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Universidade Federal da Bahia Escola de Medicina Veterinria Programa de Ps-Graduao em Cincia Animal nos Trpicos

USO DO MEDICAMENTO HOMEOPTICO SULPHUR NO CONTROLE DO Amyloodinium sp. EM BIJUPIR (Rachycentron canadum Linnaeus, 1766)

Bartira Guerra Santos

Salvador 2011 BARTIRA GUERRA SANTOS

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USO DO MEDICAMENTO HOMEOPTICO SULPHUR NO CONTROLE DO Amyloodinium sp. Brown (1931) em bijupir (Rachycentron canadum Linnaeus, 1766)

Dissertao apresentada Escola de Medicina Veterinria da Universidade Federal da Bahia, como requisito para a obteno do ttulo de Mestre em Cincia Animal nos Trpicos, na rea de Sade Animal.

Orientador: Prof Dr. Ricardo Castelo Branco Albinati

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Co-Orientadora: Prof Dr Fernanda Washington de Mendona Lima.

Salvador 2011

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Sistema de Bibliotecas da UFBA Santos, Bartira Guerra. Uso do medicamento homeoptico Sulphur no controle do Amyloodinium sp Brown (1931) em bijupir (Rachycentron canadum Linnaeus, 1766) / Bartira Guerra Santos. - 2011. 101 f. : il. Orientador: Prof. Dr. Ricardo Castelo Branco Albinati. Co-Orientadora: Prof. Dr. Fernanda Washington de Mendona Lima. Dissertao (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Escola de Medicina Veterinria, Salvador, 2011.

1. Peixe - Parasito. 2. Amyloodiniose. 3. Parasito. 4. Aqicultura. 5. Cobia (Peixe). 6. Homeopatia. I. Albinati, Ricardo Castelo Branco. II. Lima, Fernanda Washington de Mendona. III. Universidade Federal da Bahia. Escola de Medicina Veterinria. IV. Ttulo.

CDD - 597 CDU - 597

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A Dudu e Boni.

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AGRADECIMENTOS

Os agradecimentos constituem-se como um momento de reflexo muito especial que, a despeito de qualquer vestgio de pieguice, permitem que se faa reverncia s atitudes das pessoas que nos cercam ao longo da escritura de uma dissertao. E eu, como todos que chegam concluso de um experimento do porte do que foi empreendido ao longo desses dois anos, tive muito com quem contar. Por conta dos momentos em que estivemos juntos, muito mais que em minha casa, por determinado perodo, tenho muito a agradecer ao grupo LASOA, especialmente Tati Maslowa pela ateno e o trabalho prestado a esse estudo em todo seu curso, e amizade que pode ser firmada nesse perodo, que incluiu debates em algumas mesas de bar, na companhia de Deni Soledade, que tambm participou de vrias etapas desse projeto e principalmente pelo seu papel na assessoria social. A dedicao incondicional, em todas as fases do projeto, de Sil Medeiros foi fundamental para a pesquisa (teve at choro!), valeu Sil. Jaci Carvalho, agradeo pela sua contribuio durante o experimento e pelas sugestes feitas para o melhor andamento da pesquisa. Al Danile deu sangue na contagem das clulas sanguneas. Tai Almeida trabalhou duro na fase experimental e anlise, Rafa ajudou durante o experimento. Com uma turma dessa no foi difcil acreditar que daria certo. Aos professores, agradeo primeiro ao Prof. Dr. Albinati, para alm da orientao, agradeo pela amizade, pela confiana e pela iniciao naquela que, segundo Hahnemann, a nica e maior forma de curar. Profa. Dra. Fernanda Lima, que foi a primeira pessoa a dizer que eu deveria fazer mestrado, que tinha alguma coisa de mestre e tal... e vejam s, eu acreditei!! Ao Prof. Dr. Eduardo Moreira, sou imensamente grata pelo entusiasmo. No dia em que encontramos o parasito, ele disse: Bartira, hoje ganhei meu dia. Saiba que ao longo desse perodo ganhou tambm o meu respeito e a minha admirao. professora Consulo Ayres pela colaborao para a realizao das anlises hematolgicas. Aos professores do Mestrado em Cincia Animal nos Trpicos UFBA e aos professores do Curso de Especializao em Homeopatia, Maria Amlia Soares da Cunha, Vicente Dias e Zacharias Farouk. A minha gratido estende-se ainda aos tcnicos Althemar e Eva do Laboratrio de Anatomia Patolgica pelo cuidadoso trabalho na confeco do material para anlise histopatolgica; Capes pelo incentivo pesquisa; Bahia Pesca pelo fornecimento dos peixes, especialmente a Tom Tosta e a Jernimo Filho, pela liberao dos mesmos.

Agradeo Cris Farias, pois seu peculiar olhar de guia, sempre perscrutador dos implcitos e explcitos de um texto, deu forma a esse trabalho. Por fim, quero agradecer ao Grupo Guerra, esse to grande e grandioso que no cabe em toda extenso desse trabalho. Vocs so mola mestra para os meus avanos.

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A mais alta e nica misso do mdico restabelecer a sade nos doentes, que o que se chama curar.

Samuel Hahnemann

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RESUMOO confinamento dos peixes em altas densidades favorece o aparecimento de epizootias como consequncia do estresse fisiolgico que se reflete na sua homeostasia, ocasionando diminuio da capacidade de resposta imunolgica. As espcies de parasitos que atualmente so consideradas problemas para a sade dos peixes no ambiente marinho so em nmero reduzido, entretanto, considerando o aumento da atividade de cultivos em ambientes marinhos no mundo, esses parasitas despontam como responsveis por danos nos cultivos. Dentre os parasitos, est o Amyloodinium, um dinoflagelado, ectoparasito obrigatrio de peixe que se aloja, inicialmente, nas brnquias, mas, logo em seguida, se instala rapidamente por toda a superfcie do peixe. A amyloodiniose representa uma das principais restries ao desenvolvimento da aquicultura marinha e os tratamentos qumicos tm se mostrado insuficientes para o controle do Amyloodinium nas espcies afetadas. O sulfato de cobre o produto mais usado no controle do parasito. Contudo, essa substncia apresenta efeito fortemente adstringente sobre epitlio branquial alm de ser hepatotxico. um produto que agride o meio ambiente, requerendo muitos cuidados com sua aplicao e no existe, at o momento, conhecimento que garanta segurana quanto aos resultados e eficincia na reduo da infestao. A Homeopatia, concebida como um modelo teraputico baseado na similitude dos sintomas e nos medicamentos diludos, desponta como uma prtica no tratamento e preveno de doenas em peixes que atende aos requisitos de uma aquicultura sustentvel. Assim, constitui-se numa alternativa a ser avaliada no tratamento de animais aquticos, uma vez que tais medicamentos, por serem ultradiludos no causam danos aos peixes e nem ao meio ambiente. Assim, esta pesquisa tem o objetivo de avaliar o Sulphur no controle da amyloodiniose em bijupir, considerando sua eficcia em relao ao desempenho zootcnico, as alteraes parasitolgicas, aos parmetros hematolgicos e as alteraes histopatolgicas dos animais. No experimento 1 desse trabalho foram descritas as principais alteraes e os sintomas desencadeados pelo Amyloodinium, atravs das avaliaes da prevalncia e da intensidade mdia parasitrias, dos parmetros hematolgicos e histopatolgicos em juvenis de bijupir naturalmente infectados. No experimento 2 testou-se o efeito do medicamento Sulphur sobre o desempenho, o ndice hepato-somtico, a prevalncia e incidncia parasitrias, os parmetros hematolgicos e as alteraes histopatolgicas de juvenis de bijupir naturalmente infestados com Amyloodinium.

PALAVRAS-CHAVES: Amyloodiniose; Aquicultura; Cobia; Homeopatia; Parasito.

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ABSTRACT

The confinement of fish at higher densities encouraged the emergence of epidemics as a result of physiological stress that is reflected in its homeostasis, causing impairment of immune response. The parasite species that are currently considered problems for the health of fish in the marine environment are few in number, however, considering the increased activity of aquaculture in marine environments in the world, these parasites appear as responsible for damage to crops. Among the parasites, is the Amyloodinium, a dinoflagellate, obligatory ectoparasite of fish that lodges itself initially in the gills, but right then settles quickly across the surface of the fish. The amyloodiniose represents a major constraint on the development of marine aquaculture and chemical treatments have proven insufficient to control the Amyloodinium the affected species. Copper sulfate is the most used in the control of parasito.However, this substance has strong astringent effect on the gill epithelium in addition to being hepatotoxic. This a product is harmful to the environment, requiring much care with your application and there is still no the time, aware that ensures security for the outcome and efficiency in reducing the infestation. Homeopathy, conceived as a therapeutic model based on similarity of symptoms and medications diluted, emerges as a practice in the treatment and prevention of fish diseases that meets the requirements of sustainable aquaculture. Thus, it constitutes an alternative to be evaluated in the treatment of aquatic animals, such as medications, being ultradiluted do not cause damage to fish and not the environment. Thus, this research aims to evaluate the control of Sulphur in amyloodiniose bijupir, considering its effectiveness in relation to animal performance, changes parasitological, haematological parameters and histopathological changes of the animals. In experiment 1 of this work, were described the main changes and the symptoms triggered by Amyloodinium through assessments of the prevalence and mean intensity of parasitic diseases, haematological parameters and histopathology in juvenile bijupir naturally infected. In Experiment 2 tested the effect of the medication Sulphur on performance, the hepatosomatic index, prevalence and incidence of parasitic diseases, haematological parameters and histopathological changes in the juvenile bijupir naturally infested with Amyloodinium. KEYWORDS: Amyloodiniose; Aquaculture; Cobia; Homeopathy; Parasite.

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LISTA DE TABELAS

ARTIGO 1

Tabela 1. Intensidade mdia parasitaria valor mnimo e mximo e desvio padro do nmero de parasitos nas brnquias e no muco de bijupir.....................................................................57 Tabela 2. Valores de VG, Eritrcitos, VGM e PPT de juvenis de bijupir parasitados por Amyloodinium sp.......................................................................................................................58 Tabela 3. Resultados de leuccitos e trombcitos totais dos juvenis de bijupir parasitados com Amyloodinium...................................................................................................................59 Tabela 4. Valores mdios de alterao histopatolgica (VMA) e seu significado (entre parntese) para as leses em brnquias de juvenis de bijupirs coletados de unidade de aquicultura.................................................................................................................................61 ARTIGO 2 Tabela 1. Valores mdios e desvio-padro de salinidade, Oxignio dissolvido, pH, temperatura pela manh e tarde da gua de manuteno dos peixes parasitados, tratados com homeopatia ou sem....................................................................................................................81 Tabela 2. Sobrevivncia, biomassa final, peso mdio final, ganho de peso mdio e ganho de peso dirio dos juvenis de bijupir submetidos ao ensaio experimental com e sem medicao homeoptica.............................................................................................................................82 Tabela 3. Consumo alimentar mdio, converso alimentar aparente e ndice hepato-somtico dos juvenis de bijupir submetidos ao ensaio experimental com e sem medicao homeoptica..............................................................................................................................82 Tabela 4. Numero mdio de Amyllodinium sp nas brnquias e no muco tegumentar de juvenis de bijupirs submetidos ao ensaio experimental com e sem medicao homeoptica, comparado com o numero inicial observado nos animais capturados para o estudo........................................................................................................................................83 Tabela 5. Prevalncia e intensidade parasitria mdia de juvenis de bijupirs submetidos ao ensaio experimental com e sem medicao homeoptica, comparado com os valores observados nos animais capturados para o estudo....................................................................84 Tabela 6. Eritrcitos,VG, VGM, Hb, CHGM, PPT de juvenis de bijupir submetidos ao ensaio experimental com e sem medicao homeoptica, comparado com os valores observados nos animais capturados para o estudo inicial.........................................................84 Tabela 7. Valores mdios de Leuccitos e trombcitos totais de juvenis de bijupirs submetidos ao ensaio experimental com e sem medicao homeoptica, comparado com os valores observados nos animais capturados para o estudo inicial............................................85

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Tabela 8. Valores VMA e seu significado (entre parnteses) para hiperplasia/hipertrofia, fuso, descolamento e ruptura de epitlio lamelar, necrose, dilatao, aneurisma, infiltrado, parasito desarranjo lamelar em brnquias de bijupirs do ensaio experimental com e sem medicao homeoptica, comparado com os valores observados nos animais capturados para o estudo.....................................................................................................................................87 Tabela 9. ndices de Alterao Histopatolgica (IAH) de brnquias de juvenis de bijupirs submetidos ao ensaio experimental com e sem medicao homeoptica, comparado com o observado nos animais capturados para o estudo......................................................................88

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Ciclo biolgico do Amyloodimium ocellatum. A = trofonte, B, C e D = tomontes, E = dinosporo. Figura adaptada de Ramos e Oliveira (2001)......................................................27

ARTIGO 1Figura 1. Brnquias de jubenis de bijupir. Trofontes em exame a fresco observados em estereomicroscpio (2X)...........................................................................................................57 Figura 2. Seces de brnquias de bijupirs infestados com Amyloodinium. (A) hiperplasia e fuso de lamelas (1000X. HE); (B) hiperplasia e fuso focal disseminada (40X.HE); (C) fuso lamelar apical (1000X. HE); (D) descolamento do epitlio respiratrio (1000X. HE); (E) dilatao do seio venoso (1000X. HE); (F) aneurisma (40X. HE)............................................................................................................................................63 Figura 3. Seces de brnquias de bijupirs infestados com Amyloodinium. (G) congesto, dilatao do canal venoso, descolamento e ruptura do epitlio com hemorragia (1000X. HE); (H) rompimento do epitlio sem hemorragia (seta amarela) e infiltrado linfoctico (seta vermelha) (1000X.HE);(I) acmulo sanguneo interlamelar com desarranjo lamelar (40X.HE); (J) trofonte entre lamelas, hiperplasia e fuso com leve descolamento (1000X.HE); (K,L) trofontes atracadas a regio apical de lamelas hiperplsicas e fusionadas (1000X.HE)...............................................................................................................................64

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1. Principais espcies de peixes suscetveis e regies de ocorrncia do Amyloodinium ocellatum...................................................................................................................................26 ARTIGO 1 Quadro 1. Pontuao e ocorrncia das alteraes nas brnquias, modificado de Schawiger et al (1997)....................................................................................................................................54 Quadro 2. Categorias de IAH baseada na severidade das leses e funcionamento do rgo (POLEKSIC; MITROVIC-TUTUNDZIC,1994) ....................................................................55 Quadro 3. Classificao das alteraes histopatolgicas das brnquias quanto ao tipo das leses e dos estgios em que se inserem de acordo com Poleksic e Mitrovic-Tutundic (1994)........................................................................................................................................56 ARTIGO 2 Quadro1. Pontuao e ocorrncia das alteraes nas brnquias, modificado de Schawiger et al (1997)....................................................................................................................................79 Quadro 2. Categorias de IAH baseada na severidade das leses e funcionamento do rgo (POLEKSIC; MITROVIC-TUTUNDZIC,1994).....................................................................80 Quadro 3. Classificao das alteraes histopatolgicas das brnquias quanto ao tipo das leses e dos estgios em que se inserem de acordo com Poleksic e Mitrovic-Tutundic (1994).......................................................................................................................................80

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LISTA DE ABREVIATURAS

ANVISA - Agencia Nacional de Vigilncia Sanitria CAA converso alimentar aparente CHGM - concentrao de hemoglobina globular media COBEA - Colgio Brasileiro de Experimentao Animal cm - centmetro ELISA ensaio imunossorvente ligado enzima EMEV Escola de Medicina Veterinria FAO - Organizao das Naes Unidas para Agricultura e Alimentao FDA - Food and Drug Administration fL fentolitro GP- ganho de peso g-grama g/dL grama por decilitro Hb hemoglobinaHE hematoxilina-eosina

HLPs - protenas semelhantes a histonasHOSPMEV Hospital de Medicina Veterinria IAH ndice de alterao histopatolgica IHS ndice hepato-somtico LABAP Laboratrio de Anatomia Patolgica

LASOA - Laboratrio de Sanidade de Organismos Aquticos mL/L mililitro por litro L - microlitro OPG - ovos por grama pH - potencial hidrogeninico SAEG Sistema de Anlises Estatsticas e Genticas UFBA Universidade Federal da Bahia VG - volume globular VGM - volume globular mdio VMA valor mdio de alterao

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SUMRIO

RESUMO ABSTRACT LISTA DE TABELAS LISTA DE FIGURAS LISTA DE QUADROS LISTA DE ABREVIATURAS 1 INTRODUO 2 REVISO DE LITERATURA2.1 Aquicultura 2.1.1 Bijupir Rachycentron canadum 2.2 Amyloodinium ocellatum 2.2.1 Principais hospedeiros e distribuio geogrfica 2.2.2 Ciclo biolgico 2.2.3 Transmisso 2.2.4 Sintomas 2.2.5 Patogenia 2.2.6 Resistncia imunolgica dos peixes ao Amyloodinium ocellatum 2.2.6.1 Imunidade inata 2.2.6.2 Imunidade adquirida 2.2.7 Diagnstico 2.2.8 Profilaxia e Tratamento

VII VIII IXXI XII XIII 16 19 19 21 24 24 27 28 29 29 30 30 31 32 33 35 36 38 39 40 43 45 47

2.3 Homeopatia2.4 Filosofia homeoptica 2.5 Cincia homeoptica 2.6 O medicamento homeoptico 2.7 Homeopatia veterinria 2.8 A homeopatia na aquicultura 2.9 A escolha do medicamento homeoptico

3 ARTIGOS CIENTFICOS

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3.1 Artigo 1: Descrio da amyloodiniose em bijupir (Rachycentron canadum Linnaeus, 1766). 3.2 Artigo 2: O efeito do medicamento homeoptico Sulphur sobre o desempenho zootcnico, alteraes parasitolgicas, parmetros hematolgicos e histopatolgicos em juvenis de bijupir (Rachycentron canadum Linnaeus, 1766) infestados naturalmente com Amyloodinium.

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4 CONSIDERAES FINAIS REFERNCIAS

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1 INTRODUOA aquicultura, atividade amplamente desenvolvida no mundo, uma prtica agropecuria de produo em cativeiro de organismos com habitat predominantemente aqutico, tais como peixes, crustceos, moluscos e plantas aquticas. Segundo dados da FAO (2009), o crescimento da aquicultura tem ocorrido num ritmo mais acelerado que qualquer outro setor de produo de alimentos de origem animal. Parece provvel que a pesca tenha atingido seu potencial mximo de captura nos oceanos, tendendo para uma estabilizao da captura com ndices de crescimento de 1,2% ao ano. Em contrapartida, a aquicultura aumentou sua produo e atinge ndices mdios de crescimento de 8,8% ao ano (FAO, 2009), significando uma possibilidade eficiente para aumentar a oferta de pescado. Nessa perspectiva, a piscicultura marinha tem se desenvolvido muito ultimamente. Tsuzuki (2006) atribui tal fato sua importncia na produo de alimento, na atividade de repovoamento, na produo de isca viva e de peixes ornamentais e, principalmente, aos preos atrativos que seus produtos alcanam no mercado. A FAO (2005) apresenta a China no topo do ranking mundial entre os maiores produtores no ano de 2003 e destaca a Grcia, Espanha, Itlia, Frana, Japo, Egito e Coria como principais produtores de peixes marinhos. Entre as principais espcies cultivados a FAO elenca o salmo do Atlntico (Salmo salar), o peixe-rei (Chano chano), a truta arco-ris (Onchorynchus mykiss), o olhete japons (Seriola quinqueradiata), a tainha (Mugil cephalus) e o pargo europeu (Sparus aurata) como os mais produzidos. Segundo Brandini et al (2000), o potencial da piscicultura marinha brasileira imensurvel, contudo, essa atividade ainda incipientel, com tentativas de desenvolvimento muito pontuais. Pesquisas apontam vrias espcies detentoras de caractersticas importantes para o sucesso. Tsuzuki (2006) destaca o robalo-peva (Centropomus paralellus), o robaloflecha (Centropomus undecimalis), o linguado (Paralichthys orbignyanus), a garoupa (Epinephelus sp) e o olhete (Seriola lanlandi). Diversas espcies de peixes marinhos tm demonstrado condies para criao, em vrios pases ao redor do mundo, por suas caractersticas zootcnicas e em virtude da aceitao pelo mercado consumidor. Dentre as espcies mais cultivadas, destaca-se o bijupir ou cobia (Rachycentron canadum Linnaeus, 1766). Para Benetti et al (2007) e Liao et al (2004), se trata de uma excelente espcie para o cultivo. Aceita bem o alimento artificial;

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apresenta baixa mortalidade e boa taxa de converso alimentar; proporciona excelente aproveitamento para o consumo humano; se adapta facilmente ao ambiente de cativeiro alm de tolerar variaes de qualidade da gua (KILDUFF et al, 2002; LIAO et al, 2004; BENETTI, 2007; HOLT et al, 2007). Pavanelli et al (2000) destacam a piscicultura no Brasil como importante atividade econmica e relaciona seu sucesso diretamente possibilidade de se cultivar o maior estoque possvel de peixes, no menor volume de gua disponvel. Por outro lado, advertem quanto aos riscos relativos ao aparecimento de doenas quando se promove a intensificao dos sistemas. O confinamento dos peixes em altas densidades de estocagem, peculiar ao modelo intensivo de criao, favorece o aparecimento de epizootias que em condies naturais teriam expresso mnima. Altas densidades populacionais provocam nos peixes estresse fisiolgico (estresse crnico) que se reflete na sua homeostasia, ocasionando diminuio da capacidade de resposta imunolgica, ficando susceptveis s infeces de variadas etiologias, destacandose entre elas as parasitias (PAVANELLI et al, 2008). As espcies de parasitos que atualmente so considerados problemas para a sade dos peixes no ambiente marinho so em nmero reduzido, entretanto, considerando o aumento da atividade de cultivos em ambientes marinhos no mundo, esses parasitas despontam, com grande potencial, como causadores de danos nos cultivos. Dentre esses parasitos, est o Amyloodinium, um dinoflagelado, ectoparasito obrigatrio de peixe, como se descrever a seguir, que tem provocado grandes perdas econmicas na piscicultura marinha ao redor do mundo, representando grande entrave ao desenvolvimento da aquicultura marinha (REED FRANCIS-FLOYD, 1994; EIRAS et al, 2006). Trata-se de parasito muito comum em populaes selvagens de ambientes marinhos. No primeiro momento da parasitose, o Amyloodinium invade as brnquias, mas, logo em seguida, se instala rapidamente por toda superfcie do peixe, dando-lhe uma aparncia aveludada (EIRAS, 2006). O controle de surtos de amyloodiniose representa uma das principais restries ao desenvolvimento da aquicultura marinha. No existe produto qumico teraputico registrado como parasiticida na Food and Drug Administration - FDA1 para peixes destinados ao consumo (SMITH; SCHWARZ, 2009). Os tratamentos qumicos tm se mostrado insuficientes para o controle do Amyloodinium nas espcies afetadas pelo parasito. O sulfato de cobre a forma mais usada1

Food and Drug Administration FDA o rgo governamental dos EUA responsvel pelo controle dos alimentos, suplementos alimentares, medicamentos, cosmticos, equipamentos mdicos, materiais biolgicos e produtos derivados do sangue humano.

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nos Estados Unidos (REED; FRANCIS-FLOYD, 1994). Contudo, essa substncia apresenta efeito fortemente adstringente no epitlio branquial e hepatotxico para os peixes (SCOTT, 2000). um produto txico ao meio ambiente, requerendo muitos cuidados com sua aplicao e no existe, at o momento, conhecimento que garanta segurana quanto aos resultados e eficincia na reduo da infestao (REED; FRANCIS-FLOYD, 1994). A grande dificuldade encontrada quando se pretende aplicar tratamento em peixes no Brasil, a escassez de estudos que atestem a eficcia e os mecanismos de ao atravs do quais as drogas utilizadas no controle s enfermidades atuam sobre as funes bioqumicas ou fisiolgicas dos animais (PAVANELLI et al 2008). A Homeopatia, concebida como um modelo teraputico baseado na similitude dos sintomas e nos medicamentos diludos, desponta como uma prtica no tratamento e preveno de doenas em peixes que atende aos requisitos de uma aquicultura sustentvel. Assim, constitui-se numa alternativa a ser avaliada no tratamento de animais aquticos, uma vez que tais medicamentos, por serem ultradiludos, no deixam resduos e, dessa forma, no causam danos aos peixes e nem ao meio ambiente. Diante de tais consideraes, sero expostos, ao longo deste trabalho, os resultados da investigao bibliogrfica e experimental cujo objetivo foi avaliar o Sulphur no controle da amyloodiniose em bijupir, considerando sua eficcia em relao ao desempenho zootcnico, alteraes parasitolgicas, histopatolgicas e parmetros hematolgicos dos animais.

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2 REVISO DE LITERATURA2.1 Aquicultura

A aquicultura uma atividade agropecuria de produo em cativeiro de organismos com habitat predominantemente aqutico, como peixes, crustceos, moluscos e plantas aquticas. Apesar de milenar, trata-se de uma prtica atividade economicamente emergente (BURSZTYN, 2000), e se baseia nos pilares da produo lucrativa, da preservao ambiental e do desenvolvimento social (VALENTI, 2000). Segundo a FAO (2009), o crescimento da aquicultura se faz em um ritmo mais acelerado que qualquer outro setor de produo de alimentos de origem animal. No ano de 2008, das 143 milhes de toneladas de pescado produzidas no mundo, 115 milhes foram destinadas ao consumo humano e os produtos gerados pela aquicultura contriburam com 46% para esse fim. Ao avaliar a situao da pesca mundial, a FAO (2009) - Organizao das Naes Unidas para Agricultura e Alimentao - considera provvel que a pesca tenha atingido seu potencial mximo de captura nos oceanos, tendendo para uma estabilizao da captura em cerca de 90 milhes de toneladas, com ndices de crescimento de 1,2% ao ano. Em contrapartida, a aquicultura aumentou sua produo de 35,5 milhes de toneladas em 2000 para 47 milhes em 2007, crescendo a uma taxa mdia de 8,8% ao ano (FAO, 2009). Essa tendncia o reflexo da diminuio dos recursos pesqueiros marinhos devido pesca predatria, deteriorao de reas essenciais ao desenvolvimento das espcies e, principalmente, presso de captura exercida sobre os estoques (AMARAL; JABLONSKI, 2005). Segundo Dias Neto (2003), o excessivo esforo de pesca aplicado sobre a maioria dos recursos que compem a produo de pescado o fator responsvel pela intensa crise por que passa a pesca marinha brasileira. Assim, a aquicultura significa uma possibilidade eficiente para aumentar a oferta de pescado no mercado mundial. Nessa perspectiva, a piscicultura marinha tem se desenvolvido muito ultimamente. Tsuzuki (2006) atribui tal fato sua importncia na produo de alimento, na atividade de repovoamento, na produo de isca viva e de peixes ornamentais e, principalmente, aos preos atrativos que seus produtos alcanam no mercado. A atividade representa uma alternativa capaz de gerar emprego e renda; incrementar de forma sustentvel a produtividade das reas costeiras; promover a fixao dos produtores em sua comunidade de origem;

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estimular a cadeia produtiva do pescado; diminuir a presso extrativista sobre os recursos explotados (BRANDINI et al, 2000). A piscicultura marinha j uma atividade consolidada, gerando emprego e renda a pequenos, mdios e grandes produtores em diversos pases, como Indonsia, Filipinas, Taiwan, dentre outros (SILVA, 2006). Dados da FAO (2005) apresentam a China no topo do ranking mundial entre os maiores produtores no ano de 2003. Destaca pases como Grcia, Espanha, Itlia, Frana, Japo, Egito e Coria como principais produtores de peixes marinhos. Entre as principais espcies cultivados a FAO elenca, entre os didromos, o salmo do Atlntico (Salmo salar), o peixe-rei (Chano chano) e a truta arco-ris (Onchorynchus mykiss) como sendo os mais cultivados; enquanto que, entre os peixes tipicamente marinhos, destaca o olhete japons (Seriola quinqueradiata) a tainha (Mugil cephalus) e o pargo europeu (Sparus aurata) como os mais produzidos. Para Brandini et al (2000), o potencial da piscicultura marinha brasileira imensurvel frente s condies climticas e hidrogrficas adequadas em grandes extenses do litoral, alm da elevada diversidade de peixes de interesse comercial. Contudo, essa atividade ainda incipiente no Brasil, com tentativas de desenvolvimento muito pontuais. Pesquisas apontam vrias espcies detentoras de caractersticas importantes para o sucesso do cultivo. Tsuzuki (2006) destaca o robalo-peva (Centropomus paralellus), o robalo-flecha (Centropomus undecimalis), o linguado (Paralichthys orbignyanus), a garoupa (Epinephelus sp) e o olhete (Seriola lanlandi). Alm desses recursos, Brandini et al (2000) apontam a produo de peixes ornamentais marinhos como um recurso importante a ser explorado da piscicultura marinha para atender a demanda do mercado da aquariofilia. Vale ressaltar que, embora nem todos os aspectos tecnolgicos da piscicultura marinha estejam to avanados quanto aos da piscicultura de gua doce, essa atividade considerada bastante promissora. Aspectos relativos reproduo e larvicultura ainda se constituem em principais variveis limitantes ao seu desenvolvimento (TSUZUKI, 2006). Ainda so necessrias pesquisas com vistas a melhorar as tcnicas de produo intensiva em cativeiro. Na avaliao de Benetti (1993), alm da carncia dessas pesquisas, o desinteresse por parte do setor privado so fatores responsveis pela falta de produo comercial de peixes marinhos no Brasil. Conforme literatura corrente, dentre as diversas espcies de peixes nativos da costa do Brasil, o bijupir, vem se destacando nos ltimos anos como uma espcie alternativa

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aquicultura mundial. Isso se justifica por sua elevada taxa de crescimento, baixa converso alimentar, tima qualidade de carne, alm de bom valor de mercado.Para ser considerado ideal para o cultivo, o peixe precisa dispor de caractersticas zootcnicas e biolgicas que justifiquem o investimento em pesquisas para conhecimento sobre a espcie e desenvolvimento de tecnologia. Essas caractersticas, de uma maneira geral, esto relacionadas ao ganho de peso, hbito alimentar, adaptao ao alimento artificial, resistncia s doenas, facilidade para produo de ovos e larvas, boa aceitao pelo mercado consumidor e condies econmicas. No Brasil algumas espcies dispem dessas caractersticas e o bijupir aquela que ocupa o primeiro lugar no ranking dessa classificao, seguido pelo robalo (CAVALLI; HAMILTON, p. 55, 2007).

2.1.1 Bijupir (Rachycentron canadum)

O bijupir (Rachycentron canadum, Linnaeus, 1766), tambm conhecido por beijupir, barriga branca, o rei dos peixes ou cao de escamas2 o nico representante da famlia Rachycentridae. Espcie migratria epipelgica, de hbito natatrio ativo, encontra-se amplamente distribudo em guas tropicais e subtropicais de todos os oceanos, entre as latitudes de 32N e 28S, mas ausente na costa leste do Oceano Pacfico (SHAFFER; NAKAMURA, 1989). A aparncia morfolgica externa dessa espcie marcada por um achatamento dorsoventral na regio da cabea, um corpo alongado e subclnico, com a pele recoberta por escamas muito pequenas. Ao longo das laterais do corpo do bijupir distendem-se duas faixas prateadas, contrastando com a colorao marrom-escura do seu corpo e a cor amarelada do seu ventre. O bijupir habita toda a costa brasileira, podendo atingir at 60kg e mais de 2m de comprimento e pode ser encontrado em guas rasas com fundos rochosos ou de recife, assim como em esturios e baas (FIGUEIREDO; MENEZES, 2000). Embora seu formato tenha semelhana com o peixe rmora (Echeneidae), Ditty e Shaw (1992) em estudos sobre morfologia das larvas, indicam uma relao filogentica mais prxima ao peixe dourado (Coryphaenidae). Peixe detentor de timas caractersticas zootcnicas e com rpido crescimento que o coloca na condio de espcie promissora aquicultura. Nessa perspectiva, Arnold et al (2002) asseguram que o bijupir pode crescer numa razo mdia superior a 1mm por dia nas2

O bijupir recebe diversos nomes ao redor do mundo. Nos EUA conhecido por cobia, lemofish, black fingfish, ling, cabio e creab-eater; na Espanha por cabie; na Franca por mafou; no Japo por suji; na Costa Leste da Africa por runner; na Itlia, Austrlia e Paquisto por black kingfish e nas Amricas Central e do Sul conhecido por bacalao, medregal ou esmedregal.

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fases iniciais de desenvolvimento. Esse ganho pode levar o animal a alcanar de 4 a 7kg durante um ano ou de 8 a 10kg por 16 meses, conforme Su et al (2000). Por sua vez, Liao (2003) verificou ganhos de 7kg ao longo do mesmo tempo. Esse ritmo de crescimento empreendido, segundo informam Stevens et al (2004), s custas de uma taxa de converso alimentar prximas a 1,1:1. Alm dessas caractersticas, outras tantas conferem ao bijupir, conforme consideraes de Benetti et al (2007) e Liao et al (2004), o atributo de excelente espcie para o cultivo. Aceita bem o alimento artificial, uma vez que se condiciona com 30 a 40 dias de criao rao (KILDUFF et al, 2002; LIAO et al, 2004); apresenta baixa mortalidade e boa taxa de converso alimentar (BENETTI, 2007); proporciona excelente aproveitamento para o consumo humano, visto que 60% podem ser utilizados para esse fim (KILDUFF et al, 2002); se adapta facilmente ao ambiente de cativeiro (HOLT et al, 2007); alm de tolerar variaes de qualidade da gua (KILDUFF et al, 2002). O Brasil apresenta excelentes condies para o desenvolvimento do cultivo de bijupir. Entretanto, essa prtica incipiente, ainda no existindo em escala comercial. A despeito do evidente interesse no cultivo dessa espcie, inclusive com iniciativas do setor privado nos estados da Bahia, Pernambuco e So Paulo, so poucos os estudos cientficos a seu respeito (CAVALLI; HAMILTON, 2007; OSTRENSKY et al, 2008). Quanto ao comportamento alimentar do bijupir, Frankes et al (1996) relataram que indivduos adultos e juvenis so carnvoros e se alimentam preferecialmente de pequenos peixes, crustceos e lulas. Chou et al (2001) os caracterizam como nadadores velozes e predadores agressivos capazes de capturar sua presa em pleno movimento, geralmente se alimentando na coluna dgua. A tima performance de crescimento do bijupir conseguida em ambientes com temperatura da gua entre 22 e 32C (CHANG, 2003). Em condies de temperaturas abaixo de 16C, Liao e Leao (2005), constataram diminuio no crescimento e elevada mortalidade. Quanto salinidade, estudos demonstram que larvas e juvenis so capazes de tolerar uma ampla variao. Nesse sentido, Resley et al (2006) afirmam que o crescimento de bijupirs mantidos em salinidade de 5ppt foi equivalente ou melhor do que dos peixes mantidos em salinidades de 15 e 30ppt. Contrariamente, Chen et al (2007) consideram que a salinidade pode ter um imediato e significante efeito sobre o crescimento de bijupir, ao tempo em que recomenda uma salinidade em torno de 30ppt para o cultivo de juvenis de bijupir. Corroborando esses estudos, Denson et al (2003) reportaram significativa reduo no

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crescimento e sobrevivncia de juvenis de bijupir mantido em salinidade 5 e 15ppt, quando comparados ao crescimento de peixes mantidos a 30ppt. Indicadores econmicos avaliados em estudos desenvolvidos por Sanches et al (2008) demonstraram a viabilidade do cultivo do bijupir em sistema offshore3, consistindo em uma atraente atividade econmica quando se considera o potencial de produo das espcies marinhas. Contudo, esse tipo de sistema no se adapta ao pequeno pescador ou ao cultivo familiar devido aos elevados investimentos exigidos pelo empreendimento para sua implantao e para o custeio da atividade. Luz (2001) adverte que, apesar das vrias caractersticas conferidas s espcies carnvoras, a produo em escala comercial ainda enfrenta dificuldades relacionadas ao alto ndice de canibalismo, dificuldade de alimentao, assim como aos elevados custos requeridos manuteno desses peixes. Este panorama parece indicar que o bijupir, espcie nativa do Brasil - com registros de estatsticas de capturas pouco expressivas, quando comparadas produo de outros peixes - representa uma das espcies com potencial para a aquicultura marinha, tendo em vista ser detentor de diversas caractersticas zootcnicas e mercadolgicas favorveis ao cultivo. Pavanelli et al (2000) destacam a piscicultura no Brasil como importante atividade econmica e relaciona seu sucesso diretamente possibilidade de se cultivar o maior estoque possvel de peixes, no menor volume de gua disponvel. Por outro lado, advertem quanto aos riscos relativos ao aparecimento de doenas quando se promove a intensificao dos sistemas. Estudos demonstram que nos ambiente marinhos poucas so as espcies de parasitos consideradas problemas sade dos peixes. Pavanelli et al (2008) ponderam, entretanto, que, tendo-se em vista o incremento da aquicultura nesses ambientes, esses patgenos podem emergir como promotores de doenas e que o aumento do prevalncia e da intensidade do parasitismo estabelece uma relao direta com as altas densidade de estocagem. O confinamento dos peixes em altas densidades de estocagem, peculiar ao modelo intensivo de criao, favorece o aparecimento de epizootias que em condies naturais teriam expresso mnima. Altas densidades populacionais aliada ao tipo de alimentao, degradao de qualidade da gua, s formas de tratamento e s prticas de manejo, prprias dos modelos intensivos, provocam nos peixes estresse fisiolgico (estresse crnico) que se reflete na sua homeostasia, ocasionando diminuio da capacidade de resposta imunolgica. Consequentemente gera uma menor resistncia s infeces de variadas etiologias que podem3

Sistema offshore so cultivos de organismos aquticos implantados distante da rea costeira, em alto mar.

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provocar grave ameaa ao sucesso da explorao, destacando-se entre elas as parasitrias (PAVANELLI et al, 2008). Alm das questes a respeito dos atributos necessrios indicao de uma espcie piscicultura, importante considerar sua capacidade de resistir s doenas. Para Holt et al (2007), bijupirs so peixes muitos resistente s condies de cativeiro, alimentam-se vorazmente e crescem rapidamente. No entanto, ocasionalmente surgem doenas que precisam ser controladas. Dentre os parasitos causadores de problemas sade de peixes marinhos, o Amyloodinium ocellatum, Brown, 1931, se destaca como o mais importante patgeno que pode trazer srias ameaas aquicultura marinha (PAPERNA, 1980; NOGA et al, 1991; EIRAS et al, 2006). O Amyloodinium ocellatum um dinoflagelado, ectoparasito obrigatrio de peixe, que tem provocado grandes perdas econmicas na piscicultura marinha ao redor do mundo e tem sido um grande entrave ao desenvolvimento da piscicultura destinada ao consumo e da piscicultura marinha ornamental (REED; FRANCIS-FLOYD, 1994; EIRAS et al 2006). Os surtos decorrentes dessa parasitose resultam em altos ndices de morbidade e mortalidade (SINDERMANN, 1990).

2.2 Amyloodinium ocellatum

O Amyloodinium ocellatum, Brown, 1931, um ectoparasito que se destaca como um dos mais importantes patgenos de peixes marinhos de guas tropicais. Dinoflagelado de distribuio cosmopolita (LOM; DYKOV, 1992) agente etiolgico da amyloodiniose ou doena do veludo, com localizao no tegumento ou nas brnquias. Sem especificidade parasitria pode ser responsvel por altos ndices de morbidade e por elevadas taxas de mortalidade em pisciculturas e aqurios pblicos (PAPERNA, 1980; SINDERMANN, 1990; NOGA et al, 1991; EIRAS et al, 2006; PAVANELLI et al, 2008).

2.2.1 Principais hospedeiros e distribuio geogrfica

O Amyloodinium um parasito responsvel por diversos surtos epidmicos na aquicultura ao redor do mundo. A ocorrncia da amyloodiniose no robalo legtimo (Dicentrarchus labrax) foi registrada por Gallet de Saint Aurin (1987) no Mar do Caribe na

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Martinica. Enquanto Ghittino et al (1980), Giavanne (1988) e Paperna (1980) a descreveram na Itlia, Alvarez-Pellitero et al (1993) observaram na Espanha e Paperna et al (1981) relataram sua presena no Mar Vermelho. A ocorrncia desse dinoflagelado foi tambm registrada no dourado (Sparus aurata) por Paperna e Larencin (1979) no Mar mediterrneo e na Frana. Tareen (1986) descreveu surto no Mar Egeu, na Turquia. Paperna (1981) a registrou em Eilat em Israel. Enquanto Rigos (1998) faz referncia em dourado cultivado em gaiolas flutuantes na Grcia. Paperna (1980) fez referncia ao parasito em Tilpia de Moambique (Tilapia mossambicus) no Mar Vermelho em Israel. Aiello e DAlba (1986) referem-se no peixe charuteiro-catarino (Seriola dumenerili) na regio de Siclia na Itlia. Rigos et al (1998) descrevem em sargo-bicudo (Diplodus puntazzo) em gaiolas flutuantes na Grcia Central. No Brasil, em estudos com a espcie de linguado Paralichthys orbignyanus desenvolvidos no departamento Oceanogrfico da Fundao da Universidade Federal do Rio Grande, foram observados recorrentes surtos de amyloodiniose em reprodutores e alevinos mantidos em cativeiro (ABREU et al, 2005). A amyloodiniose tambm foi registrada em muitos outros peixes de cultivo nos Estados Unidos e em outros pases (CARVALHO-VARELA, 2005), conforme sumarizadas no quadro abaixo.

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Quadro 1. Principais espcies de peixes suscetveis e regies de ocorrncia do Amyloodinium ocellatum ESPCIE Robalo legtimo (D. labrax) REGIO DE OCORRNCIA Mar do Caribe na Martinica Itlia REFERNCIA GALLET de SAINT AUTIN, 1987. GHITTINO et al,1980, GIAVANNE, 1988 e PAPERNA, 1980. ALVAREZ-PELLITERO et al, 1993. PAPERNA; LARENCIN, B. 1979 TAREEN, 1986 PAPERNA, 1981 PAPERNA, 1980 AIELLO; DALBA, 1986 ABREU et al, 2005 LAWLER, 1980 e LANDSBERG et al, 1994 NOGA et al, 1991

Espanha Mar Mediterrneo e na Frana Dourado (S.aurata) Tilapia de Moambique (O. mossambicus) Charuteiro-catarino (S.dumenerili) Linguado (P.orbignyanus) Mar Egeu, Turquia Eliat, Israel Mar Vermelho, Israel Siclia, Itlia Brasil Golfo do Mxico (Mississipi, Texas, Louisiana, Florida, EUA) Oceano Atlntico (Carolina do Norte, EUA)

Striped bass (M. saxatilis) Redfish (Sciaenops ocellata) Grey mullet (Mugil cephalus) Pompano (Trachinotus Carol) Hbrido (Morone chrysops X Morone saxatilis) Linguado (Paralichthys dentatus) Hbrido (M. chrysops X M. saxatilis) Redfish Linguado (Paralichthys lethostigma) Bullseye puffer (Spheroides annulatus) Pompano (Trachinotus goodei, T. carolinus) Pacific threadfin (Polydactylus sexfilis) Grey mullet Ayu (Plecoglossus altivelis) Mulloway (Argyrosomus japonicus) Barramundi (Lates calcarifer )

Oceano Atlntico (Carolina do Sul, EUA) Oceano Atlntico (Flrida, EUA)

JENKINS et al, 1998; SMITH et al, 1999; SANDIFER et al, 1993 BENETTI et al, 2001

Oceano Pacfico (Mxico) Mar do Caribe (Ilha da Margarida, Venezuela) Oceano Pacfico (Havai, EUA) Oceano Pacfico (Filipinas) Oceano Pacfico (Taiwan) Oceano Pacfico (Austrlia) Oceano Pacfico(Tailndia)

FAJER-VILA et al, 2003 GASPAR, 1987 MONTGOMERY-BROCK et al, 2001 BATICADOS; QUINITIO, 1984 CHIEN; HUANG, 1993 FIELDER; BARDSLEY,1999 CHONCHUENCHOB et al, 1987

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2.2.2 Ciclo biolgico

O ciclo biolgico do Amyloodinium complexo quando comparado com outros parasitos de peixes. Apresenta ciclo trifsico (Fig. 1), incluindo o trofonte, estgio parasitrio, que se fixa e se alimenta nas brnquias e tecido epitelial; o tomonte, estgio reprodutivo, que realiza divises sobre o substrato e o estgio infeccioso, o dinosporo, que nada livremente na gua ao encontro de um hospedeiro susceptvel. O desenvolvimento, bem como sua morfologia, foi criteriosamente descrito por Brown (1931,1934); Nigrelli (1936); Brown e Hovasse (1946); Cheung et al (1981).

Figura 1. Ciclo biolgico do Amyloodimium ocellatum. (A) = trofonte, (B, C e D) = tomontes, (E) = dinosporo. Figura adaptada de Ramos e Oliveira (2001).

Os trofontes (50 a 100m), com aspecto ovide ou piriforme, alimentam-se fixando-se no epitlio das brnquias e da pele dos peixes. So organismos limitados por uma membrana celular fina e resistente, que forma uma camada de vesculas achatadas, nas quais vrias organelas podem estar presentes. Os trofontes so dotados de um pednculo proeminente, com ganchos de fixao de filamentos radiculares ou rizocistos, por meio dos quais se fixam ao hospedeiro e em alguns casos, tambm absorvem os nutrientes. Ao alcanar um

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determinado tamanho e maturao, essas estruturas de fixao tornam-se mecanicamente insuficientes e ento o parasito se desprende do hospedeiro. Uma vez sobre o substrato, os parasitos absorvem gua, possivelmente atravs do canal presente no pednculo e aumentam de volume. Todas as organelas, inclusive o flagelo, so gradualmente retrados dentro do corpo do parasito quando ento forma-se um cisto reprodutivo e protetor (tomonte) com divises sucessivas assexuadamente (NIGRELLI, 1936; BRONW; HOVASSE, 1946; CARVALHO-VARELA, 2005), influenciadas pela temperatura e salinidade (BROWN; HOVASSE, 1946). Aps a ltima diviso dos tomontes, formas mveis (dinosporos), com cerca de 20m de dimetro so liberadas e podem infectar um novo hospedeiro. Cada tomonte pode liberar at 256 dinosporos, os quais so capazes de infectar vrias espcies de peixes suscetveis (BROWN; HOVASSE, 1946). Conforme afirmam Reed e Francis-Floyd (1994), a diviso celular no interior do tomonte cessa em guas com temperatura inferiores a 10C, mas pode ser completada de 3 a 5 dias a temperatura de 22C a 25C. Temperaturas superiores a 20C e salinidades entre 16.7 a 28.5ppt frequentemente so favorveis ao seu desenvolvimento, completando o ciclo at sete dias, contexto que pode dizimar uma populao de peixe parasitada muito rapidamente em uma piscicultura. Ainda segundo Reed e Francis-Floyd (1994), os dinosporos liberados, quando comparados aos trofontes maduros, so muito pequenos, medindo em torno de 12 a 15m de dimetro e que mesmo na ausncia de um hospedeiro ele mantm o seu poder de infeco por um perodo de at quinze dias. Quando finalmente encontra um hospedeiro, liga-se a este, perde seus flagelos e entra na fase parasitria.

2.2.3 Transmisso

Visto que as fases do ciclo de vida do Amyloodinium no se completam no prprio hospedeiro, pode-se inferir que a transmisso ocorre atravs de formas infectantes, os dinosporos, caracterizando um ciclo indireto. A gua do abastecimento a principal porta de acesso dos tomontes ou dinosporos ao sistema de criao e consequentemente aos peixes. Entretanto, muito criterioso considerar que a introduo de peixes infectados funcionar como uma fonte importante da parasitose to logo os trofontes se desprendam e iniciem seu ciclo reprodutivo (CARVALHO-VARELA, 2005).

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2.2.4 Sintomas

No existe uma sintomatologia especfica na amyloodiniose. A evidncia dos sintomas so aquelas relacionadas s diversas parasitoses dos peixes. De uma maneira geral, diante de eventos desencadeadores de mortes de peixes, mantidos em sistemas de guas estuarinas ou marinhas, prudente, conforme indica Reed e Francis-Folyd (1994), suspeitar da manifestao do Amyloodinium. Geralmente, os sinais iniciais so alteraes comportamentais as quais incluem diminuio ou completa perda de apetite. Os peixes ficam se raspando contra objetos, paredes ou substrato dos tanques, refluxo de gua atravs das brnquias (coughing), respirao rpida, natao errtica, aglomerao dos peixes prximos aos aeradores, assim como na superfcie da gua. Com a evoluo do processo patolgico, podem se observar manchas de despigmentao, congesto e eroso das nadadeiras, hipersecreo mucosa, perda de escamas e dilatao do ventre (PAPERNA, 1980; REED; FRANCIS-FLOYD, 1994; RAMOS; OLIVEIRA, 2001; CARVALHO-VARELA, 2005).

2.2.5 Patogenia

Segundo Carvalho-Varela (2005), as brnquias so o primeiro rgo de infeco. Entretanto, h registros que indicam, em algumas espcies de peixe, a pele como sitio de predileo a ser parasitado. As infeces macias podem envolver a pele, as nadadeiras e os olhos. Porm, os peixes podem morrer sem apresentar grandes leses cutneas. As formas de trofontes podem ser encontradas nas brnquias, na cavidade branquial e nas fossas nasais. J foi referida as formas de tomontes no esfago, estmago e intestino, contudo, acredita-se que o desenvolvimento nestes rgos tenha sido aps ingesto. Apenas uma nica forma parasitria pode alimentar-se sucessivamente sobre mltiplas clulas epiteliais, e ser responsvel pela extenso das leses causadas. Nveis medianos de infeces, com presena de 1-2 trofontes por filamento brnquial e causam ligeiras alteraes patolgicas. Contudo, as fortes infeces, com um nmero superior a 200 trofontes no filamento branquial, provocam hiperplasia, inflamao, hemorragia,e necrose e a morte, geralmente devida anxia, pode ocorrer dentro de 12 horas. O autor pondera ainda que, em casos agudos, nem sempre a morte

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dos peixes est associada anxia, mas s alteraes osmorreguladoras e s infeces microbianas secundrias. Nas parasitoses intensas pode-se manifestar hiperplasia epitelial acompanhada de necrose a hemorragias (PAVANELLI et al, 2008). Conforme Paperna (1980), leses como hiperplasia, fuso das lamelas de ordem focal ou difusa e fuso apical de lamelas foram frequentemente observadas. Ramos e Oliveira (2001), em estudos sobre amyloodiniose em pregado (Psetta maxima), registraram hiperplasia do epitlio branquial com fuso das lamelas seguidas de edema, levando ao descolamento das clulas de suporte das brnquias. Constataram ainda alteraes degenerativas, necrose das clulas do epitlio branquial e depleo das clulas mucosas. Segundo Scott (2000), as formas parasitrias provocam uma leso grave nos pontos de fixao sobre a pele e as brnquias, desencadeando hemorragias, inflamao e hiperplasia epitelial extensa.

2.2.6 Resistncia imunolgica dos peixes ao Amyloodinium ocellatum

Embora a maioria dos peixes residentes em guas contaminadas com Amyloodinium seja suscetvel amyloodiniose, alguns fatores limitam claramente a sua capacidade de proliferao, envolvendo tanto a imunidade inata quanto a adquirida (DICKERSON; CLARK,1996; WOO, 1996). Algumas espcies de peixe so naturalmente resistentes a infeco, como killifish (Fundulus grandis), american eel (Anguilla rostata), molly (Poecilia latipinna) e outros.

2.2.6.1

Imunidade inata

Investigaes tm revelado a resistncia imunolgica dos peixes ao Amyloodinium. Nesse sentido, Dickerson e Clark (1996) e Woo (1996) asseguram que a resistncia a infeco pelo parasito envolve tanto a imunidade inata quanto a adquirida. De uma maneira geral as espcies resistentes so aquelas que produzem muco espesso ou tem tolerncia a baixos nveis de oxignio (LAWLER, 1977), como tambm em peixes mais velhos parecem ser mais resistentes, em algumas circunstncias. Diversos fatores inerentes ao hospedeiro devem ter importante papel nas interaes hospedeiro parasito (NOGA; LEVY, 2006).

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O Amyloodinium tambm altamente sensvel aos antibiticos naturais do hospedeiro, designados como protenas semelhantes histona (HLP), presente em altas concentraes na pele e brnquias conforme observado no hbrido striped bass e outros peixes. As HLP foram letais para Amyloodinium, pois inibiu severamente a infeco, o crescimento e sua diferenciao nas clulas do hospedeiro, provavelmente justificando seu importante papel na proteo dos peixes contra este parasito (NOGA et al, 2001). Ainda de acordo com Noga (2001), curiosamente as HLP so altamente letais para trofontes, mas no tm nenhum efeito sobre dinosporos. Essa toxicidade preferencial muito incomum, visto que as drogas agem contra os dinosporos, enquanto as trofontes so geralmente resistentes terapia. Por outro lado, foi demonstrado que o magainin 2, um antibitico produzido na pele do sapo africano (Xenopus laevis), foi igualmente txico tanto para trofontes, quanto para dinosporos. H evidncias de que HLP-1 e o magainin 2 causam graves anormalidades no desenvolvimento do parasito, principalmente nas fases de trofontes e tomontes. Estes dados sugerem que pele e tecidos branquiais contm potentes defesas contra os protozorios.

2.2.6.2

Imunidade adquirida

Estudos recentes tm revelado importantes mecanismos de defesa que podem ser usados para aumentar especificamente a proteo a esses parasitos. Pesquisas fornecem evidncias de que peixes, uma vez recuperados de Amyloodinium foram resistentes reinfeco (LAWLER, 1977; PAPERNA, 1980). Segundo Smith et al (1993) soro de peixes imunizados com dinosporos pode aglutinar e destruir o Amyloodinium em cultura de clula. Peixes imunizados foram tambm capazes de montar uma resposta de anticorpo que foi detectada via ensaio imunoadsorvente ligado enzima (ELISA). Em outras pesquisas Smith et al (1994), detectaram anticorpo anti-amyloodinium de soro de hbrido striped bass (Morone saxatilis X Morone chrysops) aps surto de amyloodiniose em uma aquicultura comercial na Carolina do Norte. Os autores sugerem que uma infestao de A. ocellatum pode induzir produo humoral de anticorpos ao parasito e seus resultados fornecem futuras evidncias que infestaes naturais podem conferir resistncia protetora em peixes que sobrevivem a uma infestao.

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Cecchini et al (2001), por sua vez, utilizando antgeno de trofontes, detectaram anticorpo anti-amyloodinium em cultivo de robalo legtimo (Dicentrarchus labax). Dados experimentais demonstram que algumas espcies desenvolvem uma resposta imunolgica adaptativa que pode ser detectada por ELISA. Os autores conjecturam, com base nos seus resultados, que o robalo (Dicentrarchus labax), que demonstrou uma imunidade adquirida contra A. ocellatum, pode desenvolver uma parcial resistncia nova infestao. Cobb et al (1998) estudando a imunidade adquirida da amyloodiniose associada com uma resposta de anticorpo em peixe palhao (Amphirion frenatus), sugerem que esse peixe capaz de montar uma resposta protetora mediada por anticorpos ao Amylodinium. Os autores consideram ainda que futuros estudos so necessrios sobre a resposta imune, incluindo o papel da imunidade das mucosas ao A. ocellatum, assim como a identificao e caracterizao de antgenos dos parasitos. Diversas pesquisas tm demonstrado, ao longo dos anos, que os peixes so capazes de desenvolver resposta imune, frente a um desafio por um patgeno, seja experimental ou naturalmente, como tambm montar uma resposta mediada por anticorpo contra o Amyloodinium ocellatum. Existe a necessidade de mais estudos com o intudo de novos esclarecimentos quanto a essas respostas. Situao essa que direcionar procedimentos que permitam o controle de uma parasitose desencadeadora de muitas perdas na piscicultura marinha.

2.2.7 Diagnstico

A nica maneira segura de diagnosticar uma infestao por Amloodinium pela identificao do parasito em tecido infectado. Essa deteco efetuada atravs de preparaes de raspado de branquias e tegumento os quais podem ser observados em microscpio tico. Sua fixao pode ser feita diretamente em lmina, com formol a 5% e, para colorao, podem empregar-se, rotineiramente, os corantes May-grunwald e Giemsa ou Hematoxilina e Eosina. Os trofontes, em forma de pra ou esfrica, com colorao variando do dourado ao marrom escuro, so facilmente vistos, mesmo com pequeno aumento (40x). A estrutura atravs da qual o trofonte liga-se ao tecido do peixe, tambm pode ser vista ao microscpio de luz (REED; FRANCIS-FLOYD, 1994; CARVALHO-VARELA, 2005; EIRAS et al, 2006; PAVANELLI et al, 2008).

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2.2.8 Profilaxia e Tratamento

O controle de surtos de amyloodiniose representa uma das principais restries ao desenvolvimento da aquicultura marinha. No existe produto qumico teraputico registrado como parasiticida na Food and Drug Administration FDA para peixes destinados ao consumo. Contudo, pesquisas tem identificado diversos produtos qumicos que demonstram ter razovel sucesso no controle (SMITH; SCHWARZ, 2009). O sulfado de cobre a substncia mais amplamente utilizado no controle da amyloodiniose (BOWER, 1983; CARDEILHAC; WHITAKER, 1988; REED; FRANCIS-FLOYD, 1994 SMITH;

SCHWARZ, 2009). No existe comprovao da eficcia desses produtos, assim como sua segurana para os animais-alvo (REED e FRANCIS-FLOYD (1994). O cobre usado no tratamento de infestaes por ectoparasitos, principalmente de peixes marinhos. Seu comportamento qumico na gua complexo e pode ser altamente txico aos peixes e invertebrados marinhos. O uso do sulfato de cobre estressa os peixes, tornando-os mais suscetveis a septicemias entricas e quando utilizado em imerso ou na forma de banho, demonstra severo efeito adstringente, com eliminao de muco das brnquias mediante retrao das clulas mucgenas e ao hepatotxica (SCOTT, 2000). Em sistemas marinhos, esse autor recomenda concentrao 0,1mg de cobre por litro, mas alerta sobre a necessidade de seguidos testes para mant-lo em 0,1- 0,2mg/L e garantir o controle da amyloodiniose sem matar os peixes. O uso desse produto em Cyprinus carpio desencadeia estresse crnico, registrando aumento dos teores de glicose e epinefrina circulantes, conforme referido por Vig et al (1987) e Toth et al (1996). Danos nas brnquias, fgado e rim foram observados em Puntius conchorius aps exposio droga (KUMAR; PANT, 1981). Diversos estudos demonstram alteraes nas propores dos elementos do sangue perifrico de Oncorhynchus mykiss, de Heteropneustes fossilis, de Channa punctatus e de Cyprinion watsoni (WILLIAMS; WOOTTEN, 1981; DICK; DIXON, 1985; SINGH; REDDY, 1990; SAXENA; CHUAHAN, 1994; SINGH, 1995). Segundo Noga (2001), o cobre um elemento com atividade imunossupressora, do que se pode supor que peixes submetidos a sua exposio poder se tornar mais vulnervel a ao de agentes infecciosos. Campagna et al (2008) concluram que, apesar da importncia do cobre como um micronutrientes no metabolismo dos organismos aquticos, mesmo em concentraes muito baixas, este metal pode coprometer a sobrevivncia e o crescimento de Danio rerio. Ao

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mesmo tempo sugerem novas investigaes para a formulao de normas de qualidade da gua que permitam efetivamente proteger a vida aqutica. Por sua vez, Pickering e Pottinger (1987) asseguraram que o cobre contaminante comum do ambiente aqutico, exercendo diferentes efeitos agudos e crnicos sobre populaes de peixes. Outros produtos tm sido preconizados como capazes de controlar a amyloodiniose. O difosfato de cloroquina, um produto antimalrico, eficaz no controle da amyloodiniose nas concentraes de 5-10mg/L de gua, em nica aplicao por dez dias, contudo, tambm txico para algas e vrios invertebrados. Formol aldedo, produto amplamente usado nas ectoparasitoses, embora integre a listas dos produtos com restries, provoca o desprendimento dos trofontes, mas os tomontes continuam a diviso, aps remoo do produto (CARVALHO-VARELA, 2005; REED; FRANCIS-FLOYD, 1994). As medidas profilticas so de extrema importncia na tentativa de prevenir focos da amyloodiniose e evitar os surtos da doena. Algumas delas podem ser adotadas com relativo xito. Os peixes, antes de serem introduzidos na piscicultura devem ser submetidos quarentena, pelo menos por 3 a 4 semanas e a gua de entrada do sistema deve passar por irradiao ultravioleta. Embora do ponto de vista prtico seja muito difcil, tem sido sugerido imerso dos peixes em gua doce, diminuio da temperatura e choque de salinidade. Tais medidas so apenas adjuvantes no processo de controle do Amyloodinium, no se constituindo em prticas acertadamente exitosas, podendo ter maior ou menor nvel de sucesso, em funo da complexidade do ciclo do parasito (REED; FRANCIS-FLOYD, 1994; CARVALHOVARELA, 2005). A grande dificuldade encontrada quando se pretende aplicar tratamento em peixes no Brasil, a escassez de estudos que atestem a eficcia e o mecanismo de ao das drogas utilizadas no controle das enfermidades. Em funo disso, muitas vezes, a atitude adotada no aplicar qualquer forma de tratamento, pois alm de no haver conhecimento acerca da farmacodinmica da droga, no se sabe sobre a extenso de seus danos ao ambiente (PAVANELLI et al, 2008). Assim, o uso da homeopatia no tratamento de animais aquticos uma alternativa a ser avaliada, uma vez que tais medicamentos, por serem ultradiludos, no deixam resduos e, dessa forma, no causam danos aos peixes e nem ao meio ambiente.

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2.3 Homeopatia

A homeopatia, elaborada pelo mdico alemo Cristhian Frederic Samuel Hahnemann, no sculo XVIII, um sistema de interveno mdica baseada na aplicao de substncias diludas e no princpio das semelhanas com o objetivo de alcanar resultados clnicos. A lei da similitude j era adotada pela escola grega de Alexandria e pela medicina hipocrtica, as quais se valiam dos recursos da analogia para selecionar o medicamento ideal para o pronto restabelecimento da sade (ROSENBAUM, 2002). A partir de seus experimentos com a quina 4 (China officinalis), Hahnemann resgata o princpio da similitude preconizado pelo pai da medicina, no sculo V a. C., para a sustentao de sua teoria sobre a cura das doenas (BENEZ, 2004), conforme enunciado por Hipcrates: O que produz a estrangria, cura a estrangria; o que causa o vmito cura o vmito; o que d febre a um homem so, cura um homem que tem febre. A teoria homeoptica est sustentada pela lei dos semelhantes, e por trs princpios: experimentao no homem so, remdio nico e medicamento diludo e dinamizado. Segundo a lei da similitude, o medicamento capaz de curar, quando, uma vez experimentado no individuo so, desencadeia sintomas semelhantes aos sintomas deflagrados pela doena. Segundo Hahnemann (2007) para se alcanar o sucesso no tratamento de uma enfermidade necessrio administrar um princpio medicamentoso que gere no organismo sadio os sintomas da molstia que se quer tratar. As experimentaes da droga no homem so permitem relacionar minuciosamente os sintomas provocados pelos medicamentos que so as chamadas patogenesias ou doena artificial, descrita pelos experimentadores nas Matrias Mdicas. Esse mtodo torna possvel o conhecimento das propriedades curativas do medicamento (HAHNEMANN, 2007). No Organon, obra que inaugura a homeopatia, Hahnemann (2007, p. 166) recomenda o uso do medicamento nico, afirmando que: em nenhum caso de tratamento necessrio e, por conseguinte, no admissvel, administrar a um doente mais do que uma nica substncia medicamentosa de cada vez. O medicamento deve ser administrado e que este seja capaz de cobrir o quadro atual do enfermo, ou seja, apenas o remdio mais semelhante, mais de acordo com os sintomas apresentados pela pessoa enferma deve ser administrado. Para expressar o seu potencial curativo, as substncias medicamentosas precisam ser diludas. Hahnemann (2007) demonstrou que quanto mais diludo e dinamizado o remdio,4

Planta de origem peruana utilizada no tratamento da malria.

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mais eficaz e penetrante sua ao. O autor afirma, ainda, que a capacidade de cura encontrase na razo direta da sua similaridade com os sintomas do enfermo. A homeopatia surgiu no cenrio brasileiro em 1840, trazida pelo mdico francs Benoit Mure. Entretanto, somente a partir dos anos 80 conquistou status de especialidade mdica, tendo sido reconhecida pelo Conselho Federal de Medicina atravs de Resoluo n 1000 de 1980; Conselho de Farmcia, Resoluo n 232 de 1992; e Conselho Federal de Medicina Veterinria, Resoluo 662, de 14 de julho de 2000.

2.4 Filosofia Homeoptica

O corpo biolgico, na concepo do modelo homeoptico, dotado de uma natureza dinmica fsico-vital, na qual ocorre interao das funes orgnicas com pensamentos e sentimentos, tornando-o susceptvel ou no ao processo de adoecimento. Com essa viso holstica do binmio sade-doena os mltipos aspectos do indivduo doente so valorizados, (TEIXEIRA, 2006). A medicina do sculo XVII estava marcada por duas correntes de pensamento: o mecanicismo e o vitalismo. Para os vitalistas, o organismo animado e gerido por princpio denominado fora vital, condio que o torna distinto de um ser inanimado. Nessa concepo, os organismos so direcionados por uma espcie de fora de sade que se impe normalmente como fora dominante. O desequilbrio desse princpio vital provocaria o surgimento da doena (ROSENBAUM, 2005). Compartilhando as ideias do pensar da medicina vitalista, Hahnemann (2007) considera que sem fora vital, o organismo incapaz de sentir, de funcionar e de prover sua prpria conservao. Esse princpio dinmico capaz de sofrer a ao dos agentes hostis vida. A sade est relacionada ao estado de equilbrio dessa fora e a doena, ao seu desequilbrio. Os fenmenos vitais descritos por Hahnemann correspondem aos mecanismos homeostticos abordados pela fisiologia moderna. Na concepo hahnemanianna o desequilbrio vital ou homeosttico, desencadearia o surgimento e a progresso das doenas. O organismo, uma vez atingido por diversos agentes nocivos, reagiria em uma ao secundria ou reao vital, atravs de manifestaes de sintomas em propores relacionadas

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magnitude da sua suscetibilidade individual gerando indisposies passageiras ou doenas crnicas (TEIXEIRA, 2006). Segundo Vithoulkas (1980), doena o resultado de um estmulo morbfero, chamado causa excitante, que ressoa no nvel particular de suscetibilidade do organismo. Para que haja a manifestao da doena, necessria uma forte suscetibilidade ao agente morbfico. Essa predisposio chamada de causa mantenedora, pois a fragilidade do mecanismo de defesa que mantm um estado de sade reduzido e no as ocorrncias sucessivas de causas excitantes. Teixeira (2006) enfatiza que o estmulo teraputico das substncias ultradiludas promove uma reao homeosttica de cura, desencadeando uma reao do organismo contra seus prprios sintomas e por meio de auto-ajustes fisiolgicos, promove o equilbrio interno. Esse estmulo, conforme esclarece Ullman (1995), capaz de induzir o sistema imunolgico do indivduo a modelar uma resposta adequada ao estmulo da doena. Portanto, o tratamento homeoptico permite ao indivduo restabelecer a sade e prevenir doena. As doenas, de acordo com Hahnemann (2010), so classificadas em agudas, que se expressam como um processo mrbido rpido da fora vital, mas sempre em termos moderados; e em crnicas que manifestam sintomas que aparecem progressivamente de forma vagarosa e alternada. No que diz respeito s doenas de carter crnico, Hahnemann (2010) considera que elas provm dos miasmas crnicos: Syphilis, Sycosis e Psora, sendo que as enfermidades causadas pelos memso manifestam-se atravs de sintomas locais e dos quais se origina a maioria das doenas crnicas. Sobre a psora Hahnemann afirma no pargrafo 80 do Organon:[...] h o miasmaa da Psora que se revela, aps o trmino da infeco interna de todo o organismo, por uma erupo cutnea peculiar, consistindo, s vezes, apenas de pequenas vesculas acompanhadas de prurido forte e voluptuoso (e de odor caracterstico), o miasma interno crnico [...] a Psora, a nica causa fundamental real, produtora de todas as demais numerosas outras, direi mesmo incontveis, formas de molstia, que, com os nomes de debilidade nervosa, histeria, hipocondria, mania, melancolia, demncia, furor, epilepsia e convulses de toda a sorte, amolecimento dos ossos (raquitismo), escrofulose, escoliose e cifose, crie, cncer, fungus haematodes, neoplasmas, gota, hemorridas, ictercia, cianose, hidropsia, amenorria, hemorragia gstrica, nasal, pulmonar, vesicular e uterina; asma e lcera pulmonar, impotncia e esterilidade, enxaqueca, surdez, catarata, amaurose, clculos nos rins, paralisia, defeito dos sentidos e dores de milhares de espcies etc., figuram nas obras sitemticasde patologia como doenas peculiares e independentes (HAHNEMANN, p. 61, 2007)

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Os principais sintomas produzidos pela psora se expressam principalmente na pele e nas mucosas, estando associados diretamente s parasitoses, ocorrendo a manifestao de outros sinais clnicos, com destaque para distenso abdominal, palidez da face, pele seca e debilidade geral (HAHNEMANN, 2010).

2.5 A cincia homeoptica

Apesar de bicentenria, a homeopatia ainda se defronta com um grande desafio frente comunidade cientfica contempornea que comprovar como substncias diludas e agitadas em srie, em concentraes abaixo da constante de Avogadro5, podem induzir resposta nos sistemas biolgicos, contrariando o modelo farmacolgico bioqumico e dose respostadependente (TEIXEIRA, 2006). Assim, a homeopatia permanece marginalizada pelo pensamento cientfico contemporneo, que, segundo Reale (1994), herdeiro direto do positivismo de August Comte (1793-1857) avesso Metafsica e a qualquer ideia que no seja fruto da experimentao. Estudos cientficos modernos fundamentados em modelos fsico-qumicos e biolgicos confirmam que a informao presente nas substncias ultradiludas desencadeariam alteraes nos nveis orgnicos semelhantes s substncias ponderais. Pesquisadores do departamento de Fsica Nuclear da Universidade de Milo e do Instituto de Qumica da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) respaldam essas pesquisas na buscam de explicao racional e cientfica para o fenmeno de transmisso da informao atravs das modificaes de natureza eletromagntica da gua (TEIXEIRA, 2006). Pesquisas fundamentadas no modelo biolgico, por sua vez, asseguram que as ultradiluies homeopticas de substncias reguladoras do sistema imunolgico, demonstram atividade imunomoduladora. Para Bastide (GUEDES et al, 2004, apud BASTIDE, 1998) pesquisadora da Faculdade de Farmcia da Universidade de Montpellier na Frana, o sistema de regulao biolgico envolve mais a noo de informao do que a quantidade de molculas recebidas. Sua hiptese a de que os imunomoduladores transmitiriam as informaes especficas para as molculas utilizadas na diluio no momento do preparo do medicamento maneira homeoptica (GUEDES, 2004).5

A constante de Avogrado (nmero de Avogrado), definida por Amedeo Avogrado, representa um mol de algumas entidades elementares (tomos, molculas, ons, eltrons). Formalmente definida como o nmero de tomos do carbono-12 em 12gramas, ou seja, 6,02X1023.

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Guedes et al (2004), estudaram a influncia do tecido tireoidiano, de girinos de rtouro (Rana catesbeiana) na alterao da velocidade da metamorfose desses animais. A investigao revelou que o tecido tireoidiano diludo teve efeito oposto ao da tintura me e transmitiu a informao s molculas hidroalcolicas usadas na diluio, e,

subsequentemente, transferiu essas informaes aos girinos. Pesquisa desenvolvida por Sukul et al (2003) testou a capacidade do Mercuric chloride 30C e Nux vomica 30C em alterar a permeabilidade da gua atravs dos eritrcitos em Catfish (Clarius batrachus), submetidos intoxicao aguda por etanol. Os resultados demonstraram que as potncias homeopticas foram capazes, in vitro, de aumentar a permeabilidade dos eritrcitos gua nos peixes em estudo. Os autores concluram que esses resultados indicavam que o Merc.cor 30C e o Nux vom 30 podem interagir com protena do canal de gua e com isso facilitar a penetrao da mesma atravs dos eritrcitos. O alvo primrio da potncia homeoptica parece ser uma protena da membrana plasmtica.

2.6 Medicamento homeoptico

Buscando tornar prtica a concepo da cura pelo semelhante, Hahnemann instituiu mtodo teraputico com substncia que fosse capaz de provocar sintomas semelhantes aos observados no indivduo doente, mas que no induzisse toxicidade ao mesmo. Assim, usou a substncia semelhante em si prprio, porm em quantidade muito pequena, de forma diluda, antes de serem utilizadas no paciente. Entretanto, percebeu que usando a substncia diluda a sua ao poderia ser diminuda ou nula. Hahnemann constatou que ao agitar a substncia esta se tornava mais potente, mais ativa, apesar de conter menos substncia que a inicial (CESAR, 2002). Esse processo que envolve diluio e sucusso foi denominado dinamizao, e o resultado final de cada etapa de dinamizao se obtm uma potncia (BENITES, 2006). Quanto mais dinamizada maior a potncia do medicamento e mais efetivo do ponto de vista clnico (CESAR, 2002). Os medicamentos homeopticos so originados dos reinos animal, vegetal e mineral. Sua produo obedece s normas estabelecidas pelo Decreto n 57477-66, que dispe sobre a manipulao, receiturio, industrializao e venda de produtos homeopticos, atravs da Portaria n 1180 de 1988 e Resoluo n 23 de 06 de dezembro de 1999 da Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria.

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Para o preparo do medicamento, preciso inicialmente que a droga seja solubilizada em um solvente, podendo este ser gua, lcool ou glicerina. Quando se tratar de uma substncia insolvel nesses compostos, dever a mesma ser submetida triturao. Essa solubilizao d origem tintura-me, a partir da qual, as diluies podem ser feitas em diferentes propores ou escalas: centesimal (1:100), decimal (1:10) e cinquenta milesimal (1:50.000). Depois de diludo, o medicamento submetido ao processo de sucusso, ou seja, agitao vigorosa em srie atravs de fortes batidas do frasco, em sentido vertical, contra um anteparo. A cada diluio seguem-se 100 sucusses, obtendo-se uma potncia superior (CESAR, 2002). A escala centesimal (C ou CH) e a cinquenta milesimal (LM) foram desenvolvidas por Hahanemann, enquanto que a decimal (X) foi introduzida pelo homeopata Hering (BENITES, 2006).

2.7 Homeopatia Veterinria

Hahnemann foi o precursor da aplicao da homeopatia em animais. Em seguida, seu discpulo Benninghause, advogado e botnico, realizou muitos tratamentos individuais em animais. Contudo, segundo o que se tem notcia, teria sido Joseph Wilhelm Lux (1777-1849), o primeiro mdico veterinrio homeopata a introduzir o tratamento homeoptico na cura das doenas dos animais por volta de 1823 (BENITES, 1999). A despeito de Hahnemann ter preconizado uma teraputica nica e individualizada, ele verificou a ocorrncia de doenas coletivas e recomendou que o tratamento dos sintomas fsicos fosse considerado a partir da sua escala de importncia e alteraes comportamentais, ponderados em funo da movimentao do grupo e no de um indivduo isolado. A esse respeito Hahnemann afirma que:

A maneira de se estudar e de tratar as enfermidades epidmicas ser sempre a mesma [...] o clnico deve ver a imagem caracterstica de cada enfermidade reinante, como algo novo e desconhecido [...] todas as epidemias tm um carter nico [...] necessrio excetuar as epidemias cujo agente infeccioso e contagioso sempre permanece idntico, como a varola e o sarampo etc. necessrio fazer uma anlise com todos os sintomas dos enfermos afetados. Deveremos realizar anotaes cuidadosas de casos epidmicos anteriores causados por aquele agente. Estas anotaes sero aperfeioadas paulatinamente observando-se como os sintomas se repetem, fazendo com que a lista v se tornando significativa e com mais particularidades. O mdico que, nos primeiros casos, j tenha podido escolher um medicamento que se aproxime do especifico homeoptico, poder, nos casos

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subseqentes, verificar a segurana do remdio escolhido ou ento, descobrir o mais apropriado (HAHNEMANN, 2007 p. 45)

A considerao acerca das doenas epidmicas levou Hahnemann a utilizar pela primeira vez a expresso Gnio Epidmico se referindo ao conjunto dos sintomas apresentados na populao, assim como Gnio Medicamentoso para referir-se ao medicamento que representasse a maioria dos sintomas expressos na populao. Resgatando esses conceitos, os veterinrios passaram a contemplar a possibilidade de tratar os animais de produo adotando-se a concepo homeoptica. Assim, o Dr. Claudio Real, o primeiro homeopata veterinrio brasileiro, utilizou pela primeira vez a expresso Homeopatia Populacional para designar uma abordagem que diz respeito ao tratamento de populaes animais acometidas por uma enfermidade comum maioria dos indivduos. Nesse caso, o rebanho encarado como um organismo nico (REAL, 2003). Ao que se sabe, poucos medicamentos homeopticos foram testados quanto sua eficcia na teraputica em animais, sendo este um campo de estudos que ainda requer muita pesquisa e empenho dos mdicos veterinrios, entretanto, o nmero de pesquisas tem aumentado, sendo possvel apresentar aqui alguns resultados de alta relevncia para a rea. No ano de 1993, Benites, na I Jornada Brasileira de Mdicos Veterinrios Homeopatas realizada em Curitiba (BENITES, 1993), referiu-se a um caso de osteomielite piognica pstraumtica em bovino tratada com Mercuris solubilis 6CH, registrando rpido e adequado restabelecimento do processo. Nesse caso, o tratamento homeoptico da doena aguda mostrou-se eficiente na eliminao da infeco e estimulao da cicatrizao ssea sem auxlio de medicao aloptica como antibiticos e antiinflamatrios. No campo da fertilizao, Benites e Roberti Neto (1993) citam caso de tratamento de bovino que apresenta problemas na concepo devido s falhas na fertilizao ou morte embrionria precoce de causa desconhecida. Aps 60 dias de tratamento com Sepia succus 6CH, o animal foi submetido a um processo de transferncia de embries, tendo sido obtido sucesso no mesmo, tanto pela presena de embries morfologicamente viveis, quanto pela confirmao de prenhez nas receptoras submetidas transferncia. A homeopatia tambm foi testada por Samarth (2002), cujo estudo avaliou o desempenho de frangos de corte, frente ao uso da medicao Calcarea phosphorica 200X por um perodo de seis semanas. Os animais que receberam o medicamento apresentaram resultados estatisticamente significativos, com melhora para as taxas de converso alimentar, melhor rendimento de carcaa e superioridade de massa muscular das partes comestveis. Por

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sua vez, em pesquisa desenvolvida tambm com aves, Vivanco (2006) fez uso de Pulsatilla nigricasn 200 CH, com o propsito de estimular a postura de galinhas e constatou aumento de 5% no nmero de ovos produzidos por esses animais. Comparando o uso da Calcarea carbonica e de Baryta carbonica como promotores de crescimento em suno Viamontes et al (2005) verificaram que ambos medicamentos testados contriburam no incremento de peso de leites em recria, com resultados favorveis a Calcarea carbonica. No ano de 2006, Lira-Salazar et al (2006) constataram a eficcia dos medicamentos Eupatorium perfoliatum e Arsenicum album em camundongos infectados com Plasmodium berghei, parasito causador da malria. Uma inibio de 60% na multiplicao do parasito foi observada nos animais tratados com E. perfoliatum 30CH e de 70% naqueles tratados com A. album. Ainda neste mesmo ano, Oliveira (2006) publicou resultado de testes no tratamento homeoptico em caprinos com linfadenite caseosa. Um grupo de animais foi submetido ao Hepar sulphur 30X e Silicea 12X, enquanto outro grupo recebeu Hepar sulphur 200X por 15 dias. Esses grupos foram comparados com um terceiro grupo controle. Foi constatado no estudo que os animais submetidos ao tratamento homeoptico nos dois protocolos apresentaram resultados de cura significativamente superiores comparados ao grupo controle. No ano de 2008, avaliando o efeito dos medicamentos Sulphur 30X, Ferrum phosphoricum 6X, Arsenicum album 6X e Mercurius solubilis 6X em cordeiros mestios, naturalmente infectados com NGI (nematdeos gastrointestinais), Cavalcanti (2008) concluiu que os animais tratados com homeopatia no apresentaram sintomas clnicos da parasitose e tiveram um ganho significativo de peso (p