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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI MAURÍCIO BASSO A FUNÇÃO SOCIAL COMO ELEMENTO DA TEORIA GERAL DOS CONTRATOS Tijucas 2008

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

MAURÍCIO BASSO

A FUNÇÃO SOCIAL COMO ELEMENTO DA TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

Tijucas

2008

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MAURÍCIO BASSO

A FUNÇÃO SOCIAL COMO ELEMENTO DA TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

Monografia apresentada como requisito parcial para a

obtenção do título de Bacharel em Direito, pela

Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências

Sociais e jurídicas, campus Tijucas.

Orientador: MSc. Leonardo Matioda

Tijucas

2008

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MAURÍCIO BASSO

A FUNÇÃO SOCIAL COMO ELEMENTO DA TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

Esta Monografia foi julgada adequada para obtenção do título de Bacharel em Direito e

aprovada pelo Curso de Direito do Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus Tijucas.

Área de Concentração/Linha de Pesquisa: Direito Privado

Tijucas, 12 de maio de 2008..

MSc. Leonardo Matioda

Orientador

Prof. MSc. Marcos Alberto Carvalho de Freitas

Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho, aos meud Pais, Loris e Zulma os quais, com

muita dedicação ensinaram-me a nunca desistir de meus sonhos e,

que com perseverança, garra, humildade e simplicidade, sempre

alcançaremos nossos objetivos, nunca se esquecendo de nossas

raízes.

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AGRADECIMENTOS

Inicialmente agradeço a DEUS, que sempre esteve presente em minha vida.

Aos meus familiares, em especial ao meu Pai, Lóris, pela dedicação e amor.

Ao meu estimado professor MSc. Leonardo Matioda, o qual, com muita paciência e

dedicação ao longo do curso, transmitiu-me boa parte de seus conhecimentos.

Agradeço também aos amigos, colegas e demais professores, os quais muito ajudaram

na realização deste trabalho.

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EPÍGRAFE

O analfabeto do século XXI não será aquele que não consegue ler e

escrever, mas aquele que não consegue aprender, desaprender, e

reaprender.

Alvin Toffler

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí –

UNIVALI, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca

do mesmo.

Tijucas, 12 de maio de 2008..

Maurício Basso

Graduando

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso trata da função social como elemento da Teoria Geral dos Contratos, tendo como objetivo principal verificar a aplicabilidade do Princípio Função Social do contrato, tendo como base o artigo 421, do Código Civil brasileiro de 2002. Os objetivos específicos que foram a base deste trabalho centraram-se em examinar, teórica e criticamente, do significado da categoria “Função Social do Contrato”; analisar a liberdade para contratar, condicionada à Função Social do Contrato, bem como ao estudo dos Princípios que devem fundamentar a nova Teoria dos Contratos; a observar se a intervenção do Estado entre as partes contratantes poderá cumprir efetivamente a Função Social pretendida. Com a elaboração deste estudo, chega-se ao consenso de que, a função social do contrato é elemento essencial da Teoria Geral dos Contratos, visto que, na atualidade vige o principio como a boa-fé e o equilíbrio contratual e não mais apenas o princípio da autonomia da vontade, pois sua preocupação é com uma sociedade mais justa e solidária, além de haver uma maior preocupação com a dignidade da pessoa humana. Palavras-chave: Função social, Contrato, Princípios.

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ABSTRACT

The gift I work of completion of course treated of the theme The feature social I eat element from Theory Across the board from the Contracts , I tend I eat objective across the board verify the applicability from scratch Social role of the I hire , I tend I eat base the review 421, of the Civil code Brazilian of 2002. The targets specific what have been the base you gave I work center - if em examine , abstract & critically , of the significance from category “Função Social of the I hire ; analyze the liberty about to hire , conditioned on the Social role of the I hire , as well as the I study from the Principals what owes found the new Theory from the Contracts ; the observe if the intervention of the State among the concerned parties may abide by effectively the feature Social pretended. With the elaboration you gave I study, arrives - if the accord of what , the feature social of the I hire is element essential from Theory Across the board from the Contracts , since , on actuality effective the beginner I eat the good - faith & the equilibrium contractual & no more barely the begining from autonomy from will , as she sweats preoccupation is with an association mais justa & sympathetic , in addition to have only one major preoccupation with the dignity from person humana. Key words Social role , I hire , Principals.

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LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS

Lista de categorias que o Autor considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com

seus respectivos conceitos operacionais.

Autonomia de Vontade

Que todos são livres para contratar ou não, para escolher com quem contratar e para estipular,

em comum acordo as cláusulas do contrato (COELHO, 2007).

Autonomia Privada

É o principio do direito contratual que firma o poder de os sujeitos disporem de seus próprios

interesses mediante acordos (COELHO, 2007).

Boa-fé Objetiva

[...] a necessidade de compreender ou interpretar o contrato segundo os ditames da ‘lealdade e

confiança’ entre os contratantes (THEODORO JÚNIOR, 1999).

Cláusulas Gerais do Direito Contratual

São normas jurídicas vazadas em um ou mais conceitos vagos destinados a deixar em aberto a

questão dos exatos contornos do seu âmbito de incidência (COELHO, 2007).

Contrato

[...] é o resultado do encontro das vontades dos contratantes e produz seus efeitos jurídicos em

função dessa convergência (COELHO, 2007)

Equilíbrio dos Contratantes

[...] preservar a função econômica para a qual o contrato foi concebido, resguardando-se a

parte que tiver seus interesses subjugados aos de outra (GUERRA, 2008).

Força Obrigatória dos Contratos

Um contrato válido e eficaz deve ser cumprido pelas partes; pacta sunt servanda. O acordo de

vontades faz lei entre as partes (COELHO, 2007).

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Função Social do Contrato

Cumpre sua função o contrato que não sacrifica, compromete ou lesa interesses

metaindividuais acerca dos quais não têm os contratantes a disponibilidade (COELHO, 2007).

Principio da Relatividade

Os efeitos do contrato atinentes à criação de obrigações são restritos às partes contratantes.

(COELHO, 2007).

Vinculação das partes

O contrato vincula aqueles que dele participaram, sendo, portanto, res inter allios, não

obrigando ou prejudicando terceiros estranhos à relação jurídica (SIMÃO, 2008)..

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SUMÁRIO

RESUMO............................................................................................................................7

ABSCTRAT .......................................................................................................................8

LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS.......................9

1 INTRODUÇÃO ..............................................................................................................13

2 A TEORIA GERAL DOS CONTRATOS....................................................................15

2.1 CONCEITO DE CONTRATO......................................................................................15

2.2 PRINCÍPIOS CONTRATUAIS ....................................................................................17

2.2.1 Princípio da obrigatoriedade contratual......................................................................17

2.2.2 Princípio do consensualismo ......................................................................................19

2.2.3 Princípio da autonomia privada..................................................................................20

2.2.4 Princípio da boa-fé......................................................................................................23

2.2.5 Princípio da relatividade dos efeitos dos contratos ....................................................24

2.3 REQUISITOS DE VALIDADE DOS CONTRATOS..................................................25

2.3.1 Requisitos subjetivos ..................................................................................................25

2.3.1.1 A capacidade das partes..........................................................................................25

2.3.1.2 O consentimento ......................................................................................................26

2.3.2 Requisitos objetivos....................................................................................................27

2.3.3 Requisitos formais ......................................................................................................28

2.4 FORMAÇÃO E CONCLUSÃO DO VÍNCULO CONTRATUAL..............................29

3 A FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS .................................................................38

3.1 HISTÓRICO..................................................................................................................38

3.2 CONCEITO DE FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS..........................................43

3.2.1 A natureza jurídica da função social dos contratos ....................................................46

3.3 A FINALIDADE DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO......................................47

3.3.1 Finalidade compensatória ...........................................................................................48

3.3.2 Finalidade punitiva .....................................................................................................49

3.4 O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE NA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRA-

TO........................................................................................................................................51

3.5 A FIXAÇÃO DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO ............................................52

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3.5.1 A fixação indenizatória da função social do contrato.................................................52

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS.........................................................................................55

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................57

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objeto "A função social como elemento da Teoria Geral

dos Contratos”.

O tema é atual e relevante, pois com a vigência do Código Civil Brasileiro (CCB), que

reúne em seus dispositivos o direito civil e o direito comercial legislado, ficam claras as várias

alterações que deverão ser assimiladas gradativamente pelos destinatários da lei. Salienta-se a

relevância para as relações jurídicas da atual sociedade. Isto referindo-se aos artigos 421 e 422

deste dispositivo legal, incluídos no titulo V – Dos Contratos em Geral, Capítulo I, do CCB,

que trata Das Disposições Gerais. Com a mudança das formas contratuais, também mudaram

os princípios que regem o instituto. Se antes a autonomia da vontade era o mote do direito

contratual, hoje princípios como a boa-fé e o equilíbrio contratual preponderam.

Em vista do parâmetro delineado, constitui-se como objetivo geral deste trabalho,

verificar a aplicabilidade do Princípio Função Social do contrato, tendo como base o artigo

421, do Código Civil Brasileiro de 2002.

O objetivo institucional da presente Monografia é a obtenção do Título de Bacharel

em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Jurídicas, Políticas e

Sociais, Campus de Tijucas.

Os objetivos específicos que foram a base deste trabalho centraram-se em examinar,

teórica e criticamente, o significado da categoria “Função Social do Contrato”; analisar a

liberdade para contratar, condicionada à Função Social do Contrato, bem como ao estudo dos

Princípios que devem fundamentar a nova Teoria dos Contratos; observar se a intervenção do

Estado entre as partes contratantes poderá cumprir efetivamente a Função Social pretendida.

Quanto à metodologia empregada, registra-se que, na fase de investigação foi utilizado

o método dedutivo, e, o relatório dos resultados expresso na presente monografia é composto

na base lógica dedutiva1, já que se parte de uma formulação geral do problema, buscando-se

1 Sobre os “Métodos” e “Técnicas” nas diversas fases da pesquisa científica, vide PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 99-125.

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posições científicas que os sustentem ou neguem, para que, ao final, seja apontada a

prevalência, ou não, das hipóteses elencadas.

Para o desenvolvimento da presente pesquisa formulou-se o seguinte questionamento:

a) Qual é a função do princípio da Função Social do Contrato?

Já a hipótese considerada foi a seguinte:

a) A função social do contrato visa manter o equilíbrio contratual entre os

contratantes, desde que o mesmo não seja abusivo e se umas das partes sentir-se lesada poderá

buscar o amparo deste principio.

Nas diversas fases da pesquisa, foram acionadas as técnicas do referente, da categoria,

do conceito operacional e da pesquisa bibliográfica.

É conveniente ressaltar, enfim, que, seguindo as diretrizes metodológicas do Curso de

Direito da Universidade do Vale do Itajaí, as categorias fundamentais, são grafadas, sempre,

com a letra inicial maiúscula e seus conceitos operacionais apresentados em Lista de

Categorias e seus Conceitos Operacionais, ao início do trabalho.

O trabalho foi dividido em dois capítulos. A Teoria Geral dos Contratos, no qual

procurou-se destacar de forma clara e sucinta, aspectos pertinentes ao conceito, princípios

contratuais, elementos de validade dos contratos e a formação e conclusão do vínculo

contratual.

O segundo, A função Social dos Contratos, abordando-se além do conceito, a natureza

jurídica, a finalidade da função social, o princípio da proporcionalidade, além da fixação da

função social do contrato, de forma a se obter uma maior compreensão da função social no

âmbito da Teoria Geral dos Contratos.

Nas conclusões apresentam-se breves sínteses de cada seção e se demonstra se a

hipótese básica da pesquisa foi ou não confirmada.

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2 A TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

No decorrer deste capítulo, aborda-se a teoria geral dos contratos, de forma a se obter

maior entendimento a respeito dos contratos e, para tanto, discorre-se sobre conceito,

princípios, requisitos e vínculo contratual.

2.1 CONCEITO DE CONTRATO

Reportando-se a história, verifica-se que o contrato foi estruturado pelo Direito

Romano, no qual entendia-se que um contrato não poderia existir sem a presença de elemento

material, um pacto, sendo que, a distinção do contrato no direito romano com relação ao

direito moderno, encontra-se basicamente na relação jurídica criada (PEREIRA, 2003).

Há diversos conceitos de contratos, mas não existe dúvida que o contrato nasce do

consenso e geralmente tem caráter patrimonial, pois a partir do momento que os indivíduos se

relacionam no âmbito da sociedade, passa a existir uma relação entre eles que, em muitos

casos, culmina com um contrato.

De acordo com Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 11), verifica-se que:

O contrato é um negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitadas pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia de vontades.

No entendimento de Tartuce (2007, p. 24), verifica-se que:

O contrato é um ato jurídico bilateral, dependente de pelo menos duas declarações de vontade, cujo objetivo é a criação, a alteração ou até mesmo a extinção de direitos e deveres de conteúdo patrimonial. Os contratos são, em suma, todos os tipos de convenções ou estipulações que possam ser criadas pelo acordo de vontades e também por outros fatores acessórios.

Tartuce (2007, p. 24) complementa:

Dentro desse contexto, o contrato é um ato jurídico em sentido amplo, em que há o

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elemento norteador da vontade humana que pretende um objetivo de cunho patrimonial (ato jurígeno); constitui um negócio jurídico por excelência. Para existir o contrato, seu objeto ou conteúdo deve ser lícito, não podendo contrariar o ordenamento jurídico, a boa-fé, a sua função social e econômica e os bons costumes.

Seguindo esta linha, Rodrigues (2000, p. 9-10) afirma que “cada vez que a formação

do negócio jurídico depender da conjunção de duas vontades, encontramo-nos na presença de

um contrato, que é, pois, o acordo de duas ou mais vontades, em vista de produzir efeitos

jurídicos”.

Para Gomes (2000, p. 19), contrato “é uma espécie de negócio jurídico que se

distingue, na formação, por exigir a presença de pelo menos duas partes. Contrato é, portanto,

negócio jurídico bilateral, ou plurilateral”.

Consoante o entendimento de Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 14), conceitua-se

contrato como:

[...] um negócio jurídico bilateral, por meio do qual as partes, visando a atingir determinados interesses patrimoniais, convergem as suas vontades, criando um dever jurídico principal (de dar, fazer ou não fazer), e, bem assim, deveres jurídicos anexos, decorrentes da boa-fé objetiva e do superior princípio da função social.

Clóvis Beviláqua apud Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 13) discorre sobre o

conceito de contrato da seguinte forma:

Pode-se, portanto, considerar o contracto como um conciliador dos interesses colidentes, como um pacificador dos egoísmos em lucta. É certamente esta a primeira e mais elevada função social do contrato. E para avaliar-se de sua importância, basta dizer que, debaixo deste ponto de vista, o contracto corresponde ao direito, substitue a lei no campo restricto do negocio por elle regulado. Ninguém dirá que seja o contracto o único factor de pacificação dos interesses, sendo o direito mesmo o principal delles, o mais geral e o m ais forte, mas impossível será desconhecer que também lhe cabe essa nobre função socializadora.

Neste sentido cita Coelho (2007, p.19): “O contrato é o resultado de encontro das

vontades dos contratantes e produz efeitos jurídicos em função dessa convergência”.

De acordo com o exposto, entende-se que o contrato é a base de todo direito das

obrigações, ou seja, desde que o homem começou a mercantilizar, o contrato passou a fazer

parte da vida na sociedade e, assim, rege as relações envolvendo patrimônio de forma a

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manter registro das vontades dos indivíduos.

2.2 PRINCÍPIOS CONTRATUAIS

São cinco os principais princípios dos contratos: o da obrigatoriedade

contratual, o do consensualismo, o da autonomia privada, o da boa fé e o da relatividade dos

efeitos dos contratos.

2.2.1 Princípio da obrigatoriedade contratual

Por este princípio, quando celebrados os contratos e obedecidos os requisitos legais,

estes não podem ser modificados, caracterizam a irreversibilidade da palavra empenhada,

senão por nova avença, ou seja, o contrato faz lei entre as partes.

O Poder Judiciário somente pode atuar nos contratos para declará-los nulos ou para a

sua resolução, nunca podendo proceder à modificação de cláusulas contratuais.

Com relação ao princípio da obrigatoriedade contratual, Orlando Gomes apud

Theodoro Júnior (1999, p. 13) destaca:

O acordo de vontade é, sem dúvida, a força propulsora do evento jurídico, e o vínculo obrigacional que dita força acarreta imediatamente é o resultado jurídico da atuação volitiva dos agentes. Não tem sentido, pois, o completo isolamento dos dois dados, já que não se pode cogitar de contrato apenas encarando o acordo de vontades e sem levar em conta a relação jurídica que o consenso criou. Daí ser razoável entender-se o contrato como fenômeno jurídico compreendido desde a sua formação até a sua extinção, ou seja, desde o acordo de vontades até o aperfeiçoamento da relação jurídica com todos os seus elementos subjetivos e objetivos, e não apenas como a sua força propulsora.

Gomes (2000, 36) discorre sobre o conceito do princípio da força obrigatória como

“na regra de que o contrato é lei entre as partes. Celebrado que seja, com observância de todos

pressupostos e requisitos necessários à sua validade, deve ser executado pelas partes como se

suas cláusulas fossem preceitos legais imperativos”.

Rizzardo (2001, p. 16) explana sobre este princípio, destacando que:

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Em verdade, o contrato obriga em função de várias razões, todas de origem prática, sem necessidade de teorizar os fundamentos. É necessário o cumprimento em virtude da palavra dada, e mais porque a lei ordena a obediência às cláusulas, cominando sanções aos infratores. A estabilidade da ordem social e a necessidade de dar segurança às relações desenvolvidas são outros fatores que ensejam a irretratabilidade.

Para Rodrigues (2002, p. 12), “[...] é a lei que torna obrigatório o cumprimento do

contrato. E o faz compelir aquele que livremente se vinculou a manter sua promessa,

procurando, desse modo, assegurar as relações assim estabelecidas”.

No entendimento de Pereira (2003, p. 15),

O princípio da força obrigatória do contrato contém ínsita uma idéia que reflete o máximo de subjetivismo que a ordem legal oferece: a palavra individual, enunciada na conformidade da lei, encerra uma centelha de criação, tão forte e tão profunda, que não comporta retratação, e tão imperiosa que, depois de adquirir vida, nem o Estado mesmo, a não se excepcionalmente, pode intervir, com o propósito de mudar o curso de seus efeitos.

Há, contudo uma exceção legal, que é a escusa por caso fortuito ou força maior

previsto no art. 393 parágrafo único do Código Civil.

Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado. Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.

Destaca-se que, a diferença entre caso fortuito ou força maior, pode ser entendida

como:

[...] no caso fortuito a impossibilidade relativa (impossível para o agente), e na força maior a impossibilidade absoluta (impossível para quem quer que seja). (...) o caso fortuito está relacionado a um impedimento com a pessoa do devedor ou com a sua empresa, enquanto que a força maior é um acontecimento externo (RIZZARDO, 2001, p. 18).

A este respeito, Rizzardo (2001, p. 19) cita que:

No caso fortuito, os acontecimentos são previsíveis, mas não quanto ao momento, ao lugar e ao modo de sua verificação. É viável que no inverno vá gear, mas sem precisar-se o lugar, a intensidade e o momento do fenômeno. Há um incidente produzido por força física ininteligente, em condições imprevisíveis pelas partes.

Com relação ao caso fortuito ou força maior, Washington de Barros Monteiro apud

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Rizzardo (2001, p. 19) destaca os elementos que devem estar presentes para a sua

configuração, quais sejam:

a) O fato deve ser necessário, não determinado por culpa do devedor... Se há culpa, não há caso fortuito, e reciprocamente, se há caso fortuito, não pode haver culpa do devedor. Um exclui o outro. Por exemplo, um incêndio pode caracterizar o caso fortuito, mas se para ele concorreu com culpa o devedor, desaparece a força liberatória; b) o ato deve ser superveniente e inevitável. Nessas condições, se o contrato vem a ser celebrado durante uma guerra, não pode o devedor alegar depois as dificuldades oriundas dessa mesma guerra para furtar-se às suas obrigações; c) finalmente, o fato deve ser irresistível, fora do alcance do poder humano. Desde que não pode ser removido pela vontade do devedor, não há que se cogitar da culpa deste pela inexecução da obrigação.

Como se pode observar, ocorrendo caso fortuito ou força maior, o devedor não poderá

arcar com as conseqüências, pois inexistiu culpa por parte deste, devendo, nesses casos, ser

levado em consideração os motivos que levaram ao não cumprimento do contrato.

2.2.2 Princípio do consensualismo

Segundo esse princípio, e com base nos estudos de Diniz (2002), o simples acordo de

duas ou mais vontades basta para gerar contrato válido, pois a maioria dos negócios jurídicos

bilaterais é consensual, embora alguns, por serem solenes, tenham sua validade condicionada

à observância de certas formalidades legais.

Na visão de Arnoldo Wald apud Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 34),

A autonomia da vontade se apresenta sob duas formas distintas, na lição dos dogmatistas modernos, podendo revestir o aspecto de liberdade de contratar e de liberdade contratual. Liberdade de contratar é a faculdade de realizar ou não determinado contrato, enquanto a liberdade contratual é a possibilidade de estabelecer o conteúdo do contrato. A primeira se refere à possibilidade de realizar ou não um negócio, enquanto a segunda importa na fixação das modalidades de sua realização.

Complementam Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 34):

A autonomia da vontade vista no plano da bilateralidade do contrato, pode ser expressa pelo denominado consensualismo: o encontro das vontades livres e contrapostas faz surgir o consentimento, pedra fundamental do negócio jurídico contratual.

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Com relação a este princípio, Lisboa (2005, p. 89-90) cita:

De acordo com o princípio do consensualismo, apenas há contrato mediante a declaração convergente de vontades acerca do objeto da avença e do seu respectivo conteúdo. A ausência de convergência de vontades, quanto ao respectivo conteúdo, mesmo nos contratos de adesão, implica a inexistência de contratação. (...) mesmo nessa categoria contratual subsiste a vontade livre do aderente par escolher o que contratar, podendo ainda optar pela não contratação, se assim julgar mais conveniente.

Entende-se que, o consensualismo juntamente com a autonomia da vontade são a base

de todo contrato, porém, deve-se levar em consideração aspectos pertinentes as normas de

ordem pública que dizem respeito ao bem estar comum.

2.2.3 Princípio da autonomia privada

Este princípio surgiu muito antes do direito romano, consagrando-se através dos

tempos, pois, passou pelas correntes filosóficas e jurídicas que transformaram a história,

sendo que, no entendimento de Rizzardo (2001, p. 12), verifica-se que, “[...] é o contrato

considerado como o acordo de vontades livres e soberanas, insuscetível de modificações

trazidas por qualquer outra força que não deriva das partes envolvidas”.

Francisco Amaral apud Tartuce (2007, p. 73) cita:

[...] a autonomia privada representa um dos princípios fundamentais do direito privado, tratando-se de ‘projeção, no direito, do personalismo ético, concepção axiológica da pessoa como centro e destinatário da ordem jurídica privada, sem o que a pessoa humana, embora formalmente revestida de titularidade jurídica, nada mais seria do que mero instrumento a serviço da sociedade.

Segundo Tartuce (2007, p. 71),

[...] conceituamos o princípio da autonomia privada como sendo um regramento básico, de ordem particular – mas influenciado por normas de ordem pública – pelo qual na formação do contrato, além da vontade das partes, entram em cena outros fatores: psicológicos, políticos, econômicos e sociais. Trata-se do direito indeclinável da parte de auto-regulamentar os seus interesses, decorrente da dignidade humana, mas que encontra limitações em normas de ordem pública, particularmente nos princípios sociais contratuais.

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Segundo artigo publicado na internet2 por Ramanauskas, o princípio da autonomia

privada, significa:

[...] a liberdade das partes na estipulação do que lhes convenha; mediante acordo de vontade, a disciplina de seus interesses, suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica. Esse poder de autoregulamentação dos interesses das partes contratantes, envolve, além da liberdade de criação do contrato: a. a liberdade de contratar ou não contratar, isto é, o poder de decidir, segundo seus interesses, se e quando estabelecerá com outrem uma relação jurídica contratual. Esse princípio sofre exceções, como por exemplo, quando o indivíduo tem obrigação de contratar imposta por lei, como é o caso das companhias seguradoras; b. a liberdade de escolher o outro contraente, embora às vezes haja insuscetibilidade de opção, como por exemplo nas hipóteses de serviço público concedido sob monopólio; c. a liberdade de ficar o conteúdo do contrato, escolhendo qualquer uma das modalidades contratuais reguladas por lei (contratos nominados) introduzindo alterações ou cláusulas que melhor se coadunem com seus interesses e com as peculiaridades do negócio, ampliando ou restringindo os efeitos do vínculo contratual, ou adotando novos tipos contratuais, distintos dos modelos previstos pela ordem jurídica, conforme as necessidades do negócio jurídico, dando origem, aos contratos inominados.

Com relação as suas limitações, Theodoro Júnior (1999, p. 15) cita duas, quais sejam:

Duas limitações, porém, sempre foram opostas ao princípio da liberdade de contratar, que são as regras legais de ‘ordem pública’ e os ‘bons costumes’. Isto quer dizer que a vontade pode amplamente determinar o aparecimento do contrato e definir o seu conteúdo, mas não o pode fazer contrariando aquilo que o legislador disciplinou como matéria de ‘ordem pública’, por reconhecer, nas circunstâncias, a ocorrência de interesse público em nível superior ao interesse privado dos contratantes.

É preciso lembrar que a liberdade de contratar é limitada pela supremacia da ordem

pública, que veda convenções que lhe sejam contrárias e aos bons costumes, de forma que a

vontade dos contraentes esta subordinada ao interesse coletivo. Assim, os contraentes deverão

sujeitar suas vontades às normas de ordem pública e aos bons costumes.

Tartuce (2007, p. 72) efetua uma diferenciação entre a liberdade de contratar e a

liberdade contratual, destacando:

Em um primeiro momento, a liberdade de contratar está relacionada com a escolha da pessoa ou das pessoas com que o negócio será celebrado, sendo uma liberdade plena, em regra. (...) Em outro plano, a autonomia da pessoa pode estar relacionada com o conteúdo do negócio jurídico, ponto em que residem limitações ainda maiores à liberdade da pessoa humana. Trata-se, portanto, da liberdade contratual.

2 RAMANAUSKAS, Flávio Augusto. Contrato. A página do advogado. Disponível em:

<http://advogado.adv.br/artigos/2001/edsonramanauskas/contratos.htm> Acesso em: 01/04/03.

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(...) Dessa dupla liberdade da pessoa é que decorre a autonomia privada, que seria a liberdade que a pessoa tem para regular os próprios interesses.

Lisboa (2005, p. 87-88), destaca que:

Não é suficiente a convergência de vontades para que se possa reputar o contrato válido e eficaz. Isso, quando muito, se presta à demonstração da sua existência. É indispensável, ainda, a seriedade do conteúdo da declaração da vontade de ambas as partes. Assim, qualquer declaração em tom jocoso ou por simples brincadeira não é considerada adequada para que se possa reconhecer a constituição de um contrato.

Esse princípio sofre restrições, trazidas pelo dirigismo contratual, que é a intervenção

estatal na economia do negócio jurídico, sendo limitado quando a lei exigir formalidades

extras para certos tipos de contratos. A este respeito, Theodoro Júnior (1999, p. 36) enfatiza

que:

O dirigismo contratual, como forma de intervenção no domínio, não representa um superpoder do Estado que possa ser exercido com total desprezo às garantias constitucionais e à ideologia do regime, claramente assentada no conjunto das normas que, na Carta Magna, precedem a franquia da citada intervenção. Vale dizer: essa intervenção será sempre limitada e realizar-se-á nos termos da lei e dos princípios inspiradores da ordem constitucional vigente, de tal maneira que, em todos os casos, restem sempre ‘assegurados os direitos e garantias individuais’.

Para Lopes (1996, p. 33) citando M. Waline, o princípio resume-se nessas duas

proposições essenciais: toda obrigação para ser sancionada pelo direito, deve ser livremente

consentida; mas, ao revés, toda obrigação, a partir do momento em que for assumida, deve ser

sancionada pelo direito. Os postulados que decorrem dessas preposições podem ser assim

determinados; 1º) os indivíduos são livres de contratar ou não contratar; 2º) nulo é o contrato

em não havendo um consentimento livre; 3º) O conteúdo do contrato pertence livremente à

determinação das partes contratantes; 4º) no caso de conflito interespacial de leis, os

contribuintes são livres de eleger a lei aplicável as suas relações contratuais; 5º) concluído o

contrato ele é inatingível, a menos que as próprias partes contratantes o rescindam

voluntariamente; 6º) o contrato concluído livremente incorpora-se ao ordenamento jurídico,

tendo o contratante o direito de pedir a intervenção do Estado para a execução da obrigação

não cumprida. 7º) o juiz, ao aplicar o contrato, é obrigado a se ater à intenção comum das

partes contratantes.

O princípio da autonomia tem suas limitações e, para Rodrigues (2002, p. 17),

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“esbarra sempre na limitação criada por lei de ordem pública. Esbarra, igualmente, na noção

de bons costumes, ou seja, naquelas regras morais não reduzidas a escrito, mas aceitas pelo

grupo social e que constituem o substrato ideológico inspirador do sistema jurídico”.

2.2.4 Princípio da boa-fé

Por este princípio o sentido literal não deve prevalecer sobre a intenção das partes no

momento da celebração do contrato. As partes devem agir com lealdade e confiança

recíprocas, devem ter boa-fé.

A respeito deste princípio, Theodoro Júnior (1999, p. 32) cita que:

Além de prevalecer a intenção sobre a liberdade, compreende-se no princípio da boa fé a necessidade de compreender ou interpretar o contrato segundo os ditames da ‘lealdade e confiança’ entre os contratantes, já que não se pode aceitar que um contratante tenha firmado o pacto de má fé visando locupletar-se injustamente à custa do prejuízo do outro. O dever de ‘lealdade’ recíproca acha-se explícito no Código Civil alemão e prevalece doutrinariamente em todo o direito de raízes romanas.

Tem a finalidade de evitar lesão no contrato, oriunda de má fé de uma das partes,

como cláusula abusiva, enganadora, leonina, que geralmente decorre da hipossuficiência de

uma das partes, portanto este princípio surge para limitar a autonomia das partes na

celebração dos contratos estabelecendo princípios éticos aos contratos, fazendo com que o

interprete procure se preocupar mais com o espírito do contrato do que com a sua “letra

morta” muitas vezes “infestada” de subterfúgios e ambigüidades.

A respeito deste princípio, Pereira (2003, p. 20) cita que:

A boa-fé referida no art. 422 do Código é a boa-fé objetiva, que é característica das relações obrigacionais. Ela não se qualifica por um estado de consciência do agente de estar se comportando de acordo com o Direito, como ocorre com a boa-fé subjetiva. A boa-fé objetiva não diz respeito ao estado em determinada relação jurídica de cooperação. O seu conteúdo consiste em um padrão de conduta, variando as suas exigências de acordo com o tipo de relação existente entre as partes.

Complementa Pereira (2003, p. 20-21) enfatizando que:

A boa-fé objetiva não cria apenas deveres negativos, como o faz a boa-fé subjetiva.

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Ela cria também deveres positivos, já que exige que as partes tudo façam par que o contrato seja cumprido conforme previsto e para que ambas obtenham o proveito objetivado. Assim, o dever de simples abstenção de prejudicar, característico da boa-fé subjetiva, se transforma na boa-fé objetiva em dever de cooperar.

Desta forma, entende-se que a boa-fé objetiva se torna elemento importante do

contrato, pois é através deste princípio que são criados os deveres jurídicos, inclusive como

fator delimitador de direitos.

2.2.5 Princípio da relatividade dos efeitos dos contratos

Os contratos só atingem os celebrantes e não a terceiros. Assim o princípio representa

um elemento de segurança nas relações sociais, visando garantir que ninguém ficará preso a

uma convenção, a menos que a lei o determine, ou a própria pessoa o delibere, do contrário

imperaria a desordem.

Theodoro Júnior (1999, p. 30) destaca que:

O contrato assume força de lei, mas sua eficácia é, ordinariamente, limitada às partes contratantes. Perante terceiros, apresenta-se como res inter alios acta, aliis

neque nocet neque prodest (vale dizer: seus efeitos se produzem apenas entre as partes, não aproveitando nem prejudicando a terceiros.

Comentam Gagliano e Pamplona Filho (2005, p. 46) a respeito do princípio da

relatividade:

Regra geral, os contratos só geram efeitos entre as próprias partes contratantes, razão por que se pode afirmar que a sua oponibilidade não é absoluta ou erga

omnes, mas, tão-somente, relativa. Como negócio jurídico, em que há a manifestação espontânea da vontade para assumir livremente obrigações, as disposições do contrato, a priori, somente interessam às partes, não dizendo respeito a terceiros estranhos à relação jurídica obrigacional.

É aí que surgem as figuras jurídicas que excepcionam esta regra que, segundo

Gagliano e Pamplona Filho (2005, p. 46),

É o caso, por exemplo, da estipulação em favor de terceiro e do contrato com pessoa a declarar. Por meio da primeira previsão, uma parte convenciona com o devedor que este deverá realizar determinada prestação em benefício de outrem, alheio à relação jurídica obrigacional original. Na mesma linha, o contrato com pessoa a declarar é uma figura contratual

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consagrada expressamente pelo novo Código Civil, consistindo, em verdade, em uma promessa de prestação de fato de terceiro, que também titularizará os direitos e obrigações decorrentes do negócio, caso aceite a indicação realizada.

Portanto, verifica-se que o princípio da relatividade não é absoluto e tem exceções,

como a estipulação em favor de terceiros.

2.3 REQUISITOS DE VALIDADE DOS CONTRATOS

Para o contrato ser válido e produzir efeitos é necessário preencher certos requisitos,

que são classificados como condições objetivas (relativas aos contratos, que são forma legal,

objeto do contrato lícito, determinado e possível) e também subjetivas (relativas aos

contraentes que são capacidade das partes e o consentimento).

2.3.1 Requisitos subjetivos

Com relação aos requisitos subjetivos, destacam-se a capacidade das partes e

consentimento, sem os quais não é possível a validade e eficácia de qualquer tipo de contrato.

Segundo Diniz (2002, p. 27), os requisitos subjetivos abrangem:

a) existência de duas ou mais pessoas, já que o contrato é um negócio jurídico bilateral ou plurilateral; b) capacidade genérica das partes contratantes para praticar os atos da vida civil, (...) sob pena do contrato ser nulo ou anulável; c) aptidão específica para contratar, pois a ordem jurídica impõe certas limitações à liberdade de celebrar determinados contratos; d) consentimento das partes contratantes, visto que o contato é originário do acordo de duas ou mais vontades isentas de vício (erro, dolo, coação, lesão, estado de perigo, simulação e fraude) sobre a existência e natureza do contrato, o seu objeto e as cláusulas que o compõe.

A seguir, discorre-se sobre os requisitos subjetivos, mais precisamente sobre a

capacidade das partes e consentimento.

2.3.1.1 A capacidade das partes

A capacidade, segundo Lopes (1996, p. 64), é a “aptidão para ser sujeito de direitos e

obrigações”.

Para Gomes (2000, p. 46), “todo negócio jurídico pressupõe agente capaz, isto é,

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pessoa apta a realizá-lo”. Para ele a capacidade “é aptidão que tem a pessoa para exercer, por

si, os atos da vida civil. É um atributo essencial da personalidade; é o modo pelo qual ela se

exercita”.

Segundo a legislação brasileira pelo Código Civil Brasileiro, em seu Artigo 5º, esta

capacidade somente ocorrerá após os 18 anos de idade, salvo as hipóteses do parágrafo único.

Além desta, existe a capacidade negocial ou contratual, a qual é exigida por lei para

determinados contratos. Como no caso em que uma pessoa casada, mesmo maior de 18 anos

de idade, necessita do consentimento da esposa ou do marido para a venda de bem imóvel.

Com relação aos contratos que são considerados relativamente e absolutamente

inválidos, Lisboa (2005, p. 164-165) destaca:

São absolutamente inválidos os contratos celebrados por: a) menores de 16 anos, conforme o critério cronológico adotado pelo legislador; b) enfermos ou deficientes mentais que não possuam o necessário discernimento para a prática do negócio jurídico; c) aqueles que não puderem exprimir a sua vontade, ainda que de forma transitória, como sucede com a pessoa que se encontra em estado de coma ou com o surdo-mudo que não consegue exteriorizar a sua vontade.

São relativamente inválidos os contratos celebrados por: a) pessoas com 16 anos completos, que tenha menos de 18 anos; b) os ébrios habituais, quando o grau de embriaguez reduzir o discernimento para a prática do negócio jurídico; c) os viciados em tóxicos, conforme decisão judicial efetuada a partir de laudo de dependência toxicológica; d) aqueles que têm o discernimento reduzido por deficiência mental; e) os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo; f) os pródigos, assim considerados aqueles que judicialmente foram interditados para praticar atos de disposição patrimonial.

Os absolutamente incapazes podem contratar, mas necessitam ser representados neste

ato, da mesma forma os relativamente incapazes também podem contratar, mas neste caso

necessitam ser assistidos.

2.3.1.2 O consentimento

O consentimento é a manifestação das partes em concordar com aquilo que se estipula

no contrato e, segundo Lopes (1996, p. 67), “pressupõe a existência de duas distintas

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declarações de vontade, emitidas cada um per si e isentas de defeitos”. Assim deve haver

uma oferta e uma aceitação.

Portanto não vale a declaração sob coação, que, conforme Gomes (2000, p. 49),

“muitas vezes ocorre divergência entre a vontade real e a declarada. Quando se origina de

certa causa, diz-se que o consentimento é viciado. São vícios do consentimento o erro, o dolo

e a coação”.

Para Fernandes apud Rizzardo (2001, p. 11),

É o consentimento que determina a obrigatoriedade do prometido, como manifestação jurídica e recíproca de promessas válidas. Sem esse entendimento, o contrato não teria propósito moral, nem econômico, nem jurídico, nem a lei seria bastante forte para fazer nascer uma relação, ou ‘vivulum juris’, capaz de obrigar as partes contratantes.

O consentimento pode se dar de forma expressa ou tácita (quando a lei não exige que

seja expressa).

O Código Civil, no Artigo 111, prevê como exceção que o silêncio vale como

anuência, quando as circunstâncias e os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração

de vontade expressa.

2.3.2 Requisitos objetivos

O objeto dos contratos é constituir uma obrigação que deve ser possível, tanto material

quanto juridicamente, ou seja, não proibido em lei, é sempre uma prestação de dar, fazer ou

não fazer.

Segundo Diniz (2002, p. 28), verifica-se que “os requisitos objetivos dizem respeito ao

objeto do contrato, ou seja, à obrigação constituída, modificada ou extinta”. Enfatiza ainda

que, a validade e a eficácia do contrato, dependem da:

a) licitude de seu objeto, que não pode ser contrário à lei, à moral, aos princípios da ordem pública e aos bons costumes [...]. b) possibilidade física ou jurídica do objeto. Se o negócio tiver objeto física ou materialmente impossível, de modo que o agente jamais possa vencer o obstáculo à sua realização [...]. é preciso esclarecer que a impossibilidade material deve existir

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no instante da constituição do contrato, porque, se aparecer em momento ulterior, ter-se-á a inexecução do contrato, com ou sem perdas e danos, conforme ocorra ou não a culpa do devedor. c) determinação de seu objeto, pois este deve ser certo ou, pelo menos, determinável. O contrato deverá conter, portanto, os elementos necessários (especificação do gênero, da espécie, da quantidade ou dos caracteres individuais) para que se possa determinar o seu objeto, de modo que a obrigação do devedor tenha sobre que incidir. Se indeterminável o objeto, o contrato será inválido e ineficaz. d) economicidade seu objeto, que deverá versar sobre interesse economicamente apreciável, capaz de se converter, direta ou indiretamente, em dinheiro (DINIZ, 2002, p. 29-30).

Portanto, de acordo com o exposto, o objeto deve ser possível, pois se fisicamente

impossível, deixa ela de existir.

Ainda, o objeto do contrato deve ser certo, podendo ser determinável, no momento da

celebração ou da sua execução. Deve ser ainda lícito, pois um contrato não pode ter por objeto

prestação proibida por lei ou pelos princípios de ordem pública.

2.3.3 Requisitos formais

Primeiramente se faz necessário discorrer sobre o que são os requisitos formais e, a

este respeito, Diniz (2002, p. 30) destaca:

Os requisitos formais são atinentes à forma do contrato. Entretanto, é preciso ressaltar que, atualmente, não há rigorismo de forma, pois a simples declaração volitiva tem o condão de estabelecer o liame obrigacional entre os contraentes, gerando efeitos jurídicos independentemente da forma de que se revista, de tal sorte que o elemento formal, na seara contratual, constitui uma exceção nos casos em que a lei exige, para a validação do negócio, a observância de certa forma. A regra é a liberdade de forma, celebrando-se o contrato pelo livre consentimento das partes contratantes [...].

A forma do contrato pode ser livre ou especial. A regra geral é a da liberdade de

forma, mas tão numerosas são as restrições impostas pela lei, que se pode considerar a forma

livre quase que uma exceção. A este respeito Clóvis Beviláqua apud Diniz (2002, p. 30)

destaca: “[...] é o conjunto de solenidades que se devem observar par que a declaração de

vontade tenha eficácia jurídica”.

Há casos em que é necessário instrumento público, e sem eles o contrato não possui

validade, são os casos de doações e transmissões de direitos sobre imóveis acima de

determinado valor.

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Quando a lei não exige instrumento público o instrumento particular é a forma

adequada, pois o princípio que rege tais atos é o de que a validade das declarações de vontade

não dependerá de forma especial. Assim, segundo Lopes (1996, p. 81), “o instrumento

particular feito e assinado ou somente assinado por quem esteja na disposição e administração

livre de seus bens, sendo subscrito por duas testemunhas, prova as obrigações de qualquer

valor”.

Para valerem contra terceiros certos contratos precisam de registro público como no

caso de os documentos decorrentes de depósito, as cartas de fiança, os contratos de compra e

venda em prestações, os contratos de compra e venda de automóveis e outros.

Ademais a invalidade dos contratos, por vício de forma somente se decreta quando

esta for de sua substância.

2.4 FORMAÇÃO E CONCLUSÃO DO VÍNCULO CONTRATUAL

Para que haja a formação de um contrato, se faz necessário que, inicialmente haja

informações a respeito, ou seja, as partes devem ser informadas a respeito do objeto do

contrato para a verificação da possibilidade ou não da realização do negócio jurídico.

Com relação a formação do contrato, Rodrigues (2002, p. 6) cita que:

Forma-se o contrato pelo encontro concordante de duas declarações receptícias. Isso ocorre, portanto, quando a proposta emanada do proponente (também chamado policitante) é aceita pela pessoa a quem foi dirigida, isto é, o oblato. Pelo menos é dessa maneira que a lei encara o problema da formação dos contratos.

A este respeito, Lisboa (2005, p. 214) destaca:

Em qualquer modalidade de progressividade contratual destaca-se a importância da informação prévia e necessária para que a conclusão do contrato realmente possa satisfazer plenamente os interesses das partes. O acesso à informação é direito fundamental presente em todas as relações jurídicas e garantido expressamente às relações de consumo, por dispositivo legal. Cada uma das partes deverá fornecer à outra informações adequadas e relevantes para que se faça o juízo de valor apropriado sobre a oportunidade da realização ou não do negócio jurídico.

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Para Gomes (2000, p. 57), “O contrato consensual torna-se perfeito e acabado no

momento em que nasce o vínculo entre as partes”.

Para atingir este estágio preconizado por Orlando Gomes os contratos passam por

diversas fases de negociação até estar efetivamente concluído, geralmente o contrato começa

com a puntuação, ou seja, as negociações preliminares e segundo Paulo Sá Elias3, “esta fase

não cria direitos nem obrigações, não estabelece qualquer laço convencional”.

Para complementar Elias cita na seqüência Maria Helena Diniz “apesar de faltar

obrigatoriedade na puntuação, poderá surgir excepcionalmente, a responsabilidade civil para

os que dela participam, não no campo da culpa contratual, mas no da aquiliana”.

Assim na hipótese de uma das partes criar na outra expectativa de que o negócio será

celebrado, levando-a a arcar com despesas e desistir injustificadamente, terá de ressarcir os

danos com base no princípio da boa-fé e no artigo 186 do CC respondendo assim por perdas

e danos.

O contrato surge com uma oferta (que é a declaração de vontade) dirigida a outra

pessoa pela qual a primeira manifesta a sua intenção de se vincular, caso a outra aceite.

Para tanto esta proposta deve ser “séria, completa, precisa e inequívoca” (SILVA4, 2003).

A respeito, Lisboa (2005, p. 215) destaca:

Proposta é a declaração unilateral formal dirigida a outra pessoa (o ppolicitado) na qual o emissor (o proponente ou policitante) se dispõe a celebrar negócio jurídico, nos termos por ele elaborados. O proponente vincula-se aos termos da proposta, durante o período no qual esta possui vigência; ou, na falta de prazo fixado pelo policitante, durante prazo razoável, conforme a análise do caso concreto. Trata-se a proposta, então, de uma declaração de vontade receptícia, que deve conter todos os elementos essenciais do negócio jurídico proposto.

3 ELIAS, Paulo Sá. Breves considerações sobre a formação do vínculo contratual e a internet. Disponível em: <http://www.direitodainformatica.com.br/artigos/002.htm> Acesso em: 01/04/03 4 SILVA, Rosana Ribeiro da. Contratos Eletrônicos. Infojur: revista de informática jurídica e direito da informática. Disponível em: <http://www.infojur.ccj.ufsc.br/> Acesso em: 11/04/08

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Lisboa (2005, p. 216) discorre sobre dois tipos de propostas: proposta entre presentes

e proposta entre ausentes. A primeira refere-se a proposta realizada com a presença física de

ambas as partes, enquanto que a segunda ocorre quando o policitante não pode contar com a

anuência do policitado com relação ao conteúdo da proposta.

A respeito da proposta, Rodrigues (2002, p. 69) cita:

A proposta é a oferta dos termos de um negócio, convidando a outra parte a com eles concordar. Constitui ato jurídico unilateral, por intermédio do qual o policitante convida o oblato a contratar, apresentando desde logo os termos em que se dispõe a fazê-lo.

Com relação a aceitação, o passo seguinte da formulação do contrato, Lisboa (2005, p.

217) cita:

Na primeira hipótese, a da proposta entre presentes, a falta de aceitação imediata pelo oblato desvincula o proponente. Se ele, no entanto, conceder prazo para a reflexão necessária do policitado, aplicar-se-á o regime jurídico da proposta entre ausentes. No segundo caso, a da proposta entre ausentes, o prazo máximo estipulado para a expedição da aceitação é o limitador da vinculação temporal do proponente.

Assim, a oferta segundo o artigo 427 do Código Civil obriga o ofertante, sob pena de

indenizar o oblato5 pela recusa em cumpri-la, mas para este dispositivo existem exceções

encontradas no artigo 428 do mesmo:

Art. 428 Deixa de ser obrigatória a proposta: I – se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante; II - se feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente; III – se, feita à pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado; IV – se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do proponente.

A aceitação por outro lado é a manifestação do oblato com a proposta que lhe foi

dirigida pela outra parte, tal manifestação é imprescindível para a conclusão do contrato,

podendo a conclusão ser tácita ou expressa, salvo nos contratos solenes.

5 Oblato é a pessoa a quem foi realizada determinada oferta.

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A aceitação para valer contra o ofertante deve ser dentro do prazo estipulado na oferta,

caso não haja tal prazo esta valerá até que a oferta seja retirada.

Para ter validade, entretanto, a aceitação deverá ser integral e nos moldes da oferta,

sendo alternativa o oblato deverá indicar a de sua escolha, caso não opte por nenhuma o

policitante6 dará como entendido como que o oblato tenha consentido com qualquer uma

delas.

Caso o oblato aceite, mas ofereça novos requisitos teremos uma nova proposta da qual

fica liberado o policitante o qual pode ou não vir a concordar.

Conforme Paulo Sá Elias7 há duas hipóteses em que a aceitação deixará de gerar o

aperfeiçoamento do contrato, desobrigando o proponente:

[....] se a aceitação, embora expedida a tempo, por motivos imprevistos chegar tarde ao conhecimento do proponente, este se encontrará desobrigado pelo atraso involuntário, de modo que o contrato não se aperfeiçoa, a menos que haja nova declaração de vontade. Considera-se inexistente a aceitação, se antes dela ou com ela chegar ao proponente a retratação do aceitante (art. 1.085, CC). O dispositivo em questão, trata da retratação . É possível, portanto, ao aceitante arrepender-se, desde que sua retratação chegue ao conhecimento do proponente antes da aceitação ou juntamente com ela.

Os contratos, portanto começam a surtir efeitos a partir da aceitação, ocorrendo o

acordo recíproco.

Sendo o contrato celebrado entre ausentes como no caso da carta, do fax, do

telegrama, radiograma; há um intervalo mais longo de tempo e a doutrina nestes casos

diverge quanto ao momento da conclusão do contrato e assim explica Rosana Ribeiro da

Silva (2003):

A primeira teoria é a da informação ou cognição, segundo a qual o contrato é tido por concluído no momento em que o ofertante toma ciência da aceitação do oblato. Isto porque, para esta teoria, não se pode dizer que um negócio jurídico esteja realizado sem que o proponente e o aceitante tenham conhecimento da vontade um do outro. Esta teoria encontra-se hoje em decadência, posto que dá margem a fraude e má-fé por parte do ofertante, p. ex., conforme a variação do mercado lhe seja mais ou menos vantajosa, podendo este dar por lida ou não uma aceitação. Enorme seria

6 Policitante é igual a ofertante, ou seja a pessoa que fez determinada oferta. 7 ELIAS, Paulo Sá. Breves considerações sobre a formação do vínculo contratual e a internet. Disponível em: <http://www.direitodainformatica.com.br/artigos/002.htm> 01/04/03

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nesta hipótese, a dificuldade do aceitante em provar a ocorrência de fraude ou má-fé por parte do ofertante. A segunda teoria é a da agnição ou declaração, que entende por concluído o contrato no instante que o oblato manifesta sua aquiescência à proposta. Esta teoria apresenta 3 subespécies que são: da declaração propriamente dita, segundo a qual o contrato será concluído no momento em que o aceitante formula sua aceitação em relação à oferta, redigindo a carta, telegrama ou e-mail. Não tem boa acolhida posto que facilmente o aceitante poderia destruir qualquer prova da aceitação formulada, destruindo a missiva que a continha; da expedição, pela qual não basta a formulação da aceitação, sendo indispensável sua remessa ao policitante, quando então se entender ter o oblato feito tudo o que seria necessário para externar a sua aceitação, da recepção, que entende concluído um contrato no momento em que o policitante recebe, efetivamente, a resposta favorável, mesmo que não seja por ele lida. Para esta corrente, não é necessário que o proponente tome conhecimento da aceitação, bastando apenas que tenha efetivamente recebido a carta, telegrama ou e-mail que a transmite.

O Código Civil brasileiro adotou o sistema da agnição, na subespécie da expedição,

conforme leitura do artigo 434 do Código Civil, com exceções nos incisos II e III que adotam

a subteoria da recepção e artigo 433 que fala da retratação antes da aceitação:

Art. 433 Considera-se inexistente a aceitação, se antes dela ou com ela chegar ao proponente a retratação do aceitante. Art. 434 Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expediada exceto: I – no caso do artigo antecedente; II – se o proponente se houver comprometido a esperar a resposta; III – se ela não chegar no prazo convencionado.

Quando o código trata do lugar da celebração dos contratos adota este a subespécie da

expedição da oferta, conforme artigo 435 do Código Civil: “Reputar-se-á celebrado o contrato

no lugar em que foi proposto”. E, segundo Gomes (2000, p. 69), verifica-se que “o contrato

entre pessoas presentes forma-se onde elas se encontram. O que se realiza entre pessoas

distantes uma da outra, no lugar em que foi proposto”.

A determinação do lugar onde se tem concluído o contrato é de suma importância para

se determinar, não apenas o foro competente, mas também para determinar a lei a ser aplicada

na relação estabelecida e conforme o art. 9º da LICC, a obrigação resultante do contrato

reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente.

É importante destacar ainda, aspectos pertinentes ao regime jurídico da proposta, os

quais, segundo Lisboa (2005, p. 217-218), são:

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São regras básicas da proposta (...): a) a discussão ou a modificação do conteúdo da proposta pelo policitado importa em nova proposta, desvinculando-se o policitante do conteúdo da anterior. A alteração dos termos da proposta pode se dar: por acréscimo (adição) ou por restrição. Nesse caso, incumbirá ao ex-policitante afirmar se concorda ou não com os termos da nova proposta, observando-se as mesmas regras expendidas. b) a aceitação realizada fora de prazo é também considerada nova proposta, porque aquela encaminhada pelo policitante já não mais o vincula. Com isso, ele deixa de ser o policitante e, ao ser-lhe encaminhada a aceitação fora do prazo, torna-se o policitado. c) ausência de recusa na proposta emitida com prazo certo para resposta somente importa em aceitação se a policitação assim o estabelecer. Essa regra não é aplicável, todavia, às relações jurídicas submetidas a normas de ordem pública e de interesse social, como é o caso do Código de Defesa do Consumidor. c) na proposta entre ausentes, uma vez expedida a aceitação no prazo consignado pela policitação, o negócio jurídico estará perfeito e acabado, desde aquela data, pouco importando que o proponente somente venha a tomar conhecimento posterior da aceitação.

Após a proposta, passa-se para o contrato preliminar ou preparatório, o qual pode ser

conceituado como “é o negócio jurídico por meio do qual as partes se vinculam a celebrar um

contrato futuro e definitivo” (LISBOA, 2005, p. 222).

Na verdade, o contrato preparatório diz respeito a uma obrigação de fazer e sua

ausência pode prejudicar não apenas o seu desfazimento como também qualquer percepção de

indenização por perdas e danos que possa ocorrer por descumprimento entre as partes.

Com relação a extinção do contrato, Diniz (2002, p. 150) cita que:

O contrato, como todo e qualquer negócio jurídico, cumpre seu ciclo existencial. Nasce do mútuo consenso, sofre as viscissitudes de sua carreira, e termina normalmente com o adimplemento da prestação, sendo executado pelas partes contratantes em todas as suas cláusulas. A execução é, pois, o modo normal de extinção do vínculo contratual, não suscitando, por isso, quaisquer problemas quanto à forma e aos efeitos, já que, uma vez executado o contrato, extinguir-se-ão todos os direitos e obrigações que originou.

No entendimento de Maria Helena Diniz (2002, p. 152) existem outras formas de

extinção do contrato, destacando a nulidade, condição resolutiva, direito de arrependimento e

causas extintivas do contrato superveniente à sua formação. O entendimento a este respeito

pode ser assim explicado:

A nulidade é, portanto, uma sanção, por meio da qual a lei priva de efeitos jurídicos o contrato celebrado contra os preceitos disciplinadores dos pressupostos de validade do negócio jurídico. Essa nulidade poderá ser absoluta ou relativa. A nulidade absoluta (CC, arts. 166, I a VII, e 167) é a sanção cominada ao contratante que transgride preceito de ordem pública, operando de pleno direito, de sorte que o

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contrato não poderá ser confirmado, nem convalescerá pelo decurso de tempo, da mesma forma que não produzirá efeitos desde a sua formação. (...) A nulidade relativa (CC, art. 171) é uma sanção que apenas poderá ser pleiteada pela pessoa a quem a lei protege e que se dirige contra os contratos celebrados por relativamente incapazes ou por pessoas cujo consentimento se deu por erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão e fraude contra credores.

Com relação a condição resolutiva, Diniz (2002, p. 152) cita:

Pelo novo Código Civil, arts. 475 e 476, a condição resolutiva tácita está subentendida em todos os contratos bilaterais ou sinalagmáticos, para o caso em que um dos contraentes não cumpra sua obrigação, autorizando, então, o lesado pela inexecução a pedir rescisão contratual, se não preferir exigir o cumprimento, e indenização por perdas e danos.

No que se refere ao direito de arrependimento, Diniz (2002, p. 154) enfatiza:

[...] O exercício do direito de arrependimento deverá dar-se dentro do prazo convencionado, ou, se não houve estipulação a respeito, antes da execução do contrato, uma vez que o adimplemento deste importará em renúncia tácita àquele direito. O prejudicado com o arrependimento não poderá opor-se à rescisão contratual, pois o direito de arrepender-se já estava assegurado no contrato; assim, bastará que o contratante arrependido pague a multa para exonerar-se do vínculo.

Diniz (2002, p. 155) cita as causas extintivas do contrato supervenientes à sua

formação, ou seja:

A extinção do vínculo contratual pode operar-se por motivos supervenientes à sua formação, que impedem a sua execução. A dissolução do contrato em razão de causas posteriores à sua criação verificar-se-á por: a) resolução, que se liga ao inadimplemento contratual, caso em que se terá resolução por inexecução voluntária ou involuntária do contrato, por onerosidade excessiva etc.; b) resilição, que é o modo de extinção do ajuste por vontade de um ou dos dois contratantes, por razões que variam ao sabor de seus interesses, podendo ser, portanto, unilateral ou bilateral; e c) morte de uma das partes contratantes, se o contrato for intuitu

personae.

Lisboa (2005, p. 234) discorre sobre os aspectos pertinentes a causas extintivas,

destacando:

Sob o aspecto de imputabilidade da responsabilidade contratual, pode-se afirmar ordinariamente que o contrato pode ser extinto: a) por fatores não imputáveis às partes, descabendo a indenização por perdas e danos. Exemplos: morte, caso fortuito, força maior. b) por fatores imputáveis às partes, caso em que o responsável será obrigado a efetuar o pagamento de indenização por perdas e danos. Exemplos: resolução voluntária, alguns casos de denúncia.

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A seguir, destacam-se alguns destes fatores. Primeiramente discorre-se sobre fatores

não imputáveis às partes, destacando-se:

A morte ordinariamente proporciona a extinção do contrato (mors omnia solvit). Exemplo: a morte é causa extintiva do contrato de prestação de serviços; o contrato de fiança cessa com a morte do fiador, ainda que o contrato principal esteja em andamento; o contrato de mandato cessa com a morte do mandatário. Entretanto, as obrigações pactuadas que não chegaram a ser cumpridas pelo de cujus poderão ser exigidas dos seus herdeitos, até os limites das forças da herança, ou seja, até o valor que integra o patrimônio deixado aos sucessores (LISBOA, 2005, p. 236).

Com relação a força maior e caso fortuito, verifica-se que ocorre a extinção do

contrato, segundo o novo código e de acordo com Lisboa (2005, p. 237-238), nos seguintes

casos:

- o devedor não responde por caso fortuito ou força maior, salvo se expressa a sua responsabilidade; - antes da escolha da obrigação de dar coisa incerta, não pode ser alegada a perda ou a deterioração da coisa por caso fortuito ou força maior; - no comodato, o comodatário responde pelos riscos e danos acarretados sobre os bens do comodante se preferiu salvar os seus, mesmo por caso fortuito ou força maior; - a prestação de serviços também se extingue por força maior que impossibilita a continuidade da atividade contratada; - na empreitada, a força maior pode dar causa à suspensão da obra; - no depósito, o depositário que perde a coisa por força maior e recebe outra no seu lugar fica obrigado a entregar o que obteve em favor do depositante; - o depositário, em regra, não responde por força maior; - na comissão, o comissário é responsável por prejuízos que a sua atividade pode causar ao comitente, salvo motivos de força maior; - no contrato de agência e distribuição, o agente tem o direito ao recebimento de remuneração pelos serviços prestados, mesmo no caso de morte ou de força maior que o impossibilite de dar continuidade ao trabalho; - o transportador tem a sua responsabilidade pela condução de pessoas e bagagens exonerada nos casos de força maior; - o transportador tem a sua responsabilidade por honorários e pelo cumprimento do itinerário previamente divulgado, salvo motivo de força maior; - no contrato de transporte, a responsabilidade do transportador pelo perecimento ou deterioração da coisa em face da longa interrupção da sua condução ao destino é afastada pela ocorrência da força maior; e - a responsabilidade do dono do animal que ferir a vítima é afastada por força maior, assim como por culpa dela.

No que se refere aos fatores imputáveis às partes, Lisboa (2005, p. 238) destaca os

vícios de consentimento e os vícios sociais, quais sejam:

Os vícios de consentimento geram a extinção do contrato por defeito da manifestação da vontade de uma das partes, que se sujeita à ineficácia (efeitos ex

nunc). É o que sucede com: o erro, o dolo, a coação, a lesão e o estado de perigo. Os vícios sociais proporcionam a extinção do negócio jurídico por defeito grave da manifestação da vontade e os prejuízos que disso podem resultar sobre terceiros.

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Após discorrer sobre a teoria geral dos contratos, onde pode-se obter maiores

informações a respeito de conceito, princípios, requisitos, formação e extinção do contrato, é

mister abordar-se os aspectos voltados à função social do contrato, que será tema do próximo

capítulo deste estudo.

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3 A FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS

Neste capítulo, procura-se abordar a função social dos contratos e, para tanto, destaca-

se aspectos pertinentes ao histórico, conceito, natureza jurídica, finalidade, princípio da

proporcionalidade e a fixação da função social dos contratos.

3.1 HISTÓRICO

Para efetuar uma abordagem complexa sobre a função social do contrato, faz-se

necessário conhecer, primeiramente, seu histórico e sua evolução através dos tempos.

A função social dos contratos tem como ponto de partida, no século XIX, mais

precisamente em 1884, o texto escrito por Enrico Cimbali, denominado “A função social dos

contratos e a causa jurídica da respectiva força obrigatória” (MULLER, 2008)

No ano de 1929, outra obra foi publicada sobre o tema, nos idos de 1929, de autoria de

Karl Renner, intitulada “Os institutos de direito privado e a sua função social” (MULLER,

2008).

No Brasil, destacam-se dois autores que se preocuparam em tratar do tema, quais

sejam, Alvino Lima que, em 1939, ministrou aula inaugural na Faculdade de Direito da USP,

enfocando o tema “Da influência, no direito civil, do movimento socializador do Direito” e

Clóvis Bevilacqua, em sua obra, “Direito das obrigações” (SILVA apud MULLER, 2008).

Porém, já se ouvia falar na função social dos contratos no Código de Hamurabi, mais

precisamente no cânone 48, coluna XIV, cuja redação destacava:

Si un senõr tiene deuda y (si) el dioa Adad há inundado su campo y há destrozado la cosecha, o bien (si) a causa de la sequía, el campo no produce grano, en esse año no entregará grano a su credor; cancelará su tablilla (de contrato) y no pagará el interés de esse año (PEINADO apud ALVIM; CESAR; ROSAS, 2003, p. 341).

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No Direito Romano, não se conhecia o contrato como um direito subjetivo, pois o

mesmo representava uma garantia de recurso à autoridade estatal, cabendo ao pretor admitir a

actio e, desta forma, se assim não o fosse os pactos eram nulos (GUIMARÃES, 2003).

A respeito do contrato, ainda Guimarães (2003), destaca:

A partir da Idade Média, com a significativa influência do direito canônico e da moral cristã, modifica-se profundamente a conceituação do contrato, que assume o papel de instituto de conotação subjetiva, derivado da vontade livre do indivíduo que tivesse capacidade para contrair obrigações, deixando-se de lado o aspecto do formalismo exacerbado.

No entendimento de Marques (1999), verifica-se que

[...]as principais origens da doutrina da autonomia da vontade encontram-se no Direito Canônico, ao defender a validade e a força obrigatória da promessa por si própria; na teoria do Direito Natural, que fornece a base filosófica da ética da liberdade e do dever de Kant; na Revolução Francesa, através dos princípios da Teoria do Contrato Social; e, por fim, no liberalismo econômico, que encontrava no contrato um instrumento de circulação de riquezas.

Como se pode observar, no Direito Canônico já se encontrava a autonomia da vontade

nos contratos e, desta forma, valorizava-se a teoria do Direito Natural, demonstrando que o

contrato passava a ser um instrumento de circulação de riquezas e, como um instrumento de

vontades, o contrato poderia criar, modificar ou extinguir direitos e obrigações. Guimarães

(2003) destaca:

Neste contexto, tem-se como princípio basilar o da igualdade (correspondente à isonomia perante a lei), que se afigurou indispensável para a construção de um mercado em busca da livre contratação, "em que os indivíduos não estivessem subordinados a limitações de disposição, foi respondida pela técnica do sujeito de

direito único: era-se proprietário, contratante, pai de família", sem quaisquer outros atributos diferenciadores.

Com o advento da Revolução Industrial, mudanças significativas ocorreram no âmbito

do direito contratual, levando a ampliação dos efeitos negociais a diversas condutas, sem levar

em consideração a vontade dos obrigados.

No entendimento de Ricardo Aronne apud Guimarães (2003), verifica-se que:

Advém, nesse contexto, a Revolução Industrial com a política liberalista vindo esmagar massas arrastadas ao proletariado,fermentando a inquietação destas contra o individualismo, de modo a questionar o mundo de então sobre a questão social, promovendo, conseqüentemente, uma reviravolta no sistema de então.

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Complementa estes dizeres Wald (2000),

[...] no passado, o contrato era uma espécie de ilha, independente e alheia aos acontecimentos, sempre a prevalecer sobre eventuais modificações fáticas e legislativas, já na atualidade, porém, o contrato transforma-se em um bloco de direitos e obrigações para ambas as partes.

Como se pode verificar, o contrato passou a prevalecer sobre o individualismo,

gerando direitos e obrigações por ambas as partes, devido, principalmente aos movimentos

sociais e ao processo de industrialização que se intensificava.

No entendimento de Marques (1999), o contrato sofreu transformações adequando-se

às exigências da sociedade, ou seja, “de espaço reservado e protegido pelo direito para a livre

e soberana manifestação da vontade das partes, para ser um instrumento jurídico mais social,

controlado e submetido a uma série de imposições cogentes, mas eqüitativas”.

Verifica-se que, as mudanças na sociedade trouxeram transformações significativas,

inclusive no âmbito social, fazendo com que o contrato passasse a ser considerado um

instrumento de convívio social e de preservação dos interesses da coletividade. A este

respeito, Guimarães (2003) cita:

Na verdade, as transformações sociais sempre influenciaram sobremaneira o mundo jurídico. Assim, o contrato vem sofrendo mudanças significativas, que iniciaram, de maneira mais intensa, no período do pós-guerra. Inicialmente, temos a primeira guerra mundial, época em que, realmente, se deu a passagem para o século XX no que diz respeito ao mundo de idéias e concepções. A partir de então, a sociedade começou a passar por processos como o aumento da população mundial, o que deu margem a novas relações jurídicas, massificadas ou coletivas; acarretando, também, um grande desequilíbrio social.

Com a Segunda Guerra Mundial, surge o princípio da autonomia da vontade,

conferindo aos indivíduos poder de exercitarem seus interesses, tendo as limitações impostas

estabelecidas pelo Direito, levando em consideração, ainda, os interesses da coletividade

(GUIMARÃES, 2003).

Na visão de Guimarães (2003), destaca-se:

O significado e o alcance do contrato reflete-se nas relações econômicas e sociais de cada momento histórico. O modelo clássico (liberal e tradicional) apresenta-se inadequado aos atos praticados na atualidade, porque são distintos os seus fundamentos, configurando-se uma barreira às mudanças sociais. O conteúdo

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conceitual e material e a função do contrato mudaram, para adequá-lo às exigências da concretização de uma justiça social, que não é só dele, mas de todo o Direito.

No Brasil, as mudanças mais profundas, pertinentes aos contratos e sua função social,

surgiram com o Código Civil de 1916, o qual detinha uma posição individualista e

voluntarista, pois tinha em sua base o Código Napoleônico, instituindo o sujeito de direito em

suas relações econômicas. Guimarães (2003) destaca:

Logo após a promulgação do Código Civil de 1916, inicia-se a primeira fase intervencionista do Estado, na qual se promove a edição de leis extravagantes que objetivassem o reequilíbrio do quadro social delineado pela consolidação de novas classes econômicas formadas na ordem liberal e que reproduziam os ideais da Revolução Francesa.

As novas leis eram tidas como de caráter excepcional, visto que introduziam

princípios outros que não os consagradores do Código Civil de 1916, permitindo que

situações pudessem ser reguladas pelo Estado sem que fosse alterada substancialmente a

centralidade e a exclusividade do Código Civil de 1916. Teriam estas leis, portanto, "caráter

emergencial", sendo incapazes de afetar os pilares do direito civil, mantendo-se o caráter de

exclusividade do Código Civil de 1916.

Porém, logo o Estado passou a intervir na ordem jurídica, com a criação de diversas

leis extracodificadas, as quais passaram a tutelar diversas situações não abrangidas pelo

Código Civil de 1916, inclusive com relação aos contratos, surgindo, assim, as denominadas

leis especiais. Guimarães (2003) cita que,

Novos textos constitucionais começam a incorporar e definir princípios atinentes às matérias antes abordadas apenas pelo Código Civil, passando as mesmas a apresentar um caráter constitucional. Esta profunda alteração, se deve à preocupação que o legislador teve em estabelecer um modelo jurídico que protegesse o sujeito de direito, garantindo a estabilidade das normas, principalmente, com as modificações causadas pela legislação especial que tutelavam uma nova realidade de interesses sociais e econômicos preestabelecidos pelo Estado.

Com a promulgação da Constituição de 1988, verificou-se que a Carta Magna e o

Código Civil eram distintos, não unificados, ou seja, não havia compatibilidade entre o que

rezava a Constituição e o que dispunha o Código Civil de 1916. Pode-se verificar que, a

Constituição de 1988 surgiu como forma de normatizar a organização e competência estatal e

de acordo com Guimarães (2003),

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O respeito à Constituição não requer apenas a observância de procedimentos para feitura da norma infraconstitucional, implica, também, na imposição de que o seu conteúdo reflita os valores insculpidos na própria Constituição. De qualquer sorte, mesmo que o legislador ordinário deixe de observar estas premissas, caberá ao juiz e ao intérprete proceder à adequação da legislação, através da interpretação sistemática, verificando sempre o espírito da Carta Maior.

Observa-se que, o Código Civil de 1916 não poderia mais ser considerado superior aos

ditames da Constituição Federal, necessitando urgente de mudanças expressivas em seu texto.

Aí surge o Código Civil de 2002, no qual passou-se a disciplinar a função social dos

contratos, mais precisamente no artigo 421, preconizando as relações entre as partes além do

princípio da função social. A este respeito, Negreiros (2002, p. 206) destaca:

[...] o princípio da função social importa em redefinir o alcance daqueles outros princípios da teoria clássica, constituindo-se em um condicionamento adicional imposto à liberdade contratual.

Do exposto, observa-se que, encontra-se aí o princípio da relatividade dos contratos,

demonstrando que este é um instrumento capaz de produzir efeitos somente com relação aos

contratantes, não atingindo terceiros.

A função social dos contratos tem como natureza ser um princípio e a este respeito

Ferreira da Silva apud Muller (2008) cita,

Por possuir tal natureza – a de um princípio –, não pode valer-se da lógica do tudo ou nada, da aplicação completa ou da não aplicação. Tal princípio convive com os demais do direito obrigacional, não os excluindo e não sendo excluído. Seu peso será analisado somente no caso concreto.

Segundo Tartuce (2007, p. 76), verifica-se que:

[...] os contratos devem ser interpretados de acordo com a concepção do meio social onde estão inseridos, não trazendo onerosidades excessivas às partes contratantes, garantindo que a igualdade entre elas seja respeitada, mantendo a justiça contratual e equilibrando a relação onde houver a preponderância da situação de um contratantes sobre a do outro. Valoriza-se a eqüidade, a razoabilidade, o bom senso, afastando-se o enriquecimento sem causa (...) a função social dos contratos visa à proteção da parte vulnerável da relação contratual.

Com base no exposto, verifica-se que, o princípio da função social leva em

consideração a observância das conseqüências sociais das relações obrigacionais e, Santos

(2003, p. 109), complementa que “a função social do contrato requer dois elementos, ou seja,

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para existir a possibilidade de o contrato cumprir sua função social, mister se faz a existência

de dois requisitos: um interno e um externo”.

O mesmo autor destaca que:

O primeiro deles é a adequada ponderação entre os três princípios fundamentais de direito contratual: a autonomia privada, a boa-fé objetiva e o equilíbrio contratual. Sem que estejam bem balanceados esses três princípios na relação contratual não se pode dizer que o contrato cumpriu a sua função social, pois será mera imposição de uma parte; ou então será um contrato abusivo e desleal, quando faltar observância ao princípio da boa-fé objetiva; ou será um contrato injusto quando não atentar para o princípio do equilíbrio contratual. Mas, todos esses princípios têm, eminentemente, uma relação com o conteúdo do contrato, ou seja, com a parte interna do acordo de vontades e que diz respeito, na maioria dos casos, apenas ao interesse privado. Para que se conceba um conceito adequado de função social do contrato é preciso que se busque também um elemento externo ao contrato. Por isso não basta apenas aquela relação de proporcionalidade entre os princípios. É necessário que com o contrato se atinja o bem comum. E o bem comum, para se dar uma breve explicação, não pode ser entendido como o bem somente dos indivíduos, tampouco como o bem somente do todo, do coletivo. O bem comum deve ter uma concepção mista. Portanto, deve ser visto como o bem do todo e o bem dos indivíduos (SANTOS, 2003, p. 109)..

Verifica-se que, a função social tem como preocupação a inclusão desta no plano da

eficácia e é a este respeito que Veloso apud Alvin e Rosas (2003, p. 598) destacam:

[...] a eficácia jurídica é a conseqüência principal do negócio. Em regra, ninguém declara a sua vontade para que não tenha sentido algum nem que gere qualquer efeito. Há casos, todavia, em que, considerando as circunstâncias, a lei recusa efeitos ao negócio. Nestes casos, a ineficácia não atinge os atos em si, pois eles são válidos, mas impede que os seus efeitos se projetem a determinadas pessoas.

Portanto, pode-se enfatizar que a função social do contrato procura equilibrar as

relações contratuais, em consonância com a finalidade do Direito através da utilização do

princípio da dignidade humana.

3.2 CONCEITO DE FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO

A vida moderna é formada por incontáveis contratos, necessários para preservar a

segurança jurídica dos interesses das partes. É inconcebível visualizar-se o mundo moderno

sem a existência dos contratos, quando se toma um táxi, um ônibus, compra-se pão, todos os

atos até os mais simples da vida são regidos por contratos.

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O contrato, como diz Serpa Lopes (1996, p. 35), “é o centro da vida dos negócios, os

quais implicam a composição dos interesses inicialmente opostos, ou, quando menos, não

coincidentes”.

A vida contratual é cada vez mais intensa, esta maior intensidade é resultante do

progresso econômico alicerçado pela evolução tecnológica. Ao desenvolver-se as relações

industriais, de comércio e propriamente civis tem-se um incremento na celebração de

contratos em termos tanto quantitativos quanto qualitativos, assim surgem e desenvolvem-se

novas categorias contratuais. Portanto apesar de diversas serem as funções atuais dos

contratos, a mais importante é a função econômica, pois é o principal veículo de

movimentação da economia. Esta função econômica também é a razão da existência dos

contratos.

Para Gomes (2000, p. 19-20):

o homem precisa dos contratos para alcançar fins determinados por seus interesses econômicos. É mediante um desses contratos que se desfaz de um bem por dinheiro ou em permuta de outro bem; que trabalha para receber salário; que coopera com outrem a obter uma vantagem pecuniária; que a outros se associa para realizar determinado empreendimento; que previne risco; que põe em custódia coisas e valores; que obtém dinheiro alheio; em suma, que participa da vida econômica. Se quer comprar um bem que outrem está disposto a vender ou a trocar, a lei lhe oferece o instrumento adequado: o contrato de compra e venda, ou o de permuta. Se pretende, por liberalidade, transferir de seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra pessoa, utiliza o contrato de doação. Se precisa de casa para morar, pode alugá-la, celebrando contrato de locação. Se necessita trabalhar para outrem em troca de salário, estipula contrato de trabalho. Se pretende de outrem determinada obra, a encomenda, concluindo contrato de empreitada. Se tem necessidade de bem alheio, toma-o por empréstimo, mediante comodato ou mútuo. Se quer que determinada coisa seja guardada por outrem, durante algum tempo, serve-se do contrato de depósito. Se lhe convém que outra pessoa administre seus interesses, confere-lhe poderes bastantes pelo contrato de mandato. Se necessita lograr certo fim juntamente com outrem, exige fiança, estipulando o respectivo contrato. E assim por diante, cada qual tendo função econômica específica.

Além de sua função econômica, deve-se mencionar a sua função social como forma de

garantir direitos, quanto a expectativas de contratação, zelando, sobretudo pela paz social.

No entendimento de Savigny apud Lopes (1996, p. 29), “contrato é o concurso de

mais de uma pessoa em uma concorde declaração de vontade pela qual se determinam as suas

relações jurídicas”.

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Nesta mesma linha, encontram-se os seguintes dizeres de Silvio Rodrigues (2002):

“cada vez que a formação do negócio jurídico depender da conjunção de duas vontades,

encontramo-nos na presença de um contrato, que é, pois, o acordo de duas ou mais vontades,

em vista de produzir efeitos jurídicos”.

Já para Orlando Gomes (1977), contrato:

[...] é uma espécie de negócio jurídico que se distingue, na formação, por exigir a presença de pelo menos duas partes. Contrato é, portanto, negócio jurídico bilateral, ou plurilateral. Contrato distingue-se da lei, por ser fonte de obrigações e direitos subjetivos, enquanto a lei é fonte de direito objetivo, ação humana de efeitos voluntários.

Com relação ao conceito propriamente dito a respeito do contrato, verifica-se a

existência de uma vasta gama, porém, em todos, encontra-se a peça chave que é o fato de o

contrato nascer do consenso e geralmente possuir caráter patrimonial.

Pode-se dizer com segurança que o comércio mundial só sobreviveu e atingiu o atual

estágio de desenvolvimento devido à garantia de cumprimento das obrigações assumidas no

momento da celebração dos contratos.

Com relação a função social do contrato, verifica-se que, no entendimento do

Conselho da Justiça Federal, através do Enunciado 21, o qual reza:

A função social do contrato, prevista no artigo 421 do novo Código Civil, constitui cláusula geral, a impor a revisão do principio da relatividade dos efeitos dos contratos em relação a terceiros, implicando a tutela externa do crédito.

Complementa Noronha apud Azevedo (1998, p. 119) a respeito:

Efetivamente, se um contrato deve ser considerado como fato social, como temos insistido, então a sua real existência há de impor-se por si mesma, para poder ser invocada contra terceiros, e, às vezes até ser oposta por terceiros à próprias partes. Assim é que não só a violação de contrato por terceiro pode gerar

responsabilidade civil deste (como quando terceiro destrói a coisa que devia ser prestada, ou na figura da indução ao inadimplemento de negócio jurídico alheio), como também terceiros podem opor-se ao contrato, quando sejam por ele prejudicados (o instituto da fraude contra terceiros é exemplo típico disso.

Como menciona com acuidade Tartuce (2005, p. 315):

A função social do contrato, preceito de ordem pública, encontra fundamento constitucional no princípio da função social do contrato lato sensu (art. 5º, XXII e

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XXIII, e 170,III), bem como no princípio maior de proteção da dignidade da pessoa humana (art. 1º III), na busca de uma sociedade mais justa e solidária (art. 3º,I) e da isonomia (art. 5º, caput). Isso, repita-se, em uma nova concepção do direito privado, no plano civil-constitucional, que deve guiar o civilista do nosso século, seguindo tendência de personalização.

3.2.1 A natureza jurídica da função social do contrato

Para compreender a natureza jurídica da função social do contrato, deve-se levar em

consideração que, o mesmo não pode trazer onerosidade excessiva, desproporção e injustiça

social, bem como, não pode violar interesses individuais que abranjam a proteção da

dignidade humana.

O artigo 421 do novo Código Civil destaca a importância dos princípios que passaram

a reger os negócios jurídicos, destacando-se o princípio da boa-fé, da equidade e função

social, ou seja, “Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da

função social do contrato”.

Verifica-se que, houve por preocupação do legislador, ao elaborar o novo Código

Civil, destacar a função social, passando a reconhecer o contrato com base em princípios que

deverão ser seguidos para atingir o direito. A este respeito, Cambraia (2008) cita:

O compromisso expresso no art. 421, do Código Civil, com a função social, importa no reconhecimento de que o contrato não pode mais ser considerado como direito absoluto, devendo estar ligado ao instituto jurídico da igualdade. O princípio da função social do contrato possui nítido relacionamento com o princípio da boa fé, que exige que as partes ajam com lealdade e confiança recíprocas, devendo colaborar, mutuamente, na formação e execução do contrato, tudo na mais absoluta probidade. A função social instrumentaliza-se pelos princípios do equilíbrio contratual e da boa-fé objetiva, ressaltando-se que o princípio do pacta sunt servanda não vigora mais em toda a sua intensidade. O princípio da função social do contrato revela-nos que o contrato não pode mais ser visto pela ótica meramente individualista, já que possui um sentido social para toda a comunidade. Considera-se violado o princípio da função social dos contratos quando os efeitos externos do pacto prejudicarem injustamente os interesses da sociedade ou de terceiros não ligados ao contrato firmado .

A este respeito, cita Gavião (2008):

Na realidade, ao dispor que a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato, o artigo 421 do Código Civil institui um novo requisito de validade dos pactos, subordinando a eficácia das avenças à observância de determinados padrões de probidade, lealdade e socialidade, o que revela que não

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podemos pensar no contrato de modo isolado, mas no contexto do ordenamento jurídico em que está inserido, em que deve ser assegurado, principalmente, o princípio da igualdade.

Observa-se então que, o art. 421 do Código Civil instituiu um novo requisito de

validade dos pactos, fazendo com que houvesse um entendimento do contrato tendo por base,

principalmente, o princípio da igualdade.

Complementando estes dizeres, Cambraia (2008), cita que,

O que o princípio imperativo da “função social do contrato” estatui é que este não pode ser transformado em um instrumento para atividades abusivas, causando dano à parte contrária ou a terceiros, uma vez que, nos termos do Art. 187, “também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. O art. 421 do Código Civil veio atrelar o princípio da autonomia de vontade ao da socialidade, uma vez que a liberdade de contratar é limitada pela função social do contrato, sendo esse artigo conseqüência dos princípios constitucionais da função social da propriedade e da igualdade, atendendo aos interesses sociais, uma vez que limita o arbítrio dos contratantes, criando condições para o equilíbrio econômico-contratual. O novo Código Civil não ficou a margem da indispensável necessidade de integrar o contrato na sociedade, como meio de realizar os fins sociais, pois determinou que a liberdade contratual (...) deve ser exercida em razão e nos limites da função social do contrato.

O que se verifica com relação a natureza jurídica da função social do contrato, diz

respeito ao princípio da sociabilidade que foi adotado pelo novo Código Civil, o qual

encontra-se em consonância com a Constituição Federal, demonstrando que o contrato tem

prevalência dos valores coletivos sobre os individuais, porém, sem deixar de considerar o

valor fundamental da pessoa humana.

Assim, pode-se dizer que, a função social do contrato é o reconhecimento, ainda que

tardio, da função precípua, inerente, e essencial do contrato, isto porque, o contrato surge

como forma de conceder ao homem o suprimento de suas deficiências naturais e individuais,

como veículo orientador da vida humana e social (CASALI, 2008).

3.3 A FINALIDADE DA FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS

No que se refere a finalidade da função social dos contratos, procura-se abordar a

compensatória e a punitiva, sobre as quais se passa a discorrer.

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3.3.1 Finalidade compensatória

Analisando o que dispõe o artigo 421 do novo Código Civil, verifica-se que, um dos

pontos altos do mesmo encontra-se em que “a liberdade de contratar será exercida em razão e

nos limites da função social do contrato” e, desta forma, passa a haver uma maior

preocupação com relação ao direito de propriedade, tendo por base o que dispõe os incisos

XXII e XXIII do artigo 5° da Constituição Federal com relação ao atendimento da função

social deste direito.

A este respeito, Reale (2008) cita que: “Ora, a realização da função social da

propriedade somente se dará se igual princípio for estendido aos contratos, cuja conclusão e

exercício não interessa somente às partes contratantes, mas a toda a coletividade”.

Hora Neto (2003) discorre sobre o tema da seguinte forma:

Em verdade, se certo é que a Carta Magna/88, de forma explícita, condiciona que a livre iniciativa deve ser exercida em consonância com o princípio da função social da propriedade (art. 170, inciso III), e, uma vez entendida que a propriedade representa o segmento estático da atividade econômica, não é desarrazoado entender que o contrato, enquanto segmento dinâmico, implicitamente também está afetado pela cláusula da função social da propriedade, pois o contrato é um instrumento poderoso de circulação da riqueza, ou melhor, da própria propriedade.

Desta forma, entende-se que o direito contratual moderno vige sob dois princípios

constitucionais: o princípio da dignidade humana (art. 1°, inciso III) e o princípio da livre

iniciativa (art. 170 caput) da Constituição Federal, demonstrando que a Teoria Geral dos

Contratos passa a se valer também da função social do contrato como forma de priorizar

aspectos necessários a validação dos contratos com base na função social.

A respeito destes princípios, Hora Neto (2003) cita:

Quanto ao primeiro (dignidade da pessoa humana), por se tratar de um valor constitucional supremo, que se traduz no respeito ao ser humano, significa dizer ser o ponto central de todo o ordenamento jurídico e para onde converge todo o espectro de interesses constitucionais. Para tanto, a Constituição Federal repousa todo o seu manto principiológico na proteção da dignidade da pessoa humana, ou seja, na concepção de que a pessoa é o fundamento e o fim da sociedade e do Estado. Quanto ao segundo (livre iniciativa), não se cinge tão-somente à liberdade da empresa (comércio e indústria), mas também à liberdade de contrato, enquanto uma das facetas da livre iniciativa. Nesse aspecto, a livre iniciativa e, por conseguinte, o lucro, tem respaldo constitucional, desde que o lucro não seja abusivo ou extorsivo,

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pois deve estar atrelado aos ideais de Justiça Social externados nos objetivos fundamentais da República (art. 3º da CF/88).

Verifica-se que, a atribuição de função social ao contrato não impede que pessoas

naturais ou jurídicas livremente o concluam, mas sim, tem a preocupação de que o acordo de

vontades não ocorra em detrimento da coletividade, representando, contudo, uma forma de

promover a afirmação e desenvolvimento de uma sociedade.

Guimarães (2004) destaca que:

[...] o Estado Social, que tem na dignidade da pessoa humana o seu maior fundamento, colocando ao lado da autonomia da vontade e da liberdade princípios como os da boa-fé objetiva e da tutela do hipossuficiente, em busca da justiça substancial, com o deslocamento da relação contratual da tutela subjetiva da vontade à tutela objetiva da confiança, visando sempre o interesse social. A boa-fé objetiva significa, portanto, uma atuação "refletiva", uma atuação refletindo, pensando no outro, no parceiro contratual, respeitando-o, respeitando seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento do objetivo contratual e a realização dos interesses das partes.

E complementa:

[...] a nova concepção de contrato é uma concepção social deste instrumento jurídico, para a qual não só o momento da manifestação da vontade (consenso) importa, mas onde também e principalmente os efeitos do contrato na sociedade serão levados em conta e onde a condição social e econômica das pessoas nele envolvidas ganha em importância [...]

Desta forma, prioriza-se na atualidade, a realização de um contrato que detenha a

função social, voltado para o desenvolvimento de função translativa-circulatória das riquezas,

mas que, não deixe de realizar seu papel social com relação à dignidade da pessoa humana e à

redução das desigualdades culturais e materiais, levando em consideração os valores e

princípios descritos na Constituição Federal.

3.3.2 Finalidade punitiva

A finalidade punitiva da função social do contrato tem por preocupação a não

transformação do instrumento do contrato em um fim para que sejam realizadas atividades

abusivas que possam causar dano à parte contrária ou a terceiros, tendo por base o que reza o

artigo 187 do novo Código Civil: “também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao

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exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela

boa-fé ou pelos bons costumes”.

Estes dados estão previstos no § 4° do artigo 173 da Constituição Federal, “que não

admite negócio jurídico que implique abuso do poder econômico que vise à dominação dos

mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros”.

A respeito do tema, Reale (2008) cita que:

Esse é um caso extremo de limitação do poder negocial, não sendo possível excluir outras hipóteses de seu exercício abusivo, tão fértil é a imaginação em conceber situações de inadmissível privilégio para os que contratam, ou, então, para um só deles. É em todos os casos em que ilicitamente se extrapola do normal objetivo das avenças que é dado ao juiz ir além da mera apreciação dos alegados direitos dos contratantes, para verificar se não está em jogo algum valor social que deva ser preservado.

Complementa estes dados, Hora Neto (2003) enfatizando que:

Na contemporaneidade, no contexto de uma sociedade massificada e plural ao extremo, não é mais aceitável, sob qualquer ótica a analisar, que o contrato seja um instrumento de ruína do contratante mais fraco, levando-o à miséria ou mesmo entregando sua liberdade em razão de eventual inadimplência contratual, sem qualquer direito de defesa. Veja-se, por oportuno, diversos exemplos que infringem os direitos humanos privados, (...), a saber: a prisão civil em matéria de alienação fiduciária em garantia; a edição da Resolução 980/84 que, em sede de contrato de ‘leasing’, o desnaturou para compra e venda e, como tal, impossibilitou que os arrendatários pagassem somente o aluguel, elidindo o direito de escolha ao final do contrato (art. 6º II do CDC); o leilão extrajudicial do bem imóvel adquirido nos termos do Dec.-lei 70/66, sem a interferência do Poder Judiciário; a resolução do contrato de trato sucessivo, ainda que adimplido em larga escala, dentre outros.

A este respeito, Guimarães (2004) cita que:

O mesmo se pode dizer dos princípios do equilíbrio econômico do contrato, da eqüidade e da proporcionalidade que podem ser concretizados através da incidência dos institutos da lesão e da onerosidade excessiva superveniente. [...] ocorre a lesão quando inexiste a comutatividade da prestação, ou seja, quando uma das partes contratantes se aproveita da outra, dada a sua inexperiência ou estado de necessidade. Para que se possa configurar a ocorrência da lesão é necessária convivência de dois aspectos: um objetivo e um subjetivo. Do ponto de vista objetivo, a lesão requer a presença de prestação desproporcional a que uma das partes se vincula. O subjetivo apresenta-se como o aspecto deficitário de uma das partes, o que requer inexperiência para que o ato seja considerado como praticado em estado de lesão.

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De acordo com o exposto, verifica-se que a finalidade punitiva da função social do

contrato diz respeito a lesão e onerosidade excessiva que podem decorrer de um determinado

contrato por uma das partes, necessitando esta ser punida com rigor, para que não fira os

preceitos constitucionais.

3.4 O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE NA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO

Para compreender o significado do princípio da proporcionalidade no âmbito da

função social do contrato, destaca-se o pensamento de Eduardo Sens Santos apud Gaglano e

Pamplona Filho (2005, p. 47-48):

[...] o contrato não pode mais ser entendido como mera relação individual. É preciso atentar para os seus efeitos sociais, econômicos, ambientais e até mesmo culturais. Em outras palavras, tutelar o contrato unicamente para garantir a eqüidade das relações negociais em nada se aproxima da idéia de função social. O contrato somente terá uma função social – uma função pela sociedade – quando for dever dos contratantes atentar para as exigências do bem comum, para o bem geral. Acima do interesse em que o contrato seja respeitado, acima do interesse em que a declaração seja cumprida fielmente e acima da noção de equilíbrio meramente contratual, há interesse de que o contrato seja socialmente benéfico, ou, pelo menos, que não traga prejuízos à sociedade – em suma, que o contrato seja socialmente justo.

Desta forma, o princípio da proporcionalidade voltado à função social do contrato

abrange muito mais do que apenas os contratos em si, voltados para os aspectos econômicos,

pois ao abranger o aspecto social volta-se para o atingimento do bem comum de uma

população.

Gagliano e Pamplona Filho (2005, p. 53) destacam ainda que:

[...] os principais vetores de uma ordem econômica sustentada e equilibrada, em que haja respeito ao direito do consumidor, ao meio ambiente e como já observamos, a própria função social da propriedade, todos eles, reunidos e interligados, dão sustentação constitucional a função social do contrato. (...) Ao mencionar que a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato, o legislador estabeleceu, de uma só vez, um critério finalístico ou teleológico e outro critério limitativo para a caracterização desse princípio.

Entende-se que, o contrato como um dos principais instrumentos de circulação de

riquezas, ao se preocupar com a regulação dos interesses das partes, não pode ser visto de

forma desvinculada do contexto social no qual se encontra inserido, visto que, por ser uma

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relação jurídica, exerce também a função econômica, através da distribuição de bens

suscetíveis de valoração econômica, além de proteger interesses sociais relevantes.

De acordo com Mônica Yoshizato Bierwagen apud Guimarães (2004), o novo Código

Civil teve preocupação com relação a desigualdade material entre as partes contratantes,

estabelecendo novos limites com relação a autonomia da vontade, ou seja:

[...] seu exercício deverá objetivar e se dar em razão da função social do contrato; proibindo e tornando anuláveis determinados conteúdos que representem uma desigualdade substancial entre as partes (enriquecimento sem causa, lesão nos contratos bilaterais, contrato estabelecido em estado de perigo); exigindo transparência, lealdade e correção nos negócios (princípio da boa-fé).

No entendimento de Antônio Junqueira Azevedo apud Guimarães (2004),

[...] a noção de função social do contrato condiz com a de um preceito que se destina a integrar os contratos em uma ordem social, visando impedir tanto aqueles que causam prejuízo à coletividade quanto os que lesam pessoas indeterminadas. [...] A idéia de função social do contrato está claramente determinada pela Constituição, o fixar como um dos fundamentos da República, o valor social da livre iniciativa (art. 1º, IV); essa disposição impõe, ao jurista, a proibição de ver o contrato como um átomo, algo que somente interessa às partes, desvinculado de tudo mais. O contrato, qualquer contrato, tem importância para toda a sociedade e essa asserção, por força da Constituição, faz parte, hoje, do ordenamento positivo brasileiro [...]

O mesmo autor complementa, enfatizando que:

[...] uma vez que o contrato tem, entre outras funções, a de instrumentalizar a aquisição da propriedade. Se a esta não é mais reconhecido o caráter absoluto e sagrado, a condição de direito natural e inviolável do indivíduo, correlatamente ao contrato também inflete o cometimento - ou o reconhecimento – de desempenhar função que transpassa a esfera dos meros interesses individuais.

3.5 A FIXAÇÃO DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO

Destacam-se, a seguir, aspectos pertinentes a fixação indenizatória da função social do

contrato.

3.5.1 A fixação indenizatória da função social do contrato

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A liberdade negocial tendo por base a função social do contrato, deverá encontrar um

justo limite no interesse social e também nos valores da pessoa humana, levando em

consideração ainda aspectos que se voltem para a preservação do meio ambiente, segurança

no trabalho e, como citam Gagliano e Pamplona Filho (2005, p. 54) ao exemplificar a respeito

de negócio pactuado de forma perfeita onde conste agente capaz, objeto lícito, forma prescrita

ou não defesa em lei, enfatizam que, se ocorrer qualquer violação a legislação ambiental ou

segurança no trabalho, a função social não terá sido respeitada e, portanto, o prejudicado

poderá entrar com ação indenizatória junto ao Poder Judiciário.

Com base no exposto, Gagliano e Pamplona Filho (2005, p. 54) citam:

Claro está que, em caso de dano, poderá o prejudicado intentar ação indenizatório, sem que descartemos a hipótese de se poder atacar até mesmo a sua validade, pois, se a infringência ao superior princípio houver derivado de fraude à lei, hipótese bastante factível, nada impede que se obtenha judicialmente a nulidade do próprio contrato.

Destacam ainda o que estabelece o art. 166 do Código Civil, ou seja:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: I – celebrado por pessoa absolutamente incapaz; II – for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto; III – o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito; IV – não revestir a forma prescrita em lei; V – for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; VI – tiver por objetivo fraudar lei imperativa; VII – a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.

A este respeito, Paula (2007) destaca que:

Com o objetivo de integrarmos o fim social no valor indenizatório do dano moral nas sentenças, faz-se necessário invocarmos o atual Código Civil, no artigo 1.228, § 1º, que reafirma a função social da propriedade acolhida no art. 5º, XXII e XXIII e artigo 170, III, da Constituição Federal de 1988, através dos quais ratifica-se a importância da função social do contrato, de tal sorte que nas indenizações de danos morais tal princípio constitucional não pode ser afastado.

A regra está contida no artigo 1.553 do Código Civil, o qual dispõe que: "Art. 1.553.

Nos casos não previstos neste capítulo, se fixará por arbitramento a indenização”.

No novo Código Civil, também encontramos a respeito da indenização, ou seja:

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Art. 953. A indenização por injúria, difamação ou calúnia consistirá na reparação do dano que delas resulte ao ofendido. Parágrafo único. Se o ofendido não puder provar prejuízo material, caberá ao juiz fixar, eqüitativamente, o valor da indenização, de conformidade com as circunstâncias do caso.

Complementa Paula (2007) destacando:

Adotando-se o fim social na sentença de reparação por dano moral estará o magistrado atendendo aos princípios constitucionais e do próprio direito natural, evitando a utilização de ações desta natureza como forma de locupletamento indevido ou ainda nos casos em que uma atitude isolada de um indivíduo o quantum atribuído como forma indenizatória a uma empresa possa trazer conseqüências a própria sociedade, como a redução do número de empregados em determinada empresa ou até mesmo a decretação da falência desta, impondo a própria sociedade a sanção.

Para melhor compreensão a respeito, destaca-se jurisprudência que se refere a

indenização.

AGENCIAMENTO – PUBLICIDADE – INADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO – REEMBOLSO – DANO MORAL – DESCABIMENTO (...) O mero fato do descumprimento do contrato não enseja indenização por dano moral (TJRJ – AC 1.015/98 – Reg. 240498 – Cód. 98.001.01015 – 5ª C.Cív. – Rel. Des. Carlos Ferrari – J. 24.03.1998). AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. COMÉRCIO ELETRÔNICO. COMPRA E VENDA DE CAMISETA DA SELEÇÃO BRASILEIRA. COBRANÇA EM DUPLICIDADE. NÃO ENTREGA DO PRODUTO. RESPONSABILIZAÇÃO DA EMPRESA QUE DISPONIBILIZA NA INTERNET A REALIZAÇÃO DOS NEGÓCIOS. OCORRÊNCIA DE DANOS MATERIAIS. INOCORRÊNCIA DE DANOS MORAIS. Sentença confirmada por seus próprios fundamentos. Recurso improvido (TJ-RS 71001264332).

Do exposto, fica claro que, nos casos em que houver violação ao disposto na

legislação, a indenização material dos danos sofridos poderá ser requerida por aquele que se

sentir lesado e, desta forma, no âmbito dos contratos, mais especificamente com relação a

função social destes, a indenização é pertinente, cabendo ao magistrado decidir sobre valores

e a forma indenizatória, tendo por base o prejuízo causado.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com o advento do novo Código Civil em 2002, a Teoria Geral dos Contratos sofreu

mudanças, principalmente com relação a função social, na qual passou-se a destacar a

importância do princípio da boa-fé de maneira a se preservar os aspectos sociais e,

primordialmente, a dignidade da pessoa humana.

O trabalho foi dividido em dois capítulos, sendo que no primeiro, A Teoria Geral dos

Contratos, procurou-se destacar de forma clara e sucinta, aspectos pertinentes ao conceito,

princípios contratuais, elementos de validade dos contratos e a formação e conclusão do

vínculo contratual.

Neste capítulo, pôde-se compreender o significado dos contratos tendo por base

autores que tratam do tema, destacando-se os princípios contratuais, mais precisamente o

princípio da obrigatoriedade contratual, do consensualismo, da autonomia privada, da boa-fé e

da relatividade dos efeitos dos contrato. Enfatizou-se também os requisitos de validade dos

contratos, quais sejam: requisitos subjetivos, objetivos e formais. Finalmente, abordou-se a

formação e conclusão do vínculo contratual.

O segundo, A função social dos contratos, abordou-se o conceito da função social, sua

natureza jurídica, sua finalidade, o que levou a obtenção de maior compreensão com relação a

este importante quesito no entendimento da Teoria Geral dos Contratos. Enfocou-se também o

princípio da proporcionalidade no âmbito da função social dos contratos, além da fixação

indenizatória da função social do contrato.

Este capítulo voltou-se exclusivamente para o entendimento da função social dos

contratos, tendo por base o que dispõe o novo Código Civil e os preceitos constitucionais,

destacando-se os aspectos voltados a priorização da função social como forma de

cumprimento do princípio da boa-fé em detrimento do princípio da vontade.

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A elaboração deste estudo permitiu conhecer aspectos importantes não só com relação

a Teoria Geral dos Contratos, mas, principalmente da função social do contrato, sendo que,

demonstrou-se que a hipótese “a função social do contrato visa manter o equilíbrio contratual

entre os contratantes, desde que o mesmo não seja abusivo e se umas das partes sentir-se

lesada poderá buscar o amparo deste princípio”, levantada quando da elaboração do projeto

foi atingida, isto porque, verificou-se que, na atualidade, a função social do contrato objetiva,

com base no novo Código Civil e na Constituição Federal, manter o equilíbrio contratual,

impondo punições aos que não cumprirem de forma correta o contrato, ao mesmo tempo, que

passa a ter uma maior preocupação com o aspecto social do contrato.

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