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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
LIBERTADORA, LIBERTÁRIA E CRÍTICO SOCIAL DOS
CONTEÚDOS - AS TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS
PROGRESSISTAS TRANSFORMADORAS NA ORIENTAÇÃO
EDUCACIONAL.
Por: Monnik Lodi Poubel
Orientador: Professora Flávia Cavalcanti
Niterói, Rio De Janeiro
2012
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
LIBERTADORA, LIBERTÁRIA E CRÍTICO SOCIAL DOS
CONTEÚDOS - AS TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS
PROGRESSISTAS TRANSFORMADORAS NA ORIENTAÇÃO
EDUCACIONAL.
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do grau
de especialista em Orientação Educacional e
Pedagógica
Por: Monnik Lodi Poubel
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos amigos e colegas da Pós-
Graduação AVM, com os quais estudei e
compartilhei importantes momentos de
estudo e troca de experiência e saberes,
aos professores com quem pude adquirir
o conhecimento necessário à produção
deste trabalho e aos meus parentes,
principalmente ao meu companheiro
César Mello, que teve paciência e me
apoiou nesse trabalho.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à minha mãe Cristina,
ao meu pai Walzer, que sempre me
apoiaram para a continuidade dos meus
estudos e ao meu companheiro César
Mello, que me apoiou em todos os
momentos, contribuindo de forma
fundamental para sua realização.
5
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 06
CAPÍTULO I - A Pedagogia Libertária e a Pedagogia Crítica 08
CAPÍTULO II - A Pedagogia Libertadora de Paulo Freire 17
CAPÍTULO III - O Orientador educacional e a educação libertadora 25
CONCLUSÃO 32
BIBLIOGRAFIA 35
ÍNDICE 35
6
INTRODUÇÃO
Este trabalho terá como tema as tendências pedagógicas progressistas e a
educação, com ênfase no trabalho de orientação educacional. A partir de um
breve estudo em torno das três principais tendências pedagógicas progressistas
– Libertadora, Libertária e crítico social dos conteúdos – será feita uma análise
acerca da atuação do orientador educacional no caso específico da Tendência
Libertadora, avaliando as dificuldades de se aplicar esta prática educativa.
O método utilizado será qualitativo. A base da pesquisa serão fontes
secundárias, concentrando-se principalmente nos teóricos da pedagogia e
naqueles que pensaram sobre questões relacionadas ao ensino e às suas
mudanças contemporâneas. O trabalho será feito basicamente a partir de livros,
artigos e sites que abordem o tema sob diferentes perspectivas e análises.
Existem muitos estudos acadêmicos sobre a educação progressista. É um
tema bastante comum e muito discutido no meio acadêmico. Porém, apesar de
difundido e defendido por muitos alunos e professores de pedagogia e outras
áreas da educação, a tendência progressista ainda encontra grande resistência
na prática escolar, tanto no que se refere aos alunos quanto aos pais e aos
próprios educadores. FREITAS (2008) chamou a atenção para o fato de termos
no Brasil uma das mais ricas produções científicas sobre educação em todo o
mundo. Apesar da riqueza teórica a maioria das escolas e educadores exerce
práticas educativas tradicionais. Essa resistência parte não somente dos pais e
alunos, mas muitas vezes dos próprios educadores, quando encontram grande
dificuldade na tentativa de aplicar métodos educacionais que fujam do padrão
tradicional.
LIBÂNEO (1990) destaca que as tendências pedagógicas liberais, ou seja,
a tradicional, a renovada e a tecnicista, por se declararem neutras, nunca
assumiram compromisso com as transformações da sociedade, embora, na
prática, sempre tivesse procurado legitimar a ordem econômica e social do
sistema capitalista.
7
A pedagogia liberal é, portanto, reprodutora da sociedade capitalista no
que se refere à competição, desigualdade sócio-econômica e concorrência.
Inexiste nessas tendências a perspectiva de mudança social em qualquer esfera.
Buscam, ao contrário, a manutenção das formas vigentes de organização da
sociedade.
Já as tendências pedagógicas progressistas, em oposição às liberais, têm
em comum a análise crítica do sistema capitalista e o princípio transformador da
sociedade. De base empirista, como afirma FREIRE (1996) e marxista, segundo
GRAMSCI (1982), essas tendências valorizam a produção do conhecimento pelo
aluno, a partir da sua realidade social, cultural e do seu conhecimento de mundo.
O primeiro capítulo deste trabalho irá traçar um panorama geral em torno
das tendências progressistas e pontuar as características específicas de cada
Tendência, chamando a atenção para seus pontos comuns e suas divergências.
Em relação aos pontos comuns entre a tendência libertadora e libertária vale
destacar, por exemplo, a defesa da autogestão pedagógica e o antiautoritarismo.
O segundo capítulo será um aprofundamento do estudo em torno do principal
teórico libertador, Paulo Freire e da ideologia que envolve a Tendência
Pedagógica Libertadora. O terceiro capítulo tem como objetivo fazer uma análise
mais específica da Tendência Libertadora, traçando um paralelo entre suas mais
importantes questões teóricas e a atuação do Orientador Educacional.
8
CAPÍTULO I
A Pedagogia Libertária e a Pedagogia Crítica
.As tendências pedagógicas progressistas podem ser vistas através de três
tendências: a libertária, a crítico-social dos conteúdos e a libertadora. De acordo
com LUCKESI (2007) a pedagogia progressista parte, de maneira geral, de uma
análise crítica das realidades sociais e tem como princípio fundamental mudar
esta realidade, estabelecendo uma nova relação hegemônica, construída a partir
dos interesses populares. Postulam a compreensão da educação a partir de seus
condicionantes sociais, enxergando os alunos como atores históricos
transformadores que fazem parte de determinado contexto social e que integram,
portanto, a sociedade. Sobre o potencial transformador da educação o autor
afirma:
(...) cabe entender a educação como um instrumento de luta. Luta para estabelecer uma nova relação hegemônica que permita constituir um novo bloco histórico sob a direção da classe fundamental dominada da sociedade capitalista – o proletariado. Destaca-se aqui a importância fundamental da educação. A forma de inserção da educação na luta hegemônica configura dois momentos simultâneos e organicamente articulados entre si: um momento negativo que consiste na crítica da concepção dominante (a ideologia burguesa); e um momento positivo que significa: trabalhar o senso comum de modo a extrair o seu núcleo válido (o bom senso) e dar-lhe expressão elaborada com vistas à formulação de uma concepção de mundo adequada aos interesses populares. 1
As três tendências pedagógicas progressistas têm, portanto, um ponto
básico em comum: partem do mesmo princípio transformador, valorizando o
social em detrimento do individual e trocando questões psicológicas pela busca
da mudança social. Apesar deste ponto em comum, existem princípios
específicos que norteiam cada uma das tendências e que este trabalho irá, a
partir de agora, tentar definir e compreender.
1.1 - A Pedagogia Libertária
1 Saviani, Educação: do senso comum à consciência filosófica, p.3
9
O pensamento pedagógico libertário critica as relações de poder presentes
no processo educativo e as estruturas que proporcionam as condições para que
estas relações se reproduzam. Um dos seus princípios centrais é a rejeição de
toda e qualquer forma de autoritarismo. Neste aspecto, a pedagogia libertária
oscila entre a não-diretividade e a aceitação de processos educacionais diretivos,
isto é, em que se manifestem formas de autoridade. O antiautoritarismo,
essencial à prática pedagógica libertária. A idéia chave subjacente a este
conceito é que não é possível combater o autoritarismo e a opressão presentes
no Estado, família e escola sem que, concomitantemente, se formem homens
livres; e, não se formam homens livres através de métodos autoritários e de
controle.
O questionamento do autoritarismo constitui, portanto ponto central do
pensamento pedagógico libertário. Isto significa recusar quaisquer procedimentos
que induzam à obediência cega às autoridades e expresse relações opressivas.
Na perspectiva bakuninista, trata-se de ensinar a liberdade, o que pressupõe, em
determinadas fases do processo educativo, a presença da autoridade. É ela que
educa para a liberdade2.
A Pedagogia Libertária defende um projeto de sociedade fundada na
autogestão presente na Associação Internacional dos Trabalhadores (a I
Internacional, fundada em 1864). A autogestão tanto pode ser assimilada numa
perspectiva não-diretiva quando diretiva. Segundo GALLO (1996):
O que diferencia as duas perspectivas de aplicação da autogestão pedagógica no contexto libertário é que enquanto a primeira toma a autogestão como um meio, a segunda a toma por um fim; em outras palavras, na tendência não-diretiva a autogestão é tomada como metodologia de ensino, enquanto que na diretiva ela é assumida como o objetivo da ação pedagógica ou ainda: educa-se pela liberdade ou para a liberdade. 3
2 Na concepção anarquista a liberdade não deve ser entendida no sentido burguês, individualista ou liberal. Aqui a liberdade é intrínseca à prática libertária, construída socialmente a partir de conquistas coletivas e lutas sociais. 3 Embora a autogestão seja um dos elementos centrais da Pedagogia Libertária, esta não é a única a levá-la em conta. Como esclarece GALLO (1996): “Ao ser anti-autoritária por definição, a educação anarquista sempre teve na autogestão pedagógica seu foco central, implícita ou explicitamente. Não foi apenas o anarquismo, porém, que assumiu a tendência autogestionária na educação; a autogestão cabe a múltiplas interpretações políticas, do anarquismo mais radical até o liberalismo laissez-faire mais reacionário. Assim, muitas tendências pedagógicas acabaram por assumir práticas total ou parcialmente ligadas ao princípio da autogestão, seja de forma consciente, seja na sutil inocência - ou ignorância - que tudo permite. A autogestão se faz presente pois desde o "escolanovismo" mais liberal, da pedagogia institucional até as técnicas de Freinet.
10
Os princípios da autogestão e educação integral nortearam as
experiências pedagógicas libertárias. A Pedagogia Libertária tem na autogestão
um de seus princípio primordiais, enfatizando que no processo educacional, os
recursos devem ser controlados e administrados por aqueles que estão
diretamente envolvidos e pela comunidade. Isto significa superar a dicotomia
Estado/Sociedade e colocar a educação sob controle da sociedade e da
comunidade. Em relação à educação integral os educadores libertários não
recusam a ciência e o saber especializado, mas advogam que o processo
educativo deve se concentrar na formação plena (dimensões física, intelectual e
moral), que não separe o saber do saber fazer, isto é, que não se fundamente na
divisão entre ação e pensamento (trabalho braçal e intelectual).
Os primeiros representantes desta pedagogia no Brasil foram os
trabalhadores imigrantes — principalmente italianos, espanhóis e portugueses —
que, em fins do século XIX, chegavam ao Brasil para trabalhar nas lavouras de
café, em substituição à mão-de-obra escrava. Posteriormente, estes imigrantes
constituíram uma parcela importante do nascente proletariado urbano brasileiro. 4
O processo educativo pedagógico centra-se no educando, com pleno respeito
aos estágios do seu desenvolvimento e o estímulo para que ele tome o próprio
destino em suas mãos. O educando não é tratado como objeto (meio), mas
enquanto sujeito e fim em si mesmo.
Nas primeiras décadas do século XX, os sindicatos operários tomaram
para si a tarefa de criar os espaços necessários para o desenvolvimento desta
pedagogia crítica às instituições formais, à educação oficial, laica ou religiosa.
Estes espaços alternativos são os centros de estudos sociais, as escolas
modernas, as escolas operárias, a universidade popular, onde se desenvolvem
experiências fundadas na Pedagogia Libertária, no sentido de formar um novo
homem e forjar uma nova sociedade.
A Pedagogia Libertária está, portanto, associada ao movimento operário,
às primeiras organizações dos trabalhadores, à ação anarquista e anarco-
4 Observe-se, no entanto, a tendência persistente presente na historiografia sobre o movimento operário brasileiro em omitir a questão racial, reproduzindo uma concepção branca e eurocêntrica, ao não pesquisar ou a atenuar a presença negra nos movimentos políticos do início do século XX.
11
sindicalista contra o Estado, a Igreja e o capitalismo. Sua difusão se dá através
da imprensa operária e da ação direta dos libertários. A partir dos anos 20, o
ideário comunista, fortalecido pela vitória da Revolução Russa, passa a disputar a
hegemonia com os libertários e, pouco a pouco, se imporá enquanto interlocutor
dos trabalhadores frente às classes dirigentes.
A ascensão do movimento comunista, aliado à criação de uma legislação
sindical e legalização dos sindicatos durante o governo Vargas, reduz
drasticamente a influência do pensamento libertário no movimento operário
brasileiro. Evidentemente, a Pedagogia Libertária sofrerá os efeitos desta nova
realidade. Neste caso, devemos considerar ainda que, do ponto de vista
estritamente pedagógico, esta corrente teve que enfrentar, de um lado, a
Pedagogia Tradicional (associada às aspirações dos intelectuais ligadas às
oligarquias dirigentes e à Igreja); e, por outro lado, a Pedagogia Nova (expressão
das mudanças econômicas, políticas e sociais, isto é, a urbanização,
industrialização e fortalecimento das classes médias e da burguesia, que
buscavam modernizar o Estado e a sociedade brasileira).
De qualquer maneira, a Pedagogia Libertária sobrevive enquanto projeto
social, presente nas iniciativas vinculadas às lutas sociais, centros de cultura,
vida acadêmica e apresentando, na sua práxis, características comuns que
possibilitam identificar a ideologia e os princípios que norteiam a atuação do
educador libertário.
1.2 - Crítico- social dos conteúdos: A Pedagogia Crítica
A pedagogia crítica ressoa com a sensibilidade do símbolo hebraico tikkun, que significa curar, consertar e transformar o mundo; todo o resto é comentário. Ela fornece a direção histórica, cultural, política e ética para aqueles que ainda ousam acreditar na educação.5
Giroux (1999) situa as origens da Pedagogia Crítica nos idos de 1976,
quando Samuel Bowles e Herbert Gintis publicaram seu inovador Schooling in
Capitalist Society. Pode-se dizer que esse livro, juntamente com algumas obras
de sociologia da educação, constituiu a base de uma nova ideologia que foi além
5 Mclaren, A Vida nas Escolas: Uma introdução à pedagogia crítica nos fundamentos da educação, p 192.
12
da tradição “revolucionária” de Dewey6. O autor observa que no início a maior
parte do trabalho dedicou-se à teoria da reprodução, predominando o discurso
marxista, inspirado na Escola de Frankfurt. A partir daí Giroux analisa suas
implicações para o desenvolvimento da Pedagogia Crítica e analisa que os
autores frankfurtianos oferecem aportes importantes aos educadores críticos às
concepções fundadas na racionalidade positivista:
A Escola de Frankfurt oferece uma análise histórica, bem como um arcabouço teórico penetrantes que condenam a cultura do positivismo em seu sentido mais amplo, enquanto, ao mesmo tempo, fornecem “insight” sobre como aquela cultura torna-se incorporada dentro do “ethos” e das práticas escolares. Embora haja um crescente volume de literatura educacional que é crítica à racionalidade positivistas nas escolas, falta-lhes a sutileza teórica do trabalho de Horkheimer, Adorno e Marcuse. 7
GIROUX assinala, ainda, que a teoria crítica propicia um terreno
epistemológico valioso sobre o qual se pode desenvolver formas de crítica que
esclareçam a interação do social e do pessoal, de um lado, bem como da história
e da experiência particular, de outro. A importância desta dimensão da
consciência histórica permite que se desenvolva um novo tipo de conhecimento
que leve em conta a dialética das relações entre a cultura dominante e a
dominada, isto é, que permita aos oprimidos e deserdados apropriarem-se das
dimensões mais progressistas de suas próprias histórias culturais e também
como reestruturar e apropriar-se dos aspectos mais radicais da cultura burguesa.
Trata-se de uma concepção crítica que, apesar de valorizar os conteúdos
e defender que eles são imprescindíveis, não restringe o conhecimento a si, isto
é, o saber não é ingênuo, não está “dado”, mas deve ser contextualizado e ter um
sentido na direção de transformar a sociedade. O conhecimento dado expressa e
é legitimado por interesses inscritos nas relações sociais amplas. Libâneo (1990)
expõe essa concepção de com muita clareza:
A difusão de conteúdos é a tarefa primordial. Não conteúdos abstratos, mas vivos, concretos e, portanto, indissociáveis das realidades sociais. A valorização da escola como instrumento de apropriação do saber é o melhor serviço que se presta aos interesses populares, já que a própria escola pode
6 Dewey pode ser classificado como um teórico da Escola Nova, que apesar de apresentar propostas humanistas e inovadoras na educação, se enquadra numa concepção de liberdade burguesa, valorizando questões individuais e psicológicas em detrimento da transformação social, característica das correntes libertadora, libertária e crítico-social dos conteúdos. 7 Giroux. Pedagogia Radical: subsídios, p. 24.
13
contribuir para eliminar a seletividade social e torná-la democrática. Se a escola é parte integrante do todo social, agir dentro dela é também agir no rumo da transformação da sociedade. Se o que define uma pedagogia crítica é a consciência de seus condicionantes histórico-sociais, a função da pedagogia "dos conteúdos" é dar um passo à frente no papel transformador da escola, mas a partir das condições existentes. Assim, a condição para que a escola sirva aos interesses populares é garantir a todos um bom ensino, isto é, a apropriação dos conteúdos escolares básicos que tenham ressonância na vida" dos átimos.8
Segundo MC LAREN (1997) conhecer se vincula a poder. Nesta perspectiva
a autor chama a atenção para o fato de que o poder é concebido de maneira
dialética: com potencialidades negativas, mas também positivas. Desse modo,
para a Pedagogia Crítica as relações sociais no locus da escola e da sociedade
em geral não expressam apenas a dominação, mas também possibilidade de
resistência e de ação contra-hegemônica. Por isso, o papel dos professores
enquanto intelectuais públicos e transformadores é fundamental.
A Pedagogia Crítica recusa a tese de que o conhecimento e a escola são
neutros e que, portanto, os professores devem ter uma atitude neutra. Não existe
neutralidade na educação e todo ato educacional é uma escolha política
carregada de ideologias e intenções.
A escola é um processo político, não apenas porque contém uma mensagem política ou trata de tópicos políticos de ocasião, mas também porque é produzida e situada em um complexo de relações políticas e sociais das quais não pode ser abstraída. 9
Ainda sobre a questão, pode-se sublinhar os dizeres de Paulo Freire (1979):
Não há nem jamais houve prática educativa em espaço-tempo nenhum de tal maneira neutra, comprometida apenas com idéias preponderantemente abstratas e intocáveis. Insistir nisso e convencer ou tentar convencer os incautos de que essa é a verdade é uma prática política indiscutível com que se pretende amaciar a possível rebeldia dos injustiçados. Tão política quanto a outra, a que não esconde, pelo contrário, proclama, sua politicidade.10
Vale sublinhar a importância de Paulo Freire para a Pedagogia crítico-social
dos conteúdos. Embora vinculada à obra de educadores ingleses e americanos, a
sua base teórica é fortemente influenciada pela Pedagogia Libertadora de Paulo 8 Libâneo, Democratização da Escola Pública, p. 29 9 Giroux. Pedagogia Radical: subsídios, p. 88. 10 Freire, Educação e Mudança, p. 78
14
Freire11. A Pedagógica Crítica não constitui um corpo homogêneo de autores e
idéias. É mais correto dizer que os teóricos críticos estão unidos em seus
objetivos comuns: fortalecer aqueles sem poder e transformar desigualdades e
injustiças sociais existentes.
Esses objetivos unem idéias em torno da prática educacional, que se
relacionam com um projeto político e social. Uma idéia que vale frizar diz respeito
à valorização dos conteúdos de forma contextualizada. Para a Pedagogia Crítica
o conhecimento e a consciência são os instrumentos para se alcançar mobilidade
social. Para tal, a educação precisa oferecer um conteúdo que possibilite ao
aluno entender a sua realidade e se enxergar como agente histórico
transformador.
A escola e o processo de aprendizagem devem, portanto considerar os
contextos históricos, os vínculos e relações com a sociedade mais ampla, assim
como os interesses políticos, econômicos e culturais. Levando isto em conta,
pode-se enxergar com mais clareza a amplitude da educação. Esta não se
manifesta e se desenvolve apenas nas instituições formais, as escolas. A
sociedade também educa e deve assumir este compromisso. Trata-se, assim, de
valorizar o capital cultural dos estudantes, seus conhecimentos e experiências – o
educador crítico reconhece a necessidade de conferir poder aos estudantes.
Com idéias opostas, a concepção tradicional da educação vê os professores
como técnicos e transmissores de conteúdos, executores de planos de ensino,
leis e projetos definidos pelos políticos. Centrada no método e na técnica, essa
pedagogia tem como foco modelar e adequar o aluno de acordo com a sociedade
que a elite deseja manter. É, de qualquer forma, uma escolha política que tem
como finalidade a manutenção da sociedade tal como está e em tais condições,
os professores terminam por legitimar e reproduzir o status quo.
Como se pode perceber, A Pedagogia Crítica tem princípios e ideologias
completamente contrárias à tradicional, em todas as esferas de sua teoria.
Enfatiza a conexão entre valores e fatos; e, concebe a escola como locus não
apenas voltado à instrução. Trata-se de politizar a pedagogia:
11 É importante deixar claro que Paulo Freire é o grande defensor e a maior referência da pedagogia libertadora, tendo apenas exercido influência sobre algumas idéias que constituem a Pedagogia Crítica.
15
Tornar o político mais pedagógico significa utilizar formas de pedagogia que incorporem interesses políticos que tenham natureza emancipadora; isto é, utilizar formas de pedagogia que tratem os estudantes como agentes críticos; tornar o conhecimento problemático; utilizar o diálogo crítico e afirmativo; e argumentar em prol de um mundo qualitativamente melhor para todas as pessoas. 12
Neste contexto, os professores desempenham, queiram ou não, um papel
pedagógico-político. Não há espaço para a neutralidade: esta se constitui em
engodo. O mesmo professor que reproduz os valores da cultura dominante e
contribui para manter a sua hegemonia, pode desempenhar um papel
transformador e contra-hegemônico. Como salienta Mclaren, no prefácio à obra
de Giroux:
Sem duvida, o professor como intelectual transformador deve estar comprometido com o seguinte: ensino como prática emancipadora; criação de escolas como esferas públicas democráticas, restauração de uma comunidade de valores progressistas compartilhados; e fomentação de um discurso público comum ligado aos imperativos democráticos de igualdade e justiça social13.
A Pedagogia Crítica é, portanto, uma pedagogia engajada, responsável
diante dos dilemas sociais. Ela examina as escolas nos seus contextos históricos
e também como parte do tecido social e político existente que caracteriza a
sociedade dominante, incorporando as experiências de vida dos oprimidos, suas
histórias e valores.
Em oposição às vertentes liberais e tradicionais a Pedagogia Crítica recusa
a tese de que a escola é uma instituição neutra, que transmite conhecimentos
imparciais capazes de instruir e elevar o nível cultural dos estudantes, gerando
possibilidades iguais. A importância dessas teorias reside no fato delas
desmistificarem a pretensa função equalizadora da escolarização, isolada da
sociedade global, com suas contradições e de mostrarem que a principal função
do sistema de ensino é reproduzir os fundamentos da sociedade desigual e
injusta, contribuindo desta maneira para a perpetuação do status quo.
12 Freire, Educação e Mudança, p. 163 13 Giroux, Pedagogia Radical: subsídios, XVIII
16
CAPÍTULO II
A Pedagogia Libertadora
Como vimos no capítulo I as tendências libertária e crítico-social possuem
algumas características semelhantes, principalmente no que diz respeito à
superação das pedagogias liberal, tradicional e renovada com objetivo de efetivar
a participação dos alunos em lutas sociais, respectivamente.
A Pedagogia Libertadora também se apresenta como um contraponto em
relação às posturas liberais, tradicional e renovada, vistas como domesticadoras,
principalmente, no sentido da transformação social (Luckesi, 2005). Segundo
Libâneo (1994), é uma corrente que tem como um de seus princípios enxergar a
educação como uma forma de atuação política que busca a transformação da
sociedade.
. Em nenhum momento o inspirador e mentor da pedagogia libertadora, Paulo Freire, deixa de mencionar o caráter essencialmente político de sua pedagogia, o que, segundo suas próprias palavras, impede que ela seja posta em prática, em termos sistemáticos, nas instituições oficiais, antes da transformação da sociedade. 14
A Pedagogia Libertadora busca, portanto, a superação das injustiças
sociais e a transformação através da educação e da conscientização das classes
populares. Em alguns aspectos apresenta semelhanças com as outras
tendências progressistas, em outros, especificidades, que serão analisadas e
interpretadas neste capítulo, que se concentrará apenas no estudo da tendência
libertadora.
2.1 – O Método Paulo Freire
Paulo Freire é responsável pela criação de um método conhecido como
Método Paulo Freire, que revolucionou as idéias em torno da educação,
colocando em prática um projeto de alfabetização de adultos. Ele criou um
método de ensino inovador e problematizador, que será a base da Educação
14 Libâneo, Democratização da Escola Pública, p. 22
17
Popular. Antes de ater-se a esse método, vale elucidar o uso da expressão
‘método’. Para FREIRE (1987):
O método é, na verdade, a forma exterior e materializada em atos, que assume a propriedade fundamental da consciência: a sua intencionalidade. O próprio da consciência é estar no mundo e este procedimento é permanente e irrecusável. Portanto, a consciência é, em sua essência, um ‘caminho para’ algo que não é ela, que está fora dela, que a circunda e que ela apreende por sua capacidade ideativa. Por definição, a consciência é, pois, método, entendido este no seu sentido de máxima generalidade. Tal é a raiz do método, assim como tal é essência da consciência, que só existe enquanto faculdade abstrata e metódica. 15
O método de alfabetização de Paulo Freire não consiste no simples ato de
aprender a ler e reescrever o que se lê de forma mecânica. Para FREIRE (1979)
mais importante do que reescrever o que se lê é descobrir a conexão entre o
texto e o contexto do texto, e também vincular o texto à realidade do leitor, tendo
sempre um viés político, um projeto de sociedade. Para se ler, não basta apenas
verbalizar os fonemas ou conformar signos e significados. É preciso que exista
relação entre o texto e a vida cotidiana daquele que o apreende. É preciso, ao se
ler um texto, relacioná-lo com o mundo.
Contradizendo os métodos de alfabetização puramente mecânicos, projetávamos levar a termo uma alfabetização direta, ligada realmente à democratização da cultura e que servisse de introdução; ou, melhor dizendo, uma experiência susceptível de tornar compatíveis sua existência de trabalhador e o material que lhe era oferecido para aprendizagem. Verdadeiramente, só uma paciência muito grande é capaz de suportar, depois das dificuldades de uma jornada de trabalho, as lições que citam a “asa”: “Pedro viu a asa”; “A asa é do pássaro”; ou as que falam de “Eva e as uvas” a homens que, com freqüência, sabem pouquíssimo sobre Eva e jamais comeram uvas.16
Aprender a ler não significa apenas aprender a ler a palavra, mas também
consiste em ler o mundo e compreendê-lo. A leitura do mundo precede a leitura
da palavra, existe antes dela. E a leitura do texto só tem sentido quando
associada ao mundo e quando se alcança uma leitura crítica. Isso implica
percepção das relações entre o texto e o contexto.
A importância desse método está, portanto no fato da alfabetização não se
deter na mera alfabetização tradicional, baseada no uso da cartilha – que ele 15 Freire. Pedagogia do Oprimido, p. 56. 16 Freire. Conscientização: teoria e prática da libertação: uma introdução ao pensamento de Paulo Freire, p. 22.
18
rejeita categoricamente no aprendizado da leitura e da escrita. O educador
defende e incentiva o posicionamento do adulto não alfabetizado no meio social e
político em que ele vive, ou seja, no seu contexto real. Defende o papel ativo do
educando na criação e construção do conhecimento.
Pensávamos numa alfabetização que fosse ao mesmo tempo um ato de criação, capaz de gerar outros atos cria-dores; uma alfabetização na qual o homem, que não é passivo nem objeto, desenvolvesse a atividade e a viva-cidade da invenção e da reinvenção, características dos estados de procura (...) Procurávamos uma metodologia que fosse um instrumento do educando, e não somente do educador, e que identificasse – como fazia notar acertadamente um sociólogo brasileiro – o conteúdo da aprendizagem com o processo mesmo de aprender. 17
Assim, tendo como base do seu estudo a alfabetização de adultos, Paulo
Freire acredita que o letrado pode transcender a simples esfera do conhecimento
de regras, métodos e linguagens, e ser então inserido na esfera sócio-econômica
e política da qual fora excluído. Daí a importância de se partir da realidade do
educando para que ele possa, a partir da construção do seu conhecimento formar
uma consciência crítica.
Aprender é um ato de conhecimento da realidade concreta, isto é da situação real vivida pelo educando, e só tem sentido se resulta de uma aproximação crítica dessa realidade. O que é aprendido não decorre de uma imposição ou memorização, mas do nível crítico de conhecimento, ao qual se chega pelo processo de compreensão, reflexão e crítica. O que o educando transfere, em termos de conhecimento, é o que foi incorporado como resposta às situações de opressão – ou seja, seu engajamento na militância política. 18
A Pedagogia Libertadora defende, portanto que é possível acordar a
consciência do aluno para que ele seja capaz de exercer seu papel de cidadão e
se habilitar a revolucionar a sociedade. Tendo como princípio a idéia que o aluno
é um sujeito social e histórico Freire (1996) enfatiza a importância de se respeitar
o conhecimento que ele traz para a escola e de se entender que formar é muito
mais do que puramente treinar o educando no desempenho de destrezas. Educar
é um ato político e como tal pressupõe um projeto de sociedade.
17 Freire. Conscientização: teoria e prática da libertação: uma introdução ao pensamento de Paulo Freire, p. 22. 18 Libâneo, Democratização da escola pública, p. 24.
19
2.2 – O caráter político e o contexto social na prática educacional
libertadora
Para Paulo Freire as questões e os problemas relacionados à educação não
são questões simplesmente pedagógicas e todo processo educacional é um ato
político, não havendo educação neutra Envolve relações de poder e questões
diversas relacionadas à política, economia e sociedade. Ou seja, a educação
parte de um contexto concreto.
Para Freire esse contexto vincula-se à realidade social, econômica e
cultural vivenciado pelos grupos sociais inseridos no processo. O autor procura
mostrar o papel da educação para a conscientização desses grupos e
conseqüente construção de uma sociedade democrática. Os oprimidos aparecem
aqui como os agentes históricos transformadores, que reconhecendo seu papel
no mundo e, tornado-se conscientes da sua realidade, tornam-se capazes de
transformá-la.
Nesse sentido LIBÂNEO (1994) destaca que uma marca significativa da
Pedagogia Libertadora é a atuação não-formal, não sendo característica dessa
tendência falar em ensino escolar:
. Em nenhum momento o inspirador e mentor da pedagogia libertadora, Paulo Freire, deixa de mencionar o caráter essencialmente político de sua pedagogia, o que, segundo suas próprias palavras, impede que ela seja posta em prática, em termos sistemáticos, nas instituições oficiais, antes da transformação da sociedade. Daí porque sua atuação se dê mais a nível da educação extra-escolar.19
Dessa forma, a Pedagogia Libertadora apresenta uma postura crítica em
relação às tendências tradicionais, vistas como domesticadoras, principalmente,
no que se refere à manutenção do status quo. A Pedagogia Libertadora é, ao
contrário, essencialmente política no sentido de libertar os sujeitos da opressão e
de, através da conscientização das classes populares buscar a superação das
injustiças sociais e a transformação da realidade.
Assim, quando se fala na educação em geral, diz-se que ela é uma atividade onde professores e alunos, mediatizados pela realidade que apreendem e da qual extraem o conteúdo de aprendizagem, atingem um nível de consciência dessa mesma realidade, a fim de nela atuarem, num sentido de transformação social. Tanto a educação tradicional, denominada "bancária" -
19 Libâneo, Democratização da escola pública, p. 22
20
que visa apenas depositar informações sobre o aluno -, quanto a educação renovada - que pretenderia uma libertação psicológica individual - são domesticadoras, pois em nada contribuem para desvelar a realidade social de opressão. A educação libertadora, ao contrário, questiona concretamente a realidade das relações do homem com a natureza e com os outros homens, visando a uma transformação – daí ser uma educação crítica. 20
Segundo esta abordagem não existe senão homens concretos, situados
no tempo e no espaço, inseridos num contexto histórico – social, econômico,
cultural e político. E para a Pedagogia Libertadora a educação só tem sentido se
levar em conta, além das potencialidades e vocações individuais dos educandos,
as condições nas quais eles vivem. E mais do que considera-las cabe ao
educador fornecer ferramentas para que o educando tome consciência da sua
realidade e da sua condição de oprimido. Afinal, quanto mais o Homem reflete
sobre o ambiente concreto, ou seja,a realidade na qual se insere, mais se torna
progressiva e gradual sua consciência crítica e comprometimento com a
realidade, para intervir e mudar o mundo. Em outras palavras, o homem é um ser
da práxis, compreendida por Freire como ação e reflexão dos sujeitos sobre o
mundo, com o objetivo de transformá-lo.
A conscientização é, neste sentido, um teste de realidade. Quanto mais conscientização, mais se “desvela” a realidade, mais se penetra na essência fenomênica do objeto, frente ao qual nos encontramos para analisá-lo. Por esta mesma razão, a conscientização não consiste em “estar frente à realidade” assumindo uma posição falsamente intelectual. A conscientização não pode existir fora da “práxis”, ou melhor, sem o ato ação – reflexão. Esta unidade dialética constitui, de maneira permanente, o modo de ser ou de transformar o mundo que caracteriza os homens. 21
2.3 – A relação professor-aluno na Pedagogia Libertadora
A relação professor aluno é uma discussão pontual e de extrema
importância para a teoria libertadora. Em primeiro lugar FREIRE (1996) irá
destacar o respeito ao aluno e aos seus saberes como uma das atitudes éticas
que todo educador deve ter. Como já foi apontado anteriormente o educando
chega na escola com conhecimentos sobre a vida e a sociedade, que dependem
do meio social de onde ele vem. O professor tem como compromisso respeitar e
considerar esses saberes, trabalhando os conteúdos a partir deles,
20 Freire. Pedagogia do Oprimido, p. 33. 21 Freire. Conscientização: teoria e prática da libertação: uma introdução ao pensamento de Paulo Freire, p.15.
21
estabelecendo relações e contribuindo para que ele construa uma nova visão
desse mundo.
Por isso mesmo pensar certo coloca ao professor ou, mais amplamente à escola, o dever de não só respeitar os saberes com que os educandos, sobretudo os das classes populares, chegam a ela, saberes socialmente construídos na prática comunitária – mas também, como há mais de trinta anos venho sugerindo – discutir com os alunos as razões de ser desses saberes em relação com o ensino do conteúdo.22
A forma como os conteúdos devem ser trabalhados é primordial para a
Pedagogia Libertadora. Tem como proposta questionar a realidade das relações
sociais e políticas através de temas geradores e não de conteúdos
sistematizados Os métodos aplicados em sala de aula convergem para grupos de
discussão. A estes grupos cabem autogerir seu processo de aprendizagem,
determinando o conteúdo e a dinâmica das atividades.
Libâneo resume essas idéias, esclarecendo que para a Pedagogia
Libertadora os conteúdos não devem ser transmitidos. Devem sim ser
construídos a partir do cotidiano e do conhecimento prévio do aluno.
Denominados "temas geradores", são extraídos da problematização da prática de vida dos educandos. Os conteúdos tradicionais são recusados porque cada pessoa, cada grupo envolvidos na ação pedagógica dispõem em si próprios, ainda que de forma rudimentar, dos conteúdos necessários dos quais se parte. O importante não é a transmissão de conteúdos específicos, mas despertar uma nova forma da relação com a experiência vivida. A transmissão de conteúdos estruturados a partir de fora é considerada como "invasão cultural" ou "depósito de informação", porque não emerge do saber popular. Se forem necessários textos de leitura; estes deverão ser redigidos pelos próprios educandos com a orientação do educador. 23
É valido ainda destacar as idéias de GUEDES (2008). Assim como Paulo
Freire o autor defende a importância de se atribuir sentido ao aprendizado, O
primeiro ponto, que já foi colocado anteriormente, seria a capacidade do
professor de contextualizar o conteúdo trabalhado de acordo com a realidade
sócio-cultural do educando e o segundo ponto diz respeito à postura do educador
22 Freire. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa, p 15. 23 Libâneo. Democratização da escola pública, p. 22.
22
diante do processo de ensino-aprendizagem, ou seja, o seu caráter não
autoritário e de liberdade.
O aprender é um processo de significação do sujeito, isto é, o processo precisa ser exercido com liberdade, com desejo, e não por imposição. A troca, base da educação não pode ser imposta, quando as trocas são impostas a relação é de opressão. A relação de parceria e a libertação dão lugar à imposição, opressão e à tensão (...) Nas relações movidas pelo reconhecimento à alteridade, nesses processos educacionais, teremos a possibilidade de construir o saber e a aprendizagem significativa, com trocas vivenciadas e não por oposições sociais ou pessoais. Assim, esta relação, pelo menos a que se propõe aqui, implicará a Aprendizagem Significativa – o sujeito dando significado próprio ao que foi aprendido e, ainda, realizando trocas de significados. 24
Outro aspecto tratado por Nilson Guedes relacionado a essa questão diz
respeito à diferença entre ensino e educação. No ensino acontece a transmissão
de informações, na educação estimula-se a interação e a troca de significações.
Dentro do sistema econômico atual, o neoliberalismo, as escolas visam
exclusivamente o ensino, que têm como base o treinamento e como objetivo
qualificar para a competição do mercado de trabalho. Essa educação foi definida
por Paulo Freire (1987) como “bancária”, opondo-se à educação
problematizadora. Enquanto uma visa à regulação para o controle a outra visa à
estruturação para a libertação. Uma, tem como concepção a passividade e a
apatia; a outra, a ação e a inquietude para pensar, questionar, perguntar e
construir a si e ao seu conhecimento. Citando Paulo Freire, Gadotti (1988) define
da seguinte maneira essas duas vertentes para a educação:
Na concepção bancária (burguesa), o educador é o que sabe, os educandos os que não sabem; o educador é o que pensa e os educandos os pensados; o educador é o que diz a palavra e os educandos os que escutam docilmente, o educador é o que opta e prescreve sua opção e os educandos os que seguem a prescrição; o educador escolhe o conteúdo programático e os educando jamais são ouvidos nessa escolha e se acomodam a ela (...) A educação bancária tem por finalidade manter a divisão entre os que sabem e os que não sabem, entre oprimidos e opressores. Ela nega a dialogicidade,
24 Freitas. Pedagogia do Amor, p. 20
23
ao passo que a educação problematizadora funda-se justamente na relação dialógica – dialética entre educador e educando: ambos aprendem juntos. 25
O ensino bancário prioriza a transmissão de conhecimento a partir de uma
relação vertical, onde o professor é o detentor do conhecimento e tem o papel de
transferir esse conhecimento para o aluno, que recebe as informações de forma
passiva. Para Freire essa educação contribui para a deformação da criatividade
do aluno e do professor. Na educação libertadora acontece o contrário. O
professor deve não apenas transmitir conteúdos, mas também levantar questões
que estimulem o senso crítico, a formação do pensamento próprio, deve ensinar
a pensar, a criticar o que lê, a pesquisar e a ser curioso.
A relação entre professor e aluno seria, portanto, uma troca onde o
professor, ao ensinar também aprende com o aluno. Para Freire ensinar não é
transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção. O
professor deixa de ter o mero papel de transmissor de conteúdos, estabelecendo
uma relação que se opõe ao autoritarismo presente no ensino tradicional. A
relação entre docente e discente deve ser horizontal (de igual para igual,
dispensando a hierarquia e a relação de poder), dialógica e anti-autoritária.
O processo de aprendizagem na Pedagogia Libertadora é baseado na
resolução de situações problemáticas do cotidiano. Dispensam-se programas
educacionais previamente estruturados, trabalhos escritos, aulas expositivas e
provas, por exemplo. No que se refere à avaliação admite-se a avaliação
subjetiva baseada nas práticas vivenciadas ao longo do processo de educação
(Luckesi, 2005). É uma proposta antiautoritária, onde professores e alunos,
engajados num diálogo permanente ensinam e aprendem juntos.
25 Gadotti, Pensamento Pedagógico Brasileiro, p. 29.
24
CAPÍTULO III
A educação libertadora e o orientador educacional
Depois de estudar e avaliar as três tendências pedagógicas progressistas
iremos por fim analisar a atuação e a prática do orientador educacional, tendo
como base a perspectiva libertadora. Esse capítulo tem, portanto, como objetivo
central analisar, a partir de questões teóricas, a prática do orientador educacional
na escola, apontado os desafios e limitações dessa ação dentro do quadro da
pedagogia libertadora.
Para se chegar a essa análise é importante, em primeiro lugar, esclarecer
pontos relacionados à função e à história da orientação educacional. Para tanto,
será traçado uma panorama em torno de temas como: o campo de atuação da
Orientação Educacional, e a sua relação com a teoria e a prática, além de um
levantamento do histórico dessa profissão.
3.1. História da orientação educacional
É imprescindível para esse trabalho traçar um breve panorama da História
da Orientação, a fim de compreender melhor o que é o trabalho do orientador e
como este se constituiu e evoluiu ao longo do tempo, além de ser uma forma de
enxergar com mais clareza seus desafios e limitações no passado e na
atualidade.
Grinspun (2002) relata a origem da Orientação Educacional, a qual se
iniciou com a Orientação Vocacional, nos Estados Unidos, em 1908, com um
caráter de aconselhador que marca toda sua trajetória. Movimentos da época
teriam feito eclodir tal prática no mundo todo, como os movimentos em prol da
psicometria, da revolução industrial, da saúde mental e das novas tendências
pedagógicas.
No Brasil, segundo Grinspun (2002), a Orientação Educacional teve início
em 1924, no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo, também com a função de
25
Orientação Vocacional. Já Nérici (1976) acredita que a primeira tentativa de
Orientação Educacional no Brasil deve-se à Lourenço Filho, que quando diretor
do Departamento de Educação do Estado de São Paulo, criou o “Serviço de
Orientação Profissional e Educacional”, em 1931, o qual tinha como maior
objetivo, guiar o indivíduo na escolha de seu lugar social pela profissão.
Somente com as Leis Orgânicas de 1942, do ministro de Getúlio Vargas,
Gustavo Capanema, que pela primeira vez se encontraram referências explicitas
à Orientação Educacional. Sua função teria caráter corretivo e direcionado para o
atendimento dos alunos problemas. Outra função seria a de velar para que os
estudos e descanso do aluno ocorressem de acordo com as normas pedagógicas
mais adequadas. Também teria o papel de esclarecer possíveis dúvidas dos
alunos e orientar seus estudos para que sozinhos buscassem sua
profissionalização. A profissão também seria regulamentada, tendo o Orientador
Educacional que fazer um curso próprio de Orientação Educacional. (Grinspun,
2002).
Nesse período o curso principal da Orientação Educacional era no ensino
técnico, com a formação de uma mão-de-obra especializada e qualificada,
assumindo caráter terapêutico, preventivo, psicometrista, identificando aptidões,
dons e inclinações dos indivíduos.
Na Lei de Diretrizes e Bases da educação nº. 4024 de 1961, previa-se que
o ensino normal deveria se encarregar da formação de Orientadores
Educacionais para o primário, assim como prevê que as faculdades de Filosofia
formariam esse profissional para o atendimento do Ensino Médio. Segundo
Grinspun (2002) a referida lei fala mais sobre a formação do Orientador
Educacional do que sobre o conceito da função deste profissional. Vale ressaltar
também que nesta lei, a Orientação Educacional aparece com a função de
contribuir para a formação integral da personalidade do adolescente, para seu
ajustamento pessoal e social. Suas principais áreas de abrangência seriam as
orientações escolar, psicológica, profissional, da saúde, recreativa e
familiar.Pode-se observar aí o quanto está presente uma perspectiva liberal de
educação.
A partir da década de 1980, o orientador vai deixando as funções de
atender alunos-problema, de psicólogo e facilitador de aprendizagem e vai com o
tempo ostentando com mais autoridade técnica seu compromisso político com e
26
na escola. A produção acadêmica na área da Orientação vai sendo ampliada
numa dimensão mais crítica e questionadora; assim como os orientadores
adotam uma função política comprometida com as causas sociais (Grinspun,
2002). Começa a existir questionamentos e críticas no campo teórico, o
orientador passa a pensar e discutir sobre sua profissão, seu papel na educação
e a forjar mudanças conceituais em relação à função e atuação da Orientação
Educacional.
3.2. A orientação educacional na atualidade
Segundo GRINSPUN (2002) o cenário da orientação sofreu grandes
modificações e possui, atualmente, papel mediador junto aos demais educadores
da escola, buscando assim uma educação de qualidade.
Da ênfase ao individual de antes, passa-se, agora, a reforçar o aspecto
coletivo, sem deixar de levar em conta que este é formado por pessoas com
pensamentos e contextos sociais diferentes que as levam a pensar de maneira
própria sobre as questões que lhes cercam.
Essas mudanças começam a surgir no início da década de 1990,
passando a educação e a orientação a andarem juntas, valendo destacar que ela
passa a defender características da Pedagogia libertadora, caminhando para uma
educação que valoriza o coletivo e o meio social do educando, a formação plena
de cidadãos críticos e conscientes.
O principal papel da Orientação será ajudar o aluno na formação de uma cidadania crítica, e a escola, na organização e realização de seu projeto pedagógico. Isso significa ajudar nosso aluno por inteiro: com utopias, desejos e paixões. (...) a Orientação trabalha na escola em favor da cidadania, não criando um serviço de orientação para atender aos excluídos (...), mas para entendê-lo, através das relações que ocorrem (...) na instituição Escola. 26
A Orientação de hoje precisa lidar com o real e suas perspectivas. Ela é
parte integrante da educação e como tal deve pensar nas dimensões sociais,
culturais, políticas e econômicas na qual ela acontece. Por esse motivo, devem-
se definir as tarefas de um orientador engajado com as transformações sociais e
com o momento histórico no qual está inserido. 26 Grinspun. A orientação educacional: conflito de paradigmas e alternativas para a escola, p.29
27
3.3. O orientador educacional na prática escolar hoje: uma
perspectiva libertadora
(...) a Orientação Educacional hoje, em termos de teoria e prática. da educação, posiciona-se como uma prática político-pedagógica que procura respostas para as perguntas: Por que e para quê faço Educação? 27
Levando em conta que a Orientação Educacional caminha ao lado da
educação, é importante traçar um quadro sob a perspectiva teórico-prática a qual
a educação é submetida. Sobre isso Grinspun (2002) descreve como cada
tendência da pedagogia, levando em conta seu tempo e de seus ideais, acabou
definindo a prática educativa do Orientador dentro do âmbito da escola:
Educação tradicional: para os autores a Orientação se caracteriza como
terapêutica e psicológica destinada aos alunos-problema;
Educação tecnicista: para esta linha teórica a Orientação tem o papel de
identificar as aptidões dos alunos para um determinado mercado de trabalho;
Educação construtivista: os teóricos deste pensamento afirmam que a função
da Orientação está relacionada a promover meios para a aquisição do
conhecimento por parte do aluno
Educação renovada progressista: para os autores desta linha teórica, o
Orientador deve auxiliar o desenvolvimento cognitivo de seus alunos;
Educação não-diretiva: para estes teóricos a Orientação está relacionada a
afetividade, tendo nesse momento a função de facilitadora de mudanças;
Educação libertária: os teóricos desta perspectiva acreditam que o Orientador
possui o papel de assessorar o professor na medida em que era um catalisador
do grupo junto aos alunos;
Educação crítico-social dos conteúdos: os autores desta linha teórica indicam
que a Orientação serve como um caminho de preparação do aluno para o mundo
adulto;
Educação libertadora: os autores desta teoria afirmam que a Orientação possui
o papel de captar o mundo real dos alunos, sendo que estes devem ser
percebidos como indivíduos históricos, concretos e reais;
27 A orientação educacional: conflito de paradigmas e alternativas para a escola, p. 46.
28
A evolução do estudo teórico e da prática da Orientação Educacional
certamente sofreu e sofre influências das principais tendências pedagógicas, que
variam de acordo o contexto sócio-político e com questões ideológicas. Afinal,
como já foi posto, a educação nunca é neutra e tem relação com uma proposta
de sociedade, reproduzindo questões políticas e ideológicas.
Considerando essas questões, iremos nos concentrar na atuação do
Orientador educacional hoje a partir de uma perspectiva libertadora, apontado a
sua evolução teórica-prática e o progresso pelo qual a Orientação Educacional
passou, além das dificuldades e desafios enfrentados pelos profissionais da área
que tentam implementar uma prática educacional norteada pelos princípios da
pedagogia libertadora.
Durante um longo período da educação no Brasil a escola teve como
função ensinar o aluno que, por sua vez, tinha o papel de aprender. Apesar de
todos os estudos e propostas inovadoras essa prática é muito comum ainda hoje,
inclusive nas escolas que têm uma proposta teórica progressista, mas que na
prática atuam de forma tradicional.
Seguindo essa prática acontece o seguinte: se no processo educacional
os objetivos traçados são insatisfatórios, ao invés de buscar identificar suas
falhas e compreender o aluno e os possíveis motivos do seu desinteresse, a
escola transfere toca a culpa do seu fracasso para o educando, o rotula como
incapaz, problemático, portador de dificuldade, “malandro”.
Sendo a causa do fracasso de inteira responsabilidade do aluno, é ele que
precisaria de “ajuda”, ou seja, de um acompanhamento para resolver seu
problema, para adaptá-lo, torna-lo adequado para o padrão da escola. Nesse
encaixe é que aparece a função do Orientador, tendo esse profissional apenas a
função de ajudar o aluno a se encaixar no sistema.
Conforme GRINSPUN (2002), o trabalho do Orientador Educacional não
deveria ser reduzido apenas a diagnosticar os alunos com dificuldade de
aprendizagem, e sim refletir sobre soluções que minimizem o fracasso escolar. E
para tanto, a construção do Projeto Político Pedagógico se faz importante. O
papel do Orientador estaria muito mais relacionado a promover reflexões na
escola a respeito de seus alunos e professores, das suas relações, dos
problemas encontrados na escola e no seu entorno (comunidade), do currículo e
29
dos objetivos encontrados no Projeto Pedagógico que, muitas vezes, não são
nem do conhecimento dos que dela participam.
O Orientador é aquele que discute as questões da cultura escolar promovendo meios/estratégias para que sua realidade não se cristalize em verdades intransponíveis, mas se articule com prováveis verdades vividas no dia-a-dia da organização escolar. 28
Na concepção progressista a educação não acontece exclusivamente na
escola, estando presente também fora das instituições oficiais, como por
exemplo, nos meios de comunicação. Nesse contexto, o aluno passa a ser
sujeito, fazendo sua história e participando de forma ativa da sua formação.
... e a Orientação Educacional passa a ter uma amplitude de ações nessa prática pedagógica, sendo um profissional que respeita o senso comum, aprecia o conhecimento científico, e está ciente de que seu exercício só é possível porque existe uma teoria que lhe permite desenvolver sua proposta pedagógica. 29 Outra questão de grande importância diz respeito ao cotidiano escolar. Nele
está implícita a cultura escolar, a cultura que cada um carrega, a linguagem que é
usada pelo indivíduo, seus costumes, e todas as outras ações e mediações que
explícita ou implicitamente são contempladas pelo espaço que ocupamos em
nosso cotidiano. Desprovido de qualquer tipo de preconceito o orientador que
busca praticar uma pedagogia libertadora tem como compromisso ético
compreender e avaliar todos esses aspectos para, a partir deles traçar seu plano
de ação e projeto transformador.
Quanto mais procuro compreender os mecanismos da prática social que se configuram pelo cotidiano escolar, melhores condições tenho para analisar as rotinas e rupturas que ocorrem nesse interior. (...) O cotidiano escolar me desvela tudo aquilo que ocorre nesse contexto, como forma de traduzir, de efetivar as práticas sociais que são do domínio de todos e que são colocadas em processo no dia-a-dia da escola. 30
28 A orientação educacional: conflito de paradigmas e alternativas para a escola, p. 112 29 A orientação educacional: conflito de paradigmas e alternativas para a escola, p. 48 30 A orientação educacional: conflito de paradigmas e alternativas para a escola, p. 54.
30
CONCLUSÃO
O Orientador Educacional deve procurar se envolver com a comunidade, resgatando sua realidade socioeconômico-cultural como meio de contribuir para a adequação curricular, tendo em vista a transformação da escola e da sociedade. (...) A Orientação deve trabalhar com um planejamento participativo, sempre voltado para uma concepção crítica. Um diálogo entre as comunidades das disciplinas teóricas e das disciplinas práticas permitirá a busca dessa concepção crítica31
A citação de Grinspun resume os principais pontos que caracterizam um
trabalho de Orientação Educacional sob uma perspectiva libertadora. A autora
utiliza nessa citação conceitos-base para o Orientador Educacional “libertador”,
imprescindíveis para compreendermos melhor como seria a sua atuação e quais
são os desafios enfrentados pelo profissional na realidade que se configura.
Mais uma vez Grinspun destaca que a Orientação Educacional está
diretamente ligada aos acontecimentos do dia-a-dia, pois a ela se conectam
fatores que ocorrem na escola ou na família e que refletem nos estudos ou no
comportamento dos alunos, o que, quando estudado, tem relação com os
princípios da educação freireana.
O orientador faz a análise, junto com todos os protagonistas desse cotidiano, para que se tenha, tanto quanto possível, uma visão mais objetiva do que ocorre nesse dia-a-dia. Se a Orientação deve estar compromissada com o projeto político-pedagógico da escola, a forma de melhor atuar nele, garantindo a qualidade, é conhecer sua cotidianidade. 32
Portanto, implementar um projeto libertador por parte do profissional de
Orientação depende da sua sensibilidade em relação às questões do cotidiano,
do trabalho coletivo, da formação consistente desse profissional e da
aproximação verdadeira entre a escola e a realidade do aluno.
Para que haja a construção de uma escola democrática deve haver um
projeto coletivo, que requer ação coordenada e participação de todos nela
31A orientação educacional: conflito de paradigmas e alternativas para a escola, p. 109. 32 A orientação educacional: conflito de paradigmas e alternativas para a escola, p.55.
31
envolvidos, nunca deixando de considerar os fatores daquela realidade. Nessa
escola deve existir, a partir daí, uma discussão sobre as finalidades da educação,
a atuação do professor, as metodologias (Grinspun, 2002). Como em Freire, é
uma escola que está longe da neutralidade e que carrega um ideal político
transformador e de formação de cidadãos conscientes.
E quando há compromisso com a formação da cidadania a escola amplia o
papel de transmissora de saberes, passando a ter comprometimento com ações
planejadas que contribuam para a apropriação crítica do conhecimento e o
desenvolvimento do educando em todas as suas potencialidades (Porto, 2008).
Vasconcellos destaca que esse profissional deve ultrapassar questões
técnicas e funcionais, estar atento à realidade para, a partir dela identificar os
temas geradores do grupo, organizá-los e devolver como um desafio para o
coletivo Esse profissional precisa ter um projeto assumido conscientemente e,
pautado nele, ser capaz de despertar e mobilizar as pessoas para a
transformação. Não é um trabalho simples e como destaca Vasconcellos exige
um nível de abstração e complexidade.
Os especialistas devem se especializar em mudança! Sabemos que estes processos são extremamente complexos, uma vez que envolvem concepções, desejos, medos, decisão, avaliação, planos de ação, relações de poder, disponibilidade de recursos, caldo de cultura, relações interpessoais, teoria, necessidades, imaginário, narrativas, memória, condições de trabalho, etc” Todavia, é preciso ter pessoas altamente qualificadas neste âmbito a fim de ajudar na coordenação da travessia, não como o iluminado, o dono da verdade, mas naquela perspectiva que apontamos de intelectual orgânico. (...) Há necessidade de pessoas que se dediquem a refletir sobre os próprios processos de mudança, buscar tanto socializar as tentativas localizadas como tirar princípios que possam orientar as práticas de intervenção objetivando mudança. 33
A grande dificuldade atual enfrentado pelo orientador educacional que
deseja uma prática libertadora está na dicotomia entre teoria e prática. Fala-se
muito em educação progressista e, na maior parte das escolas vê-se a aplicação
de métodos tradicionais. Como sugere Porto (2008) ainda privilegia-se uma
educação tradicional, onde os conteúdos são transmitidos sem se levar em conta
as especificidades culturais e sociais, visando a formação para o mercado e
reproduzindo o ideal individualista e classificatório da sociedade capitalista.
33 Vasconcellos. Coordenação do trabalho pedagógico, p. 71.
32
Partindo desse pressuposto pode-se concluir que há um abismo entre o pensar e
o fazer.
O projeto vigente, ainda, é o que privilegia o conhecimento científico como acúmulo de informações e o da educação como reprodutora de desigualdades sociais e econômicas; portanto, os métodos de fixação e repetição, a disciplinaridade, como objetivo e preocupação predominante nas relações entre a escola e o aluno, o individualismo e a avaliação como instrumento de classificação são os meios mais adequados para que a instituição-escola cumpra seu papel na manutenção do status quo. 34
O grande desafio é, portanto conseguir levar a teoria para a prática real,
buscar aproximação entre o discurso e a prática, coerência entre as intenções da
escola e a metodologia para realizá-la. Sobre o assunto Candau coloca três
premissas:
(...) a primeira é que a teoria depende da prática, uma vez que esta determina o horizonte do desenvolvimento e o progresso do conhecimento; a segunda é que a teoria tem como finalidade a prática, no sentido de uma antecipação ideal de uma prática que não existe; e a terceira é o fato de que a unidade entre a teoria e a prática pressupõe necessariamente a percepção da prática como atividade objetiva e transformadora da realidade natural e social. 35
De acordo com Candau a teoria depende da prática e não tem sentido se
não partir dela. Da mesma forma, para a Pedagogia Libertadora a educação só
tem sentido quando parte da realidade, ou seja, da prática.
Avaliando todo o quadro teórico traçado em torno da atuação do orientador
educacional, pode-se destacar que para o seu trabalho ser verdadeiramente
libertador é imprescindível conseguir vencer na prática as barreiras de uma
educação tradicional/ tecnicista e implementar um projeto educacional que antes
de tudo parta da realidade e do cotidiano do educando.
Para tanto pode-se concluir que o orientador educacional libertador precisa
ser um sujeito crítico e sensível, capaz de e entender a subjetividade e a
complexidade do ser humano e do seu contexto sócio-cultural para criar, a partir
daí, alternativas que lutem por uma educação democrática. Uma educação
dialógica e horizontal que prioriza o coletivo em detrimento do individual; a
transformação em detrimento da reprodução e massificação dos sujeitos para a
34 Porto. Orientação Educacional: Teoria, prática e ação, p.106 35 Apud Grinspun, 2002, p. 34
33
mercado de trabalho; a formação de um cidadão crítico e livre, capaz de formar
seu próprio pensamento e de fazer suas escolhas pessoais.
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ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
SUMÀRIO 5
INTRODUÇÃO 6
CAPÍTULO I
A Pedagogia Libertária e a Pedagogia Crítica 8
1.1 - A Pedagogia Libertária 9
1.2 - Crítico- social dos conteúdos: A Pedagogia Crítica 11
CAPÍTULO II
A Pedagogia Libertadora
2.1 - O Método Paulo Freire 16
2.2 - O caráter político e o contexto social na prática Educacional libertadora 19
2.3 - A relação professor-aluno na Pedagogia Libertadora 20
CAPÌTULO III
A educação libertadora e o orientador educacional 24
3.1 - História da orientação educacional 24
3.2 - A orientação educacional na atualidade 26 3.3 - O orientador educacional na prática 27
escolar hoje: uma perspectiva libertadora
CONCLUSÃO 30
BIBLIOGRAFIA 33
ÍNDICE 35