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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALICENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURPSCURSO DE DIREITO- NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA
OS DESAFIOS ATUAIS DO EXERCÍCIO DO PODER FAMILIAR
FRENTE O PODER DO ECA
GABRIELA GONÇALVES
Itajaí (SC), julho de 2009
ii
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALICENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPSCURSO DE DIREITO- NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA
OS DESAFIOS ATUAIS DO EXERCÍCIO DO PODER FAMILIAR
FRENTE O PODER DO ECA
GABRIELA GONÇALVES
Monografia submetida à Universidadedo Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau deBacharel em Direito.
Orientador(a): Professor(a) Msc.Maria Inês França Ardigó
Itajaí (SC), julho de 2009
AGRADECIMENTO
Primeiramente a Deus;
Aos meus pais, Luiz Carlos Gonçalves e Rosana Margareth Gonçalves pelapersistência no incentivo a minha formação acadêmica.
Ao meu irmão Guilherme Gonçalves e ao meu noivo Níkolas Reis pelacompreensão e companheirismo nesta fase da minha vida.
As valiosas amizades que encontreinestes cinco anos de Universidade;
A todos os professores do Curso de Direito da Univali pelos conhecimentosdeixados ao longo desses cinco anos de caminhada;
E, especialmente, a minha orientadora Professora Maria Inês França Ardigó queme acolheu com paciência e dedicação, sendo fundamental para a conclusão
deste trabalho.
DEDICATÓRIA
Este trabalho dedico à memória de Laura Rebello.
2
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí (SC), julho de 2009
Gabriela Gonçalves
Graduanda
3
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do
Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Gabriela Gonçalves, sob o
título Os Desafios atuais do exercício do poder familiar frente o poder do
Eca, foi submetida em ______à banca examinadora composta pelos seguintes
professores: Profª Maria Inês França Ardigó [Orientadora e Presidente da
Banca],___________[Membro], e aprovada com a nota _________.
Itajaí (SC), julho de 2009.
Professora Maria Inês França Ardigó
Orientadora e Presidente da Banca
Professor MSc Antônio Augusto Lapa
Coordenação da Monografia
4
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Art. Artigo
Ampl. Ampliada
Arts. Artigos
Atual. Atualizada
CC Código Civil
CC/1916 Código Civil Brasileiro de 1.916
CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2.002
CCB Código Civil Brasileiro
CDC Código de Defesa do Consumior
CEJURPS Centro de Ciência Jurídicas Políticas e Sociais
CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
ECA Estatuto da Criança e do Adolescente
Ed. Edição
Inc. Inciso
Nº Número
Segs. Seguintes
Trad. Tradutor
UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí
5
ROL DE CATEGORIAS
Criança: de acordo com o artigo 2º, primeira parte, do Estatuto da Criança e do
Adolescente, “considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até
doze anos de idade incompletos”1.
Filiação: é o vínculo existente entre pais e filhos; vem a ser a relação de
parentesco consangüíneo em linha reta de primeiro grau entre uma pessoa e
aqueles que lhe deram a vida2.
Pátrio Poder: conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, em relação à
pessoa e bens dos filhos não emancipados tendo em vista a proteção destes3.
1 ECA,São PAULO Editora Rideel, 2007, p. 23.2 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002,p.372.3 Rodrigues, Silvio. Direito de Família. São Paulo , Saraiva, 1979, p. 354.
6
SUMÁRIO
RESUMO...................................................................................................... IX
INTRODUÇÃO .............................................................................................10
CONSIDERAÇÕES FINAIS .........................................................................77
CAPÍTULO 1
A HISTÓRIA DA CRIANÇA NO BRASIL
1.1. A HISTORIA DA CRIANÇA DA COLONIZAÇÃO ATÉ HOJE ............12
1.2 A CRIANÇA E A COLONIZAÇÃO DO BRASIL ..................................13
1.2.1 Os Portugueses...................................................................................14
1.2.2. A Igreja Católica ................................................................................14
1.2.3 Os JESUITAS .....................................................................................15
1.2.4.Catequizar os índios e negros.............................................................16
1.2.5. O CRISTIANISMO..............................................................................17
1.2.6.Roda dos expostos..............................................................................18
1.2.7 AMAS-DE-LEITE.................................................................................21
1.2.8 O internato de crianças .......................................................................22
1.2.9 A Disciplina escolar .............................................................................22
1.2.10 Abolição oficial da escravatura..........................................................24
1.2.11 Século XIX. .......................................................................................24
1.2.12 Movimento higienista......................................................................... 25
1.2. 13 República .........................................................................................26
1.3 A constituição DE 1934 ..........................................................................27
1.3.1 Código de menores .............................................................................28
1.3.2 FEBEM................................................................................................28
1.3.3 CONSTITUIÇÃO DE 1988 ..................................................................29
1.3.4 Estatuto da Criança e do Adolescente ................................................30
7
Capítulo 02
FILIAÇÃO
2.1 PROCRIAR É UM ATO NATURAL........................................................34
2.1.2 Procriar gera efeitos jurídicos..........................................................34
2.2 FILIAÇÃO ..............................................................................................35
2.2.1 Conceito de filiação ..........................................................................35
2.3 DIREITO AO ESTADO DE FILIAÇÃO...................................................36
2.4 PRINCÍPIO DA IGUALDADE DE DIREITOS ........................................37
2.5 CONCEITO DE FAMÍLIA ......................................................................39
2.6 CONCEITOS DE FILIAÇÃO .................................................................42
2.6.1 Filiação legítima ..................................................................................42
2.6.2 Prova da condição de filho legítimo:....................................................45
2.6.3 Filiação legitimada...............................................................................46
2.6.4 Filiação ilegítima..................................................................................49
2.6.5.Filiação matrimonial ............................................................................51
2.6.6 Filiação extramatrimonial:....................................................................53
Capítulo 03
DESAFIOS DO EXERCICIO DO PODER
3.1 DESAFIOS DO EXERCICIO DO PODER FAMILIAR............................57
3.1.1 Responsabilidade dos pais para com seus filhos................................57
3.1.2. Pátrio poder .......................................................................................58
3.1.3..Ordenações do reino português .........................................................60
3.1.4 Declaração universal dos direitos........................................................60
3.1.5 Poder familiar .....................................................................................60
3.1.6 Funções sociais da família ..................................................................70
3.1.7 Funções dos pais ................................................................................71
3.1.8 Pais podem perder o poder familiar ....................................................72
8
3.1.9 Compete aos pais amoldarem o caráter do filho ................................73
3.1.10 Pais educadores................................................................................73
REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS...................................................79
ANEXO.........................................................................................................83
9
RESUMO
A presente monografia trata do estudo dos Desafios atuais do exercício
do poder familiar frente o poder do ECA, ao trabalhar-se com um tema tão
complexo e tocante, forma-se a sensibilidade imprescindível para aborda-se as
questões trágicas que envolvem a difícil realidade da grande maioria dos pais
diante da difícil tarefa de educar seus filhos.
Foi neste aspecto, então, que se colocou esta proposta de analisar a
eficácia do ECA, partindo à apresentação histórica da criança no Brasil, da
filiação ,Código Civil Brasileiro e Constituição Federal, responsável pela
trajetória de milhares de filhos menores.
A presente monografia tem, por objetivo geral, analisar, o poder
familiar perante o poder do ECA, pois a complexidade das relações pode
permitir uma variabilidade maior de relacionamentos dos filhos menores com
os pais, o que pode lhe proporcionar uma gama de experiências.
Mostrar limites saudáveis é importante para o menor desenvolver
bons relacionamentos, obter maturidade, segurança e equilíbrio na vida, pois
os limites são uma base segura para o desenvolvimento dos filhos. Os limites
ajudam os pais a preparar seus filhos para assumir responsabilidade com o
próximo e consigo mesmo.
Enfim, o carinho dedicado à busca da solução para o problema dos
limites que os pais vem a oferecer para seus filhos é que a criança sente -se
segura, apresenta maior capacidade de estruturação de vínculos,o que lhe
estrutura uma base importantíssima para seu desenvolvimento futuro, em todos
os sentidos.
10
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto os Desafios
atuais do exercício do poder familiar frente e o ECA.
O seu objetivo é a dificuldade que os pais encontram para
educar seus filhos, saber até onde vai o limite de cada um.
Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando da
história da criança no Brasil, desde quando os jesuítas chegaram ao Brasil e
começaram a catequizar as crianças, pois acreditavam que elas seriam as
peças chaves. Trata-se também da história social em linha geral, o desprezo
com as crianças e adolescentes durante o período colonial e a instalação da
República. A vinda da Constituição de 1988 e o Estatuto da criança e do
adolescente (ECA), onde fica estabelecida a proteção integral e o direito como
sujeitos.
No Capítulo 2, serão abordados os conceitos de filiação.
No Capítulo 3, por fim, tratando do lineamento histórico do
pátrio poder , Código Civil Brasileiro, Constituição Federal, ECA e os limites
que os pais devem dar aos filhos.
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das
reflexões sobre a educação dos filhos com os pais.
Para a presente monografia foram levantadas as
seguintes hipóteses:
Primeira hipótese: há uma ampla divulgação na mídia
esclarecendo os direitos do ECA.
11
Segunda hipótese: se a legislação vigente os pais podem
exigir obediência dos filhos.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na
Fase de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de
Dados o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na
presente Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica.
12
CAPÍTULO 1
A HISTÓRIA DA CRIANÇA NO BRASIL
1.1. A HISTORIA DA CRIANÇA DA COLONIZAÇÃO ATÉ HOJE
Faz-se necessário iniciar este estudo com breve estudo
sobre a criança, como surgiu na história a criança.
Noticia-se que as crianças não tinham valor pois nasciam
em quantidade muito grande, mas morriam muitas por falta de cuidados com a
higiene.
Áries4 informa que a primeira imagem da infância é:
[...] uma miniatura otoniana do século XI, (que) nos dá
uma idéia impressionante da deformação que o artista
impunha então ao corpos das crianças, num sentido que
nos parece muito distante de nosso sentimento e da
nossa visão. O tema é a cena do Evangelho em que
Jesus pede que se deixe vir a ele as criancinhas, sendo o
texto latino claro: parvulli. Ora, o miniaturista agrupou em
torno de Jesus oito verdadeiros homens, sem nenhuma
das características da infância: eles foram simplesmente
reproduzidos numa escala menor. Apenas seu tamanho
os distingue dos adultos.
Áries5 noticia que no século XIII, no continente europeu,
aconteceu a descoberta da infância , tornando-se visíveis alguns tipos de
13
crianças, mais próximos do sentimento moderno. Conforme afirma o autor, esta
evolução foi acompanhada através da história da arte e iconografia. Nas
práticas religiosas cristãs, passa a ser percebida a infância, quando um clero
juvenil passa a ser ajudante da celebração de missa, sob aparência de um
anjo, usando vestimentas que assim o caracterizava.
Del Priore6 esclarece que resgatar o passado da infância
brasileira significa, primeiramente, dar voz aos documentos históricos, uma vez
que “é pela voz de médicos, professores, padres, educadores, legisladores que
obtemos informações sobre a infância no passado; essa fala obriga, contudo, o
historiador a uma crítica e a uma interpretação de como o adulto retrata o
estereótipo da criança ideal”7.
Foi assim que, como historia Áries8, para abrandar este
convívio com tantas mortes inocentes no seio das famílias, a Igreja Católica, na
busca de compensação e explicação para essa tragédia, utilizou a associação
medieval européia de crianças com os anjos do Senhor que ia para o céu.
Conforme Ferriani ( 2002), verifica-se que a infância,
independentemente do estrato social, era considerada uma fase bastante curta,
pois assim que demonstravam condições de sobreviverem sem os cuidados
básicos maternos, as crianças ingressavam no mundo dos adultos passando a
serem consideradas iguais.
1.2 A CRIANÇA E A COLONIZAÇÃO DO BRASIL
4 ÁRIES, Philippe. História Social da criança e da família. Rio de Janeiro:Guanabara,1984, p.50.5 ARIÉS, Philippe. História Social da criança e da família. Rio de Janeiro:Guanabara,1984.6 PRIORI, Mary Del. História da Criança no Brasil. 5. ed. São Paulo: 1998.p. 16.7 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil. 5 ed São Paulo. 1998, p.15.8 ARIÉS, Philippe. História Social da criança e da família. Rio de Janeiro:Guanabara,1984.
14
Os colonizadores, ao chegarem no Brasil depararam-se
com uma raça muito diferente, com cultura e costumes próprios, fato que levou
os portugueses a crerem na necessidade de conduzir os indígenas, pois
pareciam estar muito mais próximos aos bárbaros e selvagens do que da
condição humana.
No período colonial, no Brasil, da terceira década do
século XVI à Independência, em 1822, de acordo com Ramos (1999), o
universo infantil não tinha espaço: as crianças eram obrigadas a adaptar-se em
meio a um mundo adulto.
Na época da colonização, muitas doenças afligiam e
dizimavam as crianças,como o sarampo, a varíola, verminose, dermatoses e
sarna,além da infecção chamada “mal-de-sete-dias”, resultante da inflamação
do umbigo do recém nascido9.
1.2.1 Os portugueses
Primeiramente, os portugueses preocuparam-se em
povoar a nova terra e conquistar riquezas, assim como, os jesuítas iriam
catequizar os hereges, banindo toda a forma de doutrina contrária aos dogmas
do catolicismo10.
1.2.2. A igreja católica
Juntamente com monarquia portuguesa, os reis católicos,
os colonizadores, trouxeram os padres jesuítas que tinham por objetivo
expandir a Companhia de Jesus.
9 SANTOS FILHO, L.História geral da medicina brasileira. São Paulo:HUCITEC/EDUSP, 1991, p.5210 PRIORE, Mary Del. História da criança no Brasil. São Paulo: Contexto, 1998,p.09.
15
A igreja católica e a por meio dos jesuítas que para o
Brasil foram trazidos durante a colonização, determinavam como deveria ser os
comportamentos, com base em leis divinas .
1.2.3 Os Jesuitas
Para os religiosos que chegaram a nova colônia esta foi a
visão:
Aos olhos dos jesuítas recém-chegados às Índias entãodescobertas, não só o cenário carecia de ordem queexprimisse a marca civilizatória da metrópole na colônia,mediante a instalação de vilas, erecção de capelas e asemeadura dos campos, mas as almas indígenas deviam serordenadas e adestradas para receber a semeadura da palavrade Deus. Transformação da paisagem natural e tambémtransformação dos nativos em cristãos: esta era a missão11.
No início do seu trabalho, os jesuítas encontraram
dificuldades em modificar os hábitos já arraigados nos índios adultos e
voltaram-se para a educação das crianças12 por acreditarem, serem elas
tábuas rasas onde tudo se poderia imprimir.
Afirma Priore:
Municiados por um regime de normas a submeter à criança, osjesuítas ajudaram a fazer a passagem entre a escola da IdadeMédia e o colégio dos tempos modernos, substituindo ainstrução técnica atabalhoadamente dirigida a jovens e velhos,por uma formação social e moral rigidamente hierarquizada13.
A pedagogia jesuítica, e a tentativa de transformar os
pequenos indígenas em crianças santificadas e exemplares, vai ajudar na
11 PRIORE, Mary Del. História da criança no Brasil, 1998, p.10-11.12 De acordo com o artigo 2º, primeira parte, do Estatuto da Criança e do Adolescente,
“considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idadeincompletos” (ECA,São PAULO Editora Rideel, 2007, p. 01)
13 PRIORE, MaryDel, História da criança no Brasil, 1996/1999, p. 14.
16
elaboração de uma cultura sincrética, que como bem diz Laura de Mello e
Souza ”era vivência”14.
Diz Priore15:
A infância é percebida como momento oportuno para a
catequese porque é também momento de unção, iluminação e
revelação. Mais além, é o momento visceral de renúncia , da
cultura autóctone das crianças indígenas, uma vez que certas
práticas e valores ainda não se tinham sedimentado16.
No entanto, mais importante, no que diz respeito à
infância brasileira e os jesuítas, foi a elaboração, também quinhentista e
européias, dos primeiros modelos ideológicos sobre a criança. A igreja católica
nesse período responsabilizava-se particularmente pela disseminação de duas
imagens que embora desvinculadas da vida das crianças comuns da época,
ajudaram a alterar a maneira pela qual os adultos as “pensavam” e
acompanhavam seus passos17.
São eles ainda, segundo Áries18, os primeiros a atentar
para a especificidade da infância, o conhecimento da psicologia infantil e a
preocupação com um método que atendesse a essa mesma psicologia19.
1.2.4.CATEQUISAR OS ÍNDIOS E NEGROS
Nesse clima de catequizar os índios e negros, “a
separação de crianças índias e negras de seus pais foi a forma mais eficiente
14 SOUZA, Laura de Mello. O Diabo na Terra de Santa Cruz, São Paulo, Cia dasletras, 1986, p.4515 PRIORE, Mary Del. História da criança no Brasil. São Paulo, Contexto, 1998. p.1516 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, p. 15.17 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, 1998, p.11/12.18 ARIÉS, Philippe. História Social da criança e da família. Rio de Janeiro:Guanabara,1984. p.5119 ARIÈS, Philippe. História Social da criança e da família. Rio de Janeiro:Guanabara,1984, p.188.
17
encontrada pelos catequizadores para isolar estas crianças da influência dos
costumes e tradições de seus antepassados e assim levá-las a assimilar mais
facilmente a cultura e a religião dos portugueses. Com esta finalidade surgiu
em 1551 a primeira casa de recolhimento de crianças do Brasil”20.
A emergência das atitudes de valorização da infância,
somada à elaboração de um modelo ideológico da criança - Jesus – ambos
emigrados para a colônia na mentalidade jesuítica- , que fez a Companhia
escolher as crianças indígenas como o “papel blanco”, a cera virgem, em que
tanto desejava escrever; e inscrever-se21.
.
O objetivo era conquistar, sim, a alma indígena, como
sugere o ensaio de Roberto Gambini, mais aquelas alminhas virgens, onde os
pecados destas terras tão paradoxais ainda não se tivessem instalado22.
1.2.5. O CRISTIANISMO
O cristianismo conseguiu também propagar que as
crianças tinham também uma alma imortal, nascendo, então uma consciência,
um reconhecimento “ a esses seres frágeis e ameaçados, uma particularidade
que antes ninguém se importava em reconhecer”23.
As cenas de gênero infantil não se consagra á descrição
exclusiva da infância, mas tinham nas crianças seus personagens principais,
que nos sugere duas idéias de infância, de acordo com Priore:
Nota-se também uma nostalgia da criança “meúda”, pequena evulnerável na qual se podia projetar o menino Jesus. Apuberdade aos olhos dos padres catequistas é a idade
20 DINIZ, Andréa; CUNHA, José Ricardo. Visualizando a política de atendimento à
criança e ao adolescente, p. 10.21 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, p.12.22 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, p.12.23 ARIÉS, Philippe. História Social da criança e da família. Rio de Janeiro:Guanabara,1984.
18
perigosa e ingrata na qual as raízes falam mais alto. Omomento de “seguir a seus pais” torna-se um marco de rupturaentre o ideal jesuítico e as realidades coloniais. A puberdademarca, por fim, a expulsão do paraíso prometido pelos jesuítas,onde na realidade eles queriam ter nada mais do que criançasdóceis e obedientes.24
Difundiam-se então duas representações infantis: a
criança mística e a da criança que imita Jesus. Exaltando aquelas cuja fé as
ajudava a suportar a dor e a agonia física, os pequenos místicos chamavam
atenção para as qualidades individuais da criança. 25
Priori26 diz, que foi expandida a visão da criança mística, a
criança que imita Jesus. Ressaltavam –se as características das crianças cuja
fé possibilitava suportar a dor e a agonia física, constituindo-se, assim, o mito
da “criança-santa”,cujos padrões eram Pedro de Luxemburgo e Catarina de
Siena , bem como era exaltada a devoção ao Menino Jesus.
As características humanas – olhar, o perfume e osgestos – desta criança divinizada, somadas a sua doçura,inocência e afabilidade, tocariam a todos que acercassem. Assim fora na manjedoura: infiéis e pagãosconvertiam-se ante a dulcíssima visão do pequeno eluminoso Jesus.27
O pequeno corpo, o caminhar infantil, as tenras
mãozinhas irradiavam uma meiguice absolutamente convincente para a
conversão das almas mais empedernidas. Esse retrato era um afresco
melhorado e espiritualizado da infância estudada por Airès, para o final da
Idade Média e que via a criança enquanto um ser anedótico e engraçadinho.28
24 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, São Paulo: Contexto, 1998, p.23.25 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, São Paulo: Contexto, 1998, p.12.26 PRIORE, Mary Del. História da criança no Brasil. São Paulo, Contexto, 1998. p.1227 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, São Paulo: Contexto, 1998, p.12.
19
1.2.6.RODA DOS EXPOSTOS
Com origem na Europa, este dispositivo engenhoso era
composto por um cilindro, fechado por um dos lados, que girava em torno de
um eixo e ficava incrustado nos muros dos conventos, com uma campainha a
ser acionada quando uma criança era colocada na roda e esta era girada, de
modo que o “doador” do recém nascido não fosse visto29.
Afirma Rizzini30,é fabricado um aparelho, em geral de
madeira, do formato de um cilindro, com um dos lados vazados,assentado num
eixo que produzia um movimento rotativo, colocado em uma das paredes de
um abrigo para crianças, identificado por “ Roda dos Desvalidos ou Enjeitados”.
Desde o Brasil colonial, há alguns exemplos bem
documentados. Venâncio31, por exemplo, mostra como a ausência de apoio às
famílias de classe baixa determinou o abandono de crianças por pais ou mães
incapazes de sustentá-las. Esperançosos de garantir melhores condições de
vida aos seus filhos, muitas famílias pobres os entregavam à Roda dos
Expostos, o que, na verdade, acabava por redundar em alta mortalidade
infantil. Assim, “desde os séculos XVIII e XIX, a única forma de as famílias
pobres conseguirem apoio público para a criação de seus filhos era
abandonando-os”32.
No período colonial, assumindo o modelo português no
trato à criança, nosso país adotou a Roda dos Expostos como prática de
28 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, p.12.29 MARTINS, Daniele Comin, Estatuto da criança e adolescente e política deatendimento, 2003, p. 29.30 RIZZINI, Ireni; et. al. Acolhendo crianças e adolescentes: experiências depromoção do direito à convivência familiar e comunitária no Brasil. São Paulo: Cortez;Brasília: DF: UNICEF; Rio de Janeiro: PUC Rio, 2006. p. 7231 VENÂNCIO, Renato Pinto. Famílias abandonadas: assistência a criança decamadas populares no Rio de Janeiro e em Salvador – séculos XVIII e XIX. Campinas:Papirus, 1999. p.1232 VENÂNCIO, Renato Pinto. Famílias abandonadas: assistência a criança decamadas populares no Rio de Janeiro e em Salvador – séculos XVIII e XIX. Campinas:Papirus, 1999. p. 13
20
institucionalização, “ligada ao que posteriormente se nomearia como problema
do abandono”33.
Gonçalves comenta que:
A pessoa que levava e “lançava” a criança na Roda nãoestabelecia nenhuma espécie de contato com quem arecolhia do outro lado de dentro do estabelecimento. Amanutenção do segredo sobre a origem social da criançaresultava da relação promovida entre abandono decrianças e amores ilícitos. [...] visavam num primeiromomento, absorver os frutos de tais uniões. Com otempo[...] indivíduos das camadas populares, porexemplo, abandonavam seus filhos na Roda por nãopossuir meios materiais de mantê-los e criá-los34.
Em todos os locais em que existiu, a Roda de Expostos
foi sempre muito discutida. Acreditava-se que o anonimato dos pais do
enjeitado propiciava a licenciosidade e a irresponsabilidade pelo fruto de seus
prazeres. O abandono da criança acabava sendo considerado como resultante
da existência da Roda, quando esta procurou, muitas vezes êxito, salvar a vida
de recém-nascidos cujo abandono era feito nos adros das igrejas ou no beiral
das portas, muito antes de as Rodas terem sido criadas.35
Os destinos dos sobreviventes da Rodas de Expostos
eram delimitados pelo sexo, segundo Marcílio36: os meninos quando não eram
enviados para as companhias de aprendizes marinheiros ou aprendizes do
arsenal de guerra, verdadeiras escolas profissionalizantes dentro da dura
disciplina militar,eram enviados para casas de famílias, como aprendizes de
ferreiro, sapateiro, caixeiro, balconista, etc:
33 ALVAREZ, 1989, p. 41.34 GONÇALVES, Margareth de Almeida.Pensando a família no Brasil: da colônia àmodernidade. Rio de Janeiro. Espaço e Tempo. 1987. p.38.35 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, São Paulo: Contexto, 1998, p.99.36 MARCÍLIO, M. C. A rodados expostos e a criança abandonada no Brasilcolonial: 1726/1950. Em M. Freitas ( Org.) História social da infância no Brasil. SãoPaulo: Cortez, 2001. p. 77
21
As meninas eram encaminhadas as Casas de Meninas Órfãspara [...] à preservação de sua honra e castidade, era alvo demaiores preocupações pela Santa Casa. Para elas foramcriadas junto as maiores Casas de Misericórdias umRecolhimento de meninas órfãs e desvalidas que estivessemligadas às casas de expostos37
Arantes38 afirmava que a Roda dos Expostos ou Roda dos
Enjeitados, tinha por objetivo receber crianças abandonadas para que se
pudesse desviá-lo do perigo da prostituição e da vadiagem. ‘’’Enjeitados’, ‘
deserdados da sorte’, ‘expostos’ e ‘desvalidos’ foram denominações de uso
corrente, referindo-se a estas crianças. Para elas destinou-se a “ Roda ”.
Não resta dúvida, que esse foi o marco do recolhimento
das crianças necessitadas, por parte da igreja no Brasil.
1.2.7 AMAS-DE-LEITE
Durante o século XVIII, os bebês, ao nascerem, eram
entregues a amas-de-leite e eram conduzidas as suas casas para receberem
os cuidados necessários: “ (...) a prática era dos mais pobres aos mais ricos,
nas pequenas ou nas grandes cidades (...)”. Ao voltar da casa da ama, o filho
das classes abastadas era imediatamente confiado a uma governanta, até aos
sete anos. Em seguida, se fosse menino, era entregue a um preceptor39.
As famílias que não tinham condições de manter uma
governanta, conforme Badinter40, mutuamente davam seus filhos em troca,
para prestarem serviços como criados. Quando as crianças passaram a
37 MARCÍLIO, M. C. A rodados expostos e a criança abandonada no Brasilcolonial: 1726/1950. Em M. Freitas ( Org.) História social da infância no Brasil. SãoPaulo: Cortez, 2001. p. 7738 apud PILOTTI e RIZINNI, 1995, p.19139 Badinter, Elisabeth. Um Amor conquistado: o mito do amor materno. ElisabethBadinter; tradução de Waltensir Dutra. — Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.p. 67 e12840 Badinter, Elisabeth. Um Amor conquistado: o mito do amor materno. ElisabethBadinter; tradução de Waltensir Dutra. — Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.p. 67
22
morrer,em quantidades assustadoras, devido a falta de cuidados, é que as
famílias começaram a examinar suas atitudes.
No período em que se fazia necessário o aprendizado, a
criança era retirada de sua casa para ir aprender e trabalhar em uma outra
casa, como um “mini adulto”, e sua socialização e educação não se realizavam
em casa, no que era privado, mas se estendiam a um espaço distinto disso e
se realizavam de uma forma que o contato com toda a comunidade
acontecia41.
1.2.8 O internato de crianças
O internato de crianças, por outro lado, passou a se tornar
prática aceitável no final do século XVII, com a criação dos grandes colégios
internos, para onde a burguesia levava seus filhos, e com a instalação dos
conventos, onde as meninas se preparavam para o casamento, “ ao abrigo de
todas as tentações contrárias à virtude”42.
1.2.9 A disciplina escolar
A disciplina escolar, explica Áries43, teve origem na
disciplina eclesiástica ou religiosa; ela era menos um instrumento de coerção
do que de aperfeiçoamento moral e espiritual e foi adotada por sua eficácia
porque era a condição necessária do trabalho em comum, mas também por ser
um valor intrínseco de edificação e ascese. Os educadores a adaptariam a um
41 MARTINS, Daniele Comin, Estatuto da criança e adolescente e política deatendimento, 2003, p. 20.42 PRIORE, Mary Del. História da criança no Brasil. São Paulo, Contexto, 1998.p. 1143 ARIÉS, Philippe. História Social da criança e da família. Rio de Janeiro:Guanabara,1984 p. 52
23
sistema de vigilância permanente das crianças, de dia e de noite, ao menos em
teoria44.
Somente quando a escola passou a ser freqüentada pelas
crianças provenientes das camadas populares é que surgiu a necessidade de
normalizá-las. Esse processo iniciou-se com o ideal de educar crianças e
jovens para uma nova sociedade. Para tanto era necessário adequar a esse
novo ideal todos aqueles que constituíssem obstáculos ao desenvolvimento
social, uma vez que “lidar com a falta de qualificações da família pobre para
educar os próprios filhos significava abordar um assunto que dizia respeito aos
destinos da nação”45.
De acordo com a mentalidade vigente na época, pode-se
afirmar que as crianças órfãs figuravam como um desses obstáculos. “A escola
deveria efetivar a aculturação de todos os que iam sendo deixados à margem
da nova realidade, dentre os quais, as famílias pobres, os desocupados, e
todos aqueles que fossem identificados como desintegrados e excluídos, para
produzir mudanças culturais que atingissem toda a população” 46.
As transformações começaram a ser realizar quando as
crianças, já nos fins da Idade Média, deixaram de sair de junto de seus pais
para serem confiadas a estranhos. Assim, as crianças passaram a ser
indispensáveis à vida cotidiana, e os adultos passaram a se preocupar com
elas, inclusive com sua educação em uma escola. Aquela antiga “família”
44 ARIÈS, Philippe. História Social da criança e da família. Rio de Janeiro:Guanabara,1984, p.191.
45 CUNHA,M.V. O discurso educacional renovador no Brasil (1930-1960): um estudosobre as relações entre a escola e a família. Araraquara, 1998. Tese (Livre-Docênciaem Psicologia da Educação) Faculdade de Ciências e Letras. Universidade EstadualPaulista.
46 CUNHA,M.V. O discurso educacional renovador no Brasil (1930-1960): um estudosobre as relações entre a escola e a família. Araraquara, 1998. Tese (Livre-Docênciaem Psicologia da Educação) Faculdade de Ciências e Letras. Universidade EstadualPaulista.
24
medieval começou a atribuir uma importância tal à criança, que passou a se
organizar em torno dela47.
Durante muito tempo a criança não era tida como
importante dentro da “família” medieval. Eram freqüentes as mortes de
crianças, o que criava uma indiferença dos pais em relação ao fato. O
tratamento dispensado às crianças era mais semelhante ao dado a um
animalzinho doméstico do que ao dado a uma pessoa. Somente quando o
adolescente se tornava de fato adulto é que ele passava a assumir um papel
dentro da família48.
1.2.10 Abolição oficial da escravatura
Em 1860, é aprovada a lei que impedia a venda de
escravos separando casais e filhos de seus pais. De acordo com Gonçalves49,
esta lei foi muito importante porque deu inicio ao processo de abolição da
escravatura. .
A abolição oficial da escravatura pouco, ou quase nada,
mudou na vida das meninas e meninos negros. Estes continuaram sendo os
parias da sociedade, “cidadãos” sem voz, impedidos de usufruir a infância,
conforme manifesta Priore.
Com o advento da Lei Áurea, chegamos ao fim daescravatura, iniciando mais uma fase da nossa história, onde otrabalho agora tem valor econômico, estimulando ocrescimento dos centros urbanos. “Algumas pesquisas sobre aquestão apontam a urbanização como uma das causas dogradativo e acentuado abandono e rejeição das crianças pelas
47 MARTINS, Daniele Comin, Estatuto da criança e adolescente e política deatendimento, 2003, p. 20-21.48 MARTINS, Daniele Comin, Estatuto da criança e adolescente e política deatendimento, 2003, p. 20.49 GONÇALVES, Margareth de Almeida.Pensando a família no Brasil: da colônia àmodernidade. Rio de Janeiro. Espaço e Tempo. 1987. p.28
25
ruas ou nas portas das casas.” 501 “Organização social apud
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do
adolescente, p. 15. .
1.2.11 Século XIX.
Mas foi na Época moderna que a preocupação com a
infância abandonada mostrou-se mais candente, a partir do momento em que a
pobreza se tornou onerosa ao Estado e a idéia de que o aumento populacional
embasava a riqueza das nações tomou contornos definidos51.
A prática ilegal e quase aberta do abandono e o fatalismo
com que era aceita a mortalidade infantil revelaram certa indiferença ao valor
da criança até o início do século XIX, quando as escolas começaram a
descobri-la e a classe médica passou a insistir na necessidade da criação dos
filhos pelas mães, pois cada criança achada (depois de abandonada) era uma
criança perdida52. No século XIX chega ao Brasil às práticas do Estado Liberal,
com novas formas de exercer a filantropia e, fortemente, a medicina higienista:
Em meados dos século XIX, seguindo os rumos da Europaliberal, que fundava cada vez mais sua fé no progressocontinuo, na ordem e na ciência, começou forte campanhapara a abolição da rodas dos expostos esta passou a serconsiderada imoral e contra os interesses do estado. Aqui noBrasil igualmente iniciou-se um movimento para sua extinção.Ele partiu inicialmente dos médicos higienistas, horrorizadoscom o altíssimo níveis de mortalidade reinantes dentro dascasas de expostos53.
1.2.12 Movimento higienista
50 “Organização social apud VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança
e do adolescente, p. 15.51 SILVA, Maria Beatriz Nizza da. “ O problema dos expostos na Capitania de SãoPaulo”,1980-1981, pág.148.52 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, São Paulo: Contexto, 1998, p.99.53 MARCÍLIO, M. C. A rodados expostos e a criança abandonada no Brasilcolonial: 1726/1950. Em M. Freitas ( Org.) História social da infância no Brasil. SãoPaulo: Cortez, 2001. p. 68.
26
Com a inauguração da faculdade de medicina na então
capital do Brasil, Rio de Janeiro, foi imposto aos formandos da primeira turma
um trabalho de final de curso para ser realizado um estudo de campo nas
rodas dos expostos. Surgiu o movimento dos higienistas, que preocupados
com a formação moral, física e intelectual das crianças, ditavam as regras e
normas no preparo e aperfeiçoamento dos futuros “ homens da Sociedade”.
Valendo-se dos altos índices de mortalidade infantil e dasprecárias condições de saúde dos adultos, a higiene conseguiuimpor à família uma educação física, moral, intelectual esexual, inspirada nos preceitos sanitários da época. Estaeducação dirigida, sobretudo às crianças, deveria revolucionaros costumes familiares. Por seu intermédio, os indivíduosaprenderiam a cultivar o gosto pela saúde, exterminando,assim, a desordem higiênica dos velhos hábitos coloniais54.
Reis55, destaca o surgimento em torno da criança, na
primeira década do século XX, de um campo totalmente novo de investigação
cientifica, procurando auxiliar a vida psíquica infantil através da análise dos
distúrbios de conduta.
A psicometria, a psiquiatria dinâmica, o aparecimento dojuizado de menores e o movimento de higiene mental seriam osmarcos iniciais da longa estrada que haveria de transformar oséculo XX no ‘ Século da Criança’, segundo a escritora epoetiza sueca Ellen Key.
A aglomeração urbana sempre provocou surtos
epidêmicos de maior ou menor gravidade. A aglomeração de recém-nascidos e
crianças nas mesmas salas, freqüentemente sem o arejamento adequado,
54 Costa, J. F(1989).Ordem médica e norma familiar. Rio de Janeiro: Edições Graal.p.12 e 1355 REIS, M. R. de O. Equipe interprofissional em psiquiatria infantil. Monografia deConclusão de Curso, Escola de Serviço Social da Universidade Federal Fluminense,Niterói, 1965..p. 48.
27
propiciava o agravamento de todas as demais condições de intensificação da
mortalidade infantil56.
A introdução da mamadeira, na segunda metade do
século XIX, embora fosse um progresso importante na substituição do
aleitamento materno, com as dificuldades de assepsia já citadas transformou-
se num elemento a mais a contribuir para a mortalidade infantil. Tanto quanto
as enfermidades e o aleitamento de várias crianças pela mesma ama-de-leite,
a mamadeira matou muitas crianças por disenteria57.
1.2.13 República
Com o advento da República esta situação começou a se
modificar. Na opinião de Pereira58, uma série de elementos reforçou a imagem
negativa do “populacho”, como epidemias que se iniciavam nas zonas pobres,
o aumento da criminalidade, da mendicância, do comércio ambulante e as
reações políticas, como as greves e os motins.
Imprima-se uma direção de modernização da sociedade,submetendo os sujeitos a novos comportamentos. Quebrava-se o monopólio colonial, naquilo que ele representavaarcaísmo, Buscava-se o direito de passagem para o mundocivilizado. A cidade, no que dizia respeito aos segmentosmédios e altos, ia adquirindo ares mais cosmopolitas. Mas, noentanto, as mudanças que ganhavam terreno se adequavam auma estrutura social ainda enredada no tradicionalismo.Assim, o liberalismo se chocava com a escravidão, asposturas universalistas com o particularismo local59.
Neste novo quadro urbano, a figura da mãe pobre,
perambulando pelas ruas com seus filhos subnutridos, e dos menores
56 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, São Paulo: Contexto, 1998, p.109.57 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, São Paulo: Contexto, 1998, p.109.58 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: direito de família.V.5.11.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
28
abandonados, envolvidos o mais das vezes com atividades suspeitas, mudou
de figura, gerando discursos ideológica e profissionalmente especializados: os
médicos, preocupados com as crianças, os juristas, com os menores60.
1.3 A Constituição de 1934
A Constituição de 1934 foi a primeira a mencionar a
proteção aos direitos da criança, estabelecendo a proibição de trabalho ao
menor de quatorze anos, trabalho noturno aos menores de dezesseis anos,
bem como, trabalhos realizados em indústrias insalubres aos menores de
dezoito anos (art.121, § 1º “d”). O mesmo artigo, porém no §3º prescrevia o
amparo à maternidade e à infância:
Art 121 - A lei promoverá o amparo da produção e estabeleceráas condições do trabalho, na cidade e nos campos, tendo emvista a proteção social do trabalhador e os interesseseconômicos do País.§ 1º - A legislação do trabalho observará os seguintespreceitos, além de outros que colimem melhorar as condiçõesdo trabalhador:d) proibição de trabalho a menores de 14 anos; de trabalhonoturno a menores de 16 e em indústrias insalubres, a menoresde 18 anos e a mulheres;61
E ainda sobre o amparo à maternidade:§ 3º - Os serviços de amparo à maternidade e à infância, osreferentes ao lar e ao trabalho feminino, assim como afiscalização e a orientação respectivas, serão incumbidos depreferência a mulheres habilitadas.62
Já a Constituição do Estado Novo, a de 1937, visava
proteger, fundamentalmente, as crianças mais carentes. O art. 127 dizia:
59 GONÇALVES, Margareth de Almeida.Pensando a família no Brasil: da colônia àmodernidade. Rio de Janeiro. Espaço e Tempo. 1987. p. 5160 RIBEIRO, Paulo Rennes Marçal. História da saúde mental infantil: a criançabrasileira da Colônia à República Velha. Psicologia em Estudo. Maringá, v. 11, n. 1,p. 29-38, jan./abr. 2006. p. 5061 Constituição Federal da Republica do Brasil, 1934, art. 121, § 1º, d.62 Constituição Federal da Republica do Brasil, 1934, art. 121, § 3º.
29
Art 127 - A infância e a juventude devem ser objeto decuidados e garantias especiais por parte do Estado, quetomará todas as medidas destinadas a assegurar-lhescondições físicas e morais de vida sã e de harmoniosodesenvolvimento das suas faculdades.63
1.3.1 Código de Menores
Em 12 de outubro de 1927,através do decreto 17.943-A,
institui-se o primeiro código de menores na América Latina; o código de
Menores do Brasil; conhecido como Código Mello Mattos. Através deste código
o Estado é oficialmente responsável pela assistência aos menores
dessassIstidos, passando a intervir diretamente nas relações familiares,
quando o pátrio poder do pai, absoluto como no direito romano, passa sofrer a
intervenção estatal.
1.3.2 FEBEM
Onde se lê adultos, leia-se também instituições, pois a
história da infância “lança luzes sobre crianças prisioneiras da escola, da Igreja,
da legislação, do sistema econômico e, por fim, da numa linhagem extensa de
tarefas e obrigações que as desdobravam, no mais das vezes, em adultos”64.
Em 1946 foi no Brasil instalada a FUNABEM - Fundaçao
Nacional do Bem Estar do Menor. Criando as ramificações nos estados sob a
denominação FEBEM Fundação Estadual do Bem Estar do Menor. A partir de
1980 no Brasil passou a ter muitas denuncias contra estes órgãos por este
motivo surgiu o Estatuto da Criança e do Adolescente
Diz a autora que “a história da criança fez-se à sombra
daquela dos adultos. Entre pais, mestres e senhores ou patrões, os pequenos
63 Constituição Federal da Republica do Brasil, 1937, art. 127.64 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, p.07.
30
corpos dobravam-se tanto à violência, à força e às humilhações, quanto foram
amparados pela ternura e os sentimentos maternos”65.
1.3.3 CONSTITUIÇÃO DE 1988
Assim, em 05 de outubro de 1988, é promulgada a
Constituição da República Federativa do Brasil, que sem dúvida alguma
representou “um marco na prolatação de uma série de novos direitos, os quais
foram o resultado da participação ativa de toda a sociedade junto à Assembléia
Nacional Constituinte, num trabalho que se estendeu por mais de um ano”66.
A nova constituição trouxe uma série de inovações com
relação ao direito da criança. Face à Constituição de 1988 e especialmente a
Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, que consagra a
Doutrina da Proteção Integral67.
É com a Constituição Federal de 1988 que tal panorama
se altera ao se prever em seu artigo 227 que:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar àcriança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito àvida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, àprofissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, àliberdade e a convivência comunitária, além de colocá-los asalvo de toda a forma de negligência, discriminação,exploração, violência, crueldade e opressão.
Lembra Gélis que,
65 PRIORE, Mary Del, História da criança no Brasil, p.07.66 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente, p. 44.67 “Conjunto de medidas legais que procuram proteger, integralmente, a criança atédoze e dezoito anos, e, excepcionalmente, o menor entre dezoito e vinte e um anos,assegurando-lhes todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, quedeverão ser respeitados, prioritariamente, não só pela família, pela sociedade, comotambém pelo Estado, sob pena de responderem pelos danos causados”. (DINIZ, MariaHelena. Dicionário Jurídico, v. 3, p. 396)
31
[...] a lenta mudança sofrida nesse período pelo estatuto dacriança não se fez apenas como resultado de transformaçõesna estrutura familiar; mas tornava-se evidente na medida emque atitudes pioneiras eram incorporadas a critérios morais epolíticos. Novas leis, sintomáticas de uma primeiradeterminação por parte do Estado moderno em protegercrianças pequenas, serviam a médio prazo para intervir emquestões demográficas, atendendo assim uma das prioridadesdas monarquias centralizadas68.
1.3.4 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLECENTE
A Constituição Federal de 1988 não deixa mais que se
manifeste desigualdade entre o homem e a mulher, ou seja, entre o pai e a
mãe. Não Vigora mais o termo “colaboração”, prevalecendo uma atuação
conjunta e igualitária:
“ Artigo 226. A família, base da sociedade, tem especialproteção do Estado.(...)§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal sãoexercidos igualmente pelo homem e pela mulher69.”
O grande marco, entretanto, foi a constituição Federal de 1988que, consagrando a igualdade entre o homem e a mulher ,entre os filhos havidos ou não do casamento e oreconhecimento de novas entidades familiares, refletiu aenorme transformação ocorrida nas relações familiares epromoveu a adequação do Direito de família à nova realidade,derrogando vários dispositivos do Código Civil de 1916atinentes a matéria70.
68 GÉLIS, Jacques. “The Child: from anonymity to individuality”. In a History of PrivateLife, Cambridge Mass., The Belknop Press of Havard University 1989, pág. 313.69 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. 2008, p. 18.70 Levy, Fernanda Rocha Lourenço. Guarda de filhos Os conflitos no Exercício doPoder Familiar, 2008 p.10-11.
32
Segundo Silva71, a Constituição Federal de 1988 teve,
pela primeira vez, um dispositivo que incorporou direitos às crianças. Esse
novo direito: "caracterizado pela coercibilidade, passa garantir às crianças e
adolescentes ‘todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana,
assegurando-lhes oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o
desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições e
dignidade’ (ECA, artigo 3º)".
Enunciados direitos, estes passam agora a ser exigíveis.
E a mencionada coercibilidade do direito, por sua vez, implica na possibilidade
de se acionar o aparato judicial para que o direito previsto no ECA seja
concretizado, utilizando-se, se for necessário, todos os instrumentos
disponíveis pelo judiciário para que tal direito se realize. Sob essa nova
perspectiva, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA – aprovado pelo
Congresso Nacional, foi sancionado pelo Presidente da República, tornando-se
a Lei 8069 de 13 de Julho de 1990.
A Lei 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente –
também deixa clara a relação de igualdade entre os pais, em seu artigo 21:
“ O Pátrio Poder será exercido, em igualdade de condições ,pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a LegislaçãoCivil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso dediscordância, recorrer à autoridade judiciária competente paraa solução da divergência”72.
O Estatuto da Criança e do Adolescente,como dispõem
seus artigos 1º e 2º, visa a proteção integral da criança e do adolescente,
considerando-se criança, para tal finalidade, s pessoas até doze anos de idade
incompletos, diz os artigos 1º e 2º do Estatuto da criança e do adolescente:
71 SILVA, Antônio F. do Amaral e. O Estatuto, Novo Direito da Criança e doAdolescente e a Justiça da Infância e da Juventude. 2002. Disponível em:<www.direitoejustiça.com>. Acesso em: abr. 2009.72 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. 2008, p. 19.
33
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e aoadolescente.Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, apessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescenteaquela entre doze e dezoito anos de idade.Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-seexcepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito evinte e um anos de idade.
Com a criação de um novo Direito no país: o Direito da
Criança e do Adolescente passou-se a cuidar da garantia à infanto-
adolescência, com absoluta prioridade, direitos assegurados pela família, pela
Sociedade e pelo Estado. Nestes termos, ressalta Fernandes:
Torna-se nitidamente avesso à Constituição o nãoatendimento ou violação dos direitos enunciados. (...) Empoucas mas expressivas palavras, a criança e o adolescentepassaram a ter o direito à assistência e à proteção integral.Aliás, conforme a Constituição da República em vigor, aassistência social é um dever do Estado e direito de qualquerpessoa que dela necessitar. Em síntese, significa uma políticapública, objeto de lei, no âmbito da seguridade sócia73.
Acrescenta Mèndez; et.al:
O Eca amplia sua abrangência a todas as crianças eadolescentes sendo que as medidas ali previstas exigemuma prestação positiva do Estado, da família e dasociedade independente de qualquer condição,diferentemente, o Código de Menores possuiabrangência restrita suas medidas não obrigam o Estadoe a sociedade justamente por englobar apenas osmenores em situação irregular. Sujeitos de direitos sãoassim todas as crianças e adolescentesindependentemente de qualquer condição ouadequação74.
73 FERNANDES, Vera Maria Mothé. O adolescente infrator e a liberdade assitida:um fenônemo socio-jurídico. Rio de Janeiro, CBCISS 1998. p. 44.74 MÈNDEZ, Emilio Garcia, et. al.Infância, Lei e Democracia na América Latina.Blumenau: EDIFURB, 2001. p.67.
34
A nova condição jurídica que foi posta as crianças e os
adolescentes, coloca-os em igualdade em relação aos adultos, onde ambos
são vistos como pessoas humanas, possuindo direitos subjetivos que podem
ser exigidos judicialmente.
Traçadas com apreço o estudo acerca da história da
criança no Brasil, sob vários aspectos passa-se o capítulo a seguir a compilar o
instituto da filiação, ou seja, o vínculo sangüíneo entre pais e filhos.
35
CAPÍTULO 02
DA FILIAÇÃO
2.1 PROCRIAR É UM ATO NATURAL
Inicia-se este capítulo com a abordagem sobre a
procriação, sendo que é um ato natural, pois a concepção é imprescindível a
participação do macho e fêmea, não importa a modalidade, natural, fertilização
assistida ou inseminação artificial . Para VALLE “ Todo humano ao ser gerado
precisa de um pai e de uma mãe, já que ninguém é filho do vento e da
aurora75“.
2.1.2 Procriar gera efeitos jurídicos
O fato natural, isto é, a união fecunda do homem e da
mulher, gera a relação ou vínculo natural entre pais e filhos.
A relação jurídica prescindi do fato natural, Isto é, não
existe uma coincidência total entre o fato natural da filiação e a relação jurídica
da filiação.
A procriação gera efeitos jurídicos, não mais importando
a forma , o modo, em que foi concebido o filho, todas sem exceção, delegam
direitos ao descendente. O efeito jurídico da filiação é conseqüência natural da
procriação.
75 VALLE, Gabriel. Ética e Direito. Porto Alegre: Síntese, 1999, p. 28.
36
VENOSA76 afirma que a procriação é, portanto um ato
natural .Sob o aspecto do Direito , a filiação é um ato jurídico do qual decorrem
inúmeros efeitos.
2.2 FILIAÇÃO
O vínculo da filiação que a geração cria, deve ser
analisado sob dois ângulos, isto é, do ângulo da relação natural da filiação e do
ângulo da relação jurídica.
Aos filhos com o nascimento emergem efeitos jurídicos
ou seja os direitos e deveres da filiação.
Os seres humanos são plenos para exercerem seus
direitos e deveres, em um grupo social como a família, que por sua vez é a
célula base da sociedade, representando, dessa forma, a continuação da
espécie. Daí que a filiação constitui objeto de apreciação de diversas áreas do
saber.
Nas sociedades humanas juridicamente organizadas é de
fundamental importância determinar os pais dos quais descende cada ser
humano, pois depende da condição individual dos pais e da qualificação
jurídica de sua união, a condição jurídica dos filhos.
2.2.1 Conceito de filiação
O filho ao pai e à mãe, chamam-se de filiação.
Filiação, no dizer de Lafayette [ 1956, p. 255], “ é a
relação que o fato da procriação estabelece entre duas pessoas, das quais
uma é nascida da outra”.
76 VENOSA. Sílvio de Salvo .DIREITO DE FAMÍLIA. –8ed.- São Paulo : Atlas , 2008,vol 6. p.35
37
Filiação é o vínculo existente entre pais e filhos; vem a ser
a relação de parentesco consangüíneo em linha reta de primeiro grau entre
uma pessoa e aqueles que lhe deram a vida.77
Na definição de Maria Helena Diniz, "filiação é o vínculo
existente entre pais e filhos; vem a ser a relação de parentesco consangüíneo
em linha reta de primeiro grau entre uma pessoa e aqueles que lhe deram a
vida" 78.
Já o Jurisconsulto Miranda sustenta que a filiação é "a
relação que o fato da procriação estabelece entre duas pessoas, uma das
quais nascidas da outra, chama-se paternidade, ou maternidade, quando
considerada com respeito ao pai, ou à mãe, e filiação, quando do filho para
qualquer dos genitores" 79.
Sociologicamente tem-se como filiação o resultado das
relações interpessoais na concretização do desejo pela perpetuidade da
espécie.
Nas palavras de Maria Cláudia Brauner80 "o
acontecimento da reprodução significa algo mais do que a mera comprovação
de maturidade sexual e de fertilidade, ele estabelece uma nova etapa na vida
adulta quando a responsabilidade pelo destino deste novo ser torna-se um
dever, frente à família e a sociedade"
2.3 DIREITO AO ESTADO DE FILIAÇÃO
77 Antônio Chaves, Filiação legítima, in Enciclopédia Saraiva do Direito, v. 37, p.314.78 02 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 17. ed. São Paulo:Saraiva, 2002, vol.5, p.372.79 03 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado.Campinas: Bookseller, 2000, vol.9, p.45.80 Novos Contornos do Direito da Filiação: a dimensão afetiva das relações parentais.In Anuário do Programa de Pós-Graduação em Direito. São Leopoldo: UNISINOS,2000.
38
Toda pessoa humana tem direito ao estado de filiação,
como prerrogativa contida no âmbito da disciplina jurídica das relações
familiares, e essa constituição do estado de filiação pode se dar inclusive
através do conhecimento da origem genética, se os laços de paternidade não
se constituíram por via da afetividade (LÔBO, 2003, p. 153).
A filiação, pois é fundada no fato da procriação, pelo qual
se evidencia o estado de filho, indicativo do vínculo natural ou consangüíneo,
firmado entre gerado e progenitores.
É assim, a relação de parentesco entre os pais e os
filhos, considerados na ordem ascensional, destes para os primeiros, do qual
também procedem, em ordem inversa, os estados de pai (paternidade) e de
mãe (maternidade) 81.
2.4 PRINCÍPIO DA IGUALDADE DE DIREITOS
Todo aquele que nasce em solo brasileiro, está sob aproteção de princípios constitucionais.
Segundo a Constituição Brasileira o Estado democrático
de direito tem como fundamento
Art.1º .......I- (...)II- a dignidade humana
Sendo assim A Constituição Federal de 1988 adotou o
Princípio da Igualdade de Direitos, ou seja, todos os cidadãos têm o direito
tratamento idêntico pela lei.
81 SILVA, de Plácido. Vocabulário Jurídico. v.I-II. Rio de Janeiro: Forense, 1989.
39
Menciona Martins Neto82, que o itinerário do princípio da
igualdade aporta na afirmação dos direitos humanos.
Afirma Canotilho83:
O princípio da igualdade é não apenas um princípio de Estadode direito, mas também um princípio de Estado social.Independentemente do problema da distinção entre “igualdadefáctica” e “igualdade jurídica” e dos problemas econômicos epolíticos ligados à primeira (ex.: políticas e teorias dadistribuição e redistribuição de rendimentos), o princípio daigualdade pode e deve considerar-se um princípio de justiça
social.84
Segundo Benezath85, (...) a igualdade, enquanto
igualdade de oportunidades, conexiona-se, por um lado, com uma política de
“justiça social” e com a concretização das imposições constitucionais tendentes
a efectivação dos direitos econômicos, sociais e culturais.
Justiça social, trata-se como a igualdade de
oportunidades para todo que aquele que nascem em condição já desigual .
Neste sentido segue as palavras de BENEZATH (...) é a
aplicação da igualdade em seu sentido positivo que baliza concretamente a
adoção de medidas tendentes a preservar e promover a dignidade da pessoa
humana86.
A vida humana nasce com dignidade , é um valor
indizível, portanto princípio fundamental para todo filho brasileiro..
82 MARTINS NETO, João dos Passos. Direitos fundamentais: conceito, função e tipos.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 168.83 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e teoria da constituição, 1999,p. 416.84 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e teoria da constituição. 1999,p. 420.85 BENEZATH, Bruno Ribeiro de Souza. O direito a uma existência digna. 2006,p.33.86 BENEZATH, Bruno Ribeiro de Souza. O direito a uma existência digna. 2006,p.33.
40
O código civil no capítulo da filiação explicita de modo
expresso a transformação tácita decorrente do texto constitucional, sob o
horizonte normativo constitucional. Observa-se que o enunciado proibe das
designações discriminatórias.
Art. 1.596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento,ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações,proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas àfiliação.
Segundo TEIXEIRA o Código Civil acolheu o princípio87
da igualdade já esculpido na Constituição, sem detalhamento ou novas
configurações.
O princípio da igualdade fez cessar a distinção
discriminatória entre filhos bem nascidos e filhos mal nascidos, e desapossou o
casamento de um seus efeitos tradicionais no que aos filhos dizia respeito: o
estatuto privilegiado da legitimidade.”
2.5 CONCEITO DE FAMÍLIA
Com o advento da Constituição Republicana de 1988,
seguidora da tendência liberal dos pensadores do Direito, ampliou-se,
sensivelmente o conceito de família.
CAPÍTULO VIIDA FAMÍLIA, DA CRIANÇA, DO ADOLESCENTE E DO IDOSOArt. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteçãodo Estado.§ 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração.§ 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
87 MUNIZ, Francisco José Ferreira. A família na evolução do direito brasileiro. In:TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Direitos de família e do menor. Belo Horizonte: DelRey, 1993, p. 78.
41
§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a uniãoestável entre o homem e a mulher como entidade familiar,devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.§ 4º - Entende-se, também, como entidade familiar acomunidade formada por qualquer dos pais e seusdescendentes.§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugalsão exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.§ 6º - O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, apósprévia separação judicial por mais de um ano nos casosexpressos em lei, ou comprovada separação de fato por maisde dois anos.§ 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humanae da paternidade responsável, o planejamento familiar é livredecisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursoseducacionais e científicos para o exercício desse direito,vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituiçõesoficiais ou privadas.§ 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoade cada um dos que a integram, criando mecanismos paracoibir a violência no âmbito de suas relações.88
Assim, apenas um dos pais e os seus descendentes
constituem família, apagando de uma vez por todas o ranço discriminatório de
classificar a prole em legítima, legitimada e ilegítima, a última dividida em
natural, incestuosa ou adulterina.
LEITE (2002) afiram que “ Filhos são apenas filhos,
proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação, passando
os tribunais a se orientar da seguinte forma 89.
O Código Civil brasileiro trata de capítulos diferentes
como: os filhos havidos da relação de casamento e os havidos fora do
casamento.
88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988<http://www.Planalto.gov.br/ccivil_03 /constituicao/constitui%C3%A7ao.htm> Acessoem 28.05.0989 LEITE, Eduardo de Oliveira. (org.). Grandes temas da atualidade- DNA comomeio de prova da filiação. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.383
42
No Código Civil brasileiro o capítulo “ Da filiação” , arts.
1.596 à 1.606, que cuida dos filhos nascidos na constância do casamento e os
filhos havidos fora do casamento encontra- se no capítulo “ Do reconhecimento
dos filhos”, arts. 1.607 à 1.617.
A presunção de concepção sofre singela adequação,
altera-se “sociedade conjugal” por “casamento”, no caput.90
Há introdução de nova temática concernente à
fecundação artificial homóloga e heteróloga, aos embriões excedentários, em
campo que gerará ampla controvérsia.91
A referência é genérica e sem pretensão de arrostar o nó
contemporâneo que esse campo requer.
Art. 1.597_ Presumem-se concebidos na constância docasamento os filhos:
I – nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois deestabelecida a convivência conjugal;II - nascidos nos trezentos dias subseqüentes à dissolução dasociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade eanulação do casamento;III - havidos por fecundação artificial homóloga , mesmo quefalecido o marido;IV- havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriõesexcedentários, decorrentes de concepção artificial homologaV – havidos por inseminação artificial heteróloga, desde quetenha prévia autorização do marido.
Como se vê não há profundas alterações jurídicas na
seara da procriação, perdendo o legislador uma grande oportunidade de
90 O projeto de Lei nº 6960/2002 acrescenta parágrafo único aos arts. 1.597e 1.598prevendo a cessão da presunção de paternidade se a época da concepção oscônjuges estavam separados de fato.91 Ver, a propósito, MEIRELLES, Jussara Maria Leal de. A vida humana embrionária esua proteção jurídica. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.
43
sistematizar a realidade existente, deixando à margem desse novo século no
âmbito da filiação tão importante porfia.
Ainda no tocante à filiação, não se altera a prova da
impotência, trocando-se, tão somente, “ presunção da legitimidade do filho” por
“presunção da paternidade” O “ art. 1.599 A prova da impotência do cônjuge
para gerar, à época da concepção, ilide a presunção da paternidade.”
A hipótese de novo casamento da mulher recebe
tratamento similar com a disciplina atual, mantendo-se a presunção pater is est
do primeiro marido.
Art. 1.598 Salvo a prova em contrário, se, antes de
decorrido o prazo previsto no inciso II do art.1.523, a
mulher contrair novas núpcias e lhe nascer algum filho,
este se presume do primeiro marido, se nascido dentro
dos 300 (trezentos) dias a contar da data do falecimento
deste, e do segundo, se o nascimento ocorrer após esse
período e já decorrido o prazo a que se refere o inciso I do
art. 1.597.
Embora a procriação sempre dê lugar a uma relação
natural de filiação, no aspecto exclusivamente jurídico tal filiação será rotulada
de legítima, legitimada e ilegítima.
A filiação pode ser92 classificada didaticamente em:
2.6 CONCEITOS DE FILIAÇÃO
2.6.1 Filiação legítima
44
Tendo-se em vista que a sociedade percebia como família
a advinda das relações matrimoniais, considerava-se como filiação legítima a
oriunda de justas núpcias, ou seja, a que se originou na constância do
casamento dos pais ainda que anulado ou nulo, conforme dispõe o próprio
Código Civil Brasileiro em seus dispositivos93.
Concedia-se o status de legítimo aquele filho havido no
mínimo cento e oitenta dias após a relação matrimonial ou então, nascido
dentro de trezentos dias subseqüente da ruptura do vínculo matrimonial.
Filiação Legítima, se oriunda da união de pessoas ligadas
por matrimônio válido ao tempo da concepção ou se resultante de união
matrimonial, que veio a ser anulada, posteriormente, estando ou não de boa-fé
os cônjuges.94
Filiação legítima, por sua vez, abrange, segundo Simas
Filho95, os filhos que foram concebidos na constância do matrimônio, ainda que
este seja anulado ou putativo.
Para Beviláquia96, verifica-se filiação legítima em duas
situações concretas.
1º- Se, no momento da concepção, o pai e a mãe seachavam vinculados por casamento válido; 2º, ouputativo, ou anulável, embora não putativo, isto é, noscasos em que subsistiria, se o vício determinante da
92 Antônio Chaves, Filiação legítima, cit., p. 317; Ferrara, op. Cit., p.543.93 Código Civil Brasileiro. Art.367 A filiação paterna e a materna podem resultar decasamento declarado nulo, ainda mesmo sem as condições do putativo.94 CC, art. 221 e parágrafo único, alterado pela Lei n. 6.515/ 77, art. 14, parágrafoúnico.95 SIMAS FILHO, Fernando. Investigação de paternidade: peculiaridades, panoramaatual, futuro, In Repensando o Direito de Família, Anais do I Congresso Brasileiro deDireito de Família: Belo Horizonte, Del Rey, 1999, Coord. Rodrigo da Cunha Pereira,p.1596 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito da Família. 8. Ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,1956. p. 309.
45
anulação não tivesse sido utilizado para esse efeito, noprazo e segundo os preceitos da lei. Porém, convémrecordar que os expostos, até prova em contrário, eramconsiderados legítimos.
Conforme o art. 14 da lei 6.515/77 Lei do Divórcio em seu
parágrafo único:
Art 14 - No caso de anulação do casamento, havendofilhos comuns, observar-se-á o disposto nos arts. 10 e 13.Parágrafo único - Ainda que nenhum dos cônjuges estejade boa fé ao contrair o casamento, seus efeitos civisaproveitarão aos filhos comuns.
A relação jurídica de filiação legitima tem seu fundamento
essencial no casamento dos genitores legalmente celebrado, onde podemos
definir filho legítimo o filho concebido por genitores unidos em matrimônio.
A filiação legítima é a que se origina na constância do
casamento dos pais, ainda que anulado ou nulo.97
O casamento dos pais é a pedra de toque para a
legitimidade da filiação, é o ponto de partida ou da chegada.
Assim, o casamento dos genitores deve ser anterior não
só ao nascimento dos filhos, como também à sua própria concepção; logo, em
princípio, o momento determinante de sua legitimidade é o de sua concepção.98
Em face do critério de atribuição da legitimidade, é
valorizado o casamento para fim de legalizar as relações sexuais, sob prisma
ético de concepções que perduram, as relações encontram toda sua
moralidade dentro do casamento.
97 CC, art. 367;Lei n. 6.515/77, art. 14, parágrafo único.98 Planiol, Ripert e Boulanger, Traité élémentairede droit civil français, Paris, 1926, v.1,n. 1.282.
46
Todavia pode ocorrer que o filho seja concebido antes e
nascido depois da celebração do casamento, sem que por isso deixe de ser
legítimo.
São legítimos os filhos concebidos na constância do
casamento – se nascidos 180 dias após o estabelecimento de convivência
conjugal ou dentro de 300 dias após a dissolução da sociedade conjugal ou,
em certas circunstâncias, antes do casamento .99
A legitimidade do filho não é inerente ao matrimônio, pois
será legítimo mesmo se veio à luz após a dissolução ou anulação do
casamento ou se foi concebido antes de celebrado o ato nupcial, apesar de ter
nascido durante o casamento.100
Logo, a filiação legítima é a concebida na constância do
matrimônio, seja ele válido, nulo ou anulável, ou, em certo casos, antes da
celebração do casamento, porém nascida durante a sua vigência.
2.6.2 Prova da condição de filho legítimo:
Pela certidão do termo do nascimento, inscrito no Registro
Civil, de acordo com os arts. 50 e s. da Lei n. 6.015/73. Ninguém pode vindicar
estado contrário ao que resulta desse registro, salvo provando-se erro ou
falsidade deste .
Realmente pode ocorrer que alguém declare o
nascimento de uma criança, filha legítima do declarante e de sua esposa,
quando não houve esse evento; ante a falsidade, com alteração da verdade
material das declarações, o próprio registrado, como qualquer pessoa
99 Orlando Gomes, op. Cit., p.341-2100 Antônio Chaves, Filiação legítima, cit., p.319.
47
interessada, pode anular referido registro, mediante processo contencioso
previsto na Lei n. 6.015/73, art. 113.101
Por qualquer modo admissível em direito, se o registro
faltar, porque os pais não fizeram ou porque se perdeu o livro ou se o termo de
nascimento for defeituoso, como quando o filho é dado com nome diverso ou
se lhe atribui paternidade incógnita.102
Desde que, haja começo de prova por escrito, proveniente
dos pais, conjunta ou separadamente, como cartas familiares, declaração
formal,diários onde registram que, em certa época, lhes nasceu um filho.103
Existem veementes presunções resultantes de fatos já
certos, p. ex.,se, em companhia de um casal, vive há muito tempo pessoa tida
como filha, sabendo-se que houve casamento e que a mulher teve um filho;
estribada na posse do estado de filho, a pessoa educada e criada pelo casal
poderá vindicar em juízo o reconhecimento da legitimidade da filiação, se não
fez, oportunamente, no termo de nascimento, menção a esse fato.104
Importante é adquirir a condição jurídica de filho legítimo
para obter não só o direito ao nome, à educação e à criação compatível com o
nível social de seus pais, à companhia dos genitores, à sucessão, na qualidade
de descendente a que o Código ( art. 1.603) outorga, em primeiro lugar a
sucessão legítima e aos alimentos, mas também aos direitos que decorrem do
pátrios poder e da tutela.
Por outro lado, incumbe-lhe o dever de prestar obediência
e respeito aos pais e os serviços próprios de sua idade e condição.105
101 W. Barros Monteiro, op. cit., p. 242; CP, arts. 241 a 243, trata dos crimes contra oestado de filiação.102 Antônio Chaves, Filiação legítima, cit., p.329.103 Caio M .S. Pereira, Instituições, cit., p. 215; W Barros Monteiro, op. cit., p.243.104 W. Barros Monteiro, op. cit., p. 243105 Antônio Chaves, Filiação legítima, cit., p. 330.
48
De tudo o que foi dito até agora, resultou claro que a lei
procura proteger os nubentes de qualquer vício de consentimento deixando- os
livres de pronunciar-se favoráveis ou não ao casamento.
A filiação legítima, diferentemente da ilegítima, conta com
dados seguros e objetivos para seu estabelecimento, sua verificação ocorre
com dados certos e perceptíveis como: casamento, maternidade, paternidade.
Realmente, a base da sustentação legal para o
reconhecimento da legitimidade da filiação é a de que os pais entretiveram as
relações sexuais, de onde proveio o filho, durante o casamento.
2.6.3 Filiação Legitimada
Legitimada, decorrente de uma união de pessoas que,
após o nascimento do filho, vieram a convocar núpcias, ou seja, se o pais de
um filho já concebido ou mesmo nascido vêm contrair casamento, dá-se a
legitimação desse filho por força tão só do casamento.
Conceito de filho legitimado:
Filho legitimado é aquele que adquire o status de legítimo
pelo subseqüente matrimônio dos pais, por não ter sido concebido ou nascido
na constância do casamento.
A legitimação é um benefício legal que dá condição de
legítimo ao filho legítimo;106 para tanto requer o casamento de seus pais,
106 Orlando Gomes, op.cit., p. 353
49
mesmo in extremis107, possibilitando aos genitores reparar sua falta e reabilitar
o filho perante a sociedade108; é portanto,obra solidária dos pais.
No entendimento de Gomes[ 1995, p. 319], legitimação é
o benefício legal que atribui a condição de legítimo ao filho ilegítimo concebido
ou nascido antes do casamento dos pais.
Gomes [1995, p. 320] arremata seu pensamento,
alinhando que o instituto da legitimação não é novo, e é proveniente do Direito
Romano, oferecido por Constantino, era admitido de quatro formas:
1- casamento subseqüente dos concubinos - per subsequensmatrimonium;
2- restrito ao príncipe – per rescriptum principis;
3- testamento – per testamentum;
4- oblação à corte pontifícia- per oblationem curiae.
Beviláquia109 explica que como o Direito tem por
entendimento que o efeito principal do casamento é a constituição legal da
família legítima, aquele retroage aos filhos ilegítimos, tornando-os legítimos.
Entretanto, doutrinadores civilistas entendiam que os
filhos incestuosos, os adulterinos não podiam receber o benefício desse mio de
legitimação, eis que o casamento entre seus pais era impossível ao tempo da
concepção.
Beviláquia110, admite que o primeiro efeito do casamento
é constituir família legítima e legitimar os filhos anteriormente havidos de um
107 Caio M. S . Pereira, Instituições, cit.,p. 223; Lopes Del Carril, Legitimación de loshijos extramatrimoniales, ns. 82 e 83; Orlando Gomes, op. cit.,p. 356.108 W. Barros Monteiro, op.cit., p. 245; Dusi, Della filiazone e Dell”adozione, 2 ed.,Napoli,Ed. Marghieri, p. 824.109 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito da Família. 8. Ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,1956. p. 324110 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito da Família. 8. Ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,1956. p. 326
50
dos contraentes com o outro, salvo se um destes, ao tempo do nascimento ou
da concepção dos mesmos filhos, estiver casado com outra pessoa .
Assim, conforme o disposto, exclui-se apenas a
legitimidade dos adulterinos. Todavia, como os pais dos incestuosos não
podiam validar seu casamento, consequentemente, seus filhos, não poderiam
gozar desse benefício.
Podem-se agrupar em três as doutrinas que procuram
determinar a natureza jurídica da legitimação. São elas:
1) Teoria da ficção, de Pothier111, segundo a qual, numprimeiro aspecto, a lei finge que o nascimento do filho se deudepois da celebração do subseqüente casamento e, numsegundo aspecto, é o subseqüente matrimônio que,ficticiamente, retroage ao momento da concepção ounascimento do filho.
2) Teoria da equidade, de Chironi 112, que funda a legitimaçãona idéia de que seria injusto que o enlace matrimonial, fazendocessar a união ilegítima, não desfizesse também a ilegitimidadeda prole havida anteriormente.
3) Teoria da regularização das relações extramatrimoniais,de Cicu113,que foi seguida pelo nosso direito114.
Realmente, com o casamento subseqüente normalizam-
se as relações familiares entre marido e mulher; conseqüentemente tal ato
atinge o filho ilegítimo, conferindo-lhe o estado de filho legitimado, equiparado
ao legitimo, reabilitando-o perante a sociedade.115
111 Pothier, Traité Du contrat de mariage, ParteV, Cap. II.112 Chironi, Instituzioni di diritto civile italiano, 2. Ed., v. 2, p. 290.113 Cicu, La filiazone, cit.,p. 161.114 W. Barros Monteiro resume todas elas ( op. cit.,p. 246).115 Antônio Chaves, Filiação ilegítima, cit., p. 287.
51
A legitimação produz efeito jurídico, pois o subseqüente
matrimônio dos pais visa a apagar a irregularidade originária do nascimento do
filho, supondo-se que foi sempre legítimo.116
A simples celebração do ato nupcial concede ao filho o
estado de legitimado, como se ele fosse legítimo desde a sua concepção.
O pressuposto fundamental da legitimação é operar sobre
o reconhecimento da filiação ilegítima.
2.6.4 Filiação Ilegítima
Filiação ilegítima, provinda de pessoas que estão
impedidas de casar ou que não querem contrair casamento, podendo ser
espúria ( adulterina ou incestuosa) ou natural.
Consoante Plácido de Silva 117, "é a que decorre do
nascimento de pessoa concebida por pais que não se encontram em
casamento legal."
A filiação ilegítima é a decorrente de relações
extramatrimoniais.
A filiação ilegítima dividi-se em duas categorias:
- Naturais, se descenderem de pais entre os quais não haviamnenhum impedimento matrimonial no momento em que foramconcebidos.118
São naturais os filhos concebidos em época em que os
pais não sofriam impedimentos dirimentes absolutos para casar.
116 Troplong, Donations entre – vifs ET dês testaments, 3 ed., v.2 , p. 647, apud WBarros Monteiro, op. cit., p.246.117 SILVA, Plácido de. Vocabulário Jurídico. V.I-II. Rio de Janeiro: Forense, 1989.118 Orlando Gomes, op. cit., p. 361.
52
- Espúrios, se oriundos da união de homem e mulher entre osquais havia, por ocasião da concepção, impedimentomatrimonial.119
São espúrios os adulterinos, que nascem de casal
impedido de casar, por motivo do casamento anterior e os incestuosos,
nascidos de homem e de mulher, que ante parentesco natural, civil ou afim,
não podiam convolar núpcias à época de sua concepção.
Em outras palavras, dizem-se espúrios os filhos provindos docoito danado e punível pelo Direito Civil. Lafayette [1956, p.302] destaca que o coito é danado e punível, segundo o DireitoCivil, quando entre o homem e mulher, ao tempo daconcepção, subsistia algum dos seguintes impedimentos: a)impedimento de parentesco em grau proibido [incestuosos]; b)impedimento resultante de investidura de ordens sacrasmaiores ou de entrada em ordem religiosa aprovada[sacrilégios]; c) impedimento de vínculo matrimonial [adulterinos].
Considera-se filho adulterino, quando ao tempo da
concepção ou parto, o pai ou mãe, se achava ligado por matrimônio com
outrem ; incestuoso, quando os pais são parentes entre si [colaterais , dentro
do 2º grau; parentes que estavam entre si em relação de pai e filho [ respectu
paerentalae ]; como tio e sobrinha; e entre afins nos mesmos graus, que não
poderiam, validamente, casar]. Beviláqua120 assinala que estas duas espécies,
a dos filhos adulterinos e dos filhos incestuosos, formam a espécie dos
bastardos ou espúrios.
Sobre os filhos que progenitores estavam em condições
de realizar matrimônio legal entre si, ao tempo da concepção ou do parto,
Beviláqua121 aduz que aqueles que não podiam ser classificados como
119 Vide Silvio Rodrigues, op.cit., p. 301.120 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito da Família. 8. Ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,1956. p. 321121 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito da Família. 8. Ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,1956.p. 32
53
adulterinos, nem como incestuosos, denomina-se, simplesmente, naturais ou
naturais em espécie.
O reconhecimento vem a ser o ato que declara a filiação
ilegítima, estabelecendo, juridicamente, o parentesco entre pai e mãe ilegítimos
e seu filho.122
Não cria, portanto, a paternidade, pois apenas visa a
declarar um fato,do qual o direito tira conseqüências.123
Por isso que é declaratório e não constitutivo, pois ao
estabelecer relação de parentesco, origina efeitos jurídicos.
Portanto a união fora do matrimônio é união ilegítima e os
filhos nascidos dessa união são também ilegítimos, a legitimidade pressupõe,
portanto, o matrimônio legalmente celebrado.
2.6.5.Filiação Matrimonial
Filiação matrimonial, consoante Diniz [2002, p. 381], “ é a
que se origina na constância do casamento dos pais, ainda que anulado ou
nulo CC, arts. 1561 e 1617”
Está disposto no Código Civil:
Art. 1.561. Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído deboa-fé por ambos os cônjuges, o casamento, em relação a estecomo aos filhos , produz todos os efeitos até o dia da sentençaanulatória.
122 Silvio Rodrigues, op. cit., p. 303; Orlando Gomes, op. cit., p. 361; Euclides deOliveira, Reconhecimento de filhos e investigação de paternidade, Informativo IASP, n.41, p. 10-1.123 Caio M. S. Pereira, Instituições, cit., p. 229.
54
Art. 1.617. A filiação materna ou paterna pode resultar decasamento declarado nulo, ainda mesmo sem as condições doputativo.
Rodrigues [2000, p. 282], em sua doutrina ultrapassa o
conceito supra mencionado por Diniz, ao ressaltar o casamento contraído de
boa-fé.
Reforçando ainda, sob o prisma do casamento nulo ou
anulável, Venosa124 salienta que o novo Código Civil resguarda, também, os
direitos e os efeitos civis dos filhos nascidos deste casamento, conforme diz o
art. 1.561, § 2º:
Art. 1.561. Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído deboa-fé por ambos os cônjuges, o casamento, em relação a estecomo aos filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentençaanulatória.[...]§ 2º. Se ambos os cônjuges estavam de má-fé ao celebrar ocasamento, os seus efeitos civis só aos filhos aproveitarão.
Para Chaves [ 1975, p.319], “ o filho será matrimonial se
veio à luz após a dissolução ou anulação do casamento, mas tendo sido
concebido durante este, ou se foi concebido antes de celebrado o ato nupcial,
apesar de ter nascido durante o casamento”.
Para Rodrigues [2000, p. 282], a anulação do casamento
não obsta a legitimidade do filho concebido ou havido antes ou na constância
dele. E este é o mesmo entendimento para os filhos oriundos de casamento
nulo, caso declarado putativo, “de modo que o filho nele concebido é como se
houvesse sido concebido em casamento válido”.
É considerado filho matrimonial aquele concebido na
constância do casamento, sendo, o último, válido, nulo ou anulável ou, se
concebido antes da celebração do casamento, deverá ter nascido durante a
124 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. São Paulo, Atlas, 2003.p. 269.
55
sua vigência, ou no período que compreende a presunção de paternidade,
fixado na lei civil brasileira.
2.6.7 Filiação Extramatrimonial
Filiação extramatrimonial, no entendimento de Diniz125, é
aquela decorrente de relações fora do casamento. Indo mais além, a autora
ainda classifica, didaticamente, os filhos gerados durante tais relações como
naturais e espúrios.
A Constituição Federal de 1988 , rompeu com o tabu e
concedeu aos filhos havidos fora do casamento igualdade de direitos,
recriminando todas e quaisquer discriminações a eles referentes:
Art. 227 É dever da família, da sociedade e do estadoassegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade,o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer,à profissionalização, á cultura, à dignidade, ao respeito, àliberdade e à convivência familiar e comunitária, além decolocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,exploração, violência, crueldade e opressão.Parágrafo Sexto_ Os filhos, havidos ou não da relação docasamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos equalificações, proibidas quaisquer designações discriminatóriasrelativas à filiação.
Os princípios basilares da Constituição Federal do Brasil
da dignidade humana e da igualdade entre os filhos, recebem respaldo no o
diploma legal que regula a investigação de paternidade dos filhos havidos fora
do casamento e dá outras providências.
LEI Nº 8.560, DE 29 DE DEZEMBRO DE 1992.
125 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 18. Ed. São Paulo: Saraiva,2002, v.5. p. 393
56
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, faço saber que o CongressoNacional decreta e eu sanciono a seguinte lei:
Art. 1° O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamentoé irrevogável e será feito:I - no registro de nascimento;II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivadoem cartório;III - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado;IV - por manifestação expressa e direta perante o juiz, aindaque o reconhecimento não haja sido o objeto único e principaldo ato que o contém.Art. 2° Em registro de nascimento de menor apenas com amaternidade estabelecida, o oficial remeterá ao juiz certidãointegral do registro e o nome e prenome, profissão, identidadee residência do suposto pai, a fim de ser averiguadaoficiosamente a procedência da alegação.
Assim está disposto no Código Civil, pois assim prescreve o
Art. 1.596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento,ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações,proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas afiliação.
Portanto o tratamento para os filhos havidos de relação
extramatrimonial apresenta, atualmente, a igualdade de direitos e obrigações à
filiação originada dentro do casamento, não havendo mais que se fazer
diferenciação alguma.
Lembra Venosa,126
“ apesar da igualdade de direitos estabelecida em lei, os filhoshavidos fora do casamento não gozam da presunção depaternidade outorgada aos filhos de pais casados entre si”. Istose dá apenas por uma questão de lógica e equilíbrio, segundoautor, pois não há como se presumir legalmente a paternidadese não há casamento entre os pais.
57
Para os filhos havidos fora do casamento, ainda no
entendimento do mesmo autor127 [ 2003, p. 289], há a necessidade de
reconhecimento, seja ele resultante de ato de vontade dos próprios pais, ou o
ato invocado ao Poder Judiciário, ou seja, coativo.
Venosa128 faz sobressair o reconhecimento de filhos
havidos fora do casamento, que importa em estabelecer o parentesco entre pai
e mãe não casados e o filho.
Continua Diniz129, o reconhecimento apenas visa declarar
um fato, do qual o direito tira conseqüências. É um ato declaratório, pois visa a
estabelecer a relação de parentesco entre os progenitores e a prole.
“ Desde o instante do reconhecimento válido, proclama-sea filiação, dela decorrente conseqüência jurídicas, já queantes do reconhecimento, na órbita do direito, não háqualquer parentesco”.
Venosa130 ainda pondera:
Esse ato pode ser espontâneo ou coativo, gerando, é evidente, todo um complexo de direitos e obrigações. Na verdade,enquanto não houver reconhecimento, a filiação biológica éestranha ao direito. Toda a gama de direitos entre pais e filhosdecorre do ato jurídico do reconhecimento. A cada ponto emque tocamos no tema, nunca é demais mencionar que achamada paternidade socioafetiva deve passar a preocuparnossos estudos e julgados.
Diniz [ 2002, p. 395] observa:
O ato declaratório de reconhecimento pode promanar dalivre manifestação da vontade dos pais ou de um deles,
126 Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. 2003, p. 289.127 Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. 2003,.p. 289128 Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. 2003, p. 292.129 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 18. Ed. São Paulo: Saraiva,2002, v.5. p. 395130 Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. 2003, p. 292
58
afirmando, conforme a lei, que certa pessoa é seu filho,hipótese em que é voluntário,ou de sentença prolatadaem ação de investigação de paternidade ou dematernidade, demandada pelo filho,que declara que oautor é filho do investigado, caso em que é forçado oujudicial, o reconhecimento produz efeitos jurídicosidênticos.
Como se pode detectar, há duas modalidades de
reconhecimento: o voluntário ou espontâneo e o judicial ou coativo, Venosa131
explica que o “ reconhecimento é espontâneo quando alguém, por meio de ato
e manifestação solene e válida, declara que determinada pessoa é seu filho”.
Portanto, a filiação é um conceito jurídico de razoável
maleabilidade, tendo sofrido substanciais modificações ao longo do tempo. Daí
defluem as diferenças existentes entre o direito de vindicar a filiação, direito a
ter um pai, e o direito de personalidade ao conhecimento de sua origem
genética, que com aquele não se confunde. Verificou-se que após a
promulgação da Constituição Federal de 1988 os filhos estão protegidos, em
informar a origem de sua procriação. Fez-se necessário este estudo pois no
próximo capítulo será aventado o exercício do Poder Familiar.
131 Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. 2003, p. 293
59
CAPÍTULO 03
DESAFIOS DO EXERCICIO DO PODER
3.1 DESAFIOS DO EXERCÍCIO DO PODER FAMILIAR
3.1.1 Responsabilidade dos pais para com seus filhos
Para compreender a relação social contemporânea
dentro da família no Brasil, faz-se necessário estudar o seu lineamento
histórico das responsabilidades dos pais para com seus filhos::
Em Roma, a família era definida como o conjunto de pessoasque estavam sob a patria potestas do ascendente comum vivomais velho. O conceito de família independia assim daconsangüinidade. O pater famílias exercia a sua autoridadesobre todos os seus descendentes não emancipados, sobre asua esposa e sobre as mulheres casadas com manus com osseus descendentes132
No Direito Romano, a característica fundamental da
família é o fato de a mesma fundar-se sobre relações de poder, relações essas
que tinham por base a profunda desigualdade entre os indivíduos do corpo
familiar133..
Em Roma, quando o instituto da família começou aevoluir, consubstanciando-se numa estrutura jurídica,econômica e religiosa, a partir da figura do pater, a mulherfoi colocada em uma posição inferior, sendo consideradaincapaz de reger sua própria vida, igualando-se aosfilhos134.
Como observa Waldir Grisard Filho:
132 Wald, Arnoldo. O Novo Direito de Família. 2004, p. 2.133.133 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. São Paulo, J.H.Mizuno, 2008, p. 14
60
“ (...) a tradição romana, mantida nos países de direitoescrito, consagrava a predominância do pai emdetrimento do filho e lhe atribuía um poder perpétuo sobreseus descendentes135.”
3.1.2 Pátrio Poder
Para o começo do estudo é importante transcrever o que
os doutrinadores conceituam por Pátrio Poder, discursam com palavras
diferentes, mas a interpretação, o significado, em todos esses conceitos não
deixa de ser o mesmo. Transcreve-se nas palavras dos doutrinadores:
Sílvio Rodrigues136:
“conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, em relaçãoà pessoa e bens dos filhos não emancipados tendo em vista aproteção destes”
Washington de Monteiro137:
“o pátrio poder pode ser conceituado como o conjunto deobrigações, a cargo dos pais , no tocante à pessoa e bens dosfilhos menores”.
Maria Helena Diniz138. conceitua que:
(...) o pátrio poder pode ser definido como um conjunto dedireitos e obrigações, quanto à pessoa e os bens do filhomenor, não emancipado, exercido em igualdade de condições,por ambos os pais, para que possam desempenhar osencargos que a norma jurídica lhes impõe, tendo em vista ointeresse e a proteção do filho
Rizzardo, apud Silvia, afirma que :
134 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. 2008, p. 14.135 GRISARD, Waldir Filho. Guarda Compartilhada: um novo modelo deresponsabilidade parental. São Paulo: Revista dos Tribunais , 2000, p. 30.136 Rodrigues, Silvio. Direito de Família. São Paulo , Saraiva, 1979, p. 354.137 Monteiro, Washington de Barros. Direito de Família. São Paulo, 1986, p. 277.
61
“ (...) o pátrio poder não é uma auctoritas, é um múnus. Trata-se de uma conduta dos pais relativamente aos filhos, de umacompanhamento para conseguir uma abertura dos mesmos,que se processará progressivamente, à medida que evoluemna idade e no desenvolvimento físico e mental, de modo adirigi-los a alcançarem sua própria capacidade para sedirigirem e administrarem seus bens. Não haveria tão-somenteum encargo, ou um munus, mas um encaminhamento paraimpor uma certa conduta, em especial antes da capacidaderelativa. Não mais há de se falar praticamente em poder dospais, mas em conduta de proteção, de orientação eacompanhamento dos pais139.”
Miranda140:
[...] o pátrio poder, é um conjunto de atos concedidos ao pai ouà própria mãe, a fim de que, graças a eles, possamdesempenhar melhor a sua missão de guardar, defender eeducar os filhos, formando-os e robustecendo-os para asociedade e para a vida.
Em assim sendo, o Pátrio Poder era exercido somente
pelo pai ( como bem diz o nome) e significava um poder idêntico ao da
propriedade, que incluía a esposa, os filhos, os escravos e os
assemelhados141.
Era uma poder absoluto,sem limites e sem fim. O pai
possuía o direito de expor ou matar o filho, vendê-lo ou entregá-lo à vítima de
dano causado por seu dependente.Quanto ao direito de vida e morte, esse só
poderia ser exercido mediante consulta aos membros da família mais
próxima142.
138 Diniz, Maria Helena. Direito de Família. São Paulo, Saraiva, 1993, p. 301.139 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. 2008, p. 23.140 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de direito privado: partegeral. Campinas: Booksller, 2000. p. 59.141 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. 2008, p. 14142 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. 2008, p. 14.
62
Importante salientar que era através da autoridade
paterna que se estabelecia a disciplina e assim consolidava a vida dentro do lar
e, por conseguinte, na própria sociedade. Daí a conveniência em assegurar
essa ampla autoridade paternal143.
3.1.3.Ordenações do Reino Português
A feição romana do Pátrio Poder encontrou guarida nas
Ordenações do Reino e assim foi trasladada para o Brasil pela Lei 20 de
outubro de 1823, ou seja, conferiu total poder e domínio do pater família.. O
homem era o chefe da sociedade conjugal,a “cabeça do casal”, enquanto a
mulher, relativamente incapaz, necessitava de seu amparo e de sua
autorização para a prática de atos da vida civil144..
3.1.4 Declaração Universal dos Direitos
A Declaração Universal dos Direitos das crianças de
1959 determina no seu Segundo Princípio que a “ a criança gozará de proteção
especial e ser-lhe:
O lar é o ambiente mais recomendável para a iniciação efiscalização da correta formação do filho pelos pais, quefuturamente contarão como o auxílio da escola e professores,sendo que a infringência ao dever de criação e educaçãosujeita-os à sanção dos artigos 244 e 246 do Código Penal,que se referem à falta de manutenção ( alimentos) e educaçãoprimária, em igual consonância com o que prega o Estatuto daCriança e do Adolescente145.
3.1.5 Poder Familiar
143 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. 2008, p. 15.144 144 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. 2008, p. 17145 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. 2008, p. 25
63
Por princípio constitucional da isonomia que é a igualdade
de direitos para todos, o termo pátrio poder passou para poder família.
A própria expressão poder foi ressignificada, tornando-se
uma espécie de poder-dever, como afirma Bittar Filho (apud ISHIDA, 2006). Ou
como afirma Venosa:
Na noção contemporânea, o conceito transfere-se
totalmente para os princípios de mútua compreensão, a proteção dos menores
e os deveres inerentes, irrenunciáveis e inafastáveis da paternidade e
maternidade. O pátrio poder, poder familiar ou pátrio dever nesse sentido, tem
em vista primordialmente a proteção dos filhos menores. A convivência de
todos os membros do grupo familiar deve ser lastreada não em supremacia,
mas em diálogo, compreensão e entendimento.
Entende Milano146 que “
O poder familiar é imposto aos pais pelo Estado, que é ofiscalizador do exercício legal do mesmo. Essa competência doEstado é direcionada para fiscalizar e controlar as relaçõesentre os sujeitos Pai-Filhos para que os direitos e deveressejam cumpridos com o respeito devido à lei e nos limites porela permitidos.
Explica Comel:
Nos ensinamentos de Pontes Miranda, já se acenava paraessa concepção, uma vez que o autor colocava os direitosatribuídos ao pai como meio para realização de seus deverescom relação aos filhos. Não poder em si, visando tão-somenteao exercício de autoridade, mais poder como instrumento decumprimento de um dever, como se depreende de seu conceitoe pátrio poder: Conjunto de direitos concedidos ao pai ou àprópria mãe, a fim de que, graças a eles, possa melhordesempenhar sua missão de guardar, defender e educar osfilhos, formando-os e robustecendo-os para a sociedade e avida (2003, p. 61).
146 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. 2008, p. 24.
64
Quadro comparativo abaixo, apresenta a competência dos
pais para o exercício do Pátrio Poder no Código Civil Brasileiro de 1916 e o
Poder Familiar no Código Civil Brasileiro, de 2002 .
CÓDIGO CIVIL DE 1916
Do exercício do pátrio poder
ATUAL CÓDIGO CIVIL DE 2002
Do exercício do poder familiar
Art. 384. Compete aos pais, quanto à
pessoa dos filhos menores:
Art. 1.634. Compete aos pais,
quanto à pessoa dos filhos
menores:
I – dirigir-lhes a criação e educação; I - dirigir-lhes a criação e
educação;
II - tê-los em sua companhia e guarda; II - tê-los em sua companhia e
guarda;
III - conceder-lhes, ou negar-lhes
consentimento para casarem;
III – conceder-lhes, ou negar-lhes
Consentimento para casarem;
IV - nomear-lhes tutor, por testamento ou
documento autêntico, se o outro dos
pais lhe não sobreviver, ou o sobrevivo
não puder exercitar o pátrio poder;
IV - nomear-lhes tutor por
testamento ou documento
autêntico, se o outro dos pais
não lhe sobreviver, ou o
sobrevivo não puder exercer o
poder familiar;
V - representá-los, até aos 16 (dezesseis)
anos, nos atos da vida civil, e assisti-
los, após essa idade, nos atos em que
forem partes, suprindo-lhes o
consentimento; (Redação dada pelo
Decreto Legislativo nº 3.725, de
15.1.1919)
V - representá-los, até aos
dezesseis anos, nos atos da
vida civil, e assisti-los, após
essa idade, nos atos em que
forem partes, suprindo-lhes o
consentimento;
VI – reclamá-los de quem ilegalmente os
detenha;
VI - reclamá-los de quem ilegal-
mente os detenha;
VII - exigir que lhes prestem obediência,
respeito e os serviços próprios de sua
idade e condição.
VII - exigir que lhes prestem
Obediência, respeito e os
serviços próprios de sua idade
e condição.
Fonte: VENOSA (2003, p.428).
65
Com a demonstração deste quadro, comprova-se que o
conteúdo é o mesmo. Denota-se claramente que o atual Código Civil Brasileiro
apenas mudou a expressão “Do exercício do Pátrio Poder” para “Do exercício
do Poder familiar”.
Os pais brasileiros desde 1916 podem exigir que seus
filhos lhes prestem obediência. O cidadão se forma desde criança dentro do lar.
Obedecer, respeitar e realizar os serviços próprios de sua idade e condição é
dever de todo filho que está sob a responsabilidade dos pais.
Cabe aos pais, primordialmente, dirigir-se a criação e
educação dos filhos, para proporcionar-lhes a sobrevivência. Compete aos pais
tornar seus filhos úteis à sociedade147.
Rodrigues (2004), manifesta-se a este respeito, afirmando
que dentre as prerrogativas dos pais acima referidas, o direito de exigir
obediência e respeito, é parte da educação e, para alcançar esses fins, o
genitor pode castigar o filho, contanto que o faça moderadamente.
A atitude dos pais é fundamental para a formação da
criança. Faltando com esse dever, o progenitor faltoso submete-se a
reprimendas de ordem civil e criminal, respondendo pelos crimes de abandono
material, moral e intelectual148.
[...] para que o cumprimento desse dever, impõem-se seja conferido aos pais
um conjunto de prerrogativas a fim de que possam efetivamente cumprir com
a obrigação devida. Volta-se, então, a noção de poder, mas não como direito
subjetivo dos pais, de um poder concedido pelo ordenamento jurídico como
meio para satisfação de seus interesses, mas sim como instrumento de
realização da função paterna, e sempre no interesse do filho ( COMEL, 2003,
p. 62).
147 Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. 2003, p. 361.148 Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. 2003, p. 361.
66
Este último aspecto apontado por Comel (op. cit.) vem de
encontro ao que está expresso no inciso VII do Código Civil, onde se lê que
cabe aos pais em relação aos filhos “exigir que lhes prestem obediência,
respeito e os serviços próprios de sua idade e condição”, poderão os pais
utilizar sua autoridade, por direito, em relação a sua prole. Rodrigues (2004),
manifesta-se a este respeito, afirmando que dentre as prerrogativas dos pais
acima referidas, o direito de exigir obediência e respeito, é parte da educação
e, para alcançar esses fins, o genitor pode castigar o filho, contanto que o faça
moderadamente.
Afirma Venosa:
Na noção contemporânea, o conceito transfere-se totalmentepara os princípios de mútua compreensão, a proteção dosmenores e os deveres inerentes, irrenunciáveis e inafastáveisda paternidade e maternidade. O pátrio poder, poder familiar oupátrio dever, nesse sentido, tem em vista primordialmente aproteção dos filhos menores. A convivência de todos osmembros do grupo familiar deve ser lastreada não emsupremacia, mas em diálogo, compreensão e entendimento149.
Essas modificações e transformações foram evoluindo
nos países, e entre eles o Brasil, apresentando em suas legislações as
inovações. Afigura exclusiva do pai vai se amainando, enquanto a da mãe vai a
ele se igualando150.
Nosso Código Civil de 1.916, no artigo 380, parágrafo
único, ainda conseguiu o paradigma do Direito Romano,conferindo um maior
poder patriarcal:
“Art. 380. Durante o casamento compete o pátrio poderaos pais,exercendo-o o marido com a colaboração damulher, Na falta ou impedimento de um dos progenitorespassarão outro a exercê-lo com exclusividade.
149 Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. São Paulo, Atlas, 2003, p.355.
67
Parágrafo único. Divergindo os progenitores quanto aoexercício do pátrio poder, prevalecerá a decisão do pai,ressalvando à mãe o direito de recorrer ao juiz parasolução da divergência151.”
Salientou-se que o Código Civil de 1.916 revelou um
direito “mais preocupado com o círculo social da família do que com os círculos
sociais da nação”152.
A palavra pátrio poder (artigo 379 do antigo Código Civil)
não mais existe, tendo sido substituída pelo poder familiar, de acordo com o
artigo 1.630 do novo Código Civil, estando, os filhos menores, sujeitos a tal
poder familiar153.
A criança e o adolescente gozam de todos os direitosfundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo daproteção integral de que trata esta lei assegurando-lhes, porlei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades,a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral,espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade (MÈNDEZ; et. al, 2001, p. 81).
De acordo com os princípios, afirma Mèndez; et. al:
Essa obrigação comum entre os pais, a sociedade e o Estadopara com a infância e a juventude deve ser cumprida comprimazia absoluta,conforme a expressão com absolutaprioridade. Isto significa que ante a impossibilidade de seassegurar direitos a todos os que necessitam da prestação,deve-se atender primeiramente à infância e a juventude. Emverdade, trata-se de um princípio que caracteriza o direito dacriança que,como tal, irá desempenhar, dentre outras funções,a de servir como instrumento de interpretação nos maisvariado casos ( 2001, p. 81).
150 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. 2008, p. 17.151 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. 2008, p. 17-18.152 Miranda, Pontes de. Fontes e evolução do direito Civil Brasileiro, p. 489.
68
A igualdade de direito entre os pais sobre os filhos e
confirmada na Lei n. 8.069/90 (ECA), que sustenta em seus artigos:
Art. 21 - O Pátrio poder será exercido, em igualdade decondições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser aLegislação Civil, assegurado a qualquer deles o direito de, emcaso de discordância, recorrer à autoridade judiciáriacompetente para a solução da divergência.
Fica claro que a família é a base de tudo, principalmente
da educação, afirma Pereira, ao tratar da família, lembra que:
Não há nenhuma controvérsia de que a família seja a célulabásica de toda e qualquer sociedade. Ela desperta interessede todos os povos, em todos os tempo, uma vez que entendê-la é preservar a organização e a continuidade da sociedade edo Estado ( PEREIRA, 2001, p. 5).
Contudo, como observa Villela:
Faz-se necessário ter uma visão pluralista da família, abrigandoos mais diversos ARRANJOS FAMILIARES, devendo-sebuscar a identificação do elemento que permita enlaçar oconceito de entidade familiar todos os relacionamentos que temorigem em um elo de afetividade, independentemente de suaconformação. O desafio dos dias de hoje é achar o toqueidentificador das estruturas interpessoais que permita nominá-las como família154.
Gokhale (1990) acrescenta que a família não é somente o
berço da cultura é a base das sociedades futuras, mas é também o centro da
vida social. A educação bem sucedida da criança na família é que vai servir de
apoio à sua criatividade e ao seu comportamento produtivo quando for adulto.
A família tem sido, é e será a influência mais poderosa para o desenvolvimento
da personalidade e do caráter das pessoa, através das virtudes.
153 Rodrigues, Décio Luiz José. Guarda Compartilhada. São Paulo, Imperium, 2009, p.21.
69
Segundo Kaloustian155 (1998), é a família que propicia os
aportes afetivos e, sobretudo, materiais necessários ao desenvolvimento e
bem-estar dos seus componentes, bem como desempenha um papel decisivo
na educação formal e informal, sendo que é em seu espaço que são
absorvidos os valores éticos e humanitários, e onde se aprofundam os laços de
solidariedade. Complementa o autor, afirmando que é também em seu interior
que se constroem as marcas entre as gerações e são observados valores
culturais.
Como bem mostra Singly156, a família é o espaço no qual,
em princípio, a disponibilidade de amor gratuito e incondicional alimentam a
construção/descoberta do eu nas diferentes etapas da vida, cabendo-lhe,
portanto, como função central e quase exclusiva nos dias de hoje a produção
identitária, uma vez que, em suas demais funções (reprodução biológica e
social), há um compartilhamento de tarefas com o Estado.
Define-se instituição familiar, nos termos propostos por
Minuchin:,
[...] como um conjunto de exigências funcionais que organizaa interação dos membros da mesma, considerando-a,igualmente, como um sistema, que opera através de padrõestransacionais. Assim, no interior da família, os indivíduospodem constituir subsistemas, podendo estes ser formadospela geração, sexo, interesse e/ou função, havendo diferentesníveis de poder, e onde os comportamentos de um membroafetam e influenciam os outros membros (1990, p. 26).
Afirma Giddens157,
154 VILLELA, João Baptista. Repassando o direito de família. Anais do I CongressoBrasileiro de Direito de Família. IBDFAM/OAB-MG, 1999. p. 20155 KALOUSTIAN. Silvio Manoug (org.). Família brasileira: a base de tudo. SãoPaulo: Cortez; Brasília, DF: UNICEF, 2004.156 SINGLY, François de. Le soi, le couple et la famille. Paris: Nathan, 2002. p. 56157 GIDDENS, Anthony. A Terceira Via. Porto Alegre: Artmed, 2005 p. 122
70
As duas principais funções da família são a socializaçãoprimária e a estabilização da personalidade, sendo que asocialização primária é um processo pelo qual as criançasaprendem as normas culturais da Sociedade em quenasceram (...) ocorre durante os primeiros anos da infância, afamília é o mais importante núcleo para o desenvolvimento dapersonalidade humana. Diz o autor que a estabilização dapersonalidade (...)é o papel desempenhado pela família aoassistir emocionalmente seus membros adultos (2005, p. 152).
Estas funções são igualmente preconizadas e detalhadas
por Stanhope (apud GIDDENS, 2005), que embora considere que elas variam
muito, destaca as seguintes atribuições familiares:
a “socialização da criança”, relacionado com as atividadescontribuintes para o desenvolvimento das capacidades mentaise sociais da criança;os “cuidados às crianças”, tanto físicos como emocionais,perspectivando o seu desenvolvimento saudável; o “papel desuporte familiar”, que inclui a produção e/ ou obtenção de bense serviços necessários à família;o “papel de encarregados dos assuntos domésticos”, ondeestão incluídos os serviços domésticos, que visam o prazer e oconforto dos membros da família; o “papel de manutenção dasrelações familiares”, relacionado com a manutenção do contatocom parentes e implicando a ajuda em situações de crise; os “papéis sexuais”, relacionado com as relações sexuaisentre ambos os parceiros;o “papel terapêutico”, que implica a ajuda e apoio emocional,quando dos problemas familiares; o “papel recreativo”,relacionado com o proporcionar divertimentos à família, visandoo relaxamento e desenvolvimento pessoal.
Oliveira158, nos fundamentos constitucionais do direito de
família, registra que o sustento, a guarda e a educação dos filhos,
[...] são “funções”, desempenhadas pelos cônjuges em regimede co-gestão, oportunizando estes a seus filhos as condiçõesmínimas de crescimento em termos materiais e afetivos para
158 OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos Constitucionais do direito defamília. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 128
71
que se tornem pessoas de bom caráter. Os filhos devem terdentro do lar a estrutura necessária e suficiente para oamadurecimento.
Segundo o posicionamento de Comel159:
Por ser verdadeiro que tanto o homem quanto a mulherparticipam na formação do filho (...) em condições decomplementaridade, vai se entender que o pai e a mãe formampara o filho uma unidade estrutural. As diferentes funções emnível de complementaridade não poderão ser matematicamentedeterminadas, ainda mais no tempo em que a ciência jáconhece, suficientemente, como a fecundação acontece. Apaternidade e a maternidade se caracterizam pelo exercício defunções diferenciadas que se completa, no todo, do ponto devista das necessidades básicas da vida do filho.
Quanto aos deveres e direitos dos pais em relação a seus
filhos, são expressos na Constituição, no Código Civil e no ECA. Nesta última
ordenação, como já foi visto, as atribuições dos pais aparecem sob a
designação de pátrio poder (art. 21), também denominado no Código Civil (arts.
1.642 e ss), a partir de 2002, como poder familiar, tendo em vista à atribuição
de poderes aos cônjuges, de acordo com a justificativa elaborada pelo jurista
Miguel Reale (apud ISHIDA, 2006) e a partir daí regulamentada.
A referência aos princípios da legislação civil ésuperfetação. Ambos os pais devem exercer o pátrio poder, em ambiente decompreensão e entendimento160.
Cabe aos pais dirigir a educação dos filhos, tendo-os sobsua guarda e companhia, sustentando-os e criando-os161.
Conforme Campos162, é notável esse dispositivo,
principalmente em um país extremamente pobre e miserável como o Brasil. A
159 COMEL, Denise Damo. Do poder familiar .São Paulo: Revista dos Tribunais,2003. p. 97160 Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. 2003, p. 356.161 Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. 2003, p. 359.
72
pobreza, por si só, não pode servir de fundamentos para o pedido de
suspensão ou perda do poder familiar. É possível, entretanto, que os próprios
pais, vendo a carência material da família, em ato de altruísmo extremo,
venham a concordar com a colocação do filho em família substituta (art.166,
parágrafo único do ECA). De toda a sorte, caso não se configurem maus tratos
ou carência extremada, a ponto de colocar em risco a própria integridade física
e mental do menor, não há que se falar em retirada ou suspensão do poder
familiar.
3.1.6 Funções Sociais da Família
Segundo Kaloustian163, é a família que propicia os aportes
afetivos e, sobretudo, materiais necessários ao desenvolvimento e bem-estar
dos seus componentes, bem como desempenha um papel decisivo na
educação formal e informal, sendo que é em seu espaço que são absorvidos
os valores éticos e humanitários, e onde se aprofundam os laços de
solidariedade
Com a saída da mulher do lar, com intenso progresso
onde ela exerce papel importante em várias profissões passou (...)
o século XX a ser o grande palco das transformações ocorridasna seara familiar, tendo por tônica a redefinição dos papéis deseus protagonistas: o pai, outrora autoritário e distante, hojepresente e participativo; a mãe, antes submissa ao pai, hojetem seus direitos reconhecidos em igualdade de condiçõescom o homem; o filho, antes objeto de posse podendo até sermorto ou abandonado pelos pais, hoje ocupa o lugar central dafamília, é ser humano em processo de desenvolvimento
162 CAMPOS, G.W.S. Considerações sobre a arte e a ciência da mudança:revolução das coisas e reforma das pessoas. O caso da saúde. In: CECÍLIO,L.C.O. (Org.). Inventando a mudança na saúde. São Paulo: HUCITEC, 1994. p. 258163 Kaloustian, Silvio Manoug. Familia brasileira : a base de tudo. 3. ed Sao Paulo :Cortez, 1998. p 53
73
merecedor de proteção integral dos pais, da sociedade e doEstado164.
Entre as funções sociais da família, por sua relevância ao
longo do processo civilizatório, está a transmissão das pautas culturais dos
agrupamentos étnicos. Outra, também considerada por Osório165 importante
função social da família e, que a ela é delegada pela sociedade, é a
preparação para o exercício da cidadania.
Em suma,
(...) do ambiente familiar depende certo tipo de evolução doindivíduo e que aos pais (ou seus substitutos) cabe preencheros requisitos necessários ao bom desempenho físico eemocional de seus filhos. Segundo essa ótica, a dinâmicafamiliar repousa em quem exerce os papéis parentais e queseriam os responsáveis pela formação biopsicossocial dadescendência, de acordo com um modelo que por sua vezprovém das gerações anteriores e que só seria modificado apartir das alterações nele introduzidas por obra das
idiossincrasias dos executores da ação parental166.
3.1.7 Funções dos Pais
Para Kaloustian167,
a família é compreendida como a principal entidaderesponsável pela proteção da criança, da infânciaadolescência: “Para um desenvolvimento completo eharmonioso de sua personalidade, a criança deve crescer numambiente familiar, numa atmosfera de felicidade, amor ecompreensão”
164 Levy, Fernanda Rocha Lourenço. Guarda de filhos Os conflitos no Exercício doPoder Familiar, São Paulo, Atlas, 2008 p.9.
165 OSORIO, Luiz Carlos . Família hoje. Porto Alegre : Artes Médicas, 1996. p. 23166 OSORIO, Luiz Carlos . Família hoje. Porto Alegre : Artes Médicas, 1996. p21167 KALOUSTIAN. Silvio Manoug (org.). Família brasileira: a base de tudo. SãoPaulo: Cortez; Brasília, DF: UNICEF, 2004. p.6
74
Em 1990 surge o ECA, que passa a reconhecer o valor de
crianças e adolescentes, consideradas então pessoas em pleno exercício de
seus direitos.
Os desafios atuais para os pais, estão na dificuldade de educar
filhos, conhecedores que são do ECA. Todos os alunos da escola fundamental, já
estão conscientes de que os pais não podem bater imoderamente, mas eles não
sabem que o BB
De acordo com Teixeira.
Na medida em que os filhos adquirem discernimento eresponsabilidade, os genitores devem reconhecer-lhes certaautonomia, em respeito à personalidade da criança e doadolescente, para que eles sejam protagonistas da própriavida. Em contraposição, a liberdade dos filhos não se tornairrestrita, ela é atrelada ao discernimento, maturidade eresponsabilidade 168
3.1.8 Pais podem perder o Poder Familiar
Com o advento do ECA, onde crianças e adolescentes
passaram a ter e saber seus direitos como pessoas,os pais que não estão
preparados, ou seja sem condições emocionais, não tem condições de impor
limites ao seus filhos. A maioria dos pais brasileiros que aprenderam com seus
pais, que a obediência é resultado de castigos, surras,hoje estão sendo
desafiados de como gerir, aplicar, gerenciar o poder familiar, exigindo dos filhos
obediência.
Caso os pais não saibam como exercer seu poder
familiar, poderão perde-lo.
168 TEIXEIRA, 2005, p.130
75
Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai
ou a mãe que:
I - castigar imoderadamente o filho;
Sua interpretação, ao que tudo indica, baseia-se no artigo
1.638, I do Código Civil, que trata da perda do pátrio poder, incluindo como
uma das razões para esta perda “castigar imoderadamente o filho”. De outra
parte, o castigo moderado (Art. 1638, I do Código Civil) de acordo com Santos
Neto (apud ISHIDA, 2006, p. 33), “[...] está inserido no poder de correção do
pai e é aceitável como instrumento de educação e de garantia do respeito e
obediência devidos pelo filho”.
3.1.9 Compete aos Pais Amoldarem o Caráter Do Filho
É dever primordial imposto aos pais, pois, inegavelmente,
compete a eles amoldar o caráter do filho para torná-lo útil à sociedade, sob o
ponto de vista moral,intelectual e cívico169.
3.1.10 Pais Educadores
Os primeiros educadores são os atores componentes da
família. Logo, é de primordial importância que eles estejam orientados sobre
quais decisões devem tomar diante das atitudes de suas crianças e
adolescentes, visto que, a base estrutural do ser humano são suas qualidades
adquiridas através da educação.
Deste modo, os pais, segundo Arendt170,
[...] não apenas trazem seus filhos à vida mediante a
169 Silva, Ana Maria Milano. A lei sobre guarda compartilhada. 2008, p. 24170 ARENDT, H. Entre o passado e o futuro. São Paulo: Perspectiva, 1979. p. 235
76
concepção e o nascimento, mas simultaneamente osintroduziram em um mundo. Eles assumem na educação aresponsabilidade, ao mesmo tempo, pela vida edesenvolvimento da criança e pela continuidade do mundo
Em relação às crianças e adolescentes, estas funções
são focalizadas por outros autores, entre os quais os abordados a seguir,
através das noções de cuidar e de educar.
Conforme D’Aroz:
Estudos recentes relacionam o cuidar e o educar, ambosapontados na literatura nacional sob o imperativo de suprir asnecessidades básicas das crianças. Nessa perspectiva, o atode cuidar não deve ser confundido com o de dar assistência ourestringir-se a concepções higienistas171.
D’Aroz consigna, também, que na própria literatura
nacional infantil o cuidado era interpretado apenas como higiene, prevenção de
acidentes e oferta de nutrientes, cujo fato, atrapalhava o desenvolvimento da
ação pedagógica restringindo as atividades educativas apenas aos intervalos
que "sobravam" para o educador, sendo que:
Tais discursos e acusações decorriam da falta de definiçõesprecisas do que sejam o cuidar e o educar em relação acrianças. Também demonstravam a ausência de umaintegração efetiva entre as noções de saúde e educação, alémde denunciar uma restrição indesejável tanto nas concepçõesde cuidado, quanto nas de educação da criança172.
171 D’AROZ, Marlene Schüssler. Concepções de cuidado familiar na visão deadolescentes abrigados, das suas famílias e de educadores de uma ONG. 2008.216 fls. Dissertação (Mestre em Educação). Universidade Federal do Paraná. 2008. p.65.172 D’AROZ, Marlene Schüssler. Concepções de cuidado familiar na visão deadolescentes abrigados, das suas famílias e de educadores de uma ONG. 2008.216 fls. Dissertação (Mestre em Educação). Universidade Federal do Paraná. 2008. p.65
77
D’Aroz173 considera que o cuidado humano seria a
capacidade que se tem, pela interação com outros seres humanos, de
observar, perceber e interpretar as suas necessidades e a melhor forma de
atendê-las. No processo de cuidar do outro, também ocorre o desenvolvimento
como seres capazes de ter empatia, além de perceber as próprias
necessidades e desenvolver tecnologias para aprimorar tais cuidados.
Afirmando que embora as necessidades básicas humanas, como preservação
da integridade corporal, alimentação, segurança física e psíquica sejam
universais, as formas de identificá-las, valorizá-las e atendê-las são construídas
socialmente. E, complementando, a autora menciona que “embora suscite
sentimentos semelhantes, o cuidado com crianças difere no ambiente
institucional e no contexto familiar, demandando instrumentos de trabalho
próprios”174.
Citando, D’Aroz175 pontua que cada família possui uma
dinâmica de vida própria, sendo também observados aspectos nas famílias que
dizem respeito às marcas deixadas pelas gerações e os comportamentos que
são valorizados culturalmente. Os modos de vida cotidianos ocorrem a partir do
modo como as pessoas se relacionam no ambiente que as cercam. É
perceptível a diversidade de comportamentos de cuidar desenvolvidos pelos
diferentes agrupamentos humanos, inseridos nos mais diversos contextos.
Ressalte-se que o “cuidar”, bem como o “educar” não são, necessariamente,
uma atividade positiva, havendo variadas formas de se cuidar/educar.:
Portanto, independente da forma e do contexto, com diálogo e afeto, ou com
repressão e agressividade, os resultados serão diferentes à formação da
criança. Já em caso de repressão e agressividade, os danos causados poderão
173 D’AROZ, Marlene Schüssler. Concepções de cuidado familiar na visão deadolescentes abrigados, das suas famílias e de educadores de uma ONG. 2008.216 fls. Dissertação (Mestre em Educação). Universidade Federal do Paraná. 2008. p.66174 D’AROZ, Marlene Schüssler. Concepções de cuidado familiar na visão deadolescentes abrigados, das suas famílias e de educadores de uma ONG. 2008.216 fls. Dissertação (Mestre em Educação). Universidade Federal do Paraná. 2008.p.72175 D’AROZ, Marlene Schüssler. Concepções de cuidado familiar na visão deadolescentes abrigados, das suas famílias e de educadores de uma ONG. 2008.
78
ser irreversíveis para o desenvolvimento cognitivo, emocional e social da
mesma.
Segundo Campos, o cuidar inclui todas as atividades
ligadas ao cotidiano de qualquer criança:
Alimentar, lavar, trocar, curar, proteger, consolar, todas asatividades que são integrantes ao educar." Isso abrangetodas as atitudes e procedimentos que tenham porobjetivo atender as necessidades da criança no seuprocesso de crescimento e desenvolvimento. Sendoassim, uma compreensão adequada requerconhecimentos da área biológica e das áreas humanas,uma vez que o conceito relaciona-se com a saúde e coma educação176
De acordo com D’Aroz:
É necessário também refletir sobre a dinâmica que ocorre
na própria unidade educacional para se abarcar direitos
tais como os de proteção, afeto e amizade, a expressão
dos próprios sentimentos, o desenvolvimento da
criatividade e da imaginação por parte da criança. Com
base principalmente nesses aspectos é que se aborda a
dimensão de cuidado que, de um modo ou de outro,
sempre está presente nas relações entre adultos e
crianças independentemente do contexto e do cuidador. O
cuidado com a criança proporciona a ela, desde a sua
concepção, recursos para que se desenvolva plenamente
e em todos os contextos177.
216 fls. Dissertação (Mestre em Educação). Universidade Federal do Paraná. 2008. p.72176 CAMPOS, G.W.S. Considerações sobre a arte e a ciência da mudança: revoluçãodas coisas e reforma das pessoas. O caso da saúde. In: CECÍLIO, L.C.O. (Org.).Inventando a mudança na saúde. São Paulo: HUCITEC, 1994. p. 15.177 D’AROZ, Marlene Schüssler. Concepções de cuidado familiar na visão deadolescentes abrigados, das suas famílias e de educadores de uma ONG. 2008.
79
Conforme Weber178, a falta de cuidado ou simplesmente o
cuidar em famílias consideradas em situação de risco pode estar intimamente
ligado a fatores como a má distribuição de renda do país, o desemprego e
conseqüente depauperação, que acabam dificultando o processo de cuidar e o
próprio desenvolvimento da criança. Os contextos ambientais nos quais estas
famílias encontram-se inseridas geram uma condição de risco permanente em
suas relações intra-familiares e sociais e interferem na sua realidade social.
Zagury179, a seu turno, considera o cuidar como sendo um
ato de amor, mas um amor acrescido de limites. Ela defende o cuidado e a
necessidade do amor na educação dos filhos, mas também observa que a
excessiva liberalidade pode levar à criação de filhos tiranos. A seu ver, a ação
segura e firme dos pais é a forma mais eficiente de conduzir os filhos a um
destino produtivo, saudável e feliz.
216 fls. Dissertação (Mestre em Educação). Universidade Federal do Paraná. 2008. p.70178 WEBER, L. A evolução das relações parentais: uma abordagem etológica.Psicologia Argumento, 38, 19-25, 2004. p. 98.179 Zagury, Tania, Educar sem culpa : a gênese da Ética. 10. ed Rio de Janeiro, RJ :Record, 1996
80
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho teve como objetivo pesquisar os
Desafios atuais do exercício do poder familiar frente o poder do ECA, ao
trabalhar-se com um tema tão complexo e tocante, forma-se a sensibilidade
imprescindível para aborda-se as questões trágicas que envolvem a difícil
realidade da grande maioria dos pais diante da difícil tarefa de educar seus
filhos.
No primeiro capítulo do trabalho , abordou-se a história
da criança no Brasil, desde quando os jesuítas chegaram ao Brasil e
começaram a catequizar as crianças, pois acreditavam que elas seriam as
peças chaves. Trata-se também da história social em linha geral, o desprezo
com as crianças e adolescentes durante o período colonial e a instalação da
República. A vinda da Constituição de 1988 e o Estatuto da criança e do
adolescente (ECA), onde fica estabelecida a proteção integral e o direito como
sujeitos.
No segundo capítulo, por sua vez, abordou-se os
conceitos de filiação.
Por último, no terceiro capítulo , abordou-se o lineamento
histórico do pátrio poder, Código Civil Brasileiro, Constituição Federal, ECA e
os limites que os pais devem dar aos filhos.
Para o desenvolvimento da presente pesquisa, foram
levantadas duas hipóteses, quais sejam: há uma ampla divulgação na mídia
esclarecendo os direitos do ECA; Se a legislação vigente os pais podem exigir
obediência dos filhos.
Assim, a primeira hipótese restou comprovada, visto que
é evidente a grande divulgação na mídia esclarecendo os direitos do ECA.
81
No tocante a segunda hipótese, essa igualmente foi
comprovada.
Enfim, o carinho dedicado à busca da solução para o
problema dos limites que os pais vem a oferecer para seus filhos é que a
criança sente-se segura, apresenta maior capacidade de estruturação de
vínculos, o que lhe estrutura uma base importantíssima para seu
desenvolvimento futuro, em todos os sentidos.
Todo o envolvimento com esta causa, no entanto,
demanda muito mais do que simples leituras, pesquisas bibliográficas, estudos
e reflexões cientificas sobre o tema. É fundamental pensarmos nisso.
82
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.
88
ANEXO
LEI Nº 8.560, DE 29 DE DEZEMBRO DE 1992.
Regula a investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento edá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, faço saber que o Congresso Nacionaldecreta e eu sanciono a seguinte lei:
Art. 1° O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável eserá feito:
I - no registro de nascimento;
II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório;
III - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado;
IV - por manifestação expressa e direta perante o juiz, ainda que oreconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.
Art. 2° Em registro de nascimento de menor apenas com a maternidadeestabelecida, o oficial remeterá ao juiz certidão integral do registro e o nome eprenome, profissão, identidade e residência do suposto pai, a fim de seraveriguada oficiosamente a procedência da alegação.
§ 1° O juiz, sempre que possível, ouvirá a mãe sobre a paternidade alegada emandará, em qualquer caso, notificar o suposto pai, independente de seuestado civil, para que se manifeste sobre a paternidade que lhe é atribuída.
§ 2° O juiz, quando entender necessário, determinará que a diligência sejarealizada em segredo de justiça.
§ 3° No caso do suposto pai confirmar expressamente a paternidade, serálavrado termo de reconhecimento e remetida certidão ao oficial do registro,para a devida averbação.
§ 4° Se o suposto pai não atender no prazo de trinta dias, a notificação judicial,ou negar a alegada paternidade, o juiz remeterá os autos ao representante doMinistério Público para que intente, havendo elementos suficientes, a ação deinvestigação de paternidade.
§ 5° A iniciativa conferida ao Ministério não impede a quem tenha legítimointeresse de intentar investigação, visando a obter o pretendidoreconhecimento da paternidade.
89
Art. 3° E vedado legitimar e reconhecer filho na ata do casamento.
Parágrafo único. É ressalvado o direito de averbar alteração do patronímicomaterno, em decorrência do casamento, no termo de nascimento do filho.
Art. 4° O filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento.
Art. 5° No registro de nascimento não se fará qualquer referência à natureza dafiliação, à sua ordem em relação a outros irmãos do mesmo prenome, excetogêmeos, ao lugar e cartório do casamento dos pais e ao estado civil destes.
Art. 6° Das certidões de nascimento não constarão indícios de a concepçãohaver sido decorrente de relação extraconjugal.
§ 1° Não deverá constar, em qualquer caso, o estado civil dos pais e anatureza da filiação, bem como o lugar e cartório do casamento, proibidareferência à presente lei.
§ 2º São ressalvadas autorizações ou requisições judiciais de certidões deinteiro teor, mediante decisão fundamentada, assegurados os direitos, asgarantias e interesses relevantes do registrado .
Art. 7° Sempre que na sentença de primeiro grau se reconhecer a paternidade,nela se fixarão os alimentos provisionais ou definitivos do reconhecido quedeles necessite.
Art. 8° Os registros de nascimento, anteriores à data da presente lei, poderãoser retificados por decisão judicial, ouvido o Ministério Público.
Art. 9° Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 10. São revogados os arts. 332, 337 e 347 do Código Civil e demaisdisposições em contrário.
Brasília, 29 de dezembro de 1992; 171° da Independência e 104° da República.
ITAMAR FRANCOMaurício Corrêa
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de
30.12.1992