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SEMINÁRIO: EMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS E OFERTAS PÚBLICAS EM TEMPOS DE CRISE FINANCIAMENTO NUM AMBIENTE DE FORTE CRIATIVIDADE E ACTIVIDADE FINANCEIRA P AULO CÂMARA 3 e 4 de Junho de 2013 | Sala Conferência Hotel Praia Mar

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SEMINÁRIO: EMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS

E OFERTAS PÚBLICAS EM TEMPOS DE CRISE

FINANCIAMENTO NUM AMBIENTE DE FORTE CRIATIVIDADE E ACTIVIDADE FINANCEIRA

PAULO CÂMARA

3 e 4 de Junho de 2013 | Sala Conferência Hotel Praia Mar

I.

ENQUADRAMENTO GERAL

Cada crise representa uma oportunidade para repensar o desenho regulatório.

A um tempo, as intervenções devem ser dotadas da suficiente agilidade para atingir, com eficácia, as soluções de emergência que porventura se imponham, para salvaguarda do funcionamento regular dos mercados.

A outro tempo, porém, devem ser evitadas intervenções apressadas e mal concebidas: hard cases make bad law.

RELEVO DA ANÁLISE DO CONTEXTO ANTERIOR E POSTERIOR À CRISE

Importa, para já, examinar detidamente o ambiente de mercado

anterior à eclosão da crise – para daí inferir conclusões quanto às lições regulatórias que devem ser extraídas deste relevante período do sistema financeiro mundial.

RELEVO DA ANÁLISE DO CONTEXTO ANTERIOR E POSTERIOR À CRISE

O conceito de inovação financeira é geralmente entendido como o

processo contínuo e dinâmico que conduz à conceção, distribuição e popularização de produtos financeiros, bem como ao aparecimento, divulgação e utilização de novas tecnologias financeiras e de novos mercados (Delimatsis 2013).

CONCEITO DE INOVAÇÃO FINANCEIRA

Operando num ambiente muito competitivo, o mercado financeiro sempre viveu do engenho e da inovação. Alguns exemplos:

Valores mobiliários escriturais;

Derivados;

Análise da eficiência fiscal dos produtos financeiros;

Importância do desenvolvimento tecnológico e da Internet na rede de distribuição de produtos financeiros e na actual configuração das estruturas de negociação.

CRIATIVIDADE E INOVAÇÃO COMO CAUSAS DA CRISE?

Há vantagens inquestionáveis que decorrem do processo de inovação financeira:

Redução dos custos de transacção;

Ampliação da eficiência dos mercados;

Aumento da velocidade de execução de operações;

Alargamento da oferta de produtos e de serviços aos clientes.

INOVAÇÃO FINANCEIRA - VANTAGENS

Liberdade de conformação do conteúdo dos valores mobiliários é importante pilar na inovação dos mercados.

Código MVM de Cabo Verde acolhe este princípio, ao admitir como valores mobiliários “outros documentos representativos de situações jurídicas homogéneas, desde que sejam susceptíveis de negociação em mercado” (art. 3.º/a) vii).

ATIPICIDADE DOS VALORES MOBILIÁRIOS

Sobreutilização do crédito: Titularização e Assimetrias prudenciais

Imperfeições na distribuição de produtos complexos: Falhas das agências de rating

Integridade do mercado: Derivados de Crédito

Sobreendividamento dos Estados e crise de dívida pública

CAUSAS DETERMINANTES DA CRISE

Integridade do mercado: Short selling e Limitações ao regime do abuso de mercado

A Fragmentação das Estruturas de Supervisão

Governação: Deficiente gestão de conflito de interesses, estruturas remuneratórias inadequadas e eclipse do Activismo Accionista

CAUSAS AGRAVANTES DA CRISE

II.

OBRIGAÇÕES TITULATIZADAS

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OBRIGAÇÕES COM GARANTIAS ESPECIAIS

A emissão de valores mobiliários pode adquirir maior complexidade quando, tratando-se de valores representativos de dívida, o dever de reembolso é robustecido através de garantias especiais, que complementam o património geral do emitente.

Tal sucede, em particular, em relação aos seguintes tipos de valores mobiliários: obrigações hipotecárias; obrigações sobre o sector público; obrigações titularizadas.

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OBRIGAÇÕES TITULARIZADAS: VANTAGENS

As entidades cedentes (sejam de natureza pública ou privada) vêem na titularização uma oportunidade.

Os clientes das empresas cedentes podem beneficiar indirectamente da utilização desta técnica, na medida em que esta contribui para uma redução do custo de financiamento bancário.

Os investidores deparam-se com um novo meio de aplicação de poupanças, com a suplementar vantagem de, como adiante se verá, implicar uma garantia a rodear o direito representado nos valores mobiliários emitidos na sequência destes processos.

As sociedades de rating encontram aqui um factor que potencia a expansão da sua actividade.

O sistema financeiro, em geral, assiste a uma distribuição porosa do risco, o que potencia uma afectação mais eficiente dos recursos.

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OBRIGAÇÕES TITULARIZADAS: INCONVENIENTES

Em termos sistémicos, a proliferação de entidades que distribuem o risco sobre entidades que assumem risco pode causar desequilíbrios no sistema financeiro.

Acentuou o efeito de contágio geográfico e sectorial do sistema financeiro

No circuito de distribuição dos produtos financeiros, a agregação de largas quantidades de direitos de crédito (packaging) em obrigações titularizadas de complexidade acrescida (collateralized debt obligations), por vezes de natureza dissemelhante, por seu turno, também dificultou sensivelmente a avaliação do risco correspondente.

Pode propiciar algumas deficiências na informação prestada sobre os valores mobiliários.

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OBRIGAÇÕES TITULARIZADAS

O regime apoia-se no esquema central de titularização, repousando na existência de um cedente de créditos (originator) e de um distinto cessionário (special purpose vehicle (SPV) ou special purpose entity (SPE)) que toma a iniciativa da emissão dos valores mobiliários com base nos créditos cedidos.

A titularização implica sempre uma cessão de direitos de crédito a favor do emitente de valores mobiliários.

A prática não se basta com promessas de transmissão de créditos, impondo no âmbito da titularização uma cessão efectiva e incondicional (true sale).

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OBRIGAÇÕES TITULARIZADAS

A legitimidade para figurar como entidades cedentes de créditos para titularização é concedida a três categorias de entidades:

Estado e outras pessoas colectivas públicas;

instituições de crédito, as sociedades financeiras, as empresas de seguros, os fundos de pensões e as sociedades gestoras de fundos de pensões;

pessoas colectivas cujos documentos de prestação de contas tenham, nos últimos três exercícios, sido objecto de certificação legal por auditor registado .

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OBRIGAÇÕES TITULARIZADAS

As exigências gerais quanto à eficácia da cessão de créditos perante

o devedor mantêm-se, salvo quando se trate de cessão de créditos cujo cedente seja instituição de crédito, sociedade financeira, empresa seguradora, fundo de pensões ou sociedade gestora de fundos de pensões. Nesse caso, a cessão é eficaz simultaneamente perante os contraentes e perante o devedor, sem carecer, em relação a este, de conhecimento, de aceitação ou de notificação (art. 6.º, n.º 4)

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OBRIGAÇÕES TITULARIZADAS

Para que o mercado de titularização alcance sucesso, é muito importante aliviar as exigências de forma relacionadas com a cessão de créditos.

Em Portugal, é permitido que a cessão se realize por documento particular, ainda que tenha por objecto créditos hipotecários.

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OBRIGAÇÕES TITULARIZADAS

Antes da emissão deve ser afectada uma parcela de créditos, na medida em que for necessária, ao reembolso do empréstimo obrigacionista, créditos esses sobre os quais recai um privilégio creditório especial a favor dos titulares de obrigações titularizadas. Os direitos de crédito ficam submetidos ao princípio da segregação, não respondendo por outras dívidas do emitente até reembolso integral do montante devido aos titulares das obrigações titularizadas.

A autonomia patrimonial deste lote de créditos é vincada através do princípio do limited recourse, segundo o qual apenas os créditos e respectivos frutos afectos à emissão responderiam pelo reembolso das obrigações

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TITULARIZAÇÃO E CRISE

A crise financeira revelou um problema de incentivos na prática das operações de titularização.

A integralidade da cessão de créditos, e da transferência do risco que lhe está associado, induziu em alguns casos a um comprovado menor rigor nos critérios da concessão de crédito, na expectativa da sua posterior titularização. Documentam-se casos de displicência nas exigências de documentação dos contratos de crédito celebrados, bem como de diminuição no grau de exigência na selecção dos créditos a titularizar.

Estas causas terão estado na origem de uma sobreutilização do crédito, com efeitos negativos em termos macroeconómicos.

Directiva 2010/76/UE agravou impacto das titularizações no cálculo de fundos próprios.

A REFORMA EUROPEIA DO REGIME DA TITULARIZAÇÃO

Directiva 2009/111/CE estabelece condições para que as instituições que não actuem na qualidade de instituição cedente ou patrocinadora assumam risco de crédito em posições de titularização.

Esta Directiva prevê, designadamente, que Uma instituição que não actue na qualidade de instituição cedente ou

patrocinadora só pode ser exposta ao risco de crédito de uma posição de titularização incluída ou não na sua carteira de negociação se a instituição cedente ou patrocinadora tiver divulgado expressamente que manterá, de forma contínua, um interesse económico líquido substancial de, pelo menos, 5 %.

Semelhante orientação encontra-se na Directiva AIFMD (gestão de fundos

alternativos).

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III.

Obrigações hipotecárias

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OBRIGAÇÕES HIPOTECÁRIAS

As obrigações hipotecárias são valores mobiliários representativos de dívida cuja situação jurídica subjacente é reforçada através de um privilégio creditório especial sobre os créditos hipotecários afectos à emissão.

Correspondem, com pequenas adaptações, às covered bonds anglo-saxónicas ou Pfandbriefe alemãs.

Aí coexistirá, por regra, na mesma pessoa jurídica, o detentor originário dos créditos e o emitente dos valores mobiliários.

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OBRIGAÇÕES HIPOTECÁRIAS

Para o regime destes valores mobiliários seja flexibilizador, deve deixar de exigir o registo dos privilégios creditórios

Traço importante: as hipotecas que garantam os créditos hipotecários afectos à emissão prevalecem sobre quaisquer privilégios creditórios imobiliários.

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OBRIGAÇÕES HIPOTECÁRIAS: DOUBLE RECOURSE

1. Implicam privilégio creditório especial sobre os créditos

hipotecários que lhes subjazem, bem como sobre outras disponibilidades monetárias ou activos dotados de liquidez, com precedência sobre quaisquer outros credores, para efeitos de reembolso do capital e recebimento dos juros correspondentes às obrigações hipotecárias

2. Supõem ainda a constituição de um património autónomo que funciona como garantia do seu reembolso. Mas o restante património da sociedade responder subsidiariamente e na medida necessária a solver as dívidas decorrentes da emissão de obrigações .

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OBRIGAÇÕES HIPOTECÁRIAS: PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE

Em caso de insolvência do emitente, o património é separado da massa insolvente, para ser autonomamente gerido até reembolso dos obrigacionistas.

Este princípio de continuidade das emissões apenas é perturbado em caso de haver uma deliberação da assembleia de obrigacionistas, no sentido de provocar o vencimento antecipado das obrigações.

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IV.

OBRIGAÇÕES SOBRE O SECTOR PÚBLICO

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OBRIGAÇÕES SOBRE O SECTOR PÚBLICO

Obrigações em garantia de cujo cumprimento são afectos créditos sobre administrações centrais ou autoridades regionais e locais de um dos Estados membros da União Europeia e créditos com garantia expressa e juridicamente vinculativa das mesmas entidades.

Nestes casos, o valor nominal global das obrigações sobre o sector público em circulação pode ir até 100% do valor nominal global dos créditos afectos às referidas obrigações.

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IV.

OUTRAS MODALIDADES DE OBRIGAÇÕES

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NOVAS MODALIDADES DE OBRIGAÇÕES

Obrigações Cov light: caracterizadas pela escassez ou, no limite, ausência de covenants. São por isso associadas a mercados de divida sobreaquecidos.

Obrigações Pik toggle: credor pode receber obrigações no vencimento.

Obrigações Dividend recap: emitidas com o propósito de permitirem o pagamento de dividendos

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OBRIGAÇÕES SUBORDINADAS

As obrigações representativas de dívida subordinada são aquelas em que o titular da obrigação, havendo insolvência da emitente, apenas se pode pagar sobre o património do emitente depois de satisfeitos todos os credores comuns.

O tráfego conhece, ainda, distinções no âmbito das obrigações

subordinadas, admitido-as na sua forma simples ou sob a veste de obrigações profundamente subordinadas (deeply subordinated bonds) – caso em que o credor obrigacionista apenas é reembolsado após o reembolso dos demais credores subordinados.

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SUKUK

Instrumentos financeiros emitidos em conformidade com Shariah

Ausência de juro

Representam formas de co-titularidade em investimentos: em créditos, bens, projectos ou outros investimentos.

Não transmissíveis: excepto na Malásia

Alargamento a emitentes ocidentais (p. ex: General Electric Finance, em 2009)

Sendo uma ferramenta privilegiada de financiamento através do mercado de capitais, as obrigações têm conhecido uma acentuada diversificação.

Alguns aspectos – mas não todos – deste fenómeno estão relacionados com as causas da crise financeira e merecem a devida reflexão, em termos regulatórios.

Esta asserção tem validade mesmo em relação ao contexto cabo-verdiano, apesar de o sistema financeiro de Cabo Verde não ter sofrido os danos reputacionais que se fizeram sentir noutros quadrantes geográficos.

CONCLUSÕES