TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
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ESTADO DO RIO DE JANEIRO
PODER JUDICIÁRIO
RAS 3 E
NONA CÂMARA CÍVEL
Apelação nº 0001030-40.2007.8.19.0028
Apelante: EJORAN EDITORA DE JORNAIS REVISTAS E AGENCIA DE
NOTÍCIAS
Apelante: SIMONE MARINS QUARESMA
Apelante: SYLVIO LOPES TEIXEIRA
Apelante: MINISTÉRIO PÚBLICO
Apelado: OS MESMOS
Apelado: MUNICÍPIO DE MACAÉ
Relator: Desembargador ROBERTO DE ABREU E SILVA
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ATO DE IMPROBIDADE. MUNICÍPIO DE MACAÉ.
APLICABILIDADE DA LEI 8429/92 AOS PREFEITOS. LICITAÇÃO. CONTRATO
ADMINISTRATIVO. SERVIÇO DE PUBLICAÇÃO DE ATOS OFICIAIS. FRACIONAMENTO
INDEVIDO DO OBJETO DO CONTRATO. LICITAÇÃO NA MODALIDADE CONVITE.
PROCEDIMENTO MENOS RIGOROSO. CONTRATAÇÃO DIRIGIDA A UM LICITANTE.
AUSÊNCIA DE COMPETIÇÃO. BURLA AO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO.
CONDENAÇÃO A MULTA CIVIL E PROIBIÇÃO DE CONTRATAR COM O PODER PÚBLICO
PELO PRAZO DE 5 ANOS.
As Cortes Superiores firmaram entendimento no sentido da harmonia do sistema jurídico em
relação à responsabilidade civil, penal, administrativa e política dos prefeitos. O Decreto-lei 201/1967
prevê crimes de responsabilidade conduzindo o prefeito a um julgamento político perante o Poder
Legislativo e a um julgamento na esfera penal na via judicial. Por sua vez, a Lei nº 8.429/1992
submete o prefeito a julgamento na esfera cível perante o Poder Judiciário pela prática dos mesmos
fatos. Assim, as normas convivem sem qualquer antinomia no ordenamento jurídico.
A presente ação civil pública versa sobre irregularidade no procedimento licitatório para
contratação de serviço de divulgação dos atos oficiais pela imprensa local. O Município de Macaé deu
início a dois procedimentos simultâneos de licitação na modalidade convite, uma com valor de R$
70.000,00 e outra com valor de R$ 72.000,00, sendo que ambas continham o mesmo objeto, qual seja,
contratação de serviço para publicação de atos oficiais. Nesses moldes, patente é o fracionamento dos
valores do serviço com o fito de burlar a lei de licitação, esquivando-se da modalidade licitatória
adequada. A comissão de licitação, na pessoa da sua presidente (1ª ré), encaminhou convites às
mesmas empresas, contrariando determinação legal expressa. À exceção da 3ª ré, ditas sociedades
eram sediadas em Nova Friburgo e em Nova Iguaçu. Apurou-se, ainda, que existiam outros jornais
que circulavam em Macaé e não foram convidados a participar da licitação. Constatou-se, por fim,
que não foi apresentada qualquer proposta por parte das sociedades convidadas, senão a apresentada
pela 3ª ré. Noutras palavras, não houve competição, violando-se o fim maior da licitação, que é o de
selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração Pública.
A conduta dos réus está objetivamente caracterizada no art.10 da Lei 8429/94 como ato de
improbidade que causa prejuízo ao Erário
O fracionamento indevido da licitação é conduta há muito rechaçada pela jurisprudência dos
Tribunais Superiores e enquadrada como prática de ato de improbidade. Nesses casos, entende-se
que o prejuízo à Administração Pública é in re ipsa, porquanto notoriamente, ao conduzir-se
irregularmente uma licitação, frustrando a competição que lhe é inerente, impossibilita-se a
contratação da proposta mais vantajosa ao Erário.
O art. 12 da Lei de Improbidade prevê diversas cominações a serem aplicadas
isolada ou cumulativamente àquele que comete ato de improbidade. In casu, o d.
Sentenciante, estabeleceu a pena de multa pagar multa civil no valor, correspondente à
quantia despendida com as publicações nº 929e 930, acrescida de correção monetária na
forma da lei, condenação que se mantém. Quanto às demais cominações da lei, cuja
aplicabilidade constituem objeto de recurso do Ministério Público, merece parcial reforma
a r.sentença adequando as sanções à gravidade do caso concreto, bem assim, com o fim de
prevenir nova ocorrência do mesmo ilícito patrimonial. Assim sendo, aplico aos réus a pena
de proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais
ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da
qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos e para suspender os direitos políticos
do 1° e 2° réus pelo prazo de cinco anos. DESPROVIMENTO AOS RECURSOS DO 1°, 2°
e 3° RÉUS. PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
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Vistos, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação
nº 0001030-40.2007.8.19.0028 A C O R D A M os Desembargadores que compõem a
Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro em NEGAR
PROVIMENTO AOS RECURSOS DO 1°, 2° e 3° RÉUS e DAR PROVIMENTO
PARCIAL AO RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO, nos termos do voto do
relator. Decisão UNÂNIME.
VOTO
Integra-se ao presente o relatório constante dos autos.
Conheço e admito os recursos, ante a presença dos pressupostos de
admissibilidade.
Cuida-se de ação civil pública. A demanda diz respeito ao direcionamento de duas
licitações para publicações de atos oficiais pelo MUNICIPIO DE MACAE, em favor da
ré EJORAN - EDITORA DE JORNAIS, REVISTAS E AGÊNCIA DE NOTICIAS, no
ano de 2000. Em síntese, aduz o Ministério Público que: a) no ano de 2000, foram
abertas, simultaneamente, duas licitações, na modalidade carta convite, com o mesmo
objeto: publicações de atos oficiais, com números sequenciais: 929 e 930, sendo a
primeira com preço estimado pelo Município de R$ 72.000,00 e a segunda, de R$
70.000,00; b) para ambas as licitações, a comissão de licitação, na pessoa da sua
presidente Simone Marins Quaresma, encaminhou convites às mesmas empresas,
contrariando determinação legal expressa, quais sejam: (i) Editora Nova Friburgo Ltda.,
com sede em Nova Friburgo, (ii) Deara Organização Jornalística Ltda., com sede em
Nova Iguaçu; c) a despeito de haver diversos jornais em circulação na cidade de Macaé,
as empresas escolhidas para participar de ambas as licitações são de municípios que
nem ao menos são fronteiriços a Macaé; d) para completar o quadro de direcionamento
explícito para favorecer à Ré EJORAN, nenhuma das empresas apresentou sequer uma
proposta de preços. Em suma, ambas as cartas-convite contaram somente com a
participação da empresa Ré; e) as duas contratações, a bem da verdade, representavam
uma única unidade fática, dividida em duas para possibilitar a realização de cartas-
convite, que, da forma como realizadas, aniquilou a competição; f) violação ao art. 23, §
5° e art.22, §3° e 4° da lei 8.666/93; g) a conduta dos réus se insere no art.10, XII e
art.11 da Lei 8429/92, violando-se os princípios da impessoalidade, finalidade,
publicidade e moralidade.
A r. sentença julgou procedente em parte os pedidos formulados na inicial, nos
termos do art.269, I do CPC, para CONDENAR (1) Sylvio Lopes Teixeira, (2) Simone
Marins Quaresma e (3) Ejoran — Editora De Jornais, Revistas e Agência de Noticias à
pagar multa civil no valor, correspondente à quantia despendida com as publicações nº
929e 930, acrescida de correção monetária na forma da lei. Outrossim, condenou os
réus, solidariamente, ao pagamento das custas do processo e ao pagamento dos
honorários advocatícios ao Fundo" Especial do Ministério Público, fixados em R$
5.000,00 (cinco mil reais), consoante art. 20 §4°, do CPC.
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Pugna a ré Ejoran pela reforma do r.julgado sob a s seguintes alegações: a) ante
o reconhecimento da não ocorrência de lesão ao Erário e conluio entre as partes não há
como se falar em ato de improbidade administrativa eis que as características essenciais
para que esta conduta seja configurada não estão presentes na conduta imputada à
pessoa jurídica; b) não há como prevalecer as sanções que lhe foram imputadas pois
ausentes o dolo, a má-fé, a lesão ao erário e o locupletamento ilícito da recorrente, o que
é inequívoco nos autos, não sendo admitida a responsabilidade objetiva.
Subsidiariamente, invoca o princípio da proporcionalidade na quantificação da multa e
dos honorários, para que sejam os mesmos reduzidos.
Postula a ré Simone pela reforma da r. sentença, aduzindo que: a) integrou o polo
passivo e foi chamada à responsabilidade, sem ter praticado qualquer ato decisório que
tivesse concorrido para a contratação da terceira ré; b) sua função como presidente da
Comissão Permanente de Licitação era processar e julgar as centenas, senão milhares,
de licitações ocorridas no município de Macaé, sempre no sentido de empreender a
maior eficiência possível nos trâmites administrativos, sem ter, contudo, ingerência nos
pedidos emanados das secretarias e, principalmente, nas decisões referendadas pelo
Chefe do Executivo; c) como simples servidora pública e membro da Comissão
Permanente de Licitação, a segunda ré não ordenava despesas e portanto, não poderia
ser convocada a dar explicações por atos que foram praticados por outros, sempre com
respaldo em manifestações técnicas dos órgãos competentes; d) a imputação restringe-se
a assertiva de que ela teria sido responsável pela entrega dos convites; e) a simples
alegação de violação aos princípios da Administração Pública não são capazes de
configurar ato de improbidade administrativa; f) inexistência do dolo especifico ou má-
fé da demandada em enriquecer ilicitamente e causar lesão ao Erário, elementos estes
essenciais para a configuração de ato de improbidade administrativa; g) os atos
perpetrados peta recorrente não representaram qualquer lesão ao Erário, ou benefício
pessoal a quem quer que se cogite, mas, ao revés, apenas tiveram a missão de, naquele
momento, suprir as necessidades da administração pública municipal, a fim de que
pudesse se concretizar o princípio constitucional da publicidade dos atos
administrativos.
Pugna o réu Sylvio a reforma do r. decisum para julgar improcedentes os pedidos.
Em suas razões recursais, alega, sem síntese: a) inaplicabilidade da Lei 8429/92 aos
agentes políticos, como é o caso dos prefeitos, sujeitos ao Decreto 201/67; b) no mérito,
quanto à violação do art. 10, VIII da Lei 8429/92, o procedimento adotado objetivava o
cumprimento de importante princípio administrativo-constitucional, tendo sido
realizado com base na Lei Orgânica Municipal; c) a celebração dos contratos se deu no
mês de dezembro do ano 2000, final do mandato do primeiro réu, onde inúmeros atos
foram praticados pelo Poder Público Municipal, em vista do término da própria gestão
administrativa, tem-se justificativa plausível para a adoção de procedimento mais
simples para contratação do serviço almejado, sem que isso signifique violação à Lei
8.666/93 ou à Lei 8429/92; d) a adoção de procedimento mais complexo para a
contratação de serviço de publicação dos atos oficiais do município, no final do
mandato do primeiro réu, não teria a celeridade necessária a viabilizar que ainda em
dezembro se pudesse dar publicidade aos atos oficiais do município, como determina o
art. 37, caput, da Constituição Federal; e) havendo a necessidade de dar publicidade aos
atos oficiais do poder público municipal no final da gestão 1997/2000, resolveu-se
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diante da demanda apresentada em dezembro e dos inequívocos compromissos que teria
a nova administração em janeiro de 2001, proceder com o certame na modalidade
convite, porquanto seria a única maneira de regularmente contratar o serviço que visava
concretizar o princípio da publicidade; f) não havia espaço para outro mecanismo.
Somente a contratação direta ou a carta convite poderiam suprir a necessidade do poder
público municipal, que tinha o dever de dar publicidade a inúmeros atos oficiais naquele
momento; g) inexistência do dolo especifico ou má-fé do demandado em enriquecer
ilicitamente e causar lesão ao erário, elementos estes essenciais para a configuração de
ato de improbidade administrativa, que não se constata nos presentes autos; h) os
conceitos de ilegalidade e de improbidade são essencialmente diferentes, podendo se
afirmar inclusive que todo ato ímprobo é ilegal, mas nem todo ato ilegal pode ser
considerado ímprobo; i) em inúmeras hipóteses uma conduta que em tese configuraria
um ato de improbidade, quando vista sob a ótica da razoabilidade, ou seja, quando se
aplica a norma ao caso concreto, perde o caráter de ilicitude; h) interpretação teleológica
da Lei de Improbidade Administrativa, tem-se que se finalidade última é a proteção ao
erário, que se faz através da punição ao administrador que, sendo v.g. desonesto,
desleal, imoral, imparcial; obtenha, indevidamente, vantagem patrimonial ou, ainda,
cause dano ao erário público; i) não agiu com dolo em lesar o erário e que não
enriqueceu ilicitamente, mas se, ao contrário, as condutas apontadas foram praticadas
por inabilidade ou porque eram as únicas a serem adotadas, estando afastado o campo
de incidência da norma, não há que se falar em improbidade administrativa; j) a
aplicação da sanção de multa no valor das publicações dos editais que somam o valor de
R$ 70.000,00 (setenta mil reais), além de se revelarem desproporcionais e
desarrazoados por ser em patamar sobremaneira elevado, tal sanção se reveste de
características de ressarcimento ao erário, pois na prática, se estará devolvendo os
valores despendidos com as publicações dos editais de publicação das cartas-convites, o
que não se pode admitir eis que já foi reconhecido que não houve lesão ao erário.
Subsidiariamente, postula a diminuição da multa aplicada, bem como no valor dos
honorários advocatícios, por não guardar consonância com os postulados da
razoabilidade e proporcionalidade.
Postula o Ministério Público a reforma parcial do r.julgado. em suas razões
recursais, aduz, que: a) Na r. sentença guerreada, o d. Magistrado sentenciante entendeu
estar provada a prática de ato de improbidade, reconhecendo que o agir dos apelados se
deu em descompasso com a legislação vigente e, com isso, condenou-os, apenas, ao
pagamento de multa no montante no valor dos contratos viciados; b) prejuízo ao erário,
decorrente do fracionamento do objeto licitado com a frustração do regular
procedimento licitatório, é in re ipsa, vez que com o agir dos apelados a Municipalidade
deixou de contratar e conhecer a melhor proposta; c) prejuízo ao erário, decorrente do
fracionamento do objeto licitado com a frustração do regular procedimento licitatório, é
in re ipsa, vez que com o agir dos apelados a Municipalidade deixou de contratar e
conhecer a melhor proposta; d) todos os apelados tentam apresentar justificativas para o
agir ímprobo, mas nenhum deles nega a violação das normas constantes na Lei Geral de
Licitações e Contratos; e) o princípio da licitação é, a um só tempo, instrumento de
realização dos princípios da moralidade, isonomia, publicidade e impessoalidade; f) o
dever administrativo da licitação tem suporte no princípio republicano, pois se inspira
na vedação a discriminações e privilégios e na igualdade de oportunidades; g) o
procedimento licitatório, como sabido, se desdobra em fases rigorosamente previstas na
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lei, que visam garantir padronização e o planejamento este, tendo como ultimo fim a
proteção do Erário e da moralidade administrativa; h) o administrador público deve
programar a execução do objeto em sua totalidade, para viabilizar o controle pelos
órgãos externos e pela própria sociedade, bem como para reduzir custos; i) existe
vedação expressa na Lei Geral das Licitações (art. 23, §5°) ao fracionamento do objeto
da licitação; j) justificativa apresentada pelo recorrido Sylvio Lopes para o
fracionamento da licitação com adoção de modalidade menos complexa, qual seja, a
urgência na contratação, que, em momento algum foi demonstrada, não é, de forma
alguma, suficiente para afastar os valores e princípios da Administração Pública e,
muito menos, para justificar a adoção de procedimento ilegal; k) urgência jamais
poderia ser alegada no caso em tela, eis que o serviço de publicação dos atos oficiais
constituiu, como já afirmado em sede de alegações finais, desdobramento lógico do
princípio da publicidade dos atos administrativo, de forma que trata-se de serviço
corrente, sendo a necessidade de sua contrafação previamente conhecida por qualquer
administrador; l) se os contratos são nulos, impõe-se a restituição integral dos valores
vazados dos cofres públicos, independentemente da eventual prestação dos serviços
contratados. Isso porque, "... suprimido do mundo jurídico o ato maculado de
ilegalidade, a conseqüência será a reposição ao Erário"(Sérgio Ferraz e Lúcia Valle
Figueiredo. Dispensa e inexigibilidade de licitação. 3 edição. São Paulo: Malheiros,
1994, p. 107); m) no caso do fracionamento indevido do objeto da licitação, com adoção
de modalidade licitatória menos complexa, o prejuízo à Administração decorre da lei,
uma vez que o legislador entendeu que este ato, por si só, seria potencialmente lesivo ao
erário, razão pela qual instituiu uma presunção relativa de lesão aos cofres públicos; n)
afronta ao art. 23 da Lei 8.666/93; o) multa civil tem finalidade e destinação distinta da
penalidade de ressarcimento ao erário, sendo certo que a primeira, considerada sanção
de natureza pecuniária imposta ao ímprobo em virtude do ilícito praticado, de natureza
eminentemente punitiva, não caracteriza-se como estimativa do dano causado pela
infração, de forma que não serve para recomposição do dano causado a Municipalidade.
Preliminarmente, enfrenta-se a questão da submissão do prefeito, enquanto agente
político, às cominações da Lei 8429/92 em caso de cometimento de ato de improbidade.
A questão já restou analisada pelo Eg. STF e STJ, entendendo-se pela aplicabilidade da
mencionada lei.
As Cortes Superiores firmaram entendimento no sentido da harmonia do sistema
jurídico em relação à responsabilidade civil, penal, administrativa e política dos
prefeitos. O Decreto-lei 201/1967 prevê crimes de responsabilidade conduzindo o
prefeito a um julgamento político perante o Poder Legislativo e a um julgamento na
esfera penal na via judicial. Por sua vez, a Lei nº 8.429/1992 submete o prefeito a
julgamento na esfera cível perante o Poder Judiciário pela prática dos mesmos fatos.
Assim, as normas convivem sem qualquer antinomia no ordenamento jurídico.
Confira-se os precedentes jurisprudenciais das Cortes Superiores:
ACP. PREFEITO. DL. N. 201/1967. LEI N. 8.429/1992. Cuida-se de
ação civil pública (ACP) ajuizada contra ex-prefeito pela falta de prestação de
contas no prazo legal referente a recursos repassados pelo Ministério da
Previdência e Assistência Social. Nesse panorama, constata-se não haver
qualquer antinomia entre o DL n. 201/1967 (crimes de responsabilidade), que
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conduz o prefeito ou vereador a um julgamento político, e a Lei n. 8.429/1992
(Lei de Improbidade Administrativa - LIA), que os submete a julgamento pela
via judicial pela prática dos mesmos fatos. Note-se não se desconhecer que o
STF, ao julgar reclamação, afastou a aplicação da LIA a ministro de Estado,
julgamento de efeito inter pars. Mas lá também ficou claro que apenas as poucas
autoridades com foro de prerrogativa de função para o processo e julgamento
por crime de responsabilidade, elencadas na Carta Magna (arts. 52, I e II; 96,
III; 102, I, c; 105, I, a, e 108, I, a, todos da CF/1988), não estão sujeitas a
julgamento também na Justiça cível comum pela prática da improbidade
administrativa. Assim, o julgamento, por esses atos de improbidade, das
autoridades excluídas da hipótese acima descrita, tal qual o prefeito, continua
sujeito ao juiz cível de primeira instância. Desinfluente, dessarte, a condenação
do ex-prefeito na esfera penal, pois, conforme precedente deste Superior
Tribunal, isso não lhe assegura o direito de não responder pelos mesmos fatos
nas esferas civil e administrativa. Por último, vê-se da leitura de precedentes
que a falta da notificação constante do art. 17, § 7º, da LIA não invalida os atos
processuais posteriores, a menos que ocorra efetivo prejuízo. No caso, houve a
citação pessoal do réu, que não apresentou contestação, e entendeu o juiz ser
prescindível a referida notificação. Portanto, sua falta não impediu o
desenvolvimento regular do processo, pois houve oportunidade de o réu
apresentar defesa, a qual não foi aproveitada. Precedentes citados do STF: Rcl
2.138-DF, DJe 18/4/2008; Rcl 4.767-CE, DJ 14/11/2006; HC 70.671-PI, DJ
19/5/1995; do STJ: EDcl no REsp 456.649-MG, DJ 20/11/2006; REsp 944.555-
SC, DJe 20/4/2009; REsp 680.677-RS, DJ 2/2/2007; REsp 619.946-RS, DJ
2/8/2007, e REsp 799.339-RS, DJ 18/9/2006. REsp 1.034.511-CE, Rel. Min.
Eliana Calmon, julgado em 1º/9/2009. (Informativo 405 de 2009)
Transcreva-se a detida análise das normas pela e. Ministra Eliana Calmon:
“(...) No caso dos prefeitos e vereadores, essa legislação federal refere-
se ao Decreto-Lei 201/1967, que, em seus arts. 4º e 7º, preceitua a competência
da Câmara de Vereadores para processá-los e julgá-los pela prática de crimes
de responsabilidade, sem ressalvar quanto ao julgamento desses mesmos fatos
pela justiça comum.
Dessa forma, entendo que não há qualquer antinomia entre o Decreto-
Lei
201/1967 e a Lei 8.429/1992, pois a primeira impõe ao prefeito e
vereadores um julgamento político, enquanto a segunda submete-os ao
julgamento pela via judicial, pela prática do mesmo fato.
É essa a conclusão advinda da regra hermenêutica prevista no art. 2º, §
2º, do Decreto-Lei 4.657/1942 (Lei de Introdução ao Código Civil) (...)
A Lei 8.429/1992 que, diga-se de passagem, é da mesma hierarquia do
Decreto-Lei 201/1967, dispondo sobre a mesma matéria, estabeleceu outras
normas a par das já existentes, sem contrariá-las, apenas ressalvando que,
além do processo político pelo Parlamento (Câmara Municipal), os detentores
de mandato eletivo, in casu, prefeito e vereadores, também serão julgados pela
justiça comum cível pelo mesmo fato.
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Esclareço que o Supremo Tribunal tem jurisprudência pacífica de que os
crimes de responsabilidade (infrações político-administrativas) dos Prefeitos
são os tipificados no art. 4º do Decreto-Lei 201/1967, sujeitos ao julgamento
pela Câmara Municipal. Já as demais infrações (art. 1º) serão julgadas pela
justiça comum, na esfera penal. (...)
Assim, fica evidente que esse diploma legal previu o processamento do
prefeito tanto na esfera política (Câmara dos Vereadores) como na esfera
penal (Justiça comum), mas não fez qualquer ressalva quanto ao julgamento
desses mesmos fatos pela justiça cível.
É nessa parte que entra a Lei da Improbidade Administrativa. Deve-se
interpretar o art. 2º da Lei 8.429/1992 com o intuito de lhe dar finalidade. Colaciono o mencionado dispositivo:
Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele
que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição,
nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou
vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no
artigo anterior. (grifei).
Ora, se a Lei define como agente público – para fins de submissão da
LIA – aqueles que exercem cargos "por eleição" ou "mandato", por que
afastar todos os agentes políticos, pelo simples fato de eles já se submeterem a
normas específicas de crimes de responsabilidade? Se adotássemos esse
proceder, estaríamos considerando inúteis as mencionadas expressões da lei.
Assim, entendo que o julgamento das autoridades – que não detêm o
foro constitucional por prerrogativa de função para julgamento de crimes de
responsabilidade –, por atos de improbidade administrativa, continuará a ser
feito pelo juízo monocrático da justiça cível comum de 1ª instância. (...)”
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE
INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. PREFEITO MUNICIPAL.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APLICAÇÃO DA LEI N. 8.429/1992.
PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA
PROVIMENTO.
(...) Todavia, o Agravante interpretou de forma equivocada a decisão proferida
pelo Supremo Tribunal no julgamento da Reclamação n. 2.138 (DJe 18.4.2008),
Redator para o acórdão o Ministro Gilmar Mendes. Naquele julgado, este
Supremo assentou que, para os agentes políticos detentores da prerrogativa
de foro prevista no art. 102, inc. I, alínea c, da Constituição não seria
possível a cumulação dos dois regimes de responsabilidade político-
administrativa, devendo-se-lhes aplicar aquele previsto na Lei n.
1.079/1950. (...) Logo, o caso em análise não se enquadra no precedente
indicado. (AI 790829 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda
Turma, julgado em 25/09/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-207 DIVULG
19-10-2012 PUBLIC 22-10-2012)
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ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL
PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APLICAÇÃO DA LEI
8.429/1992 AOS AGENTES POLÍTICOS. COMPATIBILIDADE COM O
DECRETO-LEI 201/1967. REPERCUSSÃO GERAL. SOBRESTAMENTO
DO FEITO. DESNECESSIDADE.
1. Não há qualquer antinomia entre o Decreto-Lei 201/1967 e a Lei
8.429/1992, pois a primeira impõe ao prefeito e vereadores um julgamento
político, enquanto a segunda submete-os ao julgamento pela via judicial, pela
prática do mesmo fato. Precedentes.
2. O reconhecimento de repercussão geral em recurso extraordinário não
determina automaticamente o sobrestamento do recurso especial, apenas impede
a ascensão de eventual recurso de idêntica matéria ao Supremo Tribunal
Federal. Precedentes.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 323.532/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON,
SEGUNDA TURMA, julgado em 13/08/2013, DJe 20/08/2013)
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE
INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. PREFEITO MUNICIPAL.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APLICAÇÃO DA LEI N. 8.429/1992.
PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA
PROVIMENTO.
(...) Todavia, o Agravante interpretou de forma equivocada a decisão proferida
pelo Supremo Tribunal no julgamento da Reclamação n. 2.138 (DJe 18.4.2008),
Redator para o acórdão o Ministro Gilmar Mendes. Naquele julgado, este
Supremo assentou que, para os agentes políticos detentores da prerrogativa
de foro prevista no art. 102, inc. I, alínea c, da Constituição não seria
possível a cumulação dos dois regimes de responsabilidade político-
administrativa, devendo-se-lhes aplicar aquele previsto na Lei n.
1.079/1950. (...) Logo, o caso em análise não se enquadra no precedente
indicado. (AI 790829 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda
Turma, julgado em 25/09/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-207 DIVULG
19-10-2012 PUBLIC 22-10-2012)
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ATO DE
IMPROBIDADE TIPIFICADO PELO ART. 11 DA LEI 8.429/92. PREFEITO
MUNICIPAL. IRREGULARIDADES NO REPASSE DAS CONTRIBUIÇÕES
DEVIDAS AO INSTITUTO MUNICIPAL DE SEGURIDADE SOCIAL -
IMSS. CONDUTA QUE ATENTA CONTRA OS PRINCÍPIOS DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 CPC NÃO
OCORRENTE. DOLO GENÉRICO RECONHECIDO PELO TRIBUNAL DE
ORIGEM. REEXAME FÁTICO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. (...)
(REsp 1285160/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA
TURMA, julgado em 04/06/2013, DJe 12/06/2013)
No mérito, a presente ação civil pública versa sobre irregularidade no
procedimento licitatório para contratação de serviço de divulgação dos atos oficiais pela
imprensa local.
Os fatos narrados na inicial ocorreram em 2000, durante a gestão do 1º réu, Sylvio
no mandato de prefeito do Município de Macaé, o qual perdurou até 2004. A ação foi
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distribuída em 2007, cumprindo-se, portanto, o lapso temporal de 5 anos após o término
do mandato, tal como preceitua o art. 23, I, da Lei 8429/971.
Os princípios basilares da Administração Pública estão expressamente
consagrados no art. 37, caput, da Constituição da República, o qual dispõe que "A
administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência..."; acrescendo-se, ainda, que
“ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e
alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure
igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam
obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da
lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica
indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações” (Art. 37, XXI, CRFB/88).
Nesses moldes, a licitação é o procedimento administrativo através do qual a
Administração Pública seleciona a proposta que oferece mais vantagens para o contrato
de seu interesse.
O Direito Administrativo fundamenta-se em nos preceitos basilares da supremacia
do interesse público sobre o privado e da indisponibilidade dos interesses públicos, por
parte da Administração.
No âmbito da legislação infraconstitucional, a Lei 8666/93 em seu art. 2º caput e
§ 1º dispõem: “Art. 2
o As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações,
concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando
contratadas com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação,
ressalvadas as hipóteses previstas nesta Lei.
Parágrafo único. Para os fins desta Lei, considera-se contrato todo e
qualquer ajuste entre órgãos ou entidades da Administração Pública e
particulares, em que haja um acordo de vontades para a formação de vínculo
e a estipulação de obrigações recíprocas, seja qual for a denominação
utilizada.”
Certo é que todos os serviços contratados pela Municipalidade com terceiros
devem ser precedidos de licitação, ressalvados apenas as exceções previstas na Lei
8666/93 (princípio da legalidade administrativa), nelas não se enquadrando o caso sub
judice.
A lei de licitação no art. 22 elenca as modalidades de licitação, determinando,
ainda, no art. 23 os limites dos valores estimados das contratações de acordo com as
modalidades a serem adotadas. Estabelece a lei que, quanto maior é o valor do contrato,
mais rigoroso será o procedimento licitatório. Confira-se: 1 Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser
propostas:
I - até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função
de confiança;
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“Art. 22. São modalidades de licitação: I - concorrência; II - tomada de preços; III - convite; IV - concurso; V - leilão. § 1
o Concorrência é a modalidade de licitação entre quaisquer
interessados que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir os requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital para execução de seu objeto.
§ 2
o Tomada de preços é a modalidade de licitação entre
interessados devidamente cadastrados ou que atenderem a todas as condições exigidas para cadastramento até o terceiro dia anterior à data do recebimento das propostas, observada a necessária qualificação.
§ 3
o Convite é a modalidade de licitação entre interessados do
ramo pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados em número mínimo de 3 (três) pela unidade administrativa, a qual afixará, em local apropriado, cópia do instrumento convocatório e o estenderá aos demais cadastrados na correspondente especialidade que manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas da apresentação das propostas.
“Art. 23. As modalidades de licitação a que se referem os incisos I a
III do artigo anterior serão determinadas em função dos seguintes limites, tendo em vista o valor estimado da contratação:
I - para obras e serviços de engenharia: a) convite - até R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais); b) tomada de preços - até R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos
mil reais); c) concorrência: acima de R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos
mil reais); II - para compras e serviços não referidos no inciso anterior: a) convite - até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais); b) tomada de preços - até R$ 650.000,00 (seiscentos e cinqüenta mil
reais); c) concorrência - acima de R$ 650.000,00 (seiscentos e cinqüenta mil
reais).”
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Nota-se no caso concreto que Município de Macaé deu início a dois
procedimentos simultâneos de licitação na modalidade convite, uma com valor de R$
70.000,00 e outra com valor de R$ 72.000,00, sendo que ambas continham o mesmo
objeto, qual seja, contratação de serviço para publicação de atos oficiais.
Consoante pontuou o Parquet em sua inicial: “Nenhum dos processos de licitação
possuía qualquer diferença em seus respectivos objetos que forçasse a realização das
licitações em procedimentos distintos. Na verdade, o objeto de ambos era sucinta e
rigorosamente o mesmo.”
Nesses moldes, patente é o fracionamento dos valores do serviço com o fito de
burlar a lei de licitação, esquivando-se da modalidade licitatória adequada (fls. 211 e
235) prevista no art. 23, II “a” da Lei 8666/93.
O parágrafo quinto do art. 23 da lei 8666/93 repudia expressamente tal atitude
excetuando, apenas as hipóteses autorizadas em lei, nos seguintes moldes:
“Art. 23, § 5o, Lei 8666/93: É vedada a utilização da modalidade
"convite" ou "tomada de preços", conforme o caso, para parcelas de uma mesma obra ou serviço, ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente, sempre que o somatório de seus valores caracterizar o caso de "tomada de preços" ou "concorrência", respectivamente, nos termos deste artigo, exceto para as parcelas de natureza específica que possam ser executadas por pessoas ou empresas de especialidade diversa daquela do executor da obra ou serviço.”
Por outro lado, a comissão de licitação, na pessoa da sua presidente (1ª ré),
encaminhou convites às mesmas empresas (Editora Nova Friburgo LTDA, Deara
Organização Jornalística LTDA e Ejoran Editora de Jornais Revistas e Agencia de
Notícias – 3ª ré), contrariando determinação legal expressa.
Ditas sociedades eram sediadas em Nova Friburgo e em Nova Iguaçu. Ressaltou,
ainda, o d. representante do Ministério Público, que duas das sociedades convidadas
sequer possuíam sede no Município de Macaé ou nas proximidades a fim de justificar o
convite a elas.
Apurou-se, ainda, que existiam outros jornais que circulavam em Macaé e não
foram convidados a participar da licitação. Consoante pontuou a d. Procuradora de
Justiça (fls. 654): “Na região, circulam atualmente, além do diário O Debate, o
jornal O Diário, Macaé News, Jornal Diário da Costa do Sul e Folha da
Manhã. Há ainda o periódico Expresso Regional. Inclusive o jornal A
Folha da Manhã circula pelo Município há mais de 25 anos, não
havendo explicação para serem convidadas a participar do certame duas
empresas jornalísticas sediadas em municípios distantes, como os de
Friburgo e Nova Iguaçu, mormente se levarmos em consideração que o
apelante Sylvio Teixeira, em razão do término do seu mandato, arguiu
pressa para a prática do ato ímprobo.”
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Constatou-se, por fim, que não foi apresentada qualquer proposta por parte das
sociedades convidadas, senão a apresentada pela 3ª ré.
Demais, inexiste prova do cumprimento do disposto no art. 22, §§ 3º e 6º da Lei
8666/93 pela ré (art. 333, II, CPC), que assim determinam:
Art. 22, Lei 8666/93
§ 3o Convite é a modalidade de licitação entre interessados do
ramo pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados em número mínimo de 3 (três) pela unidade administrativa, a qual afixará, em local apropriado, cópia do instrumento convocatório e o estenderá aos demais cadastrados na correspondente especialidade que manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas da apresentação das propostas.
(...)
§ 6o Na hipótese do § 3
o deste artigo, existindo na praça mais
de 3 (três) possíveis interessados, a cada novo convite, realizado para objeto idêntico ou assemelhado, é obrigatório o convite a, no mínimo, mais um interessado, enquanto existirem cadastrados não convidados nas últimas licitações.
Noutras palavras, não houve competição, violando-se o fim maior da licitação,
que é o de selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração Pública.
Tais fatos restaram incontroversos nos autos, bem assim, foram apurados em
demanda anterior que julgou fatos conexos a estes (ação n° 0019839-
15.2006.8.19.0028).
A conduta dos réus está objetivamente caracterizada no art.10 da Lei 8429/94
como ato de improbidade que causa prejuízo ao Erário. Transcreva-se a norma:
Seção II Dos Atos de Improbidade Administrativa que Causam Prejuízo ao
Erário
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (...)
VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;
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Subsidiariamente, prevê o art. 11 da Lei 8429/92, que constitui ato de
improbidade a conduta que atenta contra os princípios da Administração Pública,
notadamente o da moralidade e honestidade.
Seção III Dos Atos de Improbidade Administrativa que Atentam Contra os
Princípios da Administração Pública
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
Sobre tal conduta ímproba, confira-se as lições do d.Emerson Garcia2:
“ Dentre as formas mais comuns de dispensa (lato sensu) indevidade
licitação, tem-se o fracionamento de determinado objeto em múltiplos
contratos administrativos , de modo que cada um deles não atinja o
limite previsto no art.24, I e II da lei 8666/93, sem que haja justificativa
para tanto (...), quando em verdade, se busca beneficiar apadrinhados
em nítida violação ao princípio da moralidade. “
Consigne-se, finalmente, que os réus são partes legítimas tendo em vista o atuar
do 1° e 2° réus no fracionamento e direcionamento da licitação, bem assim o
favorecimento da 3° ré, sociedade eleita para firmar contrato com a Administração
Pública.
Apurou-se que os procedimentos licitatórios iniciaram-se por meio da chefia do
gabinete do prefeito (1º réu), sendo que o mesmo assinou os contratos e homologou o
resultado das licitações.
Confira-se a análise das provas feita pelo d. Julgador a quo (fls.403/404):
“As fls. 34/39, o Convite de n° 929/2000, que atesta terem os dois
primeiros, réus iniciado licitação na modalidade convite, á ser realizada
no dia 11/12/2000 às 10 horas. Do Convite de n° 930/2000, acostado às
fls. 58/63; data e hora de realização da segunda licitação: 11/12/2000,
10 horas e 30 minutos. Os anexos de fls. 40 e 64 comprovam que o
preço de ambos monta a R$ 70.000,00 (setenta mil reais). Destes
mesmos anexos o objeto ligado ao certame licitatório publicação: de
atos oficiais. Dessarte, não há qualquer razoabilidade, seja de ordem
econômica, seja de ordem técnica no fracionamento do certame
licitatório.
A soma dos valores elevaria o montante a R$ 140.000, 00 (cento e
quarenta mil reais). Sabe-se que a modalidade legal para licitações em
que o objeto ultrapassa R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) é a tomada de
preços. A razão desta normativa é cristalina: maior sacrifício
patrimonial por parte do Poder Público, maior controle na seleção dos
2 Garcia, Emerson. Improbidade administrativa/Emerson Garcia e Rogerio Pacheco Alves. 6ª ed, ver e
ampl. e atualizada – Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
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interessados. Não é por outra razão que a Lei n2 8.42/92 considera a
frustração da licitude do processo licitatório ato de improbidade,
causador, de prejuízo ao Erário, conforme redação do 'artigo 10, inciso
VIII daquela lei. Consigne-se que tal conduta configura desvio de
finalidade, porquanto visa burlar os mecanismos de controle da
Administração nas contratações com particulares, tendo por escopo
direcionar o resultado da licitação a determinado parceiro.”
Consoante pontuou o d. Julgador a quo: “A segunda ré, por sua vez, calca sua
defesa na alegação de que não praticou qualquer ato decisório nos processos
administrativos indigitados. Das cartas - convite acostadas aos autos consta a
assinatura da Sra.Simone Quaresma bem como seu carimbo. Neste, a informação de
que esta ré preside “Comissão Permanente de Licitação”. Ostentando tal encargo;
inimaginável que possa a pessoa encarregada das licitações se eximir de
responsabilidade de certame que haja - atuado enquanto Presidente de Comissão.”
Consigne-se que o art. 51, §3º da Lei 8666/93 dita a responsabilidade dos
membros das Comissões de licitação prevendo que estes “responderão solidariamente
por todos os atos praticados pela Comissão, salvo se posição individual divergente
estiver devidamente fundamentada e registrada em ata lavrada na reunião em que tiver
sido tomada a decisão.”
A Lei 8429/92 consigna que suas disposições são aplicáveis a todo aquele que
“induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob
qualquer forma direta ou indireta”.
Ressalte-se que o fracionamento indevido da licitação é conduta há muito
rechaçada pela jurisprudência dos Tribunais Superiores e enquadrada como prática de
ato de improbidade.
Ademais, nesses casos, entende-se que o prejuízo à Administração Pública é in re
ipsa, porquanto notoriamente, ao conduzir-se irregularmente uma licitação, frustrando a
competição que lhe é inerente, impossibilita-se a contratação da proposta mais vantajosa
ao Erário.
Confira-se os precedentes do Eg. STJ:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. OFENSA AO ART.
535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. FRACIONAMENTO DE OBJETO
PARA PROVOCAR DISPENSA. PREJUÍZO AO ERÁRIO IN RE
IPSA. ART. 334, INC. I, DO CPC. FATO NOTÓRIO SEGUNDO
REGRAS ORDINÁRIAS DE EXPERIÊNCIA. INQUÉRITO CIVIL.
VALOR PROBATÓRIO RELATIVO. CARGA PROBATÓRIA DE
PROVA DOCUMENTAL. AUTENTICIDADE DOS DOCUMENTOS
OBTIDOS NA FASE PRÉ-JUDICIAL NÃO QUESTIONADA.
SUFICIÊNCIA DOS ELEMENTOS PROBANTES.
1. Trata-se, na origem, de ação civil pública para provocar a
declaração de nulidade de contrato administrativo, com conseqüente
reparação de danos, em razão de ter havido fracionamento de objeto licitado
com o objetivo de permitir a dispensa de licitação.
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2. O acórdão recorrido entendeu que a irregularidade estava provada,
mas que não haveria como se anular o contrato para garantir o ressarcimento,
uma vez que não existiria, nos autos, prova de efetivo prejuízo ao erário.
Além disso, a origem fundamentou descartou a caracterização de prejuízos
por ter havido prestação do serviço contratado.
3. (...)
5. No mais, é de se assentar que o prejuízo ao erário, na espécie
(fracionamento de objeto licitado, com ilegalidade da dispensa de
procedimento licitatório), que geraria a lesividade apta a ensejar a
nulidade e o ressarcimento ao erário, é in re ipsa, na medida em que o
Poder Público deixa de, por condutas de administradores, contratar a
melhor proposta (no caso, em razão do fracionamento e conseqüente
não-realização da licitação, houve verdadeiro direcionamento da
contratação).
6. Além disto, conforme o art. 334, incs. I e IV, independem de prova
os fatos notórios.
7. Ora, evidente que, segundo as regras ordinárias de experiência
(ainda mais levando em conta tratar-se, na espécie, de administradores
públicos), o direcionamento de licitações, por meio de fracionamento do
objeto e dispensa indevida de procedimento de seleção (conforme
reconhecido pela origem), levará à contratação de propostas
eventualmente superfaturadas (salvo nos casos em que não existem outras
partes capazes de oferecerem os mesmos produtos e/ou serviços).
8. Não fosse isto bastante, toda a sistemática legal colocada na Lei n.
8.666/93 e no Decreto-lei n. 2.300/86 baseia-se na presunção de que a
obediência aos seus ditames garantirá a escolha da melhor proposta em
ambiente de igualdade de condições.
9. Dessa forma, milita em favor da necessidade de procedimento
licitatório precedente à contratação a presunção de que, na sua
ausência, a proposta contratada não será a economicamente mais viável
e menos dispendiosa, daí porque o prejuízo ao erário é notório.
Precedente: REsp 1.190.189/SP, de minha relatoria, Segunda Turma, DJe
10.9.2010.
10. Despicienda, pois, a necessidade de prova do efetivo prejuízo
porque, constatado, ainda que por meio de inquérito civil, que houve
indevido fracionamento de objeto e dispensa de licitação injustificada
(novamente: essas foram as conclusões da origem após análise dos autos), o
prejuízo é inerente à conduta. Afinal, não haveria sentido no esforço de
provocar o fracionamento para dispensar a licitação se fosse possível,
desde sempre, mesmo sem ele, oferecer a melhor proposta, pois o peso
da ilicitude da conduta, peso este que deve ser conhecido por quem se
pretende administrador, faz concluir que os envolvidos iriam aderir à
legalidade se esta fosse viável aos seus propósitos.
11. Por fim, o inquérito civil possui eficácia probatória relativa para
fins de instrução da ação civil pública. Contudo, no caso em tela, em que a
prova da irregularidade da dispensa de licitação é feita pela juntada de notas
de empenho diversas, dando conta da prestação de serviço único, com claro
fracionamento do objeto, documentos estes levantados em inquérito civil,
não há como condicionar a veracidade da informação à produção da prova
em juízo, porque tais documentos não tiveram sua autenticidade contestada
pela parte interessada, sendo certo que, trazidos aos autos apenas em juízo,
não teriam seu conteúdo alterado.
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12. Recurso especial parcialmente provido.
(REsp 1280321/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL
MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/03/2012, DJe
09/03/2012)
ACP. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. Trata-se de ação civil
pública (ACP) ajuizada na origem pelo MP estadual por ato de improbidade
na contratação de serviço de transporte público para alunos, de modo
fracionado, em três períodos, quando já havia a dimensão do serviço por
todo o ano letivo. Segundo a sentença condenatória, esse fracionamento
em períodos sucessivos deu-se para haver dispensa da modalidade de
licitação de tomada de preços e possibilitar a licitação por convite. Daí o
juiz considerar nulas as licitações e condenar o ex-prefeito e demais corréus
por prática de ato de improbidade, nos termos do art. 11, I, da Lei n.
8.429/1992 (LIA), aplicando-lhes ainda multa civil. No entanto, o tribunal a
quo reformou essa decisão, excluindo os honorários advocatícios da
condenação dos corréus, bem como afastou a multa ao fundamento de não
haver pedido específico do MP. Para a Min. Relatora, esse fundamento não
pode ser mantido, visto que, em se tratando de ACP por ato de improbidade
administrativa, o magistrado não fica adstrito aos pedidos formulados pelo
autor. Foi por esse mesmo motivo que o juiz tipificou as condutas dos
agentes em dispositivo diverso daquele apontado pelo Parquet. Nesses casos,
assevera que, segundo a jurisprudência, basta que o autor faça uma descrição
genérica dos fatos e imputação dos réus, sem necessidade de descrever, em
minúcias, os comportamentos e as sanções devidas de cada agente (jura novit
curia e da mihi factum dabo tibi ius). Quanto às penas aplicadas aos agentes
ímprobos, ressalta também a jurisprudência que o magistrado não está
obrigado a aplicar cumulativamente todas as penas previstas no art. 12 da
citada lei, podendo, mediante fundamentação, fixá-las e dosá-las segundo a
natureza e as consequências da infração. Observa, outrossim, que, no caso
dos autos, o tribunal a quo afirmou estar comprovada a existência do dano, o
que não comporta reexame. Também afirma com base em precedentes da
Turma que a falta da notificação prevista no art. 17, § 7º, da citada lei não
invalida os atos processuais ulteriores, salvo se ocorrer efetivo prejuízo. Por
essa razão, a Turma não proveu o recurso do ex-prefeito e proveu o recurso
do MP apenas para restabelecer as multas civis. Precedentes citados: REsp
658.389-MG, DJ 3/8/2007; REsp 631.301-RS, DJ 25/9/2006; REsp 507.574-
MG, DJ 8/5/2006; REsp 825.673-MG, DJ 25/5/2006; REsp 964.920-SP, DJe
13/3/2009; REsp 944.555-SC, DJe 20/4/2009; REsp 680.677-RS, DJ
2/2/2007, e REsp 619.946-RS, DJ 2/8/2007. REsp 1.134.461-SP, Rel. Min.
Eliana Calmon, julgado em 3/8/2010.
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL
PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FRACIONAMENTO
DE COMPRAS. BURLA À LEI DE LICITAÇÕES. ART. 11 DA LEI
8.429/1992. CONFIGURAÇÃO DO DOLO GENÉRICO.
PRESCINDIBILIDADE DE DANO AO ERÁRIO. COMINAÇÃO DAS
SANÇÕES. ART. 12 DA LIA. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E
PROPORCIONALIDADE. SÚMULA 7/STJ.
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1. A caracterização do ato de improbidade por ofensa a princípios da
administração pública exige a demonstração do dolo lato sensu ou genérico.
Precedentes.
2. O ilícito previsto no art. 11 da Lei 8.249/1992 dispensa a prova de
dano, segundo a jurisprudência desta Corte.
3. Modificar o quantitativo da sanção aplicada pela instância de
origem enseja reapreciação dos fatos e da prova, obstado nesta instância
especial (Súmula 7/STJ).
4. Recurso especial não provido.
(REsp 1323503/SC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA
TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe 05/08/2013).
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO POPULAR.
DISPENSA ILEGAL DE LICITAÇÃO. FRACIONAMENTO DE
CONTRATO ADMINISTRATIVO. REVISÃO.
MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ. RECURSO
ESPECIAL. ALÍNEA "C". NÃO DEMONSTRAÇÃO DA DIVERGÊNCIA.
1. Hipótese em que o Tribunal a quo consignou que, "no caso dos
autos, conforme se verifica dos documentos que acompanharam a inicial a
fls. 13/50, bem como os contratos de prestação de serviços de fls. 97/102,
que juntos totalizaram o montante de CR$ 7.477.057, 17 (sete milhões,
quatrocentos e setenta e sete mil, cinquenta e sete cruzeiros reais e dezessete
centavos), valor que supera, em muito, o limite previsto na lei". Afirma
ainda que se trata "efetivamente de vistoso ladeamento do princípio
constitucional e legal que veda o fracionamento do contrato administrativo
para se furtar a obrigatoriedade do procedimento licitatório fora das
hipóteses legalmente previstas ". A revisão desse entendimento implica
reexame de fatos e provas, obstado pelo teor da Súmula 7/STJ.
2. A divergência jurisprudencial deve ser comprovada, cabendo a
quem recorre demonstrar as circunstâncias que identificam ou assemelham
os casos confrontados, com indicação da similitude fática e jurídica entre
eles. Indispensável a transcrição de trechos do relatório e do voto dos
acórdãos recorrido e paradigma, realizando-se o cotejo analítico entre
ambos, com o intuito de bem caracterizar a interpretação legal divergente. O
desrespeito a esses requisitos legais e regimentais (art. 541, parágrafo único,
do CPC e art. 255 do RI/STJ) impede o conhecimento do Recurso Especial,
com base na alínea "c" do inciso III do art. 105 da Constituição Federal.
3. Recurso Especial não provido.
(REsp 1354581/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
SEGUNDA TURMA, julgado em 19/02/2013, DJe 07/03/2013)
Configurado o ato de improbidade praticado pelos réus, passa-se à análise das
penas impostas pelo Julgador a quo:
O art. 12 da Lei de Improbidade prevê diversas cominações a serem aplicadas
isolada ou cumulativamente àquele que comete ato de improbidade. In casu,
enquadrando-se o ato de improbidade no art. 10, VIII da Lei 8429/93, a norma dispõe
que:
“Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas
previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de
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improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas
isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato:
II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda
dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se
concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão
dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil
de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o
Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou
creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de
pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco
anos;
Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará
em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito
patrimonial obtido pelo agente.”
In casu, o d. Sentenciante, estabeleceu a pena de pagamento de multa civil no
valor correspondente à quantia despendida com as publicações nº 929 e 930, acrescida
de correção monetária na forma da lei, condenação que se mantém. Pontue-se que a
pena se reverterá em proveito do Município, a teor do que dispõe o art.18 da Lei
8429/93.
Quanto às demais cominações da lei, cuja aplicabilidade constituem objeto de
recurso do Ministério Público, merece parcial reforma a r.sentença adequando as
sanções à gravidade do caso concreto, bem assim, com o fim de prevenir nova
ocorrência do mesmo ilícito patrimonial contra a Administração Pública.
Assim sendo, aplico aos réus a pena de proibição de contratar com o Poder
Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou
indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio
majoritário, pelo prazo de cinco anos.
A gravidade do ato praticado pelos 1° e 2° réus merece, ainda, a sanção de
suspensão dos direitos políticos, por 5 anos, como forma de repressão e prevenção de
novos ilícitos. Os autos demonstram que os réus não merecem a confiança neles
depositada para a gestão da coisa pública.
Consoante afirmou a d. Procuradora de Justiça, nas palavras do d. Emerson
Garcia: “não existe um salvo-conduto para que o agente público possa dilapidar o
patrimônio público com a prática de atos irresponsáveis e completamente dissociados
da redobrada cautela que deve ele ter presente ao administrar o patrimônio alheio”.
Nesse sentido, os seguintes precedentes do Eg. STJ:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92. LESÃO A PRINCÍPIOS
ADMINISTRATIVOS. AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO. APLICAÇÃO
DAS PENALIDADES. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE.
VIOLAÇÃO DO ART. 535, I e II, DO CPC. NÃO CONFIGURADA.
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1. O caráter sancionador da Lei 8.429/92 é aplicável aos agentes públicos
que, por ação ou omissão, violem os deveres de honestidade, imparcialidade,
legalidade, lealdade às instituições e notadamente: a) importem em
enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário público (art. 10); c)
atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11) compreendida
nesse tópico a lesão à moralidade administrativa.
2. A exegese das regras insertas no art. 11 da Lei 8.429/92, considerada a
gravidade das sanções e restrições impostas ao agente público, deve se realizada
cum granu salis, máxime porque uma interpretação ampliativa poderá acoimar de
ímprobas condutas meramente irregulares, suscetíveis de correção administrativa,
posto ausente a má-fé do administrador público, preservada a moralidade
administrativa e, a fortiori, ir além de que o legislador pretendeu.
3. A má-fé, consoante cediço, é premissa do ato ilegal e ímprobo e a
ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere
os princípios constitucionais da Administração Pública coadjuvados pela má-
intenção do administrador.
4. À luz de abalizada doutrina: "A probidade administrativa é uma forma
de moralidade administrativa que mereceu consideração especial da Constituição,
que pune o ímprobo com a suspensão de direitos políticos (art. 37, §4º). A
probidade administrativa consiste no dever de o "funcionário servir a
Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem
aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de
outrem a quem queira favorecer". O desrespeito a esse dever é que caracteriza a
improbidade administrativa. Cuida-se de uma imoralidade administrativa
qualificada. A improbidade administrativa é uma imoralidade qualificada pelo
dano ao erário e correspondente vantagem ao ímprobo ou a outrem(...)." in José
Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, 24ª ed., São Paulo,
Malheiros Editores, 2005, p-669.
5. Ação Civil Pública ajuizada por Ministério Público Estadual em face de
membros de Comissão de Licitação, realizada sob a modalidade de convite para a
aquisição de um trator agrícola, um arado, uma grade hidráulica e uma roçadeira,
e das empresas habilitadas no mencionado certame, objetivando a condenação
dos réus nas sanções previstas no art. 12 da Lei 8429/92 pela prática de
irregularidades em procedimento licitatório, qual seja, habilitação de empresas à
míngua de apresentação de documentos exigidos pelo edital.
6. O Tribunal local, revisitando os fatos que nortearam o ato acoimado de
improbidade, deu parcial provimento ao recurso interposto pelos membros da
comissão de licitação, apenas, para afastar o ressarcimento ao erário, mantendo
incólume a condenação no que pertine à perda da função pública, à suspensão dos
direitos políticos por três anos, ao pagamento de multa civil, calculada sobre
cinco vezes o valor da remuneração percebidas pelos agentes públicos à data do
fato, além da proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou
incentivos fiscais, creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio
de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos, fixada
pela sentença exarada às fls. 136/142, bem como proveu o recurso apresentado
pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais para condenar as empresas
com supedâneo no art. 3º da Lei 8429/92, consoante se infere do voto-condutor
do acórdão às fls. 235/245.
7. O elemento subjetivo é essencial à caracterização da improbidade,
afastado pelo Tribunal a quo na sua fundamentação, por isso que incidiu em error
in judicando ao analisar o ilícito somente sob o ângulo objetivo, consoante se
infere do voto condutor às fls. fls. 235/245.
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8. A lei de improbidade administrativa prescreve no capítulo das penas que
na sua fixação o “juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o
proveito patrimonial obtido pelo agente.” (Parágrafo único do artigo 12 da lei nº
8.429/92).
9. In casu, a ausência de dano ao patrimônio público e de enriquecimento
ilícito por parte dos membros da comissão de licitação e das empresas
contratadas, tendo em vista a efetiva entrega dos equipamentos licitados,
reconhecidos pelo Tribunal local à luz do contexto fático delineado nos autos,
revelam a desproporcionalidade das sanções impostas às partes, ora recorrentes.
Precedentes do STJ:REsp 626.204/RS, DJ 06.09.2007; MS 10.826/DF, DJ
04.06.2007; REsp 717375/PR, DJ 08.05.2006 e REsp 514820/SP, DJ 06.06.2005.
(...)
(REsp 831178 / MG, RECURSO ESPECIAL 2006/0059673-2, Relator(a)
Ministro LUIZ FUX (1122), Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA, Data do
Julgamento 25/03/2008, Data da Publicação/Fonte DJe 14/05/2008)
AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92.
VIOLAÇÃO DOS DEVERES DE MORALIDADE E IMPESSOABILIDADE.
CONTRATAÇÃO MEDIANTE CARTA-CONVITE PELO MUNICÍPIO DE
EMPRESAS AS QUAIS FAZIAM PARTE O VICE-PREFEITO E O IRMÃO
DO PREFEITO, PESSOAS IMPEDIDAS DE LICITAR. LESÃO À
MORALIDADE ADMINISTRATIVA QUE PRESCINDE DA EFETIVA
LESÃO AO ERÁRIO. SANÇÕES POLÍTICO-ADMINISTRATIVAS
COMPATÍVEIS COM A INFRAÇÃO. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE.
1. A Ação de Improbidade Administrativa. Explicitação do cânone do art.
37, § 4º da Constituição Federal. A Ação de Improbidade tem como escopo impor
sanções aos agentes públicos que pratiquem atos de improbidade nos casos em
que: a) importem em enriquecimento ilícito (art.9º); b) que causem prejuízo ao
erário público (art. 10); c) que atentem contra os princípios da Administração
Pública (art. 11), aqui também compreendida a lesão à moralidade administrativa.
2. Preliminar de julgamento extra-petita. Os recorrentes foram demandados
em Ação de Improbidade, sede em que vários fatos foram invocados como
incidentes na citada Lei 8.429/92. Assim os réus defenderam-se dos fatos,
competindo ao juízo a qualificação jurídica dos mesmos.
Aliás, é cediço que a qualificação jurídica dos fatos é dever de ofício do
Juízo, por isso iura novit curia. Consectariamente, essa qualificação não integra a
causa petendi e seu ajuste na decisão à luz da demanda inicial não significa
violação da regra da congruência, consubstanciada nos artigos 128 e 460 do CPC.
Nesse sentido é lição de Barbosa Moreira, in O Novo Processo Civil Brasileiro,
1995, p. 20-21.
Deveras, as multifárias ações administrativas que se enquadram no novel
diploma, transmudam o pedido de adequação das mesmas, aos fatos previstos,
como nítida ação fungível, podendo o juízo, ao decidir, impor sanção aliud
porém minus.
3. A ausência de dano ao erário público não obsta a aplicação das sanções
previstas na Lei 8.429/92. Inteligência do art. 21.
O enriquecimento ilícito a que se refere a Lei é a obtenção de vantagem
econômica através da atividade administrativa antijurídica.
O enriquecimento previsto na Lei 8.429/92 não pressupõe lucro ou
vantagem senão apropriação de qualquer coisa, ainda que proporcional ao
trabalho desenvolvido, mas viciado na sua origem.
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O fruto do trabalho, como de sabença, nem sempre é lícito, gerando o
enriquecimento ilícito à luz da mens legis.
Deveras, a transgressão à moralidade administrativa in casu restou patente
porquanto, tanto quanto se pode avaliar na estreita esteira de cognição do E.
S.T.J, a participação na licitação de pessoas impedidas de fazê-lo é o quanto basta
para incidir a regra do art. 11 da Lei.
Outrossim, a adequação da conduta ao cânone legal, impede o arbítrio
judicial que exsurgiria acaso a imputação derivasse do conceito subjetivo de
moralidade plasmado pelo Poder Judiciário.
In casu, uma conduta objetiva e incontroversa dos réus frustrou a licitude
da concorrência com a participação das pessoas impedidas encerrando ato
ímprobo im re ipsa.
4. A participação de empresas em licitação pública, que tem como sócio
majoritário o Vice-Prefeito do Município, Secretário de Obras. Lesão aos
princípios da impessoalidade e moralidade administrativa (art. 11, da Lei
8.429/92).
5. Condutas que recomendam o afastamento no trato da coisa pública,
objetivo aferível pela manutenção das sanções político-administrativas
consistentes na inabilitação para contratar com a Administração Pública.
6. Recurso parcialmente provido, para aplicar a regra prevista no art. 12, III
da Lei 8.429/92, imputando-se a multa civil em 10 vezes o valor da remuneração,
excluindo-se o ressarcimento do dano ao erário e seus consectários e mantendo a
suspensão dos direitos políticos, assim como a inabilitação para contratar com o
Poder Público, pelo prazo de 03 (três) anos, como forma de obtemperar a sanção.
(REsp 439280 / RS RECURSO ESPECIAL 2002/0063492-4, Relator(a)
Ministro LUIZ FUX (1122), Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA, Data do
Julgamento 01/04/2003 Data da Publicação/Fonte DJ 16/06/2003 p. 265)
Nesse diapasão, resta prejudicado os recursos dos réus no sentido de afastar
a sanção determinada na r. sentença.
Inclua-se o nome dos réus no Cadastro Nacional dos Condenados por Ato de
Improbidade Administrativa (CNCIAI) nos moldes do Aviso TJ/CGJ n° 22/20133 e
Resolução 172/2013 do Conselho Nacional de Justiça.
Por tais razões, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO AOS RECURSOS
DO 1°, 2° e 3° RÉUS e DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DO
MINISTÉRIO PÚBLICO para condenar os réus na pena de proibição de contratar
com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios,
direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja
sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos e para suspender os direitos políticos
do 1° e 2° réus pelo prazo de cinco anos, mantendo-se, no mais, a r. sentença.
Rio de Janeiro, 24 de setembro de 2013.
Desembargador ROBERTO DE ABREU E SILVA – Relator
3 As informações necessárias à atualização dos dados deverão ser lançadas pelo Presidente do Órgão
Colegiado de qualquer instância prolator da decisão condenatória por ato que implique inelegibilidade, ao
final da sessão de julgamento.
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