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1 SUMÁRIO EXECUTIVO DE PESQUISAS SOBRE PRISÃO PROVISÓRIA Rede Justiça Criminal Agosto de 2013 PREFÁCIO Em 2009 a Open Society Foundations entrou em contato com organizações da sociedade civil no Brasil para discutir o uso abusivo da prisão provisória no país, e ao longo de alguns meses realizou uma serie de reuniões com as organizações que vieram a constituir a Rede de Justiça Criminal, e desse diálogo surgiu o financiamento que possibilitou a realização das pesquisas aqui discutidas e também de uma série de ações descritas abaixo. No inicio de 2010 éramos sete organizações 1 e realizamos nossa primeira reunião de planejamento. Ao longo daquele ano, percebemos a necessidade de um documento que trouxesse nossas propostas para avançar em direção a uma justiça criminal mais justa e eficiente. Foi aí que surgiu nosso documento norteador, a Agenda Mínima 2 , resultado de um trabalho colaborativo, que traz 11 tópicos referentes à justiça criminal. São eles: fortalecimento da Defensoria Pública, fim do uso abusivo da prisão provisória, gestão mais eficiente do sistema prisional, valorização da educação e do trabalho no sistema prisional, medidas para as mulheres encarceradas, medidas para os egressos, efetivação do controle externo do sistema carcerário, transparência nos dados e acesso à informação, incentivo às penas alternativas, desafios da Lei de Drogas e justiça restaurativa. 1 Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), Conectas Direitos Humanos, Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP), Associação pela reforma Prisional (ARP), Justiça Global, Instituto Sou da Paz, Instituto Terra Trabalho e Cidadania (ITTC/PASTORAL CARCERÁRIA) e Instituto de Defensores dos Direitos Humanos (posteriormente) 2 Disponível em http://www.soudapaz.org/Portals/0/Downloads/Agenda%20M%c3%adnima%20- %20Justi%c3%a7a%20Criminal.pdf

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SUMÁRIO EXECUTIVO DE PESQUISAS SOBRE PRISÃO PROVISÓRIA

Rede Justiça Criminal

Agosto de 2013

PREFÁCIO

Em 2009 a Open Society Foundations entrou em contato com organizações da sociedade

civil no Brasil para discutir o uso abusivo da prisão provisória no país, e ao longo de alguns meses

realizou uma serie de reuniões com as organizações que vieram a constituir a Rede de Justiça

Criminal, e desse diálogo surgiu o financiamento que possibilitou a realização das pesquisas aqui

discutidas e também de uma série de ações descritas abaixo.

No inicio de 2010 éramos sete organizações1 e realizamos nossa primeira reunião de

planejamento. Ao longo daquele ano, percebemos a necessidade de um documento que trouxesse

nossas propostas para avançar em direção a uma justiça criminal mais justa e eficiente. Foi aí que

surgiu nosso documento norteador, a Agenda Mínima2, resultado de um trabalho colaborativo,

que traz 11 tópicos referentes à justiça criminal. São eles: fortalecimento da Defensoria Pública,

fim do uso abusivo da prisão provisória, gestão mais eficiente do sistema prisional, valorização da

educação e do trabalho no sistema prisional, medidas para as mulheres encarceradas, medidas

para os egressos, efetivação do controle externo do sistema carcerário, transparência nos dados e

acesso à informação, incentivo às penas alternativas, desafios da Lei de Drogas e justiça

restaurativa.

1 Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), Conectas Direitos Humanos, Núcleo de Estudos da Violência da

Universidade de São Paulo (NEV-USP), Associação pela reforma Prisional (ARP), Justiça Global, Instituto Sou da Paz, Instituto Terra Trabalho e Cidadania (ITTC/PASTORAL CARCERÁRIA) e Instituto de Defensores dos Direitos Humanos (posteriormente) 2 Disponível em http://www.soudapaz.org/Portals/0/Downloads/Agenda%20M%c3%adnima%20-

%20Justi%c3%a7a%20Criminal.pdf

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A construção da agenda mínima nos fez pensar na nossa atuação enquanto grupo. E

também nos levou a lugares importantes em relação à tomada de decisões em Brasília.

Percebemos que poderíamos ter um trabalho relevante de advocacy no Executivo e Legislativo se

tivéssemos alguém atuando em Brasília – vale lembrar que as organizações da Rede encontram-se

hoje em São Paulo e no Rio de Janeiro.

Iniciamos a elaboração de boletins informativos com o objetivo de levar informação

qualificada para o Legislativo e o Executivo de forma simples e direta. A partir do trabalho dos

projetos desenvolvidos pela Rede, não apenas de pesquisa, começamos a produzir informação de

qualidade com o intuito de avançar nos pontos da agenda mínima e começamos a ocupar um

espaço até então não ocupado pela sociedade civil em relação ao tema da justiça criminal.

Fizemos um levantamento da produção legislativa no Congresso Nacional no ano de 2010.

A Rede acompanha hoje em torno de mil projetos de lei que tratam de temas de justiça criminal.

Avaliamos os projetos a partir de dois critérios, relevância em relação ao conteúdo e ao momento

de tramitação. Desde o primeiro mapeamento dos projetos de lei, elegemos o Projeto de Lei nº

4208/2001 (Lei das Cautelares) como um dos pontos centrais para o avanço das ações pela

diminuição das prisões provisórias.

Esse projeto esteve no Congresso por mais de 10 anos e foi considerado pelo governo

como de alta prioridade, mas perdeu sua importância ao longo dos anos. O projeto de lei tinha

sido proposto originalmente pelo Executivo, o que aumentava as chances de se tornar uma lei.

Além disso, também continha propostas extremamente positivas com relação à prisão provisória e

por isso tornou-se um projeto prioritário para a Rede.

Após quase um ano de discussões acerca da importância da lei e conversando com

diferentes atores, encontramos fortes aliados na Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério

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da Justiça. Com eles, fomos capazes de captar a atenção dos líderes partidários e aumentar o nível

de prioridade da proposta.

A Rede contribuiu fortemente para a inserção do projeto de lei na agenda legislativa, e

persuadiu vigorosamente os líderes partidários e legisladores a aprová-la. A lei foi aprovada em

abril de 2011 (Lei nº 12.403/2011), e entrou em vigor em 4 de julho do mesmo ano, com o

potencial de causar significativos efeitos positivos em escala nacional, efeitos que ainda não se

concretizaram, infelizmente.

A nova lei estipula que a prisão provisória não é cabível para crimes com penas de até 04

anos, quando os acusados são réus primários e os crimes não são violentos. Para esses casos,

existe uma lista de medidas cautelares que podem ser adotadas pelos juízes, isolada ou

cumulativamente. A lei contém nove medidas cautelares alternativas à prisão: monitoramento

eletrônico; prisão domiciliar; comparecimento periódico em juízo; recolhimento domiciliar no

período noturno; pagamento de fiança; proibição de frequência ou acesso a determinados

lugares; proibição de manter contato com pessoa determinada; proibição de ausentar-se da

comarca; e suspensão do exercício de função pública.

A segunda conquista legislativa alcançada pelo projeto foi a aprovação da Lei nº

12.433/2011, que entrou em vigor em junho de 2011, e prevê a remição de pena pelo estudo.

Sabemos que vitórias legislativas não necessariamente se realizam no dia-a-dia da rotina

policial e da justiça criminal. Nosso desafio é maior, é o de concretizar uma mudança na ideologia

vigente de que a prisão é a única forma de punição aceitável.

Além da importante atuação em Brasília, a publicação das pesquisas que dialogamos aqui

significou um momento importante de fortalecimento do trabalho da rede. As pesquisas foram

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publicadas e discutidas em seminários e eventos que contaram com a participação de importantes

atores do sistema de justiça criminal no Brasil. Essas pesquisas nos trazem, dentre outras coisas,

informações sobre quem são os presos, como foram presos, e como o sistema de justiça lida com

eles.

Acreditamos que a discussão do tema a partir de dados concretos e seguros, nos servirá

para avançar em políticas públicas mais eficientes, e esperamos que esses dados tenham

capacidade de transformação, ou no mínimo de indignação, fazendo com que tenhamos uma

visão mais realista do que se passa atrás das grades, desmistificando figuras usadas

frequentemente para justificar o endurecimento penal.

Helena Romanach

Advogada, cientista social e coordenadora de justiça criminal do instituto sou da paz e

facilitadora da rede de justiça criminal entre 2010 e 2012.

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INTRODUÇÃO

Este documento apresenta os principais resultados de quatro pesquisas desenvolvidas em

São Paulo e Rio de Janeiro por instituições que integram a Rede de Justiça Criminal apoiadas pela

Open Society Foundations.

Impacto da Assistência Jurídica a Presos Provisórios: um experimento na cidade do Rio de

Janeiro (2011) - Associação Pela Reforma Prisional (ARP).

Prisão Provisória e Lei de Drogas: um estudo sobre os flagrantes de tráfico de drogas na

cidade de São Paulo (2011) - Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo

(NEV-USP).

Tecer Justiça: Presas e Presos Provisórios da Cidade de São Paulo (2012) - Instituto Terra,

Trabalho e Cidadania/Pastoral Carcerária (ITTC/Pastoral Carcerária).

Prisões em Flagrante na Cidade de São Paulo (2012) - Instituto Sou da Paz (ISDP).

Os objetivos da presente publicação são os de prestigiar e compartilhar com organizações

da sociedade civil, pesquisadores, ativistas e públicos em geral do Brasil e da América Latina as

reflexões e dados produzidos por estas instituições ao longo de 2010/2011 em torno de um tema

comum, a prisão provisória, fortalecendo argumentos contra o uso abusivo e arbitrário deste

dispositivo legal.

A despeito dos diferentes métodos e enfoques empregados, discriminados na sessão

seguinte, as pesquisas partem de um diagnóstico comum acerca do sistema penitenciário nacional

e do papel desempenhado pela prisão provisória no agravamento deste cenário.

Em 2010, ano de início das referidas pesquisas, o Brasil era o país com a quarta maior

população carcerária do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, Rússia e China. O crescimento

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da população prisional pode ser observado no gráfico 1. De acordo com dados de 2011 do Infopen

- sistema de informação e estatística do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), ligado ao

Ministério da Justiça - havia no Brasil 514.582 presos em todos os regimes ou 269,79 para cada

100 mil habitantes. Entre 1995 e 2011 o número de presos aumentou 246%.

Gráfico 1. População Carcerária no Brasil, de 1995 a 2011.

Números absolutos e taxas por 100 mil habitantes

Fonte: Depen/MJ

A razão entre presos provisórios e presos condenados também cresceu vertiginosamente

na última década: em 2000 era de 0,54 preso provisório para cada preso condenado e em 2011

passou a 0,73 provisório por condenado, de acordo com o gráfico 2.

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171,3 184,3 195,3

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Número de Presos Presos por 100 mil habitantes

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Gráfico 2. Número de presos condenados e provisórios, e razão provisórios/condenados

no sistema prisional brasileiro – 2000 - 20113

Fonte: Depen/MJ

O cenário que por si só é assustador, toma contornos trágicos quando associado a

problemas de superlotação, insalubridade e falta de condições mínimas de higiene e convivência,

abusos físicos por parte de autoridades públicas e entre os próprios presos, entre outras violações

de direitos básicos amplamente denunciadas por organizações da sociedade civil, como bem

apontado por Salla:

Não é admissível um país viver um período de prosperidade econômica, de melhoria de condições de vida para milhões de pessoas, de conquista de expressivo avanço na proteção e promoção de direitos humanos em outras áreas e ter um sistema prisional que siga na mão oposta, que continue a ser o território dos horrores, da violência e da degradação dos indivíduos (2012, p.157).

3 Os dados disponíveis no site do DEPEN para 2002 referem-se até junho do referido ano.

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2000 2001 2002* 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Condenados Provisórios Razão

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Com este pano de fundo, as organizações da Rede lançaram mão de diferentes estratégias

de pesquisa com vistas a traçar um diagnóstico a respeito do uso da prisão provisória no Brasil e

assim subsidiar as ações de advocacy e campanhas da Rede de Justiça Criminal.

Dada a vasta quantidade de dados e reflexões produzidos por cada uma das pesquisas –

muitos deles concordantes e complementares entre si - achamos que seria de grande utilidade

agrupá-los em torno de um único documento, facilitando o acesso dos leitores aos principais

resultados. Longe de esgotar os pontos debatidos por cada pesquisa, o Sumário pretende ser um

convite para a leitura integral das mesmas.

Para apresentar o conteúdo das pesquisas, optamos por dividi-lo em três eixos respeitando

a própria arquitetura dos estudos aqui resumidos e a importância dos tópicos em discussão:

Eixo 1 – Perfil do Preso e Contexto da Prisão: nesse tópico descrevemos o contexto da

abordagem, perfil sociodemográfico e jurídico dos acusados por crimes violentos e não

violentos e a forma de atuação das polícias. Ao agrupar essas informações, podemos

verificar a existência de uma política de segurança pública que tem alvos demográficos

bastante específicos.

Eixo 2 - Dinâmica Judicial: apresentamos os dados referentes ao modo de atuação do

judiciário confirmando a tese do uso abusivo da prisão provisória e a questão do acesso à

justiça.

Eixo 3 – Drogas e Prisão Provisória: elegemos dar uma atenção especial à questão do

tráfico de drogas, pois dentre todos os crimes, ele vigora como um dos principais

responsáveis pelo o crescimento da população carcerária nos últimos anos. Além disso, no

Brasil e no mundo o tema está no centro das discussões políticas atuais.

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Dado que em cada eixo se articulam diferentes informações das pesquisas para a

construção da argumentação, alguns dados serão apresentados em mais de um eixo.

Por fim, depois da apresentação dos resultados das pesquisas, esse documento traz

Conclusões e Recomendações, com considerações sobre a prisão provisória e recomendações com

vistas a orientar mudanças legislativas e práticas cotidianas das organizações do sistema de justiça

e policial.

Esperamos que esta publicação sirva de inspiração para a realização de pesquisas, bem

como fomente o necessário monitoramento do uso da prisão provisória, contribuindo para o

fortalecimento das políticas públicas voltadas para a redução da população carcerária e, em

especial, para a construção de um sistema de justiça criminal mais humano.

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RECORTES DAS PESQUISAS

PESQUISA – Impacto da assistência jurídica a presos provisórios: um experimento na cidade do Rio de Janeiro (2011) Associação pela Reforma Prisional (ARP) Foco: pesquisa baseada em um Projeto de Intervenção Jurídica, que consistiu em assistência multidisciplinar aos presos provisórios. A pesquisa analisou, não apenas os casos de presos assistidos pelo Projeto, mas também casos que não foram atendidos. Local: Cidade do Rio de Janeiro – carceragens Período: junho de 2010 a junho de 2011 Pesquisa/Projeto:a pesquisa teve por base duas fontes de dados: (i) aplicação de survey para 479 presos; (ii) análise de 575 casos, sendo que 130 foram assistidos pelo Projeto de Assistência,148 foram abordados mas não foram assitidos e 297 presos correspondiam ao grupo de controle, que não foram assistidos pelo Projeto, mas acompanhados para realização de comparações. Perfil do público atendido: acusados de delito contra o patrimônio sem violência nem grave ameaça à pessoa, ou acusados de crimes de tráfico privilegiado.

PESQUISA – Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011) Núcleo de Estudos da Violência/USP (NEV-USP) Foco: o uso da prisão provisória nos casos de tráfico de drogas; operadores que trabalham com a Lei de Drogas Local: Cidade de São Paulo Número de casos analisados: 667 autos de prisão em flagrante; 928 réus. Período: novembro e dezembro de 2010 e janeiro de 2011 Entrevistas: 70 [9 defensores, 8 promotores, 12 juízes, 16 delegados e 26 policiais militares] Delitos: Casos registrados como tráfico de drogas.

PESQUISA – Tecer a Justiça: presas e presos provisórios da cidade de São Paulo (2012)

Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) e Pastoral Carcerária

Foco: pesquisa baseada em um Projeto de Intervenção Jurídica, que consistiu em assistência

multidisciplinar aos presos provisórios. A pesquisa analisou, não apenas os casos de presos

assistidos pelo Projeto, mas também casos que não foram atendidos.

Local: Centro de Detenção Provisória – CDP Pinheiros I e Penitenciária Feminina de Santana

Período: junho de 2010 e dezembro de 2011

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Pesquisa/Projeto: a pesquisa teve por base 2 bancos de dados: (i) dos questionários aplicados a 1161 detentos/as; (ii) dos processos analisados (dos processos em que o Projeto Tecer a Justiça atuou, parte deles foi analisada e as informações foram computadas em banco de dados separado). Perfil do público atendido: O projeto atendeu pessoas presas por qualquer tipo de crime, que

foram dividas em três categorias: delitos de drogas, crimes não violentos e violentos.

PESQUISA – Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

Instituto Sou da Paz

Foco: traçar o perfil das pessoas que foram presas em flagrante na cidade, com foco em suas

características sociodemográficas e sociojurídicas (tipo de crime e circunstâncias da prisão)

Local: Cidade de São Paulo

Número de casos analisados: 4.559 presos em flagrante denunciados

Período: abril a junho de 2011

Delitos: os flagrantes de crimes dolosos ocorridos na capital (com exceção dos crimes contra a vida

ou previstos na Lei Maria da Penha)

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EIXO 1 – PERFIL DO PRESO E CONTEXTO DA PRISÃO

Perfil sociodemográfico dos presos

Um dado já bastante conhecido para presos em geral e que se confirma em relação aos

presos provisórios é de que os homens são a grande maioria dos presos, compondo em torno de

90% do total das três amostras nas pesquisas que apresentaram esse dado4. A presença de

mulheres aumenta um pouco quando são considerados apenas os crimes relacionados a drogas.

Dados do Infopen/Ministério da Justiça mostram, no entanto, que o número de mulheres presas

aumentou não apenas em função do tráfico de drogas, mas também em relação a outros crimes5.

A prevalência da maternidade sobre a paternidade (ao menos alegada) entre as pessoas

presas pode ser tributária do próprio perfil prevalecente da mulher encarcerada, como de chefe

de família e portadora da guarda de filhos menores, o que certamente contribui para que sua

prisão (com a consequente ausência de atenção às suas especificidades) redunde em efeitos

sociais ainda mais perversos.

A maioria dos presos em flagrante concentra-se na primeira faixa etária, dos 18 aos 25

anos, tendência que já vem sendo observada desde os anos 1990 no contexto urbano brasileiro.

Se há indícios de que há um crescimento da criminalidade entre os jovens, é importante frisar que

as políticas penais e de segurança pública acabam sempre por ter como alvo privilegiado os jovens

que são com maior frequencia revistados pela polícia em comparação com outros grupos etários.

Em 11% das ocorrências estudadas também foram apreendidos adolescentes, que foram

levados ao Distrito Policial (duas pesquisas da cidade de São Paulo apresentam exatamente a

4 A pesquisa do ITTC/Pastoral Carcerária sobre São Paulo foi realizada com uma amostra estratificada,

propositadamente equitativa na distribuição entre homens e mulheres. As outras três pesquisas não fizeram esse recorte e, portanto têm mais semelhança com o universo das pessoas presas. 5 Veja os dados na discussão sobre drogas, nesta publicação.

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mesma porcentagem, em outra a porcentagem foi de 8,3%). O número de adolescentes

identificados na coleta diz respeito àqueles que foram apreendidos com os adultos no momento

do flagrante. Nenhuma das pesquisas tem informação a respeito de flagrantes que tenham

envolvido somente adolescentes, pois esses casos seguem para a Vara da Infância e Juventude.

A pesquisa do ITTC/Pastoral Carcerária relevou que em um terço das ocorrências que

envolviam adolescentes, houve a imputação ao adulto do crime do artigo 244-B6 do Estatuto da

Criança e do Adolescente, embora em nenhum dos casos, com desfecho processual conhecido,

tenha havido condenação por esse crime pelo juiz singular.

Os dados referentes a presos em flagrante denunciados segundo cor acrescentam

subsídios ao debate sobre a discriminação racial no âmbito do sistema jurídico-criminal. A

porcentagem de pretos e pardos entre os presos provisórios no Rio de Janeiro e em São Paulo foi

de no mínimo 55% quando a representação desse mesmo grupo na população do sudeste é de

35%.

Apenas a pesquisa realizada pelo ITTC/Pastoral Carcerária levantou informações diretas

sobre renda. 41,6% das mulheres e 27,9% dos homens declararam ganhos de até um salário

mínimo. Por outro lado, 16,9% dos homens e 13,8% das mulheres disseram não ter renda. O lugar

onde foi realizada essa pesquisa contém especificidades que exigem cautela na generalização

dessa renda para o universo dos presos provisórios de São Paulo o que será explicado logo

adiante. De qualquer modo, a baixa escolaridade, a dependência da assistência judiciária da

defensoria pública e a condição de trabalho informal ou precário7 nos permite inferir com razoável

grau de segurança a situação geral de baixa renda entre os presos provisórios. A situação de prisão

6 Artigo 244-B. Corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito) anos, com ele praticando infração penal

ou induzindo-o a praticá-la. Pena: reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. 7 É importante frisar que o trabalho informal ou temporário não é necessariamente um indicador de baixa renda. Mas

o acúmulo deste com a baixa escolaridade e a dependência da assistência judiciária que indica as condições de baixa renda e precariedade no trabalho.

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torna o quadro ainda mais grave quando se leva em conta que boa parte dos presos são

responsáveis pelo sustento familiar e muitos têm filhos.

Em relação à presença de pessoas em situação de rua, as duas pesquisas que apresentaram

esses dados, ambos para a cidade de São Paulo, mostraram porcentagens diferentes – na pequisa

do ITTC/Pastoral Carcerária, 31% (homens) e 13% (mulheres) declararam viver em situação de rua.

Na pesquisa do ISDP, 7,1% das pessoas (entre homens e mulheres) declararam a mesma situação.

Essa diferença provavelmente está relacionada ao tipo de coleta, a pesquisa do Sou da Paz

analisou o que foi declarado para o processo, o ITTC/Pastoral Carcerária entrevistou as pessoas

diretamente. Outro fator que pode ter contribuido foi à escolha do CDP I de Pinheiros para a

realização da pesquisa do ITTC/Pastoral Carcerária, sendo que essa unidade abrange as prisões

realizadas na área central onde vive a maior parte das pessoas em situação de rua. Entre 2008 e

2010, mais de mil vagas em albergues no centro de São Paulo deixaram de existir, medida que está

em consonância com o projeto político de retirada pessoas em situação de rua do centro da

cidade. A dificuldade dessas pessoas no acesso a documentos, como comprovante de residência,

acaba servindo como justificativa para a manutenção da prisão provisória, assunto que será

discutido mais adiante.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisa – Cidade do Rio de Janeiro

ARP- Impacto da Assistência Jurídica a Presos Provisórios (2011)

Uma parte da pesquisa foi de tipo survey, em que foram entrevistadas 479 pessoas, cerca de 20% dos

presos provisórios das dez carceragens da região metropolitana do Rio de Janeiro. A amostra de presos

ouvida no survey se compõe da seguinte forma:

Homens 96,3% e mulheres 3,7%

Idade média em torno de 29 anos

40% de cor parda e 22% de cor preta

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15

Quase todos os entrevistados já haviam trabalhado, sendo que 71% deles estavam trabalhando

quando foram presos, a maioria sem carteira assinada, principalmente na construção civil, no

comércio e em atividades domésticas.

74% tinham filhos

58% eram os responsáveis pelo sustento da casa

Pesquisas – Cidade de São Paulo

ITTC/Pastoral Carcerária - Tecer justiça (2012)

1161 pessoas do Centro de Detenção Provisória – CDP Pinheiros I e Penitenciária Feminina de Santana que

responderam a um questionário. Os resultados do perfil sociodemográfico seguem abaixo8:

44,8 % dos homens e 42,9% das mulheres com idade entre 18 e 25 anos.

Em 8,3% dos casos de prisões em flagrante havia adolescentes no momento do suposto delito.

46,3% das pessoas da amostra eram pardas, 15,9% eram pretas e 35% eram brancas.

70,2% dos homens e 63,8% das mulheres possuiam no máximo o primeiro grau completo. 27,1%

dos homens e 34,3% das mulheres com ensino médio completo ou incompleto. Apenas 2,7% dos

homens e 1,9% das mulheres com ensino superior completo ou incompleto.

39% dos homens e 27,4% das mulheres declararam ter trabalho formal ou informal e contínuo no

momento da prisão. 30,2% dos homens e 30,8% das mulheres declararam ter trabalho informal e

temporário. 30,8% dos homens e 41,8% das mulheres declararam não ter trabalho no momento da

prisão.

41,6% das mulheres e 27,9% dos homens declararam ganhos de até um salário mínimo e 33,8% das

mulheres e 42,2% dos homens, entre um e 03 salários mínimos. Os homens e mulheres que não

possuem renda familiar perfazem 16,9% e 13,8%, respectivamente.

81,2% das mulheres e 53% dos homens declararam ter filho.

33,6% dos homens e 30,5% das mulheres disseram ser o principal provedor para o sustento da

família.

31% dos homens e 13% das mulheres declaram viver em situação de rua antes da prisão.

8 A pesquisa foi aplicada em quantidades semelhantes entre mulheres e homens e não representa a proporção de

pessoas presas por sexo.

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16

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

A amostra de 4.559 autos de prisão em flagrante revelou o seguinte perfil do preso provisório da cidade de

São Paulo:

91,9% de homens e 7,9% de mulheres.

Maioria de jovens com idade entre 18 e 25 anos (55%).

Em 11% dos casos de prisões em flagrante, havia adolescente no momento do suposto delito.

44,4% pardos, 11% pretos e 41,7% brancos.

75,7% com escolaridade até o primeiro grau completo, 20,9% com ensino médio e apenas 1,8%

com ensino superior.

39% declararam ter filhos e 43,56% declararam não ter filhos.

Para 7,1% foi declarada a situação de morador de rua.

NEV-USP Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

As informações sobre os presos provisórios abaixo foram colhidas dos 667 autos de prisão em flagrante de

tráfico de drogas:

87% homens e 13% mulheres.

75,6% jovens na faixa etária entre 18 e 29 anos.

Em 11% das ocorrências também foram apreendidos adolescentes, que foram levados ao Distrito

Policial.

46% foram classificados como pardos, 41% como brancos e 13% como pretos. Pretos e pardos

somam aproximadamente 59% dos apreendidos.

Cerca de 79% das pessoas com até o primeiro grau completo e 14% com o segundo grau completo.

Menos de 1% com curso superior completo ou incompleto.

62,17% declararam exercer atividade remunerada, 29,43% declararam estar desempregados e

8,40% disseram-se estudantes.

Perfil sociojuridico

Com relação a antecedentes criminais, as pesquisas apresentaram os seguintes dados:

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17

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisa – Cidade do Rio de Janeiro

ARP- Impacto da Assistência Jurídica a Presos Provisórios (2011)

28% já haviam sido presos uma vez antes da prisão atual.

Pesquisas – Cidade de São Paulo

ITTC/Pastoral Carcerária - Tecer justiça (2012)

53,8% dos homens e 68,4% das mulheres nunca havia cumprido pena de prisão.

9,0% dos homens 6,5% das mulheres haviam cumprido algum tipo de pena alternativa.

24,6% dos homens e 16,6% das mulheres declararam estar respondendo a processo (que não

aquele que motivou a prisão atual).

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

Entre os presos em flagrante denunciados, 52,6% possuíam antecedentes criminais, ou seja, já

haviam sido indiciados ou processados anteriormente. Quando se consideram apenas os presos em

flagrante que apresentavam processos de execução – aqueles que já foram condenados ou mesmo

iniciaram o cumprimento de sua pena –, há um decréscimo significativo de casos, reduzindo-se a

27,6%, praticamente a metade daqueles com antecedentes criminais.

NEV-USP Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

57% das pessoas apreendidas por tráfico de drogas não apresentam antecedente.

Tipo criminal

Na pesquisa realizada pela ARP (2011), os crimes mais recorrentes entre os presos em

flagrante foram os de tráfico de drogas (32,6%) e roubo (26,8%).

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Na pesquisa do ISDP (2012) o tráfico de drogas e o furto representaram as maiores

incidências criminais entre as mulheres presas em flagrante denunciadas na capital, ambos

correspondendo a 35% dos delitos praticados. Note-se que esses crimes têm uma

representatividade muito maior no universo das mulheres do que no dos homens (21,6% e 25,3%

respectivamente), ao passo que com o roubo acontece o contrário (32,4% dos delitos entre os

homens e 14,2% dos delitos entre as mulheres).

Classificando-se os crimes dos acusados a partir da natureza jurídica, encontramos nas

pesquisas do ITTC/Pastoral Carcerária (2012) e ISDP (2012) as seguintes porcentagens: tráfico de

drogas: 25,3% (ITTC/ Pastoral Carcerária) e 22,7% (ISDP); crimes violentos9 32,5% (ITTC/ Pastoral

Carcerária) e 30,5% (ISDP) e crimes não violentos10 42,2% (ITTC/ Pastoral Carcerária) e 40% (ISDP).

Quanto à tipificação penal dos crimes de droga especificamente, apesar de uma das importantes

inovações da Lei de Drogas ter sido prever tipos penais mais variados, na prática houve pouca

variação na classificação dada pelo delegado, o que pode ser observado pela primazia do

enquadramento dos delitos dessa natureza no caput do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006, presente

em mais de dois terços dos casos na pesquisa para o qual esse dado foi compilado (ITTC/ Pastoral

Carcerária). Os crimes enquadrados desta forma indicam tráfico em oposição aos crimes

enquadrados no artigo 28 da mesma lei, que indicam porte de drogas para uso e não são punidos

com prisão.

Por fim, foi constada a primazia de delitos patrimoniais não violentos (furto) junto à

população em situação de rua, o que revela os expedientes de sobrevivência de um público que

9 Para a pesquisa ITTC/Pastoral Carcerária, a categoria crime violento inclui: roubo simples, roubo qualificado, lesão

corporal em contexto doméstico, roubo e outro crime. A pesquisa ISDP não usou essa categoria e para esta análise foram somados os crimes de roubo. 10

Para a pesquisa ITTC/Pastoral Carcerária, a categoria crimes não violentos inclui: furto simples, furto qualificado, furto e outro(s) crime(s), estelionato, receptação, dano, falsificação de documento particular e uso de documento e crimes de perigo. A pesquisa ISDP não usou essa categoria e para esta análise foram somados os crimes de furto, receptação e aqueles ligados ao Estatuto do Desarmamento.

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tem sido alvo de medidas de controle e repressão, que articulam as diferentes forças repressivas

do estado e do município.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisa – Cidade do Rio de Janeiro

ARP- Impacto da Assistência Jurídica a Presos Provisórios (2011)

Quase todos os presos entrevistados (95%) estavam respondendo por um único crime. Principais

acusações nos crimes com e sem flagrante: tráfico de drogas (27%), roubo (23,6%), homicídio (13%)

e furto (10,5%).

Observa-se que entre os presos em flagrante, as maiores parcelas o foram por tráfico de drogas

(32,6%), roubo (26,8%) e furto (15%); já entre os presos sem flagrante, prevalecem os acusados de

delitos diversos (categoria outros, 25,4%), seguido de homicídio (21,9%), tráfico de drogas (21,4%)

e roubo (26,8%).

Pesquisas – Cidade de São Paulo

ITTC/Pastoral Carcerária - Tecer justiça (2012)

Diferentemente das informações apresentadas para essa pesquisa até agora, os dados abaixo não foram

colhidos por meio de survey, mas a partir do acompanhamento de 348 processos consultados. Esses

processos dizem respeito a ocorrências criminais com data entre os dias 24 de agosto de 2010 e 22 de maio

de 2011:

Dos casos acompanhados, 25,3% eram tráfico de drogas; 32,5% eram crimes violentos e 42,2%

eram crimes não violentos.

Eram primários, ou seja, não tinham cometido nenhum crime antes: 65,3% das pessoas que

respondiam por crimes de drogas, 44,9% das pessoas que respondiam por crimes não violentos e

62,3% das pessoas que respondiam por crimes violentos.

Entre os crimes não violentos o furto foi a acusação mais comum. Furto simples: tentado, 10,8%,

consumado, 24,6% (35,4% no total); furto qualificado: tentado, 16,8%, consumado, 31,7% (48,5%

no total); outros 16,2%.

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Entre os crimes classificados pela pesquisa como violentos, o roubo foi o mais comum. Roubo

simples: tentado 15,2%, consumado 34,1% (47,3%); Roubo qualificado: tentado 2,9%; consumado

41,3% (44,2%), outros 6,7%.

Entre os crimes relacionados a droga, 78,9% dos casos foram enquadrados no artigo 33 caput da Lei

nº 11.343 (referente a tráfico); 11,6% foram enquadrados no artigo 33 caput e também nos artigos

34 (referente a maquinário, aparelho, instrumento ou qualquer objeto destinado à fabricação) e/ou

35 (associação). Apenas 1,1% dos casos foram enquadrados no artigo 28 caput da Lei nº 11.343/06

(referente a usuário).

Entre os que foram acusados de crimes de drogas, 52,9% declararam exercer atividade remunerada

e 42,5% declararam-se desempregados.

Entre os que respondiam por crimes não violentos, 51,6% declararam atividade remunerada e

44,4% declararam estar desempregados. Entre os acusados por crimes violentos, 50,4% declararam

exercer atividade remunerada, 48,8% declararam estar desempregados.

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

80,96% dos denunciados respondiam a um único crime.

22,7% foram acusados por crimes relacionados a drogas, 30,5% por crimes violentos e 40% por

crimes não violentos.

Os tipos penais mais recorrentes foram: roubo (31%), furto (26,1%) e tráfico de drogas (22,7%).

Do total de delitos praticados pelas mulheres, 35% foram tráfico de drogas, 35% furto e 14,2%

roubo.

Entre os homens, 32,4% dos delitos cometidos foram roubos, 25,3% foram furtos e 21,6% foram

tráfico de drogas.

51,4% dos que declararam serem moradores de rua foram presos por furto, seguido pelo roubo

com 31,4%. O tráfico de drogas foi responsável por 10% dessas prisões.

NEV-USP Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

Enquadramento dado pela autoridade policial no momento da lavratura do auto de prisão nos crimes

relacionados a droga:

76% apenas no artigo 33, caput da lei 11.343/2006;

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11% dos casos a classificação foi no artigo 33 combinada com outros delitos.

Em quase 10% deles foram reunidos os artigos 34 e 35.

Nenhum caso enquadrado no artigo 28 caput (referente a usuário).

Contexto da abordagem

A maior parte das pessoas presas em flagrante foi abordada durante patrulhamento de

rotina por parte da polícia militar. Poucos casos foram resultados de investigação, apenas 4%.

Quanto ao local em que ocorreu a prisão, tanto homens quanto mulheres são presos

principalmente em vias públicas. Contudo, em relação às mulheres, há duas especificidades:

serem presas em estabelecimentos comerciais e em unidades prisionais. O primeiro caso se

explica pela prática de furtos em supermercados e lojas. Já em relação aos estabelecimentos

prisionais, as mulheres foram presas com drogas, tendo a maior parte delas dito que o marido

estava sendo ameaçado por presos da unidade e, caso a esposa não levasse a droga, ele seria

morto.

Tudo indica que patrulhamento de rotina, polícia militar e via pública são os elementos

base da política de segurança pública em São Paulo em detrimento do trabalho investigativo.

Entrevistados na pesquisa do NEV-USP (2011) mencionaram a atitude suspeita como motivadora

das abordagens que resultaram em prisões por droga, um elemento que dá margem a ação

seletiva motivada por preconceitos de classe e etnia.

Na pesquisa do ISDP, foi observada a prevalência de apenas um indiciado nas prisões em

flagrante (64,4%), ou seja, apenas uma pessoa teria sido presa pela polícia. Mesmo nos casos de

roubo, crime em que a coautoria delitiva é mais constatada, na maior parte dos casos (56%) havia

apenas um indiciado. No caso de tráfico de drogas, 70% dos casos foram de apenas um indiciado.

Este último número é corroborado pela pesquisa do NEV-USP (2011): em 69% dos flagrantes por

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tráfico de drogas a pessoa foi presa sozinha. Se o tráfico de drogas é uma atividade que envolve

uma cadeia de atores que transacionam dinheiro e mercadorias ilegais em várias escalas, a prisão

de um único indivíduo demonstra o escopo limitado da ação da polícia que em suas abordagens de

rua, mesmo quando está prendendo um traficante e não um usuário, seleciona a ponta da cadeia.

Na pesquisa da ARP, que investigou presos provisórios por flagrante e sem flagrante no Rio

de Janeiro ficou demonstrado que o flagrante amplia significativamente a possibilidade de o

acusado sofrer violência no momento em que é detido. Ser negro também aumenta a chance de

agressão quando a pessoa é detida(ARP, 2011). Na Pesquisa ITTC/Pastoral Carcerária (2012),

muitos homens e mulheres entrevistados descreveram experiências muito semelhantes, como o

“zigue-zague”11, o “micro-ondas”12, o uso de spray de pimenta nos olhos e no nariz, a invasão de

domicílio, o flagrante forjado, a extorsão, a discriminação racial e a ameaça contra parentes

(inclusive crianças). Em se tratando da população feminina, também foram marcantes as

denúncias de violência sexual, que abrangem pedido de “propina sexual”, apalpadelas durante a

revista por policial masculino, obrigação de ficar nua e ameaça de estupro. A pesquisa também

abordou experiências anteriores dos entrevistados com a polícia. Os resultados demonstram que a

trajetória dos homens que responderam ao questionário no CDP I de Pinheiros é marcada pela

presença dos agentes do aparato repressivo do Estado, tanto na forma de abordagens como de

agressões físicas e verbais (92,1%). Ainda que mais baixos, não são desprezíveis os dados de que

23,3% das mulheres foram muitas vezes agredidas verbalmente pela polícia e que 43,7%

presenciaram muitas vezes alguém ser agredido por policial.

Duas das pesquisas abordaram também outro tipo de questão relacionada aos direitos e

garantias, a entrada na residência ou a chamada “entrada franqueada”. Na pesquisa do ISDP

(2012), 90,9% das prisões realizadas na residência do acusado foram feitas sem mandado judicial.

11

O motorista da viatura policial faz manobras bruscas com o veículo enquanto a pessoa algemada com as mãos para trás vai batendo a cabeça e o corpo no porta-malas da viatura policial, onde se encontra solta. 12

A pessoa presa permanece, sem água, no interior da viatura por longas horas debaixo de sol com as janelas do veículo fechadas.

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A pesquisa do NEV-USP (2011) também encontrou casos frequentes de “entrada franqueada”.

Questionados se essa prática estaria ferindo o direito à inviolabilidade da residência, alguns

operadores (policiais, promotores, juízes) entrevistados responderam que a entrada na residência

é legítima porque o tráfico é considerado crime permanente. Essa premissa será questionada

adiante, na discussão sobre drogas.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisa – Cidade do Rio de Janeiro

ARP- Impacto da Assistência Jurídica a Presos Provisórios (2011)

Pouco menos da metade dos presos provisórios disse ter sofrido algum tipo de violência no

momento da prisão e quase 1/3 afirmou ter sofrido mais de uma forma de agressão ou ameaça

entre as listadas no questionário (agressão verbal, agressão física, ameaça de agressão física,

ameaça de morte, foi baleado).

Entre os presos em flagrante entrevistados, é menor a proporção dos que não sofreram nenhum

tipo de agressão (48%) e é maior a proporção dos que dizem ter sido vítimas de mais de um tipo de

agressão ou ameaça (37%).

64% dos entrevistados que afirmaram ter sofrido mais de uma forma de violência ou ameaça no

momento da prisão eram pretos ou pardos, contra menos de 23% dos brancos.

Em todos os tipos de agressões ou ameaças, pretos e pardos foram mais vitimados que brancos.

Também foram alvo, em proporção muito maior, das agressões mais graves, como terem sido

baleados (apenas pretos e pardos foram baleados), agredidos fisicamente (76,5% dos que foram

agredidos fisicamente eram pretos ou pardos) ou ameaçados de morte (apenas 10% dos

ameaçados eram brancos).

Pesquisas – Cidade de São Paulo

ITTC/Pastoral Carcerária - Tecer justiça (2012)

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Para 65,7% dos homens e 77,1% das mulheres a prisão foi efetuada pela polícia militar. Para 10%

dos homens e 11,6% das mulheres a prisão foi efetuada pela polícia civil. Para 11,4% dos homens e

3,4% das mulheres, a prisão foi efetuada pela Guarda Civil Metropolitana.

Para 78,6% dos homens e 56,% das mulheres, a prisão ocorreu em via pública. 6,8% dos homens e

21,9% das mulheres foram presos em estabelecimento comercial. 3,8% dos homens e 12,8% das

mulheres foram presos em residência ou local de hospedagem. 4,6% das mulheres foram presas

em unidade prisional ou delegacia, o que não ocorreu entre os homens.

67,6% dos homens e 65,4% das mulheres disseram ter sofrido agressão verbal no momento da

prisão. 56,5% dos homens e 40,3% das mulheres disseram ter sofrido agressão física e 33% dos

homens e 22,7% das mulheres disseram terem sido ameaçados com arma no momento da prisão.

57,9% dos homens disseram já terem sido abordados por policial muitas vezes em situações

anteriores, 56,7% disseram já terem sido agredidos verbalmente por policial muitas vezes, 35,6%

disseram já terem sido agredidos fisicamente por policiais muitas vezes e 65,1% já presenciaram

muitas vezes alguém ser agredido por policial.

19,4% das mulheres disseram já terem sido abordadas por policial muitas vezes em situações

anteriores, 23,3% disseram já terem sido agredidas verbalmente por policial muitas vezes, 10,2%

disseram já terem sido agredidas fisicamente por policiais muitas vezes e 43,7% já presenciaram

muitas vezes alguém ser agredido por policial.

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

79,2% das prisões em flagrante na capital foram realizadas por policais militares. Apenas 13,2%

foram realizadas por policias civis.

A abordagem policial, proveniente do policiamento ostensivo realizado pela polícia militar, foi

responsável por 33,27% das prisões. A situação de denúncia da vítima e a situação de denúncia e

abordagem policial responderam por 16,10% e 14,5% das prisões, respectivamente. A atividade

investigativa, realizada por destinação funcional pela Polícia Civil, respondeu por apenas 4% das

prisões.

Na faixa etária de 18 a 25 anos, 62,89% das prisões foram decorrentes de abordagem policial. À

medida que se avança nas faixas etárias, o percentual de prisões decorrentes de abordagens

policiais vai declinando gradativamente.

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76,6% das prisões foram realizadas em local de acesso público, 10,6% em estabelecimento

comercial e 8% em residências.

90,9% das prisões na residência do acusado foram feitas sem madado judicial.

Em 56% dos casos de roubo, 65% dos casos de furto e em 69,7% dos casos de tráfico, foi indiciado

apenas um autor.

NEV-USP Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

86% das prisões em flagrante (droga) foram feitas pela polícia militar e 9,58% pela polícia civil

62,28% das prisões ocorreram durante o patrulhamento de rotina, 24,7% das abordagens foram

motivadas por denúncia e 4% foram motivadas por investigação.

As mulheres, quando comparadas proporcionalmente, foram presas através de denúncias (35%) e

em revistas na penitenciária (10,9%) enquanto os homens sofreram mais abordagens a partir de

patrulhamento de rotina (67,8%)

82% das prisões foram realizadas em via pública e 12,46% em residências.

Em 69% dos casos a pessoa foi presa sozinha.

Em 17,5% houve entrada na residência, a chamada entrada franqueada13.

13

Nota: % calculada sobre o total de acusados em que havia essa informação.

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EIXO 2 – DINÂMICA JUDICIAL

Para compreender como os casos de prisão em flagrente e prisão provisória são tratados

pelo sistema de justiça criminal é importante descrever seu fluxo e cada fase considerada

importante para o processo.

Quando uma prisão em flagrante é realizada14, o acusado é conduzido à autoridade

competente, o delegado de polícia. Na delegacia, são ouvidas as pessoas que realizaram a prisão

em flagrante, eventuais testemunhas, a vítima nos casos em que há e o acusado. O delegado

elabora o auto de prisão em flagrante. Cabe à autoridade competente, diante dos fatos que lhe

são apresentados, enquadrar a conduta delituosa em um determinado tipo penal.

O juiz deve ser comunicado da prisão em flagrante no prazo de 24 horas, devendo dar vista

ao Ministério Público e, se o acusado não tiver indicado o nome do seu advogado, também deve

ser encaminhada cópia dos autos à Defensoria Pública. Nesse momento, a defesa pode apresentar

pedido de liberdade provisória. Apresentado o pedido, será dada vista ao Ministério Público para

que se manifeste sobre o que foi requerido e, então, o juiz decidirá novamente se mantém a

prisão ou se concede a liberdade provisória ou relaxa a prisão, caso constate a existência de uma

ilegalidade. A liberdade provisória pode ser concedida quando não estiverem presentes os

requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal15.

14

Será considerado em flagrante delito, nos termos do art. 302, do Código de Processo Penal, quem: (i) está cometendo a infração penal; (ii) acaba de cometê-la; (iii) é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; (iv) é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração. Em relação ao crime de tráfico de drogas, entende-se que é crime permanente, isso significa que a consumação do crime se prolonga no tempo, ou seja, enquanto alguém estiver guardando a droga consigo ou em sua residência, haverá o estado de flagrância. 15

De acordo com o art. 312. “A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria”.

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A autoridade policial terá um prazo determinado para concluir o inquérito policial16. Esses

prazos podem ser duplicados17 se houver um pedido fundamentado da autoridade policial.

Findado o inquérito policial, este será encaminhado ao juiz, que dará vista para o Ministério

Público para que este requeira o arquivamento dos autos, requisite diligências ou ofereça a

denúncia18.

O juiz, então, decidirá se recebe ou rejeita a denúncia. Caso a receba, o juiz designará data

para a audiência de instrução e julgamento19. Nessa audiência, serão ouvidas as testemunhas de

acusação e defesa e o acusado será interrogado. Após esses atos será dada a palavra ao Ministério

Público e ao defensor para que façam suas alegações finais orais20. Encerrados os debates, o juiz

proferirá a sentença de imediato ou em 10 dias.

Em junho de 2011, entrou em vigor a Lei nº 12.403/11, que alterou alguns dispositivos do Código de Processo Penal relacionados à prisão provisória. Essa lei também introduziu no ordenamento jurídico medidas cautelares alternativas à prisão. As pesquisas apresentadas foram realizadas antes dessa lei.

16

Inquérito policial é um procedimento policial administrativo que apura e investiga um crime e antecede a ação penal. 17

De acordo com o artigo 51 da Lei 11.343/2006:"O inquérito policial será concluído no prazo de 30 (trinta) dias, se o indiciado estiver preso, e de 90 (noventa) dias, quando solto. Parágrafo único: Os prazos a que se refere este artigo podem ser duplicados pelo juiz, ouvido o Ministério Público, mediante pedido justificado da autoridade de polícia judiciária". 18

Denomina-se de denúncia a acusação formulada pelo Ministério Público, na qual deve constar de forma detalhada a descritiva a conduta do acusado, as testemunhas que a acusação deseja que sejam ouvidas e a descrição do crime que teria sido praticado pelo acusado. 19

Audiência de instrução e julgamento é a sessão pública da qual participam o juiz, auxiliares da Justiça, testemunhas, advogados, promotores e partes, com o objetivo de realizar a prova oral, debater a causa e proferir sentença. 20

Até 2008, a lei processual previa a apresentação de alegações, não havendo a previsão de sustentação oral. Apesar das alterações trazidas pela Lei 11.719/08, que incluem de forma mais acentuada a oralidade no procedimento ordinário, vale observar que frequentemente não há debates, sendo esses substituídos por textos previamente preparados pelas partes.

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Encaminhamento dos casos de flagrante no Rio de Janeiro

De acordo com o fluxograma abaixo podemos visualizar melhor como são processados os

casos de flagrantes no sistema de justiça da cidade do Rio de Janeiro:

A "audiência especial" para ciência da denúnica ocorre na capital do Rio de Janeiro. Em

conversa com juízes, promotores e defensores a equipe de pesquisa da ARP não foram obtidas

informações confiáveis sobre a origem do procedimento. O certo é que os juízes determinam a

requisição dos réus presos para tomar conhecimento da denúncia (ARP, 2011).

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Encaminhamento dos casos de flagrante em São Paulo

Em São Paulo, diferente do Rio de Janeiro, existe um Departamento que recebe todos os

flagrantes da cidade: o Departamento de Inquéritos Policiais (DIPO). Este é um órgão que só existe

na cidade de São Paulo. Todos os inquéritos policiais, bem como os autos de prisão em flagrante,

são encaminhados para esse departamento. Trata-se de órgão com competência para todos os

crimes punidos com reclusão, exceto para os casos de responsabilidade das Varas de Júri, ou seja,

casos de homicídios e tentativas de homicídio.

Assim, no caso de São Paulo, o juiz que recebe a comunicação da prisão e que deve decidir

pela manutenção ou não dessa medida é o juiz do DIPO. Da mesma forma, esse juiz deve ser

comunicado da prisão em 24 horas, devendo dar vista ao Ministério Público e, se o acusado não

tiver indicado o nome do seu advogado, também deve ser encaminhada cópia dos autos à

Defensoria Pública. Nesse momento, já pode a defesa apresentar pedido de liberdade provisória.

Apresentado o pedido, será dada vista ao Ministério Público para que esse se manifeste sobre o

que foi requerido e, então, o juiz decidirá novamente se mantém a prisão ou se concede a

liberdade provisória.

Oferecida a denúncia pelo Ministério Público, o Departamento de Inquéritos Policiais

(DIPO) encaminhará os autos à Vara Criminal onde tramitará o processo.

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Qualidade dos autos

Crimes como furto, roubo e tráfico de drogas, pelos quais grande parte dos suspeitos é

mantida presa provisoriamente, são em sua maioria casos de prisão em flagrante realizada pela

Polícia Militar. Conduzidos à autoridade policial, será lavrado o auto de prisão em flagrante e

instaurado o inquérito policial, cuja função é embasar a decisão judicial acerca da legalidade da

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prisão e o ajuizamento da ação penal (função dos autos de prisão em flagrante), bem como

auxiliar na elucidação dos crimes perpetrados, a partir da colheita de provas (função dos

inquéritos policiais que se pretendem aqui discutir), orientando o órgão de acusação quanto à

proposição da ação penal e oferecendo elementos probatórios ao juiz.

A partir de entrevistas com operadores do sistema de justiça, a qualidade dos autos de

prisão em flagrante e do inquérito policial foi colocada em questão, uma vez que exerce influência

direta nas fases posteriores do processo penal. Verificou-se que a ação da Polícia Judiciária vai

pouco além da lavratura do auto de prisão em flagrante. Como aponta um dos promotores

entrevistados: “quando o flagrante chega à delegacia, raramente é iniciada uma investigação (...) a

polícia civil não faz este trabalho, os inquéritos nada mais são do que os autos de prisão em

flagrante” (NEV-USP, 2011, p.58). Vale lembrar que a pesquisa do NEV-USP, única a realizar

entrevistas e a abordar a questão deste tópico, investigou exclusivamente casos de tráfico de

drogas. Porém, sem deixar a ressalva de lado, cremos que são opiniões representativas do que

ocorre com as prisões em flagrante como um todo.

Não há uma investigação aprofundada, função da polícia civil essencial à fundamentação

das etapas subsequentes do processo penal. Se considerarmos o artigo 6º do Código de Processo

Penal, não há cumprimento das providências necessárias para a apuração do fato criminal,

providências estas que são deveres da autoridade policial. A precariedade da instrução dos

inquéritos policiais e a deficiência da polícia civil na colheita de provas são assinaladas por outro

promotor entrevistado, que acrescenta: “o ideal seria um trabalho de investigação, em que se

reunissem mais provas, fossem ouvidas outras testemunhas, inclusive os parentes da pessoa

apreendida” (NEV-USP, 2011, p.58).

A consequência disto é a superestimação da atuação da polícia militar, uma vez que não há

outros indícios de autoria e materialidade que não a palavra dos policiais que efetuaram a prisão.

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Para um dos defensores entrevistados “fica a palavra do policial contra a do acusado”, mas,

considerando que “o pensamento dominante é dar confiança para a palavra dos policiais, porque

o policial tem fé pública”, a palavra do policial tende a ter mais valor que a do acusado no

julgamento. Há, para o defensor, inversão de princípios jurídicos fundamentais como in dúbio pro

réu e que o ônus da prova cabe acusação.

Essa fragilidade é, em parte, consequência da precariedade estrutural da polícia civil. Não

há, segundo delegados entrevistados, nem estrutura, nem recursos humanos adequados para

investigar todos os flagrantes atendidos por uma delegacia de polícia. Este fato é de conhecimento

do Ministério Público e do Poder Judiciário, daí a tolerância e aceitação da falta de provas mais

consistentes para denúncia e julgamento. Apesar do espaço para dúvidas que este cenário cria,

estabeleceu-se um consenso entre operadores de que há indícios de autoria e materialidade

suficientemente firmes na prisão em flagrante apenas pela sua natureza, sem maior contestação.

Acusa-se e condena-se com base em elementos frágeis, portanto.

Diante da falta de investigações, a principal evidência nos casos de prisão em flagrante é o

depoimento das testemunhas, tanto no inquérito policial, como no julgamento. As duas pesquisas

aqui apresentadas (ISDP e NEV-USP) referem-se ao momento pré-processual, entre a lavratura do

auto de prisão em flagrante e o inquérito policial. Neles, a coincidência dos dados é evidente: em

aproximadamente dois terços de todos os casos analisados, os policiais que realizaram o flagrante

são as únicas testemunhas. Com exceção da pequena parcela de policiais civis ou guardas civis

metropolitanos, são os policiais militares que predominam como testemunhas nos casos.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisas – Cidade de São Paulo

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

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Em 76,6% dos casos os policiais militares que participaram das prisões foram ouvidos como

testemunhas no inquérito policial.

Em 32,2% dos casos, a vítima aparecia como testemunha.

Em 21,8%, a testemunha era um civil - nem policial, nem vítima do crime.

NEV-USP Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

74% dos casos de tráfico de drogas contaram apenas com o testemunho dos policiais que

realizaram a apreensão do acusado

Em outros 26% dos casos, além dos policiais condutores, houve também a presença de

testemunhas civis: 9% eram usuários que estariam comprando a droga, 5,2% pessoas que estavam

próximas ao local, 2,3% parentes e outros 9,5% não identificados.

Policiais entrevistados afirmam ser muito difícil que alguém concorde em testemunhar

contra suspeitos de crimes, por medo de retaliação ou por não querer envolver-se com assuntos

da justiça e os operadores do sistema de justiça criminal tomam este fato com naturalidade. Sobre

prisões relacionadas a tráfico, alguns dos promotores entrevistados defendem o testemunho

policial como prova válida do flagrante e dizem que a necessidade de contar com testemunhas

civis seria, na verdade, prejudicial ao processo penal: ou o policial nunca conseguiria realizar

prisões, resvalando sempre na resistência dos civis, ou as testemunhas, retiradas do contexto do

traficante, ajudariam a encobertá-lo. Juizes, por outro lado, apesar de considerarem ideal a

presença de testemunhas civis (além de outras provas colhidas pela polícia judiciária), manifestam

indulgência diante da dificuldade de se arrolar tais testemunhas (NEV, 2011).

Apesar de ponto pacífico entre promotores e juízes, a ausência de outras testemunhas e

provas não deixa de representar problemas dentro do processo penal. Podemos encontrar alguns

exemplos destes problemas nas pesquisas, como o que foi chamado de “confissão informal” na

pesquisa do NEV-USP (2011): em 44% dos casos analisados na pesquisa, policiais militares alegam

em seu depoimento que o acusado “confessou” a autoria do crime no momento da prisão. Este

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dado é contrastante com o depoimento formal do acusado prestado na delegacia: 11% confessam,

48% permanecem calados e 41% negam.

Não é possível saber o que dizem na rua ou deixam de dizer, porém, num sistema todo

escorado sobre o testemunho policial, alegações como estas, por parte dos policiais acabam tendo

peso desproporcional durante o julgamento e são tomadas por juizes como “forte indício de

culpa” como colocado por um defensor público entrevistado.

Outro dado ajuda no esclarecimento do papel do depoimento de policiais no julgamento

de prisões em flagrante: 48% das prisões analisadas pela pesquisa do NEV-USP (2011)

aconteceram quando a droga não estava efetivamente com a pessoa, ou seja, o vínculo entre a

pessoa e a droga foi estabelecido unicamente pelo policial que efetuou a prisão. Uma vez que

juizes têm em alta conta o testemunho policial, considerando sua fé pública, é muito difícil para a

defesa reverter aquilo que alegam os policiais, sendo os acusados condenados com base em

provas bastante questionáveis.

De acordo com a pesquisa do ISDP pode-se concluir, a partir da ineficiência da polícia civil

em investigar e da ausência de testemunhas não policiais, que se tem aí um “modelo não apenas

de segurança pública, mas também jurídico-penal, mais inquisitorial do que acusatório, pelo qual a

culpa é baseada, além da prisão em flagrante, em elementos de fraca potência investigativa”

(ISDP, 2012, p.40).

Evolução do enquadramento

O papel dos operadores na atenuação ou agravamento da conduta foi analisado por duas

pesquisas: ITTC/Pastoral Carcerária (2012) e ISDP (2012) e permite um olhar sobre a atuação de

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cada instituição no desenrolar do processo penal. Aqui, destaca-se o papel do promotor de justiça

na dinâmica dos processos criminais.

Quando oferece a denúncia, o representante do Ministério Público agrava a conduta

imputada pelo delegado em praticamente 30% dos casos, sobretudo a partir da modificação da

modalidade tentada para a modalidade consumada e adiciona qualificadores. Quando observada a

sentença, porém, esse quadro se inverte: há maior atenuação das condutas, o que ocorre em

pouco mais de 27% dos casos. Isso se explica, sobretudo pela atuação dos defensores públicos.

Porém a regra é a concordância entre Ministério Público e Poder Judiciário, o que ocorre em

pouco mais de 70% dos casos (ITTC/Pastoral Carcerária, 2012).

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisas – Cidade de São Paulo

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

Dinâmica de agravamentos das condutas

Qualificadores: entre inquérito e denúncia, a incidência de roubo simples cai de 14,7%, no Inquérito

Policial para 6,8% na denúncia e de furto simples cai de 11% para 8,2%. A incidência destes crimes

com qualificadoras aumenta: roubo qualificado por arma de fogo sobe de 8,5% para 14,9%; o

mesmo ocorre com roubo qualificado por concurso de agentes, de 7,3% para 8,3%, e furto

qualificado, de 15,1% para 17,5%.

Reconhecimento da tentativa: 24,6% dos casos de roubo são reconhecidos como tentados (em

oposição a consumados) pela autoridade policial, valor que sofre queda significativa, para 17,1% no

momento da denúncia. O reconhecimento da tentativa para furto sofre pequena queda, de 50,3%

para 48,5%.

ITTC/Pastoral Carcerária - Tecer justiça (2012)

Entre o boletim de ocorrência e o relatório final do inquérito policial, o enquadramento é o mesmo

em 77,7% dos casos, em 13,5% a conduta foi atenuada e em 8,9%, agravada.

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Entre o final do inquérito policial e a denúncia, ocorre o agravamento da conduta em 29,8% dos

casos.

Entre a denúncia e a sentença, em 27,7% dos casos a conduta é atenuada. Em 70,3% dos casos, é

mantida a gravidade da conduta inalterada.

O estudo do ISDP (2012) indica outras maneiras pelas quais o mesmo alinhamento se

manifesta. Quando confrontadas as classificações do inquérito policial e da denúncia, para furto e

roubo verifica-se a diminuição na incidência das modalidades simples e aumento das modalidades

qualificadas, sobretudo por arma de fogo e concurso de agentes. Há também aumento da

modalidade consumada em relação à modalidade tentada. Em ambos os casos – tentativa e

qualificadores – o agravamento se dá em maior escala para roubos em relação a furtos. Os dados

aqui apresentados permitem, sobretudo, observar o impacto da atuação do Ministério Público

sobre a ação penal: agravar a conduta, padrão sistemático apresentado pelos representantes

desta instituição, o que tende a dificultar a concessão da liberdade provisória, bem como agravar

as sentenças.

As decisões do Poder Judiciário acerca da prisão provisória também parecem ser

influenciadas pelas manifestações do representante do Ministério Público: No tocante ao

deferimento ou não da liberdade provisória, a tendência é novamente um alinhamento entre

Poder Judiciário e Ministério Público: dos casos nos quais o Ministério Público manifestou-se

contrariamente à concessão da liberdade do preso, em 73,5% a liberdade não foi deferida pelo

Poder Judiciário. Da mesma maneira, em 70,3% dos casos em que a liberdade foi concedida, o

parecer do Ministério público era favorável (ISDP, 2012).

Por fim, o mesmo estudo analisa a dissonância entre os crimes pelos quais os suspeitos

são presos em flagrante e os crimes pelos quais os detidos foram condenados, revelando que

alguns crimes apresentam maior punitividade que outros: das mulheres presas, 35% o foram por

tráfico de drogas; quando observado o número de condenadas, porém, a parcela referente aos

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crimes de tráfico é maior - 62%. O inverso ocorre para furto: os mesmos 35% das mulheres são

presas por este delito, mas apenas 5,8% são condenadas a penas privativas de liberdade. Para

homens, também há uma redução no número de condenados por furto em relação à parcela

daqueles que são presos por este crime, de 25% para 15,3%. Com exceção dos crimes relacionados

ao tráfico, o desfecho processual de crimes não-violentos e de pequeno potencial ofensivo

evidencia a falta de necessidade da aplicação da prisão provisória para estes casos (ISDP,2012).

Tempo dos processos

Quando se trata de prisão provisória, a discussão sobre os prazos é essencial, uma vez que

os suspeitos estão submetidos à condição de privação de liberdade em caráter provisório e às

condições degradantes da detenção. Tanto a Convenção Americana de Direitos Humanos, de 1969

quanto o Pacto de São José da Costa Rica e a Constituição Federal brasileira asseguram a razoável

duração do processo e meios que garantam a celeridade de sua tramitação como garantia

fundamental. Entretanto, essa garantia configura-se como uma previsão genérica: não existem

critérios objetivos que determinem o que é um período de tempo razoável para um processo

penal.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisas – Cidade de São Paulo

ITTC/Pastoral Carcerária - Tecer justiça (2012)

Em média, o intervalo de tempo entre a prisão e a primeira audiência de instrução e julgamento foi

de 109,2 dias para homens e 135,7 dias para mulheres.

O intervalo entre a prisão e a sentença foi de, em média, 114 dias para homens e 142,8 dias para

mulheres.

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NEV-USP Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

Quanto à aplicação da Lei nº 11.343/11, observou-se:

Em 28% dos casos o intervalo entre fato e audiência ficou entre 90 e 120 dias; em 27% dos casos,

ficou entre 120 e 150 dias e em outros 27%, superou 150 dias.

Previsão de prazo razoável para duração do processo de acordo com os tempos previstos em lei:

105 dias. Soma dos intervalos médios do estudo, entre fato e sentença: 142 dias.

Segundo dados do NEV-USP, em mais de 50% dos casos de suspeitos presos por tráficos de

drogas houve uma demora de 3 a 5 meses entre fato e audiência; outros 27% superam essa

marca. Em média, suspeitos demoraram 142 dias para ouvir sua sentença. Dados do ITTC/Pastoral

Carcerária também acompanham esta afirmação, acrescidos de uma importante análise de

gênero.

Ao analisar o tempo médio ao qual os acusados por todos os tipos penais são submetidos à

prisão provisória (intervalo entre fato, audiência e sentença), o estudo constatou diferenças

significativas entre estes prazos para homens e para mulheres: com tempo médio de 109,2 dias

até a audiência para os homens, a tendência é que mulheres permaneçam presas provisoriamente

por cerca de 26 dias a mais, em média (135,6). A diferença também ocorre quando tomamos o

tempo da sentença: o intervalo entre fato e sentença é 28 dias maior, em média, para mulheres

(142,8) quando comparadas com homens (114).

Se há uma previsão constitucional de celeridade do processo penal, sobretudo quando o

réu encontra-se privado de liberdade, estes dados deixam claro que ela não é respeitada.

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Uso abusivo da prisão provisória e acesso à justiça

Diagnóstico realizado pelo Ministério da Justiça (2009)21 estimou que, 80% dos presos no

Brasil não podem pagar um advogado e precisam receber os serviços de um defensor público ou

de um advogado particular à custa do poder público. Ainda assim, na prática, há poucos

defensores públicos para realizar esta tarefa.

As pesquisas possibilitaram conhecer o alcance e a efetividade dos direitos de defesa de

presos nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, por tipo de crime, bem como o posicionamento

da justiça criminal no que toca à manutenção da prisão provisória até a formalização da acusação

pelo Ministério Público. A falta de defensores públicos para dar conta da demanda, a demora no

contato entre defensor e acusado, a seleção dos casos em que se pede ou não a liberdade, foram

alguns dos problemas identificados. Tendo em vista que muitos acusados dependem da

assistência jurídica da Defensoria Pública, esse cenário revela um problema grave quando se trata

de direito à defesa e acesso à justiça. A pesquisa do NEV-USP, por exemplo, revela que 61% dos

réus acusados de tráfico de drogas foram assistidos pela Defensoria Pública de São Paulo.

Muitas vezes, o primeiro contato entre o defensor lotado na vara e o acusado coincide com

a realização da audiência de instrução, debates e julgamento, o que pode vir a acontecer meses

após a prisão. Não raro esse primeiro encontro é também o único, o que suscita questionamentos

quanto à prestação de uma defesa técnica integral. O fato de a pessoa responder ao processo

privada de liberdade pode conduzir a entraves bastante significativos em termos da defesa, já que

as possibilidades de produção de provas ficam prejudicadas. A pesquisa do NEV-USP demonstrou

que o contato entre o defensor público e o acusado ocorre, na maioria dos casos, somente na

primeira audiência do caso, o que pode demorar mais de 03 meses para acontecer (82,90%).

21

Defensoria Pública, Diagnóstico III. Ministério da Justiça: Brasília, 2009.

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De acordo com a pesquisa realizada pela ARP no Rio de Janeiro, se o preso não tem

advogado particular, a Defensoria, em 24 horas, toma conhecimento da prisão em flagrante e

passa a responsabilizar-se pela assistência jurídica. Entretanto, ela raramente consegue entrar

com um pedido de liberdade nos dias logo após o flagrante e com frequência só encontra pela

primeira vez o réu na "audiência especial", quando este é levado ao Fórum para tomar ciência da

denúncia, o que em geral ocorre depois de 20 dias de prisão.

Diante do grande volume de demandas, outra dificuldade encontrada pelos defensores

públicos diz respeito ao contato com os réus. A equipe de pesquisa do NEV-USP, quando

acompanhava audiências nas varas criminais, pode verificar o quão rápido e superficial é o contato

entre defensores públicos e “assistidos”. Os defensores alegam que é prejudicial à defesa o fato de

que o primeiro, e às vezes único, contato com o réu se dá minutos antes da audiência. No caso de

São Paulo, é apenas nesse momento que os defensores têm acesso aos fatos através da versão

dos acusados, que têm cerca de 10 minutos para conversar com os seus defensores. Essa

dificuldade em acessar os réus pode, certamente, gerar um prejuízo comparado àquele acusado

que conta com a assistência de um advogado particular.

As pesquisas apontam para a questão do direito à defesa, pensado como um direito à

efetiva e ativa defesa e não apenas como mero requisito de formalidade. Para se garantir a

igualdade do processo, as partes precisam estar em iguais condições de demonstrar o que alegam,

tanto no plano formal como no plano material. Foi observado, nos casos acompanhados pela

pesquisa, que muitas vezes esse direito não é garantido.

Em razão do restrito número de defensores, eles têm dificuldades para dar

encaminhamento à demanda diária deste setor. De acordo com um defensor público entrevistado

pela pesquisa do NEV-USP, acaba sendo “necessária uma seleção de casos em que a Defensoria vai

pedir ou não a liberdade provisória”.

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Os pedidos de liberdade22 são importantes porque possibilitam que o acusado responda ao

processo fora da prisão, especialmente naqueles casos em que não há a necessidade de tal

medida cautelar. Porém, não é em todos os casos que esse pedido é apresentado. Isso pode ser

observado nos resultados das pesquisas:

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisa – Cidade do Rio de Janeiro

ARP- Impacto da Assistência Jurídica a Presos Provisórios (2011)

Nos primeiros 20 dias após a prisão, 70% dos presos assistidos pela Defensoria Pública não tiveram

pedidos de liberdade formulados.

Pesquisas – Cidade de São Paulo

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

Em 60,8% das prisões em flagrante em que havia denúncia, na capital, constatou-se a existência de um ou

mais pedidos de liberdade para os acusados: relaxamento de flagrante, liberdade provisória ou Habeas

Corpus. Desse total:

64,4% foram da Defensoria Pública

31% foram de advogados particulares

3,3% decisões de liberdade de ofício (tomadas pelos juízes sem provocação)

0,8% pedidos pelo do Ministério Público.

Nos 39,2% restantes não houve qualquer manifestação da defesa (pública ou constituída),

requerimento do Ministério Público ou decisão judicial, no sentido de postular ou conceder a

liberdade.

A pesquisa do ISDP revela que a maioria dos pedidos feitos partiu da iniciativa da

Defensoria Pública. Certamente o perfil dos acusados está diretamente relacionado a este dado,

22

Os pedidos de liberdade aqui se referem aos pedidos de relaxamento de flagrante, liberdade provisória e/ou Habeas Corpus.

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tendo em vista que a maioria deles não pode pagar advogado particular. As pesquisas também

registraram distribuição desigual entre os pedidos de liberdade quando considerados

separadamente por tipos penais.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisa – Cidade do Rio de Janeiro

ARP- Impacto da Assistência Jurídica a Presos Provisórios (2011)

Em 69,6% dos casos de tráfico de drogas não houve formulação de pedido no prazo de 20 dias

Em 45,2% dos crimes contra o patrimônio não houve formulação de pedido no prazo de 20 dias.

Interessante perceber que, na amostra da pesquisa realizada pela ARP, o tráfico de drogas

foi o crime que menos mobilizou pedidos de liberdade, tendo uma porcentagem pequena de

pedidos (30,4%) quando comparado aos demais. O ISDP também destacou as diferenças nos

pedidos de liberdade quando considerados os tipos penais:

Pesquisas – Cidade de São Paulo

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

Roubo

52,1% dos presos por roubo permaneceu sem defesa até o oferecimento da denúncia.

36,8% tiveram o pedido de liberdade formulado pela Defensoria Pública

11,1% tiveram o pedido de liberdade formulado por advogado constituído

Furto

31,2% dos casos permaneceram sem defesa e sem manifestação por sua liberdade

50,3% tiveram o pedido de liberdade formulado pela Defensoria Pública

18,5% tiveram o pedido de liberdade formulado por advogado constituído

Tráfico de drogas

48% dos presos por tráfico permaneceu sem defesa até a denúncia

40,1% tiveram o pedido de liberdade formulado pela Defensoria Pública

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11,7% tiveram o pedido de liberdade formulado por advogado constituído

O crime de roubo foi o que menos mobilizou pedidos de liberdade quando comparado a

outros tipos penais a partir do universo pesquisado. O tráfico de drogas é outro crime que

apresentou poucos pedidos de liberdade.

Resultados dos pedidos de liberdade

As pesquisas revelaram a resistência do Judiciário em conceder liberdade aos presos

provisórios. Mesmo nos casos de réus primários, com residência fixa e trabalho lícito (requisitos

muitas vezes exigidos pelos juízes), verificou-se resistência do Judiciário em reconhecer o direito

constitucional dos acusados de responderem ao processo em liberdade. Outra evidência trazida

pelas pesquisas diz respeito à qualidade da decisão de indeferimento do pedido de liberdade,

sendo genéricas e pouco fundamentadas.

Esse cenário foi verificado tanto no Rio de Janeiro como em São Paulo.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisa – Cidade do Rio de Janeiro

ARP- Impacto da Assistência Jurídica a Presos Provisórios (2011)

Os advogados do projeto conseguiram liberar 25% dos seus assistidos

Na comparação especifica com a Defensoria, os advogados do projeto liberaram 30,6% dos

assistidos dentro do prazo de referência (20 dias) ao passo que a Defensoria obteve alvará de

soltura para 13,7% no mesmo prazo.

Importante levar em consideração para a análise dessa informação que não há defensores

em Delegacias de Polícia acompanhando o momento da prisão e o contato com o defensor

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público, no Rio de Janeiro, ocorre no momento em que o réu comparece ao Fórum para tomar

ciência da denúncia, o que geralmente ocorre aproximadamente 20 dias depois da prisão,

momento em que o réu informa se possui advogado ou será defendido pela Defensoria Pública.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisas – Cidade de São Paulo

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

Em 12,1% foi concedida a liberdade, sendo que 0,9% ocorreram em razão de pedido de

relaxamento de flagrante e 11,2% em razão de pedido de liberdade provisória ou impetração de

Habeas Corpus.

0,86% dos acusados por roubo conseguiram a liberdade

2% dos acusados por tráfico de drogas conseguiram a liberdade

O tráfico supera o roubo em rejeições dos pedidos de liberdade, alcançando a mais alta cifra:

71,3%, contra 68% no roubo, valor também bastante elevado.

Em 3,1% dos casos de tráfico de drogas houve relaxamento da prisão.

De acordo com as pesquisas de São Paulo, a concessão de liberdade é mais difícil de ser

conseguida quando os delitos em questão são roubo e tráfico. No Rio de Janeiro, a pesquisa da

ARP (2011) revelou que a chance do acusado obter liberdade num prazo relativamente curto é

maior para os acusados de crimes contra o patrimônio sem violência ou grave ameaça à pessoa

(29,4% com alvará de soltura em até 20 dias) do que para os acusados de tráfico de drogas (5,1%).

A pesquisa do NEV-USP (2011) confirma este dado, já que de toda a amostra23 a maioria

respondeu ao processo presa (88,64%).

Houve também um destaque em todas as pesquisas com relação ao papel do Ministério

Público. A maioria dos pareceres do Ministério Público foi contrária à concessão de liberdade para

23

Vale lembrar que a pesquisa do NEV-USP (2011) foi realizada somente nos casos de flagrantes por crimes relacionados a tráfico de drogas

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os presos, com algumas variações segundo os diferentes tipos penais, especialmente roubo e o

tráfico de drogas. As pesquisas também apontaram o significativo alinhamento das decisões

judiciais aos pareceres do Ministério Público, poucos foram os juízes que decidiram de forma

contrária ao parecer do promotor de justiça.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisas – Cidade de São Paulo

ITTC/Pastoral Carcerária - Tecer justiça (2012)

Em 96,7% dos casos examinados, o Ministério Público no DIPO se manifestou contrário a todos os

pedidos de liberdade

Em 3,3% dos casos o Ministério Público foi favorável à liberdade, porém, o juiz do DIPO manteve a

prisão

Em 93,3% dos pedidos apresentados nas varas criminais, o Ministério Público se manifestou

contrário aos pedidos de liberdade

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

74,8% dos pareceres do Ministério Público foram contrários à concessão de liberdade para os

presos

81,7% dos pareceres de casos de roubo foram contrários à concessão de liberdade

82,8% dos pareceres de casos de tráfico de drogas foram contrários à concessão de liberdade

66,4% dos pareceres de casos de furto foram contrários à concessão de liberdade

Os argumentos mais frequentemente utilizados para a não concessão da liberdade são:

manutenção da custódia cautelar como garantia da ordem pública

a conveniência da instrução criminal

a gravidade abstrata do delito

assegurar a aplicação da lei penal

ausência de comprovação de residência fixa e de ocupação lícita

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Esses argumentos foram comuns, tanto no judiciário do Rio de Janeiro como no de São

Paulo. A avaliação das decisões referentes à manutenção das prisões realizadas pelas pesquisas

pôde perceber que a fundamentação dos juízes é geralmente muito precária e está muito aquém

da exigência constitucional. De acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, o juiz tem que

fundamentar a sua decisão (artigo 310, CPP e artigo 5º, LXV, e artigo 93, IX, Constituição Federal).

Porém, as decisões analisadas revelaram que são frequentes, como destacado pela pesquisa da

ARP, as decisões de “carimbo” ou “etiqueta”, em que o conteúdo se adapta a todos os casos. Há

menções genéricas às hipóteses legais: “presentes os requisitos do artigo 311 e seguintes do CPP”,

“presentes os pressupostos”, “garantia da ordem pública”, além da falta de Folha de Antecedentes

Criminais (FAC), comprovante de residência e/ou prova de atividade laboral para justificar a

manutenção da prisão. Se fosse feita uma filtragem dessas decisões pela sua fundamentação

jurídica e constitucional, provavelmente muito poucas ficariam de pé.

Em São Paulo, desde o primeiro momento em que o flagrante é encaminhado ao Poder

Judiciário, mais especificamente ao DIPO, já se verificam alguns problemas. Quando o delegado de

polícia comunica o juiz sobre a prisão em flagrante, deveria o juiz competente, por força da

resolução nº 87, do Conselho Nacional de Justiça, verificar a legalidade da prisão, justificar a

manutenção da prisão provisória e registrar sua necessidade. Esses despachos servem, porém, ao

mero cumprimento de formalidade, sendo que praticamente todos os autos de prisão em

flagrante apresentavam a mesma decisão sem qualquer individualização (os chamados

“despachos-padrão” ou “carimbos”).

A situação de flagrância, o fato dos autos conterem os documentos que supostamente

comprovam autoria e materialidade do crime, afasta para os magistrados a hipótese do

relaxamento da prisão. No Rio de Janeiro, também é verificada esta fundamentação precária, que

não condiz com as exigências constitucionais.

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Ainda nesta etapa, de acordo com dados do ITTC/ Pastoral Carcerária, verifica-se que o

Ministério Público se posiciona, via de regra, contrariamente à soltura, sendo raríssimas as

manifestações em favor da soltura do preso, o que aconteceu em apenas 3% dos casos analisados

pelo estudo.

E, quando observadas as decisões concretas, percebe-se a influência de tal posicionamento

no Poder Judiciário. O estudo do ISDP revela que o indeferimento da liberdade provisória por

magistrados é maior nos casos onde o Ministério Público se manifestou contrariamente a sua

concessão (o que acontece em 73,5% dos casos observados pelo estudo). Quando deferida, o

Ministério Público era favorável em 70,3% dos casos. Tais dados mostram o significativo

alinhamento entre as duas instituições. Há de se considerar também, quanto às decisões a

respeito da liberdade provisória, outros aspectos da atuação do Ministério Público expostos em

outros tópicos, como a tendência ao agravamento da conduta quando do oferecimento da

denúncia.

Novamente segundo o estudo do ITTC/Pastoral Carcerária, no DIPO, as argumentações

mais recorrentes para a manutenção da prisão foram: a ausência de comprovação de residência

fixa (presente em 58,2% dos casos), de ocupação lícita (55,7%), a garantia da ordem pública

(54,1%), a conveniência da instrução criminal (45,9%), gravidade abstrata do delito (41%),

assegurar a aplicação da lei penal (23,8%) e reincidência (23%). Ainda segundo o estudo, mais da

metade dessas decisões foram consideradas génericas, ou seja, não fizeram nenhuma menção ao

caso concreto.

Apesar de ser considerada uma excepcionalidade no ordenamento jurídico brasileiro, a

prisão provisória parece não estar sendo considerada assim pelos operadores do direito. O

Ministério Público não chega nem a mencionar em sua denúncia que o acusado está preso. De

acordo com a pesquisa do ITTC/Pastoral Carcerária, 91,7% dos promotores não mencionaram o

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fato do suspeito encontrar-se preso. Porém, quando se manifestam, os promotores se posicionam

pela manutenção da custódia cautelar (com exceção de 2% dos casos investigados pelo estudo).

Ao receber a denúncia, o mesmo é observado quanto aos juízes, que em 82,2% dos casos não

mencionam a prisão.

Nas Varas Criminais de São Paulo podemos perceber o mesmo comportamento do

Ministério Público, que tende a se posicionar contrário à concessão da liberdade na maioria dos

casos. Entretanto, nesta fase, os juízes se mostram mais propensos a concedê-la, soltando um

número expressivamente maior de presos em comparação com as taxas de soltura dos juízes do

DIPO, que neste departamento representa 8,5%, e na Vara, 23,2%. Nesse momento, os

argumentos presentes nas decisões de liberdade provisória variam com frequência em relação à

fase anterior, porém apresentam a mesma natureza: a garantia da ordem pública (presente em

65,3% dos casos), a conveniência da instrução criminal (41,5%), gravidade abstrata do delito

(32,1%) e assegurar a aplicação da lei penal (24,5%), ausência de compravação de residência

(18,9%) e ocupação lícita (17,4%), sendo genéricas 64,6% dessas decisões (ITTC/Pastoral

Carcerária, 2011).

No caso de crimes de tráfico, a pesquisa do NEV-USP demonstrou que a maior parte das

“fundamentações” gira em torno dos seguintes argumentos: a) a gravidade do delito, b) a garantia

da ordem pública, c) a garantia da aplicação da lei, d) a conveniência da instrução criminal, e) o

fato do tráfico de drogas ser crime hediondo e f) a quantidade de droga apreendida.

A presença de comprovação de residência fixa e ocupação lícita no pedido de liberdade

pode contribuir para a sua concessão, mas não é determinante para o desfecho do pedido. A

ausência da documentação acaba sendo um argumento adicional, entre outros, para o não

deferimento dos pedidos de liberdade aos presos. No entanto, mesmo quando apresentados ao

juiz os referidos documentos, outros argumentos são utilizados para manter, da mesma forma, a

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prisão. Para termos uma dimensão acerca desta questão, podemos citar as constatações das

pesquisas que tiveram como fonte importante o seu projeto de assistência direta aos presos.

A pesquisa da ARP destacou a importância de haver na equipe um assistente social para

conseguir, além do contato com a família do preso, toda a documentação que pode ser juntada ao

processo para contribuir com o pedido de liberdade. Para eles, a brevidade do pedido de liberdade

devidamente instruído por documentos de comprovação de atividade laboral lícita e residência

fixa contribuem para a obtenção da liberdade.

De acordo com a ARP (2011, p.28-29), não há qualquer fundamento jurídico na exigência

de que a defesa junte aos autos a comprovação do exercício de atividade lícita. Primeiro, porque

não há dispositivo legal condicionando a concessão da liberdade ao exercício de atividade laboral

(aliás, tampouco existe amparo legal para a exigência da folha de antecendentes criminais ou do

comprovante de residência). Segundo, porque o princípio da presunção de inocência não admite

condicionantes: considerar legítimas as exigências judiciais para responder ao processo em

liberdade equivale a restringir esse direito aos acusados que têm empregos formais.

Já a pesquisa do ITTC/Pastoral Carcerária destacou que, na maioria dos casos, não houve a

juntada de documentos para instruir o pedido com vistas à liberdade do réu, a despeito de

grandes esforços de sua equipe para consegui-los. No início do projeto, acreditava-se que a

presença de documentos teria o papel de aumentar a probabilidade de concessão da liberdade,

sendo já conhecida de antemão a recorrência a argumentos como “falta de vínculo com o distrito

da culpa” nas decisões de indeferimento do pedido. Os dados sobre os principais argumentos

utilizados para indeferir o pedido no DIPO corroboraram essa percepção inicial. Contudo, a

condição de vida dos presos em flagrante, que pertencem aos estratos mais baixos da pirâmide

socioeconômica, dificultou a obtenção de documentos que comprovassem moradia fixa ou o

exercício de uma atividade remunerada regular.

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Nos casos em que houve juntada de documentos, 76,2% das decisões mantiveram o

constrangimento à liberdade. Tendo-se em conta a quantidade de pessoas que não apresentaram

documentos e que foram mantidas presas (82,7%), percebe-se que houve uma diferença, mas ela

não foi considerada tão significativa quanto se esperava. Assim, diante da ausência de

comprovantes, os juízes baseiam sua decisão nesse fato. Entretanto, quando há documentos,

outros são os argumentos utilizados para o indeferimento do pedido de liberdade.

Tanto a pesquisa da ARP quanto a do ITTC/Pastoral Carcerária observaram um relevante

encarceramento de moradores de rua, na maioria dos casos usuários de crack e/ou com

transtornos mentais. Nesses casos, a dificuldade era dobrada, porque não era possível conseguir

comprovantes de residência e de trabalho. A recorrência da prisão dessa população também

deixou transparecer um tratamento higienista do problema de saúde pública. As respostas aos

casos, muitas vezes, não deveriam estar no âmbito do judiciário, mas no campo da saúde, da

assistência social e de políticas públicas, que extrapolam o judiciário.

Sentenças e penas

Outra importante constatação das pesquisas e que confirma resultados de pesquisas

anteriores24 é de que são muitos os casos de imposição indevida da prisão provisória. Em muitos

casos, a pessoa ficou presa provisoriamente durante todo o processo, mas, ao final, recebeu pena

restritiva de direitos ou outra medida que não a privação de liberdade, ou seja, ela poderia ter

respondido ao processo solta e não presa.

De acordo com a pesquisa da ARP, do total de 575 pessoas acompanhadas pelo projeto

(assistidos, abordados e grupo de controle), 339 tiveram o desfecho processual conhecido e, desta

parcela, só 30,1% foram condenadas a penas privativas de liberdade. Ou seja, pelo menos 2 em

24

Estudos como o de Barreto (2007) e Boiteux (2009).

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cada 3 presos deveriam ter respondido ao processo em liberdade, dado que a pena final

(previsível desde o início) não foi de encarceramento, demonstarando a desproporcionalidade da

medida cautelar.

A equipe do projeto ITTC/Pastoral Carcerária em São Paulo também se deparou com

diversos casos em que o réu estava sendo acusado de delito, geralmente crimes não violentos,

pelo qual poderia receber o benefício da Lei nº 9.099/199525 ou, ainda, se condenado nos exatos

termos da denúncia, receberia, ao fim do processo, pena restritiva de direitos, nos termos do

artigo 44 do Código Penal (CP)26. Porém, mesmo assim o acusado era mantido preso

cautelarmente até a sentença que, enfim, o colocaria em liberdade, ainda que condenado.

Constatou-se assim um perverso sistema que subverte a lógica jurídica. Se o Código prevê

para um determinado delito cometido sem violência ou grave ameaça, por réu primário ou

reincidente não específico, pena restritiva de direitos e não privativa de liberdade, como pode o

magistrado deixar o réu – presumidamente inocente - preso por diversos meses, soltando-o

somente ao final, quando condenado?

Esse sistema de aprisionamento cautelar de réus acusados por crimes que - ainda que

condenados nos termos em que foram denunciados - receberão penas alternativas é de evidente

desproporção e incoerência processual penal.

25

Na legislação brasileira, os crimes de menor potencial ofensivo (contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 anos, cumulada ou não com multa) são processados em um Juizado Especial que orienta-se pelos critérios da oralidade, informalidade, economia processual e celeridade, objetivando, sempre que possível, a reparação dos danos sofridos pela vítima e a aplicação de pena não privativa de liberdade. O acusado não fica preso nesses casos. 26

De acordo com o art. 44: “As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: I - aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; II - o réu não for reincidente em crime doloso; III - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente”.

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Podemos citar um caso emblemático que ilustra exatamente essa questão:

Caso de M.V.C. Mesmo sendo primário, M. V. C. passou 01 mês e 16 dias preso no CDP I de Pinheiros, acusado de furto qualificado (...) Condenado ao final do processo, nos exatos termos da denúncia, julgada totalmente procedente, M. V. C. recebeu pena restritiva de direitos e foi colocado em liberdade, sem oposição do Ministério Público. (...)M. V C. permaneceu 07 dias na insalubre cela escura, úmida e superlotada do regime de observação, e, depois, mais 01 mês e 09 dias em outra cela não menos lotada do raio 3 do CDP I de Pinheiros. Assim, os direitos do réu se tornam um obstáculo à sua liberdade, e há uma inversão em que a pessoa permanece presa enquanto está respondendo ao processo, mesmo com a presunção de inocência, e é solta quando é condenada.

(ITTC/ Pastoral Carcerária, 2012, p.78)

A privação da liberdade é a punição mais severa do ordenamento jurídico brasileiro e só

deveria ser aplicada em casos de gravidade. É possível, por exemplo, que uma conduta esteja

legalmente definida como crime, mas na prática a lesão ao bem jurídico seja tão insignificante que

torne desproporcional a intervenção do Direito Penal.

Como apontado pela pesquisa da ARP (2011), um aspecto importante a ser considerado é a

enorme desproporção do custo econômico (sem falar no custo pessoal e social) da prisão para

esses tipos de crime. Mencione-se, inicialmente, que, como é difícil encontrar juízes de primeira

instância que reconheçam o conceito de “bagatela”, faz-se necessário o recurso aos tribunais

superiores e só isso já implica gastos da ordem de R$ 2.600,00 por processo, segundo informações

do Superior Tribunal de Justiça. Ainda de acordo com a pesquisa da ARP (2011), levando em conta

que boa parte dos acusados permanece presa até a audiência de instrução e julgamento, que

pode demorar entre 03 e 04 meses, cada acusado em prisão provisória pode custar aos cofres

públicos algo como R$ 6.000,00.

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Outro dado trazido pela pesquisa do ITTC/Pastoral Carcerária revela que em 91% dos casos

em que o objeto foi subtraído este foi devolvido pelo autor. O dado a respeito da restituição do

bem nos casos de crimes patrimoniais não violentos é demonstrativo do baixo grau de lesividade

dessas condutas e evidencia de forma eloquente a contradição entre os impactos concretos do

crime e a expressão máxima do controle estatal, a privação da liberdade. A manutenção da prisão

nesses casos demonstra o quanto o sistema de justiça é extremamente severo com delitos

durante a face processual, alegando uma série de argumentos sustentados por preconceitos.

Nos casos de tráfico de drogas as pesquisas que analisaram os resultados dos processos

também identificaram casos de desproporcionalidade com relação ao uso da prisão provisória. A

pesquisa do NEV-USP revela justamente o quanto os operadores entendem que o crime tráfico de

drogas - mesmo casos em que os autores não representam mais do que a ponta da cadeia -

consiste em um crime grave e que deve ser punido com rigor. A despeito das frequentes

condenações e da constante alegação de que se trata de crime grave, verifica-se que não é comum

a aplicação de penas muito longas. Conforme os dados, nota-se que com frequência as pessoas

condenadas por tráfico são apenadas a 01 ano e 08 meses ou, ao menos, com pena menor do que

5 anos. Esse fato indica, conforme já observado anteriormente, que uma parte significativa dos(as)

acusados(as) são primários e assim se presume que não apresentam tanto perigo à sociedade.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisas – Cidade de São Paulo

NEV-USP Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

91% dos réus acusados por tráfico de drogas foram condenados

9% não foram condenados (3% absolvidos e 6% crime foi desclassificado para artigo 28 da lei

11.343/2006)

62,5% dos acusados receberam pena abaixo de 5 anos

36,8% receberam pena de 1 ano e 8 meses

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ITTC/Pastoral Carcerária - Tecer justiça (2012)

Em 6,3% dos casos houve a desclassificação para artigo 28 da Lei nº 11.343/2006, que trata do uso

de entorpecentes

44,2% do total de casos recebeu pena privativa de liberdade

Em 36% dos casos a pena foi de 01 ano e 08 meses, que corresponde ao tráfico privilegiado

Os dados coletados durante a pesquisa revelam que, excluindo-se os processos ainda em

andamento nas varas criminais singulares, os casos em que o desfecho é diverso da privação da

liberdade perfazem 29,8%, o que demonstra a desproporção entre a medida cautelar e a resposta

final do sistema de justiça criminal.

Presunção de inocência e ônus da prova

A prisão em flagrante, por si mesma, não autoriza a prisão provisória, já que o juiz tem que

analisar em cada caso concreto a necessidade de manter ou não a privação da liberdade do

acusado. Mas, na prática, como a prisão em flagrante decorre do cometimento de um delito cuja

autoria e materialidade são apontadas, o acusado já inicia o processo como presumidamente

culpado, deduzindo-se erroneamente que deva permanecer privado da liberdade. Não se leva em

consideração nem a obrigatoriedade da presunção de inocência, nem o princípio constitucional da

proporcionalidade e homogeneidade entre a medida cautelar e o resultado final do processo.

Desse modo, a prisão provisória acaba sendo uma antecipação da pena, sujeita a todo tipo de

arbitrariedade. Isso é confirmado por um juiz entrevistado:

Se você condenar, para o indivíduo não mudou nada, prisão é prisão, só muda o nome. Em termos é uma antecipação de pena, qualquer Juiz acaba fazendo esse cálculo: se hipoteticamente vou soltar essa pessoa depois, porque deixaria essa pessoa presa? É claro que você faz uma antecipação (NEV-USP, 2011).

Essa lógica de funcionamento do sistema de justiça criminal foi obervada tanto no Rio de

Janeiro como em São Paulo, o que pode revelar uma prática disseminada no sistema de justiça

brasileiro. Essa lógica revela a negação aos presos provisórios do direito a um julgamento justo,

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abandonando‐se uma garantia processual fundamental à presunção de inocência, isto é, do direito

de responder ao processo em liberdade.

Vale observar que essa inversão na lógica da prisão provisória - de ser utilizada como

mecanismo de punição - verificada nos crimes de tráfico revela prejuízos concretos. De acordo

com os dados da pesquisa, observa-se que dentre aqueles já sentenciados com sentença

absolutória ou de desclassificação para consumo pessoal (somam 9% do total já sentenciado) a

maioria respondeu ao processo privado de liberdade. Isso significa que 6,7% dos acusados nunca

deveriam ter sido presos e, a rigor, nem deveriam ter sido submetidos a um processo criminal.

Casos como esses evidenciam os problemas trazidos pela inversão dos propósitos da prisão

provisória. Não há formas de compensar o tempo que estas pessoas passaram presas sendo esse

mais um motivo para que os operadores lidem com a prisão provisória com toda a

responsabilidade que exigem suas funções.

Essa política de Estado agrava o problema carcerário brasileiro, pois o desdobramento mais

direto dessa opção é a formação de espaços de tensão e violência dentro e fora das prisões.

Impactos da prisão provisória

As pesquisas, especialmente aquelas que atuaram diretamente na assistência a presos,

puderam observar mais de perto o impacto da prisão provisória não só na vida dos presos e de

seus familiares, mas também no sistema de justiça criminal, para o Estado e para a sociedade.

Estima-se que, por ano, 10 milhões de pessoas sejam presas provisoriamente no mundo.

Os presos provisórios representam 1/3 de toda população carcerária mundial. A taxa de presos

provisórios é de 40 por 100 mil habitantes no mundo, que varia entre diferentes regiões e países

(OSI, 2011). Muitos são os prejuízos do uso excessivo da prisão provisória apontados, em

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diferentes níveis. Para os indivíduos presos e suas famílias, tem-se: (i) perda do emprego e

redução da empregabilidade pós-detenção; (ii) formação educacional ou profissional interrompida

e dificilmente retomada; (iii) e, como muitos dos presos provisórios possuem família, acabam por

deixá-las desassistidas. Com relação aos impactos socioeconômicos para comunidades bem como

para o Estado, verifica-se que a prisão provisória leva à: (iv) exposição a doenças quando na prisão,

como HIV; (v) recursos mal gastos em policiamento e segurança pública para redução da

criminalidade; (vi) custos para a manutenção do sistema penitenciário e a ampliação do mesmo.

Apresenta custos indiretos para o Estado, tais como: (vii) perda de força de trabalho e capital

humano; (viii) perdas na arrecadação de impostos; (ix) recursos gastos com a prisão deixam de ser

aplicados em outros programas sociais etc.

A pesquisa do ITTC/Pastoral Carcerária relata uma série de casos acompanhados pelo

projeto nos quais pessoas que poderiam estar em liberdade eram mantidas presas, em condições

insalubres e desumanas que acabavam envolvendo essas pessoas em situações de violência, maus

tratos, discriminação e exploração no interior das unidades prisionais, especialmente aquelas

dominadas por organizações criminosas.

O uso excessivo e arbitrário da prisão provisória impacta diretamente e indiretamente na

sociedade e no Estado como um todo. Os presos, submetidos a prisões indevidas, podem perder

seus empregos e residências; contrair e transmitir doenças; receber ofertas de corrupção para

serem liberados ou obterem melhores condições de detenção e sofrer tortura e danos físicos e

psicológicos que podem perdurar para além de seu tempo de prisão. O uso execessivo da prisão

provisória alimenta um ciclo que perpetua a exclusão, a violência, e a prática sistemática desse

dispositivo como resposta imediata a problemas que exigem políticas públicas complexas.

A prisão provisória, em tese, somente deveria ser utilizada como último recurso, e ainda

sim, a partir de determinados critérios. Para crimes considerados leves e não graves, não caberia

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esse tipo de recurso. Essas prisões acabam onerando ainda mais o Estado. Há enorme

desproporção do custo econômico da prisão para esses tipos de crime. Casos acompanhados pelo

Projeto ARP (2011, p.32), todos referentes a tentativas de furto (artigo 155 do Código Penal),

podem exemplificar os custos que estão presentes nessas prisões:

Processo: 0235096-41.2010.8.19.0001 Bens: R$ 12,00 (em espécie) Data da prisão: 22/07/2010 Alvará em 19/10/2010 (condenado a 8 meses de reclusão em regime aberto) Tempo de prisão: 4 meses Custo da Prisão: R$ 6.000,00

Processo: 0031743-40.2011.8.198.0001 Bens: uma bolsa com documentos pessoais (sem avaliação) Data da prisão: 02/02/2011 Alvará: 29/03/2011 Tempo de prisão: 1 mês e 27 dias Custo da prisão: aproximadamente R$ 3.000,00

Outro caso, acompanhado pelo ITTC/Pastoral Carcerária (2012, pg.91-94), ilustra os

impactos da prisão:

Um caso bastante emblemático na atuação do Projeto Tecer Justiça foi o do jovem P., atendido pela primeira vez no dia 19 de outubro de 2010 no CDP I de Pinheiros, quando se iniciou um acompanhamento que incluiu diversos recursos aos tribunais superiores e contatos familiares. P., que é natural da Bahia, estava em São Paulo havia poucos meses. Veio para trabalhar como cabeleireiro (...). Era primário, nunca havia sido sequer processado, mas em 16 de outubro de 2010 (...) foi preso acusado de ter roubado um real e um bilhete único (bilhete de transporte público da capital) – sem crédito comprovado – mediante ameaça verbal, sem uso de arma. P. permaneceu 06 meses e 12 dias preso antes da sentença. (...) Vários pedidos de liberdade foram elaboradores pelo Projeto do ITTC/Pastoral Carcerária, sem sucesso. Durante o período que ficou preso, em função de sua orientação sexual, P. começou a receber diversas ameaças dentro do CDP I de Pinheiros, sendo então extorquido por um grupo de presos pertencentes a uma organização criminal, presente naquela unidade. Assim, sua mãe recebeu ligações de dentro da cadeia exigindo que depositasse a quantia de duzentos reais numa conta corrente, o que foi feito por duas vezes consecutivas. Foi então que P. conversou com a equipe do

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projeto e pediu para interceder por ele, solicitando sua transferência para outra unidade prisional. P. foi, então, transferido para o CDP II de Pinheiros, local que “aceita” presos homossexuais. (...) a mãe do acusado, que residia em Salvador, esteve duas vezes em São Paulo, despendendo enorme esforço financeiro e psicológico para ver seu filho, tendo recebido apoio da equipe naquilo que foi possível realizar. Em 28 de abril de 2011, P. foi enfim julgado, sendo condenado à pena de 05 anos e 04 meses de reclusão em regime inicial fechado, por infração ao delito de roubo de um real e um bilhete único, mediante ameaça verbal, sem uso de arma, mas qualificado por concurso de agentes. Ocorre que, como P. era primário (tendo sido reconhecido pela própria juíza que o condenou como possuidor de bons antecedentes), e sendo a pena fixada em 05 anos e 04 meses de reclusão, o regime inicial para o cumprimento deveria ter sido o semiaberto (...). Porém, a juíza do caso fixou o regime fechado para cumprimento inicial da pena, utilizando-se para tanto de argumentações sobre a gravidade em abstrato do delito de roubo que, nas palavras da juíza, “tanto aterroriza a população desta cidade”. A juíza afirmou ainda que o regime fechado se justificaria porque o delito teria sido cometido “em plena luz do dia”, demonstrando que o agente agira de forma “ousada”. Pela legislação brasileira, porém, são os delitos cometidos no período do repouso noturno que têm merecido maior reprimenda penal, como o estereotipado caso do furto noturno cuja pena é mais alta do que o mesmo crime cometido em plena luz do dia (artigo 155, §1ª do CP). Enquanto a equipe do Projeto atuava em favor de P, ele vivia na pele as opressões do cárcere, contraindo tuberculose no interior de uma cela superlotada, e como já era HIV positivo, sua saúde ficava extremamente debilitada, chegando a pesar míseros 42 kg. Após cumprir 11 meses de prisão e com a saúde extremamente debilitada, P. recebeu o benefício de cumprir o restante da pena em regime semiaberto. Porém, a decisão proferida em 9 de setembro de 2011 por um magistrado do mutirão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) permanece apenas no papel, e, 02 meses e meio após receber o benefício, P. ainda permanece trancado integralmente no regime fechado dentro de um centro de detenção que, a princípio, deveria ser provisório.

A prisão provisória de mulheres tem impacto específico. Cada vez mais as mulheres são as

provedoras do lar. Das pessoas pesquisadas no estudo do ITTC/Pastoral Carcerária, 53% dos

homens disseram que tinham filhos, enquanto 81,2% das mulheres tinham filhos e 14,1% delas

com 5 filhos ou mais. Mais de 64% das mulheres declararam ser solteiras, divorciadas ou viúvas e

que não têm companheiros ou esposos para dividir o sustento da família. Esse resultado pode

indicar que muitas delas eram chefe de família e portadora da guarda de filhos menores, o que

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certamente contribui para que sua prisão (com a consequente ausência de atenção às suas

especificidades) redunde em efeitos sociais ainda mais perversos.

Desigualdade no tratamento jurídico

Para além da seletividade da polícia no momento da prisão -como ficou demonstrado no

primeiro eixo desse documento - foi possivel perceber também que ela é reproduzida no sistema

de justiça criminal. Algumas das pesquisas também observaram a presença uma seletividade que

leva em conta a condição socioeconômica dos acusados. Um caso, trazido pela ARP, pode

contribuir para ilustrar:

(...) O órgão do Ministério Público, em sua douta promoção, entendeu com muita propriedade pela desnecessidade de se manter custodiada a indiciada, uma vez que a mesma possui residência fixa, ocupação lícita, é esposa de militar e é mãe de uma filha de 3 anos. A despeito da reprovabilidade da conduta da acusada, a toda evidência mostram-se ausentes os pressupostos que acenam para a necessidade da manutenção da prisão, elencados no artigo 312, do Código de Processo Penal, mormente quando esta viria a representar, para a indiciada, de pouca periculosidade, o convívio desumano com a superpopulação carcerária, inegável e triste realidade (...) (ARP, 2011, p. 28). (...) Da análise dos autos, extrai-se que a indiciada teria tentado subtrair 12 (doze) latas de Sustagem, sendo que possui uma outra anotação por furto e conforme bem analisado pelo Dr. Promotor de Justiça, não apresentou comprovante de residência e nem comprovante de atividade laborativa lícita. E mais. A instrução está se iniciando, o que acarretaria prejuízo a esta, daí brotar a necessidade da manutenção da custódia cautelar para o resguardo da ordem pública (ARP, 2011, p. 28).

Esses dois casos evidenciam as diferenças de abordagem quando percebemos o perfil

socioeconômico das envolvidas. Para a ré com condições financeiras precárias, a prisão durante o

processo foi considerada “necessária e legítima”, enquanto para a “esposa de militar”, foi

considerada não só “desnecessária à manutenção da ordem pública”, mas também como uma

experiência “desumana”.

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Projetos de assistência

Conforme ressaltado pelas pesquisas, o direito de defesa é garantido pelo processo penal

brasileiro e possui status de garantia constitucional assegurada a todos os acusados, réus e

condenados. Contudo, na prisão em flagrante ou na fase de inquérito, que antecedem a

instauração do processo penal propriamente dito, não há obrigatoriedade da presença de um

defensor. A justificativa para isso é que as chamadas provas repetíveis, por exemplo, os

depoimentos de testemunhas, serão realizadas outra vez diante do juiz, momento em que a

presença do defensor será obrigatória.

No entanto, as pesquisas que atuaram diretamente com a assistência juridica aos presos

destacaram a importância da presença do defensor já na fase de inquérito, pois quanto mais

próxima do momento da prisão, a defesa técnica pode ter um impacto positivo não somente para

a pessoa assistida, mas também para a justiça criminal na fase processual em geral. Exemplos de

várias partes do mundo revelam que intervenções próximas ao momento da prisão podem reduzir

o uso da prisão provisória, melhorar o desempenho dos operadores do sistema de justiça criminal

e provocar decisões mais racionais e efetivas, além de elevar o nível de responsabilização e

respeito pelo Estado de Direito.

Na Nigéria, por exemplo, um acordo entre a Força Policial Nacional e o Legal Aid Council e a Open Society Justice Initiative estabeleceu em 2005 um projeto de assistência jurídica em grandes distritos policiais em quatro estados, com assistência imediata ao preso. Ao final de 08 meses, 611 pessoas em custódia da prisão e 644 pessoas em custódia da polícia foram libertas. O período médio de prisão provisória foi reduzido de 609 para 171 dias (OSI, 2012).

Contudo, as pesquisas revelam que, especialmente nos casos em que os acusados

dependem de defesor público, esse contato pode demorar até a realização da primeira audiência,

que pode ocorrer mais de 03 meses após a prisão (NEV-USP, 2011).

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No Rio de Janeiro, a ARP (2011) constatou que o atendimento jurídico da Defensoria

Pública só começa efetivamente quando da audiência especial em que o acusado toma

conhecimento da denúncia-crime feita pelo Ministério Público, o que ocorre, via de regra, cerca de

20 dias após a prisão. Até esse momento, portanto, o processo tramita exclusivamente entre o juiz

e o promotor de justiça. Como também já se viu, parcela significativa dos presos em flagrante,

acusados de praticar crimes sem violência ou grave ameaça à pessoa, é assistida pela Defensoria

Pública estadual, o que já diz muito sobre a condição econômica desses presos e sobre as suas

chances de usufruir do direito à liberdade durante o processo.

PROJETO DA ASSOCIAÇÃO PELA REFORMA PRISIONAL

Parte do projeto teve como objetos a assistência jurídica aos presos em flagrante, logo após a

prisão, com a finalidade de fazer o pedido de liberdade e o acompanhamento de casos

semelhantes cuja assistência jurídica fora prestada pela Defensoria Pública e/ou advogados

particulares.

O atendimento jurídico prestado pelos advogados27 do projeto e um assistente social28 teve como

objetivos: abreviar o tempo de permanência na prisão, por meio da formulação de pedidos para

que os acusados respondessem ao processo em liberdade; demonstrar a necessidade de expansão

do trabalho da Defensoria Pública junto aos presos provisórios visando à redução dos custos

sociais e econômicos desse tipo de encarceramento e identificar os obstáculos existentes no

trâmite em juízo dos pedidos de liberdade.

Foram acompanhados 575 casos de pessoas presas em flagrante atendidas pela Defensoria

Pública, advogados particulares e advogados que atuaram pelo projeto de pesquisa. Os advogados

27

Cinco advogados prestaram a assistência jurídica no período de junho de 2010 a junho de 2011. 28

De acordo com o relatório do projeto da ARP, houve a necessidade de incorporar uma assistente social à equipe para o relacionamento com as famílias dos presos e a obtenção dos comprovantes de residência e de emprego exigidos pelos juízes.

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do projeto abordaram 278 pessoas, entretanto, realizaram os pedidos de liberdade para 148

presos provisórios. Foram atendidos somente presos em flagrante acusados de praticar crimes

contra o patrimônio sem violência ou grave ameaça à pessoa e delito de tráfico privilegiado. Para

todos os casos foi utilizado como marco temporal 20 dias após a prisão em flagrante (prazo que a

ARP considerou razoável para haver um pedido de liberdade, bem como a expedição do alvará de

soltura).

Na comparação geral, os advogados do projeto conseguiram liberar 25% dos seus assistidos, e, na

comparação específica com a Defensoria, os advogados do projeto liberaram 30,6% dos assistidos

dentro do prazo de referência do total de atendidos, ao passo que a Defensoria obteve alvará de

soltura para 13,7%.

Das 339 pessoas acompanhadas cujos processos tinham sentença apenas 30% foi condenada a

uma pena privativa de liberdade. Ou seja, pelo menos 2 em cada 3 desses presos deveriam ter

respondido o processo em liberdade.

A partir desse Projeto foi possível constatar que: a assistência jurídica logo após a prisão em

flagrante contribui para a obtenção da liberdade; a prisão provisória, que deveria ser a exceção, é

a regra para os acusados de crimes sem violência ou grave ameaça à pessoa e de tráfico; juízes,

com o consentimento dos Promotores de Justiça, não asseguram aos presos provisórios o direito

de responder ao processo em liberdade. Constatou-se ainda que vários aspectos contribuem para

o uso indevido da prisão provisória e a inobservância do Princípio da Presunção de Inocência,

dentre os quais se destacam: burocracia do sistema de justiça criminal que impõe uma demora na

apreciação do pedido de liberdade, ausência de assistência de um defensor no momento da

prisão, decisões judiciais sem fundamentação adequada para justificar a privação da liberdade

durante o processo e a cultura punitiva dos juízes que usam a prisão provisória como antecipação

de pena.

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PROJETO ITTC E PASTORAL CARCERÁRIA

O Instituto Terra, Trabalho e Cidadania e a Pastoral Carcerária desenvolveram o Projeto Tecer

Justiça: repensando a prisão provisória. Empreendido entre junho de 2010 e dezembro de 2011, o

projeto atendeu e defendeu técnicamente presos(as) provisórios(as) recém-incluídos(as) no

Centro de Detenção Provisória I de Pinheiros e na Penitenciária Feminina de Sant’Ana.

O Projeto se propôs a abordar o acesso à justiça a partir de uma experiência concreta de

intervenção judiciária em favor de presos provisórios no momento da prisão e proceder às

medidas cabíveis. Teve por objetivos:

→ Melhorar as condições de vida da população provisoriamente presa por meio da realização de

contato com familiares para solicitar alimentos, roupas, cobertores, material de higiene pessoal e

demais itens necessários.

→ Identificar e acompanhar pessoas presas acometidas de transtorno mental ou usuárias de

drogas, tomando as providências que o caso exigisse.

→ Dar atenção especial aos pequenos furtos e outros crimes de menor gravidade, já que as

particularidades dessa situação permitem prever maior chance de deferimento do pedido de

liberdade.

→ Construir o perfil da população atendida (situação socioeconômica, familiar e de saúde).

Fornecer dados empíricos relativos à experiência do atendimento de modo a subsidiar o

planejamento e a execução de políticas públicas.

→ Contribuir especialmente para o fortalecimento da Defensoria Pública do Estado, evidenciando

a absoluta necessidade de mais defensores para a assistência de pessoas presas e, também, a

necessidade de melhor utilização de recursos.

A equipe do projeto foi composta por advogados, estagiários do direito, cientistas sociais e

assistente social. Foram realizados cerca de 1050 pedidos jurídicos em 561 processos judiciais.

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Constatou-se que o acesso imediato ao defensor público assegura não somente o acesso à justiça,

mas também a preservação dos direitos fundamentais e a coibição da tortura contra a pessoa

presa. Notou-se falta de clareza, presente nos discursos dos entrevistados, quanto à qualidade da

custódia (cautelar ou pena), a revelar que a prisão provisória é ordinariamente percebida como

pena entre os presos.

O projeto mostrou, ainda, quão decisiva é a postura dos atores do sistema de justiça criminal,

incluindo a polícia. Juízes e promotores – e também defensores públicos – corroboram a

seletividade e a violência promovidas pelas polícias e raramente questionam a necessidade da

prisão cautelar. Há grande resistência dos operadores, que não se dão ao trabalho nem mesmo de

atentar para o caso concreto, emitindo cotas e decisões caracterizadas pela generalidade e pela

pobreza argumentativa.

Verificou-se, durante a intervenção, que o argumento em favor da segurança e da preservação da

disciplina quase sempre prevalece em detrimento dos direitos dos presos, em especial o direito às

assistências material e jurídica e à saúde. A quantidade de violações dos direitos dos presos

presenciada pela equipe sugere a necessidade de um maior controle sobre o sistema prisional e o

judiciário, mecanismo necessário e que talvez tenha de ser independente.

O Projeto revela ainda a importância do atendimento imediato de recém-ingressos no sistema

penintenciário: i) assistência social (levantamento de documentos e contato com a família);

identificação de problemas de saúde e uso de drogas; identificação de violência policial, uma vez

que o trabalho do IML é cheio de lacunas e; ii) assistência jurídica, informando o réu sobre sua

condição e possibilitando um pedido de liberdade ou relaxamento melhor fundamentado.

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EIXO 3 - DROGAS

O número de presos por tráfico de drogas cresce a cada ano. De acordo com os dados

fornecidos pelo Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), em 2006, primeiro ano de vigência

da Lei nº 11.343/06, havia 47.472 presos por tráfico de drogas no Brasil, valor que representa 14%

dos presos por todos os crimes. Já em 2011, foram 125.744 presos por este delito, número 164%

maior que em 2006 e que corresponde a 24% de todos os presos do sistema.

Gráfico 3 - Presos por crime de tráfico, Brasil, 2006-2010.

Fonte: Depen/MJ

Já no que diz respeito ao número de presos provisórios por tráfico de entorpecentes não

há informações públicas oficiais disponíveis. No entanto, os dados e reflexões fornecidas pelas

pesquisas apoiadas pela Open Society Foundations sugerem que tal delito figura entre os

responsáveis pelo alto número de presos provisórios no sistema penitenciário brasileiro.

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Os aspectos explorados pelas pesquisas referem-se ao conteúdo impresso na Lei nº

11.343/06, sua aplicação e percepções de representantes da segurança pública e do sistema de

justiça criminal com respeito ao comércio de drogas ilegais, traficantes, prisão provisória etc.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisa – Cidade do Rio de Janeiro

ARP- Impacto da Assistência Jurídica a Presos Provisórios (2011)

95% dos presos entrevistados estavam respondendo por um único crime, sendo 27% por tráfico de

drogas.

32,6% das pessoas presas em flagrante são acusadas por tráfico de drogas.

Pesquisas – Cidade de São Paulo

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

23% dos denunciados foram presos em flagrante por tráfico de drogas.

O primeiro ponto a ser destacado diz respeito à definição de usuário e traficante de drogas

presente na lei e suas respectivas penas. Uma das mudanças em relação à lei anterior (6.368/76)

foi a de não punir o usuário de drogas com pena de privação de liberdade. No entanto, tal

mudança impôs critérios vagos para a classificação de quem se enquadra como traficante ou como

usuário. A falta de objetividade nessa distinção traz, de um lado, inúmeras implicações para o

cotidiano dos profissionais da segurança pública e da justiça criminal, conforme entrevista de um

delegado concedida ao NEV-USP.

Não temos uma diferenciação muito clara entre traficante e usuário e não sei se o legislador vai conseguir fazer isto porque hoje em dia as pessoas são apreendidas com 15g de maconha, etc. É para uso próprio, é para uso dos amigos ou é pra vender? Então, esta diferenciação nós não temos na legislação. E eu não sei se a lei é capaz de nos dar esta nitidez (NEV-USP, 2011, p.108).

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Conforme conclusão apresentada pela mesma pesquisa não se estabeleceu um consenso

em relação ao que significa cada critério previsto na lei para distinção entre o artigo 28 (porte para

uso) e o artigo 33 (tráfico). Sintoma disso está na identificação de um conflito entre os

entendimentos das polícias civil e militar sobre a ocorrência, identificado por um policial militar:

“às vezes acontece da Polícia Militar levar pra Delegacia de Polícia como traficante, mas o

delegado liberar porque fala que o cara é usuário, mas não sei não” (NEV-USP, 2011, p.111).

De outro lado, as dificuldades de se distinguir na prática quem é usuário de quem é

traficante acarretam prejuízos na vida de cidadãos brasileiros que foram confundidos com

traficante de drogas e ficaram presos erroneamente, como revelam denúncias de casos feitas por

organizações da sociedade civil como o Banco de Injustiças

(http://www.bancodeinjusticas.org.br/).

A complexidade da diferenciação entre usuário e traficante pode ser colocada em pauta

nas referidas pesquisas por meio do contexto das informações coletadas acerca da abordagem

policial e do perfil sociodemográfico dos acusados por tráfico de drogas. As pesquisas realizadas

em São Paulo pelo NEV-USP, ISDP e ITTC/Pastoral Carcerária revelam semelhanças de perfil,

seguindo o padrão encontrado em outras modalidades criminais. Conforme visto no eixo 01 da

presente publicação, os presos provisórios por tráfico de drogas são em sua maioria: jovens, do

sexo masculino, pardos e pretos, com baixa escolaridade e renda.

Vale apontar que um número considerável de presos por comércio ilegal de entorpecentes

diz ser usuário de drogas. Isso chama atenção pelo fato de tais pessoas serem usuárias presas

como traficantes ou se encaixarem na modalidade de pessoas que traficam para sustentar o vício.

Neste ponto, destaca-se a falta de uma política específica no sistema penitenciário para lidar com

este perfil.

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DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisas – Cidade de São Paulo

NEV-USP - Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

30,6% dos acusados alegam serem usuários de drogas

ITTC/Pastoral Carcerária - Tecer justiça (2012)

46,3% dos acusados por tráfico de drogas alegam serem usuários de drogas

A pesquisa do ISDP revela que 11% das pessoas em situação de rua presas em flagrante em

São Paulo o foram por tráfico de drogas. Este dado nos coloca a questão a respeito da categoria

usuário-traficante e da associação imediata que juízes e promotores fazem entre tráfico de drogas,

crime organizado e periculosidade do delito. Como se verá adiante, parte considerável dos

entrevistados cria esta “receita” para justificar a necessidade da prisão provisória. Quais vínculos

são possíveis de se estabelecer entre um morador em situação de rua e o crime organizado? As

pesquisas indicam que este perfil de apreendidos ou eram usuários ou traficavam pequenas

quantidades de drogas, dessa forma contestando a assertiva por parte das autoridades públicas

quanto à periculosidade do fato.

Já a despeito da predominância masculina entre os presos provisoriamente por tráfico de

drogas, a partir de dados do Depen é possível constatar um crescimento no número de mulheres

presas por este delito no sistema penitenciário brasileiro e crescimento com relação ao número

total de presas, conforme gráfico elaborado pela ARP (2011).

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Gráfico 4 – Total de mulheres presas e mulheres presas por tráfico de drogas no sistema

penitenciário brasileiro – 2005 a 2010

Fonte: Depen/MJ

Outra questão a respeito do perfil sociodemográfico é a presença de jovens menores de

18 anos. Na pesquisa realizada pelo NEV-USP foi constatado que em 11% das ocorrências foram

apreendidos adolescentes. O número de adolescentes identificados na coleta diz respeito àqueles

que foram apreendidos com os adultos no momento do flagrante. Não se teve informação a

respeito dos flagrantes que tenham envolvido somente adolescentes, pois esses casos seguem

para a Vara da Infância e Juventude. Ainda com relação a este tema, a reflexão proposta no

relatório do ITTC/Pastoral Carcerária torna a questão ainda mais complexa:

O procedimento de construção da figura do traficante, aliado ao enrijecimento da Lei de Drogas, tem gerado o encarceramento massivo dos jovens pobres das periferias, que são mais facilmente cooptados para atuarem no varejo do tráfico de entorpecentes, uma vez que isso se mostra muito mais lucrativo do que os poucos e precários postos de trabalho oferecidos pelo mercado e com ganhos mais condizentes com as necessidades de consumo (ITTC/PASTORAL CARCERÁRIA, 2012, p.68).

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Quanto ao registro de antecedentes criminais, os dados coletados pelo NEV-USP e

ITTC/Pastoral Carcerária se aproximam, ressaltando que a maioria dos acusados por tráfico de

drogas não apresenta antecedentes criminais.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisas – Cidade de São Paulo

NEV-USP - Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

57,3% dos apreendidos por crime de tráfico de drogas não tem antecedentes criminais

ITTC/Pastoral Carcerária - Tecer justiça (2012)

65,3% dos apreendidos por crime de tráfico de drogas não tem antecedentes criminais

Já o dado apresentado pelo ISDP afirma que no tráfico de drogas, a trajetória dos presos

em outros crimes é a mais cambiante, notando-se que embora prevaleçam antecedentes por

tráfico (24%), o roubo aparece como modalidade igualmente predominante entre aqueles que

tinham antecedentes, representando 22% de seus antecedentes.

Visando a completar o retrato dos casos de flagrante em tráfico de drogas e dessa forma

conhecer um pouco mais sobre o tipo de tráfico processado pelo sistema de justiça criminal, bem

como suas características mais afeitas ao varejo ou atacado (ISDP, 2012), assim como o papel

desempenhado pelas forças de segurança, foram coletadas informações sobre o contexto das

ocorrências: quem e como foi efetuada a prisão, quantidade de drogas apreendidas etc.

As pesquisas realizadas em São Paulo revelam um padrão. Os flagrantes de tráfico de

drogas em sua grande maioria:

São realizados por Polícias Militares em via pública e em patrulhamento de rotina;

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Não há a presença de conflitos, apreensão de armas de fogo e registra-se ausência de

menção a organização criminosa;

Apreende-se apenas uma pessoa por ocorrência.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisas – Cidade de São Paulo

NEV-USP - Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

85,6% dos flagrantes em tráfico de drogas foram realizados pela Polícia Militar.

82,3% dos flagrantes em tráfico de drogas foram realizados em via pública.

62,3% dos flagrantes em tráfico de drogas foram realizados em patrulhamento de rotina.

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

71,9% dos flagrantes de drogas foram realizados pela Polícia Militar.

Ainda a este respeito, a pesquisa do ISDP revela que o “tráfico de drogas é o crime em

que a prisão por patrulhamento/abordagem policial é a forma predominante, chegando a

representar 43,05% das prisões em contexto da abordagem”.

Outra informação importante a ser frisada dada a controvérsia gerada é o da abordagem

realizada na residência das pessoas apreendidas. Trata-se de situações em que policiais motivados

por denuncia anônima, ou patrulhamento de rotina entram em residências particulares,

supostamente autorizados pelos próprios acusados ou por outras pessoas e lá encontram drogas.

Dados da pesquisa do NEV-USP revelam que em 17,50% dos casos houve entrada na residência, ou

entrada franqueada, como a chamam alguns operadores. É digno de nota que dentre esses

17,50% de casos, 12,50% dos flagrantes foram realizados diretamente na residência e outros 5%

são casos em que a entrada na residência se deu depois da abordagem em via pública, não sendo

a residência o local onde se iniciou a ocorrência.

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Os entrevistados pela pesquisa do NEV-USP foram questionados sobre essa prática.

Alguns responderam que a entrada na residência é legítima porque o tráfico é considerado crime

permanente. Portanto, se o policial encontra drogas na casa do suspeito a abordagem consistiria

em um flagrante. Para um promotor entrevistado, a entrada franqueada não é ilegal desde que

“confirmada a ação delituosa”. Segundo ele:

Se o sujeito guarda entorpecente dentro de casa pra fins de comércio ele comete um crime e isto autoriza a entrada na casa dele, isto é uma das circunstâncias que autoriza a entrada na casa de alguém. Não dá pra gente afirmar que todos os casos sejam legais ou ilegais, tem que ser visto caso a caso. (NEV-USP, 2011, p.40)

Desse modo, para que a entrada na residência de determinado suspeito seja considerada

legal há a necessidade da “certeza” de que o sujeito guarda drogas em sua casa. “Nos casos em

que o policial entra na casa da pessoa e não encontra droga, daí ele pode responder por abuso de

autoridade”, alegou um policial militar entrevistado, que acrescentou:

Às vezes, para que a entrada não seja considerada ilegal, o policial diz que estava perseguindo o suspeito cujo flagrante já havia sido feito. Porque se o policial não achar nada, colocou sua profissão e sua liberdade em risco. O comandante instaura com certeza o inquérito para averiguar. Às vezes o próprio traficante foge e vai à delegacia dizendo que a Polícia Militar invadiu sua casa. O contrário também ocorre, com certeza se o policial não encontrar nada ele vai sair que nem um louco pra achar droga, nem que seja um pino. (NEV-USP, 2011)

O entrevistado reconheceu que se o policial entra na casa da pessoa sem indícios do

crime ele corre o risco de sofrer um processo por abuso de autoridade (NEV-USP, 2011). Na

contramão dessa tese, uma sentença proferida em 2002 sustenta a necessidade de mandado

judicial em casos de crimes permanentes em respeito aos direitos básicos consagrados na

constituição brasileira:

O argumento de se tratar de crime permanente não permite que o Estado, arbitrariamente, invada domicílios e faça busca sem o consentimento do morador ou sem autorização judicial. Justamente por se tratar de crime permanente é que recaem

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sobre a autoridade oficiante o dever e a responsabilidade de acercar-se de todas as cautelas visando o correto desempenho de sua função. Ora, se os agentes policiais tinham tanta certeza assim da prática de tráfico levada a efeito pelo paciente, imperioso é exigir-se que tivessem eles se acautelado e se municiado do indispensável mandado judicial para assim convalidarem o ato de busca domiciliar e apreensão e objetos. A invasão é ato de barbárie e merece a mais enérgica dos poderes constituídos. Perante a autoridade policial, o paciente não afirma ter autorizado a entrada ou permanência dos agentes policiais em sua moradia, muito embora os seus condutores declarem no auto de prisão em flagrante ela ter sido franqueada. Na dúvida, fico com o silêncio do paciente que antes que mais nada se traduz em negativa de autorização (TJ GO – 1ª Câmara Criminal – HC 19.268 – 0/217 – Rel. Paulo Teles – j. 19.03.2002 – Revista Síntese 14/95).

No que se refere ao número de pessoas presas em flagrantes por tráfico de drogas por

ocorrência, a mesma pesquisa citada acima aponta que em 69% dos casos apreendeu-se apenas

uma pessoa por ocorrência. Já a respeito da quantidade de drogas apreendidas por ocorrência, as

pesquisas realizadas em São Paulo indicam pequenas quantidades de drogas e dinheiro para um

comércio classificado como de pequeno porte, voltado para o varejo.

DADOS DAS PESQUISAS

Pesquisas – Cidade de São Paulo

NEV-USP - Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

Em 62,1% das ocorrências foram apreendidas até 100 gramas de drogas

A média das apreensões foi de 66,5g de drogas

A Polícia Militar foi responsável por 90,62% dos casos em que houve as menores apreensões de

drogas.

Além de drogas, na maior parte dos casos, as pessoas detidas estavam de posse de

dinheiro ou outros objetos que, para os operadores, seriam outras evidências de traficância.

A gente, com o dia-a-dia de patrulhamento, geralmente sabe o local de maior incidência de tráfico. No momento da abordagem a gente identifica o local, antecedentes, dinheiro trocado, droga independente da quantidade, a presença de usuários. A partir do

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momento em que você identificou estes elementos trata-se de um crime de tráfico (NEV-USP,2011, p.51).

NEV-USP - Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

Em 33% dos casos de tráfico de drogas não foi apreendido dinheiro

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

Em 34% dos casos de tráfico de drogas não foi apreendido dinheiro

Foi observado que os contextos das apreensões não são permeados por confrontos entre

policiais e traficantes, a baixa porcentagem de apreensão de arma de fogo ou outro tipo reforçam

esta informação:

NEV-USP - Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

Em 3% das prisões em flagrantes por tráfico de drogas houve apreensão de arma de fogo.

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

Em 6,5% das prisões em flagrantes por tráfico de drogas houve apreensão de armas

Tais dados vão na contramão da percepção sobre este crime e da justificativa de punição

ao traficante de drogas apresentados por parte dos entrevistados na pesquisa Prisão Provisória e

Lei de Drogas do NEV-USP. Ainda nesse sentido, revela-se a baixa menção nos autos de prisão em

flagrante analisados ao envolvimento com organizações criminosas.

NEV-USP - Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

Em 94,3% dos casos não houve menção a organização criminosa

Para alguns entrevistados essa falta de menção à organização criminosa é resultado da

própria atuação de repressão ao tráfico, pois ela estaria especialmente voltada para o pequeno

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traficante, que não necessariamente faz parte de organização criminosa. De acordo com diversos

policiais militares e civis, tem-se a sensação de “enxugar gelo”, pois prende um traficante hoje e

no dia seguinte já há outro. Já um juiz relata que a justiça acaba trabalhando somente com o que é

levado pela polícia, que só pega as pessoas miúdas. Para ele “é o pequeno traficante que é

atingido e não a organização criminosa”.

Ao cruzarmos os padrões fornecidos pelas pesquisas acerca do perfil sociodemográfico

dos presos em flagrantes por tráfico de drogas e das ocorrências nas quais ocorreram as prisões é

possível questionar a política de combate a este delito desempenhada pelas autoridades públicas

quanto à eficiência, eficácia, os custos e as consequências desse modelo. Esta estratégia de

combate, expressa de forma ambígua no sentimento colocado por grande parte dos profissionais

entrevistados - “enxugar gelo, mas necessária” -, além de ter se mostrado ineficiente, pois, “após

apreendidos, os jovens são logo substituídos por um exército de reserva”, produz apenas o

aumento da massa carcerária, aprofundando a crise do já fracassado sistema carcerário (NEV-USP,

2011).

Diante da evidente baixa atividade investigativa, de responsabilidade da polícia civil, nos

casos de drogas, assim como em casos envolvendo outros delitos, a pesquisa do ISDP destaca a

seguinte questão para reflexão:

(...) é mais efetivo prender em flagrante ou investigar e realizar prisões mais direcionadas a crimes mais graves e organizados? Do ponto de vista da segurança pública, prender mais em flagrante, que, como vimos, abrange a criminalidade do varejo, tem impactos mais significativos do que a prisão realizada após o trabalho de investigação e inteligência policiais? (ISDP, 2012, p.37)

Outro aspecto problemático da Lei nº 11.343/06 apontado pelas pesquisas é a aplicação

do artigo 44, que veda a possibilidade de liberdade provisória àqueles que se enquadram como

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traficante de drogas29. Em 2012, a resolução 5 do Senado Federal suspendeu a execução da

expressão “vedada a conversão em penas restritivas de direitos” do referido artigo, seguindo com

atraso a decisão do Supremo Tribunal Federal que declarou referida vedação inconstitucional no

julgamento do Habeas Corpus 97.256/RS, em 2010. Como o período de coleta das pesquisas não

abarca a vigência da decisão do Senado e apenas a do STF, podemos afirmar que ela foi pouco

acatada por juízes de primeiro grau. Como bem notado pelo defensor público do estado de São

Paulo, Lucas Abrantes Pinheiro:

Com a resolução 5/12 do Senado, deixa de haver vedação abstrata de penas alternativas para condenados por tráfico na forma do artigo 33, § 4º, da Lei de Drogas. Caberá aos juízes, nesses casos, verificar o cabimento das penas restritivas de direitos na forma dos artigos 44 e seguintes do Código Penal (PINHEIRO, 2012).

A despeito dos casos de prisão em flagrante estarem referidos a pequenos traficantes

(quando não possíveis usuários), como observado anteriormente, a grande maioria deles são

mantidos presos até o julgamento.

De acordo com a pesquisa desenvolvida pelo ISDP, o tráfico de drogas figura como o

segundo delito em que a concessão de liberdade ao acusado é mais difícil (2%)1, superado apenas

pelo roubo (0,86%). Contudo, quando analisamos as rejeições ao pedido, o tráfico supera o roubo,

alcançando a maior cifra (71,3%) entre os tipos penais (ISDP, 2012).

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

Em 2,01% dos casos de tráfico de drogas foi concedida liberdade provisória

Em 3,10% dos casos de tráfico de drogas a prisão foi relaxada

Em 71,35% dos casos de tráfico de drogas não foi concedida liberdade provisória

Em 22,26% dos casos de tráfico de drogas não foi proferida decisão até o momento da denúncia

29

Art 44. Os crimes previstos nos arts 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas a restritivas de direitos.

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Durante o acompanhamento processual realizado pela pesquisa do NEV-USP foram

identificados os principais argumentos utilizados pelos juízes em suas decisões sobre o pedido de

liberdade provisória em casos que envolvem suposto tráfico de drogas. Dentre as justificativas

para a manutenção da prisão provisória, verificou-se que são mais frequentes30: (i) gravidade do

delito; (ii) garantia da ordem pública; (iii) garantia da aplicação da lei penal; (iv) hediondez do

crime; (v) conveniência da instrução criminal; (vi) quantidade de droga apreendida.

Apesar da jurisprudência do STF já ter pacificado o entendimento de que a gravidade em

abstrato do delito não autoriza a prisão31, pode-se verificar que muitos juízes utilizam esse

argumento como justificativa para a manutenção da prisão. Os magistrados, em algumas decisões,

esboçam opiniões sobre o tráfico, demonstrando que a lesividade do crime é considerada por eles

um fator importante para se decretar a prisão cautelar dos acusados por esse tipo de delito.

Argumenta-se que o tráfico “incentiva a criminalidade”, que ele é crescente, que “não tem

piedade dos familiares dos usuários” e desagrega famílias, que compromete a saúde pública, que

com este tipo de crime “a sociedade fica desprovida de garantias para a sua tranquilidade”, bem

como que é um crime que inquieta a população (NEV-USP, 2011). No entanto, quando

consideramos o perfil dos casos apresentados pelas pesquisas parece ser a gravidade no caso

concreto tratada mais de forma abstrata do que focada nas especificidades e condições pessoais

de cada um. Os operadores, nas sentenças e nos julgamentos, se referem aos traficantes como se

eles incorporassem todo o mal existente na sociedade, como se eles fossem, independente da

posição que ocupam na rede do tráfico e de suas trajetórias, o “inimigo"32 a ser combatido.

30

Destacam-se as justificativas na ordem de frequência em que elas aparecem. Entretanto, é preciso esclarecer que não se trata de um levantamento quantitativo e, assim, esses dados não permitem qualquer análise quantitativa. 31

A nova Lei 12.403/11 acrescenta a gravidade do delito como um dos elementos a serem observados para a aplicação das medidas cautelares, dentre elas a prisão provisória. 32

A este “inimigo”, ou “inimigo do direito penal” conforme Zaffaroni (2007) são negados direitos e sua condição de pessoas, é considerado como perigoso ou daninho.

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A pesquisa do NEV USP aponta também outros argumentos que justificam a manutenção

da prisão cautelar e explicam o elevado número de prisões provisórias: (i) o fato de todas as

prisões terem sido realizadas em flagrante, (ii) a previsão de que ao final o acusado será

condenado ao cumprimento de pena de detenção em regime fechado. Tal cenário agrava-se

quando revelado que é alto o número de casos em que inexistem pedidos de liberdade provisória

nos casos de tráfico de drogas, totalizando 48,2% dos casos levantados pela pesquisa do ISDP. Em

comparação com outros tipos penais, esse número está apenas abaixo do crime de roubo. Já a

pesquisa desenvolvida pelo ITTC/Pastoral Carcerária revela que em 70,5% dos casos de tráfico

coletados não houve pedido de liberdade provisória por parte da defesa na fase do DIPO. Já na

Vara Criminal, tal realidade inverte-se: em 89,5% desses casos houve pedido de liberdade

provisória. Interessante perceber que na amostra da pesquisa realizada pela ARP, no Rio de

Janeiro, o tráfico de drogas foi o crime que menos mobilizou pedidos de liberdade, com uma

porcentagem pequena de pedidos (30,4%) quando comparada aos demais crimes.

Ainda neste ponto é importante lembrar a posição defendida pelos promotores do

Ministério Público de São Paulo, conforme exposto em item anterior. A maioria dos pareceres é

contrária à concessão de liberdade provisória, totalizando 82,8% dos casos. Tal dado revela a

inclinação funcional do Ministério Público para atuar como órgão acusatório, em detrimento de

funções menos parciais no âmbito do processo penal.

Já no que se refere aos resultados do processo, a pesquisa do NEV-USP informa que 9%

dos acusados por tráfico de drogas não tiveram confirmada para si a tese apresentada pela

acusação, havendo desclassificação para uso ou absolvição. 93% dos acusados não tiveram o

direito de recorrer da decisão em liberdade, sendo que em 88,64% dos casos não foi concedido

sequer o direito de responder ao processo em liberdade. A mesma pesquisa sugere que isto pode

ter ocorrido porque há juízes que ao preverem a decisão que irão tomar ao final do processo,

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preferem manter o réu preso, demonstrando o caráter de antecipação de pena que reveste a

prisão provisória.

Os dados referentes à defesa do acusado por tráfico de drogas mais uma vez corroboram

a perspectiva, citada alhures, de que o perfil de traficante capturado pelo sistema repressivo

permanece como o do pequeno, sem recursos para contratar defensores particulares que

postulem a liberdade:

ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

40,1% dos acusados foram defendidos pela Defensoria Pública

Em 48,2% dos casos não houve pedido de liberdade provisória

NEV-USP - Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

60,85% dos réus foram atendidos pela Defensoria Pública

Outro fato interessante constatado pelas pesquisas do NEV e ITTC/Pastoral Carcerária

refere-se às penas aplicadas aos casos de tráfico de drogas. Para a maioria dos casos foi aplicada

pena menor do que 05 anos, tendo certa concentração na aplicação de 01 ano e 08 meses. A

aplicação de penas abaixo de 05 anos indica que uma parte significativa dos acusados são

primários e, assim, de baixa periculosidade, o que se apresenta como indicativo do baixo grau de

necessidade da prisão, especialmente a cautelar. Ademais, de acordo com dados coletados pelo

NEV-USP, considerando apenas a pena aplicada, em 58,73% dos casos seria possível falar em

substituição da privação de liberdade por pena restritiva de direitos, muito embora os dados

coletados pelo NEV-USP e ITTC/Pastoral Carcerária revelem sua baixa aplicação.

NEV-USP - Prisão Provisória e Lei de Drogas (2011)

Em 94,76% dos casos não houve substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de

direitos

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ISDP - Prisões em flagrante na cidade de São Paulo (2012)

Em 91,1% dos casos não houve substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos

Conforme afirmou um juiz aos pesquisadores do NEV-USP (2011, p.84) “a grande

mudança [em relação à prisão provisória] virá a partir desta decisão do Supremo sobre a

substituição de pena restritiva de liberdade por pena restritiva de direitos.” E não poderia ser

diferente, já que em uma análise de proporcionalidade, se, ao final do processo, já se reconhece o

direito ao cumprimento de pena restritiva de direitos, não faz sentido a manutenção da prisão

desse acusado durante o processo, quando ele ainda é presumido inocente. No entanto, a

possibilidade de substituição da pena por restritiva de direito é vista com resistência por diversos

profissionais, conforme se vê na fala de um dos entrevistados:

Acho um erro pensar em substituir pena de prisão pro traficante. É uma inversão de valores. O que é o tráfico? É um crime grave? Eu, pessoalmente, não acho o tráfico um crime grave. Eu não seria afetado pela conduta do tráfico: eu não uso drogas. Mas aqui não é só a minha convicção que vale, é minha convicção fundamentada. A vontade do juiz está aonde? Na Constituição Federal. A sociedade exige objetividade do juiz. E essa objetividade é buscada na Constituição Federal: crimes hediondos ou equiparados a hediondos tem que ter um tratamento diferenciado.

A breve exposição dos principais dados das pesquisas aponta que a política de

encarceramento foca em um perfil específico da população e que pouco ou nada afetou as

organizações criminosas, apenas fez aumentar o número de pessoas no fracassado sistema

carcerário. Um suspeito preso e que se enquadre no perfil descrito acima tem grande

probabilidade de condenação. Mesmo quando há uma considerável margem de dúvida, opta-se

pela punição.

Sobre esta política Pinheiro (2012) ressalta: "(...) o Brasil nunca teve tantos presos por

envolvimento com drogas e, mesmo assim, nunca enfrentou tamanha endemia no consumo de

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crack e de outras substâncias ilícitas. Como pode haver tanto consumo se tantos traficantes estão

presos?".

Nesse contexto, a prisão provisória posta como ferramenta para barrar este “mal” toma

feições de uma antecipação de pena ao acusado, no momento em que ele deveria ser

presumidamente inocente.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

As pesquisas desenvolvidas no Rio de Janeiro e São Paulo demonstram a utilização

abusiva e arbitrária da prisão provisória. Nesse sentido, os estudos revelam uma série de

desrespeitos a princípios constitucionais caros ao Estado de Direito, seja ao desconsiderar a

presunção de inocência dos acusados por parte dos operadores do Direito, seja pela ausência ou

insuficiência de acesso à justiça aos acusados, que se manifesta principalmente na ausência de

defesa ou em sua precariedade ao longo do processo.

Podemos afirmar que o acusado, no sistema de justiça brasileiro, já é considerado

culpado antes mesmo do início do seu julgamento. A ele é decretada a prisão preventiva sem que

se analise se estão presentes os pressupostos de cautelaridade e independentemente das

circunstâncias objetivas do caso concreto. O princípio de presunção de inocência é deixado de

lado, já que a maioria das pessoas presas é mantida em privação de liberdade de maneira

automática, como forma de antecipação da pena final, como se o estado de flagrância constituísse

em si prova suficiente da culpa. A desproporção dos presos em flagrante e condenados no sistema

prisional por tipo de delito, sobretudo nos casos de furto, indica o abuso da prisão provisória para

crimes de menor gravidade.

Outro ponto destacado pelas pesquisas é a prisão sistemática de pessoas que poderiam

responder ao processo em liberdade, especialmente aquelas que cometeram um crime sem

violência. Algumas das pesquisas chegaram a apontar os impactos dessas prisões desnecessárias

na vida, não apenas dos presos, mas de sua família e do próprio Estado, que gasta muito mais por

manter presa uma pessoa que poderia responder ao processo em liberdade.

O trabalho policial também foi objeto de reflexão desses estudos, que demonstram uma

política de segurança pública pautada em uma atuação extremamente repressiva, pouco

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investigativa e que tem por característica fundamental o fato de ser seletiva. Além disso, revelam

a persistência de práticas violentas e abusivas por parte da polícia. Vale ressaltar que, como a

maioria dos autos de prisão em flagrante é basicamente elaborada a partir do testemunho dos

próprios policiais que realizaram a prisão, o policial apresenta um poder central nesses casos, já

que sua versão constará no documento oficial, sendo que este pode simplesmente omitir

informações, inclusive excluindo detalhes do caso ou até mesmo acrescentar dados que não

condizem com o que aconteceu. Cabe também dizer que a falta de questionamentos pelos

operadores do direito com relação a esse tipo de atuação, acaba por fortalecer ainda mais esse

poder centrado na polícia. Como visto, a chamada “entrada franqueada”, aquela que

supostamente foi autorizada pela pessoa, não é tema de protesto ou revisão por parte dos

operadores. Se essa entrada foi de fato autorizada pela pessoa ou não, isso não é discutido.

Do mesmo modo, se o acusado foi vítima de maus tratos ou tortura, isso não irá aparecer

nos autos, mas apenas será inserido neste documento se ele tiver um defensor que interceda por

ele. Apesar das alegações de tortura ou outras formas de violência praticadas pela polícia, as

pesquisas revelam a inexistência de apuração e a completa omissão por parte das autoridades

competentes.

Destacamos, assim, a relevância que os projetos de intervenção tiveram para demonstrar

o impacto da assistência jurídica nos casos de prisão em flagrante. Os projetos que tiveram

intervenções jurídicas como objeto constataram que o acesso imediato ao defensor público

assegura não somente o acesso à justiça, mas também a preservação dos direitos fundamentais

daqueles sob custódia e a coibição da tortura contra a pessoa presa.

Paradoxalmente, os operadores responsáveis pela proteção da lei acabam sendo

responsáveis por sua própria violação. Eles argumentam que existe um clamor social para que não

haja impunidade, para que pessoas sejam punidas de maneira severa e exemplar. Porém, esse

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discurso se torna insustentável na medida em que tal lógica é aplicada de maneira indiscriminada

para delitos tão diferentes entre si, sobretudo àqueles em que não há violência e o dano não é

considerado grave. Ao insistir numa lógica quase que exclusivamente punitiva, observamos que a

resposta dada pelo judiciário a crimes, em nome deste clamor social por justiça, não tem nem o

efeito de garantir direitos, nem de diminuição da criminalidade, como os operadores insistem em

afirmar. Ao contrário, essa política punitiva apenas destrói a vida de pessoas - excluindo-as do

convívio social e familiar -, lota as prisões de maneira desumana, impõe custos sociais e

econômicos para o acusado, para as famílias e para o Estado, e, no limite, contribui para o

aumento da violência.

As pesquisas explicitam as fragilidades do sistema de justiça, que pouca reflexão faz sobre

si mesmo. É preciso evidenciar, como em parte se fez nesses estudos, os obstáculos enfrentados

pelos operadores e suas resistências para compreender os desafios e pensar estratégias para uma

atuação estatal mais democrática, cuja seletividade não seja orientada por critérios

socioeconômicos. Não se pode seguir aplicando a prisão como instrumento de controle social, que

além de incidir em evidente ilegalidade, mostra-se como um instrumento ineficaz para o combate

à criminalidade e para a pacificação das relações sociais. Assim, novas formas de lidar com esses

cenários se fazem necessárias.

Se a impunidade gera descrédito na Justiça, é preciso reforçar que a punição injusta,

desarrazoada ou desproporcional também o faz, enfraquecendo valores basilares do Estado

Democrático de Direito e minando a legitimidade de suas instituições.

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RECOMENDAÇÕES

As recomendações que apresentamos a seguir compreendem alguns consensos que

emergiram dos estudos que serviram de base para esse sumário. Algumas são medidas urgentes e

de efeito imediato, como por exemplo, mudanças específicas na legislação, enquanto outras

tratam de ações continuadas tais como formação de operadores, sensibilização da sociedade e

monitoramento da situação dos presos provisórios. Muitas outras questões podem e devem ser

levantadas a partir dessas recomendações para um debate abrangente, transformador e

permanente.

Aprimoramento legal

1. Criar, nos termos do Projeto de Lei do Senado nº 554, de 2011, a audiência de custódia, pela

qual o preso em flagrante deve ser apresentado à autoridade judicial em 24 horas, afim de que

sejam avaliadas a legalidade da prisão, a possibilidade de concessão de liberdade ou a substituição

da prisão por alguma das medidas cautelares alternativas à prisão, previstas na Lei nº 12.403

(aprovada em 2011). Legislativo e executivo federal

2. Excluir do artigo 312 do Código de Processo Penal a expressão “ordem pública”, tendo em vista

seu caráter genérico e indefinido e por ser indiscriminadamente utilizada como justificativa para a

manutenção da prisão provisória. Legislativo e executivo federal

3. Reavaliar os critérios para diferenciação entre usuários (artigo 28) e traficantes (artigo 33) da

atual legislação de drogas (Lei 11.343/06), analisando a experiência de outros países. Legislativo,

executivo federal, comunidade acadêmica e sociedade civil

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Implementação de políticas/leis e medidas

1. Efetuar a transferência de presos que ainda se encontram em carceragens policiais para

unidades do sistema penitenciário. Executivos estaduais

2. Aplicar de modo efetivo os dispositivos previstos na Lei 12.304/11. Poder judiciário nos estados

3. Criar uma central de fiscalização das medidas cautelares. Executivos estaduais

4. Fortalecer a Defensoria Pública dos Estados, através da ampliação de seus quadros (defensores

e servidores públicos). Executivos e legislativos estaduais

5. Garantir a presença de defensores públicos em delegacias de polícia para que possam

acompanhar os flagrantes; a fim de prover acesso rápido à justiça e garantir os direitos da pessoa

presa . Executivos e legislativos estaduais e defensorias públicas estaduais

6. Assegurar que promotores de justiça, juízes corregedores e defensores públicos monitorem

regularmente as unidades prisionais e tomem as providências cabíveis. Poder judiciário,

Ministério Público e Defensoria nos estados

7. Garantir a efetivação da Lei XX que cria o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à tortura,

com a sua rápida estruturação no âmbito federal, bem como avanço nas criações dos sistemas

estaduais. Executivo e Legislativo Federal e Executivo e Legislativos Estaduais

8. Garantir os princípios de proporcionalidade, de ampla defesa e do contraditório. Poder

judiciário nos estados

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Monitoramento e avaliação das políticas e medidas

1. Produzir dados e informações detalhados referentes aos presos provisórios, como por exemplo:

gênero, idade, tipo de crime, situação da defesa, etc. Ministério de Justiça, Conselho Nacional de

Justiça e Tribunais de Justiça dos estados

2. Garantir transparência pública na disponibilização dos dados e informações estatísticas sobre a

situação dos presos provisórios no Brasil. Ministério de Justiça, Conselho Nacional de Justiça e

Tribunais de Justiça dos estados

3. Realizar o monitoramento constante dos casos de prisão provisória. Ministério da justiça,

DEPEN, Conselho Nacional de Justiça, Ministério Público, Defensorias, comunidade acadêmica e

sociedade civil

Produção de conhecimento e formação

1. Desenvolver estratégias de sensibilização dos operadores do direito e da população em geral

para os temas de direito penal, segurança pública e sistema prisional, através do fomento de um

amplo debate na sociedade. Sociedade civil, Defensoria Pública, Ministério Público e poder

judiciário nos estados, comunidade acadêmica e sociedade civil

2. Investir em pesquisas e formação continuada dos operadores do sistema de segurança pública

e justiça criminal. Ministério da Justiça, Executivos estaduais, Poder Judiciário, Ministério Público

e Defensoria Pública nos estados, comunidade acadêmica e sociedade civil

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3. Criar meios para facilitar o acesso às informações processuais tanto a defensores públicos

quanto a presos. A estes últimos, as informações deveriam ser disponibilizadas em linguagem clara

e acessível. Tribunais de Justiça dos estados

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REFERÊNCIAS

PINHEIRO, LUCAS CORRÊA ABRANTES. Mudança na Lei de Drogas apenas respeita decisão do STF.

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CRÉDITOS

Sistematização e Redação

Maria Gorete Marques de Jesus

Roberta Astolfi

Pedro Lagatta

Thiago Thadeu Rocha