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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE LETRAS INSTITUTO DE HISTÓRIA DE ARTE As obras da Fundação Calouste Gulbenkian alvo das inundações de 1967 - O restauro preventivo da pintura a óleo e a sua relação com o ambiente museológico - Elisa Loureiro Comberiati Dissertação MESTRADO EM ARTE PATRIMÓNIO E RESTAURO 2012

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Faculdade Lusófonas

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  • UNIVERSIDADE DE LISBOA

    FACULDADE DE LETRAS

    INSTITUTO DE HISTRIA DE ARTE

    As obras da Fundao Calouste Gulbenkian alvo das inundaes de 1967

    - O restauro preventivo da pintura a leo e a sua relao com o ambiente

    museolgico -

    Elisa Loureiro Comberiati

    Dissertao

    MESTRADO EM ARTE PATRIMNIO E RESTAURO

    2012

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    UNIVERSIDADE DE LISBOA

    FACULDADE DE LETRAS

    INSTITUTO DE HISTRIA DE ARTE

    As obras da Fundao Calouste Gulbenkian alvo das inundaes de 1967

    - O restauro preventivo da pintura a leo e a sua relao com o ambiente

    museolgico -

    Elisa Loureiro Comberiati

    Dissertao orientada pela Prof. Doutora Clara Moura Soares

    MESTRADO EM ARTE PATRIMNIO E RESTAURO

    2012

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    Aos meus pais e ao Frederico

    A guilty conscience needs to confess. A work of art is a confession.

    Albert Camus 1957

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    Contedos

    Agradecimentos ............................................................................................................ - 8 -

    Resumo ....................................................................................................................... - 10 -

    Introduo .................................................................................................................. - 11 -

    CAPTULO I - ALGUMAS QUESTES TERICAS ACERCA DA

    CONSERVAO E RESTAURO DA PINTURA A LEO ............................... - 15 -

    1. Restauro preventivo versus Conservao .............................................................. - 15 -

    1.1 O restaurador-conservador e o curador uma relao intrnseca e distinta no

    mbito da conservao e do restauro .................................................................... - 20 -

    2. Aspectos fundamentais da pintura a leo .............................................................. - 25 -

    2.1 Os Craquelures ................................................................................................ - 28 -

    CAPTULO II - NOOES DE MUSEOLOGIA COMPORTAMENTOS A

    ADOPTAR PARA AS BOAS-PRTICAS DE CONSERVAO NO MUSEU- 32 -

    1. Responsabilidade conservativa do Museu ......................................................... - 32 -

    1.1 A problemtica ................................................................................................. - 34 -

    1.1.2 Tutela das coleces .................................................................................. - 35 -

    2. Consideraes tcnicas ...................................................................................... - 41 -

    2.1 Humidade e Temperatura ............................................................................. - 42 -

    2.2 Os poluentes .................................................................................................. - 46 -

    2.3 A luz como factor de deteriorao ................................................................ - 48 -

    2.4 Tipologias de degradao ................................................................................ - 49 -

    2.4.1 Deteriorao fsica .................................................................................... - 49 -

    2.4.2 Deteriorao qumica ................................................................................ - 52 -

    2.4.3 Deteriorao biolgica .............................................................................. - 53 -

    3. Finalidades e Metodologias ............................................................................... - 55 -

    4. A conservao da pintura de cavalete em ambiente museolgico ..................... - 59 -

    4.1 Cuidados de manuseamento e manuteno da pintura ................................ - 60 -

    CAPTULO III - QUANDO AS CIRCUNSTNCIAS TRANSPEM AS

    TEORIAS: AS INUNDAES DO PALCIO POMBAL (1967) ...................... - 63 -

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    1. As obras da Fundao Calouste Gulbenkian ......................................................... - 63 -

    1.1 O perodo pr-inundaes ............................................................................... - 66 -

    1.1.2 As pinturas da Coleco da Fundao Calouste Gulbenkian .................. - 66 -

    1.1.3 O Restauro emergente Contribuies educacionais .................................. - 72 -

    1.2 A Fundao e os restauros inesperados .......................................................... - 73 -

    1.3 Um caso comparativo: a inundao de Florena de 1966 .............................. - 76 -

    1.4 Anlise aos restauros efectuados s pinturas da Fundao ............................ - 79 -

    1.4.1 Particularidades dos restauros .................................................................. - 83 -

    1.5 Apreciaes: as obras hoje .............................................................................. - 86 -

    CAPTULO IV - A INUNDAO E O PLANO DE EMERGNCIA

    CONSIDERAES PARA A SUA ELABORAO .......................................... - 89 -

    1. A inundao como factor catastrfico ................................................................... - 89 -

    2. O plano de emergncia .......................................................................................... - 92 -

    2.1 O Vade Mecum ................................................................................................. - 95 -

    2.2 O inventrio ..................................................................................................... - 97 -

    2.3 Critrios para a elaborao de um plano de emergncia ............................... - 98 -

    2.3.1 As peas ....................................................................................................... - 103 -

    2.3.2 Avaliao de danos ..................................................................................... - 105 -

    Consideraes Finais .............................................................................................. - 109 -

    ANEXOS ................................................................................................................. - 113 -

    Elenco Bibliogrfico ............................................................................................... - 128 -

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    Agradecimentos

    Expresso aqui os meus sinceros agradecimentos s inmeras pessoas sem as

    quais a presente dissertao no teria sido possvel.

    minha orientadora, a Professora Doutora Clara, a qual tenho a agradecer a

    receptividade e o facto de me ter acolhido, incentivando-me durante esta jornada a

    manter a perseverana, fornecendo-me informao e dando-me sugestes fulcrais para a

    concluso deste percurso. Dr. Lusa Sampaio, sem a qual no teria sido possvel

    concretizar este trabalho, agradeo a boa vontade, pacincia e disponibilidade que

    sempre teve para comigo. Dr. Maria Teresa Gomes Ferreira pela disponibilidade e

    cordialidade que teve em receber-me, deixando-me com um relato nico que irei

    guardar na memria, bem como a valiosa e agradvel troca de impresses sobre

    determinados conceitos no mbito da conservao. Ao Professor Doutor Vtor Serro, o

    qual, no meio de uma agenda preenchida, se disponibilizou a ajudar-me na ingresso

    para o mestrado e sem o qual no me encontraria nesta fase de concluso.

    Numa tnica mais pessoal, agradeo em primeiro lugar a todas as minhas

    grandes amigas as quais me ajudaram sempre entre desabafos, a ter foras, e que me

    ajudaram a superar tudo. A toda a minha famlia fenomenal, que sempre me ajudou e

    incentivou: aos meus avs Alberto e Licnia, aos meus tios Joo e Elisa, s minhas

    primas Mariana e Elvira, ao Eurico, minha irm Marta que com as suas impacincias

    sempre me distrai, e por fim aos meus queridos pais: ao meu pap Gabriele pela grande

    ajuda, esforo e amor e minha mam Ftima, a mulher mais corajosa que conheo,

    bonita por dentro e por fora, que apesar das intempries da vida pe sempre os seus

    frutos em primeiro lugar, dando-me sempre todo o amor, benevolncia, apoio

    incondicional e felicidade que eu possa precisar.

    Por fim agradeo ao Carlos Frederico, por tudo, pelo seu amor e pelo estmulo,

    amizade, carinho, apoio, compreenso, crticas e sugestes que sempre me deu, mas

    sobretudo pela sua infinita pacincia e pela sua habilidade em aguentar os meus maus-

    humores e as minhas tristezas, e por estar sempre a meu lado no bom, no mau e no

    pssimo durante estes anos percorridos juntos. No vou deixar de referir e agradecer ao

    tio Carlitos, no qual penso muita vez com imensa saudade e que tenho a certeza que de

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    vez em quando d uma espreitadela e um empurrozinho, e o qual tenho a certeza que

    estar presente neste momento de felicidade, se no em carne ento em esprito.

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    Resumo

    O equilbrio vital de uma obra de arte deve ser tutelado com o auxlio de espertos deste

    campo que trabalham com o propsito de abonar uma harmonia sbia e adequada a

    estas. Esta tese tem como objectivo aprofundar os conceitos e argumentos da

    conservao da pintura ao interno do ambiente museolgico, especificamente a pintura a

    leo, analisando os factores de deteriorao, contemplando as causas mais recorrentes

    que conduzem s ditas deformaes. Com alguns casos proporcionados pela Fundao

    Calouste Gulbenkian podemos analisar as sequelas do evento catastrfico comum de

    que as obras foram alvo e as subsequentes intervenes de restauro efectuadas para um

    conseguimento conservativo final que se mantm at ao presente.

    Palavras-chave: Conservao; Pintura a leo; Museu; Deteriorao; Causas;

    Gulbenkian

    Riassunto

    Lequilibrio vitale di unopera darte devessere tutelato con lausilio di esperti del

    campo che operano al fine di fornire all'opera un'adeguata armonia. Questa tesi ha lo

    scopo di approfondire il tema della conservazione della pittura allinterno di un museo,

    specificamente della pittura a olio su tela, analizzando i fattori di deterioramento ed

    esaminando in questo modo le cause pi comuni che conducono alle suddette

    deformazioni. Su alcuni casi forniti dalla Fondazione Calouste Gulbenkian

    analizzeremo le conseguenze dellevento catastrofico comune che hanno subito questi

    dipinti e i successivi interventi di restauro apportati alle suddette opere, giungendo poi

    alla stabilit conservativa nel tempo.

    Parole Chiave: Conservazione; Pittura a olio; Museo; Deterioramento; Cause;

    Gulbenkian

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    Introduo

    Esta dissertao aborda e analisa as pinturas da Fundao Calouste Gulbenkian,

    alvo das inundaes ocorridas em Novembro de 1967, estudando posteriormente um

    comportamento conservativo adequado em relao a um potencial evento catastrfico.

    Devido ao nosso percurso profissional realizado no mbito da Conservao e do

    Restauro houve desde sempre um interesse enraizado na especializao no campo da

    pintura em tela, razo pela qual a presente dissertao d um relevo a certas vertentes

    prticas, no focando somente a inundao do Palcio Pombal e os seus porqus. Graas

    a uma relao concordante estabelecida com a Conservadora da Fundao, a Dr. Lusa

    Sampaio, despontou a oportunidade de ter acesso documentao dos processos de

    restauro efectuados pelo Instituto Jos de Figueiredo, de modo a aprofundar e analisar

    todas as vertentes terico-prticas, da eventualidade ocorrida e dos comportamentos e

    intervenes que se seguiram. O objectivo primordial desta tese, ser ento analisar as

    aces subsequentes inundao no Palcio Marqus de Pombal, onde se encontrava o

    esplio naquela altura, a logstica empregue em relao salvaguarda e ao restauro das

    obras, bem como uma posterior viso global sobre o savoir-faire em situaes

    catastrficas idnticas. Optou-se por analisar analogamente o caso de Florena,

    extremamente semelhante se bem que em dimenses maiores, ocorrido em 1966. No

    querendo cingir o caso da Fundao a um espordico evento lusitano, a necessidade de

    um caso comparativo surgiu com oportuno e vrios foram os casos pesquisados1 mas a

    preferncia foi para o de Florena, por ter sido um caso derradeiramente catastrfico,

    eliminando inmeras obras de arte de valor exponencial e por ser mais prximo s

    nossas razes.

    Como referido, estas pinturas encontravam-se no Palcio Marqus de Pombal

    em Oeiras aquando das inundaes de 1967, que resultaram no alagamento dos cofres

    do Palcio onde estavam colocadas temporariamente as ditas. Iremos analisar o estado

    das pinturas antecedente s inundaes, o estado ulterior s cheias e consequentemente

    os procedimentos realizados pela principal entidade restauradora, o Instituto Jos de

    Figueiredo. Denotmos que durante este processo foi fulcral o relato vivo que nos

    ofereceu a Dr. Maria Teresa Gomes Ferreira, a antiga Directora da Fundao, que

    1Nomeadamente a inundao de 2002 em Dresden (DE) especificamente o museu Albertinum

    completamente restructurado e reaberto em 2010; pinturas danificadas pelas inundaes causadas pelo

    furaco Katrina em 2005; inundao em Praga (CZ) de 2002.

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    sobejamente descreveu a logstica da qual foi encarregue, naquele momento de

    emergncia, sublinhando as inter-relaes criadas com especialistas vindos do

    estrangeiro, que em conjunto com os tcnicos nacionais, primaram pela salvaguarda e

    recuperao das obras danificadas. A comunicao irrepreensvel que se manteve

    durante todo este processo resultou numa recuperao exmia das obras, que com toda a

    ateno, cuidado e sabedoria, voltaram a espelhar memria artstica e histrica atravs

    das suas pinceladas.

    Em termos tcnicos analisar-se-o portanto os pontos em comum entre as ditas

    intervenes efectuadas nos seis casos apresentados conseguindo assim chegar a um

    ponto de concluso representativo, concernente a todos os casos deste sector que

    estiveram sujeitos a estas circunstncias. A escolha de seis casos especficos foi feita

    com base na informao concedida, tendo em conta o tipo de danos sofridos e a

    tipologia de pintura e cremos que expressam um resultado global acerca do esplio de

    pintura danificado em 1967.

    Visto que os casos analisados da Fundao se tratam somente da seco de

    pintura, achou-se lgico fazer uma abordagem especfica, introdutria e explicativa, dos

    contedos tcnico-prticos da pintura a leo, focando os aspectos estruturais das

    questes propostas acerca da pintura de cavalete e da sua relao com a conservao,

    tendo em conta os restantes factores de degradao das obras, como o natural processo

    de envelhecimento ou outras causas externas. O termo pintura de cavalete suscita de

    imediato uma referncia pintura a leo e de facto todos os casos examinados so

    realizados mediante esta tcnica. Logo de incio a abordagem concentrar-se- nos

    materiais e tcnicas utilizados na pintura de cavalete e na sua relao com a subsequente

    e inevitvel degradao e/ou envelhecimento. A degradao e o envelhecimento da

    pintura assumem vrias formas identificveis, so processos inevitveis, consequncias

    do tempo e do meio em que se insere a pintura. O fenmeno do envelhecimento afecta

    toda a estrutura da pintura se bem que onde os efeitos se denotam maioritariamente no

    estrato pictrico o mais visvel.

    Outro factor que iremos abordar e que consideramos atinente, o caso do

    restauro conservativo, e da sua teorizao. Esta escolha precedeu uma concluso

    pessoal: que h uma notvel diferena entre a escola italiana do restauro e da

    conservao e todas as outras instituies internacionais, que apesar de serem regidas

    pelos mesmos princpios, no acentuam a necessidade da aplicao do restauro

  • - 13 -

    preventivo como conceito a seguir. Por isso mesmo, uma pequena reflexo feita sobre

    o restauro conservativo, a conservao e o restauro, e entre as diferenas ou

    semelhanas entre o trabalho de um restaurador e de um conservador, que cremos se

    complementem apesar de existirem pontos divergentes.

    Um outro ponto fulcral que dissertaremos ser, e retirando o exemplo do caso da

    Fundao, qual o comportamento a seguir durante uma catstrofe imprevista.

    Analisaremos todas as condicionantes e quais as vias possveis para uma salvaguarda

    potencialmente completa em casos semelhantes. O que torna o caso da Fundao

    interessante so as suas pequenas (grandes) particularidades, pois o que se poderia ter

    revelado uma autntica catstrofe em todos os sentidos da palavra, acabou talvez da

    melhor maneira possvel, tendo em conta a poca, os meios, o local e a informao

    disponvel. Houve uma delegao de tarefas, interajuda e compreenso mtua

    fenomenais que impediram maiores desgraas em relao preservao das espcies.

    Todos se empenharam para chegar ao mesmo objectivo. Retiramos assim exemplo para

    contextualizar uma eventualidade semelhante, concebendo cenrios actuais e propondo

    solues museolgicas. Por ltimo abordaremos a questo da conservao museolgica

    em si, pois toda a dissertao culmina num tema de resposta lgica visto que, tendo em

    conta todos os factores analisados, o resultado concludente o perfazimento de uma

    anlise multiplicidade de conceitos que fazem parte da museologia.

    O intuito do conservador deve ser a manuteno a lungo termine2 da vida das

    obras e, para um exerccio positivo da sua funo h que requerer bases concretas de

    museologia s quais pode aliar as prticas de restauro preventivo3, para o bem-estar do

    acervo pelo qual responsvel. Ora o museu, tem nessa funo conservativa grande

    responsabilidade, porque ao expor uma obra tem de estudar a adaptao dessa mesma

    com o meio onde ir inserir-se e conseguir mant-la num ambiente idneo, fora de

    situaes que comprometam a sua existncia. A planificao do espao de exposio

    por isso, de extrema importncia. Sendo tambm o museu um fiel consignatrio de

    patrimnio, no h qualquer dvida de que tem o dever de manuteno, caso contrrio o

    museu nunca teria hoje a definio pela qual o conhecemos. Os factores a ter em conta

    so variados e o museu no pode comprometer a situao das obras, expondo-as a

    agentes de degradao ou danificando-os por privao de salvaguarda. Uma anlise

    2 A longo prazo

    3 Expresso e conceito que sero analisados ao longo do captulo primeiro, para uma reflexo sobre as

    noes de conservao da escola italiana.

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    perspicaz ao esplio de obras que este possui o ideal para recolher dados sobre como

    conservar da melhor forma. evidente que, a preservao adequada de uma coleco,

    depende do gnero de obras que a compem (o que se ajusta a um conjunto de telas no

    ser o mesmo que se aplica num conjunto de livros).

    O propsito assegurar a segurana e preservao a longo termo das coleces,

    a problemtica que se prope que, enquanto as obras demandam determinadas

    condies, os visitantes podem necessitar de outras. Administrar o ambiente pode ser

    difcil porque requer peritos, tempo e meios. Solicita um esforo de equipa constante e a

    cooperao do pblico. No entanto um ambiente controlado pode ser conseguido at em

    pequenos museus com escassos recursos.

    Para esta dissertao despontou portanto como hiptese oportuna e favorvel a

    descrio de casos autnticos de restauro preventivo de uma Fundao de renome em

    Portugal, possuidora de um percurso dignificante desde o comeo da sua existncia e,

    partindo deste pressuposto, h toda uma complexidade de temticas que achmos que se

    coadunavam perfeitamente com o tema e por isso mesmo complementam e enquadram

    globalmente todos os factores relevantes dos casos da Fundao Calouste Gulbenkian.

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    CAPTULO I

    ALGUMAS QUESTES TERICAS ACERCA DA CONSERVAO E

    RESTAURO DA PINTURA A LEO

    1. Restauro preventivo versus Conservao

    A pintura uma parte integrante da arte que relata um pedao de histria, seja pelo tema

    da pintura, pelo artista ou pela materialidade desta. este o entendimento necessrio de

    que o conservador precisa ao trabalhar com a obra. por isso que a preservao

    material deve ser conseguida, pois est directamente interligada preservao da

    historicidade, da vida da obra. A conservao de um objecto da arte prova que um

    determinado intervalo de espao-tempo existiu, e por isso esta prtica deve subsistir

    sempre porque, alterando ou danificando a obra, ou sujeitando-a s condies do tempo,

    retira-se-lhe o significado primordial: a transmisso de uma mensagem. Especialmente

    no caso da pintura que oferece uma viso diferente de outro tipo de objecto, d-nos uma

    viso mais viva e real, como uma brecha que nos possibilita uma aproximao

    verdica aos nossos antepassados. Se todo o esplio de pintura que possumos no

    tivesse sido conservado idoneamente ou no tivesse sobrevivido ao tempo decorrido, a

    nossa viso da Histria e das vicissitudes precedentes seria com certeza diferente.

    No se pode secundarizar a unio infrangvel entre a obra e o conservador, mas este

    deve evocar sempre o facto de que a obra a gui-lo e no o contrrio. A conservao

    diverge do restauro pois este ltimo procura recuperar as lacunas materiais e reestruturar

    possveis falhas, enquanto a conservao visa a adaptao da obra a um meio que

    possua condies idneas para que esta subsista ao longo do tempo, sem que o seu

    envelhecimento natural seja acelerado ou alterado por factores externos e sem que haja

    necessariamente uma interveno prtica na obra. Cesare Brandi denomina o que ns

    reconhecemos como conservao, de restauro preventivo4 e fundamenta o significado

    deste termo como a tutela, remoo de perigos e garantia de condies favorveis.

    No consiste apenas em intervenes prticas sobre a matria da obra, mas em

    4 BRANDI C. - Teoria del Restauro - Einaudi, Torino, 1977 pp. 53-54

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    qualquer procedimento que assegure, no futuro, a conservao desta como imagem e

    matria. Este refere ainda que somente a ttulo prtico que se distingue um restauro

    preventivo de um restauro efectivo executado numa pintura, enquanto um e outro valem

    pelo nico e indivisvel imperativo que a conscincia pe em acto: o reconhecimento da

    obra de arte na sua dupla polaridade esttica e histrica e que leva sua salvaguarda

    como imagem e como matria.5 Ou seja, a diferena entre o restauro e a conservao

    tnue, e implica conhecimentos anlogos com aplicaes diferentes, mas com o mesmo

    propsito de fornecimento de estabilidade vida da obra para que possamos protrair

    para o futuro o nosso legado.

    Brandi sustenta por fim que O restauro preventivo mais imperativo seno mais

    necessrio, do que aquele de extrema urgncia, porque dirigido ao impedimento deste

    ltimo, o qual dificilmente poder realizar-se com um salvamento completo da obra de

    arte.6 Claro que estas consideraes tm sido contestadas pelos tericos apologistas da

    conservao pura como Dezzi Bardeschi78 que sendo um dos basties da conservao

    integral afirma que as atenes devem ser concentradas prioritariamente sobre a

    imagem em detrimento da representao da cultura material que a produziu, valorizando

    assim a aparncia visvel ao invs da consistncia da obra (que ocasiona a alterao e

    destruio do valor material).

    A teoria Brandiana9 foca-se sim, na necessidade de equilibrar a dialtica esttica-

    histrica inerente s intervenes de restauro, pois enquanto a obra definida na sua

    dupla polaridade, a determinao das condies necessrias para o proveito da obra

    como imagem e facto histrico coincidem no campo da pesquisa, para encontrar a

    soluo estvel e portanto idnea longevidade da matria e da imagtica a serem

    transmitidas. Em termos estruturais, a matria ou matrias das quais formada, a

    razo pela qual parte da obra de arte se define como tal, por isso h uma

    5 BRANDI C. op.cit. p. 55

    6 BRANDI C. op. cit. p. 56

    7 Dezzi Bardeschi (Florena 1934) um arquitecto, terico da conservao integral, com cerca de 40 anos

    de profisso de renome, no mbito da conservao e interveno do patrimnio construdo. Possui

    inmeras publicaes no mbito do restauro e da arquitectura tendo fundado e dirigido (1980 -1985) o

    departamento para a Conservao dos recursos arquitectnicos e ambientais no Politcnico de Milo.

    Consultar http://www.marcodezzibardeschi.com 8 BARDESCHI M. - Manuale del Restauro Architettonico Mancosu Ed. 2001 - Cap. 8 Approcci

    metodologici 9 Cesare Brandi (1906 1988) formado em Letras demonstra, pelo seu percurso profissional e pelos seus

    estudos, uma actividade polidrica combinada com um pensamento humanstico e viso nica em relao

    obra de arte e sua dupla polaridade. Da conclumos a importncia da necessidade de incidir estes

    conceitos na formao do restaurador de modo a que este considere a obra e a veja como a entendia

    Brandi, na sua historicidade e na sua esttica, de modo a que ambas sejam recuperveis.

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    indispensabilidade de pesquisa pelo estado da consistncia da(s) matria(s) e

    consequentemente sobre as condies ambientais em que se insere (que tm de ser

    necessariamente consideradas pois podem permitir a precarizao ou ameaar

    directamente a conservao da obra).10

    Nos dois ltimos decnios o contraste entre a teoria da conservao e o restauro crtico11

    foi-se atenuando progressivamente resultando numa convergncia de posies crtico-

    conservativas, ou seja tem hoje uma inclinao prevalente para com a sensibilidade ao

    dever primrio da tutela, da perpetuao e da conservao das espcies sem esquecer as

    razes e os porqus de uma vlida modificao da prpria obra. Actualmente o restauro

    encontra-se definido cientificamente em termos de estatuto e chegou gradualmente a um

    alto nvel de rigor histrico e crtico, acolhe e integra a atribuio de funes

    compatveis e equilibradas para uma garantia de preservao no tempo.

    Brandi expe claramente a duplicidade dos problemas do restauro, que tem de ter em

    considerao os aspectos histricos, que se conservam para uma transmisso futura, e os

    aspectos estticos, precisamente porque se intervm directamente na materialidade da

    obra. Estas duas instncias esto, contudo, frequentemente em contraste. No panorama

    actual do restauro italiano sublinhamos as trs principais linhas de mtodo que

    privilegiam ou uma ou outra das instncias brandianas:

    Linha conservativa (Bellini e Bardeschi)

    Linha neo-filolgica (Marconi)

    Linha crtica (Carbonara)

    A linha conservativa, como j referido, privilegia o factor histrico em detrimento do

    esttico. O restauro visto como um acto eminente tcnico-cientfico, atento

    materialidade de um antigo testemunho histrico-artstico e que a obra para ser mantida

    e protrada na sua integridade e autenticidade, vindas do passado, no postula uma

    necessidade de retorno ao estado original, nem de parecer falsamente novo. Bardeschi

    10

    BRANDI C. op. cit. p. 57 11

    Por restauro crtico entende-se toda a interveno como um caso em si, no classificvel em categorias

    como as do restauro cientfico catalogadas pelos seus tericos. O restauro crtico no responde a dogmas

    ou regas mas segue a reinveno e a originalidade pois entende a obra como um objecto nico, logo, com

    requerimentos e competncias diversos das outras. O restauro crtico fundamenta a individualidade da

    obra e portanto das suas intervenes, dando extrema relevncia ao juzo crtico que o restaurador deve

    possuir. CARBONARA G. Avvicinamento al Restauro Napoli 1997 pp. 185-301 em BRANDI C. op. Cit pp. 13-14

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    define o restauro como o pior tipo de destruio acompanhado de uma falsa descrio

    da coisa destruda nem o pblico nem aqueles encarregues pela proteco dos

    monumentos pblicos compreendem o verdadeiro significado da terminologia restauro

    () o paradoxo grotesco que tal massacre continuamente motivado e oficializado

    por critrios (convenientes) da tutela e da salvaguarda.12

    A linha neo-filolgica (ou neo-estilstica) privilegia por sua vez o lado esttico em

    detrimento do histrico: procura uma recuperao da beleza perdida e da integridade

    mesmo que para isso se descure a complexidade e autenticidade histrica de um objecto.

    O restauro visto como a recuperao e restituio de um estado original, que se

    presume alcanvel com um processo de reintegrao completa pr-artstica mais que

    cientifica. As intervenes guiam-se pela necessidade de tipo esttico e de reintegrao

    total de uma expresso artstica. Marconi escreve, admito com orgulho () a debilidade

    em querer reconstruir no melhor dos modos o que tinha sido danificado ou

    destrudo13

    Por sua vez a linha crtica visa o estabelecimento de uma lgica saudvel entre as duas

    instncias avaliando caso a caso, para o fornecimento de uma resposta s perguntas que

    cada restauro prope, sem dogmas, ideologias ou mtodos pr-constitudos. Confia nas

    possibilidades expressivas e resolutivas das tcnicas modernas do restauro e guia-se

    pela diferenciao, interveno mnima, reversibilidade e autenticidade expressiva. Em

    caso de contraste histrico-artstico define-se um passo de cada vez para esclarecer que

    instncia deve prevalecer estabelecendo assim as linhas de interveno, sem delegar

    aleatoriamente e coordenando os argumentos e contrapropostas que sobressaram aps

    este esclarecimento.

    A linha mais sensata, podemos afirmar que a ideologia crtica que, apesar de no se

    querer basear em doutrinas pr-estabelecidas, no deixa de funcionar em prol dos dois

    aspectos mais importantes da obra, sempre em vista da transmisso contnua do legado

    que possumos e sem colocar em causa o lado histrico ou o artstico da obra. Contudo,

    aps esta reflexo, cada vez mais constatamos que a mxima de Brandi mais ajustvel

    e ponderada do que qualquer outra, pois o Museu vai ganhado sempre mais importncia

    como lugar permanente de manuteno do nosso legado, logo o restauro preventivo e a

    12

    BARDESCHI M. - Manuale del Restauro Architettonico Mancosu Ed. 2001 - Cap. 8 Approcci metodologici 13

    MARCONI P. Il recupero della bellezza Skira Ed. 2006 in http://architettura.unipr.it/didattica/att/ba8d.5802.file.pdf 01/06/2012

  • - 19 -

    adaptao equilibrada de valores favorveis pintura uma resoluo mais vantajosa do

    que um pobre acondicionamento geral com subsequentes restauros pontuais (muitas

    vezes infrutferos na recuperao da obra, dependendo do estado de deteriorao em que

    esta se encontra e a irreversibilidade dos danos causados). A deteriorao temporal da

    obra um processo inevitvel, como se do envelhecimento humano se tratasse,

    podemos abrandar este processo com todo o tipo de acondicionamento e proteco

    ideais mas no o conseguimos impedir totalmente. A obra de arte representa uma

    unidade temporal especfica e determinante pela herana de informaes que nos

    transmite e este legado s consegue continuar a ser transmitido se for conservado. A

    conservao exige um conhecimento total da materialidade da obra, das suas

    fragilidades e pontos fortes, da sua composio e da histria que transporta.

    O restauro preventivo acaba por ser uma terminologia que nos foi transmitida por

    Cesare Brandi, e que d significado a todo o tipo de interveno indirecta que vise o

    bem-estar da obra e o seu prolongamento na Histria. Suscita dvidas por ser uma

    expresso que englobando a palavra restauro, remete-nos automaticamente para uma

    viso de intervenes estruturais e directas. Brandi poder referir-se ao restauro

    preventivo como o trabalho de um tcnico que se foque maioritariamente na

    conservao das peas, e no numa aco directa e nica sobre a obra. De modo geral a

    conservao como fundamento, poder significar o mesmo que restauro preventivo

    visto que ambas se baseiam nas aces indirectas. Em suma, cremos que apesar das

    divergncias em usar determinadas terminologias, que sero mais ou menos adequadas,

    segundo a viso da prpria pessoa, o restauro preventivo e a conservao tm ambas as

    mesmas finalidades, baseiam-se nos mesmos conceitos e focam os mesmos aspectos

    quando se trata de escolher a maneira de operar. A aplicao deste termo precede

    logicamente os seus fundamentos, e cremos que a escola italiana se baseia muito no

    principio do restauro preventivo, tendo sido este l originado, enquanto que de maneira

    geral o termo conservao o mais utilizado, talvez por ser um termo de certa maneira

    mais abrangente, que engloba todas as variantes da conservao. O restauro preventivo,

    por ser denominado restauro, no significa que obrigatoriamente isso implique uma

    interveno na obra em si, mas intervenes em prol do seu bem-estar, intervenes que

    a acondicionem do melhor modo14

    . Estas acabam por ser ento expresses anlogas, e o

    14

    Giuseppe Basile, restaurador italiano, aluno e discpulo de Brandi, dirigiu os restauros da Cappela degli

    Scrovegni em Pdua, seguindo sempre a metodologia do seu mentor. Vrias intervenes indirectas foram

    realizadas e por ele denominadas de operaes de restauro preventivo, retiramos exemplo de alguns:

  • - 20 -

    facto de se adequarem ou no ao tipo de interveno levada a cabo por um tcnico

    restaurador-conservador, cremos que tenha a ver com o seu background , denotamos

    sobretudo que a prevalncia da utilizao desta expresso brandiana se manifesta em

    Itlia, onde os cnones brandianos, independentemente das outras linhas de pensamento

    que possam surgir ao longo da histria do restauro, imperam, por serem os que mais se

    coadunam com o tipo de trabalho que, cada vez mais, o tcnico tem de executar.

    1.1 O restaurador-conservador e o curador uma relao intrnseca e distinta no

    mbito da conservao e do restauro

    Esta abordagem, surge como resultado do estudo comparativo entre a tipologia

    de trabalho da conservao e do restauro. Seguindo as missivas de Brandi assumimos

    que so dois encargos diferentes, mas actualmente consideramos que haja um pouco de

    desentendimento no que diz respeito ao trabalho de um tcnico e o de um curador.

    Coloca-se a questo: porqu esta fuso algo indistinta de trabalhos que requerem

    competncias diferentes? Estas so duas reas que estaro sempre e inevitavelmente

    interligadas porque visam o cumprimento do mesmo objectivo o prolongamento da

    vida da(s) obra(s) - mas um conservador no executa as funes de um restaurador e

    vice-versa, podendo apenas complementar-se alternadamente nas suas tarefas.

    Esclarecemos que com conservador queremos indicar o designado curador que executa

    funes que complementam as dos tcnicos especializados e vice-versa. Destacamos no

    CDIGO DE TICA da E.C.C.O.15

    Directrizes Profissionais (II) algumas das

    directrizes16

    descritas que julgamos uniformes e anlogas na descrio das funes do

    tcnico restaurador - conservador17

    :

    filtros nas vidraas, substituio de lmpadas incandescentes e um filtro entre o interno e externo do

    edifcio (aplicado durante a restruturao), uma das operaes mais complexas e modernas realizadas no

    restauro da Capela. Aps um ano verificou-se uma nova e estvel situao ambiental interna o que

    significa que os restauros preventivos foram eficazes. http://www.giottoagliscrovegni.it/ita/resta

    16/07/2012 15

    European Confederation of Conservator-Restorers Organisations 16

    E.C.C.O. Directrizes Profissionais (II): CDIGO DE TICA, aprovado pela sua Assembleia Geral em

    Bruxelas a 7 de Maro de 2003, em http://arp.org.pt/profissao/codigo-de-etica.html 14/05/2012 17

    A E.C.C.O. denomina o tcnico de restaurador- conservador pois define esta rea como contradistinta

    das restantes dentro da Arte. O objectivo do tcnico a preservao do patrimnio cultural ao invs da

    criao de novos objectos ou reparao no sentido funcional. A formao do tcnico especificamente

    em conservao e restauro, da a sua denominao, pois o tcnico apreender toda a informao

    necessria para de modo directo ou indirecto, salvaguardar a vida da obra.

  • - 21 -

    II. Obrigaes para com os Bens Culturais

    ()

    Artigo 5. O Conservador-restaurador deve respeitar o significado esttico, histrico e

    espiritual e a integridade fsica dos bens culturais que lhe foram confiados.

    Artigo 6. O Conservador-restaurador, em colaborao com outros profissionais

    relacionados com o Patrimnio Cultural, deve ter em considerao as exigncias da

    utilizao social dos bens culturais que est a preservar.

    Artigo 8. O Conservador-restaurador deve ter em considerao todos os aspectos

    relativos Conservao Preventiva, antes de desempenhar o tratamento de bens

    culturais, e dever limitar o tratamento ao estritamente necessrio.

    Artigo 9. O Conservador-restaurador deve empenhar-se em utilizar unicamente

    produtos, materiais e procedimentos que, de acordo com os nveis de conhecimento

    nesse momento, no iro danificar os bens culturais, o meio ambiente ou pessoas. A

    prpria interveno e os materiais usados no devem interferir, dentro do possvel, com

    quaisquer diagnsticos, tratamentos ou anlises futuros. Devem ainda ser compatveis

    com os materiais constituintes desses bens culturais e, tanto quanto possvel, fcil e

    totalmente reversveis.

    ()

    Artigo 15. O Conservador-restaurador nunca deve remover material de bens culturais,

    a no ser que seja indispensvel para a sua preservao ou que esse material interfira

    substancialmente com o seu valor histrico e esttico dos bens culturais. Os materiais

    removidos devem ser conservados, sempre que possvel, e o procedimento

    integralmente documentado.

    Artigo 16. Quando a utilizao social de um bem cultural seja incompatvel com a sua

    preservao, o Conservador-restaurador deve discutir com o proprietrio ou

    responsvel legal se a execuo de uma reproduo do bem cultural poder ser

    soluo. O Conservador-restaurador deve recomendar processos de reproduo

    adequados, de modo a no danificar o original.

  • - 22 -

    Todo este tipo de decises so feitas pelo conservador - restaurador que, analisando a

    obra, estruturalmente e no meio circundante, ir decidir o que melhor para o

    prolongamento da vida desta. Usufrumos assim deste exemplo para sublinhar a patente

    diferena que existe entre o tcnico restaurador-conservador e o curador, que esse sim

    tem funes de superviso, administrao e delegao, complementares s dos tcnicos

    de restauro. O trabalho do curador multifacetado, e dependendo do tipo de instituio

    em que est inserido pode ser uma pessoa altamente especializada com

    responsabilidades particulares para reas da coleco definidas ou pode desenvolver um

    trabalho mais generalista que permita controlar um vasto espectro de materiais e

    encarregar-se do desenvolvimento de uma exposio ou a manuteno e utilizo das

    instalaes do museu.

    O CurCom18

    descreve as funes do curador, sublinhando a importncia de ter em conta

    os seguintes factores:

    A interpretao, estudo, cuidado e desenvolvimento da coleco;

    Os materiais, conceitos, exposies e outros programas focados na identidade do

    museu.

    Dada a sua posio dentro do museu, o curador tem directas responsabilidades para com

    a coleco e pelo papel que desempenham em relao ao desenvolvimento do material

    interpretativo, os curadores so embaixadores que representam a instituio em que se

    inserem, dentro da esfera pblica.19

    H uma notria distino entre o tipo de funes

    desempenhadas por um conservador responsvel por diversas reas do museu e um

    tcnico de conservao e restauro que se ocupa principalmente da vitalidade da obra. E,

    apesar do trabalho do conservador se focar em todas as envolventes das obras das quais

    encarregue, o seu trabalho acima de tudo evidencia-se na delegao de tarefas e

    liderana dentro da comunidade do museu. semelhana das Directrizes Profissionais

    dadas pela E.C.C.O em relao ao tcnico especialista, o Cdigo de tica elaborado

    pela CurCom evidencia a tipologia de trabalho desenvolvida pelo conservador, do qual

    retiramos alguns exemplos para efeitos comparativos:

    18

    Curators Committee of the American Association of Museums

    19CurCom A Code of Ethics for Curators approved by the Executive Committee of CurCom at the

    AAM Annual Meeting in 2009 p.3

  • - 23 -

    Assumir responsabilidades para com os cuidados gerais e desenvolvimento da

    coleco, que pode incluir artefactos, fine arts, espcimes, estruturas histricas

    e propriedade intelectual;

    Desenvolver e organizar exposies;

    Desenvolver e providenciar o usufruto da coleco ao pblico;

    Executar pesquisas para identificao de materiais na coleco e para

    documentar posteriormente a sua histria;

    Representar a sua instituio para com os media, em reunies publicas e

    conferencias e seminrios profissionais.

    Consideramos ainda mais relevantes os valores que o curador deve possuir20

    :

    Servir o bem pblico contribuindo e promovendo a aprendizagem, a consulta e

    o dilogo ();

    Servir a instituio de maneira responsvel gerindo financiamentos, materiais e

    recursos intelectuais; perseguindo os objectivos e a misso da instituio,

    respeitando a diversidade de ideias, culturas e crenas ();

    Servir a profisso museolgica com a promoo e prtica de excelncia,

    honestidade e transparncia em todas as actividades profissionais.

    O curador tem portanto um papel de orientador relativamente ao desenvolvimento da

    coleco considerando sempre a conjuno dos valores transmitidos pelo museu, ou

    seja, o que que a entidade possuidora do acervo pretende fazer com este e qual a sua

    misso, bem como outras polticas de procedimentos. So encarregues de toda uma

    panplia de funes, sendo capazes de identificar malefcios na coleco ou deficincias

    que possam existir a nvel da conservao, efectuando revises das espcies

    periodicamente, no s o seu estado mas tambm a nvel da exposio, deslocando as

    obras ou gerindo o espao de exibio para que as obras no percam a relevncia (que

    acaba por estar directamente interligada com a misso do prprio museu) a qual o

    pblico est encarregue de lhes dar.

    O ICOM refere que o termo conservao engloba todas as funes de conservao e de

    restauro, no entanto fornece-nos as diferenas entre as tipologias de trabalho, referindo

    20

    Ibidem p. 3

  • - 24 -

    que a conservao preventiva consiste em todas as medidas e aces destinadas ao

    evitar e minimizar futuras deterioraes ou perdas. So conduzidas no mbito do

    contexto ou do meio circundante de um item, mas mais frequentemente num grupo de

    itens, independentemente da sua idade ou condio. Estas medidas e aces so

    indirectas no interferem com os materiais e estruturas dos itens. No modificam a

    sua aparncia.21

    J o restauro definido como todas as aces directamente aplicadas

    a um singular e estvel item visando a facilitao sua apreciao, compreenso e

    utilizao. Estas aces s so levadas a cabo quando o item perdeu parte do seu

    significado ou funo atravs de alteraes passadas ou deteriorao. So baseadas no

    respeito pelo material original. Frequentemente tais aces modificam a aparncia de

    um item22

    .

    Assumimos ento que apesar do englobamento da nomenclatura do restaurador-

    conservador, as funes sero sempre divergentes das de um curador, que tem como

    funo principal o acondicionamento indirecto da coleco, sem ter necessidade de

    intervir directamente em qualquer aspecto estrutural de que as obras possam carecer.

    Podemos sumarizar os conceitos dizendo que o conservador delega as tarefas ao tcnico

    de conservao e restauro, pois apesar de serem parte integrante do mesmo campo,

    executam tarefas diferentes e complementares, e distinguem-se por serem dois cargos

    diferentes com aprofundamentos distintos. O curador teoriza e delega o que possvel

    fazer para o melhor acondicionamento das obras, sem ter propriamente necessidade de

    um background tcnico (embora seja conveniente), enquanto que o restaurador executa

    um tipo de trabalho completamente manual, tcnico-cientfico, interagindo com a obra e

    as suas condicionantes. Visam, como j referido, sempre o mesmo objectivo, o fornecer

    de longevidade vida da obra, respeitando os aspectos estruturais, estticos e histricos

    da mesma, mas ocupam-se das obras de maneira diferente.

    21

    Terminology to characterize the conservation of tangible cultural heritage - Resolution to be

    submitted to the ICOM-CC membership on the occasion of the XVth Triennial Conference, New Delhi,

    22-26 September 2008 p. 2 22

    Ibidem p. 2

  • - 25 -

    2. Aspectos fundamentais da pintura a leo

    Todas as pinturas, assim como todas as obras de arte, esto sujeitas ao envelhecimento

    ou acondicionamento ao meio em que se encontram e tal fenmeno concerne toda a

    estrutura da obra. As pinturas so feitas de diversos materiais, que juntos formam uma

    estrutura complexa e interligada que pode ser facilmente ou danificada devido

    sensibilidade dos seus componentes em relao ao ambiente circundante.

    O estrato pictrico, em particular, revela sinais de envelhecimento que podem ser

    devidos ao suporte, preparao, aos pigmentos e aos seus ligantes, assim como aos

    vernizes que frequentemente no so possveis procrastinar com intervenes

    conservativas, nem anular com operaes de restauro. Como j referido, uma boa

    conservao consegue abrandar a deteriorao, mas no a pode parar. Um conhecimento

    global e completo da estrutura da pintura, dos seus materiais e potenciais fragilidades,

    das tipologias de degradao e possveis ameaas, proporcionam ao conservador os

    instrumentos necessrios para uma boa prtica de conservao.

    Uma pintura a leo geralmente constituda por quatro estratos principais: o suporte, a

    preparao, a camada pictrica e o verniz.

    Figura 1 Exemplo de corte transversal da superfcie de uma tpica estrutura

    A camada preparatria e a pictrica podem estar por sua vez subdivididas, a pluralidade

    destas diferencia-se normalmente por poca, provenincia ou artista.

  • - 26 -

    Figura 2 Corte transversal de uma pintura a leo

    Como reportado na Figura 2 podemos ver um corte seccional de uma pintura a leo

    sobre tela que contm 5 estratos diferentes para alm do suporte, sendo que a primeira, a

    camada preparatria serve como estrato preliminar para a aplicao das cores a leo.

    Como indica a prpria nomenclatura, o estrato intermdio que d tela a idoneidade

    material, sela a porosidade do suporte e d suavidade superfcie para a aplicao da

    camada seguinte, a pictrica. Segue-se a imprimitura, uma outra camada preparatria,

    que um estrato impermeabilizante feito com a utilizao de uma cola animal (aplicada

    vrias vezes) ou mediante uma primeira camada homognea de leo com cor. A camada

    pictrica implica ento a utilizao do ligante ou mdium que o leo, que ir englobar

    o pigmento. Antes da industrializao das cores, a preparao destas era um processo

    manual e moroso, desde a moagem dos pigmentos at preparao do leo para a

    consequente mistura e aplicao, e estes eram produzidos pelo prprio artista que

    decidia assim o tipo de cor a utilizar, bem como a densidade desta, criando uma paleta

    de cores exclusiva. Este gnero de pintura implica frequentemente a aplicao da

    tcnica de velatura sobre velatura para dar dimenso imagtica do quadro, visto que a

    prpria tcnica ao contrrio das outras que podem ser limitativas, pode ser aplicada e

    modificada visto os tempos de secagem longos. um tipo de pintura normalmente

    estvel, duradoura e resistente, se bem aplicada. No entanto, o envelhecimento afecta

    igualmente este gnero de pintura, com diversas variantes, que podem ser naturais ou

    causais, esta ltima por vezes erro do prprio pintor por falta de conhecimento dos

    materiais e da consequente m aplicao dos mesmos.

  • - 27 -

    As modificaes do estrato pictrico devido s tcnicas pictricas e/ou envelhecimento,

    so:

    Rugas;

    Amarelecimento primrio e secundrio;

    Perda de capacidade de cobertura;

    Perda de coeso;

    Descolorao ou atenuao das cores;

    Escurecimento;

    Deslizamentos;

    Craquelures;

    Blanching23.

    O amarelecimento primrio frequentemente encontrado, uma reaco escurido

    que comparece nas pinturas frescas que foram conservadas no escuro ou na penumbra.

    Depende da natureza dos leos secantes, da sua percentagem, da espessura do estrato e

    da HR do ar, quando o ar muito seco a pelcula pictrica no amarelece. O

    amarelecimento verifica-se com o passar do tempo, um efeito secundrio da secagem,

    quando em estado lquido os leos secantes no amarelecem. Com o passar do tempo o

    amarelecimento primrio transforma-se em secundrio, este consequente da presena

    e aco da luz (ao invs do amarelecimento primrio) e irreversvel. Este efeito

    deteriorante acontece somente em zonas de cor branca ou claros, para as outras cores,

    sobretudo as da gama fria (que vo dos azuis aos roxos), no h um amarelecimento

    mas sim uma alterao irreversvel das cores, que mutam para uma gama que vai do

    verde ao castanho-escuro. Algumas das cores utilizadas pelos mestres do passado, em

    particular nas velaturas, perderam a vivacidade da tonalidade original no decorrer do

    23

    Branqueamento: reas irregulares, plidas ou de cor leitosa , na pintura ou na camada de verniz; no

    so um defeito superficial como o bloom mas sim uma disperso geral de luz devido porosidade

    acrescida ou granulao em films envelhecidos, in Appendix L: Curatorial Care of Easel Paintings,

    http://www.nps.gov/museum/publications/mhi/appendl.pdf - traduzido por Elisa Comberiati

  • - 28 -

    tempo. Esta atenuao influenciada pela luz e pelo oxignio e depois de uma fase

    inicial sbita de descolorao segue-se uma mais lenta.

    2.1 Os Craquelures

    As manifestaes mais evidentes e mais frequentes de deteriorao e envelhecimento

    so os craquelures, por isso cremos que seja importante abordar esta patologia da

    degradao das pinturas. o sinal de envelhecimento ou danificao mais reconhecido,

    pela sua facilidade de diagnstico a olho nu e apesar de parecerem semelhantes, os

    craquelures tm de facto origem e razo diferente. Estes consistem numa rede de

    fissuras ou fendas que dependem de vrios factores: dos materiais usados para a pintura,

    da tcnica do artista, das condies atmosfricas s quais foi submetida a pintura e do

    modo como foi tratada e/ou preservada. So contraces e microrroturas nos estratos

    constitutivos de uma pintura com diferentes coeficientes de dilatao segundo a

    elasticidade do suporte, da preparao e da camada pictrica. H uma distino entre o

    tipo de craquelures: podemos afirmar que todas as formas de fissuras produzidas no

    mbito do processo de secagem ou de oxidao definem-se fendas de retrocesso ou

    retiro, ao passo que quando o estrato pictrico j se encontra seco, oxidado,

    polimerizado e no elstico pode apresentar fissuras de envelhecimento devido a

    agentes mecnicos externos. Das fissuras, para alm da morfologia, geralmente

    conseguimos distinguir a formas dos bordos, a profundidade, a largura e a distncia.

    Diviso de tipologias das craquelures:

    Envelhecimento deformao plstica devido ao processo natural de envelhecimento.

    Tambm denominada de CVCP24

    , ou seja a capacidade de absoro de leo que um

    pigmento possui. As zonas com maior quantidade de leo ressentem mais os

    movimentos e vice-versa, o que significa que numa pintura coexistem vertical e

    horizontalmente diferentes tenses. A tela inevitavelmente alargar-se- porque a

    urdidura muito mais rgida que a trama25

    . As cores duras quebram primeiro devido

    baixa concentrao de CVCP e as fendas podem ser poligonais, com andamento

    24

    Critical Pigment Volume Concentration Concentrao Volumtrica Crtica do Pigmento 25

    Urdidura so os fios longitudinais paralelos deitados sobre a armao da tela. A trama so os fios transversais inseridos com lanadeiras. Consultar Anexos Imagem 1. Em /http://www.disegnoepittura.it/tecnica-caravaggio-tele/ 17/07/2012

  • - 29 -

    geomtrico, ordenado, ortogonal, farpado etc... as que tm um bordo visivelmente

    lmpido so mais recentes e so devidas a traumas fsicos.

    Precoces tcnicas erradas ou pouco idneas, de execuo (a cor lasca). H uma

    mxima a respeitar a do grasso sul magro, ou seja substncias polares em bases

    apolares26

    . Se esta no for respeitada, ou seja revertida, d-se um deslizamento da

    matria magra na gorda que causa uma consequente quebra. Existem vrios tipos de

    craquelures j identificveis, pela sua frequncia:

    Cocleares/ Cocleiformes quando a espessura do estrato excessiva

    relativamente ao suporte, este no aguenta a cor. um fenmeno que se

    encontra frequentemente em pinturas do sculo XVIII;

    Vrtice quando os tempos de secagem no so respeitados entre os estratos

    subjacentes h uma tentativa de sada (evaporao) do solvente pelo

    substrato, que ao tentar sair concentra-se nos pontos mais dbeis;

    Rugas/ Encrespaduras - apresentam-se como vincos/pregas ou grumos na

    superfcie e so devidas a um excesso de ligante, geralmente muito difusa

    nos bordos;

    Fendas estratos espessos de cor e de medium que ficam presos na zona

    subjacente, so semi-concntricas;

    Ilha excessos de ligante aplicado de maneira homognea, subtil,

    distendido. Com a evaporao da fraco voltil do medium d-se uma

    renncia ou encolhimento da matria, os bordos distanciam-se deixando

    entrever o estrato subjacente. Sumariamente a cor contrai-se sem o ligante;

    Fechadas quando o estrato preparatrio suporta uma ruptura precoce

    enquanto a cor sobrejacente se encontra ainda macia e s com o tempo

    tender a fender-se.

    Causas eventuais precipitadas devido a causas externas, eventos catastrficos (velas,

    incndio, inundaes etc...):

    26

    A regra do grasso sul magro diz respeito s substncias compatveis com a gua, da polares, e as

    substncias gordas incompatveis com a gua, da no se poderem misturar pela sua natureza diferente.

  • - 30 -

    As ascenses sbitas de temperatura comportam uma evaporao do

    solvente tendem a ter bordos mais farpados;

    Longas exposies em ambientes saturados de HR podem acelerar o

    fenmeno creep27

    que se manifesta com fendas muito vincadas;

    O transporte de cor de um suporte para outro faz com que as tipologias se

    somem - sobreposio de craquelures.

    Degradao/deterioramento define-se como degenerao do envelhecimento. As

    craquelures de deterioramento podem-se definir como o produto de uma srie de ajustes

    da pintura, podemos encontrar bolhas ou elevaes da pintura. Neste caso a cor que

    deforma a tela e no o contrrio, a tela elstica e a cor inicialmente tambm, mas ao

    longo do tempo torna-se plstica. Estas fendas assumem todas as formas relatadas

    precedentemente mas esto mais a risco porque tem os bordos elevados, tm de ser no

    somente tratadas mas tambm aplainadas/niveladas.

    O envelhecimento material est ento ligado aos movimentos e ao acostumar da obra

    ao longo da sua existncia: consideremos o estrato pictrico e a sua preparao como

    uma nica entidade - as solicitaes mecnicas que interessam preparao provocam

    fissuras que se transmitem pintura.

    H ulteriores factores que contribuem para a deteriorao da pintura, relativamente ao

    suporte independentemente da idade, seja este de madeira ou tela, em presena de

    humidade incha ou encolhe segundo a percentual de HR em determinado momento.

    Estes movimentos se contnuos fazem com que a pintura e a preparao deslizem do

    suporte por no conseguirem acompanhar as movimentaes deste. um fenmeno que

    pode mesmo causar a separao dos estratos, mais frequentes e extremas forem as

    oscilaes de humidade relativa e temperatura mais danos causar pintura. Em

    situaes inversas, o extremo calor e seca causam um aceleramento do processo de

    envelhecimento e faz com que as fibras enfraqueam e fiquem quebradias. As telas

    podem tambm fazer folgas o que consequentemente origina vincos e protuberncias. A

    humidade inconstante ou alta tambm facilita o desenvolvimento de bolor e atrai

    27

    O fenmeno creep consiste no efeito, sobretudo em telas de grandes dimenses, de surgimento de

    bolsas devido presso exercida pelo peso e como resultado destas alteraes o film (camada) pictrico quebra e cai.

  • - 31 -

    diversas tipologias de insectos que os so motivadores da biodegradao. A camada

    protectora, de verniz, est sujeita ao amarelecimento e a craquelures, assim como

    acumulao de ps e sujidade na superfcie. Sendo a primeirssima camada, est

    desarmada e vulnervel s mudanas que possam ocorrer volta desta.

    A problemtica que se prope como razo para todos estes danos consequentes, poder

    estar no acondicionamento forado da obra, a determinado ambiente. Ao colocarmos

    uma obra num ambiente desconhecido, totalmente diferente do ambiente onde sempre

    esteve inserida resulta num acomodamento forado da obra a estas condies, mesmo

    que para isso a deteriorao acelere. uma situao mais frequente com obras a fresco

    que so extremamente sensveis a mudanas ambientais devido aos materiais

    componentes que tendem a interagir, devido sua natureza, com os elementos

    atmosfricos presentes no ar circundante. Hoje a escolha recai em deixar o fresco no seu

    ambiente original para permitir uma leitura exacta da obra, e para assegurar que a

    unidade estrutural se mantenha, somente quando as condies ambientais do local no

    garantem a sua sobrevivncia que se procede com o stacco28

    ou seja a remoo do

    fresco da parede original.

    A identificao das diversas formas de degradao que atingem a obra so importantes

    na aplicao de metodologias de diagnstico que tm como tarefa a obteno de dados e

    informaes sobre a forma como estes factores interagem com a obra. de fundamental

    importncia tambm, o diagnstico ambiental, que tem por objectivo, recolher dados e

    informaes sobre o ambiente em que se encontra a obra toda esta informao permite

    ao tcnico a definio das melhores condies para a preservao das obras.

    28

    Definio em italiano para remoo

  • - 32 -

    CAPTULO II

    NOOES DE MUSEOLOGIA COMPORTAMENTOS A ADOPTAR PARA AS

    BOAS-PRTICAS DE CONSERVAO NO MUSEU

    O International Council of Museums (ICOM) define a Museologia como a cincia do

    museu ou o estudo da histria e do passado dos museus, do seu papel na sociedade, de

    sistemas de pesquisa especficos, conservao, educao e organizao, relao com o

    ambiente fsico ()

    1. Responsabilidade conservativa do Museu

    O museu uma instituio permanente, ao servio da sociedade e da sua

    evoluo, que deve ter como objectivo a aquisio, conservao, pesquisa, comunicao

    e exposio (para educao e deleite), dos testemunhos materiais da humanidade e do

    ambiente.29

    incumbida ao museu a tarefa de difundir o conhecimento do patrimnio

    adquirido, e de comportar-se como abrigo dos vestgios materiais da nossa civilizao e

    igualmente proteg-los de maneira ininterrupta para dar longevidade ao patrimnio.

    Uma das suas finalidades principais a de garantir a conservao mais adequada e

    idnea dessa herana.

    O campo que abrange o meio conservativo do local da exposio a

    museologia, matria de competncia tcnica em que se projectam, entre outros, os

    meios de apresentao mais idneos s obras, como a climatizao do ambiente, parte

    fundamental da estabilidade que as obras tm de ter. So considerados os diversos

    aspectos da actividade do museu e estudados os meios mais aptos realizao completa

    do propsito da exposio, sem negligenciar a conservao. finalidade primordial do

    museu a soluo dos problemas referentes conservao da obra. As exigncias

    comeam pelo local onde instalado o museu, que deve ser concebido para que os

    29

    Definio de Museu segundo os Estatutos do ICOM adoptados durante a 21 Conferencia Geral em

    Viena, Austria 2007: A museum is a non-profit, permanent institution in the service of society and its development, open to the public, which acquires, conserves, researches, communicates and exhibits the

    tangible and intangible heritage of humanity and its environment for the purposes of education, study and

    enjoyment.

  • - 33 -

    objectos fiquem ao abrigo de factores de destruio, como a humidade - que um dos

    mais graves.

    Outro problema para a conservao a explorao intensiva a que esto sujeitas

    as obras, desde a simples exposio ao pblico at s exposies temporrias no exterior

    do museu ou em outras localidades. A frequncia dessas viagens faz com que os

    objectos sofram com as variaes causadas pela mudana. por estes motivos que

    garantir a segurana a longo prazo e preservao das coleces requer

    fundamentalmente a estabilidade das obras, por isso se criam ambientes controlados que

    impedem que variaes de luz, calor ou humidade cheguem ao corpo da obra.

    Examinando a histria da evoluo cientfica e o desenvolvimento das ditas

    recomendaes para o clima dos museus, revelou-se mnimo o apoio cientfico dado.

    Muitas das advertncias dadas no eram aplicveis a toda a tipologia de objectos, agia-

    se seguindo suposies baseadas em provas nfimas. S recentemente que a pesquisa

    comeou a focar-se na permanncia dos objectos num determinado local e a pensar nas

    limitaes mecnicas dos sistemas de climatizao, do ambiente circundante exterior e

    em regulamentos de edifcios histricos, fornecendo aos tcnicos uma base cientfica

    credvel para a determinao dos valores apropriados para o clima do museu

    especialmente o intervalo de temperatura e humidade relativa em que os objectos esto

    estveis. Ora a preservao das obras depende do conhecimento dos materiais que

    integram as mesmas, como se comportam e como as influncias ambientais actuam

    sobre estas, para poderem ser posteriormente controladas. Danos causados pela aco da

    luz e de valores inadequados termo-higromtricos, deterioram lentamente e de maneira

    menos dramtica. Evidente que a luz no se pode eliminar uma vez que necessria

    visualizao dos objectos (e permite que o pblico se movimente com segurana). A

    quantidade e o tipo de radiao a que podero ser expostas coleces mais susceptveis,

    devem ser limitadas ao montante mnimo da faixa espectral de luz visvel indispensvel

    para a visualizao de uma obra. Sem dvida que uma tarefa que requer uma

    adaptao variabilidade do olho humano e da ampla gama de cores, texturas e

    contrastes. Determinar de maneira concreta os nveis mais apropriados muito

    complexo, pois tantos outros efeitos tm de ser considerados, visto que diferentes

    materiais tm diferentes respostas a valores especficos ou a alteraes. Um clima

    adequado para um tipo de material pode ser extraordinariamente prejudicial para outros

  • - 34 -

    e o efeito a curto e longo prazo e a velocidade do processo de envelhecimento de cada

    matria deve ser considerado.

    A manuteno do museu em climas especficos continuamente demorada, cara,

    sempre activa e de grande responsabilidade um meio adequado contribuir para a

    permanncia da coleco no museu. Caso seja um processo negligenciado em que se

    trabalhe com uma base de dados incorrecta ou incompleta para alm de ser prejudicial

    um desperdcio de energias e fundos. Michalski notou a semelhana entre a conservao

    preventiva moderna e os conselhos dados para a boa manuteno domstica em textos

    do sculo XIX e uniu-os, sumarizando-os em 5 pontos essenciais30

    :

    Deixar os espaos limpos e arrumados;

    Manter um horrio rotineiro para as tarefas relativas manuteno;

    Controlar a humidade (mofos e eventual apodrecimento);

    Confinar (proteger) o acervo;

    Conhecer os objectos.

    Este ltimo ponto, talvez o de maior importncia para a conservao em si,

    julgamos que pretende salientar todas as medidas que devem ser tomadas para ampliar a

    vida da obra, ou protrair o seu envelhecimento. Para uma preveno adequada deve-se,

    em primeiro lugar, conhecer a estrutura material da obra, ou seja a matria e a tcnica

    utilizadas na sua confeco, que iro posteriormente definir as intervenes bsicas de

    conservao31

    .

    1.1 A problemtica

    Se o tutelar define uma abordagem subjectiva ou passiva, o acto do apresentar

    ou mostrar , ao invs, caracterizado por uma gestualidade activa, prtica e aberta: este

    dualismo de metodologia em certos aspectos antitica contra distingue as principais

    30

    MICHALSKI S. - Risk analysis of backing boards for paintings: damp climates vs cold climates in Colour and Conservation - Materials and Methods in the Conservation of Polychrome Art Works.

    Minimal Intervention on the Structural Conservation of Paintings, Proceedings of the CESMAR7

    Conference, Thiene, October 2004 pp. 21-22 31

    DRUMOND P. - Preveno e Conservao em Museus 09-11-2010 em Instituto Brasileiro de Museus p.108 http://www.museus.gov.br/sbm/downloads/cadernodiretrizes_sextaparte.pdf

  • - 35 -

    finalidades, caractersticas, da instituio museal. Como refere Michalski32

    o

    material versus o conhecimento ou seja, o objectivo por oposio ao subjectivo: o

    mundo material aquele do qual podemos deduzir que a sua existncia subsiste,

    independentemente da sabedoria humana e sua percepo deste. So as mudanas

    qumicas moleculares s quais damos definies e analisamos para um contnuo estudo

    subjectivo. A demanda pela conjugao destes propsitos antinmicos, dando respostas

    unvocas, contra distingue e envolve inmeros aspectos da vida do museu como os

    aspectos prticos conceptuais, institucionais e tcnicos. A conciliao das exigncias,

    potencialmente contraditrias, entre a salvaguarda do patrimnio, a sua conservao e o

    acolhimento de um pblico que reivindica nveis diferentes de oferta cultural, requerem

    no s uma profissionalizao e especializao mas tambm uma interdisciplinaridade,

    transversalidade e capacidade de trabalhar em grupo, pela parte dos responsveis pela

    conservao.33

    1.1.2 Tutela das coleces

    Fundamentalmente a figura do conservador a mais relevante no que concerne a

    responsabilidade da segurana, gesto e valorizao das coleces que tem em mos.

    Idealmente o conservador deve34

    :

    Colaborar com o Director para a definio dos objectivos do instituto;

    Ser o referente cientfico no interior (e aquando situaes oportunas no exterior

    do edifcio) do museu, pelas coleces pelas quais responsvel;

    Predispe planos de manuteno standards, de conservao e restauro;

    Ajuda na elaborao dos projectos de exposio do acervo;

    Conduz e coordena as actividades de pesquisa cientficas;

    Colabora para a valorizao das coleces.

    A cincia da conservao uma matria vasta e articulada e as actividades

    desenvolvidas pelos peritos deste campo concernem mltiplos campos, da qumica

    32

    MICHALSKI S. - Conservation lessons from other types of museums and a universal database for

    collection preservation - in Modern Art: Who Cares, Netherlands Institute for Cultural Heritage. pp. 290-

    295, 1999 33

    DAGOSTINO V. - Condizioni Microclimatiche e di qualit dellaria negli ambient museali - Universit degli Studi di Napoli Federico II, 2005 Tese de Doutoramento pp. 10-11 34

    Ibidem p. 12

  • - 36 -

    radiologia, aos mtodos de investigao das obras de arte (como a cromatografia,

    espectrofotometria etc.). Nos ltimos anos a conservao de obras de arte tem ganho um

    crescente interesse pela parte da pesquisa cientfica aplicada, esta nova ateno devida

    forte perseverana das estratgias de conservao preventiva que, ao apelarem ao seu

    carcter multidisciplinar conseguem envolver activamente o sector fsico/tcnico,

    nomeadamente devido ao controlo de parmetros como os da temperatura, humidade

    relativa, radiaes etc., que influenciam os fenmenos naturais de degradao das obras.

    oportuno assumir que do ponto de vista tcnico conservar significa criar volta da

    obra de arte, condies microclimticas adequadas. Todavia a idoneidade de um

    ambiente museal no clara, porque todos os processos e controlos no podem ser

    estandardizados esquematicamente quando lidamos com objectos que requerem

    condies climticas no standard e que normalmente esto inseridos em edifcios que

    por sua vez tm as suas necessidades tecnolgicas construtivas. Isto significa que

    necessrio considerar trs elementos principais do sistema museal: o museu, as

    coleces e o pblico em que cada um pode apresentar problemticas diversas. H que

    chegar a uma poltica concorde entre a preservao a longo prazo e a gesto dos riscos,

    e para tal h que criar uma sensibilizao e colaborao entre todos os servios do

    museu para alcanar o objectivo primrio que a salvaguarda do acervo ao longo dos

    anos, diminuindo os riscos de alteraes ou degradao das obras de arte35

    .

    Acerca do manuseamento das peas, segundo a DGA36

    podemos sistematizar

    para reconhecer e controlar os possveis agentes danificadores, cooperando para a

    longevidade dos esplios, ao providenciarmos uma sensibilizao ao pessoal

    interveniente. Induzindo solicitaes bsicas que vo desde uma limpeza regular,

    inspeco e manuseamento correcto das peas, promovendo assim a sua preservao

    implementando um acondicionamento correcto das espcies, aps uma devida anlise

    das caractersticas das mesmas para um melhor manuseamento. Os seguintes pontos

    demonstram sumariamente os cuidados que o museu pode tomar para uma preveno

    idnea da sua coleco:

    Condies ambientais adequadas;

    Constante e eficaz manuteno de todos os locais;

    35

    Procedimentos bsicos de preservao/conservao preventiva de Documentos Grficos - Diviso de

    Preservao, Conservao e Restauro 15-11-2011 - Direco Geral de Arquivos pp. 1-2 http://dgarq.gov.pt/servicos/consultorias/preservacao/ 36

    Direco Geral de Arquivos op.cit.

  • - 37 -

    Medidas especificas de proteco;

    Verificao regular dos standards de conservao;

    Sempre que necessrio, proceder com adequadas intervenes para

    assegurar a integridade dos objectos;

    Medidas de segurana para todo o esplio pertencente ao museu, ou seja,

    para o acervo exposto e para os objectos mantidos em depsito ou

    laboratrios.

    Podemos considerar a conservao preventiva como um conjunto global de

    intervenes, tcnicas e actividades desenvolvidas para o melhorar do estado

    conservativo, seja das obras (expostas ou em depsito), seja do ambiente circundante

    que alberga as ditas, atravs da gesto e planificao dos recursos materiais, humanos e

    temporais disposio. Acentua-se uma necessidade de agir no somente num s

    objecto mas em todo um esplio considerando o espao envolvente como todo o

    edifcio do museu (e no somente o espao de exposio), que pode apresentar mltiplas

    e diversas limitaes. Evidentemente que h uma necessidade de definio de

    prioridades que permitam individuar as problemticas principais, dando assim um maior

    foco aos factores que resultam potencialmente mais danosos. As seguintes tabelas

    demonstram uma anlise dos riscos37

    :

    Ameaa Fonte Danos Causas frequentes Aco preventiva

    HUMIDADE

    RELATIVA

    Humidade

    relativa

    muito alta

    ou muito

    baixa

    -mofo

    -corroso

    (valores

    elevados)

    -

    enfraquecimento

    (valores baixos)

    Mudanas

    meteorolgicas/climticas

    Efectuar um controlo

    termo -higromtrico

    Presena de condensa;

    infiltraes de gua

    Mudar as coleces

    para ambientes

    idneos; introduo

    de sistemas de

    controlo activo e

    passivo da HR

    Rpidas

    variaes de

    HR

    - Fissurao

    - Deformaes

    Ventilao inadequada,

    limpeza a hmido dos

    pavimentos, tinta das

    paredes internas

    Melhorar a ventilao

    37

    DAGOSTINO V. Op. Cit. pp. 14-17

  • - 38 -

    - shrinking Humidade proveniente do

    solo; presena de

    condensa superficial

    Intervir no invlucro

    de construo

    TEMPERATURA

    Temperatura

    elevada ou

    baixa

    - Aumento da

    degradao e

    enfraquecimento

    Aquecimento ou controlo

    e regulao da

    temperatura inadequados

    Efectuar um controlo

    microclimtico;

    melhorar os sistemas

    de controlo e

    regulao da T Mudanas climatricas

    Rpidas

    variaes de

    T

    - Fissurao

    - shrinking

    - Deformaes

    Iluminao

    Instalar um sistema de

    iluminao externa s

    vitrinas com baixa

    dissipao de energia

    Isolamento insuficiente

    do edifcio

    Melhorar o

    isolamento

    Regulao insuficiente do

    aquecimento

    Controlar a T com

    sistemas de

    condicionamento ou

    melhorar o controlo

    do aquecimento

    Ameaa Fonte Danos Causas frequentes Aco preventiva

    LUZ

    - Luz intensa

    - Luz de

    comprimento

    de onda curta

    (ultravioleta)

    - fading

    - Descolorao

    - enfraquecimento

    - Destruio

    Luz natural ou

    artificial no

    doseada; objectos na

    posio errada;

    fontes de luz

    artificial no

    adequada; falta de

    filtros

    Medir a intensidade da luz e

    o nvel dos ultravioletas;

    instalar filtros para reduzir as

    radiaes UV; reduzir a

    iluminao exposta na rea

    de exposio; reduzir os

    tempos de exposio luz;

    se necessrio impor um

    limite anual.

    INFESTAES

    Pssaros Defecaes nos

    objectos

    Furos e passagens no

    edifcio

    Cuidar da manuteno do

    edifcio

    Roedores Objectos rodos

    ou devorados

    Materiais atractivos

    ou fontes de

    alimento nos

    materiais expostos

    Inserir ratoeiras

    Insectos

    lepidpteros;

    Traas; baratas

    Objectos com

    defecaes, rodos

    ou devorados

    internamente e

    danificados na

    Limpeza

    insuficiente, falta de

    controlo

    Isolar imediatamente os

    objectos infestados,

    inspeccionar as novas

    aquisies do acervo

  • - 39 -

    superfcie

    Mofo Danos superficiais

    Humidade relativa

    elevada

    Evitar a criao de reas

    hmidas; isolar da luz e

    manter ao frio os

    repositrios; etiquetar e

    inspeccionar frequentemente

    os materiais a risco Fungos Danos superficiais

    Ameaa Fonte Danos Causas frequentes Aco preventiva

    POLUENTES

    Aeriformes;

    cidos;

    particulados;

    sujidade;

    poeiras

    Degradao dos

    materiais

    Proximidade de

    estradas

    Limpar regularmente e

    cuidadosamente as aras de

    exposio e os depsitos;

    introduzir tapetes vinlicos

    para a reteno de poeiras;

    efectuar um controlo

    ambiental

    Falta de filtrao do

    ar

    Utilizar aparelhos de

    filtrao

    Fecho inadequado de

    portas e janelas;

    manuteno

    inadequada do

    edifcio

    Cuidar da manuteno do

    edifcio

    Desinfestao e

    utilizo de qualquer

    produto qumico

    normalmente no

    presente no ambiente

    Utilizar materiais e

    procedimentos aprovados

    Visitantes Reduzir o contacto com os

    objectos

    Repositrios

    inadequados

    Embalar e proteger os

    objectos que esto em

    arquivo

  • - 40 -

    Materiais

    utilizados para

    os depsitos e

    elementos de

    exposio

    - Corroso

    - Descolorao

    - Danos fsicos

    Usar somente materiais

    aprovados e testados para

    determinadas aplicaes;

    evitar o uso de materiais

    danosos; se possvel, testar

    os materiais conhecidos antes

    de os utilizar ou ento sigilar,

    cobrir ou ventilar para a

    mitigao dos possveis

    efeitos secundrios

    Ameaa Fonte Danos Causas frequentes Aco preventiva

    DESASTRES

    Inundaes

    - Ferrugem

    Dissolvncia de

    pigmentos e tinta

    - Crescimento de

    mofo

    - Deformaes

    - Impregnao

    Aumento de

    volume

    Desintegrao

    Inundaes externas,

    perdas de tubagens,

    infiltraes; sistema

    anti-incndio

    Formular um detalhado

    Disaster Plan que inclua

    uma lista de controlo para os

    procedimentos de

    manuteno e controlo de

    manuteno internos e

    externos, treinar e motivar os

    empregados

    Incndios

    - Incinerao

    - Abrases

    - Furtos

    Falhas elctricas,

    relmpagos; causas

    acidentais

    PESSOAS Intrusos

    - Rupturas

    - Abrases

    - Furtos

    Manipulao no

    necessria ou

    indevida;

    manipulaes

    incorrectas

    Aumento de:

    - Temperatura

    - Poluentes

    - Grau higromtrico

    PBLICO

    Aumento de:

    - Temperatura

    - Poluentes

    - Grau

    higromtrico

    Optimizar a gesto dos fluxos

    e percursos das visitas

    Exposio aberta

    Prevenir a possibilidades de

    os visitantes tocarem nos

    objectos

  • - 41 -

    H que salientar, por fim, a importncia da elaborao de um perfil das

    coleces, pois algumas problemticas de conservao podem afectar um limitado

    nmero de objectos dentro da dita coleco. Uma perspectiva ampliada no delibera a

    estimativa de riscos, que requer um escrutnio mais detalhado. Para grandes coleces

    impraticvel uma anlise por objecto, h que definir primariamente os propsitos deste

    profiling system38

    para a conservao preventiva:

    Estabelecer uma base para definir os recursos necessrios para uma

    manuteno contnua pois no se devem criar possibilidades para

    eventuais lacunas nos cuidados da coleco, por falta de recursos;

    Definir custos e dar prioridade a planos de manuteno especficos para

    eventuais casos particulares de conservao.

    Com um suporte modelo a seguir, ganha-se uma orientao mais plausvel

    versus o objectivo principal que a longevidade da vida das obras pertencentes ao

    museu.

    Il primo intervento che noi dovremo considerare, non sar quello diretto sulla

    materia stessa dell'opera, ma quello volto ad assicurare le condizioni necessarie a che

    la spazialit dell'opera non sia ostacolata al suo affermarsi entro lo spazio fisico

    dell'esistenza.39

    2. Consideraes tcnicas

    Os progressos que se tem vindo a incrementar, ao longo do ltimo sculo, no mbito

    da pesquisa para o desenvolvimento de orientaes mais racionais em relao ao

    ambiente do museu concederam novas directrizes com ampla aceitao, desvalorizando

    o pensamento arraigado das recomendaes fixas e inflexveis que se propunham

    38

    WALLER R. - Preventive Conservation Planning For Large And Diverse Collections - American

    Institute for Conservation, Presession Preprints, 1996 p. 5 39

    BRANDI C. - Teoria del Restauro in Lo spazio dellopera darte Cap. VII, Edizioni di Storia e Letteratura, Einaudi, Torino, 1977

  • - 42 -

    aquando as primeiras formulaes de conservao preventiva para o museu40

    . Um

    objecto exposto num museu, enquanto testemunho material do percurso de crescimento

    civil e cultural do Homem para as futuras geraes, deveria conservar-se imutvel no

    tempo. No entanto todas as obras de arte, mesmo que protegidas cedem sempre

    deteriorao, por muito lentamente que esta se desenvolva no tempo, activam-se

    processos que alteram o estado original minando a integridade da obra. Um dos grandes

    e graves problemas , sem dvida, o da conservao dos objectos de arte cuja defesa

    muito dependa da conservao das condies do meio.41

    Percorrendo esta afirmao,

    evidenciamos que todos estes processos esto em estreita relao com a tipologia dos

    materiais que constituem os objectos e com as condies termo-higromtricas presentes

    no ambiente no qual esto inseridos. Podemos elencar sumariamente e de maneira

    representativa determinados problemas reais a que o acervo pode estar sujeito42

    :

    Destruio contnua devido ausncia de obras essenciais de reparao no

    caso de monumentos e locais onde se encontram artes plsticas;

    Fragmentao pela perda de aderncia dos componentes intermedirios no

    caso de locais com excesso de humidade ou excesso de secura;

    Runa do suporte e da pintura por organismos xilfagos (bactrias, fungos ou

    insectos) exemplo de ms condies locais e ausncia de medidas preventivas

    para a proteco das pinturas;

    Danificaes e perdas provocadas pela incria dos indivduos responsveis

    exemplo de obras abandonadas por falta de interesse ou meios.

    2.1 Humidade e Temperatura

    Devido ao clima frio e isolamento mnimo nas paredes de um museu, as superfcies

    internas do exterior dessas mesmas paredes pode chegar ao ponto de orvalho, o que

    resulta em nveis altssimos de humidade e at em condensao dessas superfcies. Se

    40

    Na literatura encontram-se sugestes acerca de valores e/ou intervalos para a conservao, contudo

    pe-se sempre a questo da eficcia de valores padro em todos os campos da conservao. In

    MECKLENBURG F. (et.al.) - Applying Science To The Question Of Museum Climate NMD 2007 41 MOURA de A. - Os Problemas da Conservao das Pinturas e das Condies do Meio - Coleco

    Reis Santos, Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa, 1961 42

    PADFIELD T.; BORCHERSEN K. - Museum Microclimates - (eds.) National Museum of Denmark,

    2007

  • - 43 -

    ao invs de isso analisarmos o mesmo edifcio, em dias de vero em que a temperatura

    chega ao seu pico podemos constatar que nos mesmos pontos poderemos verificar

    descidas de temperatura em que a % de humidade pode chegar aos 30. O acervo de um

    museu/galeria est normalmente perto das paredes quer sejam retbulos, telas ou

    esculturas, o espao entre o objecto e a parede denomina-se microclima, em que a

    temperatura e a humidade tm quase sempre valores que divergem amplamente com o

    resto do ambiente e com o pretendido controlo do clima do local. Como consequncia

    podem ocorrer danos considerveis s obras de arte. A humidade relativa, se estiver a

    um nvel diminuto pode causar problemas incluindo danos fsicos pintura como

    deformaes e fendas e nas madeiras provoca solturas das articulaes mveis e a

    separao dos retbulos. No The Museum Environment43

    Garry Thomson recomenda,

    para o museu tradicional, valores de 55% de humidade relativa, estimativa feita por

    ser o ponto mdio entre a que ele considera ser a zona de segurana que vai dos 40% e

    70% (a esta percentual h o crescimento de fungos). H infinitos casos que comprovam

    que extremos de humidade causam danos gravssimos. Valores de temperatura so

    provavelmente o tema menos controverso, uma vez que por razes prticas em termos

    de espao de exposio deve ser mantido um nvel dentro da faixa do conforto humano,

    independentemente dos efeitos que provoque.

    44Existem trs etapas fundamentais no controlo do clima de um museu:

    Determinar os efeitos do ambiente sobre os materiais e objectos.

    Especificaes estabelecidas com base nos resultados da etapa 1 tendo em conta

    o tipo de coleco, a construo e o clima local

    Manter e monitorar o ambiente baseado nos resultados da Etapa 2.

    Desafortunadamente tende-se a dar mais ateno s etapas 2 e 3 em detrimento da

    etapa 1 que basilar pois permite agir correctamente nas etapas consecutivas. A

    definio de condies para o bem-estar de uma obra que tenha interesse histrico-

    artstico garante uma correcta conservao do mesmo, e actualmente este definir de

    valores (de temperatura e humidade relativa) j considerado regra. Contudo

    43 ERHARDT D., TUMOSA C., MECKLENBURG M. - Applying science to the question of museum

    climate - in Museum Microclimates, (eds.) NMD 2007 44

    PADFIELD T.; BORCHERSEN K. -