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PODER JUDICIÁRIO DE PERNAMBUCO SEGUNDA VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DA CAPITAL RUA JOÃO FERNANDES VIEIRA, 405, BOA VISTA, RECIFE CEP 50050-200 FONE: (81) 31815905 e FONE/ FAX: (081) 31815906 PROCESSO: Nº 001.2005.XXXXXX-X AÇÃO: ADOÇÃO NACIONAL BILATERAL REQUERENTES: XXXXXX XXXXXXX XX XXXXXX e XXXXX XXXXXXX XXXXXXX ADOTANDO: XXXXXXXXXXX XX XXXXXXXXXXXXX Ementa: Ação de Guarda transformada em Ação de Adoção Nacional Bilateral. Estudo psicossocial favorável ao pedido de adoção. Consentimento materno e contestação paterna. Parecer do Ministério Público pela procedência do pedido. Reconhecimento de entidade familiar homoafetiva. Comprovação de fortes vínculos afetivos do adotado em relação aos pais adotivos. Procedência do pedido e Concessão de adoção de criança por família constituída por duas pessoas do mesmo sexo. Extinção do Poder Familiar dos Genitores. SENTENÇA de Nº XXX/05/2011-EBM VISTOS ETC. XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX, XXXXXXXXXXX, XXXXXXXX, XXXXXXXXXXXXXXXXXXXX, CPF Nº XXXXXXXXXXXXXX, RG Nº XXXXXXXXX XXXX, devidamente qualificado nos autos, ingressou perante o Juízo da 1ª Vara da Infância e Juventude do Recife com a Ação de Guarda da criança XXXXX XX XXXXXXX, com base no artigo 33 e seus parágrafos da Lei 8.069/90, alegando que a criança é filho de XXXXX XXXXXXX XX XXXXXXX e de pai ignorado, sendo a genitora da criança ainda adolescente e devidamente representada pelos seus genitores XXXXXXX XXXXXXX XXXXXXXX XX XXXX X XXXXXXXX XXXXXXX XX XXXXXXX. Juntou os documentos de fls.05/26 exigidos para o prosseguimento da ação, e houve despacho inicial solicitando mais documentos o que foi atendido às fls. 30/44. Novo despacho de fls. 46 referindo-se ao desejo do requerente de adotar a criança e que seja intimado para dizer da transformação da ação de guarda em ação de adoção. Petição de fls. 47 pedindo a conversão par adoção, parecer do MP concordando às fls.49 e despacho às fls. 51 determinando a conversão par ação de adoção e envio à distribuição par a 2ª Vara da Infância e Juventude do Recife. Às fls.53 decisão inicial deste juízo recebendo a presente ação de adoção e concedendo a guarda para fins de estágio de convivência, e determinando a designação de audiência, com Termo de Guarda expedido às fls. 55. Despacho de fls. 62 determinando a Citação da genitora e seus genitores e a juntada do relatório psicossocial para fins de apreciar o pedido de antecipação de audiência. Relatório psicossocial de fls. 63/66 informando que o requerente tem um companheiro com vida em comum e que juntos decidiram adotar uma criança, e que a genitora da criança informou que vivia com o pai da criança e não foi aceita a gravidez porque o genitor se afirma estéril e a família dele não aceitou a criança, e a própria família dela genitora também não aceitou a gravidez, pois já cuidavam do primeiro filho dela genitora. Ainda informa que o Sr. XXXXX tem condições de receber a criança em companhia do requerente, e por tudo o que foi relatado emitiram parecer favorável à adoção da criança pelo requerente. Despacho de fls. 67 determinando que se aguarde data designada para audiência de instrução e julgamento. Petição de fls. 70/72 do requerente solicitando juntada de declaração e certidão de vínculo empregatício e aprovação de conclusão de XXXXX XX XXXXXXXX XX XXXXXXX XX XXXXXXXXXX XXXX XXXX. Nova petição de fls. 74/91 do Sr. XXXXX XXXXXXX XXXXXXX XXXXXXX, XXXXXXXXXX, XXXXXXXX, XXXXXXXXX XX XXXX XXXXXXXX, Identidade de XXXXXXXXXXXXXXXXXXXX e CPF de NºXXXXXXXXXXXXXXX, residente domiciliado à Rua XXXXX XX XXXXXXXXX, XXX, XXXXXXXXX, XXXXXXXX, em XXXXXX, através de advogado legalmente habilitado requerendo o ADITAMENTO da petição inicial para constar no pólo ativo da presente Ação de Adoção da criança XXXXXXXXXXXXXXXX, alegando viver em uma convivência de orientação homossexual com o requerente XXXXX XXXXXXX XX XXXXXX, formando uma entidade familiar, possuindo situação sólida financeiramente e condições de propiciar os cuidados necessários ao poder familiar. Juntada às fls. 77/81 de procuração, documento de identidade, declaração de matrícula em Instituição de Nível Superior, fotografias da criança em companhia dos requerentes, e às fls. 83/91 declaração de não possuir

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  • PODER JUDICIRIO DE PERNAMBUCO

    SEGUNDA VARA DA INFNCIA E DA JUVENTUDE DA CAPITAL

    RUA JOO FERNANDES VIEIRA, 405, BOA VISTA, RECIFE CEP 50050-200

    FONE: (81) 31815905 e FONE/ FAX: (081) 31815906

    PROCESSO: N 001.2005.XXXXXX-X

    AO: ADOO NACIONAL BILATERAL

    REQUERENTES: XXXXXX XXXXXXX XX XXXXXX e XXXXX XXXXXXX XXXXXXX ADOTANDO:

    XXXXXXXXXXX XX XXXXXXXXXXXXX

    Ementa: Ao de Guarda transformada em Ao de Adoo Nacional Bilateral. Estudo

    psicossocial favorvel ao pedido de adoo. Consentimento materno e contestao paterna.

    Parecer do Ministrio Pblico pela procedncia do pedido. Reconhecimento de entidade

    familiar homoafetiva. Comprovao de fortes vnculos afetivos do adotado em relao aos pais

    adotivos. Procedncia do pedido e Concesso de adoo de criana por famlia constituda por

    duas pessoas do mesmo sexo. Extino do Poder Familiar dos Genitores.

    SENTENA de N XXX/05/2011-EBM

    VISTOS ETC.

    XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX, XXXXXXXXXXX, XXXXXXXX, XXXXXXXXXXXXXXXXXXXX,

    CPF N XXXXXXXXXXXXXX, RG N XXXXXXXXX XXXX, devidamente qualificado nos autos, ingressou

    perante o Juzo da 1 Vara da Infncia e Juventude do Recife com a Ao de Guarda da criana XXXXX XX

    XXXXXXX, com base no artigo 33 e seus pargrafos da Lei 8.069/90, alegando que a criana filho de XXXXX

    XXXXXXX XX XXXXXXX e de pai ignorado, sendo a genitora da criana ainda adolescente e devidamente

    representada pelos seus genitores XXXXXXX XXXXXXX XXXXXXXX XX XXXX X XXXXXXXX XXXXXXX XX

    XXXXXXX. Juntou os documentos de fls.05/26 exigidos para o prosseguimento da ao, e houve despacho

    inicial solicitando mais documentos o que foi atendido s fls. 30/44. Novo despacho de fls. 46 referindo-se ao

    desejo do requerente de adotar a criana e que seja intimado para dizer da transformao da ao de guarda

    em ao de adoo. Petio de fls. 47 pedindo a converso par adoo, parecer do MP concordando s fls.49 e

    despacho s fls. 51 determinando a converso par ao de adoo e envio distribuio par a 2 Vara da

    Infncia e Juventude do Recife.

    s fls.53 deciso inicial deste juzo recebendo a presente ao de adoo e concedendo a guarda para fins de

    estgio de convivncia, e determinando a designao de audincia, com Termo de Guarda expedido s fls. 55.

    Despacho de fls. 62 determinando a Citao da genitora e seus genitores e a juntada do relatrio psicossocial

    para fins de apreciar o pedido de antecipao de audincia.

    Relatrio psicossocial de fls. 63/66 informando que o requerente tem um companheiro com vida em comum e

    que juntos decidiram adotar uma criana, e que a genitora da criana informou que vivia com o pai da criana e

    no foi aceita a gravidez porque o genitor se afirma estril e a famlia dele no aceitou a criana, e a prpria

    famlia dela genitora tambm no aceitou a gravidez, pois j cuidavam do primeiro filho dela genitora. Ainda

    informa que o Sr. XXXXX tem condies de receber a criana em companhia do requerente, e por tudo o que foi

    relatado emitiram parecer favorvel adoo da criana pelo requerente.

    Despacho de fls. 67 determinando que se aguarde data designada para audincia de instruo e julgamento.

    Petio de fls. 70/72 do requerente solicitando juntada de declarao e certido de vnculo empregatcio e

    aprovao de concluso de XXXXX XX XXXXXXXX XX XXXXXXX XX XXXXXXXXXX XXXX XXXX.

    Nova petio de fls. 74/91 do Sr. XXXXX XXXXXXX XXXXXXX XXXXXXX, XXXXXXXXXX, XXXXXXXX,

    XXXXXXXXX XX XXXX XXXXXXXX, Identidade de N XXXXXXXXXXXXXXXXXXXX e CPF de

    NXXXXXXXXXXXXXXX, residente domiciliado Rua XXXXX XX XXXXXXXXX, XXX, XXXXXXXXX,

    XXXXXXXX, em XXXXXX, atravs de advogado legalmente habilitado requerendo o ADITAMENTO da petio

    inicial para constar no plo ativo da presente Ao de Adoo da criana XXXXXXXXXXXXXXXX, alegando

    viver em uma convivncia de orientao homossexual com o requerente XXXXX XXXXXXX XX XXXXXX,

    formando uma entidade familiar, possuindo situao slida financeiramente e condies de propiciar os

    cuidados necessrios ao poder familiar.

    Juntada s fls. 77/81 de procurao, documento de identidade, declarao de matrcula em Instituio de Nvel

    Superior, fotografias da criana em companhia dos requerentes, e s fls. 83/91 declarao de no possuir

  • parentesco com a criana, atestado de sanidade fsica e mental, declaraes de boa conduta, antecedentes

    criminais e certido de distribuio da Justia Federal.

    Autos com vistas ao Ministrio Pblico que inicialmente pediu o indeferimento do pedido de aditamento e a

    intimao do primeiro requerente para dizer do desejo de prosseguir com o feito apenas em seu nome.

    Deciso deste Juzo de fls. 96/96v. indeferindo o pedido do Ministrio Pblico e DEFERINDO o ADITAMENTO

    DA PETIO INICIAL, motivando a deciso sob a alegao de que no se pode negar o exerccio do direito

    constitucional de petio e a um devido processo legal para conhecimento e julgamento do pedido judicial.

    Determinando tambm designao de audincia e estudo psicossocial para fins de instruir a audincia de

    instruo e julgamento.

    Citao da genitora j maior de idade, nascida em 20/01/1988, conforme documento de fls. 07 devidamente

    cumprida s fls. 98/99.

    Juntada de relatrio psicossocial de fls. 100/107, com parecer favorvel ao pedido de adoo dos requerentes

    para a criana XXXXX XX XXXXX.

    Audincia de instruo s fls. 109/113, com oitiva da genitora XXXXX XXXXXXX XX XXXXXXX, que informou

    os nomes de dois supostos genitores XXXXX XX XXXX seu companheiro e XXXXX com quem teve um namoro.

    Tambm foram ouvidos as trs testemunhas e os dois requerentes.

    O Ministrio Pblico nesta ocasio no agravou contra a deciso que recebeu o aditamento e solicitou a citao

    dos dois supostos genitores da criana conforme os nomes e os endereos fornecidos pela genitora em

    audincia, decidindo o Juiz pela citao e intimao para ouvir os supostos genitores em audincia.

    Citado apenas o suposto genitor XXXXX XXXXXXXXX XX XXXXX s fls. 115/116 e no citado o suposto genitor

    XXXXX conforme certido de fls. 130.

    Contestao do suposto genitor XXXXX XX XXXXX de fls. 118/125, alegando ser o pai da criana XXXXX e que

    a genitora entregou a criana sem a sua anuncia, e entrou com uma ao de investigao de paternidade na

    cidade de XXXXXXXX, e que deseja a guarda da criana e no concorda com a presente ao de adoo.

    s fls. 127/129 e 137/134 os requerentes ofereceram rplica contestao do suposto genitor requerido

    alegando que, a genitora com a participao de seus genitores, entregou a criana em confiana aos

    requerentes, e assim solicitam a procedncia do pedido de adoo.

    s fls. 136 parecer do Ministrio Pblico pelo indeferimento de regulamentao de visitas pelo suposto genitor,

    por entender ser temerria esta autorizao antes de confirmada a paternidade, e ainda que seja oficiado

    Escola XXXXXXXXXX XXXXX XXXXX XXXXXXX solicitando o nome e endereo de algum aluno com o nome

    de XXXXX que tenha estudado na XX srie no ano de XXXXX.

    Deciso de fls. 137/137v. deferindo integralmente a cota do Ministrio Pblico e determinando que seja

    oficiado comarca de Paulista solicitando cpia dos autos de investigao de paternidade referido, que tambm

    seja oficiado XXXXXX XXXXXXXXXX XXXXX XXXXX XXXXXXX solicitando informao sobre o suposto

    genitor XXXXX, e que os envolvidos genitora e suposto genitor XXXXXX XXXX sejam submetidos a exame de

    DNA, e ofcio distribuio para pesquisa de antecedentes do suposto genitor.

    Petio de fls. 142/148 informando que o suposto genitor responde por ocorrncia policial por crime de injria e

    de ameaa contra a genitora, e que o mesmo responde por outras aes conforme distribuies na Vara de

    Crimes contra a Criana e Adolescente e na Vara de Ato Infracional.

    s fls. 151/204 juntada de cpia dos autos da ao de investigao de paternidade datada de 19/06/2006 tendo

    como autor o Sr. XXXXX XXXXXXXXX XXXXXXXX como r a Sra. XXXXX XXXXXXX XX XXXXXXX,

    informando sobre ocorrncia policial datada de 06/10/2005 do Sr. XXXXXX reclamando da Sra. XXXXXXXX

    sobre o desaparecimento do filho e cpia de comunicao do Programa XXXXXXXX GPCA datada de

    05/10/2005. Nesta ao de investigao de paternidade consta a contestao da genitora alegando que apenas

    viveu com o autor por 01(hum) ms e no por 04(quatro) meses e que no tem certeza que ele o pai da

    criana porque esteve com outro namorado neste mesmo tempo, pois o autor negou a paternidade,

    apresentando documentos da criana e comprovante de endereo.

    Cpia de termo de audincia da ao de investigao de paternidade onde as partes concordaram em fazer o

    exame de DNA.

    Parecer do Ministrio Pblico de fls. 206/207 alegando que os autos se encontram instrudos e que aguada o

    resultado do exame de DNA para apresentar o seu parecer.

    Deciso deste juzo para determinar o prosseguimento da instruo da presente ao independente do

    resultado do exame de DNA, pois a alegao de afirmativa de paternidade e no de negativa, determinando

    designao de audincia para ouvir todos, inclusive o suposto genitor, a genitora e sua me, os requeridos e

    testemunhas arroladas pelo suposto genitor.

    Audincia realizada s fls. 22/227 onde foram ouvidos a genitora, a me da genitora, o suposto genitor e sua

    me e as trs testemunhas do suposto genitor. O juzo determinou a realizao de novo estudo psicossocial na

    famlia do suposto genitor.

  • Petio de fls. 234/247 do genitor XXXXX XXXXXXXXX XX XXXXX juntando o exame de DNA confirmando a

    paternidade da criana XXXXX XX XXXXXXX e requerendo a regulamentao de visita e a entrega da criana

    para sua guarda paterna.

    Parecer do Ministrio Pblico de fls. 248v. solicitando a realizao de novo estudo psicossocial, a reiterao

    dos ofcios de fls.229, 230 e 231, pugnando por nova vista para dizer sobre a regulamentao de visitas, e a

    intimao dos requerentes para dizer sobre o pedido de visitas.

    Despacho do juzo deferindo integralmente a cota do Ministrio Pblico.

    Juntada de antecedentes criminais que no se referem qualificao do genitor.

    Despacho de impulso processual de fls. 259 deferindo o pedido do Ministrio Pblico para fins de aguardar o

    novo relatrio psicossocial e reiterar o ofcio de fls. 231.

    Juntada de relatrio psicossocial de fls. 264/268 informando que o genitor deseja receber o filho XXXXX e

    entregar a sua genitora av paterna para realizar um sonho dela em criar um neto, e que se a av deixar a

    criana poder ir dormir na casa dele genitor que vive com outra companheira que tem trs filhos. Ao final o

    parecer pela ausncia de condies e fundamentos mnimos que apontem que a criana XXXXX encontre um

    espao nesta famlia na qual o seu lugar de filho esteja garantido por seu genitor.

    Petio de fls. 270 dos requerentes com juntada de escritura pblica de Unio Homoafetiva com pacto de

    comunho de bens e declarao de matrcula escolar da criana XXXXX em escola particular.

    Juntada s fls. 278/287 de cpias do exame de DNA, enviado pelo juzo de XXXXXXXX confirmando a

    paternidade de XXXXX XXXXXXXXX XX XXXXX em relao criana XXXXX XX XXXXXXX.

    Cota do Ministrio Pblico de fls. 289/292 requerendo designao de audincia para busca de uma sada

    consensual sobre as visitaes, de logo opinando favorvel.

    Deciso deste juzo de fls. 293/293v, indeferindo o pedido do Ministrio Pblico para designao de audincia e

    autorizao de regulamentao de visitas, afirmando que os autos se encontram em fase de alegaes finais e

    para sentena e que a deciso sobre visitas dever ocorrer de forma definitiva por ocasio da sentena final

    evitando prejuzos e instabilidade para a criana.

    Alegaes finais dos requerentes s fls. 296/297 solicitando a procedncia do pedido e a negativa do direito de

    visita.

    Intimadas as advogadas do genitor atravs de pauta publicada no Dirio Oficial, foi certificado s fls. 299v. da

    ausncia de apresentao de alegaes finais do requerido.

    Deciso de fls. 299v. nomeando Curador o Bel. XXXXX XXXXXXXXXXX para fins de apresentar alegaes

    finais, o que foi juntado aos autos s fls.301/306.

    s fls. 308/310 o Juiz autorizou a juntada das alegaes finais do requerido apresentadas pela advogada

    nomeada, que requereu a improcedncia do pedido e a entrega da criana ao genitor.

    Parecer do Ministrio Pblico de fls. 311 solicitando audincia de conciliao e estudo psicossocial pelo NARF e

    NAEF, o que foi deferido pelo juzo s fls. 311v, que determinou novo estudo psicossocial e audincia de

    conciliao.

    Relatrio psicossocial subscrito pelo NARF e pelo NAEF s fls. 313/319, aduzindo pela permanncia da criana

    com os requerentes e pela inviabilidade de conciliao entre as partes.

    Audincia de tentativa de conciliao s fls. 321, sem sucesso por manifestao das partes pelo julgamento

    final do processo.

    Alegaes finais dos requerentes s fls. 323.

    Alegaes finais do requerido s fls. 327/329.

    Alegaes finais do Curador s fls. 331/333.

    Parecer do Ministrio Pblico requerendo apresentao de novo relatrio do NARF e do NAEF.

    Deciso deste juzo indeferindo o pedido do Ministrio Pblico e determinando vistas para a cota final do

    Ministrio Pblico.

    Parecer final do Ministrio Pblico apresentado s fls. 337/356.

    Conclusos.

    o Relatrio.

    Passo a decidir.

    Autos conhecidos para sentena somente nesta data, em razo do acmulo de servio desta Vara

    Especializada, e pela complexidade da causa.

    No h preliminares a conhecer e decidir, assim no mrito do pedido h que ser consideradas as

    reiteradas apresentaes de estudos psicossociais e audincias realizadas, bem como de logo, esclareo que

    at a presente data no houve qualquer apresentao de agravo s decises tomadas no curso processual,

    nem foram juntadas aos autos informaes de alguma outra ao judicial que modifique os fatos apurados e

    conhecidos nesta ao de adoo.

  • O pedido no se enquadra nas hipteses de excluso do artigo 50, 13 da Lei 12.010/2009, por tratar-

    se de distribuio ocorrida anterior referida lei, ademais, mesmo que assim no se procedesse, a criana tem

    idade superior a 3(trs) anos de idade, fato este que exclui a limitao do inciso 3 do mesmo pargrafo e

    artigo.

    Trata-se de pedido de adoo realizado por dois homens que vivem em unio estvel de orientao

    homoafetiva familiar[1] para o exerccio do poder familiar referente a uma criana de 5 (cinco) anos e 8(oito) meses que lhes foi entregue pela prpria genitora tal logo deu a luz criana, estando a criana em convivncia

    familiar com os requerentes por longo perodo de tempo, sem qualquer convivncia com os familiares

    biolgicos. Nos autos h informao de que a genitora ainda grvida passou a residir na casa dos requerentes

    que apoiaram a criana da gestao at o parto.

    O pedido inicial se deu na 1 Vara da Infncia e Juventude do Recife como ao de guarda,

    entendendo aquele juzo de transformar a ao de guarda em ao de adoo ante as manifestaes do

    requerente e o pedido de converso, que foi deferido com a concordncia do Ministrio Pblico. Recebida que

    foi a ao de adoo consentida por este juzo da 2 Vara da Infncia e Juventude do Recife, foi concedida a

    GUARDA para estgio de convivncia e deu-se incio ao estudo psicossocial e realizao de audincia em

    face da inexistncia do nome do genitor e da anuncia da genitora ao pedido.

    O primeiro estudo psicossocial foi juntado aos autos s fls. 63/66, onde se ouviu o requerente e a

    genitora, informando que a criana se encontrava inserida no ambiente familiar adotivo, posicionando favorvel

    ao pedido de adoo. Informa ainda que o requerente tem um companheiro e vive uma relao de orientao

    homoafetiva e que ambos manifestaram o desejo em conjunto de adoo da criana, demonstrando que ao

    decidirem juntos sobre a adoo dividem a responsabilidade e os cuidados com a guarda da criana, mas no

    solicitaram a adoo conjuntamente porque no foram orientados neste sentido. Afirma ainda a psicloga s fls.

    66:

    Observamos que o ambiente familiar oferecido pelo requerente a criana adequado e

    saudvel ao seu pleno desenvolvimento fsico e emocional. Acreditamos ainda que XXXXX j

    parte integrante da famlia e que os laos entre ele e os requerentes j esto se consolidando.

    s fls. 74/81 o Sr. XXXXX XXXXXXX XXXXXXX XXXXXXX, companheiro do requerente peticiona pelo

    aditamento alegando que pretende ser autor da ao de adoo da criana XXXXX XX XXXXXXX, juntando a

    documentao necessria ao prosseguimento da ao, e afirmando que integra uma convivncia em entidade

    familiar de orientao sexual homossexual, e que:

    ...possue situao familiar e financeira slida e ambos tm condies de proporcionar ao

    referido menor uma efetiva prestao de assistncia material, moral, afetiva e educacional, o

    que vem ao encontro dos seus ldimos interesses.

    O Ministrio Pblico s fls. 94 pediu o indeferimento do pedido de aditamento e a intimao do

    primeiro requerente para dizer do desejo de prosseguir com o feito apenas em seu nome, tendo este Juzo

    indeferido o pedido do Ministrio Pblico e DEFERINDO o ADITAMENTO DA PETIO INICIAL, motivando a

    deciso sob a alegao de que no se pode negar o exerccio do direito constitucional de petio e a um devido

    processo legal para conhecimento e julgamento do pedido judicial. Trata-se de simples efetivao do direito de

    apreciao judicial do objeto de uma ao judicial, sem a sua preliminar extino por impossibilidade jurdica do

    pedido como requereu o Ministrio Pblico. Determinando tambm o juiz a designao de audincia e de novo

    estudo psicossocial para fins de instruir a audincia de instruo e julgamento, deciso esta no agravada pelo

    Ministrio Pblico.

    Pela segunda vez juntado um estudo psicossocial sobre o pedido dos requerentes, informando que:

    O Sr. XXXXX ao falar de sua famlia, ressalta a unio e a convivncia com os tios e lembra que

    os primos estudavam no mesmo colgio. Diz que aos 17 anos enfrentou a questo da sua

    homossexualidade na famlia, mas considera que seus pais souberam ultrapassar os

    obstculos relativos aos preconceitos e atualmente, todos apiam a sua relao com o Sr.

    XXXXX. Mantm contatos freqentes com seus familiares.

    O estudo psicossocial conclui pela concesso da adoo da criana XXXXX aos requerentes, ressaltando ainda

    que:

    Os psicanalistas e psiclogos avanaram e apontam no se trata mais de um homem ou de

    uma mulher para que se identifique os elementos necessrios ao simblico que favorece

    insero na cultura e na linguagem. Trata-se de funo materna e paterna e isto, no est

    associado ao sexo. Como diria Hamad, (2002, p.41) renomado psicanalista: A funo paterna ou materna no sinnimo de pai ou de me biolgicos; ela o apangio daqueles ou

    daquelas que representam um papel importante na vida da criana. Mas o que dizer da funo paterna ou materna? So funes que na sua dinmica asseguram criana a condio de ser

    interditado no simbolicamente na relao parental e o leva se conduzir na vida e na

  • articulao com a cultura da humanidade. Ou seja, os significantes de pai e me no se referem mais a funo ao sexo.

    A audincia de instruo e julgamento foi realizada em 19/12/2006, e foram ouvidas a genitora e suas

    testemunhas, e os requerentes, ocasio em todos confirmaram as alegaes inicias dos requerentes de que a

    criana foi entregue pela prpria genitora aos requerentes sem oposio de familiares maternos ou paternos.

    Nesta audincia a genitora informou os nomes dos supostos genitores. A genitora j com 18 anos manifestou a

    sua concordncia com o pedido de adoo da criana XXXXX XX XXXXXXX, seu filho biolgico para os

    requerentes, ficando ciente de todos os efeitos jurdicos e legais desta anuncia, relatando s fls. 109 que:

    ... que est ciente dos efeitos jurdicos e legais da adoo, sabe ser irrevogvel, que seu nome

    ser retirado do registro de nascimento da criana e no poder reclamar mais direitos ou

    deveres de guarda, alimentcios ou at mesmo sucessrios; que est certa de que o melhor

    para a criana ser adotado por XXXXX e XXXX porque no tem condies de criar XXXXX

    porque j tem o filho XXXXXX e porque XXXXX e XXXXX so pessoas de boa ndole,

    trabalham e tem condies de tudo, de criar e de dar plano de sade a XXXXX; que entregou a

    criana em adoo para XXXXX e XXXXX e no somente para XXXXX ou somente para

    XXXXX; que tem conhecimento de que XXXXX e XXXXX vivem uma relao homossexual e

    que os dois iro criar XXXXX como se fosse um casal,e no v nenhum problema, e acredita

    que os dois iro exercer bem a guarda de XXXXX, educ-lo, e que XXXXX no ter nenhum

    problema de ser criado por dois homens; que ningum da sua famlia recriminou ter entregue

    XXXXX para ser criado por dois homens.

    A testemunha XXXXXXXX XXXXXXX XXX XXXXXX, s fls. 110 afirma que:

    ...sabe que XXXXX e XXXXX tem relao homoafetiva e no v reao da famlia, da

    comunidade no trabalho ou de onde residem, em rejeio a criana ou a XXXXX e XXXXX

    como guardies da criana; que no conhece qualquer reao ou omisso da empresa onde

    XXXXX ou XXXXX trabalham em rejeio a adoo da criana no tendo ocorrido qualquer

    represlia ou advertncia por parte das empresas, nem mesmo das famlias.

    As testemunhas XXXXXXX XXXXXXX e XXXXXXXX XXXXXX XXXXXXXXXXX XXXXXXXXX XXX

    XXXXXX em audincia de fls. 110 e 111 afirmaram que a criana no ter dificuldades de relacionamento no

    colgio ou na famlia por ser criada por dois rapazes e ainda que a me no se arrependeu da entrega da

    criana e no sabe de qualquer da famlia biolgica que tenha ido reclamar a guarda do mesmo.

    Nesta audincia foi determinada a citao dos supostos genitores indicados pela genitora, que citados

    por edital, e apenas o XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX XXXXX foi encontrado pelo Oficial de Justia e citado

    pessoalmente tendo apresentado contestao s fls.118/123, alegando que o pai da criana XXXXXX pois

    viveu maritalmente com a genitora XXXXX XXXXXXX por 3 (trs) meses e que tentou obter notcias do filho e a

    genitora sempre com respostas evasivas, da ter proposto uma ao de investigao de paternidade na

    comarca do XXXXXXXX. Alega que no concorda coma presente ao de adoo do seu filho XXXXX, porque

    deseja receber o filho em sua guarda e o direito de visitao. Ainda afirma a Ilustre Advogada:

    Ademais o Requerido sempre esteve a procura do seu filho, mesmo no residindo com ele,

    mostrando-se um pai zeloso e preocupado, demonstrando plenas condies psicolgicas para

    regulamentar e permanecer com a guarda do menor, destacando-se que, atualmente, no tem

    mantido este contato, pelos inmeros obstculos ou mesmo proibio expressa da genitora.

    Por fim, a separao do pai do filho, contraria a teoria da proteo integral disposta no Estatuto

    da Criana e do Adolescente (Lei n 8069/90), a qual estabelece o direito de crianas e de

    adolescentes de serem criados e educados no seio de sua famlia, sendo-lhes assegurados a

    convivncia familiar e comunitria, segundo o artigo 19, do referido diploma legal. Deste modo,

    em sendo inerente ao ptrio da Requerida o direito guarda de seu filho, em estando o mesmo

    em perfeitas condies de exercer este supramencionado direito e buscando resguardar a

    convivncia familiar, faz-se imperativa a manuteno da guarda do menor XXXXX XXXXXXX.

    Requereu ao final a improcedncia do pedido e que seja entregue ao genitor a criana em guarda

    paterna. Na rplica da contestao os requeridos alegaram que a criana desde o seu nascimento filho de pai

    ignorado, e que somente depois de um ano do nascimento da criana que o suposto genitor requereu a ao

    de investigao de paternidade e que segundo a genitora, o suposto genitor rejeitou a criana desde a gestao

    alegando que era estril, esclarecendo que:

    ...inclusive apresentando exame de laboratrio na vizinhana afirmando ser estril, expulsando

    a genitora grvida do lar em que conviviam maritalmente, deixando-a totalmente desamparada

    e a merc da prpria sorte, escapando de ser agredida por XXX, corruptela pela qual atende e identificado na comunidade, por interferncia da me dele reiteradas vezes, vide fls.. 109 e

  • 110 quando da oitiva da me biolgica; apresentando o contestante um vis de violncia, por

    ser conhecido na regio como um contumaz etilista.

    Solicitaram os requerentes a procedncia do pedido de adoo e o indeferimento do pedido de

    visitao. A visitao no foi deferida pelo MM Juiz em razo do Ministrio Pbico ter se manifestado s fls. 136

    pelo indeferimento da visitao, alegando a inexistncia de prova da paternidade. s fls. 222/227, foi realizada

    outra audincia onde foram ouvidos novamente a genitora biolgica, a me da genitora, o genitor e sua genitora

    e duas testemunhas do genitor. O requerido alegou nesta audincia que:

    ...que soube do nascimento do seu filho pela me de XXXXX que tambm acrescentou que a

    criana j tinha sido dada e estava fora do pas e diante disso o depoente foi para XXXXXXXX

    e prestou queixa na GPCA; que somente na delegacia que tomou conhecimento que seu filho

    estava em processo de adoo ingressado pelos requerentes; que sua me lhe apia para

    tomar conta do seu filho.

    As testemunhas do requerido XXXXX XXXXXXX XX XXXXXXXX e XXXXX XXXXXXX XX XXXXX

    afirmaram em audincia que conhecem o Sr. XXXXX XXXXXXXXX XX XXXXX h muito tempo e so vizinhos e

    que o mesmo teve uma convivncia marital com a genitora XXXXX que perdurou por quatro meses. Afirma a

    Sra. XXXXX:

    ...que XXXXX e XXXXX conviveram por pouco tempo; que quando XXXXX saiu da casa de

    XXXXX, ela j estava grvida conforme ela mesmo comenta; que XXXXX sabia que XXXXX

    estava grvida quando a mesma saiu de sua casa; que XXXXX foi morar na casa de uma

    sapato, esclarecendo que na casa havia outras lsbicas; que em decorrncia do cime da companheira sapato de XXXXX,a mesma evitava conversar com XXXXX, apesar do mesmo ter tentado ajud-la em face da gravidez; que a me de XXXXX fez de tudo para XXXXX voltar

    e ela no quis; que XXXXX brigou com sua companheira sapato e a sua companheira foi

    embora e XXXXX tentou voltar para a casa de sua me, no tendo conseguido, tendo XXXXX

    desaparecido da comunidade; que XXXXX procurava XXXXX e no sabia do seu paradeiro;

    que a me de XXXXX no conversava com XXXXX; que XXXXX comentou que XXXXX lhe

    disse do nascimento do seu filho; que a confuso toda porque XXXXX diz que o filho no era

    de XXXXX e XXXXX sempre disse que o filho era dele; que desconhece qualquer notcia de

    esterilidade da parte de XXXXX.

    Nos autos houve a juntada do exame de DNA confirmando a paternidade de XXXXX em relao

    criana XXXXX XX XXXXXXX.

    Pela terceira vez mais outro relatrio e parecer psicossocial s fls. 264/268, desta vez, relativo ao

    pedido de contestao do requerido, aduzindo que o Sr.XXXXXX relatou que quando morava com XXXXX

    tomava bebida alcolica e mostrava-se irritado e agressivo, fazendo com que XXXXX prestasse cerca de seis

    queixas na delegacia contra ele por espancamento. O Sr. XXXXX neste mesmo relatrio afirmou que est

    morando h dois meses com outra companheira, a Sra. XXXX, e esta tem dois filhos, e que quase diariamente a

    Sra.XXXXX passa em frente a sua casa e fica xingando a ele e sua esposa. Ainda afirma que a sua genitora a

    Sra. XXXXXXXXXX muito nervosa e quando ela diz uma coisa, tem que ser daquele jeito e que todos os filhos

    dela tm medo dela, porque ela muito braba. A Sra. XXXXXXXXXX tambm foi ouvida e relatou que quer

    XXXXX para ela criar e se XXXXX for querer a criana ele enlouquece. O parecer final da psicloga foi de que

    no identificou fundamentos mnimos que apontem para que XXXXX encontre um espao nesta famlia, na qual

    o seu lugar de filho esteja garantido por seu genitor.

    Pela quarta vez juntado novo relatrio do NARF - Ncleo de apoio a reinsero familiar e do NAEF

    Ncleo de adoo e estudos da famlia, de maneira que mais uma vez confirmou o entendimento dos

    profissionais envolvidos que a criana XXXXX no tem ambiente adequado par o seu desenvolvimento saudvel

    em razo do uso exagerado de substncias alcolicas, afirmando ainda que:

    Pelo que foi exposto da dinmica familiar paterna, questiona-se se h realmente um desejo do

    genitor dirigido a XXXXX, ou se a persistncia pela disputa da guarda da criana atende ao

    desejo da av, a qual teria no neto a possibilidade de ver atendida o desejo de cuidar e manter

    consigo o filho de um filho, realizando ainda a posio onipotente diante dos familiares, bem

    como dos outros (famlia materna de XXXXX), que questionam tal condio. Esse panorama

    encontra eco nas discusses ancoradas pela Psicanlise e Psicologia, quanto s dinmicas

    familiares e do modo como algumas demandas podem vir camufladas por desejos inconscientes que so identificados em funo de sua intensidade. Pelos sentimentos de

    exclusividade e posse percebidos no relato da av paterna em relao ao neto XXXXX; pela

    ausncia de firmeza do genitor, o qual pareceu incapaz de contrapor a Sra. XXXXXXXXXX;

    assim como pela prpria dinmica familiar no se considera vivel uma tentativa de

    conciliao nos moldes de uma adoo aberta, como sinalizado pelo Ministrio Pblico

  • e Curador. Outro ponto a ser destacado o de que se a guarda da criana ficasse com

    qualquer representante dos ncleos de origem, provavelmente XXXXX continuaria a ser piv e

    alvo de disputas e conflitos recrudescidos, que a nosso ver, no se encerrariam com o trmino

    da pendncia judicial. No histrico dessas divergncias h diversos boletins de ocorrncia

    policial de ambos os lados, com acusaes mtuas. XXXXX tem 3 anos e 7 meses, desde

    recm-nascido est na companhia dos guardies. Estes se mostram ansiosos quanto ao

    trmino do processo, reiterando o desejo de adoo. No contato realizado pelo NARF e NAEF,

    a criana apresentou-se com aparncia saudvel e tranqila, aceitando os limites colocados

    pelos responsveis, com vnculo afetivo fortalecido e recproco com os ltimos. Pelos contatos

    obtidos, identificou-se que XXXXX tem uma posio psquica definida e clara como filho Dos

    Srs. XXXXX e XXXXX, e contando com uma famlia ampliada que demonstrou acolh-lo

    integralmente.

    As alegaes finais dos requerentes de fls.323/324 pleiteiam a procedncia do pedido alegando ser de

    ldimo direito e escorreita justia, referindo-se ao parecer das equipes do NARF e NAEF.

    As alegaes finais do requerido de fls. 327/329 pela total improcedncia do pedido alegando que o

    requerido tem perfeitas condies de exercer aguarda do seu filho XXXXX, e que discorda do laudo

    apresentado pelas equipes interprofissionais deste juzo.

    O curador nomeado tambm emitiu parecer final opinando pela procedncia do pedido por entender

    que a adoo apresenta reais vantagens para a criana XXXXXX XX XXXXXX, por se encontrar protegido em

    ambiente familiar que d plenas condies para o seu crescimento como um todo.

    O Ministrio Pblico s fls. 337/356 apresentou o seu parecer final, em exaustiva relatoria das fases

    processuais e alegando que:

    Os requerentes, do que foi apurado, podem oferecer ao adotando condies para o seu bom

    desenvolvimento fsico, emocional, psicolgico e afetivo, autorizando o deferimento do

    pedido de adoo formulado por XXXXX XXXXXXX XX XXXXXX e XXXXX XXXXXXX

    XXXXXXX XXXXXXX, em favor da criana XXXXX, filho de XXXXXX XXXXXXX XX XXXXX e

    XXXXX XXXXXXX XX XXXXXXX e, via de conseqncia, extinguindo-se o poder familiar dos

    genitores e razo da adoo (art. 1835, IV do CC, destacando-se a reconhecida impropriedade

    legislativa do inciso V), que consentida em relao genitora (lembrando que pela nova

    redao da Lei n. 2010/09. art. 166, 5.o. o consentimento retratvel at data da publicao

    da sentena constitutiva da adoo) e cumulada com a perda do poder familiar do genitor, que

    no anuiu ao pleito e, apesar dos seus esforos iniciais, resultou por ver prejudicado o seu

    direito que pereceu diante do interesse maior da criana que se encontra com o casal

    requerente h mais de trs anos.

    A questo central desta ao de adoo no decidir sobre o direito de os requerentes exercerem o

    poder familiar de guarda, sustento e educao da criana XXXXX, por tratar-se uma famlia formada por pessoa

    do mesmo sexo, mas sim de buscar entendimento sobre qual o melhor interesse da criana nesta disputa

    judicial.

    Recentemente, em 05 de maio do corrente ano, o Supremo Tribunal Federal STF decidiu por quase

    unanimidade de seu colegiado que a unio homossexual uma entidade familiar com todos os desdobramentos

    legais que uma entidade familiar constitucional possa ter, inclusive de criar filhos. Os ministros do STF foram

    firmes em afirmar esta posio doutrinria, merecendo destaque o voto do Ministro Relator Ayres Brito na ADPF

    n 132-RJ:

    Muito bem. Consignado que a nossa Constituio vedou s expressas o preconceito em razo

    do sexo e intencionalmente nem obrigou nem proibiu o concreto uso da sexualidade humana, o

    que se tem como resultado dessa conjugada tcnica de normao o reconhecimento de que

    tal uso faz parte da autonomia de vontade das pessoas naturais, constituindo-se em direito

    subjetivo ou situao jurdica ativa. Direito potestativo que se perfila ao lado das clssicas

    liberdades individuais que se impem ao respeito do Estado e da sociedade (liberdade de

    pensamento, de locomoo, de informao, de trabalho, de expresso artstica, intelectual,

    cientfica e de comunicao, etc). Mais ainda, liberdade que se concretiza: I - sob a forma de

    direito intimidade, se visualizada pelo prisma da absteno, ou, ento, do solitrio desfrute

    (onanismo); II sob a forma de direito privacidade, se a visualizao j ocorrer pelo ngulo do intercurso ou emparceirado desfrute (plano da intersubjetividade, por conseguinte).

    Note-se que os termos intimidade e privacidade so a essncia do entendimento do Excelso Ministro,

    e este juzo ora prolator desta sentena defende que o Estado no deve ser o primeiro descumpridor da

    Constituio Federal do Brasil. Entendimento este, que aplicado ao mandamento constitucional de vedao

    expressa ao preconceito das liberdades individuais, resulta na clareza normativa de que no devido ao

  • Estado-Juiz decidir sobre a vida intima sexual e a privacidade familiar, para dizer o modo de interao social das

    pessoas no mbito privado de suas vidas afetivas e sexuais.

    Assim a discusso atual sobre o direito de pessoas do mesmo sexo ser felizes em unio estvel de

    entidade familiar tema consolidado pela jurisprudncia do nosso Tribunal Superior, sendo descabido neste

    processo elevar esta questo seara jurdica de ponto controvertido para deciso final. Ademais, sequer houve

    pelas partes alegaes neste sentido de vedao ou limitao do direito dos requerentes em exercer o poder

    familiar pleiteado.

    Com efeito afirma Ana Paula Uziel[2] em sua obra Homossexualidade e Adoo, p.77: Do ponto de vista do nmero de pessoas envolvidas, a famlia homossexual no cria nada de

    novo; monoparental, biparental ou pluriparental, como ocorre com todas as outras famlias,

    como vimos. Da perspectiva da cidadania, dos direitos e dos deveres, um cidado protegido

    pela lei, como todos. Em relao aos cuidados com as crianas, as poucas pesquisas feitas

    no identificam diferenas. A maior parte dos casos de abuso sexual, como demonstram as

    pesquisas da Abrapia, no Brasil, tem nos pais e nos padrastos os agentes nenhuma referncia relevante orientao sexual,. As crianas abandonadas, postas para adoo,

    foram fruto de relaes heterossexuais. Heterossexuais tm filhos homossexuais. O contrrio

    tambm verdadeiro. As identificaes, fundamentais para o desenvolvimento e a formao da

    identidade, sofrem abalos em parte da populao, sem que a estruturao familiar que propicia

    maiores problemas seja identificada com a existncia de pessoas do mesmo sexo.

    Decido o que interessa para o deslinde da questo posta pelas partes litigantes, que a escolha do

    que representa o melhor interesse para a criana XXXXX. Este juiz encontra nos autos informaes que

    comprovam a ausncia de habilidade dos genitores biolgicos em agir pensando no interesse superior de

    XXXXX. As aes de XXXXX e XXXXX demonstram a todo tempo o feitio egosta de suas intenes e defesas

    de desejos pessoais que sobrepuseram aos interesses da criana descumprindo as prerrogativas legais de

    garantias especiais. Esta criana que foi concebida pela famlia afetiva formada da unio amorosa de XXXXX e

    XXXXX. E foi vitimizada quando no lhe permitido receber os devidos cuidados de ambos os seus genitores

    tanto no perodo pr-natal como nos primeiros dias de vida. Desfeita esta famlia afetiva pela separao do

    casal, foram encerradas as relaes amorosas que poderiam evitar o desastre do afastamento da criana

    XXXXX de seu ambiente familiar biolgico materno ou paterno nuclear ou extenso, cumprindo-se a garantia

    legal de manuteno da criana no seio da famlia natural. Infelizmente restaram desavenas e violncia entre

    os genitores. Ausente os laos afetivos da famlia biolgica no h sobrevivncia do ambiente familiar apenas

    pelos laos sanguneos. A famlia , sobretudo e principalmente, o ambiente afetivo onde as pessoas formam

    laos mais ou menos seguros de amor e solidariedade, e onde os laos sanguneos podem ou no favorecer

    esta formao de um grupo afetivo. No caso em anlise, a famlia de XXXXX e XXXXX perdurou por menos de

    quatro meses, com o nascimento de XXXXX, fruto dos laos sanguneos, j no mais existia o ambiente afetivo

    para receb-lo, da surge a sequncia de fatos que do incio a decadncia do direito de os genitores manterem

    a criana em sua guarda.

    A deciso da genitora de entregar a criana aos requerentes para exercerem a guarda, o sustento e

    educao foi fruto das conflitantes relaes familiares de inteira responsabilidade de XXXXX e XXXXX,

    entretanto, nos autos resta provado que a escolha da genitora propiciou criana uma famlia afetiva para a

    garantia de sua sobrevivncia.

    Hoje, decorridos mais de cinco anos, a criana encontra-se integrada ao ambiente familiar formado

    pela famlia afetiva dos requerentes, que garante a XXXXX as condies necessrias ao seu desenvolvimento

    bio-psicossocial saudvel e seguro. Existe o reconhecimento de XXXXX em toda comunidade familiar, social e

    educacional como filho dos requerentes, realidade esta que integra a identidade da criana e fortalece o seu

    direto de personalidade.

    Est evidente pelas declaraes do prprio genitor XXXXX no relatrio de fls.265/269 reforado pelo

    relatrio de fls.313/319, que o seu desejo de exercer o poder familiar de XXXXX secundrio ao desejo de

    entreg-lo aos cuidados da av paterna, retirando dele XXXXX e de XXXXX a certeza de uma relao filial

    plena que favorea o desenvolvimento saudvel da criana.

    Estou convicto de que o melhor interesse para XXXXX se encontra na sua permanncia sob a guarda,

    o sustento e a educao dos requerentes XXXXX e XXXXX, que desde o incio de sua vida garantiram os

    cuidados necessrios sua sobrevivncia, oferecendo amor e carinho e uma condio de vida familiar livre de

    graves conflitos familiares com agresses fsicas e perturbaes emocionais. Isto representa reais vantagens e

    motivos legtimos para a concesso da adoo. A manuteno da guarda da criana com os requerentes atende

    ao princpio do melhor interesse da criana preconizado pela Conveno de Nova Iorque de 1989, ao princpio

    da proteo integral previsto em nossa Constituio Federal em seu artigo 227, bem como ao princpio prescrito

  • pelo artigo 43 do Estatuto da Criana e do Adolescente que determina ser a adoo deferida apenas quando

    apresentar reais vantagens para as crianas e funda-se em motivos legtimos.

    A proteo integral prevista pela Carta Magna Brasileira evidenciada na constatao das garantias

    de convivncia familiar e na construo do universo afetivo necessrio ao desenvolvimento de uma

    personalidade estruturada e saudvel, como tambm se observa na Psicanlise pela afirmativa de KEHL:

    A psicanlise nos ensinou que famlia no um grupo natural e sim um grupo cultural, ela uma estruturao

    psquica, onde as funes exercidas por seus membros no dizem respeito a questo de gnero e sim ao desejo

    dirigido a criana e possibilidade de faze-la sujeito diferenciado, ou seja no alienado das expectativas e

    imposies das figuras representativas nesta constituio familiar. Por fim compreendemos que na construo da

    subjetividade infantil: O que insubstituvel um olhar sobre a criana, ao mesmo tempo responsvel e

    desejante, no no sentido de um desejo sexual abusivo, mas o desejo de que esta criana exista e seja feliz na

    medida do possvel; o desejo que confere um lugar a este pequeno ser, e a responsabilidade que impe os

    limites deste lugar. Isto necessrio para que elas obtenham um mnimo de parmetros, inclusive ticos, para

    se constituir como sujeitos, (KEHL, 2001, p. 38).[3]

    As reais vantagens so consubstanciadas tambm na condio concreta dos recursos matrias e

    financeiros que os adotandos dispem conforme consta no relatrio de estgio de convivncia, realizado pela

    equipe interprofissional da 2 Vara da Infncia e da Juventude do Recife.

    Assim, convencido se encontra este juzo de que as razes afetivas fortalecem a realidade do grupo

    familiar em que se encontra inserida a criana[4], pois a compreenso para a aceitao desta realidade familiar um resultado de muitos anos de evoluo da sociedade familiar. O Direito como cincia social que busca o

    equilbrio social o instrumento cientfico que permite atravs do devido processo legal o reconhecimento das

    mudanas sociais e culturais, homologando a proteo aos bens vitais que esta mesma sociedade elege e

    vincula s leis, como indicado nos pargrafos anteriores. A psicologia uma cincia que cuida do estudo do

    comportamento humano com ateno ao universo afetivo das pessoas, sempre considerando o contexto bio-

    psicosocial e as suas relaes subjetivas decorrentes. Assim por estes dois referenciais tericos este juzo

    reconhece o direito de crianas serem adotadas por pessoas do mesmo sexo refletindo uma conscincia atual

    da sociedade de eleio do bem vital do afeto como o elemento mais importante para a definio destas novas

    famlias.

    A adoo de crianas por pessoas do mesmo sexo no resulta em deciso judicial de reconhecimento

    legal do casamento homoafetivo. O que se caracteriza legalmente a garantia de as crianas podem receber

    afeto de pessoas habilitadas e capazes do exerccio do poder familiar reconhecidas pela justia como tais. Em

    suma a concretizao da condio de sujeito de direitos que o Estatuto da Criana e do Adolescente concebe

    para a garantia do respeito condio peculiar de pessoa em desenvolvimento. Como ensina a Professora

    Martha de Toledo Machado[5]: Da por que, na essncia, a possibilidade de desenvolver a personalidade humana (as potencialidades do ser

    humano adulto) pr-requisito da prpria noo jurdica de personalidade, como tradicionalmente no Direito

    vinha sendo concebida. Por outras palavras, no h direitos da personalidade em sua plenitude sem a

    preexistncia da personalidade humana formada como tal. Por isto que, sustento, pode-se afirmar, ao menos

    sob uma tica principiolgica ou conceitual, que a possibilidade de formar a personalidade humana adulta

    exatamente o que esto fazendo crianas e adolescentes pelo simples fato de crescerem at a condio de

    adultos h de ser reconhecida como direito fundamental do ser humano, porque sem ela nem poderiam ser os

    demais direitos da personalidade adulta, ou a prpria personalidade adulta.

    Consideradas todas as razes de fato e de direito e apreciados todos os elementos constantes nos autos, do

    entendimento deste juzo que as relaes afetivas no so delimitadas pelas possibilidades das unies de

    gneros, mas sim pela inata condio humana de realizar a vida atravs do afeto e da construo da felicidade

    com respeito ao outro e a si mesmo. A reconquista da histria da humanidade atravs da alteridade, um

    fundamento do princpio da preservao da espcie humana, o objetivo da aplicao das leis para a proteo

    das famlias. As crianas so nossos bens mais preciosos e responsveis pelo futuro da humanidade, tendo as

    leis em todo o mundo assim reconhecido. No Brasil a Carta Magna em seu artigo 227 responsabiliza a todos,

    famlia, sociedade e estado para a proteo integral com prioridade absoluta na ateno com as crianas. O

    artigo 226 da mesma Carta dispe ser a famlia a base da sociedade e ter a proteo especial do Estado, e em

    seu pargrafo 4 determina que tambm entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus

    descendentes.

    No mrito, houve plena integrao da criana famlia adotiva, conforme constatado no parecer da equipe

    tcnica no estgio de convivncia. O pedido se funda em motivos legtimos e os autores no revelaram

  • impedimento do Art. 28, do Estatuto da Criana e do Adolescente, para adoo. A adoo atende aos

    interesses da criana e o estgio de convivncia foi devidamente cumprido. Obedecidas foram todas as

    formalidades legais. O pedido est de acordo com o direito e conta com a anuncia do rgo Ministerial

    Pblico.

    ANTE TODO O EXPOSTO, com arrimo no Art. 227, 5 e 6 da Constituio Federal, combinado

    com os Artigos 1.635, IV do Cdigo Civil, 269, I, do Cdigo de Processo Civil e nos Artigos 28; 39 e seguintes,

    165 e seguintes, todos da Lei n. 8069/90, JULGO PROCEDENTE o pedido da inicial, para fins

    de CONCEDER a Adoo de XXXXXX XX XXXXXX em favor dos requerentes XXXXX XXXXXXX XXXXXXXXX

    e XXXX XXXXXXX XXXXXXX XXXXXXX, e, em conseqncia, JULGO EXTINTO O PODER FAMILIAR dos

    genitores XXXXX XXXXXXX XX XXXXXXX e XXXXX XXXXXXXXX XXXXXXXX. Os requerentes devero ser

    intimados para dizer em Secretaria, mediante certido, como a criana passar a chamar-se, consignando-se

    nos seus assentamentos os nomes dos adotantes como GENITORES e de seus ascendentes como AVS,

    informando a ordem de lanamento do patronmico, bem como de seus ascendentes na condio de avs, no

    constando da certido do registro qualquer observao sobre a natureza do ato, cumprindo o Oficial de Registro

    Civil com a realizao dos assentamentos dos genitores e de ambos os respectivos avs.

    Determino a remessa dos autos ao NAEF- Ncleo de Adoo e Estudos da Famlia para fins

    de controle estatstico do CNA/CNJ.

    Sem custas.

    P.R.I., aps o trnsito em julgado, arquive-se definitivamente e no modo digital.

    Em segredo de Justia.

    Recife, 17 de maio de 2011.

    lio Braz Mendes

    Juiz de Direito Titular da 2 VIJ.

    [1] No entanto, h autores, em diferentes textos da literatura consultada, que ainda utiliza a

    expressoorientao sexual para se referir atrao tanto afetiva quanto sexual de uma pessoa em relao a

    outra; no caso de seu prprio sexo, orientao sexual homossexual, ou no caso e sexo oposto a ela,

    orientao sexual heterossexual. Outros autores, ainda, com o objetivo de explicar a afetividade nos

    relacionamentos sexuais, utilizam a expresso orientao afetivo-sexual para designar a atrao de uma

    pessoa por outra que no seja exclusivamente sexual, mas tambm afetiva, como dissemos. FARIA, Mariana

    de Oliveira e MAIA, Ana Cludia Bortolozzi. Adoo por Homossexuais. A famlia homoparental sob o olhar da

    psicologia jurdica.Curitiba: Juru, 2009, p. 20.

    [2] UZIEL, Anna Paula. Homossexualidade e Adoo. Rio de Janeiro: Garamond, 2007.

    [3] KEHL, Maria R. Lugares do feminino e do masculino na famlia, in Comparato, M, c. m. &Monteiro, D, S. F.

    (org.). A criana na contemporaneidade e a psicanlise. So Paulo: Casa do Psiclogo, 2001.

    [4] A criana se encontra convivendo com o grupo familiar desde o dia do seu nascimento, portanto em estgio

    de convivncia ftico por mais de cinco anos. Nota do autor.

    [5] MACHADO, Martha de Toledo. A Proteo Constitucional de Crianas e Adolescentes e os direitos

    humanos.Barueri, SP: Manole, 2003, p.109.