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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ ALINE PANDOLFO A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MUNICÍPIO FRENTE AO ABANDONO DOS ANIMAIS São José 2010

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

ALINE PANDOLFO

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MUNICÍPIO FRENTE AO ABANDONO DOS ANIMAIS

São José

2010

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ALINE PANDOLFO

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MUNICÍPIO FRENTE AO ABANDONO DOS ANIMAIS

Monografia apresentada à Universidade do

Vale do Itajaí – UNIVALI , como requisito

parcial a obtenção do grau em Bacharel em

Direito.

Orientador: Prof. MSc. Rafael Burlani Neves

São José

2010

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ALINE PANDOLFO

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MUNICÍPIO FRENTE AO ABANDONO DOS ANIMAIS

Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de bacharel e

aprovada pelo Curso de Direito, da Universidade do Vale do Itajaí, Centro de

Ciências Sociais e Jurídicas.

Área de Concentração: Direito Ambiental; Direito Administrativo.

São José, 24 de Novembro de 2010.

Prof. MSc. Rafael Burlani Neves UNIVALI – Campus de São José

Orientador

Prof. MSc. Maria Helena Machado UNIVALI – Campus de São José

Membro

Prof. Dr. Daniela Mesquita Leutchuk de Cademartori UNIVALI – Campus de Biguaçu

Membro

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Dedico este trabalho a todos os animais que sofreram e sofrem qualquer tipo de

violência e a seus anjos da guarda que dedicam muito carinho e atenção para esses

seres especiais.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço em primeiro lugar aos meus pais, Ademir Pandolfo e Miria de

Jesus Mallmann Pandolfo, que me deram a oportunidade de estar concluindo o

curso de Direito.

Agradeço as minhas irmãs, Liane Pandolfo e Alisen Pandolfo, por me

apoiarem todos esses anos.

Agradeço imensamente ao meu namorado, Bruno Coelho Probst, que

durante esses cinco anos agüentou minhas preocupações, lamentações e meu deu

forças.

Agradeço ao meu Professor Orientador Rafael Burlani Neves que tornou

este trabalho possível.

Agradeço a todas as minhas amigas da faculdade pelos momentos que

passamos juntas, pelas experiências trocadas e pelo o apoio e força que me fizeram

chegar ate aqui.

Por fim agradeço a todos que colaboraram, direta ou indiretamente, com este

trabalho.

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“A compaixão pelos animais está intimamente ligada à bondade de caráter e pode

ser seguramente afirmado que quem é cruel com os animais não pode ser um bom

homem."

Arthur Schopenhauer

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade

pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

São José, 24 de Novembro de 2010.

Aline Pandolfo

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RESUMO

O presente trabalho apresenta a discussão sobre a responsabilidade civil do

Município em relação aos animais abandonados. A pesquisa envolveu o texto

Constitucional, leis e doutrinas referentes ao Direito Administrativo e ao Direito

Ambiental. Em um primeiro momento buscou-se analisar a sociedade de risco e

seus aspectos, o estado de direito ambiental e suas funções, bem como seus

princípios basilares, para uma melhor definição e compreensão do problema aqui

analisado. A responsabilidade civil, penal e administrativa foram os temas abordados

em seguida, porém com foco na responsabilidade civil e como esta deve ser

aplicada em matéria ambiental, com o intuito de enquadrar o tipo de

responsabilidade decorrente do abandono de animais. Para chegar a uma conclusão

foram analisados a teoria do risco integral e da responsabilidade civil objetiva e os

aspectos da omissão, da inércia e da falha na prestação de serviços públicos de

cuidados com os animais, com o intuito de ser assegurada a responsabilização e a

conseqüente reparação dos danos.

Palavra-chave: Direito ambiental. Animais. Responsabilidade civil.

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ABSTRACT

The project presents the discussion about the municipality civil liability in relation to

abandoned animals. The search involved the constitution text, laws and doutrines

referent to Administrative Law and Evironmental Law. At first moment, it had to

analyze the risk society and its aspects, the status of environmental law and its

functions and its basic principles for a better definition and understanding of the

problem analyzed here. Then, the civil liability, criminal and administrative were the

adressed themes, but with a focus on civil liability and how it should be applied in

environmental matters, in order to fit the type of responsibility for abandoned animals.

To reach a conclusion, were analyzed the theory of Full risk and objective civil liability

and the aspects of omission, of inertia and the failure in the provision of public

services for the animals, in order to be ensured the accountability and consequently

repair damage.

Keyword: Environmental Law. Animals. Civil liability.

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ROL DE ABREVIATURAS

Ampl. – Ampliada

Art. – Artigo

Atual. – Atualizada

Ed. – Edição

Org. – Organizadores

Pág. – Página

Rev. – Revisada

Trad. – Tradução

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ROL DE CATEGORIAS

Direito Ambiental

Ciência jurídica que estuda, analisa e discute questões e problemas ambientais, com

o finalidade de proteger o meio ambiente e melhorar as condições de vida no

planeta.1

Meio Ambiente

De acordo com o art. 3°, I da Lei 6.938/81 meio ambiente é “o conjunto de

condições, leis, influencias e interações de ordem física, química e biológica, que

permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”.2

Estado

Núcleo social politicamente organizado, com poder soberano a ser exercido sobre

um determinado território, cumprindo finalidades especificas.3

Administração Pública

Compreende pessoas jurídicas, órgãos e agentes públicos que são incumbidos de

exercer as funções administrativas.4

1 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª ed. rev., atual. e ampl. São

Paulo: Editora Saraiva, 2006. Pág. 27. 2 BRASIL. Lei 6.938/81. Lex: Vade Mecum compacto. 3ª Ed. atual., e ampl. São Paulo:

Saraiva, 2010. 3 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. rev., ampl. e atual.

Bahia: Editora Podivm, 2008. Pág. 30. 4 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. São Paulo: Editora Atlas,

2003. Pág 54.

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Serviço Público

Função administrativa que é exercida pelo Estado e seus delegados, e consiste em

prestações materiais ou especificas que geram aos seus administrados benefícios

de variadas ordens.5

Poluidor

Conforme o art. 3°, IV da Leu 6.938/81 poluidor é toda “pessoa física ou jurídica, de

direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade

causadora de degradação ambiental”.6

Dano Ambiental

É uma lesão aos recursos ambientais, provocada por pessoa física ou jurídica,

pública ou privada.7

5 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. rev., ampl. e atual.

Pág. 207. 6 BRASIL. Lei 6.938/81. Lex: Vade Mecum compacto. 3ª Ed. atual., e ampl. São Paulo:

Saraiva, 2010. 7 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 5ª ed. ampl.

São Paulo: Saraiva, 2004. Pág. 41.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 14

1 SOCIEDADE DE RISCO ........................................................................................ 16

1.1 ASPECTOS DA SOCIEDADE DE RISCO ............................................................................................... 16

1.2 CONCEITO DE ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL ............................................................................. 20

1.3 PRINCÍPIOS DO ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL ........................................................................... 24

1.3.1 Princípio do Desenvolvimento Sustentável ................................................................................. 25

1.3.2 Princípio Democrático .................................................................................................................. 27

1.3.3 Cooperação Ambiental ................................................................................................................. 28

1.3.4 Princípio do Poluidor-Pagador ..................................................................................................... 29

1.3.5 Princípio da Precaução ................................................................................................................. 30

1.3.6 Princípio da Prevenção ............................................................................................................ 32

1.3.7 Princípio da Participação .............................................................................................................. 33

1.3.8 Princípio da Responsabilização .................................................................................................... 34

2 O ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL E OS MECANISMOS DE

RESPONSABILIDADE: CIVIL, ADMINISTRATIVA E PENAL ................................... 36

2.1 RESPONSABILIDADE CIVIL ............................................................................................................... 37

2.1.1 Teorias da Culpa ........................................................................................................................... 39

2.1.2. Causas Excludentes de Responsabilidade ................................................................................... 43

2.1.2. Responsabilidade Civil Ambiental ............................................................................................... 45

2.2. RESPONSABILIDADE PENAL ............................................................................................................ 46

2.2.1. Penas Aplicáveis às Pessoas Jurídicas ......................................................................................... 47

2.3. RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA .......................................................................................... 50

3 O MUNICÍPIO COMO RESPONSÁVEL POR DANOS AOS ANIMAIS EM

DECORRÊNCIA DE SEU ABANDONO .................................................................... 54

3.1 A TEORIA DA RESPONSABILIDADE INTEGRAL E A RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA ................. 54

3.2 ASPECTOS DA OMISSÃO, DA INÉRCIA E DA FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO NOS

CUIDADOS COM OS ANIMAIS ................................................................................................................ 59

CONCLUSÃO ........................................................................................................... 68

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 70

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14

INTRODUÇÃO

O direito ambiental é um ramo ainda em expansão e por isso merece toda a

atenção dos profissionais e estudantes da área jurídica. A responsabilidade civil do

Município tem uma grande ligação com este tema, já que o bem ambiental deve ser

preservado para as presentes e futuras gerações.

O tema deste trabalho é a responsabilidade civil do Município em relação a

omissão de seus agentes na prestação dos serviços públicos de cuidados com os

animais abandonados. A escolha do tema se deu devido ao interesse pessoal da

autora, e tem como objetivo definir a responsabilidade do Município pelos animais

abandonados. Esta responsabilidade deverá ser lançada tanto por questões

relativas à existência quanto a questões sanitárias, pois não se trata somente da

vida dos animais, mas também da vida humana, que pode ser prejudicada devido a

proliferação de doenças que animais em estado de abandono podem transmitir.

Para o desenvolvimento do presente trabalho foram formulados os seguintes

questionamentos: 1) O Município deve ser responsabilizado pelos animais

abandonados nas ruas?; 2) Sob qual teoria da responsabilidade civil será baseada

esta responsabilização?; e 3)Deve existir alguma punição para o Município que for

responsabilizado caso ele não cumpra seu dever?

As hipóteses consideradas para responder os questionamentos formulados

acima, sempre baseadas no art. 225 da Constituição Federal, são: 1) Sim, se houver

omissão dos agentes públicos no cuidado com os animais abandonados. Esta

responsabilização deriva da teoria da responsabilidade civil objetiva baseada no

risco integral. Caso o Município não cumpra com o seu dever ele poderá ser

penalizado civil e administrativamente; 2) Não, pois o Município não pode ser

responsabilizado por atos de terceiros, baseado nas excludentes de

responsabilidade civil, aplicadas pela teoria subjetiva, nem poderá ser penalizado.

Com a elaboração das hipóteses passou-se a formulação das variáveis que

podem influenciar o resultado desta pesquisa: 1) A alteração da legislação ambiental

no tocante a teoria da responsabilidade objetiva; e 2) A mudança no entendimento

de diversos Tribunais do país.

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15

O método adotado foi o dedutivo, e a técnica de pesquisa de documentação

indireta, partindo-se da análise da Constituição Federal e outras leis e da pesquisa

bibliográfica em doutrinas que versem sobre todos os temas aqui abordados, em

especial os que tratam sobre Direito Administrativo e Direito Ambiental.

O trabalho foi elaborado em três capítulos distintos, sendo o primeiro voltado

para a definição de sociedade de risco, estado de direito ambiental e seus princípios

norteadores, pois só fazendo esta distinção é possível compreende a profundidade

do tema abordado neste trabalho. O segundo capítulo tem por objetivo conhecer e

identificar os tipos de responsabilidade existentes, sendo elas a civil, a penal e a

administrativa, porem com maior ênfase na responsabilidade civil, pois de antemão

sabe-se que é ela que deve ser aplicada no problema analisado por este trabalho. A

responsabilidade a ser lançada ao Município em relação aos animais abandonados

está delineada no terceiro capitulo, onde também estão enumerados os aspectos

que tornam essa responsabilização possível. O trabalho se encerra com as

Considerações Finais, onde são apresentados os pontos conclusivos deste estudo e

a estimulação para a continuidade das pesquisas voltadas aos Direitos dos animais.

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16

1 SOCIEDADE DE RISCO

A sociedade de risco é aquela que pode sofrer as conseqüências de uma

catástrofe ambiental a qualquer tempo, por conseqüência de seu crescimento

econômico contínuo. Há uma evolução na sociedade e um agravamento nos

problemas, no entanto, não existe uma adequação dos mecanismos jurídicos para

solucionar as dificuldades dessa nova sociedade.8

Uma característica que pode ser associada a esse novo modelo de

sociedade é a proliferação de ameaças imprevisíveis ou invisíveis, para as quais os

instrumentos de controle são incapazes de prevê-las ou simplesmente falham.9

Assim, conforme Leite10, pode-se afirmar que a sociedade moderna criou um

modelo de desenvolvimento tão complexo e avançado que faltam meios capazes de

controlar e disciplinar tal desenvolvimento. E como conseqüência desta evolução o

abandono de animais nas ruas dos Municípios está cada vez maior, gerando

problemas múltiplos para toda a coletividade.

1.1 ASPECTOS DA SOCIEDADE DE RISCO

Sociedade de risco, para Ulrich Beck11, é uma fase da sociedade moderna,

onde os riscos sociais, políticos, ecológicos e individuais criados pela ocasião do

8 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2007. Pág. 132. 9 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. Pág.12. 10 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 132. 11 BECK, Ulrich. La Sociedade Del Riesgo. Trad. De Jorge Navaro, Daniel Jiménez, Maria Rosa Borras. Madri: Paidós, 1998. Pág. 27.

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17

momento de inovação tecnológica escapam das instituições de controle e proteção

da sociedade industrial.

Os riscos diferem dos perigos porque caracterizam uma fase do

desenvolvimento da modernidade, na qual a interpretação de diversas ameaças a

que a sociedade sempre esteve exposta passam a ser realizadas, sendo

condicionadas diretamente a ação humana.12 Para um melhor entendimento pode-se

fazer uma distinção dos riscos em externo ou fabricado. O externo é o risco vindo de

fora, da natureza ou das fixidades da tradição, e o fabricado é o risco criado por nós,

pelo crescente conhecimento sobre o mundo, no qual temos pouca experiência. Os

riscos ambientais, como o aquecimento global, se encaixam nesta última

categoria.13 Conseqüentemente há um perfil dos risco específicos para a nova

sociedade, que não expressa mais o resultado exclusivo de eventos involuntários e

naturais.14

A partir deste ponto procura-se submeter as contingências da natureza à

pretensão de controlabilidade, que supostamente poderia ser atingida mediante a

ação racional da atividade humana. Os riscos na modernidade pressupõem e

dependem de decisões, sendo o resultado e o efeito das mesmas. Surgem portanto,

da transformação das incertezas e dos perigos em decisões.15

O risco é a expressão característica das sociedades que se organizam sob a

ênfase da inovação, da mudança e da ousadia.16 Pode-se também acompanhar o

ensino de Giddens17 quando diz que o “risco se refere a infortúnios ativamente

avaliados em relação a possibilidades futuras”. Há de se questionar a prudência e a

cautela da ciência ao lidar com todas as inovações tecnológicas e ambientais, já que

12 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. Pág.13. 13 GIDDENS, Anthony. Mundo em descontrole: o que a globalização está fazendo de nós. Trad. De Maria Luiza X. de A. Borges. 4ª ed. Rio de Janeiro: Editora Record, 2005. Pág. 36. 14 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. Pág.13 15 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. Pág.13-14. 16 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 132. 17 GIDDENS, Anthony. Mundo em descontrole: o que a globalização está fazendo de nós. Trad. De Maria Luiza X. de A. Borges. Pág. 33.

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18

estão causando riscos sociais não mensuráveis, mesmo trazendo alguns

benefícios.18

A falta de conhecimento científico e a sua incerteza gera uma disfunção, o

que pode ocasionar duas formas de risco ecológico possíveis, conforme Leite19,

atuando o Estado como mero gestor do controle dos riscos, de forma paliativa:

a) Risco concreto ou potencial – visível e previsível pelo conhecimento, e

b) Risco abstrato – invisível e imprevisível pelo conhecimento humano.

Toda essa difusão subjetiva, temporal e espacial das situações de risco nos

conduz a pensar em um meio ambiente de forma diferente, ultrapassando o modelo

jurídico tradicional. Por isso, o risco hoje é considerado um dos maiores problemas

enfrentados quando se objetiva a proteção jurídica do meio ambiente.20

O dano ambiental tem condições de projetar seus efeitos no tempo sem

haver uma certeza e um controle do seu grau de periculosidade. Essa proliferação

de situações de risco atinge não só a geração presente21, mas na maioria das vezes

manifesta-se em momentos temporalmente muito distantes daquele em que foram

gerados, prejudicando severamente a visibilidade das relações de causalidade e

imputação.22

Considerando os principais comprometimentos ambientais terrestres,

podemos visualizar, de acordo com José Rubens Morato Leite e Patryck de Araújo

Ayala23, três dimensões de risco:

18 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 132. 19 LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araujo. Transdisciplinariedade e a proteção jurídico-ambiental em sociedade de risco: direito, ciência e participação. In: LEITE, José Rubens Morato, FILHO, Ney de Barros Bello (org.). Direito Ambiental contemporâneo. Barueri, São Paulo: Manole, 2004. Pág. 102-103. 20 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 133. 21 LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araujo. Transdisciplinariedade e a proteção jurídico-ambiental em sociedade de risco: direito, ciência e participação. In:LEITE, José Rubens Morato, FILHO, Ney de Barros Bello (org.). Direito Ambiental contemporâneo. Pág. 103. 22 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. Pág.15-16. 23 LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araujo. Transdisciplinariedade e a proteção jurídico-ambiental em sociedade de risco: direito, ciência e participação. In:LEITE,

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19

a) Problemas de escopo mundial no sentido de que seus efeitos podem

comprometer todo o planeta, sendo sua origem relativamente difusa;

b) Problemas de escopo transnacional, no sentido de que seus efeitos podem

comprometer diretamente mais de uma nação e;

c) Problemas de escopo local.

Como uma forma de resposta a essa problemática crucial, um novo conjunto

de normas espalhou-se pelos ordenamentos jurídicos contemporâneos, dando

causa a revolucionárias transformações.24 Como exemplo encontram-se previstos

pelo Direito Ambiental Brasileiro alguns instrumentos que possibilitam a gestão dos

novos riscos ambientais, havendo apenas a necessidade de serem efetivamente

implementados.25

Assim, o Direito Ambiental acaba por exercer uma função meramente

figurativa na sociedade de risco, atuando de forma simbólica ante a necessidade de

uma efetiva proteção do meio ambiente. Isso cria a falsa impressão de que existe

uma ativa e completa assistência ecológica por parte do Estado, produzindo uma

realidade fictícia, na qual a sociedade é mantida confiante e tranqüila em relação

aos padrões de segurança existentes,26 principalmente nos Municípios, onde a

população pressupõe que está em segurança, porém o abandono e o descaso com

os animais pode afetar está dita segurança.

Este ramo do direito, com o reconhecimento dos riscos da atualidade,

poderá ser alicerçado sob novas bases que irão viabilizar um meio ambiente

José Rubens Morato, FILHO, Ney de Barros Bello (org.). Direito Ambiental contemporâneo. Pág. 358-359. 24 LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araujo. Transdisciplinariedade e a proteção jurídico-ambiental em sociedade de risco: direito, ciência e participação. In: LEITE, José Rubens Morato, FILHO, Ney de Barros Bello (org.). Direito Ambiental contemporâneo. Pág. 359. 25 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 136. 26 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 135.

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20

ecologicamente equilibrado para as gerações presentes e futuras através da efetiva

utilização de instrumentos que ajudem a salvaguardar o bem ambiental em risco.27

A complexidade da atual sociedade está diretamente ligada a conformação

do Estado à ficção do Estado de Direito Ambiental, que visa e criar e disponibilizar

os meios eficazes à proteção do meio ambiente.28

1.2 CONCEITO DE ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL

Construir um Estado de Direito do Ambiente é possível, porém muito difícil,

tendo em vista a complexidade dos problemas emergentes e da transição que a

sociedade enfrenta com a globalização e outros fenômenos.29

Em um planeta marcado por desigualdades sociais, empobrecimento e

degradação ambiental, construir um Estado de Direito Ambiental parece ser uma

tarefa árdua ou ainda uma utopia já que o consumo e a produção capitalista tomam

conta dos recursos, que são finitos.30 Boaventura de Souza Santos31 nos ensina que

esta utopia é na verdade democrática porque “a transformação que aspira

pressupõe a repolitização da realidade e o exercício radical da cidadania individual e

colectiva, incluindo nela a carta dos direitos humanos da natureza”.

Para discutir-se o Estado de Direito Ambiental é necessário ponderar que

são tarefas prioritárias dele os valores ambientais, porém fundados em normas

27 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 136. 28 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 136. 29 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. Pág. 29. 30 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 149. 31 SANTOS, Boaventura de Souza. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 7ª ed. São Paulo: Cortez Editora, 2000. Pág.44.

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constitucionais.32 E pode-se estender os ensinamentos de Norberto Bobbio33 quando

diz que “uma coisa é falar dos direitos do homem, direitos sempre novos e cada vez

mais extensos, e justificá-los com argumentos convincentes; outra coisa é garantir-

lhes uma proteção efetiva” para os direitos do meio ambiente.

A proteção do meio ambiente é tão complexa quanto a proteção dos direito

humanos, já que a primeira é um direito fundamental derivado da segunda, e pelo

fato de ter proporções planetárias, demanda instrumentos em nível internacional34,

não se restringindo apenas a estados isolados, tornando o ambiente a ser protegido

uno, sem limitações geográficas.35

Assim, inexistindo uma política globalizada sobre o meio ambiente surgem

tratados, declarações, convenções internacionais que visam justamente proteger o

bem ambiental.36 Por outro lado também pode-se verificar a discrepância entre as

Constituições no tocante ao meio ambiente, gerando assim um problema entre os

diversos países já no plano teórico, e se estendendo ao plano prático, no momento

em que devem ser tomadas medidas conjuntas que visem a qualidade do meio

ambiente.37

Para uma melhor compreensão do Estado de Direito Ambiental, Leite38

vislumbra quatro postulados básicos, sendo eles:

1) O postulado globalista, que atenta para o fato de que a questão ambiental

não pode se restringir apenas a Estados isolados, mas sim em termos

supranacionais, ou em outras palavras, em termos de “Planeta”;

32 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. Pág. 31. 33 BOBBIO, Norberto. A era dos Direitos. Trad. De Carlos Nelson Coutinho. 10ª ed. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992. Pág. 63. 34 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. Pág. 32. 35 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 150. 36 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. Pág. 32. 37 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 151. 38 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 150.

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2) O postulado publicista, estabelecendo a questão ambiental no “Estado”,

tanto em dimensão espacial quanto na institucionalização dos instrumentos jurídicos

de proteção ambiental;

3) O postulado individualista, que restringe a proteção ao meio ambiente em

posição individual, e;

4) O postulado associativista, que tenta formular uma democracia de vivência

da virtude ambiental, visando uma participação democrática.

Uma solução para a proteção do meio ambiente seria uma

internacionalização das políticas de crescimento, porém criaria outros problemas,

levando transferência de soberania dos Estados, em face do modelo societário

vigente nos dias atuais. Sem contar que os verdadeiros implementadores da política

ambiental são as pequenas instituições locais, que teriam de seguir os mesmo

padrões das políticas internacionais.39 O que precisamos é de uma carta de amor a

natureza, cerceada por novos valores e novas diretrizes e que expressem princípios

de origem constitucional.40

Leite41 nos ensina que mesmo sendo abstrato o Estado de Direito do

Ambiente não podemos pensar que não existe importância nessa discussão,

devemos fazer mais, aplicar como meta ou parâmetro a definição dos pressupostos

do Estado de Direito do Ambiente.

O autor42 também indica cinco funções fundamentais para serem discutidas

e aplicadas:

a) moldar formas mais adequadas para a gestão dos riscos e evitar

irresponsabilidade organizada. Pois já que o Estado não pode ser um herói que

39 LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araujo. Transdisciplinariedade e a proteção jurídico-ambiental em sociedade de risco: direito, ciência e participação. In: LEITE, José Rubens Morato, FILHO, Ney de Barros Bello (org.). Direito Ambiental contemporâneo. Pág. 106. 40 LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araujo. Transdisciplinariedade e a proteção jurídico-ambiental em sociedade de risco: direito, ciência e participação. In: LEITE, José Rubens Morato, FILHO, Ney de Barros Bello (org.). Direito Ambiental contemporâneo. Pág. 107. 41 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 151. 42 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 152.

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garante a eliminação do risco, pode ao menos buscar a gestão dos riscos, evitando

assim a irresponsabilidade organizada;

b) juridicizar instrumentos contemporâneos, preventivos e precaucionais,

típicos do Estado pós-social, abandonando a idéia de que o Direito só se ocupa de

danos evidentes, introduzindo aparatos jurídicos e institucionais que ajudem a

garantir a preservação ambiental, como exemplo os princípios da prevenção e da

precaução, previstos no art. 225 da Constituição Federal;

c) trazer a noção, ao campo do Direito Ambiental, de direito integrado, já que a

defesa ao meio ambiente depende de considerações multitemáticas;

d) buscar a formação da consciência ambiental, ao passo que é impossível o

exercício da responsabilidade compartilhada e a participação popular sem que haja

este conhecimento, e

e) propiciar maior compreensão do objeto estudado, conceituando “ambiente”,

possibilitando uma melhor compreensão da posição ecológica do ser humano.

Essas funções fundamentais não resolveriam todos os problemas

ambientais, porém servem como uma transição da irresponsabilidade para

uma situação mais controlada, em que o Estado tem conhecimento dos

riscos e tentando de todas as formas possíveis fornecer uma qualidade de

vida melhor sob o aspecto ambiental.43

Desta forma, o Estado de Direito Ambiental tem um conceito técnico-

abstrato, que conforme Canotilho44, compreende elementos jurídicos, sociais

e políticos, buscando um ambiente favorável a plena satisfação da dignidade

humana e harmonia dos ecossistemas. Outra definição de Estado de Direito

Ambiental é a citada por Capella45 quando diz que: “a forma de Estado que

se propõe a aplicar o princípio da solidariedade econômica e social, para

alcançar um desenvolvimento sustentável orientado a buscar a igualdade

43 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 152 e 153. 44 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 153. 45 CAPELLA, Vicente Bellver. Ecologia: de lãs razones a los derechos. Ecorama, 1994. Pág. 248.

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substancial entre os cidadãos mediante o controle jurídico do uso racional do

patrimônio natural”.

Para edificar-se um Estado de Direito Ambiental em harmonia com

uma justiça ambiental é necessária a formulação de uma política de meio

ambiente baseada em princípios criados a partir das questões suscitadas

pela crise ambiental.46 Princípios que devem também ser aplicados no

tocante ao resgate e manutenção dos animais abandonados, para que eles

tenham a vida digna que lhes é assegurada pela Constituição Federal e pela

Declaração Universal dos Direitos dos Animais.

1.3 PRINCÍPIOS DO ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL

Parte-se agora para uma análise dos princípios que regem o Estado de

Direito Ambiental. Tal Estado pode ser considerado uma ciência autônoma, já que

possuiu seus próprios princípios, que em nosso país estão previstos no art. 225 da

Constituição Federal de 1988.47 O estudo dos princípios é importante, devido a

complexidade da proteção ambiental, possibilitando assim adentrar nos elementos e

instrumentos necessários para a formação de um Estado de Direito Ambiental.48

No âmbito do Direito Ambiental, os princípios adquirem uma importância

diferenciada por terem um elevado potencial de colisão com direitos fundamentais e

também tendem a assumir uma pretensa posição de valor de precedência absoluta

para manter o ambiente ecologicamente sadio.49

46 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ªed. Pág. 154. 47 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2007. Pág.28. 48 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 154. 49 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. Pág. 69.

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Os princípios ambientais constituem pedras basilares dos sistemas jurídicos

dos Estados modernos, sendo adotados internacionalmente, advindos da

necessidade se uma ecologia equilibrada e de um mecanismo eficiente na busca da

proteção ambiental, sempre de acordo com os valores culturais e a realidade social

de cada Estado.50

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, foi possível

recepcionar a lei nº 6.938 de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio

Ambiente. A referida lei faz menção a princípios globais, porém adaptados a nossa

realidade social e cultural. Em outras palavras, é uma continuação dos princípios

globais.51

Na Conferência de Estocolmo no ano de 1972 os princípios ambientais

foram inicialmente formulados, e posteriormente ampliados na ECO-92 realizado na

cidade do Rio de Janeiro.52

Os princípios ambientais podem ser de natureza explícita ou implícita. Os

explícitos estão claramente escritos nos textos legais, principalmente na

Constituição Federal. Já os implícitos decorrem do sistema constitucional, mesmo

que não estejam escritos. Vale ressaltar que tanto os princípios explícitos quanto os

implícitos são dotados de positividade, dando base ao operador jurídico para agir,

baseado em norma superior, com o fim de obter uma efetiva proteção ambiental.53

Para um melhor entendimento, neste trabalho os princípios serão estudados

separadamente, baseando-se no art. 225 da Constituição Federal de 1988, sendo

eles:

1.3.1 Princípio do Desenvolvimento Sustentável

50 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág.28. 51 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág. 29. 52 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág. 29. 53 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8ª ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Juris Editora, 2005. Pág. 25.

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O princípio do desenvolvimento sustentável foi inicialmente discutido na

Conferência de Estocolmo, e afirmado nas demais conferências, principalmente na

ECO-92, onde foi inserido o seu contexto em quase metade dos outros princípios ali

discutidos.54

Na nossa Constituição ele está presente no caput do art. 225:

Art. 225. Todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defende-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (grifo nosso).55

Pode-se analisar este princípio de duas maneiras distintas, porém

interligadas. A primeira parte de que os recursos ambientais não são inesgotáveis.

Assim, tornam-se inadmissíveis atividades econômicas que possam vir a esgotar

esses recursos, a não ser que exista uma harmonia entre economia e meio

ambiente, permitindo um desenvolvimento sustentável e planejado, não esgotando

ou tornando inócuo os recursos hoje existentes.56

A segunda parte trata dos níveis de renda da população, já que ao se fazer

uma análise, os principais problemas ambientais se encontram nos locais onde há

excessiva pobreza, local onde também é possível visualizar melhor a questão do

abandono de animais. Há realmente uma severa relação entre pobreza e condições

ambientais, as quais só poderão ser melhoradas com uma adequada distribuição de

renda entre os membros de toda a sociedade.57

Este princípio visa a manutenção das bases vitais de produção industrial e

distribuição de renda, garantindo uma relação satisfatória entre os homens e entre

eles e o meio ambiente, e dando oportunidade às futuras gerações de desfrutarem

os recursos que hoje temos a nossa disposição.58

54 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág. 29. 55 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Lex: Vade Mecum compacto. 3ª ed. atual., e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010. 56 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág. 29. 57 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8ª ed. Pg. 28. 58 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág. 29.

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Visto isso, pode-se garantir que este princípio tem fundamental importância,

já que uma sociedade sem regras é o caminho para o caos ambiental. Portanto a

preservação ambiental e o desenvolvimento econômico devem coexistir, de modo

que um não anule o outro,59 pois são direitos complementares e indissociáveis.60

1.3.2 Princípio Democrático

O princípio democrático é assegurado aos cidadãos através de outros

princípios, entre eles os da informação e da participação, que estão expressamente

previstos na Constituição Federal.61

O pleno direito de colaborar com a elaboração das políticas públicas

ambientais e obter informações relacionadas à defesa do meio ambiente

caracterizam o princípio democrático.62

Conforme Antunes63 a participação efetiva da população para que exista um

meio ambiente sustentável pode ser feita de varias maneiras, entre elas o dever

jurídico de preservar e proteger o meio ambiente e o direito de opinas sobre as

políticas públicas através de participação em audiências públicas, mecanismos

judiciais (ação popular ou ação civil pública) e administrativos (direito de informação,

direito de petição e estudo prévio de impacto ambiental) e iniciativas legislativas

(iniciativa popular, plebiscito e referendo) instigadas pelos cidadãos.

Este princípio dá aos cidadãos o direito de receberem informações sobre

tudo que possa atingir o meio ambiente, e com essas informações tem o direito de

promover as ações cabíveis para a efetiva proteção ambiental.64

59 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág. 30. 60 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8ª ed. Pág. 28. 61 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8ª ed. Pág. 29. 62 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8ª ed. Pág. 29. 63 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8ª ed. Pág. 29. 64 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8ª ed. Pág. 32.

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Canotilho65 ensina que o art. 225 da Constituição Federal busca a

participação dos cidadãos na defesa e preservação ambiental, porém todo problema

de política ambiental somente será resolvido quando houver uma unidade entre a

população, Estado e meio ambiente. Como também acontece com o abandono de

animais, pois se não houver uma ação conjunta da população com o Poder Público

este problema não poderá ser resolvido.

1.3.3 Cooperação Ambiental

O princípio da cooperação ambiental deve ser entendido como uma política

solidaria entre os Estados, por conta da necessidade intergeracional de proteção

ambiental. Tendo em vista as exigências da preservação ambiental devem ser

incorporados sistemas mais efetivos de cooperação entre os Estados, visando uma

soberania menos egoísta dos mesmos e mais solidária em combate aos efeitos

devastadores da degradação ambiental.66

A cooperação encontra-se visivelmente ligada ao princípio da participação,

pois necessita do exercício da cidadania, e além disso da colaboração de diversos

Estados para uma efetiva preservação ambiental.

Leite67 cita alguns elementos que podem ser de efetiva colaboração

internacional, entre eles:

1) Dever de informar os outros Estados em casos de situações críticas capazes

de causar prejuízos transfronteiriços;

2) Dever de informar e consultar previamente os outros Estados em casos de

projetos que possam trazer prejuízos a eles;

65 CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional ambiental brasileiro. 3ª ed. rev. São Paulo: Editora Saraiva, 2010. Pág. 184. 66 CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional ambiental brasileiro. 3ª ed. rev. Pág. 191. 67 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional ambiental brasileiro. 3ª ed. rev. Pág. 190.

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3) Dever de assistência e auxílio entre os países, nas situações de degradação

importante e catástrofes ecológicas;

4) Dever de impedir a transferência para outros Estados de atividades ou

substâncias que causem degradação ambiental grave ou que sejam prejudiciais a

saúde humana.

Esse princípio não pressupõe o monopólio do Estado, mas sim a gestão de

diversos grupos sociais. Em conseqüência, no âmbito interno de cada Estado, está

ligado à tomada de decisões públicas referentes a medidas de proteção ao meio

ambiente, necessitando da colaboração entre legisladores, poluidores e cidadãos

afetados.68

1.3.4 Princípio do Poluidor-Pagador

Previsto no §3° do art. 225 da Constituição Federal de 1988 este princípio

requer uma maior atenção. Partindo-se da constatação de que os recursos naturais

são escassos e que seu uso e consumo acarretam na degradação do meio ambiente

é que ele foi desenvolvido.69

Pode-se afirmar que o princípio do poluidor-pagador não é uma punição,

visto que mesmo não existindo uma ilicitude no comportamento do pagador ele pode

ser implementado visando apenas a prevenção da ocorrência do dano ambiental,

porém este pagamento não confere ao pagador o direito de poluir.70

68 CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional ambiental brasileiro. 3ª ed. rev. Pág. 191. 69 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8ª ed. Pág. 42. 70 MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 15ª ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2007. Pág. 62.

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30

Fiorillo71 identifica o princípio do poluidor-pagador em duas orbitas de

diferente alcance: a) busca evitar a ocorrência de danos ambientais e b) após

ocorrer o dano visa a sua reparação.

A primeira trata de um caráter preventivo, impondo ao poluidor o dever de

pagar pelas despesas de preservação do dano ambiental que a sua atividade pode

ocasionar.72 Em outras palavras o poluidor é primeiro pagador, porque paga

justamente para não poluir.73 E assim deve agir o Município, antecipando-se ao dano

que o abandono de animais pode gerar, criando mecanismos de prevenção e

proteção.

A segunda tem caráter repressivo pois ocorrido o dano ao meio ambiente o

poluidor será responsabilizado pela sua reparação,74 como bem é afirmado no §3°

do art. 225:

“§3°: As condutas e atividade consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independente da obrigação de reparar os danos causados.”75

Assim os poluidores são obrigados a escolher entre poluir e pagar ao Estado

ou pagar para não poluir, resultando assim em uma vantagem social já que a

poluição será reduzida das duas maneiras.76

1.3.5 Princípio da Precaução

71 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág. 32. 72 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág. 32. 73 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. Pág. 98. 74 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág. 33. 75 BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil. Lex: Vade Mecum compacto. 3ªed. atual., e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010. 76 ARAGÃO, Alexandra. Direito constitucional da ambiente da união européia. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 49.

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31

Nenhuma atividade humana é isenta de riscos. Por isso a prudência é

essencial para evitar danos muitas vezes irreparáveis.77

O princípio da precaução é o mais indicado para lidar com riscos já

existentes ou com situações que causem impactos ambientais por novos produtos

ou atividades.78 Em outras palavras trata do risco potencial, pois mesmo que este

risco ainda não tenha sido demonstrado nem quantificado há a necessidade de obter

uma resolução buscando alternativas para serem tomadas as melhores decisões

possíveis.79

Não é preciso paralisar a atividade geradora de riscos, ela apenas deve

ser realizada com os cuidados necessários, analisando o custo e o beneficio

entre o risco aceitável e o benefício da atividade para a sociedade.80

Na nossa Constituição o princípio da precaução esta presente no Art.

225 caput e nos incisos I, III e IV do §1°:

Art. 225: Todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder público e à coletividade o dever de defende-lo e preservá-lo para as presente e futuras gerações.

§1°: Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Publico:

I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

III – definir, em todas as unidade da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;

IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade.81

77 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8ª ed. Pág. 33. 78 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8ª ed. Pág. 33. 79 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. Pág. 76. 80 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8ª ed. Pág. 34. 81 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Lex: Vade Mecum compacto. 3ª ed. atual., e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010.

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32

Como bem assinala Machado82 o princípio da precaução visa a

continuidade dos recursos naturais existente no planeta e a continuação da

sadia qualidade de vida.

O princípio da precaução exige uma proteção antecipatória do ambiente,

funcionando como uma espécie de “in dubio pro ambiente”, decidindo em favor

do ambiente e contra o potencial poluidor.83

1.3.6 Princípio da Prevenção

O princípio da prevenção é muito parecido com o princípio da precaução,

porém enquanto este trata de possíveis danos causados por atividade novas, aquele

trata de riscos já existentes, causados por atividade já conhecidas84, com o objetivo

de proibir ou limitar as mesmas por já saber que são perigosas.85

Este princípio atua no sentido de inibir o risco de danos que são causados

pelas atividades perigosas.86 Ele não visa inviabilizar as atividades econômicas,

apenas excluir do mercado o poluidor que utiliza os recursos naturais sem controle,

não respeitando a coletividade, já que os bens ambientais são bens de uso comum

do povo e não propriedades particulares.87

82 MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 15ª ed. Pág. 65. 83 ARAGÃO, Alexandra. Direito constitucional da ambiente da união européia. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. Pág. 41. 84 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8ª ed. Pág. 71. 85 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. Pág. 71. 86 LEITE, José Rubens Morato, AYALA, Patryck de Araujo. Direito Ambiental na Sociedade de risco. Pág. 72. 87 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág. 44.

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33

Referido princípio implica na adoção de medidas previas à ocorrência do

dano, que tem causas já conhecidas, com a finalidade de evitar ou minorar o dano.

Como discorre Aragão88 “mais vale prevenir do que remediar”.

O princípio da prevenção não é estático, pois deve ser atualizado e

reavaliado com o intuito de influenciar a formulação de novas políticas ambientais

que alcancem tanto o Poder público quanto os particulares.89

1.3.7 Princípio da Participação

O princípio da participação está previsto no caput do art. 225 da Constituição

Federal de 1988, quando diz que pessoas físicas e jurídicas estão obrigadas a

tutelá-lo.90

Para Antunes91 o princípio da participação é chamado de princípio

democrático e assegura aos cidadãos o pleno direito de participar da elaboração de

política públicas ambientais e de obter informações referentes ao meio ambiente.

Existem dois elementos fundamentais para que exista uma efetiva

participação popular nas ações ambientais: a) a informação e b) a educação

ambiental. Esses dois elementos devem atuar em conjunto, numa relação de

complementaridade.92

A informação tem como objetivo formar uma consciência ambiental para que

os principais destinatários dela possam se manifestar sobre os problemas

ambientais. Ela deve ser transmitida com tempo suficiente para que os destinatários

88 ARAGÃO, Alexandra. Direito constitucional da ambiente da união européia. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 1ª ed. Pág. 43. 89 MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 15ª ed. Pág. 85. 90 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág. 45. 91 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 8ª ed. Pág. 29. 92 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág. 45.

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34

possam agir perante eventos que considerem significativamente danos ao meio

ambiente.93

A educação ambiental visa trazer consciência ecológica à população, titular

do direito ao meio ambiente. Para Fiorillo94 educar ambientalmente significa:

a) Reduzir os custos ambientais;

b) Efetivar o princípio da prevenção;

c) Fixar a idéia de consciência ecológica;

d) Efetivar o princípio da participação, entre outras finalidades.

Para efetivar o princípio da participação foi criada a Política Nacional do

Meio Ambiente que visa a implementação da educação ambiental no ensino formal,

desenvolvendo desde cedo a consciência ecológica na população,95 referindo-se

também ao abandono de animais.

1.3.8 Princípio da Responsabilização

O princípio da responsabilização está previsto na Constituição Federal no

art. 225, §3°:

§3°: As condutas e atividade consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independente da obrigação de reparar os danos causados.96

A atual sociedade de risco e os danos ambientais gerados por ela quebram

um sistema de segurança, articulado pelo Estado, verificando-se a ausência de uma

93 MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 15ª ed. Pág. 90. 94

FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 5ª ed. Pág. 41. 95 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 8ª ed. Pág. 48. 96 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Lex: Vade Mecum compacto. 3ª ed. atual., e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010.

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35

maneira eficaz de compensação. Assim a sociedade exige que o poluidor seja

responsável pelos seus atos.97

Desta forma não há um Estado Democrático de Direito se não há a

possibilidade de serem aplicadas todas as espécies de sanção àquele que ameace

ou lese o meio ambiente.98

O instituto da responsabilização se divide em vários tipos: civil, administrativo,

penal e até intercomunitário, ligados aos efeitos da poluição, tendo como objetivo

alcançar um Estado mais justo e aparelhado, do ponto de vista ambiental.99

A responsabilidade civil por danos ao meio ambiente associada aos

instrumentos jurídico-administrativos e ainda à responsabilidade penal ambiental tem

importante missão no cenário do princípio da responsabilização, devendo ser

articulada conjunta, coerente e sistematicamente no sistema múltiplo de imputação

ao degradador ambiental.100

Essa tríplice responsabilização será alvo do próximo capítulo, onde serão

estudadas individualmente, sempre relacionando-se ao abandono de animais.

97 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 3ª ed. Pág. 202. 98 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 3ª ed. Pág. 202. 99 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 3ª ed. Pág. 202. 100 LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 3ª ed. Pág. 210.

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36

2 O ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL E OS MECANISMOS DE

RESPONSABILIDADE: CIVIL, ADMINISTRATIVA E PENAL

A Constituição Federal, em seu art. 225, §3° trata da responsabilidade

ambiental, em todas as formas, seja ela penal, administrativa ou civil. Todas elas

podem ser utilizadas para o Estado de Direito Ambiental, com a finalidade de punir

os responsáveis pelos danos causados ao meio ambiente.

Antes de entrar nos tipos de responsabilidade, vale ressaltar o significado

deste termo, que se não for bem conceituado poderá resultar em ambigüidade

devido a pobreza do vocabulário jurídico. A palavra responsabilidade serve para

indicar a situação daquele que deve arcar com as conseqüências de um fato

danoso, neste caso, ambiental.101

Todos são responsáveis pelos seus atos e devem arcar com suas

conseqüências. Se essas conseqüências atingirem terceiros haverá necessidade de

se reparar o dano. A responsabilidade é um dever jurídico indispensável, trata-se de

um princípio fundamental do direito e é o alicerce para uma vida em sociedade.102

Não há responsabilidade sem prejuízo ou dano, que é a sua causa direta.

No campo jurídico a responsabilidade pressupõe aquele que infringe a norma, a

vítima da quebra, o nexo causal entre o agente e a irregularidade e o prejuízo

gerado com a finalidade de reparação.103

No caso do Estado esta responsabilidade está descrita no artigo 37, §6° da

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:

§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.104

Quando se trata da responsabilidade do Estado cogita-se três tipos de

funções advindas do poder estatal: a administrativa, a jurisdicional e a legislativa. 101 CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2002. Pág.596. 102 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª ed. Pág. 153. 103 CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Pág.596. 104 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Lex: Vade Mecum compacto. 3ª ed. atual., e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010.

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37

Porém a responsabilidade tratada neste capitulo é a resultante dos atos da

Administração Pública, já que os Poderes Legislativo e Judiciário somente são

responsabilizados em casos excepcionais.105

2.1 RESPONSABILIDADE CIVIL

A responsabilidade civil se traduz na obrigação de reparar danos

patrimoniais e se extingue com a indenização.106 Sua intenção é a de restabelecer o

equilíbrio econômico-jurídico provocado pelo evento danoso mediante a recolocação

do prejudicado no stato quo ante, ou seja, na situação em que se encontrava o

quanto antes.107

O Estado, no cumprimento de suas obrigações exerce diversas atividades

que podem causar danos a terceiros, através de atos lícitos ou ilícitos, devendo ser

responsável pelos mesmos.108 A definição de ato ilícito está presente no art. 186 do

Código Civil de 2002 :

Art. 186 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligencia ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.109

Considera-se primordialmente o dano, que compreende na diminuição do

patrimônio e na turbação ou diminuição do gozo de qualquer outro bem.110

O dano ambiental é toda agressão ao meio ambiente causada por atividade

econômica potencialmente poluidora através de ato comissivo ou omissivo praticado

105 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág 523. 106 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29ª ed. São Paulo: Editora Malheiros. 2004. Pág .624. 107 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. 1ª ed. São Paulo: IOB Thomson, 2005. Pág. 49. 108 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. rev., ampl. e atual. Pág. 323. 109 BRASIL. Código Civil. Lex: Vade Mecum compacto. 3ª ed. atual., e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010. 110 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 49.

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38

por qualquer pessoa.111 Milaré112 afirma que existe uma dupla face da danosidade

ambiental, já que seus efeitos alcançam não só o meio ambiente mas também o

homem. Significa dizer que o dano ambiental, embora sempre recaia diretamente

sobre o meio ambiente, pode em alguns casos refletir material e moralmente sobre o

patrimônio, saúde ou interesses de uma determinada pessoa ou grupo de pessoas.

Desta maneira pode-se dividir o dano ambiental em coletivo ou individual. O

dano ambiental coletivo diz respeito aos sinistros causados ao meio ambiente que

tem repercussão em interesses difusos de um coletividade indeterminada. Por outro

lado o dano ambiental individual afeta diretamente a qualidade do meio refletindo

sobre a esfera patrimonial ou extra patrimonial do proprietário.113

Este dano deve ser economicamente reparado ou ressarcido, e como nem

todo bem é recuperável deverá ser fixado um valor indenizatório pelo dano causado.

O problema é arbitrar esse valor para um dano ambiental, que é extra patrimonial,

pois os critérios para sua fixação são subjetivos. Por isso, o magistrado deve avaliar

a gravidade do dano, a capacidade financeira do autor e a proporcionalidade entre

eles.114 E mesmo levando em conta o esforço reparatório nem sempre é possível o

cálculo da totalidade do dano ambiental, pois como alguém pode estabelecer

parâmetros econômicos para uma espécie que desapareceu?115

A responsabilidade pode ser compreendida em responsabilidade contratual,

que ocorre quando o Estado descumpre cláusulas contratuais à que estava

obrigado,116 e em responsabilidade extracontratual, alvo de nosso estudo, na qual o

Estado tem a obrigação de reparar danos lesivos a terceiros em decorrência de

comportamentos comissivos ou omissivos, lícitos ou ilícitos, materiais ou jurídicos,

imputáveis aos agentes públicos.117

A responsabilidade do Estado recebeu diversos tipos de tratamento no

tempo e no espaço, sendo elaboradas inúmeras teorias a começar pela teoria da

111 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª ed. Pág. 152. 112 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ª ed. Pág. 666. 113 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ª ed. Pág. 667. 114 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª ed. Pág. 152. 115 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ª ed. Pág. 670. 116 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. Pág. 323. 117 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. Pág. 524.

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39

irresponsabilidade, passando para a teoria da responsabilidade subjetiva e em

seguida para a teoria da responsabilidade objetiva.118

2.1.1 Teorias da Culpa

Adotada na época dos Estados Absolutos, a teoria da irresponsabilidade

estava fundamentada na idéia de soberania.119 Negava-se a responsabilidade dos

Estados, ao mesmo tempo que vigia a máxima “The king can do no wrong” (O rei

não pode errar) que era extensiva aos seus representantes.120 Nas palavras de José

Cretella Júnior 121 “o Estado é infalível, não comete erro, não causa dano”.

O Estado dispunha de autoridade incontestável perante os seus súditos, e

responsabilizá-lo seria colocá-lo num mesmo nível que o súdito, desrespeitando a

sua soberania.122

Esta teoria se funda nos seguintes argumentos, conforme cita José Cretela

Júnior123:

- Por ser pessoa jurídica o Estado não tem vontade própria;

- O Estado age por intermédio de seus funcionários, e se eles praticam atos

ilícitos é a eles que a responsabilidade cabe, e não ao Estado;

- Sabendo-se que os funcionários não estão autorizados a agir fora da lei,

quando o fazem agem fora de sua qualidade de funcionários, não sendo possível

atribuir a responsabilidade ao Estado.

Por sua evidente injustiça, a teoria da irresponsabilidade logo começou a ser

combatida. Se o Estado deve tutelar o direito ele não deve deixar de responder

quando causar danos a terceiros, mesmo que por ação ou omissão.124

118 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 524. 119 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 525. 120 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29ª ed. Pág. 625. 121 CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Pág. 607. 122 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. Pág. 324. 123 CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Pág. 607.

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40

Foi no Século XIX que esta teoria foi superada, dando lugar a teoria civilista

da culpa, que adotava princípios do Direito Civil.125 Na primeira fase desta teoria

para fins de responsabilidade fazia-se distinção dos atos de império e dos atos de

gestão. O primeiro era praticado pela Administração com todos os privilégios e

prerrogativas das autoridades sendo impostos coercitivamente e unilateralmente aos

particulares, regido por um direito especial onde os particulares não podem praticar

atos semelhantes aos da Administração. Já os atos de gestão eram praticados pela

Administração em situação de igualdade com os particulares, com o intuito de

conservar e desenvolver o patrimônio público e a gestão dos seus serviços.126

Os atos de império tiravam do Estado qualquer responsabilidade, colocando-

o coberto de toda iniciativa jurídica por parte dos particulares. Sempre que se tratar

de ato de gestão o Estado é responsável civilmente pelos danos causados aos

Particulares.127

Para a responsabilidade não cair em cima da pessoa do Rei, que praticava

os atos de império, era feita a distinção entre ele e a pessoa do Estado, que

praticava os atos de gestão através de seus prepostos.128 No entanto surgiu grande

oposição a esta teoria, pois havia a impossibilidade de dividir-se a personalidade do

Estado da personalidade do Rei, e ainda a impossibilidade de enquadrar os atos

como sendo de gestão.129

Apesar desta teoria ser muito mais avançada em relação a anterior, ela não

é satisfatória, pois para aquele que sofre o dano não importa se o ato foi de gestão

ou de império.130

Por isso, no segundo momento desta teoria surge o critério da culpa para

efeitos de responsabilização, porém o conceito de culpa era o mesmo do direito civil,

onde comparava-se o Estado ao patrão, pelos atos dos empregados ou

prepostos.131

124 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 525. 125 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 525. 126 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 525. 127 CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Pág. 610. 128 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 526. 129 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 526. 130 CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Pág. 610. 131 CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Pág. 612.

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As teorias de responsabilidade do Estado seguindo os princípios do direito

público surgiu através da jurisprudências, quando julgou o caso Blanco em 1873.

Com a decisão do Tribunal de Conflitos atribuindo a solução do problema ao tribunal

administrativo, pois se tratava de responsabilidade decorrente de funcionamento do

serviço público, entendeu-se que o Estado deve ser regido por regras especiais que

vão variar conforme as necessidades do serviço.132

A partir desse momento histórico começaram a surgir as teoria publicistas de

responsabilidade do Estado, divididas em teoria da culpa administrativa ou culpa do

serviço e a teoria do risco integral.133

2.1.1.1 Teoria da Culpa Administrativa ou Culpa do Serviço

Também chamada de teoria do acidente administrativo, a teoria da culpa

administrativa procura desvincular a responsabilidade do Estado da idéia de culpa

do funcionário.134 Foi feita a distinção entre a culpa individual do agente público, pela

qual ele respondia, e a culpa anônima do serviço.135 Baseando-se nos princípios

publicistas não se faz necessária a identificação da culpa individual para se

responsabilizar o Estado.136

O serviço público, em tese, deve ser perfeito, regular, continuo, sem falhas,

proporcionando a coletividade o mais alto grau de benefício com seu funcionamento.

Quando é alterado o funcionamento gerando prejuízos aos administrados ocorre o

acidente administrativo.137

Para fixar a responsabilidade do Estado através desta teoria basta apoiar-se

na idéia de culpa ou falta do serviço ou ainda acidente administrativo, independente

132 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 526. 133 CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Pág. 614. 134 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 527. 135 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. rev., atual e ampl. Pág. 324. 136 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 20ª ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2006. Pág. 946. 137 CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Pág. 615.

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42

da culpa do funcionário. Esta falta do serviço ocorre quando o serviço não funcionou

ou não existiu, o serviço funcionou mal, ou o serviço funcionou atrasado.138 Isso está

ligado com a ação ou omissão do agente público que prestou o serviço e que de

modo direto ou indireto deveria ter diligenciado para que o serviço fosse perfeito.139

Cabia a vítima demonstrar que a lesão sofrida injustamente decorreu da falta do

serviço. 140

O reconhecimento do não-funcionamento do serviço público significa que o

Estado está obrigado a reparar pela sua inação.141

2.1.1.2 Teoria do Risco Integral

A teoria do risco integral obriga o Estado a indenizar qualquer dano ocorrido,

resultantes de suas atividades.142 Não é exigido a culpa dos agentes e nem a falta

de serviço, basta apenas a lesão, desde que sem concurso do lesado.143

Essa teoria está fundamentada sob os seguintes aspectos: o potencial risco

que a atividade Administrativa gera para os administrados e a necessidade de se

repartir tanto os benefícios quanto os encargos resultantes da atuação do Estado.144

Aqui a culpa é substituída pelo nexo de causalidade entre o fato do serviço e

o dano sofrido pelo administrado. Não importa se o serviço funcionou ou não ou se

foi demorado, se foi lícito ou ilícito, se decorreu de culpa ou do agente. Se há um

138 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. rev., atual e ampl. Pág. 325. 139 CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Pág. 618. 140 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29ª ed. Pág. 626. 141 CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Pág. 617. 142 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo. 11ª ed. rev., e atual. São Paulo: Editora Saraiva, 2006. Pág. 971. 143 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29ª ed. Pág. 626. 144 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. Pág. 325.

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nexo de causalidade entre comportamento do Estado e o dano ao terceiro, o Estado

responde.145

Isso não significa que o Estado deva indenizar sempre o dano suportado

pelo particular, mas que a vítima fica dispensada de provar a culpa do Estado.

Porém se a administração conseguir provar que a culpa foi total ou parcial do lesado

o Estado se eximirá integral ou parcialmente da indenização.146

2.1.2. Causas Excludentes de Responsabilidade

As excludentes de responsabilidade consistem em fatos ou circunstâncias

que liberam o agente da obrigação de indenizar.147 A responsabilidade civil do

Estado deixará de existir ou incidirá de forma menos branda quando o serviço

público não deu causa ao evento danoso ou ainda quando ele não for a única causa

e estiver ligado a outras circunstâncias.148

Para Cunha Junior149 se existir uma causa que quebre a relação de causa e

efeito, entre o comportamento estatal e o dano, é evidente que ela deve ser

qualificada como excludente de responsabilidade. As causas excludente de

responsabilidade são varias, o caso fortuito, a força maior, o fato de terceiro, a culpa

exclusiva da vítima, o exercício regular de um direito, a legitima defesa e o estado de

necessidade.

A primeira excludente de responsabilidade é a força maior, que sempre é

estudada em conjunto com o caso fortuito. Quando o evento for imprevisível e por

conseqüência inevitável resultará em caso fortuito e se for impossível resistir aos

145 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. rev., atual e ampl. Pág. 325-326. 146 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29ª ed. Pág. 627. 147 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 98. 148 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. Pág. 530. 149 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. rev e atual. e ampl. Pág. 334.

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acontecimentos imprevisíveis, como nos eventos da natureza, resultará em força

maior.150

A força maior decorre de um acontecimento imprevisto, por isso a

responsabilidade não pode ser imputada a Administração, já que na há nexo de

causalidade entre o dano e o comportamento da própria Administração. Do mesmo

modo o caso fortuito não pode ser imputado a Administração, visto que os

acontecimento que levaram ao dano fogem de seu poder.151

O fato de terceiro somente irá excluir a responsabilidade do Estado se um

terceiro tiver sido o causador exclusivo do dano, caso contrário a responsabilidade é

solidária. Para Montenegro152 o fato de terceiro se equipara a caso fortuito e a força

maior, pois advêm de uma causa estranha a conduta do Estado e se apresenta

como imprevisível ou inevitável. Para Di Pietro153 quando se tratar de fato de terceiro

o Estado irá responder somente se ficar caracterizada a sua omissão ou inércia na

prestação do serviço.

Quando a conduta da vítima se mostra como a única causa para o dano está

caracterizada a culpa exclusiva da vítima, já que é rompido o nexo de causalidade

entre o dano e o aparente causador.154 Assim o Estado não tem a obrigação de

indenizar, pois não deu causa ao dano.155 Para Di Pietro156 há de se distinguir se

houve culpa exclusiva da vítima ou concorrente, pois se a culpa foi concorrente com

a do Estado este responde, mesmo que com atenuantes.

Se o agente público age no exercício regular do direito significa que o

Estado não responde, desde que tenha sido observados todos os limites e deveres

relacionados ao caso.157 Porém é preciso que o exercício do direito guarde um grau

de razoabilidade, sob pena de comparar-se ao ilícito.158

Em algumas situações não é possível esperar pela ajuda de uma autoridade

pública, assim é possível invocar a legitima defesa, que emana da personalidade

150 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 99. 151 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 530-531. 152 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 100. 153 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 530-531. 154 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 100-101. 155 CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Pág. 634. 156 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 530-531. 157

JUSTEM FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 4. ed. rev. e atual. Pag. 1088. 158

MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 101.

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45

humana e sempre foi aceita como uma excludente de responsabilidade, porém

devem ser analisadas conforme cada caso concreto.159

A última excludente de responsabilidade é o estado de necessidade, que

pode ser invocado quando ocorrerem graves perturbações ou comoções, seja por

fatos externos ou por fatos internos.160 Nesta situação encontra-se quem não pode

escapar de um perigo sem causar prejuízo a outrem, e tal atitude poderia ser

tomada por qualquer homem na mesma situação.161

2.1.2. Responsabilidade Civil Ambiental

As pessoas jurídicas de direito público, ou seja, o Estado, devem ser

responsabilizadas pelas lesões causadas ao meio ambiente. E não só como

agente poluidor, mas também quando se omite no dever de proteger o meio

ambiente.162

Pode ainda ser responsável solidariamente pelos danos ambientais

provocados por terceiros, pois o Estado está obrigado constitucionalmente a

defender o meio ambiente para as presente e futuras gerações. Assim, se não evitar

o dano, seja por negligência ou deficiência do serviço público, deve o Estado

responder.163

Aplica-se a responsabilidade objetiva do Estado fundada na teoria do risco

integral quando se trata de dano ambiental, fundada nos princípios de Direito

Ambiental e de que não deve haver tolerância, dada a natureza metaindividual dos

interesses em jogo e a sua tutela constitucional.164 Por isso, esta teoria também é

159

MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 102. 160

CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Pág. 633. 161

MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 103. 162 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 3ªed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora revista dos tribunais, 2004. Pág. 766. 163 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 766-767. 164 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 116.

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46

utilizada para tratar da responsabilidade pelo abandono de animais, que será

estudada no próximo capítulo.

2.2. RESPONSABILIDADE PENAL

Algumas condutas, levando-se em conta a sua repercussão social e a

necessidade de intervenção do Estado foram classificadas como tipos penais,

culminando em sanções ao agente como a multa, as restrições de direito ou as

privações de liberdade.165

A luta em defesa ao meio ambiente tem encontrado no Direito Penal

instrumentos significativos, já que o estigma de um processo penal gera efeitos que

as sanções administrativas ou civis não alcançam. Em determinados casos as

agressões ao meio ambiente são tantas que somente a aplicação de sanções penais

conseguem refreá-las em função de sua maior eficácia dissuasória.166

A Constituição Federal estabeleceu no seu art. 225, §3º a possibilidade de

responsabilizar as pessoas jurídicas pela pratica de crimes ambientais. A

responsabilidade penal ambiental também encontra-se disposta na lei 9.605/98. Esta

lei unificou as infrações ambientais, antes dispersas.167

Nas disposições penais ambientais a detalhada e exaustiva descrição do

comportamento do agente é, na maioria das vezes, difícil ou quase impossível, por

isso é necessário que a lei faça constantes remissões a disposições externas,

normas ou conceitos técnicos. 168

165 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 7ª ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Saraiva, 2006. Pág. 55. 166 FREITAS, Vladimir Passos de. FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza: (de acordo com a lei 9.065/98). 8ª ed. ver., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. Pág. 31-32. 167 AYALA, Patryck de Araújo. O novo paradigma constitucional e a jurisprudência ambiental do Brasil. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 3ª ed. Pág. 444. 168 FREITAS, Vladimir Passos de. FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza: (de acordo com a lei 9.065/98). 8ª ed. Pág. 35.

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Para encontrar o bem jurídico protegido nas leis penais ambientais o

aplicador do direito deve analisar o delito sob uma perspectiva sociológica e

constitucional. Nos crimes ambientais o bem jurídico protegido é meio ambiente em

toda a sua amplitude, pois pertence a categoria de bens jurídicos coletivos e afeta a

comunidade mesmo que de forma direta ou indireta, mediata ou imediata.169

A responsabilidade penal é determinada pela culpabilidade, em

conseqüência, os crimes ambientais podem ser punidos a título de dolo ou culpa.170

O crime doloso tem sua tipicidade quando o agente quer e assume o resultado e o

risco de produzi-lo, já o crime culposo se caracteriza quando há a hipótese de o

agente provocar resultados por negligência, imprudência ou imperícia. Com a edição

da Lei 9.605/98 os crimes culposos foram inseridos no ordenamento jurídico

ambiental e como conseqüência a impunidade que antes era a regra foi cessando

aos poucos.171

2.2.1. Penas Aplicáveis às Pessoas Jurídicas

Conforme o art. 21 da Lei 9.605/98 as penas aplicáveis às pessoas jurídicas

são a multa, a restritiva de direitos e a prestação de serviços a comunidade, que

também podem ser aplicadas isolada, cumulativa ou alternativamente.

A pena de multa é aplicada conforme o art. 18 da referida Lei, que tem como

base o critério dias-multa previsto no Código Penal172. Desta maneira uma grande

empresa poderá ser penalizada com uma multa não condizente com a sua

169 FREITAS, Vladimir Passos de. FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza: (de acordo com a lei 9.065/98). 8ª ed. Pág. 38. 170 FREITAS, Vladimir Passos de. FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza: (de acordo com a lei 9.065/98). 8ª ed. Pág. 39. 171 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 778. 172 Art. 49, §1° do Código Penal: O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário-minímo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário. BRASIL. Código Penal. Lex: Vade Mecum compacto. 3ª ed. atual., e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010.

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possibilidade de ressarcimento do dano ou mesmo com a vantagem obtida através

do crime cometido.173

O legislador ao instituir a pena de multa na esfera penal ambiental deveria

ter se preocupado com a fixação de um sistema dias-multa próprio para as pessoas

jurídicas, como no exemplo citado por Milaré174, que correspondesse a um dia de

faturamento da empresa.

As penas restritivas de direitos são as previstas no art. 22 da Lei de Crimes

Ambientais. A suspensão parcial ou total das atividades da empresa é a primeira

modalidade prevista e somente é aplicável quando a pessoa jurídica não estiver

obedecendo as disposições legais ou regulamentares relativas a proteção do meio

ambiente. A segunda modalidade prevista é a interdição temporária de

estabelecimento, obra ou atividade e é aplicável quando estes estiverem

funcionando sem a devida autorização, em desacordo ou violando dispositivo legal.

E a última modalidade de pena restritiva de direito é a proibição de contratar com o

Poder Público, ou obter dele subsídios, subvenções ou doações, decorrente de

descumprimento de normas, critérios e padrões ambientais.175

O art. 23 da mesma Lei trata das penas de prestação de serviços a

comunidade que consistem em custeio de programas e de projetos ambientais, na

execução de obras de recuperação de áreas degradadas, na manutenção de

espaços públicos e na contribuição a entidades ambientais ou culturais públicas.176

Como ressalta Milaré177, o art. 24 da Lei de Crimes Ambientais que decreta a

liquidação forçada de pessoa jurídica constituída ou utilizada preponderantemente

com o intuito de permitir, facilitar ou ocultar prática de crime ambiental, é

considerada como “uma verdadeira pena de morte”.

A aplicação de penas as pessoas jurídicas deve levar em conta a

recuperação do meio ambiente lesado. Se uma empresa tem decretada a

paralisação de suas atividades o empregado, que nada tem a ver com a

173 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 789. 174 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 789. 175 BRASIL. Lei 9.605/98. Lex: Vade Mecum compacto. 3ª Ed. atual., e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010. 176 BRASIL. Lei 9.605/98. Lex: Vade Mecum compacto. 3ª ed. atual., e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010. 177 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 789.

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responsabilidade pelo crime cometido, será atingido, e esta não é a finalidade da

pena.178

A dificuldade de se aplicar as sanções penais está na forma de

atuação da mesma, já que elas deverão ser aplicadas a pessoas jurídicas.

Na teoria de Savigny as pessoas jurídicas têm existência fictícia, irreal ou de

pura abstração, e assim os delitos devem ser praticados somente por seus

membros ou diretores, ou seja, por pessoas naturais. Já na teoria de Gierke

a pessoa jurídica é um ente vivo e ativo, com personalidade real ou orgânica,

dotada de vontade própria com capacidade de agir e praticar ilícitos penais,

e sendo assim nada impede que sejam dirigidos à ela fins proibidos pela lei

penal. 179

Assim o Estado, utilizando-se de princípio da intervenção mínima e

tendo em vista a falta de instrumentos compatíveis com a finalidade da

sanção penal tem procurado intervir apenas em situações que envolvam

ofensas de maior vulto à segurança da coletividade. Se a sanção civil se

mostra eficaz para a proteção do meio ambiente, torna-se desnecessário a

aplicação da sanção penal.180

Embora a responsabilidade penal da pessoa jurídica seja uma

realidade de direito positivo, a doutrina ainda está reticente quanto ao seu

fundamento jurídico, aplicabilidade e eficácia. 181

Em relação aos animais abandonados a responsabilidade penal

também pode ser aplicada, porém não é este o objetivo do trabalho.

178 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 789. 179 PRADO, Luiz Regis. Direito Penal do Ambiente: meio ambiente, patrimônio cultural, ordenação de território e biossegurança (com análise da lei 11.105/2005). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. Pág. 145-146. 180 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 7ª ed. Pág. 55. 181 PRADO, Luiz Regis. Direito Penal do Ambiente: meio ambiente, patrimônio cultural, ordenação de território e biossegurança (com análise da lei 11.105/2005). Pág. 170.

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2.3. RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA

Na esfera administrativa o meio ambiente é tutelado pelo art. 225 §3º da

Constituição Federal e pelo capítulo VI da lei nº 9.605/98.182

A aplicação das sanções administrativas figura entre as mais importantes

expressões de poder conferidas a Administração Pública. O seu principal atributo é a

coercibilidade externado através das penalidades administrativas. Ao contrário das

sanções civis e penais as penalidades administrativas são impostas aos infratores

pelos órgãos da Administração direta ou indireta da União, do Distrito Federal, dos

Estados e dos Municípios.183

Infração administrativa ambiental, conforme previsto no art. 70 da lei

9.605/98 é toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo,

promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.184 Trata-se de um tipo

infracional aberto, possibilitando ao agente público agir com discricionariedade

buscando a subsunção do caso concreto.185

Na esfera administrativa a infração é caracterizada pela inobservância das

regras jurídicas que podem ou não resultar conseqüências prejudiciais ao meio

ambiente. Essas regras jurídicas são elencadas na Constituição Federal, nas

normas federais, estaduais, distritais e municipais, nas resoluções do Conselho

Nacional do Meio Ambiente e de Conselhos Estaduais do Meio Ambiente.186

As sanções administrativas estão diretamente ligadas ao poder de polícia,

que limita ou disciplina direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou

abstenção de fato e razão do interesse público.187 Este poder é prerrogativa da

administração pública que legitima a intervenção na esfera jurídica do Particular em

182 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª Ed. Pág. 387. 183 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 685. 184 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª Ed. Pag. 388. 185 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 687. 186 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 688-689. 187 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 7ª ed. Pág. 49-50.

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defesa de interesses coletivos desde que fundado em lei que disciplina e defina seus

contornos.188

Conforme Montenegro189 o poder de polícia ambiental é a função

administrativa que tem por finalidade assegurar a preservação e conservação do

meio ambiente, mediante a regulação de atividades individuais ou coletivas, públicas

ou particulares, impondo um fazer ou não fazer promovendo a ordem ambiental.

O poder de polícia deve ser executado corretamente para refletir na

prevenção de atividades lesivas ao ambiente, através do controle dos administrados,

e na repressão quando as autoridade notificam formalmente a ocorrência de uma

infração desencadeando os procedimentos da tutela civil, penal e administrativa.

Este poder não é exercido por policiais profissionais, mas por profissionais

capacitados que se ocupam de aspectos específicos do bem comum. Porém, em

alguns casos a polícia administrativa ambiental precisa de reforços, onde se

enquadra a Polícia Militar Ambiental, pois está em jogo a defesa e preservação do

meio ambiente, a manutenção da qualidade ambiental e do equilíbrio ecológico

essencial.190

São atributos do poder de polícia a discricionariedade, que está relacionada

à oportunidade e conveniência do exercício deste poder, devendo aplicar sanções

adequadas ao interesse público, a auto-executoriedade que faculta a Administração

Pública em executar diretamente a sua decisão e a coercibilidade que possibilita a

imposição de sanções utilizando-se, se necessário, de força.191

As sanções aplicadas pela Administração pública através do poder de polícia

são as mais variadas e tem sempre o intuito de resguardar os bens ambientais de

uso comum do povo.192

O art. 72 da Lei de Crimes Ambientais193 apresenta o seguinte rol de

sanções administrativas:

188 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ª ed. Pág. 678. 189 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 43. 190 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 679-680. 191 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª Ed. Pág. 390. 192 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 7ª ed. Pág. 51. 193 BRASIL. Lei 9.605/98. Lex: Vade Mecum Compacto. 3ª Ed. atual., e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010.

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a) Advertência: será aplicada quando houver inobservância da legislação ou

dos regulamentos e é imposta nas infrações mais leves ou quando cometidas por

infratores primários;194

b) Multa simples: será aplicada quando o agente, por negligência ou dolo,

deixar de sanar as irregularidades no prazo constante da advertência ou ainda

quando opuser embargos à fiscalização. Vale ressaltar que este tipo de multa

poderá ser aplicada em qualquer caso, não se restringindo as opções constante no

artigo;195

c) Multa diária: aplicada nos casos de infração continuada até a sua efetiva

cessação ou regularização;196

d) Apreensão dos animais, produtos ou subprodutos da fauna e flora,

instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados

na infração: os animais e produtos ou subprodutos da fauna e da flora serão

devolvidos ao seu habitat e os veículos, petrechos ou equipamentos serão doados

ou vendidos desde que haja garantia de sua descaracterização;197

e) Destruição ou inutilização dos produtos: os produtos da flora e da fauna

serão destruídos ou inutilizados, ou ainda doados a instituições científicas, culturais

ou educacionais;198

f) Suspensão de venda e fabricação de produto: tem por objetivo obstar a

continuidade da venda e fabricação irregular produto nocivo à saúde, à segurança e

ao bem-estar da população;199

g) Embargo de obra ou atividade: consiste no embargo de obra ou atividade

causadoras de degradação ambiental;200

h) Demolição de obra: aplica-se tanto à obras em andamento quanto a obras já

concluídas. É uma medida extrema aplicável em casos de irregularidade insanável,

de perigo a saúde pública ou de dano ambiental;201

194 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 700-701. 195 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 701. 196 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 703. 197 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª Ed. Pág. 397. 198 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª Ed. Pag. 397. 199 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª Ed. Pag. 398. 200 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª Ed. Pag. 398.

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i) Suspensão total ou parcial de atividades: penalidade extremamente severa

aplicável quando há perigo iminente à saúde publica ou grave risco de dano

ambiental;202

j) Restritivas de direitos: abrange a suspensão ou cancelamento de registro,

licença, permissão ou autorização, perda ou restrição de incentivos e benefícios

fiscais, perda ou suspensão da participação em linhas de financiamento de

estabelecimento oficial de crédito e proibição de contratar com a Administração pelo

período de até 3 anos.203

k) Reparação de danos causados: esta sanção administrativa não está prevista

na Lei de Crimes Ambientais, mas no Decreto 3.179/99, art. 2°, XI, e independe da

demonstração de culpa praticada pelo autor.204

A responsabilidade Administrativa ambiental tem a finalidade de obrigar os

órgãos direta ou indiretamente aos entes estatais para defender e preservar os bens

ambientais para as presentes e futuras gerações.205

No Brasil a responsabilidade administrativa ambiental encontra dificuldades

na estruturação dos órgãos fiscalizadores além da morosidade, o que muitas vezes

faz a parte recorrer ao Judiciário.206

A penas administrativas podem e devem ser aplicadas em conjunto com a

responsabilização pelo abandono dos animais, o que será demonstrado e

comparado no próximo capítulo através de jurisprudências.

201 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 708. 202 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 709. 203 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 710. 204 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª Ed. Pag. 398. 205 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 7ª ed. Pág. 54. 206 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 45.

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54

3 O MUNICÍPIO COMO RESPONSÁVEL POR DANOS AOS ANIMAIS

EM DECORRÊNCIA DE SEU ABANDONO

A palavra responsabilidade deriva do latim responsus, que se traduz na idéia

de reparação, compensação, recuperação, e para ela se tornar obrigação deve o

bem lesado ser juridicamente relevante, como é o caso do bem ambiental.207

A responsabilidade civil implica prejuízo a terceiros, resultando num pedido

de reparação de dano, para recompor o status quo ante, ou ainda num pedido de

indenização.208 Trata-se de um princípio fundamental, alicerce para uma vida em

harmonia na sociedade civilizada.209

Este capítulo irá tratar do Estado como responsável pelos animais em

estado de abandono, para isso devemos abordar a teoria da responsabilidade

integral e a responsabilidade civil objetiva mais a fundo, o que se faz a seguir.

3.1 A TEORIA DA RESPONSABILIDADE INTEGRAL E A RESPONSABILIDADE

CIVIL OBJETIVA

A teoria da culpa, estudada no capítulo anterior, é fundamentada no agente

público que por ação ou omissão dá origem ao dano. Assim, se não for possível

identificar o causador do dano a responsabilização do Estado é impossível. Porém

esta teoria deixou de ser aceita para responsabilizar o Estado pelos danos

ambientais. Neste momento entra em cena a teoria da risco integral.210

A teoria do risco integral serve de fundamento para a responsabilidade civil

objetiva, e toma por base os seguintes aspectos:

207 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 17. 208 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 751. 209 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª Ed. Pag. 152. 210 CRETELA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Pág. 618-619.

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1) O risco que a atividade administrativa gera para os administrados e;

2) A necessidade de divisão, igualmente, tanto dos benefícios quanto dos

encargos suportados por alguns.211

Rompe-se o equilíbrio que deve necessariamente haver entre os encargo

sociais quando uma pessoa recebe um ônus maior que as demais, e por isso o

Estado deve indenizar o prejudicado, através dos recursos públicos.212

Para Montenegro esta é a teoria mais extremada da responsabilidade civil

pois está “impondo a responsabilidade sempre que a atividade do agente, de

qualquer forma, concorrer para o evento causador do dano”.213

Nesta teoria a idéia de culpa é substituída pela de nexo de causalidade entre

o funcionamento do serviço público e os prejuízos sofridos pelos seus

administrados. Não importa se houve culpa do serviço ou culpa do agente público,

nem se o serviço funcionou mal, de forma rápida ou demorada ou se não funcionou.

Não se questiona também a culpa ou dolo do agente ou da licitude ou ilicitude do

ato, pois, evidenciado o nexo de causalidade, o Estado responde.214

Não é admitida também nenhuma excludente de responsabilidade, como por

exemplo o fato de terceiro ou fato exclusivo da vítima, ou ainda a força maior, pois

elas rompem o nexo de causalidade existente entre a atividade e o dano. Porém na

teoria do risco integral, mesmo considerando-se estas excludente de

responsabilidade acima citadas, o nexo de causalidade não seria rompido, pois

aquele que exerce atividade causadora de dano responde por todo dano que não se

consumaria sem a existência desta atividade.215 No caso do abandono de animais

as excludentes de responsabilidade também não podem ser chamadas pois o

Município tem o dever de agir.

A teoria do risco integral reconhece a obrigação de reparar o dano, desde

que possa ser estabelecido o nexo de causalidade entre a atividade e o dano

causado. Ela pressupõe uma responsabilidade ampla daquele que exerce uma

211 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. re., atual. e ampl. Pág. 325. 212 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 527. 213 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 112. 214 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. ver., atual e ampl. Pág. 325-326. 215 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 113.

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atividade danosa, abrangendo todos os riscos por ela criados, mesmo que tiverem

concorrência com outros riscos que não sejam ligados a sua atividade.216

A responsabilidade objetiva baseia-se no nexo de causalidade entre a

atuação estatal e os danos dela decorrentes, e consiste na obrigação de reparar os

danos causados a terceiros em conseqüência de um procedimento lícito ou ilícito.

Cunha Junior217 afirma que a responsabilidade objetiva “distingue-se da

responsabilidade subjetiva não só pelo fato de dispensar a demonstração da culpa

administrativa ou do serviço, pois se satisfaz com a mera relação de causalidade

entre o comportamento e o dano”. Neste sentido o dano causado pelo abandono de

animais deriva da responsabilidade objetiva pois a omissão do Município gera o

dano, onde fica caracterizada a relação de coletividade.

Por estar mais ligada ao sentimento de solidariedade a responsabilidade

objetiva é considerada mais humana que a subjetiva, pois responsabiliza aquele que

tira proveito dos danos causados e criados à vítima, mesmo sem ter agido com

culpa. Não se pode admitir que a vítima suporte todos os transtornos da atividade

causadora de danos.218

A presunção de culpa representa uma tentativa de reequilibrar as partes, já

que há uma grande dificuldade em se provar a culpa do causador do dano ambiental

e por muitas vezes ela inexiste. A responsabilidade objetiva mostra-se como meio de

não permitir que o dano fique sem reparação.219

O art. 37, §6° da Constituição Federal de 1988 ensina que:

Art. 37, §6°: as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.220

Segundo o artigo citado acima, e conforme Maria Sylvia Zanella Di Pietro221,

a regra da responsabilidade objetiva exige:

216 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 113. 217 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. ver., atual e ampl. Pág. 326. 218 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 31-32. 219 MONTENEGRO, Magda. Meio ambiente e responsabilidade civil. Pág. 32. 220 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Lex: Vade Mecum compacto. 3ª ed. atual., e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010. 221 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 530.

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1) Que se trate de pessoa jurídica de direito público ou de direito privado

prestadora de serviços públicos;

2) Que as entidades prestem serviços públicos;

3) Que haja dano causado a terceiro em decorrência da prestação do serviço

público;

4) Que o dano seja causado por um agente que preste serviços a uma pessoa

jurídica, não importando o título sob o qual preste estes serviços, abrangendo todas

as categorias, de agentes políticos, administrativos ou ainda particulares em

colaboração com a Administração;

5) Que o dano deve ser causado pelo agente no exercício de sua atividade,

pois se o dano for causado quando o agente não estiver agindo no exercício de suas

funções não acarretará a responsabilidade estatal.

O art. 37, §6° da Constituição Federal cria também duas relações de

responsabilidade. A primeira é a do Estado e de seus delegados na prestação do

serviço público perante a vítima, que tem natureza objetiva baseada no nexo causal

ou tem natureza subjetiva baseada nos casos de omissão. A segunda relação de

responsabilidade é a do agente público que causou o dano perante o Estado ou

delegado na prestação de serviços de natureza exclusivamente subjetiva baseada

na culpa ou no dolo.222

É importante fazer a distinção de quando o Estado responde objetiva ou

subjetivamente pelos danos causados a terceiros. Quando o Estado causa o dano,

ou em outras palavras, se o dano decorreu de um comportamento seu, ele responde

objetivamente, mesmo sendo o resultante de comportamento lícitos ou ilícitos. É

suficiente demonstrar o dano e o nexo de causalidade entre aquele e a ação

estatal.223

Se o dano foi resultante da omissão do Estado, ele não pode a princípio ser

responsabilizado. Porém quando o Estado tinha o dever jurídico de agir e não o fez,

ele responde pelos danos que não evitou. A responsabilidade resultante da omissão

222 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. ver., atual. e ampl. Pág. 328. 223 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. ver., atual. e ampl. Pág. 328.

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58

do Estado tem natureza subjetiva224 e é indispensável a demonstração da culpa, por

ato comissivo ou omissivo, o dano e o nexo causal.225 Contudo, existem

divergências doutrinarias em relação a aplicação da responsabilidade por omissão

do Município.

A responsabilidade civil objetiva, na esfera ambiental, é decorrente do art.

225, §3° da Constituição Federal que prevê a obrigação de reparar os danos

causados ao meio ambiente sem exigir qualquer elemento subjetivo que configure a

responsabilidade civil.226 A responsabilidade objetiva ambiental significa que quem

danificou o meio ambiental tem o dever jurídico de reparar, não importando o motivo

pelo qual se levou a degradação.227

Além do art. 225, §3° da Constituição Federal a responsabilidade civil

objetiva também está expressamente prevista no art. 14, §1° da Lei 6.938/81 que

dispõe:

Art. 14, §1°: sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por suas atividades. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.228

A responsabilidade civil objetiva, estabelecida pelos artigos acima citados

afasta a necessidade de investigação e a discussão de culpa, mas ainda há a de se

mostrar o nexo de causalidade entre o dano e a ação ou omissão do agente.229

Se é licito usar o meio ambiente, o abuso do mesmo ultrapassa os limites da

licitude e passa a ser qualificado como agressão ao meio ambiente. É uma questão

muito complexa, pois muitas vezes estão envolvidos múltiplos agentes, o que quer

dizer que embora cada um esteja agindo licitamente o resultado global é ilícito.230

Assim, todo aquele que causar dano ao meio ambiente ou a terceiros será obrigado

224 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. ver., atual. e ampl. Pág. 330. 225 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª Ed. Pag. 154. 226 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 5ª ed. Pág. 45. 227 MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileito. 13ª ed. Pág. 335. 228 BRASIL. Lei 6.938/81. Lex: Vade Mecum compacto. 3ª ed. atual., e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010. 229 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª Ed. Pag. 156. 230 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 753-754.

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a ressarci-lo, mesmo que a conduta culposa ou dolosa tenha sido praticada por

terceiro.231

A ligação feita da responsabilidade objetiva à teoria do risco integral

expressa a preocupação dos doutrinadores em estabelecer um sistema de

responsabilidade mais rígido possível tendo em vista o quadro de degradação que é

visível em todo o mundo.232 Principalmente em relação ao abandono de animais,

que pode causar sérios danos a saúde da população, por isso a aplicação da

responsabilidade objetiva quando relacionada a este assunto.

3.2 ASPECTOS DA OMISSÃO, DA INÉRCIA E DA FALHA NA PRESTAÇÃO DO

SERVIÇO PÚBLICO NOS CUIDADOS COM OS ANIMAIS

No Brasil, que é uma República Federativa, a organização político-

administrativa envolve a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, que

conforme a Constituição Federal são todos autônomos. O que se busca é a

realização de um equilíbrio federativo através de um sistema de repartição de

competências.233

Em relação as competências legislativas aplica-se o princípio da

predominância dos interesses, assim as matérias de interesse nacional serão de

competência da União, as matérias de interesse regional aos Estados e as matérias

de interesse local aos Municípios. O art. 24, V, VI e VII da Constituição Federal

estabelece a competência legislativa da União, dos Estados e do Distrito Federal. Já

a competência legislativa dos Municípios, que é suplementar, está prevista no art.

30, II da Constituição Federal.234

231 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª Ed. Pag. 155. 232 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 753-754. 233 FERREIRA, Heline Sivini. Competências ambientais. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 3ªed. rev. Pág. 227. 234 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 5ª ed. Pág. 68-69.

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A competência material ou administrativa comum está prevista no art. 23 da

Constituição Federal. Nota-se que o constituinte foi redundante ao estabelecer,

simultaneamente, o dever de proteger o meio ambiente e preservar a fauna e a

flora.235

Em determinados momentos a competência comum a todos os entes

federativos poderá tornar difícil a tarefa de identificar qual norma administrativa deve

ser usada em determinada situação. Para isso deverão ser analisados os seguintes

critérios: 1) a preponderância do interesse; e 2) a cooperação entre os entes da

federação, conforme frisa o parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal.

Desta maneira deve-se privilegiar a norma que atenda melhor e mais efetivamente

os interesses comuns.236

Cada ente federativo deverá atuar respeitando seus limites legislativos,

porém em casos excepcionais a competência material ou administrativa poderá ser

exercida por pessoa política diferente daquela que editou a norma. Por exemplo, se

o Município não penalizar o causador do dano ambiental podem o Estado ou a

União intervir, defendendo o bem lesado.237

A competência municipal, tema deste trabalho, não é muito expressiva,

porém de extrema importância, já que é no Município que nascemos, trabalhamos,

nos relacionamos, por isso é no Município que podem ser adotadas as mais efetivas

ações para atender de modo imediato as necessidades ambientais locais238 como as

políticas de controle de zoonoses e de proteção aos animais abandonados.

Como lembra Sirvinskas239 a autonomia municipal não deve ser levantada

como justificativa para a sobreposição das normas de interesse local, pois “compete

aos Municípios suplementar a legislação federal e estadual no que couber, não

podendo legislar plenamente, mas respeitar a hierarquia das normas”.

235 FERREIRA, Heline Sivini. Competências ambientais. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 3ªed. rev. Pág. 239. 236 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 5ª ed. Pág. 70. 237 FERREIRA, Heline Sivini. Competências ambientais. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes, LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. 3ªed. rev. Pág. 240. 238 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 5ª ed. Pág. 70. 239 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4ª Ed. Pag. 91.

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Para Fiorillo240 a Constituição Federal trouxe uma grande importância para o

Município, principalmente em relação ao direito ambiental brasileiro pois “é a partir

dele que a pessoa humana poderá usar os denominados bens ambientais, visando

plena integração social, com base na moderna concepção de cidadania”.

Desta maneira, definida a competência municipal nas questões ambientais,

passa-se a análise dos aspectos da omissão, da inércia e da falha na prestação do

serviço público em relação ao abandono de animais nas ruas dos Municípios.

Se o Município não causou o dano ele não pode ser responsabilizado a

princípio, porém essa responsabilidade irá existir se ele tinha o dever jurídico de agir

para impedir o evento danoso e não o fez.241

As hipóteses de dano ambiental resultante de omissão podem ser separadas

em dois grupos. O primeiro trata de casos em que a norma prevê o dever de

atuação e o Município não age resultando em infração direta ao dever jurídico e a

responsabilidade por ato ilícito omissivo próprio. O segundo trata dos casos em que

a norma proscreve o resultado danoso e quando ocorre a ausência de ação do

Município para prevenir o dano se consome e responsabilidade por ato ilícito

omissivo impróprio.242

A responsabilidade por ato omissivo próprio é equiparável à dos atos

comissivos, pois quando uma norma estabelece a obrigatoriedade de o agente

público praticar determinada ação a omissão caracteriza a atuação ilícita. Já na

responsabilidade por ato omissivo impróprio o agente público não esta obrigado a

agir de determinada forma, por isso não gera presunção de infração. Porém deve-se

verificar se existiam elementos que comprovem que a adoção de providências

necessárias e suficientes poderiam impedir o dano, neste caso estaria o Município

responsabilizado.243

Para Cunha Junior “só existe a responsabilidade do Estado, insista-se,

quando houver uma correlativa obrigação de agir”. Ele afirma ainda que a omissão

240 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 5ª ed. Pág. 71. 241 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed.rev., atual. e ampl. Pág. 329. 242 JUSTEM FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. Pag. 1082-1083. 243 JUSTEM FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 4. ed. rev. e atual. Pag. 1083-1084.

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do Estado, neste caso do Município, gera uma responsabilidade subjetiva por culpa

anônima, baseada na culpa administrativa. O autor faz essa afirmação baseado-se

na idéia de que a responsabilidade objetiva adotada pelo §6° do art. 37 da

Constituição Federal é limitada aos danos derivados das ações do Município.244

O autor ainda cita dois acontecimentos que podem suscitar a

responsabilidade por atos omissivos: 1) fato da natureza, onde o Município não age,

devendo fazê-lo; e 2) o comportamento material de terceiros, onde o Município

também não age, mas deveria e podia fazê-lo. Neste último a responsabilidade é

subjetiva, pois decorre de um comportamento ilícito do Município em razão de culpa

ou dolo, o que ele chama de culpa anônima, pois não é necessário demonstrar a

culpa do agente. Pode ser chamada também de culpa do serviço.245

Contudo, para Carvalho Filho246 “se é verdadeiro que a omissão estatal é

sempre caracterizada como conduta culposa, não é menos verdade que a

responsabilidade objetiva, sendo um plus em relação à responsabilidade subjetiva,

pode ser sempre aplicável as condutas estatais”.

E é neste sentido que aplica-se a responsabilidade civil do Município perante

os animais abandonados, e para afirmar este entendimento seguem jurisprudências

de diversos Tribunais. Porém, vale frisar que os animais abandonados alvo deste

trabalho são animais domésticos, como cães, gato e coelhos que convivem com a

presença humana e estabelecem com ela um vínculo de dependência quanto à sua

sobrevivência.247

Primeiro vale citar o julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul,

que define a responsabilidade objetiva a ser aplicada ao Município em casos de

danos causados ao meio ambiente:

Constitucional, Processual civil e ambiental. Ação civil pública. Dano ambiental. Indenização ou reparação. Teoria do risco. Responsabilidade objetiva. Abrigando a teoria do risco criado, a lei nº 6.938/81 consagrou a obrigação do poluidor pela indenização ou

244 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. rev., atual. e ampl. Pág. 330. 245 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de direito administrativo. 7ª ed. rev., atual. e ampl. Pág. 332. 246 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 21ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. 247 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 5ª ed. Pág. 101.

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reparação dos danos causados ao meio ambiente em virtude de sua atividade, independentemente de culpa (art. 14, § 1º). Dessa responsabilidade objetiva decorre para o suposto "infrator" o ônus de produzir prova excludente da conduta danosa imputada e de seu nexo etiológico com os danos infligidos ao meio ambiente [condição aqui não atendida]. Apelação provida, por maioria.248

O julgado acima citado utiliza o art. 14, §1° da Lei 6.938/81, já mencionada

neste trabalho, para justificar a aplicação da responsabilidade objetiva quando tratar-

se de reparação ou indenização por danos ambientais, e só confirma todo o exposto

até aqui.

Pode-se perceber em outro julgado do Estado do Rio Grande do Sul que o

entendimento do julgado acima citado já está firmado naquele Estado. Trata-se de

Ação Civil Pública contra o Município de Jaguarão obrigando o mesmo a manter um

local para abrigo e tratamento de animais em estado de abandono:

Apelação cível. Direito público não especificado. Ação civil pública. Determinação ao Município de Jaguarão para criar e manter em funcionamento programas para que sejam recolhidos os animais abandonados e doentes, bem como criar mecanismos para manter e garantir a infra-estrutura, com cuidados e alimentação adequada a esses animais. Ampliação do prazo para cumprimento da ordem. Possibilidade. Multa diária para o caso de descumprimento da decisão judicial. Redução do quantum arbitrado. Cabimento. Apelo parcialmente provido.249

Vale ressaltar que caso o Município não cumpra a ordem imposta pela

sentença ainda caberá multa diária, como penalidade administrativa.

Neste outro caso uma Associação Protetora de Animais do Município de

Camaquã, também no Estado do Rio Grande do Sul, foi quem ajuizou a ação civil

pública, com o intuito de responsabilizar o Município pelos animais que estão sob

seus cuidados por se tratar de obrigação de natureza pública.

Apelação cível. Ação civil pública ajuizada por Associação Protetora de animais do Município de Camaquã (Apaca). Responsabilidade do Município pelo recolhimento, abrigo e tratamento de animais abandonados nas ruas do Município. Omissão manifesta do ente público. Indenização da Associação pelos gastos despendidos no

248 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível Nº 70017633991, da Vigésima Segunda Câmara Cível, Relator: Mara Larsen Chechi, julgado em 29/04/2010. Disponível em <http://www1.tjrs.jus.br/busca/?tb=juris>. Acesso em: 27 de Outubro de 2010. 249 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70032160020, Vigésima Primeira Câmara Cível, Relator: Francisco José Moesch. Julgado em 04/08/2010. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/busca/?tb=juris>. Acesso em 27 de Ouubro de 2010.

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cumprimento de obrigação de natureza pública. Imposição da condenação em obrigação de fazer. Construção de abrigo em local adequado. [...] Manutenção do pagamento dos custos pelo abrigo dos animais até a conclusão da obra. Nos termos do art. 225, VII, c/c art. 23, VI e VII, e art. 30, V, todos da CF/88, recolher, abrigar, e dar tratamento adequado a animais domésticos abandonados vias públicas municipais, até como forma de se evitar a propagação de doenças aos munícipes. [...]250

Nota-se também que foi imposto ao Município a obrigação de indenizar e

arcar com todos os custos gerados pela Associação até a conclusão das obras para

a criação de um canil municipal.

O Município de Alegrete, no Estado do Rio Grande do Sul, alega que pelo

fato de não existir norma municipal que regule o cuidado de animais em estado de

abandono não está caracterizada a omissão:

Ação civil pública. Direito público não especificado. Alegrete. Omissão do Município no cuidado com animais perambulando nas ruas e eventualmente recolhidos a local, onde estão desamparados de maiores cuidados, com proliferação de doenças, poluição do meio ambiente e maus tratos. Ausência de regulamentação específica que não serve para justificar a omissão do poder público. Normas de cunho geral que podem e devem ser invocadas, como o dever legal de polícia sanitária dos municípios, a par de normas específicas da lei orgânica e do código de posturas. Poder-dever de polícia sanitária e poder de propulsão dos municípios. Proteção ambiental. Procedência parcial do apelo ministerial.251

Porém pode-se aqui suscitar o princípio da prevenção que se atem ao

momento anterior ao dano, ou seja, o mero risco.252 Assim o Município não deve

esperar pela elaboração de uma norma para então agir, ele deve coibir práticas que

possam resultar em danos futuros.

O Tribunal de Justiça de São Paulo corrobora com o entendimento do

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ao proferir as seguintes sentenças:

Agravo de Instrumento – Ação Civil Pública. 1. Tutela de interesses difusos e/ou coletivos - Adoção de políticas sanitárias para o controle de zoonoses e a implantação de programas para recolhimento de animais domésticos abandonados na via pública -Município de

250 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70023027758, Primeira Câmara Cível, Relator: Henrique Osvaldo Poeta roenick. Julgado em 26/03/2008. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/busca/?tb=juris>. Acesso em 27 de Outubro de 2010. 251 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível n° 70005885298, Quarta Câmara Cível. Relator: Vasco Della Giustina. Julgado em: 09/04/2003. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/busca/?tb=juris>. Acesso em 27 de outubro de 2010. 252 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 3ªed. Pág. 755.

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Paraguaçu Paulista Legitimidade ativa do Ministério Público do Estado de São Paulo para o processo -Inteligência do artigo 25, inciso IV, alínea "a", da Lei Federal n°. 8.625, de 12/fevereiro/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), combinado com os artigos Io, inciso IV, e 5o, inciso I, ambos da Lei Federal n°. 7.347, de 24/julho/1985 (Lei da Ação Civil Pública). 2. Deferimento de liminar - Determinação de recolhimento de todos os animais abandonados nas vias públicas, mediante disponibilização para adoção. [...]253

Ação de Interdição de imóvel. [...] Remoção dos animais decorre da interdição do imóvel - Canil - ONG que retira animais da rua para encaminhar à adoção - Excesso de animais mo imóvel - Interdição decorrente da violação ao direito de vizinhança - Inteligência do artigo 1277 do Código Civil - Entretanto, deve ser observada a tutela constitucional dada aos animais que, como seres vivos, devem receber tratamento digno pela coletividade e pelo Estado - Canil Municipal que deve observar o quanto estatuído na Lei Estadual 12.916/08 no que toca a programas de controle populacional dos animais, medidas protetivas e adequação às normas de vigilância sanitária e salubridade. [...]254

Ao analisar o primeiro julgado pode-se perceber que trata-se do tipo de ação

que ocorreu no Município de Camaquã, no Estado do Rio Grande do Sul, e que

também obteve êxito quando o Município foi condenado a retirar das ruas todos os

animais abandonados e mantê-los até sua adoção.

O segundo julgado do Estado de São Paulo trata do tratamento digno que

deve ser dispensado aos animais, pois são seres vivos, tutelados pela Constituição

Federal, por leis especiais e ainda pela Declaração Universal dos Direitos dos

Animais.

Em casos de acidentes com o envolvimento de animais abandonados o

Tribunal de Justiça de Minas Gerais decidiu:

Direito constitucional e administrativo - Acidente - Omissão do poder público municipal - Animal abandonado em via pública - Acidente de trânsito - Danos materiais devidos - Danos morais - Ausência de comprovação - Recursos improvidos. Restando comprovada a falta do serviço, ou seja, que haja uma falha objetiva do serviço público, ou mau funcionamento deste, ou uma irregularidade anônima que importa em desvio da normalidade, é dever do município indenizar o

253 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação n°994092614842. Decima Segunda Camara de Direito Público. Relator: Osvaldo de Oliveira. Julgado em 10/03/2010. Disponível em: <http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=4385139>. Acesso em 27 de Outubro de 2010. 254 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação n° 994092538803. Terceira Camara de Direito Público. Relator: Magalhães Coelho. Julgado em: 16/03/2010. Disponível em: <http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=4398193&vlCaptcha=tkbyr>. Acesso em 27 de Outubro de 2010.

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cidadão pelos danos materiais sofridos. Para que seja configurado o dano moral, mister a concorrência dos requisitos, a saber, o dano sofrido, a ação da administração pública e o nexo de causalidade entre o dano alegado pela apelante e a conduta do poder público.255

O Código Civil de 2002 trata dos danos causados por animais no seu artigo

936:

Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.256

Sobre este artigo do Código Civil Cavalieri explica:

O dispositivo em exame não atribui a responsabilidade exclusivamente ao dono porque, como já visto, pode ele ter transferido juridicamente a guarda do animal a outrem, como no caso de locação, comodato etc., ou tê-la perdido em razão de furto ou roubo. Por isso o Código atribui também responsabilidade ao detentor do animal, isto é, àquele que, embora não sendo o dono, tinha o efetivo controle dele, o poder de direção, podendo, assim, guardá-lo como cuidado necessário e preciso para que ele não cause dano a outrem.257

e por serem guardiões do animal ou por terem o dever de cuidá-lo é que o Estado

deve ser responsabilizado.

Aplicando o mesmo entendimento que Di Pietro “o Estado responderá se

ficar caracterizada a sua omissão, a sua inércia, a falha na prestação do serviço

público”258 ficando claro que se o Estado se omite em relação aos animais

abandonados é de sua responsabilidade reparar os danos causados aos seus

administrados.

Para finalizar vale citar alguns dos artigos da Declaração Universal dos

Direitos dos Animais, considerados mais relevantes ao assunto aqui abordado, ou

seja, aos animais domésticos em estado de abandono.

Art. 1º: Todos os animais nascem iguais perante a vida e têm os mesmos direitos à existência.

Art. 2º: a) Todo o animal tem o direito de ser respeitado. b) O homem, enquanto espécie animal, não pode atribuir-se o direito de exterminar os outros animais ou de os explorar, violando esse

255 MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Apelação n°4749029-54.2007.8.13.0024. Relator Carreira Machado. Julgado em 14/10/2008. Disponível em: <http://www.tjmg.jus.br/juridico/sf/proc_resultado.jsp?comrCodigo=24&numero=1&listaProcessos=07474902&btn_pesquisar=Pesquisar>. Acesso em 27 de Outubro de 2010. 256 BRASIL. Código Civil. Lex: Vade Mecum compacto. 3ª ed. atual., e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010. 257 CAVALIERI Filho, Sérgio. Programa de responsabilidade Civil. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pág. 206. 258 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16ª ed. Pág. 531.

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direito. Tem a obrigação de empregar os seus conhecimentos ao serviço dos animais. c) Todos os animais têm direito à atenção, aos cuidados e à proteção do homem.

Art. 3º: a) Nenhum animal será submetido a maus tratos nem a atos cruéis. Art. 6º: a) Todo o animal que o homem tenha escolhido por companheiro, tem direito a que a duração da sua vida seja conforme à sua longevidade natural. b) O abandono de um animal é um ato cruel e degradante.259

Com isso conclui-se este capítulo deixando clara a responsabilidade do

Município pelos animais abandonados nas ruas, em razão do nexo de causalidade

entre o fato gerador e o dano, que se concretiza no momento em que o Município

não toma atitudes que possam prevenir o abandono de animais. Pode-se afirmar

ainda que é necessária a criação de Centros de Zoonoses Municipais para o efetivo

cumprimento das suas obrigações ambientais.

259 DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DOS ANIMAIS. Disponível em <HTTP://www.apasfa.org/leis/declaracao.shtml>. Acesso em 27 de Outubro de 2010.

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CONCLUSÃO

Com o término do desenvolvimento deste trabalho, após a análise de

doutrinas e jurisprudências verificou-se que a sociedade em que vivemos nos expõe

a diversos riscos ambientais, decorrentes do crescimento desenfreado da população

e das tecnologias, o que pode gerar problemas de âmbito mundial. Para mudar esta

realidade deve-se construir um Estado de Direito Ambiental, que tem como objetivo

criar meios eficazes de proteção ao meio ambiente, disponíveis somente se houver

uma política globalizada tratando do meio ambiente.

Para a efetivação deste Estado de Direito Ambiental é necessária a

aplicação de diversos princípios, como o princípio do desenvolvimento sustentável,

democrático, da cooperação ambiental, do poluidor-pagador, da precaução, da

prevenção, da participação e da responsabilização além de outros princípios

secundários.

Constatou-se que a responsabilidade civil objetiva é a que norteia o Direito

Ambiental, e tem como base a teoria do risco integral, que obriga o Município a

indenizar qualquer dano ocorrido que seja resultante de qualquer uma de suas

atividade. As causas excludentes de responsabilidade, como o caso fortuito ou a

força maior, o fato de terceiro, a culpa exclusiva da vitima, a legitima defesa, o

estado de necessidade e o exercício regular de um direito, não são aplicadas no

Direito Ambiental.

Analisou-se também a responsabilidade penal e a administrativa. A primeira

é de difícil aplicabilidade, pois o responsabilizado é pessoa jurídica. Já a segunda

tem extrema importância na proteção ambiental e é sempre utilizada, aplicada pelo

Poder Público através do poder de polícia. As penalidade administrativas são várias,

porém a de maior aplicabilidade é a multa.

Por fim passou-se a análise do Município com responsável pelos animais

abandonados. Após feita a análise da competência legislativa e executiva do

Município conclui-se que a responsabilidade objetiva é a que deve ser aplicada,

baseada sempre na teoria do risco integral.

Portanto, a hipótese que se verificou mais adequada como solução dos

questionamentos feitos no inicio desse estudo foi a de que o Município é sim

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responsável pelos animais abandonados em suas ruas e merece sanções se não

cumprir o seu dever de proteção e guarda.

As variáveis expostas na introdução não se concretizaram ainda, e os

Tribunais continuam a confirmar o entendimento da doutrina, e espera-se que sejam

mantidos.

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REFERÊNCIAS

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