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UIVERSIDADE CÂDIDO MEDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SESU ISTITUTO A VEZ DO MESTRE AS DEMADAS AUTÔOMAS DE IMPUGAÇÃO EM FACE DE DECISÕES TRASITADAS EM JULGADO OS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS Por: Luciana Rosa Malagrici Orientador Prof. Jean Alves Rio de Janeiro 2009

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U�IVERSIDADE C�DIDO ME�DES

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SE�SU

I�STITUTO A VEZ DO MESTRE

AS DEMA�DAS AUTÔ�OMAS DE IMPUG�AÇÃO EM FACE DE DECISÕES

TRA�SITADAS EM JULGADO �OS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

Por: Luciana Rosa Malagrici

Orientador

Prof. Jean Alves

Rio de Janeiro

2009

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U�IVERSIDADE C�DIDO ME�DES

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SE�SU

I�STITUTO A VEZ DO MESTRE

AS DEMA�DAS AUTÔ�OMAS DE IMPUG�AÇÃO EM FACE DE DECISÕES

TRA�SITADAS EM JULGADO �OS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

Apresentação de monografia ao Instituto A Vez do Mestre –

Universidade Cândido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em Direito Processual Civil

Por: Luciana Rosa Malagrici

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AGRADECIME�TOS

Aos meus pais, sempre.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a todos aqueles que, de alguma

forma, colaboraram para sua elaboração.

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RESUMO

O presente artigo trará uma analise à vedação legal quanto à utilização da ação rescisória nos

Juizados Especiais Cíveis, bem como a possibilidade de admissibilidade da ação anulatória,

querella nullitatis e mandado de segurança contra decisões proferidas por aquele juízo.

Assim, identificará e explicitará tais institutos, seus conceitos e hipóteses de admissibilidade,

bem como procedimentos e competências. A partir desta análise, trará também a posição

jurisprudencial sobre o tema e as controvérsias existentes. Pretende-se, assim, compreender

quais seriam as formas de impugnações autônomas adequadas e possíveis diante o

procedimento previsto na Lei 9099/95. Ressalte-se, ainda, que para tal será inicialmente

analisado o instituto da coisa julgada, seus efeitos e conseqüências nas relações jurídicas

envolvidas e a possibilidade de reavaliação judicial. Portanto, objetiva demonstrar as formas

de combate a decisões que, pela análise fria da lei, seriam imutáveis, podendo prejudicar a

existência e validade de direitos inerentes àquelas relações jurídicas.

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METODOLOGIA

A coleta de dados se deu através de livros doutrinários pesquisados na biblioteca da EMERJ,

da Universidade Estácio de Sá e do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, pesquisa

de acórdãos através da Internet, nos sites do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro,

Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, ou outros endereços eletrônicos

pertinentes, bem como pesquisa de artigos publicados em revistas de direito. O que se deseja é

trazer possibilidades de soluções para as controvérsias existentes sobre o tema.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08 CAPÍTULO I - A coisa julgada 10 CAPÍTULO II - Da ação rescisória II.1 - Conceito, previsão legal, competência e procedimento 12 II.2- Do cabimento da ação rescisória em face de sentenças transitadas em julgado perante os Juizados Especiais Cíveis 24 CAPÍTULO III – Da ação anulatória III.1 - Conceito, previsão legal, competência e procedimento 25

III.2 - Do cabimento da ação anulatória em face de decisões proferidas perante os Juizados Especiais Cíveis 29

CAPÍTULO IV - Da querella nullitatis IV.1 - Conceito, previsão legal, competência e procedimento 32

IV.2 - Do cabimento da querella nullitatis em face de sentenças transitadas em julgado

perante os Juizados Especiais Cíveis 33 CAPÍTULO V – Do mandado de segurança V.1 - Conceito, previsão legal, competência e procedimento 35 V.2 - Do cabimento do Mandado de Segurança em face de decisões interlocutórias proferidas no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis 42 V.3 - Do cabimento de Mandado de Segurança em face de decisões já transitadas em julgado perante os Juizados Especiais Federais 46 CONCLUSÃO 49

BIBLIOGRAFIA 51

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I�TRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo analisar os meios possíveis de impugnação de

decisões transitadas em julgado proferidas em sede de Juizados Especiais Cíveis.

Inicialmente faz-se necessário tratar do instituto da coisa julgada, abordando suas

características e efeitos em relação às decisões judiciais. Inicialmente cabe esclarecer que, em

que pese a segurança jurídica prestigiada pelo instituto, tal não deverá se sobrepor à

ilegalidade e inconstitucionalidade de algumas decisões.

Assim, verificar-se-á que, diante de uma decisão judicial transitada em julgado que

afronta a ordem jurídica, existirá meios de impugná-la, ainda que ultrapassados prazos e

oportunidades recursais.

O Código de Processo Civil vigente prevê como meio de impugnação de sentenças de

mérito transitadas em julgado a ação rescisória. Ressalte-se, contudo, que tal espécie de ação

autônoma somente é admitida em determinadas situações taxativamente narradas no artigo

485 do diploma processualista pátrio.

Tais hipóteses objetivam, na sua maioria, evitar que sentenças de mérito

inconstitucionais ou contrárias às leis ou à veracidade dos fatos tornem-se imutáveis ad

eternum prejudicando, assim, direitos inerentes àquelas relações jurídicas.

Além da ação rescisória cabível em face de sentença de mérito transitada em julgado

quando ocorrer algumas das hipóteses previstas no dispositivo legal supracitado, o Código

Processual Civil também trás a previsão da ação anulatória em seu artigo 486, a qual é

cabível, em tese, em face de decisões proferidas no curso do processo que não dependem de

sentença, ou ainda, em face de sentença meramente homologatórias.

Há ainda uma terceira forma de impugnação de sentenças transitadas em julgado, que

não encontra previsão legal no ordenamento pátrio, trazida pela jurisprudência e doutrina, que

é através da querella nullitatis. Trata-se igualmente de uma ação autônoma que vem sendo

admitida em casos nos quais não há previsão legal para aplicação da ação rescisória.

Resta, ainda, a suscitar a aplicabilidade do mandado de segurança como forma de

impugnação de manifestação jurisdicional, comumente utilizado junto ao procedimento da Lei

9099/95.

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Assim, cabe analisar a aplicabilidade destas formas autônomas de impugnação com o

fim de estabelecer hipóteses de admissibilidade perante o procedimento previsto na Lei

9099/95, bem como trazer as posições doutrinárias e jurisprudenciais sobre o tema.

Este artigo contém quatro sessões, contendo esclarecimentos quanto à coisa julgada e

seus efeitos, à ação rescisória, à ação anulatória, à querella nullitatis e ao mandado de

segurança.

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I - DA COISA JULGADA

Tem-se como coisa julgada o efeito de imutabilidade que recai sobre a decisão da qual

não cabe mais qualquer espécie de recurso, impondo, pois, um estado de irrevogabilidade e

irretratabilidade.

Neste sentido, tem-se que a coisa julgada pode ser material quando julga o mérito da

causa, tornando a matéria decidida imutável naquela ou em outra lide; ou formal, quando

decide a causa sem, contudo julgar o mérito, tornando-se imutável naquele processo,

permitindo-se, porém, que a matéria volte a ser analisada em outra lide.

Tal efeito que recai sobre as decisões judiciais recebe proteção constitucional, na

forma do art. 5º, inciso XXXVI.1

A melhor interpretação do dispositivo constitucional leva a entender que pretendeu o

legislador impedir que lei posterior infraconstitucional venha alterar o condão da decisão

judicial já transitada em julgado, de modo a resguardar direitos já deferidos ou afastados nas

relações jurídicas, preservando a irretroatividade daquela. Não objetivou o legislador

constitucional impedir a revisão destas decisões, podendo, inclusive, haver normas

infraconstitucionais delineando a matéria, como ocorre com o Código de Processo Civil.

Espera-se, assim, que a sentença que se tornou imutável atenda à legalidade, à

moralidade, à razoabilidade e à verdade dos fatos, bem como aos preceitos constitucionais.

Ocorre que é possível que a decisão judicial venha a deixar de atender a alguns desses

critérios. Diante disso, em que pese a proteção à ordem e à segurança jurídica pretendida pelos

efeitos da coisa julgada, há que se analisar possibilidades de reavaliação destas decisões.

Nesse contexto, tem-se que a coisa julgada não está imune de impugnação. Assim, o

legislador, bem como doutrinadores e a jurisprudência, criaram métodos de reavaliação e

revisão destas decisões contrárias ao ordenamento jurídico e a verdade dos fatos.

As formas autônomas de impugnação de decisões transitadas em julgado são a ação

rescisória, prevista no art, 485 do CPC; a ação anulatória prevista no art. 486 do CPC e a

querella nullitatis, esta última trazida pela doutrina e jurisprudência. Cabe analisar, ainda, o

papel do mandado de segurança como sucedâneo recursal.

1 Art. 5º, inciso XXXVI. A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.

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II. DA AÇÃO RESCISÓRIA

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II.1. Conceito, previsão legal, competência e procedimento

Contra uma sentença cabe a interposição de recurso, visando a sua reforma ou

anulação, ou, se já transitada em julgado, ação autônoma de impugnação, in casu, a ação

rescisória.

O que caracteriza o recurso é ser, na lição de Pontes de Miranda, uma “impugnativa

dentro da mesma relação jurídica processual da resolução judicial que se impugna”.

Só cabem recursos, outrossim, enquanto não verificado o transito em julgado da

sentença. Operada a coisa julgada, a sentença torna-se imutável e indiscutível para as

partes do processo (Código de Processo Civil, art. 467).

[...] O recurso visa a evitar ou minimizar o risco de injustiça do julgamento único.

Esgotada a possibilidade de impugnação recursal, a coisa julgada entra em cena para

garantir a estabilidade das relações jurídicas, muito embora corra o risco de

acobertar alguma injustiça latente no julgamento. Surge, por último, a ação rescisória

que colima reparar a injustiça da sentença transita em julgado, quando o seu grau de

imperfeição é de tal grandeza que supere a necessidade de segurança tutelada pela

res iudicata.2

Assim, tendo transitado em julgado a sentença, a forma de impugnação será diversa do

recurso.

A ação rescisória é tecnicamente ação, portanto. Visa a rescindir, a romper, a cindir

a sentença como ato jurídico viciado. Conceituam-se Bueno Vidigal e Amaral Santos

como “ação pela qual se pede a nulidade da sentença”. Assim, hoje, não se pode

mais por em dúvida que a rescisória “é ação tendente à sentença constitutiva. ·

Em que pese a ação rescisória visar a revisão de decisão já proferida, não se trata de

espécie de recurso, mas sim de uma ação autônoma, de processo e procedimento próprio. Tem

por objeto a desconstituição de um provimento jurisdicional de mérito transitado em julgado.

2 HUMBERTO, Theodoro Júnior. Curso de Direito Processual Civil – Teoria Geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 778.

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Conforme ensina o Alexandre Câmara,3 a ação rescisória não visa anular a sentença,

conforme normalmente e equivocadamente é dito pela doutrina e jurisprudência, ela objetiva

sim a rescisão da decisão. A sentença, quando transitada em julgado, além da imutabilidade e

irrecorribilidade, experimenta também o efeito sanatório de invalidades. Uma vez transitada

em julgado a sentença, todos os vícios que poderiam gerar sua anulação ou anulabilidade são

sanados pela eficácia sanatória geral da coisa julgada.

“A sentença rescindível, mesmo nula como a classificavam vários doutores, produz os

efeitos da res iudicata e apresenta-se exeqüível enquanto não revogada pelo remédio próprio

da ação rescisória”.4

Na verdade, porém, não se trata nem de sentença nula nem de sentença anulável, mas

de sentença que, embora válida e plenamente eficaz, porque recoberta da coisa

julgada, pode ser rescindida. Rescindir, em técnica jurídica, não pressupõe defeito

invalidante. È simplesmente romper ou desconstituir ato jurídico, no exercício da

faculdade assegurada pela lei ou pelo contrato (direito potestativo).

[...]

Nessa ordem de idéias, o Código Buzaid agiu com melhor técnica, substituindo a

afirmativa do Estatuto anterior de que “é nula” a sentença rescindível (art. 798) pela

de que “a sentença de mérito transitada em julgado pode ser rescindida” nas

hipóteses que menciona o art. (485). Aboliu-se, assim, a imprópria qualificativa de

sentença “nula” à decisão suscetível de revogação em ação rescisória.5

E, ainda:

A rescindibilidade, que autoriza a ação rescisória, nos termos do art. 485, não se

confunde com a nulidade da sentença. A rescisória, portanto, não supõe sentença

nula, mas ao contrário, sentença válida, que tenha produzido a coisa julgada.

Rescindir, ensina Pontes de Miranda, não é decretar nulidade, nem anular; é partir,

partir até em baixo, cindir. Vale dizer: é desconstituir o ato até então válido e eficaz.

A sentença é nula ipso iure quando a relação processual em que se apóia acha-se

contaminada de igual vício. Para reconhecê-lo não se reclama a ação rescisória,

3 CÂMARA, Alexandre Freitas. Ação rescisória. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 36/37. 4 MIRANDA, Pontes de. Comentários ao código de processo civil, 2ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1960, v. X, p. 149, apud, HUMBERTO, Theodoro Júnior. Curso de Direito Processual Civil – Teoria Geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 778. 5 Ibid., p. 779.

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posto que dita ação pressupõe coisa julgada que, por sua vez, reclama, para sua

configuração, a formação e existência de uma relação processual válida.6

Ensina Liebman:

[...] Todo e qualquer processo é adequado para constatar e declarar que um julgado

meramente aparente é na realidade inexistente e de nenhum efeito. A nulidade pode

ser alegada em defesa contra quem pretende tirar da sentença um efeito qualquer;

assim como pode ser pleiteada em processo principal, meramente declaratório.

Porque não se trata de reformar ou anular uma decisão defeituosa, função esta

reservada privativamente a uma instância superior (por meio de recurso ou ação

rescisória); e sim de reconhecer simplesmente como de nenhum efeito um ato

juridicamente inexistente.7

O art. 485 do Código de Processo Civil enumera as hipóteses passíveis de ensejar a

revisão do julgado através de ação rescisória, sendo elas: prevaricação, concussão ou

corrupção do juiz; sentença proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente;

resultar de dolo pela parte vencedora em detrimento da parte vencida ou coluio entre elas para

fraudar a lei; quando ofender coisa julgada; violar literal disposição legal; quando a sentença

se fundar em prova comprovadamente falsa; quando a parte obtiver documento novo que

poderia lhe dar julgamento favorável; houver fundamento para invalidar confissão, desistência

ou transação; a sentença for fundada em erro de fato resultantes de atos e documentos da

causa.

Tem-se, pois, que a ação rescisória visa atacar sentença de mérito que contenham

vícios graves de formação, não bastando o descontentamento da parte sucumbente ou a

alegação de injustiça da decisão. O rol do art. 485 do CPC é, pois, taxativo, não permitindo

dilações. Vale ressaltar que apesar do dispositivo supracitado mencionar somente sentenças,

permite-se esta espécie de ação também em face de acórdãos que julgaram o mérito da causa.

Alexandre Câmara admite ainda que o provimento judicial a ser rescindido seja

inclusive uma decisão interlocutória onde se tenha julgado o mérito, como, por exemplo, uma

6 Ibid., p. 806. 7Apud, HUMBERTO, Theodoro Júnior. Curso de Direito Processual Civil – Teoria Geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 807.

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decisão saneadora em que se reconheça a decadência ou prescrição de um dos pedidos,

continuando o feito em relação aos demais.8

Assim, desde que tenha julgado o mérito da causa, na forma do art. 269 do CPC, cabe

esta espécie de ação. Pontes de Miranda, contudo, admitia a ação rescisória em face também

de decisões terminativas, na forma do art. 267 do CPC, alegando que a expressão “de mérito”

aludida no art. 485 do CPC seria mero erro de redação. 9

Por sentença de mérito devem-se entender, aquelas proferidas nas hipóteses

taxativamente enumeradas pelo art. 269, isto é, as que solucionam por inteiro o

objeto do processo, fato que ocorre quando:

I – o juiz acolhe ou rejeita o pedido do autor;

II – o réu reconhece a procedência do pedido;

III – as partes transigem;

IV – o juiz pronuncia a decadência ou prescrição;

V – o autor renuncia o direito sobre que se funda a ação.

Na técnica processual moderna, o mérito da causa é a própria lide, ou seja, o fundo

da questão substancial controvertida.

Em outras palavras, a conceituação carneluttiana define a lide como “o conflito de

interesses qualificado pela pretensão de um dos litigantes e pela resistência do outro.

O julgamento desse conflito de pretensões, mediante o qual o juiz, acolhendo ou

rejeitando o pedido, dá razão a uma das partes e nega-se à outra, constitui uma

decisão definitiva de mérito”.10

Necessário, pois, que o pronunciamento jurisdicional atacado tenha analisado o mérito

da causa.

Vale mencionar posicionamento já manifestado pelo Supremo Tribunal Federal,

admitindo ação rescisória em face de decisão que negou seguimento a agravo de instrumento,

apreciando o mérito da causa julgado no recurso extraordinário.11

Neste sentido:

8 Ibid., p.56/57. 9 MIRANDA, Pontes apud CÂMARA, Alexandre Freitas. Ação rescisória. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.p.57 10 HUMBERTO, Theodoro Júnior. Curso de Direito Processual Civil – Teoria Geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 780. 11 STF, AR nº 1.154-6, SP, Rel. Min. Moreira Alves.

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STF, AR nº 1.154-6 – SP, Rel. Min. Moreira Alves, ac. De 15.03.84, in RT 593/241.

“Em princípio, as decisões proferidas em agravo de instrumento não examinam o

mérito da questão, o que constitui, em tese, óbice previsto no art. 485 do CPC ao

cabimento da rescisória. Contudo, se a decisão proferida constitui autêntico exame

de mérito, de forma que, deferida ou indeferida a pretensão, não resta outra

providência, pondo o decisum fim ao processo, contra ela cabe, evidentemente, ação

rescisória”. (1º TACiv. SP, AR nº 380.002, Rel. Juiz Bruno Netto, ac. De 10.08.88,

in RT, 634/92) 12

Aduz, ainda, HUMBERTO THEODORO JUNIOR:

É que nem sempre é possível fazer-se o enquadramento da sentença nos permissivos

do art. 485. Mas, se houve erro in iudicando no acórdão, o apelante sofreu violento

cerceamento do direito de obter a revisão da sentença de mérito, pela via normal da

apelação, que é muito mais ampla do que a da rescisória.

Tendo-se em vista a instrumentalidade do processo e considerando-se que o error in

iudicando, embora de natureza simplesmente processual, afetou diretamente uma

solução de mérito, entendo que, nessa hipótese excepcional, a mens legis deve ser

interpretada como autorizadora da ação rescisória, a fim de que, cassada a decisão

ilegal do Tribunal, se possa completar o julgamento de mérito da apelação, cujo

trancamento se deveu a flagrante negação de vigência de direito expresso.13

São legítimos para ajuizar a ação rescisória quem foi parte no processo anterior, ou

sucessor; terceiro interessado e o Ministério Público (art. 487 do Código de Processo Civil).

Quanto ao tema, traz BARBOSA MOREIRA:

Pelo TJ de Sergipe foi decido que “na ação rescisória só é parte legítima aquele para

quem ou contra quem a sentença faz coisa julgada; se o autor não contestou a ação

de usucapião, nela não tendo tomado parte nem a título de terceiro interessado, é

parte ilegítima para rescindir tal sentença” (Ac. De 21.08.68, in Revista Forense,

230/210). Por terceiro juridicamente interessado só de pode entender aquele que,

não sendo parte no feito, tem com uma delas um vinculo jurídico dependente do

direito debatido e submetido à coisa julgada. O interesse do terceiro, para autorizar a

propositura da ação rescisória, tem de ser o de restaurar o direito subjetivo negado à

parte vencida, porquanto sem essa restauração não terá condições de exercer o seu

12 HUMBERTO, Theodoro Júnior. Curso de Direito Processual Civil – Teoria Geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 781.

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direito (não envolvido no processo) contra a parte sucumbente. Se o direito do

terceiro pode ser discutido, contra a parte vencedora ou contra o vencido, sem

embargo da coisa julgada, por inexistir dependência jurídica entre as duas relações,

caso não será se ação rescisória. O terceiro discutirá sua pretensão pelas vias

ordinárias. Para admitir a rescisória promovida por terceiro exige-se um inter-

relacionamento entre a situação jurídica decidida pela sentença e a invocada por

este, de tal modo que não tenha “perante o direito material, fundamento para

recompor a situação anterior por meio de ação própria” (STJ, Resp. 10,220/SP, Rel.

Min. Sálvio de Figueiredo, ac. De 23.06.92, in DJU de 03.08.92, p. 11.322).14

Sobre a legitimidade atribuída ao Parquet:

O Ministério Público também é legitimado para promover a rescisória quando for

parte no processo da sentença rescindenda, já que a legitimação que se lhe dá para

determinado pedido é a mesma que o permite pleitear a rescisão.

[...]

Mesmo não sendo causa que reclame sua intervenção, o Ministério Público pode

pedir a rescisão da sentença, quando houve colusão das partes, com o fim de fraudar

a lei (art. 487, III, b). O processo simulado, fraudulento ou não, atenta contra suas

finalidades e, conseqüentemente, contra interesses de ordem pública, revelados no

processo.15

Ressalte-se ainda que o direito do autor de rescindir a decisão atacada decai no prazo

de dois anos, na forma do art. 495 do Diploma Processual pátrio.

Insta salientar que, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal:

Não basta distribuir ou protocolizar a petição no prazo do art. 495. É preciso que o

autor promova a citação do réu dentro de tal prazo, segundo dispõe o art. 219, §2º,

c/c o art. 220. Mas promover, para o autor, não é sinônimo de realizar, posto que a

realização do ato citatório não lhe compete, mas sim aos órgãos auxiliares do juízo,

encarregados da comunicação processual. Se o autor cumpriu tudo que lhe cabia

para que a diligência fosse realizada no prazo, e o atraso decorreu apenas do

aparelhamento judiciário, não se há de cogitar de decadência da ação rescisória. Só

quando a demora decorre de ato dependente do autor (preparo, transporte,

13 Ibid., p. 781. 14 Ibid., p. 792/793. 15 SANTOS. Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil. Volume 3. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p.739.

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fornecimento de endereço, etc.) é que o efeito da citação não retroagirá à data do

despacho que a deferiu (STF, Pleno, AR 1030, Rel. Min. Moreira Alves, ac. De

07.10.81, in RTJ, 103/485).16

Segundo SANTOS:

Ainda por inspiração de princípios de ordem pública, a ação rescisória só pode ser

proposta no prazo de dois anos, contados do trânsito em julgado da decisão (art.

495). O trânsito em julgado ocorre sempre que a sentença não mais está sujeita a

recurso ordinário e extraordinário (art. 467). Mas, para contagem do prazo, ter-se-á

por sentença transita toda aquela que foi considerada sob eficácia da coisa julgada,

ainda que contra o indeferimento do recuso tenha havido agravo, julgado

improcedente. Assim, se a apelação foi indeferida por intempestividade e de tal

decisão agravou o apelante, não sendo provido o agravo, o transito em julgado vai

ser considerado em sua data efetiva, como se recurso não houvesse.17

O Código de Processo Civil é silente quanto à competência para processar e julgar a

ação rescisória. Contudo, apreciando a Carta Magna e suas previsões legais sobre o tema,

conclui-se que serão competentes os Tribunais para apreciar ação rescisória movida em face

de decisões proferidas por seus juízos hierarquicamente inferiores, bem como em face de seus

próprios julgados.

Deve ser sempre observado que a decisão que gera a análise da competência deve ser

aquela que julgou o mérito da causa, e não aquelas, por exemplo, que negam conhecimento e

seguimento a recurso.

Em relação aos efeitos, insta dizer que a ação rescisória não suspende a execução da

decisão a ser rescindida.

Neste sentido:

A ação rescisória, não sendo recurso, não está sujeita a nenhum efeito devolutivo

que provoque o reexame de questões de fato e de direito julgadas na sentença

16Apud, HUMBERTO, Theodoro Júnior. Curso de Direito Processual Civil – Teoria Geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 780. 17 SANTOS. Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil. Volume 3. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p.758/759.

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rescindenda. Trata-se de nova ação e, como tal, tem fundamentação diversa do

processo onde se proferiu a sentença a se rescindir.

[...]

A doutrina e a jurisprudência têm-se orientado no sentido de a execução pode ser

suspensa, mas como efeito de antecipação de tutela, conforme prevista no art. 273 do

Código de Processo Civil, isto é, quando se fundar em prova inequívoca e

verossimilhança. A medida provisória n. 1.798-5, de 2 de junho de 1999, porém,

acrescentando artigo à Lei n. 8.437, de 30 de junho de 1992, estabeleceu: “Art. 4º -

A. Nas ações rescisórias propostas pela União, Estados, Distrito Federal e

Municípios, bem como pelas autarquias e fundações instituídas pelo Poder Público,

caracterizada a plausibilidade jurídica da pretensão, poderá o tribunal, a qualquer

tempo, conceder medida cautelar para suspender os efeitos da sentença

rescindenda”. Isso equivale a dizer que, em tais hipóteses, enquanto persistir a

medida ou se se transformar em lei, para a suspensão da execução e outros efeitos,

bastam o fumus boni iuris e periculum in mora. A MP n. 1.798-5, no entanto, perdeu

a eficácia e a M.P. n. 2.180-35, que acrescentou os artigos à Lei 8.437-92, não

repetiu o dispositivo.18

Quanto ao procedimento a ser respeitado para o ajuizamento da ação rescisória,

inicialmente prevê o art. 488 do diploma processual que a petição inicial deve conter os

mesmos requisitos previstos no art. 282, ressaltando-se que além dos fatos a serem narrados

na causa de pedir, deve o autor indicar em quais dispositivos no art. 485 baseia sua pretensão,

bem como delimitar a decisão que se pretende rescindir.

Em relação ao pedido, cabe salientar que, tendo em vista a correlação estrita entre este

e a sentença, caso o autor deseje o juízo de rescisório, ou seja, que seja proferido novo

julgamento à causa, deve obrigatoriamente cumular este pedido com aquele referente ao juízo

rescindente, não havendo o que se falar em pedido implícito.

Muito se discutiu, no regime do código anterior, sobre a possibilidade de cumulação

de judicium rescindens com o judicium rescissorium. O novo estatuto pôs fim à

controvérsia, criando não apenas a faculdade, mas instituindo a obrigatoriedade de

cumular o autor, em sua petição inicial, as duas pretensões, isto é, a de rescisão da

sentença e a de nova solução para a causa, em seu mérito, sempre que for o caso.

Aliás, na prática, só há três hipóteses em que a cumulação não ocorrerá: a) a de

ofensa à coisa julgada (art. 485, nº IV), onde a ação rescisória apenas desconstituirá

18 Ibid., p.739.

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a sentença impugnada; b) a de juiz peitado (art. 485, nº I); c) a de juiz impedido ou

absolutamente incompetente (art. 485, nº II); porque, nos últimos casos, toda a

instrução do processo será anulada e o feito terá de ser renovado em primeira

instância.19

Conforme SANTOS:

Na ação rescisória, conforme se disse, se contém o iudicium rescindens e o iudicium

rescissorium. Pelo primeiro, a sentença (ou o acórdão) simplesmente se rescinde,

desconstitui-se como ato, perdendo todos os seus efeitos. Em razão do segundo,

novo julgamento da causa, cuja sentença se rescindiu, se faz necessário, motivo pelo

qual mister se faz que o pedido seja também expresso neste sentido.20

Afirma, ainda, que:

A cumulação de pedidos é dispensável, quando a conseqüência da rescisão vem a ser

exatamente a declaração de improcedência do pedido que fora julgado procedente.

Se o autor da ação pleiteia rescindir sentença que julgou procedente o pedido de

divórcio, implicitamente se entende que sua pretensão é a declaração de

improcedência do próprio pedido.21

Contudo, conforme dito acima, não é esse o entendimento dominante, devendo sempre

constar, na ação rescisória, os dois pedidos de forma expressa.

O pedido que se pode cumular ao da rescisão é apenas o de novo julgamento da

causa. Não se comporta, na rescisória, pedido específico de condenação à devolução

de coisa, dinheiro, indenização por serviço prestado, etc., quando já tiver havido

execução de sentença ou acórdãos rescindendos. Mas, na consideração de que,

declarada a rescisão do ato jurídico judicial, tudo volta ao estado anterior, o iudicium

rescissorium poderá gerar efeitos secundários que também autorizam a execução.22

19 Ibid., p. 793. 20 SANTOS. Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil. Volume 3. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p.759. 21 Ibid., p. 762. 22 SANTOS. Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil. Volume 3. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p.762.

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Insta dizer que antes de o deferimento da inicial, há que ser realizado, pelo

demandante, o depósito de quantia correspondente a 5% sobre o valor da causa, a título de

multa (art. 488, II, do CPC), caso o pedido seja declarado incabível ou improcedente.

Quanto à produção probatória, pode o autor requer o que entender de direito, contudo,

salienta-se que a instrução probatória somente diz respeito ao juízo rescindente, cabendo ao

juízo rescisório julgar a causa pelas provas já produzidas pelo juízo que proferiu a decisão

atacada, salvo na hipótese no art. 485, VII, que permitirá ao juízo analisar a nova prova

atinente ao direito invocado.

Ao proferir o cite-se, o Tribunal determinará o prazo de resposta, podendo variar entre

15 e 30 dias. Na resposta poderá o réu contestar ou apresentar exceção, ressaltando que esta

última somente pode se referir a suspeição ou impedimento e nunca à incompetência relativa,

vez que na ação rescisória qualquer forma de incompetência será absoluta.

Já quanto a possibilidade de reconvenção, há divergência doutrinária, admitindo-se

que somente caberia reconvenção se através desta objetivasse o réu rescindir outra parte da

mesma sentença atacada pelo autor. Para outros doutrinadores, contudo, admite-se tal instituto

ainda que a sentença seja outra, desde que oriunda de processos ao menos conexos.

Após a resposta do réu abre-se prazo para as partes informarem as provas que

pretendem produzir, devendo o juiz sanear o feito, podendo o relator, através de decisão

monocrática, extinguir o feito sem resolução do mérito, na forma do art. 267 do Código de

Processo Civil, ou ainda reconhecer decadência. Contudo, havendo julgamento do mérito,

deve a decisão ser proferida pelo colegiado. Ressalte-se que a produção de prova ocorrerá

perante a primeira instância na forma do art. 492 do diploma processual.

Com a apresentação de alegações finais, o feito será remetido a julgamento perante o

Tribunal competente, na forma do art. 493, ressalvando a intimação do Ministério Público

para elaboração de parecer.

Passa-se, então, ao julgamento da lide.

Na ação rescisória o julgamento se mostra, de certa forma, fragmentado, ou seja, em

etapas.

Em uma primeira oportunidade, será examinada a admissibilidade da ação. Após, será

analisado o mérito propriamente dito, rescindo ou não a decisão atacada (judicium rescindens)

e, por fim, a realização de novo julgamento da matéria objeto da sentença rescindida (judicium

rescissorium).

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Acolhendo o pedido, a decisão do tribunal pode completar-se com a simples

desconstituição da sentença, como ocorre no caso de violação da res iudicata (art.

485, nº IV). O mero judicium rescindens exaure, assim, a prestação jurisdicional,

restaurando a autoridade da primeira sentença transita em julgado.

Em outros casos, rescindida a sentença, permanece pendente a questão de mérito do

processo em que a decisão impugnada foi proferida. Cumpre, então, ao tribunal

completar o julgamento, decidindo-a, também, através do judicium rescissorium (art.

494).

[...]

No judicium rescindens, é constitutiva a decisão que acolhe o pedido, pois cria

situação jurídica nova, ao desfazer a autoridade da coisa julgada. A que o julga

improcedente é de natureza declaratória (negativa), pois limita-se a declarar a

inexistência do motivo legal para desconstituir a sentença impugnada.

No judicium rescissorium, o pronunciamento do tribunal substitui a sentença

primitiva e terá, naturalmente, a mesma natureza dela, se coincidir com o seu teor.

Mas poderá ser de sentido contrário, hipótese em que as respectivas naturezas serão

diversas. A decisão do tribunal, destarte, poderá assumir todas as feições

admissíveis, quais sejam: declaratória, constitutiva ou condenatória, conforme a

prestação jurisdicional apresentada às partes.23

Julgada a admissibilidade da ação rescisória, passa ao juízo rescindente e enfim ao

juízo rescisório.

Quantos aos efeitos da decisão:

Os efeitos próprios das sentenças constitutivas, no comum, operam ex nunc, isto é, a

partir do momento em que a decisão transita em julgado. No caso específico da ação

rescisória, as conseqüências, todavia, poderão ser as mais diversas, já que a sentença

primitiva, até ser rescindida, teve plena eficácia. 24

Da decisão proferida na ação rescisória cabe a oposição de embargos de declaração e

infringentes, bem como a interposição de recurso especial e extraordinário, dentro das

hipóteses legais. Logicamente, por tratar-se de feito de competência originária do Tribunal,

não cabe apelação.

23 Ibid., p. 797. 24 Ibid., p. 763

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Cabe analisar, ainda, a possibilidade de ajuizamento de ação rescisória contra decisão

proferida em ação rescisória anterior.

É importante notar, porém, que a rescisória de rescisória não pode se apresentar

como simples reiteração da matéria decidida na ação anterior. A pretensão de atacar

o acórdão que julgou a primeira ação rescisória somente terá cabimento se algum

dos fatos mencionados no art. 485, incisos I a IX, do CPC, tiver ocorrido na relação

processual da ação rescisória antecedente. Fora daí, inadmissível será o ataque ao

julgado de uma ação rescisória por meio de nova demanda da mesma natureza.25

E, ainda, SANTOS:

Os fundamentos da nova rescisória não podem ser a mera reapreciação do que se

decidiu na primeira, mas devem ser inerentes à motivação que decorre dela própria.

Se, na rescisória, por exemplo, decidiu-se que houve literal violação de lei, a

rescisão não pode fundamentar-se na necessidade de reapreciação do motivo, mas

sim em outra causa particular do julgamento e nele não levada em conta. Um

exemplo esclarece: o acórdão proferido em ação rescisória pode ser objeto de nova

rescisória se, nela, atuou juiz impedido. Não poderá, porém, o impedimento do juiz

da sentença da primeira causa voltar, como fundamento de novo pedido, quando da

rescisória já foi objeto de apreciação.26

II.2. Do cabimento da ação rescisória em face de sentenças transitadas em julgado perante os

Juizados Especiais Cíveis

Na forma do art. 59 da Lei 9099/95, não se admite a utilização da ação rescisória

contra sentenças proferidas pelos Juizados Especiais. Assim, havendo casos de

rescindibilidade da sentença, esta somente poderá ser atacada por outras demandas autônomas

de impugnação.

25 Ibid., p. 800. 26 Ibid., p.753.

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Alexandre Câmara27 justifica que a mens legis da negativa de aplicação da ação

rescisória trazida na Lei 9099/05 tem como fundamento a competência para seu julgamento.

Conforme estabelecido na Constituição Federal, os Tribunais são sempre os competentes para

julgar estas demandas, nos moldes do julgamento do recurso de apelação. Ocorre que no

sistema dos Juizados Especiais, o julgamento de recurso é feito perante as Turmas Recursais,

que são órgãos de primeira instância. Assim, não havendo qualquer espécie de revisão de

julgados pelo Tribunal, o processamento e julgamento de ação rescisória nos moldes

estabelecidos na Carta Magna restaria prejudicado.

Ressalta, ainda, que há apenas uma hipótese em que uma sentença proferida no âmbito

dos Juizados Especiais Cíveis poderá ser rescindida através de ação rescisória, quando o

julgamento de primeira instância for revisto pelo Supremo Tribunal Federal através do exame

de recurso extraordinário. Conforme o art. 102, inciso I, alínea j, da Carta Magna28, cabe ação

rescisória a ser ajuizada perante a Corte Suprema para revisão de seus próprios julgados.

Ocorre que não se pode admitir que em prol da segurança jurídica e na vedação legal,

sentenças afrontosas ao ordenamento pátrio e com graves vícios sejam impossibilitadas de

serem revistas, tornando-se imutável ad eternum.

Diante disso, deve ser analisadas outras forma de impugnação de tais decisões.

III. DA AÇÃO ANULATÓRIA

III.1. Conceito, previsão legal, competência e procedimento

27 CÂMARA, Alexandre Freitas. Juizados especiais cíveis e federais: uma abordagem crítica. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 158/159 28 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988

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O art. 486 do Código de Processo Civil prevê a ação anulatória como forma autônoma

de impugnação de atos que não dependem de sentenças, bem como em face daqueles

meramente homologatórios.

O que se pretende não é a impugnação ao ato jurisdicional propriamente dito, mas sim

o direito material manifestado pelas partes que ensejaram o determinado ato no processo

judicial. Assim, restando analisado o vício no ato de direito material praticado pelas partes o

caminho será o da ação prevista no art. 486 do CPC.

Não há que se confundir com os fundamentos que ensejam o ajuizamento da ação

rescisória:

[...] os fundamentos de invalidação dos atos praticados pelas partes em juízo são os

mesmos de quaisquer atos de direito material. Não coincidem, assim, com os

fundamentos do art. 485. mas também não se limitam, de qualquer sorte, às

invalidações regidas pelo direito civil (...). Também as regras de direito público

podem ser fundamentadas para identificar vício de ato praticado pela parte em juízo

(...). Todas as leis regentes do direito processual civil podem dar supedâneo à

invalidação de atos praticados pelas partes no plano do processo [...] 29

Diante de tais considerações, tem-se que, na verdade, a ação anulatória não se presta a

afrontar a decisão judicial em si, mas sim e na verdade o ato praticado pelas partes. Através

dela o demandante busca reconhecer ato praticado no processo, já findo ou em trâmite, seu ou

de outra parte, que considera com algum vício e que acabou por ser considerado apto a surtir

efeito pelo Poder Judiciário.

Dois são os atos que podem ser objeto desta forma de impugnação autônoma: os atos

que independem de sentença e aqueles que são meramente homologatórios.

Os primeiros são considerados quaisquer atos praticados no processo, como Carlos

Barbosa Moreira afirma: “a outorga de poderes em procuração passada nos autos, a renúncia

ao direito de recorrer, a aceitação expressa da decisão, a desistência de recurso e, de modo

geral, as declarações de vontade das partes, uniletarais ou bilaterais que sejam”30.

Quanto aos atos meramente homologatórios, trata-se de meros atos de manifestação do

Poder Judiciário para confirmar vontade das partes. Não são considerados atos do magistrado

29 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. 5. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 405/406.

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julgador, pois, nestes, a decisão judicial somente teve o caráter formal analisado, apenas, e tão

somente, a formalidade extrínseca do mesmo. Não houve, em momento algum, o

questionamento da situação meritória homologada.

Diferentemente do que ocorre com a ação rescisória, na qual o que se pretende é

exatamente a reforma da decisão atacada, quanto ao seu mérito propriamente dito.

Ressalte-se que tais sentenças não são passíveis de embasar a ação rescisória haja vista

a inexistência de coisa julgada material, salvo na hipótese prevista no inciso VIII do art. 485

do CPC. Nestes casos, caberá ação rescisória de sentenças homologatórias de reconhecimento

do pedido, de renúncia ou transação.

A doutrina traz, como diferença principal entre tais institutos, o momento processual

em que poderão ser usados pelos demandantes. Se a decisão ou o ato impugnado foi praticado

no curso do processo, a ação a ser formalizada será a anulatória, prevista no art. 486 do CPC,

vez que para a ação rescisória faz-se necessário o trânsito em julgado da decisão.

Contudo, resta analisar que não é somente o momento de propositura da ação que

basta para demonstrar a diferença entre os institutos.

Quando a decisão impugnada não for de mérito e demonstrar-se com caráter

meramente homologatório, a única e exclusiva forma de impugnação será através da ação

anulatória, ainda que já tenha transitado em julgado, sob pena de inadequação da via eleita e

extinção do processo.

Controvérsias poderão existir e dificultar a aplicação dos institutos quando a decisão a

ser atacada acabou por homologar a transação entre as partes.

Há previsão, no art. 485, VIII, do CPC, pela aplicação da ação rescisória quando a

decisão extinguiu o feito, com análise de mérito, pela transação entre as partes. Ora, tratando-

se de mera decisão homologatória, o instituto a ser usado não seria o da ação anulatória?

O melhor entendimento é no sentido de que:

Importa, pois, para discernir uma de outra hipótese, constatar, na petição inicial

(especificamente da conjunção da “causa de pedir” e do “pedido”, v. ns. 6 e 7 do

Capítulo I da Parte II do Vol. 2, tomo I), a verdadeira pretensão do autor: se ele

pretender questionar, com sua nova investida jurisdicional, o ato tal qual praticado

com a outra parte no outro processo, cuja participação jurisdicional foi de cunho

homologatório, deve aplicar-se o art. 486; do contrário, se o objeto de

30 MOREIRA, Carlos Barbosa, apud BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual

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questionamento do ato for a própria decisão jurisdicional, em si mesma considerada,

a hipótese reclama a sua rescisão, com observância do disposto no art. 485.31

Cabe dizer que não há o que se falar em prazo de decadência, diverso do que ocorre na

ação rescisória, devendo ser aplicado o prazo previsto no direito material para cada hipótese.

A competência para processamento e julgamento da ação anulatória será do juízo onde

tramitou, ou ainda tramita, o processo no qual foi praticado o ato a ser anulado. Já o

procedimento, poderá ser sumário ou ordinário, dependendo do valor da causa.

No caso de a ação ser ajuizada incidentalmente, enquanto ainda tramita o processo

onde foi praticado o ato a ser anulado, a primeira ação será suspensa até o julgamento final da

ação anulatória. Quando já houve o trânsito em julgado na segunda hipótese, sendo julgada

procedente, ensejará o retorno do trâmite daquele processo a partir do ato impugnado, nos

moldes do art. 265, IV, do Código de Processo Civil, conforme leciona Alexandre Câmara 32.

A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro já se manifestou,

em diversos acórdãos, no sentido ser cabível recurso de apelação em face de sentença

meramente homologatória, desde que demonstrados vícios de consentimento na manifestação

de vontade das partes.33

No mesmo sentido, caso a sentença meramente homologatória eivada de vício na

manifestação da vontade das partes venha a transitar em julgado, poderá ser objeto de ação

anulatória. A jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro já

manifestou, ainda, no sentido de ser também cabível esta espécie de ação autônoma quando

existir qualquer vício no ato que impeça sua convalidação no tempo.

Há que se ressaltar também que a sentença meramente homologatória não produz coisa

julgada material, haja vista que não analisa o mérito da causa, em que pese ter previsão legal

no artigo 269 do Código de Processo Civil. Desta forma o meio adequado de impugná-las não

civil. 5. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 407. 31 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. 5. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 410. 32 CÂMARA, Alexandre Freitas. Ação rescisória. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 36/37. 33 A título de exemplo: TJ/RJ, 11ª Câmara Cível, Des. Jose C. Figueiredo, Julgamento em 21/11/2007: APELACAO CIVEL. Ementa: SENTENÇA DE EXTINÇÃO. ACORDO DE ALIMENTOS. NULIDADE DO ATO. VÍCIO DE VONTADE. INOCORRÊNCIA. Inexistindo, nos autos, prova de que a Apelante tenha sido levada a erro quando do acordo, não deve ser acolhido o pedido de declaração de nulidade da sentença homologatória. Autor que foi assistido por seu Patrono em audiência devidamente realizada, onde também se notava a presença do Ministério Público. Recurso Improvido.

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será através da ação rescisória, mas sim daquela prevista no artigo 486 do diploma

processual.34

III.2. Do cabimento da ação anulatória em face de sentenças meramente homologatórias

transitadas em julgado perante os Juizados Especiais Cíveis

A lei 9099/95, em seu artigo 41, veda expressamente a interposição de recursos em

face de sentenças homologatórias, em prol da autocomposição de conflitos prestigiada no

34 TJ/RJ, 10ª Câmara Cível, Des. Bernardo Moreira Garcez Neto, Julgamento em 07/11/2007, Apelação Cível 2007.001.35675: Ementa: Ato jurídico nulo. Transação em ação acidentária. Legitimidade ativa do Ministério Público. Nulidade decorrente da falta de atribuições para transigir do procurador autárquico. Imprescritibilidade da ação anulatória, uma vez que ato nulo não convalesce com o decurso do tempo. Decisão homologatória que, ainda que esteja equiparada a sentença de mérito, não tem autoridade de coisa julgada material. Possibilidade de rescisão, nos termos do artigo 486 do CPC. Preliminares rejeitadas. Recurso desprovido. TJ/RJ, 18ª Câmara Cível, Jds. Des. Pedro Freire Raguenet, Julgamento em 16/10/2007, Apelação Cível 2007.001.49887. Ementa: Anulatória de ato jurídico. Acordo homologado por sentença. Sentença reconhece nulidade do ato por vício de representação. Inconformismo. Preliminar de ilegitimidade ativa do Ministério Público. Possui o MP regular legitimidade para defesa de interesses sociais e individuais que sejam indisponíveis, como se verifica no caso presente. Inteligência do art. 127 da carta política vigente. Titulação à ação reconhecida e rejeição desta preliminar. Prescrição. Inocorrência. Se o ato hostilizado se revela como nulo, não admitindo convalidação, não se reconhece aplicação do instituto de preclusão ao mesmo. O comando do art. 269, inciso III do CPC não confere os efeitos de coisa julgada material às sentenças meramente homologatórias. Rejeição da preliminar. Mérito. Nulidade de ato jurídico que deve ser reconhecida diante do vício de representação constatado. Se o acordo foi celebrado, em nome do INSS, por quem não ostentava poderes regulamentares para tal, não se reconhece qualquer validade ao mesmo. Manutenção da sentença e improvimento do apelo. TJ/RJ, 20ª Câmara Cível, Des. Conceição Mousnier, Julgamento em 01/10/2007, Ação Rescisória nº 2007.006.00222. Ementa: Ação rescisória dirigida contra sentença proferida em sede de demanda indenizatória por danos materiais e morais, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, que extinguiu o feito na forma do art. 269, III do CPC. Entendimento desta Relatora quanto à inexistência dos requisitos ensejadores da ação rescisória. Consoante art. 486 do Tratado Processual Civil, as sentenças meramente homologatórias devem ser rescindidas mediante ação anulatória e não rescisória, incabível na espécie. EXTINÇÃO DO PROCESSO. TJ/RJ, 19ª Câmara Cível, Des. Vera Maria Soares Van Hombeeck, Julgamento em 12/06/2007, Apelação Cível nº 2007.001.24123. Ementa: PROCESSO CIVIL. SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA. APELAÇÃO. DESCONHECIMENTO. O termo de conciliação homologado por sentença e realizado na audiência de conciliação, prevista no art. 331 do CPC, tem natureza jurídica de transação e somente pode ser anulado mediante a ação anulatória prevista no art. 486 do CPC. TJ/RJ, 17ª Câmara Cível, Des. Lindolpho Morais Marinho, Julgamento em 15/03/2007, Agravo de Instrumento nº 2007.002.05427. Ementa: PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO. INEXISTÊNCIA DE RESOLUÇÃO DO MÉRITO DA CAUSA. AÇÃO RESCISÓRIA. VIA INADEQUADA. PROVIMENTO MONOCRÁTICO DO RECURSO DA AGRAVADA, DETERMINANDO-SE O RECEBIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL DE SUA DEMANDA. RAZÕES INVOCADAS PELO AGRAVANTE NESTE RECURSO QUE DEVEM SER TIDAS COMO PREJUDICADAS ANTE A REFORMA DA DECISÃO RECORRIDA. A sentença homologatória de transação, por externar a vontade das partes, não é resolutiva de mérito, devendo ser desconstituída por meio de demanda anulatória prevista no art. 486 do Código de Processo Civil. Tendo havido reforma liminar da decisão recorrida no Agravo de Instrumento nº 5.751/2007, interposto pela agravada, o presente recurso deve ser declarado prejudicado. Aplicação, à hipótese, do art. 557, do Código de Processo Civil.

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procedimento sumaríssimo através da audiência de conciliação, bem como diante da

renovação de tal possibilidade em sede de Audiência de Instrução e Julgamento. Tal se dá,

principalmente, em respeito aos princípios da celeridade e informalidade norteadores do

procedimento previsto na Lei 9099.

Em que pese a vedação legal, pode-se aferir de decisão proferida na jurisprudência do

Conselho Recursal Cível do Estado do Rio de Janeiro que, mutatis mutandi, havendo vício no

ato atacado, mais precisamente no acordo firmado entre as partes, seria admissível a

interposição de Recurso Inominado.35

Alexandre Câmara, contudo, em sua obra36, é estritamente legalista ao não admitir

qualquer espécie de recurso da sentença homologatória, diante da vedação legal trazida no art.

41 da Lei 9099/95. Porém, aduz que esta sentença poderá ser rescindida através da querella

nullitatis, já que vedado o ajuizamento de ação rescisória, nos termos do art. 59 da Lei

9099/95.

Ora, em que pese o brilhantismo da manifestação doutrinária, há que se ressaltar

algumas situações práticas. Se será admitida a rescisão da sentença homologatória viciosa

através da ação autônoma de impugnação após seu trânsito em julgado, não há que se impedir

a sua reanálise enquanto o processo estiver em trâmite, sob pena de se estar impondo ônus

excessivamente oneroso à parte, bem como contrário aos princípios norteadores dos Juizados

35 TJ/RJ, Conselho Recursal Cível, processo nº 2005.700.012474-9, Juiz (a) Ana Maria Carrapatoso Carvalho De Oliveira. Ementa: Recurso interposto pelo réu contra acordo homologado, às fIs. 14, sustentando a ilegitimidade da autora, a necessidade de realização de perícia e a insuficiência da defesa produzida pela Defensoria Pública que não se empenhou em garantir os interesses do recorrente. Dispõe o artigo 41, da Lei nº 9.099/95, a contrario sensu que da sentença homologatória de conciliação não caberá recurso. Recorrente que não comprova vício no acordo firmado. Ausência de interesse de recorrer. TJ/RJ, Conselho Recursal Cível, processo nº 2003.700.016550-4, Juiz (a) Carlos Gustavo Vianna Direito. Ementa: Recurso inominado - Nulidade da sentença Sentença que homologa acordo que não foi apresentado nos autos - Audiência de conciliação que restou infrutífera diante da impossibilidade de acordo entre as partes (fls. 81) - Processo que foi concluso ao juízo a quo para a designação de audiência de instrução e julgamento - Erro material com a prolação de sentença homologatória (fls. 87) - Nulidade Sentença que se cassa para que o processo tenha seu curso normal com a designação de audiência de instrução e julgamento - Recurso conhecido e provido. TJ/RJ, Conselho Recursal Cível, processo nº 2004.700.032151-6 Juiz (a) Eduardo Perez Oberg. Ementa: As partes realizaram acordo às fls.17 dos autos devidamente homologado pela autoridade judicial, fazendo tal acordo coisa julgada material - recurso da autora questionando o acordo feito - na forma do artigo 41, caput, da lei n° 9.099/95 não é cabível recurso de sentença homologatória, por expressa previsão legal - não há vício no acordo e deve ser respeitada a norma processual especial cogente. Isto posto, deixo de conhecer o recurso por falta de previsão legal, na forma do artigo 41, caput, da lei n° 9.099/95. Sem ônus sucumbenciais. 36 CÂMARA, Alexandre Freitas. Juizados especiais cíveis e federais: uma abordagem crítica. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 138/139.

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Especiais Cíveis, exigindo que a parte aguarde o trânsito em julgado da decisão para só então

impugná-la. Ressalte-se, ainda, os danos que a execução de um julgado vicioso pode gerar.

Mister se faz ressaltar ainda que, como bem salientado pela jurisprudência do nosso

Egrégio Tribunal, o meio adequado para a impugnação da sentença meramente homologatória

é a ação prevista no artigo 486 do diploma processual, e não a ação rescisória, nem mesmo a

querella nullitatis.

O Conselho Recursal Cível do Estado do Rio de Janeiro já se manifestou, em acórdão

publicado em 2003, no sentido de que não é admissível ação anulatória vez que possui a

mesma “roupagem” da ação rescisória, que é expressamente vedado na Lei 9099/95.37

Contudo, cabe analisar com cautela tal decisão. Sendo o artigo 59 uma restrição ao

direito da ampla defesa amparado pela Carta Magna, deve ser interpretado de forma restritiva.

Assim, a proibição legal quanto à ação rescisória não pode ser estendida às demais formas de

impugnação autônomas.

Salienta-se, ainda, que não há qualquer impedimento procedimental, vez que o juízo

competente para esta espécie de ação será o mesmo que proferiu a decisão atacada, ao

contrário da rescisória, que em regra é julgada pelo Tribunal de segunda instância que inexiste

em sede de Juizados Especiais Cíveis. Portanto, não haveria óbice legal ao ajuizamento da

ação anulatória em face de sentenças homologatórias proferidas no procedimento sumaríssimo

da Lei 9099/95.

37 TJ/RJ, Conselho Recursal Cível, processo nº 2003.700.018323-3, Juiz (a) Ana Maria Pereira De Oliveira. Ementa: Ação de conhecimento objetivando a declaração de nulidade de acórdão desta Turma Recursal, ao argumento de que a citada decisão estaria eivada de ilegalidade por ofensa ao princípio da reformatio in pejus quando da apreciação do recurso inominado interposto pelo Autor. Embora tenha o Autor atribuído à ação o nome de "ação anulatória", constitui a mesma autêntica ação rescisória não contemplada no sistema dos Juizados Especiais Cíveis, nos termos do que dispõe o artigo 59 da Lei 9.099/95. Por outro lado, a decisão impugnada não era irrecorrível porque contra ela eram admissíveis não só os embargos de declaração, não manejados pelo Autor, como o recurso extraordinário. Diante do exposto, voto no sentido de que seja indeferida a petição inicial, e, em conseqüência, seja julgado extinto o processo, sem apreciação do mérito (art. 267, inciso I c/c 295, inciso I e parágrafo único, inciso I do CPC). Sem custas, por ser o Autor beneficiário da gratuidade de justiça.

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IV. DA QUERELLA 8ULLITATIS

IV.1. Conceito, previsão legal, competência e procedimento.

Outra forma de impugnação autônoma de sentenças transitadas em julgado é a querella

nullitatis.

Segundo Alexandre Câmara38, tendo em vista o efeito sanatório da coisa julgada, não

há o que se falar em nulidade da sentença, mas sim rescindibilidade, que será alcançada tanto

38 CÂMARA, Alexandre Freitas. Ação rescisória. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 282.

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através da ação rescisória quanto da querella nullitatis. Assim, procurar-se-á, através desta

ação, a ineficácia de tais provimentos jurisdicionais.

A querella nullitatis tramitará pelo rito ordinário ou sumário, dependendo do valor da

causa. Ao contrário do que ocorre na ação rescisória, onde a competência é originária do

Tribunal de segunda instância, a querella nullitatis será julgada perante o juízo singular.

Inicialmente no direito brasileiro admitia-se esta espécie de ação quando caracterizado

vício ou inexistência de citação. Assim, independente do prazo previsto no artigo 495 do

Código de Processo Civil, poderia a parte lesada ajuizar a querella nullitatis objetivando

declarar nula a sentença. Ressalte-se que sem citação válida a relação jurídica não se constitui,

nem se valida, podendo ser declarada nula a sentença a qualquer tempo, bem como os demais

atos processuais.

Posteriormente passou a jurisprudência a admitir a querella nullitatis quando a

sentença tiver sido proferida em violação à norma constitucional. A primeira manifestação

jurisprudencial foi em relação às demandas onde já havia transitado em julgado a sentença

reconhecendo ou paternidade e com o avanço tecnológico advindo do exame de DNA, não

existente à época, pôde-se aferir resultado diverso.

A partir deste momento no direito brasileiro, iniciou-se a admissibilidade da querella

nullitatis em face de decisões transitadas em julgado contrárias às normas constitucionais.

Ressalte-se que esta ação somente deve ser utilizada quando não restar caracterizada

uma das hipóteses de admissibilidade da ação rescisória, conforme artigo 485 do diploma

processual brasileiro, ou quando já houver transcorrido o prazo decadencial de dois anos para

tal.

Não se pode admitir que decisões judiciais contrárias à Carta Magna se tornem

imutáveis apenas pelo decurso de prazo decadencial.

Portanto, a coisa julgada material passou a ser relativizada, admitindo-se sua

modificação ainda que após o prazo decadencial de rescindibilidade.

IV.2. Do cabimento da querella nullitatis em face de sentenças transitadas em julgado perante

os Juizados Especiais Cíveis.

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Diante da vedação legal quanto ao ajuizamento de ação rescisória em face de julgados

proferidos em sede de Juizados Especiais Cíveis, há quem defenda o cabimento da querella

nullitatis.

Entende-se que a querella nullitatis é perfeitamente cabível no procedimento

sumaríssimo previsto na Lei 9099/95, devendo ser, inclusive, utilizada não somente em casos

de sentenças afrontosas às normas constitucionais ou quando houver vício de citação, mas

também quando verificada qualquer das hipóteses previstas para o ajuizamento da ação

rescisória prevista no art. 485 do Código Processual Civil.

Cabe analisar o procedimento e julgamento da querella nullitatis perante os Juizados

Especiais.

Como já salientado, a competência para julgamento da querella nullitatis é do juízo de

primeira singular. Porém, conforme salienta Câmara39, trata-se de causa de extrema

complexidade jurídica, o que foge à competência dos Juizados Especiais. Neste diapasão,

deve ser julgada por uma das varas cíveis, remetendo o feito à livre distribuição.

Em que pese o ilustre ensinamento proferido pelo autor supracitado, cabe discordar no

sentido que nem sempre o objeto da querella nullitatis será de grande complexidade jurídica,

por exemplo a verificação de vício do ato citatório. Nestes casos não haverá qualquer

impedimento legal que afaste a análise de tal ação no procedimento da Lei 9099/95. Assim, a

competência para esta ação deverá ser analisada caso a caso.

Ressalte-se que esta ação não tem o condão de rejulgar a causa, como ocorre no juízo

rescisório, mas apenas de tornar ineficaz àquela determinada decisão, devendo ser proferido

novo julgamento pelo juízo originário da sentença atacada, respeitando a competência para a

causa.

Por este motivo, seria adequado, procedimentalmente, a distribuição do feito por

prevenção ao juízo que proferiu a decisão objeto da impugnação, ao contrário do que leciona

Câmara, defendendo a livre distribuição.40

Mister salientar que para o ajuizamento da querella nullitatis não há o que se falar em

prazo decadencial, sendo este somente aplicável à ação rescisória. Vale lembrar que esta ação

autônoma será adequada em casos inclusive quando restar prejudicado o direito de ajuizar a

rescisória pelo decurso do lapso temporal de dois anos, relativizando a coisa julgada material.

39 CÂMARA, Alexandre Freitas. Juizados especiais cíveis e federais: uma abordagem crítica. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 167

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Contudo, para Alexandre Câmara, sendo o único impedimento para o ajuizamento da

rescisória em face de julgados proferidos nos Juizados Especiais Cíveis o procedimento para

julgamento, o qual seria originário da segunda instância, e diante da inexistência de

modificação no plano material, deve ser aplicado também à querella nullitatis o prazo

decadencial de dois anos.41 Ressalte-se que há muita confusão na doutrina e até mesmo na

jurisprudência entre os institutos da querella nullitatis e da ação anulatória prevista no art. 486

do Código de Processo Civil. Vale, portanto, dizer que são institutos diversos e com

aplicações específicas, conforme já salientado neste estudo.

Quanto à posição da jurisprudência sobre o tema, cabe salientar que já houve

manifestação, mais precisamente perante os Juizados Especiais Federais, não admitindo o

ajuizamento da querella nullitatis, sob pena afronta à vedação legal.42

V. DO MANDADO DE SEGURANÇA V.1. Conceito, previsão legal, cabimento, competência e procedimento

O mandado de segurança, instituto de natureza dúplice, remédio constitucional e ação

civil, encontra amparo legal no art. 5º, inciso LXIX, da Carta Magna, bem como na sua

legislação própria (Lei nº 1.533/51).

Estabelece o art. 5º:

40 Ibid., p. 167. 41 Ibid., p. 167. 42 Justiça Federal, processo nº 2004.33.00.766360-6 (nº de origem: 2003.33.00.710732-8), recurso contra decisão que defere ou indefere medida cautelar cível - Juiz Federal Relator Carlos D’ávila Teixeira - EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ATÍPICO, IMPROPRIAMENTE DENOMINADO DE QUERELLA 8ULLITATIS (AÇÃO ANULATÓRIA), COM FEIÇÃO RESCISÓRIA DE ACÓRDÃO DA TURMA RECURSAL TRANSITADO EM JULGADO. IMPOSSIBILIDADE, QUER POR AUSÊNCIA DE VÍCIO NO ATO JUDICIAL, QUER POR AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL PARA O RECURSO IMPRÓPRIO. INDEFERIMENTO DA INICIAL. 1.A legislação de regência dos Juizados Especiais Federais só prevê alguns tipos de recursos, não cogitando da existência de ação rescisória. Transitado em julgado o acórdão, não há mais qualquer outra chance de revisão do acórdão, especialmente quando não se localizam os vícios apontados pela suplicante/recorrente. 2. Agride o sistema processual dos Juizados Especiais Federais Cíveis, a interposição anômala de recursos, mesmo sob a égide de aparente ação anulatória. A inadequação procedimental e a precariedade da tese rescindenda arrostam a petição ao indeferimento por falta de interesse de agir da parte. 3.A legislação específica dos Juizados Especiais Federais não prevê o manejo da ação rescisória ou da ação anulatória de sentença ou acórdão. Trata-se de sistema processual de regramento fechado que não admite inserções não cogitadas pelo legislador. Não bastasse isso, a lei não deferiu competência originária à

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LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo,

não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela

ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no

exercício de atribuições do Poder Público43.

Cabe analisar cada requisito.

O pólo ativo do mandado de segurança pode ser formado por pessoa natural ou

jurídica, particular ou pública.

Já o pólo passivo do writ deve ser formado pela autoridade coatora, ou seja, aquela que

praticou o ato impugnado. Tem-se como autoridade toda pessoa que age como representante

do Poder Público.

Não necessariamente será aquele que executou o ato da administração, mas sim a

quem é conferido o poder de determinar e decidir. Assim, têm-se todos aqueles que agem com

poder emanado diretamente do ente da administração pública ou, ainda, aqueles que exercem

funções delegadas.

Nos casos de concessão de serviços notadamente de competência do Poder Público,

envolvendo o direito ameaçado ou lesado a função concedida propriamente dita, a

concessionária também se enquadrará como autoridade, para fins de figurar no pólo passivo

do mandado de segurança. Já os atos administrativos de mera autorização, não há o que se

falar legitimado para figurar no mandamus.

Quanto ao direito líquido e certo, há que ser aquele que independe de produção

probatória, notadamente com lastro probatório documental suficiente para fundamentar todo o

inicialmente alegado, induvidosamente.

Não há, na via do mandado de segurança, a possibilidade de dilação probatória.

Ressalte-se, ainda, que o direito amparado pelo mandado de segurança não pode ser

igualmente garantido pelos institutos do habeas corpus ou habeas data.

Salienta-se, ainda, que necessário se mostra a existência de lesão concreta ou ameaça

de lesão ao direito do sujeito ativo. Não se admite, assim, a impetração do remédio

constitucional contra lei ou qualquer outra norma em tese.

Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais. 4. Inicial indeferida. Sem multa ou honorários de sucumbência, por ausência de citação da parte adversa. Custas, ex lege (Lei nº 9.099/95). 43 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988

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Contudo, se a legislação gera efeitos concretos com a sua execução, de forma

impositiva, resta amparado a ameaça ou lesão a direito pelo instituto do mandado de

segurança.

A omissão da autoridade pública também pode ser afrontada através do remédio

constitucional, através de sua forma preventiva, ressalte-se, restando comprovado o justo

receio de violação ao direito do sujeito ativo.

O ato da autoridade que será objeto de impugnação deve estar eivado de ilegalidade ou

abuso do direito.

É ilegal o ato que contraria expressa determinação legal, sendo lei propriamente dita

ou qualquer outro ato normativo, bem como quando exarado de autoridade incompetente para

tal.

Já o abuso do direito resta configurado quando a autoridade age além dos limites de

suas atribuições ou quando desvia a finalidade do ato. O abuso também pode ocorrer por

omissão, quando a autoridade administrativa deixa de executar ato cujo qual o administrado

tem direito garantido por lei ou norma.

Há, também, atos eivados de ilegalidade e abuso do poder emanados da autoridade

judiciária.

A autoridade judiciária pratica não só atos jurisdicionais, mas sim também atos de

administração. Quanto a este último, não resta dúvida a cerca da admissão de mandado de

segurança para sua impugnação, desde que preenchidos os requisitos legais, por tratar-se de

atos administrativos.

Contudo, quanto aos atos judiciais, resta tecer algumas considerações.

Inicialmente não cabe mandado de segurança de atos jurisdicionais contra os quais

haja previsão legal de impugnação através de recurso próprio, conforme entendimento já

consolidado no Supremo Tribunal Federal, súmula 26744 e previsão expressa do art. 5º, II, da

lei 1533/51.

Como afirma BUENO:

O referido dispositivo legal deve, por isso, por isso mesmo, ser interpretado como

indicativo de ausência de “interesse de agir” na impetração de um mandado de

44 Súmula 267 do Supremo Tribunal Federal: Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição.

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segurança contra ato judicial toda vez que a decisão puder ser impugnada mediante

recurso que tenha aptidão de evitar lesão ou ameaça a direito do recorrente.45

Os atos do juiz são: despachos de mero expediente, decisões interlocutórias e

sentenças.

Quanto aos despachos de mero expedientes, não cabe qualquer recurso (art. 504, do

CPC), ressalvada a Correição, prevista nos Códigos de Organização Judiciária, com a

finalidade de, administrativamente, sanar abusividade ou ilegalidade do ato. Neste diapasão,

não seria admissível o mandado de segurança face ao recurso, ainda que administrativo, para

sanar o vício.

Ressalva, ainda, Ernani Fidélis dos Santos: “Quanto aos despachos, o prejuízo, às

vezes, é imediato, passando a correição a ficar sem sentido, justificando-se o mandado de

segurança. Seria o caso de o juiz, abusivamente, negar retirada dos autos de cartório pelo

advogado da parte.”46

Quanto às decisões interlocutórias, na forma prevista no diploma processualista, o

meio viável de impugnação é o agravo de instrumento ou retido. Valendo lembrar, ainda, a

previsão de atribuição de efeito suspensivo ao agravo, na forma do art. 558 do CPC, o que

afastaria o interesse de agir de possível remédio constitucional, diante da tutela jurisdicional

imediata47.

Neste sentido, BUENO:

[...] toda vez que se puder evitar a consumação da lesão ou da ameaça pela utilização

do próprio sistema recursal, interpretando-o de forma tal que ele, por si próprio,

independentemente de qualquer outra medida, tenha aptidão para evitar a

consumação do dano irreparável ou de difícil reparação para o recorrente, e pela

dinâmica do efeito suspensivo dos recursos, forte do que dispõem o caput e o

parágrafo único do art. 588, descabe o mandado de segurança contra ato judicial à

míngua de interesse jurídico na impetração. Inversamente, toda vez que o sistema

recursal não tiver aptidão para evitar a consumação de lesão ou ameaça na esfera

jurídica do recorrente, toda vez que não se aceitar uma interpretação ampla

suficiente das regras processuais para evitar uma dada situação de ameaça ou de

45 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil, 5. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 433. 46 SANTOS. Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil. Volume 3. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 222.

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lesão ao recorrente, o mandado de segurança contra ato judicial tem pleno

cabimento.48

Entende Ernani Fidelis dos Santos:

Nas decisões interlocutórias, todavia, o gravame, às vezes, não é apenas de direito

processual, mas também de direito material, como ocorre nas liminares possessórias

e no adiantamento de medidas cautelares, o que, por si só, justificaria o mandado de

segurança, se a decisão não tiver atendido aos requisitos formais necessários: não se

citou o réu, por exemplo, para audiência de justificação para concessão liminar do

interdito possessório; fundamentou-se a decisão liminar em depoimentos escritos de

testemunhas, quando o oral é imprescindível; concedeu-se a liminar possessória

apenas com alegação de domínio.49

Em que pese o entendimento acima mencionado, a jurisprudência, de forma pacífica,

já se manifestou pela impossibilidade de impetração de mandado de segurança para impugnar

decisão interlocutória, haja vista a previsibilidade de recurso próprio50.

48 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil, 5. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 426. 49 SANTOS. Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil. Volume 3. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 222. 50 TJ/RJ, Segunda Câmara Cível, Mandado de Segurança nº 2009.004.00460, Des. Carlos Eduardo. Julgamento: 06/05/2009. Ementa: MANDADO DE SEGURANÇA IMPETRADO CONTRA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. Veto legal expresso ao exercício da pretensão. Impossibilidade jurídica do pedido. Indeferimento da inicial. Extinção do processo sem julgamento do mérito.

TJ/RJ, Décima Nona Câmara Cível, Mandado de Segurança nº 2008.004.01251, Jds. Des. Marcelo Marinho, Julgamento: 25/03/2009. Ementa: D E C I S Ã O. Trata-se de mandado de segurança impetrado contra ato do Exmo. Sr. Juiz de Direito da Primeira 6ª Vara Cível da Comarca de Niterói visando suspender a ordem de despejo determinada contra o impetrante. Impõe-se indeferir de plano a petição inicial do mandado de segurança, data maxima venia, porquanto impróprio o ajuizamento de ação autônoma que busque a revisão de decisão judicial que comporta recurso. Com efeito, o próprio impetrante afirma na inicial que está interpondo o presente recurso porque já decorrido o prazo do agravo de instrumento. Assim, inviável a via mandamental eleita, diante do que dispõe a Súmula 267 do Supremo Tribunal Federal: "Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição". Nesse sentido a orientação jurisprudencial de nosso Tribunal de Justiça e do e. Superior Tribunal de Justiça: Tribunal de Justiça/RJ: MS nº: 2005.004.01002. Relator: Des. WALTER D'AGOSTINHO. Órgão Especial Julgado em 24.10.2005. DECISÃO MONOCRÁTICA. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA DECISÃO PROFERIDA PELO EXMO. SR. DESEMBARGADOR 3º VICE PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUE INDEFERIU RECURSO EXTRAORDINÁRIO POR DESERÇÃO DESCABIMENTO DE AÇÃO MANDAMENTAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. Cuida-se de Mandado de Segurança contra decisão que indeferiu Recurso Extraordinário por deserção. Não é cabível o Mandado de Segurança contra decisão judicial que desafia recurso de Agravo de instrumento (Súmula 267, do STF). Extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267, VI, do CPC). MS nº: 2005.004.01250. Décima Sétima Câmara Cível. Relator: Des. HENRIQUE DE ANDRADE FIGUEIRA. Julgado em 21.09.2005. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. DESCABIMENTO. Nos termos do artigo 5º, II, da Lei nº 1.533/51 e da

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Ressalte-se, ainda, que até mesmo quando o objetivo é a discussão do direito

materialmente suscitado no feito judicial, há que ser feito mediante o recurso adequado, salvo

se a decisão for teratológica51.

Contra os atos decisórios de sentença, não há qualquer controvérsia, havendo, em

qualquer seja o procedimento adotado, a previsão do recurso legal cabível.

Quanto à competência para julgamento do writ, será determinada sempre pela análise

da autoridade coatora, na forma estabelecida da Constituição Federal de 1988.

O art. 18 da lei 1533/51 prevê o prazo decadencial de 120 dias para a impetração do

mandamus, a contar da ciência pelo interessado do ato impugnado. Em caso de ato omissivo,

Súmula 267 do E. Supremo Tribunal Federal, inadmissível o mandado de segurança dirigido contra decisão judicial atacável por recurso próprio, como a que determina apreensão do veículo alienado fiduciariamente e conhece a existência de conexão entre ação de busca e apreensão e consignação em pagamento. Recurso desprovido. Superior Tribunal de Justiça:RMS 16092 / RJ. Segunda Turma. Relator: Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA. Julgado em 23.08.2005 (DJ 14.11.2005 - p. 232)PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO JUDICIAL. SÚMULA N. 267/STF. CABIMENTO DE EMBARGOS À EXECUÇÃO. PRECEDENTES. 1. Na forma estabelecida no artigo 5º, inciso II, da Lei n. 1.533/51, não cabe impetração de mandado de segurança como sucedâneo de recurso legalmente cabível. 2. Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição (Súmula n. 267/STF).3. Não cabe mandado de segurança contra decisão, que em sede de execução fiscal, determina a citação de co-responsável para compor pólo passivo da demanda. Cabível, na hipótese, a ação de embargos à execução. 4. Após as inovações trazidas pela Lei n. 9.139/95, o mandado de segurança contra ato judicial somente é admitido nos casos de decisão judicial teratológica. 5. Recurso ordinário não-provido. RMS 18792 / SP. Primeira Turma Relator: Ministro LUIZ FUX. Julgado em 06.10.2005 (DJ 24.10.2005 - p. 172)PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO JUDICIAL. UTILIZAÇÃO DE MANDAMUS COMO SUCEDANEO DE RECURSO. INOCORRENCIA DE SITUAÇÃO EXCEPCIONAL A JUSTIFICAR A REFORMA DA DECISÃO ATACADA. INCIDENCIA DA SÚMULA 267, DO STF. PRECEDENTES DESTA CORTE. 1. O Mandado de Segurança não pode ser utilizado como sucedâneo do recurso cabível, revelando-se medida excepcional e extrema, somente cabível em casos de ilegalidade ou abuso de poder por parte do prolator do ato processual impugnado. Incidência da Súmula 267 do STF: "(.)".2. À luz desse entendimento jurisprudencial pacificado decidiu com acerto o aresto recorrido ao assentar que:"MANDADO DE SEGURANÇA. Embargos à execução fiscal recebido sem suspensão da execução. Decisão atacável por agravo de instrumento onde é possível concessão de efeito suspensivo. Inadequação da via eleita. Mandado de segurança não é sucedâneo de recurso cabível à espécie. Súmula 267/ Supremo Tribunal Federal. Impetrante carecedor de ação. Extinção do feito sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, VI, Código de Processo Civil".3. Recurso Ordinário desprovido. Por todo o exposto, verificada a inviabilidade da via mandamental eleita, INDEFIRO a petição inicial. Custas pela parte impetrante.

STJ, Quarta Turma, RMS nº 27365, Ministro Carlos Fernando Mathias (Juiz Federal Convocado do TRF 1ª Região), DJe 28/10/2008. Ementa: CONTRA DECISÃO MONOCRÁTICA DE RELATOR. AUSÊNCIA DE TERATOLOGIA. SÚMULA 267/STF. 1. O mandado de segurança não pode ser utilizado como sucedâneo do recurso legalmente cabível, sendo medida excepcional e extrema, admissível somente em casos de ilegalidade ou abuso de poder por parte do prolator do ato processual impugnado. 2. Decisão teratológica é a decisão absurda, impossível juridicamente, não se enquadrando em tal categoria o decisum objeto do presente writ, uma vez que, conforme bem aponta o Ministério Público Federal, a decisão do relator que, monocraticamente, dá provimento a recurso não retira da parte a oportunidade de exercer o contraditório. 3. Havendo no ordenamento jurídico remédio específico destinado a impugnar a ação judicial contra o decisum do qual foi impetrado o writ, inadmissível a utilização dessa ação constitucional, como substituto do recurso cabível. 4. Recurso Ordinário não provido. 51 Assim entendidas aquelas que são esdrúxulas, claras e inequivocadamente erradas, capaz de causar danos aos demandantes.

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a partir da ciência da omissão pelo Poder Público. Claro resta, portanto, que em caso de

mandado de segurança contra ato judicial, o prazo contará a partir da publicação da decisão ou

despacho a ser impugnada, vez que somente após esta há produção de efeitos concretos.

Se tratando de mandado de segurança preventivo, não há o que se falar em contagem

de prazo:

Parte da doutrina entende que não ocorre prazo preclusivo, quando o mandado se

fundar em “justo receio”, já que a ameaça é estado permanente que apenas cessa com

a violação do direito. A assertiva é correta, quando na verdade, se dá a violação do

direito, porque, aí, o prazo passa a se contar dela e não do “justo receio”.

Acontecendo, porém, que a ameaça se fundamenta sempre em dados objetivos, em

fatos, e não no subjetivismo do impetrante, se ela não se concretizar, já há prazo

decadencial, contando a partir do ato que a concretizou, o que vem a significar que,

com base nela, o mandado não pode ser mais interposto52.

Cumpridos os requisitos legais, a petição inicial será recebida, sendo notificada a

autoridade coatora para, no prazo de dez dias, prestar as informações que entender necessárias

sobre a questão ali suscitada.

Ressalte-se que, na verdade, a notificação faz às vezes de citação, sendo as

informações nada mais nada menos do que a defesa dos órgãos da administração pública,

devendo, inclusive, ser a referida peça instruída com todos os documentos que se mostrem

necessários ao deslinde da lide.

Findo o prazo, com ou sem resposta da autoridade coatora, abre-se vista ao Ministério

Público, que atua obrigatoriamente no feito (art. 10 da Lei 1533/51).

Cabe trazer o entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

Embargos de Divergência. Mandado De Segurança. Pronunciamento do Ministério

Publico. Obrigatoriedade. 1. Consoante entendimento assente na Primeira Seção do

STJ, é obrigatória a intervenção do Ministério Público nos mandados de segurança,

sob pena de nulidade. 2. Por seu manifesto interesse público, esse pronunciamento

não se subordina ao prazo estipulado no art. 10 da Lei 1.533/51. 3. Embargos de

divergência conhecidos e recebidos.53

52 SANTOS. Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil. Volume 3. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p.225. 53 STJ, EREsp nº 26709, Primeira Seção, Ministro Francisco Peçanha Martins, DJ 25/09/1995, p. 31058.

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Constitucional. Mandado de segurança. Lei 1533/51, aplicação do art. 10 -

Processual civil - Ministério Público. Participação necessária e obrigatória. I - Em

mandado de segurança é necessário e obrigatório o efetivo pronunciamento do

Ministério Público, como instituição essencial à função jurisdicional do estado, em

defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e

individuais indisponíveis (art. 127, C.F.). II - Anulação do processo, para ficar

assegurada a participação do Ministério Público. III - Precedentes da Jurisprudência.

IV - Recurso conhecido e provido.54

Sobre tal entendimento, é ver:

[...] O entendimento, na verdade, além de significar retrocesso, desvia-se dos mais

comezinhos princípios processuais. Imprescindível no processo é o pronunciamento

do juiz – o despacho, a decisão e a sentença -, já que a ele está afeto o exercício da

jurisdição. Atos das partes e dos demais participantes, inclusive do custus legis,

revelam-se como simples faculdades ou faculdades com conseqüências prejudiciais

(ônus), não podendo a falta de atuação no momento próprio impedir ou retardar o

normal desenvolvimento da jurisdição, exatamente porque tais atos não deixam de

ser praticados por quem tem função jurisdicional55.

Melhor e mais moderno entendimento é no sentido de que a intimação e remessa dos

autos ao Ministério Público é que se mostra essencial, sendo que este, em prol da sua

independência funcional, pode manifestar-se, inclusive, pelo não interesse na causa, não

emitindo, desta forma, parecer sobre o assunto. Não há como o magistrado obrigar ao ilustre

membro do Parquet a exarar parecer se este entender pela não intervenção.

Após a manifestação do Ministério Público, o juiz proferirá sentença.

A decisão proferida no writ formará coisa julgada, assim como qualquer outra,

inclusive material, quando a decisão adentrar ao mérito da causa. Ressalta-se que, sendo

denegada a ordem, pelo mérito propriamente dita, não há o que se falar em ajuizamento de

ação própria, salvo se restar verificado a inexistência de direito líquido e certo.

54 STJ, REsp nº 73887, Primeira Turma, Ministro Milton Luiz Pereira, DJ 20/05/1996, p. 16675. 55 SANTOS. Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil. Volume 3. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 231.

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No mandado de segurança há, na verdade, a existência de duas lides: a primeira

caracterizada pela forma especial de proteção jurídica, revelada pela liquidez e

certeza processuais do direito; a segunda, pela pretensão resistida em si. Decidindo-

se pela iliquidez ou incerteza do direito tão-somente, há definitividade do julgamento

com relação à especial forma de proteção jurídica, de modo que o outro mandado

não pode ser interposto; vencida esta fase, o julgamento já passa a abranger uma

segunda lide, que é relacionada com a própria pretensão resistida e com o direito que

se quer reconhecer, de forma tal que a coisa julgada vem a qualificar todo o

julgamento, resguardados apenas os limites que lhe são próprios. O julgamento de

incerteza ou iliquidez, todavia, embora não mais permita o novo mandado, não

impede o socorro do impetrante às vias ordinárias56.

V.2. Do cabimento do Mandado de Segurança em face de decisões interlocutórias proferidas

no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis.

Como já visto, não é admissível a utilização do mandado de segurança como forma de

impugnação de decisões judiciais quando haja previsão legal de recurso próprio para atacá-la.

No procedimento previsto na Lei 9099/95, somente há previsão legal de recurso

(recurso inominado, art. 41) em face da sentença que põe termo ao processo na sua 1ª fase

(ressalte-se que não há, no procedimento dos Juizados Especiais, primeira e segunda instancia,

vez que o órgão colegiado que julgará possível impugnação em face da decisão proferida pelo

juízo monocrático também é, na organização judiciária, órgão de primeira instância do

Tribunal de Justiça do Estado).

Assim, vem sendo utilizado o Mandado de Segurança como forma de impugnação de

decisões interlocutórias proferidas no curso do feito.

Ocorre que, mesmo como sucedâneo do recurso de agravo de instrumento, o mandado

de segurança deve seguir seus requisitos próprios, notadamente a demonstração, pelo

impetrante, do direito líquido e certo, bem como ilegalidade e abusividade do ato judicial

impugnado.

Uma vez impetrado o mandado de segurança, será este julgado perante a Turma

Recursal dos Juizados Especiais.

Para CÂMARA, contudo, o órgão competente para julgar o mandamus contra ato do

juiz de primeiro grau é o Tribunal de Justiça do Estado:

56 Ibid., p. 235.

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A meu juízo é do Tribunal de Justiça Estadual a competência para conhecer,

originariamente, dos mandados de segurança contra atos praticados pelos Juizados

Especiais Cíveis e pelas Turmas Recursais. Estabelece o art. 101, §3º, d, da Lei

Complementar nº 35/79 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional- LOMAN), que é

da competência dos Tribunais de Justiça julgar mandado de segurança contra ato de

juiz de direito. [...] Não me parece possível que a lei estadual atribua às Turmas

Recursais competência para conhecer de mandados de segurança, mesmo que tal

remédio processual tenha sido usado contra ato de Juizado Especial Cível. É certo

que o art. 24, X, da Constituição da República, atribui competência legislativa

concorrente à União e aos Estados e Distrito Federal para legislar sobre processo nos

Juizados Especiais de Pequenas Causas (nota-se, trata a Constituição da República

apenas de pequenas causas, não das causas cíveis de menor complexidade, quando

trata da competência legislativa concorrente). A meu juízo, essa competência

legislativa concorrente não permite aos Estados ou ao Distrito Federal legislar sobre

mandado de segurança. Esta não é, certamente, uma causa cível de menor

complexidade, ainda que se lhe dê valor da causa que permita ser ele considerado

uma pequena causa. O processo do mandado de segurança a que se atribui valor da

causa baixo, muitas vezes meramente simbólico, deve ser considerado pequena

causa de grande complexidade. Tanto é assim, aliás, que o art. 3º, § 1º, da Lei nº

10.259/01, exclui, expressamente, da competência dos Juizados Especiais Cíveis

federais os processos de mandado de segurança57.

Em que pese este posicionamento, não é o que prevalece na jurisprudência do nosso

Egrégio Tribunal de Justiça58.

57 CÂMARA, Alexandre Freitas. Juizados especiais cíveis e federais: uma abordagem crítica. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 162 58 TJ/RJ, 20ª Câmara Cível, AI nº 2009.002.03410, Des. Marco Antonio Ibrahim, Julgamento: 08/04/2009. Ementa: Processo Civil. Competência. Lei "Maria da Penha". Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Decisão de 1º grau que indeferiu a fixação de alimentos provisórios requerida pela agravada. Incompetência absoluta das Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. O recurso deriva de decisão monocrática proferida em Agravo de Instrumento tirado contra decisão do III Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Jacarepaguá, tendo a Relatora fixado alimentos provisórios em favor da parte ora agravada. Com a redação da Lei Estadual nº 4.913/2006 o CODJERJ é expresso no sentido de que os "Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher" integram o sistema dos Juizados Especiais (artigo 68, "a", VII). O artigo 41 da Lei nº 11.340/06 não trata de matéria relativa à competência funcional, estando seu texto restrito a espancar eventuais incongruências entre a Lei nº 9.099/95 e a Lei "Maria da Penha". Não há base jurídico-normativa para que se reconheça a competência das Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro para apreciar recursos ou mandados de segurança contra decisões de "Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher". Não o faz a Lei "Maria da Penha", o CODJERJ e, tampouco, o Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, o que implica na conclusão de que os recursos devem ser julgados pelas Turmas Recursais competentes a teor do disposto na alínea b, do artigo 68 do CODJERJ. O regramento de competência dos órgãos jurisdicionais dos Estados é da exclusiva alçada das normas estaduais, considerando-se inconstitucional qualquer norma federal que disponha sobre isso. A competência,

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É ver, ainda:

Segundo a Comissão de Interpretação da Lei dos Juizados Especiais", diz Cândido

Dinamarco, "os tribunais estaduais têm competência originária para o hábeas corpus

e mandado de segurança quando coator for o juiz especial (conclusão n. 11) - mas,

operando o mandado de segurança nesse caso como sucedâneo extraordinário do

sistema recursal, é mais razoável atribuir essa competência ao órgão que seria

competente para o julgamento de eventual recurso, ou seja, ao colégio recursal; mas

é razoável a competência dos tribunais estaduais quando o ato impugnado for do

próprio colégio.59

Comenta Ernane Fidélis dos Santos a cerca da utilização do mandado de segurança

como sucedâneo recursal nos Juizados Especiais:

Está sendo tormentosa, nos tribunais, a questão do mandado de segurança contra atos

dos juízes do Juizado Especial. É preciso, todavia, atentar que o mandado de

segurança é possível contra ato ilegal ou abusivo de autoridade, do qual não caiba

mais recurso. Nesse caso, em tese, abuso do direito ou ilegalidade, sem possibilidade

de recurso, praticados por juiz de Juizado Especial são passíveis de reparo, via

mandado de segurança, e competente para seu conhecimento é, em princípio, o

Tribunal de Justiça, de acordo com as normas de organização judiciária, nunca a

turma recursal do Juizado Especial, a que falta competência, inclusive constitucional,

mesmo porque a função de tal órgão é de julgamento de verdadeira infringência do

mesmo juizado60.

nestes termos, é sempre determinada pela Constituição Estadual e pelas normas de organização judiciária, conforme se verifica do disposto no artigo 125 da Constituição Federal. Recurso provido, com reconhecimento da incompetência absoluta da Câmara. TJ/RJ, Órgão Especial, MS nº 2007.004.01512, Des. Leticia Sardas, Julgamento: 26/05/2008. Ementa: MANDADO DE SEGURANÇA. JUIZADOS ESPECIAIS. TURMA RECURSAL. RECURSO CABÍVEL. LEI 9.099/95. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. DENEGAÇÃO DA ORDEM.1. O Tribunal de Justiça não é órgão judicial com competência revisional das decisões proferidas pelas Turmas Recursais.2. Os recursos cabíveis em face das decisões dos Juizados Especiais e das Turmas Recursais estão previstos na Lei n. 9.099/95, sendo ainda admitido o recurso extraordinário nos termos das alíneas a, b e c, do inciso. 59 Cândido Rangel Dinamarco. Manual dos Juizados Especiais. São Paulo, Malheiros, 2001. p. 184, apud, Juizados Especiais Federais Cíveis. 13. Mandado de segurança. Disponível em: <http://www. tex.pro.br/wwwroot/processocivil >. Acesso em: 15 jul. 2009. 60 Ressalte que este não é o posicionamento dominante, quanto à competência para julgamento do mandado de segurança perante os Juizados Especiais, conforme jurisprudência já acostada.

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O que ressalta na conclusão da possibilidade do mandamus contra atos de tais juízes

não pode, evidentemente, ser a injustiça de qualquer decisão, mas a simples

ilegalidade ou abuso de poder praticado pelo juiz enquanto tal.

O Juizado Especial tem por característica fundamental a limitação legislativa e

jurisdicional, com incomunicabilidade, em princípio, absoluta, de forma tal que ele

se sustém por si só, sem qualquer comunicação com a justiça comum. Assim, se a

atuação judicial se desenvolve normalmente nos limites legislativos, nada há que a

corrija, não sendo atos e decisões passíveis de reexame por quem quer que seja.

Instaurado o processo, por exemplo, culminando com sentença ou recurso ao órgão

recursal, decisão alguma é passível de reexame pela justiça comum, a não ser por

questão constitucional, via recurso extraordinário, já que tal controle não escapa do

Supremo Tribunal Federal, qualquer que seja a legislação. [...]

Em matéria de Juizado Especial – e isto até agora está sendo em parte ignorado –

não há subsidiariedade da legislação comum, a não ser na liberdade que se dá ao juiz

de adotar normas procedimentais, para adaptação de situações peculiares, [...]. Há,

sim, possibilidade de interpretação analógica e extensiva de normas e emprego de

princípios de direito comum a todos os ramos, mas não utilização de instituto do

processo comum no Juizado Especial, por exemplo, da tutela antecipada. Não há, na

legislação própria, a previsão. Nesse caso, ali concedida, há flagrante ilegalidade e

abuso de autoridade judiciária, que o mandado de segurança pode evitar.61

V.3. Do cabimento de Mandado de Segurança em face de decisões já transitadas em julgado

perante os Juizados Especiais Federais.

De acordo com o entendimento sumulado do Supremo Tribunal Federal, não cabe

mandado de segurança contra decisão já transitada em julgado62.

Tal posicionamento se dá, notadamente, pela previsão legal da ação rescisória como

meio processual adequado de impugnação desta espécie de decisão.

Ocorre que, como já abordado, no sistema da Lei 9099/95 não se admite a utilização

da ação rescisória.

61 SANTOS. Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil. Volume 3. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 219/220. 62 Súmula 268 do STF.

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Diante de tal negativa expressa, resta analisar se é possível, não havendo outro meio

processual adequado, a impetração de mandado de segurança contra o ato judicial transitado

em julgado.

A jurisprudência já firmada nas Turmas Recursais Cíveis do Estado do Rio de Janeiro

é toda no sentido de que, diante da vedação expressa pela impugnação de decisões transitadas

em julgado através da ação rescisória, em prol da celeridade e do procedimento menos

oneroso e complexo da lei 9099/95, seria um contra-senso admitir o mandado de segurança

como sucedâneo desta ação.

Neste sentido, caber trazer à colação os julgados:

Mandado de Segurança. Processo nº 2009.700.002302-4. Impetrante: Paulo Nunes

Bulle Impetrado: XXVI Juizado Especial Cível da Capital. V O T O: Sentença de

improcedência do pedido. Inconformismo do Autor manifestado por meio do writ.

Inviabilidade da via eleita pelo jurisdicionado. Previsão legal de recurso específico

para atacar o ato judicial questionado. Na hipótese de trânsito em julgado da

sentença, igualmente inoportuna a utilização do mandamus como substituto da ação

rescisória, instituto sequer previsto na Lei nº 9.099/95. Indeferimento da petição

inicial que se impõe. EXTINÇÃO DO PROCESSO, sem apreciação do mérito, na

forma do artigo 8º, da Lei nº 1.533/51 c/c o artigo 267, I, do CPC. Custas pelo

Impetrante, observada a JG, ora deferida. Sem honorários, na forma das Súmulas

105 do STJ e 512 do STF.63

Mandado de Segurança. Processo nº 58.427-5/08 Impetrante: DIANA MOREIRA

DA SILVA. V O T O: Trata-se de mandado de segurança. O ato judicial impugnado

é suposto acórdão que teria sido proferido pela Segunda Turma do Conselho

Recursal dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio de Janeiro (petição inicial,

fls. 02). Não tem razão a impetrante. Com efeito, não há prova do ato impugnado ou

sequer do processo em que tal ato teria sido praticado. Ademais, o sistema dos

juizados especiais cíveis, de matriz constitucional, adotou, na esteira dos princípios

da celeridade e da simplicidade, o subprincípio do recurso único. É o que se extrai

dos arts. 98, I, da Constituição, e 2º, 41 e 42 e 59, da Lei 9.099/95, este último

relativo à ação rescisória, banida do sistema. De se convir, por outro lado, que a

competência para o julgamento de mandado de segurança contra ato judicial é de

órgão jurisdicional de hierarquia funcional superior ao do órgão que proferiu a

decisão impugnada. Não é coincidência a disciplina estabelecida pelos arts. 21, VI,

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da LOM, 102, I, d, da CF, 105, I, b, da CF, 108, I, c, da CF, 109, VIII, da CF, 101,

§3º, d, da LOM, e 110, par. único, da LOM. Diante dessas circunstâncias, forçoso

concluir que inexiste, mesmo em tese, o alegado direito líquido e certo. A existência

de direito líquido e certo violado é pressuposto específico de admissibilidade do

mandado de segurança, nos termos dos arts. 5º, caput, LXIX, da Constituição, e 1º,

caput, da Lei 1.533/51. ANTE O EXPOSTO, voto no sentido de se indeferir a

inicial.64

Mandado de Segurança que se volta contra a decisão que deixou de receber a

exceção de pré-executividade. Informações prestadas pela D. Autoridade Coatora de

fls. 30. O requerimento da ora impetrante que deu azo a decisão de fls. 23 deste MS,

tem corpo de "EXCEÇÃO DE PRÉ EXECUTIVIDADE" e alma de EMBARGOS A

EXECUÇÃO, e ainda ataca a coisa julgada, em rito célere que expungiu do cenário

processual a ação rescisória. Por todas estas razões a exceção, é tão absurda que não

merece ser conhecida nem mesmo à luz da fungibilidade. A exceção de pré-

executividade é construção jurisprudencial, apenas voltada para as execuções de

título extrajudicial, precisamente para ataque as cambiais frias e nunca poderiam ser

utilizadas contra títulos judiciais, sob pena de assumir papel de embargos à

execução. O D. Parquet opinou pela denegação da ordem às fls. 32. Inexistência de

direito líquido e certo. Denegação da ordem que se impõe. Sem honorários, na forma

das Súmulas 105 do STJ e 512 do STF. Pelo exposto, voto pela denegação da

ordem. Sem honorários, na forma das Súmulas 105 do STJ e 512 do STF. Oficie-se

o Juízo impetrado, com cópia desta decisão.65

63 TJ/RJ, Conselho Recursal, processo nº 2009.700.002302-4, Juiz(a) Alexandre Chini Neto, Julgamento: 6/01/2009. 64 TJ/RJ, Conselho Recursal, processo nº 2008.700.058427-5, Juiz(a) Brenno Cruz Mascarenhas Filho, Julgamento: 15/01/2009. 65 TJ/RJ, Conselho Recursal, processo nº 2008.700.015345-8, Juiz(a) Flavio Citro Vieira De Mello, Julgamento: 17/07/2008.

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CO�CLUSÃO Diante de todo o exposto, conclui-se que tendo em vista a vedação legal prevista no

art. 59 da lei nº 9099/95, a jurisprudência e doutrina acompanham o entendimento de que tal

espécie de ação é incabível em sede de Juizados Especiais Cíveis.

Assim, como consequência da inaplicabilidade desta forma de impugnação, parte da

doutrina entende que, para evitar que decisões contraditórias ao ordenamento jurídico ou às

normas constitucionais tornem-se imutáveis, admitir-se-á a utilização da querella nullitatis.

Cabe salientar que, ao contrário da ação rescisória, não há impedimento procedimental

para o ajuizamento da querella nullitatis, vez que seu julgamento se dará perante a primeira

instância, sendo somente discutível se possível de apreciação perante o próprio Juizado

Especial Cível ou no juízo comum.

Contudo, em que pese tal entendimento, a jurisprudência já se posicionou no sentido

de ser incabível a querella nullitatis, haja vista a vedação legal sendo, pois, uma forma de

burlar a vedação legal, utilizando outro instituto com mesma finalidade, apesar de tratar de

ações diversas.

Já quanto à ação anulatória, prevista no art. 486 do CPC, há manifestação

jurisprudencial no sentido de que é inadmissível em sede de Juizados Especiais Cíveis vez

que possuem o mesmo caráter da ação rescisória, vedada por lei. Ademais, há ainda parte da

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doutrina que inadmite o instituto em sede de Juizados Especiais por conta da vedação à

interposição de recurso inominado em face de sentenças meramente homologatórias.

Porém, cabe salientar que se tratam de institutos diversos. A ação anulatória somente é

cabível em face de sentenças homologatórias, nas quais, inclusive, não há coisa julgada

material, ao contrário do que ocorre com a ação rescisória.

Salienta-se, também, que não há impedimento procedimental, vez que o julgamento

desta ação, igualmente como ocorre com a querella nullitatis, se dará perante a primeira

instância.

Conclui-se, portanto, que a aplicação de tais institutos deve se dar de forma cautelosa,

bem como na hipótese devidamente prevista em lei, sob pena de se confundir os institutos

gerando sua inadmissibilidade perante os tribunais, como vem ocorrendo. Há também que se

estimular a utilização das formas autônomas de impugnação perante os Juizados Especiais

Cíveis, diversas da ação rescisória, de modo a evitar que decisões contraditórias ao

ordenamento pátrio tornem-se imutáveis.

Resta, ainda, verificado a possibilidade de utilização do mandado de segurança como

sucedâneo recursal junto aos Juizados Especiais, vez que para determinadas manifestações do

magistrado julgador não há recurso legalmente previsto. Ressalte-se, contudo, que tal somente

poderá ocorrer quando se verificar a ilegalidade e abuso de poder por parte do julgador.

Não cabe, contudo, a utilização do mandado de segurança como substituto da ação

rescisória, vedada expressamente por lei, conforme jurisprudência já acostada.

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