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214 Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — N o 2 — Março/Abril de 2001 INTRODUÇÃO Em situações de emergência, a avaliação da vítima e seu atendimento devem ser prontamen- te realizados de forma objetiva e eficaz, a fim de aumentar a sobrevida e reduzir as seqüelas des- sas vítimas. O suporte básico de vida inclui vári- as etapas do socorro à vítima em situação que represente risco de vida. Na maioria das vezes, o socorro a essas vítimas tem início fora do ambiente hospitalar. O reconhecimento preco- ce da vítima de infarto do miocárdio ou acidente vascular cerebral deflagra o suporte básico de vida, que inclui: 1. Ativação do sistema de serviço médico de emergência — No Brasil, cada pessoa deve conhecer o número do telefone do sistema de serviço médico de emergência local, uma vez que não existe um número único para todas as regiões, como ocorre em outros países (911 nos Estados Unidos, 112 na Europa ou 119 no Japão). 2. Avaliação da vítima com perda súbita da cons- ciência e realização de manobras para sus- tentação das vias aéreas, respiração e cir- SUPORTE BÁSICO DE VIDA ADRIANA VADA SOUZA FERREIRA , E LIANA GARCIA Comitê Nacional de Ressuscitação — Funcor Endereço para correspondência: Rua Guiará, 325 — ap. 71 — CEP 05025-020 — São Paulo — SP O suporte básico de vida inclui o reconheci- mento precoce de pacientes com os primeiros sinais e sintomas de síndrome coronariana agu- da, acidente vascular cerebral e obstrução de via aérea. Inclui as manobras de ressuscitação cardiopulmonar nas vítimas de parada e mano- bras de desobstrução de vias aéreas por corpo estranho. Atualmente inclui também as tentati- vas de desfibrilação de vítimas que apresentem fibrilação ventricular ou taquicardia ventricular sem pulso, como ritmo de colapso, por meio do uso de desfibriladores externos automáticos. So- mente a ação simultânea em várias etapas do atendimento a essas vítimas poderá reduzir os índices de mortalidade. Cada comunidade deve reconhecer seu ponto fraco e trabalhar melhori- as em torno dele. Palavras-chave: ressuscitação cardiopulmonar, parada cardíaca, cuidados para prolongar a vida. culação, conforme necessário. 3. Tentativa de desfibrilação de pacientes com fibrilação ventricular ou taquicardia ventricu- lar utilizando desfibrilador externo automáti- co. 4. Reconhecimento da vítima com obstrução de via aérea por corpo estranho e realização de manobras de desobstrução, conforme indi- cado. Atualmente, existem evidências de que a res- suscitação cardiopulmonar imediata realizada por voluntários e a desfibrilação precoce dimi- nuem a mortalidade de vítimas de parada cardí- aca. A ressuscitação cardiopulmonar imediata previne a deterioração da fibrilação ventricular para assistolia, pode aumentar a chance de des- fibrilação e contribui para a preservação das fun- ções cardíaca e cerebral. A desfibrilação preco- ce é o fator isolado que, comprovadamente, mais aumenta a sobrevida de adultos com parada car- díaca (1) . A fim de garantir a ressuscitação cardiopul- monar imediata e a desfibrilação precoce para vítimas de parada cardíaca, é fundamental o trei- namento em massa da comunidade e a disponi- (Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 2001;2:214-25) RSCESP (72594)-1083

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214 Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — No 2 — Março/Abril de 2001

INTRODUÇÃO

Em situações de emergência, a avaliação davítima e seu atendimento devem ser prontamen-te realizados de forma objetiva e eficaz, a fim deaumentar a sobrevida e reduzir as seqüelas des-sas vítimas. O suporte básico de vida inclui vári-as etapas do socorro à vítima em situação querepresente risco de vida. Na maioria das vezes,o socorro a essas vítimas tem início fora doambiente hospitalar. O reconhecimento preco-ce da vítima de infarto do miocárdio ou acidentevascular cerebral deflagra o suporte básico devida, que inclui:1. Ativação do sistema de serviço médico de

emergência — No Brasil, cada pessoa deveconhecer o número do telefone do sistemade serviço médico de emergência local, umavez que não existe um número único paratodas as regiões, como ocorre em outrospaíses (911 nos Estados Unidos, 112 naEuropa ou 119 no Japão).

2. Avaliação da vítima com perda súbita da cons-ciência e realização de manobras para sus-tentação das vias aéreas, respiração e cir-

SUPORTE BÁSICO DE VIDA

ADRIANA VADA SOUZA FERREIRA, ELIANA GARCIA

Comitê Nacional de Ressuscitação — Funcor

Endereço para correspondência: Rua Guiará, 325 — ap. 71 — CEP 05025-020 — São Paulo — SP

O suporte básico de vida inclui o reconheci-mento precoce de pacientes com os primeirossinais e sintomas de síndrome coronariana agu-da, acidente vascular cerebral e obstrução devia aérea. Inclui as manobras de ressuscitaçãocardiopulmonar nas vítimas de parada e mano-bras de desobstrução de vias aéreas por corpoestranho. Atualmente inclui também as tentati-vas de desfibrilação de vítimas que apresentemfibrilação ventricular ou taquicardia ventricular

sem pulso, como ritmo de colapso, por meio douso de desfibriladores externos automáticos. So-mente a ação simultânea em várias etapas doatendimento a essas vítimas poderá reduzir osíndices de mortalidade. Cada comunidade devereconhecer seu ponto fraco e trabalhar melhori-as em torno dele.

Palavras-chave: ressuscitação cardiopulmonar,parada cardíaca, cuidados para prolongar a vida.

culação, conforme necessário.3. Tentativa de desfibrilação de pacientes com

fibrilação ventricular ou taquicardia ventricu-lar utilizando desfibrilador externo automáti-co.

4. Reconhecimento da vítima com obstrução devia aérea por corpo estranho e realização demanobras de desobstrução, conforme indi-cado.Atualmente, existem evidências de que a res-

suscitação cardiopulmonar imediata realizadapor voluntários e a desfibrilação precoce dimi-nuem a mortalidade de vítimas de parada cardí-aca. A ressuscitação cardiopulmonar imediataprevine a deterioração da fibrilação ventricularpara assistolia, pode aumentar a chance de des-fibrilação e contribui para a preservação das fun-ções cardíaca e cerebral. A desfibrilação preco-ce é o fator isolado que, comprovadamente, maisaumenta a sobrevida de adultos com parada car-díaca(1).

A fim de garantir a ressuscitação cardiopul-monar imediata e a desfibrilação precoce paravítimas de parada cardíaca, é fundamental o trei-namento em massa da comunidade e a disponi-

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 2001;2:214-25)RSCESP (72594)-1083

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bilidade de desfibriladores externos automáticosem locais públicos.

EPIDEMIOLOGIA DA PARADACARDIOPULMONAR NO ADULTO

Adultos vítimas de parada cardíaca súbitanão-traumática, na maioria das vezes, apresen-tam fibrilação ventricular como ritmo de colap-so. Existem relatos de comunidades treinadascom o primeiro choque ocorrendo nos primei-ros três minutos de parada cardíaca com sobre-vida de 74% das vítimas (2). Esses dados con-trastam com relatos de que quando o primeirochoque é realizado com mais de doze minutosde parada cardíaca, a sobrevida gira em tornode 2% a 5%. Por esse motivo, quando um únicosocorrista atende uma vítima adulta com perdasúbita de consciência, ele primeiro ativa o siste-ma de serviço médico de emergência local esolicita um desfibrilador externo automático,depois retorna à vítima e realiza as manobrasde ressuscitação cardiopulmonar, conforme ne-cessário (“chame primeiro”).

Nas crianças, as doenças primariamente res-piratórias são mais freqüentes. Quando uma ví-tima de parada respiratória é prontamente so-corrida, a sobrevida é muito mais elevada quan-do comparada ao suporte básico de vida reali-zado quando já ocorreu parada cardíaca por hi-poxia, secundária à parada respiratória. Sendoassim, quando uma criança apresenta perda deconsciência e um único socorrista está disponí-vel, ele primeiro realiza um minuto de manobrasde suporte básico de vida, conforme necessá-rio, e depois ativa o sistema de serviço médicode emergência (“chame rápido”).

Quando mais de um socorrista está disponí-vel, um deles ativa o sistema de serviço médicode emergência e o outro fica ao lado da vítima,realizando ressuscitação cardiopulmonar, emqualquer faixa etária.

Existem algumas exceções a essas reco-mendações: vítimas de submersão, de traumaou de uso abusivo de drogas — “chame rápido”em qualquer faixa etária. E para crianças comdoença prévia conhecida de risco para distúrbi-os do ritmo cardíaco — “chame primeiro”.

SÍNDROME CORONARIANA AGUDA:COMO RECONHECER PRECOCEMENTEE COMO AGIR

Com o advento da terapêutica fibrinolítica edas intervenções coronarianas percutâneas, tor-nou-se possível a desobstrução coronariana.

Entretanto, para o sucesso dessas intervençõesé fundamental que o intervalo de tempo do iní-cio dos sintomas até a realização do procedi-mento não exceda poucas horas. Para que es-ses pacientes sejam submetidos a tempo a es-ses procedimentos, é necessário que a popu-lação leiga reconheça precocemente os sinaise sintomas do chamado ataque cardíaco, queo sistema de serviço médico de emergência sejaacionado e que a vítima seja rapidamente trans-portada para o hospital.

Freqüentemente, pacientes e seus acompa-nhantes demoram para reconhecer a síndromecoronariana aguda. O sintoma clássico é o des-conforto subesternal vago, às vezes descritocomo uma pressão ou aperto, geralmente irra-diado para o braço esquerdo, o pescoço ou amandíbula. Pode estar associado a respiraçãocurta, náuseas, vômitos, palpitação ou sudore-se. Os sintomas da angina costumam durarmenos de 15 minutos, enquanto no infarto agu-do do miocárdio duram mais de 15 minutos. Al-guns pacientes, principalmente idosos, mulhe-res ou diabéticos, podem apresentar sintomasatípicos ao invés da descrição clássica da dortorácica.

O socorrista leigo que presencia uma víti-ma com dor torácica deve: reconhecer os si-nais e sintomas da síndrome coronariana agu-da; manter a vítima em repouso, sentada oudeitada; e se o desconforto durar cinco minutosou mais, deve ser ativado o sistema de serviçomédico de emergência. Após ativação do siste-ma de serviço médico de emergência, o socor-rista deve permanecer ao lado da vítima; nocaso de perda de consciência, avaliar a neces-sidade de respiração de resgate, compressãotorácica e uso do desfibrilador externo automá-tico, se disponível.

A ativação precoce do sistema de serviçomédico de emergência permite o envio de am-bulância de suporte básico ou avançado, con-forme necessário, além de fornecer orienta-ções sobre o uso de nitroglicerina e aspirina.O Sistema pode fornecer orientações para so-corristas previamente treinados ou tambémsem treinamento anterior (ensinar compres-são torácica apenas, no meio do tórax da víti-ma).

A disponibilidade e o papel que o sistemade serviço médico de emergência representavariam nas diversas regiões. Cada comunida-de deve adaptar essas recomendações a suarealidade, enquanto os serviços de Saúde de-vem se empenhar para fortalecer essa etapado atendimento.

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ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL:COMO RECONHECER PRECOCEMENTEE COMO AGIR

A nova terapêutica fibrinolítica permite limi-tar a lesão neurológica e melhorar o prognósti-co do acidente vascular cerebral isquêmico. Aterapêutica fibrinolítica endovenosa deve serconsiderada para todos os pacientes que seapresentem no hospital até três horas do iníciode sinais e sintomas compatíveis com acidentevascular isquêmico. Da mesma forma que nassíndromes coronarianas agudas, o socorristaleigo deve ser treinado a reconhecer precoce-mente e ativar o sistema do serviço médico deemergência a fim de transportar rapidamente avítima de acidente vascular cerebral para o hos-pital.

As manifestações iniciais podem ser repen-tinas e podem incluir paralisia facial, alteraçãoda fala, alteração do nível de consciência, per-da de força ou sensibilidade em membros ouface, convulsão, alteração de equilíbrio e perdade visão. Uma vez detectada qualquer dessasalterações, imediatamente deve ser ativado osistema de serviço médico de emergência. Osocorrista presente à cena deve avaliar a vítimae realizar ressuscitação cardiopulmonar, se in-dicado, e a vítima deve ser transportada para ohospital o mais rápido possível. O hospital deveser avisado antecipadamente da chegada depaciente com suspeita de acidente vascular ce-rebral, a fim de agilizar sua admissão no setorde emergência e a realização da tomografiacomputadorizada, que irá confirmar ou não odiagnóstico de acidente vascular isquêmico. Comesses dados disponíveis, os pacientes que pre-enchem os critérios para terapia fibrinolítica re-cebem a droga endovenosa.

Se, por um lado, existe um limite de tempopara a ação benéfica da terapia fibrinolítica, poroutro lado existem muitas etapas sujeitas a de-mora tanto antes do paciente chegar ao hospi-tal como dentro do ambiente hospitalar. Fica, por-tanto, evidente a importância do treinamento dapopulação leiga e da ação integrada dos servi-ços pré-hospitalares e hospitalares.

SEQÜÊNCIA DO SUPORTE BÁSICODE VIDA(1)

Para padronizar o atendimento do suportebásico de vida, usaremos o termo vítima adultapara as vítimas com mais de 8 anos de idade.

O suporte básico de vida consiste de váriospassos e manobras feitos seqüencialmente, que

incluem uma avaliação e uma intervenção emcada fase da ressuscitação cardiopulmonar.Cada passo começa com uma avaliação: A)abertura das vias aéreas (avaliação e posicio-namento correto das vias aéreas); B) boca-a-boca (avaliação dos movimentos respiratórios;na ausência destes, realização da respiração deresgate); C) circulação (avaliação de sinais decirculação; se indicado, realização de compres-sões torácicas).

Nos Estados Unidos, o sistema de serviçomédico de emergência é ativado quando umavítima é encontrada inconsciente. Em outros pa-íses, a recomendação pode ser diferente, ati-vando o sistema de serviço médico de emer-gência quando a vítima está inconsciente e semrespirar ou sem pulso.

Avaliação do nível de consciênciaApós ter certeza de que o local está seguro,

o socorrista deve se aproximar da vítima e rapi-damente avaliar a presença de qualquer traumae determinar se a pessoa está respondendo,batendo e agitando gentilmente os ombros davítima e gritar: “Você está bem?”. Se há suspei-ta de trauma, o socorrista deve mover a vítimasomente se necessário, pois qualquer movimen-to inadequado pode causar lesão medular.

Ativar o sistema de serviço médico deemergência

Quando a vítima se encontra inconsciente,deve ser ativado o serviço médico de emergên-cia e também deve ser solicitado um desfibrila-dor externo automático. Ativar o serviço médicode emergência significa telefonar para o núme-ro de emergência local (pronto-socorro próximo,serviço de atendimento médico domiciliar, bom-beiros, etc.). Esse número deve ser largamentedivulgado na comunidade. A pessoa que cha-ma o serviço médico de emergência deve estarapta a fornecer os seguintes dados:1) Localização — endereço completo e pontos

de referência.2) Telefone do local.3) O que aconteceu — acidente automobilísti-

co, ataque cardíaco, etc.4) Quantas pessoas necessitam de atendimen-

to.5) Condições das vítimas.6) O que está sendo feito para as vítimas.7) Outras informações solicitadas pelo pessoal

do serviço médico de emergência.

Vias aéreasPara que a avaliação e a ressuscitação se-

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jam eficazes, a vítima deve estar em decúbitodorsal, sobre uma superfície plana e rígida. Sea vítima estiver com a face voltada para o chão,role-a como uma unidade (em bloco); assim, acabeça, o pescoço, os ombros e o tronco serãomovidos sem torção. Todo o corpo da vítima deveestar em um mesmo plano, com os braços aolongo do corpo.

O socorrista deve estar ao lado da vítima,posicionado para fazer respirações e compres-sões torácicas (a altura dos ombros da vítima éideal).

É importante lembrar que a língua é a causamais comum de obstrução das vias aéreas emuma vítima inconsciente, uma vez que está pre-sa na parte posterior da mandíbula. Quando amandíbula é movida para a frente, a língua élevantada, liberando a parte de trás da faringe,permitindo a passagem de ar.

Se não há evidência de trauma craniano oucervical, o socorrista deve usar a manobra deinclinação da cabeça/elevação do queixo (des-crito a seguir) para abrir a via aérea, removerqualquer material/vômitos da boca e secar oslíquidos com os dedos protegidos por luvas oupanos. O socorrista deve tirar qualquer substân-cia da boca da vítima, enquanto mantém a viaaérea aberta com a outra mão.Inclinação da cabeça/elevação do queixo

Para fazer a manobra de abertura das viasaéreas, o socorrista deve colocar uma das mãosfirmemente sobre a testa da vítima e inclinar acabeça para trás. Simultaneamente, colocar osegundo e o terceiro dedos da outra mão naparte óssea do queixo e realizar movimento deelevação do queixo (Fig. 1).

Tração da mandíbulaO socorrista deve colocar as mãos, uma de

cada lado da cabeça da vítima, apoiando seuscotovelos na superfície em que a vítima está dei-tada. Segurar firmemente no ângulo inferior damandíbula e levantar ambos os lados. Se os lá-bios se fecharem, abri-los com os polegares. Sea respiração boca-a-boca for necessária, man-ter a tração da mandíbula e fechar as narinasda vítima, colocando sua face contra elas. Essatécnica é muito eficaz para abrir as vias aéreas,porém tecnicamente difícil e cansativa para osocorrista, sendo a mais segura para uma abor-dagem inicial de uma vítima com suspeita detrauma cervical. O socorrista deve se lembrarde apoiar a cabeça sem movê-la para os ladosou para trás.

RespiraçãoPara avaliar a respiração, o socorrista deve

colocar seu ouvido próximo à boca/nariz da víti-ma, enquanto mantém a via aérea aberta. As-sim, enquanto observa o tórax da vítima, o so-corrista deve: (1) ver se o tórax da vítima se ele-va, (2) ouvir se há ruído de ar durante a respira-ção, e (3) sentir se há fluxo de ar. Se não háelevação do tórax e não há fluxo de ar, a vítimanão está respirando. Essa avaliação não devedurar mais que 10 segundos.

A ausência ou respiração inadequada (sinaisde obstrução das vias aéreas, “gasping”, etc.)requer a realização da respiração de resgate.Posição de recuperação

Se a vítima estiver respirando e apresentarsinais de circulação (pulso, respiração normal,tosse ou movimentos) durante ou após a res-suscitação, o socorrista deve manter as viasaéreas abertas e colocar a vítima em posiçãode recuperação.

A posição de recuperação é usada para víti-mas inconscientes, com respiração e sinais decirculação. Se uma vítima inconsciente perma-necer em decúbito dorsal e respirando esponta-neamente, as vias aéreas podem ficar obstruí-das com secreção, vômitos ou com a língua.Esse problema pode ser resolvido quando colo-camos a vítima de lado, facilitando a drenagemde líquidos pela boca.

Não há uma posição perfeita para todas asvítimas. Ao decidir em que posição colocar a ví-tima, leve em consideração:1. A vítima deve estar o mais próximo possível

do decúbito lateral, permitindo a drenagemdos líquidos pela boca.

2. A posição deve ser estável.3. Não deve haver pressão sobre o tórax a pon-

Figura 1. Manobra de abertura de via aérea: in-clinação da cabeça/elevação do queixo.

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to de impedir a respiração.4. Deve ser possível colocá-la de lado e de cos-

tas com facilidade e segurança, sem traumacervical.

5. Deve ser possível a observação e a avaliaçãodas vias aéreas.

6. A posição não deve causar dano à vítima.Respiração de resgate: respiraçãoboca-a-boca

Quando a vítima não apresenta respiraçãoefetiva, devem ser iniciadas as respirações deresgate. A palma de uma das mãos deve sermantida sobre a testa da vítima e as narinas davítima devem ser ocluídas com o polegar e odedo indicador, o que evitará que o ar saia. Osocorrista realiza uma inspiração profunda, selasua boca ao redor da boca da vítima e promoveduas respirações lentas efetivas, de aproxima-

damente dois segundos, observando a eleva-ção do tórax da vítima durante a respiração. Afreqüência usada quando apenas a respiraçãoé necessária é de 10 a 12 por minuto (Fig. 2).

A fim de reduzir o risco da distensão gástri-ca e suas complicações, é recomendado que ovolume ofertado seja de aproximadamente 10ml/kg (700 ml a 1.000 ml) em dois segundos,por ventilação.

Se as tentativas iniciais de respiração foremfrustradas, o socorrista deve reposicionar a ca-beça da vítima e tentar novamente; a aberturainadequada da via aérea é a principal causa dedificuldade para ventilar a vítima. Se a vítima nãopuder ser ventilada mesmo após o reposiciona-mento da cabeça, deve-se suspeitar de obstru-

Figura 2. Respiração boca-a-boca.

ção da via aérea por corpo estranho. O profissi-onal de saúde (não o socorrista leigo) deve ini-ciar a manobra de desobstrução da via aérea(descrita a seguir).Respiração boca-nariz

A respiração boca-nariz é o método recomen-dado quando a respiração boca-a-boca for im-possível (trisma, trauma bucal ou selo boca-a-boca ineficaz). Pode ser recomendada para víti-mas de submersão, pois o socorrista pode inici-ar a respiração tão logo a cabeça da vítima es-teja fora da água.

Para realizar a respiração boca-nariz, o so-corrista deve inclinar a cabeça da vítima paratrás com uma das mãos na testa e a outra namandíbula (como na manobra de inclinação dacabeça/elevação do queixo) e fechar a boca davítima. Respirar profundamente, selar seus lá-bios ao redor do nariz da vítima e expirar paradentro do nariz, então remover os lábios e per-mitir a expiração passiva, podendo ser neces-sário abrir os lábios da vítima com os polega-res.Respiração boca-estoma

Quando uma pessoa traqueostomizada pre-cisa de respiração de resgate, deve ser feita aventilação boca-estoma. Para executá-la, o so-corrista deve colocar seus lábios ao redor doestoma formando um selo, soprar o ar até queocorra expansão torácica e remover a boca paraque ocorra a exalação passiva.

Uma cânula de traqueostomia pode estarpresente no estoma, que deve estar pérvio paraque as ventilações possam ser realizadas. Se acânula não estiver pérvia e não for possível as-pirar a secreção ou desfazer a obstrução, a câ-nula deve ser removida e outra deve ser coloca-da. Se não há outra cânula disponível e a vítimanecessita de respirações de resgate, o socor-rista deve fazer a respiração diretamente no es-toma.Respiração boca-barreira

O uso de barreiras deve ser encorajado quan-do se faz ressuscitação cardiopulmonar fora doambiente doméstico. Há dois tipos de barreirasdisponíveis: máscaras e lenços faciais. As más-caras, normalmente, possuem uma válvula uni-direcional que impede que o ar expirado entrena boca do socorrista. Os lenços faciais nãopossuem válvulas e o ar expirado sai entre olenço e a face da vítima. Os dispositivos de bar-reira devem ter baixa resistência ao fluxo de arpara permitir a ventilação.

Para a respiração boca-máscara, é usadauma máscara transparente com ou sem válvulaunidirecional. A válvula permite o direcionamento

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do ar mandado pelo socorrista, enquanto man-tém o ar exalado fora do contato com o socor-rista. Algumas possuem entrada para oxigênio,permitindo oferta de oxigênio suplementar. Sehouver oxigênio suplementar, o volume total ofer-tado será de 6 ml/kg a 7 ml/kg (400 ml a 600ml). Esse volume mantém a oxigenação sanguí-nea e diminui o risco de distensão gástrica.

A ventilação com máscara é particularmen-te efetiva, pois permite que o socorrista use asduas mãos para fazer o selo da máscara com aface da vítima. Há duas formas de realizar res-piração boca-máscara:1. Técnica cefálica: o socorrista fica acima da

cabeça da vítima. Pode ser usada por umsocorrista quando a vítima está em paradarespiratória, durante a ressuscitação comdois socorristas, e também facilita a mano-bra de tração mandibular, pois o socorristaestá voltado para o tórax da vítima.

2. Técnica lateral: o socorrista fica ao lado davítima e usa a elevação da cabeça-inclina-

quando usada por dois socorristas treinados eexperientes: enquanto um faz o selo o outro aper-ta a bolsa.

Se houver apenas um socorrista, coloque-se acima da cabeça da vítima. Se não há certe-za sobre trauma cervical, eleve a cabeça da ví-tima e coloque um apoio sob ela (travesseiro outoalha) para atingir a posição de “cheirar”. Colo-que a máscara sobre o nariz, seus dedos indi-cador e polegar sobre a máscara e os demaisabaixo da mandíbula; com a outra mão, pressi-one a bolsa, observando a expansão torácica.

A ventilação será mais efetiva se realizadapor dois socorristas: um socorrista segura a más-cara e o outro pressiona a bolsa. Se um terceirosocorrista estiver disponível, pode fazer pressãocricóide.

A técnica de pressão cricóide consiste emaplicar pressão sobre a cartilagem cricóide davítima, empurrando a parte posterior da traquéiasobre o esôfago durante as respirações de res-gate. É utilizada para diminuir o risco de disten-

são gástrica e conseqüente aspira-ção. Deve ser usada apenas em víti-mas inconscientes, por profissionaisde saúde treinados, e requer um so-corrista a mais no local.

CirculaçãoEstudos recentes demonstraram

a dificuldade de socorristas leigos emdeterminar a presença ou não depulso em vítimas inconscientes (3). Afim de evitar atraso na ressuscitação,passou-se a recomendar verificaçãodos sinais de circulação para socor-ristas leigos ao invés de avaliação dopulso. Isso significa que, após ofere-cer as ventilações iniciais, deve-seprocurar por respiração normal, tos-se ou movimentos como resposta àsventilações. O socorrista deve ver,ouvir e sentir a respiração enquanto

procura por movimentos. Ensina-se procurar porrespiração normal para não haver confusão comrespiração agônica.

Para profissionais de saúde, acrescenta-sea verificação do pulso enquanto se procura poroutros sinais de circulação, como tosse, movi-mentos e respiração.

Essa avaliação não deve demorar mais dedez segundos. O profissional de saúde deve ve-rificar o pulso enquanto procura por sinais decirculação. Se não estiver certo da presença depulso, deve iniciar imediatamente as compres-sões torácicas.

ção do queixo. É ideal para ressuscitaçãocom um socorrista, pois o socorrista man-tém a mesma posição para fazer as respira-ções e as compressões torácicas (Fig. 3).

Bolsa-máscaraO dispositivo bolsa-máscara é usado no aten-

dimento pré-hospitalar. Esse dispositivo é o mé-todo mais utilizado no pré- e no intra-hospitalarpara promover ventilação com pressão positiva.A maioria das unidades disponíveis comercial-mente tem o volume de aproximadamente 1.600ml, o qual normalmente é adequado para insu-flar o pulmão. A bolsa-máscara é mais eficiente

Figura 3. Respiração boca-máscara.

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Para verificar o pulso em vítimas com maisde um ano de idade, deve-se palpar a artériacarótida do mesmo lado que o socorrista se en-contra.Compressões torácicas

Dados de estudos em animais e humanosdemonstram que com o ritmo de 80 compres-sões por minuto obtém-se bom fluxo sanguíneodurante a ressuscitação. Por essa razão, reco-menda-se que o ritmo de compressões toráci-cas seja de 100 por minuto. Prefere-se veloci-dade e não o número de compressões. A velo-cidade de 100 compressões por minuto resulta-rá em menos que isso, principalmente quandofeita por um socorrista que interrompe as com-pressões para fazer a respiração.

A recomendação anterior para adultos erade 15 compressões e duas ventilações para umsocorrista e 5 compressões e uma ventilaçãopara dois socorristas. A recomendação atual éde 15 compressões e duas ventilações para ume dois socorristas, pois, dessa forma, obtêm-semais compressões por minuto, uma vez que aqualidade das compressões e das ventilaçõesnão é afetada pela freqüência.

Durante a parada cardíaca, a pressão de per-fusão coronariana aumenta gradualmente comas compressões torácicas, sendo mais elevadaapós 15 compressões se comparada a 5 com-pressões. Essa recomendação é para socorris-tas leigos e para profissionais de saúde. Após avia aérea ser estabelecida (intubação orotraque-al), a ressuscitação pode ser sem sincronia, coma freqüência de 5:1.

O posicionamento adequado das mãos é es-tabelecido quando identificada a metade inferi-or do esterno. A seguir estão descritas recomen-dações que podem ser utilizadas:1. Com seus dedos, localizar o rebordo costal

da vítima (do lado que você está).2. Deslizar os dedos para cima do rebordo cos-

tal até encontrar o apêndice xifóide.3. Colocar a parte inferior de uma das mãos na

parte inferior do esterno e a outra mão porcima desta. Certificar-se de que o áxis desua mão está sobre o áxis do esterno. Issomanterá a força da compressão sobre o ossoe diminuirá a chance de fratura de costela.Não faça as compressões sobre a base infe-rior do esterno.

4. Manter os dedos estendidos ou entrelaçadose afastados do tórax (Fig. 4).Outro método utilizado para localização das

mãos é colocar a base de uma das mãos sobrea outra no centro do esterno entre os mamilos.Esse método é usado pelos “despachantes”

americanos há mais de dez anos.Para compressões efetivas, devem ser se-

guidas as seguintes orientações:1. Com os braços estendidos, travar os cotove-

los e posicionar os ombros perpendicular-mente às mãos. Dessa forma, cada compres-são será diretamente sobre o esterno.

2. Comprimir o esterno de um terço a metadedo diâmetro ântero-posterior do tórax da ví-tima. A compressão ideal do esterno gerapulso carotídeo ou femoral (para ser checa-do, é necessário um segundo socorrista).

3. Descomprimir o tórax, até que o tórax volte àposição normal, para que o sangue possacircular pelo coração. Isso deve ser feito acada compressão, mantendo as mãos emcontato com a vítima no mesmo local.

4. A efetiva perfusão coronariana e cerebral ocor-re quando as fases de compressão e relaxa-mento são iguais, ou seja, 50% do tempopara cada fase. Os socorristas conseguemessa freqüência com facilidade.

5. As mãos devem ser mantidas na mesma po-sição, não devem ser movidas ou levanta-das durante as compressões, mas deve-sepermitir que o tórax volte à posição normalapós cada compressão.As respirações de resgate e as compressões

torácicas devem ser combinadas para uma res-suscitação eficaz.

Durante a ressuscitação, a compressão car-

Figura 4. Compressões torácicas.

FERREIRA AVSe col.Suporte básicode vida

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díaca adequadamente realizada pode gerarpressão arterial sistólica de 60 mmHg a 80mmHg, mas a pressão diastólica é muito baixa.O débito cardíaco gerado na compressão torá-cica não ultrapassa um terço do normal e dimi-nui quando a ressuscitação se prolonga. Paraotimizar o fluxo sanguíneo, recomenda-se que,durante a ressuscitação, a força e o ritmo dascompressões sejam mantidos.Compressões torácicas sem respiraçõesde resgate(4)

Sabe-se que a respiração de resgate é umatécnica segura e eficaz, que tem salvo muitasvidas. Algumas publicações, porém, têm de-monstrado certa relutância dos socorristas emrealizar a respiração boca-a-boca em vítimasdesconhecidas, por medo de contrair doença in-fecciosa.

As evidências demonstram que a evoluçãode pacientes que receberam apenas compres-sões torácicas sem as ventilações é melhor quequando não são realizadas manobras de res-suscitação em vítima com parada cardíaca. Al-guns estudos em animais e humanos sugeremque a ventilação com pressão positiva não é ne-cessária nos primeiros seis a doze minutos deparada. Outros demonstram que o “gasping”pode manter os parâmetros ventilatórios próxi-mos do normal na ressuscitação sem ventila-ção com pressão positiva, pois o débito cardía-co cai para 25% do normal, diminuindo a ne-cessidade ventilatória para manter ótima rela-ção ventilação/perfusão.

Portanto, a compressão cardíaca sem venti-lação é recomendada apenas nos seguintes ca-sos:— quando o socorrista treinado não pode ou não

quer fazer as ventilações;— quando o socorrista não-treinado recebe ori-

entações telefônicas simplificadas.

DesfibrilaçãoNa maioria dos adultos com parada cardía-

ca súbita não-traumática, o ritmo mais freqüen-te é a fibrilação ventricular. Por essa razão, otempo entre o colapso e a desfibrilação é de-terminante para a sobrevivência. A sobrevivên-cia de uma parada cardíaca por fibrilação caide 7% a 10% por minuto sem desfibrilação.Portanto, os profissionais de saúde devem es-tar aptos e equipados para promover a desfi-brilação o mais rápido possível em vítimas demorte súbita.

A desfibrilação precoce também deve serfeita nos hospitais e ambulatórios; portanto, todoo pessoal responsável pela atendimento de

emergência deve estar apto a usar o desfibrila-dor em vítimas de parada cardíaca por fibrila-ção dentro de três minutos do colapso. Para atin-gir esse objetivo, todos devem estar treinados efamiliarizados com o desfibrilador de sua área.

ReavaliaçãoApós quatro ciclos de 15 compressões e

duas ventilações, verificam-se sinais de circula-ção (por 10 segundos). Se não houver sinais decirculação, reiniciar a ressuscitação pelas com-pressões torácicas; se houver sinais de circula-ção, avaliar a respiração.— Se a respiração estiver presente, colocar a

vítima em posição de recuperação, monito-rando a respiração e a circulação.

— Se a respiração estiver ausente, mas comsinais de circulação, promover respiração deresgate, uma ventilação a cada 4 a 5 segun-dos (de 10 a 12 por minuto) e monitorar ossinais de circulação de tempos em tempos.

— Se não houver sinais de circulação, continu-ar a ressuscitação.

— Parar para verificar sinais de circulação a cadapoucos minutos.

— A ressuscitação não deve ser interrompida,exceto em situações específicas.

— Quando houver sinais de circulação e venti-lação espontânea adequada, colocar a víti-ma em posição de recuperação, mantendoa abertura da via aérea.

Ressuscitação cardiopulmonar comdois socorristas

Todas as pessoas que prestam atendimentode emergência, seja por profissão ou por ocu-par cargo que exija treinamento em emergên-cia, devem ser treinadas para realizar a ressus-citação com um e com dois socorristas; quandopossível, deve ser acrescentado treinamentocom barreiras e máscara.

Na ressuscitação com dois socorristas, umdeles deve se posicionar ao lado da vítima erealizar as compressões torácicas; o outro so-corrista deve se colocar na altura da cabeça davítima, manter as vias aéreas abertas, realizaras respirações de resgate e monitorar o pulsocarotídeo.

As compressões torácicas devem ser feitasna freqüência de 100 por minuto e a relação deveser de 15 compressões para cada duas ventila-ções. Quando o socorrista que está fazendo ascompressões torácicas ficar cansado, os socor-ristas devem mudar de posição, porém a inter-rupção das manobras deve ser a menor possí-vel.

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Desobstrução das vias aéreas porcorpo estranho

A completa obstrução das vias aéreaspode resultar em morte se não for tratada empoucos minutos. A causa mais comum de obs-trução das vias aéreas superiores é a línguadurante a perda da consciência e parada car-diopulmonar. Uma vítima inconsciente podedesenvolver obstrução da via aérea por cau-sa intrínseca (língua e epiglote) e por causaextrínseca (corpo estranho). A língua podecair para trás e obstruir a faringe; a epiglotepode bloquear a entrada da via aérea, na ví-tima inconsciente. Vítimas de trauma facialpodem apresentar sangramento e coágulospodem obstruir a via aérea.

A obstrução de via aérea por corpo estra-nho é relativamente rara e é uma causa pou-co comum de morte. Não é comum em casosde afogamento, pois a água não causa obs-trução da via aérea; portanto, a manobra dedesobstrução da via aérea não é usada emvítimas de afogamento.

A obstrução de via aérea por corpo estra-nho deve ser considerada causa de parada car-diopulmonar em qualquer vítima, especialmen-te crianças que subitamente param de respirar,ficam cianóticas e perdem a consciência semcausa aparente. Em adultos, normalmente, aobstrução de via aérea por corpo estranho ocor-re durante a alimentação e a carne é a causamais freqüente. Entre os fatores associados àobstrução de via aérea por corpo estranho es-tão as tentativas de ingerir grandes pedaços decomida, elevado teor de álcool e uso de denta-dura.

O corpo estranho na via aérea pode causarobstrução parcial ou total. Se a obstrução forparcial, a vítima será capaz de fazer a troca dear, que pode ser boa ou má, dependendo dograu de obstrução. Com boa troca de ar a vítimaestá consciente e consegue tossir fortemente,embora algumas vezes pode-se ouvir um ruídoentre as respirações. Enquanto existir boa trocade ar, encoraja-se a vítima a tossir e o socorris-ta não deve interferir, mas manter-se atento casoseja necessária alguma atitude. Se a obstruçãopersistir, o serviço médico de emergência deveser ativado.

Algumas vítimas de obstrução de via aéreapor corpo estranho podem apresentar má trocade ar, imediatamente, ou, inicialmente, boa tro-ca de ar progredindo para má troca de ar. Ossinais de má troca de ar incluem fraqueza, tos-se ineficaz, batimento de asa de nariz durante arespiração, aumento da dificuldade respiratória

e cianose. Trata-se a pessoa com obstrução par-cial das vias aéreas e má troca de ar como umaobstrução completa — a ação deve ser imediata.

A completa obstrução das vias aéreas nãopermite que a pessoa fale, respire ou tussa. Elaainda pode estar com as mãos ao redor do pes-coço. Não há passagem de ar. O público deveser encorajado a usar o sinal universal de difi-culdade respiratória quando se encontra engas-gado (Fig. 5). O socorrista deve perguntar à víti-ma se ela pode falar; caso a vítima não possafalar, isso indica completa obstrução das viasaéreas e o socorrista deve agir imediatamente.

Recomenda-se que socorristas leigos usema manobra de Heimlich (pressão subdiafragmá-tica ou pressão abdominal) para desobstruir asvias aéreas de uma vítima consciente a partirde um ano de idade, não sendo recomendadapara bebês. Também é recomendada quandousada por profissionais de saúde em vítimas in-conscientes (adultos e crianças, mas não embebês).

A manobra de Heimlich por meio de pressãoabdominal eleva o diafragma, aumentando apressão do ar, forçando-o para fora dos pulmões,que pode ser suficiente para criar tosse artifici-al, e expelir o corpo estranho das vias aéreas. Osucesso do uso da manobra já foi relatado pelaimprensa pública e médica. Entretanto, o uso damanobra de Heimlich pode causar complicações,como rompimento de órgãos internos, e nãodeve ser usada se não for realmente necessá-

Figura 5. Sinal universal de engasgo.

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ria. Portanto, toda vítima que necessite dessamanobra deve ser avaliada, posteriormente, porum médico. Para minimizar a possibilidade detrauma, a mão não deve ser colocada sobre oprocesso xifóide ou nas bordas das costelas. Asmãos devem estar abaixo dessas estruturas,porém acima da cicatriz umbilical e na linhamediana. Mesmo quando realizada corretamen-te, a manobra de Heimlich pode acarretar re-gurgitação e conseqüente aspiração.Manobra de Heimlich em vítima conscientesentada ou em pé

O socorrista deve ficar atrás da vítima, pas-sar seus braços ao redor do abdome e proce-der como se segue:— Fechar uma das mãos em forma de punho.— Colocar o lado do polegar contra o abdome

da vítima, na linha mediana acima da cica-triz umbilical e abaixo do processo xifóide.

— Colocar a outra mão sobre a que está fecha-da, e pressioná-las contra o abdome da víti-ma em movimentos rápidos para dentro epara cima.

— Repetir as compressões abdominais até queo corpo estranho seja expelido ou a vítimase torne inconsciente.Deve haver um intervalo entre as compres-

sões, pois cada movimento deve ser feito distin-to e separadamente um do outro. Quando a víti-ma se torna inconsciente, o sistema de emer-gência deve ser acionado. Se o socorrista forleigo, a orientação atual é que se inicie aressuscitação cardiopulmonar, uma vez que asmanobras descritas a seguir são muito comple-xas e de baixa retenção pelo aluno leigo. Cadavez que a via aérea for aberta (durante os ciclosda ressuscitação), porém, deve-se procurar poralgum objeto na garganta e removê-lo, caso sejavisualizado. As compressões torácicas daressuscitação cardiopulmonar, na prática, po-dem servir como manobra de desobstrução devia aérea. Se o socorrista for um profissional desaúde, deve passar para a seqüência de desobs-trução das vias aéreas da vítima inconsciente(descrita a seguir).Compressões torácicas em vítimas obesase mulheres grávidas

A pressão torácica pode ser uma alternativapara vítimas em estágio final de gravidez oumuito obesas, em substituição à manobra deHeimlich. O socorrista deve:— Ficar atrás da vítima com os braços sob as

axilas e abraçar o tórax.— Colocar a região do polegar de uma das mãos

em forma de punho na linha mediana sobreo esterno, com cuidado para não apoiar so-

bre o processo xifóide ou arco costal.— Colocar a outra mão sobre a primeira e pres-

sionar o tórax até que o corpo estranho sejaexpelido ou a vítima fique inconsciente.

— Se não conseguir abraçar o tórax da vítima,podem ser realizadas compressões toráci-cas com a vítima em decúbito dorsal (o so-corrista posiciona-se a seu lado; a posiçãodas mãos é a mesma das compressões to-rácicas na ressuscitação).

Varredura digital e elevação mandíbula-línguaA varredura digital deve ser usada somente

por profissionais de saúde, em vítimas incons-cientes. Jamais deve ser utilizada em vítimasconscientes ou em crise convulsiva.

O socorrista deve posicionar a vítima com orosto para cima e proceder aos passos descri-tos a seguir.— Abrir a boca da vítima, segurar a língua e a

mandíbula entre seus dedos polegar e indi-cador, e puxar a língua para a frente da fa-ringe, onde o corpo estranho pode estar alo-jado (essa manobra pode, por si só, desobs-truir a via aérea).

— Colocar o dedo indicador da outra mão dentroda boca da vítima e percorrer as bochechas ea faringe (até a base da língua). Usar o dedoem forma de gancho, seja para remover o cor-po estranho ou para pressioná-lo contra o ladooposto à faringe, e puxá-lo para fora. Deve-setomar muito cuidado para não empurrar o ob-jeto para dentro da faringe.

Desobstrução da via aérea por corpoestranho em vítimas inconscientes —profissionais de saúde

As vítimas de obstrução de via aérea porcorpo estranho podem estar conscientes quan-do encontradas pelos socorristas e ficar incons-cientes; nessa circunstância, o socorrista sabe-rá a causa dos sintomas. Algumas vezes o so-corrista pode encontrar a vítima inconsciente esó saberá que se trata de obstrução de via aé-rea por corpo estranho após a tentativa de ven-tilação sem sucesso.

Se o socorrista souber que a perda de cons-ciência é decorrente de obstrução de via aéreapor corpo estranho, recomenda-se a seqüência:1. Ativar o Sistema de Emergência. Se houver

um segundo socorrista, este deve acionar oSistema de Emergência enquanto o primei-ro atende a vítima. Coloque a vítima em de-cúbito dorsal.

2. Fazer elevação língua-mandíbula, seguida devarredura digital para remover o corpo es-tranho.

3. Abrir a via aérea e tentar ventilar; se o tórax

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da vítima não se expandir, a cabeça deveser reposicionada e deve ser feita nova ten-tativa de ventilação.

4. Se não conseguir ventilações efetivas mes-mo após reposicionamento da cabeça, o so-corrista deve suspeitar de obstrução de viaaérea por corpo estranho.

5. O socorrista deve se posicionar “a cavalo”sobre as coxas da vítima e realizar cinco com-pressões abdominais (manobra de Heimlich).

6. A seqüência elevar língua-mandíbula, varre-dura digital, tentativas de ventilação e ma-nobras de Heimlich deve ser feita até que avia aérea seja liberada (ventilação efetivacom expansão do tórax) ou até que estejadisponível suporte avançado (pinça Kelly ouMagil ou cricotirotomia).

7. Se a via aérea for liberada, o socorrista deveverificar a respiração. Se a vítima não esti-ver respirando, promover as respirações deresgate, após verificar os sinais de circula-ção. Se não houver sinais de circulação, ini-ciar as compressões torácicas.Para realizar as compressões abdominais em

uma vítima inconsciente, o socorrista deve ajo-elhar-se sobre as coxas da vítima e colocar abase de uma das mãos contra o abdome da ví-tima, sobre a linha mediana acima da cicatrizumbilical e bem abaixo do processo xifóide. Co-locar a outra mão diretamente sobre a primeira,e pressionar as mãos contra o abdome em mo-vimentos rápidos para dentro e para cima doabdome.

O uso de pinças (Magil ou Kelly) para remo-ver corpo estranho é permitido apenas se esteestiver visível, podendo ser utilizadas lanternase laringoscópios para visualização direta do ob-jeto. A cricotirotomia deve ser feita apenas porprofissionais treinados e autorizados a procedi-mentos cirúrgicos.Profissionais de saúde — desobstrução dasvias aéreas por corpo estranho quandoa vítima é encontrada inconsciente

Se a vítima for encontrada inconsciente, arecomendação é a seguinte:1. Ativar o Sistema de Emergência. Se um se-

gundo socorrista estiver presente, este deveativar o Sistema enquanto o primeiro atendea vítima.

2. Abrir a via aérea e tentar ventilar com as res-pirações de resgate. Se o tórax não expan-dir, reposicionar a cabeça e tentar novamen-te a ventilação.

3. Se a vítima não for ventilada adequadamen-te, mesmo após o reposicionamento da ca-beça, o socorrista deve ajoelhar-se sobre as

coxas da vítima e realizar a manobra deHeimlich (5 compressões abdominais, comodescrito anteriormente).

4. Após as 5 compressões abdominais, o socor-rista deve abrir a via aérea usando a eleva-ção da língua-mandíbula e fazer a varreduradigital para remover o objeto.

5. O socorrista deve repetir a seqüência venti-lar, manobra de Heimlich, elevação da lín-gua-mandíbula e varredura digital, até que avia aérea seja liberada (objeto removido ouexpansão torácica durante a ventilação) ouaté que esteja disponível suporte avançado(pinça Magil ou Kelly, cricotirotomia).

6. Se a obstrução for resolvida, o socorrista deveverificar a respiração. Se a vítima não esti-ver respirando, promover as respirações deresgate, verificando, posteriormente, os si-nais de circulação. Se não houver sinais decirculação, iniciar as compressões torácicas.

SEGURANÇA DO SOCORRISTA: RISCO DETRANSMISSÃO DE DOENÇAS

No treinamento de ressuscitação cardiopul-monar com manequins, devem ser respeitadasnormas de descontaminação dos manequins afim de minimizar o risco de transmissão de do-enças infecto-contagiosas entre as pessoas emtreinamento(5). Nos Estados Unidos, até o mo-mento, aproximadamente 70 milhões de pesso-as já realizaram treinamento de ressuscitaçãocardiopulmonar em manequins e não há relatode complicações infecciosas. Alunos que sabi-damente estão na vigência de doença infecto-contagiosa devem ser convidados a adiar o cursopara outra ocasião, após resolução da doença.

Quanto à realização de respiração boca-a-boca em vítimas reais, até o momento não exis-tem relatos de transmissão de hepatite B ou aids.Nas duas últimas décadas, existem 15 relatosde transmissão de doença durante a ressusci-tação cardiopulmonar real. O risco é maior paradoenças de transmissão respiratória (Neisseriameningitidis, tuberculose, vírus respiratórios).Sendo assim, qualquer pessoa que tenha reali-zado respiração boca-a-boca em vítima comdoença infecto-contagiosa deve ser tratada comocontactante. Sempre que disponível, deve serutilizada uma barreira na realização das respi-rações de resgate. Preferencialmente, deve serutilizada máscara acoplada a bolsa-valva, ou,então, máscaras com filtros e válvula de fluxounidirecional, ou os lenços faciais como terceiraopção, pois são menos eficazes, permitindo con-tato de secreção entre a vítima e o socorrista.

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BASIC LIFE SUPPORT

ADRIANA VADA SOUZA FERREIRA, ELIANA GARCIA

The basic life support includes the earlyrecognition of victims with the first signs andsymptoms of acute coronary syndromes,stroke and airway obstruction; includes thecardiopulmonary resuscitation maneuvers andtechniques to relieve foreign-body airway obs-truction; includes the attempted defibrillationof patients with ventricular fibrillation or ven-tricular tachycardia with an automated exter-nal defibrillator. The basic life support actions

serve as the foundation for emergency cardi-ovascular care throughout the community.Each community should identify weaknessesin its actions and strengthen each step throu-gh cardiopulmonary resuscitation programs,automated external defibrillator available andan optimized emergency medical system.

Key words: cardiopulmonary resuscitation, he-art arrest, life support care.

(Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 2001;2:214-25)RSCESP (72594)-1083

REFERÊNCIAS

1. American Heart Association. Guidelines 2000for Cardiopulmonary Resuscitation and Emer-gency Cardiovascular Care. Circulation2000;102(suppl I):I-22-I-59.

2. Valenzuela TD, Roe DJ, Nichol G, Clark LL,Spaite DW, Hardman RG. Outcomes of rapiddefibrillation by security officers after cardiacarrest in casinos. N Engl J Med 2000; 343:1206-9.

3. Dick WF, Eberle B, Wisser G, Schneider T. Thecarotid pulse check revisited: what if there isno pulse? Crit Care Med 2000;28(sup-pl):N183-N185.

4. Kern KB. Cardiopulmonary resuscitation withoutventilation. Crit Care Med 2000;28(sup-pl):N186-N189.

5. The Emergency Cardiac Care Committee of theAmerican Heart Association. Risk of infectionduring CPR training and rescue: supplemen-tal guidelines. JAMA 1989;262: 2714-5.

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