UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA · identificar as categorias centrais: a documentação...

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PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ CURSO DE PEDAGOGIA ROBERTA ROECKER REGISTRO E DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA: Refletindo as Práticas São José 2011

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PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ

FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ

CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ

CURSO DE PEDAGOGIA

ROBERTA ROECKER

REGISTRO E DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA:

Refletindo as Práticas

São José

2011

PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ

FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ

CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ

CURSO DE PEDAGOGIA

ROBERTA ROECKER

REGISTRO E DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA:

Refletindo as Práticas

Trabalho elaborado para a disciplina de Conclusão de Curso (TCCII) do Curso de Pedagogia, como requisito parcial para curso de graduação em Pedagogia do Centro Universitário Municipal de São José- USJ. Orientadora: Profa. MSc. Arlete de Costa Pereira

São José

2011

ROBERTA ROECKER

REGISTRO E DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA:

Refletindo As Práticas

Trabalho de Conclusão de Curso elaborado como requisito parcial para obtenção do grau de licenciado em Pedagogia do Centro Universitário Municipal de São José – USJ avaliado pela seguinte banca examinadora:

BANCA EXAMINADORA

________________________________________________________ Profª. Msc. Arlete de Costa Pereira

Orientadora- USJ

_________________________________________________________ Profª. Msc. Moema Helena Koche de Albuquerque Kiehn

Examinadora –FAED/ UDESC

____________________________________________________

Profª. Msc. Roberta Schnorr Buehring Membro Examinador - USJ

São José, 21 de novembro de 2011

Dedico este trabalho ao meu marido Daniel

e ao meu filho Arthur pelo apoio e dedicação incondicional que me deram

durante este percurso.

AGRADECIMENTOS

A Deus, por ter me concedido o potencial de concretizar esse trabalho.

Aos meus pais, Fredolino Roecker e Dilza Rogéria Brüggemann Roecker, meus

primeiros educadores e grandes incentivadores na vida. Está conquista é, também,

de vocês.

As minhas irmãs, Rejane, Renata, Rafaela e Roseana Roecker pelo apoio e auxílio

durante todo o percurso da graduação.

Ao meu esposo Daniel e ao meu filho Arthur por serem constante alegria em minha

vida.

As amigas Fernanda Gesser, Jennifer Tâmara Linhague, Juliana Campos Calazans

Ribeiro e Vanderleia Pandini. Ao amigo Eduardo Tasca, pelo convívio quase diário.

A vocês agradeço a amizade e parceria reafirmada a cada passo.

A minha orientadora, Arlete de Costa Pereira, professora e amiga por compartilhar

os desafios e conquistas durante esta pesquisa.

As professoras e Instituições por colaborarem para que esta pesquisa fosse

realizada.

As professoras Moema Helena Koche de Albuquerque Kiehn e Roberta Schnorr

Buehring por aceitarem o convite em participar da banca examinadora.

Escrever deixa marca, registra pensamento, sonho, desejo de morte e vida. Escrever dá

muito trabalho, porque organiza e articula pensamento na busca de conhecer o outro, a

si, o mundo.

Madalena Freire

RESUMO

O presente trabalho refere-se a uma pesquisa de campo junto às professoras que atuam na Educação Infantil da Rede Municipal de São José e buscou investigar a existência ou não das práticas de registro e documentação pedagógica e se estas práticas são utilizadas como instrumentos de reflexão e replanejamento na atuação docente. A coleta dos dados foi realizada a partir de questionários respondidos pelas professoras participantes da pesquisa. Com base nesses dados buscou-se compreender a relação que estas professoras têm com a documentação pedagógica e o registro. Com os resultados obtidos por meio da análise do conteúdo ancorados nas teorias dos autores: Freire (1996), Ostetto (2001; 2008), Dahlberg, Moss e Pence (2003), Gandini e Goldhaber (2002), Kinney e Wharton (2009), pode-se identificar as categorias centrais: a documentação pedagógica na educação infantil, a observação e o registro como dimensões reflexivas da prática, o registro do vivido e as formas de registro e documentação. Concluindo-se que a prática do registro e da documentação pedagógica são ferramentas relevantes na reflexão da prática docente e a aceitação dessas ações incentiva mudanças na atuação docente. Palavras-Chave: Educação Infantil. Registro. Documentação Pedagógica. Professoras.

LISTAS DE ILUSTRAÇÕES

GRÁFICOS

Gráfico 1 – Faixa Etária das Professoras Participantes da Pesquisa......................... 28 Gráfico 2 – Tempo de Formação das Professoras Participantes da Pesquisa........... 28 Gráfico 3 – Tempo de atuação na Educação.............................................................. 29 Gráfico 4 – Presença de registro e documentação pedagógica nas práticas das professoras..................................................................................................................

29

Gráfico 5 – Participação das professoras pesquisadas em formação continuada..... 31 Gráfico 6 – Temáticas abordadas com mais frequência em formação continuada.... 31 Gráfico 7 – Experiência com registro e documentação pedagógica durante a formação.....................................................................................................................

32

Gráfico 8 – Entendimento sobre registro e documentação pedagógica..................... 32 Gráfico 9 – Forma de utilização do registro pelas professoras pesquisadas.............. 34 Gráfico 10 – A prática do registro auxilia no trabalho docente................................... 36 Gráfico 11 – Forma que o registro auxilia no trabalho docente.................................. 37 Gráfico 12 – Frequência que os registros são realizados........................................... 39 Gráfico 13 – Local e horário de realização do registro............................................... 40

QUADROS

Quadro 1 – CEIs Pesquisados................................................................................ 18

LISTAS DE ABREVIATURAS

USJ – Centro Universitário Municipal de São José

CEI – Centro de Educação Infantil

NDI – Núcleo de Desenvolvimento Infantil

SUMARIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 10

2 CENTROS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DA REDE MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ . 14

3 PERCURSO METODOLÓGICO: OS DESAFIOS DA PESQUISA ....................... 16

4 REFERENCIAL TEÓRICO: A DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA NA

EDUCAÇÃO INFANTIL ............................................................................................ 20

4.1 A OBSERVAÇÃO E O REGISTRO COMO DIMENSÕES REFLEXIVAS DA

PRÁTICA ................................................................................................................... 27

4.2 O REGISTRO DO VIVIDO....................................................................................35 4.3 AS FORMAS DE REGISTRO E DOCUMENTAÇÃO ............................................ 38

5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ............................................................................. 43

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 45

APÊNDICE 1 – TABULAÇÃO DOS DADOS ............................................................ 47

APÊNDICE 2 - QUESTIONÁRIO .............................................................................. 50

10

1 INTRODUÇÃO

Neste documento apresenta-se o Trabalho de Conclusão de Curso (TCCII) do

Curso de Pedagogia do Centro Universitário Municipal de São José- USJ.

O estudo teve, como principal objetivo, a investigação da existência ou não

de práticas de registro e documentação pedagógica e se estas práticas são

utilizadas como instrumentos de reflexão e replanejamento na atuação docente, das

professoras de Educação Infantil da Rede Municipal de São José.

A pesquisa foi realizada a partir de um levantamento de dados com as

professoras de Educação Infantil da Rede Municipal de ensino de São José, por

meio de questionários com as mesmas e posteriormente a análise dos dados com

base no referencial teórico existente sobre o assunto.

Este trabalho trouxe como base teórica os estudos de Freire (1996), Ostetto

(2001; 2008), Dahlberg, Moss e Pence (2003), Gandini e Goldhaber (2002), Kinney e

Wharton (2009). E ainda a Tese de Doutorado de Amanda Cristina Teagno Lopes de

Marques (2010) da Universidade de São Paulo e a Dissertação de Rejane Tereza

Marcus Bodnar (2006) da Universidade Federal de Santa Catarina.

O interesse pelo tema surgiu a partir da 6ª fase do curso de Pedagogia,

quando foi ministrada a disciplina de Cotidiano e Prática Pedagógica na Educação

Infantil onde foram realizadas leituras e discussões sobre autores que abordam a

documentação pedagógica como subsídio para a formação e a prática docente.

A partir destas leituras, foi possível experimentar um pouco a utilização dos

registros e formas de documentação, durante as vivências em campo de estágio

realizado na disciplina de Estágio Curricular em Educação Infantil1, que aconteceu

em uma instituição de educação infantil, localizada no município de São José.

Durante as observações e registros diários, e principalmente no período do

exercício da docência, a documentação do estágio por meio de variadas formas de

registro em todo o processo, foi fundamental para a análise da etapa de formação e

construção do documento final, o Relatório de Estágio, e com isso foi possível

perceber a relevância da documentação pedagógica para a prática docente.

A partir desta vivência, foi possível inferir que a utilização da documentação

1 O Estágio Curricular na Educação Infantil ocorreu durante o segundo semestre de 2010, no período

compreendido entre os meses de julho a dezembro em parceria com a colega de turma Juliana Campos Calazans Ribeiro.

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pedagógica permite registrar o que acontece durante a prática docente tornando o

trabalho diário concreto, palpável, o que possibilita o exercício da reflexão das

práticas.

Após esta etapa de formação e encantamento com o aprendizado do registro

e documentação, houve uma motivação e uma inquietação para a pesquisa que,

impulsionada pela descoberta desta importante ferramenta de trabalho,

desencadeou o desejo de saber se ela é ou não utilizada pelas professoras de

Educação Infantil da rede Municipal de São José no seu cotidiano.

Levando isto em conta, esta pesquisa teve como principal objetivo investigar a

existência (ou não) de práticas de registro e documentação pedagógica, como

instrumentos de reflexão, formação e planejamento, na atuação docente de

professoras da Rede Municipal de São José. Seus objetivos específicos constituíram

em realizar um levantamento junto às professoras para saber se elas fazem registros

e documentação das suas práticas cotidianas; analisar como as professoras que

realizam a documentação pedagógica compreendem esta prática; perceber se a

documentação pedagógica tem contribuído para reflexão da prática docente e de

qual maneira.

As discussões acerca do registro das práticas em Educação Infantil têm sido

ampliadas mais intensamente no início da última década. Presentes em documentos

como o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (MEC, 1996) e com

experiências desenvolvidas tanto em escolas públicas como privadas, a introdução

da prática da documentação no campo da Educação Infantil aparece quebrando

paradigmas em relação à compreensão da prática pedagógica.

O conceito de documentação pedagógica surgiu a partir das abordagens

italianas para a Educação Infantil e, especialmente à produção do pedagogo Loris

Magaluzzi, que tem como foco principal a sistematização de percursos, elaboração

da experiência e comunicação.

A inserção, em nosso meio, de produções acerca da experiência italiana para

a Educação Infantil, principalmente a desenvolvida na cidade de Reggio Emilia,

certamente constituiu um impulso à ideia de “documentação pedagógica”, percebida

como elemento intrínseco à proposta pedagógica para a Educação Infantil

(MAGALUZZI, 1999).

Os italianos trouxeram o conceito, mas Madalena Freire vem discutindo a

necessidade dos registros desde os anos 90. O termo “registro das práticas”

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derivado de seus estudos em seu livro Observação, Registro e Reflexão (1996),

apresenta o registro como instrumento metodológico do “planejamento, observação

e registro”. Para a autora, registrar a prática constitui em estudar a aula, refletir sobre

o trabalho diário, e abrir-se ao processo de formação.

Nesta direção, Ostetto, Oliveira e Messina (1998), apresentam no livro

Deixando Marcas o resultado da pesquisa realizada no Núcleo de Desenvolvimento

Infantil2 (NDI), onde o registro é tratado como instrumento reflexivo para a prática

educativa.

Passados mais de dez anos discutindo sobre a importância desses

instrumentos para a reflexão da prática pedagógica ficam alguns questionamentos:

Será que as professoras de Educação Infantil já incorporaram essa prática? E se já

incorporaram, conseguem perceber a importância?

Tais discussões acerca do registro e da documentação provocaram uma

questão que norteou a pesquisa - O registro e a documentação pedagógica estão

presentes no cotidiano das professoras da Rede Municipal de São José, e se estão

presentes, contribuem para a reflexão e replanejamento das práticas cotidianas?

A pesquisa mostra como a documentação pedagógica é relevante,

principalmente para refletir a prática das professoras de Educação Infantil da Rede

Municipal de São José, pois possibilita as professoras concretizarem seus

pensamentos, tornando-o um material tangível e capaz de interpretação. Deste

modo os registros de observação e a documentação são um espaço de produção de

história de quem ensina e dos que aprendem, porquanto promove condições para o

pensar e o repensar do próprio fazer, tendo como subsídio a teoria. Para Steier

(apud DAHLBERG; MOSS E PENCE, 2003, p. 200),

A documentação pedagógica pode contribuir para uma auto-reflexidade aprofundada e nos dizer algo sobre a maneira como temos nos constituídos como pedagogos, pois nos ajuda a “contar a nós mesmos uma história sobre nós mesmos. .

A partir dessas questões apresento os resultados e as análises inseridas no

capítulo: A Documentação Pedagógica na Educação Infantil e nos subcapítulos: A

Observação e o Registro como Dimensões Reflexivas da Prática, O Registro do

Vivido e As Formas de Registro e Documentação e ao final faço algumas

2 O Núcleo de desenvolvimento Infantil é um a Instituição de Educação Infantil ligada ao Centro de

Ciências da educação da Universidade Federal de Santa Catarina.

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considerações sobre os dados coletados durante a pesquisa.

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2 CENTROS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DA REDE MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ

A pesquisa abrangeu professoras de Educação Infantil de vinte e quatro

Centros de Educação Infantil (CEI) da Rede Municipal de São José. Os CEI’s

pesquisados foram: CEI APAM, CEI Bom Jesus de Iguape, CEI Flor de Nápolis, CEI

Jardim Pinheiros, CEI José Nitro, CEI Los Angeles, CEI Manoel Cunha, CEI Maria

de Lourdes Bott Philippi, CEI Morar bem, CEI Nossa Senhora Aparecida, CEI Nossa

Senhora das Graças, CEI Nossa Senhora de Fátima, CEI Professora Ana Sperandio

Battisti, CEI Professora Zenir Kretzer Borges, CEI Santa Inês, CEI Santo Antônio,

CEI São Francisco de Assis, CEI São José I, São José II, CEI São Judas Tadeu, CEI

São Luiz, CEI Vida Nova, CEI Vila Formosa e CEI Regina Bastos.

O trabalho educacional das Instituições de Educação Infantil pesquisadas

está alicerçado na Proposta Curricular da Rede Municipal de São José (2000), que

descreve as Instituições como espaços onde as crianças passam grande parte da

sua infância e estes espaços necessitam estar em constante processo de reflexão,

avaliação, discussão e reestruturação do seu fazer pedagógico. De acordo com o

documento citado:

[...] a criança é vista como ser social, cultural e histórico e se constitui como tal nas relações que estabelece com o mundo, desde que nasce. É um ser que aprende e, porque aprende, se desenvolve. É um ser que deseja e , porque deseja, age relacionando-se com a realidade na busca de compreendê-la. Nesse processo, crianças e adultos vão se apropriando e produzindo cultura, tecendo histórias, significando e resignificando o mundo no qual estão inseridos. (p.182).

A Instituição de Educação Infantil torna-se um lugar privilegiado de interações,

mediações, interlocuções em torno da apropriação da cultura tanto pelas crianças

como pelos professores. Como descreve o documento:

[...] procurando assim, observar o movimento do grupo, suas preferências, suas dificuldades, suas alegrias, suas brincadeiras, e a forma como ocupam os mais diferentes espaços, como se organizam, se conseguem organizar-se sozinhos ou se é necessária a intervenção do adulto ou de outro parceiro, como resolvem os conflitos, por que os conflitos aparecem: enfim, observar e incluir-se como membro deste grupo, interagindo, aprendendo, desenvolvendo-se mediando e propondo experiências que ampliem o repertório vivencial das crianças. (ibidem, p.183-184)

Neste documento o Centro de Educação Infantil é considerado como um

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espaço para as vivências das crianças, que necessita ser comprometido com a

redefinição dos tempos, dos espaços, das práticas, tendo a criança como ponto de

partida para delinear o cotidiano.

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3 PERCURSO METODOLÓGICO: OS DESAFIOS DA PESQUISA

Ao iniciar a pesquisa, havia apontado como procedimento metodológico um

estudo de caso com algumas professoras da Rede Municipal de São José, mas

segundo Pais (2003, p. 33), “[...] como o caminho se faz ao andar, o método que nos

deve orientar é esse mesmo: o de trotar a realidade, passear por ela em

deambulações vadias, indiciando-a de uma forma bisbilhoteira [...]” o estudo de caso

acabou se transformando em um estudo de campo com todas as professoras da

mesma Rede Municipal.

A pesquisa foi realizada apenas com as professoras regentes de sala, das

Instituições e, mesmo compreendendo que as auxiliares de sala ou professoras

auxiliares também exercem a docência em conjunto com as professoras, não foi

possível incluí-las nesta pesquisa, por falta de tempo em analisar o grande número

de dados que seria gerado, o que poderá se concretizar em uma futura pesquisa de

mestrado.

Com o desenvolvimento da pesquisa e a análise do referencial teórico percebi

que este era o caminho para responder as inquietações que esta investigação

gerou. Apresentar a realidade e experiências de todos (ou quase todos) os CEIs do

Município, talvez possibilitasse um melhor entendimento sobre o assunto e

permitisse uma maior fonte de dados para a análise.

De acordo com Marconi e Lakatos (1996), a pesquisa de campo é a fase

realizada após o estudo bibliográfico, para que o pesquisador tenha um maior

conhecimento sobre o assunto. Nesta etapa ele vai definir as hipóteses, o meio de

coleta de dados, o tamanho da amostra e como os dados serão tabulados e

analisados posteriormente. Esta pesquisa de campo é do tipo qualitativa, segundo

Bogdan e Biklen (1982) a pesquisa qualitativa tem como fonte direta de dados, o

ambiente natural e o pesquisador como seu principal instrumento.

Neste caso o objetivo principal foi o de investigar a existência (ou não) de

práticas de registro e documentação pedagógica, como instrumentos de reflexão,

formação e planejamento, na atuação docente de professoras da Rede Municipal de

São José.

Para realizar a pesquisa, primeiramente fui a Secretaria da Educação do

Município, onde fui bem recebida, tive orientações de que eu poderia visitar as

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Instituições, esclarecer, propor e convidá-las a participarem da pesquisa caso elas

aceitassem, então poderia iniciar a minha pesquisa de campo.

Estava com expectativas que iria dar tudo certo, e ansiosa para iniciar a

pesquisa. Na primeira semana do mês de setembro, visitei algumas instituições de

Educação Infantil do Município de São José com o intuito de esclarecer sobre o que

se tratava a pesquisa e deixar os questionários para as professoras responderem.

Os questionários , de acordo com Vergara (2009), constituem um método de

coleta de dados em campo composto por uma série de questões com variáveis que

o pesquisador deseja averiguar. São úteis quando o pesquisador quer fazer o

levantamento de dados com um grande número de respondestes. Para a autora, a

utilização dos questionários apresenta algumas limitações, uma delas é a obtenção

de respostas, geralmente é baixa a devolução, além disso, mesmo devolvido poderá

haver questões sem resposta e para diminuir esta possibilidade, deve-se entrar em

contato telefônico mais de uma vez, se necessário, com a pessoa que se propôs a

entregar e recolher os questionários.

Tudo isto foi vivido intensamente durante a pesquisa: um grande número de

respondentes, muitas idas e vindas, baixa devolução dos questionários por parte das

professoras.

Durante o percurso da pesquisa senti algumas dificuldades, como a

resistência de alguns CEIs em participar da pesquisa, muitas vezes, por já estarem

saturados de estagiárias. Fiquei desanimada e cheguei a pensar que deveria mudar

a temática da minha pesquisa. Porém, nas Instituições que visitei na sequência,

percebi que as professoras estavam dispostas a ajudar, o que me deixou mais

animada para dar continuidade ao percurso e superar os obstáculos iniciais.

Desta forma visitei os outros CEIs deixando os questionários e combinando

um dia para buscá-los, geralmente ficava combinado para a semana seguinte, para

que as professoras tivessem tempo de responder e eu telefonava antes para

confirmar se estavam prontos.

Quando retornei às Instituições para buscar os questionários, fiquei um pouco

decepcionada pelo número de questionários respondidos, a maioria das professoras

não o respondeu. Mesmo as Instituições que foram acolhedoras e receptivas com a

minha visita deram pouco retorno, o que não era esperado por mim. Percebi o

quanto é difícil o campo do pesquisador, que conta com a colaboração dos

participantes da pesquisa e nem sempre é correspondido como espera. Se, para a

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pesquisadora, neste momento, o mais importante, o auge de seu trabalho é a

pesquisa, para aquelas profissionais que estão lá na ponta, isto é só mais uma das

inúmeras tarefas a realizar.

Talvez a escolha das prioridades que devem ser realizadas no dia a dia ou a

falta de tempo tenha sido o empecilho para alguma das professoras não

responderem ao questionário da minha pesquisa ou até mesmo por não

compreenderem a sua importância.

No quadro abaixo estão relacionados os CEIs pesquisados, o número de

professoras e os questionários respondidos:

Nome das Instituições Número de Professoras

Número de questionários respondidos

1. Centro de Educação Infantil Apam

06 0

2. Centro de Educação Infantil Bom Jesus de Iguape

14 06

3. Centro de Educação Infantil Flor de Nápolis

10 05

4. Centro de Educação Infantil Jardim Pinheiros

12 01

5. Centro de Educação Infantil José Nitro

06 02

6. Centro de Educação Infantil Los Angeles

10 02

7. Centro de Educação Infantil Manoel Cunha

18 02

8. Centro de Educação Infantil Maria de Lourdes Bott Philippi

20 04

9. Centro de Educação Infantil Morar Bem

12 03

10. Centro de Educação Infantil Nossa Senhora Aparecida

07 02

11. Centro de Educação Infantil Nossa Senhora das Graças

04 01

12. Centro de Educação Infantil Nossa Senhora de Fátima

20 11

13. Centro de Educação Infantil Professora Ana Sperandio Battisti

24 06

14. Centro de Educação Infantil Professora Zenir Kretzer Borges

06 05

15. Centro de Educação Infantil Santa Inês

12 08

16. Centro de Educação Infantil 20 07

19

Santo Antônio

17. Centro de Educação Infantil São Francisco de Assis

04 04

18. Centro de Educação Infantil São José I

12 02

19. Centro de Educação Infantil São José II

20 03

20. Centro de Educação Infantil São Judas Tadeu

31 01

21. Centro de Educação Infantil São Luiz

06 06

22. Centro de Educação Infantil Vida Nova

20 08

23. Centro de Educação Vila Formosa

09 02

24. Centro de Educação Infantil Regina Bastos

16 14

TOTAL 319 107

É possível perceber esta dificuldade de retorno dos questionários ao olhar

para os números e ver que somente um terço das professoras respondeu e devolveu

o material solicitado. Isto significa que os resultados obtidos com este trabalho de

campo não revelam a realidade de uma maioria, mas de apenas um terço das

professoras que estão atuando na Educação Infantil hoje.

Após o levantamento dos dados feitos através dos questionários recolhidos

nas Instituições, estes foram analisados e organizados, tendo por fundamento os

autores Freire (1996), Ostetto (2001; 2008), Dahlberg, Moss e Pence (2003), Gandini

e Goldhaber (2002), Kinney e Wharton (2009) e os objetivos que nortearam a

pesquisa.

Os dados gerados foram diversificados e numerosos o que favoreceu uma

compreensão da realidade das professoras e dos CEIs e suas particularidades.

Quadro1: CEIs pesquisados

Fonte: Elaborado pela autora, 2011.

20

4 REFERENCIAL TEÓRICO: A DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL

A terminação registro pedagógico aparece nas obras sobre Educação Infantil

desde meados da década de 60, como na obra de Fostes e Headley (1967)

denominada “Jardim de Infância”. Conforme Kramer apud Bonnar (2006), nesta

época, na Europa e nos Estados Unidos a educação pré-escolar era baseada na

privação cultural. A publicação citada documentava as informações sociais,

econômicas e culturais das famílias e também registrava o desenvolvimento físico

intelectual das crianças.

De acordo com os autores Fostes e Headley (1967), o registro ajuda os

professores e pais a compreenderem as crianças e servir como orientação para a

idealização dos currículos e prover informações para pesquisa. Outro fator em

evidência nesta produção é o registro cumulativo que de acordo com os autores tem

a função de resumir a vida pré-escolar da criança preenchendo a lacuna existente

entre a pré-escola e a 1ª série.

Na década de 80, a Educação Infantil foi reconhecida legalmente como um

direito e fundamentava-se basicamente nas contribuições da psicologia do

desenvolvimento. Nicolau (1988, p. 290) menciona a observação como “o melhor

instrumento para orientar, acompanhar e avaliar o desempenho infantil”, deste modo

o relatório sobre a criança tornou-se uma abertura para o diálogo com as famílias.

Ao final desta mesma década, Kramer se refere ao registro como uma

estratégia para avaliação que além de ser um modo de observar as crianças, auxilia

na elaboração do planejamento. De acordo com a autora,

Diariamente, cada professor observa três a cinco crianças, fazendo anotações nos “relatórios de avaliação” individuais, de forma que avaliar se torne de fato um processo construído, não se prendendo somente aos momentos da entrega de cópia desses relatórios aos pais. Cada relatório é preenchido pela professora da turma e discutido com a supervisora. (KRAMER, 1989, p .97).

Durante a década de 90 uma nova função para o registro é estabelecida.

Como descreve a autora Warschauer (1993, p. 62),

O registro ajuda a guardar na memória fatos, acontecimentos ou reflexões, mas também possibilita a consulta quando nos esquecemos. Este “ter presente” o já acontecido é de especial importância na transformação do agir, pois oferece o conhecimento de situações arquivadas na memória,

21

capacitando o sujeito a uma resposta mais profunda, mais integradora e mais amadurecida, porque menos ingênua e mais experiente, de quem já aprendeu com a experiência. Refletir sobre o passado (e sobre o presente) é avaliar nas próprias ações, o que auxilia na construção do novo. E o novo é a indicação do futuro. É o planejamento.

Warschauer baseou-se na obra Madalena Freire “A paixão de conhecer o

mundo” (1983). Nesta obra, Madalena, relata sua experiência como professora de

educação infantil nos anos de 1978 a 1981 mediante os registros do cotidiano

realizado pelas crianças e por ela.

Abramowicz e Wajkop (1995) mencionam o diário e os relatórios como

instrumentos pedagógicos do professor de Educação Infantil. Para as autoras, esses

instrumentos permitem o registro do trabalho, e contribuem para a elaboração do

planejamento e acompanhamento das crianças: “O registro escrito diariamente ajuda

a organização e a reflexão constante do trabalho” (ABRAMOWICZ; WAJKOP, 1995,

p. 22) e ajudam também para o registro individual e do grupo. Para elas, o relatório

individual “é um relato-síntese do processo de crescimento da criança, das

características apresentadas, de suas conquistas e dificuldades [...] e o relatório do

grupo é uma síntese do trabalho coletivo realizado” (ABRAMOWICZ; WAJKOP,

1995, p. 23).

Ostetto et al em 1998, apresentam o livro “Deixando Marcas”, como

decorrência da pesquisa realizada no Núcleo de Desenvolvimento Infantil, no qual o

registro é considerado um instrumento para a reflexão do professor. Aplicando os

conceitos dos registros de Madalena (1995), Magalhães et al (1995), Kramer (1993)

e Warschauer (1995), segundo as autoras,

Como instrumento de trabalho, o registro vem associado ao planejamento e à avaliação. Assim, os rituais do planejamento, registro e avaliação compõem o fazer educativo do profissional que quer construir sua competência e qualidade no trabalho que desenvolve junto aos grupos de crianças. (OSTETTO et al, 2002, p. 23-24).

Na bibliografia brasileira, o termo o registro é inclusive citado em documentos

oficiais como o Referencial Curricular para Educação Infantil (MEC, 1996).

Entretanto, cabe diferenciar registro e documentação. De acordo com o documento,

o registro que o professor faz do seu trabalho pode fazer parte da documentação,

entendida como um procedimento mais abrangente de sistematização e construção

de memória sobre uma criança, um grupo ou uma escola.

22

No Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (MEC, 1998), o

registro é apresentado interligado a observação e à avaliação formativa, nos 3

volumes do documento. Deste modo mostra que a observação e o registro são

instrumentos que contribuem para a prática pedagógica e para o acompanhamento

do desenvolvimento das crianças. Conforme o documento:

Por meio deles o professor pode registrar, contextualmente, os processos de aprendizagem das crianças; a qualidade das interações estabelecidas com outras crianças, funcionários e acompanhar os processos de desenvolvimento obtendo informações sobre as experiências das crianças na instituição. Esta observação e seu registro fornecem aos professores uma visão integral das crianças ao mesmo tempo que revelam suas particularidades (BRASIL, 1998, v. 1, p. 58-59).

Neste sentido, é importante ressaltar que a documentação pode estar a

serviço do educador (como instrumento de reflexão da prática, avaliação da

aprendizagem e do planejamento contribuindo com o processo de formação), das

crianças (quando elaboram a memória do seu percurso junto ao educador), e dos

pais (como acesso ao trabalho pedagógico e a trajetória da criança na escola).

Mas o registro das práticas existiu em outras épocas nas escolas, antes

mesmo do desenvolvimento de pesquisas ou de publicações dos referenciais

curriculares, por meio de iniciativas individuais das professoras que os realizavam ou

do coletivo e das instituições. Os Boletins dos Parques Infantis, por exemplo,

possuía relatos das educadoras dos Parques que de acordo com Lopes (2009),

continham indicações de como preencher fichas de observação das crianças.

As nomenclaturas utilizadas: registro (MADALENA FREIRE, 1996), diário de

aula (ZABALZA, 1996, 2004), portfólio (SÁ-CHAVES, 2004), documentação

(MELLO, 2002, 2005) indicam concepções e maneiras de organização diferentes,

mas não opostas.

A ideia de registro remete as produções de Madalena Freire, se refere a

ação de escrever, narrar e refletir sobre a atuação docente. Tem como foco o

educador e a sua prática tornando a ideia autoavaliação mais próxima. Madalena

Freire (1996) traz em seus textos a denominação do registro como instrumento

metodológico do trabalho docente ao lado do planejamento, observação e reflexão.

Os quatro elementos agregam-se a prática pedagógica, já que o registro possibilita a

observação e a reflexão sobre a ação docente, que fornecem subsídios para o

planejamento, e este sugere pontos para observação, registro e reflexão.

23

Para a autora o registro tem uma tarefa, “Tarefa que formaliza, dá forma,

comunica o que pensa, para assim refletir rever, revisar, aprofundar, construir o que

ainda não conhece: o que necessita aprender.” (MADALENA FREIRE, 1996, p.41)

Enfim, para Madalena Freire, registrar a prática constitui em estudar a aula, refletir

sobre o trabalho e abrir-se ao processo de formação.

A documentação por sua vez, empregada mais especificamente na

bibliografia italiana, tem como objetivo sistematizar o trabalho pedagógico, ou seja

produzir memória sobre o percurso de desenvolvimento e aprendizagem da criança

e do professor por meio da organização de diversos registros.

De acordo com Mello (2002), a documentação beneficia o alcance de diversos

objetivos: promove o trabalho alcançado pela instituição; dá visibilidade ao projeto

educacional; fornece informações para os envolvidos no trabalho educativo como:

professores, alunos e por outros; concretiza o experimentado e vivido por meio da

memória das mediações e elaborações. Para a autora,[...] começamos a procurar as

explicações teóricas para entender a prática e começamos a planejar a prática

experimentando a teoria... se registramos esse processo, ao final teremos um

aprendizado consciente. (Mello, 2005, p.3)

A documentação envolve os registros dos fatos ocorridos, das situações

vividas, das tarefas realizadas, das vozes manifestadas no dia a dia da sala de aula,

mas também, abrange reflexões fundamentais para a compreensão do que foi

realizado, bem como ao esboço do que está por ser feito. O registro é uma parte da

documentação. Integra-a, mas não a constitui. Sua importância se confirma quando,

[...] o educador [o] faz com intenção de aprender com ela [com sua prática],... não é registro para a burocracia da escola, não é observação das crianças com o objetivo de avaliar seu desenvolvimento, mas tem como objetivo o estabelecimento de uma relação cada vez mais consciente do educador com sua própria prática e com a teoria que orienta sua prática. (MELLO, 2005, p.1).

Já o portfólio pode ser entendido como uma modalidade de documentação.

Segundo Sá Chaves (2004), no livro “Portfolios Reflexivos: estratégias de formação

e de supervisão” descreve que a construção do portfólio na formação inicial pode

auxiliar na reflexão e a construção de uma profissionalização docente, favorecendo

a compreensão do processo de aprendizagem dos estudantes. Cabe aqui destacar

que a utilização dos portfólios não se restringe apenas a formação docente; existem

24

referências da utilização desse instrumento na Educação Infantil e no Ensino

Fundamental como forma de tornar visível da trajetória de aprendizagem das

crianças.

A autora define o portfólio reflexivo como:

(...) trata-se de uma estrutura dinâmica definida em função de um objetivo explícito; integra no processo descrição-narração-reflexão-(meta)reflexão as experiências práticas e as teorias que a sustentam; recorre a fonte múltiplas de evidências (relatos, fotografias, observações, instrumentos de pesquisa, textos de apoio, auto-reflexões, cassetes e/ou vídeogravações...); constitui um documento autêntico (existe uma ligação direta entre os fatos experiências e os seus relatos, tidos como parte da evidência); captura o crescimento e a mudança no conhecimento do formando ao longo do tempo; é uma peça única. (SÁ-CHAVES, 2004, p.22-23.)

O portfólio portanto, uma oportunidade para contribuir com o processo de

desenvolvimento pessoal e profissional, pois possibilita a reflexão, o enriquecimento

conceitual, estímulo a criatividade, a construção do conhecimento e a autoavaliação.

Deste modo, o portfólio pode constituir uma estratégia de formação, avaliação e

investigação.

Os diários de aula aproximam-se da ideia de registro das práticas. Miguel

Zabalza (2004), considera os diários de aula como instrumentos para o

desenvolvimento profissional e pesquisa. Escreve que a atividade profissional é para

ele uma maneira de conscientizar-se, distanciando-se e refletindo sobre a

aprendizagem, elementos que considera essenciais a formação continuada. Para o

autor “O bom de um diário, o que se torna um importante documento para o

desenvolvimento pessoal, é que nele se possa contrastar tanto o objetivo-descrito

como o reflexivo-pessoal.” (ZABALZA, 2004, p.16).

O autor sugere a utilização do diário além da formação inicial, que seja

utilizado também na formação permanente dos professores e professoras. Ele

conceitua os diários como “[...] documentos em que os professores e professoras

anotam suas impressões sobre o que vai acontecendo em suas aulas.” (ZABALZA,

2004, p.13). Logo, os diários podem ser alterados de acordo com o conteúdo,

periodicidade e função que desempenham. Para o autor os impactos formativos dos

diários são:

• Entrar no mundo do professor: capacidade de percepção de teorias e

crenças pessoais, de reflexão sobre vivência e reconstrução do vivido;

25

• Solução para explicar os próprios dilemas da atuação profissional;

• Acesso à avaliação e a reajuste de processos didáticos;

• Meio para o desenvolvimento profissional permanente.

Segundo o autor, os diários trazem ainda outras possibilidades, como o saber:

habituam os professores a refletir e a escrever; beneficiam o feedback imediato e

permanente; promovem o compartilhamento de experiências e são compatíveis a

outros processos de formação continuada.

O passado quando registrado, documentado e refletido elucida o presente e

aponta referencias para pensar e planejar o futuro.

Gandini e Goldhaber (2002) expressam em sua concepção de documentação

pedagógica, em parte, o que antes afirmara Warschauer (1993, p.63) acerca do

registro, com ênfase especial à importância da valorização e compreensão da linha

temporal.

[...] vejamos a historicidade do processo de construção dos conhecimentos, porque ilumina a história vivida e auxilia a criação do novo a partir do velho. Oferece segurança porque relembra as dificuldades anteriores e a sua superação, dando coragem para enfrentar novos desafios e dificuldades, que, como as anteriores, poderão ser superadas.

A documentação é mais que reunir textos, tarefas, instruções, fotos, filmes

entre outros. A junção dos elementos componentes é um momento essencial para

que a documentação cumpra a sua função de afirmar o trabalho docente e

evidenciar a qualidade do desenvolvimento e da aprendizagem alcançados por cada

criança.

Em Reggio Emilia3, província localizada na Itália, existe um programa para

primeira infância que ficou conhecido como uma das melhores propostas para a

educação de crianças pequenas. Esta abordagem italiana tem como objetivo

atender a diversidade e necessidades das crianças e suas famílias. Essas

experiências valorizam a infância, pois as crianças são reconhecidas como sujeitos

sociais autônomos (GALARDINI, 1996) que tem direito a cidadania e políticas

pensadas para elas que são garantidas de forma concreta.

Um importante destaque é a formação dos educadores em serviço nas

instituições italianas. Lá, realizam projetos de formação ligados à prática educativa,

3 Região no norte da Itália, cujas Instituições de Educação Infantil tornaram-se visíveis aos olhos de

todo o mundo quando, em 1991, a Newsweek escreveu um longo artigo destacando a sua escola voltada a crianças pequenas como sendo a melhor do mundo.

26

proporcionando aos professores conhecimentos, repertórios metodológicos,

equilíbrio e motivação para sustentar a carga emocional exigida pelo trabalho com

as crianças pequenas. Formação esta centrada na observação, reflexão, na

documentação e na mudança, elementos essenciais na constituição de um

educador. Galardini (1996) considera que esse conjunto tenha beneficiado o

crescimento da documentação das experiências, da prática de registro exercida no

cotidiano.

Para Malaguzzi (1999), a documentação é uma forma de dar visibilidade ao

trabalho desenvolvido nas Instituições de Educação Infantil, como maneira de

construir uma imagem de “criança competente” – não apenas como objeto da

educação, mas pessoa, sujeito de sua história.

Na experiência de Reggio Emilia, documentar significa apropriar-se das

experiências e refletir sobre elas no processo de construção de um projeto

educacional. No processo de qualificação e construção de uma proposta

pedagógica, formação continuada, reflexão e documentação tornam-se

indispensáveis. A documentação é entendida também com uma forma de atribuir

visibilidade a criança enquanto pessoa e ser pensante.

Dahlberg, Moss e Pence (2003), avaliam a documentação pedagógica como

um procedimento para encorajar uma prática reflexiva e democrática, permitindo a

construção de novos significados. Deste modo “a documentação pedagógica pode

funcionar como instrumento para abrir uma prática critica e reflexiva que desafie os

discursos dominantes e construa contra discursos.” (DAHLBERG, MOSS, PENCE,

2003, p.199).

A vinculação da experiência italiana para a Educação Infantil brasileira

parece ter sido influente, nas pesquisas, nos debates e nas práticas cotidianas dos

professores de Educação Infantil. Com um cenário teórico inovador, o registro é

considerado por eles como parte integrante da documentação pedagógica,

composta pelos professores, crianças e instituição. Segundo Dahlberg et al (1999,

p.148) “A “documentação” como conteúdo é o material que registra o que as

crianças estão dizendo, fazendo e produzindo e como o pedagogo se relaciona com

as crianças e seu trabalho.”

O apontamento das diferenças nas abordagens, parece haver como ponto

principal e fundamental a ideia da reflexão da prática docente. É a necessidade da

reflexão, seja sobre o trabalho, as crianças ou sobre si, que justifica a produção dos

27

registros, o que entrelaça a concepção de escrita com a organização do pensamento

4.1 A OBSERVAÇÃO E O REGISTRO COMO DIMENSÕES REFLEXIVAS DA PRÁTICA

Observar requer da professora um direcionamento a partir dos seus objetivos,

um olhar atento as situações vividas pelas crianças e que são relevantes para serem

registradas. A observação deve estar presente na sala de aula e dela devem resultar

informações que irão constituir a documentação pedagógica.

Ao observar a professora precisa saber o que quer constatar, como pretender

coletar aquelas informações e quais as suas intenções ao coletá-las. Quando

observa, a professora tem seus olhos direcionados por um referencial teórico que

muitas vezes é imperceptível para si. De acordo com Gandini e Goldhaber (2002,

p.151),

[...] a documentação pedagógica não é considerada aqui como uma mera coleta de dados realizada de maneira distante, objetiva e descompromissada. Pelo contrário, ela é vista como uma observação aguçada e uma escuta atenta, registrada através de uma variedade de formas pelos educadores que estão contribuindo conscientemente com sua perspectiva pessoal.

O registro, no contexto da documentação pedagógica, não é produzido

apenas para relembrar fatos, diálogos, situações, choros e risos. Ele é realizado

para favorecer uma reflexão da prática, para permitir as professoras ajustes com as

apropriações objetivadas pelo grupo.

Por meio das análises dos gráficos gerados a partir da pesquisa, articulados

aos estudos teóricos acerca dos registros e documentação pedagógica, exponho um

pouco a realidade das professoras participantes da pesquisa, para situar a origem

das informações utilizadas.

Entre as professoras que participaram da pesquisa cerca de 1,87% entre 18 e

25 anos, 17,76% tem entre 26 e 30 anos, 40,19% possuem entre 31 e 40 anos,

36,45% possuem entre 41 e 50 anos e 3,74% acima de 50 anos.

28

Quanto ao tempo de formação, 16% estão formadas até 2 anos, 36% estão

formadas entre 3 a 5 anos, 21% estão formadas entre 6 e 10 anos e 28% estão

formadas a mais de 11 anos.

As professoras participantes da pesquisa, 6% atuam até 2 anos na Educação,

18% entre 3 e 5 anos, 27% entre 6 e 10 anos e 50% a mais de 11 anos. Como

mostra o gráfico a seguir.

Gráfico1: Faixa etária das professoras participantes da pesquisa

Fonte: Elaborado pela autora, 2011.

Gráfico 2: Tempo de formação das professoras participantes da pesquisa

Fonte: Elaborado pela autora, 2011.

29

De acordo com o gráfico que segue 97% das professoras relataram que o

registro e a documentação pedagógica estão presentes em suas práticas e 3% que

os mesmo não se fazem presentes em suas práticas.

Gráfico 3: Tempo de atuação na educação

Fonte: Elaborado pela autora, 2011.

Gráfico 4: Presença de registro e documentação pedagógica nas práticas das professoras

Fonte: Elaborado pela autora, 2011.

30

Para essas professoras que confirmaram a presença dos registros em suas

práticas, as razões são as mais diversas, entre elas, as mais recorrentes são:

“A documentação auxilia para ver o que foi realizado com as

crianças e para que possamos refletir sobre a nossa prática.”

“Através dos registros observamos se os objetivos foram

alcançados, contribuindo também para novas mudanças.”

“A partir dos registros faço anotações dos principais

acontecimentos do dia e, principalmente, sobre a evolução de

cada criança.”

“A documentação é indispensável para realizarmos um

planejamento de acordo com os interesses das crianças.”

“A documentação auxilia na produção dos portfólios das

crianças para apresentar para as famílias como elas

evoluíram.”

Todas as professoras participam de formação continuada, que na sua

maioria são as oferecidas pela Rede Municipal. Entre as temáticas mais citadas

estão a Semana da Educação, Dimensões do Desenvolvimento Infantil, Inclusão,

Brincadeiras e Documentação Pedagógica. Estas informações são ilustradas nos

gráficos que seguem.

31

Na sua formação inicial como professoras, 67% tiveram experiência com o

registro e a documentação pedagógica e 21% não tiveram experiência alguma.

Gráfico 6: Temáticas abordadas com mais freqüência em formação continuada

Fonte: Elaborado pela autora, 2011.

Gráfico 5: Participação das professoras pesquisadas em formação continuada

Fonte: Elaborado pela autora, 2011.

32

Dentre estas professoras que participaram da pesquisa, conforme o gráfico a

seguir, 30% entendem que a documentação pedagógica é o registro das produções

das crianças, 21% acham que é o registro do cotidiano da Instituição e 31%

acreditam a documentação refere-se ao registro da sua prática.

Conforme afirmado por elas:

Gráfico 8: Entendimento sobre registro e documentação pedagógica

Fonte: Elaborado pela autora, 2011.

Gráfico 7: Experiência com registro e documentação pedagógica durante a formação

Fonte: Elaborado pela autora, 2011.

33

“Acredito que o registro demonstra o caminho traçado, bem

como o rumo que se deve tomar, as dificuldades, os avanços e

também aponta novas possibilidades.”

“Através da documentação tem-se uma reflexão das

experiências vivenciadas no dia a dia do CEI.”

“A documentação e o registro envolvem a prática pedagógica

desde o planejamento diário até a produção dos portfólios das

crianças.”

“A documentação é o registro das produções das crianças, bem

como suas dificuldades e superações ao longo do ano.”

“O registro é uma ferramenta importante para a reflexão da

nossa prática pedagógica, procuro revisitá-lo sempre que

necessário.”

Nesta mesma perspectiva, Ostetto (2008, p.13) afirma:

Por meio do registro travamos um diálogo com nossa prática, entremeando perguntas, percebendo idas e vindas, buscando respostas que vão sendo elaboradas no encadeamento da escrita, na medida em que o vivido vai se tornando explícito, traduzido e, portanto passível de reflexão.

O registro é um modo de articular a própria prática, em que o agir permanente

e a sua sistematização permitem a interlocução sobre o que se registra e o que é

concretizado.

Para 26% das professoras os registros são utilizados para rever a sua prática,

35% para acompanhar a evolução do grupo de crianças, 22% são utilizados para

realizar o planejamento das atividades com as crianças ao longo do dia, como está

exposto no gráfico que segue.

34

De acordo com as mesmas:

“Os registros servem para descrever as atividades em sala e

para observar o desenvolvimento das crianças.”

“O registro auxilia no meu trabalho como professora, pois com

ele repenso a minha prática e como devo prosseguir com as

crianças.”

“Observo os pontos positivos e negativos do que registrei, o

que contribui para melhorar o desempenho das propostas

dentro do planejamento.”

“Registro no meu caderno de plano de aula. Utilizo-os para

relembrar as estratégias e atividades que foram bem aceitas

pelas crianças.”

“O registro é algo necessário para tornar a prática

significativa.”

“Ao registrar consigo perceber os avanços, superações e

Gráfico 9: Forma de utilização do registro pelas professoras pesquisadas

Fonte: Elaborado pela autora, 2011.

35

dificuldades de cada criança no processo de aprendizado”.

Segundo Madalena Freire (1996), por meio dos registros, armazenam-se

informações do objeto de estudo, para ser capaz de refletir sobre ele, pensá-lo e só

assim apreendê-lo, para depois transformá-lo construindo um conhecimento antes

ignorado. Por este motivo o escrito amplia a memória e deixa registrado o processo

com seus momentos e movimentos da produção do grupo. Desencadeando um

processo reflexivo sobre a compreensão da prática, levando a melhorar o que é

preciso junto com as crianças.

O registro do percurso diário da prática docente permite, em sua leitura, tomar

certo distanciamento do que foi realizado, revê-lo e dar novas direções ao trabalho,

permitindo a construção de um instrumento reflexivo.

Com a prática do registro, é possível ler a realidade, aprender a ouvir o grupo

e refletir sobre o que é necessário melhorar no dia a dia juntamente com as crianças.

Sobre essa questão, Messina, Oliveira e Ostetto (2001, p. 21) afirmam que, “O

registro é esse convite a ver o que de bom já sabemos fazer e o que ainda não

sabemos e precisamos aprender. É um convite a desmontar o jogo do “tudo ou

nada” através da revelação de nossa inteireza: cabeça e coração.”

4.2 O REGISTRO DO VIVIDO

A documentação é um recurso que permite uma melhor compreensão do que

as crianças querem nos mostrar. Ao registrarem as experiências vivenciadas, as

crianças deixam as marcas da sua passagem, a forma como pensam e como se

sentiram naquele momento.

A documentação, interpretada e reinterpreta junto com outros educadores e crianças, oferece a opção de esboçar roteiros de ação que não são construídos arbitrariamente, mas que respeitam e levam em consideração todas as pessoas envolvidas. O processo de documentar é capaz de ampliar a compreensão dos conceitos e das teorias sobre as crianças com a convicção de que, tanto para as crianças quanto para os adultos, a documentação serve de apoio aos seus esforços para entender e para se fazer entender. (GANDINI; GOLDHABER, 2002, p.150).

Na medida em que se registra, qualificam-se os fatos do cotidiano educativo e

36

percebe-se o valor de cada ação. Não é apenas contar o que aconteceu no dia, mas

estabelecer relações com a continuidade do trabalho, tentar compreender o passado

e assim aprender com a experiência. Para Warschauer (1993, p. 62 apud Ostetto,

2008, p. 20),

O registro ajuda a guardar na memória fatos, acontecimentos ou reflexões, mas também possibilita a consulta quando nos esquecemos. Este “ter presente” o já acontecido é de especial importância na transformação do agir, pois oferece o conhecimento de situações arquivadas na memória, capacitando o sujeito a uma resposta mais profunda, mais integradora e mais amadurecida, porque menos ingênua e mais experiente, de quem já aprendeu com a experiência.

Quase todas das professoras, 99% como mostra o gráfico a seguir,

compreendem que a prática do registro auxilia no seu trabalho docente, enquanto

apenas 1% não percebe essa importância do registro no seu trabalho pedagógico.

Cerca de 10% das professoras defendem que o registro auxilia no

planejamento diário, 35% na avaliação das crianças e 44% que o registro auxilia na

reflexão da prática.

Gráfico 10: A prática do registro auxilia no trabalho docente

Fonte: Elaborado pela autora, 2011.

37

As professoras descreveram:

“O registro ajuda no ato de refletir sobre as atividades em sala,

para relembrar acontecimentos no trabalho com as crianças.”

“O registro é a base para eu desempenhar e dar continuidade

no meu trabalho junto às crianças.”

“Com o registro tenho suporte para conhecer o grupo de

crianças e para a proposição dos conteúdos.”

“Através do registro podemos ter um outro olhar sobre a nossa

prática pedagógica.”

“É importante para avaliar as crianças em vários aspectos, para

saber como elas realizam as brincadeiras, as atividades...”

“O registro e a documentação pedagógica relatam as

informações e particularidades do grupo e das crianças

individualmente no decorrer das propostas, suas percepções,

inseguranças, desafios e conquistas”.

De acordo com Malaguzzi (1999), a documentação possibilita às crianças e

Gráfico 11: Forma que o registro auxilia no trabalho docente

Fonte: Elaborado pela autora, 2011.

38

aos professores a construção de memória que permite revisitar falas e ações

construindo novos significados. Documentar implica reconhecer o valor do trabalho,

levar a sério as produções e fala das crianças.

O processo de documentação instiga os esforços das crianças em se fazer

entender permitindo-lhes reformular suas indagações e seus pensamentos,

aprendendo a escutar as outras, enquanto constroem em conjunto seus significados

e relacionamentos.

Para os adultos, o processo de documentação amplia o nosso entendimento sobre os conceitos que as crianças estão elaborando, sobre as teorias que elas estão construindo e sobre os questionamentos que elas propõem. O processo de documentação nos une como comunidade de aprendizagem e nos desafia a expressar os nossos pensamentos, articulada e publicamente, e a aceitar a responsabilidade, como sugere Carla Rinaldi (1998), de escutar atentamente a fim de compreender o ponto de vista dos outros. (GANDINI; GOLDHABER, 2002, p. 161).

Registrar é um ato fundamental, pois de acordo com Ostetto (2008, p. 22), “O

ato de registrar poderá ajudar no exercício de “desabituar-se”. Escrevendo,

poderemos limpar os olhos, clarear a visão, para melhor percebermos as crianças

que estão em nosso grupo, assim como as relações que vamos construindo”.

Ao registrar, percebemos os fatos do dia a dia e aprendemos a ver cada

criança em particular e os acontecimentos em grupo, que às vezes, passam

despercebidos na correria habitual. E que cada criança está em busca de tempo

para viver a sua infância, tempo este que nem sempre cabe no planejamento diário

do professor.

A documentação é uma forma de relacionamento do professor com o aluno,

pois ele elabora junto com as crianças a memória pessoal, que lhes deixa reconstruir

por si sós a experiência adquirindo a consciência das mudanças. O professor

intervém para dar estímulo à produção e a organização de marcas representativas

das experiências vividas, de maneira que possibilite a percepção do percurso,

favorecendo o processo de reconstrução da história.

4.3 AS FORMAS DE REGISTRO E DOCUMENTAÇÃO

O registro e a documentação podem ser produzidos de várias maneiras, por

exemplo, podem ser observações manuscritas, registros de áudio ou vídeo,

39

fotografias ou por meio do próprio trabalho realizado pelas crianças, ou seja, das

produções infantis. São instrumentos que se tornam uma fonte importante de dados,

informações e materiais que podem auxiliar as professoras a refletir diariamente

sobre as experiências vividas e permitem construir teorias que são baseadas no

conhecimento adquirido através desta prática. Permitem também analisar a maneira

como a relação do professor com ele mesmo e com a criança está sendo construída.

Para Dalhberg, Moss e Pence (2003, p. 194) a Documentação Pedagógica é:

[...] como conteúdo, é o material que registra o que as crianças estão dizendo e fazendo, é o trabalho das crianças e a maneira com que o pedagogo se relaciona com elas e com o seu trabalho. Tal material pode ser produzido de muitas maneiras e assumir muitas formas – por exemplo, observações manuscritas do que é dito e feito, registros em áudio e vídeo, fotografias, gráficos de computador, o próprio trabalho das crianças, incluindo, por exemplo, arte realizada no atelier com o atelierista. Este material torna o trabalho pedagógico concreto e visível (ou audível) e, como tal, é um ingrediente importante para o processo da documentação pedagógica.

Quanto à frequência dos registros, de acordo com o gráfico abaixo, 12% das

professoras os realizam diariamente e/ou semanalmente, 6% quinzenalmente, 48%

semanalmente e 35% diariamente.

Ao serem questionadas sobre o local e horário em que realizam os registros,

Gráfico 12: Frequência que os registros são realizados

Fonte: Elaborado pela autora,2011.

40

as professoras responderam, conforme gráfico abaixo que 14% os realizam durante

as aulas, 17% durante os intervalos das aulas, 28% no fim do dia e 31% realizam os

registros em casa. Ou seja, elas encontram lugares e espaços para registrar, seja

durante o descanso das crianças, no horário da educação física, ao final do dia

quando parte já foi embora, mas a maioria realiza os registros em casa.

As professoras expuseram como fazem seus registros e suas maiores

dificuldades:

“Utilizo muito as fotos no meu registro, gosto da documentação

fotográfica para relembrar o acontecido”.

“Geralmente realizo os meus registros, em casa no final do dia,

o que falta é tempo.”

“Faço os registros no término da tarde, quando as crianças vão

embora. A dificuldade é não conseguir registrar tudo que

considero importante devido à correria do dia a dia.”

“Em momentos organizados pela coordenação do CEI, onde

Gráfico 13: Local e horário de realização do registro

Fonte: Elaborado pela autora,2011.

41

disponibilizam momentos para as professoras estarem juntas

relatando as suas dificuldades.”

“Na sala, nos momentos de atividades externas, como o parque

ou a aula de educação física. Tenho mais dificuldades e

registrar quando estou sozinha com as crianças.”

“Durante a jornada, faço pequenos bilhetes e ao final do dia

junto todos em um texto.”

De acordo Freire (1996), uma das maiores dificuldades das professoras é

tornar essa prática uma tarefa indispensável. O registro reflexivo é um instrumento

de aperfeiçoamento do pensar e é necessário reservar tempo, para realizá-lo.

O registro dos fatos, situações e acontecimentos que envolvem o dia-a-dia da

sala de aula, torna-se um importante instrumento para o professor que

comprometido, busca constantemente aprimorar sua prática junto à turma de

crianças. Segundo Ostetto, Oliveira e Messina (2002, p. 24), “Registrar é

responsabilizar-se por seus desígnios, seus projetos. É lançar-se para frente. Ver-se

e rever-se. É envolver-se com o resgate do seu processo criativo que envolve,

necessariamente o resgate da sua palavra.”

Dalhberg; Moss, Pence (2003, p.194), dizem que a documentação

pedagógica precisa ser “interpretada e reinterpretada junto com outros educadores e

crianças”. Mas, para que tanto os registros escritos, como os fotográficos ou fílmicos

sejam considerados instrumentos importantes para conhecer as crianças, de acordo

com Gandini e Goldhaber (2002, p. 152)

[...] é necessário que registremos o que vemos e ouvimos, elaborando registros significativos das nossas observações. Podemos fazer anotações rápidas que posteriormente reescreveremos de maneira extensa, gravar em fitas cassete as vozes e as palavras das crianças ao interagirem entre si e conosco. Também podemos tirar fotografias e slides, ou até mesmo gravar fitas de vídeo que mostrem as crianças e os professores em atividade. O próprio trabalho das crianças e as fotografias desse trabalho devem ser considerados essenciais.

Documentar implica reconhecer o valor do trabalho, levar a sério as

produções e fala das crianças. Edwards, Gandini e Forman (1999), atribuem

42

diversas finalidades para prática de documentar os processos pedagógicos:

• Mostrar para os pais, do quanto, do que e do como os seus filhos estão

aprendendo e se desenvolvendo;

• Deixar a criança revisitar as suas experiências, olhando o que fizeram e

ouvindo o que disseram;

• Garantir que o grupo pode crianças e cada criança individualmente, possa

se observar de um ponto de vista exterior enquanto está aprendendo, de modo a

perceberem o quanto suas realizações são significativas;

• Permitir que os educadores se tornem pesquisadores de suas práticas

desvelando-as, de maneira que possam reconstruir-se em seus reconstituir e

reinterpretar suas aprendizagens enquanto acompanham a caminhada do

aprendizado de seus alunos.

Por meio da documentação os professores escutam e observam as crianças,

possibilitando conhecê-las melhor para respeitá-las. É uma forma cooperativa de

leitura das experiências e reflexão sobre elas, que envolve a coleta de informações,

a seleção de dados e a sua interpretação (GANDINI, GOLDHABER, 2002). A

documentação permite entender como as crianças constroem e exploram a sua

leitura de mundo, e como ocorrem seus processos de aprendizagem.

43

5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Chegar ao final da pesquisa implica em retomar o problema e os objetivos a

fim organizar as conclusões tecidas ao longo da investigação, e descrever os

avanços em termos de produção do conhecimento.

Após realizar o levantamento bibliográfico, vivenciar na pesquisa de campo a

realidade das professoras de Educação Infantil na Rede Municipal de Ensino de São

José, acredito ter respondido, ainda que de maneira provisória, a pergunta da

pesquisa: O registro e a documentação pedagógica estão presentes no cotidiano

das professoras da Rede Municipal de São José, e se estão presentes, contribuem

para a reflexão e replanejamento das práticas cotidianas?

Pude confirmar a inserção do registro das práticas e documentação

pedagógica nas Instituições, entretanto, em cada contexto a documentação foi/está

sendo constituída de modo particular, à luz das necessidades e do percurso de cada

grupo. Trata-se de um instrumento em construção, por isso não existe uma forma de

documentar, mas inúmeras, tantas quanto forem às necessidades e realidades.

Nesse processo, o registro e a documentação pedagógica foram sendo

compreendidos nas seguintes categorias que surgiram das análises das respostas

das professoras: A Documentação Pedagógica na Educação Infantil, A Observação

e o Registro como Dimensões Reflexivas da Prática, O Registro do Vivido e as

Formas de Registro e Documentação.

O registro implica na produção de marcas sobre uma experiência, e está

ligado a observação e ao planejamento. É com base nas várias formas de registro

que são produzidas as documentações, entendidas como a organização de dados

com vista a comunicação de experiências.

A documentação - produzida não somente pelas professoras, mas também

pelas crianças, possibilita a apropriação do conhecimento, a tomada de consciência

de seu percurso na construção da sua identidade. Possibilita às famílias a

oportunidade de conhecer os trabalhos desenvolvidos pelo grupo e as conquistas

das crianças. Favorece também, o reconhecimento da Instituição de Educação

Infantil como espaço de aprendizagem, de desenvolvimento, de produção de

saberes e da criança como produtora de cultura.

O tempo e lugar são fatores de relevância na produção dos registros e da

documentação pedagógica e que deve ser oferecido para que as professoras

44

possam realizar os seus registros e sistematizá-los ao planejamento, de maneira que

nos espaços de formação em serviço, esses olhares sejam partilhados com o outro e

mediados pela teoria.

Com a utilização da documentação pedagógica é necessário ter ações

intencionais, que visam considerar as aprendizagens constituídas pelas crianças

bem como a meditação sobre elas, para alcançar os fins considerados fundamentais

orientados por uma prática reflexiva que repense os caminhos traçados para as

formas de ensinar as crianças.

Desta forma, esta pesquisa leva a considerar que o registro e a

documentação pedagógica são ferramentas que fazem parte da atividade docente

das professoras de Educação Infantil da Rede Municipal de São José e contribuem

significativamente para a formação das mesmas, a partir do momento que são

interpretadas e discutidas dentro e fora de sala por meio dos relatos e das

experiências vividas ao longo do caminho percorrido.

45

REFERÊNCIAS

ABRAMOWICZ, A; WAJSKOP, G. Creches atividades para crianças de zero a seis anos. São Paulo: Moderna, 1995. BODNAR, Rejane. A Observação e o Registro Pedagógico na Formação em Serviço: um estudo sobre as relações teórico práticas com professoras da educação infantil. 2006, dissertação (Mestrado em Educação), UFSC. BOGDAN, R. e BIKLEN, S.K. Qualitative Research for Education. Boston, Allyn and Bacon, inc., 1982. BRASIL. MEC. Referenciais Curriculares para Educação Infantil. Brasília: MEC, SEB, 1996.

_______.MEC. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC, SEF, 1998, v.1. v.2, v.3 DAHLBERG, Gunilla; MOSS, Peter; PENCE, Alan. Documentação pedagógica: uma prática para reflexão e para a democracia. In: _____. Qualidade na educação da primeira infância. Porto Alegre: Artmed, 2003. p.189-208. ______. Beyond Quality in Early Childhood Development and Care: Postmodern perspectives. London, Falmer Press, 1999.

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46

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APÊNDICE 1 – TABULAÇÃO DOS DADOS

Idade

Ocorrência Percentual

18-25 anos 2 1,87%

26-30 anos 19 17,76%

31-40 anos 43 40,19%

41-50 anos 39 36,45%

Acima de 50 anos 4 3,74%

Total 107 100,00%

Tempo de atuação

Ocorrência Percentual

Até 2 anos 6 5,61%

3-5 anos 19 17,76%

6-10 anos 29 27,10%

Acima de 11 anos 53 49,53%

Total 107 100,00%

Tempo que está formada

Ocorrência Percentual

Até 2 anos 17 15,89%

3-5 anos 38 35,51%

6-10 anos 22 20,56%

Acima de 11 anos 30 28,04%

Total 107 100,00%

Participa de formação continuada

Ocorrência Percentual

Sim 107 100,00%

Não 0 0,00%

Total 107 100,00%

Últimos cursos que participou

Ocorrência Percentual

Inclusão 20 18,69%

Semana da Educação 30 28,04%

Brincadeiras 13 12,15%

Dimensões 22 20,56%

Documentação Pedagógica 9 8,41%

Outros 13 12,15%

Total 107 100,00%

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Entendimento sobre o registro e documentação pedagógica

Ocorrência Percentual

É o registro de produções das crianças 32 29,91%

É o registro do cotidiano do CEI 23 21,50%

É o registro da prática pedagógica 33 30,84%

Outros 18 16,82%

Não sabe/ Não conhece 1 0,93%

Total 107 100,00%

Experiência com registro e documentação pedagógica em sua formação inicial

Ocorrência Percentual

Sim 72 67,29%

Não 22 20,56%

Não respondeu 13 12,15%

Total 107 100,00%

Realiza registro das práticas cotidianas

Ocorrência Percentual

Sim 104 97,20%

Não 3 2,80%

Total 107 100,00%

Frequência de registros das práticas cotidianas

Ocorrência Percentual

Diários 36 34,62%

Semanais 50 48,08%

Quinzenais 6 5,77%

Diários e Semanais 12 11,54%

Total 104 100,00%

Momento que produz os registros

Ocorrência Percentual

Durante as aulas 15 14,02%

Durante os intervalos das aulas 18 16,82%

No fim do dia 30 28,04%

Em casa 33 30,84%

Outros 11 10,28%

Total 107 100,00%

Os registros são utilizados para

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Ocorrência Percentual

Rever a prática 28 26,17%

Acompanhar o a evolução do grupo 37 34,58%

Realizar planejamento das atividades 24 22,43%

Outros 15 14,02%

Não respondeu 3 2,80%

Total 107 100,00%

Acredita que o registro auxilia no trabalho docente

Ocorrência Percentual

Sim 106 99,07%

Não 1 0,93%

Total 107 100,00%

Como o registro auxilia no trabalho docente

Ocorrência Percentual

Reflexão das práticas 47 43,93%

Avaliação das crianças 37 34,58%

Planejamento diário 11 10,28%

Outros 7 6,54%

Não responderou 5 4,67%

Total 107 100,00%

Tabulação dos Dados Fonte: elaborada pelo autor, 2011.

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APÊNDICE 2 - QUESTIONÁRIO

1. Qual a sua idade?

( ) entre 18 e 25; ( ) 26 e 30; ( ) 31 e 40; ( ) 41 e 50; ( ) acima de 50 anos.

2. Tempo de atuação na área:

( ) até 2 anos; ( ) 3 a 5 anos; ( ) 6 a 10 anos; ( ) acima de 11 anos.

3. Há quanto tempo está formada?

..................................................................................................................................

4. Participa de formação continuada? Quais os últimos cursos que participou?

..............................................................................................................................................

......................................................................................................................

5. O que entende por registro e documentação pedagógica?

..............................................................................................................................................

......................................................................................................................

6. Teve alguma experiência com a documentação e o registro na sua formação inicial

como professora? Qual?

..............................................................................................................................................

......................................................................................................................

7. Realiza o registro e documentação das práticas cotidianas? Se realiza, com qual

frequência:

( ) diários; ( ) semanais; ( ) quinzenais

8. Em que momento os produz? Quais as dificuldades?

..............................................................................................................................................

......................................................................................................................

9. O que faz com os registros? Como os utiliza?

..............................................................................................................................................

......................................................................................................................

10. Você acredita que o registro auxilia no seu trabalho como professora ou não? Por

quê?

..............................................................................................................................................