Texto Sergi Arbusà
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Uma poética do ar
Na obra de Sergi Arbusà, é notória a preocupação com questões relativas ao espaço e à
escultura entendida em seu “campo ampliado”. Sua obra, que traz como título A
escultura do movimento do espaço, | o espaço da escultura do movimento, | o
movimento do espaço da escultura, | o espaço do movimento da escultura, | a escultura
do espaço do movimento, | o movimento da escultura do espaço, | e o outro, toca
especialmente neste eixo de suas investigações, que se desdobram a partir de cada uma
destas palavras-chave, além de trazer, como dispositivo, o ventilador, objeto
obsessivamente utilizado pelo artista em outros trabalhos.
O jogo semântico proposto pelo título, ao acolher todas as variações possíveis do
primeiro verso, solicita, em alguma medida, uma ideia de movimento circular que opera
como as hélices do ventilador que desloca o ar, elemento que aqui é reivindicado
enquanto materialidade de uma escultura erigida como uma “coluna infinita” –
referência inevitável a Brancusi – que se ergue e logo se rarefaz e que, portanto, pode
ser percebida e sentida se o espectador – “o outro” – se oferecer a um embate “corpo a
corpo” com a obra, como diria Lygia Clark. O espectador torna-se, deste modo, um
elemento crucial da “escultura”, não apenas porque é dele que o artista e a obra
dependem para que a conta do “coeficiente artístico”, de que fala Duchamp, seja
fechada; mas também porque o seu corpo é ali acolhido como uma peça complementar
que a ativa ao mesmo tempo em que é ativado por ela.
Como resultado de outros projetos investigativos em torno da escultura e da arquitetura
realizados juntamente com PolCrusella, com quem compõe o duo responsável por
PeniqueProductions, Sergi Arbusà apresenta também o grande inflável que ocupa o
pátio central da Escola de Artes Visuais do Parque Lage.
Feita de polietileno monocromático e fita adesiva, a escultura ganha tônus graças a
outros dois ventiladores que nunca cessam de soprar, fazendo com que ela esbarre, o
tempo todo, na estrutura arquitetônica que, se por um lado lhe impõe limites, por outro é
condição sine qua non de sua existência.
O espaço, outrora “vazio”, torna-se pleno. O palácio, de tons de cinza e ocre, é banhado
pela luz do plástico alaranjado que o redimensiona e intervém na paisagem. O ar se
dispersa aos poucos, pressionado contra o plástico que o envolve e se avoluma entre os
vãos.
Cada abrir e fechar das portas que dão acesso ao inflável (ou ao palácio?) gera uma
oscilação que desencadeia nele um movimento superficial tão sutil quanto o de um
corpo que, de longe, não parece vivo; mas que, olhado de perto, mostra que está na
verdade profundamente adormecido, pois respira. Assim, resguardado em meio às
colunas que circundam a piscina, o inflável torna-se uma espécie de pulmão
complacente que garante ao corpo do “imóvel” uma porção de vida.