SÁVEL, LAMPREIA E ENGUIA

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11 Março 2010 | O MIRANTE38 | SÁVEL, LAMPREIA E ENGUIA

foto O MIRANTE

Gostam de comer bem e juraram promover a enguia como produto gastronómico de eleição. Formaram a Confraria da Enguia, em Salvaterra de Magos.

Custódio Silva é o chanceler da Confraria, que foi apadrinhada pela vizinha Confraria do Torricado de Ba-calhau, de Samora Correia. O chanceler ficou com o cognome de ”vai à proa”. O

Confraria da enguia nasce em Salvaterra de MagosNomeado o chanceler Custódio Silva e entronizados quinze fundadores

Ricardo Carreirasecretário tem o epíteto de “pescador” enquanto o tesoureiro é o “narça”. Os confrades vindouros são os meixões.

No auditório do Centro de Interpre-tação do Cais da Vala decorreu o ritual

de entronização dos novos confrades. O chanceler da Confraria do Torrica-do de Bacalhau, de Samora Correia, Manuel Teles Fernandes, apadrinhou a entronização dos confrades vizinhos.

Primeiro entronizou Custódio Silva, que leu o juramento de defesa e promoção da enguia e recebeu o cordão com me-dalha, símbolo da confraria. Por cada confrade empossado, outro se seguia

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Vila Nova da Barquinha promove até 4 de Abril de 2010 a 16.ª edição do Mês do Sável e da Lampreia. A mostra tem como principal objectivo promover a cozinha típica associada a este concelho ribeirinho banhado pelos rios Tejo, Zêze-re e Nabão. Açorda de sável e arroz de lampreia, entre outras iguarias, podem ser apreciadas à mesa durante o período em que decorre o evento, resultante da parceria entre o município e os dez restaurantes aderentes.

Este ano, foi introduzida uma novi-dade: quem saborear os pratos confec-cionados com sável e lampreia ganha bilhetes para passeios de barco ao Castelo de Almourol. É atribuído um bilhete por cada dose servida, sendo válidos durante a iniciativa que se iniciou a 13

de Fevereiro.Os restaurantes aderentes: Almourol

(Tancos); A Carroça (Limeiras); Ikarus (Vila Nova da Barquinha); O Chico (Praia do Ribatejo); Palmeira (Vila Nova da Barquinha); Platina (Cardal); Quinta dos Rouxinóis (Madeiras); Soltejo (Vila Nova da Barquinha); Stop (Atalaia); Tasquinha da Adélia (Vila Nova da Barquinha).

ao toque de ferrinhos.Os trajes são elaborados. Têm a

ver com a realidade do concelho e da confraria. A capa azul releva a água e o verde, a realeza. A gravata bordada com uma enguia cinzenta é dos con-frades fundadores, a enguia bordada a castanho destina-se aos vindouros. Camisa branca, calça preta e chapéu acinzentado à lavrador completam o traje. O cordão amarelo e azul – cores do concelho de Salvaterra de Magos – é colocado ao pescoço. Segura a medalha com o brasão da confraria onde figuram o barco, a água, a narça e a enguia. A data da fundação da Confraria da Enguia é 17 de Novembro de 2008 e também está inscrita na medalha.

Gostar de enguias e abrir os cordões à bolsa Ser confrade é para quem pode, não

para quem quer. Quem não gosta de en-guias fica de fora. “Somos mais um grupo de gastrónomos que gosta de comer bem e formalizámos esta confraria. Havia a lacuna de termos o Mês da Enguia e não existir uma confraria para a promover”, explica Custódio Silva.

O chanceler confessa que nunca foi grande pescador de enguias à beira rio. Sempre preferiu pescar no prato. “Não dá tanto trabalho”, garante. Sobre os

confrades diz que não se trata de qual-quer grupo elitista de adeptos do bom comer e beber. “Além de gostar de en-guias, há que ter espírito de irmandade e querer manter a tradição.

Quem almeja ser confrade tem de ser convidado por um dos membros a estar presente nas refeições que se vão realizar à média de uma por mês. Depois será avaliado na altura em que se propuser a confrade. Os fundadores decidem. Terá de ser assíduo, não provocar confusões e estar disposto a gastar algum dinheiro. Há penalizações de dez euros para quem fale de trabalho e política à mesa.

Nas reuniões degustativas, compos-tas sempre de um prato de enguias, seja entrada ou prato principal, cada confrade contribui com dez euros para que um bolo se vá acumulando. A verba é entregue a uma instituição de benefi-cência ou caridade.

Presente na cerimónia a presidente da Câmara de Salvaterra de Magos, Ana Cristina Ribeiro (BE), que apesar de gostar de enguias (ainda) não é confrade, salientou a importância da confraria para ajudar a implementar o Mês da Enguia no concelho e a enguia como prato gastronómico.

Sável e lampreia à mesa de dez restaurantes na Barquinha

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TÉCNICA. Há quem retire o “pente” ao pescado

foto O MIRANTE

No “Recanto do Ti Pedro”, em Vila Franca de Xira, um restaurante que deu cartas na região até 2009, Pedro Miguel Gil fazia questão de retirar intacta a espinha do sável: o “pente”. O peixe que vem desovar ao rio é rei nos restaurantes de Vila Franca de Xira até Abril e o segredo está no corte. Postas finas servidas à mesa com açorda de ovas.

O sável era deitado numa prancha para ser preparado. Depois de um golpe de mestre, usando lâminas afiadas, Pedro Miguel Gil retirava, intacta, a espinha do peixe: o “pente”, como gosta de lhe chamar. Foi assim que o proprietário do restauran-te “O Recanto do Ti Pedro”, que fechou portas em Maio de 2009, preparou o sável durante anos. Fazia questão de libertar a espinha do peixe para tornar ainda mais apetecível o pitéu dos apreciadores da

TÍPICO. No restaurante “O Forno” o sável está na ementa todos os dias

Com o sável o segredo está no cortePeixe é rei nos restaurantes do concelho de Vila Franca de Xira

gastronomia local. “A pessoa deve imaginar e criar para

que o trabalho saia cada vez mais perfeito e seja feito cada vez em menos tempo”, diz Pedro Miguel Gil para justificar a técnica que usava no restaurante.

O sável é rei nos restaurantes do concelho de Vila Franca de Xira durante os meses de Março e Abril. O sável frito com açorda de ovas é um dos pratos mais procurados por esta altura nos restaurantes do concelho.

O equipamento, garante Pedro Miguel Gil, é fundamental. “Não podemos levar um alicate para uma intervenção cirúrgica”, exemplifica. Para retirar o “pente” intacto Pedro Miguel Gil tinha em exclusivo um corpo de facas bem afiadas.

É quase impossível encontrar sável sem espinhas, sobretudo em sável frito e grelhado (no sável cozido as espinhas são expulsas) mas a técnica permite reduzir as probabilidades de as encontrar.

O primeiro corte a realizar é no peixe, para retirar a cabeça, é na vertical. Mas os que se seguem são na diagonal. É preciso

cuidado nos golpes a aplicar para manter as ovas intactas. “Leva-se o sável debaixo da torneira. A faca vai junto à espinha que vai descolando da carne. Puxamos as espi-nhas para cima e sai o pente”, explica. Há uma condição para que a técnica resulte: “O sável tem que ser fresco”, avisa. Pedro Miguel Gil assegura que se o trabalho for bem feito até se ouvem as espinhas a fazer um timbre. Com o pente já retirado ainda permanecem espinhas que Pedro Miguel Gil retirava com paciência.

A parte mais larga de um sável com três quilos possui entre 14 ou 15 centímetros. “Se a posta for cortada como deve ser re-presenta quase o dobro porque é cortada na diagonal. Vai para os 18 centímetros”, calcula Pedro Miguel Gil com a ajuda de uma fita métrica.

O sável nunca pode ser cortado para ser imediatamente servido. A posta deve ser cortada e colocada dentro de um alguidar com água, vinagre e rodelas de limão e deve ficar uma hora a sangrar.

As postas podem ser depois arrumadas

num tabuleiro com um prato virado ao contrário, tipo paveia, mantendo a humi-dade. As fatias são envoltas em farinha e vão a fritar.

Para fritar as fatias devem ser mais finas. O sável para grelhar tem outra grossura. Mas Pedro Miguel Gil também cozinhava ainda o pescado de outra forma. “A posta com a mesma grossura do sável para grelhar era cozinhada em ervas aromáticas. Era assim que se fazia no tempo dos avieiros. Nos barcos e com a própria água do Tejo é que se fazia açorda. Nas canoas não tinham óleo ou possibilidade de fritar o peixe”, recorda. O preparado era servido com a mesma açorda e sem escorrer a água que assegura uma “ligação óptima”.

Corte diagonal e limão quanto basteNo restaurante “O Forno”, onde o sável

é servido todos os dias, as postas de sável também são mergulhadas em água com limão e o corte é cuidadosamente executado na diagonal.

Os três sócios – José Gomes, José Gabriel e Fernando Carneiro – estão habilitados para fazer o corte do peixe muito procurado na altura da campanha gastronómica. Para facilitar o corte colocam o peixe, acabado de chegar do mercado, no frio. Depois de frito ou grelhado, conforme o gosto do freguês, é servido com açorda de ovas.

Maria do Sameiro, cozinheira do restaurante “O Regional”, também está familiarizada com a forma de preparar o pescado. “Tem de ser muito bem amanha-do, limpinho e é só. O resto é segredo”, diz entre sorrisos. O sável na sua casa não tem espinhas, garante. “Como partimos o sável fino elas praticamente ficam destruídas”, explica. Leva à mesa com salada e uma tigela com açorda e ovas de sável.