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UNIVALE – UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE FADE - FACULDADE DE DIREITO, CIÊNCIAS ECONÔMICAS E ADMINISTRATIVAS CURSO DE DIREITO DIREITO DE INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ EM CASOS DE ANENCEFALIA EDILZA BORGES DA SILVA Governador Valadares – MG Setembro/2009

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UNIVALE – UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE FADE - FACULDADE DE DIREITO, CIÊNCIAS ECONÔMICAS E

ADMINISTRATIVAS CURSO DE DIREITO

DIREITO DE INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ EM CASOS DE ANENCEFALIA

EDILZA BORGES DA SILVA

Governador Valadares – MG Setembro/2009

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EDILZA BORGES DA SILVA

DIREITO DE INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ EM CASOS DE ANENCEFALIA

Monografia para obtenção do grau de bacharel em Direito, apresentada à Faculdade de Direito, Ciências Econômicas e Administrativas da Universidade Vale do Rio Doce. Orientador: Ronald Amaral Junior

Governador Valadares Setembro/2009

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EDILZA BORGES DA SILVA

DIREITO DE INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ EM CASOS DE ANENCEFALIA

Governador Valadares Setembro de 2009.

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EDILZA BORGES DA SILVA

DIREITO DE INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ EM CASOS DE ANENCEFALIA

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Vale do Rio Doce, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Direito.

Governador Valadares, _____de ________________de________.

Banca Examinadora:

______________________________________

Ronald Amaral Junior

_______________________________________

Vinicius Sampaio da Costa

_______________________________________

Ítalo Passos

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AGRADECIMENTOS

A Deus, em primeiro lugar, pelo milagre que me foi dado, permitindo que eu

concluísse este curso, apesar das grandes dificuldades.

Aos meus pais, Ângela e Ednaldo, por serem minha fonte de sabedoria, de

inspiração, de incentivo, de respeito, de educação, e, principalmente de caráter, de

honestidade e de dignidade. Por me ensinarem a valorizar mais o ser do que o ter,

por me ensinarem o respeito mútuo, por me ensinarem que com inteligência e

principalmente amor a Deus se vence.

As minhas irmãs Lidiane e Leila cada uma com seu carinho e paciência que tiveram

para que chegasse ate aqui.

Ao meu noivo Tiago, pelo amor dado a cada dia, pela dedicação e compreensão

enfrentados nos momentos mais difíceis que passei.

A FUNAI, por tudo que fez durante meu curso.

Ao AJEAS, por proporcionar a continuação do curso sem mais dificuldades além de

todas enfrentadas para o término dessa jornada.

A todos os meu amigos e colegas de sala, em especial minha amiga Jessica e

Antônio Fernandes, o meu muito obrigada pela companhia durante esses cinco anos

juntos.

Enfim, a todos o meu muito obrigado, por estarem agora desfrutando do meu

trabalho, com o intuito de conquistar novos ideais e conhecimentos.

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RESUMO

O objetivo desse trabalho é esclarecer questões à cerca do aborto de feto

anencéfalo, com o conceito de anencefalia,como se diagnostica, a expectativa de

vida de tais fetos, demonstrar os princípios constitucionais e direitos que estão

envolvidos no tema e, demonstrar a falta de tipicidade material dessa interrupção de

gravidez, a que não poderá ser definido como crime de aborto.Esse tipo de

interrupção, infelizmente ainda traz alguma polêmica, por envolver questões

moralistas, sociais e jurídicas, mas o avanço da medicina ao diagnosticar tal

anomalia fetal, essa polêmica, acredita-se não existirá dentro em breve. É certo que

o Estado tem o dever de proteger a vida humana, mas a vida com potencialidade.

Palavras-chave: anencefalia; potencialidade de vida; dignidade da pessoa humana;

ausência de tipicidade material; antijuricidade.

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ABSTRACT

The objective of this research paper is to make clear some subjects about of

the embryo anencephal abortion, with anencephaly, as a concept that is diagnosed,

the expectation of life of such fetuses, to demonstrate the constitutional and right

rinciples that are involved in the theme and, to demonstrate the lack of law material

of that pregnancy interruption, the one that cannot be defined as crime of abortion.

This type of interruption, unhappily still brings some polemic, for involving moralists,

social and juridical subjects, but the progress of the medicine when diagnosing such

a fetal anomaly, that polemic, is believed that won't exist in the future. It is right that

the State has the duty of protecting the human life, but the life with potentiality.

Key words: anencephaly; potentiality life; dignity of the human being person; lack of

law principles; unlawful.

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1 INTRODUÇAO

Vale ressaltar, inicialmente, que a nomenclatura utilizada não foi aborto de

anencéfalo, mas sim, interrupção da gestação em casos de anencefalia. Isto porque,

para que se configure o crime de aborto, se faz necessário a presença de

expectativa de vida e, conforme será visto posteriormente, o feto que detém tal

anomalia não possui dita potencialidade, tendo no máximo, uma sobrevida, ou seja,

alguns minutos de vida.

A anencefalia é uma anomalia fetal, em que na cabeça fetal há ausência de

calota craniana e cérebro rudimentar. É uma anomalia incompatível com a vida e

que ainda, mesmo com o avanço da Medicina e da Genética Humana, não existe

tratamento capaz de curá-la.

Apesar de ainda não estar tipificado pelo Código Penal Brasileiro, alguns

Tribunais têm concedido a antecipação do parto em casos de anencefalia fetal,

entendendo que as mulheres grávidas de fetos portadores desta anomalia, são mais

vítimas do que os próprios seres que são gerados por elas.

A discussão sobre tal tema, discutindo-se principalmente se deve ou não ser

concedido tal direito, levando em consideração a vontade da mulher, tomou maiores

proporções através do Descumprimento de Preceito Fundamental em trâmite no

Supremo Tribunal Federal, sob o n.º 54 desde junho de 2004, que teve como autor a

Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde (CNTS), assessorada

juridicamente pelo Instituto de BIOÉTICA, Direitos Humanos e Gênero com

fundamento no artigo 1º, inciso III, da Lei n.º 9.882/99, requereu a interpretação

conforme a Constituição Federal dos artigos 124, 126 e 128 do Código Penal

Brasileiro, levando a maior corte do país a se pronunciar acerca da possibilidade da

inconstitucionalidade da incidência nas disposições do Código Penal na hipótese de

gravidez de fetos comprovadamente anecéfalos reconhecendo à gestante portadora

o direito subjetivo de submeter-se ao procedimento médico adequado de

antecipação terapêutica do parto.

Em 1º de julho de 2004, o Ministro Marco Aurélio de Melo, do Supremo

Tribunal Federal, concedeu liminar à Confederação Nacional dos Trabalhadores da

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Saúde, para reconhecer o direito constitucional de gestantes que decidam realizar

operação terapêutica de partos de fetos anencefálicos.

Atualmente ainda não há julgamento definitivo desta ação. Diante de tal

discussão, enquanto não houver tipicidade no Código Penal Brasileiro para o fato

discutido, é inadmissível que hoje, diante do desenvolvimento atual da Genética

Humana e da Medicina Fetal, ainda existam pessoas que queiram obrigar uma

mulher a seguir gestação de feto sem perspectiva de vida.

É certo que o Direito pode perfeitamente ser aplicado a estas situações

imprevistas, as quais ainda não estão tipificadas, pois se busca a JUSTIÇA e não a

frieza da Lei.

A simples alegação de que a legislação pátria é omissa é muito fraca para

fazer cair por terra o direito à dignidade de uma mulher que leva em seu ventre um

feto anencefálico, o qual é subumano por excelência, ou seja, fetos que não

atingiram o patamar mínimo de desenvolvimento biológico exigido para a entrada na

humanidade.

Os julgadores precisam levar em conta a dor psíquica da mulher que se

encontra em tal situação, para que seja evitado nela um trauma de que foi compelida

de vê-la nascer um ser com ausência de calota craniana e cérebro rudimentar, sem

possibilidades de sobrevivência. Este estado de luto, certamente a acompanhará

pelo resto de seus dias, abalando seu equilíbrio emocional, causando depressão,

fobias, entre outras doenças.

Salienta-se que a saúde da mulher deve ser preservada, bem como sua

integridade psíquica, pois a continuação de tal gravidez causará às essas mulheres,

choques emocionais repulsivos, contrariando o que está disposto no artigo 5º, inciso

III, da Constituição Federal, que apregoa que ninguém será submetido a tortura,

nem a tratamento desumano ou degradante.

Diante disso, é dever do Judiciário respeitar o pluralismo social, podendo o

especialista interferir no processo biológico, desde que o diagnóstico repouse em

uma certeza e não em um risco estatístico.

O Direito é muito mais amplo que qualquer legislação, sendo acertadíssimas

as decisões que deferem o pedido de interrupção deste tipo de gravidez, buscando

assim, evitar o nascimento de um feto cientificamente sem vida, incapaz de existir

por si só e não apenas com o propósito de melhorar a raça ou evitar que o ser em

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gestação venha a ser cego, aleijado ou mentalmente débil, como nos casos do

aborto eugênico que deve continuar como ilícito penal, vez que este vai além da

anencefalia, aceitando como justificativa para o abortamento qualquer doença

hereditária que possa ocorrer ao nascituro, ainda que esta não o leve a morte.

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2 ABORTO

2.1 CONCEITO E HISTÓRICO

A palavra aborto deriva do latim ab-ortus, ou seja, privação do nascimento. De

acordo o Organização Mundial de Saúde, o abortamento é “ a morte do embrião ou

feto antes que seu peso ultrapasse 500g, atingindo antes das primeiras 22 semanas

de gravidez. O aborto, neste caso, seria a interrupção da gravidez, espontânea ou

provocada, em embrião ou de um feto antes do final de seu desenvolvimento

normal, com a consequente destruição do produto da concepção.

Em Obstetrícia aborto é a interrupção da prenhez antes que o feto seja viável,

isto é, antes que o feto possa viver fora do útero, o que ocorre dos sete meses da

gestação em diante, pois, se uma criança nasce viva ao sétimo ou oitavo mês não

se diz que houve aborto, mas parto prematuro.

Assim, pode-se dizer que, o aborto ocorre quando por algum motivo a vida

intra-uterina é interrompida, e que a causa desta interrupção não seja o nascimento

da criança.

Sempre presente em toda a história dos Homens, o aborto vem se

apresentando como uma das práticas que apresenta a maior diversidade em seu

tratamento. Em certas épocas e países não é punido, revestindo-se de assunto de

caráter estritamente familiar. Noutras épocas e em outros povos, é duramente

castigado, às vezes até com a pena de morte.

A aceitação do aborto como exceção à regra geral da proibição surgiu com

extrema raridade em algumas legislações antigas, mas inapelavelmente

condicionadas ao preenchimento de determinados e rigorosos requisitos.

O Cristianismo que trouxe a concepção válida até os dias de hoje, no sentido

de que o feto, mesmo no ventre materno, embora não se possa reputar como

pessoa no seu sentido jurídico, representa um ser a quem a sociedade deve

proteger e garantir o direito à vida. Os escritores cristãos é que iniciaram o combate

a tese dos juristas de Roma. Para eles, não era o feto simples parte do ventre da

mulher, mas um ser dotado de alma.

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A Época da República romana, o aborto foi considerado ato imoral, em

conseqüência disso, a Lei Cornélia cominou pena de morte à mulher que

consentisse com a prática abortiva e pena igual aos que a faziam.

Mais recentemente (século XIX), as penas severas do aborto se atenuaram,

deixando-se de aplicar a pena capital em todas as partes do mundo. Hoje, se

aplicam penas privativas de liberdade.

A questão sempre, em quase sua totalidade, caminhou em pés filosóficos,

advertidos pelos conceitos religiosos.

Entretanto, apesar da evolução histórica, gerando avanços sociais, culturais,

e as conquistas do mundo moderno, a discussão sobre o aborto continua

provocando controvérsias, havendo países que admitem sua prática e outros, como

o nosso, que a punem como crime doloso contra a vida.

A prática do aborto vem desde nossos primórdios, apesar de sanções,

controles e legislações existentes.

Antigamente este maldoso ato não era considerado um crime. A mulher tinha

o livre-arbítrio de decidir sobre o destino do feto, visto que este era definido como

“algo qualquer” no organismo materno. No caso da mulher casada, ressalta-se a

proeminência do direito marital. A penalidade sofrida não é pelo aborto realizado,

mas sim, pelo “estrago” deixado no organismo da mulher.

O aborto, no Código de Hamurabi, era definido como crime acidental contra

os interesses do marido e do pai, sendo este prejudicado até mesmo

economicamente, alem de uma lesão causada à mulher.

Há nas escrituras do Livro êxodo, hebraico, trazia que o prejudicado ao aborto seria

o causador deste ato, quer dizer, qualquer homem num ato de violência contra a

mulher seria punido de acordo com os desejos do marido e conforme o arbítrio

social.

Os filhos eram propriedades privadas do pai, conforme a Lei de Mileto, se a

mulher fizesse o aborto sem a aprovação do marido sofreria pena de morte.

Hipócrates, 400 a. c, mesmo dizendo para “não dar à mulher grávida nenhum

medicamento que possa fazê-lo abortar”, aconselhava às parteiras e aos médicos

métodos anticoncepcionais e abortivos.

Sócrates e Platão eram favoráveis ao ato de aborto. O segundo filósofo citado

apoiava por causa da regulagem da densidade demográfica da população.

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Aristóteles também era solidário a esta opinião.

No Direito Romano inicialmente punia-se pela prática do aborto a mulher por

não dá ao seu cônjuge um herdeiro, depois, passou a condenação para a pena de

morte, por motivos morais, século I.

Considerou o aborto como homicídio a partir do século XVIII, pela maioria das

legislações, principalmente pelos iluministas que espalhava o ideal de igualdade e

liberdade. O movimento radical de descriminalização do aborto expandiu nos

códigos da Rússia, em 1920, autorizando os médicos a praticar o aborto pela a vida

da gestante, sendo castigado apenas os abortos feitos sem o consentimento das

autoridades e a relevância do direito à vida e ao nascituro. E no Uruguai, em 1934, a

punição só era dada nos casos ocorridos sem a permissão da gestante, porém, no

ano de 1938, passou-se a viger a punição nos abortos provocados pela gestante ou

por terceiro, independente do consentimento ou não.

Na Alemanha nazista surgiu-se o aborto eugênico partindo de pressuposto do

beneficio genético da espécie ariana. Esta idéia nazista servia como meios de

diminuição de espécies degenerativas, como: síndromes, alcoólatras, criminosos e

outros inaceitáveis. Dos países que dão liberação do aborto são: Alemanha, África

do Sul, Canadá, Dinamarca, Espanha (os abortos se converteram na principal causa

de morte, sendo que de 6 gestantes 1 causa aborto), e a França, este ato é

realizado nos 3 primeiros meses, para a amenização do sofrimento psíquico da

gestante.

A gestante tem o livre-arbítrio na decisão do aborto ou não, na Rússia, nos

EUA e na China, este último citado o autoriza por motivos de controle de natalidade.

As legislações se movem para que a pena seja mais branda em se tratando

da gestante, sendo ela a provocadora ou não deste, e mais rígida para o 3º que o

provocou.

E, quer fosse legal quer não, o aborto no século XIX tomou-se uma prática

muito vulgar.

No Brasil, o aborto já foi permitido no caso necessário, quer dizer quando

havia risco à vida da gestante, poderia ser realizado por médicos ou parteiras, estes,

seriam punidos se viessem causar a morte da gestante, seguindo o Código Penal de

1891, no artigo 302.

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2.2 O INÍCIO DA VIDA HUMANA

2.2.1 Direitos do nascituro

O Direito confere proteção jurídica ao nascituro por umas inflexões às normas

gerais, constitucionais ou mesmo internacionais, que garantem ao ser humano a

devida proteção, mesmo antes de nascer.

GOMES (2001) já ensinava que:

A ordem jurídica admite a existência de uma personalidade fictícia, ao lado da real e verdadeira, em hipóteses nas quais não haveria coincidência entre a existência fática do sujeito e o próprio direito, apenas presunção, elencando 03 (três) situações: 1º - a do nascituro; 2º a do ausente; 3º a da pessoa cuja possibilidade de vir a existir é admitida para aquisição de direitos.

Ainda segundo o civilista, a lei assegura direitos ao nascituro por um dever do

Estado de não duvidar das leis da natureza e de conferir expectativa de direitos ao

ser futuro.

O Preâmbulo e o artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos da Criança

determinam que: “Toda criança necessita de proteção e cuidados especiais,

inclusive a devida proteção legal, tanto antes quanto após o seu nascimento".

Também a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (conhecida como

Pacto de São José da Costa Rica), da qual o Brasil é signatário, através da

promulgação do Decreto n.º 678/92, estabelece, em seu artigo 4°: “Direito à vida:

Toda pessoa tem direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido

pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da

vida arbitrariamente”.

Acompanha estes comandos a íntegra da Lei Federal brasileira n.º 8.069/90,

que instituiu o Estatuto da Criança e do Adolescente, que, pela redação do seu

artigo 7º, assim assegura: “A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e

à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o

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nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de

existência”.

O nascituro não tem uma personalidade civil formal. Mas não deve haver

dúvida alguma de que a lei contempla sua personalidade material ou real. Tanto

assim que sobre ela funda toda disciplina dos direitos do nascituro. O novo Código

Civil brasileiro, preconiza de forma mais objetiva em seu artigo 2°: "A personalidade

civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a

concepção, os direitos do nascituro."

FIÚZA (2002), relator do Projeto de Lei que resultou no novo Código Civil

descreve os direitos vigorados no diploma legal que recaem sobre o nascituro:

Conquanto comece do nascimento com vida a personalidade civil do homem, a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro (CC, arts. 2º, 1609,1779, parágrafo único e 1798) como o direito à vida (CF, art. 5º, CP, arts. 124 a 128, I e II), à filiação (CC, arts. 1596 e 1597), à integridade física, a alimentos (RT, 650/220;RJTJSP, 150/906), a uma adequada assistência pré-natal, a um curador que zele pelos seus interesses em caso de incapacidade de seus genitores, de receber herança (CC, arts. 1798 e 1800 §3º), de ser contemplado por doação (CC, art. 542), de ser reconhecido como filho.

O nascituro, portanto, certamente já é um ser com vida e em formação. Tem

tutela jurídica e não uma mera expectativa, o que infere proteção total, e não

fracionada de seus direitos. Se tem direitos é porque a lei reconhece que ele é

sujeito de direitos e ser sujeito de direitos é, justamente, ser pessoa.

2.3 TEORIAS SOBRE A PERSONALIDADE (NATALISTA, CONCEPCIONISTA)

Em nosso ordenamento jurídico, convém destacar, o nascituro não está

elencado como incapaz, nem como capaz, posto que o artigo 2.º do Código Civil

persistiu, a par de críticas antigas, na positivação da teoria natalista, ressalvando,

contudo, os direitos do nascituro desde a concepção.

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A questão se amplia se analisadas as proposições feitas pela teoria natalista

e teoria concepcionista, visto que cada qual possui uma ótica diferenciada sob o

início da personalidade civil. Para a teoria natalista, Caio Mário da Silva Pereira

opina que,

o nascituro possui apenas "mera expectativa de vida" pois que a personalidade civil só se adquire com o nascimento com vida, sendo considerado até lá apenas parte das vísceras maternas.

Com atual teoria brasileira, a constatação da existência jurídica se dá apenas

através do nascimento com vida sem qualquer exigência de viabilidade do ser e

forma humana, ou seja, presume-se apenas verificar se o neonato chegou a

respirar. Para isso, o teste médico-legal mais utilizado quando a dúvida se o bebê,

apesar de se encontrar morto, chegou a respirar em algum momento após o parto, é

o chamado Docimasia de Galeano.

A corrente natalista apresenta como principais argumentos favoráveis:

• Não há existência de direito subjetivo sem que haja titular, da mesma

maneira que há titular sem personalidade jurídica;

• O nascimento é um fato concreto para que se atribua a personalidade

ao ser; e

• Todo ordenamento jurídico brasileiro está baseado nessa regra.

Ensina Fiúza que:

O nascituro não tem direitos propriamente ditos. Aquilo a que o próprio legislador denomina “direitos do nascituro” não são direitos subjetivos. São na verdade, direitos objetivos, isto é, regras impostas pelo legislador para proteger um ser que tem a potencialidade de ser pessoa e que, por já existir pode ser resguardados eventuais direitos que virá a adquirir ao nascer.

Já por outro lado, há a teoria concepcionista, de acordo com Planiol, Teixeira

de Freitas, que possui duas vertentes, quais sejam:

a verdadeiramente concepcionista, que preconiza os direitos do nascituro desde a sua concepção, sem qualquer outra condição; e a concepcionista da personalidade condicionada.

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Para Eduardo Espínola e Espínola Filho,

que reconhece a personalidade desde a concepção, porém sob a condição de infans conceptus, isto é, desde que nasça com vida.

A teoria natalista, portanto, apregoa que embora o nascituro possua mera

expectativa de personalidade, estão garantidos os direitos do nascituro para o que

lhe for juridicamente proveitoso. Em contrapartida, a teoria concepcionista destaca

que se o nascituro possui direitos, é sujeito de direitos, então há personalidade, é

pessoa.

Analisando alguns direitos assegurados aos nascituros podemos nos

posicionar de forma mais segura em relação a uma das duas correntes

mencionadas acerca do início da personalidade civil da pessoa.

O artigo 1.609 do Código Civil sintetiza o disposto no artigo 26 do Estatuto da

Criança e do Adolescente, e no artigo 1.º da Lei n.º 8.560/92, dispõe que o nascituro

pode vir a ter reconhecida a sua paternidade por escritura pública ou escrito

particular arquivado em cartório, testamento ou manifestação direta e expressa

perante o juiz, de forma que considera o nascituro como sujeito de direitos, portanto,

pessoa.

O artigo 1.621 do Código Civil preconiza que "a adoção depende de

consentimento dos pais ou dos representantes legais", estendendo a necessidade

de anuência às pessoas capazes, e não apenas incapazes ou nascituro como

dispunha o antigo artigo 372. Todavia, não excluiu taxativamente a possibilidade de

o nascituro vir a ser considerado uma pessoa. O artigo 542 do Codex Civilis torna

válida as doações feitas ao nascituro, de forma que o está considerando pessoa,

pois que sujeito de direitos.

O artigo 877s do Estatuto Processual Civil instrumentaliza a posse em nome

do nascituro; os natalistas afirmam que se está preservando apenas a expectativa

de direitos, posto que "não há como representar pessoa que ainda não existe".

Entretanto, tais argumentações nos parecem carecer de maior racionalidade, visto

que só uma pessoa é sujeito de direitos, de forma que se tenta mascarar ao máximo

a teoria concepcionista da personalidade condicionada.

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Pela singela explanação vislumbramos que o Código Civil pátrio, a rigor,

segue a teoria concepcionista da personalidade condicionada, visto que, conquanto

estabeleça o início da personalidade civil com o nascimento com vida, acaba pondo

os direitos do nascituro a salvo desde a concepção, de forma que este sempre terá

seu direito resguardado, diferente do que dispunham os romanos, para quem, por

exemplo, não se admitia sequer a representação (non pupilus qui in utero est).

Crítica plausível é a que se aduz ao legislador do novo Código Civil em ter

perenizado a discussão acerca da situação jurídica do nascituro, ou seja, considerou

a teoria natalista como início da personalidade civil, mas pôs ressalvas a esta, de

forma que em nosso entender já deveria ter positivado a teoria concepcionista da

personalidade condicional, no seguinte sentido: Art. 2.º - A personalidade civil da

pessoa começa desde a concepção, condicionada ao nascimento com vida, o que

evitaria algumas aberrações ligadas ao biodireito, tais como a mudança de

cromossomos do embrião, de forma a mudar o sexo do nascituro; a eliminação de

embriões por não serem considerados sujeitos de direito, visto não possuírem

personalidade jurídica; entre outros aspectos relacionados à fase embrionária do

nascituro, que já repercutem no mundo jurídico.

2.4 TIPOS DE ABORTOS

No Código Penal de 1940, vigente, são permitidos duas modalidade de

aborto: para salvar a vida da gestante, quando não houver outro recurso, e para

interromper gravidez resultante de estupro. No primeiro caso, o aborto é chamado

terapêutico ou necessário. “Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico: I.

se não houver outro meio de salvar a vida da gestante”.

O aborto necessário ocorre quando a interrupção da gravidez é

absolutamente necessária, para se evitar perigo à vida da gestante. É importante

que haja risco de vida e não apenas dano à saúde ou á higidez da mulher.

Em regra, as legislações consideram o aborto necessário como um caso

particular de estado de necessidade, ou como conseqüência da regra geral dessa

causa excludente de ilicitude. Vários são os Códigos que expressamente admitem:

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os Códigos da Suíça, México, Costa Rica, Nicarágua, Cuba, Venezuela, Peru,

Equador, Paraguai, Uruguai e Argentina. Admitem ainda o Canadá, Inglaterra,

França e Itália.

Em face dos dizeres, se não há outro meio de salvar a vida da gestante,

cremos que o fundamento é o estado de necessidade: há dois interesses em conflito

– a vida biológica do feto e a da mãe; a lei decide-se por esta.

Mirabete (1991) também entende assim:

[...] para evitar qualquer dificuldade, deixou o legislador consignado expressamente a possibilidade de o médico provocar o aborto se verificar ser esse o único meio de salvar a vida da gestante. No caso é necessário que o perigo seja atual, bastando à certeza que o desenvolvimento da gravidez poderá provocar a morte da gestante.

O texto legal em seu art. 24 (Código Penal), diz que: “Considera-se em estado

de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou

por sua vontade, nem podia de outro meio evitar”.

O aborto terapêutico em determinadas condições independe do

consentimento da gestante ou de terceiros, pois essa prática pode estar

circunstanciada de tal gravidade que a lei já ampara plenamente e a Medicina

conceitua como de indispensável intervenção.

A segunda modalidade de aborto permitido no Brasil é o chamado aborto

moral, ético, humanitário ou sentimental. De acordo com o artigo 128/CP “não

constitui crime o aborto praticado por médico: II – se a gravidez resulta de estupro e

o aborto é precedido do consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu

representante legal”.

Em quase todas as legislações do mundo, a lei permite que a mulher grávida,

vítima dessa forma de conjunção carnal, aborte, pois não seria concebível admitir

que uma pessoa humana tivesse um filho que não fosse gerado pelo seu

consentimento e pelo seu amor. Em tais situações, defende-se o princípio do estado

de necessidade contra as consequências oriundas de um grave dano à pessoa.

O legislador brasileiro atendeu unicamente à razões de ordem ética e

emocional, evitando-se, dessa maneira, a vergonha e a revolta da mulher violentada,

que traria no filho a imagem de uma ofensa e de uma humilhação, testemunha da

sua desonra.

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Para que o médico pratique o aborto não há necessidade, de existência da

sentença condenatória contra o autor do estupro e nem mesmo de autorização

judicial.

Deve ele submeter-se apenas ao Código de Ética Médica, admitindo como

prova elementos sérios a respeito da ocorrência do estupro. Não havendo menção

na lei à necessidade de autorização judicial para a prática de aborto sentimental,

não há legítimo interesse num pedido com tal finalidade.

Mesmo com tais argumentos, essa forma de aborto é difícil de ser justificada,

portanto, gera discussões. Muitos defendem que em nenhuma hipótese se poderia

aceitar, o estado de necessidade, pois, tirar uma vida, mesmo gerada pela violência,

não apagaria a abominação recebida. Seria garantir ao médico o direito de atentar

contra uma vida que não teve qualquer participação, sem nenhuma culpa.

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3 O ABORTO ANENCEFÁLICO E A CONCEPÇAO SOCIAL CONTEPORANEA

3.1 PROBLEMAS MÉDICOS SUSCITADOS EM TORNO DA GESTAÇÃO DO FETO

ANENCEFÁLO

LUÍS ROBERTO BARROSO procura definir a anencefalia e explicar as razões

éticas para a "antecipação terapêutica do parto" antes de relacionar as razões pelas

quais a gravidez de um feto anencefálico seria muito mais arriscada do que uma

gravidez normal, o que colocaria a vida da mãe (ou, ao menos, sua saúde) em risco.

A anencefalia é conceituada como a má-formação fetal congênita por defeito

do fechamento do tubo neural durante a gestação, de modo que o feto não

apresenta os hemisférios cerebrais e o córtex, havendo apenas resíduo do tronco

encefálico.

Tal situação é incompatível com a vida extra-uterina, sendo fatal em todos os

casos. Embora haja relatos esparsos sobre fetos anencefálicos que sobreviveram

alguns dias fora do útero materno, o prognóstico é de sobrevida de apenas algumas

horas após o parto, sendo que aproximadamente 65% (sessenta e cinco por cento)

dos fetos morrem ainda no período intra-uterino.

Seria possível identificar o feto anencefálico por meio de uma simples

ecografia, com confortável certeza médica.

O ponto alto da argumentação médica apresentada é o de que não há nada

que a ciência médica possa fazer quanto ao feto inviável, mas há muito que se

possa fazer pelo quadro clínico da gestante, dado que a permanência do feto

anencefálico, considerando, sobretudo, os altos índices de óbito intra-uterino, é

potencialmente perigosa para a saúde e até para a vida da gestante.

Para ilustrar esta afirmação, são relacionadas diversas complicações no

processo gestacional, durante e após a gravidez (observando-se que são listados

não apenas argumentos médicos, mas também argumentos sobre inconvenientes

práticos):

a) a manutenção da gestação de feto anencefálico tende a se prolongar além de 40 (quarenta) semanas;

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b) sua associação com polihidrâminio (aumento do volume de líquido amniótico) é muito freqüente; c) associação com doença hipertensiva específica da gestação (DHEG); d) associação com vasculopatia periférica de estase; e) alterações do comportamento e psicológicas de grande monta para a gestante; f) dificuldades obstétricas e complicações no desfecho do parto de anencéfalo de termo; g) necessidade de apoio psicoterápico no pós-parto e no puerpério; h) necessidade de registro de nascimento e sepultamento desses recém-nascidos; i) necessidade de bloqueio de lactação (interromper a amamentação); j) puerpério com maior incidência de hemorragias maternas por falta de contratilidade uterina; k) maior incidência de infecções pós-cirúrgicas devido às manobras obstetrícias do parto de termo.

É interessante observar que a argumentação médica articulada por LUÍS

ROBERTO BARROSO como base de sua tese jurídica não apresenta dados

estatísticos que permitam concluir que, em número realmente significativo de casos,

se tenha verificado efetivos danos à saúde ou à vida da gestante. E é de rigor

observar que a maioria das complicações médicas descritas não são passíveis de

ocorrer apenas na gestação de fetos anencefálicos ou não representam, em si,

riscos à mãe (como é o caso da necessidade de interrupção da lactação).

Estas circunstâncias esvaziam significativamente a consistência de seus

argumentos, ao menos do ponto de vista da ciência médica: que há maiores riscos e

inconvenientes na gestação do feto anencefálico, ninguém duvida.

Mas daí a se extrair a conclusão de que há potencialidade de dano à saúde e

à vida da gestante (pondo de lado, por enquanto, o aspecto emocional), vai uma

grande distância.

Para a Medicina, existem dois processos que evidenciam o momento morte: a

morte cerebral e a morte clínica. A morte cerebral é a parada total e irreversível das

funções encefálicas, em conseqüência de processo irreversível e de causa

conhecida, mesmo que o tronco cerebral esteja temporariamente funcionante. A

morte clínica (ou biológica) é a parada irreversível das funções cardiorrespiratórias,

com parada cardíaca e conseqüente morte cerebral, por falta de irrigação

sanguínea, levando a posterior necrose celular. Segundo o Conselho Federal de

Medicina (CFM), os exames complementares a serem observados para constatação

de morte encefálica deverão demonstrar de forma inequívoca: ausência de atividade

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elétrica cerebral, ou ausência de atividade metabólica cerebral, ou ausência de

perfusão sanguínea cerebral. (Conselho Federal de Medicina. Resolução n° 1.480,

de 08 de Agosto de 1997). Segundo o CFM, em sua Resolução n° 1.752/04, o

anencéfalo são natimortos cerebrais, e por não possuírem o córtex, mas apenas o

tronco encefálico, são inaplicáveis e desnecessários os critérios de morte encefálica.

E sendo o anencéfalo o resultado de um processo irreversível, de causa

conhecida e sem qualquer possibilidade de sobrevida, por não possuir a parte vital

do cérebro, é considerado desde o útero um feto morto cerebral.

Partindo destes critérios diagnósticos, não há que se falar em aborto, pois o

aborto é a morte do feto causada pela interrupção da gravidez. Se o feto já estava

morto, não é lesado o interesse protegido pela lei penal. Resta, portanto, atípica a

conduta da interrupção da gravidez do anencéfalo.

Nesta argumentação, os autores constroem com certa dose de arbítrio uma

analogia entre a formação com ausência de cérebro e a morte cerebral, tomando por

empréstimo o conceito de morte cerebral utilizado no caput do artigo 3° da Lei de

Transplante de Órgãos e Tecidos (Lei n° 9.434/97).

Ocorre que o contexto é diverso e diversa é a sua inspiração: uma coisa é

utilizar-se a idéia de morte encefálica para permitir a extração de órgãos, tecidos ou

partes do corpo humano destinados a transplante ou tratamento; outra coisa, bem

diversa, é manejar-se este conceito para sustentar que o feto anencéfalo não

merece qualquer proteção jurídica. Cambiar estas idéias equivale a justificar o

egoísmo com o altruísmo.

Aliás, é interessante observar que a própria Lei de Transplantes de Órgãos e

Tecidos, embora nem de longe trate do problema do feto anencefálico, tem o

cuidado de privilegiar a proteção do feto em relação à liberdade de disposição de

órgãos e tecidos pela mãe, ao dispor no § 7° do seu artigo 9° que:

"É vedado à gestante dispor de tecidos, órgãos ou partes de seu corpo vivo, exceto quando se tratar de doação de tecido para ser utilizado em transplante de medula óssea e o ato não oferecer risco à sua saúde ou ao feto.".

Vale insistir neste ponto, parece haver sedutora coerência no raciocínio de

que seria admissível privilegiar a saúde da gestante em detrimento da vida do feto

anencefálico porque, neste caso, não se negaria que se trate de pessoa, apenas se

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ajuntaria que se trata de pessoa morta. Mas este raciocínio não é imune a críticas

igualmente sedutoras, como a apresentada por VICTOR SANTOS QUEIROZ, que

parecem superar com vantagem a tese rival.

Mas o que resta evidente – repita-se à exaustão – é que o conceito de morte

encefálica inserto na Lei n° 9.434/97 pressupõe ter havido vida, raciocínio este que é

totalmente incompatível com a idéia de supressão do direito à sobrevivência, intra ou

extra uterina.

Não bastasse o fato de a morte encefálica ter sido adotada no Brasil apenas

para fins de viabilização de realização de transplante de órgãos, pressupondo a

prévia existência de vida, portanto, uma apurada pesquisa relativamente aos

procedimentos com vistas à sua caracterização revela que não é viável determiná-la

no que concerne aos nascituros.

A razão de ser da inaplicabilidade do conceito de morte encefálica aos fetos

anencefálicos, segundo o Conselho Federal de Medicina, está em que "a morte não

é um evento, mas sim um processo. O conceito de morte é uma convenção que

considera um determinado ponto deste processo". Assim, como o que se pretende

com o conceito de morte encefálica é tão-somente determinar um momento a partir

do qual é segura a retirada de órgãos do corpo humano para fins de transplante, não

se pode afirmar que mesmo a partir dele não haja vida, ainda que minguante.

Interessante, ainda, verificar que o mesmo parecer do Conselho Federal de

Medicina reconhece que "os anencéfalos morrem clinicamente durante a primeira

semana de vida", de molde a demonstrar de forma definitiva que o conceito de morte

encefálica dentro do útero materno não se lhes aplica. Repita-se: se os nascituros

anencefálicos falecem logo após o nascimento, é lógico que isto quer dizer que

nasceram com vida.

Tomar este argumento em prol do aborto, parece inaceitável, praticar uma

espécie de eutanásia em quem não pode se manifestar sobre a sua vontade de viver

é um autêntico homicídio.

Mesmo diante das inconsistências que se acredita haverem sido apontadas

nas posições em prol do aborto, é de rigor reconhecer que não é insustentável a

proposta de "interrupção terapêutica do parto".

Evidência disso é que GENIVAL VELOSO DE FRANÇA, em texto destinado a

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criticar precisamente a banalização do aborto, conclui favoravelmente ao aborto de

fetos anencéfalos: "alguns casos isolados de abortamento de fetos anencéfalos não

constituem modalidade de aborto eugênico, mas, tão-só, uma forma de intervenção

em uma vida cientificamente incapaz de existir por si só".

O aborto resolve o problema dos pais, não o dos filhos. É ingênuo acreditar

que os pais defendem o aborto porque o feto tem um problema irreversível. Na

verdade, essas pessoas se servem das doenças detectadas pelos modernos

exames pré-natais para que tenham o direito de se ver livres de uma criança com

malformação, para não terem problema.

3.2 O ABORTO DE FETOS PORTADORES DA ANENCEFALIA E SEUS

ASPECTOS JURÍDICOS

A temática do aborto de fetos anencéfalos sempre foi bastante delicada e

discutida por juristas de posições as mais distintas. No entanto, foi apenas

recentemente que ganhou notoriedade e ensejou debates entre a opinião pública de

modo geral.

Em 1ode julho de 2004, o ministro Marco Aurélio de Mello concedeu liminar

que autorizava o abortamento de feto anencéfalo com base em pedido realizado

pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde (CNTS). Pouco tempo se

passou para que, em 20 de outubro do mesmo ano, o julgamento da decisão

monocrática fosse levado a termo. Apenas quatro dos magistrados do Supremo

Tribunal Federal votaram pela manutenção da liminar: o próprio Marco Aurélio de

Mello, Carlos Ayres Britto, Celso de Mello e Sepúlveda Pertence. Eros Grau

justificou seu voto contrário alegando que "o Código Penal não pode ser reescrito

pelo Judiciário e permitir uma terceira modalidade de aborto. Seus argumentos,

assentes na observância do dispositivo sobre o aborto, foram amplamente aceitos

pelos demais ministros, o que resultou na imediata cassação da liminar.

Desde então, a polêmica acerca do aborto de feto anencéfalo tem dividido

opiniões, envolvendo um leque diversificado de questões que vão desde valorações

éticas a religiosas. Como é costume em casos jurídicos que abarcam a defesa da

vida, a Igreja Católica não se furtou a manifestar sua posição. Embora laico, o

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Estado brasileiro ainda se vê às voltas com a influência de opiniões religiosas,

chegando mesmo, em algumas circunstâncias, a ter de colocar em pauta as

posturas assumidas por seus líderes.

O processo de laicização do Estado, ocorrido sobretudo após a Revolução

Francesa, propiciou a dissociação entre a religião e o Estado e motivou uma nova

forma de concepção a respeito de certos temas . Além disso, se na época do Ancien

Régimea religião católica praticamente determinava a visão de mundo do indivíduo,

com o surgimento de uma nova realidade social – fundada na crescente

racionalização do mundo – ela terá papel secundário. Ainda assim, é curioso notar

que não obstante tenha abolido a religião como dado estrutural de sua existência, o

próprio Estado permite a ingerência da Igreja Católica em questões que não são de

sua alçada, chegando a influenciar tribunais jurídicos.

Seria, contudo, restringir o foco da contenda à esfera religiosa se não

admitíssemos a presença de outros setores sociais que, de uma maneira ou de

outra, mostraram-se sequiosos de participar da discussão.

A despeito da cassação acima consignada, a liminar de Marco Aurélio de

Mello ensejou intensa polêmica. Não bastassem as justificativas apresentadas pelo

ministro quando de seu parecer, ainda se propôs a discutir o tema abertamente,

publicando artigo em jornal de ampla circulação. Não lhe seria necessária tal

postura, posto que sua função de magistrado não exija esforços de esclarecimentos

diante da opinião pública. Ainda assim, parece-nos que sua motivação ao escrever o

texto se pautava na intenção de trazer a lume idéias caras ao debate. Vejamos

algumas de suas considerações que, acreditamos, possam ser de bastante valia

para os argumentos que aqui tentamos desenvolver.

O foco no qual estão centradas suas justificativas não poderia ser outro senão

a preocupação com a integridade física, moral e psicológica da gestante. Com efeito,

não haveria de analisar o fato desprezando as conseqüências de uma gravidez

dessa natureza. Suas palavras são claras: "Assenti sobretudo aos argumentos de

que a permanência do feto mostra-se potencialmente perigosa, podendo ocasionar

danos à saúde e à vida da gestante. Para qualquer pessoa nessa situação, ficar à

mercê da permissão do Estado para livrar-se de semelhante sofrimento resulta, para

dizer o mínimo, em clara violência às vertentes da dignidade humana -física, moral e

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psicológica". Note-se o contraponto entre o bem-estar da gestante e a esfera jurídica

que, salvo engano, encerra o dilema maior do assunto, objeto da liminar em tela. De

modo explícito, há a idéia de que a formalidade jurídica, expressa na "permissão do

Estado", poderia comprometer a defesa de um valor que, em princípio, cabe a ele

tutelar: a dignidade humana. Por mais estranho que possa parecer, estaria aqui a

rigidez da normatividade jurídica a serviço de uma tarefa antagônica à sua própria

essência, porque incapaz de salvaguardar o leque de direitos inalienáveis ao

indivíduo. É nesse sentido que o jurista aponta para posições contrárias às suas,

observando que "É até possível para alguns passar incólume pela decisão de,

mediante simples omissão, escudados pelas lacunas ou obsolescências da

legislação, impingir dor e aflição a outrem".

A leitura de alguns trechos do artigo poderia nos fazer crer que a análise feita

se restringe a um tom eminentemente pessoal, preterindo os aspectos técnicos da

esfera jurídica. É certo que o autor procura sopesar situações de anencefalia

relativamente à possibilidade de ocorrência em familiares. O argumento tecido,

contudo, é muito mais sutil do que à primeira vista parece. Ao lançar mão de

hipóteses sobre tal possibilidade não visa dotar a polêmica de laivos pessoais, mas

proceder justamente ao contrário, na medida em que trabalha com circunstâncias

abstratas: "Ora, principalmente em caso penoso como o que se põe em discussão,

há que se calçar o sapato não com o próprio pé, mas com o pé do outro, de modo a

sentir exatamente onde lhe machuca o calo. Para aguçar o termômetro da

sensibilidade, é de bom alvitre perguntar a si mesmo, antes de qualquer decisão: e

se fosse com a minha filha, minha mulher, minha irmã? Suportaria esses nove

meses de tormento, de espera sem esperança?"

Ao leitor atento restará patente que se trata de indagações afeitas à

imparcialidade do tema, justamente por se considerar que possa ocorrer,

abstratamente, a todas e a cada gestante simultaneamente. Nessa perspectiva,

casos concretos podem ser avaliados a partir da situação hipotética acima

consignada.

Em seu entendimento, a dignidade humana, como valor a ser integralmente

resguardado, não poderia ser avaliado parcialmente, sob pena de torná-la um mero

"objeto". Assim, dando vazão à noção de que o direito deve corresponder a uma

forma de organização apta a englobar valores de toda sorte, observa o jurista: "No

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cerne da questão está a dimensão humana que obstaculiza a possibilidade de se

coisificar uma pessoa, usando-a como objeto. São muitos e de crucial importância

os valores em jogo. A um só tempo, cuida-se do direito à saúde, do direito à

liberdade em seu sentido maior, do direito à preservação da autonomia da vontade,

da legalidade e, acima de tudo, da dignidade da pessoa humana".

Um dos pontos a merecer atenção em nossa discussão é a incompatibilidade

do teor da legislação penal com os tempos atuais. Dotando tal discussão de traços

essencialmente sociológicos, diríamos que a legislação penal deveria estar

adequada à realidade social na qual se insere, sob pena de não ser eficaz. Isso, no

entanto, não basta: é preciso também que ela atenda às necessidades sociais

impostas pela dinâmica social.

Uma vez que a vida, sendo um direito universal e inalienável, independe do

contexto social para que seja tutelada. Dito em outros termos, tratando-se da vida,

não há norma que seja ultrapassada, visto que sua defesa jamais poderá ser

comprometida em virtude de tais ou quais princípios qualificados modernos. O que

merece ser enfatizado no presente caso é a incapacidade de o Direito Penal não

prever regramento normativo para um tipo específico de situação na qual, embora

esteja a vida envolvida, ela se apresenta como inviável. Não estamos, portanto,

diante de ordinária interrupção da gravidez e tampouco de ato lesivo à vida.

Avaliamos uma circunstância sui generis: aquela em que a vida não passa de uma

existência efêmera e episódica, pois que o feto anencéfalo não terá condições de

sobreviver fora do útero materno por muito tempo, ou seja, não haverá possibilidade

de vida extra-uterina.

Na década de 1940, não dispunha o conhecimento médico dominante de

condições eficazes e precisas para se verificar a anencefalia. Diante dessa

incapacidade científica torna-se compreensível que nem sequer fosse cogitado,

pelos nossos legisladores, o abortamento de fetos anencéfalos.

Não é possível presumir se o autor tinha em mente o caso específico do

aborto de fetos anencéfalos. Tal suposição certamente resvalaria em ordinários

exercícios de especulação. Todavia, valeria arriscar algumas indagações: havendo

naquela época a possibilidade de detecção da anencefalia.

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Segundo Cezar Roberto Bitencourt ao responder tal indagação nos seguintes

termos:

"se, na época [1940], houvesse o arsenal de conhecimento e tecnologia de hoje, provavelmente também teria admitido o denominado aborto anencefálico, diante da absoluta certeza da inexistência de vida, como ocorre na atualidade".

Modificando-se substancialmente a realidade que nos separa do autor acima

citado, ou seja, tendo agora condições inequivocamente precisas para averiguar a

anencefalia, como poderíamos equacionar o problema da legislação penal

relativamente à possibilidade de abortamento de fetos anencéfalos? Além disso,

assinalemos haver previsão de alteração do dispositivo legal na reforma da

legislação penal.

Veja-se, a título de ilustração, quais são as alterações previstas para o Código

Penal brasileiro: "A Comissão sugere ampliar a extensão do aborto legal. Mantém o

chamado aborto necessário; dá nova redação ao aborto ético; menciona, além do

estupro, “violação da liberdade sexual, ou emprego não consentido de técnica de

reprodução assistida”. Além disso, quando houver “fundada probabilidade, atestada

por dois outros médicos, de o nascituro apresentar graves e irreversíveis anomalias

físicas ou mentais”. Ad cautelam, “deve ser precedido de consentimento da

gestante, ou quando menor, incapaz ou impossibilitada de consentir, de seu

representante legal, do cônjuge ou de seu companheiro”, além da não oposição

justificada do cônjuge ou companheiro" . Conforme fica patente no texto acima, a

legislação penal proposta estaria muito mais afinada com as vicissitudes da vida

moderna e rechaçaria a vetustez do diploma legal de 1940.

Sob essa perspectiva, valeria também notar que a controvérsia originada pela

liminar do ministro Marco Aurélio de Mello, anteriormente mencionada, perdurou por

algum tempo, movimentando debates na sociedade civil e na esfera jurídica.

Osíres de Azevedo Lopes Filho Silva, assim se pronunciou sobre o assunto:

"Agiu sábia e humanitariamente o ministro Marco Aurélio, realizando a construção judicial que supera insuficiência do Código Penal, libertando gestantes do adicional fardo torturante de processo penal agravador de sua situação infeliz”.

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Examinando as palavras do autor, somos levados a entender que o Código

Penal brasileiro concorre para a infelicidade de uma situação dramática ao impedir

que se suprima o "fardo torturante" referido. O aspecto interessante do depoimento

acima não é esse, entretanto. Parece-nos conveniente indagar se a liminar em

questão, ao tentar "superar a insuficiência do Código Penal", não arrostou os

pressupostos da Teoria da Separação dos Poderes, cuja expressão constitucional

encontra-se no art. 2o da CF/88.

O dilema intrínseco às opiniões acima dadas pode ser cifrado na

contraposição entre a necessidade de cumprir rigidamente os preceitos insculpidos

no ordenamento jurídico, ainda que tal procedimento implique formas de

constrangimento pessoal, e a possibilidade de "superar" as insuficiências nele

contidas.

3.3 O ABORTO DE FETOS PORTADORES DA ANENCEFALIA E SEUS

IMPACTOS NA SOCIEDADE

Inúmeros alvarás vêm sendo concedidos autorizando o aborto em caso de

má-formação do feto incompatível com a vida extra-uterina. Baseando em doutrinas

e jurisprudências, as decisões mostram uma realidade existente na sociedade, a

possibilidade de aliviar o sofrimento dos pais devido ao avanço da medicina que

permite o diagnóstico preciso de anomalias que impossibilitam a vida do feto após o

nascimento.

Vejamos alguns exemplos:

[...] Não há razão para deixar de afirmar que, no caso da anencefalia, a vida que subsiste não é propriamente falando uma vida humana, a vida de um ser humano destinado a chegar a ser (ou já) pessoa humana [...]. Não se está admitindo a indicação eugênica com o propósito de melhorar a raça ou evitar que o ser em gestação venha a nascer cego, aleijado ou mentalmente débil. Busca-se evita o nascimento de um feto cientificamente sem vida, inteiramente desprovido de cérebro e incapaz de existir por si só [...] (Alvará emitido pela Comarca de Londrina, 2ª Vara Criminal: 02 diagnósticos; anencefalia, em 01-12-1992). [...] Com efeito, infere-se que a requerente demonstrou, através de parecer médico, haver irregularidades na gravidez, sendo certo que tais problemas impedem a vida extra-uterina. Vale notar que o objeto jurídico do aborto consiste na preservação da vida humana que, na hipótese sob análise, não ficaria prejudicada pela interrupção da gravidez, ante o fato descrito [...]

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(Alvará emitido pela Comarca de São Paulo: 01 diagnóstico: sem a descrição do diagnóstico, em 05-03-1996). [...] Ademais, o prosseguimento da gravidez pode acarretar danos à higidez psíquica da requerente, situação que torna o aborto necessário [...] (Alvará emitido pela Comarca de São Paulo: 01 diagnóstico, em 05-03-1996).

Elenca Vieira (1999):

Em 19 de dezembro de 1992, em Londrina-PR, nosso esclarecido mestre e juiz Miguel Kfouri Neto concedeu autorização para que C.M.A., de 24 anos, interrompesse a gravidez na 25ª semana, pois havia comprovação de três médicos de que a criança nasceria sem cérebro. A simples idéia de negar a um ser em gestação repugna-nos, a todos. A ciência médica, entretanto, tem evoluído de tal forma no plano do diagnóstico pré-natal,que enfermidades capazes de colocar em risco a vida da mãe, é inviabilizar por completo a existência do feto são detectados com razoável antecedência. O direito contempla um número de situações muito maior do que a letra fria da lei o faz. E a lei não dá mais conta da realidade colocada pelo avanço da ciência. Em 05 de novembro o juiz Geraldo Pinheiro Franco autorizou a interrupção da gestante de vinte e quatro semanas com feto portador de acrania e onfalocele. Do mesmo modo, em 03 de dezembro de 1993, o magistrado José Fernando Seifarth de Freitas, de Garulhos-SP, autorizou a interrupção de gravidez em que o feto era portador de anencefalia.

Em abril de 1994, em Santo André-SP, S.R.S. conseguiu permissão judicial

para interromper sua gravidez, pois o feto possuía malformação cardíaca grave. É o

que também Vieira traz em seu livro Bioética e Direito:

O casal D.V.A. e D.R.G.A. apresentou exames ultra-sonográficos e clínicos efetuados por junta médica especializada, a qual diagnosticou uma anencefalia no feto, o que inviabilizaria sua vida extra-uterina. Os exames verificaram que o feto (19ª semana) não possuía calota craniana e hemisférios cerebrais, possuindo caráter evolutivo leal, podendo sobrevive no máximo sete dias, caso viesse a nascer. O promotor público do caso, Dr. Maurílio Batista Palhares, foi favorável à expedição de alvará judicial autorizando o aborto, solicitando que o mesmo fosse realizado com a máxima urgência. Segundo ele, a efetivação do aborto não constituiria crime, por não pesar face às circunstâncias do caso, um juízo de reprobabilidade sobre a conduta do casal. Acertadíssima a decisão do magistrado Luiz Carlos Gabarão, que deferiu o pedido de interrupção da gravidez, considerando o aborto eugênico causa excludente de ilicitude. Por sua vez, no Rio de Janeiro, o juiz da 14ª Vara Criminal, Marcos Henrique Pinto Basílio, acatou a argumentação de R.F.S. autorizando-a a realizar, em 03 de setembro de 1997, a interrupção da gravidez na Santa Casa de Misericórdia, por carregar um feto portador de anencefalia.

Vejamos outras decisões dos Tribunais:

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ABORTO NECESSÁRIO – Artigo 128 do Código Penal – Má formação do feto – Síndrome de “Edwards” – Concessão do alvará – ausência de fundamento jurídico – gravidez, porém, já interrompida – direito assegurado à apelada por decisão judicial – análise da questão de fundo obstada – recurso prejudicado. (TJSP – ACr 245.697-3 – São Paulo – 1ª C. Crim. Ext. Rel Des. Almeida Sampaio – J. 29-09-1999 – v.u.) ABORTO – AUTORIZAÇÃO JUDICIAL – ANENCEFALIA FETAL – COMPROVADA INVIABILIZAÇÃO DA VEDA EXTRA-UTERINA – Pedido instruído com laudo médico irrefutável da anomalia e de suas conseqüências e com favorável parecer psicológico do casal – consentimento expresso do pai – evidência de risco à saúde, especialmente parcial, da gestante – interpretação extensiva da excludente de punibilidade prevista no inciso I do Art. 128 do CP – Aplicação dos Princípios da analogia admitidos no art. 3º do CPP – autorização concedida – apelo provido. Diante da solicitação de autorização para realização de aborto, instruída com laudo médico e psicológico favoráveis, deliberada com plena conscientização da gestante e de seu companheiro e evidenciado o risco à saúde desta, mormente a psicológica, resultante do drama emocional a que estará submetida caso leve a termo a gestação, pois comprovado cientificamente que o feto é portador de anencefalia (ausência de cérebro) e de outras anomalias incompatíveis com a sobrevida extra-uterina, outra solução não resta senão autorizar a requerente a interromper a gravidez. (TJSC – ACr. 98.003566-0 – SC – 2ª C. Crim. Rel. Des. Jorge Mussi – J. 05.05.1998).

Nota-se, mais uma vez, diante das inúmeras decisões que autorizam a

realização de aborto de anencefalos, a necessidade de sua regulamentação.

3.4 ASPECTOS RELIGIOSOS

As religiões estão presentes sempre no que se trata de tema polêmico, e a

questão do aborto sendo anencéfalo ou não é um de seus enfoques, pois, prega

assiduamente, que a vida é um presente de Deus e só Ele pode nos tirar.

• Católica: Não admite a interrupção da gestação, colocando-se primeiramente

em favor ao direito à vida. É favorável a opinião de que todos têm o direito de

nascer, independente do tempo desta sobrevivência, isto não pode ser critério de

eliminação à vida. Desde o século IV condena o aborto em qualquer estágio e em

qualquer circunstancia, conservando-se até hoje como opinião e posição oficial,

sendo bastante rígida e tradicional. Ponderar que a alma é infundida no novo ser no

período da fecundação; então, proíbe o aborto independentemente no momento que

se encontra a gestação, caso contrário a punição será a excomunhão. Em 1917, a

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Igreja declarou que uma mulher e todos de seu convívio deveriam receber a

excomunhão pelo pecado desta monstruosidade, quer dizer, seriam negados todos

os sacramentos e seu ligamento com a igreja: uma punição eterna no inferno. Em

1930, ficou determinado que o direito à vida de um feto é igual ao da mulher, e toda

medida anticoncepcional foi considerada um "crime contra a natureza" exceto os

métodos que estabelecem a abstinência sexual para os dias férteis. Em 1976 o

Papa Paulo VI disse que o feto tem "pleno direito à vida" a partir do momento da

concepção; que a mulher não tem nenhum direito de abortar, mesmo para salvar

sua própria vida. Essa posição se baseia em quatro princípios: Deus é o autor da

vida, a vida se inicia no momento da concepção, ninguém tem o direito de tirar a

vida humana inocente e o aborto, em qualquer estágio de desenvolvimento fetal,

significa tirar uma vida humana inocente.

• Protestantes – O protestantismo é talvez um dos mais difusos e de-

centralizado tradições religiosas do mundo. Não há quase nada que não é verdade

de alguma denominação em algum lugar. Vocal, vociferante oposição ao aborto é

comum nos círculos protestantes, mas apoiar o aborto também é comum - não é tão

alto. Não existe uma única posição Protestante sobre o aborto, mas os protestantes

que se opõem ao aborto, por vezes, apresentarem-se como os únicos cristãos

verdadeiros. Existe uma “liberdade” em se tratando de aborto. Respeitando sempre

a prioridade que é a vida da mãe.

• Islâmicas: Muitos teólogos conservadores muçulmanos condenam o aborto,

mas há amplo espaço na tradição islâmica para a autorização. Quando os

ensinamentos muçulmanos não permitem o aborto, é geralmente limitada aos

primeiros estágios da gravidez e apenas sob a condição de que há razões muito

boas para ele - razões frívolas não são permitidos. Os líderes esta na maioria se

apresentam como desfavoráveis ao aborto, mas já estão menos conservadores.

• Judaica: Analisava-se a vida da mãe como mais sagrada que a do feto, mas,

se o aborto não é desejável, também não é considerado um assassinato, e que em

todos os casos é a saúde da mulher que prevalece tanto no que se refere ao

equilíbrio físico como psíquico. O feto no pensar deles só é humano quando nasce.

• Espírita: É fortemente contrária ao aborto, considerando-o como um crime,

mesmo em caso anencefálico, pois, constituem de seres indefesos e uma

controversa aos ensinamentos de Deus. Aceitam apenas nos casos de riscos da

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vida da gestante, para que esta seja salva. Acreditam que desde a fecundação do

óvulo já ha uma vida presente de corpo e alma, assim, em qualquer fase da

gestação é considerado um crime. Crêem que o Espírito, anterior a reencarnação,

tem a opção de auto pôr a prova, côo modo de aprendizagem e recuperação das

falhas cometidas em outra vida, tendo o corpo como um instrumento. Pregam que os

provocadores do aborto terão naquele espírito um inimigo perigoso, causadores de

maldades.

• Afro-Brasileiras – Umbanda e Candomblé: A semelhança é a valorização da

vida, ao ser humano em si, a natureza, aos deuses, por isso, há a rejeição da

ideologia do aborto, consideram ser um ato desumano. Umbanda e Candomblé

transgridem os códigos éticos e morais, é o aborto antivida e antinatureza. O

Candomblé é de ampla liberdade em diversos assuntos, mas vêem o aborto como

uma transgressão dupla aos que Odum, que é a marca de destino de cada individuo

e família. O aborto para eles é considerado grave.

• Budismo, Hinduismo e o Hare Krishma: o sêmen é o transmissor da vida,

melhor dizendo, é na concepção que se nasce a vida. Defendem que o homem é o

transportador da vida e a mulher do corpo protetor do feto. São religiões machistas,

onde quem decide a continuidade ou não da gestação é o homem, principalmente,

nos casos das casada. Para os budistas, o aborto como uma prática negativa, já que

está eliminando vida, constituída de energia própria e consciência.

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4 OS PRINCÍPIOS E OS DIREITOS QUE ESTÃO LIGADOS DIRETAMENTE AO

TEMA

4.1 PRINCÍPIOS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

O inciso III do artigo 1º da Constituição Federal brasileira de 1988 consagra o

princípio da dignidade da pessoa humana, como um dos fundamentos da República

Federativa do Brasil, configurada como Estado democrático de Direito.

Entende-se por dignidade da pessoa humana:

[...] um valor espiritual e moral inerente às pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. (MORAIS, 2007, p.16).

Por ser um princípio absoluto, submete aos demais, pressupondo a

autonomia vital da pessoa, a sua autodeterminação relativamente ao Estado, às

demais entidades públicas e às outras pessoas.

Em decorrência desse princípio, ninguém poderá ser submetido a torturas,

penalidades, ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, pois intimamente

ligados ao mesmo, está a integridade física, psíquica e moral do ser humano, que

tem direito à vida, uma vida digna.

A dignidade da pessoa humana foi alçada ao centro dos sistemas jurídicos

contemporâneos. A Constituição Brasileira de 1988 se integra ao movimento

doutrinário pós-positivista, caracterizado pela reaproximação entre o direito e a ética,

pelo resgate dos valores civilizatórios e pela primazia dos direitos fundamentais.

Pois bem: obrigar uma mulher a conservar no ventre, por longos meses, o filho que

não poderá ter impõe a ela sofrimento inútil e cruel. Adiar o parto, que não será uma

celebração da vida, mas um ritual de morte, viola a integridade física e psicológica

da gestante, em situação análoga á da tortura.

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[...] o período em que a mulher gesta uma nova vida, embora possa ser gratificante, não é fácil nem simples. A gravidez traz uma série de transformações físicas e psicológicas por vezes difíceis de suportar. O corpo se deforma, a ingestão de alimentos torna-se um problema, a circulação do sangue fica prejudicada, o cabelo cai, os dentes enfraquecem, surgem manchas no rosto, aumentam a sonolência e o calor, as disposições são freqüentes e o tamanho da barriga provoca dores lombares e compromete o equilíbrio. Evidentemente, algumas tarefas cotidianas ou profissionais, tornam-se proibidas nesse período e, não raro, sobrevém prejuízos materiais. Tudo isso se a gravidez for normal, sem problemas mais graves de saúde, que vão de herpes gravídico a hipertensão arterial, cardiopatias e depressão. Sem falar, nos riscos do próprio parto. (...) No entanto, é evidente que o sacrifício da gestação não pode ser imposto a uma mulher quando já se sabe, com toda a segurança, que a criança em formação irá falecer logo após o nascimento. Nesse caso, a antecipação do parto é a medida indicada para a preservação da saúde física e mental da mulher e por respeito aos seus direitos humanos, bem como de seu eventual companheiro e de sua família.Ninguém pode ser obrigado a sofrer inutilmente, amargando uma espera angustiante por uma criança sem cérebro e, portanto, sem nenhuma condição de sobreviver.( JORNAL DO ADVOGADO. OAB/SP,2004, p.03.)

Assim, tem-se de um lado a mulher e sua respectiva família tendo sua

dignidade, sua saúde psicológica, sendo comprometida pela angústia, depressão,

medo e de outro lado um ser, que não tem as mínimas condições de vitalidade

exterior, que possui sim direito, mas que não sobreviverá após a tormenta.

.

4.2 PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE

O artigo 5º da Constituição Federal diz que ninguém será obrigado a fazer ou

deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Para o Poder Público,

somente é facultado agir por imposição ou autorização legal. Em relação aos

particulares, esta é a cláusula constitucional genérica da liberdade no direito

brasileiro: se a lei não proíbe determinado comportamento ou se a lei não o impõe,

têm as pessoas a autodeterminação de adotá-las ou não. Através desse princípio,

prova a verdade da frase que diz que tudo aquilo que não está proibido por lei é

juridicamente permitido.

Diante disso, conclui-se que não existe vedação legal para a antecipação

terapêutica do parto no ordenamento jurídico de fetos anencefálicos.O que ocorre de

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fato é uma restrição à liberdade de escolha e à autonomia de vontade da gestante

frente à cláusula constitucional genérica da liberdade no direito brasileiro.

A simples alegação de que a legislação pátria é omissa é muito fraca para

fazer cair por terra o direito a dignidade de uma mulher que vivencia tal drama,

tornando-se inadmissível, diante do desenvolvimento atual da Genética Humana e

da Medicina Fetal, que existam pessoas que queiram obrigar uma mulher a seguir

gestação de feto sem perspectiva de vida.

4.3 DIREITO DA MULHER E SAÚDE MENTAL DA MÃE

Ao elaborar este estudo tive por objetivo primordial destacar as dores e os

sofrimentos da mulher: vítima histórica do poder dos dogmas religiosos e da

prepotência dos dogmas jurídicos. O médico que detém de conhecimentos médicos,

tecnológicos e científicos, capacitado, portanto, para curar, minorar a dor e até de

salvar vidas humanas, não pode ser punido na antecipação do parto de feto

anencefálico.

O feto ainda não existe, pois não está no mundo. O seu único “mundo”, ou

lugar, é o ventre materno. Os dogmáticos religiosos e os do direito posto consideram

o feto mais importante que a saúde física, mental e social da mulher. O feto tem

apenas a expectativa de tornar-se pessoa e assim adquirir personalidade jurídica se

nascer com vida viável; isto é, a de iniciar a existência que se consubstancia no

estar no-e-com o mundo.

Por outro lado, o feto anencefálico é possuidor de deformação congênita

irreversível, ou seja, inviável para a vida e para a existência. A antecipação do parto

ainda não legalizado constitui do momento oportuno para o magistrado criar a norma

do caso concreto para fazer prevalecer o Direito, porque não há regra jurídica que

obrigue a mulher (preferencialmente a pobre) – permanente vítima de nossas leis

obsoletas - abrigar no ventre um ser anencéfalo.

Magistrados sensíveis à realidade da vida têm autorizados a interrupção da

gravidez, quando confirmado por conclusivos laudos médicos, de enfermidade

incurável ou deformidade anatômica e estrutural de feto sem nenhuma possibilidade

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de vida viável após o parto. Enquanto seres racionais, não podemos nunca duvidar

da razão, mesmo quando se constata o inusitado e a irracionalidade de decisões

morais e judiciais que dizem respeito à saúde de todas as mulheres.

A prática do aborto em casos de anencefalia assumem a defesa dos direitos

da mãe, pois alegam que cabe a ela, e somente a ela, decidir se quer ou não ter um

filho nessa trágica condição de uma vida breve e puramente vegetativa. Mas

devemos considerar que se trata realmente de um caso de escolha em que nenhum

direito é aviltado, como no caso da escolha de uma mulher querer engravidar ou

não? A escolha, em se tratando de aborto em sentido amplo, será sempre da

competência exclusiva da mulher, pois é dona do seu corpo e da inalienável

liberdade de agir, não obstante sofrer da interferência abusiva dos dogmas jurídicos

e religiosos, os quais constituem em verdadeiro abuso de direito tal invasão em sua

intimidade e estrita privacidade. Por outro lado, o sistema jurídico e os seus

operadores ainda não conseguiram superar os dogmas e as contradições, cujas

decisões judiciais são ainda muito prejudiciais à saúde da mulher.

Assim se manifestou, sem rodeios, o Jornalista e Articulista da Revista Veja,

André Petry: “.... o STF deu guarida ao autoritarismo religioso pelo qual todos têm

de viver sob os ditames da fé – queiram ou não, sejam crentes, sejam ateus. Afinal,

a liminar não obrigava mulher alguma a interromper a gravidez de um feto sem

cérebro. Apenas autorizava o aborto às mulheres que, torturadas pela dor

psicológica de gerar um filho que morrerá ao nascer, quisessem fazê-lo. A idéia,

generosamente humana, era conceder a elas o direito de fugir do suplício de dar à

luz um filho que, já em sua primeira noite, em vez do berço, deita no caixa.”

É preciso que os operadores do Direito comprometidos com a felicidade e a

dignidade de todas as mulheres, encontrem formas de enfrentar a prepotência dos

dogmas jurídicos.

Não se vislumbra nos dogmas nenhuma perspectiva libertadora nem indícios

de transformarem-se pelo menos culturalmente, porque todo o Direito é

arbitrariamente reduzido à norma jurídica formalizada e em decisão fossilizada

(injusta e retrógrada). Ou seja, para o positivista o Direito é um saber dos dogmas,

repetidos à exaustão. A não-autorização judicial da antecipação do parto é porque

“alguns juízes são absolutamente incorruptíveis. Ninguém consegue induzi-los a

fazer Justiça” (Bertolt Brecht). É em nome da segurança jurídica que se quer que o

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juiz proceda maquinalmente como juiz obediente à literalidade da lei, alheio aos

valores do humanismo e principalmente à circunstância da vida e da existência das

mulheres.

Todavia, a responsabilidade histórica será a do juiz monocrático que vai obrar

a difícil missão de fazer progredir o Direito, adaptando a ordem jurídica posta à

evolução das circunstâncias protetoras da indefesa mulher. Se a circunstância é

autorizar a interrupção da gravidez em razão da mulher carregar no ventre desde já

um natimorto, o magistrado que assim decidir estará não só fazendo a justiça do

caso concreto, mas projetando na eqüidade a solução de que o Juiz deve estar

subordinado ao Direito (e não simplesmente ao texto da lei e de norma jurídica

injusta e anacrônica) e à realidade da vida social. Em ponderação pertinente, o

eminente Ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mendes de Farias

Mello assim se manifestou sobre o tema: “O Judiciário não pode se fechar em torno

de si mesmo, omitindo-se, furtando-se de participar dos destinos da sociedade... A

sociedade quer, sim, juízes, e não semideuses encastelados em torres de marfim...

O juiz tem de ser um cidadão atento ao cotidiano da comunidade em que vive, em

vez de robô repetidor de leis. Só assim será sensível para proferir decisões sábias”.

A mulher é a mãe da humanidade e é por isso que o humanismo reverencia

este ser humano, sabendo que há o elo básico de interdependência entre a mulher e

o feto. Após o diagnóstico da anencefalia, ela tem a certeza de que não está

gerando vida, mas morte, para não dizer que é durante toda a gestação do

anencéfalo um caixão ambulante. Assim, não ocorrerá o bem-estar físico,

psicológico e social dela, porque os seus olhos e todo o sentir estão voltados para a

morte. A vida inviável a deixou mentalmente ferida e com ela o sentimento de que

não será mãe.

É verdade banal que deve ser repetida, pois na área da saúde mental é

deveras conhecido que uma gravidez indesejada imposta pode causar sofrimento

em todos os níveis: psicológico, social, econômico, intelectual e espiritual. Em

resumo, forçar a mulher, a carregar no ventre um feto sem vida viável até o final da

gravidez é uma das mais profundas feridas que podem ser infligidas à sua mente e

ao seu corpo

Magistrados não análgicos nem dogmáticos autorizarão a interrupção da

gestação de feto possuidor de enfermidade incurável. Assim decidindo, não fazem

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somente a justiça inadiável que o caso concreto pede, mas também homenageiam

as suas mães e as mulheres despossuídas, alienadas, exploradas e maltratadas por

todos os dogmas. O feto anencéfalo é um ser desconhecido que apenas sobrevive

vegetativamente. Não tem consciência nem nunca terá; desconhece o que é dor e

sofrimento porque está totalmente amparado no útero, porém o seu destino é a

morte, ou dentro do ventre, quando comprometerá a saúde da própria mulher

colocando-a em risco de morte, ou logo após o parto.

É imperativo moral, ainda não amparado no sistema jurídico, da autonomia da

mulher decidir se quer prosseguir, ou não, na gestação até ao final, em se tratando

de fetos incuráveis e fatalmente doentes. Esta decisão está fundamentada no livre

arbítrio de querer ou não de cessar gravidez indesejada e de alto risco à sua saúde.

É, antes de tudo, decisão íntima dela pela antecipação do parto. Extrair um ser

inviável para a vida e também para a existência do seu ventre não pode constituir

crime, pois tal crime é impossível, por tratar-se justamente não de aborto, mas de

antecipação do parto; por isso o médico não pode nem deve ser criminalizado.

Por outro lado, a mulher movida por conduta humana altamente altruísta, de

exemplar abnegação e generosidade, apesar de saber, com a mais absoluta

certeza, que está gerando no útero feto anencefálico.

O recém-nascido anencefálico não apresenta possibilidade alguma de

recuperação, inclusive por motivos anatômicos, por não possuir o córtex cerebral

nem de ser dotado de estruturas anatômicas próprias que presidem as funções

superiores. Na realidade constata-se a ausência completa ou parcial da calota

craniana e dos tecidos que a ela sobrepõem deixando parte do cérebro exposto.

Em conseqüência, o feto anencefálico é gravemente deficiente no plano

neurológico. Faltam-lhe as funções que dependem do córtex e, portanto, não

somente os fenômenos da vida psíquica, mas também a sensibilidade, a mobilidade

e a integração de quase todas as funções corpóreas. Em suma, a anencefalia é

uma condição letal e normalmente nenhum neonato sobrevive além dos três dias.

É imperioso acentuar que o feto anencefálico possui irreparável falência

cerebral. Ele só se mantém vivo, biologicamente falando, porque está ligado ao

corpo da mulher e é o seu aparelho biológico que mantém a “sobrevida” precária

deste feto anômalo, condenado à morte. Assim, a morte encefálica do feto é certa e

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que a biológica ocorre durante o parto ou logo após “nascer”, isto é, a expulsão de

um ser para o mundo.

Em face do exposto, para adquirir o status de pessoa precisa nascer com vida

viável e com saúde, quando inicia a personalidade civil (sujeito de direitos, deveres e

obrigações). Qualquer discussão doutrinária fora deste fato é inócua e estéril. É falta

de honestidade intelectual dos operadores do Direito negarem os avanços da

medicina tecnológica, assim como não é possível negar a Ciência e a Razão, cuja

interrupção da gestação somente deverá correr se a mulher assim decidir.

Finalmente, é preciso repetir à exaustão que a anencefalia é para a medicina

uma anomalia fatal porque a vida está condicionada a atividade cerebral. É, contudo,

de uma perversidade ímpar obrigar a mulher, pois é a única a levar à exaustão este

sofrimento de quem está condenada a viver. É a manifestação suprema do poder

dos dogmas jurídicos e religiosos ao ignorar o Direito da Mulher que está

consubstanciado no Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Porém, há

magistrados comprometidos com a saúde da mulher e que são cuidados no dia-a-

dia para atender aos fins sociais e às exigências do bem comum na aplicação do

Direito têm autorizados a cirurgia para a retirada de fetos anencefálicos ou

possuidores de outras anomalias incompatíveis com a vida extra-uterina.

Para que prevaleça a concretude dos fatos da vida é preciso humanizar o

operador do direito dogmático. O fato concreto não pode diluir na abstração, pois o

conteúdo é mais importante que a forma. A existência da mulher é muito mais

importante que a expectativa de vida de feto com vida extra-uterina inviável.

Portanto, a saúde da mulher é bem mais importante que a do feto, mormente se é

portador de deformidade irreparável e fatal ou está acometido de doença incurável.

Por outro lado, é direito da mulher decidir se deseja prosseguir na gestação, ou não.

Para concluir sobre a saúde mental da mãe e sobre o direito que ela possui

eis as acertadas e iluminadas ponderações de Ginette Paris: “Até hoje o aborto

tem sido julgado de acordo com o dogma cristão; é pecado porque é proibido

pela Igreja, e a Igreja não pode mudar de posição, pois está escrito na Bíblia,

e se começarmos a mudar o dogma escrito a realidade toda ruirá. As

religiões monoteístas baseadas num livro (cristão, judeu, muçulmano)

funcionam de acordo com códigos escritos (dogma), que divide o

comportamento em pecado e virtude, de uma vez por todas. Mas, tão logo

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adotemos uma perspectiva mais global e menos dogmática, podemos ver a

loucura que é sacrificar a mãe pelo bebê, a estupidez dos

procedimentos obstétricos que só consideram o conforto e a segurança do

feto (como se a mãe e filho não fossem interdependentes), e a loucura

de uma posição moral que força as mulheres a ter filhos quando a primeira

necessidade de uma criança é ser querida”.

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5 ANENECEFALIA E O DIREITO

5.1 ANENCEFALIA

Anencefalia trata-se de uma anomalia diagnosticável, porém, não possui

nenhuma explicação plausível para justificar sua origem, sabendo-se, apenas, que o

feto não apresenta abóbada craniana e os hemisférios cerebrais ou não existem, ou

se apresentam como pequenas formações aderidas à base do crânio. Acontecida

entre o 16º e o 26º dia de gestação, na qual se verifica “ausência completa ou

parcial da calota craniana e dos tecidos que a ela se sobrepõem e grau

variado “de má formação e destruição dos esboços do cérebro exposto”.

Tessaro também traz uma definição interessante sobre a anencefalia,

definindo-a como “ausência dos hemisférios cerebrais e do crânio. Podendo ou não

ser acompanhada por espinha bífida e polidrânio, não se formam as partes

anteriores e centrais do cérebro”. Esta estrutura fetal é a percussora do Sistema

Nervoso Central, é uma má-formação congênita.

O defeito do fechamento ocorre por volta do 24º dia após a concepção do

feto, já que é nesta época que o tecido formado por células fetais, que se

apresentava até então em uma forma plana, começam a formar um tecido que se

imaginava forma pregas, e começa a fechar-se completamente, formando uma

estrutura tubular.

Para o conselho federal de medicina é um natimorto cerebral o feto

anencefalo.

O diagnóstico da anencefalia pode ser realizado, através do “screening” da

alfa feto proteína materna e a ultra-sonografia.

Para evitar a anencefalia, há uns 10 anos atrás informou o professor Jerôme

Lejeune que as gestantes destes fetos tinham baixa taxa de ácido fólico no sangue,

e então propôs que estas o tomassem antes da vinda da próxima gravidez. Feito

esta experiência no norte da Europa foi-se reduzida um terço da anencefalia,

deixando em evidência que se basta um simples tratamento e não uma abolição à

nova vida.

5.2 NOÇÕES GERAIS SOBRE ADPF

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A Argüição de Descumprimento de Preceito Legal foi criada com a função de

proteger os direitos fundamentais dos cidadãos, violados pelo poder público,

previstos no texto constitucional, tendo em vista que a própria Constituição tem por

sua característica principal a defesa desses direitos. Trata-se de típica ação que

exsurge do novo paradigma instituído pelo Estado Democrático de Direito, que tem

como pilares básicos à defesa dos direitos fundamentais e a democracia.

Dispõe o art.102, § 1º da Constituição que a argüição de descumprimento de

preceito fundamental será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma de lei.

Essa ação que é uma norma de eficácia limitada, ou seja, depende de edição

de lei, já se encontra integrante de nosso controle concentrado de

constitucionalidade, no entanto, somente teve regulamentação com o advento da Lei

9.882/99 que estabelece a forma de aplicação deste dispositivo aprovado apenas 11

anos após a promulgação da Carta.

Ademais, diz a Lei 9.882/99, em seu artigo 10, § 3º que a decisão final da

argüição terá eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais

órgãos do Poder Público.

5.3 ADPF Nº 54

A Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54, ajuizada

pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), em 17 de junho

de 2004, perante o STF, teve seu pedido de liminar deferido em julho pelo relator. A

CNTS pede que seja dada interpretação conforme a Constituição Federal aos

artigos 124, 126 e 128, I e II, do Código Penal, que tratam do crime de aborto, a fim

de permitir a interrupção da gravidez de filhos anencéfalos.

A Confederação justifica o pedido com base nos princípios constitucionais da

dignidade da pessoa humana, da legalidade, liberdade e autonomia da vontade,

bem como o direito à saúde.

Contudo, o STF revogou, por 7 votos a 4, a liminar concedida pelo Ministro

Marco Aurélio á CNTS.

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5.4 ANÁLISES JURISPRUDENCIAIS

Apesar de toda polêmica, os tribunais têm se mostrado a favor do aborto de

feto anencéfalo, e concedendo liminares autorizando a interrupção deste tipo de

gravidez, como foi no caso do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, nos dizeres

do desembargador Marcel Esquivel Hoppe:

A mulher, em casos de gravidez de anencéfalos, não carrega a vida, mas a morte, por inviabilidade do feto. [...] Entendo quer não se pode prolongar ainda mais sofrimento tão intenso e profundo que gera sério risco para a saúde mental da apelante quando possível solucionar-se a questão de pronto. (REVISTA ELETRONICA CONSULTOR JURÍDICO, 2005, p. 01)

Decisão favorável também foi a da Justiça de Goiás, no qual o juiz Jesseir

Coelho de Alcântara da 13ª Vara Criminal decidiu em favor de Antônia Alessandra

Vieira, grávida de 22 semanas.

Nesse caso, o juiz esclareceu que preferiu julgar o caso tendo em vista a

realidade do país, no qual se tem uma grande quantidade de abortos clandestinos,

explanando que:

É sabido que o direito à vida, abrangendo as vidas uterinas, assegurado pelo art. 5º da CF é inviolável. Todavia, esse elementar direito não se apresenta absoluto, admitindo exceções conforme prescreve o art. 128 e seus incisos do Código Penal. Tenho assim, que a situação requer a adaptação do ordenamento jurídico à evolução do tempo e às avançadas técnicas que auxiliam a medicina. (REVISTA ELETRONICA CONSULTOR JURÍDICO, 2005, p. 01)

A Justiça de Minas Gerais também decidiu em favor da interrupção da

gravidez e caso de feto anencefálico, se apoiando no laudo médico que disse ser o

quadro do feto “extremamente grave e incompatível com a vida”, passando decidir o

desembargador Relator Francisco Kupidlowski que:

O fato de não haver previsão legal para a concessão do aborto em casos de anencefalia não impede que o Judiciário autorize a interrupção da gravidez, porque aí deve ser levada em consideração, também, a dignidade da pessoa humana, no caso a mãe, porque o feto anencéfalo pode trazer complicações à mesma, não se podendo exigir que ela carregue, por nove meses, um feto quem não sobreviverá. (REVISTA ELETRONICA CONSULTOR JURÍDICO, 2005, p. 01)

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5.5. FUNDAMENTOS JURÍDICOS A FAVOR DO ABORTO DO FETO

ANENCEFÁLICO

Os fundamentos jurídicos a favor do aborto do feto anencefálico são muito

bem sintetizados e expostos por LUÍS ROBERTO BARROSO nos seguintes pontos:

“(I) dignidade da pessoa humana – analogia à tortura; (II) legalidade, liberdade e

autonomia da vontade e (III) direito à saúde”.

A violação à dignidade da pessoa humana, princípio fundamental da

República Federativa do Brasil (artigo 1°, III, da Constituição da República),

consistiria no fato de se impor à mulher que leve adiante a gestação de um feto que

certamente morrerá, causando-lhe dor, angústia e frustração. Haveria potencial

ameaça à integridade física (pelos fatores de risco da gravidez de feto anencéfalo) e

à integridade psíquica (pela convivência com a mórbida perspectiva do nascituro),

sendo certo que “a convivência diuturna com a triste realidade e a lembrança

ininterrupta do feto dentro de seu corpo, que nunca poderá se tornar um ser vivo,

podem ser comparadas à tortura psicológica", ao passo que o artigo 5°, III, da

Constituição da República veda qualquer forma de tortura.

A legalidade, liberdade e autonomia da vontade formam um argumento

monolítico como a legalidade, sob o ponto de vista do particular, implica na

admissão de fazer tudo o que não seja proibido em lei e como a proibição do aborto

do anencéfalo "não é a ordem jurídica vigente no Brasil, mas outro tipo de

consideração" deve ser respeitada a liberdade de escolha e a autonomia da vontade

da gestante.

Daí a apresentação pelo constitucionalista carioca de uma ponderação na

qual, realmente, não há como não se reconhecer a primazia dos interesses da

gestante, nada impede que se opte por colocar a questão em termos de ponderação

de bens ou valores contrapostos de um lado os direitos fundamentais da mãe e, de

outro, a convicção religiosa ou filosófica que defenda a obrigatoriedade de levar a

termo a gravidez, mesmo em se tratando de feto inviável.

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E percebendo que a válvula de escape da tensão argumentativa de sua

proposta de "ponderação" não mostra consistência, o professor arremata:

"A ponderação, no entanto, é técnica de decisão que se utiliza quando há colisão de princípios ou de direitos fundamentais, funcionando como uma alternativa à técnica tradicional da subsunção. Não se vislumbra colisão no caso aqui estudado, mas sim uma situação de não subsunção ao Código Penal, vale dizer, de atipicidade da conduta.".

Curioso notar que precisamente esta última colocação tangenciou o ponto no

qual o Supremo Tribunal Federal se basearia para revogar a liminar concedida pelo

Ministro Marco Aurélio, o fato de se estar criando, por via reflexa, uma nova hipótese

de exclusão do crime de aborto (o que, vale notar, traz logicamente implícita a

rejeição, pelo STF, do argumento de que a anencefalia geraria risco à vida da

gestante).

O direito à saúde da gestante seria resguardado pelo aborto do feto

anencéfalo pelos mesmos motivos pelos quais se argumentou que haveria violação

à sua dignidade pessoal, a lesão à integridade física e psíquica. Como o conceito de

saúde formulado pela Organização Mundial da Saúde engloba o completo bem-estar

físico, mental e social, negar à gestante o aborto do feto anencéfalo implicaria em

negar-lhe o acesso à saúde.

Em resumo, toda a argumentação jurídica em prol do aborto do feto

anencéfalo se baseia na premissa de que o anencéfalo não é (e nunca será)

pessoa, desta forma, não há quem rivalize com os interesses da gestante e, postos

em interesses da gestante em situação isolada, recorre-se facilmente a todos os

fundamentos do bem-estar individual para justificar o aborto.

Cabe observar que a posição de LUÍS ROBERTO BARROSO está longe ser

isolada, apenas para citar um exemplo significativo, MIGUEL KFOURI NETO, um

reconhecido especialista na responsabilidade civil médica, foi o primeiro juiz a

autorizar o aborto de feto anencefálico, em Londrina – PR, além de constatar-se,

com alguma freqüência, a concessão de salvo-condutos para abortos de fetos

anencefálicos.

Em 16 de agosto de 2004, apoiando a iniciativa de que participou o

constitucionalista carioca, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil

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se manifestou publicamente sobre o tema, aprovando por maioria de votos, o

relatório e voto do Conselheiro Federal ARX TOURINHO.

O voto reúne de modo muito interessante aspectos médicos, jurídicos e

sociológicos ligados ao tema, razão pela qual, sem embargo da eventual

discordância com o resultado, vale a pena reproduzir breve trecho:

A asserção do clássico Nélson Hungria, a respeito da gravidez extra-uterina e

da gravidez molar, pode, perfeitamente, ser aplicada à hipótese do feto anencefálico:

"O feto expulso (para que se caracterize aborto) deve ser produto fisiológico, e não patalógico. Se a gravidez se apresenta como um processo verdadeiramente mórbido, de modo a não permitir sequer uma intervenção cirúrgica que pudesse salvar a vida do feto, não há falar-se em aborto, para cuja existência é necessária a presumida possibilidade de continuação da vida do feto" ( Comentários ao código penal, Forense ).

Do ponto de vista médico, o feto anencefálico é uma patologia e como

patologia deve ser tratada. Como diz a professora Débora Diniz, pesquisadora do

Núcleo de Estudos e Pesquisas em Bioética da Universidade de Brasília:

"A ausência dos hemisférios cerebrais, ou no linguajar comum, a ausência de cérebro, torna o feto anencéfalo a representação do subumano por excelência. Os subumanos são aqueles que, segundo o sentido dicionarizado do termo, se encontram aquém do nível humano. Ou, aqueles não aptos a compartilharem da humanitude, a cultura dos seres humanos", (Aborto seletivo no Brasil e os alvarás judiciais).

A Justiça não pode olvidar essa realidade. Não se trata de interrupção de

gravidez em razão de eugenia, seletividade ou de sentimentalismo, mas, sim, de

circunstância indiscutível de que o feto não terá sobrevida, porque o feto é

subhumano ou inumano. Não se deve olvidar das palavras de Giovanni Berlinguer

"O aborto é o desfecho trágico de um conflito em que estão envolvidos de um lado

um ser em formação, do outro as aspirações e necessidades de uma mulher"

(Bioética cotidiana, Editora UNB, tradução de Lavínia Porciúncula, 2004). Ora, se

não há, em realidade, ser em formação, de um lado, e aspirações e necessidades

de uma mulher, de outro lado, não há desfecho trágico, não há, portanto, aborto.

Expele-se um ser malformado. Expele-se uma patologia.

Efetivamente, o princípio da dignidade da pessoa humana é básico na

interpretação da ordem normativa e serve de luzeiro para desvendar caminhos, que

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alguns não vêem ou teimam em não vê-los, sob o enfoque de concepções que,

contraditoriamente, negam o mencionado princípio. À gestante de um feto

anencefálico basta que se lhe conceda a eficácia do princípio da dignidade da

pessoa humana. E, para assim agir, basta que se lhe reconheça o direito de

interrupção terapêutica de uma gravidez, marcada pela patologia, que constrange e

perturba a ciência e os homens.

As ações e a liminar, aqui referidas, em verdade, estão a proteger mulheres

desprovidas de recursos financeiros, mulheres pobres, que necessitam ir a juízo,

pleiteando alvará autorizador, porque vão utilizar-se dos serviços públicos de saúde.

Aquelas que têm condições financeiras sabem qual clínica ou qual médico devem

procurar, para a prática interruptiva da gravidez. Não seja a sociedade hipócrita,

nem sejam os opositores da liminar ingênuos...Em respeito à dignidade da pessoa

humana, que a UNIVALE possa interpor pelo direito da gestante interromper,

sempre que assim desejar, uma gravidez, onde em gestação se ache um feto

anencefálico, porque o Direito não é, nem pode, ser estático, não é, nem pode, ser

contemplativo de uma realidade que passou, ignorando os avanços da ciência.

Mais uma vez, nota-se que a premissa central da argumentação é a

desconstituição do caráter humano do feto anencéfalo. Este aspecto merece

especial realce: o anencéfalo é tratado não como um ser humano doente, mas, ele

mesmo, como a própria doença ou como um "sub-humano". O que causa maior

perplexidade ao observador é a circunstância de que esta criticável visão médica é

tomada como "indiscutível" por leigos em medicina! Não pode passar despercebida,

também, a curiosa perspectiva emancipatória da mulher, no caso do voto referido

acima, da mulher pobre. Desvirtua-se o debate moral em favor do velho mote

político de que as limitações de direitos são uma dominação social.

É interessante, para concluir o tópico, transcrever o excerto da decisão

monocrática do Ministro Marco Aurélio de Mello, na ocasião em que concedeu a

medida liminar, em termos mais suaves, mas calcados nos mesmos fundamentos.

Em questão está a dimensão humana que obstaculiza a possibilidade de se coisificar uma pessoa, usando-a como objeto. Conforme ressaltado na inicial, os valores em discussão revestem-se de importância única. A um só tempo, cuida-se do direito à saúde, do direito à liberdade em seu sentido maior, do direito à preservação da autonomia da vontade, da legalidade e, acima de tudo, da dignidade da pessoa humana. O determinismo biológico faz com que a mulher seja a portadora de uma nova vida, sobressaindo o

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sentimento maternal. São nove meses de acompanhamento, minuto a minuto, de avanços, predominando o amor. A alteração física, estética, é suplantada pela alegria de ter em seu interior a sublime gestação. As percepções se aguçam, elevando a sensibilidade. Este o quadro de uma gestação normal, que direciona a desfecho feliz, ao nascimento da criança. Pois bem, a natureza, entrementes, reserva surpresas, às vezes desagradáveis. Diante de uma deformação irreversível do feto, há de se lançar mão dos avanços médicos tecnológicos, postos à disposição da humanidade não para simples inserção, no dia-a-dia, de sentimentos mórbidos, mas, justamente, para fazê-los cessar. No caso da anencefalia, a ciência médica atua com margem de certeza igual a 100%. Dados merecedores da maior confiança evidenciam que fetos anencefálicos morrem no período intra-uterino em mais de 50% dos casos. Quando se chega ao final da gestação, a sobrevida é diminuta, não ultrapassando período que possa ser tido como razoável em foco. Daí o acolhimento do pleito formulado para, diante da relevância do pedido e do risco de manter-se com plena eficácia o ambiente de desencontros em pronunciamentos judiciais até aqui notados, ter-se não só o sobrestamento dos processos e decisões não transitadas em julgado, como também o reconhecimento do direito constitucional da gestante de submeter-se à operação terapêutica de parto de fetos anencefálicos, a partir de laudo médico atestando a deformidade, a anomalia que atingiu o feto. É como decido na espécie.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Muito se discute à respeito da possibilidade de aborto em caso de

anencefalia. Apesar de englobar diversas áreas, como penal, aspectos religiosos,

étnicos, morais e filosóficos, deve-se visar a dignidade da pessoa humana.

Grande problema de se manter uma gravidez nestas condições é o desgaste

sofrido pela mulher, tanto físico, como psicológico em levar adiante uma gravidez

que será sem sucesso. Dessa forma, deveria ser valorizado o direito à dignidade da

pessoa humana afim de cessar o inútil sofrimento, tanto da gestante, quanto dos que

a cercam.

Claro que pode haver casos da mulher ser contra o próprio aborto, e optar por

permanecer com a gravidez. Entretanto, essa deve ser uma escolha pessoal de

cada gestante.

A possibilidade de aborto deve ser encarada diante de ideais como: dignidade

da pessoa humana, princípio da legalidade, autonomia da vontade e o direito à

saúde.

Com base em tudo que foi exposto, pode-se inferir que o aborto é uma prática

que caminha junto com a humanidade no desenrolar de sua história, e que quanto

mais avançar a ciência, mais polêmica e complexa a problemática que a envolve.

Denota-se, ainda, que o Código Penal Brasileiro preceitua valores e

conceitos, muitas vezes já ultrapassados, pois seu texto ainda é praticamente o

mesmo desde 1940.

Também se atenta para o fato de que a sociedade modifica-se

constantemente e assim é impossível o Direito positivo prevê todas as situações e

problemas sociais hoje existentes. A questão sobre a qual versa o aborto

anencefálico é recente e o ordenamento jurídico do Brasil ainda não prevê.

Todavia muitas mulheres não desejam passar nove meses abrigando em seu

ventre um ser que enterrarão pouco tempo após o nascimento. Estas, por suas

vezes, vêem-se compelidas a suplicar ao Poder Judiciário por autorizações para

interromper a gestação quando diagnosticada que o feto é portador de anomalia

fetal. Mesmo não havendo uma norma a respeito, não como o Direito ignorá-la, até

porque, conforme os jurisprudências apontadas anteriormente observa-se que a

situação não é tão rara quanto se pensava.

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A tendência é que cada vez mais casos cheguem aos tribunais. Daí surge a

necessidade e a urgência de uma norma clara e objetiva, pois os magistrados

atualmente ficam a tatear na escuridão.

A questão, efetivamente, não é nada simples, pois de um lado há a

inviolabilidade da vida e do outro há a liberdade da mulher. Há que se considerar,

ainda, os riscos gerados por este tipo de gestação, o tormento psicológico vivido

pela mãe desde a descoberta do problema e, principalmente, o aspecto da sua

dignidade humana. Não há duvida de que o artigo 5º da Constituição Federal de

1988 assegura a inviolabilidade da vida, mas o direito não uma ciência estática e

não existe direito absoluto. Portanto, feliz foi o Pacto de São José da Costa Rica e a

redação do artigo 4º da Convenção Americana de Direitos Humanos que diz:

“ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente”. A interpretação desta lei,

claramente, cai como uma luva ao caso do aborto de portadores de anencefalia.

Sobretudo, sob a ótica global, a regulamentação e, por conseguinte, a

autorização do aborto por anencefalia é a prática atual dos países desenvolvidos.

Diferentemente do Brasil, aqueles já pacificaram a questão do aborto anencefálico e

concedem à mãe, em comum acordo com o genitor, se assim estes desejarem, o

direito de, nos casos de anencefalia, interromper a gravidez.

Deve-se ressaltar, outrossim, que, nas hipóteses em que a legislação pátria

autoriza a prática do aborto, o feto possui viáveis expectativas de vida, o que se

diferencia cabalmente do tema relativo à anencefalia onde, nesta última hipótese,

não resta qualquer esperança de vida ao produto da fecundação. Dessa arte, vê-se

uma diferenciação crucial das hipóteses recriminadas pela legislação nacional para

com a hipótese aventada neste trabalho concernente à anencefalia, qual seja, a

“expectativa de vida” do organismo humano em desenvolvimento, presente nas

hipótese elencadas na legislação penal repressiva; ausente, plenamente, na

anencefalia.

Uma vez que o Código Penal Brasileiro já prevê duas hipóteses de aborto

permitido, quais sejam, a da gravidez proveniente de estupro e a da gravidez em

que há risco à vida da gestante, sendo que nessas duas hipóteses, frise-se, o feto

possui expectativa de vida, nada mais plausível que a mesma legislação nacional vir

a prever, doravante, e com urgência, a interrupção de uma gestação de feto

anencefálico a qual, além de também gerar profundas consequências psíquicas

negativas à mãe, à semelhança do que ocorre na gravidez proveniente de estupro, e

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além de causar, também, danos potenciais à sua saúde, à semelhança do que

ocorre com a gravidez geradora de aborto terapêutico, contempla em seu

desenvolvimento produto de fecundação desprovido de qualquer expectativa de

vida.

Por fim, com o estudo que se realizou neste singelo trabalho, infere-se que a

autorização legal, e mesmo a judicial enquanto aquela não advier, do aborto de feto

anencefalo, além de obedecer a uma tendência mundial do Direito moderno,

também contempla aspectos lógicos e incontestáveis os quais, em seu conjunto,

elidem qualquer justificativa plausível para a manutenção de uma gravidez que, além

de inútil à proliferação e à manutenção da espécie humana, só vem a causar horror

e sofrimento desnecessário aquela mãe que, por seu instinto natural, almeja, tão-

somente, amar e educar seu filho durante se desenvolvimento.

Enfim, o direito não pode exigir heroísmo das pessoas, muito menos quando

ciente de que a vida do anencéfalo é impossível fora do útero materno. Sendo

assim, não justifica prorrogar a gestação e o sofrimento físico e psíquico da mãe que

tem garantido o direito a dignidade.

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