Segurança Jurídica e Eficácia da Garantia de Direito de Resposta após a Revogação da Lei de...

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UFF – UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE DIREITO – NITERÓI CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO DISCIPLINA DE MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA JURÍDICA PROJETO DE MONOGRAFIA Segurança Jurídica e Eficácia da Garantia de Direito de Resposta após a Revogação da Lei de Imprensa pelo STF Aluno: Jimes Vasco Milanez Professor: Pedro Hermílio Villas Boas Castelo Branco Niterói 2010

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[Projeto de monografia apenas com introdução ao tema]

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UFF – UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

FACULDADE DE DIREITO – NITERÓI

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

DISCIPLINA DE MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA JURÍDICA

PROJETO DE MONOGRAFIA

Segurança Jurídica e Eficácia da

Garantia de Direito de Resposta após a

Revogação da Lei de Imprensa pelo STF

Aluno: Jimes Vasco Milanez

Professor: Pedro Hermílio Villas Boas Castelo Branco

Niterói

2010

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SUMÁRIO

1. Objeto 2

1.1. Histórico 3

1.2. Fundamentos Temáticos 5

1.3. Hipóteses 7

2. Justificativa 8

3. Metodologia 11

3.1. Referências Preliminares 11

4. Bibliografia 12

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1. Objeto

Em 30 de Abril de 2009, o Supremo Tribunal Federal revogou integralmente a Lei de

Imprensa (Lei no 5250/67), promulgada durante a ditadura militar. A Lei de Imprensa visava regular

a liberdade de manifestação do pensamento e da informação, o registro dos órgãos de imprensa, os

abusos no exercício de sua liberdade, o direito de resposta, a responsabilidade penal e a

responsabilidade civil decorrentes. O entendimento de sete dos onze ministros foi de que a lei era

inconstitucional frente à Constituição Federal de 1988, bem como incompatível com a democracia:

A atual Lei de Imprensa foi concebida e promulgada num prolongado período autoritário da nossa história de Estado soberano, conhecido como "anos de chumbo" ou "regime de exceção". Regime de exceção escancarada ou vistosamente inconciliável com os arejados cômodos da democracia afinal resgatada e orgulhosamente proclamada na Constituição de 1988. E tal impossibilidade de conciliação, sobre ser do tipo material ou de substância (vertical, destarte), contamina grande parte da Lei de Imprensa, para não dizer toda ela.1

Apesar dos entendimentos sobre a inconstitucionalidade de vários artigos da lei, como o

estabelecimento de várias penas para jornalistas maiores que as do próprio Código Penal,

referências a censura, procedimentos para limitação da liberdade de imprensa, etc., não houve no

entanto a unanimidade sobre a revogação total ou parcial da lei. Conforme salientado por alguns

ministros em seus votos e posteriormente na própria imprensa, criou-se assim, supostamente, um

vácuo normativo quanto à regulação do direito de resposta, previsto no Art. 5º, V da Constituição

Federal: "É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por

dano material, moral ou à imagem".

Com a derrubada da Lei de Imprensa, ficará a cargo da Justiça de primeira instância decidir o que fazer com os processos já em andamento envolvendo essa legislação. As opções são duas: arquivar a ação ou aplicar uma legislação que possa substituir o artigo da Lei de Imprensa em questão. Por exemplo: processos por crimes contra a honra podem ser julgados à luz do Código Penal. O problema maior, porém, será o futuro dos processos nos quais se pede direito de resposta a um veículo de comunicação. Além da Lei de Imprensa, nenhuma outra legislação cuida do assunto. A decisão caberá ao juiz.2

De tal forma, a pesquisa aqui proposta tomará como ponto de partida a questão da garantia

do direito de resposta após a revogação da Lei da Imprensa pelo STF, quais fontes do Direito e

1 Trecho do voto do ministro Ayres Britto, relator da ação, em: http://oglobo.globo.com/pais/mat/2009/04/01/lei-de-imprensa-confira-trechos-do-voto-de-ayres-britto-no-stf-755094776.asp – 01/04/2009.

2 Lei de Imprensa: direito de resposta terá de ser regulado. http://oglobo.globo.com/pais/mat/2009/04/30/lei-de-imprensa-direito-de-resposta-tera-de-ser-regulado-755536437.asp – 30/04/2009.

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quais dispositivos jurídicos estão sendo aplicados pelos tribunais em face aos casos concretos, qual

a segurança jurídica para o cidadão e para os veículos de comunicação, qual a eficácia do princípio

constitucional na ausência de lei específica.

Nesse contexto, ainda nos remetendo àquela sessão do STF, é digna de nota a afirmação do

ministro Cezar Peluso de que o Judiciário poderia garantir esse direito mesmo sem legislação

específica: “Estou fazendo uma aposta na sensatez do Poder Judiciário que, mesmo sem lei sobre

direito de resposta, poderá dar respostas ainda melhores. O Judiciário tem decidido de forma

eficaz para garantir a liberdade de imprensa.”3 É possível portanto estabelecer como objetivo

principal da pesquisa verificar se há de fato um vácuo normativo ou se os tribunais teriam realmente

encontrado meios eficazes para garantir esse direito previsto na Constituição.

Para melhor delimitação do objeto de pesquisa, manter-se-á o foco da investigação nas

evidências jurisprudenciais de garantia do direito de resposta em si, embora os efeitos jurídicos da

revogação também atinjam a esfera dos direitos da personalidade, como a proteção da honra

objetiva e subjetiva. Como um possível objetivo secundário da pesquisa, teria-se a análise da

concessão do direito de resposta como medida complementar indispensável para uma justa

reparação dos danos em crimes de calúnia, injúria e difamação cometidos pela imprensa ou através

dela, uma vez que possuem uma repercussão muito maior. Pela revogação da lei, jornalistas não

mais terão tratamento diferenciado em crimes contra a honra, mas por outro lado bastaria a

aplicação dos artigos relacionados nos Códigos Penal e Civil? Além de indenização por dano

material, moral ou à imagem, também prevista na Constituição no Art. 5º, V, não seria a retratação

pública ou, na ausência desta, o direito de resposta parte indispensável da reparação?

1.1. HistóricoEmbora desde a época do Império o Brasil tenha buscado alguma regulação da atividade de

imprensa em leis específicas ou como matéria avulsa em outras leis e códigos (LANER, 2000), a

primeira garantia a um direito de resposta ocorreu com a Constituição de 1934, em seu Art. 113,

inciso 9, no Capítulo II, Dos Direitos e das Garantias Individuais:

9) Em qualquer assunto é livre a manifestação do pensamento, sem dependência de censura, salvo quanto a espetáculos e diversões públicas, respondendo cada um pelos abusos que cometer, nos casos e pela forma que a lei determinar. Não é permitido anonimato. É segurado o direito de resposta [grifo]. A publicação de livros e periódicos independe de licença do Poder Público. Não será, porém, tolerada propaganda, de guerra ou de processos violentos, para subverter a ordem política ou social.

3 STF revoga a Lei de Imprensa. http://oglobo.globo.com/pais/mat/2009/04/30/stf-revoga-lei-de-imprensa-755515498.asp – 30/04/2009.

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Com a Lei de Imprensa (Lei no 5250/67), embora criada em um contexto de constrangimento

à atividade de imprensa pela ditadura, veio finalmente uma regulamentação mais precisa desse

instituto. Em seu Capítulo IV, ao longo de oito artigos (Art. 29 a 36), o legislador procedeu a uma

melhor definição terminológica e da abrangência do “direito de resposta”, do prazo para sua petição

judicial, do juízo competente, da possibilidade de multa, das situações em que há a perda do direito,

e até mesmo das características do pedido e restrição a seu conteúdo. Desde então, ressalte-se que

esse direito foi novamente consagrado pela Constituição de 1988, em seu Art. 5o, inciso V,

conforme já mencionado, sem que tenha surgido nenhuma outra lei específica substitutiva quanto à

sua regulamentação.

Antes da presente revogação pelo STF, mesmo sendo de conhecimento pouco difundido na

sociedade, tal dispositivo regulatório do direito de resposta foi colocado em prática várias vezes,

sendo um dos mais notáveis aquele concedido ao então governador do Rio de Janeiro, Leonel

Brizola, contra a Rede Globo de Televisão. Após dois anos de disputa judicial, tendo o governador

sido alvo de um editorial injurioso, foi enfim lida em 15 de março de 1994 a resposta no Jornal

Nacional pelo apresentador Cid Moreira; o trecho em questão está disponível em vídeo na internet.4

Por questões alheias ao direito de resposta, em 19/02/2008 o Partido Democrático

Trabalhista – PDT impetrou no Supremo Tribunal Federal uma ação de Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), instrumento adequado à impugnação de norma

pré-constitucional, quanto à recepção e interpretação de determinados dispositivos da Lei no

5250/67 à luz da Constituição de 1988. Nos termos da ADPF protocolada sob o número 130 no

STF, em seu item 1.1 – Os Preceitos Fundamentais Violados, lê-se:

O objetivo da presente ADPF é a declaração, com eficácia geral e efeito vinculante, de que determinados dispositivos da Lei de Imprensa (a) não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988 e (b) outros carecem de interpretação com ela compatível, a fim de evitar que defasadas disposições de lei sirvam de motivação para a prática de atos administrativos ou judiciais lesivos aos seguintes preceitos fundamentais assegurados pela Lei Maior: [passa então à enumeração dos artigos constitucionais julgados conflitantes com a Lei de Imprensa]

Após liminar parcial concedida pelo relator ministro Carlos Ayres Britto naquele mesmo

mês de fevereiro, suspendendo a aplicação de determinados artigos, a decisão do plenário do STF

em 30/04/2009 foi finalmente pela revogação completa da lei, suscitando divergências, entre outras,

quanto à aplicação do direito de resposta a partir desse momento.

4 http://www.youtube.com/watch?v=ObW0kYAXh-8

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Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, julgou procedente a ação, vencidos, em parte, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa e a Senhora Ministra Ellen Gracie, que a julgavam improcedente quanto aos artigo 1º, § 1º; artigo 2º, caput; artigo 14; artigo 16, inciso I e artigos 20, 21 e 22, todos da Lei nº 5.250, de 9.2.1967; o Senhor Ministro Gilmar Mendes (Presidente), que a julgava improcedente quanto aos artigos 29 a 36 da referida lei e, vencido integralmente o Senhor Ministro Marco Aurélio, que a julgava improcedente. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Eros Grau, com voto proferido na assentada anterior. Plenário, 30.04.2009.

1.2 Fundamentos temáticosPara melhor fundamentação do tema, cabe inicialmente uma melhor análise do que afirma a

Constituição Federal de 1988 a respeito da liberdade de expressão, de imprensa, bem como as

respectivas observações e ressalvas legais:

CAPÍTULO VDA COMUNICAÇÃO SOCIAL

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

Retomando o Art. 5o e os mencionados incisos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:[...]IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;

De tal modo, a partir do disposto no Art. 220, § 1o, observa-se que o exercício da liberdade

de imprensa não é direito absoluto, devendo observar os mencionados direitos e garantias

fundamentais expressos no Art. 5o, entre os quais o direito de resposta.

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Sendo válido o direito de resposta no ordenamento jurídico brasileiro, deve-se em seguida

buscar uma melhor compreensão de seus contornos e abrangência; como a norma constitucional não

se aprofunda no assunto, vejamos que fatos jurídicos geravam o direito subjetivo de resposta na

revogada Lei de Imprensa, em seu Capítulo IV, Do Direito de Resposta:

Art. 29. Toda pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade pública, que for acusado ou ofendido em publicação feita em jornal ou periódico, ou em transmissão de radiodifusão, ou a cujo respeito os meios de informação e divulgação veicularem fato inverídico ou errôneo, tem direito a resposta ou retificação. [grifos]

Deve portanto ser feita a distinção entre acusações e ofensas da simples crítica, não podendo

o direito de resposta ser transformado em panaceia (CERQUEIRA, 2003). Com a extensão dos

fatos à publicação de fatos inverídicos ou errôneos, o reclamante deveria buscar antes o direito de

resposta por via extrajudicial, junto ao próprio órgão de imprensa, recorrendo à Justiça apenas caso

não tenha logrado êxito:

Art. 32. Se o pedido de resposta ou retificação não for atendido nos prazos referidos no art. 31, o ofendido poderá reclamar judicialmente a sua publicação ou transmissão.

Caracterizados os fatos geradores, permanece a questão da caracterização de “resposta”;

além da proporcionalidade ao agravo indicada pela Constituição, vejamos o que era disposto

também na Lei de Imprensa:

Art . 30. O direito de resposta consiste:I - na publicação da resposta ou retificação do ofendido, no mesmo jornal ou periódico, no mesmo lugar, em caracteres tipográficos idênticos ao escrito que lhe deu causa, e em edição e dia normais;II - na transmissão da resposta ou retificação escrita do ofendido, na mesma emissora e no mesmo programa e horário em que foi divulgada a transmissão que lhe deu causa; ouIII - a transmissão da resposta ou da retificação do ofendido, pela agência de notícias, a todos os meios de informação e divulgação a que foi transmitida a notícia que lhe deu causa.

Mencione-se por último que a Lei de Imprensa, nos artigos restantes do Capítulo IV,

procedia ainda à normatização da formulação da resposta e seu prazo, da extinção do direito, da

forma da resposta, das custas e do prazo para publicação, da réplica e tréplica, das condições para

reclamação em juízo e dos limites ao conteúdo da resposta. No entanto, por outro lado, registrava-se

também a existência de antinomias em seus próprios dispositivos, como nos artigos sobre a relação

entre o direito de resposta e ações civil e penal (Art. 29, § 3o e Art. 35), quanto à sucumbência na

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reclamação em juízo, entre o Art. 31, § 2o e o Art. 32, conforme Cerqueira (2003), além de

dispositivos que perderam eficácia, como os valores das multas em cruzeiros.

Apesar de todos os dispositivos regulatórios presentes naquela lei, a fundamentação da

revogação pelo STF indica o inciso V do Art. 5o da Constituição Federal como auto-aplicável,

possibilitando portanto a revogação por completo da Lei de Imprensa:

11. EFEITOS JURÍDICOS DA DECISÃO. Aplicam-se as normas da legislação comum, notadamente o Código Civil, o Código Penal, o Código de Processo Civil e o Código de Processo Penal às causas decorrentes das relações de imprensa. O direito de resposta, que se manifesta como ação de replicar ou de retificar matéria publicada é exercitável por parte daquele que se vê ofendido em sua honra objetiva, ou então subjetiva, conforme estampado no inciso V do art. 5º da Constituição Federal. Norma, essa, “de eficácia plena e de aplicabilidade imediata”, conforme classificação de José Afonso da Silva. “Norma de pronta aplicação”, na linguagem de Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres Britto, em obra doutrinária conjunta.12. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO. Total procedência da ADPF, para o efeito de declarar como não recepcionado pela Constituição de 1988 todo o conjunto de dispositivos da Lei federal nº 5.250, de 9 de fevereiro de 1967.

1.3. HipótesesA partir da decisão do STF, a hipótese inicial a ser verificada na prática jurídica pós-

revogação é quanto à suficiência e auto-aplicação do dispositivo constitucional. Não se pode dizer

exatamente que houve um retorno ao estado anterior à Lei de Imprensa, mas o que surgiu depois, as

disposições restantes, são de fato suficientes, eficazes? Quais os limites de uma legislação geral em

detrimento a uma específica no contexto de um tema polêmico, de partes desiguais, e quais as

dificuldades que têm suscitado para a Justiça? Como e em que termos pode alguém pleitear em

juízo direito de resposta, assim como o que se pode aceitar como satisfatório em termos de

publicação extrajudicial de uma resposta? Há necessidade de edição pelo Congresso Nacional de

uma nova lei específica dedicada a esse assunto?

Para parametrização da análise, deve-se considerar ainda o possível efeito de outras

variáveis, como o poder político e econômico dos grandes meios de comunicação impedindo uma

resposta digna, a insegurança jurídica para os pequenos veículos em caso de decisões desfavoráveis,

as diferentes técnicas de hermenêutica frente às cláusulas gerais, o eventual atraso na concessão da

resposta, tornando-a inócua. Por último, mas não menos importante, com tem sido decidida a

ponderação de interesses de liberdade de imprensa contra os direitos de imagem e dignidade da

pessoa humana, se tem levado a um todo coerente, que transmita segurança à sociedade.

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2. Justificativa

A pesquisa proposta busca identificar se, e como, a Justiça está garantindo o direito de

resposta desde abril de 2009 na falta de regulamentação específica sobre o tema, uma vez que o juiz

não pode se eximir de julgar o caso concreto. Casos posteriores relatados na própria imprensa e em

sites especializados na internet parecem indicar que as dificuldades decorrentes podem inviabilizá-

lo, ou no mínimo levar a uma baixa eficácia daquele direito, pois perderia-se a agilidade necessária

para uma resposta (NICOLODI, 2007).

Entre vários, podemos citar como primeiro exemplo a justificativa do indeferimento de uma

solicitação de direito de resposta movida pelo jornalista Luís Nassif contra a revista Veja, por conta

de acusações ofensivas publicadas contra aquele pelo colunista Diogo Mainardi:

Na sentença, a juíza sustenta que, com o fim da Lei de Imprensa (Lei 5.250/1967), revogada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 130, não há mais fundamento legal para o direito de resposta. Para a defesa de Nassif, no entanto, "o direito de resposta é garantia constitucional, previsto no artigo 5º, inciso V da Constituição Federal". O advogado de Nassif deve recorrer.5

Um outro caso, de grande repercussão e de sentença praticamente simultânea ao primeiro,

parece reforçar a perda de segurança jurídica e eficácia:

O juiz Wanderley Salgado de Paiva, da 30ª Vara Cível de Belo Horizonte, determinou que a revista IstoÉ dê direito de resposta a Fernando Pimentel (PT), ex-prefeito de Belo Horizonte.

[...] Salgado ainda lembrou que o fato de a Lei de Imprensa ter sido suspensa pelo STF (Supremo Tribunal Federal) não inviabiliza o direito de resposta. “As ações de natureza como a dos presentes autos têm por fundamento a legislação em vigor, Código Penal, Civil e, principalmente, a Constituição Federal”, disse o magistrado.

[…] O Código de Ética do Jornalismo Brasileiro, aprovado em agosto de 2007, e ainda em vigor, também foi citado pelo magistrado. De acordo com o Código de Ética, a divulgação de informações deve se pautar pela veracidade dos fatos e o autor da matéria precisa estar seguro de suas fontes e das informações fornecidas.6

Neste segundo caso já houve depois também a apreciação liminar de recurso formulado à

segunda instância, revertendo a decisão e agravando ainda mais a percepção de perda de segurança

jurídica pela sociedade, tanto quanto à concessão quanto a possíveis abusos nas respostas:

5 Juíza nega direito de resposta a Nassif contra Veja. http://www.conjur.com.br/2010-mar-31/juiza-nega-direito-resposta-luis-nassif-revista-veja – 31/03/2010.

6 Juiz manda IstoÉ dar direito de resposta a ex-prefeito de Belo Horizonte. http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/JUIZ+MANDA+ISTOE+DAR+DIREITO+DE+RESPOSTA+A+EXPREFEITO+DE+BELO+HORIZONTE_68645.shtml – 30/03/2010.

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"O tribunal aceitou os argumentos de que a tutela não poderia ter sido concedida tão rapidamente, sem que o antigo titular da 30ª Vara Cível de BH tivesse ao menos lido a resposta a ser publicada."7

Outro motivo que se apresenta é que disposições constitucionais em geral não são auto-

executáveis, dependendo de regulamentação para uma aplicação juridicamente segura,

distintamente do afirmado no acórdão do STF. Conforme foi salientado pelos ministros Gilmar

Mendes e Marco Aurélio Mello em seus votos na referida sessão:

O presidente do STF, Gilmar Mendes, alertou para esse fato ao defender que os artigos sobre direito de resposta continuassem em vigor. Ele ressaltou que são uma forma de garantir esse direito ao cidadão, e um mecanismo de assegurar à imprensa que os juízes não cometerão abusos para punir os veículos de comunicação:- Temos 15 mil juízes no país. Qual será a regra que o juiz seguirá a partir do desaparecimento desta norma? Os problemas são enormes e variados a partir dessa perspectiva. Vejo com grande dificuldade a supressão dessas regras.8

Contra a ação do PDT, o ministro Marco Aurélio Mello foi bastante enfático. "A quem interessa o vácuo normativo? A jornais, jornalistas, aos cidadãos em geral?", perguntou. Segundo ele, após a decisão do STF será instalada a "babel". Ele observou que a lei estava em vigor há 42 anos, dos quais 20 no período da atual Constituição Federal. "Não me consta que a imprensa do País não seja uma imprensa livre", afirmou.9

Além disso, ressalte-se como agravante a condição desigual das partes na matéria, também

salientada pelo ministro Gilmar Mendes:

[...] O mundo não se faz apenas de liberdade de imprensa, ele se faz também de liberdade da pessoa humana - disse Gilmar.- O que me impressiona realmente é a dificuldade quanto ao direito de resposta tendo em vista a vitalidade. É a única forma do indivíduo comum equilibrar eventualmente esta relação ou estabelecer uma relação já de início desequilibrada.10

A título de ilustração da força política e econômica da imprensa, cabe mencionar a recente

fala do eminente jurista e professor da USP Fábio Konder Comparato, que encaminhou neste ano ao

Conselho da OAB uma proposta de Ação Direta de Inconstitucionalidade por omissão do Congresso

Nacional, quanto à regulamentação de dispositivos constitucionais referentes à imprensa:

7 TJ-MG suspende decisão que puniu a revista IstoÉ. http://www.jusbrasil.com.br/noticias/2224022/tj-mg-suspende-decisao-que-puniu-a-revista-istoe – 08/06/2010.

8 Lei de Imprensa: direito de resposta terá de ser regulado. http://oglobo.globo.com/pais/mat/2009/04/30/lei-de-imprensa-direito-de-resposta-tera-de-ser-regulado-755536437.asp – 30/04/2009.

9 STF derruba a Lei de Imprensa. http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,stf-derruba-lei-de-imprensa,363661,0.htm – 30/04/2009.

10 STF revoga a Lei de Imprensa. http://oglobo.globo.com/pais/mat/2009/04/30/stf-revoga-lei-de-imprensa-755515498.asp – 30/04/2009.

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“Até hoje, 22 anos depois da promulgação da Constituição Federal, os artigos 220 e 221 não foram regulamentados porque o oligopólio exerce controle sobre o Congresso", disse o professor da USP. “Estamos numa fase em que a concentração da propriedade e do controle dos meios de comunicação de massa sobre a sociedade atingiu seu grau máximo.”11

Ainda sobre a Lei de Imprensa, é necessário distinguir o contexto de seu surgimento de um

estigma sobre a totalidade de seu conteúdo. Embora aquela tenha sido editada durante a ditadura

militar, com finalidade clara de tentar calar a imprensa, e o STF tenha de forma geral desqualificado

a lei pelo seu contexto, isso por outro lado não significa que a imprensa esteja imune a qualquer

crítica, questionamento em juízo ou até mesmo nova regulação em nova lei específica, democrática.

Liberdade não pode ser confundida com ausência de normatização, com ausência do Direito.

Com a grande concentração da mídia no Brasil, sendo parte interessada e usualmente dotada

de evidente, mas inconfesso, alinhamento com interesses econômicos, políticos, religiosos, etc., o

assunto parece mais atual do que nunca. Embora seja possível relembrar alguns casos clássicos de

acusações sem provas pela imprensa, como aqueles da Escola Base, o suposto enriquecimento

ilícito de Ibsen Pinheiro, ou mesmo a injúria que suscitou o mencionado direito de resposta de

Leonel Brizola no Jornal Nacional, a atualidade parece ainda mais marcada por uma banalização do

fenômeno, além de natural exacerbação principalmente quando a informação da mídia tradicional

pode ser verificada a partir do universo de informações disponíveis na internet. Aqueles que buscam

comparar notícias, bem como acessam os dados nas fontes, não só se deparam com muitas

informações erradas, desencontradas, mas também com distorções, viés e temeridades em muitas

notícias. O leitor, ouvinte ou espectador comum na maioria das vezes acaba ficando sem o acesso à

correção, ao contraditório, à pluralidade de versões, o que é mais grave quando há impacto sobre a

imagem de terceiros. Na falta de um direito de resposta eficaz, considerando que a maioria dos

veículos não abre espaço adequado para tal, chegamos a casos de empresas tendo que pagar espaço

publicitário para fazer resposta, bem como ao recente fenômeno de blogs para publicação de

contraditório, como o da Petrobras, o do Planalto, ou mesmo a abertura de espaço por terceiros para

um “direito de resposta” em seus blogs, como é o caso do blog do jornalista Luís Nassif.

A partir da declaração do jurista Fábio Comparato, em se desejando garantir o direito de

resposta à sociedade, parece necessário que no contexto jurídico a imprensa seja enxergada tal

como ela é de fato no presente, em vez de meras visões românticas sobre sua suposta função

democrática. Deixar de lado o wishful thinking e confrontar-se com a realidade concreta, eis um dos

focos propostos para a pesquisa.

11 Comparato propõe ação no STF contra omissão do Congresso. http://cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=16728 – 25/06/2010.

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3. Metodologia

Pretende-se utilizar sobretudo o método indutivo: não se deseja aqui deduzir um caminho

para aplicação do direito de resposta a partir dos dispositivos existentes, mas sim buscá-lo na práxis

dos tribunais, na eficácia. Diferentemente de opiniões e teorias a priori, deseja-se constatar o que

está ocorrendo de fato desde a revogação da Lei de Imprensa.

O roteiro de trabalho proposto para a presente pesquisa consiste sobretudo na análise da

jurisprudência recente, como sentenças, acórdãos, petições e liminares, com foco em estudo de

casos. Conforme se faça necessária, também não se prescinde da leitura mais aprofundada de outras

leis e dispositivos aplicáveis, na própria Constituição Federal, no Código Penal, no Código Civil, no

Código de Processo Civil no Código de Defesa do Consumidor, por exemplo quanto a matérias de

calúnia, injúria e difamação, obrigação de fazer, tutela antecipada, propaganda e contrapropaganda.

Como forma de complementação da análise, à semelhança de um processo convencional,

deseja-se proceder na medida do possível à coleta da visão de partes sobre o direito de resposta, por

meio de questionários a serem enviados a jornalistas e relações públicas de veículos de mídia, bem

como a reclamantes, como por exemplo Luis Nassif e o ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando

Pimentel. Outro ponto que pode ser um pouco melhor explorado, embora não deva se tornar o foco

da pesquisa, são os mecanismos extrajudiciais para direito de resposta. Não se descarta ainda a

pesquisa bibliográfica da doutrina, embora não muito abundante sobre o tema, e por último do

direito comparado, mas apenas de forma subsidiária.

3.1. Referências preliminaresAlém da jurisprudência dos dois casos mencionados na justificativa, da Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental no 130, das atas e do referido acórdão pelo STF, dos

próprios artigos do Capítulo IV da Lei de Imprensa, de uma interpretação das demais normas já

citadas de maneira mais aprofundada que no presente projeto, adicione-se a busca de outras fontes

primárias, como outros processos de direito de resposta em tramitação ou julgados recentemente,

conforme notícias diversas na imprensa e na internet. Mencionem-se ainda as obras doutrinárias

sobre direito de resposta de José Afonso da Silva, Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres Britto,

aludidos no acórdão do STF, assim como as obras de direito de resposta comparado e

constitucional, do jurista Vital Moreira, da Universidade de Coimbra, citado por Nicolodi (2007).

Page 13: Segurança Jurídica e Eficácia da Garantia de Direito de Resposta após a Revogação da Lei de Imprensa pelo STF

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