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UMA AVALIAÇÃO RETROSPECTIVA DA POLÍTICA DE EXPORTAÇÃO NO BRASIL* * Edson P. Guimarães Doutor em Economia pelo I.E./UFRJ e professor da UFRJ 1. INTRODUÇÃO A política econômica brasileira nos anos 50 estabeleceu como ideário modificar a especialização internacional do país para obter uma industrialização “plena”. O planejamento econômico elegeu como diretriz principal a ponderação de importância dos setores produtivos para o crescimento econômico. A proteção aos setores industriais foi formulada, assim, em função dos linkages da cadeia produtiva (Hischman; 1956), o que resultaria em movimento contra a deterioração dos termos de troca internacionais (Prebisch; 1951). Setores industriais considerados prioritários à montagem de um parque industrial diversificado e abrangente, como os de transporte, metalurgia, materiais elétricos e comunicação e o de química foram altamente protegidos contra a competição externa. A diretriz básica era garantir a acumulação endógena de capital diminuindo a dependência do crescimento econômico às flutuações da demanda internacional. Esta orientação protecionista, que perdurou até o final dos anos 80, foi exitosa em termos restritos aos objetivos do alcance de formação de um parque industrial. Contudo, em frontal desalinho com a teoria das vantagens comparativas, a industrialização “plena” negligenciava: a) as consequências com respeito a alocação de mão-de-obra abundante e dos recursos naturais existentes e b) a prática política de selecionar os setores a serem protegidos em função da dinâmica dos respectivos mercados internacionais. A sabedoria a posteriori sugeriu que a ausência destas variáveis na formulação política foi uma das principais razões da industrialização brasileira não ter sido * Este artigo é uma separata da tese de doutorado do autor: Competitividade Internacional e política Comercial Externa: a experiência brasileira nos anos 80 e início dos anos 90 – IE/UFRJ T.D. nº 24.

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UMA AVALIAÇÃO RETROSPECTIVA DA

POLÍTICA DE EXPORTAÇÃO NO BRASIL**

Edson P. GuimarãesDoutor em Economia pelo I.E./UFRJ e professor daUFRJ

1. INTRODUÇÃO

A política econômica brasileira nos anos 50 estabeleceu como ideário modificar a especialização

internacional do país para obter uma industrialização “plena”. O planejamento econômico elegeu como

diretriz principal a ponderação de importância dos setores produtivos para o crescimento econômico. A

proteção aos setores industriais foi formulada, assim, em função dos linkages da cadeia produtiva

(Hischman; 1956), o que resultaria em movimento contra a deterioração dos termos de troca internacionais

(Prebisch; 1951). Setores industriais considerados prioritários à montagem de um parque industrial

diversificado e abrangente, como os de transporte, metalurgia, materiais elétricos e comunicação e o de

química foram altamente protegidos contra a competição externa.

A diretriz básica era garantir a acumulação endógena de capital diminuindo a dependência do

crescimento econômico às flutuações da demanda internacional. Esta orientação protecionista, que

perdurou até o final dos anos 80, foi exitosa em termos restritos aos objetivos do alcance de formação de

um parque industrial.

Contudo, em frontal desalinho com a teoria das vantagens comparativas, a industrialização

“plena” negligenciava: a) as consequências com respeito a alocação de mão-de-obra abundante e dos

recursos naturais existentes e b) a prática política de selecionar os setores a serem protegidos em função da

dinâmica dos respectivos mercados internacionais. A sabedoria a posteriori sugeriu que a ausência destas

variáveis na formulação política foi uma das principais razões da industrialização brasileira não ter sido

* Este artigo é uma separata da tese de doutorado do autor: Competitividade Internacional e política

Comercial Externa: a experiência brasileira nos anos 80 e início dos anos 90 – IE/UFRJ T.D. nº 24.

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suficientemente capaz de ter como resultado alterações significativas no ordenamento das vantagens

comparativas, em favor dos bens intensivos em capital ou com razoável conteúdo tecnológico. De fato, a

não observância dos atributos tecnológicos requisitados pelos novos processos de concorrência no

mercado internacional, surgidos nos anos 80, e a negligência com respeito à eficiência alocativa estática

na formulação de política econômica contribuíram para refrear a expansão/deslocamento da fronteira

técnica produtiva nacional.

Com efeito, retrospectivamente, as medidas de promoção das exportações passaram a ser

implementadas no Brasil a partir dos anos 60, num contexto político cujo objetivo era estabilizar a

economia. Sob a égide do pensamento militar, dominante a partir de 1964, a própria exposição de motivos

do Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG) atribuía à atividade exportadora um duplo papel: a) na

ausência de uma demanda governamental, deveriam as exportações expandir a demanda agregada para

continuar o processo de criação de oportunidades aos investimentos substituidores de importações e b)

gerar divisas para importação de bens de capital e insumos básicos.

Uma vez alcançada a estabilidade e na tentativa de continuar sustentando o crescimento

econômico do período do “milagre” brasileiro (68/73), o governo recolocou, na segunda metade dos anos

70, as exportações para desempenhar o papel de coadjuvante do processo de crescimento econômico

calcado na substituição de importações: as exportações deveriam ser incentivadas para aumentar a

quantidade de divisas, viabilizando, assim, as importações de bens de capital e insumos básicos e para

saldar encargos da dívida externa. A exemplo do período anterior, a política de promoção às exportações

negligenciou as variáveis de crescimento econômico (mão-de-obra qualificada, capital e recursos naturais,

para citar os mais simples), e as que constituem o progresso técnico, como o nível educacional, a função

P&D, suportes infra-estruturais à ciência e tecnologia e etc, favorecendo a distorção de preços como

mecanismo principal para tornar os produtos exportáveis mais competitivos internacionalmente. Nas

palavras de Fanzylber (1990) a política comercial calcada em instrumentos e mecanismos formadores do

preço de exportação geralmente resulta em uma competividade espúria, onde são relegados a segundo

plano os reais condicionantes do desempenho exportador.

Na verdade, sob estas condições, a natureza da política exportadora era passivamente

condicionada ao processo de substituição de importações. O nexo existente entre exportação e progresso

técnico não foi considerado explicitamente na estratégia do crescimento econômico, nem mesmo os

melhoramentos nos processos de produção, os ganhos em sofisticação dos produtos, a maior capacidade

gerencial e financeira e a atribuição de importância à função P&D.

No anos 80, o processo da substituição de importações estava concluído, exceto apenas para

alguns setores como os de eletrônica, principalmente os produtos da informática, e de química fina.

A evolução da dívida externa, a má performance das finanças públicas (Dain, S.; 1988) e do setor

público (Abranches; 1994), aliados ao excesso de capacidade ociosa da economia, foram assuntos que

dominaram a agenda de política econômica na segunda metade dos anos 80. Os temas competitividade

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internacional e crescimento econômico, embora fossem recorrentes e constassem das diretrizes básicas do

governo, foram relegados a segundo plano, em favor das políticas destinadas à obtenção da estabilidade

econômica. Só a partir de 1990 foram criados os Programas Brasileiro de Qualidade e Produtividade

(PBQP) e o de Apoio à Capacitação Tecnológica (PACT), ambos com o propósito de agilizar a absorção

de técnicas eficientes. Ainda assim, sem uma clara vinculação com a construção de novas vantagens

comparativas ou com os processos de inovação e concorrência do mercado internacional.

No início dos anos 90, finalmente, as exportações passaram a ser consideradas mais pelos aspectos

qualitativos de oferta e menos pela lógica quantitativista dominante desde os anos 60. A idéia de

liberalização do comércio exterior teve maior ênfase na agenda da política governamental, extinguindo

muitos dos incentivos existentes de promoção às exportações. Neste, abordamos justamente essas

questões. A idéia central é recuperar a orientação da política brasileira recente de exportação para resgatar

o que ela possa ter para contribuir à formulação de uma política de competitividade internacional.

2. POLÍTICA DE EXPORTAÇÃO NOS ANOS 80

A década de 80 se caracterizou pelo início das políticas voltadas para o saneamento das finanças

públicas. As exportações, entretanto, não deixaram de ter crescimento constante, apesar de não mais

contarem com os generosos subsídios governamentais. A estrutura industrial apresentava um grau de

diversificação semelhante ao dos países industrializados, levando o país a ser observado pelo resto do

mundo como um concorrente industrializado. Mais de um terço de suas exportações eram compostas por

produtos manufaturados, como podemos observar pela tabela 1, abaixo.

Tabela 1

ESTRUTURA EM VALOR DO COMÉRCIO EXTERIOR BRASILEIRO (%)

1968 1970 1975 1980 1986PRODUTO X M X M X M X M X MPrimários 91,4 64,7 85,0 73,3 70,4 11,9 59,7 16,1 50,8 22,6

Manufaturados 8,1 20,2 13,4 13,7 27,3 62,0 38,6 40,8 46,0 50,7

Diversos 0,7 0,3 1,0 0,6 - - - - - -

Combustíveis 0,0 14,8 0,6 12,4 2,3 26,1 1,7 43,1 3,2 26,7

Fonte: IFS, Supplement on Trade Statstics, 1982 e 1988.

Nas duas décadas anteriores, como já dito, a natureza da política de promoção às exportações era

contingenciada passivamente ao processo de substituição de importações: o receituário desenvolvimentista

privilegiava o mercado interno no sentido da industrialização plena, sem qualquer orientação específica

com o mercado internacional ou com o conteúdo tecnológico embutido nas mercadorias exportadas.

Assim, os ganhos nos termos de troca até a entrada dos anos 80 foram desfavoráveis ao país, apesar da

alteração estrutural da pauta de exportação a favor dos bens manufaturados. De fato, estes, que em 1970

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participavam com 13%, passaram a participar com 39% em 1980 na composição da exportação total (ver

tabela 1), mas o déficit comercial acumulado desde 1970 somou, no ano de 1980, U$ 13,94 bilhões. Cinco

anos depois, esse valor tornou-se positivo em U$ 19,96 bilhões (ver tabela 2), não porque o conteúdo

tecnológico tivesse se alterado, mas sim devido à contração das importações na ordem de 40%.

É consenso, contudo, que nos anos 80 a economia doméstica não cresceu. Em outras palavras, os

benefícios gerados pelo comércio exterior não foram colocados a serviço do crescimento econômico. Os

encargos da dívida externa decorrentes dos contratos de débitos externos contraídos no período anterior,

pela opção de ajustamento gradual à crise do petróleo em 1973 e 1979, requeriam substanciais saldos

comerciais. Assim, o câmbio foi ajustado pela política de comércio exterior: em dezembro de 1979 e

fevereiro de 1983, a política econômica (maxi)desvalorizou o câmbio em 30%. Essa medida contribuiu

para que as exportações crescessem 34% e as importações caíssem 60% de 1980 à 1984. Em

contrapartida, contribuiu também para pôr em marcha movimentos inflacionários acentuados. Como

recorda Bacha (1986), o ajustamento externo pôde ser feito mediante o aumento da rentabilidade das

exportações, forçando igual rentabilidade às vendas domésticas via elevação dos preços internos. O

resultado foi um processo inflacionário elevado. A perda de confiança na condução da política econômica

se fez presente, aumentando o grau de incerteza dos agentes econômicos. A inflação no período 1980/2

situou-se no patamar próximo a 100%, para dobrar no período 1983/5.

Várias medidas convencionais de combate à inflação foram adotadas pelo governo. O resultado foi

a contração da demanda agregada e queda no nível de investimentos. Pelo lado do comércio exterior a

política econômica, procurando manter o mesmo grau de promoção às exportações, rebaixou,

proporcionalmente à desvalorização cambial anterior, os incentivos às exportações. Nenhuma orientação

significativa foi tomada para assegurar a exportação do produtos com elevados valores adicionados

visando a um novo ordenamento (criação) de vantagens comparativas transformador da estrutura

industrial, alinhadas com a competição estabelecida internacionalmente.

Tabela 2

BALANÇA COMERCIAL E DÍVIDA EXTERNA: BRASIL 1960-88 (U$ bilhões)

BALANÇA COMERCIAL SALDO COMERCIAL DIVIDA EXTERNA

ANOS EXPORTAÇÃO IMPORTAÇÃO ANUAL ACUMULADO SERVIÇO TOTAL

SALDO C/CDO BP

60 1,27 1,29 0,02 2.08 2,070 2.74 2,51 0,23 2,31 0,28 5,3 0,5675 8,67 12,21 -3,54 -1,77 1,86 21,17 -6,7080 20,13 22,96 -2,79 -13,94 7,46 53,85 -12,8181 23,29 22,08 1,09 -12,85 10,35 61,41 11,7382 20,18 19,40 0,77 -12,08 12,55 69,65 -16,3183 21,9 15,43 6,50 5,58 10,26 - 81,32 - 6,8484 27,01 13,92 13,09 7,51 10,20 102,04 0,1785 25,64 13,15 12,45 19,96 9,60 105,13 0,3086 22,34 14,04 08,31 28,27 9,09 111,05 -4,0387 26,22 15,05 11,17 39,44 8,79 121,17 -2,6188 33,79 14,61 19,18 58,62 9,83 112,89 4,90

Fonte: Anuários do Comércio Exterior Brasileiro e Relatórios do Banco Central do Brasil, vários anos

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A tabela 3 apresenta resultados do cálculo do viés anti exportador para o ano de 1985, por gênero

da indústria. Neste ano, o saldo em conta corrente do balanço de pagamentos próximo a zero sugere

metodologicamente uma taxa de câmbio próxima à do equilíbrio. As penúltima e última colunas

apresentam, respectivamente, a variação percentual das taxas de especialização e a variação percentual das

taxas de contribuição no comércio internacional no período 1980-92, por gêneros da indústria. Esta taxa

mensura a participação das exportações por gênero da indústria na exportação global do país. A taxa de

especialização mostra a força relativa e a direção dos compromissos competitivos do país, extraídos pela

relação entre o crescimento das exportações e o crescimento do respectivo mercado internacional. Essas

duas últimas colunas foram elaboradas a partir das informações contidas no programa Competitive

Analysis of Nations, 1994, da CEPAL.

A proteção nominal implícita construída através dos diferenciais de preços internos e

internacionais para a indústria de transformação foi de 7.64% para o ano de 1985. Os incentivos dedicados

à atividade exportadora, medidos como proporção do valor das exportações, totalizaram 3.91%. Os

resultados indicam, portanto, para a indústria de transformação, um viés antiexportador relativo à

rentabilidade das vendas domésticas de 3.73 %.

Os gêneros industriais que obtiveram taxas de incentivo às exportações superiores à taxa de

proteção às vendas domésticas (viés antiexportador negativo) como minerais não-metálicos (-4,6),

mecânica, (-2,34), madeira (-13,66), papel e papelão (-13,67), perfumaria, sabões e vela (-5,19), produtos

alimentares (-13,54), bebidas (-47,94) e fumo (-68,44), são visivelmente intensivos em trabalho e com

forte dependência da existência de recursos naturais. Todos eles, exceto os produtos alimentares e os

produtos do gênero perfumaria sabões e velas, tornaram-se mais especializados internacionalmente,

revelando que o sistema de incentivos às exportações contribuiu na década passada para consolidar as

vantagens comparativas estáticas assentadas em recursos naturais e mão-de-obra barata.

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Tabela 3

VIÉS ANTI EXPORTAÇÃO 1985 E ÍNDICE DE ESPECIALIZAÇÃO 1980/92,por gênero da indústria

INCENTIVOS À EXPORTAÇÃOa

gênero da indústria fiscal variação 92/80Classificação / Denominação Crédito

prêmioreduçãodo IR

financeiro total Proteçãonominal

Viés anti expor-

tador implícita bespecialização Contribuição

10 prod.miner. não met. 0.11 1.0 0.39 1.5 -3.15 -4.65 2.68 -51.4211 metalurgia 0.41 1.3 3.73 5.44 9.15 3.71 16.15 -30.5912 mecânica 1.25 1.5 3.51 6.26 3.92 -2.34 2.95 53.6713 mat. elet. e de comun 3.4 1.6 3.23 8.23 45.97 37-74 -36.31 78.8714 material .de transp 4.46 1.5 1.0 6.96 16.11 9.15 -0.75 54.5515 madeira 0.01 1.7 3.05 4.76 -8.9 -13.66 1.12 -29.9816 mobiliário 0.22 1.1 3.87 5.19 3.97 -1.22 258.01 70.5917 papel e papelão 0.12 3.8 2.97 6.69 -6.78 -13.67 35.48 12.4318 borracha 3.49 2.2 0.78 6.47 52.1 45.63 89.87 23.4319 couros, peles e simil 0.07 0.9 3.26 4.23 16.69 12.46 25.12 -35.4620 química 0.02 0.4 0.65 1.07 12.06 10.99 25.66 22.3321 prods. farm. e vet. 0.7 2.0 4.87 6.94 30.9 23.96 4.75 96.2322 perfum. sab. Velas 0.9 0.9 5.5 6.49 1.08 -5.41 39.37 80.5623 produtos plásticos 0.4 1.4 15.14 16.94 103.44 86.5 381.33 24.5524 têxtil 0 1.7 3.85 5.55 30.81 25.26 -25.4 -6.6225 vest. calç. e tecidos 0 2.1 4.67 6.77 70.79 65.02 103.61 64.7126 prod. Alimentares 0 1.0 1.87 2.84 -10.69 -13.54 -51.44 -17.4927 bebidas 0.03 1.7 1.57 3.3 -44.64 -47.94 168.72 16.5028 fumo 0.0 2.1 0.01 2.11 -66.33 -68.44 18.12 8.6629 editorial e gráfica 0.01 0.6 2.31 2.92 -10.03 -12.95 873.12 38.1230 diversos 0.15 11.0 2.17 13.32 48.14 34.82 83.81 36.64Indústria de Transform 0.74 1.2 1.97 3.91 7.64 3.73 -11.64 0.71

obs: a) As taxas de incentivos às exportações foram calculadas pelo métodoconvencional da razão entre incentivos e valor exportador. O valor do crédito prêmio foiobtido do movimento de Compra e Venda do M. F./SRF. A taxa de incentivo da reduçãodo IR foi estimada através da média observada nos anos anteriores (1981-1985). Paraos incentivos financeiros as participações dos valores financiados no valor exportadosão os prevalecentes em 1983 (Baumann, 1986) multiplicados pela alíquota de reduçãode juros vigente para as exportações em 1985.b)O índice de especialização foi construído pela razão entre o crescimento daparticipação das exportações brasileiras setoriais nas exportações totais com destino aOCDE e o crescimento das importações respectivas nas importações totais da OCDE;período 1980/92 (médias desazonalizadas), ver Programa CAN, CEPAL,1994.

Fonte: Movimento de Compra e Venda , 1985, SRF, Baumann (1986), Programa CAN, CEPAL,1994

Por outro lado, os gêneros com viéses anti-exportador positivo, como material elétrico e de

comunicações (37,74), material de transporte (9,15), borracha (45,63), produtos plásticos (86,5), têxtil

(25,26), e vestuário, calçados e tecidos (65,02) não aumentaram sua especialização internacional, exceto

os dois últimos. Ambos também com forte dependência de recursos naturais e mão-de-obra barata. Todos

esses gêneros industriais possuem valores adicionados substanciais e, por isso, a despeito de não

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aumentarem significativamente suas participações no comércio internacional, as participações relativas na

pauta de exportação cresceram, pelos valores relacionados na coluna da taxa de contribuição, exceto o

gênero têxtil, que se submete ao acordo Multifibras, imposto pelo Estados Unidos da América.

Vale qualificar, entretanto, esses resultados. Primeiro, os incentivos financeiros e fiscais de

promoção às exportações tiveram como fonte de recursos o orçamento público, enquanto a

proteção requereu somente uma administração tarifária e não-tarifária. Por não destinar recursos

públicos às atividades produtivas e impor uma distorção ao consumo, a política de proteção

tarifária é considerada the second best, por diversos autores [(Corden; 1971); (Balassa; 1971)].

Segundo, a promoção às exportações foi elaborada perseguindo a idéia de premiar quem exporta e não

a de dotar previamente as empresas de melhores condições competitivas. Essencialmente, prevaleceu a

ótica da política “horizontal” - não discriminatória entre setores - enquanto a proteção contra a competição

externa foi seletiva e abrangente. Terceiro, a idéia de small country e price-take foi adotado para o Brasil,

sugerindo que as exportações brasileiras estão concentradas em produtos cuja elasticidade preço de

demanda internacional é infinita (Mesquita; 1993). Por outro lado, dada as condições de oferta, qualquer

acréscimo em dólares resultante da política de promoção às exportações requeria desta um volume

substancial de incentivos em moeda nacional (Braga, H. & Markwald; 1983). Finalmente, estas

qualificações reiteram que o esforço político para promover exportações é superior ao esforço político de

proteger os mercados nacionais contra a competição externa.

Pode-se, entretanto, afirmar que a política comercial externa foi bem sucedida, restrita à resposta

das empresas ao sistema de incentivos. Com efeito, os gêneros da indústria com viéses anti-exportador

negativos são (grupos de) produtos nacionais exportados que deslocaram concorrentes externos, ganhando

parcelas de mercados internacionais em expansão. Porém, os setores mais dinâmicos internacionalmente,

como Mecânica, Produtos Farmacêuticos e Veterinários, Material Elétrico e de Comunicação e Material

de Transporte, cujas taxas de expansão no mercado internacional são substanciais, obtiveram maior

proteção aos seus mercados domésticos do que a promoção de suas exportações pela política comercial.

Este ordenamento dos incentivos à atividade exportadora em relação ao vetor de proteção por

setores industriais, quando comparado à direção do comércio internacional permite concluir que não

houve esforços significativos para criar/alterar as vantagens comparativas existentes. Adicionalmente, não

se consegue sacar qualquer orientação pro-exportadora integrada a um processo de crescimento para fora,

isto é, articulada ao mercado internacional. Sem entrar no mérito da eficácia desta política, ela reafirma a

existência de resquícios da política de substituição de importações voltada exclusivamente para “dentro”,

onde prevalece a idéia de ganho ou perda nos termos de troca independente da dimensão da base produtiva

nacional.

Em fevereiro de 1986, a exemplo de países como Israel e Argentina, o governo adotou um choque

heterodoxo com duração de um ano. No pressuposto de que a inflação era inercial, fez-se o congelamento

dos preços (das mercadorias, salários e câmbio), política batizada de Plano Cruzado com Inflação Zero.

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Em junho de 1987 foi implementado o Plano Bresser, em resposta à pressão inflacionária acionada nos

quatro meses seguintes ao fim do Plano Cruzado. Durou também aproximadamente um ano. Seis meses

depois, em janeiro de 1989, contudo, foi instituído o Plano Verão, sob a gerência do quarto ministro da

Fazenda do Governo Sarney, Dr. Mailson da Nóbrega. Estes planos objetivavam reduzir o grau de

instabilidade econômica através da imposição de regras funcionais de mercado - congelamento de preços e

salários - e de política monetária - indexação do grau de emissão monetária e dos gastos públicos. A

expectativa era aumentar o grau de confiança dos agentes econômicos no governo, tornando sua política

mais transparente, o que permitiria a elaboração pelas empresa de condutas concorrenciais mais

consistentes.

A taxa de câmbio foi, assim, fixada/congelada pelo pico, em todos os planos, independente das

condições e circunstâncias do comércio exterior ou do contexto internacional. No primeiro quinquênio dos

anos 80, ela foi utilizada pela política de comércio exterior em detrimento do mercado doméstico. Já com

os planos heterodoxos vigorantes para a segunda metade dos anos 80 ocorreu justamente o inverso. A

política cambial privilegiou a função macroeconômica de ajustamento doméstico em detrimento ao

comércio exterior.

Em adição, os instrumentos convencionais adotados pela política comercial externa não sofreram

modificações nem em gênero e nem em número. Somente seus graus continuaram variáveis, atendendo

pelo lado das importações os esquemas tarifários e não-tarifários defensivos da estrutura industrial. Pelo

lado das exportações, como o contexto político era voltado para a obtenção da estabilidade econômica, o

volume de recursos públicos dedicados a atividade exportadora foi reduzido. substancialmente.

Na tabela 4, abaixo, são apresentados alguns indicadores econômicos ilustrativos daqueles três

planos emergênciais. Cabe ressaltar que por esses indicadores não se consegue associar quaisquer

orientações políticas voltadas para o longo prazo ou de competitividade internacional: no final de agosto

de 1989 (fim do Plano Verão), o salário real médio havia diminuído, a balança comercial continuava

superavitária e o ágio do dólar paralelo atingia taxas inimagináveis, devido em grande parte à falta de

confiança na condução da política econômica.

No início de julho de 1989, a dívida externa brasileira já somava U$ 130 bilhões e a dívida pública

U$ 115,8 bilhões. No início da década, a primeira era quase metade disto (U$ 64,2 bilhões), ao passo que

a dívida pública representava apenas 11% da cifra correspondente a julho de 1989. Somente de janeiro de

1987 a maio de 1989, a base monetária saltou mais de 2.000%, em termos nominais. O valor nominal total

dos títulos públicos fora do BACEN cresceu 1.800%. Neste contexto, o giro diário dos títulos da dívida

pública chegou, em meados de 1989, a U$ 46,7 bilhões. No início da década era de cerca de U$ 15,4

bilhões.

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Tabela 4

INDICADORES ECONÔMICOS DOS PLANOS CRUZADO, BRESSER E VERÃO(variação acumulada em 12 meses)

IPC U$oficial paralelo

BaseMonetáriaNominal

Títulosfora doBACEN

SalárioReal

BalançaComercialU$ (bilhões)

Plano Cruzado(FEV/86-FEV/87)

62,59 43,03 60,00 - - 3,2 5,84

Plano Bresser(JUN./87-MAI/88)

359,92 389,3 414,00 492,6 556,25 8,96 12,21

Plano Verão(JAN/89-JUL/89)

1001,6 744,06 1348,9 10055,3 12302,2 5,8 9,0

* Medido pelo mês de competência Fonte: Macrométrica; Gazeta Mercantil, C.I.

Na entrada dos anos 90, a indústria no Brasil teve uma experiência traumática. A liquidez foi

reduzida drasticamente pela política governamental, a taxa de crescimento do produto nacional era

negativa, as taxas de juros foram acentuadamente elevadas, a inflação estabilizou-se em 25% ao mês e

iniciou-se um processo de abertura comercial visando a expor o mercado doméstico à competição

internacional.

Desde a primeira metade da década de 1980, as pressões dos parceiros comerciais contra os

incentivos às exportações brasileiras eram declaradamente retaliativas (e isto persistiu, sob certo sentido,

até a assinatura do Acordo da Dívida Externa, no início dos anos 90). Também a utilização do instrumento

cambial para promover as exportações tinha margem de manobra limitada; prevalecia o sentimento de que

tal medida elevaria o processo inflacionário do país, já em marcha, a níveis altíssimos. Por fim, o processo

redemocratizante pelo qual passava o país enfatizava os aspectos sociais para o direcionamento dos

recursos públicos escassos, contribuindo para reduzir a participação dos incentivos tradicionais às

exportações na formação do preço FOB.

A ausência de novos instrumentos promotores de exportação e a perda relativa dos tradicionais

nos anos 80, longe de se constituir em rationale política “criticável”, era precursora à proposta da CEPAL

divulgada no final dos anos 80. Ao elevar o status dos assuntos referentes à estabilidade econômica em

detrimento do desempenho exportador antecipava-se ao alerta cepalino acerca do caráter negativo da

competitividade espúria obtida pelos incentivos à formação de preços de exportação (Fajnzylber; 1990).

Também antecipou-se à CEPAL que argumentou, na entrada dos anos 90, a necessidade da “preparação

do terreno” para transformações produtivas substanciais, através de novas tecnologias incorporadas que

seriam adequadas aos recursos naturais e ao desenvolvimento da mão-de-obra local com garantias para a

sustentabilidade ambiental (Fajnzylber; 1991).

Com orientação correta, mas táticas pouco consistentes, o encaminhamento da política econômica,

no entanto, não alcançou os resultados esperados. Não se obteve a estabilidade econômica pretendida,

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exceto para o período inicial do Plano Cruzado. Com o elevado grau de incerteza e a falta de confiança na

condução da política econômica, os agentes econômicos tornaram-se propensos a adotarem mais as

estratégias concorrenciais defensivas e menos as ofensivas. Estas últimas se traduzem em investimentos

que convencionalmente ampliam a capacidade e podem efetivamente atribuir elevado grau de importância

à potencialidade dos gastos com a função P&D. As políticas empresariais defensivas, ao revés, se

caracterizam pela restrição aos gastos, pela expectativa de poderem aumentar do grau de confiança no

Estado e, neste contexto, em exacerbada prudência na tomada de decisões com respeito aos investimentos,

mercado e (re)alocação de recursos.

Outro aspecto, não menos importante, foi o curso tomado pela identidade das funções do Estado.

Ganhava espaços na sociedade, principalmente ao final dos anos 80, a idéia de que funções antes tuteladas

pelo Estado deveriam ser revertidas ao mercado. A pouca eficácia da política de estabilização

implementada através dos planos heterodoxos, o sentimento de que o Estado havia-se tornado “grande” e

inoperante devido ao acúmulo de funções e a visão neoliberal adotada principalmente nos países europeus

e nos Estados Unidos da América, foram os argumentos principais para elevar o status das forças do

mercado como atributo essencial para obtenção da estabilidade econômica. Na “preparação do terreno” o

livre jogo de mercado deveria cumprir destacadamente este papel.

Negligenciou-se, porém, dois aspectos cruciais. O primeiro foi o de que a habilidade do Estado em

implementar as necessárias mudanças para a diminuição do grau de incerteza e aumento de confiança na

condução da política econômica é que é importante, e não o seu tamanho absoluto. O segundo, decorrente,

foi a ausência sentida de um projeto de desenvolvimento econômico que estruturasse regras diretivas para

as forças competitivas de mercado. O pouco entendimento desses aspectos contribuiu na entrada dos anos

90 para o aprofundamento da instabilidade e da crise de confiança. Tal qual uma “preparação do terreno”

para plantio através da queimada, onde os nutrientes propícios ao crescimento das plantas são

enfraquecidos, parece ter sido a política adotada no início dos anos 90, a julgar a extinção e perda de poder

decisório de vários órgãos governamentais, sem uma recomposição eficaz das atribuições do Estado

(Abranches; 1994).

Os dados contidos na tabela 5 informam que os alinhamentos dos fluxos comerciais desenhavam

um novo modelo de concorrência internacional para os anos 80/90. Os dados indicam que na década de

80 os países desenvolvidos, o sul e sudeste Asiático em menor escala, mantiveram um grau de integração

comercial entre eles bastante expressivo, retratando certa independência com respeito aos países em

desenvolvimento. Ao mesmo tempo, o grau de integração comercial dos países da América Latina

diminuiu, refletindo maior penetração comercial das exportações latino americanas nos mercados dos

países desenvolvidos.

As implicações das tendências dos fluxos de comércio internacional, longe de sugerir posições

confortáveis para a América Latina, são indicativas de perdas nas relações de troca. As exportações latino-

americanas são em sua grande maioria de demanda-inelástica. As exportações de manufaturados da

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América Latina foram declaradamente baseadas em recursos naturais (61%) e pouco intensivas em

tecnologia (4,4%), em meados dos anos 80. Como assinalou Rosalez (1990), caracteristicamente, 100 em

volume de exportações da América Latina representaram 74 em valor enquanto os países desenvolvidos

para volume semelhante exportado, no mesmo período, receberam 124 em valor.

O conteúdo das exportações latino-americanas e a assimetria dos fluxos comerciais entre países

desenvolvidos, sul e sudeste Asiático e países em desenvolvimento confirmam a prática protecionista dos

países desenvolvidos de assegurar rendas derivadas do processo de inovação tecnológica, obstaculizando a

sua difusão. Este é um dos motivos pelos quais os Estados Unidos da América tentaram incluir na agenda

da Rodada Uruguai do GATT, iniciada no segundo quinquênio dos anos 80, questões referentes à

formulação de um tratado de propriedade industrial e intelectual.

Apesar da força normativa desses fatos, a pauta das exportações brasileiras aumentava e

continuava cada vez mais diversificada, mantendo a predominância dos produtos industrializados.

Entretanto, o dinamismo exportador não era satisfatório, uma vez que as exportações cresciam abaixo da

demanda mundial . De modo geral, não se observou, portanto, indicativos de estratégias de crescimento

econômico que aceitassem o mercado externo como opção de crescimento industrial.

O desempenho exportador verificado nesta época resultou muito provavelmente da composição

empresarial que, ao privilegiar mecanismos defensivos, elegeu o mercado externo como variável relevante

à manutenção/crescimento da firma.

O protecionismo contra a difusão tecnológica, a queda na taxa de crescimento do volume de

comércio e o fato da experiência em outros países ter demonstrado que políticas restruturantes dos

segmentos produtivos em um contexto de instabilidade tornam-se ineficazes, impediam aceitar, como

regra geral, ponderação substancial do comércio exterior nas estratégias empresariais. Este conjunto de

fatores, muito provavelmente, criavam um grande ceticismo quanto à viabilidade do governo implementar

políticas destinadas a tornar o país um export-led grow, a exemplo dos tigres asiáticos (Erber, F; 1992).

Vale registrar que este cenário não era contraditório com a busca de integração regional. Os

esforços conjuntos dos países signatários referentes ao desenvolvimento tecnológico podem criar efeitos

dinâmicos, elevando suas participações no comércio internacional. Esta foi uma das opções da política

externa brasileira constatada pela integração do Brasil ao Mercosul, no segundo quinquênio dos anos 80,

através inicialmente do convênio de Lhamas.

A par dos ganhos que os processos de integração entre países podem gerar, essa política deve ser

conduzida de modo a não interferir negativamente nas opções passadas de comércio exterior pelas

empresas. De fato, os resultados indicam que o Brasil caminha para uma posição de global trader, a qual

certamente é mais confortável que uma possível eleição restritiva de comércio causada pela integração.

Desse modo, a opção pelos acordos de integração regional entre países não deve ser substituto das ações

individuais das empresas na obtenção da competitividade internacional.

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Tabela 5

PARTICIPAÇÃO DAS CORRENTES DE COMÉRCIO DAS PRINCIPAIS REGIÕES MUNDIAIS (%)

DestinoEconomias Desenvolvidas Economias em Desenvolvimento

OrigemAméricado Norte

EuropaOcidental

Japão Total AméricaLatina

Sul/Sudeste Asiático

África OrienteMédio

Total

1980 13.3 51.1 3.1 69.9 5.8 6.4 5.0 5.4 22.8PaísesDesenvolvidos

1990 1634 54.7 4.1 77.2 3.7 8.7 2.3 2.7 17.6

1980 27.9 26.6 8.4 65.7 14.3 8.7 2.5 4.3 30.1América doNorte

1990 33.8 23.8 10.6 70.6 0.6 11.4 1.3 2.3 25.8

1980 26.3 16.8 - 47.7 5.9 23.8 3.5 10.0 43.6Japão

1990 34.0 22.2 - 59.5 2.5 28.8 1.0 3.0 35.7

1980 6.1 67.5 1.0 76.4 3.0 2.7 6.1 5.2 17.1EuropaOcidental

1990 7.9 72.2 2.1 83.5 1.8 3.8 2.8 2.7 11.4

1980 22.4 32.7 13.7 70.0 7.8 10.2 2.4 4.0 24.6Países em De-senvolvimento

1990 27.0 24.4 12.5 65.7 4.9 16.8 2.2 2.9 26.9

1980 37.7 23.6 3.9 65.6 20.6 1.2 2.4 2.1 26.4América Latina

1990 46.3 22.5 4.9 74.4 13.4 2.4 1.0 1.2 18.0

1980 22.1 17.8 17.8 62.9 2.5 21.0 2.9 5.2 32.2Sul/SudesteAsiático

1990 25.9 17.9 14.3 60.5 1.7 25.2 1.8 2.7 31.8

1980 10.6 39.7 19.8 71.6 5.5 11.8 1.6 5.3 24.3Oriente Médio

1990 14.3 25.8 21.4 63.0 6.0 16.0 2.3 5.2 29.9

1980 31.6 50.0 2.0 84.1 6.2 1.1 3.2 1.3 11.9África

1990 16.6 61.5 2.1 81.0 2.3 2.1 6.5 2.7 13.6fonte:Valls(1993)

3. PERSPECTIVAS DA POLÍTICA DE EXPORTAÇÃO NO BRASIL

Uma vez concluído o ciclo substitutivo de importação, nos anos 80, a capacidade do Estado

continuar como fiador do padrão de industrialização não se sustentou principalmente devido à escassez de

recursos públicos e à impossibilidade de alavancar recursos externos. Ao mesmo tempo, ganhava

importância, como estratégia de crescimento pelas empresas, a incorporação das inovações relacionadas

com a Terceira Revolução Industrial. Na segunda metade dos anos 80, o efeito demonstração dessas

inovações no Brasil foi bastante visível. O acesso às novas tecnologias era imprescindível, referendado por

argumentos indicativos de que a estrutura industrial brasileira, embora diversificada e pesada, havia se

tornado obsoleta e ineficaz (Braga, H; 1990). E isto só seria possível através do aumento da capacitação

tecnológica.

Há certo consenso que a política tecnológica e seus suportes infra-estruturais requeridos à

competitividade internacional devem priorizar os aspectos relativos ao uso e difusão da tecnologia, ao

desenvolvimento tecnológico e aos investimentos em capital humano (Haque, I; 1990). A maior

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capacitação tecnológica necessária para tornar a estrutura produtiva brasileira competitiva

internacionalmente necessitava de esforços dirigidos aos melhoramentos do sistema educacional, das

ciências e dos experimentos tecnológicos para que estes fossem bem sucedidos.

De fato, a capacitação tecnológica não está congregada no maquinário. Ela incorpora-se

naturalmente nas pessoas. Logo, a tecnologia importada não pode ser um substituto dos esforços

domésticos. Assim, o volume de recursos necessários para o alinhamento da estrutura produtiva aos

requisitos impostos pela competição internacional, deveriam corresponder previamente às exigências de

gastos em P&D em relação ao estoque de conhecimento e pessoal qualificado disponíveis, além de serem

substanciais para o aprimoramento da incorporação/difusão/adaptação das novas tecnologias vigentes em

outros países.

Contudo, os aspectos distintivos da competitividade internacional (equidade distributiva, coesão

social, elevação do nível educacional, apoios inf7ra estruturais, dentre outros) deixaram de ser priorizados

politicamente na entrada dos anos 90 em favor da adequação da estrutura industrial a um (neo)liberalismo

ingenuamente administrado. De fato, os resultados pouco satisfatórios da reforma tarifária aduaneira

iniciada nos anos 90, em termos de reestruturação da indústria, os aspectos negativos da política salarial

(Sabóia, J.;1992) e uma reforma administrativa do setor público sem uma clara orientação prioritária ao

sistema educacional, a ciência e a tecnologia (Abranches, 1994) , são eventos não condicentes a uma

política voltada para dotar as empresas de maior competitividade, ou de pelo menos conduzir à criação de

novas vantagens comparativas.

Com o contexto caracterizado pelas ações de saneamento/ajustamento macroeconômico, alguns

aspectos ligados ao comércio exterior derivados das propostas neoliberais foram incorporados à agenda da

política econômica: a opção de alargar a base de produtos internacionalmente comercializáveis.

acreditando-se que a maior inserção do país no mercado externo elevaria a competitividade dos produtos

brasileiros e traria benefícios ao mercado interno, foi um deles. Pressupunha-se também que a

incorporação de melhorias em termos de qualidade, desempenho, prazo de entrega e outros fatores

requeridos pela competição internacional nos produtos exportados se traduziria na maior eficiência

produtiva doméstica. Pelo lado das importações, o controle seletivo seria utilizado para absorver os

avanços tecnológicos verificados em outros países. Os argumentos podiam ser tecnicamente corretos,

porém não havia respaldo político suficiente para sua implementação (Cordeiro, M; 1992).

Pela tabela 6, na qual se constata, a seguir, o grau de abertura comercial da economia de 14 países

(mais de 55% no comércio mundial), verifica-se que muitos deles (08) aumentaram sua abertura comercial

entre 1980 e 1993. O Brasil, cujo grau de abertura em 1980 só era superior aos da Argentina e da Índia,

passou, em 1993, a ser a economia, juntamente com a da Argentina, de menor inserção no comércio

exterior; foi o país que menos importou em relação ao mercado interno e o quarto em menor parcela

exportada de seu produto interno. Calculamos também o grau de exposição dos produtos nacionais à

concorrência internacional (grau de internacionalização).

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Tabela 6

RELAÇÕES BÁSICAS COMERCIAIS ENTRE MERCADO INTERNO E EXTERNO 1980/92 -VÁRIOS PAÍSES

Grau deabertura

% das M nomercadointerno

% das X no PIB(c)

interno(%aa)

Cresc. domercado %(d)

Grau de inter-nacionalização

PAÍSES 1980 1993 1980 1993 1980 1993 1980/1993 1980 1993

Alemanha 8.72 9.27 28.7 31.1 28.5 36.5 2.23 48.50 44.82Argentina 8.0 7.2 9.0 8.0 6.7 6.3 0.95 15.10 13.66Austrália 17.4 19.6 13.7 17.4 17.0 19.3 2.37 28.37 33.34Brasil 10.0 8.2 10.8 6.7 8.9 9.9 2.36 18.73 15.94

Canadá 27.4 29.6 26.9 29.9 28.3 29.3 2.40 47.67 50.44Coréia do Sul 37.6 39.3 38.5 29.3 33.7 29.5 6.75 55.1 50.17Espanha 17.0 19.3 17.7 20.1 15.8 17.8 2.92 41.21 34.32

Estados Unidos 8.4 10.9 10.7 11.3 10.2 10.4 2.09 18.81 20.52França 22.1 20.5 22.5 19.6 21.5 22.1 2.22 39.16 37.37Índia** 8.3 9.2 9.7 9.2 6.6 9.2 5.17 15.66

Itália* 21.9 18.5 23.0 18.6 19.8 18.3 2.31 38.25Japão 15.3 8.3 15.6 7.3 14.9 9.5 3.8 28.16 16.11México* 13.0 15.8 13.4 16.9 12.6 14.1 2.52 24.26

Reino Unido 26.1 23.69 25.6 24.1 27.2 22.8 1.76 45.88 41.41Tailândia 17.2 39.3 28.3 39.7 24.5 36.9 6.93 46.00 61.95

(a) Grau de abertura definido como [(X + M) / 2]/PIB(b) O conceito de mercado interno eqüivale ao PIB - exportações (X) + importações (M) = MI;(c) Relação das exportações sobre o PIB;(d) O grau de internacionalização (TI), foi medido cf. Orleans(1986): MI=PIB-X+M; TE=X/PIB; TP=M/MI; TI=TE+(1-TE)TP.*. dados do ano de 1992**. dados do ano de 1991

Fonte: IFS/FMI - vários anos (foram utilizados os valores de exportação, importação e PIB em moedacorrente de cada país, exceto para a mensuração da taxa de crescimento do mercado interno).

A idéia contida neste último indicador é que o mercado interno, em geral, importa produtos de que

não dispõe e exporta o excesso produzido para a demanda nacional. Assim, a realização das exportações

pressupõe a exposição desses produtos à competição externa coroada de sucesso. As importações, por seu

lado, preenchem uma insuficiência interna qualitativa ou quantitativa de mercado interno. Quanto maiores

forem as exportações e as importações em relação ao mercado interno, tanto mais internacionalizado será

o país, no sentido do aproveitamento das vantagens comparativas.

Durante o período 1980/93, o Canadá, os Estados Unidos, a Austrália, a Índia, e a Tailândia

aumentaram seu grau de internacionalização. Os demais países reduziram a exposição da sua economia à

competição externa em graus variados. Japão, Itália e Brasil registraram as maiores quedas: o Japão

reduziu em 57% a exposição de sua economia doméstica à competição internacional, no período

considerado, enquanto Brasil dinimuiu em 17%. Quando confrontados com o desempenho dos respectivos

mercados internos, esses resultados são bastante ilustrativos. O mercado interno japonês cresceu (3.8%aa),

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seguindo a Índia (5.17%aa), Coréia do Sul (6.7%aa) e Tailândia (7.0%aa). O mercado brasileiro foi um

dos que menos se expandiu (2.36%aa).

Essas informações referendam os argumentos de Teixeira, E. (1993), pelo menos no tocante ao

Japão e os de Mesquita (1993) para a Coréia do Sul. Esses autores sugeriram que a diminuição da

exposição dos produtos japoneses e coreanos no mercado internacional decorreu, em larga medida, do

padrão de eficiência vigente nestes países, constituíndo-se na melhor proteção possível contra a

competição externa. No caso brasileiro, em contrapartida, o fraco desempenho do mercado interno,

conjugado com a pequena participação das exportações no PIB, explicaria a tendência à não

internacionalização da economia. Vale dizer, a aversão à exposição internacional de seus produtos.

De fato, no cômputo geral, não se extrai uma relação clara entre exposição da economia ao

mercado internacional e crescimento de mercado interno, sugerindo que atributos domésticos são mais

importantes do que simplesmente os efeitos causados pela maior ou menor abertura comercial.

Em extensão, a maior parte das exportações brasileira de manufaturados são ainda de produtos

industrializados tradicionais (têxteis, calçados, siderúrgicos e outros), adicionados de inovações marginais

e acumulativas que garantem certo sucesso comercial (Guimarães, E.P.& Carvalho, F; 1986). Resultado, a

demanda por esses produtos no mercado dos países desenvolvidos não tem crescido sensivelmente, já que

são produtos padronizados no conceito de Vernon. Isto acarreta dois efeitos negativos para obtenção de

maiores receitas de exportação. O primeiro é que estes bens são inelásticos ao preço de demanda, o que

caracteristicamente torna as exportações bastante instáveis pelo lado da oferta. O segundo é que favorece

as pressões, naqueles países, no sentido da adoção de medidas retaliativas contra as exportações

brasileiras.

Com efeito, este é um dos maiores problemas com que o Brasil se defronta nos mercados

importadores dos países desenvolvidos. No final dos anos 80, por exemplo, os Estados Unidos da América

incluíram o Brasil na Super 301, o que implicou na possibilidade “justificada” de sanções às exportações

brasileiras. Por sua vez, o Brasil não tem maior competitividade nas exportações de produtos com

conteúdo técnico mais sofisticado (aeronáuticos, componentes informatizados, alguns serviços e outros)

caracterizados pela elevada elasticidade da demanda. Nestes setores de alta elasticidade preço de

demanda, como observou Hirsch (1968) nos anos 60, há um avanço sensível da fronteira tecnológica

internacional.

Nestes termos e admitindo que a competitividade internacional é um conceito multidimensional

que objetiva aumentar a produtividade congregando a habilidade para exportar, o uso eficiente dos fatores

de produção e dos recursos naturais, combinar a política científico-tecnológica com a promoção de

exportações é recomendável. Não só pelos fatos observados mas, num mundo em que as questões

comerciais despontam cada vez mais como reguladas por tratados de propriedade industrial e intelectual,

os ajustamentos de preços são sobrepujados pelos prazos de entrega e pelos atributos de

qualidade/desempenho/durabilidade embutidos nos produtos (Fajerberg, 1986). A promoção das

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exportações, via distorção de preços, como tradicionalmente era feito, constituiria, por isso, política pouco

eficaz no atual cenário internacional.

3.1. CONSIDERAÇÕES PARA FORMULAÇÃO DE UMA POLÍTICA DE

EXPORTAÇÕES

É consenso que a tônica da orientação de política externa deve privilegiar as condições que

propiciem um ambiente macroeconômico adequado ao desenvolvimento da técnica produtiva-comercial,

de modo a afrontar-se o mercado internacional com sucesso (competitividade internacional dinâmica).

Por outro lado, os governos tradicionalmente procuram disciplinar os poderes de mercado das

firmas estabelecendo regras para as condutas concorrenciais. A política econômica, por seu turno, envia

sinais, principalmente, distorcendo os preços relativos para obter situações entendidas como desejáveis

socialmente. Como a natureza regulatória e a da distorção de preços são eventos distintos, pode ocorrer,

muito frequentemente, dos mercados não se conformarem às situações desejadas politicamente (Han, S.S;

1992).

Para maximizar os efeitos de uma política exportadora, é desejável portanto, concentrar esforços

para elevar o conceito de interação entre setor público/privado ao de cooperação entre eles. O conceito de

cooperação entre setores público e privado tem como resultado não somente equilibrar as distorções para

conformar, mas principalmente aumentar o grau de confiança na condução da política econômica, uma vez

que dela todos são partícipes. Contudo, a elevação do status de interação para o de cooperação entre setor

público e setor privado não é trivial. A forte interdependência entre os setores/empresas e entre países,

dificulta conseguir consensos gerais, os quais resultariam efetivamente no sistema de formulação política

cooperativa bem sucedida. A institucionalização das Câmaras Setoriais na segunda metade dos anos 80, na

qual participavam formalmente representantes das empresas, dos trabalhadores e do governo, constituiu a

semente deste processo.

Do ponto de vista factual, o Brasil, tradicionalmente, adicionou maior valor aos insumos básicos

(ferro, aço, energia, alumínio, plásticos, papel e papelão e outros) apoiado no desenvolvimento do setor de

bens de capital. Os países industrializados, enquanto isso, cuidaram de inserir mais eletrônica em seus

equipamentos, aumentando eficiência. Resulta que um processo de abertura comercial amplo é posto em

xeque continuamente, principalmente na ausência de uma política destinada a apoiar as empresas em seus

esforços para aumentar a eficiência, a produtividade e a induzir à diversificação produtiva favorável aos

bens de demanda internacional elástica.

A resolução para esta questão tem sido catalizada pela taxa de câmbio. No curto prazo o

expediente cambial pode ter sucesso, pois envolve os aspectos reais (balança comercial) e monetários

(movimento de capitais) do balanço de pagamentos que fazem o câmbio ter seu apreço comercial

contrabalançado pelo movimento de capitais internacionais autônomos. Isto efetivamente vem ocorrendo

no Brasil desde o início dos anos 90. Mas a volatilidade desses capitais impõe limites à adequação de um

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programa que objetiva a criação de novas vantagens comparativas, a partir da modificação nas condições e

circunstâncias dos mercados domésticos.

Esta situação permite interpretar/concluir que a política comercial externa brasileira não deve ser

enfatizada pela atual “onda” liberal, referendada pela teoria tradicional de comércio. A atuação de um

programa de fomento às exportações, obtido através do binômio setor público/setor privado, deve seguir

padrão de ingerência no comércio pautado na abrangência, flexibilidade, coerência e seletividade.

Abrangência, para não prejudicar a coerência da função estratégica de crescimento econômico, tendo

como resultado o incremento das exportações, requerido pela abertura comercial. Flexível, para aprumar

os rumos da industrialização com rapidez, diante dos obstáculos conjunturais e estruturais privilegiando a

adequação da oferta doméstica à demanda internacional. Seletivo, para dar ênfase, se for o caso, aos

segmentos/funções de maior potencial para aumentar a adaptabilidade da estrutura industrial ao padrão da

competição internacional observável atualmente.

De fato, a promoção às exportações submetida a uma política de competitividade, pressupõe a

combinação de três conjuntos de fatores interrelacionados; a) as condições macroeconômicas, b) a

habilidade para absorver, usar e desenvolver tecnologias para reduzir custos de produção e aumentar a

qualidade dos produtos e c) das estratégias de mercado consistentes, com a devida atenção aos diversos

fatores que geram competitividade, como os prazos de entrega, marketing internacional e assistência

técnica pós-venda.

Para atender a estes fatores, recuperar instrumentos e mecanismos utilizados anteriormente e que

deram certo, parece ser uma opção atraente, ainda mais em sistema econômico onde ainda reina elevada

incerteza e as políticas empresariais são nitidamente defensivas. O Brasil dispõe de dois programas de

incentivo ao desempenho exportador particularmente interessantes - BEFIEX (extinto desde o governo

Collor) e Drawback (em funcionamento). O retorno do sistema BEFIEX, se expandido com incentivos

favoráveis aos investimentos em pesquisa e desenvolvimento tecnológico, atrairia o reconhecimento de

que a maior abertura comercial contemplada por este instrumento deslocaria a fronteira produtiva nacional

na direção das demandas do comércio internacional.

Instituído em 1972, o programa BEFIEX funcionou regularmente desde sua implantação, tendo

sido responsável de 1980 a 1989 por um terço (U$ 45,56 bilhões) das exportações de manufaturados. Os

impostos anistiados por esse programa representaram 10% do total exportado no período. Esses resultados

atestam que o programa representou um poderoso estímulo às exportações. O BEFIEX em verdade foi

bastante importante quantitativamente no contexto passado de elevada proteção à indústria. Perde

importância, no entanto, em contexto de clara desproteção, onde a isenção de impostos e tarifas é

generalizada, exceto pelo aspecto qualitativo de contemplar um comprometimento exportador.

Desse modo, resgatar os aspectos da difusão tecnológica gerados intersetorialmente pelo programa

BEFIEX parece ser opção correta. De fato, a diretriz básica do BEFIEX era vincular um

comprometimento de exportação à importação de maquinário com a isenção/redução de impostos. A

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empresa que nele ingressava o fazia justamente para obter maquinário importado mais eficiente e ter

avaliado o seu sucesso a partir dos resultados obtidos no mercado internacional. Isto levava outras

empresas do ramo a fazerem o mesmo, sob pena de serem por ela suplantadas.

A tabela 7 apresenta resultados ilustrativos sobre este aspecto, deste a inauguração do BEFIEX até

o ano de 1985. Para os anos posteriores as informações não estão disponíveis publicamente. Dos 316

contratos firmados pela indústria de transformação com o sistema BEFIEX, 16% (51 contratos) foram

feitos pelo gênero material de transporte, com concentração a partir de 1980 (31 contratos). A partir deste

ano, já era claro que o crédito prêmio IPI e ICM, um dos principais instrumentos de fomento às

exportações seria extinto - e isto efetivamente ocorreu em maio de 1985. Empresas inseridas no programa

BEFIEX na vigência deste instrumento tinham direitos adquiridos após sua extinção, valendo lembrar que

geralmente para saldar o comprometimento de exportação, o programa contemplava um período de até 10

anos. Este condicionante de política, associado às transformações em curso no cenário internacional,

explicaria não só a concentração de empresas produtoras de material de transporte, mas também a

concentração na BEFIEX das empresas localizadas nos gêneros de química, vestuário, calçados e artefatos

de couro, metalurgia, têxtil e mecânica no início dos anos 80.

A força normativa dos fatos sugere que o programa não só representou um poderoso estímulo à

modernização do parque produtivo nacional, mas muito provavelmente foi capaz de não deixar expandir a

lacuna tecnológica entre o Brasil e os países desenvolvidos que passavam por transformações produtivas

substanciais.

Essas considerações apontam, isto sim, para a necessidade de ampliar a área de manobra política

do BEFIEX, principalmente no tocante ao financiamento à P&D e à ampliação e modernização da

capacidade industrial instalada, ao contrário do que foi feito pela política oficial até a sua extinção. Desse

modo, pode-se adicionar à redução da proteção contra a competição externa, esquemas de financiamento

favorável à P&D, com comprometimento de exportação, no sentido de assegurar condições de

competitividade a segmentos específicos da indústria que não respondem espontaneamente a

intensificação da concorrência provocada pela abertura comercial. O comprometimento de exportações

visa a assegurar uma destinação de recursos orientada pela maior adaptabilidade produtiva aos rumos do

comércio determinados pela competição internacional, com efeitos benéficos ao mercado interno e à

obtenção coerente de novas vantagens comparativas.

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Tabela 7

NÚMERO DE CONTRATOS BEFIEX POR GÊNERO DA INDÚSTRIA, 1972-1985Gênero da Indúistria ano

Cód. de denominação 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 total10 prod. de

min.não met

11 metalurgia 01 03 02 04 07 01 03 09 30

12 mecânica 01 01 01 03 03 16 03 03 03 34

13 mat.elet. e de eletron comuni. 01 01 01 03 03 02 02 05 01 19

14 material 02 02 02 04 01 01 02 06 04 15 05 04 03 51

15 madeira

16 mobiliário

17 papel e papelão

18 borracha

19 couros.,peles e simil

20 química 01 05 01 07

21 prod. farmac.e veter. veterin 01 03 04

22 perf. sab. e velas

23 prod. mat. plásticas

24 têxtil 01 02 01 01 02 01 03 07 09 03 03 04 09 46

25 vest. calç. e art. de tec. 01 01 02 01 09 05 13 08 40

26 produtos alimentares 01 03 01 01 01 02 01 10

27 bebidas

28 fumo

29 editorial e gráfica

30 diversos 02 01 04 04 10 11 21 06 07 09 75

indústria de transf 02 03 03 04 11 05 10 16 35 35 79 25 44 44 318

Fonte: Guimarães, E.P(1988) (1988)

Guardadas as devidas proporções, os argumentos evocados para os incentivos canalizados pelo

programa BEFIEX são válidos também para o regime de drawback, que isenta impostos das mercadorias

importadas destinadas a comporem produtos exportados. Ele procura proporcionar para as empresas

domésticas as mesmas condições competitivas vigentes para os concorrentes externos. Destaque-se aqui a

proposta de inclusão do apoio financeiro à isenção de impostos destinados aos aspectos produtivos para

exportação, como aplicado em outros países (Coréia, França e Alemanha, por exemplo), em detrimento

aos incentivos fiscais e financiamento à comercialização somente, como tradicionalmente se fez.

Diferentemente da renúncia à carga tributária em favor das exportações como convencionalmente

era feito no sistema BEFIEX e o é no sistema DRAWBACK, o apoio financeiro (funding & finance) pode

se constituir num instrumento eficaz para contrabalançar movimentos desfavoráveis de capitais, inter e

intra setores industriais. Além disso, pode viabilizar também uma ação que estimule o investimento

industrial, ao prever reduções de custos de capital. E pode, ainda, ser útil à formação e consolidação dos

grupos nacionais, por favorecer a formulação de estratégias empresariais mais consequentes.

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Além disso, e apoiando-se em Minsky, a integração entre a estrutura produtiva e financeira

poderia cuidar engenhosamente dos débitos-créditos sem prejuízo para a formação do capital financeiro,

ao assegurar a renda da atividade exportadora no circuito financeiro nacional (em moeda nacional) ou

internacional (em dólares) .

Estas considerações não são incompatíveis com o projeto MERCOSUL. Coadunam-se

exemplarmente com ele e deveriam ser expandidas aos países integrantes do acordo regional. O sistema

BEFIEX ampliado- nas atribuições e regionalmente - além de ser concordante com as normas do

GATT/OMC, ajudaria a dirimir um foco de conflitos nas negociações com respeito à harmonização da

tarifa externa incidente nos produtos fabricados pelo setor de bens de capital e de informática. Estas só

terão alíquotas ad valorem comuns, pela leitura dos últimos protocolos do acordo MERCOSUL, no

próximo milênio.

No caso específico do setor de bens de capital, os resultados de Sarti et alii (1992) mostram que as

exportações brasileiras de bens de capital para a Argentina têm se constituído por intensivas em capital e

produzidas em grande escala, enquanto os bens de capital argentinos importados pelo Brasil são

predominantemente caracterizados pelo uso de mão de obra qualificada e produção em pequena escala. A

maior aderência da proposta inserção BEFIEX no acordo MERCOSUL, além da evidência das relações

interindustriais para o setor de bens de capital destacada por Sarti, reside também no fato de que tanto o

processo de tarifação quanto o de difusão tecnológica poderiam, assim, ser encurtados com significante

racionalização na utilização dos mecanismos de salvaguardas, contidos no acordo de integração.

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