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Teoria de Nielsen de ra´ızes e teoria do grau de Hopf
Transcript of Teoria de Nielsen de ra´ızes e teoria do grau de Hopf
Teoria de Nielsen de raızes
e teoria do grau de Hopf
Paulo Takashi Taneda
DISSERTACAO APRESENTADA
AO
INSTITUTO DE MATEMATICA E ESTATISTICA
DA
UNIVERSIDADE DE SAO PAULO
PARA
OBTENCAO DO TITULO DE MESTRE
EM
CIENCIAS
Area de Concentracao: Matematica
Orientadora: Prof.a Dr.a Lucılia Daruiz Borsari
Durante a elaboracao deste trabalho o autor recebeu o auxılio financeiro da CAPES
Sao Paulo, fevereiro de 2007.
Teoria de Nielsen de raızes
e teoria do grau de Hopf
Este exemplar corresponde a redacao final
da dissertacao devidamente corrigida e
defendida por Paulo Takashi Taneda,
e aprovada pela comissao julgadora.
Sao Paulo, 21 de marco de 2007.
Banca Examinadora:
Prof.a Dr.a Lucılia Daruiz Borsari (orientadora) - IME/USP
Prof.a Dr.a Fernanda Soares Pinto Cardona - IME/USP
Prof. Dr. Daniel Vendrusculo - DM/UFSCar
Dedico este trabalho a meus queridos pais, Shunji Taneda e Heiko Uemura Taneda,
por todo o apoio durante esta empreitada, e a Tatyana Maya Okano, cujo carinho me
foi de grande inspiracao.
iii
Quero registrar aqui meus sinceros agradecimentos a todos os que contribuıram,
direta ou indiretamente, para a realizacao deste trabalho: a minha orientadora Lucılia
Daruiz Borsari, pela paciencia e compreensao com que sempre esta disposta a auxiliar
seus alunos; a Tatyana Maya Okano, pelo companheirismo e encorajamento na horas
mais difıceis; a meus colegas e professores da area de Topologia Algebrica (em particu-
lar, as alunas de doutorado Hildebrane, Fernanda e Natalia, e aos professores Fernanda
S. P. Cardona, Daciberg L. Goncalves e Daniel Vendrusculo), cuja convivencia me foi
muito enriquecedora; e a meus caros amigos do IME, Marcio M. Onodera, Rodnei R.
da Silva, Carlos H. Griese, Debora C. Brandt, Ednei F. Reis, Maria Cristina D. N. do
Amaral, Joao R. Sato, Paula M. Yamakawa e Marcelo H. Ogava, por todos os momentos
compartilhados.
v
Este trabalho e baseado num artigo de Robert F. Brown e Helga Schirmer, intitu-
lado Nielsen Root Theory and Hopf Degree Theory, publicado em 2001 no Pacific Journal
of Mathematics (vide [BS1]). Para aplicacoes f : M −→ N, entre variedades topologicas
compactas, orientaveis e de mesma dimensao, existe um numero, conhecido como
numero de Nielsen de raızes (de f num ponto c ∈ N), que constitui um invariante ho-
motopico e e um limitante inferior para o numero de classes de raızes de f em c.
Neste trabalho, veremos que a nocao de numero de Nielsen pode ser estendida para
aplicacoes entre variedades nao necessariamente orientaveis ou compactas, com ou
sem fronteira. Este novo numero, denominado numero de Nielsen transverso de raızes,
tambem e um invariante homotopico e constitui um limitante inferior para o numero
de classes de raızes na categoria em que se define. Esta extensao da teoria de Nielsen e
entao aplicada a teoria do grau, obtendo-se a relacao entre o grau absoluto de Hopf e
o grau geometrico.
This work is based on Robert F. Brown and Helga Schirmer’s article, named Nielsen
Root Theory and Hopf Degree Theory, published in 2001, in the Pacific Journal of Mathematics
(see [BS1]). For maps f : M −→ N, between orientable and compact topological
manifolds of the same dimension, there exists a number, called the Nielsen root number
(of f at c ∈ N), that is a homotopy invariant and a lower bound for the number of
root classes of f at c. In this work, we are going to see that the concept of Nielsen
root number can be extended to maps between not necessarily orientable nor compact
manifolds, with or without boundary. This new number, the transverse Nielsen root
number, is a homotopy invariant and a lower bound for the number of root classes
os maps which are transverse to c. This extension of the Nielsen theory is applied to
degree theory, to obtain the relationship between the Hopf’s absolute degree and the
geometric degree.
vii
Dedicatoria iii
Agradecimentos v
Resumo/Abstract vii
Introducao 1
1 Preliminares 5
1.1 Orientabilidade de Variedades Topologicas . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.2 O Recobrimento Orientado de uma Variedade Topologica . . . . . . . . . 28
1.3 A Multiplicidade de uma Classe de Raızes . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
1.4 O Grau Cohomologico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
2 Teoria de Nielsen de Raızes 76
2.1 A Propriedade Fundamental da Teoria de Raızes . . . . . . . . . . . . . . 76
2.2 O Calculo da Multiplicidade de uma Classe de Raızes . . . . . . . . . . . 84
2.3 Os Numeros de Nielsen de Raızes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes . . . . . . . . . . . . . . 115
3 Aplicacoes a Teoria do Grau de Hopf 153
3.1 Os Graus Absoluto e Geometrico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 153
3.2 Os Numeros de Nielsen de Raızes para Aplicacoes entre Superfıcies . . . 156
A Limites Diretos 159
B Um Homeomorfismo para Variedades Topologicas 171
C Deformacoes Propriamente Homotopicas que Preservam Raızes 176
Referencias Bibliograficas 186
ix
O trabalho a seguir baseia-se no artigo intitulado Nielsen Root Theory and Hopf Degree
Theory, de Robert F. Brown e Helga Schirmer, publicado em 2001 (vide [BS1]). Nele,
vamos estender alguns resultados da teoria de Nielsen de raızes, que originalmente
tratam de aplicacoes entre variedades topologicas orientaveis, de modo a remover a
hipotese de orientabilidade. A teoria obtida sera, entao, utilizada para restabelecer
a conexao entre a teoria de Nielsen de raızes e duas diferentes versoes do grau de
uma aplicacao, a saber, os graus absoluto e geometrico. Assim, os metodos da teoria
de Nielsen nos proporcionarao uma nova maneira de compreender alguns conceitos
basicos da teoria de Hopf, bem como fornecerao demonstracoes mais diretas para
alguns de seus resultados. No que segue, vamos descrever os objetivos acima mais
detalhadamente.
Se f : M −→ N e uma aplicacao contınua entre duas variedades topologicas (de
mesma dimensao), e c ∈ N, entao uma raiz de f em c e um ponto da imagem inversa
f−1(c). Por outro lado, o numero de Nielsen de raızes (de f em c), denotado por
N( f , c), e um limitante inferior para a cardinalidade de f−1(c), e constitui um invariante
homotopico. Embora seja possıvel definir N( f , c), mesmo M e N nao sendo varieda-
des topologicas, e usualmente muito difıcil (quando possıvel) calcular este numero
com tal generalidade. Entretanto, se M e N sao variedades orientaveis, existe uma
formula para se determinar N( f , c). Denotando por j a cardinalidade do grupo quoci-
ente π1(N)/ f#(π1(M)), onde f# : π1(M) −→ π1(N) e o homomorfismo induzido por f ,
H. Hopf ([H2]) e X. Lin ([L]) obtiveram o seguinte resultado (que constitui uma versao
parcial do corolario 2.3.1, a ser demonstrado mais adiante):
Teorema. Se f : M −→ N e uma aplicacao contınua entre duas variedades topologicas de
mesma dimensao n, fechadas, conexas e orientadas, entao N( f , c) = 0 se o grau de f e zero, ou
N( f , c) = j caso contrario.
1
2 Introducao
Na secao 2.3 (teorema 2.3.1), veremos que este teorema pode ser estendido para
aplicacoes entre variedades nao-necessariamente orientaveis, nao-compactas e com
fronteira (desde que f seja uma aplicacao propria, que leve a fronteira de M na fronteira
de N).
Em 1930, Hopf utilizou a teoria de Nielsen de raızes como base para a sua teoria do
grau (vide [H2]), a qual, por este motivo, distinguia-se das demais existentes em sua
epoca. O grau mencionado no teorema acima, refere-se ao conceito classico introdu-
zido por Brouwer ([Bw], pagina 105), que e definido em funcao do homomorfismo em
homologia (com coeficientes emZ) induzido por f . Esta definicao pode ainda ser esten-
dida para aplicacoes proprias que preservam fronteira, entre variedades topologicas de
mesma dimensao, orientaveis, com fronteira e nao-compactas. No entanto, se ao menos
uma das variedades M ou N for nao-orientavel, o grau homologico so podera ser defi-
nido utilizando-se homologia com coeficientes em Z2, e, neste caso, o grau resultante
nao reflete satisfatoriamente as propriedades geometricas da aplicacao f . Deste modo,
a fim de obter as informacoes geometricas desejadas, e, em particular, procurando uma
interpretacao algebrica que tivesse em vista as imagens inversas pontuais de f , Hopf
introduziu um conceito de grau denominado Absolutgrad (ou grau absoluto); este, por
nao depender da orientabilidade das variedades topologicas envolvidas, mostrou-se
muito mais fiel a geometria da aplicacao f que o grau homologico a coeficientes emZ2.
O grau absoluto de Hopf pode ser considerado uma variante do numero de Nielsen de
raızes: com efeito, ele e exatamente o que chamamos de “numero de Nielsen transverso
de raızes”, denotado por N∩( f , c), e constitui um limitante inferior para a cardinalidade
do conjunto de raızes das aplicacoes que sao “tranversas” ao ponto c, num sentido
que tornaremos mais preciso na definicao 2.3.2 (vide teorema 3.1.1). Em geral, tem-se
N∩( f , c) > N( f , c), sendo que esta igualdade nao e necessariamente valida; na secao 2.3,
veremos como calcular estes numeros de acordo com as propriedades geometricas de
f .
Uma importante motivacao para o calculo do numero de Nielsen de raızes N( f , c),
e que ele contem informacoes relacionadas a geometria da aplicacao f : se a dimensao
n das variedades M e N for diferente de 2, este numero constitui um limitante inferior
preciso, ou seja, existe uma aplicacao g : M −→ N, homotopica a f , tal que a imagem
inversa g−1(c) contem exatamente N( f , c) pontos (por “precisao”, estamos nos referindo
a propriedade do limitante ser efetivamente realizado). Por outro lado, o numero de
Nielsen transverso N∩( f , c) tambem e um limitante inferior preciso: em outras palavras,
existe uma aplicacao g : M −→ N, homotopica a f e “transversa” a c, tal que g−1(c)
possui N∩( f , c) pontos. Na secao 3.1, veremos que isto equivale a dizer que o limite
inferior N∩( f , c) e realizado por uma aplicacao g : M −→ N que possui N∩( f , c) como
seu “grau geometrico” (vide definicao 3.1.2); logo, a realizacao do numero de Nielsen
3
transverso N∩( f , c) implica na igualdade entre os graus absoluto e geometrico de f .
Assim sendo, o trabalho que sera apresentado a seguir pode ser visto, em parte, como
um re-exame da teoria do grau de Hopf segundo uma perspectiva matematica contem-
poranea. Muitos dos resultados contidos em [BS1] (que, conforme mencionamos de
inıcio, e o artigo no qual se baseia esta dissertacao) nao eram absolutamente ineditos a
epoca de sua publicacao: os primeiros estudos neste sentido podem ser encontrados em
dois importantes artigos, escritos respectivamente por P. Olum ([O]) e D. B. A. Epstein
([E]). Estes autores classificaram as aplicacoes entre variedades topologicas de mesma
dimensao em tres tipos distintos, e entao definiram o grau absoluto separadamente
para cada caso. Entretanto, embora facilite o calculo do grau absoluto, esta definicao
obscurece seu significado geometrico. Mais recentemente, foram publicadas outras
extensoes da teoria de Hopf: em 1986, X. Lin ([L]) introduziu uma definicao moderna
para a multiplicidade de uma classe de raızes, e forneceu uma nova demonstracao
para a realizacao do numero de Nielsen de raızes, no caso especıfico em que f e uma
aplicacao entre variedades topologicas fechadas de dimensao maior ou igual a 3. No
entanto, Lin nao considerou a nao-orientabilidade das variedades, nem restabeleceu
a conexao entre a teoria de Nielsen de raızes e a teoria do grau de Hopf. Por outro
lado, em 1987, R. Skora ([Sk]) apresentou uma versao geometrica para a relacao entre o
grau absoluto de Hopf e o grau geometrico, mas tambem nao conectou seus resultados
a teoria de Nielsen de raızes. Ja em 1992, Y. Rong e S. Wang ([RW]) desenvolveram
uma extensao da teoria de Nielsen de raızes para aplicacoes proprias f : M −→ N,
que pode ser utilizada para demonstrar a realizacao do numero de Nielsen transverso
de raızes, no caso particular em que as variedades M e N sao fechadas e orientaveis;
contudo, o artigo que publicaram nao faz referencias ao grau absoluto de Hopf. Isto
posto, a diferenca crucial entre estas abordagens e a de [BS1], e que, alem de restabe-
lecer a ligacao entre as teorias de Hopf e de Nielsen, Brown e Schirmer apresentam
demonstracoes (bem como definicoes) muito diferentes daquelas que se encontram nos
artigos acima mencionados: para definir a multiplicidade de uma classe de raızes (de
uma aplicacao f : M −→ N, entre variedades de mesma dimensao), eles utilizam as
propriedades do “grau local” de f , e, entao, definem o numero de Nielsen de raızes,
N( f , c), como sendo o numero de classes de raızes (de f em c ∈ Int N) que tem multipli-
cidades nao-nulas; ademais, eles tambem introduzem o conceito de numero de Nielsen
transverso de raızes, N∩( f , c), definido como a soma das multiplicidades de todas as
classes de raızes de f em c, e mostram que N( f , c) e N∩( f , c) podem ser calculados
a partir dos graus locais de determinados levantamentos de f , provando ainda que
estes numeros sao efetivamente realizaveis quando a dimensao das variedades M e N e
diferente de 2. Em particular, a demonstracao de que N∩( f , c) e realizavel requer o uso
de uma certa versao do “lema de Whitney”, adaptado ao conceito de “transversalidade
4 Introducao
de microfibrados”, assunto cujo desenvolvimento e relativamente recente.
Com estes objetivos em mente, nosso trabalho sera organizado da seguinte forma:
no capıtulo 1, iremos introduzir os conceitos e resultados que servirao de suporte para
os capıtulos seguintes (mais especificamente, as definicoes de orientabilidade de vari-
edades, o grau local, a multiplicidade de uma classe de raızes, e o grau cohomologico);
ja no capıtulo 2, procedemos ao calculo da multiplicidade de uma classe de raızes,
atraves do qual poderemos determinar os numeros de Nielsen de raızes e demonstrar
suas respectivas realizacoes, e finalmente, no capıtulo 3, mostraremos a relacao da
teoria do grau de Hopf com a teoria de Nielsen desenvolvida.
O objetivo deste capıtulo e introduzir os conceitos basicos que serao utilizados nas
definicoes dos numeros de Nielsen de raızes. No que segue, consideraremos que um
espaco topologico de Hausdorff M e uma variedade topologica de dimensao n sem
fronteira, se M possui uma base enumeravel de abertos e todo ponto de M admite
uma vizinhanca homeomorfa a um subconjunto aberto de Rn; analogamente, dizemos
que um espaco de Hausdorff M e uma variedade topologica de dimensao n com
fronteira, se M possui uma base enumeravel de abertos e todo ponto de M admite uma
vizinhanca homeomorfa, ou a subconjunto aberto de Rn, ou a um subconjunto aberto
de Rn+ = (x1, . . . , xn) ∈ Rn : xn > 0.
Nesta secao, vamos estabelecer um criterio que nos permitira subdividir as aplicacoes
contınuas entre variedades topologicas de mesma dimensao em tres tipos distintos.
Primeiramente, no entanto, convem apresentarmos alguns resultados preliminares.
Definicao 1.1.1 . Seja M uma variedade topologica de dimensao n, com ou sem fronteira. Dado
um ponto x ∈ Int M, dizemos que um elemento µx ∈ Hn(M,M r x) e uma orientacao local
de M em x se µx e um gerador de Hn(M,M r x); evidentemente, como Hn(M,M r x) ≃ Z
para todo x ∈ Int M, segue que cada ponto de Int M admite exatamente duas orientacoes locais.
Agora, tendo em vista a definicao acima, veremos como definir uma “orientacao
global” numa variedade topologica conexa M, sem fronteira. Intuitivamente, tal
5
6 Preliminares
orientacao (quando existir) sera uma “escolha contınua” de orientacoes locais para
cada ponto de M, sendo que, por “continuidade”, devemos subentender que, esco-
lhida uma orientacao local num ponto x ∈ M, esta sera, de algum modo, coerente com
a orientacao local num outro ponto y ∈ M (de maneira que, globalmente, possamos
definir uma unica “funcao” para escolher orientacoes locais em cada ponto de M).
Seja, pois, M uma variedade topologica conexa de dimensao n, sem fronteira; consi-
derando o conjunto
Θ(M) =⋃
x∈M
Hn(M,M r x) ,
vamos introduzir uma estrutura de espaco topologico em Θ(M). Para tanto, defini-
mos uma n-bola propria em M como sendo um aberto V ⊆ M, tal que existe um
homeomorfismo do disco unitario fechado Dn em V, que leva Sn−1 = ∂(Dn) sobre
V r V = ∂V (note que toda n-bola propria em M e, portanto, um subconjunto aberto
e conexo de M). Assim, a colecao de todas as n-bolas proprias em M constitui uma
base para a topologia de M. Por outro lado, se V e um aberto conexo em M, e x ∈ V,
sabemos que M r V e um retrato por deformacao de M r x, o que implica que a
inclusao jx : (M,MrV) −→ (M,Mr x) induz um isomorfismo em homologia singular
( jx)∗ : Hn(M,M r V) −→ Hn(M,M r x). Deste modo, denotando
U(z,V) = ( jx)∗(z) : x ∈ V ,
onde V ⊆M e uma n-bola propria e z ∈ Hn(M,M r V), temos que a colecao
C = U(z,V) : V ⊆ M e uma n-bola propria e z ∈ Hn(M,M r V)
constitui uma base para a topologia de Θ(M).
Isto posto, para cada x ∈M, seja φx : Hn(M,Mr x) −→ Z um isomorfismo (lembre-
se que Hn(M,M r x) ≃ Z), e considere a aplicacao γ : Θ(M) −→ Z definida por
γ(w) = |φx(w)|, para cada w ∈ Hn(M,M r x) ⊆ Θ(M). Note que, como γ(w) e o valor
absoluto de φx(w), segue que γ nao depende de uma particular escolha do isomorfismo
φx : Hn(M,M r x) −→ Z, de modo que a aplicacao γ esta, portanto, bem definida.
Vamos mostrar entao que γ e constante em cada aberto U(z,V) da colecao C que
constitui a base para a topologia de Θ(M). Com efeito, dada uma n-bola propria
V ⊆ M e um elemento z ∈ Hn(M,M r V), sejam x, y ∈ V e considere os isomorfismos
( jx)∗ : Hn(M,M r V) −→ Hn(M,M r x) e ( jy)∗ : Hn(M,M r V) −→ Hn(M,M r y)
induzidos pelas respectivas inclusoes; temos, pois, que ( jx)∗(z) ∈ Hn(M,M r x) e
( jy)∗(z) ∈ Hn(M,M r y) sao tais que ( jx)∗(z), ( jy)∗(z) ∈ U(z,V). Assim, tendo em vista
que Hn(M,M r V) ≃ Z, seja µV um dos dois geradores de Hn(M,M r V), e denote
por µx e µy os geradores de Hn(M,M r x) e Hn(M,M r y), respectivamente, tais que
( jx)∗(µV) = µx e ( jy)∗(µV) = µy. Deste modo, representando z ∈ Hn(M,M r V) como
1.1 Orientabilidade de Variedades Topologicas 7
sendo z = k ·µV, onde k ∈ Z, e observando que φx(µx) = ±1 e φy(µy) = ±1 (uma vez que
φx e φy sao isomorfismos), obtemos que:
γ(( jx)∗(z)) = γ(( jx)∗(k · µV)) = γ(k · ( jx)∗(µV))
= γ(k · µx) = |φx(k · µx)|
= |k · φx(µx)|
= |k|
e (analogamente) γ(( jy)∗(z)) = |k|. Logo, temos que γ(w1) = γ(w2) para quaisquer
w1,w2 ∈ U(z,V), o que prova que γ e constante em cada U(z,V) ∈ C (e, portanto,
γ : Θ(M) −→ Z e contınua, supondo que Z esta munido da topologia discreta). Note
ainda que, dado w ∈ Hn(M,Mr x) para algum x ∈M, temos que γ(w) = |φx(w)| = 1 se,
e somente se, w e um gerador de Hn(M,M r x), pois φx : Hn(M,M r x) −→ Z e um
isomorfismo; por conseguinte, o subconjunto γ−1(1) ⊆ Θ(M) e constituıdo exatamente
das orientacoes locais nos pontos x ∈ M. Alem disso, o fato de γ ser constante em
cada conjunto de C, implica, em particular, que o espaco topologico Θ(M) se decompoe
numa uniao disjunta,
Θ(M) = M(0) ∪ M(1) ∪ M(2) ∪ . . . ,
onde, para cada k ∈ 0, 1, 2, . . ., denotamos M(k) = γ−1(k).
Agora, dada uma n-bola propria V ⊆ M, seja µV um gerador de Hn(M,M r V) ≃ Z,
e, para cada x ∈ V, considere o gerador µx de Hn(M,Mr x) tal que ( jx)∗(µV) = µx, onde
( jx)∗ : Hn(M,MrV) −→ Hn(M,Mr x) e o isomorfismo induzido pela inclusao. Como
todo elemento de Hn(M,M r x) pode ser representado de maneira unica por k · µx,
onde k ∈ Z, segue que a projecao pΘ(M) : Θ(M) −→ M, definida por pΘ(M)(z) = x para
cada z ∈ Hn(M,M r x), com x ∈M, e tal que:
p−1Θ(M)(V) =
z ∈ Θ(M) =
⋃
x∈M
Hn(M,M r x) : pΘ(M)(z) ∈ V
= z ∈ Hn(M,M r x) : x ∈ V
= k · µx : k ∈ Z e x ∈ V
= k · ( jx)∗(µV) : k ∈ Z e x ∈ V
= ( jx)∗(k · µV) : k ∈ Z e x ∈ V
=⋃
k∈Z
U(k · µV,V) .
Entretanto, se k1, k2 ∈ Z sao tais que k1 , k2, segue que U(k1 · µV,V) ∩U(k2 · µV,V) = ∅,
uma vez que:
U(k · µV,V) = ( jx)∗(k · µV) : x ∈ V = k · µx : x ∈ V ,
8 Preliminares
para todo k ∈ Z; assim, p−1Θ(M)
(V) e a uniao disjunta dos abertos U(k · µV,V) ∈ C
de Θ(M), onde k ∈ Z. Isto posto, observe que cada U(k · µV,V), k ∈ Z, e levado
homeomorficamente sobre V pela projecao pΘ(M) : Θ(M) −→ M, pois pΘ(M)(k · µx) = x
para todo x ∈ V. Consequentemente, como a colecao de todas as n-bolas proprias em
M constitui uma base para a topologia de M, segue que todo ponto x ∈ M admite uma
vizinhanca aberta V ⊆ M (a saber, uma n-bola propria contendo x), tal que p−1Θ(M)
(V) e
uma uniao disjunta⋃
k∈Z
Uk de abertos emΘ(M) (a saber, Uk = U(k ·µV,V)), cada um dos
quais se aplica por pΘ(M) homeomorficamente sobre V; em outras palavras, a restricao
de pΘ(M) : Θ(M) −→M a cada componente conexa deΘ(M) e um recobrimento de M, e,
portanto, denotando por p : M −→M a restricao de pΘ(M) ao conjunto
M = M(1) ⊆ Θ(M) =⋃
k∈Z
M(k) ,
temos que a restricao de p a cada componente conexa de M = M(1) e um recobrimento de
M (note que, embora os conjuntos M(k) = γ−1(k), k ∈ Z, sejam dois a dois disjuntos, cada
um deles pode nao ser necessariamente uma componente conexa de Θ(M)). Convem
mencionarmos ainda que, pelo fato de p : M −→ M ser um homeomorfismo local,
segue que o espaco M = M(1) possui as mesmas propriedades topologicas locais de M;
em particular, temos que M e uma variedade topologica de dimensao n, sem fronteira.
Finalmente, lembrando que M = M(1) e constituıdo exclusivamente dos geradores
µx,−µx ∈ Hn(M,M r x) ≃ Z, onde x ∈ M, vamos mostrar que, dado x ∈ M, se µx e
−µx pertencem a uma mesma componente conexa C de M, entao, para todo y ∈ M,
os geradores µy e −µy de Hn(M,M r y) tambem pertencem a C. De fato, como a
variedade M e conexa (e, portanto, conexa por caminhos), sabemos que existe um
caminho ω : I −→ M tal que ω(0) = y e ω(1) = x; logo, como p(µy) = p(−µy) = y, segue
que existem caminhos ω1 : I −→ C e ω2 : I −→ C tais que ω1(0) = µy, ω2(0) = −µy e
pω1 = pω2 = ω, isto e,ωadmite levantamentos ω1 e ω2, relativamente ao recobrimento
p |C : C −→ M, com inıcio nos pontos µy e −µy, respectivamente (note que C e conexo
por caminhos, pois e uma componente conexa da variedade topologica M). Assim,
como ω1(1), ω2(1) ∈ p−1(x) = µx,−µx, temos que, ou ω1(1) = ω2(1) = ±µx, ou ω1(1) = µx
e ω2(1) = −µx; no primeiro caso, segue que o caminho justaposto ω1 ∨ ω−12 : I −→ C liga
os pontos µy, −µy e±µx, enquanto que, no segundo caso, os caminhos ω1 e ω2 ligam µy e
−µy aos pontos µx e −µx, respectivamente. Deste modo, concluımos que, para qualquer
que seja y ∈ M, os geradores µy e −µy de Hn(M,M r y) ≃ Z tambem pertencem a
mesma componente conexa C ⊆ M que contem µx e−µx; isto, por sua vez, implica que a
variedade M (que contem somente os geradores dos grupos Hn(M,Mrx), onde x ∈M)
e conexa, e, consequentemente, a aplicacao p : M −→M e um recobrimento duplo de M
1.1 Orientabilidade de Variedades Topologicas 9
(ou seja, um recobrimento de duas folhas). Em contrapartida, observe agora que, se os
geradores µx e −µx de Hn(M,M r x) ≃ Z pertencem a componentes conexas distintas
de M, digamos µx ∈ C1 e −µx ∈ C2, entao, para todo y ∈ M, os geradores µy e −µy de
Hn(M,Mry) tambem sao tais queµy ∈ C1 e−µy ∈ C2: com efeito, sendoλ : I −→M um
caminho tal queλ(0) = x eλ(1) = y, sabemos queλ admite levantamentos λ1 : I −→ C1 e
λ2 : I −→ C2, relativos aos recobrimentos p |C1e p |C2
, respectivamente, tais que λ1(0) = µx
e λ2(0) = −µx; logo, como λ1(1), λ2(1) ∈ p−1(y) = µy,−µy, segue que λ1(1) = µy e
λ2(1) = −µy (uma vez que nao podemos ter λ1(1) = λ2(1), pois, do contrario, os pontos
µx = λ1(0) e −µx = λ2(0) pertenceriam a mesma componente conexa de M), o que
mostra que µy ∈ C1 e −µy ∈ C2. Neste caso, temos que a variedade M e a uniao de duas
componentes conexas distintas C1 e C2, cada qual contendo exatamente um dos dois
geradores de Hn(M,M r x) para cada x ∈M, sendo que as restricoes p |C1: C1 −→ M e
p |C2: C2 −→M sao recobrimentos simples de M (isto e, com uma unica folha).
Deste modo, podemos introduzir a seguinte
Definicao 1.1.2 . Seja M uma variedade topologica conexa, de dimensao n e sem fronteira. A
variedade M obtida acima, constituıda das orientacoes locais nos pontos x ∈ M, denominamos
fibrado orientado de M, ao passo que a aplicacao p : M −→ M, definida por p(µx) = x para
cada gerador µx ∈ Hn(M,M r x), com x ∈ M, e chamada projecao orientada de M. Alem
disso, se M for conexa (e, consequentemente, p for um recobrimento duplo de M), dizemos que M
e uma variedade nao-orientavel; por outro lado, se M for a uniao disjunta de duas componentes
conexas C1 e C2 (e, portanto, cada restricao p |C1e p |C2
for um recobrimento simples de M), a
variedade M e dita orientavel, sendo que uma orientacao em M e uma aplicacao contınua
s : M −→ M tal que p s = IdM, onde IdM : M −→M e a identidade.
A respeito da definicao acima, temos o seguinte
Lema 1.1.1 . Se M e uma variedade topologica conexa, de dimensao n e sem fronteira, entao:
(i) se s : M −→ M e uma orientacao em M, entao, para cada x ∈ M, s(x) e um gerador de
Hn(M,M r x) ≃ Z (ou seja, para cada x ∈M, s(x) e uma orientacao local de M em x);
(ii) M e orientavel se, e somente se, ela admite uma orientacao s : M −→ M;
(iii) denotando por p : M −→M a projecao orientada de M, e sendo s : M −→ M uma aplicacao
tal que p s = IdM, onde IdM : M −→ M e a identidade, segue que s e contınua (e, portanto,
define uma orientacao em M) se, e somente se, para todo x ∈ M, existem uma n-bola propria
V ⊆ M, contendo x, e um gerador µV de Hn(M,M r V) ≃ Z, tais que ( jy)∗(µV) = s(y) para
cada y ∈ V, onde ( jy)∗ : Hn(M,M r V) −→ Hn(M,M r y) e o isomorfismo induzido pela
inclusao.
10 Preliminares
Demonstracao. (i) Com efeito, sabemos que o fibrado orientado M e constituıdo
somente dos geradores dos grupos Hn(M,M r x) ≃ Z, onde x ∈ M, enquanto
que a projecao orientada p : M −→ M e definida como sendo a aplicacao que leva
cada gerador de Hn(M,M r x) no ponto x ∈ M; consequentemente, dado x ∈ M,
temos que a imagem inversa p−1(x) e o conjunto constituıdo unicamente dos dois
geradores de Hn(M,Mr x) ≃ Z. Por outro lado, se s : M −→ M e uma orientacao
em M, segue (por definicao) que s e contınua, e p s = IdM, onde IdM : M −→ M e
a identidade. Logo, dado x ∈ M, temos que p(s(x)) = x, isto e, s(x) ∈ p−1(x), o que
implica que s(x) e um gerador de Hn(M,M r x) ≃ Z.
(ii) De fato, se M e orientavel, temos que o fibrado orientado M e a uniao de duas
componentes conexas distintas C1 e C2, e as restricoes p |C1: C1 −→ M e p |C2
:
C2 −→M (da projecao orientada p : M −→M as componentes C1 e C2) constituem
recobrimentos simples de M. Logo, temos que p |C1e p |C2
sao homeomorfismos
sobre M, e, portanto, os homeomorfismos inversos s1 = (p |C1)−1 : M −→ C1 ⊆ M
e s2 = (p |C2)−1 : M −→ C2 ⊆ M definem orientacoes distintas em M (note que
p s1 = p s2 = IdM, onde IdM : M −→ M e a identidade). Reciprocamente, seja
s : M −→ M uma orientacao em M, e suponhamos (por absurdo) que M seja nao-
orientavel; neste caso, temos que o fibrado orientado M e uma variedade topologica
conexa (e, portanto, conexa por caminhos), e a projecao orientada p : M −→ M e
um recobrimento duplo de M. Por outro lado, dado x ∈M, sabemos que µx = s(x)
e um gerador de Hn(M,M r x) ≃ Z (conforme vimos no item anterior); assim,
denotando por −µx o outro gerador de Hn(M,M r x) ≃ Z, distinto de µx = s(x),
seja ω : I −→ M um caminho tal que ω(0) = µx e ω(1) = −µx. Temos entao que a
imagem ω = p ω : I −→ M e um laco com base em x = p(µx) = p(−µx), e ω e o
unico levantamento deω (relativamente ao recobrimento p : M −→M), com inıcio
em µx. Alem disso, como a composicao p s : M −→M e a identidade em M, segue
que o caminho sω : I −→ M coincide com ω (pois, como p (sω) = ω, segue que
sω : I −→ M tambem e um levantamento deω com inıcio em (sω)(0) = s(x) = µx,
o que, pela unicidade do levantamento ω, implica que sω = ω). Logo, a aplicacao
s : M −→ M leva o laco ω : I −→ M no caminho (nao-fechado) ω : I −→ M, o
que contradiz o fato de s ser contınua. Portanto, se M admite uma orientacao
s : M −→ M, segue que o fibrado orientado M nao pode ser conexo, isto e, M deve
ser orientavel.
(iii) Com efeito, dado x0 ∈M arbitrario, sabemos que s : M −→ M e contınua em x0 se,
e somente se, para toda vizinhanca aberta W ⊆ M de s(x0), existe uma vizinhanca
W ⊆M de x0, tal que s(W) ⊆ W. Por outro lado, sabemos tambem que a colecao
C = U(µV,V) : V ⊆M e n-bola propria e µV e gerador de Hn(M,M rV) ≃ Z
1.1 Orientabilidade de Variedades Topologicas 11
constitui uma base para a topologia de M (lembre-se que, para cada n-bola propria
V ⊆ M e cada gerador µV ∈ Hn(M,M r V) ≃ Z, denotamos U(µV,V) como sendo
o conjunto ( jy)∗(µV) : y ∈ V, onde ( jy)∗ : Hn(M,M r V) −→ Hn(M,M r y) e o
isomorfismo induzido pela inclusao). Logo, dada uma vizinhanca aberta qualquer
W ⊆ M de s(x0), segue que existem uma n-bola propria V ⊆ M e um gerador
µV ∈ Hn(M,MrV), tais que s(x0) ∈ U(µV,V) ⊆ W. Deste modo, como a colecao de
todas as n-bolas proprias em M constitui uma base para a topologia de M, temos
que a aplicacao s : M −→ M e contınua em x0 se, e somente se, para toda n-bola
propria V ⊆ M, e todo gerador µV ∈ Hn(M,M r V) satisfazendo s(x0) ∈ U(µV,V)
[isto e, para todo aberto basico U(µV,V) ∈ C, contendo s(x0)], existe uma n-bola
propria W ⊆ M, contendo x0, tal que s(W) ⊆ U(µV,V). Isto posto, utilizando
a continuidade de s : M −→ M em x0, vamos mostrar que, a fim de que s seja
contınua em x0, e necessario e suficiente que existam uma n-bola propria V0 ⊆ M,
contendo x0, e um gerador µV0de Hn(M,M r V0) ≃ Z, tais que ( jV0
y0)∗(µV0
) = s(y0)
para todo y0 ∈ V0, onde ( jV0y0
)∗ : Hn(M,MrV0) −→ Hn(M,Mr y0) e o isomorfismo
induzido pela inclusao.
De fato, sejam V ⊆M uma n-bola propria e µV um gerador de Hn(M,M r V), com
s(x0) ∈ U(µV,V); supondo s : M −→ M contınua em x0, temos entao que existe
uma n-bola propria W ⊆ M, contendo x0, tal que s(W) ⊆ U(µV,V). No entanto,
se s(x0) ∈ U(µV,V), segue que existe um y ∈ V tal que s(x0) = ( jVy )∗(µV); logo,
como a composicao p s : M −→ M e a identidade em M (onde p : M −→ M
e a projecao orientada de M), segue que x0 = p(s(x0)) = p(( jVy )∗(µV)) = y (uma
vez que ( jVy )∗(µV) e um gerador de Hn(M,M r y) ≃ Z), ou seja, x0 ∈ V. Agora,
considere uma n-bola propria V0 ⊆ M tal que x0 ∈ V0 ⊆ V ∩W (a qual existe, pois
a colecao de todas as n-bolas proprias em M e uma base para a topologia de M);
como MrV e um retrato por deformacao de MrV0, temos que o homomorfismo
i∗ : Hn(M,M r V) −→ Hn(M,M r V0), induzido pela inclusao i : (M,M r V) −→
(M,MrV0), constitui um isomorfismo. Seja, pois, µV0o gerador de Hn(M,MrV0) ≃
Z tal que i∗(µV) = µV0, e, para cada y ∈ V, continuemos a denotar por ( jV
y )∗ :
Hn(M,M r V) −→ Hn(M,M r y) o isomorfismo induzido pela inclusao. Como
s(V0) ⊆ s(W) ⊆ U(µV,V) = ( jVy )∗(µV) : y ∈ V, segue que, para cada y0 ∈ V0, existe
um y ∈ V tal que s(y0) = ( jVy )∗(µV); logo, como p s : M −→ M e a identidade em
M, obtemos que y0 = p(s(y0)) = p(( jVy )∗(µV)) = y, isto e, s(y0) = ( jV
y0)∗(µV) para cada
y0 ∈ V0 ⊆ V. Portanto, denotando por ( jV0y0
)∗ : Hn(M,M r V0) −→ Hn(M,M r y0)
o isomorfismo induzido pela inclusao, onde y0 ∈ V0, segue, da comutatividade
do diagrama abaixo, que ( jV0y0
)∗(µV0) = [( jV
y0)∗ i−1
∗ ](µV0) = ( jV
y0)∗(µV) = s(y0) para
todo y0 ∈ V0. Em outras palavras, a continuidade de s : M −→ M no ponto x0
12 Preliminares
implica que existem uma n-bola propria V0 ⊆ M, contendo x0, e um gerador µV0
de Hn(M,M r V0), tais que ( jV0y0
)∗(µV0) = s(y0) para cada y0 ∈ V0.
Hn(M,M r V0) Hn(M,M r V)
Hn(M,M r y0)
( jV0y0
)∗
i∗
( jVy0
)∗
Reciprocamente, suponhamos entao que existam uma n-bola propria V0 ⊆ M,
contendo x0, e um geradorµV0∈ Hn(M,MrV0), tais que ( jV0
y0)∗(µV0
) = s(y0) para todo
y0 ∈ V0 (onde ( jV0y0
)∗ : Hn(M,MrV0) −→ Hn(M,Mr y0) e o isomorfismo induzido
pela inclusao), e seja V ⊆ M uma n-bola propria satisfazendo s(x0) ∈ U(µV,V),
para algum gerador µV ∈ Hn(M,M r V) ≃ Z. Conforme vimos ha pouco, o fato
de termos s(x0) ∈ U(µV,V) nos garante que x0 ∈ V. Considere, pois, uma n-bola
propria W ⊆ M tal que x0 ∈ W ⊆ V ∩ V0 (a qual existe, uma vez que a colecao
de todas as n-bolas proprias em M e uma base para a topologia de M); como
( jV0y0
)∗(µV0) = s(y0) para todo y0 ∈ V0, segue, em particular, que ( jV0
x0)∗(µV0
) = s(x0) e
( jV0w )∗(µV0
) = s(w) para cada w ∈W ⊆ V0. Agora, observando que MrV e MrV0 sao
retratos por deformacao de MrW, segue que os homomorfismos (iV)∗ : Hn(M,Mr
V) −→ Hn(M,MrW) e (iV0)∗ : Hn(M,MrV0) −→ Hn(M,MrW), induzidos pelas
inclusoes iV : (M,M r V) −→ (M,M r W) e iV0: (M,M r V0) −→ (M,M r W),
constituem isomorfismos. Isto posto, para cada y ∈ V e cada w ∈ W, denote por
( jVy )∗ : Hn(M,MrV) −→ Hn(M,Mr y) e ( jW
w )∗ : Hn(M,MrW) −→ Hn(M,Mr w)
os isomorfismos induzidos pelas respectivas inclusoes, e, dado w ∈ W ⊆ V ∩ V0,
considere o seguinte diagrama comutativo:
Hn(M,M r x0)
Hn(M,M rV) Hn(M,M rW) Hn(M,M rV0)
Hn(M,M r w)
( jVx0
)∗ ( jV0x0
)∗
(iV)∗ (iV0)∗
( jVw)∗
( jWw )∗
( jV0w )∗
(note que a comutatividade do diagrama segue do fato de que os isomorfismos
representados sao todos induzidos por inclusoes). Assim, como ( jVx0
)∗(µV) = s(x0)
(pois s(x0) ∈ U(µV,V) e p s : M −→ M e a identidade em M), podemos concluir
1.1 Orientabilidade de Variedades Topologicas 13
que:
( jVw)∗(µV) = [( jW
w )∗ (iV)∗](µV) = ( jWw )∗ [(iV0
)∗ ( jV0x0
)−1∗ ( jV
x0)∗](µV)
= [( jWw )∗ (iV0
)∗ ( jV0x0
)−1∗ ](s(x0)) = [( jW
w )∗ (iV0)∗](µV0
)
= ( jV0w )∗(µV0
) = s(w) ,
isto e, ( jVw)∗(µV) = s(w) para todo w ∈W. Portanto:
s(W) ⊆ ( jVw)∗(µV) : w ∈W ⊆ V ⊆ ( jV
y )∗(µV) : y ∈ V = U(µV,V) ,
o que mostra que, para toda n-bola propria V ⊆M, e todo gerador µV ∈ Hn(M,Mr
V) satisfazendo s(x0) ∈ U(µV,V), existe uma n-bola propria W ⊆ M, contendo
x0, tal que s(W) ⊆ U(µV,V), o que significa que s : M −→ M e contınua em x0.
Em resumo, temos entao que s e contınua em x0 se, e somente se, existem uma
n-bola propria V0 ⊆ M, contendo x0, e um gerador µV0de Hn(M,M r V0), tais que
( jV0y0
)∗(µV0) = s(y0) para cada y0 ∈ V0, conforme querıamos provar.
Finalmente, como s : M −→ M e contınua se, e so se, ela for contınua em cada ponto
de M, segue que s sera contınua se, e somente se, para todo ponto x ∈M, existirem
uma n-bola propria V ⊆M, contendo x, e um gerador µV ∈ Hn(M,MrV) ≃ Z, tais
que ( jy)∗(µV) = s(y) para cada y ∈ V (onde ( jy)∗ : Hn(M,M r V) −→ Hn(M,M r y)
e o isomorfismo induzido pela inclusao), o que encerra a demonstracao.
Intuitivamente, uma orientacao s : M −→ M pode ser vista como uma “escolha
contınua” de orientacoes locais para os pontos de M, de tal forma que o diagrama abaixo
seja comutativo (note que s e um levantamento da aplicacao identidade IdM : M −→M,
relativamente a projecao orientada p : M −→M).
M
M M
s p
IdM
Convem observarmos ainda que, se M for uma variedade topologica, de dimensao
n e sem fronteira, mas nao-conexa, a orientabilidade de M fica condicionada a ori-
entabilidade de cada uma de suas componentes conexas, isto e, M sera considerada
orientavel se, e somente se, todas as suas componentes conexas assim o forem; neste
caso, denotando por m > 1 o numero de componentes de M, podemos ver que ha 2m
maneiras distintas de orientar M, posto que cada componente conexa C de M admitira
14 Preliminares
duas orientacoes distintas (cada uma assumindo valores numa das duas componentes
do fibrado orientado C de C).
Exemplo 1.1.1 . Pode-se verificar (embora nao o faremos aqui) que o espaco euclidiano
Rn, a esfera unitaria n-dimensional e o toro T2 sao exemplos de variedades topologicas
orientaveis, enquanto que o plano projetivo real RP2 e a garrafa de Klein K sao varie-
dades nao-orientaveis.
Exemplo 1.1.2 . Se M e uma variedade topologica conexa, contratil e sem fronteira, entao
M e orientavel: com efeito, se M e contratil, segue que M e simplesmente conexa, e,
portanto, todo recobrimento de M constitui um homeomorfismo (vide [Li], proposicao
11, pagina 136); isto, por sua vez, implica que o fibrado orientado de M nao pode ser
conexo, pois, neste caso, a projecao orientada de M seria um recobrimento de duas
folhas (e nao um homeomorfismo).
Proposicao 1.1.1 . Sejam M e N variedades topologicas de dimensao n, conexas e sem fronteira.
Se f : M −→ N e um homeomorfismo local, e N e orientavel, entao M tambem e orientavel.
Demonstracao. Sendo N orientavel, considere uma orientacao sN : N −→ CN, onde
CN e uma das duas componentes conexas do fibrado orientado N. Dado um ponto
x ∈ M, sabemos (pela continuidade de sN) que existem uma n-bola propria V ⊆ N,
com f (x) ∈ V, e um gerador µV ∈ Hn(N,N r V), tais que (iVy )∗(µV) = sN(y) para todo
y ∈ V, onde (iVy )∗ : Hn(N,N r V) −→ Hn(N,N r y) e o isomorfismo induzido pela
inclusao (vide item (iii) do lema 1.1.1). Seja, pois, U ⊆ f−1(V) uma n-bola propria
contendo x, tal que W = f (U) ⊆ V e aberto (e conexo) em M, contendo f (x), e f |U e
um homeomorfismo sobre W. Denotando por i∗ : Hn(N,N r V) −→ Hn(N,N rW) o
homomorfismo induzido pela inclusao, temos que µW = i∗(µV) ∈ Hn(N,N rW) e tal
que (iy)∗(µW) = sN(y) para todo y ∈ V ∩W, onde (iy)∗ : Hn(N,N rW) −→ Hn(N,N r y)
e o isomorfismo induzido pela inclusao: com efeito, da comutatividade do diagrama
abaixo, segue que (iy)∗(µW) = (iy)∗(i∗(µV)) = (iVy )∗(µV) = sN(y), para cada y ∈ V ∩W.
Hn(N,N rV) Hn(N,N r y)
Hn(N,N rW)
(iVy )∗
(iy)∗i∗
Alem disso, do teorema da excisao em homologia singular, sabemos que os homo-
morfismos ( jUx )∗ : Hn(U,U r x) −→ Hn(M,M r x) e (iW
f (x))∗ : Hn(W,W r f (x)) −→
1.1 Orientabilidade de Variedades Topologicas 15
Hn(N,Nr f (x)), induzidos pelas respectivas inclusoes, sao isomorfismos, assim como
o homomorfismo ( f |U)x∗ : Hn(U,U r x) −→ Hn(W,W r f (x)) induzido por f |U. Logo,
vamos definir a orientacao de M no ponto x como sendo o unico gerador µx de
Hn(M,M r x) que e levado no gerador sN( f (x)) de Hn(N,N r f (x)) pela seguinte
cadeia de isomorfismos:
Hn(M,M r x)
Hn(U,U r x) Hn(W,W r f (x))
Hn(N,N r f (x))
( jUx )−1∗
( f |U)x∗
(iWf (x))∗
(note que sN( f (x)) e, de fato, um gerador de Hn(N,N r f (x)), conforme nos garante o
item (i) do lema 1.1.1). Considere ainda o gerador µU ∈ Hn(M,MrU) que e levado em
µW ∈ Hn(N,N rW) pelos isomorfismos dados no diagrama abaixo:
Hn(M,M rU)
Hn(M,M r x) Hn(U,U r x)
Hn(W,W r f (x)) Hn(N,N r f (x))
Hn(N,N rW)
( jx)∗
( jUx )−1∗
( f |U)x∗
(iWf (x))∗
(i f (x))−1∗
Temos entao que ( jz)∗(µU) = µz para cada z ∈ U, onde ( jz)∗ : Hn(M,MrU) −→ Hn(M,Mr
z) e o isomorfismo induzido pela inclusao (obviamente, estamos denotando por µz
a orientacao de M no ponto z, obtida de maneira analoga a µx). De fato, dado z ∈ U
arbitrario (e observando que f (z) ∈W, pois f |U e um homeomorfismo sobre W), temos
16 Preliminares
o seguinte diagrama comutativo:
Hn(M,M rU)
Hn(M,M r x) Hn(M,M r z)
Hn(U,U r x) Hn(U,U r z)
Hn(W,W r f (x)) Hn(W,W r f (z))
Hn(N,N r f (x)) Hn(N,N r f (z))
Hn(N,N rW)
( jx)∗ ( jz)∗
( jUx )−1∗
( f |U)x∗
(iWf (x))∗
(i f (x))−1∗
( jUz )∗
[( f |U)z∗]−1
(iWf (z))∗
(i f (z))−1∗
Utilizando este diagrama, podemos ver que os isomorfismos do ramo esquerdo levam
µU ∈ Hn(M,M r U) em µW ∈ Hn(N,N rW), o qual, por sua vez, e levado por (i f (z))∗em sN( f (z)) ∈ Hn(N,N r f (z)); entretanto, sabemos (por definicao) que a composicao
( jUz )−1∗ [( f |U)z
∗] (iWf (z)
)∗ leva sN( f (z)) no gerador µz ∈ Hn(M,M r z). Portanto, como o
resultado deste procedimento coincide com a imagem de µU por ( jz)∗, concluımos que
( jz)∗(µU) = µz.
Agora, suponha que U′ ⊆ f−1(V) seja outra n-bola propria contendo x, tal que
W′ = f (U′) ⊆ V e aberto (e conexo) em M, com f (x) ∈ W′, e f |U′ e um homeomorfismo
sobre W′. Neste caso, a orientacao de M no ponto x poderia ser o gerador µ′x de
Hn(M,M r x), que e levado em sN( f (x)) ∈ Hn(N,N r f (x)) pela seguinte cadeia de
isomorfismos:
Hn(M,M r x) Hn(U′,U′ r x)
Hn(W′,W′ r f (x)) Hn(N,N r f (x))
( jU′
x )−1∗
( f |U′)x∗
(iW′
f (x))∗
1.1 Orientabilidade de Variedades Topologicas 17
Entretanto, a comutatividade do diagrama abaixo nos garante que µ′x = µx.
Hn(U,U r x) Hn(W,W r x)
Hn(M,M r x) Hn(N,N r f (x))
Hn(U′,U′ r x) Hn(W,W r x)
( f |U)x∗
( jUx )−1∗
( jU′
x )−1∗
( f |U′)x∗
(iWf (x))∗
(iW′
f (x))∗
Finalmente, sendo M o fibrado orientado de M, considere a aplicacao sM : M −→ M,
que, a cada x ∈M, associa o geradorµx ∈ Hn(M,Mrx) obtido conforme descrito acima.
Denotando por pM : M −→ M a projecao orientada de M, segue que a composicao
pM sM : M −→ M e a identidade em M; alem disso, pelos fatos que acabamos de
demonstrar, temos que sM esta bem definida e e contınua em M (vide lema 1.1.1). Logo,
sM define uma orientacao em M, o que significa que M e uma variedade orientavel,
como querıamos provar.
Proposicao 1.1.2 . Sendo M uma variedade topologica de dimensao n, conexa e sem fronteira,
temos que o fibrado orientado M e uma variedade orientavel, independentemente da orientabili-
dade de M.
Demonstracao. Primeiramente, suponhamos que M seja orientavel, e, denotando
por C1 e C2 as componentes conexas do fibrado orientado M, considere os recobrimentos
p1 = p |C1: C1 −→M e p2 = p |C2
: C2 −→M, obtidos pela restricao da projecao orientada
p : M −→ M a C1 e C2, respectivamente. Como p1 e p2 sao homeomorfismos locais,
segue (da proposicao 1.1.1) que C1 e C2 sao orientaveis, e, portanto, o fibrado orientado
M = C1 ∪ C2 e orientavel. Suponhamos entao que M seja nao-orientavel; neste caso,
temos que M e conexo, e a projecao orientada p : M −→ M e um recobrimento de
duas folhas. Isto posto, dado x ∈ M, seja x = p(x) ∈ M (de modo, que x e, portanto,
um gerador de Hn(M,M r x)), e considere uma n-bola propria V ⊆ M, contendo
x, que constitui uma vizinhanca elementar em relacao ao espaco de recobrimento M
(isto e, tal que p−1(V) e uma uniao disjunta de abertos em M, cada um dos quais se
aplica por p homeomorficamente sobre V). Sendo V ⊆ M a componente conexa de
p−1(V) contendo x, temos que p |V : V −→ V e um homeomorfismo sobre V, que leva
x em x; logo, o homomorfismo (p |V)∗ : Hn(V, V r x) −→ Hn(V,V r x), induzido
18 Preliminares
por p |V, e um isomorfismo. Por outro lado, do teorema da excisao em homologia
singular, sabemos que os homomorfismos ( jx,V)∗ : Hn(V, V r x) −→ Hn(M, M r x) e
( jx,V)∗ : Hn(V,Vr x) −→ Hn(M,Mr x), induzidos pelas inclusoes jx,V : (V, Vr x) −→
(M, M r x) e jx,V : (V,V r x) −→ (M,M r x), tambem sao isomorfismos. Assim,
definimos a orientacao de M em x como sendo o gerador s(x) de Hn(M, M r x) que e
levado no gerador x ∈ Hn(M,M r x) pela seguinte cadeia de isomorfismos:
Hn(M, M r x) Hn(V, V r x)
Hn(V,V r x) Hn(M,M r x)
( jx,V)−1∗
(p |V)∗
( jx,V)∗
Note que s(x) nao depende da n-bola propria V ⊆ M que tomamos inicialmente: de
fato, dada outra n-bola propria V′ ⊆ M, com x ∈ V′, que constitui uma vizinhanca
elementar relativamente ao espaco de recobrimento M, e denotando por V′ ⊆ M a
componente conexa de p−1(V′) contendo x, temos que a restricao p |V′ : V′ −→ V′ e um
homeomorfismo sobre V′ (que leva x em x), e, consequentemente, o homomorfismo
induzido (p |V′)∗ : Hn(V′, V′ r x) −→ Hn(V′,V′ r x) e um isomorfismo; logo, sendo
( jx,V′)∗ : Hn(V′, V′r x) −→ Hn(M, Mr x) e ( jx,V′)∗ : Hn(V′,V′r x) −→ Hn(M,Mr x)
os isomorfismos induzidos pelas respectivas inclusoes, segue da comutatividade do
diagrama abaixo que o gerador s(x) ∈ Hn(M, M r x), correspondente a x ∈ Hn(M,M r
x) pelo isomorfismo ( jx,V)∗ (p |V)∗ ( jx,V)−1∗ , coincide com o gerador de Hn(M, Mr x)
que e levado em x pelo isomorfismo ( jx,V′)∗ (p |V′)∗ ( jx,V′)−1∗ .
Hn(V, V r x) Hn(V,V r x)
Hn(M, M r x) Hn(M,M r x)
Hn(V′, V′ r x) Hn(V′,V′ r x)
(p |V)∗
( jx,V)−1∗
( jx,V′)−1∗
(p |V′)∗
( jx,V)∗
( jx,V′)∗
Deste modo, denotando por ˜M o fibrado orientado de M (que e a variedade to-
pologica constituıda exclusivamente dos geradores dos grupos Hn(M, M r x), onde
x ∈ M), seja s : M −→ ˜M a aplicacao que, a cada x ∈ M, associa o gerador s(x) ∈
1.1 Orientabilidade de Variedades Topologicas 19
Hn(M, Mr x) segundo o procedimento acima; vamos mostrar entao que s define uma
orientacao em M. Com efeito, sendo ˜p : ˜M −→ M a fibracao orientada de M (dada
por ˜p( ˜x) = x para cada gerador ˜x ∈ Hn(M, M r x), onde x ∈ M), temos de imediato
que ˜p s = IdM, onde IdM : M −→ M e a identidade. Agora, a fim de mostrarmos que
s e contınua em M, tomemos um ponto x ∈ M arbitrario, e consideremos uma n-bola
propria V ⊆M, contendo o ponto x = p(x), que constitui uma vizinhanca elementar em
relacao ao espaco de recobrimento M. Sendo V ⊆ M a componente conexa de p−1(V) que
contem x, temos, pois, que a restricao p |V : V −→ V e um homeomorfismo sobre V; logo,
dado outro ponto y ∈ V, segue que y e o unico gerador de Hn(M,Mr y) tal que y ∈ V,
onde y = p(y) ∈ V. Por outro lado, denotando por ( jx)∗ : Hn(M,MrV) −→ Hn(M,Mrx)
e ( jx)∗ : Hn(M, M r V) −→ Hn(M, M r x) os isomorfismos induzidos pelas inclusoes
jx : (M,M r V) −→ (M,M r x) e jx : (M, M r V) −→ (M, M r x), respectivamente,
sejam µV ∈ Hn(M,M r V) e µV ∈ Hn(M, M r V) os geradores tais que ( jx)∗(µV) = x e
( jx)∗(µV) = s(x), onde s(x) e o gerador de Hn(M, Mr x) definido ha pouco (note que x e
um gerador de Hn(M,M r x)). Considere ainda o diagrama comutativo abaixo, onde
( jx,V)∗, ( jx,V)∗, ( jy,V)∗, ( jy,V)∗, ( jy)∗ e ( jy)∗ sao os isomorfismos induzidos pelas respectivas
inclusoes:Hn(M,M r V)
Hn(M,M r x) Hn(M,M r y)
Hn(V,V r x) Hn(V,V r y)
Hn(V, V r x) Hn(V, V r y)
Hn(M, M r x) Hn(M, M r y)
Hn(M, M r V)
( jx)∗ ( jy)∗
( jx,V)∗
(p |V)∗
( jx,V)−1∗
( jx)∗ ( jy)∗
( jy,V)∗
(p |V)−1∗
( jy,V)−1∗
Por definicao, sabemos que x = [( jx,V)∗ (p |V)∗ ( jx,V)−1∗ ](s(x)) e s(( jy)∗(µV))x = [( jy,V)∗
(p |V)−1∗ ( jy,V)−1
∗ ](( jy)∗(µV)); consequentemente, pela comutatividade do diagrama acima,
20 Preliminares
obtemos que:
( jy)∗(µV) = [( jy,V)∗ (p |V)−1∗ ( jy,V)−1
∗ ( jy)∗ ( jx)−1∗
( jx,V)∗ (p |V)∗ ( jx,V)−1∗ ( jx)∗](µV)
= [( jy,V)∗ (p |V)−1∗ ( jy,V)−1
∗ ( jy)∗ ( jx)−1∗
( jx,V)∗ (p |V)∗ ( jx,V)−1∗ ](s(x))
= [( jy,V)∗ (p |V)−1∗ ( jy,V)−1
∗ ( jy)∗ ( jx)−1∗ ](x)
= [( jy,V)∗ (p |V)−1∗ ( jy,V)−1
∗ ( jy)∗](µV)
= s(( jy)∗(µV)) .
Assim, como o ponto y ∈ V e arbitrario, podemos concluir que s(( jy)∗(µV)) = ( jy)∗(µV)
para todo y ∈ V, onde y = p(y); em outras palavras, lembrando que U(µV,V) =
( jy)∗(µV) : y ∈ V e U(µV, V) = ( jy)∗(µV) : y ∈ V, temos s[U(µV,V)] ⊆ U(µV, V).
Finalmente, observe entao que x ∈ U(µV,V) e s(x) ∈ U(µV, V), pois os pontos x ∈ V
e x ∈ V sao tais que x = ( jx)∗(µV) e s(x) = ( jx)∗(µV). Logo, U(µV,V) ⊆ M e U(µV, V) ⊆ ˜Msao vizinhancas abertas de x e s(x), respectivamente, tais que s[U(µV,V)] ⊆ U(µV, V).
Portanto, como a colecao
C = U(µB, B) : B ⊆ M e uma n-bola propria e µB e um gerador de Hn(M, M r B) ≃ Z
constitui uma base para a topologia de ˜M, e como V ⊆ M e uma n-bola propria contendo
x (pois V e homeomorfo a n-bola propria V ⊆M pela restricao p |V : V −→ V), segue que,
para toda vizinhanca aberta ˜W de s(x) em ˜M, existem n-bolas proprias V ⊆ M e V ⊆ M,
contendo x = p(x) e x, respectivamente, e existem geradores µV ∈ Hn(M,M r V) e
µV ∈ Hn(M, Mr V), tais que x ∈ U(µV,V), s(x) ∈ U(µV, V) e s[U(µV,V)] ⊆ U(µV, V) ⊆ ˜W(lembre-se que s(x) nao depende da n-bola propria V ⊆M utilizada para defini-lo, desde
que ela contenha x = p(x) e seja uma vizinhanca elementar em relacao ao recobrimento
p : M −→ M). Deste modo, mostramos que, para toda vizinhanca aberta ˜W ⊆ ˜M de
s(x), existe uma vizinhanca aberta W ⊆ M de x tal que s(W) ⊆ ˜W, o que implica que
s : M −→ ˜M e contınua em x. Logo, como x ∈ M e arbitrario, segue que a aplicacao
s : M −→ ˜M e contınua, e, por conseguinte, define uma orientacao em M (vide lema
1.1.1).
Isto posto, dada uma variedade topologica conexa M, de dimensao n e sem fronteira,
considere agora um subconjunto aberto e conexo U ⊆ M. Temos entao que U tambem
e uma variedade topologica de dimensao n (conexa e sem fronteira), e, para cada
x ∈ U, o homomorfismo (ix)∗ : Hn(U,Ur x) −→ Hn(M,Mr x), induzido pela inclusao
ix : (U,U r x) −→ (M,M r x), constitui um isomorfismo (conforme nos garante o
1.1 Orientabilidade de Variedades Topologicas 21
teorema da excisao em homologia singular). Deste modo, supondo M orientavel, e
sendo s : M −→ M uma orientacao em M, vamos mostrar que a aplicacao sU : U −→ U,
dada por sU(x) = [(ix)−1∗ s](x) para cada x ∈ U, define uma orientacao em U. Com efeito,
dado x0 ∈ U, temos que sU(x0) e o unico gerador de Hn(U,U r x0) que e levado no
gerador s(x0) de Hn(M,Mr x0) pelo isomorfismo (ix0)∗ [note que, pelo item (i) do lema
1.1.1, temos que s(x0) e de fato um gerador de Hn(M,M r x0)]; alem disso, a projecao
orientada pU : U −→ U, que leva cada gerador µx ∈ Hn(U,U r x) no ponto x ∈ U, e
tal que pU sU = IdU, onde IdU : U −→ U e a identidade (lembre-se que U e o fibrado
orientado de U, que contem somente as orientacoes locais dos pontos de U). Por outro
lado, a continuidade de s : M −→ M no ponto x0 ∈ U, implica que existem uma n-bola
propria V ⊆ M, contendo x0, e um gerador µV ∈ Hn(M,M r V), tais que ( jx)∗(µV) = s(x)
para todo x ∈ V, onde ( jx)∗ : Hn(M,MrV) −→ Hn(M,Mr x) e o isomorfismo induzido
pela inclusao (vide item (iii) do lema 1.1.1). Seja, pois, W ⊆ M uma n-bola propria
contendo x0, tal que W ⊆ U ∩ V (a qual existe, pois a colecao de todas as n-bolas
proprias em M e uma base para a topologia de M), e, para cada x ∈W ⊆ V, considere os
isomorfismos ilustrados no diagrama comutativo abaixo, induzidos pelas respectivas
inclusoes:
Hn(M,M rW) Hn(M,M r V)
Hn(U,U rW) Hn(M,M r x)
Hn(U,U r x)
( jVW)∗
(iUx )∗
(iW)∗ ( jx)∗
( jx)∗ (ix)∗
(note que MrV e UrW sao retratos por deformacao de MrW e Urx, respectivamente).
Deste modo, sendo µW o gerador de Hn(U,U rW) tal que [( jVW
)−1∗ (iW)∗](µW) = µV ∈
Hn(M,M r V), segue (da comutatividade do diagrama acima) que:
( jUx )∗(µW) = [(ix)−1
∗ (iUx )∗](µW) = (ix)−1
∗ [( jx)∗ ( jVW)−1∗ (iW)∗](µW)
= [(ix)−1∗ ( jx)∗](µV) = (ix)−1
∗ (s(x)) = sU(x) ,
para todo x ∈ W ⊆ U ∩ V. Assim, podemos concluir que existem uma n-bola propria
W ⊆ U, contendo x0, e um gerador µW ∈ Hn(U,U rW), tais que ( jUx )∗(µW) = sU(x) para
todo x ∈ W, o que, por sua vez, significa que a aplicacao sU : U −→ U e contınua no
ponto x0 ∈ U (vide item (iii) do lema 1.1.1). Portanto, temos que sU e, de fato, uma
orientacao em U, de modo que podemos introduzir a seguinte
22 Preliminares
Definicao 1.1.3 . Sendo M uma variedade topologica de dimensao n, conexa, orientavel e sem
fronteira, denotemos por s : M −→ M uma orientacao em M, e, dado um subconjunto aberto
e conexo U ⊆ M, consideremos a orientacao sU : U −→ U definida por sU(x) = [(ix)−1∗ s](x)
para cada x ∈ U, onde (ix)∗ : Hn(U,U r x) −→ Hn(M,M r x) e o isomorfismo induzido
pela inclusao. Utilizando um certo abuso de notacao, dizemos entao que sU e a restricao da
orientacao s : M −→ M ao conjunto U ⊆ M, ou ainda, que sU e a orientacao induzida em U
pela orientacao s : M −→ M.
Na definicao acima, note que, mesmo que o aberto U ⊆ M nao seja conexo, a
orientacao s : M −→ M induz uma orientacao sU′ : U′ −→ U′ em cada componente
conexa U′ de U, o que torna U uma variedade orientada.
Definicao 1.1.4 . Sendo M uma variedade topologica de dimensao n, conexa e com fronteira
∂M, dizemos que M e orientavel se Int M = M r ∂M for uma variedade orientavel, isto
e, se o fibrado orientado de Int M for a uniao de duas componentes conexas distintas. Neste
caso, sendo p : Int M −→ Int M a projecao orientada de Int M, definimos uma orientacao
em M como sendo uma aplicacao contınua s : Int M −→ Int M, tal que p s = IdInt M, onde
IdInt M : Int M −→ Int M e a identidade.
Note que a definicao acima nao leva em consideracao os pontos da fronteira de
M; entretanto, como ∂M constitui uma variedade topologica de dimensao n − 1 (sem
fronteira), segue que o conceito de orientabilidade se aplica a cada componente conexa
de ∂M. Alem disso, pode-se provar (vide [D], pagina 257) que, se M e orientavel, entao
qualquer orientacao em Int M induz uma orientacao em ∂M; convem lembrarmos
apenas que o fato de Int M ser nao-orientavel nao significa que ∂M tambem o seja (a
faixa de Mobius e um exemplo de variedade conexa nao-orientavel, cuja fronteira e
orientavel).
Definicao 1.1.5 . Seja M uma variedade topologica de dimensao n, conexa e com fronteira, e
seja p : N −→ N a projecao orientada de N = Int M. Sendo C uma componente conexa de
N, sabemos que a restricao p |C : C −→ N e um recobrimento de N (eventualmente, C = N
se N e conexo, isto e, se N = Int M e nao-orientavel). Logo, dado um laco ω : I −→ N,
com ω(0) = ω(1) = x0 ∈ N, e denotando por µx0o gerador de Hn(N,N r x0) ≃ Z tal que
µx0∈ C, segue que existe um unico levantamento ω : I −→ C (isto e, p |C ω = ω) satisfazendo
ω(0) = µx0. Assim, temos que ω(1) = ±µx0
; dizemos, pois, que ω preserva orientacao
(respectivamente, inverte orientacao) se ω(1) = µx0(respectivamente, ω(1) = −µx0
).
1.1 Orientabilidade de Variedades Topologicas 23
Exemplo 1.1.3 . Intuitivamente, podemos ver que o cırculo central de uma faixa de
Mobius constitui um laco que inverte orientacao, pois, dada uma orientacao s(x0)
num ponto x0 deste cırculo, e estendendo-se s(x0) continuamente ao longo do cırculo,
obtemos, apos uma volta completa, uma orientacao s′(x0) que e oposta a s(x0).
Proposicao 1.1.3 . Seja M uma variedade topologica de dimensao n, conexa e com fronteira
nao necessariamente vazia. Entao, M e orientavel se, e somente se, todo laco ω : I −→ Int M
preserva orientacao (ou, equivalentemente, M e nao-orientavel se, e somente se, existe pelo
menos um laco ω : I −→ Int M que inverte orientacao).
Demonstracao. Primeiramente, suponhamos que M seja orientavel, e consideremos
o recobrimento p |C : C −→ N de N = Int M, relativo a uma componente conexa C
de N (lembre-se que a orientabilidade de M significa que N e constituıdo de duas
componentes conexas distintas). Sendo s : N −→ C uma orientacao em N, temos que
p s = Id (onde Id : N −→ N e a identidade), e s(x) e um gerador de Hn(N,Nr x) para
cada x ∈ N. Agora, dado um laco ω : I −→ N, com ω(0) = ω(1) = x0 ∈ N, seja µx0∈ C o
gerador de Hn(N,N r x0) ≃ Z tal que s(x0) = µx0, e considere o (unico) levantamento
ω : I −→ C de ω (isto e, p |C ω = ω) tal que ω(0) = µx0. Temos entao que ω(1) = µx0
(pois µx0e o unico gerador de Hn(N,N r x0) pertencente a componente conexa C de
N), o que implica que ω e um laco que preserva orientacao.
Reciprocamente, suponhamos que todo laco em N = Int M preserve orientacao, e
seja p |C : C −→ N o recobrimento de N, relativo a uma componente conexa C de
N. Dado um laco ω : I −→ N, com ω(0) = ω(1) = x0 ∈ N, e sendo ω : I −→ C o
unico levantamento de ω tal que ω(0) = µx0, onde µx0
∈ C e um dos dois geradores de
Hn(N,N r x0) ≃ Z, segue entao que ω(1) = µx0. Ora, se ω(0) = ω(1) = µx0
, temos que
ω e um laco em C; deste modo, concluımos que todo laco ω : I −→ N e levantado para
um laco em C (pelo recobrimento p |C). Isto posto, vamos mostrar que C nao e a unica
componente conexa de N. Com efeito, se assim fosse, ambos os geradores µx0e −µx0
de Hn(N,N r x0) ≃ Z pertenceriam a C, qualquer que fosse x0 ∈ N; neste caso, sendo
α : I −→ C um caminho tal que α(0) = µx0e α(1) = −µx0
(o qual existe, pois o espaco
de recobrimento C e conexo por caminhos), segue que α = p α : I −→ N seria um
laco com base no ponto x0, cujo levantamento α nao e um laco em C, contradizendo
a conclusao acima. Portanto, se todo laco em N preserva orientacao, temos que N e
constituıdo de duas componentes conexas distintas, o que, por definicao, significa que
N = Int M e orientavel, conforme querıamos provar.
Definicao 1.1.6 . Sejam M e N variedades topologicas de dimensao n, nao necessariamente
orientaveis, e com fronteira (eventualmente vazias). Dizemos que uma aplicacao contınua
24 Preliminares
f : M −→ N e fiel a orientacao se ela leva lacos que preservam (respectivamente, invertem)
orientacao em lacos que preservam (respectivamente, invertem) orientacao.
A proposicao a seguir constitui uma consequencia direta da proposicao 1.1.3.
Proposicao 1.1.4 . Seja f : M −→ N uma aplicacao contınua entre variedades topologicas
conexas, ambas de dimensao n (nao necessariamente orientaveis e com fronteiras possivelmente
nao-vazias). Entao:
(i) se M e N sao orientaveis, f e fiel a orientacao;
(ii) se M e nao-orientavel e N e orientavel, f nao e fiel a orientacao.
Exemplo 1.1.4 . Considere a aplicacao quociente π : S2 −→ RP2. Como todo laco
ω : I −→ S2 preserva orientacao (pois S2 e orientavel), e a imagem π ω : I −→ RP2
e um laco contratil (e, portanto, preserva orientacao), segue que π e um exemplo de
aplicacao fiel a orientacao entre uma variedade orientavel (S2) e uma variedade nao-
orientavel (RP2). Observe que os lacos que invertem orientacao em RP2 sao imagens
(pela aplicacao quociente π) de caminhos homotopicos a semi-circulos maximos em S2;
logo, tais lacos em RP2 nao constituem imagens de lacos em S2.
Proposicao 1.1.5 . Se M e uma variedade topologica de dimensao n, conexa e com fronteira
(eventualmente vazia), entao todo recobrimento p : M′ −→M e uma aplicacao fiel a orientacao.
Demonstracao. Primeiramente, observe que, como p : M′ −→ M e um homeo-
morfismo local, segue (do teorema da invariancia do domınio) que p(∂M′) ⊆ ∂M e
p(Int M′) ⊆ Int M; consequentemente, temos que a restricao de p a Int M′ e um recobri-
mento de Int M. Seja, pois, p : N′ −→ N a restricao de p a N′ = Int M′ sobre N = Int M;
para provarmos que p : M′ −→ M e uma aplicacao fiel a orientacao, basta mostrarmos
que p e fiel a orientacao (uma vez que os conceitos de lacos que preservam ou inver-
tem orientacao estao definidos apenas para lacos no interior de uma variedade), sendo
que, para tanto, basta verificarmos que um laco α : I −→ N′ preserva orientacao se, e
somente se, sua imagem p α : I −→ N e um laco que preserva orientacao. Entretanto,
se M e orientavel (isto e, se N = Int M e orientavel), este fato torna-se evidente, pois,
pela proposicao 1.1.1, a orientabilidade de N implica na orientabilidade de N′, e, con-
sequentemente, todos os lacos em N′ e N preservam orientacao (conforme nos garante
a proposicao 1.1.3).
1.1 Orientabilidade de Variedades Topologicas 25
p
N′N
U0U1
U2
U3
Uk−1 α
Uk
x0 x1 x2
x3
xk
xk+1
V0
V1
V2
V3
Vk−1
β
Vk
y0
y1
y2
y3
ykyk+1
Figura 1.1
Assim sendo, suponhamos que N = Int M seja nao-orientavel, e considere um laco
α : I −→ N′, com base num ponto x0 ∈ N′, que preserva orientacao. Denotando
por β : I −→ N o laco, com base em y0 ∈ p(x0) ∈ N, dado por β = p α, seja
C(β) = V0,V1, . . . ,Vk uma cobertura finita de β(I) ⊆ N, onde V0,V1, . . . ,Vk sao subcon-
juntos abertos contrateis (e, portanto, orientaveis) de N, que constituem vizinhancas
elementares em relacao ao espaco de recobrimento N′. Se, para cada λ ∈ 0, 1, . . . , k,
denotarmos por Uλ a componente conexa de p−1(Vλ) tal que Uλ ∩ α(I) , ∅, temos que
C(α) = U0,U1, . . . ,Uk e uma cobertura de α(I), constituıda de subconjuntos abertos
contrateis de N′, e cada restricao p |Uλ: Uλ −→ Vλ e um homeomorfismo sobre Vλ.
Sejam ainda x1, x2, . . . , xk+1 ∈ α(I) e y1, y2, . . . , yk+1 ∈ β(I) tais que:
• p(xλ) = yλ para cada λ ∈ 1, 2, . . . , k + 1;
• xλ ∈ Uλ−1 ∩Uλ e yλ ∈ Vλ−1 ∩ Vλ para cada λ ∈ 1, 2, . . . , k;
• xk+1 ∈ Uk ∩U0 e yk+1 ∈ Vk ∩ V0
(vide figura 1.1 acima), e considere os caminhos α0,α1, . . . ,αk+1 : I −→ α(I) ⊆ N′ e
β0, β1, . . . , βk+1 : I −→ β(I) ⊆ N, cujas imagens estao contidas nas imagens dos lacos α e
β, satifazendo:
• βλ = p αλ para cada λ ∈ 0, 1, . . . , k + 1;
• αλ(0) = xλ, αλ(1) = xλ+1 e αλ(I) ⊆ Uλ para cada λ ∈ 0, 1, . . . , k;
• αk+1(0) = xk+1, αk+1(1) = x0 e αk+1(I) ⊆ U0;
• βλ(0) = yλ, βλ(1) = yλ+1 e βλ(I) ⊆ Vλ para cada λ ∈ 0, 1, . . . , k;
26 Preliminares
• βk+1(0) = yk+1, βk+1(1) = y0 e βk+1(I) ⊆ V0.
Isto posto, sendo p′ : N′ −→ N′ o recobrimento obtido de uma componente conexa
do fibrado orientado de N′, vamos levantar os caminhos αλ, λ ∈ 0, 1, . . . , k + 1, rela-
tivamente a p′, da seguinte maneira: dado um gerador x0 ∈ Hn(N′,N′ r x0) ⊆ N′, e
sendo α0 : I −→ N′ o unico levantamento de α0 tal que α0(0) = x0, considere o unico
levantamento α1 : I −→ N′ de α1, com α1(0) = x1, onde x1 = α0(1); entao, tomando
x2 = α1(1), definimos α2 : I −→ N′ como o unico levantamento de α2 tal que α2(0) = x2, e
assim sucessivamente (em outras palavras, escolhida uma orientacao x0 para α(0) = x0,
estendemo-la ao longo do laco α, ate o ponto α(1)). Deste modo, observando que
α = α0 ∨ α1 ∨ . . . ∨ αk+1, obtemos:
p′ (α0 ∨ α1 ∨ . . . ∨ αk+1) = (p′ α0) ∨ (p′ α1) ∨ . . . ∨ (p′ αk+1)
= α0 ∨ α1 ∨ . . . ∨ αk+1 = α ,
isto e, o caminho α = α0 ∨ α1 ∨ . . . ∨ αk+1 : I −→ N′, constituıdo da justaposicao de α0,
α1, . . ., αk+1, e um levantamento de α (relativamente a p′), com inıcio em α0(0) = x0.
Entretanto, como o laco α : I −→ N′ preserva orientacao (conforme nossa suposicao
inicial), temos que α pode ser levantado para um unico laco em N′ com inıcio em x0;
logo, o levantamento α = α0∨ α1∨ . . .∨ αk+1 e um laco em N′, ou seja, x0 = α(1) = αk+1(1).
Agora, utilizando o teorema da excisao em homologia singular, considere os iso-
morfismos (i0)∗ : Hn(U0,U0 r x0) −→ Hn(N′,N′ r x0) e ( j0)∗ : Hn(V0,V0 r y0) −→
Hn(N,N r y0), induzidos pelas respectivas inclusoes i0 : U0 −→ N′ e j0 : V0 −→ N.
Lembrando que a restricao p |U0: U0 −→ V0 e um homeomorfismo sobre V0, considere
tambem o isomorfismo (p0)∗ : Hn(U0,U0r x0) −→ Hn(V0,V0r y0) induzido por p |U0, e
seja y0 o gerador de Hn(N,Nr y0) que e levado em x0 ∈ Hn(N′,N′r x0) pela seguinte
cadeia de isomorfismos:
Hn(V0,V0 r y0) Hn(U0,U0 r x0)
Hn(N,N r y0) Hn(N′,N′ r x0)
( j0)−1∗
(p0)−1∗
(i0)∗
Por outro lado, denotemos por p : N −→ N a projecao orientada de N (que e um reco-
brimento de N, pois estamos supondo N nao-orientavel), e, para cada λ ∈ 0, 1, 2, . . . , k
e cada t ∈ I, seja (ptλ)∗ : Hn(Uλ,Uλ r αλ(t)) −→ Hn(Vλ,Vλ r βλ(t)) o isomorfismo
induzido pela restricao p |Uλ: Uλ −→ Vλ (lembre-se que p |Uλ
e um homeomorfismo
sobre Vλ, e p αλ = βλ, com αλ(I) ⊆ Uλ e βλ(I) ⊆ Vλ, para cada λ ∈ 0, 1, . . . , k). Alem
disso, para cada t ∈ I, considere ainda o isomorfismo (ptk+1
)∗ : Hn(U0,U0 r αk+1(t)) −→
1.1 Orientabilidade de Variedades Topologicas 27
Hn(V0,V0 r βk+1(t)), induzido pela restricao p |U0: U0 −→ V0 (o qual esta bem de-
finido, pois αk+1(I) ⊆ U0, βk+1(I) ⊆ V0 e p αk+1 = βk+1), e, utilizando o teorema da
excisao em homologia singular, sejam (itλ)∗ : Hn(Uλ,Uλr αλ(t)) −→ Hn(N′,N′r αλ(t))
e ( jtλ)∗ : Hn(Vλ,Vλ r βλ(t)) −→ Hn(N,N r βλ(t)) os isomorfismos induzidos pelas
inclusoes iλ : Uλ −→ N′ e jλ : Vλ −→ N, onde λ ∈ 0, 1, . . . , k. Entao, sendo
(itk+1
)∗ : Hn(U0,U0rαk+1(t)) −→ Hn(N′,N′rαk+1(t)) e ( jtk+1
)∗ : Hn(V0,V0rβk+1(t)) −→
Hn(N,N r βk+1(t)) os isomorfismos induzidos pelas inclusoes ik+1 = i0 : U0 −→ N′ e
jk+1 = j0 : V0 −→ N, vamos definir os caminhos β0, β1, . . . , βk+1 : I −→ N da seguinte
maneira: se λ ∈ 0, 1, . . . , k, βλ e dado por βλ(t) = [( jtλ)∗ (pt
λ)∗ (it
λ)−1∗ ](αλ(t)), para cada
t ∈ I, conforme ilustra o diagrama abaixo:
Hn(Uλ,Uλ r αλ(t)) Hn(Vλ,Vλ r βλ(t))
αλ(t) ∈ Hn(N′,N′ r αλ(t)) Hn(N,N r βλ(t))
(itλ)∗
(ptλ)∗
( jtλ)∗
Por outro lado, se λ = k + 1, defina βk+1 como sendo βk+1(t) = [( jtk+1
)∗ (ptk+1
)∗
(itk+1
)−1∗ ](αk+1(t)), de acordo com o diagrama a seguir:
Hn(U0,U0 r αk+1(t)) Hn(V0,V0 r βk+1(t))
αk+1(t) ∈ Hn(N′,N′ r αk+1(t)) Hn(N,N r βk+1(t))
(itk+1)∗
(ptk+1)∗
( jtk+1)∗
Note que, como αη : I −→ N′ e um levantamento de αη : I −→ N′, relativamente
ao recobrimento p′ : N′ −→ N′, para cada η ∈ 0, 1, . . . , k + 1, temos de fato que
αη(t) ∈ Hn(N′,N′r αη(t)) ⊆ N′ para cada t ∈ I (pois p′ e a projecao que leva cada ponto
z ∈ Hn(N′,N′ r z) em z ∈ N′).
Isto posto, observe que, como βη(t) ∈ Hn(N,N r βη(t)) para cada η ∈ 0, 1, . . . , k + 1
e cada t ∈ I, e como p : N −→ N e a projecao orientada de N, temos (p βη)(t) = βη(t),
ou seja, p βη = βη; isto, por sua vez, significa que βη : I −→ N e um levantamento de
βη relativamente a p, para cada η ∈ 0, 1, . . . , k + 1. Logo, como β = β0 ∨ β1 ∨ . . . ∨ βk+1,
segue que:
p (β0 ∨ β1 ∨ . . . ∨ βk+1) = (p β0) ∨ (p β1) ∨ . . . ∨ (p βk+1)
= β0 ∨ β1 ∨ . . . ∨ βk+1 = β ,
28 Preliminares
e, consequentemente, o caminho justaposto β = β0 ∨ β1 ∨ . . . ∨ βk+1 : I −→ N e um
levantamento de β relativamente a projecao orientada p : N −→ N. Alem disso,
como α0(0) = x0 e β0(0) = y0, segue que, para λ = 0 e t = 0, temos (i00)∗ = (i0)∗ :
Hn(U0,U0r x0) −→ Hn(N′,N′r x0), ( j00)∗ = ( j0)∗ : Hn(V0,V0 r y0) −→ Hn(N,Nr y0)
e (p00)∗ = (p0)∗ : Hn(U0,U0 r x0) −→ Hn(V0,V0 r y0), e, portanto:
β(0) = β0(0) = [( j0)∗ (p0)∗ (i0)−1∗ ](α0(0)) = [( j0)∗ (p0)∗ (i0)−1
∗ ](x0) = y0 .
Agora, como αk+1(1) = x0 e βk+1(1) = y0, segue que, para λ = k+1 e t = 1, tambem temos
(i1k+1
)∗ = (i0)∗ : Hn(U0,U0r x0) −→ Hn(N′,N′r x0), ( j1k+1
)∗ = ( j0)∗ : Hn(V0,V0r y0) −→
Hn(N,N r y0) e (p1k+1
)∗ = (p0)∗ : Hn(U0,U0 r x0) −→ Hn(V0,V0 r y0); logo, como
α = α0 ∨ α1 ∨ . . . ∨ αk+1 : I −→ N′ e um laco com base em x0, segue que:
β(1) = βk+1(1) = [( j0)∗ (p0)∗ (i0)−1∗ ](αk+1(1)) = [( j0)∗ (p0)∗ (i0)−1
∗ ](x0) = y0 .
Deste modo, concluımos que β : I −→ N e um laco com base em y0, que constitui o
unico levantamento de β, relativamente ao recobrimento p : N −→ N, com inıcio em y0,
o que, por definicao, significa que β : I −→ N e um laco que preserva orientacao.
Em resumo, supondo N nao-orientavel, mostramos que, se um laco α : I −→ N′ pre-
serva orientacao, entao o laco β = pα : I −→ N tambem o faz. Assim, demonstrando-se
a recıproca de maneira analoga, obtemos que o recobrimento p : N′ = Int M′ −→ N =
Int M e uma aplicacao fiel a orientacao, conforme querıamos provar.
Seja M uma variedade topologica conexa e sem fronteira, e denotemos por p : M −→
M a projecao orientada de M. Na secao anterior, vimos que, dada uma componente
conexa C de M, a restricao p |C : C −→ M constitui um recobrimento de uma ou duas
folhas, conforme M seja respectivamente orientavel ou nao. De maneira analoga,
veremos a seguir que, ainda que M seja uma variedade topologica com fronteira, existe
uma aplicacaoap :aM −→M tal queap e um recobrimento simples se M e orientavel, ou um
recobrimento duplo se M e nao-orientavel, o que mostrara que o recobrimento p |C pode
(de um certo modo) ser “generalizado” para variedades com fronteira. Entretanto, a
fim de definirmosap, precisaremos recordar alguns conceitos da teoria de recobrimentos.
Seja M uma variedade topologica conexa (e, portanto, conexa por caminhos), e con-
sidere um subgrupo H ⊆ π1(M, x0), onde x0 ∈ M (como usualmente, denotaremos por
1.2 O Recobrimento Orientado de uma Variedade Topologica 29
π1(M, x0) o grupo fundamental de M com base no ponto x0); vamos mostrar entao (re-
sumidamente) que existem um recobrimento p : M −→M, com M conexo, e um ponto
x0 ∈ M, tais que p#(π1(M, x0)) = H, onde p# : π1(M, x0) −→ π1(M, x0) e o homomorfismo
induzido por p.
Com efeito, dados dois caminhos α, β : I −→ M, com α(0) = β(0) = x0, diremos
que α e β sao equivalentes, e escreveremos α ≡ β, quando α(1) = β(1) e [α ∨ β−1] ∈ H
(onde o sımbolo ∨ denota a justaposicao de caminhos). Como H e um subgrupo de
π1(M, x0), temos que ≡ constitui uma relacao de equivalencia; assim, dado um caminho
α : I −→ M, com α(0) = x0, utilizaremos a notacao 〈α〉 para nos referirmos a classe de
equivalencia de α, segundo a relacao ≡. Seja, pois, M o conjunto de todas as classes
de equivalencia 〈α〉 dos caminhos α : I −→ M que comecam no ponto x0, e definamos
p : M −→ M como sendo p(〈α〉) = α(1). A fim de introduzir uma topologia em M,
consideremos a base B de M, constituıda dos abertos U ⊆ M, conexos por caminhos, e
tais que todo laco em U e homotopico a uma constante em M (lembre-se que, por ser uma
variedade topologica, M e localmente conexa por caminhos e localmente simplesmente
conexa), e, para cada 〈α〉 ∈ M e cada aberto U ∈ B, com α(1) ∈ U, tomemos:
U〈α〉 = 〈α ∨ β〉 : β : I −→ U e um caminho tal que β(0) = α(1).
Pode-se provar entao que os conjuntos U〈α〉 constituem a base de uma topologia em
M, segundo a qual p : M −→ M e contınua e aberta (para mais detalhes, vide [R],
paginas 295 a 299). Alem disso, para cada U ∈ B e cada 〈α〉 ∈ M, com α(1) ∈ U, a
restricao p |U〈α〉 : U〈α〉 −→ U e uma bijecao (e, portanto, um homeomorfismo) sobre
U. Observe ainda que, para cada U ∈ B, a imagem inversa p−1(U) e a reuniao dos
conjuntos U〈α〉, onde α varia entre os caminhos em M com origem x0 e extremidade em
U; logo, como dois desses conjuntos U〈α〉, ou coincidem ou sao disjuntos, segue que
p : M −→ M e uma aplicacao de recobrimento. Agora, dado um caminho α : I −→ M
com origem α(0) = x0, consideremos, para cada t ∈ I, o caminho αt : I −→ M definido
por αt(s) = α(st); como α0(s) = α(0) = x0 e α1(s) = α(s) para todo s ∈ I, segue que α0
e o caminho constante igual a x0, denotado por εx0: I −→ M, enquanto que α1 = α.
Assim, o caminho γα : I −→ M, dado por γα(t) = 〈αt〉, e tal que γα(0) = 〈α0〉 = 〈εx0〉 e
γα(1) = 〈α1〉 = 〈α〉; em outras palavras, todo ponto 〈α〉 ∈ M pode ser ligado ao ponto
x0 = 〈εx0〉 ∈ M por um caminho γα : I −→ M, o que prova que M e conexo por caminhos
(e, portanto, conexo). Finalmente, sendo α : I −→ M o caminho definido por α(t) = 〈αt〉
(onde 〈α〉 ∈ M), temos que α(0) = 〈α0〉 = 〈εx0〉 = x0 e (p α)(t) = p(〈αt〉) = αt(1) = α(t);
logo, pela propriedade do levantamento unico de caminhos, segue que α e o unico
levantamento do caminho α : I −→ M (relativamente a p), com inıcio no ponto x0 =
〈εx0〉 ∈ M. Por outro lado, dado um caminho α : I −→ M com α(0) = x0, e sendo
p# : π1(M, x0) −→ π1(M, x0) o homomorfismo induzido pela aplicacao de recobrimento
p : M −→M, temos que [α] ∈ p#(π1(M, x0)) se, e somente se, o levantamento α : I −→ M
30 Preliminares
for um laco com base em x0 (uma vez que [α] = [p α] = p#([α])); isto, por sua vez,
ocorre se, e somente se, x0 = α(1) = 〈α1〉 = 〈α〉. Ora, por definicao, sabemos que as
classes de equivalencia x0 = 〈εx0〉 e 〈α〉 coincidem se, e so se, [α] = [α ∨ ε−1
x0] ∈ H. Deste
modo, concluımos que [α] ∈ p#(π1(M, x0)) se, e somente se, [α] ∈ H, o que prova que
H = p#(π1(M, x0)), completando a demonstracao.
Definicao 1.2.1 . Seja M uma variedade topologica conexa. Dado um subgrupo H ⊆ π1(M, x0),
onde x0 ∈ M, o recobrimento p : M −→ M obtido acima e denominado recobrimento de M
associado a H.
Observe que, como p : M −→ M e um homeomorfismo local sobrejetivo, o espaco
de recobrimento M herda as propriedades topologicas locais de M, e vice-versa; em
particular, temos que M e uma variedade topologica, de dimensao igual a de M, e
(pelo teorema da invariancia do domınio) p(∂M) = ∂M; alem disso, da proposicao 1.1.1,
segue que, se M for uma variedade orientavel, entao M tambem o sera.
Lema 1.2.1 . Dadas variedades topologicas conexas M e N, de mesma dimensao, considere uma
aplicacao contınua f : M −→ N, e sejam x0 ∈ M e c ∈ N tais que f (x0) = c. Denotando por
q : N −→ N o recobrimento de N associado ao subgrupo H = f#(π1(M, x0)) ⊆ π1(N, c), onde
f# : π1(M, x0) −→ π1(N, c) e o homomorfismo induzido por f , segue que existe uma aplicacao
contınua f : M −→ N tal que f = q f (isto e, f admite um levantamento f : M −→ N
relativamente a q).
Demonstracao. Com efeito, se q : N −→ N e o recobrimento de N associado a
f#(π1(M, x0)), temos que q#(π1(N, C)) = f#(π1(M, x0)), onde c ∈ q−1(c); logo, da proposicao
8, pagina 162, de [Li], segue que existe uma aplicacao contınua f : M −→ N, com
f (x0) = c, tal que f = q f .
Proposicao 1.2.1 . Seja M uma variedade topologica de dimensao n, conexa e sem fronteira,
e denote por p : C −→ M o recobrimento de M obtido de uma componente conexa C do
fibrado orientado M (em outras palavras, p e a restricao da projecao orientada π : M −→ M
a componente C ⊆ M). Dado um ponto x0 ∈ M, considere ainda o conjunto H ⊆ π1(M, x0)
constituıdo das classes de homotopia dos lacos α : I −→ M, com base em x0, que preservam
orientacao. Temos entao que H e um subgrupo de π1(M, x0), e p e o recobrimento de M associado
a H (isto e, p#(π1(C, x0)) = H, onde x0 ∈ p−1(x0)).
Demonstracao. De fato, considere dois lacos α, β : I −→ M, com base no ponto x0;
vamos mostrar primeiramente que, se α e β sao homotopicos, por uma homotopia que
1.2 O Recobrimento Orientado de uma Variedade Topologica 31
fixa o ponto base x0, entao α preserva orientacao se, e somente se, β tambem o faz.
Com efeito, denotando por µx0um dos dois geradores de Hn(M,M r x0) ≃ Z, com
µx0∈ C, sabemos que α admite um unico levantamento α : I −→ C, relativamente ao
recobrimento p, tal que α(0) = µx0. Logo, supondo que α preserve orientacao, temos
que α(1) = µx0, ou seja, α e um laco em C com base em µx0
. Isto posto, seja β : I −→ C o
unico levantamento de β (relativamente a p), satisfazendo β(0) = µx0, e denotemos por
H : I × I −→ M a homotopia entre α e β que fixa o ponto base x0. Temos, pois, que H
admite um unico levantamento H : I× I −→ C, que constitui uma homotopia entre α e β
e mantem fixo o ponto µx0∈ C (isto e, H(s, 0) = α(s), H(s, 1) = β(1) e H(0, t) = H(1, t) = µx0
para quaisquer s, t ∈ I). Em particular, segue que β(1) = H(1, 1) = H(0, 1) = β(0) = µx0, o
que significa que o laco β : I −→M tambem preserva orientacao.
Agora, observe que, se dois lacos α, β : I −→ M, com base no ponto x0, preservam
orientacao, o mesmo se da com o laco justaposto α ∨ β : I −→ M e com os inversos α−1
e β−1. Destas propriedades, podemos concluir entao que o conjunto H (das classes de
homotopia dos caminhos que preservam orientacao e tem base no ponto x0) constitui
um subgrupo de π1(M, x0). Finalmente, para verificar que p e o recobrimento de M
associado a H, considere um laco α : I −→ M com base no ponto x0, e seja α : I −→ C o
unico levantamento de α (relativamente a p) tal que α(0) = µx0. Suponto [α] ∈ H, temos
que α preserva orientacao, isto e, α e um laco com base em µx0(pois α(0) = α(1) = µx0
);
logo, como α = p α, segue que [α] = [p α] = p#([α]) ∈ p#(π1(C,µx0)). Reciprocamente,
se [α] ∈ p#(π1(C,µx0)), segue que existe um laco β : I −→ C, com base em µx0
, tal que
[α] = p#([β]) = [pβ]; assim, denotando por β : I −→M o laco (com base em x0) dado por
β = p β, temos que [α] = [β], sendo que β e o unico levantamento de β (relativamente
a p) tal que β(0) = µx0. Alem disso, como β(0) = β(1) = µx0
, segue que β preserva
orientacao, e, portanto, [α] = [β] ∈ H. Deste modo, concluımos que p#(π1(C,µx0)) = H,
conforme querıamos provar.
Definicao 1.2.2 . Sendo M uma variedade topologica de dimensao n, conexa e com fronteira,
sabemos que existem uma vizinhanca aberta U de ∂M em M, e um homeomorfismo h : U −→
∂M× (0, 1], tais que h(x) = (x, 0) para todo x ∈ ∂M (vide [Bwn1], teorema 2, pagina 339). Isto,
por sua vez, significa que a inclusao i : Int M −→M e um equivalencia homotopica: com efeito,
sendo V ⊆ U tal que V = h−1(∂M × [0, 12]), e denotando por ρ : ∂M × [0, 1
2] −→ ∂M × [1
4, 1
2]
o homeomorfismo dado por ρ(y0, t0) = (y0,t0
2+ 1
4), temos que a aplicacao r : M −→ Int M,
definida por
r(x) =
x se x ∈M r V
h−1(x, 14) se x ∈ ∂M
h−1(ρ(h(x))) se x ∈ V r ∂M
,
32 Preliminares
e uma inversa homotopica de i. Logo, o homomorfismo induzido i# : π1(Int M, x0) −→ π1(M, x0)
constitui um isomorfismo, qualquer que seja x0 ∈ Int M. Por outro lado, se M e nao-orientavel,
segue que o fibrado orientado Int M de Int M e conexo, e a projecao orientada p : Int M −→ Int M
e um recobrimento de duas folhas. Assim, definimos o recobrimento orientado de M como
sendo a aplicacao ap :aM −→M tal que:
• se M e orientavel, ap :aM −→M e a identidade;
• se M e nao-orientavel, ap :aM −→ M e o recobrimento de M associado ao subgrupo (i#
p#)(π1(Int M, x0)) ⊆ π1(M, x0), isto e,ap#(π1(aM, ax0)) = (i# p#)(π1(Int M, x0)), onde x0 ∈ Int M,
x0 ∈ p−1(x0) e ax0 ∈ap−1(x0).
Note que, como ap :aM −→ M e um homeomorfismo local, segue que o espaco
aM e
uma variedade topologica de dimensao n, com fronteira, tal queap(∂aM) = ∂M.
O lema a seguir nos mostra que, para variedades topologicas sem fronteira, o espaco
de recobrimento orientado coincide com o fibrado orientado (a menos de homeomor-
fismos).
Lema 1.2.2 . Seja M uma variedade topologica de dimensao n, conexa e com fronteira (eventual-
mente vazia), e denote porap :aM −→M o recobrimento orientado de M. Sendo p : C −→ Int M
o recobrimento obtido de uma componente conexa C do fibrado orientado de Int M, segue que
existe um homeomorfismo ϕ : C −→ IntaM que comuta o seguinte diagrama:
C IntaM
Int M
ϕ
pap |Int
aM
(note que a restricao deap a IntaM e um recobrimento de Int M).
Demonstracao. Com efeito, se M e orientavel, temos queap :aM −→M e a identidade,
isto e,aM = M, e, portanto, o homeomorfismo ϕ e dado pelo recobrimento p : C −→
Int M = IntaM (o qual, pelo fato de M ser orientavel, constitui um homeomorfismo,
cuja inversa e uma das duas possıveis orientacoes em Int M). Por outro lado, se M e
nao-orientavel, temos que p : C = Int M −→ Int M e a projecao orientada de Int M, eap :aM −→ M e o recobrimento de M associado ao subgrupo (i# p#)(π1(Int M, x0)) ⊆
π1(M, x0), onde i# : π1(Int M, x0) −→ π1(M, x0) e o isomorfismo induzido pela inclusao,
com x0 ∈ Int M e x0 ∈ p−1(x0) (vide definicao 1.2.2); logo, dado ax0 ∈ap−1(x0) ⊆ Int
aM,
segue queap#(π1(IntaMax0)) = p#(π1(Int M, x0)), o que, por sua vez, implica que existe um
homeomorfismo ϕ : Int M −→ IntaM satisfazendo (ap |Int
aM ) ϕ = p e ϕ(x0) = ax0 (vide
[Vi], proposicoes 4.18 e 4.19, pagina 104), conforme querıamos demosntrar.
1.2 O Recobrimento Orientado de uma Variedade Topologica 33
Observe ainda que a existencia do homeomorfismo ϕ : C −→ IntaM, mencionado no
lema anterior, significa que, se U ⊆ Int M e um aberto orientavel, entao uma orientacao
s : U −→ C induz uma aplicacao contınua as : U −→ IntaM, dada por as(x) = (ϕ s)(x)
para cada x ∈ U; assim, como ap ϕ = p, temos que ap as = ap (ϕ s) = p s = IdU,
onde IdU : U −→ U e a identidade. Por este motivo, a aplicacao as : U −→ IntaM,
denominamos orientacao induzida por s no espaco de recobrimento orientado de M
(ou, simplesmente, orientacao induzida por s emaM).
Proposicao 1.2.2 . Sendo M uma variedade topologica de dimensao n, conexa e com fronteira
(eventualmente vazia), e denotando por ap :aM −→ M o recobrimento orientado de M, temos
que:
(i) ap possui uma ou duas folhas, conforme M seja respectivamente orientavel ou nao;
(ii) a variedadeaM e sempre orientavel (independentemente da orientabilidade de M).
Demonstracao. (i) De fato, sendo p : C −→ Int M o recobrimento obtido de uma
componente conexa do fibrado orientado de Int M, sabemos que p possui uma
ou duas folhas conforme Int M (e, consequentemente, M) e orientavel ou nao,
respectivamente. Logo, como C e homeomorfo a IntaM (pelo lema anterior), segue
que a restricao (ap |IntaM ) : Int
aM −→ Int M e um recobrimento de uma folha se
M e orientavel, ou de duas folhas caso M seja nao-orientavel. Portanto, como
todas as fibras ap−1(x), com x ∈ M, possuem o mesmo numero cardinal (uma vez
que M e uma variedade topologica conexa), concluımos que ap :aM −→ M e um
recobrimento de uma ou duas folhas, caso M seja respectivamente orientavel ou
nao.
(ii) Com efeito, da proposicao 1.1.2, sabemos que o fibrado orientado de Int M e sempre
orientavel, independentemente da orientabilidade de M. Logo, sendo p : C −→
Int M o recobrimento obtido de uma componente conexa do fibrado orientado
de Int M, temos que C e orientavel, e, portanto, a existencia do homeomorfismo
ϕ : C −→ IntaM (dado pelo lema 1.2.2) nos garante que Int
aM e orientavel (vide
proposicao 1.1.1, substituindo f por ϕ−1). Deste modo, concluımos que IntaM, e,
consequentemente,aM, e sempre orientavel, quer M seja orientavel ou nao.
A seguir, veremos que as nocoes de lacos que preservam ou invertem orientacao (da-
das na definicao 1.1.4) podem ser estendidas para lacos cujas imagens nao se encontram
necessariamente no interior de uma variedade.
34 Preliminares
Definicao 1.2.3 . Seja M uma variedade topologica de dimensao n, conexa e com fronteira, e
denote por ap :aM −→ M o recobrimento orientado de M. Dado um laco ω : I −→ M, com base
num ponto x0 ∈ M, dizemos que ω preserva orientacao relativamente ao recobrimento
orientado de M (ou, simplesmente, preserva orientacao emaM) se existe um lacoaω : I −→
aM
tal que ap aω = ω, isto e, se ω pode ser levantado para um laco emaM relativamente ao
recobrimento orientado ap; caso contrario, diremos que ω inverte orientacao relativamente
ao recobrimento orientado de M (ou, simplesmente, inverte orientacao emaM).
Proposicao 1.2.3 . Seja M uma variedade topologica de dimensao n, conexa e com fronteira
(eventualmente vazia), e denote por ap :aM −→ M o recobrimento orientado de M. Dado um
laco ω : I −→ Int M, temos que ω preserva (respectivamente, inverte) orientacao emaM se, e
somente se, ele preserva (respectivamente, inverte) orientacao.
Demonstracao. Com efeito, seja p : C −→ Int M o recobrimento obtido de uma
componente conexa do fibrado orientado de Int M, e considere o homeomorfismo
ϕ : C −→ IntaM tal que p = ap |Int
aM ϕ (cuja existencia e garantida pelo lema 1.2.2). Por
definicao, sabemos queω : I −→ Int M e um laco que preserva orientacao se, e somente
se, ele pode ser levantado para um laco ω : I −→ C relativamente a p; entretanto, como
p = ap |IntaM ϕ, segue que isto ocorre se, e somente se, ω admite um levantamento
aω : I −→ IntaM relativamente ao recobrimento ap |Int
aM : Int
aM −→ Int M. Portanto,
ω preserva ou inverte orientacao se, e so se, ele respectivamente preserva ou inverte
orientacao emaM, conforme querıamos provar.
Na proposicao 1.2.1, vimos que, se M e uma variedade sem fronteira, o recobrimento
p : C −→ M, obtido de uma componente conexa C do fibrado orientado M, constitui
o recobrimento de M associado ao subgrupo H ⊆ π1(M, x0), gerado pelas classes de
homotopia dos lacos que preservam orientacao. Por outro lado, se M for uma variedade
com fronteira, a proposicao a seguir (cuja demonstracao e analoga a da proposicao
1.2.1, e, portanto, sera omitida) nos mostra que o recobrimento orientado ap :aM −→ M
constitui o recobrimento de M associado ao subgrupoaH ⊆ π1(M, x0), gerado pelas classs
de homotopia dos lacos que preservam orientacao emaM. Assim, ap e, de certo modo,
uma generalizacao do recobrimento p para variedades com fronteira.
Proposicao 1.2.4 . Sendo M uma variedade topologica de dimensao n, conexa e com fronteira
(eventualmente vazia), denote por ap :aM −→ M o recobrimento orientado de M, e considere
o subconjuntoaH ⊆ π1(M, x0), constituıdo das classes de homotopia dos lacos α : I −→ M,
com base em x0 ∈ M, que preservam orientacao emaM. Temos entao que
aH e um subgrupo de
π1(M, x0), eap e o recobrimento de M associado aaH (isto e,ap#(π1(
aM,ax0)) =
aH, ondeax0 ∈
ap−1(x0)).
1.2 O Recobrimento Orientado de uma Variedade Topologica 35
Proposicao 1.2.5 . Dada uma variedade topologica M, conexa e com fronteira (eventualmente
vazia), temos que M e orientavel se, e somente se, todo laco em M preserva orientacao relativa-
mente ao recobrimento orientado de M.
Demonstracao. Com efeito, se M e orientavel, segue que o recobrimento orientadoap :aM −→ M e a identidade, e, portanto, todo laco em M pode ser levantado para
um laco emaM (ou seja, todo laco em M preserva orientacao em
aM). Reciprocamente,
suponhamos que M seja nao-orientavel; neste caso, o recobrimento orientadoap :aM −→
M e um recobrimento de duas folhas, o que, pelo fato deaM ser uma variedade conexa
por caminhos, implica queap :aM −→M e um recobrimento regular (vide [Li], corolario
2, pagina 152). Isto, por sua vez, significa que, dado um laco qualquerω : I −→M, com
base num ponto x ∈ M, ou todos os levantamentos de ω a partir dos pontos ax ∈ ap−1(x)
sao lacos, ou nenhum e. Agora, observe que, como ap :aM −→M e um recobrimento de
duas folhas, segue que existem ax0,ax1 ∈
ap−1(x) tais que ax0 ,ax1; logo, sendo aω : I −→
aM
um caminho tal que aω(0) = ax0 e aω(1) = ax1, e denotando por ω : I −→ M o laco com
base em x dado por ω = ap aω, temos que aω e um levantamento de ω que nao constitui
um laco emaM. Portanto, do que vimos acima, concluımos que ω e um laco em M que
nao pode ser levantado para um laco emaM (isto e, ω inverte orientacao em
aM), o que
mostra que, se M e nao-orientavel, nem todo laco em M preserva orientacao emaM. Daı,
segue entao que, se todo laco em M preserva orientacao emaM, a variedade M deve ser
orientavel.
Agora, observe que, uma vez definidos os conceitos de lacos que preservam ou
invertem orientacao relativamente ao recobrimento orientado, podemos utiliza-los para
introduzir a seguinte
Definicao 1.2.4 . Sejam M e N variedades topologicas de dimensao n, com fronteira, e denote
por apM :aM −→ M e apN :
aN −→ N os recobrimentos orientados de M e N, respectivamente.
Dada uma aplicacao contınua f : M −→ N, dizemos que f e fiel a orientacao relativamente
aos recobrimentos orientados de M e N (ou, simplesmente, fiel a orientacao emaMeaN)
se a imagem f α : I −→ N, de todo laco α : I −→ M que preserva (respectivamente, inverte)
orientacao emaM, for um laco que preserva (respectivamente, inverte) orientacao em
aN.
A proposicao a seguir mostra que o conceito de aplicacao fiel a orientacao relativa-
mente a recobrimentos orientados e, de fato, uma generalizacao da definicao 1.1.5.
Proposicao 1.2.6 . Se M e N sao variedades topologicas de dimensao n, conexas e com fronteira
(eventualmente vazias), e f : M −→ N e uma aplicacao fiel a orientacao relativamente aos
recobrimentos orientados de M e N, tal que f (Int M) ⊆ Int N, entao f e fiel a orientacao.
36 Preliminares
Demonstracao. De fato, se f : M −→ N e fiel a orientacao relativamente aos re-
cobrimentos orientados de M e N, com f (Int M) ⊆ Int N, segue (da proposicao 1.2.3)
que um laco ω : I −→ Int M preserva ou inverte orientacao se, e somente se, o laco
f ω : I −→ Int N respectivamente preserva ou inverte orientacao, o que (pela definicao
1.1.5) significa que f e fiel a orientacao.
Proposicao 1.2.7 . Se M e uma variedade topologica de dimensao n, conexa e com fronteira
(eventualmente vazia), entao todo recobrimento p : N −→ M e uma aplicacao fiel a orientacao
relativamente aos recobrimentos orientados de N e M.
Demonstracao. Denotemos por apN :aN −→ N e apM :
aM −→ M os recobrimentos
orientados de N e M. Por definicao, sabemos que M e orientavel se, e somente se,
Int M e orientavel; logo, como a restricao p |Int N : Int N −→ Int M e um homeomorfismo
local sobre Int M, segue (da proposicao 1.1.1) que a orientabilidade de M implica na
orientabilidade de Int N, o que mostra que, se M e orientavel, N tambem o e. Entretanto,
pela proposicao 1.2.5, sabemos que, se as variedades M e N sao orientaveis, entao ambas
possuem apenas lacos que preservam orientacao relativamente a seus recobrimentos
orientados. Assim, concluımos que, caso M seja orientavel, o recobrimento p : N −→M
e fiel a orientacao relativamente aos recobrimentos orientados de N e M.
Suponhamos agora que M seja nao-orientavel. Para provarmos que o recobrimento
p : N −→M e uma aplicacao fiel a orientacao relativamente aos recobrimentos orienta-
dos de N e M, basta mostrarmos que um laco α : I −→ N preserva orientacao emaN se,
e somente se, o laco β = p α : I −→M preserva orientacao emaM.
Isto posto, considere um laco α : I −→ N, com base num ponto y ∈ N, e suponhamos
que α preserve orientacao emaN. Como N e
aN sao variedades topologicas conexas (e,
portanto, conexas por caminhos), sabemos que, dados y0 ∈ Int N, ay0 ∈ap−1
N (y0) ⊆ IntaN e
ay ∈ ap−1N
(y), os homomorfismos φN : π1(N, y0) −→ π1(N, y) eaφN : π1(
aN,ay0) −→ π1(
aN,ay)
definidos por φN([γ]) = [ω∨γ∨ω−1] eaφN([aγ]) = [aω∨aγ∨aω−1], para cada [γ] ∈ π1(N, y0)
e cada [aγ] ∈ π1(aN,ay0), constituem isomorfismos, onde ω : I −→ N e aω : I −→
aN sao
caminhos ligando y a y0, e ay a ay0, respectivamente. Sejam, pois, i : Int N −→ N eai : Int
aN −→
aN as inclusoes, e denote por pN : CN −→ Int N o recobrimento obtido de
uma componente conexa CN do fibrado orientado de Int N. Dado y0 ∈ p−1N (y0), tal que
y0 e um gerador de Hn(Int N, Int N r y0) contido em CN, considere ainda a aplicacao
ϕN : CN −→ IntaN dada por:
• se N e orientavel (e, consequentemente, o recobrimento orientado apN :aN −→ N e a
identidade), ϕN = pN;
• se N e nao-orientavel, ϕN e o homeomorfismo dado pelo lema 1.2.2.
Conforme vimos na definicao 1.2.2, temos que as inclusoes i eai sao equivalencias
1.2 O Recobrimento Orientado de uma Variedade Topologica 37
homotopicas, e, portanto, os homomorfismos induzidos i# : π1(Int N, y0) −→ π1(N, y0)
eai# : π1(Int
aN,ay0) −→ π1(
aN,ay0) sao isomorfismos que comutam o seguinte diagrama:
π1(IntaN,ay0) π1(
aN,ay0) π1(
aN,ay)
π1(CN, y0) π1(N, y0) π1(N, y)
π1(Int N, y0)
ai#
aφN
(ϕN)#
(pN)#i#
φN
(apN)#
Agora, lembrando que α : I −→ N e um laco que preserva orientacao emaN, segue que
existe um laco aα : I −→aN, com base em ay, tal que apN
aα = α. Por outro lado, como i#
e φN sao isomorfismos, segue que existe um laco α′ : I −→ Int N, com base em y0, que
satisfaz (φN i#)([α′]) = [α]. Vamos mostrar entao que α′ preserva orientacao (ou seja,
α′ pode ser levantado para um laco em CN, relativamente ao recobrimento pN).
Com efeito, se N e orientavel, a conclusao e imediata (pois, pela proposicao 1.1.2,
teremos que α′ preserva orientacao). Caso contrario, isto e, se N e nao-orientavel,
temos que ϕN : CN = Int N −→ IntaN e um homeomorfismo que leva y0 em ay0, e,
consequentemente, o homomorfismo induzido (ϕN)# : π1(Int N, y0) −→ π1(IntaN,ay0) e
um isomorfismo; isto posto, seja ξ : I −→ Int N um laco, com base em y0, tal que
[aφN
ai# (ϕN)#]([ξ]) = [aα] ∈ π1(
aN,ay). Da comutatividade do diagrama acima, segue
que:
[pN ξ] = (pN)#([ξ]) = [(φN i#)−1 (apN)# (aφN
ai# (ϕN)#)]([ξ])
= [(φN i#)−1 (apN)#]([aα]) = (φN i#)−1([α])
= (φN i#)−1[(φN i#)([α′])] = [α′] .
Logo, denotando por ξ : I −→ Int N o laco (com base em y0) dado por ξ = pN ξ, temos
que [ξ] = [α′], sendo que ξ e o unico levantamento de ξ (relativamente a pN) tal que
ξ(0) = ξ(1) = y0. Isto, por sua vez, significa que ξ e um laco que preserva orientacao, e,
portanto (como [ξ] = [α′]), segue que α′ tambem o e (pois qualquer homotopia entre ξ
e α′ pode ser levantada para uma homotopia entre ξ e um levantamento de α′).
Agora, considerando x0 = p(y0) ∈ Int M, seja p |Int N : Int N −→ Int M o recobrimento
de Int M obtido pela restricao de p a Int M, e denote por pM : Int M −→ Int M a projecao
38 Preliminares
orientada de Int M (que e um recobrimento de duas folhas, pois estamos supondo
M nao-orientavel). Pela proposicao 1.1.5, temos que p |Int N e uma aplicacao fiel a
orientacao; logo, como α′ : I −→ Int N e um laco que preserva orientacao, segue que
o laco β′ = (p |Int N) α′ = p α′ : I −→ Int M (com base em p(y0) = x0) tambem o e, ou
seja, β′ pode ser levantado para um laco β′ : I −→ Int M, relativamente ao recobrimento
pM, com base num ponto x0 ∈ p−1M
(x0) ⊆ Int M. Assim sendo, vamos mostrar entao que
o laco β = p α : I −→ M pode ser levantado para um laco emaM, relativamente ao
recobrimento orientado ap :aM −→M.
De fato, dadosax0 ∈ap−1
M (x0) ⊆ IntaM eax ∈ ap−1
M (x), onde x = p(y), considere as seguintes
aplicacoes:
• j# : π1(Int M, x0) −→ π1(M, x0) eaj# : π1(Int
aM,ax0) −→ π1(
aM,ax0) sao os homomorfismos
induzidos pelas inclusoes j : Int M −→M eaj : Int
aM −→
aM;
• (ϕM)# : π1(Int M, x0) −→ π1(IntaM,ax0) e o homomorfismo induzido pelo homeomor-
fismo ϕM : Int M −→ IntaM, dado pelo lema 1.2.2;
• φM : π1(M, x0) −→ π1(M, x) eaφM : π1(
aM,ax0) −→ π1(
aM,ax) sao os isomorfismos defini-
dos por φM([δ]) = [η∨ δ∨ η−1] eaφM([aδ]) = [aη∨
aδ∨aη−1], para cada [δ] ∈ π1(M, x0) e cada
[aδ] ∈ π1(
aM,ax0), onde δ : I −→ M e
aδ : I −→
aM sao caminhos ligando x a x0, e ax a ax0,
respectivamente.
Pelo que vimos na definicao 1.2.2, temos que as inclusoes j eaj sao equivalencias ho-
motopicas, e, portanto, j# eaj# sao isomorfismos; assim, denotando por p# : π1(N, y) −→
π1(M, x) e (p |Int N)# : π1(Int N, y0) −→ π1(Int M, x0) os homomorfismos induzidos pelos
recobrimentos p : N −→ M e p |Int N : Int N −→ Int M, obtemos o diagrama comutativo
ilustrado na figura 1.3.
Como (φN i#)([α′]) = [α], p α = β e (p |Int N) α′ = β′, a comutatividade deste
diagrama nos mostra que:
(φM j#)([β′]) = (φM j#)((p |Int N)#([α′])) = (p# φN i#)([α′]) = p#([α]) = [β] .
Isto posto, lembrando que o laco β′ : I −→ Int M, com base em x0 ∈ Int M, e um
levantamento de β′ relativamente ao recobrimento pM, seja aµ : I −→aM um laco com
base em ax tal que [aµ] = (aφM
aj# (ϕM)#)([β′]). Do diagrama comutativo da figura 1.2,
segue entao que:
(apM)#([aµ]) = [(φM j#) (pM)# ((ϕM)−1# j−1
# aφ−1
M )]([aµ])
= [(φM j#) (pM)#]([β′]) = (φM j#)([β′]) = [β] .
Logo, denotando por µ : I −→ M o laco (com base em x = p(y)) dado por µ = apM aµ,
temos que [µ] = [β], sendo que aµ e o unico levantamento de µ, relativamente ao
recobrimento orientado apM, tal que aµ(0) = aµ(1) = ax. Isto, por sua vez, significa que
1.2
OR
eco
brim
en
toO
rien
tad
od
eu
ma
Va
ried
ad
eT
op
olo
gica
39
π1(IntaN,ay0) π1(
aN,ay0) π1(
aN,ay) π1(
aM,ax) π1(
aM,ax0) π1(Int
aM,ax0)
π1(CN, y0) π1(N, y0) π1(N, y) π1(M, x) π1(M, x0) π1(Int M, x0)
π1(Int N, y0) π1(Int M, x0)
ai#
aφN
aφM
aj#
(ϕN)#
(pN)#
i#
φN
p#
φM
j#(pM)#
(ϕM)#
(p |IntN)#
(apN)# (apM)#
Figura 1.2
40 Preliminares
µ e um laco que preserva orientacao emaM, e, portanto, como [µ] = [β], segue que β
tambem o e (pois toda homotopia entre µ e β pode ser levantada, relativamente ao
recobrimento apM, para uma homotopia entre aµ e um levantamento de β). Deste modo,
podemos concluir que existe um lacoaβ : I −→
aM, com base em ax, tal que apM
aβ = β.
Resumindo, supondo M nao-orientavel, mostramos que, se α : I −→ N e um laco
que preserva orientacao emaN, entao o laco β = p α : I −→ M preserva orientacao
emaM. Provando-se a recıproca de maneira analoga, concluımos entao que o laco α
preserva orientacao emaN se, e somente se, o laco β = p α preserva orientacao em
aM,
o que implica que o recobrimento p : N −→ M e fiel a orientacao relativamente aos
recobrimentos orientados de N e M.
Definicao 1.2.5 . Dada uma aplicacao contınua f : M −→ N, entre variedades topologicas de
mesma dimensao n, conexas e com fronteira (eventualmente vazias), dizemos que f :
(1) e do tipo I, se ela e fiel a orientacao relativamente aos recobrimentos orientados de M e N;
(2) e do tipo II, se ela nao e fiel a orientacao relativamente aos recobrimentos orientados de M e
N, e nao leva lacos que invertem orientacao relativamente ao recobrimento orientado de M em
lacos contrateis em N;
(3) e do tipo III, se ela leva um laco que inverte orientacao relativamente ao recobrimento
orientado de M num laco contratil em N.
Alem disso, se f for dos tipos I ou II, dizemos que ela e orientavel; caso contrario, e dita
nao-orientavel.
Convem observarmos que alguns autores utilizam o termo orientavel apenas para
aplicacoes do tipo I (vide [D], exercıcio 6, pagina 271). Mais adiante, veremos que as
aplicacoes dos dois primeiros tipos acima possuem muitas propriedades relacionadas
a teoria de Nielsen de raızes.
Para encerrar esta secao, apresentaremos alguns exemplos destes tres tipos de
aplicacoes.
Exemplo 1.2.1 (Tipo I). (a) Se M e N sao variedades conexas orientaveis (de mesma
dimensao), entao toda aplicacao contınua f : M −→ N e fiel a orientacao (vide
item (i) da proposicao 1.1.4).
(b) A aplicacao identidade numa variedade nao-orientavel e um exemplo de aplicacao
do tipo I entre variedades nao-orientaveis.
(c) A aplicacao quociente π : S2 −→ RP2 e do tipo I (vide exemplo 1.1.4).
1.3 A Multiplicidade de uma Classe de Raızes 41
Exemplo 1.2.2 (Tipo II). Seja M+ a faixa de Mobius, e considere a aplicacao p : M+ −→
S1, obtida retraindo-se M+ ao seu cırculo central. Seja ainda i : S1 −→ S1×I = N+ definida
por i(x) = (x, 0) para cada x ∈ S1. Temos, pois, que a aplicacao f+ = i p : M+ −→ N+leva a fronteira de M+ na fronteira de N+. Logo, sendo f = 2 f+ : M = 2M+ −→ 2N+ = N
o dobro da aplicacao f+, segue que M e a garrafa de Klein e N e o toro bidimensional.
Agora, dado x0 ∈ M, e sendo c = f (x0) ∈ N, observe que os lacos que representam os
elementos do nucleo do homomorfismo induzido f# : π1(M, x0) −→ π1(N, c) preservam
orientacao, o que implica que f nao e do tipo III. Como uma aplicacao, de uma variedade
nao-orientavel (M) numa variedade orientavel (N), nao pode ser fiel a orientacao (vide
proposicao 1.1.4), concluımos entao que f e do tipo II.
Exemplo 1.2.3 (Tipo III). (a) Se M e uma variedade nao-orientavel, entao uma
aplicacao constante f : M −→ N e obviamente do tipo III (independentemente
da variedade N ser ou nao orientavel).
(b) Sejam D1 ⊆ T2 e D2 ⊆ RP2 discos fechados, e considere a soma conexa T2#RP2,
obtida identificando-se os pontos de ∂D1 ⊆ T2 com os pontos de ∂D2 ⊆ RP2,
por meio de um homeomorfismo h : ∂D1 −→ ∂D2. Isto posto, sendo Id : T2 r
Int D1 −→ T2 r Int D1 a aplicacao identidade, vamos estender (continuamente)
Id a uma aplicacao f : T2#RP2 −→ T2. Para tanto, observe que, como ∂D2 e
fechado emRP2 r Int D2, e como D1 ⊆ T2 e um subconjunto contratil do tipo ENR,
segue que a aplicacao Id h−1 : ∂D2 −→ D1 ⊆ T2 estende-se continuamente a uma
aplicacao g : RP2 r Int D2 −→ D1 (vide [Li], corolario 1, pagina 18); logo, como
∂D1 = Id(∂D1) = Id(h−1(∂D2)) = g(∂D2), temos que a aplicacao f : T2#RP2 −→ T2,
dada por:
f (x) =
Id(x) se x ∈ T2 r Int D1
g(x) se x ∈ RP2 r Int D2
,
encontra-se bem definida e constitui uma extensao contınua de Id a soma conexa
T2#RP2. Agora, note que T2#RP2 possui um laco que inverte orientacao (poisRP2
e nao-orientavel), o qual e levado por f no subconjunto contratil D1 ⊆ T2. Deste
modo, temos que f e um exemplo de aplicacao do tipo III.
Nesta secao, vamos introduzir o conceito de multiplicidade de uma classe de raızes,
para aplicacoes proprias que preservam fronteira. Para tanto, precisaremos de algumas
42 Preliminares
definicoes preliminares.
Definicao 1.3.1 . Sejam X e Y espacos topologicos. Uma aplicacao f : X −→ Y e dita propria
se, para todo subconjunto compacto K ⊆ Y, a imagem inversa f−1(K) e um subconjunto compacto
de X. Alem disso, dizemos que duas aplicacoes contınuas f , g : X −→ Y sao propriamente
homotopicas se existe uma homotopia propria h : X × I −→ Y entre f e g, isto e, uma
homotopia que constitui uma aplicacao propria. Por outro lado, se M e N sao variedades
topologicas de dimensao n, dizemos que uma aplicacao f : M −→ N preserva fronteira se
f (∂M) ⊆ ∂N (supondo, obviamente, que M e N sejam variedades com fronteira); neste caso,
denotamos f como uma aplicacao entre pares, ou seja, f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N). Assim, se
h : M × I −→ N for uma homotopia entre duas aplicacoes f , g : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), tal que
h(∂M × I) ⊆ ∂N, escrevemos h : (M × I, ∂M × I) −→ (N, ∂N).
Exemplo 1.3.1 . Todo homeomorfismo e evidentemente uma aplicacao propria. Outro
exemplo: dado um subconjunto fechado A de um espaco topologico X, a inclusao
i : A −→ X e propria. Com efeito, se A e um subconjunto fechado de X, entao, para
todo compacto K ⊆ X, a imagem inversa i−1(K) = A ∩ K e um subconjunto fechado
de K, e, portanto, e compacto. Mais geralmente, a restricao de uma aplicacao propria
f : X −→ Y, a qualquer subconjunto fechado de X, constitui uma aplicacao propria.
Exemplo 1.3.2 . Se X e um espaco topologico compacto, entao toda aplicacao contınua
f : X −→ Y, num espaco de Hausdorff Y, e propria: com efeito, se K ⊆ Y e compacto,
segue (do fato de Y ser um espaco de Hausdorff) que K e fechado em Y, e, portanto,
f−1(K) e um subconjunto fechado de X; logo, sendo X um espaco compacto, temos que
f−1(K) e compacto (pois constitui um subconjunto fechado de um espaco compacto).
Exemplo 1.3.3 . Se M e uma variedade topologica conexa, entao todo recobrimento
p : M′ −→ M, que possui um numero finito de folhas, constitui uma aplicacao propria
(vide [Li], proposicao 4, pagina 121).
Definicao 1.3.2 . Dada uma aplicacao contınua f : X −→ Y, entre dois espacos topologicos X
e Y, dizemos que um ponto x ∈ X e uma raiz de f em y ∈ Y, se f (x) = y; consequentemente,
as raızes de f num ponto y ∈ Y sao os pontos da imagem inversa f−1(y). Por outro lado, sendo
f : M −→ N uma aplicacao contınua entre variedades topologicas conexas (e, portanto, conexas
por caminhos), e considerando c ∈ N tal que f−1(c) , ∅, dizemos que dois pontos x1, x2 ∈ f−1(c)
pertencem a mesma classe de raızes de f em c se existe um caminho ω : I −→ M, com
1.3 A Multiplicidade de uma Classe de Raızes 43
ω(0) = x1 e ω(1) = x2, tal que f ω : I −→ N e um laco contratil em c; em outras palavras,
uma classe de raızes de f em c e um subconjunto nao-vazio de f−1(c), tal que quaisquer dois de
seus pontos podem ser ligados por um caminho (em M) que e levado por f num laco contratil
em N.
Da definicao anterior, podemos ver que a relacao de pertencer a mesma classe de
raızes constitui uma relacao de equivalencia, e, portanto, o conjunto f−1(c) e a uniao
disjunta das classes de raızes de f em c. Note que, como estamos supondo (por
definicao) que uma classe de raızes de f em c e um conjunto nao-vazio, segue que,
se f−1(c) = ∅, entao nao existem classes de raızes de f em c (e, reciprocamente, se
existir uma classe de raızes de f em c, segue que f−1(c) , ∅). Convem observarmos,
no entanto, que nem toda classe de raızes (de f em c) e um subconjunto conexo de M,
conforme ilustra o seguinte
Exemplo 1.3.4 . Considere a aplicacao f : R −→ R+ dada por f (x) = x2, e seja c = 1.
Como f−1(c) = 1,−1, e R+ e simplesmente conexo, segue que a unica classe de raızes
de f em c e o conjunto R = −1, 1.
Exemplo 1.3.5 . Dado n , 0, seja f : S1 −→ S1 a aplicacao dada por f (z) = zn, onde S1 e
a circunferencia unitaria no plano complexo. Entao, sendo c = 1 ∈ S1, temos que:
f−1(c) =
exp(2πir
|n|
): r = 1, 2, . . . , |n|
.
Agora, dados z1, z2 ∈ f−1(c) distintos, note que qualquer caminho ligando z1 a z2 em S1
e levado por f num laco que completa uma ou mais voltas ao redor de S1; logo, como
tais lacos em S1 nao sao contrateis, concluımos que as classes de raızes de f em c sao
da forma R = z, onde z ∈ f−1(c).
Proposicao 1.3.1 . Seja f : M −→ N uma aplicacao contınua entre variedades topologicas
conexas. Se c ∈ Int N, entao toda classe de raızes de f em c constitui um subconjunto aberto
do subespaco f−1(c) ⊆ M (isto e, toda classe de raızes de f em c e a interseccao de um aberto
U ⊆M com f−1(c)).
Demonstracao. Com efeito, sendo R uma classe de raızes de f em c, e dado y ∈ R
qualquer, considere uma vizinhanca contratil V de c em N (tal vizinhanca de fato
existe, pois toda variedade topologica e localmente simplesmente conexa). Temos
entao que f−1(V) e uma vizinhanca aberta de y em M. Logo, como toda variedade
topologica e localmente conexa por caminhos, segue que y admite uma vizinhanca
44 Preliminares
aberta Uy ⊆ f−1(V), conexa por caminhos. Assim, observe que, se y′ ∈ Uy ∩ f−1(c),
temos y′ ∈ R: de fato, como Uy e conexo por caminhos, existe um caminho ω : I −→ Uy
tal que ω(0) = y e ω(1) = y′; logo, como V e contratil, segue que f ω : I −→ V e um
laco contratil com base no ponto c, o que significa que y′ ∈ R. Deste modo, concluımos
que Uy ∩ f−1(c) ⊆ R. Isto posto, seja U =⋃Uy : y ∈ R, onde, para cada y ∈ R,
Uy ⊆ f−1(V) e uma vizinhanca aberta de y, conexa por caminhos. Temos, pois, que U
e um subconjunto aberto de M, tal que U ∩ f−1(c) = R (uma vez que Uy ∩ f−1(c) = R
para cada y ∈ R, e R ⊆ U ∩ f−1(c)); em outras palavras, R e um subconjunto aberto do
subespaco f−1(c) ⊆M, como querıamos mostrar.
Proposicao 1.3.2 . Se f : M −→ N e uma aplicacao contınua propria entre variedades
topologicas conexas, e c ∈ Int N, entao toda classe de raızes de f em c e um subconjunto
compacto de M. Alem disso, f−1(c) contem apenas uma quantidade finita de classes de raızes.
Demonstracao. Primeiramente, observe que f−1(c) e um subconjunto compacto de
M, pois f : M −→ N e uma aplicacao propria (e o conjunto unitario c ⊆ Int N e
compacto). Logo, como toda classe de raızes de f em c e um subconjunto aberto de
f−1(c) (conforme vimos na proposicao anterior), e como f−1(c) e a uniao disjunta das
classes de raızes de f em c, segue que f−1(c) deve conter apenas uma quantidade finita
de classes de raızes (uma vez que estas constituem uma cobertura aberta de f−1(c)). Por
outro lado, seja R uma classe de raızes de f em c, arbitraria; da compacidade de f−1(c),
segue que, para provarmos que R e um subconjunto compacto de M, basta mostrarmos
que M r R e aberto em M (pois isto implicara que R e fechado em M, e, portanto,
compacto, uma vez que R ⊆ f−1(c)).
Assim, considere y ∈ M r R; se y < f−1(c), segue que existe um aberto U ⊆ M tal
que y ∈ U e U ∩ f−1(c) = ∅ (posto que f−1(c) e fechado em M). Como R ⊆ f−1(c),
segue entao que U e uma vizinhanca aberta de y em M, tal que U ⊆ M r R. Agora,
suponhamos que y ∈ f−1(c); ora, como y < R, segue que, para todo x ∈ R e todo caminho
ω : I −→ M, com ω(0) = x e ω(1) = y, o laco f ω : I −→ N (com base no ponto c) nao
e contratil. Entretanto, como toda variedade topologica e localmente simplesmente
conexa, sabemos que existe uma vizinhanca aberta V de c ∈ Int N em N, tal que todo
laco em V e contratil. Alem disso, como toda variedade topologica e localmente conexa
por caminhos (e observando que f−1(V) e uma vizinhanca aberta de y em M), segue
que y admite uma vizinhanca aberta U ⊆ f−1(V) em M, conexa por caminhos. Isto
posto, note que U ∩ R = ∅: de fato, se existisse x ∈ R tal que x ∈ U, tambem existiria
um caminho ω : I −→ U, com ω(0) = x e ω(1) = y (pois U e conexo por caminhos), tal
que f ω : I −→ f (U) ⊆ V e um laco contratil em N (uma vez que V e uma vizinhanca
contratil de c em N), contradizendo a hipotese de que y < R. Logo, U e uma vizinhanca
1.3 A Multiplicidade de uma Classe de Raızes 45
aberta de y em M, tal que U∩R = ∅. Deste modo, concluımos que, para todo y ∈MrR,
existe um aberto U ⊆ M tal que y ∈ U e U ⊆ M r R, o que significa que M r R e aberto
em M, conforme querıamos mostrar.
Agora, para o que faremos em seguida, precisaremos recordar as definicoes de classe
fundamental e grau local.
Definicao (e Proposicao) 1.3.3 . Seja M uma variedade topologica orientavel de dimensao
n (sem fronteira), com orientacao s : M −→ M, e considere um conjunto compacto K ⊆ M.
Entao, existe uma unica classe θK ∈ Hn(M,M r K) tal que ( jp)∗(θK) = s(p) para cada p ∈ K,
onde ( jp)∗ : Hn(M,M r K) −→ Hn(M,M r p) e o homomorfismo induzido pela inclusao
(para maiores detalhes, vide [D], definicao 4.1, pagina 267). A esta classe θK, denominamos
classe fundamental em K. Em particular, se a variedade M e compacta, existe uma classe
fundamental θM ∈ Hn(M,MrM) ≃ Hn(M), a qual e denominada classe fundamental de M.
Na definicao acima, convem observarmos que, se o conjunto compacto K ⊆ M e
conexo (e nao-vazio), temos Hn(M,M r K) ≃ Z (vide [D], corolario 3.4, pagina 260), e,
neste caso, a classe fundamental θK e um gerador de Hn(M,M r K).
Definicao 1.3.4 . Seja f : M −→ N uma aplicacao contınua entre variedades topologicas
orientaveis (sem fronteira), ambas de dimensao n, e seja K ⊆ N um subconjunto compacto,
conexo e nao-vazio, tal que f−1(K) ⊆ M e compacto. Como a classe fundamental θK e um
gerador de Hn(M,M r K) ≃ Z, segue que o homomorfismo f∗ : Hn(M,M r f−1(K)) −→
Hn(N,N r K) ≃ Z, induzido por f , leva a classe fundamental θ f−1(K) num multiplo inteiro de
θK, o qual denominamos grau local de f em K, e denotamos por degK f ; em outras palavras, o
numero degK f ∈ Z e tal que f∗(θ f−1(K)) = degK f · θK.
Na definicao acima, note que, se f−1(K) = ∅ (por exemplo, se K = c ⊆ N e c < Im( f )),
segue que f∗ : Hn(M,M r f−1(K)) −→ Hn(M,M r K) ≃ Z e o homomorfismo trivial, e,
portanto, degK( f ) = 0.
Exemplo 1.3.6 . Se M e uma variedade topologica orientavel de dimensao n (sem
fronteira), e Id : M −→ M e a aplicacao identidade, entao, para todo subconjunto
compacto, conexo e nao-vazio K ⊆ M, temos degK(Id) = 1. De fato, como as classes
fundamentais θK ∈ Hn(M,M r K) e θId−1(K) ∈ Hn(M,M r Id−1(K)) = Hn(M,M r K)
coincidem, e o homomorfismo Id∗ : Hn(M,MrId−1(K)) = Hn(M,MrK) −→ Hn(M,MrK)
e a identidade, segue que Id∗(θId−1(K)) = Id∗(θK) = θK, e, portanto, degK(Id) = 1.
46 Preliminares
Exemplo 1.3.7 . Se M e N sao variedades topologicas conexas de mesma dimensao n,
fechadas (isto e, compactas e sem fronteira) e orientaveis, definimos o grau de uma
aplicacao contınua f : M −→ N como sendo o numero inteiro d( f ) tal que f∗(θM) =
d( f ) · θN, onde θM e θN sao as classes fundamentais de M e N, respectivamente (e
f∗ : Hn(M) −→ Hn(N) e o homomorfismo induzido por f ). Da definicao 1.3.4, temos
entao que d( f ) = degN( f ), o que mostra que o conceito de grau local e uma generalizacao
para o grau de uma aplicacao contınua entre variedades fechadas de mesma dimensao.
Em particular, se f : Sn −→ Sn e uma aplicacao contınua entre esferas de dimensao n
(com n > 1), segue que d( f ) = degSn( f ) (para a definicao de grau de uma aplicacao
entre esferas de mesma dimensao, vide tambem [Vi], pagina 25).
O conceito de grau local possui muitas propriedades importantes, dentre as quais
destacaremos algumas que nos serao particularmente uteis.
Lema 1.3.1 . Sejam M uma variedade topologica orientavel de dimensao n (sem fronteira), U ⊆
M um aberto, e K ⊆ U um subconjunto compacto nao-vazio. Entao, denotando por i : U −→M
a inclusao, temos que o homomorfismo i∗ : Hn(U,U r K) −→ Hn(M,M r K), induzido por i,
leva a classe fundamental θUK∈ Hn(U,U r K) na classe fundamental θM
K∈ Hn(M,M r K),
isto e, i∗(θUK
) = θMK
. Consequentemente, se o compacto K ⊆ U for conexo (e, portanto, a classe
fundamental θMK
for um gerador de Hn(M,M r K)), teremos que degK i = 1.
Demonstracao. Com efeito, dado x ∈ K, considere os homomorfismos
( jM)∗ : Hn(M,M r K) −→ Hn(M,M r x) ,
( jU)∗ : Hn(U,U r K) −→ Hn(U,U r x) e
( jMU )∗ : Hn(U,U r x) −→ Hn(M,M r x) ,
induzidos pelas respectivas inclusoes jM : (M,M r K) −→ (M,M r x), jU : (U,U r
K) −→ (U,U r x) e jMU
: (U,U r x) −→ (M,M r x). Como M rU = M r U ⊆
Int(M r x) =M r x, segue (do teorema da excisao em homologia singular) que ( jMU
)∗e um isomorfismo. Por outro lado, como M rU =M rU ⊆ Int(M r K) =M r K, temos
que o homomorfismo i∗ : Hn(U,U r K) = Hn(U,U r i−1(K)) −→ Hn(M,M r K), induzido
pela inclusao i : U −→M, tambem constitui um isomorfismo, o qual comuta o seguinte
diagrama:
Hn(U,U r x) Hn(M,M r x)
Hn(U,U r K) Hn(M,M r K)
( jMU )∗
i∗
( jU)∗ ( jM)∗
1.3 A Multiplicidade de uma Classe de Raızes 47
Isto posto, sejam θUK∈ Hn(U,U r K) e θM
K∈ Hn(M,M r K) as classes fundamentais, e,
adotando-se uma orientacao sM : M −→ M em M, considere sU : U −→ U a orientacao
de U obtida pela restricao da orientacao de M (lembre-se que, por hipotese, M e
orientavel). Pela definicao de classe fundamental, temos entao que ( jU)∗(θUK
) = sU(x) e
( jM)∗(θMK
) = sM(x). Logo, como ( jMU
)∗(sU(x)) = sM(x) (pois U e orientado pela restricao da
orientacao de M), a comutatividade do diagrama acima nos garante que:
( jM)∗(i∗(θUK )) = ( jM
U )∗[( jU)∗(θUK )] = ( jM
U )∗[sU(x)] = sM(x) .
Deste modo, podemos concluir que, para todo x ∈ K, o homomorfismo ( jM)∗ : Hn(M,Mr
K) −→ Hn(M,Mr x) e tal que ( jM)∗(i∗(θUK
)) = sM(x). Assim, como a classe fundamental
θMK
e o unico elemento de Hn(M,M r K) tal que ( jM)∗(θMK
) = sM(x), para cada x ∈ K,
segue que i∗(θUK
) = θMK
. Consequentemente, se o compacto K ⊆ U for conexo, temos
que θMK
e um gerador de Hn(M,MrK), o que (pela definicao de grau local) implica que
degK i = 1, conforme querıamos demonstrar.
Proposicao 1.3.3 . Sejam M, M′ e M′′ variedades topologicas orientaveis de dimensao n (sem
fronteira), e considere duas aplicacoes contınuas f : M′′ −→ M′ e g : M′ −→ M. Dado um
subconjunto compacto, conexo e nao-vazio K ⊆ M, tal que g−1(K) , ∅ e compacto e conexo, e
(g f )−1(K) = f−1(g−1(K)) e compacto, temos que:
degK(g f ) = degK(g) · degg−1(K)( f ) .
Demonstracao. Com efeito, sejam θK ∈ Hn(M,Mr K), θg−1(K) ∈ Hn(M′,M′ r g−1(K)) e
θ(g f )−1(K) ∈ Hn(M′′,M′′ r (g f )−1(K)) as classes fundamentais em K ⊆ M, g−1(K) ⊆ M′
e (g f )−1(K) ⊆ M′′, respectivamente. Por definicao, sabemos que degK(g f ) e o
numero inteiro tal que (g f )∗(θ(g f )−1(K)) = degK(g f ) · θK, onde (g f )∗ : Hn(M′′,M′′ r
(g f )−1(K)) −→ Hn(M,M r K) e o homomorfismo induzido por g f . Entretanto,
sendo f∗ : Hn(M′′,M′′ r f−1(g−1(K))) = Hn(M′′,M′′ r (g f )−1(K)) −→ Hn(M′,M′ r
g−1(K)) e g∗ : Hn(M′,M′ r g−1(K)) −→ Hn(M,M r K) os homomorfismos induzidos
por f e g, respectivamente, sabemos tambem que (g f )∗ = g∗ f∗. Logo, como
degK(g),degg−1(K)( f ) ∈ Z sao tais que f∗(θ(g f )−1(K)) = degg−1(K)( f ) · θg−1(K) e g∗(θg−1(K)) =
degK(g) · θK, segue que:
degK(g f ) · θK = (g f )∗(θ(g f )−1(K)) = g∗( f∗(θ(g f )−1(K)))
= g∗(degg−1(K)( f ) · θg−1(K)) = degg−1(K)( f ) · g∗(θg−1(K))
= degg−1(K)( f ) · degK(g) · θK ,
e, portanto, degK(g f ) = degK(g) · degg−1(K)( f ), conforme querıamos mostrar.
48 Preliminares
Corolario 1.3.1 . Sejam M e N variedades topologicas orientaveis de dimensao n (sem fronteira),
e considere um homeomorfismo h : M −→ N. Dado um subconjunto compacto, conexo e nao-
vazio K ⊆ N, temos que degK h = ±1.
Demonstracao. De fato, sendo h−1 : N −→ M o homeomorfismo inverso de h, sa-
bemos que a composicao h h−1 : N −→ N e a identidade Id : N −→ N. Logo,
dado um subconjunto compacto, conexo e nao-vazio K ⊆ N, segue (da proposicao
anterior e do exemplo 1.3.6) que degK h · degh−1(K)(h−1) = degK(Id) = 1. Assim, como
degK h ∈ Z e degh−1(K)(h−1) ∈ Z, podemos concluir que degK h = degh−1(K)(h
−1) = 1 ou
degK h = degh−1(K)(h−1) = −1, isto e, degK h = ±1.
Proposicao 1.3.4 . Sejam M e N variedades topologicas orientaveis de dimensao n (sem fron-
teira), e considere uma aplicacao contınua propria f : M −→ N. Se N e conexa, entao o
numero inteiro degK f e independente do subconjunto compacto e conexo K ⊆ N, K , ∅ (em
outras palavras, para quaisquer conjuntos compactos, conexos e nao-vazios K1,K2 ⊆ N, temos
degK1f = degK2
f ).
Demonstracao. Com efeito, dados K1,K2 ⊆ N, compactos, conexos e nao-vazios,
existe K ⊆ N, compacto e conexo, tal que K1,K2 ⊆ K: basta tomar K = K1 ∪ K2 ∪ α(I),
onde α : I −→ N e um caminho ligando um ponto x1 ∈ K1 a um outro ponto x2 ∈ K2.
Considere entao o seguinte diagrama comutativo:
Hn(M,M r f−1(K)) Hn(N,N r K)
Hn(M,M r f−1(K1)) Hn(N,N r K1)
f∗
f∗
i∗ j∗
(onde i∗ e j∗ sao os homomorfismos induzidos pelas respectivas inclusoes). Denotando
por θK ∈ Hn(N,N r K), θ f−1(K) ∈ Hn(M,M r f−1(K)), θK1∈ Hn(N,N r K1) e θ f−1(K1) ∈
Hn(M,Mr f−1(K1)) as classes fundamentais, temos que ( j∗ f∗)(θ f−1(K)) = ( f∗ i∗)(θ f−1(K)).
Assim, como:
( j∗ f∗)(θ f−1(K)) = j∗(degK f · θK) = degK f · j∗(θK) = degK f · θK1
e
( f∗ i∗)(θ f−1(K)) = f∗(θ f−1(K1)) = degK1f · θK1
,
segue que degK f = degK1f . De maneira analoga, pode-se verificar tambem que
degK f = degK2f , d’onde concluımos que degK1
f = degK2f , conforme querıamos pro-
var.
1.3 A Multiplicidade de uma Classe de Raızes 49
Definicao 1.3.5 . Sejam M e N variedades topologicas orientaveis (sem fronteira), de mesma
dimensao, e suponha N conexa. Dado um homeomorfismo h : M −→ N, sabemos que degK h =
±1, qualquer que seja o subconjunto compacto e conexo K ⊆ N, com K , ∅ (corolario 1.3.1).
Logo, pela proposicao anterior, segue que, ou degK h = 1, ou degK h = −1, para todo subconjunto
compacto, conexo e nao-vazio K ⊆ N; de acordo com estes dois casos, dizemos (respectivamente)
que h preserva ou inverte orientacao.
Proposicao 1.3.5 (Propriedade aditiva do grau local). Sejam f : M −→ N e K ⊆ N
conforme a definicao 1.3.4, e suponha que M e uma uniao finita de conjuntos abertos Mλ,
λ ∈ 1, 2, . . . , r, tais que os conjuntos Lλ = f−1(K) ∩Mλ sao dois a dois disjuntos. Se, para
cada λ ∈ 1, 2, . . . , r, denotarmos por fλ a restricao de f a Mλ ⊆M, temos que:
degK f =
r∑
λ=1
degK fλ
(note que cada Lλ e compacto, pois f−1(K) e a uniao disjunta destes conjuntos).
Demonstracao. Dado p ∈ f−1(K), considere o diagrama
r⊕
λ=1
Hn(Mλ,Mλ r Lλ) Hn(M,M r f−1(K)) Hn(M,M r p) jλ∗ ( jp)∗
onde jλ∗ : Hn(Mλ,Mλ r Lλ) −→ Hn(M,M r f−1(K)) e ( jp)∗ : Hn(M,M r f−1(K)) −→
Hn(M,M r p) sao os homomorfismos induzidos pelas respectivas inclusoes. Temos
entao que a composicao destes homomorfismos leva todas as componentes da classe
fundamental θLλ no elemento nulo de Hn(M,Mr p), com excecao da componente θLλ
para a qual tem-se p ∈ Lλ, que e levada na classe fundamental θp ∈ Hn(M,Mr p). Daı,
segue que ( jp)∗[ jλ∗ (θLλ)] = θp para todo p ∈ f−1(K), e, portanto, jλ∗ (θLλ) = θ f−1(K),
uma vez que a classe fundamental θ f−1(K) e o unico elemento de Hn(M,M r f−1(K))
levado por ( jp)∗ em θp. Por outro lado, sendo f∗ : Hn(M,M r f−1(K)) −→ Hn(N,N r K)
e ( fλ)∗ : Hn(Mλ,Mλ r Lλ) −→ Hn(N,N r K) os homomorfismos induzidos por f e
fλ, respectivamente, sabemos que o diagrama abaixo e comutativo, para todo λ ∈
1, 2, . . . , r:
Hn(M,M r f−1(K))
Hn(Mλ,Mλ r Lλ) Hn(N,N r K)
jλ∗
( fλ)∗
f∗
50 Preliminares
Assim, temos que f∗ ( jλ∗ ) = ( fλ)∗ para cada λ ∈ 1, 2, . . . , r, ou seja, f∗ jλ∗ = ( fλ)∗.
Deste modo, obtemos que:
(degK f ) · θK = f∗(θ f−1(K)) = f∗( jλ∗ (θLλ)) = ( fλ)∗(θLλ)
=
r∑
λ=1
( fλ)∗(θLλ) =( r∑
λ=1
degK fλ)· θK ,
e, portanto,
degK f =
r∑
λ=1
degK fλ ,
como querıamos demonstrar.
Corolario 1.3.2 . Seja M uma variedade topologica conexa de dimensao n, orientavel e sem
fronteira. Se p : M′ −→ M e um recobrimento que possui um numero finito k > 0 de
folhas, entao, dado c ∈ M arbitrario, temos que degc(p) = ±k (note que, pelo exemplo 1.3.2,
p : M′ −→M e uma aplicacao propria, e, portanto, o conjunto p−1(c) e compacto).
Demonstracao. De fato, dado c ∈ M, seja U ⊆ M uma vizinhanca aberta contratil
(e, portanto, orientavel) de c, que constitui uma vizinhanca elementar em relacao
ao recobrimento p : M′ −→ M. Temos entao que p−1(U) e a uniao de uma famılia
U′1,U′2, . . . ,U
′k de abertos em M′, dois a dois disjuntos, cada qual e levado homeomor-
ficamente por p sobre U (e, consequentemente, cada U′i, i ∈ 1, 2, . . . k, e contratil). Seja,
pois, p−1(c) = x1, x2, . . . , xk, com xi ∈ U′i
para cada i ∈ 1, 2, . . . , k, e denote por
U′ =
k⋃
i=1
U′i .
Como as restricoes pi = p |U′i
: U′i−→ U sao homeomorfismos sobre U, segue que os
homomorfismos induzidos (pi)∗ : Hn(U′i,U′
ir xi) −→ Hn(U,U r c) sao isomorfismos;
alem disso, como M′ rU′ =M′rU′ ⊆ Int(M′r p−1(c)) = M′r p−1(c) e M rU =MrU ⊆
Int(M r c) = M r c, temos (do teorema da excisao em homologia singular) que os
homomorfismos j∗ : Hn(U,U r c) −→ Hn(M,M r c) e j′∗ : Hn(U′,U′ r p−1(c)) −→
Hn(M′,M′ r p−1(c)), induzidos pelas respectivas inclusoes, constituem isomorfismos.
Assim, denotando por p∗ : Hn(M′,M′ r p−1(c)) −→ Hn(M,M r c) e (p |U′)∗ : Hn(U′,U′ r
p−1(c)) −→ Hn(U,Ur c) os homomorfismos induzidos por p : M′ −→M e p |U′ : U′ −→
U, respectivamente, obtemos o seguinte diagrama comutativo:
1.3 A Multiplicidade de uma Classe de Raızes 51
Hn(U′,U′ r p−1(c)) Hn(U,U r c)
Hn(M′,M′ r p−1(c)) Hn(M,M r c)
(p |U′)∗
p∗
j′∗ j∗
Agora, observe que, como xi = U′i∩ p−1(c) para cada i ∈ 1, 2, . . . , k, a proposicao 1.3.5
nos garante que:
degc(p |U′) =
k∑
i=1
degc(pi) .
Logo, sendo θMc ∈ Hn(M,M r c), θU
c ∈ Hn(U,U r c), θU′
p−1(c)∈ Hn(U′,U′ r p−1(c)) e
θM′
p−1(c)∈ Hn(M′,M′ r p−1(c)) as classes fundamentais, e lembrando que j′∗(θ
U′
p−1(c)) = θM′
p−1(c)
e j∗(θUc ) = θM
c (vide lema 1.3.1), segue (da comutatividade do diagrama acima) que:
p∗( j′∗(θU′
p−1(c))) = j∗[(p |U′)∗(θ
U′
p−1(c))] = j∗[degc(p |U′) · θ
Uc ] = degc(p |U′) · j∗(θ
Uc )
= degc(p |U′) · θMc =
[ k∑
i=1
degc(pi)
]· θM
c ,
isto e, degc(p) =
k∑
i=1
degc(pi) (uma vez que p∗( j′∗(θU′
p−1(c))) = p∗(θ
M′
p−1(c)) = degc(p) · θM
c ). Isto
posto, vamos mostrar entao que degc(pi1) = degc(pi2) para quaisquer i1, i2 ∈ 1, 2, . . . , k.
Com efeito, dados i1, i2 ∈ 1, 2, . . . , k arbitrarios, considere as inclusoes j′i1
: (U′i1,U′
i1r
xi1) −→ (U′,U′ r p−1(c)) e j′i2
: (U′i2,U′
i2r xi2) −→ (U′,U′ r p−1(c)); como U′ rU′
i1=
U′ r U′i1⊆ Int(U′ r p−1(c)) = U′ r p−1(c) e U′ rU′
i2= U′ r U′
i2⊆ Int(U′ r p−1(c)) = U′ r
p−1(c) (onde os fechos sao relativos a U′), segue, do teorema da excisao em homologia
singular, que os homomorfismos ( j′i1
)∗ : Hn(U′i1,U′
i1r xi1) −→ Hn(U′,U′ r p−1(c)) e
( j′i2
)∗ : Hn(U′i2,U′
i2r xi2) −→ Hn(U′,U′ r p−1(c)), induzidos respectivamente por j′
i1e j′
i2,
constituem isomorfismos, que comutam o seguinte diagrama:
Hn(U′i1 ,U′i1r xi1)
Hn(U′,U′ r p−1(c)) Hn(U,U r c)
Hn(U′i2 ,U′i2r xi2)
( j′i1)∗ (pi1)∗
( j′i2)∗ (pi2)∗
(p |U′)∗
52 Preliminares
Por outro lado, sendo θ′i1∈ Hn(U′
i1,U′
i1r xi1) e θ′
i2∈ Hn(U′
i2,U′
i2r xi2) as classes
fundamentais, temos (do lema 1.3.1) que ( j′i1
)∗(θ′i1
) = ( j′i2
)∗(θ′i2
) = θU′
p−1(c)(onde θU′
p−1(c)∈
Hn(U′,U′ r p−1(c)) e a classe fundamental). Portanto, da comutatividade do diagrama
acima, segue que:
degc(pi1) · θUc = (pi1)∗(θ
′i1
) = [(p |U′)∗ ( j′i1)∗](θ′i1
)
= [(pi2)∗ ( j′i2)−1∗ ( j′i1)∗](θ
′i1
) = [(pi2)∗ ( j′i2)−1∗ ](θU′
p−1(c))
= (pi2)∗(θ′i2
) = degc(pi2) · θUc ,
ou seja, degc(pi1) = degc(pi2), conforme querıamos mostrar (note que a classe funda-
mental θUc e um gerador de Hn(U,U r c)).
Finalmente, lembrando que as restricoes pi = p |U′i
: U′i−→ U sao homeomorfis-
mos (onde i ∈ 1, 2, . . . , k), segue, do corolario 1.3.1, que degc(pi) = ±1 para cada
i ∈ 1, 2, . . . , k. Ora, se degc(p1) = degc(p2) = . . . = degc(pk) e degc(pi) = ±1, qualquer
que seja i ∈ 1, 2, . . . , k, temos entao que:
k∑
i=1
degc(pi) = ±k ,
o que nos leva a concluir que degc(p) = ±k.
Agora, retornando a teoria de raızes, considere uma aplicacao contınua propria
f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) entre variedades topologicas conexas de dimensao n (nao ne-
cessariamente orientaveis), e, dado um ponto c ∈ Int N, seja V ⊆ Int N uma vizinhanca
aberta contratil de c em N (lembre-se que toda variedade topologica e localmente sim-
plesmente conexa); como f preserva fronteira, temos que f−1(V) ⊆ Int M. Seja, pois, R
uma classe de raızes de f em c, e U ⊆ f−1(V) um aberto em M tal que U ∩ f−1(c) = R
(cuja existencia e garantida pela proposicao 1.3.1). Temos entao que U e uma variedade
topologica de dimensao n, sem fronteira, embora possivelmente nao-conexa.
Assim sendo, vamos supor primeiramente que U seja uma variedade orientavel (em
particular, se M for orientavel, consideraremos a orientacao de U como sendo a restricao
da orientacao de M). Note que, como a vizinhanca aberta V e contratil, segue que V
tambem e uma variedade orientavel (de dimensao n e sem fronteira), cuja orientacao
adotaremos como sendo a restricao da orientacao de N, caso N seja orientavel; deste
modo, temos que f |U : U −→ V e uma aplicacao contınua entre variedades topologicas
orientaveis de dimensao n e sem fronteira. Isto posto, como c ⊆ V e compacto e conexo,
e f−1(c) e um subconjunto compacto de U (pois f e propria), segue que o grau local
de f |U em c, denotado por degc( f |U), esta bem definido, e constitui o numero inteiro
1.3 A Multiplicidade de uma Classe de Raızes 53
tal que ( f |U)∗(θ f−1(c)) = degc( f |U) · θc, onde ( f |U)∗ : Hn(U,U r f−1(c)) −→ Hn(V,V r c)
e o homomorfismo induzido por f |U (e θ f−1(c) e θc sao as classes fundamentais em
f−1(c) e c, respectivamente). Sem muitas dificuldades, podemos ver que, se U0 ⊆ U e
um aberto contendo R, orientado pela restricao da orientacao de U, temos degc( f |U0) =
degc( f |U); consequentemente, se U1 e U2 sao subconjuntos abertos de f−1(V), ambos
contendo R e orientados de maneira que suas orientacoes coincidam na interseccao
U1 ∩ U2, entao degc( f |U1) = degc( f |U2
). Alem disso, se V0 ⊆ V e outra vizinhanca
aberta contratil de c em N, com U ⊆ f−1(V0), segue que degc( f |U) possui o mesmo valor,
independentemente de considerarmos f |U como aplicacao em V ou V0. Da propriedade
aditiva do grau local (proposicao 1.3.5), temos ainda que:∑degc( f |U) : R e classe de raızes de f em c = degc( f |⋃ UR
) ,
onde, para cada classe de raızes R de f em c, UR ⊆ f−1(V) e um aberto tal que UR∩ f−1(c) =
R.
Observe entao que, devido as condicoes impostas na definicao 1.3.4, tivemos de
supor que o aberto U ⊆ f−1(V), contendo a classe de raızes R, fosse orientavel para
podermos definir degc( f |U). Agora, vamos admitir que U nao seja necessariamente
orientavel; deste modo, pode nao existir qualquer aberto U ⊆ f−1(V), contendo R,
que seja orientavel (como e o caso, por exemplo, se M for uma variedade topologica
fechada, nao-orientavel, e f for a aplicacao constante f : M −→ c ⊆ Int N). Entretanto,
mostraremos a seguir que, se f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) for uma aplicacao orientavel,
entao o aberto U tambem e orientavel, e vamos descrever um procedimento que sera
utilizado para orientar U quando f for uma aplicacao orientavel.
Definicao 1.3.6 . Considere f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua, propria e
orientavel, entre variedades topologicas conexas de dimensao n, e sejam V uma vizinhanca
aberta contratil de um ponto c ∈ Int N em N, e U ⊆ f−1(V) um aberto contendo uma classe de
raızes R de f em c, com U ∩ f−1(c) = R. Primeiramente, convem mostrarmos que U e uma
variedade orientavel: de fato, todo laco em U e levado por f num laco do conjunto contratil V,
e, portanto, todo laco em U preserva orientacao (uma vez que os lacos em V sao contrateis, e f e
orientavel); logo, pela proposicao 1.1.3, temos que cada componente conexa de U e orientavel, o
que implica que U e orientavel.
Isto posto, a fim de orientar U, vamos utilizar o seguinte procedimento, o qual denominaremos
processo de orientacao: se M for uma variedade orientavel, consideramos a orientacao de U
como sendo a restricao da orientacao de M. Caso contrario, tomamos xR ∈ R ⊆ U arbitrario,
contido numa componente conexa (aberta) UxRde U, e escolhemos uma orientacao s(xR) ∈ UxR
em xR (onde UxRe o fibrado orientado de UxR
). Pela definicao de classe de raızes, sabemos
que, dado outro ponto x ∈ R, existe um caminho ω : I −→ M, com ω(0) = xR e ω(1) = x,
54 Preliminares
tal que f ω : I −→ N e um laco contratil com base no ponto c; alem disso, sendo ( jxR)∗ :
Hn(UxR,UxR
r xR) −→ Hn(Int M, Int M r xR) o isomorfismo induzido pela inclusao, temos
que s(xR) determina uma unica orientacao local de Int M em xR, a saber, sM(xR) = ( jxR)∗(s(xR)).
Assim, orientamos U em x estendendo a orientacao local de xR em Int M ao longo de
ω, e depois restringimos a orientacao local obtida, para uma orientacao em U: denotando por
pM : Int M −→ Int M a projecao orientada de Int M (a qual constitui um recobrimento de duas
folhas, pois Int M e nao-orientavel), consideramos a orientacao sM(x) de Int M em x como sendo
sM(x) = ω(1), onde ω : I −→ Int M e o unico levantamento deω (relativamente ao recobrimento
pM) tal que ω(0) = s(xR) ∈ Int M; entao, considerando o isomorfismo ( jx)∗ : Hn(Ux,Uxrx) −→
Hn(Int M, Int M r x), induzido pela inclusao da componente conexa Ux ⊆ U, que contem x,
em Int M, definimos a orientacao de U em x por s(x) = ( jx)−1∗ (sM(x)) ∈ Hn(Ux,Ux r x). Note
que esta orientacao s(x) e independente da escolha do caminhoω : I −→M: com efeito, dado um
outro caminho λ : I −→M, satisfazendo λ(0) = xR e λ(1) = x, tal que f λ : I −→ N e um laco
contratil com base no ponto c, e sendoω−1∨λ : I −→M o laco constituıdo da justaposicao deω−1
e λ, temos que f (ω−1∨λ) : I −→ N e um laco contratil, pois f (ω−1∨λ) = ( f ω−1)∨( f λ);
logo, f (ω−1 ∨ λ) e um laco que preserva orientacao, o que significa que ω−1 ∨ λ tambem o e
(uma vez que a aplicacao f e orientavel). Portanto, temos que sM(x) = ω(1) = ω−1(0) = λ(1),
d’onde concluımos que a orientacao s(x) nao depende do caminho ω : I −→ M que escolhemos
acima.
Deste modo, a partir da orientacao em xR, podemos orientar cada ponto x ∈ R. Agora,
considere uma componente conexa U0 de U tal que U0 ∩ R , ∅, e seja x ∈ U0 ∩ R. A fim de
orientarmos os pontos de U0 que nao pertencem a R, procedemos da seguinte maneira: dado
y ∈ U0 r R, tomamos um caminho α : I −→ U0 tal que α(0) = x e α(1) = y (o qual existe,
pois U0 e uma variedade conexa, e, portanto, conexa por caminhos), e orientamos U em x de
acordo com o procedimento descrito acima; entao, sendo p0 : C0 −→ U0 o recobrimento de U0
obtido de uma componente conexa C0 do fibrado orientado U0, contendo a orientacao s(x) de
U em x, definimos a orientacao de U0 em y como sendo s(y) = α(1), onde α : I −→ C0 e o
unico levantamento de α (relativamente a p0) tal que α(0) = s(x) ∈ C0 (em outras palavras,
orientamos U0 em y estendendo a orientacao de x ao longo de α, conforme ilustrado na figura
1.3 a seguir). Para verificar que s(y) nao depende do caminho α escolhido, basta observar que,
se β : I −→ U0 e outro caminho satisfazendo β(0) = x e β(1) = y, entao α−1 ∨ β : I −→ U0 e um
laco que preserva orientacao (uma vez que U0 e orientavel), isto e, s(y) = α(1) = α−1(0) = β(1).
Consequentemente, temos que s(y) tambem nao depende do ponto x ∈ U0 ∩ R que tomamos
inicialmente: de fato, dado outro ponto x′ ∈ U0 ∩ R, e sendo γ, δ : I −→ U0 caminhos tais
que γ(0) = x, γ(1) = δ(0) = x′ e δ(1) = y, segue que o caminho β = γ ∨ δ : I −→ U0
satisfaz β(0) = x e β(1) = y, e, portanto, s(y) = α(1) = β(1) = δ(1). Assim, a orientacao de xR
tambem nos permite orientar os pontos de cada componente conexa de U que intercepta R. Logo,
orientando as demais componentes de U (que nao interceptam R) arbitrariamente, tornamos U
1.3 A Multiplicidade de uma Classe de Raızes 55
uma variedade orientada.
R
R
U0
UxRy
x
x′
δ
β
α
γ
λ
ωxR
Figura 1.3
Agora, observe que, embora nao haja um criterio na escolha das orientacoes de U
e V (a menos, e claro, que M e N sejam variedades orientadas), o grau local degc( f |U)
possui o mesmo valor absoluto, independentemente das orientacoes de U e V. De
fato, utilizando as mesmas notacoes acima, fixemos uma orientacao sU : U −→ U em
U, e consideremos a classe fundamental θ f−1(c) em f−1(c) ⊆ U; entao, adotando uma
orientacao sV : V −→ V em V, e sendo θc a classe fundamental em c, segue que
degc( f |U) ∈ Z e tal que ( f |U)∗(θ f−1(c)) = degc( f |U) · θc, onde ( f |U)∗ : Hn(U,U r f−1(c)) −→
Hn(V,Vr c) e o homomorfismo induzido por f |U : U −→ V. Entretanto, considerando
a orientacao oposta −sV : V −→ V em V, obtemos outra classe fundamental θ′c em
c, satisfazendo θ′c = −1 · θc (vide definicao 1.3.3), a qual, por sua vez, determina um
grau local deg′c( f |U) ∈ Z tal que ( f |U)∗(θ f−1(c)) = deg′c( f |U) · θ′c. Ora, se ( f |U)∗(θ f−1(c)) =
degc( f |U) · θc = deg′c( f |U) · θ′c e θ′c = −1 · θc, concluımos que deg′c( f |U) = −degc( f |U).
Por outro lado, suponhamos agora que a orientacao sV : V −→ V e fixa; entao, se
f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e uma aplicacao orientavel, e se tomarmos a orientacao oposta
de U em xR ∈ R, o processo de orientacao descrito acima altera a orientacao de cada
componente conexa de U que intercepta R. Logo, o grau local, em c ∈ Int N, da restricao
de f a cada uma destas componentes, tambem muda de sinal. Ora, como a classe de
raızes R e compacta, segue que o numero de componentes de U, que interceptam R, e
finito; alem disso, se U0 e uma componente conexa de U que nao intercepta R, segue
que U0 ∩ f−1(c) = ∅ (pois U0 ∩ f−1(c) ⊆ U ∩ f−1(c) = R), isto e, ( f |U0)−1(c) = ∅, o que
implica que degc( f |U0) = 0. Portanto, pela propriedade aditiva do grau local aplicada
56 Preliminares
a restricao f |U : U −→ V, podemos ver que a mudanca de orientacao de U tambem
inverte o sinal de degc( f |U). Consequentemente, a menos de sinal, o grau local degc( f |U)
e independente das orientacoes de U e V, conforme querıamos mostrar.
Finalmente, antes de definirmos o conceito de multiplicidade de uma classe de raızes,
convem observarmos tambem que, se f nao for uma aplicacao orientavel, o aberto
U ainda pode ser orientavel (e o que ocorre, por exemplo, se a classe de raızes R e
finita e U e tomado como sendo uma uniao de vizinhancas euclidianas). Entretanto,
a nao-orientabilidade de f implica que a orientacao de U, obtida pelo processo de
orientacao, dependera nao somente da orientacao de U em xR (como era o caso, se f
fosse orientavel), mas tambem da escolha dos caminhos entre xR e os demais pontos de
R; isto significa que o grau local degc( f |U) pode nao estar bem definido, pois uma dada
orientacao de U em xR pode definir duas possıveis orientacoes na componente conexa
de U que contem xR, sendo que cada uma delas determinara um valor diferente para
o grau local nesta componente. Assim, para evitar esta inconveniencia, consideramos
que, se f nao e orientavel, o grau local degc( f |U) deve ser calculado utilizando-se
coeficientes emZ2, pois, deste modo, o aberto U torna-se unicamente orientado.
Tendo em vista as observacoes acima, podemos entao introduzir a seguinte
Definicao 1.3.7 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao propria entre variedades
topologicas conexas, de dimensao n, e sejam c ∈ Int N e R uma classe de raızes de f em c. Dada
uma vizinhanca aberta contratil V ⊆ Int N de c em N, e sendo U ⊆ f−1(V) um aberto tal que
U ∩ f−1(c) = R, definimos a multiplicidade de R, denotada por |m(R)|, como sendo
|m(R)| = |degc( f |U)| ,
onde:
• se f e uma aplicacao orientavel (isto e, dos tipos I ou II), degc( f |U) e o grau local, com
coeficientes em Z, e U e orientado de acordo com o processo de orientacao;
• se f e uma aplicacao nao-orientavel (isto e, do tipo III), degc( f |U) e o grau local com coeficientes
em Z2.
Exemplo 1.3.8 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao propria entre variedades
topologicas conexas (de dimensao n), e sejam c ∈ Int N e V ⊆ N uma vizinhanca
aberta contratil de c em N. Supondo f−1(c) finito e nao-vazio, considere uma classe
de raızes R = x1, x2, . . . , xk de f em c, e, para cada i ∈ 1, 2, . . . , k, denote por Ui uma
vizinhanca aberta de xi em f−1(V), tal que Ui ∩ f−1(c) = xi. Orientando o aberto
U =⋃k
i=1 Ui ⊆ f−1(V) pelo processo de orientacao, segue (da propriedade aditiva do
1.4 O Grau Cohomologico 57
grau local, aplicada a f |U : U −→ V), que:
degc( f |U) =
k∑
i=1
degc( f |Ui) .
Assim, se f for uma aplicacao orientavel, concluımos que:
|m(R)| =
∣∣∣∣∣∣k∑
i=1
degc( f |Ui)
∣∣∣∣∣∣ .
Note que, caso f seja nao-orientavel, a expressao acima ainda contınua valida: basta
tomarmos coeficientes em Z2 nos calculos dos graus locais.
O objetivo desta secao e definir o grau cohomologico para aplicacoes proprias
f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), e mostrar sua relacao com o conceito de grau local introduzido
na secao anterior. Primeiramente, no entanto, convem apresentarmos uma revisao da
cohomologia de Cech com suporte compacto para variedades com fronteira, sendo que,
para tanto, utilizaremos alguns resultados sobre limites diretos (o apendice A contem
um breve resumo sobre este assunto).
Definicao 1.4.1 . Seja M uma variedade topologica de dimensao n e A ⊆ M um subconjunto
localmente compacto (por exemplo, aberto ou fechado). Denotando por Λ a famılia de todos os
subconjuntos compactos K ⊆ M, tais que A ⊆ M r K, temos que Λ constitui um conjunto
dirigido pela relacao de inclusao direta, dada por K1 6 K2 ⇐⇒ K1 ⊆ K2, onde K1,K2 ∈ Λ
(vide exemplo A.1). Isto posto, dados K1,K2 ∈ Λ, com K1 6 K2, seja i∗K1,K2: Hk(M,M r
K1) −→ Hk(M,M r K2) o homomorfismo em cohomologia singular induzido pela inclusao
i : (M,M r K2) −→ (M,M r K1). Como i∗K1,K3= i∗K2,K3
i∗K1,K2para quaisquer K1,K2,K3 ∈ Λ,
com K1 6 K2 6 K3, segue entao que Hk(M,MrK), i∗K1,K2K1 ,K2∈Λ e um sistema direto de grupos
abelianos e homomorfismos (note que i∗K1,K1e o homomorfismo identidade, para todo K1 ∈ Λ).
Assim, ao grupo abeliano lim−−→Hk(M,M r K) : K ∈ Λ, denominamos k-esimo grupo de
cohomologia de Cech com suporte compacto (e coeficientes em Z) do par (M,A), e o
denotamos por∨
Hkc(M,A). Como usualmente, se A = ∅, escrevemos
∨
Hkc(M,∅) =
∨
Hkc(M) (neste
caso, Λ e constituıdo de todos os subconjuntos compactos de M).
Proposicao 1.4.1 . Sendo M uma variedade topologica de dimensao n, com fronteira ∂M, entao
existe um isomorfismo∨
ϕ :∨
Hkc(M, ∂M) −→
∨
Hkc(Int M).
58 Preliminares
Demonstracao. Com efeito, denotemos por Λ a famılia de todos os subconjuntos
compactos K ⊆ M, tais que ∂M ⊆ M r K, dirigida pela relacao de inclusao di-
reta. Como todo subconjunto compacto L ⊆ M r ∂M = Int M constitui um sub-
conjunto compacto de M, tal que ∂M ⊆ M r L, e como K ⊆ M r ∂M = Int M para
todo compacto K ∈ Λ, segue que Λ coincide com a famılia dos subconjuntos com-
pactos de Int M (tambem dirigida pela relacao de inclusao direta). Isto posto, da-
dos K1,K2 ∈ Λ, com K1 6 K2, sejam i∗K1,K2: Hk(M,M r K1) −→ Hk(M,M r K2) e
j∗K1,K2: Hk(Int M, Int M r K1) −→ Hk(Int M, Int M r K2) os homomorfismos em coho-
mologia singular induzidos pelas inclusoes iK1,K2: (M,M r K2) −→ (M,M r K1) e jK1,K2
:
(Int M, Int M r K2) −→ (Int M, Int M r K1); por definicao, temos entao que∨
Hkc(M, ∂M)
e∨
Hkc(Int M) sao os limites diretos dos sistemas S(M, ∂M) = Hk(M,M r K), i∗K1,K2
K1 ,K2∈Λ
e S(Int M) = Hk(Int M, Int M r K), j∗K1,K2K1,K2∈Λ , respectivamente. Considere, pois, a
aplicacao identidade IdΛ : Λ −→ Λ (dada por IdΛ(K) = K para todo K ∈ Λ), e, para cada
K ∈ Λ, seja i∗K : Hk(M,MrK) −→ Hk(Int M, Int MrK) o homomorfismo em cohomologia
singular induzido pela inclusao iK : (Int M, Int MrK) −→ (M,MrK). Dados K1,K2 ∈ Λ,
com K1 6 K2, sabemos que o diagrama abaixo e comutativo:
Hk(M,M r K1) Hk(M,M r K2)
Hk(Int M, Int M r K1) Hk(Int M, Int M r K2)
i∗K1 ,K2
j∗K1,K2
i∗K1i∗K2
Daı, segue que Φ = IdΛ, i∗KK∈Λ e uma aplicacao entre os sistemas diretos S(M, ∂M)
e S(Int M), a qual induz um homomorfismo∨
ϕ =→Φ :
∨
Hkc(M, ∂M) −→
∨
Hkc(Int M).
Agora, observe que ∂M = ∂M ⊆ M r K = Int(M r K) para todo K ∈ Λ; pela excisao
em cohomologia singular (vide [Vi], teorema 3.12, pagina 81), isto significa que i∗K :
Hk(M,M r K) −→ Hk(Int M, Int M r K) e um isomorfismo, qualquer que seja K ∈ Λ.
Logo, pela proposicao A.3, podemos concluir que∨
ϕ e um isomorfismo entre os grupos∨
Hkc(M, ∂M) e
∨
Hkc(Int M).
Proposicao 1.4.2 . Se M e uma variedade topologica conexa de dimensao n, entao∨
Hnc (M, ∂M) ≃
Z se M for orientavel, ou∨
Hnc (M, ∂M) ≃ Z2 caso contrario.
Demonstracao. Como∨
Hnc (M, ∂M) ≃
∨
Hnc (Int M), podemos supor, sem perda de ge-
neralidade, que ∂M = ∅. Seja, pois, Λ0 a famılia de todos os subconjuntos compactos
e conexos K ⊆ M; no exemplo A.3, vimos que Λ0 e um subconjunto cofinal da famılia
Λ de todos os subconjuntos compactos de M, ambas dirigidas pela relacao de inclusao
1.4 O Grau Cohomologico 59
direta. Portanto:
∨
Hnc (M) = lim
−−→Hn(M,M r K) : K ∈ Λ ≃ lim
−−→Hn(M,M r K) : K ∈ Λ0
(vide item (iii) da proposicao A.2). Entretanto, do teorema dos coeficientes universais
para cohomologia singular, temos que:
Hn(M,M r K;Z) ≃ Hom(Hn(M,M r K),Z) ⊕ Ext(Hn−1(M,M r K),Z)
para todo K ∈ Λ0 (vide [Vi], teorema 3.14, pagina 84); por outro lado, sabemos tambem
que:
Hom(Hn(M,M r K),Z) ≃
Z se M e orientavel
0 se M e nao-orientavel
e
Ext(Hn−1(M,M r K),Z) ≃
0 se M e orientavel
Z2 se M e nao-orientavel
(vide [D], corolarios 3.4 e 3.5, paginas 260 e 261). Logo, para todo K ∈ Λ0, segue que:
Hn(M,M r K;Z) ≃
Z se M e orientavel
Z2 se M e nao-orientavel.
Isto posto, consideremos os sistemas diretos GK, fK1,K2K1,K2∈Λ0
e HK, gK1,K2K1 ,K2∈Λ0
, onde
GK = Z e HK = Z2 para cada K ∈ Λ0, e fK1,K2: GK1
−→ GK2e gK1,K2
: HK1−→ HK2
sao
os homomorfismos identidade, quaisquer que sejam K1,K2 ∈ Λ0 tais que K1 6 K2; sem
muitas dificuldades, podemos ver que lim−−→GK : K ∈ Λ0 ≃ Z e lim
−−→HK : K ∈ Λ0 ≃ Z2.
Assim, supondo M orientavel, temos que Hn(M,M r K;Z) ≃ GK para todo K ∈ Λ0, e,
consequentemente (da proposicao A.3), segue que:
∨
Hnc (M) ≃ lim
−−→Hn(M,M r K;Z) : K ∈ Λ0 ≃ lim
−−→GK : K ∈ Λ0 ≃ Z .
Por outro lado, se M e nao-orientavel, temos que Hn(M,M r K;Z) ≃ HK para todo
K ∈ Λ0, o que implica que:
∨
Hnc (M) ≃ lim
−−→Hn(M,M r K;Z) : K ∈ Λ0 ≃ lim
−−→HK : K ∈ Λ0 ≃ Z2 .
Deste modo, concluımos que:
∨
Hnc (M, ∂M) ≃
∨
Hnc (Int M) ≃
Z se Int M e orientavel
Z2 se Int M e nao-orientavel,
como querıamos demonstrar.
60 Preliminares
Definicao 1.4.2 . Sejam M e N variedades topologicas de dimensao n, e, dados subconjuntos
localmente compactos A ⊆M e B ⊆ N, considere uma aplicacao contınua propria f : (M,A) −→
(N,A). Sejam ainda Λ a famılia dos conjuntos compactos K ⊆ M tais que A ⊆ M r K, e Ω
a famılia dos conjuntos compactos L ⊆ N tais que B ⊆ N r L, ambas dirigidas pela relacao
de inclusao direta. Note entao que f−1(L) ∈ Λ para todo L ∈ Ω: com efeito, se L ∈ Ω (isto
e, se L ⊆ N e compacto, com B ⊆ N r L), segue que f−1(L) e um subconjunto compacto
de M (pois f e propria), tal que A ⊆ f−1(B) ⊆ f−1(N r L) = M r f−1(L). Isto posto, seja
φ : Ω −→ Λ a funcao dada por φ(L) = f−1(L) para cada L ∈ Ω. Evidentemente, temos que
φ preserva ordem, pois, dados L1, L2 ∈ Ω tais que L1 6 L2, segue que L1 ⊆ L2, o que implica
que f−1(L1) ⊆ f−1(L2), ou seja, φ(L1) 6 φ(L2). Agora, dado L ∈ Ω, considere o homomorfismo
f ∗L : Hk(N,N r L) −→ Hk(M,M r f−1(L)) induzido em cohomologia singular pela restricao de
f a M r f−1(L). Entao, dados L1, L2 ∈ Ω, com L1 6 L2, e sendo j∗L1,L2: Hk(N,N r L1) −→
Hk(N,NrL2) e i∗f−1(L1), f−1(L2)
: Hk(M,Mr f−1(L1)) −→ Hk(M,Mr f−1(L2)) os homomorfismos
induzidos pelas inclusoes N r L2 ⊆ N r L1 e M r f−1(L2) ⊆ M r f−1(L1), temos o seguinte
diagrama comutativo:
Hk(N,N r L1) Hk(N,N r L2)
Hk(M,M r f−1(L1))︸ ︷︷ ︸
Hk(M,Mrφ(L1))
Hk(M,M r f−1(L2))︸ ︷︷ ︸
Hk(M,Mrφ(L2))
j∗L1,L2
i∗f−1(L1), f−1(L2)
f ∗L1f ∗L2
Portanto, Φ = φ, f ∗LL∈Ω e uma aplicacao entre os sistemas diretos S(N) = Hk(N,N r
L), j∗L1,L2L1 ,L2∈Ω e S(M) = Hk(M,M r K), i∗K1,K2
K1 ,K2∈Λ. Deste modo, definimos o homomor-
fismo induzido (em cohomologia de Cech com suporte compacto), pela funcao f , como sendo o
limite direto∨
f ∗k = →Φ :∨
Hkc(N,B) −→
∨
Hkc(M,A) .
Note que, dados L ∈ Ω e µL ∈ Hk(N,NrL), o homomorfismo∨
f ∗k
leva JµLK ∈∨
Hkc(N,B) na classe
J f ∗L(µL)K ∈∨
Hkc(M,A).
Proposicao 1.4.3 . Sejam M, M′ e M′′ variedades topologicas de dimensao n, e considere
subconjuntos localmente compactos A ⊆ M, A′ ⊆ M′ e A′′ ⊆M′′. Se f : (M,A) −→ (M′,A′) e
g : (M′,A′) −→ (M′′,A′′) sao aplicacoes contınuas proprias, entao (lembrando que a composta
de duas aplicacoes proprias tambem e propria) temos que:∨
(g f )∗k =∨
f ∗k ∨
g∗k .
1.4 O Grau Cohomologico 61
Demonstracao. De fato, sejam Λ a famılia dos conjuntos compactos K ⊆ M tais que
A ⊆MrK,Λ′ a famılia dos compactos K′ ⊆M′ tais que A′ ⊆ M′rK′, eΛ′′ a famılia dos
compactos K′′ ⊆ M′′ tais que A′′ ⊆ M′′ r K′′, todas dirigidas pela relacao de inclusao
direta. Conforme observamos na definicao 1.4.2, temos que f−1(K′) ∈ Λ e g−1(K′′) ∈ Λ′
para quaisquer K′ ∈ Λ′ e K′′ ∈ Λ′′; sejam, pois,φ : Λ′ −→ Λ eφ′ : Λ′′ −→ Λ′ as aplicacoes
dadas por φ(K′) = f−1(K′) e φ′(K′′) = g−1(K′′), e, para cada par K′ ∈ Λ′ e K′′ ∈ Λ′′, sejam
f ∗K′ : Hk(M′,M′ r K′) −→ Hk(M,M r f−1(K′)) e g∗K′′ : Hk(M′′,M′′ r K′′) −→ Hk(M′,M′ r
g−1(K′′)) os homomorfismos em cohomologia singular induzidos pelas restricoes fK′ :
(M,Mr f−1(K′)) −→ (M′,M′ rK′) e gK′′ : (M′,M′r g−1(K′′)) −→ (M′′,M′′rK′′), de f e g,
respectivamente. Por definicao, temos entao que∨
f ∗k(JxK) = J f ∗K′(x)K e
∨
g∗k(JyK) = Jg∗K′′(y)K,
para quaisquer x ∈ Hk(M′,M′ r K′) e y ∈ Hk(M′′,M′′ r K′′), com K′ ∈ Λ′ e K′′ ∈ Λ′′.
Por outro lado, como (g f )−1(K′′) ∈ Λ para todo K′′ ∈ Λ′′, segue que a aplicacao
ψ : Λ′′ −→ Λ, dada por ψ(K′′) = (g f )−1(K′′), esta bem definida; assim, para cada
K′′ ∈ Λ′′, seja (g f )∗K′′ : Hk(M′′,M′′rK′′) −→ Hk(M,Mr (g f )−1(K′′)) o homomorfismo
induzido pela restricao (g f )K′′ : (M,M r (g f )−1(K′′)) −→ (M′′,M′′ r K′′), de g f a
M r (g f )−1(K′′). Dado y ∈ Hk(M′′,M′′ r K′′), com K′′ ∈ Λ′′, sabemos que:∨
(g f )∗k(JyK) = J(g f )∗K′(y)K .
Agora, observe que, para todo K′′ ∈ Λ′′, temos (g f )∗K′′ = f ∗g−1(K′′)
g∗K′′ , conforme ilustra
o diagrama abaixo:
Hk(M′′,M′′ r K′′) Hk(M′,M′ r g−1(K′′)) Hk(M,M r f−1(g−1(K′′)))︸ ︷︷ ︸
Hk(M,Mr(g f )−1(K′′))
g∗K′′f ∗g−1(K′′)
Portanto, para todo y ∈ Hk(M′′,M′′ r K′′), com K′′ ∈ Λ′′, temos que:∨
(g f )∗k(JyK) = J(g f )∗K′(y)K = J( f ∗g−1(K′′)
g∗K′′)(y)K = J f ∗g−1(K′′)
(g∗K′′(y))K
=∨
f ∗k (Jg∗K′′(y)K) =∨
f ∗k (∨
g∗k(JyK)) = (∨
f ∗k ∨
g∗k)(JyK) ,
d’onde concluımos que∨
(g f )∗k=∨
f ∗k∨
g∗k, como querıamos provar.
Proposicao 1.4.4 . Sejam M e N variedades topologicas de dimensao n, e considere subconjuntos
localmente compactos A ⊆ M e B ⊆ M. Dadas aplicacoes contınuas proprias f , g : (M,A) −→
(N,B), suponha que h : (M × I,A × I) −→ (N,B) seja uma homotopia propria entre f e g
(isto e, h e uma aplicacao contınua propria tal que h(x, 0) = f (x) e h(x, 1) = g(x), para todo
x ∈ M). Neste caso, sendo∨
f ∗k,∨
g∗k
:∨
Hkc(N,B) −→
∨
Hkc(M,A) os homomorfismos induzidos por f
e g, respectivamente, temos que∨
f ∗k=∨
g∗k
(em outras palavras, os homomorfismos induzidos em
cohomologia de Cech com suporte compacto sao invariantes por homotopias proprias).
62 Preliminares
Demonstracao. Sejam u, v : (M,A) −→ (M × I,A × I) as aplicacoes definidas por
u(x) = (x, 0) e v(x) = (x, 1), para cada x ∈M; como todo subconjunto compacto de M × I
e da forma K × J, onde K ⊆M e compacto e J ⊆ I e fechado, e como
u−1(K × J) =
K se 0 ∈ J
∅ se 0 < Je v−1(K × J) =
K se 1 ∈ J
∅ se 1 < J,
segue que u e v sao aplicacoes proprias. Observe entao que (h u)(x) = h(u(x)) =
h(x, 0) = f (x) e (h v)(x) = h(v(x)) = h(x, 1) = g(x), para todo x ∈ M, isto e, h u = f e
hv = g. Agora, como h : (M× I,A× I) −→ (N,B) e propria, segue que o homomorfismo∨
h∗k
:∨
Hkc(N,B) −→
∨
Hkc(M × I,A × I) esta bem definido; logo, da proposicao anterior,
temos que∨
f ∗k=∨
u∗k∨
h∗k
e∨
g∗k=∨
v∗k∨
h∗k. Deste modo, para provarmos que
∨
f ∗k=∨
g∗k, basta
mostrarmos que∨
u∗k=∨
v∗k.
Com efeito, sejam Ω a famılia dos subconjuntos compactos K × I ⊆ M × I tais que
A × I ⊆ (M × I) r (K × I), e Λ a famılia dos compactos K ⊆ M tais que A ⊆ M r K,
ambas dirigidas pela relacao de inclusao direta. Como u−1(K × I), v−1(K × I) ∈ Λ para
todo K × I ∈ Ω (pois u e v sao proprias), segue que as aplicacoes φ,ψ : Ω −→ Λ,
dadas por φ(K × I) = u−1(K × I) e ψ(K × I) = v−1(K × I), estao bem definidas; alem
disso, como u−1(K × I) = K = v−1(K × I), temos que φ = ψ. Isto posto, para cada
K× I ∈ Ω, sejam u∗K : Hk(M× I, (M× I)r (K× I)) −→ Hk(M,MrK) = Hk(M,Mrφ(K× I)) e
v∗K : Hk(M×I, (M×I)r(K×I)) −→ Hk(M,MrK) = Hk(M,Mrψ(K×I)) os homomorfismos
em cohomologia singular induzidos pelas restricoes uK : (M,MrK) −→ (M× I, (M× I)r
(K× I)) e vK : (M,MrK) −→ (M× I, (M× I)r (K× I)), de u e v a MrK, respectivamente, e
considere a aplicacao contınua hK : (M×I, (MrK)×I) −→ (M×I, (M×I)r(K×I)) dada por
hK(x, t) = (x, t), onde (x, t) ∈M×I. Como hK(x, 0) = (x, 0) = uK(x) e hK(x, 1) = (x, 1) = vK(x)
para todo x ∈M, segue que hK e uma homotopia entre uK e vK, o que implica que u∗K = v∗K.
Portanto, as aplicacoes Φ = φ, u∗KK×I∈Ω e Ψ = ψ, v∗KK×I∈Ω (entre os sistemas diretos
associados as famılias Hk(M× I, (M× I)r (K× I))K×I∈Ω e Hk(M,MrK)K∈Λ) sao iguais,
e, consequentemente, os limites diretos∨
u∗k=→Φ e
∨
v∗k=→Ψ tambem o sao.
Agora, considere uma variedade topologica M, de dimensao n, conexa, orientavel,
e sem fronteira; sendo Λ0 a famılia de todos os subconjuntos compactos e conexos de
M, dirigida pela relacao de inclusao inversa, sabemos que:∨
Hnc ≃ lim−−→Hn(M,M r K) : K ∈ Λ0
(pois Λ0 e cofinal em relacao a famılia de todos os subconjuntos compactos de M). Isto
posto, dado K ∈ Λ0, seja θK ∈ Hn(M,M r K) a classe fundamental em K. Como M e
orientavel e K ⊆M e compacto e conexo, temos que Hn(M,MrK) ≃ Z e Hn−1(M,MrK) ≃
0 (vide [D], corolarios 3.4 e 3.5, paginas 260 e 261); daı, segue que Hom(Hn(M,M r
1.4 O Grau Cohomologico 63
K),Z) ≃ Hom(Z,Z) ≃ Z e Ext(Hn−1(M,M r K),Z) ≃ Ext(0,Z) ≃ 0. Assim, seja
κ : Hn(M,MrK) −→ Hom(Hn(M,MrK),Z) a aplicacao de Kronecker (vide [Mu], pagina
276), que, a cada [ω] ∈ Hn(M,MrK), associa o homomorfismo hω : Hn(M,MrK) −→ Z
dado por hω([α]) = 〈ω,α〉, onde [α] ∈ Hn(M,M r K); do teorema dos coeficientes
universais (vide [Vi], teorema 3.14, pagina 84), sabemos que existe uma sequencia
exata
0 Ext(Hn−1(M,M r K),Z)
Hn(M,M r K) Hom(Hn(M,M r K),Z) 0κ
Ora, como Ext(Hn−1(M,M r K),Z) ≃ 0, a exatidao desta sequencia nos garante que
κ e um isomorfismo. Portanto, sendo ϕK : Hn(M,M r K) −→ Z o isomorfismo que
leva o gerador θK ∈ Hn(M,M r K) ≃ Z em 1 ∈ Z, segue que existe uma unica classe
µK ∈ Hn(M,M r K) tal que κ(µK) = ϕK. Observe que, como ϕK e um gerador de
Hom(Hn(M,M r K),Z) ≃ Z e κ e um isomorfismo, temos que µK e um dos dois
geradores de Hn(M,M r K) ≃ Z.
Note entao que Hn(M,MrK) e Hn(M,MrK) sao isomorfos (uma vez que Hn(M,Mr
K) ≃ Z e Hn(M,M r K) ≃ Z); seja, pois, ψK : Hn(M,M r K) −→ Hn(M,M r K) o
isomorfismo que leva o gerador µK ∈ Hn(M,M r K) no gerador θK ∈ Hn(M,M r K).
Como ϕK : Hn(M,M r K) −→ Z e o isomorfismo tal que ϕK(θK) = 1, segue que a
aplicacao φK : Hn(M,M r K) −→ Z, dada por φK = ϕK ψK, e o isomorfismo que leva
µK em 1, conforme ilustra o diagrama abaixo:
Hn(M,M r K) Hn(M,M r K) Z
µK θK 1
ψK ϕK
Assim, passando ao limite direto, obtemos um isomorfismo
→Φ : lim−−→Hn(M,M r K) : K ∈ Λ0 −→ Z ,
que, para qualquer que seja K ∈ Λ0, leva a classe JµKK ∈ lim−−→Hn(M,M r K) : K ∈ Λ0
em φK(µK) = 1 ∈ Z; ora, se cada JµKK, K ∈ Λ0, e levado no gerador 1 ∈ Z, e→Φ e um
isomorfismo, temos que JµKK e um gerador de lim−−→Hn(M,M r K) : K ∈ Λ0 (qualquer
que seja K ∈ Λ0), o qual, por sua vez, corresponde a um gerador JMK ∈∨
Hnc (M) pelo
isomorfismo∨
Hnc (M) ≃ lim
−−→Hn(M,M r K) : K ∈ Λ0 (note que, pela proposicao 1.4.2,
temos∨
Hnc (M) ≃ Z). Deste modo, podemos introduzir a seguinte
64 Preliminares
Definicao 1.4.3 . O gerador JMK ∈∨
Hnc (M) ≃ Z obtido acima e denominado classe funda-
mental (em cohomologia de Cech com suporte compacto) de M.
Finalmente, com base nos resultados apresentados, podemos definir o conceito de
grau cohomologico.
Definicao 1.4.4 . Sejam M e N variedades topologicas conexas de dimensao n, e considere os
isomorfismos
∨
ϕM :∨
Hnc (M, ∂M) −→
∨
Hnc (Int M) e
∨
ϕN :∨
Hnc (N, ∂N) −→
∨
Hnc (Int N) ,
dados pela proposicao 1.4.1. Supondo M e N orientaveis, segue que existe uma classe JMK ∈∨
Hnc (M, ∂M), correspondente a classe fundamental JInt MK ∈
∨
Hnc (Int M) pelo isomorfismo
∨
ϕM, bem como existe uma classe JNK ∈∨
Hnc (N, ∂N), correspondente a classe fundamental
JInt NK ∈∨
Hnc (Int N) pelo isomorfismo
∨
ϕN. Como JInt MK e JInt NK sao geradores de∨
Hnc (Int M)
e∨
Hnc (Int N), respectivamente, temos que JMK e JNK sao geradores dos respectivos grupos
∨
Hnc (M, ∂M) e
∨
Hnc (N, ∂N). Logo, dada uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→
(N, ∂N), e sendo∨
f ∗n :∨
Hnc (N, ∂N) −→
∨
Hnc (M, ∂M) o homomorfismo em cohomologia de Cech com
suporte compacto induzido por f , segue que existe k ∈ Z tal que∨
f ∗n(JNK) = k·JMK. A este inteiro
k, denominamos grau cohomologico de f , e o denotamos por deg( f ). Observe que, tomando-se
coeficientes em Z2, as variedades M e N tornam-se sempre orientaveis; neste caso, procedendo
de maneira analoga ao que fizemos acima, obtemos classes JMK ∈∨
Hnc (M, ∂M;Z2) e JNK ∈
∨
Hnc (N, ∂N;Z2), que constituem geradores destes grupos, e definimos o grau cohomologico
mod 2, denotado por deg( f , 2), como sendo o numero inteiro tal que∨
f ∗n(JNK) = deg( f , 2) · JMK.
Como consequencia imediata da proposicao 1.4.4, temos a seguinte
Proposicao 1.4.5 . Sejam M e N variedades topologicas conexas de dimensao n, e considere duas
aplicacoes contınuas proprias f , g : (M, ∂M) −→ (N, ∂N). Se h : (M × I, ∂M × I) −→ (N, ∂N)
e uma homotopia propria entre f e g, entao deg( f ) = deg(g) se M e N forem orientaveis, ou
deg( f , 2) = deg(g, 2) caso contrario (em outras palavras, o grau cohomologico e invariante por
homotopias proprias).
Proposicao 1.4.6 . Sejam M, M′ e M′′ variedades topologicas de dimensao n, conexas e
orientaveis. Se f : (M′′, ∂M′′) −→ (M′, ∂M′) e g : (M′, ∂M′) −→ (M, ∂M) sao aplicacoes
contınuas proprias, entao deg(g f ) = deg(g) · deg( f ).
Demonstracao. De fato, sejam
∨
ϕ :∨
Hnc (M, ∂M) −→
∨
Hnc (Int M) ,
1.4 O Grau Cohomologico 65
∨
ϕ′ :∨
Hnc (M′, ∂M′) −→
∨
Hnc (Int M′) e
∨
ϕ′′ :∨
Hnc (M′′, Int M′′) −→
∨
Hnc (Int M′′)
os isomorfismos dados pela proposicao 1.4.1, e considere as classes JMK ∈∨
Hnc (M, ∂M),
JM′K ∈∨
Hnc (M′, ∂M′) e JM′′K ∈
∨
Hnc (M′′, ∂M′′) correspondentes as classes fundamen-
tais JInt MK ∈∨
Hnc (Int M), JInt M′K ∈
∨
Hnc (Int M′) e JInt M′′K ∈
∨
Hnc (Int M′′) pelos iso-
morfismos∨
ϕ,∨
ϕ′ e∨
ϕ′′, respectivamente. Pela definicao 1.4.4, sabemos que os graus
cohomologicos deg( f ), deg(g) e deg(g f ) sao os numeros inteiros tais que:
∨
f ∗n(JM′K) = deg( f ) · JM′′K ,∨
g∗n(JMK) = deg(g) · JM′K
e∨
(g f )∗n(JMK) = deg(g f ) · JM′′K ,
onde∨
f ∗n :∨
Hnc (M′, ∂M′) −→
∨
Hnc (M′′, ∂M′′),
∨
g∗n :∨
Hnc (M, ∂M) −→
∨
Hnc (M′, ∂M′) e∨
(g f )∗n :∨
Hnc (M, ∂M) −→
∨
Hnc (M′′, ∂M′′) sao os homomorfismos em cohomologia de Cech com
suporte compacto induzidos por f , g e g f , respectivamente (note que a composta de
duas aplicacoes proprias tambem e propria). Logo, da proposicao 1.4.3, segue que:
deg(g f ) · JM′′K =∨
(g f )∗n(JMK) = (∨
f ∗n ∨
g∗n)(JMK) =∨
f ∗n(deg(g) · JM′K)
= deg(g) ·∨
f ∗n(JM′K) = deg(g) · deg( f ) · JM′′K .
Daı, concluımos que deg(g f ) = deg(g) · deg( f ), conforme querıamos mostrar.
Agora, vamos mostrar a relacao entre o grau cohomologico e o grau local, sendo
que, para tanto, necessitamos de alguns resultados preliminares. Seja, pois, M uma
variedade topologica de dimensao n (nao necessariamente conexa), orientavel e sem
fronteira; por definicao, temos que:
∨
Hnc (M) = lim
−−→Hn(M,M r K) : K ∈ Λ ,
onde Λ e a famılia de todos os subconjuntos compactos de M, dirigida pela relacao de
inclusao direta. Entao, dado K ∈ Λ, e sendo θK ∈ Hn(M,MrK) a classe fundamental em
K, considere o homomorfismo DK : Hn(M,M r K) −→ H0(M), dado por DK(x) = x ∩ θK
para cada x ∈ Hn(M,M r K) (onde ∩ denota o produto cap); dados K1,K2 ∈ Λ, com
K1 6 K2, e sendo j∗K1,K2: Hn(M,M r K1) −→ Hn(M,M r K2) o homomorfismo induzido
pela inclusao MrK2 ⊆MrK1, segue (da naturalidade do produto cap) que o diagrama
abaixo e comutativo:
66 Preliminares
Hn(M,M r K1)
H0(M)
Hn(M,M r K2)
DK1
DK2
j∗K1,K2
Logo, passando ao limite direto, obtemos um homomorfismo
∨
DM :∨
Hnc (M) = lim
−−→Hn(M,M r K) : K ∈ Λ −→ H0(M) ,
o qual e definido por∨
DM(JxK) = x ∩ θK, para cada x ∈ Hn(M,M r K), com K ∈ Λ.
A respeito deste homomorfismo, temos entao o seguinte teorema (cuja demonstracao
pode ser encontrada em [Ma2], paginas 360 a 364):
Teorema 1.4.1 (Dualidade de Poincare). Sendo M uma variedade topologica de dimensao n
(nao necessariamente conexa), orientavel e sem fronteira, a aplicacao∨
DM :∨
Hnc (M) −→ H0(M),
dada por∨
DM(JxK) = x ∩ θK para cada x ∈ Hn(M,M r K), onde K ⊆ M e compacto (e
θK ∈ Hn(M,M r K) e a classe fundamental em K), e um isomorfismo.
Definicao 1.4.5 . A aplicacao∨
DM :∨
Hnc (M) −→ H0(M), dada no teorema anterior, e denomi-
nada isomorfismo de Poincare relativo a M.
Isto posto, podemos introduzir a seguinte
Definicao 1.4.6 . Sejam M e N variedades topologicas de dimensao n, orientaveis e sem fronteira,
e considere uma aplicacao propria f : M −→ N. Denotando por∨
DM :∨
Hnc (M) −→ H0(M)
e∨
DN :∨
Hnc (N) −→ H0(N) os isomorfismos de Poincare relativos a M e N, respectivamente,
e sendo∨
f ∗n :∨
Hnc (N) −→
∨
Hnc (M) o homomorfismo (em cohomologia de Cech com suporte
compacto) induzido por f , definimos o homomorfismo transfer em homologia (associado a
f ) como sendo o homomorfismo f! : H0(N) −→ H0(M) obtido pela seguinte composicao:
H0(N)∨
Hnc (N)
∨
Hnc (M) H0(M)
∨
D−1N
∨
f ∗n∨
DM
(isto e, f! =∨
DM ∨
f ∗n ∨
D−1N ). Por outro lado, sendo f∗ : H0(M) −→ H0(N) o homomorfismo em
homologia singular induzido por f , denominamos homomorfismo transfer em cohomologia
(associado a f ) ao homomorfismo f ! :∨
Hnc (M) −→
∨
Hnc (N) dado pela seguinte composicao:
1.4 O Grau Cohomologico 67
∨
Hnc (M) H0(M) H0(N)
∨
Hnc (N)
∨
DM f∗∨
D−1N
(isto e, f ! =∨
D−1N f∗
∨
DM).
A proposicao abaixo, mostra-nos que o homomorfismo transfer em homologia esta
diretamente relacionado ao grau local.
Proposicao 1.4.7 . Sejam M e N variedades topologicas de dimensao n, orientaveis e sem
fronteira. Se f : M −→ N e uma aplicacao contınua propria, e N e conexa, segue que o grau
local degK( f ) assume o mesmo valor r ∈ Z em todo subconjunto compacto e conexo K ⊆ N
(vide proposicao 1.3.4); consequentemente, a composicao
H0(N) H0(M) H0(N)f! f∗
e tal que ( f∗ f!)(x) = r · x, para cada x ∈ H0(N).
Demonstracao. Com efeito, dado x ∈ H0(N), sabemos que existe JyK ∈∨
Hnc (N), diga-
mos y ∈ Hn(N,N r L) com L ⊆ N compacto, satisfazendo∨
DN(JyK) = x = y ∩ θL, onde∨
DN :∨
Hnc (N) −→ H0(N) e o isomorfismo de Poincare relativo a N, e θL ∈ Hn(N,N r L)
e a classe fundamental em L; note que, como a famılia de todos os subconjuntos com-
pactos e conexos de N e cofinal em relacao a famılia dos subconjuntos compactos de
N, podemos supor L conexo. Por outro lado, sendo∨
f ∗n :∨
Hnc (N) −→
∨
Hnc (M) o homo-
morfismo em cohomologia de Cech com suporte compacto induzido por f , temos que∨
f ∗n(JyK) = J f ∗L(y)K, onde f ∗
L: Hn(N,N r L) −→ Hn(M,M r f−1(L)) e o homomorfismo em
cohomologia singular induzido pela restricao de f a (M,M r f−1(L)). Isto posto, sendo
θ f−1(L) ∈ Hn(M,M r f−1(L)) a classe fundamental em f−1(L), segue que:
f!(x) = (∨
DM ∨
f ∗n ∨
D−1N )(x) = (
∨
DM ∨
f ∗n)(JyK) =∨
DM(J f ∗L(y)K) = f ∗L(y) ∩ θ f−1(L)
(onde∨
DM :∨
Hnc (M) −→ H0(M) e o isomorfismo de Poincare relativo a M). Entretanto,
da naturalidade do produto cap (vide [D], pagina 239), temos que:
f∗( f ∗L(y) ∩ θ f−1(L)) = y ∩ f∗(θ f−1(L))
isto e, ( f∗ f!)(x) = y ∩ f∗(θ f−1(L)); alem disso, da definicao de grau local, sabemos que
r = degL( f ) e o numero inteiro tal que f∗(θ f−1(L)) = r · θL. Portanto:
( f∗ f!)(x) = y ∩ f∗(θ f−1(L)) = y ∩ (r · θL) = r · (y ∩ θL) = r · x .
Deste modo, concluımos que ( f∗ f!)(x) = r ·x para todo x ∈ H0(N), conforme querıamos
provar.
68 Preliminares
Por outro lado, as proximas duas proposicoes tem um carater mais tecnico, e serao
utilizadas na demonstracao do teorema posterior.
Proposicao 1.4.8 . Sejam M e N variedades topologicas de dimensao n, conexas e orientaveis, e
considere uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N). Sendo W = Mr f−1(∂N),
temos que W e um subconjunto aberto de Int M tal que, para toda componente conexa U
de W, a restricao f |U : U −→ Int N e uma aplicacao propria. Alem disso, denotando por
i! :∨
Hnc (U) −→
∨
Hnc (Int M) o homomorfismo transfer em cohomologia associado a inclusao
i : U −→ Int M, onde U e uma componente conexa de W, temos que i! e um isomorfismo que
leva a classe fundamental JUK ∈∨
Hnc (U) na classe fundamental JInt MK ∈
∨
Hnc (Int M), e comuta
o seguinte diagrama:
∨
Hnc (Int N)
∨
Hnc (U)
∨
Hnc (Int M)
∨
Hnc (N, ∂N)
∨
Hnc (M, ∂M)
∨
( f |U)∗n
∨
f ∗n
∨
ϕN
i!
∨
ϕM
(onde∨
ϕM :∨
Hnc (M, ∂M) −→
∨
Hnc (Int M) e
∨
ϕN :∨
Hnc (N, ∂N) −→
∨
Hnc (Int N) sao os isomorfismos
dados na proposicao 1.4.1). Consequentemente, sendo deg( f ) ∈ Z o grau cohomologico de f ,
temos que:∨
( f |U)∗n(JInt NK) = deg( f ) · JUK ,
onde JInt NK ∈∨
Hnc (Int N) e a classe fundamental em Int N.
Demonstracao. Como f−1(∂N) e fechado em M, e f preserva fronteira, segue que
W = M r f−1(∂N) e de fato um subconjunto aberto de Int M. Seja, pois, U ⊆ W uma
componente conexa de W; vamos mostrar que a restricao f |U : U −→ Int N e uma
aplicacao propria.
Primeiramente, verifiquemos que f |W : W −→ Int N e propria. Com efeito, dado
K ⊆ Int N compacto, temos que f−1(K) ⊆ M e compacto (pois f e propria); por outro
lado, sabemos que:
( f |W)−1(K) = f−1(K) ∩W = f−1(K) ∩ (M r f−1(∂N)) = f−1(K) r f−1(∂N) .
Note entao que f−1(K) ∩ f−1(∂N) = ∅: de fato, se x ∈ f−1(K) ∩ f−1(∂N), segue que
f (x) ∈ f ( f−1(K)) = K e f (x) ∈ f ( f−1(∂N)) = ∂N, ou seja, f (x) ∈ K∩∂N, o que e impossıvel
1.4 O Grau Cohomologico 69
(uma vez que K ⊆ Int N). Assim, temos que:
( f |W)−1(K) = f−1(K) r f−1(∂N) = f−1(K) ,
isto e, ( f |W)−1(K) e compacto, o que prova que f |W : W −→ Int N e uma aplicacao
propria. Consequentemente, como U e uma componente conexa de W, segue que a
restricao f |U : U −→ Int N tambem e uma aplicacao propria (pois, dado um compacto
K ⊆ Int N, a imagem inversa ( f |U)−1(K) e, ou o conjunto vazio, ou uma uniao finita de
componentes conexas do compacto ( f |W)−1(K) ⊆ W).
Agora, considere a inclusao i : U −→ Int M; por definicao, sabemos que o homo-
morfismo transfer em cohomologia i! :∨
Hnc (U) −→
∨
Hnc (Int M) e o homomorfismo obtido
pela seguinte composicao:
∨
Hnc (U) H0(U) H0(Int M)
∨
Hnc (Int M)
∨
DU i∗∨
D−1Int M
(onde∨
DU :∨
Hnc (U) −→ H0(U) e
∨
DInt M :∨
Hnc (Int M) −→ H0(Int M) sao os isomorfismos
de Poincare relativos a U e Int M, respectivamente). Como U e Int M sao variedades
conexas, orientaveis e sem fronteira, temos que o homomorfismo em homologia sin-
gular i∗ : H0(U) −→ H0(Int M) e o isomorfismo identidade, o que implica que i! e um
isomorfismo. Vamos mostrar entao que i! leva a classe fundamental JUK ∈∨
Hnc (U)
na classe fundamental JInt MK ∈∨
Hnc (Int M). Com efeito, dado K ⊆ U compacto,
seja x ∈ Hn(U,U r K) tal que x ∈ JUK; temos, pois, que∨
DU(JUK) = x ∩ θK, onde
θK ∈ Hn(U,U r K) e a classe fundamental em K. Assim, seja y ∈ Hn(Int M, Int M r K)
tal que x = i∗K(y) e y ∈ JInt MK, onde i∗K :: Hn(Int M, Int M r K) −→ Hn(U,U r K) e o
homomorfismo induzido pela inclusao iK : (U,U r K) −→ (Int M, Int M r K). Sendo
θ′K ∈ Hn(Int M, Int M r K) a classe fundamental em K (relativa a Int M), sabemos que
θ′K = (iK)∗(θK), onde (iK)∗ : Hn(U,U r K) −→ Hn(Int M, Int M r K) e o homomorfismo
induzido pela inclusao iK. Logo, como∨
DInt M(JInt MK) = y∩ θ′K, segue, da naturalidade
do produto cap (vide [D], pagina 239), que:
i∗(∨
DU(JUK)) = i∗(x ∩ θK) = i∗(i∗K(y) ∩ θK) = y ∩ (iK)∗(θK)
= y ∩ θ′K =∨
DInt M(JInt MK) ,
d’onde concluımos que i!(JUK) = (∨
D−1Int M i∗
∨
DU)(JUK) = JInt MK, como querıamos
provar.
Isto posto, vamos mostrar que o diagrama abaixo e comutativo (onde∨
ϕM e∨
ϕN sao
os isomorfismos dados na proposicao 1.4.1):
70 Preliminares
∨
Hnc (Int N)
∨
Hnc (U)
∨
Hnc (Int M)
∨
Hnc (N, ∂N)
∨
Hnc (M, ∂M)
∨
( f |U)∗n
∨
f ∗n
∨
ϕN
i!
∨
ϕM
De fato, dado K ⊆ Int N compacto, sejam D1 : Hn(U,U r ( f |U)−1(K)) −→ H0(U) e
D2 : Hn(Int M, Int Mr f−1(K)) −→ H0(Int M) os homomorfismos dados por D1(x) = x∩θ1
e D2(y) = y ∩ θ2, para cada x ∈ Hn(U,U r ( f |U)−1(K)) e cada y ∈ Hn(Int M, Int M r
f−1(K)), onde θ1 ∈ Hn(U,U r ( f |U)−1(K)) e θ2 ∈ Hn(Int M, Int M r f−1(K)) sao as classes
fundamentais em ( f |U)−1(K) e f−1(K), respectivamente. Assim, denotando por i∗ :
H0(U) −→ H0(Int M) o homomorfismo induzido pela inclusao U ⊆ Int M, segue (da
naturalidade do produto cap) que o diagrama abaixo e comutativo:
Hn(Int N, Int N r K) Hn(U,U r ( f |U)−1(K))
H0(U)
H0(Int M)
Hn(Int M, Int M r f−1(K))
Hn(N,N r K) Hn(M,M r f−1(K))
( f |U)∗n
f ∗n
j∗Int N
D1
i∗
D2
j∗Int M
(onde j∗Int N
e j∗Int M
sao os homomorfismos induzidos pelas inclusoes Int N ⊆ N e
Int M ⊆ M, respectivamente). Logo, passando ao limite direto (vide proposicao A.4),
1.4 O Grau Cohomologico 71
obtemos a comutatividade do diagrama desejado:
∨
Hnc (Int N)
∨
Hnc (U)
H0(U)
H0(Int M)
∨
Hnc (N, ∂N)
∨
Hnc (M, ∂M)
∨
Hnc (Int M)
∨
( f |U)∗n
∨
f ∗n
∨
ϕN
∨
DU
i∗
∨
DInt M∨
ϕM
i!
Finalmente, sejam JMK ∈∨
Hnc (M, ∂M) e JNK ∈
∨
Hnc (N, ∂N) as classes correspondentes
as classes fundamentais JInt MK ∈∨
Hnc (Int M) e JInt NK ∈
∨
Hnc (Int N), pelos isomorfismos
∨
ϕM e∨
ϕN, respectivamente; por definicao, sabemos que o grau cohomologico de f e
o numero deg( f ) ∈ Z tal que∨
f ∗n(JNK) = deg( f ) · JMK. Portanto, a comutatividde do
diagrama acima nos garante que:
(i! ∨
( f |U)∗n)(JInt NK) = (i! ∨
( f |U)∗n ∨
ϕN)(JNK) = (∨
ϕM ∨
f ∗n)(JNK)
=∨
ϕM(deg( f ) · JMK) = deg( f ) ·∨
ϕM(JMK)
= deg( f ) · JInt MK .
Consequentemente, como i! :∨
Hnc (U) −→
∨
Hnc (Int M) e um isomorfismo que leva a
classe fundamental JUK ∈∨
Hnc (U) na classe fundamental JInt MK ∈
∨
Hnc (Int M), podemos
concluir que∨
( f |U)∗n(JInt NK) = deg( f ) · JUK.
Proposicao 1.4.9 . Sejam M e N variedades topologicas de dimensao n, orientaveis e sem
fronteira, e considere uma aplicacao contınua propria f : M −→ N. Se U ⊆ M e um aberto,
tal que a restricao f |U : U −→ N e propria, entao, denotando por i∗ : H0(U) −→ H0(M)
o homomorfismo em homologia singular induzido pela inclusao U ⊆ M, temos o seguinte
diagrama comutativo:
H0(N) H0(U)
H0(M)
( f |U)!
f! i∗
72 Preliminares
(onde f! e ( f |U)! sao os homomorfismos transfer em homologia, associados a f e f |U, respectiva-
mente).
Demonstracao. Com efeito, dado K ⊆ N compacto, considere os homomorfismos
DM : Hn(M,M r f−1(K)) −→ H0(M) e DU : Hn(U,U r ( f |U)−1(K)) −→ H0(U), dados
por DM(x) = x ∩ θM e DU(y) = y ∩ θU para cada x ∈ Hn(M,M r f−1(K)) e cada y ∈
Hn(U,U r ( f |U)−1(K)), onde θM ∈ Hn(M,M r f−1(K)) e θU ∈ Hn(U,U r ( f |U)−1(K)) sao
as classes fundamentais. Da naturalidade do produto cap, temos entao o seguinte
diagrama comutativo:
Hn(N,N r K) Hn(U,U r ( f |U)−1(K)) H0(U)
Hn(M,M r f−1(K))
H0(M)
( f |U)∗n DU
f ∗n
DM
i∗
Logo, passando ao limite direto (vide proposicao A.4), obtemos o diagrama comutativo
abaixo (onde∨
DM,∨
DN e∨
DU sao os isomorfismos de Poincare relativos a M, N e U,
respectivamente):
H0(N)∨
Hnc (N)
∨
Hnc (U) H0(U)
∨
Hnc (M)
H0(M)
∨
D−1N
∨
( f |U)∗n∨
DU
∨
f ∗n
∨
DM
i∗
Portanto, como f! =∨
DM ∨
f ∗n ∨
D−1N e ( f |U)! =
∨
DU ∨
( f |U)∗n ∨
D−1N , segue a comutatividade
do diagrama desejado.
Finalmente, com base nas proposicoes anteriores, podemos demonstrar o seguinte
Teorema 1.4.2 . Sejam M e N variedades topologicas de dimensao n, conexas e orientaveis, e
considere uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N). Sendo W = Mr f−1(∂N),
1.4 O Grau Cohomologico 73
temos entao que deg( f ) = degc( f |W), qualquer que seja c ∈ Int N. Em particular, orientando-se
M e N com coeficientes em Z2, temos que deg( f , 2) = degc( f |W) para todo c ∈ Int N, onde
degc( f |W) e o grau local (de f |W em c) a coeficientes em Z2.
Demonstracao. Com efeito, na proposicao 1.4.8, vimos que W = M r f−1(∂N) e
um subconjunto aberto de Int M, tal que, para toda componente conexa U de W,
as restricoes f |W : W −→ Int N e f |U : U −→ Int N sao aplicacoes proprias; alem
disso, sendo JInt NK ∈∨
Hnc (Int N) e JUK ∈
∨
Hnc (U) as classes fundamentais em Int N e U,
respectivamente, temos que:∨
( f |U)∗n(JInt NK) = deg( f ) · JUK ,
onde deg( f ) e o grau cohomologico de f . Assim sendo, consideremos as classes [Int N] ∈
H0(Int N) e [U] ∈ H0(U), correspondentes as classes fundamentais JInt NK e JUK pelos
isomorfismos de Poincare∨
DInt N :∨
Hnc (Int N) −→ H0(Int N) e
∨
DU :∨
Hnc (U) −→ H0(U),
respectivamente. Sabemos que o homomorfismo transfer em homologia, associado a
f |U : U −→ Int N, e o homomorfismo ( f |U)! : H0(Int N) −→ H0(U) dado pela seguinte
composicao:
H0(Int N)∨
Hnc (Int N)
∨
Hnc (U) H0(U)
∨
D−1Int N
∨
( f |U)∗n∨
DU
Logo, temos que:
( f |U)!([Int N]) = (∨
DU ∨
( f |U)∗n ∨
D−1Int N)([Int N]) = (
∨
DU ∨
( f |U)∗n)(JInt NK)
=∨
DU(deg( f ) · JUK) = deg( f ) ·∨
DU(JUK) = deg( f ) · [U] .
Por outro lado, como o homomorfismo ( f |U)∗ : H0(U) −→ H0(Int N), induzido por f |U,
leva a classe [U] ∈ H0(U) na classe [Int N] ∈ H0(Int N), obtemos que:
(( f |U)∗ ( f |U)!)([Int N]) = deg( f ) · [Int N] .
Agora, pela proposicao 1.4.9, sabemos que o diagrama abaixo e comutativo:
H0(Int N) H0(U)
H0(W) H0(Int N)
( f |U)!
( f |W)∗
( f |W)! ( f |U)∗i∗
(onde i∗ : e o homomorfismo em homologia singular induzido pela inclusao U ⊆ W).
Consequentemente, temos que:
(( f |W)∗ ( f |W)!)([Int N]) = (( f |U)∗ ( f |U)!)([Int N]) = deg( f ) · [Int N] .
74 Preliminares
Finalmente, observe entao que, da proposicao 1.4.7, tambem temos:
(( f |W)∗ ( f |W)!)([Int N]) = degc( f |W) · [Int N] ,
qualquer que seja c ∈ Int N (lembre-se que Int N e uma variedade orientavel, conexa e
sem fronteira). Deste modo, concluımos que deg( f ) = degc( f |W) para todo c ∈ Int N,
conforme querıamos provar.
Em particular, tomando-se coeficientes emZ2, as variedades M e N tornam-se unica-
mente orientadas, e, neste caso, podemos utilizar o mesmo raciocınio da demonstracao
acima para concluir que deg( f , 2) = degc( f |W), qualquer que seja c ∈ Int N, onde
degc( f |W) e o grau local a coeficientes em Z2.
Corolario 1.4.1 . Sejam M e N variedades topologicas de dimensao n, conexas e orientaveis.
Se h : M −→ N e um homeomorfismo (e, consequentemente, uma aplicacao contınua propria
que preserva fronteira), entao deg(h) = ±1.
Demonstracao. Com efeito, sendo W = M r h−1(∂N) = M r ∂M = Int M, considere
a restricao h |Int M : Int M −→ Int N; pelo teorema anterior, sabemos que deg(h) =
degc(h |Int M), qualquer que seja c ∈ Int N. Por outro lado, observando que h |Int M e um
homeomorfismo sobre Int N, segue (do corolario 1.3.1) que degc(h |Int M) = ±1 para todo
c ∈ Int N, d’onde concluımos que deg(h) = ±1, como querıamos provar.
Corolario 1.4.2 . Sejam M e N variedades topologicas de dimensao n, conexas e orientaveis, e
considere uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N). Dado um ponto c ∈ Int N,
seja ainda V ⊆ Int N uma vizinhanca aberta contratil de c em N (lembre-se que toda variedade
topologica e localmente simplesmente conexa). Se, para cada classe de raızes R de f em c,
denotarmos por UR ⊆ f−1(V) um aberto tal que UR ∩ f−1(c) = R (cuja existencia e garantida
pela proposicao 1.3.1), entao:∑degc( f |UR
) : R e classe de raızes de f em c = deg( f ) .
Demonstracao. De fato, considere o aberto
U =⋃UR : R e classe de raızes de f em c ⊆ Int M ;
pela propriedade aditiva do grau local (proposicao 1.3.5), temos entao que:∑degc( f |UR
) : R e classe de raızes de f em c = degc( f |U) .
Por outro lado, sendo W = M r f−1(∂N), sabemos que W e um subconjunto aberto de
Int M; alem disso, como UR ⊆W para toda classe de raızes R de f em c (pois UR ⊆ f−1(V)
1.4 O Grau Cohomologico 75
e V ⊆ Int N), segue que U ⊆ W. Agora, observe que:
f−1(c) =⋃R : R e classe de raızes de f em c
=⋃UR ∩ f−1(c) : R e classe de raızes de f em c
⊆⋃UR : R e classe de raızes de f em c = U ,
isto e, W r U ⊆ W r f−1(c). Logo, pela excisao em homologia singular, temos que o
homomorfismo i∗ : Hn(U,U r f−1(c)) = Hn(W r (W r U), (W r f−1(c)) r (W r U)) −→
Hn(W,Wr f−1(c)), induzido pela inclusao i : (U,Ur f−1(c)) −→ (W,Wr f−1(c)), e um iso-
morfismo, que leva a classe fundamental θU ∈ Hn(U,U r f−1(c)) na classe fundamental
θW ∈ Hn(W,W r f−1(c)), e comuta o seguinte diagrama:
Hn(U,U r f−1(c)) Hn(Int N, Int N r c)
Hn(W,W r f−1(c))
( f |U)∗
i∗ ( f |W)∗
(note que f (U) ⊆ Int N, pois U ⊆ W = M r f−1(∂N)). Assim, denotando por θc ∈
Hn(Int N, Int N r c) a classe fundamental em c, temos que:
( f |U)∗(θU) = (( f |W)∗ i∗)(θU) = ( f |W)∗(θW) = degc( f |W) · θc .
Ora, como o grau local degc( f |U) e definido como sendo o numero inteiro tal que
( f |U)∗(θU) = degc( f |U) · θc ,
segue entao que degc( f |U) = degc( f |W). Deste modo, utilizando o teorema anterior,
podemos concluir que:∑degc( f |UR
) : R e classe de raızes de f em c = degc( f |U) = degc( f |W) = deg( f ) ,
conforme querıamos demonstrar.
No proximo capıtulo (secao 2.1), veremos mais alguns resultados que relacionarao
o conceito de grau cohomologico a multiplicidade de uma classe de raızes.
Neste capıtulo, dada uma classe de raızes R de uma aplicacao propria f : (M, ∂M) −→
(N, ∂N) em c ∈ Int N, vamos utilizar a multiplicidade |m(R)| para definir o numero de
Nielsen de raızes e o numero de Nielsen transverso de raızes (de f em c). Primeiramente,
no entanto, convem estudarmos algumas propriedades de |m(R)|.
No que faremos a seguir, vamos utilizar o conceito de recobrimento associado a um
subgrupo, apresentado na definicao 1.2.1.
Proposicao 2.1.1 . Sendo M e N variedades topologicas conexas de dimesao n (nao neces-
sariamente orientaveis), considere uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N).
Dado um ponto c ∈ Int N, seja q : N −→ N o recobrimento de N associado ao subgrupo
f#(π1(M, x0)) ⊆ π1(N, c), onde f# : π1(M, x0) −→ π1(N, c) e o homomorfismo induzido por f ,
e x0 ∈ M e tal que f (x0) = c. Seja ainda f : M −→ N o levantamento de f relativamente a q
(isto e, f = q f ), que leva o ponto x0 ∈M na classe de equivalencia 〈εc〉, onde εc : I −→ N e o
caminho constante igual a c (cuja existencia e garantida pelo lema 1.2.1). Entao, dado c ∈ q−1(c),
o conjunto f−1(c), ou e vazio ou constitui uma classe de raızes de f em c.
Demonstracao. Primeiramente, observe que, dados z0, z1 ∈ M e c0, c1 ∈ N, tais que
f (z0) = c0 e f (z1) = c1, e sendo γ : I −→ M um caminho ligando z0 a z1, temos que
δ = f γ : I −→ N e um caminho ligando c0 a c1, e as aplicacoes γ : π1(M, z0) −→ π1(N, z1)
e δ : π1(N, c0) −→ π1(N, c1), definidas por γ([α]) = [γ−1 ∨ α ∨ γ] e δ([β]) = [δ−1 ∨ β ∨ δ],
para [α] ∈ π1(M, z0) e [β] ∈ π1(N, c0), sao isomorfismos (vide [Li], proposicao 4, pagina
76
2.1 A Propriedade Fundamental da Teoria de Raızes 77
34). Alem disso, denotando por f 0#
: π1(M, z0) −→ π1(N, c0) e f 1# : π1(M, z1) −→ π1(M, c1)
os homomorfismos induzidos por f , segue que:
(δ f 0# )([α]) = δ([ f α]) = [δ−1 ∨ ( f α) ∨ δ] = [( f γ)−1 ∨ ( f α) ∨ ( f γ)]
= [ f (γ−1 ∨ α ∨ γ)] = f 1# ([γ−1 ∨ α ∨ γ]) = ( f 1
# γ)([α])
para todo [α] ∈ π1(M, z0), ou seja, o diagrama abaixo e comutativo:
π1(M, z0) π1(N, c0)
π1(M, z1) π1(N, c1)
f 0#
f 1#
γ δ
Em particular, se c0 = c1, isto e, se f (z0) = f (z1) = y ∈ N, temos o seguinte diagrama
comutativo:π1(M, z0)
π1(N, y)
π1(M, z1)
f 0#
f 1#
γ
Isto posto, supondo f−1(c) , ∅, considere x1, x2 ∈ f−1(c), e seja ω : I −→ M um
caminho tal que ω(0) = x1 e ω(1) = x2; como ( f ω)(0) = ( f ω)(1) = q(c) = c e
( f ω)(0) = ( f ω)(1) = c, segue que f ω : I −→ N e f ω : I −→ N sao lacos com base
nos pontos c ∈ N e c ∈ N, respectivamente. Assim, como q#( f ω) = [q f ω] = [ f ω]
e q#(π1(N, 〈εc〉)) = f#(π1(M, x0)), temos que [ f ω] ∈ f#(π1(M, x0)), isto e, [ f ω] =
f#([λ]) = [ f λ] para algum laco λ : I −→ M com base em x0. Por outro lado, dado
um caminho γ : I −→ M tal que γ(0) = x0 e γ(1) = x1, sabemos (de acordo com o que
acabamos de mostrar acima) que a aplicacao γ : π1(M, x0) −→ π1(M, x1), definida por
γ([α]) = [γ−1 ∨ α ∨ γ], e um isomorfismo que comuta o seguinte diagrama:
π1(M, x0)
π1(N, c)
π1(M, x1)
f#
γ
f 1#
78 Teoria de Nielsen de Raızes
(onde f 1# : π1(M, x1) −→ π1(N, c) e o homomorfismo induzido por f ). Deste modo,
temos que:
[ f ω] = [ f λ] = f#([λ]) = f 1# (γ([λ])) = f 1
# ([γ−1 ∨ λ ∨ γ]) = [ f (γ−1 ∨ λ ∨ γ)] ,
isto e, o laco µ : I −→ M (com base no ponto x1) dado por µ = γ−1 ∨ λ ∨ γ e tal que
[ f ω] = [ f µ] (vide figura 2.1 a seguir). Consequentemente, o produto [ f µ−1]∗ [ f ω]
e igual a classe de homotopia do caminho constante εc, ou seja,
[εc] = [ f µ−1] ∗ [ f ω] = [( f µ−1) ∨ ( f ω)] = [ f (µ−1 ∨ ω)] .
λ
x0
γ
x1
x2
ω
f
c
f γ
f λ
f ωFigura 2.1
Portanto, µ−1∨ω : I −→M e um caminho ligando os pontos x1 e x2, tal que f (µ−1 ∨ω)
e um laco contratil em c, o que mostra que quaisquer dois pontos de f−1(c) pertencem
a mesma classe de raızes de f em c; em outras palavras, existe uma classe de raızes R,
de f em c, tal que f−1(c) ⊆ R.
Agora, dados x ∈ f−1(c) ⊆ R e y ∈ R, seja ω : I −→ M um caminho ligando x e
y, tal que f ω : I −→ N e um laco contratil em c; temos entao que o levantamento
f ω : I −→ N de f ω (relativamente ao recobrimento q) e um laco contratil em c ∈ N.
Em particular, f ω e um caminho fechado, d’onde segue que f (y) = ( f ω)(1) =
( f ω)(0) = f (x) = c, isto e, y ∈ f−1(c). Assim, podemos concluir que f−1(c) = R, ou seja,
f−1(c) e uma classe de raızes de f em c, conforme querıamos mostrar.
Corolario 2.1.1 . Nas condicoes da proposicao anterior, dada uma classe de raızes R de f em c,
existe um elemento c ∈ q−1(c) tal que R = f−1(c).
Demonstracao. De fato, tomando um ponto x ∈ R ⊆ f−1(c), considere o elemento
c = f (x) ∈ N; temos entao que c ∈ q−1(c), pois q(c) = q( f (x)) = f (x) = c. Assim, como
2.1 A Propriedade Fundamental da Teoria de Raızes 79
x ∈ f−1(c), segue, da proposicao anterior, que o conjunto R′ = f−1(c) e uma classe de
raızes de f em c. Entretanto, sabemos que quaisquer duas classes de raızes de f em c,
ou coincidem ou sao disjuntas. Logo, como x ∈ R∩R′, concluımos que R = R′ = f−1(c),
conforme querıamos provar.
Assim sendo, utilizando as mesmas notacoes da proposicao 2.1.1, vamos descrever
a multiplicidade de R = f−1(c) em funcao do levantamento f : M −→ N.
Seja, pois, V ⊆ Int N uma vizinhanca aberta contratil de c, que constitui uma
vizinhanca elementar em relacao ao espaco de recobrimento N, isto e, tal que q−1(V) e
uma uniao disjunta de abertos em N, cada um dos quais se aplica por q homeomor-
ficamente sobre V. Considere ainda uma classe de raızes R = f−1(c) de f em c (onde
c ∈ q−1(c) e tal que f−1(c) , ∅), e seja V a componente conexa de q−1(V) que contem c, de
modo que a restricao q |V e, portanto, um homeomorfismo sobre V. Como q(∂N) ⊆ ∂N
e q(Int N) = Int N (uma vez que q e um homeomorfismo local), e f (∂M) ⊆ ∂N, temos
que f preserva fronteira, pois:
f (∂M) ⊆ q−1((q f )(∂M)) ⊆ q−1( f (∂M)) ⊆ q−1(∂N) = ∂N .
Logo, como V e um subconjunto aberto de Int N (uma vez que V ⊆ q−1(V) ⊆ Int N), segue
que f−1(V) e um subconjunto aberto de Int M. Alem disso, note que R = f−1(V)∩ f−1(c):
de fato, se x ∈ R = f−1(c), temos que f (x) = c ∈ V, e, portanto, x ∈ f−1(V) e f (x) =
q( f (x)) = q(c) = c, isto e, x ∈ f−1(V) ∩ f−1(c); reciprocamente, dado x ∈ f−1(V) ∩ f−1(c),
segue que f (x) = c = (q f )(x) e f (x) ∈ V, o que, pelo fato de f (x) ser o unico
ponto de V tal que q( f (x)) = c, implica que x ∈ f−1(c) = R (lembre-se que q |V e um
homeomorfismo sobre V). Isto posto, seja U um subconjunto aberto de ˆf−1(V), contendo
R; se f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) for orientavel, podemos orientar U utilizando o processo
de orientacao dado na definicao 1.3.6, e entao, escolhendo-se uma orientacao para V (o
que e possıvel, pois, se V e contratil, V e orientavel), o numero inteiro degc( f |U) estara
bem definido. Se, no entanto, f nao for orientavel, podemos utilizar coeficientes em
Z2 para definir o grau local degc( f |U). Da comutatividade do diagrama abaixo (e da
proposicao 1.3.3), temos ainda que:
degc( f |U) = degc(q |V) · deg(q |V)−1(c)( f |U) = degc(q |V) · degc( f |U)
(note que (q |V)−1(c) = c, pois q |V e um homeomorfismo sobre V).
V
U Vf |U
f |Uq |V
80 Teoria de Nielsen de Raızes
Agora, lembrando que o aberto V e orientavel (pois e contratil), fixemos uma orientacao
para ele. Se o homeomorfismo q |V : V −→ V preserva orientacao, temos que degc(q |V) =
1, e, portanto, degc( f |U) = degc( f |U); por outro lado, se q |V inverte orientacao, segue que
degc(q |V) = −1, o que implica que degc( f |U) = −degc( f |U). Deste modo, tendo em vista
que |m(R)| = |degc( f |U)|, obtemos a seguinte descricao alternativa para a multiplicidade
de uma classe de raızes:
Teorema 2.1.1 . Sendo M e N variedades topologicas conexas de mesma dimensao, considere
uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), e, dado c ∈ Int N, seja R uma classe
de raızes de f em c. Denotando por q : N −→ N o recobrimento de N associado ao subgrupo
f#(π1(M, x0)) ⊆ π1(N, c), onde x0 ∈ f−1(c), seja f : M −→ N o levantamento de f relativo
a q, que leva o ponto x0 ∈ M na classe de equivalencia do caminho constante igual a c (vide
lema 1.4.1), e considere um elemento c ∈ q−1(c) tal que R = f−1(c). Sendo V ⊆ Int N uma
vizinhanca aberta contratil de c, que constitui uma vizinhanca elementar em relacao ao espaco
de recobrimento N, considere ainda a componente conexa V de q−1(V) contendo c, e seja U um
subconjunto aberto de f−1(V), contendo R. Entao:
|m(R)| = |degc( f |U)| ,
onde:
• se f e orientavel, degc( f |U) e o grau local com coeficientes em Z, e U e orientado de acordo
com o processo de orientacao;
• se f e nao-orientavel, degc( f |U) e o grau local com coeficientes em Z2.
Finalmente, vamos demonstrar o seguinte resultado fundamental:
Teorema 2.1.2 . Sejam M e N variedades topologicas conexas de mesma dimensao n, e considere
uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N). Se R1 e R2 sao classes de raızes de f
num ponto c ∈ Int N, entao |m(R1)| = |m(R2)|.
Demonstracao. Com efeito, denotando por q : N −→ N o recobrimento de N as-
sociado ao subgrupo f#(π1(M, x0)) ⊆ π1(N, c), onde x0 ∈ f−1(c), e sendo f : M −→ N
o levantamento de f relativo a q, que leva o ponto x0 ∈ M na classe de equivalencia
do caminho constante igual a c, considere c1, c2 ∈ q−1(c) ⊆ N tais que R1 = f−1(c1) e
R2 = f−1(c2). Suponha ainda que M e N, e consequentemente N, sejam orientaveis
(lembre-se que a proposicao 1.1.1 nos garante a orientabilidade de N, uma vez que
N e orientavel e q : N −→ N e um homeomorfismo local). Como N e conexo, te-
mos (pela proposicao 1.3.4) que degc1( f ) = degc2
( f ). Considere entao uma vizinhanca
aberta contratil V ⊆ Int N de c, que constitui uma vizinhanca elementar em relacao
2.1 A Propriedade Fundamental da Teoria de Raızes 81
ao espaco de recobrimento N, de modo que as restricoes q |V1e q |V2
sao, portanto,
homeomorfismos sobre V, onde V1 e V2 sao as componentes de q−1(V) contendo c1 e
c2, respectivamente. Sendo U1 ⊆ M o aberto dado por U1 = f−1(V1), orientado pela
restricao da orientacao de M, temos que R1 ⊆ U1, pois R1 = f−1(c1) e c1 ∈ V1; logo, como
M rU1 ⊆MrU1 ⊆MrR1 = Int(MrR1), segue (do teorema da excisao em homologia
singular) que o homomorfismo (i1)∗ : Hn(U1,U1 rR1) −→ Hn(M,MrR1), induzido pela
inclusao i1 : (U1,U1rR1) = (Mr (MrU1), (MrR1)r (MrU1)) −→ (M,MrR1), constitui
um isomorfismo. Alem disso, denotando porθU1∈ Hn(U1,U1rR1) eθM ∈ Hn(M,MrR1)
as classes fundamentais, temos (do lema 1.3.1) que (i1)∗(θU1) = θM.
Agora, lembrando que R1 = f−1(c1) ⊆ U1, note que o seguinte diagrama e comutativo:
Hn(M,M r R1) Hn(N, N r c1)
Hn(U1,U1 r R1)
(i1)∗
f∗
( f |U1)∗
Como f∗(θM) = degc1( f ) · θc1
e ( f |U1)∗(θU1
) = degc1( f |U1
) · θc1, onde θc1
∈ Hn(N, N r c1)
e a classe fundamental, segue entao que:
degc1( f |U1
) · θc1= ( f |U1
)∗(θU1) = f∗((i1)∗(θU1
)) = f∗(θM) = degc1( f ) · θc1
,
isto e, degc1( f |U1
) = degc1( f ). De maneira analoga, podemos mostar tambem que
o aberto U2 = f−1(V2) ⊆ M, orientado pela restricao da orientacao de M, satisfaz
degc2( f |U2
) = degc2( f ), o que, pelo fato de termos degc1
( f ) = degc2( f ), implica que
degc1( f |U1
) = degc2( f |U2
). Isto posto, considere os seguintes diagramas comutativos:
V1
U1 V
f
f
q
V2
U2 V
f
f
q
Como (q |V1)−1(c) = c1 e (q |V2
)−1(c) = c2 (pois q |V1e q |V2
sao homeomorfismos sobre V),
segue, da proposicao 1.3.3 e do corolario 1.3.1, que:
|degc( f |U1)| = |degc1
( f |U1) · degc(q |V1
)| = |degc1( f |U1
) · (±1)| = |degc1( f |U1
)|
e
|degc( f |U2)| = |degc2
( f |U2) · degc(q |V2
)| = |degc2( f |U2
) · (±1)| = |degc2( f |U2
)| .
82 Teoria de Nielsen de Raızes
Logo, como degc1( f |U1
) = degc2( f |U2
), temos que |degc( f |U1)| = |degc( f |U2
)|; consequen-
temente, observando que U1 ∩ f−1(c) = R1 e U2 ∩ f−1(c) = R2, concluımos que:
|m(R1)| = |degc( f |U1)| = |degc( f |U2
)| = |m(R2)|
(vide definicao 1.3.7). Em particular, como toda variedade topologica e orientavel
quando consideramos coeficientes em Z2, segue que, se f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e uma
aplicacao nao-orientavel, temos |m(R1)| = |m(R2)|.
Suponhamos agora que pelo menos uma das variedades M ou N e nao-orientavel,
e f e uma aplicacao orientavel. Consideremos novamente c1, c2 ∈ q−1(c) ⊆ N tais que
R1 = f−1(c1) e R2 = f−1(c2), e, dado um subconjunto euclidiano E em Int N (isto e,
um subconjunto E ⊆ Int N homeomorfo ao espaco euclidiano Rn), tomemos b1, b2 ∈ E
arbitrarios. Como c1, c2 ∈ q−1(c) e c ∈ Int N, temos que c1, c2 ∈ Int N (lembre-se que
q(∂N) = ∂N, pois q e um homeomorfismo local); logo, existe um homeomorfismo
h : N −→ N tal que h(c1) = b1 e h(c2) = b2 (vide teorema B.1, do apendice B). Assim,
S = h(E) e um subconjunto aberto de Int N, homeomorfo ao espaco euclidiano Rn, que
contem os pontos c1 e c2; alem disso, como E e homeomorfo a Rn, temos que S = h(E)
e conexo e contratil. Isto posto, observe que, como f e uma aplicacao orientavel, o
levantamento f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) tambem o e (note que f preserva fronteira,
pois f (∂M) ⊆ ∂N e q(∂N) = ∂N): de fato, sendo ω : I −→ M um laco que inverte
orientacao relativamente ao recobrimento orientado de M, e supondo que a imagem
ω = f ω : I −→ N seja um laco contratil (isto e, supondo que f seja uma aplicacao nao-
orientavel), temos que qω = q( f ω) = f ω e um laco contratil em N, o que contradiz
o fato de f ser uma aplicacao orientavel. Em particular, isto implica que f−1(S) ⊆ Int M
e orientavel, pois, como S e contratil, nao existem lacos ω : I −→ f−1(S) que invertem
orientacao (do contrario f nao seria orientavel, uma vez que a imagem f ω e um laco
contratil em S). Portanto, f−1(S) e uma subvariedade topologica orientavel de Int M.
Assim sendo, vamos estender o processo de orientacao (dado na definicao 1.3.6)
para orientar f−1(S). Primeiramente, suponhamos que nao exista componente conexa
de f−1(S) que intercepte R1 e R2 simultaneamente; neste caso, tomando-se dois pontos
quaisquer x1 ∈ R1 e x2 ∈ R2, escolhemos orientacoes em x1 e x2, orientamos as compo-
nentes de f−1(S) que interceptam R1 ou R2 de acordo com o processo de orientacao, e
depois orientamos as demais componentes de f−1(S) arbitrariamente. Por outro lado,
suponhamos agora que C0 seja uma componente conexa de f−1(S) que intercepta R1 e
R2 simultaneamente; neste caso, escolhemos uma orientacao para C0, e tomamos dois
pontos x1 ∈ R1 e x2 ∈ R2 tais que x1, x2 ∈ C0. Entao, orientamos as componentes de
f−1(S) que interceptam pelo menos uma das classes de raızes R1 ou R2, estendendo
as orientacoes de x1 e x2 (obtidas da orientacao de C0) de acordo com o processo
de orientacao, e depois orientamos as outras componentes de f−1(S) arbitrariamente.
2.1 A Propriedade Fundamental da Teoria de Raızes 83
Assim, precisamos mostrar apenas que este procedimento de orientacao esta bem de-
finido, isto e, precisamos mostrar que, se C e uma componente conexa de f−1(S) que
intercepta R1 e R2 simultaneamente, entao a sua orientacao (obtida pelo procedimento
acima) e independente da escolha dos pontos x1 ou x2.
De fato, dados x′1∈ R1 ∩C e x′2 ∈ R2 ∩C, considere dois caminhos α1,α2 : I −→ Int M,
com α1(0) = x1, α1(1) = x′1, α2(0) = x2 e α2(1) = x′2, tais que f α1 e f α2 sao lacos
contrateis no ponto c. Sejam ainda β : I −→ C0 e γ : I −→ C caminhos tais que β(0) = x1,
β(1) = x2, γ(0) = x′1
e γ(1) = x′2; como as orientacoes em x1 e x2 sao determinadas pela
orientacao de C0, ao estendermos a orientacao de x1 a x2, ao longo de β, obtemos a
mesma orientacao em x2 (lembre-se que, por ser orientavel, todo laco em C0 preserva
orientacao). Por outro lado, utilizando o processo de orientacao, as orientacoes de x′1
e x′2sao obtidas estendendo-se as orientacoes de x1 e x2 ao longo de α1 e α2, respectivamente.
Isto posto, suponhamos que a orientacao de C, obtida pelo processo de orientacao a
partir da orientacao de x′1, seja diferente da orientacao de C obtida por este mesmo
processo a partir da orientacao de x′2. Neste caso, estendendo-se a orientacao de x′1
ao
longo de ω (de acordo com o que e feito no processo de orientacao), a orientacao de x′2obtida sera diferente daquela que obtivemos pelo processo de orientacao. Logo, o laco
λ : I −→ Int M, com base em x′2, definido por λ = α−12 ∨ β
−1 ∨ α1 ∨ γ, sera um laco que
inverte orientacao. Entretanto, como f α1 e f α2 sao lacos contrateis em N, ambos
com base no ponto c, segue que f α1 e f α2 (e, consequentemente, f α−12 ) sao lacos
contrateis com base em c1 e c2, respectivamente (pois f α1 e um levantamento de f α1,
enquanto que f α2 e um levantamento de f α2); portanto, temos que:
[ f λ] = [( f α−12 ) ∨ ( f β−1) ∨ ( f α1) ∨ ( f γ)] = [( f β−1) ∨ ( f γ)] ,
ou seja, o laco f λ e homotopico a ( f β−1) ∨ ( f γ). Assim, como ( f β−1) ∨ ( f γ)
e um laco em S (pois ( f β−1) ∨ ( f γ) = f (β−1 ∨ γ), e β−1 ∨ γ e um laco em f−1(S)),
e como S e contratil, temos que f λ e um laco contratil em Int N. Resumindo, temos
entao que f leva o laco λ : I −→ Int M, que inverte orientacao, no laco contratil
f λ, o que evidentemente contradiz o fato de f ser uma aplicacao orientavel. Deste
modo, concluımos que a orientacao de C, obtida pelo processo de orientacao a partir
da orientacao de x′1, deve ser igual aquela obtida a partir da orientacao de x′2, como
querıamos mostrar.
Agora, escolhendo-se uma orientacao para S, temos a aplicacao propria f : f−1(S) −→
S entre variedades orientadas; logo, como S e conexa, segue que:
degc1( f ) = degc2
( f )
(vide proposicao 1.3.4). Sejam, pois, S1 e S2 vizinhancas abertas de c1 e c2 em S, res-
pectivamente, tais que q |S1e q |S2
sao homeomorfismos sobre suas respectivas imagens
84 Teoria de Nielsen de Raızes
(note que tais S1 e S2 de fato existem, pois q : N −→ N e um homeomorfismo local).
Considere ainda uma vizinhanca euclidiana elementar V de c em q(S1) ∩ q(S2), e sejam
V1 e V2 as componentes conexas de q−1(V) contendo c1 e c2, respectivamente, de modo
que as restricoes q |V1e q |V2
sao, portanto, homeomorfismos sobre V. Sendo U1 = f−1(V1)
e U2 = f−1(V2), temos entao que V1 ∪ V2 ⊆ S, pois:
V1 ∪ V2 ⊆ q−1(V) ⊆ q−1(q(S1) ∩ q(S2)) = q−1(q(S1)) ∩ q−1(q(S2)) = S1 ∩ S2 ⊆ S .
Logo, U1 ∪U2 ⊆ f−1(V1)∪ f−1(V2) = f−1(V1 ∪ V2) ⊆ f−1(S). Isto posto, consideremos U1
e U2 orientados pela restricao da orientacao de f−1(S) (a qual, conforme vimos acima, e
obtida pelo processo de orientacao), e orientemos V1 e V2 pela restricao da orientacao
de S. Entao, considerando as aplicacoes f |U1: U1 −→ V1 e f |U2
: U2 −→ V2, temos
(conforme demonstramos anteriormente, para o caso em que M e N eram orientaveis)
que degc1( f |U1
) = degc1( f ) e degc2
( f |U2) = degc2
( f ). Assim, como degc1( f ) = degc2
( f ),
segue que degc1( f |U1
) = degc2( f |U2
), o que, pelo teorema 2.1.1, significa que:
|m(R1)| = |degc1( f |U1
)| = |degc2( f |U2
)| = |m(R2)| .
Deste modo, concluımos que, se pelo menos uma das variedades M ou N e nao-
orientavel, e f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e uma aplicacao orientavel, tambem temos
|m(R1)| = |m(R2)|, o que encerra a demonstracao.
Na secao 2.3, veremos que os numeros de Nielsen de raızes, de uma aplicacao
contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) num ponto c ∈ Int N, sao definidos a partir das
multiplicidades das classes de raızes de f em c; consequentemente, uma vez conhecida
a multiplicidade de uma classe de raızes R de f em c, o teorema acima nos permite
calcular estes numeros diretamente de suas definicoes, uma vez que toda classe de
raızes de f em c possui a mesma multiplicidade. Assim, tendo como objetivo o calculo
dos numeros de Nielsen, veremos agora como determinar |m(R)|.
No que segue, dada uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) (onde M
e N serao consideradas variedades topologicas conexas de dimensao n), continuaremos
a denotar por q : N −→ N o recobrimento de N associado ao subgrupo f#(π1(M, x0)) ⊆
π1(N, c), onde c ∈ Int N e x0 ∈ f−1(c), sendo que f : M −→ N denotara o levantamento
de f , relativamente a q, que leva o ponto x0 ∈ M na classe de equivalencia do caminho
2.2 O Calculo da Multiplicidade de uma Classe de Raızes 85
constante igual a c (cuja existencia e garantida pelo lema 1.2.1). Lembramos ainda
(conforme ja mencionado anteriormente) que q(∂N) = ∂N e f (∂M) ⊆ ∂N; alem disso,
note que f e uma aplicacao propria, pois, dado K ⊆ N compacto, temos que:
K ⊆ q−1(q(K)) =⇒ f−1(K) ⊆ f−1(q−1(q(K))) = ((q f )−1 q)(K) = ( f−1 q)(K) ,
isto e, f−1(K) e um subconjunto fechado de M, contido no compacto ( f−1 q)(K).
Proposicao 2.2.1 . Se f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e uma aplicacao contınua propria do tipo III,
entao, para toda classe de raızes R de f num ponto c ∈ Int N, temos que:
|m(R)| = deg( f , 2) ∈ Z2 ,
onde deg( f , 2) e o grau cohomologico mod 2 da aplicacao propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N).
Demonstracao. De fato, seja R uma classe de raızes de f num ponto c ∈ Int N, e
considere c ∈ q−1(c) ⊆ Int N tal que R = f−1(c). Utilizando coeficientes em Z2 para
orientar M e N, temos (pelo teorema 1.4.2) que deg( f , 2) = degc( f |W), onde W =
M r f−1(∂N) e degc( f |W) e o grau local de f |W : W −→ Int N em c a coeficientes em Z2.
Isto posto, sendo V ⊆ Int N uma vizinhanca aberta contratil de c, que constitui uma
vizinhanca elementar em relacao ao espaco de recobrimento N, considere a componente
conexa V de q−1(V) contendo c, e seja U um subconjunto aberto de f−1(V), contendo
R. Pelo teorema 2.1.1, temos entao que |m(R)| = |degc( f |U)| = degc( f |U) ∈ Z2, onde
degc( f |U) e o grau local com coeficientes em Z2. Agora, note que V ⊆ Int N, pois
V ⊆ Int N e V ⊆ q−1(V) (lembre-se que q(∂N) = ∂N); consequentemente, temos que:
f−1(V) ⊆ f−1(Int N) = f−1(N r ∂N) = f−1(N) r f−1(∂N) = M r f−1(∂N) =W ,
e, portanto, R ⊆ U ⊆ f−1(V) ⊆ W. Assim, como W rU = W r U ⊆ W r R = Int(W r
R), segue (do teorema da excisao em homologia singular) que o homomorfismo i∗ :
Hn(U,U r R) −→ Hn(W,W r R), induzido pela inclusao i : (U,U r R) = (W r (W r
U), (WrR)r(WrU)) −→ (W,WrR), constitui um isomorfismo. Alem disso, denotando
por θU ∈ Hn(U,U r R) e θW ∈ Hn(W,W r R) as classes fundamentais, temos (do lema
1.3.1) que i∗(θU) = θW. Agora, lembrando que R = f−1(c) ⊆ U, observe que o seguinte
diagrama e comutativo:
Hn(W,W r R) Hn(Int N, Int N r c)
Hn(U,U r R)
( f |W)∗
i∗ ( f |U)∗
Entao, como ( f |W)∗(θW) = degc( f |W) · θc e ( f |U)∗(θU) = degc( f |U) · θc, onde θc ∈
86 Teoria de Nielsen de Raızes
Hn(Int N, Int N r c) e a classe fundamental, obtemos que:
degc( f |U) · θc = ( f |U)∗(θU) = ( f |W)∗(i∗(θU)) = ( f |W)∗(θW) = degc( f |W) · θc ,
isto e, degc( f |U) = degc( f |W). Portanto, como deg( f , 2) = degc( f |W) e |m(R)| = degc( f |U),
segue que |m(R)| = deg( f , 2), conforme querıamos provar.
Proposicao 2.2.2 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria, e, dado
c ∈ Int N, denote por j a cardinalidade de q−1(c) [isto e, j e a cardinalidade do grupo quociente
π1(N, c)/ f#(π1(M, x0))]. Entao, se j e infinito, temos que |m(R)| = 0 para toda classe de raızes R
de f em c.
Demonstracao. Com efeito, seja R1 uma classe de raızes de f em c, com R1 = f−1(c1)
para algum c1 ∈ q−1(c), e, dada uma vizinhanca aberta contratil V ⊆ Int N de c, que
constitui uma vizinhanca elementar em relacao ao espaco de recobrimento N, seja V1 a
componente conexa de q−1(V) que contem c1. Isto posto, supondo |m(R1)| , 0, o teorema
2.1.1 nos garante que degc1( f |U1
) , 0, onde U1 = f−1(V1) ⊇ R1. Consequentemente,
dado outro ponto c2 ∈ q−1(c), e sendo V2 a componente conexa de q−1(V) contendo c2, a
demonstracao do teorema 2.1.2 nos mostra que degc2( f |U2
) , 0, onde U2 = f−1(V2) (pois
degc1( f |U1
) = degc2( f |U2
)). Ora, se degc2( f |U2
) , 0, temos que f−1(c2) , ∅ (uma vez que
f−1(c2) = ∅ implica degc2( f |U2
) = 0); logo, pela proposicao 2.1.2, o conjunto R2 = f−1(c2)
e uma classe de raızes de f em c. Portanto, se existe uma classe de raızes de f em c,
cuja multiplicidade e nao-nula, entao, para todo c ∈ q−1(c), existe uma classe de raızes
R de f em c tal que R = f−1(c) (note que esta conclusao e a recıproca do corolario 2.1.1).
Neste caso, temos que o numero de classes de raızes de f em c e igual a cardinalidade
de q−1(c), isto e, j. Entretanto, sabemos que f−1(c) e a uniao disjunta das classes de
raızes de f em c, as quais, por serem subconjuntos abertos de f−1(c) (proposicao 1.3.1),
constituem uma cobertura aberta de f−1(c). Assim, como f−1(c) e compacto (pois f e
propria), segue que a quantidade de classes de raızes de f em c e finita, o que significa
que j e finito. Deste modo, podemos concluir que, se j e infinito, entao |m(R)| = 0 para
toda classe de raızes R de f em c.
Como consequencia das proposicoes 2.2.1 e 2.2.2, podemos agora nos restringir ao
calculo de |m(R)| nos casos em que f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e orientavel e a cardinalidade
j de q−1(c) e finita.
Doravante, dada uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e um ponto
c ∈ Int N, vamos utilizar (no restante desta secao e ao longo da proxima) os espacos de
recobrimento representados na figura 2.2 abaixo:
2.2 O Calculo da Multiplicidade de uma Classe de Raızes 87
(M′, x′0) (aN,ac)
(aM,ax0) (N′, c′)
(M, x0) (N, c)
(N, c)
f ′
af
f
f
p′
ap
aq
q′
q
Figura 2.2
Os espacos e aplicacoes ilustrados acima sao obtidos da seguinte maneira:
•ap :aM −→M e o recobrimento orientado de M;
• q′ : N′ −→ N e o recobrimento de N associado ao subgrupo ( f ap)#(π1(aM,ax0)) ⊆
π1(N, c), eaf :aM −→ N′ e um levantamento de f ap relativamente a q’ (vide lema
1.2.1);
•aq :aN −→ N′ e o recobrimento orientado de N′;
• p′ : M′ −→aM e o pullback de aq :
aN −→ N′ via
af (isto e, M′ = (ax,ay) ∈
aM ×
aN :
aq(ay) =af (ax) e p′ : M′ −→
aM e tal que p′(ax,ay) = ax para cada (ax,ay) ∈ M′), enquanto
que f ′ : M′ −→aN e a aplicacao dada por f ′(ax,ay) = ay para cada (ax,ay) ∈M′; note que
p′ e um recobrimento deaM, pois, tomando-se ax ∈
aM arbitrario, e sendo V′ ⊆ N′
uma vizinhanca elementar deaf (ax) relativamente ao recobrimento aq :
aN −→ N′,
temos queaU =
af−1(aV) ⊆
aM e uma vizinhanca elementar de ax relativamente a p′;
por outro lado, como (aq f ′)(ax,ay) = aq(ay) =af (ax) = (
af p′)(ax,ay) para todo (ax,ay) ∈M′,
segue que f ′ : M′ −→aN e um levantamento de
af p′ : M′ −→ N′ relativamente ao
recobrimentoaq :aN −→ N′.
Observe ainda que:
(i) o fato de M, N e N serem variedades topologicas conexas de dimensao n, conexas
e com fronteira, nos garante que os demais espacosaM,aN, M′ e N′ tambem o sao,
uma vez que ap :aM −→ M, q′ : N′ −→ N, p′ : M′ −→
aM e aq :
aN −→ N′ sao
homeomorfismos locais;
88 Teoria de Nielsen de Raızes
(ii) como ap, aq, p′ e q′ sao homeomorfismos locais, segue (do teorema da invariancia
do domınio) que ap(∂aM) = ∂M, q′(∂N′) = ∂N, p′(∂M′) = ∂
aM e aq(∂
aN) = ∂N′, e,
consequentemente, como f : M −→ N preserva fronteira, temosaf (∂aM) ⊆ ∂N′ e
f ′(∂M′) ⊆ ∂aN (isto e,
af e f ′ tambem preservam fronteira);
(iii) as aplicacoesaf : (aM, ∂
aM) −→ (N′, ∂N′) e f ′ : (M′, ∂M′) −→ (
aN, ∂aN) sao proprias
(assim como f e f ): de fato, dados K′ ⊆ N′ eaK ⊆
aN compactos, temos que:
K′ ⊆ q′−1(q′(K′)) =⇒af−1(K′) ⊆
af−1(q′−1(q′(K′))) = (q′
af )−1(q′(K′))
= ( f ap)−1(q′(K′)) = ap−1( f−1(q′(K′)))
e
aK ⊆ aq−1(aq(
aK)) =⇒ f ′−1(
aK) ⊆ f ′−1(aq−1(aq(
aK))) = (aq f ′)−1(aq(
aK))
= (af p′)−1(aq(
aK)) = p′−1(
af−1(aq(
aK))) ,
o que implica queaf−1(K′) e compacto (pois e um subconjunto fechado do com-
pacto ap−1( f−1(q′(K′))) ⊆aM), ou seja,
af e propria; daı, segue que p′−1(
af−1(aq(
aK))) e
compacto, e, portanto, f ′−1(K′) tambem o e (pois constitui um subconjunto fechado
de p′−1(af−1(aq(
aK))) ⊆M′);
(iv) as variedadesaM,aN e M′ sao sempre orientaveis (independentemente da orienta-
bilidade de M e N), de maneira que o grau cohomologico deg( f ′) ∈ Z da aplicacao
propria f ′ : (M′, ∂M′) −→ (aN, ∂aN) encontra-se bem definido (vide definicao 1.4.4).
Proposicao 2.2.3 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria e orientavel,
e, dado c ∈ Int N, suponha que a cardinalidade j de q−1(c) e finita. Entao, para toda classe de
raızes R de f em c, temos:
|m(R)| = |deg( f ′)|,
onde deg( f ′) e o grau cohomologico de f ′ : (M′, ∂M′) −→ (aN, ∂aN).
Demonstracao. Dada uma classe de raızes R de f em c ∈ Int N, seja V ⊆ Int N uma
vizinhanca aberta contratil de c, que constitui uma vizinhanca elementar em relacao ao
espaco de recobrimento N, e considere a componente conexa V de q−1(V) que contem c,
de modo que a restricao q |V : V −→ V e, portanto, um homeomorfismo sobre V (onde
c ∈ q−1(c) e tal que R = f−1(c)). Seja ainda U ⊆ f−1(V) um aberto tal que U∩ f−1(c) = R, e
considere a orientacao s : U −→aM de U, induzida no recobrimento orientado de M pela
orientacao de U, obtida pelo processo de orientacao a partir de um ponto xR ∈ R ⊆ U
(vide definicao 1.3.6). DefinindoaU = s(U),
aR = s(R) e axR = s(xR), temos entao que
c′ =af (axR) ∈ N′ satisfaz c′ ∈ q′−1(c), uma vez que:
q′(c′) = q′(af (axR)) = f (ap(axR)) = f (xR) = c
2.2 O Calculo da Multiplicidade de uma Classe de Raızes 89
(observe que f (xR) = c qualquer que seja xR ∈ R, pois R = f−1(c)). Isto posto, supo-
nhamos que V seja uma vizinhanca elementar em relacao ao espaco de recobrimento
N′, e consideremos a componente conexa V′ de q′−1(V) contendo c′ (de maneira que a
restricao q′ |V′ : V′ −→ V e, portanto, um homeomorfismo sobre V). Note queaf (aU) ⊆ V′:
de fato, como f (U) ⊆ V e f (U) = (q′ af s)(U) = (q′
af )(aU), temos que (q′
af )(aU) ⊆ V,
e, consequentemente, como q′−1(V) e uma uniao disjunta de abertos em N′, cada um
dos quais e levado homeomorficamente por q′ sobre V, segue que cada componente
conexa que compoe q′−1(V) contem uma copia homeomorfa de (q′ af )(aU), sendo que
uma delas coincide comaf (aU); assim, como c′ ∈
af (aU) (pois c′ =
af (axR) eaxR ∈
aU), podemos
concluir que a componente de q′−1(V) que contemaf (aU) e V′, isto e,
af (aU) ⊆ V′. Deste
modo, tomandoaS =af−1(c′), vamos provar que
aS =aR.
Primeiramente, a fim de mostrarmos queaR ⊆
aS, observe que axR ∈
aS (uma vez que
af (axR) = c′); considere, pois, um outro ponto qualquer ax ∈
aR, e seja x = ap(ax) ∈ M. Como
aR = s(R), temos que x ∈ ap(
aR) = ap(s(R)) = R. Alem disso, como s : U −→
aM e a induzida
emaM pela orientacao de U obtida pelo processo de orientacao, segue que ax = s(x) e
definido da seguinte forma: dado um caminho ω : I −→ M ligando xR a x, tal que
f ω : I −→ N e um laco contratil com base no ponto c, tomamos ax como sendo a
extensao da orientacao axR de xR ao longo de ω, isto e, ax = aω(1), onde aω : I −→aM e o
unico levantamento de ω (relativamente ao recobrimento orientado ap :aM −→ M) tal
que aω(0) = axR (para mais detalhes, vide definicao 1.3.6). Isto posto, como
(q q′) (af aω) = q (q′
af ) aω = q ( f ap) aω = (q f ) (ap aω) = f ω ,
segue queaf aω : I −→ N′ e um levantamento de f ω : I −→ N, relativamente ao
recobrimento qq′ : N′ −→ N (note que qq′ e de fato um recobrimento de N, conforme
se verifica em [Li], corolario da proposicao 12, pagina 139). Assim, como f ω e um
laco contratil, temos queaf aω tambem o e, o que, em particular, implica que:
c′ =af (axR) = (
af aω)(0) = (
af aω)(1) =
af (ax) ,
isto e,ax ∈af−1(c′) =
aS.
Agora, vamos mostrar queaS ⊆
aR. Para tanto, suponhamos (por absurdo) que
exista um ponto ax ∈aS tal que ax <
aS. Como ax ∈
aS =
af−1(c′) e c′ ∈ q′−1(c), segue que
( f ap)(ax) = (q′ af )(ax) = q′(c′) = c, ou seja, o ponto x = ap(ax) ∈ M e tal que x ∈ f−1(c) = R;
logo, existe um caminho ω : I −→ M, ligando xR a x, tal que f ω : I −→ N e um
laco contratil em c. Seja, pois, ω−1 : I −→ M o caminho inverso de ω (ligando x a
xR), e considere o levantamento aω−1 : I −→aM de ω−1 (relativamente ao recobrimento
orientado ap :aM −→ M), com aω−1(0) = ax. Temos entao que o ponto ax′R =
aω−1(1) ∈aM e
tal que ax′R ∈ap−1(xR), pois ap(ax′R) = ap(aω−1(1)) = ω−1(1) = xR. Entretanto, note que ax′R ,
axR:
90 Teoria de Nielsen de Raızes
com efeito, sendo aω = (aω−1)−1 : I −→aM o inverso do levantamento aω−1 de ω−1, temos
que:
(ap aω)(t) = [ap (aω−1)−1](t) = (ap aω−1)(1 − t) = ω−1(1 − t) = ω(t)
para todo t ∈ I, ou seja, aω e um levantamento de ω (relativamente ao recobrimento
orientado ap), que satisfaz aω(0) = (aω−1)−1(0) = aω−1(1) = ax′R e aω(1) = (aω−1)−1(1) = aω−1(0) =ax; logo, se ax′R =
axR, terıamos que aω(0) = axR, isto e, ax = aω(1) coincidiria com a orientacao
s(x) de x, obtida pelo processo de orientacao a partir de axR, o que mostraria queax = s(x) ∈ s(R) =
aR, contradizendo nossa hipotese de que ax <
aR. Por outro lado,
comoaf aω : I −→ N′ e um levantamento de f ω relativamente ao recobrimento
q q′ : N′ −→ N (onde aω = (aω−1)−1), e como f ω e um laco contratil em c, segue queaf aω e um laco contratil em c′, e, consequentemente,
af (ax′R) = (
af aω)(0) = c′, isto e,
ax′R ∈af−1(c′) =
aS. Agora, observe que
aS =af−1(c′) e uma classe de raızes de f ap :
aM −→ N
em c ∈ Int N (basta aplicar a proposicao 2.1.1, substituindo f , q e f por f ap, q′ eaf ,
respectivamente); logo, como axR,ax′R ∈
aS, segue que existe um caminho aµ : I −→
aM,
com aµ(0) = axR e aµ(1) = ax′R, tal que f ap aµ : I −→ N e um laco contratil em c. No
entanto, o laco µ = ap aµ : I −→ M, com base em xR =ap(axR) = ap(ax′R), nao pode ser
levantado para um laco emaM (relativamente ao recobrimento ap :
aM −→ M), uma vez
queaxR ,ax′
R; isto, por sua vez, significa que µ : I −→M e um laco que inverte orientacao
relativamente ao recobrimento orientado de M. Assim, como f apaµ e um laco contratil
em c, e q f µ = q ( f ap aµ), segue que q f µ e um laco contratil em c, isto e,
a aplicacao f = q f leva o laco µ : I −→ M, que inverte orientacao relativamente ao
recobrimento orientado de M, num laco contratil em N, contradizendo a hipotese de f
ser uma aplicacao orientavel. Deste modo, concluımos que ax ∈aR para todo ax ∈
aS, ou
seja,aS ⊆aR, e, portanto,
aS =aR.
Isto posto, note que ap | aU :aU −→ U e um homeomorfismo, pois e uma aplicacao
contınua e bijetora, cuja inversa e a aplicacao contınua s : U −→aU. Logo, como
fap = q′af eaf (aU) ⊆ V′, segue queap | aU :
aU −→ U e q′ |V′ : V′ −→ V sao homeomorfismos
tais que ( f |U) (ap | aU ) = (q′ |V′) (af | aU ); consequentemente, da proposicao 1.3.3, do
corolario 1.3.1 e do teorema 2.1.1, temos que:
|m(R)| = |degc( f |U)| = |degc( f |U)| · 1 = |degc( f |U)| · |degx0(ap | aU )|
= |degc( f |U) · deg( f |U)−1(c)(ap | aU )| = |degc[( f |U) (ap | aU )]|
= |degc[(q′ |V′) (
af | aU )]| = |degc(q
′ |V′) · deg(q′ |V′ )−1(c)(af | aU )|
= |degc(q′ |V′)| · |degc′(
af | aU )| = 1 · |degc′(
af | aU )|
= |degc′(af | aU )| .
Agora, lembremos que o recobrimento p′ : M′ −→aM e o pullback de aq :
aN −→ N′
viaaf , isto e, M′ = (ax,ay) ∈
aM ×
aN : aq(ay) =
af (ax) e p′(ax,ay) = ax para cada (ax,ay) ∈ M′,
2.2 O Calculo da Multiplicidade de uma Classe de Raızes 91
enquanto que a aplicacao f ′ : M′ −→aN, dada por f ′(ax,ay) = ay, e o levantamento de
af p′
relativamente ao recobrimento aq :aN −→ N′. Observando que V′ e orientavel (pois e
contratil), consideremos uma orientacao as : V′ −→aN de V′, e definamos
aV = as(V′).
Temos entao queaq | aV :aV −→ V′ e um homeomorfismo, cuja inversa eas : V′ −→
aV. Seja
aindaac =as(c′) ∈ aq−1(c′) ∩aV (lembre-se que c′ ∈ V′), e denotemos por U′ o subconjunto
aberto de M′ dado por:
U′ = (ax,ay) ∈M′ : ax ∈aU e ay ∈
aV .
Como os pontos ax0 = s(x0) ∈aU e ac ∈
aV sao tais que
af (ax0) = aq(ac) = c′, segue que
(ax0,ac) ∈ U′, e, portanto, U′ , ∅. Deste modo, sendo h : U′ −→
aU a restricao de p′ a U′, e
denotando por h−1 :aU −→ U′ a aplicacao dada por h−1(ax) = (ax,as(
af (ax))) para cadaax ∈
aU
(a qual, de fato, esta bem definida, uma vez queaf (aU) ⊆ V′ e aq(as(
af (ax))) =
af (ax)), temos
que (h h−1)(ax) = h(ax,as(af (ax))) = ax e
(h−1 h)(ax,ay) = h−1(ax) = (ax,as(af (ax))) = (ax,as(aq(ay))) = (ax,ay) ,
para quaisquer ax ∈aU e (ax,ay) ∈ U′ (note que
af (ax) = aq(ay) e as(aq(ay)) = ay para todo
(ax,ay) ∈ U′). Em outras palavras, h : U′ −→aU e h−1 :
aU −→ U′ sao aplicacoes
contınuas tais que h h−1 :aU −→
aU e h−1 h : U′ −→ U′ sao as identidades em
aU e U′,
respectivamente, o que implica que h e um homeomorfismo, cuja inversa e h−1. Isto
posto, sendo R′ = (ax,ay) ∈ M′ : ax ∈aR e ay ∈
aV e S′ = f ′−1(ac), vamos mostrar que
R′ = S′.
Com efeito, comoaR =aS =af−1(c′) (conforme vimos ha pouco), entao, dado (ax,ay) ∈ R′,
temos que ax ∈aR =
af−1(c′), isto e,
af (ax) = c′. Logo, como (ax,ay) ∈ M′, segue que
af (ax) = aq(ay), e, portanto, aq(ay) = c′, ou seja, f ′(ax,ay) = ay ∈ aq−1(c′). Entretanto, comoaq | aV :
aV −→ V′ e uma bijecao (eay ∈
aV), devemos teray =ac (uma vez queaq(ay) = aq(ac) = c′),
d’onde concluımos que f ′(ax,ay) = ac, isto e, (ax,ay) ∈ f ′−1(ac) = S′. Reciprocamente, se
(ax,ay) ∈ S′ = f ′−1(ac), segue queay = f ′(ax,ay) =ac; assim, comoaf (ax) = aq(ay) (pois (ax,ay) ∈M′),
temos queaf (ax) = aq(ac) = c′, e, portanto, ax ∈
af−1(c′) =
aS =aR. Consequentemente, como
ay =ac ∈aV, obtemos que (ax,ay) ∈ R′, o que prova que R′ = S′.
Finalmente, observe que os homeomorfismos h = p′ |U′ : U′ −→aU e aq | aV :
aV −→ V′
satisfazem (af | aU ) (p′ |U′) = (aq | aV ) ( f ′ |U′), pois
af p′ = aq f ′ e f ′(U′) ⊆
aV. Logo, da
proposicao 1.3.3 e do corolario 1.3.1, segue que:
|degc′(af | aU )| = |degc′(
af | aU )| · 1 = |degc′(
af | aU )| · |degax 0
(p′ |U′)|
= |degc′(af | aU ) · deg
(af | a
U)−1(c′)
(p′ |U′)| = |degc′[(af | aU ) (p′ |U′)]|
= |degc′[(aq | aV ) ( f ′ |U′)]| = |degc′(
aq | aV ) · deg(aq | aV
)−1(c′)( f ′ |U′)|
= |degc′(aq | aV )| · |degac ( f ′ |U′)| = 1 · |degac ( f ′ |U′)| = |degac ( f ′ |U′)| .
92 Teoria de Nielsen de Raızes
Por outro lado, sendo W′ = M′ r f ′−1(∂aN) ⊆ Int M′, temos que:
W′ = (ax,ay) ∈M′ : f ′(ax,ay) < ∂aN = (ax,ay) ∈M′ : ay < ∂
aN ;
consequentemente, como U′ = (ax,ay) ∈ M′ : ax ∈aU e ay ∈
aV e
aV ⊆ Int
aN (pois
aV = as(V′) e V′ ⊆ Int N′), segue que U′ ⊆ W′. Alem disso, como
aR ⊆
aU, temos
que R′ = (ax,ay) ∈ M′ : ax ∈aR e ay ∈
aV ⊆ U′, ou seja, f ′−1(ac) ⊆ U′ (uma vez que
S′ = f ′−1(ac) = R′), e, portanto, W′rU′ ⊆W′r f ′−1(ac). Assim, como W′ rU′ =W′rU′ ⊆
W′ r f ′−1(ac) = Int(W′ r f ′−1(ac)) (onde o fecho e relativo a W′), segue, do teorema
da excisao em homologia singular, que o homomorfismo i′∗ : Hn(U′,U′ r f ′−1(ac)) −→
Hn(W′,W′ r f ′−1(ac)), induzido pela inclusao i′ : (U′,U′ r f ′−1(ac)) −→ (W′,W′ r f ′−1(ac)),
e um isomorfismo, que leva a classe fundamental θU′ ∈ Hn(U′,U′ r f ′−1(ac)) na classe
fundamental θW′ ∈ Hn(W′,W′ r f ′−1(ac)), e comuta o seguinte diagrama:
Hn(U′,U′ r f ′−1(ac))
Hn(IntaN, Int
aN r ac)
Hn(W′,W′ r f ′−1(ac))
( f ′ |U′)∗
( f ′ |W′)∗
i′∗
(note que f ′(U′) ⊆ IntaN, pois U′ ⊆ W′ ⊆ f ′−1(∂
aN)). Logo, denotando por θac ∈
Hn(IntaN, Int
aN r ac) a classe fundamental em ac, temos que:
( f ′ |U′)∗(θU′) = ( f ′ |W′)∗(i′∗(θU′)) = ( f ′ |W′)∗(θW′) = degac ( f ′ |W′) · θac .
Ora, como o grau local degac ( f ′ |U′) e definido como sendo o numero inteiro tal que
( f ′ |U′)∗(θU′) = degac ( f ′ |U′) · θac ,
obtemos entao que degac ( f ′ |U′) = degac ( f ′ |W′). Deste modo, como
|m(R)| = |degc′(af | au )| , |degc′(
af | aU )| = |degac ( f ′ |U′)| e degac ( f ′ |U′) = degac ( f ′ |W′) ,
segue que |m(R)| = |degac ( f ′ |W′)|. Entretanto, como M′ eaN sao variedades topologicas
conexas e orientaveis, e f ′ : (M′, ∂M′) −→ (aN, ∂aN) e uma aplicacao contınua propria, o
teorema 1.4.2 nos garante que degac ( f ′ |W′) = deg( f ′), d’onde concluımos que |m(R)| =
|deg( f ′)|, conforme querıamos demonstrar.
2.2 O Calculo da Multiplicidade de uma Classe de Raızes 93
No que segue, a fim de nao sobrecarregarmos o texto, vamos omitir o termo “re-
lativamente ao(s) recobrimento(s) orientado(s) de . . .” das definicoes 1.2.3 e 1.2.4, dei-
xando subentendido que estamos nos referindo apenas a levantamentos relativos aos
recobrimentos orientados (deste modo, quando dissermos, por exemplo, que um laco
ω : I −→ N preserva orientacao, deve-se entender que ω preserva orientacao relativa-
mente ao recobrimento orientado de N).
Corolario 2.2.1 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria do tipo I (vide
definicao 1.2.5), e suponha que a cardinalidade j de q−1(c) e finita. Entao, a variedade topologica
N′ e orientavel (e, portanto, o grau cohomologico deg(af ) de
af : (aM, ∂
aM) −→ (N′, ∂N′) esta
bem definido), e, para toda classe de raızes R de f em c, temos |m(R)| = |deg(af )|.
Demonstracao. De fato, consideremos novamente o diagrama comutativo abaixo:
(M′, x′0) (aN,ac)
(aM,ax0) (N′, c′)
(M, x0) (N, c)
(N, c)
f ′
af
f
f
p′
ap
aq
q′
q
Como q : N −→ N, q′ : N′ −→ N e ap :aM −→ M sao aplicacoes de recobrimento, segue
(da proposicao 1.2.7) que q, q′ e ap sao fieis a orientacao. Isto posto, seja α : I −→ M
um laco com base em x0, e consideremos o laco β : I −→ N (com base em c) dado por
β = f α. Temos entao que α preserva orientacao se, e somente se, β tambem o faz: com
efeito, sabemos que β preserva orientacao se, e somente se, o laco γ = q β : I −→ N
preserva orientacao (pois q e fiel a orientacao); logo, como q β = q ( f α) = f α,
temos que β preserva orientacao se, e so se, f α preserva orientacao, o que, por sua
vez, ocorre se, e so se, α preserva orientacao (uma vez que f e do tipo I, isto e, fiel a
orientacao). Daı, concluımos que a aplicacao f : M −→ N tambem e fiel a orientacao.
Por outro lado, sejaaα : I −→aM um laco com base emax0, e considere o laco β′ : I −→ N′
(com base em c′) dado por β′ =af aα. Temos, pois, que aα preserva orientacao se, e
somente se, β′ tambem o faz: de fato, como q′ : N′ −→ N e fiel a orientacao, segue
94 Teoria de Nielsen de Raızes
que β′ preserva orientacao se, e so se, o laco q′ β′ = q′ (af aα) = f ap aα preserva
orientacao, o que, por sua vez, ocorre se, e somente se,aα preserva orientacao (uma vez
que f : M −→ N e ap :aM −→ M sao fieis a orientacao). Logo, temos que
af :aM −→ N′
tambem e uma aplicacao fiel a orientacao.
Agora, note que o homomorfismoaf# : π1(
aM,ax0) −→ π1(N′, c′), induzido por
af , e
sobrejetivo: com efeito, dado um laco ω′ : I −→ N′ com base em c′, temos que o laco
ω = q′ ω′ e tal que [ω] ∈ ( f ap)#(π1(aM,ax0)) (uma vez que q′ : N′ −→ N e o recobrimento
de N associado ao subgrupo ( f ap)#(π1(aM,ax0)) ⊆ π1(N, c)), o que implica que existe um
laco aω : I −→aM, com base em ax0, tal que [ω] = ( f ap)#([aω]); logo, como ( f ap)#([aω]) =
(q′ af )#([aω]) = q′#(
af#([aω])), segue que q′#(
af#([aω])) = [ω] = q′#([ω′]), ou seja,
af#([aω]) =
[ω′] (pois, como q′ : N′ −→ N e um recobrimento, o homomorfismo induzido q′# :
π1(N′, c′) −→ π1(N, c) e injetivo), demonstrando queaf# e um homomorfismo sobrejetivo.
Consequentemente, dado um laco qualquer γ′ : I −→ N′, com base em c′, segue que
existe um laco aγ : I −→aM, com base em ax0, tal que [γ′] = [
af aγ] =
af#([aγ]). Entretanto,
comoaM e uma variedade orientavel, temos que todo laco em
aM preserva orientacao;
em particular, segue entao queaγ preserva orientacao, o que (pelo fato deaf :aM −→ N′
ser fiel a orientacao) implica que o lacoaf aγ : I −→ N′ (com base em c′) preserva
orientacao. Assim, como [γ′] = [af aγ] e
af aγ preserva orientacao, temos que γ′ tambem
preserva orientacao, uma vez queaf aγ pode ser levantado para um laco
aδ : I −→
aN,
relativamente ao recobrimento orientadoaq :aN −→ N′, e toda homotopia entre γ′ e
af aγ
pode ser levantada para uma homotopia entreaδ e um levantamento deγ′ (relativamente
a aq), o qual, por conseguinte, sera um laco emaN. Deste modo, podemos concluir que
todo laco γ′ : I −→ N′, com base em c′, preserva orientacao, o que (pela proposicao
1.2.5) significa que N′ e uma variedade orientavel, e, portanto, o grau cohomologico
deg(af ) da aplicacao propria
af : (aM, ∂
aM) −→ (N′, ∂N′) encontra-se bem definido (vide
definicao 1.4.4). Alem disso, pela definicao 1.4.2, a orientabilidade de N′ nos garante
que o recobrimento orientado aq :aN −→ N′ e a identidade, isto e,
aN = N′. Logo, como
p′ : M′ −→aM e o pullback deaq via
af , segue que:
M′ = (ax,ay) ∈aM ×
aN :
af (ax) = aq(ay) = ay = (ax,
af (ax)) : ax ∈
aM ,
e, consequentemente, as aplicacoes p′ : M′ −→aM e f ′ : M′ −→
aN sao dadas por
p′((ax,af (ax))) = ax e f ′((ax,
af (ax))) =
af (ax) para cada ax ∈
aM. Note entao que, deste modo, o
recobrimento p′ : M′ −→aM e um homeomorfismo, cuja inversa e a aplicacao contınua
p′−1 :aM −→ M′ definida por p′−1(ax) = (ax,
af (ax)), para cada ax ∈
aM. Portanto, como
f ′ = aq f ′ =af p′, segue (da proposicao 1.4.6 e do corolario 1.4.1) que:
|deg( f ′)| = |deg(af p′)| = |deg(
af ) · deg(p′)|
= |deg(af )| · |deg(p′)| = |deg(
af )| · 1 = |deg(
af )| ,
2.2 O Calculo da Multiplicidade de uma Classe de Raızes 95
d’onde concluımos (utilizando a proposicao anterior) que |m(R)| = |deg(af )|, para toda
classe de raızes R de f em c.
Agora, antes de demonstrarmos o proximo resultado, convem observarmos alguns
fatos sobre lacos que preservam ou invertem orientacao.
Observacao 2.2.1 . A fim de apresentarmos uma descricao alternativa para o fibrado ori-
entado, considere uma variedade topologica conexa X, de dimensao n e sem fronteira, e
seja x0 ∈ X; da teoria de recobrimentos, sabemos que existem uma variedade topologica
simplesmente conexa XU, bem como uma aplicacao de recobrimento pU : XU −→ X, dita
universal, tais que, para todo recobrimento p : X −→ X, existe um outro recobrimento
pU : XU −→ X satisfazendo p pU = pU (isto e, XU recobre qualquer outro recobrimento
X de X). Por outro lado, se p : X −→ X e um recobrimento qualquer de X, dizemos que
um homeomorfismo D : X −→ X e uma transformacao de deck, relativamente a p, se
p D = p. Alem disso, sabemos tambem que, dado um lacoω : I −→ X, com base em x0,
existe uma unica transformacao de deck Dω : X −→ X relativamente ao recobrimento
p : X −→ X, denominada transformacao de deck induzida por ω em X, definida da
seguinte maneira: para cada x ∈ X, consideramos Dω(x) = ω(1), onde ω : I −→ X e
o unico levantamento de ω, relativamente ao recobrimento p, tal que ω(0) = x (para
maiores detalhes sobre estes assuntos, vide [Bd], paginas 147 a 150). Isto posto, seja
DUω : XU −→ XU a transformacao de deck induzida por ω no espaco de recobrimento
universal XU de X; seguindo o raciocınio dado na observacao 5.9 de [Bk3] (pagina 406),
pode-se verificar que o laco ω : I −→ X preserva ou inverte orientacao conforme o grau
local degy(DUω) e respectivamente igual a 1 ou −1, onde y ∈ XU e tal que DU
ω(x) = y para
algum x ∈ (pU)−1(x0) (note que, como DUω : XU −→ XU e um homeomorfismo, temos,
do corolario 1.3.1, que degy(DUω) = ±1). Deste modo, segue que o fibrado orientado de
X e o espaco de recobrimento de X associado ao subgrupo G de π1(X, x0), constituıdo
das classes de homotopia dos lacos ω : I −→ X, para os quais a transformacao de deck
induzida por ω, no espaco de recobrimento universal de X, e um homeomorfismo que
preserva orientacao.
Observacao 2.2.2 . Tendo em vista os conceitos apresentados na observacao acima, e
adotando as mesmas notacoes la utilizadas, suponhamos agora que p : X −→ X seja um
recobrimento de X, com X orientavel, e considere a transformacao de deck Dω : X −→ X
induzida porω em X; pela definicao de recobrimento universal, sabemos que existe um
recobrimento pU : XU −→ X tal que pU = p pU. Logo, como p Dω = p e pU DUω = pU,
obtemos que p (Dω pU) = p pU = pU e p (pU DUω) = pU DU
ω = pU, isto e,
96 Teoria de Nielsen de Raızes
Dω pU : XU −→ X e pU DUω : XU −→ X constituem levantamentos de pU relativamente
ao recobrimento p : X −→ X, conforme ilustra o diagrama abaixo:
X
XU X
pU
pU
p
Dω
DUω
Em contrapartida, sendo x, y ∈ X tais que pU(x) = x e Dω(x) = y (onde x, y ∈ XU sao
tais que pU(x) = x0 e DUω(x) = y), sabemos que Dω(x) = ω(1) = y e DU
ω(x) = ωU(1) = y,
onde ω : I −→ X e ωU : I −→ XU sao, respectivamente, os unicos levantamentos de
ω, relativamente aos recobrimentos p e pU, tais que ω(0) = x e ωU(0) = x; consequen-
temente, denotando por ωU : I −→ XU o unico levantamento de ω relativamente a pU
(isto e, ω = pU ωU), com ωU(0) = x, temos que pU ωU = (p pU) ωU = p ω = ω e
ωU(0) = x = ωU(0). Portanto, da unicidade do levantamento ωU : I −→ XU, segue que
ωU = ωU, o que implica que:
pU(y) = pU(ωU(1)) = (pU ωU)(1) = ω(1) = y .
Assim, temos que
(Dω pU)(x) = Dω(x) = y e (pU DUω)(x) = pU(y) = y ,
ou seja, Dω pU : XU −→ X e pUDUω : XU −→ X sao levantamentos de pU (relativamente
a p) que coincidem no ponto x ∈ XU. Daı, segue (da unicidade destes levantamentos)
que Dω pU = pU DUω , o que (pela proposicao 1.3.3) significa que:
degy(Dω) · deg(Dω)−1(y)(pU) = degy(pU DU
ω)
(lembre-se que as variedades XU e X sao orientaveis). Logo, como (Dω)−1(y) = x (pois
Dω : X −→ X e um homeomorfismo), obtemos que:
(I) degy(Dω) · degx(pU) = degy(pU DUω) .
Agora, observe que, como (pU)−1(y) nao e necessariamente conexo, nao podemos utilizar
diretamente a proposicao 1.3.3 para concluir que
degy(pU DUω) = degy(pU) · deg(pU)−1(y)(D
Uω) ,
uma vez que o grau local degK(DUω) encontra-se bem definido somente se, alem de
compacto, K tambem e conexo; entretanto, denotando por K = (pU)−1(y), segue, da
2.2 O Calculo da Multiplicidade de uma Classe de Raızes 97
proposicao 4.5 de [D] (pagina 268), que a igualdade (DUω)∗(θ(DU
ω )−1(K)) = degy(DUω) · θK e
valida ainda que K nao seja conexo (onde, como usualmente, θ(DUω )−1(K) ∈ Hn(XU,XU r
(DUω)−1(K)) e θK ∈ Hn(XU,XU r K) sao as classes fundamentais em (DU
ω)−1(K) e K, res-
pectivamente, e (DUω)∗ : Hn(XU,XU r (DU
ω)−1(K)) −→ Hn(XU,XU r K) e o isomorfismo
induzido pelo homeomorfimo DUω : XU −→ XU). Deste modo, nao e difıcil mostrar que
(II) degy(pU DUω) = degy(pU) · degy(DU
ω)
(basta construir um diagrama com os homomorfismos em homologia induzidos por
pU, DUω e pU DU
ω , e verificar a relacao entre as classes fundamentais). Assim, utilizando
a proposicao 1.3.4, temos que degy(pU) = degx(pU), e, consequentemente (de (I), (II) e do
fato de que degx(pU) > 0), obtemos que degy(Dω) = degy(DUω). Finalmente, note entao
que, se o laco ω : I −→ X preserva ou inverte orientacao, temos respectivamente que
degy(Dω) = degy(DUω) = 1 ou degy(Dω) = degy(DU
ω) = −1. Em resumo, dado qualquer
recobrimento p : X −→ X, com X orientavel, a transformacao de deck Dω : X −→ X,
induzida por um laco ω : I −→ X em X, e um homeomorfismo que preserva ou inverte
orientacao conforme ω respectivamente preserva ou inverte orientacao.
Corolario 2.2.2 . Se f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e uma aplicacao contınua propria do tipo
II (vide definicao 1.4.5), tal que a cardinalidade j de q−1(c) e finita, entao deg( f ′) = 0, e,
consequentemente, |m(R)| = 0 para toda classe de raızes R de f em c ∈ Int N.
Demonstracao. Como f nao e fiel a orientacao, segue que existem lacos ω : I −→ M
e µ = f ω : I −→ N, com base nos pontos x0 ∈ Int M e c ∈ Int N, respectivamente,
tal que um deles preserva orientacao e o outro inverte orientacao. Sem perda de
generalidade, podemos supor ainda queω(I) ⊆ Int M eµ(I) ⊆ Int N, pois, caso contrario,
basta deformarmos ω e µ em vizinhancas contrateis de cada ponto de ω(I) ∩ ∂M e
µ(I) ∩ ∂N, de modo a obter lacos ω′ : I −→ Int M e µ′ : I −→ Int N, homotopicos a
ω e µ, respectivamente, tais que µ′ = f ω′, e que preservam ou invertem orientacao
conforme ω e µ tambem o fazem. Isto posto, sendo p : Int M′ −→ Int M e q : IntaN −→
Int N os recobrimentos dados por p = (ap p′) |Int M′ e q = (q q′ aq) |IntaN , sejam
D′ω : Int M′ −→ Int M′ eaDµ : Int
aN −→ Int
aN as transformacoes de deck induzidas por
ω e µ = f ω em Int M′ e IntaN, respectivamente (vide observacao 2.2.1), e considere
as aplicacoes g1 = f ′ D′ω : Int M′ −→aN e g2 =
aDµ f ′ : M′ −→
aN. Denotando por
W′ =M′ r ( f ′)−1(∂aN) = Int M′ r ( f ′)−1(∂
aN), temos entao que:
degac (g1 |W′) = degac [( f ′ D′ω) |W′] = degac [( f ′ |W′) D′ω] .
Contudo, apesar de ( f ′ |W′)−1(ac) = ( f ′)−1(ac) nao ser necessariamente conexo (de maneira
que o grau local deg( f ′ |W′ )−1(ac )(D
′ω) pode nao estar bem definido), podemos utilizar o
98 Teoria de Nielsen de Raızes
mesmo raciocınio dado na observacao 2.2.2 para mostrar que degac [( f ′ |W′) D′ω] =
degac ( f ′ |W′) · degx′0(D′ω), d’onde obtemos que:
degac (g1 |W′) = degac ( f ′ |W′) · degx′0(D′ω) .
Por outro lado, tambem temos que:
degac (g2 |W′) = degac [(aDµ f ′) |W′]
= degac (aDµ) · deg(
aD µ)−1(ac )( f ′ |W′)
= degac (aDµ) · degac ( f ′ |W′) .
Alem disso, da comutatividade do diagrama ilustrado na figura 2.2 (e do fato de que
as transformacoes de deck D′ω eaDµ satisfazem p D′ω = p e q
aDµ = q), segue que:
q (g1 |W′) = q [( f ′ D′ω) |W′] = q ( f ′ |W′) D′ω
= q q′ aq ( f ′ |W′) D′ω = q q′ (af | aW ) p′ D′ω
= q ( f |W) ap p′ D′ω = ( f |W) ap p′ D′ω
= ( f |W) p D′ω = ( f |W) p ,
e:
q (g2 |W′) = q [(aDµ f ′) |W′] = (q
aDµ) ( f ′ |W′)
= q ( f ′ |W′) = ( f |W) p ,
onde W = M r f−1(∂N), W = M r f−1(∂N) eaW =
aM r
af−1(∂N′). Logo, g1 |W′ e g2 |W′ sao
levantamentos de ( f |W)p relativamente ao recobrimento q : IntaN −→ Int N. Ademais,
sendo ω′ : I −→ Int M o unico levantamento de ω, relativamnte a p, tal que ω′(0) = x′0,
e considerandoaµ = f ′ ω′ : I −→ IntaN, temos que:
q aµ = q f ′ ω′ = f p ω′ = f ω = µ ,
isto e, aµ e o unico levantamento de µ relativamente ao recobrimento q, que comeca
em aµ(0) = ( f ′ ω′)(0) = f ′(x′0) = ac. Assim, como (por definicao) D′ω(x′0) = ω′(1) eaDµ(ac) = aµ(1), obtemos que:
(g1 |W′)(x′0) = g1(x′0) = ( f ′ D′ω)(x′0) = ( f ′ ω′)(1) = aµ(1)
=aDµ(ac) = (
aDµ f ′)(x′0) = g2(x′0) = (g2 |W′)(x
′0) .
Portanto, g1 |W′ e g2 |W′ sao levantamentos de ( f |W)p (relativamente a q) que coincidem
no ponto x′0 ∈ Int M′, o que, da unicidade destes levantamentos, implica que g1 |W′ =
g2 |W′ , e, consequentemente, degac (g1 |W′) = degac (g2 |W′), ou seja,
degac ( f ′ |W′) · degx′0(D′ω) = degac (
aDµ) · degac ( f ′ |W′) .
2.3 Os Numeros de Nielsen de Raızes 99
Enfim, como apenas um dos lacos ω ou µ = f ω preserva orientacao, segue, da
observacao 2.2.2, que degx′0(D′ω) ·degac (
aDω) = −1, o que, pela igualdade acima, significa
que degac ( f ′ |W′) = −degac ( f ′ |W′), isto e, degac ( f ′ |W′) = 0. Deste modo, utilizando o
teorema 1.4.2, temos que deg( f ′) = degac ( f ′ |W′) = 0; por conseguinte, como a cardina-
lidade j de q−1(c) e finita (por hipotese), podemos concluir, pela proposicao 2.2.3, que
|m(R)| = 0 para toda classe de raızes R de f em c, conforme querıamos demonstrar.
Finalmente, com os resultados obtidos acima, podemos agora calcular |m(R)| para
qualquer aplicacao propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), num ponto c ∈ Int N arbitrario;
em particular, isto nos permitira calcular os numeros de Nielsen de raızes de f em c,
pois, conforme veremos na proxima secao, estes numeros sao definidos a partir das
multiplicidades |m(R)|, as quais, pelo que vimos no teorema 2.1.2, dependem apenas
da aplicacao f e do ponto c.
Definicao 2.3.1 . Dada uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), dizemos que
uma classe de raızes R de f em c ∈ Int N e essencial se sua multiplicidade |m(R)| e nao-nula,
e definimos o numero de Nielsen de raızes de f em c, denotado por N( f , c), como sendo o
numero de classes de raızes essenciais de f em c. Por outro lado, se |m(R)| = 0, dizemos que R e
uma classe de raızes inessencial.
Observe que, como o numero de classes de raızes essenciais de f : (M, ∂M) −→
(N, ∂N) em c ∈ Int N e menor ou igual ao numero de classes de raızes de f em c, e como
este, por sua vez, e menor ou igual ao numero de raızes de f em c (pois cada classe
de raızes de f em c contem pelo menos uma raiz de f em c) segue que N( f , c) e um
limitante inferior para o numero de raızes de f em c. Alem disso, se f−1(c) = ∅, segue
que nao existem classes de raızes de f em c (o que, em particular, implica que f nao
possui classes de raızes essenciais em c), e, consequentemente, N( f , c) = 0.
Definicao 2.3.2 . Dada uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), e um ponto
c ∈ Int N, dizemos que f e transversa a c se existe uma vizinhanca euclidiana V de c em Int N,
tal que f−1(V) e uma uniao finita e disjunta de vizinhancas euclidianas em Int M, cada uma das
quais e levada homeomorficamente por f sobre V.
A respeito da definicao acima, note que, se f−1(c) = ∅, segue (do fato de N ser uma
variedade topologica e c ∈ Int N) que c admite uma vizinhanca euclidiana V em Int N
100 Teoria de Nielsen de Raızes
tal que f−1(V) = ∅; logo, f−1(V) e a uniao de uma famılia vazia de subconjuntos de Int M
(isto e, uma famılia sem qualquer conjunto). Ora, como os membros de uma famılia
vazia de conjuntos possuem qualquer propriedade que desejemos (simplesmente por
nao existirem elementos na famılia, para os quais a propriedade em questao nao se
verifica), inclusive aquela que afirma que seus membros sao vizinhancas euclidianas
levadas homeomorficamente por f sobre V, podemos adotar (por “vacuidade”) que,
se f−1(c) = ∅, entao f e transversa a c.
Exemplo 2.3.1 . Se M e uma variedade topologica conexa, sem fronteira, e p : M −→M e
um recobrimento que possui um numero finito de folhas, entao, dado c ∈M arbitrario,
temos que p e uma aplicacao transversa a c: com efeito, do exemplo 1.2.3, sabemos
que p : M −→ M e uma aplicacao propria; alem disso, como p e um recobrimento de,
digamos, k folhas, segue que o ponto c ∈M admite uma vizinhanca euclidiana V ⊆ M,
tal que p−1(V) e a uniao de uma colecao finita U1,U2, . . . ,Uk ⊆ M, de abertos dois a
dois disjuntos, onde, para cada i ∈ 1, . . . , k, a restricao de p a Ui e um homeomorfismo
sobre V (e, portanto, U1,U2, . . . ,Uk sao vizinhancas euclidianas em M).
Definicao 2.3.3 . Dada uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), e um ponto
c ∈ Int N, definimos o numero de Nielsen transverso de raızes (de f em c), denotado por
N∩( f , c), como sendo:
• N∩( f , c) = 0 se f−1(c) = ∅;
• N∩( f , c) =∑|m(R)| : R e classe de raızes de f em c se f−1(c) , ∅ (isto e, caso f−1(c) ,
∅, N∩( f , c) e a soma das multiplicidades de todas as classes de raızes de f em c).
Note que, conforme sugere o nome, o numero de Nielsen transverso de raızes esta
diretamente relacionado com o conceito de transversalidade introduzido na definicao
2.3.2: de fato, se uma aplicacao propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e transversa a um
ponto c ∈ Int N (com f−1(c) , ∅), segue de imediato que f−1(c) e um conjunto finito,
pois, sendo V ⊆ Int N uma vizinhanca euclidiana de c tal que V =⋃
U1
⋃U2 . . .
⋃Uk,
onde U1,U2, . . . ,Uk sao vizinhancas euclidianas disjuntas em Int M, cada qual levada
homeomorficamente por f sobre V, temos que cada ponto de f−1(c) esta contido num
unico Ui, i ∈ 1, 2, . . . , k; por outro lado, como as restricoes f |Ui: Ui −→ V, com i ∈
1, 2, . . . , k, sao homeomorfismos sobre V, segue (do corolario 1.3.1) que degc( f |Ui) = ±1,
e, portanto, pelo que vimos no exemplo 1.3.7, obtemos que:
|m(R)| =∣∣∣∣
l∑
j=1
degc( f |Ui j)∣∣∣∣ 6
l∑
j=1
|degc( f |Ui j)| = l ,
2.3 Os Numeros de Nielsen de Raızes 101
onde R = xi1 , xi2 , . . . , xil ⊆ f−1(c) e uma classe de raızes de f em c, e Ui1 ,Ui2, . . . ,Uil ∈
U1, . . . ,Uk. Logo, o numero l de raızes na classe R e, no mınimo, igual a multiplicidade
de R, ou seja, cada classe de raızes R de f em c contem pelo menos |m(R)| raızes de
f em c. Consequentemente, como N∩( f , c) e a soma das multiplicidades de todas as
classes de raızes de f em c, segue que, se f e transversa a c, entao N∩( f , c) e um limitante
inferior para o numero de classes de raızes de f em c.
Isto posto, tendo em vista as interpretacoes para N( f , c) e N∩( f , c) dadas acima, e
natural surgir a seguinte pergunta: se uma aplicacao propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e
transversa a um ponto c ∈ Int N, qual dos dois numeros N( f , c) ou N∩( f , c), e o limitante
inferior mais preciso para o numero de raızes de f em c? Sem muitas dificuldades,
podemos verificar que a resposta e N∩( f , c), pois N( f , c) 6 N∩( f , c): com efeito, tanto
N( f , c), quanto N∩( f , c), sao calculados utilizando somente as classes de raızes essenciais
de f em c; entretanto, se R e uma classe de raızes essencial de f em c, temos que a
“contribuicao” de R no calculo de N( f , c) e +1, enquanto que, no calculo de N∩( f , c),
a “contribuicao” de R e |m(R)| > 1 (observe que, como |m(R)| ∈ Z+ e nao-nulo, entao
|m(R)| > 1), d’onde concluımos que N( f , c) 6 N∩( f , c). Nos exemplos apresentados mais
adiante, veremos que, em geral, a igualdade N( f , c) = N∩( f , c) nao e valida, uma vez
que ela ocorre somente quando as classes de raızes de f em c tem multiplicidade igual
a 1 (ou quando f−1(c) = ∅).
Agora, sabendo que as classes de raızes de uma aplicacao propria f : (M, ∂M) −→
(N, ∂N), num ponto c ∈ Int N, tem todas a mesma multiplicidade (conforme vimos
no teorema 2.1.2), podemos calcular os numeros N( f , c) e N∩( f , c) diretamente de suas
definicoes, utilizando para tanto os resultados obtidos na secao anterior (bem como
o diagrama ilustrado na figura 2.2). No que segue, vamos supor obviamente que
f−1(c) , ∅ (pois, caso contrario, sabemos que N( f , c) = N∩( f , c) = 0).
Teorema 2.3.1 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria (entre varieda-
des topologicas conexas de mesma dimensao n), e, dado c ∈ Int N, denote por j a cardinalidade
de q−1(c). Se f e uma aplicacao do tipo I (isto e, fiel a orientacao), com j finito e deg(af ) , 0,
entao N( f , c) = j; por outro lado, se f e do tipo III, com j finito e deg( f , 2) = 1, tambem temos
N( f , c) = j. Em todos os demais casos, vale que N( f , c) = 0.
Demonstracao. Com efeito, se f e do tipo I e j e finito, temos (do teorema 2.1.2 e
do corolario 2.2.1) que |m(R)| = |deg(af )| para toda classe de raızes R de f em c; logo,
supondo que deg(af ) , 0, segue que toda classe de raızes de f em c e essencial, e,
portanto, o numero de Nielsen N( f , c) coincide com o numero de classes de raızes de
f em c. No entanto, do corolario 2.1.1, sabemos que, dada uma classe de raızes R de
102 Teoria de Nielsen de Raızes
f em c, existe um elemento c ∈ q−1(c) tal que R = f−1(c); assim, como quaisquer duas
classes de raızes de f em c sao disjuntas, segue que o numero de classes de raızes de f
em c e igual a cardinalidade j de q−1(c), d’onde concluımos que N( f , c) = j.
Analogamente, se f e do tipo III e j e finito, a proposicao 2.2.1 (juntamente com o
teorema 2.1.2) nos garante que |m(R)| = deg( f , 2) ∈ Z2, para toda classe de raızes R de f
em c; deste modo, se deg( f , 2) , 0 ∈ Z2 (isto e, se deg( f , 2) = 1), temos que toda classe
de raızes de f em c e essencial, e, consequentemente, N( f , c) coincide com o numero
de classes de raızes de f em c, que, conforme vimos acima, e igual a cardinalidade j de
q−1(c).
Finalmente, observe que, se f for do tipo I e j finito, mas deg(af ) = 0, entao |m(R)| =
|deg(af )| = 0 para toda classe de raızes R de f em c, o que implica que N( f , c) = 0, sendo
que o mesmo ocorre se f for do tipo III, com j finito e deg( f , 2) = 0 ∈ Z2, pois, neste
caso, tambem teremos |m(R)| = deg( f , 2) = 0 para toda classe de raızes R de f em c. Ja
nos casos em que f e do tipo II ou j e infinito, segue de imediato (da proposicao 2.2.2
e do corolario 2.2.2) que |m(R)| = 0 para toda classe de raızes R de f em c, e, portanto,
N( f , c) = 0.
Teorema 2.3.2 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria (entre varieda-
des topologicas conexas de mesma dimensao n), e, dado c ∈ Int N, denote por j a cardinalidade
de q−1(c). Se f e uma aplicacao do tipo I e j e finito, temos que N∩( f , c) = j · |deg(af )|, enquanto
que, se f e do tipo III e j e finito, temos N∩( f , c) = j · deg( f , 2); nos demais casos (isto e, se f for
do tipo II ou j for infinito), tem-se que N∩( f , c) = 0.
Demonstracao. De fato, conforme vimos na demonstracao do teorema anterior, se f
e do tipo I e j e finito, temos |m(R)| = |deg(af )| para toda classe de raızes R de f em c,
sendo que j coincide com o numero de classes de raızes de f em c; logo, por definicao,
temos que:
N∩( f , c) =∑|m(R)| : R e classe de raızes de f em c = j · |deg(
af )| .
Por outro lado, se f e do tipo III e j e finito, segue que |m(R)| = deg( f , 2) ∈ Z2 para toda
classe de raızes R de f em c, e, portanto (como j e igual ao numero de classes de raızes
de f em c), N∩( f , c) = j ·deg( f , 2). Enfim, se f for do tipo II ou j for infinito, teremos que
|m(R)| = 0 para toda classe de raızes R de f em c (conforme nos garante a proposicao
2.2.2 e o corolario 2.2.2), de modo que N∩( f , c) = 0.
Assim sendo, os teoremas 2.3.1 e 2.3.2 nos permitem calcular os numeros de Nielsen
N( f , c) e N∩( f , c) para todo tipo de aplicacao propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), em qual-
quer ponto c ∈ Int N. Contudo, se, em particular, M e N forem variedades orientaveis
2.3 Os Numeros de Nielsen de Raızes 103
(conexas e de mesma dimensao n), este teoremas podem ser simplificados utilizando-se
o grau cohomologico deg( f ) nos calculos de N( f , c) e N∩( f , c). Mais especificamente,
temos o seguinte
Corolario 2.3.1 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria, entre vari-
edades topologicas conexas, orientaveis e de mesma dimensao n. Dado c ∈ Int N, e denotando
por j a cardinalidade de q−1(c), temos que:
N( f , c) =
j se deg( f ) , 0
0 se deg( f ) = 0,
enquanto que N∩( f , c) = |deg( f )|.
Demonstracao. Primeiramente, suponhamos que a cardinalidade j de q−1(c) seja
finita; neste caso, como q : N −→ N e uma aplicacao de recobrimento e N e uma
variedade topologica conexa (e, portanto, todas as fibras q−1(y), y ∈ N, tem a mesma
cardinalidade), segue que q possui um numero finito de folhas, o que, pelo exemplo
1.3.3, significa que q : N −→ N e uma aplicacao propria. Agora, lembrando que q(∂N) =
∂N (pois q e um homeomorfismo local), temos que a restricao q |Int N : Int N −→ Int N
e um recobrimento de Int N que possui o mesmo numero de folhas de q (a saber, j);
assim, como Int N, e, consequentemente, Int N, sao orientaveis, segue (do teorema
1.4.2) que deg(q) = degc(q |Int N), isto e, deg(q) = ±j (vide corolario 1.3.2). Por outro lado,
como M e uma variedade topologica orientavel, temos que o recobrimento orientadoap :aM −→M e a identidade (ou seja,
aM =M); logo, como q′ : N′ −→ N e o recobrimento
de N associado ao subgrupo ( f ap)#(π1(aM,ax0)) = f#(π1(M, x0)) ⊆ π1(N, c), segue que
f#(π1(M, x0)) = q′#(π1(N′, c′)), enquanto queaf :aM = M −→ N′ e tal que f = q′
af (uma
vez queaf e o levantamento de f ap = f relativamente ao recobrimento q′ : N′ −→ N).
Observe entao que o homomorfismo f# : π1(M, x0) −→ π1(N, c) e sobrejetivo: com
efeito, dada uma classe [α] ∈ π1(N, c), considere [β] = q#([α]) ∈ q#(π1(N, c)); como
q#(π1(N, c)) = f#(π1(M, x0)) (pois q : N −→ N e o recobrimento de N associado ao
subgrupo f#(π1(M, x0)) ⊆ π1(N, c)), segue que existe [α] ∈ π1(M, x0) tal que f#([α]) =
[β] = q#([α]), e, portanto, q#( f#([α])) = f#([α]) = [β] = q#([α]), o que (pelo fato do
homomorfismo q# : π1(N, c) −→ π1(N, c), induzido pelo recobrimento q : N −→ N,
ser injetivo), implica que f#([α]) = [α], mostrando que f# : π1(M, x0) −→ π1(N, c) e
sobrejetivo. Deste modo, obtemos que:
q′#(π1(N′, c′)) = f#(π1(M, x0)) = π1(N, c) ,
isto e, o homomorfismo q′# : π1(N′, c′) −→ π1(N, c) tambem e sobrejetivo. Isto, por
sua vez, significa que o ındice do subgrupo q′#(π1(N′, c′)) ⊆ π1(N, c), em π1(N, c), e
104 Teoria de Nielsen de Raızes
igual a 1, e, consequentemente, o numero de folhas do recobrimento q′ : N′ −→ N
e igual a 1 (pois, conforme se verifica em [Li], corolario 1, pagina 152, o numero
de folhas de q′ e igual ao ındice do subgrupo q′#(π1(N′, c′)) em π1(N, c)). Portanto,a
restricao q′ |Int N′ : Int N′ −→ Int N e um recobrimento de uma unica folha, e (pelo
exemplo 1.3.3, corolario 1.3.2 e teorema 1.4.2) deg(q′) = degc′(q′ |Int N′) = ±1 (note que
N, e consequentemente N e N′, sao variedades orientaveis, conforme nos garante a
proposicao 1.1.1). Logo, sendo deg(q) = ±j e deg(q′) = ±1, concluımos (utilizando a
proposicao 1.4.6) que:
deg( f ) = deg(q f ) = deg(q) · deg( f ) = deg(q) · deg(q′ af )
= deg(q) · deg(q′) · deg(af ) = ±j · deg(
af ) .
Assim, como j > 0, temos que |deg( f )| = j · |deg(af )|, sendo que deg( f ) , 0 se, e somente
se, deg(af ) , 0. Por conseguinte, dos teoremas 2.3.1 e 2.3.2, obtemos que N( f , c) = j se
deg( f ) , 0, N( f , c) = 0 se deg( f ) = 0, e N∩( f , c) = |deg( f )|.
Finalmente, suponhamos agora que a cardinalidade j de q−1(c) e infinita. Neste caso,
pela proposicao 2.2.2, temos que |m(R)| = 0 para toda classe de raızes R de f em c;
consequentemente, dada uma classe de raızes R de f em c, e sendo V ⊆ Int N uma
vizinhanca aberta contratil de c, temos (pela definicao 1.3.7) que degc( f |UR) = 0, onde
UR ⊆ f−1(V) e um aberto tal que UR∩ f−1(c) = R. Logo, do corolario 1.4.2, obtemos que:
deg( f ) =∑degc( f |UR
) : R e classe de raızes de f em c = 0 .
Portanto, como f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e uma aplicacao propria do tipo I (pois M e N
sao orientaveis), concluımos (a partir dos teoremas 2.3.1 e 2.3.2) que, se j e infinito, entao
N( f , c) = 0 e N∩( f , c) = 0 = |deg( f )|. Resumindo, temos, pois, que N∩( f , c) = |deg( f )|,
N( f , c) = j se deg( f ) , 0, e N( f , c) = 0 se deg( f ) = 0, como querıamos demonstrar.
Da invariancia do grau cohomologico por homotopias proprias (proposicao 1.4.5),
obtemos ainda o seguinte
Corolario 2.3.2 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria (entre
variedades topologicas conexas de mesma dimensao n). Dado c ∈ Int N, temos que os
numeros de Nielsen N( f , c) e N∩( f , c) sao invariantes por homotopias proprias, isto e, se
H : (M × I, ∂M × I) −→ (N, ∂N) e uma homotopia propria entre f e outra aplicacao contınua
propria g : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), entao N( f , c) = N(g; c) e N∩( f , c) = N∩(g; c). Alem disso,
tanto N( f , c), quanto N∩( f , c), sao independentes da escolha do ponto c ∈ Int N.
Demonstracao. Com efeito, dado c ∈ Int N, sejam x0, x1 ∈ Int M tais que f (x0) = c e
g(x1) = c, onde g : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e uma aplicacao contınua propria, homotopica
2.3 Os Numeros de Nielsen de Raızes 105
a f por uma homotopia propria H : (M × I, ∂M × I) −→ (N, ∂N). Como M e uma
variedade conexa (e, portanto, conexa por caminhos), sabemos que existe um isomor-
fismo γ : π1(M, x0) −→ π1(M, x1) tal que f# = g# γ, onde f# : π1(M, x0) −→ π1(N, c) e
g# : π1(M, x1) −→ π1(N, c) sao os homomorfismos induzidos por f e g, respectivamente;
logo, como γ(π1(M, x0)) = π1(M, x1), segue que f#(π1(M, x0)) = (g# γ)(π1(M, x0)) =
g#(π1(M, x1)), e, consequentemente, o recobrimento q : N −→ N associado ao sub-
grupo f#(π1(M, x0)) de π1(N, c) coincide com o recobrimento associado ao subgrupo
g#(π1(M, x1)). Alem disso, sem muitas dificuldades, pode-se verificar que os levanta-
mentos f : M −→ N e g : M −→ N (de f e g, respectivamente), pelo recobrimento
q : N −→ N, sao propriamente homotopicos, isto e, existe uma homotopia propria
H : (M × I, ∂M × I) −→ (N, ∂N) entre f e g (basta tomar H como sendo o levantamento
de H relativamente a q, observando que o fato de H ser propria nos garante que H
tambem o e). Deste modo, segue que as aplicacoes f ap :aM −→ N e q ap :
aM −→ N sao
propriamente homotopicas, e, portanto (por um raciocınio analogo ao que utilizamos
acima), o recobrimento q′ : N′ −→ N associado ao subgrupo ( f ap)#(π1(aM,ax0)) ⊆ π1(N, c)
coincide com o recobrimento de N associado ao subgrupo (q ap)#(π1(aM,ax1)) ⊆ π1(N, c),
onde ax1 ∈ap−1(x1). Daı, segue que os levantamentos
af :aM −→ N′ e aq :
aM −→ N′,
de f ap e q ap, respectivamente, relativos a q′ : N′ −→ N, tambem sao propriamente
homotopicos, o que (pela proposicao 1.4.5) nos permite concluir que deg(af ) = deg(aq)
e deg( f , 2) = deg(g, 2), desde que estes numeros estejam bem definidos. Portanto, dos
teoremas 2.3.1 e 2.3.2, obtemos que N( f , c) = N(g; c) e N∩( f , c) = N∩(g; c), ou seja, o
numeros de Nielsen N( f , c) e N∩( f , c) sao invariantes por homotopias proprias.
Finalmente, para mostrarmos que N( f , c) e N∩( f , c) nao dependem da escolha do
ponto c ∈ Int N, basta observarmos que, para quaisquer c1, c2 ∈ Int N, a cardinalidade
dos conjuntos q−1(c1) e q−1(c2) e a mesma (uma vez que N e uma variedade topologica
conexa), alem do que, os graus cohomologicos deg(af ) e deg( f , 2) sao independentes de
c ∈ Int N; logo, pelos teoremas 2.3.1 e 2.3.2, segue que os numeros de Nielsen N( f , c) e
N∩( f , c) sao, de fato, independentes de c ∈ Int N.
Definicao 2.3.4 . Dadas aplicacoes contınuas proprias f , g : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), entre
variedades topologicas conexas de mesma dimensao n, escreveremos f ∼p g para indicar que f
e g sao propriamente homotopicas. Alem disso, dado c ∈ Int N, denotaremos por MR[ f ; c] o
numero mınimo de raızes na classe de homotopia propria de f , ou seja:
MR[ f ; c] = minnumero de raızes de g em c : g ∼p f .
Definimos ainda o numero mınimo transverso de raızes, denotado por MR∩[ f ; c], como
sendo o menor numero de raızes na classe de homotopia propria de f , com a restricao de que as
106 Teoria de Nielsen de Raızes
aplicacoes g : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), tais que g ∼p f , sejam transversas a c, isto e:
MR∩[ f ; c] = minnumero de raızes de g em c : g ∼p f e g e transversa a c .
Como consequencia imediata do corolario 2.3.2, segue que, se f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N)
e uma aplicacao contınua propria e c ∈ Int N, entao N( f , c) 6 MR[ f ; c] e N∩( f , c) 6
MR∩[ f ; c]. Na proxima secao, veremos que, se a dimensao das variedades M e N
for diferente de 2, os numeros de Nielsen N( f , c) e N∩( f , c) sao realizaveis, ou seja,
existem aplicacoes contınuas proprias g, g′ : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), com g ∼p f , g′ ∼p f e g′
transversa a c, tais que as cardinalidades de g−1(c) e g′−1(c) sao respectivamente iguais
a N( f , c) e N∩( f , c), o que mostrara que N( f , c) =MR[ f ; c] e N∩( f , c) =MR∩[ f ; c].
Entretanto, antes de encerrarmos esta secao, convem apresentarmos alguns exem-
plos que ilustrem os calculos dos numeros de Nielsen; em particular, os tres primeiros
exemplos a seguir mostram, inclusive, que os numeros de Nielsen sao realizaveis para
alguns tipos especıficos de aplicacoes entre variedades de dimensao 1.
Exemplo 2.3.2 . Dada uma aplicacao contınua propria f : R −→ R, seja c ∈ R tal que
f−1(c) , ∅; temos entao que f−1(c) e um subconjunto compacto deR, o que implica que
existe um intervalo aberto ]a, b[⊆ R (com a < b, obviamente), tal que f−1(c) ⊆]a, b[. Isto
posto, considere a aplicacao g : R −→ R dada por:
g(x) =
f (x) se x ∈ Rr]a, b[[f (a) − f (b)
a − b
]· x +
[a · f (b) − b · f (a)
a − b
]se x ∈]a, b[
.
Sem muitas dificuldades, pode-se ver que g esta bem definida e e contınua emR, sendo
que o grafico da restricao g |[a,b] e o segmento de reta que liga os pontos (a, f (a)) e (b, f (b)),
conforme ilustra a figura 2.3 (note que a, b < f−1(c), pois f−1(c) e um subconjunto fechado
de R, contido no aberto ]a, b[). Alem disso, temos que g tambem e uma aplicacao
propria, uma vez que f e propria e g coincide com f exceto no conjunto compacto
[a, b] ⊆ R.
Agora, denotando por ϕ : [a, b] −→ [ f (a), f (b)] o homeomorfismo dado por
ϕ(x) =
[f (a) − f (b)
a − b
]· x +
[a · f (b) − b · f (a)
a − b
],
observe que a aplicacao h : [a, b] × I −→ R, definida por
h(x, t) = t · ϕ(x) + (1 − t) · f (x)
para cada (x, t) ∈ [a, b]× I, constitui uma homotopia entre a restricao f |[a,b] e o segmento
de reta dado por ϕ : [a, b] −→ R; como [a, b] × I e compacto, temos ainda que h e uma
2.3 Os Numeros de Nielsen de Raızes 107
homotopia propria. Considere, pois, a aplicacao H : R × I −→ R, definida por:
H(x, t) =
h(x, t) se x ∈ [a, b]
g(x) = f (x) se x ∈ Rr]a, b[.
xa b
c
f (a)
f (b)
y
f
g
Figura 2.3
Como H(a, t) = h(a, t) = f (a) = g(a) e H(b, t) = h(b, t) = f (b) = g(b) para todo t ∈ I,
segue que H encontra-se bem definida e e contınua em R × I; ademais, como
H(x, 0) =
h(x, 0) = f (x) se x ∈ [a, b]
g(x) = f (x) se x ∈ Rr]a, b[= f (x)
e
H(x, 1) =
h(x, 1) = ϕ(x) se x ∈ [a, b]
g(x) = f (x) se x ∈ Rr]a, b[= g(x) ,
temos que H contitui uma homotopia entre f e g, a qual tambem e propria, uma vez
que f , g e h sao aplicacoes proprias.
Finalmente, do corolario 2.3.2, obtemos entao que N( f , c) = N(g, c) e N∩( f , c) =
N∩(g, c). No entanto, note que N(g, c) = N∩(g, c) = 0 ou N(g, c) = N∩(g, c) = 1: com
efeito, se os pontos (a, f (a)) e (b, f (b)) estao localizados no mesmo semi-plano de R2
determinado pela reta y = c, segue que o segmento de reta dado por ϕ : [a, b] −→ R
nao intercepta a reta y = c, o que implica que g nao possuira raızes em c ∈ R (pois,
108 Teoria de Nielsen de Raızes
para x ∈ Rr]a, b[, temos g(x) = f (x), e, portanto, g(x) , c, uma vez que f−1(c) ⊆]a, b[), e,
consequentemente, teremos N(g, c) = N∩(g, c) = 0. Por outro lado, se os pontos (a, f (a))
e (b, f (b)) estao localizados em lados opostos do planoR2, relativamente a reta dada por
y = c, segue que o segmento de reta dado porϕ : [a, b] −→ R intercepta a reta y = c num
unico ponto, o que, por sua vez, significa que g tera exatamente uma raiz em c, a saber,
o ponto z ∈ [a, b] tal que ϕ(z) = c. Neste caso, R = z sera a unica classe de raızes de g
em c, e, denotando por V ⊆ R um intervalo aberto tal que c ∈ V ⊆ [ f (a), f (b)], teremos
que U = ϕ−1(V) ⊆ [a, b] e um intervalo aberto de R, contendo z = ϕ−1(c), que satisfaz
U ∩ g−1(c) = R; logo, como ϕ : [a, b] −→ R e um homeomorfismo sobre [ f (a), f (b)], e
g |U = ϕ |U, segue (da definicao 1.3.7 e do corolario 1.3.1) que:
|m(R)| = |degc(g |U)| = |degc(ϕ |U)| = |±1| = 1 ,
o que (pelas definicoes 2.3.1 e 2.3.3) implica que N(g, c) = N∩(g, c) = 1. Deste modo, se
N( f , c) = N(g, c) e N∩( f , c) = N∩(g, c), com N(g, c) = N∩(g, c) = 0 ou N(g, c) = N∩(g, c) =
1, concluımos que N( f , c) = N∩( f , c) = 0 ou N( f , c) = N∩( f , c) = 1.
Observe ainda que a aplicacao g : R −→ R, utilizada nos calculos dos numeros de
Nielsen N( f , c) e N∩( f , c), e transversa ao ponto c (por vacuidade, caso g nao tenha raızes
em c, ou pelo fato de ϕ = g |[a,b] ser um homeomorfismo sobre [ f (a), f (b)], se g possuir
uma unica raiz z ∈ [a, b] em c); assim, para toda aplicacao contınua propria f : R −→ R
e todo ponto c ∈ R, os numeros de Nielsen N( f , c) e N∩( f , c), ambos iguais a zero ou
ambos iguais a 1, sao realizados por uma aplicacao contınua propria g : R −→ R, que
e transversa a c e propriamente homotopica a f .
Exemplo 2.3.3 . Seja f : S1 −→ R uma aplicacao contınua qualquer, e consideremos um
ponto c ∈ R tal que f−1(c) , ∅; como S1 e compacto e R e um espaco de Hausdorff,
segue (do exemplo 1.3.2) que f e uma aplicacao propria. Alem disso, comoR e contratil,
temos que f e homotopica a qualquer outra aplicacao g : S1 −→ R, sendo que toda
homotopia H : S1 × I −→ R entre f e g tambem sera propria. Isto posto, dado c′ ∈ R
tal que c′ , c, considere a aplicacao (contınua e propria) g : S1 −→ R dada por g(z) = c′
para todo z ∈ S1; como g nao possui raızes em c, temos de imediato que g e transversa
a c, e N(g, c) = N∩(g, c) = 0. Logo, como g e propriamente homotopica a f , concluımos
(do corolario 2.3.2) que N( f , c) = N∩( f , c) = 0.
Exemplo 2.3.4 . Sendo S1 a circunferencia unitaria no plano complexo, considere uma
aplicacao contınua f : S1 −→ S1; como S1 e uma variedade topologica compacta, segue
(do exemplo 1.3.2) que f e uma aplicacao propria. Alem disso, sabemos tambem que,
qualquer que seja f : S1 −→ S1, existe um inteiro r > 0 tal que f e homotopica a aplicacao
2.3 Os Numeros de Nielsen de Raızes 109
g : S1 −→ S1, dada por g(z) = zr para cada z ∈ S1 (vide [Sp], lema 13, pagina 55), sendo
que r , 0 se, e somente se, f−1(z) , ∅ para todo z ∈ S1. Agora, utilizando o conceito de
grau introduzido no exemplo 1.3.7, segue que d(g) = d( f ) = r (conforme nos garante o
corolario 4.7, pagina 65, de [D]), e, consequentemente, (do teorema 1.4.2, da proposicao
1.3.4 e do exemplo 1.3.7), temos que o grau cohomologico de g e:
deg(g) = degc(g) = degS1(g) = d(g) = r ,
para qualquer que seja c ∈ S1. Logo, como toda homotopia H : S1 × I −→ S1, entre f
e g, e uma aplicacao propria (pois S1 × I e compacto), segue, do corolario 1.4.1 e da
proposicao 1.4.5, que:
N∩( f , c) = |deg( f )| = |deg(g)| = r ,
onde c ∈ S1 e arbitrario. Por outro lado, suponhamos que r , 0 (pois, caso contrario,
temos deg( f ) = deg(g) = r = 0, o que, pelo corolario 2.3.1, implica de imediato que
N( f , c) = 0); do exemplo 1.3.5, segue entao que o conjunto das raızes de g num ponto
c ∈ S1 e:
g−1(c) =
exp
(2πik
r
): k = 1, 2, . . . , r
,
sendo que cada z ∈ g−1(c) constitui, por si so, uma classe de raızes de g em c. Isto posto,
observe que g e transversa a c, pois constitui um recobrimento de r folhas (vide [Li],
exemplo 6, pagina 122); assim, considere uma vizinhanca euclidiana V ⊆ S1 de c, tal
que g−1(V) e a uniao disjunta de vizinhancas euclidianas U1, U2, . . ., Ur, cada uma das
quais contem um unico ponto de g−1(c), e e levada homeomorficamente por g sobre V.
Do corolario 1.3.1 e da definicao 1.3.7, temos que a multiplicidade de uma classe de
raızes R = z, com z ∈ Ui ∩ g−1(c) para algum i ∈ 1, 2, . . . , r, e:
|m(R)| = |degc(g |Ui)| = |±1| = 1 .
Portanto, do teorema 2.1.2, segue que todas as r classes de raızes de g em c tem
multiplicidade igual a 1 (ou seja, sao todas classes de raızes essenciais), o que, pelo
corolario 2.3.2, implica que N( f , c) = N(g, c) = r. Deste modo, concluımos que, para
toda aplicacao contınua (propria) f : S1 −→ S1 e todo ponto c ∈ S1, tem-se N( f , c) =
N∩( f , c) = r, onde r = d( f ).
Exemplo 2.3.5 . Dado n > 2, seja f : Sn −→ Sn uma aplicacao contınua de grau d( f ) , 0.
Pelo que vimos no exemplo 1.3.7, o grau de f coincide com o grau local de f em Sn;
por outro lado, como Sn e uma variedade topologica compacta, conexa, orientavel e
sem fronteira, temos que f e uma aplicacao propria, e degSn( f ) = degc( f ), qualquer que
110 Teoria de Nielsen de Raızes
seja c ∈ Sn (vide exemplo 1.3.2 e proposicao 1.3.4). Assim, como W = Sn r f−1(∂Sn) =
Sn r f−1(∅) = Sn, segue (do teorema 1.4.2) que o grau cohomologico deg( f ) e tal que
deg( f ) = d( f ) , 0. Agora, observe que, como Sn e simplesmente conexa para n > 2,
temos queπ1(Sn, x0) ≃ 0 para qualquer x0 ∈ f−1(c); logo, f#(π1(Sn, x0)) ≃ 0, o que, pelo
fato de q : N −→ Sn ser o recobrimento de Sn associado ao subgrupo f#(π1(Sn, x0)) ⊆
π1(Sn, c), implica que q#(π1(N, c)) = f#(π1(Sn, x0)) ≃ 0. Consequentemente, como o
homomorfismo q# : π1(N, c) −→ π1(Sn, c) e injetivo, segue que π1(N, c) ≃ 0, ou seja, N
e simplesmente conexo. Deste modo, concluımos que N e o espaco de recobrimento
universal de Sn, que, a menos de homeomorfismos, coincide com Sn (vide [Bd], corolario
4.6, pagina 145). Portanto, q : N = Sn −→ Sn e um recobrimento de uma unica folha
(isto e, um homeomorfismo), o que significa que a cardinalidade j de q−1(c) e igual a 1.
Logo, do corolario 2.3.1, obtemos que N( f , c) = 1 e N∩( f , c) = |d( f )|; em particular, se
|d( f )| > 1, temos N∩( f , c) N( f , c).
Exemplo 2.3.6 . Generalizando o exemplo anterior, segue (do corolario 2.3.1) que
N∩( f , c) = |deg( f )| e estritamente maior que N( f , c) = 1, para toda aplicacao contınua
propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), entre variedades topologicas orientaveis de mesma
dimensao, desde que o homomorfismo induzido f# : π1(M, x0) −→ π1(N, c) seja sobreje-
tivo (onde c ∈ Int N e x0 ∈ f−1(c)) e |deg( f )| > 1 (note que, se f# e sobrejetivo, temos que
q#(π1(N, c)) = f#(π1(M, x0)) = π1(N, c), ou seja, o homomorfismo q# : π1(N, c) −→ π1(N, c),
alem de injetivo, tambem e sobrejetivo, o que mostra que, neste caso, o recobrimento
q : N −→ N e um homeomorfismo, e, portanto, a cardinalidade j = N( f , c) de q−1(c) e
igual a 1).
Exemplo 2.3.7 . Sendo g : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria, entre
variedades topologicas conexas de mesma dimensao n, considere uma outra variedade
topologica conexa X, tambem de dimensao n (com ou sem fronteira), e denote por
f : M × X −→ N × X a aplicacao contınua dada por f = g × Id, onde Id : X −→ X
e a identidade (isto e, f (x0, x) = (g(x0), x) para cada (x0, x) ∈ M × X). Utilizando
diretamente as definicoes dos numeros de Nielsen de raızes, pode-se demonstrar que
N( f , c) = N(g, c′) e N∩( f , c) = N∩(g, c′), onde c = (c′, c′′) ∈ Int N × Int X (vide [BBS],
teorema 2.1, paginas 9 e 10). Em particular, se f : S2 × RP2 −→ S2 × RP2 e a aplicacao
dada por f = g × Id, onde Id : RP2 −→ RP2 e a identidade e g : S2 −→ S2 e uma
aplicacao contınua de grau d(g) = d, com |d| > 1, temos que N( f , c) = N(g, c′) = 1 e
N∩( f , c) = N∩(g, c′) = |d| > 1 para qualquer que seja c = (c′, c′′) ∈ S2 ×RP2 (note que g e
uma aplicacao propria tal que N(g, c′) = 1 e N∩(g, c′) = |d|, conforme vimos no exemplo
2.3.5).
2.3 Os Numeros de Nielsen de Raızes 111
Exemplo 2.3.8 . Dada uma variedade topologica conexa N, sem fronteira e nao-orienta-
vel, seja f : M −→ N o recobrimento orientado de N (de modo que M constitui uma
variedade topologica conexa, orientavel e sem fronteira), e considere o recobrimento
q : N −→ N associado ao subgrupo f#(π1(M, x0)) ⊆ π1(N, c), onde c ∈ N e x0 ∈ f−1(c).
Denote ainda por f : M −→ N o levantamento de f , relativamente ao recobrimento q,
tal que f (x0) = c, onde c ∈ q−1(c). Como f = q f e q#(π1(N, c)) = f#(π1(M, x0)), temos
que:
(q# f#)(π1(M, x0)) = (q f )#(π1(M, x0)) = f#(π1(M, x0)) = q#(π1(N, c)) .
Logo, como o homomorfismo q# : π1(N, c) −→ π1(N, c), induzido pelo recobrimento
q : N −→ N, e injetivo, obtemos que f#(π1(M, x0)) = π1(N, c), isto e, o homomorfismo
f# : π1(M, x0) −→ π1(N, c) e sobrejetivo. Consequentemente, temos que f : M −→ N
e um homeomorfismo (vide corolario da pagina 162 de [Li]), e, portanto, |deg( f )| = 1
(note que, pelo fato de f ser um homeomorfismo e M ser orientavel, temos que N
tambem e orientavel, o que nos garante que o grau cohomologico deg( f ) encontra-se
bem definido). Agora, da orientabilidade de M, segue que o recobrimento orientado
de M, ap :aM −→M, e a identidade (isto e,
aM =M); por conseguinte, dado c′ ∈ (q′)−1(c′),
onde q′ : N′ −→ N e o recobrimento de N associado ao subgrupo (ap f )#(π1(aM, x0)) =
f#(π1(M, x0)) = π1(N, c), temos que:
q′#(π1(N′, c′)) = f#(π1(M, x0)) = π1(N, c) ,
ou seja, q′# : π1(N′, c′) −→ π1(N, c) e um homomorfismo sobrejetivo, o que, conforme
vimos na demonstracao do corolario 2.3.1, implica que q′ e um recobrimento de uma
unica folha. Assim, temos que q′ : N′ −→ N tambem e um homeomorfismo, d’onde
segue que N′ e orientavel e |deg(q′)| = 1. Deste modo, denotando poraf :aM = M −→ N′
o levantamento de f ap = f , relativamente ao recobrimento q′, tal queaf (x0) = c′,
obtemos (da proposicao 1.4.6) que:
1 = |deg( f )| = |deg(q′ af )| = |deg(q′)| · |deg(
af )| = 1 · |deg(
af )| ,
isto e, |deg(af )| = 1. Finalmente, como f : M −→ N e uma aplicacao de recobrimento,
temos (da proposicao 1.1.5) que f e do tipo I; alem disso, como f e um recobrimento de
duas folhas e f e um homeomorfismo, segue que q tambem constitui um recobrimento
de duas folhas, o que significa que a cardinalidade de q−1(c) e j = 2. Logo, utilizando os
teoremas 2.3.1 e 2.3.2, concluımos que N( f , c) = j = 2 e N∩( f , c) = j · |deg(af )| = 2.
Exemplo 2.3.9 . Denotando porK a garrafa de Klein, considere uma aplicacao contınua
f : K −→ K, e sejam c ∈ K e x0 ∈ f−1(c); como K e uma variedade topologica compacta
nao-orientavel, segue que f e uma aplicacao propria, e (pelo exemplo 19, pagina 179,
112 Teoria de Nielsen de Raızes
de [Li]) existem geradores α, β ∈ π1(K, x0) que satisfazem a relacao α ∗ β = β−1 ∗α. Alem
disso, da proposicao 6.4 de [BO] (paginas 416 e 417), sabemos que existem b, d, e ∈ Z
tais que f#(α) = αb ∗ βd, f#(β) = βe e N( f , c) = |b · e|, com e = 0 se, e somente se, |b| for um
numero par. Assim, supondo e , 0, temos que |b| e ımpar, e, portanto, N( f , c) = |b ·e| , 0;
cosequentemente, utilizando o diagrama ilustrado na figura 2.2 (com M = N = K), e
denotando por j a cardinalidade de q−1(c), o teorema 2.3.1 nos garante que f nao e do
tipo II, e j = N( f , c) = |b · e|. Por outro lado, se e , 0, a demonstracao da proposicao
6.4 de [BO] nos mostra que f# : π1(K, x0) −→ π1(K, c) e um homomorfismo injetivo, ou
seja, Ker( f#) ≃ Z; daı, segue que f nao pode ser do tipo III, pois, neste caso, existiria
um laco que inverte orientacao (e, portanto, nao-contratil) que e levado por f num laco
contratil em c (lembre-se que [ω] ∈ Ker( f#) se, e so se, f ω e um laco contratil em c).
Deste modo, se e , 0, segue que f : K −→ K e uma aplicacao do tipo I. Isto posto,
vamos mostrar que |deg(af )| = 1 (vide diagrama da figura 2.2).
Primeiramente, note que, como f : M = K −→ N = K e fiel a orientacao e K e
nao-orientavel, entao N tambem e nao-orientavel: com efeito, sendo ω : I −→ M = K
um laco que inverte orientacao, temos que f ω = q f ω : I −→ N = K e um laco que
inverte orientacao; consequentemente, como q : N −→ N e do tipo I (pois constitui uma
aplicacao de recobrimento), segue que f ω : I −→ N e um laco que inverte orientacao,
o que, pela proposicao 1.1.3, implica que N e nao-orientavel. Agora, observe que
q′ : N′ −→ N e um recobrimento de duas folhas: de fato, sendo ω : I −→ N um laco
(com base em c) tal que [ω] ∈ q′#(π1(N′, c′)), temos que ω preserva orientacao, pois,
pelo corolario 2.3.1, sabemos que N′ e orientavel (e, portanto, todo laco em N′ preserva
orientacao), enquanto que, por ser uma aplicacao de recobrimento, q′ : N′ −→ N e fiel
a orientacao; logo, denotando por q : N −→ N o recobrimento orientado de N (o qual
possui duas folhas, uma vez que N e nao-orientavel), segue que ω pode ser levantado
para um laco ω : I −→ N relativamente a q′, o que implica que [ω] ∈ q#(π1(N, c)), onde
c = ω(0) ∈ q−1(c). Deste modo, temos que q′#(π1(N′, c′)) ⊆ q#(π1(N, c)), e, por conseguinte
(da proposicao 8, pagina 162, de [Li]), existe uma aplicacao contınua q′ : N′ −→ N, com
q′(c′) = c, que torna comutativo o seguinte diagrama:
N
N′ N
aM M
q′
q′
q
af
ap
f
2.3 Os Numeros de Nielsen de Raızes 113
Em contrapartida, sendo γ : I −→ N um laco tal que [γ] ∈ q#(π1(N, c)) ⊆ π1(N, c),
temos que γ preserva orientacao (uma vez que q e fiel a orientacao e N e orientavel).
No entanto, como q#(π1(N, c)) = f#(π1(M, x0)) e f = q f , segue que q#( f#(π1(M, x0))) =
f#(π1(M, x0)) = q#(π1(N, c)), ou seja, f# : π1(M, x0) −→ π1(N, c) e um homomorfismo
sobrejetivo (pois q# e injetivo); logo, como f : M −→ N e fiel a orientacao (conforme
vimos na demonstracao do corolario 2.2.1), segue que [γ] = f#([γ]), onde γ : I −→ M
e um laco com base em x0 que preserva orientacao. Consequentemente, γ pode ser
levantado para um lacoaγ : I −→aM relativamente ao recobrimento orientadoap :
aM −→
M; assim, considerando o laco γ′ : I −→ N′ dado por γ′ =af aγ, temos que:
q′#([γ′]) = [q′ γ′] = [q′ (af aγ)] = [ f (ap aγ)] = [ f γ] = f#([γ]) = [γ] ,
isto e, [γ] ∈ q′#(π1(N′, c′)). Daı, concluımos que q#(π1(N, c)) ⊆ q′#(π1(N′, c′)), e, por-
tanto, q#(π1(N, c)) = q′#(π1(N′, c′)), o que significa que a aplicacao q′ : N′ −→ N e um
homeomorfismo, provando que q′ = q q′ e um recobrimento de duas folhas.
Agora, denotando por q : N′ −→ N o recobrimento dado por q = q q′, note que a
cardinalidade de q−1(c) e igual a 2 · j = 2 · |b · e|, pois q−1(c) = (q′)−1(q−1(c)), sendo que
q−1(c) possui cardinalidade j = |b · e| e q′ : N′ −→ N e um recobrimento duplo de N.
Isto posto, seja q0 : N0 −→ N = K o recobrimento orientado de K (isto e, q0 = ap); se
ω : I −→ N e uma laco tal que [ω] ∈ q#(π1(N′, c′)), segue queω preserva orientacao (pois
N′ e orientavel e o recobrimento q = q q′ : N′ −→ N e uma aplicacao fiel a orientacao),
e, portanto, ω pode ser levantado para um laco ω0 : I −→ N0 relativamente a q0. Assim,
temos que [ω] ∈ q0#(π1(N0, c0)), onde c0 ∈ (q0)−1(c), isto e, q#(π1(N′, c′)) ⊆ q0
#(π1(N0, c0)),
o que (pela proposicao 8, pagina 162, de [Li]) significa que existe um recobrimento∨
q : N′ −→ N0, com∨
q(c′) = c0, que comuta o seguinte diagrama:
aM N′
M N N0
N
af
ap q′
f
fq
∨
q
q0
Como q−1(c) possui cardinalidade 2 · |b · e|, e q0 : N0 −→ N e um recobrimento de duas
folhas, com q = q0 ∨
q, segue que∨
q : N′ −→ N0 e um recobrimento de |b · e| folhas; logo,
lembrando que N′ e N0 sao variedades topologicas conexas, orientaveis e sem fronteira
(de modo, que o grau cohomologico deg(∨
q) encontra-se bem definido), obtemos, do
114 Teoria de Nielsen de Raızes
teorema 1.4.2 e do corolario 1.3.2, que:
|deg(∨
q)| = |degc0(∨
q)| = |b · e| .
Finalmente, observe entao que a comutatividade do diagrama acima nos garante que a
aplicacao f 0 :aM −→ N0, dada por f 0 =
∨
q af , satisfaz f ap = q0 f 0; consequentemente
da demonstracao da proposicao 6.4 de [BO], temos que deg( f 0) = b · e (note queaM e N0
sao orientaveis), e, portanto (utilizando a proposicao 1.4.6), concluımos que:
|b · e| = |deg( f 0)| = |deg(∨
q)| · |deg(af )| = |b · e| · |deg(
af )| ,
ou seja, |deg(af )| = 1, conforme querıamos provar.
Deste modo, como f : M = K −→ N = K e uma aplicacao contınua propria do tipo
I, com j = |b · e| e |deg(af )| = 1, segue (do teorema 2.3.2) que:
N∩( f , c) = j · |deg(af )| = |b · e| = N( f , c) .
Exemplo 2.3.10 . Denotando por T2 o toro, considere uma aplicacao contınua f :
T2 −→ T2, e sejam c ∈ T2 e x0 ∈ f−1(c); como T2 e uma variedade topologica compacta
e orientavel, temos que f e uma aplicacao propria do tipo I. Lembrando que H1(T2) ≃
Z ⊕Z, seja ainda A = ai j a matriz quadrada de ordem 2 do homomorfismo induzido
( f∗)1 : H1(T2) −→ H1(T2), relativamente a uma base B = b1, b2 de H1(T2); do exemplo
4.26 de [Bk3] (paginas 402 e 403), temos que deg( f ) = det A e N( f , c) = |det A|. Logo, do
corolario 2.3.1, obtemos que N∩( f , c) = N( f , c) = |det A|.
Exemplo 2.3.11 . Seja f : T2#RP2 −→ T2 a aplicacao contınua (propria) dada no item
(b) do exemplo 1.2.3, e considere um ponto c ∈ T2rD1. Como D1 e contratil, segue que
todo laco ω : I −→ T2, com base em c, e homotopico a um laco ω′ : I −→ T2 r Int D1;
logo, como f coincide com a aplicacao identidade Id : T2 r Int D1 −→ T2 r Int D1 em
T2 r Int D1, segue que f (c) = c e
f#([ω′]) = [ f ω′] = [ω′] = [ω] ,
onde f# : π1(T2#RP2, c) −→ π1(T2, c) e o homomorfismo induzido por f (note que
[ω′] ∈ π1(T2#RP2, c), pois T2 r Int D1 ⊆ T2#RP2). Daı, obtemos que f#(π1(T2#RP2, c)) =
π1(T2, c) (isto e, f# e um homomorfismo sobrejetivo), o que implica que o recobri-
mento q : N −→ T2, associado ao subgrupo f#(π1(T2#RP2, c)) = π1(T2, c), e um ho-
meomorfismo: com efeito, dado c ∈ N tal que q(c) = c, temos que o homomorfismo
induzido q# : π1(T2#RP2, c) −→ π1(T2, c), alem de injetivo, tambem e sobrejetivo (pois
q#(π1(T2#RP2, c)) = f#(π1(T2#RP2, c)) = π1(T2, c)), e, portanto (do corolario 3, paginas
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 115
152 e 153, de [Li]), o recobrimento q : N −→ T2 constitui um homeomorfismo. Assim,
temos que a cardinalidade j de q−1(c) e igual a 1. Agora, utilizando coeficientes em Z2
a fim de orientar T2#RP2 e T2, observe que deg( f , 2) = 1: de fato, pelo teorema 1.4.2,
temos que deg( f , 2) = degc( f ), onde degc( f ) e o grau local de f em c a coeficientes
em Z2; logo, como f |T2rInt D1e a identidade e c = f (c) ∈ T2 r D1 ⊆ T
2 r Int D1, segue
que degc( f ) = 1, e, portanto, deg( f , 2) = 1. Ora, se deg( f , 2) = 1 e o recobrimento
q : N −→ T2 e um homeomorfismo, segue que o grau cohomologico a coeficientes em
Z2, do levantamento f : T2#RP2 −→ N de f , relativamente a q, e deg( f , 2) = 1, uma
vez que deg( f , 2) = deg(g, 2) ·deg( f , 2) e deg(g, 2) = 1 (vide corolario 1.4.1 e proposicao
1.4.6). Deste modo, como f : T2#RP2 −→ T2 e uma aplicacao contınua propria do tipo
III (vide item (b) do exemplo 1.2.3), com j = 1 e deg( f , 2) = 1, temos, dos teoremas 2.3.1
e 2.3.2, que N( f , c) = j = 1 e N∩( f , c) = j · deg( f , 2) = 1.
Conforme mencionamos na secao anterior, vamos mostrar agora que, dada uma
aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e um ponto c ∈ Int N, os numeros
de Nielsen N( f , c) e N∩( f , c) sao realizaveis, isto e, N( f , c) = MR[ f ; c] e N∩( f , c) =
MR∩[ f ; c]. Para tanto, contudo, precisaremos introduzir o conceito de transversalidade
de microfibrados.
Definicao 2.4.1 . Um microfibrado ξ = ξn = (E(ξ),X, rξ), sobre um espaco topologico X
(denominado base), consiste de um espaco total E(ξ) ⊇ X, juntamente com uma retracao
rξ : E(ξ) −→ X (ou seja, uma aplicacao contınua rξ : E(ξ) −→ X satisfazendo rξ(x) = x para
todo x ∈ X ⊆ E(ξ)), tais que:
(i) para cada x ∈ X, o conjunto ξx = r−1ξ
(x), denominado fibra de ξ sobre x, e uma variedade
topologica de dimensao n, sem fronteira;
(ii) para cada x ∈ X, existem uma vizinhanca aberta Ux ⊆ X de x, e um homeomorfismo
ϕx : Ux × ξx −→ r−1ξ
(Ux), tais que a aplicacao rξ ϕx : Ux × ξx −→ Ux ⊆ X e a projecao
de Ux × ξx sobre Ux, isto e, (rξ ϕx)(u, y) = u para todo (u, y) ∈ Ux × ξx.
Exemplo 2.4.1 . Remetendo a Teoria dos Espacos Fibrados, lembremos que uma aplica-
cao contınua π : E −→ B (entre espacos topologicos) e um fibrado trivial, com espaco
total E e base B, se existem um espaco topologico F, denominado fibra, e um home-
omorfismo γ : B × F −→ E, tais que a aplicacao π γ : B × F −→ B e a projecao de
116 Teoria de Nielsen de Raızes
B × F sobre B. Deste modo, se ξ = ξn = (E(ξ),X, rξ) e um microfibrado sobre X, entao
rξ : E(ξ) −→ X e localmente um fibrado trivial, pois, para cada x ∈ E(ξ), existe uma
vizinhanca Vx ⊆ E(ξ) de x tal que a restricao rx = rξ |Vx : Vx −→ rξ(Vx) e um fibrado tri-
vial. Em particular, note que todo fibrado trivial π : E −→ B, cujas fibras π−1(x), x ∈ B,
sao variedades topologicas de dimensao n sem fronteira, constitui um microfibrado
sobre B.
x
ξx
X
h−1(P)
E(ξ)
h h
Y
P
E(η)
ηh(x)h(x)
Figura 2.4
Definicao 2.4.2 . Seja (Y,P) um par de espacos topologicos, onde P e um subconjunto fechado de
Y. Dizemos que um microfibrado η = (E(η),P, rη), sobre P, e normal se o espaco total E(η) ⊇ P
e um subconjunto aberto de Y. Alem disso, se X e uma variedade topologica de dimensao m,
sem fronteira, e η = ηn = (E(η),P, rη) e um microfibrado normal sobre P ⊆ E(η) ⊆ Y, dizemos
que uma aplicacao contınua h : X −→ Y e topologicamente transversa a η se h−1(P) ⊆ X
e uma subvariedade topologica (de dimensao ℓ 6 m), que admite um microfibrado normal
ξ = ξn = (X, h−1(P), rξ) satisfazendo a seguinte propriedade: para cada x ∈ h−1(P), existe
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 117
uma vizinhanca aberta Ux de x na fibra ξx, que e levada homeomorficamente por h sobre uma
vizinhanca aberta Uh(x) de h(x) na fibra ηh(x) (vide figura 2.4). Em particular, se h−1(P) = ∅,
consideraremos, por vacuidade, que h : X −→ Y e topologicamente transversa a η.
Na definicao acima, convem observarmos que as dimensoes dos microfibrados η e ξ
tem de ser necessariamente iguais, pois, como Ux ⊆ ξx e uma variedade topologica de
dimensao igual a da fibra ξx, levada homeomorficamente na variedade Uh(x) ⊆ ηh(x) (que,
por sua vez, possui dimensao igual a da fibra ηh(x)), segue, do teorema da invariancia da
dimensao (vide [Bd], corolario 19.10, pagina 235) que Ux e Uh(x) tem a mesma dimensao,
e, consequentemente, as dimensoes de ξx e ηh(x) tambem sao iguais.
A fim de evitarmos uma digressao excessivamente longa, que nos desviaria do obje-
tivo principal desta secao, nao vamos nos deter num estudo mais aprofundado destes
conceitos. Para nossos propositos, convem enunciarmos apenas o seguinte teorema,
cuja demonstracao, por exigir uma gama muito extensa de resultados preliminares,
sera omitida (para mais detalhes, vide [KS], teorema 1.1, paginas 85 a 90, juntamente
com [Sch], teorema 5.3, pagina 10, e [F], teorema 17, pagina 371).
Teorema 2.4.1 . Sejam X, Y e P ⊆ Y variedades topologicas conexas e sem fronteira, cujas
dimensoes m, n e p, respectivamente, satisfazem n + p = m, n > 2 e 2 6 p 6 m, e considere
um microfibrado normal (sobre P) η = ηn = (Y,P, rη), de dimensao igual a de X. Sejam ainda
C,D ⊆ X subconjuntos fechados, e VC,VD ⊆ X vizinhancas abertas de C e D, respectivamente,
e suponha que h : X −→ Y seja uma aplicacao contınua, tal que a restricao h |VC: VC −→ Y e
topologicamente transversa a η. Entao, lembrando que toda variedade topologica e metrizavel,
e denotando por dY : Y −→ R+ uma metrica em Y, segue que, dada uma aplicacao contınua
arbitraria ǫ : X −→ R+, existem uma vizinhanca aberta Vǫ ⊆ X de C ∪ D, bem como uma
homotopia Hǫ : X × I −→ Y, entre h e outra aplicacao contınua h′ : X −→ Y (com Vǫ e Hǫ
dependendo de ǫ), tais que:
(i) Hǫ(x, t) = h(x) para todo x ∈ C ∪ (X r VD) e todo t ∈ I;
(ii) a restricao h′ǫ = h′ |Vǫ: Vǫ −→ Y e topologicamente transversa a η;
(iii) dY(Hǫ(x, t), h(x)) 6 ǫ(x) para todo (x, t) ∈ X × I.
Em outras palavras, existe uma aplicacao contınua h′ : X −→ Y, homotopica a h e topologi-
camente transversa a η numa vizinhanca de C ∪ D, tal que h′ encontra-se “tao proxima” de h
quanto se queira.
Agora, sejam M e N variedades topologicas conexas, de dimensao n e com fronteira
(eventualmente vazias); ao empregarmos o conceito de transversalidade de microfibra-
dos para uma aplicacao contınua propria F : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), teremos de assumir
118 Teoria de Nielsen de Raızes
que F tambem satisfaz F (Int M) ⊆ Int N, sendo que, neste caso, denotaremos por
F 0 : Int M −→ Int N a restricao de F a Int M. Alem disso, dado c ∈ Int N, considerare-
mos (no decorrer desta secao) X = Int M, Y = Int M× Int N e P = Int M× c. Isto posto,
sendo r : Y −→ P a retracao dada por r(x, y) = (x, c) para cada (x, y) ∈ Y = Int M× Int N,
temos que r constitui um fibrado trivial, com espaco total Y, base P e fibra F = Int N
(vide exemplo 2.4.1): com efeito, sendo γ : P × F −→ Y o homeomorfismo definido por
γ(x, c, y) = (x, y) para cada (x, c, y) ∈ P×F = Int M× c × Int N, temos que a composicao
r γ : P × F −→ P e a projecao de P × F sobre P, pois (r γ)(x, c, y) = r(x, y) = (x, c)
para quaisquer (x, c) ∈ P = Int M × c e y ∈ F = Int N. Assim, como P = Int M × c
e um subconjunto fechado de Y = Int M × Int N, e, para cada (x0, c) ∈ P, a imagem
inversa r−1(x0, c) = x0× Int N e uma variedade topologica de dimensao n sem fronteira
(na topologia induzida pela topologia produto de Y = Int M × Int N), segue (pelo que
vimos no exemplo 2.4.1) que r : Y −→ P define um microfibrado normal sobre P, o qual
denotaremos por η = ηn = (Y,P, r).
Observe entao que, se h : X = Int M −→ Y = Int M × Int N e a aplicacao definida
por h = (e,F 0), onde e : Int M −→ Int M e uma aplicacao qualquer, segue que h−1(P) =
F−1(c), pois:
h−1(P) = x ∈ Int M : h(x) = (e(x),F (x)) ∈ P = Int M × c
= x ∈ Int M : F 0(x) = F (x) = c = F−1(c)
(note que F−1(c) ⊆ Int M, uma vez que F (∂M) ⊆ ∂N). Por outro lado, sabemos (por
definicao) que F e transversa a c ∈ Int N se existe uma vizinhanca euclidiana V de c
em Int N, tal que F−1(V) e uma uniao finita e disjunta de vizinhancas euclidianas em
Int M, cada uma das quais e levada homeomorficamente por F sobre V. Assim, temos
que a transversalidade topologica de h ao microfibrado normal η = ηn esta diretamente
relacionada a transversalidade de F em c, conforme nos mostra a seguinte
Proposicao 2.4.1 . Uma aplicacao contınua propria F : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) e
transversa a um ponto c ∈ Int N se, e somente se, existe uma aplicacao contınua e : Int M −→
Int M tal que a aplicacao h : Int M −→ Int M × Int N, dada por h = (e,F 0), e topologicamente
transversa ao microfibrado normal η = ηn.
Demonstracao. Com efeito, suponhamos que exista e : Int M −→ Int M contınua tal
que a aplicacao h = (e,F 0) : Int M −→ Int M × Int N e topologicamente transversa ao
microfibrado normal η = ηn = (Y,P, r); neste caso, temos que h−1(P) = F−1(c) ⊆ Int M e
uma subvariedade topologica de dimensao ℓ 6 n, que admite um microfibrado normal
ξ = ξn = (Int M, h−1(P), rξ) satisfazendo a seguinte propriedade: dado x0 ∈ h−1(P) =
F−1(c) arbitrario, existe uma vizinhanca aberta Ux0de x0 na fibra ξx0
, que e levada
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 119
homeomorficamente por h sobre uma vizinhanca aberta Uh(x0) de h(x0) na fibra ηh(x0).
Ora, se ξ = ξn e um microfibrado normal sobre h−1(P), segue, em particular, que
tanto a fibra ξx0, quanto a vizinhanca aberta Ux0
⊆ ξx0, sao variedades topologicas de
dimensao n (sem fronteira); logo, como Int M ⊇ ξx0e uma variedade de dimensao n,
temos que Ux0e uma vizinhanca aberta de x0 em Int M. Agora, observe que, como a
aplicacao r : Y = Int M × Int N −→ P = Int M × c, dada por r(x, y) = (x, c) para cada
(x, y) ∈ Y = Int M × Int N, e a retracao com a qual se encontra munido o microfibrado
normal η = ηn, temos que:
ηh(x0) = r−1(h(x0)) = r−1(e(x0),F (x0)) = r−1(e(x0), c)
= (x, y) ∈ Int M × Int N : r(x, y) = (e(x0), c)
= (x, y) ∈ Int M × Int N : (x, c) = (e(x0), c)
= e(x0) × Int N ,
qualquer que seja x0 ∈ h−1(P) = F−1(c). Portanto, se Uh(x0) e uma vizinhanca aberta de
h(x0) na fibra ηh(x0), segue que Uh(x0) e da forma e(x0) × Vc, onde Vc e uma vizinhanca
aberta de F (x0) = F 0(x0) = c em Int N. Deste modo, como Ux0e aplicado homeomor-
ficamente por h sobre Uh(x0) = e(x0) × Vc, segue que a aplicacao e : Int M −→ Int M e
constante (e igual a e(x0) ∈ Int M) na vizinhanca Ux0⊆ Int M de x0, e, consequentemente,
F 0 : Int M −→ Int N leva Ux0homeomorficamente sobre Vc. Daı, concluımos que, para
cada x0 ∈ h−1(P) = F−1(c), existe uma vizinhanca aberta Ux0⊆ Int M de x0 que e le-
vada homeomorficamente por F numa vizinhanca aberta Vc ⊆ Int N de F (x0) = c; em
particular, isto significa que h−1(P) = F−1(c) e um conjunto discreto, e, portanto, finito
(uma vez que F−1(c) e compacto). Isto posto, considere h−1(P) = F−1(c) = x1, x2, . . . , xr,
e, para cada i ∈ 1, 2, . . . , r, sejam Ui ⊆ Int M e Vic ⊆ Int N vizinhancas abertas de xi
e F (xi) = c, respectivamente, tais que Ui e levada homeomorficamente por F sobre
Vic; considere ainda W1,W2, . . . ,Wr ⊆ Int M vizinhancas euclidianas tais que, para cada
i ∈ 1, 2, . . . , r, xi ∈ Wi ⊆ Ui e Wi ∩W j = ∅ se j , i. Sendo V ⊆ Int N uma vizinhanca
euclidiana de c, tal que
V ⊆
r⋂
i=1
F (Wi) ⊆
r⋂
i=1
Vic ,
segue que:
F−1(V) =
r⊔
i=1
Vi ,
onde, para cada i ∈ 1, 2, . . . , r, Vi ⊆ Int M e a vizinhanca euclidiana de xi, contida em
Wi, que e levada homeomorficamente por F sobre V (observe que estamos utilizando
o sımbolo ⊔ para denotar uniao disjunta). Em resumo, temos entao que existe uma
120 Teoria de Nielsen de Raızes
vizinhanca euclidiana V de c em Int N, tal que F−1(V) e uma uniao finita e disjunta de
vizinhancas euclidianas em Int M, cada uma das quais e aplicada homeomorficamente
por F sobre V, o que mostra que a aplicacao F : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) e
transversa a c.
Reciprocamente, suponhamos agora que F seja transversa a c ∈ Int N, e seja V ⊆
Int N uma vizinhanca euclidiana de c tal que
F−1(V) =
r⊔
i=1
Vi ,
onde, para cada i ∈ 1, 2, . . . , r, Vi e uma vizinhanca euclidiana em Int M, aplicada
homeomorficamente por F sobre V. Neste caso, temos que cada ponto de F−1(c) esta
contido num unico Vi, onde i ∈ 1, 2, . . . , r, o que implica que F−1(c) e um conjunto
discreto e finito, contendo exatamente r pontos, digamos F−1(c) = x1, x2, . . . , xr, com
xi ∈ Vi para cada i ∈ 1, 2, . . . , r. Isto posto, considere a aplicacao
rξ : F−1(V) =
r⊔
i=1
Vi −→ F−1(c) ,
dada por rξ(x) = xi para cada x ∈ Vi, onde i ∈ 1, 2, . . . , r (note que todo ponto x ∈
F−1(V) esta contido num unico Vi); como rξ(xi) = xi para todo xi ∈ F−1(c), temos que
rξ e uma retracao de F−1(V) sobre F−1(c). Alem disso, dado x ∈ F−1(V), digamos
x ∈ Vi, com i ∈ 1, 2, . . . , r, temos que a aplicacao ϕi : xi × Vi −→ Vi = r−1ξ
(xi), dada
por ϕi(xi, y) = y para cada (xi, y) ∈ xi × Vi, constitui um homeomorfismo tal que a
composicao rξ ϕi : xi ×Vi −→ xi e a projecao de xi ×Vi sobre xi (evidentemente,
estamos supondo F−1(c) munido da topologia discreta, de modo que xi ⊆ F−1(c) e,
portanto, uma vizinhanca aberta de xi = rξ(x) em F−1(c)). Assim, como r−1ξ
(x) = Vi ⊆
Int M e uma variedade topologica de dimensao n (sem fronteira) para todo x ∈ Vi,
e como F−1(V) e um subconjunto aberto de Int M contendo F−1(c), segue que rξ :
F−1(V) −→ F−1(c) define um microfibrado normal sobre F−1(c), o qual denotaremos
por ξ = ξn = (F−1(V),F−1(c), rξ). Isto posto, considere entao uma aplicacao contınua
e : Int M −→ Int M tal que e(Vi) = xi para cada i ∈ 1, 2, . . . , r (tome, por exemplo,
a aplicacao identidade IdM : Int M −→ Int M, e deforme IdM continuamente numa
vizinhanca compacta C deF−1(V) em Int M a fim de obter a aplicacao e : Int M −→ Int M
requerida); sendo h : Int M −→ Int M × Int N a aplicacao dada por h = (e,F 0), sabemos
que h−1(P) = F−1(c), onde P = Int M × c. Logo, como F−1(c) e discreto e finito, temos
que h−1(P) ⊆ Int M e uma subvariedade topologica de dimensao zero. Por outro lado,
lembrando que η = ηn = (Y,P, r) e o microfibrado normal sobre P, com espaco total
Y = Int M × Int N e retracao r : Y −→ P, dada por r(x, y) = (x, c) para cada (x, y) ∈ Y,
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 121
segue que:
ηh(xi) = r−1(h(xi)) = r−1(e(xi),F0(xi)) = r−1(xi, c) = xi × Int N
para todo xi ∈ h−1(P) = F−1(c). Deste modo, como V ⊆ Int N e uma vizinhanca
euclidiana de c, temos que o conjunto Vic = xi × V e uma vizinhanca aberta de
h(xi) = (xi, c) na fibra ηh(xi); ademais, como ξxi= r−1
ξ(xi) = Vi, segue que Vi e uma
vizinhanca aberta de xi na fibra ξxi. Consequentemente, como F leva Vi ⊆ Int M
homeomorficamente sobre V ⊆ Int N, e a aplicacao e : Int M −→ Int M e constante e
igual a xi em Vi, temos que Vi e aplicado homeomorficamente por h = (e,F 0) sobre
Vic = xi × V. Portanto, para todo xi ∈ h−1(P) = F−1(c) = x1, x2, . . . , xr, existe uma
vizinhanca aberta Vxide xi na fibra ξxi
que e levada homeomorficamente por h = (e,F 0)
numa vizinhanca aberta Vic de h(xi) = (xi, c) na fibra ηh(xi), d’onde concluımos que a
aplicacao h = (e,F 0) : Int M −→ Int M×Int N e topologicamente tranversa a c, conforme
querıamos provar.
Isto posto, seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria (entre va-
riedades topologicas conexas de dimensao n), e considere um ponto c ∈ Int N. Mais
adiante, veremos que a etapa mais importante na demonstracao de que os numeros
de Nielsen N( f , c) e N∩( f , c) sao realizaveis, consiste de “criar” e “remover” pontos de
f−1(c), por meio de homotopias proprias, a fim de encontrarmos aplicacoes contınuas
g, g′ : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), propriamente homotopicas a f , que possuem respecti-
vamente N( f , c) e N∩( f , c) raızes em c. Para descrevermos as condicoes em que tais
procedimentos sao possıveis, precisaremos introduzir o conceito de Nielsen-relacao.
Definicao 2.4.3 . Sejam X, Y e P ⊆ Y variedades topologicas conexas, e considere uma aplicacao
contınua h : X −→ Y. Dados dois pontos x1, x2 ∈ h−1(P), dizemos que x1 e x2 estao Nielsen-
relacionados, e escrevemos x1 ∼N x2, se existe um caminho ω : I −→ X, com ω(0) = x1 e
ω(1) = x2, tal que h ω : I −→ Y e homotopico a um caminho em P; neste caso, dizemos ainda
que ω Nielsen-relaciona os pontos x1 e x2.
O proximo lema nos mostra que, para aplicacoes da forma h = (e,F 0) : Int M −→
Int M × Int N, onde e : Int M −→ Int M e F : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) sao
aplicacoes contınuas quaisquer, o conceito de Nielsen-relacao, para pontos na imagem
inversa h−1(Int M × c), com c ∈ Int N, equivale a relacao de pertencer a mesma classe
de raızes de F em c.
Lema 2.4.1 . Seja F : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) uma aplicacao contınua (entre
variedades topologicas conexas de mesma dimensao n), e considere um ponto c ∈ Int N. Sendo
122 Teoria de Nielsen de Raızes
h : X = Int M −→ Y = Int M×Int N a aplicacao dada por h = (e,F 0), onde e : Int M −→ Int M
e uma aplicacao contınua qualquer, e denotando por P = Int M×c ⊆ Y, temos que dois pontos
x1, x2 ∈ h−1(P) estao Nielsen-relacionados se, e somente se, eles pertencem a mesma classe de
raızes de F em c.
Demonstracao. Com efeito, se x1, x2 ∈ R, onde R e uma classe de raızes de F em c,
segue (por definicao) que existe um caminho ω : I −→ Int M, com ω(0) = x1 e ω(1) = x2,
tal que F ω : I −→ Int N e um laco contratil em c. Seja, pois, H : I × I −→ Int N
uma homotopia entre F ω e o caminho constante ǫc : I −→ c ⊆ Int N (isto e,
H : I×I −→ Int N e uma aplicacao contınua tal que H(s, 0) = (Fω)(0), H(s, 1) = ǫc(s) = c,
H(0, t) = (F ω)(0) = ǫc(0) = c e H(1, t) = (F ω)(1) = ǫc(1) = c, para quaisquer
(s, t) ∈ I× I), e considere o caminho λ : I −→ P = Int M× c dado por λ(t) = ((e ω)(t), c)
para cada t ∈ I. Sendo K : I × I −→ Y = Int M × Int N a aplicacao contınua definida por
K(s, t) = ((e ω)(s),H(s, t)) para cada (s, t) ∈ I × I, temos entao que K e uma homotopia
entre os caminhos h ω : I −→ Y e λ : I −→ P, uma vez que:
K(s, 0) = ((e ω)(s),H(s, 0)) = ((e ω)(s), (F ω)(s)) = (h ω)(s) ,
K(s, 1) = ((e ω)(s),H(s, 1)) = ((e ω)(s), c) = λ(s) ,
K(0, t) = ((e ω)(0),H(0, t)) = ((e ω)(0), (F ω)(0)) = (h ω)(0) = λ(0) e
K(1, t) = ((e ω)(1),H(1, t)) = ((e ω)(1), (F ω)(1)) = (h ω)(1) = λ(1) ,
quaisquer que sejam s, t ∈ I. Logo, temos que o caminho h ω : I −→ Y e homotopico
a um caminho em P, o que implica que ω Nielsen-relaciona os pontos x1 e x2, isto e,
x1 ∼N x2.
Reciprocamente, suponhamos que x1, x2 ∈ h−1(P) sejam tais que x1 ∼N x2; neste caso,
segue que existe um caminho ω : I −→ Int M, com ω(0) = x1 e ω(1) = x2, tal que
h ω : I −→ Y = Int M × Int N e homotopico a um caminho em P = Int M × c,
digamos λ = (λ1, c) : I −→ Int M × c, com λ1 : I −→ Int M. Por outro lado, se
x1, x2 ∈ h−1(P) ⊆ Int M, temos que h(x1) = (e(x1),F (x1)) e h(x2) = (e(x2),F (x2)) pertencem
a P = Int M × c, isto e, F (x1) = F (x2) = c; logo, F ω : I −→ Int M e um laco com
base em c = (F ω)(0) = (F ω)(1). Agora, considere uma homotopia H : I × I −→
Y = Int M × Int N entre h ω = (e ω,F ω) e λ = (λ1, c); temos entao que H e
uma aplicacao contınua tal que H(s, 0) = (h ω)(s) = ((e ω)(s), (F ω)(s)), H(s, 1) =
λ(s) = (λ1(s), c), H(0, t) = (h ω)(0) = λ(0) e H(1, t) = (h ω)(1) = λ(1), para quaisquer
(s, t) ∈ I × I. Consequentemente, denotando por πN : Int M × Int N −→ Int N a projecao
de Int M × Int N sobre Int N (dada por πN(x, y) = y para cada (x, y) ∈ Int M × Int N),
segue que a aplicacao K = πN H : I × I −→ Int N e contınua e satisfaz:
K(s, 0) = (πN H)(s, 0) = πN((e ω)(s), (F ω)(s)) = (F ω)(s) ,
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 123
K(s, 1) = (πN H)(s, 1) = πN(λ1(s), c) = c ,
K(0, t) = (πN H)(0, t) = πN(λ(0)) = πN(λ1(0), c) = c = (F ω)(0) e
K(1, t) = (πN H)(1, t) = πN(λ(1)) = πN(λ1(1), c) = c = (F ω)(1) ,
para todo (s, t) ∈ I × I. Deste modo, concluımos que K e uma homotopia entre o laco
F ω : I −→ Int N e o caminho constante ǫc : I −→ c ⊆ Int N, ou seja, F ω e um laco
contratil em c, o que prova que x1 e x2 pertencem a uma mesma classe de raızes de F
em c.
Isto posto, lembremos entao que, dada uma variedade topologica X, de dimensao
n, definimos uma orientacao local de X num ponto x ∈ Int X como sendo um gerador
O(x) de Hn(X,X r x) ≃ Z. Considere, pois, h : X −→ Y uma aplicacao contınua
entre variedades topologicas conexas e sem fronteira, e seja P uma subvariedade to-
pologica conexa de Y. Suponha ainda que as dimensoes n,m, p > 0 de X, Y e P ⊆ Y,
respectivamente, satisfacam n + p = m e p < m (de modo que P e, portanto, um sub-
conjunto fechado de Y), e considere um microfibrado normal δ = δn = (Y,P, rδ), de
dimensao igual a de X, tal que h : X −→ Y e topologicamente transversa a δ. Isto
significa que h−1(P) e uma subvariedade topologica de X, de dimensao ℓ 6 n, que
admite um microfibrado normal ξ = ξn = (X, h−1(P), rξ) satisfazendo a seguinte pro-
priedade: para cada x ∈ h−1(P), existe uma vizinhanca aberta de x na fibra ξx, que e
levada homeomorficamente por h numa vizinhanca aberta de h(x) na fibra δh(x). As-
sim, dado um ponto x ∈ h−1(P), sejam Ux ⊆ ξx e Uh(x) ⊆ δh(x) vizinhancas abertas de
x e h(x), respectivamente, tais que a restricao h |Ux : Ux −→ Uh(x) e um homeomor-
fismo sobre Uh(x). Como ξx e δh(x) sao variedades topologicas de dimensao n (sem
fronteira), segue que os abertos Ux ⊆ ξx e Uh(x) ⊆ δh(x) tambem o sao; logo, sendo
( jx)∗ : Hn(ξx, ξx r x) −→ Hn(X,X r x), ( jξx)∗ : Hn(Ux,Ux r x) −→ Hn(ξx, ξx r x)
e ( jδh(x))∗ : Hn(Uh(x),Uh(x) r h(x)) −→ Hn(δh(x), δh(x) r h(x)) os isomorfismos induzidos
pelas respectivas inclusoes, obtemos a seguinte cadeia de isomorfismos:
Hn(X,X r x) Hn(δh(x), δh(x) r h(x))
Hn(ξx, ξx r x) Hn(Ux,Ux r x) Hn(Uh(x),Uh(x) r h(x))
( jx)−1∗
( jξx)−1∗
(h |Ux)∗
( jδh(x))∗
Dada uma orientacao local O(x) ∈ Hn(X,X r x) de X em x, temos entao que os
isomorfismos acima determinam uma orientacao local da fibra δh(x) em h(x) ∈ P, a
124 Teoria de Nielsen de Raızes
qual (utilizando um abuso de notacao) denotaremos por h∗(O(x)), isto e,
h∗(O(x)) = [( jδh(x))∗ (h |Ux)∗ ( jξx)
−1∗ ( jx)−1
∗ ](O(x)) .
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
Y
h∗(O(x))
µh(x)
h(x)
λ
P
λ∗(µh(x))
λ∗[h∗(O(x))]
h(y)
h∗[ω∗(O(x))]
δh(x)
δh(y)
h
O(x)
xω
y
ω∗(O(x))
X
Figura 2.5
Por outro lado, dado y ∈ h−1(P), e supondo que x e y estao Nielsen-relacionados,
sabemos que existe um caminho ω : I −→ X, com ω(0) = x e ω(1) = y, tal que
h ω : I −→ Y e homotopico a um caminho λ : I −→ P, com λ(0) = h(x) ∈ P e
λ(1) = h(y) ∈ P. Entretanto, como X e uma variedade topologica conexa e sem fronteira,
segue que o fibrado orientado X de X encontra-se bem definido (sendo a variedade
topologica constituıda das orientacoes locais de todos os pontos de X), de maneira que,
se pX : CX −→ X e o recobrimento obtido da componente conexa CX de X que contem
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 125
O(x), podemos levantar o caminho ω : I −→ X, relativamente a pX, para um unico
caminho ω : I −→ CX com inıcio em ω(0) = O(x). Logo, denotando por ω∗(O(x)) o ponto
final do levantamento ω (isto e,ω∗(O(x)) = ω(1) ∈ Hn(X,Xr y)), temos queω∗(O(x)) e a
orientacao local de X no ponto y, obtida estendendo-se a orientacao local O(x) ao longo
do caminho ω. Agora, vamos descrever um procedimento para transladar a orientacao
h∗(O(x)) de δh(x) em h(x), ao longo do caminho λ, a fim de obtermos uma orientacao
λ∗[h∗(O(x))], da fibra δh(x) no ponto h(y) (vide figura 2.5).
Primeiramente, observe que, como h(x) ∈ P e δ = δn = (Y,P, rδ) e um microfibrado
normal sobre P, segue que existem uma vizinhanca aberta Vh(x) ⊆ P de h(x), e um
homeomorfismo ϕh(x) : Vh(x) × δh(x) −→ r−1δ
(Vh(x)), tais que a aplicacao rδ ϕh(x) : Vh(x) ×
δh(x) −→ Vh(x) e a projecao de Vh(x) × δh(x) sobre Vh(x). Como rδ : Y −→ P e contınua e Vh(x)
e aberto em P, temos que Wh(x) = r−1δ
(Vh(x)) e um subconjunto aberto de Y, e, portanto,
constitui uma variedade topologica de dimensao m = p + n, da mesma forma que o
produto Vh(x)×δh(x) (note que, por ser aberto em P, Vh(x) possui dimensao p, enquanto que
a fibra δh(x) e de dimensao n). Isto posto, seja wh(x) ∈Wh(x) tal que ϕh(x)(h(x), h(x)) = wh(x);
como Y rWh(x) = Y rWh(x) ⊆ Y r wh(x) = Int(Y r h(x)), segue (do teorema da excisao
em homologia singular) que a inclusao ih(x) : (Wh(x),Wh(x) r wh(x)) −→ (Y,Y r wh(x))
induz um isomorfismo (ih(x))∗ : Hp+n(Wh(x),Wh(x) r wh(x)) −→ Hp+n(Y,Y r wh(x)), uma
vez que (Wh(x),Wh(x) r wh(x)) = (Y r (Y rWh(x)), (Y r wh(x)) r (Y r Wh(x)). Por outro
lado, como Y e uma variedade topologica conexa e sem fronteira, segue que existe
um homeomorfismo ρh(x) : Y −→ Y, homotopico a identidade, tal que ρh(x)(wh(x)) =
h(x) (vide [Vi], lema 6.4, pagina 150); logo, sendo (ϕh(x))∗ : Hp+n(Vh(x) × δh(x), (Vh(x) ×
δh(x)) r (h(x), h(x))) −→ Hp+n(Wh(x),Wh(x) r wh(x)) e (ρh(x))∗ : Hp+n(Y,Y r wh(x)) −→
Hp+n(Y,Y r h(x)) os isomorfismos induzidos por ϕh(x) e ρh(x), temos a seguinte cadeia
de isomorfismos:
Hp+n(Vh(x) × δh(x), (Vh(x) × δh(x)) r (h(x), h(x)))
Hp+n(Wh(x),Wh(x) r wh(x))
Hp+n(Y,Y r wh(x))
Hp+n(Y,Y r h(x))
(ϕh(x))∗
(ih(x))∗
(ρh(x))∗
126 Teoria de Nielsen de Raızes
Agora, sendo A = Vh(x), A0 = Vh(x) r h(x) ⊆ A, B = δh(x) e B0 = δh(x) r h(x) ⊆ B, temos
que:
(A0 × B) ∪ (A × B0) = [(Vh(x) r h(x)) × δh(x)] ∪ [Vh(x) × (δh(x) r h(x))]
= (v, d) ∈ Vh(x) × δh(x) : v , h(x)⋃
(v, d) ∈ Vh(x) × δh(x) : d , h(x)
= (v, d) ∈ Vh(x) × δh(x) : (v, d) , (h(x), h(x))
= (Vh(x) × δh(x)) r (h(x), h(x)) ,
o que, em particular, implica que A0×B = (Vh(x)rh(x))×δh(x) e A×B0 = Vh(x)×(δh(x)rh(x))
sao abertos em (A0 × B) ∪ (A × B0); portanto, do teorema de Kunneth em homologia
singular (vide [Ma1], pagina 302, teorema 6.2), obtemos que:
Hp+n(A × B, (A0 × B) × (A × B0)) ≃
( ⊕
i+ j=p+n
[Hi(A,A0) ⊗H j(B,B0)]
)⊕
( ⊕
i+ j=p+n
[Tor(Hi(A,A0),H j(B,B0))]
).
No entanto, como A = Vh(x) e B = δh(x) sao variedades topologicas de dimensoes
respectivamente iguais a p e n, temos que Hi(A,A0) ≃ 0 e H j(B,B0) ≃ 0 para i , p e
j , n, sendo que Hp(A,A0) ≃ Z e Hn(B,B0) ≃ Z; assim, a expressao acima se reduz a:
Hp+n(A × B, (A0 × B) × (A × B0)) ≃ [Hp(A,A0) ⊗Hn(B,B0)] ⊕
Tor(Hp(A,A0),Hn−1(B,B0)) ⊕
Tor(Hp−1(A,A0),Hn(B,B0))
≃ [Hp(A,A0) ⊗Hn(B,B0)] ⊕
Tor(Z, 0) ⊕ Tor(0,Z)
≃ Hp(A,A0) ⊗Hn(B,B0) ,
isto e, existe um isomorfismo
Hp+n(Vh(x) × δh(x), (Vh(x) × δh(x)) r h(x), h(x))
Hp(Vh(x),Vh(x) r h(x)) ⊗Hn(δh(x), δh(x) r h(x))
(ψh(x))∗
Deste modo, escolhida uma orientacao local µh(x) ∈ Hp(Vh(x),Vh(x) r h(x)), de Vh(x) em
h(x), seja νh(x) ∈ Hp+n(Y,Y r h(x)) a orientacao local de Y em h(x) correspondente a
µh(x) ⊗ h∗(O(x)) ∈ Hp(Vh(x),Vh(x) r h(x)) ⊗Hn(δh(x), δh(x) r h(x)) pela seguinte cadeia de
isomorfismos:
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 127
Hp(Vh(x),Vh(x) r h(x)) ⊗Hn(δh(x), δh(x) r h(x))︸ ︷︷ ︸
Hp+n(Vh(x) × δh(x), (Vh(x) × δh(x)) r (h(x), h(x)))
Hp+n(Wh(x),Wh(x) r wh(x))
Hp+n(Y,Y r wh(x))
Hp+n(Y,Y r h(x))
(ψh(x))−1∗
(ϕh(x))∗
(ih(x))∗
(ρh(x))∗
(note que, pelas propriedades do produto tensorial, o elemento µh(x) ⊗ h∗(O(x)) e um
gerador de Hp(Vh(x),Vh(x) r h(x)) ⊗ Hn(δh(x), δh(x) r h(x))). Entao, lembrando que Y e
uma variedade topologica conexa e sem fronteira (de modo que o fibrado orientado
Y de Y encontra-se bem definido), podemos estender a orientacao νh(x) ao longo do
caminho h ω : I −→ Y: sendo CY a componente conexa do fibrado orientado Y, que
contem νh(x) ∈ Hp+n(Y,Yr h(x)), e denotando por ˜h ω : I −→ CY o unico levantamento
de h ω, relativamente ao recobrimento pY : CY −→ Y obtido da projecao orientada
de Y, com ( ˜h ω)(0) = νh(x), tomamos (h ω)∗(νh(x)) ∈ Hp+n(Y,Y r h(x)) como sendo
a orientacao local de Y em h(y) = (h ω)(1), dada por (h ω)∗(νh(x)) = ( ˜h ω)(1). Por
outro lado, considere uma vizinhanca aberta Vh(y) ⊆ P de h(y) ∈ P tal que existe
um homeomorfismo ϕh(y) : Vh(y) × δh(y) −→Wh(y) = r−1δ
(Vh(y)), cuja composicao rδ ϕh(y) :
Vh(y)×δh(y) −→ Vh(y) e a projecao de Vh(y)×δh(y) sobre Vh(y) (lembre-se que δ = δn = (Y,P, rδ)
e um microfibrado sobre P), e sejam ( jVh(x))∗ : Hp(Vh(x),Vh(x) r h(x)) −→ Hp(P,P r h(x))
e ( jVh(y))∗ : Hp(Vh(y),Vh(y) r h(y)) −→ Hp(P,P r h(y)) os isomorfismos induzidos pelas
respectivas inclusoes; denotando por µPh(x)∈ Hp(P,P r h(x)) a orientacao local de P em
h(x), tal que ( jVh(x))∗(µh(x)) = µ
Ph(x)
, e estendendo µPh(x)
ao longo do caminho λ : I −→ P (de
maneira analoga ao que fizemos para o caminho h ω acima), obtemos uma orientacao
local λ∗(µPh(x)
) ∈ Hp(P,P r h(y)) de P em h(y) = λ(1), a qual determina uma unica
orientacao local µh(y) ∈ Hp(Vh(y),Vh(y) r h(y)) pelo isomorfismo ( jVh(y))∗. Assim sendo,
consideremos entao a cadeia de isomorfismos representada a seguir:
128 Teoria de Nielsen de Raızes
Hp(Vh(y),Vh(y) r h(y)) ⊗Hn(δh(y), δh(y) r h(y))︸ ︷︷ ︸
Hp+n(Vh(y) × δh(y), (Vh(y) × δh(y)) r (h(y), h(y)))
Hp+n(Wh(y),Wh(y) r wh(y))
Hp+n(Y,Y r wh(y))
Hp+n(Y,Y r h(y))
(ψh(y))−1∗
(ϕh(y))∗
(ih(y))∗
(ρh(y))∗
onde:
• (ψh(y))∗ : Hp+n(Vh(y) × δh(y), (Vh(y) × δh(y)) r (h(y), h(y))) −→ Hp(Vh(y),Vh(y) r h(y)) ⊗
Hn(δh(y), δh(y) r h(y)) e o isomorfismo obtido pelo teorema de Kunneth aplicado
ao produto Vh(y) × δh(y);
• (ϕh(y))∗ : Hp+n(Vh(y)×δh(y), (Vh(y)×δh(y))r(h(y), h(y))) −→ Hp+n(Wh(y),Wh(y)rwh(y)) e o
isomorfismo induzido pelo homeomorfismoϕh(y) : Vh(y)×δh(y) −→Wh(y) = r−1δ
(Vh(y)),
com wh(y) ∈Wh(y) tal que ϕh(y)(h(y), h(y)) = wh(y);
• (ih(y))∗ : Hp+n(Wh(y),Wh(y) r wh(y)) −→ Hp+n(Y,Y r wh(y)) e o isomorfismo induzido
pela inclusao de Wh(y) em Y;
• (ρh(y))∗ : Hp+n(Y,Y r wh(y)) −→ Hp+n(Y,Y r h(y)) e o isomorfismo induzido por
um homeomorfismo ρh(y) : Y −→ Y, homotopico a identidade, que leva wh(y) em
h(y) (cuja existencia e garantida pelo lema 6.4, pagina 150, de [Vi]).
Deste modo, definimos a translacao da orientacao local h∗(O(x)) ∈ Hn(δh(x), δh(x)r h(x)),
de h(x) a h(y) ao longo do caminho λ : I −→ P, como a orientacao local λ∗[h∗(O(x))] ∈
Hn(δh(y), δh(y) r h(y)), da fibra δh(y) no ponto h(y) = λ(1), tal que o gerador µh(y) ⊗
λ∗[h∗(O(x))] ∈ Hp(Vh(y),Vh(y)r h(y))⊗Hn(δh(y), δh(y)r h(y)) corresponde a (hω)∗(νh(x)) ∈
Hp+n(Y,Y r h(y)) pelos isomorfismos mencionados acima.
Observe que λ∗[h∗(O(x))] nao depende da orientacao local µh(x) ∈ Hp(Vh(x),Vh(x) r
h(x)) escolhida inicialmente: de fato, repetindo o mesmo procedimento com o outro
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 129
gerador −µh(x) ∈ Hp(Vh(x),Vh(x) r h(x)) ≃ Z, obterıamos a orientacao local −νh(x) ∈
Hp+n(Y,Y r h(x)), oposta a νh(x), pois (pelas propriedades do produto tensorial) o
gerador (−µh(x)) ⊗ h∗(O(x)) ∈ Hp(Vh(x),Vh(x) r h(x)) ⊗ Hn(δh(x), δh(x) r h(x)) ≃ Z ⊗ Z
coincide com o gerador−(µh(x)⊗h∗(O(x))), oposto a µh(x)⊗h∗(O(x)), e, consequentemente,
ao aplicarmos o isomorfismo (ρh(x))∗ (ih(x))∗ (ϕh(x))∗ (ψh(x))−1∗ sobre (−µh(x)) ⊗ h∗(O(x)),
obtemos a orientacao local −νh(x) ∈ Hp+n(Y,Y r h(x)), uma vez que:
[(ρh(x))∗ (ih(x))∗ (ϕh(x))∗ (ψh(x))−1∗ ](µh(x) ⊗ h∗(O(x))) = νh(x) .
Daı, estendendo a orientacao−νh(x) ∈ Hp+n(Y,Yrh(x)) ao longo do caminho hω : I −→
Y, chegarıamos a orientacao local−(hω)∗(νh(x)) ∈ Hp+n(Y,Yrh(y)), oposta a orientacao
(h ω)∗(νh(x)) que obtivemos ao estender νh(x); note que, ao estender −νh(x) ao longo de
hω, nao podemos chegar a mesma orientacao (hω)∗(νh(x)) estendida de νh(x), pois, neste
caso, existiriam dois levantamentos distintos de (hω)−1, relativamente ao recobrimento
pY : CY −→ Y, com inıcio no mesmo ponto (hω)∗(νh(x)) (um deles terminando em νh(x), e
o outro em−νh(x)). Analogamente, sendo−µPh(x)∈ Hn(P,Prh(x)) a orientacao local de P
em h(x), tal que ( jVh(x))∗(−µh(x)) = −µ
Ph(x)
(onde ( jVh(x))∗ : Hp(Vh(x),Vh(x)rh(x)) −→ Hp(P,Pr
h(x)) e o isomorfismo induzido pela inclusao), segue que, ao estendermos −µPh(x)
ao
longo do caminho λ : I −→ P, obteremos a orientacao local −λ∗(µPh(x)
) ∈ Hp(P,Pr h(y)),
oposta aquela a que chegamos ao estender µPh(x)
, e esta, por sua vez, determinara
a orientacao local −µh(y) ∈ Hp(Vh(y),Vh(y) r h(y)), oposta a µh(y), pelo isomorfismo
( jVh(y))∗ : Hp(Vh(y),Vh(y) r h(y)) −→ Hp(P,P r h(y)) induzido pela inclusao. Logo, a
orientacao local ζh(y) ∈ Hn(δh(y), δh(y) r h(y)), tal que (−µh(y)) ⊗ ζh(y) ∈ Hp(Vh(y),Vh(y) r
h(y))⊗Hn(δh(y), δh(y)r h(y)), correspondente a−(hω)∗(νh(x)) ∈ Hp+n(Y,Yr h(y)) pelos
isomorfismos ilustrados no ultimo diagrama acima, deve coincidir com λ∗[h∗(O(x))],
uma vez que estes isomorfismos levam (−µh(y))⊗λ∗[h∗(O(x))] = −(µh(y)⊗λ∗[h∗(O(x))]) em
−(h ω)∗(νh(x)). Portanto, λ∗[h∗(O(x))] e, de fato, independente da escolha da orientacao
µh(x) ∈ Hp(Vh(x),Vh(x) r h(x)), conforme querıamos provar.
Resumindo, temos entao que, adotada uma orientacao local O(x) ∈ Hn(X,X r x),
obtemos orientacoes locais ω∗(O(x)) ∈ Hn(X,X r y), h∗(O(x)) ∈ Hn(δh(x), δh(x) r h(x)) e
λ∗[h∗(O(x))] ∈ Hn(δh(y), δh(y)r h(y)), a primeira estendendo-se O(x) ao longo do caminho
ω : I −→ X, a segunda pela transversalidade topologica da aplicacao h : X −→ Y rela-
tivamente ao microfibrado δ = δn = (Y,P, rδ), e a terceira pela translacao de h∗(O(x)) ao
longo do caminho λ : I −→ P. Entretanto, utilizando novamente a transversalidade to-
pologica de h : X −→ Y, sabemos que existem vizinhancas abertas Uy ⊆ ξy e Uh(y) ⊆ δh(y),
de y e h(y), respectivamente, tais que a restricao h |Uy : Uy −→ Uh(y) e um homeomor-
fismo sobre Uh(y); assim, denotando por ( jy)∗ : Hn(ξy, ξy r y) −→ Hn(X,X r y),
( jξy)∗ : Hn(Uy,Uy r y) −→ Hn(ξy, ξy r y) e ( jδh(y))∗ : Hn(Uh(y),Uh(y) r h(y)) −→
Hn(δh(y), δh(y) r h(y)) os isomorfismos induzidos pelas respectivas inclusoes, segue
130 Teoria de Nielsen de Raızes
que a orientacao local ω∗(O(x)) ∈ Hn(X,X r y), obtida estendendo-se O(x) ao longo de
ω, corresponde a uma orientacao local h∗[ω∗(O(x))] ∈ Hn(δh(y), δh(y)r h(y)), da fibra δh(y)
no ponto h(y) ∈ P, pela seguinte cadeia de isomorfismos:
Hn(X,X r y) Hn(ξy, ξy r y) Hn(δh(y), δh(y) r h(y))
Hn(Uy,Uy r y) Hn(Uh(y),Uh(y) r h(y))
( jy)−1∗
( jξy)−1∗
(h |Uy)∗
( jδh(y))∗
(note que, por serem respectivamente abertos em ξy e δh(y), Uy e Uh(y) constituem va-
riedades topologicas de dimensao n). Deste modo, como tanto λ∗[h∗(O(x))], quanto
h∗[ω∗(O(x))] sao geradores de Hn(δh(y), δh(y) r h(y)) ≃ Z, temos duas possibilidades:
λ∗[h∗(O(x))] = h∗[ω∗(O(x))] ou λ∗[h∗(O(x))] = −h∗[ω∗(O(x))], onde, evidentemente, esta-
mos denotando por −h∗[ω∗(O(x))] o gerador de Hn(δh(y), δh(y) r h(y)) ≃ Z que e distinto
de h∗[ω∗(O(x))]. Por conseguinte, isto nos leva a seguinte
Definicao 2.4.4 . Sejam X, Y e P ⊆ Y variedades topologicas conexas, sem fronteira, de
dimensoes respectivamente iguais a n, m e p, com n + p = m e p < m. Considere ainda um
microfibrado normal δ = δn = (Y,P, rδ), de dimensao igual a de X, e suponha que h : X −→ Y
seja uma aplicacao contınua topologicamente transversa a δ. Utilizando as mesmas notacoes
adotadas acima, dizemos que dois pontos x, y ∈ h−1(P) ⊆ X estao R-relacionados com
respeito a h, e escrevemos x ∼h y, se existe um caminho ω : I −→ X, Nielsen-relacionando x e
y, tal que, para qualquer que seja a orientacao local O(x) ∈ Hn(X,X r x) escolhida, temos
λ∗[h∗(O(x))] = −h∗[ω∗(O(x))] ,
onde λ : I −→ P e um caminho homotopico a h ω : I −→ Y, λ∗[h∗(O(x))] e a translacao da
orientacao local h∗(O(x)) ∈ Hn(δh(x), δh(x) r h(x)) ao longo de λ, e ω∗(O(x)) e a orientacao local
de X em y obtida estendendo-se O(x) ao longo de ω.
A definicao de R-relacao nos permite entao caracterizar os pontos de h−1(P) que
podem ser “removidos” por uma homotopia; mais especificamente, temos o seguinte
Lema 2.4.2 . Sejam X, Y e P ⊆ Y variedades topologicas conexas e sem fronteira, cujas
dimensoes n, m e p, respectivamente, satisfazem n + p = m, n > 2 e 2 6 p < m, e considere um
microfibrado normal δ = δn = (Y,P, rδ), de dimensao igual a de X. Suponha ainda que B ⊆ X
seja uma n-bola propria em X, e que h : B −→ Y e uma aplicacao contınua topologicamente
transversa a δ (onde o fecho de B e relativo a variedade X). Se h−1(P) = x0, x1 ⊆ B e x0 ∼h x1,
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 131
segue que h e homotopica a uma aplicacao contınua g : B −→ Y r P ⊆ Y, relativamente a
∂B = B r B (isto e, existe uma aplicacao contınua g : B −→ Y r P, homotopica a h por uma
homotopia H : B × I −→ Y tal que H(x, t) = h(x) = g(x), para todo (x, t) ∈ ∂B × I).
Por razoes historicas, resultados como o do lema acima (que fornecem condicoes
sob as quais podemos “remover” pontos da imagem de uma aplicacao contınua, por
meio de homotopias) sao conhecidos como do tipo Whitney; sua demonstracao pode
ser encontrada em [Je] (lema 3.1, paginas 175 e 176), e sera omitida aqui devido a
tecnicidade envolvida.
A seguir, veremos entao como interpretar o conceito de R-relacao para aplicacoes
do tipo h : Int M −→ Int M × Int N, onde P = Int M × c e c ∈ Int N. Primeiramente, no
entanto, convem adotarmos mais uma notacao: dada uma aplicacao contınua propria
F : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N), entre variedades topologicas conexas de dimensao
n, tal que F e transversa a um ponto c ∈ Int N, e sendo x ∈ Int M uma raiz de F
em c, sabemos que existem vizinhancas abertas Ux ⊆ Int M e Vc ⊆ Int N, de x e c,
respectivamente, tais que a restricao F |Ux : Ux −→ Vc e um homeomorfismo sobre
Vc; logo, denotando por ( jUx)∗ : Hn(Ux,Ux r x) −→ Hn(Int M, Int M r x) e ( jVc)∗ :
Hn(Vc,Vc r c) −→ Hn(Int N, Int N r c) os isomorfismos induzidos pelas respectivas
inclusoes, temos que, dada uma orientacao local O(x) ∈ Hn(Int M, Int M r x), existe
uma unica orientacao local de N em c, correspondente a O(x) pela seguinte cadeia de
isomorfismos:
Hn(Int M, Int M r c) Hn(Int N, Int N r c)
Hn(Ux,Ux r x) Hn(Vc,Vc r c)
( jUx)−1∗
(F |Ux)∗
( jVc)∗
Assim, utilizando um abuso de notacao, vamos representar esta orientacao local de N
em c por F∗(O(x)), isto e,
F∗(O(x)) = [( jVc)∗ (F |Ux)∗ ( jUx)−1∗ ](O(x)) .
Lema 2.4.3 . Seja F : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) uma aplicacao contınua propria
(entre variedades topologicas conexas de mesma dimensao n), e considere novamente X = Int M,
Y = Int M × Int N e P = Int M × c, onde c ∈ Int N. Suponha ainda que e : Int M −→ Int M
seja uma aplicacao contınua, tal que a aplicacao h = (e,F 0) : X = Int M −→ Y = Int M× Int N
e topologicamente transversa ao microfibrado normal η = ηn = (Y,P, r), onde r : Y −→ P e a
retracao definida por r(x, y) = (x, c) para cada (x, y) ∈ Y = Int M×Int N. Dados x1, x2 ∈ h−1(P),
132 Teoria de Nielsen de Raızes
e um caminho ω : I −→ X = Int M, com ω(0) = x1 e ω(1) = x2, tal que F ω : I −→ Int N e
um laco contratil em c, temos que x1 e x2 estao R-relacionados com respeito a h se, e somente se,
F∗(O(x1)) = −F∗[ω∗(O(x1))], onde O(x1) ∈ Hn(X,X r x1) e uma orientacao local arbitraria
de X em x1, e ω∗(O(x1)) ∈ Hn(X,X r x2) e a orientacao local de X em x2 obtida estendendo-se
O(x1) ao longo do caminho ω.
Demonstracao. De fato, sabemos que h−1(P) = F−1(c); alem disso, a existencia do
caminho ω : I −→ X = Int M, ligando x1 a x2, tal que F ω : I −→ Int N e uma laco
contratil em c, significa que x1 e x2 pertencem a mesma classe de raızes de F em c, o que,
pelo lema 2.4.1, implica que x1 e x2 estao Nielsen-relacionados (condicao necessaria
para que tenhamos x1 ∼h x2). Por outro lado, conforme vimos na demonstracao da
proposicao 2.4.1, a transversalidade topologica de h = (e,F 0) : X −→ Y, em relacao
ao microfibrado normal η = ηn = (Y,P, r), nos garante que existem vizinhancas abertas
Ux1,Ux2
⊆ X = Int M e Vc ⊆ Int N, de x1, x2 e c, respectivamente, tais que a aplicacao
e : X −→ X satifaz e(z1) = e(x1) e e(z2) = e(x2) para quaisquer z1 ∈ Ux1e z2 ∈ Ux2
, e as
restricoes F |Ux1: Ux1
−→ Vc e F |Ux2: Ux2
−→ Vc sao homeomorfismos sobre Vc. Assim,
como ηh(x) = e(x) × Int N para todo x ∈ h−1(P), segue que Wx1= e(x1) × Vc ⊆ ηh(x1)
e Wx2= e(x2) × Vc ⊆ ηh(x2) sao vizinhancas abertas dos pontos h(x1) = (e(x1), c) e
h(x2) = (e(x2), c), respectivamente, tais que as restricoes h |Ux1: Ux1
−→ Wx1e h |Ux2
:
Ux2−→ Wx2
sao homeomorfismos sobre Wx1e Wx2
(note que todos os abertos Ux1,
Ux2, Vc, Wx1
e Wx2sao variedades topologicas de dimensao n). Agora, considere as
aplicacoes πx1: ηh(x1) −→ Int N e πx2
: ηh(x2) −→ Int N, definidas por πx1(e(x1), y1) = y1 e
πx2(e(x2), y2) = y2 para cada (e(x1), y1) ∈ ηh(x1) = e(x1) × Int N e cada (e(x2), y2) ∈ ηh(x2) =
e(x2) × Int N (em outras palavras, πx1e πx2
sao as projecoes de ηh(x1) = e(x1) × Int N
e ηh(x2) = e(x2) × Int N sobre Int N); denotando por jh(x1) : Wx1−→ ηh(x1), jh(x2) : Wx2
−→
ηh(x2), jUx1: Ux1
−→ X, jUx2: Ux2
−→ X e jVc : Vc −→ Int N as inclusoes, obtemos
o diagrama comutativo ilustrado na figura 2.6. Logo, sendo O(x1) ∈ Hn(X,X r x1)
uma orientacao local arbitraria de X em x1, e ω∗(O(x1)) ∈ Hn(X,X r x2) a orientacao
local obtida estendendo-se O(x1) ao longo do caminho ω : I −→ X, consideremos as
orientacoes locais h∗(O(x1)) ∈ Hn(ηh(x1), ηh(x1) r h(x1)), h∗[ω∗(O(x1))] ∈ Hn(ηh(x2), ηh(x2) r
h(x2)), F∗(O(x1)) ∈ Hn(Int N, Int N r c) e F∗[ω∗(O(x1))] ∈ Hn(Int N, Int N r c), que, de
acordo com as notacoes que estamos adotando, sao definidas por:
h∗(O(x1)) = [( jh(x1))∗ (h |Ux1)∗ ( jUx1
)−1∗ ](O(x1)) ,
h∗(ω∗(O(x1))) = [( jh(x2))∗ (h |Ux2)∗ ( jUx2
)−1∗ ](ω∗(O(x1))) ,
F∗(O(x1)) = [( jVc)∗ (F |Ux1)∗ ( jUx1
)−1∗ ](O(x1)) e
F∗(ω∗(O(x1))) = [( jVc)∗ (F |Ux2)∗ ( jUx2
)−1∗ ](ω∗(O(x1))) .
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 133
Hn(X,X r x1) Hn(X,X r x2)
Hn(Ux1,Ux1
r x1) Hn(Vc,Vc r c) Hn(Ux2,Ux2
r x2)
Hn(Wx1,Wx1
r h(x1)) Hn(Wx2,Wx2
r h(x2))
Hn(ηh(x1), ηh(x1) r h(x1)) Hn(Int N, Int N r c) Hn(ηh(x2), ηh(x2) r h(x2))
( jUx1)−1∗ ( jUx2
)−1∗
(F |Ux1)∗ (F |Ux2
)∗
(h |Ux1)∗ (h |Ux2
)∗
( jVc)∗
( jh(x1))∗ ( jh(x2))∗
(πx1)∗ (πx2
)∗
Figura 2.6
De maneira analoga ao que fizemos na discussao que precedeu a definicao 2.4.5, pode-
mos utilizar o teorema de Kunneth em homologia singular para concluir que existem
isomorfismos
(ψYh(x1))∗ : H2n(Y,Y r h(x1)) −→ Hn(X,X r e(x1)) ⊗Hn(Int N, Int N r c)
eH2n(P × ηh(x1), (P × ηh(x1)) r (h(x1), h(x1)))
Hn(P,P r h(x1)) ⊗Hn(ηh(x1), ηh(x1) r h(x1))
(ψh(x1))∗
(lembre-se que h(x1) = (e(x1), c) e tal que h(x1) ∈ P = Int M × c e h(x1) ∈ ηh(x1) =
e(x1) × Int N). Por outro lado, note que a aplicacao ϕx1: P × ηh(x1) −→ Y, dada por
ϕx1(x, c, e(x1), y) = (x, y) para cada (x, c, e(x1), y) ∈ P×ηh(x1) = (Int M×c)×(e(x1)×Int N),
constitui um homeomorfismo sobre Y, que leva o ponto (h(x1), h(x1)) = (e(x1), c, e(x1), c) ∈
P× ηh(x1) em h(x1) = (e(x1), c) ∈ Y = Int M× Int N; assim, denotando por px1: P = Int M×
c −→ X = Int M o homeomorfismo dado por px1(x, c) = x para cada (x, c) ∈ P, segue
que a aplicacao px1×πx1
: P×ηh(x1) −→ Y, definida por (px1×πx1
)(xP, xη) = (px1(xP),πx1
(xη))
para cada (xP, xη) ∈ P × ηh(x1), coincide com ϕx1, pois, sendo xP = (x, c) ∈ P = Int M × c
134 Teoria de Nielsen de Raızes
e xη = (e(x1), y) ∈ ηh(x1) = e(x1) × Int N, temos que:
ϕx1(xP, xη) = ϕx1
(x, c, e(x1), y) = (x, y)
= (px1(xP),πx1
(xη))
= (px1× πx1
)(xP, xη) .
Considere entao o homomorfismo
Hn(P,P r x1) ⊗Hn(ηh(x1), ηh(x1) r h(x1))
Hn(X,X r e(x1)) ⊗Hn(Int N, Int N r c)
(px1)∗ ⊗ (πx1
)∗
dado por:
[(px1)∗ ⊗ (πx1
)∗](zP ⊗ zη) = [(px1)∗(zP)] ⊗ [(πx1
)∗(zη)]
para cada zP ⊗ zη ∈ Hn(P,P r x1) ⊗ Hn(ηh(x1), ηh(x1) r h(x1)); como os isomorfismos
(ψh(x1))∗ e (ψYh(x1)
)∗, dados pelo teorema de Kunneth, sao definidos pelo teorema de
Eilenberg-Zilber (vide [Ma1], paginas 300 a 302), segue, da naturalidade das aplicacoes
de Eilenberg-Zilber (novamente, vide [Ma1], lema 5.6, pagina 290), que o seguinte
diagrama e comutativo:
Hn(P × ηh(x1), (P × ηh(x1)) r h(x1), h(x1))︸ ︷︷ ︸
︷ ︸︸ ︷Hn(P,P r x1) ⊗Hn(ηh(x1), ηh(x1) r h(x1))︸ ︷︷ ︸
Hn(Y,Y r h(x1))
︷ ︸︸ ︷Hn(X,X r e(x1)) ⊗Hn(Int N, Int N r c)
(ψh(x1))∗
(px1)∗ ⊗ (πx1
)∗
(ϕx1)∗ = (px1
× πx1)∗
(ψYh(x1))∗
Por conseguinte, temos que (ψYh(x1)
)∗ (ϕx1)∗ (ψh(x1))∗ = (px1
)∗ ⊗ (πx1)∗, isto e,
[(ψYh(x1))∗ (ϕx1
)∗ (ψh(x1))∗](zP ⊗ zη) = [(px1)∗(zP)] ⊗ [(πx1
)∗(zη)]
para cada xP ∈ Hn(P,P r h(x1)) e cada zη ∈ Hn(ηh(x1), ηh(x1) r h(x1)), de modo que o
diagrama abaixo e comutativo:
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 135
︷ ︸︸ ︷Hn(P,P r x1)
⊗︷ ︸︸ ︷Hn(ηh(x1), ηh(x1) r h(x1))
︸ ︷︷ ︸
Hn(P × ηh(x1), (P × ηh(x1)) r (h(x1), h(x1)))
Hn(Y,Y r h(x1))
︷ ︸︸ ︷Hn(X,X r e(x1))︸ ︷︷ ︸
⊗Hn(Int N, Int N r c)︸ ︷︷ ︸
(ψh(x1))−1∗
(ϕx1)∗
(ψYh(x1))∗
(px1)∗ (πx1
)∗
Em contrapartida, fazendo as mesmas consideracoes para x2 no lugar de x1, obtemos
tambem o diagrama comutativo a seguir:
︷ ︸︸ ︷Hn(P,P r x2)
⊗︷ ︸︸ ︷Hn(ηh(x2), ηh(x2) r h(x2))
︸ ︷︷ ︸
Hn(P × ηh(x2), (P × ηh(x2)) r (h(x2), h(x2)))
Hn(Y,Y r h(x2))
︷ ︸︸ ︷Hn(X,X r e(x2))︸ ︷︷ ︸
⊗Hn(Int N, Int N r c)︸ ︷︷ ︸
(ψh(x2))−1∗
(ϕx2)∗
(ψYh(x2))∗
(px2)∗ (πx2
)∗
136 Teoria de Nielsen de Raızes
Isto posto, sendo λ : I −→ P = Int M × c o caminho dado por λ = (e ω, c), temos
que λ e homotopico ao caminho h ω = (e ω,F ω) : I −→ Y = Int M× Int N (uma vez
que F ω : I −→ Int N e um laco contratil em c). Lembremos entao que a translacao
de h∗(O(x1)) ∈ Hn(ηh(x1), ηh(x1) r h(x1)), de h(x1) = (e(x1), c) a h(x2) = (e(x2), c) ao longo
de λ = (e ω, c), e a orientacao local λ∗[h∗(O(x1))] ∈ Hn(ηh(x2), ηh(x2) r h(x2)) obtida pelo
seguinte procedimento: escolhendo-se uma orientacao local µh(x1) ∈ Hn(P,P r h(x1)),
tomamos a orientacao local
[(ϕx1)∗ (ψh(x1))
−1∗ ](µh(x1) ⊗ h∗(O(x1))) ∈ H2n(Y,Y r h(x1)) ,
estendemo-la ao longo do caminho h ω : I −→ Y para uma orientacao
νh(x2) = (h ω)∗([(ϕx1)∗ (ψh(x1))
−1∗ ](µh(x1) ⊗ h∗(O(x1)))) ∈ H2n(Y,Y r h(x2)) ,
e finalmente tomamos λ∗[h∗(O(x1))] ∈ Hn(ηh(x2), ηh(x2) r h(x2)) tal que
[(ϕx2)∗ (ψh(x2))
−1∗ ](λ∗(µh(x1)) ⊗ λ∗[h∗(O(x1))]) = νh(x2) ,
onde λ∗(µh(x1)) ∈ Hn(P,P r h(x2)) e a orientacao local obtida estendendo-se µh(x1) ao
longo do caminho λ : I −→ P. No entanto, observe que, como h ω = (e ω,F ω),
segue (do penultimo diagrama acima, e da definicao de fibrado orientado para espacos
produto, dada em [D], paginas 255 e 256) que o processo de estender a orientacao
local [(ϕx1)∗ (ψh(x1))
−1∗ ](µh(x1) ⊗ h∗(O(x1))) ∈ H2n(Y,Y r h(x1)) ao longo de h ω, a fim de
obter νh(x2) ∈ H2n(Y,Y r h(x2)), equivale a estender as orientacoes locais (px1)∗(µh(x1)) ∈
Hn(X,X r e(x1)) e (πx1)∗(h∗(O(x1))) ∈ Hn(Int N, Int N r c), ao longo de e ω : I −→
X = Int M e F ω : I −→ Int N, respectivamente, determinando assim orientacoes
locais τx2= (e ω)∗[(px1
)∗(µh(x1))] ∈ Hn(X,X r e(x2)) e τc = (F ω)∗[(πx1)∗(h∗(O(x1)))] ∈
Hn(Int N, Int N r c), e depois tomar νh(x2) ∈ H2n(Y,Y r h(x2)) como sendo νh(x2) =
(ψYh(x2)
)−1∗ (τx2
⊗ τc); contudo, procedendo desta maneira, teremos (pela comutatividade
do ultimo diagrama acima) que λ∗[h∗(O(x1))] = (πx2)−1∗ (τc), pois:
[(ϕx2)∗ (ψh(x2))
−1∗ ]((px2
)−1∗ (τx2
) ⊗ (πx2)−1∗ (τc)) = (ψY
h(x2))−1∗ (τx2
⊗ τc) = νh(x2)
(note que (px2)−1∗ (τx2
) = λ∗(µh(x1))). Deste modo, podemos concluir que o ato de transladar
h∗(O(x1)) ∈ Hn(ηh(x1), ηh(x1)r h(x1)) ao longo do caminho λ : I −→ P, equivale a estender
a orientacao local (πx1)∗(h∗(O(x1))) ∈ Hn(Int N, Int Nr c) ao longo de F ω : I −→ Int N,
obtendo a orientacao local τc = (F ω)∗[(πx1)∗(h∗(O(x1)))] ∈ Hn(Int N, Int N r c), e
depois tomar λ∗[h∗(O(x1))] = (πx2)−1∗ (τc). Ora, como F ω e um laco contratil em c (e,
portanto, preserva orientacao), temos que τc = (πx1)∗(h∗(O(x1))), isto e, ao estendermos
a orientacao local (πx1)∗(h∗(O(x1))) ao longo de F ω, “chegaremos” a mesma orientacao
local. Logo, temos que:
λ∗[h∗(O(x1))] = [(πx2)−1∗ (πx1
)∗](h∗(O(x1))) ;
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 137
consequentemente, das definicoes de h∗(O(x1)), h∗[ω∗(O(x1))], F∗(O(x1)) e F∗[ω∗(O(x1))],
e da comutatividade do diagrama ilustrado na figura 2.6, segue que:
x1 ∼h x2 ⇐⇒ λ∗[h∗(O(x1))] = −h∗[ω∗(O(x1))]
⇐⇒ [(πx2)−1∗ (πx1
)∗](h∗(O(x1))) = −h∗[ω∗(O(x1))]
⇐⇒ (πx1)∗(h∗(O(x1))) = (πx2
)∗(−h∗[ω∗(O(x1))]) = −(πx2)∗(h∗[ω∗(O(x1))])
⇐⇒ F∗(O(x1)) = −F∗[ω∗(O(x1))] ,
ou seja, x1 e x2 estao R-relacionados com respeito a h = (e,F 0) se, e somente se,
F∗(O(x1)) = −F∗[ω∗(O(x1))], conforme querıamos demonstrar.
O proximo lema nos fornece informacoes a respeito do numero de pontos, numa
classe de raızes de uma aplicacao propriaF : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N), que estao
R-relacionados entre si com respeito a uma aplicacao h = (e,F 0) : Int M −→ Int M×Int N.
Tais pontos, por sua vez, serao exatamente aqueles que poderemos “remover” por meio
de homotopias proprias, a fim de minimizar o conjunto de raızes de F .
Lema 2.4.4 . SejaF : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) uma aplicacao contınua propria (entre
variedades topologicas de dimensao n), e considere novamente X = Int M, Y = Int M × Int N
e P = Int M × c, onde c ∈ Int N. Supondo que F e transversa a c (de modo que o conjunto
F−1(c) e, portanto, finito), seja ainda R = x1, x2, . . . , xk uma classe de raızes de F em c. Se
k > |m(R)|, entao existem dois pontos em R que estao R-relacionados com respeito a qualquer
aplicacao contınua h = (e,F 0) : X −→ Y, desde que h seja topologicamente transversa ao
microfibrado normal η = ηn = (Y,P, r).
Demonstracao. Primeiramente, suponhamos que F seja uma aplicacao orientavel,
e, dada uma vizinhanca aberta contratil V ⊆ Int N de c, considere, para cada i ∈ 1, 2,
. . . , k, uma vizinhanca aberta Ui ⊆ Int M de xi em F−1(V), tal que Ui ∩ F−1(V) = xi (a
qual existe, pois F−1(c) e finito). Como F e transversa a c, podemos supor ainda que
V e uma vizinhanca euclidiana em Int N, e U1, U2, . . ., Uk sao vizinhancas euclidianas
duas a duas disjuntas, tais que F |Ui: Ui −→ V e um homeomorfismo sobre V para
cada i ∈ 1, 2, . . . , k. Assim, orientando o aberto U =
k⋃
i=1
Ui = F−1(V) pelo processo de
orientacao dado na definicao 1.3.6, segue (do exemplo 1.3.8) que:
|m(R)| =
∣∣∣∣∣∣k∑
i=1
degc(F |Ui)
∣∣∣∣∣∣ ,
onde, para cada i ∈ 1, 2, . . . , k, degc(F |Ui) denota o grau local a coeficientes em
Z. Ora, como cada uma das restricoes F |Uie um homeomorfismo sobre V, e os
138 Teoria de Nielsen de Raızes
abertos U1, U2, . . ., Uk, V sao variedades topologicas orientaveis (pois constituem
vizinhancas euclidianas), temos, do corolario 1.3.1, que degc(F |Ui) = ±1, qualquer
que seja i ∈ 1, 2, . . . , k; logo, como k > |m(R)|, segue que nem todos os graus locais
degc(F |Ui) sao iguais. Deste modo, sem perda de generalidade, podemos supor que
degc(F |U1) = −degc(F |U2
). Entretanto, sendo ( jU1)∗ : Hn(U1,U1rx1) −→ Hn(X,Xrx1)
e ( jU2)∗ : Hn(U2,U2rx2) −→ Hn(X,Xrx2) os isomorfismos induzidos pelas respectivas
inclusoes, temos que as orientacoes sU1(x1) ∈ Hn(U1,U1rx1) e sU2
(x2) ∈ Hn(U2,U2rx2),
de U1 e U2 em x1 e x2, respectivamente, definem orientacoes locais O(x1) ∈ Hn(X,Xrx1)
e O(x2) ∈ Hn(X,X r x2), a saber, O(x1) = ( jU1)∗(sU1
(x1)) e O(x2) = ( jU2)∗(sU2
(x2)); alem
disso, como U =
k⋃
i=1
Ui e orientado pelo processo de orientacao, temos que a orientacao
local O(x2) e obtida estendendo-se O(x1) ao longo de um caminho ω : I −→ X = Int M,
ligando x1 ∈ U1 a x2 ∈ U2, tal que F ω : I −→ Int N e um laco contratil em c
(vide definicao 1.3.6). Agora, sendo (F |U1)∗ : Hn(U1,U1 r x1) −→ Hn(V,V r c) e
(F |U2)∗ : Hn(U2,U2 r x2) −→ Hn(V,V r c) os isomorfismos induzidos por F |U1
e
F |U2, lembremos que os graus locais degc(F |U1
) e degc(F |U2) sao definidos como os
numeros inteiros tais que F |U1)∗(θx1
) = degc(F |U1) · θc e F |U2
)∗(θx2) = degc(F |U2
) · θc,
onde θx1∈ Hn(U1,U1 r x1), θx2
∈ Hn(U2,U2 r x2) e θc ∈ Hn(V,V r c) sao as classes
fundamentais. Por outro lado, de acordo com as notacoes que estamos adotando, temos
queF∗(O(x1)) ∈ Hn(Int N, Int Nrc) e F∗(O(x2)) ∈ Hn(Int N, Int Nrc) sao as orientacoes
locais obtidas de O(x1) ∈ Hn(X,Xr x1) e O(x2) ∈ Hn(X,Xr x2), respectivamente, pelas
seguintes cadeias de isomorfismos (onde (JV)∗ : Hn(V,V r c) −→ Hn(Int N, Int N r c)
e o isomorfismo induzido pela inclusao de V em Int N):
Hn(X,X r x1) Hn(X,X r x2)
Hn(U1,U1 r x1) Hn(V,V r c) Hn(U2,U2 r x2)
Hn(Int N, Int N r c)
( jU1)−1∗ ( jU2
)−1∗
(F |U1)∗ (F |U2
)∗
( jV)∗
Em outras palavras, temos que:
F∗(O(x1)) = [( jV)∗ (F |U1)∗ ( jU1
)−1∗ ](O(x1))
e
F∗(O(x2)) = [( jV)∗ (F |U2)∗ ( jU2
)−1∗ ](O(x2)) .
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 139
Portanto, se degc(F |U1) = −degc(F |U2
), segue que:
(F |U1)∗(θx1
) = degc(F |U1) · θc = −degc(F |U2
) · θc = −(F |U2)∗(θx2
) ,
e, consequentemente,
[( jV)∗ (F |U1)∗](θx1
) = −[( jV)∗ (F |U2)∗](θx2
) .
No entanto, pela definicao de classe fundamental, temos que θx1e θx2
coincidem com
as orientacoes de U1 e U2 em x1 e x2, respectivamente, isto e, θx1= sU1
(x1) e θx2= sU2
(x2).
Logo, como sU1(x1) = ( jU1
)−1∗ (O(x1)) e sU2
(x2) = ( jU2)−1∗ (O(x2)), a ultima igualdade acima
equivale a:
[( jV)∗ (F |U1)∗ ( jU1
)−1∗ ](O(x1)) = −[( jV)∗ (F |U2
)∗ ( jU2)−1∗ ](O(x2)) ,
ou seja, F∗(O(x1)) = −F∗(O(x2)). Assim, pelo lema 2.4.3, podemos concluir que os pontos
x1 e x2 estao R-relacionados com respeito a qualquer aplicacao contınua h : X −→ Y da
forma h = (e,F 0), desde que h seja topologicamente transversa ao microfibrado normal
η = ηn = (Y,P, r).
Isto posto, suponhamos agora que a aplicacao F seja nao-orientavel (isto e, do tipo
III); utilizando as mesmas vizinhancas euclidianas U1, U2, . . ., Uk e V, segue (do exemplo
1.3.8 com coeficientes emZ2) que:
|m(R)| =
∣∣∣∣∣∣k∑
i=1
degc(F |Ui)
∣∣∣∣∣∣ =
1 se k e ımpar
0 se k e par
(note que, em Z2, temos degc(F |Ui) = 1 para todo i ∈ 1, 2, . . . , k). Suponhamos entao
que k > |m(R)| = 1; neste caso, existem pelo menos duas raızes em R, digamos x1 e x2,
bem como um caminho ω : I −→ X = Int M, ligando x1 a x2, tal que F ω : I −→ Int N e
um laco contratil em c. Deste modo, orientando-se o aberto U =
k⋃
i=1
Ui com coeficientes
emZ2, e utilizando as notacoes definidas anteriormente, segue que, se a orientacao local
O(x2) ∈ Hn(X,X r x2), obtida estendendo-se O(x1) ∈ Hn(X,X r x1) ao longo de ω, for
tal que F∗(O(x1)) = −F∗(O(x2)), concluımos de imediato (do lema 2.4.3) que x1 e x2 estao
R-relacionados, qualquer que seja h = (e,F 0) : X −→ Y topologicamente transversa a
η. Caso contrario (ou seja, se F∗(O(x1)) = F∗(O(x2))), tomamos um laco λ : I −→ Int M,
que inverte orientacao, tal que F λ : I −→ Int N e um laco contratil (o qual existe, pois
F e supostamente do tipo III), e consideramos um caminho α : I −→ Int M, ligando
x1 a p = λ(0) = λ(1); assim, denotando por ω′ : I −→ Int M o caminho dado pela
justaposicao ω′ = α∨λ∨α−1 ∨ω, temos que ω′ e um caminho ligando x1 a x2 (uma vez
140 Teoria de Nielsen de Raızes
que ω′(0) = α(0) = x1 e ω′(1) = α(1) = x2), cuja imagem F ω′ : I −→ Int N e um laco
contratil em c, pois:
[F ω′] = [F (α ∨ λ ∨ α−1 ∨ ω)]
= [(F α) ∨ (F λ) ∨ (F α−1) ∨ (F ω)]
= [(F α) ∨ (ǫp) ∨ (F α−1) ∨ (ǫc)]
= [(F α) ∨ (F α−1)] = [F (α ∨ α−1)] = [ǫc]
(observe que estamos denotando por ǫp : I −→ p ⊆ Int M e ǫc : I −→ c ⊆ Int N os
caminhos constantes iguais a p = λ(0) = λ(1) e c, respectivamente). Logo, como λ e um
laco que inverte orientacao, ao estendermos a orientacao local O(x1) ∈ Hn(X,Xr x1) ao
longo de ω′ = α ∨ λ ∨ α−1 ∨ ω, obteremos uma orientacao local O′(x2) ∈ Hn(X,X r x2)
que e oposta aquela O(x2) que obtivemos estendendo O(x1) ao longo de ω. Daı, como
F∗(O(x1)) = F∗(O(x2)) e O(x2) = −O′(x2), segue que F∗(O(x1)) = −F∗(O′(x2)), o que
novamente implica (pelo lema 2.4.3) que x1 e x2 estao R-relacionados com respeito a
toda aplicacao contınua h = (e,F 0) : X −→ Y topologicamente transversa a η.
Enfim, se |m(R)| = 0, temos que k e um numero par, e, portanto, se k > |m(R)|, segue
que k > 2; logo, repetindo o procedimento acima, podemos encontrar duas raızes em R
que estao R-relacionadas, encerrando a demonstracao.
Lema 2.4.5 . Sendo φ : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) uma aplicacao contınua propria
(entre variedades topologicas conexas de mesma dimensao n > 3), transversa a um ponto
c ∈ Int N, considere dois pontos x1, x2 ∈ φ−1(c), pertencentes a uma mesma classe de raızes
R de φ em c, e sejam U1,U2 ⊆ Int M e Vc ⊆ Int N vizinhancas euclidianas de x1, x2 e c,
respectivamente, tais que as restricoesφ |U1: U1 −→ Vc eφ |U2
: U2 −→ Vc sao homeomorfismos
sobre Vc (de modo que degc(φ |U1) = ±1 e degc(φ |U2
) = ±1). Se degc(φ |U1) = −degc(φ |U2
),
segue que existe uma aplicacao contınua propria φ′ : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N),
transversa a c e propriamente homotopica a φ, tal que:
(i) φ′ coincide com φ em MrB, onde B ⊆ Int M e uma n-bola propria satisfazendo B ⊆ Int M
e B ∩ φ−1(c) = x1, x2;
(ii) (φ′)−1(c) = φ−1(c) r x1, x2;
(iii) R′ = R r x1, x2 constitui uma classe de raızes de φ′ em c.
Demonstracao. De fato, como φ e transversa a c ∈ Int N, segue que existe uma
vizinhanca euclidiana Vc ⊆ Int N de c, tal que φ−1(Vc) e uma uniao finita e disjunta de
vizinhancas euclidianas em Int M, cada uma das quais e levada homeomorficamente
por φ sobre Vc. Isto posto, dada uma classe de raızes R = x1, x2, . . . , xk deφ em c, sejam
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 141
U1,U2, . . . ,Uk ⊆ Int M vizinhancas euclidianas contendo x1, x2, . . . , xk, respectivamente,
tais que, para cada i ∈ 1, 2, . . . , k, a restricao φ |Ui: Ui −→ Vc e um homeomorfismo
sobre Vc; temos entao que o conjunto U =
k⋃
i=1
Ui e uma vizinhanca aberta de R em
Int M, tal que U ∩ φ−1(c) = R. Assim, orientando U de acordo com o processo de
orientacao descrito na definicao 1.3.6, e considerando as componentes conexas U1,U2 ⊆
U orientadas pela restricao da orientacao de U, temos que a orientacaoµx2∈ Hn(U2,U2r
x2) de U2 em x2 e obtida da seguinte maneira: sendoµx1∈ Hn(U1,U1rx1) a orientacao
de U1 em x1, consideramos a orientacao local O(x1) ∈ Hn(Int M, Int M r x1) dada
por O(x1) = ( jU1)∗(µx1
), onde ( jU1)∗ : Hn(U1,U1 r x1) −→ Hn(Int M, Int M r x1) e
o isomorfismo induzido pela inclusao, estendemos O(x1) ao longo de um caminho
ω : I −→ Int M ligando x1 a x2, tal que φ ω : I −→ Int N e um laco contratil em c,
obtendo uma orientacao local ω∗(O(x1)) ∈ Hn(Int M, Int M r x2), e depois tomamos
µx2∈ Hn(U2,U2 r x2) de tal forma que ω∗(O(x1)) = ( jU2
)∗(µx2), onde ( jU2
)∗ : Hn(U2,U2 r
x2) −→ Hn(Int M, Int Mr x2) e o isomorfismo induzido pela inclusao. Agora, observe
que, uma vez adotadas estas orientacoes em U1 e U2, temos que µx1e µx2
constituem
as classes fundamentais em x1 e x2, respectivamente; logo, escolhida uma orientacao
para Vc ⊆ Int N, e denotando por θc ∈ Hn(Vc,Vc r c) a classe fundamental associada
a esta orientacao, segue que (φ |U1)∗(µx1
) = degc(φ |U1) · θc e (φ |U2
)∗(µx2) = degc(φ |U2
) · θc,
onde (φ |U1)∗ : Hn(U1,U1 r x1) −→ Hn(Vc,Vc r c) e (φ |U2
)∗ : Hn(U2,U2 r x2) −→
Hn(Vc,Vc r c) sao os isomorfismos induzidos pelas restricoes φ |U1: U1 −→ Vc e
φ |U2: U2 −→ Vc. Deste modo, sendo ( jVc)∗ : Hn(Vc,Vc r c) −→ Hn(Int N, Int N r c) o
isomorfismo induzido pela inclusao, considere os elementos φ∗(O(x1)), φ∗[ω∗(O(x1))] ∈
Hn(Int N, Int N r c) dados por:
φ∗(O(x1)) = [( jVc)∗ (φ |U1)∗ ( jU1
)−1∗ ](O(x1))
e
φ∗[ω∗(O(x1))] = [( jVc)∗ (φ |U2)∗ ( jU2
)−1∗ ](ω∗(O(x1))) ;
se degc(φ |U1) = −degc(φ |U2
), segue que:
φ∗(O(x1)) = [( jVc)∗ (φ |U1)∗ ( jU1
)−1∗ ](O(x1)) = [( jVc)∗ (φ |U1
)∗](µx1)
= ( jVc)∗[degc(φ |U1) · θc] = ( jVc)∗[−degc(φ |U2
) · θc]
= −( jVc)∗[degc(φ |U2) · θc] = −[( jVc)∗ (φ |U2
)∗](µx2)
= −[( jVc)∗ (φ |U2)∗ ( jU2
)−1∗ ](ω∗(O(x1))) = −φ∗[ω∗(O(x1))] ,
o que, pelo lema 2.4.3, implica que x1 e x2 estao R-relacionados com respeito a uma
aplicacao h = (e,φ0) : Int M −→ Int M × Int N, que e topologicamente transversa ao
142 Teoria de Nielsen de Raızes
microfibrado η = ηn = (Y,P, r). No entanto, do fato de R ser discreto e X = Int M ser
uma variedade topologica conexa, sabemos que existe uma n-bola propria B ⊆ Int M,
contendo x1 e x2, tal que B ⊆ Int M e B ∩ φ−1(c) = x1, x2. Ademais, sem perda de
generalidade, podemos supor que existe um caminho ω : I −→ B, com ω(0) = x1 e
ω(1) = x2, tal que φ ω : I −→ Int N e um laco contratil em c: com efeito, como x1
e x2 pertencem a mesma classe de raızes de φ em c, segue que existe um caminho
ω′ : I −→ Int M, ligando x1 a x2, tal que φω′ : I −→ Int N e um laco contratil em c; logo,
se a imagem ω′(I) nao estiver contida em B (conforme queremos), pode-se deformar
ω′(I) numa vizinhanca contratil de cada ponto y ∈ ω′(I) ∩ (Int M r B), de maneira a
obter um caminho ω : I −→ B, homotopico a ω′, com φ ω homotopico a φ ω′. Pelo
que vimos na demonstracao do lema 2.4.3, temos ainda que tal caminho ω : I −→ B
R-relaciona os pontos x1 e x2 com respeito a restricao h |B : B −→ Y. Isto posto, note
entao que:
(h |B)−1(P) = B ∩ h−1(P) = B ∩ x ∈ X : h(x) ∈ P
= B ∩ x ∈ X : (e(x),φ0(x)) ∈ Int M × c
= B ∩ x ∈ X : φ(x) = c = B ∩ φ−1(c)
= x1, x2 .
Em contrapartida, lembrando que φ : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) e transversa
a c, seja Ec ⊆ Int N uma vizinhanca euclidiana de c, tal que φ−1(Ec) = E1 ∪ E2, onde
E1,E2 ⊆ B sao vizinhancas euclidianas disjuntas de x1 e x2, respectivamente, que sao
levadas homeomorficamente por φ sobre Ec (de modo que a restricao φ |B : B −→ Int N
e, portanto, transversa a c); denotando por rδ : E = E1 ∪ E2 −→ (h |B)−1(P) = x1, x2 a
retracao dada por:
rδ(x) =
x1 se x ∈ E1
x2 se x ∈ E2
,
temos que δ = δn = (E, (h |B)−1(P), rδ) e um microfibrado normal sobre (h |B)−1(P) = x1, x2,
tal que h |B = (e |B,φ0 |B) : B −→ Y e topologicamente transversa a δ. Logo, do lema 2.4.2,
segue que existe uma aplicacao contınua ~ : B −→ Y r P = Int M × (Int N r c),
homotopica a h |B : B −→ Y por uma homotopia K : B × I −→ Y tal que K(x, t) = ~(x) =
(h |B)(x) para todo (x, t) ∈ ∂B × I. Assim, considerando a aplicacao ~′ : X = Int M −→
Y = Int M × Int N dada por:
~′(x) =
~(x) se x ∈ B
h(x) se x ∈ X r B,
temos que ~′ encontra-se bem definida e e contınua em X. Alem disso, sendo e : B −→
Int M, φ : B −→ Int N r c, e′ : Int M −→ Int M e φ′0 : Int M −→ Int N as aplicacoes
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 143
contınuas tais que ~ = (e, φ) e ~′ = (e′,φ′0), temos que:
φ′0(x) =
φ(x) se x ∈ B
φ(x) se x ∈ X r B,
e, consequentemente, a aplicacao φ′ : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N), dada por
φ′(x) =
φ′0(x) se x ∈ X = Int M
φ(x) se x ∈ ∂M=
φ(x) se x ∈ B
φ(x) se x ∈M r B,
tambem encontra-se bem definida e e contınua em M. Como φ : B −→ Int N × c nao
possui raızes em c, e φ e transversa a c (com φ−1(c) r x1, x2 ⊆ Int(X r B) = X r B),
temos que φ′ e transversa a c, e satisfaz (φ′)−1(c) = φ−1(c) r x1, x2; observe ainda
que R′ = R r x1, x2 constitui uma classe de raızes de φ′ em c, pois, dados x′, x′′ ∈
R r x1, x2 ⊆ Int M r B, e sendo α : I −→ M um caminho ligando x′ a x′′, tal que
φ α : I −→ N e um laco contratil em c, podemos deformar α numa vizinhanca de cada
ponto y = α(t) ∈ B, de modo a encontrar um caminho β : I −→ XrB, ligando x′ a x′′, tal
que φ β = φ′ β e homotopico a φ α. Por outro lado, como φ′ difere de φ apenas no
compacto B ⊆ Int M, temos que φ′ e uma aplicacao propria, enquanto que a aplicacao
K′ : (M × I, ∂M × I) −→ (N, ∂N), definida por:
K′(x, t) =
(πN K)(x, t) se x ∈ B , ∀t ∈ I
φ(x) se x ∈M r B , ∀t ∈ I,
constitui uma homotopia propria entre φ′ e φ, onde πN : Y −→ Int N e a projecao
de Y = Int M × Int N sobre Int N (lembre-se que K : B × I −→ Y e uma homotopia
entre ~ = (e, φ) = (e,φ′ |B) e h |B = (e |B,φ |B), tal que K(x, t) = ~(x) = (h |B)(x) para todo
(x, t) ∈ ∂B × I). Deste modo, concluımos que φ′ : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) e a
aplicacao que procuravamos.
Finalmente, vamos mostrar agora que os numeros de Nielsen de raızes sao rea-
lizaveis, com respeito a homotopias proprias, desde que a dimensao n das variedades
topologicas envolvidas seja diferente de 2 (conforme veremos na secao 3.2 mais adiante,
para o caso n = 2 este resultado geralmente nao e valido).
Teorema 2.4.2 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria, entre varieda-
des topologicas conexas de mesma dimensao n, e considere um ponto c ∈ Int N. Se n , 2, entao
existe uma aplicacao contınua propria g : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), propriamente homotopica a f ,
que e transversa a c e possui exatamente N∩( f , c) raızes em c. Em outras palavras, se n , 2, o
numero de Nielsen transverso de raızes e realizavel, ou seja, N∩( f , c) =MR∩[ f ; c].
144 Teoria de Nielsen de Raızes
Demonstracao. Primeiramente, suponhamos que n = 1; neste caso, pelo teorema de
classificacao das variedades topologicas de dimensao 1 (vide [Le], teorema 6.1, pagina
118), segue que M e N devem ser homeomorfas a subconjuntos conexos de S1 ou R.
Logo, sem muitas dificuldades, pode-se verificar que f deve assumir uma das seguintes
formas:
(i) f : R −→ R;
(ii) f : S1 −→ R;
(iii) f : S1 −→ S1;
(iv) f : (I, ∂I) −→ (I, ∂I);
(v) f : (R+, 0) −→ (R+, 0), onde R+ = x ∈ R : x > 0.
Note que, como f deve ser (por hipotese) uma aplicacao contınua propria que preserva
fronteira, os demais casos possıveis (isto e, que nao contradizem as hipoteses do pro-
blema) podem ser reduzidos a um dos cinco listados acima. Deste modo, observando
que os casos (i), (ii), e (iii) ja foram discutidos respectivamente nos exemplos 2.3.2,
2.3.3 e 2.3.4, enquanto que, em (iv) e (v), a demonstracao segue o mesmo raciocınio do
exemplo 2.3.2, concluımos que o teorema e valido em dimensao n = 1.
Isto posto, suponhamos que n > 3; do teorema C.1 do apendice C, sabemos que existe
uma aplicacao contınua propria F : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N), propriamente
homotopica a f , tal que F−1(c) = f−1(c). Assim, consideremos novamente X = Int M,
Y = Int M× Int N e P = Int M × c, e seja η = ηn = (Y,P, r) o microfibrado normal (sobre
P) cuja retracao r : Y −→ P e dada por r(x, y) = (x, c) para cada (x, y) ∈ Y; se W ⊆ Int M
e um aberto tal que f−1(c) ∩W = ∅, segue que a restricao F |W : W −→ Int N satisfaz:
(F |W)−1(c) =W ∩ F−1(c) =W ∩ f−1(c) = ∅ .
Logo, por vacuidade, temos que F |W e transversa a c ∈ Int N, e, consequentemente
(pela proposicao 2.4.1), existe uma aplicacao contınua e : Int M −→ Int M tal que a
restricao h |W : W −→ Y, da aplicacao h = (e,F 0) : X = Int M −→ Y = Int M × Int N, e
topologicamente transversa a η. Por outro lado, sendo V ⊆ Int N uma n-bola propria
contendo c, considere U = F−1(V) ⊆ Int M; como V e compacto (uma vez que V e
homeomorfo ao disco unitario fechado Dn ⊆ Rn), temos que F−1(V) tambem o e, o
que implica que U e compacto, pois U = F−1(V) ⊆ F−1(V). Portanto, temos que
U = F−1(V) e uma vizinhanca aberta de F−1(c) = f−1(c) em X = Int M, tal que U e
compacto. Agora, lembrando que toda variedade topologica e metrizavel, e denotando
por dN : Int N −→ R+ uma metrica em Int N, seja ǫ : X −→ R+ a aplicacao contınua
definida por:
ǫ(x) =dN(c,F (x))
2
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 145
para cada x ∈ X = Int M, e considere a metrica dY : Y = Int M × Int N −→ R+ dada por:
dY((x, y), (x′, y′)) = dM(x, x′) + dN(y, y′)
para cada (x, y), (x′, y′) ∈ Y, onde dM : Int M −→ R+ e uma metrica em Int M. Utilizando
o teorema 2.4.1 (com C = ∅, VC = W, D = f−1(c) = F−1(c) e VD = U), segue entao que
existe uma vizinhanca aberta Vǫ ⊆ X de f−1(c) = F−1(c), bem como uma homotopia
Hǫ : X × I −→ Y, entre h = (e,F 0) e outra aplicacao contınua h′ : X −→ Y, tais que:
(I) Hǫ(x, t) = h(x) para todo x ∈ X rU e todo t ∈ I;
(II) a restricao h′ |Vǫ: Vǫ −→ Y e topologicamente transversa a η;
(III) dY(Hǫ(x, t), h(x)) 6 ǫ(x) para todo (x, t) ∈ X × I.
Em particular, sendo h′1
: Int M −→ Int M e h′2 : Int M −→ Int N as aplicacoes contınuas
tais que h′ = (h′1, h′2) : X = Int M −→ Y = Int M × Int N, segue (do item (I) dado acima)
que (h′1(x), h′2(x)) = h′(x) = h(x) = (e(x),F (x)) para todo x ∈ X r U, o que significa que
h′2(x) = F (x) para cada x ∈ X rU (isto e, h′2 coincide com F em X r U). Alem disso, se
h′ |Vǫ= (h′
1|Vǫ, h′2 |Vǫ
) : Vǫ −→ Y e topologicamente transversa a η, temos (da proposicao
2.4.1) que a restricao h′2 |Vǫ: Vǫ −→ Int N e transversa a c. Entretanto, do item (III) acima,
segue que:
dN(h′2(x),F (x)) = dM(h′1(x), e(x)) + dN(h′2(x),F (x))
= dY((h′1(x), h′2(x)), (e(x),F (x)))
= dY(h′(x), h(x)) 6dN(c,F (x))
2
para todo x ∈ X. Logo, se x ∈ (h′2)−1(c), temos que
dN(c,F (x)) 6dN(c,F (x))
2,
ou seja, dN(c,F (x)) = 0, o que implica que F (x) = c; em contrapartida, se x ∈ F−1(c),
segue que:
dN(h′2(x), c) 6dN(c, c)
2= 0 ,
isto e, dN(h′2(x), c) = 0, o que, por sua vez, significa que h′2(x) = c. Deste modo,
obtemos que (h′2)−1(c) = F−1(c) = f−1(c), e, consequentemente, como Vǫ ⊆ X = Int M
e uma vizinhanca aberta de f−1(c) = (h′2)−1(c), e a restricao h′2 |Vǫ: Vǫ −→ Int N e
transversa a c, segue que h′2 : Int M −→ Int N e transversa a c. Assim, da proposicao
2.4.1, concluımos que existe uma aplicacao contınua λ : Int M −→ Int M tal que ~ =
(λ, h′2) : X = Int M −→ Y = Int M × Int N e topologicamente transversa ao microfibrado
146 Teoria de Nielsen de Raızes
η. Ademais, como h′2(x) = F (x) para todo x ∈ X r U ⊇ ∂M, temos que a aplicacao
ϕ : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N), definida por
ϕ(x) =
h′2(x) se x ∈ Int M
F (x) se x ∈ ∂M,
encontra-se bem definida e e contınua em M. Note ainda queϕ e propria e transversa a
c (poisϕ difere de F apenas no compacto U ⊆ Int M, e h′2 = ϕ |Int M e transversa a c), alem
de ser propriamente homotopica a F , pela homotopia H : (M × I, ∂M × I) −→ (N, ∂N)
dada por:
H(x, t) =
(πN Hǫ)(x, t) se x ∈ Int M
F (x) se x ∈ ∂M,
onde πN : Y −→ Int N e a projecao de Y = Int M × Int N sobre Int N (lembre-se que
Hǫ(x, t) = h(x) = (e(x),F (x)) para todo x ∈ X r U ⊇ ∂M, de modo que H esta bem
definida).
Agora, lembremos que o fato de ϕ ser transversa a c, significa que existe uma
vizinhanca euclidiana Ec ⊆ Int N de c tal que ϕ−1(Ec) e uma uniao finita e disjunta de
vizinhancas euclidianas E1, E2, . . ., Es ⊆ Int M, cada uma das quais e levada homeomor-
ficamente por ϕ sobre Ec; daı, segue que ϕ−1(c) e um subconjunto discreto e finito de
Int M, digamos ϕ−1(c) = x1, x2, . . . , xs, com xi ∈ Ei para cada i ∈ 1, 2, . . . , s. No entanto,
sendo R = xi1 , xi2 , . . . , xik ⊆ ϕ−1(c) uma classe de raızes de ϕ em c, sabemos (pelo que
vimos no exemplo 1.3.7) que:
|m(R)| =
∣∣∣∣∣∣k∑
j=1
degc(ϕ |Ei j)
∣∣∣∣∣∣ ;
logo, como ϕ |Ei j: Ei j
−→ Ec e um homeomorfismo sobre Ec para cada j ∈ 1, 2, . . . , k,
temos que degc(ϕ |Ei j) = ±1, o que implica que |m(R)| 6 k. Alem disso, se k > |m(R)|, segue
que existem pelo menos dois pontos x j1 , x j2 ∈ R = xi1 , xi2 , . . . , xik tais que degc(ϕ |E j1) =
−degc(ϕ |E j2), o que mostra que k deve ser da forma k = |m(R)|+2 ·ℓ, onde ℓ e um numero
natural positivo.
Considere entao uma classe de raızes R deϕ em c, contendo uma quantidade (finita)
k > |m(R)| pontos; como ~ = (λ, h′2) = (λ,ϕ0) e topologicamente transversa a η, segue (do
lema 2.4.4) que existem pelo menos dois pontos x1, x2 ∈ R que estao R-relacionados com
respeito a aplicacao ~. Portanto, de maneira analoga ao que fizemos na demonstracao
do lema 2.4.5, podemos utilizar o lema 2.4.2 para mostrar que existe uma aplicacao
contınua propria ϕ′ : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N), transversa a c e propriamente
homotopica a ϕ, tal que, exceto por x1 e x2, ϕ′ possui as mesmas raızes de ϕ em c (isto
e, (ϕ′)−1(c) = ϕ−1(c)r x1, x2), e R′ = Rr x1, x2 e uma clase de raızes de ϕ′ em c. Como
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 147
este processo nao altera a composicao das demais classes de raızes de ϕ em c, podemos
aplica-lo a cada uma das classes de raızes de ϕ em c, “removendo” pares de pontos por
meio de homotopias proprias ate que suas cardinalidades sejam iguais a |m(R)|, obtendo
enfim uma aplicacao contınua propria g : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N), transversa
a c e propriamente homotopica a ϕ, cujas classes de raızes em c contem exatamente
|m(R)| pontos; observe que, se |m(R)| = 0 (e, consequentemente, N∩(ϕ, c) = 0, uma vez
que todas as classes de raızes de ϕ em c tem a mesma multiplicidade), segue que g nao
possui raızes em c.
Finalmente, note entao que o numero de classes de raızes de g em c e igual ao numero
r > 0 de classes de raızes essenciais de ϕ em c; logo, a quantidade de raızes de g em
c e r · |m(R)|. Ora, da definicao 2.3.3, sabemos que N∩(ϕ, c) = r · |m(R)|; no entanto,
como ϕ : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) e propriamente homotopica a aplicacao
F : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N), e esta, por sua vez, e propriamente homotopica a
f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), temos (do corolario 2.3.2) que N∩(ϕ, c) = N∩(F , c) = N∩( f , c),
d’onde concluımos que g : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) e uma aplicacao contınua
propria, transversa a c e propriamente homotopica a f , que possui exatamente N∩( f , c)
raızes em c, provando que o numero de Nielsen transverso N∩( f , c) e realizavel.
Agora, a fim de mostrarmos que o numero de Nielsen N( f , c) tambem e realizavel,
precisaremos do seguinte lema:
Lema 2.4.6 . Sendo φ : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) uma aplicacao contınua propria
(entre variedades topologicas conexas de mesma dimensao n > 2), transversa a um ponto
c ∈ Int N, considere um ponto x0 ∈ φ−1(c), pertencente a uma classe de raızes R de φ em
c, e sejam B0 ⊆ Int M e C ⊆ Int N n-bolas proprias contendo x0 e c, respectivamente, com
B0 ⊆ Int M e B0 ∩ φ−1(c) = x0, tais que B0 e levada homeomorficamente por φ sobre C. Se
degc(φ |B0) = 1 entao, dado um inteiro ℓ > 1 arbitrario, existem pontos x1, x2, . . . , xℓ ∈ B0, bem
como uma aplicacao contınua propria φ′ : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N), propriamente
homotopica a φ, tais que:
(i) φ′(x) = φ(x) para todo x ∈M r B0;
(ii) B0 ∩ (φ′)−1(c) = x0, x1, x2, . . . , xℓ;
(iii) R′ = R ∪ x1, x2, . . . , xℓ e uma classe de raızes de φ′ em c;
(iv) x1 esta contido numa n-bola propria B1 ⊆ B0, tal que B1 ⊆ B0, B1 ∩ (φ′)−1(c) = x1,
degc(φ′ |B1
) = ℓ − 1, e a restricao φ′ |MrB1: M r B1 −→ N r C e transversa a c, e satisfaz
(φ′ |MrB1)(Int(M r B1)) ⊆ Int(N r C) e (φ′ |MrB1
)(∂M ∪ ∂B1) ⊆ ∂N ∪ ∂C;
148 Teoria de Nielsen de Raızes
(v) os pontos x2, x3, . . . , xℓ estao respectivamente contidos em vizinhancas euclidianas U2, U3,
. . ., Uℓ ⊆ Int M, que sao levadas homeomorficamente por φ′ sobre uma mesma vizinhanca
euclidiana de c em Int N, tais que degc(φ′ |Ui
) = −1 para cada i ∈ 2, 3, . . . , ℓ.
Demonstracao. Vide [Bk3], lema 5.35, paginas 425 e 426.
Teorema 2.4.3 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria, entre varieda-
des topologicas conexas de mesma dimensao n, e considere um ponto c ∈ Int N. Se n , 2, entao
existe uma aplicacao contınua propria g : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), propriamente homotopica a f ,
que possui exatamente N( f , c) raızes em c. Em outras palavras, se n , 2, o numero de Nielsen
de raızes e realizavel, ou seja, N( f , c) =MR[ f ; c].
Demonstracao. Conforme observamos na demonstracao do teorema 2.4.2, podemos
supor que n > 3, uma vez que o caso n = 1 segue de imediato dos exemplos 2.3.2,
2.3.3 e 2.3.4. Por outro lado, utilizando o teorema 2.4.2, sabemos que existe uma
aplicacao contınua propria φ0 : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N), transversa a c ∈ Int N
e propriamente homotopica a f , contendo exatamente r = N( f , c) classes de raızes em
c, sendo que cada uma delas, por sua vez, contem o mesmo numero k > 0 de raızes
(mais precisamente, φ0 e a aplicacao g mencionada na demonstracao do teorema 2.4.2).
Isto posto, se N( f , c) = 0, segue que φ0 nao possui raızes em c, d’onde concluımos
que φ0 e a aplicacao que procuramos. Suponhamos entao que r = N( f , c) > 1, e seja
R0 = x1, x2, . . . , xk uma classe de raızes de φ0 em c; como φ0 e transversa a c, segue
que existem vizinhancas euclidianas U1,U2, . . . ,Uk ⊆ Int M e Vc ⊆ Int N, contendo os
pontos x1, x2, . . ., xk, c, respectivamente, tais que, para cada i ∈ 1, 2, . . . , k, a restricao
φ0 |Ui: Ui −→ Vc e um homeomorfismo sobre Vc. Logo, orientando o aberto U =
k⋃
i=1
Ui
pelo processo de orientacao (dado na definicao 1.3.6), temos que:
|m(R0)| =
∣∣∣∣∣∣k∑
i=1
degc(φ0 |Ui)
∣∣∣∣∣∣
(vide exemplo 1.3.8); assim, como φ0 |Ui: Ui −→ Vc e um homeomorfismo para
cada i ∈ 1, 2, . . . , k, temos que degc(φ0 |Ui) = ±1, o que implica que |m(R0)| 6 k.
Observe entao que, se |m(R0)| < k, segue que existem i1, i2 ∈ 1, 2, . . . , k tais que
degc(φ0 |Ui1) = −degc(φ0 |Ui2
); portanto, pelo lema 2.4.5, existe uma aplicacao contınua
propriaφ′0 : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N), transversa a c e propriamente homotopica
a φ0, tal que toda classe de raızes R , R0 de φ0 em c constitui uma classe de raızes de
φ′0 em c, e R′0 = R0 r xi1 , xi2 e uma classe de raızes de φ′0 em c. Deste modo, apli-
cando repetidamente o lema 2.4.5, a fim de “remover” os pares de pontos xi, x j ∈ R0
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 149
tais que degc(φ0 |Ui) = −degc(φ0 |U j
), obtemos uma aplicacao contınua propria φ1 :
(M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N), transversa a c e propriamente homotopica aφ0, tal que
φ1 possui as mesmas classes de raızes deφ0 em c, com excecao de R0, que e “substituıda”
por uma classe de raızes R1 ⊆ R0 contendo exatamente ℓ = |m(R0)| pontos, digamos xλ1,
xλ2, . . ., xλℓ ∈ R0, com degc(φ0 |Uλi
) = degc(φ0 |Uλ j) para quaisquer i, j ∈ 1, 2, . . . , ℓ. Note
que ℓ > 1, pois, se ℓ = |m(R0)| = 0, terıamos que N( f , c) = N(φ0, c) = 0, uma vez que
quaisquer duas classes de raızes de φ0 em c possuem a mesma multiplicidade (teorema
2.1.2).
Agora, observe que, sem perda de generalidade, podemos supor degc(φ0 |Uλi) = 1
para cada i ∈ 1, 2, . . . , ℓ (pois, caso contrario, basta “invertermos” a orientacao do
aberto U adotada inicialmente). Por outro lado, da transversalidade de φ1 em relacao
ao ponto c, sabemos que existem n-bolas proprias B ⊆ Int M e C ⊆ Int N, contendo xλ1
e c, respectivamente, com B ⊆ Uλ1⊆ Int M e B ∩ φ−1
1(c) = xλ1
, tais que B e levada
homeomorficamente por φ1 sobre C. Logo, pelo lema 2.4.6, segue que existem pontos
x′λ1
, x′λ2
, . . ., x′λℓ+1∈ B, bem como uma aplicacao contınua propria φ′
1: (M, ∂M, Int M) −→
(N, ∂N, Int N), propriamente homotopica a φ1, tais que:
(i) φ′1(x) = φ1(x) para todo x ∈M r B;
(ii) B ∩ (φ′1)−1(c) = xλ1
, x′λ1, x′λ2, . . . , x′
λℓ+1;
(iii) R′1= R1 ∪ x
′λ1, x′λ2, . . . , x′
λℓ+1 = xλ1
, xλ2, . . . , xλℓ , x
′λ1, x′λ2, . . . , x′
λℓ+1 e uma classe de
raızes de φ′1
em c;
(iv) x′λℓ+1
esta contido numa n-bola propria B1 ⊆ B, tal que B1 ⊆ B, B1∩ (φ′1)−1(c) = x′
λℓ+1,
degc(φ′1|B1
) = ℓ, e a restricao φ′1|MrB1
: M r B1 −→ N r C e transversa a c e satisfaz
(φ′1|MrB1
)(Int(M r B1)) ⊆ Int(N r C) e (φ′1|MrB1
)(∂M ∪ ∂B1) ⊆ ∂N ∪ ∂C;
(v) os pontos x′λ1, x′λ2, . . . , x′
λℓestao respectivamente contidos em vizinhancas euclidia-
nas U′1,U′2, . . . ,U
′ℓ⊆ Int M, que sao levadas homeomorficamente por φ′
1sobre uma
mesma vizinhanca euclidiana de c em Int N, tais que degc(φ′1|U′
i) = −1 para cada
i ∈ 1, 2, . . . , ℓ.
No entanto, de (i) e (v), temos que degc(φ′1|Uλi
) = −degc(φ′1|U′
λi) para todo i ∈ 1, 2, . . .,
ℓ; assim, como a restricao φ′1|MrB1
: (M r B1, Int(M r B1), ∂M ∪ ∂B1) −→ (N r C, Int(N r
C), ∂N ∪ ∂C) e uma aplicacao contınua propria transversa a c, com B1 ∩ (φ′1)−1(c) =
x′λℓ+1, podemos aplicar novamente o lema 2.4.5, “removendo” os pares de pontos xλi
,
x′λi∈ R′
1, onde i ∈ 1, 2, . . . , ℓ, de maneira a obter uma aplicacao contınua propria
ψ′0 : (M r B1, Int(M r B1), ∂M ∪ ∂B1) −→ (N r C, Int(N r C), ∂N ∪ ∂C), transversa a c e
propriamente homotopica a φ′1|MrB1
, que possui as mesmas classes de raızes de φ′1|MrB1
,
com excecao de R′1r x′
λℓ+1 = xλ1
, xλ2, . . . , xλℓ , x
′λ1, x′λ2, . . . , x′
λℓ (a qual “desaparece”),
150 Teoria de Nielsen de Raızes
e que coincide com φ′1|MrB1
em (M r B1) r W ⊇ ∂B1, onde W ⊆ Int(M r B1) e uma
uniao de n-bolas proprias B′1,B′2, . . . ,B
′ℓ⊆ Int(M r B1), tais que B′
i⊆ Int(M r B1) e
B′i∩ (φ′
1|MrB1
)−1(c) = xλi, x′λi para cada i ∈ 1, 2, . . . , ℓ. Deste modo, considerando a
aplicacao ψ0 : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) dada por:
ψ0(x) =
ψ′0(x) se x ∈M r B1
φ′1(x) se x ∈ B1
,
podemos ver que ψ0 esta bem definida e e contınua em M (pois φ′1
coincide com ψ′0 em
∂B1 = (M r B1) ∩ B1), alem de ser propria, transversa a c e propriamente homotopica
a φ′1
(uma vez que ψ0 difere de φ′1
apenas no compacto W ∪ B1, sendo que φ′1|B1
e ψ′0sao transversas a c). Note que, de fato, temos ψ0(∂M) ⊆ ∂N e ψ0(Int M) ⊆ Int N, pois
∂M ⊆ (M r B1) rW e ψ′0(∂M) = φ′1(∂M) ⊆ ∂N, enquanto que:
ψ0(Int M) = ψ0(W) ∪ ψ0(B1) ∪ ψ0(Int M r (B1 ∪W))
= ψ′0(W) ∪ φ′1(B1) ∪ φ′1(Int M r (B1 ∪W))
⊆ ψ′0(Int(M r B1)) ∪ φ′1(Int M)
⊆ Int(N r C) ∪ Int N = Int N .
Observe ainda que as classes de raızes de φ1’em c, distintas de R′1= xλ1
, xλ2, . . . , xλℓ , x
′λ1
,
x′λ2, . . . , x′
λℓ+1 (que tambem sao classes de raızes de φ1 em c, e, portanto, de φ0 em c),
constituem classes de raızes de ψ0 em c; em contrapartida, a classe R′1
foi “substituıda”
por Rψ0= x′
λℓ+1 ⊆ B1, de modo que ψ0 possui o mesmo numero r = N( f , c) > 1 de
classes de raızes de φ0 em c.
Finalmente, repetindo o mesmo procedimento descrito acima para as demais classes
de raızes de φ0 em c, obtemos uma aplicacao contınua propria g : (M, ∂M, Int M) −→
(N, ∂N, Int N), propriamente homotopica a φ0, que contem exatamente N( f , c) classes
de raızes em c, cada uma das quais contendo exatamente uma raiz. Logo, como φ0 e
propriamente homotopica a f , segue que g e a aplicacao que procuravamos.
Para encerrarmos esta secao, veremos agora alguns exemplos que ilustram os teore-
mas 2.4.2 e 2.4.3.
Exemplo 2.4.2 . Seja f : Sn −→ Sn uma aplicacao contınua (propria) de grau d( f ) = d,
com |d| > 1, e considere um ponto c ∈ Sn. Se n > 3, segue (do exemplo 2.3.5 e do
teorema 2.4.3) que existe uma aplicacao contınua (propria) g : Sn −→ Sn, propria-
mente homotopica a f , que possui exatamente N( f , c) = 1 raiz em c. Entretanto, como
N∩( f , c) = |d| > 1 (vide exemplo 2.3.5), segue que esta aplicacao g : Sn −→ Sn nao pode
ser transversa a c, pois qualquer aplicacao transversa a c e propriamente homotopica
2.4 A Realizacao dos Numeros de Nielsen de Raızes 151
a f , deve ter no mınimo N∩( f , c) = |d| raızes em c. Com efeito, o teorema 2.4.2 nos
garante que existe uma aplicacao contınua g′ : Sn −→ Sn, transversa a c e propriamente
homotopica a f , que possui exatamente |d| raızes em c.
Exemplo 2.4.3 . Seja f : S2×RP2 −→ S2×RP2 a aplicacao contınua dada por f = f ′× Id,
onde Id : RP2 −→ RP2 e a identidade e f ′ : S2 −→ S2 e uma aplicacao contınua de grau
d( f ′) = d, com |d| > 1. Temos entao que f e uma aplicacao propria entre variedades
topologicas de dimensao 4, com N( f , c) = 1 e N∩( f , c) = |d| > 1, onde c ∈ S2 × RP2
(vide exemplo 2.3.7). Assim, do teorema 2.4.3, segue que existe uma aplicacao contınua
(propria) g : S2 ×RP2 −→ S2 × RP2, propriamente homotopica a f , que possui apenas
uma raiz em c. Entretanto, tal aplicacao g nao pode ser transversa a c, uma vez que
qualquer aplicacao propriamente homotopica a f e transversa a c deve possuir pelo
menos N∩( f , c) = |d| > 1 raızes em c. De fato, pelo teorema 2.4.2, sabemos que existe
uma aplicacao contınua propria g′ : S2×RP2 −→ S2×RP2, transversa a c e propriamente
homotopica a f , com exatamente |d| raızes em c.
Exemplo 2.4.4 . Denotando por Tn o n-toro (isto e, o produto cartesiano de n copias
de S1), com n > 3, seja f : Tn −→ Tn uma aplicacao contınua, e considere c ∈ Tn e
x0 ∈ f−1(c). Como Tn e uma variedade topologica compacta e orientavel, temos que f e
uma aplicacao contınua propria do tipo I. Isto posto, lembrando que H1(Tn) ≃ Zn, seja
A = ai j a matriz quadrada de ordem n do homomorfismo induzido ( f∗)1 : H1(Tn) −→
H1(Tn), relativamente a uma base B = b1, b2, . . . , bn de H1(Tn); do exemplo 4.26 de
[Bk3] (paginas 402 e 403), temos que deg( f ) = det A e N( f , c) = |det A|. Portanto, do
corolario 2.3.1, segue que N( f , c) = N∩( f , c) = |det A|, o que, pelos teoremas 2.4.2 e
2.4.3, implica que existe uma aplicacao contınua propria g : Tn −→ Tn, transversa a
c e propriamente homotopica a f , que realiza ambos os numeros de Nielsen N( f , c) e
N∩( f , c).
Observacao 2.4.1 . Seja f : M −→ N uma aplicacao contınua propria entre variedades
topologicas de mesma dimensao n , 2, sem fronteira, e considere um ponto c ∈ N.
Em [Bk2], pagina 282, R. Brooks define uma classe de raızes R de f em c como sendo
essencial se R nao pode ser “removida” por meio de homotopias a partir de f . No
entanto, em [BS4] (observacao 3.2, pagina 255), os autores mostram que, se M e N forem
variedades topologicas fechadas (isto e, compactas e sem fronteira) e orientaveis, entao
R e essencial, segundo a concepcao de Brooks, se, e somente se, |m(R)| , 0. Do teorema
2.4.3, temos que esta equivalencia tambem e valida se f for uma aplicacao propria que
152 Teoria de Nielsen de Raızes
preserva fronteira (com M e N nao necessariamente compactas ou orientaveis): de fato,
pelos lemas 2.2.1 e 2.2.2, e pelos corolarios 2.2.1 e 2.2.2, temos que a multiplicidade
|m(R)| e invariante por homotopias proprias (pois o conceito de grau cohomologico e
invariante por homotopias proprias, conforme vimos na proposicao 1.3.5), e, portanto,
uma classe de raızes R de f em c, tal que |m(R)| , 0 e “preservada” por homotopias
proprias; logo, se f e propria e preserva fronteira, o teorema 2.4.3 nos garante que existe
uma homotopia propria entre f e outra aplicacao g : M −→ N que nao possui classes
de raızes (em c) com multiplicidade nula, o que implica que uma classe de raızes R de
f em c, tal que |m(R)| = 0, nao e “preservada” por toda homotopia propria.
O objetivo deste ultimo capıtulo e interpretar alguns conceitos e resultados da teoria
de Nielsen de raızes na linguagem da teoria do grau de Hopf, bem como apresentar
algumas propriedades destas teorias para aplicacoes entre superfıcies.
Se f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e uma aplicacao contınua propria entre variedades to-
pologicas de mesma dimensao n, sabemos que o grau cohomologico de f , deg( f ),
encontra-se bem definido somente se as variedades M e N forem orientaveis (vide
definicao 1.4.4). Entretanto, se uma delas for nao-orientavel, so podemos definir o
grau cohomologico utilizando coeficientes em Z2, obtendo o denominado grau coho-
mologico mod 2, deg( f , 2), o qual geralmente fornece poucas informacoes a respeito
das propriedades geometricas da aplicacao f ; em particular, ele nao reflete o conceito
geometrico intuitivo de grau, a saber, o “numero de vezes que a imagem f (M) co-
bre o contra-domınio N”. Deste modo, a fim de encontrar um invariante algebrico
que caracterizasse o conceito geometrico de grau independentemente da orientabili-
dade, Hopf acabou por dar significativas contribuicoes a teoria de Nielsen de raızes,
introduzindo um diferente tipo de grau (denominado por ele de “Absolutgrad” ou
“grau absoluto”), que fornece informacoes a respeito das propriedades geometricas de
f mesmo quando uma das variedades M ou N (ou ambas) forem nao-orientaveis (por
outro lado, caso M e N sejam orientaveis, o grau absoluto coincide com o valor absoluto
153
154 Aplicacoes a Teoria do Grau de Hopf
do grau cohomologico de f , conforme veremos nos teoremas 3.1.2 e 3.1.3 a seguir).
Definicao 3.1.1 . Dada uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), entre
variedades topologicas conexas de mesma dimensao n, e considerando-se um ponto c ∈ Int N,
definimos o grau absoluto de f , denotado por A( f ), como sendo a soma das multiplicidades
das classes de raızes de f em c, isto e, A( f ) =∑|m(R)| : R e classe de raızes de f em c.
O motivo que levou Hopf a definir o grau absoluto A( f ) da maneira acima e que,
deste modo, A( f ) encontra-se diretamente relacionado ao conceito de grau geometrico
(conforme veremos no teorema 3.2.1), o qual e dado precisamente pela seguinte
Definicao 3.1.2 . Dada uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), entre
variedades topologicas conexas de mesma dimensao n, definimos o grau geometrico de f ,
denotado por G( f ), como sendo o menor inteiro positivo para o qual existem uma n-bola fechada
Bn ⊆ Int N e uma aplicacao propria g : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), propriamente homotopica
a f , tais que g−1(Bn) contem exatamente G( f ) componentes conexas, cada uma delas levada
homeomorficamente por g sobre Bn.
Note que, como f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) e propria, o grau geometrico de f de fato
existe, pois G( f ) e limitado superiormente pelo numero de raızes num ponto c ∈ Int N
de uma aplicacao contınua g : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), transversa a c e propriamente
homotopica a f .
Pelas definicoes acima, podemos ver que os graus absoluto e geometrico sao con-
ceitos que, em essencia, pertencem a teoria de Nielsen de raızes. Com efeito, das
definicoes 2.3.3 e 2.3.4, temos de imediato o seguinte resultado:
Teorema 3.1.1 . Sejam M e N variedades topologicas conexas de mesma dimensao n, e considere
uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N). Dado c ∈ Int N, temos entao que
A( f ) = N∩( f , c) e G( f ) = MR∩[ f ; c].
Como podemos verificar na introducao de seu artigo [H2], Hopf percebeu que o
problema de determinar o grau geometrico e equivalente ao de encontrar o numero
mınimo de pontos fixos na classe de homotopia de uma aplicacao, e ele explica tambem
que sua definicao de grau absoluto utiliza uma extensao de certos conceitos para teoria
de raızes que, a epoca, haviam sido recentemente pesquisados por Jakob Nielsen (em
[N1] e [N2]) no estudo dos conjuntos de pontos fixos de uma aplicacao. No entanto,
a motivacao de Hopf para a introducao do grau absoluto A( f ) nao e mencionada em
artigos que posteriormente trataram deste assunto. Conforme vimos na introducao
3.1 Os Graus Absoluto e Geometrico 155
deste trabalho, Epstein (em [E]) interpretou os calculos realizados por Olum em [O]
em termos dos graus de levantamentos de f relativamente a certas aplicacoes de re-
cobrimento (mais especificamente, os recobrimentos que ilustramos no diagrama da
figura 2.2); em [O], Olum obteve os possıveis valores para o numero de Nielsen trans-
verso de raızes N∩( f , c), calculados aqui no teorema 2.3.2, de uma maneira bastante
diferente (utilizando o que ele chamou de “grau do anel de grupo”). Epstein, por sua
vez, classificou as aplicacoes entre variedades topologicas em tres tipos distintos, de
modo equivalente ao que fizemos na definicao 1.2.5, e entao definiu separadamente o
“grau absoluto” A( f ) para cada tipo de aplicacao f (vide [E], pagina 371); ele obser-
vou, contudo, que, apesar de “complicada”, sua definicao para A( f ) e justificada pelo
significado geometrico proveniente da igualdade entre os graus geometrico e absoluto,
demonstrada por Hopf (vide [E], pagina 371), nao fazendo qualquer mencao sobre a
relacao entre a teoria de Nielsen de raızes e o grau absoluto, conforme Hopf idealizou
inicialmente. Assim, pelo fato de [E] ser a referencia mais citada atualmente quando
se trata do grau absoluto (pois contem demonstracoes mais modernas para alguns
dos importantes teoremas estabelecidos por Hopf), a conexao com a teoria de Nielsen
de raızes, que possibilitou a unificacao do grau absoluto de Hopf com o geometrico,
acabou por nao ser preservada na teoria do grau de Hopf.
A equivalencia entre os graus absoluto e geometrico para aplicacoes contınuas entre
variedades topologicas de mesma dimensao n, com n , 2, foi demonstrado primeira-
mente em [H2], pagina 607 (uma nova demonstracao desta igualdade foi o que motivou
o artigo de Epstein, apresentado em [E], teorema 4.1, pagina 376); tendo em vista as
identificacoes dadas no teorema 3.1.1, segue entao que o teorema 2.4.2 nos fornece este
mesmo resultado:
Teorema 3.1.2 . Dada uma aplicacao contınua propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), entre varie-
dades topologicas conexas de mesma dimensao n, com n , 2, temos que o grau absoluto A( f ) e
igual ao grau geometrico G( f ).
Por outro lado, se ambas as variedades M e N forem orientaveis, a teoria do grau
de Hopf pode ser relacionada com o grau cohomologico a coeficientes inteiros, o qual
encontra-se bem definido neste caso; mais especificamente, do corolario 2.3.1 e dos
teoremas 3.1.1 e 3.1.2, obtemos o seguinte
Teorema 3.1.3 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria, entre varieda-
des topologicas conexas de mesma dimensao n. Se M e N forem ambas orientaveis, temos que
A( f ) = |deg( f )|; alem disso, se n , 2, tambem temos G( f ) = |deg( f )|.
156 Aplicacoes a Teoria do Grau de Hopf
Nesta secao, vamos analisar alguns resultados sobre a realizacao dos numeros de
Nielsen de raızes para aplicacoes entre superfıcies, uma vez que os teoremas 2.4.2, 2.4.3,
3.1.2 e 3.1.3 excluıram o caso n = 2.
Embora desconhecido a epoca da publicacao do trabalho de Hopf, sabemos atu-
almente que, dada uma aplicacao contınua f : M −→ M, onde M e uma variedade
topologica de dimensao n, o numero de Nielsen N( f ), para pontos fixos de f , pode ser
realizado como o menor numero de pontos fixos na classe de homotopia de f , desde
que tenhamos n , 2, sendo que esta propriedade, contudo, nao e valida (neste nıvel
de generalidade) no caso de M ser uma superfıcie. Deste modo, se f : M −→ N e uma
aplicacao contınua entre superfıcies, nao e de se surpreender que os numeros de Niel-
sen de raızes N( f , c) e N∩( f , c) tambem nao possam ser realizados sem alguma hipotese
adicional acerca de f (ou das superfıcies M e N); o que e surpreendente, no entanto, e
que N∩( f , c) pode ser realizavel ainda que N( f , c) nao o seja, conforme veremos a seguir.
Para aplicacoes contınuas f : M −→ N entre superfıcies, varios autores determina-
ram condicoes que tornam valida a igualdade A( f ) = G( f ), a qual, pelo que vimos no
teorema 3.1.1, e equivalente a afirmacao de que o numero de Nielsen transverso N∩( f , c)
e realizavel. Um resultado desta natureza e dado pelo teorema abaixo, demonstrado
pela primeira vez por H. Kneser em [Kn1] e [Kn2] (e que constitui um corolario do
teorema 2.1, pagina 419, de [Sk]):
Teorema 3.2.1 . Se f : M −→ N e uma aplicacao contınua entre superfıcies fechadas (isto e,
compactas e sem fronteira), entao, para todo c ∈ N, o numero de Nielsen transverso N∩( f , c) e
realizavel, e, consequentemente, A( f ) = G( f ).
Exemplo 3.2.1 . Sendo f : K −→ K a aplicacao contınua dada no exemplo 2.3.9, vimos
que N( f , c) = N∩( f , c) = |b · e|, onde c ∈ K e b, e ∈ Z sao tais que e , 0 e |b| e um numero
ımpar. Logo, do teorema acima, segue que A( f ) = G( f ) = N∩( f , c) = |b · e|, e existe uma
aplicacao contınua g : K −→ K, transversa a c e propriamente homotopica a f , que
contem exatamente |b · e| raızes em c.
Por outro lado, em [Sk], Skora mostrou que, sob certas condicoes, o teorema 3.2.1
pode ser generalizado para aplicacoes contınuas que preservam fronteira, entre su-
perfıcies nao necessariamente compactas; mais especificamente, do teorema 2.5 de
[Sk], temos o seguinte
3.2 Os Numeros de Nielsen de Raızes para Aplicacoes entre Superfıcies 157
Teorema 3.2.2 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria entre su-
perfıcies, e considere um ponto c ∈ N. Se f e fiel a orientacao (isto e, do tipo I), entao o numero
de Nielsen transverso N∩( f , c) e realizavel, e, portanto, A( f ) = G( f ).
Alem disso, na secao 3 (paginas 421 a 423) de [Sk], Skora construiu uma aplicacao
contınua f : M −→ N, entre superfıcies sem fronteira, tal que f e propria, mas nao
fiel a orientacao, e G( f ) > A( f ), demonstrando que a hipotese de ser fiel a orientacao e
necessaria no teorema 3.2.2.
Agora, quanto a realizacao do numero de Nielsen de raızes N( f , c), a questao e mais
delicada, pois as conclusoes dos teoremas 3.2.1 e 3.2.2 nao sao validas se substituir-
mos N∩( f , c) por N( f , c). De fato, utlizando alguns resultados obtidos por Hopf, Lin
encontrou um exemplo de aplicacao contınua f : T2#T2 −→ T2 tal que N( f , c) = 3 e
MR[ f ; c] = 4, o que significa que, neste caso, N( f , c) nao e realizavel (vide [L], secao
4, paginas 205 e 206); note, contudo, que, pelo teorema 3.2.2, N∩( f , c) e realizavel,
uma vez que T2#T2 e T2 sao superfıcies compactas e orientaveis, e, consequentemente,
f : T2#T2 −→ T2 e propria e fiel a orientacao. Para aplicacoes contınuas entre su-
perfıcies fechadas orientaveis, D. L. Goncalves e H. Zieschang provaram o seguinte
resultado (vide [GZ1] e [GZ2], teoremas 3.6 e 2.1, respectivamente):
Teorema 3.2.3 . Sejam M e N superfıcies fechadas orientaveis, de generos h e k, respectivamente,
e considere uma aplicacao contınua f : M −→ N. Se a cardinalidade j do grupo quociente
π1(N)/ f#(π1(M)) for finita (onde f# : π1(M) −→ π1(N) e o homomorfismo induzido por f ),
entao o numero de Nielsen N( f , c) e realizavel (com c ∈ N) se, e somente se,
|deg( f )| 62 · h − 2 + j
2 · k − 1.
Assim, dos calculos dos numeros de Nielsen de raızes, apresentados na secao 2.3,
podemos obter novos resultados a respeito da realizacao de N( f , c) para aplicacoes
entre superfıcies. Por exemplo, se N∩( f , c) for realizavel e N( f , c) = N∩( f , c), teremos
que N( f , c) tambem e realizavel; logo, analisando os teoremas 2.3.1, 2.3.2 e 3.2.1, temos
de imediato o seguinte
Teorema 3.2.4 . Se f : M −→ N e uma aplicacao contınua entre superfıcies fechadas, tal que f
nao e fiel a orientacao, entao, para todo c ∈ N, o numero de Nielsen de raızes N( f , c) e realizavel.
Exemplo 3.2.2 . Sendo f : T2#RP2 −→ T2 a aplicacao contınua dada no item (b) do
exemplo 1.2.3, vimos (no exemplo 2.3.11) que N( f , c) = N∩( f , c) = 1 para qualquer que
158 Aplicacoes a Teoria do Grau de Hopf
seja c ∈ T2 r D1. Portanto, como f e uma aplicacao do tipo III, o teorema acima nos
garante que existe uma aplicacao contınua g : T2#RP2 −→ T2, homotopica a f , que
possui exatamente uma raiz em c.
Em contrapartida, dos teoremas 2.3.1, 2.3.2 e 3.2.1, tambem e imediato o seguinte
Teorema 3.2.5 . Seja f : M −→ N uma aplicacao contınua, fiel a orientacao, entre superfıcies
fechadas nao-orientaveis, e considere um ponto c ∈ N. Utilizando as notacoes adotadas na secao
2.3, temos que, se j for finito, ou |deg(af )| 6 1, entao N( f , c) e realizavel.
Finalmente, observe que os teoremas 2.3.1, 2.3.2 e 3.2.2 nos permitem obter alguns
resultados sobre a realizacao de N( f , c) quando as fronteiras das superfıcies sao eventu-
almente nao-vazias; de fato, por um raciocınio analogo ao utilizado quando enunciamos
os teoremas 3.2.4 e 3.2.5, temos o teorema dado abaixo:
Teorema 3.2.6 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria entre su-
perfıcies, e considere um ponto c ∈ Int N. Utilizando as mesmas notacoes adotadas na secao
2.3, temos que:
(i) se f e fiel a orientacao, com j infinito ou |deg(af )| 6 1, entao N( f , c) e realizavel;
(ii) se f nao e fiel a orientacao, entao (independentemente de j e de deg( f , 2) ∈ Z2) N( f , c)
tambem e realizavel.
O objetivo deste apendice e apresentar uma breve introducao a teoria de limites
diretos (de grupos abelianos e homomorfismos), cujos resultados utilizamos na secao
1.3.
Definicao A.1 . Dizemos que um conjunto Λ e dirigido se seus elementos estao munidos de
uma relacao 6, satisfazendo as seguintes propriedades:
(i) α 6 α para todo α ∈ Λ;
(ii) se α, β,γ ∈ Λ sao tais que α 6 β e β 6 γ, entao α 6 γ;
(iii) dados α, β ∈ Λ, existe δ ∈ Λ tal que α 6 δ e β 6 δ.
O elemento δ mencionado acima e denominado limitante superior para α e β.
Exemplo A.1 . Seja A um subconjunto de uma variedade topologica M, e considere a
famılia Λ de todos os subconjuntos compactos K ⊆ M tais que A ⊆ M r K. Suponha
ainda que os elementos de Λ estao munidos da relacao 6 dada por
K1 6 K2 ⇐⇒ K1 ⊆ K2 (K1,K2 ∈ Λ) ,
denominada inclusao direta. Temos entao que Λ e um conjunto dirigido: com efeito,
as propriedades (i) e (ii) da definicao A.1 sao imediatamente satisfeitas; para verificar
(iii), basta observar que, dados K1,K2 ∈ Λ, o conjunto K3 = K1∪K2 e compacto e satisfaz
A ⊆M r K3 (pois K1 e K2 sao compactos tais que A ⊆ M r K1 e A ⊆M r K2, e, portanto,
A ⊆ (M r K1) ∩ (M r K2) =M r (K1 ∪ K2) =M r K3), isto e, K3 = K1 ∪ K2 e um elemento
de Λ tal que K1 6 K3 e K2 6 K3.
159
160 Limites Diretos
Definicao A.2 . Se Λ e um conjunto dirigido, dizemos que um subconjunto Λ0 ⊆ Λ e cofinal
em Λ se, para cada α ∈ Λ, existe δ ∈ Λ0 tal que α 6 δ; note que Λ0 tambem e um conjunto
dirigido com respeito a relacao de ordem parcial induzida de Λ.
Exemplo A.2 . Considerando o conjunto dos numeros naturaisN, munido da relacao
de ordem usual 6, temos que todo subconjunto infinito deN e cofinal.
Exemplo A.3 . Sendo M uma variedade topologica conexa, considere a famıliaΛ0 cons-
tituıda de todos os subconjuntos compactos e conexos K ⊆ M. Supondo os elementos
de Λ0 munidos da relacao de inclusao direta, temos que Λ0 e um conjunto dirigido: de
fato, as propriedades (i) e (ii) da definicao A.1 sao imediatas; para verificar (iii), basta
observar que, dados K1,K2 ∈ Λ0, podemos ligar K1 e K2 por um arco em M (uma vez
que M e conexa), obtendo um conjunto compacto e conexo K3 ⊆ M tal que K1 6 K3 e
K2 6 K3. Observe entao que todo subconjunto compacto de M esta contido num K ∈ Λ0
(pois todo compacto em M possui um numero finito de componentes conexas, que
podem ser ligadas por arcos em M); logo, temos que Λ0 e um subconjunto cofinal da
famılia Λ de todos os subconjuntos compactos de M (dirigida pela relacao de inclusao
direta).
Definicao A.3 . Um sistema direto de grupos abelianos e homomorfismos, correspondente a
um conjunto dirigido Λ, e uma famılia Gαα∈Λ de grupos abelianos, indexados por Λ, para os
quais existe uma famılia de homomorfismos fαβ : Gα −→ Gβα,β∈Λ, definidos para α 6 β, tais
que:
(i) fαα : Gα −→ Gα e a identidade, para todo α ∈ Λ;
(ii) se α, β,γ ∈ Λ sao tais que α 6 β 6 γ, entao fαγ = fβγ fαβ; em outras palavras, o diagrama
abaixo e comutativo:
Gα Gγ
Gβ
fαγ
fαβ fβγ
Exemplo A.4 . Sendo N o conjunto dos numeros naturais, dirigido pela relacao de
ordem usual 6, considere a famılia Gnn∈N de grupos abelianos, onde Gn = Z para todo
n ∈N, e, para cada par m, n ∈N, com m 6 n, seja fmn : Z −→ Z o homomorfismo dado
por fmn(k) = 2n−m · k. Temos entao que Gn, fmnm,n∈N e um sistema direto, pois:
Limites Diretos 161
(i) para todo n ∈ N, fnn : Gn = Z −→ Z e o homomorfismo identidade, uma vez que
fnn(k) = 2n−n · k = k, para cada k ∈ Z;
(ii) dados m, n, p ∈N, com m 6 n 6 p, segue que:
( fmn fnp)(k) = fmn( fnp(k)) = fmn(2p−n · k)
= 2n−m · (2p−n · k) = 2p−m · k
= fmp(k)
qualquer que seja k ∈ Z (isto e, fmn fnp = fmp).
Proposicao A.1 . Seja Gα, fαβα,β∈Λ um sistema direto de grupos abelianos e homomorfismos
(onde Λ e um conjunto dirigido). Sem perda de generalidade podemos supor que os grupos Gα
cosntituem conjuntos dois a dois disjuntos (pois, caso contrario, podemos substituir qualquer
um deles por um outro grupo abeliano isomorfo a ele). Assim, considerando a uniao disjunta dos
grupos Gα (como conjuntos), vamos definir a seguinte relacao de equivalencia: dados gα ∈ Gα
e gβ ∈ Gβ, com α, β ∈ Λ, diremos que gα ∼ gβ se, e somente se, fαδ(gα) = fβδ(gβ) para algum
limitante superior δ ∈ Λ de α e β. Deste modo, sendo G∞ o conjunto das classes de equivalencia
segundo esta relacao, temos que G∞ constitui um grupo abeliano quando munido da operacao
binaria dada por:
JgαK + JgβK = J fαδ(gα) + fβδ(gβ)K ,
onde J K denota a classe de equivalencia segundo a relacao ∼, e δ ∈ Λ e um limitante superior
de α e β. Neste caso, denotando por 0α o elemento identidade do grupo Gα, temos que o elemento
identidade do grupo G∞ e a classe J0αK, onde α ∈ Λ pode ser tomado arbitrariamente.
Demonstracao. Primeiramente, mostremos que ∼ e de fato uma relacao de equi-
valencia. Com efeito, dados gα ∈ Gα, gβ ∈ Gβ e gγ ∈ Gγ (onde α, β,γ ∈ Λ), podemos
ver facilmente que gα ∼ gα, e que, se gα ∼ gβ, entao gβ ∼ gα. Suponhamos, pois, que
gα ∼ gβ e gβ ∼ gγ; isto significa que existem δ,ω ∈ Λ, com α, β 6 δ e β,γ 6 ω, tais que
fαδ(gα) = fβδ(gβ) e fβω(gβ) = fγω(gγ). Logo, se δ 6 ω, segue queω e um limitante superior
de α e γ, tal que:
fαω(gα) = fδω( fαδ(gα)) = fδω( fβδ(gβ)) = fβω(gβ) = fγω(gγ) .
Portanto, existe um limitante superior λ ∈ Λ de α e γ satisfazendo fαλ(gα) = fγλ(gγ), o
que, por definicao, implica que gα ∼ gγ.
Agora, observe que a operacao binaria dada acima esta bem definida: de fato, se
gα ∈ Gα, gβ ∈ Gβ, gγ ∈ Gγ e gǫ ∈ Gǫ sao tais que JgαK = JgγK e JgβK = JgǫK, segue
que gα ∼ gγ e gβ ∼ gǫ, isto e, existem δ,ω ∈ Λ, com α,γ 6 δ e β, ǫ 6 ω, tais que
162 Limites Diretos
fαδ(gα) = fγδ(gγ) e fβω(gβ) = fǫω(gǫ). Logo, se δ 6 ω, segue queω e um limitante superior
de α, β, γ e ǫ, tal que:
JgαK + JgβK = J fαω(gα) + fβω(gβ)K = J fαω(gα) + fǫω(gǫ)K
= J fδω( fαδ(gα)) + fǫω(gǫ)K = J fδω( fγδ(gγ)) + fǫω(gǫ)K
= J fγω(gγ) + fǫω(gǫ)K = JgγK + JgǫK ;
por outro lado, se ω 6 δ, temos que δ e um limitante superior de α, β, γ e ǫ, tal que:
JgαK + JgβK = J fαδ(gα) + fβδ(gβ)K = J fγδ(gγ) + fβδ(gβ)K
= J fγδ(gγ) + fωδ( fβω(gβ))K = J fγδ(gγ) + fωδ( fǫω(gǫ))K
= J fγδ(gγ) + fǫδ(gǫ)K = JgγK + JgǫK .
Resumindo, se JgαK = JgγK e JgβK = JgǫK, segue que JgαK+ JgβK = JgγK+ JgǫK, o que prova
que a operacao binaria + esta de fato bem definida. Note ainda que esta operacao e
comutativa, pois, dados gα ∈ Gα e gβ ∈ Gβ, segue que:
JgαK + JgβK = J fαδ(gα) + fβδ(gβ)K = J fβδ(gβ) + fαδ(gα)K = JgβK + JgαK ,
para todo limitante superior δ ∈ Λ de α e β (lembre-se que Gδ e um grupo abeliano,
qualquer que seja δ ∈ Λ).
Finalmente, vamos mostrar entao que o conjunto G∞ (contendo as classes de equi-
valencia dos elementos dos grupos Gα), munido da operacao binaria +, constitui um
grupo (abeliano, devido a comutatividade desta operacao). Com efeito, dados gα ∈ Gα,
gβ ∈ Gβ e gγ ∈ Gγ (onde α, β,γ ∈ Λ), sejam δ, ǫ,ω ∈ Λ tais que α, β 6 δ, β,γ 6 ǫ e δ, ǫ 6 ω
(o que implica que δ,γ 6 ω). Temos, pois, que:
(JgαK + JgβK) + JgγK = J fαδ(gα) + fβδ(gβ)K + JgγK
= J fδω( fαδ(gα) + fβδ(gβ)) + fγω(gγ)K
= J fδω( fαδ(gα)) + fδω( fβδ(gβ)) + fγω(gγ)K
= J fαω(gα) + fβω(gβ) + fγω(gγ)K
= J fαω(gα) + fǫω( fβǫ(gβ)) + fǫω( fγǫ(gγ))K
= J fαω(gα) + fǫω( fβǫ(gβ)) + fγǫ(gγ)K
= JgαK + J fβǫ(gβ) + fγǫ(gγ)K
= JgαK + (JgβK + JgγK) ,
o que prova a associatividade da operacao +. Agora, denotando por 0α o elemento
identidade do grupo Gα, para cada α ∈ Λ, observe que 0α ∼ 0β quaisquer que sejam
α, β ∈ Λ: de fato, para todo limitante superior δ ∈ Λ de α e β, temos que fαδ(0α) = 0δ =
Limites Diretos 163
fβδ(0β). Logo, J0αK = J0βK para quaisquer α, β ∈ Λ. Por outro lado, dado α ∈ Λ, temos
que:
J0αK + JgβK = JgβK + J0αK = JgβK
para todo gβ ∈ Gβ (onde β ∈ Λ), pois, se δ ∈ Λ e um limitante superior de α e β, segue
que
J0αK + JgβK = JgβK + J0αK = J fβδ(gβ) + fαδ(0α)K = J fβδ(gβ) + 0δK = J fβδ(gβ)K = JgβK ,
onde a ultima igualdade provem do fato de que fβδ(gβ) ∼ gβ (uma vez que, para todo
ξ ∈ Λ tal que δ 6 ξ, tem-se fδξ( fβδ(gβ)) = fβξ(gβ)). Portanto, o conjunto G∞ possui um
elemento identidade J0K (relativamente a operacao binaria +), definido por J0K = J0αK,
onde α ∈ Λ pode ser tomado arbitrariamente.
Isto posto, para finalizar a demonstracao, considere um elemento gα ∈ Gα (onde
α ∈ Λ), e denote por −gα o inverso de gα em Gα. Temos entao que a classe −JgαK = J−gαK
e tal que:
JgαK + (−JgαK) = (−JgαK) + JgαK = J0K ,
pois, dado δ ∈ Λ tal que α 6 δ, segue que:
JgαK + (−JgαK) = (−JgαK) + JgαK = J−gαK + JgαK = J fαδ(−gα) + fαδ(gα)K
= J fαδ(−gα + gα)K = J fαδ(0α)K = J0δK = J0K .
Em outras palavras, todo elemento em G∞ possui um inverso (em relacao a operacao
binaria +), d’onde concluımos que G∞ constitui um grupo.
Definicao A.4 . Nas condicoes da proposicao anterior, o grupo abeliano G∞ e denominado
limite direto do sistema Gα, fαβα,β∈Λ, e e denotado por lim−−→Gα : α ∈ Λ (ou, abreviadamente,
lim−−→
Gα).
Exemplo A.5 . Seja Gn, fmnm,n∈N o sistema direto dado no exemplo A.4. Entao, para
quaisquer r ∈ Gn = Z e s ∈ Gm = Z, temos que r ∼ s se, e somente se, existe p ∈ N tal
que n,m 6 p e
fnp(r) = 2p−n · r = fmp(s) = 2p−m · s .
Logo, r ∼ s se, e somente se, r/s e da forma 2k, para algum k ∈ Z. Portanto, a classe
de equivalencia de um elemento r ∈ Z e constituıda dos numeros inteiros da forma
r/2k, onde k ∈ Z. Assim, o limite direto lim−−→
Gn e isomorfo ao grupo H dos numeros
racionais diadicos (que e o grupo aditivo de todos os numeros racionais da forma r/2k,
onde r, k ∈ Z).
164 Limites Diretos
Proposicao A.2 . Sendo Gα, fαβα,β∈Λ um sistema direto de grupos abelianos e homomorfismos
(onde Λ e um conjunto dirigido), temos que:
(i) se todos os homomorfismos fαβ, α 6 β, sao isomorfismos, entao lim−−→
Gα e isomorfo a cada
um dos grupos Gα;
(ii) se, para cada α ∈ Λ, existir um β ∈ Λ tal que α 6 β e fαβ : Gα −→ Gβ e o homomorfismo
identicamente nulo, entao lim−−→
Gα e o grupo trivial;
(iii) se Λ0 ⊆ Λ e cofinal em Λ, entao lim−−→Gα : α ∈ Λ ≃ lim
−−→Gα : α ∈ Λ0.
Demonstracao. (i) Da proposicao A.1, sabemos que o elemento identidade de
lim−−→
Gα e a classe J0αK, onde α ∈ Λ pode ser tomado arbitrariamente. Observe
entao que J0αK contem apenas os elementos identidade 0β ∈ Gβ, onde β ∈ Λ: com
efeito, dado gβ ∈ Gβ tal que gβ ∈ J0αK, segue que gβ ∼ 0α, isto e, existe um limitante
superior δ ∈ Λ de α e β, tal que fαδ(0α) = fβδ(gβ); logo, como fαδ(0α) = 0δ, temos que
fβδ(gβ) = 0δ, ou seja, gβ = 0β (pois fβδ e, por hipotese, um isomorfismo). Isto posto,
para cada β ∈ Λ, consideremos o homomorfismo λβ : Gβ −→ lim−−→
Gα dado por:
λβ(gβ) = JgβK , gβ ∈ Gβ .
Como
Ker(λβ) = gβ ∈ Gβ : λβ(gβ) = JgβK = J0αK = 0β ,
segue que λβ e um homomorfismo injetor. Vamos mostrar entao que λβ e um
homomorfismo sobrejetor; para tanto, dados ξ ∈ Λ e gξ ∈ Gξ, devemos verificar
se existe um elemento gβ ∈ Gβ tal que λβ(gβ) = JgξK. Com efeito, se β 6 ξ,
basta tomarmos gβ = f−1βξ
(gξ), pois, neste caso, existe δ ∈ Λ tal que β 6 ξ 6 δ e
fβδ(gβ) = fξδ(gξ), a saber, δ = ξ (uma vez que fβξ(gβ) = gξ = fξξ(gξ)); por outro lado,
se ξ 6 β, basta tomarmos gβ = fξβ(gξ), pois, neste caso, tambem existe δ ∈ Λ tal
que ξ 6 β 6 δ e fξδ(gξ) = fβδ(gβ), a saber, δ = β (uma vez que fξβ(gξ) = gβ = fββ(gβ)).
Deste modo, concluımos que, para cada β ∈ Λ, o homomorfimso λβ : Gβ −→ lim−−→
Gα
e um isomorfismo, isto e, lim−−→
Gα e isomorfo a cada um dos grupos abelianos Gα.
(ii) Sendo J0αK o elemento identidade de lim−−→
Gα (onde α ∈ Λ e arbitrario), considere
um elemento gβ ∈ Gβ, β ∈ Λ; vamos mostrar que gβ ∈ J0αK. De fato, supondo
α 6 β, segue (por hipotese) que existe δ ∈ Λ tal que α 6 β 6 δ e fβδ : Gβ −→ Gδ
e identicamente nulo (isto e, Im( fβδ) = 0δ); assim, temos que fαδ(0α) = 0δ e
fβδ(gβ) = 0δ, ou seja, fαδ(0α) = fβδ(gβ), o que significa que gβ ∼ 0α, e, portanto,
gβ ∈ J0αK. De maneira analoga, pode-se verificar que, no caso β 6 α, tambem
tem-se gβ ∈ J0αK. Logo, para quaisquer β ∈ Λ e gβ ∈ Gβ, temos que JgβK = J0αK,
d’onde concluımos que o grupo lim−−→
Gα e constituıdo unicamente da classe J0αK,
isto e, lim−−→
Gα e o grupo trivial.
Limites Diretos 165
(iii) Denotemos por J K0 e J K as classe de equivalencia em lim−−→Gα : α ∈ Λ0 e lim
−−→Gα :
α ∈ Λ, respectivamente, e consideremos a funcao
ϕ : lim−−→Gα : α ∈ Λ0 −→ lim
−−→Gα : α ∈ Λ ,
dada por ϕ(JgβK0) = JgβK, para cada gβ ∈ Gβ, com β ∈ Λ0. Observe que ϕ esta bem
definida, pois, se JgβK0 = JgγK0 (onde gβ ∈ Gβ e gγ ∈ Gγ, β,γ ∈ Λ0), segue que gβ ∼ gγem Λ0, isto e, existe um limitante superior δ ∈ Λ0 de β e γ tal que fβδ(gβ) = fγδ(gγ);
logo, temos que gβ ∼ gγ em Λ, ou seja, ϕ(JgβK0) = JgβK = JgγK = ϕ(JgγK0). Alem
disso, temos tambem que ϕ e um homomorfismo, pois, dados gβ ∈ Gβ e gγ ∈ Gγ,
com β,γ ∈ Λ0, e sendo δ ∈ Λ0 um limitante superior de β e γ, segue que:
ϕ(JgβK0 + JgγK0) = ϕ(J fβδ(gβ) + fγδ(gγ)K0) = J fβδ(gβ) + fγδ(gγ)K
= JgβK + JgγK = ϕ(JgβK0) + ϕ(JgγK0) .
Agora, sendo J0αK o elemento identidade do grupo lim−−→Gα : α ∈ Λ (onde α ∈ Λ
pode ser tomado arbitrariamente), temos que:
Ker(ϕ) = JgβK0 ∈ lim−−→Gα : α ∈ Λ0 : ϕ(JgβK0) = JgβK = J0αK .
Logo, dado JgβK0 ∈ Ker(ϕ), temos que JgβK = J0αK, ou seja, gβ ∼ 0α em Λ; isto,
por sua vez, significa que existe um limitante superior γ ∈ Λ de α e β, tal que
fαγ(0α) = fβγ(gβ). Entretanto, como Λ0 e cofinal em Λ, segue que existe δ ∈ Λ0 tal
que γ 6 δ; assim, como fβδ = fγδ fβγ, temos que:
fβδ(gβ) = fγδ( fβγ(gβ)) = fγδ( fαγ(0α)) = fγδ(0γ) = 0δ = fδδ(0δ) .
Em outras palavras, δ ∈ Λ0 e tal que β 6 δ e fβδ(gβ) = fδδ(0δ), o que, por definicao,
implica que gβ ∼ 0δ em Λ0, isto e, JgβK0 = J0δK0. Deste modo, concluımos que o
unico elemento JgβK0 ∈ lim−−→Gα : α ∈ Λ0 tal que JgβK0 ∈ Ker(ϕ) e JgβK0 = J0δK0, que
e o elemento identidade de lim−−→Gα : α ∈ Λ0. Portanto, ϕ e um homomorfismo
injetor. Finalmente, observe que ϕ tambem e um homomorfismo sobrejetor: com
efeito, dado JgβK ∈ lim−−→Gα : α ∈ Λ (onde β ∈ Λ e gβ ∈ Gβ), seja δ ∈ Λ0 tal que
β 6 δ e considere o elemento J fβδ(gβ)K0 ∈ lim−−→Gα : α ∈ Λ0; como fβδ(gβ) ∼ gβ em
Λ (pois fβδ(gβ) = fδδ( fβδ(gβ))), segue que J fβδ(gβ)K = JgβK, isto e, ϕ(J fβδ(gβ)K0) = JgβK.
Logo, todo elemento de lim−−→Gα : α ∈ Λ0 e a imagem de um elemento de lim
−−→Gα :
α ∈ Λ pelo homomorfismo ϕ, o que implica que ϕ e sobrejetor, e, portanto, e um
isomorfismo.
166 Limites Diretos
Definicao A.5 . Dados dois conjuntos dirigidos Λ e Ω, sejam SΛ = Gα, fαβα,β∈Λ e SΩ =
Hγ, gγδγ,δ∈Ω sistemas diretos de grupos abelianos e homomorfismos. Definimos, pois, uma
aplicacaoΦ entre SΛ e SΩ como sendo uma famıliaΦ = φ,φαα∈Λ, constituıda de uma funcao
φ : Λ −→ Ω que preserva ordem (isto e, se α, β ∈ Λ sao tais que α 6 β, entao φ(α) 6 φ(β) em
Ω), juntamente com homomorfismos φα : Gα −→ Hφ(α) tais que, para cada par α, β ∈ Λ com
α 6 β, o diagrama a seguir e comutativo:
Gα Gβ
Hφ(α) Hφ(β)
fαβ
φα φβ
gφ(α)φ(β)
Esta aplicacao Φ induz um homomorfismo
→Φ : lim−−→Gα : α ∈ Λ −→ lim
−−→Hγ : γ ∈ Ω ,
denominado limite direto de Φ, que leva a classe de equivalencia de um elemento gα ∈ Gα na
classe de equivalencia de φα(gα) ∈ Hφ(α), para cada α ∈ Λ.
Exemplo A.6 . Dados um sistema direto Gα, fαβα,β∈Λ, de grupos abelianos e homomor-
fismos, e um conjunto cofinal Λ0 ⊆ Λ, seja φ : Λ0 −→ Λ a inclusao, e, para cada α ∈ Λ0,
denote por φα : Gα −→ Gφ(α) o homomorfismo identidade em Gα. Temos entao que φ
preserve ordem e φα fαβ = fφ(α)φ(β) φα, para quaisquer α, β ∈ Λ0. Logo, Φ = φ,φαα∈Λ0
e uma aplicacao entre os sistemas diretos S0 = Gα, fαβα,β∈Λ0e S = Gα, fαβα,β∈Λ, e o
limite direto de Φ e o homomorfismo
→Φ : lim−−→Gα : α ∈ Λ0 −→ lim
−−→Gα : α ∈ Λ
dado por→Φ (JgαK0) = JgαK para cada gα ∈ Gα, α ∈ Λ0, onde J K0 e J K denotam as
classes de equivalencia em lim−−→Gα : α ∈ Λ0 e lim
−−→Gα : α ∈ Λ, respectivamente. Note
que→Φ coincide com o homomorfismo ϕ, utilizado na demonstracao do item (iii) da
proposicao A.2.
Proposicao A.3 . Seja Φ = φ,φαα∈Λ uma aplicacao entre dois sistemas diretos Gα, fαβα,β∈Λe Hγ, kγδγ,δ∈Ω. Se Im(φ) = φ[Λ] e um subconjunto cofinal em Ω, e, para cada α ∈ Λ, o
homomorfismo φα : Gα −→ Hφ(α) e um isomorfismo, entao os grupos lim−−→Gα : α ∈ Λ e
lim−−→Hγ : γ ∈ Ω sao isomorfos; em particular, se φ : Λ −→ Ω e sobrejetora, o limite direto
→Φ : lim−−→Gα : α ∈ Λ −→ lim
−−→Hγ : γ ∈ Ω e um isomorfismo.
Limites Diretos 167
Demonstracao. Sendo Ω0 = Im(φ) ⊆ Ω, sabemos que o limite direto de Φ e o
homomorfismo
→Φ : lim−−→Gα : α ∈ Λ −→ lim
−−→Hγ : γ ∈ Ω0 ,
dado por→Φ (JgαK) = Jφα(gα)K para cada gα ∈ Gα, onde α ∈ Λ. Por outro lado, denotando
por 0φ(α) o elemento identidade do grupo Hφ(α), sabemos tambem que a classe J0φ(α)K e o
elemento identidade de lim−−→Hγ : γ ∈ Ω0, qualquer que seja α ∈ Λ. Assim, temos que:
Ker(→Φ ) = JgβK ∈ lim
−−→Gα : α ∈ Λ :
→Φ (JgβK) = Jφβ(gβ)K = J0φ(α)K .
Logo, dado JgβK ∈ Ker(→Φ ), segue que Jφβ(gβ)K = J0φ(α)K, isto e, φβ(gβ) ∼ 0φ(α) em Ω0;
isto, por sua vez, significa que existe um limitante superior δ ∈ Ω0 de φ(α) e φ(β), tal
que kφ(β)δ(φβ(gβ)) = kφ(α)δ(0φ(α)) = 0δ. Suponhamos entao que δ = φ(γ), onde γ ∈ Λ
(lembre-se que Ω0 = Im(φ)); temos, pois, que:
kφ(β)φ(γ)(φβ(gβ)) = 0φ(γ) .
Portanto, como kφ(β)φ(γ) φβ = φγ fβγ, segue que:
φγ( fβγ(gβ)) = 0φ(γ)
(note que β 6 γ em Λ, pois φ(β) 6 φ(γ) em Ω0). Consequentemente, como φγ e um
isomorfismo (por hipotese), temos que fβγ(gβ) = 0γ, o que implica que gβ ∼ 0γ em
Λ (pois γ e um limitante superior de β tal que fβγ(gβ) = 0γ = fγγ(0γ)). Deste modo,
concluımos que JgβK = J0γK para todo JgβK ∈ Ker(→Φ ), ou seja, Ker(
→Φ ) e o subgrupo
trivial de lim−−→Gα : α ∈ Λ (uma vez que J0γK e o elemento identidade deste grupo,
qualquer que seja γ ∈ Λ), provando, assim, que→Φ e um homomorfismo injetor.
Agora, dado JhγK ∈ lim−−→Hγ : γ ∈ Ω0 arbitrario, seja α ∈ Λ tal que φ(α) = γ, e
considere o elemento gα ∈ φ−1α (hγ) ∈ Gα. Temos entao que:
→Φ (JgαK) = Jφα(gα)K = Jφα(φ−1
α (hγ))K = JhγK ,
ou seja, todo elemento de lim−−→Hγ : γ ∈ Ω0 e a imagem de um elemento de lim
−−→Gα :
α ∈ Λ pelo homomorfismo→Φ , o que implica que
→Φ e sobrejetor. Portanto,
→Φ e
um isomorfismo entre lim−−→Gα : α ∈ Λ e lim
−−→Hγ : γ ∈ Ω0. Finalmente, como Ω0
e cofinal em Ω (por hipotese), segue, do item (iii) da proposicao A.2, que o grupo
lim−−→Hγ : γ ∈ Ω0 e isomorfo a lim
−−→Hγ : γ ∈ Ω, d’onde concluımos que
lim−−→Gα : α ∈ Λ ≃ lim
−−→Hγ : γ ∈ Ω .
Em particular, note que, se φ : Λ −→ Ω e sobrejetora, temos Ω0 = φ[Λ] = Ω, e,
portanto, o limite direto→Φ e um isomorfismo entre lim
−−→Gα : α ∈ Λ e lim
−−→Hγ : γ ∈
Ω0 = lim−−→Hγ : γ ∈ Ω.
168 Limites Diretos
Proposicao A.4 . Sejam Kα, fαβα,β∈Λ, Lα, gαβα,β∈Λ, Mγ, hγδγ,δ∈Ω e Nγ, iγδγ,δ∈Ω sistemas
diretos de grupos abelianos e homomorfismos, correspondentes a conjuntos dirigidos Λ e Ω, e
considere aplicacoes µ : Λ −→ Λ, φ,ψ : Λ −→ Ω e ξ : Ω −→ Ω que preservam ordem e
comutam no seguinte diagrama:
Λ Ω
Λ Ω
φ
µ ξ
ψ
Suponha ainda que φα : Kα −→ Mφ(α)α∈Λ, ψα : Lα −→ Nψ(α)α∈Λ, µα : Kα −→ Lµ(α)α∈Λ e
ξγ : Mγ −→ Nξ(γ)γ∈Ω sao famılias de homomorfismos, tais que, para cada α ∈ Λ, o diagrama
abaixo e comutativo:
Kα Mφ(α)
Lµ(α) Nξ(φ(α))=ψ(µ(α))
φα
µα ξφ(α)
ψµ(α)
Se Φ = φ,φαα∈Λ, Ψ = ψ,ψαα∈Λ, Γ = µ,µαα∈Λ e Σ = ξ, ξγγ∈Ω sao aplicacoes entre
sistemas diretos, entao os limites diretos→Φ ,→Ψ ,→Γ e
→Σ tornam comutativo o seguinte
diagrama:
lim−−→Kα : α ∈ Λ lim
−−→Mγ : γ ∈ Ω
lim−−→Lα : α ∈ Λ lim
−−→Nγ : γ ∈ Ω
→Φ
→Γ
→Σ
→Ψ
Demonstracao. Com efeito, dados α ∈ Λ e k ∈ Kα, temos que:
(→Σ →Φ )(JkK) =
→Σ (→Φ (JkK)) =
→Σ (Jφα(k)K)
= Jξφ(α)(φα(k))K = Jψµ(α)(µα(k))K
=→Ψ (Jµα(k)K) =
→Ψ (→Γ (JkK))
= (→Ψ
→Γ )(JkK) ,
ou seja,→Σ →Φ =
→Ψ
→Γ , conforme querıamos provar.
Limites Diretos 169
Proposicao A.5 . Sejam
S1 = Kα, fαβα,β∈Λ , S2 = Lα, gα,βα,β∈Λ e S3 = Mα, hαβα,β∈Λ
sistemas diretos de grupos abelianos e homomorfismos, correspondentes a um mesmo conjunto
dirigido Λ, e, para cada α ∈ Λ, sejam φα : Lα −→ Kα e ϕα : Kα −→ Mα homomorfismos tais
que a seguinte sequencia e exata:
Lα Kα Mα
φα ϕα
Suponha ainda que, para cada par α, β ∈ Λ, com α 6 β, o diagrama abaixo e comutativo:
Lα Kα Mα
Lβ Kβ Mβ
φα ϕα
φβ ϕβ
gαβ fαβ hαβ
Sendo φ : Λ −→ Λ a funcao identidade, temos entao queΦ = φ,φαα∈Λ e Ψ = φ,ϕαα∈Λ sao
aplicacoes (de S2 em S1, e de S1 em S3, respectivamente), tais que a sequencia a seguir tambem e
exata:
lim−−→Lα : α ∈ Λ lim
−−→Kα : α ∈ Λ lim
−−→Mα : α ∈ Λ
→Φ
→Ψ
Demonstracao. O fato de Φ = φ,φαα∈Λ e Ψ = φ,ϕαα∈Λ serem aplicacoes entre
sistemas diretos segue de imediato da comutatividade do diagrama acima. Assim
sendo, vamos mostrar que a sequencia
lim−−→Lα : α ∈ Λ lim
−−→Kα : α ∈ Λ lim
−−→Mα : α ∈ Λ
→Φ
→Ψ
e exata, isto e, Im(→Φ ) = Ker(
→Ψ ). Com efeito, dado JkαK ∈ Im(
→Φ ) ⊆ lim
−−→Kα : α ∈ Λ
(onde kα ∈ Kα), segue que existe JlβK ∈ lim−−→Lα : α ∈ Λ (com lβ ∈ Lβ) tal que
→Φ (JlβK) =
JkαK. Como→Φ (JlβK) = Jφβ(lβ)K, temos entao que Jφβ(lβ)K = JkαK, ou seja, φβ(lβ) ∼ kα.
Isto, por sua vez, significa que existe um limitante superior γ ∈ Λ de α e β, tal que
fβγ(φβ(lβ)) = fαγ(kα), e, portanto, fαγ(kα) ∈ Im(φγ) ⊆ Kγ. Logo, como Im(φγ) = Ker(ϕγ),
temos que ϕγ( fαγ(kα)) = 0Mγ, onde 0Mγ
e o elemento identidade do grupo Mγ. Agora,
como ϕγ fαγ = hαγ ϕα, obtemos que hαγ(ϕα(kα)) = 0Mγ= hβγ(0Mβ
). Resumindo, temos
que γ e um limitante superior de α e β, tal que hαγ(ϕα(kα)) = hβγ(0Mβ), o que implica que
ϕα(kα) ∼ 0Mβ, isto e, Jϕα(kα)K = J0Mβ
K. Assim, como→Ψ (JkαK) = Jϕα(kα)K, concluımos que
→Ψ (JkαK) = J0Mβ
K, ou seja, JkαK ∈ Ker(→Ψ ) (uma vez que 0Mβ
e o elemento identidade de
lim−−→Mα : αΛ, qualquer que seja β ∈ Λ). Deste modo, provamos que Im(
→Φ ) ⊆ Ker(
→Ψ ).
170 Limites Diretos
Por outro lado, consideremos um elemento JkαK ∈ Ker(→Ψ ) ⊆ lim
−−→Kα : α ∈ Λ; temos,
pois, que→Ψ (JkαK) = Jϕα(kα)K = J0Mβ
K, onde 0Mβe o elemento identidade do grupo Mβ (e
β ∈ Λ e arbitrario). Logo, segue que ϕα(kα) ∼ 0Mβ, ou seja, existe um limitante superior
γ ∈ Λdeα e β, tal que hαγ(ϕα(kα)) = hβγ(0Mβ) = 0Mγ
. Como hαγϕα = ϕγ fαγ, temos entao
que ϕγ( fαγ(kα)) = 0Mγ, isto e, fαγ(kα) ∈ Ker(ϕγ) ⊆ Kγ. Portanto, como Ker(ϕγ) = Im(φγ),
segue que fαγ(kα) ∈ Im(φγ), o que significa que existe lγ ∈ Lγ tal que φγ(lγ) = fαγ(kα).
Agora, sendo δ ∈ Λ um limitante superior de α e γ, observe que:
fγδ(φγ(lγ)) = fγδ( fαγ(kα)) = fαδ(kα) .
Logo, temos que φγ(lγ) ∼ kα, ou seja,→Φ (JlγK) = Jφγ(lγ)K = JkαK, d’onde concluımos que
JkαK ∈ Im(→Φ ). Assim, a inclusao Ker(
→Ψ ) ⊆ Im(
→Φ ) tambem se verifica, de modo que
Im(→Φ ) = Ker(
→Ψ ), conforme querıamos demonstrar.
Neste apendice, vamos provar o seguinte resultado (utilizado na demonstracao do
teorema 2.1.2):
Teorema B.1 . Seja M uma variedade topologica conexa de dimensao n > 1. Dados quatro
pontos arbitrarios x1, y1, x2, y2 ∈ Int M, existe um homeomorfismo h : M −→ M tal que
h(x1) = y1 e h(x2) = y2.
Com efeito, utilizando a demonstracao do lema 6.4 de [Vi] (paginas 150 a 152),
obtemos o seguinte:
Lema B.1 . Seja M uma variedade topologica conexa de dimensao n, e, dados x, y ∈ Int M,
considere um caminho ω : I −→ Int M tal que ω(0) = x e ω(1) = y (o qual existe, pois M e
conexa por caminhos). Seja ainda U1,U2, . . . ,Uk uma cobertura aberta finita do subconjunto
compacto ω(I) ⊆ Int M, onde, para cada i ∈ 1, 2, . . . , k, Ui e homeomorfo a uma bola aberta
em Rn. Entao, denotando por U a uniao dos abertos Ui, segue que existe um homeomorfismo
ϕ : M −→M tal que a restricao ϕ |MrU : M rU −→M rU e a identidade, e ϕ(x) = y.
Assim, sob as hipoteses do teorema B.1, considere dois caminhosω1,ω2 : I −→ Int M,
com ω1(0) = x1, ω1(1) = y1, ω2(0) = x2 e ω2(1) = y2, e sejam C1 = U1,U2, . . . ,Uk1 e
C2 = V1,V2, . . . ,Vk2 coberturas abertas de ω1(I) e ω2(I), respectivamente, tais que, para
cada i ∈ 1, 2, . . . , k1 e cada j ∈ 1, 2, . . . , k2, os conjuntos Ui e V j sao homeomorfos a
171
172 Um Homeomorfismo para Variedades Topologicas
bolas abertas em Rn. Considere ainda
U =
k1⋃
i=1
Ui e V =
k2⋃
j=1
V j ,
e sejam ϕ1 : M −→ M e ϕ2 : M −→ M os homeomorfismos que satisfazem ϕ1(x1) = y1
e ϕ2(x2) = y2, tais que as restricoes ϕ1 |MrU e ϕ2 |MrV coincidem com as aplicacoes
identidade em M r U e M r V, respectivamente. Isto posto, a fim de construirmos o
homomorfismo h : M −→M mencionado no teorema B.1, e natural tentarmos definir
(⋆) h(z) =
ϕ1(z) se z ∈ U
ϕ2(z) se z ∈ V.
Entretanto, para que esta aplicacao esteja bem definida, precisamos verificar que as
coberturas C1 e C2 podem ser tomadas de tal forma que U∩V = ∅ (pois, caso contrario,
nao ha como garantir que ϕ1(z) = ϕ2(z) para z ∈ U ∩ V), sendo que isto, por sua vez,
depende dos caminhosω1 eω2 nao se interceptarem (ou seja,ω1(I)∩ω2(I) = ∅); a figura
B.1 ilustra uma situacao na qual o homomorfismo h, dado por (⋆), esta bem definido.
M
y1
x2
x1 y2
ω1
ω2
U1
U2
V1
V2
Figura B.1
Resumindo, para concluirmos a demonstracao do teorema B.1, basta mostrarmos
que, dados quatro pontos x1, x2, y1 e y2 no interior de uma variedade topologica conexa
Um Homeomorfismo para Variedades Topologicas 173
M (de dimensao n), existem caminhos ω1,ω2 : I −→ Int M, com ω1(0) = x1, ω1(1) = y1,
ω2(0) = x2 e ω2(1) = y2, tais que ω1(I) ∩ ω2(I) = ∅. Para tanto, e suficiente mostrar que
existe uma n-celula W ⊆ Int M (isto e, um subconjunto W ⊆ Int M, homeomorfo a uma
bola aberta em Rn), que contem os pontos x1, x2, y1 e y2, pois, neste caso, tomando
um caminho qualquer ω1 : I −→ W, ligando x1 a y1, sabemos que existe um caminho
ω2 : I −→ W, ligando x2 a y2, que nao intercepta ω1 (uma vez que W r ω1(I) e conexo
por caminhos).
A
X
VA
A × [0, 1)
A × (−1, 0]
f |A×[0,1)
f |A×(−1,0]
Figura B.2
Com este proposito, vamos introduzir entao a seguinte
Definicao B.1 . Seja X um espaco topologico. Dizemos que um subconjunto A ⊆ X, possui
colarinho duplo em X se existe um homeomorfismo f de A × (−1, 1) sobre uma vizinhanca
aberta VA ⊆ X de A, tal que f (a, 0) = a para todo a ∈ A (vide figura B.2).
174 Um Homeomorfismo para Variedades Topologicas
O lema a seguir constitui um caso particular do teorema 3 de [Bwn1], e nos fornece
um exemplo de subconjunto com colarinho duplo (a demonstracao sera omitida, pois
requer uma investigacao mais detalhada das propriedades metricas de uma variedade
topologica).
Lema B.2 . Seja M uma variedade topologica conexa de dimensao n. Se D ⊆ Int M e uma
n-celula fechada (isto e, um subconjunto de Int M, homeomorfo a uma bola fechada em Rn),
entao a fronteira ∂D e uma subvariedade topologica de M, com dimensao n − 1, que possui
colarinho duplo em M.
Por outro lado, o proximo lema (cuja demonstracao pode ser encontrada em [DH],
paginas 469-470) constitui a peca principal na demonstracao do teorema B.1.
Lema B.3 . Sejam M uma variedade topologica conexa de dimensao n (com ou sem fronteira),
e D ⊆ M uma n-celula fechada cuja fronteira ∂D possui colarinho duplo em M (por exemplo,
uma n-celula fechada em Int M). Entao, dado p ∈ M arbitrario, existe uma n-celula fechada
C ⊆M, tal que ∂C possui colarinho duplo em M e D ∪ p ⊆ Int C.
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
x1
x2y1
y2
D1
D2
D3
D4
M
Figura B.3
Finalmente, podemos agora concluir a demonstracao do teorema B.1. Considere,
Um Homeomorfismo para Variedades Topologicas 175
pois, x1, x2, y1, y2 ∈ Int M (onde M e uma variedade topologica conexa de dimensao n),
e seja D1 ⊆ Int M uma n-celula fechada contendo x1. Pelo teorema B.2, sabemos que
∂D1 possui colarinho duplo em M; logo, do lema B.3, segue que existe uma n-celula
fechada D2 ⊆ Int M, tal que ∂D2 possui colarinho duplo em M, e D1 ∪ x2 ⊆ Int D2.
Assim, aplicando mais duas vezes o lema B.3, segue que existem n-celulas fechadas
D3,D4 ⊆ Int M, tais que ∂D3 e ∂D4 possuem colarinho duplo em M, D2 ∪ y1 ⊆ Int D3 e
D3 ∪ y2 ⊆ Int D4 (vide figura B.3).
Deste modo, concluımos que existe uma n-celula W ⊆ Int M (a saber, W = Int D4)
contendo todos os quatro pontos x1, x2, y1 e y2, o que, conforme mencionamos anteri-
ormente, e suficiente para garantir que o homeomorfismo h : M −→ M dado em (⋆)
esta de fato bem definido.
Neste apendice, nosso objetivo e demonstrar que, dada uma aplicacao contınua
propria f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N), entre variedades topologicas conexas de mesma di-
mensao, e dado um ponto c ∈ Int N arbitrario, podemos deformar f por meio de uma ho-
motopia propria, a fim de obter uma aplicacao contınua propria F : (M, ∂M, Int M) −→
(N, ∂N, Int N), tal que F−1(c) = f−1(c).
Com este intuito, vamos introduzir entao a seguinte
Definicao C.1 . Dado um espaco topologico X, dizemos que um subconjunto A ⊆ X possui
colarinho em X se existe um homeomorfismo h de A × [0, 1), sobre uma vizinhanca aberta
VA ⊆ X de A, tal que h(x, 0) = x para todo x ∈ A. Por vacuidade, consideraremos ainda que o
conjunto vazio sempre possui colarinho, independentemente do espaco topologico X.
O proximo lema (cuja demonstracao segue de imediato do teorema 1 e do lema 5 de
[Bwn1]) constitui o exemplo classico de subconjunto com colarinho.
Lema C.1 . A fronteira ∂M, de uma variedade topologica M, possui colarinho em M (vide
figura C.1).
Mais especificamente, o lema a seguir nos mostra que a fronteira de uma variedade
topologica M possui “colarinho fechado” em M.
176
Deformacoes Propriamente Homotopicas que Preservam Raızes 177
Lema C.2 . Dada uma variedade topologica M, existem uma vizinhanca aberta W ⊆ M da
fronteira ∂M, bem como um homeomorfismo hM : ∂M × I −→ W, tais que hM(∂M × 1) =
W rW = ∂W r ∂M e hM(x, 0) = x para todo x ∈ ∂M.
Demonstracao. De fato, se ∂M = ∅, o resultado e imediato (por vacuidade). Caso
contrario (isto e, se ∂M , ∅), basta tomarmos W = h(∂M× [0, 12)) e hM(x, t) = h(x, t
2) para
todo (x, t) ∈ ∂M × I, onde h e um homeomorfismo de ∂M × [0, 1) sobre uma vizinhanca
aberta V ⊆ M de ∂M (o qual existe, pois, pelo lema C.1, sabemos que ∂M possui
colarinho em M).
∂MM
V∂M
h
︸ ︷︷
︸
∂M × [0, 1)
Figura C.1
Agora, utilizando o lema acima, podemos demonstrar o principal resultado deste
apendice:
Teorema C.1 . Seja f : (M, ∂M) −→ (N, ∂N) uma aplicacao contınua propria, entre variedades
topologicas conexas de mesma dimensao n. Dado um ponto c ∈ Int N, existe uma aplicacao
contınua propria F : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N), homotopica a f por uma homotopia
propria H : (M × I, ∂M × I) −→ (N, ∂N), tal que F−1(c) = f−1(c).
178 Deformacoes Propriamente Homotopicas que Preservam Raızes
Demonstracao. De fato, como c ∈ Int N e f preserva fronteira, temos que f−1(c) ⊆
Int M; logo, como f−1(c) e um subconjunto fechado de M, segue que Mr f−1(c) e aberto
em M, e, consequentemente, constitui uma variedade topologica de dimensao n, cuja
fronteira coincide com a fronteira de M. Analogamente, temos tambem que N r c e
uma variedade topologica de dimensao n, tal que ∂(Nrc) = ∂N. Isto posto, utilizando
o lema C.2, considere vizinhancas abertas WM ⊆Mr f−1(c) e WN ⊆ N r c de ∂M e ∂N,
respectivamente, e sejam hM : ∂M × I −→ WM e hN : ∂N × I −→ WN homeomorfismos
tais que hM(∂M × 1) =WM rWM = ∂WM r ∂M, hN(∂N × 1) =WN rWN = ∂WN r ∂N,
hM(x, 0) = x e hN(y, 0) = y para quaisquer x ∈ ∂M e y ∈ ∂N. Temos, pois, que, se x ∈WM
e f (x) ∈WN, existem dois unicos pares (z, s) ∈ ∂M× I e (y, t) ∈ ∂N× I tais que x = hM(z, s)
e f (x) = hN(y, t). Deste modo, vamos definir F : M −→ N da seguinte maneira: se
x ∈M rWM, consideraremos
F (x) =
f (x) se f (x) ∈ N rWN
hN
(y,
t + 1
2
)se f (x) = hN(y, t) ∈WN
,
enquanto que, se x = hM(z, s) ∈WM, tomamos
F (x) =
f (x) se f (x) ∈ N rWN
f (x) se f (x) = hN(y, t) ∈WN, com t > s
hN
(y,
s + t
2
)se f (x) = hN(y, t) ∈WN, com t 6 s
.
Observe entao que, se x = hM(z, s) ∈ WM e f (x) = hN(y, t) ∈ WN, com s = t, temos
f (x) = hN(y, t) = hN(y, s+t2
). Por outro lado, sabemos que:
WM rWM = ∂WM r ∂M = (M rWM) ∩WM
e
WN rWN = ∂WN r ∂N = (N rWN) ∩WN ;
assim, como hM(z, s) ∈WM rWM e hN(y, t) ∈WN rWN se, e somente se, s = t = 1, segue
que:
(i) se x ∈M rWM e f (x) = hN(y, t) ∈WN rWN, temos t = 1, e, portanto,
F (x) = f (x) = hN(y, t) = hN
(y,
t + 1
2
);
(ii) se x = hM(z, s) ∈WMrWM e f (x) = hN(y, t) = WNrWN, temos s = t = 1, e, portanto,
F (x) = f (x) = hN(y, t) = hN
(y,
t + 1
2
)= hN
(y,
s + t
2
).
Deformacoes Propriamente Homotopicas que Preservam Raızes 179
Daı, concluımos que as restricoes F |MrWMe F |WM
estao ambas bem definidas e sao
contınuas, e F encontra-se bem definida na interseccao (MrWM)∩WM =WM rWM, o
que mostra que F esta bem definida e e contınua em M.
Note ainda que F (∂M) ⊆ ∂N, pois, se x ∈ ∂M, temos que f (x) ∈ ∂N (lembre-se que
a aplicacao f preserva fronteira), isto e, x = hM(x, 0) ∈ WM e f (x) = hN( f (x), 0) ∈ WN, o
que implica que
F (x) = hN
(f (x),
0 + 0
2
)= hN( f (x), 0) = f (x) ,
e, consequentemente, F (x) ∈ ∂N. Em contrapartida, tambem temos que F (Int M) ⊆
Int N: com efeito, se x ∈MrWM ⊆ Int M, temos queF (x) = f (x) se f (x) ∈ NrWN ⊆ Int N
(e, portanto, F (x) ∈ Int N), ou F (x) = hN(y, t+12
) se f (x) = hN(y, t) ∈ WN (o que tambem
significa que F (x) ∈ Int N, pois hN(y, t+12
) ∈ ∂N se, e somente se, t+12= 0). Por outro lado,
se x ∈ Int M e tal que x = hM(z, s) ∈WM, segue que s > 0; daı, obtemos que:
(I) F (x) = f (x) se f (x) ∈ N rWN ⊆ Int N (e, portanto, F (x) ∈ Int N), ou
(II) F (x) = f (x) se f (x) = hN(y, t) ∈ WN, com t > s > 0 (o que implica que hN(y, t) =
f (x) = F (x) ∈ Int N, posto que hN(y, t) ∈ ∂N se, e so se, t = 0), ou
(III) F (x) = hN(y, s+t2
) se f (x) = hN(y, t) ∈WN, com t 6 s (e, por conseguinte, F (x) ∈ Int N,
uma vez que hN(y, s+t2
) ∈ Int N, pois s > 0).
Assim, temos que F (∂M) ⊆ ∂N e F (Int M) ⊆ Int N, de modo que podemos denotar
F : M −→ N por F : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N). Quanto as raızes de F em
c ∈ Int N, temos de imediato que F−1(c) = f−1(c), pois, como f−1(c) ⊆ M r WM e
c ∈ N rWN, segue que F (x) = f (x) = c para todo x ∈M tal que f (x) = c.
Isto posto, vamos mostrar agora que F e uma aplicacao propria. Considere entao
um subconjunto compacto K ⊆ N; como N = (N rWN) ∪WN, segue que K = K′ ∪ K′′,
onde K′ = (N rWN)∩K e K′′ = WN ∩K. Ora, como N rWN e fechado em N, temos que
K′ ⊆ N e compacto, pois constitui um subconjunto fechado de N, contido no compacto
K. Entretanto, note que, para todo x ∈ M, temos F (x) ∈ K′ ⊆ N rWN se, e somente se,
f (x) ∈ N rWN; logo, como F (x) = f (x) para todo x ∈ M tal que f (x) ∈ N rWN, segue
que:
F−1(K′) = x ∈M : F (x) ∈ K′ = x ∈M : f (x) ∈ K′ = f−1(K′) ,
o que implica que F−1(K′) e compacto (uma vez que f e uma aplicacao propria). Por
outro lado, temos que K′′ = WN∩K tambem e compacto, pois e um subconjunto fechado
de K; alem disso, denotando por
L1 = x ∈M rWM : F (x) ∈ K′′ ⊆ WN
180 Deformacoes Propriamente Homotopicas que Preservam Raızes
e
L2 = x ∈WM : F (x) ∈ K′′ ⊆WN ,
segue que:
F−1(K′′) = x ∈M : F (x) ∈ K′′ = L1 ∪ L2 .
Observe entao que, para todo x ∈ M rWM, temos F (x) ∈ K′′ ⊆ WN se, e somente se,
f (x) ∈ WN, sendo que, neste caso, F (x) = hN(y, t+12
), onde y ∈ ∂N e t ∈ I sao tais que
f (x) = hN(y, t) ∈ WN. Logo, denotando por φ : ∂N × I −→ ∂N × I o homeomorfismo
dado por φ(y, t) = (y, t+12
) para cada (y, t) ∈ ∂N × I, segue que F (x) = (hN φ h−1N f )(x)
para todo x ∈M rWM tal que f (x) = hN(y, t) ∈WN; consequentemente, temos que:
L1 = x ∈M rWM : F (x) ∈ K′′ ⊆WN
= x ∈M rWM : (hN φ h−1N f )(x) ∈ K′′
= (M rWM) ∩ [( f−1 hN φ−1 h−1
N )(K′′)] .
No entanto, como K′′ ⊆ WN e compacto, e as aplicacoes hN : ∂N × I −→ WN e φ :
∂N× I −→ ∂N× I sao homeomorfismos, segue (juntamente com o fato de f ser propria)
que o conjunto ( f−1hNφ−1h−1
N)(K′′) e compacto; portanto, como L1 e um subconjunto
fechado de ( f−1 hN φ−1 h−1
N )(K′′), concluımos que L1 e compacto. Finalmente, note
que, para todo x ∈ WM, tambem temos F (x) ∈ K′′ ⊆ WN se, e somente se, f (x) ∈ WN,
sendo que, neste caso,
F (x) =
f (x) se f (x) = hN(y, t) ∈WN, com t > s
hN
(y,
s + t
2
)se f (x) = hN(y, t) ∈WN, com t 6 s
,
onde s ∈ I e tal que x = hM(z, s) ∈WM, para algum z ∈ ∂M. Logo, temos que:
L2 = x ∈WM : F (x) ∈ K′′ ⊆WN = L′2 ∪ L′′2 ,
onde
L′2 = x = hM(z, s) ∈WM : f (x) = hN(y, t) ∈ K′′ e t > s
e
L′′2 = x = hM(z, s) ∈WM : f (x) = hN(y, t) ∈WN , hn
(y,
s + t
2
)∈ K′′ e t 6 s .
Entretanto, denotando por πM : ∂M × I −→ I e πN : ∂N × I −→ I as projecoes dadas por
πM(z, s) = s e πN(y, t) = t para cada (z, s) ∈ ∂M × I e cada (y, t) ∈ ∂N × I, temos que:
L′2 = f−1(K′′) ∩ x ∈WM : (πN h−1N )( f (x)) > (πM h−1
M )(x) .
Assim, como f−1(K′′) e compacto (pois K′′ e compacto e f e uma aplicacao propria), e
como o conjunto
x ∈WM : (πN h−1N )( f (x)) > (πM h−1
M )(x)
Deformacoes Propriamente Homotopicas que Preservam Raızes 181
e fechado, segue que L′2 e um subconjunto compacto de WM. Por outro lado, sendo
ψ1 : ∂M × I −→ ∂N e ψ2 : ∂M × I −→ I as aplicacoes contınuas dadas por
ψ1(z, s) = (pN h−1N f hM)(z, s)
e
ψ2(z, s) =s + (πN h−1
N f hM)(z, s)
2
para cada (z, s) ∈ ∂M × I, onde pN : ∂N × I −→ ∂N e a projecao de ∂N × I sobre ∂N
(definida por pN(y, t) = y para cada (y, t) ∈ ∂N × I), considere a aplicacao contınua
ψ = (ψ1,ψ2) : ∂M × I −→ ∂N × I; se x ∈ WM e tal que x = hM(z, s) e f (x) = hN(y, t) ∈ WN,
temos que:
(hN ψ h−1M )(x) = (hN ψ)(z, s)
= hN(ψ1(z, s),ψ2(z, s))
= hn
((pN h−1
N f hM)(z, s),s + (πN h−1
N f hM)(z, s)
2
)
= hn
((pN h−1
N f )(x),s + (πN h−1
N f )(x)
2
)
= hn
((pN h−1
N )(hN(y, t)),s + (πN h−1
N )(hN(y, t))
2
)
= hn
(pN(y, t),
s + πN(y, t)
2
)
= hn
(y,
s + t
2
).
Alem disso, note que ψ : ∂M × I −→ ∂N × I e uma aplicacao propria: com efeito, se
C ⊆ ∂N × I e compacto, temos que C = C1 × C2, onde C1 ⊆ ∂N e C2 ⊆ I sao compactos,
e, portanto,
ψ−1(C) = (z, s) ∈ ∂M × I : ψ(z, s) ∈ C
= (z, s) ∈ ∂M × I : (ψ1(z, s),ψ2(z, s)) ∈ C1 × C2
= (z, s) ∈ ∂M × I : ψ1(z, s) ∈ C1 e ψ2(z, s) ∈ C2
= ψ−11 (C1) ∩ ψ−1
2 (C2) ;
logo, comoψ1 : ∂M×I −→ ∂N e uma aplicacao propria (pois pN, h−1N , f e hM sao proprias,
e ψ1 = pN h−1N f hM), segue que ψ−1
1(C1) e compacto, o que (pelo fato de ψ−1
2 (C2) ser
um subconjunto fechado de ∂M× I) implica queψ−1(C) = ψ−11
(C1)∩ψ−12 (C2) e compacto.
182 Deformacoes Propriamente Homotopicas que Preservam Raızes
Deste modo, como:
L′′2 = x = hM(z, s) ∈WM : f (x) = hN(y, t) ∈WN , hN
(y,
s + t
2
)∈ K′′ e t 6 s
= x ∈WM : f (x) ∈WN , (hN ψ h−1M )(x) ∈ K′′ e (πN h−1
N )( f (x)) 6
(πM h−1M )(x)
= f−1(WN) ∩ (hN ψ h−1M )−1(K′′) ∩
x ∈WM : (πN h−1N )( f (x)) 6 (πM h−1
M )(x) ,
segue que L′′2 e compacto, uma vez que (hN ψh−1M )−1(K′′) e compacto (pois hN ψh−1
M
e propria e K′′ e compacto), e f−1(WN) e x ∈ WM : (πN h−1N
)( f (x)) 6 (πM h−1M
)(x) sao
fechados. Resumindo, temos entao que os conjuntos F−1(K′), L1, L2 e L′′2 sao compactos,
e, consequentemente, F−1(K) tambem o e, pois:
F−1(K) = F−1(K′ ∪ K′′) = F−1(K′) ∪F−1(K′′) = F−1(K′) ∪ (L1 ∪ L2)
= F−1(K′) ∪ [L1 ∪ (L′2 ∪ L′′2 )] .
Assim, concluımos que F−1(K) e compacto para todo subconjunto compacto K ⊆ N, o
que prova que F : (M, ∂M, Int M) −→ (N, ∂N, Int N) e uma aplicacao propria.
Agora, considere a aplicacao H : M × I −→ N, definida do seguinte modo: se
x ∈M rWM, tomamos
H(x, r) =
f (x) se f (x) ∈ N rWN (∀r ∈ I)
hN
(y, (1 − r)t + r
(t + 1
2
))se f (x) = hN(y, t) ∈WN
;
por outro lado, se x = hM(z, s) ∈WM, consideramos
H(x, r) =
f (x) se f (x) ∈ N rWN (∀r ∈ I)
f (x) se f (x) = hN(y, t) ∈WN , t > s (∀r ∈ I)
hN
(y, (1 − r)t + r
(s + t
2
))se f (x) = hN(y, t) ∈WN , t 6 s
.
De maneira analoga ao que fizemos para a aplicacaoF , pode-se verificar que H esta bem
definida e e contınua em M × I; ademais, nao e difıcil ver tambem que H(∂M × I) ⊆ ∂N
(uma vez que, para todo x ∈ ∂M, temos x = hM(x, 0) e f (x) = hN( f (x), 0) ∈ ∂N). Logo,
como H(x, 0) = f (x) e H(x, 1) = F (x) para todo x ∈ M, segue que H : (M × I, ∂M ×
I) −→ (N, ∂N) constitui uma homotopia entre f e F . Portanto, a fim de encerrarmos a
demonstracao do teorema, basta verificarmos que H e uma aplicacao propria.
Considere, pois, as aplicacoes contınuas α : f−1(WN)× I −→ I e β : [WM ∩ f−1(WN)]×
I −→ I, dadas por:
α(x1, r) = (1 − r) · (πN h−1N f )(x1) + r ·
(πN h−1N f )(x1) + 1
2
Deformacoes Propriamente Homotopicas que Preservam Raızes 183
e
β(x2, r) = (1 − r) · (πN h−1N f )(x2) + r ·
(πM h−1M )(x2) + (πN h−1
N f )(x2)
2
para cada (x1, r) ∈ f−1(WN) × I e cada (x2, r) ∈ [WM ∩ f−1(WN)] × I (onde πM, πN e pN
sao as projecoes mencionadas anteriormente), e sejam γ : f−1(WN) × I −→ ∂N × I e
δ : [WM ∩ f−1(WN)] × I −→ ∂N × I as aplicacoes contınuas definidas por:
γ(x1, r) = ((pN h−1N f )(x1),α(x1, r)) e δ(x2, r) = ((pN h−1
N f )(x2),α(x2, r))
para cada (x1, r) ∈ f−1(WN)×I e cada (x2, r) ∈ [WM∩ f−1(WN)]×I. Dado C = C1×C2 ⊆ ∂N×I
compacto, com C1 ⊆ ∂N e C2 ⊆ I compactos, temos que:
γ−1(C) = (x1, r) ∈ f−1(WN) × I : γ(x1, r) ∈ C = C1 × C2
= (x1, r) ∈ f−1(WN) × I : (pN h−1N f )(x1) ∈ C1 e α(x1, r) ∈ C2
= (pN h−1N f )−1(C1) ∩ α−1(C2)
e, analogamente, δ−1(C) = (pN h−1N f )−1(C1) ∩ β−1(C2); logo, como (pN h−1
N f )−1(C1)
e compacto (uma vez que pN, h−1N e f sao aplicacoes proprias), e α−1(C2) e β−1(C2) sao
fechados, segue que γ−1(C) e δ−1(C) sao compactos, o que implica que γ e δ sao ambas
aplicacoes proprias. Alem disso, se x = hM(z, s) ∈ WM e tal que f (x) = hN(y, t) ∈ WN,
temos que:
(hN γ)(x, r) = hN((pN h−1N f )(x),α(x, r))
= hN
((pN h−1
N f )(x), (1 − r) · (πN h−1N f )(x) + r
(πN h−1N f )(x) + 1
2
)
= hN
(pN(y, t), (1 − r) · πN(y, t) + r
πN(y, t) + 1
2
)
= hN
(y, (1 − r)t + r
t + 1
2
)
e
(hN δ)(x, r) = hN((pN h−1N f )(x), β(x, r))
= hN
((pN h−1
N f )(x), (1 − r)·(πN h−1N f )(x) +
r ·(πM h−1
M )(x) + (πN h−1N f )(x)
2
)
= hN
(pN(y, t), (1 − r) · πN(y, t) + r
πM(z, s) + πN(y, t)
2
)
= hN
(y, (1 − r)t + r
s + t
2
),
184 Deformacoes Propriamente Homotopicas que Preservam Raızes
para todo r ∈ I. Assim, se x ∈M rWM, segue que:
H(x, r) =
f (x) se f (x) ∈ N rWN (∀r ∈ I)
(hN γ)(x, r) se f (x) ∈WN
,
enquanto que, se x = hM(z, s) ∈WM, temos:
H(x, r) =
f (x) se f (x) ∈ N rWN (∀r ∈ I)
f (x) se f (x) − hN(y, t) ∈WN, com t > s (∀r ∈ I)
(hN δ)(x, r) se f (x) = hN(y, t) ∈WN, com t 6 s
.
Isto posto, dado um subconjunto compacto K ⊆ N arbitrario, considere novamente
K′ = (N rWN) ∩ K e K′′ = WN ∩ K (de modo que K = K′ ∪ K′′); temos entao que K′ e
um subconjunto compacto de NrWN, e, portanto (como H(x, r) = f (x) para todo x ∈M
tal que f (x) ∈ N rWN ⊇ K′′), H−1(K′) e compacto. Por outro lado, temos que K′′ ⊆ WN
tambem e compacto, e H−1(K′′) = F1 ∪ F2, onde
F1 = (x, r) ∈ (M rWM) × I : H(x, r) ∈ K′′
e
F2 = (x, r) ∈WM × I : H(x, r) ∈ K′′ ;
no entanto, como H(x, r) = (hN γ)(x, r) para todo r ∈ I e todo x ∈ M r WM tal que
f (x) ∈ WN ⊇ K′′, segue que F1 = [(M rWM) × I] ∩ (hN γ)−1(K′′), o que implica que
F1 e compacto (pois, como hN e γ sao aplicacoes proprias, o conjunto (hN γ)−1(K′′) e
compacto). Enfim, note que F2 = F′2 ∪ F′′2 , onde
F′2 = (x, r) ∈WM × I : H(x, r) ∈ K′′ e (πN h−1N )( f (x)) > (πM h−1
M )(x)
= (x, r) ∈WM × I : f (x) ∈ K′′ e (πN h−1N )( f (x)) > (πM h−1
M )(x)
= [ f−1(K′′) × I] ∩ [x ∈WM : (πN h−1N )( f (x)) > (πM h−1
M )(x) × I]
e
F′′2 = (x, r) ∈WM × I : H(x, r) ∈ K′′ e (πN h−1N )( f (x)) 6 (πM h−1
M )(x)
= (x, r) ∈WM × I : (hN δ)(x, r) ∈ K′′ e (πN h−1N )( f (x)) 6 (πM h−1
M )(x)
= (hN δ)−1(K′′) ∩ [x ∈WM : (πN h−1N )( f (x)) 6 (πM h−1
M )(x) × I] ;
logo, como os conjuntos
x ∈WM : (πN h−1N )( f (x)) > (πM h−1
M )(x) × I
e
x ∈WM : (πN h−1N )( f (x)) 6 (πM h−1
M )(x) × I
Deformacoes Propriamente Homotopicas que Preservam Raızes 185
sao fechados, e f−1(K′′) × I e (hN δ)−1(K′′) sao compactos (pois as aplicacoes f , hN e δ
sao proprias), segue que F′2 e F′′2 sao compactos, e, consequentemente, F2 tambem o e.
Deste modo, temos que o conjunto
H−1(K) = H−1(K′) ∪H−1(K′′) = H−1(K′) ∪ F1 ∪ (F′2 ∪ F′′2 )
e compacto, o que mostra que a homotopia H : (M × I, ∂M × I) −→ (N, ∂N) e propria,
concluindo a demonstracao.
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