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UMA EXPERIÊNCIA COM A APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA NA

DESNATURALIZAÇÃO DO PRECONCEITO RACIAL NA ESCOLA

Autora: Clarice Garbin Manueira1

Orientadora: Regina Célia Alegro2

RESUMO

Mesmo com as recomendações das diversas instâncias curriculares para sua abordagem, temas da cultura negra, quando são tratados na escola, o são muitas vezes de maneira protocolar. Na direção de contribuir para a reflexão sobre o preconceito entre os alunos participantes do projeto, este trabalho descreve noções de conhecimento prévio e de aprendizagem significativa (AUSUBEL, 1980), para se abordar o tema. E relata a experiência de implementação pedagógica realizada com alunos da 6ª série do Ensino Fundamental no ano de 2011. De maneira geral, as respostas dadas mostraram que os alunos não se sentiam ou não admitiam ser racistas, no entanto, por vezes muitos relataram que conheciam alguém que o era. Ao longo das atividades, percebemos mudança no comportamento da maioria dos alunos em relação ao preconceito e racismo, pois muitos passaram a perceber que mesmo não tendo a intenção, acabavam sendo preconceituosos.

Palavras-Chave: racismo; conhecimento prévio; aprendizagem significativa

ABSTRACT

The resistance and the unpreparedness among teachers to discuss themes related to the Brazilian black culture and racism are evident. Despite the recommendations of several curricular instances for the approach of black culture subjects, when they are discussed in classroom, it occurs in a superficial and formal way. In the direction of contributing for the extirpation of racial prejudice in our society, this article discusses the possibilities of the notions of previous knowledge and meaningful learning (AUSUBEL, 1980), to approach the theme. We also give an account of some experiences with a pedagogic intervention proposal accomplished with Sixth Grade students of our so-called Fundamental Education in the year of 2011, in which the mentioned approach showed promising results.

Key-words: racism; previous knowledge; meaningful learning

1 INTRODUÇÃO

1 Professora PDE: Pós-graduada em Didática e Metodologia de Ensino pela Universidade Norte do Paraná – UNOPAR; Graduada em Ciências Sociais pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Arapongas; atua no Colégio Estadual Sabáudia.2 Doutora em Educação pela UNESP/SP; Professora do Departamento de História da Universidade Estadual de Londrina (UEL)

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Este estudo consiste em uma discussão sobre a questão do preconceito racial

no Brasil e na apresentação de experiências de uma proposta de implementação na

escola, baseada no conceito de aprendizagem significativa de David Ausubel (1980),

com vistas a contribuir para a desnaturalização e erradicação do preconceito.

Ao constatarmos que em nosso país o preconceito racial ainda é bastante

presente, parece-nos que o caminho mais viável para a superação das

desigualdades raciais passa por uma releitura, em nossas escolas, da história do

mundo africano, sua cultura e presença na vida dos brasileiros.

Assim, por meio de estudos e reflexões, tencionamos levar os alunos a

reconhecer a real participação de tradições com matrizes africana na cultura

brasileira em alguns campos: música, política, literatura, dança e outros. Isso por

acreditarmos que mudanças legais favoráveis não bastam, se queremos mudanças

mais profundas em certos ideários preconceituosos, intrinsecamente

desagregadores, que permeiam nossa cultura.

Pensar a questão racial no ambiente escolar é importante por diversas

razões, sendo uma delas a irrelevância atribuída ao tema, desconsiderado nos

conteúdos escolares. Sua ausência total na filosofia da escola, até bem pouco

tempo, tem dificultado o combate das ideologias que preservam o racismo e o

preconceito na cultura brasileira.

A Lei 10.639/2003, estabelecendo a obrigatoriedade do ensino de História e

Cultura Afro-Brasileira e Africana estimulou a necessidade de reflexão não apenas

do ponto de vista temático, mas também sobre as representações que amparam

posicionamentos cotidianos. Acreditamos, porém, que não se trata apenas de mudar

o conteúdo programático, focando o processo cognitivo, mas de promover, a partir

da sala de aula, mudanças de atitudes em decorrência do reconhecimento de

diferenças e diversidades étnicas e culturais e seu papel na composição da

identidade brasileira.

Por outro lado, não obstante a renovação da historiografia brasileira nos

últimos anos, os livros didáticos não contemplam a riqueza da diversidade étnico-

cultural, cuja matriz afro-brasileira merece ser ressaltada para que, de fato,

tenhamos uma escola plural e democrática, que seja favorável ao acesso e

permanência dos afrodescendentes em nosso sistema educacional.

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Dentre outras fontes, as interpretações da obra de Gilberto Freire, Casa

Grande e Senzala, passaram a ser introduzidas no Ensino de História do Brasil.

Mostrando a miscigenação entre senhores e escravas, as ações cristãs de senhores

que concediam alforria a seus filhos nascidos nas senzalas, entre outras concessões

dos senhores aos escravos, relatadas na obra, tais interpretações têm sido tomadas

como elementos para provar a existência da democracia racial entre nós.

Destacamos no entanto, a insuficiência de tal referencial para a superação do

do que se considera o mito da democracia racial. (ROSEMBERG, 1995, p. 73). Para

a derrubada dos mitos que mascaram os problemas sociais, os preconceitos, as

discriminações, faz-se necessário o empreendimento de ações na formação de

docentes, com reflexões e sensibilização sobre a temática do preconceito racial.

No que tange ao papel da escola, parece ser o mais importante passo para

que aflorem as diferenças, o multiculturalismo e a diversidade, a fim de que se possa

“fazer falar a multidão imensa dos figurantes mudos que enchem o panorama da

História e que são muitas vezes mais interessantes e mais importantes do que os

outros, os que apenas escrevem a história”. (BITTENCOURT, 2005).

Com essa perspectiva, a escola será mais competente se for capaz de

valorizar a diferença. Lembramos entretanto, que valorizar a diferença não significa

exaltar a desigualdade, quando se entende diferença como um conceito cultural e

desigualdade como um conceito ético. (SILVA & ALEGRO, 2010).

O preconceito parece não ter limites de possibilidade de manifestação, sendo

praticamente impossível dizer que alguém seja totalmente dele destituído, seja

entendido como uma atitude que traz consigo a predisposição deliberada de

desvalorizar o outro, seja fruto de uma ideologia transmitida de geração a geração,

por anseio de domínio de certo grupo sobre outro.

O combate ao preconceito, segundo o entendemos, deveria começar com a

informação histórica, para o que necessitávamos saber as concepções tácitas dos

aprendizes sobre as questões que o envolvem, para que sobre elas pudéssemos

empreender as ações pedagógicas de mudança de atitude que objetivávamos.

Nesse sentido, há uma consciente decisão em favor da promoção da igualdade do

valor humano que nos caracteriza a todos.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TÉORICA

2.1 Combate ao racismo e ao preconceito

Como outros países da América Latina e os Estados Unidos, o Brasil viveu

até 1888 um longo período de escravidão de pessoas negras trazidas da África ou

de seus descendentes. Inicialmente, como legado da escravidão e, posteriormente,

decorrente de práticas racistas, temos observado no país a convivência de

desigualdade e preconceito racial bastante forte, com o chamado “mito da

democracia racial” ou “racismo cordial”. (ROSEMBERG, 1995).

Na história do Brasil, perpassando os períodos colonial, imperial e

republicano, a discriminação e o racismo foram até mesmo legalmente sustentados.

A legislação demonstrava uma postura ativa e permissiva, como se constata pelo

Decreto nº 1331 de 17/02/1854, que estabelecia a não aceitação de escravos nas

escolas públicas do país. Nesse sentido, pouco avançou o Decreto nº 7.031-A, de

06/09/1878, que mantinha a segregação dos negros ao somente permitir que

frequentassem o ensino noturno; mesmo assim, com muitos entraves para o acesso

e continuidade dos estudos. (BRASIL, 2004, p.7).

Não obstante a Constituição de 1988, instituindo o Estado democrático e de

direito, enfatizando os princípios da cidadania e da dignidade humana, o país ainda

enfrenta posturas subjetivas e objetivas de preconceito e dificuldades de acesso da

população negra à escola, relacionados à situação geral do negro em nossa

sociedade.

Se buscarmos alguma comprovação estatística, verificamos que o número

de anos de estudos de pessoas negras é de 4,2, contrapostos a 6,2 das pessoas

brancas, números que evidenciam a desvantagem educacional daquela população

(BRASIL, 2004).

Como forma de tratar educacionalmente a questão, o Governo Federal, por

meio da Lei nº 10.639/03 – MEC altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação,

instituindo a obrigatoriedade de ensino de História da África e dos africanos, no

currículo escolar dos Ensinos Fundamental e Médio, como forma de valorizar a

contribuição dos negros na constituição e formação da sociedade brasileira. Em tal

direção, foram instituídas políticas de reparações, reconhecimento e valorização da

história e cultura dos afro-brasileiros:

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Reconhecimento implica justiça e direitos sociais, civis, culturais e econômicos, bem como valorização da diversidade daquilo que distingue os negros dos outros grupos que compõem a população brasileira. E isto requer mudança nos discursos, raciocínios, lógicas, gestos, posturas, modo de tratar as pessoas negras. Requer também que se conheça a sua história e cultura apresentadas, explicadas, buscando-se especificamente desconstruir o mito racial na sociedade brasileira; mito este que difunde a crença de que, se os negros não atingem os mesmos patamares que os não negros, é por falta de competência ou de interesse, desconsiderando as desigualdades seculares que a estrutura social hierárquica cria com prejuízos para os negros (BRASIL, op.cit., p.11-12).

Torna-se evidente, no entanto, que esse combate não pode ser tarefa

exclusiva da escola, pois não é a única instância educativa dos indivíduos na

sociedade. Mas a escola é o espaço privilegiado, onde se podem instalar as

discussões potencialmente capazes de alterar posturas. Ao se considerar a relação

de dominador e dominado entre brancos e negros, estabelecida no correr da

história, seja no interior da escola ou fora dela, conforme colocam as mesmas

Diretrizes (op.cit., p.14), a educação das relações étnico-raciais impõe um projeto

conjunto, de aprendizagens entre brancos e negros, trocas de conhecimentos,

quebras de desconfianças, para a construção de uma sociedade justa e igualitária.

Acrescentamos que uma educação nesse sentido deve pensar que o

racismo acaba imprimindo marcas de maneira forte na subjetividade das pessoas

negras, as quais acabam reproduzindo o preconceito social, subestimando a si

próprias, como forma de se sintonizar à ideologia reinante da inferioridade da raça.

Segundo Cavalleiro (2005, p.27), pouco se fala sobre racismo e discriminação

na escola e tal omissão colabora para a perpetuação de novas ocorrências,

reforçando a legitimidade de atitudes e procedimentos preconceituosos e

discriminatórios no espaço escolar e, a partir deste, para outros ambientes sociais.

Nesse contexto, colocando-se o racismo como uma questão de

responsabilidade do todo da sociedade, a escola deve posicionar-se politicamente. É

uma questão que faz parte da formação para a cidadania, mesmo porque o racismo

está previsto no Artigo 5º da Carta Magna como um crime inafiançável. Dado o

alcance das consequências da intolerância mencionada, dar ao conhecimento do

aluno fatos dessa importância é o mínimo que a escola pode fazer. Desse modo,

A escola tem papel preponderante para eliminação das discriminações e para emancipação dos grupos discriminados, ao proporcionar acesso aos

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conhecimentos científicos, a registros culturais diferenciados, à conquista de racionalidade que rege as relações sociais e raciais, a conhecimentos avançados, indispensáveis para consolidação e concerto das nações como espaços democráticos e igualitários. (BRASIL, op. cit., p.15).

Concordamos com a perspectiva expressa nas Diretrizes: o combate ao

racismo e ao preconceito deverá ter como ponto de partida a informação, pelo

acesso aos conhecimentos científicos. Embora saibamos que o preconceito e o

racismo têm forte componente emocional em sua gênese, entendemos que a escola

estará em terreno mais seguro se estiver embasada na ciência, para derrubar, por

exemplo, os mitos da superioridade de uma raça sobre outras, bem como questionar

e redefinir esses conceitos relacionados à questão ora aventada.

A esse respeito, vale lembrar que o racismo não atinge só os negros e que

também não é o único preconceito presente na sociedade e na escola. Ao

considerarmos tal fato, impõe-se, de igual forma, uma pedagogia de combate ao

racismo e discriminações em geral na formação do professor. Tal pedagogia será

bem mais que a mera

[...] inclusão de novos conteúdos, exige que se repensem relações étnico-raciais, sociais, pedagógicas, procedimentos de ensino, condições oferecidas para aprendizagem, objetivos tácitos e explícitos da educação oferecida pelas escolas. (BRASIL, op. cit. P.17).

Para isso, na perspectiva da reeducação das relações étnico-raciais, nos

necessários cursos de formação de professores e de outros profissionais de

educação, devemos analisar as relações sociais e raciais no Brasil, os conceitos de

racismo, discriminação, intolerância, preconceito, estereótipo, raça, etnia, cultura,

classe social, diversidade, multiculturalismo e outros. De igual modo, merecem

revisão as práticas pedagógicas, os materiais e textos didáticos.

Entendemos que os conhecimentos científicos de nossa área de atuação, a

História e as ciências afins têm o potencial de despertar a consciência política e

histórica da diversidade, erodindo, a partir da razão científica, as bases formadoras

das ideias preconcebidas, tão danosas à convivência harmônica da sociedade,

trazendo ainda o fortalecimento das identidades e dos direitos.

2.2 Visão adotada para a corrente proposta

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Colaborando com a postura que ora expomos, as Diretrizes Curriculares da

Educação para o Ensino de História (PARANÁ, 2008) afirmam que o jovem constrói

a identidade a partir da alteridade, ou seja, em suas relações com os variados

sujeitos, estes dotados de suas visões de mundo e temporalidades, em diversos

contextos de espaço e tempo, permeados pela narrativa histórica.

De igual modo, entendemos ser central para nosso estudo o conceito de

consciência histórica, vista como

Uma condição da existência do pensamento humano, pois sob essa perspectiva os sujeitos se constituem a partir de suas relações sociais, em qualquer período e local do processo histórico, ou seja, a consciência histórica é inerente à condição humana em sua diversidade. Em outras palavras, as experiências históricas dos sujeitos se expressam em suas consciências (THOMPSON, 1978). (apud PARANÁ, op.cit., p.56)

A perspectiva que parece mais adequada para o trabalho ora empreendido é

a que vai contra a história linear, durante muito tempo dominante no ensino da

disciplina. A história linear, de que muitos de nós fomos discípulos, é centrada em

heróis, seres entendidos como superiores, sobre-humanos; é uma história que exclui

a participação de outros sujeitos. Baseada em causas e consequências, ela não

problematiza a construção do processo histórico. Há uma espécie de verdade

inquestionável, acontecida em um tempo eterno, transmitida pelo professor e

memorizada pelo aluno.

Contrariamente à noção exposta, orienta nossa visão para este trabalho a

narrativa histórica, conforme a qual se formulam representações da continuidade da

evolução temporal dos homens e de seu mundo, as quais instituem sua identidade,

por meio da memória. Desse modo

A narrativa histórica torna presente o passado, sempre em uma consciência de tempo na qual o passado, presente e futuro formam uma unidade integrada, mediante a qual, justamente, constitui-se a consciência histórica (RÜSEN, 2001, p. 57, 65, 66-67).

Na direção da desnaturalização do preconceito por nós almejada na corrente

discussão, buscamos a percepção das experiências do passado de negros e

brancos na história nacional, em que a consciência histórica vai se dar por

interpretações feitas no presente à luz de uma expectativa de futuro diferente para

as relações raciais em nosso contexto.

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Particularmente relevante e consoante à posição por nós adotada para a

consecução dos objetivos da proposta é a organização dos “conteúdos

estruturantes” para a disciplina de história. Tais conteúdos apresentam-se em três

eixos: a) relações de trabalho, as quais enfatizam a “história vista de baixo”,

buscando novas fontes para revelar a voz dos excluídos; a) relações de poder, em

que se faz a crítica à mencionada história factual, baseada em heróis; c) relações

culturais, centrais a esta proposta, cujas perspectivas já aventamos (PARANÁ, op.

cit. p. 63-68).

Em suma, norteia nossas ações a visão emanada das Diretrizes (op. cit. p.59)

de que a consciência histórica crítica baseia-se na aprendizagem histórica das

experiências do passado. Essa visão possibilita a formação de pontos de vista

históricos quando nega o tipo tradicional e exemplar de consciência, rompendo-se a

linearidade temporal e reduzindo-se as interpretações vinculadas a causas e

consequências, fazendo mais amplas as possibilidades de explicação e

compreensão do processo histórico.

2.3 Conceituação de aprendizagem significativa

O conceito mais amplo de construtivismo abarca alguns veios, os quais

concordam quanto à questão de que quem aprende algo o faz relacionando o

conteúdo novo que lhe é apresentado com suas experiências prévias sobre o

assunto. Desse modo, a história da construção do conhecimento reflete a história de

vida de cada indivíduo, o qual constrói esse conhecimento de um jeito próprio e

específico.

Difícil um trabalho sobre a aprendizagem significativa que não repita a famosa

assertiva de David Ausubel de que “o fator isolado mais importante que influencia a

aprendizagem é aquilo que o aprendiz já conhece. Descubra o que ele sabe e

baseie nisso seus ensinamentos (AUSUBEL et al., 1980, p. 137).

Segundo o autor, o conhecimento se organiza e se armazena nas estruturas

cognitivas humanas, conforme o princípio da diferenciação progressiva: vai das

ideias mais gerais e inclusivas para as mais pormenorizadas e específicas.

E essa é também a sequência natural da aquisição do conhecimento, de

modo que é mais fácil para os seres humanos aprender quando se parte de um todo

mais inclusivo que se vai diferenciando em suas partes constituintes. Indo além, o

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pesquisador coloca que a organização de uma disciplina no intelecto forma uma

estrutura hierárquica, em que as idéias mais inclusivas “subsumem” as proposições,

conceitos e dados factuais menos gerais e mais diferenciados (Idem, 2003, p.166).

Vale mencionar a assertiva de que

Um significado identificado em um momento específico, entretanto, é sempre um produto provisório porque no instante seguinte, dependendo dos fatores contextuais e da intencionalidade do sujeito, esse conhecimento poderá modificar-se (LEMOS, 2006, p.57).

Tal percepção de que os conceitos podem se alterar dependendo de fatores

contextuais nos acena para a possibilidade de mudanças em relação às pré-

concepções que os alunos trazem sobre os temas que ora abordamos, tornando

factível a proposta de desconstrução de percepções baseadas em noções errôneas,

relacionadas aos preconceitos aqui debatidos.

Para tanto, optamos pelo trabalho com a aprendizagem significativa,

entendida como o processo em que a nova informação interage com conhecimentos

incorporadores, integradores ou âncoras, já presentes na estrutura cognitiva. Porém,

não se trata de simples associação; há uma integração, uma interação com o

conhecimento subsunçor, que incorpora as novas aprendizagens.

Para Ausubel (op.cit., p.60), a maior parte do que ocorre em termos de

aprendizagem e retenção, no que tange à organização dos conteúdos é hierárquica

por natureza. Dá-se o processo de cima para baixo, em termos de abstração,

generalidade e inclusão, o chamado processo de subsunção.

Por outro lado, existe também o princípio da reconciliação integradora; ou

seja, pela comparação das idéias antigas com as novas, de baixo para cima,

manifesta-se a capacidade de discriminação das diferenças entre os novos materiais

de aprendizagem e ideias já existentes na estrutura cognitiva de quem aprende

(AUSUBEL, op. cit., p.170).

Lembra o mesmo pesquisador que a aprendizagem significativa não tem

como condição a idade, excetuando-se recém-nascidos. Importa para que ela ocorra

o conhecimento prévio do aluno, a predisposição, o material de aprendizagem e a

capacidade docente.

2.4 Conhecimento prévio

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Para a efetivação de nossa proposta, tivemos o conhecimento prévio como

elemento básico e organizador do ensino. Por isso, foi fundamental a identificação e

estruturação dos conceitos iniciais dos alunos, relevantes às temáticas trabalhadas.

Esses conhecimentos são as referidas âncoras, os subsunçores presentes na

estrutura cognitiva do aluno que funcionam como estruturas integradoras de novos

conteúdos estudados na escola.

Lembramos o caráter provisório do conhecimento prévio. No entanto, ele é a

condição necessária para a construção do conhecimento científico. No processo de

aprendizagem significativa, o conhecimento prévio tanto altera os novos conceitos

como é alterado por eles, de modo que há um continuum de criação de novos

produtos de aprendizagem, com novo significado para o aprendiz.

Ausubel (op.cit., p.155) refere-se também a certos conhecimentos prévios que

tendem a dificultar ou impedir a aprendizagem significativa de princípios lógicos

válidos, os quais são estáveis, tenazes e resistentes à extinção. Segundo o autor,

parece ser característica à aprendizagem humana a resistência a novas ideias

contrárias às suas concepções pré-existentes. Tal característica nos remete à

questão do preconceito, cujos conceitos são tão difíceis de se alterar, quanto mais

consideramos o teor emocional fortemente arraigado que os marca. Porém, se não

acreditássemos na possibilidade de mudanças, nem mesmo tentaríamos a

materialização do trabalho empreendido.

3 METODOLOGIA

A proposta de intervenção pedagógica foi desenvolvida no Colégio Estadual

Sabáudia, de Ensino Fundamental e Médio, tendo como participantes alunos da

então chamada 6ª série (a partir de 2012, denominada 7º ano).

A metodologia do trabalho tem como fundamentos, evidentemente, os

conceitos de conhecimento prévio e de aprendizagem significativa, na perspectiva

teórica exposta.

Com vistas à consecução dos objetivos propostos, procedemos a uma

investigação dos conhecimentos prévios dos alunos participantes por meio de um

pré-teste, estruturado para fazer uma tomada mais geral sobre o ideário dos alunos

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em relação às noções de preconceito, discriminação, racismo e do negro na

sociedade brasileira. Após tal ação, procedemos a uma análise dos dados colhidos,

buscando certa sistematização desses conhecimentos prévios, com base nos quais

empreenderíamos as ações subseqüentes.

Os indicativos coletados com essa prévia averiguação nos possibilitaram uma

exploração mais produtiva do caderno pedagógico elaborado para a intervenção.

Em relação às leituras trabalhadas em sala de aula, privilegiamos textos

diversos com diferentes perspectivas históricas, não só os documentos oficiais.

Assim, buscamos múltiplos recortes temporais, diferentes conceituações de

documentos, variados sujeitos e suas experiências, com vestígios e fontes

historiográficas diversas, valorizando a diversidade em seu papel de desenvolver a

consciência histórica. Desse modo, procuramos contemplar formas de

problematização do passado, de modo a promover a “superação da ideia de história

como verdade absoluta por meio da percepção dos tipos de consciência histórica

expressas em narrativas históricas.” (PARANÁ, op. cit., p.60)

As ações empreendidas buscaram, evidentemente, interferir nas ideias

prévias dos estudantes, buscando sua sistematização e reestruturação, fazendo

com que adquirissem um novo conhecimento sobre a temática, objeto de nosso

estudo, sendo a intenção expressa a ancoragem de novas noções advindas do

conhecimento científico de nossa disciplina, de modo a contribuir para desarraigar

noções preconceituosas e injustas, quase sempre frutos do desconhecimento da

evolução histórica do povo negro.

Para atingir esse objetivo, pelas leituras e discussões empreendidas,

buscamos promover a interação entre o novo conhecimento e o já existente,

sabendo que, nesse processo, ambos se modificam, produzindo novos significados

e um novo produto de conhecimento, informado por conhecimentos históricos.

Imbuídos dessa visão, perpassamos desde a história do negro e do

preconceito étnico-racial no Brasil até o chamado mito da democracia racial.

4 EXPERIÊNCIAS DA IMPLEMENTAÇÃO NA ESCOLA

Não pretendemos aqui uma apresentação quantitativa de resultados,

entendendo que, para a presente proposta, cabe uma abordagem mais qualitativa,

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principalmente se considerarmos que uma tomada numérica de resultados positivos

não garante que os objetivos foram totalmente atingidos. Isso porque quando se

trata de mudar ideias preconcebidas, não se pode pretender que milagres ocorram

no espaço restrito de uma proposta de implementação.

No entanto, embasados nas concepções anteriormente expostas, de

conhecimento prévio e aprendizagem significativa, apresentamos alguns relatos e

discussões da implementação efetivada na sala de aula.

Assim, ao reconhecer a existência do preconceito racial, por nossa própria

vivência no meio escolar, partimos para o desenvolvimento do projeto com os alunos

da 6ª série B do Ensino Fundamental, na Escola Estadual de Sabáudia, tendo como

material de suporte o Caderno Pedagógico por nós elaborado, como uma das

etapas de estudos do Programa de Desenvolvimento Educacional.

Na direção de desnaturalizar - de mostrar que não é normal - o preconceito,

buscamos promover atitudes de respeito à diversidade étnico-racial e cultural de

nossa sociedade. Para isso, procuramos valorizar as múltiplas expressões culturais

brasileiras, buscando suas origens principalmente na história do tráfico de escravos

africanos, sem deixar de referir as influência indígenas e as correntes imigratórias,

que moldaram o Brasil como o conhecemos.

4.1 Tomada do conhecimento prévio

Como ponto de partida, após introdução do tema com breve exposição,

fornecemos a ficha reproduzida abaixo para os alunos colocarem suas concepções:

O que eu sei sobre: O que as outras pessoas falam sobre:Preconceito: Discriminação: Racismo: O negro na sociedadebrasileira

Assim que terminaram de preencher, fizemos a leitura das respostas dadas,

fazendo uma síntese dos principais conceitos aventados, para fomentar uma

discussão. Vale lembrar a percepção que tivemos de que tratar desse assunto em

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sala de aula é praticamente um tabu. Ele geralmente não é mencionado,

principalmente pelo fato de o professor não se sentir preparado e ter receio de

evocar situações constrangedoras.

De maneira geral, as respostas dadas mostraram que os alunos não se

sentiam ou não admitiam ser racistas; no entanto, relataram, por vezes, que

conheciam alguém que o era, confirmando a idéia corrente de que o brasileiro não

se reconhece como racista. Isso nos faz aventar a hipótese de que essa pode ser

uma forma de defesa de se admitir racista frente à forte presença dos discursos

antidiscriminatórios circulantes em nosso meio. Ou seja, a aquisição do discurso

politicamente correto pode ser apenas um escudo, uma vez que as noções

preconcebidas infelizmente possuem forte componente emocional que não se

modifica de uma hora para outra.

4.2 Discriminação racial

Entre as atividades para trabalhar a questão da discriminação racial,

propusemos a leitura do texto Somos todos iguais. Com essa ação, tínhamos como

objetivo chamar a atenção para a existência do preconceito racial. Entre outras

atividades, propusemos a exploração do texto, com consulta ao dicionário e

discussão a partir da leitura, visando a uma reestruturação e sistematização do que

até então haviam estudado.

No Dia da Consciência Negra, o texto foi apresentado em forma de teatro

pelos alunos participantes do projeto, no pátio da escola, para toda a comunidade

escolar. Lembramos que o Dia da Consciência Negra nunca havia sido comemorado

na escola, pelo que se pode entender que seja mais um tema “tabu”. Em nossa

vivência no meio escolar, temos visto que a questão do racismo pode ser muito

dolorida para alguns afrodescendentes, que preferem nem mencioná-la, para não

mexerem em feridas, contribuindo para tornar o problema invisível. Outros não

querem mesmo dar espaço para a discussão.

Complementarmente à atividade, colamos cartazes com frases relacionadas

ao tema nas paredes da escola que dão para o pátio. Segundo nossa opinião, o

resultado das atividades desse dia foi excelente, a julgar pela participação dos

alunos, um começo importante, que serviu ao menos para colocar o assunto em

pauta.

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Em outro dia em sala de aula, discutimos mais sobre discriminação racial,

colocando que quando uma pessoa acredita que sua raça é melhor que outra,

instala-se o racismo que há tempos tinha mesmo o respaldo científico. Até o século

passado, mesmo os cientistas acreditavam que havia raças puras e que essas raças

“puras” eram melhores do que as “misturadas”, caso do mulato, por exemplo. Como

resquícios dessas pseudoteorias, os índios são considerados, até hoje, por muita

gente, como incapazes.

4.3 Por que preconceito?

No prosseguimento das atividades em sala de aula, trabalhamos textos de

história dos africanos no Brasil, buscando o entendimento da gênese do preconceito

étnico no Brasil, principalmente em relação aos afrodescendentes. Abordamos o

período colonial e a escravização de indígenas e africanos, lembrando da ideologia

reinante de inferioridade das raças, justificando o direito do colonizador em

escravizá-las.

Abordamos a questão de que os negros não nasceram escravos, mas foram

escravizados. Da mesma forma que não existia escravidão no Brasil antes da

chegada dos europeus.

Mostramos que os efeitos dessa história permanecem até hoje, quando

observamos as condições de desigualdade social e econômica dos negros e pardos

no Brasil. Assim, os alunos da turma puderam perceber por que, dentre as diversas

etnias, a africana, foi e é das mais estigmatizadas.

Lembramos aos alunos que é comum ouvir dizer que no Brasil já não existe

mais racismo, preconceito ou discriminação. Ao mesmo tempo, é impossível negar o

alargamento das diferenças sociais e econômicas sofridas pela sociedade no

decorrer dos séculos. Assim, foi necessário voltar ao período de colonização do País

para entender essas diferenças.

Por meio dessa tomada histórica, acreditamos ter provocado a consciência de

que a história do negro no Brasil começa e se encerra na escravidão. O sistema

escravista termina, mas a exclusão do negro não. Ele permanece na senzala,

aparentemente fora do cenário social, mas está lá, envolvido numa forma silenciosa

de segregação racial, excluído do processo de desenvolvimento social, econômico,

cultural e político do país.

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Como vemos pela própria resistência da escola em aventar o assunto, toda

essa perversa construção de ideologias e práticas implantadas pelas elites, fincou as

raízes do racismo na cultura brasileira, povoando o imaginário social de preconceito

racial, que se manifesta de forma velada, escondendo por trás do mito da

democracia racial o tratamento desigual destinado para as populações negras.

A esse propósito, aproveitando o gosto da população em geral por novelas,

parte importante da cultura brasileira, questionamos o porquê de os protagonistas

serem quase sempre brancos e de os negros estarem quase sempre em posições

subalternas de empregados e escravos. Alguns colocaram que os donos das

emissoras são racistas; outros que os negros não são protagonistas porque são

pobres e feios (!); outros ainda acham que a novela só espelha a realidade: os

negros sempre trabalharam em funções em que ganham menos que os brancos.

Surgiu nas discussões a questão das cotas para cursos superiores e

concursos. Alguns alunos colocaram que não aceitam o sistema de cotas, achando

mais uma forma de discriminação que tacha os afrodescendentes de menos

inteligentes.

Resvalou a discussão para a questão da aparência física como mais um

elemento de discriminação, quando se constata que a cor da pele é muitas vezes

empecilho no ingresso de pessoas negras em certos empregos. A maioria absoluta

dos alunos não admitia que o critério cor da pele fosse considerado em termos de

“boa aparência” para admissão em empregos. No entanto, em certos momentos,

percebíamos indícios de discriminação em comentários que faziam de respostas de

outros colegas.

4.4 Diversidade cultural

Para estudar a questão da diversidade cultural foram realizadas várias

atividades em sala de aula. Partimos das diferenças individuais, para o que pedimos

que os alunos preenchessem um quadro como o que abaixo reproduzimos:

Características físicas Características de sua personalidade

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Após discussão a respeito das características individuais, foi proposta a

leitura do texto O Brasil é formado por várias culturas. Havíamos pedido que os

alunos pesquisassem em família seus ascendentes, até onde os pais sabiam, em

uma pesquisa informal, cujos resultados foram por eles apresentados para a turma.

Foi um momento bastante interessante, em que observamos bastante interação

entre os alunos sobre suas origens.

Como parte da conscientização sobre a diversidade cultural de nosso país,

foram dadas orientações para a confecção dos bonecos, ficando determinado que

cada grupo confeccionaria bonecos de diversas nações, utilizando como material,

folhas de jornal, bombril, lã e tinta. Esses bonecos também foram expostos no pátio

da escola, para toda a comunidade escolar no Dia da Consciência Negra.

Em outra atividade, os alunos receberam um mapa do Brasil impresso em

uma folha no qual colaram recortes de rostos de diferentes pessoas representando a

diversidade étnica do Brasil. Esses mapas menores foram agrupados em um só

mapa, exposto no pátio da escola juntamente com os bonecos e os cartazes. Ainda,

em aulas subsequentes, estudamos e desenhamos máscaras africanas, marca

característica da cultura negra.

Por meio da realização desses trabalhos, os alunos tiveram oportunidade de

reconhecer que o Brasil é formado por várias culturas e que todas deram e

continuam dando sua contribuição para nossa riqueza cultural e econômica.

Para encerrar o projeto de implementação, reaplicamos o quadro para

comparação das respostas dos alunos em relação ao levantamento do

conhecimento prévio feito de início. Para isso, propusemos uma ficha com as

seguintes questões:

O que eusei sobre:

O que as outras pessoas falam sobre:

O que aprendi sobre:

Preconceito: Discriminação: Racismo: O negro na sociedade brasileira:

A seguir apresentamos um exemplo de ficha preenchida:

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Conforme expusemos na fundamentação teórica, esperávamos que, com a

interação do conhecimento novo com o já existente na estrutura cognitiva dos

alunos, tanto o conhecimento prévio como o novo se modificassem gerando uma

narrativa pessoal. Podemos dizer que, ao menos formalmente, pelo exposto pelos

alunos os resultados foram excelentes. Se considerarmos que crianças e jovens

encontram-se muito sensíveis às influências externas, parece que a intervenção

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trouxe resultados significativos em relação às concepções relacionadas à temática,

contribuindo para inibir práticas discriminatórias interiorizadas e cristalizadas, de

sérias conseqüências para a vida coletiva.

5 CONCLUSÃO

Na condução de todo o trabalho descrito, espantou-nos a continuidade da

resistência em se falar da discriminação racial na escola. Percebemos quão forte se

manifesta certa “lei do silêncio” quando se refere a questões polêmicas ou,

especificamente, para usarmos os termos de Gonçalves (1987, apud CAVALLEIRO,

2005, p.32), o “ritual pedagógico do silêncio”, que exclui dos currículos a história de

luta dos negros na sociedade brasileira.

De antemão, consideramos positivo o propósito de incluir a discussão sobre

preconceito com o fito de contribuir para sua erradicação, a partir das ideias prévias

manifestas pelos alunos. Certamente, tínhamos consciência da delicadeza do tema

e do fato que iríamos mexer em feridas e em interesses dos que não querem deixar

falar a voz do negro, imbuídos de ideologias propagadas há séculos. No entanto, por

outro lado, temos tínhamos o conhecimento científico de nossa área de atuação e o

dever ético a nosso favor, motivos bastantes para empreender a tarefa.

Para a consecução dos objetivos, buscamos percorrer o caminho mais viável

para a superação da discriminação e das desigualdades sociais, qual seja o da

releitura da história do mundo africano, sua cultura e seus reflexos na formação da

nossa nação, mostrando sua positiva contribuição na formação de nosso povo e

seus costumes.

Nossos alunos, de todas as origens étnicas, serão um dia pais e educadores.

Parece-nos essencial que levem consigo e transmitam o reconhecimento positivo

das diferenças étnicas aos seus, por acreditarmos que a autoestima começa desde

a mais tenra idade. Desse modo, pensamos que somente lutará por seu lugar o

indivíduo que é aceito e se aceita, o que começa no seio da família. Esse

“conhecimento prévio” de seu valor é o mais importante e será o mais determinante

de outras ancoragens produtivas para seu desenvolvimento satisfatório enquanto

indivíduo.

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No que tange a nosso papel enquanto educadores, consideramos que a

escola, por ser o lugar de encontro de toda a diversidade social, pode ter forte

influência e impacto quando se fala do convívio com as diferenças, principalmente

se contribuir para a desagregação do mencionado ritual pedagógico do silêncio.

Se a escola não pode modificar as mentalidades discriminatórias, deve, ao

menos, inibir as ações de discriminação manifestas em seu meio. A omissão

significa manter a naturalidade do preconceito, há anos perpretada pela ideologia.

Representando um ponto de encontro e embate das diferenças étnicas, ao conduzir

o processo educativo incluindo a questão da discriminação racial, o ambiente

escolar se torna a via de acesso à construção da autoestima, da autonomia e de

conserto das imagens distorcidas.

Na busca de uma sociedade mais pluralista e igualitária, mais trabalhos

podem e devem ser empreendidos. Por exemplo, podemos partir das

representações individuais dos alunos, de ascendência afro ou não, acerca dos

afrodescendentes, ou mesmo de ausência dessas representações, na direção da

desconstrução dos mitos que contribuem para a discriminação racial.

REFERÊNCIAS

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AUSUBEL, David. P. Aquisição e Retenção de Conhecimentos: Uma Perspectiva Cognitiva. Lisboa: Plátano, 2003.

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CAVALLEIRO, Eliane dos Santos. Do silêncio do lar ao silêncio escolar: racismo, preconceito e discriminação na educação infantil. São Paulo: Contexto 2005.

BITTENCOURT, Circe. História do Brasil: Identidade Nacional e Ensino de História do Brasil: In LEANDRO Karnal, (org.). História na Sala de Aula: conceitos, práticas e propostas. 4ª.ed. – São Paulo: Contexto, 2005.

LEMOS, Evelyse dos Santos. A Aprendizagem Significativa: estratégias facilitadoras e avaliação. In: Dossiê do I Encontro Nacional de Aprendizagem Significativa. Série Estudos, UCDB, n. 21, p. 53-66, jun/2006. Campo Grande-MS.

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PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares de História para a Educação Básica. Curitiba: SEED, 2008. Disponível na página do Portal Educacional do Estado do Paraná http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br, acesso em abril/2012.

ROSEMBERG, Fúlvia. Raça e desigualdade educacional no Brasil. In: AQUINO, Julio Groppa. (Org.). Diferenças e Preconceitos na Escola: Alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summus, 1998.

RÜSEN, Jörn. Razão histórica: teoria da história: os fundamentos da ciência histórica. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2001.

SILVA, Lucia H. O; ALEGRO, Regina C. Ideias fora do lugar na aula de história: historiografia e conceitos dos alunos sobre escravidão no Brasil. Revista História & Perspectivas, v. 23, n. 42, 2010.

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