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XIII ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EMPLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL25 a 29 de maio de 2009Florianópolis - Santa Catarina - Brasil

UMA "PRAÇA" NÃO É UMA PRAÇA

Gabriela de Souza Tenorio (Universidade de Brasília) - [email protected], professora assitente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília, doutoranda desta mesma instituição

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Uma “Praça” não é uma Praça

ResumoEste artigo pretende discutir o conceito de praça, motivado pela constatação que ele se vemdescolando cada vez mais da base material que lhe dá significado. Em outras palavras, apalavra praça , hoje, não necessariamente evoca determinados padrões de configuração,padrões estes que são, historicamente, origem e essência da praça, além de grandesresponsáveis por fazerem dela o que ela é: a materialização do domínio público porexcelência, lugar de trocas, de encontros, de passagem, de permanência, de significadocoletivo em diferentes níveis, de manifestações de diferentes naturezas, de exercício de

cidadania. Tomar qualquer configuração por praça pode significar suprimir da cidadeespaços preciosos que favorecem a urbanidade. Exemplos de praças e “praças” do DistritoFederal são mostrados para ilustrara os conceitos apresentados. O objetivo é trazerinsumos à prática projetual.

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“What's in a name? That which we call a roseBy any other name would smell as sweet .”

Shakespeare, Romeu e Julieta

1 Introdução

O que é uma praça?

Em um livro recente da editora Monsa, de Barcelona, chamado Mini Praças (Mini Plazas,2008), há uma rotatória de tráfego elevada do chão com iluminação por baixo (figura 1a ).Há ainda uma cobertura de um edifício feita de laje impermeabilizada, na qual forampintados círculos concêntricos em dois tons de azul (figura 1b ). Nenhum destes espaços é

praça, claro, e é cada vez mais comum depararmo-nos com certos espaços que sãochamados assim, mas que, ao fim e ao cabo, pouco ou nada possuem das característicasfundamentais de uma praça. Estes espaços serão aqui denominados “praças”, com aspas.

(a) (b)

Figura 1 – (a) Obertorplatz Rotunda, Schaffhausen, Suíça.(b) Impluvium, Montreal, Canadá. Fonte:Monsa, 2008, p.178 e 200, respectivamente.

Julieta, na cena do balcão, diz a Romeu que uma rosa, se tivesse outro nome, teria omesmo doce perfume. De maneira análoga, uma praça segue sendo uma praça, ainda que

tenha outro nome, ainda que não tenha nome algum. Para reconhecê-la em qualquer lugardo mundo, para distingui-la de uma “praça”, é preciso saber muito bem quais suascaracterísticas inequívocas, insubstituíveis, aquelas que lhe dão seu significado milenar eque permanecem apesar de variações em seu formato ou em seus elementos constitutivos.

A praça é um artefato, um lugar fundamental para todas as sociedades urbanasdemocráticas. Este trabalho tenciona discutir as características configuracionais da praça ecomo elas propiciam o uso e a apropriação de seu espaço pelo indivíduo. Almeja-se

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contribuir para uma prática de arquitetura consciente de suas implicações para a cidade epara a sociedade, ao trazer insumos que permitam diferenciar praças de “praças”.

2 A praça

Definição

Praça . S.f. 1 Lugar público cercado de edifícios; largo. (FERREIRA, 1986, p.1376)Praça . S.f. 1 área pública não construída, dentro de uma cidade; largo, campo2 local abertoonde se compra e se vende; mercado, feira4 área urbana arborizada e/ou ajardinada, freq.com bancos, chafarizes, coreto etc., para descanso e lazer; jardim público10 pequenaclareira aberta na mata para a construção do forno onde é fabricado o carvão vegetal(HOUAISS e VILLAR, 2001. p.2275-2276)

Observa-se, inicialmente, a definição de praça como elemento depreensível porcontraste .Isso se reforça até na significação de praça no meio natural – uma clareira. A palavra “largo”e o fato de o cheiocercar , e não ladear , trazem elementos suficiente para estabelecer, desaída, distinção entre praça e rua – os espaços livres fundamentais da cidade. Praça é,então, algo aberto, um vazio, em contraposição ao cheio que o cerca – mata ou elementosconstruídos (mas deixemos o espaço natural de lado, já que nosso interesse é a cidade).

Este vazio não só é evidenciado por sua proximidade com o cheio, mas é indissociável dele.Desta forma, uma praça é, sim, um vazio, mas um vazio em meio a um cheio circundante,não um vazio simplesmente. Um vazio no meio de um vazio circundante não é, portanto,praça: o contraste não se estabelece.

Este cheio circundante não só evidencia o vazio, mas também o delimita. O vazio é, então,finito e possuilimites inequívocos que não são arestas: são planos, pertencem a elementosconstruídos – normalmente edifícios – que sãotridimensionais . Uma praça, portanto, não éuma superfície: é um volume. Seu espaço é tridimensional. Possui comprimento, largura ealtura. Ainda que não tenha um teto que limite sua altura, ela se faz presente pela altura dosplanos limítrofes, de acordo com a percepção do indivíduo. Um vazio sem limitestridimensionais que o configurem não tem existência tridimensional. Não é praça.

Representação

Justamente para mostrar como o cheio circundante (que é a cidade) evidencia, limita econfigura o vazio (que é a praça), plantas de cheios e vazios são recurso de representação

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recorrente (ainda que limitado às 2 dimensões) na obra de autores que estudam praças.Elas permitem ilustrar contraste, formas e dimensões em planta e, eventualmente, algumelemento constitutivo de destaque (figura 2 ).

(a) (b) (c)

(d) (e) (f) Figura 2 – Representações de praças em (a) KRIER (1981, p.42);(b) ZUCKER (1959, p.90);(c) SITTE (1992, p.40 – edifício religioso em destaque),(d) CULLEN (1983, p.109),(e) GEHL e GEMZOE(2002, p.88 – planta complementar representando o efetivo espaço destinado a pedestres),(f) KATO(1993, p.50).

Destinação A que se destina uma praça?

Voltando aos verbetes, o primeiro ponto é o da definição da praça como áreapública , quepertence e diz respeito a todos, que é acessível e está disponível a qualquer um. Esse seuprincípio mais fundamental, no entanto, não esclarece muito sobre sua destinação, e apenaso HOUAISS a menciona: ao comparar a praça a um mercado ou feira, diz que nela secompra e se vende, ao compará-la a um jardim público, diz que ela se presta ao descanso eao lazer.

LEITÃO, 2002, aliás, menciona que a confusão conceitual entre praças e jardins públicostem feito com que a praça se preste muito mais atividades de ócio e de lazer contemplativo

que de outra natureza (os comentários são restritos a praças do Recife, mas podem serexpandidos às praças brasileiras de uma maneira geral). SEGAWA, apud CALDEIRA (2007,p. 31) chega a denominar o jardim como o “antídoto da praça” e mencionar que a função jardim restringe o espaço livre característico da praça.

Já no século XV, asLeyes de Índias preconizavam que as praças seriam elementos centraisna cidade, que suas dimensões deveriam ser proporcionais ao número de habitantes daurbe e adequadas às atividades que nela se pudessem desenvolver: festas pátrias,

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manobras militares, comemorações religiosas. Determinava ainda que nelas ficassemedifícios públicos e igrejas. Nas cidades criadas pela matriz espanhola, o ócio doshabitantes não estava entre as funções da praça: era previsto um terreno entre a cidade e aárea agrícola para isso (MORRIS,1998, p.378).

Descartando o descanso e o lazer como destinação primeira de uma praça (colocando-ocomo razão primeira de um jardim público), resta-nos a outra destinação aventada noverbete: a comercial. A praça seria o espaço público aberto que, historicamente, acolheuestruturas de compra e venda, onde contatos e trocas se davam. Ocorre que esta não é, noentanto, a sua única função: o dicionário se mostra limitado aqui.

KATO (1993, p. 6) relaciona a praça ao que acredita serem os principais papéis urbanos:

além do comercial, o municipal e o religioso. Todos os estudiosos sobre praças mencionamrepetidamente ágora e fórum como exemplos do seu caráter cívico. A ágora, praça principaldas antigas cidades gregas, era o local onde o povo realizava suas assembléias, onde omercado se instalava e era ainda um centro religioso (HOUAISS e VILLAR, 2001, p.118). Ofórum, praça pública dos romanos, destinava-se a reunião e debates (HOUAISS e VILLAR,2001. p.1379).

SITTE (1992, p. 17) comenta que “nas cidades antigas, as praças principais eram uma

necessidade vital de primeira grandeza, na medida em que ali tinha lugar uma grande parteda vida pública” (grifo nosso). Para ZUCKER, (1959, p.1) a praça é o coração da cidade, oelemento que faz de uma comunidade uma comunidade, e não apenas um agregado deindivíduos. Independente de tamanho ou escala, ela tem uma função física e psicológicaprópria: ela cria um lugar de encontro para as pessoas, humanizando-as pelo contatomútuo. LEITÃO (2002, p.21) diz que praças são “unidades urbanísticas fundamentais”, echegam a ser imprescindíveis na cidade, pelo papel que desempenham na vida social deseus habitantes.

Imprescindível e necessária, estrutura da própria comunidade, então, a praça se apresentacomo o lugar da cidade que permite o contato (interpessoal ou meramente visual) entretodos os seus habitantes, bem como a realização de várias de suas práticas.

Configuração, localização

Para garantir o senso de comunidade, uma praça deve estar localizada de forma a permitirque diferentes pessoas a utilizem. Assim, deve estar em umlugar acessível da cidade,mesmo que diga respeito a uma vizinhança mais imediata. Uma praça localizada em um

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local segregado acaba por ser utilizada apenas por um grupo restrito e recorrente depessoas (se tanto!), o que faz com que a simples presença de uma pessoa “estranha” gereinsegurança ou desconfiança, o que dificulta contato e interação.

Suas dimensões devem ser conformes com as atividades que nela se pretendedesenvolver, e proporcionais ao número de usuários (habitantes e visitantes). Praçasgrandes demais para o número de pessoas que a utiliza tendem a ficar vazias na maioriadas vezes, o que prejudica o contato visual e interpessoal. Dificilmente por outra razão é quepraças criadas para eventos grandiosos apenas nestas ocasiões tenham sua capacidademáxima ocupada (e não raro extrapolada). O Zócalo, na Cidade do México, seria um bomexemplo.

Necessita ser permeável . Seus limites não podem ser barreiras físicas ou visuais: devempossuir portas e janelas voltadas para ela. Eles devem delimitar e configurar sem isolar,devem permitir oentrar, o sair, o passar através , o ver e ser visto , o encontrar . Uma praçanão pode ser um lugar composto de espaços cegos (aqueles para os quais nenhuma portase abre), sob pena de vir a ser inútil.

Uma praça que pretende cumprir com sua destinação na cidade deve apresentarconfiguração compatível com várias possibilidades de uso , ainda que ênfase maior

possa vir a ser dada a este ou aquele uso específico (comercial, religioso, cívico, cotidiano).Uma praça configurada para atender a um uso exclusivo tende a ser subutilizada, ou mesmoinutilizada, em todo o restante do tempo em que este uso não ocorrer.

Para finalizar,número de praças em uma cidade deve ser proporcional ao seu número deusuários. Quando há grande oferta de praças, especialmente quando estão próximas umasdas outras, há a tendência de dispersão das pessoas ao invés de sua concentração. Issoesvazia as praças e desfavorece o convívio.

Algumas praças

A título de ilustração, são apresentadas praças dos diferentes tipos de organização espacialencontrados em partes do Distrito Federal, para que se possa observar como sãodepreensíveis por suas características inequívocas, ainda que enfraquecidas pordeterminado desenho ou transformadas por alguma peculiaridade (figura 3 ).

São representadas aqui por fotos, cortes (onde a área efetiva da praça está representadaem magenta) e plantas de cheios e vazios, estando os últimos na mesma escala, para

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favorecer a comparação. Suas localizações são indicadas por meio de um mapa axial. Omapa axial, explicado brevemente, é feito a partir da geometria da cidade, que finda por sersimplificada em linhas que correspondem aos eixos de circulação, normalmente da rede deveículos automotores. É possível calcular a relação topológica entre estas linhas e, a partirdaí, extrair-se uma série de informações, dentre as quais a medida de integração, que dizquão acessível é uma linha, considerando-se todas as linhas do sistema. Assim édenominada, tradicionalmente, na Teoria da Sintaxe Espacial, a acessibilidade topológica deuma linha ante o sistema inteiro, que significa por quantas linhas é preciso minimamentepassar para se chegar de uma certa linha a outra, ou conjunto de outras. Quanto maisintegrada uma linha, mais quente é sua cor.

Figura 3 – Localização das praças no DF.1 – Praça Coronel Salviano Monteiro, Planaltina;2 – PraçaNelson Corso, Vila Planalto;3 – Praça do Relógio, Taguatinga e4 – Praça do Buriti, Plano Piloto.

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Praça Coronel Salviano Monteiro, Planaltina (vernáculo) – Depreendida por contraste, apraça se encontra no setor mais antigo e tradicional da cidade, sendo referência para suapopulação. Localiza-se em uma área relativamente integrada (cor quente – amarela), noprolongamento de um dos principais eixos que dão acesso à cidade. Seus limitestridimensionais são inequívocos e possuem portas para seu espaço (figura 4 ).

(a) (b)

(c) (d)

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Figura 4 - Praça Coronel Salviano Monteiro, Planaltina.(a) mapa axial da cidade com destaque paraa localização da praça; (b) vista aérea, fonte: Google Earth;(c) planta de cheios e vazios;(d) plantade cheios de vazios com representação do sistema viário;(e) corte a-a. Acima, aspecto geral.

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Praça Nelson Corso, Vila Planalto (modernismo pioneiro) – Originada de umacampamento de trabalhadores, a Vila Planalto tem na praça Nelson Corso uma de suasprincipais referências e um local de intenso convívio. Próxima a um campo de futebol, édepreendida por contraste entre cheios e vazios. É bem delimitada pelos planos verticais,que possuem portas voltadas para seu interior (figura 5 ).

(a) (b)

(c) (b)

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Figura 5 - Praça Nelson Corso, Vila Planalto.(a) mapa axial do bairro com destaque para alocalização da praça; (b) vista aérea, fonte: Google Earth;(c) planta de cheios e vazios;(d) planta decheios de vazios com representação do sistema viário;(e) corte a-a. Acima, aspecto geral.

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Praça do Relógio, Taguatinga (modernismo periférico) – Principal praça desta cidadesatélite, é facilmente depreensível por contraste e possui limites verticais inequívocos, comportas voltadas para seu espaço. Está localizada em um eixo integrado (de cor quente) e éintensamente utilizada (figura 6 ).

(a) (b)

(c) (d)

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Figura 6 – Praça do Relógio, Taguatinga. (a) mapa axial parcial do DF, com destaque para alocalização da praça;(b) vista aérea, fonte: Google Earth;(c) planta de cheios e vazios;(d) planta decheios de vazios com representação do sistema viário;(e) corte a-a. Acima, aspecto geral.

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Praça do Buriti, Plano Piloto (modernismo) – A praça do Buriti representa a sede dogoverno distrital. Ainda que pelos cheios e vazios seja difícil dizer exatamente onde selocaliza a praça (o espaço é demasiado generoso e é baixo o contraste ente cheio e vazio,com vantagem para o último), os edifícios que a limitam, a sul e a norte, auxiliam a criar osplanos verticais necessários para que a terceira dimensão se estabeleça. Os edifícios abrempara o espaço da praça, mas infelizmente não há uma única passagem de pedestres, emnenhum dos lados, que favoreça a travessia. O intenso fluxo de pedestres que ocorre emhorário comercial, de um lado ao outro se dá por outro local (em azul), o que faz com queela esteja sempre vazia (figura 7 ).

(a) (b)

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Figura 7 – Praça do Buriti, Plano Piloto.(a) mapa axial do Plano Piloto com destaque para alocalização da praça;(b) vista aérea, fonte: Google Earth;(c) planta de cheios e vazios;(d) planta decheios de vazios com representação do sistema viário;(e) corte a-a. Acima, aspecto geral.

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3 A “praça”

Definição

As praças foram, durante muito tempo, espaços fechados por um entorno contínuo e somentea partir do final do séc. XIX, com a progressiva abertura de seu pano de fundo, o termo mudade significado, confundindo-se com os de largo, descampado ou clareira. O termo perdeu seusignificado único, “praça” agora é uma palavra de espectro amplo, que se utiliza para indicarlugares e intenções de projeto heterogêneos.(FAVOLE, apud ROBBA e MACEDO, 2001, p. 144)

A citação auxilia a definição de “praça”. O autor comenta que o termopraça começou aconfundir-se com significados de outros espaços para, em seguida, perder seu significado

único. Com isso, hoje ele é utilizado para indicar “lugares heterogêneos” ou mesmo lugarnenhum: “intenções de projetos” não têm existência material.

Acredita-se, no entanto, que o termo não perdeu seu significado único: ele vemsimplesmente sendo usado indevidamente. Ainda que seu “pano de fundo” tenha deixado deser tão compacto, suas dimensões se tenham ampliado, novas funções a ela tenham sidoagregadas, uma praça continua sendo uma praça: não é avenida, não é beco, não édescampado, não é jardim, não é rotatória, não é cobertura de edifício. Isso constatado,uma importante ação em favor da retomada do real significado da palavrapraça seriareafirmar suas características fundamentais (o que se buscou fazer anteriormente) edenominar de outra forma um espaço que, delas, pouco ou nada possui.

Uma “praça” não é evidenciada por contraste, pois costuma ser um vazio em meio a umvazio circundante. Dessa forma, seus limites são simplesmente arestas, e não planos. Elanão tem existência tridimensional, apenas bidimensional. Provavelmente por isso, para quehaja alguma variável tridimensional não raro se encontram taludes Uma “praça” seassemelha bastante a uma superfície com objetos em cima, normalmente em um local

segregado, pouco acessível, composta por espaços cegos. Isso porque uma “praça” nãoraro possui internamente elementos que funcionam como barreiras

Representação

A representação das “praças” não se costuma dar por plantas de cheios e vazios pelosimples fato que elas não são suficientes para evidenciá-las. No livro Praças Brasileiras(ROBBA e MACEDO, 2001), há tanto praças quanto “praças”, e a representação de todaselas praticamente não contempla os cheios circundantes, a não ser quando a relação entre

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eles e a praça é mais direta, como se dela eles fizessem parte. O que ocorre do outro ladoda rua não aparece em planta, ainda que compareça em algumas fotografias. Um bomexemplo é o da Praça da Sé, em São Paulo, na qual estão representados a Sé, o Palácio daJustiça e outros edifícios que estão inseridos em seu perímetro, mas não outros edifíciosque a delimitam (figura 8 ). Esta representação da praça pode ser considerada sintomática:ao se colocar praças e “praças” num mesmo compêndio, é necessário encontrar elementoscomuns para realizar a representação. Fundamenta-se, então, na explicitação maisdetalhada de seus elementos componentes – desenho de piso, mobiliário, monumentos,pequenas construções.

(a) (b) Figura 8 – (a) Representação da Praça da Sé. (b) Foto aérea da praça. Observar os edifícioscircundantes que não constam na representação anterior. Fonte: ROBBA e MACEDO, 2001, p.130 e131, respectivamente.

Destinação, localização

A que se destina uma “praça”? Uma “praça”, sendo um vazio em meio a um vazio, nãoestando em meio a um cheio de onde saem as pessoas, encontra-se segregada no tecidourbano. Assim, finda por ser, freqüentemente, um destino final. À “praça” se costuma ir como objetivo de conhecê-la e, uma vez conhecida, raramente se volta lá em ocasiõessubseqüentes. É um espaço que, em grande medida, guarda apenas um caráter simbólico eque se apresenta como uma espécie de enfeite, algo supérfluo, uma curiosidade na cidade.Uma “praça” não é nem imprescindível nem necessária. Não é por outra coisa que temassociada a si exclusiva ou predominantemente a função contemplativa (ROBBA eMACEDO, 2001, na ficha técnica de várias “praças” que comparecem em seu compêndio,assim o colocam): ela é feita para que seus elementos componentes sejam apreciados.

Configuração

O fato de estar segregada não raro faz com que a “praça” seja criada tendo algum mote(eventos, personagens etc.) para seu desenho normalmente esmerado . Ela é quase um

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cenário, ou um cenário, efetivamente. Há preocupação com tratamento de piso, commobiliário, com elementos escultóricos, e a vegetação costuma ser escolhida mais por seucaráter ornamental que por suas características bioclimáticas. Isso se deve ao fato da“praça” necessitar ser atraente o suficiente para que se justifique o deslocamento até ela.

É muito freqüente possuirbarreiras – escadarias, taludes, muros, diferentes níveis em pisoselevados e rebaixados, extensos espelhos d´água. Pode-se especular sobre a necessidadeda manipulação do espaço da “praça” pela colocação de barreiras como uma forma de lheconferir tridimensionalidade – a tridimensionalidade que lhe falta por não ser uma praça.

Sendo um pedaço de um vazio maior, uma praça normalmente possuigrandes dimensões .O fato de estar sempre vazia e a falta de planos verticais limítrofes potencializa esta

sensação de que é ampla demais.

Algumas “praças”

São apresentadas agora “praças” presentes no Distrito Federal, que comparecem no livroPraças Brasileiras (ROBBA e MACEDO, 2001) (figura 9 ). Em todas elas, observam-segrandes dimensões, a falta de contraste com o entorno, a falta de planos verticais comolimites e de aberturas para seu espaço. Possuem em seu desenho barreiras, desníveis eespelhos d’água. Não estão em rota de passagem de pessoas, encontrando-se portanto,

freqüentemente vazias. Nota-se, em todas, a preocupação com desenho de piso ecolocação de elementos escultóricos. À parte da praça do Setor Militar Urbano, cujamanutenção fica a cargo do Exército, todas as demais encontram-se deterioradas, com seusespelhos d’água desativados.

Figura 9 – Localização das “praças” no DF. 1 – Praça Portugal, Plano Piloto; 2 – Praça Duque deCaxias, Plano Piloto e 3 – Praça Santos Dumont, Aeroporto.

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“Praça” Portugal – localiza-se na porção sul da Esplanada dos Ministérios, atrás da ruados anexos, próxima a um eixo pouco integrado (figura 10 ).

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(f) Figura 10 – “ Praça” Portugal, Plano Piloto.(a) mapa axial do Plano Piloto com destaque para alocalização da praça;(b) vista aérea, fonte: Google Earth;(c) planta de cheios e vazios;(d) planta decheios de vazios com representação do sistema viário;(e) corte a-a; (f) representação da praça emRoBBA e MACEDO, 2001, p. 218. Na foto, detalhe de escultura localizada sobre espelho d’águadesativado.

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“Praça” Duque de Caxias – projeto de Burle Marx, localiza-se no Setor Militar Urbano,próxima a um eixo relativamente bem integrado (figura 11 ).

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Figura 11 - Praça Duque de Caxias, Plano Piloto. (a) mapa axial do Plano Piloto com destaque para alocalização da praça; (b) vista aérea, fonte: Google Earth; (c) planta de cheios e vazios; (d) planta decheios de vazios com representação do sistema viário; (e) representação da praça em ROBBA eMACEDO, 2001, p. 120; (f) corte a-a. Na foto pequena, detalhe do espelho d’água com escultura deBurle Marx. Acima, aspecto geral.

“Praça” Santos Dumont – localiza-se em frente ao aeroporto e encontra-se circundada poreixos pouco integrados da cidade (figura 12 ).

(a) (b)

(c) (d)

(e)

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Figura 12 – Praça Santos Dumont, Plano Piloto. (a) mapa axial da cidade com destaque para alocalização da praça;(b) vista aérea, fonte: Google Earth; (c) planta de cheios e vazios; (d) planta decheios de vazios com representação do sistema viário; (e) representação da praça em ROBBA eMACEDO, 2001, p.217. Na foto pequena, detalhe do busto de Santos Dumont. Acima, aspecto geral.

4 Comentários finais

Descolar a palavrapraça do que é uma praça, verdadeiramente, nada mais é do que umsintoma do descolamento prévio da praça com o seu sentido primeiro – lugar do qual seserve a população. A praça, ao deixar de ser vista como uma necessidade da sociedade,perde a razão de sua existência. O local onde “concentrava-se o movimento, tinham lugar asfestas públicas, organizavam-se as exibições, empreendiam-se as cerimônias oficiais,anunciavam-se as leis, e se realizava todo tipo de eventos semelhantes” (SITTE, 1992, p.25), ao não precisar servir a ninguém, poderia ser, então, qualquer coisa, estar em qualquer

lugar.

A criação de uma “praça” no lugar de uma praça traduz-se em enorme desperdício derecurso e oportunidade. Investimentos e esforços que poderiam ser aplicados na criação deum lugar que efetivamente favoreça o contato e apóie a população em suas práticas,acabam por ser direcionados para a criação de espaços em locais segregados que estãofadados à rápida deterioração pela sua bastante previsível inutilidade.

Talvez a conseqüência mais perversa da aceitação das “praças” como praças seja a que fazcom que praças legítimas passem a ser criadas como “praças”. São criadas como cenários,sendo voltadas para si mesmas, ignorando (como nas representações) os limites que são aprópria viabilização da sua existência. Ao não relacionar-se com eles, abrem mão do papelfundamental que desempenham na cidade.

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5 Referências Bibliográficas

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modernidade . Campinas, S.P. : Unicamp, Tese de doutorado, 2007.CULLEN, Gordon. Paisagem Urbana. Lisboa : Edições 70, 1983.FERREIRA, Aurélio.Novo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa . São Paulo : Nova

Fronteira, 1986GEHL, Jan e GEMZOE, Lars.Novos espaços urbanos . Barcelona : Gustavo Gilli, 2002.HOUAISS, A. e VILLAR, M.Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa . Rio de Janeiro:

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KATO, Akinori.Plazas of southern europe . Tokyo : Process Architecture Publishing, 1993.KRIER, Rob.El espacio urbano . Barcelona: Gustavo Gilli, 1981.

LEITÃO, Lúcia, org.As praças que a gente tem, as praças que a gente quer: manual de

procedimentos para intervenções em praças . Recife : A Secretaria, 2002.MONSA.Mini plazas . Barcelona : Instituto Monsa de Ediciones, 2008.ROBBA, Fábio e MACEDO, Sílvio.Praças Brasileiras . São Paulo : Edusp, 2002.SITTE, Camilo.A construção da cidade segundo seus princípios artísticos . São Paulo,

Ática, 1992.