Tese | Cultura Verde 2012

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2ª Tese do Coletivo Antibroibicionista Cultura Verde.

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Um ano de Cultura Verde

Um ano de Cultura VerdeH um ano atrs, o Coletivo Cultura Verde teve a ousadia de afirmar que est brotando uma nova cultura pelo mundo em nossa I Tese ao Congresso Estudantil da UFF. No mesmo momento em que sinalizamos ao movimento estudantil a inteno de organizar a primeira Marcha da Maconha da cidade, construmos relao com o movimento pela legalizao e colocamos a cara a tapa para debater com estudantes na UFF e nos encontros de rea.De l pra c, muita coisa avanou e no fosse nossa perspectiva de extrapolar os muros da UFF ao debater a legalizao, no teramos a oportunidade de dialogar com tanta gente em Niteri. O Cultura Verde, durante esse ano, apostou na construo de um coletivo mais amplo ligado a organizao da Marcha da Maconha Brasil na cidade, com a participao de novos companheiros/as, como os do blog Legalize o Boldo, do Falcatrua, da Bicicletada de Niteri. Organizamos um dos atos mais cheios da cidade, uma Marcha divertida e pacfica que interagiu com a populao de forma positiva e levantou l no alto a bandeira pela legalizao.Ao longo do processo de organizao da Marcha, o coletivo mais amplo garantiu ainda a 1 Semana Verde de Niteri, que contou com juzes, delegado, neurocientista, entre outros especialistas no tema . Alm da formao dos militantes e do debate com os niteroienses, o espao tambm propiciou a oportunidade de debater com a presidenta do Conselho Municipal Anti-drogas, uma ativista no movimento contrrio a legalizao, e com membros da LEAP Brasil, um movimento mais ligado ao anti-proibicionismo para alm da maconha. Hoje podemos afirmar que fizemos nossa parte para brotar por aqui uma nova perspectiva para a poltica de drogas no Brasil..O Cultura Verde nasceu com o debate sobre a autonomia e sobre as escolhas que fazemos, nossa posio contrria a proibio e o uso aparato repressor do Estado como poltica pblica de Estado. A proibio cria, na verdade, uma situao oposta ao controle do Estado e a regulamentao legal. A exemplo da proibio da maconha que s tem aumentado o mercado ilegal do trfico e, com isso, fortalecido o controle armado dos territrios mais marginalizados como as favelas. O comrcio ilegal tambm no distingue maiores de idade, vende sem distino drogas pesadas e leves no mesmo lugar, no passa por nenhum teste de qualidade.Desde nosso incio, temos nos colocado como um coletivo anti-proibicionista com clara inteno de se organizar pra alm da Marcha da Maconha. Devemos cumprir o papel de manifestar e se organizar nesses espaos, mas tambm de aprofundar o debate sobre a proibio em si. Nesse processo de um ano, percebemos que a proibio maconha no existe pelos malefcios do uso dessa substncia. A legislao penal tem sido usada como ferramenta de controle da populao e criminalizao da pobreza, em via de regra de forma racista e preconceituosa. Ao mesmo tempo que legitima a violncia estatal, principalmente em favelas, e gera corrupo nas instituies policiais.Nosso coletivo tem se posicionado somente pela legalizao da maconha, mas sabemos da importncia de debater a proibio contra todas as drogas. A guerra s drogas, em maior ou menor grau, causam conseqncias parecidas com a proibio da maconha: o aumento do uso do crack por populaes marginalizadas, o desrespeito soberania de pases considerados produtores e pessoa humana.No podemos tambm deixar pra trs debates que travamos no ltimo ano e que precisam ser retomados. Entre eles, a organizao dentro do movimento estudantil da UFF e nossa cobrana de DCE e CAs mais atuantes na discusso sobre a legalizao da maconha; nossas demandas de espaos mais verdes na universidade e na cidade; e a questo do transporte pblico por ciclovias que podemos tocar em conjunto com a Bicicletada de Niteri. Precisamos tambm intervir e incentivar mais a discusso acadmica da questo das drogas, seja enquanto estudantes ou nas situaes profissionais de nossa rea de atuao. A UFF uma das maiores universidades federais do pas, tem professores que discutem a questo das drogas e podem ser de ajuda valiosa no debate que travamos.Fortalecer o Cultura Verde como espao de organizao de um movimento anti-proibicionista com clara inteno de aprofundar o debate pra alm da Marcha da Maconha no significa desconstruir o coletivo amplo de Niteri. Ao contrrio, a inteno qualificar e fortalecer nossa interveno na Marcha e criar espao pra outros coletivos e atores participarem da organizao dela. O Cultura Verde deve ter mais autonomia pra intervir nacionalmente, seja em encontros estudantis ou junto a outros coletivos pela legalizao, sem que isso comprometa a autonomia da Marcha da Maconha de Niteri e suas limitaes temticas: ou seja, atuar pela legalizao da maconha exclusivamente e atuar territorialmente em Niteri. O acmulo que obtivemos nesse ltimo ano nos permite contribuir mais na Marcha de Niteri, na Marcha do Rio, nacionalmente, mas tambm nos permite colaborar mais com discusso acadmica e na construo com outros coletivos, como o Princpio Ativo e o Coletivo DAR, e outros movimentos, como o MLM Mov. pela Leg. da Maconha ou a LEAP Brasil. O coletivo tambm participou da ocupao da reitoria da UFF Maria Clenilda e Manuel Gutierrez e inclusive apontou para a importncia do movimento estudantil debater mais sobre a legalizao e poltica de drogas. Ciclovia inter-campi e bandejo vegetariano foram outras duas pautas antigas do coletivo e que conseguimos conquistar nessa ocupao. Agora temos um papel importante de fazer com que essas conquistas saiam do papel contribuindo assim para uma UFF mais VERDEHistrico da proibio.A poltica proibicionista vista pela primeira vez de maneira ntida dentro dos Estados Unidos. Com a inteno de reprimir as minorias e desencorajar a imigrao em seu pas, os EUA proibiram em 1909 o consumo do pio, hbito extremamente comum aos imigrantes orientais. Em 1914 proibida a cocana e a herona e em 1919 aprovada a Lei Seca que proibia o comercio e uso do lcool, bebida largamente consumida pelos negros e pelos imigrantes irlandeses. Pouco depois a maconha, substncia tambm utilizada em larga escala pelos imigrantes africanos, foi proibida. Mesmo com a proibio e a represso ao uso, nos anos 60 a demanda por essas substncias aumenta dentro dos EUA e explode, neste perodo, os cartis e o trfico de drogas para abastecer o mercado ilegal. Neste momento, importantes grupos mafiosos so organizados no Peru, na Bolvia e na Colmbia para abastecer o mercado norte-americano.No Brasil a proibio tambm teve um carter de represso s minorias, as minorias negras mais especificamente. A proibio da maconha foi decretada junto com a proibio da realizao de cultos afros e tambm da capoeira, todos traos culturais e hbitos comuns aos descendentes africanos no Brasil. Neste perodo, uma idia de eugenia e de embranquecimento da populao brasileira perpetuava o imaginrio de nossa elite. No toa, no mesmo perodo foi incentivada a vinda de imigrantes europeus para trabalhar nas fazendas de caf enquanto, por outro lado, uma massa de negros recm libertos estavam aos montes no Brasil procura de trabalho.

Conjuntura Mundial

Para entendermos a poltica de drogas no Brasil e no mundo necessrio conhecer as diversas leis e mecanismos que atuam na sociedade. difcil encontrar um pas que no tenha legislao especfica sobre drogas, como a China, apesar de todos os narcticos serem severamente proibidos. Pela lei do pas, posse, consumo, produo e venda de drogas ilcitas so considerados crimes. Aqueles considerados consumidores so, geralmente, submetidos a 15 dias de custdia. Os dependentes so obrigados pelo Estado a se internarem em clnicas de desintoxicao e os traficantes so presos, por anos, ou at condenados a pena de morte.No Ir a represso tambm grande. Ao mesmo tempo em que h uma certa tolerncia quanto ao consumo de drogas, a pena de morte aplicada em casos de comrcio ou posse de grandes quantidades de drogas ilegais. Em setembro deste ano, 22 pessoas foram enforcadas por trfico de drogas. A dependncia qumica , na maioria da vezes, punida com priso, mas desde 1999 o governo tenta resolver esta questo com a implementao de clnicas privadas e estatais de reabilitao.A maior parte dos pases caminha para a descriminalizao do usurio de drogas ilcitas. o que ocorre na Alemanha, por exemplo. No entanto, quem est com uma quantidade acima do permitido por lei pode chegar a pena de cinco anos de priso. A nova lei deste ano da Grcia tambm descriminaliza a posse de pequenas quantidades de todos os tipos de drogas, mas o trfico continua sendo crime com pena de 10 a 20 anos de recluso.Alguns pases rabes tambm reformularam as leis de combate s drogas de modo a no criminalizar seu consumo. Desde 1998, o governo libans prev a liberdade de dependentes desde que esses passassem por tratamentos teraputicos. Pases como Jordnia, Egito, Marrocos e Arglia possuem duras penalidades aos traficantes, sem descartar a possibilidade de pena de morte, ao passo que garantem ajuda aos dependentes.Nos Estados Unidos as penas por posse e consumo so bem variadas. Em algumas cidades, a posse de maconha uma contraveno leve, igualada ultrapassagem do limite de velocidade. Existem alguns estados norte-americanos que aceitam o uso da maconha para uso medicinal. Israel tambm regulamentou o uso da maconha medicinal em agosto de 2011, permitindo a importao e o cultivo da planta.Enquanto a ONU, em documento de 2009, fixou como meta minimizar e, eventualmente, eliminar a disponibilidade e o uso de drogas ilcitas" at 2012, atitude considerada por muitas organizaes utpica, pases como Holanda, Portugal e Repblica Tcheca so conhecidos por suas leis de drogas avanadas. No primeiro, tudo o que cannabis (maconha, haxixe e afins) pode ser comprado e consumido nos coffe shops. Em Portugal, a lei de 2001 descriminalizou o uso de todas as drogas e a Repblica Tcheca, em sua nova legislao do ano passado, especificou exatamente a quantidade e quais drogas podem ser portadas para o uso pessoal. Para o haxixe e a herona, as quantidades esto bem acima do que permitido na Holanda, por exemplo.

Infogrfico

Grfico relaciona drogas com o nmero de usurios mortos durante o ano de 2008 no Reino Unido. A maconha aparece bastante atrs de drogas como o lcool, anti-depressivos e o paracetamol, com valores muito prximos ao da aspirina.

Conjuntura da Amrica LatinaA guerra s drogas fracassou, em especial nos pases da Amrica Latina. Por isso muitos pases latinos americanos tambm esto indo contra uma poltica de drogas calcada na total represso. Hoje, na Argentina no mais ilegal que adultos portem pequenas quantidades de maconha, desde que para uso pessoal, em locais privados e sem riscos para outras pessoas.Pela legislao mexicana, tambm no mais crime a posse de pequenas quantidades de drogas como maconha, cocana e herona. A lei j estipula as quantidades das substncias que so consideradas para uso prprio, como por exemplo 500 miligramas de cocana e 5 gramas de maconha. No Chile, o usurio de drogas comete uma infrao e no um crime, mas o pas j estuda a possibilidade da total descriminalizao do mesmo.No entanto, a Colmbia foi na direo contrria. Desde 2009, a posse e o consumo de drogas so proibidos, a no ser sob prescrio mdica. Interessante que a lei colombiana de 1994 j havia descriminalizado o uso e posse. Ou seja, essa nova lei representa um retrocesso na poltica de drogas do pas.Vale lembrar que em pases como Peru e principalmente Bolvia, o plantio da folha de coca uma tradio milenar e tem representao sagrada para muitas etnias, alm de seu uso cultural e medicinal. A partir de 1961, o cultivo da coca se torna uma atividade ilegal, no diferenciando seu uso licito ou ilcito, de modo a tentar erradicar seu plantio. A lei de drogas da Bolvia prev zonas tradicionais de cultivo da coca. Os movimentos cocaleiros do pas lutam pela estimulao da produo legal da coca e so a grande oposio ao imperialismo norte-americano.Cultura CanbicaO atual momento poltico que vivemos em relao a maconha no Brasil e no mundo nos permite introduzir um tema pouco abordado, porm muito relevante no cenrio atual, que o da Cultura Canbica. Com a proibio em mbito global a partir da dcada de 30 a maconha ficou aprisionada ao preconceito e todas as produes feitas a partir dela foram condenadas e automaticamente reprimidas. No contra- fluxo do cientificismo, sequerbuscaram entender a natureza biolgica dessa planta to exuberante e mstica que serviu entre outras coisas de base filosfica, econmica e histrica para vrias sociedades.Com a fibra de cnhamo muitas embarcaes foram feitas na poca das grandes navegaes,alm disso esse planta pode vir a ser papel, tecido e at combustvel. O uso, religioso e medicinal da cannabis no um fato desprezvel , pelo contrario, no podemos negar que o uso milenar dessa erva um trao cultural importante para a humanidade. Contraditoriamente, na maior potncia capitalista do mundo, e precursora do proibicionismo da maconha os EUA, treze estados de sua federao usam cannabis como forma de tratamento mdico. A economia mundial j se beneficiou excessivamente dessa planta, no aceitar que temos que reposicionar a maconha no cenrio poltico/social/econmico no mnimo uma grande contradio e que precisa ser repensada pela a sociedade. O dio e a falta de informao que o imaginrio social conserva da maconha so herdeiros de pensamentos religiosos e proibicionistas que vem se sustentando com muita dificuldade e sempre com ajuda de aparatos repressores muito grandes por parte dos governos. O que vemos hoje no sculo XXI a crescente onda de Cultura Canbica surgindo e propondo um novo foco para a discusso..As Marchas da Maconha crescem a cada ano em todo o mundo, e aqui no Brasil o STF recentemente foi obrigado a ceder e reafirmou que o movimento pr- legalizao da maconha tem o total direito de se expressar e sustentar sua opinio em relao a erva. A quantidade visivelmente crescente de ativistas mostra que cada vez menor o nmero de pessoas que tm medo de se assumir maconheiro. O carnaval sem duvida uma grande expresso cultural e popular do pais e no Rio de Janeiro o que aconteceu em 2011 foi outra prova que a Cultura Cannbica est presente e nas ruas. Esse ano o bloco Planta na Mente, que defende a legalizao, foi um dos maiores e mais animados de todo o carnaval carioca. Tambm no Rio de Janeiro tivemos o I Festival Nacional de Cultura Canbica (FENACUCA), nesse festival o coletivo Cultura Verde ganhou o prmio na categoria Cinema. Nossos vizinhos argentinos se renem em grandes eventos anuais para discutir sobre o cultivo caseiro e novas maneiras de se plantar maconha, assim como no famoso e badalado Cannabis Cup onde realizado uma grande competio entre produtores de Cannabis na Holanda. Na internet o nmero de blogs especializados em cannabis incrvel, sendo eles, em sua maioria, uma alternativa interessante mdia tradicional hegemnica que nunca teve interesse real em debater a questo da maconha com seriedade, sem colocar seus interesses polticos em primeiro plano.No podemos proibir algo que cultural, se temos problemas que envolvem seu uso abusivo e sem controle, no com violncia e proibio que vamos resolver essa questo. Somente investindo em sade pblica, informao e conhecimento poderemos superar o atual modelo ultrapassado do proibicionismo, que longe de ser eficaz mata diariamente mais do que qualquer guerra entre naes no mundo. A questo da maconha faz ressonncia com vrios aspectos da realidade social, e merece ser estudado em suas mltiplas faces. No interessante, portanto nos fecharmos a uma idia nica cerca da Cannabis. Ela no pode ser compreendida, por exemplo, pelo mbito da segurana pblica exclusivamente. Entendemos que o consumo de maconha vai para alm da criminalizao do seu uso, podemos discutir desde filosofia e tica at biologia, direitos humanos e psicologia. importante transdisciplinarizar o debate para transformar algo hegemnico que em uma nova possibilidade de transformao e renovao.

Marcha da Maconha Niteri 2011 Um dia inesquecvel!

O dia comeou com muitas surpresas, contrariando todas as previses de tempo fornecidas pelos veculos de comunicao, o cu amanheceu azul, sem nenhuma nuvem, sinal de que coisas boas nos aguardavam! Fizemos a concentrao a partir das 14h, no incio da praia de Icara, e o pessoal foi chegando, chegando e chegando Rolou uma apresentao do movimento e de nossas bandeiras, consolidamos Niteri no calendrio nacional das 17 cidades que organizaram as Marchas pelo Brasil em 2011. s 16:20h pontualmente, espante com a organizao desses maconheiros e irresponsveis , comeamos a nossa Marcha e chegamos ao final da praia (18h) com cerca de mil pessoas cantando e gritando muito alto pela legalizao na orla da praia poluda de Icara,foi incrvel ver tanta gente logo na primeira edio da marcha aqui em Niteri. No tivemos nenhuma pessoa detida, que alegria! A Marcha da Maconha Niteri foi to linda que at a PM percebeu que no poderia estragar a festa e nos acompanhou com seus respectivos fuzis em punho, o que segundo eles, era para garantir a segurana da Marcha e seus respectivos ativistas. Nosso objetivo era levar para as ruas o debate pela legalizao da maconha e tambm discutir uma nova poltica de drogas, e isso ocorreu de forma pacfica e democrtica, em um belo domingo de sol em Niteri.

Atual conjuntura do Movimento pela legalizao da Maconha no Brasil

Temos que parabenizar a todos e a todas que tem lutado a anos para que o tema da legalizao da maconha no seja banalizado e tratado de forma preconceituosa e moral pela sociedade. Sendo a favor ou contra a legalizao preciso debater de forma clara quais as problemticas esto envolvidas na questo. No apenas o uso que esta em jogo, o uso apenas uma parte da discusso que vem aumentando de forma geral no pais . O trafico de drogas, a criminalizao da pobreza a corrupo policial, a autonomia do sujeito sobre seu corpo e, em pleno sculo XXI, at a liberdade de expresso entrou em pauta para compor o jogo de foras que esta posto para o tema da legalizao da maconha.Estamos de parabns no apenas porque obrigamos os rgos e instituies competentes a se posicionarem sobre o tema, mais principalmente porque fizemos com que o debate chegasse de forma mais concreta para grande parte da sociedade. O ano de 2011 esta sendo timo para ns que acreditamos na legalizao da maconha. O nmero de cidades que marchou cresceu sensivelmente e isso esta reverberando em todo o pais. Gostaramos tambm de refletir sobre nossa responsabilidade nesse momento, somos um movimento consolidado, pelo menos para o STF e para sociedade e isso exige que nos organizemos melhor para os prximos anos. Agora o aparato policial no pode mais impedir que possamos fazer nossas manifestaes de forma pacifica e democrtica. Outro detalhe importante a entrada de FHC e respectivamente a mdia com seus respectivos interesses econmicos no debate, no podemos perder de vista nossos objetivos, por isso acreditamos que as Marchas da Maconhas no Brasil devam se organizar nacionalmente de forma mais unitria, fazendo com que esse avano incrvel que obtivemos em 2011 no se perca.

O proibicionismo, mega-eventos e a reforma urbana.A vinda da Copa do Mundo em 2014 e as Olimpadas em 2016 no esto trazendo apenas gordos investimentos aos bancos e expectativas de lucros histricos para o setor hoteleiro e para os conglomerados de empresrios donos de empreiteiras.Os mega-eventos no Brasil trazem consigo todo um processo de criminalizao da pobreza e de reestruturao urbana para nossas cidades que, infelizmente, uma conta a ser paga pela parcela trabalhadora e pobre da populao. Os despejos em massa para a construo de complexos esportivos, estacionamentos ou hotis so referendados por uma poltica de remoo branca, como designou o deputado estadual Marcelo Freixo. A remoo branca consiste em elevar os custos de vida de uma determinada regio para que os moradores pobres tenham que se deslocar para as periferias cedendo espao aos grandes empresrios e seus investimentos em infra-estrutura para os eventos. A poltica de UPP, restrita praticamente zona sul do Rio, um bom exemplo de como isso vem ocorrendo.Com a entrada das Unidades de Polcia Pacificadora uma gama enorme de servios tiveram uma alta em seus preos e acabaram por expulsar os mais pobres da regio. A esse processo de alterao dinmica da cidade, quem vem excluindo os pobres, chamamos de reestruturao urbana, no caso especfico uma reestruturao excludente.Embora absurda, toda essa poltica repressora referendada no discurso de guerra s drogas. A entrada do estado nas favelas da zona sul carioca por meio das UPP s ocorreram porque a opinio pblica estava convicta de que tudo aquilo era necessrio para combater o grande mal que so as drogas. No demorou muito para que a populao pobre dali no se visse mais em condies de pagar suas contas de luz, gua, telefone e tivesse que se deslocar para as periferias, longe dos olhos mal acostumados de nossos turistas.A manuteno do proibicionismo pela mdia

Com o processo de urbanizao e modernizao das sociedades a opinio pblica passou a ser mediada pelos meios de comunicao e a mdia tornou-se uma importante ferramenta para seu controle. No toa, hoje, a mdia detm tanto poder que, conhecida como o 4 poder, tem no dono da TELMEX, empresa de telefonia transnacional radicada no Mxico, o homem mais rico do mundo.A mdia cumpre um papel muito importante na manuteno da poltica proibicionista no Brasil. A televiso, o rdio e os jornais foram os principais responsveis por instaurar o terror e o medo na sociedade no processo de invaso dos morros cariocas no final de 2010. Ao mesmo tempo, a grande mdia tambm cumpria o papel de encobrir os abusos cometidos pela polcia dentro das favelas e de ressaltar a boa relao desta com os moradores das comunidades.Enfim, o proibicionismo uma poltica que movimenta muito dinheiro, principalmente nos programas de guerra ao trfico e por esse motivo necessrio que ele (o mercado ilegal) esteja sempre ali, existindo, ameaando as pessoas ao mesmo tempo. Muitos interesses econmicos esto por trs da proibio e so estes mesmos interesses que movimentam a mdia de forma a tornar todo esse processo o mais lucrativo possvel. Infelizmente, em um pas onde a comunicao tem donos e seus donos tem preo, uma comunicao popular, voltada para o interesse social fica longe de nossas vistas e temos de nos deparar com a subservincia do empresariado ligado mdia diante dos grandes detentores de poder do trfico e do estado.Nova legislao: suas mudanas e conflitos

Conhecida como Lei do Usurio, por ser a primeira a diferenciar as condutas de usurios e traficantes, a lei 11.343/06 foi considerada uma inovao ao ser aprovada. De acordo com essa lei, quem importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor venda, oferecer, ter em depsito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas so considerados criminosos, enquanto quem adquirir, guardar, tiver em depsito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal considerado usurio. Para os criminosos, a lei prev recluso de 5 a 15 anos, alm do pagamento de multa e ainda exclui a possibilidade do pagamento de fiana e o torna insuscetvel a sursis, graa, indulto, anistia e liberdade provisria. J para usurios a lei prev advertncia sobre os efeitos das drogas, prestao de servios comunidade, medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo, se for o caso o juz pode determinar ao poder pblico que coloque estabelecimento de sade para tratamento especializado a disposio do infrator, gratuitamente.No fica difcil reparar que, apesar de ter diferenciado as duas condutas, a nova lei aumenta a represso aos criminosos, seja aumentando as penas ou restringindo direitos, enquanto os usurios passam a ser vistos como pacientes do sistema de sade, seja por serem considerados doentes ou por no se enquadrarem na sociedade, tendo de ser reeducados. Dessa forma a nova lei passou a ser questionada por continuar reforando a lgica da represso e criminalizao de condutas.Ao definir quais os fatores matrias que diferenciariam usurio e traficante, a lei coloca que o juiz atender natureza e quantidade da substncia apreendida, ao local e s condies em que se desenvolveu a ao, s circunstncias sociais e pessoais, bem como conduta e aos antecedentes do agente. Assim, de forma selecionada, o juiz diferencia o Tuiut do Leblon, o empresrio do trabalhador. Quando a lei considera ser os antecedentes criminais um dos fatores de diferenciao, passa a perseguir pessoas, carimba com o estigma do criminoso. Assim, se as condutas so as mesmas, por exemplo guardar, e as circunstncias sociais que definem, qual a diferena entre um pouco de maconha guardada em Icara e a mesma quantidade guardada em qualquer morro do Rio? Evidente que existe uma seleo racionalizada de acordo com as pessoas e suas classes e no de acordo com a conduta praticada. No crime guardar um pouco de maconha, o crime est em ser pobre e guardar um pouco de maconha, pois de acordo com as circunstncias sociais o morador do Morro do Caramujo pode ter conhecidos traficantes e at pode ser amigo de algum deles. Ao pautar paralelamente duas polticas distintas, preveno e represso, a lei no consegue avanar e ainda refora a inteno proibicionista, reafirmando a inteno do legislador em alargar o campo punitivo. Com polticas de sade falhas, muitas vezes sem ter chagado a sair do papel, a preveno ficou imprensada pela represso, que por sua vez cresceu visivelmente com a implantao das UPPs e imposio da paz armada nas comunidades do Rio, mais uma vez demonstrando o carter seletivo da atual poltica de drogas.

A nova lei de drogas adota uma dupla orientao poltico criminal: se de um lado, ela trata da preveno do uso, a ateno e a reinsero social de usurios e dependentes; por outro, aumenta a represso ao trfico e a figura ambgua do traficante. A lei mostra o atual conflito na sociedade brasileira que tenta equilibrar a preveno e represso. Tenta afirmar o respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana, ao mesmo tempo em que considerada inconstitucional por retirar direitos constitucionais. Inegvel que a alterao da legislao sobre drogas no Brasil mantm a inteno proibicionista e reafirma a opo do legislador pelo alargamento do campo punitivo.Entre as mudanas na lei que caracterizam esse conflito podemos citar a sano no privativa de liberdade para a aquisio, a guarda, o depsito, o transporte, o porte, o semeio, o cultivo e a colheita para consumo pessoal, distinguindo dessa forma o usurio que no deveria ser penalizado. Em contrapartida, o legislador agrava a represso ao trfico, inclusive com a criao de novas figuras tpicas como o informante colaborador e o financiador do trfico, majorando a pena mnima do trfico e figuras equiparadas de 3 para 5 anos de recluso, vedando ainda fiana, sursis, graa, indulto, anistia, liberdade provisria e substituio da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.

Ao mesmo tempo em que tenta abrandar a punio ao usurio, por outro, a lei intensificou a represso ao traficante, com procedimentos criminais mais rigorosos e penas de priso mais severas. O problema que na prtica a distino desses personagens tipificados est longe de ser clara.O artigo 28 da Lei 11.343/2006 atribui os seguintes tipos ao usurio: Quem adquirir, guardar, tiver em depsito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorizao ou em desacordo com determinao legal; e ao Traficante: Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor venda, oferecer, ter em depsito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorizao ou em desacordo com determinao legal. Alm da dificuldade real de se distinguir o crime, h semelhana dos tipos adquirir, ter em depsito, transportar, trazer consigo nos dois artigos.Como a tipificao criminal entre uso de drogas e trfico de drogas contextual, e no objetiva, ou seja, a caracterizao entre esses crimes depende somente da situao do flagrante dado pelo Policial.A necessidade de se Legalizar as drogasDe maneira concreta a proibio no reduziu o nmero de usurios de drogas no mundo. O nico resultado real que temos como efeito colateral desta poltica um aumento vertiginoso no aumento da violncia e do encarceramento de um setor pobre da sociedade. Parece estar claro que a proibio das drogas hoje tem como real intuito criminalizar a pobreza e no proteger a sociedade dos malefcios das drogas: um estado que estivesse realmente preocupado com a sade de nossa populao no deixaria o Sistema nico de Sade passando pelo processo de sucateamento em que se encontra e as polticas de reduo de danos junto aos usurios seriam levadas mais a srio.A luta pela legalizao das drogas se d pela certeza de que precisamos dar uma resposta ao extermnio da populao negra, pobre e jovem das periferias e morros brasileiros que morrem, dia-a-dia, sob um discurso falido de combate s drogas que mais tem resultado em bitos do que em avanos na qualidade de vida da nossa populao.Sabemos que muitos interesses permeiam a manuteno da proibio e o prprio trfico um dos grandes beneficiados desta poltica. Com a legalizao e regulamentao das drogas o trfico sofreria um duro golpe pelo fato de perder grande fatia de seu mercado. importante destacar que apenas a legalizao das drogas por si s no resolver o caos em que se encontra a segurana pblica hoje. Se no houver um projeto srio de investimento em educao, sade, saneamento bsico e planos trabalhistas para receber o enorme contingente de trabalhadores do trfico aps a legalizao ns podemos ter dificuldades em diversos setores sociais. A questo das drogas deve ser encarada como um problema de sade pblica e deve ser conduzida de maneira a reduzir danos. tempo da esquerda amadurecer esse debate e comear a levantar a bandeira da legalizao das drogas junto bandeiras histricas do movimento como a educao pblica de qualidade, a sade pblica, a democratizao da cultura e da comunicao.Defendemos a legalizao das drogas, o cultivo caseiro, que ajuda a combater o trfico, o uso medicinal e a Marcha, junto a todos os coletivos e ativistas anti-proibicionistas do Brasil por entender que essa luta parte importante da construo da nova sociedade que reivindicamos: justa, igualitria e livre das opresses.

Reduo de danos

Nosso sistema de sade no funciona como deveria e o governo federal junto com as secretarias municipais de sade continuam, atravs de campanhas publicitrias bilionrias, tentando convencer o povo brasileiro que todos tem acesso sade. Isso no verdade, quem trabalha no SUS ou atendido por ele sabe que o sucateamento e a insatisfao geral. Temos uma lei super avanada, mas ela s existe no papel assinado, porm nunca colocado em prtica de maneira satisfatria. A reduo de danos um exemplo de poltica pblica que deve ser mais investida como soluo para muitos problemas sociais, principalmente a questo das drogas.

Hoje o crack realmente um grave problema social principalmente para as camadas sociais mais baixas, na verdade a sade pblica ainda no sabe como lidar com essa droga que realmente devasta e muito prejudicial sade individual e coletiva da populao. A reduo de danos tem sido uma das alternativas, e a nica que tem tido resultados expressivos, ela consegue atingir um nmero muito maior de pessoas e penetrar em locais em que o estado possivelmente teria dificuldade de cobrir com suas instituies tradicionais de sade. Ela mais ampla porque tambm est presente nas ruas, ou melhor, nos locais onde existe consumo de drogas, essa poltica est bem prxima dos usurios permitindo tratar visando no apenas a abstinncia total e absoluta.Diferentemente de outros tipos de ao, a reduo de danos no tem como objetivo a abstinncia, algumas pessoas, por mais que sejam internadas e criminalizadas por todas as instituies possveis, no vo parar de usar psicoativos . Essa uma constatao dura, mas real, feita a partir da prtica e da realidade que vemos nos centros de sade que trabalham com lcool e outras drogas. Hoje a poltica pblica de sade mental, sustentada com pouqussimo investimento do Estado so os CAPS- AD (Centro de ateno psicossocial- lcool e drogas). Pelo momento crtico que vivemos, principalmente em relao ao crack, esse deveria ser o momento em que o estado mais deveria financiar os CAPS e o que vemos na realidade o sucateamento quase que total desses centros. Reduzir danos significa na prtica salvar vidas e deixar de lado preconceitos e paradigmas morais que no contribuem para uma sade publica e de qualidade. A maconha tem sido importante nessa direo, e est sendo usada para diminuir os efeitos do crack e com timos resultados. Se conseguimos evitar, ao mesclar a maconha no crack, um suicdio ou uma parada respiratria penso ser mais interessante para o usurio do que apenas deix-lo morrer sem nenhuma assistncia. Pena que nossa sociedade est enraizada em preconceitos e ainda no pensa dessa maneira. Se o THC fosse melhor aproveitado, poderia ser um princpio ativo revolucionrio para a medicina e para a sade em geral. Nos EUA vrios estados usam THC para tratamento mdico e inegvel que ele teraputico em vrios casos. A maconha que a populao brasileira fuma ou consome de diferentes formas de pssima qualidade e misturada a produtos qumicos que fazem muito mal sade dos usurios. Esse mais um motivo para que o estado legalize rapidamente a maconha, tirarando do mercado ilegal essa erva que est sendo vendida sem nenhum controle em todo o Brasil. muito mais interessante para o estado que ele saiba quem so os usurios e qual o tipo de substncia consumida pela populao, do que simplesmente mant-la na ilegalidade e sem nenhum critrio para avaliao, tanto de seus danos quanto de seus comprovados benefcios para a sade.Cultivo Caseiro (Grow Room)Devido a clandestinidade, o comrcio de maconha est cada vez mais violento e perigoso, o aumento da represso policial afasta cada vez mais usurios dos pontos de venda e a mdia estigmatiza o traficante de forma suficiente para que at mesmo usurios passem a temer o contato com o criminoso. Ainda, existe uma grande preocupao devido a inexistncia de um controle de qualidade, ou seja, no se sabe ao certo o que se est adquirindo em um mercado clandestino ou mesmo a pureza da mercadoria, ainda mais porque costume dos traficantes misturarem outras substncias s drogas vendidas no intuito de aumentarem seus lucros. Outros usurios entendem que o comrcio ilcito de maconha parte do financiamento de grupos de traficantes armados, o que fomentaria de forma indireta os constantes conflitos entre estes e as foras policiais repressoras que, no raramente, produzem baixas civis e estatsticas alarmantes.

Esses podem ser argumentos que expliquem o grande aumento de usurios que prefiram produzir (cultivar) sua prpria maconha. Embora ainda ilegal, esses usurios acabam encontrando um local mais escondido no terreno de casa ou mesmo um banheiro que no esteja sendo utilizado para cultivar ali mesmo seus prprios ps de cannabis. Sem envolvimento com o crime organizado ou traficantes internacionais, tudo parece mais fcil e simples. O fantasma da droga ilcita da lugar uma planta, que se vai cuidando dia a dia, como um animal de estimao ou um aqurio.Aliado a vontade de cultivar a prpria maconha, est a facilidade de faz-lo. No se precisa de muito, alguns vasos, um pouco de terra, lmpadas de sdio e vapor metlico (caso seja em ambiente interno) e alguns fertilizantes j do conta do recado, alm, claro, das sementes que podem ser retiradas da maconha que se compra no mercado clandestino ou encomendadas em bancos de semente internacionais, pela internet.Quanto aos conhecimentos necessrios para o plantio, o tempo e o mtodo de tentativa e erro so os melhores professores. Porm, podem ser encontrados na internet fruns que possibilitam a troca de informaes entre plantadores. O Growroom.net, maior frum deste tipo da Amrica Latina, est no ar desde 2001 e j conta com muitos usurios entre plantadores experientes e iniciantes, alm de curiosos. Existe ainda uma grande gama de doutrinadores do auto cultivo, sendo Jorge Cervantes o mais famoso deles por ter escrito, em 1983, seu primeiro livro sobre cultivo de cannabis: Indoor Growers Bible by Growers. Aps essa primeira verso da bblia de cannabis ter sucesso imediato em todo o mundo, Cervantes passou a escrever novas verses, mais completas e atualizadas, com imagens e tabelas informativas. Hoje, a Bblia considerada o manual mais completo sobre auto cultivo.Porm toda essa questo de auto cultivo, cultivo caseiro ou cultivo prprio de cannabis tem um vis contraditrio ao ser verificado conforme a lei 11.343/06, que em seu captulo dos crimes e das penas, artigo 28 normatiza as condutas do usurio (adquirir, guardar, tiver em depsito, transportar ou trouxer consigo) e define as respectivas penas (advertncia sobre os efeitos das drogas, prestao de servios comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo). Em seu 1, a mesma lei define que quem planta maconha para consumo prprio est sujeito as mesmas penas e no 2 define que o juiz atentar para a natureza e quantidade de droga apreendidas, bem como o local e as condies da ao, as circunstncias sociais e pessoais e ainda os antecedentes criminais do responsvel.Fica claro pelas penas estabelecidas que o usurio visto como ignorante, irresponsvel ou algum que no se enquadra na sociedade, necessitando de reinsero social. Alm disso, como penalizar condutas que no so consideradas crimes? Ao utilizar a nomenclatura pena, a lei tende a criminalizar os usurios, e mais ainda ao inserir tal matria na captulo referente aos crimes.Ao serem consideradas pelo juiz o local e as circunstncias sociais e pessoais para definir o consumo prprio ou no, a faceta seletiva dessa lei da as caras novamente. O que difere uma estufa de maconha em um apartamento na Barra da Tijuca e outra no Complexo do Alemo? Alguma delas tem possibilidade maior de no ser para consumo pessoal? E ainda, ao serem observados os antecedentes criminais a lei enfatiza seu carter criminalizador, onde aquele uma vez criminoso fica marcado para sempre com este stigma, mesmo depois de ter cumprido sua pena, dando tratamento diferente a usurios nunca presos e usurios ex-presidirios, por exemplo.

Tipologia das sementes

A maconha comercializada atualmente no Centro-Sul do Brasil, originada 85% no Paraguai, possui alguma concentrao de amnia. Alguns dizem ser um aditivo dos narcotraficantes, outros dizem ser proveniente da decomposio da erva prensada com a umidade, mas a verdade que ela disfara o cheiro caracterstico da erva e evita o apodrecimento antes que chegue s mos do consumidor ao mesmo tempo que degrada os psicoativos da planta. Essa substncia cria um problema de sade pblica, j que a amnia um agente carcinognico e sua inalao est relacionada a vrios problemas respiratrios a longo prazo, muito piores que os do cigarro de tabaco, expondo os aproximadamente 3 milhes de usurios brasileiros. No Norte e Nordeste, boa parte da maconha vem do cultivo nacional, do chamado Polgono da Maconha. Apesar da ilegalidade, o cultivo para consumo prprio de Cannabis uma alternativa conveniente para a maioria dos usurios, seja para evitar a violncia causada pelo narcotrfico, seja pela qualidade da erva.

Existem dois tipos de plantio de maconha, a interna, que se baseia em mtodos de estufa, em vasos ou hidroponia, oferecendo bastante segurana para o cultivador, porm uma forma ineficiente por causa do excessivo gasto de energia; e a externa, que o mtodo de cultivo no solo, que apesar de no oferecer tanta segurana, mais eficiente e pode oferecer plantas de mais de 4 metros. Alguns cultivadores externos praticam o que se chama de cultivo de guerrilha: espalham plantas em terrenos ou jardins isolados, longe de suas propriedades, a fim de obter mais segurana, mais espao ou apenas pelo ideal.

(Sativa | ndica | Ruderalis)

O gnero Cannabis possui trs espcies produtoras de canabinides: C. sativa, C.indica e C.ruderalis. A C. sativa, mais famosa, a mais alta, de folhas finas, de florescncia demorada e apresenta s maiores concentraes de canabinides, principalmente tetrahidrocanabinois (THC), podendo a chegar a 20% dessa substncia em suas inflorescncias. Geralmente apresenta um efeito mais alucinatrio e eufrico. utilizada h muito tempo pela humanidade por possuir a fibra mais resistente entre todas as plantas. A C. indica um pouco menor, de folhas largas, florescncia precoce e apresenta menos quantidade de THC, porm grandes quantidades de canabidiol (CBD), responsvel pelos efeitos de relaxamento, sonolncia e fome. A C. ruderalis rasteira e de auto-florescncia, uma planta de cultivo em climas extremos, apresenta poucos psicoativos e geralmente cruzada com as outras espcies pela sua capacidade de florao. As espcies geralmente so cruzadas para se obter uma planta do gosto do cultivador.

Atualmente pode-se comprar pela internet qualquer semente produzida e vendida em pases legalmente com todas as caractersticas que se busca para a planta: altura, tempo de cultivo e concentraes de canabinides. Algumas chegam a ser curiosas: so roxas, rosas ou azuis, apresentam cheiros caractersticos, como o de queijo, caramelo e chiclete. Para adquirir maiores informaes sobre cultivo, j existe a venda livros que tratam desde germinao e tratamento de doenas at a extrao e manufatura, alm de fruns com dirios que tratam de vrios tipos de cultivos.

Perspectiva e projeto de legalizao

Embora ainda seja tabu, tema evitado e rejeitado por muita gente o debate sobre drogas ganhou fora nesses ltimos anos. Crescimento das marchas da maconha, constante apario do tema nas mais variadas formas de mdia, manifestao desde celebridades da TV a notrios intelectuais sobre assunto, so alguns exemplos de como o debate est na boca do povo. Alm disso observamos nos ltimos anos avanos concretos na legislao sobre drogas em vrias regies do mundo e a cada dia parece ganhar mais fora a ideia de que a represso no o caminho para se lidar com as drogas. Por esses motivos essencial que reflitamos profundamente quais alteraes queremos na poltica do estado em relao a drogas. Afinal o argumento de que pior que t no fica extremamente vazio, ento como vamos lidar com esse problema no futuro? Promoveremos um debate profundo sobre as questes de segurana pblica, criminalizao da pobreza, estrutura social ou simplesmente vamos abrir um novo mercado para ser explorado pelas grandes indstrias?

Diferente do passado onde a revoluo parecia iminente hoje boa parte da antiga esquerda foi absorvida pelas maravilhas do capital. O que antes era bandeira de resistncia a estrutura da sociedade capitalista burguesa hoje passa a ser uma nova forma de mercado. A esquerda contempornea deixa de buscar promover uma revoluo e se liga muito mais a buscar pequenas reformas no sistema que contemplem melhor os interesses das massas. Hoje em dia direita e esquerda deixam de apresentar oposies to claras e muitas vezes se confundem. No raro ver ambientalista dirigindo grandes empresas que no apresentam reformas amplas nas formas de produo, mas que vendem mais produtos que a concorrente por plantar uma rvore a cada mil produtos comprados. O sistema absorve as bandeiras que tinham como objetivo lhe derrubar sem alterar profundamente suas estruturas mas conquistando um grupo de pessoas que antes eram suas opositoras. O que isso tudo tem a ver com debate da poltica de drogas?

Hoje em dia dentro do debate da reforma a poltica de drogas vigente observamos desde socilogos da esquerda at membros da direita neoliberal defendendo uma poltica diferente, menos repressora e mais branda. Embora aparentemente do mesmo lado nessa briga ser que o discurso, intenes e motivaes dos grupos que defendem a reforma so os mesmos? Embora tenha crescido o espao para debate na mdia a desinformao ainda reina quando se fala em alterar a politica de drogas, se fala em palavras como: legalizar, liberar, descriminalizar, despenalizar, regulamentar, como se fossem a mesma coisa. preciso entender a diferena entre elas e quais seriam as diferenas prticas entre descriminalizar a maconha e legalizar as drogas. As propostas de Fernando Henrique Cardoso e muitos outros representantes da direita liberal no consiste em fazer uma debate amplo da estrutura social e da problemtica das drogas e sim reduzir o debate descriminalizao do usurio de maconha inclusive propondo o aumento de pena do traficante. Por isso devemos ser muito crticos com qual tipo de alterao na poltica de drogas ns queremos. Queremos simplesmente importar o modelo holands de coffe shops para o Brasil? Onde se vende maconha por um preo extorsivo e portanto s atende a demanda das classes A e B. Ser que esse tipo de alterao vai resolver a problemtica das drogas no brasil?

Debater Drogas no pode ser simplesmente debater o direito de fumar maconha. E o debate de porque o trfico existe? Quem compe esse trfico de drogas? Por que as drogas foram proibidas? Por que hoje em dia existe boletim policial que identifica morador da zona sul portando dois quilos de cocana como usurio e morador de favela indiciado como traficante por portar cinco gramas de maconha? Queremos debater uma alterao na poltica de drogas que contemplem a massa ou somente as grandes empresas e as classes A e B?

No debate que j existe o auto cultivo se apresenta como opo muito interessante para a problemtica da maconha. Mtodo que j permitido em pases como argentina e passa a ser cada dia mais aceito pelos juzes brasileiros. Afinal o auto cultivo uma opo acessvel e quebra a cadeia entre produo, traficante e consumidor j que o prprio consumidor se torna tambm produtor. Outro mtodo interessante o das cooperativas de plantao de maconha que existem atualmente na Espanha. So medidas positivas a curto prazo mas o debate a longo prazo deve ser muito mais amplo. No basta somente regulamentar o consumo da cannabis mas sim de todas as substancias psicoativas entendidas hoje pelo governo como ilegais, analogamente a regulamentao deve vir um tratamento srio do ponto de vista mdico. No um tratamento que defina o usurio de drogacomo doente fora da normalidade e tente traze-lo de volta a essa suposta normalidade, mas sim um tratamento que permita que o usurio leve uma vida saudvel cuidando do seu corpo.

Resolver a problemtica das drogas consiste em promover alteraes profundas na estrutura da sociedade, do sistema de sade, do sistema penal e judicirio. No uma coisa simples, muito menos rpida. Entretanto no podemos utilizar esse argumento pra no promover alterao nenhuma na poltica de drogas. O Brasil um pas extremamente atrasado quanto a esse assunto, at em comparao com pases vizinhos e com realidades prximas como Argentina e Uruguai. Ento muito pode ser feito por aqui para avanarmos um pouco nessa questo: legalizar o auto-cultivo de cannabis, o uso da maconha medicinal, no somente descriminalizar o usurio de drogas mas pensar em uma poltica diferente para tratar o traficante ( uma poltica que consiga inserir criminoso na sociedade e no marginaliz-lo cada vez mais, uma poltica onde cor de pele e local de residencia no influencie na forma como o indivduo processado), descriminalizar a posse para consumo prprio de todas as drogas, entre muitas outras coisas. Contudo o mundo ainda tem muito que avanar quanto a poltica de drogas, a reforma tem que ser cada vez mais ampla porque at pases com as legislaes mais avanadas nesse sentido como Portugal e Espanha ainda tem muito o que fazer para de fato resolver a problemtica das drogas.

ANEXO:

Introduo Histrica das relaes humanas com as drogas:Maconha

A relao da cannabis com a humanidade intrnseca, ou seja, desde os primrdios elas coexistem, no podendo ser datado o primeiro contato. Acreditasse que a agricultura de cannabis date da mesma poca que a humanidade dominou essa tcnica, sendo a cannabis a primeira planta a ser cultivada sem que tivesse fim alimentcio. O primeiro papel feito pelos chineses era, provavelmente, de fibras de cnhamo. Esse povo utilizava a cannabis, principalmente, como fibra para papel e tecidos e, tambm, para fins medicinais. Os primeiros relatos do uso da cannabis para fins religiosos e espirituais so oriundos da ndia, onde era considerada uma planta entegena, ou seja, com a capacidade de despertar os deuses. Data de 1500a.C os escritos religiosos que consideram a cannabis como o alimento predileto do deus Shiva.

Assim, mesmo tendo como origem a sia Central e os frteis campos aos ps do Himalaia, a cannabis rapidamente se espalhou por todo o continente. No Oriente Mdio tambm se adaptou muito bem, tanto ao clima como s praticas sociais. Como a religio muulmana vetava o uso de lcool, a maconha passou a ser usada como alternativa para alcanar efeitos psicoativos. Com as invases rabes dos sculos IX a XII a cannabis alcanou o norte da frica, chegando ao Egito, Arglia e Marrocos. Mas foi somente durante as cruzadas que a cannabis chegou a Europa.

Na Europa, a cannabis passou a ter seu uso mais vasto at ento. Usava-se a cannabis para praticamente tudo e a vida europeia passou a estar ligada com essa planta de forma ainda no vista. O primeiro livro impresso na prensa de Gutemberg foi produzido com papel de cnhamo, assim como as cordas e velas das caravelas das Grandes Navegaes, tambm se utilizava o leo de cannabis como a segunda opo de combustvel para iluminao pblica (a primeira era leo de baleia) e para confeco das tintas utilizadas para pintas os quadros da renascena, cuja as telas tambm so feitas de fibras de cnhamo.

Em 1783, Portugal criou a Real Benfeitoria de Linho-Cnhamo, com ordens de plantar cnhamo nas novas terras da Colnia Brasil com objetivo de suprir a crescente demanda internacional pelos derivados dessa planta. A primeira fazenda foi instalada no sul da colnia, onde hoje o estado do Rio Grande do Sul, mas tambm financiou fazendas de cnhamo no Par, Amazonas, Maranho, Bahia e Rio de Janeiro, locais em que a planta se adaptou melhor. Mas a cannabis talvez seja a nica planta a ser introduzida no Brasil tanto pelos Portugueses colonizadores como pelos negros escravos vindos de angola, que traziam sementes escondidas nas vestes ou de outras formas, porm os negros costumavam fumar a cannabis, da o nome fumo de angola.

Existem, ainda, relatos de que os escravos plantavam cannabis escondida nos canaviais, ou durante o perodo da entressafra da cana. Devido ao seu vis socializador, pois costuma ser usada em grupo, alguns pesquisadores acreditam que seu uso pelos negros era uma forma de resistncia a desafricanizao, ou seja, uma forma de manterem parte de sua cultura e costumes nativos ainda vivos, mesmo convivendo com o fato da escravido. H relatos, inclusive, de seu uso nos rituais do candombl, o que demostra a cannabis como importante fator socio-cultural para a comunidade negra no Brasil colnia.

Em 1798, houve a primeira tentativa na histria de se proibir a cannabis. Foi na poca em que o Egito fora dominado pelos franceses, ento, por ordem do general Napoleo Bonaparte estavam proibidos o fumo e o licor feito dessa planta. Na poca, Napoleo alegou que os indivduos que faziam uso de cannabis ficavam violentos e fora de si, prontos para cometerem atrocidades. Mas na verdade, a inteno napolenica era boicotar a exportao de fibra de cnhamo para sua inimiga Inglaterra, gerando uma crise industrial pela falta de matria-prima. Como se pode notar, essa no foi somente a primeira tentativa de se proibir a planta, mas tambm a primeira tentativa de se mascarar os reais interesses por meio da criminalizao dos usurios.

No Brasil, data de 1929 a proibio do pito do pango. Porm, desde 1911, aps a Conferncia do pio, os usurios de cannabis j eram criminalizados e perseguidos, principalmente pelas ruas do Rio de Janeiro, pela mesma instituio responsvel por reprimir os vadios, as rodas de samba, de capoeira e de candombl. Durante a dcada de 1930, a represso passou a ficar mais acirrada, com incurses do exrcito pelo Nordeste para destruir plantaes de cannabis e com as prises dos primeiros traficantes de maconha do Brasil.

Cocana

O incio do uso de coca data de mais de 4500 anos atrs e se perde na mitologia dos ancestrais povos andinos. O nome coca tem origem na palavra aimar khoka, cujo o significado seria a rvore. Para os incas, a folha de coca era um presente do Deus Sol (Inti), relacionada a lenda de Manco Capac, o filho do sol, que desceu dos cus sobre as guas do lago Titicaca para ensinar aos homens as artes, a agricultura e para presentear-lhes com a coca. Essa lenda marca o incio da civilizao inca e o prprio surgimento da humanidade para o povo aimar.

A folha de coca era utilizada em rituais religiosos, estando profundamente atrelada com a cosmoviso desses povos. Com a chegada dos colonizadores espanhis grande parte da cultura nativa foi subvertida ou aniquilada. Genocdio, imposio da lngua europia, da religio e da escravido so apenas alguns exemplos das transformaes decorrentes da colonizao na Amrica. A folha de coca passou, ento, a ser entregue aos nativos como estmulo ao trabalho estafante nas minas de prata, ouro e estanho. Alguns historiadores relatam que, em muitos casos, a folha era entregue como uma espcie de salrio, pagamento em troca da mo de obra no sistema de mita.

Com a banalizao do uso da coca, muitas outras tribos incluram em seu rol cultural e cotidiano o hbito de mascar suas folhas. Atualmente, algumas tribos da Bacia Amaznica usam o ipadu, folhas torradas misturadas com elementos alcalinos e transformadas em p, posteriormente agrupadas em pequenas bolinhas. Esses nativos, principalmente os mais velhos, ingerem cotidianamente quantidades considerveis dessa substncia, devido ao seu valor nutritivo e espiritual, pois tambm usado em rituais ou para comunicao com suas entidades. Esse uso cultural se mostra evidente ao descobrirmos que a palavra que denomina coca, ahpi, tambm utilizada para leite materno, via lctea e at mesmo o nome da nao indgena aqui apresentada.

A folha de coca pode ser comprada legalmente em alguns pases da Amrica do Sul (Bolvia, Peru e Colmbia), mas acaba sendo comum em todos os pases prximos aos Andes, chegando tranquilamente ao norte da Argentina e Chile, e tambm na Venezuela atravs da Amaznia. comum, por exemplo, flagrar caminhoneiros (talvez pelo tipo de trabalho) com as bochechas cheias de folhas ou bolos de folhas mastigadas no cho de postos de gasolina. Na Bolvia, principalmente, a folha ainda largamente utilizada pelos mineiros, que como na poca da colonizao, continuam a passar horas corridas metidos em tneis nas profundezas das montanhas, em condies desumanas de trabalho.