Sistema HACCP Implementação do Sistema de Autocontrolo num Catering de Aviação

download Sistema HACCP Implementação do Sistema de Autocontrolo num Catering de Aviação

of 102

Transcript of Sistema HACCP Implementação do Sistema de Autocontrolo num Catering de Aviação

UNIVERSIDADE TCNICA DE LISBOA Faculdade de Medicina Veterinria

SISTEMA HACCP: IMPLEMENTAO DO SISTEMA DE AUTOCONTROLO NUM CATERING DE AVIAOJoana Cardoso dos Reis Domingues

CONSTITUIO DO JRI Professor Doutor Antnio Salvador Ferreira Henriques Barreto Professora Doutora Maria Gabriela Lopes Veloso Professora Doutora Marlia Catarina Leal Fazeres Ferreira

ORIENTADORA Professora Doutora Marlia Catarina Leal Fazeres Ferreira

2008 LISBOA

UNIVERSIDADE TCNICA DE LISBOA Faculdade de Medicina Veterinria

SISTEMA HACCP: IMPLEMENTAO DO SISTEMA DE AUTOCONTROLO NUM CATERING DE AVIAOJoana Cardoso dos Reis Domingues

DISSERTAO DE MESTRADO INTEGRADO EM MEDICINA VETERINRIA

CONSTITUIO DO JRI Professor Doutor Antnio Salvador Ferreira Henriques Barreto Professora Doutora Maria Gabriela Lopes Veloso Professora Doutora Marlia Catarina Leal Fazeres Ferreira

ORIENTADORA Professora Doutora Marlia Catarina Leal Fazeres Ferreira

2008 LISBOA

AgradecimentosA concluir mais uma etapa da minha vida, com enorme satisfao que reconheo todos aqueles que tiveram um papel determinante para a minha formao pessoal e acadmica.

Na Faculdade de Medicina Veterinria da Universidade Tcnica de Lisboa tive o previlgio de poder aprender com excelentes profissionais, na qualidade de professores, assistentes e/ou convidados; entre eles, saliento os docentes das reas de Tecnologia e Sade Pblica Veterinria, determinantes no desenvolvimento do meu entusiasmo pela Segurana Alimentar, e a minha orientadora de estgio, a Professora Doutora Marlia Ferreira, a quem agradeo a disponibilidade e pacincia.

Por ter sido to determinante no final desta etapa da minha vida (pelo acompanhamento e apoio que me prestou durante o estgio) como no incio de uma nova em que agora me aventuro (pela confiana despositada e oportunidade dada), um outro agradecimento dirijo Dra. Ceclia Smith.

Porque o sucesso acadmico depende de uma slida base emocional, inevitvel reconhecer um conjunto de amigos e familiares que me acompanharam ao longo destes anos, quer festejando comigo todas as minhas vitrias, quer partilhando o sofrimento nos momentos mais difceis e dando-me sempre a fora que me faltava. Todos eles sabem como so importantes para mim, e aqui reforo o agradecimento que lhes devo.

Deixei para o fim aqueles a quem sei que no conseguirei pr em palavras o quanto os admiro e lhes agradeo por tudo o que fazem por mim e por todos os seu ensinamentos. Os Pais. A eles agradeo por terem estado sempre e incondicionalmente ao meu lado, e por me terem dado a fora que precisei para chegar at aqui. Me agradeo por me mostrar o lado emocional da vida, e ao Pai agradeo por me fazer ver esta mesma vida de forma mais racional. aos Pais que devo tudo o que alcancei. aos Pais que devo o que sou hoje.

A todos... Muito Obrigada!

i

ResumoSISTEMA HACCP: IMPLEMENTAO DO SISTEMA DE AUTOCONTROLO NUM CATERING DE AVIAO A transmisso de agentes patognicos atravs do consumo de alimentos pode constituir um problema srio de Sade Pblica e, por isso, as questes relacionadas com a segurana alimentar tm suscitado uma crescente preocupao nas autoridades, indstrias, produtores, fornecedores e consumidores. Sinal desta preocupao toda uma nova legislao alimentar que tem sido desenvolvida. A Anlise de Risco uma ferramenta fundamental para a implementao de sistemas de autocontrolo da cadeia alimentar, como o Sistema HACCP que, assente em sete princpios, de carcter pr-activo, sistemtico e cientfico, valoriza a preveno em detrimento dos testes ao produto final e tem por objectivo identificar os perigos e concentrar o controlo da produo de alimentos para consumo nos chamados pontos crticos de controlo (PCC). Igualmente indispensvel, para a eficcia do Sistema HACCP, a implementao de programas de pr-requisitos, como as boas prticas de higiene e de fabrico, assim como a formao e sensibilizao de todos os operadores da cadeia alimentar para esta problemtica. Tendo como exemplo um catering de aviao, viu-se realada precisamente a importncia da slida implementao dos programas de pr-requisitos, do total envolvimento e sentido de responsabilidade dos manipuladores e da actuao dirigida, persistente e determinada da equipa HACCP responsvel.

Palavras-chave: Sistema HACCP, Anlise de Risco, Programas de Pr-requisitos, Microbiologia alimentar.

ii

AbstractHACCP SYSTEM: FLIGHT CATERING SELF-CONTROL SYSTEM IMPLEMENTATION Food-borne illness is a serious Public Health problem. This fact has increased public awareness and is today a major concern to authorities, industry, production, supplying sectors and consumers, as a new food hygiene legislation is being created. Risk Analysis is a fundamental tool for the implementation of self-control systems in the food chain, such as the HACCP which is based in seven principles, has an active, systematic and scientific character prioritizing prevention instead of testing of the final product. The objective of this method is to identify hazards and center food production control in critical control points (CCP). The implementation of prerequisites, such as good manufacturing practice and good hygiene practice, are vital for the efficiency of the HACCP. The consciousness of the food industry operators, along with continuous training programs of the operators play an important role to solve the problem. This essay applies the above concepts to a flight catering business where the establishment of a self-control system, along with employee training, and a firm hold, guidance and persistent actions of the HACCP team is enhanced.

Keywords: HACCP System, Risk Analysis, Prerequisite programs, Food Microbiology.

iii

ndice GeralAgradecimentos...................................................................................................................... i Resumo................................................................................................................................... ii Abstract ................................................................................................................................. iii ndice Geral ........................................................................................................................... iv ndice de Figuras ................................................................................................................... vii ndice de Tabelas .................................................................................................................... vi ndice de Anexos ................................................................................................................ viii Siglas ..................................................................................................................................... ix 1. 2. 3. Descrio do Estgio..................................................................................................... 1 Introduo .......................................................................................................................3 Sistema HACCP ..............................................................................................................7 3.1 Princpios do HACCP .............................................................................................7 3.2 Programas de pr-requisitos .................................................................................8 3.2.1 Higiene pessoal ............................................................................................. 10 3.2.1.1 Sade do pessoal........................................................................................ 10 3.2.1.2 Higiene individual ........................................................................................ 10 3.2.1.3 Atitudes e procedimentos dos manipuladores............................................. 10 3.2.1.4 Formao .................................................................................................... 11 3.2.2 Higiene das instalaes, equipamentos e utenslios.......................................... 11 3.2.2.1 Plano de limpeza e desinfeco.................................................................. 12 3.2.2.2 Plano de controlo de pragas........................................................................ 12 3.2.2.3 Plano de recolha e eliminao de resduos alimentares ............................. 12 3.2.3 Higiene alimentar ............................................................................................... 13 3.2.3.1 Seleco de fornecedores e recepo de matrias-primas ........................ 13 3.2.3.2 Manuseamento seguro dos alimentos......................................................... 13 3.2.3.3 Manuteno da cadeia do frio ..................................................................... 13 3.2.3.4 Rastreabilidade............................................................................................ 14 3.2.3.5 Qualidade da gua ...................................................................................... 14 3.2.3.6 Procedimentos de retirada do produto do mercado .................................... 15 3.2.4 Equipa HACCP................................................................................................... 15 3.2.5 Produto final e utilizao prevista....................................................................... 15 3.2.6 Diagrama de fabrico ............................................................................................................... 16 3.3 Implementao dos princpios HACCP na Teoria...............................................16 3.3.1 Identificao de perigos e determinao das medidas de controlo (1princpio) ........................................................................................................ 16 3.3.1.1 Anlise de risco ........................................................................................... 17 3.3.1.2 Perigos biolgicos ....................................................................................... 19 3.3.1.3 Perigos qumicos ......................................................................................... 27 3.3.1.4 Perigos fsicos ............................................................................................. 28 3.3.1.5 Perigos nutricionais ..................................................................................... 28 3.3.1.6 Medidas de controlo .................................................................................... 28 3.3.2 Pontos crticos de controlo (2 princpio)............................................................ 29 3.3.3 Limites crticos (3 princpio) .............................................................................. 30 3.3.4 Vigilncia ou Monitorizao (4 princpio) .......................................................... 34 3.3.5 Aces correctivas (5 princpio) ........................................................................ 34 3.3.6 Verificao (6 princpio) .................................................................................... 34 3.3.7 Documentao e registos (7 princpio) ............................................................. 39

iv

3.4 Implementao dos princpios HACCP - numa unidade de catering................ 39 3.4.1 Descrio do produto ......................................................................................... 39 3.4.2 Diagrama de fabrico........................................................................................... 43 3.4.3 Identificao de perigos e determinao das medidas de controlo ................... 45 3.4.4 Determinar os PCC e estabelecer os seus limites crticos .................................55 3.4.5 Estabelecer um sistema de vigilncia / monitorizao para cada PCC e aces correctivas ............................................................................................ 61 3.4.6 Estabelecer procedimentos de verificao ..................................................................... 64 3.4.6.1 Monitorizao.............................................................................................. 64 3.4.6.2 Anlises microbiolgicas ............................................................................. 69 4. 5. Concluso .................................................................................................................... 72 Bibliografia ................................................................................................................... 73

Anexos.................................................................................................................................. 76

v

ndice de FigurasFigura 1: Componentes da Anlise de Risco........................................................................ 18 Figura 2: Curva de crescimento bacteriano em funo da temperatura. .............................. 22 Figura 3: Classificao dos microrganismos em funo das suas temperaturas ptimas de crescimento....................................................................................................... 23 Figura 4: Padres de crescimento bacteriano de diferentes microrganismos em funo da concentrao de cloreto de sdio (NaCl).......................................................... 25 Figura 5: Curva de crescimento bacteriano .......................................................................... 26 Figura 6: rvore de deciso para determinao de PCC. .................................................... 31 Figura 7: Tipos de refeies produzidas na unidade de catering de aviao. ...................... 40 Figura 8: Tipos de refeies quentes (hot lunch & dinner) produzidas na unidade de catering de aviao.......................................................................................... 41 Figura 9: Proporo dos vrios tipos de refeies quentes (hot lunch & dinner) produzidas na unidade de catering para cada uma das companhias clientes ...... 41 Figura 10: Diagrama de fabrico de refeies quentes (hot lunch & dinner) produzidas na unidade de catering de aviao ...................................................................... 44 Figura 11: Diagrama de fabrico final da produo de refeies quentes (hot lunch & dinner) produzidas na unidade de catering de aviao.................................... 59 Figura 12: Verificao do PCC Armazenamento. ................................................................. 65 Figura 13: Verificao do PCC Cozedura............................................................................. 67 Figura 14: Verificao do PCC Arrefecimento. ..................................................................... 68 Figura 15: Anlises microbiolgicas. .................................................................................... 70

vi

ndices de TabelasTabela 1: Cronologia das principais crises alimentares e aces legislativas, na UE............ 4 Tabela 2: Classificao dos perigos quanto probabilidade de ocorrncia e severidade das complicaes ................................................................................................. 19 Tabela 3: Perigos fsicos associados aos alimentos para consumo..................................... 28 Tabela 4: Temperaturas de cozedura, manuteno a quente, arrefecimento e conservao a frio recomendadas........................................................................ 33 Tabela 5: Categorias de alimentos prontos-a-comer baseadas nos teores de aerbios totais presentes .................................................................................................... 36 Tabela 6: Parmetros de qualidade microbiolgica, e respectivs critrios de aceitabilidade, de alguns alimentos prontos-a-comer .......................................... 38 Tabela 7: Descrio da refeio quente (hot lunch & dinner) produzida na unidade de catering de aviao.......................................................................................... 43 Tabela 8: Presena provvel de perigos nas refeies quentes (hot lunch & dinner) produzidas na unidade de catering de aviao e sua origem .................. 45 Tabela 9: Perigos associados a cada etapa do processo de fabrico e medidas preventivas e de controlo que podem ser aplicadas em cada uma dessas etapas para o controlo dos respectivos perigos identificados nas refeies quentes (hot lunch & dinner) produzidas na unidade de catering de aviao....................................... 51 Tabela 10: Determinao dos PCC do processo de fabrico das refeies quentes (hot lunch & dinner) produzidas na unidade de catering de aviao .......................... 56 Tabela 11: Plano HACCP completo para o processo de fabrico das refeies quentes (hot lunch & dinner) produzidas na unidade de catering de aviao................... 62 Tabela 12: Parmetros de qualidade microbiolgica e respectivos critrios de aceitabilidade para refeies quentes (hot lunch & dinner) produzidas na unidade de catering de aviao........................................................................... 69

vii

ndice de AnexosAnexo 1: Exemplo de plano de limpeza e desinfeco (parcial), neste caso referente zona de produo denominada de cozinha quente (adaptado do Manual de Qualidade da unidade de catering de aviao) ..................................................... 77 Anexo 2: Exemplo de folha de registo dirio das aces de limpeza e desinfeco de uma zona de produo denominada cozinha quente ....................................... 78 Anexo 3: Limites de crescimento microbiano (temperatura, pH e aw) .................................. 79 Anexo 4: Valores de pH especficos de diversos alimentos ................................................. 80 Anexo 5: Valores de actividade da gua (aw) especficos de diversos alimentos................. 81 Anexo 6: Tempos de espera a temperaturas especficas para que a segurana dos alimentos seja garantida ........................................................................................ 82 Anexo 7: Procedimento do PCC referente ao armazenamento............................................ 83 Anexo 8: Folha de registo do PCC referente ao armazenamento ........................................ 85 Anexo 9: Procedimento do PCC referente cozedura......................................................... 86 Anexo 10: Procedimento do PCC referente ao arrefecimento.............................................. 88 Anexo 11: Folha de registo dos PCC referente cozedura e arrefecimento ....................... 90

viii

SiglasAPED ARESP ASAE aw BRC BSE CCE CDC CO2 EFSA FIFO HACCP HL/D IFCA IFS IFSA N O2 PC PCC RASFF TVU UE UFC UI Associao Portuguesa de Empresas de Distribuio Associao da Restaurao e Similares de Portugal Autoridade de Segurana Alimentar e Econmica Actividade da gua British Retail Consortium Bovine Spongiform Encephalopathy / Encefalopatia Espongiforme Bovina Comisso das Comunidades Europeias Centers for Disease Control and Prevention Dixido de Carbono European Food Safety Authority / Autoridade Europeia para a Segurana dos Alimentos First In, First Out (o primeiro a entrar o primeiro a sair) Hazard Analysis and Critical Control Point / Anlise de Perigos e Controlo de Pontos Crticos Hot Lunch & Dinner / refeies (almoo e jantar) quentes International Flight Catering Association International Food Standard International Food Service Association Nmero Oxignio Ponto de Controlo Ponto Crtico de Controlo Rapid Alert System for Food and Feed / Sistema de Alerta Rpido Tempo de Vida til Unio Europeia Unidades Formadoras de Colnias Unidades Internacionais

ix

1. Descrio do EstgioDe todas as reas das Cincias Veterinrias que me foram apresentadas durante o curso, foi deciso minha procurar que, durante o estgio de final de curso, pudesse solidificar e aprofundar os conhecimentos que adquiri no mbito da Segurana Alimentar. Desta forma, foi numa empresa de catering de aviao que me foram dados os meios necessrios para aprender a aplicar correctamente tais conhecimentos e desenvolver o meu sentido crtico em relao aos assuntos que higiene e segurana dos alimentos dizem respeito. Durante os quatro meses que colaborei com o departamento de Higiene e Qualidade desta empresa de catering de aviao, tive a oportunidade de: Contribuir para a garantia da correcta implementao do sistema HACCP, nomeadamente atravs da:

Actualizao do Manual de Qualidade e Plano HACCP:o o

Actualizao do fluxograma geral de produo de refeies para aviao; Elaborao de fluxograma para a produo de refeies para consumo interno (refeitrio); Elaborao de fluxogramas para a produo de sandes, saladas e sopas (retalho); Reviso, actualizao e elaborao de procedimentos de produo e folhas de registo de Pontos de Controlo (PC) e dos Pontos Crticos de Controlo (PCC); Realizao de aces de formao sobre os procedimentos de produo.

o

o

o

Verificao dos pr-requisitos:o

Acompanhamento da equipa de controlo de pragas (ratos e baratas).

Monitorizao dos PCC e PC:o o o o

Inspeco da zona de produo e cmaras de refrigerao/congelao; Identificao e correco de no-conformidades; Controlo de leos de fritura; Anlises microbiolgicas ao equipamento e manipuladores.

Verificao do Sistema HACCP:o o o

Verificao das folhas de registo dos PCC e PC; Tratamento estatstico dos dados; Anlises microbiolgicas aos alimentos e produto final. 1

Acompanhamento de aces de formao; Acompanhamento de auditorias internas e externas.

Rotulagem de produtos para venda a retalho (sandes e saladas), nomeadamente:

Listagem dos ingredientes; Realizao de pesagens (metrologia).

Plano de aco para a Pandemia de Gripe Aviria:

Elaborao de apresentao para a aco de formao sobre o plano.

A realizao deste estgio constituiu uma mais valia para a minha formao, na medida em que, no s me deu a conhecer o papel do Mdico Veterinrio na garantia da qualidade e segurana dos alimentos para consumo humano, como me permitiu desenvolver competncias nesta rea.

2

2. IntroduoNas ltimas dcadas, as questes relacionadas com a segurana alimentar tm suscitado uma crescente preocupao nas autoridades, indstrias, produtores, fornecedores e consumidores. A transmisso de agentes patognicos atravs do consumo de alimentos pode constituir um problema srio de sade pblica. Segundo dados de Centers for Disease Control and Prevention (CDC), no mundo e por ano, as toxinfeces alimentares afectam 76 milhes de pessoas, das quais 300 mil so hospitalizadas e 5 mil morrem (CDC, 2004). S na Unio Europeia (UE), durante o ano de 2006, foram registados 5.710 surtos de toxinfeces alimentares (dos quais 13 foram em Portugal), que afectaram um total de 53.568 pessoas (177 portugueses), resultando em 5.525 hospitalizaes (69 s em Postugal) e 50 mortes (nenhum dos casos mortais ocorreu em Portugal) (EFSA, 2007). O aumento da populao na UE, as alteraes nos hbitos de consumo e a preponderncia das indstrias de alimentos e bebidas em relao aos restantes sectores industriais da UE, associados ao crescente nmero de crises alimentares (nomeadamente as da responsabilidade da BSE e das Dioxinas) (Tabela 1), vieram alertar para as falhas na concepo e aplicao da legislao alimentar na UE (CCE, 2000b). Desta forma, tomou-se conscincia da necessidade de melhorar e uniformizar as normas de qualidade e reforar o sistema de controlo de toda a cadeia alimentar, da explorao agrcola at mesa (CCE, 2000b). Esta inteno foi formalizada atravs da elaborao do Livro Branco sobre a segurana dos alimentos (CCE, 2000b), no qual, entre outras medidas, se propunha a criao de uma Autoridade Alimentar Europeia. Algumas das medidas prioritrias que faziam parte do Plano de Aco em matria de segurana dos alimentos, apresentado no Livro Branco, ganharam forma aquando da publicao do Regulamento (CE) n 178/2002. Este regulamento, no s cria a Autoridade Europeia para a Segurana dos Alimentos (EFSA), como determina os princpios e normas gerais da legislao alimentar, e estabelece procedimentos em matria de segurana dos gneros alimentcios. O objectivo garantir que nenhum alimento perigoso seja comercializado, que a responsabilidade pela aplicao da legislao passe a ser dos operadores (cabendo s autoridades nacionais a sua verificao), que a rastreabilidade seja realizada desde a explorao at ao consumidor, e que seja comunicada s autoridades qualquer situao de risco; desta forma, procura-se atingir um elevado nvel de proteco da sade humana, restaurar a confiana dos consumidores (abalada pelas recentes crises alimentares), fazer uma abordagem integral que abranja toda a cadeia alimentar, permitir a livre circulao dos bens alimentcios para consumo humano ou alimentos para animais nos

3

estados membros, e melhorar os procedimentos de segurana alimentar, por exemplo, atravs da criao de um sistema de alerta rpido (Regulamento (CE) n 178/2002).

Tabela 1: Cronologia das principais crises alimentares e aces legislativas, na UE. Ano 1982 1984 1986 1986 1986 1988 1990 1992 1994 1994 1996 1996 1996 1996 1999 1999 1999 2000 2000 2000 2001 2002 2002 2003 2003 2004 2005 2005 2006 20061 2 3 4 5 6 7 8

Facto Botulismo em salmo fumado Blgica1 Listeria em queijos de pasta mole Norte da Europa1 BSE em bovinos Reino Unido2 Radioactividade nos vegetais e peixes (Chernobyl) Europa Oriental1 Campylobacter em carnes de frango Reino Unido1 Salmonella enteritidis em ovos Reino Unido1 BSE em bovino (importado) Portugal3 Salmonella typhimurium DT104 em carnes Alemanha1 BSE em bovinos Portugal3 Hormonas em carnes de bovino Blgica1 Variante da Doena de Creutzfeld-Jacob - Reino Unido4 E. coli O157 em hamburgers Esccia1 Resduos de antibiticos em carnes de sunos Reino Unido1 Clembuterol em fgados de bovino Frana1 Gripe de Hong-Kong em frangos Extremo Oriente1 Resduos de carvo na coca-cola Frana1 Dioxinas em carnes de frango e porco Blgica1 Cianeto nos peixes do Baixo Danbio Europa Central1 Antibiticos em camares ustria1 Livro Branco sobre a Segurana dos Alimentos Febre aftosa - Reino Unido1 Regulamento n 178/2002 Criao da Autoridade Europeia para a Segurana dos Alimentos5 Nitrofuranos Portugal1 Gripe aviria Holanda1 Regulamento n 852/2004 Provvel variante da Doena de Creutzfeld-Jacob Portugal6 Criao da Autoridade de Segurana Alimentar e Econmica7 Gripe aviria Portugal8 Obrigatoriedade da aplicao do Regulamento n 852/2004

Bernardo, 2006 WHO, 2002a OIE WHO, 2002b EFSA DGS, 2005 Decreto-Lei n 237/2005 FDA, 2008

4

Esta nova legislao alimentar realou a importncia de se procurar aumentar o leque de conhecimentos cientficos em matria de segurana alimentar, e uniformizar princpios e procedimentos em que se baseiam o desenvolvimento e aplicao de medidas preventivas desde a produo at ao consumidor. A Anlise de Risco a metodologia que est na base desta estratgia comum pela segurana e qualidade dos gneros alimentcios para consumo. Deste modo, o artigo 23 do Regulamento (CE) n 178/2002 atribuiu EFSA as tarefas de elaborao de pareceres cientficos, de apoio tcnico e cientfico sempre que solicitado, de disponibilizao de toda a informao em matria de segurana alimentar, e de comunicao de risco. Na ausncia de conhecimentos cientficos conclusivos, ou em caso de dvida, deve-se aplicar o prncipio da precauo previsto no artigo 7 do mesmo regulamento, a fim de garantir a segurana do consumidor (CCE, 2000a). Sendo, igualmente, parte integrante da legislao alimentar, h a considerar: o Regulamento (CE) n 852/2004, de 29 de Abril, relativo higiene dos gneros alimentcios; o Regulamento (CE) n 853/2004, de 29 de Abril, que estabelece regras especficas de higiene aplicveis aos gneros alimentcios de origem animal, alterado pelo Regulamento (CE) n 1662/2006, de 6 de Novembro; o Regulamento (CE) n 882/2004, de 29 de Abril, relativo aos controlos oficiais realizados para assegurar a verificao do cumprimento da legislao relativa aos alimentos para animais e aos gneros alimentcios e das normas relativas sade e ao bem-estar dos animais; o Regulamento (CE) n. 2073/2005, de 15 de Novembro, relativo a critrios microbiolgicos aplicveis aos gneros alimentcios, alterado pelo Regulamento (CE) n 1441/2007, de 5 de Dezembro. A reforar o facto de o Regulamento (CE) n 178/2002 atribuir responsabilidades aos operadores das empresas do sector alimentar, o artigo 5 do Regulamento (CE) n 852/2004 vem impr a criao, aplicao e manuteno de um ou mais processos permanentes baseados nos princpios de Anlise de Perigos e Controlo de Pontos Crticos (HACCP), enumerando-os com respeito ao que havia sido apresentado no anexo ao cdigo de prticas internacionais recomendadas e princpios gerais de higiene alimentar (CAC, 2003). Salientando a importncia de se atingir e reconhecer (certificar) a excelncia quanto segurana e qualidade na indstria alimentar, j referida no Codex Alimentarius (CAC, 2003) a compatibilidade entre o sistema HACCP e a implementao de sistemas de gesto da qualidade, como o das normas da srie ISO 9000 (CCE, 2005), criadas em 1987 e aplicveis a qualquer organizao (Hubbert, Hagstad, Spangler, Hinton & Hughes, 1996). Desde 2005 possvel complementar este referncial com as normas da srie ISO 22000, que se aplicam s organizaes do sector alimentar, tendo a caracterstica de conjugar, dinamicamente, os princpios e aplicao do HACCP com outros programas de pr5

requisitos, como o Global Standard-Food do British Retail Consortium (BRC) e International Food Standard (IFS), ou outros documentos relevantes neste sector (Pereira, 2005). Este referencial tem como metodologia a realizao de anlises de perigos para determinar a estratgia e garantir a segurana, atravs de uma combinao de diferentes medidas de controlo (Pereira, 2005). Este tipo de certificao como garantia de qualidade no , contudo, obrigao legal (CCE, 2005).

6

3. Sistema HACCPO sistema HACCP, que se distingue pelo seu carcter pr-activo, sistemtico e cientfico, ao valorizar a preveno em detrimento dos testes ao produto final, tem por objectivo identificar os perigos e, deste modo, concentrar o controlo da produo dos alimentos para consumo humano, ou para animais, essencialmente nos chamados pontos crticos de controlo (PCC) (CAC, 2003). Estes pontos crticos so as etapas do processo de produo onde a aplicao de medidas de controlo se mostra eficaz na eliminao ou reduo dos perigos que podem estar presentes (Forsythe, 2000). O objectivo deste sistema eliminar ou reduzir para nveis aceitveis o risco associado aos alimentos, de modo a que estes possam ser considerados seguros, ou seja, prprios para consumo. Neste contexto, so considerados seguros os gneros alimentcios que estejam em conformidade com as disposies comunitrias especficas que regem a sua segurana (Regulamento (CE) n 178/2002, p. L31/8), sabendo que a legislao alimentar deve procurar alcanar um ou mais dos objectivos gerais de um elevado nvel de proteco da vida e da sade humanas, a proteco dos interesses dos consumidores (...) tendo em conta, sempre que adequado, a proteco da sade e do bem-estar animal, a fitossanidade e o ambiente (Regulamento (CE) n 178/2002, p. L31/10).

3.1 Princpios do HACCPNa base do desenvolvimento, implementao e manuteno do sistema HACCP pelos operadores das empresas do sector alimentar, devem estar os seguintes princpios (Regulamento (CE) n 852/2004): 1 Identificao de quaisquer perigos que devam ser evitados, eliminados ou reduzidos para nveis aceitveis; 2 Identificao dos PCC na fase ou fases em que o controlo essencial para evitar ou eliminar um risco ou para o reduzir para nveis aceitveis; 3 Estabelecimento de limites crticos em PCC, que separem a aceitabilidade da no aceitabilidade com vista preveno, eliminao ou reduo dos riscos identificados; 4 Estabelecimento e aplicao de processos eficazes de vigilncia em PCC; 5 Estabelecimento de medidas correctivas quando a vigilncia indicar que um PCC no se encontra sob controlo; 7

6 Estabelecimento de processos, a efectuar regularmente, para verificar que as medidas referidas nos cinco princpios anteriores funcionam eficazmente; 7 Elaborao de documentos e registos adequados natureza e dimenso das empresas, a fim de demonstrar a aplicao eficaz das medidas referidas nos seis princpios anteriores. Para que este sistema seja correctamente implementado fundamental estabelecer programas de pr-requisitos, como as prticas de higiene e de circulao do pessoal, procedimentos de limpeza e desinfeco, e condies de armazenagem e distribuio de produtos (CAC, 2003). Igualmente importante, quer durante o desenvolvimento do sistema HACCP, quer durante a sua implementao, um conjunto de outras informaes, nomeadamente relacionadas com o impacto das matrias-primas, prticas e processos de fabrico, a utilizao final prevista do produto, as categorias de consumidores a que se destina e os dados epidemiolgicos relativos segurana alimentar (CAC, 2003). Assim, para a correcta implementao dos princpios do HACCP, foi sugerida a seguinte sequncia lgica para a aplicao do HACCP (CAC, 2003): 1 Constituir a equipa HACCP (pr-requisito); 2 Descrever o produto (pr-requisito); 3 Identificar a utilizao prevista (pr-requisito); 4 Construir um diagrama de fabrico (pr-requisito); 5 Confirmar, no local, o diagrama de fabrico (pr-requisito); 6 Listar todos os potenciais perigos associados a cada etapa e considerar quaisquer medidas para controlo dos perigos identificados (1 princpio); 7 Determinar os PCC (2 princpio); 8 Estabelecer limites crticos para cada PCC (3 princpio); 9 Estabelecer um sistema de vigilncia/monitorizao para cada PCC (4 princpio); 10 Estabelecer aces correctivas (5 princpio); 11 Estabelecer procedimentos de verificao (6 princpio); 12 Estabelecer documentao e manter os registos (7 princpio).

3.2 Programas de pr-requisitosAntes de se estabelecer um sistema HACCP, devem ser implementados programas de prrequisitos (Regulamento (CE) n 852/2004), que devem respeitar os princpios gerais de higiene alimentar do Codex Alimentarius, os Cdigos de Boas Prticas e outros requisitos de segurana alimentar. Estes programas de pr-requisitos dizem respeito a (ARESP, 2006):

8

Higiene do pessoalo o o o

Sade do pessoal Higiene individual Atitudes e procedimentos dos manipuladores Formao Plano de limpeza e desinfeco de instalaes, equipamentos e utenslios Plano de controlo de pragas Plano de recolha e eliminao de resduos alimentares Seleco de fornecedores e recepo de matrias-primas Manuseamento seguro dos alimentos (separao dos alimentos, armazenagem, preparao e confeco) Manuteno da cadeia do frio Rastreabilidade Qualidade da gua Procedimentos de retirada do produto do mercado

Higiene das instalaes, equipamentos e utenslioso o o

Higiene alimentaro o

o o o o

Equipa HACCP Produto final e utilizao prevista Diagrama de fabrico Sabendo-se que, na origem da maioria dos casos no-conformes que tm sido detectados, no esto falhas na implementao dos princpios do sistema HACCP, mas o desrespeito pelas boas prticas de higiene (ICMSF, 2002), a implementao destes pr-requisitos mostra-se determinante para a obteno de uma elevada qualidade e segurana dos alimentos. As informaes presentes nos cdigos de boas prticas no so obrigaes legais; so recomendaes que, uma vez implementadas, ajudam a atingir o nvel de segurana exigido pela legislao alimentar. Contudo, tendo em conta a flexibilidade considerada pelo Regulamento (CE) n 852/2004 para a implementao do sistema HACCP em empresas do sector alimentar de pequena dimenso, nos casos em que no h preparao (ou esta se limita a operaes simples, como corte de alimentos), produo ou transformao de gneros alimentcios, pode-se verificar que a aplicao dos programas de pr-requisitos , por si s, suficiente para controlar os perigos existentes (CCE, 2005), e a obteno de um produto seguro de acordo com o que definido pela legislao alimentar.

9

3.2.13.2.1.1

Higiene pessoalSade do Pessoal

Os manipuladores podem ser uma importante fonte de contaminao dos alimentos por microrganismos que existem habitualmente na pele, mucosas, secrees, unhas e cabelos (ARESP, 2006). Na seleco do pessoal, em particular dos que se destinam a desempenhar funes que envolvam manipulao dos alimentos, devem-se questionar os candidatos sobre o seu estado de sade (e solicitar um comprovativo mdico ou ficha de aptido), e sensibiliz-los para a imediata comunicao, ao operador, caso sofram ou sejam portadores de uma doena facilmente transmissvel atravs dos alimentos (Regulamento (CE) n 852/2004). Para alm disso, fundamental a realizao peridica de exames mdicos completos aos manipuladores, de acordo com um plano que deve estar pr-definido pelo operador da cadeia alimentar em questo. Sempre que um manipulador apresente sinais de doena, nomeadamente gastrointestinal ou respiratria, deve ser afastado da sua funo at ter comprovao mdica da recuperao da normalidade do seu estado de sade. As feridas devem estar protegidas com material impermevel, estanque e de cor viva (recomenda-se o azul) (ARESP, 2006). 3.2.1.2 Higiene individual

A lavagem cuidada, criteriosa e frequente das mos fundamental, uma vez que, nomeadamente nos manipuladores, so elas as principais responsveis pela contaminao dos alimentos. Para reduzir o risco, os manipuladores devem manter as unhas curtas, limpas e sem verniz, e evitar usar qualquer tipo de adorno (como aneis, pulseiras ou relgios) (ARESP, 2006). Os cabelos constituem, tambm, um perigo potencial, devendo estar completamente cobertos, com touca ou bon. Pelo mesmo motivo, desaconselha-se o uso de bigode ou barba pelos manipuladores (ARESP, 2006). A roupa e calado que se utiliza no local onde ocorre a manipulao dos alimentos deve ser exclusiva, adequada s funes, de cor clara, ser descartvel (nomeadamente para visitas ou pessoal da manuteno) ou lavvel e mantido limpo (ARESP, 2006). 3.2.1.3 Atitudes e procedimentos dos manipuladores

Devem ser evitados, pelos manipuladores, todos os comportamentos de risco, como assoar, tossir ou espirrar junto dos alimentos e, quando necessrio, usar papel que deve ser imediatamente descartado e as mos lavadas de seguida, fumar, mexer na boca, nariz, ouvidos, olhos ou cabelo com as mos, entre outros. Deve-se tambm evitar o contacto directo das mos com os alimentos, atravs da utilizao de utenslios apropriados ou de luvas. Neste ltimo caso, devem lavar as mos imediatamente antes de calar as luvas, que

10

devem ser descartveis, e a tarefa que inclua manipulao de alimentos deve ser executada sem interrupes; se as houver, devem lavar-se novamente as mos e calar luvas novas (ARESP, 2006). O uso de mscara naso-bucal controverso. Na maioria dos casos, no recomendado como meio de preveno da contaminao, sendo mesmo considerado contraproducente com os pr-requisitos da higiene alimentar, pois o aumento da humidade devido respirao provoca a agregao das fibras da mscara, que se torna permevel aos microrganismos, para alm de estimular o acto de coar na sequncia do prurido que provoca (INSA, n.d.). 3.2.1.4 Formao

A formao dos operadores e de todo o pessoal envolvido na cadeia alimentar, assim como a progressiva consciencializao dos consumidores para a problemtica da segurana alimentar, so elementos cruciais para uma implementao eficaz do sistema HACCP (CAC, 2003), e devem ser promovidas pelas autoridades responsveis. Particularmente importante a formao dos manipuladores, que devem ser informados acerca de todos os procedimentos relacionados com as suas funes, e sobre os quais devem receber treino, no incio de funes e tantas vezes quantas as necessrias. Deve existir um plano de formao implementado e registos que comprovem todas as aces de formao realizadas (ARESP, 2006).

3.2.2

Higiene das instalaes, equipamentos e utenslios

importante ter em conta a disposio relativa, concepo (i.e., nmero de instalaes sanitrias e lavatrios, vestirios, sistema de ventilao, iluminao, sistemas de esgotos, etc), construo (i.e., materiais utilizados), localizao e dimenses das instalaes (Regulamento (CE) n 852/2004). Essencialmente, desejvel que (ARESP, 2006): os materiais utilizados sejam resistentes, fceis de limpar, no porosos (Hubbert et al., 1996), e no transmitam qualquer substncia indesejvel aos alimentos; seja possvel a realizao de uma higienizao fcil deve existir um plano de limpeza e desinfeco implementado; no se verifique cruzamento de circuitos dos gneros alimentcios, que se devem deslocar na linha de fabrico num s sentido; estejam impedidas a entrada e permanncia de pragas (como roedoes e insectos) nas instalaes deve existir um plano de controlo de pragas implementado. Particularizando, deve dar-se uma maior ateno concepo, construo e manuteno de zonas como as de recepo de matrias-primas, as de armazenamento, incluindo as cmaras de refrigerao e congelao, as de preparao e confeco e as sanitrias do pessoal (ARESP, 2006). 11

Por outro lado, no se deve negligenciar a manuteno e calibrao dos equipamentos e instrumentos de medio. 3.2.2.1 Plano de limpeza e desinfeco

Com especial ateno para os pavimentos, paredes, tectos, portas, junes, janelas, escadas e lmpadas, as instalaes devem, de um modo geral, ser mantidas em boas condies, limpas e desinfectadas (ARESP, 2006), por forma a no constituirem um ponto de acumulao de sujidade e, consequentemente, fonte de contaminao dos alimentos manipulados. fundamental a existncia de um plano de limpeza e desinfeco (Anexo 1), no qual estejam includos todos os procedimentos e periodicidade de limpeza e desinfeco, com indicao das superfcies, equipamentos e utenslios alvo, listagem de todos os produtos a usar em cada caso e respectiva ficha tcnica, que deve incluir dosagem recomendada, tempo de aplicao e modo de preparao e utilizao dos mesmos, e folhas de registo da tarefa, com identificao do responsvel pela mesma (Anexo 2) (ARESP, 2006). Deve-se ter em conta que os detergentes e desinfectantes so compostos txicos e, por isso, devem ser mantidos em local apropriado, separado do local onde se manipulam os alimentos. 3.2.2.2 Plano de controlo de pragas

Embora seja impossvel eliminar todas as pragas que possam estar presentes nos locais onde se manipulam gneros alimentcios, o seu controlo uma forma eficaz de reduzir os riscos a elas associados (Hubbert et al., 1996). Assim, deve ser elaborado um plano de controlo de pragas. O controlo de pragas pode ter uma vertente preventiva, que consiste na implementao de medidas que impeam a entrada de qualquer tipo de praga nas instalaes, as quais se baseiam, essencialmente, na eliminao de potenciais locais de abrigo ou fontes de alimentao para essas pragas; em alternativa, pode ter uma vertente destrutiva, incluindo medidas que, pelo maior custo e menor eficcia, s so implementadas quando necessrio eliminar pragas j existentes nas instalaes (ARESP, 2006). 3.2.2.3 Plano de recolha e eliminao de resduos alimentares

Devem estar previstos e descritos procedimentos para a correcta recolha e eliminao de resduos alimentares, subprodutos no comestveis e outros resduos, de forma a que estes no ponham em risco a segurana dos alimentos, seja como fonte directa ou indirecta de contaminao (Regulamento (CE) n 852/2004). Neste sentido, os locais onde os resduos alimentares so mantidos at sua recolha, devem estar separados dos locais onde ocorre manipulao de alimentos. Na zona de laborao, os caixotes de lixo devem estar em boas condies, permitir a abertura no manual, estar revestidos com sacos de plstico e nunca atingir o seu limite da capacidade (ARESP, 2006).

12

3.2.33.2.3.1

Higiene alimentarSeleco de fornecedores e recepo de matrias-primas

fundamental ter presente que, por melhores que sejam as prticas sanitrias na produo primria, impossvel eliminar todos os agentes patognicos presentes nos alimentos crs (ICMSF, 2002). Uma reduo do risco , contudo, possvel atravs da seleco dos fornecedores e de uma correcta inspeco no acto de recepo das matrias-primas, funcionando como uma garantia de qualidade dos produtos finais (Regulamento (CE) n 852/2004). A seleco dos fornecedores deve basear-se na garantia do cumprimento dos requisitos microbiolgicos ou qumicos estabelecidos para as matrias-primas que se pretendem receber, e nas condies higio-sanitrias das instalaes dos fornecedores, avaliadas atravs de visitas e auditorias. Na recepo das matrias-primas deve-se procurar que no seja aceite nenhum alimento no-conforme (ARESP, 2006), ou seja, com sinais de contaminao, decomposio, interrupo da cadeia do frio ou com materiais estranhos. 3.2.3.2 Manuseamento seguro dos alimentos

Devem estar previstos e descritos procedimentos de produo que garantam um manuseamento seguro dos alimentos, desde a recepo das matrias-primas at ao produto final, com especial ateno ao armazenamento, preparao e confeco (ARESP, 2006). Em particular, deve-se garantir que os alimentos so protegidos contra qualquer contaminao durante as fases de produo, transformao e distribuio (Regulamento (CE) n 852/2004). So frequentes as toxinfeces alimentares que resultam de uma incorrecta manipulao dos alimentos, nomeadamente na sequncia do contacto entre alimentos prontos-a-comer e alimentos crs, da preparao dos alimentos muito tempo antes de serem consumidos, do armazenamento temperatura ambiente, do reaquecimento inadequado de alimentos previamente confeccionados, entre outros (ICMSF, 2002). 3.2.3.3 Manuteno da cadeia do frio

uma obrigao legal pelo Regulamento (CE) n 852/2004, que assenta no facto de se saber que a maioria dos agentes patognicos no se multiplica a temperaturas de refrigerao e/ou congelao. Ou seja, apesar de serem as temperaturas elevadas as responsveis pela eficaz destruio dos microrganismos presentes nos alimentos, so as temperaturas baixas que permitem manter a qualidade dos mesmos (ARESP, 2006).

13

A manuteno das cmaras de refrigerao e congelao, e a forma como os alimentos esto arrumados so fundamentais. O objectivo a manuteno de uma temperatura estvel no interior das cmaras, a garantia da livre circulao do ar frio e a proteco dos alimentos armazenados contra qualquer contaminao (ARESP, 2006). 3.2.3.4 Rastreabilidade

Considerada um elemento essencial na garantia da segurana dos gneros alimentcios (Regulamento (CE) n 852/2004), a rastreabilidade uma obrigao legal (Regulamento (CE) n 178/2002). Segundo este regulamento, os operadores da cadeia alimentar devem ter implementados procedimentos que permitam a identificao dos fornecedores dos gneros alimentcios e dos operadores aos quais tenham sido fornecidos os seus produtos. Para servir este propsito, fundamental que todos os produtos colocados no mercado sejam rotulados de forma adequada (Regulamento (CE) n 178/2002). Os registos que incluem as informaes relacionadas com a rastreabilidade devem ser mantidos por um perodo de tempo que varia consoante os alimentos em causa (ARESP, 2006): se o alimento dispensar a indicao de uma data de validade, os registos devem ser mantidos durante cinco anos; se o alimento tiver uma validade superior a cinco anos, os registos devem ser mantidos durante o tempo de validade do alimento acrescido de seis meses; no caso dos alimentos frescos, perecveis, com validade inferior a trs meses, os registos devem ser mantidos durante seis meses aps o fabrico do alimento; no caso dos alimentos frescos, perecveis, sem validade, destinados ao consumidor final, os registos devem ser mantidos durante seis meses aps a entrega do produto final. 3.2.3.5 Qualidade da gua

No contexto deste trabalho, a gua destinada ao consumo humano : toda a gua utilizada numa empresa da indstria alimentar para fabrico, transformao, conservao ou comercializao de produtos ou substncias destinados ao consumo humano, assim como a utilizada na limpeza de superfcies, objectos e materiais que podem estar em contacto com os alimentos, excepto quando a utilizao dessa gua no afecta a salubridade do gnero alimentcio na sua forma acabada (Decreto-Lei n 306/2007, p.5748). Assim sendo, deve haver um sistema independente de abastecimento de gua potvel, quente e fria, cujos padres de qualidade se devem estender gua reciclada ou que utilizada para a produo de gelo, sendo a nica excepo aplicvel aos produtos da pesca inteiros, nos quais se pode utilizar gua limpa (Regulamento (CE) n 852/2004).

14

Segundo o Decreto-Lei n 306/2007, da competncia das entidades gestoras de sistemas de abastecimento pblico 1 garantir que a gua destinada ao consumo humano seja salubre, limpa e equilibrada, cessando a sua responsabilidade apenas nos casos em que uma eventual no-conformidade seja atribuvel ao sistema de distribuio predial ou sua manuteno. Desta forma, uma indstria alimentar que utilize gua distribuda por uma entidade gestora de sistemas de abastecimento pblico, pode garantir o cumprimento deste pr-requisito atravs do pedido dos registos relativos ao programa de controlo da qualidade da gua implementado, o qual exigido, por lei, a estas entidades (Decreto-Lei n 306/2007). Contudo, de forma a verificar que a gua mantm as caractersticas legalmente exigidas (Decreto-Lei n 306/2007), devem-se realizar anlises microbiolgicas regularmente (Hubbert et al., 1996), a par da avaliao de parmetros qumicos especficos. 3.2.3.6 Procedimentos de retirada do produto do mercado

Complementar ao funcionamento do Sistema de Alerta Rpido, obrigao do operador da cadeia alimentar ter previstos procedimentos destinados a retirar do mercado qualquer gnero alimentcio por si importado, produzido, transformado, fabricado ou distribudo, que suspeite no estar em conformidade com os requisitos de segurana dos gneros alimentcios, bem como comunicar tal facto s autoridades competentes (Regulamento (CE) n 178/2002).

3.2.4

Equipa HACCP

Idealmente, a implementao do sistema HACCP deve ser feita por uma equipa multidisciplinar, de forma a garantir a disponibilidade de todos os conhecimentos especficos que dizem respeito ao gnero alimentcio em questo (CAC, 2003). Contudo, no deixa de ser possvel que um nico indivduo implemente este sistema, desde que esteja bem treinado e procure todas as informaes necessrias na literatura cientfica e em guias de orientao (CAC, 2003). Independentemente dos casos, o sucesso da equipa HACCP requer o empenho e envolvimento totais de empregadores e trabalhadores (CCE, 2005).

3.2.5

Produto final e utilizao prevista

De acordo com o Regulamento (CE) n 852/2004, quando se fala em higiene e em gneros alimentcios prprios para consumo, tem que se ter em conta a sua utilizao prevista. Desta forma, uma vez identificado o mbito (segmento da cadeia alimentar envolvido) do plano HACCP que se pretende desenvolver, a primeira responsabilidade da equipa a

Uma entidade gestora de sistemas de abastecimento pblico a entidade responsvel pela explorao e gesto de um sistema de gua para consumo humano, atravs de redes fixas ou de outros meios de fornecimento de gua, no mbito das atribuies de servio pblico (Regulamento (CE) n 306/2007 de 27 de Agosto, 2007, p.5748).

1

15

descrio completa do produto, individualmente ou por grupos de acordo com semelhanas nas caractersticas ou processos de fabrico (CAC, 2003). Desta forma, importante identificar a utilizao normal esperada do produto pelo consumidor final (CAC, 2003).

3.2.6

Diagrama de fabrico

Para cada produto, cuja descrio foi feita previamente, deve ser construdo, pela equipa HACCP, um diagrama de fluxo, que inclua todas as etapas do processo de fabrico (CAC, 2003) e um conjunto de informaes tcnicas relevantes, a saber, intervalos de segurana entre fases do processo, incorporao de matrias primas e ingredientes, a circulao dos produtos, entre outros. (CCE, 2005). De forma a verificar a adequao do diagrama de fabrico, este deve ser comparado aos procedimentos no local, em todas as etapas e fases de produo (CAC, 2003). Caso se detecte alguma discrepncia, deve-se proceder alterao do diagrama no sentido de ele representar a realidade do processo (CCE, 2005).

3.3 Implementao dos princpios do HACCP na Teoria3.3.1 Identificao de perigos e determinao das medidas de controlo (1 princpio)Utilizando o diagrama de fabrico previamente construdo, e considerando que um perigo um agente biolgico, qumico ou fsico presente nos gneros alimentcios ou nos alimentos para animais, ou uma condio dos mesmos, com potencialidades para provocar um efeito nocivo para a sade (Regulamento (CE) n 178/2002, p.31/8), devem-se identificar e listar, para cada etapa do processo de fabrico, todos os perigos cujo aparecimento se prev (CAC, 2003). Entre perigos biolgicos, qumicos e fsicos, estima-se que se totalizem cerca de cinco mil perigos sanitrios associados aos alimentos (Bernardo, 2006). De seguida, vai-se determinar quais desses perigos tm de ser eliminados ou reduzidos para nveis aceitveis de forma a que o produto obtido possa ser considerado prprio para consumo (CAC, 2003). Para que as informaes obtidas sejam vlidas e completas, deve-se ter em conta (CCE, 2005): a ocorrncia provvel de perigos e a gravidade dos seus efeitos adversos para a sade; a avaliao qualitativa e quantitativa da presena dos perigos;

16

a sobrevivncia ou multiplicao de microrganismos patognicos e a gerao a taxas inaceitveis de substncias qumicas nos produtos intermdios, nos produtos finais ou na linha de produo ou suas proximidades; a produo ou persistncia nos alimentos a taxas inaceitveis de toxinas ou outros produtos indesejveis resultantes do metabolismo microbiano, de substncias qumicas ou de agentes fsicos ou alergenos; a contaminao (ou recontaminao) de natureza biolgica (microrganismos, parasitas), qumica ou fsica das matrias-primas, dos produtos intermdios ou dos produtos finais. Seguidamente ser possivel ponderar sobre quais as medidas de controlo que permitem eliminar ou reduzir para nveis aceitveis cada um dos perigos identificados, sendo que algumas medidas adoptadas podero ser eficazes em relao ao controlo de vrios perigos, enquanto que outros perigos exigiro a aplicao de vrias medidas para o seu controlo (CAC, 2003). Para servir de apoio a esta tarefa pode-se recorrer a informaes disponveis em literatura especializada sobre as medidas que se tm mostrado eficazes no controlo da maioria das j reconhecidas doenas de origem alimentar (ICMSF, 2002). Como visto anteriormente, h casos em que a correcta implementao dos programas de pr-requisitos se mostra suficiente para a reduo ou eliminao dos perigos identificados. Excepcionalmente, nestes casos podem-se ignorar os princpios do sistema HACCP que se seguem a este (CCE, 2005), desde que isso no impea que sejam alcanados os objectivos a que a legislao alimentar se prope pelo Regulamento (CE) n 178/2002. Uma correcta identificao dos perigos e das suas medidas de controlo fundamental para o sucesso de um sistema de autocontrolo como o HACCP, e tem por base a realizao de uma anlise de risco. 3.3.1.1 Anlise de risco

Conforme apresentada pela Comisso do Codex Alimentarius (2003), a anlise de risco uma ferramenta fundamental para a boa implementao de sistemas de autocontrolo como o HACCP, j que estes se baseiam em informaes que dela resultam. A anlise de risco constituda por trs componentes: a avaliao do risco (abordagem cientfica do risco e dos factores que o influenciam), a gesto do risco (baseia-se nos conhecimentos obtidos na avaliao do risco, e pretende apresentar polticas de garantia de segurana e qualidade dos alimentos para consumo, medidas reguladoras e de controlo) e a comunicao do risco (troca de informao entre todos os operadores da cadeia alimentar e autoridades competentes) (Jouve, Stringer & Baird-Parker, 1998) (Figura 1).

17

Figura 1: Estrutura da Anlise de Risco (FAO, 2005, adaptado).

Avaliao do Risco Identificao do perigo Caracterizao do perigo Avaliao da exposio Caracterizao do risco

Gesto do Risco Poltica de avaliao do risco Implementao de medidas Monitorizao e Actualizao

Comunicao do Risco

Embora no seja fcil de quantificar, quando se faz a avaliao do risco deve-se ter em conta a probabilidade de ocorrncia do perigo em questo. Com base em dados epidemiolgicos, possvel agrupar os perigos em diferentes categorias em funo da sua probabilidade de ocorrncia: baixa, mdia ou elevada (ARESP, 2006). Deve tambm considerar-se, para a avaliao do risco, a severidade de um perigo em funo das consequncias para a sade do consumidor (ARESP, 2006). A severidade das consequncias dos perigos pode, ento, ser (ARESP, 2006): Baixa, quando os perigos so agentes de baixa patogenicidade, no provocando efeitos graves na sade do consumidor; inclui, tambm, os perigos qumicos e fsicos; Mdia, no caso das consequncias serem mais graves e requerem assistncia mdica; Alta, na medida em que provocam efeitos graves para a sade do consumidor, obrigando ao internamento hospitalar e podendo conduzir morte. A combinao destes dois parmetros (ocorrncia e severidade) fundamental para determinar a importncia de cada perigo. Na Tabela 2 feito o cruzamento destes dois parmetros, sendo realadas (a cor) as classificaes de perigos a considerar. A implementao do sistema HACCP assenta no conhecimento dos perigos que podem surgir nos alimentos, de modo a serem criadas medidas de controlo eficazes na sua eliminao ou reduo para nveis considerados aceitveis. Desta forma, ser necessrio proceder identificao dos perigos, precisamente um dos componentes da avaliao de risco.

18

Tabela 2: Classificao dos perigos quanto probabilidade de ocorrncia e severidade das complicaes (ARESP, 2006). Severidade Baixa Probabilidade de ocorrncia Baixa Mdia Elevada Legenda: Perigos para os quais a determinao de medidas de controlo eficazes fundamental para salvaguardar a segurana do consumidor. Mdia Alta

3.3.1.2

Perigos biolgicos

Estudos epidemiolgicos permitiram relacionar determinados processos patolgicos do Homem com agentes microbianos especficos e, nalguns casos, com os gneros alimentcios consumidos (ICMSF, 2002). Assim que esta relao confirmada, e de forma a evitar que um novo surto de toxinfeco alimentar com a mesma origem volte a ocorrer (ICMSF, 2002), cabe aos operadores da cadeia alimentar garantir que so aplicadas as medidas de controlo, entretanto consideradas eficazes por entidades de referncia, para o perigo em causa. De facto, a maioria dos gneros alimentcios no so estreis, sendo a qualidade microbiolgica dos alimentos essencialmente garantida por uma boa seleco dos produtos crs e controlo dos fornecedores, das caractersticas do produto final e do processo de fabrico, e da correcta aplicao de boas prticas de higiene, de programas de pr-requisitos e dos princpios HACCP, desde a produo at ao consumidor final (ICMSF, 2002). Podem, assim, identificar-se os seguintes factores de risco (APED, 2004): insuficientes cuidados de higiene pessoal; insuficientes cuidados de higiene na manipulao dos alimentos; conservao dos alimentos em condies de tempo-temperatura e humidade inadequadas; prticas que favoream a contaminao cruzada; inadequada higienizao de instalaes, equipamentos e utenslios; inadequado controlo de pragas. reconhecido que, para que a ingesto de um alimento seja responsvel pela ocorrncia de uma toxinfeco alimentar de origem microbiana, ou pela transmisso de uma doena parasitria, necessrio que estejam reunidos determinados factores. Em primeiro lugar, tem de existir um agente microbiano ou parasitrio que, no caso de produtos de origem animal, pode ter tido origem ainda em vida; numa fase posterior, tem de estar presente uma fonte de contaminao, i.e., utenslios, equipamento e manipuladores; depois, tm de estar 19

renidas condies favorveis ao crescimento bacteriano e sobrevivncia dos agentes parasitrios, i.e., gua, nutrientes, pH, temperatura e tempo; por fim, tem de existir, no alimento para consumo, uma quantidade de agente patognico suficiente para desencadear o processo patolgico (Hubbert et al., 1996). No que diz respeito aos perigos biolgicos, o que se pretende atravs da avaliao do risco que, conhecendo as caractersticas dos alimentos e dos microrganismos que neles se prev poderem estar presentes, colocando, assim, em causa a sua qualidade e segurana, se determinem quais os factores que interferem no crescimento microbiano, e cuja manipulao/transformao e monitorizao permitam o controlo eficaz de cada um dos perigos identificados. O conhecimento da biologia dos microrganismos mais provveis de estarem presentes nos alimentos permitiu reconhecer diversas formas de inibir ou retardar o crescimento bacteriano (Hubbert et al., 1996). Do que sabido sobre microbiologia, so factores fundamentais para o crescimento dos microrganismos a disponibilidade de nutriente e gua no meio, a temperatura, o pH, a presena de oxignio (O2) e o tempo. No que se refere aos alimentos enquanto meio de crescimento para os microrganismos, entre estes factores podem-se identificar a temperatura, humidade, gases atmosfricos como parmetros extrnsecos, ou a composio qumica, pH, actividade da gua (aw) e potencial redox como parmetros intrnsecos (Guedes, 2007). De todos estes parmetros, os mais importantes so a temperatura, o pH e a aw (Forsythe, 2000). Assim sendo, sabendo que cada agente microbiano tem um crescimento ptimo dentro de limites bem definidos de determinados parmetros, nomeadamente, temperatura, pH e aw (Anexo 3), se manipularmos estes parmetros podemos condicionar o crescimento desses agentes (Hubbert et al., 1996). A manipulao destes parmetros tem-se mostrado um eficaz mtodo de controlo, mesmo considerando que alguns microrganismos so capazes de se multiplicar em condies pouco favorveis (Hubbert et al., 1996). Nutrientes Todos os microrganismos necessitam de nutrientes para o seu metabolismo energtico e, como tal, para que se possam multiplicar (Prescott, Harley & Klein, 2005). Destes, alguns so denominados de macronutrientes pois so necessrios em grandes quantidades como o carbono, oxignio, hidrognio, azoto, enxofre, fsforo, potssio, clcio, magnsio e ferro, sendo na sua maioria constituintes dos hidratos de carbono, lpidos, protenas e cidos nuclecos. Outros so necessrios em menores quantidades e, por isso, designados de micronutrientes como o mangans, zinco, cobalto, molibdnio, nquel e cobre. De um modo geral, as necessidades de carbono, oxignio e hidrognio so satisfeitas em simultneo, pois a maioria das fontes de carbono fornecem tambm os outros dois nutrientes (Prescott et al., 2005).

20

De acordo com a forma como os microrganismos obtm carbono, podem ser classificados em (Prescott et al., 2005): autotrficos, que tm o CO2 como nica ou principal fonte de carbono, muitos dos quais se servem da fotossntese como fonte de energia; heterotrficos, que no so capazes de reduzir o CO2, necessitando de molculas como a glucose, como fonte de carbono. Para alm dos nutrientes acima referidos, os microrganismos necessitam tambm de energia e de electres (Prescott et al., 2005), sendo, tambm, classificados de acordo com o modo como os adquirem. Assim, no que diz respeito fonte de energia, os microganismos podem ser: fototrficos, se adquirem energia da luz; quimiotrficos, se adquirem energia a partir da oxidao de molculas orgnicas ou inorgnicas. Duas so tambm as fontes de electres. Desta forma, os microrganismos podem ser (Prescott et al., 2005): litotrficos, se obtm electres atravs da reduo de molculas inorgnicas; organotrficos, se obtm electres atravs da reduo de molculas orgnicas. Tendo por base a informao anterior, os microrganismos podem ser agrupados em fotolitoautotrficos, fotorganoheterotrficos, quimiolitoautotrficos ou quimiorganoheterotrficos (Prescott et al., 2005). neste ltimo grupo que se encontram a maioria dos microrganismos que esto na origem da contaminao dos gneros alimentcios. Gases atmosfricos A constituio da atmosfera onde os microrganismos se encontram um factor importante para a sua capacidade de multiplicao. O modo como os microrganismos se comportam perante a presena/ausncia de oxignio (O2) na atmosfera permite classific-los em (Prescott et al., 2005): aerbios, quando so capazes de se multiplicar na presena de O2;o

microaerbios: no toleram o O2 da atmosfera (20%), multiplicando-se apenas em atmosfera com 2% a 10% de O2.

anaerbios: quando so capazes de se multiplicar na ausncia de O2;o

anaerbios facultativos: no necessitam de O2 para se multiplicarem mas tm um crescimento mximo na sua presena, comportando-se, nesse caso, como aerbios; anaerbios aerotolerantes: no necessitam de O2 para se multiplicarem e so indiferentes sua presena; anaerbios estritos: no toleram a presena de O2.

o

o

21

Temperatura O crescimento microbiano ocorre entre um valor mnimo e um valor mximo de temperatura (Anexo 3), com um valor ptimo, caracterizado por um crescimento mximo, para cada microrganismo (Forsythe, 2000) (Figura 2). este valor ptimo que determina a que grupo pertence cada microrganismo (Figura 3) (Prescott et al., 2005): psicrfilos: com uma temperatura ptima entre os 12 C e os 15 C, multiplicando-se entre os 0 C e os 20 C; psicrotrficos: embora se possam multiplicar entre os 0 C e os 7 C, tm um crescimento mximo entre os 20 C e os 30 C, no se multiplicando acima dos 35 C; mesfilos: tm o seu mximo de crescimento entre os 20 C e os 45 C; termfilos: multiplicam-se acima dos 45 C, com um crescimento mximo entre os 55 C e os 65 C; hipertermfilos: incluem os microrganismos que conseguem multiplicar-se acima dos 90 C, normalmente com um crescimento mximo entre os 80 C e os 113 C.

Figura 2: Curva de crescimento bacteriano em funo da temperatura (Prescott et al., 2005, adaptado).ptimo

Taxa de crescimento

Mnimo

Mximo

Temperatura

22

Figura 3: Classificao dos microrganismos em funo das suas temperaturas ptimas de crescimento (Prescott et al., 2005, adaptado).

Hipertermfilos

Taxa de crescimento

Termfilos Mesfilos Psicrotrficos Psicrfilos

Temperatura

Sendo a temperatura corporal do Homem aproximadamente 37 C, a maioria dos microrganismos potencialmente patognicos pertencem ao grupo dos mesfilos, cuja multiplicao pode ocorrer entre os 5 C e os 47 C (Forsythe, 2000). Ou seja, se for evitada a permanncia dos alimentos dentro deste intervalo de temperaturas, possvel controlar o crescimento da populao destes microrganismos (Hubbert et al., 1996). Desta forma, conservar os alimentos em refrigerao ou congelao, atingir temperaturas elevadas (no interior das peas) durante a cozedura ou assadura e promover um posterior arrefecimento rpido, so prticas importantes para destruir ou inibir o crescimento microbiano (Hubbert et al., 1996). Contudo, nos casos em que estas medidas levam apenas inibio da multiplicao dos microrganismos, no os destruindo, as suas populaes podem crescer assim que se voltem a verificar as condies favorveis, a ponto de poderem comprometer a segurana dos alimentos, sendo aqui o tempo o factor decisivo. De forma semelhante, podem estar na origem de alimentos com elevado grau de contaminao microbiana tanto os esporos como as toxinas que, ao contrrio das formas vegetativas dos microrganismos, podem no ser destruidos mesmo quando os alimentos so sujeitos a temperaturas superiores a 60 C (Hubbert et al., 1996).

23

pH O pH a medida da actividade do io H+ numa soluo, e definido como o logaritmo negativo da concentrao do io H+ (Prescott et al., 2005, p.121). A escala de pH inclui valores entre o 0 (extremo cido) e o 14 (extremo alcalino), correspondento o 7 a um valor de pH neutro (Prescott et al., 2005). Tal como acontece em relao temperatura, tambm existe um valor ptimo de pH especfico para cada microrganismo (Anexo 3), no qual o crescimento microbiano mximo (Forsythe, 2000). Como referido anteriormente, o pH um dos parmetros intrnsecos aos alimentos que interferem no crescimento bacteriano, ou seja, cada alimento tem um valor de pH especfico (Anexo 4). Desta forma, cruzando a informao sobre o pH especfico dos alimentos com os valores ptimos de pH dos microrganismos, possvel prever quais os que, mais provavelmente, iro aparecer em determinado gnero alimentcio, influenciando, assim, a sua prevalncia. Actividade da gua A actividade da gua ou aw, definida como a razo entre a presso do vapor de gua de um alimento e a presso do vapor da gua pura (Hubbert et al., 1996, p.203), a medida da quantidade de gua disponvel no alimento (Forsythe, 2000) e que pode ser utilizada pelos microrganismos. Quando a aw baixa, ou seja, h pouca disponibilidade de gua no meio, tem de haver um maior esforo do microrganismo para manter uma elevada osmolaridade intracelular e, dessa forma, reter a gua no seu interior (Prescott et al., 2005). Um valor de aw para um microrganismo (Anexo 3) corresponde ao limite mnimo em que esse se consegue multiplicar (Forsythe, 2000); perante valores de aw inferiores a esse limite mnimo ou, no extremo, perante valores de aw inferiores a 0.60 (Hubbert et al., 1996), as bactrias so incapazes de se multiplicar embora no se verifique a sua morte, ou seja, as formas mantm-se inactivas mas infecciosas (Forsythe, 2000). O intervalo de valores de aw no qual os microrganismos tm um crescimento mximo permite a sua classificao em (Prescott et al., 2005): Osmotolerantes, os que tm a capacidade de manter uma elevada osmolaridade intracelular, multiplicando-se num grande intervalo de valores de aw; Halfilos, os que tm a capacidade de se multiplicarem em meios com elevada concentrao de cloreto de sdio (NaCl) ou outros sais, ou seja, em meios com baixa aw (Figura 4).

24

Figura 4: Padres de crescimento bacteriano de diferentes microrganismos em funo da concentrao de cloreto de sdio (NaCl) (Prescott et al., 2005, adaptado).

Taxa de crescimento

Concentrao de NaClNo halfilas Halotolerantes Halfilas moderadas Halfilas extremas

De forma semelhante ao referido para o pH, tambm este um parmetro intrnseco dos alimentos e, se for cruzada a informao relativa aw mnima a que um determinado microrganismo cresce (Anexo 3) com a informao sobre os valores de aw especficos de cada alimento (Anexos 5), possvel ter uma noo de quais os microrganismos mais provveis de contaminar um determinado gnero alimentcio. Tempo Outro parmetro que se pode trabalhar o tempo. Como possvel ver na curva de crescimento bacteriano tpica (Figura 5), obtida em condies ptimas (laboratoriais), na fase de maior crescimento, a populao bacteriana duplica em intervalos de tempo regulares, que podem ir dos 12 minutos at 24 horas ou mais (Todar, 2007), consoante o organismo em questo, a disponibilidade de nutrientes, a temperatura, o pH e a aw (Forsythe, 2000). A maioria das bactrias cujas culturas crescem em laboratrio duplicam a sua populao cada 15 minutos a 1 hora, sendo que, na realidade, nem sempre se cumprem estes intervalos (Todar, 2007). Por exemplo, em condies laboratoriais, uma populao de E. coli duplica cada 15-24 minutos; contudo, no tracto digestivo, pode demorar 12 a 24 horas at que tal ocorra (Todar, 2007). 25

Figura 5: Curva de crescimento bacteriano tpica (Forsythe, 2000, adaptado).

Contagem de clulas viveis (log10 UFC/ml)

10 9 8 7 6 5 4 3 2 Lag Estacionria Exponencial Morte

Tempo

Legenda: Na curva de crescimento bacteriano possvel identificar quatro fases. A fase Lag, que se caracteriza pela ausncia de multiplicao bacteriana, havendo apenas produo de enzimas e protenas necessrias para a multiplicao. A fase exponencial, na qual a populao bacteriana duplica em intervalos de tempo regulares. A fase estacionria, determinada pelo esgotamento de nutrientes e o aumento de produtos txicos com origem no metabolismo bacteriano, que resultam na existncia de iguais taxas de mortalidade e de crescimento bacteriano. E a fase de morte, caracterizada por uma taxa de mortalidade superior taxa de multiplicao.

Quanto menor for o tempo de exposio a temperaturas favorveis a ptimas, menor a probabilidade de se atingir uma quantidade de agente patognico no alimento capaz de provocar doena ao consumidor (Anexo 6). Assim sendo, de um modo geral, considerase que um alimento que se mantenha a uma temperatura entre os 4,4 C e os 60 C deve ser consumido em menos de 4 horas, por exemplo nos casos em que no foi respeitada a cadeia do frio, no se atingiram as temperaturas mnimas de cozedura para um controlo eficaz dos perigos, ou no se procedeu ao posterior rpido arrefecimento (Hubbert et al., 1996). Pode-se, ento, concluir que, para preservar as caractersticas de um alimento e aumentar a sua validade, podem ser utilizados vrios processos tecnolgicos, como a cozedura (j que a maioria dos microrganismos patognicos so destruidos a temperaturas acima dos 60 C), a refrigerao/congelao, uma vez que abaixo dos 4,4 C a maioria dos microrganismos patognicos no se multiplica, ou a desidratao, visto que a reduo da quantidade de gua no alimento no s reduz a multiplicao bacteriana como inibe as alteraes proteolticas. Tambm a irradiao, qual so particularmente sensveis Campylobacter jejuni, Echerichia coli, Staphylococcus aureus, Listeria monocitogenes e Salmonella spp., e

26

a adio de produtos qumicos que alteram o pH e a presso osmtica, tornando o ambiente menos favorvel ao crescimento bacteriano, podem ser medidas preventivas no controlo dos microrganismos (Hubbert et al., 1996). 3.3.1.3 Perigos qumicos

A contaminao dos alimentos por compostos qumicos pode ocorrer em qualquer fase da cadeia alimentar. No caso dos alimentos de origem animal, podem estar presentes resduos de substncias qumicas s quais os animais estiveram expostos ainda em vida, como medicamentos de uso veterinrio e substncias proibidas como hormonas anabolizantes, beta-agonistas, tireostcticos, antibiticos, desparasitantes. Posteriormente, os alimentos podem sofrer adulterao qumica quer pelos aditivos, substncias qumicas adicionadas intencionalmente durante o processo de produo dos alimentos, como corantes, conservantes ou edulcorantes, policlorados quer por metais contaminantes, pesados, substncias adicionadas aromticos inadvertidamente durante o processo de produo dos alimentos, como dioxinas, dibenzofuranos, bifenil, hidrocarbonetos policclicos, e diversos pesticidas. H ainda a considerar as substncias qumicas naturais cuja presena nos alimentos indesejvel, como as biotoxinas marinhas de bivalves e peixes txicos, micotoxinas, toxinas dos cogumelos, alcalides dos vegetais, glucosdeos cianognicos, fitatos, oxalatos e factores anti-vitamnicos (Hubbert et al., 1996; Bernardo, 2006). Os perigos qumicos tm tido uma influncia cada vez maior na segurana e qualidade dos alimentos. Os principais factores de risco a eles associados so (APED, 2004): favorecimento de permanncia de resduos qumicos associado a instalaes mal projectadas; manuteno de equipamento deficiente; prticas que favoream a contaminao cruzada; inadequados procedimentos ou agentes de limpeza e desinfeco; incumprimento dos procedimentos de limpeza e desinfeco definidos no plano de higienizao. Contudo, na sua maioria, podem ser controlados: 1) em vida, pelo cuidado na escolha dos alimentos para animais destinados ao consumo humano e dos medicamentos administrados, respeito pelas doses e intervalos de segurana exigidos; 2) pelo respeito das listas de substncias qumicas e materiais permitidos na manipulao e processamento de alimentos para consumo humano; 3) pela implementao dos programas de pr-requisitos; e 4) pela aplicao de boas prticas de higiene (Hubbert et al., 1996). 3.3.1.4 Perigos fsicos

Os pergos fsicos podem ser diversos e ter vrias origens (Tabela 3), destacando-se como principais factores de risco insuficincias nas infra-estruturas, a presena de objectos 27

estranhos actividade e o mau estado de limpeza e/ou conservao das instalaes, viaturas, equipamentos ou utenslios (APED, 2004).Tabela 3: Perigos fsicos associados aos alimentos para consumo. Perigo Papel / Carto / Plstico / Metal / Madeira Vidro / Cermica Cola Latex / Luvas descartveis Espinhas / Ossos Cabelos / Penas / Pelos Colares / Brincos / Anis / Pulseiras Insectos / Larvas / Parasitas Terra / Pedras / Tecido / Fios Origem

Matrias-primas Embalagens Equipamento Manipuladores Ambiente

3.3.1.5

Perigos nutricionais

Embora a regulamentao comunitria se refira apenas aos perigos biolgicos, qumicos e fsicos (Regulamento (CE) n 178/2002), tem-se verificado uma crescente preocupao da comunidade cientfica em relao aos que so j referidos como perigos nutricionais. Estes, dizem respeito utilizao excessiva ou escassa de determinados nutrientes como o sal, acar, lcool, vitaminas, gorduras e sais minerais, a qual pode ter um impacto negativo na sade dos consumidores, como o aumento da incidncia de diabetes, hipertenso arterial, obesidade mrbida e colesterol (Bernardo, 2006). 3.3.1.6 Medidas de controlo

De um modo geral, tendo conhecimento dos factores que predispem a uma toxinfeco alimentar, funo da equipa HACCP procurar que no haja nenhuma fonte de contaminao na linha de produo, reduzir/eliminar as condies que favoream o crescimento bacteriano e sobrevivncia de parasitas que possam estar presentes, destruir os eventuais agentes patognicos que estejam a contaminar os alimentos, e prevenir a adulterao por aditivos ou contaminantes. A aplicao de medidas de controlo serve este propsito, permitindo eliminar ou reduzir para nveis considerados aceitveis, o risco associado ao consumo de um determinado alimento. Assim sendo, as medidas de controlo podem ser agrupadas de acordo com a funo que desempenham (ICMSF, 2002): Controlo da contaminao inicial: de que so exemplo medidas como a seleco de matrias-primas, evitando-se alimentos de elevado risco como o leite ou ovos crs, a seleco dos fornecedores e a realizao de anlises microbiolgicas ou inspeco das matrias-primas recepo;

28

Preveno do aumento dos contaminantes: atravs de medidas que impeam a contaminao acrescida, i.e., boas prticas de higiene, separao de gneros alimentcios crs e confeccionados, entre outros, ou o crescimento dos agentes microbianos j presentes, ou seja, controlo da temperatura, pH ou aw; Reduo ou eliminao dos contaminantes dos alimentos: destruindo o perigo em causa, por exemplo, pela congelao ou cozedura, ou removendo-o, como pela lavagem ou filtrao. Para que se saibam quais as medidas apropriadas para o controlo dos perigos identificados necessrio conhecer cada um desses perigos, nomeadamente a sua origem e factores que predispem a sua presena ou que so, no caso dos perigos biolgicos, indispensveis para a sua multiplicao (temperatura, pH ou aw). Diversos estudos que vm sendo realizados permitiram obter estas informaes, as quais servem de base para a elaborao de recomendaes comunitrias ou cdigos de boas prticas. Nestes documentos podemse encontrar medidas que, segundo os referidos estudos, se mostraram eficazes no controlo de determinados perigos. Cabe equipa HACCP escolher as medidas de controlo adequadas realidade de que responsvel, baseando-se na informao disponvel nos documentos referidos para a implementao do plano HACCP.

3.3.2

Pontos crticos de controlo (2 princpio)

O objectivo determinar quais as etapas em que a aplicao de medidas de controlo fundamental para reduzir o risco a elas associado, ou seja, para que se eliminem, ou reduzam para nveis aceitveis, os perigos identificados aquando da anlise de risco realizada anteriormente (CAC, 2003). Pretende-se, assim, determinar os chamados pontos crticos de controlo (PCC). Embora seja uma classificao que, hoje em dia, no tem aplicao prtica, os PCC podem, teoricamente, ser de dois tipos (Hubbert et al., 1996): 1) PCC 1, aqueles em que as medidas de controlo permitem eliminar o perigo e, consequentemente, o risco a eles associado; e 2) PCC 2, aqueles em que as medidas de controlo apenas permitem reduzir o perigo, ou seja, o risco a eles associado reduzido mas no h controlo absoluto do perigo. A fim de ajudar nesta tarefa, podem utilizar-se rvores de deciso adequadas situao, com as quais se aborda sucessivamente cada etapa do processo de fabrico, mas mantendo uma viso global do processo de modo a no criar pontos crticos desnecessrios (CAC, 2003). Um exemplo de uma rvore de deciso para derterminao de PCC apresentado na Figura 6. Deve ter-se em conta que, para o controlo de um s perigo, pode haver a necessidade de mais do que uma etapa estar sujeita a controlo, ou seja, mais do que um PCC (CAC, 2003). Por outro lado, podem ser detectados perigos para os quais no existe nenhuma etapa cujo 29

controlo permita a sua eliminao ou reduo para os nveis aceitveis, o que compromete a segurana do produto final. Nestes casos, partindo do pressuposto de que a utilizao prevista do produto final se mantm, deve rever-se o processo de fabrico, de modo a modificar/eliminar aquelas etapas e ser assim possvel incluir as medidas de controlo necessrias obteno de um produto seguro (CAC, 2003). Em todas as etapas que no forem consideradas PCC no deve, contudo, ser ignorado o seu controlo. Nestes casos o controlo importante, mas no crtico para que o produto final possa ser considerado prprio para consumo. Estas etapas so, ento, consideradas PC; caracterizam-se pela existncia de um procedimento documentado a elas associado, de forma a serem respeitadas as boas prticas de higiene em todas as etapas do processo de fabrico (Culbertson et al., 2006). As trs principais funes dos PC so evitar a contaminao biolgica, qumica e/ou fsica dos alimentos, prevenir a multiplicao microbiana e garantir a correcta aplicao dos procedimentos que garantem a manuteno dos equipamentos e utenslios nas melhores condies (Culbertson et al., 2006).

3.3.3

Limites crticos (3 princpio)

Uma vez considerado que, mantendo o controlo dos PCC identificados, possvel obter um produto final prprio para consumo, o passo seguinte na implementao do sistema HACCP consiste na determinao dos critrios de higiene do processo, definidos no regulamento (CE) n 2073/2005 (p.L338/5) como qualquer critrio que indica se o processo de produo funciona de modo aceitvel. No aplicvel aos produtos colocados no mercado. Estabelece um valor de contaminao indicativo, acima do qual se tornam necessrias medidas correctivas para preservar a higiene do processo em conformidade com a legislao alimentar.

30

Figura 6: rvore de deciso para determinao de PCC (FAO/WHO, 2003, adaptado).

31

Especificamente para o controlo de perigos biolgicos, pode-se falar em quatro tipos de critrios: 1) os de desempenho, que definem os objectivos que se pretende atingir ao implementar uma determinada medida de controlo, e que garantem a segurana do alimento; 2) os de processo, ou seja, parmetros que devem ser controlados e monitorizados nos PCC para que os critrios de desempenho sejam alcanados; 3) os de produto, que so as caractersticas do alimento que impedem ou previnem a presena de um determinado perigo em nveis que se traduzem num risco inaceitvel; e 4) critrios que se caracterizam por garantir um elevado grau de segurana, e substituem os critrios de processo nos casos em que no h informao suficiente sobre os critrios de produto ou de desempenho (ICMSF, 2002). Atravs destes critrios, e tendo por base os seus limites crticos, pretende-se que seja possvel detectar uma eventual perda de controlo num dos PCC identificados (ICMSF, 2002). Os limites crticos consistem nos valores extremos aceitveis para a garantia da segurana do gnero alimentcio (CCE, 2005), e variam consoante o perigo, e respectivo risco (Hubbert et al., 1996). Assim sendo, para cada PCC devem ser definidos limites crticos, mais frequentemente relacionados com temperatura, tempo, humidade, pH, aw, cloro disponvel, aspecto visual e textura, que devem ser especficos para o perigo que pretendem controlar, vlidos, mensurveis e aplicveis ao tipo de produo em questo. Contudo, no mesmo PCC pode ser considerado mais do que um limite crtico, de acordo com a situao (CAC, 2003). A regulamentao comunitria no prev limites crticos para PCC. Os critrios que devem ser tidos em conta para o controlo dos perigos identificados, assim como os respectivos limites crticos, so apresentados em literatura especializada como recomendaes comunitrias, cdigos de boas prticas ou artigos cientficos, que podem ser adaptados pela equipa HACCP sua realidade, uma vez que no so obrigao legal. Por exemplo, na Tabela 4 so apresentadas algumas sugestes das temperaturas de cozedura, manuteno a quente, arrefecimento e conservao a frio, que se podem encontrar na literatura especializada. Os limites crticos so estipulados, pelo operador, em funo dos nveis de segurana que pretende obter no produto final, e que, em particular no que diz respeito ao controlo de perigos biolgicos, devem respeitar os critrios j definidos na regulamentao comunitria em vigor (Regulamento (CE) n 1441/2007). Desta forma, salienta-se a importncia de estar enquadrada, nas aces de verificao, a realizao de anlises microbiolgicas no produto final (CCE, 2005).

32

Tabela 4: Temperaturas de cozedura, manuteno a quente, arrefecimento e conservao a frio recomendadas. Cozedura Manuteno Quente > 63C 52C, 2h 54C, 4h 58C, 8h > 60C Arrefecimento Referigerao Congelao Referncia

> 74C no interior, 2 min

< 10C em 120 min

< 5C

APED, 2004

> 75C no interior Produtos lcteos: > 72C Arroz, Massas, Vegetais e Frutos: no tm Carne de aves: > 74C, 15seg. Ovos: >70C, 15 seg. Peixe, crustceos: > 65C ou > 63C, 15 seg ou > 60C ou alterao de cor Carnes vermelhas pea: > 63C ou alterao de cor Carnes vermelhas picadas: > 70C (Salmonella) > 80C (VTEC) Carnes vermelhas: > 63C Peixe: at desfazer com um garfo Salsichas, Enchidos, Porco e Fiambre: > 71C Ovos: > 71C Crustceos: > 71C Carne de aves caseiras e sobras: > 74C Carnes de aves (peitos): >77C Carnes de aves (peas inteiras, asas, coxas e pernas): > 82C > 75C no interior

Dos 60C aos 5C em 2h

1-4C

< -18C

ARESP, 2006

Dos 60C aos 10C em 4h Dos 60C aos 5C em 6h < 21C em 2h < 5C no interior, em 6h

< 5C

< -18C

IFCA/IFSA, 2003

Guedes, 2007

> 63C

< 10C em 150 min

0-5C

< -18C

Pearce, Maunsell & Bolton, 2006

33

3.3.4

Vigilncia ou Monitorizao (4 princpio)

A monitorizao dos PCC, atravs da medio e observao dos critrios de higiene dos processos que lhes dizem respeito como temperaturas, tempos, humidade, pH, aw, cloro disponvel, aspecto visual e textura, deve permitir detectar a respectiva perda do controlo (CAC, 2003); como tal, deve ser adequada ao tipo de perigo em causa (Hubbert et al., 1996). A deteco de uma eventual perda de controlo deve ser conseguida em tempo til, de modo a poderem ser tomadas as aces correctivas adequadas, preferencialmente antes de se ultrapassarem os limites crticos. A monitorizao deve ser contnua ou com uma frequncia tal que permita alcanar este objectivo (CAC, 2003). Caso se verifique uma tendncia para a ocorrncia frequente de perda de controlo num dado PCC, devem realizarse ajustes no procedimento, de modo a corrigir esta situao (CCE, 2005). A implementao de medidas de controlo em PCC, e sua monitorizao, tem-se mostrado mais eficaz na obteno de uma maior qualidade dos alimentos do que a realizao de anlises microbiolgicas ao produto final. Nomeadamente, estas ltimas so morosas, por vezes com baixa sensibilidade e especificidade, revelando uma baixa eficcia na deteco, em tempo til, da perda de controlo de um dado PCC (ICMSF, 2002). Como forma de monitorizao, prefervel recorrer a medies fsicas como a temperatura, e qumicas como o pH, em alternativa aos teste microbiolgicos, j que, no s do resultados mais rapidamente, como podem dar indicao sobre uma maior carga microbiana do produto (CAC, 2003).

3.3.5

Aces correctivas (5 princpio)

Devem estar previstas aces correctivas adequadas e especficas para cada PCC, de forma a fazer face a quaisquer desvios que possam ocorrer, e assim restabelecer o controlo nesse PCC. Para os casos em que o controlo no reposto e se ultrapassam os limites crticos, estas aces correctivas devem tambm incluir o destino a dar aos produtos afectados (CAC, 2003). Se, atravs da vigilncia, se verificar a aplicao repetida de aces correctivas, isto deve ser visto como sinal da necessidade de adoptar medidas preventivas (CCE, 2005).

3.3.6

Verificao (6 princpio)

Os procedimentos de verificao que assentam numa amostragem aleatria e anlises, devem ter sido previamente descritos pela equipa HACCP e ser realizados com uma periodicidade adequada, por forma a confirmar que o sistema HACCP funciona de forma eficaz (CAC, 2003). Porm, pretende-se no s verificar a eficcia do sistema HACCP como

34

a correcta implementao dos programas de pr-requisitos e respeito pelas boas prticas de higiene. A correcta higienizao dos manipuladores e a eficcia do plano de limpeza e desinfeco das instalaes, equipamentos e utenslios em vigor, podem ser verificadas atravs da realizao de anlises laboratoriais peridicas s mos dos manipuladores, superfcies de trabalho, equipamentos e utenslios (ARESP, 2006). Esta verificao, que deve ser realizada por uma pessoa diferente da que procede vigilncia e implementao de aces correctivas, consiste em (CAC, 2003): Auditorias ao HACCP e seus registos; Inspeco do processo de fabrico; Confirmao de que os PCC so mantidos sob controlo; Validao dos limites crticos; Reviso dos desvios, das aces correctivas tomadas e do destino dado aos produt