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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA CURSO DE MESTRADO SAYONARA DA SILVA SOARES A REDE DE CUIDADORES DE CRIANÇAS EM UMA COMUNIDADE DE BAIXA RENDA RECIFE 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA CURSO DE MESTRADO

SAYONARA DA SILVA SOARES

A REDE DE CUIDADORES DE CRIANÇAS EM UMA COMUNIDADE DE BAIXA

RENDA

RECIFE

2014

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SAYONARA DA SILVA SOARES

A REDE DE CUIDADORES DE CRIANÇAS EM UMA COMUNIDADE DE BAIXA

RENDA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Psicologia.

Orientadora: Profª. Drª. Maria Isabel Patrício de Carvalho Pedrosa

RECIFE 2014

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Catalogação na fonte Bibliotecária, Divonete Tenório Ferraz Gominho. CRB4- 985

S676r Soares, Sayonara da Silva. A rede de cuidadores de crianças em uma comunidade de baixa renda / Sayonara da Silva Soares. – Recife: O autor, 2014.

124 f. , il. ; 30 cm.

Orientador: Prof.ª Dr.ª Maria Isabel Patrício de Carvalho Pedrosa. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Pernambuco.

CFCH. Pós-Graduação em Psicologia, 2014. Inclui referências, apêndices e anexos.

1. Psicologia. 2. Cuidadores de crianças. 3. Crianças – Cuidado e

tratamento. I. Pedrosa, Maria Isabel Patrício de Carvalho (Orientadora). II. Título. 150 CDD (22.ed.) UFPE (BCFCH2015-25)

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SAYONARA DA SILVA SOARES

A REDE DE CUIDADORES DE CRIANÇAS EM UMA COMUNIDADE DE BAIXA

RENDA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Psicologia.

Aprovada em: 29/07/2014.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________

Profª. Drª. Maria Isabel Patrício de Carvalho Pedrosa (Orientador) Universidade Federal de Pernambuco

___________________________________________________ Profª. Drª. Maria de Fátima de Souza Santos (Examinador Interno)

Universidade Federal de Pernambuco

___________________________________________________ Profª. Drª. Ilka Dias Bichara (Examinador Externo)

Universidade Federal da Bahia

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Dedico este trabalho à minha rede de cuidadores, tão extensa quanto o afeto que nos une.

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AGRADECIMENTOS

Invadida por um sentimento imenso de gratidão, traduzo o carinho e o amor que

carrego em um afetuoso agradecimento aos que contribuíram para a construção de uma

importante caminhada e de uma linda conquista.

Agradeço a Deus, pelo espetáculo da vida que, em sua construção, me possibilita

vivenciar experiências tão significativas.

A Bel, minha orientadora, por mostrar que a construção do conhecimento une ética,

comprometimento e afeto; por, nesse processo de construção, me motivar e contagiar com sua

alegria a cada encontro com um dado que possui infinitas faces. Agradeço imensamente pelo

acolhimento e parceria que geraram importantes frutos!

Aos meus amados pais, Teresa e Guiarone, por me mostrarem a educação como

oportunidade de crescimento. É com muita emoção que agradeço pelo amor incondicional,

pelo afetuoso cuidado, pelo respeito e apoio às minhas escolhas. Vocês são minha fortaleza!

A Nara, minha querida irmã, por acreditar em mim e estar sempre presente nos

momentos mais significativos da minha vida. Seu companheirismo me dá força para ir mais

além!

A Weber, meu companheiro, por está sempre ao meu lado, e, com seu amor, ter

tornado essa caminhada mais leve. Obrigada pelo seu cuidado e pelas madrugadas nas quais

pacientemente me ajudou!

A Nessa, minha querida amiga, por juntas vivenciarmos essa experiência tão marcante,

e pelos encontros e desencontros que fortalecem a nossa especial amizade. Agradeço às

queridas Anita, Dani Charamba, Leylly e Raíssa por tornarem a graduação mais afetiva, e

pelos laços construídos.

Aos queridos companheiros do LabInt que muito me inspiram, me instigam e me

contagiam com tanto entusiasmo na construção do conhecimento. Agradeço carinhosamente a

Carina, Juliana, Karine, Mel, Nicole, Pedro, Priscila, Simone, Vanessa, pelo acolhimento,

apoio, carinho, atenção, orientações, trocas e coversas. Ter vocês nessa caminhada foi

fundamental para a construção e realização desse trabalho. É imenso meu sentimento de

gratidão por vocês!

Em especial, agradeço a Mel, pela atenção e carinho com os quais me acompanhou

nessa trajetória; pela disponibilidade para me ajudar na finalização da dissertação, apontando

aspectos tão importantes. Agradeço a Vanessa pela leitura cuidadosa da minha dissertação e

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pelas ricas contribuições. E agradeço a Juliana, Mel, Nicole e Priscila pelo apoio

importantíssimo na qualificação. A força de vocês foi fundamental!

À minha turma do mestrado e aos professores, pelas orientações, provocações e

importantes discussões. E a João, pela atenção e carinho que nos recebe e atende aos nossos

pedidos.

A Ana Carvalho e a Fátima Cruz que, com bom senso e leveza, tornaram minha

qualificação um momento rico de aprendizagens, contribuindo significativamente para a

realização desse estudo.

A Fátima Santos e a Ilka Bichara, que, com respeito e simplicidade, compuseram

minha banca de defesa de dissertação, contribuindo com aspectos significativos e abrindo um

leque de possibilidades para que novos trabalhos ganhem vida.

À minha família querida do Caminhando para Jesus, por entender a minha ausência,

pelo apoio consolador e por me mostrar, a todo o momento, o quanto a alegria e o afeto são

essenciais para compormos a nossa vida.

A Vera que, além de me possibilitar o acesso às participantes da pesquisa, foi

especialmente acolhedora e companheira, me permitindo ter vivências marcantes na

comunidade, meu local de pesquisa. Muito obrigada por me receber com tanto carinho!

Às participantes da pesquisa, por terem aberto as portas de suas casas, compartilhando

comigo aspectos importantes de suas vidas. Obrigada por tornarem esse trabalho possível!

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RESUMO

O cuidado da criança envolve diferentes pessoas, concepções e práticas em contextos culturais específicos. Partindo da psicoetologia, uma perspectiva interacionista que possui um olhar biopsicossocial do ser humano – considerando que seu comportamento, assim como sua estrutura orgânica e corporal, é produto e instrumento de seu processo de evolução – o cuidado da criança pode ser compreendido a partir do cuidado parental. Este é concebido como um conjunto de ações e comportamentos selecionados ao longo da história evolutiva da espécie, de modo a garantir a sobrevivência da prole, ajustando-o a transformações socioculturais que caracterizam o modo de vida dos seres humanos. A presente pesquisa tem como objetivo investigar as redes de cuidadores de crianças de zero a seis anos por cuidadores familiares e não familiares em uma comunidade de baixa renda da cidade do Recife. De forma específica, buscou-se identificar, descrever e discutir rotinas, práticas e redes sociais de apoio que configurem o cuidado da criança, bem como perquirir modos compartilhados de cuidar da criança e as significações atribuídas ao cuidado por familiares ou outros adultos que compartilham essa tarefa. Participaram da pesquisa trinta mulheres: 16 mães, 9 avós, 2 babás, 2 empregadas domésticas e 1 tia, na faixa etária de 20 a 80 anos que tinham pelos menos uma criança de zero a seis anos sob seus cuidados. Os dados foram coletados mediante visitas à comunidade com a realização de entrevistas nas residências das participantes, o que possibilitou observar importantes aspectos do cuidado da criança e complementar os dados das entrevistas. O material coletado foi organizado de modo quantitativo, sendo, assim, possível indicar o número de integrantes das redes de cuidado, o número de homens e mulheres e de familiares e não familiares dessas redes, a frequência de crianças a instituições educacionais e outros aspectos relevantes para a caracterização da tarefa de cuidar das crianças. Realizou-se também uma análise qualitativa, buscando-se identificar núcleos de sentidos realçados nas falas das participantes. Os resultados apontam as redes de cuidadores como um importante apoio às famílias e como estratégia para compartilhar o cuidado da criança, sendo tais redes constituídas majoritariamente por mulheres familiares que residem com a criança. A prevalência feminina nas tarefas de cuidado tanto da criança quanto da casa também é um aspecto de destaque, sinalizando a manutenção de uma divisão tradicional das tarefas de cuidado e a sobrecarga de atividades enfrentada pelas mulheres. E, por fim, a instituição educacional se sobressai como um importante componente na maioria das redes de cuidadores, porém se identifica pouca confiabilidade na creche ou no CMEI, o que instiga um olhar mais atento para as questões que envolvem a opção dos pais em compartilhar ou não o cuidado/educação da criança com essa instituição e para o tipo de serviço que ela oferece. Conclui-se que investigar a rede de cuidadores da criança suscita importantes aspectos acerca da dinâmica do grupo familiar com poucos recursos financeiros. Além disso, estudos como este têm um potencial de subsidiar políticas públicas que promovam melhores condições para a criança e a família.

Palavras-chave: rede de cuidadores; cuidado da criança; cotidiano do cuidado; cuidado institucional.

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ABSTRACT

Child care involves different people, concepts and practices in specific cultural contexts. Based on Psychoethology, an interactionist perspective that has a biopsychosocial look on the human being – considering that their behavior and their organic and body structure constitute both a product and an instrument of their process of evolution – the child care can be understood from parental care. This is conceived as a set of actions and behaviors selected along the evolutionary history of the species, as to ensure the survival of the offspring, adjusting it to sociocultural changes that characterize the way of living of human beings. This research aims to investigate the network of caregivers of children aged zero to six years by family and nonfamily caregivers in a low income community in Recife. Specifically, it was sought to identify, describe and discuss routines, practices and social support networks that constitute the child's care as well as to assert shared modes of child care and the meanings assigned to care by relatives or other adults who share this task. Thirty women participated in the study: 16 mothers, 9 grandmothers, 2 babysitters, 2 maids and 1 aunt, aged 20-80 years who had at least one child from birth to six years under their care. Data were collected by means of visits to their community with interviews held in the homes of the participants, which made it possible to observe important aspects of child care and complement the interview data. The collected material was organized in a quantitative manner, indicating the number of participants of the networks of care, the number of men and women as well as the family and nonfamily members of these networks, the attendance of children in educational institutions and other aspects relevant to the characterization of the task of taking care of the children. A qualitative analysis was also conducted, seeking to identify nuclei of meaning highlighted in the speech of the participants. The results indicate the networks of caregivers as an important support for families and as a strategy to share the care of the child, and that those networks are mostly consisted of women members of the family residing with the child. The female prevalence in care of both the child and the house is also a prominent aspect, signaling the maintenance of a traditional division of care tasks and activity overload faced by women. And finally, the educational institution stands out as an important component in most networks of caregivers, but poor reliability is identified in the day care or CMEI, which instigates a closer look into the issues involving the choice of parents to share or not to share the care / education of the child with that institution and the type of service it offers. The conclusion is that investigating the network of caregivers of children raises important issues about the dynamics of the family group with poor financial resources. Furthermore, studies like this have the potential to support public policies that promote better conditions for children and families.

Keywords: network of caregivers; child care; daily care; institutional care.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Quadro 1 – Idade (em faixa etária) e nível de escolaridade das participantes da pesquisa ............................................................................................................ 32 Quadro 2 – Instituições educacionais municipais que atendem à comunidade ........................ 34 Quadro 3 – Tarefas de cuidado com base nas atividades do cotidiano da criança .................................................................................................................... 58

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Número de crianças que cada entrevistada tem sob seus cuidados ................................................................................................................ 33 Tabela 2 – Tamanho da rede relacionada ao número de redes e de crianças atendidas em cada rede ......................................................................................... 41 Tabela 3 – Número de crianças atendidas em instituição educacional relacionado ao tamanho da rede e ao número de crianças por rede ..................... 42 Tabela 4 – Número de crianças de acordo com sua faixa etária e tamanho da rede .................................................................................................................. 43 Tabela 5 – Número de crianças de acordo com sua idade e tamanho da rede que participa ......................................................................................................... 44 Tabela 6 – Número de cuidadores e sua relação com a criança ............................................. 45 Tabela 7 – Número de cuidadores de acordo com a relação familiar (critério de consaguinidade) ou não familiar ........................................................ 46 Tabela 8 – Número de redes de cuidadores de acordo com o seu tamanho e o número de cuidadores familiares nas redes .......................................................... 49 Tabela 9 – Número de redes de cuidadores de acordo com o seu tamanho e o número de cuidadores não familiares nas redes ................................................... 49 Tabela 10 – Número de cuidadores femininos e masculinos e sua relação com a criança ................................................................................................................... 51 Tabela 11 – Número de redes de acordo com o seu tamanho e o número de cuidadoras femininas ............................................................................................ 51 Tabela 12 – Número de redes de acordo com o seu tamanho e o número de cuidadores masculinos .......................................................................................... 52 Tabela 13 – Cuidadores que residem ou não com a criança e sua relação com ela .................................................................................................................. 52 Tabela 14 – Número de cuidadores de acordo com a coabitação e o parentesco ............................................................................................................. 53 Tabela 15 – Número de cuidadores de acordo com a coabitação e o gênero ................................................................................................................... 53 Tabela 16 – Número de cuidadores de acordo com a coabitação e o parentesco (excluídos mãe, pai e irmã/os) .............................................................................. 54

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Tabela 17 – Número de cuidadores de acordo com a coabitação e o gênero (excluídos mãe, pai e irmã/os) .............................................................................. 54 Tabela 18 – Número de redes de cuidadores de acordo com o seu tamanho e o número de cuidadores residentes .......................................................................... 55 Tabela 19 – Número de redes de cuidadores de acordo com o seu tamanho e o número de cuidadores não residentes ................................................................... 56 Tabela 20 – Tipo de cuidador com base na frequência nos períodos (diurno, noturno e fins de semana) e nas tarefas de cuidado .............................................. 65 Tabela 21 – Número de crianças que frequentam ou não instituições educacionais de acordo com a faixa etária das crianças e o tipo de instituição ........................ 81

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CMEI - Centro Municipal de Educação Infantil USF - Unidade de Saúde da Família ACS - Agente Comunitária de saúde NSEb - Nível Socioeducacional baixo NSEmdA - Nível Socioeducacional médio alto

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 14

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ........................................................................................... 17

2.1 O cuidado parental na perspectiva psicoetológica ................................................................ 17

2.1.1 O cuidado parental na história evolutiva humana .............................................................. 21

2.2 O cuidado da criança e a dinâmica familiar .......................................................................... 23

2.3 O cuidado alternativo: a creche na atenção ao cuidado da criança ....................................... 26

2.4 Objetivos ............................................................................................................................... 30

3 MÉTODO ................................................................................................................................ 31

3.1 Os sujeitos da pesquisa ......................................................................................................... 31

3.2 Contextualizando o local de pesquisa: a comunidade........................................................... 33

3.3 Instrumentos de coleta .......................................................................................................... 34

3.4 Procedimentos de coleta ....................................................................................................... 35

3.5 Procedimentos de análise ...................................................................................................... 38

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................................. 40

4.1 Rede de cuidadores: os sujeitos e as práticas que envolvem o cuidado da criança .............. 40

4.1.1 A dimensão estrutural das redes de cuidadores ................................................................. 41

4.1.1.1 Tamanho das redes .......................................................................................................... 41

4.1.1.2 Composição das redes ..................................................................................................... 45

4.1.1.3 Densidade, Dispersão e Homogeneidade/Heterogeneidade das redes ............................ 56

4.1.2 A dimensão funcional das redes de cuidadores ................................................................. 57

4.1.2.1 Tipo de cuidado............................................................................................................... 58

4.1.2.2 Tipo de cuidador ............................................................................................................. 64

4.1.2.3 Participação do pai .......................................................................................................... 66

4.2 Significando o cuidado da criança ........................................................................................ 67

4.2.1 A prevalência feminina no cuidado da criança .................................................................. 68

4.2.2 O cuidado institucional ...................................................................................................... 81

4.2.2.1 As crianças que frequentam/frequentaram creche/CMEI ............................................... 82

4.2.2.2 As crianças que frequentam (pré)escola pública ou privada .......................................... 92

4.2.2.3 As crianças que não frequentam instituição educacional ............................................... 94

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................. 105

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REFERÊNCIAS ........................................................................................................................ 110

APÊNDICES............................................................................................................................. 115

APÊNDICE A – Roteiro de entrevista...................................................................................... 116

APÊNDICE B – Termo de consentimento livre e esclarecido ................................................. 119

ANEXOS .................................................................................................................................. 122

ANEXO A - Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa ............................................................. 123

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1 INTRODUÇÃO

A literatura que aborda o tema cuidado de crianças é muito ampla, perpassando

disciplinas psi e outras das áreas de humanas, biomédicas e sociais aplicadas. Os estudos

sobre essa temática têm, por isso, a possibilidade de, dialogar com diferentes áreas do

conhecimento (CARVALHO; FRANCO; COSTA; OIWA, 2012). Ademais, debruçar-se

sobre cuidado de crianças, implica, necessariamente, adentrar no contexto sociocultural, uma

vez que a compreensão desse fenômeno perpassa importantes questões no que diz respeito às

transformações socioeconômicas, à dinâmica familiar, às relações de gênero, às políticas

públicas etc.

Em Psicologia, a perspectiva psicoetológica tem se colocado como uma importante

abordagem no estudo sobre a temática do cuidado da criança. Com base nessa perspectiva,

apoiada em um olhar biopsicossocial, Carvalho, Bussab e Rabinovich (2013) apresentam

significativas evidências acerca do cuidado parental e seu compartilhamento no reino animal,

principalmente entre primatas humanos e não humanos, bem como as transformações dessa

prática nos diferentes modos de vida características da espécie humana. Nesse contexto as

autoras afirmam que “modos de vida e de produção, concepções e valores culturais

circunscrevem as variações nos modelos de cuidado, dentro dos limites de flexibilidade das

adaptações humanas.” (p. 97).

Desse modo, frente às transformações que possibilitaram a redefinição da tarefa de

cuidar, o papel da mulher tem assumido lugar de destaque. Algumas décadas atrás, o cuidado

de crianças era tarefa exclusiva da mulher que não estava inserida no mercado de trabalho. A

prole de cada família era mais extensa do que hoje e existiam vários familiares (avós, tias e

outras parentes, geralmente escolhidas para ser madrinha) que compartilhavam o cuidar dos

filhos de uma grande família. Algumas vezes, o irmão ou irmã mais velha recebia dos pais a

incumbência de cuidar do irmão mais novo, delineando, assim, uma rede hierárquica de

responsabilidades (CORSARO, 2011b).

O contexto sociocultural mudou e a mulher de todas as camadas de renda passou a ser

trabalhadora. Ela buscou não somente a divisão de tarefas de cuidar dos filhos com o

companheiro, mas também lutou para que o Estado promovesse política de atendimento a

crianças em ambientes seguros. Surgiram, timidamente, algumas creches, de responsabilidade

de Secretarias de Assistência Social, acompanhando uma tendência já em curso de caráter

filantrópica. Aos poucos, as exigências se tornaram mais especificas para um cuidar com

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melhor qualidade e, então, no final da década de 90, as creches passaram para a

responsabilidade de Secretarias de Educação e o cuidar foi transformado em cuidar/educar,

binômio que vem sendo respaldado com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional/96

– LDBEN/96 – (BRASIL, 1996), que incluiu as creches ao sistema de ensino. Estas atendem

crianças de 0 a 3 anos, em período parcial ou integral, e juntamente com as pré-escolas,

voltadas às crianças de 4 e 5 anos, constituem-se como primeira etapa da educação básica. Do

ponto de vista da legislação brasileira, portanto, as creches se transformaram em instituições

de direito da criança pequena. Os pais, entretanto, não são obrigados a matricular o filho

numa creche; é uma opção deles compartilhar a responsabilidade de cuidar e educar os filhos

com o Estado. Muitos se utilizam de redes sociais alternativas; isso ocorre por opção ou por

não dispor de instituição educacional no bairro ou comunidade onde moram.

Nesse sentido, percebe-se a importância que assume o estudo do cuidado da criança,

visto que põe em evidência um contexto de interação que envolve ambiente, criança,

familiares e possíveis cuidadores. Isto é corroborado por Carvalho et al. (2012) ao exporem

que o ato de cuidar envolve redes que incluem tanto os familiares (mãe, pai, irmão, avós)

quanto não familiares (vizinhos, amigos, babás, creche), além dos processos de sociabilidade

e comunicabilidade entre os sujeitos.

Outras importantes questões possuem estreita relação com a prática do cuidado, o que

pode ser evidenciado quando Carvalho et al. (2013, p. 97) colocam que “as transformações

nos sistemas de cuidado parental são necessariamente acompanhadas por ajustes nas

concepções sobre a infância e a educação, e, portanto também em práticas de cuidado

diferenciadas e resultados diferentes dessas práticas.” Nesse sentido, torna-se perceptível o

quanto investigar o cuidado implica que o pesquisador tenha um olhar amplo que possibilite

abarcar as diversas questões que envolvem essa prática e que dela podem emergir.

O diálogo com essas questões suscitou o interesse em estudar o cotidiano da criança

com o intuito de perscrutar as práticas que caracterizam o ato de cuidar de crianças e as

significações atribuídas pelos cuidadores a essa tarefa em um contexto sociocultural

específico no qual a criança é cuidada.

A opção por investigar o cuidado sob a perspectiva dos cuidadores é subsidiada por

um interesse anterior de estudar a criança considerando seus pais ou responsáveis, tanto pelo

dever que têm em promover o desenvolvimento da criança, quanto pelas obrigações sociais

que lhes são atribuídas para garantir a proteção da criança. Apoiando esse interesse Long,

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Wilson, Kutnick, e Telford1 (1996 apud RAPOPORT; PICCININI, 2004) expõem que a

revisão da literatura evidencia a existência de poucos estudos que se propõem explorar as

atitudes dos pais a respeito dos cuidados infantis, suas escolhas por cuidados alternativos

dentro e fora do âmbito familiar, bem como suas expectativas referentes a tais cuidados.

Ademais a proposta de realizar um estudo no ambiente em que a criança é cuidada –

além de convergir com a proposta da Psicoetologia de realizar estudos no ambiente natural, ou

seja, no ambiente onde o fenômeno se expressa – visa alçar indícios importantes para a

compreensão do cotidiano do cuidado, bem como instigar que mais estudos valorizem a

aproximação com o contexto de desenvolvimento da criança. “É consensual o reconhecimento

de que é em torno da família que se estrutura a vida cotidiana, especialmente quando as

políticas públicas são omissas e/ou não igualitárias em relação aos direitos humanos mais

básicos [...]” (BASTOS; ALCÂNTARA; FERREIRA-SANTOS, 2002, p. 99).

Sendo assim, considerando a proposta dessa pesquisa, são apontadas como questões

norteadoras para esse estudo: Como se organiza o cuidado da criança? Quais as pessoas e as

tarefas que configuram o cuidado da criança? Quais os significados que delineiam essa

prática? Como a dinâmica do cuidado repercute na organização familiar a nas relações que se

estabelecem nesse contexto?

1 Long, P.; Wilson, P.; Kutnick, P.; Telford, L. Choice and childcare: a survey of parental perceptions and views. Early Child Developmental and Care, v. 119, p. 51-63, 1996.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 O cuidado parental na perspectiva psicoetológica

Adentrando no campo da Psicologia, no qual a investigação sobre o cuidado parental

tem sido recente, busca-se a compreensão desse fenômeno a partir de uma perspectiva

psicoetológica, que considera tanto a estrutura orgânica quanto o comportamento, isto é, a

psicologia de uma espécie, como, concomitantemente, instrumento e produto de seu processo

evolutivo.

A Etologia pode ser caracterizada como uma perspectiva que se propõe a estudar e

discutir os comportamentos típicos de cada espécie e como se dá a sua ocorrência em

condições naturais. Investiga os elementos biológicos que garantem a sobrevivência do

indivíduo e da espécie, bem como as funções adaptativas do comportamento, considerando o

contexto ecológico (PRADO, 2005). Ardans (1996) afirma que a Etologia é um termo que

identifica um campo de conhecimento que se caracteriza pelo estudo comparativo do

comportamento, pela perspectiva evolucionária do estudo do comportamento, seja animal

humano ou não humano. Esse estudo pode ser tanto intraespecífico, observação e análise do

modo de vida de uma espécie em seu meio ambiente, quanto interespecífico, estudo das

relações entre diferentes espécies em um meio ambiente comum, considerando a dimensão

evolutiva filogenética e ontogenética. O autor ainda expõe que a Etologia, desde o início, se

caracterizou pelo uso privilegiado da observação dos organismos em seu meio ambiente

natural que de acordo com Carvalho (1988) é o ambiente onde se encontram às pressões

seletivas que atuaram no sentido de tornar uma característica adaptativa, explicando, assim,

sua seleção.

Estando a perspectiva psicoetológica orientada por um olhar evolucionista, uma vez

que se baseia no estudo da espécie considerando sua história evolutiva filogenética e

ontogenética, é importante apontar que a evolução, nessa perspectiva, vai ser concebida como

um “processo dialético e dinâmico, ao qual não se aplicam raciocínios lineares.”

(CARVALHO et al., 2013). De acordo com Ades (2009) a perspectiva evolucionista realiza a

interpretação do comportamento humano como adaptação tanto do ambiente físico quanto do

ambiente social onde o ser humano enquanto espécie teve sua evolução. É uma abordagem

comparativa entre o ser humano e outros animais, no que tange às suas semelhanças e

diferenças, que busca averiguar, a partir do confronto, a possibilidade de aplicar os preceitos

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de uma lógica evolucionista. Freitas e Lamas (2010), sobre a Psicologia Evolucionista, afirma

que, basicamente, sua meta é entender a mente humana, o comportamento humano no que se

refere a sua história.

Nesse contexto, mostra-se fundamental apontar a concepção de sujeito que embasa

essa pesquisa. A Psicoetologia concebe o ser humano como um ser biopsicossocial, ou seja,

um ser biologicamente sociocultural, um ser que tem suas características compreendidas

“como parte de um equipamento biopsicológico adaptado a certa modalidade de vida social: a

que envolve a inserção numa cultura.” (CARVALHO, 1988, p. 32) Nesse sentido, Bussab e

Ribeiro (1998) afirmam, a partir da compreensão do impacto da cultura no processo evolutivo

do ser humano, a possibilidade de a seleção natural ter iniciado o favorecimento de genes para

o comportamento cultural quando nossos ancestrais começaram a desenvolver, para a sua

sobrevivência, uma dependência da cultura. A partir disso, torna-se evidente, de acordo com

CARVALHO (1988) que a evolução cultural não se coloca como oposta a evolução biológica;

ambas podem ser concebidas como inseparáveis na história evolutiva do ser humano. Diante

disso, é possível considerar a psicoetologia como uma perspectiva interacionista, que se

caracteriza por uma “[...] compreensão integrada dos efeitos dos fatores hereditários e

ambientais, com reconhecimento da complexidade e inseparabilidade entre eles.” (BUSSAB,

2000, s/p) Ou seja, uma abordagem que, esvazia a oposição entre inato e adquirido ao

considerar que tanto os genes quanto o ambiente podem de maneiras diversas afetar o

comportamento e também por acreditar na impossibilidade de separação dos efeitos da

experiência e dos genes no comportamento (CARVALHO, 1988).

É interessante expor que o ser humano, segundo Carvalho (1988), é sensível tanto as

contingências ambientais quanto, de modo especial, as contingências históricas e culturais, o

que não significa negar a história evolutiva humana, uma vez que tais contingências e a

suscetibilidade a estas são também consideradas instrumento e produto do processo evolutivo,

caracterizando a especificidade humana. A partir disso, percebe-se a importância do diálogo

entre essa perspectiva psicoetológica e demais ciências como a Antropologia, a História, a

Sociologia; isto porque sendo o ser humano constituído em um modo de vida sociocultural,

sua compreensão implica debruçar-se sobre as várias dimensões: biológica, social, histórica,

cultural.

Partindo da Psicoetologia, no diálogo com outras ciências acima citadas, Carvalho et

al. (2013) refletem acerca da Família e do Comportamento Parental, situando-o

comparativamente no reino animal e, de modo particular, no campo evolutivo dos primatas,

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buscando examinar suas funções adaptativas, as relações com as pressões do meio ambiente e

os modos de vida que lhe são associados. Apontando importantes evidências, as autoras

expõem que são presentes entre os seres humanos tanto as diferentes configurações familiares

quanto a diversidade de cuidado parental existentes no reio animal, exceto a não existência da

família e a troca de parceiros sem cuidado parental, embora apontem, ainda que incomum, ser

possível no ser humano a troca de parceiros com cuidado coletivo, trazendo como exemplo da

contemporaneidade as comunidades hippies. As autoras também afirmam que há uma

variabilidade do tempo de convivência e do cuidado parental que vai desde apenas um ciclo

reprodutivo até a vida inteira do/s progenitor/es cuidador/es. Ademais, o parentesco não é

concebido como critério por excelência, uma vez que se pode constatar a adoção de filhotes

de pais diferentes, bem como de outras espécies.

Ainda no que se refere à estrutura familiar e ao cuidado parental no reino animal,

Carvalho et al. (2013) apontam que mesmo havendo variabilidade nesse arranjo familiar e de

cuidado, todos os primatas utilizam a estratégia K – estratégia reprodutiva que tem como

características um crescente custo reprodutivo, que envolve diferentes graus de investimento

parental e decrescente número de filhotes/ovos a cada estação reprodutiva, associando-se

positivamente, no que se referem as suas variantes, à dependência do filhote. A mãe tem sua

participação no cuidado garantida através da amamentação, havendo variação tanto na sua

duração como no vínculo entre mãe e filhote durante a vida. Já o pai, quanto à sua

participação, há uma maior variabilidade, assim como a de outros integrantes do grupo.

A partir disso, percebe-se claramente, de acordo com Carvalho et al. (2013) entre os

primatas, sobretudo no ser humano, o quanto

[...] as alternativas de configuração familiar e de cuidado parental podem assumir como foi visto, diversas combinações possíveis de estabilidade/ instabilidade de unidades familiares, maior ou menor participação de pais no cuidado, maior ou menor participação de outros cuidadores – com forte tendência para maior participação do sexo feminino. Seus limites parecem ser a necessidade de algum tipo de unidade familiar (ainda que uniparental) e, na maioria dos casos, de algum grau de compartilhamento do cuidado. (p. 102-103).

No que diz respeito ao compartilhamento do cuidado, Hrdy2 (2005 apud CARVALHO

et al., 2013) expõe que é raro o compartilhamento do cuidado parental no reino animal,

2 HRDY, S. B. Evolutionary context of human development: The cooperative breeding model. In: CARTER, C.S.;LAHNERT, K.E.; GROSSMAN, K.; HRDY, S.B.; LAMB, M. E.; PORGES, S.W.; SACHSER, N. (Eds.) Attachmnent and bonding – A new synthesis. Cambridge, MA/ Londres: MIT Press, 2005, p. 9-32.

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ocorrendo de formas distintas em mamíferos, aves e insetos sociais. No entanto, ao se referir

aos primatas, afirma que todos são fortemente sociais e favoráveis a algum grau de cuidado

compartilhado, o que pode ser evidenciado na tendência a proteger os filhotes e ser atraídos

por eles, bem como na forte atração por segurar e carregar filhotes. Além disso, os primatas

possuem os bebês que demandam maior investimento parental, exigências nutricionais e de

proteção, possuindo um tempo maior de imaturidade e dependência. Nesse contexto, as

autoras apontam os possíveis fatores seletivos que atuaram de modo a direcionar o cuidado

parental compartilhado no ser humano, tais como o coletivismo das sociedades pré-históricas

e pré-humanas, a disponibilidade de cuidadoras não familiares (“alomães” aparentadas) e as

condições que poderiam dificultar um modo de reprodução com cuidado uniparental ou

excepcionalmente parental.

Hrdy (2005 apud CARVALHO et al., 2013) ao levantar questões referentes ao

compartilhamento do cuidado parental e as condições que a propiciam, apontando possíveis

ganhos evolutivos dessa prática, apresenta algumas hipóteses. Uma delas tem como base o

conceito de aptidão inclusiva no qual se expõe que a colaboração de indivíduos para a

sobrevivência de seus parentes aumenta a probabilidade de seus genes permanecerem na

população, o que se pode dizer de uma possível “seleção de parentes”. Isso poderia explicar,

primeiramente, a participação dos pais no cuidado, uma vez que estes compartilham uma

maior carga genética com os filhotes, garantindo a permanência de uma maior proporção de

genes na população (50% de cada progenitor). A partir disso, dentre outros argumentos, Eibl-

Eibesfeldt3 (1989 apud CARVALHO et al., 2013) considera que “[...] o cuidado parental é a

forma primária de altruísmo no reino animal.” (p. 89), sendo sua evolução um elemento

primordial na evolução da sociabilidade entre insetos sociais e vertebrados. Ademais, a

aptidão inclusiva pode justificar a participação de outros sujeitos no cuidado parental, tais

como irmãos, tios, avós (a depender do grupo social), visto que há entre estes um

compartilhamento de genes, ainda que em menor proporção em relação aos pais. Ainda sobre

o ganho evolutivo desse compartilhamento de cuidado, são expostos alguns benefícios

potenciais para esses outros cuidadores como: a concessão para permanência em seu grupo de

origem, a possibilidade de conseguir uma melhor posição no grupo por estabelecer relações

afiliativas, e a obtenção de experiência como cuidador.

3 EIBL-EIBESFELDT, I. Human ethology. NY: Aldine de Gruyter, 1989.

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2.1.1 O cuidado parental na história evolutiva humana

Direcionando o foco para o ser humano Carvalho et al. (2013) também evidenciam

importantes transformações no cuidado parental, considerando momentos específicos da

evolução humana com seus característicos modos de vida e de produção.

Ao se ter como ponto de partida o modo de vida pré-histórica, que na história da

evolução humana representa a maior parte, os grupos eram formados por famílias extensas,

tendo como meio de subsistência a caça e a coleta com compartilhamento dos produtos entre

os membros. Havia uma tendência a poliginia, mas também a existência de relações

monogâmicas temporárias que se associavam, provavelmente, a um momento de maior

dependência dos filhos (cf. HINDE, 1987)4. Adentrando nas sociedades contemporâneas de

caça e coleta, estas se caracterizam por um modo de vida com um padrão reprodutivo de

poucos filhos e elevado investimento parental, com intenso cuidado materno para os padrões

do ocidente. Há o compartilhamento do cuidado, principalmente, com as demais mulheres

(avós, tias e irmãs mais velhas) que se ajudam entre si, ainda que nos primeiros anos de vida

da criança seja a mãe a principal cuidadora. O pai tem sua participação na subsistência e

proteção dos membros do grupo, bem como na interação lúdica com as crianças, demandando

de todo o grupo muito interesse, atenção e tolerância.

Com o advento do modo de vida agrícola, há cerca de 10 mil anos, ocorrem

significativas transformações. A família vai se caracterizar por um modelo patriarcal, com a

aceitação e valorização da poliginia; a mulher tem sua atividade produtiva, gradativamente,

restrita à maternidade e ao ambiente doméstico; e o grande número de filhos passa a ser

sinônimo de riqueza, uma vez que se transforma em recurso humano para a atividade de pasto

e cultivo. Diferenças emergem no que diz respeito às estratégias de cuidado devido às

desigualdades, tendo as crianças seu cuidado partilhado tanto com as mulheres da família

como com outras, remuneradas ou não (amas de leite, escravas e servas), isso nas famílias

favorecidas economicamente. Já a função paterna tem seu foco na promoção da subsistência e

na autoridade do pai sobre os componentes da família (cf. ENGELS, 1884/2002)5.

Adiante, com surgimento do modo de produção industrial, transformações radicais

acontecem no modo de vida. Nesse contexto caracteriza-se como uma das transformações

mais marcantes o crescimento das cidades em decorrência do êxodo rural, que vai se

4 HINDE, R. A. Individuals, relationships and culture – Links between ethology and social sciences. NY: Cambridge University Press, 1987. 5 ENGELS, F. A origem da família, da propriedade privada e do estado. RJ: Bertrand Brasil, 1884/ 2002.

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constituir como fator significativo para a emergência da família nuclear. Na sociedade

ocidental a monogamia se torna regra, mas pode coexistir com a poliginia em outros lugares

do mundo. Nas práticas de cuidado, mais uma vez, vai haver variações associadas às

diferenças socioeconômicas, no entanto permanece o apoio dos familiares (irmã mais velhas,

tias e avós), principalmente nas famílias menos favorecidas, bem como de cuidadores não

familiares, geralmente mulheres (vizinhas ou demais conhecidas nas famílias mais pobres e

babás e trabalhadoras domésticas nas famílias mais ricas).

Apesar de os contextos apresentados mostrarem um modo de vida característico das

sociedades ocidentais, é possível perceber semelhanças em outras sociedades, no tocante ao

compartilhamento do cuidado. Corsaro (2011b) ao apresentar estudos em famílias não

ocidentais, no que diz respeito à socialização inicial, aponta dados significativos do contexto

africano, demonstrado haver no país uma longa tradição de crianças pequenas possuírem

múltiplos responsáveis. Ao se referir a um estudo de um grupo específico da África, os Efes

(Pgimeus), expõe que as crianças desse grupo ficavam longe de suas mães grande parte do

tempo, uma vez que estas voltavam ao trabalho poucos dias após o parto. E no local de

trabalho, geralmente, o cuidado das crianças era compartilhado por vários indivíduos (cf.

TRONICK; MORELLI; WINN, 1987)6. Em outro estudo, ao apresentar o cuidado das

crianças em Camarões, essa prática é descrita como um empreendimento social com a

participação de pais e parentes, contando, algumas vezes, com amigos e vizinho, assim como

com a frequente participação de crianças mais velhas. É destacado que tarefas relacionadas à

rotina de cuidado nunca são destinados aos pais, além disso, ao ocorrer o desmame das

crianças, grande parte do seu cuidado é assumido, com autorização da mãe, pelos irmãos mais

velhos ou amigos (cf. NSAMENANG, 1992)7. Corsaro (2011b) ainda apresenta dados

significativos no tocante ao cuidado entre pares com idades distintas documentados em alguns

países no Leste africano. Em tais sociedades, com frequência, a criança com 1 ano e 3 meses

ficava sob o cuidado de crianças babás, com idade entre 6 e 10 anos, consideradas

responsáveis primárias. E as mães normalmente retornavam, em tempo integral, ao trabalho

agrícola (cf. HARKNESS; SUPER, 1992)8.

6 TRONICK, E.; MORELLI, G.; WINN, S. Multiple caretaking of EFE (pygmy) infants. American Anthropologist, v. 89, p. 96-106, 1987. 7 NSAMENANG, B. Early childhood care and education in Cameroon. In: LAMB, M.; STERNBERG, K..; HAWANG, C.; BROBERG, A. (Eds.). Child care in context: Cross cultural perspectives. Hillsdale, NJ: Lawrence Erlbaum, 1992, p. 441-459. 8 HARKNESS, S.; SUPER, C. Shared child care in east Africa: Sociocultural orings and developmental consequences. In: LAMB, M.; STERNBERG, K..; HAWANG, C.; BROBERG, A. (Eds.). Child care in context: Cross cultural perspectives. Hillsdale, NJ: Lawrence Erlbaum, 1992, p. 441-459.

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É importante salientar que em tais sociedades, no que se assemelha com o modo de

vida ocidental, o compartilhamento do cuidado de crianças também tem sua estruturação em

função do trabalho da mulher fora do ambiente doméstico. Nas sociedades ocidentais, a

entrada da mulher no mercado de trabalho, com acentuado crescimento a partir da década de

50 do século XX, há um drástico aumento da necessidade de cuidados externos, assumindo,

assim, o cuidado compartilhado novas proporções (CARVALHO et al., 2013; CORSARO,

2011b). Na Europa ocidental, segundo Corsaro (2011a), a maioria dos países rapidamente

respondeu a tais exigências de cuidado da criança no âmbito externo com a rápida expansão

de programas para a educação infantil. Entretanto, nos Estados Unidos, havia uma crença

entre a maioria dos pais de que as crianças na faixa etária correspondente a pré-escola teriam

melhor atendimento em casa, isso até recentemente. E mesmo que estes valores estejam, hoje,

destoantes da realidade econômica norte-americana, tanto os pais quanto o governo ainda são

relutantes quanto ao fato de os filhos deixarem o cuidado da família antes mesmo de

atingirem a idade necessária para iniciar a educação formal (cf. MASON; KUHLTHAU,

1989; HOFFERTH et al., 1991)9.

2.2 O cuidado da criança e a dinâmica familiar

Significativas transformações vêm redefinindo e modificando concepções e práticas de

cuidados de crianças, principalmente no âmbito familiar, revelando, assim, um rico campo de

investigativo. Castro et al. (2012), partindo de uma pesquisa realizada em 30 países (cf.

GEORGAS et al., 2006)10, ressaltam importantes fatores que constituem esse contexto de

transformações dos quais se pode apontar a nuclearização da família, com a consequente

diminuição da família extensa, como a mudança mais fortemente influenciada pelas alterações

ocorridas na sociedade. Esse padrão de residência nuclear foi percebido em mais da metade

dos países e como tendência nas famílias extensas em um terço dos países, estando

relacionado a fatores econômicos e à urbanização. Ademais, essa transição da família extensa

para a nuclear demonstra um possível efeito limitado sobre práticas de apoio recíproco e laços

9 MASON, K.; KUHLTHAU, K. Determinants of child care ideals among mother of preschool-aged children. Journal of marriage and the family, v.511, 1989, p. 593-603. HOFFERTH, S.; BRAYFIELD, A.; DEICH, S.; HOLCOMB, P. National Child Care Survey, 1990. Washington, DC: The Urban Institute Press, 1991. 10 GEORGAS, J.; et al. Families across cultures: a 30-nation psychological study. Cambridge: Cambridge University Press, 2006.

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afetivos entre pais e filhos. Entretanto, essa nova configuração nuclear não deve ser associada

à ausência das influências e laços dos demais familiares, visto que vários autores afirmam ser

função da família ou função dos pais os cuidados de criança. Além disso, residir próximo dos

pais do recém-casal foi uma tendência comum nos países industrializados do ocidente.

Mudanças no tocante ao casamento, divórcio e número de filhos também são fatores

expostos por Georgas et al. (2006 apud CASTRO et al., 2012), que expõem um aumento nas

taxas de divórcio e na idade do casamento, e uma diminuição no número de filhos. Esse

aumento na idade do casamento está associado ao aumento de tempo para a conclusão dos

estudos e entrada no campo profissional, bem como aos custos para a constituição de uma

família. No que tange à taxa de divórcio, seu aumento ocorre em conjunto com o crescimento

do número de crianças vivendo com um dos pais apenas, geralmente a mãe. A taxa de

divórcio também foi ressaltada como possuindo relação com a idade do casamento, sendo

ambas percebidas como causas do enfraquecimento de casamento. Em se tratando do número

de filhos, sua diminuição se relaciona com a tendência de aumento na idade das mulheres ao

se casarem. É também perceptível nos países ocidentais um maior número de crianças

nascidas de mulheres não casadas. Sendo assim, evidencia-se claramente o quanto esses

fatores influenciam decisivamente na constituição de novas configurações familiares e em sua

dinâmica, o que reverbera nas práticas e forma de cuidado da criança.

Ainda nesse contexto de transformações Castro et al. (2012) se referem a mudanças na

hierarquia patriarcal tradicional no que diz respeito aos papeis de mãe e de pai e, mais

especificamente, ao decréscimo da autoridade masculina, visto que a partilha do poder é

salientada como uma tendência entre os pais; no entanto isso não pode significar a existência

de uma igualdade. Nesse sentido, têm-se como razões para tais mudanças o trabalho da

mulher fora de casa e a elevação do seu nível educacional (cf. GEORGAS et al., 2006).

É importante enfatizar a entrada da mulher no mercado trabalho e sua crescente

atuação nos diversos campos profissionais, visto que são fatores apontados de forma

recorrente por vários autores (CARVALHO et al., 2008; CORSARO, 2011b; CASTRO et al.,

2012; CARVALHO; et al. 2013) ao tratarem de mudanças significativas na organização e

estrutura familiar, o que inclui fortemente os papeis de pais e mães no cuidado de seus

filhos/as. Alguns estudos (ROCHA-COUTINHO, 2003; WAGNER; PREDEBON;

MOSMANN; VERZA, 2005; ARAÚJO; SCALON, 2006) revelam importantes achados a

cerca da participação masculina em atividades tradicionalmente concebidas como femininas,

tais como o cuidado de filhos/as e tarefas domésticas. Tais estudos mostraram, de forma

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unânime, haver uma maior participação masculina no cuidado de seus filhos/as do que em

atividades domésticas. Alguns estudos, especificamente, afirmaram que os papeis de pais e

mães no tocante ao cuidado e tarefas domésticas ainda são percebidos de modo conservador;

que a participação masculina no cuidado de crianças é mais valorizada do que em atividades

domésticas tanto pelos homens quanto pelas mulheres; e que as atividades realizadas pelos

pais no cuidado são, geralmente, em parceria com a mãe, principalmente no brincar.

Incentivar esse envolvimento dos pais com seus filhos/as se mostra relevante, visto

que, embora significativas mudanças venham ocorrendo, principalmente no que se refere à

entrada da mulher no mercado de trabalho, esta é ainda concebida como a principal

responsável pelo cuidado dos/as filhos/as e da casa, e o homem como o provedor e figura de

autoridade. Caldeira et al. (2012) afirmam que as vozes masculinas apontam assimetria de

gênero pela distância percebida entre ser e fazer, prover e cuidar, mesmo já havendo

participação masculina no cuidado de crianças. Além disso, esse foco na mulher como

principal cuidadora pode ser percebida quando essa mesma autora expõe que apesar de haver

uma preocupação entre pais e mães em realizar um projeto comum, ao se tratar da filiação,

ainda se percebe o papel materno sendo concebido como algo vinculado à natureza da mulher.

Ou seja, no tocante às atividades que envolvem o cuidado dos/as filhos/as, essas são

percebidas como sendo naturais ao sexo feminino. O que permite a cristalização de uma

concepção sobre o cuidado na qual a mãe assume o papel principal.

Nesse sentido, é possível pensar essa concepção da mulher como principal responsável

pelo cuidado de crianças e atividades domésticas como possuindo estreita relação tanto com a

desvalorização do trabalho da mulher fora de casa, bem como com a visão do cuidado

masculino como sendo algo complementar ao cuidado feminino. Geralmente a mulher recebe

salários mais baixos do que o do homem, tem menos acesso a cargos de chefia e autoridade, é

discriminada devido à possibilidade de engravidar, entre outros; e a sua contribuição

financeira ainda é vista secundária e auxiliar ao provimento do marido, ainda que ganhe mais

que ele (DINZ, 1999; ROCHA-COUTINHO, 2003). Ademais, estudos apontam haver um

descompasso entre os papéis exercidos por homens e mulheres dentro e fora do âmbito

doméstico. À proporção que as mulheres mostram-se mais propensas a exercer funções

concebidas tradicionalmente como masculinas no mercado de trabalho, os homens, em sua

maioria, se mostram mais relutantes em desempenhar atividades consideradas

tradicionalmente como femininas, principalmente as relacionadas ao cuidado; quando

desempenhadas por eles, isso ocorre de forma a auxiliar ou complementar o cuidado da mãe

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(ARRAIGADA, 2000; FLECK; WAGNER, 2003; ROCHA-COUTINHO, 2003; ARAÚJO;

SCALON, 2006).

Diante do exposto, é possível evidenciar a gama de questões que perpassam o cuidado

de crianças, sobretudo como este fenômeno também nos oferece importantes subsídios para a

compreensão da dinâmica e da estrutura familiar tanto no contexto micro do próprio

enredamento familiar quanto no contexto macro sociocultural. Assim, percebe-se:

[...] o quanto ainda é necessário descrever, documentar e analisar crítica e comparativamente, em diversos recortes disciplinares, para que se possa alcançar novas compreensões sobre os caminhos das transformações na família e seus impactos sobre o lugar de homens e mulheres no contexto familiar, especialmente no que diz respeito à função socialmente priorizada desse contexto, o cuidado dos filhos (CASTRO et al., 2012, p. 25).

2.3 O cuidado alternativo: a creche na atenção ao cuidado da criança

De acordo com a discussão empreendida, pode-se perceber o quanto o trabalho da

mulher fora do âmbito doméstico influenciou fortemente a busca por cuidados alternativos.

De acordo com Davies e Thornburg11 (1994 apud RAPOPORT E PICCININI, 2004), os

cuidados alternativos referem-se a tipos de cuidados não-parentais, destacando-se em quatro

principais tipos: creches e pré-escolas; creche familiar (grupo de crianças na casa do próprio

cuidador); cuidado da criança em sua casa por babá ou empregada; e cuidado da criança por

parente em sua casa ou na casa da criança.

No que se refere às escolhas pelo cuidado alternativo, Rapoport e Piccinini (2004)

apontam os seguintes fatores: as condições econômicas; estrutura e apoio social da família no

cuidado da criança; as crenças e as práticas que envolvem o cuidado de crianças; grau de

escolaridade dos pais; etnia; e idade da criança. No entanto, é recorrente nas pesquisas sobre

esse tipo de escolha a ênfase no emprego materno e nas condições financeiras para pagar pelo

serviço de cuidado, focando pouco os fatores: tamanho da família, idade da criança,

disponibilidade do marido ou proximidade dos parentes.

Outro fator importante sobre o cuidado alternativo foi exposto no estudo de Shpancer

e Bennett-Murphy12 (2006 apud VASCONCELLOS; SEABRA; EISENBERG; MOREIRA,

11 Davies, N. S.; Thornburg, K. R. Child care: a synthesis of research. Early Child Development and Care, v. 98, p. 39-45, 1994. 12 SHPANCER, N; BENNETT-MURPHY, L. The link between daycare experience and attiudes toward daycare and maternal employment. Early Child Development employment and Care. v. 176, n. 1, p. 87-97, 2006.

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2012) o qual apontou que, quando pequenos, os pais que tiveram cuidado alternativo possuem

atitudes mais favoráveis a respeito desse tipo de cuidado, bem como acerca do trabalho

materno, quando comparados aos pais criados por suas mães em casa.

Em se tratando da creche, essa instituição tem se mostrado como uma importante

alternativa para o cuidado da criança. O Censo escolar 2012 realizado pelo Instituto Nacional

de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira (INEP) aponta que entre 2007 e 2012

houve um aumento de 62% no número de matrícula em creche, revelando uma forte tendência

de expansão no que se refere ao número de crianças matriculadas em creche.

Entretanto para que a creche se consolidasse como uma instituição educacional foi

preciso percorrer uma trajetória relatada aqui de forma breve. A creche tem sua história

atrelada às transformações do papel da mulher na sociedade e suas implicações no seio da

família, principalmente no que se refere à educação dos filhos. O atendimento de crianças em

creche, até o início de 1900, não diferia do atendimento em internatos e asilos, estando

destinado, basicamente, a filhos cujas mães eram solteiras e sem condições de criá-los. Com a

chegada da industrialização, na segunda metade do século XVIII, muitas mulheres passaram a

incorporar os trabalhos nas fábricas, tendo as mães que buscar alternativas para o cuidado dos

filhos, muitas delas, pagando vizinhas para realizar essa tarefa. Nesse novo contexto o

operariado passou a reivindicar melhores condições de trabalho, além de creches para seus

filhos. Assim, creches e escolas foram construídas pelos donos de indústrias de modo a conter

os movimentos dos operários. Entre as décadas de 30 e 50, as poucas creches, fora a das

indústrias, eram de responsabilidade de instituições filantrópicas. Nessa época, médicos e

sanitaristas também eram em defesa da creche devido à preocupação com as condições de

vida das pessoas pobres que, em geral, residiam em locais insalubres e superlotados. Vê-se,

diante disso, que o trabalho na creche era de cunho assistencial e filantrópico, não sendo

valorizado um trabalho educativo ou que visasse atender emocionalmente às crianças. Em

meados do século XX, a participação da mulher no mercado do trabalho aumenta, mantendo a

dificuldade de conciliar o trabalho dentro e fora de casa, sobretudo o cuidado com os filhos.

Também há um aumento das mulheres de classe média no mercado de trabalho devido ao

avanço da industrialização. Nos grandes centros urbanos, na segunda metade dos anos 70,

intensifica-se a reivindicação da população por creche impulsionada por movimentos

populares e feministas. Nesse contexto a creche passa a ser um direito do trabalhador. Há um

aumento na quantidade de creches organizadas e mantidas pelo Poder Público e na

participação das mães no trabalho realizado nas creches. Entretanto o número insuficiente de

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creches incentivou, por parte do poder público, alternativas de atendimento à criança, como as

creches domiciliares que ainda continuam a receber apoio governamental (OLIVEIRA;

MELLO; VITÓRIA; ROSSETTI-FERREIRA, 1992).

Com a promulgação da nova Constituição Federal (BRASIL, 1988), na qual a criança

vai ser reconhecida enquanto cidadã e sujeito de direitos, o Estado assume o dever com a

educação da criança de 0 a 6 anos mediante a garantia de creches e pré-escola (cf., art. nº 207

- IV). Sendo assim, as creches e pré-escolas que tinham sua atuação sob a responsabilidade da

Assistência Social, assume o caráter educativo em prol de uma educação que atenda a todas as

crianças (COSTA, s/a). Essa nova concepção vai se opor à visão tradicional e estigmatizante

da creche como uma instituição com funções exclusivamente assistencialistas e de

substituição da família, visando atender à criança pobre (OLIVEIRA et al., 1992).

Adiante, com o Estatuto da criança e do adolescente em 1990 (ECA – Lei Federal n.

8.069/90) foi possível regulamentar artigos da Constituição Federal, bem como explicitar os

mecanismos que possibilitem legalmente a exigência dos direitos da criança (ROSSETTI-

FERREIRA; RAMOM; SILVA, 2002), ratificando em seu artigo 54, inciso IV o dever do

estado em assegurar às crianças de 0 a 6 anos o atendimento em creches e pré-escolas.

Entretanto, é com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB – Lei Federal n.

394/96) que a educação infantil é incluída efetivamente no sistema educacional brasileiro.

Sendo assim, a Educação Infantil vai se constituir como a primeira etapa da educação básica

(LDB, art. nº 29), sendo oferecidas em creches, ou instituições equivalentes, para crianças de

0 a 3 anos; e pré-escolas para crianças de 4 a 5 anos13 (LDB, art. 30, incisos I e II). É

importante salientar que os pais não são obrigados a matricular o filho numa creche, é uma

opção deles compartilhar a responsabilidade de cuidar e educar os filhos com o Estado.

Essa consolidação da creche como uma instituição educacional relaça uma concepção

de creche como instituição que realiza, principalmente, um trabalho educativo; e como um

espaço de desenvolvimento, interação e ricas aprendizagens (CARVALHO, PEDROSA,

ROSSETTI-FERREIRA, 2012). Essa nova concepção de creche pode ser considerada um

fator importante no que diz respeito à mudança no perfil das famílias que buscam as creches,

13

Uma Lei recente, a de n. 12.796, de 4 de abril de 2013, altera a Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, em dois aspectos relevantes: (1) a Educação Infantil, primeira etapa do ensino básico, passou a corresponder ao período de zero a cinco anos; antes ela correspondia até aos seis anos; (2) o atendimento a crianças desde os quatro anos passou a ser obrigatório, em instituições educacionais públicas ou privadas, alterando o início da obrigatoriedade que era somente a partir dos sete anos; antes, o atendimento institucional de zero aos seis anos era uma opção dos pais. A lei também determina que, a partir de 2016, os pais poderão ser punidos com multa ou detenção de 15 dias se não cumprirem essa norma. Como toda mudança que ocorre, é preciso transcorrer certo tempo até que a norma seja integrada ao cotidiano dos cidadãos.

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que a princípio “[...] eram utilizadas principalmente por famílias operárias e de classe média

cuja mãe precisava trabalhar; só mais tarde passaram a ser procuradas por famílias mais ricas

que acabaram impondo-lhes novos padrões de qualidade.” (RAPOPORT E PICCININI, 2004,

p. 498).

É importante considerar, no que se refere ao serviço oferecido pela creche, a relação

creche-família. Vasconcellos et al. (2012) apontam a existência de conflitos, e que sua

resolução envolve, dentre outros fatores, as representações e expectativas que tanto a família

quanto a equipe da creche têm uma sobre a outra. Ainda afirmam que é comum os educadores

terem como queixa em relação à família a falta de compromisso com as questões relacionadas

à criança, ficando aborrecidos quando os pais controlam ou contestam seus trabalhos. Quanto

à família, as autoras expõem ser frequentemente observados sentimentos de ciúme e

hostilidade endereçados às educadoras. Sendo assim, percebe-se o quanto essa relação é

perpassada por significativos fatores que vão influenciar fortemente na inserção da criança na

creche. Sobre isso Vaconcellos et al. (2012) apontam dois estudos (cf. VASCONCELLOS,

2002; VASCONCELLOS; OLIVEIRA; SILVA; SOUSA, 2008)14 nos quais é sinalizada uma

correlação entre a qualidade do processo de inserção da criança na creche e a confiança

estabelecida entre pais e educadores. Ademais, evidenciou-se como outro fator nesses

trabalhos a permanência das crianças na creche durante todo o ano quando comparado com

crianças que não tiveram seu processo de inserção planejado.

Sendo assim, é notório o quanto a parceria saudável entre família e creche é

fundamental para que esta instituição atue no sentido de promover o desenvolvimento da

criança. Para tanto,

[...] a creche precisa estar aberta a novas formas de organização familiar, favorecendo a participação de outros parceiros além da mãe [...] É importante que sejam criadas alternativas e estratégias de aproximação, de acordo com a realidade cotidiana de cada creche e das famílias, para que esta parceria possa acontecer de forma efetiva, sem reforçar a ideia de que “o lugar da família é do portão para fora.” (VASCONCELLOS, 2012, p. 359).

É nesse sentido que Oliveira et al. (1992) afirmam que uma boa relação entre família e

educadores pode contribuir bastante para o trabalho com a criança, pois as dificuldades

14 VASCONCELLOS, V. M. R. Construção da subjetividade: Processo de inserção de crianças pequenas e suas famílias à creche. Tese de Professor Titular em Educação Infantil não publicada. Faculdade de Educação, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2002. VASCOCELLOS, V. M. R.; OLIVEIRA, R. A.; SILVA, D. F.; SOUZA, S. O. Creche, inserção e berçário. GRUPECI, Juiz de Fora, 2008.

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encontradas podem ser resolvidas com maior rapidez, havendo maior segurança nas decisões

a serem tomadas. Cuidar do relacionamento pode ser uma forma eficaz de prevenir possíveis

problemas.

A partir do breve caminho trilhado, já se pode perceber a relevância da temática sobre

o cuidado de crianças, uma vez que se tem a possibilidade de por em evidência importantes

questões acerca da infância, da família e dos contextos de desenvolvimento da criança. Essas

questões podem contribuir significativamente para o estudo da criança quanto ao seu

desenvolvimento; às práticas em que estão envolvidas; às interações que se estabelecem; e às

diferentes concepções que a constitui, incentivando futuros questionamentos, trabalhos e

intervenções que visem promover melhores condições de desenvolvimento para a criança,

bem como orientar a família quanto ao seu importante papel no exercício do cuidado.

2.4 Objetivos

Apoiado no referencial teórico exposto, a presente pesquisa teve como objetivo geral

investigar a rede de cuidadores de crianças de zero a seis anos por cuidadores familiares e não

familiares em uma comunidade de baixa renda da cidade do Recife.

De forma específica, buscou-se: 1) Identificar, descrever e discutir rotinas, práticas e

redes sociais de apoio que configuram o cuidado de crianças; 2) Perquirir modos

compartilhados de cuidar das crianças, os sujeitos e as variáveis que envolvem essa prática; e

3) Investigar as significações atribuídas ao cuidado da criança por familiares ou outros adultos

que compartilham essa tarefa.

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3 MÉTODO

A presente pesquisa se caracteriza como um estudo qualitativo. Minayo e Sanches

(1993) expõem que a abordagem qualitativa permite compreender as relações e as atividades

humanas com os significados que as envolvem. Os autores ainda afirmam que a investigação

qualitativa tem como objeto os significados, aspirações, atitudes, motivos, valores e crenças

expressos na vida cotidiana e pela linguagem comum, sendo sua atividade complementar e

concomitante o confronto da prática social e da fala. Nesse sentido, pretendeu-se investigar a

rede de cuidadores de criança de zero a seis anos realçando os significados e as práticas que

envolvem o ato de cuidar.

Ainda que se tenha realizado uma organização quantitativa dos dados com o intuito

evidenciar aspectos relevantes que envolvem o cuidado da criança, a análise foi de cunho

qualitativo, uma vez que se privilegiou a singularidade das significações atribuídas pelas

cuidadoras.

3.1 Os sujeitos da pesquisa

Participaram desta pesquisa 30 cuidadoras, entre familiares e não familiares da

criança, residentes em uma comunidade de baixa renda da cidade do Recife e com pelo menos

uma criança de zero a seis anos sob seu cuidado.

Os sujeitos foram selecionados a partir dos seguintes critérios: serem maiores de 18

anos, residirem na comunidade escolhida como local de pesquisa, cuidarem ou

compartilharem o cuidado de crianças de zero a seis anos e serem membros de famílias

cadastradas na Unidade de Saúde da Família (USF) da comunidade. Esse último critério se

deveu à vinculação do projeto com a Secretaria de Saúde da cidade do Recife devido à

parceria da pesquisadora com a Agente Comunitária de Saúde (ACS) para o acesso aos

sujeitos em suas residências.

A decisão de realizar a coleta de dados na residência dos sujeitos permitiu observar o

ambiente em que a criança vive; acessando esse espaço foi possível compreender melhor

importantes aspectos da rotina da criança que se configuram em relação com as práticas e a

organização de seu cuidado, tais como: as pessoas com quem ela convive, o lugar de suas

brincadeiras, as pessoas com as quais brinca e a relação com o cuidador (no caso em que a

criança esteve presente no momento da visita).

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Em se tratando de uma pesquisa qualitativa, 30 participantes pareceu à pesquisadora

um quantitativo suficiente para a obtenção de um corpus denso para trazer à tona diversas

significações do cuidar, tendo como base as questões de pesquisa. Além disso, considerou-se

o tempo disponível para a realização da coleta e o tamanho do corpus a ser transcrito, uma vez

que todas as entrevistas foram gravadas em áudio (BREAKWELL, 2006; GASKELL, 2008).

No que se refere à idade das crianças, a escolha por essa faixa etária, de zero a seis

anos, período que corresponde ao atendimento da Educação Infantil, buscou focar as variáveis

que envolvem a decisão dos pais/responsáveis em matricular ou não a/s criança/s na creche,

ou (pré)escola. Sabe-se que é dever do estado garantir o acesso a essa modalidade de

atendimento educacional; é direito da criança de usufruir desse atendimento; mas é opção dos

pais/responsáveis matricular as crianças.

A decisão de investigar cuidadores de uma comunidade de baixa renda se deveu ao

interesse em ter acesso às opções buscadas pelos pais/responsáveis nos casos em que não há

oferta pública de atendimento a crianças pequenas, ou a oferta é inferior à demanda, ou seja,

não é disponibilizado um número de vagas suficientes à comunidade. Faz-se a suposição de

que as possíveis condições financeiras de sujeitos residentes em uma comunidade de baixa

renda não possibilitem a busca por creches privadas, o que seria mais provável nas

comunidades de renda mais alta.

Sendo assim, os sujeitos de pesquisa se distribuíram da seguinte forma: 16 mães, 9

avós, 2 babás, 2 empregadas domésticas e 1 tia. Os dados referentes à faixa etária e à

escolaridade das participantes são apresentados no quadro a seguir:

Quadro 1 - Idade (em faixa etária) e nível de escolaridade das participantes da pesquisa

Desse modo, vê-se que a maioria das participantes (19 deles) se encontra na faixa

etária de 20 a 40 anos. O nível de escolaridade predominante é o Fundamental I incompleto,

com 9 sujeitos, seguido do Fundamental II incompleto ou 2º Grau incompleto, cada um com 5

efetivos. No que diz respeito à ocupação, mais da metade das entrevistadas afirmaram exercer

atividades no âmbito doméstico, como: do lar, diarista e empregada doméstica.

Nº de sujeitos Faixa etária Nº de sujeitos Escolaridade 10 20 - 30 anos 4 Sem escolaridade (analfabeta) 9 31 - 40 anos 9 Fundamental I incompleto 5 41 - 50 anos 5 Fundamental II incompleto 2 51 - 60 anos 2 1º Grau completo 2 61 - 70 anos 6 2º Grau incompleto 2 71 - 80 anos 4 2º Grau completo

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O número de crianças de zero a seis anos sob o cuidado de cada entrevistada é exposto

na tabela abaixo:

Tabela 1 - Número de crianças que cada entrevistada tem sob seus cuidados

Nº de sujeitos Nº de crianças para

cada sujeito 19 1 8 2 3 3

A partir desse quantitativo atinge-se 44 crianças da comunidade na faixa etária de 0 a

6 anos, dentre essas: 17 não frequentam nenhuma instituição de Educação Infantil, 17

frequentam (Pré)escolas públicas e privadas, e 10 frequentam Creche/CMEI.

3.2 Contextualizando o local de pesquisa: a comunidade

A comunidade na qual a pesquisa foi realizada localiza-se num bairro situado na zona

oeste da cidade do Recife. Esse bairro possui cerca de 32.000 habitantes, com uma população

em sua maioria feminina e com a faixa etária predominante de 25 a 59 anos.

Nessa comunidade é possível reconhecer uma rua principal comprida e asfaltada onde

se localiza um terminal de ônibus, bem como pequenos estabelecimentos comerciais tais

como: cabeleireiros, farmácia, panificadora, oficina, armazém de materiais de construção,

copiadora, loja de eletrônicos e informática, lan house, clínica de fisioterapia, mercadinhos

etc. Alguns estabelecimentos se estendem até as calçadas, como os bares, as granjas e

algumas lojas de roupa. E outros pontos comerciais fazem uso apenas das calçadas armando

barracas, como as feiras de frutas e verduras. Nessa mesma rua também se encontram

algumas igrejas, escolas particulares de Educação infantil e Ensino fundamental e USF da

comunidade.

As casas e os estabelecimentos comerciais da rua principal são feitos de alvenaria.

Ainda é possível identificar grandes valas com esgoto a céu aberto em vários trechos dessa via

situado entre a calçada e rua. As principais ruas que partem da principal são asfaltadas. Suas

casas também são de alvenaria, tendo muitas delas primeiro andar, fachadas de cerâmica,

portão de alumínio e garagem.

À medida que se vai adentrando na localidade a partir das ruas que partem da principal

em direção à parte da comunidade que é considerada uma invasão, a estrutura de algumas ruas

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e casas vai se modificando. Ou seja, as ruas se tornam mais estreitas e em alguns pontos não

há passagem para carros. Em algumas casas moradores abriram vendinhas e fiteiros, onde

comercializam guloseimas, refrigerantes, picolés etc. Algumas ruas não são asfaltadas, tendo

muitas delas esgotos a céu aberto que chegam a cruzar toda a rua. O esgoto também fica

exposto em vários pontos.

Essa realidade se acentua na rua que dá acesso a área invadida. Essa rua é, em quase

sua totalidade, sem asfalto, com muitos entulhos de construção civil, com falta de saneamento

básico e valas com lixo. As casas são de alvenaria, mas muitas têm fachadas feitas de tábuas.

Além disso, as casas ficam sob fios de alta tensão e torres de rede elétrica, o que torna essa

região imprópria para moradia por ser uma área de alto risco.

Quanto à movimentação das pessoas na comunidade, era comum ver crianças

brincando nas calçadas, bem como indo e voltando da escola, nesses dois casos, tanto

sozinhas quanto acompanhadas por algum adulto. Nas calçadas também era possível

encontrar alguns idosos, grupos de jovens e adultos conversando. No entanto a movimentação

maior era na rua principal devido, principalmente, aos vários estabelecimentos comerciais e

ao terminal de ônibus.

No que tange às instituições educacionais públicas que atendem à faixa etária das

crianças foco desta pesquisa, ou seja, crianças de zero a seis anos, têm-se:

Quadro 2 - Instituições educacionais municipais que atendem à comunidade

Instituições educacionais Faixa etária Salas Instituição 1 0-5 anos Berçário ao Grupo 4 (CMEI) Instituição 2 2-4 anos Grupo 2 e Grupo3 (Creche) Instituição 3 4-9 anos Pré-escola ao 4º ano Instituição 4 4-9 anos Pré-escola ao 4º ano Instituição 5 6-9 anos 1º ao 4º ano Instituição 6 6-9 anos 1º ao 4º ano

Não se tem informação, entretanto, se a demanda total é atendida, ou se faltam vagas

para a necessidade reivindicada pela comunidade.

3.3 Instrumentos de coleta

Para a realização da coleta de dados foram utilizados: um roteiro de entrevista com as

questões abordadas pela pesquisadora (ver APÊNDICE A) e dois equipamentos de gravação

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de áudio para assegurar o registro da entrevista em caso de falha em algum dos equipamentos.

É importante salientar que os equipamentos de gravação de áudio foram utilizados com a

autorização dos sujeitos após solicitação da pesquisadora.

O roteiro de entrevista é um instrumento de grande relevância, uma vez que possui

como objetivo a compreensão minuciosa das atitudes, crenças, valores e motivações, no que

diz respeito ao comportamento dos sujeitos em contextos sociais específicos. (GASKELL,

2008). Esse intercâmbio com o entrevistado, essa interação face a face, de acordo com

Richardson (1999), possibilita ao entrevistador construir uma estreita relação com o

entrevistado devido ao caráter de proximidade que caracteriza esse tipo de interação. O que

permite a configuração de um contexto no qual o pesquisador se torna mais livre para dialogar

acerca da temática investigada, obtendo, portanto, uma melhor compreensão do objeto a ser

pesquisado.

A presente pesquisa fez uso da entrevista não estruturada na qual, segundo Breakwell

(2006), o entrevistador possui determinado número de tópicos a serem considerados, porém as

questões não possuem uma ordem fixa, possibilitando que elas sejam desenvolvidas na

interação com o entrevistado. Sendo assim, nesse tipo de entrevista o pesquisador, mesmo

sendo guiado por tópicos específicos, conduz a entrevista, oferecendo uma maior liberdade

para o entrevistado se colocar acerca das questões sem deixar que se perca o foco da

investigação.

O roteiro que guiou as entrevistas desse estudo foi estruturado com questões que

focaram a rotina diária da criança e do cuidador, como: os membros da família e as atividades

que realizam dentro e fora do lar, as pessoas do convívio da criança e as atividades que

realizam com ela, os locais que a criança frequenta, a frequência à creche, como o cuidador se

sente em sua rotina, o aspecto pais importante do cuidado, etc.

3.4 Procedimentos de coleta

Inicialmente é importante explicitar como se deu a escolha da comunidade. Essa

escolha foi devida à aproximação da pesquisadora com alguns integrantes de um projeto

social realizado naquela localidade, condição esta que facilitou o acesso da pesquisadora à

comunidade, uma vez que tais integrantes do projeto mediaram esse acesso.

O primeiro acesso àquele local, onde foram juntas pesquisadora e orientadora, foi

mediado pelos integrantes acima referidos. Nesse primeiro acesso foi possível conhecer parte

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da comunidade, algumas instituições educacionais infantis e conversar sobre a forma de

acesso aos sujeitos em suas residências, sendo, então, sugerida a parceria com as Agentes

Comunitárias de Saúde (ACS).

Já o segundo acesso, quando a pesquisadora foi acompanhada de um dos integrantes

do projeto social, teve como intuito conhecer os profissionais da Unidade de Saúde da Família

(USF), e conversar sobre o projeto e a possível parceria com as ACSs para a realização da

coleta de dados. O contato com os profissionais aconteceu na sede da USF em uma das

reuniões semanais com todos os profissionais da unidade. Os profissionais presentes se

mostraram bastantes solícitos e colocaram a importância de realizações de pesquisas na

comunidade. Foi salientado pela pesquisadora que a investigação seria submetida à avaliação

do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) e que mediante aprovação haveria seu retorno à

comunidade para o agendamento dos encontros com a ACS que iria mediar as visitas

domiciliares.

A parceria com as ACSs implicou que a pesquisa fosse vinculada à Secretaria de

Saúde da Cidade do Recife, sendo através dessa Secretaria que se obteve a carta de anuência

para acesso à comunidade. Essa parceira pôs como exigência que todos os sujeitos de

pesquisa fossem membros de famílias cadastradas na USF da comunidade. Tal exigência não

se configurou como uma dificuldade de acesso aos sujeitos pelo fato de todas as famílias

visitadas pelas ACSs serem cadastradas na USF da comunidade.

Após aprovação pelo CEP, a pesquisadora foi à comunidade, no dia que acontece a

reunião semanal com os profissionais, informar a aprovação do projeto e conversar com a

ACS que iria mediar o acesso aos sujeitos em suas residências. Foi decido começar a coleta na

semana seguinte, no horário da manhã.

A coleta de dados teve início e término, respectivamente, nos dias 05/06/2013 e

23/07/2013. A pesquisadora foi à comunidade cerca de duas vezes por semana, realizando em

média de três entrevistas por dia, alguns dias no período da manhã e outros à tarde. As quatro

primeiras entrevistas realizadas no primeiro dia de coleta indicaram a necessidade do

acréscimo de algumas perguntas ao roteiro, e, em consequência, tais entrevistas foram

consideradas entrevistas piloto. Quanto ao tempo de duração de cada entrevista, obteve-se

uma média de 20 minutos, tendo a mais curta e a mais longa, respectivamente, 11 e 56

minutos de duração.

O ponto de encontro entre a pesquisadora e a ACS durante toda a coleta foi na casa da

própria profissional que ficava bem próxima à rua principal da comunidade. A relação

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estabelecida com a ACS foi bastante amigável, o que gerou uma parceria produtiva. A ACS

esteve sempre atenta às solicitações da pesquisadora, fazendo o possível para atendê-las da

melhor forma. Por exemplo, a pesquisadora ao entrevistar só mães nas primeiras entrevistas,

solicitou a ACS que a indicasse outros sujeitos, como: cuidadoras sem relação de parentesco

com a criança, pais, avó, e outros familiares que assumiam esse papel de cuidador. A partir de

tal solicitação a ACS averiguou os sujeitos possíveis e fez indicações mais diversificadas:

avós, cuidadoras sem relação de parentesco com a criança e tia. Além disso, a ACS ofereceu

importante auxilio no mapeamento das instituições educacionais que atendem à comunidade.

Nas visitas às residências, a ACS apresentava a pesquisadora à entrevistada, ora como

psicóloga que queria conversar, ora como estudante de mestrado da Universidade Federal que

queria fazer uma pesquisa. Uma vez que essa forma de apresentar em nenhum momento

causou intimidação, a ponto de causar desistência nos sujeitos, a pesquisadora deixou que a

ACS a apresentasse dessa forma. Após a apresentação, a ACS deixava a pesquisadora na

residência do sujeito e continuava fazendo visitas nas residências próximas. As formas de

encontrar a ACS novamente para continuar as visitas variavam: algumas vezes a ACS

indicava a casa que estaria visitando para a pesquisadora ir a seu encontro; outras vezes a

ACS pedia às pessoas que estavam conversando em frente às residências próximas que

avisasse a pesquisadora a casa em que ela estaria a fim de que esta fosse ao seu encontro ou,

então, a ACS pedia para que a pesquisadora ligasse para o seu celular para novo encontro.

Ao ser deixada numa residência, a pesquisadora apresentava as informações

necessárias para que o sujeito compreendesse o objetivo do trabalho, explicitando todos os

seus direitos frente à aceitação para participar da pesquisa. Assim, após consentimento do

sujeito, ele era convidado a assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (ver

APÊNDICE B), dando, assim, início a entrevista. A pesquisadora deixava o sujeito livre para

escolher o melhor lugar para ser realizada a entrevista, fazendo apenas a exigência, em alguns

casos, para se aproximar mais da entrevistada para que o equipamento de gravação de áudio

pudesse ficar próximo de ambos. Muitas entrevistas foram realizadas estando as crianças

presentes, situação já esperada, uma vez que não houve agendamento prévio. Nestes casos, a

pesquisadora podia observar a relação entre a cuidadora e a criança. Além disso, foi possível

observar os espaços nos quais as crianças circulavam, seja em situação de brincadeira ou outra

qualquer. Houve interrupções devidas a choros e demais solicitações das crianças, mas não a

ponto de suspender ou comprometer significativamente a entrevista.

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Também é importante salientar que não houve nenhuma recusa dos sujeitos quanto à

participação ou desistências no decorrer das entrevistas, mesmo em situações nas quais

algumas entrevistadas demonstraram grande emoção através do choro. Nesse momento a

pesquisadora ofereceu o espaço de escuta de modo a deixar as entrevistadas à vontade para

expressar, a sua maneira, a emoção que emergiu.

3.5 Procedimentos de análise

A análise empreendida se apoia na compreensão de que o dado é construído “a partir

de um referencial de pensamento, que ele por sua vez retroalimenta e transforma”

(CARVALHO; IMPÉRIO-HAMBURGUER; PEDROSA, 1999, p. 205). Pensar o dado nesse

sentido é adentrar em um universo de possibilidades em que é possível criar e recriar,

estabelecer e visualizar diferentes formas de organizações e relações. Sendo assim, a análise

delineada a seguir evidenciou apenas algumas facetas de um dado que é plural frente à

diversidade de propostas e olhares que poderiam guiar a sua construção.

Como corpus de análise obteve-se um conjunto de trinta entrevistas transcritas, que

foram analisadas qualitativamente com o intuito de evidenciar e discutir as práticas e os

significados que envolvem o cuidado da criança. Houve, entretanto, uma organização prévia

das informações realizando-se algumas quantificações de modo a se poder mapear o número

de redes de cuidado existentes com aspectos relevantes para a sua caracterização, como será

apontado mais adiante.

A transcrição das entrevistas pode ser caracterizada como o primeiro passo da análise,

sendo um momento privilegiado de aproximação com o material coletado. À medida que se

foi transcrevendo, dando forma e revisitando os dados – tendo como guia o roteiro de análise

com questões que funcionam como indicadores de temas de interesse – buscou-se identificar

núcleos de sentidos realçados nas falas das participantes. Esse processo foi orientado pela

análise temática de conteúdo proposta por Bardin (2000) que “consiste em descobrir os

núcleos de sentidos que compõem a comunicação e cuja presença, ou frequência de aparição

podem significar alguma coisa para o objetivo analítico escolhido” (p. 105).

Seguindo esse caminho, as questões alçadas nas entrevistas foram delineando a

organização dos dados de modo que sua discussão foi estruturada a partir de três eixos

temáticos: a rede de cuidadores, a prevalência feminina no cuidado da criança e o cuidado

institucional.

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A análise da rede de cuidadores se apoiou no estudo realizado por Carvalho et al.

(2012) com base nos dados da pesquisa Gênero e família em mudança: participação de pais

no cuidado de filhos pequenos15. Esse estudo analisa a rede de cuidadores de crianças

pequenas, esboçando um delineamento metodológico que pode orientar estudos com a mesma

proposta. Além disso, aponta dados importantes para serem comparados. Para a

caracterização das redes de cuidadores do presente estudo os dados foram organizados de

modo quantitativo, como já mencionado anteriormente, com o intuito de indicar importantes

aspectos do cuidado da criança, como: o número de crianças, o quantitativo de cuidadores, o

número de redes, a frequência à instituição educacional, entre outros que configuraram a

análise estrutural das redes. Também foi realizada a análise funcional das redes que teve como

foco a descrição das tarefas de cuidado e o envolvimento dos cuidadores com tais tarefas.

Vale ressaltar que a observação do contexto de cuidado ofereceu importantes indícios para a

caracterização das redes de cuidadores.

Nos demais eixos temáticos foram realizadas discussões pondo em destaque a

significação dada ao cuidado da criança. No que se refere à prevalência feminina nas redes de

cuidado foram evidenciadas temáticas que apontam a responsabilidade da mulher pelo

cuidado da criança e da casa, bem como a sobrecarga de atividades que enfrenta. Referente ao

cuidado institucional foram destacadas as significações que envolvem a decisão dos

cuidadores em compartilhar ou não o cuidado/educação da criança com a instituição

educacional.

15

Pesquisa multidisciplinar desenvolvida pela equipe de docentes-pesquisadores do Programa de Pós-graduação em Família na sociedade contemporânea da Universidade Catolica de Salvador (UCSal), Bahia, com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), entre 2009 e 2010. Esse estudo culminou no livro Dinâmica familiar do cuidado: afetos, imaginário e envolvimento dos pais na atenção aos filhos organizado por Castro, Carvalho e Moreira (2012).

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4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com o intuito de investigar o cotidiano do cuidado da criança, o presente capítulo tem

como pretensão expor a análise empreendida nesse estudo. Sendo assim, a apresentação e a

discussão dos dados serão organizadas em dois itens. No primeiro, será realizada a análise da

rede de cuidadores, pondo em destaque os sujeitos e as práticas que envolvem o cuidado da

criança. No segundo item será focalizado o significado do cuidado a partir da prevalência

feminina no cuidado da criança e do cuidado institucional.

4.1 Rede de cuidadores: os sujeitos e as práticas que envolvem o cuidado da criança

Neste primeiro item serão analisadas as redes de cuidadores perquirindo as práticas

que configuram o cuidado da criança no seu dia a dia, bem como a dinâmica das redes na

organização cotidiana do cuidado.

Compreendendo a rede social como um sistema constituído por diferentes pessoas,

funções e contexto (LEWIS16, 1987 apud CARVALHO et al., 2012), vale ressaltar que as

redes analisadas têm como núcleo a criança de zero a seis anos, a partir da qual serão

caracterizadas as pessoas envolvidas no seu cuidado. Serão focadas as práticas/atividades que

constituem o cuidado da criança, o contexto no qual elas são realizadas, a residência da

criança – local onde foram feitas as entrevistas –, e contextos outros considerados pelos

entrevistados, espaços onde a criança é cuidada e interage com os constituintes da rede, como,

por exemplo, as instituições educacionais infantis (creche, hotelzinho, (pré)escola) e locais de

lazer.

As redes foram construídas considerando as atividades que os cuidadores realizam

com as crianças. Tais atividades foram mapeadas mediante o exame da rotina relatadas por

eles. Esse mapeamento teve como foco as questões a partir das quais as entrevistadas eram

convidadas a relatar as atividades que realizavam diariamente e a participação de outras

pessoas que faziam parte do convívio da(s) criança(s). As atividades encontradas foram

distribuídas em quatro agrupamentos de tarefas de cuidado: cuidados físicos;

lazer/convivência; educação/disciplina; e atividades externas. Essas tarefas foram

16 LEWIS, M. Social development in infancy and early childhood. In: OSOFKY, J. D. (Org.). Handbook of Infant Development. Nova York: Wiley, 1987. p. 419-493.

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apresentadas por Moreira, Carvalho, Almeida e Oiwa (2012) de modo a caracterizar o perfil

dos cuidadores a partir das tarefas que exercem no cuidado da criança.

A análise das redes teve como base as dimensões estruturais e funcionais da rede

social proposta por Sluzki (1997) com as sugestões de Carvalho et al. (2012) que ao se

basearem em tais dimensões realizaram algumas adaptações com a finalidade de configurar

um tipo específico de rede social, a rede de cuidadores de crianças.

4.1.1 A dimensão estrutural das redes de cuidadores

A dimensão estrutural das redes de cuidadores foi analisada quanto ao seu tamanho,

composição, densidade, dispersão, e homogeneidade/heterogeneidade (SLUZKI, 1997).

4.1.1.1 Tamanho das redes

No que diz respeito ao tamanho da rede, que se caracteriza pela quantidade de sujeitos

em cada arranjo de cuidadores, são apresentados na tabela 2 o número de cuidadores que

integram as redes, o quantitativo de redes e número de crianças em cada tipo de rede17.

Tabela 2 - Tamanho da rede relacionado ao número de redes e de crianças atendidas em cada rede

Tamanho da rede (nº de cuidadores) Nº de redes

Nº de crianças em cada rede

2 6 6

3 13 19 4 11 12 5 5 7

TOTAL 35 44

A maioria das redes, num total de 35, tem como núcleo apenas uma criança. Existem

sete redes em que mais de uma criança é cuidada: cinco redes com duas crianças; e duas, com

três; nesses casos as crianças são irmãs.

Além disso, há casos em que crianças da mesma família, residindo juntas, constituem

redes diferentes. Como exemplo, tem o caso de dois irmãos apenas por parte de mãe que

17 Tipo de rede corresponde a uma classificação das redes com base no número de cuidadores.

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possuem redes diferentes pelo fato de um deles, a menina, ter seu cuidado compartilhado com

uma tia paterna que não constitui a rede do irmão. Além disso, ela é cuidada por familiares

paternos do seu irmão que não constituem a rede de cuidadores dele. Isto porque o irmão de

três meses fica apenas sob o cuidado da mãe e do pai enquanto que a irmã de três anos passa

momentos do dia com a avó paterna e tio paterno de seu irmão. Assim, a rede do menino é

constituída apenas pelo pai e pela mãe, enquanto que a rede da irmã tem os seguintes

membros: mãe, padrasto, tia paterna, avó do irmão e tio do irmão. Nesse sentido, é realçado

que morar juntos não implica compartilhar a mesma rede. Ainda cabe salientar que a opção de

caracterizar os cuidadores sem relação de parentesco com a menina, neste exemplo, (sogra e

cunhado da mãe) evidencia novas configurações familiares existentes nos dias atuais.

As redes analisadas possuem uma variação de dois a cinco cuidadores. A maioria das

redes é composta por três cuidadores, seguindo, respectivamente, em ordem decrescente, as

redes de quatro, dois e cinco cuidadores. Carvalho et al. (2012) ao analisarem as redes de

cuidadores de uma pesquisa realizada com 150 esposas e 150 maridos, com pelo menos um

filho do casal, residentes em Salvador, na Bahia, distribuídos equitativamente entre o nível

socioeducacional baixo (NSEb) e o médio alto (NSEmdA), apontam que há uma maior

frequência de redes pequenas, com dois a três cuidadores, tendendo a decrescer a partir de três

cuidadores. Ademais, afirmam que há uma maior tendência de redes menores no NSEb.

Assim, vê-se uma significativa correspondência entre os dados apresentados por esses autores

e os encontrados no presente trabalho, ou seja, 19 redes com dois e três membros e 16 com

quatro e cinco membros.

Com o intuito de observar se a frequência da criança a uma instituição educacional se

relaciona ao tamanho da rede, organizou-se a tabela 3.

Tabela 3 - Número de crianças atendidas em instituição educacional relacionado ao tamanho

da rede e ao número de crianças por rede

Tamanho da rede (nº de cuidadores)

Nº de crianças em cada rede

Em instituições educacionais

Nº de crianças

2 6 3

3 19 12

4 12 9

5 7 3

TOTAL 44 27

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A partir do exposto na tabela 3 observa-se que mais da metade das crianças

frequentam alguma instituição educacional, como creche, CMEI18, pré-escola e escolas.

Ademais, constata-se uma maior frequência de crianças a instituições no tamanho de rede

intermediário, com três e quatro cuidadores. Chama a atenção que a rede de dois cuidadores,

que deveria ter a maior frequência de crianças a instituições educacionais, é justamente a que

possui menor frequência. Seria, pois, um equívoco supor uma possível relação entre essas

variáveis.

Estes dados são também respaldos com os achados de Carvalho et al. (2012) que

indicam não existir relação entre o tamanho da rede e a frequência a creches/outras

instituições educacionais, uma vez que constataram menor frequência de crianças na categoria

de três cuidadores dentre uma variação de dois a seis cuidadores.

Outro aspecto importante a ser considerado na análise do tamanho da rede é a idade

das crianças. Na tabela 4 é explicitada a idade das crianças (em faixas etárias) em cada tipo de

rede. O agrupamento das idades nas duas faixas teve como critério a caracterização da

Educação infantil – creche (0 a 3 anos) e pré-escola (4 e 5 anos), acrescida da idade de seis

anos, idade deslocada mais recentemente para o Ensino Fundamental.

Tabela 4 - Número de crianças de acordo com sua faixa etária e tamanho da rede

Tamanho da rede

(nº cuidadores) Faixa etária das crianças

Total de crianças 0 a 3 anos % 4 a 6 anos %

2 3 50 3 50 6 3 10 53 9 45 19 4 7 58 5 45 12 5 5 71 2 29 7

Total 25 57 19 43 44

De modo geral, com exceção da classe de menor quantitativo de cuidadores – a que

tem dois cuidadores –, existe maior número de crianças atendidas por rede de cuidadores na

faixa etária de zero a três anos, e, neste grupo, do ponto de vista percentual, o número de

crianças cresce à medida que também cresce o número de cuidadores; ocorre o inverso com a

porcentagem de crianças de quatro a seis anos que aumenta à medida que diminui o número

de cuidadores. A partir de tais resultados é possível supor que as crianças mais novas

demandam mais cuidadores, permitindo formular a hipótese de que a imaturidade motora da

18

Centro Municipal de Educação Infantil que integra creche ( com crianças de 0 a 3 anos) e pré-escola (com crianças de 4 e 5 anos).

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criança nos anos iniciais exige um alto investimento de tempo e de esforço na prestação dos

cuidados necessários à sua sobrevivência. Todavia, à medida que a criança cresce e se torna

mais independente, a exigência de alto investimento para cuidar dela tenderia a decrescer,

inclusive porque ela já é capaz de pedir o que deseja ou falar de sua insatisfação sobre

qualquer evento. Assim, considerando-se a faixa etária de zero a seis anos, poder-se-ia ter a

expectativa de que haveria um maior investimento na prestação do cuidado (maior número de

cuidadores), para as crianças menores; e, para as crianças de seis anos haveria um menor

investimento.

Com a pretensão de averiguar essa suposição, a tabela 5 apresenta a distribuição das

idades das crianças (em anos) em cada tipo de rede de cuidadores.

Tabela 5 - Número de crianças de acordo com sua idade e tamanho da rede

Observando-se a distribuição das crianças na tabela 5, verifica-se que a expectativa

anunciada não se confirma: crianças do primeiro ano de vida (idade zero) e também as de seis

anos são cuidadas por redes de todos os tamanhos, sem qualquer tendência. A rede de três

cuidadores é a mais frequente em todas as outras idades; exceção é feita para o grupo de cinco

anos, que tem quantitativos iguais para redes de três e quatro cuidadores.

Quando os resultados tinham sido agrupados por faixa etária havia uma aparente

relação entre a idade das crianças e o tamanho da rede (número de cuidadores). Esmiuçando a

faixa etária e observando o tamanho da rede por idades, os dados não parecem confirmar essa

suposição.

É importante salientar que a análise empreendida não pretende engendrar conclusões

generalizáveis, primeiro, porque o estudo não tem esse objetivo e, segundo, porque a

quantidade de sujeitos e a seleção da amostra inviabiliza tal pretensão. O intuito, pois, é

apontar questões importantes acerca do cuidado da criança e instigar trabalhos futuros.

Tamanho das redes Idade das crianças (em anos)

Zero Um Dois Três Quatro Cinco Seis TOTAL Dois 1 2 - - 1 1 1 6 Três - 3 5 2 5 3 1 19

Quatro 1 1 4 1 1 3 1 12 Cinco 1 - 3 1 1 - 1 7

TOTAL 3 6 12 4 8 7 4 44

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4.1.1.2 Composição das redes

A composição das redes de cuidadores focaliza as pessoas que participam do cuidado

da criança. Pretendendo explicitar todos os cuidadores focalizados nesse estudo, é apresentado

na tabela abaixo:

Tabela 6 - Número de cuidadores e sua relação com a criança

Cuidadores Nº Cuidadores Nº

Mãe 33 Tia-avó materna 2

Pai 22 Prima materna 2

Avó materna 17 Amiga19 2

Tia materna 15 Irmão 1

Avó paterna 5 Avô paterno 1

Tio materno 5 Tia paterna 1

Irmã 4 Padrasto 1

Babá 3 Cunhado 1

Empregada doméstica 2 Sogra 1

No tocante à quantidade de pessoas envolvidas no cuidado da criança é importante, a

princípio, fazer uma ressalva esclarecendo que o quantitativo mencionado ultrapassa o

número real de pessoas envolvidas no cuidado da criança pelo fato de existirem casos em que

uma pessoa está presente em duas redes de cuidadores, sendo, portanto, contabilizada mais de

uma vez. É possível dividir os casos encontrados em dois grupos. O primeiro grupo é

constituído por cinco pessoas que compõem duas redes e possuem diferentes relações, seja de

parentesco ou não, com as crianças núcleo de cada rede. Assim, do total de cinco pessoas três

são mães e tias, uma é mãe e babá, e outra é um pai e também padrasto. Como exemplo é

possível citar a entrevistada que é cuidadora principal de uma criança e auxilia no cuidado da

sobrinha, ou seja, é mãe e tia de duas crianças de redes distintas. Já o segundo grupo, é

composto por nove sujeitos que constituem duas redes e possuem a mesma relação de

parentesco com as crianças núcleo de cada rede. Desse modo, o total de nove sujeitos

constitui-se por: três avós, duas mães, dois tios, uma tia e uma tia-avó. Um exemplo desse

grupo é a avó materna de duas crianças que constituem redes distintas, o que a possibilita ser

avó em dois arranjos de cuidadores. Assim, o número de cuidadores reais identificados nesse

19 Alguns cuidadores sem relação de parentesco com a criança foram caracterizados pela relação com o cuidador principal da criança, sendo em três casos com a mãe: a amiga, o cunhado e a sogra, e em um caso com a avó: a nora.

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estudo pode ser calculado pela subtração dos 14 cuidadores repetidos do total de 120, o que

resulta em 106 cuidadores; considera-se também o total de 35 redes de cuidadores, com média

de três cuidadores por rede, existindo 14 redes com três cuidadores.

A decisão de levar em consideração a repetição dos referidos cuidadores, ainda que se

distancie de seu número real, apoia-se nos seguintes motivos: 1) especificar todos os

cuidadores que compõem as redes analisadas nesse estudo; 2) considerar as diferentes

relações de parentesco que um mesmo sujeito pode estabelecer em diferentes redes; e 3)

explicitar a dinâmica das redes no que se refere à circulação dos cuidadores em diferentes

arranjos de cuidado, a partir da qual tais sujeitos podem assumir diferentes papéis e funções,

assim como estabelecer diferentes relações tanto com a(s) criança(s) sob seus cuidados quanto

com os demais cuidadores.

Dando continuidade, a análise das redes quanto à sua composição foi realizada com

base na proposta de Carvalho et al. (2012), na qual os cuidadores foram categorizados em

termos de parentesco, gênero e coabitação.

Caracterização por parentesco

A presente caracterização propôs uma análise das redes, questionando se os cuidadores

possuem ou não relação de parentesco com a criança, ou seja, se eles são familiares ou não

familiares da(s) criança(s) sob seu cuidado em termos de consanguinidade. Tal caracterização

é apresentada na tabela 7:

Tabela 7 - Número de cuidadores de acordo com a relação familiar (critério de

consaguinidade) ou não familiar

Familiares Nº Não familiares Nº Mãe 33 Babá 3 Pai 22 Empregada doméstica 2

Avó materna 17 Amiga 2 Tia materna 15 Padrasto 1 Avó paterna 5 Cunhado 1 Tio materno 5 Sogra 1

Irmã 4 Nora 1 Tia-avó materna 2 Vizinha 1 Prima materna 2 - -

Irmão 1 - - Avô paterno 1 - - Tia paterna 1 - -

TOTAL 108 TOTAL 12

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É bastante evidente a disparidade entre membros familiares e não familiares, ainda que

se desconsiderem os familiares repetidos por comporem mais de uma rede de cuidadores.

Concernente aos cuidadores familiares, mãe e pai, sobretudo a mãe, que não esteve presente

em apenas duas redes, são os mais presentes nas redes de cuidadores, caracterizando quase

metade (55) de todos (120) os cuidadores identificados nesse estudo. Também se destacam

como importantes colaboradoras no cuidado das crianças a avó e a tia maternas, que

configuram uma quantidade significativa de cuidadores (32) nas redes analisadas. O que mais

vez encontra respaldo nos achados de Carvalho et al. (2012) nos quais a avó e a tia maternas

assumem posição de destaque enquanto cuidadoras, sendo a avó materna mais frequentemente

mencionada no NSEb.

Também foi possível encontrar correspondência com outros estudos, como o de

Moreira e Biasoli-Alves (2007), que ao realizarem uma pesquisa com 50 homens e 50

mulheres de nível universitário, com pelo menos um filho de dois a sete anos e residentes em

uma capital do Nordeste (25 homens e 25 mulheres) e no Interior de São Paulo (25 homens e

25 mulheres), apontaram, sobretudo na capital do Nordeste, que os pais contam com uma

significativa ajuda das avós na educação dos filhos cotidianamente. As autoras também

sinalizaram como importantes colaboradores tios e tias no que se refere ao aspecto da

convivência, o que possui similaridade com a realidade dos tios e tias do presente estudo.

Todavia é importante salientar que em algumas redes as tias maternas assumem papel

significativo no cuidado cotidiano da criança, sendo uma delas a principal cuidadora. Em

outro estudo desenvolvido por Almeida e Moreira (2011) com 55 mães e 5 pais de crianças

matriculadas em uma instituição educacional localizada em um bairro de classe média na

cidade de Salvador-Bahia, as avós também foram identificadas como uma das principais

colaboradoras da família na educação das crianças.

Ainda que tenham aparecido com baixa frequência nas redes, foram identificados

como cuidadores a irmã e o irmão, bem como outros familiares maternos (tio, tia-avó e prima)

e paternos (avó, avô e tia). Desse modo, novamente os resultados encontram respaldo no

estudo de Almeida e Moreira (2011), no qual tios, irmãos e outros familiares foram pouco

citados por mães e pais como colaboradores na educação dos filhos. Mais uma vez se obtém

correspondência com os dados de Carvalho et al. (2012) nos quais avó paterna, tio, irmã,

irmão, prima e outros familiares foram menos mencionados por pais e mães como cuidadores.

Ademais, cabe aqui salientar a importância dos familiares maternos nas redes analisadas,

possibilitando considerá-los como os principais colaboradores no cuidado cotidiano das

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crianças. Quanto aos familiares paternos identificados, embora tenham configurado uma baixa

frequência nas redes descritas, destaca-se mais uma vez a figura da avó, realçando, assim, sua

importância na tarefa do cuidado de crianças pequenas.

No que diz respeito aos cuidadores não familiares, esses configuram um quantitativo

bastante inferior em relação aos cuidadores familiares. Desse quantitativo, a babá, a

empregada doméstica e a amiga somam um pouco mais da metade (sete) do total de

cuidadores (doze) sem parentesco com a criança. Já os demais cuidadores não familiares

aparecem com um efetivo em cada classe, estando três desses (padrasto, cunhado e sogra)

presentes na mesma rede. Sendo assim, com os estudos já citados, pode-se encontrar uma

nova correspondência concernente a uma baixa colaboração dos vizinhos no

cuidado/educação das crianças. Contudo, nesses mesmos estudos (MOREIRA; BIASOLI-

ALVES, 2007; ALMEIDA; MOREIRA, 2011; CARVALHO et al., 2012), as babás tiveram

grande destaque como cuidadoras e colaboradoras na educação das crianças, indo de encontro

aos achados da presente pesquisa. Essa discrepância pode ser explicada pelo fato de nesses

estudos citados as famílias das crianças pertenciam à classe média, tendo, assim, condições

financeiras para contratar o trabalho dessas profissionais, o que difere da maioria das famílias

da presente pesquisa que possuem uma renda baixa. Isso pode ser evidenciado no estudo de

Carvalho et al. (2012) quando apontam que as menções às babás foram significativamente

mais frequentes no NSEmdA e que as menções a outras domésticas ocorreram apenas no

NSEmdA. A respeito dos amigos, Moreira e Biasoli-Alves (2007) expõem que estes tiveram

um percentual relevante (em torno de 50%) quanto à colaboração na educação/cuidado dos

filhos. Já Carvalho et al. (2012) apontaram a amiga sendo mencionada em apenas 2% das

respostas de pais e mães acerca dos cuidadores. Esse dado que se aproxima do baixo número

de amigas (apenas duas) identificadas na presente pesquisa enquanto colaboradoras no

cuidado das crianças.

Sendo encontradas algumas discrepâncias entre os estudos citados no que tange às

pessoas envolvidas no cuidado da criança, é importante considerá-las em meio a múltiplos

determinantes que se vinculem às especificidades, sejam em relação à unidade familiar, sejam

em relação à amostra pesquisada: como a escolaridade, a ocupação e disponibilidade dos

familiares para a tarefa do cuidado, o contexto sociocultural e as crenças acerca do cuidado da

criança (os sujeitos e as práticas que configuram essa tarefa), além da renda, como citada

anteriormente no caso de contratar babás.

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Com o intuito de especificar o número de cuidadores familiares e não familiares nas

redes analisadas, são apresentadas as tabelas a seguir:

Tabela 8 - Número de redes de cuidadores de acordo com o seu tamanho e o número de cuidadores familiares nas redes

Tamanho da rede (nº de cuidadores)

Nº de cuidadores familiares Total

2 3 4 5 2 6 - - - 6 3 2 11 - - 13 4 - 4 7 - 11 5 1 1 1 2 5

TOTAL 9 16 8 2 35

A partir do exposto vê-se que as redes apresentam uma variação de dois a cinco

cuidadores familiares. Além disso, todas as redes analisadas (35 redes) são compostas por no

mínimo dois cuidadores familiares, sendo todas as redes de dois cuidadores constituídas

apenas por familiares. Isso demonstra a importância atribuída à família da criança no seu

cuidado cotidiano. Há um grande quantitativo de redes (16 redes) com três cuidadores

familiares distribuídos nas redes de três, quatro e cinco cuidadores. Desse total de 16 redes, 11

se concentram na rede de três cuidadores, das quais seis são compostas por pai, mãe e avó.

Observa-se que há apenas duas redes com cinco cuidadores familiares.

Tabela 9 - Número de redes de cuidadores de acordo com o seu tamanho e o número de cuidadores não familiares nas redes

Tamanho da rede (nº de cuidadores)

Nº de cuidadores não familiares TOTAL 1 2 3

2 - - - - 3 2 - - 2 4 4 - - 4 5 1 1 1 3

TOTAL 7 1 1 9

Os cuidadores não familiares são identificados em apenas nove redes com variação de

um a três cuidadores, não estando presentes nas redes de dois cuidadores. Dentre as nove

redes, a maioria (sete redes) tem em sua composição apenas um cuidador não familiar, sendo

em três redes a babá e em duas redes a empregada doméstica. As outras duas redes com,

respectivamente, dois e três cuidadores não familiares são constituídas por cinco cuidadores.

Explicitando de forma mais detalhada os membros familiares e não familiares nas

redes, tem-se que nas redes de dois cuidadores, num total de seis, a maioria (quatro redes) é

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composta por pai e mãe; as outras duas redes são compostas pela mãe e a avó materna. Nas

redes de três cuidadores, que possuem um total de treze redes, nove são constituídas por mãe,

pai e cuidador familiar: avó (em seis), tia materna (em duas) e irmã (em uma); duas são

formadas por pai, mãe e cuidador não familiar: empregada doméstica (em uma) e babá (em

uma); e as duas redes restantes são compostas por mãe e tia materna, sendo uma integrada

pela avó materna e a outra pela prima materna. Das seis redes compostas por mãe, pai e avó,

três são constituídas por avós maternas e três por avós paternas. Já nas redes de quatro

cuidadores, que totalizaram onze redes, foram identificadas quatro redes com mãe e pai

juntos, e uma única rede sem a presença da mãe (pai, avó materna e duas tias maternas). Oito

redes têm em sua composição mãe e avó materna juntas, e apenas duas redes têm em sua

constituição mãe e avó paterna juntas, sendo uma delas a única rede desse estudo que tem o

avô (paterno) em sua constituição. Os cuidadores não familiares compõem quatro redes, tendo

como membros: empregada doméstica (uma rede), babás (duas redes) e vizinha (uma rede).

Nas redes de cinco cuidadores, que possuem um quantitativo de cinco redes, mãe e pai

aparecem juntos em duas redes, enquanto que mãe e avó juntas compõem apenas uma rede.

Também há uma frequência maior de irmãs (em três redes) e de cuidadores sem relação de

parentesco com a criança: padrasto, duas amigas, cunhado, sogra e nora (em três redes). O

irmão aparece como cuidador apenas nesse tipo de rede, compondo uma única rede. E assim

como na rede de quatro cuidadores, há uma única rede com ausência da mãe.

Assim, de acordo com os dados expostos, destaca-se a presença de mãe e pai

integrando a maioria dos arranjos de cuidadores (em 21 redes), sendo onze redes compostas

por três cuidadores, das quais seis são constituídas por mãe, pai e avó. Também se pode

assinalar como relevante a presença de mãe e avó juntas em grande parte das redes de

cuidadores (em 19 redes), havendo significativo destaque para a avó materna que, dentre as

19 redes, integra com a mãe 15 redes. Isso demonstra a importância da avó materna na

colaboração com o cuidado da criança.

Caracterização por gênero

No que tange ao gênero, os participantes das redes foram caracterizados enquanto

cuidadoras femininas e cuidadores masculinos, como mostra a tabela 10 abaixo:

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Tabela 10 - Número de cuidadores femininos e masculinos e sua relação com a criança

Feminino Nº Masculino Nº Mãe 33 Pai 22

Avó materna 17 Tio materno 5 Tia materna 15 Irmão 1 Avó paterna 5 Avô paterno 1

Irmã 4 Padrasto 1 Babá 3 Cunhado 1

Tia-avó materna 2 - - Prima materna 2 - -

Empregada doméstica 2 - - Amiga 2 - -

Tia paterna 1 - - Sogra 1 - - Nora 1 - -

Vizinha 1 - - Total 89 TOTAL 31

As redes analisadas possuem majoritariamente cuidadoras femininas, tendo destaque a

mãe e as cuidadoras familiares maternas, principalmente a avó e a tia, como ressaltado

anteriormente. A predominância feminina também ocorre entre as cuidadoras não familiares,

havendo um tímido destaque entre babás, empregadas e amigas.

Quanto aos cuidadores masculinos, o pai se sobressai com um efetivo de 22

cuidadores. Já os outros nove cuidadores masculinos integram redes de quatro e cinco

cuidadores, portanto, com exceção do pai, quando existe um cuidador masculino este integra

redes de maior tamanho.

Na pretensão de esmiuçar o quantitativo de cuidadores femininos e masculinos, nas

redes, são apresentadas as tabelas 11 e 12.

Tabela 11 - Número de redes de acordo com o seu tamanho e o número de cuidadoras

femininas

Tamanho da rede (nº de cuidadores)

Nº de cuidadoras femininas TOTAL

1 2 3 4 5 2 4 2 - - - 6 3 - 11 2 - - 13 4 - 2 5 4 - 11 5 - - 3 1 1 5

TOTAL 4 15 10 5 1 35

A distribuição de cuidadoras femininas nas redes compreende uma variação de uma a

cinco cuidadoras, possuindo todas as redes pelo menos uma cuidadora. Há um número maior

de redes com duas cuidadoras (quinze redes), distribuídas entre as redes de dois, três e quatro

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cuidadoras, das quais dez são constituídas por mãe e avó. Dentre as quinze redes, onze

constituem as redes de três cuidadores, sendo seis delas constituídas de mãe e avó. Observa-se

que existe uma única rede de cinco cuidadoras.

Tabela 12 - Número de redes de acordo com o seu tamanho e o número de cuidadores

masculinos

Tamanho da rede (nº de cuidadores)

Nº de cuidadores masculinos Total

1 2 2 4 - 4 3 11 - 11 4 5 2 7 5 1 3 4

TOTAL 21 5 26

Os cuidadores masculinos estão presentes em 26 redes com uma pequena variação de

um a dois cuidadores. Há um quantitativo significativamente maior de redes com um

cuiadador (21 redes) distribuídas nos quatro tipos de redes, sobretudo em onze redes de três

cuidadores. Destas 21 redes, 20 têm a participação do pai da criança e uma tem a participação

de um tio. As outras cinco redes têm em sua constituição dois cuidadores masculinos, das

quais três redes são constituídas por cinco cuidadores e as duas outras por quatro cuidadores.

Portanto, os dados indicam que a cuidadora feminina ocupa lugar de destaque, tanto

entre os cuidadores familiares, na figura da mãe, da avó e da tia, quanto entre o reduzido

número de cuidadores não familiares, dos quais participam timidamente a babá, a empregada

doméstica e a amiga.

Caracterização por coabitação

A caracterização por coabitação possibilitou a identificação dos cuidadores que

residem ou não com a(s) criança(s) sob seus cuidados. Explicitando o quantitativo de

residentes e não residentes, segue a tabela 13:

Tabela 13 - Cuidadores que residem ou não com a criança e sua relação com ela

Sujeitos Residentes Não residentes TOTAL Mãe 30 3 33 Pai 19 3 22

Avó materna 12 5 17 Tia materna 9 6 15 Avó paterna 3 2 5

continua

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continua

Sujeitos Residentes Não residentes TOTAL Tio materno 5 0 5

Irmã 4 0 4 Babá - 3 3

Empregada doméstica 0 2 2 Tia-avó materna 0 2 2 Prima materna 1 1 2

Amiga 0 2 2 Irmão 1 0 1

Avô paterno 1 0 0 Tia paterna 0 1 1

Padrasto 1 0 1 Sogra 0 1 1

Cunhado 0 1 1 Nora 0 1 1

Vizinha 0 1 1 TOTAL 86 34 120

Assim como as demais variáveis que caracterizaram a análise da composição das redes

(parentesco e gênero), a coabitação também apresentou variação, havendo uma significativa

predominância de cuidadores que residem com a criança.

Ao cruzar a variável coabitação com as variáveis parentesco e gênero, obtêm-se os

resultados expressos nas tabelas 14 e 15:

Tabela 14 - Número de cuidadores de acordo com a coabitação e o parentesco

Residentes Não residentes TOTAL

Familiares 85 23 108 Não familiares 1 11 12

TOTAL 86 34 120

Tabela 15 - Número de cuidadores de acordo com a coabitação e o gênero

Residentes Não residentes TOTAL Feminino 59 30 89 Masculino 27 4 31 TOTAL 86 34 120

Na tabela 14 observa-se a quase totalidade de cuidadores não familiares que não

residem com a criança, e na tabela 15, o dado que chama a atenção é a quase inexistência de

cuidadores masculinos que não residem com a criança (apenas quatro não residem!). A

quantidade de cuidadores familiares residentes se sobressai na tabela 14. Como já comentado,

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é bem expressivo o quantitativo de cuidadoras femininas (ver tabela 15) que residem com a

criança.

De modo a realizar uma comparação com os dados do estudo de Carvalho et al. (2012)

quanto à coabitação, é importante fazer algumas ajustes na apresentação dos resultados da

presente pesquisa. Os dados dos autores mencionados excluíram mãe, pai, irmão e irmã, todos

mencionados como residentes. Vale salientar que a amostra do estudo citado foi composta por

300 casais (esposas e maridos) com pelo menos um filho biológico ou adotivo do casal,

critérios que implicaram em todos os pais, mães e irmãos residirem com a criança alvo do

estudo. Assim, com o intuito de comparar os dados do estudo com estes aqui analisados,

foram construídos as tabelas 16 e 17.

Tabela 16 - Número de cuidadores de acordo com a coabitação e o parentesco (excluídos

mãe, pai e irmã/os)

Residentes Não residentes TOTAL Familiares 31 17 48

Não familiares 1 11 12 TOTAL 32 28 60

Tabela 17 - Número de cuidadores de acordo com a coabitação e o gênero (excluídos mãe, pai e irmã/os)

Residentes Não residentes TOTAL

Feminino 25 27 52 Masculino 7 1 8 TOTAL 32 28 60

É bastante evidente a diminuição de cuidadores que residem com a criança (decresceu

de 86 para 32 coabitantes), ao serem excluídos mães, pais e irmãos. No que pese essa

diminuição, observa-se que cuidadores masculino existem, praticamente, se eles residem com

a criança. Há uma correspondência desses dados com os de Carvalho et al. (2012) ao

apontarem tanto uma forte relação entre ser cuidador masculino e coabitar com a criança, isto

é, uma maior probabilidade de engajamento masculino no cuidado quando o cuidador reside

com a criança, quanto a ausência dessa relação entre as cuidadoras do sexo feminino, pois

esse quantitativo é praticamente o mesmo, 25 e 27, respectivamente, para residentes e não

residentes. Todavia observa-se uma discrepância quando os autores apontam que essa

ausência de relação entre ser cuidador e residir com a criança ocorre, principalmente entre

avós e as tias. Isso porque, no estudo de Carvalho et al., a quantidade de avós residentes é

significativamente menor que o número de avós não residentes. Mais uma vez é importante

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ressaltar que tal discrepância pode estar relacionada às singularidades das amostras

pesquisadas, o que pode incluir a variável renda familiar e todas as variáveis a ela associadas

como escolaridade, configuração familiar, crenças sobre o cuidado de crianças etc.

Com exceção de um único caso, os cuidadores não familiares e não residentes (de total

de onze) moram próximo à criança que cuida; dentre esses, quatro são vizinhos (moram na

mesma rua) e dois moram no mesmo terreno onde também se localiza a casa da criança. Esses

dois sujeitos (sogra e cunhado), que são integrantes de uma rede de cinco cuidadores, moram

na casa da frente, enquanto que a criança reside na casa de trás com a mãe e o padrasto.

Residir próximo à criança também é uma característica de destaque entre os cuidadores

familiares não residentes: quinze cuidadores de um total de dezessete moram próximo à

criança. Observando-se as cuidadoras femininas não residentes, 23 pessoas, dentre o total de

27, residem próximo à criança.

Nesse sentido, a proximidade do cuidador com a criança, seja residindo na mesma

casa, seja residindo em casas diferentes, faz da variável coabitação um fator de extrema

relevância entre os cuidadores das redes analisadas, visto que, com exceção de apenas cinco

cuidadores que residem distantes da criança sob seus cuidados, os cuidadores considerados

nesse estudo residem com criança ou próximo a ela. Esses dados podem ser observados em

consonância com os achados de Hewlett (1991) que, ao investigar o cuidado de crianças em

sociedades pré-industriais, apontam que o cuidado alternativo, sobretudo entre caçadores-

coletores, é influenciado pelo fato de diferentes famílias residirem em proximidade,

possibilitando, pois, que diferentes pessoas estejam familiarizadas com a criança.

Explicitando o número de cuidadores residentes e não residentes nas redes de

cuidadores, seguem as tabelas abaixo:

Tabela 18 - Número de redes de cuidadores de acordo com o seu tamanho e o número de cuidadores residentes

Tamanho da rede (nº de cuidadores)

Nº de cuidadores residentes TOTAL

1 2 3 4 5 2 - 6 - - - 6 3 1 9 3 - - 13 4 1 3 5 2 - 11 5 - 2 1 1 1 5

TOTAL 2 20 09 3 1 35

Evidentemente que cuidadores que residem com a criança estão presentes em todas as

redes analisadas, nas 35 redes, mas a coabitação varia de um a cinco cuidadores. Verifica-se

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um número significativamente maior de vinte redes com dois cuidadores residentes

distribuídas entre os quatro tipos de redes. Deste total de vinte redes, treze são constituídas

por pai e mãe, das quais nove se concentraram na rede de três cuidadores. Quanto à rede de

cinco cuidadores (apenas um caso), todos os componentes residem com a criança.

Tabela 19 - Número de redes de cuidadores de acordo com o seu tamanho e a indicação do

número de cuidadores não residentes nas redes

Tamanho da rede (nº de cuidadores)

Nº de cuidadores não residentes TOTAL

1 2 3 2 - - - - 3 9 1 - 10 4 5 3 1 9 5 1 1 2 4

TOTAL 15 5 3 23

Os cuidadores não residentes, numa variação de um a três, integram 23 redes. Assim

como os cuidadores não familiares, eles também não participam de redes de dois cuidadores.

Um quantitativo considerável de quinze redes tem em sua constituição um cuidador não

residente, das quais cinco são avós. Desse total de quinze redes, nove são constituídas por três

cuidadores. O menor número de redes foi constatado em quatro células: uma nas redes de três

cuidadores, sendo dois não residentes; uma nas redes de quatro cuidadores, sendo três não

residentes; e duas nas redes de cinco cuidadores, sendo uma delas com um cuidador não

residente e outra com dois não residentes.

Mediante a análise empreendida, constata-se que as redes de cuidadores constituem-se

predominantemente por familiares, mulheres e residentes com as crianças, ou seja, cuidadora

feminina, com relação de parentesco e residindo com a criança são características marcantes

da maioria dos cuidadores desse estudo. Isso permite considerar essas três características

como atributos relevantes dos cuidadores que se responsabilizam pela criança, bem como das

pessoas que se disponibilizam ou são convocados para auxiliar nesse cuidado.

4.1.1.3 Densidade, Dispersão e Homogeneidade/Heterogeneidade das redes

Sluzki (1997) também considera a densidade, dispersão e

homogeneidade/heterogeneidade como os atributos estruturais da rede social; ele define

densidade como a conexão entre os constituintes da rede, independentemente do membro

central (o informante); dispersão, como a distância geográfica entre as pessoas das redes; e

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homogeneidade/heterogeneidade é a consideração das variáveis demográficas e

socioculturais. Conforme a sugestão proposta por Carvalho et al. (2012), densidade e

dimensão são analisadas através dos respectivos critérios de parentesco e coabitação. Já a

homogeneidade/heterogeneidade considera, conforme proposto por Sluzki (1997), a

caracterização sociocultural e demográfica dos que compõem a rede em termos de sexo,

idade, cultura e nível socioeconômico.

Nesse sentido, as redes analisadas, com base nos critérios propostos, possuem um alto

nível de densidade pelo predomínio de relações de parentesco íntimas, com destaque para a

mãe e o pai, assim como para a avó e a tia, ambas maternas (ver tabela 7); e um baixo nível de

dispersão tanto pela predominância de cuidadores residentes (ver tabela 13) quanto pela

proximidade da maioria dos cuidadores não residentes, visto que estes residem ou no mesmo

terreno, ou na vizinhança onde a criança mora.

A heterogeneidade das redes se expressa na idade dos membros ao abarcar uma faixa

etária que inclui desde a criança (as que são foco da rede e os irmãos) até o idoso (as avós),

mas predominando o adulto (mãe, pai e tias maternas). As redes também são heterogêneas

quanto ao sexo, pois, ainda que haja um destaque para o sexo feminino, as redes são

compostas por cuidadores de ambos os sexos (ver tabela 10). A respeito da cultura e nível

socioeconômico, as redes são homogêneas, uma vez que seus membros, com poucas

exceções, estão situados em um mesmo contexto sociocultural, uma comunidade de baixa

renda, construindo e compartilhando ideias e práticas que caracterizam esse contexto.

Segundo Rossetti-Ferreira (2004) é no contexto social e culturalmente regulado que se situam

os processos de desenvolvimento das pessoas; contexto que compreende um ambiente físico e

social, uma estrutura econômica e organizacional, sendo conduzido por determinadas funções,

rotinas e regras que delimitam a forma como as interações vão se estabelecer.

4.1.2 A dimensão funcional das redes de cuidadores

A análise da dimensão funcional da rede de cuidadores foi realizada com base nas

seguintes variáveis: tipo de cuidado, tipo de cuidador e participação do pai. Essas variáveis

possibilitam realizar o mapeamento das funções da rede e explorar alguns atributos do vínculo

propostos por Sluzki (1997) que permitem a caracterização da rede no que diz respeito ao seu

funcionamento – o envolvimento/compromisso, que se refere à intensidade da relação dos

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constituintes da rede; e a versatilidade, que aponta o número de funções exercidas pelos

membros da rede (CARVALHO et al., 2012).

4.1.2.1 Tipo de cuidado

O tipo de cuidado foi caracterizado a partir das atividades realizadas pelos cuidadores

no cotidiano da criança. Essas atividades, conforme exposto anteriormente, foram mapeadas

considerando o relato das entrevistadas quando respondiam quais eram as atividades que

realizavam rotineiramente com a criança e com outras pessoas de seu convívio. Esse

mapeamento possibilitou identificar tanto as pessoas envolvidas no cuidado da criança,

permitindo a construção das redes de cuidadores, quanto as atividades que caracterizam o

cotidiano do cuidado das crianças da comunidade investigada. Assim, as atividades foram

distribuídas em quatro agrupamentos de tarefas de cuidado: cuidado físico; lazer/convivência;

educação/disciplina; e atividades externas (MOREIRA et al., 2012), expostos no quadro 3. A

distribuição das atividades no quadro não é mutuamente exclusiva; por exemplo, Passear

poderia ser alocada na coluna “Atividades externas”; ou, Levar e buscar na instituição

educacional poderia ser colocada em “Educação/disciplina”. Entretanto, ao se tomar uma

decisão sobre em qual coluna a atividade era colocada, outras que surgissem, seguia-se a

mesma orientação das precedentes; além disso, a análise não visava a uma comparação

quantitativa entre os diferentes agrupamentos; o quadro foi elaborado para apresentar as

atividades de modo mais organizado a fim de inspecionar a quem cabia, entre os membros da

rede, cada uma dessas tarefas.

Quadro 3 - Tarefas de cuidado com base nas atividades do cotidiano da criança

Cuidado físico

Educação/disciplina Lazer/convivência Atividades externas

Alimentação Tomar decisões referentes à

instituição educacional Passear

Levar e buscar na instituição educacional /

casa da babá

Higiene Auxiliar nas tarefas escolares Contar história/

assistir filme Levar ao médico

Sono Estabelecer regras e rotinas Brincar Levar à igreja

A seguir será apresentado cada agrupamento, destacando a participação dos cuidadores

em cada tarefa de cuidado.

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Cuidado físico

O cuidado físico da criança inclui tarefas relacionadas com a alimentação, a higiene e

o sono. Essas tarefas são realizadas com mais frequência pela maioria das entrevistadas: a

mãe, a avó, a tia e a babá, que são as cuidadoras que passam mais tempo com a criança

diariamente.

Educação/disciplina

Esse agrupamento é composto por três tarefas. A primeira delas, tomar decisões

quanto à instituição educacional, se refere à responsabilidade tanto pela decisão de

compartilhar ou não o cuidado/educação da criança com a instituição educacional, quanto pela

escolha da instituição a ser frequentada pela criança. Nesse sentido, ainda que algumas mães

apontem a não inserção da criança na instituição educacional por falta de concordância do pai,

a maioria delas são as responsáveis pela decisão de compartilhar o cuidado/educação da

criança e pela escolha da instituição. Em algumas redes, essa responsabilidade é da mãe e da

avó em conjunto e, em outras, a avó é a única responsável. Em apenas um caso o pai é

apontado como a pessoa que escolheu a instituição educacional frequentada pela criança. Nos

poucos relatos acerca do auxílio nas tarefas escolares, a mãe se responsabiliza por essa

atividade, sendo mencionados em alguns casos o pai e a avó.

A tarefa de estabelecer regras e rotinas diz respeito a algumas atitudes que visam

regular e orientar o comportamento da criança como: repreender alguma atitude; colocar de

castigo; determinar os lugares que pode frequentar e as pessoas com as quais pode se

relacionar; e definir horários para a realização de atividades diárias. Essas regras foram

identificadas tanto a partir do relato das entrevistas, como a partir de observações realizadas

durante as entrevistas com algumas participantes. No local da entrevista foi possível

presenciar alguns cuidadores (mãe, avó, empregada, babá, tia, cunhado) repreendendo a

criança e limitando seu espaço de brincadeira e de circulação. Assim, verificou-se entre as

entrevistadas uma participação significativa nessa tarefa.

Lazer/convivência

As tarefas que constituem o agrupamento lazer/convivência inclui passear, contar

história/assistir filme e brincar. Referente ao passeio as entrevistadas apontam que costumam

frequentar: pracinha, parque, shopping, praia, zoológico, lanchonete, festa de aniversário e

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casa de parentes. Essa tarefa possui o maior número e a maior diversidade de cuidadores:

mãe, pai, tia, avó, tio, irmã, irmão, prima, tia-avó e padrasto. A mãe e o pai, conjunta ou

separadamente, são os mais mencionados, realizando essa tarefa, com ou sem a companhia de

outro cuidadores.

As tarefas contar história e assistir filme são pouco mencionadas; quando aparecem, o

pai e a mãe, sozinhos ou em conjunto, são os responsáveis por realizá-las; outros cuidadores

não as realizam, ou pelo menos não foram mencionados.

Já o brincar é uma tarefa que, embora inclua uma considerável diversidade de

cuidadores (mãe, pai, tia, tio, irmã, sogra e babá), reúne poucos participantes, sendo a mãe e o

pai os mais mencionados. A maioria das participantes aponta – quando indagadas sobre as

pessoas com quem brinca a criança – os irmãos, os primos e os colegas (da vizinhança e da

instituição educacional) como parceiros de brincadeira da criança, não fazendo referência a si

própria, nem a outros cuidadores. Confirmando o relato de algumas cuidadoras, pôde-se

observar durante as visitas às residências, momentos de brincadeira da/s criança/s com os

irmãos, primos e vizinhos, na maioria das vezes dentro de casa. Em algumas residências

havia, além da entrevistada, outro cuidador e criança/s, porém em nenhum caso o cuidador

presente brincou com a/s criança/s ou foi convidado por ela/s para se envolver na brincadeira

que realizava/m.

Sobre o brincar, é válido ressaltar a sua importância para a criança, sobretudo por ser

uma atividade divertida, prazerosa e um momento de descontração com outros parceiros. Ao

brincar as crianças aprendem e cooperam umas com as outras na construção ou transformação

de objetos, compartilham significados, fazem antecipações acerca do comportamento do

parceiro, atribuem novos sentidos a objetos sociais etc. (CARVALHO, PEDROSA et al.,

2012). Eyer, Hirsh-Pasek e Golinkoff (2006) apontam que quando os pais se envolvem em

brincadeiras com crianças estas brincam mais, aumentando também a variedade de

brincadeiras promovidas por elas. Entretanto, ainda salientam que, hoje em dia, muitos pais

acreditam que o brincar não é importante e que a criança não aprende nada quando está “só”

brincando.

Nesse sentido, pode-se inferir que essa pouca participação dos cuidadores na

brincadeira com a criança pode estar apoiado nessa desvalorização do brincar, que indica o

desconhecimento de sua importância. Além disso, é possível supor que os cuidadores

considerem a criança, e não o adulto, como o parceiro mais apropriado para brincar com

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outras crianças, o que pode justificar a não participação ou o pouco envolvimento do adulto

na brincadeira com a criança.

De fato a criança é um importante parceiro de interação. Carvalho e Pedrosa et al.

(2012) afirmam que a criança desde muito cedo se interessa fortemente por outra criança, que

é um parceiro menos previsível e mais difícil de controlar do que o adulto. Contudo, os pais

ou outras figuras de apego também são importantes parceiros de brincadeiras; ao brincar com

o bebê, eles vão, paulatinamente, possibilitando que seu mundo se estruture, significando os

objetos utilizados na interação com o bebê, atribuindo sentidos as vocalizações do bebê e

dialogando através da alternância de papeis, aprendendo, pois, a comunicar-se com ele.

As crianças desse estudo, sobretudo as mais novas (com um e dois anos), estão

constantemente em companhia de adultos. E uma vez que esses adultos reconheçam a sua

importância enquanto parceiro de interação da criança e a relevância do brincar é provável

que se envolvam mais com a criança em momentos de brincadeira, constituindo, assim, um

contexto fértil de troca social e afetividade, tão significativo para o bem-estar e

desenvolvimento da criança.

Atividades externas

Três tarefas constituem esse agrupamento. Levar/buscar na instituição

educacional/casa da babá foi uma tarefa que contou com uma significativa diversidade de

cuidadores: mãe, avó, tia, pai, irmã, babá, vizinha e tio, sendo a mãe e a avó as cuidadoras

mais mencionadas nessa tarefa, seguidas da tia e do pai. As tarefas de levar ao médico e levar

à igreja quase não foram mencionadas. Para a primeira, apenas a mãe é mencionada, podendo

ser considerada a principal responsável por essa tarefa. Já a segunda, é realizada tanto por

alguns cuidadores em conjunto, mãe e pai, quanto por um único cuidador, como a mãe ou a

tia.

Ainda no que se refere às tarefas de cuidado, cabe aqui salientar o destaque dado ao

cuidado físico, visto que quase todas as entrevistadas, quando indagadas sobre o aspecto mais

importante do cuidado da criança, apontam as tarefas relacionadas à alimentação, à

higienização, ao sono, bem como à saúde e integridade física da criança (ter atenção e zelo

para evitar que a criança se machuque ou adoeça, levá-la ao médico quando doente e para

tomar as vacinas). Como exemplo seguem os excertos:

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20E: Em relação ao cuidado da criança o que a senhora acha mais importante

ter?

S8: Dar banho, dar comida na hora certa, dar o lanchinho na hora certa, ter

cuidado pra não cair, tudo isso, né. (Avó materna da criança)

E: E em relação ao cuidado da criança, o que é que tu acha21 mais

importante? Acha que não pode faltar?

S4: No cuidado eu acho que... levar pro médico, né, cuidar sempre levando pro

médico, as vacinas, tá tudo em dias.Tem alimentação. (Mãe da criança)

Algumas participantes ainda apontaram como importante a educação tanto no que se

refere ao aspecto disciplinar (orientar e regular o comportamento da criança) quanto à

frequência à instituição educacional, conforme é expresso nos trechos abaixo:

E: Tem alguma outra coisa que senhora ache importante também?

S5: Que o que?

E: Que a senhora ache importante em relação ao cuidado dele?

S5: Isso, né. Também educar pra mais tarde quando já tiver fechado os olhos,

aí.... né, minha avó, né, me ensinou isso, né. (Avó paterna da criança)

E: E em relação ao cuidado da criança, o que é que tu acha mais importante?

S10: Educação, higiene [...] Essas duas coisa é o que mais importa, pelo

menos pra mim. Sempre limpinha, cabelo sempre arrumado, unha sempre

cortada. Educação... [...] sempre procuro saber como ela tá na escola [...]

sempre toco nesse assunto. (Mãe da criança)

Em poucas respostas, expostas adiante, as entrevistadas também consideram o lazer

(brincar, passear) como um fator importante no cuidado da criança, embora sempre realcem o

cuidado físico como elemento principal:

20 A letra ‘E’ identifica a entrevistadora e ‘S8’ identifica o sujeito número oito no que se refere à ordem em que os trinta sujeitos foram entrevistados.

21 Em alguns lugares do Nordeste, a norma culta da fala não é respeitada com o intuito de sinalizar um tom informal da interação; a pesquisadora ativamente buscou que a entrevistada se sentisse mais à vontade.

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E: Em relação ao cuidado da criança o que é que tu acha mais importante?

S28: Rapaz, a alimentação dele. Ele ultimamente tá ruinzinho pra comer, eu

gosto que ele coma. O banho dele, deixo ficar bem à vontade, brincar. (Avó

materna da criança)

E: E assim em relação ao cuidado da criança, o que é que tu acha mais

importante?

S29: O que eu acho mais importante, cuidar deles. Educação e lazer pra eles.

É o que eu acho, mas primeiro vem a limpeza. Eles tando limpinho, eles tando

limpinho, eles tando limpinho, brincando assim, ó, depois quando chega toma

um banho. Aí pronto, é o que eu acho no cuidado da criança, que eles é

pequeno ainda, mas quando ele crescer, tiver maiorzinho aí é a educação. A

educação, eu gosto muito quando eu to com dinheiro e a gente vai almoçar

fora, a gente vai se divertir, acho massa. Gosto, a gente foi pro shopping do

Rio Mar [...]. (Mãe das crianças)

Ademais, apenas uma cuidadora delega importância ao vínculo afetivo com a criança:

E: Quando se fala assim do cuidado da criança, tem alguma coisa que a

senhora acha mais importante, que não pode faltar?

S30: O amor, o carinho, paciência, muita. Tem que ter, né, senão... Sem o

amor e sem... Sem amor e sem carinho pra criança, a criança não... Não, não

pega amor a gente. Pra pegar amor pela gente tem que ter amor a eles [...].

(Babá da criança)

Uma vez que a satisfação das necessidades básicas – como a fome, a sede e o sono –

são essenciais para a sobrevivência da criança e eliminação de seu desconforto, não

surpreende que a maioria das cuidadoras considere como mais importantes no cuidado da

criança as tarefas que visem satisfazer tais necessidades também denominadas primárias.

Contudo se apresenta como um dado significativo o fato de apenas uma entrevistada apontar o

vínculo afetivo com a criança como o aspecto mais importante, o que pode ser justificado pelo

menor reconhecimento da troca afetiva como uma necessidade primária tão fundamental

quanto às necessidades físicas básicas. No entanto, o cuidado físico pode se caracterizar como

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um momento privilegiado para o estabelecimento do vínculo afetivo entre o adulto e a

criança. Por exemplo, o cuidador ao alimentar, dar banho ou trocar a roupa da criança pode se

engajar com ela em divertidos momentos de brincadeiras, sorrisos, cócegas, caretas e

vocalizações (CARVALHO; PEDROSA et al., 2012), configurando um contexto de

desenvolvimento que preze pela qualidade de vida da criança.

Entretanto, vale salientar que embora o cuidado físico seja considerado o elemento

mais importante do cuidado da criança, observou-se, tanto no relato das entrevistadas quanto

nas observações realizadas durante as entrevistas, que o lazer e a relação afetiva são fatores

significativos no cuidado da criança. Quanto ao lazer, um número considerável aponta as

seguintes tarefas: passear, assistir filme, contar história e brincar; e os considera como

melhores momentos com a criança. No que se refere à afetividade entre cuidador e criança,

algumas entrevistadas colocam que o melhor momento com a criança é quando recebe ou dá

carinho; enquanto que muitos participantes, ao serem indagados sobre o que a criança faz que

eles mais gostam, apontam receber elogio e carinho da criança. Além disso, durante a

entrevista, em algumas residências, pode-se observar trocas afetivas entre cuidador e criança:

em todos os casos, com exceção dos bebês, a criança espontaneamente se aproxima da

entrevistada, sendo acolhida por ela com carinho e palavras afetuosas. Diante disso, mesmo

sendo pouco citados, o lazer e a relação afetiva parecem, pois, ocupar um lugar especial no

cuidado de muitas crianças desse estudo.

4.1.2.2 Tipo de cuidador22

Nessa variável o cuidador é caracterizado como principal e como complementar de

acordo com dois critérios: a frequência nos períodos: diurno, noturno, fins de semana; e a

frequência nas tarefas de cuidado. Desse modo, é considerado cuidador principal aquele mais

frequente em pelo menos dois períodos ou no período diurno em dias úteis e na maioria das

tarefas de cuidado. Já o cuidador complementar possui menor frequência na maioria dos

períodos e das tarefas de cuidado. A tabela 20 apresenta a caracterização de todos os

cuidadores identificados nesse estudo.

22 Essa variável apresentada por Carvalho et. al (2012) caracteriza o cuidador como principal, complementar e esporádico, todavia, frente aos dados disponíveis nesse estudo, foram necessárias e cabíveis algumas adaptações de modo que os cuidadores foram caracterizados como principal e complementar, sendo o primeiro o mais envolvido e o segundo o menos envolvido com o cuidado da criança.

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Vale salientar que o mapeamento das atividades também teve como intuito descrever

as práticas que caracterizam o cotidiano de cuidado das crianças no contexto de investigação.

Frente a essa proposta, foram consideradas todas as atividades relatadas pelas entrevistadas,

ainda que não configurem a rotina de todas as crianças. Nesse sentido, para a caracterização

do tipo de cuidador, no que se refere à frequência nas tarefas de cuidado, são consideradas as

tarefas realizadas com a criança de cada rede, que podem incluir ou não todas as tarefas

apresentadas no quadro anterior.

Tabela 20 - Tipo de cuidador com base na frequência nos períodos (diurno, noturno e fins de

semana) e nas tarefas de cuidado

Cuidadores Cuidador principal Cuidador complementar Mãe 18 15 Avó 8 14

Tia materna 2 14 Babá 2 1 Pai 0 22

Outras cuidadoras femininas 0 15 Outros cuidadores masculinos 0 9

TOTAL 30 90

Ao possuir uma maior frequência na maioria das tarefas de cuidado, em pelo menos

dois períodos, sobretudo no período diurno em dias úteis, a mãe foi caracterizada como

cuidadora principal, na maioria das redes; a avó foi considerada principal em oito redes, com

destaque para a avó materna, em seis dos oito casos; a tia e a babá foram, cada uma, principal

em duas redes. Destacam-se como principal as cuidadoras familiares que residem com a

criança; a exceção foi o caso de uma avó que não reside com a criança, mas mora no mesmo

terreno; e de duas babás que são cuidadoras não familiares e não residem com a criança Esses

resultados são muito próximos dos achados de Carvalho et al. (2012) que ao analisarem o tipo

de cuidador apontam como cuidador principal: a mãe, a babá, a avó materna e a tia, com

destaque da babá no NSEmdA e da avó materna no NSEb.

Já os demais cuidadores foram caracterizados como complementares pela menor

frequência na maioria dos períodos e das tarefas de cuidado, tendo uma maior participação

nas tarefas de lazer (passear e brincar) e em uma das atividades externas (levar/buscar na

instituição educacional/casa da babá). Entretanto é importante destacar nesse grupo o maior

envolvimento das cuidadoras femininas, visto que nas cinco redes em que não há cuidador

principal, sendo todos complementares, as mães que trabalham fora em tempo integral

(período diurno) dividem o cuidado da criança com a instituição educacional e outras

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cuidadoras femininas familiares (avó e irmã) e não familiares (empregada doméstica e babá).

Apenas um pai foi mencionado nessa condição. Além disso, são as cuidadoras femininas as

mais acionadas quando as mães ou outra cuidadora principal precisam deixar a criança para

realizar outras atividades.

4.1.2.3 Participação do pai

O pai não foi cuidador principal em nenhuma rede de cuidadores, sendo caracterizado

como cuidador complementar em todos os casos. Isso pode ser justificado por sua seletividade

no que se refere às tarefas de cuidado, uma vez que sua participação mais significativa está

relacionada ao lazer/convivência. Frente a esse quadro também é importante considerar o

tempo de trabalho do pai: quase todos os pais que residem com a criança trabalham fora de

casa em tempo integral (período diurno nos dias úteis), estando em casa apenas no período

noturno. Algumas mães colocaram que ao chegar a casa o pai realiza algumas tarefas com a

criança: brinca, assiste filme e alimenta (o pai só realiza essa última tarefa quando a mãe não

está em casa). Contudo algumas entrevistadas afirmam que chegando a casa os pais jantam,

assiste TV, saem ou dormem; sem mencionar qualquer interação entre pai e criança. Outras

mães ainda se mostraram incomodadas com a ausência do pai na realização de atividades de

lazer em família. Assim, vê-se que o tempo de trabalho do pai, embora seja um elemento

relevante no que se refere à sua pouca disponibilidade para as tarefas de cuidado, não parece

justificar, de modo geral, o pouco envolvimento em tais tarefas.

Houve três casos de pais que não residem com a criança e tiveram sua atuação junto à

criança criticada pela entrevistada: um deles fica longos períodos longe do filho devido ao

trabalho, sendo considerado um pai ausente pela tia da criança por ficar pouco tempo com ele

quando está em casa, embora ainda brinque um pouco; o outro pai apenas recentemente,

desde a separação da mãe da criança, está mais próximo do filho, realizando algumas

atividades de lazer; e o último pai faz visita ao filho em alguns dias úteis, dividindo o final de

semana alternadamente com a mãe da criança que também não reside com o filho.

Observa-se, a partir do exposto, que o fato de o pai residir ou não com a criança não se

mostra como um fator determinante para o maior ou menor envolvimento no cuidado da

criança, visto que tanto entre os residentes quanto entre os não residentes é possível encontrar

pais pouco envolvidos nas tarefas de cuidado, bem como um envolvimento mais significativo

desse cuidador nas tarefas de lazer.

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A partir desses resultados constata-se que a mãe é a cuidadora mais versátil e com

maior grau de envolvimento por sua alta frequência na maioria das tarefas de cuidado e em

vários períodos do dia. Também se destaca quanto à versatilidade e envolvimento a avó

materna. Em relação ao pai vale destacar sua participação nas tarefas de lazer/convivência e

sua menor frequência nas demais tarefas e períodos, o que possibilita considerá-lo como um

cuidador seletivo quanto às atividades que assume no cuidado da criança. Concernente aos

demais cuidadores, todos complementares, destacam-se as cuidadoras femininas por sua

maior participação, embora com menos frequência.

É importante ressaltar que sendo a amostra pesquisada constituída pelas cuidadoras

que mais se destacaram nas redes analisadas é válido supor que elas enfatizaram sua própria

participação comparativamente à de outros cuidadores. No entanto esse fato pode ser

minimizado pela convergência dos dados com pesquisas nas quais mãe e avó se destacam no

cuidado cotidiano da criança (MOREIRA; ALVES, 2007; ALMEIDA; MOREIRA, 2011;

MOREIRA et al., 2012). Além disso, a realização da entrevista na residência da criança, sem

agendamento prévio, possibilitou uma maior aproximação com o cotidiano da criança de

modo a validar o relato das participantes no que se refere à sua disponibilidade para o cuidado

e seu destaque enquanto cuidadora.

4.2 Significando o cuidado da criança

O cuidado da criança também envolve uma diversidade de significados que tanto

constitui as práticas de cuidado quanto é por elas constituída. Partindo da perspectiva de

Bruner (1997), considera-se que os processos pelos quais damos significados são criados e

negociados dentro da comunidade. Os sistemas simbólicos utilizados para a construção dos

significados já se encontram arraigados na linguagem e na cultura. Assim, é através da

participação na cultura que os significados e conceitos se tornam compartilhados,

possibilitando que concepções sejam construídas e modificadas, e também permitindo que nos

adaptemos a um mundo culturalmente estruturado.

Nesse sentido, o presente item tem como pretensão discutir o significado do cuidado

da criança pondo em destaque importantes evidências acerca da prevalência feminina no

cuidado da criança e do cuidado institucional.

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4.2.1 A prevalência feminina no cuidado da criança

A partir da análise das redes de cuidadores, no item anterior, é possível conceber o

cuidado da criança como uma tarefa tipicamente feminina, sobretudo materna. Desse modo,

encontra-se convergência com estudos em diferentes áreas (ARRAIGADA, 2000; ROCHA-

COUTINHO, 2003; SORJ, 2004, WAGNER et al., 2005) que assinalam a mulher como a

principal responsável pelas atividades domésticas, inclusive o cuidado de crianças. Entretanto,

significativas mudanças sociais como a crescente entrada da mulher no mercado de trabalho e

a participação na renda familiar vêm impulsionando e redefinindo funções tradicionalmente

atribuídas ao homem como provedor do lar e a mulher como responsável pelo cuidado da casa

e dos filhos.

No presente estudo a predominância feminina no cuidado da criança pode ser

percebida tanto quantitativamente, por haver um número significativamente maior de 89

cuidadoras femininas dentre um total de 120 cuidadores (ver tabela 10), quanto

qualitativamente, pelo maior envolvimento e versatilidade das cuidadoras femininas nas

tarefas de cuidado, havendo, portanto, em 30 redes, dentre o total de 35, uma mulher como

cuidadora principal. Cabe aqui ressaltar como um dado relevante, de modo a respaldar essa

prevalência feminina, a amostra ser constituída apenas por mulheres, ainda que o sexo não

fosse um critério a ser controlado nesse estudo. A indisponibilidade de participantes do sexo

masculino durante as entrevista em domicílio revela, pois, a maior disponibilidade das

mulheres no cuidado cotidiano da criança.

A tipificação do cuidado da criança como uma atribuição feminina pode ser

evidenciada mediante significativas questões expostas pelas entrevistadas, como considerar a

mãe a melhor pessoa para cuidar de seu filho, conforme expõe a entrevistada a seguir:

E: Aí tua relação com elas [as crianças], assim, como é?

S3: É bom, é bom. É porque essa idade é complicado, né. Aí já não atende

bastante porque sabe que eu não sou a mãe, aí a mãe: “Olhe, você pode botar

de castigo de castigo a hora que precisar”. Eu coloco, mas nem sempre

adianta, sai do castigo, enfim. Mas... é porque pra uma mãe é... a melhor

pessoa pra cuidar de um filho é ela própria, né, eu acho que ninguém cuida

como ela gostaria que cuidasse. Mas eu me dou bem, eu tenho uma boa

relação com as crianças e com os parentes. (Babá de duas irmãs gêmeas com

idade de cinco anos)

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Rocha-coutinho (2003) afirma que a sociedade, inclusive a própria mulher, ainda hoje,

atribui a esta a responsabilidade pelo cuidado do lar e, sobretudo, o cuidado da criança. Nesse

sentido, a fala da cuidadora, que também é mãe, sugere que embora outras pessoas possam

cuidar de sua filha, ela é a pessoa mais indicada para a tarefa de cuidar e também a mais

qualificada para tal.

A cuidadora, como pode ser visto no excerto abaixo, também demonstra receio em

delegar o cuidado de sua filha a um cuidador masculino, parecendo ser este uma última opção

frente à necessidade de compartilhar o cuidado da criança:

E: Aí, caso a [filha] menorzinha não tivesse nem você pra cuidar, nem o pai,

tem alguma pessoa que ela poderia ficar?

S3: Caramba, minha mãe tá totalmente dependente de mim, né. É... homem a

gente... fica assim, não como uma mulher, né. Mas se for o caso faz sim. (Mãe

e cuidadora principal da filha) 23

Observa-se também que, mesmo sendo uma opção inviável para compartilhar o

cuidado da filha, a avó da criança (sua mãe), seria a pessoa mais indicada para dividir essa

tarefa. Um cuidador, um homem, não parece desejável. Diante disso, cabe lançar a seguinte

questão:

[...] será que as mulheres não confiam nos homens para essas tarefas? Essa hipótese seria compatível com a ideia de que as mulheres são melhor dotadas e mais motivadas do que os homens para o cuidado, devido às pressões seletivas decorrentes de seu alto investimento parental. Essa melhor dotação justificaria a prevalência cultural de mulheres cuidadoras: arranjos culturais também precisam ser eficientes e, para isso, em alguma medida precisam compatibilizar-se com as condições físicas e psicológicas dos agentes sociais (CARVALHO et al., 2008).

Essa preferência por uma cuidadora feminina para compartilhar o cuidado da criança

configurou-se como um fator relevante entre muitas entrevistadas pelo fato de todas terem

apontado uma mulher como possível cuidadora, caso necessitassem dividir essa tarefa.

Exemplificando, seguem os excertos:

E: Caso ela não frequentasse a creche quem poderia cuidar dela?

23 A entrevistada S3 é mãe de uma criança de seis anos e babá de duas irmãs gêmeas de cinco anos.

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S2: A minha... quem poderia não, assim, né, eu deixaria ou com minha mãe ou

com minha irmã. Só que minha mãe já... como ela é muito danada, não

obedece, minha mãe não... diz que não fica, não, com ela assim não. Pra tomar

conta mesmo, não. E minha irmã tem uma menininha agora de um ano, aí...

mas era as pessoas que eu confiava pra tomar conta se eu fosse trabalhar.

(Mãe e cuidadora principal da filha)

Ainda sobre essa preferência vale expor a seguinte colocação:

E: Se ele não frequentasse creche e tu trabalhasse durante a semana, com

quem ele ficaria?

S15: Ninguém. Porque minha mãe trabalha, minha sogra trabalha e meu

marido trabalha. Ninguém. Ninguém. (Mãe e cuidadora principal do filho)

Nesse excerto especula-se que a ordem das pessoas mencionadas revele a ordem de

preferência das pessoas com as quais a mãe compartilharia o cuidado da criança. Essa

suposição pode se ancorar na importância atribuída à avó, principalmente a avó materna, no

cuidado cotidiano da criança. Também é provável que tal suposição se sustente na

consideração do homem como menos qualificado para o cuidado, podendo, nesse caso,

explicar o fato de o pai ser mencionado por último e não em primeiro lugar, apesar de, como a

mãe, ele ser também o responsável pela criança.

A partir do exposto é pertinente destacar mais uma vez Carvalho et al. (2008) por

apontarem que as mães tipicamente delegam o cuidado tanto dos/das filhos/filhas quanto da

casa a mulheres. Também é válido destacar Rocha-Coutinho (2003) que salienta a

permanência de uma visão oposta e complementar do homem e da mulher, na qual esta se

distancia dos traços que se espera de um executivo, ao passo que aquele se distancia dos

traços esperados de uma pessoa que deve cuidar da casa e da família.

Outra importante questão trazida pelas entrevistadas, que se mostra como um efeito

dessa divisão tradicional que responsabiliza a mulher pelas atividades domésticas, o que inclui

tanto o cuidado dos filhos quanto do lar, é a sobrecarga de tarefas presente no cotidiano

feminino, que pode ser observada no relato a seguir:

E: E o que tu mais gosta de fazer?

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S6: Almoço. Almoço. Ser bem sincera, se você me fizesse uma

pergunta assim: “Carla24, você preferia fazer o almoço ou ficar com

Bia?” Eu queria fazer o almoço e ter dinheiro pra pagar uma, ter

dinheiro não, eu queria uma pessoa pra tá ali com Bia. Eu preferia tá

no almoço. É minha filha, mas eu preferia fazer o almoço e uma

pessoa, eu vendo, tomando conta da minha filha, entendesse? Que eu

não sou muito paciente pra criança, não. Eu acredito porque eu não

cuidei de Ane [a filha mais velha]. E a minha vida foi sempre rua. Aí

a minha mudança de rotina foi agora durante dois anos de Bia. Eu tô

dentro de casa agora, mas minha rotina desde que eu me entendi de

trabalhar é rua, é rua, eu não sabia o que era varrer casa, lavar

prato, passar roupa de marido, entendesse? Babar marido... é feito

eu, babar eu digo assim, comida, passar roupa, eu lavar, não. Eu...

durante agora dois anos, então foi muito difícil pra eu, pra eu, pra

mim... aceitar, entendeu? Foi muito difícil, assim de chegar a uma

separação [conjugal], em termo de... dentro de casa ser babá de

marido e filho, foi muito difícil pra mim. Mas não é porque eu queria,

porque meu ritmo não era esse, meu ritmo era administrar empresa

dos outros e quando eu saí da empresa dos outros eu fui pra minha25.

Então eu não sabia o que era menino, eu não sabia o que era mo,

marido. O marido tá sentado e eu ter que botar comer, ter que

levantar, passar, não, eu não sabia o que isso, pra mim foi uma

aprendizagem agora, entendesse? Aí foi durante dois anos uma

aprendizagem, olha, e... aceitar e tem dia que eu tô esgotada mesmo,

de sair tudinho de perto de mim, de sair filho e marido, os três

mesmo, vai lá pra fora e porque eu tô cansada, saturada, entendesse?

(Mãe e cuidadora principal da filha)

A cuidadora relata explicitamente a sobrecarga de tarefas domésticas que configura

seu cotidiano. A mudança da miniempresa para o ambiente doméstico implicou a

24 Todos os nomes apresentados nesse estudo são fictícios. 25 A entrevistada e o cônjuge têm uma miniempresa na própria residência que antes se localizava fora do ambiente doméstico.

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responsabilidade da mãe pelas atividades domésticas que se somam às atividades da empresa.

É nesse contexto que a entrevistada expõe as dificuldades que enfrentou e enfrenta ao assumir

a responsabilidade pelo cuidado da família e da casa, como a separação conjugal, o cansaço e

o esgotamento que reverberam na relação com os demais familiares. A entrevistada ainda

coloca a responsabilidade pelas atividades domésticas como uma aprendizagem e algo de

difícil aceitação, o que se contrapõe a uma divisão tradicional que promove e aceita os papéis

sociais atribuídos ao homem e à mulher.

Nesse contexto vale ressaltar que quase todas as famílias, constituintes das redes de

cuidadores, compostas por familiares de ambos os sexos apresentam uma tradicional divisão

de tarefas que atribui à mulher a responsabilidade pelo cuidado do lar. Como se observa no

trecho abaixo:

E: As atividades da casa quem é que faz?

S10: O que? Almoço, essas coisa?

E: É, atividades domésticas.

S10: Não, eu faço.

E: Tem ajuda de alguém?

S10: Minha mãe ajuda.

E: E teu marido?

S10: Por que ele fica trabalhando! (Mãe e cuidadora principal da filha)

A resposta final da entrevistada sinaliza que o fato de o marido trabalhar fora de casa

justifica seu não envolvimento com as atividades domésticas. Contudo essa justificativa que é

válida para o cônjuge não parece ser para ela, visto que mesmo trabalhando fora de casa em

tempo integral, assim como o marido, ela é a responsável pelas atividades da casa. Isso indica

que a justificativa dada pela entrevistada não parece suficiente para explicar uma divisão

desigual das tarefas da casa. Além disso, observa-se que o trabalho remunerado fora de casa,

mesmo em tempo integral, ainda não conduz a uma divisão igualitária das atividades

domésticas (ARAÚJO; SCALON, 2006).

Esse quadro também é apresentado por uma avó ao expor o envolvimento dos pais da

criança com as atividades do lar. E assim como na família exposta acima, os pais trabalham

fora de casa em tempo integral:

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E: Ela [mãe da criança] lhe ajuda também?

S14: Ajuda. Ela me ajuda, ela lava louça, ela bota roupa na máquina, bota no

varal. Ela ajuda. Varre casa. [...]

E: Aí em casa ele [pai da criança] faz alguma coisa?

S14: Não, em casa ele não faz nada, faz nada. Chega, janta, fica por aí, assiste

televisão até dez horas, é, nove e meia, vai dormir. Faz nada não. (Avó paterna

da criança)

Sendo assim, se constata a prevalência feminina ainda mais significativa no cuidado

do lar, visto que, na maioria das famílias, as tarefas referentes a esse tipo de cuidado é

realizada apenas pela mulher sem a participação do familiar masculino. Enfatizar esse dado é

algo relevante pela possibilidade de apontar, assim como Araújo e Scalon (2006), que dentre

as tarefas tradicionalmente atribuídas à mulher, o cuidado da criança possui uma maior

participação masculina, sobretudo paterna, do que o cuidado do lar. Como exemplo segue o

excerto:

E: E as atividades daqui da casa quem é que faz?

S2: Eu.

E: Só você? Ele [o cônjuge] te ajuda em alguma coisa?

S2: Não, só quando ele tá em casa no final de semana, ele fica com ela pra

mim fazer as coisas assim, mas sou eu que faço. (Mãe e cuidadora principal da

filha)

A participação masculina no cuidado da criança é também exposta na análise da

dimensão funcional das redes de cuidadores. Essa participação se caracterizou como

complementar ao cuidado feminino e mais expressiva nas atividades de lazer, principalmente

no brincar e passear. Essa seletividade e menor participação do homem no que tange às

tarefas de cuidado da criança diferem da versatilidade da mulher e de seu maior envolvimento

nessas tarefas. Dessa forma, ao assumir um maior número de atividades, é possível que a

mulher se depare com a sobrecarga de atividade. Como se observa no trecho abaixo:

S6: [...] Se eu for lá nesse hotelzinho, ver que... se Deus tocar no meu coração,

dizer... se Deus tocar uma coisa positiva e eu sentir que minha filha pode ficar

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ali, aí vou, mas se eu sentir que não vai ficar, não fica, entendesse? Aí eu vou

porque eu to cansada, entendesse? Porque dois anos já sem parar,

entendesse? [...] dona Marta [a antiga babá da filha] ficava aqui, mas eu ia

ajudar as meninas26, entendesse? Que eu não sei ficar parada, aí eu tô

cansada em termo de criança [...]. (Mãe e cuidadora principal da filha)

Essa sobrecarga também pode ser observada quando algumas cuidadoras respondem

que o melhor momento com a criança é no momento em que ela dorme. Seguem como

exemplo os excertos:

E: E qual o melhor momento com ele [o filho]?

S15: Quando eles tão dormindo [risos]. O melhor momento é quando eles tão

dormindo porque eu descanso, tenho tempo de assistir, tenho tempo pra, pra,

pra, pra mim, que quando eles tão acordado eu não tenho tempo pra mim

porque é um dando no outro, arengando, me aperreando, e fugiu, aí vai eu

atrás da [filha] maior, aí tem que deixar ele [o filho] aqui sozinho. Eles

dormindo é um alívio [risos]. É, né pra dizer a verdade, é pra dizer a verdade

mesmo. (Mãe e cuidadora principal dos filhos)

E: E qual é o melhor momento com as crianças?

S11: Quanto tão dormindo [risos] [...] Na horinha que vai tomar um banho,

vai dormir, eu digo glória Jesus, graças a Deus. (Avó materna e cuidadora

principal das duas netas)

O cuidado da criança não tem tempo delimitado para sua realização, uma vez que o

cuidador deve sempre estar disponível para atender às suas necessidades. Muitas vezes, esse

cuidado se soma às tarefas da casa, realidade do cotidiano da maioria das entrevistadas. Esse

excesso de atividades demanda momentos de descanso; daí o momento em que a criança

dorme se mostra como o mais propício para repousar e realizar outras atividades.

Guedes e Daros (2009) destacam um ponto importante que também pode ser

observado nesse estudo como um dos efeitos da responsabilização feminina pelas tarefas de

cuidado. As autoras afirmam que “ao identificar‐se com o ato de cuidar, a mulher, muitas 26 As três funcionárias que trabalham na miniempresa sediada na residência da entrevistada.

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vezes, distancia‐se da possibilidade de outras escolhas, ou distancia‐se dos próprios projetos.

Cuidar do outro torna-se o seu cotidiano” (p. 124). Essa assertiva se mostra em convergência

com a fala das entrevistadas:

E: Tem alguma coisa que você gostaria [de fazer], mas não pode, não tem

tempo, não tem condições?

S2: Agora eu queria fazer curso, né e arrumar emprego, né. Mas eu não posso

por causa da creche que não tá fixa mesmo. É só isso. E assim, serviço assim,

não. (Mãe e cuidadora principal da filha)

E: Como é que tu se sente na tua rotina, dentro do que tu faz diariamente?

S24: Estressada. Tem dia que a... [rir bastante] que fica atacada [risos]. Aí eu

fico atacada aqui, dou uns grito. É, é. Aí eu fico estressada, mas não é direto,

não. Quando tá dentro de casa, como eu to acostumada a trabalhar aí... (Mãe

e cuidadora principal das duas filhas)

As cuidadoras manifestam a vontade de se profissionalizar e trabalhar. Entretanto a

responsabilidade pelo cuidado da criança se coloca à frente dos interesses que extrapolam o

âmbito doméstico. Assim, o ato de cuidar, seja da criança e de ouros familiares, seja do lar, se

constitui como a principal atividade do cotidiano dessas mulheres e da maioria das

participantes desse estudo.

Uma vez que a discussão até o momento se apoiou significativamente nos discursos

das mães, sinalizando também a predominância materna no cuidado da criança, faz-se mister

destacar a avó, sobretudo a avó materna, por sua grande importância no cotidiano do cuidado

da criança (RABINOVICH; AZEVEDO, 2012; AZAMBUJA; RABINOVICH, 2013).

Quantitativamente, as avós constituem um número considerável nas redes de cuidadores (22,

das quais 17 são avós maternas), não superando apenas o número de mães (33) (ver tabela 6).

Além disso, a amostra pesquisada teve em sua constituição nove avós, dentre um total de

trinta entrevistadas, número que, assim como nas redes de cuidadores, ficou abaixo somente

do quantitativo de mães (16). Já, qualitativamente, as avós se mostraram versáteis e com forte

envolvimento nas atividades de cuidado que realizam; em algumas redes, a avó é a cuidadora

principal da criança. No entanto, a participação da avó nesse estudo, exceto nas redes em que

é cuidadora principal, não supera a participação materna, embora não se pode afirmar com

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relação ao pai que em nenhuma rede de cuidadores aparece como cuidador principal, tendo

maior envolvimento nas atividades de lazer.

Além de ser constatada a importância da avó mediante sua significativa participação

no cuidado da criança, independente de como se percebem nesse papel de cuidadora,

verificou-se que algumas delas atribuem a si própria esse lugar de importância no cuidado dos

netos, como uma avó que afirma cuidar melhor do que a mãe da criança:

E: Em relação ao cuidado no geral ela [a mãe da criança]...

S14: Não, não. Ela não recomenda nada, não. Eu até que cuido mais do que

ela.

E: A senhora acha que cuida melhor [que a mãe]?

S14: Eu acho, mais do que ela. É porque, ela, ela é muito ligada em televisão.

Às vezes passa da hora, da, da comida do menino e eu fico em cima dela:

“Natália, cuida do menino”. Ela: “Eu vou fazer, vou fazer” [...]. (Avó

materna da criança)

Outras avós também afirmam a ligação afetiva que tem com os netos de modo a

demonstrar a sua importância na vida das crianças:

E: E qual o teu melhor momento com ele, com o neto?

S28: É mais o dia a dia, ele é mais apegado a mim mesmo, acorda de manhã

vai logo me chamando, só dorme comigo, quando eu me acordo e ele sente que

eu tô me levantando, ele quer... ele se acorda atrás. Ele é mais apegado a mim

do que a ela. (Avó materna e cuidadora principal do neto)

É também enfatizado por outra avó a sua responsabilidade pelo cuidado dos netos:

E: Aí a escola quem foi que decidiu colocar?

S26: É eu, tudo sou eu. A responsável de escola tudo sou eu. Eu que matriculo,

eu que qualquer hora que tiver eu que resolvo. Eu é que... quando tá... começa

assim pra renovar as aula, eu é que vou atrás, corro atrás. Vou, fico na fila

pra guardar vaga, uma cinco hora da manhã. Eu que tiro retrato, eu que tiro

os documento, tudo sou eu que... A outra trabalha, não pode, esse aí às vezes,

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essa aí só se acorda meio dia, uma hora da tarde. Aí pronto, tem que ser eu,

né. A mãe, a cabeça, pai, tudinho sou eu. (Avó materna e cuidadora principal

dos dois netos)

Diante disso, parece significativo para essas avós o reconhecimento, ainda que por elas

próprias, de sua importância no cuidado dos netos, o que as fazem elencar as

responsabilidades que assumem no ato de cuidar, bem como se colocarem como a melhor

cuidadora e a preferida da criança se comparada com a mãe desta.

Outra questão relevante diz respeito à importância da avó em algumas situações

vivenciadas pelas famílias como: separação, recasamento, abandono dos genitores,

dificuldade econômica, a falta de apoio financeiro do pai, doença e gravidez na adolescência,

corroborando, assim, algumas pesquisas (DIAS; SILVA, 1999; ARAÚJO; DIAS, 2002;

DIAS; VIANA; AGUIAR, 2003; LOPES; NERI; PARK, 2005). Algumas situações podem

ser observadas nos trechos que se seguem:

E: Mas porque a senhora cuidou dele e não os pais? Teve algum...

S25: Não, ele se separam, né. Aí se separou-se dela novinho, novinho mesmo,

acho que ele não tinha dois meses, três meses ainda quando ela se separou,

tinha não. Tava novinho de braço assim. Aí... ela arranjou outro rapaz, foi

morar com ele, ele também arranjou outra aí vão, ela mora pra cá, ele mora

pra cá. Aí ela só confia em deixar o menino comigo [...]. (Avó paterna e

cuidadora principal do neto)

E: E a mãe dela [da neta mais velha] é sua filha?

S11: É minha filha, mas tá aí pelo meio do mundo. (Avó materna e cuidadora

principal das duas netas)

E: E a senhora ajuda no cuidado dela?

S13: Eu [...] com meu dinheiro, pago minha casa e compro as coisas pra ela, é

roupa, é sandália, [...] Quando a mãe dela, eu digo: “Elisa, tu vai mandar o

dinheiro?” “Mainha, hoje eu não tenho dinheiro, não, aí compre do seu.” Aí

eu compro do meu. (Avó materna da criança)

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E: E o pai dele?

S26: [...] o pai do outro, Bruno, [...] ela [a mãe] sustentou ele sem pai, tá

nome de mãe solteiro, aí pronto, ela que banca ele de tudo. (Avó materna e

cuidadora principal dos dois netos)

E: Aí quem são as pessoas do convívio dele, fora você e a mãe, e o pessoal da

creche? Com quem mais ele convive?

S28: Ele conveve com o povo todinho da rua. [risos] Ele conveve com minha

família, né, vai pra lá, passa o dia. Com a família do pai [...] eu não tô mais

deixando porque ele não tá dando as coisas a ele direito, aí não vai, não, deixa

ele aqui. (Avó materna e cuidadora principal do neto)

Cabe aqui salientar que das dezesseis redes de cuidadores nas quais as crianças

residem com nenhum ou apenas um genitor, quatorze redes têm a avó em sua constituição.

Dessas quatorze redes, em cinco a criança reside com a avó e nenhum dos genitores, e em oito

reside com a avó e a mãe, ou seja, em treze redes coabitam avó e criança27. Ademais, é válido

ressaltar que dentre as oito redes nas quais a avó é a cuidadora principal, seis estão entre essas

treze redes citadas, apontando, pois, a maior probabilidade de a avó assumir a

responsabilidade pelo cuidado da criança nos casos em que estão ausentes ambos ou um dos

genitores. Nas outras duas redes constituídas pela avó como a cuidadora principal, as mães

das crianças trabalham fora de casa em tempo integral28. Além disso, em outras seis redes nas

quais as crianças residem com os dois genitores e possui o cuidado das avós, pelo menos um

dos genitores trabalha fora de casa em tempo integral. Sendo assim, também se constata a

importância da avó frente à participação dos pais no mercado de trabalho.

É importante ressaltar a prevalência feminina entre os cuidadores não familiares, visto

que, embora tenham constituído um número expressivamente menor se comparado ao número

de cuidadores familiares, do total de doze cuidadores sem relação de parentesco com a

criança, dez são mulheres (ver tabela 7). Desse modo, é possível mais uma vez confirmar a

preferência pelas mulheres para o compartilhamento do cuidado das crianças.

27 É importante esclarecer que desse total de treze redes nas quais as crianças residem com a avó, em uma rede a criança só possui a avó paterna como cuidadora, e em três só possui a avó materna e a mãe. Já nas nove redes restantes a criança possui um ou mais cuidadores familiares residentes. 28 Referente ao pai das crianças, sabe-se apenas que um deles trabalha em um ponto comercial localizado no mesmo terreno de sua residência.

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Frente a essa preferência, é possível que algumas mulheres se destaquem nesse tipo de

tarefa, como uma das babás desse estudo que já possui o reconhecimento das pessoas da

comunidade enquanto uma possível profissional para dividir o cuidado da criança, como é

exposto pela babá e seu marido que chega para almoçar no momento da entrevista:

Marido: Essa [a babá] gosta de menino, de criança mesmo. É. Essa gosta,

adora tomar conta de menino. Chegou aí, quase todo dia chega gente aí na

porta com um no braço [...].

S19: Semana retrasada, não foi, Pedro, chegou com mala e cuia do menino já

pra deixar, a mulher, mas eu não tinha condições de ficar por causa dela já,

que eu tomo conta dela.

Além disso, uma vizinha da babá também a elege como uma possível opção diante da

necessidade de compartilhar o cuidado da criança:

E: E caso tu tivesse que trabalhar, quem poderia cuidar dela?

S18: Assim que eu já ouvi falar muito, que sempre cuidou de criança e nunca

maltratou é a vizinha daqui. Se eu fosse trabalhar, eu deixaria com ela. (Mãe e

cuidadora principal da filha)

Outro ponto interessante a ser salientado se refere à ligação afetiva que se estabelece

entre a criança e a cuidadora, como se percebe na fala da entrevistada a seguir:

E: Aí tem alguma coisa que ela faz que tu gosta muito?

S19: Chama de mamãe, quando ela me chama de mamãe, mamãezinha, me dá

os braços, aí eu gosto [risos]. Mamãezinha, ela diz. (Babá e cuidadora

principal da criança)

Outra entrevistada demonstra, em seu relato abaixo, que essa ligação afetiva pode ser

tão intensa a ponto de causar uma separação dolorosa entre babá e criança, bem como

influenciar decisivamente na opção por não continuar mais trabalhando como babá:

E: Mas tu gostava [de trabalhar como babá]? Como era?

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S21: Gostava, era tanto prova que agora eu não quero mais trabalhar com

criança, não, porque a gente se apega muito. Foi muito difícil eu me separar

delas e elas se separar de mim. Eu não quero mais, não, trabalhar como babá

mais não. (Mãe e cuidadora principal dos filhos)

Sobre isso, Brites (2007) assinala que a intensidade de contato entre a criança e as

empregadas envolvidas em seu cuidado pode, em várias situações, estabelecer um vínculo que

transcende uma relação estritamente profissional, configurando, assim, um contexto no qual

uma mudança de emprego possa implicar uma grande perda afetiva.

Em se tratando da empregada doméstica, vale salientar um aspecto interessante acerca

do manejo de conciliar o trabalho fora e dentro do âmbito doméstico, observado a partir do

excerto abaixo:

E: Então até dois anos você ficava ajudando ela aqui a cuidar dele?

S17: Foi. É. Aí quando ela abriu a loja é que ela foi trabalhar, né. Aí vinha só

na hora do almoço. Aí eu ia pra casa dar banho na minha menina, organizar

pra levar pra escola.

Nota-se, portanto, que a rotina de trabalho da entrevistada é organizada de modo que

seja possível realizar tanto suas atividades profissionais quanto as atividades em seu próprio

lar no que diz respeito ao cuidado de sua filha.

Em suma, os dados apontam uma tipificação do cuidado, tanto da criança quanto do

lar, como tarefa feminina. Nesse estudo o cuidado da criança se apresentou como uma

atribuição majoritariamente feminina entre os cuidadores familiares e não familiares, havendo

grande destaque para a mãe e, em seguida, para a avó materna. Também se pode assinalar que

a responsabilização da mulher pelas atividades domésticas – capaz de promover a sobrecarga

de atividades, bem como a desvalorização do homem enquanto cuidador – repercute na

dinâmica familiar, delineando as relações que se estabelecem entre os familiares e os papeis

assumidos por cada membro da família. Além disso, observa-se que as mulheres se mostram

mais abertas a uma divisão mais igualitária, assumindo papéis tipicamente masculinos ao

trabalhar fora de casa e participar do sustento familiar. No entanto, não se observa o mesmo

entre os homens que se mostram seletivos ao se envolverem nas as tarefas domésticas,

tradicionalmente realizadas por mulheres, apresentando uma participação mais significativa

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nas atividades de lazer com os filhos (ARAÚJO; SCALON, 2006). Assim, conforme aponta

Diniz (1999) é a mulher que arca com o maior ônus ao assumir múltiplos e novos papéis.

4.2.2 O cuidado institucional

Nesta pesquisa, o cuidado institucional refere-se aos serviços oferecidos pelas

seguintes instituições educacionais: CMEI (Centro Municipal de Educação Infantil),

instituição pública que integra o atendimento de creche – zero a três anos – e de pré-escola –

quatro e cinco anos; creche ou entidades equivalentes, como por exemplo, hotelzinho; pré-

escola, pública ou privada; e escola, com os quais é compartilhado o cuidado da criança de

zero a seis anos. Na comunidade investigada, as pré-escolas públicas integram o CMEI ou a

escola (junto ao Ensino Fundamental I); já nas instituições privadas, a pré-escola é oferecida

junto ao hotelzinho e à escola. Ainda é válido ressaltar que a única creche da comunidade,

assim como o único CMEI, são instituições públicas (ver quadro 2).

Conforme pôde ser observado na tabela 3, anteriormente apresentada, das 44 crianças

abrangidas por esta pesquisa, 27 frequentam instituições educacionais. Uma informação a ser

acrescida a este quantitativo é que em cinco dos oito casos nos quais os cuidadores possuem

mais de uma criança sob seu cuidado, há pelo menos uma criança que frequenta instituição

educacional e outra que não frequenta. Em dois casos, todas as crianças frequentam

instituição educacional e, em apenas um caso, todas as crianças não frequentam.

A princípio será apresentada na tabela 21 a frequência das crianças às instituições

educacionais consideradas no estudo e a faixa etária das crianças que compõem cada

agrupamento.

Tabela 21 - Número de crianças que frequentam ou não instituições educacionais de acordo

com a faixa etária das crianças e o tipo de instituição.

Frequência à instituição educacional Número de crianças Faixa etária

Frequentam CMEI ou creche 10 1 a 5 anos

Frequentam (pré)escola pública ou privada 17 2 a 6 anos

Não frequentam instituição educacional 17 0 a 6 anos

TOTAL DE CRIANÇAS 44 -

As 27 crianças que frequentam instituições educacionais é indicador da relevância das

instituições nas redes de cuidadores aqui analisadas. Esse fato também foi ressaltado por

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Moreira e Biasoli-Alves (2007) ao concluírem que a instituição educacional infantil e a escola

assumem papel de destaque na tarefa educacional das crianças, sendo consideradas o “braço”

direito das famílias.

Com base na tabela 21, a discussão sobre o cuidado institucional será desenvolvida em

três tópicos: 1) As crianças que frequentam/frequentaram creche/CMEI; 2) As crianças que

frequentam escola; e 3) As crianças que não frequentam instituição educacional.

4.2.2.1 As crianças que frequentam/frequentaram creche/CMEI

Concernente às dez crianças que frequentam creche ou CMEI, a maioria (seis) tem

dois anos de idade. Além disso, sete frequentam a mesma creche, duas frequentam o CMEI da

comunidade e a outra frequenta uma instituição pública não localizada na comunidade, a qual

não foi possível identificar como sendo uma creche ou CMEI29.

Um importante ponto a ser destacado diz respeito aos motivos que propiciaram a

entrada das crianças na instituição. A maioria dos cuidadores apontou como motivos o fato de

trabalhar fora de casa e a pretensão de conseguir um trabalho. O que pode ser visualizado nos

excertos a seguir:

E: Mas se essa [creche] daqui que ela tava pegasse mais novinha, tu teria

colocado?

S12: Aham. Mas não pega, não. E também assim, eu só inventei de botar ela

na creche porque eu fui trabalhar, porque assim, querendo ou não, tinha uma

coisa, aparecia uma coisa pra fazer, aparecia outra, mas senão a gente não

botava, não. Porque querendo ou não, a creche ajudava que só também, né.

Mais por isso porque se não fosse isso... (Mãe de uma criança que já

frequentou creche)

E: Quem foi que escolheu a creche?

S2: Fui eu, porque eu tava pensando em... eu to, né, só não fui ainda porque a

creche não tá fixa mesmo assim largando de cinco horas da tarde, mas pra

mim arrumar um emprego. (Mãe de uma criança que frequenta creche) 29 As cuidadoras da criança afirmam ser uma creche, mas não existe precisão na informação porque uma pessoa leiga, que não lida com a terminologia educacional, chama, frequentemente, de creche a instituição que atende crianças pequenas.

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Além dos motivos expostos acima, algumas cuidadoras também apontaram como

causas para a entrada da criança na instituição a necessidade de ter mais tempo para dar conta

de outras atividades, assim como a preparação da criança para a entrada na escolinha. Tais

causas podem ser explicitadas nos trechos abaixo:

E: Mas por que colocou ele só com mais de um ano? Não colocou mais cedo?

S28: Porque eu achei muito novo. Depois foi que eu resolvi colocar, que eu

nem ia colocar, né. Mas tem vez que a gente sai pra um, médico, aparece uma

unha, diarista, né. Aí tem que arranjar alguém pra ele ficar, né, com as

pessoas. E ele não gosta de ficar muito, ele é ruim de ficar com as pessoas.

Chorava muito, ninguém queria ficar com ele. (Avó materna de uma criança

que frequenta instituição educacional)

E: Mas por que tão querendo tirar ele [da creche]?

S28: Assim, né [...] É bom pra ele porque já vai acostumando quando for pra

escola esse ano. Aí eu coloquei pra ele ir se acostumando mais. Mas... Não é

porque queria se livrar dele pra ficar o dia todinho à vontade, não, é porque

criança tem que ir se acostumando com o colegiozinho.

Esse último excerto também evidencia que parece ser uma preocupação entre os

responsáveis pela criança que compartilhar o cuidado com a creche seja sinônimo de eximir-

se de sua responsabilidade enquanto cuidador. Os trechos acima possibilitam uma

compreensão de que a permanência da criança na creche deveria ser justificada por motivos

plausíveis como os que envolvem trabalho e saúde. Motivos que se relacionem com o

lazer/descanso do cuidador parecem pôr em questionamento sua função de mãe/pai ou

responsável pela criança.

A idade de ingresso na creche ou CMEI também é um fator importante a ser posto em

discussão. Tais idades recaem entre zero a quatro anos, havendo grande destaque para as

crianças que começaram a frequentar a instituição aos dois anos. Apenas uma criança entrou

com menos de um ano (nove meses), quatro crianças com um ano e uma aos quatro anos.

Entretanto três crianças desse grupo já haviam frequentado outras instituições educacionais:

duas crianças (irmãos gêmeos) entraram no hotelzinho aos onze meses até conseguirem vaga

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na creche aos dois anos; e uma criança que entrou na escola (que também oferecia a pré-

escola) aos três anos, mas devido a alguns desentendimentos ocorridos na instituição deixou a

escola e foi para o CMEI aos quatro anos.

Ao ser indagada sobre o porquê da entrada das crianças na instituição com as referidas

idades, a maioria dos cuidadores coloca como justificativa as crianças possuírem a idade

mínima (a maioria dois anos) atendida pela creche. O excerto abaixo expõe a justificativa

mencionada:

E: Mas por que só com dois anos que ela foi pra creche?

S11: Porque só pega com dois anos. (Avó materna de uma criança que

frequenta creche e de outra que já frequentou)

Uma vez que a maioria das crianças frequenta/frequentou a mesma creche, observa-se

que há uma preferência por essa instituição. Um dos indícios dessa preferência é a confiança

na instituição, visto que ela é antiga na comunidade, já conhecida pelos cuidadores, tendo

alguns deles já frequentado a creche, como pode ser visto nos excertos abaixo:

E: E os filhos da senhora, todos foram [pra creche]?

S8: Os menores, os mais novos, tudo foram, tudo passaram. Ela [neta adulta

que estava presente na entrevista] passou pela creche, ela foi criada mais por

aqui, né. Ela tinha a mãe dela, mas foi criada mais por aqui porque eu sou vó,

sou vó dela. Ela passou pela creche.

Neta: Quase tudinho daqui [frequentou a creche], não foi?

S8: Foi, uma bocado de neto que mora na beira da pista, três neto... [...] Muita

gente, muita mesmo, muita dessa família já passou pela creche. É a creche que

a gente mais gosta. Ali tem uma bonita, mas a gente só gosta mais daquela.

(Avó materna de uma criança que frequenta creche)

E: Como foi que tu teve conhecimento da creche?

S15: Eu fui de lá.

E: Foi.

S15: Eu fui da creche.

E: Ela é bem antiga, né?

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S15: É. Quando eu era pequena, eu era da creche, aí minha filha foi de lá e

agora ele. (Mãe de uma criança que frequenta creche)

Os comentários que circulam na comunidade sobre as instituições educacionais

também podem ser apontados como um fator importante para a preferência de uma instituição

dentre outras. Assim apontam os trechos a seguir:

E: Por que, assim, as pessoas falam [da instituição]?

S24: Sei lá, porque dizem que... dizem, né, eu não sei, né, que a gente pra dizer

alguma coisa tem que ter prova, né. Dizem que lá a creche não é muito boa,

não [...]. O povo fala muito mal mesmo, dessa creche, muito mal mesmo, aí

eu... eu ia até botar essa daqui a pequenininha pra eu ir trabalhar mais cedo,

né, mas botaram tanta coisa, disse: “olha, não bota, não”, aí eu fiquei com

medo, né, [...] aí eu prefiro que ela faça, fazer dois anos pra eu ir começar

trabalhar pra botar aí na [outra] creche. (Mãe de duas crianças; uma que já

frequentou creche e outra que nunca frequentou)

E: O que é que o pessoal costuma falar [referindo-se ao CMEI]?

S2: Fala que lá ela não cuida do menino direito [...] Dizem que... não sei, né, o

povo também fala demais, né. [...] Aí eu não colocaria lá, não. Eu já coloquei

nessa [creche] porque eu conheço essa daí, já... só vejo falar coisa boa dessa.

Aí por isso que eu coloquei. (Mãe de uma criança que frequenta creche)

Outra importante evidência da preferência pela creche se apoia na compreensão de que

um local menor, com poucas crianças oferece melhores condições de cuidado, como se pode

visualizar a seguir na fala de duas cuidadoras:

E: Mas não tem outra creche aqui, não, que pegue mais novinho?

S12: Tem ali [referindo-se ao CMEI], mas a gente preferiu essa.

E: Por quê?

S12: É costume [risos]. E outra, aí é mais pequenininho, é mais pouca criança

e a dali é muita criança e pega todos os tamanhos. (Mãe de uma criança que já

frequentou creche)

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E: [A creche] É uma que tem um espaço bem grande na frente, na entrada?

S15: Não [...]. É a daqui do outro lado da rua...

E: A que é menorzinha...

S15: A menorzinha que só tem dois grupo. Eu acho melhor porque é poucas

criança, elas dá mais atenção e ali é muita criança. Já teve acidente, eu não

gosto, não. (Mãe de uma criança que frequenta creche)

É possível justificar a preferência por um local menor, com menos crianças, conforme

apresentado na fala dos cuidadores, por acreditarem ser essa organização a que melhor

atenderá a criança em suas necessidades. Tal perspectiva se aproxima da apontada por

Amorim (1997 apud RAPOPORT; PICCININI, 2007): tradicionalmente, a educação da

criança é uma atribuição do adulto devido a sua maior experiência. Essa visão, atrelada à

pequena razão adulto-criança na creche, engendra nos responsáveis uma ideia de que faltam

os cuidados apropriados à criança se a instituição educacional for muito grande.

No excerto abaixo, outra cuidadora realça o tamanho da creche como uma

característica que não é tão boa, mas é compensada por outro aspecto:

E: E porque vocês gostam tanto de lá da creche?

S8: A gente... a gente acha, né, não sei os outros, mas a gente aqui acha, lá é

pequenininha, é menor a creche, mas as crianças é mais cuidada. É mais bem

cuidada. (Avó materna de uma criança que frequenta creche)

Nessa compreensão a cuidadora põe em oposição o fato de a creche ser menor e

oferecer um bom cuidado. Ela parece evidenciar a creche enquanto sua estrutura,

possibilitando a compreensão de que embora essa estrutura não seja a mais adequada (ser uma

creche pequena) as crianças são bem cuidadas, o que de fato justifica sua preferência por tal

instituição.

A partir das evidências apresentadas, vê-se que as cuidadoras avaliam os serviços que

são oferecidos pelas instituições educacionais e se preocupam em compartilhar o cuidado das

crianças com instituições que garantam um serviço de qualidade.

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Quando questionadas se teriam posto a criança com menos idade na creche, algumas

cuidadoras disseram que colocariam se a instituição fosse a de sua preferência, como se pode

observar no excerto abaixo:

E: Mas aí se lá [na creche] tivesse pegando mais novinho tu teria colocado [a

criança]?

S15: Botava. Que é boa, a creche.

E: Mas o motivo de não ter colodo mais novinho foi porque...

S15: Não pega, só pega com dois anos.

E: E as outras creches...

S15: Pega... recém-nascido aqui, na [diz o nome da instituição]. Mas eu não

gosto, não, porque meu primo caiu de lá da... da mesa [...]. (Mãe de uma

criança que frequenta creche)

O excerto acima também possibilita considerar a experiência de outras crianças como

uma importante fonte de informações sobre a instituição de modo a exercer uma significativa

influência na escolha por outros cuidadores. No caso citado, a experiência desagradável da

criança configura-se como uma informação negativa sobre a instituição que,

consequentemente, se torna um lugar não adequado – e, por isso, não escolhido – para

compartilhar o cuidado da criança.

Outras justificativas foram expostas pelos cuidadores para o não compartilhamento

dos cuidados da criança com a creche, nos anos iniciais:

a) A dificuldade de encontrar vagas na instituição

Ainda que o cuidador opte pelo serviço da creche, a insuficiência de vaga se coloca

como um impeditivo para a inserção da criança na instituição, como se pode ver no excerto a

seguir:

E: Qual foi o motivo de tu ter saído da primeira [casa onde trabalhou]?

S21: Porque, as duas [casas que trabalhou] foi porque eu engravidei. Eu

engravidei aí... fica difícil deixar os menino, pagar... pagar, na creche30 já

30 Embora a entrevistada nomeie a instituição de creche, ela se refere ao CMEI que é a única instituição localizada na comunidade que atende crianças a partir do primeiro ano de vida.

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pega a partir de dois, três meses e é bem difícil de... pegar vaga na creche.

(Mãe de três crianças: uma frequenta CMEI, outra já frequentou o CMEI, e a

terceira não frequenta instituição educacional)

Cabe aqui salientar que na comunidade pesquisada há apenas uma instituição

educacional, o CMEI, que atende crianças no primeiro e segundo ano de vida, ou seja, com

zero e um ano. Isso evidencia a dificuldade posta pela cuidadora de conseguir vaga para

crianças com menos de um ano.

b) A preferência pelo cuidado doméstico e familiar

O cuidado doméstico, sobretudo por familiares da criança, por vezes, é uma alternativa

preferível ao cuidado institucional, como se pode observar no trecho abaixo:

E: Mas porque tu acha que muito novo não era bom colocar?

S28: Tá aqui em casa, pra que colocar o bichinho na creche? Tava eu e ela [a

mãe da criança] em casa, aí... Não. (Avó materna de uma criança que

frequenta instituição educacional)

Compreende-se que se referir à criança pelo termo “bichinho” a coloca numa posição

de vítima, ou seja, de alguém em situação de desconforto ou sofrimento. Sendo assim,

depreende-se dessa fala que frequentar a creche seria algo ruim ou não desejável para a

criança com menos idade, o que motiva a cuidadora a optar por deixar a criança sob o cuidado

dos familiares disponíveis para essa tarefa.

Essa disponibilidade do cuidador, sobretudo da mãe, também se evidencia quando este

afirma não trabalhar fora do ambiente doméstico. Isto é, não trabalhar fora de casa é um fator

que o torna disponível para cuidar da criança, não havendo, pois, necessidade de solicitar o

serviço da creche, como sinaliza o trecho abaixo:

E: Mas, e mais novinho tu não... [colocou na creche]

S20: Eu não coloquei, não.

E: Por quê?

S20: Porque eu não trabalhava, não. (Mãe de uma criança que frequenta

CMEI e de outra que não frequenta instituição educacional)

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c) A criança estar em período de amamentação

A amamentação é considerada um fator que inviabiliza a entrada da criança mais cedo

na instituição, como ressalta a entrevistada:

E: Mas caso tivesse a possibilidade de colocar eles mais cedo, assim mais

novinho na creche...

S9: Eu acho que não [...]

E: Não, por quê?

S9: Por causa da mama. (Mãe de uma criança que frequenta creche e de duas

que já frequentaram)

d) A necessidade de passar mais tempo com a criança

A frequência da criança à creche diminuiria o tempo do cuidador junto à criança. O

que é relatado no seguinte excerto:

E: Mas porque tu não quis colocar ela mais cedo? Ela mais novinha?

S10: Não, que... porque eu quase não tenho tempo com ela e botar ela mais

nova e qual o tempo que eu... Parei de fazer o estágio pra me dedicar a ela,

pelo menos um pouco. (Mãe de uma criança que já frequentou creche)

A necessidade que a mãe demonstra de passar mais tempo com a filha pode ser

compreendida como um desejo que ela tem de ficar com a criança, de estar mais próxima da

filha. Pode-se inferir também que seja uma vontade da cuidadora investir mais nas tarefas de

cuidado da criança, visto que, por ser mãe, se ache a pessoa mais apropriada para realizar

essas tarefas.

e) Medo de que a criança sofra algum tipo de violência

Optar pela entrada da criança na creche com mais idade também se sustenta no receio

do cuidador de que a criança seja vítima de algum ato de violência, como expõe a mãe de uma

criança que frequentou creche:

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E: Mas se tu trabalhasse com ela novinha ainda, tu teria colocado?

S10: Não, deixava ela com minha mãe mesmo [risos].

E: Mas por quê? Tem algum motivo?

S10: Não. Sei lá, porque eu acho que...

E: Pode falar, fique à vontade.

S10: Indefesa ainda, não tem como se defender. Ela com dois anos não, já

falava tudo, se alguém fizesse alguma coisa, ela falava e... três, quatro meses

não fala nada, sei lá, eu tenho medo que faça alguma coisa, aconteça alguma

coisa e ela...

Vê-se, portanto, que a preocupação da cuidadora é amenizada quando a criança é

inserida na creche após ter a linguagem verbal desenvolvida, pelo fato de ela já ser capaz de

relatar o que acontece na creche, inclusive podendo expressar verbalmente alguma situação

desagradável ou ruim pela qual tenha passado. Também se percebe, no excerto acima, certa

resistência da cuidadora em expor tal justificativa, o que também pode ser observado na fala

de outra entrevistada:

E: Mas você teria colocado mais cedo, se pudesse?

S9: Eu... [...] acho que não, porque eu tomo conta, né, aí eu não ligo pra essas

coisas assim, não.

E: Mas caso tivesse a possibilidade de colocar eles mais cedo, assim mais

novinho na creche...

S9: Eu acho que não, que eu toda vida eu tomei conta deles e assim... ali tem

uma creche, né, que pega, parece que é com seis meses, berçário, né, mas eu

jamais deixei não meus filhos, não.

E: Não, por quê?

S9: Por causa da mama.

E: Ah! Mas só por causa da mama? Tem outro motivo assim que tu não

deixaria?

S9: Não, porque a gente assiste, vê um bocado de coisa na televisão, aí eu fico

com aquilo na cabeça.

E: É o que assim, que tu fica...

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S9: Segurança, né. Em casa pra mim ele tá com mais segurança. (Mãe de uma

criança que frequenta creche e de duas que frequentam escola pública)

Nos dois casos acima, nota-se uma relutância das cuidadoras para falar sobre o que

realmente parece justificar a decisão de não colocar criança mais novinha na creche. No

primeiro caso, a relutância se observa através de um aparente desconforto da entrevistada, que

profere uma resposta com negações e interrupção, seguida de uma colocação da pesquisadora

de modo a deixá-la mais à vontade pra falar. Já no segundo caso a relutância se mostra pelo

fato de a entrevistada expor uma grande preocupação somente após uma investida da

pesquisadora, que não se contentou com as razões até então apresentadas e insistiu um pouco

mais com questionamentos.

A relutância em explicitar as razões que levam as mães a não colocarem a criança

novinha na creche provavelmente, se deve ao fato de considerarem sua casa um local mais

seguro para seu/sua filho/a ser cuidado/a. O que é possível intimidar as mães é a repercussão

de suas colocações, pois temer uma possível violência na creche ou questionar a segurança da

criança, implicitamente significa questionar a qualidade do serviço oferecido pelas

instituições educacionais da comunidade, incluindo a creche que seus filhos

frequentam/frequentaram.

Ademais, no último excerto acima é importante destacar a influência da mídia no

discurso dos cuidadores; essa influência é ainda mais clara na fala de uma avó que não

concorda que a criança (seu neto) frequente creche:

E: Mas se tivesse creche por lá [no local onde morava] a senhora botaria...

S23: Botava nada.

E: Mas por quê?

S23: Porque eu to vendo muitas coisas na televisão sobre creche, minha filha.

E: O que a senhora costuma ver?

S23: Vejo muita coisa aí a... as, as cozinheira, as empregada que toma conta

das criança, tava dando, queimando, fazendo coisa que não deve. Tá vendo aí

o que tá acontecendo em creche, não pense que vão botar menino em creche

não porque tu trabalha, tem eu pra tomar conta do menino, é melhor tá

comigo, não tá rasgado, queimado, entendeu. Tem, tem, eu vejo aí, menina,

creche que as mulher pega [...] mete na parede assim, ó. Depois disso pronto,

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tira Pedro. Pedro não vai mais pra, pra creche mais não. (Avó materna de

uma criança que já frequentou creche, mas não frequenta mais)

Diante disso é posto em cena como a mídia televisiva, ao veicular informações sobre

situações de violência no trato de crianças, pode influenciar a concepção do cuidador sobre

instituições educacionais infantis.

4.2.2.2 As crianças que frequentam (pré)escola pública ou privada

No que se refere às crianças que frequentam escola (que atendem também crianças de

creche e pré-escola – dois a seis anos, mas são chamadas, genericamente, de escola, pela

comunidade), têm-se um total de 17 crianças, na maioria, com quatro (sete crianças) e cinco

anos (cinco crianças). Dessas 17 crianças, onze frequentam instituições particulares, cinco

frequentam instituições públicas e uma frequenta duas instituições, uma pública e outra

privada. É notório o quantitativo significativamente maior de crianças em instituições

privadas, sinalizando uma relevante valorização de tais instituições. Essa valorização também

foi percebida entre alguns cuidadores de crianças que ainda frequentam creche, como pode ser

observado no excerto a seguir:

E: Mas se fosse alguma [instituição] particular? Colocaria?

S15: Colocaria. Quando ele sair daí da creche eu vou botar ele num

particular. (Mãe da criança)

Essa valorização da instituição privada pode encontrar explicação na realidade de

grande parte das escolas públicas do Brasil, consideradas instituições educacionais de má

qualidade, sobretudo as de regiões mais pobres que, via de regra, possuem escolas públicas de

péssima qualidade (SCHWARTZMAN, s/a). E sendo o local de pesquisa uma comunidade de

baixa renda, se aproximando de um contexto socioeconômico menos privilegiado, é possível

que se encontre escolas públicas de baixa qualidade, motivando os pais a optarem, quando

possível, pelas escolas privadas, consideradas instituições de melhor qualidade.

Das 17 crianças que frequentam escolas, oito já frequentaram creche/CMEI e nove

nunca tinham frequentado. Sendo assim, a respeito da entrada das crianças na instituição

escolar, as oito primeiras crianças tiveram sua inserção de modo a dar continuidade a

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Educação Infantil, uma vez que a maioria já tinha atingido a idade limite atendida pela creche

(quatro anos). No que se refere às outras nove crianças, percebeu-se, em alguns casos, que a

entrada na instituição escolar está atrelada a uma motivação pedagógica, ou seja, os

cuidadores acham que a criança já deve ter uma iniciação escolar, conforme é ressaltado no

trecho a seguir:

E: Ela não foi pra creche, ela foi direto pra escolinha...

S1: É porque ela é muito esperta. Ela contava, ela sabia as cores, Ela

aprendeu aqui e foi direto pra escola, nem esperei fazer dois anos, foi direto.

Aí ficou admirado, menina como ela é esperta. Aí eu botei ela logo [...]. (Mãe

de uma criança que frequenta escola privada e outra que não frequenta

instituição educacional)

Quanto ao questionamento sobre a não entrada mais cedo na escola, visto que nove

crianças frequentam a instituição pela primeira vez, alguns cuidadores apontaram como

justificativas: a criança estar em período de amamentação e haver disponibilidade de

cuidadores para cuidar da criança. Essas justificativas se assemelham as que foram citadas

pelos cuidadores de crianças de creche/CMEI. Como exemplo, são apresentados os excertos

abaixo:

E: Ele [o pai] também concordou em colocar [na instituição]?

S17: É. Concordou. [...] mas ela [a mãe] disse: “Não, ele é muito novinho e

ele ainda mama.” Ele mamou até um tempo desse. (Empregada doméstica e

cuidadora de uma criança que frequenta escola privada)

E: Mas a senhora teria colocado ele na creche...

S14: Não, não. O avô disse que não.

E: Por quê?

S14: Não, porque ia, outra coisa que ele tá crescendo, tá ficando sabidinho e

vai ser melhor pra gente ele maiorzinho, né, que já vai entendendo das coisas.

E eu e ele não trabalha, ele tá agora ajudando meu sobrinho, mas ele não

trabalha. E também meu trabalho é só aqui em casa, dá pra gente tomar conta

dele.

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E: E porque a senhora acha que maiorzinho é melhor?

S14: Não, eu acho que assim ele maior porque a gente vai conversando com

ele, né, e ele vai entendendo, obedecendo a gente, aí eu acho que não tem

necessidade dele ir pra creche. (Avó paterna de uma criança que frequenta

escola privada)

É interessante ressaltar nesse último excerto a concepção da avó de que a criança mais

velha, por possuir uma maior capacidade de entender o que deve ser ensinado pelo cuidador,

não necessita frequentar creche uma vez que tal capacidade parece facilitar a tarefa de cuidar,

não havendo, pois, a necessidade do cuidador dividir essa tarefa. Desse modo elucida-se como

a cuidadora percebe a criança em termos de suas capacidades e necessidades, e como tal

percepção define as escolhas e as práticas que configuram o cuidado da criança e vice-versa.

4.2.2.3 As crianças que não frequentam instituição educacional

Concernente às crianças que não frequentam nenhuma instituição educacional, um

efetivo de 17 crianças, na faixa etária de zero a seis anos, a maioria (dez crianças) tem entre

um e dois anos. Ademais, todas as crianças com menos de um ano (três crianças) compõem

esse grupo.

Vale ressaltar que desse total de 17 crianças, três já frequentaram instituição

educacional e duas crianças tentaram frequentar. A seguir será explicitado cada caso com o

intuito de evidenciar significativos fatores que envolvem o cuidado institucional.

Entre as três crianças que estiveram, anteriormente, em instituição educacional, duas

frequentaram a mesma creche e uma frequentou três instituições: um CMEI, uma instituição

localizada em outro bairro31 e um hotelzinho próximo à comunidade. Das três crianças, uma

saiu da creche após completar a idade limite (quatro anos), contudo não conseguiu vaga na

pré-escola por não possuir a documentação necessária, como pode ser visto no trecho a seguir:

S11: Essa daí [referindo-se à criança] é em casa que, agora por enquanto tá

sem documento da mãe; ela [a mãe da criança] tá pelo meio do mundo,

pessoal pelo meio do mundo, aí tá sem documento, aí fui botar ela [a criança]

na escolinha lá na [diz o nome do bairro], paga dez reais por mês, pra [...]

31 Por falta de informações mais precisas, não é possível identificá-la como creche ou CMEI.

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estudar, né, aí não conseguiu e tá dentro de casa mesmo. (Avó materna da

criança)

A segunda criança dentre as três que também frequentaram creche deixou de

frequentá-la após ser diagnosticada com câncer, conforme é exposto no excerto abaixo:

E: E o menorzinho vai pra creche?

S23: Não, não. Passou dois meses na creche, quando a gente descobriu isso

dele a gente tiremos ele da creche. Aí não, não vai botar mais não. Ainda ia

fazer dois meses, um mês e [...] tiremos logo, deixamos mais não [...] a gente

não vai botar ele na creche mais não, a gente tem que dar amor e carinho, que

ele tá precisando agora de amor e carinho. Cuidar da vista, a vista é muito

importante pra gente. (Avó materna da criança)

Observa-se no discurso da avó como sendo uma função da família apoiar emocional e

afetivamente a criança em uma situação de enfermidade. Duas hipóteses são possíveis para

compreender essa fala: ou não compete à creche atender a criança em seu aspecto afetivo-

emocional, mas, sim, à família; ou, na creche e/ou (pré) escola, diante do efetivo de

matrículas, a proporção adulto-crianças é alta, comparada à proporção adulto-crianças em

família. Em decorrência, a criança doente precisa de mais atenção, carinho e afeto do que a

que não tem enfermidade. Por essa razão, a criança doente deve ficar em casa, pois será mais

bem assistida. Essas concepções também são encontradas no discurso de outra cuidadora,

como pode ser visto no trecho a seguir:

E: Tu acha que a família pode oferecer o que, que a creche não oferece?

S16: Elas cuidam, né, mas carinho elas não dão, não, né [risos]. (Mãe da

criança)

Já a terceira criança, a que frequentou três instituições, duas públicas e uma privada,

deixou o CMEI (instituição pública) tendo como justificativa o desejo da mãe de oferecer algo

melhor à filha, o que permite supor que sua saída da outra instituição pública tenha sido pelo

mesmo motivo. A mãe opta pelo serviço do hotelzinho; contudo devido à impossibilidade de

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arcar com os custos desse serviço, tirou a filha da instituição, como será descrito no trecho a

seguir:

E: Ela tinha nove meses quando tu colocou [na instituição] foi?

S29: É, nove meses pra um ano, assim. Aí eu tirei.

E: Por quê? Tu não gostou? Como foi a experiência?

S29: Eu só tinha ela, então eu disse assim: “Não, vou estudar, vou trabalhar e

vou dar uma coisa melhor pra minha filha”, aí tirei ela da creche32 e botei ela

no hotelzinho. Aí eu peguei, mesmo que eu passe aperto, mas eu quero botar

ela o que, numa escola paga, numa coisa melhor, aí peguei botei. Aí só tirei

ela [...] só porque eu to apertada mesmo, Aí pronto, aí tirei ela.

E: E porque tu colocou ela só com nove meses? Não colocou assim mais cedo?

S29: Porque... a creche lá em baixo só pegava com essa idade. E a creche lá

em baixo eu só botei porque estava sem condições mesmo, não tinha noção

onde ia botar ela, aí arrumaram, pediram uma vaga pra ela, aí minha irmã

arrumou uma vaga pra ela, [...] aí eu peguei e fiz: “Tá bom, então eu deixo

ela”. Peguei deixei ela, só que... depois eu não gostei muito. [...] Ela também

ficou um pouquinho numa creche lá em [diz o nome do bairro], mas ela num

instante ela saiu de lá, acho que ela foi só uns três dia. Foi que a família dela

lá [por parte de pai] botou. Aí tirei. (Mãe da criança)

Constata-se novamente a preferência pela instituição privada. E nesse caso pode-se

observar isso de forma mais explícita, uma vez que a retirada da criança do CMEI para a

entrada no hotelzinho teve como justificativa o desejo da mãe de oferecer algo melhor à filha.

Além disso, a renda familiar se coloca como um fator relevante no que concerne à escolha da

instituição educacional, pois se constata que a inserção da criança no CMEI, uma instituição

pública, tem como uma das justificativas a impossibilidade de a mãe custear financeiramente

o serviço de uma instituição educacional privada.

Com relação às outras duas crianças que tentaram frequentar a instituição educacional,

uma delas chegou a ir um dia na creche, como afirma a avó no excerto abaixo, mas a mãe não

32 A mãe chama de creche, mas por ser uma instituição que atende crianças de zero a cinco anos, oferecendo o serviço de creche e pré-escola, é caracterizada como CMEI.

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permitiu que a filha frequentasse a instituição com medo de que ela fosse agredida por outras

crianças:

E: Ela frequentou a creche alguma vez?

S13: Já foi. [...]

E: Ela tinha quantos anos quando a senhora levou ela pra creche?

S13: Ela tinha um ano e uns meses, a mãe dela levou pra, pra ver que a moça

pediu, né, pra ela passar o dia, pra ver se ela chorava, mas ela não chorou. Só

que a mãe dela não queria deixar porque a mãe dela morava mais eu. “Vou

botar minha menina agora não, Deus me livre, muito menino e minha filha é

muito novinha” [a avó traz a fala da mãe da criança], aí pronto [...].

E: Por que ela não quis colocar muito pequenininha?

S13: Eu não sei. E ela morava mais eu, quando ela saiu, ela já tinha dois anos,

mas ela [a mãe] não queria botar ela [a criança], agora ela [a mãe] quer.

Agora porque ela [a mãe] diz, ela [a criança] agora já tem... Mas Ana [a

agente comunitária de saúde] tá aí, Ana falava todo dia pra botar ela na

escola: “Bota na creche, bota ela na creche que é pra ela se desarmar”. Eu

digo: “É a mãe dela”. Eu não posso fazer nada sem a mãe dela, né! Ela tem

mãe.

E: Mas por que ela saiu da creche?

S13: Não, porque é a mãe dela que tirou. A mãe dela que não deixou, não. Só

levou um dia só porque a gente conhecia [a creche] [...]. Onde tinha muito

menino a mãe dela não gostava, não. Onde tinha muito menino a mãe dela

tinha medo que os menino desse nela porque ela era muito... ela não é, ela não

era, ela é a bestinha, aí apanha dos menino menor, aí a mãe dela não... E a

mãe dela não cria ela, a gente cria, mas a mãe dela não quer que os menino dê

nela. [...]. (Avó materna da criança)

Mais uma vez, encontra-se no discurso do cuidador o medo da violência como

justificativa para a não frequência da criança à creche, havendo, nesse caso, um receio

direcionado fortemente às outras crianças da instituição. Além disso, nota-se que a avó atribui

unicamente à mãe a responsabilidade pela não frequência da criança à creche ao afirmar:

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S13: [...] Mas Ana [a ACS] tá aí, Ana falava todo dia pra botar ela na escola:

“Bota na creche, bota ela na creche que é pra ela se desarmar”. Eu digo: “É a

mãe dela”. Eu não posso fazer nada sem a mãe dela, né! Ela tem mãe. (Avó

materna da criança).

No entanto, em um momento anterior, a avó também se coloca como responsável pelo

fato de a criança ainda não frequentar nenhuma instituição educacional, revelando ter o

mesmo receio que foi atribuído apenas à mãe da criança:

E: O que ela [a criança] gosta de fazer?

S13: Ah, ela gosta de brincar, é assim. É... ainda não botei ela na escola

porque eu tenho medo, porque ela é assim se chegar algum menino ela gosta

que vá buscar os brinquedos, ela brinca, ela fica e depois eu tenho medo dos

meninos dar nela porque ela é muito bestaiada. Ela não sabe arengar, ela sabe

brincar.

Desse modo, pelo fato de existirem poucos adultos para muitas crianças, na creche, o

que possibilita uma maior interação das crianças, entre elas próprias, os pais podem ficar

receosos, seja pela influência de umas no comportamento das outras, seja ao considerar a sua

integridade física (AMORIM, 1997 apud RAPOPORT; PICININI, 2007). Considerando esse

último aspecto, observa-se que tanto a mãe quanto a avó, nos últimos excertos considerados,

concebem como perigosa a interação da criança com seus pares tendo em vista sua

integridade física, isto é, as educadoras não atentarem para uma possível agressão dos

parceiros contra a criança, o que justificou a opção da mãe pela não permanência da criança

na instituição, assim como explicou a escolha da avó pela não frequência da criança à

instituição educacional.

A outra criança que também tentou frequentar a instituição educacional passou por

várias tentativas em escolas pública e privada, entretanto a mãe aponta, no excerto abaixo,

uma grande dificuldade de a criança se adaptar às instituições, o que fazia com que ela adiasse

o ingresso da criança para o ano seguinte:

E: E a menorzinha [costuma fazer que atividades]?

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S3: A menor, eu acho, a psicóloga falou pra mim que por ela... por eu passar o

dia em casa, eu ela e o pai, ela criou um vínculo muito... entendeu, então ela só

aceita ir pra escola se eu for, eu tenho que ficar na sala de aula com ela o dia

todo até ela largar. Mas pra ela fazer qualquer atividade sem eu tá presente,

em relação à escola, ela não quer. Aí foram duas particulares que ela passou,

a gente iniciou, tudinho, mas... muito problema, muito escândalo, muito choro,

enjoava e como quem queria... náuseas, enfim. Ficava pálida, se tremendo e a

gente começou a ficar com medo, aí ela tá muito nova, ano que vem. Aí ano

que vem a gente iniciava tudo numa particular e era a mesma coisa, e a gente

errando, fomos adiando. Aí agora matriculamos ela na escola [instituição

pública] da irmã do meio, assim a irmã dela do meio, a que tem nove anos.

Achávamos, né, que pôr as duas na mesma escola ela iria aceitar, ela só foi o

primeiro dia e depois causou vários problemas, não quis ir, a gente deixava,

tinha que sair correndo, as professoras seguravam, subia as escadarias pra

escola se arrastando, enfim.

A partir do exposto, foi possível observar como o comportamento hostil da criança em

resposta à inserção na instituição educacional influencia a atitude da mãe de modo que ela

opta por adiar várias vezes, julgando ter sido um erro, a entrada da criança na escola. Esse

fato parece estar em consonância com a ideia na qual se afirma ser possível que alguns traços

do temperamento da criança auxiliem ou dificultem a inserção da criança na creche a

depender das características da instituição (CAREY; MCDEVITT33, 1997 apud RAPOPORT;

PICCININI, 2007).

Desse modo, abre-se espaço para se pensar o modo como as instituições se organizam

para receber as crianças e auxiliá-las no processo de adaptação. Vitória e Rossetti-Ferreira

(1993) apontam que durante a adaptação da criança suas reações podem ter grande

variabilidade, dependendo principalmente da sua idade, do tipo de relacionamento existente

com seus responsáveis, da concepção de creche que estes possuem e da forma como a

instituição organiza a recepção da criança e seu modo de funcionar. Ainda apontam a

importância de que nesse período inicial de inserção da criança na instituição seja construído

um processo gradual de familiarização, exploração e contato no qual seja solicitada e

planejada a permanência de alguém com quem a criança tenha um forte vínculo afetivo o

33 CAREY, W. B.; MCDEVITT, S. C. Coping with children’s temperament. Nova York: Basic Books, 1997.

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tempo que for necessário. No entanto, quando a mãe afirma que se retirava às pressas da

instituição, constata-se que esse tempo de permanência não é um aspecto considerado na

adaptação da criança, o que pode ter influenciado fortemente o comportamento hostil da

criança. Destarte, percebe-se como a forma que a instituição se organiza para lidar com os

diferentes eventos que nela ocorrem pode ser um fator relevante para a permanência da

criança na instituição.

Das 44 crianças cujos cuidadores foram entrevistados, metade delas (22 crianças)

nunca frequentou creche. As justificativas apresentadas pelos cuidadores para o não ingresso

delas na instituição remetem à questões citadas anteriormente, tais como:

a) A experiência negativa de outras crianças

E: Mas o que é que tu acha assim da creche que tu fica preocupada em

colocar?

S16: Sei lá porque a... a creche... não vai se acostu... acostumar na creche.

Que aquele menino lá de oito anos [filho mais velho] eu botei ele, não se

acostumou, não, ele não comia, não dormia, ficava chorando lá. (Mãe de uma

criança que não frequenta instituição educacional)

b) A escassez de vaga na creche

E: Ela frequenta creche?

S20: Ela não.

E: Por que ela não vai?

S20: Porque eu perdi a, a hora de escrever ela. Só no ano que vem agora. [...]

Vou colocar o ano que vem agora. Pra eu não perder de novo, né.

E: Mas tu perdeu o que? Foi o prazo?

S20: Não, a hora. Porque tem que ir cedo. Tem gente que dorme lá senão

perde. Muita gente. (Mãe de uma criança que não frequenta instituição

educacional e outra que frequenta CMEI)

c) A prioridade do cuidado doméstico e familiar frente ao cuidado institucional

E: Como é que ele [o pai da criança] pensava em relação à creche, de colocar

na creche?

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S18: Ele também respeita o... o cuidado com ela. Não concordou muito, não,

em botar em creche não. E até porque eu não trabalho, se eu trabalhasse [...],

mas eu dentro de casa, eu preferia eu ficar com ela do que colocar na creche.

(Mãe de uma criança que frequenta escola privada)

d) A amamentação adiando a entrada da criança na instituição educacional

E: Por que, assim, as pessoas falam [da instituição]?

S24: [...] O povo fala muito mal mesmo dessa creche, muito mal mesmo, aí

eu... eu ia até botar essa daqui a pequenininha pra eu ir trabalhar mais cedo,

né, mas botaram tanta coisa, disse: “Olha, não bota, não”, aí eu fiquei com

medo, né, porque a outra [filha mais velha] eu não botei, porque essa ainda

mama a bichinha, né, ela é pequenininha aí eu não botei [...]. (Mãe de uma

criança que frequenta escola pública e de uma que não frequenta instituição

educacional)

e) Receio de um possível ato de violência contra a criança

E: E teu marido, o que é que ele acha [sobre colocar no hotelzinho]?

S6: [...] ele quer, até também pra me descansar, ele tá pensando na filha dele e

em mim também, que ele, quando ele veio eu disse: Não, vai não, levar minha

filha nada, minha filha sabe nem falar direito e eu sei o que essas mulher vai

fazer com minha filha” [...]. (Mãe de uma criança que não frequenta instituição

educacional)

f) Uso de uma vaga que deveria ser deixada para quem mais necessita do serviço da

creche, ou seja, para a criança cuja mãe trabalha fora de casa

E: A senhora acha que cuida melhor que na creche?

S26: Não, a creche cria bem também, tá entendendo, ela cria bem a creche. É

porque tem eu em casa, eu não tô fazendo nada, tem ela também tá

desempregada. Quando tá, quando tá algum doente ela também vai pro

hospital, socorre, eu também vou. Aí não tem que botar eles, aí as vaga eu já

deixo pra gente que tá precisando, que trabalha, né. Tem muita mãe, [...] as

mãe trabalha, né, aí pronto, já que a gente tá vadiando, aí dando vaga pra

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outro que a mãe trabalha, que não tem costume de ficar, né, não! É por isso

que esses daqui não foi pra creche. (Avó de uma criança que frequenta escola

pública e de uma que nunca frequentou instituição educacional)

Essa ideia de que a creche é uma necessidade maior das mães que trabalham fora de

casa também é corroborada por outras cuidadoras, como se percebe no trecho a seguir:

E: E o que a senhora acha assim de mães que não colocam na creche?

S19: Que não coloca? Rapaz, eu acho que a mãe que não coloca a criança na

creche é porque não tem assim... não tem como deixar, né, a criança. Agora

quem coloca é quem precisa, que vai trabalhar, que tem alguma coisa pra

fazer pra sustentar ela melhor. (Babá de uma criança que não frequenta

instituição educacional).

Ainda que a cuidadora pareça se confundir na primeira parte de sua colocação, não há

duvidas quanto a sua concepção de que a mãe que opta pelo serviço da creche é a mãe que

precisa trabalhar e garantir o sustento da criança.

g) A não concordância do pai com a frequência da criança à creche

E: Mas em creche, tu nunca teve vontade de colocar? Por qual motivo tu não

colocou?

S3: A minha primeira que eu coloquei na creche, eu coloquei porque eu

trabalhava, aí a segunda o pai já exigiu que não queria.

E: Tem algum motivo que ele dizia que não queria?

S3: Porque eu não tava trabalhando, passava o dia em casa e não tinha

motivos assim, ele achava que... todo mundo tinha certeza que creche é pra

uma mãe que realmente tá ocupada o dia inteiro, trabalha, enfim. E como eu

tava em casa ele disse, não, não há necessidade, né, você fica com a mais

velha e a mais nova. Quer dizer, aí pronto, mas... não coloquei. E essa mais

nova também não pensei em colocar em creche. (Mãe de uma criança que não

frequenta instituição educacional)

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Desse modo, percebe-se entre os cuidadores uma concepção de creche como uma

instituição que deve atender, prioritariamente, os filhos de mães que trabalham fora de casa e

precisam compartilhar a tarefa de cuidar. Como também expõe a entrevistada:

E: Por que a senhora acha a creche melhor? Tem algum motivo?

S30: Por que assim... às vezes é muita mãe pra trabalhar, pra fazer alguma

coisa. As mãe às vezes quer... quer resolver os problema e não tem quem fique

com eles. (Babá de uma criança que não frequenta instituição educacional)

Não há dúvidas quanto à importância da creche para as mães que trabalham e precisam

dividir a tarefa do cuidado da criança, assim como se reconhece a entrada da mulher no

mercado de trabalho como um fator significativo para que a creche se consolide e ganhe

espaço. Entretanto, priorizar o serviço da creche para as crianças cujas mães estão no mercado

de trabalho e necessitam de auxílio no cuidado dos/as filhos/ é reconhecer tal instituição tendo

como objetivo principal a assistência às mães que trabalham. Nesse sentido, a creche é

concebida mais como uma necessidade da mãe que trabalha do que um direito da criança,

expresso na Constituição Federal (1988) e regulamentado na lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional (LDBEN – Lei Federal n. 394/96).

Além disso, ao se ter como a justificativa mais citada pelas cuidadoras para a inserção

da criança na creche a necessidade e a pretensão de trabalhar, é possível enfatizar não só a

relevância dessa instituição para essas mulheres, mas também apontar, junto às justificativas

acima, a prevalência de uma visão da creche, que historicamente a caracterizou, como uma

instituição que realiza um serviço de caráter assistencial e filantrópico. Aliada a essa visão

também foi atribuído à creche o estigma de um serviço de baixa qualidade, um último recurso

na ausência de alternativas, devido a sua pretensão inicial em atender famílias carentes. Isso

pode dar sustentação à preferência de algumas cuidadoras pela instituição privada, sobretudo

no caso da mãe que tendo a possibilidade de usufruir o serviço da creche o dispensa,

aguardando uma melhor condição financeira para custear uma instituição particular. Assim

sendo, essa visão estigmatizante se sobrepõe a uma concepção de creche como instituição que

realiza, principalmente, um trabalho educativo; e como um espaço de desenvolvimento,

interação e ricas aprendizagens (CARVALHO, PEDROSA et al., 2012). Contudo, cabe

salientar o importante papel da creche na superação dos seus históricos estigmas e na sua

consolidação como um contexto de desenvolvimento tão importante quanto o da família. Para

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tanto é preciso que a creche tenha como compromisso esclarecer a população atendida quanto

aos objetivos da instituição, assim como realizar um trabalho que ponha em exercício suas

reais atribuições.

Constata-se a relevância do cuidado institucional para a amostra pesquisada, visto que

mais da metade das crianças frequentam instituição educacional. Porém o conjunto dessas

justificativas que se referem à preferência por determinada instituição educacional, mesmo

sendo paga, ou a espera de mais idade para ingresso do filho na creche (observada na

predominância de crianças que entraram na creche no terceiro ano de vida), ou mesmo a

decisão de não colocar a criança na creche evidenciam a baixa credibilidade ao atendimento

de crianças pequenas, principalmente o atendimento público porque muitas mães colocam as

crianças em creches particulares, mas não em creches públicas. Havendo disponibilidade de

algum membro da família para cuidar da criança, principalmente da mãe, que

temporariamente deixa de trabalhar ou adia esse seu plano, existe uma preferência forte pelo

não ingresso da criança à creche. Além da falta de credibilidade das instituições, pode-se

levantar uma hipótese de que exista subjacente a esse receio uma concepção de que o melhor

lugar para a criança pequena é no seio da família, sendo cuidada pelos pais. Entretanto, chama

atenção a ausência de justificativa que alegue um desejo parental para ficar com seu bebê.

Uma diversidade de justificativas (capacidade da criança de verbalizar, disponibilidade

de cuidadores diariamente no seio familiar, dificuldade de conseguir vaga na instituição, entre

outros) pôs em evidência a escolha ou não escolha pelo cuidado institucional, abrangendo

diferentes pessoas (crianças, familiares e cuidadores) e contextos (familiar e institucional) que

se constituem mutuamente, não podendo ser considerados isoladamente. Sendo assim, a

análise realizada, longe de esgotar a discussão sobre a temática – sobretudo por corresponder

a um contexto específico e uma amostra situada – elucida um campo frutífero para futuras

investigações.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Mediante o estudo empreendido compreende-se que a rede de cuidadores da criança

pode envolver diferentes contextos (intra e extra familiar), nos quais uma diversidade de

pessoas, práticas e significados delineiam o ato de cuidar, bem como a dinâmica da família.

No que concerne às pessoas envolvidas com o cuidado da criança, as rede de

cuidadores que caracterizam esse estudo são constituídas, predominantemente, por três e

quatro pessoas, tendo como principais componentes a mãe, o pai e a avó materna. Esse dado

converge com o exposto por Hyrd (2001) acerca da importância do compartilhamento do

cuidado parental para a sobrevivência da prole entre muitas espécies, inclusive para os seres

humanos. Além disso, o número e a diversidade de cuidadores que configuram as redes

analisadas apontam um aspecto interessante salientado por Amazonas et al. (2003) que ao

investigarem os arranjos familiares de crianças de camadas populares da cidade do Recife

identificam, entre os componentes da família e da comunidade, a solidariedade como uma

estratégia comum de sobrevivência e de enfrentamento da condição social expressa,

sobretudo, no compartilhamento do cuidado das crianças. As autoras ainda assinalam que essa

relação de solidariedade não se limita ao grupo de parentes, o que respalda os dados dessa

pesquisa, uma vez que algumas redes contam com a participação de não familiares como a

amiga e a vizinha, embora os cuidadores sejam, em sua maioria, familiares que residem com a

criança. Diante disso, é possível caracterizar as redes de cuidadores como importantes redes

de apoio que, de acordo com Almeida e Moreira (2011), permitem aos pais e às mães

melhores condições para exercerem suas atividades profissionais, além de favorecerem o

desenvolvimento da criança e ao equilíbrio da dinâmica familiar.

As redes de cuidadores analisadas também possuem uma constituição

majoritariamente feminina. A mulher é considerada a principal responsável pelo cuidado da

criança, com destaque para a mãe e a avó materna que são as cuidadoras mais versáteis e

envolvidas com as tarefas de cuidado, sobretudo com as atividades relacionadas ao cuidado

físico (alimentação, higiene e sono). Essas tarefas foram consideradas pela maioria das

entrevistadas como o aspecto mais importante do cuidado da criança, permitindo supor que

essa relevância decorre do fato de o cuidado físico garantir a satisfação de necessidades

essenciais para a sobrevivência da criança e eliminação de seu desconforto. Concernente aos

demais cuidadores, a maioria possui uma participação menos expressiva nas tarefas de

cuidado, havendo um maior envolvimento do pai com as atividades de lazer.

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A prevalência feminina também se revela no cuidado do lar que somado à

responsabilidade pelo cuidado da criança, e em alguns casos com trabalho remunerado dentro

e fora de casa, acarreta para a mulher uma sobrecarga de atividades que gera cansaço,

conflitos familiares e impede/adia a realização de outras atividades de seu interesse. Frente a

esse quadro evidencia-se o quanto essa tipificação do cuidado como uma tarefa feminina

influencia o funcionamento das redes, bem como a organização da família e a relação entre

seus membros. Desse modo, ainda que se verifique a participação masculina no cuidado da

criança, a divisão de tarefas de cuidado mantem-se desigual, sinalizando pouca mudança no

modelo tradicional que atribui à mulher a responsabilidade por tais tarefas (ARAUJO;

SCALON, 2006).

Ao se pensar em um caminho de superação desse modelo, Caldeira et al. (2012)

sugerem que seja incorporada à abordagem de igualdade de direitos uma abordagem

colaborativa que inclua mulheres/mães e homens/pais em iniciativas que objetivem o

equilíbrio entre a vida familiar e profissional. Como exemplo, as autoras citam o aumento da

licença parental sem a diminuição da licença maternidade, e ainda salientam que o

desenvolvimento de políticas poderia buscar a flexibilidade de paternidade de modo que

assegure às famílias uma adequada provisão financeira, promovendo a igualdade entre

gêneros.

Ainda que o cuidado da criança seja considerado uma responsabilidade feminina e,

sobretudo, materna, contando com a significativa participação de outros cuidadores, é válido

também realçar a instituição educacional como um importante componente da rede de

cuidadores, uma vez que a maioria dos pais/responsáveis compartilha o cuidado/educação da

criança com a creche/CMEI e pré/escola. Identificou-se entre um grupo de entrevistadas a

preferência por umas das instituições educacionais da comunidade pelos seguintes motivos:

por ser uma creche antiga e já frequentada por algumas mães; pelas informações positivas que

circulam na comunidade acerca do seu serviço; e por ser um local menor e com poucas

crianças, garantindo às crianças um cuidado mais apropriado. Esses fatores sugerem que a

confiança na instituição é um elemento importante quando se decide compartilhar o cuidado

da criança, como também revelam que as mães/responsáveis avaliam o serviço da instituição

educacional e se preocupam com a garantia de um serviço de qualidade. Dessa forma, para

que a creche ofereça um atendimento de qualidade, se caracterizando como um importante

contexto de desenvolvimento, assim como a família, é necessário que possua, entre outros

fatores, um espaço e um planejamento que possibilitem a realização de várias atividades; uma

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adequada razão adulto-criança e compatível tamanho do grupo para cada faixa etária; um

adequado processo de adaptação da criança; educadores com formação prévia e continuada; e

satisfatórias condições de trabalho (VITÓRIA; ROSSETTI-FERREIRA, 1993).

Todavia muitas cuidadoras demonstraram pouca confiabilidade na instituição,

sobretudo na creche/CMEI, não optando pelos seus serviços ou decidindo pela inserção da

criança após os anos iniciais, a maioria no terceiro ano de vida. Como justificativas essas

entrevistadas apontam o medo de que a criança sofra algum tipo de violência, a preferência

pelo cuidado doméstico e familiar, a experiência negativa de outras crianças e a preferência

pela instituição privada. Também é válido ressaltar as demais questões que justificaram a não

frequência da criança à instituição educacional ou a sua inserção após os primeiros anos de

vida: a dificuldade de encontrar vaga no caso de a opção ser pelo compartilhamento do cuidar,

a criança estar em período de amamentação, a necessidade de passar mais tempo com a

criança, deixar a vaga para quem mais necessita dos serviços da creche (para as mães que

trabalham), a não concordância do pai frente à disponibilidade da mãe para cuidar da criança,

a dificuldade de adaptação da criança na instituição e a o fato de a criança está acometida por

alguma enfermidade. Sendo assim, evidencia-se que optar ou não pela inserção da criança na

instituição educacional abarca uma diversidade de questões que também revelam aspectos

importantes referentes ao cuidado da criança, como: as necessidades da criança (ser

amamentada e ter atenção de adultos); as pessoas com quem dividir o cuidado da criança (de

preferência a mãe e cuidadoras familiares); o momento de inserção na instituição educacional

(após os anos iniciais, já possuindo a capacidade de verbalizar e, possivelmente, relatar

situações desagradáveis); as características da instituição disponível para compartilhar o

cuidado (ser menor e com poucas crianças garantem melhores condições de cuidado); e as

pessoas com prioridade para usufruírem dos serviços da instituição educacional (mães que

trabalham fora de casa), entre outros.

Frente a esse emaranhado de crenças, ideias e opiniões que permeiam as escolhas e as

práticas dos cuidadores é possível considerar, conforme Carvalho et al. (2012), a rede de

cuidadores como uma rede de significações que delineiam as decisões e ações que envolvem

o cuidado. Nesse sentido, partindo da perspectiva da rede de significações (RedSig), as

autoras afirmam que:

[...] as ações e opções dos pais estão sendo circunscritas (ou seja, ao mesmo tempo, possibilitadas e limitadas) por um conjunto de significados que – em função de sua história de vida, suas

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circunstâncias, sua inserção sociocultural e histórica, sua identidade de gênero e suas relações socioafetivas – compõem uma rede de significações interrelacionadas em torno da situação do cuidado de um filho pequeno: o que é um bebê; o que é ser mãe e pai de um bebê [...]; o que são avós e avôs, maternos e paternos; o que é cuidado feminino e cuidado masculino; o próprio significado e valor de cuidar e dos tipos de cuidados; quem é o cuidador adequado para cada tipo de cuidado; o significado e o valor do cuidado institucional e assim por diante. Portanto, não são apenas aspectos circunstanciais concretos, como a disponibilidade de tempo e de outros cuidadores que estão envolvidos na compreensão da configuração da rede de cuidadores [...]. (p. 103).

As redes de cuidadores também têm possibilitado a criança conviver com diferentes

pessoas, entre familiares e não familiares, como: irmãos, avós, tias, tios, babás, vizinhas, entre

outros. Nesse estudo, esse dado se revela de forma mais expressiva em quase metade das

redes que possuem quatro ou mais cuidadores, a maioria com pelo menos três cuidadores

além do pai e/ou da mãe, com destaque para os familiares, incluindo diferentes gerações. Esse

quadro pode encontrar apoio na melhora das condições de vida da população que – devido ao

aumento da expectativa de vida e a diminuição das taxas de mortalidade infantil e

fecundidade – vem demandando atenção especial para as relações intergeracional que se

estabelecem em um mesmo núcleo familiar (BASTOS et al., 2002). Esse notório

envolvimento de outras pessoas com o cuidado da criança, também constatado em outras

pesquisas (AMAZONAS; DAMASCENO; TERTO; SILVA, 2003; MOREIRA; BIASOLI-

ALVES, 2007; ALMEIDA; MOREIRA, 2011; CARVALHO, et al. 2012), e o foco dado aos

pais em investigações que consideram aspectos da dinâmica familiar e do cuidado, como nas

pesquisas citadas, instigam a realização de estudos que também considerem a perspectiva

desses cuidadores de modo que se possa investigar as implicações de suas concepções e

práticas no cuidado da criança e na dinâmica da família. É igualmente importante considerar a

perspectiva da própria criança acerca do envolvimento de diferentes pessoas com o seu

cuidado e das relações estabelecidas nesse contexto.

É válido também incentivar a realização de pesquisas no ambiente de cuidado da

criança. Nessa pesquisa, o acesso à comunidade e às residências da criança permitiu a

observação de importantes aspectos do cotidiano do cuidado, sendo possível complementar os

dados da entrevista quanto às pessoas envolvidas no cuidado, às práticas exercidas por alguns

cuidadores e ao relacionamento entre cuidador e criança. Outra importante evidência

constatada no ambiente de cuidado foi a indisponibilidade do pai para a participação da

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entrevista, o que é corroborado com a menor participação do pai no cuidado da criança,

relatada por algumas entrevistadas. Assim, percebe-se a relevância de serem elaboradas

estratégias que possibilitem o acesso a esses pais. E uma vez que sejam promovidos estudos

com esses homens, vê-se a possibilidade de problematizar as funções e os lugares que lhes são

atribuídos no cuidado da criança e na família.

Em suma, os resultados obtidos que apontaram significativas evidências acerca do

cotidiano do cuidado da criança e do modo como as famílias se organizam nesse contexto

sugerem novas reflexões e indicam a necessidade de realização de pesquisas mais amplas em

diferentes contextos socioculturais. Eles também revelam um importante campo investigativo

que possa subsidiar o planejamento de políticas públicas e de intervenções para propiciar

melhores condições de desenvolvimento da criança e da família.

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SLUZKI, C. A rede social na prática sistêmica: alternativas terapêuticas. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.

SORJ, B. Trabalho e responsabilidades familiares: um estudo sobre o Brasil. Rio de Janeiro: OIT, 2004.

VASCONCELLOS, V. M. R.; SEABRA, K. C.; EISENBERG, Z. W.; MOREIRA, A. R. C. P. O lugar da creche nos debates sobre a parentalidade e a coparentalidade. In: PICCININI, C. A.; ALVARENGA, P. (Org.). Maternidade e paternidade: a parentalidade em diferentes contextos. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2012. p. 341-365.

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APÊNDICES

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APÊNDICE A – Roteiro de entrevista

• Dados pessoais

- Qual o seu nome?

- Qual a sua idade?

- Até que série estudou?

- Qual a sua profissão?

• Organização familiar

- Quais são as pessoas que fazem parte da família?

- Qual a idade de cada familiar?

- Quais são as atividades realizadas na casa por cada pessoa da família?

- Quem fez a divisão das atividades realizadas em casa?

- O que os familiares acham das atividades que realizam em casa?

- Quais são os familiares que trabalham fora de casa?

- Qual o trabalho realizado fora de casa por esses familiares?

• Rotina diária da criança

� As pessoas do convívio da criança

- Quais são as pessoas que convivem com a criança?

- Quanto tempo essas pessoas passam com a criança?

- Quais são as pessoas responsáveis pelo cuidado da criança?

� O cuidado compartilhado

- Quem decidiu quem iria cuidar da criança?

- Por que “fulano” foi escolhido pra cuidar da criança (alterar a pergunta se a criança

vai para a creche)?

- Quais atividades não podem ser realizadas pelo(s) cuidador(es)?

� As atividades que realizam com a criança

- Quais são as atividades realizadas com a criança?

- Quem realiza cada atividade com a criança?

- Em que momento cada atividade é realizada?

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- Como cada atividade é realizada?

- Como é o comportamento da criança durante a realização de cada atividade?

� As atividades realizadas pela criança

- Quais as atividades realizadas pela criança?

- Em que momento a criança realiza cada atividade?

- A criança brinca?

- Onde a criança brinca?

- Com quem a criança brinca?

- Em que momento a criança brinca?

- Em que momento a criança não pode brincar?

� Os locais frequentados pela criança

- Quais os lugares que a criança frequenta?

- Quem leva a criança?

- A criança frequenta a creche?

- Qual a creche que a criança frequenta?

- Por que escolheu essa creche?

- Como teve conhecimento da creche?

- Quem decidiu colocar a criança na creche?

- Com que idade a criança entrou na creche?

- Por que somente entrou na creche com essa idade (conferindo que a criança entrou

com mais de três meses)?

- O que a criança faz na creche?

- O que acha das atividades realizadas na creche?

- Caso a criança não frequentasse a creche, quem poderia cuidar da criança?

• Rotina do cuidador (perguntas acrescentadas após o piloto)

- Na sua rotina diária tem algo que você faz e não gosta?

- Na sua rotina diária tem algo que você gostaria de fazer, mas não faz?

- Na sua rotina diária tem o que você mais gosta de fazer?

- Qual o seu melhor momento com a criança?

- O que a criança faz que você menos gosta?

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- O que a criança faz que você mais gosta?

- Como você se sente na sua rotina diária?

- O que você acha mais importante no cuidado da criança?

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APÊNDICE B – Termo de consentimento livre e esclarecido

Projeto: Cuidado de crianças e redes sociais de apoio em uma comunidade de baixa renda

Pesquisadora responsável: Sayonara da Silva Soares

Instituição: Universidade Federal de Pernambuco – Departamento de Psicologia

Convite aos participantes da pesquisa

Convido você a participar da pesquisa Cuidado de crianças e redes sociais de apoio em uma comunidade de baixa renda. Esta pesquisa tem como objetivo investigar as concepções de familiares e cuidadores sobre cuidado de crianças de 0 a 5/6 anos, e como estes delineiam as relações estabelecidas em um contexto intra e extra familiar, em uma comunidade de baixa renda. Considera-se que o cuidado da criança envolve diferentes sujeitos, práticas, significados, valores e formas de organização, podendo, seu estudo, trazer importantes contribuições para o estudo da criança e da infância.

A sua participação na pesquisa será através de uma entrevista, onde a pesquisadora utilizará um roteiro com questões a serem abordadas durante a conversa, ficando você livre para responder do seu modo. Para garantir o acesso a todo conteúdo da entrevista e obter uma melhor análise dos dados coletados a entrevista será registrada em um equipamento de gravação de som após sua autorização.

Você pode interromper sua participação nessa pesquisa no momento em que desejar sem prejuízo à pesquisa. Também é garantido que não seja revelada sua identidade, ou seja, seu nome ou outros dados que possibilite seu reconhecimento, no relato e apresentação dos resultados desse trabalho.

Contato com a pesquisadora responsável:

Fone (81)87999652. E-mail: [email protected]

Endereço: Av. da Arquitetura, s/n, Cidade Universitária, CEP: 50740-550 Recife / PE.

Universidade Federal de Pernambuco. Centro de Filosofia e Ciências Humanas. 9º andar. Departamento de Psicologia. Programa de Pós-Graduação em Psicologia.

Local em que as gravações serão guardadas, sob a responsabilidade da pesquisadora principal: Laboratório de Interação Social Humana (LabInt), Departamento de Psicologia, UFPE, por um prazo mínimo de 5(cinco) anos.

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Contato com o Comitê de Ética em Pesquisa da UFPE:

Av. da Engenharia s/n, 1º andar, Cidade Universitária, Recife - PE, CEP: 50740-600, Tel./Fax: 2126 8588, Email: [email protected].

Benefícios esperados

Os benefícios da pesquisa podem ser percebidos nas importantes questões que podem surgir sobre o cuidado da criança e seu desenvolvimento, na possibilidade de realizar um estudo que envolva familiares e possíveis cuidadores sobre o desenvolvimento infantil, como também na realização de um estudo no contexto em que a criança é cuidada, incentivando pesquisas que valorizem a aproximação com o contexto de desenvolvimento da criança. Além disso, estes benefícios se mostram na possibilidade de oferecer aos participantes um espaço onde possam falar sobre suas experiências no cuidado de crianças, podendo assim, repensar suas práticas e encontrar novas formas de atuação no exercício do cuidado.

Riscos possíveis

A situação de conversa com o pesquisador pode causar embaraço e desconforto ao participante. Com a pretensão de diminuir esses constrangimentos o pesquisador buscará estabelecer uma relação tranquila com o entrevistado esclarecendo os objetivos da pesquisa, garantindo o sigilo de sua identidade e das informações colhidas e a liberdade de participação na pesquisa. Além disso, a entrevista também irá interferir na rotina dos participantes que precisará dispor de um tempo para participar da entrevista. Procurar-se-á ajustar o tempo dos participantes à entrevista, com o agendamento da entrevista em momento e horário adequado, no intuito de diminuir esse efeito.

Consentimento de participação

Eu,____________________________________________________________, declaro que fui devidamente informado(a) pela pesquisadora Sayonara da Silva Soares acerca da finalidade e dos procedimentos da pesquisa Cuidado de crianças e redes sociais de apoio em uma comunidade de baixa renda. Estou perfeitamente ciente de que:

1. Concordei em participar da pesquisa, de livre e espontânea vontade, sem que recebesse nenhuma pressão para aceitar o convite;

2. Também aceitei participar da pesquisa, de livre e espontânea vontade, sem que recebesse nenhuma pressão para isso;

3. Poderei desistir da pesquisa a qualquer momento sem que minha decisão traga prejuízo a mim ou à pesquisa;

4. Tenho a garantia de receber respostas e esclarecimentos sobre qualquer dúvida quanto aos procedimentos, riscos, benefícios e outros aspectos relacionados à pesquisa, sempre que desejar;

5. Estou seguro(a) de que as minhas informações serão privadas e utilizadas apenas para os propósitos da pesquisa e formação de outros adultos profissionais;

6. Fui informado(a) de que a pesquisa e sua publicação será feita sem constar o meu nome, que será chamado/a por um nome fantasia.

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7. Não arcarei com gastos nem receberei recompensa financeira pela participação no estudo.

8. Estou também com uma cópia deste documento. 9. Em caso de dúvidas relacionadas aos aspectos éticos deste estudo poderei consultar

o Comitê de Ética em Pesquisa da UFPE no endereço acima citado.

Estando assim de acordo, assinam o presente termo de consentimento em duas vias:

______________________________ _____________________________

Responsável pelo projeto Participante da pesquisa

______________________________ _____________________________

Primeira testemunha Segunda testemunha

Recife, ____ de ________________ de 2013.

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ANEXOS

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ANEXO A - Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa

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