Direito Societário – Sociedades Simples e Empresárias, 10ª ...
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NATHÁLIA ESTEFANO LÊDO
SOCIEDADES UNIPESSOAIS NO DIREITO
EMPRESARIAL BRASILEIRO
Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, São Paulo, 2019
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FOLHA DE ROSTO
NATHÁLIA ESTEFANO LÊDO
SOCIEDADES UNIPESSOAIS NO DIREITO
EMPRESARIAL BRASILEIRO
Trabalho de Conclusão de Curso
(Monografia) apresentado à banca
Examinadora da Faculdade de
Direito de São Bernardo do
Campo, como exigência parcial
para obtenção do grau de
Bacharel em Direito sob
orientação do Professor-
Orientador Marino Postiglione.
São Bernardo do Campo/SP
11/2019
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FOLHA DA BANCA EXAMINADORA
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RESUMO
Estudo sobre Direito Empresarial, mais especificamente sobre sociedade unipessoais, que surgiram no decorrer da prática comercial, sendo reclamado seu reconhecimento pelo ordenamento jurídico, mesmo enfrentando críticas doutrinárias. O objetivo principal deste trabalho é apresentar as espécies de sociedades unipessoais existentes no direito empresarial brasileiro. Para tanto, faz-se estudo sobre o surgimento da subsidiária integral, introduzida por intermédio da Lei das Sociedades Anônimas (Lei nº 6.404/1976), em seu art. 251 e seguintes, observando suas peculiaridades quando da constituição; assim como da EIRELI, introduzida pela Lei nº 12.441/2011, trazendo um novo artigo ao Código Civil, 980-A, que por sua vez apresenta requisitos essenciais para sua regular constituição. Após abordar sobre as espécies de sociedades unipessoais no direito empresarial brasileiro, será tratada a desconsideração da personalidade jurídica das mencionadas espécies. Recente modificação do artigo 1.052 do Código Civil. Palavras-chave: Direito Empresarial; Sociedade Unipessoal; Subsidiária integral; Empresa Individual de Responsabilidade Limitada; EIRELI; Desconsideração da personalidade jurídica. Sociedade Limitada unipessoal.
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Índice
Resumo ........................................................................................................................................ 4
Introdução .................................................................................................................................... 6
Capítulo 1 – Conceito de sociedade unipessoal ................................................................... 7
Capítulo 2 – Sociedade unipessoal no Brasil ...................................................................... 11
Capítulo 2.1 – Sociedade unipessoal temporária incidental .......................................... 11
Capítulo 2.2 - Subsidiária integral ...................................................................................... 14
Capítulo 2.3 – Empresa Individual de Responsabilidade Limitada .............................. 27
Capítulo 3 – Desconsideração da personalidade jurídica .................................................. 38
Capítulo 3.1 – Desconsideração da personalidade jurídica na sociedade limitada e
na sociedade anônima ......................................................................................................... 43
Capítulo 3.2 – Desconsideração da personalidade jurídica na Empresa Individual de
Responsabilidade Limitada (EIRELI) ................................................................................ 50
Capítulo 4 – Sociedade limitada unipessoal introduzida pela Lei nº 13.874/19 (Lei da
Liberdade Econômica) ............................................................................................................. 52
Capítulo 5 – Considerações Finais ........................................................................................ 55
Bibliografia ................................................................................................................................. 58
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INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por objetivo analisar as sociedades unipessoais
permitidas no direito empresarial brasileiro, que permite que os empresários que
desejam empreender tenha sua responsabilidade limitada – seja por suas ações, seja
pela integralização, seja por suas quotas -. Importante destacar o significado da
limitação para o âmbito empresarial, haja vista a separação patrimonial que gozará o
empresário ao instituir um dos tipos societários unipessoais permitidos no Brasil.
Cumpre ressaltar que no decorrer do trabalho serão analisadas as formas
como constituídas cada sociedade unipessoal, assim como requisitos essenciais e
particulares de cada tipo societário, além da análise de eventual desconsideração da
personalidade jurídica e a novidade trazida pela Lei nº 13.874/19, a qual tornou
possível a constituição de sociedade limitada unipessoal.
Para a produção do presente trabalho adotou-se pesquisa documental,
com foco em textos legislativos, livros, artigos e textos retirados da internet,
jurisprudências pelos tribunais brasileiros.
A problemática levantada por este estudo consiste em como deverá o
empresário proceder quando diante da situação de unipessoalidade, o que o legislador
propôs para mencionada situação, qual a desvantagem de se tornar titular de uma
Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, ainda mais em razão da permissão
legal de constituição de sociedade limitada unipessoal, além de trazer à tona os
possíveis enfrentamentos empresariais após a Lei da Liberdade Econômica (Lei nº
13.874/19).
Traçadas essas considerações, a estruturação do trabalho recai, no
primeiro capítulo, sobre o conceito de sociedade unipessoal, identificando as principais
diferenças entre sociedade simples e sociedade empresária, entre empresário, sócio e
empresa, finalizando com a definição de unipessoalidade.
Já no segundo capítulo haverá o aprofundamento de quais são os tipos de
sociedades unipessoais presentes no Brasil, trazendo no primeiro item sociedade
unipessoal temporária incidental, isto é, quando na constituição a sociedade
apresentava o mínimo de sócios requeridos pela legislação brasileira e, no decorrer do
negócio, apresenta seu quadro societário apenas um sócio, como deverá o empresário
se comportar diante da presente situação, quais são os mecanismos que poderá
adotar.
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No segundo item será apresentada a figura da subsidiária integral,
regulada pela Lei das Sociedades por Ações, demonstrando sua peculiaridade – que
poderá apenas ser constituída por sociedade brasileira. Já no item três será analisada
a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, instituída no direito pátrio em
2011, tendo por base análise de outros países latino-americanos.
Não obstante, por apresentarem personificação jurídica, no capítulo três
será trabalhado o instituto da desconsideração da personalidade jurídica, trazendo,
inclusive, a desconsideração inversa da personalidade jurídica, tanto nas sociedades
tidas como limitadas, como anônimas, quando subsidiária integral, quando EIRELI.
E, por fim, no capítulo quatro será tratada a Lei sobre Liberdade
Econômica, mencionada anteriormente, a qual permitiu que a sociedade limitada seja
constituída, em sua origem, por apenas um sócio. E, em razão dessa permissão ser
conflitante com a figura da EIRELI, tendo em vista que ambas podem, agora, serem
constituídas por apenas uma única pessoa, buscou-se analisar as diferenças de
ambos os institutos (sociedade limitada unipessoal e EIRELI), quais os embates que
poderão ocorrer com sua permissão no direito brasileiro e como ficará a EIRELI.
Em conclusão, o trabalho pretende, após o estudo do tema proposto,
opinar pela possibilidade de adoção pelo ordenamento jurídico brasileiro de um tipo
societário capaz de limitar a responsabilidade do empresário que deseja empreender
sem que seja pela figura do empresário individual, a qual não possibilitaria a
separação patrimonial deseja pelos possíveis empreendedores.
CAPÍTULO 1 – CONCEITO DE SOCIEDADE UNIPESSOAL
Ao procurar a palavra sociedade no dicionário encontra-se definida como:
f. Reunião de homens, que têm a mesma origem, as mesmas leis e os mesmos
costumes. Estado social. Associação. Aggremiação. Reuniãoo de animaes, que
têm os mesmos interesses ou são destinados ao mesmo fim. Parceria,
participação: têr sociedade numa empresa. Relações ou frequência habitual de
pessoas. Casa, em que se reúnem os membros de uma aggremiação qualquer.
(Do lat. societas)
Não obstante, o Direito Empresarial pátrio ao definir sociedade remete à
ideia de união ou associação de duas ou mais pessoas que tem os mesmos interesses
destinados ao mesmo fim, ou melhor, “[...] celebram contrato de sociedade as pessoas
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que unem seus esforços e recursos para lograr fins comuns” 1. Nas palavras de
Ascarelli: “um contrato plurilateral, dadas as relações dos sócios, reciprocamente,
entre si, dos sócios com a sociedade, da sociedade com terceiros e dos sócios com
terceiros” 2.
Destarte, quando do estudo das sociedades encontram-se duas espécies,
quais sejam a sociedade simples e a sociedade empresária. A primeira é
caracterizada como aquela que explora atividade econômica não empresarial, ou seja,
sociedades constituídas por profissionais intelectuais cujo objeto social é justamente a
exploração de suas profissões, por exemplo, uma sociedade fundada por dois médicos
para prestação de serviços médicos, uma sociedade formada por professores para
prestação de serviços de ensino, uma sociedade formada por engenheiros para
prestação de serviços de engenharia e etc. Enquanto a segunda explora
profissionalmente a atividade econômica de forma organizada para a produção ou
circulação de bens ou de serviço. Não obstante, traz o caput do artigo 982 do Código
Civil, que: “Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a
sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a
registro (art. 967); e, simples, as demais”.
Segundo Fábio Ulhôa Coelho (2014), a sociedade empresária é aquela
que explora a empresa, que desenvolve atividade econômica de produção ou
circulação de bens ou serviços.
Desta forma, foca o presente trabalho nesta última espécie, isto é, nas
sociedades empresárias, uma vez que o presente tema apresenta como espécies a
subsidiária integral, advinda com a Lei das Sociedades Anônimas, e a EIRELI
(Empresa Individual de Responsabilidade Limitada), que introduziu um novo artigo ao
Código Civil, qual seja 980-A, tal como as situações temporárias de sociedades
limitadas e anônimas que por motivos que serão apresentados posteriormente tornam-
se unipessoais, tendo que cumprir alguns requisitos para que não haja a sua
dissolução.
Entretanto, antes que haja aprofundamento no tema, importante destacar a
diferença entre as figuras de empresário e sócio, que serão pertinentemente
destacados. Segundo Fernando Schawrz Gaggini:
1 MARCONDES, Sylvio. Questões de Direito Mercantil. 1977, p.13. 2 Questões de direito mercantil, p. 13/14.
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A pessoa do empresário (seja física, o “empresário individual”, ou jurídica, a
“sociedade empresária” ou “EIRELI – empresa individual de responsabilidade
limitada”) exerce a atividade em nome próprio, aspecto que exclui da abrangência
desse conceito os sócios da sociedade ou o titular da EIRELI, que não exercem
qualquer atividade diretamente em seu nome e, portanto, não se inserem na
condição de empresários.3
Ou seja, a divergência se encontra em quem se expõe direta e
ilimitadamente ao risco da atividade econômica, assim, empresário é aquele que
exerce a atividade empresarial de forma direta e ilimitada, expondo-se ao risco da
atividade; enquanto os sócios se escondem na pessoa jurídica que se chama
sociedade, sendo esta que se expõe diretamente ao risco da atividade.
Nesse diapasão, a escolha pela constituição de um determinado tipo de
sociedade advém do desejo de redução ou repartição do risco entre sócios, ou mesmo
entre sócios e credores, quando da estipulação de uma estrutura de limitação de
perdas. Desta forma, a diferença entre sócio e sociedade está que na sociedade a
responsabilidade pelas dívidas será direta e imediatamente, como principal devedora,
ao passo que o sócio terá responsabilidade subsidiária, ou seja, servirá como reforço
ao patrimônio social da sociedade. Quer dizer, não sendo o patrimônio social da
sociedade suficiente para pagamento das dívidas, recorre-se ao patrimônio dos
sócios, de forma limitada. Nas palavras de Fernando Schwarz Gaggini:
Primeiramente, essa distinção de situações entre sócios e sociedade se revela em
razão de que, enquanto a responsabilidade da sociedade, por suas dívidas, é
sempre direta (de modo que, ao se comprometer perante terceiros, a sociedade
responderá diretamente e imediatamente, como principal devedora), a
responsabilidade patrimonial dos sócios será subsidiária, ou seja, servirá em
reforço ao patrimônio social, caso este não seja suficiente ao pagamento das
obrigações, de forma que a responsabilidade patrimonial dos sócios é secundária,
admissível, a princípio, quando necessário o reforço à responsabilidade principal
que cabe à sociedade 4.
Cumpre esclarecer a definição de empresa para o direito empresarial,
diante da confusão que se faz entre as palavras sociedade e empresa. A primeira,
como acima definida, remete à ideia de pluralidade de pessoas, titulares reunidos
3 Responsabilidade dos sócios nas sociedades empresárias. 2013, p.61-62. 4 Responsabilidade dos sócios nas sociedades empresárias. 2013, p.68.
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entre si por um objetivo ou finalidade em comum; enquanto empresa é a atividade
econômica exercida pelo empresário.
Já o conceito de unipessoalidade, como o próprio nome diz, remete à ideia
de singularidade, uma única pessoa, um único titular. Por conta disso, quando da
formação de uma sociedade unipessoal, diante do paradoxo existente entre as
palavras, bem como pela forma em que os próprios comerciantes à época a viam, que
não houve seu reconhecimento imediato por intermédio de legislações. Ou seja,
empresários que desejavam colocar em prática ideias inovadoras ou simplesmente
continuar o negócio que herdou, de forma solitária, com proteção de seu patrimônio
pessoal, assim não poderiam sozinhos realizar face à imposição legal de que uma
sociedade para ser constituída deveria haver pelo menos dois sócios, sejam eles
pessoas físicas ou jurídicas.
Entretanto, em 1980, na Alemanha, iniciou-se a imposição da concessão
visando ao incentivo às pequenas e médias empresas, haja vista a análise de diversas
sociedades fictícias, onde um dos sócios detinha pleno controle sobre a empresa,
enquanto outro, participação irrisória, somente com a finalidade de configurar a
obrigatoriedade da pluralidade, sendo estes chamados “testa de ferro”. A partir de
então, o instituto começou a se alastrar por diversas nações, ante à vantagem e
incentivo econômico outorgado, ocorrendo na Europa, por intermédio da XII Diretiva
da Comunidade Econômica Europeia, de 1989, a imposição de reconhecimento aos
países da comunidade europeia que ainda não faziam.
Corroborando, nas palavras de Ricardo Alberto Santos Costa 5:
A concentração das participações sociais na titularidade de uma única pessoa
desde sempre sofreu o estigma da impossibilidade. Mesmo no país mais
condescendente com a manifestação da unipessoalidade societária (a Alemanha),
ela não deixou de ser individualizada pela doutrina como uma “contradição em si
mesmo” e até insusceptível de ser justificada dogmaticamente em face do
contrassenso lógico que a constituía. Chegou noutras paragens, a qualificar como
“heresia” jurídica e etimológica ou uma “monstruosidade jurídica”, mas o certo é
que a emergência de novas realidades e exigências sociais vieram ditar a
tolerância (em face da unipessoalidade superveniente, primeiro, e, depois, a
5 A unipessoalidade societária, 2003, p.45; Conferir, com mais referências Costa, Ricardo
Alberto Santos. A Sociedade por Quotas Unipessoal..., 2002, p. 26/27.
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incorporação nos ordenamentos jurídicos das sociedades unipessoais na sua
vertente originária) 6.
Desta forma, sociedade unipessoal é segundo Fernando Schawrz Gaggini:
Trata-se da possibilidade de constituição de uma sociedade por ato de um único
sócio, detentor originário da totalidade das participações sociais, ou conversão
de uma sociedade, originalmente pluripessoal, pelo agrupamento da totalidade
das participações sociais sob a titularidade de um único sócio 7.
CAPÍTULO 2 - SOCIEDADE UNIPESSOAL NO BRASIL
De acordo com diversos doutrinadores, a sociedade unipessoal no Brasil é
admita como exceção, sendo a regra, portanto, a pluralidade de sócios. Configurando
a sociedade empresária como unipessoal por tempo maior daquele permitido pela lei,
poderá sofrer os efeitos da dissolução ou extinção. Desta forma, encontram-se como
admitidas: a unipessoalidade temporária incidental, subsidiária integral e EIRELI
(Empresa Individual de Responsabilidade Ilimitada).
CAPÍTULO 2.1 - SOCIEDADE UNIPESSOAL TEMPORÁRIA INCIDENTAL
A primeira situação exposta, qual seja unipessoalidade temporária
incidental, pode ser aplicada em qualquer tipo societário personificado. Isto é assim
porque concede a lei tempo máximo para a regularização da pluralidade de sócios,
diante do impacto socioeconômico que eventual dissolução da sociedade acarretaria
no mundo fático, visando à preservação da empresa. Ou seja, como uma forma de
preservar a atividade econômica em funcionamento exercida pelo empresário, assim
como seus oferecidos e desejáveis efeitos no mundo fático, tais como o emprego,
arrecadação de tributos, fornecimento de produtos e serviços, estímulo à concorrência
e etc., que a lei concede prazo de 180 dias – salvo a exceção da subsidiária integral –
para que o sócio remanescente busque outra pessoa – física ou jurídica – para
compor o quadro societário, regularizando dessa forma a pluralidade de sócios, regra
no direito empresarial brasileiro.
6 A Unipessoalidade societária, 2003, pg.45; Conferir também, com mais referências COSTA, Ricardo Alberto Santos. A Sociedade por Quotas Unipessoal, 2002, p. 26/27. 7 Responsabilidade dos sócios nas sociedades empresárias. 2013, p.92
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Desta forma, a unipessoalidade temporária é configurada quando há
dissolução parcial de uma sociedade (um dos sócios não deseja mais participar do
quadro societário, deixando apenas um único compondo mencionado quadro) ou
porque em uma sociedade de dois sócios, a morte ou retirada de um leva a sociedade
à situação inesperada de unipessoalidade.
Segundo o que preceitua o artigo 1.033, inciso IV do Código Civil: “Art.
1.033. Dissolve-se a sociedade quando ocorrer: IV - a falta de pluralidade de sócios,
não reconstituída no prazo de cento e oitenta dias”. Subtrai legalmente o prazo
máximo que uma sociedade poderá configurar como unipessoal, qual seja 180 dias,
sob pena de dissolução.
Nas palavras de Fernando Schawz Gaggini:
Nesse caso, a unipessoalidade é admitida somente como alternativa para evitar a
dissolução da sociedade em razão de fato alheio à vontade inicial dos sócios, de
modo que, por se tratar de situação excepcional, a lei atribui o prazo para a
reconstituição da pluralidade sob pena de dissolução 8.
A decisão pioneira no sentido de preservação da empresa é o caso do
STF, in RTJ 35/150, de 19 de outubro de 1965. Como pedido tinha-se a dissolução
total da sociedade, optando o acórdão apenas pela retira do sócio, avançando a Corte
em seu posicionamento, uma vez que buscou a preservação da atividade exercida
pelo empresário e seu impacto no mundo socioeconômico, assim proferindo:
O recorrente deixou claro, desde o seu pedido inicial, não mais desejar continuar
na sociedade.
Embora tenha requerido a dissolução, o seu pedido demonstrava o interesse de
não mais continuar como sócio.
Como é sabido, o pedido inicial compreende tudo aquilo que virtualmente se
contém. O recorrente não quer continuar na sociedade, não devendo interessar-
lhe se a mesma continuará ou não com os sócios remanescentes.
O que ocorreu no caso acima foi o pedido de dissolução total da
sociedade, em que o Tribunal julgou ser melhor analisado como pedido de retirada do
sócio, uma vez que demonstrava o Autor falta de interesse na atividade exercida pela
empresa e dos atos em que a sociedade decidia tomar, preservando, mesmo que
através de julgamento infra petita, a empresa.
8 Responsabilidade dos sócios nas sociedades empresárias. 2013, p.94
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Portanto, diante da presente situação: quando um dos sócios falece e
deixa apenas um único configurando no quadro societário ou quando um dos sócios
pleiteia seu direito de retirada, fazendo com que figure apenas um sócio no quadro
societário, tem o sócio que permaneceu no mencionado quadro 180 dias para
regularizar a pluralidade exigida por lei ou, como será analisado em tópico apartado,
transformar a sociedade temporariamente unipessoal em EIRELI (Empresa Individual
de Responsabilidade Limitada), transformar em empresário individual ou optar por
extinguir a sociedade.
Conforme André Luiz Santa Cruz Ramos 9:
Essa unipessoalidade da sociedade limitada, todavia, além de acidental, é
temporária, uma vez que o Código estabelece um prazo para que seja
restabelecida a pluralidade dos sócios. Com efeito, segundo o art. 1.033, IV, a
sociedade limitada que ficar com apenas um sócio deve restabelecer a pluralidade
de sócios no prazo de 180 (cento e oitenta dias), sob pena de dissolução.
Quanto a esse dispositivo legal, registre-se que a Lei Complementar 128/2008
trouxe uma pequena alteração. Com efeito, a referida lei acrescentou um
parágrafo único ao art. 1.033 do Código Civil, com o seguinte teor: “não se aplica o
disposto no inciso IV caso o sócio remanescente, inclusive na hipótese de
concentração de todas as cotas da sociedade sob sua titularidade, requeira no
Registro Público de Empresas Mercantis a transformação do registro da sociedade
para empresário individual, observado, no que couber, o disposto nos arts. 1.113 a
1.115 deste Código”.
Nesse sentido:
EMENTA: AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE. DIFERENÇAS
EXISTENTES ENTRE AS FIGURAS DE DISSOLUÇÃO TOTAL, DISSOLUÇÃO
PARCIAL E EXCLUSÃO DO SÓCIO.DISSOLUÇÃO TOTAL QUE EQUIVALE À
PRIMEIRA FASE DO PROCESSO QUE CULMINARÁ NA EXTINÇÃO DA
PESSOA JURÍDICA. ART. 51 DO CCB. HIPÓTESES PREVISTAS NOS ARTS.
1.033 E 1.034 DO CCB, DENTRE AS QUAIS SE ENCONTRA A QUEBRA DE
AFFECTIO SOCIETATIS.DISSOLUÇÃO PARCIAL QUE CONFIGURA O
EXERCÍCIO DO DIREITO DE RETIRADA DO QUADRO SOCIAL PELO PRÓPRIO
SÓCIO, SEM NECESSIDADE DE CONFIGURAÇÃO DE MOTIVO JUSTO,
BASTANDO A INSATISFAÇÃO DO SÓCIO OU MESMO A QUEBRA DA
AFFECTIO SOCIETATIS (ART. 1.029 DO CCB). (...) 2. A dissolução parcial da
sociedade nada tem a ver com a extinção da pessoa jurídica, mas sim com o
9 Direito Empresarial Esquematizado. 2014, p.224.
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exercício do direito de retirada por um dos sócios, o qual busca se retirar do
quadro societário pelas mais variadas razões, com o recebimento dos resultados
que lhe são devidos até então, conforme o art. 1.029 do CCB. (...) 4.
Comparativamente, enquanto a dissolução parcial da sociedade equivale ao
exercício do direito de se retirar da pessoa jurídica pelo próprio sócio, sem
necessidade de exposição de motivos, decorrente da liberdade associativa (art. 5º,
XX, da CF)- para a qual é suficiente a quebra da affectio societatis -, a exclusão do
sócio se dará somente se configurada falta grave no exercício das funções,
incapacidade civil superveniente - sendo insuficiente, portanto, a mera quebra da
affectio societatis. (...) 6. É possível a exclusão por justa causa de um sócio do
quadro social em sociedades compostas apenas por duas pessoas, sem que isso
acarrete a dissolução total da sociedade, desde que o sócio restante reconstitua a
pluralidade de integrantes do quadro societário no prazo de 180 dias (art. 1.033,
IV, do CCB), a contar do trânsito em julgado da decisão judicial que afastou o
sócio anterior, ou requeira a transformação do registro para empresa individual ou
EIRELI (art. 1.033, parágrafo único, do CCB). (...) (TJPR - 17ª C.Cível - AC -
1264791-5 - Pato Branco - Rel.: Fernando Paulino da Silva Wolff Filho - Unânime -
- J. 01.04.2015)
Cumpre ressaltar que o prazo estipulado pelo Código Civil não se aplica
quando diante de uma sociedade por ações, uma vez que tal tipo societário apresenta
lei especial que regulamenta prazo diverso do Código Civil, qual seja Lei nº 6.404/76.
O prazo para regularização da pluralidade desse tipo societário é até a próxima
assembleia-geral ordinária (art. 206, inciso I, alínea d da Lei das Sociedades por
Ações).
CAPÍTULO 2.2 - SUBSIDIÁRIA INTEGRAL
A segunda situação exposta é expressamente prevista na Lei das
Sociedades por Ações, Lei nº 6.404 de 15 de dezembro de 1976, em seu artigo 251, in
verbis:
Art. 251. A companhia pode ser constituída, mediante escritura pública, tendo
como único acionista sociedade brasileira.
§ lº A sociedade que subscrever em bens o capital de subsidiária integral deverá
aprovar o laudo de avaliação de que trata o artigo 8º, respondendo nos termos
do § 6º do artigo 8º e do artigo 10 e seu parágrafo único.
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§ 2º A companhia pode ser convertida em subsidiária integral mediante
aquisição, por sociedade brasileira, de todas as suas ações, ou nos termos do
artigo 252.
Entretanto, antes de aprofundar o conhecimento sobre as subsidiárias
integrais, importante destacar características das sociedades anônimas, uma vez que
a subsidiária, conforme explanado, encontra-se disciplina na Lei das Sociedades por
Ações. Desta maneira, a sociedade anônima é uma sociedade de capital, seus títulos
representativos são livremente negociáveis (ações), frisa-se que o capital social deste
tipo societário é fracionado em unidades representadas por ações, daí seus sócios
serem denominados acionistas, respondendo limitadamente ao que falta para a
integralização das ações de que sejam titulares, conforme art. 1º da LSA: “Art. 1º A
companhia ou sociedade anônima terá o capital dividido em ações, e a
responsabilidade dos sócios ou acionistas será limitada ao preço de emissão das
ações subscritas ou adquiridas”.
Destarte, classificam-se em abertas ou fechadas, segundo as palavras de
Fábio Ulhôa Coelho:
As sociedades anônimas se classificam em abertas ou fechadas, conforme
tenham, ou não, admitidos à negociação, na Bolsa ou no mercado de balcão, os
valores mobiliários de sua emissão. Anote-se que o critério de identificação de
uma ou outra categoria de sociedade anônima é meramente formal. Basta que a
companhia tenha seus valores mobiliários admitidos à negociação na Bolsa ou
mercado de balcão (que compõem o “mercado de valores mobiliários”), para ser
considerada aberta. É irrelevante se os valores mobiliários de sua emissão
efetivamente são negociados nessas instituições 10.
Reitera Fábio que:
A principal classificação das sociedades anônimas divide-as em abertas e
fechadas. Na primeira categoria, encontram-se aquelas cujos valores mobiliários
são admitidos à negociação nas bolsas de valores ou mercado de balcão (estes
são os “mercados de valores mobiliários”); na outra, estão as demais, isto é, as
que não emitem valores mobiliários negociáveis nesses mercados (LSA, art. 4º)
11.
Quanto a sua constituição devem ser observados três passos: a)
requisitos preliminares dispostos nos artigos 80 e 81 da LSA; b) modalidades de
10 Manual de Direito Comercial – direito de empresa. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais
LTDA, 2016, p.216. 11 Curso de Direito Comercial – direito de empresa. Editora Saraiva, 2012, p.91.
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constituição (artigos 82 a 93 da LSA) e c) providências complementares (artigos 94 a
99 da LSA).
O primeiro diz respeito aos requisitos preliminares, quais sejam:
1. Subscrição de todo o capital social por, pelo menos, duas pessoas.
Quer dizer, subscrição de todas as ações, que é contrato plurilateral
complexo pelo qual uma pessoa se torna titular de ação emitida por
sociedade anônima, sendo negócio jurídico irretratável;
2. Realização, como entrada, de, no mínimo, 10% do preço de emissão
das ações subscritas em dinheiro. Aqui, o prazo em dinheiro, pelo
menos 1/10 do preço da ação deve ser integralizado como entrada.
Em se tratando de instituição financeira, estabelece a Lei da Reforma
Bancária (Lei nº 4.595/1964), no art. 27, que a porcentagem deve ser
de 50%;
3. Depósito das entradas em dinheiro no Banco do Brasil ou
estabelecimento bancário autorizado pela CVM (CVM-AD nº 2/78),
que deverá ser feito pelo fundador até 5 (cinco) dias do recebimento
das quantias, em nome do subscritor e em favor da companhia em
constituição. Concluso o processo, a companhia levantará o montante
depositado. Caso negativo, em seis meses, o subscritor é que
levantará a quantia por ele paga.
Adiante, segundo as modalidades de constituição, prevê a Lei duas
hipóteses: a) por intermédio de subscrição pública ou b) por intermédio de subscrição
particular. A primeira, os fundadores buscam recursos para a constituição da
sociedade junto aos investidores existindo, portanto, apelo ao público investidor;
enquanto a segunda, inexiste esta preocupação.
Como regras gerais e comuns, trouxe a lei a escritura pública como
indispensável para a incorporação de imóveis para a formação do capital social (artigo
89), o subscritor poderá ser representado por procurador com poderes especiais, na
assembleia de fundação ou na escritura pública (artigo 90), denominação deverá ser
aditada pela expressão em organização enquanto não concluso o processo de
constituição (artigo 91) e entre outros.
Já as providências preliminares dizem respeito à necessidade de registro
e publicação dos atos constitutivos da companhia, podendo a companhia, após
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observados esses três passos, dar início à exploração de suas atividades comerciais
de forma regular.
Desta forma, a sociedade anônima é constituída por intermédio de um
estatuto social, contrato que disciplina o relacionamento interno e externo da
sociedade, contendo em suas cláusulas a sua qualificação, tipo jurídico de sociedade,
denominação, localização, objeto social, forma de integralização do capital social,
prazo de duração da sociedade, data de encerramento do exercício social e entre
outras disposições.
Assim, expõe a lei certos conteúdos que deverão necessariamente
constar no estatuto. No artigo 3º, assim como no artigo 1.160 do Código Civil, fala-se
da denominação social, que nada mais é que o nome da sociedade. Aqui, tem-se a
peculiaridade, afinal tem que apresentar em sua denominação a sigla “S.A.”
(Sociedade Anônima) ou Companhia (ou Cia.), no começo ou no meio da
denominação social. O prazo de duração – que dirá quando a empresa não será mais
exercida, sendo uma das hipóteses de extinção da sociedade -, sede (município),
objeto social – que deverá ser definido de modo preciso e completo, conforme artigo
2º, §2º da LSA -, capital social expresso em moeda nacional (artigo 5º da LSA), ações
– números em que se divide o capital, qual sua espécie (ordinária, preferencial ou de
fruição), classe das ações e se terão valor nominal ou não, conversibilidade e forma
nominativa (artigo 11 e ss. da LSA).
Adiante, os diretores - número mínimo ou os limites que a lei permite,
modo de sua substituição, prazo de gestão que não superior a três anos, atribuições e
poderes de cada diretor (artigo 143 da LSA) -, conselho fiscal – como será dado o seu
funcionamento, se permanente ou não, com indicação do número de seus membros,
sendo mínimo de três e máximo de cinco membros efetivos e suplentes em igual
número (art. 161 da LSA) e, por fim, o término do exercício social, sendo fixada a sua
data.
O registro do estatuto se dá junto à Junta Comercial do Estado.
Como se pode extrair do próprio texto da LSA, em seu artigo 1º,
supratranscrito, deverá a sociedade anônima ser constituída por dois ou mais sócios,
obedecendo à regra geral imposta pela legislação brasileira empresarial. Ocorre que
havendo unipessoalidade traz o artigo 206, inciso I, alínea d da Lei nº 6.404/76 que:
Art. 206. Dissolve-se a companhia:
P á g i n a | 18
I - de pleno direito:
d) pela existência de 1 (um) único acionista, verificada em assembléia-geral
ordinária, se o mínimo de 2 (dois) não for reconstituído até à do ano seguinte,
ressalvado o disposto no artigo 251.
Isto é, admite-se a unipessoalidade pelo período de tempo entre uma
assembleia-geral ordinária e a próxima, sob pena de dissolução, que para não ocorrer,
é necessário que haja o ingresso de outro sócio dentro do prazo estipulado. Presente
situação de unipessoalidade ocorre de forma derivada, ou seja, quando da
constituição da sociedade deve ela apresentar pluralidade de sócios, ocorrendo a
unipessoalidade pelos motivos dissolução parcial ou causa mortis.
Como forma de solucionar a questão da unipessoalidade e visando a não
dissolução poderá o sócio que consta como único titular transformar a sociedade em
EIRELI (Empresa Individual de Responsabilidade Limitada), fazer com que ingresse
um novo sócio no prazo acima mencionado ou transformá-la em subsidiária integral.
Assim, nas palavras de Fábio Ulhôa Coelho:
A unipessoalidade é causa de dissolução total da sociedade empresária
contratual, visto que o direito brasileiro só admite uma hipótese de sociedade
com um único sócio, a subsidiária integral, necessariamente uma sociedade por
ações (e, portanto, institucional). Sempre quem por alguma razão – sucessão por
ato inter vivos ou mortis causa na titularidade das costas sociais, dissolução
parcial etc. -, todas as cotas representativas do capital social de sociedade
contratual forem reunidas sob a titularidade de uma só pessoa, física ou jurídica,
a sociedade deverá ser dissolvida. A dissolução é imediata, assegurando-se ao
sócio único as condições para negociar o ingresso de mais uma pessoa na
sociedade. A lei fixa como prazo para o reestabelecimento da pluralidade o de
180 dias. Vencido este e se mantendo a concentração da totalidade das costas
sociais nas mãos de uma única pessoa, deve ser dissolvida a sociedade
contratual 12.
Outra forma de extinção da presente sociedade está disposta no artigo
219, inciso II da LSA:
Artigo 219: Extingue-se a companhia:
...
12 Manual de Direito Comercial. 2011, p.204.
P á g i n a | 19
II – pela incorporação ou fusão, e pela cisão com versão de todo o patrimônio em
outras sociedades.
Destarte, como mecanismo para que a sociedade não sofra os efeitos de
uma dissolução ou extinção, previu a Lei a figura da subsidiária integral, no artigo 251,
podendo ser constituída de forma originária ou derivada. À vista disso, trata-se a
presente espécie de uma sociedade anônima constituída por intermédio de escritura
pública possuindo apenas um único acionista, sendo todas as ações pertencentes à
outra sociedade brasileira, que detém o controle acionário integral.
Cumpre ressaltar que o controle acionário deverá ser detido por uma
sociedade, ou seja, por uma reunião de duas ou mais pessoas que se unem por um
mesmo fim, afinal trata-se de regra geral aplicado ao direito empresarial brasileiro,
conforme dito alhures; bem como ser a referida sociedade brasileira, não podendo,
portanto, possuir mencionado controle uma sociedade estrangeira.
No mais, “trata-se de uma sociedade necessariamente do tipo ‘anônima’,
constituída por escritura pública, por uma sociedade brasileira (LSA, art. 521). A
pessoa natural e a sociedade estrangeira não podem constituir subsidiária integral” 13.
Desse modo, para maiores esclarecimentos dos requisitos necessários
para que haja a constituição de uma subsidiária integral, temos:
1. Deve ser adotado o tipo societário de sociedade anônima, não
podendo possuir tipo diverso;
2. O único sócio que constituirá a subsidiária integral necessariamente
deverá ser uma sociedade, não sendo permitidas pessoas físicas ou outros tipos de
pessoas jurídicas – tais como associações ou fundações;
3. Aquela que exercerá o poder de controle acionário deve ser brasileira,
quer dizer que deverão ser observadas as legislações brasileiras quando de sua
constituição, com sede e administração no país;
4. A constituição deverá ser realizada por intermédio, necessariamente,
de escritura pública, isto é, em um cartório de notas, devendo ser os documentos
posteriormente levados a registro na Junta Comercial do Local da sede da nova
sociedade.
13 Manual de Direito Comercial – Direito de empresa. 2016, p. 75.
P á g i n a | 20
Quando uma sociedade observa referidos requisitos para a sua
constituição está-se diante de uma constituição originária de uma subsidiária integral.
Entretanto, não necessariamente precisará uma sociedade já constituída observar
todos os requisitos acima para ser considerada subsidiária integral, podendo, portanto,
adotar método diferente, tal como se transformar em uma subsidiária. Realizando a
conversão, bastará que uma sociedade brasileira adquira a totalidade das ações de
outra companhia, não necessitando de escritura pública para ser considerada como
subsidiária, tendo em vista já apresentar estatuto social, necessitando apenas
mencionar em seu estatuto a alteração para a nova situação, devendo ser
apresentada referida alteração na Junta Comercial do local da sede da sociedade para
que haja a averbação.
Não obstante, preceitua o artigo 252 da LSA, in verbis:
Art. 252. A incorporação de todas as ações do capital social ao patrimônio de
outra companhia brasileira, para convertê-la em subsidiária integral, será
submetida à deliberação da assembléia-geral das duas companhias mediante
protocolo e justificação, nos termos dos artigos 224 e 225.
§ 1º A assembléia-geral da companhia incorporadora, se aprovar a operação,
deverá autorizar o aumento do capital, a ser realizado com as ações a serem
incorporadas e nomear os peritos que as avaliarão; os acionistas não terão
direito de preferência para subscrever o aumento de capital, mas os dissidentes
poderão retirar-se da companhia, observado o disposto no art. 137, II, mediante
o reembolso do valor de suas ações, nos termos do art.
230. (Redação dada pela Lei nº 9.457, de 1997)
§ 2º A assembléia-geral da companhia cujas ações houverem de ser
incorporadas somente poderá aprovar a operação pelo voto de metade, no
mínimo, das ações com direito a voto, e se a aprovar, autorizará a diretoria a
subscrever o aumento do capital da incorporadora, por conta dos seus
acionistas; os dissidentes da deliberação terão direito de retirar-se da
companhia, observado o disposto no art. 137, II, mediante o reembolso do valor
de suas ações, nos termos do art. 230. (Redação dada pela Lei nº
9.457, de 1997)
§ 3º Aprovado o laudo de avaliação pela assembléia-geral da incorporadora,
efetivar-se-á a incorporação e os titulares das ações incorporadas receberão
diretamente da incorporadora as ações que lhes couberem.
§ 4o A Comissão de Valores Mobiliários estabelecerá normas especiais de
avaliação e contabilização aplicáveis às operações de incorporação de ações
P á g i n a | 21
que envolvam companhia aberta. (Redação dada pela Lei nº
11.941, de 2009)
Trata-se da incorporação de ações, uma das formas de extinção de uma
companhia conforme anteriormente transcrito. Trata-se de uma operação por meio do
qual uma sociedade anônima brasileira (incorporadora) absorve as ações de outra
sociedade anônima (incorporada). O capital da primeira é aumentado, sendo subscrito
e integralizado com as ações da incorporada. Assim, torna-se proprietária da
totalidade das ações da incorporada e, em razão dos antigos sócios receberem ações
da incorporada, tornam-se sócios da incorporadora, ora subsidiária integral.
Ou seja, quando se verifica a incorporação de ações na forma do artigo
acima transcrito, ocorre a operação de reestruturação societária, sendo que todas as
ações da sociedade considerada “alvo“ são contribuídas ao capital social da sociedade
incorporada, tornando-se aquela subsidiária integral desta. Nas palavras de Camila
Caetano Cardoso 14:
Por meio dessa operação de reestruturação societária, todas as ações da
sociedade “alvo” são contribuídas ao capital social da sociedade incorporadora,
tornando-se aquela subsidiária integral desta. Como consequência, a sociedade
incorporadora deverá aumentar seu capital mediante a emissão de novas ações,
a serem subscritas pelos antigos acionistas da sociedade convertida em
subsidiária integral. Os acionistas da companhia cujas ações foram incorporadas
passam a ser, portanto, acionistas da companhia incorporadora e, indiretamente
da companhia da qual eram originariamente acionistas. Cumpre frisar que, de
acordo com o artigo 252, a companhia incorporadora deve, necessariamente, ser
constituída de acordo com as leis brasileiras.
Ainda, leciona Nelson Eizirik que:
Sob o aspecto formal, a incorporação de ações constitui uma das modalidades
de formação de subsidiária integral, tida como derivada, em oposição à
originária, que ocorre quando uma sociedade destaca de seu próprio patrimônio
parcela de recursos e bens para constituir uma nova sociedade, da qual será a
única acionista (artigo 251) 15.
Cumpre ressaltar que na presente operação a controladora deve ser
sociedade anônima e que para sua formalização deverá haver aprovação dos sócios
da sociedade, além da alteração no estatuto social da incorporadora, descrevendo o
14 A utilização da incorporação de ações como meio para promover o fechamento de capital
sem realização de OPA. Rio de Janeiro, 2012. 15 A Lei das S/A Comentada. São Paulo: Quartier Latin, 2011. Volume III, p. 397.
P á g i n a | 22
aumento de seu capital e o ingresso dos novos sócios, bem como a alteração do
estatuto da incorporada, registrando o fato de que passou a ser subsidiária integral.
Lembrando que deve ser levado a registro na Junta Comercial respectiva.
A subsidiária integral resultante desse tipo de operação poderá ser tanto
aberta como fechada, bastando para ser aberta que seus valores mobiliários sejam
admitidos à negociação no mercado, conforme preceitua o artigo 4º da Lei nº
6.404/1976.
Importante deixar claro que controladora é a sociedade anônima que
detém a titularidade de todas as ações de outra companhia, enquanto que a
subsidiária integral é denominação adotada para qualificar a sociedade que tem
apenas uma sociedade brasileira como acionista, sendo esta a sua controladora.
Quando a sociedade anônima adota a espécie de uma sociedade aberta
ocorrem ofertas públicas das ações que a constituiu e, em se tratando de incorporação
de ações, conforme o artigo acima, discute-se se as ações da incorporada deverão ser
ofertadas publicamente. Assim: “As companhias abertas têm ações (e demais valores
mobiliários) de sua emissão admitidas à negociação no ‘mercado de valores
mobiliários’ (MVM) [...]” 16. Contudo, para que haja a negociação junto ao mencionado
Mercado necessita a sociedade de autorização prévia do governo, dada por uma
autarquia denominada Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Nas palavras de Fabrício Tanure:
Note bem: segundo a regra legal, o que imprime a uma sociedade anônima a
condição de companhia aberta é a mera admissão de seus valores mobiliários às
negociações de mercado, sendo bastante que obtenha o registro na CVM17. Desta
feita, ainda que nenhum título da sociedade tenha ido ao mercado, a formalidade
do registro já a torna uma companhia aberta 18.
Desta forma, mesmo companhias que não tenham seus valores
mobiliários negociados no mercado, como no caso das subsidiárias integrais, podem
ser classificadas como companhias abertas se detentoras de registro perante a
Comissão de Valores Mobiliários. Entretanto, anota Carlos Augusto Junqueira de
Siqueira que na prática do mercado essa não tem sido a opção escolhida pela
16 Manual de Direito Comercial. 2016, p.109. 17 Presente registro dá-se conforme a Lei nº 6.385 de 1976: “A Comissão de Valores Mobiliários manterá, além do registro de que trata o art. 19:
I- O registro para negociação na bolsa; II- O registro para negociação no mercado de balcão, organizado ou não”.
18 Tópicos sobre a subsidiária integral.
P á g i n a | 23
incorporadora: “[...] as subsidiárias integrais convertidas vêm tendo o cancelamento do
registro promovido pela incorporadora o que, se não constitui uma consequência
inafastável, apresenta-se como opção lógica” 19.
Nesse sentido:
RECURSO ESPECIAL. DIREITO SOCIETÁRIO. SOCIEDADE ANÔNIMA.
INCORPORAÇÃO DE AÇÕES. TRANSFORMAÇÃO DA CONTROLADA EM
SUBSIDIÁRIA INTEGRAL. OFERTA PÚBLICA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO
LEGAL. EQUIPARAÇÃO A FECHAMENTO DE CAPITAL. APLICAÇÃO DO ART.
4º, §4º, DA LEI DAS S/A POR ANALOGIA. DESCABIMENTO. 1. Controvérsia
acerca da necessidade de a companhia controladora realizar oferta pública de
aquisição de ações em favor dos acionistas preferenciais da companhia que teve
suas ações incorporadas. 2. Existência de norma que exige a realização de
oferta pública para aquisição de ações no caso de fechamento de capital (art. 4º,
§4º, da Lei 6.404/1976). 3. Distinção entre a hipótese de fechamento de capital e
a de incorporação de ações entre companhias de capital aberto. 4. Inocorrência
de fechamento em branco (ou indireto) de capital no caso dos autos, pois as
companhias envolvidas na operação são de capital aberto, não tendo havido
perda de liquidez das ações. 5. Inaplicabilidade, mesmo por analogia, de norma
constante do art. 4º, §4º, da Lei 6.404/1976 ao caso dos autos. 6. Doutrina e
jurisprudência do STJ. 7. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. (STJ – Resp:
1642327 SP 2015/0274044-9, Relator: Ministro PAULO DE TARSO
SANSEVERINO, Data de Julgamento: 19/09/2017, T3 – TERCEIRA TURMA,
Data de Publicação: DJe 26/09/2017)
No presente caso, foi objeto de discussão no Superior Tribunal de Justiça
se a operação de incorporação de ações realizada da seguinte forma:
(a) Aquisição das ações dos acionistas controladores do Grupo Ipiranga
pela ULTRAPAR;
(b) Oferta pública de tag along para os acionistas ordinários das empresas
controladas (RPI; CBPI, DPPI);
(c) Oferta pública a todos os acionistas da COPESUL S/A, para o
fechamento do capital dessa companhia;
(d) Incorporação das ações da RPI, DPPI e CBPI pela ULTRPAAR
tornando-as subsidiárias integrais;
(e) Segregação de ativos, mediante redução de capital da RPI e da CBPI,
para transferir ativos petroquímicos, bem como cisão da CBPI para transferir
19 Fechamento de Capital: Oferta Pública de Aquisição de Ações e Outras Modalidades.
Ribeirão Preto: Migalhas, 2010, p. 215.
P á g i n a | 24
ativos de distribuição, tendo como destinatárias dos ativos a BRASKEM, a
PETROBRAS.
Violou o disposto no artigo 4º, §§4º e 5º da Lei nº 6.404/7620 uma vez que
alegada reorganização societária seria equivalente a um fechamento indireto de
capital, tornando-se necessária a oferta pública de aquisição das ações dos
minoritários, sendo as ações tanto ordinárias como preferenciais21. Foi julgado pelo
STJ que: “[...] a incorporação pode ser deliberada pelo controlador que detenha mais
da metade das ações com direito a voto, restando aos minoritários dissidentes tão
somente a opção pelo direito de retirada [...]”. Vale dizer que o controlador toma a
posição de acionista minoritário na sociedade incorporada, retribuindo-o com ações da
sociedade incorporadora, haja ou não interesse deste na substituição de ações.
Ainda, para esclarecer quaisquer dúvidas restantes sobre o que se trata a
incorporação de ações citou Fábio Ulhôa Coelho, in verbis:
Trata-se de operação pela qual uma sociedade anônima se torna subsidiária
integral de outra. Viabiliza-se pelo aumento do capital social da incorporadora,
com emissão de novas ações, que serão subscritas em nome dos acionistas da
futura subsidiária (a sociedade cujas ações são incorporadas), ao mesmo tempo
em que se transfere à titularidade da primeira toda a participação societária
representativa do capital social desta última. Tanto os acionistas da
incorporadora de ações como os da sociedade cujas ações são incorporadas
têm direito de recesso (art. 252). Também em relação a essa hipótese a lei nega
o direito de retirada se há condições de o acionista facilmente negociar suas
ações no mercado de capital. Quer dizer, se a ação da sociedade incorporadora
de ações – titularizada desde antes da operação, ou atribuída, em razão desta,
20 Art. 4o Para os efeitos desta Lei, a companhia é aberta ou fechada conforme os valores mobiliários de sua emissão estejam ou não admitidos à negociação no mercado de valores mobiliários. (Redação dada pela Lei nº 10.303, de 2001): § 4o O registro de companhia aberta para negociação de ações no mercado somente poderá ser cancelado se a companhia emissora de ações, o acionista controlador ou a sociedade que a controle, direta ou indiretamente, formular oferta pública para adquirir a totalidade das ações em circulação no mercado, por preço justo, ao menos igual ao valor de avaliação da companhia, apurado com base nos critérios, adotados de forma isolada ou combinada, de patrimônio líquido contábil, de patrimônio líquido avaliado a preço de mercado, de fluxo de caixa descontado, de comparação por múltiplos, de cotação das ações no mercado de valores mobiliários, ou com base em outro critério aceito pela Comissão de Valores Mobiliários, assegurada a revisão do valor da oferta, em conformidade com o disposto no art. 4o-A. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001) 21 Ordinárias são aquelas que conferem aos seus titulares os direitos que a lei reserva ao acionista comum, sendo de emissão obrigatória. Já as preferenciais são aquelas que conferem aos seus titulares um complexo de direitos diferenciados como, por exemplo, a prioridade na distribuição de dividendos ou no reembolso do capital, etc., podendo ou não conferir direito ao voto.
P á g i n a | 25
ao antigo sócio da subsidiária integral – possui boa liquidez ou dispersão, o
dissidente não tem direito de retirada 22.
Por fim, entendeu o Superior Tribunal de Justiça que não houve violação
ao artigo 4º, §§ 4º e 5º da LSA, porque ainda resta aos sócios das ações incorporadas
o direito de retirada, diante da facilidade em que encontravam de dispor de suas ações
por meio da bolsa de valores, local onde seriam comercializadas as ações que ainda
detinham. Ainda, não considerou como fechamento de capitais ou fraude à lei, porque
as companhias envolvidas na operação eram de capital aberto, com ações plenas de
liquidez, não retirando dos sócios a possibilidade de alienar suas ações no mercado
de capitais. Quanto às ações preferenciais, decidiu da seguinte maneira:
Acrescente-se que também não seria possível estender aos ora recorrentes, na
qualidade de acionistas preferenciais, a oferta pública decorrente da primeira
etapa da operação (alienação de controle), pois tal oferta é prevista tão somente
em favor dos titulares de ações ordinárias, conforme já decidiu esta Corte
Superior 23.
Cumpre esclarecer que a incorporação das ações difere da incorporação
de uma sociedade a outra, porque no primeiro a sociedade continua existindo na
condição de subsidiária integral, enquanto na segunda há a extinção de uma das
sociedades, qual seja a incorporada. Assim:
A incorporação [de sociedades] não se confunde com a incorporação de ações.
Esta última está disciplinada no art. 252 da LSA e importa a conversão de
sociedade anônima em subsidiária integral. Na incorporação de ações, todas as
ações do capital social de uma companhia são transferidas ao patrimônio de
uma sociedade empresária, que passa à condição de sua única acionista. É
indispensável que essa sociedade, detentora de todo o capital social da
anônima, seja brasileira 24.
E, quando há o fechamento de capital (ou cancelamento do registro de
companhia aberta) por uma sociedade, deixam os sócios de terem liquidez em suas
ações, uma vez que não mais poderão comercializar no mercado de capitais, havendo
uma forma diversa de venda e compra das ações que detém. Como bem definem
Modesto Carvalhosa e Nelson Eizirik:
22 Curso de direito comercial. [livro eletrônico]. Vol. 2. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2016, cap. 25, item 3.5.1. 23 Recurso Especial 1.642.327 – SP. 24 Recurso Especial 1.642.327 – SP.
P á g i n a | 26
O cancelamento do registro de companhia aberta (ou fechamento de capital, na
terminologia do mercado) constitui o procedimento mediante o qual uma
companhia aberta torna-se fechada, inviabilizando a negociação dos valores
mobiliários de sua emissão no mercado de valores mobiliários. 25
Por fim, visando concretizar as modalidades em que uma subsidiária
poderá ser constituída, são elas: de forma originária ou de forma derivada. Diante da
primeira hipótese deverão ser observados requisitos essenciais para que haja a
regular constituição, são eles: ser adotado o tipo societário de sociedade anônima, o
sócio único que constituirá a subsidiária deverá ser uma sociedade brasileira e, esta
constituição, ser por intermédio, necessariamente, de escritura pública, não sendo
dispensado o registro junto a Junta Comercial competente.
De acordo com José Waldecy Lucena 26, o processo de constituição de
subsidiária integral pode ser divido em dois tipos: constituição originária ou
derivada.91 A constituição originária seria aquela decorrente da separação de uma
parcela do patrimônio de uma sociedade brasileira para a constituição de outra
sociedade que passará a ser então, subsidiária integral daquela, conforme previsto no
caput do artigo 251 da Lei das Sociedades por Ações.
Já, diante da segunda hipótese, a constituição seria aquele em que uma
sociedade já existente é convertida em subsidiária integral, podendo resultar da: a)
transformação por incorporação de ações, conforme artigo 252 da LSA e b) aquisição
por sociedade brasileira de todas as ações de emissão de uma companhia, conforme
artigo 252 da LSA. Ou seja, em razão da unipessoalidade configurada na sociedade
após a sua constituição, isto é, foi constituída uma sociedade com dois ou mais sócios
e por motivos de dissolução parcial ou causa mortis tornou-se a sociedade unipessoal,
devendo o sócio que configura como único observar o prazo estipulado de 180 dias ou
até a próxima assembleia-geral 27.
25 A Nova Lei das S/A. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 42. 26 LUCENA, José Waldecy. Das Sociedades Anônimas: Comentários à Lei. Rio de Janeiro:
Renovar, 2012. Vol. III, p. 805. 27 Lembrando que 180 dias refere-se ao prazo previsto no Código Civil sendo, portanto,
inaplicável às sociedades anônimas, diante da previsão em sua Lei especial ser diversa. Neste caso, quando se está diante do prazo de 180 dias, além de ter que se transformar em uma sociedade anônima, deverá ser essa sociedade brasileira. Não necessariamente deverá o sócio que configurou como único se transformar em subsidiária integral, poderá optar por ser empresário individual, EIRELI ou, simplesmente, dar por extinta a sociedade.
P á g i n a | 27
CAPÍTULO 2.3 - EMPRESA INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA
Surgiu da necessidade do empresário individual limitar a sua
responsabilidade pelo exercício de suas atividades somente ao monte atinente a ela,
como nos ensina Ricardo Sandoval Lopez:
Desde hace bastante tiempo se venía planteando la necesidad de introducir en la
normativa jurídica mercantil una figura que permitiese al empresario individual
limitar su responsabilidad por el ejercicio de las actividades empresariales
solamente al monto de los bienes afectados a ella, separando este patrimonio de
los bienes que destina a otros fines, como, por ejemplo, a subvenir los gastos
familiares 28.
Desta forma, o objetivo seria “permitir que um determinado empreendedor,
individualmente, exercesse atividade empresarial limitando sua responsabilidade, em
princípio, ao capital investido no empreendimento, ficando os seus bens particulares
resguardados” 29.
Segundo Alfredo de Assis Gonçalves Neto, a EIRELI pode ser conceituada
como “agente econômico personificado, constituído por um ato unilateral de uma
pessoa natural, mediante aporte de um patrimônio mínimo, ou mediante conversão de
uma sociedade unipessoal com patrimônio líquido mínimo para o fim de exercer
atividade própria de empresário” 30.
Ainda, nas palavras de Alessandro Sanchez:
A Lei 12.441/2011 institui as Empresas Individuais de Responsabilidade Limitada,
alterando dispositivos de nosso Código Civil. O ideal é o de autorizar o titular da
Empresa Individual na separação de patrimônio, já que a pessoa natural exercente
da empresa será considerada distinta, logicamente, da pessoa jurídica
empresária, e cada uma dessas pessoas terá patrimônio próprio 31.
Haja vista a prerrogativa de separação patrimonial, característica em que o
empresário individual não desfruta, fez com que esse tipo de pessoa jurídica em que
uma única pessoa exerce a atividade empresarial sem que seu patrimônio pessoal
28 Derecho Comercial – Actos de comercio. Noción general de empresa individual y colectiva.
Vol.1, p.173. 29 RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial esquematizado. 4ª edição. São Paulo:
MÉTODO, 2014, p.62 [livro eletrônico]. 30 A empresa individual de responsabilidade limitada. In: Revista dos Tribunais. São Paulo,
v.101, n.915, p. 153/180, jan. 2012 31 MP 881 e a Liberdade Econômica – Os Reflexos na EIRELI e Sociedade Limitada
Unipessoal.
P á g i n a | 28
seja afetado fosse recebido em 2011 pelo ordenamento jurídico brasileiro. Antes disto,
se desejasse o empresário exercer atividade empresarial teria que desfrutar das
figuras do: a) empresário individual, o qual não desfruta de separação patrimonial,
havendo confusão patrimonial da atividade empresarial exercida e o pessoal. Portanto,
tem-se a responsabilidade ilimitada; b) sociedade limitada, a qual requer, no mínimo,
dois sócios para sua constituição, conforme explicado no tópico anterior. Portanto,
tem-se a responsabilidade limitada com exigência de dois integrantes, no mínimo, no
quadro societário para que seja regular sua situação; ou c) sociedade anônima,
também explanada anteriormente, que exige dois ou mais sócios para sua
constituição.
Nas palavras de Diana Caiado Balassiano 32:
Como se viu, antes de 2011, o direito brasileiro não contemplava a possibilidade
de um indivíduo exercer a atividade empresarial com a mesma proteção conferida
aos sócios e acionistas de sociedades empresárias – a limitação da sua
responsabilidade patrimonial. Para que uma pessoa natural pudesse empreender
sem ariscar o seu patrimônio particular, fazia-se necessária a constituição das
chamadas “sociedades fictícias”, “sociedades aparentes” ou “sociedade
simuladas”, [...].
Destarte, aprovada em 11 de julho de 2011 e publicada no Diário Oficial da
União no dia seguinte, com entrada em vigor em janeiro de 2012, haja vista vacacio
legis de 180 dias, foi introduzida a figura da empresa individual de reponsabilidade
limitada (EIRELI) no Código Civil, trazendo uma nova figura de pessoa jurídica (artigo
44, inciso VI do Código Civil) 33, disciplinada em tópico apartado, qual seja Título I-A,
artigo 980-A, do Código Civil, in verbis:
Art. 980-A. A empresa individual de responsabilidade limitada será constituída por
uma única pessoa titular da totalidade do capital social, devidamente integralizado,
que não será inferior a 100 (cem) vezes o maior salário-mínimo vigente no
País. (Incluído pela Lei nº 12.441, de 2011) (Vigência)
§ 1º O nome empresarial deverá ser formado pela inclusão da expressão “EIRELI”
após a firma ou a denominação social da empresa individual de responsabilidade
limitada. (Incluído pela Lei nº 12.441, de 2011)(Vigência)
32 EIRELI: O Novo Tratamento Jurídico da Unipessoalidade no Direito Brasileiro. 33 CC, art. 44. “São Pessoas jurídicas de direito privado: [...] VI – as empresas individuais de
responsabilidade limitada. (Incluído pela Lei nº 12.441, de 2011) (Vigência)”.
P á g i n a | 29
§ 2º A pessoa natural que constituir empresa individual de responsabilidade
limitada somente poderá figurar em uma única empresa dessa
modalidade. (Incluído pela Lei nº 12.441, de 2011) (Vigência)
§ 3º A empresa individual de responsabilidade limitada também poderá resultar da
concentração das quotas de outra modalidade societária num único sócio,
independentemente das razões que motivaram tal concentração. (Incluído pela Lei
nº 12.441, de 2011) (Vigência)
§ 4º (VETADO) . (Incluído pela Lei nº 12.441, de 2011) (Vigência)
§ 5º Poderá ser atribuída à empresa individual de responsabilidade limitada
constituída para a prestação de serviços de qualquer natureza a remuneração
decorrente da cessão de direitos patrimoniais de autor ou de imagem, nome,
marca ou voz de que seja detentor o titular da pessoa jurídica, vinculados à
atividade profissional. (Incluído pela Lei nº 12.441, de 2011) (Vigência)
§ 6º Aplicam-se à empresa individual de responsabilidade limitada, no que couber,
as regras previstas para as sociedades limitadas. (Incluído pela Lei nº 12.441, de
2011) (Vigência)
§ 7º Somente o patrimônio social da empresa responderá pelas dívidas da
empresa individual de responsabilidade limitada, hipótese em que não se
confundirá, em qualquer situação, com o patrimônio do titular que a constitui,
ressalvados os casos de fraude. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)
Sua implantação na legislação brasileira deu-se diante da observação de
sua utilização em vários países europeus e latino-americanos. Na Alemanha, por
exemplo, foi constituída em 1980 sendo denominada GmbH-Novelle. Seguida pela
França, a qual denominou como empresa unipessoal de responsabilidade limitada. Já
na Itália, após o Decreto-Lei nº 88/93 e, na Espanha, em 1995 com a Lei nº 02.
Quanto aos países latino-americanos, citam-se como exemplos o Paraguai, Peru e
Chile.
Desta forma, Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI) é
aquela constituída por uma única pessoa titular da totalidade do capital social,
devidamente integralizado, que não poderá ser inferior a cem vezes o salário mínimo
vigente no País. Visou, com sua criação, desestimular a constituição de sociedades
fictícias, ou seja, sociedades que apresentam um sócio com quase totalidade das
quotas ou ações, enquanto outro com expressão irrisória no quadro societário. Assim,
nas lições de Gladston Mamede:
P á g i n a | 30
[...] é preciso reconhecer haver um número expressivo das sociedades limitadas,
no Brasil, que não constituem uma sociedade de fato, mas apenas de direito.
Nelas não se afere efetivamente um encontro de investimentos e esforços de seus
sócios, pelo contrário, tem-se um sócio majoritário, que é aquele que efetivamente
investiu na constituição da pessoa jurídica e da empresa e que dela se ocupa, e
um sócio minoritário (esposa, irmão, filho, primo etc.) que nada investiu de fato,
nem sequer se interessa pelo que se passa com a sociedade. Está ali apenas
para garantir a pluralidade de pessoas que salvo exceções específicas, é
necessária para que se tenha uma sociedade (pessoa jurídica) 34.
Sua formação, não diferentemente da subsidiária integral, poderá ser de
duas formas: originária e derivada. A primeira se dá quando constituída diretamente
pelo titular e registrada perante o registro competente, tanto Registro Público de
Empresas Mercantis quanto Registro Civil de Pessoas Jurídicas. Enquanto a derivada
dá-se pelo fruto de transformação de uma sociedade anteriormente constituída ou do
empresário individual. Não obstante:
Temos duas formas de constituição da EIRELI: originária ou derivada. Aquela
forma se refere quando a constituição tem caráter inicial e esta quando se busca a
continuidade de uma atividade anteriormente exercida. É o que se lê da redação
do art. 980-A, §3º, que permite que uma EIRELI resulte da concentração das
quotas de outra modalidade societária num único sócio independente das razões
que motivaram tal concentração. Essa transformação pode resultar da não
superação da unicidade dos sócios, em 180 dias, conforme previsto no art. 1.033
C.C. É válido também o contrário, a admissão de um sócio na EIRELI, constituindo
assim, uma sociedade empresária, observados as regras sobre a transformação
do tipo empresarial inscrita no art. 1.113 a 1.115 C.C. 35.
Assim, para constituição originária, necessário documento denominado
“Ato Constitutivo”, que nos termos da Instrução nº 11/2013 do DREI deverá conter,
obrigatoriamente: qualificação do titular do capital social da EIRELI, nome empresarial
– que poderá ser tanto denominação quanto firma, conforme previsão do parágrafo
único do art. 1º da Instrução Normativa nº 15/2013 do DREI 36 -, capital social mínimo
34 Comentários ao Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, art.
69, p. 372. 35 Welter, Marlene. Vieira, Marli Terezinha. Dos Santos, José Vandilo. Empresa Individual de
Reponsabilidade Limitada (EIRELI) e o Patrimônio de Afetação: uma análise jurídica e econômica. ISSN 2369-4403, setembro de 2016. 36 Nas lições de Fábio Ulhôa Coelho (Manual de Direito Comercial, 23ª edição, Editora Saraiva):
A firma e a denominação se distinguem em dois planos, a saber: quanto à estrutura, ou seja, aos elementos linguísticos que podem ter por base; e quanto à função, isto é, a utilização que se pode imprimir ao nome empresarial.
P á g i n a | 31
37, o objeto a ser desenvolvido, prazo de duração – se determinado ou indeterminado -
, a responsabilidade limitada; qualificação do administrador – se o titular ou não da
EIRELI 38-, obrigação de o administrador prestar contas da administração,
possibilidade ou não da sua continuidade em caso de falecimento do titular; eleição de
foro, endereço da sede, declaração que o titular não possui outra empresa com a
mesma modalidade e declaração de integralização do capital.
Em razão de o legislador ter sido breve na regulamentação da EIRELI,
inúmeras questões ficaram em discussão, dentre elas: se a EIRELI somente poderia
ser constituída por pessoas naturais e de que tanto pessoas naturais quanto jurídicas
poderiam constituir EIRELI. Apenas em 2017, o DREI (Departamento de Registro
Empresarial e Integração) se posicionou quanto à possiblidade de tanto pessoa
jurídica quanto pessoa física constituírem presente empresa. Assim, conforme extraído
do artigo Constituição de Eireli por pessoas jurídicas: o novo posicionamento do DREI,
publicado no site Migalhas por Fernando Schwarz Gaggini, em 05 de abril de 2017:
Ainda em 2011, o então existente DNRC – Departamento Nacional de Registro do
Comércio, ao regulamentar o tema da Eireli pela Instrução Normativa 117, adotou
o entendimento de que a Eireli somente poderia ser constituída e titularizada por
pessoas naturais, vedando a constituição por pessoas jurídicas. Referido
entendimento levou a diversos questionamentos e discussões judiciais, mantendo
a polêmica em aberto.
Em 2013, com a substituição do DNRC pelo DREI – Departamento de Registro
Empresarial e Integração, surgiu a expectativa de que, com a nova
regulamentação do DREI, se autorizasse a constituição de Eireli por pessoa
No tocante à estrutura, a firma só pode ter por base o nome civil. O núcleo do nome
empresarial dessa espécie será sempre um ou mais nomes civis. Já a denominação deve designar o objeto da empresa e pode adotar por base nome civil ou qualquer outra expressão linguística [...].
Explique-se: quanto à função, os nomes empresariais se diferenciam na medida em que a firma, além da identidade do empresário, é também a sua assinatura, ao passo que a denominação é exclusivamente elemento de identificação do exercente da atividade empresarial, não prestando a outra função.
Portanto, o nome empresarial poderá ser firma ou denominação, a firma formada pelo nome do empresário, podendo abreviar o prenome, e a denominação deve obedecer à novidade e veracidade, acompanhados da palavra EIRELI ao final. 37 Não há necessidade de alteração do capital social em razão de posterior aumento do salário-
mínimo, conforme o Enunciado 4 da I Jornada de Direito Comercial: “Uma vez subscrito e efetivamente integralizado, o capital da empresa individual de responsabilidade limitada não sofrerá nenhuma influência decorrente de ulteriores alterações no salário mínimo”. 38 Conforme artigo 980-A, §6º o administrador pode ser ou não titular da EIRELI, aplicando-se
subsidiariamente as previsões das sociedades limitadas, ressaltando o disposto no artigo 1.061 do Código Civil: “Art. 1.061. A designação de administradores não sócios dependerá de aprovação da unanimidade dos sócios, enquanto o capital não estiver integralizado, e de 2/3 (dois terços), no mínimo, após a integralização”.
P á g i n a | 32
jurídica. Entretanto, o DREI, através da Instrução Normativa 10/13, em seu anexo
V (Manual de Registro de Eireli), manteve o entendimento anterior do DNRC,
vedando às pessoas jurídicas a condição de titular de Eireli. Com isso,
continuaram as discussões e medidas judiciais em relação ao tema.
Mas eis que, nesse início de 2017, surge uma novidade a respeito dessa
polêmica. Através da Instrução Normativa 38, que conforme os dados divulgados
pelo site do DREI, entrará em vigor no início de maio, o DREI alterou seu
entendimento acerca do tema, de modo que a nova redação do item 1.2.5
("Capacidade para ser titular de Eireli") do Manual de Registro, em sua alínea "c",
prevê expressamente que pode ser titular de Eireli a pessoa jurídica nacional ou
estrangeira.
Completa, “Com isso, parece que mais uma grande discussão prática
sobre o tema da Eireli se encerrará, oferecendo maior segurança jurídica aos
empreenderes”. Destaca-se, portanto, que tanto pessoa física como pessoa jurídica
poderão constituir uma empresa individual de responsabilidade limitada,
posicionamento dado em 2017 pelo Departamento de Registro Empresarial e
Integração (DREI).
Já a constituição derivada está prevista no Manual de Registro da EIRELI,
editado pelo DREI, a partir do item 3.2.14. A primeira hipótese trata é a do sócio
remanescente que não obteve êxito ou não desejou recompor a pluralidade de sócios.
A segunda trata da concentração de quotas de sociedades simples, seguida de
conversão ou transformação para EIRELI. Aqui, o Manual recomenda primeiro a
conversão ou transformação – o primeiro se mantido o tipo societário e o segundo
quando há mudança do mencionado tipo – da sociedade simples em empresária. A
terceira hipótese é a transformação do empresário individual em EIRELI.
Nas lições de Humberto Theodoro Jr.:
Em tema de responsabilidade patrimonial, situação interessante foi criada pela Lei
nº 12.441, de 11 de junho de 2011, que inclui entre as pessoas jurídicas a
denominada empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI). Por meio
dessa instituição é possível à pessoa física dedicar-se à atividade empresarial
sem associar-se com outras pessoas e sem comprometer a totalidade de seu
patrimônio. Pelas obrigações contraídas em nome da empresa individual, que
passou a figurar no inciso VI do art. 44 do Código Civil, apenas responderão os
bens com que o instituidor integralizou o respectivo capital. Aplicam-se à EIRELI,
no que couber as regras: previstas para as sociedades limitadas (art. 980-A, § 6º,
do Código Civil). Esse tipo empresarial pode ser produto de ato de vontade
P á g i n a | 33
originário do instituidor, ou resultar da concentração das cotas de outra
modalidade societária num único sócio (art. 980-A, §3º, do Código Civil). Todavia,
limita a lei a liberdade da pessoa física permitindo-lhe figurar em uma única
empresa dessa modalidade (art. 980-A, §2º do Código Civil) 39.
Ainda, quanto a sua classificação pela natureza encontram-se dois tipos:
EIRELI simples e EIREILI empresária. A primeira é aquela que também poderá
configurar como sociedade simples, esta explanada anteriormente no item 1 do
presente trabalho. Ao passo que a EIRELI empresária é aquela que observa os
requisitos necessários para que seja considerado seu objeto como exercente de
atividade empresarial.
A importância de sua classificação está quanto ao órgão competente para
seu registro. Sendo EIRELI simples o local de seu registro será, diante do objeto social
que apresenta, no Cartório (Registro Civil de Pessoas Jurídicas), à medida que a
EIRELI empresária será registrada na Junta Comercial (Registro Público de Empresas
Mercantis). O registro cumpre a função de reconhecimento da personalidade jurídica
que se confere à Empresa (artigo 44, inciso VI do Código Civil), bem como quanto à
eficácia dos atos posteriores, com repercussões sobre o regime de responsabilidade
do titular.
A responsabilidade do titular da EIRELI, o que por si é atrativo para que
haja a constituição da presente Empresa, afinal faz com que empreenda sem arriscar
o seu patrimônio particular, é limitada. O limite é, via de regra, o capital social,
excetuando quando incidente fraude ou desconsideração da personalidade jurídica.
Tal entendimento prevaleceu mesmo após o veto presidencial do §4º do art. 980-A do
Código Civil, o qual preceituava:
§4º. Somente o patrimônio social da empresa responderá pelas dívidas da
empresa individual de responsabilidade limitada, não se confundindo em qualquer
situação com o patrimônio da pessoa natural que a constitui, conforme descrito em
sua declaração anual de bens entregue ao órgão competente.
As razões do veto foram:
Não obstante o mérito da proposta, o dispositivo traz a expressão “em qualquer
situação”, que pode gerar divergências quanto à aplicação das hipóteses gerais de
desconsideração da personalidade jurídica, previstas no art. 50 do Código Civil.
39 “Curso de Direito Processual Civil Teoria Geral do Direito Processual Civil”, vol. III 47ª ed., Forense, 2015
P á g i n a | 34
Assim, e por força do §6º do projeto de lei, aplicar-se-á à EIRELI as regras da
sociedade limitada, inclusive quanto à separação do patrimônio.
Corroborando para o entendimento trouxe a V Jornada de Direito Civil o
Enunciado 470: “Art. 980-A. O patrimônio da empresa individual de responsabilidade
limitada responderá pelas dívidas da pessoa jurídica, não se confundindo com o
patrimônio da pessoa natural que a constitui, sem prejuízo da aplicação do instituto da
desconsideração da personalidade jurídica”.
Nesse sentido:
APELAÇÃO – AÇÃO DE COBRANÇA – ILEGITMIDADE PASSIVA DO SÓCIO –
NEGÓCIO FIRMADO POR EIRELI – A empresa individual de responsabilidade
limitada EIRELI -, instituída pela LF 14.441/2011, é sujeito de direito, possui
individualidade própria, autonomia e responsabilidade patrimonial distinta da
pessoa natural, que a constitui, de sorte, que uma não responde pelas obrigações
decorrentes da outra, quando inexistente previsão contratual ou legal, em sentido
contrário, como acontece na espécie, em que sequer foi requerida a instauração
do incidente de desconsideração da personalidade jurídica. RECURSO
IMPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1005986-80.2014.8.26.0048; Relator
(a): Maria Lúcia Pizzotti; Órgão Julgador: 30ª Câmara de Direito Privado; Foro de
Atibaia - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 25/09/2019; Data de Registro:
26/09/2019).
Agravo de instrumento. Determinação para que o constituinte de empresa
individual de responsabilidade limitada (EIRELI) seja incluído no polo passivo de
execução movida contra a sociedade executada. Tipo empresarial que não se
confunde com o empresário individual, em que a pessoa natural exerce atividade
econômica organizada para produção e circulação de bens e serviços, na qual há
confusão patrimonial entre os bens da firma individual e da pessoa física. Na
EIRELI não há confusão patrimonial entre os bens da empresa constituída e da
pessoa que a constituiu. Possibilidade, todavia, de se buscar a desconsideração
da personalidade jurídica, na forma do art. 50 CCivil, mediante a instauração de
procedimento adequado (art. 133 e ss. CPC). Agravo provido. (TJSP; Agravo de
Instrumento 2148161-54.2019.8.26.0000; Relator (a): Soares Levada; Órgão
Julgador: 34ª Câmara de Direito Privado; Foro de Indaiatuba - 2ª Vara Cível; Data
do Julgamento: 30/08/2019; Data de Registro: 30/08/2019).
AGRAVO DE INSTRUMENTO EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL
PRETENSÃO PENHORA DE BENS DE TITULARIDADE DE EMPRESA
INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA (EIRELI) CONSTITUÍDA PELO
DEVEDOR INADMISSIBILIDADE patrimônio da empresa constituída pelo devedor
P á g i n a | 35
que não se confunde com o patrimônio deste empresa cujo capital social é
constituído por um único titular figura empresária criada pela Lei nº 12.441/2011
que se equipara, para fins de responsabilização de seu titular, à sociedade
limitada impossibilidade de constrição de bens da empresa, que não figura no polo
passivo da execução pretensão de penhora das cotas do capital social não
conhecimento pedido ainda não apreciado pelo juiz de 1º grau apreciação nesta
sede recursal que seria açodada e representaria indevida supressão de um grau
de jurisdição agravo parcialmente conhecido e, na parte conhecida, desprovido.
(TJSP, Agravo de Instrumento 2036740- 98.2015.8.26.0000, rel. Des. Castro
Figliolia, j. 25/03/2015).
Não obstante essa limitação da responsabilidade, a presente figura é
utilizada como solução para não dissolução da sociedade empresária ou sua extinção,
prevendo o artigo 1.033, parágrafo único do Código Civil a alternativa de
transformação em EIRELI, in verbis:
Art. 1.033. Dissolve-se a sociedade quando ocorrer:
(...)
IV - a falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de cento e oitenta
dias;
(...)
Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV caso o sócio remanescente,
inclusive na hipótese de concentração de todas as cotas da sociedade sob sua
titularidade, requeira, no Registro Público de Empresas Mercantis, a
transformação do registro da sociedade para empresário individual ou para
empresa individual de responsabilidade limitada, observado, no que couber, o
disposto nos arts. 1.113 a 1.115 deste Código . (Redação dada pela Lei nº 12.441,
de 2011) (Vigência)
Conforme explanado anteriormente, prevê o artigo 980-A, §3º do Código
Civil que: “A empresa individual de responsabilidade limitada também poderá resultar
da concentração das quotas de outra modalidade societária num único sócio,
independentemente das razões que motivaram tal concentração”. Observou o
legislador a importância de dar continuidade à empresa, mantendo a atividade
empresarial, que alimenta a sociedade com emprego, tributações, mercadorias e entre
outros. Lembrando que presente transformação dá-se pela forma derivada de
constituição de uma EIRELI.
P á g i n a | 36
Se a sociedade que permanecer apenas com um sócio, durante o período
de 180 dias e a concentração de quotas fique nas mãos de um deles, poderá ser
transformada em EIRELI. Assim, quando diante de uma transformação tem-se que ser
analisado sob a ótica da Instrução Normativa do DREI de nº 35/2017. Logo no artigo
1º encontra-se conceituada a transformação, que vem a ser: “Art. 1º Transformação é
a operação pela qual uma empresa ou sociedade passa de um tipo para outro,
independentemente de dissolução ou liquidação, obedecidos os preceitos reguladores
da constituição e inscrição do tipo em que vai converter-se”. Assim, quando se trata de
transformação, “[...] pretende dar continuidade à empresa, mantendo a atividade
empresarial independente da modalidade escolhida” 40.
Quando diante de uma transformação envolvendo sociedade empresária
os sócios ou acionistas da sociedade a ser transformada deverão deliberar sobre
algumas questões (art.2º), quais sejam:
I – a transformação da sociedade, podendo fazê-la por instrumento
público ou particular;
II – a aprovação do estatuto ou contrato social;
III – a eleição dos administradores, dos membros do conselho fiscal,
se permanente, e fixação das respectivas remunerações quando se
tratar de sociedade anônima.
Cumpre ressaltar que qualquer tipo jurídico societário quando na presente
situação necessita da aprovação da totalidade dos sócios ou acionistas, salvo se já
expressamente previsto no contrato ou estatuto social quórum inferior a este (art. 3º).
Perante a transformação de uma sociedade empresária destaca o art. 9º, §1º que: “A
transformação de registro a que se refere o caput deste artigo pode ser realizada no
mesmo ato em que ficar registrada a falta de pluralidade de sócios”, tendo em vista
que passado o prazo de 180 dias a que refere o art. 1.033, inciso IV do CC poderá a
sociedade, alternativamente, requerer a transformação de seu registro, a
recomposição da pluralidade ou promover a dissolução (§2º, art. 9º). Caso não
requerendo nenhuma das hipóteses elencadas, a sociedade operará como sociedade
em comum, conforme o art. 986 do CC: “Enquanto não inscritos os atos constitutivos,
reger-se-á a sociedade, exceto por ações em organização, pelo disposto nesta
Capítulo, observadas, subsidiariamente e no que com ele forem compatíveis, as
40 DA ROCHA, Carlos Alexandre Kolb. Empresa individual de responsabilidade limitada para o
profissional de arquitetura. 2013, p. 39.
P á g i n a | 37
normas da sociedade simples”. A deliberação pela transformação poderá ser seguida
do ato constitutivo da EIRELI, no mesmo instrumento, respeitado o capital mínimo
previsto no caput do art. 980-A do CC (§3º, art. 9º).
Dessa forma, conforme o artigo Considerações sobre a transformação do
registro de Sociedade Limitada para EIRELI em ato único, por Paola Pereira Martins, a
Instrução Normativa 35 do DREI prevê a possibilidade que a transformação de registro
seja realizada em um ato único (artigo 9º da IN 35/DREI). Os requisitos são: a) capital
social da sociedade limitada respeite o capital mínimo exigido pela EIRELI – descrito
supra. Sendo aquém este valor, necessária deliberação de aumento do capital em
momento anterior ou, ainda, no mesmo ato transformador; b) o ato transformador
disporá quanto ao ato constitutivo da EIRELI, que a disciplinará.
Nas lições de Gilvânia Benker:
Não há na lei vedação para que uma mesma pessoa possa participar,
simultaneamente, de outras modalidades de empresas. Mas é importante salientar
que a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada também poderá resultar
da concentração das quotas de outra modalidade societária num único sócio. Isso
significa que, nesses casos, não haverá a necessidade de constituição de uma
nova pessoa jurídica, mas sim a transformação desta já existente em uma Eireli.
Por exemplo, no caso de uma sociedade limitada, um dos sócios pode adquirir as
quotas do outro sócio e concentrar, a partir daí, todo o capital social da empresa,
transformando-a em uma Eireli 41.
Dá-se a transformação de empresário individual em EIRELI mediante
requerimento de transformação próprio, concomitantemente a este requerimento,
deverá ser arquivado o ato constitutivo da EIRELI em separado, respeitado o capital
mínimo previsto no art. 980-A do CC (art.11).
Nesse sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. TRANSFORMAÇÃO
SOCIETÁRIA NO CURSO DA EXECUÇÃO FISCAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA. O
recorrente pode responder pessoalmente pelas obrigações assumidas em nome
da firma individual, porque a transformação societária, de firma individual para
EIRELI, ocorreu em momento posterior ao ajuizamento da execução fiscal citação.
Negado provimento ao agravo de instrumento. (TRF-4 – AG:
50301145220184040000 5030114-52.2018.4.04.0000, Relator: ROGER RAUPP
RIOS, Data de Julgamento: 10/10/2018, PRIMEIRA TURMA).
41 Empresa de responsabilidade limitada agora não requer sócio. Jornal do Comércio.
P á g i n a | 38
Todavia, nem sempre será possível a utilização dos mecanismos de
transformação para que haja a continuidade da atividade empresarial, ocorrendo
dissolução da EIRELI pelo “vencimento de seu prazo de duração e respectiva
liquidação, vontade do titular de seu capital; morte do titular do capital e extinção, na
forma da lei, de autorização para funcionar”, de forma extrajudicial, e ainda
“decretação de falência (Lei 11.101/05); anulação do ato de inscrição e exaurimento
do fim social” 42. Dessa forma, havendo dissolução, tem-se que ser observado os
dispositivos do Código Civil, artigos 1.102 a 1.112, procedendo-se com a baixa do
registro e declaração de extinção da empresa.
Apesar de sua criação permitir que o empresário sozinho configure como
titular de uma pessoa jurídica, diferenciando dos demais elencados no art. 44 do
Código Civil, a exigência de 100 vezes o salário mínimo vigente quando da
integralização do capital em sua constituição faz com que a presente figura não seja
comumente utilizada, apesar da separação patrimonial que dispõe. Como se observa
nas palavras de Aline Awdrey Ribeiro:
Desde a vigência da legislação que trata da EIRELI – Empresa Individual de
Responsabilidade Limitada, a sociedade com apenas uma única pessoa já estava
englobada em nossa legislação pátria. Entretanto, o mercado até o momento não
tinha conseguido aderir esse tipo societário de forma vultuosa, em razão de, entre
outros requisitos, haver a obrigatoriedade de integralização de 100 (cem) salários
mínimos, o que na maioria das vezes inviabilizava o negócio 43.
CAPÍTULO 3 - DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
Diante da possibilidade de se desvirtuar a função da personalidade
jurídica é que surgiu a doutrina da desconsideração, a qual permite a superação da
autonomia patrimonial, que embora seja um importante princípio, não é um princípio
absoluto44.
Prevista no art. 50 do Código Civil, o abuso da personalidade jurídica
permite que, por decisão judicial, “os efeitos de certas e determinadas relações de
obrigações sejam estendidas aos bens particulares dos administradores ou sócios da
42 Cardoso, Paulo Leonardo Vilela. O empresário de responsabilidade limitada. São Paulo:
saraiva 2012, p. 117. 43 Sociedade limitada unipessoal permitida no Brasil. 44 TOMAZETTE, Marlon. A desconsideração da personalidade jurídica: a teoria, o CDC, e o
novo código civil, p.239.
P á g i n a | 39
pessoa jurídica” 45. Referentes abusos são caracterizados de duas maneiras: a) pelo
desvio de finalidade, ou seja, pelo uso da pessoa jurídica para acobertar negócios do
interesse particular dos seus gestores e b) pela confusão patrimonial, que vem a ser a
sociedade absorvendo todo o patrimônio dos sócios, de modo que não se consegue
distinguir o interesse da pessoa jurídica do interesse do particular dos sócios.
Não obstante, outras legislações vigentes no País regem o instituto da
desconsideração, tais como: Código de Defesa do Consumidor, art. 28 – destacando
que foi a primeira a legislar sobre o instituto - e Lei Antitruste (Lei nº 12.529/11), art.38.
Cumpre ressaltar que a desconsideração da personalidade jurídica não
se dá por inadimplemento ou insolvência do sócio, mas sim quando diante de uma das
duas hipóteses acima mencionadas, por intermédio de uma decisão judicial que as
reconhecem, aplicando o artigo supramencionado. Desta forma, a pretensão do credor
pode ser manifestada incidentalmente no processo de conhecimento ou de execução
(CPC, art. 134, caput), devendo ser observado os princípios do contraditório, da ampla
defesa e do devido processo legal (art. 5º, incisos LIV e LV da CF/88), proferindo o
magistrado decisão interlocutória de reconhecimento ou não do abuso, cabendo contra
aquela decisão agravo de instrumento. Nesses termos:
“A aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica dispensa a
propositura de ação autônoma para tal. Verificados os pressupostos de sua
incidência, poderá o Juiz, incidentemente no próprio processo de execução
(singular ou coletiva), levantar o véu da personalidade jurídica para que o ato da
expropriação atinja os bens particulares de seus sócios, de forma a impedir a
concretização de fraude à lei ou contra terceiros. O sócio alcançado pela
desconsideração da personalidade jurídica da sociedade empresária torna-se
parte no processo e assim está legitimado a interpor, perante o Juízo de origem,
os recursos tidos por cabíveis, visando à defesa de seus direitos” (STJ, 3ª T.,
RMS 26.274/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. em 19-8-2003, DJ, 2-8-2004, p.
359).
Ainda, cabe deixar claro que a desconsideração da personalidade jurídica
“subsiste o princípio da autonomia subjetiva da pessoa coletiva, distinta da pessoa de
seus sócios ou componentes, mas essa distinção é afastada, provisoriamente e tão só
para o caso concreto” 46, sendo seus efeitos meramente patrimoniais e sempre
relativos a obrigações determinadas – decorrentes de direitos civis e não apenas
45 Artigo 50 do CC. 46 COMPARATO, Fábio Konder, O poder de controle na sociedade anônima. 3. Ed., forense,
1983, p. 283.
P á g i n a | 40
contratuais -, pois a pessoa jurídica não entra em liquidação. Destarte, não atinge a
validade do ato constitutivo, mas importa em sua ineficácia episódica, quebrando,
assim, o princípio geral da autonomia patrimonial da sociedade em relação ao
patrimônio de seus sócios.
Desta forma, inclusive, a causa da desconsideração da personalidade
jurídica não é, apenas, o desvio dos fins estabelecidos no contrato social ou nos atos
constitutivos. O abuso pode também consistir na confusão entre o patrimônio social e
o dos sócios ou administradores, ainda que mantida a mesma atividade prevista,
estatutária ou contratualmente, tendo em vista que o Ministério Público também pode
configurar como parte.
Nas lições de Regina Beatriz Tavares da Silva:
Desconsideração da pessoa jurídica: A pessoa jurídica é uma realidade autônoma,
capaz de direitos e obrigações, independentemente de seus membros, pois efetua
negócios sem qualquer ligação com a vontade deles; além disso, se a pessoa
jurídica não se confunde com as pessoas naturais que a compõem, se o
patrimônio da sociedade não se identifica com o dos sócios, fácil será lesar
credores, mediante abuso de direito, caracterizado por desvio de finalidade, tendo-
se em vista que os bens particulares dos sócios não podem ser executados antes
dos bens sociais, havendo dívida da sociedade. Por isso o Código Civil pretende
que, quando a pessoa jurídica se desviar dos fins determinantes de sua
constituição, ou quando houver confusão patrimonial, em razão de abuso da
personalidade jurídica, o órgão judicante, a requerimento da parte ou do Ministério
Público, quando lhe couber intervir no processo, esteja autorizado a
desconsiderar, episodicamente, a personalidade jurídica, para coibir fraudes de
sócios que dela se valeram como escudo sem importar essa medida numa
dissolução da pessoa jurídica. Com isso subsiste o princípio da autonomia
subjetiva da pessoa coletiva, distinta da pessoa de seus sócios; tal distinção, no
entanto, é afastada, provisoriamente, para um dado caso concreto, estendendo a
responsabilidade negocial aos bens particulares dos administradores ou sócios da
pessoa jurídica 47.
Ainda, Fábio Ulhôa Coelho:
Como se vê destes exemplos, por vezes a autonomia patrimonial da sociedade
empresária dá margem à realização de fraudes. Para coibi-las, a doutrina criou,
a partir de decisões jurisprudenciais (nos EUA, Inglaterra e Alemanha,
principalmente) a “teoria da desconsideração da pessoa jurídica”, pela qual se
47 Código Civil Comentado, 6ª edição. Editora Saraiva, 2012, p.66 [livro eletrônico].
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autoriza o Poder Judiciário a ignorar a autonomia patrimonial da pessoa jurídica,
sempre que ela tiver sido utilizada como expediente para a realização de fraude.
Ignorando a autonomia patrimonial, será possível responsabilizar se, direta,
pessoal e ilimitadamente, o sócio por obrigação que originariamente cabia à
sociedade 48.
Desta forma:
O princípio da autonomia patrimonial não tem prosperado em situações em que o
credor é empregado, consumidor ou o estado, hipóteses em que o patrimônio dos
sócios ou administradores responde pelas dívidas da sociedade. Igual tratamento
tem sido aplicado nos casos de uso fraudulento ou abusivo do instituto da
autonomia patrimonial, situação em que o juiz poderá determinar a
desconsideração da pessoa jurídica, o que não significa sua extinção 49.
Destarte, pressuposto inafastável para desconsideração é a ocorrência
de fraude por meio da separação patrimonial, especificadamente manipulação da
autonomia patrimonial. Daí, ser a desconsideração “instrumento de coibição do mau
uso da pessoa jurídica” 50, devendo o credor da sociedade que pretende a
desconsideração fazer prova da fraude perpetrada na manipulação da autonomia
patrimonial. Segundo o doutrinador Rubens Requião (2014, p. 476) “Não se trata, é
bom esclarecer, de considerar ou declarar nula a personificação, mas de torná-la
ineficaz para determinados atos”.
Diante disso, a desconsideração, por apenas suspender a eficácia do ato
constitutivo, no episódio sobre o qual recai o julgamento, sem invalidá-lo, preserva a
empresa, que não será necessariamente atingida por ato fraudulento de um de seus
sócios, resguardando-se, dessa forma, os demais interesses que gravitam ao seu
redor, como o dos empregados, dos demais sócios, da comunidade etc.
Nas lições de Gladston Mamede:
A atribuição de personalidade para os contratos e estatutos societários é um
artifício jurídico cunhado, ao longo da evolução social, econômica e jurídica da
humanidade, para otimizar a marcha desenvolvimentista das relações
interindividuais. É essa a função social do instituto. Seu manejo doloso, seu uso
com imprudência ou negligência, assim como seu exercício em moldes que
48 Manual de Direito Comercial – direito de empresa. São Paulo: Editora Saraiva, 2011, p. 153
[livro eletrônico]. 49 Manual de Direito Comercial. São Paulo: Editora Saraiva, 2002. 50 Manual de Direito Comercial – direito de empresa. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais
LTDA, 2016, p. 77 [livro eletrônico].
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excedem manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social,
pela boa-fé ou pelos bons costumes, constituem ato ilícito. E se há uso ilícito da
personalidade jurídica [...], daí decorrendo danos a terceiros, é preciso
responsabilizar civilmente aquele(s) que deu(ram) causa eficaz a tais prejuízos
51.
No direito brasileiro surgiu teoria da desconsideração da personalidade
jurídica cujo objetivo é tornar ineficaz a separação existente entre os bens da
sociedade e os bens pessoais dos sócios, para considerá-los como uma
universalidade capaz de responder pelas obrigações contraídas, em nome da
sociedade, através da consumação de fraude ou abuso de direito.
Atualmente, portanto, adota-se uma concepção objetivista, que busca
estabelecer critérios seguros para desconsideração mesmo que não se prove o ato
fraudulento, como por exemplo, a caracterização do abuso da personalidade pelo
desvio de finalidade e a confusão patrimonial. Desta maneira, nas palavras de Joyce
Barrozo Fernandes:
Pelo exposto, o novo Código de Processo Civil trouxe o procedimento adequada
para o requerimento, que vis alcançar o patrimônio dos sócios, desde que os
requisitos materiais previsto no Código Civil estejam devidamente comprovados,
mediante interpretação restrita e em obediência ao devido processo legal 52.
Presente instituto apresenta duas teorias: Teoria Maior – divida em
subjetiva e objetiva - e a Teoria Menor. Diante da Teoria Maior Subjetiva tem-se como
pressuposto o desvio de função da personalidade jurídica, configurando fraude 53, ou
abuso de direito da personalidade jurídica 54; enquanto a Teoria Maior Objetiva
necessária a ocorrência da confusão patrimonial. Por sua vez, a Teoria Menor tem
como pressuposto apenas o não pagamento de débitos, que “caso fosse aplicada com
frequência, acabaria por enterrar a possiblidade de exercício de atividade empresarial
com limitação de responsabilidade” 55. Nas palavras de Fernanda Quintas
Vasconcelos:
51 Direito empresarial brasileiro: direito societário, sociedade simples e empresária. São Paulo,
Atlas, 2012. 52 A desconsideração da personalidade jurídica no CPC/15. 53 Conduta maliciosa com o objetivo de prejudicar terceiros, exercendo ilícito, utilizando-se da
autonomia patrimonial. 54 Conduta lícita praticada pela pessoa jurídica que leva a resultado contrário a sua função
social. 55 Vasconcelos, Fernanda Quintas. Uma análise sobre a evolução da desconsideração da
personalidade jurídica.
P á g i n a | 43
O STJ já afirmou, em alguns julgados, que a regra geral, no âmbito da
desconsideração, deve ser a teoria maior, que, além da insolvência da pessoa
jurídica, exige também a demonstração do abuso do sócio, caracterizado pelo
desvio de finalidade ou confusão de patrimônio (com base no artigo 50 do Código
Civil, que será adiante estudado) 56.
Não obstante poderá a desconsideração ocorrer de duas formas: direta e
indiretamente (ou inversa). A primeira ocorre quando desconsiderada a personalidade
jurídica da sociedade que incorreu no art. 50 do Código Civil, já a segunda ocorre
quando o sócio coloca seu patrimônio pessoal em nome da pessoa jurídica com o
intuito de ocultar o seu patrimônio frente a uma responsabilização. Ou seja, “a pessoa
jurídica é utilizada como meio para que os credores do sócio não tenham acesso aos
seus bens” 57. Corroborando, trazem os Enunciados 283 e 285 da IV Jornada de
Direito Civil:
Enunciado 283: É cabível a desconsideração da personalidade jurídica
denominada “inversa” para alcançar bens de sócio que se valeu da pessoa jurídica
para ocultar ou desviar bens pessoais, com prejuízo de terceiros.
Enunciado 285: A teoria da desconsideração, prevista no art. 50 do Código Civil,
pode ser invocada pela pessoa jurídica, em seu favor.
CAPÍTULO 3.1 - DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA
SOCIEDADE LIMITADA E NA SOCIEDADE ANÔNIMA
Ambos o tipos societários – limitada e anônima – são consideradas
pessoas jurídicas para o direito pátrio, ou seja, está vinculada à ideia de coletividade
de pessoas, que podem estar organizadas para fins econômicos ou não.
Atualmente a pessoa jurídica está vinculada à ideia de coletividade: a
‘universitates personarum’, ou seja, coletividade de pessoas, que podem estar
organizadas para fins econômicos ou não, além da ‘universitates bonorum’, isto é,
coletividade de bens. Sobre essas coletividades, o Direito atribui a personalidade,
fazendo que sejam compreendidas como uma pessoa, como unidade subjetiva 58.
Na sociedade limitada, como o próprio nome já diz, a responsabilidade de
cada sócio é restritiva ao valor de suas quotas, conforme preceitua o art. 1.052 do CC:
56 Uma análise sobre a evolução da desconsideração da personalidade jurídica. 57 Uma análise sobre a evolução da desconsideração da personalidade jurídica. 58 Direito empresarial brasileiro: direito societário, sociedade simples e empresária. São Paulo,
Atlas, 2012.
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“Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas
quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social”,
acrescentando o art. 1.024 que “Os bens particulares dos sócios não podem ser
executados por dívidas da sociedade, senão depois de executados os bens sociais”,
estabelecendo o art. 1.080 que “as deliberações infringentes do contrato ou da lei
tornam ilimitada a responsabilidade dos que expressamente as aprovaram”, isto é,
quando configurada práticas ilícitas pelos sócios, estes responderão direta, pessoal e
ilimitadamente com seus bens particulares.
Nas palavras de Mariana Borlido de Lima Pereira:
Cabe ressaltar que, em qualquer ramo do Direito em que se deparar com a
exceção à regra da autonomia patrimonial da sociedade em relação ao patrimônio
de seus sócios, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica somente
poderá ser aplicada em juízo e em face de situação de abuso da pessoa jurídica,
caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial 59.
Assim, inicialmente cada sócio assume a responsabilidade de integralizar o
capital social da sociedade limitada por meio de quotas, o que nas palavras de Sueli
Baptista de Sousa:
De fato, o princípio jurídico que norteia a sociedade limitada é o da
responsabilidade de cada sócio restrita apenas ao valor de suas quotas (Código
Civil, art. 1.052). De modo que os sócios, ao constituírem a sociedade, assumem a
obrigação de proceder à transferência de seus recursos, deslocando-os do seu
patrimônio particular para o da sociedade. Esse procedimento na terminologia
societária, é conhecido pela expressão integralização. Trata-se pois, da realização
das contribuições necessárias para a formação do capital social 60.
Cumpre ressaltar que as contribuições dos sócios no que tange à
integralização do capital social devem ser pecuniárias, com bens, valores ou créditos,
diante da previsão do art. 1.055, §2º do CC 61, entretanto, estes são responsáveis pelo
total não integralizado do capital social, em solidariedade com os demais sócios. Desta
forma: “Logo, é nítido que a delimitação da responsabilidade dos sócios está no capital
59 Sociedade limitada: da responsabilidade dos sócios e da desconsideração da personalidade
jurídica. 60 Responsabilidade dos Sócios na Sociedade Limitada. São Paulo: Quarter Latin, 2006, p.
57/58. 61 Art. 1.055. O capital social divide-se em quotas, iguais ou desiguais, cabendo uma ou
diversas a cada sócio. § 2º É vedada contribuição que consista em prestação de serviços.
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social no que diz respeito a sua integralização, pois antes disso todos os sócios são
solidariamente responsáveis por sua integralização” 62.
No entanto, quando diante de uma desconsideração da personalidade
jurídica, é necessário que a atuação de cada sócio ou administrador seja analisada
individualmente a fim de uma verificação sobre quem vai arcar com a
responsabilização. Assim, conforme preceitua o Enunciado 07 da Jornada de Direito
Civil do Conselho da Justiça Federal: “Só se aplica a desconsideração da
personalidade jurídica quando houver a prática de ato irregular e, limitadamente, aos
administradores ou sócios que nela hajam incorrido”.
Não se olvidando da desconsideração da personalidade jurídica inversa
tem-se a seguinte ementa que explica os requisitos para que haja legitimidade na
aplicação da desconsideração inversa. A presente demanda versa sobre execução de
título extrajudicial (cédula de crédito bancário) no importe de R$ 35.315.325,29 (trinta
e cinco milhões, trezentos e quinze mil, trezentos e vinte e cinco reais e nove
centavos), que em razão da baixa liquidez dos imóveis, os credores postularam a
desconsideração inversa da personalidade jurídica em face de Hunday CAOA do
Brasil Ltda. e outros.
No Tribunal de origem (AI nº 2022463-48.2013.8.26.0000) negou
provimento ao pedido de desconsideração, que mais de 10 anos depois ao
ajuizamento da execução, renovou o pedido de desconsideração inversa somente em
face de CAOA Montadora de Veículos Ltda., diante do inadimplemento ainda estar
caracterizado, alegando que naquela ocasião, Sr. Carlos Alberto de Oliveira Andrade
(sócio) detinha 88% das ações da empresa, em março de 2006 e que, após o
julgamento do primeiro pedido de desconsideração inversa, em março de 2013,
transferiu parte de suas cotas para sua esposa Izabela Molon Luchesi de Oliveira
Andrade, ficando com apenas 50% das costas em seu próprio nome.
Tendo o executado requerido 30 dias para indicar outros bens,
permanecendo inerte, acabou por realizar no período requerido a transferência do
restante de suas cotas para sua esposa, ficando com a participação de somente
0,59% da empresa montadora, requerendo o exequente, novamente, a
desconsideração inversa em razão da fraude à execução, somando o crédito da
execução em R$ 380.811.646,44 (trezentos e oitenta milhões oitocentos e onze mil
seiscentos e quarenta e seis reais e quarenta e quatro centavos), sendo incontroverso
62 LIMA, Paloma Bonifácio de Camargo. Sociedade limitada: da responsabilidade dos sócios e
da desconsideração da personalidade jurídica.
P á g i n a | 46
R$ 136.051.271,90 (cento e trinta e seis milhões, cinquenta e um mil, duzentos e
setenta e um reais e noventa centavos).
EMENTA: RECURSO ESPECIAL. DIRFEITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA. EXECUÇÃO
CONTRA EMPRESA PERTENCENTE A CONGLOMERADO, CUJO SÓCIO
MAJORITÁRIO OU ADMINISTRADOR ALIENOU A QUASE TOTALIDADE DAS
COTAS SOCIAIS DA PRINCIPAL EMPRESA DO GRUPO PARA SUA ESPOSA.
FRAUDE À EXECUÇÃO. ABUSO DE PERSONALIDADE. CONFUSÃO
PATRIMONIAL. ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA. TENTAIVA DE
FRUSTAR A EXECUÇÃO. RISCO DE INSOLVÊNCIA DO DEVEDOR.
NECESSIDADE DE PERSEGUIÇÃO DE NOVAS GARANTIAS. 1. Controvérsia
em torna da legalidade da desconsideração inversa da personalidade jurídica em
relação à empresa recorrente no curso de execução movida contra uma das
empresas integrantes do mesmo grupo econômico, mas sem patrimônio para
garantia do juízo, em face da transferência pelo sócio majoritário da quase
totalidade de suas cotas sociais para sua esposa, ficando somente com a
participação de 0,59% na empresa recorrente. 2. A alienação maliciosa para a
esposa da quase totalidade de sua participação societária pelo sócio-controlador,
co-executado na qualidade de avalista, de empresa-jóia de conglomerado de
empresas, integrado pela empresa co-executada, sem patrimônio, em fraude à
execução, caracteriza abuso de personalidade jurídica. 3. Legalidade da
desconsideração inversa da personalidade jurídica, autorizada pelo art. 50 do
Código Civil, que abrange, conforme a jurisprudência desta Corte, as hipóteses de
ocultação ou mescla de bens no patrimônio de seus sócios ou administradores. 4.
A teoria da “disregard doctrine” surgiu como mecanismo para coibir o uso abusivo
da autonomia da pessoa jurídica para a prática de atos ilícitos em detrimento dos
direitos daqueles que com ela se relacionam. 5. A comprovação de que a
personalidade jurídica da empresa está servindo como cobertura para abuso de
direito ou fraude nos negócios, deve ser severamente reprimida. 6. Utilização, no
caso, de uma das empresas, a mais importante, do conglomerado de empresas
pertencentes ao devedor, integrado pela empresa co-devedora sem patrimônio,
para ocultar bens, prejudicando credores. 7. Caracterização do abuso de
personalidade jurídica, autorizando a medida excepcional. Precedentes do STJ. 8.
RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. (STJ – Resp: 1721239 SP 2017/0296335-
9, Relator: Ministro PAULO DE TARDO SANSEVERINO, Data de Julgamento:
27/11/2018, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/12/2018).
Não obstante, quando se trata de sociedade anônima (Lei nº 6.404/76),
tendo em vista que sua criação teve o intuito de possibilitar a certas empreitadas maior
P á g i n a | 47
acesso a investimentos, torna-se complexa a sua desconsideração, diante do alto
número de acionistas que possui. Nas palavras de Fábio Matias Gonçalves 63:
Dessa forma, pode-se notar um primeiro empecilho para a aplicação da
desconsideração da personalidade jurídica, tendo em vista esta característica de
conferir aos acionistas a segurança de que o risco do negócio terá como limite o
valor de suas ações.
O segundo deles é o fato de seu capital social não estar divididos por cotas, mas
sim por ações, que podem ser livremente negociadas dependendo do caso, não
sendo assim facilmente identificável a figura do sócio, ou neste caso do acionista,
já que este não é escolhido pelos seus atributos pessoais, conforme já destacado,
mas sim adentra no quadro acionário ao adquirir as ações, com o respectivo
investimento.
Em terceiro lugar, destaca-se que a administração e execução das atividades
desse tipo societário é dividido em órgãos sociais internos, os quais podem ser
divididos em três categorias, sendo elas os órgãos de deliberação, os órgãos de
execução e os órgãos de fiscalização.
Cabe destacar que quando diante de uma sociedade anônima de capital
fechado, o acesso à informação de quem são os titulares de suas ações é mais fácil,
diante da restrição que eles possuem em negociar suas ações com terceiros.
Entretanto, quando se passa a analisar quem são os titulares de cada ação de uma
sociedade anônima de capital aberto, a complexidade e quase impossibilidade de se
ter com certeza presente informação acaba desestimulando o requerimento de sua
desconsideração, acrescendo Fábio Matias Gonçalves:
Neste caso, ao desconsiderar a personalidade jurídica de uma sociedade
anônima, uma das primeiras dúvidas que podem surgir é: pode ser efetivada a
desconsideração sobre as suas duas espécies (aberta ou fechada)? Quem será
afetado? Os acionistas? Os administradores que a dirigem? Ambos? No caso dos
acionistas, a aplicação desse instituto não violaria o princípio fundamental das
sociedades anônimas quanto à extensão de suas responsabilidades? 64
Cumpre ressaltar que mesmo diante da complexidade na aplicação do
instituto da desconsideração nas sociedades anônimas de capital fechado, o art. 50 do
CC poderá ser aplicado, tendo em vista que existe entre os acionistas o interesse de
63 Desconsideração da personalidade jurídica na sociedade anônima pela aplicação do art. 50
do Código Civil. 64 Desconsideração da personalidade jurídica na sociedade anônima pela aplicação do art. 50
do Código Civil.
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se associarem dentre si (affectio societatis), sendo relevante neste caso o aspecto
pessoal de cada um, tanto que é vedada a livre negociação das ações nestas
sociedades.
Dessa forma, na prática uma sociedade anônima de capital fechado adquire
características de sociedade pessoal, sendo semelhante em vários aspectos à
sociedade limitada. Nestes casos, muitas vezes os administradores são os
próprios acionistas 65.
Portanto, quando desconsiderada a personalidade jurídica nas sociedades
anônimas de capital fechado, o mesmo entendimento que se tem a respeito das
sociedades limitadas, aqui se aplica, ou seja, atingirá todos os seus acionistas. Já
diante da sociedade de capital aberto:
Neste caso, deve o acionista que se utilizou da personalidade jurídica de forma
abusiva ter, a princípio, um número de ações suficientes para exercer o controle
sobre a sociedade, ou de alguma outra situação que demonstre ter ele poder de
decisão e veto sobre os rumos da atividade da empresa, já que o simples fato de
uma pessoa ser acionista de uma empresa não significa necessariamente possuir
ela arbítrio sobre os rumos da atividade da sociedade da qual participa 66.
Ou seja, atingirá o sócio controlador, que nos termos do art. 116 da Lei das
S.A.:
Art. 116. Entende-se por acionista controlador a pessoa, natural ou jurídica, ou o
grupo de pessoas vinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, que:
a) é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, a
maioria dos votos nas deliberações da assembléia-geral e o poder de eleger a
maioria dos administradores da companhia; e
b) usa efetivamente seu poder para dirigir as atividades sociais e orientar o
funcionamento dos órgãos da companhia.
Parágrafo único. O acionista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a
companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e
responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela
trabalham e para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve
lealmente respeitar e atender.
65 Desconsideração da personalidade jurídica na sociedade anônima pela aplicação do art. 50
do Código Civil. 66 Desconsideração da personalidade jurídica na sociedade anônima pela aplicação do art. 50
do Código Civil.
P á g i n a | 49
Nesse sentido:
APELAÇÃO CÍVEL – Interposição contra sentença que julgou improcedentes os
embargos de terceiro. Desconsideração inversa da personalidade jurídica já
deferida na ação de rescisão contratual e mantida por este Tribunal. Apelante que
se limitou a repetir a tese já afastada. Penhora de numerário justificada, ante a
prova robusta de conduta fraudulenta, que visa a frustrar a execução. Sociedade
anônima que também pode ter sua autonomia patrimonial desconsiderada.
Honorários advocatícios majorados nos termos do artigo 85, § 11, do Código de
Processo Civil de 2015. Sentença mantida. ‘(...) o fato de a apelante constituir-se
como sociedade anônima não impede a desconsideração de sua personalidade
jurídica, uma vez que apenas a responsabilidade ordinária é limitada às ações dos
respectivos sócios. Ou seja, provado o abuso da personalidade ou a confusão
patrimonial, é desconsiderada a autonomia patrimonial para se atingir os bens da
sociedade. Nenhuma ilegalidade há, portanto, na aplicação da desconsideração
da personalidade jurídica, direta ou inversa, nas sociedades anônimas’”. (TJSP;
Apelação 1012232- 23.2015.8.26.0577; Relator (a): Mario A. Silveira; Órgão
Julgador: 33ª Câmara de Direito Privado; Foro de São José dos Campos - 5ª Vara
Cível; Data do Julgamento: 03/07/2017; Data de Registro: 04/07/2017)
De pouca ocorrência prática, a subsidiária integral, regulamentada pela Lei
das Sociedades por Ações, poderá também sofrer desconsideração de sua
personalidade jurídica, conforme se depreende da seguinte ementa:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA
PERSONALIDADE JURÍDICA. PRESSUPOSTOS DO INCIDENTE. ARTIGO 50
DO CÓDIGO CIVIL. PRESENTES. INSOLVÊNCIA DA DEVEDORA. NÃO
EXIGIDA. ABUSO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. DESVIO DE FINALIDADE.
PROVA ROBUSTA. EXISTENCIA. 1. Trata-se de agravo de instrumento interposto
contra o deferimento da desconsideração inversa da personalidade jurídica da
agravante, subsidiária integral da devedora, determinado sua inclusão no polo
passivo da execução. 2. A desconsideração da personalidade jurídica regida pelo
Código Civil é instituto aplicado de forma excepcional, em caso de abuso de
personalidade, consubstanciado no desvio de finalidade ou na confusão
patrimonial, nos moldes do artigo 50 do Código Civil, não se exigindo a insolvência
do devedor como requisito do incidente. 3. O acervo patrimonial da sociedade
recuperanda deve atender, com prioridade, à satisfação dos credores,
caracterizando o desvio de finalidade o ato de criar companhia subsidiária integral,
com a transferência de parte significativa de seu patrimônio à nova empresa, à
revelia do plano aprovado. 4. Recurso conhecido e desprovido. (TJ-DF
07183612820188070000 DF 0718361-28.2018.8.26.0000., Relator: SANDOVAL
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OLIVEIRA, Data de Julgamento: 13/02/2019, 2ª Tuma Cível, Data de Publicação:
Publicado no DJE: 20/02/2019, Pág.: Sem Página Cadastrada).
CAPÍTULO 3.2 - DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA
EMPRESA INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA (EIRELI)
Conforme preceitua o art. 980-A, §6º do Código Civil, que nos remete ao
art. 1.052 do Código Civil, que trata das sociedades limitadas: “Na sociedade limitada,
a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos
respondem solidariamente pela integralização do capital social”, ou seja, havendo
dívidas perante terceiros, o patrimônio pessoal do empresário não será utilizado,
limitando assim a responsabilidade das obrigações decorrentes da atividade
empresária na EIRELI ao capital integralizado.
Muito se discute sobre a desconsideração da personalidade jurídica da
EIRELI em razão do veto presidencial, transcrito anteriormente no presente trabalho,
corroborando a falta de previsão legal sobre sua aplicabilidade. No entanto, sabendo-
se que a desconsideração visa coibir fraudes quando do uso da pessoa jurídica, opina
Fábio Ulhôa Coelho:
[...] é pacífico na doutrina e jurisprudência que a desconsideração da
personalidade jurídica não depende de qualquer alteração legislativa para ser
aplicada, na medida em que se trata de instrumento de repressão a atos
fraudulentos. Quer dizer, deixar de aplicá-la, a pretexto de inexistência de
dispositivo legal expresso, significaria o mesmo que amparar a fraude 67.
Ainda, nas palavras de José Edwaldo Tavares Borba: “a sociedade, ainda
que unipessoal, representa um foco de interesses – o interesse da empresa.
Desvirtuada essa distinção, frustra-se a base teleológica do instituto – quebra-se a
personalidade jurídica, de modo a permitir penetrá-la e responsabilizar o sócio” 68.
Assim, a desconsideração é medida excepcional que dependerá da
comprovação de abuso de personalidade, caracterizado pelo ato intencional dos
sócios em fraudar terceiros com desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial da
pessoa jurídica (EIRELI) e do titular, assim como ocorre nas sociedades limitadas e
anônimas.
67 Curso de Direito Comercial – Direito de Empresa, vol. 2/60, item n.2, 16ª ed., 2012, Saraiva. 68 Direito societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.
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Portanto, havendo a comprovação de abuso de personalidade, em caráter
excepcional, poderá ser desconsiderada a personalidade jurídica da EIRELI. Nas
palavras de Gabriel Bertoluci:
Portanto, a limitação da responsabilidade na EIRELI pode ser desconsiderada
quando houver abuso de personalidade e atividade fraudulenta, devendo-se
apresentar primeiramente execução dos seus créditos até o esgotamento de seu
capital constante de todo seu patrimônio empresarial. Posteriormente, quando
estes não bastarem para suprir os débitos contraídos, torna-se plausível a
afetação no patrimônio pessoal do titular da EIRELI 69.
Nesse sentido:
Ementa: Penhora – Pessoa jurídica – EIRELI – Desconsideração – Rejeição –
Honorários advocatícios. Não existindo indícios de que o sócio da EIRELI
(Empresa Individual de Responsabilidade Ltda.) abusou da pessoa jurídica, em
detrimento de seus credores, descabe a desconsideração, de modo a imputar-se a
ele responsabilidade pelo pagamento do débito. A rejeição do incidente de
desconsideração da personalidade jurídica dá ensejo ao arbitramento de
honorários advocatícios. Recurso não provido. (TJ-SP – AI
21101999420198260000 SP 2110199-94.2019.8.26.0000, Relator: Itamar Gaiano,
Data de Julgamento: 19/08/2019, 21ª Câmara de Direito Privado, Data de
Publicação: 19/08/2019).
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PRIVADO NÃO
ESPECIFICADO. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL.
DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA. CITAÇÃO DA
EMPRESA INDIVIDUAL. DESNECESSIDADE. Tratando-se de pessoa jurídica
constituída na modalidade de Empresa Individual de Responsabilidade Limitada -
EIRELI, não há confusão patrimonial entre o ente jurídico e a pessoa física (já
citada). Não obstante, ainda remanesce a desnecessidade de citação da empresa
individual, na hipótese de desconsideração inversa da sua personalidade jurídica,
pois que, nos moldes em que ocorre na desconsideração propriamente dita, a
superação episódica da personificação não gera a abertura de uma nova
execução, tampouco altera a relação de direito material que constituiu o título
executivo extrajudicial, não havendo razão, portanto, para que integre o pólo
passivo da demanda executiva. Sobremais, o exercício do direito à ampla defesa e
ao contraditório estará assegurado à pessoa jurídica, assim que penhorado seus
bens, na eventualidade de ocorrer o deferimento, pelo Juízo de Primeiro Grau, da
desconsideração inversa da personalidade jurídica. Desnecessária, assim, a
69 A (in)aplicabilidade da teoria da desconsideração da personalidade jurídica na empresa
individual de responsabilidade limitada (Lei nº 12.441/2011).
P á g i n a | 52
citação determinada na origem. DERAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (Agravo de
Instrumento Nº 70060682770, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça
do RS, Relator: Pedro Celso Dal Pra, Julgado em 09/10/2014)
CAPÍTULO 4 - SOCIEDADE LIMITADA UNIPESSOAL INTRODUZIDA PELA
LEI Nº 13.874/19 (LEI DA LIBERDADE ECONÔMIA)
Conforme dito em tópico anterior, adota o Brasil a regra de pluralidade de
sócios quando da constituição de uma sociedade, permitindo a unipessoalidade em
caso de superveniência (morte de um dos sócios fazendo com que figure apenas um
único sócio no quadro societário ou dissolução da sociedade) ou quando da
constituição de uma EIRELI. Entretanto, em 20 de setembro de 2019 foi sancionada a
Lei de Liberdade Econômica, a qual institui a Declaração de Direitos de Liberdade
Econômica, estabelece garantias de livre mercado, altera diversas leis, dentre elas
aquela que regulamenta a sociedade limitada (Código Civil), visando ao cumprimento
do art. 170 da Constituição Federal 70.
Isto é, “trata-se de uma tentativa de desburocratização das atividades
empresariais, destinada notadamente a pequenos e médios empreendedores, com o
intuito de impulsionar o mercado e superar a estagnação econômica do Brasil” 71.
Introduzindo uma novidade e exceção à regra de pluralidade de sócios,
notadamente vedada antigamente pelo CC, alterou o art. 1.052 do CC que passa
assim a ser previsto:
70 Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre
iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; X - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995) Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei. (Vide Lei nº 13.874, de 2019) g.n. 71 RESENDE, Luisa Mafia. O futuro da Eireli após a edição da “MP da liberdade econômica”.
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Art. 1.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao
valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do
capital social.
§1º A sociedade limitada pode ser constituída por 1 (uma) ou mais pessoas.
(Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019).
§2º Se for unipessoal, aplicar-se-ão ao documento de constituição do sócio único,
no que couber, as disposições sobre o contrato social. (Incluído pela Lei nº 13.874,
de 2019).
Ou seja, deu-se permissão à constituição de sociedade limitada por
apenas um único sócio, sem que haja o requisito de integralização mínima de capital
social – diferentemente do que ocorre na figura da EIRELI – garantindo ao empresário
a separação patrimonial visada quando da realização da atividade empresarial.
No entanto, essa modificação ao Código Civil traz preocupação quanto à
figura da EIRELI, lembrando que esta foi criada para que empresários individuais
pudessem empreender de forma mais segura, não afetando seu patrimônio pessoal
em eventual responsabilização da pessoa jurídica, exigindo a lei, apenas,
integralização de capital mínimo (100 vezes o salário mínimo vigente) quando de sua
constituição, conforme nas palavras Luisa Mafia Resende 72:
Tradicionalmente, no cenário do Direito Empresarial brasileiro, não havia um
instituto jurídico por meio do qual uma única pessoa pudesse exercer a atividade
empresária sem que seus bens e patrimônio permanecessem sujeitos às ações de
seus credores. Nesse cenário, os riscos do negócio eram assumidos em seu
próprio nome, sem que houvesse a distinção entre patrimônio pessoal e societário,
ou seja, não havia efetiva limitação de responsabilidade do sócio. A inscrição,
como empresário individual, na Junta Comercial acarretava a assunção de todos
os riscos do negócio e atingiam o patrimônio pessoal do sócio em caso de
inadimplência. Dessa maneira, posteriormente, objetivando corrigir tal entrave,
sobreveio a edição da Lei 12.441, de 11 de julho de 2011, com a instituição da
Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (Eireli), introduzindo o inciso VI
ao artigo 44 do Código Civil e o artigo 980-A.
A inserção da Eireli no âmbito empresarial brasileiro possibilitou o exercício da
atividade empresária por um único indivíduo, sem que seu patrimônio fosse
atingindo pelas dívidas da empresa, limitando, assim, a responsabilidade. Esse
instituto ganhou muita força no cenário jurídico e conquistou seu espaço no
72 O futuro da Eireli após a edição da “MP da liberdade econômica”.
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contexto econômico, principalmente por viabilizar a constituição de uma empresa
composta de um só empresário, com responsabilidade limitada. No entanto, para
que uma Eireli seja constituída, é necessário integralizar capital social equivalente
a, no mínimo, 100 salários mínimos, gerando, por conseguinte, um obstáculo
econômico para aqueles que desejam se aventurar individualmente como
empreendedores. Além disso, o Código Civil restringe a constituição de uma única
Eireli para cada pessoa natural.
Desta forma, a preocupação reside porque a EIRELI traz a desvantagem
da exigência de capital social mínimo para sua constituição, enquanto a sociedade
limitada não. Esta, por sua vez, traz a vantagem de constituir mais de uma sociedade
em nome de uma única pessoa natural, diferentemente da EIRELI que veda à pessoa
natural a constituição de mais de uma EIRELI. Nas palavras de Alessandro Sanchez
73:
Atualmente, a EIRELI – Empresa Individual de Responsabilidade Limitada deve
ser constituída mediante integralização do capital de 100 salários-mínimos
segundo o art. 980-A, CC que em seu §2.º restringe a constituição de uma única
empresa dessa modalidade por cada pessoa natural.
Em vista da instituição do afastamento da pluralidade da Sociedade Limitada, para
a previsão da Sociedade Unipessoal na forma limitada, não haverá restrição
patrimonial ou mesmo restrição acerca da possibilidade de o mesmo titular instituir
mais de uma sociedade limitada unipessoal, o que, em primeiro momento, me traz
uma sensação de que essa hipótese será mais razoável ao Empresariado.
Cumpre ressaltar que por ter sido essa modificação introduzida por uma
Medida Provisória (art. 62 da Constituição Federal), tem ela o prazo de 60 dias,
prorrogáveis por mais 60, contados de sua publicação.
Por fim, vale ressaltar que tais alterações foram propostas por meio de medida
provisória, instrumento com força de lei, editado pelo presidente da República em
casos de relevância e urgência, o qual tem prazo de vigência de 60 dias,
prorrogáveis por mais 60, contados de sua publicação. Assim, é preferível que
eventuais providências para alteração ou constituição de uma Sociedade
Unipessoal Limitada sejam tomadas somente após a conversão definitiva da
supracitada MP em lei 74.
73 MP 881 e a Liberdade Econômica – Os Reflexos na EIRELI e Sociedade Limitada
Unipessoal. 74 RESENDE, Luisa Mafia. O futuro da Eireli após a edição da “MP da liberdade econômica”.
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Algumas questões ficam sem resposta, por ora, como: como ficará a
questão do patrimônio quando de sua busca? Como ocorrerá a tributação? Como
indicar o ato fraudulento, quando da desconsideração da personalidade jurídica?
Desejando participar de uma concorrência, como esta deverá ser procedida?
Portanto, diante das vantagens em que uma sociedade limitada unipessoal
oferece ao pequeno e médio empreendedor se comparado aos requisitos obrigatórios
quando da constituição da EIRELI, torna-se mais vantajosa de ser realizada.
CAPÍTULO 5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Visando estabelecer mecanismos que possibilitassem ao empreendedor
analisar a extensão do risco inerente à prática comercial, a limitação da
responsabilidade patrimonial surgiu como medida para estimular ao
empreendedorismo brasileiro, uma vez que ao empreender seu patrimônio pessoal
não seria afetado pela sua atividade empresarial, ocorrendo que se chama de
autonomia patrimonial. Entretanto, essa limitação não se deu da noite para o dia, mas
sim durante anos de prática e clamor empresarial, assim como da análise de outros
países vizinhos e até mesmo europeus para que houvesse a instituição de
mecanismos facilitadores para o empreendedor individual tomar a iniciativa e
empreender sem o receio de ver seu patrimônio pessoal ser atingido.
Desta forma, durante anos foram os empreendedores se utilizando da
sociedade limitada de forma que configurasse um sócio majoritário e o outro irrisório,
tornando a sociedade fictícia, mas cumprindo com os ditames legais de pelo menos
dois sócios em sua constituição. Caso não utilizassem presente tipo societário para
empreender, restaria a figura do empresário individual, que não limitava em nada seu
patrimônio pessoal, portanto, havendo confusão patrimonial.
Isso ocorreu até o surgimento da figura da EIRELI, a qual trouxe a
novidade de apenas um titular em sua constituição com responsabilidade limitada,
desde que integralizasse 100 vezes o salário mínio vigente como seu capital social.
Embora essa exigência deva ser cumprida para que a EIRELI seja considerada
regular, empreendedores acabaram a adotando.
No entanto, em setembro de 2019, visando ao fomento da economia
brasileira, buscando que mais empreendedores invistam no país sem que seu
patrimônio pessoal seja atingido, foi promulgada a Lei da Liberdade Econômica, a qual
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permite que sociedade limitada seja constituída por apenas um sócio. Isto é, trouxe
uma nova exceção à regra empresarial brasileira de no mínimo dois sócios para a
constituição de quaisquer sociedades.
Presente figura acabou por gerar questionamentos acerca da existência da
EIRELI, a qual possui particularidades em sua constituição, julgada por muitos
doutrinadores como onerosa, diante da integralização de 100 vezes o salário mínimo
vigente. Diferentemente da sociedade limitada, que não institui capital mínimo de
integralização, bem como não restringe sua constituição por pessoa natural apenas
uma única vez.
Após o tratamento das particularidades dos tipos societários e quais são as
sociedade unipessoais hoje permitidas pelo ordenamento jurídico brasileiro, analisou-
se a desconsideração da personalidade jurídica direta e inversamente, trazendo
jurisprudências acerca do tema, uma vez ser esse instituto aplicado excepcionalmente
e em caráter incidental.
Quando analisadas as sociedades limitadas observou-se que quando
desconsiderada a personalidade jurídica há o ato de atingir o patrimônio dos sócios,
haja vista a conduta contrária àquela prevista em lei, ou seja, trata a sociedade como
mecanismo de escape para pagamento de credores ou a sua finalidade é diversa
daquela prevista. Assim, visando de certa forma punir o ato ilegal do sócio,
desconsidera o juiz, a requerimento da parte ou do Ministério Público, a personalidade
jurídica da sociedade para atingir aquele sócio que não atua conforme tem que atuar.
Situação igual quando diante de sociedade anônima, entretanto
apresentando particularidade porque quando de capital aberto, a desconsideração da
personalidade jurídica acaba sendo mais complexa diante da facilidade de “compra e
venda” das ações no mercado de bolsa (Bolsa de Valores), trazendo a dificuldade de
se saber com que está determinada ação no decorrer do dia. Já quando de capital
fechado, por suas ações não serem de fácil acesso, tampouco de fácil compra e
venda, afinal para integrar o quadro societário é mais complexo do que quando
comparado ao capital aberto, a desconsideração acaba por ser mais fácil, diante da
facilidade de se saber a quem pertence determinada ação.
Muito embora ser a subsidiária integral sociedade anônima, conforme
analisado no tópico apartado acima, a desconsideração de sua personalidade jurídica
é de difícil constatação prática, daí não ter sido trazido em tópico apartado sua
desconsideração, bastando a menção e jurisprudência.
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Já quando analisada a desconsideração de uma EIRELI, diante do veto
presidencial ocorrido, muito se discutiu se poderia ser realizada a desconsideração.
Assim, por intermédio de jurisprudência, restou concluso que se caracterizado o abuso
da personalidade jurídica, descrito no art. 50 do Código Civil, nada impede que o juiz
reconheça, a pedido das partes, a confusão patrimonial ou desvio de finalidade para
que desconsidere a personalidade jurídica e seu titular, por fim, responda pelas
obrigações que antes seria a pessoa jurídica que instituiu.
Desta forma, buscou-se nessas linhas demonstrar que a sociedade
unipessoal é instrumento hábil e adequado para solucionar o desejo de limitação da
responsabilidade patrimonial do empresário que almeja empreender sozinho,
individualmente. No entanto, utilizando o empresário de forma abusiva a personalidade
jurídica que a lei confere aos tipos de sociedade unipessoais presentes no Brasil, corre
ele o risco de ter seu patrimônio pessoal atingido, diante do cumprimento dos
requisitos do art. 50 do Código Civil para a desconsideração da personalidade jurídica.
Por fim, as sociedades unipessoais – sendo elas temporárias incidentais,
subsidiária integral, EIRELI e, atualmente, sociedade limitada -, abraçam o desejo de
limitação da responsabilidade do empresário que deseja empreender individualmente,
bem como permitem o instituto da desconsideração da personalidade jurídica para
aqueles que a utilizam como mecanismo de continuar inadimplindo obrigações,
ocultando o patrimônio nesse tipo de sociedade, ou quando desviam a finalidade
atinente a esse tipo de sociedade.
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