TORRES, Walter Lima. Entre a técnica e a arte

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    Entre tcnica e arte:introduo prtica teatral do ensaiador 1890-1954 fIalter LimaTorres r

    ostuma-seafirmar que o perfil do moder- Nos limitando ao mbito da prtica tea-no diretor teatral, como ns o concebemos tral brasileira,mas sem perder de vista os acon-no teatro ocidental hoje, caracterizado or tecimentos oriundos do exterior, verificamosum projeto cultural de cunho esttico,po- entretanto que esta moderna viso da direoltico, social ou mesmo miditico, a servi- teatral, instaurou-seum pouco mais tarde, poro do texto teatral ou no, teve como precurso- aqui, em relaosexperincias ue surgiam naras na virada do sculo XIX-XX as idias e as Europa, em especialaps a I Guerra. O deno-experinciasde George Duque de Saxe-Mei- minado processo e modernizaoda cena ea-ningen, Andr Antoine e Constantin Stanis- tral implicava no aparecimentode novas ormaslavski. E na esteira do trabalho destes nsignes atribudas ao espetculo, novas alternativasdiretores outros homens de teatro - Meyer- quantoao seuprocesso e montagem , sobre-hold, Copeau,Brecht para citar somentealguns tudo, novasorientaesquanto a sua produo

    - deram prosseguimentoa estavia que acabou e difuso. No Brasil, vale destacar, ue estamo-por forjar a tradicionalorientao sttica n- dernizao urgiu, aps entativasesparsas, jtorno das noes de moderna encenaoe de partir do trabalho do diretor polons,Z. Ziem-teatro de arte. No nosso escopo aqui tecer binski, em contato com o grupo Os Comedian-uma genealogia dos precursoresdo moderno tesno Rio de Janeiro, com a montagem do tex-diretor teatral no Ocidente, visto que estudio- to de Nelson Rodrigues, Vestido e Noiva emsos mais abalizados se debruaram sobre o 1943. E essamodernizaoconsolidou-se,umassunto!. pouco mais tarde, atravsdo trabalho sistem-

    WalterLima Torres professor o Departamento e Artesda UFPR.1 Consulte-se este espeito, obreaspectos istricose estticoselativos gnese o diretor teatral,acomplexa abrangentebradeVEINSTEIN, Andr. a miJe mscenehatrale tsacondition sthtique.Paris: Flammarion, 1955. Em portugush um texto bastantesignificativo sobre o assuntodeROSENFELD,Anatol. "O que miJe nscene".n Prismas o 1eatro. oPaulo:Perspectiva,993,pp.75-106. Ou ainda,no tocantea casos specficose diretores companhias, s volumesda srieLesVaies e a crationhtrale. aris:CNRS, vriosvolumes.

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    Entre tcnica e arte: ntloduo j}l\t \~\~~~~ ~~"b\~~~ ~a.~\~

    tico dos diretores italianos contratados por fundido s novas geraes, traa um histricoFranco Zampari para as montagens do TBC em extremamente cuidadoso e detalhista sobre osSo Paul02. diversos integrantes da prtica teatral, das suasFazendo uma rpida retrospectiva, d~ origens poca do autor. O relato de Victorinodcada de 1940 at nossos dias, no temos d- colabora diretamente com a anlise que preten-vidas acerca do gradativo processo de emanci- demos desenvolver e neste sentido dois aspec-pao da cena teatral brasileira em relao li- tos devem ser ressaltados.teratura dramtica. A este fato, soma-se a con- Em primeiro lugar, para um estudo sobresolidao de linguagens cnicas especficas o trabalho do diretor teatral no Brasil antes daelaboradas por grupos e companhias nos prin- dcada de 1940, portanto sobre o ensaiado , jul-cipais centros urbanos do pas com o objetivo gamos necessrio considerar no mnimo trsde particularizarada montagem.Consideran- fontesprimrias: 1) os manuaisde ensaiado-do este movimento de grupos e companhias, res, editados tanto no Brasil quanto em Portu-poderamos afirmar que foi aberto um espao gal; (2) o discurso produzido pela crtica e pelapara uma afirmao da identidade brasileira no crnica teatral nos principais peridicos de Somais nos termos de uma literatura dramtica, Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Salvador emas de uma escrita cnica. A pesquisa desta es- Recife, cidades que recebiam com regularidadettica brasileira permanece at nossos dias, des- a visita de companhias dramticas brasileiras etacando-se procedimentos de produo, criao estrangeiras; (3) os livros de memrias e aindae montagem teatral, comprometidos em refle- artigos circunstanciais publicados na imprensa,tir as condies econmicas, sociais, polticas e a exemplo do que faz Victorino em seu textoestticas, consolidando, agora, uma cultura tea- encomendado pelo governo federal para as co-traI especificamente brasileira, valorizando a di- memoraes relativas ao Centenrio da Inde-versidade regional, diferente do panorama dos pendncia do Brasil em 1922.anos 40, e neutralizando quase por completo a Em segundo lugar, deve-se ressaltar, quedefasagem entre o que se produzia aqui e no o estudo sobre esta formao ou este ofcio foiexterior3. prejudicado pela inexistncia de documentosInteressa-nos, dar alguns passos atrs na que descrevessemessaatividade, principalmen-tentativa de conhecermos o trabalho do precur- te no Brasil. Se o teatro, durante certo tempo,sor do moderno diretor teatral, - o ensaiado - foi entendido pela histria como uma categoriafigura responsvel pela montagem de uma pea da literatura, unicamente como o gnero dra-teatral antes do advento da moderna encenao. mtico, sabe-se que a prtica teatral est almEm termos histricos, o artigo de Eduardo Vic- da condio literria que possa repousar sobre otorino, que em boa hora aqui resgatado e di- texto teatral. E hoje entende-se que teatro no

    2 Cf. o exaustivo e minucioso trabalho de RABETI, Maria de Lourdes (Beti Rabetti): Contribuioparao estudodo moderno eatro brasileiro:a presenataliana (Doutorado em Cincias Humanas) pelo Dept.de Histria da FFLCH, USP, 1988.3 No tocante ao teatro realizado nos anos 60 e 70 h de se consultar as anlises de refernciasde:MOSTAO, Edlcio. Teatroe pol/tica: Arena, Oficina e Opinio. SP: Proposta Editorial, 1982., e deGARCIA, Silvana. Teatroda militncia. SP: Perspectiva,1990. E sobre os grupos dos anos 70-80 con-frontar o abrangente rabalho de FERNARDES, Slvia. Grupos eatrais:anos70. Campinas: Unicamp,

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    literatura, efetivamente eatro, e como tal se pea inha a sua realizaomaterial confiada aodefine por meio de uma prtica especfica. sujeito que acumulavaas unesde maquinis-Prtica que se verifica complexa, visto que a ta e cenotcnicoe que mais tarde seriadesigna-direo teatral faz constantemente apelo aos do como rgisseur. o menos plausvelseria amais variados segmentosdas cinciashumanas evoluoda funo de ensaiado da de mestre ee dasartes. ballo, como sugereAugusto de Mello em seuSoma-se estesdois pontos o fato de que manual (1890). No sem fundamento, poisao longo do tempo, o trabalho do diretor tea- adviria da mesmo este rigor permanente, umatral - ou do seu precursor,o ensaiado - tenha recorrnciaverificvel em todos os manuais, i-sido, ofuscado,quando no completamenteen- vros, opsculose congneres o ensaiador, omcoberto, pela primazia da produo dramatr- . a questo da distribuio espacialdos atores egica do autor teatral ou pela atuaodo grande seusdeslocamentos obrea cenasemo compro-ator ou atriz. O fato da figura do autor ter se metimento da visibilidade do espetculo.Massobreposto do ensaiado justifica-se em parte no precipitemos concluses.por uma contingncia do perodo (anterior a Para introduzir uma discusso sobre a1940), onde certos autores eram tambm os condio do ensaiadorna prtica teatral brasi-ensaiadoresde suas peas, responsveis anto leira, ao menos por quasesessenta nos, comopela ransposioem cenade suasobrasquanto aqui seprope, consideroduasdatas: 1890, anopelasuapossvel dio.No casodo grandeator da edio do Manual do Ensaiadorde Augustoou atriz, tendo sua atuao registrada na cr- de Mello e 1954, ano da ediodo livro de Ot-nica e crtica teatral, mantendo-seviva atravs vio Rangel,EscolaTeatralde Ensaiadores. araada transmissooral de geraesem geraes, compreenso e pouco mais de meio sculo decolaboraria para reforar a imagem do ensaia- tcnica teatral, fundamental considerarque ador numa posio de escanteio, margem do atividade teatral e mais especificamenteo seureconhecimentopblico. Este anonimato pode processo e produo estsob a gidede inten-ser verificado ainda no anncio da programa- sa comercializao, enquadrando-se no queo ou no escassomaterial publicitrio de que Walter Benjamin denominou "a era da repro-se em acesso. dutibilidade tcnica". sto , o processode pro-Na tentativa de localizar historicamente duo do espetculo eatral deve ser capaz dea matriz funcional do comportamento artstico fabricar uma mercadoriaque oferecidaao p-do ensaiador,dentro do espetculo eatral antes blico, atravs das inmeras sesses emanais,de 1940, elaboramosa hiptesede que sua ati- vido de cultura e entretenimento. Segundoosvidade tenha evoludo do trabalho que estava literatos da segundametade do sc. XIX e osreservadoaos cengrafose cenotcnicos elati- intelectuais da primeira metade do sc.XX, ovos aos aspectos isuais da cena;efeitos cnicos pblico estariamais afeito ao riso fcil e gar-agora possveis,e cada vez mais sofisticados, galhadacoletiva em detrimento do dito teatrocom o surgimento da eletricidade e sua aplica- de arte, que possuindoqualidade iterria supe-o nos espetculosao final do sc. XIX. Em rior, elevariao esprito e formaria o cartermo-parte, sto seexplicariapor conta do prprio ter- ral do cidado dentro de propsitos educativosmo ensaiador ue nos chega,seguramente, ia mais civilizatrios.Portugal. O seusignificado associado tradio Ao longo destes essenta nos,o procedi-francesa, ue antesmesmode nfluenciar o Bra- mento para uma montagem teatral, encenaosil j faziaescolaem Portugal, nos permitiria as- de uma peaou, como prefereVictorino, a "me-soci-Ioao rgisseur o teatro francs. sto por- Cnica eatral", vive um certo processode afir-que na Frana, necessrio ue se ressalte,ao mao e consolidaopara atingir uma exaus-longo do sc. XVIII, a apresentaode uma to e desgaste ue abrir caminho para sua de-

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    Entre cnicae arte: introduo prtica eatral do ensaiado 1890-1954

    cadncia a consecutivamarginalizao assuas do conjunto de funes cnicas,artsticase ad-tcnicaspor parte daqueles rticos da cenaque ministrativas no interior da empresa eatral.estavamempenhadosna modernizaodo es- O significado geral da funo de ensaia-petculo.Em linhas gerais,o trabalho do ensai- dor, oferecido por SousaBastos,est presenteador circunscreveu-se entro desteprocessode tanto no texto de Augusto Mello, quanto noascenso glria, como demonstra o texto de artigo de Eduardo Victorino. Mello e Victori-Victorino, e crisee decadncia,omo afirma a no, cada um suamaneira, onciliamumavi-moderna crtica que surge nos anos40. so histrica da prtica teatral (tcnica de cenaVamos proceder em ordem cronolgica. e literatura dramtica), com a exignciade co-Partindo das idias que norteiam o ma- nhecimentos especficossobre os mecanismosnual de 1890, que uma publicao de carter do palco, aliado a um esprito enciclopdiconoinstrutivo e informativo, no tocante ao ofcio domnio das artes e das cincias humanas. Edo ensaiador, amosconvergir na direode um curiosamente,o plano da obra de Augusto dedocumento oficial que atesta uridicamente a Mello no muito diferente do pensamentoexistnciadesta uno artstica, desempenhada sobre tcnica teatral que sobrevivia ainda nopor obscura igura. Brasil na dcadade 1950, em meio s entativasAugusto de Mello, portugus,ator, ensai- de renovaodo teatro nacional. iador e, segundo SousaBastos,professorda Es- Em 1954, Otvio Rangel, uncionrio docola Dramtica do Conservatrio, organizou SNT (ServioNacional do Teatro) e ensaiador,seu manual dividindo-o em quatro captulos publicava seu segundo ivro dedicado ao traba-que abordam: (1) a atividade do ensaiadore a lho do ensaiador:EscolaTeatralde Ensaiadores.miJeen scene;2) o teatro antigo e a miJeen sce- Esta publicao fazia parte de um ambiciosone; (3) o teatro moderno e a miJeen scene (4) projeto, iniciado em 1949, com suaoutra obra,asetapasque constituam o trabalho do ensaia- Tcnica Teatral. Tratava-se de obras comple-dor: a distribuio dos papis;a prova da pea; mentares,estaem forma de verbetes, ornecen-o ensaiode marcao;o apuro da pea;ensaios do significado de expresses sentido de voc-de figurao: coros, comparsas; nsaiogeral; os bulos que faziam parte do jargo da prtica tea-intervalos. Em 1908, SousaBastosdefinia, em tral; aquelademonstrandoa exatamarcao ueseudicionrio referenteao teatro portugus, as- condicionava cada gnero teatral e que o en-sim a funo do ensaiado: "Tem a seu cargo saiadordeveriaobedecer.Obras de vulgarizaoaspeasdesdea prova at o ensaiogeral. do ofcio de ensaiadorque afirmavam, portan-Faz abelasde servio e de multas, dirige os es- to, a necessidade e rigor tcnico para o bompetculos, manda comear os atos, mantm a desempenhoneste mtier. Se estasduas obrasordem no palco, tira os roteiros de cenrio, de Rangelprocuram uma sistematizao o of-guarda-roupa e adereos, entregando-os em cio na tentativa de legitimar uma profisso, otempo competente aos diversos empregadose opsculo de Paulo de Magalhes:Como seen-fornecedores,guarda os manuscritos do reper- saia umapea:aula de tcnica eatral, de 1958,trio sobre sua responsabilidade,etc. Alm de retomavade forma idntica as mesmasnoes,muita aptido para ensaiar,precisaser rabalha- o mesmovocabulrio, diferindo unicamentenodor e manter-se na sua importante posio de tom de informalidade com o qual este autor-chefe de servio de tudo que se faz no palco." ensaiado se dirigia ao leitor para "passara sua(SousaBastos, 1994: 56). Esta genricadefini- experinci'.o era a noo que, acrescidade uma ou outra No de menor importncia, notar quevariante, valia naquelemomento para definir as em 1937, quando da implantao do SNT, du-atribuies do ensaiador. sto severifica devido rante o Estado Novo, foi criada a companhiascircunstanciaiscombinaespossveis entro denominada Comdia Brasileira.Tendo sido a

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    cop--s al pr eta

    primeira tentativa de estabelecimentode uma ecoam em 1941. Como se no bastasse obracompanhia dramtica nacional ligada esfera de Rangel,que consolidaestepensamento rag- Io poder pblico federal, no seu estatuto de mtico que move o ensaiador!Marcar e ensaiar1941, dentro do regimento interno fixado pela a pea com a colaboraodo ponto e do con-comissoadministrativa, eram enumeradosos tra-regra. No se trata de conceber uma ence-deveres elativosaoscargosda nova companhia. nao, mas sim de ajust-Ia ao seu elenco. O JDentro deste egimento destacam-se ove fun- verbo criar estranhoa estevocabulrio, ou no ties elacionadasa seguinte rdem:superin- mnimo circunscritosexignciasormaisque ~tendente; diretor de cena; ensaiado; artistas; limitavam o trabalho maginativo do ensaiador.ponto; arquivista; contra-regra; maquinista e Exige-sesobre o palco uma coernciapr-esta-guarda-roupa (roupeiro). Portanto, com uma belecida entre gnero dramtico e forma cni-certa hierarquia, estes argossoapresentados ca. A eficcia em relao recepodo espet-junto aos deveresdo ensaiador,as competnci- culo se d atravsde uma convenoobjetivaasque he conferem xistncia egitimama sua queassegurapermanncia esta ormacnica "autoridade rtstica: na ransposioo manuscrito opalcoe amais ~a suadiversidade e sentido.A subjetividade ~" 1- Marcare ensaiar speas ueparaesse banida em nome de uma objetividade quaseci- ~fim lhe forem apresentadasela Comisso entfica. Ou, como avaliavaVictorino: "A cena tAdministrativa, omunicando o Diretor de devedar a impressoexatado ambiente em que ~Cenaashorasde ensaio araserexarado m se desenrolaa ao, determinando os hbitos ~,

    tabela; dos personagens ela sua posio no decorrer2- Comear ensaioum quarto de hora dos atos.Esta a impressoe expresso bjetivaap6sa marcada a tabela,comunicando s que deveproduzir, to realistaquanto possvel."faltas ao Diretor de Cena para efeito de (1922)penalidade; Em linhas gerais, emosnestas bras,com3-Entregarogoque stiver arcadapea diminutas ariantes cerca aspeas ueas lus- Ios diversos oteiros das diversas ees o tram e dos casosque exemplificam, noes,ex-Diretor de Cena; presses procedimentos,a reproduode uma40- No marcaro ensaio em er plenoco- tcnica que seusautoresdominam na prtica enhecimento ue odosos rabalhos eacham almejamsistematizar ara difundi-Ia. Nestesen-concludos; tido, vale ressaltaro papel de popularizaodo ,~5- Exigir a presenao Contra-Regraem- conhecimentoatravsda ediode manuaisso-pre que ulgar necessria; bre os mais diversos setoresdas atividades na60- Exigir que o Pontosecoloqueno local sociedade,abarcando as ocupaescriadas se-pr6prio desde ue principiem os ensaios e gundo uma moderna diviso do trabalho na so-apuro; ciedade ivil. Os manuaisocuparam um impor- ,7- Para o exerccio de suas funes, en- tante lugar na instruo das massas na socieda-tender-se-, nicamente,com a Comisso de capitalistado sc.XIX e ainda nasprimeirasAdministrativa" Michalski & Trotta, 1992: dcadasdo sc. xx. Advindo dos verbetesda23-4). Encyclopedieo sc.XVIII, os manuaisapresen- .tavam-secomo portadores de informaes so- .As competnciasatribudas ao ensaiador, bre um fazer cnico especfico.Difundiam umnos termos deste regimento, reafirmam em savoir aire mais aplicativo e normativo do que1941, o carter diligente e executivo que per- reflexivo, propondo uma interveno de car- .meia seu rabalho. As funesprevistaspor Me- ter tecnicista. No casoda atividade teatral, em

    110 a autoridade to caraa SousaBastosainda sua abordagemsomam-se onhecimentosacer-

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    sala preta -i;I

    principal, Furtado Coelho, o mesmo celebrado soubesse rientar sua encomenda.Existia umapor Eduardo Victorino em 1922 como um en- tipologia;~edefinida de vistas bjetivando o seusaiador nteligente e preocupadocom a moder- emprego na representao e cada peadepen-nizaoda cenae com o empregode elementos dendo dasnecessidadese caracterizao o 10-acessrio.Diz-nos Machado: "O Sr. Furtado re- cal da ao (interior ou exterior) ou ainda, ga-velou-nos uma nova direo de suas endnci- binete de trabalho ou biblioteca, escritrio (lu- )as. Depois de percorrer uma parte da escalaar- gar do masculino) ou a indefectvelsalade visita !tstica, na interpretaode diversose encontra- (lugar do feminino). Todos espaosde convi- idos sentimentos dramticos, inclinou-se vncia que possibilitassem desfilede uma ga- jnteontempara a comdiae entrou no salo leria de personagens-tipose ambosos sexos :.com o riso e a chufa nos lbios. (ASSIS: 1961, dentro das regrasdo decoro. Quanto aos gne-59-60). Furtado Coelho, alm de interpretar ros musicais mgicas, peretas, evistasde ano ;um papel, como se deduz, tendendo ao cmi- - o telo pintado era o grande recurso, repre- ~Jco, era encarregadoda execuodo texto, e a sentandobosques, lorestas,montanhas,palci- Jesse espeito opina Machado: "O Sr. Furtado, os, espaos nricos e fantsticos.Obra de pin- \como ensaiado, merece ainda os aplausosdo tores especializados, telo era pintado parafolhetim. Revela-se nteso cavalheirodo salo, determinado espetculo,quando no era apro-que o ator do tablado" (Assis, 1961: 60). Ele- veitado. J os adereose figurinos, diante dagncia, bom gosto e corteo. Sem exageros correria de estrias um teatro por sesses,ica-com moderao deve se desenvolvera marca- vam a cargo dos prprios atores. Cada artistao que consolida o "por em cen' de uma pea deveria constituir o seu guarda roupa pessoaldramtica ou cmica. Passando uma observa- baseadona gama de personagens-tipos m queo pouco habitual pocasobreos objetos que atuavadentro do repertrio que historicamenteso percebidosno palco, o crtico adverte: "J poderia r das ragdiasneoclssicas os dramasest um pouco velho aquele retrato da sala de de casaca a atualidade.Da Guilhermina no 20 ato; e o mesmo aconte- Na dcadade 1940, em pleno momentoce com aquelacadeirade braosda mesmasala. de reformulao da cena teatral, a funo de- }Aconselhamos ma reforma sobreestesdois sempenhadaeloensaiador consideradaltra- ~acessrios. o duas coisasque no estona al- passada or haver uma defasagem ntre os res- ftura da importncia do Ginsio, como pessoal, qucios do velho teatro que se fazia por aqui, ~como repertrio e como pblico" (Assis,1961: ainda balizado por princpios lusitanos.A nova ,60). Est em jogo o compromisso que se esta- gerao e batia por um teatro de arte e menos ;beleceentre palco e platia, tanto no tocante s comercial, uma prosdia autenticamentebrasi-convenes nicasquanto qualidade e o va- leira sobreos palcos,uma dramaturgiaque trou-lor simblico do que dado ver ao espectador. xesse cenao homem brasileiro e com esteob- j

    A observao e Machado de Assissobre jetivo rechaavaudo que pudesse emetera ve- festesacessrios os faz pensar que no haveria lha prtica. O ensaiadore ponto personificamainda, por mais que Eduardo Victorino tenha estavelha prtica luso-brasileira.O novo olhartrabalhado no intuito de uma reforma, um sen- para cena difundido agorapelas dias de umtido global de unidade alm daqueleque ofere- diretor teatral como, por exemplo,JacquesCo-cesseo palco como suporte, necessariamente peau, que se apresentamno Brasil em turnspreciso e exato, quanto narrativa anunciada como a de Louis Jouvet (1941-42), e todas as "na pea. que seseguem o ongo dos anos 1950-60:Jean- "No que diz respeito ao cenrio, e neste Louis Barrault, TNP (Thetre National Popu- jponto Victorino reafirma a especialidade de laire) dirigido por JeanVilar, Piccolo Teatro de icada pintor, era fundamental que o ensaiador Milo, dirigido por Giorgio Strehler. jj, j

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    principal, Furtado Coelho, o mesmo celebrado soubesse rientar sua encomenda.Existia umapor Eduardo Victorino em 1922 como um en- tipologia;p1;edefinidae vistas bjetivando o seusaiador nteligente e preocupadocom a moder- emprego~a representao e cada peadepen-nizaoda cenae com o empregode elementos dendo dasnecessidadese caracterizao o 10-acessrio.Diz-nos Machado: "O Sr. Furtado re- cal da ao (interior ou exterior) ou ainda, ga- )velou-nos ma novadireode suas endnci- binetede trabalhoou biblioteca,escritrio lu- .as. Depois de percorrer uma parte da escalaar- gar do masculino)ou a indefectvelsalade visitatstica, na interpretaode diversose encontra- (lugar do feminino). Todos espaosde convi-dos sentimentos dramticos, inclinou-se vncia que possibilitassem desfile.deuma ga-anteontem para a comdia e entrou no salo leria de personagens-tiposde ambos os sexoscom o riso e a chufa nos lbios. (ASSIS: 1961, dentro das regrasdo decoro. Quanto aosgne-59-60). Furtado Coelho, alm de interpretar ros musicais mgicas, peretas, evistasde anoum papel, como se deduz, tendendo ao cmi- - o telo pintado era o grande recurso, repre-co, era encarregadoda execuodo texto, e a sentandobosques, lorestas,montanhas,palci-esse espeito opina Machado: "O Sr. Furtado, os, espaos nricos e fantsticos.Obra de pin-como ensaiado, merece ainda os aplausosdo tores especializados, telo era pintado parafolhetim. Revela-se nteso cavalheirodo salo, determinado espetculo,quando no era apro-que o ator do tablado" (Assis, 1961: 60). Ele- veitado. J os adereose figurinos, diante dagncia, bom gosto e correo.Sem exageros correria de estrias um teatro por sesses,ica-com moderaodeve se desenvolvera marca- vam a cargo dos prprios atores. Cada artistao que consolidao "por em cen' de uma pea deveria constituir o seu guarda roupa pessoaldramtica ou cmica. Passando uma observa- baseado a gama de personagens-tipos m queo pouco habitual pocasobreos objetos que atuavadentro do repertrio que historicamenteso percebidosno palco, o crtico adverte: "J poderia r das ragdiasneoclssicas osdramasest um pouco velho aquele retrato da sala de de casaca a atualidade.Da Guilhermina no 2 ato; e o mesmo aconte- Na dcadade 1940, em pleno momentoce com aquelacadeirade braosda mesmasala. de reformulao da cena teatral, a funo de-Aconselhamos uma reforma sobre estes dois sempenhada elo ensaiador considerada ltra-acessrios. o duas coisasque no estona al- passada or haver uma defasagem ntre os res-tura da importncia do Ginsio, como pessoal, qucios do velho teatro que se fazia por aqui,como repertrio e como pblico" (Assis,1961: ainda balizado por princpios lusitanos.A nova60). Est em jogo o compromisso que se esta- gerao e batia por um teatro de arte e menosbeleceentre palco e platia, tanto no tocante s comercial, uma prosdia autenticamentebrasi-convenes nicasquanto qualidade e o va- leira sobreos palcos,uma dramaturgiaque rou-lor simblico do que dado ver ao espectador. xesse cenao homem brasileiro e com esteob-

    A observao e Machado de Assissobre jetivo rechaavaudo que pudesse emetera ve-estesacessrios os faz pensar que no haveria lha prtica. O ensaiado e ponto personificamainda, por mais que Eduardo Victorino tenha estavelha prtica luso-brasileira.O novo olhartrabalhadono intuito de uma reforma, um sen- para cena difundido agorapelas dias de um ;tido global de unidade alm daqueleque ofere- diretor teatral como, por exemplo,JacquesCo- !cesseo palco como suporte, necessariamente peau, que se apresentamno Brasil em turns ~preciso e exato, quanto narrativa anunciada como a de Louis Jouvet (1941-42), e todas asna pea. que seseguem o ongo dos anos 1950-60:Jean-No que diz respeito ao cenrio, e neste Louis Barrault, TNP (Thetre National Popu-ponto Victorino reafirma a especialidade de laire) dirigido por JeanVilar, Piccolo Teatro decada pintor, era fundamental que o ensaiador Milo, dirigido por Giorgio Strehler.

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    Ao comentar a prtica teatral que antece- O problema com o qual o ensaiadorsede a estecomplexo movimento de renovao a confrontava o mesmo com o qual, ainda hojecenabrasileira,GustavoDria lembra que "a se debatemos modernosdiretores eatrais:ofe~turado espetculo icava a carg~ de um en- problema d: forma. Sobre ela nos afir~a PetersaIador ue,de um modo geral,cuIdava penas Brookque: QuandocomeamosensaIar mada marcao a pea.E quandoconstado pro- pea, inevitvelque de incio ela no tenhagramaa ndicao e um responsvelelamise- forma; soapenasdiasou palavras o papel.en-scene,al fato no significava absolutamente O espetculo consiste em dar forma a umaa presenade um metteur-en-sceneo sentido forma. O que chamamosde 'trabalho' a buscaexato da palavra. Era apenasa indicao de al- da forma adequad' (Brook, 2000: 43). O pro-gum que se responsabilizava elo arranjo de cessode trabalho do ensaiador,no entanto, es-cena, da disposiodos mveis, quadros e flo- tava condicionado por uma delimitao deres, etc., uma espciede contra-regra de luxo". fronteiras entre o cumprimento sexigncias e(Dria, 1975: 6-7). Certamente, o trabalho de uma potica normativa, que definia os parme-diretores como Ziembinski, Adolfo Celli, tros da escritadramtica, e a coernciaartsticaRuggeroJacobbi, Gianni Ratto, Luciano Salce, da sua transposioatravsde uma mecnicaoutorgou cenabrasileirauma emancipao o teatral que no a descaracterizasse.sta formavelho teatro portugus que se mantinha inte- de concebere apresentaro espetculo,eviden-grado diversoe ao lazer cultural. temente, era cultural, e estavacondicionada sNeste mesmo sentido, o celebradocrti- trocas simblicas presentesna sociedadebur-co e historiador Dcio de Almeida Prado perce- guesa,marcadapela ntensificaoda circulaobia os imites da atuaodo ensaiado lembran- do capital.do que "a orientao geral do espetculocabia A tcnica teatral normalmente associadaao ensaiado, figura quase nvisvel para o p- figura do ensaiador,conforme se verifica, erablico e para a crtica, mas que exercia unes de fato singular e fazia dele uma autoridade naimportantes dentro da economia interna da coordenao do espetculo. Entretanto, estacompanhia. Competia-lhe, em particular, tra- mes.macnicase imitava exclusivamente cenaar a mecnica cnica, dispondo os mveis e frontal, dita italiana. O trabalho do ensaiadoracessrios aoe fazendoos atorescircularem no Brasil, tal como se observahistoricamente,por entre eles de modo a extrair de tal movi- est diretamente associado proliferao damentao o mximo rendimento cmico ou cena rontal nos principais teatrosde Portugaledramtico" (Prado, 1988: 16). daqui. Manaus, Belm, Fortaleza,Recife, Sal-Seo legado do teatro portugus, e sobre- vador, Rio de Janeiro, So Paulo, Rio Grandetudo o da prtica do ensaiador minimizado, do Sul e outras capitais que conceberamedif-tido por vezes omo atrasadoou descontextua- cios teatrais igadosao poder local ou federal,elizado no que concerne a uma nova dramatur- que so verdadeirosmonumentos, reforam agia, esquece-se e observarem relaoaos ago- condio de frontalidade e de hierarquia dora responsveis ela encenaodo espetculo olhar, valorescom os quais rabalhavao ensaia-moderno, que estes rouxeram na bagagem ma dor. O universo cultural e artstico do ensaia-formao humanstica, um novo olhar sobre o dor pareceno conceberoutro espaoque nofenmeno teatral, mas sobretudo uma tcnica aqueleque promovesse m facea faceentre pal-apuradssima e palco assimilada. sto , pro- co e platia. Configuraesespaciais ambian-cedimentos de trabalho que o ensaiado luso- tes e outras relaesentre palco e platia, tobrasileirodominava.Estahiptese, anariauma caras modernidadeno so consideradas.outra discussoque neste momento foge ao Sobreo espao rontal significativo re-foco de nossoartigo. lacionar que a diviso do palco em partescomo

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    Direita, Centro, Esquerda;Direita Alta, Direita c'. (1922). Advm destaoperaoo rigor exa- /iMeio e Direita Baixa e assimpor diante se ori- cerbado com a chamadamarcaode cena e aginou de uma frmula que fosse capaz de ser suasistematizao, omo lembramosacima, nas !eficiente o bastantena transposio,em grande divisesdo palco segundoo olhar do ensaiador. tescala, e um desenhoque fora concebidonuma Assim sendo, pode-seconsiderarque a ativida-folha de papel. Explico-me: considerandoo pal- de do ensaiado tanto devedoraao mestre eco frontal como espao eatral exclusivamente bailo quanto ao cengrafo-cenotcnico.vlido aodramtica de uma pea,o ensaia- O conhecimento do ensaiador sobre a ,dor toma de emprstimo os recursos da ce- caixa cnica, sobre as funes de cada um dos tnografia, compreendidaa como a arte de colo- componentesda companhia dramtica, o tor- jcar os objetos em perspectiva,que permitem ao navam um profissional cuja experinciaera ru-pintor ampliar seuesboonuma tela de maiores to do exerccioconciliador entre tcnica e arte.propores.Ora, por analogia,a tela do ensaia- Esteartista era muito disputado pelos empres-dor o palco frontal delimitado pela sua mol- rios teatrais,apesarde seuanonimato. Seuesp-dura de cena e pela rampa ou ribalta. O palco rito pragmtico e o imediatismo de suasence-concebido como um grande quadro, - que pode naes, devido presso de uma realidade eco- ser esquadrinhado dotado de movimento har- nmica que trabalhava com espetculospormonioso e graa,por meio dos mecanismos ue sesses, aracterizaramo ensaiado como umas a caixacnicadispe, deveno pensarde Vic- personalidade lustrada, que detinha um con-torino, "harmonizar-se com o pensamento do junto de conhecimentos, - a mecnica teatral eautor, criando ~m meio e.no ~eve.nunca,p~r a art~ da ~ncenao como nos lem~:a ~duar- 1excessos e realIsmo, atraIr e dIstraIr a atenao do VIctonno, resultadode uma expenenCIa ue .Ido espectador, orque tudo quanto for preocu- poderamosdefinir em termos gerais,agora i- rpao e produzirefeito,embora eal,prejudi- vre de preconceitos,omo cnica eatral.

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