TECLAS & AFINS 02

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& A

FINS

Ano 1 - Número 2 - Junho 2014www.teclaseafins.com.br

Fusão de estilos,do rock ao erudito!

O mais inovador piano elétrico de todos os tempos

JON LORD

FENDER RHODES

Cultuado e incompreendido: o mestre do jazz latino-brasileiro

comemora 80 anos

João Donato

E MAIS! Harmonia e Improvisação - Arranjo Comentado - Síntese

CONHEÇA OS PRINCIPAIS TIPOS DE TECLADOS E SUAS FUNÇÕES

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6 / MAIO 2014 teclas & afins

Chegamos à segunda edição de Teclas & Afins e, confirmando

nossas pesquisas, o público recebeu com alegria esta revista dedicada aos instru-mentos de teclas. Nossa pro-posta é difundir o que há de novo, democratizar informa-ções, discutir tendências, de-senvolver o ensino de música, aprimorar talentos e divulgar trabalhos. Com certeza, objeti-vos ousados, assim como foi ousada nossa decisão de levar o projeto adiante, em um ano que promete ser, no mínimo, anormal. Mas para que nossas metas sejam alcançadas, é in-dispensável a colaboração de nossos leitores, participando, sugerindo, comentando, compartilhando e, principalmente, explorando todo o potencial que esta publicação proporcio-na. Clique nos ícones, nas imagens e nos endereços e tenha acesso a ainda mais informação. Acesse nossos perfis nas re-des sociais, comente, conheça outras pessoas. Vamos forta-lecer a comunidade dos instrumentistas de teclas em nosso País e, com isso, buscar a valorização tanto da música como forma de expressão inigualável e desenvolvedora de capa-cidades quanto do trabalho daqueles que se dedicam a ela. Como conhecimento é a principal ferramenta para ultrapas-sar qualquer obstáculo, trazemos como destaques desta e-dição dois músicos que inscreveram seus nomes na história utilizando a mesma técnica: a inovação! João Donato e Jon Lord, cada um dentro de seus universos, sempre atuaram no sentido de apresentar o novo, fundindo tendências, experi-mentando e, por conta disso, sendo alvos de críticas. Mas, como o tempo é senhor da razão, são hoje cultuados e ad-mirados. Que assim seja com todos os bem-intencionados deste nosso Brasil que, mais do que nunca, precisa de razão.

Boa leitura!

Nilton CorazzaPublisher

EDITORIALAno 1 - N° 02 - Junho 2014

PublisherNilton Corazza

[email protected]

Gerente FinanceiroRegina Sobral

[email protected]

Editor e jornalista responsávelNilton Corazza (MTb 43.958)

Colaboraram nesta edição:Alexandre Porto, Alex Saba, Amador Rubio,

Cristiano Ribeiro, Eloy Fritsch, Hudson Hostins, Maurício Domene, Rosana Giosa, Turi Collura

DiagramaçãoSergio Coletti

[email protected]

Foto da capaCristina Granato

Publicidade/anú[email protected]

[email protected]

Sugestões de [email protected]

Desenvolvido por Blue Note Consultoria e Comunicação

www.bluenotecomunicacao.com.br

Os artigos e materiais assinados são de responsabilidade de seus autores. É permitida a reproduação dos conteúdos publicados aqui desde que fonte e autores sejam citados e o material seja enviado para nossos arquivos. A revista

não se responsabiliza pelo conteúdo dos anúncios publicados.

& A

FINS

Rua Nossa Senhora da Saúde, 287/34Jardim Previdência - São Paulo - SP

CEP 04159-000Telefone: +55 (11) 3807-0626

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MAIO 2014 / 7 teclas & afins

VOCE EM TECLAS E AFINS 4O espaço exclusivo dos leitores

INTERFACE 8As notícias mais quentes do

universo das teclas

Vitrine 12Novidades do mercado

Memoria 16Fender Rhodes

O inovador piano elétrico por Alexandre Porto

materia de Capa 22João Donato

O simples, sofisticado

MESTRES 32Jon Lord

O pioneiro da fusãopor Cristiano Ribeiro

42 SINTESEO controle do som no tempopor Eloy Fritsch

44 TRILHA MUSICALUma trilha no meu caminhoPor Maurício Domene

48 LIVRE PENSARPorque “Jass”por Alex Saba

52 KEYNOLOGIA Tipos e funçõespor Hudson Hostins

54 orgaos e organistas Respeito ou ignorânciapor Amador Rubio

56 harmonia e improvisacaoA Improvisação Horizontalna Cadência II-V-Ipor Turi Collura

59 arranjo comentadoStandard americano: cançãopor Rosana Giosa

NESTA EDIÇÃO

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4 / JUNHO 2014 teclas & afins

vOCE em teclas & afins

Vamos nos conectar? Teclas & Afins quer conhecer melhor você, saber sua opinião e manter comunicação constante, trocando experiências e informações. E suas mensagens podem ser publicadas aqui! Para isso, acesse, curta, compartilhe e siga nossas páginas nas redes sociais clicando nos ícones acima. Se preferir, envie críticas, comentários e sugestões para o e-mail [email protected]

“Olá, pessoal de Teclas & Afins. Toco em bandas de covers de rock progressivo há quase 10 anos e estou extremamente feliz com o surgimento da revista. A primeira edição já foi muito boa. Gostei especialmente da matéria do Eloy Fritsch e daquela sobre o sintetizador Moog. Muito obrigado pela iniciativa!” (Rômulo Martins da Silva, por e-mail).

“Cordiais saudações. É com muita alegria que encontrei vocês, pois sempre senti que os tecladistas ficam deixados para trás. Há várias publicações sobre guitarristas, baixistas e bateristas e, pobres de nós, sem nada. Mas, graças a vocês, este problema foi sanado. Meus parabéns sobre esta revista e agradeço a Deus por tê-los encontrado. Meu trabalho é voltado à música progressiva eletrônica, ao estilo de Vangelis, Tangerine Dream, Klaus Schulze e outros. Tudo de bom para vocês.” (Walter Sassarrão Junior, por e-mail).

Agradecemos, Rômulo e Walter. Nosso objetivo é o de garantir a melhor e mais qualificada

informação aos amantes dos instrumentos de teclas. Por que não enviam um vídeo para esta seção com um release de seus trabalhos? Vejam ao lado como participar. Forte abraço!

‘’Finalmente uma revista especializada em teclas no Brasil! Fico extremamente envaidecido e agradecido pelo convite de ser a primeira capa. Isso para mim é mais uma vitória pelo reconhecimento de uma escolha que fiz ainda menino: a música e as teclas! Obrigado a todo pessoal da Revista Teclas & Afins por me dar a oportunidade de falar sobre este assunto que tanto me fascina, os teclados e a música! Boa sorte na empreitada e vida longa à revista! (Márcio Buzelin, via Facebook)

A redação de Teclas & Afins é que agradece por ter aceitado nosso convite. Não poderíamos ter escolhido melhor!

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6 / JUNHO 2014 teclas & afins

vOCE em teclas & afinsvOCE em teclas & afins

Direto da BahiaIntegrante da banda Melaço de Cana, baiano mostra talento no forró, na música instrumental e no chorinho

SETUP Kurzweil SP4-7 (SP-76II)Edirol/Roland PCR-800Roland AX-7M-Audio Keystation Mini 32Korg NanoKEY (black)Roland D-50

Tecladista, cantor, arranjador, produtor, compositor e diretor musical: esse é Henry Souza, baiano de 37 anos, natural de Valen-ça. Começou a tocar desde cedo - aos 6 anos de idade já tinha aulas de piano erudito – e iniciou a carreira profissional aos 12, quando foi convidado para integrar a Banda Medusa, uma das mais tradicionais da cidade de San-to Antonio de Jesus. E sua estréia não pode-ria ser melhor: em cima do Trio Elétrico em plena Micareta (Carnaval fora de época)!Atualmente morando em Salvador, Henry está completando 25 anos de estrada e é músico da banda da cantora Ludmillah Anjos (ex-The Voice), e tecladista, produtor e diretor musical da Melaço de Cana - banda de Forró de Salva-dor famosa por revelar os cantores Levi Lima (Jammil) e Felipe Pezzoni (Banda Eva), além de trabalhar com vários outros grupos da região e artistas de renome nacional. De suas pesquisas na área de música instru-mental mixadas à sua influência do forró nordestino, nasceu a paixão por chorinhos instrumentais, tendo como referência a san-fona e seu mestre maior, Dominguinhos. Por não saber tocar sanfona – por enquanto, se-gundo ele – inovou mais uma vez e adaptou

a técnica ao teclado, executando com fideli-dade as mais diversas e magníficas obras do gênero. Atualmente, continua suas pesquisas e mostra o resultado dos seus trabalhos em vídeos postados no Youtube.

NA REDE

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JUNHO 2014 / 7 teclas & afins

Este espaço é seu!vOCE em teclas & afins

Teclas & Afins quer divulgar trabalhos, iniciativas, músicos e bandas que apresentem qualidade e sejam diferenciados.

Não importa o instrumento: piano, órgão, teclado, sintetizadores, acordeon, cravo e todos os outros têm espaço garantido em nossa revista. Mas tem que ser de teclas!

Veja abaixo como participar:

1. Grave um vídeo de sua performance. A qualidade não importa. Pode ser até mesmo de celular, mas o som precisa estar audível.

2. Faça o upload desse vídeo para um canal no Youtube ou para um servidor de transferência de arquivos como Sendspace.com, WeTransfer.com ou WeSend.pt.

3. Envie o link, acompanhado de um release e uma foto para o endereço [email protected]

4. A cada edição, escolheremos um ou dois artistas para figurarem nas páginas de Teclas & Afins, com direito a entrevista e publicação de release e contato.

Não fique fora dessa! Mostre todo seu talento!

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8 / JUNHO 2014 teclas & afins

Concertos de classeNo mês de julho, o Brasil recebe Valentina Lisitsa para dois concertos, um deles durante o Festival de Inverno de Campos do Jordão. A pianista ucraniana apresenta-se também na capital paulista, com a Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo sob a regência de John Neschling, interpretando o Concerto N. 3 em Ré Menor, Op. 30, de Sergei Rachmaninov. Lisitsa está radicada nos Estados Unidos e mantém com seu marido, o também pianista Alexei Kuznetsoff, um dueto de sucesso. Além disso, preocupa-se em popularizar a música erudita, como quando colaborou com o grupo Horse the Band, na canção “Rare Escape”, do álbum Desperate Living. Com mais de sete milhões de visitas para um de seus vídeos, ela se diz ser a pianista mais popular do YouTube.

INTERFACE

Heaven & Earth Depois de mais de quatro décadas de carreira e 20 dis-cos de estúdio, a banda britânica Yes anuncia um novo trabalho. O álbum Heaven & Earth será o primeiro regis-tro oficial da veterana banda de rock progressivo com a nova formação, que traz os músicos Chris Squire (baixo), Steve Howe (guitarra), Alan White (bateria), Geoff Downes (teclado) e o vocalista norte-americano Jon Davison. O material foi produzido por Roy Thomas Baker e, mais uma vez, a arte da capa ficou sob responsabilidade de Roger Dean, com quem a banda trabalha há anos.

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JUNHO 2014 / 9 teclas & afins

INTERFACE

Doutor Lang Lang

O bandeonista argentino Daniel Binelli - considerado o mais experiente mestre em tango e aclamado, atualmente, como o principal expoente do estilo de Ástor Piazzolla - se apresenta em São Paulo com o Quarteto de Cordas da Cidade. O compositor foi membro e arranjador da orquestra de Osvaldo Pugliese, integrou o Sexteto Astor Piazolla Nuevo Tango, foi músico e responsável pelos arranjos do grupo Tango7, na Suíça, e diretor musical do grupo Tango Metrópolis e do Quinteto de Daniel Binelli. Gravou mais de 50 discos e entre suas interpretações de maior destaque está a estreia do Concerto de Lieja para bandoneon e violão de Piazzolla, em Tóquio, com o violonista Eduardo Isaac e a Orquesta Sinfônica Nacional de Argentina conduzida por Pedro Ignacio Calderón.

TESTAMENTO PORTEÑO

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O músico e compositor Vangelis está envolvi-do na produção da trilha musical de uma nova película cinematográfica. Trata-se de uma produção franco-algeriana de título Le Crépus-cule des Ombres (ainda sem titulo em portu-guês), do diretor Mohamed Lakhdar-Hamina. Segundo informações da assessoria do tecla-dista, a trilha será inteiramente composta nos sintetizadores do músico. Vangelis já foi vence-dor do Oscar na categoria melhor música pela composição de Chariots of Fire (Carruagens de Fogo), em 1981, e foi o responsável pelas mar-cantes trilhas de clássicos do cinema como Blade Runner (Blade Runner, o Caçador de An-dróides), 1492: Conquest of Paradise (1492: A Conquista do Paraíso) e Alexander (Alexandre).NOVA TRILHA

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10 / JUNHO 2014 teclas & afins

Durante a AES Brasil Expo, realizada em maio, em São Paulo, dois dos maiores co-nhecedores de sintetizadores no Brasil - Miguel Ratton, da Informus Music Center, e Vinicius Brazil, da VBrazil Sys-tems – apresentaram palestra discutindo as tecnologias uti-lizadas no desenvolvimento dos diferentes tipos de equi-pamentos e as tendências tanto em termos de pesquisa quanto de mercado.

Para exemplificar, Vinícius apresentou o sintetizador modular fabricado por ele, que, ao lado de outros fabricantes nacionais, investe no desenvolvimento de soluções customizadas.

INTERFACE

A tradicional escola e loja de instrumentos musicais inaugura em junho as novas insta-lações no ABC, mais precisamente em Santo André. Será a primeira loja da região espe-cializada em pianos acústicos - com as mar-cas Fritz Dobbert, Yamaha e Kawai - além de oferecer órgãos, teclados, pianos digitais e instrumentos de sopro e percussão.A escola contará com seis salas de aula, com tratamento acústico e ar condicionado, e uma equipe de professores formados nas mais renomadas instituições do país. A rela-ção de cursos oferecidos inclui Musicaliza-ção Infantil para crianças a partir de quatro anos, Violão, Guitarra, Bateria, Teclado, Órgão, Violino, Flauta Transversal, Saxofone, Canto e Piano. As aulas são individuais e o aluno pode participar das turmas de teoria. A partir do mês de julho, os interessados, alu-nos ou não, também poderão participar das aulas de coral. Mais informações podem ser obtidas pelo site www.intermezzo.com.br.

INTERMEZZO ABC inaugura novo espaço

Sintetizadores: tecnologias e tendências

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JUNHO 2014 / 11 teclas & afins

Conheça as publicações da

www.editorasomearte.com.brContato: [email protected]

Visite nosso site para conhecer melhor os 3 Métodos e os 3 Repertórios

SOM & ARTEE D I T O R A

INICIAÇÃO AO PIANO POPULAR Volumes 1 e 2

LANÇAMENTOInéditos na área do piano popular, são livros dirigidos a adultos ou crianças que queiram iniciar seus estudos de piano de forma agradável e consistente.

MÉTODO DE ARRANJO PARA PIANO POPULAR

Volumes 1, 2 e 3

Ensinam o aluno a criar seus próprios arranjos.

Trazem 14 arranjos prontos em cada volume para desenvolvimento da leitura das duas claves (Sol e Fá) e análise dos arranjos.

REPERTÓRIO PARA PIANO POPULAR

Volumes 1, 2 e 3

INTERFACE

Tecladista, produtor e arranjador, o brasileiro Renato Neto - após duas déca-das morando em Los Angeles - lança o CD Plugins Amazônicos. O álbum é o primeiro trabalho-solo da carreira do instrumentis-ta, que já tocou com Prince, Rod Stewart e Tim Maia, entre outros. O projeto é o re-sultado musical de uma extensa pesquisa sobre povos indígenas e animais do Norte e Nordeste do Brasil, e reúne ritmos de tri-bos da Amazônia e artistas do Norte do país. Além da instrumentação formada por piano acústico, teclados, percussão, baixo acústico e elétrico, violoncelo, viola, dois violinos, baixo, clarinete e sax soprano, o músico incluiu no CD as sonoridades de 270 espécies de pássaros da Amazônia. O álbum pode ser adquirido nas unidades e pelo site do SESC.

Renato Netoe os indígenas

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12 / junho 2014 teclas & afins

VITRINE

O KDP90, da Kawai, é um piano digital de 88 teclas com mecanismo Advanced Hammer Action IV-F™ e quatro tipos de toque (Normal, Light, Heavy e Constant). Com polifonia de 192 notas e 15 sons, o modelo possui os recursos transposição, dual, afinação, quatro mãos e metrônomo, além de funções MIDI e Reverb (3). O gravador digital com capacidade de três músicas e aproximadamente 15.000 notas traz embutidos os cursos Burgmuller e Czerny na função Estudo. Três pedais (Sustain, Soft e Sostenuto), com half pedal, MIDI IN/OUT e duas saídas para fones de ouvido completam o instrumento.

ROLAND DP90Se / DP90eRoland - www.roland.com.br

A série DP90, da Roland, apresenta o aclamado mecanismo de som de Piano SuperNATURAL e teclado PHA-4 de toque ultrassensível, além da nova função Individual Note Voicing que permite personalizar cada nota do piano ao gosto do

executante. O efeito Headphone 3D Ambience proporciona um campo sonoro rico e envolvente para utilizar fones de ouvido para estudar . A compatibilidade com as aplicações para piano da Roland para dispositivos Apple iOS ajuda a motivar o interesse na aprendizagem do piano. O equipamento oferece ainda suporte integrado com sistema de áudio incorporado, metrônomo e gravador, entre outras funções.

Toque nos produtos para acessar vídeos, informações e muito mais!

Kawai KDP90 Kawai - www.fritzdobbert.com.br

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junho 2014 / 13 teclas & afins

VITRINE

O teclado arranjador Pa50-SD, da Korg, oferece geração de som proveniente do sistema TRITON HI (Hyper Integrated System). Todos os sons clássicos - e particularmente os sons de solo como saxofone, trompete, flauta, guitarra e piano - foram incrementados. Além disso, o teclado apresenta uma seleção especial de timbres de acordeão e sanfona. Estão disponíveis 160 memórias de Performances para armazenar configurações, incluindo seleção de sons, transposição de tonalidade, andamento, efeitos etc. além dos modos Style Play e Song, funções Easy Program Edit, quatro processadores e 89 efeitos, e uma seção completa de edição que permite editar e criar Programas e novos Drum Kits. E, para completar, uma bag é oferecida promocionalmente com o produto.

O KORG Pa600 é um teclado arranjador profissional compacto e acessível que permite incluir até mesmo conjuntos

de sons e performance (comercializados separadamente) provenientes de todo o mundo. Assim como seus irmãos maiores - o Pa800 e o Pa3X -, o Pa600 usa as tecnologias RX (Real eXperience) e DNC (Defined Nuance Control) para proporcionar qualidade de som sem precedentes em um teclado arranjador. Com gabinete compacto, amplo display TFT colorido TouchView, grande memória de fábrica para timbres e de usuário e banco de dados e de estilos, e excelente sistema de amplificação, o Pa600 oferece mais de 360 Styles de fábrica, cada um incluindo três Intros/Endings, quatro Variations e quatro Fill In + Break, além de dez Favorite e três bancos User para armazenamento dos Styles personalizados.

KORG Pa50-SDPride Music – www.korg.com.br

KORG Pa600Pride Music – www.korg.com.br

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14 / junho 2014 teclas & afins

VITRINE

O coletivo paulistano Clube do Balanço apresenta uma bem temperada porção de influências que tem um único objetivo: animar os salões de dança. Não à toa, as músicas foram selecionadas junto ao publico, nos ensaios abertos em que a banda montava os instrumentos no chão do teatro e deixava o espaço do palco para os dançarinos de samba-rock. Inteiramente autoral, o repertório do disco apresenta dez músicas inéditas. Destaque para as performances de Marcelo Maita nos pianos elétricos Wurlitzer e Rhodes e no órgão Hammond, que em faixas como “De Chinelo” - em que apresenta algumas das referências que a banda tem - e “Don Bocato” em que solos e camas são bem dosados, reverenciando a black music tupiniquim e seus formadores. (NC)

Os trabalhos do pianista Fernando Moura sempre se destacarm pelo inconformismo em relação às fórmulas consagradas e pela grande criatividade, embasada no conhecimento profundo de seu instrumento. Este +Piano não poderia ser diferente. Trazendo, em suas 23 faixas, músicas compostas para os filmes Paixão e Virtude e Stefan Zweig - Paraíso Utópico - ambos do diretor Ricardo Miranda -, o instigante Moura explora as possibilidades do piano acústico embaladas por discretas sonoridades eletrônicas. Denso e coeso, o álbum apresenta um compositor maduro, que domina como poucos a arte de tecer diferentes ambiências para a tela grande sem se afastar de seu filão principal: a música de qualidade, para pessoas inteligentes. (NC)

Menina da JanelaClube do BalançoYBmusic

+PianoFernando MouraTratore

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junho 2014 / 15 teclas & afins

VITRINE

Sem a pretensão de ser uma biografia, Solo, de Cesar Camargo Mariano, é um passeio pela vida de uma dos mais destacados artistas brasileiros, intimamente associado à história da música em nosso País. O texto de fácil leitura e as ilustrações (duas das aptidões menos conhecidas de Mariano) percorrem a trajetória do músico, sem se prenderem a datas, mas a fatos que marcaram sua trajetória desde a descoberta da música e do piano até a consagração mundial como compositor e arranjador. O livro apresenta um panorama bem completo dos trabalhos e dos grandes nomes, principalmente da música brasileira, que, não coincidentemente, cruzaram o caminho do pianista e tecladista. Leitura imperdível! (NC)

Solo - MemóriasCésar Camargo MarianoEditora Leya464 páginas

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16 / junho 2014 teclas & afins

Fender Rhodes: sonoridade incomparável

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junho 2014 / 17 teclas & afins

Estamos em 2014. E seja no rock, no pop, no jazz, no hip hop, no acid jazz ou em qualquer outro estilo, a sonoridade única do Fender Rhodes está mais popular do que nunca. Segundo grandes músicos, isso se deve ao fato de que ele é perfeito tanto para acompanhamentos quanto para solos. Seu timbre é extremamente suave quando são tocados acordes longos. E curto e encorpado quando percutido rapidamente em solos. Não existiu nenhum grande pianista ou tecladista que, ao longo desses 50 anos, não o tenha usado pelo menos uma vez. Experiências com o timbre original e limpo foram feitas. Os músicos experimentaram adicionar efeitos como chorus, flanger, delay, distortion e phaser, entre muitos outros, criando sons que variavam do funky ao profundo smoothly. Para ter uma idéia de como esse instrumento foi explorado e adorado nestes últimos anos de existência, muitos teclados e softwares tentam simular seu timbre original, alguns com considerável sucesso. Igual a colecionadores de carros, ter um Fender Rhodes hoje significa para muitos possuir uma peça de arte!

memoria Por Alexandre Porto

RHODES - “ARMY AIR CORPS PIANO”Em 1942, terceiro ano da Segunda Grande Guerra, Harold Rhodes criou um pequeno piano de duas oitavas e meia (29 teclas) com o intuito de ensinar e entreter os soldados que se encontravam enfermos. O pequeno instrumento, construído a partir de velhos canos de alumínio usados no bombardeiro B17, podia ser colocado nas coxas dos pacientes. Ele era totalmente acústico e logo se tornou muito popular entre os soldados.Alguns poucos milhares foram fabricados e futuramente Harold seria premiado pelo seu feito. Nascia a idéia do piano Fender Rhodes.Após a guerra, a fábrica de pianos Rhodes foi concebida. E, em 1946, Harold apresentou o pré-piano, constituído de apenas três oitavas e meia. Suas peças incluíam as fornecidas por uma fábrica de campainhas, um microfone eletrostático, amplificador e um speaker de seis polegadas. Seu preço era de 99,5 dólares!Em 1959, na convenção anual da NAMM, Harold Rhodes lançou o Piano Bass, popularizado pelo famoso músico Ray Manzarek, do The Doors.

Na era dos samplers e sintetizadores de grande qualidade sonora, o piano elétrico Fender Rhodes continua presente

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18 / junho 2014 teclas & afins

Ray Manzarek e seu setup com o Rhodes Piano Bass

Modelos clássicos: Suitcase Piano e Stage Piano.

memoria

FENDER RHODES ELETRIC PIANOEntre os anos de 1959 e 1965, um piano elé-trico de 72 teclas, projetado a partir de um baby grand, entra em turnê demonstrativa e chama a atenção de Leo Fender, que com-pra a companhia. A partir de então ela passa a chamar-se Fender Rhodes.Mas, apesar das experiências de Harold, o Piano Bass ainda era o único instrumento do tipo no mercado. Durante essa época, Mr. Fender estimula o criador Rhodes a pes-quisar e a aprimorar suas idéias. Em 1965, a CBS compra a Fender Rhodes. Harold con-tinua na companhia e nesse período, final-mente, o primeiro Fender Rhodes Eletric Piano começa a ser fabricado.Os modelos eram constantemente modi-

ficados, o que tornava a sonoridade de cada um deles muito peculiar. No início, os martelos e as cordas quebravam freqüente-mente. Quem possuía um Fender, entretan-to, aprendia rápido como reparar e restau-rar o equipamento.

MODELOS CLÁSSICOSDois foram os modelos que ficaram mais conhecidos: o Suitcase Piano e o Stage Piano. Ambos pesavam os mesmos 63 quilos. Mas o Suitcase tinha seu cabinete provido de alto-falantes que ultrapassavam os 60 quilos. Seu transporte era feito em cases de vinil ou fibra. O primeiro deles, o Rhodes Suitcase Piano, fabricado entre 1965 e 1981, possuía 73 teclas, pesava 63 quilos (sem o amplificador) e era equipado com um cabinete composto de dois speakers. O piano não funcionava sem o cabinete, uma vez que a amplifica-ção (ativa) se encontrava nessa parte. Po-dia, porém, ser conectado a um amplifica-dor externo. O modelo possuía controle de graves e agudos e, em algumas versões, o efeito tremolo. Esses primeiros exemplares possuíam martelos de feltro. Futuramente, usariam martelos com pontas de neoprene. Em 1970, um mesmo modelo, mas com 88 teclas, estaria à disposição.

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junho 2014 / 19 teclas & afins

Para ouvirGeorge Duke e seu Fender Rhodes

Na década de 1970, a maioria dos pia-nistas e tecladistas usou Rhodes em gravações e shows. No jazz, Chick Corea, Herbie Hancock, George Duke e Joe Zawinul, entre muitos outros. No rock, está presente em todas as vertentes, de Doors e Beatles a Led Zeppelin, Yes e toda a turma do progressivo. No pop, Stevie Wonder e Steely Dan, notada-mante. Atualmente, está mais presente no pop, no drum’n’ bass e no hip-hop.

Stevie WonderInervisions

JamiroquaiReturn To Space Cowboy

Chick CoreaReturn To ForeverLight As A Feather

Brand New HeaviesHeavy Rhyme Experience

Billy Preston“Get Back”

Miles DavisNared And TrueEd Motta

DwitzaBill Evans

From Left To Right

Na mesma época, foi lançado o Rhodes Stage Piano, com opção de 73 e 88 teclas. Pesando os mesmos 63 quilos e possuindo saídas mono e estéreo, tornou-se famoso pelo topo arredondado que alguns acha-vam charmoso e outros, um incômodo, porque impossibilitava que se colocasse outro teclado em cima. A cada ano, o Mark I sofria modificações. As mais importantes foram na área de afinação e a substituição dos martelos de madeira por plástico. O preço na época variou entre 500 e 1,8 mil dólares.Em 1979, esse modelo seria substituído pelo Stage Piano Mark II, que passaria a ter seu topo reto. Existem significantes diferenças de timbre entre eles, tanto que os softwares e teclados tentam simular cada modelo. Com o desenvolvimento da eletrônica, mui-tos outros modelos foram fabricados.

GERAÇÃO SONORAO Fender Rhodes utiliza um sistema fisica-mente diferente do piano. A pequena “cor-da” de aço, chamada de “agulha”, depois de percutida, produz uma vibração. A obten-ção do timbre por completo se dá em con-junto com uma chapa de metal superior, que é a haste ou o “diapasão”. É justamente a vibração dessas duas peças que cria o som, que, por sua vez, é captado por uma bobina eletromagnética. Como definiu o

memoria

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20 / junho 2014 teclas & afins

memoria

técnico Gebran Sabbag, “o som é gerado pela perturbação do campo magnético no conjunto da corda com o diapasão”É importante notar que, quando se refere ao termo agulha ou corda, na verdade está se falando de um fio de aço de aproximada-mente 1,5 mm de espessura. O diapasão é uma chapa de metal. Ambos variam de ta-manho de acordo com a nota.

EFEITOS E AMPLIFICAÇÃOAntes de falar dos efeitos eletronicamente produzidos, vale ressaltar os distintos efei-tos conseguidos usando apenas o toque.As diferentes forças aplicadas ao teclado podem produzir inúmeras “cores” sonoras. Um dos mais expressivos e apreciados pelos jazzistas é quando se usa de grande força na tecla, produzindo um som forte com uma leve distorção natural. Os efeitos clássicos da época inicial do Rhodes eram MXR Phase 90 Phase Shifter, ART Tube MP Tube Preamp, Crybaby Wah Pedal, Dunlop TS-1 Stereo Panner (para efeito do vibrato do suitcase), Roland Space Echo Tape Delay e Mooger-fooger Analog Effects. Posteriormente, mui-tos músicos começaram a utilizar pedais. Entre os efeitos preferidos estavam stereo chorus, flanger, delay e phaser. É quase una-nimidade que os melhores amplificadores

para o piano são o Fender Twin Reverb e o Roland JC-120 Jazz Chorus. O Rhodes Super Satélite Speakers, para o som original do suitcase, e o Motion Sound Roary Speakers também são muito usados.

O MERCADO ATUALForam milhares de pianos fabricados ao lon-go dos anos e existem muitos Fender Rhodes no Brasil, até mesmo esquecidos em cantos de hotéis e estúdios de restauração de pia-nos ou de gravação. Qualquer desses instru-mentos, pela idade e pela diferente consti-tuição, irá sempre requerer reparos ou uma reforma completa. Em uma pequena busca na Internet podem ser encontrados preços que variam entre R$ 8.500 até R$ 15.000.

MANUTENÇÃO E REFORMAO Rhodes - apesar de ter a fama de ser difícil de desafinar - é de fácil afinação. Basta deslizar o arame que fica preso à cor-da para frente ou para trás a fim de obter a freqüência desejada. Ao examinar uma unidade, deve-se prestar atenção na parte mecânica da ação dos martelos. Ela tem de estar preferencialmente firme. Não se prenda a pequenas diferenças de timbres ou volume entre uma nota e outra. Isso pode facilmente ser acertado, ajustando-se o ângulo e a distância entre cordas e captador. No entanto, por conta das inúmeras modifi-cações feitas através dos tempos, nenhum Fender Rhodes costuma soar igual a outro. Nos primeiros anos de fabricação, alguns possuíam um som maravilhoso, enquanto outros, decepcionavam.É imporante lembrar que se está lidando com um instrumento de, pelo menos, 30 anos de idade. De acordo com o técnico Elias Rodrigues, uma restauração pode custar, em média, a partir de R$3.000. Mecanismo do Fender Rhodes

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memoria

Agradecemos as contribuições dos técnicos e restauradores que trabalham com compra, venda e restauração de pianos Fender no Brasil:Elias V. Rodrigues - Tel.: (11) 3208-4203 /99712-6298/99904-6298 - www.afinadordepiano.com.brDiego e Dennis Machado - [email protected] - Tel.: (11) 5031-7326Gebran Sabbag - [email protected] - Tel./fax (41) 353-1878

EMULADORESPara quem não faz questão de um teclado físico, mas quer o som do Rhodes em suas produções, algumas opções de simula-dores em software podem ser úteis, como o Emagic EVP 73 e EVP 88, o Mr Ray Seventy Three (freeware), o Scarbee Vintagekeys ou o Lounge Lizard.

Os Rhodes atuais, em compa-ração aos modelos antigos, apre-

sentam algumas diferenças de sonori-dade, pois, para muitos, é menos “Fat”. Mas

os novos modelos são mais coloridos e boni-tos! Visite o site www.rhodespiano.com e conheça

o Rhodes dos dias de hoje!Há também algumas opções no mercado que se dispõem a

oferecer som e toque realísticos do Rhodes para quem procura por um teclado moderno e robusto, porém leve, como o Clavia Nord

Electro e o Korg SV-1 Stage Vintage Piano, entre outros.

O QUE HÁ DE NOVO

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João Donato: personalidade desbravadora e modernidade precoce

materia de capa

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Comemorando seus 80 anos, João Donato é cultuado como gênio incompreendido - tanto no Brasil quanto no exterior - e continua ativo e visionário, criando, a seu modo, clássicos futuros da música internacional

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ação

O SIMPLES,SOFISTICADO

Quando João Donato deixou sua terra natal - Rio Branco, no Estado do Acre - com destino ao Rio de Janeiro, não podia imaginar que ali se iniciava uma carreira, se não inconstante, muito controversa. O menino de 11 anos chegou à cidade grande tocando acordeon e piano e, logo, começou a se apresentar em festas do colégio, onde conheceu o grupo Namorados da Lua e fez amizade com Lúcio Alves, Nanai e Chicão. Aos 15 anos, iniciou sua carreira profissional como integrante do grupo Altamiro Carrilho e Seu Regional, participando, algum tempo depois, da gravação de um disco em 78 RPM contendo a canção “Brejeiro”, de Ernesto Nazareth. O contato com o jazz ocorreu logo depois e Donato tornou-se membro do Sinatra-Farney Fan Club. Atuou em

casas noturnas, como Plaza - onde o titular era Johnny Alf -, Drink, Sacha’s e Au Bon Gourmet, entre outras. Logo fez amizade com Tom Jobim, João Gilberto, Luiz Bonfá e outros expoentes do movimento que ganhava corpo e ao qual influenciou definitivamente: a bossa nova. Entre os grupos que formou estão Donato e Seu Conjunto, Os Namorados, Trio Donato e Os Copacabanas. Em 1959, viajou para o México com Nanai e Elizeth Cardoso e dali foi para os Estados Unidos, onde permaneceu por três anos atuando com Carl Tjader, Johnny Martinez e Mongo Santa Maria. Excursionou com João Gilberto pela Europa e retornou ao Brasil em 1962, onde gravou os LPs Muito À Vontade e A Bossa Muito Moderna de João Donato e seu Trio.

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João Donato com seu acordeon, a orquestra de Mongo Santa Maria e o passeio com o amigo João Gilberto

Considerando-se incompreendido no Brasil por ser “moderno demais”, mudou-se para os Estados Unidos, onde ficou por mais de uma década. Lá, gravou com o saxofonista Bud Shank e com a violonista Rosinha de Valença, além dos discos Piano of João Donato - The New Sound of Brazil, A Bad Donato e Donato Deodato - Featuring João Donato arranged and conducted by Deodato, com arranjos de Eumir Deodato. Atuou também com outros artistas, como Astrud Gilberto, Dorival Caym-mi, Tom Jobim, Stan Kenton, Nelson Riddle, Herbie Mann e Wes Montgomery. Mas a música de Donato sempre foi con-siderada pouco comercial e popular. Em seu retorno ao Brasil, em 1971, prestes a gravar um disco, recebeu um conselho do cantor Agostinho dos Santos que lhe abriu as portas do sucesso por aqui: a de colocar letras nas músicas para cantá-las. A tarefa foi entregue a amigos do compositor, que escreveram as letras – às vezes mais de uma para a mesma melodia –, e resultou na gravação do antológico Quem É Quem, lançado em 1973, com canções como “Ter-remoto”, “Chorou, Chorou”, “Até Quem Sabe” e “Cadê Jodel?”. Em 1975, Donato retoma o formato, gravando o disco Lugar Comum, com as músicas “Naturalmente”, “Ê menina”,

“Xangô é de Baê”, “Tudo Tem”, “A Bruxa De Mentira”, “Deixei Recado”, “Que Besteira” e “Emoriô”, além da faixa-título e “Bananeira”. Apesar do sucesso, o mercado da época não assimilava mais o estilo de Donato, até mes-mo difícil de definir, e o músico ficou por quase 20 anos sem gravar, retomando aos registros apenas em 1996.Considerado um dos precursores e difusores da bossa nova, e ícone do gênero instrumen-tal, Donato é atualmente homenageado como um dos grandes compositores da música popular brasileira, com músicas gravadas por nomes como Gal Costa, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Tim Maia, Leny Andrade, Nara Leão, Maysa, Dóris Monteiro, Raul de Souza, Joyce, Bebel Gilberto, Simone, Fafá de Belém, Leila Pinheiro, Baden Powell, Zizi Possi, Adriana Calcanhotto, Angela Rô Rô e Nana Caymmi.Comemorando 80 anos em 2014, João Do-nato é reverenciado com homenagens por todo o Brasil, incluindo desde um piano comemorativo com sua assinatura a uma exposição multissensorial sobre sua vida e obra e gravações de shows, CDs, DVDs e uma série documental, entre outros, que deverão lançar mais luzes sobre a carreira do controverso compositor. Leia, a seguir, a entrevista que fizemos com o músico.

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Como iniciou a carreira como acordeonista?Na primeira gravação do Altamiro Carri-lho, quando ele gravou aquele chorinho, o “Brejeiro”, e me colocou para tocar com ele. Eu tocava acordeon na rádio Guanabara, onde Altamiro mantinha um regional. Então, quando ele foi gravar pela primeira vez, um 78 rotações ainda, me convidou para fazer parte do grupo. Gravei pela primeira vez aos 18 anos ou algo assim.

Por que você fez a transição para o piano?Foi uma consequência natural. Eu gostava do piano, desde pequeno, achava um instru-mento muito bonito, muito completo, com 88 teclas, que abrangia todos os instrumen-tos da orquestra, do grave ao agudo. Eu to-cava acordeon e achava incômodo ter que

carregar aquele peso para casa. Eu estava em Los Angeles, em certa época. Tinha viajado para lá com o acordeon debaixo do braço para fazer parte de um grupo de brasileiros que já estavam nos Estados Unidos: Carmem Miranda, aquele pessoal que tinha ido mui-to tempo atrás, como o Carioca, o Nestor, o Nonô. Mas não me adaptei com eles. Um belo dia, fiquei com preguiça de trazer o acordeon para dentro de casa e deixei no carro. Na manhã seguinte, já não estava mais lá. Aproveitei e nunca mais comprei outro. E nunca mais toquei acordeon também.

Nunca mais?Nunca. Fiquei no piano. Sempre foi um instrumento que me atraiu muito, desde pequeno. Eu ouvia minha irmã tocar aqueles

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João Donato e o piano que leva sua assinatura

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métodos do Hanon. Eu era três anos mais novo que ela que, bem novinha, estudava piano. Então, minhas primeiras ideias de música são das escalas dos métodos de prin-cipiante que minha irmã tocava e que me acordavam de manhã cedo. Depois que ela saía do piano, eu ia para lá brincar também. Procurava tirar algum sentido nas teclas e fui criando gosto pelo instrumento. Mas ganhei um acordeonzinho de brinquedo de Papai Noel (rs). Aí comecei a tocar “Ciranda Cirandinha”, “Cai Cai Balão”, essas coisas. Notaram minha tendência para a música e me coloaram para estudar piano. Comecei, então, com uma professorinha no Acre. Mas depois continuei, com o tempo, estudando em todos os lugares por onde ando. Procuro estudar um pouco com as pessoas do lugar.

Então sua experiência nos Estados Unidos, e aqui em São Paulo e Rio de Janeiro, com os músicos da noite, foi importante para desenvolver sua linguagem pianística?As experiências foram muitas. Teve o Noites Cariocas, aqui no Brasil, nos anos 50, quan-do comecei. João Gilberto, Tom Jobim, Johnny Alf, o pessoal da bossa nova, Carlos Lira, Roberto Menescal, Milton Banana, Ro-berto Carlos querendo dar canja nas boates.

E eu o incentivando, principalmente, a ir para a Europa, por que nem sempre éra-mos muito bem recebidos em todos os lugares. Essa época foi muito importante. Em seguida, fui para os Estados Unidos. Eu tinha muita dificuldade para achar trabalho aqui porque diziam que minha música era muito moderna para a época, muito disso-nante, muito isso, muito aquilo... Eu ouvia muito disco de jazz americano e sabia que lá se tocava do jeito que eu queria e aqui não tinha oportunidade de fazer. Então fui para os Estados Unidos, em um convite que teve para os brasileiros. Mas terminou nosso compromisso de quatro semanas em um lugar e, quando pensei em voltar, eles falaram: “não dá para voltar agora, porque nós mandamos uma passagem para você – eles compravam à prestação – você vai ter primeiro que pagar essa passagem”. Então fui ficando para pagar a passagem. Não ha-via trabalho. O pessoal com quem eu tinha ido me encontrar achava que eu era muito americanizado para o estilo deles. Eles toca-vam aquele estilo brasileiro bem “Carmem Miranda” e eu cheguei com as novidades da bossa nova. Eles acharam estranho e me deixaram para trás. Fiquei sozinho em Los Angeles, sem conhecer ninguém, a não ser

o Laurindo de Almeida. Eu o conhecia de nome e sabia que tocava com a orques-tra de Stan Kenton. Mas ele também não queira muita aproximação, porque, sabe como é, brasileiro que pro-cura outro brasileiro no ex-terior sempre precisa de al-guma coisa. Então, quando falei para o Laurindo que era brasileiro, compositor, pianista e tudo mais ele fa-lou: “Ah, manda suas músi-Joao Donato e Tom Jobim: turma da bossa nova nos Estados Unidos

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cas pelo correio” (rs). Ele não queria aproxi-mação. Fiquei perambulando pelos Estados Unidos sem nada, sem conhecer ninguém. Sofri um bocado lá, passei uns perrengues, uns apertos, mas acabei sendo contratado pela orquestra do Johnny Martinez, que era a big band que mais trabalhava em Los An-geles. Daí fui para a orquestra do Mongo Santa Maria, em Nova Iorque, onde fiquei por uns três ou quatro anos. Em seguida,

explodiu a bossa nova nos Estados Unidos e todos os brasileiros que foram para lá me procuravam para organizar um trio - piano, baixo e bateria - para acompanhá-los em diversos programas de televisão ou shows e gravações. Assim aconteceu com Tom Jo-bim, João Gilberto, Astrud Gilberto, Dorival Caymmi, todos passavam lá e me telefona-vam. Eu já estava entrosado com o pessoal de Los Angeles, tinha amigos americanos

João Donato: gravações antológicas pelos maiores nomes da MPB

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na (A Bossa Muito Moderna de João Donato e seu Trio). Esses discos já tinham história. Agora, eu gravaria com letra. E foi o que aconteceu. Segui o conselho do Roberto Menescal: “para que você vai fazer músicas novas? Pega as que você já tem, diminui o andamento e coloca letra”. Eu tinha mui-tas músicas gravadas como instrumental. E elas foram mudando de nome de acordo com as letras. “Índio Perdido” virou “Lugar Comum”, “Villa Grazia” se transformou em “Bananeira”, “Jodel” ficou “Café com Pão”. Aí as coisas começaram a acontecer de forma mais popular: “Simples Carinho”, “Até Quem Sabe”, que foi gravada por muitos cantores brasileiros, “Emoriô”, “Nasci Para Bailar...

Mas suas melodias já favoreciam a coloca-ção da letra...Tenho uma síndrome repetitiva, minha música soa meio repetitiva. Ela tem uma cé-lula que se repete como se fosse um loop ou um refrãozinho. É disso que gosto, essas repetiçõezinhas que se apresentam como se fossem uma coisa primária, bem simples. Mas dizem que o mais simples é bem com-

com descendência de mexicanos como Ralf Peña (contrabaixista) e Chuck Flores (baterista).

Apesar de a bossa nova acontecer aqui, você já estava fazendo bossa nova lá....O problema é que eu era sozinho. E era com-plicado eu poder me expressar sozinho com músicos estrangeiros. Não tinha brasileiro al-gum comigo. A vantagem do Sergio Mendes foi que ele chegou com o conjunto todo brasileiro. Aí era mais fácil tocar e aquela música ter um sentido interessante. No meu caso, não. Eu tocava minha música, mas o contrabaixista era mexicano, o baterista não sei o quê... Aí a música ficava meio des-temperada. Era complicado para mim. Tive que apelar para os artistas latinos, mas eu não sabia tocar o estilo. Aprendi um pouco, praticando esse negócio diariamente. Então chegou a bossa nova...

Por que voltou ao Brasil?Depois que eu me separei, que nada mais me segurava nos Estados Unidos, fiquei sem motivação de permanecer por lá: “já co-nheço isto aqui, já sei como é, já descobri que jazz não existe assim tão facilmente”. Eram poucos lugares e muitos músicos que-rendo tocar. E a maioria dos intervalos era para orquestras latinas, como Perez Prado, Tito Puente, Machito. Quando voltei para o Brasil, o Agostinho dos Santos me disse para colocar letras nas músicas: “ninguém canta suas músicas por que elas não têm le-tra”, me disse. E eu estava prestes a gravar um disco...

O Quem é Quem...Isso. Ele tinha toda a razão. Caí de cabeça nesse projeto de gravar um disco cantando, além de tocando piano. Eu já tinha gravado o Muito À Vontade e o Bossa Muito Moder-

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plicado. Escolas de filosofia por aí dizem que o simples é o complicado sofisticado. Gosto dessa coisa e é nesse simples que está a com-plicação toda. Meu compositor preferido, por exemplo, é Debussy, que é o mais simples de todos e, ao mesmo tempo, o mais com-plicado, porque a harmonia dele é absurda até hoje e vamos descobrir os acordes dele e usar ainda por muito tempo. Ele influenciou o jazz, a bossa nova, o popular americano. A harmonia dele é maravilhosa.

E como será o projeto sobre Debussy em que você está trabalhando?Será uma suíte sinfônica popular baseada em temas de Debussy e Ravel. Estou acres-centando meu piano, contrabaixo, bateria e percussão para tocar isso junto à orquestra sinfônica. A gravação deve ser feita no dia

20 de janeiro de 2015, abrindo as comemo-rações dos 450 anos da Cidade do Rio de Janeiro. Haverá vários trechos de “Pelléas e Mélisande”, “Prélude à l’après-midi d’un faune”, “La Mer” e “Jeux”, de Claude Debussy, e “Rapsodie Espagnole”, “Shéhérazade” e “Daphnis et Chloé”, de Maurice Ravel. São as partes que acho mais expressivas, tocantes, comoventes. É uma aventura audaciosa. Mas é bastante emocionante fazer.

Como foi a homenagem da Fritz Dobbert para as comemorações de seus 80 anos?Tenho um piano da Fritz Dobbert com minha assinatura. Me disseram que vão fazer alguns exemplares para colocar à venda. É feito com madeira enviada pelo governo do Estado do Acre, a Curupixá, que só cortam a cada 30 anos. É uma madeira amarela da Amazô-

Exemplos das melodias “em loop” de João Donato

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nia, muito bonita. Tenho um aqui, oferecido pela Fritz Dobbert e estou tocando com ele nos lugares onde é possível levá-lo. Mas não gosto de tirá-lo daqui, pois é muito compli-cado e vai chegar um momento em que ele estará todo riscado.

Como vê o panorama atual da música brasileira? Está estagnada. Na época da bossa nova houve uma renovação: mais melodia, mais harmo-nia, um jeito de cantar diferente. Depois, pas-saram a cantar gritando. Agora abaixou um pouquinho, mas a música está estagnada. Sinto falta de inspiração nas composições. Es-pero que venha uma nova onda.

Quando você iniciou, os centros musicais

eram São Paulo e Rio de Janeiro. Atual-mente, um jovem músico do Acre teria que sair de lá para fazer sucesso?Rio e São Paulo permanecem. Há Minas também, Bahia... Pernambuco também é interessante, mas a grande quantidade de acontecimentos é em Rio e São Paulo. Ainda é assim. Os músicos do nordeste vem para cá, de todos os Estados. Aqui se tem maior exposição na mídia. A maior parte do tem-po em que estou trabalhando no Brasil, é em São Paulo.

Como definiria sua música?Eu diria que é um jazz brasileiro, uma mistu-ra de várias influências. Há quem diga que é um estilo “Donatiano”, mas não posso dizer isso. Diria que é um jazz latino brasileiro.

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Assinatura na tampa do piano em comemoração aos 80 anos do músico

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Jon Lord:rock na veia e erudito na alma

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O pioneiro da fusãoJon Lord deixou sua marca, principalmente, como integrante de uma das bandas mais emblemáticas da história do rock ‘n’ roll: o Deep Purple. Mas sua atuação e importância ultrapassam em muito essa fronteira

Todos aqueles que se dedicam ao estudo da música, principalmente dos instrumentos de teclas, são apreciadores, fãs fervorosos ou, no mínimo, curiosos a respeito deste ícone. E, de uma forma ou de outra, já tiveram contato com sua obra. Jon Lord nasceu em Leicester, em 9 de junho de 1941, filho de um saxofonista amador. Estudou piano erudito dos 5 aos 17 anos, tendo como primeiro professor Frederick Alt. Esses estudos lhe municiaram de uma forte influência erudita, utilizada por ele em toda a carreira. Composições, arranjos, solos ao órgão, piano ou teclados eletrônicos sempre tiveram a marca da música de concerto. Em 1960, se interessou por teatro e mudou-se para Londres, ingressando na Central School

of Speech and Drama, onde garantiu uma bolsa de estudos. Participou de grupos de teatro amador e do coral da escola antes de ingressar profissionalmente na música. Isso ocorreu somente em 1963, quando se juntou a Blood Red e seus Bluesicians e adquiriu seu primeiro órgão. No ano seguinte, ocupou o lugar de tecladista na banda Artwoods, liderada por Art Wood (irmão do futuro Rolling Stone Ronnie Wood), onde permaneceu por quatro anos - período em que o grupo lançou vários singles e EPs, e Lord se tornou um músico de estúdio muito procurado, tendo participado de gravações com nomes como Elton John, John Mayall, David Bowie, Jeff Beck e The Kinks (com “You Really Got Me”).

POR CRISTIANO RIBEIROmestres

Setups: Hammond, Clavinet, ARP String Ensemble e dois ARPs Odyssey (esquerda) e Hammond, Minimoog, Memorymoog, EMU Emulator II e Yamaha CP70 (direita).

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DEEP PURPLEO capitulo mais importante da vida de Jon Lord, no entanto, estava para começar. Sua história está fortemente atrelada à da banda Deep Purple. Considerado fundador de um dos mais importantes grupos de rock de todos os tempos, foi ele quem procurou Ritchie Blackmore com um vago projeto de formar uma banda. Os dois tinham em comum constantes trabalhos no meio musical de Londres, além de bebedeiras

quando o trabalho era escasso. O guitarrista, por sua vez, foi atrás de um baterista, colega das temporadas de Hamburgo, chamado Ian Paice. O próximo passo seria encontrar um baixista. Lord citou em algumas entrevistas que, na época, até pensou em tocar o baixo na pedaleira do órgão, como o Doors fazia, mas decidiu ficar livre pra improvisar usando o Hammond como teclado independente. Por último, decidiram buscar por um cantor, pois o trio não primava pelos dotes vocais.

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Jon Lord durante as gravações de Concerto for Group and Orchestra, em1969.

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Com um anúncio de jornal, encontraram Rod Evans (vocal) e Nicky Simper (contrabaixo), que completaram a primeira formação do Deep Purple, com duração de dois álbuns. No terceiro disco, quem assumiu os vocais foi Ian Gillan. Para o contrabaixo, a banda passou a contar com Roger Glover. Essa foi a formação mais idolatrada e bem-sucedida comercialmente na história do Deep Purple. A banda teve outros integrantes, gravou dezenove álbuns, percorreu o mundo e teve vários sucessos emplacados nas rádios, além de angariar diversos prêmios e discos de ouro e platina. Jon Lord fez parte da banda de 1968 a 1976, ano em que o grupo resolveu interromper as atividades. Quando decidiram pelo retorno, em 1984, Lord assumiu novamente os teclados, permanecendo até 2002.

OUTROS TRABALHOSAlém do Deep Purple, Jon Lord integrou a banda Whitesnake – embora, posteriormente, tenha declarado que não se sentia como inte-grante, mas sim um músico de apoio, fato que não o incomodava. Mas é notável uma menor participação de seus teclados na banda, em-bora não menos importante. Jon também tocou com alguns amigos como George Harrison (Troppo Gone, de 1982), David Gilmour (About Face, de 1983), Cozy Powell (Octopuss, de 1983), Alvin Lee (Detroit Diesel, de 1986) e, em 1985, fez uma breve aparição como membro do The Singing Rebels Band - que contou com Eric Clapton, George Harrison e Ringo Starr - no filme Water. Também excursionou como membro da banda Olympic Rock & Blues Cir-cus, liderada por Pete York e com formação alternada de Miller Anderson, Tony Ashton, Brian Auger, Zoot Dinheiro, Colin Hodgkin-son, Chris Farlowe e outros. A banda excur-sionou principalmente na Alemanha entre 1981 e 1989.

CARREIRA-SOLOJon Lord sempre teve trabalhos-solo paralelos às bandas. Em sua discografia, constam nada menos que 16 álbuns, três singles e uma compilação. Grande parte dessa produção era dedicada a músicas para banda e orquestra, em sua maioria misturando o erudito com o rock. Entre várias peças, se destaca o “Concerto para Grupo e Orquestra”, composto em 1969 e executado pela Royal Philarmonic Orchestra de Londres, conduzida por Malcom Arnold, e pelo Deep Purple, naquele mesmo ano. Em 1999, quando o “Concerto” completou 30 anos, o Deep Purple voltou a executá-lo, no mesmo local, com a London Symphony Orchestra conduzida por Paul Mann, em dois concertos esgotados no Royal Albert Hall, gravados e lançados em CD e DVD para vendas, atingindo mais de 500 mil cópias. A banda saiu em turnê entre 1999 e 2000, tocando com orquestras do mundo inteiro, inclusive no Brasil (em 2009, este concerto foi executado por Lord com a Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo, conduzida pelo regente Rodrigo de Carvalho, na virada cultural).Em 2002, Lord tomou, talvez, a mais difícil decisão de sua carreira, a de sair do Deep Purple, pois sentia grande necessidade de

Foto de divulgação do álbum Beyond The Notes, de 2004

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Jonathan Douglas LordNascimento: 9 de junho de 1941, em Leicester, InglaterraMorte: 16 de julho de 2012, em Londres, InglaterraGênero: Hard rock, heavy metal, blues-rock, música eruditaInstrumentos: órgão, teclados, piano, voz, baixoPeríodo em atividade: 1956 a 2012Gravadoras: Purple Records, EMI, HarvestGrupos: Deep Purple, Whitesnake, Paice, Ashton & Lord, The Artwoods, The Flower Pot Men

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NA REDEse dedicar ao trabalho-solo. No website oficial do músico (www.jonlord.org), há o relato da situação: “em 2001, eu estava começando a perder o sono, não parava de pensar em como fazer as duas coisas cor-rerem em paralelo: ficar no Deep Purple e ainda ter tempo para me concentrar e es-crever o tipo de música que estava cada vez mais em meu coração. Foi a mais lon-ga e difícil decisão da minha vida deixar a banda que eu tinha fundado e que tinha amado por quase 35 anos.”

LEGADO O mais destacado legado de Jon Lord é sua contribuição ao rock ‘n’ roll. Foi nesse gênero que deixou sua grande marca na história da música. Ninguém usou tão bem teclados, pianos e órgãos dentro desse estilo (mais propriamente no Hard Rock). Ele imprimiu uma personalidade musical tão forte, que até hoje é influência para tecladistas, e ainda o será por muito tempo.Quando se fala em Jon Lord, logo vem à mente a imagem do organista. Mas ele dominava com maestria um vasto campo nas teclas. Usava e dominava sintetizadores como os ARP e os Moog, além de pianos RMI, Rhodes, Wurlitzer, Hohner Clavinet e acústicos. Posteriormente, se rendeu aos instrumentos digitais, como Korg M1, Yamaha DX7, Kurzweil K2000 e K2600 e pianos da linha RD da Roland. Mas sempre acompanhado de seu inseparável Hammond.Hoje parece simples criar um universo formado por estilo, timbres, arranjos, riffs e composições, afinal, a rede mundial de computadores oferece muita informação. Mas no século passado, isso foi fruto de muito estudo e pioneirismo. Ligar um Hammond em um amplificador Marshall? Usar pitch shifter no órgão e distorção no piano Rhodes? Misturar blues,

erudito e jazz com pegada rock? Tudo isso foi invenção e matéria-prima de Jon Lord! Mesmo que alguém tenha criado isso antes, quem colocou essas sonoridades em evidência, sem dúvida, foi ele, desbravando o caminho das teclas no rock’n roll como ninguém. Além de exímio instrumentista, Lord foi uma figura muito querida no meio artístico. A maioria dos que conviveram com ele o cita como um grande companheiro, gentil, de muitas convicções, enérgico na dose certa, mas um cavalheiro na maior parte do tempo. Sua obra ficará marcada na história da música como a figura do tecladista chacoalhando o órgão Hammond em solos esfuziantes. Mas seu legado vai muito além. Composições, arranjos e riffs estarão sempre ecoando e repercutindo pelo mundo.

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Jon Lord e Rick Wakeman

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“Highway Star”Trecho do solo

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Transcrição de Cristiano Ribeiro

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Geralmente, nas transcrições deste solo de “Highway Star”, há muita confusão nos arpejos. Normalmente são simplificadas, com apenas uma mão executando esse elemento. Mas de fato são dois arpejos que, com um pouco de estudo, é possível executar juntos. Quem tem um órgão com dois “manuais” (duas seções de teclas - up

e down) pode executar ambos na mesma região, usando os dois teclados com timbragem semelhante dos drawbars, pode usar dois teclados ou, até mesmo, splitar um órgão com outro timbre de órgão em uma workstation. O ideal é que tenha distorção e uma registração de drawbars próxima de 888800000.

Deep Purple embarcando para turnê

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DISCOGRAFIA-SOLO

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Gemini Suite (1970 e 1971)Purple Records O álbum foi gravado primeiramente ao vivo, em 1970, com a então formação do Deep Purple (Lord, Blackmore, Gillan, Glover e Paice) e a orquestra Light Music Society, regida por Malcom Arnold. O disco de 1971 foi gravado em estúdio com alguns outros músicos, como Albert Lee nas guitarras, e Tony Ashton e Yvonne Elliman nos vocais além de Lord, Piace e Glover, A orquestra foi a London Symphony Orchestra conduzida por Malcom Arnold. O disco Concerto For Group and Orchestra gravado pelo Deep Purple com a Royal Philarmonic Orchestra conduzida por Malcom Arnold, lançado em 1969, não foi muito bem recebido pelos fãs da banda, o que levou Jon Lord a se decidir por trabalhar paralelamente suas peças orquestrais e lançar este álbum, que já estava em projeto, como de carreira-solo.

Windows (1974) Purple Records, EMI ElectrolaGravado por Jon Lord, David Coverdale, Tony Ashton, Glenn Hughes, Pete York, Ray Fenwick e a Orquestra de Câmara da Ópera de Munique conduzida por Eberhard Schoener.

Sarabande (1976)HÖR ZU, EMI Electrola, Purple RecordsGravado por Jon Lord (teclados), Andy Summers (guitarra), Paul Karass (baixo), Mark Nauseef (percussão), Pete York (bateria) e a Philharmonia Hungarica regida por Eberhard Schoener.

Before I Forget (1982)Harvest É um álbum sem orquestra, e nele há mais uma particularidade: Lord usou mais sintetizadores. A maior parte das músicas é de faixas de rock tradicional e baladas ao piano acústico acompanhado pelo duo de vozes, Vicki Brown e Sam Brown (esposa e filha do artista Joe Brown) e o vocalista Elmer Gantry. O álbum também conta com Simon Phillips, Cozy Powell, Neil Murray, Simon Kirke, Boz Burrell e Mick Ralphs.

The Country Diary of an Edwardian Lady Soundtrack (1984) Safari RecordsNeste álbum, Jon Lord assume só papel de compositor, ao lado de Alfred Ralston.

Pictured Within (1998)Virgin ClassicsDepois de dezesseis anos, Jon Lord lança um dos seus discos mais conceituais. Todas as músicas foram compostas, arranjadas e produzidas por ele. Gravado no Everest Estúdios e mixada por Frank Meyer, apresenta performances de Sam Brown, Miller Anderson, Pete York e Thijs van Leer, entre outros.

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Live At The Basement (2003)EMILançado em CD e DVD duplo, este álbum segue o estilo rock’n’blues. Foi gravado ao vivo, em Sidney, na Austrália, com participação da banda The Hoochie Coochie Men e de Jimmy Barnes.

Beyond The Notes (2004)Capitol Records, EMIJon Lord ao piano, no órgão Hammond e nos teclados, com participações especiais de Frida Lyngstad, Sam Brown, Miller Anderson, Thijs van Leer, Pete York e do conjunto de câmera norueguês Trondheim Soloists.

Danger: White Men Dancing (2007)Thompson Music, Edel RecordsCD e DVD de rock’n’blues, novamente acompanhado da banda The Hoochie Coochie Men (Bob Daisley no contrabaixo, harmônica e vocais; Tim Gaze nas guitarras e vocais e Bob Grosser na bateria), além das participações de Ian Gillan, Jimmy Barnes e Jeff Duff nos vocais.

Boom of the Tingling Strings(2008)EMI ClassicsPeça inspirada no poema homônimo de D.H. Lawrence executada por Nelson Goerner ao piano e a Orquestra Sinfônica de Odense regida por Paul Mann.

To Notice Such Things (2010) Avie RecordsLord compôs essa peça em homenagem ao falecido amigo Sir John Mortimer. Tem como instrumento-solo principal a flauta doce. Executada pela Orquestra Real Filarmônica de Liverpool regida por Clark Rundell, com Cormac Henry na flauta e o próprio Jon Lord ao piano.

Live (2011)Serious ComedyRetorno ao formato orquestra e banda, com Jon Lord (Hammond e piano), Steve Balsamo e Kasia Łaska (vocais), Darin Vasilev (guitarra), Ivaylo Zvezdomirov (contrabaixo) e Venko Poromanski (bateria) e Rousse Philharmonic Orchestra regida por Nayden Todorov.

Durham Concerto (2007)Avie Records Obra clássica encomendada pela Universidade de Durham e executada pela Orquestra Real Filarmônica de Liverpool regida por Mischa Damev.

Concerto for Group and Orchestra (2012) Ear MusicRegravação da peça executada pelo Deep Purple em 1969, no Estúdio Abbey Road com a Orquestra Real Filarmônica de Liverpool regida por Paul Mann. Participações de Bruce Dickinson, Steve Balsamo e Kasia Laska nos vocais, Darin Vasilev, Joe Bonamassa e Steve Morse nas guitarras, Guy Pratt no contrabaixo e Brett Morgan na bateria.

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42 / JUNHO 2014 teclas & afins

SINTESE POR ELOY FRITSCH

O controle do som no tempoNos sintetizadores, os geradores de envoltória servem para determinar o comportamento do som em um transcurso de tempo

O termo gerador de envoltória provém do inglês “Envelope Generator” e utiliza-se a abreviação EG, ou então, ADSR, que corres-ponde às quatro fases clássicas do EG: Attack, Decay, Sustain e Release. É possível também, encontrar o termo “Countor Generator” ou simplesmente as iniciais “Env”. A principal diferença entre o EG e as demais unidades moduladoras do som é que o EG é “trigado”. Isso significa que quando a tecla é pressionada, um sinal de disparo é en-viado ao EG para iniciar a alteração no som de acordo com as configurações do ADSR. E quando a tecla é solta, outro sinal é en-viado a ele para que finalize a atuação sobre o som. A unidade de EG não envia som aos

outros módulos sintetizadores, mas um si-nal de controle. Nos sintetizadores analógi-cos, esse sinal é um valor de voltagem e, nos digitais, um conjunto de bits.

ESTÁGIOS DO EGOs primeiros sintetizadores analógicos dis-ponibilizavam quatro potenciômetros, um para cada estágio do EG. Atualmente, esse formato ainda é usado para a maioria dos sintetizadores, mas alguns modelos pos-suem mais estágios, o que proporciona maior flexibilidade para o processo de con-trole do som no transcurso de tempo. Os es-tágios ADSR do EG encontrados na maioria dos sintetizadores são:

Release: controla o tempo que leva para a envoltória atingir o ponto zero após a tecla ter sido solta. Quando o EG modula o amplificador, este estágio determina por quanto tempo o som irá durar após a tecla ser abandonada.

A D SR

Max

TempoATTACK DECAY

Nota pressionada Nota solta

SUSTAIN RELEASE0

Am

plit

ude

As quatro fases do envelope ADSR clássico

Attack: controla quanto tempo a envoltória leva, partindo de zero, para atingir o nível máximo de saída do EG. No amplificador, ao pressionar uma tecla, o som poderá iniciar com ataque (como o som de piano) ou em um crescendo (como o som de violino tocado com arco em crescendo).

Decay: controla o tempo de decaimento do som. Se o valor de Sustain for zero, o término da envoltória é dado pelo final do estágio de Decay. Sons percutidos que não possuam sustentação podem ser construídos utilizando apenas os estágios de Attack e Decay.

Sustain: controla o nível de sustentação enquanto a tecla estiver pressionada. Quando o nível de Sustain for zero, o final do estágio Decay será o término da envoltória.

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JUNHO 2014 / 43 teclas & afins

Eloy F. FritschTecladista do grupo de rock progressivo Apocalypse, compositor e professor de música do Instituto de Artes da UFRGS onde coordena o Centro de Música Eletrônica. Lançou 10 álbuns de música instrumental tocando sintetizadores, realizou trilhas sonoras para cinema, teatro e televisão.

sintese

APLICAÇÃO DO EGA principal aplicação do EG é a de modu-lar o amplificador, o filtro e o oscilador do sintetizador. Quando o EG modula o am-plificador, ele controla o volume no tempo (Amp). Quando modula o filtro, ele controla modificações do timbre no tempo (Cutoff Frequency) e quando modula o oscilador, controla as modificações de altura no tem-po (Coarse tune). Quando o EG é ligado ao filtro, pode gerar um efeito de “Wah-wah”, mais rápido ou mais lento dependendo da regulagem do ADSR. Quando o EG é ligado ao oscilador, causa uma variação na altura do som, ou seja, quando uma tecla é pres-sionada, é possível ouvir um efeito de glis-sando, que também pode ser mais rápido ou mais lento dependendo da regulagem do ADSR.

PECULIARIDADESAlguns sintetizadores, como o Korg MS-20, o Korg MS-2000 e o Vírus Access (analógicos e de modelagem analógica), possibilitam programação fácil, permitindo que o ADSR possa ser modificado diretamente pelo

ajuste dos potenciômetros no painel. Outros modelos, disponíveis em Music Workstations, disponibilizam recursos gráficos que podem ser acessados por meio de botões de função e modificados pela movimentação de sliders no painel. Para os sintetizadores que não possuem facilidades para a programação do Gerador de Envoltória, recomenda-se o emprego de um software MIDI editor de timbres. O SoundDiver da Emagic, por ex-emplo, possibilita apresentar graficamente as envoltórias enquanto o músico programa como será o comportamento do som. Em alguns sintetizadores, a envoltória possui mais estágios do que o clássico ADSR. Em modelos da Roland, por exemplo, os estágios são denominados Time Level e possibilitam mais ajustes para regular o comportamento do som no tempo. No painel do JD-800, por exemplo, existe um conjunto de sliders dedi-cados e EGs específicos para o amplificador, o filtro e o gerador de ondas. Alguns sintetiza-dores da Korg apresentam as nomenclaturas Break Point (ponto de parada) e Slope Time (rampa) para um estágio e uma rampa a mais que o ADSR clássico.A regulagem da quantidade de modula-ção do EG pode ser feita por meio de um parâmetro denominado Envelope Depth (quantidade de envoltória). Valores altos resultam em maior intensidade da modu-lação ADSR sobre o som. Se o valor do En-velope Depth for nulo, o EG não altera o som. Valores negativos resultam no funcio-namento inverso do EG.

Unidade Gerador de Envolvente

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44 / junho 2014 teclas & afins44 / junho 2014 teclas & afins

TRILHA MUSICAL POR MAURICIO DOMENE

Uma trilha no meu caminhoCompor trilhas musicais não é apenas deixar a criatividade fluir. Na verdade, há bem menos espaço para ela do que se imagina

O que é trilha sonora? A expressão é parecida em várias línguas: Banda Sonora (espanhol), Soundtrack (inglês), Bande Sonore

(francês). Mas, por que “Trilha”? E por que “Banda”? Porque nos filmes, na película em que o fotograma com a imagem é fixado,

há um espaço na lateral (na banda) onde é gravado o som do filme. Daí vem, também, a expressão “trilha”. A tecnologia

mudou. O som se tornou digital, assim como o filme. A película já está em processo de extinção, mas o nome

permanece, da mesma forma que vários outros termos permaneceram, como fotograma, por exemplo.

Até agora não se falou de música, mas apenas de som. Na verdade, trilha sonora é o conjunto

de sons de um filme que inclui a música, os diálogos, as ambiências e os efeitos sonoros.

Portanto, o que o compositor cria não é a trilha sonora, mas a música do filme. Há algumas

variantes de termos que se pode usar para definir o trabalho do compositor: “música

original”, “música incidental”, “trilha musical”, “partitura original” (que só

aparece em artigos escritos por críticos ou em traduções, já que não é usado

no mercado brasileiro) e outros. Em pesquisa informal, os compositores

apontam uma preferência por “música original” ou simplesmente

“música” quando assinam um filme. Como isso está sempre

dentro de um contexto, fica claro que é a música do

filme. Mas quando falamos sem o contexto, é comum

acabarmos usando “trilha musical” como sinônimo

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junho 2014 / 45 teclas & afins junho 2014 / 45 teclas & afins

música deve ter, se há alguma alteração nessa emoção durante a música. Além disso, já há a definição de alguns pontos em que a música deve acentuar ou sublinhar etc. O compositor de trilha musical deve saber criar dentro desse conjunto de restrições ou indicações.

De que um compositor precisa?Além de saber compor em vários estilos e em uma ampla gama de emoções, o compositor deve dominar essas técnicas e vai precisar de alguns equipamentos. Atualmente, não é mais possível ser um compositor que somente escreve a música em um pentagrama que, depois, vai ser executada em uma sessão de gravação. Diretor algum vai querer descobrir dentro do estúdio que a música “não funciona” e que não era exatamente aquilo que ele queria. Todo compositor, portanto, tem que encontrar uma maneira de gravar um esboço (chamado de “mockup”) da música para aprovação, antes de gravar com músicos, se houver verba para isso. Um programa sequenciador que possa ser sincronizado com vídeo e uma livraria de samples de vários instrumentos, especialmente os de orquestra, são fundamentais para permitir que o diretor ouça a música - com certo grau de realismo - e possa aprová-la.

trilha musical

de “música inserida em uma obra audiovisual”. Mas por que é importante esta discussão e esta definição? Muita gente compõe música instrumental que se parece com música de cinema e diz que está compondo trilha musical. Mas trilha musical não é um gênero. Não é o estilo musical que a define, mas o fato de ser uma música composta para fazer parte de uma cena, acompanhando a ação dramática, os diálogos etc. Há uma infinidade de estilos musicais usados em filmes: Orquestral (o primeiro estilo que vem à mente quando falamos em trilha musical), Jazz, Rock, Eletrônico e outros. Tudo o que se pode imaginar já foi usado como estilo musical em filme e, muitas vezes, misturado. Não é o estilo que define o que é uma trilha musical: é o uso. A trilha musical é, por excelência, uma música utilitária, que serve a um propósito. Ela não obedece à pura inspiração do autor e não há liberdade criativa como a que existe em outras formas de música. O autor cria dentro de uma série de parâmetros estabelecidos em conjunto com o diretor e os produtores do filme. Antes mesmo de escrever a primeira nota, o autor já tem definido em qual estilo deve compor, quais sentimentos ou emoções deve provocar, quanto tempo de duração a

Wataru Hokoyama regendo a gravação da trilha musical do videogame “Afrika” com a Hollywood Studio Symphony

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46 / junho 2014 teclas & afins46 / junho 2014 teclas & afins

O processoTRILHA MUSICAL

1 Spotting SessionO diretor e o produtor se reúnem com o compositor para assistir o filme, discutir

o estilo e as intenções, e definir onde deve ter música e onde ela não deve ser colocada. Para cada música, (chamada de “cue”), é preciso definir: o momento do início (em qual time code); qual a emoção que ela deve atingir ou sublinhar; onde ela deve mudar; para o que ela deve mudar; onde deve terminar; e quais cenas ela deve acentuar. Essa reunião vai gerar uma lista de músicas e suas diretrizes.

3 ApresentaçãoO compositor apresenta as músicas para o diretor que, normalmente, faz algumas

observações, pede algumas mudanças, rejeita completamente ou aprova aquele cue.

4 AjustesO compositor volta ao estúdio e faz as alterações necessárias, se descabela de

raiva por aquela música que ele adora e que foi rejeitada (vida de compositor de filme não é só glamour) e volta ao ponto 2. Como o processo todo é sempre “espremido” em um cronograma apertado - já que a música é a última coisa a ser

feita em um filme e só pode começar quando o filme já está editado - não há tempo hábil para refazer a música inteira de um projeto. Então, por razões práticas, é importante fazer reuniões de apresentação e aprovação das músicas em blocos pequenos de alguns cues. Dessa forma, não se leva adiante um conceito equivocado.

2 ComposiçãoO compositor começa seu trabalho de criação, compondo, orquestrando e

gravando com samples para apresentar ao diretor para aprovação. Em grandes projetos - ou quando o compositor não tem essas habilidades

ou não há tempo para que uma pessoa faça tudo - é comum usar o talento de outros músicos, que podem fazer o papel de orquestradores ou de programadores MIDI. São pessoas que vão ajudar o compositor a completar seu trabalho.

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junho 2014 / 47 teclas & afins junho 2014 / 47 teclas & afins

6 MixagemAs fontes sonoras gravadas ao vivo ou em estúdio são combinadas. Os níveis de

sinal e os conteúdos de freqüência, dinâmica e posição panorâmica são manipulados e efeitos como reverberação adicionados.

Mauricio DomeneFormado pela Berklee em Music Composition for Film and TV, é compositor de trilha sonora premiado com atuação em cinema, TV, publicidade, teatro e outras plataformas. Tem dois álbuns instrumentais lançados: “Nuvens” e “Nuvens 2”. Foi colunista sobre Trilha Sonora na revista Home Studio.Foi professor de “Trilha Sonora” na grade do curso superior de Produção em Radio, Vídeo, Tv e Cinema da FMU/Fiam. Está à frente do Estúdio Next.www.estudionext.com.br

5 GravaçãoSessões de gravação com os músicos (quando for o caso).

Em alguns projetos pequenos, o compositor acaba fazendo tudo sozinho (compor, orquestrar, gravar, mixar). Portanto, é importante ter uma boa base dessas funções para poder sobreviver com esses projetos também.

trilha musical

Sessão de gravação de trilha musical com Aaron Moore na New York University

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48 / junho 2014 teclas & afins

livre pensar POR ALEX SABA

Porque “Jass”Jass ou Jazz? A origem e a grafia do nome confundem-se com a própria história do gênero. Ao ver um duplo “S” em vez do duplo “Z”, todos pensariam ser um erro. Mas não é o caso. Acreditem: esta grafia também é correta

Segundo Andres Francis, em seu livro “Jazz”, o termo teria origem quando da chegada das primeiras orquestras em Chicago. Os músicos sindicalizados da cidade fizeram o possível para impedir que os novos “colegas” se instalassem. Trataram sua música “suja” por todos os nomes, particularmente “Jass”’ ou “Jazz music”, o que, na gíria dos negros americanos de então, significava o coito e todas as variações da relação sexual. Ainda segundo Francis: “a palavra intrigou o pú-blico a tal ponto que o primeiro a utilizá-la como slogan publicitário (o músico branco Tom Brown), atraiu a curiosidade das multi-dões”. Particularmente acho essa colocação de Francis muito exagerada. As primeiras manifestações de Jazz (ou Jass) ocorreram por volta da década de 1910. Naquela época, uma referência dessas não causaria furor, mas sim horror e pânico. Eubie Blake, pianista que morreu centenário, explicou: “Nunca pronuncio a palavra “Jass” diante de uma dama; é uma palavra muito suja. Minha música é o ragtime”.Segundo François Billard (em “No Mundo do Jazz”), a divulgação dessa palavra aconteceu em parte com o lançamento, em 1916 ou 1917, do primeiro disco da Original Dixieland Jass Band (ODJB) e se tornou um achado comercial: “(...) adivinha-se que ela não descreve uma música e não pode traduzir um fenômeno musical bem anterior, do qual encontramos vestígios desde o início do século (inclusive na forma de discos)”.

Voltando a Eubie Blake, o pianista: “um dia, enquanto minha mãe trabalhava, eu estava tocando em casa. Ela era muito religiosa e, ao entrar de repente, gritou: ‘Não admito ragtime em minha casa!’ Na época, o rag-time era uma música de lugares mal afa-mados, bordéis, salas de fundo de bares”. Vê-se que o ancestral não era muito mais apresentável do que o descendente e que o termo Jass (ou Jas) não poderia ser uti-lizado com facilidade. O que acontecia é que um novo estilo de dan-ça estava se infiltrando no universo pop(ular) de então - povoado por foxtrot, black bottom, charleston, lindy hop, big apple, trucking en-tre outras, todas danças derivadas dos cabarés do Meio-Oeste e, mais tarde, dos salões do Harlem - e havia necessidade de rotulá-lo.

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junho 2014 / 43 teclas & afins

livre pensar

PreconceitoFrancis Newton, em “História Social do Jazz”, é mais claro: “(...) o termo Jazz (ou Jass, Jas ou Jaz) passou a ser usado como um rótulo genérico para a nova música de dança, já que poucos sabiam, até então, que esse era o termo de gíria africana para relação sexual.(...) O interessante a respeito dessa moda é que, desde o início, ela não era vista simplesmente como mais uma - e talvez monstruosamente deplorável - onda de música pop, mas como um símbolo, um movimento. Os moralistas, é claro, declararam guerra a ela imediatamente, mostrando, como sempre, uma fantástica incapacidade de resolver se sua objeção estava na associação com o submundo ou com as classes inferiores.”.

O autor cita ainda um “desabafo” publicado em 20 de junho

de 1918 no jornal The Times-Picayune, de

Nova Orleans, que vale a

transcrição: “Por que, então, a música de Jass e a banda de Jass? Pergunte-se, igualmente, o porquê da novela barata. Tudo é manifestação de um traço inferior do gosto humano, que ainda não foi consertado pelo processo de civilização. Na verdade, poderíamos ir mais longe e dizer que a música de Jass é a história indecente, sincopada e contrapontuada. Como as anedotas impróprias, ela também era ouvida com rubor, atrás de portas e cortinas fechadas, mas, como todos os vícios, se tornou mais ousada, até penetrar nos lugares decentes, onde também foi tolerada por causa de sua estranheza... Dá um prazer sensual maior do que a valsa vienense ou do que o refinado sentimento e a emoção respeitosa de um minueto do século XVIII. Em matéria de Jass, Nova Orleans está especialmente interessada, já que foi amplamente sugerido que essa forma particular de vício musical nasceu nesta cidade... Não reconhecemos a honra da paternidade, porém diante de tal história sendo propagada, caberá a nós sermos os últimos a aceitar tal atrocidade em meio à sociedade educada?”

Eubie Blake: pianista centenário

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44 / junho 2014 teclas & afins

Alex SabaTecladista, guitarrista, percussionista, compositor, arranjador e produtor com quatro discos instrumentais solo e um disco ao vivo com sua banda Hora do Rush, lançados no exterior pelo selo Brancaleone Records. Produziu e dirigiu programas para o canal TVU no Rio de Janeiro e compôs trilhas para esses programas com o grupo Poly6, formado por 6 tecladistas/compositores. Foi colunista do site Baguete Diário e da revista Teclado e Áudio. www.alexsaba.com.br

“O execrável Jazz tem de desaparecer!”, cla-mava o Ladies’ Home Journal em 1921. Um clérigo chamado Stephen T. Wise, assegu-rava que “quando a América recuperar sua alma, o Jazz desaparecerá - não antes. Vale dizer que será relegado aos sombrios locais de onde veio, para secar sem pena (...)”.Mas o Jass não só não desapareceu como buscou sair do gueto. Mais uma vez, Fran-cis Newton: “O concerto de Paul Whiteman, em 1924, destinado a estabelecer as cre-denciais acadêmicas para o ‘Jazz sinfônico’, mereceria todo o desdém dos caras real-mente bons, porém não houve oposição, pois a intenção era trazer o Jazz para o palco de concertos. (“Rhapsody in Blue”, de Gershwin, foi apresentada pela primeira vez naquela ocasião e é um exemplo res-peitável de música light influenciada pelo Jazz). O Jazz ansiava por um reconheci-

mento maior do que o de mera música de dança desde que havia surgido.”Hoje o Jazz é reconhecido (o que não sig-nifica que seja compreendido), é universal e não mais restrito aos “sombrios locais de onde veio”, distanciando-se do significado de uma velha gíria africana Jass.

Keith Emerson e Oscar Peterson: “Honky Tonky Train Blues”

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52 / junho 2014 teclas & afins

keynologia

Tipos e funçõesIniciamos aqui nossa jornada, que proponho ser interessante nos dias atuais em que temos um dilúvio de informações de todos os tipos. Vamos direto ao centro do mundo da programação, do sequenciamento, da criação de ritmos e de tudo mais que envolve a bagagem tecnológica de nossos teclados. Fiquem ligados, pois vamos entrar nesse universo maravilhoso da parte técnica dos nossos tão queridos “keyboards”

por hudson hostins

Mas para que tantos botões em um tecla-do? Vou usar todas as funções que estão no painel? Para que servem esses nomes es-tranhos? Se você já é tecladista, provavel-mente tem as respostas dessas perguntas. Mas, caso você esteja iniciando, vamos abordar aqui muitos diferentes aspectos!

Nada está ali por acaso. Tudo foi pensado para, de alguma forma, auxiliar os tecladis-tas do mundo todo em suas mais diferentes necessidades e, também, para novas for-mas de recriar música sob outras óticas. Os teclados existentes no merado se dividem em grupos com funções muito peculiares:

1 ArranjadoresOs teclados “arranjadores” se destacam pela capacidade de reproduzir os mais va-

riados ritmos e acompanhamentos para “a banda de um homem só”, formato em que, geralmente, os tecla-distas tocam sozinhos.

2 SintetizadoresOs “sintetizadores” são usados para a criação de sons e timbres;

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junho 2014 / 53 teclas & afins

keynologia

Hudson HostinsProdutor musical, tecladista e compositor, tem em seu currículo trabalhos para empresas como Roland, Michael, Korg e Yamaha.É proprietário de estúdio e produtora de áudio onde atende clientes como Beto Carrero World, Massa FM e Transamérica Hits, entre outras grandes empresas. Produziu vários artistas da região Sul do Brasil atuando com artistas expressivos da área. É, atualmente, tecladista do cantor Gabriel Valim.

3 ControladoresOs “controladores” são projetados para controlar programas e synths virtuais. A grande

maioria não possui sons internos, mas é provida de muitos botões endereçáveis, assim como de pads e sliders.

4 WorkstationsOs “workstations” são supermáquinas! Além

de ter um banco de sons geralmente grande, podem oferecer síntese, superfícies de controle, modos “Piano” e “Órgão” e uma infinidade de outras ferramentas, sendo a principal delas o “sequenciador”.

Chegamos ao ponto! Com um teclado worksta-tion, é possível produzir praticamente um disco inteiro. Existem modelos que pos-suem entradas de áudio de linha e, por ve-zes, de microfone, para captação de guitar-ras, baixos, vozes ou o que o músico desejar. Os workstations ainda possuem uma gama de efeitos para serem usados tanto na mi-xagem como na produção de timbres. A produção de timbres, aliás, é bem explorada nesses teclados, pois é possível alterar prati-camente qualquer parâmetro das amostras sonoras existentes nele.

Outra função que possuem é a de samplea-mento, ou seja, é possível capturar ou ler ar-quivos de áudio e direcioná-los às teclas de-sejadas, criando timbres e novas texturas.

Além desses, ainda há pianos digitais, órgãos, instrumentos eletromecânicos e modelos vintage. E, atualmente, ainda temos os iPads e os celulares touchscreen que estão dando o que falar na produção musical!

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ORGAOS E ORGANISTAS

Respeito ou ignorância?Em nossa conversa da edição anterior a tentativa de estabelecer uma definição sobre o que é um órgão mostrou contrastes interessantes e, por que não, instigantes. Seguindo essa mesma linha, acho oportuno conversarmos mais um pouco sobre os contrastes tão presentes no assunto “órgão”

por amador rubio

Trabalhando para uma empresa multinacional fabricante de órgãos, tive a felicidade de conhecer a planta da fábrica nos Estados Unidos. Embora conhecesse boa parte da Europa e alguns países africanos, nunca tive interesse ou vontade de conhecer a potência norte-americana. Mas ordens são ordens e lá estávamos nós, rumo à pequena cidade de Hillsboro, perto de Portland, no longínquo estado do Oregon, no noroeste americano.Tive uma grata surpresa sobre o que são os

EUA. O preconceito logo foi aniquilado e vi aquele povo e seu modo de vida nos seus melhores exemplos. A cidade era tipicamente americana em todos os detalhes: jantar delicioso às 17h30, toneladas de panquecas no breakfast, almoço sempre frio e ruim e somente carros Ford e GM. Nada de veículos japoneses. A esposa de um executivo da empresa havia comprado um Toyota Prius (híbrido) e estava sendo taxada como pervertida. FIAT então, nem pensar! Segundo

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junho 2014 / 55 teclas & afins

ORGAOS E ORGANISTAS

Amador RubioPianista, organista, professor e autor de adaptações de métodos para órgão. Com larga experiência na área pedagógica, tem agregado vasto conhecimento comercial, tendo atuado como Gerente de Produtos na Roland Brasil por sete anos. Foi responsável por grandes instalações dos órgãos americanos Rodgers no País (Sinagoga Israelita do Rio de Janeiro, Igreja Nossa Senhora do Brasil, UFRJ, Igreja Batista Renascença de Brasília etc) além de difundir os órgãos Roland Atelier no mercado nacional, conquistando uma importante fatia do mercado. Autor de adaptação de métodos de piano para órgãos Spinet sob encomenda da Tokai, tem lutado para o incentivo do estudo organístico no Brasil.

a explicação que recebi, a marca italiana queria dizer “Fix It Again, Tony” (conserta de novo, Tony). Propositadamente, exagerei nos exemplos para que, a essa altura, o amigo deva pensar: que povo ignorante! Pois é aí que entra o contraste citado no primeiro parágrafo. A empresa fabricava órgãos que simulavam o som de órgãos de tubos, o mais tradicional dos instrumentos. A região contava com inúmeras igrejas, sempre com um órgão para uso nos serviços religiosos. Como então algo tão não-tradicional poderia ser fabricado e comercializado nesse ambiente? Acontece que respeito não é sinônimo de ignorância.Os órgãos de tubos tinham suas limitações quanto à quantidade de registros, dificuldades para conservação etc. O órgão digital apareceu como uma ajuda, um complemento, uma salvação. Quando a consola do órgão estava muito danificada, era colocada uma nova, digital, acoplada aos tubos reais já existentes. Caso fosse necessário, novos registros poderiam ser incorporados, com caixas acústicas estrategicamente colocadas no meio dos tubos, escondidas, soando com o “antigo” órgão, enriquecendo-o, como um aliado e não como um inimigo. Fomos visitar instalações em muitas igrejas com esses órgãos híbridos e participávamos de um “game”: eram tocados dois registros e tínhamos que adivinhar qual era o digital e qual era o dos tubos reais. Margem de acerto: 50%.Ao desembarcar de volta ao Brasil, via as chances de usar a mesma estratégia, para não

entrar em conflito com algum purista. Houve muito apoio, infelizmente não traduzido em muitas vendas, mas não por objeção de organistas. Mas o contraste de respeito versus ignorância ficou bem claro nesta nossa mãe gentil. Em uma conversa, a detentora de uma relíquia prestes a ficar muda para sempre, quase chamou a polícia mineira quando sugeri que fosse feita uma análise para salvar o órgão moribundo. Parecia que Tiradentes estava se revirando no sepulcro! Fui audacioso: “a senhora prefere conservar um instrumento mudo do que oferecer a oportunidade de mostrá-lo para as pessoas como algo vivo e sublime?” A resposta foi: “só se mexe nisso depois que eu morrer!” Acho que ainda anda por lá... Pergunto: é respeito ou ignorância? A resposta é simples: o contraste é humilhante. Nos EUA, órgãos soando majestosamente engrandecem os cultos e reúnem famílias para concertos. Organistas brasileiros têm por ali passagem obrigatória em seus currículos, há grande quantidade de cursos em universidades e raramente se discute se o órgão é totalmente de tubos reais, se tem algum componente digital, se é digital etc.Por aqui, só vemos uma luta árdua de menos de uma dezena de organistas para tentar salvar o pouquíssimo que nos resta, mas sempre sofrendo algum desdém se descambarem para algum recurso digital. Igualzinho à esposa do executivo americano que quis comprar um Toyota – ainda por cima e-lé-tri-co! Valha-me Deus!

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56 / junho 2014 teclas & afins

HARMONIA E IMPROVISACAO

A Improvisação Horizontal na Cadência II-V-I

Uma moeda, duas faces. O aspecto melódico, representado pela horizontalidade (isto é, pela sucessão das notas no decorrer do tempo) e o aspecto harmônico, representado pela verticalidade (isto é, pelo grupo de notas que se apresentam simultaneamente, compondo um acorde), são como duas faces de uma mesma moeda, estritamente ligadas entre si. Isso significa que, em música, há sempre uma relação muito estreita entre um determinado acorde e a melodia daquele momento. Em uma visão mais ampla, existem sucessões de acordes que podem ser relacionadas a uma só escala. Essas sucessões são, por exemplo, as compostas pelos acordes do campo harmônico diatônico. Na edição anterior, falei da correlação escala-acorde no campo harmônico diatônico maior (veja a Figura 1).

Figura 1

Dando continuidade ao estudo proposto na edição anterior, neste número falaremos sobre a “abordagem horizontal” à improvisação melódica na cadência II-V-I. Falaremos, então, de melodia e de harmonia. Por quê? As duas coisas andam juntas? A resposta é sim!

por turi collura

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junho 2014 / 57 teclas & afins

HARMONIA E IMPROVISACAO

A cadência II-V-IEm música popular, a cadência II-V-I constitui um clichê harmônico característico, isto é, algo recorrente e, por isso mesmo, interessante de ser estudado. Esse movimento harmônico substitui o mais tradicional IV-V-I, cujos acordes possuem, respectivamente as funções de subdominante-dominante-tônica. O acorde II possui a mesma função do IV, ou seja, o de subdominante.A cadência II-V-I no âmbito maior, é composta, mais especificamente, pela sequência IIm7-V7-I. Veja a Figura 2, que apresenta essa sequência na tonalidade de Dó maior:

Figura 2

O que significa II-V-I?Trata-se de alguma mensagem em código secreto? Nada disso. Os algarismos romanos indicam a posição que aquele determinado acorde ocupa dentro do campo harmônico diatônico. A Figura 3 revela os detalhes:

Figura 3

OBSERVE: Pertencendo os três acordes ao campo harmônico diatônico, ao improvisarmos sobre esses acordes podemos utilizar uma única escala.

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58 / junho 2014 teclas & afins

Turi ColluraPianista, compositor, atua como educador musical e palestrante em instituições e festivais de música pelo Brasil. Autor dos métodos “Rítmica e Levadas Brasileiras Para o Piano” e “Piano Bossa Nova”, tem se dedicado ao estudo do piano brasileiro. É autor, também, do método “Improvisação: práticas criativas para a composição melódica”, publicado pela Irmãos Vitale. Em 2012, seu CD autoral “Interferências” foi publicado no Japão. Seu segundo CD faz uma releitura moderna de algumas composições do sambista Noel Rosa. Entre outras atividades, em 2014 Turi está ministrando cursos online em grupo, entre os quais os de “Piano Blues & Boogie”, o de “Improvisação e Composição Melódica” e o de “Bossa Nova”. [email protected] - www.turicollura.com - www.pianobossanova.com

HARMONIA E IMPROVISACAO

A improvisação horizontal na cadência II-V-IA princípio, vale a pergunta: o que é improvisação horizontal? No contexto que estamos analisando agora podemos dizer que:

“A abordagem horizontal se baseia em um pensamento linear, visando agrupar os acordes em áreas em que se pode usar uma só escala”.

Esse é o caso, por exemplo, da sequência II-V-I. Veja a Figura 4: as três escalas da sequência desse exemplo estão baseadas nas sete notas da escala de Dó Maior: Ré Dórico e Sol Mixolídio são escalas derivadas da escala Maior de Dó. Então, ao longo dos três compassos, pode-se pensar em uma só escala: Dó maior!

Figura 4

A seguir apresentamos algumas frases baseadas na escala de Dó maior sobre a cadênciaII-V-I.

Figura 5

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arranjo comentado por rosana giosa

Standard americano: canção“Summertime”

“Summertime” é uma ária composta pelo americano George Gershwin para a ópera Porgy and Bess, de 1935. Rapidamente se tornou um jazz standard muito popular, sendo uma das canções mais gravadas da história da música - com mais de 38.100 versões por grupos e artistas-solo. Mistura elementos de jazz com estilos das canções afro-americanas do sudeste dos Estados Unidos do início do século XX. Gershwin declarou que essa música foi baseada em uma canção ucraniana de ninar “Um Sonho Passa pela Janela” que ele teria ouvido em uma apresentação do Coral Ucraniano na cidade de Nova Iorque.É um tema relativamente curto, de 16 compassos, que se repete como A1 e A2. É uma canção quaternária, lenta e bastante melódica. Deve ser tocada com jazz-feeling ou com o sotaque americano (como em “A História de Lily Braun” da edição passada) em que as colcheias são sempre subdivididas como se fossem tercinas: a primeira mais longa (espera-se a segunda colcheia da tercina) e a segunda mais curta.A1. Nos primeiros oito compassos da primeira parte, optei basicamente por acordes em mínimas, que valorizam a harmonia e dão leveza à canção. Nos oito compassos seguintes, a esquerda se movimenta ritmicamente, mas no centro do teclado, região em que a sonoridade ainda é leve.A2. A esquerda desce para a região grave, executando arpejos abertos ( 1ª, 5ª e 7ª ou 6ª junto com a 3ª) e dando mais peso à canção.Contracantos: repare que nos compassos 3 a 8 e 19 a 28, a mão direita toca duas vozes, isto é, as notas com haste pra cima fazem o tema e as notas com haste pra baixo fazem outro canto (ou contracanto) que seria outra melodia com poucas notas baseada nos acordes que a acompanham. É um recurso simples e interessante que pode ser usado para preencher espaços vazios em que a melodia principal conversa com outra, complementar.

Bom estudo!

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arranjo comentado

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arranjo comentado

Rosana GiosaPianista de formação popular e erudita, vive uma intensa relação com a música dividindo seu trabalho entre apresentações, composições, aulas e publicações para piano popular.Pela sua Editora Som&Arte lançou três segmentos de livros: Iniciação para piano 1 e 2; Método de Arranjo para Piano Popular 1, 2 e 3; e Repertório para Piano Popular 1, 2 e 3. Com seu TriOficial e outros músicos convidados lançou o CD Casa Amarela, com composições autorais.É professora de piano há vários anos e desse trabalho resultou a gravação de nove CDs com seus alunos: três CDs coletivos com a participação de músicos profissionais e seis CDs-solo. Contato: [email protected]