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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA FACULDADE DE DIREITO CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO DIREITO FINANCEIRO – 2º/2013 CASO 2- GRUPO 4 (DEFESA DO CONTRIBUINTE): ALUNOS: Claudio Huguet - 11/0112989 Denis Gamell de Alvarenga - 090023455 Iasmim Pacheco Magalhães-09/0116658 Nadiel Alves Franco – 09/0126742 Rodrigo Thiago Guntzel de Souza 09/0133901 Vanilson Souto Victor Siboney Cordeiro – 09/0041305 BREVE RELATO DO CASO A Lei 1.010/06 do município de Cidade Limpa instituiu uma “contribuição de melhoria do asseio público”. Este tributo serviria para cobrir os custos do sistema de coleta de lixo residencial municipal, anteriormente financiado por outras receitas do Município de Cidade Limpa. O Sr. Pedro Cabral, proprietário de casa no centro do Município de Cidade Limpa, negou-se a pagar a referida contribuição de melhoria, entendendo ser contestável o referido tributo. Como representante do Sr. Pedro Cabral, o grupo irá expor os motivos pelos quais ele tem razão ao contestar o tributo em questão.

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

FACULDADE DE DIREITO

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

DIREITO FINANCEIRO – 2º/2013

CASO 2- GRUPO 4 (DEFESA DO CONTRIBUINTE):

ALUNOS:

Claudio Huguet - 11/0112989Denis Gamell de Alvarenga - 090023455Iasmim Pacheco Magalhães-09/0116658Nadiel Alves Franco – 09/0126742RodrigoThiago Guntzel de Souza 09/0133901Vanilson SoutoVictor Siboney Cordeiro – 09/0041305

BREVE RELATO DO CASO

A Lei 1.010/06 do município de Cidade Limpa instituiu uma “contribuição de

melhoria do asseio público”. Este tributo serviria para cobrir os custos do sistema de coleta

de lixo residencial municipal, anteriormente financiado por outras receitas do Município de

Cidade Limpa. O Sr. Pedro Cabral, proprietário de casa no centro do Município de Cidade

Limpa, negou-se a pagar a referida contribuição de melhoria, entendendo ser contestável o

referido tributo. Como representante do Sr. Pedro Cabral, o grupo irá expor os motivos

pelos quais ele tem razão ao contestar o tributo em questão.

DEFESA DO CONTRIBUINTE

O artigo 3º do Código Tributário Nacional define o conceito de tributo: “Tributo

é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir,

que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade

administrativa plenamente vinculada.”

À luz do Sistema Tributário vigente, incluindo as normas e princípios

constitucionais tributários, e à luz da jurisprudência do STF, verifica-se a existência de

cinco espécies tributárias: impostos, taxas, contribuições de melhoria (previstos no art. 145

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da CF), empréstimo compulsório (art. 148 da CF) e contribuições sociais mencionadas no

artigo 149 e no artigo 195 da Constituição Federal.

A taxa está normatizada no artigo 145, II, da CF e no artigo 77 do CTN, in

verbis:

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:(...)II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição.

Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.

Ela é, portanto, um tributo vinculado, pois sua receita será destinada ao custeio

da atividade prestada pelo Estado, no caso o custeio do exercício do poder de polícia e dos

serviços públicos específicos e divisíveis prestados ao contribuinte ou postos à sua

disposição. Não pode o produto da arrecadação da taxa ser transferido para outros fins. É

exatamente esse o fim estabelecido pela lei municipal 1.010/06 em seu artigo 4º, que

estabelece que os “recursos serão destinados exclusivamente ao financiamento do sistema

de coleta de lixo residencial municipal”.

Segundo ensinamento de Kiyoshi Harada, “podemos conceituar a taxa como

um tributo que surge da atuação estatal diretamente dirigida ao contribuinte, quer pelo

exercício do poder de polícia, quer pela prestação efetiva ou potencial de um serviço

público específico e divisível, cuja base de cálculo difere, necessariamente, da de qualquer

imposto.” 1

Sendo específico e divisível, o serviço público pode ser prestado de forma

individualizada ao usuário, de modo mensurável e quantificável, como ocorre na coleta de

lixo residencial.

Segundo a Constituição Federal, o Estado é autorizado a instituir contribuições

de dois tipos: contribuições de melhoria (art. 145, III, CF) e contribuições especiais (art.

1 HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 19º edição revista e ampliada. Editora Atlas S.A.. São Paulo, 2010, pág. 308.

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149, CF). Como se mostrará a seguir, o tributo em questão não se enquadra em nenhuma

dessas duas hipóteses.

A contribuição de melhoria (art. 145, III, CF) é um tributo vinculado à

valorização de imóvel decorrente de obra pública. A valorização decorrente da obra pública

é requisito ínsito dessa espécie tributária, sendo esse seu fato gerador, consoante

entendimento do STF (RTJ 89/598, 105/434, 138/600, 138/614, etc), ou seja, inexistindo

valorização imobiliária, não há como cobrar a contribuição de melhoria.

Dispõe o artigo 1º do Decreto-Lei 195/67: “A Contribuição de Melhoria,

prevista na Constituição Federal tem como fato gerador o acréscimo do valor do imóvel

localizado nas áreas beneficiadas direta ou indiretamente por obras públicas.” O artigo

81 do CTN preceitua: “A contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados,

pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, é

instituída para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra valorização

imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o

acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.”

A respeito da contribuição de melhoria, afirma Kiyoshi Harada:

A sua cobrança é legitimada sempre que da execução de obra pública decorrer valorização imobiliária, fundada no princípio da equidade. De fato, não é justo que toda comunidade arque com o custo de uma obra pública que traz benefício direto e específico a certas pessoas. (...) A maior dificuldade na cobrança dessa espécie tributária está na delimitação da zona de influência benéfica da obra pública. (...) Isso explica a razão pela qual a maioria das municipalidades vêm cobrando a contribuição de melhoria somente em relação à execução de obras de pavimentação de vias e logradouros públicos, hipótese em que é fácil a delimitação da zona de influência benéfica. 2

     As hipóteses taxativas de cobrança de contribuição de melhoria estão

normatizadas no artigo 2º do Decreto-Lei 195/67. Nota-se que coleta de lixo residencial não

está prevista neste artigo:

Será devida a Contribuição de Melhoria, no caso de valorização de imóveis de propriedade privada, em virtude de qualquer das seguintes obras públicas:        I - abertura, alargamento, pavimentação, iluminação, arborização, esgotos pluviais e outros melhoramentos de praças e vias públicas;

2 Op. Cit., págs. 310 e 311.

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        II - construção e ampliação de parques, campos de desportos, pontes, túneis e viadutos;        III - construção ou ampliação de sistemas de trânsito rápido inclusive todas as obras e edificações necessárias ao funcionamento do sistema;        IV - serviços e obras de abastecimento de água potável, esgotos, instalações de redes elétricas, telefônicas, transportes e comunicações em geral ou de suprimento de gás, funiculares, ascensores e instalações de comodidade pública;        V - proteção contra secas, inundações, erosão, ressacas, e de saneamento de drenagem em geral, diques, cais, desobstrução de barras, portos e canais, retificação e regularização de cursos d’água e irrigação;        VI - construção de estradas de ferro e construção, pavimentação e melhoramento de estradas de rodagem;        VII - construção de aeródromos e aeroportos e seus acessos;        VIII - aterros e realizações de embelezamento em geral, inclusive desapropriações em desenvolvimento de plano de aspecto paisagístico.

Já no tocante às contribuições especiais, também denominadas apenas de

“contribuições”, tem-se que são aquelas instituídas visando a finalidades predeterminadas,

que atendam ao interesse de um grupo de contribuintes em especial, sem que, no entanto, se

possa verificar ações estatais específicas e divisíveis. É o que nos ensina Leandro Paulsen:

Há situações em que o Estado atua relativamente a um determinado grupo de contribuintes. Não se trata de ações gerais, a serem custeadas por impostos, tampouco específicas e divisíveis, a serem custeadas por taxa, mas de ações voltadas a finalidades específicas que se referem a determinados grupos de contribuintes, de modo que se busca, destes, o seu custeio através de tributo que se denomina de contribuições. Não pressupondo nenhuma atividade direta, específica e divisível, as contribuições não são dimensionadas por critérios comutativos, mas por critérios distributivos, podendo variar conforme a capacidade contributiva de cada um.3

A Contribuição de Melhoria do Asseio Público, por se tratar de utilização de

serviço público específico e perfeitamente individualizável, não pode de modo algum ser

considerado uma contribuição.

Nota-se que o fato gerador da obrigação é fator determinante para a

classificação do tributo em uma espécie específica. Prescreve o artigo 4º do Código

Tributário Nacional:

3 PAULSEN. Leandro. Curso de direito tributário: completo. 4. ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2012

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Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la: I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei; II - a destinação legal do produto da sua arrecadação.

Segundo Sérgio Pinto Martins, “não importa o nome que se dá ao tributo, se

imposto, contribuição, etc., mas sim o seu fato gerador. Pouco importam também os fins

determinados pela lei para arrecadar o tributo, mas qual é o seu fato gerador.”4

Observa-se, portanto, que muito embora o legislador tenha utilizado a

denominação “contribuição de melhoria do asseio público” (art. 1º da lei municipal

1.010/06: “Fica instituída, para financiar o sistema municipal de coleta de lixo residencial,

a Contribuição de Melhoria do Asseio Público”), tal espécie tributária tem natureza jurídica

de taxa, pois é um tributo cobrado em virtude da prestação de um serviço público específico

e divisível (coleta de lixo residencial).

A cobrança de contribuição de melhoria é legitimada sempre que uma obra

pública implicar, direta ou indiretamente, em valorização imobiliária. A lei 1.010/06 não

prevê nenhuma obra pública que valorize determinados imóveis, portanto jamais a natureza

jurídica do tributo será de contribuição de melhoria. Além disso, a coleta de lixo não é

hipótese narrada no artigo 2º do Decreto-Lei 195/67, portanto não há autorização legal para

sua cobrança como contribuição de melhoria.

Não é plausível considerar como obra o que na verdade é prestação de serviço

público de coleta de lixo. A título de ilustrar este ponto, veja-se que o conceito de obra é

definido legalmente como: toda construção, reforma, fabricação, recuperação ou ampliação,

realizada por execução direta ou indireta. Esse conceito é muito diferente do conceito de

serviço público de coleta de lixo residencial que pode ser definido como: conjunto de

atividades operacionais de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destino final do lixo

doméstico.

Portanto, se a “Contribuição de Melhoria do Asseio Público” tem como fato

gerador a prestação de serviço público, não pode ser considerada efetivamente uma

contribuição de melhoria, visto que esta tem como fato gerador a valorização imobiliária

4 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de Direito Tributário. 9ª edição. Editora Atlas. São Paulo, 2010, pág. 80.

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decorrente de obra pública. Se a taxa tem como fato gerador a prestação de serviços

públicos, tais como a coleta de lixo residencial, que é divisível, específica e de utilização

efetiva, temos que, necessariamente, o tributo tratado na lei tem natureza jurídica de taxa e

não de contribuição de melhoria.

Argumentos de que o tributo instituído por essa lei municipal teria natureza

jurídica de imposto também não podem prosperar. Os impostos, conforme a definição

contida no art. 16 do Código Tributário Nacional, são tributos cuja obrigação incide sobre

fato gerador independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.

Eles são exações desvinculadas de qualquer atuação estatal, decretadas exclusivamente em

função do jus imperii do Estado. O imposto sempre representa uma retirada de parte da

riqueza do particular contribuinte, respeitada a capacidade contributiva deste.

Deste modo, não tem natureza jurídica de imposto o tributo que é cobrado em

face do exercício de atividades próprias do Estado, como, no caso, a prestação de um

serviço público.

Ora, é forçoso reconhecer que a Contribuição de Melhoria do Asseio Público

está diretamente relacionada à prestação do serviço público de coleta de lixo residencial. O

critério utilizado pela lei é o lixo recolhido, deixando claro que o fato gerador é a efetiva

prestação do serviço público de coleta do lixo.

As afirmações acima, todas lastreadas na letra da lei e na doutrina das melhores

penas é lastreada também, como não podia deixar de ser, por sólida e pacificada

jurisprudência das cortes superiores, formalizadas inclusive em diversas súmulas do STF,

algumas das quais vinculantes, logo com força análoga a de lei, como se verá a seguir.

A fim de que não pairem dúvidas, há de se reconhecer, especialmente

considerando o quanto dispõe a Súmula Vinculante nº 19 do STF, que não há qualquer

ilegalidade no ato praticado por um Município, ao instituir a cobrança de taxa visando

exclusivamente o custeio da prestação dos serviços públicos de coleta, remoção e

tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis, competência que lhe

foi atribuída no caput do artigo 145 da  Constituição Federal de 1988:

STF – Súmula Vinculante 19 – A taxa cobrada exclusivamente em razão dos serviços públicos de coleta, remoção ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis, não viola o artigo 145, II, da Constituição Federal.

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No entanto, ao instituí-la, em obediência ao “princípio da legalidade”,  o ente

público municipal estará sempre obrigado, devido à  limitação expressa contida tanto

no inciso II, como no § 2º do mesmo dispositivo constitucional, em restringir a cobrança da

Taxa, à ocorrência do fato gerador imposto pelo legislador constitucional,  qual seja,

a utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao

contribuinte ou postos a sua disposição. O legislador, ainda, proíbe que as taxas a serem

instituídas, tenham base de cálculo própria de impostos.  Converge com essa vedação legal

o entendimento da mais alta corte. Vejamos, pois parte de extensa ementa do TRF-2

versando especificamente sobre essa vedação (trata-se da apelação cível no processo

20015105312254/RJ, julgado pela 6ª Turma, datando a decisão de 26.03.2003):

(...) CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO – TAXA DE COLETA DE LIXO E LIMPEZA PÚBLICA (TCLLP) – APURAÇÃO DA TAXA EM FUNÇÃO DE ELEMENTOS UTILIZADOS NA APURAÇÃO DO IPTU – INIDONEIDADE DO TRIBUTO, COMO INSTITUÍDO PELO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. - A teor do art. 107 do Código Tributário do Município do Rio de Janeiro (CTMRJ - Lei n.º 691, de 24.12.1984, com redação dada pela Lei n.º 2.277, de 28.12.1994, então em vigor), a base de cálculo da “taxa” de coleta de lixo e limpeza pública era apurada em função da área, da localização e da destinação do imóvel que lhe serve de referência, elementos os quais são, também, considerados na apuração do valor venal do imóvel, base de cálculo do Imposto sobre a propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) (CTMRJ, art. 61, caput e §§ 1º e 2º). - Circunstância que, só por si, vulnera a limitação ao poder de tributar disciplinada especificamente no preceito do art. 145, § 2º, da Constituição Federal, expresso ao estatuir que “as taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos”. Precedentes do Plenário do C. STF (RE n.º 199.969-SP, RE n.º 206.777-SP). - Apelação parcialmente provida. (Grifos nossos).

O STJ  tem reconhecido a legalidade da cobrança das referidas taxas, quando

utilizados os critérios de especificidade e divisibilidade, fazendo menção em certos

julgados, a uma base de cálculo contendo 

(…) o custo da atividade estatal, repartido entre os proprietários dos imóveis, tendo como critério a utilização do imóvel, se comercial ou residencial, em função de sua localização, área edificada, tendo-se em conta, ainda, a subdivisão da zona urbana, com aplicação anual, por metro quadrado, de um percentual da unidade fiscal criada pelo município, obedecendo-se a um escalonamento previsto em lei.

No entanto, tais parâmetros não são apresentados pelo Município de Cidade

Limpa, que se atém em cobrar os valores resultado da multiplicação do valor venal do

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imóvel residencial. Assim, existe a conclusão lógica de que, o que contraria o princípio da

legalidade não é a cobrança da taxa em si,  mas uma cobrança que não tenha como base o

fato gerador previsto na Lei Magna:  a utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos

específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição.

Ora, se o lixo é proveniente de imóveis, pode-se identificar como usuários do

serviço os proprietários de tais bens.  Por este motivo, a Corte tomou o cuidado de inserir a

palavra exclusivamente no enunciado sumular, pois existe manifesta inconstitucionalidade

quando a taxa também é destinada à limpeza dos logradouros públicos ou a qualquer outro

serviço de natureza indivisível.  (…)     Pelo exposto, um serviço reúne as características da

especificidade e da divisibilidade, podendo ser remunerado por taxa, quando para ele é

possível, tanto ao Estado quanto ao contribuinte, a utilização da frase:  “Eu te vejo e tu me

vês”.   O contribuinte “vê” o Estado prestando o serviço, pois sabe exatamente por qual

serviço está pagando (especificidade atendida) e o Estado “vê” o contribuinte, uma vez

que consegue precisamente identificar os usuários (divisibilidade presente).”

Lamentavelmente,  após ver reconhecida a sua inconstitucionalidade pelo STF,

alguns entes municipais tendem a “maquiar”  o custeio com a prestação dos serviços,

convertendo-o em contribuição de melhoria, daí o seu não enquadramento ao quanto dispõe

a referida Súmula Vinculante 19 do STF.

Veja-se ainda outro exemplo oriundo da jurisprudência sumulada do STF que

permite uma analogia com o caso em tela, ficando reforçada a proibição da coincidência da

base de cálculo entre taxa e imposto:

SÚMULA Nº 595 É INCONSTITUCIONAL A TAXA MUNICIPAL DE CONSERVAÇÃO DE ESTRADAS DE RODAGEM CUJA BASE DE CÁLCULO SEJA IDÊNTICA À DO IMPOSTO TERRITORIAL RURAL.

De onde conclui-se que as taxas e os impostos devem ter bases de cálculo

distintas conforme já mencionado acima e expressamente previsto tanto na CF/1988, §2º do

art. 145: “As taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos”, como no CTN, no

§ único do seu art. 77: “A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos

que correspondam a imposto nem ser calculada em função do capital das empresas”.

Sérgio Pinto Martins comenta casos de tomada de base de cálculo

inconstitucional da taxa:

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As taxas, por sua própria natureza, representam o ressarcimento do valor da atuação estatal a elas correspondente. Somente podem ser medidas com base nos custos dessa mesma atuação. Inútil, errada e inconstitucional é a tomada, para base de cálculo da taxa de remoção de lixo domiciliar (...) dos componentes quantitativos próprios do IPTU, tais como: área construída, testada do imóvel, localização, categoria, etc.5.

O parágrafo primeiro do artigo 3º da lei municipal em comento estabelece que

“Para efeitos deste artigo, presume-se que a quantidade mensal de lixo residencial é o

resultado da multiplicação do valor venal do imóvel residencial por 10-6” (grifo

acrescido). O Código Tributário Nacional, por sua vez, no artigo 33 estabelece para o IPTU

que: "A base do cálculo do imposto é o valor venal do imóvel” (grifo acrescido).

Ora, além do legislador confundir os conceitos de contribuição de melhoria com

o de taxa, ele ainda cobrou do contribuinte uma taxa inconstitucional! O valor venal do

imóvel residencial é a base de cálculo do IPTU (imposto predial e territorial urbano).

Conforme acima mencionado, a Constituição Federal e o Código Tributário Nacional

vedam que uma taxa tenha a mesma base de cálculo de um imposto, o que ocorreu no caso.

A lei 1.010/96 violou o § 2º do art. 145 da CF, pois contrariou a proibição de se estabelecer

para taxas as bases de cálculo de impostos. A “Contribuição de Melhoria do Asseio

Público” é, portanto, uma taxa inconstitucional.

E, por fim, apenas para afastar de vez qualquer possibilidade de que o fisco do

Município recorra a verdadeiras "chicanas jurídicas" vindo a afirmar, por exemplo, que o

§2º do art. 3º da lei teria o condão de retira a característica de coercibilidade da taxa,

podendo-se então entendê-la com preço público, também essa alegação deve ser

veementemente afastada, pois sequer preço público é espécie tributária.

Ocorre que se a base de cálculo para aferição do valor do tributo fosse

unicamente a declaração do contribuinte, não haveria nenhum problema em relação à

cobrança dessa "contribuição", seja ela uma taxa, seja ela um preço público. A grande

questão, porém, é que, enquanto cada contribuinte individualmente não comparecer à

prefeitura, munido de todos os documentos probatórios necessários para solicitar a revisão

dos valores pagos, todos eles serão vítimas de uma cobrança compulsória que se sustenta

em uma base de cálculo vedada pela constituição.

5 MARTINS, Sérgio Pinto. Op. Cit. pág. 96.

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Logo essa presunção de quantidade de lixo baseada no valor venal do imóvel,

que se mantem até que se prove que se produz uma quantidade de lixo menor ou mesmo

que não se produz lixo algum, é incompatível com a natureza voluntária e contratual dos

preços públicos e com a natureza de taxa, conforme ficou demonstrado acima. O município

estaria cobrando dos contribuintes sem saber antes se o serviço é efetivamente prestado,

não sendo possível enxergar essa cobrança como fonte de receita originária, onde o Estado

deve estar em pé de igualdade com o cidadão.

Para que a contribuição de melhoria de asseio público pudesse ser considerada

um preço público, o município deveria se abster de efetuar a cobrança até que fosse feita a

aferição da quantidade de lixo produzida por cada proprietário de imóvel, sendo esse o

único critério apto a definir o valor da contribuição, operação de tal monta que é, por

diversos fatores impossível de levar a cabo, até mesmo pela custosa instalação de balanças

para pesar o lixo em cada residência. Afastada esse hipótese não tributária e enviesada fica,

pois, configurado o exercício de poder de império por parte do Poder Público pelas vias

ilegais e inconstitucionais já acima demonstradas.

Há de se observar o argumento do Ministro Carlos Britto de que muitas vezes a

cobrança de taxa do serviço de recolhimento domestico de lixo se torna uma ofença ao

princípios da razoabilidade, pois não há correlação alguma o valor do imóvel a produção de

lixo neste imóvel. A questão é que a taxa deve corresponder, como contraprestação, a um

serviço efetivo utilizado ou colocado à disposição. (RE 576321 QO-RG / SP, Relator(a): 

Min. RICARDO LEWANDOWSKI)

Em face do exposto, portanto, observa-se que o contribuinte não tem o dever de

pagar a referida “contribuição de melhoria”, em virtude de sua patente

inconstitucionalidade.