Tecnologia e educação

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Derivações do problema da “técnica” na educação Prof. Dr. Richard Romancini

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Derivações do problema da “técnica” na educação

Prof. Dr. Richard Romancini

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Técnica e filosofia• “Origina-se de Ernest Kapp primeira formulação sistemática de

uma filosofia da técnica (Grundlinien einer Philosophie der Technik, 1877) que, hoje [...] concentra-se sua atenção como disciplina na reflexão sobre a estrutura e função das tecnologias de informação, doravante situadas no âmbito do que se já se convencionou chamar de tecno ou cibercultura” (Rüdiger, 2007, p. 13)

• “A análise [...] deve considerar em primeiro lugar aquela dimensão ontológica da técnica como princípio constituinte das formas das cultura” (Subirats apud Rüdiger, 2007, p. 13)

• Perspectivas diversas de abordagem analítica sobre o fenômeno: fáusticos x prometéicos; tecnófobos x tecnófilos, humanistas x tecnicistas)

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Ferramentas e tecnologia“Entre os famosos aforismos produzidos pela impertinente caneta de Karl Marx está sua observação em A miséria da filosofia, de que ‘o tear manual nos deu a sociedade com o senhor feudal; o moinho a vapor, a sociedade com o capitalista industrial’. [...] no final desse livro [A ideologia alemã], Marx inclui um parágrafo notável que ficaria bem à vontade em Understading Media de McLuhan. Pergunta ele: ‘É Aquiles possível quando foram inventadas a pólvora e a bala? É possível a Ilíada quando existem a prensa tipográfica e as máquinas impressoras? Não é inevitável que com o surgimento da imprensa cessem o canto, a narrativa e a musa, ou seja, desapareçam as condições para a poesia épica’” (Postman, 1994, p. 31)

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Autores Autores que pensam a “técnica”, sem, entretanto, o viés tão marcado de “tecnologia educacional” (e o tecnicismo) de Skinner:

• H. Marshall McLuhan (1911-1980): “media literacy” e o “futuro da escola”

• Ivan Illich (1926-2002): tecnologia como opressão e como possibilidade de libertação, para “desescolarizar a sociedade”

• Pierre Lévy (1956): tecnologias da inteligência e novos ambientes cognitivos

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H. Marshall McLuhan• Contribuição inovadora na compreensão

do papel da tecnologia na sociedade, embora siga/popularize contribuições de Harold Innis (The Bias of Communication – 1951) (1894-1952)

• As tecnologias e os meios são vistos como “extensões do homem”, isto é prolongam capacidades, sentidos, percepções. Exemplos:• Trem: pernas/mobilidade• Vestuário: pele/tato• Microscópio/cinema/TV: olho/visão• Fonógrafo/rádio: ouvido/audição

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Meios conformando ambiente• Meios geram ambientes

(background), “galáxias”, que moldam os tipos de sociedades e as formas de vida, com consequências profundas no homem. É por isso que “o meio é a mensagem”

• Tipologia dos meios• Meios quentes: prolongam (mais) um único de nossos sentidos,

permitindo menos “participação” que um meio frio. Quanto “mais quente, mais informação”. Ex: rádio, cinema.

• Meios frios: fornecem menos informação que os quentes, por isso dão maior margem de “participação” ao indivíduo. Ex.: TV (de baixa definição, da época de McLuhan), telefone.

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“O meio é a mensagem”• O aspecto mais importante dos meios é a mudança nos

esquemas de pensamento que eles propiciam, e não as mensagens individuais. Exemplos:• Imprensa: individualismo• TV: retribalização (“aldeia global”)

• “[Tools] are pedagogical instruments, [...]. Tools are not merely instruments nor only signs of human imagination and creative reach. They also symbolize the activities they enable and act as models for their own reproduction and as scripts for the re-enactment of the skills they represent. That is the sense in which media are pedagogic instruments [...]. This is the sense in which the medium is the message: the complex of habits, dispositions, extensions, metaphorical, and imaginative reproductions it creates and the secondary service background or industry it creates around it.” (Carey, 1998)

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“O meio é a mensagem”

http://www.youtube.com/watch?v=fvRMpS-aGLE

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Aspectos interessantes do trabalho• Chamou a atenção para aspectos culturais e estéticos dos

produtos midiáticos• “McLuhan was the first intellectual not only to take the medium [TV]

seriously but to see possibilities in it for something more than transmitting high culture or debasing the popular arts.” (Carey, 1998)

• Desenvolveu análise histórica com olhar prospectivo bastante sagaz, com intuições certeiras (como a net)

• De modo também pioneiro, teve preocupação com questões relacionadas à educação, de um ponto de vista arrojado http://www.youtube.com/watch?v

=NNhRCRAL6sY

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Críticas principais a McLuhan• Determinismo tecnológico

• Autonomia da tecnologia, que opera independentemente da intenção e controle humanos

• Caráter apolítico e acrítico da teoria (ignora questões de poder e pontos conexos, como a exclusão, p.ex.)• “Hoje, essa vanguarda apolítica

encontrou seu ventríloquo e profeta na pessoa de Marshall McLuhan, um autor a quem faltam, todas as categorias para a compreensão dos processos sociais, mas cujas obras podem servir de fonte de observações esparsas sobre a indústria da consciência. Intuitivamente, pelo menos, conseguiu maior discernimento das força produtiva dos meios de comunicação do que todas as comissões ideológicas do PCUS em suas intermináveis resoluções e diretrizes.” (Enzensberger, 1979, p. 116)

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Críticas principais a McLuhan• Noção meramente técnico-sensorial da “participação” do

receptor

• Classificação/separação entre meios quentes/frios é relativizada por aperfeiçoamentos tecnológicos• Por exemplo, o aumento da definição da TV, tornou-a menos

“participativa”, no sentido de McLuhan

• Forma de expressão/estilo de pensamento: mais literário (e mesmo experimental) do que científico ou filosófico (protótipo do “intelectual midiático” – “pensador da Maddison Square Garden”)• “McLuhan was one of the first intellectuals to participate actively in the

commercial popular media of television (many of his interviews are available online), and as a media expert, ‘the professor’ created a bridge between the public sphere of the media and the University.” (Marchessault, 2008, p. 12)

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McLuhan e a educação• Pensa, específica e pioneiramente

(1960), sobre a questão da “media literacy” (educação para a mídia), aspecto retomado em trabalho de 1970

• Propõe mudanças no sistema escolar, de modo a aproximar a escola das possibilidades e da sensibilidade da cultura moderna

• Influencia e sugere reflexões na pedagogia e nos estudos em comunicação e educação, principalmente a partir da releitura de sua obra desde a década de 1990

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McLuhan e a educação

McLuhan’s Wake (dir.: Kevin McMahon, Canadá, 2002)http://vimeo.com/23890132(40’)

http://www.youtube.com/watch?v=fvRMpS-aGLE(18’30’’)(23’21’’)

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Report on Project in Understanding New Media (1960)

• Embrião de Understanding Media (1964) – Os meios de comunicação como extensões do homem

• “Project 69 in Understanding Media proposed to provide an approach to media and a syllabus for teaching the nature and effects of media in secondary schools.... My objectives were: (a) to explain the character of a dozen media, illustrating the dynamic symmetries of their operation on man and society, (b) to do this in a syllabus usable in secondary schools. (Secondary schools were chosen as offering students who had not in their own lives become aware of any vested interest in acquired knowledge. They have very great experience of media, but no habits of observation or critical awareness. Yet they are the best teachers of media to teachers, who are otherwise unreachable)” (McLuhan, 1960, pp. l, 4 apud Carey, 1998).

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Report on Project in Understanding New Media (1960)

• “McLuhan’s approach to new media is dialectical, taking into account both the materialization and dematerialization of educational systems as interrelated processes. While McLuhan recognized that the different uses of technologies will produce different kinds of products, he is ultimately not interested in how technologies are used but in the uses (which he called service environments), perceptions, behaviors, biases that technologies create. Thus, to the criticisms levied against him by James Russell of the National Association of Educational Broadcasters’ Policies Committee that his 1960 Report on new media failed to address the impact of computers in the classroom, he explained that the computers were the classroom […]. He was perhaps overstressing his point, but in the main he wanted to argue that the media needed to be an inherent part of the new curriculum—hence the urgency to design a curriculum for media studies in high schools.” (Marchessault, 2008, p. 8)

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City as Classroom: Understanding Language and Media (1977)

• Segunda publicação voltada à “media education”• “[...] a book co-authored with his son Eric McLuhan and Kathryn Hutchon

called City as Classroom: Understanding Language and Media (1977), a title that references the earlier essay co-written with the radical anthropologist Edmund Carpenter, ‘Classroom Without Walls’. City as Classroom was rewritten in a prose that was far more accessible than the 1960 Report, while continuing to emphasize what is stressed so emphatically in his first book The Mechanical Bride (1951): the need to give students the analytic tools to understand the electric culture that is everywhere around them. The introduction to City as Classroom asks, ‘What’s in a school?’ This is not a rhetorical question but, in McLuhanesque fashion, asks students to consider the school ‘as a place of work,’ to analyze the meaning of work and of its placement, its layout and interior design within the built environment and overall design of the school.” (Marchessault, ano, p. 7)

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A reflexão mais ampla sobre o “futuro da escola”: leitura brasileira• O pedagogo brasileiro Lauro de Oliveira Lima

fez, em 1968, uma pioneira – no contexto brasileiro – aproximação entre a escola/educação e as ideias de McLuhan

• Ele lê o autor (dada sua formação e perspectiva epistemológica) a partir da perspectiva da pedagogia piagetiana: isto é, pensando a reformulação da escola, num ambiente saturado de informação

• A escola deveria, então, valorizar mais a criatividade e a cooperação do que a “produção em “série” (aspecto que marca a escola da sociedade industrial)

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A reflexão mais ampla sobre o “futuro da escola”: leitura brasileira• “A aprendizagem padronizada estimula o isolamento, porque

priva da necessidade de comunicação: ninguém tem nada a dizer a ninguém...” (Lima, 1971, p. 29)

• Para LOL, a escola deve formar os indivíduos para um mundo de incerteza (apontado por McLuhan), nesse sentido, mais importante do que os conteúdos, a “riqueza instrumental da escola será o permanente desafio” (p. 46)

• Daí a valorização do engajamento e da diversão (“aquilo que agrada ensina de forma muito mais eficaz” – McLuhan) que os estudos devem propiciar

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A reflexão mais ampla sobre o “futuro da escola”: leitura brasileira• Nessa perspectiva o autor irá preconizar não o uso instrumental

dos meios (simulando as situações tradicionais da escola), mas técnicas – como a dinâmica de grupo, resolução de problemas, trabalho com projetos, dramatizações, etc. – que possam ser favorecidas pelas tecnologias, em termos de motivação

• “A televisão (como os demais recursos audiovisuais) tem por objetivo produzir o impacto engajador e motivador, ficando ao processo didático (por exemplo dinâmica de grupo) o trabalho de organização mental” (Lima, 1971, p. 41).

• Outra ideia desenvolvida por LOL, a partir de McLuhan, é a da “escola aberta” (do futuro), em oposição à “escola clausura” (atual), aspecto que poderá contar com o recurso das tecnologias

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City as Classroom: Understanding Language and Media (1977)

“A second major illusion on which the school system rests is that most learning is the result of teaching. Teaching, it is true, may contribute to certain kinds of learning under certain circumstances. But most people acquire most of their knowledge outside school, and in school only insofar as school, in a few rich countries, has become their place of confinement during an increasing part of their lives…. Most learning happens casually, and even most intentional learning is not the result of programmed instruction.” (p. 12)

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Continuadores• Neil Postman, EUA (1931-2003):

“O que precisamos para refletir sobre o computador [na educação] nada tem a ver com sua eficiência como ferramenta de ensino. Precisamos saber de que maneira ele vai alterar nossa concepção de aprendizado e como, em conjunção com a televisão, ele minará a ideia de escola. Quem se importa com a quantidade de caixas de cereal que pode ser vendida pela televisão? Precisamos saber se a televisão muda nossa concepção da realidade, o relacionamento entre ricos e pobres, a ideia de felicidade em si.” (1994, p. 28-29)

•Discípulos diretos de McLuhan:• Pierre Babin (1922-2012). Obra: Os novos modos de

compreender (ed. Bras: 1989)• Derrick de Kerckhove (1944-). Obra: A Pele da Cultura (Uma

investigação sobre a nova realidade eletrônica), 2001.

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Ivan Illich• Para alguns, a análise da educação do

austríaco Ivan Illich leva as críticas reprodutivistas ao extremo (embora sua obra sobre o tema – Deschooling society, de 1970, tenha sido publicada mais de uma década antes dos trabalhos de Bourdieu)

• Por outro lado, seu olhar crítico é mais amplo: trata-se de uma crítica a todas às instituições que tiram poder das pessoas, à alienação das sociedades pelas instituições

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Ivan Illich: principais ideias• Depois de abandonar a Igreja, no final da década de 1960,

Illich desenvolve suas principais contribuições à educação

• Conjuga crítica dos efeitos da escolarização da sociedade, aos problemas mais amplos causados pela institucionalização das atividades humanas (como a medicina), do que decorre a alternativa de uma “sociedade convivencial” – “Convivencial é uma sociedade em que o homem controla a ferramenta” (Illich, 1973, apud Gajardo, 2010, p. 21)

• Foi um crítico da sociedade de consumo, mas não um autor marxista, desenvolvendo mais um humanismo radical do que um pensamento dentro desta corrente (crítica não alcança um nível político)

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Ivan Illich: críticas à escola• Segundo Gajardo (2010), em Sociedade sem escolas (1970), Illich

desenvolve quatro ideias principais (continuamente retomadas neste em outros escritos do autor sobre a educação):

a) A educação universal pela escolarização não é viável e não o será se se tentar alcançá-la pelo viés das alternativas institucionais elaboradas sobre o modelo do sistema escolar atual.b) Nem as novas atitudes dos professores com relação a seus alunos, nem a proliferação de novos instrumentos e métodos, nem uma extensão da responsabilidade dos educadores a todos os aspectos da vida de seus estudantes, conduzirão à educação universal.c) À pesquisa atual de novos meios de superação, é necessário opor outra pesquisa, que seja sua antítese institucional: a formação de redes educativas que aumentem as chances de aprender, de partilhar, de se interessar.d) Não é suficiente desescolarizar as instituições do saber; é necessário também desescolarizar o ethos da sociedade.

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Ivan Illich: críticas à escola1. O mito dos valores institucionalizados

“[...] a escola ensina que o resultado da frequência escolar é uma aprendizagem que tem um valor; que o valor da aprendizagem aumenta com a quantidade de informação que ela contém; que esse valor é mensurável e que ele pode ser certificado por graus e diplomas. Para Illich, ao contrário, a aprendizagem é a atividade humana que menos necessita da intervenção de terceiros; a maior parte da aprendizagem não é consequência da instrução, mas o resultado de uma relação do aprendiz com um meio que tem um sentido [...]” (Gajardo, 2010, p. 17)

2. O mito dos valores mensuráveis“Segundo Illich, os valores institucionalizados com os quais a escola impregna os espíritos são valores quantificáveis. [...] Uma vez que os indivíduos aceitaram a ideia de que os valores podem ser produzidos e medidos, eles tendem a aceitar todas as classificações hierárquicas.” (Gajardo, 2010, p. 17)

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Ivan Illich: críticas à escola3. O mito dos valores acondicionados“A escola vende programas, diz Illich, e o resultado desse processo de

produção se aparenta ao de qualquer outra mercadoria moderna de primeira necessidade.” (Gajardo, 2010, p. 17-18)

4. O mito do progresso eterno“A escolaridade, a produção do saber, a comercialização do saber, todasas coisas que constituem a escola, enganam a sociedade, fazendo-aacreditar que o saber é higiênico, branco, respeitável, desodorizado,produzido pelo cérebro humano e estocado. [...] Essa influência é a mesma nos

países ricos e nos países pobres e ela pode ser descrita da seguinte maneira: se, em uma sociedade, pretende-se que esse rito, que é a escolaridade, sirva à educação (...), os membros dessa sociedade em que a escolarização é obrigatória aprendem que o autodidata pode ser rejeitado, que a aprendizagem e o crescimento das capacidades cognitivas passam pelo consumo de serviços, que se revestem de uma forma industrial, planificada, profissional” (Illich apud Gajardo, 2010, p. 19).

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Ivan Illich: desdobramentos

• “Since the beginning of the twenty-first century, there has been a renewed interest in the critique of schooling expounded by Ivan Illich at the beginning of the 1970s. It is part of a search for new frames of reference in critical pedagogy on the part of educators committed to ecological, anticapitalist, and messianic movements, and of those attempting to theorize the changes brought by new information and communication technologies to pedagogy and education in a broad sense.” (Bruno-Jofré, Rosa; Zald, 2012, p. 573)

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Ivan Illich: desdobramentos• Acabou influenciando os movimentos de homeschooling,

educação aberta (open education), autoeducação e ideia de “abolicionismo escolar”

• Se a tecnologia, enquanto forma social (sociedade administrada), é criticada por Illich, por outro lado, ele deu indicações positivas para superar a escola, a partir de formas específicas da tecnologia, assim, Illich tem sido valorizado e recuperado pelos que pensam o “aprendizado na rede” (internet), por exemplo

• Nos últimos anos de sua vida, Illich se afastou do debate político e repensou em parte sua crítica à escola• “he refocused his quest toward the roots (origins) of modern certitudes,

such as those related to education, by engaging himself in historical analysis rather than concentrating on responses to specific contemporary problems.” (Bruno-Jofré; Zald, 2012, p. 575)

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Illich: redes de aprendizagem“Se as metas de aprendizagem não mais fossem dominadas pelas escolas e professores escolares, o mercado para os aprendizes seria bem mais variado e a definição de “artefatos educativos” seria menos restritiva. Poderia haver lojas de utensílios, bibliotecas, laboratórios e salões de jogos. Os laboratórios fotográficos e as impressoras “offset” permitiriam o florescimento de jornais da vizinhança. Alguns desses centros educativos poderiam ter cabinas de televisão de circuito fechado; outros poderiam projetar equipamento de escritório para seu uso e conserto próprio. O toca-discos e o toca-fitas seriam lugares-comuns. Alguns se especializariam em música clássica, outros em músicas populares internacionais e outros ainda em jazz. Os clubes de cinema competiriam entre si e com televisão comercial. As saídas dos museus poderiam ser redes de exposições circulantes de obras de arte, antigas e novas, originais e reproduções, talvez administradas pelos museus metropolitanos.O pessoal necessário para esta rede deveria ser constituído de guardas, guias de museu e bibliotecários, mas não professores.” (Illich, 2010, p. 95-96)

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Illich: redes de aprendizagem“Um bom enxadrista fica sempre feliz ao encontrar um bom adversário, da mesma forma um noviço ao encontrar outro. Os clubes servem a esta finalidade. As pessoas que desejam discutir determinados livros ou artigos, provavelmente pagariam para encontrar parceiros. As pessoas que desejam jogar, fazer excursões, construir tanques de peixes ou motorizar bicicletas andariam grandes distâncias para encontrar parceiros. Sua recompensa pelo esforço será encontrar esses parceiros. As boas escolas tentam descobrir os interesses comuns de seus alunos matriculados no mesmo curso. O contrário de escola seria uma instituição que aumentasse as chances de as pessoas que, em dado momento, compartilharam o mesmo interesse específico, pudessem encontrar-se – não importa o que mais tenham em comum.” (Illich, 2010, p. 105)

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Illich: redes de aprendizagem“O funcionamento de uma rede de encontros de parceiros serásimples, como já foi esboçado no capítulo 1. O candidato se identificaria, dando nome e endereço, e descreveria a atividade para a qual procura um parceiro. Um computador lhe remeteria os nomes e endereços de todos os que tivessem dado a mesma descrição. É interessante que este processo tão simples nunca tenha sido usado, em larga escala, para alguma atividade pública de valor. Em sua forma mais rudimentar, a comunicação entre o cliente e o computador seria feita por resposta postal. Nas grandes cidades, os telex poderiam dar resposta imediata. A única maneira de obter um nome e endereço do computador seria inserir a descrição de uma atividade para a qual se procura um parceiro. As pessoas que usassem este sistema só ficaram conhecidas por seus parceiros potenciais.” (Illich, 2010, p. 106)

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Illich: síntese

http://www.youtube.com/watch?v=Stmz8aY682U&feature=youtu.be

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Críticas a Ivan Illich• Espontaneísmo e caráter pouco teórico (mais intuitivo) de

seu trabalho• “Sua crítica surgiu e se desenvolveu em um vácuo teórico, o que

explica, talvez, o pequeno crédito dado a suas teorias educacionais.” (Gajardo, 2010, p. 26)

• “A educação nova, não nascerá do nada, como Minerva na cabeça de Zeus, mas no ventre da educação tradicional superada; [...]” (Romão, 2010, p. 142)

• Caráter não histórico e utópico/teleológico do pensamento (quiça, influência da religião)• “São numerosos os que acusam Illich de ser um pensador utópico,

que o acusam de ter se retirado precocemente do debate geral sobre a educação. Certamente, uma inserção mais real no mundo, a elaboração de estratégias exequíveis para por suas ideias em prática, e referências teóricas sólidas poderiam ter modificado o itinerário de nosso autor.” (Gajardo, 2010, p. 26)

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Críticas a Ivan Illich• Similarmente aos teóricos frankfurtianos, critica-se em

Illich o fato de que sua crítica radical à “sociedade industrial” pareça levar ao imobilismo (daí, diferença quanto à Paulo Freire) e desmobilização (os professores, particularmente, não são tratados como agentes de mudança e, por isso, não levados em conta como aliados)• “Há, portanto, em Illich um descompasso entre denúncia e

anúncio, entre crítica e possibilidade de ação, entre contestação e possibilidade de ação.” (Romão, 2010, p. 143)

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Pierre Lévy• Considerado um continuador de McLuhan,

embora ele critique o “determinismo” deste pensador (mas é criticado também por isso)

• Popularizador da noção de “cibercultura”

• Pensa sobre os feitos cognitivos das tecnologias (daí, seus aportes para a educação)

• Caráter associativo e cognitivo da internet e do hipertexto estimulam novas formas de pensar

• Um ponto que parece absolver o autor da crítica quanto ao determinismo, porém, é o fato de ver os rumos do desenvolvimento tecnológico e social como questões humanas, dependendo de escolhas, em aberto. O sentido da técnica não é um a priori.

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Pierre Lévy: principais conceitos• Tecnologias da inteligência • Suportes, interfaces, equipamentos, programas, que

desempenham papel de tecnologia intelectual, isto é, “reorganizam, de uma forma ou de outra, a visão de mundo de seus usuários e modificam seus reflexos mentais” (Lévy, 1993, p. 54)

• Inteligência coletiva• “significa a reativação de formas de saber que estavam

relegadas a um segundo plano (2001). A crescente e acelerada conexão das pessoas à rede cria uma nova forma de relação universal, que não se deixar totalizar, não engendra uma cultura única, visto que integra a todos pela via da interação generalizada” (Rüdiger, 2007, p. 103)

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Pierre Lévy: implicações educativas

Polo da Oralidade Primária

Polo da Escrita Polo informático Mediático

Formas canônicas do saber

- Narrativa.- Rito.

- Teoria (explicação, fundação, exposição sistemática).

- Interpretação.

- Modelização operacional ou de previsão.

- Simulação.

Fonte: Lévy, 1993, p. 127

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Pierre Lévy: implicações educativas“Lembremos que o domínio de uma área qualquer do saber implica, quase sempre, a posse de uma rica representação esquemática. Os hipertextos podem propor vias de acesso e instrumento de orientação em um domínio de conhecimento [...]O hipertexto ou a multimídia interativa adequam-se particularmente aos usos educativos. É bem conhecido o papel fundamental do envolvimento pessoal do aluno no processo de aprendizagem. [...] Ora, a multimídia interativa, graças à sua dimensão reticular ou não linear, favorece uma atitude exploratória, ou mesmo lúdica, face ao material a ser assimilado. É, portanto, um instrumento bem adaptado a uma pedagogia ativa.” (Lévy, 1993, p. 40)

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Pierre Lévy e a mudança no ambiente tecnológico

https://www.youtube.com/watch?v=3PoGmCuG_kc

P: Você acha que é possível pensar numa revolução utilizando a internet, o computador?R: A internet é que é a revolução. Não se trata de utilizar a internet para se fazer a revolução. A revolução é o desenvolvimento da internet. (12’08’’)

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Críticas a Lévy• Excessivo otimismo tecnológico: “síndrome de Cândido*”

(Rüdiger, 2007)

• “Tecnoutopista liberal”, que ignora dimensões políticas da tecnologia, o entrelace da cibercultura com poderes econômicos, produzindo teoria pouco crítica

• Produção mais recente perde densidade reflexiva, preponderando a “vocação de pequeno empresário e redator de catecismos new age” (idem, p. 100)

* http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/marcos/hdh_voltaire_candido.pdf Obs: Bartleby, o escriturário (Melville): http://leidsoncvsenac.files.wordpress.com/2009/12/miololivro.pdf

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Continuidades recentes• Henry Jenkins - Cultura da convergência (cultura

participatória, inteligência coletiva) – autor influente no contexto da “media education” nos EUA

• James Paul Gee – acadêmico dos EUA que vem refletindo sobre os games e a educação (abordagem da teoria sociocultural da educação; “aprendizagem profunda”, a partir de práticas contextualizadas)

• Colin Lankshear e Michele Knobel – casal australiano que, também dentro da corrente sociocultural, desenvolve discussão sobre os “novos letramentos” e “media DIY”

• No Brasil, a antropóloga argentina Paula Sibilia procura pensar sobre o tema do impacto das redes na escola

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ReferênciasCarey, James W. Marshall McLuhan: Genealogy and Legacy. Canadian Journal of Communication, Vol 23, No 3, 1998. Disponível em <http://www.cjc-online.ca/index.php/journal/article/viewArticle/1045/951> .

Enzensberger, Hans Magnus. Elementos para uma teoria dos meios de comunicação. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1979.

Gajardo, Marcela. Ivan Illich. In: Romão, José Eustáquio (org.). Ivan Illich (Coleção Educadores). Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Editora Massangana, p. 11-27, 2010.

Lévy, Pierre. As tecnologias da inteligência. Rio de Janeiro, Ed. 34, 1993.

Lima, Lauro Oliveira. Mutações em educação segundo McLuhan. Petrópolis, RJ, Vozes, 1971.

Marchessault, Janine. McLuhan’s Pedagogical. Art. Flusser Studies 06, May 2008. Disponivel em <http://www.flusserstudies.net/pag/06/marchessault-pedagogical.pdf> .

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ReferênciasPostman, Neil. Tecnopólio: a rendição da cultura à tecnologia. São Paulo, Nobel, 1994.

Romão, José Eustáquio. Impacto da “desescolarização” na educação brasileira. In: Romão, José Eustáquio (org.). Ivan Illich (Coleção Educadores). Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Editora Massangana, p. 137-143, 2010.

Bruno-Jofré, Rosa; Zald, Jon Igelmo. Ivan Illich´s late critique of Deschooling Society: ‘‘I was largely barking up the wrong tree’’. Educational Theory, Vol. 62, N. 5, p. 573-592, 2012. Disponível em <http://www.laserwords.co.in/offprint/edth_62-5/edth_464_web.pdf>.

Rüdiger, Francisco. Introdução às teorias da cibercultura. Porto Alegre, Sulina, 2a. ed. 2007.