TEORIA GERAL DE SISTEMA: DIÁLOGOS

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Complexidade em tempos de crise: Diálogos entre economia, sustentabilidade e visão sistêmica Universidade Federal de Uberlândia - MG 03 e 04.11.2016 12º Congresso Brasileiro de Sistemas ISSN: 2446-6700 TEORIA GERAL DE SISTEMA: DIÁLOGOS Antônio Carlos Victor Amaral Centro Universitário de Caratinga [email protected] Resumo Este trabalho foi alicerçado no desenvolvimento de uma análise baseada nas discussões e consequentes considerações de Ludwig von Bertalanffy e Keneth Ewart Boulding sobre a Teoria Geral de Sistema (TGS), em troca de correspondências e em seus registros nos anuários na Society for General Systems Research, desde a sua fundação até 1972. Buscou-se estabelecer marcos metodológicos e históricos no desenvolvimento da TGS e o conhecimento interdisciplinar respectivo e sua contribuição com os avanços e resultados dessa análise. Com a pesquisa documental conclui-se que as discussões entre dois profissionais de formações distintas e com conclusões semelhantes e contemporâneas na construção da TGS e suas aplicações teóricas. Palavras-Chave: Bertalanffy. Boulding. História da Ciência. Teoria Geral de Sistema. Abstract This work was rooted in the development of an analysis based on the discussions and resulting considerations of Ludwig von Bertalanffy and Kenneth Ewart Boulding on the System General Theory (TGS) in correspondence exchange and their records in the yearbooks of the Society for General Systems Research, from its foundation until 1972. We sought to establish methodological and historical landmarks in the development of System General Theory and the respective interdisciplinary knowledge and its contribution to the progress and results of this analysis. With the documentary research is concluded that discussions between two professionals from different backgrounds and with similar and contemporary findings in the construction of System General Theory and its theoretical applications. Keywords: Bertalanffy. Boulding. History of Science. System General Theory.

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Complexidadeemtemposdecrise: Diálogosentreeconomia,sustentabilidadeevisãosistêmica

UniversidadeFederaldeUberlândia-MG

03e04.11.2016

12º Congresso Brasileiro

de Sistemas

ISSN:2446-6700

TEORIA GERAL DE SISTEMA: DIÁLOGOS

Antônio Carlos Victor Amaral Centro Universitário de Caratinga

[email protected]

Resumo

Este trabalho foi alicerçado no desenvolvimento de uma análise baseada nas discussões e consequentes considerações de Ludwig von Bertalanffy e Keneth Ewart Boulding sobre a Teoria Geral de Sistema (TGS), em troca de correspondências e em seus registros nos anuários na Society for General Systems Research, desde a sua fundação até 1972. Buscou-se estabelecer marcos metodológicos e históricos no desenvolvimento da TGS e o conhecimento interdisciplinar respectivo e sua contribuição com os avanços e resultados dessa análise. Com a pesquisa documental conclui-se que as discussões entre dois profissionais de formações distintas e com conclusões semelhantes e contemporâneas na construção da TGS e suas aplicações teóricas.

Palavras-Chave: Bertalanffy. Boulding. História da Ciência. Teoria Geral de Sistema. Abstract

This work was rooted in the development of an analysis based on the discussions and resulting considerations of Ludwig von Bertalanffy and Kenneth Ewart Boulding on the System General Theory (TGS) in correspondence exchange and their records in the yearbooks of the Society for General Systems Research, from its foundation until 1972. We sought to establish methodological and historical landmarks in the development of System General Theory and the respective interdisciplinary knowledge and its contribution to the progress and results of this analysis. With the documentary research is concluded that discussions between two professionals from different backgrounds and with similar and contemporary findings in the construction of System General Theory and its theoretical applications.

Keywords: Bertalanffy. Boulding. History of Science. System General Theory.

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Introdução

O pensamento de Bertalanffy e Boulding sobre a TGS, apesar de distantes fisicamente

inicialmente, foi possível uma conclusão semelhante, como se observa no desenvolvimento

deste trabalho, que abordou as discussões entre Bertalanffy e Boulding sobre a TGS. A

abordagem de tais considerações decorreu da interação de suas teorias, a despeito de

Bertalanffy ser um biólogo e Boulding um economista e, em razão disto, terem discutido o

mesmo tema a partir de visões paradoxalmente idênticas, muito embora com percepções ao

mesmo tempo diferentes e semelhantes.

Boulding lhe escreveu: Parece que cheguei a uma conclusão muito semelhante à sua,

embora partindo da economia e das ciências sociais e não da biologia, a saber: existe

um corpo daquilo que chamei "teoria empírica geral", ou "teoria geral do sistema" em

sua excelente terminologia, com larga aplicação em muitas disciplinas diferentes

(Bertalanffy, 1968, p. 34-5).

Fazendo um necessário flashback, em seu primeiro contato com Bertalanffy, em

novembro de 1953, depois de ler seu artigo Philosophy of Science in Scientific Education,

Boulding enviou-lhe a descrição de sua concepção da TGS. Expõe-se nesse ponto a opinião de

Boulding sobre a relação entre a economia e as ciências comportamentais. Depois de iniciar

sua análise com esta afirmação: “Estamos vivendo no meio de um movimento interdisciplinar”,

o pesquisador o descreveu como resultante de três processos evolutivos:

a) O aumento da generalidade das disciplinas em vista da ruptura dos limites que as

separam; b) O desenvolvimento de um número significativo de campos empíricos

específicos, tais como as relações industriais, que eram arrancados das bases teóricas

de várias disciplinas diferentes; e, (c) O crescimento do campo “intersticial”, no caso

de duas disciplinas análogas como a Psicologia Social e Economia Política resultarem

numa nova disciplina pela interação de seus conceitos (Boulding, 1978, p. 20).

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Complementando, Boulding (1978) enfatizou que as teorias do comportamento

econômico tiveram um impacto significativo sobre a ciência política, que se moveu na direção

da economia política.

De modo geral, Bertalanffy foi reconhecido como o fundador da TGS, muito embora,

como foi comum na história da ciência, tal autoria ter sido contestada. Neste sentido, Anatol

Rapoport o descreveu como o primeiro biólogo a tentar descrever a biologia teórica como uma

ciência natural, motivo pelo qual também lhe foi creditada a iniciativa da defesa de uma

abordagem "organísmica" da biologia.

Ludwig von Bertalanffy é provavelmente uma das figuras mais incompreendidas da

história da ciência. Pela sua concepção da “Teoria Geral de Sistema” (TGS), nota-se

que tal “sistema” foi classificado no singular, enquanto hoje é comumente referido no

plural, forma originada na sua preocupação com o desenvolvimento mais amplo de um

quadro holístico teórico em biologia (Bertalanffy, 1968, p. XXIII).

Ao associar progresso tecnológico orientado com a ideia de sistemas, muitas vezes, o

próprio pesquisador contribuiu para a má interpretação de sua obra, particularmente, no que se

refere às implicações para a compreensão dos sistemas sociais (Hammond, 2010).

Desenvolvimento Metodológico

Nesta pesquisa, buscou-se analisar inicialmente o livro General System Theory:

Foundations, Development, Applications, de Ludwig von Bertalanffy (1901-1972), publicado

em 1968, no qual o pesquisador apresenta os relatos de seus estudos em épocas distintas (1940-

1969), da principal obra e tema desteestudo sobre o que foi denominado Teoria Geral de

Sistema, a fim de identificar alguns aspectos de sua formulação original, baseado também no

artigo publicado na The Scientific Monthly, em 1953, Philosophy of Science in Scientific

Education e outros artigos e trabalhos de Bertalanffy e Boulding.

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Com isso, se propôs, uma pesquisa exploratória, associada à metodologia da pesquisa

bibliográfica. Interpretou-se os textos de forma a sustentar e apresentar as influências do

desenvolvimento da Teoria Geral de Sistema. Posto isso, algumas influências dos estudos e

pesquisas de Bertalanffy no desenvolvimento das organizações sociais. Verificou-se, em

especial conceitos propostos a partir dos diálogos entre o biólogo Ludwig von Bertalanffy e o

economista Kenneth Ewart Boulding e das discussões sobre suas contribuições científicas para

o desenvolvimento de novas teorias. Aborda-se também o papel desse diálogo na criação da

Society for General Systems Research.

Em seu livro Teoria Geral de Sistema, Bertalanffy apresentou os resultados de

discussões com biólogos e médicos alemães e austríacos. Embora a unanimidade dos

debatedores confirmasse o seu notável conhecimento e domínio das questões biológicas, após

a divulgação de sua obra, surgiram críticas de biólogos e filósofos da biologia de inspiração

“vitalista”, como Aloys Wenzl (1887-1967), que classificaram a sua perspectiva “organísmica”

como uma “alternativa refinada do mecanicismo”.

De suas discussões com Alston S. Householder (1904-1993), Bertalanffy abstraiu,

também, e mais especificamente: a possibilidade de estabelecer uma relação formal entre o

caráter aberto de um sistema e a sua equifinalidade; ou seja, o que caracteriza os sistemas

abertos e em qual estado final serão modificados; e se as condições iniciais ou o curso do

processo serão alterados.

O oposto ocorre nos processos organísmicos, quando o mesmo estado final, a mesma

meta poderia ser alcançada, partindo-se de diferentes trajetos, fazendo com que esta não

aparecesse mais como uma propriedade necessária e única dos sistemas vivos, e sim como uma

propriedade sistemática geral, ou seja, a sua capacidade de adaptação (Pouvreau, 2009, p. 51).

Bertalanffy (1952) pensou que sua visão organísmica oferecia um modelo alternativo

que pudesse superar a dicotomia entre o mecanicismo e o organicismo. No seu entendimento,

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o embrião em desenvolvimento é um fluxo inquieto e dinâmico, e “a ação de desenvolvimento

de uma célula depende de sua posição na cadeia do sistema celular” (Bertalanffy, 1952, p. 57),

pois começando como uma única célula é progressivamente diferenciada em sistemas

subordinados.

Em 1937, convidado a fazer uma conferência em um seminário organizado por Charles

Morris (1901-1979), Bertalanffy expôs, pela primeira vez, as linhas do seu projeto de

“Sistemologia Geral”, onde demonstrou que todas as ciências se encontravam em um mesmo

nível de concepção dinâmica e os conceitos de “totalidade” e de “organização”, bem como uma

identidade formal de princípios e leis em domínios, a priori, completamente diferentes

“isomorfismos” (Bertalanffy, 1968).

Bertalanffy (1968) deixou os rascunhos na gaveta, pois a guerra também interferiu no

desenvolvimento de seu trabalho que, de certa forma, foi interrompido. Assim, somente após

a guerra iniciou suas publicações sobre o tema, motivado pela percepção de uma mudança no

clima intelectual do pós-guerra, ou seja, de que havia se tornado “moda” a construção de

modelos e generalizações abstratas. Segundo ele, cientistas diferentes tinham seguido linhas

semelhantes de pensamento.

Para explicar tal simetria evolutiva, postulou a existência de princípios, de modelos e

de leis aplicáveis a quaisquer tipos de sistema, independentemente da natureza dos seus

elementos e de suas propriedades específicas, justificando, assim, a formulação do seu projeto

de “Teoria Geral de Sistema”.

No entanto, nos EUA, Norbert Wiener tinha o seu trabalho estimulado justamente pela

guerra, pela necessidade do desenvolvimento de equipamentos militares e outras realizações

tecnológicas afins (Laclau & Luhmann, 2006; Vasconcellos, 2002).

Após a guerra, ainda na Europa, Bertalanffy discutiu a TGS com os físicos,

apresentando-a em conferências e simpósios, mas eles a receberam com incredulidade. Assim,

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o pesquisador vivenciou a dificuldade de ultrapassar tanto as fronteiras disciplinares como as

continentais, ou seja, da Europa para os Estados Unidos. Boulding atesta essa dificuldade em

um comentário enviado a Bertalanffy, em 1953:

Tenho a certeza de haver muita gente em todo o mundo que chegou, essencialmente,

ao mesmo entendimento que alcançamos. ” Por fim, conclui que “estimo que esteja

amplamente espalhada e não se conheça uma à outra, tão grande é a dificuldade de

atravessar as fronteiras das disciplinas (Bertalanffy, 1968, p. 34-5).

Bertalanffy (1953) acreditou que a TGS seria como um caminho para a unidade da

ciência, e para uma transferência controlada de modelos e leis de um campo para outro. No

entanto, destacou que a unificação da ciência tem sido vista na redução de todas as ciências à

física, daí uma visão alternativa a esse ponto de vista através da sua proposta de teoria de maior

interatividade da ciência e seus pesquisadores.

Enquanto isso, a cibernética se desenvolvia nos EUA, e tendo conhecimento de sua

evolução, Bertalanffy era influenciado pela nova ciência. Em suas publicações, ele cita os

trabalhos dos pesquisadores Norbert Wiener, W. Ross Ashby, John von Newman, Warren

Weaver e Claude E. Shannon (Bertalanffy, 1968).

De sua parte, ao citar o trabalho de W. Ross Ashby, Boulding apresentou distinções

entre informação e matéria-energia, concernentes ao modelo cibernético. Assim, argumentou

que a organização não pode existir sem comunicação. E seu ponto de vista pautou-se na ideia

de que, enquanto a matéria e a energia não puderam ser criadas nem destruídas, a informação

é cumulativa e capaz de um crescimento contínuo e expansivo. Sua visão refletia o interesse

de interação dos pesquisadores de áreas distintas, mas, com objetivos comuns. Levando em

conta o que foi exposto anteriormente se pode notar que tanto Bertalanffy quanto Boulding

dedicaram-se a analisar a então nova ciência da cibernética.

Em 13 de janeiro de 1954, Bertalanffy revelou apreensão quanto à hostilidade em

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relação à Europa presente no cenário político-social dos EUA que, segundo os jornais

canadenses, se intensificara, externando sua preocupação pela recente história vivida pela

Europa e seus desdobramentos políticos. Ele se referia ao “tinkpol” (Orwell, 1984, p. 3-7),

termo que ilustrou o totalitarismo extremo, no qual até mesmo os pensamentos dos seres

humanos eram controlados (Huxley & Bertalanffy, 1973).

De fato, Bertalanffy concordou que havia necessidade de uma integração de conceitos

e abordagens de sistemas, e enviou para Boulding uma cópia de sua proposta de um instituto

de investigação de sistemas. Na sequência, Boulding e Bertalanffy redigiram uma carta que,

de imediato, foi enviada aos cientistas da natureza e da sociedade que podiam ter interesse na

formação dessa sociedade dedicada ao estudo geral dos sistemas.

Dentre esses cientistas estava Anatol Rapoport, que respondeu demonstrando-se

interessado na ideia. Com isso, os planos para a da Society for General Systems Research

(SGSR/ISSS), tornou-se real, e Boulding contatou Ralph Tyler para recomendar Bertalanffy

como um dos parceiros convidados (Boulding, 1968).

O conceito de organismo como um sistema aberto, introduzido em 1940, foi a

contribuição mais importante de Bertalanffy para a evolução do pensamento sistêmico,

fornecendo base conceitual para o surgimento da termodinâmica de não equilíbrio,

comprovando que o pesquisador se interessou por uma ampla gama de questões, transitando

em inúmeros campos de estudo.

Baseando-se na articulação de Claude Shannon da teoria da informação, Boulding vê

como interessantes algumas conclusões para a comunicação humana, sugerindo que a

redundância é necessária dada a quantidade de ruídos. E que, ainda assim, “somente com a

reiteração constante em muitas formulações diferentes, é que as ideias, realmente, atravessam

de uma mente para outra” (Boulding, 1961, p. 10). Destacou, também, as significativas

implicações da epistemologia e ética no conceito de informação.

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As principais ideias da contribuição de Boulding (1958) para o desenvolvimento do

pensamento geral de sistemas incluíam a sua concepção ecológica de sociedade, o

desenvolvimento dos conhecimentos da teoria da informação e da cibernética em uma análise

da percepção e da ideologia, e o compromisso de dedicar-se, ao longo de sua vida, à paz e

resolução de conflitos, elementos que enquadravam a sua visão evolutiva da história.

Bertalanffy distinguiu três desenvolvimentos gerais na área de sistemas: (a) sistemas e

tecnologia; (b) sistemas e ciência; e, (c) filosofia e sistemas. Posto isto, Bertalanffy (1968)

descreveu a TGS como “uma filosofia e ciência de síntese, enfatizando sua holística, orientação

ecológica e integradora, em contraste com a orientação mecanicista das mais estreitas

abordagens tecnológicas”. Concluiu que parte da confusão sobre os resultados desse trabalho

origina-se da tensão entre suas dimensões científica e filosófica” (Davidson, 1983, p. 21).

A concepção de Bertalanffy da TGS surgiu do seu trabalho anterior em biologia teórica,

e da sua percepção de que os organismos biológicos devem ser estudados como totalidades.

Quanto à concepção de Boulding, foi enraizada em uma profunda oposição à guerra. O teórico

trabalhou em direção ao conceito de totalidade que poderia equilibrar a diversidade, conter

polaridades e, ainda, deixar espaço para o crescimento individual e diverso (Boulding, 1958).

Boulding discutiu as semelhanças entre as organizações sociais e os organismos

biológicos, descrevendo como o comportamento, o crescimento e a sobrevivência das

organizações, em ambas as realidades, eram determinadas por suas estruturas internas.

No entanto, o pesquisador afirma não ter dúvida da necessidade de a TGS ser vista sob

outra denominação. Isto porque, como mencionado anteriormente neste projeto, o

desenvolvimento adicional de grande interesse na forma de estudo interdisciplinar inclui, entre

os exemplos apresentados, a teoria da informação, que se originou na engenharia de

comunicações, e tem importantes aplicações em vários campos que se estendem da biologia às

ciências sociais.

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Da mesma forma, a teoria da organização, que surgiu da economia, sociologia,

engenharia, fisiologia e da administração foi, em si, um produto igualmente multidisciplinar.

Como afirmou Boulding:

Da mesma forma, um especialista que trabalha com o conceito de crescimento – seja

ele cristalógrafo, virologista, citologista, fisiologista, psicólogo, sociólogo ou

economista – será mais sensível às contribuições de outros campos, se estiver

consciente das muitas semelhanças do processo de crescimento em diferentes campos

empíricos (Boulding, 1956, p. 199).

Uma vez que as linhas de comunicação são lineares, como são os nervos, Boulding

sugeriu que o tamanho das organizações sociais, das redes de comunicação e das funções

administrativas tem uma importância relativa, já tais dimensões são significativamente

melhoradas por mudanças tecnológicas que aperfeiçoam as competências organizacionais,

ampliando os limites anteriores do crescimento organizacional. Tal entendimento motivou a

sua análise do efeito de tal crescimento sobre a natureza do mercado e do crescente poder do

estado (Boulding, 1953).

Boulding enfatizou a necessidade e importância do feedback como ferramenta ou

mecanismo de diagnóstico de mercados, pois os “mecanismos de feedback, por exemplo, são

de importância crucial em um grande número de sistemas econômicos. ” Exemplifica ainda,

“se alguém está procurando uma explicação dos ciclos econômicos ou flutuações, ou de

determinados mercados especulativos, como o mercado de ações, ou na economia em geral, o

modelo de feedback é extremamente útil” (Boulding, 1972, p. 86). Dada a complexidade dos

sistemas sociais e a dificuldade de obtenção de informações precisas, Boulding (1956) também

enfatizou a importância de organizar teorias, citando a revolução keynesiana, por exemplo.

Boulding mencionou a cibernética, a teoria do sistema aberto ou teoria da informação,

a realização sistemática de levantamento e coleta de dados através de pesquisas de mercado e

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de opinião pública eleitoral, e a crescente sofisticação das técnicas de modelagem matemática,

como exemplos dos atuais desenvolvimentos teóricos e metodológicos que podem aumentar o

nível geral de entendimento e, portanto, conduzir as organizações aos fins planejados e

almejados (Boulding, 1961; 1964).

O entusiasmo de Bertalanffy para a criação da TGS originou-se da certeza de que este

conceito também seria relevante para outros campos de conhecimento, e que tanto poderia ser

aplicado ao estudo da psique humana como das instituições sociais e da ecosfera global, onde

as leis similares de organização podem ser aplicadas. Boulding definiu TGS como:

Um nome que tem sido usado para descrever um nível de construção de um modelo

teórico, que se encontra em algum lugar entre as construções altamente generalizadas

da matemática pura e das teorias específicas das disciplinas especializadas. Cada

disciplina correspondeu a um determinado segmento do mundo empírico, e cada uma

desenvolveu teorias que têm aplicabilidade particular para seu próprio segmento

empírico. (Boulding, 1956, p. 200-1).

Neste sentido, disciplinas como física, química, biologia, psicologia, sociologia,

economia e outras, esculpiram em si certos elementos da experiência humana, e desenvolveram

teorias e padrões de atividade (pesquisas) que produzem satisfação no entendimento, por serem

apropriadas aos seus segmentos específicos, conforme destacou Boulding em sua abordagem.

“Sugere-se que as duas abordagens possíveis para a organização da teoria geral do sistema

devam ser consideradas como complementares e não competitivas ou, pelo menos, como dois

caminhos, cada um dos quais vale a pena explorar” (Boulding, 1956, p. 200).

Desta forma, a abordagem geral dos sistemas de conhecimento tem importantes

contribuições a dar à economia, como faz a praticamente todos os outros campos de

conhecimento. Neste sentido, em seu artigo sobre a TGS, Boulding (1972) afirma que devem

ser observadas duas maneiras de se estruturá-la.

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Nessa visão complementar, pode-se afirmar que a outra área onde os sistemas gerais

tiveram um impacto maior na economia, parece ter sido na teoria do “tamanho ótimo” da

organização. Isto porque um dos triunfos reais da TGS, que deu a von Bertalanffy muito

crédito, foi a demonstração de que os processos que conduzem à formação das organizações

tendem a exibir "equifinalidade", no sentido de um senso auto limitante do crescimento.

Na estrutura hierárquica da organização, a centralização produz ausência de otimização

por causa da quebra da rede de comunicação, enquanto na descentralização, inversamente,

produz uma subotimização, do ponto de vista da organização como um todo, advinda da

dificuldade de se otimizar (Boulding, 1956).

No entanto, Boulding salientou que os ciclos de centralização e descentralização que

vemos em quase todas as grandes organizações tais como a União Soviética, a Igreja Católica

e a empresa General Eletric®, quase certamente surgiu desse princípio.

A análise da população foi outro sistema geral considerado por Boulding de grande

importância potencial na economia. No seu entendimento, em qualquer processo que reúne um

conjunto contendo elementos como data de entrada ou "nascimento", e também elementos que

deixam o conjunto, como data de saída ou "morte", ou seja, as idades do indivíduo nesses dados

momentos, qualquer elemento pode ser identificado, e ao ser identificado merece o nome de

"população".

Populações, necessariamente, não precisam ser biológicas. Neste caso, pode-se,

perfeitamente, considerar o número total de automóveis de uma cidade, por exemplo, como

uma população, e a população futura dos automóveis pode ser projetada da mesma maneira

que se projeta populações tanto de homens como de um animal qualquer.

De acordo com a instrução clássica de holismo, o todo é maior do que a soma das partes.

Neste sentido, Bertalanffy argumentou que cada organismo é um sistema, definido por ele

como “um complexo de elementos em interação mútua” (Bertalanffy, 1952, p. 147). Para

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entender qualquer sistema, o teórico sugere ser necessário compreender não apenas as partes,

como na abordagem mecanicista, mas também as relações existentes entre elas.

Enquanto a visão de mundo do século XIX esteve essencialmente atrelada à física,

Bertalanffy considerou que a investigação de problemas biológicos daria contribuições

essenciais à evolução da ciência, uma vez que, paralelamente, também promoveria a expansão

dos conceitos e leis da física. Sua concepção organísmica foi, portanto, uma tentativa de tornar

cientificamente significativo o conceito da integridade biológica.

Assim, o pesquisador imaginou a TGS como uma pesquisa interdisciplinar de leis da

física. Seus esforços para articular matematicamente essas leis, juntamente com sua ênfase nas

“isomorfias" (ou seja, nas semelhanças de estrutura matemática formal) entre diferentes tipos

de sistemas, foram os aspectos mais controversos da sua pesquisa.

Na sua perspectiva, enquanto a visão cibernética reforçava modelos de equilíbrio dos

sistemas naturais e sociais, o conceito de sistema aberto foi explicitamente evolucionista,

enfatizando a importância da espontaneidade e criatividade. Bertalanffy criticava o modelo de

estímulo-resposta (E-R) em psicologia comportamental e, também, o que foi mantido no

modelo cibernético, por representar o organismo como inteiramente passivo, contribuindo para

uma visão da humanidade que justificava as formas totalitárias de controle social.

Para Boulding, a força do capitalismo é a sua “capacidade de coordenar organizações

em um ecossistema que não foi centralmente integrado” (Boulding, 1953, p. XV). Sustentado

nessa visão “ecológica” de organização social, o pesquisador foi fundamentalmente contra as

concentrações de poder. Argumentando que, com o “crescimento das organizações, aumentava

a necessidade de democracia interna dentro da estrutura organizacional, se caso a liberdade

estivesse em perigo” (Boulding, 1953, p. 52; 1968, p. 28), buscou novas formas de promover

a comunicação e a capacidade de resposta das estruturas hierárquicas da organização.

Assim, observou que a comunicação na hierarquia é geralmente fraca, reconhecendo

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que tanto a determinação do estado ideal como a resposta a qualquer entrada de informação

refletem os desvios do executivo. Ainda assim, foi fundamental, para a sua crença no potencial

de mudança construtiva, a ideia de que os sistemas vivos são capazes de aprendizagem.

Boulding também sugeriu que as hierarquias organizacionais tendem a distorcer a

informação, e que este defeito nos sistemas de informação tem efeitos profundos sobre a

capacidade de se de tomar decisões fundamentadas. Preocupou-se, ainda, com a relação entre

conhecimento e poder. Com base em suas percepções sobre os meios de alcançar o poder nas

organizações, sugeriu que “as imagens que são úteis na obtenção de poder, mas raramente são

úteis para exercê-lo sabiamente ou mantê-lo” (Boulding, 1961, p. 14).

Entretanto, para Bertalanffy, os sistemas sociais e os sistemas ecológicos não devem

ser considerados “superorganismos”, e sim sistemas de um nível ainda mais elevado de

organização, com suas próprias leis e graus ainda maiores de liberdade.

O teórico descreveu o processo dinâmico de organização biológica como “uma luta

contínua das peças”. No seu entendimento, “o mundo como um todo e cada uma de suas

entidades individuais é uma unidade de opostos que, em sua oposição de luta, constitui e

mantém um todo maior” (Bertalanffy, 1952, p. 53; 1969, p. 87).

O problema central da ciência era a sua classificação, cujo organon fundamental é a

definição de subordinação e superordenação dos conceitos. Na ciência moderna, a

interação dinâmica parece ser problema central em todos os campos da realidade. Seus

princípios gerais terão de ser definidos pela TGS (Bertalanffy, 1968, p. 124).

Além de sua organização e natureza dinâmica, Bertalanffy (1952) enfatizou o caráter

histórico da vida, mais aparente nas áreas de desenvolvimento, tais como a embriologia e

psicologia, embora também possa ser visto no contexto de sistemas maiores.

O pesquisador também “sugeriu que a ciência emergente da genética havia

proporcionado uma familiaridade com o vocabulário, mas não com a gramática do código

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genético” (Bertalanffy, 1952, p. 74-5; 1969, p. 83), pois uma compreensão do código genético

exigiria uma integração dos conceitos de organização e de evolução que levasse em conta a

termodinâmica e a teoria da informação.

O aspecto mais significativo do modelo organísmico, no entendimento de Bertalanffy,

foi ter desafiado a “teoria da máquina da vida” (Bertalanffy, 1952, p. 18). Em contraste com a

teoria da máquina do organismo, o pesquisador enfatizou a natureza ativa do organismo

baseado em sua compreensão de organismo como sistema aberto, sendo esta uma de suas “mais

importantes contribuições” (Huxley & Bertalanffy, 1973, p. 200) para o campo da psicologia

e, em especial, para sua concepção da TGS.

Bertalanffy considerou o crescimento como um dos problemas fundamentais em

biologia. Seu objetivo era generalizar matematicamente a ideia básica de que o crescimento

resulta da interação entre o anabolismo e o catabolismo, ou processos contínuos de construir e

quebrar, que ele considerava fundamentais para todos os aspectos da vida. Enquanto o

anabolismo está relacionado com o metabolismo da respiração e, por isso, é dependente da

forma e área de superfície do corpo, o catabolismo é dependente do peso corporal. A partir

dessas considerações, Bertalanffy (1952) desenvolveu a teoria quantitativa da morfologia

dinâmica (UNESCO, 1965). Enquanto isso, para Boulding:

Outro fenômeno de significado universal foi o crescimento. Teoria do crescimento é,

em certo sentido, uma subdivisão da teoria do crescimento individual, sendo um

importante aspecto do comportamento. No entanto, há diferenças importantes entre a

teoria do equilíbrio e a teoria do crescimento, que justifiquem colocar a teoria do

crescimento numa categoria especial. (Boulding, 1956, p. 202).

Alguns fenômenos de crescimento podem ser tratados como modelos populacionais

relativamente simples, por produzirem curvas de crescimento das variáveis individuais. Nos

níveis mais complexos, problemas estruturais tornam-se dominantes e as inter-relações

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complexas entre crescimento e forma são o foco de interesse.

Embora o organismo seja aparentemente persistente, ele é, de fato, a manifestação de

um fluxo perpétuo, um sistema aberto em estado de equilíbrio dinâmico, ou seja, o organismo

nunca está em estado de equilíbrio, encontrando-se sempre em estado de não equilíbrio, por

manter um fornecimento contínuo de energia e troca de componentes com o seu ambiente

(Bertalanffy, 1952; 1968; 1969).

O objetivo geral da abordagem de Bertalanffy (1968) foi determinar os princípios que

se aplicam a sistemas em geral, para classificar logicamente os tipos de sistemas diferentes, e

elaborar modelos matemáticos, a fim de descrevê-los como o objetivo último de uma ciência

unificadora (Ackoff, 1999).

No entanto, Boulding apresentou a TGS em duas abordagens distintas. A primeira,

pelas várias abordagens dos sistemas gerais, feitas por meio da exploração dos diversos

aspectos do mundo empírico, que levaram, em última análise, a algo como uma teoria geral do

campo da dinâmica de ação e interação. A segunda abordagem possível para a TGS foi por

meio de um arranjo de sistemas teóricos com a construção de uma hierarquia de complexidade,

que correspondeu, aproximadamente, à complexidade dos "indivíduos" dos vários campos

empíricos.

Tal abordagem foi mais sistemática que a primeira, pois vai em direção a um “sistema

de sistemas” (Bertalanffy, 1968, p. 28). Não podendo substituir inteiramente o primeiro modelo

de abordagem, o teórico concluiu que também não podia considerar sempre os conceitos

teóricos e as construções do quadro sistemático do segundo modelo. Então Boulding sugeriu

um possível arranjo de nove níveis hierárquicos do discurso teórico, e Bertalanffy (1968)

esboçou uma tabela com uma visão desses níveis.

Bertalanffy não teve a pretensão do rigor lógico, foi uma proposta parcialmente em

conformidade com as ideias de Boulding, e se tratou de uma visão geral e impressionista e,

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conforme observou: “Os níveis superiores em regra pressupõem os inferiores. Mas a relação

entre os níveis exige esclarecimento em cada caso” (Bertalanffy, 1968, p. 29).

Assim, os três primeiros níveis representados pelo princípio do conhecimento teórico,

definidos, em quase todos os campos estáticos, como sistema dinâmico simples, quando de sua

evolução para o próximo nível, ocorreu por meio de movimentos predeterminados, de forma a

alcançar, consequentemente, o nível de controle, entendendo-se pelos níveis mecânicos ou dos

mecanismos.

A evolução nesses níveis refere-se, neste quarto nível, a um aumento da complexidade

em relação aos níveis inferiores e assim por diante. A premissa foi a diferenciação dos

organismos vivos dos não vivos. Em seguida, o nível “planta” ilustrou a capacidade de

recepção difusa (árvore), evoluindo para receptores especializados de informação.

Finalizando o raciocínio da evolução de complexidade proposta nos níveis anteriores,

essa etapa teve início na apresentação do sistema humano, que possui capacidade de falar,

produzir, absorver e interpretar símbolos, diferenciando-se dos animais que emitem outros

tipos de alertas restritos.

Consequentemente, no agrupamento de seres humanos, ou seja, no próximo nível

hierárquico da organização social, a preocupação tem origem no conteúdo e significado das

mensagens. Neste sentido, Boulding (1956, p. 203) apontou que “a natureza e as dimensões

dos sistemas de valores, a transcrição de imagens em um registro histórico, as simbolizações

sutis da arte, música e poesia, formam o amplo complexo da emoção humana”. Completa ainda

que “o universo empírico aqui é a vida humana e da sociedade em toda sua complexidade e

riqueza” (Boulding, 1956, p. 203). Assim, para completar a proposta dos níveis hierárquicos,

acrescentou-se o último nível, o dos sistemas transcendentais descritos como “ultimates” e

“unknowables”, tomando-se por analogia como os “finais” e os “desconhecidos”, e exibindo

também uma estrutura sistemática de relacionamento.

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Para Boulding, a maior vantagem dessa classificação foi impedir que se aceitasse que

o nível final de análise teórica está abaixo do nível empírico investigado. Enquanto, que

Bertalanffy (1962) reconheceu a evolução do conceito de sistemas, escreveu: “Apesar das

limitações óbvias, diferentes abordagens e críticas legítimas, poucos negariam a legitimidade

e a fertilidade da abordagem de sistema interdisciplinar” (Bertalanffy, 1968, p. 16).

No campo interdisciplinar, o interesse atribuído a Boulding, no início de seus estudos,

era o uso precoce de metáforas e modelos ecológicos da população. As atividades de pesquisa

abrangiam a etnologia, a economia, o comportamento político, a ecologia humana, a

população, a organização social e dinâmica, o comportamento individual e o desenvolvimento

de modelos matemáticos na teoria social (Hammond, 2010).

Bertalanffy considerou os campos da cibernética, engenharia de sistemas e análise de

sistemas como decorrentes da complexidade da tecnologia moderna. Embora reconheça uma

ligação entre a TGS e os campos tecnológicos, sua ênfase foi na necessidade de um arcabouço

conceitual que transcendesse a base mecanicista da ciência clássica, a fim de abordar os

fenômenos mais complexos que caracterizam as ciências biológicas e as ciências

comportamentais e sociais (Bertalanffy, 1952). O pesquisador percebeu a TGS como um

esforço para descobrir padrões universais de organização, reconhecendo, simultaneamente, a

existência de qualidades emergentes em cada nível da organização, buscando distinguir os

princípios comuns a todos os níveis, gerais e específicos.

As questões relativas à natureza da totalidade da organização e da interação dinâmica

multivariada caracterizaram sistemas organizados em todos os níveis, onde o

comportamento das partes foi mais diferenciado quando estudado isoladamente do que

quando avaliado no contexto do todo (Bertalanffy, 1962, p. 4; 1968, p. 50; 1969, p. 65).

No estudo desses sistemas, Bertalanffy (1968) pensou que esses conceitos pudessem

fomentar uma base para a síntese interdisciplinar, e contribuir para a unificação e integração

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da ciência dentro de um quadro mais amplo, evitando a redução de todas as ciências às

concepções mecanicistas da física. Além disso, pensou que iria facilitar uma abordagem mais

integrada de educação, aliando valores éticos ao desenvolvimento da personalidade.

Assim, enfatizou que a concepção organísmica não implica um “domínio unilateral das

concepções biológicas” (Bertalanffy, 1968, p. 178), destacando a autonomia dos diferentes

níveis. Refletindo sobre o desenvolvimento da TGS, reconheceu que os modelos formais foram

simplificados, pois muitas vezes mostravam incongruências com a realidade, embora ainda

acreditasse que os modelos forneceram uma contribuição importante para o domínio conceitual

da natureza e para a expansão da teoria científica.

A inferência contemporânea da igualdade é equivocada, pois como o campo da

cibernética evoluiu para incorporar muitos dos mesmos elementos que Bertalanffy pensou

serem exclusivos de seu sistema? A prova do equívoco está no fato do teórico distinguir as

duas teorias, com base em seus conceitos de organização: feedback e homeostase na

cibernética, e sistemas abertos e interações dinâmicas na TGS.

Enquanto cibernética tende a enfatizar modelos de equilíbrio, a TGS é baseada na ideia

de sistemas em estados de não equilíbrio. De acordo com Bertalanffy (1968), o modelo

cibernético descreveu como “estímulos-resposta com um loop de feedback” representa o

organismo como essencialmente reativo, ao contrário da TGS, baseada no modelo organísmico,

que retrata o organismo como fundamentalmente ativo. Em sua interpretação da relevância da

cibernética para a teoria social, Boulding evidenciou, uma reconstrução da economia:

O desenvolvimento de mecanismos adequados de cibernética para uma economia livre,

que não vai alcançar a estabilidade somente ao custo de tirania ou estagnação, é um

projeto de primeira prioridade, superando em urgência, talvez, apenas a necessidade de

desenvolver mecanismos semelhantes à cibernética para a estabilização da paz

(Boulding, 1964, p. 25).

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Vinculando a ideia da cibernética da homeostase à economia keynesiana, ao se referir

à busca incessante de equilíbrio, Boulding atribuiu a esses mecanismos de regulação a

administração do governo. Além disso, ele argumenta que a vida econômica deve ser entendida

como um aspecto de todo o complexo das relações sociais:

Muitas vezes, o sistema criador se utiliza da distinção conveniente entre os fatores

endógenos, que constituem o seu próprio sistema, e os fatores exógenos, que funcionam

como forças perturbadoras do ‘de fora’, como uma desculpa para não pensar em tudo

sobre os inconvenientes ‘exógenos’ (Boulding, 1956, p. 201).

Embora admitindo que os sistemas parciais possam ser úteis, Boulding estava

preocupado com o fato dos especialistas, em vários campos das ciências sociais, reconhecerem

a natureza parcial de seus próprios modelos e, pelo menos, estarem cientes de outros aspectos.

Considerações Finais

A TGS enfatizou o processo e a função, em contraste com a ênfase cibernética na

homeostase e estrutura. Embora a cibernética destacasse os conceitos de informação e

comunicação no seu modelo de sistema aberto, ela enfatizou a interação dinâmica generalizada

de componentes da cinética e termodinâmica.

Bertalanffy descreveu a dimensão simbólica da cultura como uma propriedade

emergente exclusiva da saúde da sociedade humana, que não poderia ser reduzida a impulsos

biológicos, sugerindo que “universos simbólicos” constituem a parte mais importante do

sistema comportamental do indivíduo. Salientou que o “irracional” do comportamento dos

animais foram muitas vezes mais “racional” do que o dos seres humanos, que foram cada vez

mais influenciados para escolhas irracionais pelos meios de comunicação e pela indústria da

publicidade.

Da mesma forma que os sistemas biológicos foram relativamente autônomos em

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relação à natureza inanimada, os sistemas simbólicos foram relativamente autônomos em

relação à biologia. A humanidade incorporou uma valorização do papel do simbolismo, dos

valores e da ética. Em última análise, foi sempre o sistema de valores, de ideias, de ideologias

que foi decisivo. Assim, Bertalanffy “viu como os valores são culturalmente determinados, e

se opôs à visão naturalista da humanidade, que reduziu os valores para o nível das necessidades

biológicas, dos impulsos e dos princípios”.

A natureza da relação entre o indivíduo e a sociedade como um todo foi fundamental

para a consideração dos valores por Bertalanffy (1969), ao destacar que os sistemas sociais

exigem diferentes conceitos morais daqueles que se aplicam ao comportamento individual, e

que um sistema de valor apropriado para os sistemas sociais complexos ainda não evoluiu.

Boulding acreditava que o estudo de valores e suposições subjacentes era de

importância primordial nas ciências sociais, e previu um movimento evolutivo de valorações

humanas em direção à maturidade crescente. Este foi um aspecto importante de sua concepção

da visão sistêmica, que ele viu como uma forma de olhar as coisas, um modo de investigação

ao invés de um modelo rígido da natureza.

Pode-se observar então neste artigo científico que enquanto Boulding refletiu uma visão

mais aceitável quanto às ideias da cibernética, de outra forma, Bertalanffy pareceu mais

resistente e ao mesmo tempo preocupado em não associar a TGS com a cibernética, mas a

considerava como parte inserida em sua teoria. Assim também, o economista descreveu a TGS

em níveis hierárquicos, enquanto o biólogo manteve a visão organísmica dos sistemas abertos,

por definição.

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