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TATIANA CLARO DOS SANTOS RODRIGUES

SABERES DOCENTES NA EDUCAÇÃO ONLINE:

A PERSPECTIVA DA INTERATIVIDADE

Dissertação apresentada à Coordenação do Curso de Mestrado em Educação da Universidade Estácio de Sá como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Educação.

ORIENTADOR: Prof. Dr. Marco Antônio da Silva

Rio de Janeiro 2009

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

R696

Rodrigues, Tatiana Claro dos Santos Saberes Docentes na Educação Online: a perspectiva da Interatividade. / Tatiana

Claro dos Santos Rodrigues. - Rio de Janeiro, 2009.

182 f.

Dissertação (Mestrado em Educação e Cultura Contemporânea) – Universidade Estácio de Sá, 2009.

1. Ensino à distância. 2. Interatividade. 3. Professores, Formação. I. Título.

CDD 370

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Não tenho um caminho novo.

O que tenho é um novo jeito de caminhar.

Thiago de Melo

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Dedico esse trabalho a meu querido filho Felipe, fonte de vida e alegria, reflexão e aprendizado.

A André, pelo exercício do conviver.

Com amor e gratidão.

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AGRADECIMENTOS

A meu amado filho Felipe, tão pequeno e tão compreensivo! Pelas horas roubadas, pelos

livrinhos ainda não lidos, pelas brincadeiras que ainda faremos juntos.

A meu querido André, pelo apoio e compreensão, que mesmo constantemente reclamando da

minha falta de tempo (com razão), me incentivou fortemente. Obrigada pelas xícaras de café,

pelas refeições levadas até o computador, pela atenção com o Felipe.

A meus pais Gilberto e Márcia (in memoriam), por terem me proporcionado o alicerce para

chegar até aqui.

A meu sogro Ronaldo e, em especial, a minha sogra Olga, incentivadora e sempre solícita

para acolher meu filho (e às vezes marido também) nos momentos de minha ausência.

A meu irmão Leandro, com quem pude compartilhar angústias, ainda que a centenas de

quilômetros de distância.

A tia Leila, pela generosidade de sempre.

A meus avós (in memoriam) Waldemiro, Aurora, Walter e Jandyra, que, se aqui estivessem,

certamente se sentiriam muito felizes.

À direção do CIEP 120 Monteiro Lobato, na figura da professora Adelina Márcia, que apoiou

e compreendeu a difícil da tarefa de conciliar o mundo acadêmico e a carreira profissional.

Não há palavras para agradecer.

A meu orientador, Prof. Dr. Marco Silva, que, com muita competência e generosidade,

viabilizou este trabalho. Através de sua prática docente, pude me certificar de que não existe

fronteira entre a teoria que se estabelece e a prática pedagógica que se faz.

Às professoras Maria Aparecida Mamede-Neves e Lina Nunes, que gentilmente aceitaram o

convite para participar da banca examinadora.

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Aos professores do Mestrado, pelo aprendizado e pelas dicas oportunas sobre autores e

referenciais importantes oferecidas em suas disciplinas que foram fundamentais na formação do

referencial teórico desta pesquisa.

A equipe de atendimento e suporte do Mestrado, na figura de Ana Paula Nunes, sempre tão

meiga e solícita.

Aos colegas do Mestrado, pelos momentos de troca que vivenciamos ao longo desses dois

anos e, em especial, a Kelly Fernandes, que me acompanhou nesse caminhar.

A todos os pesquisadores do projeto Formação de Professores para Docência Online, que

possibilitaram a construção deste trabalho, e em especial aos coordenadores de equipe, que

gentilmente se dispuseram a participar das entrevistas.

Aos colegas docentes do curso de Formação de Docentes Online, da Universidade Estácio de

Sá, em especial Bel, Cláudia e Keite, que numa intensa cocriação colaboraram para a

edificação de meus próprios saberes docentes, e à Profa. Dra. Edméa Santos, nossa mentora,

pelo exemplo profissional, grande aprendizado, e por sempre me encorajar a “me autorizar”.

Aos companheiros do CEDERJ, que compartilham as dores e as alegrias na busca de uma

educação não presencial de qualidade.

À CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pela concessão

da bolsa, viabilizando minha pesquisa.

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RESUMO

A educação online emerge no contexto sociotécnico contemporâneo, marcado pelo computador conectado em rede, que favorece novas relações sociais com o saber. A especificidade dessa modalidade educacional encontra-se no fato de utilizar tecnologias que permitem novas formas de interação com conteúdos de informação e com pessoas. A despeito do potencial interativo da educação online, o que se tem, nessa modalidade educativa, em larga escala, é a concepção de educação baseada na transmissão de conteúdos fechados para a autoaprendizagem. Considerando essa problemática, o estudo teve como objetivo analisar saberes e práticas expressados na docência online em um trabalho interinstitucional que reúne em ambiente virtual de aprendizagem pesquisadores de doze programas de pós-graduação em educação e comunicação digital, com vistas ao desenvolvimento de conteúdos de aprendizagem e de estratégias docentes para cursos via internet dirigidos à formação de professores para docência online. Em consonância com esse objetivo, foram definidas as seguintes questões de estudo: a) como se edificam os saberes do docente online?; b) como os saberes docentes situados na perspectiva da interatividade se expressam no ambiente virtual de aprendizagem?; e c) que saberes docentes são mobilizados na busca de uma docência online interativa? O referencial teórico contempla: a) o tratamento do ambiente sociotécnico atual definido como cibercultura e como sociedade em rede; b) o conceito de educação online; c) a crítica à pedagogia da transmissão em Vygotsky e Freire; d) a teoria da interatividade; e e) os saberes docentes em Tardif. A metodologia adotada está baseada na abordagem histórico-cultural como norteadora da pesquisa qualitativa. Os dispositivos utilizados para coleta de dados são a observação e a entrevista. Os resultados indicam que: a) na modalidade online os saberes e fazeres docentes situados na perspectiva da interatividade se manifestam quando há utilização expressiva de interfaces de compartilhamento e de colaboração; b) os saberes do docente online são plurais e agrupam-se em saberes epistemológicos, saberes didáticos, saberes tecnológicos; c) a interatividade, além de um saber, é o alicerce de outros saberes. Com base nesses resultados, a pesquisa pretende contribuir com o debate sobre qualidade na educação online, quando o investimento na oferta dessa modalidade supera o investimento na formação específica do seu corpo docente. Palavras-chave: Saberes docentes. Interatividade. Educação online.

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ABSTRACT The online education emerges in a sociotechnical context marked by the computer connected in a network that favors new social relations with the knowledge. The specificity of this educational modality rests in the fact of using technologies that allow new forms of interaction with information contents and with people. In spite of the interactive potential of the online education, what we observe in this educational modality, on a large scale, is the educational conception based on the transmission of closed contents for self learning. All these problems considered, the study aims to analyze knowledges and practices expressed on online teaching in an inter-institutional work that gathers in a virtual learning environment researchers of twelve post-graduation programs on education and digital communication, aiming the development of learning contents and of teaching strategies for online courses targeted towards teachers’ graduation for online teaching. In step with this aim, the following questions were defined: how are built the online teacher’s knowledges?; how teaching knowledges situated in the perspective of interactivity speak out in a virtual learning environment?; and c) what teaching knowledges are mobilized in pursuit of an interactive online teaching? The theoretical set of references includes: a) the dealing with the present sociotechnical environment called cyberculture and network society; b) the online education concept; c) the criticism of the pedagogy of transmission according Vygotsky and Freire; d) the theory of interactivity; and e) the teaching knowledges according Tardif. The adopted methodology is based on the historical-cultural approach that guides the qualitative research. The devices used for the data gathering are the observation and the interview. The outcomes reveal that: in online modality the teaching knowledges and practices situated in the perspective of interactivity speak out when there is expressive utilization of interfaces for sharing and collaboration; b) the online teacher’s knowledges are plural and clustered in epistemological knowledges, didactic knowledges and technological knowledges; c) the interactivity, more than a knowledge, is the bedrock to other knowledges. Based on these outcomes, the research aims to contribute to the debate concerning the quality in online education, when the investment in the offer of this modality exceeds the investment in the specific graduation of its teaching corps. Keywords: Teaching knowledges. Interactivity. Online education.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Página inicial do curso Formação de Professores para Docência Online................................................................................................

71

Figura 2. Fórum numa perspectiva temática...................................................... 73

Figura 3. Fórum numa perspectiva avaliativa.................................................... 74

Figura 4. Fórum numa perspectiva social........................................................ 74

Figura 5. O curso em formato de tópicos.......................................................... 78

Figura 6. Os rótulos de um tópico..................................................................... 79

Figura 7. O histórico do chat no AVA Moodle................................................ 82

Figura 8. O fórum no AVA Moodle................................................................. 83

Figura 9. O wiki no AVA Moodle..................................................................... 85

Figura 10. O glossário no AVA Moodle............................................................. 86

Figura 11. O blog no AVA Moodle.................................................................... 87

Figura 12. O livro no AVA Moodle.................................................................... 88

Figura 13. O texto web no AVA Moodle............................................................ 89

Figura 14. A tarefa no AVA Moodle.................................................................. 90

Figura 15. O diário no AVA Moodle.................................................................. 91

Figura 16. A pesquisa de avaliação no AVA Moodle......................................... 92

Figura 17. Mapa conceitual dos saberes docentes na educação online............... 96

Figura 18. Ambiente do Flashmeeting................................................................ 122

Figura 19. Guia para acesso ao Flashmeeting..................................................... 123

Figura 20. Desenho didático: atividade perfil do aluno..................................... 131

Figura 21. Desenho didático: arquitetura de percursos 1.................................... 135

Figura 22. Desenho didático: arquitetura de percursos 2.................................... 136

Figura 23. Desenho didático: arquitetura de percursos 3.................................... 137

Figura 24. Desenho didático: conteúdo (texto linear)......................................... 138

Figura 25. Desenho didático: conteúdo (hipertexto)........................................... 138

Figura 26. Desenho didático: conteúdo (vídeo).................................................. 139

Figura 27. Mediação: roteiro de aprendizagem................................................... 146

Figura 28. Mediação: chat.................................................................................. 155

Figura 29. Mediação: “estar junto online” 1....................................................... 157

Figura 30. Mediação: “estar junto online” 2....................................................... 158

Figura 31. Avaliação todos-todos....................................................................... 161

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1. As gerações da EAD............................................................................. 36

Quadro 2. Comparação ente as modalidades unidirecional e interativa................. 44

Quadro 3. Organização do curso Formação de Professores para Docência Online. 59

Quadro 4. Organização do bloco temático 1 do curso Formação de Professores para Docência Online – Fundamentos da Educação Online..................

61

Quadro 5. Categorias de usuários do Moodle......................................................... 80

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LISTA DE SIGLAS

AVA – Ambiente Virtual de Aprendizagem

CC – Conected computer

CCAA – Centro de Cultura Anglo América

CEDERJ – Consórcio de Educação a Distância do Estado do Rio de Janeiro

EAD – Educação a Distância

HTML – HyperText Markup Language

LMS – Learning Management System

PC – Personal computer

PPG – Programa de Pós-Graduação

PUC – Pontifícia Universidade Católica

TICs – Tecnologias de Informação e Comunicação

UAB – Universidade Aberta do Brasil

UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro

UFF – Universidade Federal Fluminense

ZDP – Zona de Desenvolvimento Proximal

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SUMÁRIO

LISTA DE FIGURAS........................................................................................... 11

LISTA DE QUADROS......................................................................................... 12

LISTA DE SIGLAS.............................................................................................. 13

1 INTRODUÇÃO............................................................................................. 16

1.1 A CONSTRUÇÃO DE UMA TRAJETÓRIA DOCENTE..................... 17

1.2 DE UM NOVO CENÁRIO EMERGE A EDUCAÇÃO ONLINE.......... 26

1.3 OBJETIVOS, QUESTÕES E ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO............. 30

2 REVISÃO DE LITERATURA: EDUCAÇÃO ONLINE E SABERES DOCENTES...................................................................................................

32

2.1 O CENÁRIO SOCIOTÉCNICO CONTEMPORÂNEO......................... 32

2.2 A EDUCAÇÃO ONLINE........................................................................ 34

2.3 A CRÍTICA À PEDAGOGIA DA TRANSMISSÃO.............................. 39

2.4 A INTERATIVIDADE COMO PARADIGMA COMUNICACIONAL. 42

2.5 OS DESAFIOS DO PROFESSOR NA EDUCAÇÃO ONLINE............. 46

2.6 SABERES DOCENTES E FORMAÇÃO DO PROFESSOR................. 51

3 A METODOLOGIA E O CONTEXTO DA PESQUISA.......................... 55

3.1 O CAMPO DA PESQUISA...................................................................... 56

3.1.1 A definição do campo da pesquisa.............................................. 56

3.1.2 A delimitação da pesquisa........................................................... 60

3.2 A METODOLOGIA DA PESQUISA...................................................... 61

3.2.1 A escolha da metodologia............................................................ 61

3.2.2 A abordagem histórico-cultural............................................... 63

3.3 DISPOSITIVOS METODOLÓGICOS.................................................... 65

3.3.1 Coleta de dados............................................................................. 65

3.3.2 Análise de dados........................................................................... 68

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3.3.3 O perfil dos sujeitos da pesquisa.................................................. 68

3.4 O LOCUS DA PESQUISA: O AVA MOODLE..................................... 70

3.4.1 A caracterização do AVA Moodle.............................................. 70

3.4.2 O funcionamento do AVA Moodle............................................. 77

3.4.3 Interfaces, recursos e atividades do AVA Moodle.................... 81

4 SABERES DO DOCENTE ONLINE: A VIA DA INTERATIVIDADE.. 95

4.1 EDIFICAÇÃO DOS SABERES NA DOCÊNCIA ONLINE................. 97

4.1.1 As dimensões temporal e social dos saberes docentes............... 97

4.1.2 As origens dos saberes................................................................... 101

4.2 INTERATIVIDADE: SABER DOCENTE?............................................ 106

4.3 DOCÊNCIA ONLINE: UMA DIVERSIDADE DE SABERES............... 109

4.3.1 Saberes epistemológicos............................................................... 110

4.3.2 Saberes tecnológicos..................................................................... 119

4.3.3 Saberes didáticos........................................................................... 126

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................... 164

REFERÊNCIAS.................................................................................................... 171

GLOSSÁRIO......................................................................................................... 177

ANEXOS................................................................................................................ 179

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1 INTRODUÇÃO

O mundo não é. O mundo está sendo. Como subjetividade curiosa, inteligente, interferidora na objetividade com que dialeticamente me relaciono, meu papel no mundo não é só o de quem constata o que ocorre, mas também o de quem intervém como sujeito de ocorrências. Não sou apenas objeto da história, mas seu sujeito igualmente. No mundo da história, da cultura, da política, constato não para me adaptar, mas para mudar.

Paulo Freire

A elaboração de uma dissertação implica em muitas escolhas: é preciso escolher sobre

o que e para que pesquisar, como investigar, com quais teorias dialogar, como analisar os

resultados e quais estratégias para a elaboração do próprio texto. Essas escolhas não são

neutras – afinal, o conhecimento é historicamente construído e as pessoas estão envolvidas em

sua construção – e carregam em si as marcas do próprio pesquisador, assim como sua visão de

homem e de mundo.

Nessa perspectiva, o pesquisador é considerado um importante integrante da pesquisa,

conforme nos aponta Freitas (2002, p. 19):

O pesquisador é um dos principais instrumentos da pesquisa porque, sendo parte integrante da investigação, sua compreensão se constrói a partir do lugar sócio-histórico no qual se situa e depende das relações intersubjetivas que estabelece com os sujeitos com quem pesquisa. A leitura que faz do outro e dos acontecimentos que o cercam está impregnada do lugar de onde fala e orientada pela perspectiva teórica que conduz a investigação.

As razões para a elaboração desta dissertação encontram-se misturadas nas minhas

próprias trajetórias pessoal e profissional; é nelas que busco as origens do interesse da

investigação.

Nesse cenário, pretendo situar o leitor em relação ao meu objeto de estudo, procurando

refletir sobre algumas experiências marcantes na minha formação e prática docente e, de

forma mais particular, sobre a educação online. Em seguida busco delinear o panorama

sociotécnico que favorece o surgimento da educação online e traz consigo a urgência de se

pensar na formação e prática do docente que nela atua, através da perspectiva do conceito de

interatividade. Por fim, aponto os objetivos e as questões norteadoras do presente estudo.

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1.1 A CONSTRUÇÃO DE UMA TRAJETÓRIA DOCENTE

O AUTO-RETRATO1

No retrato que me faço

– traço a traço – às vezes me pinto nuvem,

às vezes me pinto árvore... às vezes me pinto coisas

de que nem há mais lembrança... ou coisas que não existem

mas que um dia existirão... e, desta lida, em que busco

– pouco a pouco – minha eterna semelhança,

no final, que restará? Um desenho de criança... Terminado por um louco!

Mário Quintana

Sou uma “carioca da gema”, casada e mãe de um lindo menino. Atuo como

orientadora pedagógica da rede pública e docente online em cursos de graduação e pós-

graduação.

Creio que me fiz professora desde que nasci, não por “vocação”, mas por construção

social. Sou filha de uma professora primária e de um metalúrgico, e, sem dúvida a atividade

docente de minha mãe me influenciou fortemente. Passei minha infância envolvida por livros,

cadernos e lápis. Minha brincadeira preferida sempre foi de “escolinha”. Meus dois irmãos

gêmeos (cinco anos mais novos) eram meus alunos favoritos nas brincadeiras, e acabaram se

tornando meus primeiros alunos “particulares” de verdade. Também me lembro de que desde

os seis anos de idade já ajudava minha mãe a rodar trabalhos e provas no mimeógrafo2 e

também colaborava na correção de algumas questões objetivas das avaliações de seus alunos,

como correlacione e múltipla escolha.

Vivenciei as dores e alegrias de minha mãe em sua carreira docente, sempre ouvindo

suas conversas sobre as atividades do magistério, as dificuldades políticas e metodológicas

presentes na profissão e as conquistas em relação à aprendizagem de seus alunos.

1 QUINTANA, Mario. O auto-retrato. In: ______. Apontamentos de história sobrenatural/Poesias. São Paulo: Círculo do Livro, 197?, p. 33.. 2 Um instrumento utilizado para fazer cópias de papel escrito em grande escala e utiliza na reprodução um tipo de papel chamado estêncil e álcool.

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Além de minha mãe, boa parte de minha família também se dedica à educação: uma

tia é professora de inglês em escolas municipais, outro tio é professor de química de um

colégio federal, uma irmã é professora de Informática e outro irmão, que é militar, após já ter

concluído seus estudos na Aeronáutica, decidiu se tornar também professor e acaba de se

formar em educação física.

Certamente essa opção comum na minha família contribuiu com a minha decisão de

seguir a carreira docente. E assim, bastante decidida sobre aquilo que desejava

profissionalmente, aos 14 anos iniciei o curso de formação de professores (antigo normal)

num colégio particular confessional, Externato Geremário Dantas. Lá vivi ótimos momentos,

fui boa aluna e fiz grandes amigas.

Durante o curso normal o grande enfoque das aulas pairava sobre a dimensão técnica

do conhecimento. Aprendi como elaborar planos de curso e de aula de maneira rigorosa, me

foi ensinado como organizar os conteúdos progressivamente em relação à aprendizagem do

aluno, conheci passo a passo todas as metodologias de alfabetização, aprendi que era preciso

manter a disciplina e o constante silêncio em sala de aula; ensinaram-me até mesmo qual a

melhor forma de apagar o quadro de giz. Com uma rígida organização das atividades

docentes, eu conseguiria resultados eficientes e a aprendizagem estava assegurada. Simples

assim.

No segundo ano do curso normal iniciei o estágio na própria escola em que estudava e

também trabalhava como auxiliar de turma num Jardim de Infância perto de minha casa.

Foram experiências gratificantes e pude ter certeza que minha escolha pelo magistério foi

acertada. No entanto, descobri que boa parte daquilo que vinha aprendendo no curso de

formação de professores não correspondia à prática da sala de aula. Sentia-me inquieta com

tal situação e busquei através de meios próprios alcançar meus saberes docentes. Então

encontrei entre meus pares uma excelente maneira de aprender a fazer: procurava conversar

com as professoras responsáveis pela turma em que estagiava e me oferecia para ajudá-las em

diversas tarefas (que fossem além de corrigir livros e cadernos), questionava minha mãe sobre

sua prática em sala de aula, pedia a minha tia para me explicar sobre algumas de suas

atividades docentes, como escolha das atividades e elaboração de avaliações.

Quando cursava o terceiro ano do normal minha vida deu uma reviravolta: perdi

minha mãe precocemente, um mês depois meu pai se casou com outra mulher e, como não

aceitei tal situação, fui morar com minha tia. Foi um período bastante conturbado, pois

precisava conviver com a dor da perda, estudar, estagiar e me preparar para o vestibular.

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Felizmente não perdi meu rumo e me formei no curso normal aos 17 anos de idade. Sempre

ouvi de minha mãe que a maior herança que ela me deixaria seria a educação. Dito e feito.

Nesse mesmo ano iria fazer vestibular e precisava optar pela carreira que seguiria:

pensei em pedagogia ou alguma licenciatura, como letras ou educação física, pois o que eu

queria realmente era continuar sendo professora. Mas também sabia que sem minha mãe e

sem a ajuda de meu pai, eu precisava trabalhar. Apesar da colaboração da minha tia em

relação à moradia e à alimentação, ela não tinha condições de me sustentar durante a

graduação inteira, nem pagar material e passagens. Então, para que pudesse conciliar a

faculdade com o trabalho, optei em tentar o vestibular para o curso de pedagogia da UERJ que

era um dos poucos oferecidos totalmente no turno da noite.

Um mês exato após ter concluído o curso normal recebi duas excelentes notícias:

passei no vestibular e consegui um emprego “de verdade” como vendedora numa livraria.

Então, deixei a escola em que trabalhava como auxiliar de turma, pois lá recebia apenas uma

ajuda de custo.

Fazia minha graduação à noite, trabalhava durante o dia na livraria e estudava inglês

aos sábados. Era muito cansativo, principalmente pela grande distância entre minha casa, meu

emprego e a universidade, mas estava estudando e isso era o que importava para mim.

Após o primeiro mês na livraria como vendedora, fui chamada para compor a equipe

de divulgação e atuar como divulgadora de livros infantis. Permaneci nessa atividade durante

quase dois anos, levando projetos de literatura infantil e fazendo exposições em escolas.

Numa visita a uma dessas escolas, a coordenadora soube que eu era professora e me convidou

para trabalhar na turma de maternal. Gostava de minha atividade na livraria, mas realmente

queria atuar como docente. Aceitei e lá permaneci durante um ano. No início de 1996, no

entanto, um amigo de minha tia comprou uma franquia do CCAA no Pará e soube que eu

estava terminando meu curso de inglês no CCAA. Ele precisava de professores que

conhecessem bem a metodologia do CCAA e me fez uma proposta de trabalho.

Aceitei o emprego, até porque não estava me identificando completamente com o

curso de pedagogia. O primeiro ano da graduação me decepcionou: as matérias oferecidas

nesse início, chamadas de “Fundamentos da Educação”, eram extremamente teóricas e

cansativas. Apesar de ter professores progressistas, com discurso diferente daquilo que

vivenciei no curso de formação de professores, ainda havia uma clara separação entre aquilo

que eles ensinavam e como ensinavam. Com raras exceções, a maioria desses professores

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escolhia um livro, dividia seus capítulos pelos grupos da turma que deveriam preparar

seminários para apresentação.

Para trabalhar na franquia do CCAA precisei me mudar para Barcarena, no Pará, que é

uma cidade próxima a Belém, com uma vila construída pela Vale do Rio Doce para seus

trabalhadores das indústrias de alumínio Albrás e Alunorte. Trabalhei por dois anos no CCAA

de Barcarena, que tem como pressuposto uma metodologia baseada na psicologia

comportamental. Dois anos depois ocorreu a privatização da Vale do Rio Doce, muitos

funcionários participaram de um programa de demissão voluntária e houve uma queda

enorme no número de alunos do curso, pois nosso alunado era composto por técnicos ou

gerentes das indústrias, ou por seus filhos. As turmas foram ficando reduzidas, minha carga

horária iria diminuir e, como a saudade da minha cidade era grande, optei por pedir demissão

e retornar.

De volta ao Rio de Janeiro, consegui emprego numa escola particular construtivista na

Barra da Tijuca. Também retomei meu curso de pedagogia na UERJ: a distância me fizera

repensar sobre minha formação e considerei que valeria a pena continuar. Foi uma ótima

opção, pois tive a oportunidade de cursar algumas disciplinas com professores que ofereciam

aulas mais dinâmicas, em que se articulavam discussões teóricas com a vivência da profissão,

culminando em reflexões sobre a prática pedagógica. Pela primeira vez vivenciava a

superação entre saberes curriculares e saberes da experiência, apesar de ainda possuir muitos

professores que somente teorizavam. A experiência em atuar numa escola construtivista

também foi fundamental para compreender como se dá a construção do conhecimento numa

perspectiva histórico-social e para colocar em prática o conhecimento adquirido no curso de

pedagogia, num verdadeiro processo de práxis pedagógica.

No ano seguinte fiz concursos para magistério das séries inicias dos municípios do Rio

de Janeiro e de Duque de Caxias, sendo aprovada em ambos. Comecei a ter uma dupla

jornada de trabalho: pela manhã lecionava no município de Duque de Caxias, à tarde no

município do Rio de Janeiro e à noite estudava. Então deparei com novos desafios, alguns

específicos da atuação com alunos de classes populares – como doenças diversas, fome,

moradias precárias, violência doméstica, grande distorção série/idade – que mobilizariam

saberes que não eram tratados na formação do professor.

Ao chegar à escola do município do Rio, fui atuar em um projeto chamado

“Aceleração da Aprendizagem”, que consistia numa turma formada por alunos que estavam

há mais de três anos na escola mas não conseguiam se alfabetizar, alguns portadores de

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necessidades especiais e faixa etária entre 10 e 18 anos. Agressividade e palavrões eram

constantes na sala de aula, o interesse pela aprendizagem era muito pouco e o apoio das

famílias quase inexistente. A ajuda da escola era mínima, pois existia uma única coordenadora

pedagógica para atender a 48 turmas e a direção tinha um papel mais voltado para questões

burocráticas. Diante da complexidade do quadro, novamente fui buscar apoio em meus pares.

Também me vali da formação continuada oferecida pela Secretaria Municipal de Educação

para os regentes das turmas de Aceleração da Aprendizagem, através de cursos e reuniões.

Nesses encontros, as trocas eram intensas, apesar de haver alguns profissionais que somente

se lamentavam pela situação, em vez de buscar possibilidades para superar o desafio. Essa

mobilização de saberes colaborou para que ao término do ano letivo eu tivesse um quadro um

pouco melhor – uma turma mais tranquila, com algum interesse pela aprendizagem e alguns

alunos alfabetizados – mas longe do ideal.

Como professora das séries iniciais, também atuei em turmas de educação infantil,

ciclo de alfabetização e classes de alfabetização de jovens e adultos. Pelas escolas que passei,

sentia-me inquieta com a ação burocrática de suas equipes de coordenação pedagógica, que

passavam boa parte de seu tempo preenchendo papéis impostos pelos órgãos municipais ou

preparando festividades, e pouco colaboravam na formação continuada de seus docentes, que,

a meu ver, se fazia necessária para atualização dos saberes de seus professores e análise das

mudanças que ocorrem na prática, bem como para atribuir direções esperadas a essas

mudanças, conforme Garrido (2005, p. 9) aponta:

O trabalho do professor-coordenador é fundamentalmente um trabalho de formação continuada em serviço. Ao subsidiar e organizar a reflexão dos professores sobre as razões que justificam suas opções pedagógicas e sobre as dificuldades que encontram para desenvolver seu trabalho, o professor-coordenador está favorecendo a tomada de consciência dos professores sobre suas ações e o conhecimento sobre o contexto que atuam.

No entanto, ao contrário do que proposto pela autora, percebia nas escolas ações

docentes meramente pragmáticas, ultrapassadas, desprovidas de qualquer reflexão e sem um

trabalho de coordenação pedagógica que pudesse orientar nesse sentido. Já com alguma

experiência, buscava colaborar com meus pares, planejando em conjunto, trocando

experiências de sala de aula, propondo cursos e levando textos para debate. Foi nesse

momento, já próximo ao término da graduação, que percebi que poderia contribuir ainda mais

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para um processo de formação docente contínua se direcionasse minha atividade educativa

para a orientação pedagógica.

Em 2000, me formei em pedagogia, com habilitação para educação infantil e continuei

investindo em minha formação. Participei de um curso de extensão em educação infantil

oferecido pela PUC em convênio com a SME/Rio, fiz pós-graduação lato sensu em

Supervisão Escolar na Universidade Cândido Mendes e uma outra especialização na UERJ

em Administração e Planejamento da Educação. Nesse ínterim, fiz concurso para atuar como

orientadora pedagógica no município de Duque de Caxias, fui aprovada e lá permaneço até

hoje com duas matrículas, após pedir exoneração do município do Rio de Janeiro.

Como orientadora pedagógica, tenho intensa preocupação em colaborar com a

formação (seja ela inicial ou continuada) dos meus pares docentes da escola em que atuo.

Apesar de encontrar muitos desafios e precisar lidar diariamente com as urgências e

necessidades do cotidiano escolar, busco cooperar e estabelecer uma relação dialética ao

longo de todo o processo, possibilitando trocas nos momentos de planejamento, nas aulas, nos

processos avaliativos, em grupos de estudo. Percebo meu trabalho como uma tarefa

formadora, articuladora e transformadora, e sei que, para tal, é preciso também investir em

minha própria formação, a fim de que eu possa exercer de forma plena minha função.

Em 2004 cursava a minha segunda especialização da UERJ e tive a oportunidade de

conhecer o CEDERJ3, uma vez que vários dos professores da pós-graduação estavam

assumindo papéis de coordenação de disciplina no curso de pedagogia do consórcio. Não

sabia muito bem como era o funcionamento da educação a distância (EAD), meu único

contato com o tema fora durante a graduação, mas achei bastante interessante a proposta de

levar a universidade pública para as cidades do estado em que ela não se encontrava presente

“fisicamente”. Na época a UERJ, responsável pelo curso de pedagogia do consórcio, estava

selecionando tutores para atuar na graduação não presencial4, voltada para a formação

continuada de professores das séries iniciais que não tinham ainda nível superior. Eu não tinha

nenhuma experiência em educação a distância, mas já atuava na formação continuada do

3 O CEDERJ é um consórcio formado em 2001 pelas seis universidades públicas sediadas no estado do Rio de Janeiro – Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Universidade Federal Fluminense (UFF), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Universidade do Rio de Janeiro (UNIRIO) –, “com o objetivo de democratizar o acesso ao ensino superior público, gratuito e de qualidade e utilizando a moderna metodologia da educação a distância”. (Disponível em <www.cederj.edu.br> Acesso em 02 abr. 2008 ). 4 Erroneamente muitas pessoas dizem que o modelo CEDERJ é de educação a distância, mas na verdade o consórcio oferece ensino semipresencial, pois há encontros e avaliações presenciais obrigatórios, Tal questão foi esclarecida no site do consórcio. (Disponível em <www.cederj.edu.br> Acesso em 02 abr. 2008 ).

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corpo docente da escola em que trabalhava como orientadora pedagógica, então decidi fazer o

concurso por acreditar que poderia ser bastante interessante essa nova experiência de lidar

com uma modalidade de ensino não presencial. Fiz o concurso, passei e fui atuar como tutora

presencial5 em Paracambi, o último município da Baixada Fluminense, onde se encontra um

dos polos do CEDERJ, trabalhando com as disciplinas de Fundamentos da Educação (I, II e

III).

Como tutora presencial, vivi de perto os limites e as possibilidades de modelos

educativos não presenciais. Pude perceber a importância se levar a universidade pública para

fora dos grandes centros urbanos: muitos de meus alunos, moradores de Paracambi e das

cidades vizinhas, sempre afirmavam que aquela fora a única oportunidade que tiveram de

cursar uma graduação, pois seria financeiramente inviável estudar no Rio de Janeiro, onde se

encontram a maior parte das universidades públicas do estado.

Exercendo a função de tutora presencial, percebi que não havia nenhuma autonomia

na dinâmica do trabalho docente do tutor: meu papel consistia em sanar as dúvidas dos

alunos, que deveriam chegar ao polo com o material didático (apostilas) lido, conforme

cronograma disponibilizado pela coordenação da disciplina. O material didático, elaborado

por conteudistas selecionados pela universidade consorciada, chegava pronto e fechado às

minhas mãos; o cronograma da disciplina era feito pela coordenação e deveria ser seguido à

risca, sem que se levassem em conta as peculiaridades do polo e do grupo de alunos; as

avaliações eram elaboradas também pela coordenação, que, após a aplicação das provas,

5 A docência no sistema CEDERJ ocorre em dois diferentes níveis: coordenação acadêmica e tutoria (a distância e presencial). A coordenação de cada disciplina é de responsabilidade das universidades consorciadas e, na maior parte das vezes, é exercida por professores dos departamentos de educação a distância das universidades integrantes A essas coordenações compete traçar as diretrizes da disciplina com base no material didático disponível, preparar o plano de estudos (cronograma) de cada semestre, elaborar as avaliações (provas) presenciais e a distância, planejar outras atividades e participar da seleção de tutoria. A tutoria é considerada pelo CEDERJ como um dos eixos que sustenta a dinâmica dos cursos, podendo ser presencial (quando os alunos contatam os docentes nos polos regionais) ou a distância (quando a interação ocorre através do ambiente online, telefone, entre outros). A tutoria é formada por professores graduados e/ou pós-graduados que não fazem parte do corpo docente das universidades, mas são selecionados por essas instituições através de prova escrita, análise de currículo e entrevista. A tutoria presencial atua nos polos regionais em conjunto e colaboração com as coordenações. Ao tutor presencial cabe atender aos estudantes nos polos em dias e horários previamente estabelecidos para dúvidas do conteúdo, aplicar as avaliações presenciais e fazer a correção das avaliações a distância, além de participar de momentos de capacitação e auxílio a toda a equipe. A tutoria a distância também é selecionada pelas universidades e seus plantões de atendimento são realizados nas universidades consorciadas. Os tutores a distância interagem com os estudantes de todos os polos sob a responsabilidade da universidade. Tais interações podem ser por telefone (sistema 0800) e todas as interfaces disponíveis no ambiente online do CEDERJ, como correio eletrônico, chat, fórum e sala de tutoria. Essa equipe interage diretamente com as coordenações nas universidades, participando dos programas de capacitação, elaboração de avaliações e de planos de estudos, assim como de diretrizes estabelecidas para as disciplinas; também compete a essa equipe a correção das avaliações presenciais.

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entregava um gabarito para correção. Esse modelo educacional, que fragmenta o pensar (que

caberia à coordenação da disciplina) e o fazer (que caberia à tutoria), me inquietava bastante.

Então fui buscar nas capacitações oferecidas pelo próprio consórcio possibilidades de

respostas e descobri que era o próprio consórcio que pregava essa dicotomia do fazer docente.

Fiquei desmotivada, mas não me abati e, embora houvesse as limitações de um sistema tão

rígido e fragmentado, acabei criando alguns mecanismos de “fuga”: incentivava que os alunos

fizessem leituras de outros materiais além da apostila e para tal emprestava meus próprios

livros; criei dinâmicas de tutoria que possibilitavam maior interação entre os participantes,

fazia tutoria em conjunto com outras disciplinas e, junto com a direção do polo e com os

tutores de outras disciplinas, organizei a 1ª Semana de Pedagogia do polo Paracambi. O

evento teve por objetivo possibilitar a reflexão a respeito da formação de professores na

modalidade semipresencial. Isso implicou uma maior dinâmica no fazer docente e foi possível

ver resultados através do envolvimento dos próprios alunos com a disciplina.

Após atuar por um ano e meio como tutora presencial, fui convidada pela

coordenadora de Fundamentos da Educação III para trabalhar na tutoria a distância.

Considerei a proposta interessante do ponto de vista profissional – pois assim poderia

colaborar com as tutoras presenciais de outros polos, buscando um trabalho mais cooperativo

– e também pessoal, pois a cidade de Paracambi fica a mais de 100 quilômetros de distância

de minha residência e na tutoria a distância eu atuaria no campus UERJ Maracanã, próximo

de onde moro.

A mudança para a tutoria a distância me possibilitou ter contato com algumas facetas

do modelo CEDERJ que até então eram desconhecidas para mim. Meu trabalho, agora,

consistia em esclarecer dúvidas dos alunos dos oito polos atendidos pela UERJ através de

telefone ou da plataforma CEDERJ – que é um ambiente virtual de aprendizagem (AVA)

criado pelo próprio consórcio. As interfaces mais utilizadas eram a sala de dúvidas (uma

espécie de fórum, em que o aluno deixa a dúvida e o tutor, em até 24 horas, procura esclarecê-

la) e a caixa de e-mails. Minhas atividades também estavam diretamente ligadas à

coordenação, com a qual eu deveria colaborar na elaboração de questões para as avaliações,

cronogramas, reuniões com a equipe com os tutores presenciais, entre outros.

Os desafios que encontrei no modelo adotado pelo consórcio me motivaram a melhor

compreender a educação não presencial. Junto com outros tutores, formamos um grupo de

estudos e semanalmente nos reuníamos para debater sobre temáticas variadas que envolviam

nossos fazeres no curso de pedagogia, mas sem dúvida o papel docente se destacava. Foi

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nessa época que tive meu primeiro contato com a obra de Pierre Lévy e alguns de seus

conceitos como cibercultura e inteligência coletiva, aumentando cada vez mais meu interesse

por modelos educativos não presenciais.

Cada vez mais envolvida com as tecnologias, em 2006, optei em fazer a seleção para o

mestrado em Educação na linha de Tecnologias da Informação e Comunicação em Processos

Educacionais, sendo aprovada. A partir de então, venho investigando sobre a docência online.

Encontrei no projeto do curso Formação de Professores para Docência Online um fecundo

campo para minha pesquisa, atuando em várias frentes: como docente, como discente e, ainda,

como pesquisadora.

Em 2007 a coordenação de tutoria do Consórcio CEDERJ ofereceu para seus tutores a

distância o curso online Docência em Ambientes Online de Aprendizagem, no qual me

inscrevi. Apesar de representar uma ação isolada por parte da coordenação, o curso se

apresentou como uma válida experiência para o compartilhamento de experiências, reflexão

sobre a prática e aprofundamento de estudos sobre fundamentos da educação a

distância/online e dispositivos e interfaces presentes nos ambientes virtuais de aprendizagem.

Como aluna online, também vivenciei as dificuldades de se estudar em tal modalidade,

principalmente no que se refere à questão da organização do tempo para estudos.

No último ano fui formadora de um curso oferecido para todos os docentes

responsáveis pelas disciplinas online da Universidade Estácio de Sá e também atuei numa

pós-graduação lato sensu em Planejamento, Implementação e Gestão da Educação a Distância

oferecida totalmente online pela UFF através do sistema UAB (Universidade Aberta do

Brasil). Essas duas experiências, que ocorreram concomitantemente, apresentaram propostas

completamente dicotômicas. No primeiro curso exerci minha docência online em sua

plenitude: participei da concepção do projeto, colaborei na elaboração do desenho didático do

curso, mediei as atividades que ocorriam em interfaces síncronas (chats) e assíncronas (fórum

e e-mails) e avaliei os alunos num processo formativo, assim como fui avaliada por eles;

durante todo o tempo tive ao meu lado meus pares docentes numa lista de discussão, onde

compartilhamos os limites e as possibilidades que encontrávamos no curso. Na segunda

experiência, no entanto, a proposta foi bastante diferente: recebi um material pronto do início

ao fim, que se baseava em textos no formato pdf e com atividades fechadas; meu papel se

restringia a dar uma nota para a participação dos alunos no fórum (que na verdade era um

depositório de respostas) e corrigir as atividades.

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Todas essas vivências pelas quais passei foram fundamentais para refletir sobre vários

aspectos da educação online, como os pressupostos filosóficos e teóricos que a sustentam,

dinâmicas de trabalho colaborativo e a mediação nos AVAs. Hoje observo com satisfação

esse meu percurso como educadora, em que tive a oportunidade de conhecer a riqueza

presente nas tecnologias de informação e comunicação (TICs) e assumi o compromisso de

incorporá-las ao processo de ensino-aprendizagem, no sentido de emancipação e

desenvolvimento do ser humano. Toda essa minha caminhada de formação e docência, seja no

papel de orientadora pedagógica, seja como professora ou aluna, vem contribuindo para

minhas observações e indagações em relação à formação e à docência online. É nesse sentido

que tenho clareza da articulação da temática com minha trajetória docente.

1.2 DE UM NOVO CENÁRIO EMERGE A DOCÊNCIA ONLINE

Há bastante tempo TICs vêm influenciando a educação com a incorporação do jornal,

da televisão, do rádio, do cinema, entre outros, no cotidiano da sala de aula. Vivemos

atualmente num contexto em que as tecnologias digitais, em particular, a partir da expansão

da internet na década de 90, possibilitam a construção e o compartilhamento de “capacidades

cognitivas expandidas aliadas a um poder de expressão sem precedentes” (PRETTO; PINTO,

2006, p.25) e permitem desenvolver práticas de aprendizagem que podem ser consideradas

alicerces de novas relações sociais com o saber, decorrendo daí uma modalidade conhecida

por educação online.

A educação online – definida por Moran (2003, p. 41) como “o conjunto de ações de

ensino-aprendizagem que são desenvolvidas através de meios telemáticos, como a internet, a

videoconferência e a teleconferência” – emerge desse novo contexto sociotécnico que é

marcado pelo computador em rede online. Tal contexto contempla uma expressão sem

precedentes, uma vez que a produção colaborativa, o compartilhamento e a socialização de

informações e de conhecimentos fogem do modelo da mídia de massa baseado na

apresentação e na transmissão para o receptor. Nesse sentido, demanda-se um novo perfil do

profissional de educação, que utilize as TICs a favor de uma educação com maior qualidade e

eficiência.

A literatura especializada em TICs e processos educacionais geralmente caracteriza a

educação online como uma evolução da educação a distância (EAD), ou seja, a terceira, a

quarta ou, até mesmo, a quinta geração da EAD. Contudo, na presente pesquisa adotarei o

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conceito de educação online proposto por Santos (2005) em sua tese de doutorado “Educação

online: cibercultura e pesquisa-formação na prática docente”, em que a caracteriza essa

modalidade educacional como fenômeno da cibercultura6 e não simples desenvolvimento das

práticas convencionais de EAD. Santos (2005) discorda da conceituação da educação online

como mera evolução da EAD, pois a considera como um movimento da cibercultura, uma vez

que esta:

[...] vem promovendo novas formas de socialização e aprendizagem mediadas pelo ciberespaço e, no caso específico da Educação, pelos ambientes virtuais de aprendizagem. A cibercultura é a cultura contemporânea estruturada pelas tecnologias digitais. Não é utopia, é o presente, vivemos a cibercultura [...] (SANTOS, 2005, p. 105).

A análise desse novo contexto sociotécnico chamado da cibercultura leva a refletir

sobre a maneira pela qual essa nova realidade impacta as formas de aprender e ensinar, pois a

web traz uma multiplicidade de pontos de vista, de agentes de seleção de conteúdos, de forma

horizontal, sem controle central e possibilita a formação de uma inteligência coletiva através

de comunidades virtuais que se ajudam mutuamente. Hoje é impossível pensar a web como

um local para totalizar os saberes. Nela o saber que flui é provisório e perpetuamente

reconstruído (LÉVY, 1999).

O ciberespaço possibilita configurar espaços de aprendizagem porque permite que o

conhecimento seja constituído com base no compartilhamento e na colaboração. Nota-se que

a especificidade da educação online encontra-se no fato de utilizar tecnologias que permitem

novas formas de interação tanto com conteúdos informativos assim como interatividade entre

as pessoas. Assim, à medida que conhecemos os ambientes online de aprendizagem,

percebemos que, além da informação, existem à disposição interfaces7 de conteúdos e

6 A cibercultura é definida por Lévy como “conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores, que se desenvolve juntamente com o crescimento do ciberespaço” (1999, p. 32), isto é, o espaço por onde transita a tecnologia digital, onde ocorrem todas as ligações que a rede permite e influencia os contextos culturais, políticos econômicos e educativos. Esse conceito será tratado com maiores detalhes no quadro teórico. 7 A maior parte dos autores utiliza a expressão “ferramentas de comunicação” para designar os dispositivos virtuais que possibilitam a interatividade entre os participantes do curso, como o chat, fórum, wiki, entre outros. No entanto, concordando com Silva (2004), opto pela expressão “interfaces de comunicação”, que na cibercultura ganha sentido de dispositivo de encontro para duas ou mais faces, em atitude comunicacional, dialógica e polifônica. Para o autor, a ferramenta é o utensílio do trabalhador e do artista empregado nas artes e nos ofícios, que realiza a extensão do músculo e da habilidade humana na fabricação e na arte, própria da sociedade industrial, da fabricação, da manufatura, portanto, termo inadequado para exprimir o sentido de ambiente no ciberespaço.

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comunicação que possibilitam a interlocução entre seus frequentadores. Dessa maneira, na

cena sociotécnica da cibercultura, o conceito de interatividade – entendido como nova

perspectiva comunicacional num contexto de múltiplas interferências (SILVA, 2006b) – surge

como aspecto central.

A interatividade coloca em questão a lógica da transmissão de conteúdos e a recepção

passiva própria da mídia de massa e dos sistemas de ensino. As tecnologias digitais online

rompem com a unidirecionalidade da mensagem fechada, fortalecendo a cultura da

participação, em que o receptor é convidado à livre criação compartilhada. Nesse contexto, a

mensagem ganha sentido sob sua intervenção e “exige que o professor reveja sua prática

pedagógica em sintonia com a dinâmica informacional das tecnologias digitais e com o perfil

comunicacional dos seus alunos” (VILARES; SILVA, 2006, p. 1).

Silva (2004, 2006b) estrutura alguns indicadores de ações docentes que favorecem

interatividade e promovem uma educação online realmente de acordo com as possibilidades

da cibercultura. São eles:

1. Disponibilizar múltiplas experimentações, múltiplas expressões. 2. Possibilitar uma montagem de conexões em rede que permite múltiplas ocorrências. 3. Provocar situações de inquietação criadora. 4. Arquitetar percursos hipertextuais. 5. Mobilizar a experiência do conhecimento.

Essas cinco linhas de sugestões podem potencializar a autoria do professor online,

sendo capazes de atender ao perfil do indivíduo que emerge com a cibercultura (SILVA,

2006b). Paradoxalmente, apesar da incorporação das tecnologias digitais na educação e das

possibilidades de novas formas interativas na produção de conhecimento, a aula continua

predominantemente transmissiva. Muitas vezes as TICs digitais são utilizadas como simples

ilustrações do conteúdo oferecido, ou seja, um complemento das aulas, pois o ensinar e o

aprender não foram realmente modificados.

Cursos oferecidos pela web muitas vezes ainda subutilizam as potencialidades de

produção e socialização de informações e de conhecimentos próprias das interfaces chat,

listas, fórum, blog, wiki, etc. O que se pode ver em larga escala é a transposição de

expedientes próprios da sala de aula presencial, onde o professor é um apresentador que

transmite saberes aos alunos.

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Vários autores criticam a pedagogia baseada na transmissão de conteúdos. Essas

críticas relacionam-se à sala de aula presencial, mas se tornam ainda mais contundentes

quando direcionadas para a educação online, que possui inerentes potencialidades de

produção e socialização de informações e de conhecimentos advindas da cibercultura.

Freire (2003), por exemplo, um dos maiores educadores brasileiros, chamava de

“educação bancária” tal modelo e dizia que a educação autêntica não se faz de A para B ou de

A sobre B, mas de A com B, revelando sua crítica ao ensino que não estimula a expressão do

próprio aluno e o transforma num receptor passivo.

O papel do professor baseado na mera transmissão de informações também é

questionado a partir da concepção sócio-histórica, que tem em Vygotsky seu principal

representante. Esse autor aponta para a ressignificação do papel do professor, que não é mais

aquele que se coloca como centro do processo de ensino-aprendizagem. Ele é o agente

mediador do processo ensino-aprendizagem, mobilizando a ação colaborativa dos aprendizes.

Tardif (2006) também contesta a transmissão de saberes. Questiona a ideia tradicional

de que os professores são apenas transmissores de saberes produzidos por outros grupos, uma

vez que o saber é social e se constrói nas relações complexas entre professores e alunos.

Com tais críticas evidencia-se que o professor que centra sua ação docente apenas na

transmissão-assimilação de conteúdos não está em sintonia com o cenário histórico, cujas

respectivas características sociais, econômicas, culturais, políticas e cujo ritmo acelerado de

transformação põem em xeque os processos de ensino e aprendizagem pautados num modelo

conteudista. A modalidade online necessitará de um professor que proporcione aos educandos

oportunidades de construírem conhecimentos de forma colaborativa e interativa, tendo em

vista que as potencialidades do AVA já favorecem essa dinâmica.

Por tais especificidades, destacando-se aí as interfaces de interatividade, torna-se

imprescindível aprofundar o debate sobre as mudanças nas práticas educativas na educação

online e, concomitantemente, investigar acerca dos saberes docentes – compreendidos aqui

como conhecimentos, saber-fazer, competências e habilidades (TARDIF, 2006) – que servem

de base ao ofício do professor online.

Nessa abordagem, Tardif (2006) afirma que os saberes docentes advêm de várias

instâncias: da família, da escola que formou o professor, da cultura pessoal, da universidade,

de seus pares, dos cursos de formação continuada. São saberes plurais, heterogêneos e

temporais, pois são construídos ao longo da vida e da carreira docente. Dessa maneira, o autor

se opõe à ideia tradicional que dicotomiza a teoria e a prática, como se o saber estivesse

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somente do lado da teoria e a prática fosse desprovida de saber. Ao considerar a relevância do

contexto do saber docente, o autor conclui ser impossível compreendê-lo fora do âmbito do

ofício e sem relacioná-lo com os condicionantes do trabalho (TARDIF, 2006).

É nesse sentido que se foi configurando a investigação, em que busquei compreender

os saberes dos docentes online a partir da atuação desses profissionais em um trabalho

interinstitucional que reúne em ambiente virtual de aprendizagem pesquisadores de doze

programas de pós-graduação em educação e comunicação digital, com vistas ao

desenvolvimento de conteúdos de aprendizagem e de estratégias docentes para cursos via

internet dirigidos à formação de professores para docência online, tendo em vista que esses

saberes emergem a partir das ações e dos contextos nos quais os docentes intervêm.

Nesse cenário, considera-se de fundamental importância contribuir com o meio

acadêmico e com o fazer pedagógico no campo da educação online. Acredito na relevância

desse estudo sob a perspectiva de colaboração na implementação de cursos online e na

formação dos profissionais que atuam ou atuarão nessa modalidade de ensino. Ademais, a

análise dos saberes dos docentes online adquire pertinência uma vez que, quanto maior a

consciência desse profissional sobre o seu fazer, maiores serão as chances de ele alcançar a

qualidade no projeto educacional em que atua.

1.3 OBJETIVOS, QUESTÕES E ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO

O processo de aprendizagem se constitui no diálogo, na troca, na inter-relação do

sujeito com outros sujeitos e com diferentes objetos, numa relação de reciprocidade com o

mundo ao seu redor, em um movimento constante e permanente. Nesse sentido, a formação e

a ação docentes desenvolvem-se a partir da mobilização de diversos saberes envolvidos com a

aprendizagem dos próprios educadores, assim como os saberes de sua experiência, os

disciplinares e os construídos no trabalho pedagógico. Pautada nessa perspectiva, a presente

pesquisa teve como objetivo:

- Analisar saberes e práticas expressados na docência online em um trabalho

interinstitucional que reúne em ambiente virtual de aprendizagem pesquisadores de doze

programas de pós-graduação em educação e comunicação digital, com vistas ao

desenvolvimento de conteúdos de aprendizagem e de estratégias docentes para cursos via

internet dirigidos à formação de professores para docência online. Em consonância com o

objetivo, são definidas as seguintes questões:

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a) Como se edificam os saberes do docente online?

b) Como os saberes docentes situados na perspectiva da interatividade se expressam

no ambiente virtual de aprendizagem?

c) Que saberes docentes são mobilizados na busca de uma docência online interativa?

Cabe, por último, esclarecer que esta dissertação encontra-se organizada em quatro

capítulos. Neste primeiro capítulo, introduzi o assunto, apresentei minha implicação com o

objeto de estudo e apresentei o objetivo e as questões que nortearam a investigação. No

capítulo 2, descrevo as abordagens teóricas que ajudaram a iluminar os resultados da

pesquisa. O capítulo 3 é constituído da descrição das opções metodológicas que guiaram o

processo de pesquisa, assim como a contextualização do estudo, apresentando o cenário do

curso Formação de Professores para Docência Online, os sujeitos da pesquisa e seu locus – o

AVA Moodle. No capítulo 4 traço, a partir do tratamento e análise de dados, inferências que

buscam responder às questões de estudo no contexto do tratamento dos dados que conduzem

ao problema proposto, assim como as inquietações surgidas com o estudo. Nas considerações

finais são apresentadas algumas conclusões em confronto com a abordagem teórica, bem

como prospecções para o campo da formação de professores para docência online.

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2 REVISÃO DE LITERATURA: EDUCAÇÃO ONLINE E SABERES DOCENTES

Todo o conhecimento produzido nas ciências humanas tem seu ponto de partida e chegada nos processos da vida humana historicamente construídos. Compreendendo que o conhecimento é historicamente construído e que a pessoa está implicada em sua construção, vejo que a escolha de um referencial teórico tem a ver com a visão de homem e de mundo do pesquisador.

Maria Teresa Freitas

Neste capítulo abordo as transformações no campo social e das tecnologias da

informação e comunicação e seu impacto na sociedade; discuto o surgimento da educação

online em decorrência dessas mudanças; apresento alguns críticos da pedagogia da

transmissão; e analiso a interatividade na perspectiva de superação de modelos educacionais

transmissivos. Em seguida, apresento uma breve reflexão sobre os desafios do docente online

e, por fim, trazemos a perspectiva de Tardif acerca dos saberes docentes.

2.1 O CENÁRIO SOCIOTÉCNICO CONTEMPORÂNEO

A sociedade contemporânea vive momentos de múltiplas transformações nas esferas

política, econômica, social, cultural, tecnológica e educacional, principalmente a partir da

inserção das TICs digitais nesses diversos contextos, que ampliaram possibilidades de

comunicação, intercâmbios e compartilhamento de ideias, reflexões e conteúdos. As duas

últimas décadas do século XX, que trouxeram consigo o uso generalizado do computador e da

internet, afetaram a sociedade de tal maneira que as mudanças ocorrem numa velocidade

nunca antes experimentada.

Segundo Castells (1999), a revolução das tecnologias da informação e da comunicação

dá início a um processo de transformação no cenário social com a remodelação da base

material da sociedade e a penetrabilidade em todas as esferas da vida humana. O movimento

originou-se na década de 70 nos Estados Unidos com a consolidação de um novo paradigma

tecnológico, difundiu-se rapidamente por vários países, implementou um processo de

reestruturação global a partir da década de 80, culminando com o advento da internet em

1994, considerada pelo autor como “o tecido de nossas vidas neste momento” e “um meio

para tudo, que interage com o conjunto da sociedade” (CASTELLS, 2003, p. 255).

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Esse movimento, chamado por Castells (1999) de “sociedade em rede”, organiza-se

em torno da tecnologia associada ao surgimento de uma nova estrutura social no contexto de

transformações históricas. Ela surge em contextos culturais múltiplos, influencia todas as

nações e permite que cada uma delas se apodere de referências multiculturais e

multidirecionais. No entanto, cabe apontar que tais mudanças não implicam, necessariamente,

melhorias para a sociedade como um todo, pois elas trazem contradições, tais como a inclusão

e a exclusão de grandes massas, além de que, ao mesmo tempo em que podem provocar o

compartilhamento de informações, também podem levar ao isolamento (CASTELLS, 2003).

Em sintonia com tal perspectiva, Lemos (2003) destaca a importância das TICs

digitais aliadas ao contexto sociotécnico marcado pela passagem do computador pessoal (PC)

ao computador coletivo (CC), isto é, conectado à rede mundial online. Ele chama atenção para

a nova ambiência comunicacional, na qual o indivíduo dispõe da liberação do polo da emissão

que, na sociedade industrial hierárquica, era controlado pela imprensa, rádio e televisão.

A passagem do PC para o CC define a “sociedade em rede” de Castells e também a

“cibercultura” caracterizada por Lévy (1999, p.32) como “ conjunto de técnicas (materiais e

intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores, que se

desenvolve juntamente com o crescimento do ciberespaço” , isto é, o espaço por onde

transitam e ocorrem todas as ligações que a internet permite, e influencia os contextos

culturais, políticos econômicos e educativos. Lemos (2003, p. 12) compreende a cibercultura

como “a forma sociocultural que emerge da relação simbiótica entre a sociedade, a cultura e

as novas tecnologias de base microeletrônica que surgiram com a convergência das

telecomunicações com a informática na década de 70”.

A cibercultura emerge com o ciberespaço – o “espaço de comunicação aberto pela

interconexão mundial dos computadores e das memórias dos computadores” (LÉVY, 1999, p.

74) – constituído por novas práticas comunicacionais (e-mails, listas, weblogs, jornalismo

online, webcams, chats, etc.) e novos empreendimentos que aglutinam grupos de interesse

(cibercidades, games, software livre, ciberativismo, arte eletrônica, MP3, etc.).

Ciberespaço e cibercultura significam rompimento paradigmático com o reinado da

mídia de massa baseada na transmissão. Enquanto esta efetua a distribuição para o receptor

massificado, o ciberespaço, fundado na codificação digital, permite ao indivíduo a

comunicação operativa e colaborativa em rede hipertextual. Nesse novo contexto

sociotécnico, a informação não deve ser assistida e sim manipulada, modificada, pois

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pressupõe imersão e participação-intervenção do indivíduo – experiência incomum na mídia

de massa (SILVA; CLARO, 2008).

Santos (2005), no entanto, observa que o ciberespaço é um espaço potencialmente

comunicativo, onde existe um potencial de comunicação presente – afinal, o ciberespaço

fornece estrutura à interatividade, mas não a determina. A tecnologia, por si só, não garante

comunicação interativa. Superar a visão reducionista do determinismo tecnológico significa

compreender que a cibercultura abre infinitas possibilidades de comunicação, produção e

compartilhamento de conhecimento, mas não denota que todos seus espaços sejam assim

preenchidos. Em sua pesquisa, a autora apresenta como exemplo diversos cursos online que

subutilizam as potencialidades das interfaces interativas dos AVAs no ciberespaço e a

demanda comunicacional da cibercultura, trabalhando numa perspectiva de mera transmissão

de informações.

Diante desse cenário atual paradoxal, deparamos com uma nova relação com o saber:

de maneira cada vez mais rápida as informações tornam-se obsoletas, o ciberespaço suporta

tecnologias intelectuais que favorecem novas formas de acesso à informação e que

possibilitam novos estilos de raciocínio e conhecimento (LÉVY, 1999). A cibercultura revela

situações de ensino e aprendizagem cada vez mais complexas, que requerem do professor um

trabalho docente consoante com o contexto social e histórico em que vive.

2.2 A EDUCAÇÃO ONLINE

É dessa cena contemporânea, conhecida como cibercultura, que emerge a docência

online. Na literatura especializada em educação e tecnologias, no entanto, a educação online

geralmente é apontada como uma nova geração da educação a distância (EAD). Não será

descartado aqui o progresso da EAD, mas busca-se superar visões mais simplistas de

educação online.

A EAD representa uma estratégia desenvolvida por sistemas educativos para oferecer

educação a setores ou grupos da população que, por diferentes razões, têm dificuldade de

acesso a serviços educativos presenciais. Nela, professor e aluno estão geograficamente

dispersos, e o material do curso (textos, livros, vídeos ou apostilas) torna-se principal

mediador da aprendizagem.

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Nas práticas convencionais da EAD temos a autoaprendizagem como característica fundante, ou seja, o cursista recebe o material do curso com instruções que envolvem conteúdos e atividades, elabora sua produção individual retornando-a, vias canais de comunicação, ao professor tutor. Assim, a aprendizagem é construída e mediada pelo material didático produzido à luz de um desenho instrucional. A instrução é o centro do processo. O sujeito aprende sozinho no seu tempo tendo o material didático um papel muito importante (SANTOS, 2005, p. 111).

A EAD é uma organização educacional utilizada há muitos séculos em todo o mundo

como uma alternativa para atender a demandas sociais diversas. Peters (2001) destaca três

períodos significativos na EAD, cada um superando o anterior: (a) a instrução por

correspondência, que serviu ao treinamento profissional no período de industrialização do

trabalho, a partir de meados do século XIX; (b) a EAD nos anos 70, 80 e 90, que ajudou

países em desenvolvimento a oferecer o ensino médio àqueles que não o concluíram ou ainda

estudos universitários para trabalhadores de países já desenvolvidos; e (c) a EAD

informatizada.

No Brasil a EAD encontra-se presente há mais de um século. De acordo com Gonzalez

(2005, p. 35), essa modalidade foi oferecida inicialmente através de cursos pagos por

correspondência, passando a ser ofertada por programas de televisão de educação supletiva e,

atualmente, tendo a tecnologia da informação a sua disposição, como videoconferências, CD-

ROMs, DVDs, correio eletrônico (e-mail) e a rede mundial de computadores (internet).

Também é possível conceituar as diferentes gerações de EAD de acordo com as diversas

tecnologias que a compõem, como no quadro 1 a seguir:

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Quadro 1 - As gerações da EAD

Gerações da EAD

Tecnologia utilizada Característica

1ª geração 1850 a 1960

Começa via papel impresso e anos mais tarde ganha a participação do

rádio e da televisão.

Uma tecnologia predominante.

2ª geração 1960 a 1985

Os meios são fitas de áudio, televisão, fitas de vídeo, fax e

papel impresso.

Múltiplas tecnologias sem computadores.

3ª geração 1855 a 1995

Correio eletrônico, papel impresso, sessões de chat,

mediante uso de computadores, internet, CD, videoconferência e

fax.

Múltiplas tecnologias, incluindo os computadores e as redes de computadores.

4ª geração 1995 a 2005

Correio eletrônico, chat, computador, internet, transmissões

em banda larga, interação por vídeo e ao vivo, videoconferência,

fax, papel impresso.

Múltiplas tecnologias incluindo o começo das

tecnologias computacionais de banda larga.

5ª geração (atual)

Identificada por James C. Taylor como sendo a reunião de tudo o

que a quarta geração oferece mais a comunicação via computadores

com sistema de respostas automatizadas, além de acesso via portal a processos institucionais

Enquanto a quarta geração é determinada pela

aprendizagem flexível, a quinta é determinada por aprendizagem flexível

inteligente.

Fonte: http://portal.webaula.com.br/noticia.aspx?sm=noticias&codnoticia=195 acessado em 30/08/2007.

Vários autores, no entanto, por acreditarem que a educação online traz consigo uma

ruptura com paradigmas comunicacionais anteriores, discordam dessa visão que considera a

educação online como mais uma etapa da EAD.

Para Santos (2005) e Silva (2006b), a educação online não é uma evolução da EAD

feita à base de mídia de massa (impresso, rádio e TV), uma vez que ela emerge como um

fenômeno da cibercultura, portanto em outro paradigma comunicacional.

A educação online é fenômeno da cibercultura, isto é, do conjunto imbricado de técnicas, práticas, atitudes, modos de pensamento e valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço [...]. A educação online é demanda da sociedade da informação, isto é, do novo contexto socioeconômico-tecnológico engendrado a partir do início da década de 80, cuja característica geral não está mais na centralidade da produção fabril ou da mídia de massa, mas na informação digitalizada como nova infraestrutura básica (SILVA, 2006b, p. 11).

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Já Moran afirma que “a educação a distância é um conceito mais amplo que o da

educação online. Um curso por correspondência é a distância e não online” (2006, p. 41).

A especificidade da educação online, compreendida como modalidade educacional

potencializada pelas tecnologias digitais (SILVA, 2006), encontra-se no fato de utilizar

tecnologias que permitem novas formas de interação tanto com conteúdos informativos

quanto entre as pessoas. Diferente da EAD, além da informação e da autoaprendizagem,

existem à disposição recursos que possibilitam a interlocução entre seus frequentadores,

interfaces que permitem a interatividade e a aprendizagem colaborativa. Assim, além de

aprender com o material, conforme ocorre na EAD, o participante aprende na dialógica com

outros sujeitos envolvidos através de processos de comunicação síncronos e assíncronos

(fórum de discussão, lista, chats, blogs, entre outros).

Torres (2007) corrobora essa visão quando afirma que a comunicação e a

interatividade determinam o diferencial pedagógico na educação online, favorecendo, assim, a

troca entre pares, a construção coletiva, debates e questionamentos, e permitindo ao aluno

explorar três formas de comunicação: a de um para um, a de um para muitos e a de muitos

para muitos. Apesar de tais possibilidades, ainda há aqueles que consideram apenas a entrega

de conteúdos pela internet, desconhecendo assim todas as reais possibilidades de uso

pedagógico das interfaces presentes nos AVAs.

Nessa perspectiva, Azevedo (2007) afirma que o diferencial da educação online é a

possibilidade de aprender a distância, mas junto com outros e interagindo com muitos, e

complementa:

Educação online, portanto, é educação. Só que a sua especificidade está precisamente no fato de utilizar tecnologias que permitem novas formas de interação primeiramente com conteúdos informativos. Esse é um dos aspectos que nos chama a atenção ao travarmos contato com essas novas tecnologias. O outro aspecto é que são novas tecnologias também da comunicação, que permitem novas formas de interação entre pessoas. E essa é uma descoberta que se faz aos poucos. À medida que se vai entrando em ambientes online, percebemos que, além da informação que vem até nós, e que às vezes nos sobrecarrega, dispomos de recursos de comunicação interpessoal com o uso dessas novas tecnologias (AZEVEDO, 2003, p. 1).

Apesar de possuírem uma potencialidade interativa intrínseca, muitos cursos online

simplesmente se limitam a veicular o material didático eletronicamente sem a

disponibilização efetiva de recursos interativos e sem uma base epistemológica que efetive a

construção do conhecimento. A partir de tal perspectiva, Villardi e Oliveira (2005) alertam

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que, para além da tecnologia, é necessário que a docência online tenha por base uma matriz

epistemológica que a sustente e uma implementação que aconteça efetivamente de acordo

com a matriz, a fim de que não ocorra subutilização do potencial de interação entre os

participantes do curso.

Vários autores destacam um outro fator determinante da educação online: o

redimensionamento dos conceitos de tempo e espaço (AZEVEDO, 2007; SILVA, 2006a;

TORRES, 2007). Novos espaços e tempos socialmente construídos surgem através da

flexibilização espaciotemporal. Essa característica possibilita ao aluno determinar quando e

onde desenvolverá seu processo de aprendizagem, tornando-se possível acompanhar um curso

regularmente, interagir com o professor, com colegas de classe e com o conteúdo didático,

cada um em seu ritmo pessoal e sem a necessidade de deslocamento, mas reunidos num

espaço específico, que é o virtual.

No entanto, na educação a distância tradicional, pautada na autoinstrução, a

flexibilização espaciotemporal acaba se caracterizando como isolamento do aluno, que

estabelece uma relação solitária com seu material de estudo, o que justifica os altos índices de

evasão dessa modalidade (VILLARDI; OLIVEIRA, 2005).

Diferentemente desse contexto, na educação online torna-se possível o “estar junto

virtual” e o estreitamento de laços afetivos, apesar da ausência de espaço físico, pois essa

modalidade apresenta recursos e interfaces interativos, que possibilitam a troca e a

interlocução entre professor e alunos e/ou alunos e alunos, existindo proximidade,

cumplicidade e comprometimento. Através do ato de escrever, as pessoas conseguem

expressar seus sentimentos, sem a barreira da timidez, conforme apontam Garcia et al (2007,

p. 189):

Na educação a distância online, a comunicação é feita, principalmente, via texto escrito: escrevem-se e leem-se e-mails, mensagens em lista de discussão, em fóruns, em chats. Conhecemos as pessoas por meio da internet, afeiçoamo-nos a elas, relacionamo-nos com elas como se a conhecêssemos há muito tempo. Na maior parte das vezes, não chegamos a encontrá-las presencialmente, mas a afetividade se constrói nas relações interpessoais que se estabelecem.

Finalmente, pelas suas especificidades, a educação online irá necessitar de professores

capazes de oferecer aos alunos oportunidades de construírem conhecimentos de forma

colaborativa, interagindo com os alunos, proporcionando-lhes oportunidades de edificar seus

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próprios conhecimentos e sendo mediadores das discussões e de outras atividades. É preciso

que, em sua formação inicial e/ou continuada, eles tenham tido contato com os pressupostos

da educação online. Nesse sentido,

[...] o essencial se encontra em um novo estilo de pedagogia, que favorece ao mesmo tempo as aprendizagens personalizadas e a aprendizagem coletiva em rede. Nesse contexto, o professor é incentivado a tornar-se um animador da inteligência coletiva de seus grupos de alunos em vez de um fornecedor direto de conhecimentos (LÉVY, 1999, p. 158).

Considerando as palavras de Lévy, é possível concluir que a principal função docente

não pode mais ser uma difusão de conhecimentos, que agora é feita de forma mais eficaz por

outros meios, e a internet abre essa perspectiva. Entretanto, vale ressaltar que é preciso cuidar

para que a tecnologia digital não seja subutilizada ou para que haja de fato interatividade.

2.3 A CRÍTICA À PEDAGOGIA DA TRANSMISSÃO

A educação online vem se apresentando como grande desafio para o professor,

acostumado ao modelo clássico de ensino da sala de aula presencial. Ainda hoje prevalece o

modelo tradicional de educação baseado na transmissão para memorização, ou na distribuição

de pacotes fechados de informações. O professor se sente pouco à vontade no ambiente online

interativo, onde os aprendizes podem ser coautores da comunicação e da aprendizagem, pois

está acostumado ao modelo da transmissão de conhecimentos prontos.

Paulo Freire (2003), um dos maiores educadores brasileiros, criticou intensamente esse

modelo. Ele dizia que a educação autêntica não se faz de A para B ou de A sobre B, mas de A

com B. Sua crítica tornou-se amplamente conhecida através da expressão “educação

bancária”, que pode ser vista como uma educação em que o docente é o dono do saber,

enquanto o educando é um mero “recipiente de informações” que nada sabe. Cabe ao

professor emitir seus saberes aos educandos, enchendo-lhes de um conhecimento que lhes

servirá, basicamente, para memorização de informações que serão reproduzidas no momento

da avaliação.

O papel do professor não é transmitir conhecimento, mas criar as possibilidades para

sua própria produção ou construção. Nesse sentido, Freire diz: “Ensinar não é a simples

transmissão do conhecimento em torno do objeto ou do conteúdo. Transmissão que se faz

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muito mais através da pura descrição do conceito do objeto a ser mecanicamente memorizado

pelos alunos” (1982, p.30). Ainda mais enfático, ele não deixa dúvida sobre sua crítica:

O professor ainda é um ser superior que ensina a ignorantes. Isso forma uma consciência bancária. O educando recebe passivamente os conhecimentos, tornando-se um depósito do educador. Educa-se para arquivar o que se deposita. [...] A consciência bancária “pensa que quanto mais se dá, mais se sabe” (FREIRE, 2003, p. 98).

Além de Freire, outros teóricos da educação apresentam críticas ao modelo baseado na

transmissão de informação. Entre eles destaca-se Vygotsky, principal representante da

abordagem histórico-cultural, que foca seus estudos na dimensão social do desenvolvimento

humano. Um de seus pressupostos básicos é de que o ser humano se constitui enquanto sujeito

na relação com o outro. O funcionamento psicológico do homem é formado ao longo da

história humana, sendo moldado pela cultura e mediado pela linguagem (VYGOTSKY,

2003).

Nesse sentido, o conceito de zona de desenvolvimento proximal (ZDP), central na

teoria do autor, ressignifica o papel do professor e não deixa dúvidas sobre a dimensão

colaborativa da aprendizagem. A ZDP pode ser definida como a distância entre o nível de

desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de

problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de

problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes

(VYGOTSKY, 1998, 2003). Através da ZDP, o papel do professor baseado na pedagogia da

transmissão é questionado. Ele não é mais aquele docente que se coloca como centro do

processo, em que o emissor ensina para que os alunos receptores aprendam. Bem diferente

disso, ele é o agente mediador do processo de aprendizagem e, com suas intervenções ou

provocações, contribui decisivamente para o fortalecimento de funções ainda não

consolidadas, ou para a abertura de zonas de desenvolvimento proximal. Outrossim, o

processo de aprendizagem é mobilizado pela ação colaborativa dos aprendizes.

Tardif também merece destaque pela ênfase que confere às interações no processo de

ensino e aprendizagem. Para esse autor, o campo próprio da pedagogia são as interações

concretas entre os professores e os alunos. O ensino é um trabalho interativo. Nesse sentido,

ele diz:

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[...] o agir interativo não é orientado para a manipulação dos objetos ou para o controle dos fenômenos do ambiente circundante, mas por um confronto com o outro. O confronto com o outro não é rígido; ele pode adaptar-se a diversos modos e a diversas modulações, de acordo com as finalidades que os autores almejam alcançar (TARDIF, 2006, p. 166).

Ou seja,

[...] o professor não é um trabalhador que se contenta em aplicar meios e que se comporta como um agente de uma organização: ele é sujeito do seu próprio trabalho e ator de sua pedagogia, pois é ele quem a modela, quem lhe dá corpo e sentido no contato com os alunos (negociando, improvisando, adaptando) (TARDIF, 2006,, p. 149).

Ensinar, para Tardif (2006), é entrar numa sala de aula e colocar-se diante de um grupo

de alunos, esforçando-se para estabelecer relações e desencadear com eles um processo de

autorias e coautorias mediado por uma grande variedade de interações. O trabalho do

professor em sala de aula deve ser considerado como um espaço prático específico de

produção, de transformação e de mobilização de saberes e, portanto, de teorias, de

conhecimentos e de saber-fazer específicos que acionam a participação dos atores envolvidos

no processo.

Se, como diz Lévy (1993, p. 8), “a escola é uma instituição que há cinco mil anos se

baseia no falar-ditar do mestre”, não será fácil para o professor superar o modelo de sala de

aula, com o qual aprendeu a raciocinar na transmissão linear, separando emissão e recepção.

Não será fácil superar o agir transmissivo em nome do agir interativo recomendado pelos

teóricos da educação. O docente sente-se inseguro ao ter de abandonar a posição de dono de

um suposto saber e lidar com a posição de coautor junto a seu aluno, e não mais de autor e

guardião exclusivo dos conhecimentos.

Todavia, se esse professor não atendeu aos ensinamentos dos críticos da pedagogia da

transmissão cristalizada na sala de aula presencial, terá pela frente o desafio da sala de aula

online situada no paradigma comunicacional da cibercultura e das TICs digitais. Ele poderá

estabelecer um diálogo entre sua prática docente na educação presencial e os desafios da

educação online para daí extrair motivação para a releitura de Freire, Vygotsky e Tardif.

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2.4 A INTERATIVIDADE COMO NOVO PARADIGMA COMUNICACIONAL

O novo cenário comunicacional marcado pela cibercultura coloca em questão a lógica

da transmissão de conteúdos e a recepção passiva própria da mídia de massa e dos sistemas de

ensino. As TICs digitais rompem com a mensagem fechada, fortalecem a cultura da

participação, possibilitam configurar espaços de aprendizagem, em que o receptor é

convidado à livre criação compartilhada diante da mensagem, que ganha sentido sob sua

intervenção e em que o conhecimento é construído conjuntamente, porque permitem

interatividade (SILVA, CLARO, 2008).

Nesse sentido já não há como pensar em educação sem troca, sem cocriação, sem

participação. Na busca do modelo pedagógico específico da educação online, que colabore

com a superação de práticas pautadas na transmissão de informações, a interatividade surge

como aspecto central.

O termo “interatividade” vem sendo utilizado em muitos estudos como sinônimo de

“interação”, mas há autores que preferem diferenciar os termos. Para Beloni (2008), por

exemplo, há uma grande diferença entre o conceito sociológico de interação, definida pela

autora como a ação recíproca entre dois ou mais atores na qual ocorre intersubjetividade, isto

é, o encontro de sujeitos – que pode ser direta ou indireta (mediatizada por algum veículo

técnico de comunicação, por exemplo, carta ou telefone) –, e a interatividade, termo que vem

sendo usado com dois significados diferentes: de um lado, a potencialidade técnica oferecida

por determinado meio (por exemplo, jogos informatizados) e, de outro, a atividade humana,

do usuário, de agir sobre a máquina e receber em troca uma “retroação” da máquina sobre ele.

Primo (2005) contesta o uso da palavra “interatividade” por considerá-lo

indiscriminado e opta por utilizar a expressão “interação”.

[...] alguns modelos e teorias utilizados para o estudo da comunicação de massa são transpostos para a discussão da dita “interatividade” (conceito este que este autor prefere evitar, diante de seu uso elástico e impreciso). Diante das dificuldades que daí emergem, e reconhecendo que o estudo das interações mediadas por computador demandam um certo olhar que as teorias da comunicação de massa (“um-todos”) não dão conta, este trabalho vai buscar justamente na comunicação interpessoal (interações de tipo “um-um” e “todos-todos”) sua fundamentação (PRIMO, 2005, p. 10 e 11).

Enquanto alguns autores pesquisados sustentam que a interatividade acontece a partir

da relação homem-máquina, outros acreditam que a interatividade não está somente atrelada à

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relação em ambientes informatizados, percebendo uma perspectiva mais comunicacional, que

pode ou não ser mediada pela máquina. É este último conceito que adoto nesta pesquisa, mais

especificamente a partir dos estudos de Silva (2004, 2005, 2006a, 2006b), que abarca esse

fenômeno de forma mais ampla. A interatividade, portanto, é aqui compreendida como a

possibilidade real de participação/intervenção dos sujeitos no processo de comunicação.

Quanto às críticas ao uso do termo “interatividade”, Silva (2006) reconhece que são

pertinentes, mas busca enfatizar que há muito mais a dizer sobre esse conceito, que cada vez

mais ganha centralidade na cibercultura e, particularmente, sobre sua importância em

educação.

O termo, aliás, não é novo. Surgiu na década de 1970, para fundamentar uma crítica à

mídia unidirecional, mas se consagrou somente nos anos 1980, a partir da inserção do

computador com janelas móveis que permitem manipulação e operatividade. Na década

seguinte, com o advento da internet, o conceito ganhou expressão máxima na informática

equipada com a tecnologia do hipertexto.

O hipertexto, a teia de conexões de um texto com outros inúmeros textos, trouxe para

a comunicação a possibilidade de seus usuários conectarem-se a uma rede, permitindo

múltiplas ocorrências e navegações, além de multiplicar as ocasiões de produção de sentido e

de possibilitar enriquecer consideravelmente a leitura (LÉVY, 1993).

A dinâmica do hipertexto rompe com a sequência linear da escrita, trazendo

informações organizadas e indexadas através de links que possibilitam que se salte de um

documento para outro sem que seja necessário seguir uma rota direcionada por alguém,

possibilitando ao usuário fazer leituras em sintonia com necessidades próprias, conforme

aponta Lévy (1993, p. 33):

Um hipertexto é um conjunto de nós ligados por conexões. Os nós podem ser palavras, páginas, imagens, gráficos ou partes de gráficos, sequências sonoras, documentos complexos que podem eles mesmos ser hipertextos. Os itens de informação não são ligados linearmente, com em uma corda com nós, mas cada um deles, ou a maioria, estende suas conexões em estrela, de modo reticular. Navegar em um hipertexto significa, portanto, desenhar um percurso em uma rede que pode ser tão complicada quanto possível. Para cada nó, por sua vez, conter uma rede inteira.

Nesse sentido, o hipertexto é um marco que liberta o usuário da lógica unívoca e que

democratiza a relação do indivíduo com a informação, passando da condição de espectador

passivo para sujeito operativo, participativo e criativo. A tecnologia do hipertexto é o divisor

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de águas entre a comunicação massiva e a comunicação interativa, ou seja, é a responsável

pela disposição interativa, que passa a ser o marco distintivo do computador (SILVA, 2006b).

A interatividade, nessa perspectiva, refere-se a um conceito de comunicação, e não de

informática, podendo ser empregada para significar a comunicação entre interlocutores

humanos, entre humanos e máquinas e entre usuário e serviço. No entanto, para que haja

interatividade, é preciso garantir basicamente duas disposições: dialógica, que associa

emissão e recepção como polos antagônicos e complementares na cocriação da comunicação,

e a intervenção do usuário ou receptor no conteúdo da mensagem ou do programa abertos a

manipulações e modificações. Essas disposições refletem uma mudança no esquema clássico

de comunicação e são consideradas essenciais ao entendimento do conceito complexo de

interatividade. Sendo assim, faz-se necessário atentar para o sentido depurado do termo, na

perspectiva de superação da lógica unidirecional, que separa a emissão ativa e recepção

passiva (modelo “um-todos”) e propõe o modelo colaborativo “todos-todos”, representado

pela tríade emissão-recepção-mensagem, melhor explicada no quadro abaixo:

Quadro 2 – Comparação entre as modalidades unidirecional e interativa

A COMUNICAÇÃO

MODALIDADE UNIDIRECIONAL

MODALIDADE INTERATIVA

MENSAGEM: fechada, imutável, linear, sequencial.

MENSAGEM: modificável, em mutação, na medida em que responde às solicitações daquele que a manipula.

EMISSOR: “contador de histórias”, narrador que atrai o receptor (de maneira mais ou menos sedutora e/ou por imposição) para o seu universo mental, seu imaginário, sua récita.

EMISSOR: “design de software”, constrói uma rede (não uma rota) e define um conjunto de territórios a explorar; ele não oferece um história a ouvir, mas um conjunto intrincado (labirinto) de territórios abertos a navegações e dispostos a interferências, a modificações.

RECEPTOR: assimilador passivo

RECEPTOR: “usuário”, manipula a mensagem como coautor, cocriador, verdadeiro conceptor.

Fonte: Silva (2006b, p. 70).

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Dessa maneira, interatividade deve ser compreendida em sintonia com seus

fundamentos, que trazem em si a perspectiva da comunicação como cocriação, apresentados

por Silva (2006) através dos binômios participação-intervenção, bidirecionalidade-hibridação

e permutabilidade-potencialidade.

O binômio participação-intervenção implica a possibilidade de intervenção do sujeito,

significa interferir na mensagem de modo sensório-corporal e semântico. O segundo binômio,

bidirecionalidade-hibridação, traz a perspectiva de que a comunicação é produção conjunta da

emissão e da recepção, é cocriação, em que os dois polos codificam e decodificam: já não há

mais emissor e receptor, pois todo emissor é receptor e vice-versa. O terceiro e último

binômio, permutabilidade-potencialidade, implica que a comunicação supõe múltiplas redes

articulatórias de conexões e liberdade de trocas, associações e significações potenciais,

destacando a possibilidade de o usuário buscar informações de modo não sequencial,

construindo suas próprias narrativas e percursos.

É importante perceber que, para haver interatividade, não é imprescindível a presença

das TICs, pois ela está relacionada à disponibilização de um mais comunicacional. Além

disso, é preciso considerar que nem todas as comunicações realizadas por meio das

tecnologias oferecem a perspectiva interativa. Há informações que são transmitidas ainda

seguindo o modelo linear das mídias de massa, mesmo sendo as TICs potencializadoras de

uma outra forma de comunicação.

Do mesmo modo, na educação online as interfaces presentes nos AVAs trazem

possibilidades interativas para processo educativo, que podem representar a superação entre

um modelo de educação tradicional baseado na distribuição de informações e uma outra

educação que perceba o aluno como sujeito interagente do processo de construção de

conhecimentos. No entanto, ainda há práticas na educação online que concebem o aluno como

sujeito passivo, que deverá absorver as informações e reproduzi-las.

Essa nova lógica comunicativa requer dos professores um rompimento com um

modelo de educação que centraliza a ação comunicativa na figura do professor e mantém o

aluno numa posição de consumidor de informação. O professor que quiser lançar mão da

interatividade atuará não mais como guardião e transmissor de conhecimentos, mas como um

“formulador de problemas, provocador de situações, arquiteto de percursos, enfim, agenciador

da construção do conhecimento na experiência viva da sala de aula” (SILVA, 2004, p. 102).

As possibilidades tecnológicas para o desenvolvimento de uma educação online

interativa já existem; contudo, agora há uma necessidade de preparar os professores para atuar

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com essas tecnologias, pois, como já percebemos, eles não poderão mais ser simplesmente

professores convencionais com a mesma postura de disseminadores de informações. Será

importante que o professor, além dos conhecimentos teóricos e tecnológicos, esteja aberto

para o mais comunicacional, para deixar o aluno expor suas ideias e trilhar seus próprios

caminhos.

O aprendiz, por sua vez, não atuará mais como receptor de conhecimentos a serem

reproduzidos no dia da prova. Ele adentra e opera com os conteúdos de aprendizagem

propostos pelo professor. Neles inscreve sua emoção, sua intuição, seus anseios, seu gosto,

sua imaginação, sua inteligência, na perspectiva da coautoria.

Na busca de promover uma modificação qualitativa da modalidade comunicacional na

ação pedagógica, Silva (2004, p. 103-105) sistematizou alguns indicadores de interatividade

em educação presencial e online que interligam engajamentos do professor capazes de

promover a superação da prevalência da pedagogia da transmissão, conforme apontado no

primeiro capítulo. Esses indicadores apresentam-se detalhados em um dos anexos deste

estudo.

Essas cinco linhas, conforme aponta Silva (2004, 2006b), possibilitam a modificação

da tradicional sala de aula seja presencial ou online, uma vez que a principal função do

professor não é mais a difusão de conhecimentos, que é feita de forma eficaz por outros

meios. Na educação online, principalmente, a web abre essa perspectiva, mas é preciso cuidar

para que a tecnologia digital não seja subutilizada e para que haja de fato interatividade.

2.5 OS DESAFIOS DO PROFESSOR NA EDUCAÇÃO ONLINE

O professor vem modificando suas funções ao longo dos tempos, de acordo com o

paradigma da educação vigente em cada época. Cada abordagem educacional reivindica um

perfil distinto de professor.

Na EAD de cunho autoinstrucional, existe uma rígida divisão entre aqueles que

planejam (chamados de professores conteudistas) e os que executam (habitualmente

denominados tutores). Dessa forma, as atribuições do profissional que faz o acompanhamento

dos alunos, o tutor, acabam se limitando ao esclarecimento de dúvidas (operacionais,

organizacionais ou de compreensão da matéria) e execução de conteúdos estáticos que partem

de um polo emissor para uma comunicação de massa unidirecional.

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Dentro dessa perspectiva, Belloni (2008) apresenta um modelo de racionalização do

trabalho docente na EAD e justifica: “Considerando que de modo geral os sistemas de EAD

lidam com grande número de estudantes, fica clara a necessidade de um processo de trabalho

racionalizado e segmentado” (BELLONI, 2008, p. 81). A autora indica a exigência de um

desdobramento da função docente, transformando o professor indivíduo em professor

coletivo, representado por uma equipe de trabalho formada por profissionais de distintas áreas

de atuação (técnicos de web, programação, design instrucional, especialistas em conteúdo,

roteiristas, pedagogos, etc.). Dessa forma a divisão do trabalho, que separa a atividade

docente entre planejamento e execução, promoveria um processo de ensino mais objetivo e

eficaz.

Santos (2006b) atenta para o risco da disjunção dos papéis do professor online, como

se verifica quando cada uma das funções é exercida de forma isolada em relação às demais, e

apresenta a abordagem de um especialista de uma universidade brasileira que separa

burocraticamente a ação do professor em compartimentos, como podemos ver a seguir:

- Professor autor – elabora conteúdos para materiais didáticos de EAD;

- Professor instrutor – ministra aulas complementares ao material didático, síncrona ou

assincronamente, intermediadas por tecnologias (chats, fóruns, videoconferência,

televisão, etc.);

- Professor tutor – auxilia os autores e instrutores e, principalmente, os alunos, a serem

bem-sucedidos no processo de ensino-aprendizagem. Não têm permissão para

modificar os conteúdos e linhas pedagógicas propostas pelos autores-coordenadores

do curso.

Tal distinção burocrática, que separa as funções entre os que pensam e os que fazem,

reduz a autoria do professor à elaboração de conteúdos a serem transmitidos aos alunos,

reforçando práticas que não se encontram de acordo com a perspectiva da cibercultura

(SANTOS, 2006b).

Em consonância com o pensamento de Santos, Mill e Viana (2007, p. 2) demonstram

que esse quadro se relaciona com a perpetuação da divisão técnica do trabalho, que separa o

saber do agir:

Em geral, o tutor virtual não possui autonomia no desenvolvimento do seu trabalho. Suas atividades constituem, geralmente, um processo de mediação da relação ensino-aprendizagem, pois não é ele o responsável pela elaboração do material didático. Esse processo de produção-distribuição do

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conhecimento na docência da EaD está submetido, claro, a todas as implicações da divisão social e técnica do trabalho, influenciando aspectos como autonomia do trabalhador, subordinação e relações de poder, produção e distribuição do conhecimento etc.

Valente e Mattar (2007) questionam essa excessiva divisão do trabalho no modelo

fordista de EAD, que distingue não apenas a figura do autor/conteudista e do tutor, mas

fragmenta a teoria da prática. Assim, sugerem que os professores envolvidos com educação

online não devam apenas produzir seus conteúdos online, mas também utilizar esses

conteúdos adequadamente com seus alunos no sentido de construção de conhecimento.

Afirmam que as instituições, antes de investir em conteúdo, devem investir na formação de

seus aututores – neologismo que utilizam para designar o profissional que transcende a

divisão entre o pensar e o agir na educação online.

Como consequência de um fazer pedagógico segmentado, muitos professores

permanecem atrelados a uma prática baseada na concepção “bancária” de educação,

oferecendo ao aluno informações como pacotes fechados, que devem ser apreendidas através

da memorização e reprodução.

Alves e Nova (2003, p. 6), ao buscar compreender tal fato, afirmam que:

Uma grande parte desses cursos é estruturada a partir de uma concepção tradicional de educação (muitas vezes velada sob uma roupagem mais avançada), em que o objetivo do processo de aprendizagem é apenas a reprodução de um conhecimento já estabelecido, propiciando poucas condições efetivas para uma construção do conhecimento mais criativa, a ser realizada pelos sujeitos dessa prática educativa. Reproduz-se, dessa forma, um modelo pedagógico já saturado, impedindo a exploração dos potenciais trazidos pelas estruturas da comunicação em rede. Os cursos online tornam-se, assim, espelhos daquilo que há de pior no ensino presencial de hoje, com o agravante de estarem sendo apresentados para a população como uma das grandes inovações educacionais dos últimos tempos.

Nesse sentido, não é possível transpor expedientes próprios da docência presencial

para aquela que é desenvolvida por meio de ambientes virtuais de aprendizagem, uma vez que

cada uma tem uma maneira bastante peculiar de o professor conceber o planejamento, a

organização das informações e a mediação pedagógica (PRADO; ALMEIDA, 2007).

Até aqui discuti o papel de um professor que, ainda que utilize suporte digital, não

pode ser considerado um docente online, pois seu fazer não está de acordo com as

possibilidades comunicacionais próprias da cibercultura. Na verdade, vimos que há práticas

que subutilizam o ambiente digital, mas que são próprias da EAD tradicional, pautadas no

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modelo “um-todos”. Contudo a educação online apresenta especificidades e traz desafios

próprios de ordem educacional e tecnológica na atuação do docente online, que irá lidar com

novos papéis e funções, ainda que apresentem algumas semelhanças em relação aos

expedientes próprios da sala de aula presencial ou, ainda, da educação a distância via suportes

unidirecionais.

Com o advento da educação online, a partir do paradigma da cibercultura, os papéis do

professor se multiplicam e se diferenciam, “exigindo uma grande capacidade de adaptação e

criatividade diante de novas situações, propostas, atividades” (MORAN, 2006, p. 43). Um

primeiro desafio refere-se à própria cena sociotécnica contemporânea, marcada pela

cibercultura e pela interatividade, conforme é apontado por Silva (2005):

Hoje temos a cibercultura. Distanciados dela os professores não se dão conta da mudança paradigmática em informação e comunicação que se opera em nosso tempo. Em síntese, eles perdem ou retardam a urgente percepção de modificações decisivas na informática, na esfera social e no cenário das comunicações.

Nessa perspectiva, Silva (2006b) afirma que no ambiente online o professor terá de

modificar sua velha postura, inclusive para não subutilizar a interatividade própria do digital

online. No lugar da memorização e da transmissão centradas no seu falar-ditar, o professor

propõe a aprendizagem aos estudantes modelando os domínios do conhecimento como

espaços abertos à navegação, manipulação, colaboração e criação. Ele propõe o conhecimento

em teias (hipertexto) de ligações e de interações, permitindo que os alunos construam seus

próprios mapas e conduzam suas explorações.

Lévy (1999) utiliza duas expressões para falar do professor na cibercultura: arquiteto

cognitivo e engenheiro do conhecimento. Para ele, o educador é aquele profissional

responsável por traçar e sugerir caminhos na construção do saber. O docente, ao superar o

paradigma da transmissão, torna-se “um formulador de problemas, provocador de situações,

arquiteto de percursos, mobilizador da experiência do conhecimento” (SILVA, 2004, p. 107).

O papel do professor é o de criar as possibilidades, a ambiência, o contexto de dialógica, de

colaboração e de, principalmente, interatividade.

Em consonância, Almeida (2008) aponta que a atuação do professor na educação

online pode afetar a intensidade da interatividade entre os alunos; quando os professores

mantêm o foco do diálogo entre si mesmos e os alunos, as interações entre os alunos tendem a

diminuir. Os processos colaborativos e a interlocução se estabelecem entre os alunos quando

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os professores criam situações para o debate, e deixam fluir o diálogo fazendo intervenções

esporádicas, sintetizando ideias, provocando reflexões e evitando o diálogo com um único

aluno.

Um outro desafio que merece ser apontado é o tecnológico e refere-se ao instrumento

de trabalho do docente online, o computador conectado, que traz em seu bojo o pressuposto

de convergência de mídias em que, em um único artefato tecnológico, concentram-se

diferentes formas de expressar o pensamento e representar o conhecimento pela integração de

linguagens verbais, icônicas, sonoras, visuais, textuais e hipertextuais. Estas proporcionam

novos modos de criar, pensar, comunicar, interagir, aprender e ensinar; da mesma forma,

viabilizam o exercício do diálogo, a polifonia em relação à forma e ao conteúdo, e a

reconstrução de significados (ALMEIDA, 2008).

Esse desafio tecnológico nos guia a outro, de ordem educacional. Apesar de

potencializarem uma educação online interativa e de qualidade, as tecnologias não constituem

a garantia de que o docente trabalhará nesse sentido, conforme é apontado por Almeida

(2008):

As possibilidades proporcionadas à EAD pela TICs tanto podem otimizar processos centrados em métodos instrucionais que reforçam a rápida e eficiente transmissão de informações, o controle da participação do aluno pela quantidade de acessos às atividades e resultados produzidos, a aplicação de sofisticados processos automatizados de avaliação somativa e feedbacks padronizados, quanto podem significar o desenvolvimento de atividades com alto nível de interação e produção de conhecimento.

Portanto,

[...] antes de selecionar as tecnologias de suporte, há de se considerar intenções, objetivos, condições contextuais, incluindo as condições de aprendizagem dos alunos e as suas possibilidades de acesso às tecnologias, os conteúdos e as estratégias a desenvolver. A complexidade desse processo evidencia que não há uma tecnologia que solucione todas as situações educacionais. Os objetivos educacionais e as necessidades contextuais são as referências indicadoras para se identificar as tecnologias e abordagens educacionais mais adequadas (ALMEIDA, 2008)

Como consequência da educação online, papéis tradicionais de professores e alunos

sofrem profundas mudanças, posto que o professor, em vez de transmitir meramente os

saberes, precisa aprender a disponibilizar múltiplas experimentações, educando com base no

diálogo, na construção colaborativa do conhecimento, na provocação à autoria criativa do

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aprendiz. Na verdade, como já visto, essa orientação tem sido dada historicamente por

importantes educadores dedicados à modalidade presencial, como Freire, Vygotsky e Tardif.

Doravante, teremos o paradigma comunicacional da cibercultura corroborando as orientações

pedagógicas desses valorosos educadores.

2.6 SABERES DOCENTES E FORMAÇÃO DO PROFESSOR

As atuais pesquisas sobre formação e profissão docente apontam para uma revisão da

compreensão da prática pedagógica do professor. Essas investigações enfatizam que os

fundamentos do saber ensinar não se reduzem a um sistema cognitivo, mas são, a um só

tempo, existenciais, sociais e pragmáticos (TARDIF et al, 1991; TARDIF, 2006).

A partir da década de 90 passou-se a estudar a constituição do trabalho docente

levando-se em conta os diferentes aspectos de sua história, como individual, profissional,

entre outros. Essa virada nas investigações passou a ter o professor como foco central em

estudos e debates, considerando o quanto a vida pessoal acaba por interferir na profissional.

Nessa perspectiva de analisar a formação de professores, a partir da valorização desse

profissional, é que os estudos sobre os saberes docentes ganham impulso, numa busca de se

identificarem os diferentes saberes implícitos na prática docente.

Tardif (2006) chama de “epistemologia da prática profissional” o estudo do conjunto

dos saberes utilizados pelos profissionais em seu espaço de trabalho cotidiano para

desempenhar suas tarefas. Aqui, a noção de saber tem sentido amplo, compreendendo os

conhecimentos, as competências, as habilidades e as atitudes. A finalidade de uma

epistemologia da prática profissional é revelar esses saberes, compreender como são

integrados nas tarefas dos profissionais, e como estes mesmos profissionais os incorporam,

produzem, utilizam, aplicam e transformam, ao longo das diferentes etapas de sua carreira.

Nóvoa (1995) aponta que essa nova abordagem veio em oposição aos estudos

anteriores que acabavam por reduzir a profissão docente a um conjunto de competências e

técnicas, gerando uma crise de identidade dos professores em decorrência de uma separação

entre o eu profissional e o eu pessoal. Nessa perspectiva, Tardif (2006) utiliza a expressão

“saberes docentes”, adotada na presente investigação, em vez de “competências”, largamente

utilizada em pesquisas sobre o papel do docente em ambientes não presenciais, por considerar

que esses saberes carregam a marca do próprio trabalhador.

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Segundo Borges (2001), o fato de terem sido desenvolvidas fora do Brasil e

repercutirem aqui não inviabiliza essas pesquisas sobre saberes docentes.

O que distingue uma nação de outra é o grau de avanço, implantação, implementação, avaliação etc. desses discursos e práticas, bem como a forma como estes se difundem e são incorporados pelas instituições e agentes sociais. Acrescentando-se a isso, evidentemente, o próprio desenvolvimento social, político, econômico, cultural etc. de cada país que está na base dos interesses e desafios sociais. Sob essa ótica, a repercussão não é em si um aspecto negativo, problemática é a forma de transferibilidade que ela assume (BORGES, 2001, p. 74).

Para Borges (2001), trata-se de um movimento inevitável que tem orientado estudos

brasileiros na busca de novos caminhos de pesquisa sobre os saberes e a formação docente,

mas com características próprias de nossa realidade. É o caso, por exemplo, de Pimenta

(1999), que desenvolve uma pesquisa a partir de sua prática com alunos de licenciatura e

destaca a importância da mobilização dos saberes da experiência para a construção da

identidade profissional do professor.

Em seus estudos Tardif et al (1991) e Tardif (2006) constatam que o saber do

professor é plural, estratégico e desvalorizado. Plural porque é composto de saberes de

variadas áreas do conhecimento; estratégico pelo impacto junto às gerações jovens, às

construção de novos conhecimentos e à definição de hegemonias no contexto social, entre

outro fatores; e desvalorizado, porque a sociedade não lhe reserva, no pódio da ciência, papel

tão importante quanto o da comunidade científica e dos grupos reconhecidos como produtores

de saber.

Ancorado na ideia de que os saberes são plurais e envolvem uma diversidade de

conhecimentos, Tardif (1991, 2006) identifica quatro fontes de origem para eles, que podem

ser oriundos da formação profissional (o conjunto de saberes transmitidos pelas instituições

de formação de professores), de saberes disciplinares (saberes que correspondem ao diverso

campo do conhecimento e emergem da tradição cultural), curriculares (programas escolares) e

experienciais (do trabalho cotidiano). Essa pluralidade exige do professor capacidade de

dominar, integrar e mobilizar tais saberes enquanto condição para sua prática.

Tardif (2006) também chama nossa atenção para a dimensão temporal dos saberes do

professor, por estes serem adquiridos no contexto de uma história de vida e de uma carreira

profissional. Nesse sentido, os estudos de Josso (2004) sobre história de vida e formação

corroboram a perspectiva de Tardif. Para Josso, o trabalho a partir de relatos de histórias de

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vida valoriza a reflexividade produzida a partir de vivências singulares e permite ao indivíduo

conhecer seus próprios recursos e fragilidades, além de fornecer novas perspectivas de

trabalho como subsídios para a prática profissional. Para a autora, as histórias de vida tornam-

se relevantes para que “os autores de narrativas consigam atingir uma produção de

conhecimentos que tenham sentido para eles e que eles próprios se inscrevam num projeto de

conhecimento que os institua como sujeitos” (JOSSO, 2004, p. 25).

Essa dimensão temporal é marcada por uma tripla caracterização desses saberes, como

sociais, pragmáticos e existenciais. Inicialmente, Tardif (2006) aponta para uma natureza

social do saber docente, contrapondo-o ao modelo cognitivo no qual o conhecimento é

reduzido, e ressalta que esse saber é produzido no contexto de uma socialização profissional,

decorrendo daí a importância da interação dos professores com seus pares, partilhando

experiências de ensino e construindo um discurso da experiência que contribua com a

formação de outros docentes.

Nessa perspectiva social do saber docente, Tardif e Lessard (2007) apontam que as

situações escolares cotidianas, de onde emergem os saberes do professor, são situações sociais

caracterizadas por interações elementares entre seres humanos. O saber é social porque seus

próprios objetos são sociais, e, ao ensinar, o professor está agindo com outros seres humanos.

A interatividade caracteriza o principal objeto do trabalho do professor, pois o essencial de sua atividade profissional consiste em entrar numa classe e deslanchar um programa de interações com os alunos. Isto significa que a docência se desenrola concretamente dentro das interações (TARDIF; LESSARD, 2007, p. 235).

Em seguida, o trabalho surge nas pesquisas de Tardif (2006) como fio condutor dos

saberes do professor, sugerindo que os saberes docentes sejam compreendidos na relação com

o trabalho na escola e na sala de aula. Portanto, o saber está a serviço do trabalho. Nesse

sentido, os saberes estão completamente ligados às funções dos professores, e é através do

cumprimento dessas funções que eles são mobilizados, modelados e construídos. Essa

perspectiva pragmática reforça a hipótese de que a relação dos professores com os saberes

nunca são relações estritamente cognitivas, mas são mediadas pelo trabalho que lhes fornece

princípios para enfrentar e solucionar situações cotidianas.

Por fim, ainda numa perspectiva de dimensão temporal, vale ressaltar a acepção

existencial que os saberes adquirem “no sentido de que um professor ‘não pensa só com a

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cabeça’, mas ‘com a vida’, com o que foi, com o que viveu, com aquilo que acumulou em

termos de experiência de vida, em termos de lastro de certezas” (TARDIF, 2006, p. 103).

Tardif (2006) propõe que a formação para o magistério seja repensada à luz dos

saberes docentes, levando-se em conta as realidades específicas do trabalho cotidiano do

professor. Nesse sentido, deveria haver um equilíbrio entre os conhecimentos produzidos

pelas universidades e os saberes desenvolvidos pelos professores em suas práticas cotidianas,

superando conhecimentos disciplinares. A formação dos professores deveria acontecer

baseada nos conhecimentos específicos da sua profissão, de modo que os docentes fossem

vistos como sujeitos do conhecimento.

Embora as reflexões de Tardif se refiram ao saber do docente que atua na sala de aula

convencional, no espaço-tempo presencial, suas considerações podem ser relacionadas ao

contexto da educação online, desde que compreendidas as especificidades dessa modalidade.

Assim, é possível considerar que o contexto do trabalho em ambientes virtuais de

aprendizagem é mais uma situação específica da ação docente, que incorpora novos aspectos,

mas conserva algumas características essenciais do trabalho desse profissional. Portanto, nos

próximos capítulos discutirei de forma mais aprofundada sobre os saberes docentes que

emergem de situações online de aprendizagem.

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3 A METOLOGIA E O CONTEXTO DA PESQUISA

A VERDADE 8

A porta da verdade estava aberta, Mas só deixava passar

Meia pessoa de cada vez. Assim não era possível atingir toda a verdade,

Porque a meia pessoa que entrava Só trazia o perfil de meia verdade,

E a sua segunda metade Voltava igualmente com meios perfis

E os meios perfis não coincidiam verdade... Arrebentaram a porta.

Derrubaram a porta, Chegaram ao lugar luminoso

Onde a verdade esplendia seus fogos. Era dividida em metades Diferentes uma da outra.

Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.

Nenhuma das duas era totalmente bela E carecia optar.

Cada um optou conforme Seu capricho,

sua ilusão, sua miopia.

Carlos Drummond de Andrade

Neste capítulo apresento os desafios com os quais me deparei ao longo da pesquisa.

Para tanto, o capítulo foi dividido em quatro seções. Na primeira, apresento o campo

escolhido e o recorte da pesquisa. Em seguida, delineio a opção metodológica pela abordagem

histórico-cultural como perspectiva de pesquisa qualitativa, alicerçada na ideia de que é na

constante dialógica e na interatividade entre todos os sujeitos da pesquisa que será possível

compreender os saberes emergentes da docência online. Na terceira seção descrevo os

dispositivos metodológicos utilizados para coleta de dados, a saber, a entrevista e a

observação, assim como os dispositivos empregados para sua análise. Ainda nessa seção,

apresento os principais sujeitos da pesquisa que participaram das entrevistas e cuja prática foi

observada. Por fim, buscando melhor situar o leitor, apresento o locus da pesquisa, o ambiente

Moodle e algumas de suas principais interfaces.

8 Disponível em <http://memoriaviva.com.br/drummond/poema072.htm> Acesso em 14 out. 2007.

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3.1 O CAMPO DE PESQUISA

3.1.1 A definição do campo de pesquisa

Em março de 2007, enquanto aluna da disciplina Prática de Pesquisa, fui apresentada

pelo professor Marco Silva, meu orientador, ao embrião de um projeto interinstitucional

denominado Formação de Professores para Docência Online9. O projeto consistia na reunião

de diversos programas de pós-graduação (PPGs) em educação e comunicação digital em

ambiente Moodle, com vistas ao desenvolvimento de conteúdos de aprendizagem e de

estratégias docentes para cursos via internet dirigidos à formação de professores para

docência online. Cada programa seria responsável pelo desenho didático e docência online de

uma disciplina do curso, e seus membros também atuariam como cursistas nas outras

disciplinas.

Junto à apresentação, veio o convite para ter o projeto como campo de minha

investigação. Confesso que inicialmente relutei em aceitar: talvez por ter definido em meu

pré-projeto de pesquisa que o campo seria o curso de Pedagogia do Consórcio CEDERJ –

onde atuo como tutora a distância, talvez pelo receio em relação ao inusitado e a essa

inovadora proposta, ou ainda por sua própria dimensão. Tal fato me remeteu a Morin (1999),

que traz como um dos saberes necessário à educação do futuro o enfrentamento das

incertezas: “Ainda não incorporamos a mensagem de Eurípedes, que é a de estarmos prontos

para o inesperado” (p. 79).

No entanto, dia após dia meu envolvimento com o projeto crescia, afinal, nos

encontros de prática de pesquisa, eu vinha participando de cada parte do processo do projeto

do curso: o convite aos docentes dos PPGs, a elaboração da proposta e seu referencial teórico,

a construção das ementas, a proposta de desenho didático. Acabei sendo seduzida, aceitei o

desafio de ter o projeto interinstitucional como campo e abracei firmemente essa nova

experiência.

Participam dessa proposta doze PPGs de onze universidades públicas e privadas do

Brasil e de Portugal. Na pesquisa, as equipes criam e professoram um curso de especialização

sobre formação de professores para docência online, experimentando a construção do desenho

de conteúdos e de atividades, a docência e a aprendizagem na sala de aula online. Cada

9 O capítulo 4 dedica-se à definição detalhada desse projeto que se tornou o campo da pesquisa.

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programa, com sua equipe de pesquisadores (no máximo cinco, entre professores e

orientandos), produz um ou dois módulo(s) do curso e em seguida exercita a docência do(s)

mesmo(s) e, ainda, tornam-se discentes dos outros módulos da pesquisa interinstitucional. Ao

término de cada módulo, todos os pesquisadores são convidados participar de um fórum

voltado para a heteroavaliação10 do curso, quando todos os pesquisadores avaliam os

processos de desenho didático, mediação e discência de cada módulo.

A produção e a execução do curso, tendo todos os integrantes como criadores, como

docentes e como discentes, resultarão na experiência da pesquisa propriamente dita. A

produção de conhecimento efetuada na execução do curso (preparação, docência e

aprendizagem) resultará em relatórios, artigos, dissertações, teses, em um livro coletivo e em

um curso online de especialização lato sensu.

O principal objetivo do projeto é formar docentes para criação de cursos online e

exercício da docência online, discutindo e exercitando a própria docência em ambientes

online de aprendizagem enquanto formação dos integrantes da pesquisa coletiva. Além disso,

busca-se articular a docência e a produção técnica do desenho didático, preparando

professores para utilizar tecnologias digitais online como potencializadoras da docência e da

aprendizagem na educação superior, assim como divulgar experiências, projetos e trabalhos

sobre o uso da modalidade online na formação de docentes e profissionais da educação como

técnicos e gestores e, por fim, construir projetos educacionais para ambientes online de

aprendizagem a partir do desenho didático interativo, da utilização de interfaces de

comunicação11, de conteúdos multimídia e de objetos de aprendizagem.

A relevância dessa proposta está no fato de a formação continuada de professores para

a docência online apresentar-se como demanda da cibercultura, da sociedade da informação,

10 “A heteroavaliação é realizada por uma outra pessoa ou por uma equipe. Pode ser executada, por exemplo, pelo professor, ao avaliar seus alunos, pelo diretor de uma escola, ao avaliar o trabalho docente [...]. É muito útil para conhecimento de aspectos do processo com os quais os avaliadores e os avaliados estão muito envolvidos, pois o avaliador lança um olhar externo sobre o objeto da avaliação, podendo assim contribuir com visões diferentes das do avaliado sobre a função da educação, os padrões de desempenho desejável e os métodos de avaliação”. Disponível em <http://www.tvebrasil.com.br/SALTO/boletins2003/saeb/tetxt1.htm> Acesso: 17 nov. 2009. 11 A maior parte dos autores utiliza a expressão “ferramentas de comunicação” para designar os dispositivos virtuais que possibilitam a interatividade entre os participantes do curso, como o chat, fórum, wiki, entre outros. No entanto, concordando com Silva (2004), opto pela expressão “interfaces de comunicação”, que na cibercultura ganha sentido de dispositivo de encontro para duas ou mais faces, em atitude comunicacional, dialógica e polifônica. Para o autor, a ferramenta é o utensílio do trabalhador e do artista empregado nas artes e nos ofícios, que realiza a extensão do músculo e da habilidade humana na fabricação e na arte, própria da sociedade industrial, da fabricação, da manufatura, portanto, termo inadequado para exprimir o sentido de ambiente no ciberespaço.

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da era digital. O alastramento da presença do computador online é inarredável no cotidiano

das pessoas, constituído por novas práticas comunicacionais (e-mails, listas, weblogs,

jornalismo online, webcams, chats, etc.) e novos empreendimentos que aglutinam grupos de

interesse (cidades digitais, games, software livre, ciberativismo, arte eletrônica, MP3, etc.).

Portanto, formar o educador em sintonia com esse contexto significa prepará-lo para incluir

criticamente os cidadãos no cenário sociotécnico do nosso tempo. Essa formação se faz

proporcionando-lhe a construção de competências e de autonomia para a construção de

projetos pedagógicos que utilizam as tecnologias digitais offline e online como

potencializadoras da docência e da aprendizagem. Desenvolvido na modalidade online, este

curso de especialização traz em sua prática o engajamento do professor cursista capaz de

promover e avaliar a aprendizagem lançando mão de interfaces digitais (fórum, chat, blog e

portfolio) e então formar e educar.

O curso encontra-se organizado em três blocos temáticos, a saber: (1) Fundamentos da

Educação Online, (2) Dispositivos e Interfaces e (3) Prática Pedagógica. Em cada bloco

temático são oferecidos alguns módulos, totalizando treze. Cada módulo ocupa um “tópico”

no ambiente Moodle e possui conteúdos e atividades que perfazem 30 horas de duração,

distribuídas ao longo de um mês. O quadro 3 apresenta a organização de cada bloco:

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Quadro 3 - Organização do curso Formação de Professores para Docência Online

Blocos Temáticos

Módulos

Cibercultura e educação

Políticas de educação e comunicação no Brasil

Psicologia da aprendizagem

Bloco 1: FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO ONLINE

Educação e comunicação interativas

A internet e suas interfaces

Ambientes online de aprendizagem

Multimídia e educação

Cartografia cognitiva e investigativa

Bloco 2: DISPOSITIVOS E

INTERFACES

Computador/internet e suas implicações para a aprendizagem Desenho didático

Docência e avaliação da aprendizagem em educação online Metodologia da pesquisa qualitativa online

Bloco 3: PRÁTICA PEDAGÓGICA

Estudos de caso na educação online

A origem do projeto tange o primeiro semestre de 2007, ocasião em que os PPGs

foram convidados pelo coordenador geral a participar da proposta, montar sua equipe de

trabalho com seus orientandos e optar pela temática de seus módulos. De agosto de 2007 a

março de 2008 todas as equipes construíram seu desenho didático e em agosto de 2008

tiveram a oportunidade de participar de uma oficina sobre o AVA Moodle, oferecida por uma

das equipes do próprio projeto, a fim de se familiarizarem com o ambiente da pesquisa e

conhecerem as suas principais interfaces de comunicação. Desde abril de 2008, cada equipe

de PPG vem realizando a docência do seu módulo, um a cada mês, enquanto as outras equipes

são discentes. Essa etapa está prevista para finalizar em maio de 2009. Ao término da fase de

docência, as equipes produzirão os relatórios finais e artigos para publicação e, então, cada

PPG poderá dar início ao curso lato sensu pela sua universidade, aplicando o conhecimento

construído ao longo da pesquisa.

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3.1.2 A delimitação da pesquisa

Diante desse amplo projeto de educação online, optei junto ao grupo de pesquisa por

delimitar a área de abrangência da presente pesquisa no primeiro bloco temático do curso,

denominado “Fundamentos da Educação Online”, oferecido no período de maio a agosto de

2008 e composto por quatro módulos, a saber: Cibercultura e Educação; Políticas de

Educação e Comunicação no Brasil; Psicologia da Aprendizagem; Educação e Comunicação

Interativas.

O quadro 4 apresenta a ementa, o período de cada módulo e a definição da equipe

responsável de cada módulo do bloco 1:

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Quadro 4 - Organização do bloco temático 1 – Fundamentos da Educação Online

FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO ONLINE

Módulos Ementas Período Equipe

Cibercultura e Educação

Características da sociedade mediada pelas tecnologias digitais de comunicação e informação. Desafios da sociedade em rede, da sociedade da informação. O fenômeno da cibercultura e suas implicações nos processos de aprendizagem na cidade e no ciberespaço.

Maio/2008

PPGE de uma universidade pública de Portugal

Políticas de Educação e Comunicação no Brasil

Estudo das atuais políticas e legislações nas áreas da Educação (programas do SEED/MEC para uso do computador, das mídias digitais e da EAD e sua legislação atual) e da Comunicação (TV Digital, acesso à rede, sociedade da Informação no Brasil).

Junho/2008

PPGE de uma universidade privada do Brasil.

Psicologia da Aprendizagem

Teoria sócio-histórica da aprendizagem e suas implicações na cibercultura. Uso do computador e da internet como instrumentos culturais de aprendizagem. Pressupostos teóricos e metodológicos do sociointeracionismo, da aprendizagem significativa e da ecologia cognitiva.

Julho/2008

PPGE de uma universidade pública do Brasil.

Educação e Comunicação Interativas

Teorias e práticas da interatividade. Pressupostos da interatividade na sala de aula online. A autoria do professor na cocriação da comunicação e do conhecimento.

Agosto/2008

PPGE de uma universidade privada do Brasil.

3.2 A METODOLOGIA DA PESQUISA

3.2.1 A escolha da metodologia

À medida que passei a conhecer mais detalhes do projeto interinstitucional, fui

percebendo alguns desafios que teria ao longo da realização da pesquisa. Desempenharia uma

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tripla atuação: como docente online, como discente e como pesquisadora. A essa

multiplicidade de papéis, somava-se a complexidade da própria pesquisa: diversos docentes

reunidos em um AVA que traz inúmeras possibilidades e caminhos, repletos de práticas

dialógicas em seus fóruns, chats e outras interfaces. Além disso, sabia que não poderia ter

uma prática investigativa incoerente com os pressupostos teóricos que embasam minha

investigação: como pesquisadora da interatividade, conceito que traz em sua concepção os

fundamentos participação-intervenção; bidirecionalidade-hibridação, permutabilidade-

potencialidade (SILVA, 2006a; 2006b), não seria possível uma postura investigativa neutra e

distante, pois, como nos alerta Freitas (2003, p. 26), “a tradição empirista da pesquisa nas

Ciências Humanas tem impedido muitas vezes uma maior aproximação e compreensão das

questões propostas para estudo”. Percebia que, enquanto pesquisadora em ciências humanas,

não poderia me limitar ao ato contemplativo, pois diante de mim estavam seres com voz e era

preciso falar com eles, estabelecer interlocução (FREITAS, 2007b).

Percebo que a pesquisa nas ciências humanas pode ter enfoques diversos orientados a

partir de diferentes referenciais. Cada perspectiva teórica é marcada por determinadas

concepções de homem, de ciência e de verdade, donde se conclui que uma opção

metodológica traduz, antes, uma opção filosófica, uma visão de mundo. Dessa forma, nas

discussões acerca dos pressupostos epistemológicos e metodológicos da minha pesquisa,

surgiram indagações valiosas: Como as opções teóricas se relacionariam com as

metodológicas? Como escolher ou privilegiar uma ou outra abordagem de pesquisa? Haveria

diversidade em meu olhar em cada papel? A multiplicidade de papéis na investigação

oportunizaria outras perspectivas? Percebi que meus próprios saberes estavam sendo

colocados em xeque.

Após algumas leituras e um levantamento sobre alternativas metodológicas, optei pela

pesquisa de cunho qualitativo, por considerá-la a mais adequada à investigação em ciências

humanas e por perceber que essa forma de pesquisa permite observar e analisar questões não

mensuráveis dos processos educacionais e de seus sujeitos, visando ao aprofundamento “no

mundo dos significados das ações e relações humanas, um lado não perceptível e não captável

em equações, médias e estatística” (MINAYO, 1999, p. 22).

Segundo Alves-Mazzotti (2001), a observação de fatos, comportamentos e cenários é

extremamente valorizada pelas pesquisas qualitativas, nas quais o objeto de estudo é abordado

de maneira ampla. É a forma adequada para entender a natureza de um fenômeno.

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Apesar de saber que minha opção pela pesquisa qualitativa era adequada, algumas

dúvidas epistemológicas e metodológicas, principalmente acerca dos procedimentos a serem

adotados para coleta e análise de dados, ainda permaneciam. Nesse momento tomei

conhecimento de um texto de Freitas (2002), chamado “A abordagem sócio-histórica como

orientadora da pesquisa qualitativa”, em que a autora analisa as perspectivas abertas pela

abordagem histórico-cultural para a investigação qualitativa no âmbito das ciências humanas,

apontando para uma forma de pesquisa considerada como uma relação entre os sujeitos,

portanto, dialógica, na qual o pesquisador é parte integrante do processo investigativo.

Através dessa leitura percebi que a perspectiva dialógica da abordagem histórico-cultural

vinha ao encontro de minha investigação sobre o conceito de interatividade na educação

online. A partir de outros estudos, leituras e debates, busquei aprofundar a compreensão

acerca da abordagem histórico-cultural, que passaria a orientar minha pesquisa.

A opção por essa abordagem me ajudou a perceber que meus desafios poderiam ser,

na verdade, aliados da pesquisa, pois, embora haja algumas delimitações e limitações das

atuações de docente online, discente e pesquisadora num mesmo AVA, cabe ponderar que se

trata de atividades muito próximas, que em certa medida se complementam, uma vez que todo

professor é um pesquisador de sua práxis, de seus alunos e de seu ambiente.

3.2.2 A abordagem histórico-cultural

Por se tratar de uma pesquisa voltada para a docência online numa perspectiva

interativa, considerada aqui uma prática que surge com o paradigma da cibercultura

(SANTOS, 2005; 2006a; 2006b), busquei os caminhos da dialógica e da transformação social

que caracterizam a essência no estudo do homem enquanto sujeito histórico e social.

Dessa forma segui a abordagem histórico-cultural (FREITAS, 2002, 2003, 2007a,

2007b), numa perspectiva de investigação qualitativa, que percebe os sujeitos como históricos

e marcados por uma cultura em que são criadores de ideias que produzem e reproduzem a

realidade social, sendo, ao mesmo tempo, produzidos e reproduzidos por ela.

Os indivíduos envolvidos não foram analisados como objetos de pura observação, mas

como sujeitos de estudo dentro de um contexto histórico e social (FREITAS, 2002, 2003),

transformando a pesquisa em um processo dialógico de acordo com a teoria enunciativa da

linguagem de Bakhtin (2004).

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A perspectiva histórico-cultural fundamenta-se em autores como Vygotsky e Bakhtin,

que criticam os paradigmas hegemônicos de sua época, mais preocupados com a objetividade

das ciências. Essa crítica foi especialmente dirigida ao referencial positivista, que, em sua

convicção de que a realidade é objetiva e apreensível, considera a ciência como um

conhecimento positivo, verdadeiro, obtido sob condições controladas. Dessa forma,

arquitetaram suas teorias em um entrelaçamento de sujeito e objeto, propondo uma síntese

dialética imersa na cultura e na história.

Bakhtin (2000) considera o homem como um ser que se expressa e se comunica, e se

ele é o centro de interesse da pesquisa nas ciências humanas, sua expressão, seu

texto/contexto são fontes significativas da pesquisa. Dessa forma, em seu texto “Por uma

metodologia das ciências humanas”, demonstra a necessidade de uma nova atitude em relação

à pesquisa nessa área, considerando que o homem em sua especificidade humana não pode ser

estudado utilizando os mesmos métodos das ciências exatas (BAKHTIN apud FREITAS,

2002).

Diferentemente da postura monológica do pesquisador nas ciências exatas, em que o

objeto é considerado mudo, necessitando ser contemplado para ser reconhecido, nas pesquisas

em humanas o homem é considerado um ser expressivo e falante, não podendo mais o

pesquisador simplesmente contemplá-lo, uma vez que se encontra diante de um sujeito que

tem voz.

De uma orientação monológica passa-se a uma perspectiva dialógica. Isso muda tudo em relação à pesquisa, uma vez que investigador e investigado são dois sujeitos em interação. O homem não pode ser apenas objeto de uma explicação, produto de uma só consciência, de um só sujeito, mas deve ser também compreendido, processo esse que supõe duas consciências, dois sujeitos, portanto, dialógico (FREITAS, 2002, p. 24).

Assim como Bakhtin, Vygotsky (1998, 2003) também considera que todo

conhecimento é construído na interação entre as pessoas e dessa maneira conclui que a

mediação do pesquisador também provoca alterações de comportamento. Nessa perspectiva, o

pesquisador faz parte da própria situação da pesquisa, a neutralidade é inexistente e suas ações

também terão efeitos na análise. Ressalta-se que o pesquisador, durante o processo de

investigação, como o investigado, também estará em processo de aprendizagem e

transformação e, ademais, passará a ressignificar o campo.

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A postura do pesquisador no processo é considerada de caráter fundamental, uma vez

que deve instaurar uma relação de confiança e diálogo, de modo que suas interferências

resultem na perspectiva de melhor compreensão dos sujeitos e dos fenômenos, da mesma

forma que as influências sofridas por ele também caracterizem os esforços de sua ação

compreensiva. Vale ressaltar, portanto, que a contextualização do pesquisador também é

relevante, uma vez que ele não é um ser humano genérico, e suas análises interpretativas são

feitas do lugar sócio-histórico no qual se situa e nas relações que estabelece com os sujeitos

com os quais interage (FREITAS, 2002, 2003).

3.3 DISPOSITIVOS METODOLÓGICOS

A partir das características da abordagem histórico-cultural como norteadora da

investigação, a observação e a entrevista são apontadas por Freitas (2002; 2003; 2007a;

2007b) como alguns dispositivos12 metodológicos coerentes com essa forma de produção de

conhecimento e, portanto, aqui adotados. A seguir situo algumas observações acerca dos

dispositivos de coleta e da análise de dados, além de descrever os sujeitos da pesquisa.

3.3.1 Coleta de dados

A observação

Na perspectiva histórico-cultural, a observação é mais do que participante; caracteriza-

se pela dimensão alteritária, pois, ao participar do evento observado, o pesquisador constitui-

se parte dele, mas ao mesmo tempo mantém uma posição exotópica, que lhe possibilita o

encontro com o outro, colocando-se em seu lugar para perceber o que ele percebe, mas

retornando ao seu próprio lugar (BAKHTIN, 2000).

A observação nessa abordagem se constitui em um encontro de muitas vozes: ao se

observar um evento, depara-se com diferentes discursos verbais, gestuais e expressivos. São

discursos que refletem e retratam a realidade da qual fazem parte, construindo uma verdadeira

tessitura da vida social (FREITAS, 2002; 2003; 2007a).

12 Freitas utiliza a expressão “instrumentos metodológicos” em vez de “dispositivos metodológicos”. No entanto, aqui concordo com Santos (2006, p. 129), que, inspirada na ideia de Ardoino, entende o dispositivo como “uma organização de meios materiais e/ou intelectuais, fazendo parte de uma estratégia de conhecimento de um objeto”.

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Enfim, a teoria enunciativa da linguagem de Bakhtin permite considerar a observação numa perspectiva discursiva, dialógica e polifônica compreendendo que o campo nos confronta com eventos de linguagem marcados pela interlocução. Assim, a partir do que tenho refletido atualmente, considero que na perspectiva histórico-cultural a observação não se esgota em si mesma, o pesquisador não é apenas um observador, mas alguém que interfere no contexto em que a pesquisa é realizada visando a transformação dos participantes e também a sua. Nesse sentido a observação passa a ser um encontro dialógico (FREITAS, 2007a, p. 9)

E foi exatamente esse encontro virtual que procurei descrever em meu texto. A

observação (discursiva, dialógica e polifônica) foi primordial neste estudo, por possibilitar a

compreensão dos saberes docentes online dos sujeitos da pesquisa, ocorrendo em todos os

textos e contextos do curso, tendo como dispositivos o próprio desenho didático, a

interlocução dos chats e fóruns, os materiais inseridos no curso, as atividades de cada módulo

e a utilização de recursos variados (como áudio, vídeos, etc.). Nesse sentido, foi possível

concluir que o meu envolvimento como pesquisadora foi fundamental, pois o conhecimento

acaba sendo construído nesse processo, através de uma atitude interativa e dialógica.

Essa atitude fundamentadora da pesquisa também pode ser observada em Vygotsky, ao considerar que todo conhecimento é sempre construído na inter-relação das pessoas. Produzir um conhecimento a partir de uma pesquisa é, pois, assumir a perspectiva da aprendizagem como processo social compartilhado e gerador de desenvolvimento (FREITAS, 2002, p. 5).

A opção por uma observação discursiva, dialógica e polifônica possibilitou que a

minha participação fosse de grande implicação nesse estudo: estive presente nas diversas

fases – desde a concepção da proposta – participando junto a meu grupo de pesquisa, que

compõe a equipe do módulo em que atuei como docente das diversas reuniões para a

concepção e execução do desenho didático, assim como para a organização das estratégias

didáticas. Vivenciei diversos papéis e pude transitar livremente no ambiente Moodle em que

se deu o curso, pois fui inscrita como professora. Assim, debati com professores e cursistas as

temáticas de estudo, participei dos fóruns, chats e videoconferência, e tive a oportunidade de

assumir o papel de mediadora, percebendo “na pele” a complexidade do trabalho do docente

online.

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A entrevista

Um outro dispositivo apontado por Freitas (2002; 2003; 2007a; 2007b) é a entrevista,

que, no âmbito da pesquisa qualitativa de cunho histórico-cultural, tem a particularidade de

ser compreendida como uma produção de linguagem que ocorre entre duas ou mais pessoas:

entrevistador e entrevistado(s) numa situação de interação verbal e tem como objetivo a

mútua compreensão. “O ouvinte concorda ou discorda, completa, adapta, repensa e essa sua

atitude está em elaboração constante durante todo o processo de audição e de compreensão

desde o inicio do discurso” (FREITAS, 2007a, p. 10).

Para a autora, a partir dessas considerações, justifica-se chamar a entrevista, que se

realiza a partir dessa concepção, de dialógica, pois ela estabelece uma relação de sentido entre

os enunciados na comunicação verbal. Dessa maneira, a entrevista se constitui como uma

relação entre sujeitos, na qual se pesquisa com os sujeitos as suas experiências sociais e

culturais, compartilhadas com as outras pessoas de seu ambiente, e entrevistador e

entrevistado passam a ser parceiros de uma experiência dialógica.

Na investigação, a entrevista dialógica serviu para o aprofundamento das questões

observadas nas relações interativas entre alunos e alunos, professores e alunos, professores e

professores. Através desse dispositivo, foi possível colocar em questão aspectos da formação

e trajetória docente dos sujeitos, da ação dos professores desenvolvida nos módulos e dos

diversos saberes docentes, e revelar até aspectos pessoais que acabaram por influenciar a ação

do professor durante o curso13. Para tal, foi elaborado um pequeno roteiro flexível, que

buscava atender aos objetivos da pesquisa.

No total foram feitas seis14 entrevistas. Em média cada entrevista teve a duração de 40

minutos e foram gravadas (e algumas filmadas) com a permissão dos depoentes. Quatro

entrevistas aconteceram presencialmente e duas ocorreram através do Skype15, com docentes

de outros estados. Apesar de termos um docente de outro país, foi possível que a entrevista

ocorresse pessoalmente, na ocasião de sua visita ao Brasil para participar de alguns

congressos como palestrante. Destaco (e agradeço) a grande disponibilidade dos professores

em contribuir com a pesquisa, apesar de suas agendas sempre tão apertadas.

13 Esse roteiro encontra-se nos anexos desta dissertação. 14 No capítulo 3, há maiores detalhes sobre os sujeitos da pesquisa. 15 Skype é um software que permite comunicação pela internet através de conexões de voz sobre IP.

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3.3.2 Análise de dados

Segundo Rizzini et al (1999, p. 82), “o processo de codificação dos dados é aquilo que

dará sentido aos dados enquanto resultados de uma pesquisa ou, dizendo de outra maneira, é o

que relaciona os dados da pesquisa com seus objetivos”. Nessa perspectiva, os dados foram

analisados segundo as orientações de Freitas (2002; 2003), no contexto da pesquisa

qualitativa de cunho histórico-cultural, buscando-se a compreensão de seus conteúdos

relacionados aos contextos. Dessa forma, as anotações resultantes da observação foram

entrecruzadas com as entrevistas dialógicas após serem transcritas e escutadas, e analisadas

em seu contexto.

A partir desses procedimentos construíram-se as conclusões, sempre fundamentadas

pelo quadro teórico que embasa a pesquisa, uma vez que “é nesse jogo dialógico que o

pesquisador constrói uma compreensão da realidade investigada transformando-a e sendo por

ela transformado” (FREITAS, 2003).

3.3.3 O perfil dos sujeitos da pesquisa

Freitas (2003) lembra-nos que a própria utilização dos termos “sujeito” ou “objeto”

reflete a posição do pesquisador quanto à sua forma de focalizar e compreender a realizade.

Por se tratar de uma pesquisa qualitativa numa perspectiva histórico-cultural, optei por utilizar

o termo “sujeitos” – e não “objetos”, – para designar as pessoas investigadas. Tratar a pessoa

investigada como objeto reflete a posição do pesquisador como quem detém o poder de

realizar a interpretação sobre o outro sem lhe permitir espaço para a participação ativa no

processo, enquanto considerá-lo como sujeito implica compreender o indivíduo como

possuidor de voz revelador e coparticipante do processo de pesquisa.

Conceber, portanto, a pesquisa nas ciências humanas a partir da perspectiva sócio-histórica implica compreendê-la como uma relação entre sujeitos possibilitada pela linguagem. Para Bakthin (1992), o objeto de estudo das ciências humanas é o homem ser expressivo e falante (FREITAS, 2003, p 29).

O grupo estudado é formado pelos seis professores responsáveis pelo trabalho das

equipes que ministraram os módulos delimitados para a presente investigação, que atuaram

como docentes e conteudistas do curso. Esses docentes são oriundos de diferentes formações

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e campos de conhecimentos: psicologia, sociologia, história, matemática e pedagogia. Todos

possuem mestrado e doutorado na área de educação, além de atuarem como pesquisadores na

mesma área com ênfase nas tecnologias, com diferentes enfoques (informática educativa,

educação online, educação a distância, entre outros). Duas equipes tiveram um único docente

responsável pelo trabalho, enquanto outras duas tiveram dois docentes, totalizando seis

sujeitos.

Vale ressaltar que, além desses, todos os outros membros das equipes dos PPGs que

participaram do curso, seja no papel de colaborador da equipe responsável pela docência, seja

no papel de cursista, também foram sujeitos da presente investigação, uma vez que

pesquisadora e pesquisados se ressignificaram no campo (FREITAS, 2002).

Todos os sujeitos da pesquisa tiveram sua identidade preservada, por isso refiro-me a

eles com uma numeração, que foi estabelecida a partir de critérios que são apenas de meu

conhecimento. Essa numeração foi utilizada nas falas dos docentes e cursistas nos fóruns, nos

chats, nas entrevistas, assim como para referência ao trabalho docente desenvolvido no curso,

conforme especificação: D para os docentes e P para os pesquisadores-cursistas. Pelo mesmo

motivo, não utilizarei os nomes dos módulos; a referência a eles se dará através das letras A,

B, C e D.

Apresento, a seguir, um melhor detalhamento da formação desses professores, assim

como algumas singularidades observadas ao longo da pesquisa. Tais dados foram coletados

através de entrevistas, fórum de apresentação e/ou perfil preenchido no AVA.

D1 tem graduação em história e doutorado em educação na área de tecnologia

educativa. Atua como professor universitário na graduação, mestrado e doutorado em

educação. Seus interesses de investigação incidem nas relações entre a educação, a tecnologia

e a comunicação (comunicação e tecnologia educacional), interessando-se em especial pelos

novos ambientes criados pela integração das TIC na educação em geral, seja nos contextos

formais (escola) seja em contextos não formais. Foi o docente responsável pelo módulo A.

D2 é graduada em matemática e possui mestrado e doutorado em educação e está

finalizando seu pós-doutorado fora do Brasil. Atua como docente em cursos de mestrado e

doutorado em educação na linha de novas tecnologias em educação. Trabalha com pesquisas

sobre tecnologias e formação de educadores, educação a distância e inclusão digital. Foi uma

das docentes responsáveis pelo módulo B, atuando junto com D3.

D3 tem graduação em terapia ocupacional, mestrado e doutorado na área de educação

e TICs e tem se dedicado ao estudo de ambientes virtuais de aprendizagem e, em especial,

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imersão e mobilidade. Trabalha com projetos educacionais em rede desde os primórdios da

Internet no Brasil, quando a rede ainda não era comercial (1992). Atuou junto a D2 do

módulo B.

D4 possui graduação em pedagogia e psicologia e mestrado e doutorado em educação.

Atua como docente em cursos presenciais de graduação e pós-graduação (lato e stricto sensu)

em uma universidade pública e há cerca de sete anos trabalha em educação a distância, já

tendo sido coordenadora de curso, tutora e conteudista. Atuou conjuntamente com D5 no

módulo C.

D5 formação inicial em pedagogia, mestrado e doutorado em educação. Atua em

cursos de graduação e pós-graduação lato sensu de uma universidade pública. Já participou de

diversos cursos online, como docente, conteudista e mentora. Foi docente responsável pelo

módulo C, atuando diretamente com D4.

D6 tem formação inicial em sociologia, mestrado e doutorado em educação. Atua

como docente em cursos presenciais de graduação e pós-graduação (lato e stricto sensu) em

uma universidade pública e outra privada. É coordenador de disciplina em um curso de

educação a distância e já teve diversas experiências online, como docente, conteudista e

coordenador. Foi docente do módulo D e também coordenador geral do projeto.

3.4 O LOCUS DA PESQUISA: O AVA MOODLE

3.4.1 Caracterização do AVA Moodle

O locus da pesquisa é o Moodle (Modular Object-Oriented Dynamic Learning

Enviroment), um ambiente virtual de aprendizagem – AVA (também conhecido como sistema

de gestão da aprendizagem ou LMS, em inglês, Learning Management System), que foi

desenvolvido pelo educador e cientista computacional australiano Martin Dougiamas.

Constitui-se em um sistema de administração de atividades educacionais, destinado à criação

de comunidades online voltadas para a aprendizagem colaborativa através de módulos.

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Figura 1– Páginal inicial do curso Formação de Professores para Docência Online no AVA

Moodle

A opção pelo AVA Moodle deve-se ao fato de ele ser é um software livre16, gratuito e

que dispõe de diversos recursos para a atuação colaborativa dos professores e cursistas, em

sintonia com uma perspectiva interativa de educação online. Nele o professor prepara suas

aulas, exerce a docência, avalia a aprendizagem, reestrutura seus cursos.

Pulino Filho (2009) apresenta algumas características desse AVA:

- Promove uma pedagogia construcionista social (colaboração, atividades, reflexão crítica, etc.); - Adequado para cursos 100% online bem como para complementar um curso presencial; - Simples, leve, eficiente, compatível, com interface com navegadores de baixa tecnologia; - Fácil de instalar em qualquer plataforma que suporte PHP. Necessita apenas de um banco de dados e pode compartilhá-lo com outras aplicações; - Os cursos podem ser compartilhados em uma mesma instalação;

16 Software livre é qualquer programa de computador que pode ser usado, copiado, estudado, modificado e redistribuído sem nenhuma restrição.

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- Os cursos podem ser visitados por interessados em conhecer o ambiente (sem acesso a provas, listas de exercícios e outras informações que requeiram segurança); - Os cursos podem ser agrupados por categoria - uma instalação Moodle suporta milhares de cursos; - Grande atenção ao aspecto segurança das informações; - A maior parte das seções (Recursos, Fóruns de Discussão, Diário, etc.) tem um editor HTML gráfico WYSIWYG (o que você vê é o que você vai obter).

Muitas escolas, cursos e universidades têm aderido ao Moodle. Segundo Pulino Filho

(2008), tal fato ocorre em virtude de ser ele um sistema aberto, baseado em uma forte filosofia

educacional, com uma comunidade de usuários crescente, e que contribui para o

desenvolvimento e apoio a novos usuários. O autor ainda aponta algumas vantagens desse

LMS:

a) Ele é gratuito – ao contrário dos sistemas proprietários, o Moodle pode ser instalado

sem nenhum custo;

b) É de fonte aberta (conhecido como software livre) – os usuários têm acesso ao

código fonte do software, podendo alterar, ampliar, modificar o programa, ou mesmo usar

partes dele para aplicações de interesse pessoal;

c) Foi construído por um educador – os ambientes de gerenciamento de cursos são, em

geral, construídos em torno de ferramentas computacionais. Enquanto os sistemas de

gerenciamento comerciais são voltados para ferramentas, o Moodle é voltado para

aprendizagem, tendo o Construcionismo Social17 como estrutura pedagógica.

d) O Moodle tem uma comunidade de usuários grande e com grande participação na

manutenção da distribuição, sugerindo sempre modificações, novas habilidades e reportando

eventuais defeitos. A comunidade Moodle tem sido indispensável para o sucesso do sistema.

Para Alves e Brito (2008), o Moodle se destaca de outros AVAs por dispor de um

conjunto de interfaces que podem ser selecionadas pelo professor de acordo com seus

objetivos pedagógicos. Assim como em qualquer outro AVA, o Moodle dispõe de um

conjunto de ferramentas como fórum, chat, tarefa, wiki, glossário, mensagens, lição, pesquisa

de opinião, diário, trabalho com revisão ente outros, mas o Moodle, em particular, permite

que esses mecanismos sejam oferecidos ao aluno de forma flexibilizada, ou seja, “o professor,

além de poder definir a sua disposição na interface, poderá utilizar metáforas que imputem a

17 De acordo com Pulino (2008), o Construcionismo Social baseia-se na ideia de que pessoas aprendem melhor quando engajadas em um processo social de construção do conhecimento, pelo ato de construir alguma coisa para outros.

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estas ferramentas diferentes perspectivas, que apesar de utilizarem a mesma funcionalidade,

se tornem espaços didáticos únicos” (ALVES; BRITO, 2008).

No campo, isso pôde ser comprovado através do uso da interface fórum, que surgiu

com diferentes metáforas, diferentes perspectivas: ora o fórum foi utilizado como espaço de

discussão de determinada temática do curso, ora foi serviu como interface social – com o

objetivo de estimular o estabelecimento de vínculos entre os participantes – e, ainda, foi

utilizado como ambiente para a heteroavaliação dos cursos, como pode ser visto nas figuras 2,

3 e 4.

Figura 2 – Fórum numa perspectiva temática

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Figura 3 – Fórum numa perspectiva avaliativa

Figura 4 – Fórum numa perspectiva social

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Com isso, percebe-se que o professor não precisa ficar dependendo do conhecimento

de um profissional da informática para fazer suas opções de configuração do ambiente.

Conforme Alves e Brito (2008, p. 5) esclarecem:

[...] esta decisão não depende da interferência de qualquer profissional da área de tecnologia ou design, o próprio professor que diante das particularidades de seu corpo discente é quem vai decidir que novos espaços podem ser criados e refletir sobre a possível intervenção destes no processo ensino-aprendizagem. Nesta perspectiva, concebemos o ambiente virtual como mais do que um simples espaço de publicação de materiais, permeado por interações pré-definidas, mas como um local onde o professor espelhe as necessidades de interação e comunicação que cada contexto educacional lhe apresente em diferentes momentos e situações.

Como docente online, já tive acesso a outros AVAs, como WebAula18 e a Plataforma

CEDERJ19, e também percebo algumas possibilidades adicionais no uso do Moodle. Além

daquelas já apontadas acima, destaco a sua usabilidade e a sua hipertextualidade.

Conforme definição da International Organization for Standardization, a usabilidade é

a medida pela qual um produto pode ser usado por usuários específicos para alcançar

objetivos específicos com efetividade, eficiência e satisfação em um contexto de uso

específico. A efetividade permite que o usuário alcance os objetivos iniciais de interação, e

tanto é avaliada em termos de finalização de uma tarefa quanto em termos de qualidade do

resultado obtido. Eficiência se refere à quantidade de esforço e recursos necessários para se

chegar a um determinado objetivo. Os desvios que o usuário faz durante a interação e a

quantidade de erros cometidos podem servir para avaliar o nível de eficiência do site. A

terceira medida de usabilidade, a satisfação, é a mais difícil de medir e quantificar, pois, está

relacionada com fatores subjetivos. De maneira geral, satisfação se refere ao nível de conforto

que o usuário sente ao utilizar a interface e a maneira de alcançar seus objetivos ao navegar no

site.

De uma maneira mais prática, Marmion (2008) destaca algumas características na

comunicação que são desejáveis para concluir que um sistema possua boa usabilidade:

- O sistema é fácil de aprender a usar;

18 AVA proprietário, utilizado principalmente em meio corporativo, mas também adotado por uma universidade particular na qual atuei como docente formadora dos professores que atuam nas disciplinas online. 19 Um AVA elaborado pelo Consórcio CEDERJ (Centro de Educação a Distância do Estado do Rio de Janeiro) para apoio online aos cursos de graduação.

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- O sistema é fácil de reaprender (Não há perda substancial do conhecimento do sistema após um breve período de inatividade, e é fácil lembrar as principais características do sistema após um longo período de inatividade); - O sistema convida à exploração de suas facilidades; - O usuário consegue identificar facilmente quais funções do sistema devem ser utilizadas em quaisquer (ou pelo menos na maioria das) circunstâncias; - A interface do sistema é intuitiva, adaptada ao modelo cognitivo do usuário (“parece familiar”); - O tempo de resposta do sistema adequa-se à expectativa do usuário; - O sistema minimiza a probabilidade de erro; - O sistema minimiza as consequências de um erro, e possibilita reverter as consequências de uma ação errada; - O sistema transmite ao usuário sensação de segurança.

Corroborando essa perspectiva referente à usabilidade do AVA Moodle, Custódio

(2009) aponta que em sua pesquisa junto a professores que atuam com o Moodle na

Universidade Metodista de Piracicaba, cerca de 70% aprovam a usabilidade desse ambiente

sob vários aspectos, a saber, aprendizagem, atratividade, eficiência, intuitividade,

operacionalidade e satisfação. Dentro desse padrão, o atributo eficiência foi o que mais obteve

aprovação de seus participantes, 83%, enquanto o atributo aprendizagem obteve a menor

aprovação, cerca de 51%.

A hipertextualidade também merece destaque no AVA Moodle. Para Bonilla (2005), a

hipertextualidade é uma das características básicas da cibercultura, que não comporta as

limitações dos textos lineares e tradicionais. Corroborando Bonilla, Silva (2006b, p.14) afirma

que há uma “arquitetura sui generis no computador, uma estrutura múltipla e combinatória

que permite processos contínuos de associações não lineares e um elevado número de

interferências e de modificações de tela”, que é o próprio hipertexto20.

Lévy (1998, p. 56) descreve o hipertexto distinto do texto linear, por ser um texto

estruturado em rede.

O hipertexto seria constituído de nós (os elementos de informação, parágrafos, páginas, imagens, sequências musicais etc.) e de ligações entre esses nós (referências, notas, indicadores, “botões” que efetuam a passagem de um dos nós para outro).

20 O termo “hipertexto” foi criado por Theodore Nelson, na década de sessenta, para denominar a forma de escrita/leitura não linear na informática, pelo sistema “Xanadu”. Até então a ideia de hipertextualidade havia sido apenas manifestada pelo matemático e físico Vannevar Bush, através do dispositivo “Memex”, que imaginava um sistema de organização de informações que funcionasse de modo semelhante ao sistema de raciocínio humano: associativo, não linear, intuitivo, muito imediato (SILVA, 2006).

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No AVA Moodle é possível transformar todos os textos em hipertextos a serviço da

aprendizagem em rede, utilizando todos e quaisquer recursos disponíveis, sejam eles

utilizados por alunos ou por professores. Um aluno, ao participar de um fórum, por exemplo,

pode inserir um link de uma página web sobre o assunto que está sendo discutido para

aprofundar o debate ou, ainda, um professor, ao criar um livro, pode abrir mão do texto linear

e transformá-lo num hipertexto com conexões dentro ou fora do próprio AVA, criando dessa

maneira uma múltipla e complexa experiência de aprendizagem. Vale ressaltar, no entanto,

que apesar de ser possível criar inúmeros hipertextos, o Moodle organiza-se através de uma

estrutura de tópicos. Esses tópicos, que no ambiente da pesquisa comportavam os módulos,

ainda são organizados linearmente, não havendo outra possibilidade de arquitetura.

Apesar desse potencial hipertextual, é possível que o AVA Moodle seja subutilizado,

sendo voltado para leitura de material linear somente. Como docente online, já tive a

oportunidade de presenciar tal fato num curso de especialização, em que todos os textos

inseridos no ambiente estavam em formato pdf. A utilização hipertextual do Moodle, portanto,

dependerá das concepções epistemológicas e metodológicas dos docentes que nele estão

atuando.

Apesar das possibilidades acima apontadas, vale ressaltar que, assim como outros

AVAs, ainda existem alguns pontos a melhorar no Moodle, especificamente, seu aspecto

linear na organização dos módulos, a lentidão da abertura da página, os erros de ligação, que,

por vezes, impedem o acesso à mesma, assim como os bloqueios quando do envio de

trabalhos e na realização de pequenas atividades online.

3.4.2 O funcionamento do AVA Moodle

O Moodle é uma interface simples, seguindo uma linha de portal. As páginas dos

cursos são divididas em três colunas que podem ser modificadas e personalizadas pelo

administrador do sistema (e/ou outros usuários que tenham sido elevados à categoria de

administradores), alterando o aspecto da tela de abertura, inserindo elementos em formato de

caixas como calendário, usuários online, lista de atividades, dentre outros. Essas caixas são

dispostas nas colunas à direita e à esquerda da tela, podendo ser deslocadas de um lado para o

outro pelo professor. Na coluna central há um conjunto de caixas que representam a sequência

das aulas por meio de uma lista de tópicos numerados ou datados semanalmente ou podem ser

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criadas áreas para agrupar conteúdos ou atividades semelhantes. Essa coluna central é o local

onde o curso será efetivamente realizado.

O Moodle disponibiliza três formatos de curso:

a) Formato semanal – são estabelecidos data de início e fim e o número de semanas, e

então é inserido o material referente a cada semana;

b) Formato de tópicos – cada assunto a ser discutido representa um tópico, então

decide-se o número de tópicos: estes não terão limite de tempo predefinidos;.

c) Formato social – o tema do curso é articulado em torno de um único fórum,

disposto na página principal.

No ambiente online do projeto Formação de Professores para Docência Online optou-

se pelo formato de tópicos, como mostra a figura 5, criando espaços definidos para cada

módulo, onde foram inseridas as interfaces escolhidas pela equipe responsável pelo conteúdo

e docência.

Figura 5 – O curso em formato de tópicos

Além disso, o AVA Moodle permite que as interfaces sejam agrupadas dentro das

caixas de cada tópico, separando-as por rótulos de texto, como na figura 6, podendo ainda, ser

identificadas, criando uma hierarquia como em um sumário de um livro.

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Figura 6 – Os rótulos de um tópico

Para começar a utilizar um ambiente Moodle, é necessário ser usuário cadastrado. O

cadastramento pode ser feito pelo usuário ou pelo administrador. Após o cadastramento, é

necessário preencher um perfil com os dados do usuário. Nesse momento, devem ser

escolhidos o login e a senha que permitirão o retorno ao AVA e um e-mail é enviado com

essas informações.

O Moodle disponibiliza várias as categorias de usuários, com acessos diferenciados,

conforme aponta o quadro 5, que se encontram organizadas em ordem crescente, conforme as

possibilidades no acesso. Vale ressaltar que, para inserir ou alterar o desenho didático do

curso, é preciso estar cadastrado, ao menos, na categoria professor.

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Quadro 5 – Categorias de usuários do Moodle

Visitante

Pode acessar o ambiente e as informações constantes da tela de abertura do ambiente. Pode visitar disciplinas que permitam o acesso de visitantes (sem código de inscrição) e ver o conteúdo delas. Não pode participar de atividades que valham nota.

Usuário

Pode acessar o ambiente e as informações constantes da tela de abertura do ambiente. Tem os mesmos privilégios de acesso a disciplinas que os visitantes.

Aluno

Usuário matriculado em um curso. Tem acesso a todas as atividades e materiais do curso.

Monitor

Tem acesso a um curso e às atividades de um professor: corrigir trabalhos, verificar notas, etc. Não pode alterar o conteúdo de um curso.

Professor

Tem acesso aos cursos em que está designado como professor e pode promover alterações na tela de abertura além de incluir ou remover atividades e materiais.

Criador de cursos

Pode criar novos cursos no ambiente.

Administrador Tem acesso a todas as instâncias da instalação e pode modificá-las.

Fonte: < http://www2.tce.sp.gov.br/ecp/pdf/manual_completo_moodle.pdf > Acesso em 20/08/2008

Os alunos têm acesso a todo o curso, mas sem o modo de edição disponível.

Monitores, professores, criadores de curso e o administrador podem optar pela visualização

como aluno ou, ainda, pelo modo de edição, sendo esse com um número maior ou menor de

restrições conforme o perfil. O curso é sempre criado pelo administrador, e é este que delimita

os perfis dos novos participantes.

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3.4.3 Interfaces, recursos e atividades do AVA Moodle

Como apontamos anteriormente, a prática pedagógica bancária considera os sujeitos

da comunicação como meros objetos e receptores da informação, sem autoria de comunicação

nem de processos de aprendizagem, pois a transmissão predomina.

Nessa perspectiva, as interfaces digitais de comunicação podem colaborar para a

superação de práticas bancárias, trazendo potencial interativo à educação online através da

integração de várias linguagens como textos, sons e imagens estáticas ou dinâmicas. O AVA

Moodle disponibiliza várias dessas interfaces, sendo elas síncronas – como chats – ou

assíncronas – como fóruns, blogs e wikis.

Há também diversos outros recursos disponíveis para a realização de cursos e inserção

de conteúdo no ambiente, como o livro, texto simples, texto web e as atividades como tarefa,

questionário, entre outros.

É interessante destacar que cada recurso é representado por um diferente ícone,

facilitando a navegação dos participantes do curso. Abaixo apresentamos uma análise de cada

um dos principais recursos encontrados no ambiente Moodle presentes na pesquisa.

Chat

O chat (ou sala de bate-papo) do Moodle é uma interface simples de comunicação

síncrona, que permite que os participantes mantenham uma conversa em tempo real. Ao

contrário dos fóruns, em que as pessoas não precisam estar simultaneamente online, no chat é

necessário que todos os participantes estejam logados no ambiente no mesmo instante, para

que haja comunicação, se configurando como um espaço virtual onde os sujeitos interagem

num mesmo tempo físico estando em lugares geograficamente dispersos (SANTOS, 2006a, p.

134). Os chats são representados pelo ícone .

Um ponto interessante a se destacar no chat do ambiente Moodle é que as sessões já

encerradas, com as intervenções de todos os participantes, ficam guardadas no banco de

dados, conforme ilustra a figura 7. Também é possível, ao abrir uma sala de chat, configurá-la

de diversas maneiras: os bate-papos podem ser criados para toda a turma, para grupos

separados e para grupos que podem ver o material de outros grupos. Assim como ocorre na

interface fórum, no Moodle os participantes do chat são identificados através de foto,

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aumentando ainda mais o sentimento de pertencimento em relação ao grupo e possibilitando,

além da aprendizagem, o “estar junto virtualmente”:

Interfaces como os chats permitem que as distâncias geográficas, simbólicas e existenciais possam ser (re)significadas, permitindo a troca de saberes, desejos, dúvidas a qualquer espaço/tempo, não possíveis em práticas educacionais mediatizadas pelos suportes de comunicação de massa (SANTOS, 2006b, p. 229).

Figura 7 – O histórico do chat no AVA Moodle

Fórum

O fórum representa a principal interface de comunicação em um curso no Moodle e,

como já colocado acima, pode ser utilizado com diferentes perspectivas. Pode-se pensar no

fórum como uma caixa de correio online, na qual professor e alunos podem postar mensagens

e ao mesmo tempo observar discussões entre um grupo de participantes. Quando o curso é

elaborado em formato social, o fórum torna-se o centro do processo (PULINO FILHO, 2008).

O fórum é representado pelo ícone .

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Santos (2006a, 2006b) define os fóruns como interfaces de comunicação assíncrona,

que permitem o registro e a narrativa de sentido entre os sujeitos envolvidos, possibilitando

diálogos online em que emissão e recepção se imbricam e se confundem, permitindo que a

mensagem circulada seja comentada por todos os sujeitos do processo de comunicação. Essa

forma assíncrona de comunicação nos fóruns permite que cada participante tenha um tempo

pessoal para elaborar sua participação em uma discussão.

Nos fóruns do AVA Moodle existe a possibilidade de as mensagens postadas serem

enviadas para todos os participantes através de e-mail, facilitando a comunicação e a

interatividade dos participantes com as discussões do curso. Cabe à equipe de trabalho decidir

se os alunos serão ou não assinantes. Além disso, conforme é demonstrado na figura 8, os

autores das mensagens são identificados por meio da sua foto, que foi previamente inserida

em seu perfil, o que para Alves e Brito (2008) gera um maior sentimento de vínculo entre os

alunos, já que personalizam a mensagem, diminuindo a sensação de estar conversando com a

máquina.

Figura 8 – O fórum no AVA Moodle

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Wiki

Wikis são ambientes digitais de autoria textual coletiva, que permitem a edição

colaborativa dos documentos de maneira simples (VALENTE; MATTAR, 2007).

Os wikis estão disponíveis na internet – como Wikispace e a Mídia Wiki – ou nos

AVAs, assim como ocorre no Moodle. A Wikipedia, uma enciclopédia escrita a muitas mãos

que se tornou referência de consulta em sites de busca, é o maior exemplo de wiki que temos

hoje, alcançando hoje cerca de 456.000 verbetes.

Rosado (2008, p. 4) aponta a interface wiki como sendo uma disposição

comunicacional todos-todos, que colabora na superação do modelo transmissivo.

O modelo wiki de autoria coletiva permitiu a uma massa de pessoas se tornarem autores (com ou sem originalidade), escreverem suas contribuições nessa base de dados e deixarem de ser meramente expectadores passivos ou receptores de conteúdos em mão única, saindo pouco a pouco do modelo da transmissão de informação característico da mídia de massa do século XX.

Através do wiki uma turma inteira, por exemplo, pode editar um documento de

maneira coletiva, criando um novo produto. Por outro lado, cada aluno pode ter seu próprio

wiki e trabalhar nele o texto com a colaboração de seus colegas.

Rosado (2002, p. 22) faz uma breve análise do wiki no AVA Moodle, apontando

limites e possibilidades:

A maior falha deste modelo wiki é a ausência de espaço para negociação e discussão da produção textual, não existe uma aba de “Discussão”. Porém tal ausência poderá ser suprimida através de outros recursos de comunicação disponíveis no Moodle, como fórum, chat síncrono, mensagens particulares entre usuários. O Moodle permite a instalação de dezenas de módulos adicionais que podem suprir de certa forma tal ausência.

Além disso, é importante destacar que o wiki do Moodle traz um diferencial, que é a

variedade de permissão para edição dos textos: com grupos separados (cada grupo tem seu

wiki e outros não podem visualizar), com grupos visíveis (cada grupo tem seu wiki e outros

podem visualizar) ou sem grupos (existe apenas um único wiki para toda a turma). O wiki é

representado pelo ícone .

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Figura 9 – O wiki no AVA Moodle

Glossário

Gutierrez e Prieto (1994) afirmam que, para se conseguir uma interlocução adequada

entre autor e cursista, é preciso gerar uma comunidade de significados; um mesmo conceito

pode estabelecer sentidos e significados distintos, a partir de seu contexto socio-histórico e

cultural. Para a compreensão pedagógica de um material, importa muito partir de um acordo

mínimo sobre o significado dos conceitos básicos utilizados. Na visão dos autores, trata-se,

em definitivo, da apropriação de um termo por meio de seus alcances significativos, que

podem variar de um contexto a outro. Eles sugerem que, para facilitar a ação pedagógica,

cada curso deve incluir um glossário mínimo, uma síntese conceitual do conteúdo.

Nessa perspectiva, o glossário surge como uma importante interface que permite a

visualização de termos e conceitos relativos ao conteúdo do curso. No Moodle, há a

possibilidade se fazer links automáticos com termos do glossário para qualquer módulo do

ambiente, possibilitando uma maior hipertextualidade.

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O Moodle possibilita que os glossários sejam utilizados como recurso de construção

coletiva, onde todos os participantes têm permissão para incluir itens e comentá-los, criando e

mantendo uma lista de definições como em um dicionário. Uma outra possibilidade é utilizar

o glossário como espaço para disponibilizar produções individuais, que podem ser vistas e

comentadas pelos outros participantes. Um exemplo que vem sendo utilizado em alguns

cursos é a apropriação dessa interface para criação de Midiatecas.

No glossário do ambiente Moodle é possível visualizar os significados por ordem

alfabética, categoria, data de inserção e por autor. É representado pelo ícone .

Figura 10 – O glossário no AVA Moodle

Blog

Blogs são interfaces que permitem criar, publicar e atualizar mensagens em tempo

real, mesmo que seus autores não possuam vasto conhecimento em informática. Há vários

serviços que possibilitam a produção e publicação de um blog na Internet, como o Blogger,

Wordpress, Bloglines, entre outros.

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No ambiente Moodle, o blog é uma página que, vinculada ao perfil de cada

participante, na qual os posts (textos, imagens) são organizados cronologicamente em ordem

inversa.

Santos (2006a, 2006b) aponta diversas possibilidades de apropriação dessa interface:

diário pessoal, diário de campo (de pesquisa), diário de prática docente, entre outros.

Muitos são os sentidos encontrados nos blogs. Seja por necessidade de expor o espírito narcísico, nômade ou simplesmente comunicacional, qualquer sujeito poderá ser emissor e produtor de sentidos. O que importa é a possibilidade técnica de virtualizar e atualizar polifonias (SANTOS, 2006b, p. 231).

A utilização do blog é importante para construção coletiva do conhecimento, por

possibilitar que seus autores expressem suas opiniões de forma simples e que posteriormente

seja dada continuidade na elaboração do conteúdo.

Figura 11 – O blog no AVA Moodle

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Livro

O livro é um recurso para a inserção de conteúdos no ambiente Moodle. Trata-se um

material de estudos com várias páginas, que pode ser dividido em capítulos, conforme pode

ser visto na figura 12. Também possui barra de formatação, sendo possível incluir links,

imagens, entre outros. É representado pelo ícone .

Figura 12 – O livro no AVA Moodle

Texto simples e texto web

Por ser um ambiente baseado na web, o Moodle possui características de um editor

HTML, no qual se pode escrever um texto simples ou algo mais sofisticado com links para

imagens, arquivos, sites. O AVA Moodle oferece vários formatos: automático, html, text e

markdown.

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A diferença entre o texto simples e o texto web é que, no segundo, tanto o sumário

quanto o conteúdo terão a régua de formatação, para realizá-la no próprio editor do ambiente.

Ambos são representados pelo ícone .

Figura 13 – O texto web no AVA Moodle

Tarefa

Esse tipo de tarefa requer do aluno o envio de um arquivo (exemplo: arquivo de texto,

arquivo zipado, planilha, etc.). A partir do arquivo, o professor avalia e escreve um feedback,

atribuindo nota para o aluno. Quando o feedback é gravado, o aluno recebe uma mensagem

para que possa ver sua avaliação da tarefa no ambiente.

Ao cadastrar uma tarefa, o professor pode configurar uma data máxima de envio. A

data de envio e o eventual atraso podem ser vistos facilmente pelo professor no momento de

dar o feedback. O professor pode ver as tarefas enviadas pelos seus alunos acessando a tarefa

e clicando no link na lateral superior direita ("Ver tarefas enviadas"). É representada pelo

ícone .

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A atividade tarefa é classificada dentro do Moodle, por quatro tipos:

a) Envio de arquivo único – permite que cada cursista envie um único arquivo, de

qualquer tipo. Pode ser um arquivo de texto, uma imagem, áudio, entre outros.

b) Modalidade avançada de carregamento de arquivos – permite que cada estudante

envie mais de um arquivo, de qualquer tipo (arquivo texto, imagem, etc.).

c) Atividade offline – esta atividade pode ser realizada em algum lugar da rede ou

mesmo presencial; os cursistas podem ver a descrição da tarefa, mas não podem enviar

arquivos nem outra coisa; o processo de avaliação funciona normalmente e os estudantes

receberão o aviso de suas notas.

d) Texto online – requer que os usuários editem um texto utilizando recursos habituais

de edição. O professor poderá avaliá-las na rede e mesmo incluir comentários ou mudanças.

Figura 14 –A tarefa no AVA Moodle

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Diário

O diário é uma interface que permite que o aluno faça suas anotações, relatando

experiências, reflexões, progressivamente, podendo contar com um retorno do professor. É

uma atividade que necessita ser feita constantemente, com intervalos de tempos de acordo

com a necessidade da turma e dos professores (dia, semana, quinzena).

O diário permite ao professor estabelecer uma troca com os estudantes em suas

reflexões. Para tanto, basta clicar no link “Ver todas as anotações do diário”, que o professor

irá visualizar em uma única página a construção de todos. É representado pelo ícone .

Vale ressaltar que cada estudante tem um diário, e o conteúdo apenas poderá ser vsito

por ele e pelo professor.

Figura 15 – O diário no AVA Moodle

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Pesquisa de avaliação

Permite ao professor criar um questionário de avaliação do curso. O objetivo é

desenvolver uma avaliação dos percursos de aprendizagem online. Com base nos resultados

destes questionários, podem-se identificar os fenômenos sociais e as tendências individuais

que caracterizam os processos de aprendizagem ao longo do curso, com o objetivo de avaliar

a adequação das práticas adotadas e otimizar esses processos.

O Moodle oferece três tipos de pesquisa de avaliação

a) Pesquisa ATTLS – é utilizada para avaliar o aprendizado online e offline dos

estudantes; são vinte questões referentes à aprendizagem e reflexões críticas com relação à

postura e à atitude do estudante;

b) Pesquisa incidentes críticos – é composta de cinco perguntas que são respondidas

por extenso;

c) Pesquisa COLLES – é dividida em três grupos, cada um referente a um tipo de

avaliação relacionada a experiência efetiva, expectativas e experiência efetiva ou

expectativas.

Figura 16 – A pesquisa de avaliação no AVA Moodle

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Outros recursos

Questionários

Os questionários podem ser personalizados pelo professor, criando questões de

múltipla escolha, associação, resposta breve, verdadeiro ou falso, dentre outras. Essas

questões vão formar um banco de perguntas que o docente poderá utilizar para fazer parte de

quantos questionários ele desejar e ainda poder compartilhar este conteúdo com toda a

comunidade de professores do ambiente. Ao criar as questões, o professor irá identificar as

respostas a elas associadas, falsas e verdadeiras, indicando ou não um feedback para o aluno

no caso de ele acertar ou errar a questão. Assim, poderá dizer ao aluno mais do que

simplesmente “você errou a questão”, mas dizer a ele que caminhos seguir para que possa

responder corretamente, indicando, por exemplo, referências bibliográficas relacionadas.

Diálogo

O diálogo permite ao professor interagir separadamente com um grupo ou com todos

os participantes do curso. Funciona semelhante ao chat, porém não existe a obrigatoriedade de

ser acessado em determinado horário para a conversação. Ocorre de forma assíncrona.

Escolha

Essa atividade tem a funcionalidade de uma enquete. O professor pode elaborar uma

pergunta com diversas opções de respostas.

Lição

A lição consiste de certo número de páginas. Cada página normalmente termina com

uma questão e alternativa de resposta. Dependendo da resposta escolhida pelo estudante ele

prossegue para a lição seguinte ou pode retornar para a mesma página.

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Também é possível inserir recursos diversos como links (representados pelo ícone ),

áudios ( ) ou vídeos ( ). Esses recursos são úteis para o aproveitamento de materiais

encontrados na internet ou mesmo para apontar um arquivo já pronto que o professor pode

enviar para o ambiente Moodle

Estes são apenas alguns recursos disponíveis no Moodle, em que busquei destacar

aqueles que foram utilizados no projeto. Além deles, outros disponíveis na comunidade

Moodle podem ser utilizados pelo professor. Vale ressaltar que, graças ao trabalho

colaborativo, alternativas vêm sendo desenvolvidas em todo o mundo, algumas delas estão

disponíveis no site da comunidade (www.moodle.org), outras estão em fase experimental e,

ainda, qualquer pessoa pode desenvolver novas interfaces, inseri-las no seu ambiente Moodle

e compartilhar com os demais.

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4 SABERES DO DOCENTE ONLINE: A VIA DA INTERATIVIDADE

Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão.

Paulo Freire

As discussões acerca dos saberes docentes e de sua natureza vêm desafiando os

pesquisadores. Vários são os estudos desenvolvidos no sentido de compreender quais são

esses saberes e como se estabelecem na prática pedagógica do docente – merecendo destaque

as contribuições de Tardif. Apesar de desenvolvidos exclusivamente em contextos escolares

presenciais, tais contribuições trazem elementos importantes quando temos pela frente o

desafio de atuar na esfera da educação online, que tem como locus educativo os ambientes

virtuais de aprendizagem.

Nesse cenário emergem algumas importantes questões: Como são adquiridos os

saberes do docente que atua na educação online? Qual a natureza desses saberes? Como esses

saberes são incorporados à prática pedagógica?

Assim, apresento nesse capítulo os dados organizados e interpretados com o objetivo

de analisar a expressão de saberes na docência online na pesquisa interinstitucional Formação

de Professores para Docência Online, buscando caminhos que levem a respostas satisfatórias

para algumas das questões levantadas na introdução deste trabalho. Para tal, articulei as

discussões dos autores contemplados no quadro teórico com os depoimentos dos docentes

coletados nas entrevistas e suas práticas pedagógicas observadas no campo da pesquisa,

conforme metodologia detalhada no capítulo 3.

Em um primeiro momento procurei definir a forma pela qual se edificam os saberes

docentes, percebendo sua pluralidade. Em seguida analisei a relação existente entre esses

saberes e a teoria da interatividade proposta por Silva (2004, 2006a, 2006b). Por fim,

apresento os saberes docentes que emergiram da pesquisa e análise, organizados em

categorias e subcategorias, assim como sua expressão em ambientes virtuais de aprendizagem.

A figura 17 representa as categorias e subcategorias da pesquisa no formato de mapa

conceitual. Ressalto que as reflexões apresentadas neste capítulo não se esgotam, podendo

subsidiar outras, conforme seus espaços e tempos.

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Figura 17 – Mapa Conceitual dos Saberes Docentes na Educação Online

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4.1 A EDIFICAÇÃO DOS SABERES DOCENTES

4.1.1 As dimensões temporal e social dos saberes docentes

Na busca por respostas para as indagações sobre a gênese dos saberes do docente que

atua em ambientes virtuais, pude perceber algumas variações através das vozes dos sujeitos

dessa pesquisa. Ao serem questionados sobre sua formação profissional, os docentes que

participaram da pesquisa apontaram diversas instâncias, como sua formação, sua história de

vida, seu fazer pedagógico, seu meio social, entre outras, conforme é possível verificar a

seguir.

Mas já em 1999, numa disciplina que eu e minha colega [...] demos, bem, nem a Universidade tinha plataformas, fizemos uma experiência de usar um site, a partir de 1999 conseguimos um site de apoio exatamente às situações presenciais. (D1) [...] fiz estágio numa empresa maravilhosa. [...] e eu aprendi muita coisa e colocava em prática tudo que eu aprendi no Ensino Médio. (D5) Então eu fui, é, aprendi, com ajuda de pessoas da própria UVB [...] a fazer um web roteiro para educação online. (D6) Em seguida, eu iniciei o mestrado na área de educação, psicologia educacional, e fui, né?, aprender, estudar um pouco mais sobre aprendizagem, né? Principalmente na época, isso aí já faz bastante tempo, era, a gente estudava muito Piaget, muito, muito, muito Piaget, é, Wallon, Vygostky. (D2) [...] há um desafio de desconhecimento da própria, das próprias ferramentas, porque a minha geração é uma geração intermediária, né?, quer dizer, entre a que não conhecia e não usava TIC e uma geração mais jovem que a minha que domina tudo, né?, que usa desde a infância. (D4)

Nesse sentido, a “epistemologia da prática profissional” de Tardif (2006) ajuda a

analisar a gênese desses saberes, uma vez que, segundo o autor, pensar sobre a natureza do

saber docente implica, inicialmente, a compreensão de sua dimensão temporal, que traz em si

aspectos existenciais (história de vida, experiências pessoais), pragmáticos (carreira

profissional) e sociais, conforme analisado a seguir.

Ao longo das entrevistas, quando convidados para contar sobre sua formação, os

docentes não a dissociaram de sua história de vida, num sentido de “projetos de

conhecimento” (JOSSO, 2004), conforme tratado na revisão de literatura. O depoimento de

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D5 aponta a importância de sua experiência escolar e de sua própria vida pessoal para a

constituição dos seus saberes como docente online.

Tudo isso começou com a minha relação com a tecnologia, com a informática. Eu uso a informática desde os 15 anos, né?, meu pai comprou um computador para mim quando eu tinha 15 anos, né?, e depois eu fiz cursos de informática, estes cursos que no final dos 80 apareciam no Brasil afora, na televisão, tinha artista do Globo fazendo propaganda, e meu pai me colocou nesses cursos de informática, até porque no início dos anos 90 as famílias acreditavam que se os filhos estudassem informática eles iam ganhar dinheiro, iam ter um lugar ao sol, né? Coincidentemente com essa formação de microinformática, que hoje essa palavra nem se usa mais, porque como o computador ficou micro, ele virou computador puro e simplesmente, mas no início dos anos 90, a gente tinha os computadores que eram aquelas máquinas de médio e grande porte e os computadores que começavam a invadir, né?, os espaços sociais, é, eram chamados de microcomputadores, então a sociedade, ela convivia com estas duas dimensões. [...]

As experiências formadoras de saberes docentes se desenvolvem num contexto de

história de vida, uma vez que o saber herdado de experiências pessoais e escolares anteriores

à sua prática docente é forte e persiste através do tempo – e també se aplicam diretamente à

carreira docente, aqui compreendida como um processo temporal marcado pela construção do

saber profissional.

Nessa perspectiva temporal, podemos concluir que esses saberes docentes são

existenciais, uma vez que um professor é uma pessoa comprometida com e por sua própria

história – pessoal, familiar, escolar e social –, “ele pensa a partir de sua história de vida, não

somente intelectual, no sentido rigoroso do termo, mas também emocional, afetiva, pessoal e

interpessoal” (TARDIF, 2006, p. 103). Isso pôde ser observado no módulo A, na ocasião em

que seu professor-coordenador teve muitos problemas de ordem familiar, comprometendo a

mobilização dos saberes (voltaremos a essa questão no item 4.3) ao longo da docência.

Minha participação no módulo, no desenho do módulo... Eu nesse período estava a passar num período pessoal muito complicado, mas eu diria que fiz o possível, podia ser melhor, podia ser mais rico, mas eu fiz o possível. Inclusive penso que aquele módulo só foi possível com a ajuda do D6, que foi numa fase pessoal... As pessoas têm a sua vida pessoal e, infelizmente, a vida não é fácil. A vida tem múltiplas facetas, é, cada pessoa tem seus aspectos pessoais, sociais, têm os seus amigos, os seus familiares e tudo que os servem, e as pessoas que nos são queridas afetam a nós. (D1)

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A dimensão temporal dos saberes não se limita à história pessoal ou escolar desses

professores, ela também remete aos processos nos quais os saberes são adquiridos no âmbito

de uma carreira no ensino. O trecho abaixo, retirado da entrevista de D3, aponta a edificação

dos saberes adquiridos no âmbito de uma carreira docente:

Bom, eu me graduei então, em terapia ocupacional, já faz bastante tempo, não me lembro muito, mas já faz quase trinta anos. E trabalhei então por dez anos nessa área. É... num centro da Unicamp, a Universidade de Campinas, [...], quando eu me interessei pelo uso de computadores na educação. Então, naquela época, eu estava mais, é... Como eu atuava junto a pessoas deficientes visuais e auditivas, eu participei de um projeto, de divulgação da linguagem logo dirigida a essa população. Em seguida, eu iniciei o mestrado na área de educação, psicologia educacional, e fui, né?, aprender, estudar um pouco mais sobre aprendizagem, né? Principalmente na época, isso aí já faz bastante tempo, era, a gente estudava muito Piaget, muito, muito, muito Piaget, é, Wallon, Vygostky, mais as escolas... mais o pensamento russo e também um pouco mais de Piaget. Na verdade essas coisas, elas vão mudando um pouco com o tempo. É... depois disso eu saí da Unicamp e fui trabalhar numa empresa. Trabalhei na empresa IBM. Eu trabalhava na implantação de projetos de utilização de tecnologia em escolas e universidades. Um projeto que na época chamava “Projeto Horizonte” e consistia na interação e formação de professor, formação continuada dos professores e na gestão e coordenação de projetos educacionais nas escolas, principalmente usando linguagem logo e software de autoria. Foi bem no começo do uso dos computadores pessoais no Brasil, isso foi em 92. Depois disso, eu trabalhei uns 10 anos nesta área, foi quando eu comecei a trabalhar com EAD, participei da construção de sistemas de gestão da aprendizagem no INEP.

Essa carreira é marcada por fases de continuidade e outras de ruptura. Nesse sentido,

merecem destaque as falas de D3 sobre a fase de “continuidade” – caracterizada aqui pelo fato

de trabalhar sempre com tecnologia – e sobre a de “rupturas”, que pode ser aqui

exemplificada pela mudança de empresas ao longo de sua carreira.

Na busca da compreensão da construção do saber docente, torna-se fundamental

analisar uma outra dimensão, a social, no sentido de superação de uma visão mentalista que

insiste em reduzir o saber docente a processos mentais, cujo suporte é a atividade cognitiva

dos indivíduos (TARDIF, 2006). Nesse sentido, Tardif propõe uma abordagem social à

edificação do saber docente, compreendendo que esse saber é partilhado por um grupo de

agentes (os professores) que possuem uma formação comum, trabalham numa mesma

instituição e estão sujeitos a uma mesma estrutura de trabalho. Além disso, é social por

repousar sobre um sistema que lhe dá legitimidade e orienta sua utilização, a exemplo da

universidade, portanto, não há conhecimento sem reconhecimento social. O autor também

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destaca o próprio objeto do saber, que são as práticas sociais, uma vez que o saber se

manifesta através de relações complexas entre o professor e seus alunos. A dimensão social

do saber docente também considera as mudanças sociais que ocorrem, pois aquilo que os

professores ensinam e sua maneira de ensinar são construções sociais e encontram-se

relacionados com a história de uma sociedade e sua cultura. Por fim, o autor considera o saber

docente como social também por ter sido adquirido no contexto de uma socialização

profissional, onde é incorporado, modificado, adaptado ao longo de uma história profissional.

Uma das docentes entrevistadas ilustra com sua fala esse aspecto social do saber

docente. Quando lhe pergunto sobre a elaboração do desenho didático do curso, ela aponta

para um saber é compartilhado pelo grupo:

Nós nos encontramos, bom, eu produzi o livro, já que era a minha área de conhecimento mais específico. E aí, com o livro na mão, nós começamos a nos encontrar todas as segundas-feiras. A D5 mostrou um pouco os recursos do Moodle, já que ela tem uma desenvoltura muito grande nessa área e, e fomos desenhando, foi um trabalho muito legal, porque foi colaborativo mesmo, sabe? A gente fazia as reuniões presenciais às segundas-feiras, cada um palpitava, dava umas ideias, aí depois a gente trocava e-mails durante a semana, é, tínhamos uma divisão de tarefas, por exemplo, normalmente quem colocava o material ou era D5 ou era a P6, então foi uma experiência de trabalho bem legal, o clima de grupo excelente, a gente decidiu fazer aqueles avatarezinhos da apresentação, né?, foi uma grande brincadeira, rimos muito, então foi um trabalho muito prazeroso, foi de aprendizado, foi muito legal. (D4)

Nota-se que embora o aspecto social tenha sido ressaltado na fala da docente, a

dimensão individual não foi descartada (“Eu produzi o livro, já que era a minha área de

conhecimento mais específico” ou, ainda, “A D5 mostrou um pouco os recursos do Moodle,

já que ela tem uma desenvoltura muito grande nessa área”). Nessa perspectiva, Tardif (2006)

afirma que os saberes de um professor são uma realidade social e são, ao mesmo tempo,

saberes próprios.

O saber dos professores é profundamente social e é, ao mesmo tempo, o saber dos atores individuais que o possuem e o incorporam à sua prática profissional para a ela adaptá-lo e para transformá-lo. [...] Portanto, o saber dos professores não é um “foro íntimo” povoado de representações mentais, mas um saber sempre ligado a uma situação de trabalho com outros (alunos, colegas, pais, etc.), um saber ancorado numa tarefa complexa (ensinar), situado num espaço de trabalho (sala de aula), enraizado numa instituição e numa sociedade (TARDIF, 2006, p. 15).

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A fala de D2 corrobora essa visão da natureza social e, ao mesmo tempo, individual

dos saberes e, ainda, revela a importância da coordenação entre os papéis docentes na

docência online:

Então, esta [a qualidade na educação online] também é uma questão que depende muito da experiência que a equipe, né?, porque nós estamos falando não mais de um professor enquanto uma individualidade, mas de um professor, é, que representa, como a Maria Luiza Belloni fala, o coletivo, porque se é um projeto ou uma atividade ou um projeto muito simples, que envolve um grupo pequeno de pessoas, uma individualidade que tenha diferentes competências e diferentes saberes, dá conta. Mas se você tem um projeto muito complexo, que envolve um grande número de pessoas, tudo isso, você tem de integrar pessoas que trazem esses diferentes saberes e essas distintas competências, que representam, então, aquilo que vem sendo chamado de professor coletivo, pra que dê conta do desenvolvimento da educação online.

Vale lembrar da crítica feita pos Santos (2006), já apontada no capítulo 2 deste estudo,

à disjunção dos saberes nas equipes de educação online, chamando a atenção para a

necessidade de um modelo de práticas mais integradas e interdisciplinares21, que oportunizem

a articulação dos saberes docentes, de forma a garantir a produção de sentidos e a autoria

coletiva dos sujeitos envolvidos nos projetos.

Pode-se, pois, concluir, a par dos relatos de todos os docentes, que certamente as

dimensões temporal e social perpassam a origem dos saberes dos docentes. Essa perspectiva

torna-se primordial para aqueles que têm o conhecimento como objeto de seu trabalho, mas de

maneira mais incisiva para aqueles que atuam na educação online que possui espaço e tempo

diferenciados em relação ao ensino presencial, além de possuir especificidades próprias da

cibercultura, que caracteriza a cena sociocultural contemporânea.

4.1.2 As origens dos saberes

Conforme já tratado no referencial teórico, uma das características do saber docente

refere-se à pluralidade de sua genealogia. Assim, “pode-se definir o saber docente como um

saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da

formação profissional, e de saberes disciplinares, curriculares e experienciais” (TARDIF,

2006, p. 36). 21 Santos (2006) compreende a interdisciplinaridade como uma integração disciplinar, que se caracteriza mais pela qualidade das relações do que pela quantidade de intercâmbios.

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No universo da pesquisa, uma das primeiras análises feita foi relativa aos saberes da

formação profissional de cada sujeito. Esses saberes, conforme Tardif (2006), são

transmitidos pelas instituições de formação de professores, que produzem conhecimentos e

procuram incorporá-los à prática dos professores. Têm sua origem na contribuição que as

ciências humanas oferecem à educação e nos saberes pedagógicos (concepções sobre a prática

educativa, arcabouço ideológico, algumas formas de saber-fazer e algumas técnicas).

Nessa análise da formação – inicial ou continuada – dos seis docentes sujeitos dessa

pesquisa, foi interessante perceber que todos tiveram acesso a uma formação voltada para o

ensino presencial nas mais diversas formações: licenciatura em história (D1), licenciatura e

bacharelado em matemática (D2), terapia ocupacional (D3), pedagogia e psicologia (D4),

pedagogia (D5) e sociologia (D6). Todos possuem mestrado e doutorado na área de educação.

Contudo, apesar de todos apresentarem um amplo currículo, a maioria não teve contato com a

questão da docência online ao longo de seu processo formativo (graduação, pós-graduação,

cursos de extensão). Somente um dos sujeitos (D4) teve uma formação específica para

docência online, após já estar atuando na educação a distância, participando de uma formação

para tutores online.

Vale ressaltar que D2 teve contato com a questão da EAD no final de seu doutorado,

mas, como afirma, “não era tanto a questão da comunicação, porque a internet ainda não era

algo tão disseminado, mas era o sujeito interagindo com a máquina para aprender, para

compartilhar com os colegas e a gente fazia o compartilhar até como troca mesmo de

disquetes”.

Ficou evidenciada uma fragilidade na formação dos docentes online, especificamente

no que tange a essa modalidade educativa, o que poderia ser justificado pelo fato de a

modalidade ter surgido junto com o advento da internet na década de 1990 e pela faixa etária

da maioria dos entrevistados (em torno de 50 anos). Contudo, até mesmo a mais jovem

docente (tanto em idade, como em formação), D5, que possui 35 anos e finalizou seu

doutorado há apenas dois anos, não teve acesso a um estudo específico para atuar como

docente online, apesar de ter tido a educação online como seu objeto de estudo em suas

pesquisas de pós-graduação stricto sensu.

Esse quadro confirma a demanda pelo investimento na formação de docentes que

atuarão no ambientes virtuais de aprendizagem. Apesar de compreendermos que a educação

online se apresenta como algo relativamente novo, uma vez que emerge do contexto da

cibercultura (SANTOS, 2005) e ganha de vez a cena sociotécnica em meados da década de

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90, percebemos que o investimento na formação do professor que nela atuará está

inversamente proporcional ao surgimento de novos cursos nessa modalidade, que cresce

progressivamente, conforme nos aponta Moran (2002) em um levantamento sobre a educação

superior a distância no Brasil.

No universo da pesquisa também surgiram diversas áreas disciplinares de atuação dos

docentes: “Eu venho da sociologia, da filosofia” (D6) ou, ainda “Na psicologia eu fiz uma

formação clínica em psicanálise” (D4), destacando a relevância dos saberes disciplinares.

Os saberes disciplinares são aqueles difundidos e selecionados pela instituição

universitária, correspondendo aos vários campos de conhecimento, que também se integram à

prática pedagógica através da formação (inicial ou contínua) do docente. Esses saberes são

transmitidos nos cursos e departamentos universitários, independentemente das faculdades de

educação e dos cursos de formação de professores.

Além dos saberes disciplinares, Tardif ressalta o saber curricular, oriundo dos

programas, objetivos, conteúdos e métodos definidos pelas instituições de ensino, que os

professores devem aprender e aplicar. Vale ressaltar que, para Tardif (2006), tanto os saberes

disciplinares como os curriculares são “externos” em relação à prática docente, uma vez que

são transmitidos ao professor como um produto já determinado. O mesmo se dará em relação

aos saberes da formação profissional.

No entanto, se a formação não proporcionou a todos esses profissionais o

conhecimento necessário para atuar em ambientes virtuais de aprendizagem e se os saberes

disciplinares e curriculares são externos a seu saber docente e não se articulam com sua

prática, como os saberes foram constituídos, uma vez que todos já atuaram em experiências

online?

Através dos relatos dos docentes entrevistados, foi possível colher algumas possíveis

respostas para tal questão. D4, por exemplo, atuara por vários anos somente na educação

presencial, quando foi convidada a assumir uma dupla coordenação na Faculdade de

Pedagogia de sua universidade, estreitando as duas modalidades, a presencial e a distância.

Eu fui convidada para ser coordenadora do curso de Pedagogia a Distância e fui estreitando laços com, com a EAD. Então eu fui coordenadora do curso, é, comecei a escrever material didático para outras instituições fora daqui, fiz uma formação para tutoria na FGV, na Fundação Getúlio Vargas, trabalhei em alguns cursos do online da Fundação Getúlio Vargas, então eu fui desenvolvendo um trabalho em EAD da forma que eu acho interessante, que é ter variadas experiências: a experiência da coordenação, a experiência da

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docência, a experiência da elaboração de material didático... Então fui diversificando por essas áreas o meu trabalho

É possível perceber através de sua fala que a formação até aconteceu, mas somente

quando sua prática na educação online já estava em andamento, o que nos aponta um saber

originado e validado na/pela sua experiência. E outros relatos convergem nesse sentido,

demonstrando um saber construído através de práticas vivenciadas, conforme apontou D6 em

sua entrevista:

[...] eu tive um convite do [nome do professor], que é um especialista em educação a distância no Brasil. Ele me convidou. Na ocasião ele estava dirigindo a UVB, Universidade Virtual Brasileira, que era um pool de universidades particulares que ofereciam EAD, e ele coordenando isso aí, viu no meu livro a possibilidade de um curso lato sensu [...]. Então eu fui, é, aprendi, com ajuda de pessoas da própria UVB indicadas por ele, a fazer um web roteiro para educação online, a pegar o meu livro e transformá-lo em web roteiro, aprendi com ele a utilização das interfaces, e me deparei com uma prática que eu já tinha teorizado no livro. (D6)

Foi interessante perceber como todos os relatos dos sujeitos da pesquisa se

encaminharam para um conhecimento nascido da vivência. Para compreender a questão,

Tardif (1991, 2006) chama a atenção para os saberes baseados na experiência, que são

edificados no exercício da prática cotidiana da profissão, fundados no trabalho e no

conhecimento do meio. “São saberes que brotam da experiência e são por ela validados.

Incorporam-se à vivência individual e coletiva sob a forma de habitus e de habilidades, de

saber fazer e de saber ser” (TARDIF, 1991). Em consonância, Nogueira (2006, p. 32) aponta

uma construção da identidade do professor baseada em sua prática, quando afirma:

[...] a formação docente implica também um conjunto de saberes que vão se incorporando à vida profissional dos professores, à medida que vão sendo mobilizados pelo seu trabalho cotidiano, o qual, de forma recursiva, vai originando novos saberes, e constituindo desse modo a identidade do professor.

Ao analisar todas as entrevistas e o fórum de apresentação do primeiro módulo, pude

constatar que o saber da experiência é muito marcante na educação online, uma vez que todos

esses docentes já tiveram contato com essa modalidade a partir das mais diversas experiências

docentes e discentes, conforme aponta D5: “Como aluna online eu tive experiência ao longo

do meu mestrado que eu fui aluna de 8 cursos online, eu fiz dois pelo SENAC, um pela UVB

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[...]”. Já D1 teve seu primeiro contato com a educação online a partir de uma experiência de

utilização de site educativo como apoio ao ensino presencial, ainda no final da década

passada, conforme o trecho de sua entrevistada abaixo:

A docência online entrou na minha vida em 1999. [...] já em 1999, numa disciplina que eu e minha colega [nome da professora que atua na mesma universidade], é, nem a universidade tinha plataforma, fizemos uma experiência de usar um site, a partir de 1999. Conseguimos um site de apoio, exatamente, às situações presenciais. Nós tínhamos esse site, era uma disciplina, tínhamos alunos presencialmente. Mas depois tínhamos o fórum, tínhamos dois fóruns, tinha este site, tinha também uma situação formativa com um programa, com o cronograma das atividades disponibilizadas no site e tínhamos os fóruns e fizemos uso também do correio eletrônico, que foi entre 99, 2000. Durante três anos nós estivemos com esta experiência [...].

Esses relatos apontam para a estrita e reflexiva relação existente entre o saber docente

e o trabalho: ao mesmo tempo que são constituídos no trabalho, os saberes dos docentes

online encontram-se a serviço do trabalho, ou seja, há uma “reiteração daquilo que se sabe

naquilo que se sabe fazer”(TARDIF, 2006, p. 21). Nesse sentido, o relato de D6 aponta para

um saber edificado da experiência e consolidado na relação com seus pares:

E lá no grupo de pesquisa, com meus colegas, começou a minha primeira relação, minha primeira experiência com a internet e a educação, então eu acho que o meu saber docente com a docência online, já começa por aí. (D5)

O cenário da cibercultura traz um grande potencial para a consolidação dos saberes

entre os pares, por possibilitar o encontro de pessoas dispersas territorialmente, mas que têm

perspectivas de troca e compartilhamento de informações através do ciberespaço,

possibilitando que cada indivíduo conheça e ressignifique o saber do outro, assim como seus

próprios saberes.

Dessa forma, é possível inferir que a edificação dos saberes na educação online advém

de espaços formativos diversos que são externos ao professor (currículo, disciplina e

formação), mas é através da experiência que será possível interiorizá-los. No entanto,

conforme nos lembra Tardif (2006), os saberes produzidos por teóricos da educação ainda são

os mais valorizados, em detrimento dos saberes experienciais, que são pouco formalizados e,

muitas vezes, negligenciados.

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Compreendendo que os saberes experienciais representam o núcleo vital do saber

docente, verifiquei ser fundamental a análise de práticas docentes que ocorrem em ambientes

virtuais de aprendizagem, numa tentativa de buscar uma maior aproximação da formação

acadêmica com a realidade, estreitando os vínculos na relação entre teoria e prática.

Certamente o projeto Formação de Professores para Docência Online – campo dessa pesquisa

– se apresentou como um espaço consolidado para atrelar a formação teórica (uma vez que o

objeto de estudo do projeto era exatamente a formação do docente online) e a prática

pedagógica de todos os sujeitos que dele participaram.

Vale repetir que essa categorização utilizada por Tardif et al (1991) e Tardif (2006) foi

fruto de uma ampla pesquisa que teve como referência basicamente a sala de aula presencial

padrão, mas nos ofereceu valiosas pistas para a compreensão da natureza dos saberes docentes

no contexto digital, quando estabelecemos um diálogo entre os dados da investigação desse

autor, as falas dos sujeitos envolvidos no processo e a imersão no campo, sempre levando em

consideração as peculiaridades da educação online.

Nessa análise, foi possível pensar sobre os saberes docentes próprios da educação

online, os quais apresentarei adiante, mas não sem antes tentar estabelecer a relação existente

entre esses saberes e a interatividade.

4.2 INTERATIVIDADE: SABER DOCENTE?

No universo da pesquisa, uma indagação se mostrou bastante frequente: seria a

interatividade um saber docente? Ao longo das entrevistas, tal dúvida persistiu, uma vez que

diferentes vozes apresentavam diferentes caminhos. Até mesmo no que concerne ao conceito

de interatividade, encontrei algumas dissensões e outras convergências. Para alguns

entrevistados, a interatividade caracteriza-se pela relação homem-máquina (como D1, D2 e

D3); para outros, ela está baseada em um conceito comunicacional estruturado na dialógica e

intervenção (como D4, D5 e D6), conforme já tratado na revisão de literatura. As diversas

compreensões do termo “interatividade’ podem ser notadas através dos relatos dos docentes a

seguir:

[...] usualmente quando requeremos a interatividade, trabalhamos mais o conceito de interativo, interatividade, mais no sentido de homem-máquina, humano-computador, mais com interfaces, mais interativo e a gente denomina mais interação para esta atividade conjunta entre pessoas. (D3)

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A interatividade pra mim é interface entre pessoas, em que você tem muitas trocas de variados níveis, quando você interage de verdade com alguém, você não troca apenas conhecimento [...]. (D4)

Vale lembrar que concordo com a teoria da interatividade proposta por Silva (2004,

2005, 2006a, 2006b), que a vê como a possibilidade real de participação-intervenção dos

sujeitos no processo de comunicação, como já comentei no capítulo 2 deste trabalho. Nesse

sentido, apesar do pensamento conceitual divergente, foi possível observar através da

docência nos módulos, uma prática pedagógica baseada na interatividade de Silva.

A dúvida, contudo, persistia, principalmente por ter deparado, ao longo da

investigação, com alguns estudos que apontavam a interatividade como uma das

competências necessárias para o exercício da profissão docente em ambientes virtuais de

aprendizagem, como o de Villardi e Oliveira (2005, p. 120), em que se afirma o docente

precisa “interagir com os alunos, de forma não presencial, individualmente e em grupos,

encorajando-os e incentivando-os, minimizando, dessa forma, a evasão”. Um outro

interessante estudo sobre saberes docentes em ambientes virtuais de aprendizagem

(PEREIRA, 2008) sugere que há cinco tipos de saberes: saberes da mediação, saberes

tecnológicos, saberes interativos, processos virtualizantes e propostas de colaboração.

Portanto, para essa autora, a interatividade caracteriza-se como um saber docente.

Não discordo dessas perspectivas, afinal, a interatividade é um dos saberes (ou

competências, conforme termo utilizado no primeiro exemplo) essenciais a uma docência

online de qualidade. No entanto, entendo que existem relações mais complexas entre a

interatividade e o saber docente que merecem ser discutidas.

Inicialmente, é preciso considerar que uma especificidade da educação online

encontra-se no fato de utilizar tecnologias que permitem novas formas de interatividade, tanto

com conteúdos informativos como com interatividade entre as pessoas, como visto no

segundo capítulo. Os ambientes virtuais de aprendizagem oferecem interfaces e recursos que

possibilitam a interlocução entre seus frequentadores. Podem ser considerados

potencializadores de interatividade, pois permitem ao aluno ir além do ouvir-copiar-prestar

contas, uma vez que, junto ao professor e outros alunos, é possível criar, modificar, construir

conhecimentos e tornar-se coautor do processo ensino-aprendizagem.

Em seguida vale ponderar que o saber docente está a serviço do trabalho, e esse

trabalho docente é interativo (TARDIF; LESSARD, 2005; TARDIF, 2006). Tardif e Lessard

(2005) afirmam que o trabalho docente apresenta uma característica específica: seu objeto de

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trabalho não é um objeto, mas um sujeito, decorrendo daí um trabalho interativo, em outras

palavras, “um trabalho onde o trabalhador se relaciona com o seu objeto de trabalho

fundamentalmente através da interação humana” (TARDIF, 2006). Portanto, o saber não é

uma substância ou um conteúdo fechado em si, ele se manifesta através das relações

complexas entre o professor e seus alunos, na própria interatividade, uma vez que “a presença

de outrem diante do trabalhador conduz, inevitavelmente, a um novo modo de relação do

trabalhador com seu objeto: a interação humana” (TARDIF; LESSARD, 2005, p. 29).

Por fim, é preciso aqui recorrer à abordagem de Santos (2005), que entende a

educação online como fenômeno da cibercultura e traz em si características da própria

cibercultura, como a liberação do polo de emissão e o computador coletivo ligado à internet

(LEMOS, 2003), que potencializam interatividade. Se “a comunicação e a interatividade

determinam o diferencial pedagógico na educação online” (TORRES, 2007, p. 145), não é

possível pensar em construção de saberes docentes em ambientes virtuais de aprendizagem

destoantes da teoria da interatividade.

Tendo em vista o quadro acima, percebe-se a existência de uma reflexividade em

relação à interatividade: da mesma forma que ela é um saber docente22, também alicerça os

saberes docentes, apresentando-se de maneira transversal aos saberes que foram categorizados

nesta investigação, conforme tratarei adiante.

Nesse sentido, é interessante perceber como os sujeitos da pesquisa concebem práticas

interativas. Durante a entrevista, ao ser indagada sobre como a interatividade se materializa,

D5 afirma que “é quando o professor, o docente, lança situações desafiadoras”, o que nos

mostra que, para essa docente, a interatividade está em seu saber didático (categoria que será

trabalhada a seguir). A fala de D1 corrobora essa perspectiva: “Bom, ela [a interatividade]

permeia todo o processo”, apontando seu caráter transversal em relação aos saberes.

D6 tampouco parece ter dúvidas a esse respeito, pois afirma claramente que “os

fundamentos da interatividade tornaram-se para mim saberes docentes”, ao mesmo em tempo

que revela que sua prática pedagógica é permeada pela interatividade, principalmente através

de seus saberes didáticos e tecnológicos (que serão discutidos adiante):

[...] você oferece a possibilidade de articulação de conteúdo, de redes de relações e de conteúdos entre textos e aí você permite que discursos potenciais que não estavam lá, pré-formulados, possam emergir, você oferece um leque de possibilidades de atuação, leque de conteúdos

22 Conforme será visto no item 4.3, na seção “Saberes comunicacionais”.

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hiperlinkados com imagens, com links, com vídeos e convida o aprendiz, o interlocutor a operar isso, ou seja, a fazer permutabilidades, trocas, combinações e essas trocas e combinações [...]

Nesse sentido, a revisão de literatura, a observação da prática pedagógica no ambiente

virtual e os relatos dos docentes ajudam a perceber essa íntima relação entre a interatividade e

os saberes dos docentes presentes na educação online, que se dá através de uma interconexão

que possibilita uma abordagem de polifonia e coautoria, garantindo processos pedagógicos

mais democráticos e significativos para professores e alunos, caracterizando uma via de mão

dupla: ao mesmo tempo em que a interatividade apresenta-se como saber docente, ela

encontra-se presente nos outros saberes a seguir apresentados.

4.3 DOCÊNCIA ONLINE: UMA DIVERSIDADE DE SABERES

Durante quatro meses tive a oportunidade de observar e vivenciar a prática pedagógica

dos docentes no ambiente virtual de aprendizagem Moodle, locus da pesquisa, sendo possível

inferir sobre uma variedade de saberes docentes presentes na educação online. Do mesmo

modo, nas entrevistas, ao serem abordados sobre os saberes necessários para o exercício da

docência online, os professores apontaram diversas possibilidades de sua prática em ambiente

virtuais.

É nesse sentido que abarco o conceito de saberes apresentados por Tardif (1991,

2006), que tem como ideia central a coexistência de uma variedade de saberes que englobam

conhecimentos, competências, habilidades e atitudes docentes, que são mobilizados e

construídos na prática pedagógica.

Diante dos distintos saberes apresentados e em sintonia com os pressupostos da

educação online e da interatividade, busquei agrupá-los por áreas afins, resultando em três

grandes blocos, a saber, saberes epistemológicos, saberes didáticos e saberes tecnológicos. É

importante destacar que essa organização colaborou no tratamento e apresentação dos dados

no universo da pesquisa e certamente ajudará o leitor na compreensão dos resultados.

Contudo, ressalto que esses saberes não são isolados em suas categorias, pelo contrário, o

tempo todo dialogam entre si, numa simbiose constante.

Vale, ainda, salientar que vários autores que tratam da questão de competências e/ou

da formação de professores em ambientes não presenciais colaboraram para que fosse

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possível chegar a tal organização dos saberes, como Villardi e Oliveira (2005), Santos et al

(2007) e Belloni (2008).

Não pretendo aqui esgotar o assunto, até porque, como nos lembra Lévy (1999, p.

157), “pela primeira vez na história da humanidade, a maioria das competências adquiridas

por uma pessoa no início de seu percurso profissional estarão obsoletas no fim de sua

carreira”. Percebo o levantamento desses saberes como uma obra aberta, em que, conforme

forem crescendo as discussões acerca da educação online, poderão ser modificados, receber

acréscimos ou ser retirados.

4.3.1 Saberes epistemológicos

Os saberes epistemológicos abordam questões que fundamentam a formação e prática

dos professores. Para Dalarosa (2008, p. 344), “[...] a epistemologia consiste em um estudo

sobre a ciência tomada como sinônimo de conhecimento. É, portanto, uma teoria do

conhecimento”. Por isso, os saberes epistemológicos são aqui compreendidos como um

conjunto de conhecimentos utilizados pelos docentes a fim de promover a compreensão do

próprio agir humano, sendo propostos, para fins de apresentação dos dados, como saberes

psicopedagógicos, político-filosóficos e comunicacionais.

Saberes psicopedagógicos

A observação da prática e a análise das entrevistas apontaram para a relevância das

concepções pedagógicas e psicológicas presentes na prática docente em ambientes virtuais de

aprendizagem, conforme exemplificado nos relatos de dois professores entrevistados.

Mas por que isso [educação a distância] dava certo? Porque tinha uma concepção educacional. Não é a tecnologia que vai garantir este trabalho. Eu acredito que por mais sofisticada e por mais potencial que a tecnologia tenha, eu posso empregá-la, cada vez para fazer, é... um controle mais refinado e sofisticado e posso empregá-la para a emancipação humana do desenvolvimento do sujeito. Então, daí a importância da educação como estudo mesmo dos fundamentos, das bases que orientam este trabalho. Acho que sem isso a gente não consegue avançar. (D2) Uma proposta pedagógica consistente, certamente, é o primeiro passo pra você ter um trabalho de qualidade, a partir de uma proposta pedagógica, uma abordagem trabalhando os conceitos que, enfim, cada grupo, cada

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universidade se propõe, eu acho que isso já e uma trajetória bem importante. (D3)

Em suas falas, foi possível perceber que alguns sujeitos da pesquisa se referem ao

domínio de conhecimentos dos campos específicos da pedagogia e psicologia, voltados para a

matriz epistemológica do processo de ensino-aprendizagem, que aqui chamaremos de saberes

psicopedagógicos. Tais saberes, quando relacionados, ganham forma e sentido. Essa junção

entre os saberes deveu-se ao fato de não ser possível, ao longo da pesquisa, dissociar a

abordagem psicológica da pedagógica, uma vez que a compreensão de como ocorre a

aprendizagem do aluno e a concepção que norteia a prática do professor caminham lado a

lado.

Os saberes psicopedagógicos dizem respeito às abordagens que norteiam a prática do

professor, conforma apontou D4 na ocasião da entrevista: “Bom, nós pensamos a princípio

que a mediação acontecesse de uma forma sociointeracionista, no sentido de não ter muitas

determinações fechadas para o aluno... é... procurar deixar o grupo à vontade”.

Nos ambientes virtuais de aprendizagem, é possível encontrar teorias pedagógicas e

psicológicas diversas que sustentam a prática dos professores, ainda que estes não tenham

ciência do fato. Mais comumente, há aquelas que concebem o processo de ensino-

aprendizagem como uma transmissão de informações, como é o caso da “educação bancária”

analisada por Paulo Freire (2003) e outras que o entendem como uma forma de construção de

conhecimento, conforme delineado no segundo capítulo desta dissertação.

Buscando compreender quais saberes psicopedagógicos subsidiam a prática dos

professores participantes do projeto, foi interessante perceber que nos módulos analisados o

processo educativo encontrava-se centrado no aluno enquanto sujeito cognoscente, no qual o

professor não era a única fonte de saber. Dessa forma, caberia ao aluno buscar, pesquisar,

problematizar o conhecimento, contextualizar e descobrir. A “provocação” inicial em um dos

fóruns do módulo C reflete tal fato, quando os alunos são convidados pelos docentes a

agregarem valor ao texto inicial.

Olá, pessoal Este fórum de discussão “Cocriando o hipertexto da unidade 1” é um espaço de criação coletiva para agregarmos valor ao conteúdo inicial da nossa unidade. Nós da [nome da universidade] optamos pela produção de um texto base para cada unidade do nosso módulo. Na unidade 1 contamos com a autoria da professora [nome da professora].

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A ideia de termos um texto base garantirá para nossos cursistas o acesso a um “pré-texto”, que apresenta o conteúdo básico dos temas da unidade. Este texto base encontra-se em dois formatos: 1) livro hipertexto - Interface do Moodle; 2) documento em Word (Texto para fácil impressão. Muitos de nós preferimos fazer a leitura geral de forma mais contemplativa). No primeiro formato temos tela a tela para cocriarmos juntos o hipertexto. Este fórum é o nosso espaço de cocriação. Como poderemos participar? Sugiram links para objetos digitais (textos jornalísticos, cases, artigos científicos, vídeos, imagens, sons). Sugiram sinalizações e provocações para reflexões, novas leituras, questões para o fórum “Brincando de labirinto” que é o fórum da unidade. Esperamos por vocês aqui! []s Equipe [nome da universidade]

D6, que é docente em outro módulo e participou como discente no módulo C, analisou

em uma de suas postagens do mesmo fórum a prática dos docentes 4 e 5, responsáveis pelo

módulo, no que concerne à preposição de se ter o aluno como sujeito cognoscente do processo

de ensino-aprendizagem:

Estou achando interessante essa postura docente no módulo 3, que articula postagens dos discentes mobilizando-os como interlocutores entre si. Vejo que não só provoca com a proposição do desenho didático do seu módulo (trama de conteúdos de aprendizagem + trama de atividades vinculadas a eles), mas aciona discente personalizado para dialogar com discente, promovendo interações a partir das postagens deles.

Através da prática pedagógica presente nesse e outros módulos, foi possível inferir que

seus fazeres estavam subsidiados pelas teorias interacionistas da educação, que encontram em

Piaget e Vygotsky seus principais representantes. Tais teorias são consideradas por diversos

autores as mais propícias a um processo de ensino-aprendizagem efetivo na educação online,

por esta apresentar especificidades, principalmente pelo fato de possuir recursos que

possibilitam a interlocução entre seus frequentadores e interfaces que permitem a

interatividade e a aprendizagem colaborativa, conforme visto na revisão de literatura deste

estudo.

Autoras como Villardi e Oliveira (2005), Leal, Alves e Hetkowski (2006) e D´Ávila

(2006) apontam as teorias de Piaget e Vygotsky – este último, principalmente – como

subsídios para compreensão de um processo de ensino-aprendizagem construtivo e

significativo e garantia de “uma arcabouço teórico que possibilite pensar num modelo

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educacional mais coerente com os reclamos da sociedade contemporânea” (Villardi e Oliveira

(2005 p. 91).

A contribuição de Piaget para a educação online está pautada em um dos aspectos

centrais de sua teoria: a ideia de que “o conhecimento não é um dado exterior ao homem, mas

um processo construtivo, nascido do seu inefável desejo de conhecer” (Villardi e Oliveira.

(2005 p. 94). Dessa forma, a ação do docente online deve incidir na atividade construtiva do

aluno, criando condições favoráveis para que os esquemas de conhecimento se desenvolvam.

A premissa básica da teoria de Vygotsky (1998) encontra-se baseada na questão

social. Para esse autor, o ser humano aprende e se desenvolve do coletivo para o individual,

mediado pelos signos. Seu funcionamento psicológico é formado ao longo da história

humana, sendo, pois, moldado pela cultura. Essa perspectiva de construção histórico-social do

saber é ratificada por Lévy (1998, p. 27):

As identidades tornam-se identidades do saber. As consequências éticas dessa nova instituição da subjetividade são imensas: quem é o outro? É alguém que sabe. E que sabe as coisas que eu não sei. O outro não é mais um ser assustador, ameaçador: como eu, ele ignora bastante e domina alguns conhecimentos. Mas, como nossas zonas de inexperiência não se justapõem, ele representa uma fonte possível de enriquecimento em meus saberes. Ele pode aumentar meu potencial de ser, e tanto mais quanto diferir de mim.

Através de sua experiência na modalidade online, o papel do professor vai sendo

ressignificado. Lévy (1999, p. 171), em conformidade com as teorias de Piaget e Vygotsky,

sintetiza o novo papel do professor, no contexto atual marcado pela cibercultura, como sendo

o “animador da inteligência coletiva” dos grupos que estão a seu encargo, num sentido de que

a atividade do professor esteja centrada no incentivo às trocas dos saberes, da mediação

relacional e do acompanhamento dos percursos da aprendizagem. D2, em consonância com

Lévy, relata em sua entrevista como compreende a função do professor numa perspectiva da

educação online:

Então o papel dele [do professor] é de intervenções, não é constante, digamos assim, não naquela de marcar um aluno mesmo, mas ele vai fazendo sínteses e vai principalmente devolvendo o diálogo ao grupo, quer dizer, chamando atenção do grupo para que eles dialoguem entre si. Procurando questionar e provocar o grupo pra esta multidimensionalidade e horizontalidade do diálogo.

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O relato de D2 demonstra como os saberes psicopedagógicos refletem e ressignificam

a prática do docente, que atua em ambientes virtuais de aprendizagem. Vale ressaltar, no

entanto, que tais saberes não se encontram isolados, eles se expressam em toda a prática do

docente online, principalmente através dos saberes didáticos. Ao se escolherem as interfaces

que serão utilizadas em um curso, ao se planejar esse curso, estabelecendo-se conteúdos e

situações didáticas e definindo-se estratégias avaliativas, os saberes psicopedagógicos estarão

sendo expressos, num movimento de intenso diálogo com os outros saberes.

Saberes político-filosóficos

Ao longo das entrevistas, ao serem indagados sobre os saberes presentes em sua

prática na educação online, os professores relataram uma diversidade de saberes:

psicopedagógicos, didáticos, tecnológicos; todos analisados nesta seção. No entanto, uma

única docente, D5, tratou claramente de questões mais específicas no que tange aos aspectos

políticos e filosóficos presentes na educação online. Contudo, foi possível perceber que

questões relativas ao tema encontravam-se presentes nas vozes de alguns outros docentes, mas

eram tratadas de forma tácita. Pelo caráter qualitativo, e não quantitativo, desta pesquisa, essa

questão foi aqui analisada.

Quando indagada sobre o que significava o saber político, D5 remete ao conceito de

poder conforme tratado por Foucault (1993), que considera a concepção e a prática do poder

em várias dimensões e afirma que o campo da política não é a única manifestação do poder

propriamente dito.

É você saber lidar com a relação de poder que pode ser circular na microfísica. Então, em todos os espaços, este poder, ele concentra, ora em um grupo, ora em outro, ora num único só [...]. É você chegar nesta pessoa que domina e mostrar pra ela que ela tem que dividir o poder com você, que você também é dono deste poder em algum momento. (D5)

Certamente as relações de poder estão presentes na educação online, uma vez que, de

acordo com Foucault (1993), elas se encontram em todas as esferas sociais e em todos os

cenários da vida humana, não sendo, portanto, diferente na cena da cibercultura. O autor

afirma que não existe em nenhuma sociedade divisão entre os que têm e os que não têm

poder, ou seja, poder se exerce, se pratica. Portanto, o poder, segundo Foucault (1993), não

existe, o que há são relações e práticas de poder.

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Um interessante fato que demonstra as relações de poder presentes no projeto

pesquisado refere-se ao silêncio virtual persistente, ou seja, a baixa participação de alguns

pesquisadores em fóruns, chats e demais eventos e interfaces oferecidos pelos PPGs. Após

três meses de curso, isto é, na metade do terceiro módulo, alguns pesquisadores ainda não

tinham tomado parte no projeto, outros, que outrora estavam frequentemente presentes no

AVA, raramente participavam. Como pesquisadora, percebia que diariamente diversos

cursistas entravam no AVA, percorriam várias interfaces (livro, fóruns...), mas não interagiam

com os outros participantes. Isso foi notado e relatado por alguns docentes em suas

entrevistas, como coloca D3: “Olha, acho que tivemos ali uns limites em relação à

participação, nem todo mundo começa no mesmo tempo”. Na ocasião, o coordenador do

projeto, D6, enviou a seguinte mensagem ao fórum do módulo D:

Gente, nossa pesquisa está passando por uma certa calmaria... poucas participações. Em julho houve dispersão por conta dos recessos acadêmicos nos PPGs. Agora em agosto a dispersão ocorre com o reinício das aulas... Fico feliz com seu retorno e aproveito para convocar todos os colegas pesquisadores aqui implicados para que venham atuar na pesquisa interinstitucional. Lembro que estamos aqui não somente para montar nossos módulos, mas tb para exercitar a docência e a aprendizagem. Continuo muitíssimo motivado com esta pesquisa e gostaria de saber como motivar o engajamento de todas as equipes, mesmo sabendo de suas infinitas ocupações. Forte abraço [D6]

Uma das pesquisadores, P25, que é mestranda de um dos PPGs que participam do

projeto, respondeu a D6, postando a seguinte mensagem: “Olá [D6], pessoal... Muitas vezes

fico em dúvida se devo postar minhas humildes opiniões e experiências. Posso garantir que

essa dúvida acontece, mas nunca me impediu de escrever ou participar [...].

Relações de poder certamente se encontravam presentes na pesquisa, mas foi a partir

desse momento que a questão da hierarquia acadêmica, antes tácita, tornou-se explícita. Em

resposta, D6 postou no fórum:

Olá [P25] Destaco sua frase “Muitas vezes fico em dúvida se devo postar minhas humildes opiniões e experiências” para dizer o seguinte: - quando planejei essa pesquisa baseada na reunião de mestrandos, doutorandos e profs de PPG jamais imaginei que haveria esse tipo de reação; - jamais imaginei que haveria intimidação dos menos graduados frente aos mais graduados;

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- jamais imaginei que emitir um parágrafo em resposta a alguém seria tão custoso, ou problemático; - jamais imaginei que o peso da hierarquia acadêmica sufocaria nossa possível interatividade tão desejada. - jamais imaginei que algumas postagens mais longas de alguns colegas prolixos ou eloquentes pudessem bloquear a vontade de expressão de muitos outros. Então, [P25}: aqui já temos um aprendizado muito significativo em nossa pesquisa. Como superar esse problema implacável de hierarquia acadêmica? [...]

Mais adiante, D6 ratifica essa perspectiva de relações de poder presentes no AVA, ao

trazer à tona a fala de um pesquisador do projeto:

Há um integrante do nosso grupão [ele prefere não divulgar o nome] que faz a seguinte análise sobre o "silêncio virtual" em nossa pesquisa interinstitucional. Ele diz assim: "Sobre a participação dos pesquisadores, [D6], tenho um palpite que talvez explique parcialmente a redução (espero que provisória) da interatividade: o alto grau de qualidade acadêmica e de experiência profissional de uma porcentagem deles. Isso mesmo, parece contraditório, mas acredito que esse grupo, ao antecipar-se com postagens inteligentes, profundas do ponto de vista teórico, acabam por inibir a participação dos menos experientes, como se dissessem: ‘Poxa vida, que opinião/comentário/participação fantástica de fulano(a), o que é que eu vou dizer?’. Ou simplesmente: ‘Beltrano(a) já comentou isso ou aquilo, não posso repetir, vou dizer o que, então?! Dizer o óbvio se o assunto foi quase que exaustivamente explorado?’ Prevalece, então, o inquietante silêncio virtual. Noto que há uma ‘elite intelectual’ que polariza as discussões, sem que haja intenção disso.” Minha resposta a ele foi assim: “Prezado colega (...), aqui vai minha reflexão sobre sua inquietação. Sinceramente, não vejo o que vc vê. Penso tranquilamente o seguinte: temos diversas pessoas... elas atuam cada um a seu jeito e possibilidades... afetar-se por causa do estilo ou demasia de um ou outro é perda de tempo... cada um deve ser o que é... e colaborar no projeto. Para mim não há doutores que dominam a cena. Há silêncio virtual de mestres e doutores por causa da falta de tempo, e por não ser este o ‘projeto centralidade’ em suas vidas. Muitos desejaram entrar no projeto interinstitucional mesmo sabendo que não poderiam atuar frequentemente” [...]

Na voz de D6, fica claro como alguns pesquisadores se intimidavam por estar

debatendo em fóruns e principalmente chats questões diversas com pares mais experientes.

Em seguida, P25 respondeu: “Acredito que o problema da hierarquia com o tempo diminui,

pois vamos nos conhecendo melhor. Vamos seguir em frente que o aprendizado, com certeza,

está sendo significativo”. Contudo, a situação pouco se modificou.

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Para D5, perceber os saberes político-filosóficos como um saber docente permite que

o professor leve seu aluno a perceber que o poder não se concentra somente em determinadas

esferas e que é preciso superar o medo de se expor a seus pares, para que ocorra uma efetiva

construção de conhecimentos, pautada no diálogo e na colaboração:

Então o docente online tem que saber brincar com este jogo de poder, mostrando que todos têm poder, sobretudo o aluno. Então o saber político é muito interessante. É... porque muitas vezes as pessoas acabam deixando de se autorizar, porque não sabem se relacionar politicamente.

Essa perspectiva de D5 encontra-se em consonância com o pensamento de Freire

(2003), que, ao analisar as questões político-filosóficas que se encontram diretamente ligadas

à prática pedagógica, afirma que uma educação que liberte as pessoas oprimidas deve passar

por um intenso diálogo entre professores e alunos.

Freire (2003) afirma que não há educação neutra, o processo educativo seria um ato

político, uma ação que resultaria em relação de domínio ou de liberdade entre as pessoas, e

aponta a necessidade de o professor reconhecer que os saberes político-filosóficos estão

presentes em sua experiência docente.

Outro saber de que não posso duvidar um momento sequer na minha prática educativo-crítica é o de que, como experiência especificamente humana, a educação é uma forma de intervenção no mundo. Intervenção que além do conhecimento dos conteúdos bem ou mal ensinados e/ou aprendidos implica tanto o esforço de reprodução da ideologia dominante quanto o seu desmascaramento. Dialética e contraditória, não poderia ser a educação só uma ou só a outra dessas coisas. Nem apenas reprodutora nem apenas desmascarcrdora da ideologia dominante (FREIRE, 2008, p. 98).

Freire (2003, 2008), portanto, compreende que as relações de poder presentes na

educação apresentam-se de forma vertical, havendo uma dicotomia entre dominantes e

dominados. Tal perspectiva o afasta das prospecções de Foucault (1993), que acredita que o

poder manifesta-se em diversas esferas sociais. Salvo as diferenças, as contribuições de Freire

são igualmente valiosas para a compreensão dos saberes político-filosóficos dos docentes

online que se expressam através da consciência que cada um possui de sua prática e da

intencionalidade de suas ações.

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Saberes comunicacionais

No universo da pesquisa, pude perceber através da fala de diversos docentes a

relevância da comunicação em sua prática. Em seu relato, D5, por exemplo, coloca em

destaque a urgência dos saberes comunicacionais ao professor:

Então o docente online tem que ter esta capacidade da fala solta, não ter medo da crítica, você também tem que saber falar, você tem que descobrir, é, com a escrita, a forma de falar, porque muitas vezes, o que acontece, a mensagem é construída pelo emissor, ela é construída pelo receptor. Então se eu escrevo algo que vai pegar você numa situação sensível, você vai ver na minha mensagem, o que eu não escrevi, né?[...] Então tem esta competência comunicacional que é cultural.

Em seu relato, D5 evidencia uma lógica de comunicação diferente daquela mormente

presente na educação tradicional, que considera que o receptor da mensagem – o aluno, na

maior parte das vezes – receberá a mensagem exatamente como lhe foi transmitida. Esse tipo

entendimento, conforme nos aponta Silva (2006b), reflete um modelo comunicacional

presente na sociedade e na escola, pautado numa lógica unidirecional “um-todos”, que

considera que a comunicação deve ser utilizada na educação apenas para potenciar a

transmissão de informação para massas de alunos, conforme já aprofundado no segundo

capítulo deste estudo, o que caracteriza a interatividade.

Em consonância, D1 observa que “na interação intuí que aqui não haja uma separação

em termos comunicacionais emissor/receptor, que um dos intermientes seja simultaneamente

emissor ou receptor”, o que reflete alguns dos pressupostos presentes numa proposta de

comunicação interativa.

Silva (2006) enfatiza que a natureza interativa da comunicação é tão presente quanto a

humanidade, mas na educação ainda prevalece uma lógica de distribuição de conteúdos e

informações. Daí o desafio que se apresenta: modificar a comunicação unidirecional presente

nas instituições de ensino e buscar nos fundamentos da interatividade (binômios participação-

intervenção, bidirecionalidade-hibridação e permutabilidade-potencialidade)23 propostas para

um novo modelo, conforme exemplifica D6:

Você oferece a possibilidade de articulação de conteúdo, de redes de relações e de conteúdos entre textos, e aí você permite que discursos

23 Cf. capítulo 2

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potenciais que não estavam lá, pré-formulados, possam emergir. Você oferece um leque de possibilidades de atuação, leque de conteúdos hiperlinkados com imagens, com links, com vídeos e convida o aprendiz, o interlocutor a operar isso, ou seja, a fazer permutabilidades, trocas, combinações e essas trocas e combinações fazem emergir discursos, entendimentos provisórios, conhecimentos provisórios, percepções que não haviam sido previstas, eu considero tudo isso aí o saber docente [...]. (D6)

Silva (2006) entende que compreender a interatividade na educação e modificar o

modelo de comunicação presente na prática pedagógica implica modificar os fundamentos de

todo um sistema de ensino, repensando o sistema em geral petrificado em uma concepção

educativa de natureza reativa, fechada, sequencial e linear, o que significa modificar os

próprios saberes político-filosóficos e psicopedagógicos que subsidiam as práticas na

educação online.

4.3.2 Saberes tecnológicos

O AVA e suas interfaces

Durante as entrevistas, pude perceber a relevância atribuída pelos sujeitos da pesquisa

ao “domínio tecnológico” para utilização das TICs na prática pedagógica. Sobre essa questão,

D4 relata:

Bom, há um desafio de desconhecimento da própria, das próprias ferramentas, porque a minha geração é uma geração intermediária, né?, quer dizer, entre a que não conhecia e não usava TIC e uma geração mais jovem que a minha, que domina tudo, né?, que usa desde a infância. [...]. (D4)

Não há dúvida de que o docente que atua numa sala de aula online necessita ter o

conhecimento das interfaces presentes nos AVAs e de outros dispositivos tecnológicos

fundamentais para uma docência de qualidade. Caso contrário, o próprio processo de ensino-

aprendizagem será prejudicado. Conhecer vantagens e desvantagens do AVA adotado, saber

“abrir” um fórum ou chat, inserir textos, imagens ou vídeos e editá-los e criar hiperlinks são

alguns dos saberes tecnológicos esperados por um docente que possui como locus de seu

trabalho a sala de aula online.

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Surgem daí algumas questões: Como se dá esse conhecimento tecnológico? Ele é

meramente instrumental? Baseia-se em atividades técnicas? É um conhecimento formativo?

Relaciona-se com outras instâncias de saberes?

A perspectiva estruturante

O relato de D5 fornece alguns caminhos para a compreensão do conhecimento

tecnológico na educação, ao enfatizar que

[...] tem a competência técnica, quanto mais mexer no ambiente você souber, mais criatividade você vai ter com a didática [...]. O saber técnico, que não é um saber técnico instrucional, mas é um técnico que potencializa outros saberes.

Colocar em reflexão essa relação entre educação e tecnologia leva-nos a perceber a

importância da superação de uma visão meramente instrumental e de usuário da informação,

para uma perspectiva estruturante do pensamento, que permite que novas formas de pensar

sejam instituídas, conforme nos apontam Pretto e Pinto (2006, p. 22):

Por agora, acreditamos ser importante retomar a ideia de que, mesmo com todas essas possibilidades, percebemos que o processo de informatização da sociedade, fortemente articulado com todos os sistemas midiáticos de comunicação, não se estabelece per se, como se fosse apenas mais uma atualização dos meios tradicionais de comunicação, de envio e recebimento de dados, informações e imagens. Tais sistemas constituem-se em elementos estruturantes (Pretto, 1996) de uma nova forma de ser, pensar e viver. A dimensão estruturante das tecnologias da informação, que Pierre Lévy (1993) denomina de tecnologias coletivas ou tecnologias da inteligência, tem mexido muito com todos nós, especialmente os educadores. Isso porque essas tecnologias, antes entendidas como meras extensões dos sentidos do homem, hoje são compreendidas como algo muito mais profundo, que interfere com o próprio sentido da existência humana.

A partir de uma visão estruturante do pensamento, nota-se que o saber tecnológico do

professor não se refere à utilização das TICs como um mero instrumento de complemento às

suas aulas, como durante muito tempo se pensou. As formações tecnológicas para o professor

se limitavam ao conhecimento instrumental da tecnologia e, assim, ele podia ter sua prova

digitada em Word ou fazer uma apresentação em Power Point, em vez de necessitar escrever

no quadro de giz. Percebe-se, portanto, que as tecnologias ainda não são utilizadas na

educação em seu potencial.

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A aula continuou predominantemente oral e escrita, com pitadas de audiovisual, como ilustração. Alguns professores utilizavam vídeos, filmes, em geral como ilustração do conteúdo, como complemento. Eles não modificavam substancialmente o ensinar e o aprender, davam um verniz de novidade, de mudança, mas era mais na embalagem. (MORAN, 2004, p. 246)

Bonilla (2005) corrobora essa visão e aponta a necessidade de uma formação do

professor que vá além do aspecto instrumental. Para a autora, é preciso oferecer aos docentes

um trabalho formativo que contemple processos de produção do conhecimento, de criação e

cocriação possibilitadas pelas TICs digitais, em detrimento da simples execução de atividades

técnicas. A formação docente, nesse sentido, deve se voltar para além de treinamentos para a

execução de tarefas sem reflexão sobre o processo.

Através da implementação de uma nova interface no módulo B, o Flashmeeting24

(figura 18), foi possível compreender algumas das relações estabelecidas entre os docentes e a

tecnologia na perspectiva estruturante do pensamento, conforme relato de D3.

Nós trabalhamos com diversas interfaces, inclusive utilizamos interfaces externas ao Moodle, como Flashmeeting, da Open. Até porque se nós estamos falando de uma formação de professor online, é importante que este professor conheça as diferentes interfaces, porque se ele não conhece, ele não vai usar, tá... Você não se dispõe a usar alguma coisa com os seus alunos quando você não conhece. Aliás, até porque, se não a conhece, você não consegue conceber atividades por meio delas. Então, nós tínhamos a intenção, sim, de experimentar o uso de diferentes interfaces, foi intencional isso, não foi casual não. Então, ora nós trabalhamos com fóruns, ora trabalhamos usando o Flashmeeting, enfim a gente procurava fazer...Trouxemos vídeos, trabalhando com diferentes linguagens.

24 Interface gratuita de webvideoconferência, disponibilizada pela Open University (Inglaterra).

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Figura 18 - Flashmeeting

A equipe do módulo teve a preocupação de utilizar a tecnologia atrelada ao seu uso

didático. Para ajudar o acesso ao ambiente, foi disponibilizado um guia com o passo a passo

(figura 19), demonstrando, inclusive, telas, pelas quais cada pesquisador/cursista deveria

passar para se cadastrar e utilizar. Como cursista do módulo, participei da videoconferência e

pude concluir que essa orientação inicial sobre a questão tecnológica foi fundamental para a

realização da atividade.

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Figura 19 – Guia para acesso ao Flashmeeting

Ao observar o módulo C, em que D5 – coautora do desenho didático – aplicou

diferentes conotações ao uso do fórum (portfolio, estudo de caso, midiateca, simulação), pude

perceber a relação presente entre o conhecimento tecnológico e a própria prática, conforme

seu relato:

[Optamos pelo fórum] Porque o fórum é plástico. É uma interface digital ela pode virar, pedagogicamente, atividades bem variadas, por exemplo, a gente trabalhou com a ideia do portfolio. Portfolio, a gente sabe, que é uma metodologia que privilegia as melhores produções do sujeito, permitindo que o sujeito compartilhe essas produções com o outro, e que esses outros possam contribuir no processo avaliativo, convidando o sujeito a sintetizar tudo o que ele aprendeu na unidade, porque a gente organizou este modulo em unidades. E a gente usou portfolio, mas a interface era o fórum. Então o fórum ganhou várias caras: ele teve cara de midiateca, porque a gente criou espaço para compartilhar objetos. E na midiateca a gente fez ela multimídia, espaço para compartilhar vídeo, para texto. Então a gente criou a metodologia, mas a interface era fórum. O próprio fórum de discussão da situação de aprendizagem, a gente trabalhou estudo de caso [...].

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É interessante perceber que, quanto maiores o conhecimento tecnológico e a

experiência em situações educacionais, mais dinâmica pode ser a proposta de utilização das

interfaces.

A materialização da interatividade

Nas entrevistas, os docentes apontaram a relevância do saber tecnológico para os

docentes que atuam na sala de aula online, principalmente por perceberem que a

materialização da interatividade ocorre através do conhecimento do AVA e suas interfaces,

conforme evidencia D6:

[A materialização da interatividade ocorre] através das interfaces que permitem colaboração, compartilhamento, é possível a perspectiva de um mais comunicacional, que é assim que eu defino a interatividade. O wiki, fóruns, chats vão permitir a tal interatividade ou a tal dialógica ou a possibilidade de ação comunicativa. (D6)

O relato de D1 corrobora a perspectiva acima:

[A materialização da interatividade ocorre] a partir do momento que na docência online, através das plataformas, tenho a possibilidade de criar fóruns e chats. Durante algum tempo nós tínhamos os que textos que pesquisávamos na internet e tínhamos e-mails. Mas com as possibilidades de fóruns, e possibilidades também de chats, dentro de uma interação... Tenho possibilidades de interagir através de fóruns, uma interação até mais estruturada, mais pensada, do que aquela elaborada as falas.

Analisando a docência do módulo A, foi possível perceber como a falta do

conhecimento tecnológico prejudica a interatividade dos cursos online. Os docentes do

módulo sugeriram como situação de aprendizagem a reescrita de um texto através da interface

wiki. A orientação da atividade foi a seguinte:

Atividade O texto em seguida foi retirado da Wikipedia. Reescrever este texto segundo o ponto de vista crítico de cada PPG. Todos estão convidados à fazer inclusões e exclusões. Todos estão convidados a ampliar. Cada PPG atua escrevendo no corpo do texto as suas contribuições. O WIKI, esta valiosa interface presente no Moodle, permite a construção colaborativa de um texto a várias mãos. Cada pesquisador, segundo o entendimento acertado em sua equipe, está livre para operar no texto.

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O processo colaborativo irá gerar um texto polifônico e dialógico. Com base nesse texto cocriado e em outros textos sugeridos no módulo, discutiremos alguns desafios específicos ao ofício do professor. Essa segunda atividade será realizada no Fórum Desafios à Docência Online na Cibercultura.

A atividade teve baixíssima adesão (quatro pesquisadores-cursistas somente).

Buscando compreender os motivos, uma pesquisadora cursista lançou uma indagação no

tópico do fórum destinado à avaliação do desenho didático:

Como primeira questão, eu gostaria de abordar nossa (não) atuação no wiki proposto. O wiki ficou praticamente intacto e acho que seria muito importante tentarmos compreender o porquê disso. (P18)

Aproveitei o questionamento, levantei algumas possibilidades e aguardei o retorno:

P18, vinha refletindo a respeito da questão que você colocou sobre a não participação na wiki. Agora que ela é fato, é preciso compreendê-la. Pensei em uma possibilidade: seria receio ao novo, pois o fórum e o chat são as interfaces mais utilizadas e conhecidas, pouco uso se faz da wiki?

Alguns pesquisadores-cursistas apresentaram limites em relação ao próprio

conhecimento tecnológico, outros levantaram possibilidades:

Posso acrescentar apenas que a forma escolhida para construção do wiki não auxiliou o trabalho colaborativo e livre, pois o objetivo da construção hipertextual no wiki é justamente romper com as barreiras do “meu”, dar oportunidade para as pessoas (todas) fazerem parte de um texto colaborativo de forma completa e dinâmica. (P16) P8, você tocou numa questão fundamental. A intimidade com a interface. Quando escrevo nos fóruns e nos chats escrevo num fôlego só. Vou na empolgação da dialógica provocada pelos meus interlocutores. Não me preocupo muito com a redação do texto. Depois relendo vejo que comi letras, pequei na pontuação... Mas o importante é o entendimento lógico do texto. Tenho uma boa experiência na docência online com as interfaces fórum, chat, blogs, diários online, webconferências. Já a minha relação com as interfaces coletivas de textos não é tão natural assim. (D5) Sugiro também, com relação ao wiki, que cada grupo apresente nesta interface um pequeno resumo, com suas visões sobre as questões mais relevantes levantadas durante cada módulo, como um ponto de partida para a produção coletiva (editando ou não o texto alheio). Sendo assim, concordo também que este wiki poderia ficar ativo até o final da pesquisa, pois acredito que ao atuarmos na construção da interatividade entre os participantes, através do nosso ambiente, a produção no wiki possa se tornar mais fluente, agregadora e recursiva, com relação às diversas visões e perspectivas que certamente vão surgir e se transformar a cada módulo. (P9)

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Inicialmente, através do relato de P16, é possível concluir que a orientação foi

insuficiente e, por ser uma interface que poucos conheciam, poucos se arriscaram a utilizá-la.

Apesar dessas dificuldades, a equipe responsável pelo módulo não buscou possibilidades para

viabilizar seu uso. Acredito que deveria haver orientações técnicas acerca de seu uso. Nesse

sentido, a falta de saber tecnológico acabou por comprometer as atividades do próprio

módulo. Conhecendo mais a interface wiki, certamente os docentes do módulo buscariam uma

construção textual mais autônoma, em vez de uma reconstrução, e dariam mais informações

acerca da própria interface.

O conhecimento tecnológico é fundamental para potencializar uma educação online

interativa. Contudo, o saber tecnológico deve estar atrelado a uma base estruturante, conforme

visto, a fim de que o professor possa alcançar sua autoria e potencializar a coautoria entre os

aprendentes, concretizando uma prática docente efetivamente pautada na interatividade e seus

fundamentos: participação-intervenção; bidirecionalidade-hibridação; permutabilidade-

potencialidade.

4.3.3 Saberes didáticos

Chamaremos de saberes didáticos aqueles que se referem às intervenções e estratégias

docentes que emergem da prática do professor online. São saberes mais pragmáticos, voltados

para o próprio fazer pedagógico na educação online e que encontram subsídios nos saberes

acima analisados – epistemológicos e tecnológicos. São aqui descritos como saberes do

desenho didático25, saberes da mediação pedagógica e saberes da avaliação.

Saberes do desenho didático

O simples acesso a um AVA não garante a qualidade educacional, comunicacional e

tecnológica em educação online, conforme nos lembra Santos (2002). Com frequência,

25 A maior parte das publicações sobre o tema utiliza a expressão “desenho (ou design) instrucional” quando se refere à organização das atividades no ambiente virtual de aprendizagem. No entanto, o termo “instrucional” remete à concepção “instrucionista” do uso do computador, criticada por Valente (2009), que vê sua utilização como máquina de ensinar, pautada na informatização dos métodos de ensino tradicionais. Portanto, ao refutar a expressão “design instrucional”, encontrei na literatura recente a expressão “desenho didático” (Pesce, 2007; Araújo, 2008), adotada neste estudo que corrobora uma visão mais interativa em relação ao processo de ensino-aprendizagem em ambientes virtuais.

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podemos encontrar cursos online que simplesmente disponibilizam textos lineares e outros

materiais digitalizados para estudo, muitas vezes chamados de recursos didáticos. Estes, na

maior parte dos casos, servem apenas como fonte de informação e leitura para a construção de

tarefas, geralmente individuais, que devem ser disponibilizadas para a correção efetuada pelo

chamado tutor. Tal prática não garante o diálogo, a interatividade ou a construção coletiva da

comunicação e do conhecimento (SANTOS; SILVA, 2007).

Em um ambiente virtual de aprendizagem, um curso ou uma aula pode conter

conteúdos de aprendizagem, propostas de trabalho e de avaliações e, no mesmo ambiente,

dispor de interfaces de construção de comunicação e de conteúdo. Nesse sentido,

Pensar a prática pedagógica para a educação online é antes de qualquer coisa pensar um desenho didático interativo como arquitetura que envolve o planejamento, a produção e a operatividade de conteúdos e de situações de aprendizagem, que estruturam processos de construção do conhecimento na sala de aula online. Estes conteúdos e situações de aprendizagem devem contemplar o potencial pedagógico, comunicacional e tecnológico do computador online, bem como das disposições de interatividade próprias dos ambientes online de aprendizagem (SANTOS; SILVA, 2007, p. 2).

O planejamento na educação online possui peculiaridades e traz desafios específicos,

como elaboração de material, organização do ambiente virtual de aprendizagem e opções por

determinadas interfaces. Esse grupo de ações voltadas para o planejamento de um curso

online representam seu desenho didático, definido como uma “arquitetura de conteúdos e

situações de aprendizagem para estruturar uma sala de aula online contemplando as interfaces

de conteúdo e de comunicação” (SANTOS; SILVA, 2007, p. 3).

Certamente os saberes do desenho didático representam uma urgência no que tange ao

conhecimento do docente online. A pesquisa dessa categoria remete a quatro diferentes

instâncias, a saber: em relação às equipes interdisciplinares, em relação ao perfil do grupo, em

relação à arquitetura de percursos e, por fim, em relação aos conteúdos e situações de

aprendizagem.

Em relação às equipes interdisciplinares

No projeto analisado, foi possível perceber que a maior parte dos módulos

apresentaram equipes formadas por diferentes profissionais (incluindo os docentes), mas que

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agiram em prol da autoria e produção coletiva do seu desenho didático, conforme é reiterado

através da fala de D2:

Bom, a primeira coisa é que a equipe nossa participa, todo mundo se envolve na discussão ou na concepção mesmo, qual vai ser o conceito deste design, né? E isso teve a participação do grupo todo e depois cada um se... isso é na concepção e depois na implementação cada um entra com as suas competências. Então alguns têm as competências mais de lidar mesmo com a implementação na ferramenta, outros mais com a especificação do conteúdo, outros mais pra criação de estratégias didáticas. Então isso já é uma coisa meio que natural no nosso grupo, essa distribuição pra que o produto possa ser publicado e possa ir ao ar a contento. Inclusive competências também de mediação. Alguns têm mais competências para fazer mediação. Tudo isso é uma negociação meio tácita do nosso grupo, até porque nós já trabalhamos em conjunto em outros projetos.

Isso ficou visível ao grupo de pesquisadores-cursistas que, ao avaliar o módulo,

ressaltaram a importância dessa equipe interdisciplinar engajada:

[...] Gostaria de destacar pontos fortes da prática pedagógica do grupo: o trabalho coletivo – ficou clara a participação engajada de cada membro na divisão das tarefas. Tarefas foram divididas sem fragmentação [...] D4

A par desses relatos, Santos e Silva (2007) ressaltam que, num momento inicial da

produção do desenho didático, deve haver a estruturação de uma equipe interdisciplinar

responsável pela produção do curso, composta por diversos especialistas (conteudista, web-

roteirista, webdesigner, programador, designer didático) que articulem seus saberes, assim

como docentes e cursistas.

Essa equipe interdisciplinar deve ser autora de todo o processo, através de

intercâmbios, experiências intencionais de interação e produção mútua de conhecimento. A

autoria em educação online deve ser descentralizada; já não cabe a desarticulação entre o

fazer e o pensar, própria de práticas em que há a existência de um autor cujo trabalho é

desarticulado do dos outros atores do processo.

Como docente do módulo D, pude ter a mesma experiência: éramos cinco

componentes, com as mais diversas áreas de formação: sociologia, música, letras, análise de

sistemas e pedagogia. Durante quatro meses, nos reunimos quinzenalmente com o intuito de

elaborar o desenho didático do curso. Nossos encontros foram recheados de trocas e

coautoria, em que os diferentes saberes foram mobilizados na intenção de uma proposta de

acordo com a demanda da cibercultura. P8, por exemplo, que atua com produção fonográfica,

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sugeriu a inserção do Podcast26 em nosso módulo, enquanto P9, analista de sistema, ofereceu

novas formas de organização do desenho didático.

O relato de D5 confirma que o mesmo ocorreu em outro módulo, salientando a autoria

coletiva:

E aí eu integrei a equipe, por ter vontade mesmo de participar desta experiência. E por ter também conhecimento sobre ambiente virtual de aprendizagem. Então a relação com o grupo da D4 já começou uma relação de troca mesmo. Então a D4, como nosso curso é psicologia da aprendizagem, D4 é uma especialista nacional sobre o tema. Então a gente dividiu bastante os papéis, ela cuidou do conteúdo, participou das situações de aprendizagem, e o grupo foi formado por mim, que praticamente cuidei do ambiente por ter este conhecimento, pela professora P7 que também foi convidada, mesmo não sendo professora de pós. Na verdade, todo mundo entrou como tudo, né? Como autores, o conteúdo em si é da D4, só que nós fomos autores do desenho didático, que é a disposição destes conteúdos através de situações de aprendizagem e de modelagem deste conteúdo. Então a D4, no desenho didático, foi responsável pelo conteúdo dos módulos e eu, assim como os outros participantes, no caso o P7, o P5 e o P6, que são mestrandos, a gente pensou junto este desenho didático, essa disponibilização no ambiente.

Ações assim encontram-se em consonância com um dos indicadores de interatividade

apontados por Silva (2004): “disponibilizar uma montagem de conexões em rede que permite

múltiplas ocorrências”27. Nesse caso, podemos comprovar que isso se torna possível quando a

equipe busca “desenvolver, com a colaboração de profissionais específicos, um ambiente

intuitivo, funcional, de fácil navegação e que poderá ser aperfeiçoado na medida da atuação

dos aprendizes” (SILVA, 2004, p. 12)

Na contramão dessa perspectiva de autoria coletiva, contudo, o módulo A encontrou

dificuldade em se mobilizar para uma formação de equipe interdisciplinar, conforme o relato

de seu docente coordenador:

É, o desenho, tentamos construí-lo em equipa, diria, mas... Eu tentei sempre motivar a equipa, mas às vezes não é possível, né? [...] Talvez se fosse possível nós nos termos reunido os seis presencialmente uma vez por semana, ou pelo menos de quinze em quinze dias, facilitaria o processo de construção (D1).

26 Forma de publicação de arquivos de mídia digital, principalmente áudio. 27 Cf. anexo A – Indicadores de interatividade em educação presencial e online

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Isso certamente acabou influenciando todo o desenho didático do módulo, que

apresentou um conteúdo riquíssimo, mas disponibilizado de maneira linear e, ao mesmo

tempo, confusa no que concerne às interfaces empregadas28.

O desenho didático deve ser concebido como produção coletiva que abre espaços para

autoria de todos os sujeitos envolvidos, proporcionando “uma intencionalidade pedagógica

que garanta a educação online como obra aberta, fluida, hipertextual e interativa” (SILVA;

SANTOS, 2007, p. 2), garantindo uma educação online que esteja de acordo com a

interatividade.

Em relação ao perfil do grupo

No universo das entrevistas realizadas, foi possível perceber relatos convergentes em

relação à importância de determinar o perfil do grupo para, então, melhor definir (ou

redefinir) o desenho didático do curso, conforme o relato de D2.

[...] em primeiro lugar é o [fato] de sentir o outro, por exemplo, no caso do BMW vermelha, sentir a reação que aquela proposta provocou em todos os participantes pra poder direcionar os próximos passos. Isso é fundamental. Nosso curso não estava inteiro no ar quando ele começou. Não que ele não estivesse produzido, mas mesmo o que já estava produzido, ele sofria alterações antes de ir para o ar porque nós analisávamos o que havia acontecido e o que estava rolando ate aquele momento. Então a questão da reflexão, da analise da reflexão era fundamental aí nesse trabalho por conta disso. (D2)

Nessa perspectiva, Silva (2004) nos adverte sobre a importância de “mobilizar a

experiência do conhecimento”, num sentido de que o professor tenha possibilidades de

implementar situações de aprendizagem que considerem as experiências, conhecimentos e

expectativas que os estudantes já trazem consigo”.

Em consonância com a fala de D2, foi interessante perceber que em seu módulo (B),

assim como nos outros pesquisados, a equipe apresentou a preocupação em conhecer o perfil

dos discentes e, para tal, elaborou uma interessante atividade, em que convidava cada

pesquisador-cursista a elaborar uma linha de tempo, falando de suas vivências em

modalidades educativas não presenciais. Para tal, poderiam ser utilizadas mídias diversas:

documento do Word, apresentação de Power Point, vídeos, áudios, etc. que em seguida seriam

28 Ao tratar dos conteúdos e das situações de aprendizagem, ainda nesta seção, a questão será aprofundada.

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inseridas no recurso do Moodle conhecido como “base de dados”, mas com uma conotação de

“galeria de atividades”, pois todos poderiam ter acesso às produções de todo o grupo,

conforme a figura 20.

Figura 20 – Desenho Didático: atividade perfil do aluno

Tais práticas vão ao encontro da perspectiva histórico-cultural, que considera o

aprendente em toda sua história de vida, dentro de seu contexto social, cultural, econômico e

político. Desse modo, antes da criação dos conteúdos e de as situações de aprendizagem

serem disponibilizadas no ambiente, é necessário atentar para o perfil dos participantes, no

sentido de conhecer suas expectativas e motivações para o curso, seus conhecimentos prévios

acerca do assunto a ser tratado, seu perfil social, seus conhecimentos tecnológicos, além da

infraestrutura disponível para a aprendizagem online.

Destarte, a produção do desenho didático deve se iniciada através de uma análise dos

aprendentes, em busca de informações que colaborem para a caracterização desse aluno (nível

de escolaridade, perfil profissional, disponibilidade de tempo para estudo, levantamento das

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restrições, etc.), identificação das necessidades de aprendizagem e definição dos objetivos,

para que a aprendizagem esteja em consonância com a demanda apresentada pelo grupo.

Vale ressaltar, no entanto, que não basta estabelecer o perfil do grupo, é preciso que a

elaboração do desenho didático esteja de acordo com as informações que foram levantadas.

Essa preocupação pôde ser percebida no relato de D3, ao apontar que o conhecimento

antecipado do perfil grupo (pesquisadores que já tinham vivenciado outros processos de

aprendizagem em modalidades não presenciais) colaborou para a escolha das atividades

oferecidas em seu módulo.

[...] nós pensamos em trabalhar mesmo a reflexão sobre a prática, porque, a princípio, nós sabíamos que as pessoas já tinham vivenciado o processo de educação a distância, então a nossa ideia foi conseguir atividades que pudessem provocar esse debate com colegas.

Almeida (2003, p. 335) lembra-nos que, na educação online, “as informações são

selecionadas, organizadas e contextualizadas segundo as expectativas do grupo, permitindo

estabelecer múltiplas e mútuas relações, retroações e recursões, atribuindo-lhes um novo

sentido que ultrapassa a compreensão individual”. Na contramão dessa assertiva, foi possível

perceber que no módulo B ocorreu uma dissociação entre o conteúdo que o grupo de

pesquisadores-cursistas esperava e o conteúdo efetivamente oferecido pela equipe.

O projeto em que ocorreu a investigação está voltado para a formação de professores

para docência online, mas a equipe desse módulo focou seus conteúdos nas questões das

políticas públicas e tecnologias na escola, tratando com menor ênfase as situações não

presenciais. No fórum de avaliação do módulo, tivemos alguns relatos que mostram tal

questão:

O conteúdo referente às políticas, talvez por ser mais denso, não foi tão aprofundado pela nossa turma. (P3) Em relação ao conteúdo, o módulo 2 esteve mais focado em políticas para o uso de computador e mídia e menos na EAD. Acredito que as políticas públicas voltadas para EAD no Brasil merecessem maior destaque, uma vez que estamos tratando de formação de professores que atuarão online. Deixo aqui minha sugestão! (P10) Acho que o tema das “políticas públicas” poderia ter sido mais trabalhado em suas especificidades e relações.

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Com relação ao conteúdo, concordo com D5 e P10 que as políticas públicas mais relacionadas com a EAD foram pouco abordadas. Fiquei especialmente desejosa de discutir o Sistema UAB (P18).

Em entrevista, D2 demonstrou preocupação em se ter um desenho didático flexível, no

entanto, os conteúdos trabalhados (políticas públicas para uso de computador nas escolas)

estavam mais próximos às pesquisas desenvolvidas no PPG da docente e não da demanda do

grupo (políticas públicas em modalidades não presenciais):

[...] é você trabalhar, você tem uma intencionalidade, você tem um planejamento. Entretanto, ele tem de ser flexível o bastante para trabalhar o que emerge no contexto. E você identificar o que emerge no contexto, não é só uma questão de objetividade, é uma questão que implica mesmo a sensibilidade pra ouvir o outro, pra entender e o que é que vem do outro. Pra ler, digamos assim, não só o texto, mas o contexto e o intertexto. (D2)

Nessa perspectiva, o conceito de desenho didático contextualizado surge como uma

proposta para que haja equilíbrio entre a adequação do perfil do grupo e a necessidade de

haver um planejamento antecipado. O desenho contextualizado se refere a princípios

fundamentais para uma nova forma de planejar e implementar ações pedagógicas e

compreender que é importante levar em consideração o contexto dos aprendentes. Ele admite

personalização e flexibilização do processo. Foge dos padrões lineares em que a análise

ocorre no princípio, o desenvolvimento no meio e a avaliação ao término do processo, pois

essas operações ocorrem recursiva e processualmente (FILATRO, 2003).

Todo planejamento didático deve, pois, contemplar o contexto e considerar as

especificidades dos sujeitos aprendentes. Ao perceber o aluno como sujeito do conhecimento,

e não mero objeto, o docente online passa a valorizar a autoria do aluno, num movimento

comunicacional de troca, diálogo e cocriação.

Em relação à arquitetura de percursos

O desenho didático de uma sala de aula online se estrutura inicialmente na arquitetura

de percursos, ou seja, na sistematização hipertextual das temáticas de um curso com seus

conteúdos e situações de aprendizagem, através do uso das mais diversas linguagens

midiáticas. Silva (2004, p. 12) destaca como um dos indicadores de interatividade “Arquitetar

percursos hipertextuais”, evidenciando a implementação de um no roteiro do curso que

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contemple diferentes desenhos e múltiplas combinações de linguagens e recursos

educacionais29.

No capítulo 3, ao analisar o locus da pesquisa (o AVA Moodle), pude perceber que ele

apresenta uma diversidade de recursos e interfaces que potencializam essa arquitetura de

percursos. Nele, é possível transformar os textos em hipertextos, a serviço de uma verdadeira

aprendizagem em rede. No entanto, esse potencial pode ser subutilizado, uma vez que seu uso

dependerá das concepções dos docentes que nele estão atuando.

Um interessante exemplo de arquitetura de percursos aconteceu no módulo D. A cada

semana era disponibilizado um roteiro hipertextual para o aluno. Através desse roteiro era

possível escolher seus percursos e participar de todas as atividades do curso. No entanto, ele

transcendia a linearidade e permitia ao participante fazer suas opções. Na figura 21 há

algumas expressões (destacadas em azul) que, na verdade, são links que levam os alunos às

atividades. Dessa forma a equipe disponibilizou “uma montagem de conexões em rede que

permite múltiplas ocorrências”30, de acordo com os indicadores de interatividade para

docência (SILVA, 2004, p. 12).

29 Cf. anexo A – Indicadores de interatividade em educação presencial e online 30 Idem

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Figura 21 – Desenho didático – arquitetura de percursos 1

Vale ressaltar que a equipe também buscou fazer uso de diferentes suportes e

linguagens midiáticos (texto, som, vídeo, páginas, gráficos). No roteiro da semana (figura 18),

por exemplo, a equipe utilizou um texto web (texto base da semana), vídeo, fórum, e os

comentários dos alunos sobre o vídeo poderiam ser feitos em áudio, utilizando podcasting.

É interessante que a hipertextualidade se faça presente nos roteiros, assim como no

material do curso em geral. Nesse sentido, Silva (2004) destaca um dos engajamentos do

professor, no que concerne à arquitetura de percursos: “Explorar as vantagens do hipertexto:

disponibilizar os dados de conhecimento exuberantemente conectados e em múltiplas

camadas ligadas a pontos facilitam o acesso e o cruzamento de informações e de participações

(SILVA, 2004, p. 12)”31. Essas “camadas” se fazem presentes através de conexões

hipertextuais que podem ser intratextuais (ocorrendo dentro do próprio AVA, conforme vimos

na figura 21) ou intertextuais (com sites e/ou documentos externos), como no caso da figura

22, que traz em seu texto um vídeo que se encontra hospedado no site de compartilhamento

Youtube.

31 Idem

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Figura 22 – Desenho didático: arquitetura de percursos 2

A arquitetura hipertextual de percursos precisa “garantir um território de expressão e

aprendizagem labiríntico, com sinalizações que ajudam o aprendiz a não se perder, mas que

ao mesmo tempo não o impeça de perder-se”32 (SILVA, 2004, p. 12). Em sentido inverso, a

organização dos fóruns no módulo A ficou confusa. Um exemplo é o fórum que estava

planejado para funcionar como um “mural de avisos” do módulo, mas acabou se tornando

espaço de debate referente ao conteúdo, uma vez que a própria equipe utilizou o espaço

equivocadamente (figura 23, ver o primeiro tópico “Fórum: comunidades virtuais – obrigação

ou mediação). O fato acabou prejudicando a participação de alguns cursistas, que não

deixaram de participar de valiosas discussões por não encontrar o ambiente adequado. Isso foi

notoriamente apontado pelos pesquisadores-cursistas, que discutiram a questão no fórum de

avaliação do módulo:

A abertura de vários fóruns confundiu e desorientou o grupo. A criação do mural fora do módulo causou confusão. O mural, que era só para orientar as atividades, acabou virando fórum e isso provocou encontros/desencontros.

32 Cf. anexo A – Indicadores de interatividade em educação presencial e online

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Depois que o grupo moveu os fóruns desarticulados para dentro do fórum de debates a participação melhorou bastante (P5).

Figura 23 – Desenho didático: arquitetura de percursos 3

Dessa forma, para alcançar uma educação online que efetivamente rompa com a

pedagogia da transmissão e tenha como pressuposto a construção de conteúdos pautados na

dialógica e na cocriação, é preciso ter uma arquitetura de percursos sintonizada com nossa

atualidade sociotécnica, possibilitando um desenho didático que se apresente como rede,

definindo um conjunto de territórios a explorar.

Em relação aos conteúdos e situações de aprendizagem

No campo foi possível encontrar o conteúdo disponibilizado das mais variadas formas:

através de textos lineares, disponibilizados através do recurso “livro” (figura 24); hipertextos

disponibilizados através dos recursos “página web” ou “livro” (figura 25 – os hiperlinks

aparecem na cor azul); vídeos (figura 26) e, até, conteúdos disponibilizados no wiki, com o

objetivo de serem repensados e reconstruídos por todo o grupo.

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Figura 24 – Desenho didático: conteúdo (texto linear)

Figura 25 – Desenho didático: conteúdo (hipertexto)

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Figura 26 – Desenho didático: conteúdo (vídeo)

Esse tipo de informação disposta em formato multimídia torna-se interessante quando

se pretende atender aos diferentes estilos de aprendizagem, dando dinâmica ao processo

educacional. Contudo, conforme já salientado, não basta dispor a informação para alcançar

uma educação baseada na interatividade: o planejamento das situações de aprendizagem é

fundamental.

As situações de aprendizagem podem ser compreendidas como desafios à atuação

criativa do aprendente e também à participação colaborativa, nas quais se expressa a

materialidade de suas ações. Nos módulos pesquisados, as situações de aprendizagem, com o

intuito de mobilizar saberes, foram as mais diversas possíveis. Vale ressaltar que em nenhum

módulo o conteúdo foi disponibilizado sem que houvesse mobilização e debates sobre o tema,

ocorrendo, para tal, interações de forma síncrona, como chat e a videoconferência, ou

assíncrona, como fóruns principalmente, além de glossários colaborativos, base de dados e

wiki.

Uma interessante situação de aprendizagem que ocorreu no módulo B merece

destaque. A fim de tratar do tema relativo à evolução do uso dos computadores no Brasil, a

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equipe disponibilizou dois textos sobre o assunto. Buscando instigar o debate, convidaram os

pesquisadores-cursistas a assistir um curta-metragem chamado BMW Vermelho33. A princípio,

esse filme em nada se relacionava à questão das TICs na educação, mas o convite dos

docentes do módulo para que fosse estabelecida uma analogia entre o tema estudado e o vídeo

possibilitou um instigante debate e as participações no fórum foram inúmeras. Veja como foi

elaborada a situação de aprendizagem:

Conversa sobre TIC na educação e o sonho da BMW: Ao considerarmos a Educação a Distância como educação mediatizada pelas tecnologias, convidamos vocês a debaterem sobre a EAD no Brasil a partir dos artigos apresentados e do vídeo BMW vermelho. Sugestão de Artigos para dinamizar o debate: 1. ALMEIDA, M. Elizabeth B. de. O aprender e a informática: a arte do possível na formação do professor. Coleção Informática para a Mudança na Educação. Brasília: SEED/MEC, 1999. Disponível em: http://escola2000.net/eduardo/textos/proinfo/livro08-Elizabeth%20Almeida.pdf. Acesso em março de 2008. 2. SILVA, Maria da Graça Moreira; MENGALLI, Neli Maria e VILARDELL-CAMAS, Núria Pons. Panorama Histórico da Educação a Distância. 2007. Assista ao vídeo BMW vermelho e registre nesse fórum sua reflexão sobre a integração das tecnologias em nosso cotidiano e na educação e debata com seus colegas: Será que estamos reproduzindo na educação mediatizada por tecnologias o caso da BMW vermelha? Como fazer a atividade? Selecione um dos artigos indicados para leitura ou sugira um novo artigo, que mais se aproxime de suas vivências e interesses. Acesse o site Portacurtas no endereço: http://www.portacurtas.com.br/filme_abre_pop.asp?cod=180 No site, clique na opção "assista". O vídeo é tem aproximadamente 15 minutos, mas vale a pena! Caso tenha algum impedimento ou limitação tecnológica para assistir ao vídeo, coloque sua opinião sobre a introdução das tecnologias no processo de ensino e aprendizagem. Consulte as orientações para assistir ao vídeo:

33 O curta-metragem BMW Vermelhão, de Edu Ramos e Reinaldo Pinheiro, conta a história de uma família humilde, que recebe um carro de luxo através de um sorteio. Na família ninguém sabe dirigir e, conforme contrato do sorteio, o carro não pode ser vendido por dois anos. Então o automóvel acaba tendo os usos mais inusitados.

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http://www.portacurtas.com.br/faq.asp?FaqCat=1#1 Será ótimo debatermos até dia: 12 de junho

(Módulo B)

De acordo com Silva (2004, p. 12), o docente deve “provocar situações de inquietação

criadora”34 e isso pode ser percebido através da elaboração do problema, por parte da equipe,

que possibilitou a todo o grupo repensar alguns de seus conceitos. O relato de D4, docente de

outro módulo e discente no módulo 2, mostra como foi envolvente a situação de

aprendizagem:

Eu reparei que no módulo anterior, quando foi colocado, por exemplo, aquele vídeo do carro vermelho, que foi interessantíssimo, o pessoal não saía mais daquela discussão. Tudo bem, o vídeo era muito estimulante, mas o grupo [equipe do módulo B] queria continuar outros assuntos e o pessoal tava lá discutindo o carro o tempo todo. (D4)

D2, docente do módulo B, relatou na entrevista a preocupação entre a mídia escolhida

e seu uso nas situações de aprendizagem:

É muito importante que você vá localizar a mídia dentro daquilo que você esta se propondo na atividade. Porque, também, se você sai com o vídeo da BMW vermelha na mão achando que é legal e quer encaixar em toda e qualquer atividade, fica um desastre, né!? Então daí um casamento da tecnologia e computação.

Os AVAs oportunizam, através de variadas interfaces e recursos, uma reconfiguração

em relação aos conteúdos e situações de aprendizagem, mas não garantem a potencialidade

comunicacional própria da interatividade. Nesse sentido, cabe ao docente online

disponibilizar os conteúdos pertinentes de maneira organizada, que possibilitem a reflexão

conjunta, e provocar situações de aprendizagem que sejam desafiadoras, a fim de que ocorra

uma verdadeira construção de conhecimento.

Durante as entrevistas, um outro ponto destacado foi domínio do próprio conteúdo. Ao

ser indagado sobre os saberes docentes que foram mobilizados ao longo de seu módulo, D1

colocou que “é necessário ter o material, preparar o material: preparar, ter e conhecê-lo”. O

relato de outro docente, D4, vai ao encontro dessa perspectiva: “Eu acho que é o saber ligado

34 Cf. anexo A – Indicadores de interatividade em educação presencial e online

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ao próprio conhecimento daquele conteúdo: teorias da aprendizagem, características da

aprendizagem, relação entre a aprendizagem virtual e a aprendizagem presencial [esses foram

os conteúdos de seu módulo]”. A fala de D5, que atuou no mesmo módulo, mas não é

especialista na temática tratada, corrobora essa visão:

[...] Mas aí, na prática, acabou a própria [D4], assumindo mais a cara de docente autora do conteúdo, porque como eu não sou da psicologia da aprendizagem, o que eu sei da psicologia da aprendizagem é o que todo pedagogo sabe, né? Então eu inicialmente coloquei no grupo que eu não me autorizava, a tensionar muitos conceitos de psicologia, até porque, você viu que no curso, tinha sociointeracionismo, tinha Piaget, Vygotsky, Lévy [...]. Então eu deixei claro que eu não me autorizava a tirar dúvidas sobre Vygostsky. Até dúvidas e conceitos complexos. O que eu me autorizava era o conhecimento que eu tinha como uma pedagoga que se fui formada numa universidade que tem quatro “psicologias”, mas eu não sou uma pesquisadora de psicologia, e aí ficou bacana porque [D4] cuidou mais das especificidades, até porque ela foi autora do conteúdo, e eu cuidei muito mais da dinamização do curso, não deixando de me autorizar conceitualmente. Mas, inicialmente, eu disse que não era minha questão, mas como nosso curso era psicologia da aprendizagem para docência online, então eu acabei também teorizando por conta da minha experiência acadêmica com a própria docência online.

Sem dúvida, conforme pode ser visto através dos relatos dos sujeitos da pesquisa, o

conhecimento do conteúdo é condição sine qua non para a prática do docente online. Parece

óbvio, mas em muitos cursos de EAD há uma rígida divisão entre os que elaboram os

conteúdos – professores autores – e aqueles que executam tarefas como correção e

acompanhamento de fóruns – professores tutores – como tratado na revisão de literatura.

Nesse sentido, Freire (2008, p. 29) afirma que “ensinar exige pesquisa” e acredita que os

professores devam ser epistemologicamente curiosos, pois é a curiosidade que os leva a

aprender e ensinar.

Dessa análise é possível inferir que os docentes, juntamente com a equipe de produção

interdisciplinar do curso, precisarão estar atentos para que os fundamentos do digital e do

hipertexto estejam na base do desenho didático, mais especificamente, na estruturação dos

conteúdos e das situações de aprendizagem a serem disponibilizados aos aprendentes.

Cabe ressaltar que o desenho didático também engloba o planejamento de estratégias

de avaliação, mas estas serão tratadas mais adiante, conjuntamente com o processo de

avaliação online.

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Saberes da mediação pedagógica

Há bastante tempo autores como Vygotsky e Freire evidenciam a necessidade da

ressignificação do papel docente no que tange à transmissão de conhecimentos, como

delineado no segundo capítulo deste estudo. Nessa perspectiva, o professor passaria a

desempenhar um papel de orientador das atividades do aluno, de alguém que pode colaborar

para dinamizar sua aprendizagem, trabalhando não mais para, mas junto com o aluno,

passando a atuar como um mediador no processo educativo.

Masetto (2007, p. 144 e 145) define a mediação pedagógica como a “atitude, o

comportamento do professor que se coloca como um facilitador, incentivador ou motivador da

aprendizagem, que se apresenta com a disposição de ser uma ponte entre o aprendiz e sua

aprendizagem”. Na educação online a preocupação com a mediação se torna mais evidente,

uma vez que há o distanciamento geográfico entre o docente e os alunos, exigindo novas

formas de utilização da TICs, através de fórum, chat, e-mail, videoconferência, etc. num

diálogo permanente, na troca de experiências, no incentivo ao debate, na construção de

situações que desafiem o aluno.

Voltar nossos olhos para a reflexão sobre mediação na educação online, significa

romper com práticas pautadas na transmissão e centradas no isolamento e na

autoaprendizagem do aluno, próprias da EAD, e vislumbrar uma prática pedagógica pautada

na interatividade constante, como D1 enfatiza em seu relato:

Antes, esperávamos que as pessoas tão motivadas por si vão [sic] lá e participam [do fórum]. Não dá, por experiência. Por isto penso que é preciso rever o papel do professor, de ser um mediador, ser o motivador. Mediação é fundamental. Tem que ser uma mediação que não seja... que combine situações diversas, dirigismos, eu diria, e também mais construtivistas [...].

Analisando o ambiente virtual em que se deu o projeto, foi possível perceber que a

mediação pedagógica se materializa em diversos momentos. Destacarei aqui quatro dinâmicas

em que a mediação se apresentou de forma mais expressiva e constante: nos roteiros dos

módulos, nas interações dos fóruns e dos chats e no “estar junto online”.

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Roteiros de aprendizagem

Ao longo dos módulos, foi possível perceber a mediação nas orientações iniciais sobre

as situações de aprendizagem, como no exemplo a seguir, em que a equipe do módulo C

indica quais são as atividades propostas para aquela semana e incentiva a participação, com

regras claras e bem definidas, que ajudam o trabalho a ser desenvolvido.

Olá, pessoal! Para participar da unidade 1 do módulo [C] sugerimos o seguinte roteiro:

- Participe do fórum boas-vindas. Neste fórum poste sua apresentação rápida, fale sobre suas expectativas para este módulo [C], apresente-se para os colegas. Quem ainda não participou do curso nos módulos anteriores terá oportunidade de se apresentar aqui. Não perca tempo. Quem já participou poderá demarcar um pouco mais a sua presença!

- Estude o texto base da unidade. Temos duas versões: 1) hipertexto com a interface livro do Moodle, 2) Documento em Word para impressão e leitura básica da unidade. Nesta segunda versão não temos como acessar o palavras do glossário, nem os links. Para fazer uma leitura mais hipertextual, acesse o primeiro formato.

- Participe do fórum “Cocriando o hipertexto”. O objetivo deste fórum é colaborar com a hipertextualidade do texto base da unidade. Todos nós temos muitas referências para compartilhar sobre aprendizagem e aprendizagem na docência. Esta é uma ótima oportunidade de sugerirmos links e estratégias multirreferenciais de leituras e atividades.

- Participe do fórum “Brincando de labirinto’. Este fórum é o nosso espaço de debates mais específico sobre os temas da unidade. O texto base da unidade é apenas um "pré-texto" como cocriarmos juntos os conteúdos e discussões da unidade 1. Neste fórum abrimos um tópico com uma provocação inicial. Se você não quiser “entrar no labirinto” por esta porta sugerida por nós, crie sua própria entrada. Basta criar e mediar um tópico de discussão. Qualquer cursista poderá criar um tópico desejado. Apenas preste atenção para não criarmos tópicos repetidos.

Além disso tudo, temos ainda: o fórum “Vamos fuxicar?". Este fórum é para tomarmos café, comermos acarajé, falarmos amenidades, sugerirmos outros “nós”. Enfim, fuxicar. O glossário específico também é colaborativo. Contribua com novos verbetes ou comente os verbetes existentes. A interface bate-papo é para nossos encontros síncronos. Use e abuse! Pessoal, o desenho didático é uma arquitetura para ser habitada. Vamos habitar este nosso primeiro ensaio de arquitetura na unidade 1? Esperamos por todos e todas! Equipe [nome da universidade]

Os roteiros de aprendizagem caracterizam-se pelas orientações iniciais que o professor

dirige ao aluno, no intuito de informar sobre os trajetos que serão propostos no

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curso/módulo/disciplina online. Eles sintetizam para o aluno a arquitetura de percursos

projetada pelo docente ou pela equipe interdisciplinar: evidenciando os conteúdos que serão

tratados, as interfaces que se encontram à disposição desse aluno e as situações de

aprendizagem propostas. Portanto, o papel de um roteiro de aprendizagem não é fornecer

caminhos fechados, mas apontar possibilidades para a colaboração e construção dos

conhecimentos.

A oferta de um roteiro de aprendizagem na sala de aula online apresenta-se sintonizada

com a atualidade sociotécnica, na qual o aluno participa como coautor do processo de ensino-

aprendizagem, pois conhece os roteiros propostos para a construção do conhecimento e pode

contribuir, intervir e até mesmo trazer novas provocações ao grupo.

Assim como o módulo C, outros dos dois módulos investigados (B e D) apresentaram

um roteiro de aprendizagem no início de suas aulas. O módulo B optou por trabalhar com dois

roteiros. O primeiro, representado pela figura 27, é um guia mais amplo, em que foram

apresentados os três tópicos desse módulo, o período e a abordagem de cada um item, feito na

interface página web. Um segundo roteiro adotado foi uma apresentação semanal mais

detalhada, elaborada no próprio rótulo (página inicial do curso), que era modificado sempre

que um tópico era finalizado e se iniciava outro. Essas orientações foram fundamentais para

“propor a aprendizagem e o conhecimento como espaços abertos à navegação, colaboração e

criação, possibilitar que o aprendiz conduza suas explorações”35 (SILVA, 2004, p. 12).

35 Cf. anexo A – Indicadores de interatividade em educação presencial e online

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Figura 27 – Mediação: roteiro de aprendizagem

Na contramão, o módulo A não apresentou um roteiro de aprendizagem, embora

possuísse um fórum denominado “roteiro de atividades semanais”. Tal fórum, na realidade,

serviu como interface de apresentação dos participantes e debate dos temas tratados nas aulas.

O fato foi agravado pela arquitetura de percursos confusa, conforme já destacamos neste

capítulo, e chegou a prejudicar a participação dos discentes no módulo, principalmente nos

chats, que foram programados com pouca antecedência. Uma das pesquisadoras participantes,

ao avaliar o módulo em seu término, enfatizou a ausência de um roteiro de aprendizagem:

Senti falta de enunciados mais didáticos. A abertura de vários fóruns confundiu e desorientou o grupo. A criação do mural fora do módulo causou confusão. O mural que era só para orientar as atividades acabou virando fórum e isso provocou encontros/desencontros. (D5)

Orientar o aluno, propor situações de aprendizagem, provocar a participação,

evidenciar o todo e as etapas do curso/módulo/disciplina, mostrar os objetivos que se pretende

alcançar, apresentar as interfaces presentes no AVA, disponibilizar conteúdos: essas são as

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algumas das ações que constituem a orientação da aprendizagem, fundamentais para uma

mediação pedagógica efetiva.

Fóruns

O fórum foi, certamente, a interface mais utilizada no projeto. Vale ressaltar que o

fórum não se trata de uma mera situação de perguntas e respostas entre o docente online e

seus alunos, nem somente uma sala online de dúvidas, conforme alertam Bruno e Hessel

(2007, p. 8):

Em fóruns de cursos a distância, é comum que alunos concebam este espaço apenas para inserção de mensagens ou para divulgação de seus problemas, não valorizando a interação. Neste caso, o espaço de debate é percebido meramente como um repositório de ideias.

Nesse sentido, foi possível perceber nos fóruns dos módulos pesquisados uma postura

que buscava transcender atitudes meramente reativas. A mediação se dava através de

propostas de diálogos e busca de soluções para os problemas emergentes, favorecendo uma

reflexão contínua e um debate fundamentado de ideias com intervenções do professor.

Inicialmente os docentes se preocuparam com a abertura dos fóruns, geralmente

convidativa no intuito de promover a participação e o debate, além, é claro, de integrar seus

participantes, como foi notado em um dos fóruns oferecidos no módulo D:

Olá! Venha participar do "Fórum: Roberto Silva" da Unidade 3 do Módulo 4. Veja a proposta: Faça sua exploração em nosso ambiente Moodle e procure justificar a proposta do professor Roberto, que se revelou bem-sucedida como formação dos professores para docência online. Poste suas contribuições a respeito e não deixe de comentar as sugestões dos colegas.

Muitas vezes, no universo dos fóruns, seus docentes buscavam fazer novas

intervenções ao longo do processo, objetivando integrar aqueles que ainda não tinha

participado ou que se apresentavam de maneira mais tímida.

Olá, pessoal! Nossa unidade 2 só durará 1 semana. Na próxima segunda-feira já estaremos com a unidade 3 online. Nossa unidade 4 será disponibilizada, mas não teremos tempo para praticá-la, porque virá o grupo da [nome de uma

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instituição privada envolvida] com o módulo 4. Claro que teremos todas as unidades online até o final da pesquisa e nós da [nome de uma instituição pública envolvida] estaremos online interagindo em nosso módulo e nos módulos dos colegas. Contudo, vamos aproveitar cada semana vivenciando conosco nossas situações de aprendizagem. Convidamos todos e todas para "Entrevistarem o Piaget e o Vygotsky" a propósito da nossa provocação inicial do caso da professora “pensamentocritico.com”. Esperamos por vocês! Equipe [instituição pública envolvida]

Além de convites e aberturas estimuladoras, a mediação se fez constantemente

presente ao longo de todos os fóruns, com o intuito de incentivar os alunos a debater sobre os

temas propostos, trocar experiências com outros participantes, construir significados, trazer

novas informações, visando à cocriação do processo. Coerente com essa perspectiva, é

possível perceber como funciona a mediação no módulo B:

- Durante nossos debates emergiu o tema sobre os novos desafios no uso de recursos e ferramentas na educação, dentre eles o Second life. A cada dia, novos recursos aparecem e existe a tendência do uso de mídias sociais para o estabelecimento de redes sociais. Dessa forma o uso do Orkut, HI5, Blogs, Wikis, Youtube, etc. estão cada dia mais difundidas e tomam espaço, não os ambientes sociais. Como poderão ser usados nas escolas? (D3) - Olá, D3, de fato são muitas as ferramentas que podem ser utilizadas democraticamente na escola hoje. Basta que o professor saiba por que a utilizará. O que parece, em muitos casos, é que muitos professores acabam utilizando a “ultima” ferramenta que surge, mas acaba subutilizando-a ou simplesmente abre e abandona. As ferramentas sociais se prestam sim à educação, mas falta, como sempre, formação pedagógica e tecnológica para ser integrada ao trabalho docente. Claro, encontramos belos exemplos de utilização. Conheci experiências de professores do ensino fundamental e médio que utilizam o blog como ambiente de pesquisa e produção de conhecimento com seus alunos. O incrível é que essas experiências não são conhecidas pela academia, porque normalmente quem publica são os professores universitários. Abraço (P15) - Olá, D3, Vejo [que] as possibilidades que temos hoje no espaço virtual são imensas, e, se permitirmos que os alunos desde a educação básica possam planejar projetando suas ideias integradas às nossas, criaremos espaços de aprendizagem jamais antes imaginados. É favorecermos o ato criativo destes pré-adolescentes e jovens, que já atuam no ciberespaço com naturalidade. Interagirmos com nossos olhares e propósitos junto a eles, abriremos, com certeza, melhores e maiores oportunidades pedagógico-sociais nestes novos cenários.

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Abços... (P11) - Caras colegas, As ferramentas tecnológicas realmente crescem em número e ampliam as possibilidades de construções de comunidades de aprendizagem e de comunicação lateral (entre os pares). Como diz a colega a [P15], a utilização pedagógica demanda o processo de formação continuada para a integração na prática dos professores. Se, por um lado, muitas escolas brasileiras ainda estão lutando com os laboratórios de informática com poucos computadores, falta de manutenção, salas de fechadas, pouca formação dos professores, por outro lado outras escolas estão recebendo laptops. Muitos professores não sabem como ligar um computador, mas muitos outros professores desenvolvem atividades incríveis com o uso de blogs, wikis, construção de sites, ambientes virtuais, Orkut, portais, SW, redes de colaboração e mesmo as ferramentas básicas como processadores de texto e etc. Acredito que viveremos essas diversas realidades por muitos anos. As ferramentas e ambientes emergentes, como os metaversos (Second Life) ainda não estão inseridos nas escolas e universidades, mas essa é uma interessante possibilidade para a ampliação de nossos olhares como pesquisadores – como salienta a [P11] – e esse curso é um espaço privilegiado para o debate sobre como poderão ser utilizados para potencializar o processo de ensino e aprendizagem, não é mesmo? Na [nome da universidade] estamos iniciando os projetos e pesquisas com metaversos, mas já podemos vislumbrar algumas de suas possibilidades, como ambientes imersivos. Vocês já tiveram a oportunidade de criar seus avatares? []s (D3)

Com base no exemplo acima, é possível acompanhar a mediação pedagógica de D3,

que, inicialmente, esclareceu do que se tratava e fórum e instigou os pesquisadores-cursistas a

refletir sobre a temática. Em seguida, diante das respostas por eles apresentadas, sintetizou as

opiniões manifestadas, apresentou outros exemplos e novas informações e, por fim, lançou

outros desafios, no intuito de se construírem significados. Nesse sentido, o relato de D6

demonstra como a mediação através dos fóruns possibilita a construção de novos conceitos:

Você oferece a possibilidade de articulação de conteúdo, de redes de relações e de conteúdos entre textos e aí você permite que discursos potenciais que não estavam lá, pré-formulados, possam emergir, [...] e convida o aprendiz, o interlocutor a operar isso, ou seja, a fazer permutabilidades, trocas, combinações e essas trocas e combinações fazem emergir discursos, entendimentos provisórios, conhecimentos provisórios, percepções que não haviam sido previstas. (D6)

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É relevante que no fórum seja dado um rápido retorno aos alunos após suas postagens.

Atualmente há um acordo (geralmente tácito) nos cursos online para que esse feedback

aconteça, preferencialmente, em até 24 horas após a postagem do aluno, e não ultrapasse 48

horas. No fórum de avaliação dos módulos, esse fato pôde ser notado através da postagem de

P5:

Docentes do módulo [B], vocês estão de parabéns! Adorei a mediação de vocês. Sempre presentes, vocês provocaram a participação e se envolveram profundamente nos debates. Respostas foram dadas – sempre como obras abertas – e novos questionamentos foram propostos. A atenção individualizada e coletiva que deram aos cursistas foi fundamental para a qualidade dos debates. Gostaria de destacar pontos fortes da prática pedagógica do grupo: Presença online - nunca um questionamento ficou mais de 24 horas sem resposta ou sem feedback.

Essa prática, no entanto, não pôde ser observada no módulo A, uma vez que, em

alguns de seus fóruns, houve a abertura, mas a mediação por parte da equipe praticamente não

aconteceu. Contudo, como o projeto conta com um tipo de alunado diferenciado, formado por

pesquisadores-cursistas, já com alguma experiência em educação online, seus próprios

membros trataram de fazer a mediação, instigando uns aos outros, mobilizando a experiência

do conhecimento e provocando situações de inquietação criadora36 (SILVA, 2004), o que

possibilitou a continuidade das trocas e debates nos fóruns. No entanto, sabemos que essa não

é a regra dos cursos online, o que pode levar ao isolamento, favorecer o desestímulo e

culminar na evasão.

No fórum de avaliação do módulo A, os limites em relação à mediação ficaram claros

através das postagens de alguns cursistas:

Olá, todos, Por uma questão de princípios, não me sinto à vontade em avaliar a equipe, pois minha participação foi mínima. No entanto, penso que as discussões nos fóruns poderiam ter sido melhor exploradas. Costumo fazer sistematizações nas discussões nos chats e fóruns, não sei se seria uma boa sugestão, mas não custa fazer uma tentativa. Abraços e parabéns ao grupo! (P16)

Uma segunda avaliação do módulo ratifica a opinião de P16:

36 Cf. anexo A – Indicadores de interatividade em educação presencial e online

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[...] as mediações nos fóruns deixaram a desejar. Os docentes abriram os fóruns com ótimas provocações politizadas, mas não cuidaram da continuidade dos debates. Tenho algumas sugestões para novas experiências e para a continuidade da atuação docente:

- Dialogar mais com os aprendentes valorizando seus saberes e provocações;

- Fazer sínteses das falas convidando para novos debates; - Provocar novas dúvidas, questionando as certezas temporárias; - Trazer mais exemplos de outras experiências profissionais; - Convocar os aprendentes à autoria. Muitas vezes precisamos que os

docentes nos convidem à participação. [...] Como nosso curso só tá começando, o grupo do [nome da universidade] com certeza continuará contribuindo muito mais. Obrigada por esta oportunidade.

[]s (D5)

Seria interessante que os docentes do módulo garantissem mais interatividade. Em

seus fóruns estavam ocorrendo bons debates entre os participantes, que foram interativos,

cocriando as mensagens e exercendo a mediação em rede, mas a intervenção de seus

professores também deveria acontecer, através de uma mediação construtiva para propiciar

trocas efetivas e reflexões sobre os temas propostos.

Uma outra prática mais comumente encontrada no módulo (B) refere-se ao

encerramento dos mesmos, onde é sistematizado e sintetizado o conhecimento coproduzido

por todos seus participantes, além de serem oferecidos desafios futuros.

Esse tópico, embora breve, nos trouxe algumas reflexões importantes: a emergência de novas ferramentas tecnológicas, em especial as mídias chamadas de sociais e os ambientes virtuais imersivos que podem ser utilizados no processo de ensino e aprendizagem. Essa utilização não pode ser ingênua, mas deve ser integrada à prática pedagógica precedida pelo olhar crítico do educador, pela formação para seu uso e pelo planejamento. O Second Life, como ambiente imersivo, já tem sido objeto de algumas pesquisas, e algumas universidades já possuem seus espaços ou ilhas e já desenvolvem algumas atividades interessantes.[...] Como colocou a Adriana em uma mensagem anterior, estamos orientando um grupo de alunos que está desenvolvendo uma atividade com o uso de SL e monografias refletindo sobre a vivência (TCC - curso de graduação em tecnologia e Mídias Digitais da PUC-SP). Seguem algumas referências para animar os próximos debates: http://blog.joaomattar.com/second-life/ Não acreditamos que esse seja um ambiente definitivo para a educação, nem é esse o objetivo do SL, mas possivelmente outros ambientes semelhantes poderão ser desenvolvidos. Para concluir o Módulo 2, fica nossa sugestão para a retomada desse tema. (D3)

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A mediação estabelecida através dos fóruns possibilita maior abertura à discussão de

determinadas temáticas pertinentes ao curso, assim como uma reflexão mais aprofundada

sobre o tema em estudo, uma vez que os questionamentos disponibilizados geram debate entre

os participantes, reflexão, leituras e contribuição com sínteses mais elaboradas, possibilitando

um tempo maior para reflexão – uma vez que o fórum é uma interface de interatividade

assíncrona – e, então, posterior postagem.

Chats

Assim como os fóruns, os chats estiveram presentes em todos os módulos

pesquisados. Numa dinâmica diferente em relação ao fórum, a interface chat permite a

realização de uma discussão textual em interatividade síncrona, ou seja, enviando mensagens

e recebendo comentários em tempo real. Seu texto assemelha-se à oralidade e promove a troca

de ideias e informações, possibilitando resposta imediata ao que foi exposto, bem como

reformulações.

Por ser uma interface síncrona, exige bastante atenção por parte do docente online, a

fim de orientar e acompanhar a atividade. No entanto, o sincronismo presente nos chats pode,

por muitas vezes, se tornar uma desvantagem no que tange a seu uso, uma vez que nem

sempre todos os participantes estarão disponíveis no horário marcado. A fim de superar essa

dificuldade inicial, alguns módulos agendaram, pelo menos, dois diferentes horários. Essa

estratégia, além de possibilitar mais uma opção para o aluno, também colabora para que os

chats funcionem com um número de participantes que possibilite real diálogo e interatividade,

do contrário a tendência é que se tornem grandes “babéis”. Na opinião de Tornaghi (2008, p.

170), “[...] como numa conversa ao vivo, [uma sala de bate-papo] é pouco produtiva quando

reúne mais do que cinco ou seis pessoas”.

Em um dos chats do módulo B, foi possível acompanhar o processo de mediação.

Inicialmente, a equipe disponibilizou um convite para o chat, logo que se iniciou o módulo

(com oito dias de antecedência), com algumas orientações para os pesquisadores-cursistas:

Olá, colegas, Novas tecnologias e recursos surgem continuamente. As ações políticas e educativas não dão conta de acompanhar essa vertiginosa evolução. Diante disso, convidamos todos para a realização de um encontro síncrono dia 8 de junho de 18 horas (horário de Brasilia)

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e 22 horas (horário de Portugal) sobre as novas iniciativas e políticas de uso de TIC na educação em suas localidades e países. A participação de nossos colegas de Portugal certamente nos trará grandes contribuições para a compreensão da trajetória histórico-conceitual do uso das TIC na educação de seu país.

A antecipação foi fundamental para que os participantes pudessem programar sua

participação. O chat aconteceu na data prevista, e sua duração foi de cerca de duas horas. A

mediação foi feita por D3 e P4. A seguir temos um pequeno trecho:

[...] 18:15 D3: P4 e Eu somos da equipe do programa de educação e currículo da [nome da universidade] e fazemos parte da equipe de mediação do Módulo [B] 18:16 D3: O Módulo [B] do curso busca resgatar o componente histórico da utilização de tecnologias da informação e comunicação no processo de ensino e aprendizagem e, em especial, os programas e as políticas governamentais desenvolvidos ao longo do tempo. 18:16 D3: Dessa forma, nosso olhar vai do interior da sala de aula para as políticas. 18:17 P10: Também estou trabalhando na atividade sobre o nosso histórico na educaçãao, que considerei muito oportuna para o módulo 1. 18:17 D3: Que bacana 18:17 D3: nosso objetivo foi, inicialmente, recuperar um pouco de nossas trajetórias pessoais e grupais, articulando-as com os projetos e políticas em desenvolvimento em nossas localidades 18:18 P4: A provocação é até para resgatarmos os nossos percursos 18:18 D3: A seguir gostaríamos de resgatar as histórias de nossas localidades, os projetos e políticas em desenvolvimento e analisar qual o impacto no processo de ensino e aprendizagem 18:18 D6: D3, me parece um histórico sobre nosso envolvimento com EAD especificamente e não histórico da utilização de tecnologias da informação e comunicação no processo de ensino e aprendizagem 18:19 D1: Este histórico é bem interessante: a D2 publicou recentemente um artigo em que fazia esse histórico comparativo Brasil / Portugal 18:19 P6: Digo: sua atividade me pareceu ser um histórico 18:19 D3: não entendi sua colocação 18:20 P6: D3 estou falando da atividade 1 proposta por vcs. Vcs pedem um histórico no envolvimento de cada um de nós com a EAD 18:21 D3: Ahhh, Se bem entendi a colocação do [D6], creio que a atividade 1 sim, buscou mais especificamente refletir sobre as vivências pessoais 18:22 P4: Para que depois possamos discutir outras posições até mesmo as políticas públicas 18:23 D3: Sim, é correto P6 18:23 D3: Um dos textos retoma a introdução das TIC, o da Beth Almeida 18:23 D6: Ok, maravilha... estou escrevento meu memorial... e gostando. Obrigado pela atividade instigante. 18:23 D3: na atividade 2, e o outro retoma um pouco mais a EaD 18:24 D3: Selecionamos a utilização da ferramenta que chamamos de “Galeria”, essa ferramenta permite que todos os participantes possam anexar arquivos, bem como permite que os demais participantes possam fazer o

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download dos arquivos e também permite que todos possam comentar as atividades de todos. 18:25 P22: minha equipe (PUCPR) e eu estamos trabalhando num vídeo onde trazemos nossas experiências para a atividade 1 do módulo 2, está sendo ótima a experiência e a oportunidade. 18:25 D3: cria um tipo de fórum para cada postagem 18:25 P3: : é uma óptima ferramenta para partilharmos ficheiros 18:26 P10: Gostei muito dessa interface, D3, nunca a tinha utilizado anteriormente [...]

Nos chats, é bastante comum que ocorram dispersões e desvios do assunto em foco.

Nesse sentido, a presença de um mediador ajuda no que concerne ao resgate do tema. No

exemplo acima, o chat teve início às 18 horas. Nos quinze primeiros minutos, enquanto os

participantes acessavam a interface, ocorreram os cumprimentos e uma conversa informal do

grupo. Às 18h15, D3 buscou iniciar o tema, mas isso não foi possível, uma vez que alguns

pesquisadores-cursistas buscaram tirar suas dúvidas a respeito das atividades daquela semana.

O assunto só foi iniciado efetivamente às 18h28, quando se deu o início do relato de alguns

cursistas acerca do tema proposto. Contudo, vale ressaltar que pode haver chats sem a

obrigação de se debater uma determinada temática, com o objetivo único de promover a

socialibilidade no grupo.

Essas estratégias de mediação em chats utilizadas pela equipe C foram bem-aceitas

pelo grupo, conforme relato de P14 no fórum de avaliação do módulo:

Excelente o módulo [C] apresentado pela competente equipe da [nome da universidade]. A mediação pedagógica foi muito eficiente, sobretudo na utilização das ferramentas disponíveis no ambiente. Quero destacar a condução do Chat [...]. Vocês são 10..............................., P14

Posteriormente ao chat, a equipe inseriu uma síntese dos principais tópicos,

oportunizando, àqueles que não puderam participar, conhecimento da temática, conforme

aponta a figura 28:

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Figura 28 – Mediação: chat

Essa é uma boa estratégia para integrar ao debate aqueles que não tiveram a

oportunidade de participar do chat. No fórum de avaliação dos módulos, P8 analisa esse tipo

de abordagem e conclui:

[...] Em cada debate síncrono, a equipe apresentou resumo da discussão, proporcionando aos ausentes uma interação dos assuntos discutidos, mesmo estes tendo a possibilidade de visualizá-los na íntegra [...], promovendo sentimento de pertencimento no curso. Parabéns! Beijos, P8

Silva (2008) percebe o chat como uma interface que valoriza o interesse na troca e na

cocriação da aprendizagem e da comunicação, e destaca algumas das vantagens de sua

utilização:

No lugar da obrigação burocrática em torno das atividades de aprendizagem, valoriza o interesse na troca e na cocriação da aprendizagem e da comunicação. Não apenas o estar-junto online na base da emissão de performáticos fragmentos telegráficos, mas o cuidado com a expressão profunda de cada participante.

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Tornaghi (2008, p. 170) nos adverte que o chat é “útil para lançar questões e para

contatos informais que humanizam e amenizam as relações de grupo” e afirma que esta

interface é fundamental na educação online para construir coesão dentro das turmas. O chat

permite discussões temáticas e elaborações colaborativas, que estreitam laços e impulsionam

a aprendizagem. Entretanto, vale lembrar que, para a construção de significados e

aprofundamento dos temas trabalhados, o fórum se configura como a interface mais

apropriada.

Estar junto online

Atuar numa sala online significa expressar pensamentos, tomar decisões, dialogar,

trocar informações e experiências e produzir conhecimento, o que proporciona a sensação de

pertencimento ao grupo ou, em outras palavras, “o estar junto online”, que pode ser

compreendido como um sentimento de afetividade entre os participantes de um curso online,

apesar da ausência de espaço físico.

Silva (2006b) acredita que é possível se sentir próximo do outro numa sala de aula

online, apesar da dispersão geográfica. Para o autor, as interfaces potencializam a socialização

online quando promovem sentimento de pertencimento, vínculos afetivos e interatividade.

Esse “estar junto online” se manifestou através de diferentes estratégias de mediação

ao longo do projeto, mas principalmente em relação à acolhida no início de cada novo

módulo. Vale destacar que o módulo C criou avatares de seus membros (como pode ser visto

na figura 29), abriu um fórum “Boas-Vindas”, convidando todos os pesquisadores-cursistas a

assistirem a um vídeo sobre aprendizagem colaborativa. Nesse sentido, foi possível verificar

um grande sentimento de pertencimento por parte dos pesquisadores, conforme postagens do

fórum inicial:

D4 e equipe, parabéns pela criativa abertura do curso! Trata-se de um brilhante acolhimento p/ animar o período de recesso acadêmico em nossas universidades. Um abraço. D3 Olá, Pessoal! Também gostei muito da recepção. E conforme destacou nossa amiga P11, o vídeo Aprendizagem Colaborativa é muito rico... ele retrata aquilo que realmente entendo por colaboração no cenário educacional. Acredito que irei aprender bastante por aqui!

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Um abraço, P20

Figura 29 – Mediação: “estar junto online” 1

Do mesmo modo, a equipe cuidou para que houvesse uma mediação constante, com

um rápido retorno:

Olá, pessoal! A cada dia temos a chegada de gente nova e de gente não tão nova por aqui. Maravilha! Estou feliz com a chegada de vocês! P11, P17, D1, P30, D3 e P10, vocês são mais que bem-vindos. D1, tem uma questão para você lá no fórum Labirinto. Minto, para você só não. Para todos que consideram a psicologia da aprendizagem fundamental para a formação do docente online. []s D5

Ao término do módulo, foi disponibilizada uma mensagem de agradecimento pela

participação do grupo (figura 30).

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Figura 30 – Mediação: “estar junto online” 2

Certamente as estratégias de mediação, como as colocadas acima, incitam maior

motivação pessoal e acabam potencializando a construção coletiva e dialógica, favorecendo o

“estar junto online”, Afinal, como nos lembra Freire (2008, p. 141), “ensinar exige querer

bem aos educandos”.

Saberes da avaliação

A definição de estratégias de avaliação em educação online integradas às tecnologias

digitais de informação e comunicação tem sido um desafio ao docente. No entanto, muito

mais que utilizar as interfaces para avaliação, a concepção na qual são utilizadas é que faz a

diferença.

Ao pesquisar o processo avaliativo no campo, foi interessante perceber três diferentes

dispositivos presentes nos módulos. O primeiro buscava conhecer melhor os pesquisadores-

cursistas, logo no primeiro módulo, através de um fórum de apresentação, configurando-se

como uma avaliação diagnóstica. Um outro dispositivo, aqui tratado como avaliação

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mediadora, acontecia permanentemente através das intervenções dos docentes nos fóruns e

chats. Um terceiro apresentava-se de maneira mais ampla e ao término de cada módulo com

um aspecto multidirecional no processo avaliativo do projeto, em que todos os elementos

participantes do processo de ensino-aprendizagem (docência, discência e desenho didático)

eram avaliados. É o que aqui chamamos de heteroavaliação.

Avaliação diagnóstica

Esse tipo de avaliação encontra ligação direta com os saberes do desenho didático, no

que concerne ao perfil do grupo, uma vez que irá fornecer subsídios para o desenvolvimento

do planejamento dos cursos online.

O primeiro módulo oferecido no projeto Formação de Professores para Docência

Online, trazia como etapa inicial do curso um fórum visando a conhecer os cursistas e

identificar sua relação com a temática trabalhada, conforme apresentado abaixo:

A equipe da Universidade do Minho de Portugal, e também todas as outras equipes, gostariam de conhecer todos os integrantes dessa pesquisa interinstitucional. Todos e todas estão convidados a uma breve apresentação pessoal neste espaço. Façam isso livremente, mas não esqueçam de: Deixar claro qual é sua equipe, seu PPG. Mostrar sua implicação com o tema da pesquisa interinstitucional Formação de Professores para Docência Online Um forte abraço! (Módulo A)

Essa prática, na concepção de Rabelo (2001), consiste numa avaliação inicial ou

diagnóstica, que busca fazer um prognóstico sobre as necessidades do aluno, seus interesses,

verificar alguns pré-requisitos daquele curso/módulo/disciplina e até identificar qualquer

dificuldade presente.

Através do diagnóstico inicial, é possível escolher as situações didáticas mais

adequadas, elaborar estratégias para superação das dificuldades (como o desconhecimento por

parte do grupo de uma determinada interface) e decidir estratégias para a mediação no

ambiente virtual de aprendizagem.

Avaliação mediadora

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Tomo emprestado de Hoffman (2004) seu conceito de avaliação mediadora, que esteve

presente a partir das interações estabelecidas nos fóruns e chats oferecidos pelos módulos,

como pode ser observado no relato de D2 colhido na ocasião da entrevista:

Bom, a avaliação, nós concebemos esta avaliação tanto em termos do próprio conteúdo que foi colocado ali, né? O conteúdo ali envolvendo não só o tema de estudos, mas a própria representação do que estava sendo trabalhado e no sentido de favorecer aos alunos, no caso os colegas participantes, que olhassem pra si e para a sua evolução ao longo do módulo para fazer uma autoavaliação. Então isso... As atividades que nós propusemos foram nessa direção.

Essa estratégia, pautada na avaliação das atividades, sejam elas individuais ou

colaborativas, reflete uma avaliação que estaria a serviço da construção do conhecimento do

aluno, levando a uma perspectiva de que ele é sujeito de seu próprio desenvolvimento,

inserido no contexto social e político.

Para Hoffman (2004), a avaliação mediadora preconiza essencialmente o processo.

Com isso, tem-se a oportunidade de estimular, observar e registrar as formas de comunicação

com as quais se obteve maior êxito, bem como detectar aquelas em que se enfrentou maior

dificuldade. Os registros dessa trajetória não têm por finalidade apenas diagnosticar a situação

e sim, a partir deles, reestruturar o planejamento, direcionando o trabalho pedagógico para a

promoção de tarefas que possam incentivar o aluno a desenvolver estratégias pessoais de

superação das dificuldades apresentadas.

Silva (2004, p.11), em consonância com os preceitos de Hoffman, destaca como um

dos engajamentos necessários ao docente online, “criar ambiências para avaliação formativa,

onde os saberes sejam construídos num processo comunicativo de negociações em que a

tomada de decisões seja uma prática constante para a ressignificação processual das autorias e

coautorias”, demonstrando o caráter mediador da própria avaliação. Nesse sentido, a atuação

avaliativa do docente online estará presente ao longo de todo o processo de mediação, nos

fóruns, chats, atividades, entre outros.

Heteroavaliação

O terceiro dispositivo avaliativo presente no projeto foi ainda mais amplo, envolvendo

todos os pesquisadores-cursistas para avaliar os módulos como um todo. Ao término de cada

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módulo, todos os participantes eram convidados a analisar a docência, a discência e o desenho

didático (figura 31), também utilizando a interface fórum.

Figura 31 – Heteroavaliação

No relato a seguir, verificamos como D4 e sua equipe se aproximaram desse aspecto

multidirecional no processo avaliativo do projeto, em que todos os elementos do processo

ensino-aprendizagem (docência, discência e desenho didático) são avaliados:

[...] então nós usamos mais a avaliação pelos pares, a avaliação por todos aqueles que fizeram o curso, mas não fizemos nenhuma avaliação chamativa em relação ao desempenho das pessoas não. Uma avaliação pelos pares, uma avaliação do módulo, do material, do desenvolvimento, isso aí as pessoas fizeram sim.

Esse tipo de processo avaliativo, que rompe com lógica unívoca da mídia de massa e

da pedagogia da transmissão, encontra-se consoante com os fundamentos da interatividade,

em especial o binômio participação-intervenção, pois implica a possibilidade de o aluno

também intervir na avaliação, fornecendo valiosos dados que podem (e devem) ser subsídios

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para o (re)planejamento da equipe, sendo ratificada por D5 em sua entrevista, quando afirma:

“eu entendo a avaliação como algo de construção mesmo, que é uma oportunidade de se

avaliar e de avaliar o outro, avaliar tudo junto”.

No entanto, vale ressaltar que, apesar dessa proposta de heteroavaliação, a participação

nesse fórum foi bastante baixa. Na entrevista, ao indagar a D5 a que atribui tal fato, ela relata:

À falta de cultura de avaliar, de forma interativa. O professor avalia, mas não gosta de ser avaliado. E, por incrível que pareça, mesmo estando entre doutores e pesquisadores e mestrandos, há pessoas... eu ouvi uma pessoa num evento me dizer assim “Você se expõe muito, D5, é, você fala muita coisa, você se expõe muito, olha, ali tá todo mundo olhando todo mundo. Eu fui no outro mundo e voltei. Eu disse: Cacete! Se você tá pensando assim o caso é grave, né? Porque se estamos entre especialistas que teorizam isso, e você não se autoriza...

Assim, é possível perceber que ainda temos muitos docentes que estão presos a um

paradigma da transmissão, e que, apesar de serem pesquisadores da modalidade online, ainda

não conseguiram romper com a lógica comunicacional, na qual foram educados, e apresentam

dificuldades para se expor, mesmo quando já não há separação entre emissão e recepção.

Nesse sentido, vale lembrar as palavras de Silva (2004, p. 14):

[...] é preciso enfatizar a necessidade de modificar a modalidade comunicacional predominante na ação pedagógica do professor a partir do movimento contemporâneo das tecnologias hipertextuais, esclarecendo que isso não significa meramente uma nova tecnificação da sala de aula. Em primeiro lugar está a função social da escola, que não é simplesmente a socialização das novas gerações no contexto das novas tecnologias – a “alfabetização digital” entendida num sentido restrito: gerar mão de obra para o mercado de trabalho cada vez mais informatizado –, mas, acima de tudo, a educação do sujeito em nosso tempo.

Avaliar na educação online não significa avaliar o produto final do processo de

ensino-aprendizagem, ou seja, o aluno ao término do curso, mas é diagnosticar, mediar e

possibilitar uma avaliação de todos os presentes. E, com base nos dados, tomar decisões

concretas para que o aluno possa aprender mais e melhor. A avaliação online não é um

movimento unidirecional, em que só o professor avalia aluno, mas, em consonância com a

própria lógica da liberação do polo de emissão, a avaliação torna-se de todos para todos.

Portanto, avaliar o aluno também é avaliar o nosso fazer docente e a própria proposta

pedagógica do curso.

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Vale ressaltar, ainda, que os elementos apresentados nessa análise não esgotam os

recursos que contribuem para a compreensão do fazer pedagógico do docente online. Por

outro lado, é preciso compreender que os saberes epistemológicos, didáticos e tecnológicos e

sua perspectiva interativa, cumprem um importante papel à medida que se interconectam e se

complementam, respondendo às múltiplas exigências do novo perfil docente que atua em

ambientes virtuais de aprendizagem. As análises e prospecções serão apresentadas no capítulo

que se segue.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A mudança sempre foi um dado fundamental da vida humana. Vivemos em uma época na qual essa mudança se acelera constantemente, o que significa mais riscos e

inseguranças, mas também mais possibilidades e possibilidades.

Pierre Lévy

Num contexto de mudanças e marcado pelo computador conectado em rede online,

que favorece novas relações sociais com o saber, a formação do professor que atua em

ambientes virtuais de aprendizagem é um dos eixos que vem passando por transformações e

inspirou a elaboração deste trabalho. A vivência de propostas de formação de professores

nesse contexto cresce cotidianamente e requer a construção de saberes em sintonia com a

cibercultura, o que aponta uma pauta emergente.

Nesse sentido, neste estudo me propus a analisar saberes e práticas expressados na

docência online em um trabalho interinstitucional, que reúne em ambiente virtual de

aprendizagem pesquisadores de doze programas de pós-graduação em educação e

comunicação digital, com vistas ao desenvolvimento de conteúdos de aprendizagem e de

estratégias docentes para cursos via internet dirigidos à formação de professores para

docência online.

Para responder ao problema da pesquisa, apoiei-me em algumas questões que

orientaram essa trajetória e se formalizaram nas reflexões sintetizadas abaixo.

A partir da primeira questão, “Como se edificam os saberes do docente online?”, ficou

evidente que esses saberes emergem, mormente, de sua experiência – até pelo fato de não ser

possível encontrar fartura nas ofertas de formação desse profissional –, mas outras esferas não

podem ser desconsideradas: sua formação, o currículo da instituição e a disciplina que

leciona.

Essa edificação de saberes é influenciada diretamente pelas dimensões temporal e

social, que podem ser caracterizadas pelas experiências dos professores, construídas em suas

trajetórias pessoal, familiar e profissional, através de suas relações sociais. Essas experiências

interconectam-se e tecem uma rede que sustenta os saberes do docente que atua em ambientes

virtuais.

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Cabe ressaltar que, ainda que sejam o núcleo vital da prática do professor, os saberes

experienciais são desvalorizados, em detrimento daqueles elaborados na academia. Num

sentido de desconstrução dessa lógica, que separa o agir e o pensar, é preciso investir cada vez

mais em pesquisas que relacionem a experiência com a teoria, conforme vem acontecendo no

próprio campo, que se configura como um projeto de pesquisa e formação de seus

pesquisadores.

A segunda questão, “A interatividade é um saber docente?”, não foi formulada a

priori ; surgiu ao longo do estudo, pela necessidade de compreensão dos saberes docentes na

educação online. Vários estudos apontam a interatividade como um dos saberes essenciais a

uma docência online de qualidade – e aqui não discordo deles – no entanto, entendo que

existem relações mais complexas entre a interatividade e o saber docente.

Quando consideramos que a educação online é um fenômeno da cibercultura

(SANTOS, 2006), isto é, não se limita a uma evolução da EAD, mas está pautada em um

paradigma comunicacional que transcende a mídia de massa, podemos perceber que sua

especificidade é a interatividade. Além disso, a educação online manifesta-se através de

relações complexas entre o professor e seus alunos e ocorre em ambientes que possuem

interfaces potencializadoras de interatividade, ou seja, que permitem ao aluno e professor

criar, modificar, construir conhecimentos, sendo coautores do processo de ensino-

aprendizagem. Dessa análise é possível inferir que existe uma reflexividade em relação ao

conceito da interatividade na educação online: ao mesmo tempo em que é um saber docente, a

interatividade se encontra presente nos outros saberes.

Considerando a terceira questão, “Que saberes docentes são mobilizados na busca de

uma docência online interativa?” , foi possível verificar que diversos saberes emergiram da

observação da prática do docente online no ambiente virtual de aprendizagem e da análise das

entrevistas com os professores-coordenadores dos módulos do projeto. Esses saberes foram

organizados em categorias (saberes epistemológicos, didáticos e tecnológicos) e

subcategorias, sendo agrupados por temas afins num sentido de organização da pesquisa.

Contudo, vale ressaltar que, na prática pedagógica do docente online, eles se imbricam

constantemente.

A primeira categoria, saberes epistemológicos, aborda questões que fundamentam a

formação e a prática dos professores. Representa um conjunto de conhecimentos utilizados

pelos docentes, a fim de promover a compreensão do próprio agir humano, sendo aqui

compreendidos como saberes psicopedagógicos, político-filosóficos e comunicacionais.

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Os saberes psicopedagógicos referem-se ao domínio de conhecimentos dos campos da

pedagogia e psicologia, voltados para a matriz epistemológica do processo de ensino-

aprendizagem. Numa perspectiva interativa, baseiam-se, principalmente, nas abordagem

construtivista de Piaget e na sociointeracionista de Vygotsky, que trazem como pressuposto

fundamental o papel ativo do aluno como sujeito cognoscente. Decorre dessas perspectivas

uma mudança no papel do docente, que supere a simples transmissão de informações e

consubstancie-se através de uma prática baseada na troca de conhecimentos, mediação e

acompanhamento dos percursos de aprendizagem dos alunos.

Os saberes político-filosóficos referem-se às relações de poder presentes na educação

online. Na investigação, tais relações emergiram, principalmente, através do silêncio virtual

de alguns cursistas, que raramente participavam dos módulos, justificando sua ausência por se

sentirem intimidados pelos pares mais experientes. Foi possível perceber que esses saberes

refletem a consciência que cada um possui de sua prática e da intencionalidade de suas ações.

Os saberes comunicacionais sugerem a superação de práticas pautadas na

comunicação unidirecional (modelo “um-todos”) e o alcance de um fazer pautado nos

fundamentos da interatividade (binômios participação-intervenção, bidirecionalidade-

hibridação e permutabilidade-potencialidade).

A segunda categoria é representada pelos saberes tecnológicos, que se referem ao

conhecimento que o professor deve ter acerca dos ambientes virtuais, seus recursos e

interfaces, mas não apenas relacionados à utilização das TICs como instrumento, uma vez que

estas, por si sós, não são a garantia de uma educação interativa e de qualidade, mas numa

perspectiva estruturante do pensamento, que contemple processos de produção do

conhecimento, de criação e cocriação possibilitadas pelas TICs digitais.

A terceira categoria destaca os saberes didáticos, compreendidos aqui como as

intervenções e estratégias docentes que emergem da prática do professor online, que se

subdividem em saberes do desenho didático, saberes da mediação pedagógica e saberes da

avaliação.

Os saberes do desenho didático podem ser compreendidos como as ações de

planejamento que ocorrem no ambiente virtual de ensino e exigem do docente online:

- participação numa equipe interdisciplinar responsável pelo desenho didático do curso,

composta por diversos profissionais que articulem seus saberes;

- análise do perfil do grupo de aprendentes, na busca da construção de um desenho

didático que esteja de acordo com as necessidades e expectativas desse grupo;

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- construção de uma arquitetura de percursos hipertextuais e com diferentes suportes

(texto, som vídeo) e interfaces (chat, wiki, fórum), possibilitando um desenho didático

que se apresente como rede, definindo um conjunto de territórios a explorar;

- disponibilização de conteúdos que possibilitem reflexão conjunta e situações de

aprendizagem desafiadoras.

Os saberes da mediação são ações do professor que colaboram para a dinamização da

aprendizagem dos alunos, no sentido de romper com práticas pautadas na transmissão e

centradas no isolamento e na autoaprendizagem do aluno próprias da EAD e vislumbrar uma

prática pedagógica pautada na interatividade constante. A mediação ocorre em variadas

interfaces dos ambientes virtuais de aprendizagem, necessitando de estratégias específicas

para cada uma delas:

- Os roteiros de aprendizagem devem conter as orientações iniciais que o professor

dirige ao aluno, para informar os trajetos que serão propostos no

curso/módulo/disciplina online; sintetizam para o aluno a arquitetura de percursos

projetada pelo docente ou pela equipe interdisciplinar;

- Os fóruns devem possibilitar maior abertura à discussão de determinadas temáticas

pertinentes ao curso, assim como uma reflexão mais aprofundada sobre o tema em

estudo, uma vez que os questionamentos disponibilizados geram debate entre os

participantes, reflexão, leituras e contribuição com sínteses mais elaboradas.

- Os chats devem valorizar o interesse na troca e na cocriação da aprendizagem e da

comunicação, permitindo discussões temáticas e elaborações colaborativas que

estreitam laços e impulsionam a aprendizagem.

Além disso, é preciso que o docente online crie situações que propiciem ao grupo o

“estar junto online”, a sensação de pertencimento, para incitar a motivação pessoal e

potencializar a construção coletiva do conhecimento.

Os saberes da avaliação referem-se às estratégias para verificar a eficácia do processo

de ensino-aprendigem. Na pesquisa, foi possível perceber três diferentes dispositivos

presentes nos módulos. O primeiro buscava conhecer melhor os pesquisadores-cursistas logo

no primeiro módulo, através de um fórum de apresentação, configurando-se como uma

avaliação diagnóstica. Um outro dispositivo acontecia permanentemente, através das

intervenções dos docentes nos fóruns e chats, constituindo-se como uma avaliação mediadora.

Um terceiro apresentava-se de maneira mais ampla e ao término de cada módulo,

apresentando um aspecto multidirecional no processo avaliativo do projeto, em que todos os

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elementos participantes do processo de ensino-aprendizagem (docência, discência e desenho

didático) eram avaliados. É o que chamamos de heteroavaliação. Através desses dispositivos,

o processo em que o aluno se envolveu foi avaliado e não aquilo que produziu, porque a

prioridade é diagnosticar para tomar decisões que levem o aluno a aprender mais e melhor.

Numa perspectiva interativa, essa avaliação deixa de ser unidirecional (do professor para o

aluno) e passa a contemplar o processo como um todo: alunos, professores, desenho didático,

etc.

Para responder à última questão, “Como os saberes docentes situados na perspectiva

da interatividade se expressam no ambiente virtual de aprendizagem?”, é preciso perceber que

as três categorias aqui analisadas não representam saberes isolados, mas são saberes que se

interconectam e se complementam. Nesse movimento simbiótico, o docente online cria

conteúdos e situações de aprendizagem através das interfaces disponíveis no AVA em que

atua, de forma que o conhecimento não seja distribuído em pacotes fechados, mas

compartilhado e cocriado, através de uma mediação voltada para o fortalecimento e/ou

abertura das zonas de desenvolvimento proximal dos aprendentes. Dessa maneira, infere-se

que interatividade se manifesta quando há utilização expressiva de interfaces de

compartilhamento (como chat, fórum e videoconferência) e de colaboração (como wiki),

numa perspectiva de partilha e cocriação entre docentes e aprendentes.

Com base nesses resultados, busco contribuir com o debate sobre qualidade na

educação online, quando o investimento na oferta desta modalidade supera o investimento na

formação específica do seu corpo docente.

Nesse sentido, percebo como os caminhos dessa pesquisa se encontram articulados à

minha própria história pessoal e, principalmente, profissional. A preocupação com a formação

do professor sempre se apresentou uma constante em meu fazer pedagógico, o que se

acentuou quando passei vivenciar a educação online, pela qual tenho transitado em diferentes

modelos e concepções, algumas mais, outras menos interativas.

Percebo que, na perspectiva da qualidade em educação online, é preciso, antes de

qualquer coisa, refletir e ressignificar o próprio papel do docente online, que muitas vezes é

limitado a cumprir tarefas próprias de um tutor, sintetizadas em execução e administração de

conteúdos estáticos, que, numa perspectiva da comunicação unidirecional, partem de um polo

de emissão para a massa, desatrelados da construção do conhecimento.

Ao tutor são reservadas apenas capacitações técnicas, baseadas em uma lista de

habilidades e procedimentos, geralmente voltados para a ambientação no AVA. Já passei por

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algumas capacitações assim pude verificar que esse tipo de formação é altamente limitador

para a exploração e para o desenho de novas práticas educacionais que estejam em

consonância com a cibercultura.

Diante das possibilidades que a educação online oferece, como a interlocução entre os

sujeitos do processo, o acesso ao ambiente de aprendizagem e todo seu conteúdo e o “estar

junto online”, não cabe mais termos um tutor. Urge um docente online, que possa

efetivamente exercer sua autoria e coautoria no processo de ensino-aprendizagem.

Diante desse cenário, é oportuno que sejam concebidos e desenvolvidos programas de

formação inicial e continuada para a educação online, que apresentem espaços para a

construção de saberes atrelados à própria experiência do docente, num movimento de

ressignificação de sua prática pedagógica, assim como vem acontecendo no projeto

investigado.

Nessa configuração formativa pela experiência, o professor passa de espectador da

própria aprendizagem e da aprendizagem do outro a protagonista, atuando como coautor de

novas metodologias, concepções, situações de aprendizagem, conteúdos e abordagens.

Percebe-se inserido e comprometido com a educação, para além do exercício de sua função

pedagógica, e se reveste de significado social e político. Seu papel, então, encontra-se além da

função de tarefeiro e descomprometido, meramente transmissor de informação, passando a

favorecer sua formação e, consequentemente, contribuindo para a revitalização do processo

educacional através da reflexão e compartilhamento dos seus próprios saberes com seus pares.

Este estudo, ao investigar como ocorreu a formação da equipe de docentes online do

projeto Formação de Professores para Docência Online nas experiências que favoreceram o

desenvolvimento formativo desses profissionais, evidenciou que os saberes docentes, aqui

analisados à luz da interatividade, trazem em si potencial relevante. Esses apontamentos

podem ser aplicados como subsídio de programas de formação, pautados em perspectivas

educacionais interativas e colaborativas, sem perder de vista a educação como prática

respaldada pela fundamentação teórica, pensada e refletida no contexto da sociedade

contemporânea, cibercultural, plural e multifacetada.

Cabe, ainda, ressaltar que não pretendo que a análise dos saberes docentes aqui

realizada seja considerada um guia prático da docência online. Pelo contrário, espero que as

reflexões que ela reúne possam subsidiar outras, porque está claro para mim, também, que as

conclusões nela apresentadas são provisórias e que o trabalho de pesquisa não se esgota aqui.

Novos pontos de vista, novos enfoques, novas interpretações, devem dar continuidade a este

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estudo, conferindo ou reiterando a importância e a visibilidade que a educação online na

cibercultura merece.

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GLOSSÁRIO

Ambiente virtual de aprendizagem ou AVA: Ambiente no qual se dá a educação na modalidade online. O ambiente online de aprendizagem mais utilizado mundialmente é o Moodle, um freeware. Avatar: Representação gráfica de um utilizador em realidade virtual. Banda larga: Qualquer conexão à internet acima da velocidade padrão dos modems analógicos (56 Kbps). Usando linhas analógicas convencionais, a velocidade máxima de conexão é de 56 Kbps. Para obter velocidade acima desta, tem-se obrigatoriamente de optar por uma outra maneira de conexão do computador com o provedor, permitindo uma comunicação mais rápida via web. Blog: Tipo de página pessoal, na qual se desenvolve algum assunto e se mantém aberto um mural com a opinião dos visitantes. Chat: Software de bate-papo, comunicação online. Download: Baixar arquivo pela internet. EAD: Educação a distância. Email: Correio eletrônico. Freeware: Software grátis. Interface: Meio pelo qual se realiza a interação entre diferentes usuários, ou ainda usuário e o software. A interface é o que se vê, designa um elemento através do qual o usuário obtém informações e manipula o ambiente computacional. Internet : Rede mundial de computadores. Link : Ligação, enlace. Midiateca: Espaço para divulgação e socialização de diversas mídias. Network: Rede interna. Online: Conectado à rede mundial de computadores, internet.

PDF: Portable Document Format: É um formato de arquivo, desenvolvido pela Adobe Systems em 1993, para representar documentos de maneira independente do aplicativo, do hardware e do sistema operacional usados para criá-los. Um arquivo PDF pode descrever documentos que contenham texto, gráficos e imagens num formato independente de dispositivo e resolução.

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Podcasting: Forma de publicação de arquivos de mídia digital (áudio, vídeo, foto, pps, etc...) pela internet.

Post: Postagem. Power point (ou ppt): Arquivo do software de apresentações Power Point, da Microsoft. Site: Página para internet. Software: Programa, aplicativo. Teleconferência: Serviço que permite a comunicação simultânea entre diversas pessoas, localizadas em qualquer parte do mundo, de telefone fixo ou celular, com a comodidade de poder realizar reuniões, entrevistas, treinamentos a distância, ou até mesmo palestras, economizando assim tempo e gastos com viagens e hospedagem. TIC: Tecnologia de informação e comunicação Videoconferência: Discussão em grupo ou pessoa a pessoa, na qual os participantes estão em locais diferentes, mas podem ver e ouvir uns aos outros, como se estivessem reunidos em um único local. Web: Denominação comum dada à internet. Wiki: Termo utilizado para identificar um tipo específico de coleção de documentos em hipertexto ou o software colaborativo usado para criá-lo. www: World Wide Web, aplicativo utilizado para buscas de informações. Apresenta-se na forma de textos com ligações para páginas localizadas em servidores espalhados pelo mundo.

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ANEXOS

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ANEXO A

INDICADORES DE INTERATIVIDADE EM EDUCAÇÃO PRESENCIA L E ONLINE

1. Disponibilizar múltiplas experimentações, múltiplas expressões.

� Promover oportunidades de trabalho em grupos colaborativos.

� Desenvolver o cenário das atividades de aprendizagem de modo a possibilitar a

participação livre, o diálogo, a troca e a articulação de experiências.

� Utilizar recursos cênicos para despertar e manter o interesse e a motivação do grupo

envolvido.

� Favorecer a participação coletiva em debates presenciais e online.

� Garantir a exposição de argumentos e o questionamento das afirmações.

2. Disponibilizar uma montagem de conexões em rede que permita múltiplas ocorrências.

� Fazer uso de diferentes suportes e linguagens midiáticos (texto, som, vídeo,

computador, internet) em mixagens e em multimídia, presenciais e online.

� Garantir um território de expressão e aprendizagem labiríntico, com sinalizações que

ajudem o aprendiz a não se perder, mas que ao mesmo tempo não o impeça de perder-

se.

� Desenvolver, com a colaboração de profissionais específicos, um ambiente intuitivo,

funcional, de fácil navegação, e que poderá ser aperfeiçoado na medida da atuação dos

aprendizes.

� Propor a aprendizagem e o conhecimento como espaços abertos à navegação,

colaboração e criação, possibilitar que o aprendiz conduza suas explorações.

3. Provocar situações de inquietação criadora.

� Promover ocasiões que despertem a coragem do enfrentamento em público, diante de

situações que provoquem reações individuais e grupais.

� Encorajar esforços no sentido da troca entre todos os envolvidos, juntamente com a

definição conjunta de atitudes de respeito à diversidade e à solidariedade.

� Incentivar a participação dos estudantes na resolução de problemas apresentados, de

forma autônoma e cooperativa.

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� Elaborar problemas que convoquem os estudantes a apresentar, defender e, se

necessário, reformular seus pontos de vista constantemente.

� Formular problemas voltados para o desenvolvimento de competências que

possibilitem ao aprendiz ressignificar ideias, conceitos e procedimentos.

4. Arquitetar percursos hipertextuais.

� Articular o percurso da aprendizagem em caminhos diferentes, multidisciplinares e

transdisciplinares, em teias, em vários atalhos, reconectáveis a qualquer instante por

mecanismos de associação.

� Explorar as vantagens do hipertexto: disponibilizar os dados de conhecimento

exuberantemente conectados e em múltiplas camadas ligadas a pontos que facilitem o

acesso e o cruzamento de informações e de participações.

� Implementar no roteiro do curso diferentes desenhos e múltiplas combinações de

linguagens e recursos educacionais retirados do universo cultural do estudante e atento

aos seus eixos de interesse.

5. Mobilizar a experiência do conhecimento.

� Modelar os domínios do conhecimento como espaços conceituais, em que os alunos

possam construir seus próprios mapas e conduzir suas explorações, considerando os

conteúdos como ponto de partida e não como ponto de chegada no processo de

construção do conhecimento.

� Desenvolver atividades que propiciem não só a livre expressão, o confronto de ideias e

a colaboração entre os estudantes, mas que permitam, também, o aguçamento da

observação e da interpretação das atitudes dos atores envolvidos.

� Implementar situações de aprendizagem que considerem as experiências,

conhecimentos e expectativas que os estudantes já trazem consigo.

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ANEXO B

ROTEIRO DA ENTREVISTA COM OS DOCENTES COORDENADORES DOS MÓDULOS

1. Como ocorreu sua trajetória docente, desde sua formação inicial até sua experiência

como docente online?

2. Como ocorreu o seu envolvimento com o projeto interinstitucional Formação de Professores para Docência Online?

3. Como aconteceu a formação e as tarefas do grupo responsável pelo desenho didático

do módulo?

4. Como ocorreu a construção do desenho didático?

5. Quais as interfaces que vocês optaram por utilizar na elaboração do desenho didático e por que essa opção?

6. Como foi planejada e aconteceu a mediação em seu módulo?

7. Como foi planejada e ocorreu a avaliação?

8. Em sua opinião, o que é interatividade?

9. O módulo, em sua opinião, apresentou uma postura favorável à interatividade?

10. Como a interatividade ela se materializa na educação online?

11. Que saberes docentes foram mobilizados durante seu módulo?

12. Em suas opinião, quais os elementos necessários para termos uma educação online de

qualidade?