no cotidiano, orientando-se a partir da mudança de mentalidade despertada pela educação em Direitos Humanos. Como resultado desse estudo, procura-se demonstrar que os sujeitos envolvidos e atingidos na Educação Popular em Direitos Humanos nos espaços do CEFURIA são incentivados à participação e ao empoderamento. Tornam-se, portanto, capazes de transformara realidade que os afeta de forma desumana. Palavras-chave: Efetivação de direitos. Educação popular. Autonomia. 1 Mestranda em Direitos Humanos e Políticas Pública pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). 2 Doutora em Teologia pela PUC-Rio e pós-doutora em Teologia pelo Institut Catholique de Paris (ICP- França). Professora do Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos e Políticas Públicas da PUCPR, onde também é professora do Curso de Teologia. Anais do XIV Congresso Internacional de Direitos Humanos. Disponível em http://cidh.sites.ufms.br/mais-sobre-nos/anais/

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SABERES E AUTONOMIA: A EFETIVAÇÃO DE DIREITOS

Maria Rosa da Silva Miranda1

Jaci Fátima de Souza Candiotto2

RESUMO: O objetivo desse estudo é identificar nas práticas de Educação Popular, desenvolvidas pelo

Centro de Formação Urbano e Rural Irmã Araújo (CEFURIA), na região de Curitiba,

Paraná, as formas de Educação em Direitos Humanos e inclusão social. Utiliza-se a

metodologia da pesquisa bibliográfica e empírica, com centralidade no educador Paulo

Freire, sobretudo nas obras "Pedagogia do Oprimido" (1987) e "Pedagogia da Autonomia"

(1997) e nos dados da observação participativa, uma vez que o CEFURIA conta com um

grupo de Educadores Populares. Entende-se que a formação das pessoas envolvidas neste

Centro quer traduzir-se em um empenhado esforço de transformação da realidade pela

conscientização e afirmação dos Direitos Humanos. A formação em Direitos Humanos

mediante a pedagogia popular tem sido satisfatória visto que ela tem uma dimensão

política que se orienta, sobretudo, por princípios tais como os da autonomia e da

emancipação. No entanto, a realização dessa educação passa pelo exercício da crítica e

pelo discernimento diante dos aspectos positivos e negativos vivenciados e ou observados

no cotidiano, orientando-se a partir da mudança de mentalidade despertada pela educação

em Direitos Humanos. Como resultado desse estudo, procura-se demonstrar que os sujeitos

envolvidos e atingidos na Educação Popular em Direitos Humanos nos espaços do

CEFURIA são incentivados à participação e ao empoderamento. Tornam-se, portanto,

capazes de transformara realidade que os afeta de forma desumana.

Palavras-chave: Efetivação de direitos. Educação popular. Autonomia.

1Mestranda em Direitos Humanos e Políticas Pública pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná

(PUCPR).

2Doutora em Teologia pela PUC-Rio e pós-doutora em Teologia pelo Institut Catholique de Paris (ICP-

França). Professora do Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos e Políticas Públicas da PUCPR,

onde também é professora do Curso de Teologia.

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1 INTRODUÇÃO

A educação em direitos humanos é tema relevante em diversas abordagens, embora

ainda não se dê a devida importância ao grande potencial transformador que possui essa

modalidade de educação na formação dos cidadãos. Trata-se de um instrumento de difusão

e construção de cultura, a qual deveria estar voltada para a vivência e as práticas dos

direitos humanos, buscando a construção de uma sociedade ética, solidária e justa.

A investigação a que nos propomos tem como objeto as formas de educação em

direitos humanos com o embasamento teórico no pensamento de Paulo Freire (1921-

1997)3, mais propriamente, sua contribuição para a prática de educadores populares que

hoje repensam o cenário da construção de cidadania. Objetiva-se compreender como são

materializadas as práticas de educação em direitos humanos e inclusão social com um

recorte específico à ação dos educadores populares na região de Curitiba, Paraná, trabalho

acompanhado pelo Centro de Formação Urbano e Rural Irmã Araújo. Analisa-se a ação do

ser humano como agente de transformação a partir de sua realidade e da educação em

Direitos Humanos mediante a pedagogia popular.

2 PAULO FREIRE E A EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS

A consciência de direitos, especialmente dos direitos humanos, tem sido pauta de

muitos debates nas últimas décadas. Estamos vivendo, no Brasil, as consequências da crise

política, econômica que impõe consequências desastrosas para a dimensão da existência

humana e para as relações sociais. Vive-se um momento tenso e de insegurança pelas

previstas reformas trabalhistas e educacionais, além de outras que estão por vir. Assusta a

crescente estrutura de injustiça que gera desemprego, exclusão e perda significativa de

conquistas sociais dos últimos anos. Desta forma, a questão dos direitos humanos se torna

central e urgente. Apresenta-se, sobretudo, como desafio, para a própria educação quando

3Freire ficou conhecido mundialmente como um educador popular, o criador de um método que, em 40

horas, alfabetizava e conscientizava ao mesmo tempo. Se envolveu com as classes populares desde suas

primeiras experiências educativas, entre 1958 e 1961, escreveu textos que demonstravam sua preocupação

com a educação em geral. Questionou o elitismo do ensino vigente, seus métodos e princípios pedagógicos,

por não corresponderem ao processo de desenvolvimento industrial e de construção da democracia. Ao fazer

a crítica, também propôs a reforma completa do ensino brasileiro e reivindicou a democratização da

educação. Ao partilhar dos princípios da escola nova, definiu as características de uma educação ativa, que

formasse as predisposições mentais próprias da personalidade democrática e técnicos necessários para o

desenvolvimento almejado para o país (WERRI, 2008).

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esta objetiva desenvolvê-la numa perspectiva prática libertadora, assim como é a proposta

de Paulo Freire, para o qual os conteúdos devem representar um espaço de libertação e

emancipação humana. A esse respeito ele afirma,

A desumanização, que não se verifica, apenas, nos que têm sua

humanidade roubada, mas também, ainda que de forma diferente, nos que

a roubam, é distorção da vocação do ser mais. É distorção possível na

história, mas não vocação histórica. Na verdade, se admitíssemos que a

desumanização é vocação histórica dos homens, nada mais teríamos que

fazer, a não ser adotar uma atitude cínica ou de total desespero. A luta pela humanização, pelo trabalho livre, pela desalienação, pela afirmação

dos homens como pessoas, como “seres para si”, não teria significação.

Esta somente é possível porque a desumanização, mesmo que um fato

concreto na história, não é porém, destino dado, mas resultado de uma

“ordem” injusta que gera a violência dos opressores e esta, o ser menos

(FREIRE, 1987, p. 16).

Para Freire, os seres humanos são os únicos seres capazes de aprender com alegria

e esperança, na convicção de que a mudança é possível. Aprender é uma descoberta

criadora e nessa descoberta são recriadas as oportunidades de ensinar aprendendo e de

aprender ensinando (FREIRE, 2001, p. 23).

Na obra Pedagogia da Autonomia, saberes necessários à prática educativa,

Paulo Freire (2001, p. 30) traz a reflexão de práticas de uma educação que respeita o

educando a partir da sua realidade social. Afirma que, "ensinar exige respeito aos saberes

dos educandos". A esse respeito envolve não só os educadores, mas todos os que, de

alguma forma, buscam os saberes construídos socialmente na prática comunitária. Com as

experiências adquiridas, é necessário refletir com as pessoas envolvidas na educação a

razão de ser desses saberes em relação ao que se propõe continuar aprendendo.

As experiências dos educandos são relevantes nesse processo, pois muitos vivem

em ambientes precários da cidade, descuidados pelo poder público e passam por inúmeras

experiências de necessidades. Por que não pensar, analisar e propor saídas para tais

condições como, por exemplo, para a poluição, os baixos níveis de bem-estar das

populações, os lixões e os riscos que oferecem à saúde das pessoas? Por que não

questionar a situação constante de violência e a permanente situação em que as pessoas

vivem mais diretamente com a morte que a vida? Freire é insistente em afirmar que é

preciso estabelecer certa "intimidade" entre os saberes programáticos, no caso da escola,

saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles têm como

indivíduos (FREIRE, 1987, p. 30).

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A base política desse tipo de educação leva à prática da defesa dos direitos

humanos e adquire significado enquanto promotora da superação do silêncio das maiorias,

da preparação intelectual dos trabalhadores e trabalhadoras, da resistência por uma ética de

valoração da vida, da visão pedagógica de que todos aprendem conjuntamente com a

clareza do risco existente do processo criativo e na existência humana. Isso ajuda a

estabelecer relações de cooperação e fortalecimento para as mudanças. Na obra, A

pedagogia do Oprimido, Freire afirma

[...] a palavra viva é diálogo existencial. Expressa e elabora o mundo, em

comunicação e colaboração. O diálogo autêntico – reconhecimento do

outro e reconhecimento de si, no outro – é decisão e compromisso de

colaborar na construção do mundo comum. Não há consciências vazias;

por isto os homens não se humanizam, senão humanizando o mundo

(FREIRE, 1994, p. 11).

Essa compreensão de Freire sobre o processo de conscientização e humanização

retoma o que é essencial nas relações de superação e de enfrentamento das desigualdades

que violentam os direitos humanos ao longo da história. Portanto, na perspectiva freuriana,

a educação para os direitos humanos é aquela que se faz para o estabelecimento da justiça,

é justamente aquela educação que leva os dominados a despertar para a necessidade da

„briga‟, da organização, da mobilização crítica, justa, democrática, séria, rigorosa,

disciplinada, sem manipulações com vistas à reinvenção do mundo, à reinvenção do poder.

(FREIRE, 2001, p. 99).

A proposta de educação de Freire, portanto, é fundamentalmente uma educação em

direitos humanos, visto que pensar em direitos humanos é pensar nos direitos básicos da

pessoa humana, como o direito de comer, de se vestir, de dormir, de pensar, o direito de

estar com o direito de estar contra, entre outros tantos. Assevera o educador, “não é

possível atuar em favor da igualdade, do respeito aos demais [...] num regime que negue a

liberdade de trabalhar, de comer, de falar, de criticar, de ler, de discordar, de ir e vir, a

liberdade de ser”. (FREIRE, 1994).

Desta maneira, a educação deveria necessariamente levar os sujeitos envolvidos no

processo a protagonizarem ações que visem transformar a realidade que os oprime,

despertando-os para a consciência de que são portadores de direitos; e quando estes forem

feridos por injustiças, serem capazes de construir alternativas que possam ajudar na busca

por seus direitos. Podemos dizer, portanto, que toda educação deveria ser, nesta

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perspectiva, a de despertar nos sujeitos atitudes e competências em vista de possuírem os

instrumentos e mecanismos que os ajudem a garantir a proteção e promoção dos direitos

humanos.

A educação em Direitos humanos é aquela que qualifica o ser humano como sujeito

protagonista, uma vez que para além do desenvolvimento de habilidades, desenvolve a

capacidade crítica. Desta forma, ela tem um caráter libertador, se pensado em relação à

“educação bancária”, que no pensamento de Freire, é alienante.

2.1 ASPECTOS RELEVANTES DA EDUCAÇÃO POPULAR NO BRASIL

A esse respeito, o I Encontro Nacional de Alfabetização e Cultura Popular,

realizado em setembro de 1963 em Recife, é fonte documental de indiscutível importância.

Representa o resgate de um momento emblemático da história da educação popular no

Brasil e constitui-se como obra de referência para os pesquisadores, em particular os

historiadores da educação. O Encontro foi uma iniciativa do Ministério da Educação e

Cultura, no intuito de reunir representantes dos movimentos de alfabetização e cultura

popular que ocorriam ainda dispersos pelo país, e buscar contribuições para conceber uma

coordenação nacional para a educação de adultos. Entende-se que foi um acontecimento

necessário para avaliar, planejar e fortalecer as iniciativas que já tinham estratégias

elaboradas para continuar desenvolvendo uma educação popular.

[...] o mais denso período histórico da educação popular é aquele que vai

aproximadamente de 1958 a 1964. Nele foram criados vários movimentos

de educação e cultura popular: Centro Popular de Cultura da União

Nacional dos Estudantes (CPC da UNE), surgido no Rio de Janeiro e que

se desdobrou em vários CPCs estaduais; Movimento de Cultura Popular

(MCP), inicialmente implantado no Recife, depois estendido para outras

cidades de Pernambuco; Movimento de Educação de Base (MEB), de

abrangência nacional, com atuação no meio rural; Campanha de Educação

Popular da Paraíba (CEPLAR); Campanha "De pé no chão também se aprende a ler", de Natal (RN); e o Sistema de Alfabetização Paulo Freire,

certamente a experiência de maior repercussão (SOARES, 2009).

Vários documentos foram escritos, muitos de natureza burocrática, porém com

registros de um processo de construção de uma pedagogia da participação popular, cujo

foco é a conscientização, no sentido da formação de consciência, e a politização, em

termos de organização e mobilização das camadas populares. Dos documentos produzidos

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para e no I Encontro Nacional de Alfabetização e Cultura Popular, emergem teorias de

educação, práticas educativas, tensões políticas e ideológicas, atividades artístico-culturais,

atores sociais engajados em transformar a sociedade brasileira por meio da educação e da

cultura. Em outras palavras, evidencia-se o espaço amplo e polissêmico de germinação de

ideias e ações dos movimentos de educação e cultura popular atuantes no início dos anos

de 1960.

No nosso cotidiano, misturamos a vida com a educação a todo momento. Para

conhecer, para agir, para ser e para relacionar-se com as pessoas, enfim, a convivência é

uma educação permanente. Nesse sentido a educação deve ser compreendida como um

compromisso consigo mesmo e com o ser humano na sua diversidade e em diferentes

contextos.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos no Artigo 26, estabelece que

1. Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo

menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será

obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem

como a instrução superior, esta baseada no mérito.

2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da

personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos do

ser humano e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a

compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em

prol da manutenção da paz. (ONU, 1948).

A instrução é o termo utilizado na Declaração Universal dos Direitos Humanos, e

esta obedece certos critérios para cada etapa. Entende-se que a educação, como a

construção de saberes e, ainda mais com autonomia, era ainda uma realidade com o

potencial a ser desenvolvido.

Por sua vez, a Constituição Federal (1988) determina no Art. 205 que: “A

educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada

com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo

para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”, numa direção clara em

favor de uma educação voltada para a defesa dos Direitos Humanos e a Cidadania.

A educação popular caracterizava-se desde a Primeira República pela instrução

elementar dirigida a toda a população. Era oferecida pelo Estado mediante a constituição

das escolas primárias, que configurava o esforço do país em se alinhar ao movimento

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mundial de implantação dos sistemas nacionais de ensino e ao pensamento liberal, que

defendia educação comum para todos os cidadãos.

Com o florescimento dos movimentos de cultura popular na década de 1960, a

educação dita popular ganha uma nova conotação: aquela que é produzida pelas e para as

classes populares, segundo os seus interesses, consistindo numa crítica à educação que as

elites ofereciam ao povo, a qual não refletia os seus anseios e servia às classes dominantes

como instrumento de manipulação para a manutenção da ordem vigente.

Com a ascendência dos movimentos de educação e cultura popular, Freire se

integrou ativamente a estes movimentos, delineando uma pedagogia própria para os

objetivos enunciados. Tentando atender às necessidades pedagógicas de educação com o

povo, desenvolveu seu método de alfabetização, com o qual pretendia conscientizar as

massas sobre os problemas da realidade brasileira para que estas se tornassem participantes

no delineamento dos rumos da nação.

Freire, atento às necessidades de seu tempo e engajado na resolução de seus

problemas, se envolveu com as questões centrais a que a intelectualidade brasileira se

dedicava no período em estudo como, por exemplo, instituir a democracia e promover o

desenvolvimento econômico autônomo do país.

Para os educadores e intelectuais vinculados ao Movimento em Defesa da Escola

Pública e aos Movimentos de Educação e Cultura Popular, a questão que se enfatizava era

justamente a de que a educação era o motor propício para as transformações necessárias,

porém restava a discussão sobre qual educação e quais métodos poderiam satisfazer as

necessidades postas.

No início do século XXI, com o estabelecimento dos acordos internacionais de

Direitos Humanos incorporados ao ordenamento jurídico, o incremento da sensibilidade e

do conhecimento sobre os assuntos globais por parte dos cidadãos e a consolidação do

modelo democrático de governo do país, a sociedade brasileira adquiriu mais mecanismos

de participação popular e meios de reivindicar a defesa de seus direitos. Porém, ao mesmo

tempo, é questionável tal participação, pois é possível observar um certo esvaziamento do

envolvimento da população nos espaços públicos e, por vezes, intervenções

desqualificadas da comunidade nas instâncias de debate e deliberação das políticas

públicas. Esses fatores aumentam a vulnerabilidade desses mecanismos de participação

popular que ficam à mercê dos sistemas de manipulação dos interesses políticos e

econômicos da elite.

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Atualmente, com o aumento da crise, a população brasileira enfrenta as

consequências do desemprego e a insegurança frente às mudanças das leis trabalhista e

educacional. Embora exista o esvaziamento de grupos comprometidos com as mudanças

sociais, ainda são significativos os projetos de ação cidadã a nível popular.

A escola, como instituição formal, e os movimentos sociais de luta, são meios

significativos para a formação de cidadãos conscientes e críticos com relação ao seu papel

enquanto sujeitos de direitos e deveres, assim como a permanente afirmação de seu

compromisso humano como agentes de transformação social. Eles se apresentam como

espaços privilegiados para a discussão democrática e a afirmação desses valores, bem

como instâncias sociais para a construção de valores éticos e a formação da cidadania

individual e coletiva.

3 A EDUCAÇÃO POPULAR POR MEIO DO CEFURIA, UMA CONSTRUÇÃO DE

SABERES

O Centro de Formação Urbano e Rural Irmã Araújo (CEFURIA),4 nasce em agosto

de 1981, no contexto do fim da ditadura militar, quando movimentos populares e sindicais

viviam uma retomada da organização e das lutas por mais direitos humanos, sociais e

políticos. As Comunidades Eclesiais de Base (CEBs)5 - foram fundamentais na formação

da consciência crítica de muitas lideranças que, ao fazerem a "opção preferencial pelos

pobres", assumiram com todas as consequências os espaços da periferia, as comunidades

empobrecidas, as ocupações irregulares para morar e viver de forma simples ao lado do

povo trabalhador.

Nos anos 70, várias lideranças cristãs de Curitiba foram morar nos bairros

periféricos, especialmente na região sul da cidade - Boqueirão, Pinheirinho, Xaxim, Sitio

Cercado - dando início a novas formas de organização popular, as quais foram se

adaptando às necessidades emergentes nas décadas seguintes.

4Com a intenção de contribuir para a memória e a divulgação das lutas populares do Estado, o CEFURIA

mantém o Centro de Documentação e Biblioteca Popular Mara Vallauri - CEDOC, espaço de pesquisa aberto

ao público em geral, com foco em publicações ligadas aos Movimentos Sociais, Educação Popular e

Socioeconomia Popular Solidária. Junto ao CEDOC está a Videoteca Popular, com mais de 700 títulos que

abordam diferentes áreas temáticas.

5Comunidades Eclesiais de Base. Formada por integrantes da Igreja Católica, com o objetivo de unir fé e

política. Tem seu embasamento na Teologia da Libertação e as pessoas têm uma consciência de que as

mudanças socioeconômicas e políticas são possíveis se essa unção for feita com ética e respeito.

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Com o trabalho de base a Igreja estaria não só preparando o povo como

força viva nos movimentos, mas, sobretudo, conferindo a ele o processo

de tomada de decisões - de baixo para cima - inaugurando uma nova fase

no caráter dos movimentos sociais, caracterizado basicamente, pela

democracia interna e pela autonomia e independência em relação ao

Estado e aos partidos e organizações políticas (DOIMO, 1984, p. 35).

A criação do Centro de Formação partiu de integrantes de pastorais sociais,

militantes políticos e líderes comunitários. O CEFURIA carrega no nome uma homenagem

à Irmã Araújo (1920-1975), uma religiosa da Congregação FILHAS DA CARIDADE DE

SÃO VICENTE DE PAULO, mulher guerreira, destemida, lutadora junto com o povo,

buscou a libertação dos oprimidos, contra as injustiças e a repressão militar, que dedicou a

vida à organização da população empobrecida na Região Sul de Curitiba, mais

especificamente, no Boqueirão.

Entre os principais objetivos do CEFURIA estão: - organizar e fortalecer grupos

auto gestionários de economia popular solidária, visando à construção de um projeto

econômico. - fortalecer a comunicação popular, aliada à formação crítica sobre os grandes

meios de comunicação e à luta pela democratização da mídia; - e promover espaços de

articulação entre as organizações do campo e da cidade, impulsionando a luta pela

soberania alimentar e processos organizativos na periferia da grande Curitiba. A criação do

Centro de Formação partiu da organização popular, de integrantes de pastorais sociais,

militantes políticos e líderes comunitários.

O Centro de Formação Urbano e Rural Irmã Araujo (CEFURIA) conta com

um grupo de Educadores Populares. São pessoas comprometidas profissionalmente e com

sensibilidade socializam os conhecimentos no intuito de que os mesmos façam a diferença

na vida das pessoas, sobretudo, daquelas que participam dos espaços de construção dos

saberes e que têm como embasamento a própria realidade.

A chamada "Escolinha de Economia Solidária" é uma organização do CEFURIA.

Os educadores são itinerantes e trabalham diversos temas, como: a História Social do

Trabalho, os Movimentos Sociais, a Construção da Cidadania, a Economia Popular

Solidária e os temas emergenciais da sociedade atual. Os cursos têm por objetivo: ampliar

o coletivo de educadores em Economia Popular Solidária para cooperar no trabalho de

acompanhamento nos diversos empreendimentos, tais como, clubes de troca, padarias

comunitárias, catadores de materiais recicláveis e outras iniciativas de trabalho e renda

onde se desenvolvam valores não capitalistas. Ela possibilita aos integrantes do coletivo de

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educadores e animadores os instrumentos teórico-metodológicos, tendo como referência o

pensamento de Paulo Freire. Procuram resgatar o trabalho como construtor da vida

humana, desvelando o emprego como uma das formas sociais historicamente possíveis,

embora não a única.

É nesse cenário voltado para a educação em direitos humanos, que se fortalece a

ideia de que o caminho está sendo construído pelos atores do processo educacional. As

transformações históricas decorrentes são marcadas a partir dos movimentos

emancipatórios organizados pela sociedade civil, que de forma consciente procura

trabalhar pelas mudanças com atuações voltadas no resgate da dignidade humana junto aos

grupos vulneráveis e a promoção de comunidades as quais, por sua própria iniciativa, se

organizam para a melhoria de suas condições de vida e renovação de suas tradições

culturais e para a preservação do meio ambiente.

Luis Pequeno, educador popular e coordenador do projeto "Coopera Rua", em

novembro 2016, relata a seguinte experiência como educador.

A Igreja Anglicana da Av. Sete de Setembro, apoiadora da Economia

Solidária, abriu suas portas para o primeiro encontro dos(as) participantes

das oficinas técnicas em economia solidária, direcionadas ao público com

trajetória em situação de rua. O objetivo do encontro foi conhecer os(as)

interessados(as) nas oficinas, que terão início no Projeto. O encontro

reuniu cerca de 40 pessoas, entre profissionais de variadas formações, educadoras(es) e a pessoas em situação de rua que já participam do

mapeamento, rodas de conversa, seminário, ou do curso de agentes de

desenvolvimento social do projeto Coopera Rua, realizado pelo

Cefuria.Pessoas que se inscreveram para as Oficinas de Panificação

Básica e Cosméticos Naturais puderam trocar ideias e compromissos

sobre boas práticas de higiene e manipulação de alimentos e preparos

naturais, sob coordenação da nutricionista Teresa Cristina Frigo.

(PEQUENO, 2016).

Segundo os educadores e organizadores do CEFURIA, o projeto Coopera Rua é

resultado do convênio (811901/2014), está chegando ao fim este contrato que foi firmado

entre o CEFURIA e a Secretaria Nacional de Economia Solidaria, órgão vinculado ao

Ministério do Trabalho e Emprego. Com a atual conjuntura brasileira fica o desafio. Como

continuar sem o apoio dos órgãos federais, estaduais e municipais?

Outro espaço de atuação dos educadores populares é junto aos diferentes

empreendimentos da Economia Solidária, a qual ressurge então como uma alternativa de

buscar nova mentalidade na produção de bens, serviços e conhecimentos que vai gerando

um novo caminho favorecendo a autonomia e a inclusão. Incipiente como Política Pública,

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porém com garra suficiente para manter a organização e o controle social para a efetivação

de direitos.

Esses educadores populares que conformam a equipe do CEFURIA, são agentes de

transformação, junto com as trabalhadoras e trabalhadores da Associação das Padarias e

Cozinhas Comunitárias "Rede Fermento na Massa”6. As padarias estão organizadas em

cinco Territórios7 e um Conselho Gestor

8, formados por representantes dos

empreendimentos que participam mensalmente de reuniões. E nos Territórios é onde os

grupos recebem formação voltada para a construção da cidadania, são ofertados cursos

técnicos, trocas de experiências e ainda participam em feiras de economia solidária, bem

como dos acontecimentos que envolvem os vários setores da sociedade, assim como as

mobilizações: "Grito dos Excluídos", "Romaria da Terra", "Fórum da Democracia", etc.

Consoante Freire (1980, p. 106), ninguém liberta ninguém, mas ninguém se liberta

sozinho; os seres humanos se libertam em comunhão. Com esta afirmação compreende-se

que a autonomia tem um sentido sócio-político-pedagógico, cabendo à educação formar o

ser humano consciente e crítico capaz de transformar as estruturas opressoras e alienantes,

mudando as condições concretas de heteronomia. A autonomia se dá a partir da práxis que

leva à libertação e amadurece no confronto com outras liberdades, na defesa de seus

direitos em face da autoridade dos pais, do professor, do Estado. Por isso,

no momento em que a indignação toma forma, (ela) nos contagia como

maneira de colocar os nossos direitos e deveres em prática tornando-nos seres libertos e aptos a emancipar. Então podemos afirmar que mudar é

possível e que os seres humanos não são puros expectadores, mas atores

também da própria história (FREIRE, 2001, p. 53).

6 A Associação é um grupo de pessoas organizadas que está sendo fortalecida desde 2007, quando foi

pensada a partir das necessidades para a melhor organização das Padarias Comunitárias e de poder contar

com os benefícios de uma entidade formal.

7 Os territórios são organizados conforme a proximidade geográfica, a facilidade de locomoção ou dias livres da semana. Os encontros são mensais, com o objetivo de aprofundar a formação prática em temas como:

comunicação, sustentabilidade, gestão compartilhada e adequação às normas sanitárias. Os Territórios

também têm se fortalecido como espaço de aproximação e articulação, além de contribuir para o avanço na

formação de lideranças comunitárias.

8 O Conselho Gestor da Associação das Padarias e Cozinhas Comunitárias Rede Fermento na Massa é um

grupo de pessoas representantes das Padarias, entre essas pessoas, 90% são as mulheres. Eles se reúnem

mensalmente para conversarem sobre os rumos da Rede e, entre as pautas está a avaliação do planejamento,

a organização das formações técnicas, as dificuldades que cada grupo enfrenta, sejam as desistências ou

novos integrantes que assumem, trocas de experiências e o fortalecimento com novas perspectivas.

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A emancipação na ótica de Paulo Freire é entendida como um processo de

libertação. Esse passa pelo apropriar-se e experimentar o poder de pronunciar no mundo a

vivência da condição humana, de ser protagonista de sua história.

Ao analisar a participação das mulheres no espaço da Economia Popular Solidária,

é perceptível que especializar-se nessa tarefa de fazer o pão, criar novidades na produção e

na comercialização não é suficiente. É preciso fomentar o seu protagonismo, o que envolve

a autonomia e, sobretudo, a educação. Na compreensão de Freire (2001), ninguém é

autônomo primeiro, para depois decidir. A autonomia vai se construindo na experiência

mediante as várias decisões que vão sendo tomadas, e essas decisões implicam num

esclarecimento que é obtido através da educação.

As ideias de Paulo Freire ajudam também na compreensão da emancipação

feminina no processo histórico da realidade brasileira, sabendo o quanto as mulheres

batalharam para terem direito à educação. A organização delas em torno de seus direitos

não foi e não é um processo linear e sim um processo de lutas com muitas conquistas e

significativos desafios, nem sempre reconhecidos pela sociedade e até mesmo pelas

próprias mulheres.

A partir das informações, constatou-se que os saberes construídos em diferentes

espaços carregam o compromisso com a efetivação dos direitos humanos e, a consciência

de que esses direitos passam obrigatoriamente pela educação. Saberes, sobretudo,

baseados na dimensão pedagógica-crítica-social, uma vez que são formas diferenciadas de

organização do ensino-aprendizagem e se orientam pelo princípio da autonomia e na troca

de conhecimentos.

As experiências solidárias vão se ampliando de diferentes formas no combate à

exclusão social, na medida em que estruturam a democratização da gestão do trabalho,

valorizam as relações humanas e potencializam o desenvolvimento local integrado

sustentável. Os espaços de participação das mulheres envolve não só o trabalho que as

ajuda na superação das dificuldades econômicas, do desemprego, mas são sobretudo,

espaços onde está sendo gerada uma vida pautada na solidariedade, na cooperação, na

consciência crítica do seu modo de ser mulher.

A consciência de que é possível mudar as relações de submissão repercute no grupo

familiar, dinamiza o trabalho solidário e contribui para a sociedade em geral e, portanto, se

entende que a educação é garantia de emancipação. Entretanto, a emancipação não está

centrada apenas nas atividades práticas à medida que ela se amplia nas relações de

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autonomia e empoderamento do seu ser humano mulher, frente às relações de

desigualdade, como nos espaços das padarias onde são geradas capacidades de autogestão

e autoconfiança.

É possível assegurar que a Economia Solidária considera as relações de trabalho

mais igualitárias e que humaniza o ser na sua totalidade. Singer entende que é uma

alternativa a desenvolver-se sempre em oposição à lógica do capital, pois ela

condena no capitalismo, antes de tudo, a ditadura do capital na empresa, o

poder ilimitado que o direito de propriedade proporciona ao dono dos

meios de produção: todos os que trabalham na empresa só podem fazê-lo

por ato de vontade do capitalista, que pode demitir qualquer um tão logo a

sua vontade mude (SINGER, 2003, p.59).

Embora, Singer defenda que a Economia Popular Solidária seja uma alternativa ao

capitalismo, ao mesmo tempo alerta que se tal modo de produzir for apenas uma resposta

às contradições do sistema - como uma reação à falta de empregos -, seu crescimento

estaria condicionado ao sistema atual e fadado à ruína, uma vez que não passaria apenas de

uma forma complementar da economia capitalista.

Diante dessa advertência, as várias formas de empreendimentos com o perfil

comum da Economia Popular Solidária têm buscado o maior fortalecimento possível para

as novas relações de produção e distribuição dos produtos e serviços através da

organização de redes. É um posicionar-se contra a exploração dos trabalhadores e das

trabalhadoras. Euclides Mance acentua que a rede de empreendimentos, por sua vez,

integra grupos de consumidores, de produtores e de prestadores de serviço

em uma mesma organização. Todos se propõem a praticar o consumo

solidário, isto é, comprar produtos e serviços da própria rede para garantir

trabalho e renda aos seus membros e para preservar o meio ambiente. Por

outro lado, uma parte do excedente obtido pelos produtores e prestadores

de serviços com a venda de seus produtos é reinvestida na própria rede

para gerar mais cooperativas, grupos de produção e microempresas, a fim

de criar postos de trabalho e aumentar a oferta solidária dos produtos e

serviços. Isso permite incrementar o consumo de todos, ao mesmo tempo

em que diminui o volume e o número de itens que a rede ainda compra no mercado capitalista, evitando com isso que a riqueza produzida na rede

seja acumulada pelos capitalistas. O objetivo da rede é produzir tudo o

que as pessoas necessitam para realizar o bem viver de cada um, de

maneira ecológica e socialmente sustentável. (MANCE, 2003, p.81-82).

Essa relação de trabalho em redes acontece em muitos setores da sociedade

capitalista. Como a Economia Popular Solidária não pode ainda se caracterizar como um

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modo de produção paralelo ao modo vigente, os empreendimentos da Rede Solidária têm

características próprias e muitos são os debates e tentativas de atingir o nível de verdadeira

alternativa ao capitalismo e, não simplesmente, uma alternativa dentro do atual sistema.

Isso só será possível, se alcançar "níveis de eficiência na produção e distribuição de

mercadorias comparáveis aos da economia capitalista e de outros modos de produção,

mediante o apoio de serviços financeiros e científico-tecnológicos" (SINGER, 2002, p.

121). Muitos afirmam que é apenas uma utopia pensar a organização da Economia Popular

Solidária como uma organização que superará o modelo vigente.

Embora, possa ser visto como utopia, já se percebe o desenvolvimento significativo

de uma mentalidade que valoriza uma economia diferente do capitalismo. Essa consciência

baseada na lógica da valorização do ser humano e no respeito ao ambiente natural, à terra e

o que dela tiramos para o nosso alimento está, de alguma forma, presente na defesa de

Direitos, como o de associação.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A educação em direitos humanos e inclusão pode acontecer em diferentes espaços

de participação nos quais as pessoas sensíveis e indignadas com as violações de direitos se

dispõem a juntos lutar por uma sociedade melhor. Exemplo disso estão as mulheres que

enfrentam juntas as dificuldades cotidianas, e na cooperação, encontram alternativas no

trabalho solidário que as ajuda na superação das dificuldades econômicas frente ao

desemprego;e sobretudo, elas encontram espaços onde geram uma vida pautada na

dignidade e na consciência crítica do seu ser mulher, com autonomia.

A consciência de que é possível mudar as relações de submissão repercute no grupo

familiar, dinamiza o trabalho solidário e contribui para a sociedade em geral e, portanto, se

entende que a educação é garantia de saber e de empoderamento, no sentido de

fortalecimento para a emancipação, embora esta não esteja centrada apenas nas atividades

práticas. Na verdade, ela se amplia nas relações de autonomia do seu ser humano mulher

diante das relações de desigualdade. Nessa trajetória de superação,as padarias também são

espaços onde elas vão gerando novos saberes, autogestão, autoconfiança e inclusão.

Quem, melhor que os oprimidos, se encontrará preparado para entender o

significado terrível de uma sociedade opressora? Quem sentirá, melhor

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que eles, os efeitos da opressão? Quem, mais que eles, para ir

compreendendo a necessidade da libertação? Libertação a que não

chegarão pelo acaso, mas pela práxis de sua busca; pelo conhecimento e

reconhecimento da necessidade de lutar por ela. Luta que, pela finalidade

que lhe derem os oprimidos, será um ato de amor, com o qual se oporão

ao desamor contido na violência dos opressores, até mesmo quando esta

se revista da falsa generosidade referida (FREIRE, 1987, p. 17).

As estratégias pedagógicas participativas devem ser pensadas a partir da adesão de

todos no processo educacional e devem ser uma construção coletiva que favoreça a

educação em Direitos Humanos.No entanto, persiste no contexto da realidade brasileira a

predominância de uma educação desprovida de criticidade. Educação deficitária em muitos

quesitos e sua repercussão na construção de uma sociedade onde as desigualdades sejam

tratadas quase como naturalizadas. Efeito disso é a justificação das acentuadas

desigualdades geradoras de violências. Desta constatação, podemos dizer que a produção

de saberes que propiciem a autonomia de agentes normalmente excluídos dos processos

socioeconômicos ou permanecem à sua margem continua a ser um desafio para a

efetivação dos direitos humanos.

5 REFERÊNCIAS

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como direito de todos. Capítulo III da educação, da cultura e do desporto - seção I da

educação. Art. 205: 1988.

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1994.

________, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 41ª

ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996, 1997, 2001.

MANCE, Euclides André. (org.). Como Organizar Redes Solidárias. Rio de Janeiro,

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SINGER, Paul. A Economia Solidária no Brasil: a autogestão como resposta ao

desemprego . 2.ed. São Paulo: Contexto, 2003.

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