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    Revista de Administrao Contemporneaverso impressaISSN 1415-6555verso On-lineISSN 1982-7849

    Rev. adm. contemp. vol.20 no.3 Curitiba mai./jun. 2016

    http://dx.doi.org/10.1590/1982-7849rac2016140059

    ARTIGOS

    Trajetrias de Consumo: O Sujeito-Consumidorde Servios Bancrios na Terceira Idade

    Consumption Trajectories: Elderly Consumers of BankServices

    Marlon Dalmoro1 , Kasiana Vittorazzi1

    1Centro Universitrio Univates

    RESUMO

    O crescimento da populao com mais de 60 anos e o aumento da expectativade vida tm ampliado a participao de idosos no mercado consumidor. Estefenmeno tem sido ainda mais evidente no mercado de servios bancrios, uma vez que o recebimento daaposentadoria obriga os consumidores da terceira idade a possurem uma conta bancria. No entanto, a forma comoestes consumidores exercem agncia nas suas prticas de consumo de servios financeiros varivel, envolvendo,alm de uma posio como consumidor, sua construo como sujeitos. Assim, o artigo tem como objetivo analisar aconstruo do sujeito-consumidor de servios bancrios na terceira idade. Um estudo emprico foi conduzido atravsde entrevistas com dez consumidores do municpio de Progresso - RS - Brasil. Os resultados demonstram que apercepo de capacidade de agncia no consumo de servios bancrios na terceira idade um fenmenoinfluenciado pela trajetria de vida dos indivduos e sua capacidade de lidar com o processo de subjetivao. Anecessidade de lidar com o outro (pessoas e tecnologias) emerge como limitadora do desejo de se construir comosujeito-consumidor de servios bancrios. Por fim, teoriza-se que a agncia do consumidor construda emconsonncia com as trajetrias de vida dos indivduos enquanto consumidores e sujeitos sociais.

    Palavras-Chave: sujeito; consumidor; terceira idade; instituies bancrias

    ABSTRACT

    The growth of the population over 60 years old and increasing life expectancy have increased elderly individualsparticipation in the consumer market. This phenomenon has been especially evident in the Brazilian bank servicesmarket, since retirees need to have a bank account in order to receive their retirement income. However, how these

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    consumers exercise agency in their bank services consumption practices varies, involving both a position asconsumer and a construction as elderly subjects. This research aims to analyze the construction of the subject-consumer of banking services by the elderly. An empirical study was conducted through interviews with tenconsumers in Progresso - RS - Brazil. Results show that perception of agency power in banking services consumptionby the elderly is a phenomenon influenced by individual life trajectory and the ability to deal with the subjectivationprocess. Consumers' need to deal with others (both people and technology) emerges as an inhibitor to the desire toself-construct as a subject-consumer of banking services. Finally, we theorize that consumer agency perception isbuilt in accordance with individual life trajectories as consumers and social subjects.

    Key words: subject; consumer; elderly; bank

    Contextualizao

    O aumento da expectativa de vida transformou a velhice numa etapa relativamente longa da vida e mais distanteda representao de um perodo de privaes e decadncia (Goldenberg, 2013; Guillemard, 1986). Essa reorganizaosocial, proporcionada principalmente pelos avanos da medicina, tem resultado em processos que buscam inseriro idoso no convvio social (Barnhart & Pealoza, 2013). Para isso, novas representaes, como os termos terceira idadeou melhor idade, tm se popularizado como uma forma de definir o grupo de pessoas idosas, no a partir de umaidade cronolgica precisa, mas a partir de um processo crescente de socializao da velhice (Debert, 1999;Goldenberg, 2011).

    No Brasil, a populao de idosos pessoas com 60 anos ou mais, aposentadas, com ou sem vida profissionalativa estimada em cerca de 14,5 milhes, ou seja, 8,6% da populao total do Brasil (Instituto Brasileiro deGeografia e Estatstica [IBGE], n.d.). Ainda segundo o IBGE, a expectativa de que, em 2020, este nmero devachegar a 30,9 milhes de pessoas, representando 13% do total da populao. Diante do crescimento deste gruposocial, os pesquisadores de marketing tm reconhecido no idoso um amplo potencial de consumo, resultado dareduo das limitaes fsicas e mentais, disponibilidade de renda e tempo livre (Schau, Gilly, & Wolfinbarger, 2009;Solomon, 2011).

    Um ponto de anlise relevante para a preservao do idoso no mercado consumidor a universalizao do direito aposentadoria, que garantiu que a ltima etapa da vida correspondesse inatividade remunerada (Debert, 1999;Lemos & Zagaglia, 2004). Este fato garante condies financeiras para lidar com as limitaes da velhice, mas,principalmente, obriga os idosos a continuarem (ou se tornarem) consumidores de servios bancrios parareceber a aposentadoria, uma vez que a previdncia social brasileira repassa o benefcio aos aposentados atravsdo sistema bancrio.

    Motivado por esta particularidade, o consumo de servios bancrios emerge como um contexto relevante para aanlise sociocultural das prticas de consumo de servios na terceira idade (Askegaard & Linnet, 2011). O marketingde servios - incluindo os servios bancrios - tem se concentrado na compreenso do objeto por meio de umaperspectiva gerencial, como a satisfao e a lealdade que os consumidores expressam em relao aos bancos(Ensslin, Ensslin, & Pinto, 2013). Contudo, pouca ateno tem sido dada para o sujeito que se engaja neste tipo deconsumo. Para superar essa limitao, o presente estudo dialoga com o campo do marketing de serviosbancrios a partir de um olhar alternativo, reconhecendo que o consumo de servios bancrios est inseridonuma envolvente sociocultural, na qual indivduos negociam e transformam ativamente significados mediadospelo mercado (Arnould & Thompson, 2005).

    Em adio, perspectivas gerenciais tm destacado caractersticas peculiares do servio, como aquelas querequerem a atuao dos consumidores como coprodutores (Cheung & To, 2011; Lovelock, Wirtz, & Hemzo, 2011; Zeithaml,

    Bittner, & Gremler, 2011). No mbito dos servios bancrios no Brasil, o investimento que o setor fez nos ltimos 30anos na adoo de sistemas de autoatendimento tem repassado aos consumidores tarefas importantes para aefetivao do servio (Pitteri, Nachbar, & Arruda, 2010). Entretanto, para isso essencial compreender o processo desubjetivao e a percepo de agncia que os consumidores necessitam para atuar como coprodutores,demonstrando autonomia em suas prticas.

    Agncia tratada aqui como o reconhecimento da capacidade de exerccio de poder ou de produzir efeitoresultante de uma ao (Giddens, 2003). Mesmo reconhecendo que o exerccio de agncia no uma expressoirrestrita de liberdade da lgica de mercado, o incremento da participao do consumidor exige uma capacidadede agncia para lidar com estranhamentos e incmodos recorrentes do consumo de servios bancrios (Arnould &Thompson, 2005; Hodgson, 2002). A perspectiva do consumidor como sujeito auxilia na compreenso deste fato, umavez que, conforme Deleuze (2001), o sujeito no est dado, mas se constitui na experincia, no contato com os

    acontecimentos. Chave para isso considerar a subjetivao como um elemento central na anlise da autonomiahumana no mercado, pois a produo do sujeito ocorre nas variaes produzidas pelos encontros intensivos como outro (Deleuze, 2001) ou com um objeto (Hegel, 1988).

    Assim, a formao do consumidor envolve um processo de subjetivao nas prticas de consumo, e paraentender o consumidor preciso reconhecer a formao do sujeito que o precede (Karababa & Ger, 2011; Kjeldgaard &

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    Askegaard, 2006). O termo sujeito-consumidor proposto para definir o consumidor de forma mais ampla, nosomente enquanto usurio, mas como indivduo que nas suas prticas de consumo se constri como sujeito eexerce agncia a partir da interao com o outro (ou objeto).

    Diante dessa contextualizao, o estudo tem como objetivo principal analisar a construo do sujeito-consumidorde servios bancrios na terceira idade. Para dar conta deste objetivo, busca-se, especificamente: (a)compreender a percepo de agncia no consumo de servios bancrios por parte dos consumidores da terceiraidade e (b) analisar o processo de subjetivao dos idosos no consumo de servios bancrios.

    Observa-se que a construo dos sujeitos-consumidores da terceira idade e a percepo de agncia frente ao

    mercado refletem suas trajetrias de vida e percepes construdas ao longo do ciclo de vida. As trajetrias deconsumo so usadas como balizas para orientar a posio que os consumidores desejam assumir dentro domercado. Explorando relatos de prticas de consumo (Moisander & Valtonen, 2006), identifica-se que as experinciaspessoais imprimem diferentes percepes no processo de subjetivao. O resultado uma variao na percepode poder individual de agncia, que amplia ou reduz o desejo de assumir a posio de sujeito-consumidor naterceira idade.

    Esta parte introdutria seguida de mais quatro sees. Primeiramente, apresentado o referencial terico,buscando aproximar as discusses acerca do consumidor da terceira idade e a subjetivao decorrente das suasprticas. Aps, descreve-se o plano metodolgico, seguido da apresentao dos resultados, por meio de trscategorias principais. Por fim, o artigo apresenta as consideraes finais, limitaes e sugestes para estudosfuturos.

    Referencial Terico

    As perspectivas tericas acerca da terceira idade assumem duas posies principais, porm distintas: (a) uma,envolvendo estudos geritricos ligados a uma compreenso fsica e psicolgica da terceira idade como limitadorfsico; (b) outra - centrada num olhar cultural - compreende a terceira idade como uma construo socialrepresentada, que busca desconstruir a ideia de fim da vida. Neste estudo, entende-se que a segundaperspectiva tem um papel fundamental para compreender a formao do sujeito-consumidor da terceira idade,sendo, desta forma, enfatizada.

    Na perspectiva geritrica, o passar do tempo na vida de uma pessoa provocaria mudanas biofsicas -relacionadas reduo de habilidades, e psicossociais - que envolvem mudanas emocionais provocadas pelasensao de vulnerabilidade fsica, cognitiva, motivacional e social (Zimerman, 2007). A perspectiva adotada nesteestudo, ao mesmo tempo em que reconhece as mudanas biofsicas consequentes da velhice, refora a

    importncia dos aspectos culturais na construo da terceira idade (Silva, 2008). Regulao social, convenes erotinas socialmente impostas aos idosos restringem a percepo de autonomia na construo identitria destesindivduos (Barnhart & Pealoza, 2013). De acordo com Bauman (1988), insegurana e ansiedade representam o ladooposto da liberdade de agncia. Para o autor, a instituio do papel ativo do consumidor no mercado garante areduo da ansiedade e uma percepo de liberdade de escolha, que auxiliam na construo de identidades.

    A superao destes desafios da terceira idade seria buscada no curso da vida moderna com alterao na maneiracomo ela periodizada, abandonando comportamentos tidos como adequados s diferentes etapas da vida(Debert, 1999). Essa descronologizao da vida, conforme descrito por Held (1986), reflete uma tendncia moderna deeliminao dos gapsentre as geraes, em sintonia com a participao ativa dos sujeitos contemporneos narecriao de valores e estilos de vida (Giddens, 1991). A marca caracterstica da perspectiva de idoso como umaconstruo social a possibilidade de escapar dos determinismos, esteretipos, normas e padres decomportamento com base na idade, encorajando novas experincias e uma negao da idade cronolgica (Debert,

    1996). Permitem-se, assim, adaptaes no curso da vida do idoso, marcado por uma trajetria no linear, einfluenciado por experincias de vida, eventos, capacidade de agncia e o contexto sociocultural (Moschis, 2012).

    Assim, ao invs de a terceira idade representar uma existncia sem significado, a concepo autopreservacionistae avanos na qualidade de vida encorajam os indivduos a combaterem a decadncia associada idade(Featherstone, 2010), permitindo a formao de novas identidades e papis sociais (Barnhart & Pealoza, 2013; Schau et al.,2009). Com isso, reforma-se o discurso geritrico, ressaltando formas de envelhecimento que preservem o desejode manuteno dos estilos de vida e de permanncia (ou incluso) no mercado de consumo.

    Ao considerar a terceira idade uma construo social, alm de uma condio biolgica, projeta-se nesta etapa davida um sujeito-consumidor reconhecido e dotado de capacidades para exercer agncia no mercado ( Thompson,2005). A sociedade reconhece a habilidade dos sujeitos da terceira idade de agir, imbudos de uma capacidade deracionalizao e socializao, a qual consiste no local em que a agncia toma forma (Borgerson, 2005). J aracionalizao a capacidade de ler as informaes diante da complexidade das relaes sociais (Thompson, 2005).No caso dos idosos, o anseio de perder algo diante do reconhecimento de reduo da capacidade deracionalizao inibiria seu desejo de assumir uma posio de agente (Barnhart & Pealoza, 2013).

    Para isso, a construo do idoso como um agente ativo no mercado requer deste uma conscincia reflexiva em

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    relao ao consumo, ou seja, a percepo do sujeito frente ao mundo que ele habita enquanto consumidor(Thompson, 2005). Essa viso est associada a um movimento conceitual que rompe com a ideia de sujeitoautnomo e unificado para uma compreenso de um sujeito localizado e fragmentado pelas prticas cotidianas(Firat & Venkatesh, 1995). Estas prticas ocorrem em diferentes contextos, inclusive no mercado, auxiliando naformao do sujeito e fornecendo subsdios para a definio de quem e que consumidor esse sujeito deve ser(Geisler & Veresiu, 2014). A construo social do sujeito da terceira idade influencia e influenciada por prticas deconsumo, uma vez que estas prticas possuem um papel central na criao e manuteno do mundo social.Assim, a compreenso do consumidor da terceira idade requer tambm entender a subjetivao destes indivduosperante o mercado.

    De sujeito a consumidor de servios bancrios na terceira idade

    Tratado como um mercado promissor pela literatura de marketing (Solomon, 2011), o grupo consumidor da terceiraidade consiste, de fato, num grupo heterogneo, com diferentes padres socioeconmicos e referncias culturais,unificados apenas pela caracterstica etria (Kohijoki, 2011; Meneely, Strugnell, & Burns, 2009). Essa caraterstica coloca osconsumidores idosos em uma estrutura particular, resultante das condies histricas e sociais que os posicionamcomo sujeitos idosos (Barnhart & Pealoza, 2013). O posicionamento social refere-se ao reconhecimento individual daclasse de pertencimento, resultado da produo e imposio de categorias que dizem respeito s capacidades ecaractersticas dos indivduos (Hall, 1997). As pessoas da terceira idade, por exemplo, so categorizadas a partir decritrios de idade cronolgica e aspectos fsicos, como cabelo branco. Mesmo que o consumidor no desejeassumir estas categorias na construo de identidade, sua posio como sujeito estar atrelada a estascategorias identitrias (Deleuze, 2001).

    Por sua vez, para Holt e Thompson (2004), a identidade uma articulao discursiva que os sujeitos empregam nahora de determinar suas escolhas de consumo. Os autores compreendem que os sujeitos utilizam o consumocomo uma forma de construir identidade em consonncia ou no com as categorias que aquela identidadereproduz ou rejeita. Assim, os sujeitos poderiam assumir ou renegar sua posio social por meio do consumo,incorporando prticas de consumo que reforam ou rejeitam as categorias identitrias. Entretanto, Barnhart ePealoza (2013) identificam que, no caso dos idosos, a produo criativa de identidade pelo consumo no representaque os idosos sejam autnomos na sua participao no mercado, uma vez que no so capazes de romper comas razes e padres que construram a posio de sujeito na terceira idade. Como estas autoras descrevem, apermanncia do sujeito no mercado consumidor pode ser resultado do elderly consumption ensemble(ECE), umprocesso no qual uma ou mais pessoas agem conjuntamente com os idosos nas prticas de consumo. Estaconstatao demonstra que, mesmo desempenhando prticas de consumo, o idoso no necessariamente possuiagncia para determinar suas escolhas, condicionadas pela sua posio social como idoso e influenciadas poroutros.

    Esta reflexo est alinhada com o entendimento de que a legitimidade das prticas de consumo est atrelada percepo dos consumidores, imprimindo uma conscincia frente aos fatos (Humphreys, 2010). A naturalizao dopapel de consumidor, refletida por meio da conscincia, pode ser moldada por construes sociais que orientam apercepo do consumidor nos seus processos de subjetivao (Geisler & Veresiu, 2014; Humphreys, 2010).Especificamente no caso dos consumidores idosos, o declnio da capacidade cognitiva refora o impacto dainfluncia social na capacidade de percepo (Barnhart & Pealoza, 2013). Isto se reflete em comportamentos como aperda da sensibilidade ao preo, maior influncia dos vendedores e altos nveis de lealdade (Meneely et al., 2009).

    Ademais, a forma como os consumidores lidam com a influncia social est atrelada capacidade reflexivanecessria nas prticas de consumo, aumentando ou diminuindo percepes como risco, confiana e segurana(Thompson, 2005). importante ressaltar que estas circunstncias no esto atreladas somente ao momento emque a interao de consumo ocorre, mas sim a uma reflexo sistmica. Por exemplo, a percepo ou no de riscoem uma compra no precisa estar centrada na situao real de compra, mas em estimativas socialmenteconstrudas de que h riscos. Essa leitura encontra suporte na definio de percepo que reconhece quememrias, eventos e circunstncias consistem em fragmentos que influenciam a percepo (Richins & Chaplin, 2015).

    No mbito do marketing de servios, essa reflexo terica permite compreender a perspectiva do sujeito nainterao de servio, em contraponto ao objeto. Na literatura, tanto a corrente europeia - a partir do estudo deGrnroos (1982), quanto a corrente americana, popularizada por Parasuraman, Zeithaml e Berry (1988), tm adotado umaviso centrada no objeto (servio ou produto), por meio da mensurao da percepo individual e temporalizadados consumidores em relao ao objeto. A inverso do plano ontolgico do objeto para o sujeito na anlise doconsumidor de servios permite compreender a subjetivao derivada das prticas de consumo. Isso fornece umacompreenso sistmica, a partir do sujeito, acerca das percepes dos consumidores. Como Zeithaml, Bitner eGremler (2011)reconhecem, apesar da incorporao de elementos como o papel dos funcionrios no encontro deservio, outros parmetros que afetam a percepo dos consumidores precisam ser avaliados.

    No caso especfico do marketing bancrio, confiana e segurana so elementos basilares na formao dapercepo. Como Jrvinen (2014) aponta, instituies bancrias - com destaque para aquelas que atuam no varejo -esto entre as organizaes menos confiveis na percepo dos consumidores. Estudos realizados no contexto

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    brasileiro apontam que estes julgamentos so realizados geralmente com base na leitura do consumidor sobre oobjeto, por meio da avaliao do servio prestado e da percepo de qualidade (Ribeiro, Machado, & Tinoco, 2010;Zacharias, Figueiredo, & Almeida, 2008). No entanto, ao adotar um olhar sobre o sujeito, possvel ampliar acompreenso da forma como estas percepes so construdas, no pela racionalizao do objeto peloconsumidor, mas pela forma como ele percebe a subjetivao e exerccio de agncia. Afinal, a construo dapercepo do consumidor no se limita racionalizao do indivduo perante o objeto, mas uma construo socialresultante da interao entre objeto e sujeito, em processos de subjetivao que formam o consumidor (Karababa &Ger, 2011; Kjeldgaard & Askegaard, 2006; Thompson, 2005).

    Assim, em dilogo com perspectivas clssicas do marketing de servios e bancrio, refora-se que a percepodo consumidor tambm resultado de um processo de construo social (Geisler & Veresiu, 2014). A capacidade deagncia seria uma varivel resultante da autonomia do agente, em termos de poder decisrio sobre as aes deconsumo (Giddens, 1991). Contudo, no caso dos idosos, construes sociais ao longo da trajetria de vida auxiliamna percepo de poder de agncia, influenciando positivamente ou negativamente nas aes de consumo. Dessaforma, o processo de subjetivao do consumidor na terceira idade nem sempre resultado da capacidade ou dainteno do exerccio pleno de agncia (Barnhart & Pealoza, 2013). Interessante aqui reconhecer a forma comoaspectos caractersticos dos servios bancrios tornam ainda mais complexo o processo de formao dessesujeito-consumidor e o desejo de assumir posies ativas no mercado. Com o suporte desta exposio terica, aseguir sero detalhados os procedimentos metodolgicos adotados para a operacionalizao emprica do estudo.

    PROCEDIMENTOS METODOLGICOS

    Tratar empiricamente a temtica da terceira idade no Brasil consiste numa tarefa complexa. A heterogeneidadedos aspectos simblicos atrelados aos idosos dificulta a compreenso das suas prticas de consumo (Debert, 1996;Meneely et al., 2009). Assim, neste estudo, adota-se uma abordagem qualitativa de carter interpretativo, visandocapturar as nuances simblicas que envolvem o grupo social estudado dentro de suas prprias bases culturais.

    Para a coleta de dados, buscou-se o estabelecimento de um contexto comum, obtendo um recorte microssocialna definio da unidade de anlise. Esse procedimento tem sido recomendado em estudos que visam analisar aterceira idade (Moschis, 2012) e a subjetividade do consumidor (Karababa & Ger, 2011; Kjeldgaard & Askegaard, 2006), vistoque contextos sociais especficos permitem compreender o consumo no somente como um processo individual,mas inserido numa envolvente sociocultural distinta (Askegaard & Linnet, 2011; Cova, Kozinets, & Shankar, 2007). Nademarcao do contexto, primeiramente, definiu-se como idoso ou grupo da terceira idade, pessoas com 60 anos

    ou mais, aposentadas, com ou sem vida profissional ativa (IBGE, n.d.). Posteriormente, definiu-se o consumo deservios bancrios como um objeto de consumo transversal a todos os consumidores da terceira idade, pois,como descrito anteriormente, todos os brasileiros idosos tm acesso aposentadoria e necessitam consumirservios bancrios para receber o benefcio.

    Um terceiro elemento foi o local de realizao do estudo, conduzido junto a habitantes do municpio deProgresso/RS. A escolha por este municpio foi orientada por sua peculiaridade contextual, pois se trata de ummunicpio pequeno (cerca de 6.300 habitantes), com alta concentrao demogrfica de pessoas na terceira idade.O municpio tem 954 habitantes com idades entre 60 e 94 anos, representando 15% da populao. A mdiabrasileira de 10% (IBGE, n.d.).

    A coleta de dados foi realizada atravs de entrevistas conduzidas nos domiclios dos entrevistados. Para isso, foiutilizado um roteiro com 29 questes abertas, que visavam estimular o respondente a falar sobre tpicos queenvolvessem prticas de consumo de servios bancrios, percepes acerca das formas de consumo, e

    experincias vividas com suas agncias bancrias. No incio das entrevistas, seguiu-se a orientao de McCracken(1988), que sugere iniciar a entrevista com questes mais gerais, passando para tpicos mais especficos. Asentrevistas foram gravadas e transcritas na ntegra para a anlise dos dados.

    A seleo dos entrevistados ocorreu por meio da tcnica bola-de-neve, na qual cada entrevistado indicava doispossveis entrevistados, ou seja, um processo que envolve ondas sucessivas de seleo de entrevistados a partirdos prprios entrevistados (Malhotra, 2011). A coleta dos dados foi encerrada a partir da observao da saturaodos dados (Glaser & Strauss, 1967), quando se suspendeu a incluso de novos participantes na pesquisa, em virtudeda redundncia e repetio nos dados obtidos. No total, foram conduzidas 10 entrevistas. Dos entrevistados, trsso homens e sete so mulheres. Todos os participantes viveram a maior parte de sua vida em Progresso. Soaposentados, predominantemente pertencentes classe mdia e moram com filhos, com cnjuges ou sozinhos. ATabela 1descreve cada um deles com sua respectiva idade e profisso que exerciam antes da aposentadoria.Ressalta-se que, para garantir a confidencialidade, os nomes dos entrevistados foram alterados.

    Tabela 1 Descrio dos Entrevistados

    Nome Idade Profisso

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    Nome Idade ProfissoAlusio 77 anos Comerciante

    Ivete 75 anos Professora

    Ivonete 76 anos Comerciante

    Isabela 78 anos Dona de Casa

    Juremir 77 anos Escrivo

    Ledir 69 anos Dona de Casa

    Lediana 65 anos Dona de Casa

    Leila 65 anos Enfermeira

    Manuel 85 anos Agricultor

    Neide 65 anos Dona de Casa

    Nota. Fonte: elaborado pelos autores.

    Para a anlise e interpretao dos dados, utilizou-se a tcnica de anlise de contedo e a de identificao decategorias-chaves (Bardin, 1977; Lofland & Lofland, 1995). O uso destas tcnicas visou interpretar os dados de modo aacessar aspectos e fenmenos da vida social dos entrevistados por meio da reduo dos dados, obtendo-se umasntese da comunicao. As respostas foram agrupadas conforme as categorias tericas definidas previamente(construo do sujeito e do consumidor) em consonncia com questes-chaves que emergiram durante otrabalho de campo (os outros - entes e objetos - na formao do sujeito-consumidor). Ressalta-se que asanlises utilizam relatos e percepes do consumo, no utilizando metodologias que tratam de histria de vida erelatos verbais (Meihy, 1996). Histrias no foram adotadas como procedimento metodolgico, mas como uma

    processualidade, visto que a subjetivao resultado de experincias e foras que afetam o indivduo.

    APRESENTAO E DISCUSSO DOS RESULTADOS

    Reconhecendo que a formao do sujeito-consumidor ocorre nas interaes de consumo, observa-se que a formacomo estas interaes acontecem nos servios bancrios passou por profundas transformaes nos ltimos 30anos. Avanos tecnolgicos, ao mesmo tempo em que afastaram os clientes das agncias bancrias, reforam asinteraes mediadas por tecnologia. Estas alteraes ficam mais salientes na percepo dos idosos, visto queeste grupo social acompanhou essas mudanas ao longo de suas trajetrias de vida (Pitteri et al., 2010). No caso dosconsumidores idosos entrevistados, os diferentes nveis de interao com os bancos reforam o impacto destastransformaes nas suas vidas. Para compreender estas nuances, a primeira categoria analisada diz respeito

    formao do consumidor de servios bancrios.

    O 'se fazer consumidor'

    Os entrevistados so clientes de trs diferentes bancos: Banco do Brasil, Sicredi e Banrisul. O Banco do Brasil foio primeiro banco a se instalar na cidade. Assim, por no ter opes de escolha, aqueles consumidores quepossuem conta h mais tempo tiveram suas primeiras experincias como consumidores nesta instituio.Contudo, num exerccio de agncia, durante o perodo de vida profissional, estes consumidores atuaram na buscade opes alternativas ao Banco do Brasil, inclusive, como o caso do entrevistado Manuel, assumindo um papelativo na instalao de outro banco na cidade:

    "Abri conta no Banco do Brasil porque foi a primeira agncia que abriram aqui na cidade, e do Sicredieu me considero um fundador. Eu e o Z Dartora lutamos muito pra conseguir trazer o Sicredi para

    Progresso. Deu bastante trabalho porque a gente teve que mandar construir uma sala para instalar obanco" (Manuel).

    A busca por outras opes foi justificada pelos entrevistados em funo da insatisfao com o atendimento noBranco do Brasil, avaliado por estes como frio em relao aos demais bancos. Assim, foi somente com a aberturade novas agncias bancrias que os consumidores comearam a ter opes de escolha, demonstrando quemesmo diante da racionalizao da insatisfao, somente com a abertura de um novo banco os consumidorespassaram a ter a possibilidade de expressar agncia nas suas escolhas. Este fato refora a importncia doambiente de mercado na construo das prticas de consumo (Humphreys, 2010; Karababa & Ger, 2011). Atualmente, adiversidade de ofertas resulta num perfil variado na utilizao dos servios bancrios. A Tabela 2descreve atrajetria de consumo de cada um dos entrevistados e os servios que mais utilizam.

    Tabela 2 Bancos e Servios Consumidos pelos Entrevistados

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    Nota. Fonte: elaborado pelos autores

    Em virtude da aposentadoria, todos os entrevistados possuem conta bancria. Contudo, interessante observara existncia de dois grupos distintos: (a) aqueles que eram consumidores de servios bancrios antes daaposentadoria e expressam uma percepo de maior capacidade de agncia por experincias passadas; e (b)aqueles que passaram a ser consumidores em virtude da necessidade de receber os proventos da aposentadoria.Essa distino fica clara na fala da entrevistada Lediana, que pertence ao segundo grupo: "senti a necessidade deabrir uma conta para receber a minha aposentadoria e a penso do meu esposo...; precisava tambm de umaconta para guardar o dinheiro que sobrava" (Lediana). Em contraponto, o entrevistado Manuel, pertencente aoprimeiro grupo, possui conta bancria h 40 anos: "a primeira conta que abri foi porque precisava de umfinanciamento. Como eu tinha bastantes terras, precisava comprar mquinas e comprar gado, pois tambmcriava gado pra vender" (Manuel).

    Em termos da utilizao dos servios bancrios, os entrevistados que possuam conta antes da aposentadoriarelatam que reduziram a quantidade de servios utilizados em virtude do encerramento das atividadesprofissionais: "com o passar dos anos, diminuiu a utilizao dos servios bancrios, pois quando a gente era mais

    jovem tinha mais negcios, emprstimos, pagamentos e girava mais dinheiro ...; agora ficou restrito aorecebimento da aposentadoria" (Juremir).

    Outra razo para a reduo do consumo que, com a chegada terceira idade, os entrevistados admitem umaperda do controle sobre as operaes bancrias, como descreve a entrevistada Leila:

    "O servio que eu mais utilizo no banco o saque da aposentadoria. Tenho uma conta corrente parareceber o benefcio. Antigamente eu trabalhava com talo de cheque, mas acabei me enrolando e

    quando me dei por conta estava devendo um monte para o banco. Nunca mais quis saber do cheque,apesar de ser muito bom, preciso controlar demais, e eu no consigo fazer isso" (Leila).

    Por outro lado, interessante observar que aqueles respondentes que passaram a utilizar o banco depois deaposentados afirmam que hoje vo mais ao banco que antigamente, como explicitado na fala da entrevistadaIvonete: "agora eu utilizo mais do que antigamente, pois recebo minha aposentadoria". A razo para isso estprincipalmente no fato de este grupo ser formado basicamente por mulheres, as quais explicam que antigamenteseus esposos faziam o pagamento de contas e servios bancrios. Entretanto, quando ficaram vivas, precisaramaprender a utilizar os servios, j que no havia algum que o fizesse por elas, como a fala da entrevistadaLediana descreve:

    "Abri uma conta para receber a minha aposentadoria e a penso do meu esposo. A minha utilizaodos bancos aumentou muito, pois eu sempre deixei para meu esposo fazer tudo o que precisava.Agora, depois de viva, que comecei a receber a minha penso, precisei aprender a utilizar sozinha"

    (Lediana).

    No entanto, apesar de uma condio social que coloca as entrevistadas na posio de consumidoras (Debert, 1999),elas admitem que mesmo passando a utilizar mais os bancos, no desejariam ter que assumir essa posio,demonstrando uma percepo de vulnerabilidade em acessar os servios bancrios:

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    "Vou ao banco apenas uma vez por ms, recebo minha aposentadoria e j aproveito pra pagar ascontas na mesma viagem. Se no for isso, peo para algum fazer as coisas do banco pra mim. Nogosto de entrar no banco, eu me sinto incomodada, ainda no sei se medo, insegurana ou pressamesmo" (Ledir).

    Quando se questionou sobre a inteno de utilizar servios futuros, somente a contratao de emprstimo foimencionada. Os entrevistados alegam falta de conhecimento dos produtos e medo de serem passados para trs.Essa percepo fica ainda mais latente quando envolve a interao com outras pessoas, como expressa aentrevistada Neide: "nunca pensei em adquirir nada diferente no banco, o problema que a gente j sabe pouco,tenho um pouco de medo e no entendo direito o que eles explicam".

    Assim, a anlise dos relatos dos entrevistados pe luz sobre a importncia das circunstncias da vida nas prticasde consumo na terceira idade (Moschis, 2012). Observa-se que aqueles com maior trajetria no mercado bancrioso mais autnomos nas decises e utilizam um leque maior de servios, apesar de, com a aposentadoria,percebem ter reduzido o volume de servios contratados. J aqueles consumidores que no utilizavam serviosbancrios antes da aposentadoria, encontraram nesta nova etapa da vida a necessidade de se fazerconsumidores. Isto exigiu, inclusive, o desenvolvimento de capacidades para tal, que, diante do reconhecimentoda posio social de idoso, no gostariam de exercer.

    Quando se questionou qual o grau de envolvimento com o banco, os entrevistados comentam que se sentempouco envolvidos, principalmente por estarem na terceira idade. Mesmo necessitando dos bancos para receber aaposentadoria, os consumidores no expressam interesse em ampliar a participao no mercado. Observa-se queo consumo de servios bancrios no tomado como uma forma de renegar a posio de idoso (Featherstone, 2010;

    Schau et al., 2009), mas reflexo de situaes sociais que os colocam ou mantm na posio de consumidores.Complementarmente anlise do consumo de servios bancrios pelos entrevistados, importante compreendero processo de subjetivao necessrio para que estas prticas de consumo ocorram, o que ser descrito naprxima categoria apresentada.

    O 'se fazer sujeito'

    A conscincia e as experincias construdas ao longo das trajetrias de consumo reforam a percepo do sujeitoem relao entidade externa/objetos (instituies financeiras, neste caso) e sua autonomia enquanto sujeitos(Barnhart & Pealoza, 2013). Aqueles consumidores que relatam uma vida profissional ativa junto aos bancosdemonstram maior facilidade em lidar com o processo de subjetivao. Esses idosos utilizam termos comoparceria e confiana para explicar sua relao com o banco. Isso est conectado com a concepo de seguranacomo um balizador da autonomia do sujeito (Bauman, 1988). Mesmo que o setor bancrio seja apontado comopouco confivel (Jrvinen, 2014), os consumidores que no tiveram o rompimento da confiana ao longo da suatrajetria de vida comentam que no veem motivos para duvidar dos bancos, como expressa a entrevistadaIvete: "Sinto-me muito segura em deixar o dinheiro na conta no banco. Nunca aconteceu nada para a gentedesconfiar" (Ivete). Ou como o entrevistado Alusio enfatiza: "O banco o lugar mais seguro para guardardinheiro".

    Por outro lado, experincias negativas colocam em cheque a capacidade de agncia frente aos bancos, fazendocom que a subjetivao assuma um carter traumtico. Como a consumidora Lediana relata, o sentimento de tersido financeiramente lesada gerou um trauma que inibe o desejo de assumir novas relaes de consumo:

    "H vrios anos eu tinha uma conta corrente com meu esposo. Antes ainda de receber aaposentadoria, a gente quase no movimentava a conta e, quando fomos ver, o banco tinha cobradoum valor bem alto, s porque ns no movimentvamos a conta. A gente pagou o que devia, claro,

    mas depois disso nunca mais quis saber de conta corrente. Naquela poca foi bastante dinheiro que obanco descontou. Nunca mais me esqueci disso" (Lediana).

    Alm de gerar um sentimento de incapacidade de ao, estas experincias auxiliam numa construo socialacerca da imagem do banco, sendo utilizadas como balizadoras na construo da confiana e do risco envolvidosnos processos de subjetivao. A fala da entrevistada Leila exemplifica esta perspectiva:

    "O Banco no est bem visto na comunidade, j ouvi muitos idosos reclamarem que faltava dinheiroda aposentadoria e at j sei de casos com gente bem esclarecida que reclamou que faltava umacerta quantia na conta, depois reclamaram e voltou para a conta. Inclusive teve uma vez queestavam cobrando R$ 22,00 de manuteno de conta, se eu no fosse olhar o extrato, estavam athoje pegando o meu dinheiro" (Leila).

    Os respondentes relatam, ainda, que possuir conta corrente e talo de cheque exige muito controle e, com a

    chegada terceira idade, tornariam-se ainda mais vulnerveis em relao aos bancos. As percepes negativasapontadas aqui consistem em pontos de reflexo relevantes na formao do sujeito-consumidor (Thompson, 2005). justamente o sentido que esta reflexo assume (positiva ou negativa) que vai amplificar ou minimizar osestranhamentos e angstias derivados do processo de subjetivao. Consequentemente, a percepo de riscoslimita o desejo de se construir como consumidores, ou seja, antes de ser consumidores, os idosos precisam

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    assimilar sua posio de sujeitos frente aos bancos. Ao demonstrar uma percepo de insegurana,vulnerabilidade e desconfiana, estes entrevistados relatam que buscam reduzir aes de consumo, como numatentativa de minimizar os riscos iminentes do processo de subjetivao. Um caso que retrata isso comentadopela entrevistada Leila. Ela utilizava o talo de cheque, entretanto, por um perodo, no conseguiu administrar osgastos e deixou a conta estourar, incidindo na necessidade de pagar juros. Desde ento resolveu cancelar autilizao deste servio. Portanto, quando questionada sobre a percepo que a entrevistada tinha em relao aobanco, sua manifestao foi: "entrei em uma furada, da fiquei com raiva do Banrisul e nunca mais quis ter contal" (Leila).

    A forma de lidar com os processos de subjetivao tambm est atrelada capacidade de captar e processar asinformaes necessrias para manter um relacionamento com os bancos, visto que a chegada terceira idade acompanhada de um sentimento de vulnerabilidade (Zimerman, 2007). Na concepo dos entrevistados, a falta deinformao amplifica a percepo de vulnerabilidade: "Eu confio nos procedimentos realizados pelo banco, pormfico sempre com um p atrs, sempre peo explicaes sobre as movimentaes da minha conta, no caso, confiodesconfiando" (Neide). Os entrevistados relatam que preferem deixar suas contas em conjunto com um familiar,para evitar que sejam enganados (conforme percepo dos entrevistados) pelo banco, auxiliando noprocessamento das informaes. Eles tambm solicitam a ajuda de filhos para realizar os servios bancrios,reduzindo, assim, o envolvimento pessoal com o banco: "Eu vou muito pouco ao banco, sempre quando parareceber eu mando a minha filha fazer as coisas" (Isabela). Interessante observar que a deciso de envolver outrapessoa nas prticas de consumo, conforme descrito por Barnhart e Pealoza (2013), resultado da inibio do desejode enfrentar os processos de subjetivao que o consumo requer. Assim, envolvendo outras pessoas, os idososobtm um suporte para racionalizar e interpretar com mais tranquilidade o processo de subjetivao, visto quereduzem a possibilidade de perder algo diante da complexidade das relaes sociais nas prticas de consumo(Barnhart & Pealoza, 2013; Thompson, 2005). Reconhecendo que a formao do sujeito-consumidor envolve interaocom outros agentes, passa-se para a terceira categoria de anlise.

    O outro na formao do sujeito-consumidor

    O terceiro ponto destacado na anlise dos dados diz respeito identificao do papel do outro na subjetivao doconsumidor idoso de servios bancrios. Esse tema consiste numa categoria de ordem superior, envolvendo tantoa formao do consumidor quanto a do sujeito, apresentadas anteriormente. Este entendimento decorre do fatode que justamente na relao com o outro que o sujeito-consumidor se constitui, uma vez que o sujeito noest dado, mas construdo ao longo dos acontecimentos (Deleuze, 2001).

    Como observado por Richins e Chaplin (2015) no mbito da relao pais e filhos, as experincias de consumo de

    servios bancrios tambm imprimem uma conscincia reflexiva na formao do consumidor, cuja experinciaacumulada ou mesmo a falta dela preconiza a percepo de agncia e autonomia no processo desubjetivao. Prticas cotidianas, como sacar dinheiro no caixa eletrnico ou solicitar uma informao a umfuncionrio, contribuem neste processo, inclusive transformando a relao dos idosos com os bancos.Especificamente, neste estudo, observa-se que os atendentes e as tecnologias so apontados como entes eobjetos (respectivamente) diretamente envolvidos neste processo de subjetivao dos consumidores.

    Os entrevistados destacam que a chegada dos computadores e mquinas, ao mesmo tempo em que agilizou osprocessos, tornou-os complexos. A atual necessidade de interao com a tecnologia carrega as limitaes de umatrajetria de vida privada desses recursos, e a necessidade de interagir com a tecnologia com destaque para oscaixas eletrnicos limita o desejo dos idosos em consumir servios bancrios. Isso fica evidente na fala daentrevistada Ledir, que comenta preferir no utilizar os caixas eletrnicos em virtude de uma limitada percepode agncia frente ao equipamento: "tenho medo de o meu dinheiro no sair do caixa, e depois como vou provarque eu no peguei o dinheiro?" (Ledir)

    Reforando a relao entre elementos materiais e o exerccio de agncia (Borgerson, 2005), na opinio dosentrevistados, a falta do conhecimento necessrio para lidar com as tecnologias poderia ser minimizada seestivessem dispostos a aprender a utiliz-la, mas a insegurana inibe qualquer desejo de tentar dominar atecnologia. Em consonncia com Debert (1999) e Goldenberg (2011), a falta de desejo de aprender no est atrelada idade cronolgica, pois em nenhum momento foi mencionada pelos entrevistados a idade como um fatorlimitante, mas resultado de uma construo social de que "os tempos so outros". Como reflete o entrevistadoJuremir, "no precisa entrar na fila dentro da agncia, d mais agilidade, mas tenho medo de errar [...]; prefiro oatendimento pessoal, mais fcil". Assim como detectado por Pitteri, Nachbar e Arruda (2010), embora prefiram oatendimento pessoal, os entrevistados assimilam que a evoluo tecnolgica alterou a forma de interao com osbancos, e que, apesar da percepo de perda de poder de agncia, a tecnologia proporciona benefcios paratodos os usurios.

    Dessa forma, os entrevistados utilizam o caixa automtico basicamente para operaes bancrias simples, comoconsulta de saldo e saque. Operaes mais complexas, na viso dos idosos como depsitos e pagamentos geralmente so assistidas pelos atendentes. A insegurana diante dos objetos tecnolgicos passa a serminimizada com a orientao dos funcionrios do banco. Os entrevistados mencionam que a ajuda necessria,pois no conseguem acompanhar o ritmo das mudanas: "muda muito, est sempre mudando as telas doscomputadores, fica difcil decorar os passos, ento preciso chamar ajuda" (Manuel).

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    Por outro lado, apesar de exercerem a funo de auxiliar e estimular prticas de consumo, os funcionriostambm so reconhecidos como outro no processo de subjetivao. Isso fica evidente quando os entrevistadosrelatam que sentem sua autonomia limitada perante os atendentes, como exemplificado por uma entrevistada:"nem sempre eu consigo fazer tudo o que preciso sozinha, ento tenho que ficar chamando algum. Acho chato,pois temos que ficar incomodando, gostaria de poder fazer tudo sozinha" (Lediana).

    O carter humano no atendimento, apontado pela literatura de marketing de servios como um elementofundamental para a percepo de satisfao (Lovelock et al., 2011), tambm apontado pelos entrevistados comoum ponto fulcral no processo de subjetivao. Dentre os trs bancos existentes no municpio onde residem osentrevistados, os idosos relatam que somente em um deles se sentem em casa. Como a entrevistada Ivetemenciona, o atendimento representa a acolhida do banco, distinguindo a acolhida familiar de um em relao frieza do outro. O atendimento assume, assim, uma posio central no processo de subjetivao e, diante doexerccio de agncia do consumidor, acaba influenciando as decises de consumo. Isso fica evidente nodepoimento do entrevistado Manuel:

    "No Banco do Brasil eu no gosto muito do atendimento, eles no so preparados para atender aspessoas, parece que eles esto fazendo um favor pra gente. Eu sou um pouco ansioso e no gosto deficar horas nas filas. Acabei tirando o meu aposento do Banco do Brasil e levei para o Sicredi, l elesno deixam a gente na fila" (Manuel).

    O encontro de servio gera questionamentos e produz sentido experincia de consumo (Zeithaml et al., 2001),que no caso dos consumidores idosos, desafia, muitas vezes, prticas at ento conhecidas. Para osentrevistados, o distanciamento entre os funcionrios e os consumidores dificulta a aproximao dos idosos com

    os bancos, pois ao invs de auxiliar no processo de subjetivao, amplia a percepo de insegurana sempre queprecisam utilizar algum servio. A entrevistada Neide relata seus anseios da seguinte forma: "cada vez queprecisava ir ao banco, ficava nervosa, pois sabia que iria ser atendida por algumas pessoas que no tmpacincia com as pessoas idosas" (Neide).

    O papel do atendimento confirma o fato de as interaes sociais assumirem uma posio chave na formao doconsumidor, alm de influenciarem no processo de subjetivao (Barnhart & Pealoza, 2013; Geisler & Veresiu, 2014). Ocarter humano do atendimento pode diminuir a ansiedade e desconfiana inerentes s interaes com osbancos, especialmente aquelas mediadas por tecnologias. Observa-se, nas falas dos idosos entrevistados, queestes no desejam explorar a autonomia que a agncia do consumidor proporciona, criando uma expectativaquanto contribuio do outro para se construir como consumidores. Ao invs de assumir uma conscinciareflexiva em relao s prticas de consumo, ou seja, ter autonomia enquanto consumidor (Thompson, 2005), elesesperam a indicao do que fazer e desejam ser informados claramente do que seguro.

    Observa-se, ainda, que essa indicao no percebida atravs dos elementos tangveis, mas principalmente porintermdio do pessoal de contato, pois, como a entrevistada Ledir comenta: "tenho preferncia pelo atendimentopessoal, pois eu confio mais nas pessoas do que nas mquinas; qualquer coisa que a gente faz errado d umproblemo" percepo que refora a importncia da "linha de frente" no marketing de servios (Lovelock et al.,2011). Em consonncia com os achados de Cheung e To (2011), experincias com o atendimento, principalmente norecebimento de informaes claras, contribuem no desejo dos consumidores de interagirem com os bancos. Aentrevistada Leila comenta:

    "Os funcionrios e os bancos atendem bem, fazem o que a gente precisa, porm fico insatisfeitaquando fico com muitas dvidas e ningum consegue me esclarecer. Muitas coisas deixam de seremvendidas por falta de oferta e de informaes claras" (Leila).

    No caso dos servios bancrios, os sistemas de autoatendimento tm exigido um papel ativo dos consumidores

    na execuo dos servios (Cheung & To, 2011; Pitteri et al., 2010). Ao mesmo tempo em que os entrevistados percebemuma reduo no nmero de atendentes, apontam avanos tecnolgicos nos servios bancrios, ampliando anecessidade de autonomia. Em virtude disso, no de se estranhar o fato de aqueles consumidores, querelataram ter uma trajetria de vida ativa junto aos bancos, reduzirem o consumo quando se aposentaram,enquanto aqueles que passaram a consumir somente depois de aposentados utilizam somente servios bsicos.Destaca-se, assim, que a necessidade de interao com o outro - sejam pessoas, sejam tecnologias - reduz ainteno dos idosos em utilizar os servios bancrios. Com isso, refora-se a importncia de reconhecer que acapacidade de agncia dos idosos no mercado no refletida apenas nas suas prticas, mas tambm na formacomo estes consumidores encaram o processo de subjetivao (Kjeldgaard & Askegaard, 2006).

    Estes resultados demonstram que, mesmo com a necessidade de serem clientes de instituies bancrias parareceber o benefcio da aposentadoria, nem todos os idosos usam sua participao no mercado para negociar etransformar significados por meio da ampliao do consumo (Holt & Thompson, 2004). Isso no decorre somente da

    falta de ambio ou condies de se constituir como consumidores (Firat & Venkatesh, 1995; Karababa & Ger, 2011), massim pelo fato de no desejarem se construrem como sujeitos nas suas relaes com os bancos.

    CONSIDERAES FINAIS

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    Enquanto a literatura de marketing de servio tem focado principalmente a compreenso do objeto e osprocessos derivados da interao consumidor-empresa, como a satisfao (Grnroos, 1982; Parasuraman et al., 1988;Zeithaml et al., 2011), assunes fundamentais que emergem dos processos de subjetivao do consumidor perante oobjeto tm sido pouco exploradas. Alinhada a perspectivas que reconhecem o papel das interaes socioculturaisna formao do consumidor (Barnhart & Pealoza, 2013; Geisler & Veresiu, 2014; Thompson, 2005), a compreenso do sujeito-consumidor demonstra ser uma instncia de reflexo fundamental para compreender o consumidor de serviosbancrios na terceira idade. Afinal, como os resultados apontam, a constituio do sujeito-consumidor remete auma trajetria que agrega experincias e percepes produzidas por encontros com o outro. Isso indica que oencontro de servios, alm do momento de interao entre o consumidor e a empresa (Lovelock et al., 2011), fornece

    fragmentos incorporados na formao do sujeito-consumidor.

    Os resultados contribuem com estudos recentes acerca do consumo na terceira idade (Barnhart & Pealoza, 2013;Moschis, 2012; Schau et al., 2009) adicionando que diferentes trajetrias de vida afetam a forma como os consumidoresse engendram em relaes de consumo de servios bancrios na terceira idade. Estes resultados vo ao encontrode perspectivas gerenciais que reconhecem a influncia dos papis atribudos s pessoas ao longo da vida, no seucomportamento de compra (Solomon, 2011). Ademais, permitem analisar a trajetria de vida como um elementorelevante na forma como os idosos se engajam em prticas de consumo. Construes negativas podem implicarrecusa em reconhecer capacidade de agncia nas decises de consumo, limitando as prticas a operaesbancrias bsicas, como saques da aposentadoria e pagamentos.

    A trajetria de vida tambm influencia o processo de subjetivao do consumidor. Como Barnhart e Pealoza (2013)ponderam, a chegada terceira idade vem acompanhada do reconhecimento da reduo da capacidade de

    racionalizao. O processo de subjetivao dos idosos confronta-se com esse reconhecimento, principalmentenaqueles consumidores que passaram a experienciar o consumo de servios bancrios somente na terceira idade como o caso de mulheres que ao longo da vida praticamente no frequentaram agncias bancrias. Hoje, porestarem vivas e em funo da aposentadoria, obrigam-se a buscar estes servios, engajando-se em novasformas de consumo mesmo que no reconheam capacidade para tal. Nestes casos, no foi o desejo de se tornarconsumidoras que conduziu o processo de subjetivao, conforme observado por Karababa e Ger (2011), massimplesmente a necessidade de se tornarem usurias de servios bancrios para receber a aposentadoria.Refora-se, assim, que a compreenso do consumidor de servios bancrios no se resume anlise daracionalizao do consumidor diante do objeto, conforme enfatiza a literatura (Parasuraman et al., 1988; Ribeiro et al.,2010; Zacharias et al., 2008), devendo considerar-se tambm os aspectos sociais e histricos que permeiam ainterao entre o objeto e o sujeito nos processos de subjetivao (Deleuze, 2001; Kjeldgaard & Askegaard, 2006; Thompson,2005).

    Com isso, contribui-se com estudos acerca da cultura do consumidor (Arnould & Thompson, 2005) a partir da anliseda construo da posio de sujeito em paralelo construo do consumidor. Conforme observado no estudo, aposio social dos idosos, apesar de no inibir, reduz o desejo de se construrem como consumidores. Esteresultado distingue-se, em parte, de estudos prvios que detectaram o desejo dos consumidores idosos depermanecerem ativos no mercado (Featherstone, 2010; Schau et al., 2009). No grupo estudado, esse desejo envolve apercepo de capacidade de agncia, principalmente na forma como se d a relao com o outro. Enquanto atecnologia - representada pelos caixas eletrnicos - inibe, os atendentes so vistos como possveis fontes deinformao e segurana. Assim, os idosos visualizam nos atendentes um suporte no processo de subjetivao doconsumidor.

    Em linha com estudos como Geisler e Veresiu (2014) e Barnhart e Pealoza (2013), esse achado refora a importncia deoutros agentes de mercado na formao do consumidor. Especificamente, identifica-se que objetos como atecnologia e os atendentes, ao mesmo tempo em que podem facilitar, tambm podem inibir o desejo dos

    consumidores de atuarem num determinado mercado. Esta reflexo contribui com estudos anteriores (Geisler &Veresiu, 2014; Karababa & Ger, 2011), ressaltando que, alm dos mediadores humanos, objetos - como os caixaseletrnicos - atuam no processo de subjetivao do consumidor.

    Em termos prticos, a anlise da formao de sujeitos-consumidores de servios bancrios na terceira idadecontribui na manuteno destes consumidores ativos no mercado, renegando a categoria social de velho e todosos traumas associados a ela (Debert, 1999; Goldenberg, 2011). Tendo em vista que, por meio do consumo, os idosospodem construir identidades distintas daquelas socialmente atribudas (Barnhart & Pealoza, 2013; Holt & Thompson, 2004),construes identitrias acerca da terceira idade como uma fase de rejuvenescimento e bem-estar estariamcondicionadas ao idoso quando este reconhece sua capacidade de agncia nas prticas de consumo e aceita oprocesso de subjetivao recorrente.

    Ao abordar de forma exploratria o conceito de sujeito-consumidor, abrem-se novas possibilidades de estudos

    com consumidores de outras faixas etrias, ampliando a capacidade de teorizao deste conceito. Uma sugestoseria explorar a formao do sujeito-consumidor no mbito dos produtos, abordando o papel das marcas como ooutro ente no processo de subjetivao. Outra sugesto diz respeito ao reconhecimento dos aspectos biofsicosna capacidade de exercer agncia (Zimerman, 2007). Condies fsicas e mentais dos idosos podem se includascomo mediadoras dos processos de construo do sujeito-consumidor da terceira idade.

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    Alm disso, necessrio mencionar a particularidade do contexto limitada a um grupo de idosos residentesnum pequeno municpio -, o que impossibilita qualquer tipo de generalizao emprica dos resultados. Da mesmaforma, a utilizao da tcnica de bola-de-neve para selecionar os sujeitos da pesquisa pode implicar um reforoda homogeneidade dos entrevistados enquanto grupo social. Para superar essas limitaes, so indicadasanlises mais abrangentes, envolvendo contextos de estudo heterogneos, como consumidores com perfildeclaradamente cosmopolita, ou residentes em grandes centros urbanos. Assim, novos estudos podem adotarolhares distintos na anlise dos processos de subjetivao do consumidor da terceira idade, auxiliando nacompreenso da velhice, que como Elias (1987) descreveu, permanece um segredo desagradvel, que no se querconhecer.

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    Recebido: 02 de Outubro de 2014; Revisado: 03 de Junho de 2015; Aceito: 03 de Junho de 2015

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