[SP A - 4] ESTADO/CIDADES/PÁGINAS 10/06/12 · América Latina Logística...

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O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 10 DE JUNHO DE 2012 Cidades/Metrópole C5 Lixo ferroviário A lém dos 1.008 va- gões que a América Latina Logística (ALL) encontrou nos pátios das ferrovias que opera em São Paulo, há outro tanto que pertence ao Depar- tamento Nacional de Infraes- trutura de Transportes (DNIT). Sem condições de rodar, os equipamentos formam os ce- mitérios de trens que incomo- dam prefeituras e moradores das cidades onde estão. Em Iperó, a 121 quilôme- tros da capital, o prédio da an- tiga estação ferroviária foi re- cuperado por alunos de um curso de restauração do Servi- ço Nacional de Aprendizagem In- dustrial (Senai), mas o entorno continua como há 15 anos. Mais de 250 vagões apodrecem no pá- tio do que já foi um importante entroncamento ferroviário. A linha divide a cidade em duas partes e os moradores têm de passar entre os vagões, en- frentando o risco de aciden- tes e assaltos. A sucata cober- ta pelo mato acumula água da chuva e cria o mosquito da dengue. A Justiça do Estado man- dou a ALL fazer a retirada da sucata e fixou multa de R$ 1 mil em caso de não cumpri- mento, mas a remoção foi sus- pensa pela Justiça Federal. Em Votuporanga, a 537 km de São Paulo, a ALL iniciou a remoção de 59 vagões, a maio- ria danificada por acidentes, abandonados na área urbana. As populações de Bebedou- ro, Bauru e Cotia também con- vivem com sucata ferroviária. O próprio DNIT não sabe quantos vagões velhos exis- tem em São Paulo. O órgão informou que o in- ventário dos bens ainda não foi concluído, mas apenas em Bauru o levantamento encon- trou 633 vagões sucateados. / J.M.T. PARQUE DO MORRO DO OURO: RODOVIA SEBASTIÃO FERRAZ DE CAMARGO PEN- TEADO (SP-250), KM 320, APIAÍ. ABERTO TODO DIA, DAS 8H ÀS 16H. GRÁTIS. Parte dos vagões arrendados à ALL pertenceu à Ferrovia Pau- lista S.A. (Fepasa), extinta em 1998 e cujo patrimônio foi in- corporado pela Rede Ferroviá- ria Federal S.A. A atual opera- dora recebeu a concessão da malha paulista em 2006, por meio de licitação, por 30 anos. Os bens necessários para a operação da ferrovia – locomo- tivas, vagões, trilhos – foram arrendados pela Rede Federal, que no ano seguinte também foi extinta e teve seu patrimô- nio transferido à União. Mina de ouro tomada do Japão há 70 anos é atração no interior Serviço José Maria Tomazela SOROCABA Uma mina de ouro confiscada há 70 anos pelo governo brasileiro da Companhia de Mineração de Apiahy, empresa de capital japo- nês, virou atração turística em Apiaí, a 322 quilômetros de São Paulo. A prefeitura criou o Par- que Municipal do Morro do Ou- ro para preservar os remanescen- tes da mineradora. As trilhas le- vam às escavações em forma de túneis baixos. Na época, a mina produzia 10 mil toneladas de mi- nério por ano, com teor de 5 gra- mas de ouro puro por tonelada. O metal em barras era despacha- do para o Japão. Em 1942, com a adesão do Bra- sil aos aliados contra os países do Eixo – Alemanha, Japão e Itá- lia – na 2.ª Guerra Mundial (1939 a 1945), o governo assinou o De- creto-lei 4.166 e fechou a mina com seus 2,5 mil metros de tú- neis. Em 1945, a empresa foi liqui- dada, mas em 1960 a União reco- nheceu que os donos não eram súditos do Eixo. O remanescen- te do empreendimento foi devol- vido à mineração, mas era tarde para retomar as atividades. A região de Apiaí ficou conhe- cida pela exploração do ouro a partir do século 17. Bandeirantes paulistas fundaram a Vila da Apiahy e abriram escavações a céu aberto. Em 1885, a empresa Resende e Via incumbiu o enge- nheiro Gonzaga de Campos de pesquisar a área. Ele encontrou veios auríferos num morro vizi- nho à vila, que passou a se cha- mar Morro do Ouro. Em 1939, a mina e seus arredores foram ar- rendados ao grupo japonês. O geólogo Hélio Shimada, pes- quisador de recursos minerais do Instituto Geológico, diz que a partir do fechamento, em 1942, a mina ficou abandonada. A área foi declarada de utilidade públi- ca em 1998. O parque foi instala- do em 2004. Monitores orien- tam as visitas pelas duas trilhas existentes. Elas levam às ruínas e à entrada dos túneis, num per- curso de 8 quilômetros. De acordo com o diretor do parque, Francisco Ferrenha, a prefeitura abriu à visitação uma galeria de 80 metros, que deve ser feita com monitores. Uma in- cursão maior depende de medi- das de segurança, como escora- mento e iluminação, previstos no projeto de Shimada. A prefei- tura busca recursos para imple- mentar toda a ideia. Como a re- gião tem minas de prata e chum- bo, estuda-se o Circuito das Mi- nas do Alto Ribeira. PREFEITURA DE APIAÍ PARA LEMBRAR DIVULGAÇÃO 1.367 vagões somem. E ninguém sabe como Ministério Público investiga onde foram parar composições do patrimônio da União Em 1942, Brasil entrou na 2ª Guerra ao lado dos aliados e confiscou área que hoje virou parque no município de Apiaí Composições eram da Fepasa CEMITÉRIOS DE TRENS SÃO O PESADELO DE MUITAS CIDADES Sucatas ameaçam até a saúde de moradores que têm de conviver com elas Morro do Ouro. Utilidade pública desde 1998 Em Iperó. Mais de 250 vagões apodrecem no pátio do que já foi um importante entroncamento ferroviário na cidade José Maria Tomazela SOROCABA Exatos 1.367 vagões de trens que faziam parte do patrimô- nio da União no Estado de São Paulo desapareceram da ma- lha paulista. O sumiço dos va- gões foi constatado pelo pro- curador da República Fausto Matsumoto Kosaka, do Minis- tério Público Federal (MPF) de Piracicaba, depois de rece- ber o levantamento concluído no mês passado pela empresa América Latina Logística (ALL), feito por ordem do Tri- bunal Regional Federal (TRF) de São Paulo. Dos 2.375 vagões fora de uso que deveriam estar nos pátios ferroviários do Estado, só foram encontrados 1.008. A ALL alega que os que faltam não existiam quando assumiu a concessão da malha, em 2006. Kosaka quer saber agora onde foi parar o acervo ferroviário não relacionado. “De acordo com os controles da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), deveria existir aquele total de vagões. Vamos investi- gar o que aconteceu”, disse. Se- gundo ele, é responsabilidade da arrendatária ALL prestar contas do total de vagões. O procurador da República foi o autor de uma ação civil que bar- rou a troca dos 2.375 vagões ve- lhos por 1.116 novos proposta pe- la empresa à ANTT. Ele conside- rou o negócio lesivo para a União e feito sem a participação do De- partamento Nacional de Infraes- trutura de Transportes (DNIT), titular do acervo. Em dezembro de 2011, a Justi- ça Federal de Piracicaba deu limi- nar suspendendo a negociação. A ALL pretendia vender o mate- rial que não servia mais como su- cata para acabar com os cemité- rios de trens do interior. A em- presa recorreu ao TRF. A ALL informou que um aditi- vo ao contrato de arrendamento prevê a substituição de 2.375 va- gões considerados sucata e sem condições de recuperação, com capacidade média de 43 tonela- das e idade média de 47 anos, por 1.116 novos, com capacidade de até 120 toneladas. Com isso, a empresa afirma garantir a recom- posição integral do patrimônio da União, com ganho de 10% em capacidade. De acordo com a ALL, a desti- nação dessa sucata e das partes substituídas é responsabilidade da empresa, que, por ser privada, não precisa fazer licitação. A ALL disse que não foi informada oficialmente sobre o questiona- mento do MPF.

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O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 10 DE JUNHO DE 2012 Cidades/Metrópole C5

Lixo ferroviário

A lém dos 1.008 va-gões que a AméricaLatina Logística(ALL) encontrou

nos pátios das ferrovias queopera em São Paulo, há outrotanto que pertence ao Depar-tamento Nacional de Infraes-trutura de Transportes(DNIT).

Sem condições de rodar, osequipamentos formam os ce-mitérios de trens que incomo-dam prefeituras e moradoresdas cidades onde estão.

Em Iperó, a 121 quilôme-tros da capital, o prédio da an-tiga estação ferroviária foi re-cuperado por alunos de umcurso de restauração do Servi-

çoNacional de Aprendizagem In-dustrial (Senai), mas o entornocontinua como há 15 anos. Maisde 250 vagões apodrecem no pá-

tio do que já foi um importanteentroncamento ferroviário.

A linha divide a cidade emduas partes e os moradores têm

de passar entre os vagões, en-frentando o risco de aciden-tes e assaltos. A sucata cober-ta pelo mato acumula água dachuva e cria o mosquito dadengue.

A Justiça do Estado man-dou a ALL fazer a retirada dasucata e fixou multa de R$ 1mil em caso de não cumpri-mento, mas a remoção foi sus-pensa pela Justiça Federal.

Em Votuporanga, a 537 kmde São Paulo, a ALL iniciou aremoção de 59 vagões, a maio-ria danificada por acidentes,abandonados na área urbana.

As populações de Bebedou-ro, Bauru e Cotia também con-vivem com sucata ferroviária.

O próprio DNIT não sabequantos vagões velhos exis-tem em São Paulo.

O órgão informou que o in-ventário dos bens ainda nãofoi concluído, mas apenas emBauru o levantamento encon-trou 633 vagões sucateados. /

J.M.T.

PARQUE DO MORRO DO OURO: RODOVIA

SEBASTIÃO FERRAZ DE CAMARGO PEN-

TEADO (SP-250), KM 320, APIAÍ. ABERTO

TODO DIA, DAS 8H ÀS 16H. GRÁTIS.

Parte dos vagões arrendados àALL pertenceu à Ferrovia Pau-lista S.A. (Fepasa), extinta em1998 e cujo patrimônio foi in-corporado pela Rede Ferroviá-ria Federal S.A. A atual opera-

dora recebeu a concessão damalha paulista em 2006, pormeio de licitação, por 30 anos.Os bens necessários para aoperação da ferrovia – locomo-tivas, vagões, trilhos – foramarrendados pela Rede Federal,que no ano seguinte tambémfoi extinta e teve seu patrimô-nio transferido à União.

Mina de ouro tomadado Japão há 70 anos éatração no interior

Serviço

José Maria TomazelaSOROCABA

Uma mina de ouro confiscada há70 anos pelo governo brasileiroda Companhia de Mineração deApiahy, empresa de capital japo-nês, virou atração turística emApiaí, a 322 quilômetros de SãoPaulo. A prefeitura criou o Par-que Municipal do Morro do Ou-ro para preservar os remanescen-tes da mineradora. As trilhas le-vam às escavações em forma detúneis baixos. Na época, a minaproduzia 10 mil toneladas de mi-nério por ano, com teor de 5 gra-mas de ouro puro por tonelada.O metal em barras era despacha-do para o Japão.

Em 1942, com a adesão do Bra-sil aos aliados contra os paísesdo Eixo – Alemanha, Japão e Itá-lia – na 2.ª Guerra Mundial (1939a 1945), o governo assinou o De-creto-lei 4.166 e fechou a minacom seus 2,5 mil metros de tú-neis. Em 1945, a empresa foi liqui-dada, mas em 1960 a União reco-nheceu que os donos não eramsúditos do Eixo. O remanescen-te do empreendimento foi devol-vido à mineração, mas era tardepara retomar as atividades.

A região de Apiaí ficou conhe-cida pela exploração do ouro apartir do século 17. Bandeirantespaulistas fundaram a Vila daApiahy e abriram escavações acéu aberto. Em 1885, a empresaResende e Via incumbiu o enge-nheiro Gonzaga de Campos depesquisar a área. Ele encontrouveios auríferos num morro vizi-nho à vila, que passou a se cha-mar Morro do Ouro. Em 1939, a

mina e seus arredores foram ar-rendados ao grupo japonês.

O geólogo Hélio Shimada, pes-quisador de recursos mineraisdo Instituto Geológico, diz que apartir do fechamento, em 1942, amina ficou abandonada. A áreafoi declarada de utilidade públi-ca em 1998. O parque foi instala-do em 2004. Monitores orien-tam as visitas pelas duas trilhasexistentes. Elas levam às ruínase à entrada dos túneis, num per-curso de 8 quilômetros.

De acordo com o diretor doparque, Francisco Ferrenha, aprefeitura abriu à visitação umagaleria de 80 metros, que deveser feita com monitores. Uma in-cursão maior depende de medi-das de segurança, como escora-mento e iluminação, previstosno projeto de Shimada. A prefei-tura busca recursos para imple-mentar toda a ideia. Como a re-gião tem minas de prata e chum-bo, estuda-se o Circuito das Mi-nas do Alto Ribeira.

PREFEITURA DE APIAÍ

PARA LEMBRAR

DIVULGAÇÃO1.367 vagõessomem.E ninguémsabe comoMinistério Público investiga onde foramparar composições do patrimônio da União

Em 1942, Brasil entrouna 2ª Guerra ao lado dosaliados e confiscou áreaque hoje virou parque nomunicípio de Apiaí

Composiçõeseram da Fepasa

CEMITÉRIOS DE TRENS SÃO OPESADELO DE MUITAS CIDADESSucatas ameaçam até a saúde de moradores que têm de conviver com elas

Morro do Ouro. Utilidadepública desde 1998

Em Iperó. Mais de 250 vagões apodrecem no pátio do que já foi um importante entroncamento ferroviário na cidade

José Maria TomazelaSOROCABA

Exatos 1.367 vagões de trensque faziam parte do patrimô-nio da União no Estado de SãoPaulo desapareceram da ma-lha paulista. O sumiço dos va-gões foi constatado pelo pro-curador da República FaustoMatsumoto Kosaka, do Minis-tério Público Federal (MPF)de Piracicaba, depois de rece-ber o levantamento concluídono mês passado pela empresaAmérica Latina Logística(ALL), feito por ordem do Tri-bunal Regional Federal (TRF)de São Paulo.

Dos 2.375 vagões fora de usoque deveriam estar nos pátiosferroviários do Estado, só foramencontrados 1.008. A ALL alegaque os que faltam não existiamquando assumiu a concessão damalha, em 2006.

Kosaka quer saber agora ondefoi parar o acervo ferroviário nãorelacionado. “De acordo com oscontroles da Agência Nacionalde Transportes Terrestres(ANTT), deveria existir aqueletotal de vagões. Vamos investi-gar o que aconteceu”, disse. Se-gundo ele, é responsabilidade daarrendatária ALL prestar contasdo total de vagões.

O procurador da República foi

o autor de uma ação civil que bar-rou a troca dos 2.375 vagões ve-lhos por 1.116 novos proposta pe-la empresa à ANTT. Ele conside-rou o negócio lesivo para a Uniãoe feito sem a participação do De-partamento Nacional de Infraes-trutura de Transportes (DNIT),titular do acervo.

Em dezembro de 2011, a Justi-ça Federal de Piracicaba deu limi-nar suspendendo a negociação.A ALL pretendia vender o mate-rial que não servia mais como su-cata para acabar com os cemité-rios de trens do interior. A em-presa recorreu ao TRF.

A ALL informou que um aditi-vo ao contrato de arrendamentoprevê a substituição de 2.375 va-gões considerados sucata e semcondições de recuperação, comcapacidade média de 43 tonela-das e idade média de 47 anos, por1.116 novos, com capacidade deaté 120 toneladas. Com isso, aempresa afirma garantir a recom-posição integral do patrimônioda União, com ganho de 10% emcapacidade.

De acordo com a ALL, a desti-nação dessa sucata e das partessubstituídas é responsabilidadeda empresa, que, por ser privada,não precisa fazer licitação. AALL disse que não foi informadaoficialmente sobre o questiona-mento do MPF.